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REPUBLICA PORTUGUESA

DIARIO DA ASSEMBLEIA NACIONAL CONSTITUINTE

54.ª SESSÃO

EM 18 DE AGOSTO DE 1911

SUMMARIO.- Antes da ordem do dia: Chamada e abertura da sessão. - Leitura e approvação da acta. - Dá-se couta do expediente. - Lê-se na mesa um officio enviado pelo Sr. Deputado Dantas Baracho, insistindo na sua renuncia do cargo de Deputado. - Usa da palavra o Sr. Deputado Henrique Cardoso.- O Sr. Presidente (Braamcamp Freire) propõe, e são approvados, votos de sentimento pelos fallecimentos do Sr. Joaquim de Azevedo Terenas e do pae do Sr. Deputado Fortunato da Fonseca. - Procede-se a segundas leituras do projecto de lei.- O Sr. Deputado José Barbosa faz uma communicação em nome das commissões da Constituição e da redacção.- Usa da palavra o Sr. Ministro do Fomento (Brito Camacho), apresentando diversas emendas ao projecto sobre importação de azeite. - Fala, em aparte, o Sr. Ministro da Justiça (Affonso Costa). - Ao Sr. Deputado Lopes da Silva, responde o Sr. Ministro do Fomento (Brito Camacho).- Usa da palavra o Sr. Deputado Nunes da Mata, a quem o mesmo Sr. Ministro responde.- Falam, apresentando emendas ao projecto, os Srs. Deputados Sousa da Camara e Antonio Gil. Responde-lhe o Sr Ministro do Fomento (Brito Camacho), sendo o projecto approvado. - O Sr. Deputado Marques da Costa apresenta um projecto de lei sobre a elaboração do plano da avenida marginal do Tejo. - Enviam requerimentos para a mesa os Srs. Deputados Paiva Gomes, Pires de Campos, Alberto Souto e Antonio de Carvalho; e o Sr. Deputado Joaquim Ribeiro apresenta uma nota de interpellação.

Ordem do dia: (Continuação da discussão do projecto de lei n.° 3 (Constituição) - Apresentam emendas ao capitulo 7.º os Srs. Deputados Bernardino Roque, Adriano Pimenta e Gastão Rodrigues, falando tambem os Srs. Deputados Martins Cardoso, João de Menezes, Antonio Macieira, Peres Rodrigues, Pereira Bastos, Moraes Rosa e Abilio Barreto, sendo approvadas as propostas dos Srs. Deputados Gastão Rodrigues e Antonio Macieira. - É approvada a epigraphe do capitulo 7.°- Ao artigo 71.° propõem de emendas os Srs. Deputados Barbosa de Magalhães. Mariano Martins, Jacinto Nunes, Adriano Pimenta, Silva Ramos, Sidonio Paes, Machado Serpa, Carlos Maia, Carneiro Franco; e falando o Sr. Deputado João de Menezes em nome da commissão do projecto. - O Sr. Deputado Matos Cid apresenta um requerimento que o Sr. Ministro da Justiça (Affonso Costa) propõe que seja dividido em duas partes O artigo é approvado com as emendas da Srs. Deputados Adriano Pimenta e Carneiro Franco. - O Sr. Deputado Nanes da Mata faz diversas considerações sobre a conveniencia de uma amnistia aos implicados no caso do Arsenal. - O Sr. Deputado Barbosa de Magalhães envia para a mesa duas representações: uma da Liga da Defesa do Inquilinato e outra dos empregados nos antigos paços reaes. - O Sr. Presidente encerra a sessão.

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2 DIARIO DA ASSEMBLEIA NACIONAL CONSTITUINTE

Presidencia do Exmo. Sr. Anselmo Braamcamp Freire

Secretarios os Exmos. Srs.

Baltasar de Almeida Teixeira
Affonso Henriques do Prado Castro e Lemos

Abertura da sessão.- Ás 2 horas e 25 minutos da tarde.

Presentes. - 186 Srs. Deputados.

São os seguintes: Abel Accacio de Almeida Botelho, Abilio Baeta das Neves Barreto, Achilles Gonçalves Fernandes, Adriano Augusto Pimenta, Adriano Gomes Ferreira Pimenta, Adriano Mendes de Vasconcellos, Affonso Augusto da Costa, Affonso Ferreira, Affonso Henriques do Prado Castro e Lemos, Albano Coutinho, Alberto de Moura Pinto, Alberto Souto, Albino Pimenta de Aguiar, Alexandre Augusto de Barros, Alfredo Balduino de Seabra Junior, Alfredo Botelho de Sousa, Alfredo Djalme Martins de Azevedo, Alfredo José Durão, Alfredo Maria Ladeira, Alfredo Rodrigues Gaspar, Alvaro Poppe, Amaro de Azevedo Gomes, Americo Olavo de Azevedo, Amilcar da Silva Ramada Curto, Angelo Rodrigues da Fonseca, Angelo Vaz, Anibal de Sousa Dias, Anselmo Braamcamp Freire, Antão Fernandes de Carvalho, Antonio Affonso Garcia da Costa, Antonio Albino Carvalho Mourão, Antonio Amorim de Carvalho, Antonio Aresta Branco, Antonio Augusto Cerqueira Coimbra, Antonio Barroso Pereira Victorino, Antonio Bernardino Roque, Antonio Brandão de Vasconcellos, Antonio Caetano Celorico Gil, Antonio Caetano Macieira Junior, Antonio Candido de Almeida Leitão, Antonio Florido da Cunha Toscano, Antonio Joaquim Ferreira da Fonseca, Antonio Joaquim Granjo, Antonio Joaquim de Sousa Junior, Antonio José Lourinho, Antonio Ladislau Parreira, Antonio Ladislau Piçarra, Antonio Maria de Azevedo Machado Santos, Antonio Maria da Cunha Marques da Costa, Antonio Maria da Silva, Antonio Maria da Silva Barreto, Antonio de Padua Correia, Antonio de Paiva Gomes, Antonio Pires de Carvalho, Antonio Pires Pereira Junior, Antonio Ribeiro Seixas, Antonio dos Santos Pousada, Antonio da Silva e Cunha, Antonio Xavier Correia Barreto, Antonio Valente de Almeida, Artur Augusto da Costa, Artur Rovisco Garcia, Augusto Almeida Monjardino, Augusto José Vieira, Aureliano de Mira Fernandes, Baltasar de Almeida Teixeira, Bernardino Luis Machado Guimarães, Carlos Amaro de Miranda e Silva, Carlos Antonio Calixto, Carlos Henrique da Silva Maia Pinto, Carlos Maria Pereira, Carlos Olavo Correia de Azevedo, Carlos Richter, Casimiro Rodrigues de Sá, Celestino Germano Paes de Almeida, Christovam Moniz, Domingos Leite Pereira, Domingos Tasso de Figueiredo, Eduardo Pinto de Queiroz Montenegro, Emidio Guilherme Garcia Mendes, Ernesto Carneiro Franco, Evaristo Luis das Neves Ferreira de Carvalho, Ezequiel de Campos, Faustino da Fonseca, Fernando Baeta Bissaia Barreto Rosa, Francisco Antonio Ochôa, Francisco Correia de Lemos, Francisco Cruz, Francisco Eusebio Lourenço Leão, Francisco José Pereira, Francisco Luis Tavares, Francisco de Salles Ramos da Costa, Francisco Xavier Esteves, Gastão Rafael Rodrigues, Gaudencio Pires de Campos, Germano Lopes Martins, Guilherme Nunes Godinho, Helder Armando dos Santos Ribeiro, Henrique José Caldeira Queiroz, Henrique José dos Santos Cardoso, Henrique de Sousa Monteiro, Inacio Magalhães Basto, Innocencio Camacho Rodrigues, João Barreira, João Carlos Nunes da Palma, João Carlos Rodrigues de Azevedo, João Duarte de Menezes, João Fiel Stockler, João José de Freitas, João José Luis Damas, João Luis Ricardo, João Machado Ferreira Brandão, Joaquim Antonio de Mello Castro Ribeiro, Joaquim Brandão, Joaquim José Cerqueira da Rocha, Joaquim José de Oliveira, Joaquim José de Sousa Fernandes, Joaquim Ribeiro de Carvalho, Jorge Frederico Vellez Caroço, Jorge de Vasconcellos Nunes, José Affonso Palla, José Alfredo Mendes de Magalhães, José Antonio Arantes Pedroso Junior, José Augusto Simas Machado, José Barbosa, José de Barros Mendes de Abreu, José Bernardo Lopes da Silva, José Botelho de Carvalho Araujo, José Carlos da Maia, José de Cupertino Ribeiro Junior, José Estevam de Vasconcellos, José Francisco Coelho, José Jacinto Nunes, José Luis dos Santos Moita, José Machado de Serpa, José Maria Cardoso, José Maria Pereira, José Mendes Cabeçadas Junior, José Miranda do Valle, José Montez, José Nunes da Mata, José Perdigão, José Pereira da Costa Basto, José Relvas, José da Silva Ramos, José Thomás da Fonseca, José Tristão Paes de Figueiredo, José do Valle Matos Cid, Julio do Patrocinio Martins, Luis Augusto Pinto de Mesquita Carvalho, Luis Fortunato da Fonseca, Luis Innocencio Ramos Pereira, Luis Maria Rosette, Manuel Alegre, Manuel de Arriaga, Manual de Brito Camacho, Manuel Goulart de Medeiros, Manuel Jorge Forbes de Bessa, Manuel José Fernandes Costa, Manuel José de Oliveira, Manuel José da Silva, Manuel Martins Cardoso, Manuel Pires Brás Bravo Junior, Manuel Rodrigues da Silva, Manuel de Sousa da Camara, Mariano Martins, Miguel de Abreu, Miguel Augusto Alves Ferreira, Narciso Alves da Cunha, Pedro Alfredo de Moraes Rosa, Pedro Amaral Botto Machado, Pedro Januario do Valle Sá Pereira, Philemon da Silveira Duarte de Almeida, Porfirio Coelho da Fonseca Magalhães, Ramiro Guedes, Ricardo Paes Gomes, Rodrigo Fernandes Fontinha, Sebastião Peres Rodrigues, Severiano José da Silva, Sidonio Bernardino Cardoso da Silva Paes, Thomé José de Barros Queiroz, Tiago Moreira Salles, Tito Augusto de Moraes, Victor José de Deus Macedo Pinto, Victorino Henrique Godinho, Victorino Maximo de Carvalho Guimarães.

Entraram durante a sessão os Srs.: Alberto Carlos da Silveira, Alexandre Braga, Alexandre José Botelho de Vasconcellos e Sá, Anselmo Augusto da Costa Xavier, Antonio Caetano de Abreu Freire Egas Moniz, Antonio França Borges, Eduardo Abreu, Eduardo de Almeida, Francisco Manuel Pereira Coelho, Francisco Teixeira de Queiroz, João Pereira Bastos, Joaquim Pedro Martins, José Bessa de Carvalho, José Maria de Padua, José Maria Vilhena Barbosa de Magalhães.

Não compareceram á sessão os Srs.: Alvaro Nunes Ribeiro Alvaro Xavier de Castro, Antonio Alberto Charula Pessanha, Antonio José de Almeida, Artur Augusto Duarte da Luz Almeida, Bernardo Paes de Almeida, Elisio Pinto de Almeida e Castro, Fernando da Cunha Macedo, Fernão Botto Machado, João Gonçalves, Joaquim Theophilo Braga, José de Castro, José Cordeiro Junior, José Dias da Silva, José Maria de Moura Barata Feio Terenas, Leão Magno Azedo, Sebastião de Magalhães Lima, Sebastião de Sousa Dantas Baracho, Thomás Antonio da Guarda Cabreira, Victor Hugo de Azevedo Coutinho.

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SESSÃO N.° 54 DE 18 DE AGOSTO DE 1911 3

O Sr. Presidente: - Está aberta a sessão.

Vae ler-se a acta.

É lida a acta.

O Sr. Presidente: - Está em discussão. Ninguem pede a palavra, considera-se approvada.

Foi approvada.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se o expediente.

É lido o seguinte:

EXPEDIENTE

Officios

Do Ministerio da Justiça, enviando um memorial dos amanuenses das cadeias civis de Lisboa, no qual pedem aumento de vencimentos.

A commissão de finanças.

Do Ministerio da Marinha, communicando o resultado das eleições nos dois circulos do Estado da india.

Para a 1.ª commissão de verificação de poderes.

Do m o amo Ministerio, communicando ter se feito em 13 do corrente o apuramento geral da eleição para deputados na provincia de S. Thomé, com tranquillidade e sem protestos.

Para a 1.ª commissão de verificação de poderes.

Telegrammas

S. Bento (Porto) em 17 de agosto de 1911. - A S. Exa. o Presidente da Camara Constituinte, Lisboa. - A Commissão Administrativa do Municipio do Porto, congratulando-se com o principio de autonomia municipal consignado na Constituição, faz votos porque esse principio se effectue com a maior largueza, correspondendo-lhe uma equivalente responsabilidade dos vereadores. = O vice-presidente, Pereira Osorio.

Para a Secretaria.

Benguella, 18.- Presidente Assembleia Constituinte.- Lisboa.- Pedimos attenção telegrammas commercio Exaltação animos. Convem muita prudencia actos Governo. = Centro Republicano.

Para a Secretaria.

Benguella, 18. - Presidente Assembleia Constituinte.- Lisboa.- Apesar censura telegrapho contra qual protestamos principaes casas Benguella Catumbella receberam intermedio caminho ferro seguinte telegramma assinado principaes casas Bailundo:

Commercio indignado continuas prepotencias administrador escrivão prendemos entregando-os commandante militar, fechou estabelecimentos até que sigam litoral, pede providencias immediatas para commercio retirar suas casas. Sabemos commercio Bihé adheriu movimento. Governo provincia entra caminho perseguições processos summarios, expulsando sem forma processo motivos futeis. Urgente intervenção parlamentar prevenindo consequencias graves. = Commissão.

Para a Secretaria.

Bihé, 15.- Presidente Assembleia Nacional Constituinte.- Lisboa. - Hoje anniversario restauração Angola conselho Bihé inaugurou solemnemente nova bandeira da Paria já consagrada por essa patriotica Assembleia. Calorosa jubilosamente sauda Patria, Republica, Assembleia Nacional Constituinte, Commissão Municipal. - Bemvindo Guimarães = Julio Ferreira Nunes Santos.

Para a Secretaria.

Beja. - Presidente Assembleia Nacional Constituinte.

Bento. - Empregados commercio Beja pedem attenção da Camara cumprimento lei descanso semanal autoridades descuram por completo o assunto. - Redacção de O Caixeiro do Sul".

Para a Secretaria.

Moledo. - Exmo. Presidente Assembleia Constituinte - Lisboa. - Commissões parochiaes politicas e administra-iva reunidas pedem intervenção V. Exas. para que estarão telegraphica estas thermas continue classificada em 2.ª classe e não 3.ª, como noticiam jornaes, visto ter maior movimento que outras que são sedes de concelho. - Pelas Commissões, José de Mesquita = José Osorio Almeida.

Para a Secretaria.

Benguella, 17.-Presidente Assembleia Nacional Constituinte - Lisboa. - Commercio Benguella Catumbella reunido Associação Commercial protesta contra facto governador mandar Bailundo forca 100 homens prender europeus que destituiram chefe concelho, eleições. Bailundo ordem publica não alterada ida força remessa irritante numerosas algemas pode provocar resistencia ommercio gentio resultados graves. Moxico revolta gentio assassinatos commerciantes commercio paralysado pedimos siga força Moxico. Acontecimentos Bailundo pedimos inquerito rigoroso governador districto attitude imprudente inexplicavel desattendendo pedidos insiste meios violentos podem causar perturbação todo districto pedimos providencias urgentes. = Commissão.

Para a Secretaria.

Exposição

Da Associação Commercial de Lisboa, julgando que os prazos estabelecidos no projecto sobre a importação de azeite estrangeiro isento de direitos alfandegarios, não parecem ter sido calculados de modo a acautelar os interesses que certamente era o espirito do Sr. Ministro ao elaborar esta lei.

Para a Secretaria.

Communicações

José de Cupertino Ribeiro Junior pede á Assembleia Nacional Constituinte para lhe serem concedidos cincoenta dias de licença, para se ausentar dos serviços parlamentares, começando a gozar esta licença no dia 21 do corrente.

16 de agosto de 1911. = O Deputado, José de Cupertino Ribeiro Junior.

Foi concedida a licença pedida.

Declaro que por motivo de doença não pude comparecer ás sessões dos dias 16 e 17 do corrente.

Sala das Sessões, em 18 de agosto de 1911.: O Deputado, Gastão Rodrigues.

Foram justificadas as faltas.

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4 DIARIO DA ASSEMBLEIA NACIONAL CONSTITUINTE

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José Cupertino Ribeiro Junior, como V. Exas. ouviram, pede licença para se ausentar dos trabalhos parlamentares, pelo espaço de 50 dias.

Os Srs. Deputados que concedem a licença pedida, tenham a bondade de se levantar.

Foi concedida

O Sr. Joaquim Ribeiro: - Mas V. Exa. o maximo de licença que concedeu, ultimamente, foi de 30 dias!

O Sr. Presidente: - Nessa occasião, pedia-se uma licença illimitada.

Uma voz: - Agora, não faz differença darem-se os cincoenta dias!

O Sr. Presidente: - Peço aos Srs. Deputados a fineza de prestarem attenção ao officio do Sr. Dantas Baracho que vae ser lido.

Lê-se na mesa. É o seguinte:

Belem, 17 de agosto de 1911. - Serviço da Republica. - Exmo. Sr. Presidente da Assembleia Nacional Constituinte. - A Assembleia e a V. Exa., seu delegado, agradeço, cordialmente reconhecido, a gentileza dos novos esforços, a fim de eu dar, como não effectiva, a renuncia que formulei, do cargo de Deputado.

Quanto vale o professor, tanto vale n lição, certifica o aforismo; e V. Exa. não constitue, seguramente, excepção á regra. Não admitte, porem, a menor duvida que não podia .sobrepor-se, na sua missão catechizadora, á verdade dos factos, e estes são de lógica inatacavel.

Já os consignei; mas convem de novo registar que o partido republicano fez, durante annos, campanha preseverante a favor da Republica Democratica, inscrita no respectivo programma, de 11 de janeiro de 1891. Isto é incontestavel.

Tambem não é susceptivel de objecção que a Assembleia Nacional Constituinte, inaugurando os seus trabalhos, em 19 de junho preterito, proclamou, nesse mesmo dia, sem a mais minima discrepancia e em decreto adequado, que a forma do Governo em Portugal é a Republica Democratica.

Á despeito d'estes solemnes compromissos, a Constituição, cuja elaboração está a findar, patenteia exuberantemente que á preconizada, em teoria, Republica Democratica, foi preferida, praticamente, a Republica Aristocratica, com apparentes laivos de, dentro em pouco, resvalar para esterilizadora e tyrannica oligarehia.

Por meu turno - util é recordá-lo tambem - conservo-me coherente nos principies liberaes e democraticos, que de longa data propago, e cuja honesta applicação me coube realizar, sempre que versei a materia constitucional, ainda hoje em debate.

Apoiando-me nas lições da Historia, que superabundam, fiz sentir, na sessão de 9 do mês corrente, que o pomo da discordia tinha penetrado no seio da Constituição, com a approvação, pouco antes effectuada, da Republica ter um Presidente.

As occorrencias ulteriores confirmam á saciedade o meu asserto, e simultaneamente comprovam que a união considerada indispensavel para o viver desafogado da Republica, encontra-se assas abalada, para não dizer accentuadamente compromettida.

Tudo isto, porem, não impede que eu acate, quer como cidadão, quer como funccionario, a Constituição que venha a ser decretada, collaborando solicitamente, com os meus modestos esforços, para que ella contribua, tanto quanto ser possa, para a felicidade nacional.

O que me não é licito é continuar no desempenho das funcções de legislador, attento o antagonismo irreductivel de pareceres que deixo apontados.

Como corollario da proposição retro estabelecida, repudio desde já as responsabilidades politicas, próximas ou remotas, que me caberiam no proseguimento do exercicio do cargo legislativo, e mais uma vez presto nitido culto á coherencia por que me ajusto, mantendo a desistencia do logar de Deputado.

Com esta obstinada e inabalavel resolução, evito pela parte que me é concernente, a critica parlamentar, que não poderia ser favoravel ao regime, tal qual elle está sendo constitucionalmente architectado, e que, em todas as circunstancias, não desejo diminuir ou enfraquecer, por principio algum. Fique isto bem expresso.

Saude e Fraternidade. = Sebastião de Sousa Dantas Bar acho.

O Sr. Sá Pereira: - Peço que seja lido na mesa um telegramma, que foi enviado á Assembleia, relativo a factos que dizem respeito a um commerciante de Benguella.

O Sr. Presidente: - Esse telegramma já se leu na mesa, mas, satisfazendo o pedido do Sr. Deputado, vae ler-se novamente.

Leu-se.

O Sr. Henrique Cardoso: - Sr. Presidente: uso da palavra apenas para fazer notar á Assembleia Nacional Constituinte, o seguinte:

Por uma extrema gentileza, a Assembleia Constituinte manifestou por duas vezes o desejo de que se fosse instar junto do Sr. General Dantas Baracho para que S. Exa. retirasse o seu pedido de demissão do cargo de Deputado.

Nós acabamos de receber um officio de S. Exa. correspondendo a esta extrema delicadeza - demasiada até - da Assembleia Constituinte, com uma affirmação solemne da qual se parece inferir que S. Exa. é mais republicano que qualquer de nós (apoiados) quando afinal S. Exa. é conhecido como republicano, apenas depois de 5 de outubro.

É necessario que isto fique consignado.

Desejei somente fazer esta declaração, tanto mais que já votara contra a resolução que se tomou para que se fosse instar, pela segunda vez, com o Sr. General Dantas Baracho.

Vozes: - Muito bem.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Presidente: - Communico á Assembleia o fallecimento do Sr. Joaquim de Azevedo Terenas, irmão do Sr. Deputado Feio Terenas. Proponho, por esse infausto acontecimento, que se lance na acta da sessão de hoje um voto de sentimento, e se communique ao Sr. Feio Terenas a resolução da Assembleia.

Vozes: - Muito bem.

O Sr. Presidente: - Acabo de ser informado do fallecimento do pae do Sr. Deputado Fortunato da Fonseca. Por isso, proponho igualmente que se lance na acta um voto de pesar, por tão doloroso facto.

Vozes: - Muito bem.

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SESSÃO N.° 54 DE 18 DE AGOSTO DE 1911 5

Segundas leituras

Projectos de lei

Artigo. 1.° Nas aguas territoriaes das provincias portuguesas ultramarinas é unicamente permittido o exercicio de pesca da baleia a navios portugueses, cujo capitão, officiaes de piloto, mestre, sobrecarga e dois terços dos individuos da equipagem, pelo menos, sejam portugueses ou estrangeiros naturalizados.

Art. 2.° Para exercer a pesca da baleia nas aguas territoriaes das provincias portuguesas ultramarinas é necessario obter do respectivo governador geral uma concessão ou licença, mediante requerimento entregue á autoridade maritima local onde se pretende residir ou exercer a pesca, requerimento que será remettido á respectiva capitania dos portos com todos os esclarecimentos necessarios.

Art. 3.° Nas concessões de armações de pesca de baleia e nas de apparelhos de pesca de outros peixes, será attendida a regra geral de não fazer concessão para local onde haja outra anterior, devendo qualquer concessão posterior ficar afastada das anteriores uma distancia conveniente.

Art. 4.° São extensivas á pesca da baleia e de outros peixes, para todos os casos applicaveis, as disposições regulamentares de pesca e mais as que pela presente lei vão consignadas.

Art. 5.° Nas zonas marginaes da Bahia dos Tigres, Porto Alexandre, Bahia de Mossamedes, Bahia dos Elefantes, e bem assim em outros portos e banias das colonias portuguesas ultramarinas poderá o Governo, por meio de arrendamento de 10 réis, pelo menos, por metro quadrado de superficie, conceder, com caracter provisorio e em numero de annos nunca superior a dez, faixas de terreno com comprimento na linha da praia nunca superior a 200 metros e com profundidade variavel, conforme as condições locaes, nunca, porem, superior a 200 metros, recebida previamente licença da autoridade local.

Art. 6.° Na area superficial do terreno, a que se refere o artigo anterior, é permittido ao respectivo arrendatario estabelecer o seu arraial e, com caracter provisorio, construir barracões e bem assim rampas e pontes com serventia para o mar e rios.

Art. 7.° Na Bahia do Lobito não é permittida installação fixa em terra, mas tão somente fluctuador de qualquer especie, devendo entretanto ser tambem paga renda annual de 10 réis, pelo monos, por metro quadrado de fluctuador, quer este seja o convés de um navio ou o estrado de uma jangada.

Art. 8.° O numero de concessões em cada porto ou bahia das provincias portuguesas ultramarinas será limitado e o Governo attenderá nessas concessões á extensão dos portos e bahias e a outras condições locaes.

§ unico. Quando as circunstancias o permitiam, serão as concessões dadas mediante concurso, sendo, em igualdade de condições, preferidos os concorrentes nacionaes.

Art. 9.° É terminantemente probibido trazer, para as concessões era terra ou para fluctuador em aguas territoriaes, qualquer baleote (pequena baleia, não adulta), embora pescado fora das aguas territoriaes, não sendo em caso algum permittido que seja desfeito em concessão em terra ou em fluctuador.

§ unico. Os governadores geraes das provincias portuguesas ultramarinas estabelecerão multas pesadissimas, no intuito de conseguir que este artigo seja cumprido.

Art. 10.° Os navios em serviço da pesca da baleia não serão sujeitos ao pagamento de direitos de entrada e de saída nos portos que são base da sua exploração, excepto o de farolagem, onde estiver estabelecido.

Art. 11.° O oleo de peixe, extrahido em terra ou em fluctuador, quando destinado á exportação, pagará de direitos na respectiva alfandega, 7 por cento ad valorem.

sendo destinado a portos estrangeiros, e 2 por cento, sendo destinado a portos nacionaes.

Art. 12.° O material empregado na industria da pesca e na extracção do óleo, quando não seja desviado d'essa applicação e portanto não tenha sido importado para consumo ou emprego fora da area das concessões em terra ou das estações fluctuantes, não será sujeito a quaesquer encargos aduaneiros.

Art. 13.° É concedido despacho de importação temporaria, pelas alfandegas das colonias portuguesas, ao vasilhame que houver de ser importado para a exportação de oleo de peixe, sendo os direitos garantidos por deposito ou fiança, nos termos dos regulamentos aduaneiros das respectivas alfandegas.

Art. 14.° As concessões de arraiaes em terra e em fluctuador feitas pelo Governo e as licenças de installação de armação e a pesca em aguas territoriaes, feitas pelo governador geral, serão mencionadas em portaria publicada no Boletim Official, na qual serão inscritas as condições designadas nos artigos 6.° e 7.° das instrucções approvadas por decreto de 30 do outubro de 1902, e quaesquer outras condições que o governador gerai entender por conveniente impor ao arrendatario.

Art. 15.° A presente lei começará a ser executada no dia 1 de janeiro de 1912, sendo salvaguardados os direitos adquiridos em virtude de autorizações legaes anteriores, emquanto não expirar o seu prazo.

Art. 16.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das Sessões, em 14 de agosto de l911. = José Nunes da Mata.

Foi admittido e enviado á commissão de pescarias.

Artigo 1.° São autorizadas as camaras municipaes de Lisboa e Porto a criarem uma repartição commercial, destinada a servir de regulador ao preço dos generos de primeira necessidade.

§ unico. O quadro do pessoal da repartição commercial será formado com funccionarios que já pertençam ás camaras.

Art. 2.° A repartição commercial das camaras de Lisboa e Porto comprará directamente aos productores, com absoluta exclusão de intermediarios, os generos que precisar para a venda aos consumidores.

§ unico. Esta repartição poderá fornecer ao commercio de retalho os generos que lhe forem requisitados, com o bónus sufficiente para que o seu preço no mercado seja o preço de venda da repartição commercial.

Art. 3.° Quando o manifesto dos generos de primeira necessidade mostrar que a sua quantidade é insuficiente para o consumo publico a repartição commercial poderá importá-los directamente do estrangeiro, pagando os respectivos direitos.

Art. 4.º A repartição commercial não procurará realizar lucros para a camara municipal, mas unicamente saldar as suas contas sem déficit, sendo todos os seus lucros empregados em baixar o preço dos genero.

Art. 5.° Os preços dos generos vendidos a retalho nunca poderão exceder o preço medio que, em Lisboa e Porto, tiveram os mesmos generos no decennio de Í909 a 1910.

Art. 6.° Quando o manifesto dos generos mostrar que são sufficientes para o consumo mas o seu preço for superior ao preço medio do ultimo decennio, a repartição commercial poderá importar a quantidade precisa para que o sou preço de venda baixe até o nivel marcado, pagando só metade dos direitos de importação.

§ unico. Neste caso a importação deve ser autorizada pelo Ministro do Fomento.

Art. 7.° As camaras municipaes de Lisboa e Porto são autorizadas a pedir, por emprestimo, á Caixa Geral de Depositos a quantia sufficiente para as operações das suas repartições commerciaes.

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6 DIARIO DA ASSEMBLEIA NACIONAL CONSTITUINTE

Art. 8.° No primeiro triennio a repartição commercial realizará as suas operações sobre carne, bacalhau, arroz e azeite.

Art. 9.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala das Sessões, em 14 de agosto de 1911. = Thomás Cabreira, Deputado pelo circulo n.° 46.

Foi admittida e enviada a commissão do commercio.

Proposta de lei

Senhores Deputados. - A conclusão immediata do estudo do regime da nossa contribuição predial rustica é sempre a conveniencia senão a necessidade impreterivel de se proceder á execução de um cadastro geométrico, que sirva de base á determinação do rendimento collectavel. A todos que se dedicaram a esse trabalho parece estranho que aquelle rendimento seja apenas computado em 21:155 contos réis, quando em diversos relatorios de caracter official ou officioso se consigna que o producto bruto agricola oscilla entre cifras que chegam a attingir 200:000 contos réis, conforme a opinião do Sr. Sortorio do Monte Pereira.

Sendo computada em 5 milhões de hectares a arca cultivada do nosso país. o rendimento collectavel medio por hectare é apenas de 4:000 réis. Este resultado é significativo e demonstra claramente quando o Estado é gravemente lesado na sua receita. Por diversas formas e em diversas publicações se tem evidenciado este precario estado do regime da contribuição predial, e todos os autores concluem pela necessidade da execução do cadastro geométrico, cujas despesas se mostram sempre largamente compensadas pelo excesso de receita. Sem querermos repetir, por muito conhecidas, as diversas demonstrações, apresentaremos comtudo um facto que prova á evidencia o solido fundamento em que assentam. Em 1893 foi criada em cada districto administrativo uma commissão incumbida de proceder á inspecção directa e á avaliação dos predios rusticos e urbanos. A commissão. que operou no districto de Castello Branco e de que fazia parte o agrónomo do districto, elaborou o seguinte quadro de tarifas, que applicou ás propriedades inspecionadas:

[Ver quadro na imagem]

O resultado da applicação d'esta tarifa foi o rendimento collectavel elevar-se de 140.41 por cento.

Mas a maior parte dos publicistas teem defrontado o problema unicamente sob o restricto ponto de vista maior cobrança de receita para a fazenda publica, e no entanto elle offerece outros aspectos de não menor valor se o cadastro geometrico permitte a perequação do imposto, a desapparição das desigualdes e iniquidades que tão justamente irritam o contribuinte. Mas o cadastro não deve ser unicamente um instrumento fiscal e administrativo. O cadastro deve constituir a base da propriedade immobiliaria, deve assegurar a regularidade das sua transacções, dar solida base ao regime hypothecario, conceder á agricultura a possibilidade do credito a longo prazo e taxa reduzida. Mas o cadastro delimitando e demarcando tambem a propriedade e sendo acompanhado, como e preciso, por motivos de diversa ordem, do meditas do protecção para o emparcelamento e extincção dos errenos encravados, interessa ainda profundamente agricultura nacional. A mobilização da propriedade, que a moderna concepção do seu regime, assenta igualmente as suas bases na existencia de um cadastro geometrico.

"Para qualquer lado que nos voltemos chega-se a esta conclusão: que um bom cadastro deve ser a base e instrumento de todas as reformas sociaes, economicas e judiciarias, umas quasi immediatamente realizaveis, outras a examinar mais tarde, das quaes a propriedade immobiliaria espera a salvação e a prosperidade", como diz o relatorio da proposta de lei francesa. O cadastro é incontestavelmente a base de todo o fomento agricola.

Varios inconvenientes teem sido apontados para a sua realização. Em primeiro logar o longo prazo que requer a sua execução, e em seguida a despesa que é precisa para o levar a effeito. Mas nenhuma d'estas objecções fez vacillar os países que se interessam sinceramente pela sua riqueza agricola e procuram dotá-la de todos os meios que favoreçam o seu desenvolvimento e prosperidade. Todos elles realizaram o cadastro da sua propriedade immobiliaria, e muitos sem ter em vista o acrescimo de receita. Ainda ultimamente a Italia, em 1986, decretou a execução do seu, que previa demorar vinte annos e inscrevia annualmente no seu orçamento 7.000:000 liras, e a França estudava o seu que estava orçado entre 575.000:000 a 600.000:000 francos.

O problema entre nós apresenta um aspecto excepcionalmente favoravel. A sua execução no continente poderia realizar-se em dez annos, o seu custo está orçado entre 6.00O:000$000 a 8.000:000$000 réis e deve provocar um excesso de receita que facilmente vence a despesa e dá maiores reditos ao Thesouro Publico. De resto, querendo alongar-se aquelle periodo de tempo, e cedendo á execução do cadastro o excesso de contribuição predial por elle produzido, o problema é de facilima solução e viabilidade, como demonstraremos, desde que se adopte a disposição, que preconizamos, dos concelhos entrarem no novo regime á medida que nos seus territorios se completem os trabalhos cadastraes.

As memorias publicadas no país são geralmente destinadas a evidenciar a necessidade da execução do cadastro sem cuidar da sua estructura intima. Concretizar mais a questão é o motivo principal d'este trabalho em que se estudam summariamente as operações essenciaes do cadastro e as bases onde convem assentar a respectiva legislação. Defronta-se o problema no seu aspecto geral sem entrar em pormenores mais proprios de regulamentos e instrucções, e que só aos technicos interessam.

Delimitação e demarcação das propriedades

São duas operações completamente distinctas, sendo a segunda o complemento natural da primeira. Esta tem por objectivo o reconhecimento da linha divisoria dos diversos territorios ou propriedades, e aquella tem por fim a collocação de marcos ou outros sinaes apparentes para definir materialmente a linha divisoria já reconhecida.

Estas operações são das mais importantes e melindrosas do cadastro, e nos diversos países são regidas por principios differentes.

Em França a commissão extra-parlamentar estabeleceu nas suas conclusões a obrigação da delimitação e demarcação de todas as propriedades publicas. A mesma obrigação não foi imposta á propriedade particular para a qual a demarcação é facultativa. A lei de 17 de março de 1898 consagrou esses principios

A delimitação foi considerada essencial para a execução do cadastro; mas dois systemas se defrontaram: um, preoccupado com as necessidades technicas, propunha a delimitação obrigatoria, confiando-a a uma commissão es-

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pecial; o outro repellia esta obrigação legal, contentando-se com a acção dos syndicatos livres ou autorizados. A lei resolveu a questão subordinando a delimitação obrigatoria por commissão especial ao pedido dos conselhos municipaes.

Em Italia a delimitação e a demarcação são obrigatorias para todas as propriedades, mas estavam, pela lei de 1886, a cargo das commissões eensuarias communaes. que a si aggregavam o concurso das autoridades e das pessoas e entidades interessadas; mas, posteriormente, pela lei de 1887, foi estatuido que a delimitação dos territorios communaes e das propriedades comprehendidas em cada communa seja executada pela Administração do Cadastro, com o concurso das commissões eensuarias, e em contradita com as partes interessadas ou seus delegados.

Uma disposição de salutares effeitos insere o artigo 41.° da lei italiana. Em virtude do seu teor, todos os contratos de permuta e venda immobiliaria, estipulados no momento da delimitação, e com o fim reconhecido de melhorar os limites e configuração da propriedade, quando o valor de cada immovel permutado, e o respectivo preço de venda, não seja superior a 500 liras, não serão sujeitos, relativamente á contribuição de registo, senão á taxa de 1 lira; e alem d'isso as despesas com escrituras publicas, transcrição de hypothecas, emolumentos de notarios e conservadores são reduzidas a metade.

Commentando esta disposição dizia o Presidente da Junta Superior do Cadastro:

"A regularização geometrica dos limites e o arredondamento das propriedades interessa ao mesmo tempo a formação e conservação do cadastro, a economia agraria, o estado e a segurança da propriedade. Interessa a formação e, conservação do cadastro, porque a regular delimitação e. o arredondamento das glebas facilitará o trabalho dos topographos na formação dos mappas, terá por effeito diminuir o numero de parcelas de pequena importancia e assegura ao cadastro maior estabilidade. Interessa a economia agraria porque o arredondamento de cada propriedade torna possivel uma melhor cultura dos terrenos, faz desapparecer grande parte de pequenas parcelas dispersas e mesmo incultas, supprimindo alem d'isso muitas servidões prediaes. Interessa o estado da propriedade porque a permuta e venda das pequenas parcelas tendem a prever e a resolver definitivamente um grande numero de questões entre vizinhos, com vantagem não só dos proprietarios, mas ainda da administração publica. Contribue por ultimo para a segurança das propriedades, proporcionando lhes uma delimitação mais simples e mais definida, e servirá como preliminar para a organização do cadastro juridico. E por isso que algumas legislações tornam obrigatoria a extincção dos terrenos encravados e o emparceiramento das propriedades rusticas, applicado o principio da expropriação por utilidade publica".

Neste momento tocamos num ponto de capital importancia para a agricultura nacional, nomeadamente para a do norte do país, onde os terrenos encravados são numerosos, e assustadora a fragmentação da propriedade.

Convirá facilitar a extincção dos terrenos encravados e o emparceiramento da propriedade por medidas analogas e outras mais extensivas que as estatuidas na lei italiana? Se observarmos os resultados que leis semelhantes produziram na Allemanha, Áustria, Suecia, Dinamarca, Escossia, etc., com incontestavel vantagem para a cultura d'esses países e para os interesses dos proprietarios, afigura-se que a resposta será affirmativa e que se deve consignar na lei do cadastro disposições adequadas. O momento será opportuno, porque o topographo pode ainda neste assunto prestar relevantissimos serviços. Por isso se preceitua que deve ser isenta de contribuição de registo a permuta ou venda de terrenos dispersos de area não superior a 2 hectares, que se effectua para dar continuidade á propriedade ou melhorar e rectificar os seus limites. Todos os encargos inherentes a estas operações serão reduzidos a metade. Disposições analogas recaem sobre os terrenos encravados, e tanto estes como os permutados para o emparceiramento são isentos de contribuição predial durante dois annos. Neste ponto affastamo-nos sensivelmente da legislação italiana não só concedendo mais amplas vantagens, mas tambem definindo o terreno pela sua area e não pelo seu valor. Sabe-se que por multiplices circunstancias terrenos da mesma area e producção são vendidos por preços que variam da unidade ao quádruplo, segundo as circunstancias economicas locaes.

Não menores serviços podem os topographos prestar no estudo de traçados de caminhos, cuja area deverá ser deduzida da massa total interessada, na occasião da rectificação de limites hinuosos e irregulares e na permuta das parcelas. Os franceses dedicam especial attenção a este assunto, que denominam abornement general.

O capitulo da delimitação e demarcação assume, como se deprehende, capital importancia em todas as legislações e tem sido objecto de aturado estudo e experiencia, porque, é tambem um ponto essencial para a conversão do-cadastro fiscal em cadastro juridico. Denomina-se assim o cadastro que, alem de ter os effeitos tributarios, é constituido para servir de prova legal á propriedade nelle inscrita e figurada. A sua grande utilidade pratica é incontestavel, nomeadamente nos actos que se referem á mutação da propriedade, constituição e extincção de direitos reaes o sobretudo ás operações de credito agricola. Com diversos effeitos e sob varias formas está em vigor na Hollanda, Prussia e varios estados allemães, Alsacia-Lorena, Austria e nos cantões de Vand e Genebra; e a lei italiana preceitua no seu artigo 8.° que com outra lei serão determinados os effeitos juridicos do cadastro e as reformas que se devam produzir para tal fim na legislação civil.

Conviria desde já introduzir-se na lei organizadora do nosso cadastro disposições analogas? A resposta absoluta seria affirmativa, mas afigura-se plausivel não retardar a execução do cadastro porque, como diz o relatorio da lei francesa "quer se adopte ou não o principio dos livros ou reportorios fundiarios, ha uma cousa sobre que todos estão de acordo: é que só se pode pensar nesse assunto depois de haver á mão um bom cadastro".

Evitar-se-ha assim maior adiamento na execução do cadastro, cuja urgencia se impõe para a cobrança de maiores reditos para o thesouro, para o estabelecimento da perequação do respectivo importo predial e para o fomento agricola. Ulteriormente poderá ser resolvida a segunda parte do problema, e desde esse instante e querendo-se entrar abertamente no novo caminho, alguma cousa se poderá tambem fazer sobre a mobilização da propriedade que tanto simplifica as operações de credito, todos os actos e contratos a ella referentes.

Levantamento do cadastro

Os cadastros geometricos parcelares são fundados em duas operações: a medição e a avaliação. A medição tem por objectivo o levantamento da figura e extensão da propriedade e das diversas parcelas cadastraes e a sua representação em mappa planhnetrico referido aos pontos trigonométricos. A medição identifica e individualiza as parcelas e consequentemente presuppõe duas outras operações: a triangulação e a polygonação.

A triangulação tem por fim a rigorosa determinação dos pontos trigonométricos que servirão de base para o levantamento do terreno comprehendido entre as malhas da rede trigonometrica. O seu objectivo e facultar ao topographo os meios de operar com precisão e rigor, asseguran

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do tambem ao trabalho a sua cohesão de conjunto. Sob o ponto de vista do cadastro geométrico, a sua alta precisão é requerida pelos effeitos civis a que o cadastro pode ser destinado. A polygonação determina com maior tolerancia pontos secundario, que pelo seu grande numero prestam um apoio constante ao topographo.

O numero de pontos de referencia exigido pelo levantamento cadastral deve permittir uma distribuição de 12 por kilometro quadrado, salvas as modificações impostas pelo terreno. Por esta forma os sinaes individualizados distarão entre si cerca de 300 metros. Em Portugal é necessario apartar um pouco mais a rede trigonométrica, organizar a cadastral a estabelecer a polygonação.

O levantamento comprehende duas partes distinctas: uma metrica, que é a medição propriamente dita e a outra figurada que é o mappa, havendo entre ellas a mais intima ligação. A escala, que deve ser quanto possivel uniforme para todos os mappas, é a mesma em Italia e França. Estes países adoptam a escala de 1/2000: mas outras escalas podem ser usadas segundo a maior ou menor fragmentação da propriedade.

Em Italia a unidade cadastral, individualizada por um numero, é a pareela de cultura ou de destino: em Franca, é o predio rustico constituido por parcelas contiguas pertencentes ao mesmo proprietario. Neste país as parcelas são diffeivuciadas por uma letra affecta ao numero da propriedade a que pertencem. Esta ultima unidade talvez seja a que melhor se adapta aos nossos usos e costumes.

Como e necessario que não haja a menor solução de continuidade nos mappas cadastraes, evitando-se assim a ommissão de materia colectavel, que é o vicio organico de todos os cadastros descritivos, as leis e os regulamentos indicam ainda o que deve ser levantado ainda a que não sujeite, a contribuição predial.

No systema italiano, para se não tolher a iniciativa dos melhoramentos agricolas por um alto sentimento de justiça, o levantamento parcelar é referido a uma época censuaria determinada.

Na organização dos cadastros dois methodos são usados, segundo se toma para bases a actualidade ou uma epoca fixa. No primeiro, levantam-se as parcelas no estado em que se encontram no acto do levantamento; no segundo, as parcellas são consideradas no estado em que se achavam em um dado momento anterior áquelle acto.

Os dois methodos podem ainda combinar-se dando logar ao systema misto, segundo o qual se parte da actualidade concedendo aos proprietarios a faculdade de demonstrarem com documentos attendiveis que o estado das suas parcelas era diverso na época censuaria preestabelecida. Este ultimo systema é o adoptado na legislação italiana por permittir a perequarão e ser isento de difficuldades na sua realização.

A escolha dos processos scientificos de levantamento não u arbitraria, depende essencialmente das condições do terreno e divisão das culturas. Por isso as diversas legislações não determinam processos especiaes, exigem apenas que se conciliar a exactidão requerida pelos regulamentos com a maior rapidez economia.

Durante a execução dos trabalhos e depois de estarem finalizados, procede-se no campo e no gabinete ás verificações necessarias para se certificar a exacta determinação physica das propriedades.

Em Italia esta operação executada pelos inspectores dos circules, segundo normas estabelecidas em diversas instrucções.

Completos os trabalhos de campo a que são convidadas a assistir, segundo os casos, as commissões censuarias communaes e os interessados, e feitas as verificações necessarias, procede-se á execução do mappa e calculo das areas.

Simulteamente á operação de levantamento, procede-se á inscrição das parcelas, isto é, indica-se o nome, residencia, etc., do seu possuidor, tendo constantemente em consideração que o levantamento fixa sempre o estado de facto. Os bens de que não for possivel conhecer os possuidores são. provisoriamente, attribuidos ao Estado.

Antes de terminar esta parte, conviria estudar ainda, com a exactidão propria do assunto, a forma pratica como poderia ser levado a effeito o levantamento parcelar do nosso país. O problema é comtudo extremamente complexo e só numeros aproximados poderão ser deduzidos dos algarismos relativos aos cadastros estrangeiros, porque os factores são muitos e de variada influencia.

No nosso clima, de incontestavel benegnidade, é manifestamente possivel estabelecer o periodo de oito meses para cada campanha de trabalho, a que corresponde o maximo de duzentos dias uteis. Acceitando este elemento e desejando-se que a propriedade rustica do país fosse levantada em dez annos, o serviço de campo exigiria 200 topographos, visto que a nossa area cultivada e avaliada em cinco milhões de hectares, e experiencias realizadas no estrangeiro permittem suppor que um topo grapho pode levantar em media dez hectares por dia.

É evidente que tão elevado numero de topographos, que teem a seu cargo um trabalho tão melindroso, tem de ser orientado constantemente e os seus trabalhos frequentemente revistos e inspeccionados para que as reclamações não surjam ininterruptamente e as grandes despesas do Estado não resultem improficuas. A natureza propria d'este trabalho, de orientação e inspecção, exige um pessoal relativamente numeroso para esse especial serviço.

A difficuldade pode comtudo ser resolvida em parte pela criação de topographos de 1.ª classe em numero de cincoenta que teriam tambem a seu cargo a orientação dos trabalhos dos duzentos topographos restantes. A proporção é justa e pratica.

Para a revisão e inspecção dos serviços parece sufficicnte um corpo de dezasete inspectores de circulo.

As suas attribuições devem ser analogas ás preceituadas para o cadastro italiano nas instruccoes de 18 de marco de 1889. Mas é claro que a direcção immediata de tão numerosos o variados trabalhos não pode ser concentrada a uma unica repartição sem provocar um arduo serviço de defficillimo desempenho. Por isso, e seguindo ainda de perto o modelo italiano, parece conveniente dividir o país em tres zonas, que se poderiam denominar circunscrições do norte, centro e sul, cujas direcções superintenderiam nos diversos trabalhos em harmonia com as normas saídas da Direcção Superior.

Avaliação da propriedade

As operações de avaliação teem por objecto a determinação do rendimento collectavel de cada parcela para servir de base ao lançamento da contribuição predial e para inquirir da riqueza agricola do país.

Os diversos cadastros, esceptuado o toscano, adoptou-se invariavelmente o methodo indirecto, que consiste na organização de quadros de qualificação e classificação dos terrenos comprehendidos em uma freguesia, formação das tarifas correspondentes a 1 hectare de cada classe, e na distribuição das parcelas pelas classes estabelecidas. É um methodo objectivo, impessoal, e consequenteniente imparcial e por isso essencialmente perequativo.

Em alguns cadastros o calculo das tarifas tem unicamente por base o producto das parcelas devidamente determinado pela analyse de peritos; noutros fundamenta-se no valor locativo ou venal, isto é, nas rendas ou preço de acquisição. No cadastro italiano adopta-se o primeiro systema, tendo por subsidiario o segundo: a legislação francesa adopta este ultimo.

Na Italia a formação dos quadros de qualificação e das

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sificação e os calculos das tarifas são elaborados para cada provincia por juntas technicas compostas de peritos nomeados metade pelo Governo, metade pelo conselho de provincia e de um presidente de nomeação governamental. Porem, toda a communa pode exibir que um seu delegado seja ouvido sobre a qualificação, classificação e tarifas do seu territorio.

A primeira operação que lhes cumpre realizar é a qualificação que consiste em dividir os terrenos de cada communa segundo as suas varias qualidades, isto é, segundo as especies essencialmente differentes, quer pela sua diversa cultura, quer pelos seus productos espontaneos ou por outras circunstancias notaveis e permanentes. Para indicar os terrenos de uma mesma qualidade devem usar-se denominações uniformes em todas as communas. Evidenciadas as diversas qualidades de cultura procede-se á "classificação" que consiste em subdividir cada qualidade em tantas classes quantos são os graus notavelmente diversos da respectiva productividade, tendo em consideração as condições physicas e economicas que influem sobre a determinação do rendimento liquido, e precisando os caracteres e os elementos que sirvam para distinguir uma classe da outra, e fixando ao mesmo tempo um certo numero de parcelas que representem o merito medio de cada classe para servirem de typo para a distribuição das parcelas (classamento).

Esta operação pode ser, e é em regra, contemporanea da qualificação.

Elaborado o quadro da qualificação e classificação, o perito cadastral distribue entre as classes estabelecidas e reconhecidas todas as parcelas comprehendidas na communa. A esta operação denominam os italianos classamento e os franceses classement. O moderno regulamento italiano, pelo seu artigo 76.°, permitte que, quando seja possivel e se considere opportuno, a operação do classamanto seja associada á do levantamento.

Os terrenos devem ser qualificados e inscritos no cadastro segundo o estado de cultura e de destino no qual se encontravam no acto do levantamento, tendo comtudo em consideração os melhoramentos realizados após a época censuaria e que constem de documentos elaborados segundo os preceitos estatuidos no regulamento.

Cada parcela é considerada de per si, sem ter em consideração a sua connexão com outras propriedades, ou com exercicio industrial, ou circunstancias pessoaes do proprietario para terceiros.

A ultima operação a que as juntas technicas teem de proceder é o estabelecimento das tarifas.

A tarifa exprime em moeda legal o rendimento collectavel de um hectare de cada qualidade e classe de terreno.

A tarifa que concretiza definitivamente a avaliação tem um triplico objectivo:

a) Determinar o producto bruto dos terrenos;

b) Applicar os respectivos preços para o calculo do rendimento bruto;

c) Fazer as deduções prescritas na lei para a determinação do rendimento collectavel.

O producto bruto a attribuir-se a cada hectare de terreno de uma dada classe é a media aproximada, resultante do complexo de parcelas nella comprehendida.

O calculo do preço de cada producto é feito p da media dos tres annos de menor preço comprehendidos num periodo de doze annos. O projecto Magliani dispunha que o preço fosse determinado pela media dos preços dos ultimos doze annos, excluidos os dois de maior e menor preço.

O relator Messedaglia expunha os motivos nos seguintes termos: "Fixa-se um periodo de doze annos, mas devem subtrair-se os dois annos de maior e os dois annos de menor preço, de forma que a media só seja determi nada pelos oito annos restantes. Isto está em relação com uma observação de facto que consigna que em regra as oscillações dos preços são notavelmente mais fortes na alta que na baixa e que os extremos apresentam facilmente anomalias não compensadas, que convem portanto liminar do calculo. Prescindindo d'elles ha uma maior probabilidade de obter um resultado normal; e, por sua vez, a media e um pouco rebaixada, porque se remove a prevalencia relativa dos termos superiores, que em numero igual pesam mais que os inferiores". Este argumento era reforçado com o exemplo do cadastro austriaco para o qual se prescreve que num periodo de quinze annos fossem unicamente eliminados os cinco de maior preço "não tanto para abaixar o rendimento collectavel, mas para eliminar as maiores anomalias que apresentam nas suas excursões da alta os preços das mercadorias". O Parlamento não desconhecendo o valor d'estas razões preferiu jstabelrcer a media dos tres annos de menor preço para proteger a agricultura nacional.

Com o intuito de se determinar o rendimento collectavel normal é preferivel adoptar-se a formula do projecto italiano.

A lei italiana preceitua ainda que para o calculo do rendimento collectavel se effectucm as seguintes deduções:

a) Despesas de producção, conservação e transporte;

b) Despesas para as obras permanentes de defesa, drenagem e beneficiação;

c) Despesas de manutenção da propriedade, e das construcções ruraes necessarias, e de reintegração da cultura;

d) Uma quota para as despesas de administração;

e) Uma quota para os prejuizos provenientes de infortunio. Uma dedução proporcional ao rendimento collectavel Dará os prejuizos provenientes de inundações ordinarias, servidões militares, vinculos florestaes, etc.

Em França adopta-se processo differente. O conselho nunicipal nomeia os proprietarios classificadores em numero de cinco e escolhidos entre os proprietarios das culturas predominantes do territorio, devendo dois residir obra da communa. Pode ser aggregado um perito a requerimento do conselho geral ou municipal. Os classificadores presididos pelo funccionario das contribuições directas denominado "controleur" dividem cada especie ou qualidade de cultura no numero de classes em que devem ser distribuidas as differentes parcelas; e para fixar de uma maneira exacta os limites das classes escolhem para cada uma duas parcelas-typos, uma superior e outra inferior. Os classificadores procedem sequentemente ao estabelecimento das tarifas de avaliação, isto é, fixam o rendimento liquido para cada classe de todas as qualidades de terreno. Para esse fim adoptam o methodo syntetico, isto é, operam sobre as informações fornecidas pelos arrendamentos; contratos de venda e a experiencia pessoal, sem se proceder a nenhum calculo detalhado.

Procede-se em seguida á distribuição das parcelas nas classes estabelecidas pela classificação. Effectuada esta operação, procede-se a uma outra que denominam "ventilação" e que consiste em reconhecer as parcelas comprehendidas nos diversos contratos de arrendamento para applicar a cada uma d'ellas a tarifa das avaliações para verificar a exactidão da distribuição das parcelas por classes e a certificar se todas as propriedades estão avaliadas nas mesmas proporções.

No nosso país dificilmente poderia vigorar este methodo, porque são relativamente raros os arrendamentos de propriedade rustica por escritura publica. Em muitas freguesias faltaria por completo esse elemento para a dedução das tarifas e sua verificação.

Reclamações

A legislação italiana regulamenta pelas seguintes normas este assunto:

Os quadros de qualificação, classificação e tarifas das

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communas são communicados pelas juntas technicas ás commissões censuarias provinciaes, e os elementos relativos a cada communa e ás suas limitrophes são enviados ás commissões censuarias communaes. Estas publicam os quadros nos logares do uso.

Contra as propostas da junta technica, as commissões communaes podem reclamar á commissão provincial em via comparativa.

As reclamações são presentes á junta technica. que as transmitte com as suas observações á commissão provincial. Esta emitte o seu voto motivado e communição á junta technica e á commissão communal. que podem apresentar á mesma commissão provincial as suas ulteriores reclamações.

A commissão provincial, feitas as investigações e verificações necessarias, transmitte todos os documentos á commissão censuaria central com as suas observações e propostas. A commissão central envia o processo á direcção superior do cadastro para ouvir o seu parecer, estabelecendo em seguida as tarifas de todas as communas censuarias.

Contra as tarifas assim propostas pela commissão central, as commissões provinciaes podem reclamar em via comparativa á mesma commissão central em interesse da provincia ou de alguma das suas communas. Ouvido o parecer da direcção superior do cadastro e feitas as verificações necessarias, a commissão central approva definitivamente todas as tarifas.

Os mappas, os resultados da medição e da applicação da qualidade e classe a cada parcela são publicados pela administração cadastral. Os mappas são expostos ao publico na sede da communa. Os proprietarios podem reclamar á commissão censuaria communal sobre a inscrição, delimitação, figura e, extensão dos respectivos bens e sobre a applicação da qualidade e da classe. Podem tambem reclamar em interesse proprio as juntas communaes e outros entes interessados. A commissão communal transmitte as reclamações com o seu voto á commissão provincial, que, ouvidas as observações do perito delegado da administração do cadastro, decide em via definitiva.

A administração do cadastro e as commissões provinciaes e ainda a sua minoria podem recorrer tambem á commissão central quando julguem erróneo o criterio seguido em cada communa na applicação das qualidades e classes.

Em França o processo é muito diverso, mas não faremos d'elle menção especial por não ter em vista a perequação do imposto, condição essencial de um bom cadastro.

Registos cadastraes

Realizadas as operações essenciaes do cadastro procede-se á escrituração dos respectivos registos, que constituem com o mappa o cadastro propriamente dito.

Em Italia são em numero de tres:

a) Tabella censuaria que contem em ordem progressiva todos os numeros do mappa com a respectiva superficie, rendimento collectavel e nome do proprietario;

b) Registo dos predios no qual são inseridos, sob o nome de cada prcdio, os numeros do mappa de cada parcela cadastral que lhe pertence com a superficie, rendimento collectavel correspondente e no qual deverão mencionar-se as ulteriores mutações de propriedade;

c) Matricula dos proprietarios na qual são dispostas em ordem alfabetica com o numero das parcelas que lhe pertencem e elementos necessarios para o lançamento do imposto.

Em França ha apenas dois, denominados "estado das seccões", e "matrizes cadastraes", correspondentes ao primeiro e terceiro registo italiano.

Sendo o predio a unidade fundiaria francesa o segundo registo confunde-se com o primeiro.

Conservação do cadastro

A conservação do cadastro apresenta-se sob dois aspectos: o da cuidadosa guarda e arrecadação de tão importantes documentos para evitar a sua alteração ou destruição, e o da sua situação em dia pelo registo das mutações e variações que devam ser inscritas.

O cadastro italiano conserva-se em duplicado junto das repartições a esse fim especialmente destinadas; e é posto em dia de um modo continuo e por excursões periodicas. De modo continuo pelo registo das mutações que são communicadas ás repartições cadastraes pelos funccionarios que as autenticam; e por excursões periodicas, que teem por fim addiccionar as parcelas que devam ser comprehendidas e eliminar as que não devem figurar mais no cadastro nos termos da lei.

A commissão extra-parlamentar francesa preceituou que seja organizado um serviço de conservação do cadastro á medida que se forem completando os respectivos trabalhos. Requer um systema de conservação completa e continua operada por um serviço especial e permanente que registará em todos os mappas e livros cadastraes as alterações produzidas. Para isso estatuiu que quando o cadastro de uma communa for declarado pela administração submettido ao regime da conservação todos os actos, convenções ou sentenças tendo por effeito constituir, transmittir, declarar, modificar ou extinguir um direito de propriedade, de usufruto, posse ou outro direito real immobiliario deverão conter a designação cadastral dos immoveis de que tratam.

A designação cadastral dos immoveis é igualmente obrigatoria nas declarações relativas ás mutações por fallecimento.

No cadastro ha duas partes, uma variavel e continuamente e outra estavel por um periodo de tempo mais ou menos longo. A primeira parte comprehende o estado das parcelas e dos respectivos proprietarios, que deve em todo o momento corresponder exactamente ao resultado do exame tios actos cadastraes, e a isto se obvia pelo registo das mutações e sequentes operações de rectificação. A segunda parte comprehende a avaliação cadastral, isto é, a qualificação, classificação e tarifa. Esta estabilidade- é consagrada em todos os cadastros por razões de ordem economica, financeira e technica.

Por isso a lei italiana preceitua que nenhuma mutação seja operada na qualificação, classificação, tarifa e distribuição pelas classes, que se conservarão invariaveis até a revisão geral do cadastro, que não se poderá fazer antes de decorrer trinta annos depois da epoca em que entrou em vigor. Sobre este periodo de tempo dizia o relator Messedaglia: "As razões são diversas; e uma fundamental pode deduzir se da propria natureza dos reeditos fundiarios que constituem a materia collectavel.

Trata-se de um reedito de lenta e trabalhosa formação: os capitães empregados nas empresas agricolas não rendem geralmente senão a longiquo prazo e convem que os aumentos eventuaes de encargos não venham senão tarde quando os reeditos estejam definitivamente attingidos e consolidados. Por isso é de maior interesse
a economia nacional satisfazer a fixando inspirar a agricultura, não a perturbando com avaliações repetidas a pequenos intervallos, e promover os melhoramentos com o premio de uma temporaria immunidade. As possiveis deteriorações realizam se tambem lentamente e podem por isso consentir, sem excessivo soffrimento, uma revisão em um certo periodo, desde que não seja muito
de simples é trabalho.

Por outra parte, toda a operação, ainda que revisão ou rectificação geral de um cadastro, longo, dispendioso, difficil que encontra obstaculos, do toda a especie e gera perturbações que interessa provocar o menos frequentemente possivel. A forma e as normas

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que regem a determinação da materia colloctavel não se coadunam bem senão com o conceito de uma razoavel estabilidade e são a sua natural consequencia.

Procura-se um reedito relativamente constante, calculado sem duvida sobre o estado actual, mas por um pró cesso que comprehende os extremos de todas as ordinarias frases da cultura.

Os dois conceitos são portanto connexos e um é a natural consequencia do outro".

A lei francesa de 17 de março de 1889 consigna o mesmo principio visando unicamente as communas que foram cadastradas lia mais de trinta annos.

Gomtudo variações derivadas do acrescimo material ou diminuição do materia censitaria podem modificar o cadastro; como são a saída de um terreno do cadastro predial rustico para o cadastro urbano e vice-versa, e nutras que as leis consignam.

Conviria agora alguma cousa dizer nobre a economia do projecto e seria da maxima vantagem apresentar um orçamento tão provavel quanto possivel que permittisse avaliar com certa probabilidade os encargos de trabalho tão importante.

É comtudo extremamente difficil deduzir uma cifra aproximada que traduza o preço da formação do cadastro. Em todas as nações as previsões teem fallido por circunstancias imprevistas. De resto é um trabalho completemente novo no país, não havendo consequentemente base solida fornecida pela experiencia que faculte previsões dotadas de certo rigor.

Na falta de melhor apoio e visto havermos seguido de perto a legislação italiana que é guia seguro neste genero de trabalhos, soccorremo-nos ainda dos elementos torne eidos pelo Governo Italiano ao Governo Francês para a determinação do custo do hectare cadastrado.

A despesa distribue-se pela seguinte forma :

[Ver tabela na imagem]

Nestes algarismos estão comprehendidas todas as despesas geraes de administração (direcção e verificação): a compra de instrumentos e papel e todos os accessorios necessarios para os trabalhos de campo, assim como todas as despesas relativas ao estabelecimento de todos os registos cadastraes provisorios e definitivos.

Segundo a mesma informação, não ha elementos que permitiam determinar a proporção exacta segundo a qual a despesa se reparte entre o Estado, provincias e communas; mas pode avaliar-se em 80 por cento a parte do Estudo, sendo o resto supportado em partes sensivelmente iguaes pelas provincias e communas.

Conforme esta indicação, a despesa do Estado por hectare cadastrado é de 1$430 réis, a que corresponde réis 7.150:000$000 para a nossa area cultivada.

No entanto esta verba pode ser consideravelmente reduzida pela associação que se propõe, e o proprio regulamento italiano permitte, como dissemos, do levantamento e classificação das parcelas.

Se dos elementos fornecidos pelo Governo Italiano deduzirmos a ultima verba correspondente á acceleração do trabalho e computarmos só em l franco a economia resultante da associação das duas operações no mesmo perito, o custo do hectare fica reduzido a f r. 8,47 ou 1$525 réis, sendo a parte que pesa sobre o Estado de 1$220 réis.

Tomando por base este dado, o nosso cadastro importaria em 6.100:000$000 réis.

O mesmo resultado foi obtido pela organização de quadros technicos, que foram julgados mais proprios para o desempenho do serviço.

Segundo esses quadros a despesa do cadastro repartir-se-hia pela seguinte forma:

[Ver tabela na imagem]

é esta a cifra geralmente citada e acceite. Esta verba foi deduzida na citada hypothese da associação das duas operações no mesmo perito cadastral, que pelo seu especial recrutamento e modo de constituição da brigada de campo pode facilmente, com manifesta economia para o Thesouro Publico, accumular as duas operações.

A Escola Nacional de Agricultura e outras escolas agricolas onde seja professada a cadeira de topographia, habilitam pessoal que facilmente pode desempenhar o duplo papel.

Não é mais exigente o recrutamento estatuido nas legislações estrangeiras. As habilitações exigidas pela portaria francesa de 23 de fevereiro de 1900 e pelo programma para o concurso de 12 de março de 1889 para geometrias na circunscrição de Florença não são superiores ás professadas na Escola Nacional de Agricultura.

Este pessoal requer evidentemente um intenso tirocinio e instrucção, mas esta exigencia seria, sempre imposta a todo o pessoal pela natureza particular d'este serviço; e a sua preferencia é aconselhada por ser o mais apto, em virtude dos seus especiaes conhecimentos, para executarem a applicação da qualificação e classificação aos diversos terrenos. De, resto, sendo fortemente enquadrados pelos topographos de 1.ª classe estabelecem-se as condições precisas para o s trabalhos se executarem regularmente. Para este pensamento ser viavel, é necessario que a formação dos quadros de qualificação e classificação e a escolha das parcelas typos seja executada pelas juntas technicas antes do se iniciar o levantamento.

Não ha a menor difficuldade material na realização d'esta condição.

A execução contemporanea do levantamento e da distribuição das parcelas pelas classes tem ainda a vantagem do economizar tempo ás entidades que teem de assistir a essas operações. Para se, facilitar a dupla operação, constituiu-se a Irrigada de campo por forma especial, e os jornaes foram calculados para essa hypothese.

Em França os geometras são pagos segundo a quantidade e natureza do serviço executado mediante tarifas

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estabelecidas nos regulamentos; e em Italia a nova lei admitte a execução e forfait dos trabalhos que sejam de facil fiscalização.

Tão elevada despesa pode ser reduzida do forma consideravel, quer pela remodelação de determinados serviços publicos, que facilmente podem e devem concorrer para a execução do cadastro, quer pelo melhor aproveitamento do pessoal actualmente addido e ainda investindo nas funcções de topographos de 1.ª classe officiaes subalternos do exercito, cujas vacaturas não deveriam ser preenchidas.

Não sendo proprio da natureza d'este trabalho estabelecer este modus faciendi, limita-se apenas a consignar o facto.

No entanto affigura-se que o encargo para o Thesouro publico não será demasiadamente pesado, se attribuirmos á execução dos trabalhos cadastraes o excesso de receita cobrada em cada concelho pela sua entrada no novo regime, e esse encargo diminuiria consideravelmente pelo lançamento do um diminuto addiccional sobre a contribuição predial. Isto implica que os trabalhos não sejam desde, o seu inicio muito disseminados; mas razoes de ordem technica aconselham a mesma medida, porque a continuidade é condição indispensavel da triangulação e seria muito difficil emprehender ao mesmo tempo a revisão e organização mais apertada da rede geodésica e cadastral em mais de 3 ou 4 pontos.

Alem d'isso a instrucção do pessoal impõe a mesma condição e só assim se pode adquirir a experiencia precisa que ha de dar os elementos necessarios para conciliar a maior exactidão com a maior economia.

Justificada nos parece a necessidade do Cadastro, e porque a sua realização apenas fica dependente da boa vontade dos representantes legitimos da Nação, por seguro temos que ella se não fará esperar. Desejando contribuir, na medida das suas forças, para tão grande beneficio, o Governo Provisorio da Republica elaborou a seguinte proposta de lei, que poderia ter decretado no periodo revolucionario, mas que por ser de uma altissima importancia e exigir meditado exame e profeciente estudo, reservou para agora submetter á apreciação e voto da Assembleia Nacional Constituinte.

Artigo 1.° O cadastro geométrico será parcelar e uniformo, fundado na medição e avaliação, e terá por objecto fornecer as indicações necessarias para servir de base:

a) A identificação da propriedade iimnobiliaria rustica:

b) Ao lançamento da contribuição predial rustica:

c) A remodelação do regime da propriedade predial rustica:

d) Ao levantamento da carta em grande escala do país. O levantamento será apoiado sobre uma triangulação especial derivada da rede geodesica para esse fim convenientemente revista e completa.

A escala geralmente adoptada será de 1:2000, sendo porem admissiveis as escalas de 1:4000, 1:1000 e 1:500, segundo a menor ou maior fragmentação das culturas.

Art. 2.° O cadastro será feito por freguesias. O territorio de cada freguesia será dividido em secções definidas por limites naturaes (cursos de agua, cristas, caminhos.

Foi concedida a licença pedida. etc.) ou, em ultimo caso, por linhas de separação de predios rusticos.

Art. 3.° O predio rustico ou vaidade predial, é constituido por toda a extensão de terreno contendo uma ou muitas parcelas contiguas, pertencentes ao mesmo proprietario e situadas na mesma secção da freguesia.

A parcela cadastral é constituida por toda a extensão continua de terreno apresentando a mesma natureza de cultura com productividade sensivelmente uniforme e situada no mesmo predio rustico.

Cada immovel ou predio rustico será designado no mappa e nos registos cadastraes por um numero de ordem particular; - em cada freguesia haverá uma unica serie de numeros para os respectivos predios. As parcelas serão designadas no mappa e nos documentos cadastraes por numeros de ordem de forma que as parcelas constituintes do mesmo predio, no momento da execução do mappa, sejam indicadas por numeros que se succedam sem solução de continuidade. Haverá uma serie distincta de numeros de parcelas para cada secção.

Art. 4.° A Administração Geral do Cadastro, com o concurso das commissões censuarias parochiaes e em contradita com as partes interessadas ou seus delegados, effectuará a delimitação e a demarcação:

a) Dos territorios de cada freguesia e das secções em que se sub-divida;

b) Dos predios rusticos e das vias de communicação de qualquer natureza, que pertençam ao Estado, districtos, concelhos, freguesias e estabelecimentos publicos.

Os marcos das sub-divisões indicadas na primeira alinea serão em numero sufficiente para permittirem, utilizando os como pontos de referencia, restabelecer em caso de necessidade, os limites de todos os predios rusticos por medidas simples e rapidas.

Em caso de contestações não resolvidas, o levantamento registará o estado de facto, com reserva de todo o direito.

A ausencia das partes interessadas e a das commissões censuarias não suspenderá o curso das operações.

Art. 5.° A Administração Geral do Cadastro, com o concurso das commissões censuarias e em contradita com as partes interessadas ou seus delegados, delimitará todos os predios rusticos comprehendidos em cada freguesia. Esta delimitação não obriga a demarcação.

Os limites serão indicados no terreno por meio de estacas ou de outros sinaes materiaes, que permaneçam no terreno pelo menos até o fim das operações cadastraes na freguesia.

Em caso de contestações não resolvidas, o levantamento registará o estado de facto com reserva de todo o direito.

A ausencia das partes interessadas e das commissões censuarias não retardará o curso das operações.

A administração geral do cadastro prestará o seu concurso aos proprietarios que quiserem aproveitar as garantias de segurança e economia que as operações de delimitação e demarcação lhes offerecem para as suas demarcações particulares e para os seus trabalhos de emparceiramento.

Art. 6.° As operações de delimitação e demarcação de que tratam os artigos 4.° e 5.° serão executadas simultaneamente em cada freguesia e antecederão o levantamento cadastral.

As partes interessadas poderão fazer-se representar nessas operações por delegados seus mediante simples declarações autenticadas pelo regedor da freguesia.

Art. 7.° As despesas com as operações de demarcação e emparceiramento de que tratam os artigos 4.° e 5.° serão pagas pelas partes interessadas e poderão ser cobradas como em materia de contribuições directas.

Art. 8.° No caso de litigio referente á linha de limites, que seja acordado entre as partes, ou decidido por arbitros, ou resolvido pelo perito cadastral segundo o catado de facto, as partes interessadas podem exigir no momento da operação que seja redigido um auto de delimitação estabelecida, ficando a seu cargo a respectiva despesa.

Art. 9.° O levantamento será executado por peritos da administração geral do cadastro com a assistencia das partes interessadas ou seus delegados e pelos methodos que a sciencia indicar como os mais proprios para conciliar a maior exactidão com a economia e velocidade do trabalho.

A ausencia das partes interessadas não suspende o cur-

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só das operações, podendo os peritos do cadastro servir-se de informadores locaes.

Art. 10.° Os limites dos predios rusticos serão fixados, pelo emprego de methodos topographicos baseados numa polygonação de caracter permanente, privativa de cada freguesia, por sua vez apoiada na triangulação a que se refere o artigo 1.°, e por fornia que os mesmos limites possam em qualquer época ser restabelecidos, com a precisão que for determinada no regulamento respectivo, taes como existiam no acto do levantamento.

Todas as medidas destinadas a determinar geometricamente a posição dos limites dos predios e dos pontos fixos utilizados como pontos de referencia deverão comportar a prova da sua exactidão.

No campo e no gabinete proceder-se-ha ás verificações necessarias para confirmar a exactidão da determinação phisica dos predios.

Art. 11.° Os terrenos serão levantados no estado de cultura em que se encontram no acto d'esta operação, não se tendo comtudo em consideração as deteriorações intencionaes para fraude ou dependentes de causas accidentaes e transitorias.

O levantamento das parcellas cadastraes comprehendidas nos predios rusticos effectuar-se ha ao mesmo tempo que o levantamento dos predios sem ser adstricto á mesma precisão.

Art. 12.° Os mappas cadastraes representarão os limites das freguesias, das secções e das localidades, o perimetro da cada propriedade publica ou particular, as parcellas cadastraes, os pontos trigonométricos, polygonometricos e outros pontos de referencia, bem como as demarcações particulares, as edificações e outras construcções de caracter permanente, os muros, sebes, fossos, ribeiros e caminhos definidos no solo.

Art. 13.° Nas operações cadastraes serão determinados os elementos das cotas de altitude dos principaes pontos do terreno, nomeadamente dos pontos de referencia.

Art. 14.° O Estado poderá fazer executar por empreitada os trabalhos que possam facilmente ser vigiados e fiscalizados. Os technicos encarregados da execução das empreitadas terão a qualidade e exercerão as funcções de peritos cadastraes para os eifeitos da presente lei.

Art. 15.° Os predios rusticos serão inscritos no nome dos respectivos possuidores que resultarem do acto de levantamento.

No caso de contestação serão inscritos no nome do possuidor de facto, com a respectiva observação, e com a reserva de todo o direito.

Os bens de que não se possa conhecer os possuidores serão provisoriamente inscritos como bens nacionaes.

Art. 16.° Na avaliação o rendimento liquido será calculado mediante a formação de tarifas ccnsuarias, que devem exprimir em moeda legal aquelle rendimento por hectare de terreno de cada qualidade e classe. Em regra será organizada uma unica tarifa para cada freguesia; as excepções a esta regra serão autorizadas em decreto pelo Ministro sob proposta da administração geral do cadastro ou das commissões censuarias parochiaes, ouvidas as juntas de parochia e as camaras municipaes.

Art. 17.° A qualificação consiste em dividir os terrenos de cada freguesia segundo as suas especies essencialmente diferentes pela sua diversa cultura, pelos seus productos expontaneos ou por outras circunstancias notaveis e permanentes.

A classificação consiste em subdividir cada qualidade em tantas classes quantos são os graus notavelmente diversos da respectiva productividade, tendo em consideração as condições phisicas e economicas que influem sobre a determinação do rendimento, liquido e precisando os caracteres e os elementos que sirvam para distinguir uma classe da outra, e fixando ao mesmo tempo um certo numero de parcellas que representem o merito medio de cada classe para servirem de typo para a distribuição das diversas parcellas pelas classes estabelecidas.

Art. 18.° A organização das taritas será subordinada aos seguintes principios:

1.° A quantidade dos productos será calculada pela media dos 12 annos anteriores, ou de um periodo maior para as culturas que o exijam;

2.° O preço de cada producto será calculado pela media dos 12 annos anteriores excluidos os dois annos de maior e os dois de menor preço.

3.° As deducções a effectuar no producto bruto serão as correspondentes:

a) As despesas ordinarias de producção, conservação e transporte dos productos aos mercados ordinarios;

b) As despesas com obras permanentes de defesa, drenagem e beneficiação;

c) As despesas de manutenção da propriedade, das construcções ruraes e de reintegração da cultura;

d) Uma quota para as despesas de administração, para as perdas eventuaes e prejuizos provenientes de sinistros, innundações ordinarias e servidões militares.

Art. 19.° As aguas de irrigação serão cornprekendidas pelo seu effeito util na avaliação dos terrenos; no caso porem de estes serem irrigados no todo ou em parte com agua de renda, far-se-ha uma deducção proporcional no rendimento liquido.

Art. 20.° As parcelas serão consideradas no estado de cultura ordinaria segundo os usos e costumes locaes, não se tendo em consideração o exercicio industrial, as condições especiaes do possuidor para com terceiros, e as culturas extremamente cuidadas ou despresadas.

Art. 21.° Ainda que isentos de contribuição predial, serão levantados e avaliados os terrenos a que se refere o artigo 2.º do decreto com força de lei de 4 de maio de 1911.

Os incultos a que se refere o artigo 3.° do mesmo decreto serão levantados não lhes sendo attribui-lo rendimento algum.

Art. 22.º O cadastro será constituido em cada freguesia:

a) Pelo mappa parcelar;

b) Pelo livro predial organizado por predios rusticos na ordem crescente dos numeros do mappa e contendo, para cada predio, o nome do proprietario, a sua designação cadastral e indicações necessarias para a sua completa identificação, a de cada uma das parcelas cadastraes que contem com a respectiva superficie e rendimento collectavel;

c) Pela matriz cadastral estabelecida por proprietarios em ordem alfabética, e apresentando para cada proprietario a designação cadastral de todas as parcelas, que compõem os predios, que lhe pertencem com os elementos necessarios para o lançamento da contribuição predial.

Serão annexados os croquis, registos e todos os outros documentos que serviram para a organização do mappa e dos livros cadastraes.

Art. 23.º Será organizado um mappa de ligação na escala de 1/200000 apresentando as indicações que forem prescritas no regulamento e sobre o qual serão lançadas as cotas de altitude a que se refere o artigo 13.°

Art. 24.° Será criado um Serviço Geral do Cadastro technico e administrativo, a que será confiada a direcção e fiscalização de todas as operações cadastraes.

Junto do serviço geral do cadastro será criado um Conselho do Cadastro para dar parecer sobre todos os assuntos de maior importancia relativos á organização e conservação do cadastro.

No regulamento serão especializadas as attribuições que competem a este conselho.

Art. 25.º Os trabalhos para a organização do cadastro serão executados sob a direcção de delegações do Serviço

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Geral do Cadastro, cujo numero deve variar com a dispersão e intensidade dos trabalhos a realizar.

Art. 26.° Para as operações de avaliação serão criadas Juntas technicas compostas de peritos nomeados metade pelo Ministro, a outra metade pelos districtos interessados e de um presidente de nomeação ministerial, a quem incumbe sob as prescrições do regulamento:

a) Determinar as qualidades de cultura existentes em cada freguesia do respectivo districto, e estabelecer as classes em que devem dividir-se;

b) Organizar as tarifas determinando o rendimento liquido por cada hectare de terreno de cada qualidade e classe;

c) Prestar o seu concurso nas operações de avaliação quando lhe for requerido pela administração geral do cadastro.

Cada freguesia pode exigir que um seu delegado seja ouvido pela Junta technica sobre a qualificação, classificação e tarifa do seu territorio.

Art. 27.° A distribuição das differentes parcellas de cada freguesia pelas diversas qualidades e classes estabelecidas pelas juntas technicas será feita por peritos cadastraes com a assistencia da commissão censuaria parochial e das partes interessadas,

A ausencia d'estas ou das commissões censuarias não suspende o curso das operações.

Art. 28.º O Serviço Geral do Cadastro regulará o trabalho das juntas technicas para se obter a uniformidade de criterio e de processos na determinação dos rendimentos liquidos das diversas classes e qualidades da cultura.

Art. 29.° Em cada freguesia haverá uma Commissão censitaria parochial nomeada pela junta de parochia em sessão extraordinaria, á qual serão convidados a assistir com direito de voto um numero de maiores contribuintes da contribuição predial, igual ao dos membros da junta de parochia. A Commissão censuaria parochial será composta de cinco membros effectivos e dois supplentes, que elegerão o presidente entre os effectivos, e terá a sua sede na sede da freguesia.

Art. 30.° Em cada districto haverá uma Commissão censitaria districtal composta de um presidente nomeado pelo Ministro e de quatro vogaes effectivos e dois supplentes nomeados metade pelo Ministro e metade pelos quarenta maiores contribuintes da contribuição predial do districto interessado. A commissão terá a sua sede na capital do districto.

Art. 31.° Será criada uma Commissão censitaria central nomeada pelo Ministro, presidida por elle ou por um vice-presidedte, seu delegado. Esta commissão terá a sua sede em Lisboa.

O numero e qualidade dos vogaes d'esta commissão será determinado no regulamento.

Art. 32.° O desempenho das funcções de vogal das commissões censuarias parochiaes e districtaes será obrigatorio para todos os cidadãos, excepto os casos previstos no regulamento.

Incorrerão na multa de 5$000 réis a 50$000 réis os individuos que sendo nomeados se recusarem ao desempenho d'essas funcções.

Art. 33.° Quando por qualquer circunstancia não forem nomeados os vogaes de nomeação não ministerial a que se referem os artigos 29.° e 30,° da presente lei, o caso será resolvido respectivamente pelo governador civil e pelo Ministro nos termos do regulamento.

Art. 34.° Para exame e conhecimento dos interessados os quadros de qualificação e classificação e as tarifas de cada freguesia, serão enviados pelas juntas technicas ás commissões censuarias districtaes, e serão communicados a cada uma das commissões censuarias parochiaes os elementos relativos á respectiva freguesia e ás freguesias limitrofes. As commissões censuarias parochiaes tornarão publicos esses quadros e tarifas nos logares de uso.

Art. 35.° Os mappas e os resultados da applicaçao da qualificarão e classificação a cada parcella de terreno serão tornados publicos pela administração geral do cadastro. Os mappas serão depositados nas juntas de parochia onde poderão ser vistos e examinados pelas partes interessadas nos termos do regulamento.

Art. 36.° As commissões censuarias parochiaes poderão reclamar em via absoluta e em via comparativa á commissão censuana districtal contra os quadros de qualificação claseificação e tarifas da respectiva freguezia organisados pelas juntas technicas.

A commissão censuaria districtal decidirá em primeira instancia ouvida ajunta technica e feitas as indagações e verificações que julgar necessarias e opportunas. Poderá haver recurso para a commissão censuaria central que decidirá em ultima instancia ouvida a administração geral do cadastro.

Art. 37. Os proprietarios, as juntas de parochia e outras entidades interessadas, poderão reclamar á commissão censuaria parochial contra a inscrição, delimitação, figura e area dos respectivos bens e sobre a applicação da qualidade e classe. A commissão parochial transmittirá as reclamações com o proprio voto á commissão censuaria districtal a qual ouvidas as observações do perito para isso delegado da administração geral do cadastro, decidirá em via definitiva. Para a commissão censuaria central só se poderá recorrer por violação da lei.

Art. 38.° No regulamento serão estabelecidos a fornia, termos e processos das reclamações a que se referem os artigos 36.° e 37.° da presente lei.

Art. 39.° A medida que se forem completando os respectivos trabalhos cadastraes será criado em cada concelho um Serviço de Conservação do Cadastro incumbido de o ter em dia.

O cadastro será conservado e posto ao corrente das alterações que se produzam no estado das propriedades e no nome dos seus respectivos proprietarios por uma maneira continua e por verificações periodicas.

As mutações cadastraes serão obrigatorias e só poderão ser realizadas perante escrituras publicas, titulas particulares autenticados por notario ou sentenças judiciaes.

Art. 40.° O serviço geral do cadastro fará verificar todos os cinco annos sobre o terreno por peritos cadastraes todas as alterações que produzam rectificações sobre o mappa ou na consistencia das parcellas. Estas verificações periodicas recairão sobre as alterações declaradas e sobre as que o não tenham sido. Os proprietarios poderão requerer que uma verificação sobre o terreno seja realizada em qualquer occasião ficando a seu cargo as respectivas despesas.

Os proprietarios ou seus delegados poderão assistir ás operações de verificaçjio e rectificação, mas a sua ausencia não retardará o curso das ditas operações.

Art. 41.º No caso de fraccionamento de uim predio rustico ou de parcellas as partes interessadas devem apresentar uma planta cotada, representando esse fraccionamento, que será figurado sobre um extracto autentico do mappa cadastral e assinado por um geometra e pelas partes interessadas.

Art. 42.° Quando o cadastro de um concelho for declarado sob o regime de conservação, todos os actos, convenções ou sentenças tendo por objecto constituir, transmittir, declarar, modificar ou extinguir um direito de propriedade, usufructo, fruição ou outro direito real immobiliario, deverão conter a designação cadastral dos immoveis a que se refiram.

A designação cadastral dos immoveis será igualmente obrigatoria nas declarações relativas ás mutações por óbito. As transgressões a este artigo serão punidas com multa pecuniaria de 5$000 a 20$000 réis.

Art. 43.° As variações no rendimento liquido só se poderão produzir em aumento:

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1.° Pela alluvião, formação de ilhas, retirada ou desvio de agua;

2.° Pela passagem de solo publico a propriedade particular ;

3.° Pela introducção de bens omissos por qualquer circunstancia e que devam figurar no cadastro predial rustico.

Em diminuição:

1.° Pela desappariçao total ou parcial dos immoveis ou pela perda total da sua potencia productiva por causa de força ou do natural exgotamento;

2.° Pela passagem do immovel do cadastro rustico para o cadastro urbano.

Em cada concelho ficarão inalteraveis durante um periodo minimo de 20 annos a qualificação, classificação o tarifa correspondente a cada parcolla de terreno.

Art. 44.° Na lei do orçamento será incluida, em cada anno, a despesa necessaria para a organização do cadastro. A proposta de lei será acompanhada por um relatorio demonstrativo do estado e marcha dos trabalhos.

Art. 45.° Ficarão a cargo do Estado todas as despesas da organização do cadastro, exceptuadas as despesas a que se refere o artigo 7.° e as seguintes despesas a cargo dos districtos:

a) Retribuições e indemnizações aos delegados de nomeação não ministerial das juntas techrucas;

b) Com as respectivas commissões ccnsuarias districtaes;

c) Com os locaes e mobiliario para as repartições das juntas technicas e inspecções cadastraes.

Despesas a cargo das camaras municipaes:

a) Com a delimitação dos territorios parochiaes;

b) Com as commissões censuarias parochiaes;

c) Com os locaes e mobilia para as repartições dos operadores cadastraes;

d) Com gratificações aos informadores e publicações e notificações a fazer nas respectivas freguesias.

A cargo dos proprietarios fica a despesa da delimitação dos respectivos predios.

Art. 46.° Serão isentos de contribuição de registo e de imposto do sêllo todos os actos concorrentes para a delimitação, demarcação e formação do cadastro e para as reclamações e respectivos processos.

Os contratos de permuta e venda immobiliaria que forem estipulados na occasião da delimitação com o fim reconhecido de melhorar e rectificar os limites e a configuração dos bens ou de reunir parcellas dispersas situadas na mesma secção, serão isentos de contribuição de registo, pelas respectivas transmissões, embora haja reposições a dinheiro, quando a area de cada immovel permutado não exceda ... hectares.

Os emolumentos dos notarios e conservadores e bem assim os encargos inherentes á transcrição das hypothecas e sellos dos contratos serão reduzidos a metade.

Art. 47.° As juntas technicas, as commissões censuarias e seus delegados e os peritos cadastraes terão direito de accesso ás propriedades particulares para os effeitos da presente lei.

Os oppositores ficarão sujeitos á multa pecuniaria de 5$000 a 20$000 réis.

Art. 48.° As juntas technicas e os peritos cadastraes teem direito, no desempenho das suas funcções, de examinar gratuitamente os documentos e os registos existentes nas repartições e cartorios publicos, e d'elles extrair copia.

Art. 49.° A vigilancia para assegurar a conservação e intangibilidade dos sinaes trigonométricos e de todo o sinal permanente que interesse a formação do cadastro, será confiada aos empregados do cadastro e a todos os agentes e autoridades que denunciarão os infractores ás autoridades judiciaes para os effeitos da lei.

Art. 50.° Os documentos planimetricos e as cotas de altitude serão, à medida que se for completando os mappas de ligação, communicados ao Ministerio da Guerra.

A medida que se forem completando os trabalhos cadastraes em cada concelho, será remettida uma copia autentica ás Repartições de Fazenda para os effeitos de lançamento de contribuição predial.

Art. 51.º Em lei especial serão determinados os effeitos juridicos do cadastro e as reformas que se devem produzir para tal fim na legislação civil.

Art. 52.° O Governo promulgará um regulamento para a execução da presente lei.

Art. 53.º Fica revogada a legislação em contrario. = Manuel de Brito Camacho = José Relvas.

Foi admittida e enviada á commissão de agricultura.

O Sr. José Barbosa: - Sr. Presidente: as commissões de Constituição e de redacção resolveram, em harmonia com a resolução hontem tomada, visto estar quasi a terminar a discussão da Constituição, pedir aos Srs. Deputados que apresentaram emendas e foram approvadas, que compareçam, caso queiram, amanhã ás 11 horas do dia, se hoje acabar a discussão, no edificio da Assembleia, ou a apresentarem, por escrito, quaesquer rectificações que tenham a fazer á redacção das emendas, ou, mesmo, a dar esclarecimentos sobre ellas.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se, para entrar em discussão, o projecto sobre importação de azeite.

Posta na mesa. É o seguinte:

Artigo 1.° É autorizada a importação de azeite puro de oliveira, proprio para consumo alimentar, livre de todos os impostos aduaneiros, até a quantidade de 3.000:000 kilogrammas.

Art. 2.° O azeite importado, nos termos d'este decreto, deverá ser limpido, possuir cheiro e sabor normaes, e não poderá ter mais de 5 por cento de acidos livres, computada esta acidez em acido oleico.

Art. 3.° O despacho do azeite importado, nos termos do artigo 1.°, só poderá effectuar-se até o dia 30 de agosto do corrente anno e pelas alfandegas de Lisboa, Porto, Barca de Alva, Villar Formoso e Elvas.

Art. 4.° A Direcção Geral da Agricultura estabelecerá, nas alfandegas a que se refere o artigo antecedente, um serviço especial para verificação da pureza do azeite.

Art. 5.º O azeite importado não poderá ser vendido por grosso a bordo ou sobre vagão, comprehendidas todas as despesas, por preço superior a 200 réis por kilogramma, nem por mais de 280 réis por litro na venda a retalho em qualquer ponto do país.

§ unico. Considera-se venda por grosso a referente a uma quantidade de azeite não inferior a 600 kilogrammas.

Art. 6.° A Direcção da Fiscalização dos Productos Agricolas compete verificar se o azeite, importado com isenção de direitos, é vendido pelos preços indicados no artigo anterior.

§ unico. Quando, por eifeito da fiscalização, se prove que não são cumpridas as disposições do artigo 5.° d'este decreto, será levantado auto para se verificar a contravenção, seguindo-se o disposto no artigo 9.°

Art. 7.° No Mercado Central de Productos Agricolas será aberto um registo especial da importação de azeite, em que deverão inscrever-se os importadores até o dia 24 do corrente mês de agosto, declarando:

a) Nome ou firma e residencia;

b) Quantidade que deseja importar;

c) Alfandega por onde a importação será feita;

d) Localização do armazem em que o azeite será ré-

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cebido ou onde a sua entrega haja de ser feita aos revendedores ;

e) Situação dos estabelecimentos de venda a retalho, quando os importadores do azeite o destinem tambem a este commercio.

Art. 8.° As declarações a que se refere o artigo anterior constituem compromisso, que tem de ser garantido por caução correspondente a 5 por cento do valor do azeite a importar ou por fiança idónea pela mesma importancia.

Art. 9.° Os commerciantes que, na venda por grosso ou a retalho, exigirem preços superiores aos fixados neste decreto, serão obrigados a pagar os direitos da pauta vigente pela totalidade do azeite que tiverem adquirido.

§ unico. Para a fiscalização do inteiro cumprimento do preceituado neste artigo são os importadores obrigados:

1.° A entregar aos commerciantes de retalho uma factura de onde conste a quantidade fornecida e o preço por que o azeite lhe foi vendido.

2.° A enviar ao Mercado Central de Productos Agricolas, todas as segundas feiras, uma nota das vendas realizadas na semana anterior, e da qual constará quaes as quantidades vendidas e respectivos preços, nomes e moradas dos compradores.

Para os effeitos da fiscalização remetterá a Direcção do Mercado Central, immediatamente, á Direcção da Fiscalização dos Productos Agricolas uma copia d'essa nota.

Art. 10.° Quando, pelas declarações a que se refere o artigo 7.°, se verifique que as importações de azeite que os commerciantes pretendem effectuar excedem, na sua totalidade, a quantidade fixada no artigo 1.°, deverá o Mercado Central de Productos Agricolas proceder ao competente rateio.

§ unico. As quantidades inferiores a 5:000 kilogrammas não entrarão no rateio, não soffrendo por isso qualquer diminuição.

Art. 11.° A nenhum importador é permittida a importação de mais de 300:000 kilogrammas de, azeite.

Art. 12.° As alfandegas por onde o despacho de azeite é permittido com isenção de direitos, enviarão diariamente, ao Mercado Central de Productos Agricolas, uma nota dos despachos realizados.

Art. 13 ° Ao pessoal da Direcção Geral da Agricultura, que haja de ser deslocado para os effeitos da fiscalização do disposto neste decreto, serão abonadas pelas disponibilidades do Fundo do Fomento Agricola, as ajudas de custo e subsidios de marcha a que tenham direito ou que competem aos agronomos de 2.ª classe do quadro, quando se trate de chimicos analistas contratados.

Art. 14.° Fica revogada a legislação em contrario. = Manuel de Brito Camacho = José Relvas.

O Sr. Ministro do Fomento (Brito Camacho): - Ante-hontem, se bem me recordo, o Sr. Deputado Lopes da Silva perguntou-me se eu acceitaria uma determinada emenda ao projecto sobre os azeites. Foi uma gentileza que S. Exa. A teve para comsigo, e só como tal lh'a agradeço. Outros Deputados fizeram igual pergunta e isso leva-me a fazer a declaração, que, de resto, talvez fosse desnecessaria, de que o projecto que trouxe á Assembleia, em nome do Governo, é, como todos os projectos governamentaes, inteiramente aberto á discussão, salvo qualquer conveniencia resultante de combinação de interesses, porque, então, serão os Ministros os primeiros a informar d'essas circunstancias a Assembleia.

A questão, porem, é aberta, na mais larga accepção da palavra, o que quer dizer que todas as emendas, que forem apresentadas, serão estudadas e bem recebidas.

De muitas será o projecto susceptivel, e algumas me Decorreram, apressando-me a mandá-las para a mesa.

Relativamente ao artigo 1,°, proponho a adjunção de um § unico, assim redigido:

"§ unico. Sendo variavel a capacidade do vasilhame, o que não permitte aos importadores garantir em absoluto as quantidades manifestadas nas declarações a que se refere a alinea a) do artigo 7.°, será permittida a tolerancia até 10 por cento, para menos, das referidas quantidades". = Brito Camacho.

Esta margem de 10 por cento para differença entre o que se recebeu e o que se manifestou, parece-me de todo o ponto acceitavel.

Com respeito ao prazo tinha fixado o de 10 de agosto, na convicção de que o decreto seria publicado mais cedo do que realmente é. Pareceu-me depois conveniente alargá-lo até 30 de agosto, mas, feita essa emenda, o presidente da Associação Commercial de Lisboa procurou o Presidente da Assembleia Constituinte para lhe pedir que fosse ainda mais alargado.

Nessas condições, apresento uma emenda marcando o dia 10 de setembro, data que se me afigura attender as reclamações dos commerciantes.

Essa emenda é a seguinte:

Proponho que no artigo 38.° se substituam as palavras "até o dia 30 de agosto" por "até o dia 10 de setembro". = Brito Camacho.

Pelo que respeita ao § unico do artigo 5.°, tambem proponho uma pequena alteração de numeros:

Proponho que no § unico do artigo õ.° se substitua o n.° 600 por 10.- Brito Camacho.

Igualmente proponho que ao artigo 11.° se acrescente um pequeno paragrapho que será assim redigido:

"§ unico. A importação será individual, não podendo os socios de qualquer casa commercial importadora fazer importação de conta propria, e não sendo permittido importar a individuos que não estejam inscritos como commerciantes". = Brito Camacho.

Vê bem, a Assembleia, o alcance d'esta emenda.

Se assim não fosse, uma casa commercial podia importar, em vez de 300:000 kilogrammas, um 1.000:000; e assim teria a Assembleia contribuido para que, dentro da lei, se estabelecesse um monopolio, o que a todo o custo se quer evitar.

São estas as alterações que eu, baseado em informações que me foram dadas por commerciantes e, até, por consumidores, proponho á Assembleia.

O Sr. Ministro da Justiça (Affonso Costa): - V. Exa. não pensa em aggravar a pena, para aquelles que queiram tentar a fraude? Pede ser pequena para alguns commerciantes, que a queiram fazer; talvez devesse ser o dobro dos direitos. A pena do dobro do imposto é muito suave e pode ser um convite á fraude.

O Orador: - Concordo perfeitamente com o Sr. Ministro da Justiça e nesse sentido redijo uma emenda que mando para a mesa.

É a seguinte:

Proponho que no artigo 9.° onde se lê: "a pagar os direitos" se escreva "a pagar o dobro dos direitos". = Brito Camacho.

S. Exa. não reviu.

As propostas foram todas admittidas.

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O Sr. Lopes da Silva: - Sente immensa satisfação em ver sobro a mesa da Assembleia Nacional Constituinte o documento que se discute, apresentado pelo Governo da Republica. E essa satisfação é tanto maior, quanto foi elle, orador, que, numa campanha porfiada, ás vezes mal classificada dentro da Assembleia e lá fora, levantou a questão. Na apresentação d'esse documento vê elle, orador, a justificação completa e demonstração exacta da verdade e razão com que pedia ao Governo providencias destinadas a remediar um mal que affectava quasi todas as classes do país.

Malsinaram lhe as intenções, e estando no uso da palavra- com o modo por que sabe fazê-lo e com a modéstia de quem fala pouco - ouviu o orador, nesta Assembleia apreciações pouco lisonjeiras ao que estava dizendo. Entretanto, emquanto a sua consciencia for o supremo juiz dos seus actos, elle, orador, saberá nortear as suas acções, dando apenas satisfação a essa consciencia.

Dito isto, tem agora o Sr. Ministro do Fomento e a Assembleia a convicção de que não era por vaidade ou por qualquer outra circunstancia, que pugnava peia solução de um problema que entende ser do mais alto interesse para a economia nacional.

Sente que a providencia que se discute, e di-lo sem a mais leve sombra de censura, não tivesse sido tomada, pelo menos ha um mês, porque milhares de bênçãos cobririam o Governo da Republica, de toda essa gente do país, que se via explorada num genero de primeira necessidade, por razões de varias ordens.

O dever dos homens de Estado é legislar, aproveitando, porem, a melhor opportunidade para fazer as leis.

Entrando agora na analyse do projecto, simples e rapida, porque outra cousa não lh'o permitte fazer a sua competencia, lembra e ousa registar a declaração do Sr. Ministro do Fomento, quando disse que elie, orador, o havia procurado, para lhe perguntar se de algum modo acceitaria emendas, que modificassem o projecto apresentado.

Entendia, quando fez esta pergunta a S. Exa., que a Nação devia aproveitar-se de uma estação official, para fazer a importação. Essa estação era o Mercado Central de Productos Agricolas.

S. Exa., com aquella franqueza que o caracteriza, disse-lhe não se ter servido d'essa estação official, porque tem visto que o Mercado Central não servia para essas cousas.

Pois era exactamente para demonstrar se esse Mercado servia ou não, é que lhe devia ser remettido esse genero de primeira necessidade, porque, se não servisse, devia ser eliminado.

Se o Mercado Central de Productos Agricolas mostrasse que não tinha funccionarios que soubessem desempenhar as suas funcções, devia proceder-se para com elles do mesmo modo que procedem as casas commerciaes, quando os empregados que não desempenham os seus deveres a contento dos respectivos patrões. A Republica precisa, a bem dos interesses da Nação, de ter um corpo de funccionarios impeccavel, para que não sejam malsinadas as intenções dos Ministros, como muitas vezes o são e teem sido.

Antes mesmo de ter conhecido da representação enviada á Assembleia pela Associação Commercial de Lisboa, achou elle, orador, muito curto o prazo que o Governo marcava para o registo dos azeites a importar, e o prazo para a entrada d'esse azeite. E achava-o prejudicialissimo, porque elle daria em resultado beneficiar certas firmas commerciaes que, prevendo a hypothese d'esta lei ser votada, já tinham tido o cuidado de armazenar nos postos alfandegarios, na fronteira espanhola, azeite que entrasse mais facilmente do que outro que fosse encommendado ao abrigo d'esta lei.

Como não quer que sejam malsinadas as intenções da Republica, tencionava, o orador, apresentar uma proposta de emenda, a fim de que os dois prazos, o da declaração e o Já entrada de azeite, fossem prorogados em harmonia com as necessidades d'essa mesma introducção.

Antes de ter o prazer de ouvir a declaração franca do Sr. Ministro do Fomento-que disse ser o projecto uma questão aberta - fizera o orador uma proposta de emenda, lembrando á Assembleia Nacional Constituinte a conveniencia de deferir o pedido da Associação Commercial de Lisboa, introduzindo no projecto as emendas que ella reclamava. E já que falou nessa Associação, deseja notar á Assembleia um trecho da representação por elle elaborada, pois não sabe que significado pretende a Associação dar a determinadas palavras de um periodo da sua representação.

Diz ella: e ... pondo completamente de lado esse principio, que, em outra conjuntura, teria o direito de reivindicar para as classes, cujos interesses lhe cumpre zelar". Como se á Assembleia Nacional Constituinte e ao Governo da Nação não lhes cumprisse zelar esses interesses!

O orador felicita o Governo e a Assembleia, estando certo de que a doutrina do projecto em discussão ha de ser a prova, para muita gente, de que pode ter esperança num Governo de moralidade, dentro da instituição republicana. E está convencido de que todas as vezes que a Nação reclamar do Governo providencias semelhantes á que se discute, elle as saberá dar com energia e em tempo devido.

Em boa verdade, attenta a regulamentação do projecto, que está muitissimo bem feito, como tudo o que sae do Governo da Republica, na essencia, elle é quasi aquillo que elle, orador, apresentou á Assembleia Nacional Constituinte, no dia 17 do mês passado, num projecto mal alinhavado.

Nesse projecto dizia-se que era o Governo autorizado a importar a quantidade de azeite indispensavel para o consumo publico, até uma determinada data.

Cré que esse cômputo se faria com rigor, porque, dados os conhecimentos, que a sciencia hoje possue, pode-se determinar, em rigor, quanto é que 5 milhões de individuos podem consumir de azeite, em circunstancias normaes, durante tres meses.

Assim o artigo 1.° do projecto em discussão não é, nem mais nem menos, senão uma cousa parecida com o que elle, orador, apresentava.

Nesse mesmo projecto dizia que se criassem postos de analyse nos pontos por onde o azeite entrasse, e esses seriam os postos alfandegarios de Lisboa e Porto, onde se verificasse a pureza d'esse azeite.

Foi-lhe respondido que esses postos já existiam, como se não fosse uma cousa indispensavel relembrar esse ponto! Pois é de notar que, apesar de todas as precauções, passou-se o que todos sabem.

Permitta-lhe agora o Sr. Ministro do Fomento que lhe diga a razão por que desejava que se importasse por conta do Estado e por intermedio do Mercado Central de Productos Agricolas determinada quantidade de azeite. Essa razão parece-lhe muito attendivel.

Se fosse empregado da Direcção Geral de Agricultura e o Sr. Ministro do Fomento o consultasse a tal respeito, diria a S. Exa. que devia determinar a importação por conta do Estado e por concurso, porque assim haveria duas garantias: primeiro, obter azeite em melhores condições de preço; segundo, poder-se ter azeite em melhores condições de pureza, relativamente a esses acidos livres que entram na composição normal do azeite e que variam de região para região.

Se esse principio se adoptasse não seria preciso ir alem da tolerancia de 5 graus porque havia quem viesse ao concurso talvez em melhores condições de preço e com o maximo de acidez de 3 por cento.

Era este um dos pontos principaes para que o orador desejava chamar a attenção do Sr. Ministro do Fomento,

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para se importar azeite, por conta do Estado, e por intermedio do Mercado Central de Productos Agricolas, desejando tambem pôr em evidencia que o Mercado Central era uma repartição official com que se devia contar, em todas as circunstancias.

Não querendo fatigar mais a attenção da Camara, limita-se a pedir ao Governo, que ponha em execução todas as medidas attinentes a evitar que o azeite seja desviado do fim para que é introduzido em Portugal; e que puna, rigorosamente, todos aquelles que queiram abusar de um acto de magnanimidade do Governo da Republica, para servir interesses, que um homem honesto nunca pode pôr em evidencia.

O que o orador pede ao Governo da Republica, é que faça tudo quanto possivel para evitar o contrabando que, através da raia seca se faz, em quantidade enorme, a fim de que o povo saiba que pode recorrer para o Governo, porque o Governo lhe fará justiça em todas as questões de economia, em que elle precise de protecção.

O discurso será publicado na integra quando S. Exa. restituir as notas tachygraphicas.

O Sr. Ministro do Fomento (Brito Camacho): - Sr. Presidente: o Sr. Deputado Lopes da Silva não atacou o projecto, limitando-se a fazer sobre elle considerações de ordem varia. Alguma cousa ha, porem, que necessita de resposta.

Sem ser propriamente uma accusação, foi, em todo o caso, um reparo que S. Exa. fez, e devo responder.

Pregunta S. Exa. porque é que o Estado não se faz importador e vendedor de azeite, e acrescentou que, havendo uma estação chamada Mercado Central de Productos Agricolas, era necessario que o Estado, pelo menos occasionalmente, se fizesse commerciante e dispensasse a intervenção de intermediarios, que nunca é gratuita.

Ha, apenas, um pequeno inconveniente: é que o Mercado Central não está organizado para exercer funcções de ordem commercial, de modo que não tem agentes, não tem braços, nem aquella technica que o commerciante tem, e que é absolutamente indispensavel para não fazer uma fallencia, em vez de fazer um negocio.

Se o Sr. Deputado estivesse mais ao facto das circunstancias do Mercado, talvez não tivesse apresentado esse argumento.

O Mercado Central de Productos Agricolas, ou se desempenhava bem d'essa funcção, e fazia-o com ganancia, ou se desempenhava mal, e o Governo perdia.

O Mercado, não estando preparado para essa funcção, está claro que havia de desempenhar-se mal.

Se S. Exa. conhecesse um pouco melhor o Mercado, podia lembrar-se de que elle já desempenhou essa funcção a respeito da importação do álcool, mas este tem um regime especial, muito differente do do azeite.

De resto - e este argumento não parece que seja pouco para ponderar-o Estado podia, occasionalmente. neste momento, fazer-se importador de azeite, mas para isso precisava de dispor, immediatamente, de uma quantia que não devia ser inferior a 900:000$000 réis e, fazendo o rateio, não tirava lucro nenhum. Apenas poderia chegar para o custo do entretien e absolutamente mais nada.

Ora, não consta, pelo menos até agora, que o Estado sendo commerciante, não fosse o peor de todos os commerciantes, e isto porque não sabe desempenhar essa funcção e porque ninguem tem escrupulos em burlar o Estado.

Acrescia ainda que, com respeito ao vasilhame, havia de ser um pouco difficil o Estado desembaraçar-se d'elle e proceder de qualquer forma que não levantasse justos protestos e reclamações da parte dos tanoeiros; a não ser que quisesse ficar com um stock de vasilhas, que não seriam acceites para cousa alguma.

Eis a razão por que, tendo-se pensado em recorrer ao Mercado Central, se pôs de parte essa ideia.

O Sr. Lopes da Silva: - Em todo o caso pensou-se em utilizá-lo.

O Orador: - Antes de se acertar, procuram-se soluções menos certas.

O Sr. Deputado referiu-se á sua propria campanha, que foi nobilissima, mais pelos intuitos do que pelo modo por que a fez. Tambem eu sabia que o preço do azeite estava subindo, mas não tinha aquella somma de informações precisas, nem sobre o preço do mercado interno, nem do mercado externo, para desde logo decretar uma proposta de lei, permittindo a importação de azeite, livre de direitos.

Para mim, é pelo menos muito discutivel o direito que tenha o Estado, em determinadas occasiões, de fazer-se industrial ou commerciante, não deixando essa funcção a quem de direito deve exerce-la. Só em occasiões extremas o pode fazer; porque a uma classe, que tem as suas garantias, a sua legitimidade e razão de ser, o Estado não pode fazer com ella uma concorrencia, pelo menos illegal, excepto quando se procure evitar uma pura especulação.

Era o que acontecia neste momento; de modo que a demora que houve em adoptar providencias, foi determinada pela necessidade que tinha o Governo de receber informações, por forma a justificar o seu procedimento; e tambem para não adoptar um proceder que, pela sua precipitação, redundasse em prejuizo da classe da lavoura e dos commerciantes. Emquanto o commercio for uma funcção legitima, ha de ter necessariamente direitos, como tem obrigações.

Sem tomar a defesa da classe commercial que, de resto, tem representantes muito notaveis na Assembleia, eu sou de parecer que ella mostrava razão quando na sua representação teve o cuidado de dizer que em quaesquer outras condições, isto é, quando não se tratasse de um genero de primeira necessidade, o commercio revindicaria direitos que vê cerceados.

Se assim é, o pensamento da Associação Commercial é digno de applauso.

Quanto á emenda que me suggeriu o Sr. Ministro da Justiça, acho-a perfeitamente justificada, porque tudo quanto seja metter na lei disposições que previnam as fraudes, onde ellas possam ser prevenidas, é sempre conveniente. Lembro me sempre a proposito d'isto de um leiteiro que era multado quotidianamente em 500 réis, e que me disse que lucrava 1$500 réis diarios, adulterando o producto que vendia...

S. Exa. não reviu.

O Sr. Nunes da Mata: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: estranho caso poderá parecer que eu me proponha discutir o projecto de lei apresentado pelo Sr. Ministro do Fomento, facultando a entrada de azeite de oliveira em Portugal sem o pagamento de direitos de importação. Mas não ha razão para que haja reparos ao meu procedimento, por tres motivos.

Em primeiro logar, todos os cidadãos aqui reunidos possuem em geral e devem possuir conhecimentos de quasi todos os assuntos que interessam a economia e a riqueza publicas.

Em segundo logar, tive sempre especial estima pela arvore de Minerva, que symboliza a paz e fraternidade e que foi sempre tida em grande estima pelas Republicas de Athenas e Roma, sendo ainda um ramo de oliveira, trazido no bico de uma pomba, que indicou a Noé que as aguas do diluvio haviam baixado, segundo me affirma o meu velho amigo e collega Sr. Jacinto Nunes, muito entendido em assuntos biblicos. Finalmente, em terceiro logar, eu mesmo fui em tempo olivicultor e lagareiro, dirigindo eu mesmo a plantação de mais de doze mil pés de oliveira e construindo um lagar, cujo azeite foi premiado com medalha de ouro em duas exposições internacionaes de Paris e na de S. Luis.

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Parece-me pois justificado o meu procedimento, pedindo a palavra para tratar d'este assunto.

Em primeiro logar me referirei ao projecto de lei em discussão e depois divagarei em considerações a respeito da arvore preciosa que produz o delicioso e apreciado óleo a que se refere o mesmo projecto de lei.

Entendo que o projecto de lei apresentado pelo illustre Ministro, que tão variadas provas tem dado da sua alta capacidade administrativa, merece ser approvado na integra com as emendas agora propostas pelo seu autor. É certo que o presente projecto de lei já devia ter sido apresentado ha mais tempo; mas é desculpavel a demora, em parte por estar o Ministro persuadido, como declarou nesta Assembleia, que havia no país azeite insufficiente para o consumo até: a proxima colheita, e tambem pelo empenho que tem mostrado em proteger as industrias agricolas.

Não ha a menor duvida que deve haver muito tacto e ponderação na protecção ás diversas industrias susceptiveis de desenvolvimento no país, mas tambem não ha a menor duvida que a protecção ás diversas industrias agricolas é de todas a que mais se justifica em um país que tem tambem todas as condições de clima e de solo para ser um país agricola modelo.

Mas, infelizmente, em Portugal ha ainda vastissimas regiões incultas que de pouco servem e que podiam estar cobertas de jardins de oliveiras e, direi, tambem de matas de pinheiros.

A plantação de olivaes, em muitos e muitos terrenos ainda incultos, tenho a certeza que daria resultados indiscutiveis como tive occasião de verificar nas plantações de oliveiras que, como disse, eu mesmo dirigi.

Se a Assembleia me permitte, relatarei os pormenores que me levaram a ensaiar a olivicultura.

Ha já uns trinta annos, pouco mais ou menos, foi-me pedido pelo meu velho amigo Sr. Magalhães Lima para representar o Seculo, jornal de que então era proprietario, nas experiencias de moagem que por iniciativa do Ministro das Finanças de então, o fallecido Mariano do Carvalho, se fizeram em uma fabrica de moagem sita á Estrella.

Eu fui com effeito assistir ás experiencias, e a proposito d'estas escrevi uma serie de artigos no jornal com o pseudonymo, que quasi sempre adoptei, de Julio Graccho.

Como é de suppor, empregando eu um tal pseudonymo, natural era que nos artigos manifestasse a minha sympathia pelas theorias dos celebres reformadores agrarios da Republica Romana, Caio e Tiberio Graccho. Com effeito, instava cem os grandes proprietarios de terrenos incultos para que os cultivassem, pois não era moral nem admissivel sob o ponto de vista social que os conservassem incultos e portanto inuteis para os habitantes da Terra. O que é certo é que a censura indirecta, dirigida a grande numero de proprietarios, tambem me tocava por casa, sem eu dar por isso, pois na occasião era possuidor de um pequeno casal, na margem esquerda do Rio Zezere e na freguesia de Sernache do Bomjardim, que constava de espaçosas encostas de terreno schistoso silurico, cobertas de matas de estevas, de rosmaninhos e urzes, que nada rendiam, as quaes podiam ser povoadas de oliveiras.

Nestes termos, ou tinha, em consciencia, de vender o casal, ou de plantá-lo de oliveiras.

Optei pela segunda resolução, e nas ferias do Natal, nas ferias da Paschoa e nas terias grandes do verão lá ia para as montanhas siluricas do Rio Zezere dirigir as plantações das minhas oliveiras, podendo dizer com orgulho que em terreno tão accidentado não ha em todo o país outros olivaes tão regularmente plantados como estes. O logar fica junto á ponte sobre o Zezere, na estrada de Thomar á Certa e os olivaes estendem-se pelas encostas dos montes que limitam o ribeiro, cuja agua faz no inverno e outomno andar o lagar. Os meus vizinhos imitaram o meu exemplo, e uma região, em que se contavam bem poucas oliveiras, é hoje um verdadeiro iardim de pequenas mas formosas oliveiras.

O que é certo, porem, é que tirei a prova real. Em Portugal, em quasi todo o Algarve, Alemtejo e Estremadura, em grande parte da Beira Baixa e importantes regiões da Beira Alta, Trás-os-Montes e Minho vale a pena fazer plantações de olivaes, pois o resultado é seguro e certo, sendo o terreno proprio para oliveiras.

Como regra geral, o valor dos olivaes no fim dos dez annos da plantação é o dobro da importancia dispendida na mesma plantação e nos amanhos até essa data. Para escolher o terreno não ha necessidade de recorrer ás analyses chimicas. Nos terrenos onde as estevas e rosmaninhos se desenvolverem com pujança plantem-se as oliveiras, que o resultado é seguro.

Antigamente as plantações de oliveiras eram feitas com tanchões, mas como estes teem muita procura e por isso não chegam, recorre-se aos viveiros. Parece-me, pois, que talvez fosse conveniente que o Governo, por meio dos seus agrónomos, estabelecesse viveiros de boas especies de oliveiras para vender aos proprietarios que pretendam fazer plantações.

A razão por que no presente anno houve falta de azeite está em parte na escassez das colheitas dos ultimos annos, mas tambem é devida ao consumo crescente de azeite nas latas de peixe e ao aumento continuo de exportação de azeite fino de oliveira para a America e Africa. Esta exportação tem aumentado de anno para anno e ha de continuar a aumentar, á medida que se for aperfeiçoando a fabricação do azeite.

O nosso povo dentro da monarchia ora teimoso na rotina, não ha duvidas a este respeito; mas com paciencia, tempo e methodo ha de entrar no bom caminho do progresso em tudo, e especialmente nos lavores agricolas. Nos meus modestos ensaios agricolas tive a prova d'este acerto.

Quando comecei a moer a minha azeitona no meu lagar, os meus vizinhos não podiam levar á paciencia que eu mandasse dar principio á apanha assim que o precioso fruto começava a tornar-se vermelho, e criticavam asperamente que a moenda se fizesse do pé da oliveira e sem as azeitonas irem estar algum tempo na tulha. Eu não fazia caso e procedia como entendia. Pois, meus senhores, não foram necessarios muitos annos para que se convencessem de que eu é que tinha razão; e passaram então a disputar a primazia para a moenda da sua azeitona.

Ao Governo e aos seus delegados agricolas compete, por meio de conferencias e publicações de facil percepção, incutir no animo da população agricola este e outros conhecimentos uteis, encaminhando o país para o futuro agricola a que tem direito.

Como sabemos, o vinho, a cortiça e o azeite são os tres productos agricolas mais importantes que exportamos. A plantação da vinha, emquanto o preço do vinho for remunerador, não ha a menor duvida que é a que dá proventos maiores por hectare de superficie de terreno. Mas o preço do vinho, em razão das grandes plantações de vinhas na America do Norte e na America do Sul, ha de continuar a baixar, em media; e, quanto mais baixar, mais terrivel será a sua acção malefica na moral do povo trabalhador e na sua robustez physica, e cada vez será menos remunerador.

É uma industria agricola que por considerações de ordem moral e economica deve ser restringida tanto quanto possivel.

Emquanto á sobreira, não ha tambem a menor duvida que é uma bella arvore que se dá maravilhosamente em Portugal, constituindo a exportação da cortiça a principal exportação agricola do país. Mas a sua plantação deve ceder o passo á da oliveira por tres razoes principaes. A sobreira gasta muito tempo no seu crescimento e só pas-

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sados, pelo menos, vinte annos dá rendimento que se veja, emquanto que a oliveira já aos dez annos vae dando regular rendimento.

Suppondo duas areas de terreno iguaes em superficie e qualidade, sendo uma plantada de sobreiras e a outra de oliveiras, o rendimento das ultimas é, em media, superior ao das primeiras.

Finalmente, a exportação da cortiça é sujeita a obstaculos por causa da industria das rolhas, emquanto que a exportação do azeite de dia para dia se torna mais importante e remuneradora.

Por isso a Republica Francesa tem tomado a peito repovoar de olivaes as vastas regiões incultas do interior da Tunisia e Algeria, que no tempo do dominio da Roma antiga já possuiam extensos olivaes.

Os meus votos são para que a Republica Portuguesa imite a sua irmã latina e coopere, quanto em si possa, para que Portugal venha a ser de norte a sul um ininterrupto jardim de oliveiras.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Lopes da Silva: - Desisto da palavra.

O Sr. Gastão Rodrigues: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro que, dando-se a materia por discutida, sem prejuizo dos oradores inscritos, se prolongue a parte destinada para antes da ordem do dia até a votação do projecto sobre a importação do azeite. = O Deputado, Gastão Rodrigues.

Foi approvado.

O br. Ministro do Fomento (Brito Camacho) - É velha praxe parlamentar que os Ministros respondam aos Srs. Deputados. A uns, para se justificarem de accusações que porventura lhes sejam dirigidas; a outros, por mero dever de cortesia.

Relativamente ao Sr. Nunes da Mata, dá-se esta ultima hypothese. Na verdade S. Exa. não atacou o projecto, mas não quero deixar de lhe agradecer as suas referencias.

É de calcular que fosse surpresa para a Assembleia S. Exa. tomar a palavra sobre a questão dos azeites; não o foi para mim, que ainda hoje recebi um projecto da iniciativa de S. Exa. Mas pode S. Exa. estar tranquillo. O lavrador, vendo que o azeite é um producto que tem consumo no país e consegue exportação facil, principalmente para o Brasil, continuará trabalhando para aumentar a producção e aperfeiçoar o fabrico.

A exportação do azeite da Espanha para o Brasil está mil vezes abaixo da exportação de Portugal, embora a Espanha venda por um preço inferior, o que significa que o azeite portugês tem uma venda muito maior, porque é muito melhor fabricado.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Nunes da Mata: - É simplesmente para significar a V. Exa. o meu enthusiasmo pelas palavras que acabo de lhe ouvir.

Como V. Exa. sabe, a capital francesa está hoje devidamente abastecida d'este genero de primeira necessidade, e eu desejaria que se conseguisse outro tanto entre nós.

O Sr. Sousa da Camara: - Não tinha tenção de falar sobre a generalidade do projecto dos azeites, e se tal faço é porque julgo que discutir este projecto na generalidade, seria apenas verificar se elle era ou não necessario.

Ora elle é evidentemente necessario.

Se se apresenta uma r medida temporaria a adoptar, é porque ella é urgente. É claro que lhe dou o meu voto na generalidade. Entretanto, houve uma affirmação sobre a qual pedi a palavra, para dizer tambem alguma cousa da minha justiça. Antes d'isso, porem, seja-me permittido dirigir a V. Exa. o mesmo pedido, já feito pelo Sr. Ministro do Fomento, para que se nomeie, o mais rapidamente possivel, a commissão de agricultura, que ainda não foi possivel nomear. Este é o segundo projecto sobre agricultura que vem ao Parlamento e, nós, infelizmente, não temos ainda essa commissão eleita.

Posto isto, vou dizer o que desejava.

Ouvi assacar responsabilidades a funccionarios do Mercado Central de Productos Agricolas e, confesso, lamento este facto, porque é levantar accusações sobre funccionarios que teem procedido sempre com a maxima lealdade, dedicação, esforço e trabalho, tanto mais se se conhecer a organização d'esse mercado, que não tem attribuições como aquellas que se pretende que elle tenha. (Apoiados).

As unicas attribuições que elle tem actualmente são o manifesto dos cereaes, dos azeites e de outros productos agricolas.

Mas ha mais.

Esse Mercado, que eu entendo que nunca deve ter outras attribuições, não se deve jamais intrometter em questões commerciaes, como se pretende tambem que elle se intrometta. Seria um erro deploravel converter o Mercado numa casa commercial. (Apoiados).

Ha uma cousa unica em que elle pode ser envolvido: é nas questões agricolas, chamemos-lhe assim, em que o Estado deve influir directamente como administrador, porque essas questões prendem-se muitas vezes, em vista da sua longa duração, com o Estado, e só elle e que pode administrá-las convenientemente.

Sr. Presidente: evidentemente o Governo conhece a situação da questão dos azeites, e tanto assim que no seu relatorio cita inclusivamente os dados estatisticos, pelos quaes se vê que ainda no país ha azeite.

A questão levantou-se principalmente pela questão commercial, pela ganancia commercial, mas essa ganancia, no meu modo de ver, deve combater-se legitimamente, e de forma digna. Combatê-la legitimamente e não com decretos, que são pouco democraticos porque brigam com as liberdades.

Eu creio que ha uma maneira digna, firme e moderna, de combater o commercio: - é pela formação de cooperativas. (Apoiados).

Infelizmente ainda não houve quem apresentasse aqui na Camara essa ideia.

E pelas cooperativas se conseguirá o barateamento do genero.

E necessario que se diga ao povo que a ganancia do commercio é facilmente combatida pela fundação de cooperativas.

Quero referir-me ainda a outro assunto: á percentagem de acidez no azeite.

Disse se que era possivel ter azeito espanhol com a percentagem de 3 por cento. Duvido, porque todos conhecemos o estado de atraso em que está a olivicultura em Espanha.

Sem referir-me á parte cultural com a qual nada tem o projecto, mas sim á parte technologica, devo accentuar que o fabrico do azeite em Espanha está mais atrasado do que entre nós.

Desculpe-me o orador que me precedeu, se o contradigo.

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Em Portugal tem-se avançado muito na parte technologica dos azeites.

Tenho percorrido o país de norte a sul, e tenho visto com prazer que todos os processos antigos de fabrico de azeites tendem a modificar-se completamente.

Vamos encontrar nos nossos lagares de azeite os moinhos e as prensas mais perfeitas que a industria tem fabricado.

Não se diga, pois, que o nosso fabrico está atrasado, e de resto, quando se tratar da questão da acidez do azeite, eu apresentarei uma proposta exactamente no sentido de pedir que se cumpra a lei, que marca õ graus de acidez, comquanto seja necessario que este limite baixe. E deve baixar immediatamente, porque hoje temos azeites não a 5 graus, mas a menos de 0,5.

O commercio, aproveitando se da crise, está vendendo azeite excessivamente acido pelo preço d'aquelle que contem a acidez marcada pela lei. É necessario que neste decreto appareça uma disposição que evite um tal erro.

Terminando, repito que o projecto em discussão é evidentemente necessario, porquanto o Governo declara que tem apenas uma quantidade de azeite insignificante para ser vendido Necessitamos, pois, de o obter; e a maneira unica de consegui-lo é recorrer á nação mais próxima, que é a Espanha.

Esse azeite não será bom, mas temos que sujeitarmo-nos ao que as condições actuaes nos offerecem.

Mando para a mesa as seguintes propostas:

Proposta de additamento

"§ unico do artigo 2.° Os azeites nacionaes para consumo não poderão exceder o limite de 2 por cento em acidos livres computados em acido oleico" .= Manuel de Sousa da Camara.

Proposta de substituição

"Artigo 3.° O despacho do azeite, importado nos termos do artigo 1.°, só poderá effectuar-se pelas alfandegas de Lisboa, Porto, Barca de Alva, Elvas e Villa Real de Santo Antonio.

§ unico. A importação do azeite poderá fazer-se em dois prazos:

a) Até 10 de setembro 1.500:000 kilogrammas;

b) Até 20 de setembro 1.500:000 kilogrammas".

Lisboa, 18 de agosto de 1911.= Manuel de Sousa da Camara.

Proposta de substituição

"Artigo 4.° Para o effeito da importação do azeite, a Direcção Geral de Agricultura estabelecerá temporariamente nas alfandegas, referidas no artigo anterior, um serviço de analyse. chimica summaria, aproveitando para o seu desempenho os chimicos-analystas officiaes".

Lisboa, em 18 de agosto de 1911.= Manuel de Sousa da Camara.

Proposta de substituição

Proponho que na alinea e) do artigo 7.° se substitua a palavra "situação" pelo vocábulo "localização".

Lisboa, em 18 de agosto de 1911. = Manuel de Sousa da Camara.

Proposta de emenda

Proponho que o registo da importação de azeite vá até o ultimo dia de agosto em logar de 24 d'este mês conformo marca o artigo 7.°

Lisboa, em 18 de agosto de 1911. = Manuel de Sousa da Camara.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Antonio Gil: - Começa por elogiar o Sr. Ministro do Fomento pelo modo por que procedeu na questão dos azeites. Não ha duvida de que foi ella tratada com" todas as cautelas e seguranças, porque, sendo Portugal um país agricola, necessario é ter cautela com tudo o que diga respeito á cultura.

Somos um país agricola, mas, infelizmente, vemos-nos, neste momento, na dura necessidade de importar azeite.

O que é preciso é exactamente importar apenas o necessario e sufficiente para o consumo até a próxima producção, que é muito importante e que está para muito breve.

Quanto á quantidade marcada no artigo 1.° do projecto para se importar, é que elle, orador, tem duvidas, parecendo-lhe que no projecto se devia autorizar somente a importação de metade do necessario, dando ao Governa autorização para fazer depois entrar mais se fosse necessario.

É preciso deixar o nosso dinheiro no país e não o deixar ir para fora, para que entrem oleos em logar de azeite.

Uma pergunta deseja fazer ao Sr. Ministro do Fomento ?

Qual é a razão por que S. Exa. não autoriza a entrada do azeite por Villa Real de Santo Antonio?

Aparte do Sr. Ministro do Fomento.

O Orador: - Entende que deve ser autorizada a entrada do azeite por aquelle villa e, nesse sentido, mando para a mesa a seguinte

Proposta

Proponho que se acrescente ao artigo 3.° "Villa Real de Santo Antonio" supprimindo-se o "e", que separa "Villar Formoso" de "Elvas". = O Deputado, Antonio Gil.

Pelo que respeita ao § unico do artigo 10.°, entende que deve ser eliminado porque, por elle, pode ser sophismado o artigo 1.°

Nesse sentido apresenta tambem a seguinte

Proposta

Proponho que se elimine o § unico do artigo 10.° = O Deputado, Antonio Caetano Celorico Gil.

O discurso será publicado na integra quando S. Exa. restituir as notas tachygraphicas.

Foram admittidas as propostas apresentadas pelo Sr. Sousa da Camara e pelo Sr. Antonio Gil.

Posto á votação o artigo 1.° do projecto, foi approvado, assim como a proposta do Sr. Ministro.

O Sr. Presidente: - Vão ler-se, para se votar, o additamento proposto pelo Sr. Ministro do Fomento ao artigo 1.°

Foi lido na mesa e approvado.

O Sr. Ministro do Fomento (Brito Camacho): - Pedi a palavra porque julgo indispensavel dar uma pequena explicação á Camara.

A quantidade fixada de 3.000:000 de kilogrammas é aproximadamente a que se considera, até a próxima colheita. E fixa-se aquella quantidade precisa porque o Governo entende melhor determinar o numero do que pedir autorização para importar o que fosse necessario.

O principio das autorizações, de que muito se abusou na monarchia, é detestavel. Os Governos devem, tanto quanto possivel, evitar pedi-las; e o Parlamento deve,, tanto quanto possivel, evitar dá-las.

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Sobre a entrada de azeite por Villa Real de Santo Antonio, devo declarar que não vejo necessidade de o importar por aquella villa, porque, segundo uma estatistica que aqui tenho e que não leio á Camara porque a não quero cansar, o azeite no Algarve apenas aumentou em preço, este anno, 10 réis em litro, quando em toda a parte encareceu mais.

Em quasi toda a parte o nosso azeite encareceu 200 réis por litro e no Algarve continua a vender-se ao mesmo prego do anno passado.

De resto, os azeites importados pelo Algarve são, quasi na sua totalidade, sujeitos ao regime do drawbach e por consequencia os importadores não teem necessidade d'elle.

Era o que tinha a dizer.

S. Exa. não reviu.

Foi approvado o additamento do Sr. Ministro do Fomento ao artigo 1.°

Foi approvado o artigo 2.°

Leu-se, para ser votado, o additamento ao artigo 2.° proposto pelo Sr. Sousa da Camara.

O Sr. Ministro do Fomento (Brito Camacho): - Devo explicar ao Sr. Sousa da Camara que a restricção que se estabelece é para difficultar a entrada de azeites de graduações differentes dos nossos.

O Sr. Sousa da Camara: - Requeiro para retirar o meu additamento.

Foi concedido.

Foram approvados successivamente os artigos restantes com as emendas propostas pelo Sr. Ministro do Fomento.

As emendas apresentadas pelos Srs. Antonio Gil e Sousa da Camara a esses artigos foram rejeitadas.

O Sr. Sousa da Camara: - Sr. Presidente: desejo explicar que, julgando que o projecto fosse discutido na especialidade, deixei, por isso, de fazer a justificação minuciosa das minhas propostas.

Digo isto, para que se não julgue que, não justificando as minhas propostas, eu procedia com menos lealdade.

O Sr. Presidente:-Vae passar-se á ordem do dia, e os Srs. Deputados que tiverem papeis a mandar para a mesa, podem enviá-los.

O Sr. Marques da Costa : - Mando para a mesa um projecto de lei, autorizando o Governo a mandar proceder á elaboração do projecto definitivo da Avenida Marginal do Tejo, desde Santa Apolonia até os Olivaes.

Foi mandado publicar no "Diario do Governo".

O Sr. Paiva Gomes: - Mando para a mesa os seguintes

Requerimentos ao Ministerio da Marinha e Colonias:

Requeiro que por este Ministerio me seja remettida uma nota detalhada da despesa feita durante os annos economicos de 1908-1909, 1909-1910 e 1910-1911 com a Estação Agricola Experimental de Lourenço Marques, Quinta do Umbeluzi, no que respeita ao pessoal proprio, incluindo os trabalhadores europeus, seu nome, nacionalidade, categoria e vencimentos ou salarios, aos trabalhadores indigenas, seu numero, salario e alimentação, á acquisição de alfaias agricolas de toda a especie, seu numero e natureza, á acquisição de sementes, plantas e animaes, com o numero e qualidade d'estes ultimos, á acquisição de arame de vedação, com a designação em metros do perimetro vedado, e a outros quaesquer artigos que tenham tido a applicação em referencia.

Sala das Sessões, 18 de agosto de 1911.= O Deputado, Antonio de Paiva Gomes.

Ao Ministerio da Marinha e Colonias:

Requeiro que por este Ministerio me seja enviada uma nota detalhada da despesa feita, durante os annos economicos de 1908-1909, 1909-1910 e 1910-1911, com a Estação Agricola Experimental de Gaza, no que respeita ao pessoal proprio, incluindo os trabalhadores europeus, seu nome, nacionalidade, categoria e vencimentos ou salarios, aos trabalhadores indigenas, seu numero, salario e alimentação, á acquisição de alfaias agricolas de toda a especie, seu numero e natureza, á acquisição de sementes, plantas e animaes, com o numero e qualidade d'estes ultimos, á acquisição de arame de vedação, com a designação em metros, do perimetro vedado, e a outros quaesquer artigos que tenham tido a applicação em referencia.

Sala das Sessões, em 18 de agosto de 1911.= O Deputado, Antonio de Paiva Gomes.

Ao Ministerio da Marinha e Colonias:

Requeiro que, por este Ministerio, me seja enviada uma nota detalhada da despesa feita, durante os annos economicos de 1908-1909, 1909-1910 e 1910-1911, com a Estação Zootechnica de Lourenço Marques, no que respeita ao pessoal proprio, incluindo os trabalhadores europeus, seu nome, nacionalidade, categoria e vencimentos ou salarios, aos trabalhadores indigenas, seu numero, salario e alimentação, á acquisição de animaes, seu numero e raça á acquisição de apparelhos, instrumentos diversos ou outros quaesquer artigos.

Sala das Sessões, em 18 de agosto de 1911. - O Deputado, Antonio de Paiva Gomes.

Ao Ministerio da Marinha e Colonias:

Requeiro que, por este Ministerio, me seja fornecida uma nota especificada da applicação das verbas de réis 18:500^000 exaradas nas tabellas da despesa ordinaria da provincia de Moçambique, para os annos economicos de 1905-1906 e 1906-1907, no capitulo 8°, sob a rubrica de "despesas eventuaes", devendo em cada uma d'essas notas ser mencionadas as razões que taes dispêndios determinaram, natureza da sua applicação, nome do individuo ou individuos, de casas commerciaes ou outras e ainda o nome dos representantes ou procuradores a quem pela referida verba foram pagas diversas quantias.

Outro tanto requeiro sobre a applicação das verbas de 25:500$000 réis exaradas nas tabellas de despesa ordinaria da provincia de Moçambique para os annos economicos de 1907-1908 e 1908-1909, artigo 125.° do capitulo viu e ainda sobre as verbas de 30:0006000 réis designadas nas tabellas de despesas da provincia de Moçambique, para os annos economicos de 1909 a 1910, artigo 120.°, capitulo viu, e 1910-1911, secção 1.ª do artigo 42.°, capitulo XI.

Sala das Sessões, em 18 de agosto de 1911. = O Deputado, Antonio de Paira Gomes.

Mandaram-se expedir.

O Sr. Pires de Campos: - Envio para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro que pelo Ministerio das Finanças me sejam fornecidos os seguintes esclarecimentos:

a) O numero, qualidade, tamanho e procedencia das garrafas importadas desde 1906.

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b) A importancia cobrada por direitos de importação, quer essa importancia seja referida ao peso, quer ao numero de garrafas.

c) Nota descriminada das remessas de garrafas entradas no país sob as rubrica de "taras devolvidas".

Rota. - Estes esclarecimentos estendem-se a todos os postos alfandegarios por onde correm esses serviços. = O Deputado, G. Pires de Campos.

Mandou-se expedir.

O Sr. Alberto Souto: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro que me seja fornecida nota dos primeiros aspirantes de finanças que, a data da publicação do decreto com força de lei de 26 de maio de 1911, que reorganizou os serviços externos do Ministerio das Finanças, tinham concurso para terceiros officiaes.

Nota da antiguidade dos primeiros aspirantes de finanças á data da publicação do mesmo decreto.

Mais:

Copia do processo pelo qual Luis Braga Barreiros foi nomeado terceiro official de finanças.

Assembleia Nacional Constituinte, em 18 de agosto de 1911. = O Deputado, Alberto Souto.

Mandou se expedir.

Requerimento

O Sr. Antonio de Carvalho: - Apresento o seguinte

Requeiro que pelo Ministerio do Fomento me seja dada nota da despesa feita com a illuminação da estação da Regua, no caminho de ferro do Douro, durante o ultimo anno economico.

Assembleia Nacional Constituinte, em 18 de agosto de 1911. - O Deputado, Antão de Carvalho.

Mandou-se expedir.

O Sr. Joaquim Ribeiro: - Apresento a seguinte:

Nota de interpellação

Desejo interpellar o Sr. Ministro do Fomento sobre a não construcção do caminho de ferro de Thomar a Miranda do Corvo ou Lousa. = Joaquim Ribeiro, Deputado pelo circulo n.º 33.

Mandou-se expedir.

ORDEM DO DIA

Continuação da discussão, na especialidade, do projecto de lei n."3 (Constituição)

O Sr. Presidente: - Convido os Srs. Deputados que ainda tenham additamentos a apresentar ao capitulo VI, a enviá-los para a mesa.

O Sr. Bernardino Roque: - Sr. Presidente: numa das sessões próximas passadas apresentei uma proposta sobre descentralização de serviços ultramarinos, divididos em duas partes; uma, tratando propriamente da descentralização, e outra que é um segundo artigo, segundo o qual o Governo fica autorizado, estando o Parlamento fechado, a poder tomar as medidas de interesse geral, urgentes, dando depois conta ao Parlamento, quando elle reabrir.

É um artigo que existe na constituição de 1838 e até no acto addicional.

Vou mandar para a mesa um additamento para ser inserida esta disposição, e é o seguinte:

Proposta de additamento

"Artigo ... Quando estiver encerrado o Congresso poderá o Governo tomar as medidas que julgar necessarias e urgentes para as colonias.

§ 1.° Aberto o Congresso, o Governo prestará contas das medidas tomadas.

Lisboa, em 18 de agosto de 1911. = O Deputado, A. Bernardino Roque.

Foi opprovado.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Adriano Augusto Pimenta: - a mesa o seguinte:

Proponho o seguinte artigo novo

Mando para

"Artigo ... Annualmente o Congresso destinará algumas das suas sessões para tratar exclusivamente dos interesses locaes e reclamações feitas ao poder legislativo pelos corpos administrativos, na parte em que o Estado deve intervir." = Adriano Pimenta, Deputado pelo Porto.

Foi admittida.

O Sr. João de Menezes: - Por parte da commissão declaro que me conformo com a proposta que acaba de apresentar o Sr. Adriano Pimenta.

O Sr. Presidente: - Vae votar-se a proposta apresentada pelo Sr. Adriano Pimenta.

Foi approvada.

O Sr. Gastão Rodrigues: - E para mim profundamente desagradavel ver os soldados, que voltam dos seus serviços no ultramar, estender a mão á caridade publica.

Para que estes factos que repugnam acabem de uma vez, eu mando para a mesa a seguinte

Proposta

Os militares que, ao serviço da Republica, percam a vida ou fiquem com a saude alterada de um modo permanente, terão para suas familias ou para si, direitos a soccorros pagos pelo Estado, que serão fixados por lei especial.

Sala das Sessões, em 18 de agosto de 1911.= O Deputado, Gastão Rodrigues

Foi admittida.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Martins Cardoso: - Lembro a V. Exa. Sr., Presidente, que o capitulo VI do projecto ficou hontem completamente discutido e votado ; e que, portanto, hoje não podiam admittir-se mais additamentos a esse capitulo.

O Sr. Presidente: Declaro a V. Exa. aque tenho recebido additamentos ao capitulo vi, porque o Sr. Braamcamp Freire, que presidia á sessão quando se entrou na ordem do dia, declarou que os acceitava.

O Sr. Peres Rodrigues: - Mando para a mesa o seguinte requerimento:

Requeiro que, sem prejuizo dos oradores inscritos, se

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24 DIARIO DA ASSEMBLEIA NACIONAL CONSTITUINTE

votem as propostas que estão sobre a mesa e se passe á discussão do capitulo VII. O Deputado, Peres Rodrigues.

Foi approvado.

O Sr. Antonio Macieira: - Sr. Presidente: peço a attenção da Assembleia por muito pouco tempo.

Como tenho o meu nome ligado a um projecto que deve estar na respectiva commissão e hontem vi, ao acabarem os trabalhos d'esta Assembleia, que ella tinha reconsiderado sobre algumas das disposições da Constituição, é meu dever insistir por esse projecto, que ficaria prejudicado se a Camara, contra a lógica do seu procedimento de hontem, não attendesse as considerações que vou fazer.

Estabelecia-se no projecto primitivo o seguinte:

"Artigo novo. Os diplomas concedidos por feitos civicos e actos militares poderão ser acompanhados de medalhas - Antonio Macieira".

Quer dizer, a Assembleia hontem, a respeito de medalhas militares, reconsiderou, e muito bem, sobre o que já tinha resolvido, o que não admira, porque adoptou uma optima medida e nunca fica mal reconsiderar. A Assembleia é soberana, está no seu direito de votar hoje uma lei e amanhã revogá-la, se julgar conveniente. Se assim é, se se attendeu a circunstancias especiaes que levaram a Assembleia a manter as medalhas e pensões da Torre e Espada, por que razão ha de ficar prejudicado um projecto que ha tempo mandei para a mesa pelo qual se estabelecem medalhas commemorativas da revolução de 5 de outubro, por que razão se ha de fazer uma excepção para aquelles que teem condecorações da Torre e Espada e medalhas especiaes, e homens do povo, os pequeninos que praticaram feitos de coragem em auxilio da proclamação da Republica, hão de ficar excluidos d'esta medida inteiramente justa?

Creio, portanto, que, mandando para a mesa a minha proposta, não faço mais do que ser lógico com as considerações com que apresentei á Camara o projecto de lei que enviei para a mesa, como coherente sou com as deliberações tomadas pela Assembleia ao terminar a sessão de hontem.

Mando para a mesa a seguinte proposta de

"Artigo novo.- Os diplomas concedidos por feitos civicos e actos militares poderão ser acompanhados de medalhas ". = Antonio Macieira.

Sr. Presidente : visto que no artigo 5.° fica estabelecido que podem ser concedidos diplomas por feitos civicos e militares, accrescento que esses diplomas podem ser acompanhados de medalhas.

A Camara acccitou com applauso o meu projecto, não queria prejudicá-lo agora.

E estando a Assembleia inclinada a instituir a medalha que propus, não poderá todavia o meu projecto ser submettido á discussão, visto que o seu texto seria contrario á Constituição.

A outra proposta é a que diz respeito á autorização parlamentar, aquella autorização do poder legislativo concedida ao poder executivo.

Todos nós sabemos que a monarchia usava e abusava do direito de autorização concedida pelo poder legislativo ao poder executivo.

Já vi hoje, numa passagem de um seu discurso, o Sr. Ministro do Fomento referir-se a autorizações do poder legislativo ao poder executivo.

Até noutra passagem, o Sr. Lopes da Silva, falando sobre o projecto chamado dos azeites, pretendia que no artigo 1.° se pudesse apenas permittir a entrada a uma parte de azeite, ficando a outra, a restante parte, dependente da autorização que lhe fosse concedida pelo poder legislativo.

O Sr. Camacho disse, e disse muito bem, que preferia vir desde logo á Camara pedir a autorização completa.

O que é indispensavel é que o poder executivo não faça como no tempo da monarchia, em que se usava e abusava d'essa autorização para fazer leis novas.

Para evitar isso, é que eu entendo indispensavel o seguinte que aqui está nesta proposta que mando para a mesa.

"Artigo novo.- As autorizações concedidas pelo poder legislativo ao poder executivo não poderão ser aproveitadas mais de uma vez".= O Deputado, Antonio Macieira.

As propostas foram admittidas.

O Sr. Pereira Bastos: - Sr. Presidente: pedi a palavra para fazer algumas considerações a respeito da proposta apresentada pelo Sr. Gastão Rodrigues.

Quer-me parecer que a proposta não contem materia constitucional, alem de que é lei antiga dar pensões ás familias dos militares ou a elles proprios, quando se inutilizem.

Interrupção do Sr. Gastão Rodrigues, que não se comprehendeu.

O Orador: - Já é materia corrente a chamada pensão de sangue.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Machado de Serpa: - Desisto da palavra.

O Sr. Moraes Rosa: - Sr. Presidente: parece-me que foi mal interpretada a proposta do Sr. Gastão Rodrigues, S. Exa. propõe que se consigne na Constituição o principio que regulará a concessão de pensões ás familias dos militares, quando elles falleçam por motivo de serviço prestado á Patria; e a elles proprios quando se inutilizem no mesmo serviço, e não tenham o tempo exigido pela lei das reformas.

Nós devemos - disse S. Exa. criar uma situação que possa garantir ao operario os meios de subsistencia nos casos de accidentes do trabalho. Não ha nada que indique se não deva applicar lei analoga aos militares. O principio é o mesmo, porque o exercito deixou de ser o que era até aqui, para ser o que é nos países avançados: um elemento de progresso. O soldado é hoje um operario, tendo ainda em favor de um tal direito a circunstancia de só trabalhar para o beneficio da collectividade.

O Sr. Pereira Bastos: - Quer-me parecer em todo o caso que o que se possa estabelecer com relação ás familias dos militares, não é, repito, materia constitucional.

Tambem se deviam introduzir então na Constituição outras cousas como, por exemplo a assistencia.

O Sr. Moraes Rosa: - Na Assembleia abundam os jurisconsultos ; elles poderão discutir o assunto sob esse aspecto.

O que é uma vergonha, que precisa acabar, é que soldados que serviram no ultramar ou que se inutilizaram em qualquer serviço militar andem mendigando, por se encontrarem physicamente impossbilitados para trabalho.

Parece-me absolutamente humanitaria e patriotica a proposta do Sr. Gastão Rodrigues, á qual dou o meu mais caloroso apoio.

O Sr. Abilio Barreto: - Nos regulamentos militares estabelecem-se pensões não só para as familias dos que morrem em campanha, mas dos que se inutilizam no serviço.

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SESSÃO N.° 54 DE 18 DE AGOSTO DE 1911 25

O Sr. Gastão Rodrigues: - Contra a affirmação de que a doutrina da sua proposta não é constitucional, affirma que ella está inserida na Constituição da Suissa.

Se o que propõe já está estabelecido no nosso país, não se permitia então o espectaculo triste dos nossos soldados, ao voltar das colonias, andem descalços pelas das estendendo a mão á caridade publica.

O discurso será publicado na integra quando S. Exa. restituir as notas tachygraphicas.

O Sr. Presidente: - Como não está mais ninguem inscrito, vae passar-se á votação.

Foram approvadas a proposta do Sr. Gastão Rodrigues e as duas 2iropostas do Sr. Antonio Macieira.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se, para entrar em discussão, a epigraphe do capitulo VII.

Leu-se.

Como nenhum Sr. Deputado pedisse a palavra, foi approvada.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se, para entrar em discussão, o artigo 71.º

Leu-se.

O Sr. Barbosa de Magalhães: -Entende que o prazo para a primeira revisão da Constituição deve ser menor do que o que se estabelece no artigo em discussão. Manda, por isso, para a mesa a seguinte

Substituição

Proponho que o artigo 71.° e seus paragraphos sejam substituidos pelo seguinte artigo:

"Esta Constituição será revista no quinto anno posterior á sua promulgação e para esse e liei to terá poderes constituintes o Congresso cujo mandato abranger a época da revisão".

Lisboa, 18 de agosto de 1911. = Barbosa de Magalhães.

Foi admittida.

O discurso será publicado na integra quando S. Exa. restituir as notas tachygraphicas.

O Sr. Marianno Martins: - Pedi a palavra para mandar para a mesa o parecer da commissão de finanças sobre o desdobramento do Ministerio da Marinha.

O Sr. Jacinto Nunes: - Pedi a palavra para mandar para a mesa uma emenda ao artigo 71.º e ao seu paragrapho 1.º

Nós devemos estar convencidos de que a revisão d'esta Constituição se impõe dentro de muito pouco tempo.

Os Srs. Deputados verão d'aqui a breve trecho que, pelo menos, varios direitos não ficam bem garantidos, como, por exemplo, o direito da propriedade.

Essa revisão impõe-se tanto mais, quanto é certo não representarmos nós aqui um concilio ecuménico, nem são dogmas os preceitos que approvamos.

O que se tem feito deve precisar de uma grandissima emenda, dentro de pouco tempo.

A minha proposta transcreve fielmente a este respeito o que se encontra na Constituição Suissa, isto é, pura e simplesmente a copia do que está preceituado em uma das leis de um dos cantões da Suissa - o do Appenzell.

A precipitação com que esta Constituição tem sido discutida, impõe á Camara a obrigação de rever a Constituição. Somente na Grecia o na Roumania é que não se adopta esto principio. Entendo, pois, que a revisão da Constituição se deve fazer em qualquer tempo, quando se julgue necessario.

Neste sentido, eu mando para a mesa a minha

Proposta

Emenda ao artigo 71.° e § 1.°:

"A Constituição da Republica Portuguesa poderá ser revista em todo o tempo e para isso bastará que dois terços das duas Camaras o resolvam, ou dois terços dos municipios o reclamem". = O Deputado, J. Jacinto Nunes.

Foi admittida.

S. Exa. não reviu.

O Sr. João de Menezes: - Pedi a palavra, Sr. Presidente, para declarar a V. Exa. e á camara que não concordo com as propostas que teem sido apresentadas para a substituição do artigo 71.° e seus paragraphos.

Como V. Exas. sabem, um dos principios fundamentaes do programma do partido republicano é a revisão decennal da Constituição.

Poderá ser feita esta revisão d'aqui a cinco annos, se assim se julgar necessario; mas nunca antes, porque um periodo inferior a este não é bastante para fazer a experiencia de uma nova Constituição numa Republica recentemente implantada.

As reformas importantes, como as que se mencionam na Constituição, teem de fazer-se muito lentamente.

Uma revisão, nas condições em que o Sr. Jacinto Nunes propôs, sem tempo definido, pode trazer perturbações de ordem grave.

Não acho conveniente que um caso d'estes esteja á merco de uma maioria parlamentar.

Nós temos uma Republica que se proclamou ainda não ha um anno e, por consequencia, é natural que a Constituição que se vota agora tenha necessidade de uma revisão; mas para que essa revisão se faça é preciso que decorra o tempo necessario para se conhecerem quaes as suas vantagens e os seus defeitos.

O Sr. Jacinto Nunes:-Essa revisão tem de se fazer porque na Constituição não fica garantido, por exemplo, o direito de propriedade.

O Orador: - Mas o direito de propriedade está assegurado no Codigo Civil e no Codigo Penal.

O Sr. Jacinto Nunes: - Mas o Codigo Civil pode ser reformado.

O Orador: - Certamente. V. Exa. sabe perfeitamente que de ha muito se reconhece a necessidade de reformar o Codigo Civil, e exactamente um dos capitulos que carece de uma reforma profunda, - é aquelle que se refere á propriedade.

O Sr. Jacinto Nunes: - Podem queimar ou rasgar á vontade o Codigo Civil...

O Orador: - Não se trata de rasgar nem de queimar o Codigo Civil.

Em todos os países se trata de garantir o direito de propriedade.

Aparte do Sr. Jacinto Nunes que não foi comprehendido.

O Orador: - Pois transporte V. Exa. as suas propriedades para Inglaterra e verá o que lhe acontece.

Nós estabelecemos aqui um principio que considero muito conveniente.

O facto de dar-se a iniciativa da revisão constitucional a dois terços das camaras minicipaes, é muito importante.

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A Constituição dispõe que ella poderá ser revista de dez em dez annos; mas fica a faculdade de ser essa revisão antecipada de cinco annos, dadas certas e determinadas circunstancias; quer dizer, d'aqui a cinco annos nós podemos reformar toda a Constituição.

Diz-se que a discussão tem sido precipitada.

Não me parece. (Apoiados).

Desde 9 de julho que nós estamos aqui a discutir a Constituição, e, se adoptássemos a doutrina de S. Exa., affirmo lhe que não haveria meio de votar-se a lei organica do país.

Ha aqui um paragrapho que deve ser mantido.

É o que se refere á revisão antecipada de cinco annos.

D'aqui até lá nós temos o tempo preciso para ver o que carece de reforma ou de emenda.

Estabelecemos este principio geral e é o que fazemos. De cinco annos, ou mais, pode ser.

Do que precisamos é de um prazo, que não pode ser de menos de cinco annos de tolerancia para experiencia da Constituição, experiencia que é muito conveniente e necessaria para evitar futuras surpresas politicas e parlamentares.

Nestas condições, a commissão, que tem acceitado dezenas de emendas e não veio para aqui senão para apreciar quaesquer propostas que os Srs. Deputados apresentem, d'esta vez não pode acceitar mais propostas, porque esgotou a admissão d'ellas sobre este assunto e só teve em vista defender os interesses da Republica e do país, estabelecendo estas bases na Constituição, para prevenir todas as tentativas dos partidos.

Tenho dito.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Carvalho Araujo: - V. Exa. já hontem fez a primeira revisão.

O Sr. João de Menezes: - Eu não fiz revisão nenhuma á Constituição. Quem a faz é a Camara. Ella acceita ou rejeita o que eu proponho, e nada mais.

O Sr. Adriano Pimenta: - Sr. Presidente: estou perfeitamente de acordo com o Sr. João de Menezes, em que a Constituição não pode andar constantemente a ser modificada.

Entendo mesmo que é preciso que as leis que se estabelecem sejam primeiramente experimentadas, para que depois tenham força bastante para produzir os seus effeitos; mas entendo tambem que, neste momento, nós precisamos de pensar na revisão da Constituição, não porque a discussão fosse tumultuaria ou houvesse pouco cuidado ou pouco estudo, - mas precisamente porque a Constituição da Republica Portuguesa, estabelecendo um regime que não e parlamentar nem é presidencialista, estabelecendo normas, por assim dizer, novas, não se comprehende nem se deve desejar que se esperem dez annos para que o país seja conhecedor dos defeitos de uma Constituição que não pode ser bem julgada neste momento.

Entendo, portanto, que a primeira revisão constitucional se deve fazer d'aqui a cinco annos, sendo depois feita periodicamente de dez em dez annos, a não ser que qualquer caso muito especial determine a antecipação de cinco annos, e nunca menos.

Relativamente ao § 1.°, que se refere á forma como se pode estabelecer uma revisão accidental da Constituição, creio que bastaria a primeira parte do paragrapho, porquanto a revisão poderia ser antecipada com o prazo de cinco em cinco annos.

Entendo que esta segunda parte do § 1.° ficasse separada no projecto da Constituição Portuguesa.

Se porventura se tivesse estabelecido que a formação do Senado se faria como estava mais ou menos resolvido, então não; mas desde o momento que haja representação dos districtos, as camaras muncipaes não devem intervir de qualquer forma para a revisão da Constituição.

Porque, Sr. Presidente, desde o momento em que o Senado é o representante dos districtos, elle conhece perfeitamente a opinião d'essas corporações administrativas e conhece perfeitamente tambem a opinião dos concelhos. Portanto, creio que as camaras, como corpos administrativos, não devem intervir na reclamação da revisão constitucional.

O orador é interrompido por varios Srs. Deputados.

Vozes: - Ordem, ordem.

O Orador: - Essa reclamação deve partir de um terço do Congresso ou de dois terços de cada uma das Camaras separadamente; ou então estabeleça-se uma lei em que se consigne que, em virtude de uma das Camaras pedir a revisão, as duas casas do Parlamento se reunam em Congresso.

Demais a mais, creio que esta Assembleia já resolveu que, no caso de desacordo entre o Senado e a Camara dos Deputados a respeito de qualquer lei, ellas se pudessem reunir para juntas resolver.

Parece-me que o mesmo se pode fazer neste assunto; uma das Camaras tem a iniciativa da revisão, juntam-se as duas, e, em uma sessão conjunta, resolvem.

O que não me parece é que, desde o momento em que o Senado seja o representante dos varios districtos, haja necessidade de que as corporações administrativas intervanhampara pedir a revisão constitucional.

E, agora, vou fazer as minhas considerações relativamente ao capitulo VII.

Entendo, Sr. Presidente, que a revisão deve ser realizada no fim de cinco annos, contados do dia da promulgação d'esta Constituição, mas entendo que ao mesmo tempo se devem salvaguardar na Constituição algumas disposições, em que de maneira alguma se possa tocar.

V. Exa. e a Camara sabem que nós mantemos actualmente ainda uma luta intensa contra a reacção, que a reacção nos espreita por todas as maneiras e de todos os lados, de forma que possa atacar a Republica nos seus fundamentos.

Sr. Presidente: ha disposições dentro da Constituição que estão de tal maneira integradas na Republica que, podemos dizer, - sem ellas não ha Republica em Portugal.

Essas disposições são aquellas que se referem ao exercicio do ensino laico, á separação da Igreja do Estado e ás congregações religiosas. (Apoiados).

E eu desejaria que ficasse consignado na Constituição que, quando se realizasse a primeira revisão, no fim de cinco annos, nenhuma d'essas disposições pudesse ser alterada.

Sr. Presidente: vou submetter á apreciação da Camara a minha proposta, que é concebida nos seguintes termos:

Proposta

Proponho a seguinte substituição ao artigo 71.°:

"Art. 71.° Far-se-ha periodicamente a revisão da Constituição da Republica Portuguesa, sendo a primeira no fim de cinco annos, a contar da promulgação d'esta e as outras revisões de dez em dez annos.

Para esse effeito terá poderes constituintes o Congresso, cujo mandato abrange a época das revisões.

§ 1.° Na primeira revisão não pode o Congresso attender as disposições que se referem á laicização do ensino, separação do Estado das igrejas e á materia do n.° 13 do projecto.

§ 2.° Depois da primeira, a revisão poderá ser anteci-

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pada por dois terços dos membros do Congresso, em duas discussões.

§ 3.° A doutrina do § 2.°". = Adriano Pimenta.

Proponho a eliminação das palavras "reclamado por dois terços" A do § 1.°= Adriano Pimenta.

Nesta minha proposta não vae referencia alguma ás municipalidades, mas eu proponho, simplesmente, a eliminação da segunda parte do § 2.º, que a ellas se refere.

S. Exa. não reviu.

As propostas foram admittidas.

O Sr. Silva Ramos: - Pedi a palavra para mandar para a mesa uma emenda com relação ao prazo em que se deve fazer a revisão.

Entendo que em Jogar de dez em dez annos, seja de oito em oito annos o prazo para a revisão.

Desde que marcamos para o Presidente o mandato de quatro annos, devemos fazer a revisão quando o outro Presidente esteja a terminar o seu prazo.

Supponhamos que d'aqui a dez annos se entende que não deve haver Presidente: ou não havia a effectividade marcada agora, ou se cortavam ao Presidente dois annos do seu mandato.

Mando para a mesa a minha

Emenda

Art. 71.°:

Proponho que onde se diz "de dez em dez annos", se diga "de oito em oito annos".

§ 1.°:

Onde se diz "de cinco annos" se diga a de quatro annos ".= O Deputado, José da Silva Ramos.

Foi admittida.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Sidonio Paes: - Entende que, em casos extraordinarios e desde que o Congresso o approve por uma maioria do dois terços, deve fazer-se a revisão da Constituição. Não deve haver inconveniente nisso, quando haja necessidade da revisão, para evitar, por exemplo, um golpe de Estado ou um movimento popular. Propõe o seguinte:

"Artigo 71.° A revisão poderá ser antecipada se for approvada por dois terços, Camara dos Deputados e do Senado separadamente, e reclamado por um terço dos membros da Camara dos Deputados".= Sidonio Paes.

Foi admittida.

O discurso será publicado na integra quando S. Exa. restituir as notas tachygraphicas.

O Sr. Machado de Serpa: - Tem duvidas sobre a forma como devem contar-se os dois terços dos membros do Congresso.

Não sabe a razão por que se fixa a idade e o numero dos Senadores que primeiro serão eleitos, e até para os que hão de sê-lo de futuro, e não se fixa o numero dos Deputados.

Desde que se considera materia constitucionam fixação do numero dos Senadores, e até a sua idade, tambem se deve fixar o numero dos Deputados.

O discurso será publicado na integra quando S. Exa. restituir as notas tachygraphicas.

O Sr. Sidonio Paes: - Peco a V. Exa., Sr. Presidente, que consulte a Camara sobre se consente que eu possa alterar a minha proposta de maneira a esclarecer o sentido d'ella.

Foi autorizado.

O Sr. Matos Cid: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro que se considere a materia discutida, com prejuizo dos oradores inscritos.

Lisboa, em 18 de agosto de 1911. = O Deputado, José do Valle de Matos Cid.

O Sr. Affonso Costa: - Peço para se dividir o requerimento em duas partes.

Não quero associar-me a semelhante violencia. Não ha Parlamento nenhum onde ella se faça.

Voto a primeira parte, a segunda não.

Foi concedido, sendo approvado o requerimento nas suas duas partes.

O Sr. Carlos Maia. - Mando para a mesa a seguinte

Proposta

A Constituição da Republica Portuguesa será obrigatoriamente revista em periodos determinados.

A primeira revisão far-se-ha ao fim de cinco annos, a contar da promulgação d'esta, podendo esse prazo ser abreviado em virtude de resolução de dois terços da Camara dos Deputados.

Esta revisão far-se-ha pelo Congresso cujo mandato abrangerá a época de revisão.

§ 1.º O futuro Congresso a que competir a primeira revisão fixará os periodos da revisão e as condições em que ella pode ser antecipada. = Carlos Maia Pinto.

O Sr. Carneiro Franco: - Envio para a mesa a seguinte

Proposta

Proponho que no § 1.° do artigo 71.° a seguir á palavra "congresso" se juntem as palavras "em sessão conjunta das duas camaras".= O Deputado, Carneiro Franco.

Approvou-se o artigo 71.° e seus paragraphos, com as emendas propostas pelos Srs. Adriano Augusto Pimenta e Carneiro Franco.

Todas as outras propostas foram rejeitadas.

O Sr. Presidente: - Como a hora está adeantada vou conceder a palavra aos Deputados que a pediram para antes de se encerrar a sessão.

O Sr. Nunes da Mata: - Sr. Presidente: na sessão de 5 de julho, foi apresentada nesta Assembleia uma proposta, concedendo a amnistia aos implicados no caso do Arsenal de Marinha.

Essa proposta foi enviada á commissão de petições, mas como a esta não lhe competisse dar parecer sobre ella, devolveu-a á mesa, para ser remettida á de legislação. Como essa commissão, porem, ainda não está eleita, ha quatro dias foi novamente enviada á commissão de petições.

Ora esta commissão, repito, não tem competencia para dar parecer sobre essa proposta, e por isso, entregou-a á Assembleia para que ella, como soberana, resolva como entender melhor.

Como Deputado, e não como membro da commissão de petições, peço licença para dizer o que me parece justo com relação a este assunto.

Sob o ponto de vista dos interesses da Republica e da Nação, parece me conveniente que este assunto seja discutido e que a Assembleia diga : sobre elle, sim, ou não.

A Patria tem na sua historia já duas datas festivas, a de 5 de outubro e a de 19 de junho, e brevemente a Republica contará mais outra - aquella em que for approvada a Constituição.

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28 DIARIO DA ASSEMBLEIA NACIONAL CONSTITUINTE

Ora, attendendo a que a Assembleia representa a Nação, e que ella tem sido sempre generosa e magnanima, talvez que, interpretando esses sentimentos, queira commemorar esse acontecimento, approvando essa proposta, que concede a amnistia aos implicados no caso do Arsenal da Marinha.

Mando para a mesa a proposta que á commissão de petições foi enviada, e a Assembleia que resolva como melhor entender.

Vozes: - Muito bem.

S. Exa. não reviu.

Foi approvada a ultima redacção do projecto de lei n.° 24 de 17 de agosto do corrente atino (pensão mensal aos ministros da religião catholica).

O Sr. Barbosa de Magalhães: - Mando para a mesa duas representações: uma d'ellas refere-se á carestia dos generos alimenticios e é elaborada pela Liga da Defesa do Inquilinato.

Esta representação trata da defesa do povo no que respeita aos preços exhorbitantes que lhe estão pedindo pelos generos de primeira necessidade.

Chamo a attenção da Camara e do Governo para este assunto, que é importantissimo.

Trata-se da economia do povo, e da maneira de elle prover ás suas mais instantes necessidades.

Chamo tambem a attenção do Sr. Ministro das Finanças para um ponto da representação a que alludo, visto que foi S. Exa. que aboliu uma parte do imposto do consumo e uma parte tambem da renda de casas.

Insinua-se na representação a conveniencia de fazer com que a suppressão do imposto de consumo para certos generos reverta a favor do povo e a favor do contribuinte, - e não vá favorecer os açambarcadores.

Parece-me, pois. que este documento é digno de toda a attenção por parte dos poderes publicos.

Peço a V. Exa. que mande publicar esta representação no Diario do Governo.

A segunda representação é dos empregados da extincta casa real.

Estes empregados expõem aqui a sua situação, que eu considero lamentavel e afflictiva. Elles dizem ter sido divididos pelo Governo em tres categorias: a dos que continuam ao serviço da Republica, empregados na conservação dos palacios; a dos que recebem do Estado determinado apoio, e ainda a de outros que foram arredados e que se encontram hoje sem ter com que comer, alguns já velhos e cheios de familia.

Desejara que o Governo olhe para a sua situação e que trate a todos com equidade.

Se serviram a familia real deposta foi porque precisavam ter um modo de vida; e foram simplesmente empregados da Nação, do Estado, que os deve tratar como merecem, e sobretudo os não devo deixar morrer á fome.

Portanto, parece-me que esta representação é digna de ser attendida com toda a justiça.

Peço tambem a sua publicação no Diario do ffoverno.

Foram autorizadas as publicações.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Presidente: - A próxima sessão realizar-se ha hoje á noite, ás 9 horas, sendo a ordem da noite a discussão do projecto da Constituição.

Está encerrada a sessão.

Eram 6 horas e 30 minutos da farde.

Documentos mandados para a mesa nesta sessão

Representações

Da Associação Commercial de Lojistas de Lisboa pedindo que se ordenem as mais rigorosas providencias tendentes a prohibirem o jogo de azar.

Para a commissão de legislação.

Da Liga das Artes Graphicas do Porto pedindo que se confeccionem á Liga das Artes Graphicas d'essa cidade os impressos dos correios, telegraphos e faroes relativos á zona do norte.

Para a commissão de petições.

Errata

Publicam-se hoje na integra os officios do Sr. Deputado Sebastião Dantas Baracho, de que só se fez menção nos Summarios de 15 e 16 do corrente.

Lisboa, 15 de agosto de 1911. - Serviço da Republica.- Exmo. Sr. Presidente da Assembleia Nacional Constituinte. - Ao abrigo do que dispõe o n.° 3 do artigo 106.° da lei eleitoral vigorante, tenho a honra de apresentar a V. Exa. a desistencia do meu cargo de Deputado. - Saude e Fraternidade. = Sebastião de Sousa Dantas Baracho.

Belem, 16 de agosto de 1911. - Serviço da Republica. - Exmo. Sr. Presidente da Assembleia Nacional Constituinte.- Em virtude do n.° 3.° do artigo 106.° da lei eleitoral, a desistencia de qualquer Deputado, do exercicio do seu cargo, depende apenas da iniciativa e vontade do desistente. V. Exa., submettendo o assunto á Assembleia, nos expressivos termos em que o fez, e a Assembleia, correspondendo, por modo não menos significativo, ao acto praticado por V. Exa., penhoraram-me essencialmente. Cumpre-me, portanto, aqui exarar o meu profundo reconhecimento á Assembleia, e bem assim a V. Exa., o que não obsta a que persista na minha renuncia, e as razões são obvias.

Desde outubro de 1901, que perseverantemente trabalho- seja-me permittido recordá-lo mais uma vez - para a implantação dos genuinos preceitos democraticos, na vida politica da Nação. Na constancia da deposta monarchia, assim me conduzi, na minha qualidade de autónomo politico, que ainda hoje conservo. Na vigencia da Republica, quer como funccionario, quer como homem publico, a minha orientação foi precisamente identica. Os documentos officiaes, concernentes ao largo periodo invocado, confirmam-o sem contestação. Os annaes parlamentares de então, e de agora, são igualmente comprovativos d'este meu asserto.

Conjugadas estas circunstancias com as tradições afixadas do partido republicano, era-me licito idealizar uma Constituição, inequivocamente democratica. Em logar d'ella, o apuramento do trabalho constitucional, já produzido, exhibe um codigo cuja feição aristocratica é indiscutivel e, demais, com transparente tendencia de resvaladura para ruinosa e exautorante oligarchia. As orações por mim proferidas, com as concomitantes emendas formuladas, i no decurso do debate referente á Constituição, demonstram á evidencia essa minha affirmativa.

Nestes termos, tencionava tornar effectiva a minha desistencia, após a renovação da proposta de eliminação do § unico do artigo 72.° - d'aquelle decantado paragrapho, attentatorio da salutar incompatibilidade, em virtude da qual os Ministros não podem ser candidatos á eleição para Presidente da Republica.

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Como, porem, ante-hontem a Assembleia approvou a moção do Dr. João de Menezes, que consente, por injustificavel excepção, aos actuaes Ministros, a candidatura presidencial, ficou-me vedado o renovamento da eliminação alludida, visto o § 3.° do artigo 51.° do regimento não admittir proposta alguma acêrca de assunto já discutido e votado.

Em taes condições, antecipei a minha renuncia ao mandato de Deputado, a qual, insisto, mantenho definitiva, por este officio, cuja publicação peço a V. Exa., tanto no Summario, como no Diario, da Assembleia Nacional Constituinte.

Saude e Fraternidade. = Sebastião de Sousa Dantas Baracho.

O REDACTOR = Affonso Lopes Vieira.

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