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REPÚBLICA PORTUGUESA

DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS

SESSÃO N.º 53

EM 16 DE MARÇO DE 1916

Presidência do Exmo. Sr. Manuel Joaquim Rodrigues Monteiro

Secretários os Exmos. Srs.

Baltasar de Almeida Teixeira
Alfredo Soares

Resumo. - Responderam à chamada 77 Srs. Deputados, que aprovam a acta sem discussão. Procede-se à leitura do expediente.

Antes da ordem do dia.- O Sr. Barbosa de Magalhães agradece o voto de sentimento que a Câmara aprovou pelo falecimento de sua mãe. O Sr. Amadeu Monjardino envia para a Mesa dois projectos de lei. O Sr. Pereira Bastos apresenta um projecto de lei sôbre a instrução militar preparatória. É interrompida a sessão por meia hora. Reaberta às 16 horas e 35 minutos, dá entrada na sala o novo Govêrno. O Sr. Presidente do Ministério (António José de Almeida) lê a declaração ministerial. Grandes e entusiásticas aclamações da sala e das galerias. O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Augusto Soares) lê uma mensagem enviada ao Govêrno Português pelo Govêrno Britânico. Sôbre a constituição do novo Govêrno, usam da palavra os Srs. Alexandre Braga, Simas Machado, Brito Camacho e Costa Júnior. O Sr. Alexandre Braga volta a usar da palavra para propor uma saudação ao Brasil, á qual se associam os Srs. Simas Machado, Brito Camacho, Costa Júnior e Presidente do Ministério. O Sr. Presidente considera a proposta aprovada por aclamação. O Sr. Presidente do Ministério agradece as palavras proferidas pelos oradores que se ocuparam da constituição do Ministério. O Sr. Ministro do Fomento (António Maria da Silva) apresenta uma proposta de lei criando o Ministério do Trabalho e Previdência Social. Pede urgência e dispensa do Regimento, que a Câmara concede, aprovando-se a proposta depois de usarem da palavra os Srs. Júlio Martins, Costa Júnior e José Barbosa. O Sr. Presidente encerra a sessão, marcando a seguinte para o dia imediato.

Abertura da sessão: - Às 15 horas e 10 minutos.

Presentes à chamada: - 75 Srs. Deputados.

São os seguintes:

Alberto de Moura Pinto.
Albino Pimenta de Aguiar.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Alfredo Maria Ladeira.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
Alfredo Soares.
Amadeu Monjardino.
Amândio Oscar da Cruz e Sousa.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Alberto Charula Pessanha.
António Albino Carvalho Mourão.
António Aresta Branco.
António Augusto Fernandes Rêgo.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Barroso Pereira Vitorino.
António Cândido Pires de Vasconcelos.
António Correia Portocarrero Teixeira de Vasconcelos.
António Dias.
António Firmo de Azevedo Antas.
António Marques das Neves Mantas.
António Medeiros Franco.
António Miguel de Sousa Fernandes.
António de Paiva Gomes.
Armando Marques Guedes.
Artur Duarte de Almeida Leitão.
Augusto José Vieira.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Casimiro Rodrigues de Sá.

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Custódio Martins de Paiva.
Domingos da Cruz.
Domingos Frias de Sampaio e Melo.
Domingos Leite Pereira.
Eduardo Alfredo de Sousa.
Eduardo Augusto de Almeida.
Ernesto Júlio Navarro.
Francisco Cruz.
Francisco José Pereira.
Francisco do Livramento Gonçalves Brandão.
Francisco de Sales Ramos da Costa.
Francisco de Sousa Dias.
Francisco Xavier Pires Trancoso.
Gaudêncio Pires de Campos.
Guilherme Nunes Godinho.
Helder Armando dos Santos Ribeiro.
Henrique Vieira de Vasconcelos.
Hermano José de Medeiros.
Jaime Zuzarte Cortesão.
João Baptista da Silva.
João Barreira.
João Cabral de Castro.
João Canavarro Crispiniano da Fonseca.
João Elísio Ferreira Sucena.
João José da Conceição Camoesas.
João José Luís Damas.
João Lopes Soares.
João Pedro de Sousa.
João Teixeira Queiroz Vaz Guedes.
Joaquim José de Oliveira.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
José António da Costa Júnior.
José Augusto Pereira.
José de Barros Mendes de Abreu.
José Botelho de Carvalho Araújo.
José Mendes Nunes Loureiro.
Luís de Brito Guimarães.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel Joaquim Rodrigues Monteiro.
Manuel Martins Cardoso.
Mariano Martins.
Pedro Alfredo de Morais Rosa.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Raimundo Enes Meira.
Sérgio da Cunha Tarouca.
Tomás de Sousa Rosa.
Vasco Guedes de Vasconcelos.
Vitorino Henriques Godinho.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.

Entraram durante a sessão os Srs.:

Abílio Correia da Silva Marçal.
Abraão Maurício de Carvalho.
Adelino de Oliveira Pinto Furtado.
Afonso Augusto da Costa.
Albino Vieira da Rocha.
Alexandre Braga.
Álvaro Poppe.
António Caetano Macieira Júnior.
António da Costa Godinho do Amaral.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António José de Almeida.
António Maria da Silva.
António Vicente Marçal Martins Portugal.
Armando da Gama Ochoa.
Artur Augusto da Costa.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Augusto Luís Vieira Soares.
Augusto Pereira Nobre.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Constâncio de Oliveira.
Eduardo Alberto Lima Basto.
Ernesto Jardim de Vilhena.
Francisco Alberto da Costa Cabral.
Gastão Correia Mendes.
Gastão Rafael Rodrigues.
Germano Lopes Martins.
Jaime Daniel Leote do Rêgo.
João de Barros.
João Carlos de Melo Barreto.
João Catanho de Meneses.
João de Deus Ramos.
João Gonçalves.
João Luís Ricardo.
João Pereira Bastos.
Joaquim António de Melo Castro Ribeiro.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José António Simões Raposo Júnior.
José Augusto Simas Machado.
José Barbosa.
José Bessa de Carvalho.
José Maria Vilhena Barbosa de Magalhães.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
Júlio do Patrocínio Martins.
Levy Marques da Costa.
Luís Augusto Pinto de Mesquita Carvalho.
Luís Carlos Guedes Derouet.
Manuel da Costa Dias.
Rodrigo José Rodrigues.
Urbano Rodrigues.
Vítor Hugo de Azevedo Coutinho.

Não compareceram à sessão os Srs.:

Adriano Gomes Ferreira Pimenta.
Alberto Xavier.

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Alexandre José Botelho de Vasconcelos e Sá.
Amílcar da Silva Ramada Curto.
Angelo Vaz.
António de Almeida Garrett.
António Augusto de Castro Meireles.
António Caetano Celorico Gil.
António Maria da Cunha Marques da Costa.
António Maria Malva do Vale.
António Maria Pereira Júnior.
António Pires de Carvalho.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Bernardo de Almeida Lucas.
Diogo João Mascarenhas de Marreiros Neto.
Evaristo Luís das Neves Ferreira de Carvalho.
Francisco Coelho do Amaral Reis (Pedralva).
Francisco Correia Herédia (Ribeira Brava).
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Francisco José Fernandes Costa.
João Crisóstomo Antunes.
João Tamagnini e Sousa Barbosa.
José Alfredo Mendes de Magalhães.
José de Freitas Ribeiro.
José Maria Gomes.
José Mendes Cabeçadas Júnior.
Manuel Augusto Granjo.
Manuel Firmino da Costa.
Manuel Gregório Pestana Júnior.
Pedro Virgolino Ferraz Chaves.

Procede-se à chamada.

O Sr. Presidente: - Responderam à chamada 77 Srs. Deputados. Está aberta a sessão.

Vai ler-se a acta.

É lida a acta.

O Sr. Presidente: - Está em discussão a acta.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como ninguêm pede a palavra, considero-a aprovada. Vai ler-se o seguinte

Expediente

Ofícios

Do 1.° secretário da mesa da assemblea geral do Centro Republicano Democrático 14 de Maio, pedindo para ser dado para ordem do dia o mais breve possível o projecto do Sr. Sá Pereira considerando feriado o dia 14 de Maio.

Para a Secretaria.

Do Instituto Pasteur de Lisboa, pedindo para serem distribuídos pelos membros da Câmara alguns exemplares que enviou.

Para a Secretaria.

Do Sr. Afonso Costa, Ministro das Finanças, remetendo á Câmara cópia do decreto n.° 2:269 publicado no Diário do Govêrno de 10 do corrente mês, abrindo um crédito especial de 3:000.000$ a favor do Ministério do Fomento.

Para a Secretaria.

Para a comissão de finanças.

Representação

Dalguns cidadãos chineses, residentes no Puerto, México, protestando contra o movimento revolucionário que tem por fim mudar na China a forma republicana de Govêrno para a forma monárquica.

Para a Secretaria.

Antes da ordem do dia

O Sr. Barbosa de Magalhães: - Apenas para agradecer a V. Exa., Sr. Presidente, a proposta, que se dignou fazer, numa das últimas sessões, para que a Câmara resolvesse lançar, na acta, um voto de sentimento pela morte de minha avó, e tambêm para agradecer á Câmara a aprovação dessa proposta.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Amadeu Monjardino: - Sr. Presidente: pedi a palavra para enviar para a Mesa dois projectos de lei.

Um trata da fixação dos quadros do pessoal dos corpos administrativos, e outro diz respeito à criação da companhia n.° 3, da guarda republicana, em Angra do Heroísmo.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Pereira Bastos: - Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a Mesa um projecto de lei, que vai assinado por mim e pelo Sr. Deputado Sá Cardoso, respeitante a alterações a introduzir na lei da instrução militar preparatória.

Tenho dito.

O orador não reviu.

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O Sr. Presidente: - Está interrompida a sessão, até que chegue o Ministério.

Eram 15 horas e 30 minutos.

Ás 16 horas e 40 minutos dá entrada na sala o Ministério, sendo delirantemente aclamado pelos Srs. Deputados e pelo imenso público que enchia as galerias, com vivas à Pátria, à Republica, às nações aliadas, etc.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.

Tem a palavra o Sr. Presidente do Ministério.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Colónias (António José de Almeida) - Sr. Presidente e meus Senhores:

Leu.

Declaração ministerial

Sr. Presidente: Tendo aceitado a incumbência que o Sr. Presidente da República se dignou confiar-me de constituir o Govêrno Nacional, em conformidade com o voto unânime do Congresso, tenho a honra de apresentar à Câmara e ao Senado o novo Ministério, em que se acham representados dois partidos da República, o Partido Republicano Português e o Partido Republicano Evolucionista, e ao qual assegurou todo o seu apoio o Partido Republicano Unionista.

Nele se integrarão tambêm outras personalidades, cuja colaboração directa a extrema gravidade da hora presente aconselha, se o Congresso aprovar a propor a de lei, que lhe será submetida, para a criação de lugares de Ministros sem pasta. A missão que nos cumpre desempenhar está préviamente traçada pelos acontecimentos: concentrar todos as nossas energias na defesa da Pátria, praticando para isso os maiores sacrifícios, solidários sempre com a nossa fiel e poderosa aliada, à Inglaterra, com a qual contamos com ela conta connosco.

Pelas declarações feitas pelo anterior Govêrno sabe o Congresso que nos encontramos em estado de guerra com a Alemanha; e eu devo comunicar-lhe que, desde ontem, estão interrompidas as relações diplomáticas com a Áustria - Hungria, conforme notificação oficial do seu representante sem alegação de motivos. Uma condição suprema se impõe conseqùentemente ao nosso patriotismo: reunir todos os portugueses em prol da causa sagrada da independência e integridade nacional, dando tréguas a quaisquer lutas e dissenções internas que nos enfraqueceriam perante o inimigo comum e envidando mais do que nunca, fervorosamente, todos os esforços para que esta Pátria seja, no momento mais grave da sua história, digna de si mesma.

Mas o novo Govêrno bem sabe que, para se fazer duma maneira efectiva e proveitosa a união entre os portugueses, é indispensável, alêm da boa vontade que acredita existir em todos os espíritos, tomar medidas e realizar intentos que favoreçam e retém per em a conciliação de toda a família portuguesa, em homenagem, em culto ao sagrado princípio da nacionalidade.

Assim, como medida indispensável e urgente, far-se há, desde já, o desdobramento do Ministério do Fomento para a criação do Ministério do Trabalho e Previdência Social, para mais profícuamente se poder acudir às necessidades das classes trabalhadoras, que tanto merecem as atenções e disvelos da República, criando-se ainda lugares de sub-secretários de Estado para terem mais fácil e rápida solução os negócios que correm por alguns Ministérios.

De resto, se a hora ô para afirmar intenções duma maneira iniludível, não se presta a explanar programas que dependem tanto, se não mais, do curso dos acontecimentos como da vontade dos homens.

Programa, a querer sintetisá-lo, êle caberia em quatro palavras: pôr a justiça ao serviço da paz, manter a liberdade ao serviço da ordem.

É preciso para isso fazer sacrifícios? Sem dúvida. Mas o Govêrno é o primeiro a arrostar em êles, tomando esta posição de suprema responsabilidade.

No Ministério que tenho a honra de apresentar ao Congresso estão homens que provém de diferentes escolas políticas, embora dentro do mesmo ideal. Alguns de entre êles ainda há dias sentiam o sangue alvoraçado pela recordação das pugnas em nu se envolveram. Todavia, não trepidaram em se unir, estendendo-se as mãos, mais do que isso, associando-se na acção. Esqueceram se mutuamente os agravos, voluntariamente expulsaram da alma a sombra de todos os ressentimen-

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tos. E porque? Porque se uniram êsses homens estendendo-se fraternalmente a mão? Porque ao de cima das nossas cabeças, como uma ameaça terrível, silvaram estas palavras, que, saídas do nosso espírito inquieto, podem traduzir uma realidade tremenda: A PÁTRIA ESTÁ EM PERIGO.

Pois para que ela não corra perigo, unamo-nos todos para a defender.

Pelo que nos respeita, e é êsse o compromisso que tomámos, empregaremos todos os meios para que se consiga a forma última e superior da União Sagrada.

Seremos tolerantes dentro das leis, aproveitando daquelas que respeitam aos problemas da consciência ou possam implicar com os princípios da tolerância toda a elasticidade de que forem susceptíveis nas suas disposições para que os espíritos se acalmem e congracem. Sem dúvida que isso depende tambêm, e muito, da atitude daqueles que até hoje tem movido hostilidade à República, quando dentro dela todas as reivindicações legítimas podem ser plenamente satisfeitas pela livre discussão.

Mas por nossa parte damos, desde já, o exemplo da tolerância fazendo estas nossas liais declarações.

Em resumo: o Govêrno, a que presido por honrosa incumbência dêsse eminente português e grande republicano que ocupa a suprema magistratura do país, terá como intento máximo solidarizar toda a família portuguesa, neste momento culminante da sua grande História. Procurará ligar os homens entre si e tambêm vinculá-los à tradição do passado, estabelecendo a equação da continuidade histórica pelo sacrifício, pela tolerância o pelo amor à terra onde todos nascemos.

Neste momento formulando e augusto, não apelamos só para a geração actual, que assiste a uma violenta e trágica transformação do mundo, apelamos tambêm para a sombra dos nossos maiores que beijaram o pó para que nós vivêssemos, preparando-nos destinos épicos e gloriosos.

Assim, fortes desta comunhão entre o presente e o passado, sob a inspiração varonil de que o futuro será por nós, porque a raça é imperecível e a Pátria é imortal, o Govêrno da República tem a honra de saudar o Parlamento e todos os portugueses sem excepção, heroicamente simbolizados neste momento pelo Exército e pela Armada.

Várias frases contidas nesta declaração, foram coroadas com grandes salvas de palmas e entusiásticos vivas patrióticos por parte de todos os membros do Parlamento e das galerias. S. Exa. foi muito cumprimentado por todos os lados da Câmara.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Colónias (António José de Almeida):- Depois de lida esta mensagem com que o Govêrno entendeu apresentar-se ao Congresso, tem natural e lógico cabimento a leitura dum documento especial, singularmente importante e honroso para o nosso orgulho de povo livre, leitura que o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros vai fazer.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Augusto Soares): - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Augusto Soares): - É o seguinte o documento que acabo de receber no Ministério dos Negócios Estrangeiros:

Leu.

Legação de S. M. Britânica - Lisboa, 12 de Março de 1916. - Excelência: Não deixei de transmitir imediatamente ao Govêrno dê Sua Majestade a informação que por V. Exa. me fora dada na quinta-feira última, à noite, de que o Ministro alemão aqui lhe declarara que existia um estado de guerra entre Portugal e a Alemanha e pedira os seus passaportes.

Em harmonia com as instruções de Sir Edward Grey, tenho a honra de transmitir a V. Exa. a seguinte mensagem ao Govêrno da República.

O Govêrno de Sua Majestade estará ao lado de Portugal em face do inimigo comum, e Portugal pode confiar em que a sua antiga aliada, a Gran-Bretanha, lhe dará todo o auxílio que for possível ou necessário prestar.- Lancelot D. Carnagie".

O Sr. Presidente: - Viva a República! Êste viva é delirantemente correspondido por toda a Câmara, e a êle se associa-

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ram igualmente as galerias, erguendo-se vivas unísonos à Inglaterra, à grande e forte nação nossa aliada, no meio de contínuas salvas de palmas.

O Sr. Alexandre Braga: - A sessão em que foi lida no Congresso da República a declaração de guerra da Alemanha revestiu uma tam soberba eloquência e uma tam esmagadora grandeza, que não houve coração de português, alma de patriota e de republicano, consciência de cidadão em que ela não espertasse a fé viril e insensível dos povos e das nacionalidades que marchara corajosamente para as incertezas do destino, com a antecipada segurança de que por sua virtude e por sua crença êles hão-de necessáriamente do incerto destino triunfar. O voto que ali se formulara para que todos os artifícios, que pareciam dividir irreconciliávelmente os partidos republicanos, desaparecessem para bem da Pátria, é hoje uma realidade assegurada.

O que há poucos dias, ainda, tinha a insolvente aparência de divisão, de antagonismo, de dispersão e de enfraquecimento, é agora um sinal de unidade, de forca e de comunhão espiritual em que ressalta e estremece toda a vigorosa e vital energia duma raça cujo gloriosíssimo passado lhe afirma e assegura a certeza de que há-de gloriosamente perdurar e vencerá Bem t abe que as pequeninas preocupações dos homens que querem intrometer-se a manusear miudezas hão-de gritar amanhã que a nossa harmonia não é perfeita e completa e que a República, mesmo nesta hora de decisivo perigo para a Pátria, não soube dar a todos os seus filhos a isenção de se esquecerem de si próprios, para se lembrarem apenas dum alto e dum sagrado dever a cumprir. Bem o sabe, mas não se Surpreende, porque sempre assim foi em todos os tempos e em todos os lugares, que aqueles que fechando os olhos e vendo só uma negra mancha, se obstinam à teimosia de desconhecer a luz e a sua fecundidade criadora, tal qual como as toupeiras que só conhecem a sombra, a mudez e a fria opacidade da treva. Mas não: o voto do Parlamento tinha de cumprir-se e cumpriu-se.

Desde o momento em que o Govêrno transacto deu aos cidadãos do seu país o nobre exemplo de ver entregar por intermédio do Parlamento, nas mãos do Sr. Presidente da República, o honroso mandato que havia recebido e de que tam patrióticamente se soube sempre desempenhar em todos os lances, desde êsse momento entre os homens da República se travou um só torneio gentilíssimo, em que êles só podem parecer separados e divididos apenas pelo zelo louvável de cada um se exceder no sacrifício, na abnegação e na dedicação sem limites. Mesmo para aqueles cuja impaciência ardia em febre de ser apressadamente conhecido êste Gabinete de salvação, mesmo para êsses a quem essa febre de impaciência patriótica pode fazer compreender os factos sob um aspecto mentiroso e errado, soou a hora em que vão convencer-se porque o chefe do partido que se não encontra representado no Govêrno, mas que a êle dá todo o incondicional apoio, vai pronunciar em face da Pátria, cuja alma revolta palpita e estremece nesta hora dentro daquela casa, as palavras terminantes que êle, orador, sabe que hão-de sair da sua boca de patriota, e em que vai demonstrar a toda a nação que o seu acto não representa de nenhuma maneira - porque é português e republicano somo nós - nenhum intuito de renunciar a partilha das responsabilidades, mas simplesmente o nobre e generoso gesto de quem não quere partilhar na glória que ao Govêrno todo vai resultar da sua obra benéfica salvadora para a nação e para a República.

Desde a proclamação da República, desde que soou a hora do seu triunfo os homens que se haviam indissoluvelmente unido para o conseguimento da vitória encontram-se na primeira hora de concórdia sagrada. Se pudesse guardar no seu espírito sequer a ilusão de que pelo seu esforço e pela sua dedicação republicana, em alguns lances, êle, orador, poderia ter contribuído, numa mínima parte que fôsse, para preparar a atmosfera propícia á produção dêste acontecimento salvador, teria por bem perdidas todas as horas amargas e dolorosas da vida, e olhando para traz, para o passado, sendo o vestígio dos passos ensanguentados com que calcou numa via de destroços de ruína, êle, orador, julgaria ter conquistado o direito, mesmo quando esta hora pudesse ser a última da sua existência política de fechar os olhos em paz, seguro de que a vida da sua Pátria livre e dignificada ficava assegurada para a

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mortalidade da história, sereno na consciência de que até o seu último instante havia cumprido em tudo, até final, o seu indeclinável dever (Apoiados).

É a hora da alerta em volta daqueles homens em cujas mãos a Pátria entregou o sagrado depósito da imaculada honra do seu nome! Toda uma Pátria está de pé! Vigilante e serena ela está pronta e disposta com uma inquebrantável decisão e energia a defender com unhas e dentes o solo sagrado em que se arquitetou a nossa história de esplendor! Todo êsse povo está pronto, em todas as horas, a engrandecer aqueles que na hora decisiva do perigo mereceram da nação a oferta daqueles lugares de responsabilidade. Nós não trepidaremos jamais em estar ao seu lado para tudo, e até para lhe exigir tambêm que em nenhum instante esqueçam o cumprimento integral e perfeito de todos, absolutamente de todos os seus deveres.

Calorosos aplausos sublinham as últimas palavras do orador, que foi muito cumprimentado. As galerias manifestaram-se com muitas palmas e vivas.

O discurso será publicado na íntegra quando o orador restituir as notas taquigráficas.

O Sr. Simas Machado: - Sr. Presidente: não há muito tempo ainda que, na sessão em que nesta Câmara se debateu o melindroso assunto da requisição dos navios alemães surtos nas águas portuguesas, eu, enviando para a Mesa uma moção em nome dos Deputados evolucionistas, declarei que ela fura redigida sob o império do mais absoluto e indiscutível patriotismo (Apoiados).

Sr. Presidente, hoje, no desempenho de igual missão, em nome dos Deputados desta parte da Câmara, e movidos êstes pelo mesmo sentimento, declaro a V. Exa. e à Câmara que, depois de ter ouvido ler a mensagem apresentada pelo Sr. Presidente do Ministério, damos ao novo Govêrno a mais completa e plena confiança.

Preside a êsse Govêrno o nosso querido chefe, Dr. António José de Almeida, e dele fazem parte dois dos nossos mais estimáveis e ilustres correligionários, os Srs. Mesquita Carvalho e Pedro Martins, respectivamente Ministro da Justiça e de Instrução Pública.

Da inteligência de S. Exas., da sua vasta erudição e do seu patriotismo esperamos que prestigiem as pastas que foram encarregados de dirigir.

Mas se assim pensamos a respeito dêstes titulares, tambêm de todo o Govêrno esperamos que saiba enaltecer a honra do nosso país, elevar o crédito da nação, prestigiar a administração pública.

Sei que o momento é grave, gravíssimo para a nossa nacionalidade, que atravessa uma crise de extrema complexidade; no entanto esperamos que o actual Govêrno, onde há indiscutivelmente homens de grande valor e muito mérito, que tem a presidi-lo a nobilíssima figura de António José de Almeida, que veio, com a máxima dedicação e patriotismo, sacrificando a sua própria saúde, assumiu as responsabilidades do cargo de Presidente do Ministério, esperamos, repito, que o actual Govêrno, de que faz tambêm parte o ilustre estadista, Sr. Afonso Costa, há-de saber manter bem levantadamente a dignidade e o brio nacional.

É crítico, disse eu, o momento actual, mas, é certo tambêm, e V. Exa. e toda a Câmara sabem, que momentos muito mais críticos, muito mais graves tem havido para esta nacionalidade, e no entanto Portugal soube sempre sair honrosamente dessas tremendas e dificílimas situações.

Coloquemo-nos aberta e lialmente ao lado dos países aliados; enfileiremos ao lado da Inglaterra que ainda agora, pelo que acaba de ler o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, nos deu a prova completa da sua sincera aliança e da unidade de vistas que existe entre os dois países; coloquemo-nos ao lado da França, que através os tempos tem sido, indiscutivelmente, a nossa directora espiritual; coloquemo-nos ao lado dessa Bélgica, dessa Sérvia, que tam nobremente tem sabido honrar o seu nome batendo-se heroicamente; coloquemo-nos ao lado dessa Rússia, que apesar de ser surpreendida pela guerra quando preparava a transformação das suas instituições militares, tem sabido brilhantemente resistir a essa arrancada que contra ela dirigiu o mais formidável e colossal exército que até hoje tem aparecido em terras da Europa; coloquemo-nos ao lado da Itália, tam gloriosa pelo seu espirito artístico e pelo sen irridentismo.

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Façamos isso e cumpriremos o nosso dever.

Sr. Presidente, termino cumprimentando os Srs. Ministros e declarando, em nome dos Deputados evolucionistas, que podem S. Exas. contar com toda a nossa boa vontade, com todo o nosso patriotismo, com todo o nosso esforço, com todo o nosso trabalho, para levantar, para honrar, para enaltecer o nome de Portugal.

Tenho dito.

Muitos apoiados e uma prolongada salva de palmas.

O Sr. Brito Camacho: - Pediu a palavra para, em nome dos seus amigos políticos que tem assento naquela casa do Parlamento, fazer breves declarações.

O Sr. Presidente da República organizou o Ministério pela forma que julgou mais conveniente aos interesses nacionais, e o desejo de todos os bons patriotas deve ser que os factos dêem completa razão a S. Exa.

A União Republicana empenhar-se há em tornar fácil ao Govêrno a sua missão difícil. Se o Parlamento se conservar aberto, os Parlamentares unionistas colaborarão pela discussão em todos os assuntos que não sejam de natureza política, e, quanto a êstes, limitar-se hão a afirmar princípios e a destrinçar responsabilidades por meio de declarações. Fora do Parlamento procurarão robustecer o sentimento pátrio, de tal modo que lá fora se veja que há aqui a unidade moral duma nacionalidade que tem direito à vida, e pretende que contêm com ela no concerto das Nações.

Consta da declaração ministerial que a Áustria cortou connosco as relações diplomáticas. Muitas vezes, isto é um incidente nas relações entre dois países; a maior parte das vezes êste incidente é o prefácio duma declaração de guerra. Que seja uma cousa, que seja outra, o Congresso da República, e com êle a Nação, encara o futuro com a mesma serenidade, o mesmo ânimo, a mesma decisão com que o encarou ao ser-nos declarado o estado de guerra pela Alemanha.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros leu uma nota do Govêrno de Londres na qual se diz que a Inglaterra, em tudo e para tudo, estará connosco. A nota causou-nos satisfação, mas de forma alguma nos causou surprêza. Bem certos estávamos de que podíamos contar com a Inglaterra, em todos os lances, como a Inglaterra podia contar connosco. Nem doutra forma nos teríamos lançado, sem hesitações, na conflagração europeia, satisfazendo solicitações que nos dirigiu em nome da aliança. Estamos em tudo e por tudo com os nossos aliados, e, para a vida ou para a morte, vamos em muito boa companhia.

A União Republicana não participa do Poder; mas considera-se, neste momento, responsável pelos destinos da Pátria, e perante as suas responsabilidades não recua, honrando-as agora, como sempre.

Repetidos apoiados cobrem as últimas palavras do orador.

O discurso será publicado na íntegra quando o orado? restituir as notas taquigráficas.

O Sr. Costa Júnior: - Em nome do Partido Socialista mando para a Mesa a seguinte

Declaração

O Partido Socialista, segundo as declarações expendidas nesta casa do Parlamento na sessão do Congresso em 10 do corrente, e ainda sôbre o documento na mesma sessão votado por unanimidade, para ser constituído um Ministério Nacional, declara não concordar com a forma como foi organizado o actual Ministério por não corresponder ás aspirações do país.

Sr. Presidente: não obstante esta declaração, não vendo no Govêrno representadas todas as correntes organizadas, eu mantenho a declaração que fiz na sessão de 10 de Março Nesta declaração dizia que o Partido Socialista, que tem combatido sempre a guerra, saberá respeitar com os deveres de Portugal em face dos tratados com a nação aliada. O Partido Socialista está incondicionalmente ao lado da Pátria. Com estas declarações eu quero frisar, apenas, que não foram cumpridas as deliberações do Congresso nesta sessão.

O orador não reviu.

O Sr. Alexandre Braga: - Usa da palavra para cumprir aquilo que julga um dever indeclinável para com uma grande nação nossa amiga, para com uma grande

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nação nossa irmã. Fala do Brasil. Dêste só vê o esplendor imortal e ofuscante da aurora que se não extingue. Aprendeu a amá-lo na perpétua fascinação da sua beleza e encantada magia maravilhante no seu sol - o sol igual ao nosso que vimos surgir para a civilização e para o futuro no ardente zénite das descobertas sem par imortalizadas nos Lusíadas. A alma latina do outro lado do Atlântico dá à raça lusitana a suprema garantia da sua imortalidade. Sente sempre o seu coração fraterno alanceado das mesmas dores, derramando as mesmas lágrimas, com a alma cheia da mesma inquietação. Nós, portugueses, agradecemos ao grande povo de heróis, de poetas, de sonhadores e de artistas a carinhosa ternura com que se associa, neste lance dum grave perigo para nós, à fez à aspiração da nossa vitória e do nosso triunfo. O nome português, há-de ser abençoado na sua grandeza, na sua pureza e na sua nobre dignidade. Nessa hora, como agora, o Brasil estará connosco, e é dever nosso, de corações de patriotas agradecidos, não esquecer essa altíssima homenagem, em todos os momentos como êste, erguendo nas suas ruas, nas suas praças, o nome de Portugal. Propõe, portanto, que a Câmara dos Deputados da Nação Portuguesa envie ao Brasil a sua saudação fraternal e sentida.

Vozes: - Muito bem.

Mattos e prolongados apoiados. As galerias soltam palmas e vivas, aclamando o Brasil.

O discurso será publicado na íntegra quando o orador restituir as notas taguigráficas.

O Sr. Simas Machado: - Sr. Presidente: pedi a palavra para declarar que, em nome dêste lado da Câmara, me associo, com todo o entusiasmo, á proposta feita pelo Sr. Alexandre Braga, a fim de enviarmos as nossas saudações e agradecimentos a essa nação que, por assim dizer, é nossa irmã, e que ri com as nossas alegrias e chora com as nossas desgraças.

O Sr. Brito Camacho: - Sr. Presidente: pedi a palavra para declarar que a União Republicana, se associa tambêm, com a maior satisfação, à proposta feita pelo Sr. Alexandre Braga.

O Sr. Costa Júnior: - Sr. Presidente: simplesmente para declarar que, igualmente, me associo á proposta há pouco formulada pelo Sr. Alexandre Braga.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Colónias (António José de Almeida): - Sr. Presidente: em nome do Govêrno, associo-me gostosamente à proposta feita pelo Sr. Alexandre Braga, a qual, sem dúvida, corresponde a um tributo da Pátria Portuguesa para com a grande República Brasileira.

O Sr. Presidente: - Em vista da manifestação da Câmara, julgo interpretar o sentimento de toda ela, declarando que a proposta do Sr. Alexandre Braga foi aprovada por unanimidade. (Muitos apoiados).

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Colónias (António José de Almeida): - Sr. Presidente: são poucas as palavras que vou pronunciar, porque verdadeiramente, mais do que nunca, tudo aquilo que era preciso dizer-se já foi dito.

A alma da Pátria Portuguesa teve neste momento, no Congresso da República, a sua repercussão admirável.

Vê-se bem que, de facto, esta nacionalidade não luta somente para manter e sustentar, em nome do, a ias, sacratíssimo princípio que faz com que todos os homens duma Pátria lutem até a morte para defenderem a terra onde nasceram. Vê-se. apalpa-se e adivinha-se que na alma de todos nós há um entusiasmo fremente, não só pela salvação da nossa Pátria, na qual acreditamos indefectívelmente, mas ainda por êsse princípio de liberdade, por essa ânsia de justiça, por essa fúria, permita-se-me o termo, do novo Direito, que faz com que a Inglaterra se apresente como campeão, defendendo as pequenas pátrias, que tem direito a viver e que hão-de viver, derrubando a tirania dêsse povo que, embora grande pela sua cultura mental, é absolutamente diminuto pelas faculdades mesquinhas da sua alma (Muitos apoiados).

Às galerias manifestam-se soltando vivas e dando palmas.

Mas umas palavras há, todavia, que neste momento devem sair, se não dos lábios do Presidente do Ministério, porque isso subentendia-se - pelo menos da boca

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dum homem público dêste país, que se chama António José de Almeida. Todos se emocionaram, todos se electrisaram ao ouvir ler a nota que aqui foi apresentada pelo Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros e que a Inglaterra nos enviou.

Justiça a quem tem direito a ela.

As nossas relações com essa grande nação são admiráveis; nem podiam deixar de o ser, mas essa glória pertence ao Ministério transacto, presidido pelo grande republicano e patriota que se chama Afonso Costa (Muitos apoiados).

Vivas e palmas das galerias.

Êste não é o meu pensar da última hora, nem suponha ninguêm que porventura eu quero ir, como numa escudela de mendicante, pedir para mim uma parcela da glória que cabe a êsse Ministério.

Não. Não tenho direito a ela; contento-me, para satisfação da minha consciência, em assegurar que quando o meu partido esteve na oposição prestou sempre ao último Ministério o seu apoio liai e honrado, aliado a uma nobre, liai e honrada política (Muitos apoiados).

Disse muito bem o Sr. Alexandre Braga, na sua admirável palavra, que esta união sagrada tinha necessáriamente de se fazer. Pois que? Seria compreensível e admissível que quando os nossos aliados estão manifestando, por declarações dos seus homens mais eminentes, o prazer que sentem em ter êstes pequenos povos ao seu lado, como beligerantes, quando êles se avisinham de nós, seria porventura tolerável aos nossos sentimentos que nós próprios, os filhos desta Pátria, continuássemos em retaliações, esfacelando a maior consistência em que pode basear-se a redempção dêste povo, que é livre e que o há de ser sempre? (Muitos apoiados). Vivas e palmas das galerias.

Então nós seríamos homens tam crus, duma insensibilidade tam rudimentar que fôssemos capazes de praticar um delito que seria absolutamente ignóbil e infamante para a nossa reputação, já não digo de homens livres, mas de civilizados?

Era impossível. Essa união está firme e sólida. Poderão os homens, em algum momento, deixar de se entenderem em questões de técnica ou de processo, o que é preciso é que êles se entendam na aspiração, no intuito sagrado, na estrela que nos guia e nos ilumina o nosso caminho, e atrás da qual nós havemos de caminhar como irmãos, visto que somos filhos duma mesma Pátria (Muitos apoiados).

Eu lamento, eu sinto profundamente, que neste Ministério não esteja representada tambêm a União Republicana, que tantos, tam devotados e inteligentes republicanos conta no seu seio.

Eu lamento que não esteja aqui sentado, nestas cadeiras ministeriais, o Sr. Brito Camacho, um republicano de cujas crenças se não pode duvidar e um patriota digno dêste nome.

As cousas, porêm, não ee proporcionaram para isso. Não importa. A União Republicana dá o seu apoio e com êle o Govêrno caminhará.

Disse o Sr. Costa Júnior que não concordava com a constituição do Ministério. Nem eu; pois se queria todos dentro do Govêrno; pois se queria que todos estivessem juntos! (Muitos apoiados e palmas).

Chamem, contudo, ao Govêrno nacional ou não nacional, porque êle, de facto, é, na sua essência e na sua alma, verdadeiramente nacional, porque da Nação saiu (Muitos apoiados).

É nacional, porque fará uma política nacional, e, sobretudo, porque vai fazer uma política de salvação pública (Muitos apoiados).

Devo dizer ao Sr. Simas Machado que à frente, do Ministério não se encontra o chefe do Partido Evolucionista, mas sim um republicano e um português.

O Partido Evolucionista continuará, sem dúvida, subsistindo para a minha ternura de amigo e para o meu coração fraterno, mas neste momento o seu chefe é unicamente um instrumento dedicado da união sagrada que a todos reuniu, condição sine quan non da salvação da Pátria.

Falou S. Exa. em sacrifício. Não sei se o pratiquei, se não. Só tenho pena que a minha vida possa ser curta para não prestar maiores sacrifícios ao meu país.

Por minha parte estarei sempre ao lado dos homens que fizerem a defesa sagrada do território e assegurarem o futuro da nacionalidade.

Chamaram-me para êste lugar, sim, como irei amanhã para as trincheiras, de espingarda na mão, para defender a Pátria.

E, ao entrar nos sete palmos da minha casa, só pedirei aos fados e ao destino que

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me dêem uma supremo consolação: que a minha pupila se não embacie de vez sem nela se gravar a imagem desta pátria redimida e libertada para sempre!

Muitos apoiados e vivas das galerias.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Colónias (António José de Almeida): - Comunico à Câmara que o Sr. Ministro do Fomento vai apresentar uma proposta de lei sôbre a criação do Ministério do Trabalho e Previdência Social esperando que a Câmara decida no sentido de sôbre ela se pronunciar desde já afim de poder ser apresentado hoje ao Senado.

O Sr. Ministro do Fomento (António Maria da Silva): - Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a Mesa a proposta de lei a que se referiu o Sr. Presidente do Ministério. Requeiro a V. Exa. que consulte a Câmara sôbre se permite a urgência e dispensa do Regimento para és-ta proposta, a fim de entrar imediatamente em discussão.

Consultada a Câmara, foi aprovada a urgência e dispensa do Regimento.

O Sr. Presidente: - Vai ler-se, para entrar em discussão, a proposta de lei mandada para a Mesa pelo Sr. Ministro do Fomento.

Leu-se.

É a seguinte:

Proposta de lei

Artigo 1.° É criado o Ministério do Trabalho e Previdência Social, do qual ficam dependentes os serviços do trabalho, previdência social e subsistências, e ainda os de comunicações, excluída a viação ordinária.

Art. 2.° Os serviços do Ministério do Trabalho e Previdência Social são distribuídos por duas direcções gerais, duas inspecções, três Administrações autónomas e uma direcção fiscal, a saber:

a) Direcção Geral do Trabalho;

b) Direcção Geral de Previdência Social e Subsistências;

c) Inspecção do Trabalho;

d) Inspecção de Previdência Social;

e) Administração Geral dos Correios e Telégrafos;

f) Administração dos Caminhos de Ferro do Estado;

g) Administração do Pôrto de Lisboa;

h) Direcção Fiscal da Exploração dos Caminhos de Ferro.

§ único. Junto dêste Ministério funcionam as seguintes corporações:

Conselho Superior do Trabalho;

Conselho Superior de Previdência Social;

Conselho de Administração dos Caminhos de Ferro do Estado;

Conselho de Administração do Pôrto de Lisboa;

Conselho de Tarifas.

Art. 3.° A Direcção Geral do Trabalho competem os seguintes serviços: fiscalização da execução das leis e regulamentos sôbre o trabalho; higiene, salubridade e segurança dos lugares de trabalho; laboratório de higiene profissional; jornas, salários e contratos de trabalho; conflitos operários; desastres de trabalho; inlabor; tribunais de árbitros avindores; agências de colocação; provas de geradores e motores; instalações de oficinas, máquinas operatórias e carcaças; inquéritos; estatística; boletim do trabalho; estudos da legislação operária; estudos sôbre indústrias especiais e sôbre as condições do trabalho na indústria caseira; congressos; relações com as instituições estrangeiras; expediente do Conselho Superior do Trabalho.

Art. 4.° A Direcção Geral de Previdência Social competem os seguintes serviços: associações de classe; associações de socorro mútuo e cálculos de seguro destas associações; seguros contra desastres, invalidez, velhice, inlabor; caixas de pensão; caixas económicas; cooperativas; habitações económicas; inquéritos relativos à situação do operariado; custo da vida; subsistências; boletim da Previdência Social; estudos da legislação; estatística; congressos; relações com a Fédération Internationale e com o Bureau Internationale Permanent de la Mutualité.

Art. 5.° Passam desde já para o Ministério do Trabalho e Previdência Social, com as respectivas verbas orçamentais, os serviços e os funcionários subordinados às seguintes dependências do Ministério do Fomento:

A 3.ª Secção da 1.ª Repartição e a 2.ª Repartição da Direcção Geral do Comércio e Indústria;

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As inspecções das circunscrições industriais;

A 2.ª Repartição da Direcção Geral de Obras Públicas o Minas, exceptuando os serviços técnicos de obras públicas não especificados e a parte relativa ao restante pessoal de obras públicas;

A Administração Geral dos Correios e Telégrafos;

A Administração dos Caminhos do Ferro do Estado;

A Exploração do Pôrto de Lisboa;

A Direcção Fiscal da Exploração dos Caminhos de Ferro.

Art. 6.° Será criada para funcionar neste Ministério uma Repartição de Contabilidade, dependente da Direcção Geral de Contabilidade Pública.

Art. 7.° O Govêrno nomeará o pessoal que for indispensável para a constituição e funcionamento dêste Ministério.

§ único. Os vencimentos serão os correspondentes às respectivas categorias dos quadros do Ministério do Fomento.

Art. 8.° Ao pessoal que transitar para êste Ministério são reconhecidos os direitos adquiridos.

Art. 9.° Os vogais do Conselho Superior do Trabalho ou da Previdência Social, pertencentes à classe operária, tem direito a indemnizações correspondentes aos salários que perderem por assistirem às sessões.

Art. 10.° Independentemente do pessoal que prestava serviço nas repartições e serviços transferidos para êste Ministério serão igualmente transferidos, com as respectivas verbas orçamentais, os empregados doutras repartições e serviços do Ministério que puderem ser dispensados.

Art. 11.° O Govêrno deverá decretar em diplomas especiais:

1.° A distribuição e regulamentação dos serviços dêste Ministério;

2.° A organização dos serviços técnicos industriais, estabelecendo o quadro do pessoal e as condições do seu recrutamento.

Art. 12.° É autorizado o Govêrno a abrir os créditos necessários para a execução desta lei, com dispensa do preceituado no artigo 6.° da lei de 29 de Abril de 1913.

Art. 13.° Durante a vigência da lei n.° 480, de 7 de Fevereiro de 1916, os serviços de Subsistências Públicas ficam a cargo do Ministério do Trabalho e Previdência Social.

Art. 14.° Fica revogada a legislação em contrário.

Sala das Sessões da Câmara dos Deputados, em 16 de Marco de 1916. - O Ministro do Fomento, António Afaria da Silva.

A Câmara concede a urgência e a dispensa do Regimento.

O Sr. Presidente: - Está em discussão na generalidade.

O Sr. Júlio Martins: - Sr. Presidente: pela leitura que acaba de ser feita da proposta de lei do Sr. Ministro do Fomento, parece-me que ela não corresponde ao meu modo de ver, ao que penso sôbre o que deveria ser o Ministério do Trabalho e Previdência Social, mas atendendo ao momento presente, dou o meu voto a essa proposta.

O orador não reviu.

O Sr. Costa Júnior: - Sr. Presidente: tendo ouvido ler a proposta apresentada pelo Sr. Ministro do Fomento para a criação do Ministério do Trabalho e Previdência Social, tenho a declarar à Câmara que o Partido Socialista concorda com a criação dêsse Ministério, porque se vai estabelecer uma relação directa entre os operários e patrões, o que até o presente não havia, pois que os operários, permita-se-me a expressão, tinham de arcar de Herodes para Pilatos para resolverem as questões relativas ao trabalho. Não me soa bem o nome de Previdência Social. Assim, fazendo minhas as considerações feitas pelo meu ilustre amigo, Sr. Júlio Martins, em que vejo que há uma espécie de disparidade entre vários organismos dêsse novo Ministério, eu, fiel aos compromissos tomados pelo Partido Socialista, não discutirei essa proposta, aprová-la-hei para assim mostrar mais uma vez o meu amor pela causa público.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem.

O orador não reviu.

O Sr. José Barbosa: - Sr. Presidente: pedi a palavra para dizer à Câmara que a União Republicana dá o seu voto à pro-

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posta de lei apresentada pelo Sr. Ministro do Fomento, mas desde já declara que êste seu voto não significa que aprova a proposta de S. Exa. em todos os seus pormenores. A União Republicana concorda, em princípio, com a criação do Ministério que consta da proposta de lei apresentada pelo Sr. Ministro do Fomento, e não a discute em consequência das circunstâncias do momento.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Não havendo mais ninguêm inscrito, vai votar-se a proposta na generalidade.

Foi aprovada na generalidade.

O Sr. Presidente: - Vai discutir-se na especialidade.

Foi aprovada, na especialidade, sem discussão.

O Sr. Luís Derouet: - Requeiro, para essa proposta de lei, a dispensa da leitura da última redacção.

Foi aprovado o requerimento.

O Sr. Presidente: - A próxima sessão é amanhã, à hora regimental, e a ordem do dia é a mesma que estava dada para hoje.

Está levantada a sessão.

Eram 17 horas e 50 minutos.

Documentos enviados para a Mesa durante a sessão

Pareceres N.º 323

Senhores Deputados. - A vossa comissão de guerra, tendo examinado o projecto de lei n.° 265-A, consultou o processo do ex-primeiro sargento do regimento de infantaria n.° 7, Rodrigo Faustino, concluindo:

Que lhe não pode ser aplicada a doutrina expressa no artigo 1.° do decreto de 8 de Março de 1911, publicado na Ordem do Exército n.° 6 (2.ª série) de 9, visto não estar provado que o primeiro sargento Faustino tivesse sido despedido do serviço por imposição política.

Lisboa, 16 de Março de 1916. - João Pereira Bastos - Cruz e Sousa - Sá Cardoso - Helder Ribeiro - Vitorino Godinho - Tomás de Sousa Rosa - António Correia Portocarrero Teixeira de Vasconcelos - Simas Machado.

Para a Secretaria.

Para o "Diário das Sessões".

Da comissão de administração pública, sôbre o projecto de lei n.° 275-D, da iniciativa do Sr. Luís Brito Guimarães, criando duas assembleas eleitorais no concelho de Estarreja, com sede nas freguesias de Avança e do Bunheiro.

Imprima-se.

Da mesma comissão, sôbre o projecto de lei n.° 314-G, da iniciativa do Sr. Pedro Virgolino Ferraz Chaves, cedendo definitivamente à irmandade da Misericórdia de Ovar designados móveis e imóveis, pertencentes ao Colégio das Doroteas.

Para a comissão dos negócios eclesiásticos.

Da comissão de guerra sôbre o requerimento do primeiro sargento da guarda nacional republicana, José Diogo, pedindo que lhe seja contada a antiguidade no pôsto de primeiro sargento desde 15 de Outubro de 1910.

Para a Secretaria.

Para a comissão de finanças.

Da comissão de finanças, sôbre o projecto de lei n.° 211-C, da iniciativa do Sr. Manuel de Brito Camacho, tornando aplicáveis os benefícios da lei de 17 de Fevereiro de 1891 aos voluntários portugueses, mortos ou feridos em combate, durante a actual guerra, e que se tenham alistado no exército ou armada ou Inglaterra ou das suas aliadas.

Para a Secretaria.

Da comissão de finanças, sôbre o projecto de lei n.° 153-D da iniciativa do Sr. Ernesto Júlio Navarro, estatuindo quanto a direitos de encarte que cabem aos funcionários do Ministério das Colónias.

Para a Secretaria,

Da comissão de Finanças, sôbre o projecto de lei da iniciativa da comissão de guerra contando a antiguidade de posto, desde 5 de Outubro de 1910, ao sargento ajudante de artilharia 1, Joaquim Simões.

Para a Secretaria.

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Da comissão de guerra, sôbre os requerimentos dos seguintes Srs.: João do Nascimento Azevedo, segundo sargento n.° 796 da 7.ª companhia de reformados, José Pereira Guimarães, primeiro sargento n.° 437 da 4.ª bateria do regimento de artilharia n.° 1, João Dias Mendes, primeiro sargento n.° 21 da 2.ª companhia do regimento de infantaria n.° 2, Carlos Eugénio da Cunha Paredes, ex-segundo n.° 6/2544 da 1.ª companhia do 1.° batalhão do regimento de infantaria n.° l, e José da Silva, segundo sargento n.° 1:365 da 7.ª companhia de reformados.

Para a Secretaria.

Projectos de lei

Do Sr. Amadeu Monjardino, criando no distrito de Angra do Heroísmo (Açores) a companhia n.° 3 da guarda nacional republicana, a que se refere a lei n.° 1 de 7 de Julho de 1913, que reorganizou os serviços daquela guarda no país.

Para a Secretaria.

Do Sr. Amadeu Monjardino,, autorizando as juntas gerais dos distritos e as câmaras municipais dos concelhos do continente da República e ilhas adjacentes e fixar o quadro dos empregados indispensáveis aos serviços a seu cargo observando o disposto no artigo n.° 96 e seus parágrafos da lei de 7 de Agosto de 1913 e no parágrafo único do artigo n.° 45 da mesma lei.

Para a Secretaria.

Dos Srs. Ernesto de Vilhena, Francisco Alberto da Costa Cabral e Urbano Rodrigues dando a designação de "Comarca de Ourique" á actual comarca de "Almodóvar" e transferindo-a desta vila para aquela a sua sede.

Para a Secretaria.

Do Sr. Ernesto de Vilhena, tornando a inspecção química da Casa da Moeda independente da administração da mesma casa devendo ficar subordinada ao Ministério das Finanças.

Para a Secretaria.

Da Sr. Deputado José Augusto Pereira, modificando o § 2.° do artigo 21.° do Regulamento do Supremo Tribunal Administrativo, aprovado por decreto de 25 de Novembro de 1886, substituindo-se-lhe as palavras: "§ 2.° a 7.° do artigo 99.° do Código do Processo Civil" por as seguintes: "§ 2.° a 4.°, inclusive, do artigo 99.° do Código do Processo Civil".

Para a Secretaria.

Publicado no "Diário do Govêrno", volte para ser submetido à admissão.

Requerimento

Volto a instar que, pelo Ministério do Fomento, com toda a brevidade, me sejam enviados os documentos e esclarecimentos que por várias vezes já tenho instado, desde a sessão passada, e voltado a instar, baldadamente, pelos Caminhos de Ferro do Estado.

Insto de novo!

Esperando que não seja debalde que desta vez tenha de voltar a repetir a instância, declaro que careço da nota das gratificações, etc., visto estar prestes a discutir se o Orçamento.- O Deputado, José António da Costa Júnior.

Mandou-se expedir.

Comunicação

Para os devidos efeitos, informo V. Exa. de que a comissão de minas, indústria e comércio elegeu para seus representantes, na comissão a que se refere o artigo 8.° da lei n.° 493, de 12 do corrente, o Sr. Deputado Morais Rosa, representando a minoria parlamentar, e o signatário desta, representando a maioria.- Aníbal Lúcio de Azevedo.

Comunique-se.

Foi mandado distribuir o Boletim Comercial, publicado pela Associação Comercial de Lisboa.

Para a Secretaria.

Distribua-se.

Transitaram: da comissão de petições para a comissão de marinha os requerimentos da classe dos faroleiros pedindo aumento de vencimento; da mesma comissão para a de correios e telégrafos o requerimento de António Máximo Lopes e Silva Barros, primeiro cabo n.° 234 da 12.ª companhia do regimento de infantaria de reserva n.° 5; da mesma comissão para a de comércio e indústria a representação da The Riba-Tejo Proprietary

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Company, Limited; da mesma comissão para a de finanças uma representação da Câmara Municipal do concelho de Alcochete; da mesma comissão para a de finanças o requerimento de Honorato Botelho, ex-segundo cabo da 3.ª companhia e 1:850 de matrícula da circunscrição sul da guarda fiscal; da mesma comissão para a de guerra a representação de Augusto Marinho Falcão dos Santos.

O REDACTOR - Herculano Nunes.

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