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REPÚBLICA PORTUGUESA

SESSÃO LEGISLATIVA DE 1911-1912

DIÁRIO DO SENADO

SESSÃO N.° 17

EM 29 DE DEZEMBRO DE 1911

SUMARIO. - Chamada e abertura da sessão - Leitura e aprovação da acta. - Expediente. - É lida na mesa a proposta de lei que dia respeito às participações sôbre heranças; e depois de usar da palavra o Sr. Senador Tasso de Figueiredo é ela aprovada na generalidade e especialidade. - Leu-se na mesa o parecer da comissão de petições relativo a Joaquim José de Amoinha Lopes. - O Sr. Senador Abel Botelho justifica um projecto de lei que tem por fim autorizar o Govêrno a conceder o bronze para um busto de Sousa Viterbo. Fica para segunda leitura. - O Sr. Senador Sousa da Câmara advoga a publicação das sindicâncias e pede a construção de uma ponte sôbre a ribeira de Lucefece. - Responde o Sr. Ministro das Colónias (Freitas Ribeiro). - O Sr. Senador Miranda do Vale disserta sôbre a necessidade de desenvolver nas nossas colónias a indústria da criação de gado para consumo. Responde o Sr. Ministro das Colónias.- O Sr. Senador Miranda do Vale lembra a conveniência de pedir à nossa legação de Buenos Aires esclarecimentos sôbre aquela indústria. - O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Augusto de Vasconcelos) concorda com essa ideia. - O Sr. Senador Sousa Júnior precede de algumas palavras a apresentação do projecto de lei sôbre a extinção do liceu de Ponte do Lima. projecto que é posto logo em discussão. Falam sôbre êle os Srs. Senadores Ladislau Parreira, José de Castro e Machado de Serpa. Seguidamente foi o projecto aprovado na generalidade e especialidade.

Ordem do dia. - Lê-se na mesa o parecer sôbre o projecto de lei relativo à circulação internacional de automóveis. - Pede informações sôbre a convenção correlativa o Sr. Senador José de Castro. Responde o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Augusto de Vasconcelos) voltando a falar aquele Sr. Senador. Usa da palavra o Sr. Abel Botelho. O projecto é aprovado em seguida.- O Sr. Senador Peres Rodrigues manda para a mesa o relatório da comissão de finanças sôbre o orçamento dos Ministérios do Interior, do Fomento e da Marinha. - É posto em discussão o parecer relativo ao orçamento do Ministério das Colónias, dispensando-se a sua leitura. Usam da palavra sôbre êste assunto os Srs. Senadores Bernardino Roque, Eusébio Leão, Nunes da Mata, Faustino da Fonseca, Ladislau Piçarra, e o Sr. Ministro das Colónias (Freitas Ribeiro). Posto à votação é na generalidade e especialidade aprovado. - É posto em discussão o parecer referente ao Ministério da Marinha. Faz considerações sôbre êle o Sr. Senador Ladislau Parreira. - O Sr. Senador Silva Barreto apresenta um parecer da comissão de instrução sôbre o projecto de lei que suspende a reforma de instrução primária, requerendo que seja discutido antes do final da sessão. O Senado anui. - Fala sôbre o orçamento de marinha o Sr. Ministro respectivo (Celestino de Almeida). Os Srs. Senadores Eusébio Leão. Nunes da Mata, Ladislau Parreira, Sousa Botelho, Azevedo Gomes e Cupertino Ribeiro ocupam-se do mesmo assunto. Em seguida é aprovado êste orçamento na generalidade e especialidade. - Põe-se em discussão o orçamento do Ministério do Fomento. Usam da palavra o Sr. Senador Miranda do Vale e o Sr. Ministro do Fomento (Estêvão de Vasconcelos). - O Sr. Senador Eusébio Leão requere que haja sessão nocturna, o que é aprovado. - O Sr. Senador Arantes Pedroso requere que a sessão seja prorrogada até à votação do orçamento que se discute. Sôbre êle falam ainda o Sr. Senador Sousa da Câmara, o Sr. Ministro do Fomento (Estêvão de Vasconcelos) e os Srs. Senadores Faustino da Fonseca, José Maria Pereira, Nunes da Mata, Miranda do Vale e segunda vez os Srs. Senadores Miranda do Vale e Faustino da Fonseca. Seguidamente é o projecto aprovado na generalidade e especialidade. - Posta à discussão é aprovada na generalidade e especialidade a proposta de lei que suspende a reforma de instrução primária. - O Sr. Presidente designa a ordem da noite e encerra a sessão.

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2 DIÁRIO DO SENADO

Presidência do Exmo. Sr. Anselmo Braamcamp Freire

Secretários os Exmos. Srs.

António Bernardino Roque
Artur Rovisco Garcia

Estiveram presentes à sessão os Srs. Senadores: Abel Acácio de Almeida Botelho, Abílio Baeta das Neves Barreto, Adriano Augusto Pimenta, Alberto Carlos da Silveira, Alfredo Botelho de Sousa, Alfredo José Durão, Amaro de Azevedo Gomes, Aníbal de Sousa Dias, Anselmo Augusto da Costa Xavier, Anselmo Braamcamp Freire, António Bernardino Roque, António Caetano Macieira Júnior, António Joaquim de Sousa Júnior, António Ladislau Parreira, António Ladislau Piçarra, António Maria da Silva Barreto, António Pires de Carvalho, António Ribeiro Seixas, António da Silva e Cunha, António Xavier Correia Barreto, Artur Augusto da Cosia, Artur Rovisco Garcia, Bernardico Luís Machado Guimarães, Bernardo Paes de Almeida, Carlos Richter, Celestino Germano Paes de Almeida, Domingos Tasso de Figueiredo, Evaristo Luís das Neves Ferreira de Carvalho, Faustino da Fonseca, Francisco António Ochoa, Francisco Correia de Lemos, Francisco Eusébio Lourenço Leão, José António Arantes Pedroso Júnior, José de Castre, José de Cupertino Ribeiro Júnior, José Estêvão de Vasconcelos, José Machado de Serpa, José Maria de Moura Barata Feio Terenas, José Maria de Pádua, José Maria Pereira, José Miranda do Vale, José Nunes da Mata, Luís Fortunato da Fonseca, Manuel Goulart de Medeiros, Manuel Martins Cardoso, Manuel Rodrigues da Silva, Manuel de Sousa da Câmara, Pedro Amaral Beto Machado, Ramiro Guedes, Sebastião Peres Rodrigues, Tomás António da Guarda Cabreira.

Não compareceram à sessão os Srs. Senadores: Afonso Henriques do Prado Castro e Lemos, Albano Coutinto, Antão Fernandes de Carvalho, António Augusto Cerqueira Coimbra, Augusto Almeida Monjardino, Christóvão Moniz, Eduardo Abreu, Eduardo Pinto de Queiroz Montenegro. Elísio Pinto de Almeida e Castro, Inácio Magalhães Basto, João José de Freitas, Joaquim José de Sousa Fernandes, Joaquim Pedro Martins, José Relvas, Leão Magno Azedo. Manuel José Fernandes Costa, Manuel José de Oliveira, Narciso Alves da Cunha, Ricardo Paes Gomes, Sebastião cê Magalhães Lima.

Ás 2 horas e 35 minutos da tarde o Sr. Presidente mandou proceder à chamada.

Tendo-se verificado a presença de 36 Srs. Senadores, S. Exa. declarou aberta a sessão.

Estiveram presentes e Sr. Presidente do Ministério e Ministro dos Negócios Estrangeiros e os Srs. Ministros da Justiça, da Guerra, do Fomento, da Marinha e das Colónias.

Foi lida e aprovada sem reclamação a acta da sessão anterior.

Mencionou-se o seguinte

EXPEDIENTE

Requeiro me sejam fornecidos pelo Ministério das Finanças os Orçamentos Gerais do Estado respeitantes aos anos de 1907-1908, 1908-1909 e 1909-1910.

Sala das Sessões do Senado, em 29 de Dezembro de 1911. = José de Castro.

Mandou-se expedir.

Leu-se na mesa o seguinte:

N.° 11-B

As transmissões por título gratuito a favor de descendentes nau estavam sujeitas ao pagamento da contribuição de registo antes do decreto, com fôrça de lei, de 24 de Maio de 1911.

Depois da publicação dêste decreto tem os descendentes de pagar contribuição de registo pela herança que houverem de seus pais, tendo de dar, dentro do prazo de trinta dias, participação ao secretário de finanças respectivo, do falecimento do autor da herança, para ser instaurado o competente processo de contribuição de registo, sob peca de serem multados com uma multa que varia de 10$000 a 10$000 réis.

Acontece, porem, que a maior parte dos descendentes não só por uma lei nova mas tambêm por sempre terem sido isentos de contribuição, desconhecem por completo a obrigação que a nova lei lhes impõe, ficando surpreendidos ao dar a sua participação, fora do prazo legal, quando o secretário de finanças; lhe diz que a não pode receber sem lhes aplicar a multa em cumprimento da lei.

Pelas razões expostas o Govêrno apresenta à apreciação da Câmara o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° Os secretários de finanças deverão receber as participações dos descendentes e autores de heranças fora do prazo legal e sem imposição de multa, durante o período transitório de dez meses, a contar da publicação do decreto, com fôrça de lei, de 24 de Maio de 1911.

§ único. Todos os autos levantados pela falta das referidas participações, durante o período mencionado neste artigo, ficarão sem efeito.

Artigo 2.° Fica revogada a legislação em contrário.

Lisboa, 11 de Dezembro de 1911. - Sidónio Paes.

N.º 14

Senhores Deputados. - A vossa comissão de finanças e enforma-se inteiramente com esta proposta, visto que ela não prejudica a receita que o Estado aufere pela lei de 24 de Maio de 1911, mas simplesmente representa uma medida de justiça.

Sala da comissão de finanças, em 18 de Dezembro de 1911. = Inocêncio Camacho Rodrigues = José Barbosa = Joaquim José de Oliveira = Álvaro de Castro = Tomé de Barros Queiroz = Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães = Aquiles Gonçalves Fernandes, relator.

PARECER N.° 17

Senhores Senadores. - A vossa comissão de finanças é de parecer que deis o vosso voto de aprovação ao projecto de lei que sob êste número vos é presente, pois que é de reconhecida justiça a sucinta doutrina que nele se contêm, e não prejudica as receitas do Estado.

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SESSÃO N.° 17 DE 29 DE DEZEMBRO DE 1911 3

Sala da comissão de finanças, 29 de Dezembro de 1911. = José Maria Pereira, presidente = Alfredo Botelho de Sousa = Peres Rodrigues = Tomás Cabreira.

Artigo 1.° Os secretários de finanças deverão receber as participações dos descendentes e autores de heranças fora do prazo legal e sem imposição de multa durante o período transitório de dez meses a contar da publicação do decreto com fôrça de lei de 24 de Maio de 1911.

§ único. Todos os autos levantados pela falta das referidas participações, durante o período mencionado neste artigo ficarão sem efeito.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das Sessões da comissão de redacção do Senado, em 29 de Dezembro de 1911. = Domingos Tasso de Figueiredo = António Joaquim de Sousa Júnior.

O Sr. Tasso de Figueiredo: - Peço a V. Exa. que se digne consultar a Câmara sôbre se permite que entre imediatamente em discussão o projecto que foi lido na mesa, e que se destina a ordenar aos secretários de finanças que aceitem as participações dos que tem de receber heranças fora do prazo legal e sem imposição de multa durante o período transitório de dez meses a contar da publicação do decreto de 24 de Maio do corrente ano.

Torna-se urgente a aprovação dêste projecto para evitar mais vexames, de que tem sido vítimas aqueles que ignoram as disposições da lei, e a instauração de novos processos pelo mesmo motivo. Esta proposta já tem o parecer da comissão de finanças e por isso nenhum inconveniente há em que o Senado a discuta imediatamente.

Tendo a Câmara assentido ao pedido do Sr. Senador, foi lido na mesa o projecto e em seguida aprovado sem discussão na generalidade e na especialidade.

Leu-se na mesa o:

Parecer da comissão de petições favorável ao pedido de Joaquim José de Amoinha Lopes, para ser repatriado.

Aprovado para ter o devido seguimento.

O Sr. Presidente: - Vai entrar-se nos trabalhos antes da ordem do dia.

O Sr. Abel Botelho: - Sr. Presidente, e Srs. Senadores: Passa hoje o primeiro aniversário da morte do Dr. Sousa Viterbo.

Recordá-lo é trazer a evocação saudosa dum dos filhos dilectos da nossa terra, duma autêntica glória nacional.

Verdadeiro espírito de eleição, a um tempo poeta e erudito, a sua vida foi um exemplo nobilíssimo de trabalho incessante e indefectível.

A sua obra é um monumento imorredouro e de saber, por que foi tão solidamente documentada, como profundamente sentida; porque as aladas fugas da sua fantasia partiam sempre, conscientes, seguras, do conhecimento próximo dos homens e da investigação paciente das coisas.

Sr. Presidente: um dos aspectos mais nobres e patrióticos da grande missão que a República se impôs é, certamente, nobilitar a memória dos seus grandes homens, arrancá-los ao iníquo, ao brutal esquecimento a que o sibaritismo egoísta do regime extinto os condenava, para os exaltar, para os oferecer, para os impor, em toda a sua iluminada evidência, ao exemplo, à comovida consideração do povo, e para lhes dar o merecido lugar na história.

O Dr. Sousa Viterbo está seguramente neste caso.

Êle não é um nome retumbante, não, porque foi sempre um solitário, um retraído, um sonhador; porque a sua modesta isenção igualou em grandeza o seu talento subtil, porque êle tinha o suave, o cândido orgulho das almas simples.

Não foi um nome retumbante; mas foi um dos nossos grandes cabouqueiros na laboriosa escavação do passado; foi um dos mais claros, demovidos e profundos anotadores das glórias pátrias.

O seu monumental Dicionário Documental e Histórico dos Arquitectos Portugueses bastava para lhe assegurar uma reputação perdurável; mas os poemas da sua mocidade são obras primas, e, depois, é colossal a abundância das suas investigações arqueológicas e artísticas, prodigamente dispersas por toda a sorte de publicações, amorosamente entusiásticas, com uma perseverança incansável, sempre com uma ardência de evangelizador e uma paciência de beneditino.

Para em tudo ser interessante esta nossa grande figura [iteraria, nem escapou à história trágica do génio.

Cego e paralítico, prematuramente inutilizado quási para a vida material, não o feriu assim o Destino apenas por efeito desta ironia paradoxal com que êle de ordinário castiga os seus eleitos; j o Destino quis mais! quis assegurar a êsse isolado, uma paz, um isolamento maior ainda; quis libertá-lo das contingências dispersivas do exterior, Dará que, dentro da sua alma, essa como que eliminação do mundo objectivo se transmutasse em mais ampla e mais ímpida claridade; quis que, assim pela inacção e pela tréva, colocado fora das paixões e dos apetites, êsse novo asceta espiritual, melhor pudesse visionar o mundo, tranquilamente, de alto, como uma grande planície, como um vasto mar, sem perfídias e sem sombras.

Dentro da sua habitação modestíssima, que quadro soberbo, emocionante!

Inolvidável ficou para quantos alguma vez lograram vê la, a ténui, a emaciada figurita dêsse valetudinário precoce, - inalterávelmente rodeado por um dos mais admiráveis exemplos de piedade filial - e que nos acolhia a todos carinhosamente, dando-nos, generosa e pronta, a sua lição das cousas, em frases saltantes como toques do pincel, com a vida toda no cérebro, numa voz clara e convicta, enquanto movia animadamente a cabeça, e com as fundas órbitas cheias tambêm de ligeiras sombras movediças, que eram como que um reflexo vago do Infinito...

Meus senhores: a República tem que reconhecer oficialmente os serviços do Dr. Sousa Viterbo, por uma forma tangível e perdurável, que não apenas pela demonstração platónica de meia dúzia de frases banais.

A República deve-lhe uma demonstração, modesta embora, como a sua vida, mas que seja bem significativa na sua mesma singeleza.

E o que eu pretendo traduzir pelo presente projecto de lei, o qual tem, aliás, a valorizá-lo o nome do ilustre Senador Dr. Bernardino Machado, que tambêm quis subscrevê-lo.

Quere-me parecer que, perfilhando êste projecto, o Senado não honrará somente o nome de Sousa Viterbo, honrar-se-há a si próprio e honrará a República.

Tenho dito.

É lido na mesa e fica para segunda leitura o projecto do Sr. Abel Botelho que a Câmara admitiu e é o seguinte:

Artigo 1.° É o Govêrno autorizado a conceder o bronze necessário, e mandar proceder á fundição no mesmo metal, dum busto do escritor Sousa Viterbo, que será colocado na sala das sessões da Associação dos Arquitectos e Arqueólogos Portugueses.

Art. 2.° Os moldes para esta publicação serão feitos sôbre um busto do aludido escritor, obtido pela mesma Associação dos Arquitectos e Arqueólogos, e precedendo consulta do Conselho de Arte e Arqueologia da 1.ª Circunscrição. = Bernardino Machado = Abel Botelho.

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4 DIÁRIO DO SENADO

O Sr. Sousa da Câmara: - Sr. Presidente, primeiro que tudo permita-me V. Exa. que justifique a falta do ilustre Senador Sr. Cristóvão Moniz, que por incómodo de saúde não pode comparecer.

Isto posto, volto a insistir sôbre a reclamação que fiz aqui ao Sr. Ministro do Interior que não está presente, pedindo ao Sr. Ministro das Colónias se digna transmitir-lhe as considerações que vou expor.

Trata-se ainda das sindicâncias.

Logo que o Govêrno Provisório assumiu o poder, nomeou diferentes comissões de sindicância que se desempenharam o melhor que puderam dêsse encargo, mas dessas sindicâncias não resultou, como se esperava, benefício algum para a República ou. se porventura algum resultou, foi até certo ponto um pouco desmoralizador para ela, porque os funcionários, que em princípio tinham visto com certo receio essas comissões de sindicâncias, sabendo mais tarde que essas sindicâncias não davam resultado nenhum, perderam todo êsse receio, e as cousas mantiveram-se pouco mais ou menos, no estado em que jaziam.

Parece-me, portanto, necessário que se publiquem todas essas sindicâncias.

Há sindicâncias que, se fossem conhecidas, poderiam dar margem a que muitas verbas, que figuram por exemplo no Orçamento que vamos discutir, já não se achassem nele inscritas, de forma que acho mais que urgente, moralizador, que essas sindicâncias sejam publicadas (Apoiados).

Quero referir-me, particularmente a uma a que já aqui me referi, que é a que se fez à extinta Câmara dos Pares e em virtude da qual pesam sôbre um funcionário acusações gravíssimas. De mais a mais êsse funcionário ainda hoje é funcionário do Estado e deseja ser condenado ou reabilitado e não pode, é evidente, estar constantemente debaixo da espada de Damocles.

Por isso eu torne a insistir pedindo a V. Exa. que junto do Sr. Ministro do Interior, apresente esta reclamação, cujo deferimento é indispensável, visto que a sindicância a que aludo decerto fará justiça a quem deli precizar.

Estando no uso da palavra, permita-me V. Exa. que eu fale num assunto, que tambêm me parece de urgência.

Tenho pena de não ver presente o Sr. Ministro do Fomento, ruas, como vejo no seu lugar o Sr. Ministro das Colónias, apresento entra reclamação referente a um assunto de urgência inadiável.

Desejo referir-me á necessidade de construir se, na ribeira de Lucefece, que liga o Alandroal com o Redondo, uma ponte, porquanto, durante o inverno, as cheias impedem as comunicações entre aquelas duas localidades.

Não me parece que a ponte que reclamo exija uma grande despesa, pois que a cantaria necessária será fornecida gratuitamente pela Câmara Municipal de Vila Viçosa, a cuja população tambêm muito convêm.

Esta ponte é absolutamente indispensável a fim de satisfazer as justas necessidades dos povos do Alandroal e Redondo, os quais ficam, por ocasião das cheias, impossibilitados de comunicar entre si.

Peço, pois ao Sr. Ministro das Colónias que apresente aos Srs. Ministros do Interior e do Fomento as reclamações que acabo de fazer.

O Sr. Ministro das Colónias (Freitas Ribeiro): - Farei sciente os meus colegas das pastas do Interior e do Fomento, dos pedidos que V. Exa. acaba de formular.

O Sr. Miranda do Vale: - Pedi a palavra para quando estivesse presente o Sr. Ministro das Colónias, a fim de lhe fazer uma reclamação cujo deferimento, parece me, favorecerá altamente os interesses nacionais.

Como é do domínio público, nota se, há um certo tempo, uma grande falta de gado bovino para consumo, e é tambêm do conhecimento geral a necessidade, que tem havido, de importar da República Argentina o número de rezes bovinas indispensáveis para suprir a falta de gado bovino nacional.

A quantidade de gado que se tem ido buscar à Argentina é já bastante avultada, e essa importação orça por réis 400:000$000 anuais, com tendência para aumentar.

A agricultura nacional, devido à evolução nestes últimos anos. tem abandonado a criação de gado bovino, e isto para se" entregar a outras indústrias que lhe são mais favoráveis.

A agricultura procura empregar os seus capitais nas culturas que maior rendimento dêem, e eu estou convencido de que não é já fácil à agricultura continental criar a quantidade de gado bovino indispensável para o seu consumo.

Ora, como é inconveniente que esteja a sair todos os anos para a Argentina uma soma grande de ouro, soma que tem todas as tendências para aumentar, pensou a Câmara Municipal de Lisboa em derivar para as nossas colónias as importantes somas que se mandam para a República Argentina; fizeram-se várias tentativas, fez-se por três vezes importação de gado, e os resultados foram sempre desfavoráveis, porque o preço dos fretes é exorbitante.

Eu não sei ao certo se as colónias portuguesas tem ou não condições para a criação de gado bovino, não tenho dados suficientes para ter uma opinião segura a êste respeito.

Todos sabem que a República Argentina exporta anualmente uma quantidade importante de gado bovino vivo e congelado; pode mesmo dizer-se que a sua principal riqueza é a exportação de gado para a Europa, principalmente para a Inglaterra que consome uma grande quantidade de carne congelada.

Não á só em Portugal e na Grã-Bretanha que há falta de gado para o consumo, êste fenómeno é geral em quási toda a Europa; por consequência o comércio de gado bovino para alimentação, oferece tendência para uma enorme expansão.

Por isso pensou a Câmara Municipal de Lisboa que esta indústria podia dar um grande desenvolvimento á agricultura das nossas colónias, e o país teria uma fonte de receita incalculável.

Estamos em condições especiais para o conseguir, as nossas colónias estão relativamente próximas do porto de Lisboa.

Se nós conseguíssemos que nessas possessões se criasse gado em abundante quantidade, poderíamos fazer aqui, nas tezirias dentre Tejo e Sado, um interposto para gado bovino vivo, e estabelecendo depósitos frigoríficos nas margens do Tejo, ficaríamos em condições não só de fornecermos o nosso pais, mas ainda uma grande parte da Europa.

Isto traria para o país uma grande riqueza ; só a cidade de Lisboa garante um mercado superior a 400 contos de réis, com tendência para aumentar, e estou convencido de que a cidade do Pôrto havia de vir aqui buscar o gado para o seu consumo, como algumas cidades de Espanha e doutros países europeus.

Eu, de observação própria, não sei se as nossas colónias tem condições para uma intensa criação de gado bovino, não possuo informações absolutamente seguras sôbre o assunto.

Tenho procurado instruir-me, pedindo informações aos governadores das províncias ultramarinas, lendo tudo, e bem pouco é - que se tem escrito sôbre o assunto, e são todos unânimes em dizer que as nossas colónias tem condições para criar uma quantidade avultada de gado vacum.

Mas a grande dificuldade é o preço dos transportes. A Empresa Nacional de Navegação leva, pelo transporte de cada boi, duas vezes o valor do animal.

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SESSÃO N.° 17 DE 29 DE DEZEMBRO DE 1911 5

Logo que constou à Câmara Municipal de Lisboa que iam ser estudadas novas bases para um concurso sôbre o transporte de gado bovino, a câmara conseguiu ter representação na respectiva comissão e nomeou-me seu representante.

Na comissão fácil me foi convencê-la da necessidade de baratear os fretes do gado bovino para a metrópole.

Quere-me parecer, Sr. Presidente, que. o Estado tinha uma grande conveniência, embora fazendo sacrifício, em preparar as condições necessárias ao desenvolvimento desta indústria.

É claro que eu não desejo que os cofres públicos se vão exaurir com auxílio a indústrias parasitárias. Todavia, se esta indústria tem, realmente, condições de vida, eu entendo que o Estado deve sacrificar, de entrada, alguns contos de réis.

Eu julgo que, com um pequeno auxílio de inicio, se obteriam imediatamente resultados muito vantajosos, porquanto a carne do gado bovino africano, apesar de não ser de primeira escolha, e muito bem aceita no nosso principal mercado. As experiências já feitas pela Câmara Municipal de Lisboa dão a certeza de que êsse gado é recebido com satisfação, visto que o comércio prefere os bois pequenos da nossa África aos enormes bois da República Argentina.

Em Lisboa não há pois, dificuldades em colocar êsse gado, que pode ser melhorado à proporção que se forem conquistando novos mercados.

Poder-se há repetir entre o continente e as colónias, o que a Inglaterra faz com a Argentina.

A Inglaterra fornece por alto preço os touros reprodutores e a Argentina vende em grande quantidade a carne de bois já melhorados.

Mas, para se conseguir isto, é preciso assegurar o mercado continental por meio de transportes baratos.

Estou convencido de que êste comércio, com o auxilio inicial do Govêrno, pode entrar numa fase de grande prosperidade, devendo depois o Govêrno abandoná-lo ou deixá-lo viver sujeito às suas próprias fôrças.

Não tenho, Sr. Presidente, conhecimentos para poder fazer afirmações claras e positivas sôbre êste assunto.

O Sr. Ministro das Colónias é que pode, com os elementos de que dispõe, ver se esta indústria tem condições para prosperar, e, reconhecendo essas condições, conseguir modificar o preço dos transportes do gado bovino africano para o continente.

Concluindo, peço a V. Exa., Sr. Presidente, que me reserve a palavra para. se o Sr. Ministro me responder, eu lhe replicar, se assim o julgar necessário.

O Sr. Ministro das Colónias (Freitas Ribeiro): - Acho muito justas as considerações que acabo de. ouvir ao Sr. Miranda do Vale, considerações que denotam que nós, portugueses, começamos a interessar-nos pelas nossas colónias.

Tenciono apresentar As Câmaras um projecto tendente a aproveitar uma verba tirada ao rendimento do álcool para ser aplicada ao desenvolvimento da indústria da criação de gado bovino em Angola, que tem regiões adequadas para o exercício desta indústria, cuja defesa acaba de ser feita, e muito bem pelo Sr. Miranda do Vale.

Brevemente tenciono apresentar êsse trabalho.

Quanto à dificuldade dos transportes, que existe realmente, direi que a Empresa Nacional tem vapores para passageiros e que não devem ser destinados a transporte de gado, mas, ou a Empresa tem de adquirir barcos para êste destino especial ou o Govêrno teria de modificar o contracto ou tratar com outra companhia. Como, porém, o Govêrno tenciona apresentar o projecto da marinha colonial, naturalmente adquirirá vapores seus em que êsse transporte se possa fazer.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Miranda do Vale: - Sr. Presidente, agradeço a resposta do Sr. Ministro das Colónias e apenas tenho a observar que realmente já na comissão houve quem se referisse à inconveniência do transporte de gado juntamente com o transporte de passageiros.

Eu nunca viajei para a África, e não avalio bem os inconvenientes que êsse transporte possa originar e sei a dificuldade de estudar o assunto por dificiência de elementos.

Há pequenos vapores sem comodidades, quási nenhumas da Empresa Insulana...

O Sr. Goulart de Medeiros: - Em péssimas condições...

O Orador: - Assisti ao desembarque de mais de cem bois e vinham em regulares condições.

Mas, segundo informações fidedignas, o último carregamento de gado da Argentina vinha num vapor de passageiros.

Para a regularidade do abastecimento da cidade e desenvolvimento mais rápido desta indústria, parecia-me que haveria toda a conveniência em tornar o mais ameudado possível o transporte do gado. Isso ficaria ao estudo dos competentes; mas entendo que neste assunto muito proveitoso nos é, e peço a atenção do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, que está presente, que os nossos representantes na Argentina elucidem o Govêrno sôbre os trabalhos interessantíssimos que sôbre criação de gados se tem feito na próspera República.

Recebi já do Govêrno Provisório, e agora do Govêrno Constitucional, alguns elementos.

Do tempo da monarquia existe um interessante relatório assinado pelo Sr. Constâncio Roque da Costa, em que se vê a importância que a criação de gado bovino atingiu na República Argentina.

Tenho lido muitos trabalhos sôbre pecuária Argentina, que são dum grande ensinamento para quem queira cultivar gados nas nossas colónias africanas.

O Sr. Ministro das Colónias (Freitas Ribeiro): - Só tenho a dizer que se há-de procurar resolver a dificuldade de transporte, questão mínima para cuja solução parece-me que não haverá grandes dificuldades. Mas em geral os passageiros são muito exigentes, mais do que se supõe.

A Companhia de Moçambique tem muitos empregados e quási todos êles mostram relutância em embarcar nos vapores portugueses, preferindo os estrangeiros, por oferecerem melhores condições de comodidade e luxo.

Tem-se notado que nos vapores de carreira que vem de Angola, quando o carregamento é de cacau, já os passageiros são em menor número.

No entanto há-de fazer-se todo o possível para remediar a dificuldade de transporte, quando se fizer o novo contracto com a Empresa Nacional de Navegação, e desde que o comércio de gado possa garantir o transporte especial, pois não é bom nem conveniente fazer-se êsse transporte nos vapores de carreira.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro dos Negócios Estrangeiros (Augusto de Vasconcelos): - O Sr. Senador Miranda do Vale mostrou mais uma vez quanto tem estudado êste assunto, mas tambêm mostrou que as nossas legações podem interessar-se pelo estudo da alimentação pública e cooperar nele.

O que posso garantir a V. Exa., é que tanto os funcionários diplomáticos, como os consulares se ocuparão dêste importante assunto.

S. Exa. não reviu.

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6 DIÁRIO DO SENADO

O Sr. Sousa Júnior: - Pedi a palavra em nome da comissão de instrução para apresentar o parecer sôbre um proposta, vinda da Câmara dos Deputados pão a extinção do liceu de Ponte do Lima.

A comissão pede a dispensa do Regimento para a proposta entrar imediatamente em discussão.

Em duas palavras explico os motivos que levaram a comissão a extinguir o liceu de Ponte do Lima.

O liceu de Ponte do Lima devia chamar-se um liceu eleitoral, assim o crismou o Sr. Brito Camacho na outra Câmara e muito bem.

A minoria republicana assim o julgou, no tempo da monarquia. Êste, como es outros liceus eleitorais, eram designados a favorecer diversos indivíduos, como caciques, apaniguados dêstes, professores feitos ad hoc, etc., etc.

A comissão administrativa de Ponte do Lima entendeu que podia extinguir o liceu e extinguiu-o.

No Ministério do Interior porém, entendeu-se que a comissão administrativa não o podia fazer, sem autorização do Ministro do Interior; daqui nasceu um certo conflito, e a verdade é que o projecto, que foi apresentado na Câmara dos Deputados e lá aprovado sem discussão, resolve essa espécie de conflito.

Na Câmara dos Deputados êste projecto mereceu a simpatia de todos, como tive ocasião de ver.

Ali fui dispensado o Regimento e o projecto foi discutido, logo que foi apresentado.

Eu assentei, portanto, aã sua apresentação a esta Câmara para que fôsse imediatamente resolvido o assunto. A comissão de instrução do Senado, em nome da qual falo, entendeu que nós devíamos proceder da mesma maneira que na Câmara dos Deputados. Trata-se duma obra útil, que é necessário realizar sem demora.

O Sr. Eusébio Leão: - Eu sou em princípio contrário à entrada imediata em discussão de qualquer projecto, por isso reprovo sempre, e agora lembro, se por acaso, isso não irá prejudicar a discussão do Orçamento.

Entendo que, enquanto se discutir o Orçamento, não devemos discutir mais cousa nenhuma.

O Sr. Presidente:-Mas nós estamos ainda dentro do prazo da uma hora antes da ordem do dia.

O Orador: - Sendo prejudicada a discussão do Orçamento, entendo que a Câmara de forma nenhuma deve aprovar o pedido do Sr. Sousa Júnior.

O Sr. Sousa Júnior: - Foi aprovada aqui em tempo uma proposta para que sistematicamente se não discutissem projectos sem irem às respectivas comissões; mas êsse não é o caso sujeito.

A proposta, que veie da Camará dos Deputados, foi apreciada pela respectiva comissão desta Câmara, que deu o seu parecer e êsse parecer é que a comissão pede que entre em discussão, sem a publicação no Sumário das Sessões.

Não é o caso de se apresentar um projecto para, cem dispensa do Regimento, ser discutido imediatamente.

Êste já foi à comissão de instrução e tem o respectivo parecer.

O Sr. Presidente: - Os Srs. Senadores que aprovam o pedido do Sr. Sousa Júnior, tenham a bondade de se levantar.

Foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Vai ler-se o projecto.

Leu-se na mesa e é ao teor seguinte:

Projecto de lei n.° 25

Considerando que a dignidade das actuais Instituições políticas exige que se extingam imediatamente liceus ou escolas, criados com fins que se podem bem reputar eleitorais, fins de que nenhumas vantagens pode esperar a instrução pública;

Considerando que restas condições se encontra o Liceu Municipal de Ponte do Lima, com cujas despesas não pode. aliás, a Comissão Administrativa daquele Município, conforme e por diversas vezes o tem feito sentir às instâncias superiores;

Considerando, por último, que da extinção do referido liceu resulta para o Estado o benefício dum conto de réis, quantia com que, desde 1909, subsidiava aquele Município;

Tenho a honra de apresentar à consideração da Câmara o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° - E extinto o Liceu Municipal ou Escola Municipal Secundária de Ponte do Lima.

Art. 2.° - Fica revogada a legislação em contrário.

Sala das Sessões, 26 de Dezembro de 1911. = O Deputado, Manuel Bravo.

N.° 18

Senhores Senadores. - A vossa comissão de instrução, tendo examinado a proposta de lei n.° 16-A., vinda da Câmara dos Deputados, acha-a útil e indispensável. Entende portanto que o Senado a deve aprovar e pede que, dispensado o Regimento, ela entra imediatamente em discussão.

Sala do Senado, 29 de Dezembro de 1911. = António Ladislau Piçarra = António Maria da Silva Barreto = Faustino da Fonseca = António Joaquim de Sousa Júnior.

Proposta de lei

Artigo 1.° E extinto o Liceu Municipal ou Escola Municipal Secundária de Ponte do Lima.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.

Palácio do Congresso, em 27 de Dezembro de 1911. = António Aresta Branco, Presidente = Baltasar de Almeida Teixeira, Primeiro secretário = António Joaquim Ferreira da Fonseca, Segundo secretário.

O Sr. Presidente: - Está em discussão na generalidade.

O Sr. Ladislau Piçarra:-Duas palavras apenas para declarar que aprovo inteiramente o projecto e faço minhas as considerações tão lucidamente apresentadas pelo nosso ilustre colega Sousa Júnior.

Se se tratasse duma escola profissional, eu seria o primeiro a pedir um sacrifício ao Estado para ela se conservar, mas tratando-se dum liceu, não. Tomáramos nós dar conta do pessoal e da despesa que os liceus estão dando, quanto mais criar ou sustentar ainda mais um.

O Sr. José de Castro: - Não admito o projecto, porque não conheço a questão, mas entendo e sou de parecer que não se acabe cora essa escola, mas se transforme, se faça dela uma escola profissional.

Se é possível isto, voto o projecto.

Acho que com os mesmos recursos que se gastam no actual liceu, podia estabelecer-se uma escola profissional.

O Sr. Silva Barreto: - Está-se organizando um projecto nesse sentido.

O Orador: - Nesse caso, logo que nós temos tenção de assim proceder, entendo que devemos desde já ex-

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tinguir êsse liceu, para depois se criar uma escola profissional no seu lugar.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Machado de Serpa: - Eu aprovo o projecto, porque a Câmara e a comissão administrativa de Ponte do Lima, no uso do direito que lhe confere o Código Administrativo, querendo extinguir o liceu, porque foi ela que o criou, levou isto ao conhecimento do Govêrno.

O Govêrno de princípio mantinha doutrina oposta a esta, mas depois reconsiderando e em vista de novos argumentos concordou plenamente com a decisão da Câmara e assim, pela boca do Sr. Ministro do Interior declarou que reconheceu que a Câmara tinha andado bem e era precisa a discussão imediata dêste projecto, ou por outra, o Govêrno reconheceu a necessidade dessa discussão, para evitar um conflito entre a comissão e o Ministério, concordando com a extinção do liceu, e entendeu que, se ela não for aprovada, continua o conflito. Esta é mesmo a forma de pôr termo a uma questão entre a Câmara de Ponte do Lima e a estação superior do Ministério do Interior.

Eis a razão porque eu aprovo o projecto.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Presidente: - Como mais ninguém pediu a palavra, vai votar-se.

Posto à votação, foi aprovado tanto na generalidade como na especialidade, depois de lidos sucessivamente os artigos do projecto.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Faltam dez minutos para terminar o tempo destinado aos trabalhos antes da ordem do dia; mas eu peço licença á Câmara para por desde já em discussão o projecto que vai ser lido:

Leu-se e entrou em discussão o parecer n.° 16 da comissão de negócios externos relativo à convenção internacional sôbre a circulação de automóveis.

N.° 14-A

Artigo 1.° E aprovada, para ser ratificada pelo poder executivo, a Convenção Internacional relativa à circulação dos automóveis, assinada em Paris, em 11 de Outubro de 1909.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.

Palácio do Congresso, em 26 de Dezembro de 1911. = António Aresta Branco = Baltasar de Almeida Teixeira = Francisco José Pereira.

Número vinte e quatro. - Senhores Deputados. - A vossa comissão dos negócios estrangeiros analisou a proposta de lei número onze.-É, apresentada pelo Ministro dos Estrangeiros, e que tem por fim aprovar, para ser ratificada, a Convenção Internacional relativa à circulação de automóveis. A comissão é de parecer que a proposta merece a vossa aprovação, no mais curto prazo. = José Barbosa = Caetano Gonçalves = Helder Ribeiro = Philemon Duarte de Almeida = Eduardo de Almeida.

Está conforme. - Direcção Geral e Secretaria do Congresso, em 26 de Dezembro de 1911. = O Director Geral, Feio Terenas.

N.° 16

Senhores Senadores. - A vossa comissão dos negócios externos analisou devidamente a Proposta de lei n.° 14-A, enviada a esta Câmara pela Câmara dos Deputados e ali apresentada pelo Ministro dos Estrangeiros, e que tem por fim aprovar, para ser depois ratificada, a Convenção Internacional relativa à circulação de automóveis.

A comissão é de parecer que, visto a referida proposta tender a melhorar a mutualidade das boas relações internacionais e em nada contrariar os nossos regulamentos sôbre o mesmo assunto, merece a vossa inteira aprovação.

Sala das Sessões do Senado, em 28 de Dezembro de 1911. = Bernardino Machado = Francisco Eusébio Leão = Adriano Augusto Pimenta = Abel Acácio de Almeida Botelho.

O Sr. José de Castro: - Eu não conheço a convenção internacional, relativa à circulação de automóveis. Parece que êste projecto devia ser acompanhado da convenção.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro dos Negócios Estrangeiros (Augusto de Vasconcelos): - Essa convenção está junta ao projecto.

O Orador: - Mas eu não a conheço.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro dos Negócios Estrangeiros (Augusto de Vasconcelos): - Se a convenção não for aprovada até 31 do corrente mês, perde-se o direito ás clausulas nela fixadas. Não há, pois razão para que não seja aprovada.

O Orador: - Eu respeito muito a opinião de V. Exa.; mas tambêm respeito muito a minha.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro dos Negócios Estrangeiros (Augusto da Vasconcelos): - A convenção está sôbre a mesa.

O Orador: - Só depois de eu ter conhecimento da convenção, é que posso apresentar quaisquer dúvidas, ou reparos que o seu texto me ofereça.

Repito. Não conheço a convenção, e, não a conhecendo, não posso emitir acerca dela o meu juizo.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro dos Negócios Estrangeiros (Augusto de Vasconcelos): - Mas está sôbre a mesa, onde podem consultá-la aqueles que tem interesse em conhecê-la.

O Orador: - Mas eu não a conheço.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Presidente: - A nossa comissão já viu o projecto e por isso eu o tinha designado para a sessão de hoje.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro dos Negócios Estrangeiros (Augusto de Vasconcelos): - Estas convenções internacionais realizam-se por meio de técnicos.

A convenção, está entregue ao Parlamento, que se limita a aprová-la ou rejeitá-la.

Se entende que é boa, aprova-a: se entende que é má, rejeita-a.

Á conferência que se realizou para versar o assunto, foi um delegado português, e foi êle que assinou a convenção.

Essa convenção foi presente à Câmara dos Deputados, foi apreciada pela comissão respectiva e aprovada pela mesma Câmara.

Transitou para esta Câmara, teve parecer da comissão do Senado, e está sôbre a mesa, onde pode ser examinada.

Essa convenção não se pode modificar.

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8 DIÁRIO DO SENADO

Tem, como disse, de ser aprovada, ou rejeitada em globo.

E indispensável isso porque, sem ela, o transite internacional de automóveis e impossível.

Luta-se com bastantes dificuldades para se transporem as fronteiras.

O que a convenção faz, é regular tudo o que respeita ao trânsito de automóveis, que tem de atravessar as fronteiras e ir aos países que aderiram à mesma convenção.

E isto de que trata a convenção, e mais cada.

S. Exa. não reviu.

O Sr. José de Castro - Depois das explicações do Sr. Presidente do Conselho, convenço-me de que é de utilidade a aprovação do projecto, e por isso deu-lhe o meu voto.

Sem essas explicações, eu não o aprovaria.

E o que tenho a dizer.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Abel Botelho: - Pedi a palavra come relator da comissão de negócios externos para assegurar ao Sr. Senador José de Castro, que a mesma comissão achou da maior vantagem a aprovação da convenção respeitante á circulação internacional de automóveis, pela facilidade que dá ao trânsito dêsses veículos, e porque ela em nada contraria o que temos legislado a tal respeito.

A comissão teve e cuidado de estudar com atenção o assunto.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Presidente: - Vai votar-se na generalidade.

Em seguida foi aprovado. Pôsto em discussão na especialidade, foi igualmente aprovado.

O Sr. Peres Rodrigues (Por parte, da comissão de finanças): - Mando para a mesa o relatório da comissão de finanças sôbre o projecto de orçamento dos Ministérios do Interior, Fomento e Marinha, faltando os da Guerra e Finanças que não estando concluídos, não havia já tempo de serem impressos e apreciados amanhã, perecendo me que a unica forma de resolver esta dificuldade á a Câmara assentar em que não sejam publicados e sejam simplesmente lidos. Êles estão escritos em letra bem ilegivel e a sua leitura fácilmente pode ser apreciada pelo Senado.

Nestas condições mando-os para a mesa e deixo aqui o meu alvitre.

O Sr. Presidente: - O Sr. Peres Rodrigues pediu que se consulte a Câmara sôbre se dispensa a impressão do relatório que enviou para a mesa relativo aos Orçamentos do Fomento, Interior e Marinha, bem como a distribuição e impressão dos pareceres relativos à Guerra e Finanças.

Os Srs. Senadores que concedem esta dispensa, queiram ter a bondade de se levantar.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Está aprovado.

O Sr. Presidente: - Está em discussão na generalidade, o orçamento do Ministério das Colónias.

Vou consultar a Câmara para ser dispensada a leitura, tanto do orçamento como do parecer, visto serem extensos e terem sido distribuídos.

O Senado dispensou a leitura, sendo posto à discussão, na generalidade, o seguinte;

N.° 17-B

Senhores Deputados. - O decreto com fôrça de lei de 27 de Maio de 1911, que reorganizou os serviços da Secretaria das Colónias e hoje rege os do novo Ministério das Colónias, dispunha, no seu artigo 57.°, que os orçamentos das províncias ultramarinas dependeriam exclusivamente da aprovação em decreto do Ministro.

Por uma resolução da Assembleia Nacional Constituinte está revogado êsse preceito e cabe ao Congresso a discussão dos referidos orçamentos, que esta comissão espera lhe sejam enviados para a análise das receitas e das despesas coloniais para 1912-1913.

Emquanto não houver lei que revogue a resolução da Assembleia Nacional Constituinte - o que poderá acontecer quando se fizerem as leis orgânicas das colónias, de acordo com o artigo 85.° da Constituição - competirá exclusivamente ao poder legislativo o orçamento da receita e a fixação da despesa da República, isto é, da metrópole e das colónias.

Há, alêm disso, evidente necessidade do Congresso conhecer de maneira cabal o estado verdadeiro da administração colonial, conjugar elementos reais para avaliar a capacidade tributária das províncias ultramarinas e ajuizar, pela qualidade e soma das receitas em confronto com a natureza e volume das despesas, do grau da sua expansão económica e financeira e, ao mesmo tempo, do justo limite dos ónus inseparáveis de qualquer obra de fomento nessas terras de riqueza quási inexplorada.

Por mais reclamado que continui a ser, o nosso desenvolvimento colonial só poderá ter o impulso que merece quando a metrópole, cujos mercados de consumo e de abastecimento hão-de vir a ser, em grandíssima parte, as províncias ultramarinas, bem como o estrangeiro, a cujos capitais e a cuja multiforme cooperação havemos de ir buscar energias criadoras da riqueza do Portugal novo, se convencerem, de maneira decisiva, de que queremos e sabemos, por processos sérios e não por aventuras mais ou menos audaciosas, aproveitar o muito que ainda nos resta do vastíssimo empório que fundamos alêm-mar.

Chegou o momento de dar balanço ao que rendem e ao que gastam as coloniais, ao que produzem e ao que consomem, para que, por uma leitura concludente dos números, das estatísticas e dos orçamentos, possamos saber as medidas que devemos adoptar, os motivos que as determinam e os resultados lógicos dos nossos actos de administração.

Por tudo o que deixa dito, a vossa comissão de finanças insiste na necessidade de serem apresentados os orçamentos coloniais ao Congresso.

A sua falta já agora se sente. Assim é, que, se conhecesse os deficits daqueles orçamentos, a comissão não estranharia porventura a verba, relativamente pequena, de 850 contos de réis que "para subvenções às colónias com deficits e a êstes iguais, se inscreveu na despesa extraordinária, de acordo com o prescrito no artigo 47.° do decreto com fôrça de lei, de 27 de Maio de 1911.

Não os conhecendo, limita-se a exprimir o seu júbilo por ver os deficits coloniais relativos a 1911-1912 liquidados por uma subvenção de 850 contos de réis, quando se chegara a prever, só para a província de Angola, uma subvenção superior a 1:500 contos de réis.

A divisão da despesa ordinária "em despesas de soberania e civilização" e "despesas de administração geral" obedece ao artigo 46.° do decreto de 27 de Maio de 1911 e a vossa comissão entende que ela se deve manter. Não concorda, porem, com a falta de descriminação das despesas de administração geral, que, nas outras propostas de distribuição, se encontram decompostas em termos de se avaliar o que do total se aplica a pessoal ou a. material, se há economia ou desperdício, se as consignações tem ou não fundamento em lei.

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É por essa falta que a comissão se tem de limitar a verificar muitíssimo pouco do que conviria ver esclarecido na proposta das despesas das colónias.

Não se encontra explícita sequer a inscrição do vencimento do Ministro fixado pela Assembleia Nacional Constituinte. Está, sem dúvida, incluída nas despesas de administração geral, que, de acordo com o artigo 47.° do decreto de 27 de Maio de 1911, pesam em partes iguais, 121:556$320 réis, sôbre o Orçamento Geral do Estado e sôbre o das colónias com saldos.

Os gastos totais da Secretaria das Colónias somam, portanto, 243:112$640 réis.

Tambêm é de esperar que nas futuras tabelas se decomponham as verbas inscritas nos artigos 7.°, 8.°, 10.° e 11.° do capítulo 1.°

Sem isto não há estudo possível do Orçamento e só há cifras globais para pessoal e para material, algarismos que se não podem alterar, porque se lhes desconhecem as parcelas e qualquer modificação seria arbitrária ou caprichosa.

A comissão de finanças, fazendo estas ligeiras considerações, deseja tam somente contribuir para evitar que as antigas práticas orçamentais transitem para a República.

Sala das Sessões da Comissão de Finanças, em 23 de Dezembro de 1911. = Inocêncio Camacho Rodrigues = Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães = Aquiles Gonçalves Fernandes = Álvaro de Castro = José Barbosa.

N.º 12-(b)

Senhores Senadores. - No orçamento do Ministério das Colónias, para o ano económico de 1911-1912, é apresentada a despesa total de 2.038:497$905 réis, sendo 1.188:407$905 réis de despesa ordinária e 800:497^905 réis de despesa extraordinária.

A despesa ordinária é constituída por despesa de soberania e civilização na importância de 1.066:941$585 réis. sendo as verbas dispostas dentro do capítulo 1.°, e por despesa de administração geral apresentada em globo na importância de 121:556$320 réis, formando se com esta verba, não subdividida em parcelas, o 2.° capítulo.

A despesa de soberania e civilização, que talvez ficasse melhor com a epígrafe de despesa de soberania e fomento, é constituída por diversas parcelas ou verbas, em que avultam a de subsídio ao caminho de ferro de Loanda a Ambaca, na importância de 555:932$820 réis, a de subsídio ao caminho de ferro de Mormugão, na importância de 278:240$000 réis, a do depósito de praças do ultramar, na importância de 41:468$765 réis, sendo réis 37:968$765 para o pessoal e 3:500$000 réis para o material, e a da delimitação de fronteiras, na importância de 87:600$000 réis, sendo 55:0670$00 réis para o pessoal e 32:532$200 réis para o material. Estas são as verbas mais importantes dêste capítulo, sujeitas a aumento e diminuição, mas que é de esperar que em orçamentos futuros venham notavelmente diminuídas em razão duma sensata administração; e bem mal irá se assim não suceder. As restantes verbas dêste capítulo são muito menos importantes e, pela natureza dos serviços a que correspondem, não parecem susceptíveis de diminuição.

A despesa de administração constitui o capítulo 2.° Como se disse, é da importância de 121:556$320 réis e, devido, decerto, à circunstância de ter sido criado de novo êste Ministério, e não ter havido tempo, mão é desenvolvido o orçamento dêste capítulo nas suas diferentes parcelas ou verbas. Por esta razão não pode esta comissão formar juízo fundamentado sôbre a despesa atribuída a êste capítulo, parecendo-lhe entretanto que é muito suficiente.

A despesa extraordinária constitui o capítulo 3.°, sendo a sua importância, como se disse, de 850:497$905 réis. É destinada aos orçamentos das colónias para despesas a realizar na metrópole e importâncias a transferir para despesas nas mesmas colónias, incluindo 100:000$000 réis para pagamento de juros e amortização do empréstimo do caminho de ferro de Mossâmedes, nos termos do artigo 60.° da carta de lei de 9 de Setembro de 1908.

São vagos e indeterminados os dizeres dêste capítulo 3.°, com excepção da verba referente ao caminho de ferro de Mossâmedes. Mas não pode restar dúvida que a importância fixa de 750:497$905 réis é destinada a suprir os prováveis deficits coloniais relativos a 1911-1912, em harmonia com o prescrito no artigo 47.º, do decreto com força de lei de 27 de Maio de 1911. O ser fixada esta importância é de toda a utilidade sob o ponto de vista duma defensável elaboração do Orçamento Geral do Estado. Mas sob o ponto de vista do inadiável progresso das colónias, só o futuro poderá dizer qual o alcance duma tal medida. Entretanto a comissão acata esta medida baseada na lei, esperando os resultados práticos para poder fazer a sua crítica em orçamentos futuros.

Relativamente ao capítulo 1.° que se refere ás despesas com a soberania e civilização, entende esta comissão que é do seu dever o fazer umas rápidas considerações a respeito das duas verbas mais importantes do mesmo capítulo e que se referem aos subsídios para o caminho de ferro de Ambaca e para o caminho de ferro de Mormugão.

A despesa com o subsídio ao caminho de ferro de Ambaca é a consequência fatal do modo como foi construída esta importante linha férrea, em que parece ter havido a principal preocupação em desenvolver o maior número de quilómetros de linha férrea, sem atender ao seu profícuo rendimento, havendo curvas e contra-curvas que nunca, deviam ter sido permitidas. O mal está feito, e já não poderá ser remediado por completo. Apezar disso, a comissão tem fundamentada esperança de que esta extensa linha férrea, logo que chegue a Malange e vá mesmo n travessar o território dos Bengalas e entestar no importante rio Quango, pelo menos, se tiver uma patriótica administração, deve ainda vir a dar um tão grande incremento de rendimento que o actual pesadíssimo encargo seja não só diminuído mas até mesmo eliminado.

Quando a República Francesa mandou construir a importante linha férrea de Konakry, na costa da Guiné, a Konroussa, na margem do alto Níger, foi feita uma prudente previsão relativamente ao provável rendimento quilométrico da linha. Essa previsão foi em pouco tempo duplicada, triplicada, etc., e actualmente parece estar decuplicada. Dizia Stanley que a África pertencerá a quem nela construir melhores linhas férreas. A República Francesa assim o tem entendido, e o seu vastíssimo domínio colonial, pelo desenvolvimento que está adquirindo, é o assombro do mundo civilizado.

Emquanto à despesa com o subsídio ao caminho de ferro do Mormugão, entende esta comissão que a causa principal dessa desoladora despesa está no facto do porto do Mormugão não se encontrar nas condições que a navegação moderna exige. Êste porto, alêm de possuir acanhadas dimensões, é mal abrigado dos temporais, especialmente dos de noroeste, pela sua única e pequena muralha ou quebra-mar. Se um dia o porto de Mormugão receber os melhoramentos de que carece, se na serra dos Gates forem aproveitadas as suas magníficas quedas de água para bem da indústria, e se as selváticas encostas da serra, atravessadas pela linha férrea, passarem a ser povoadas de plantas úteis, como a do algodão, do café e outras, é de supor que esta linha férrea de pequena extensão possa vir a dar saldo em lugar de déficit desolador. Para mais, esta linha férrea é a linha de penetração mais curta para regiões ricas da Índia Inglesa, e especialmente a de Karnatik com cidades importantes, servidas por linhas férreas em ligação com aquela, tais como Dharwar, Kubli, Belgaum, Gadak, e muitas outras. Por todas estas

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razões tem esta comissão esperança no futuro desta linha férrea, se se fizer o que se deve fazer.

Não sendo entretanto possível a esta comissão julgar detalhadamente verbas do orçamento das colónias que não foram descritas, mas, tendo confiança em que os valores apresentados foram calculados pelo menos que era possível, limita-se a fazer votos para que assim tenha sucedido, esperando que no próximo orçamento as diferentes verbas de todos os capítulos sejam apresentadas com o conveniente desenvolvimento.

Sala da comissão de finanças do Senado em 23 de Dezembro de 1911. = José Maria Pereira, Presidente: Tomás Cabreira = Alfredo Botelho de Sousa = José Miranda do Vale = Peres Rodrigues = Inácio de Magalhães Basto = José Nunes da Mata.

O Sr. Bernardino Roque: - Sr. Presidente: não vou discutir isto que se diz orçamento das colónias, porque êle não é um orçamento; lembra antes um pouco uma dessas companhias falidas que apresentam as suas contas anuais dizendo apenas "a receita foi de tanto e a despesa de tanto".

Assim, custa-me aprovar um tal orçamento; preferiria aprovar um duodécimo. (Apoiados). Em todo o caso, como o tempo urge, limitar-me hei a umas pequenas observações relativas a umas verbas que figuram, neste capítulo, e sôbre as quais creio que houve engano, esquecimento ou êrro. Quero referir-me à verba de réis 80:000$000 que figura no artigo 4.° para o cabo submarino até Loanda.

V. Exa. e o Senado sabem que esta verba de réis 80:000$000 é filha dos contractos que estão aqui indicados. É em virtude deles que o Estado tinha que pagar 80:000$000 réis, sendo apenas de 20:000$000 réis a verba que o Estado costuma gastar, ordinariamente, em telegramas para Loanda; o resto é de subsídio.

Ora a verdade é que êste contracto terminou era Setembro.

O Sr. Ministro das Colónias (Freitas Ribeiro): - Termina em Junho próximo. Não deve figurar no futuro orçamento.

O Orador: - Afirmou-me pessoa da máxima respeitabilidade e responsabilidade, cujo nome escuso de trazer para aqui, que o contracto terminou em Setembro e, dês de que assim é, sendo a despesa do telégrafo, anualmente de 20:000$000 réis, não havia razão para figurar aqui 80:000$000 réis, mas apenas os 20:000$000 réis, ainda quarta parte dos 80:000$000 réis, correspondente ao trimestre de Julho a Setembro, isto é, 40:000$000 réis.

O outro ponto a que me quero referir, é relativo á garantia ao Caminho de Ferro de Ambaca, que foi como V. Exa. sabe, uma desgraça para o Estado, sobretudo para a província de Angola; desgraça na sua construção, desgraça no seu contrato, desgraça na sua administração, desgraça em tudo! E quem o pode saber bem é quem, algumas vezes, teve a infelicidade não só de transitar nesse Caminho de Ferro, mas até de dormir dentro dele, visto que de noite pára. Parece que o construtor andou a brincar com a administração... tantas e tais são as voltas, bem desnecessárias, que êle dá.

Eu não venho para aqui fazer a crítica dêsse Caminho de Ferro, apenas pedi a palavra para dizer que me parece que há aqui um engano nesta verba de 555:000$000 réis.

Parece-me que o que o Estado gasta, incluindo a garantia do juro na importância de 436:000$000 réis, perfaz um total de 605:000$000 réis, visto que a despesa da exploração anda por 169:000$000 réis.

Ora, se assim é, não é exacta a verba que vem no orçamento.

E necessário que isto se esclareça bem para que, quando se apresente o novo contracto do Caminho de Ferro de Ambaca, contracto que terá a minha plena aprovação, não se diga que, por essa obra patriótica que se quere levar a efeito, o Estado nada ganha, nada lucra com essa aquisição.

Chamo tambêm a atenção do Sr. Ministro das Colónias para o subsídio que no orçamento se estabelece para o Seminário as Missões Ultramarinas. E uma verba tão miserável que não se chega a perceber.

As nossas Colónias tem sido até hoje exploradas por tudo e por todos. Um dos meios de exploração tem sido empregado pelas missões estrangeiras. Só na província de Angola tem-se gasto com elas desde 1883 até hoje para cima de um milhar de contos de réis, emquanto que toda a obra dessas missões não corresponde à décima parte dessa importância. Podem ser dispensadas as missões católicas; mas ainda que sejam consideradas necessárias, supondo mesmo que elas não devam desaparecer, que sejam de absoluta necessidade, então que sejam portuguesas, que se gaste o dinheiro com portugueses e não com estrangeiros, que para nada mais servem do que para desnacionalizar as nossas províncias do Ultramar.

O que se dá ao Seminário das Missões é uma miséria; com um subsidio dêsses, não há maneira de se modernizar o ensino do missionário, de modo a satisfazer por completo o que dele se deve exigir actualmente.

Nada se pode fazer com esta pequena verba.

Sr. Presidente: terminando direi mais uma vez, que, eu não vim discutir o orçamento porque isto não é um orçamento; apenas quis apresentar estas leves considerações.

O Sr. Eusébio Leão: - Sr. Presidente: o orçamento é apresentado por forma tal que não se pode discutir e por isso eu limito-me a pedir ao Sr. Ministro das Colónias que o próximo ornamento, faça todo o possível por que venha como a comissão no seu parecer indicou; organizado de maneira que nós possamos formar uma ideia bem nítida e clara das receitas e despesas das colónias.

Como estamos no dia 29 vemo-nos obrigados a aprovar êste orçamento sem o poder estudar e discutir.

Felizmente estamos animados das melhores intenções de cooperar lialmente em beneficio do país e das colónias, e partindo desta hipótese, é que aprovo êste orçamento e aprovarei outros em condições análogas.

Tenho dito.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Nunes da Mata: - Desejo explicar que êstes 12 contos se referem só ao subsídio do Seminário de Sernache do Bomjardim e, p01 tanto, não constituem toda a despesa das missões.

O Sr. Faustino da Fonseca: - Protesto contra a inclusão de verbas destinadas às missões católicas.

A transformação do indígena há-de ser operada pela escola-oficina, pelo médico, pelo agrónomo.

Findou a missão do padre.

Por toda a parte se reconhece que a cristianização de africanos e de asiáticos os desmoraliza.

Nesta altura o Sr. Mata pede-me que mão prossiga, porque se pensa em nomear uma comissão para estudar a transformação das missões.

Não aceito a indicação.

A República tem quinze meses, já devia ter cortado a legação do Vaticano, e as missões jesuíticas.

Quanto mais nos afastamos da data revolucionária, tanto mais difícil é liquidar com o passado, porque os monárquicos disfarçados em adesivos, galgam por cima de nós, e mantêm à outrance a sua obra.

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É como se esbofeteassem moralmente os republicanos.

Acabemos por uma vez com êsses traços do passado, que nos empobrecem e nos aviltam.

O Sr. Ladislau Piçarra: - Pedi a palavra não para discutir o Orçamento, mas somente para dizer o seguinte.

Esta questão das missões ultramarinas é uma questão muito delicada e muito complexa. (Apoiados).

Há uma comissão que está incumbida do estudo da transformação do colégio das missões ultramarinas.

Eu só peço que essa comissão apresente o mais breve possível os seus trabalhos e direi que, na minha opinião, os seus intuitos devem visar a que êsse colégio tenha uma feição inteiramente civil.

E mais nada.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Ministro das Colónias (Freitas Ribeiro): - Sr. Presidente, quando fui chamado para a pasta das colónias, já o orçamento que está presente a esta Câmara tinha sido organizado e entregue no Ministério das Finanças: não tive pois interferência na preparação dêsse documento.

Tenho por assim dizer a certeza de que o contracto a que se refere a verba de 80 contos de réis relativa ao cabo submarino termina em Junho próximo; assim mo afirmou o Sr. Director Geral das Colónias.

Com respeito à verba pertencente ao caminho de ferro de Ambaca, julgo que a verba deve ser de 605 contos de réis e não 555.

A economia futura do contracto é de 125 contos de réis.

Quanto à verba destinada a missões ultramarinas, ela seria diminuta e insuficiente, se não se referisse só ao colégio de Sernache de Bomjardim.

Há uma comissão encarregada de reformar êste instituto e organizar as missões que em meu entender devem ser laicas.

Em todo o caso, êste problema das missões ultramarinas é complicado.

O subsídio a algumas missões tem. que continuar a dar-se em África.

Mas o Govêrno não descurará o estudo dêste assunto.

Quanto à verba do déficit de Angola, devo declarar que ela deve ser muito maior, mas não tenho ainda as bases para poder garantir qual êle seja, porque alguns orçamentos ainda não chegaram ao meu Ministério, apesar de se terem mandado pedir.com toda a urgência.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Presidente: - Não está mais ninguém inscrito, vai votar-se a generalidade do orçamento do Ministério das Colónias.

Posto à votação foi aprovado.

Entra em discussão na especialidade.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o primeiro capítulo - Despesa ordinária.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como ninguém pede a palavra, vai votar-se.

Posto à votação, foi aprovado, assim como os restantes capítulos.

O Sr. Presidente: - Vai ler-se o relatório da comissão do Senado relativo ao orçamento do Ministério da Marinha.

N. 17-(g)

Senhores Deputados. - A comissão de finanças, tendo notado que a base que serviu à organização do Ministério da Marinha não está certa, porquanto se entrou em consideração com diversos navios - Tavira, S. Rafael, Álvaro Caminha, Salvador Correia, Dily, Ibo - que já foram abatidos ao serviço da armada; vista, no entanto, a manifesta falta de tempo de fazer as competentes correcções e por que as quantias não despendidas, mas autorizadas, revertem por lei para o fundo de defesa naval, propõe à aprovação da Câmara o orçamento do Ministério da Marinha tal como foi apresentado, consignado, porem, neste parecer aquele facto para que se evite a sua repetição em orçamentos futuros.

Consigna por último, a vossa comissão de finanças, o desejo de que no próximo orçamento a despesa venha discriminada por cada navio e por cada estabelecimento dependente do Ministério da Marinha.

Sala das sessões da comissão de finanças, em 27 de Dezembro 1911. = Inocêncio Camacho Rodrigues = Tomé de Barros Queiroz = José Barbosa = Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães = Aquiles Gonçalves Fernandes = Álvaro de Castro.

Senhores Senadores. - A vossa comissão de finanças, tendo apenas algumas horas para apreciar a proposta do Orçamento do Estado relativo ao Ministério da Marinha, vindo da Câmara dos Deputados, não pode fazer dele a cuidadosa análise que o assunto pela sua importância exige; e menos ainda pode propor as alterações que poderiam parecer vantajosas, pela absoluta falta de tempo para que a referida proposta volte à Câmara dos Deputados.

A vossa comissão limita-se, pois, a fazer apenas algumas considerações que, embora não produzam o seu efeito no presente Orçamento, deverão, contudo, ser consideradas na elaboração e discussão do Orçamento do futuro ano económico.

Dum total das despesas orçadas de 78:061 contos de réis, cabem à marinha 4:378 contos de réis na despesa ordinária e 36 contos de réis na extraordinária, ou seja um total de 4:414 contos réis. Comparada esta importância com a do Orçamento anterior, de 3:975 contos de réis, acha-se a diferença para mais, na despesa ordinária, de 403 contos de réis, a que em rigor devemos juntar os contos de réis provenientes da despesa que era feita com a Direcção Geral do Ultramar, e que já não figura no presente Orçamento; o aumento é, portanto, de 456 contos de réis.

É aquela cifra bastante reduzida para uma nação, como a nossa, que só no mar pode encontrar o campo natural da sua expansão, que por mar faz a quási totalidade do seu comércio e recebe parte das suas subsistências, que tem um domínio colonial importantíssimo e uma extensa fronteira marítima na metrópole; o que tudo exige uma marinha de guerra adequada à defesa de tão vitais interesses e da própria nacionalidade.

E não se diga que estas despesas são improdutivas; as despesas com a marinha de guerra são consideradas por todas as nações que se sabem administrar, e que dependem dum grande comércio marítimo, como um prémio de seguro para êsse comércio; entre nós, cabe à marinha, alem da defesa nacional, conservar livres as vias comerciais que ligam a metrópole aos nossos domínios do ultramar e aos países onde estão estabelecidos importantes centros de colonização nacional, com as consequentes relações comerciais, a cujo desenvolvimento necessário se torna a protecção duma marinha de guerra. As despesas com a defesa nacional representam em grande parte circulação de riqueza dentro do pais, e não podem por isso considerar-se como dinheiro desperdiçado.

A razão de ser da nossa existência como nação colonial

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12 DIÁRIO DO SENADO

está no desenvolvimento económico que procurarmos ciar aos nossos domínios de alêm-mar; portanto, na importância que tomar o comércio marítimo que se fizer entre êsse a metrópole, assim como aquele que resultar da colocação dos produtos das nossas colónias nos mercados mundiais. Com a importância dêsse comércio, crescerá a da marinha de guerra, que tem como um dos seus principais fins a sua protecção; e a despesa que com ela fizermos será sempre pequena, se a compararmos com os prejuizos duma guerra que nos encontre desprevenidos, porque então sofreríamos não só a perda e destruição dêsse comércio, mas a das próprias colónias; porventura mesmo a nossa existência como nação estaria em perigo.

Comparando a percentagem das despesas totais atribuída à marinha em Portugal, com a que lhe destinam outras nações pequenas, com interesses sem dúvida menores no mar, vemos que, ao passo que a Holanda despende com a sua marinha cerca de 10 por cento e a Dinamarca 8 por cento do seu orçamento total, nós despendemos apenas õ,6 por cento. E se por outro lado compararmos as percentagens destinadas ao exército nestes países, com a do nosso, vemos que os números são 14,7 por cento para a Holanda, 13,7 por cento para a Dinamarca e 13.1 por cento para Portugal; o que nos leva a concluir que se as nossas despesas com a defesa terrestre são comparáveis às daqueles países, as que se referem à marinha de guerra estão bem longe ainda de se poderem comparar, sobretudo se atendermos á importância dos nossos interesses por mar.

Para a análise do Orçamento torna se necessário descriminar as verbas fixadas para cada serviço. Quisemos fazer uma comparação com os orçamentos das marinhas estrangeiras a fim de, determinando a parte proporcional a cada serviço, poder concluir a boa ou má utilização das importâncias correspondentes; mas, em muitos casos a descriminação é impossível, pela maneira como as verbas estão agrupadas; nestas condições a análise tem que ser necessariamente pouco rigorosa e muito incompleta, tanto mais que o tempo escasseia. A vossa comissão, tendo reconhecido que, dos diferentes orçamentos de marinhas estrangeiras, é sem dúvida o da marinha francesa o mais claro e o mais scientificamente disposto, estabeleceu, onde isso lhe foi possível, algumas comparações de ordem geral entre aquele orçamento e o nosso, que resume nas considerações que em seguida expõe.

No orçamento francês, a verba destinada a pessoal, compreendidos o pessoal civil, os operários dos arsenais e a Caixa de Inválidos, é de 35 por cento do orçamento total da marinha. Se lhe juntarmos a verba destinada a pensões, paga pelo Ministério das Finanças, (em França) cerca de 10,5 por cento, teremos um total de 45,5 por cento. A verba correspondente no nosso Orçamento é de 3 034 contos de réis ou 68,7 por cento (comparada com 2:956 contos de réis ao Orçamento anterior), e que é manifestamente exagerado. Sem dúvida, sendo a nossa marinha composta do pequenos navios, as despesas com pessoal devem ser proporcionalmente superiores às que fazem as marinhas que possuem grandes unidades, visto que o número do pessoal das guarnições dos navios está longe de ser proporcional às tonelagens. Além disso, a despesa com a administração central e com outras comissões em terra é quási independente da tonelagem da marinha.

Deve aqui notar-se de passagem que, quando muitas classes foram favorecidas depois da proclamação da República, só a classe dos oficiais da armada foi prejudicada, suspendendo-se-lhes imediatamente as promoções e reduzindo-se a ração nos vencimentos de embarcados.

Figura no Orçamento com uma verba importante a despesa com os oficiais alêm dos quadros; ao passo que a despesa com os quadros é de 422 contos de réis, a dos oficiais que estão fora é de 190 contos de réis, ou quási metade.

Impõe-se uma remodelação, pela qual certas comissões, que colocam os oficiais fora do quadro, passem a ser consideradas como serviço normal da arma, evitando se quanto possível movimentos fictícios, com agravamento de despesa.

Igualmente aos oficiais em licença ilimitada, sem vencimentos, se atribui verba no Orçamento, como se efectivamente recebessem, porque dum momento para outro podem voltar ao serviço; é necessário estabelecer normas para regular a sua volta ao quadro à medida que se vão dando vagas, porque doutro modo o Orçamento tem necessariamente de andar muito longe da realidade.

Figuram tambêm no Orçamento com 76 contos de réis os oficiais em serviço noutros Ministérios, alguns dos quais deveriam ser pagos pelos Ministérios onde servem.

Da verba pertencente ao pessoal, 452 contos de réis, ou sejam 10,3 por cento do orçamento de marinha (comparado com 382 contos de réis no orçamento anterior) são destinados ás classes inactivas; êste aumento de 70 centos de réis fez-se principalmente sentir na parte referente a oficiais (com o armamento de 49 contos de réis), o que é em grande parte devido á nova lei de reformas, que necessariamente tem de ser revista, de modo a conciliar quanto possível os interesses do Estado com os direitos legitimamente adquiridos, e ao grande número de oficiais reformados como consequência da mudança de Instituições.

Mas, se estas verbas, em si, podem parecer exageradas, muito mais se tornam ainda quando comparadas com as destinadas a material, englobadas no Orçamento sob o nome impróprio, e nada explicito, de "despesas gerais", nas quais entre outras se inclui o material para construção e reparação de navios, abastecimentos de toda a ordem (excepto subsistências) e o combustível.

Assim, nota se que de 602 contos de réis, atribuídos à Direcção das Construções Navais, apenas 236 contos de réis se destinam a material para laboração da fábrica, incluindo reparação e conservação de navios, máquinas adquiridas para navios novos, etc., o que chega a ser irrisório; ao passo que se despendem 366 contos de réis para pagamento de pessoal.

Se compararmos estas verbas com as que se referem à construção naval na marinha francesa, na parte de manutenção e reparações (para não fazermos a comparação muitíssimo mais desfavorável nas construções novas), vemos que nas despesas, de construção naval se consomem 3:59,2 contos de réis em pessoal e 3:755 contos de réis em material; isto é. naquele país, a verba de pessoal é ainda, para a manutenção e reparação, inferior á de material.

E aqui devemos notar o aumento de 78 contos de réis nas férias do pessoal operário.

E da maior justiça que o Estado melhore as condições de vida do pessoal trabalhador, mormente quando se trata dos seus próprios funcionários; mas, ao sacrifício do Estado deve corresponder um aumento compensador no trabalho produzido, dentro do que é legítimo desejar.

A situação deplorável no que se refere à proporção de pessoal para material dificilmente pode ser melhorada pela redução do pessoal; por outro lado, é inadiável a necessidade de se adquirir o material indispensável á nossa defesa naval.

Só depois de feita essa acquisição é que, em orçamentes futuros, poderemos atribuir verbas em proporções aceitáveis, ao pessoal e ao material, o que não quere dizer que não procuremos desde já aproximar-nos dessas proporções.

No orçamento da marinha francesa já várias vezes referido, nota-se que as verbas atribuídas às novas acquisições de material e ao aprovisionamento do stock de guerra

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absorvem cêrca de 50 por cento (ou 38:000 contos de réis) do orçamento total de marinha.

No nosso orçamento, como as verbas estão escrituradas, não é possível saber qual a parte dos 602 contos de réis, que se destina a construções novas, e a que se refere a manutenção e reparação.

Basta, porem, notar que o total é apenas de 14 por cento do orçamento, para se compreender como será insignificante a parte que se refere a construções novas.

É, pois, nesta classe de verbas que se deve procurar fazer incidir os aumentos dos orçamentos futuros, de modo a ir fazendo desaparecer a desproporção actual, em relação aos orçamentos de todas as marinhas.

Não se encontra nos orçamentos da despesa extraordinária importância alguma destinada às despesas feitas com as companhias de desembarque, que durante meses tem estado na fronteira norte do país; assim como não existe verba para o provável aumento de despesa que deve ter acarretado o cruzeiro na costa, dalguns navios.

Nada tambêm se prevê, por emquanto, relativamente às despesas a fazer com as medidas de fomento á marinha mercante.

As carreiras em estudo para a America do Norte e do Sul, terão de ser necessariamente subsidiadas, pelo menos nos primeiros tempos.

E bom será que a êste assunto se dê toda a atenção que merece, como um factor indispensável do nosso progresso económico, e uma das principais razões de ser do aumento da nossa marinha de guerra.

Um serviço que tem sido descurado, e figura no orçamento apenas com uma verba irrisória, é o que se refere ao levantamento hidrográfico da costa de Portugal; e tanto mais, quanto parece certo que somos o único país da Europa que não tem feito o levantamento das suas costas, não só para fins de navegação, como muito particularmente para servir como carta de pescas.

Ainda há pouco nos vimos embaraçados pela falta de elementos sôbre as linhas de igual profundidade da nossa costa, que nos eram pedidos pela comissão internacional encarregada da elaboração da carta do mundo.

Ao passo que a França despende 151 contos de réis, a Alemanha 218 contos de réis e a Itália 43 contos de réis, nós, que temos quási tudo por fazer na metrópole, nas ilhas e nas colónias, despendemos apenas 4 contos de réis; isto é, o mesmo que se gasta, por exemplo, com trabalhos tipográficos.

Algumas verbas existem ainda que a uma ligeira análise se afiguram exageradas, e outras desnecessárias; como, porem, estas verbas, quando não. despendidas, revertem para o fundo de defesa naval, aí as iremos depois encontrar, quando for presente ao Parlamento a conta da gerência.

Em conclusão: a vossa comissão, na impossibilidade de propor alterações, limita-se a propor vos que aproveis o Orçamento como êle veio da Câmara dos Deputados, fazendo votos por que o novo orçamento apresente não só uma mais justa distribuição de verbas, como tambêm um mais racional agrupamento das mesmas por serviços, de modo a torna Io mais claro, permitindo uma fácil e rápida interpretação.

Sala das sessões da comissão de finanças do Senado, 29 de Dezembro de 1911. = José Maria Pereira (Presidente) = Peres Rodrigues = José Miranda do Vale = Tomás Cabreira = José Nunes da Mata = Ladislau Piçarra = Abel Botelho = Alfredo Botelho de Sousa.

Leu-se na mesa e poz-se em discussão na generalidade.

O Sr. Ladislau Parreira: - Sr. Presidente: êste orçamento do Ministério da Marinha continua a série dos orçamentos do mesmo Ministério do tempo da monarquia!

A confusão é enorme para quem não seja do métier.

Pensava eu que, uma vez implantada a República, dentro daquele Ministério, não se pensaria noutra cousa senão em cortar abusos, igualar diferenças de vencimentos, e aceitar de boa mente sacrifícios, para que pudéssemos dizer ao povo que, se êle queria uma defesa pelo lado do mar, era indispensável que aceitasse sacrificios, e ate à gente rica que era preciso pagar mais.

Mas qual, porém, não foi o meu espanto quando poucos dias depois da Revolução, tendo o Govêrno Provisório aceitado algumas indicações dos oficiais revolucionários, para que se fizessem grandes cortes nos vencimentos de oficiais, e feitos êsses cortes, que a todos punham no mesmo pé de igualdade, com o que se conseguiu só de uma penada uma economia para cima de 80:000$000 réis, provenientes de rações a dinheiro a oficiais, e gratificações especiais, que una tinham, e outros não tinham, poucos dias depois dizia, foram restabelecidas em parte essas gratificações, e mais tarde, por exigências e pressão do operariado sôbre o mesmo Govêrno, foram absorvidas todas essas economias, que, ascendiam àquela importante soma.

Foram então aumentados os salários no Arsenal de Marinha a todos os operários, pobres e remediadas, famintos e de boa mesa, e até àqueles que passeiam ao domingo com a família bem vestida, e vão à noite ao animatógrafo.

Não me revolta, Sr. Presidente, que pelo facto de se terem feito economias no vencimento de certos oficiais, alguns de bem magros vencimentos, elas passassem para êsses desgraçados operários que ganhavam apenas 500 réis, e se lhes aumentasse meio tostão e um tostão, mãe sim que aos operários-mestres, ou contramestres, ou operários chefes, que ganhavam 1$200 réis e 1$500 réis, se aumentassem dois ou três tostões e mais.

Isto foi positivamente estragar com uma penada uma economia que se havia conseguido com outra penada, e que natural era que fôsse aumentar o fundo de defesa naval, simplesmente destinado a aquisição de material naval.

Da mesma maneira, na parte que diz respeito a subsídios a oficiais, o orçamento está de forma tal que qualquer pessoa estranha à marinha é incapaz de o perceber.

Naturalmente do Sr. Ministro das Finanças a repartição de contabilidade do Ministério da Marinha recebeu ordem de fazer o Orçamento por capítulos e artigos e depois do trabalho feito a propósito de cada serviço, determinar no fim o custo deles.

Acontece, porém, que há serviços, tais como a Escola Naval, onde existem lentes que não fazem parte do quadro e que, portanto, não figuram propriamente nos quadros dos indispensáveis para guarnecer os navios, majoria e outros serviços que deles dependem, e contudo não entram no custo dêsse serviço.

É claro que, se não existisse a Escola, não existiam oficiais colocados lá fora do quadro em comissão especial e não teria isso dado origem a promoções. Logo o custo do serviço da Escola Naval importa no material que para lá for, nos alunos que lá se instruem, e tambêm nos vencimentos de todos os seus lentes, demonstradores e mais oficiais.

Não tenho tempo para discutir todos êstes assuntos com a devida largueza.

Fecho os olhos e aprovo o Orçamento. Sou obrigado a dar-lhe o meu voto, mas espero que o próximo futuro Orçamento do Ministério da Marinha seja a expressão da verdade, e expressa com tal clareza, que todos o possam compreender.

O mapa do armamento naval, bem feito e bem previsto, e relações anexas com nomes de todos os que excedem (pessoal militar e funcionários civis), os respectivos quadros, completará esta obra tam importante como é o Orçamento duma Democracia.

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E necessário rever todos os decretos da ditadura.

Temos, por exemplo, ainda, o Arsenal de Marinha, onde meteram dentro do quadro nada menos do que 1:400 operários; quando o serviço se faria talvez com metade dêsse pessoal.

No Arsenal de Marinha havia operários que pertenciam ao quadro, e operários supranumerários e extraordinários.

Êstes últimos eram despedidos quando não convinham ou não eram precisos ao serviço, e lá iam arranjar trabalho na indústria particular.

Pois o Govêrno Provisório meteu no quadro todos, ou quási todos êsses operários supranumerários e o resultado é que se aumentou a despesa e não se trabalha quási nada.

Concederam-lhes as oito horas de trabalho, aumentaram-lhes os salários, e a verdade é que no Arsenal se trabalha hoje menos de que no tempo da monarquia.

Aos oficiais foi um verdadeiro banquete de gratificações!

A classe operária tem todas as minhas simpatias, e eu não quero de maneira nenhuma opôr-me a que lhe sejam concedidas as regalias a que ela tem direito, mas não posso deixar de me revoltar contra o facto de se garantirem direitos a quem não podia exigi-los.

Aprovo o Orçamento, repito, mas espero que o Sr. Ministro da Marinha, na confecção do futuro Orçamento do seu Ministério, determine aos seus funcionários que o organizem com a máxima clareza e de forma que toda a gente o compreenda e entenda.

O Sr. Silva Barreto: - Mando para a mesa o parecer da comissão de instrução acerca do projecto de lei, já aprovado na Câmara dos Deputados, que diz respeito à suspensão da reforma do ensino primário.

Peço a V. Exa. que ponha em discussão êste parecer antes do encerramento da sessão.

E se o projecto não for aprovado, no dia 1 de Janeiro as câmaras municipais tem de cumprir o regulamento.

Consultada a Câmara, resolveu que o projecto seja discutido antes do encerramento da sessão.

O Sr. Ministro da Marinha (Celestino de Almeida): - Pedi a palavra, quando o Sr. Senador Ladislau Parreira disse uma cousa a que eu queria fazer ligeiros reparos. Depois, como S. Exa. continuou a falar, reconheci quási a inoportunidade de usar da palavra em seguida a S. Exa., mas, como a tinha pedido, direi o que estava no meu espírito ao pedir a palavra. A verdade é que êste orçamento é inteiramente verdadeiro e obedece ao que está preceituado pelo regulamento de contabilidade para a organização dos orçamentos dêste ano.

Êste orçamento tem muitas das confusões a que o ilustre Senador se referiu mas, ainda assim, aqui, faz-se uma distinção clara entre todos os serviços, no fim de qualquer deles.

O Sr. Ladislau Parreira: - A base principal do orçamento da Marinha é o mapa do armamento naval. Ora êsse mapa que tenho aqui está erradíssimo, cousa que, aliás, já tinha sido notada na Câmara dos Deputados.

O Orador: - Mesmo no que se refere ao armamento naval, S. Exa. sabe melhor do que eu, porque é um profissional distintíssimo, que se calcula, não no principio do ano económico, mas meses antes, qual será o movimento necessário para êste pessoal de embarque, etc., arbitrando uma cifra para fazer face às despesas com o pessoal, para o número de navios e êste cálculo é feito por uma estimativa, na qual tam fácil é ser exagerado como ficar perto da verdade.

No orçamento que eu elaborar durante a- minha gerência, farei a diligência para que as contas sejam tam exactas quanto possível, mas inexactidões desta ordem há-de haver sempre.

E digo que farei a diligência para que tudo seja o mais exacto possível, porque tenho em mim que tudo aquilo que tiver de ser gasto: seja o mais limitado possível, porem, nesta parte, não serei de grandes exigências pela razão de que, desde o momento em que desapareçam as circunstâncias imprevistas que tem havido neste ano e em virtude das quais os navios de guerra tem, mais ou menos, andado em constante serviço, embora não haja as necessidades de ordem política que tem havido até agora, haverá a necessidade de ordem profissional, e eu não os deixarei estar parados, porque os navios, bons ou maus, se existem, é para servirem. (Apoiados).

Quanto ás despesas referentes ao Arsenal, estas medidas foram improdutivas, mas S. Exa. sabe perfeitamente que elas tem de ser cumpridas em virtude dum decreto com fôrça de lei, pelo qual grande número de operários adquiriram direitos que hoje ternos de respeitar.

Eu concordo com S. Exa. quanto à gerência do Arsenal de Marinha; eu mesmo tenho limitado a minha interferência ao seguinte: ema dizer aos directores dos serviços que façam unicamente a diligência de aproximar a administração do Arsenal de Marinha quanto possível, da administração particular.

Emquanto a outro ponto que S. Exa. notou como uma exagerada previsão do orçamento do Ministério da Marinha, o que aqui se encontra, há-de encontrar-se pouco mais ou menos no orçamento que se seguir, porque êste tem de ser feito muito rapidamente.

Mas deixe-me dizer a V. Exa. que eu vi outros orçamentos doutros Ministérios, e que o da Marinha talvez seja o que mais me satisfaz.

Isto vem a propósito dizer-se porque o orçamento tem de ser feito a toda a pressa, pois deve ser apresentado ao Sr. Ministro das Finanças a tempo dele o poder estudar e apresentar o Orçamento Geral do Estado até ao dia 15 de Janeiro. Portanto não é possível, neste curto espaço de tempo, organizar um orçamento como devia ser.

O Sr. Ladislau Parreira: - Eu compreendo que durante o pouco tempo que temos, não é possível apresentar um orçamento muito diferente dêste, mas o que eu desejo é que êle seja discutido depois largamente, e com o orçamento, os decreteis do Govêrno Provisório.

O Orador: - Ao Senado fica o direito de discutir largamente; emquanto à elaboração do orçamento, pela minha parte desejaria que ela fôsse feita em moldes diferentes, mas a estreiteza do tempo não o permite.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Eusébio Leão: - Pedi a palavra para mais uma vez declarar que sinto ser obrigado a votar o Orçamento, sem aquela discussão que todos desejavam.

Eu declaro a V. Exa. que estou quási arrependido de não ter votado mais um duodécimo, para poder discutir mais largamente o Orçamento, mas as cousas são o que são, e nós hoje temos de o votar.

Desejo apenas notar ao Senado uma questão que eu julgo das mais importantes para o país, que é a das classes inactivas, aquelas que não prestão serviço algum.

Só 10 por cento das despesas dêsse Ministério são para pagar a pessoal que não presta serviços.

O Sr. Nunes da Mata: - Pedi a palavra, quando falava o Senador Sr. Ladislau Parreira, porque não estava presente o ilustre Senador Sr. Azevedo Gomes, e como seu conhecedor do facto a que S. Exa. aludiu, quero jus-

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tificar de certo modo, ou antes, explicar a razão por que o Ministro da Marinha do Govêrno Provisório aumentou os vencimentos do pessoal operário do Arsenal de Marinha.

Em primeiro lugar foi porque foram aumentados os vencimentos ao pessoal doutros Ministérios e em segundo lugar porque os operários do Arsenal de Marinha, tendo tido conhecimento de que tinham sido aumentados os vencimentos dêsse pessoal, reclamaram e o Ministro da Marinha viu-se naturalmente obrigado a conceder lhes tambêm aumento.

Já que estou com a palavra, Sr. Presidente, devo dizer que, como V. Exas. sabem, os orçamentos são feitos em virtude do que determina a lei, de modo que muitas vezes na despesa aparecem umas verbas maiores do que realmente devem ser.

Se falo nisto é porque desejo explicar o que se dá com respeito à Escola Naval, onde, pela lei, devem existir cinco ajudantes e actualmente existem apenas dois; deviam existir trinta aspirantes e há apenas seis ; sucedendo o mesmo com alguns outros membros do pessoal da Escola. Ora no orçamento vem e deve vir a verba correspondente ao pessoal determinado pela lei.

O Sr. Ladislau Parreira: - É que a lei está mal feita.

O Orador: - Parece-me que V. Exa. está em equívoco, pois nos orçamentos pode haver sobras, mas é bom que nunca apresentem deficits.

Os orçamentos devem ser feitos na previsão de que a lei seja cumprida, a fim de que, quando os Ministros cumprirem a letra expressa da lei, não haja deficits imprevistos, deficifs que fatalmente se dariam e que é de boa administração que nunca haja.

O Sr. Ladislau Parreira: - Na Escola Auxiliar de Marinha há umas pequenas fábricas ou oficinas para onde eram deslocados alguns operários.

Pois agora essas fabricas tambêm já tem os seus quadros de pessoal.

O mesmo se dá com a escola de Vale de Zebro, onde tambêm há pequenas oficinas.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Correia Barreto: - Sr. Presidente: pedi a palavra para desfazer um equívoco do Sr. Senador Nunes da Mata.

Afirmo a S. Exa. que, durante a minha gerência da pasta da guerra, não se fizeram aumentos de vencimento ao pessoal do Arsenal do Exército, nem passaram para dentro dos quadros os operários adventícios dêsse estabelecimento do Estado.

Era simplesmente isto que tinha a dizer.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Botelho de Sousa: - Pedi a palavra por ser o relator do parecer sôbre o projecto do orçamento de Marinha.

Êste orçamento, como a comissão diz no seu parecer, que não chegou a ser publicado, é necessário aprová-lo tal como está, porque não há tempo para lhe introduzir emendas que teriam de voltar à Câmara dos Deputados; por isso eu o aprovo; mas, apesar de relator, não o defendo. (Apoiados).

Nào desejo criar dificuldades, nem mesmo pertenço a nenhum grupo político; em todo o caso, há certos pontos neste orçamento que se não podem deixar sem reparo; a êles se fez referência no parecer da comissão; mas. como em geral não foi ouvido, eu direi alguma cousa sôbre o assunto.

Não há dúvida nenhuma que êste orçamento está confuso.

É claro que a culpa não pertence ao Sr. Ministro nem à Repartição de Contabilidade, onde deve ter sido elaborado. Talvez isso seja o resultado da lei de contabilidade. Mas o facto é que está confuso, como disse o Sr. Parreira, com cujas considerações concordo plenamente.

Quem não seja técnico dificilmente pode entender certas verbas que aqui estão. E um exemplo basta para reconhecer isso. No orçamento estão englobadas sob o nome de despesas gerais, o que é bem pouco explícito, todas as despesas que não se refiram ao pessoal. Estas despesas são: material para construções e reparações, abastecimentos e sobressalentes de toda a espécie, combustível para os navios e arsenal, verbas de diferença de câmbios... Tudo isto dentro desta rubrica. E necessário que estas verbas sejam discriminadas competentemente. Assim não há maneira de saber como são aplicadas.

Com relação ao aumento de vencimento de operários, é justo que o Estado se interesse pela melhoria de situação das classes trabalhadoras, mas em todo o caso, o que é necessário é que a êsse aumento corresponda a boa vontade dos operários, na produção de trabalho. (Apoiados).

Assim no Arsenal nós vemos que 366 contos de réis são para o pessoal, e 236 contos para o material. Nau há nenhuma fábrica na industria particular, onde se dê um facto semelhante.

Com respeito aos oficiais fora do quadro, as verbas que aqui estão no orçamento tinham que aparecer assim; não havia outra maneira de as pôr; mas chega-se a esta conclusão tristíssima: ao passo que os oficiais do quadro custam 420 contos de réis, os que estão fora do quadro absorvem 190 contos de réis, ou seja quási metade. Há oficiais em serviços de comissões chamadas especiais, e que por isso saem fora do quadro, quando o serviço que desempenham é tudo p que mais propriamente se pode chamar serviço da arma. É o que sucede por exemplo na Escola Naval, cujos lentes estão fora do quadro, e não se pode dizer que o serviço de instruir e educar os futuros oficiais não seja um serviço da arma. O que é necessário é refundir o quadro, fazer com que os oficiais em certas comissões, hoje especiais, pertençam ao quadro; e fora do quadro só estejam os que prestam serviço noutros Ministérios.

Tudo o mais são sofismas que servem apenas para produzir movimentos fictícios nos quadros, e das vagas para virem as promoções, o que até certo ponto é desculpável, mas não é justo.

No orçamento de Marinha há necessariamente grandes dificuldades em estabelecer um cálculo aproximado das despesas a efectuar em futuros às vezes distantes, com os diferentes serviços.

O Sr. Ministro da Marinha (interrompendo): - Hão de aparecer no exercício futuro.

O Orador: - De acôrdo. No Orçamento aparecem em certos casos despesas maiores do que realmente elas virão a ser. Assim, por exemplo, incluem-se os oficiais que estão com licença ilimitada, dando assim a impressão de que êles recebem os seus vencimentos, quando de facto, nada recebem. Mas como de um momento para outro, podem voltar ao serviço, é necessário consignar no Orçamento verba para lhes pagar. É necessário remediar isto dalgum modo, regulando a maneira como êstes oficiais devem voltar ao serviço, por exemplo, à medida que se fossem dando vagas nos respectivos quadros. Doutro modo, arriscamo-nos a que num momento êles venham congestionar os quadros.

O Sr. Ministro da Marinha (Celestino de Almeida): - Eu entendo que é melhor acabar se com as licenças ilimitadas.

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16 DIÁRIO DO SENADO

O Orador: - Não sei se isso será conveniente; eu não iria tão longe, mas V. Exa. sabe talvez melhor do que eu o que convêm.

E sôbre o Orçamento, mais nada é possível dizer.

Resta-me congratular-me com o Sr. Ministro da Marinha, por ver que S. Exa. é tambêm de opinião que os navios não se fizeram para estacionar nos portos; fizeram-se para navegar no alto mar; é no mar que se instruem e educam guarnições; o estacionamento é prejudicial à disciplina, traz o abatimento, o desleixo, uma quási compreensão de inutilidade: é isso que é preciso evitar. Ninguém mais deseja rio que eu o levantamento da Marinha. Foi a esperança de poder concorrer para êle, quási a única causa que me trouxe ao Parlamento. Serei, pois, o primeiro a apoiar os sacrifícios que o Govêrno pedir ao Parlamento para a defesa nacional, mas é preciso que eu me convença de que êsses sacrifícios serão bem compensados. E preciso que desde já se comece trabalhando, que se tomem todas as medidas tendentes a assegurar uma preparação adequada ao novo material. Doutro modo, eu serei tambêm o primeiro a opor-me a que o país faça um sacrifício que possa resultar inútil.

O Sr. Azevedo Gomes: - Sr. Presidente, Srs. Senadores nos primeiros meses do Govêrno Provisório fui procurado por uma comissão de operários do Acenai de Marinha e Cordoaria Nacional, pedindo a redução do tempo de trabalho a oito horas.

Alegavam que o Estado com isso lucraria, porque todo o pessoal trabalharia de melhor vontade, produzindo mais do que até então estava produzindo com as oito horas e meia regulamentares.

Esta pretensão foi atendida pelo Govêrno, porquanto não representava aumento de despesa, visto que a nieia hora que tinham a mais, era por aquele regulamento a compensação em traballio do salário que percebiam nos dias santos em que o não havia e êstes tinham desaparecido.

Foi, pois, um acto de justiça que se fez.

Dão-se, finalmente, as recompensas aos revolucionários de marinha, que vinham, sendo já asperamente reclamadas por alguns jornais da capital e entrou-se no período intensivo das reivindicações do proletariado, período que se tornou longo e verdadeiramente angustioso para o Govêrno Provisório.

O pessoal dos serviços fabris da marinha conseguiu da direcção técnica e administração a remodelação dos quadros e salários, aqueles baseados no trabalho normal das fábricas do Arsenal e Cordoaria, e êstes aproximando-os dos da indústria particular.

Representou êsse projecto um aumento de 82 contos de réis na despesa.

Não era esta a orientação que se tinha seguido no Ministério da Marinha, a fim de cooperar com o digno titular da pasta das Finanças no seu propósito firme de apresentar o Orçamento Geral do Estado sem déficit; para o que instantemente pedir aos seus colegas redução e não aumentos de despesas pelas suas pastas.

Com êste propósito, na Marinha havia se cortado o abono de rações e gratificações especiais aos oficiais, suspensão de promoções até a organização dos novos quadros e reduzido logo o dos almirantes.

Forte com tais actos e tendo confiança nos sentimentos patrióticos dos operários, dedicados republicanos, expus à comissão, lembrando a conveniência de aguardarem uma situação mais desafogada para a resolução dos seus em parte, justos desejos.

Só consegui que reduzirem muito as suas reclamações, visto considerarem flagrante injustiça ser só o pessoal fabril de marinha o sacrificado aos interesses do Estado e ao bom da República, dizendo que com uma boa administração quási podiam garantir que, pela sua assiduidade e boa vontade no trabalho os operários compensariam o aumento da despesa. O aumento que lhes foi concedido foi inferior ao que pediam, e isto depois de ter verificado que, atenta a atmosfera que então se havia criado em Lisboa, era inconveniente, senão perigoso, não atender às suas reclamações.

Á comissão, que tratava dos interesses dos operários, várias vezes me procurou, dizendo-me que, se eu não resolvia o assunto, deporia o seu mandato, atenta a excitação dos operários.

Foi nestas circunstâncias e creio que nos últimos dias do período legislativo do Govêrno Provisório, que levei o decreto a Conselho de Ministros, onde foi aprovado com relutância por parte das Finanças, porém eu estava convencido de que não seria prejudicial ao Estado, quer económica, quer politicamente considerado.

Soube ultimamente, e devo dizê-lo a V. Exa. e ao Senado, que os operários tem trabalhado menos ainda do que dantes.

Não é por falta de fiscais agaloados no Arsenal, que se lhes não vigia o trabalho que êles tem o dever de produzir, mas porque, de cima a baixo, ninguém quere tomar o odioso (sic) de os fazer entrar na ordem.

Consta-me tambêm que os operários justificam a falta do cumprimento dos seus deveres, dizendo que haviam sido roubados no tempo da monarquia e agora se compensavam.

Não é má justificação. Como tinham sido roubados no tempo da monarquia, passaram a roubar a República!...

É absolutamente necessário que tal estado de cousas cesse.

O Sr. Cupertino Ribeiro: - Pedi a palavra para justificar o meu voto na, discussão do Orçamento.

Eu voto esta parte do Orçamento e votarei todas as que lhe sucederem, como urna necessidade imprescindível para se poderem fazer as despesas do Estado.

É certo que essas despesas poderiam ser feitas por duodécimos, mas isso não satisfazia, visto terem sido criadas despesas novas.

Todos temos, é certo, a consciência de que, votando êste Orçamento, não votamos uma obra perfeita; mas a verdade é que se torna necessário aprovar êste documento Dará regularizar a nossa situação económica.

Fica pois, justificado o meu voto sôbre a matéria em debate.

Ninguém mais pedindo a palavra, foi o projecto aprovado na generalidade.

Posto em discussão, na especialidade, foram, aprovados, sem discussão, todos os capítulos.

O Sr. Presidente: - Vai ser posto em discussão o orçamento do Ministério do Fomento.

É lido na mesa o respectivo parecer que é do teor seguinte:

N.º 17-(e)

Senhores. - Não é a meio dum ano económico que o seu Orçamento pode ser modificado ou estudado convenientemente.

Dm Ornamento é uma previsão de despesas e receitas, e por isso só impropriamente poderemos chamar assim ao de 1911-1912. Metade das suas verbas estão irremediavelmente consumidas e apenas nos servem nesta altura para o estudo e preparação do próximo Orçamento. Sôbre isto muito poderá fazer o Congresso se paralelamente à sua discussão for modificando toda a vasta rede de leis e regulamentos anteriores a 5 de Outubro de 1910, que são indiscutivelmente as amarras duma série de anormalidades enraizadas no Orçamento do Estado e que à luz da razão, da justiça e duma honesta administração dos dinheiros públicos nada mais representam do que benesses distribuídas pelos dirigentes do antigo regime.

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Seria tambêm convenientíssimo encetar desde já a discussão das leis do Govêrno Provisório da República, porque enquanto o Parlamento se não pronunciar sôbre elas e as não firmar num determinado aspecto, impossível se torna prever o seu alcance económico e portanto as consequências orçamentais que daí derivam. Vem êste Orçamento um tanto mais agravado, é certo, do que o último Orçamento da monarquia, mas a verdade é que êsse agravamento provêm, não de abusos ou irregularidades, mas de certas medidas úteis que os dirigentes da respectiva pasta introduziram na vida do país com o fim de fomentar a sua riqueza.

Não são de aconselhar os cortes neste Orçamento por ser perigoso fazê-lo.

Há verbas que podem parecer exageradas - e sê Io hão, se as compararmos com o pouco que tem produzido durante anos e anos de inclusão tio Orçamento - mas to das elas são, em bom critério, deficientíssimas, quási ridículas, para satisfazer a mil necessidades do país. Assim a verba referente a Conservação, polícia e reparação de estradas (a pag. 17) que é de 598:494^700 réis, dá uma ° média de 50$000 réis por quilómetro, o que é insignificante principalmente naqueles distritos onde a ausência de caminhos de ferro obriga a fazer por elas todo o movimento.

As verbas referentes às escolas industriais, agrícolas e comerciais, são tambêm de tal forma acanhadas que o caprichoso corte d'alguma delas seria lamentável.

Pudéssemos nós ampliá-las, mesmo com sacrifício dalgumas escolas que inundam a vida portuguesa de diplomados cujas competências não são precisamente aquelas que o país requer neste momento para fomentar a sua riqueza - pudéssemos nós inundar o país de agricultores, industriais e comerciantes, ampliando e aperfeiçoando o respectivo ensino, e teríamos a certeza de triunfar económicamente dentro de pouco tempo.

De resto, todas as verbas dêste Orçamento são autorizadas por lei, e se algumas não merecerem porventura a vossa aprovação por inúteis e improdutivas, o remédio não estará evidentemente no simples corte duma verba mas antes na revogação da lei que a autoriza.

Pretender limpar a água suja dum poço, tirando-lhe apenas o que vem à superfície, é tempo perdido.

Não lhe limpando o fundo, a água aparece suja novamente. Revoguem-se as leis perniciosas que as suas respectivas verbas não mais voltarão ao Orçamento.

Não vai nisto a insinuação de que os Governos da República e o Parlamento já poderiam ter operado essa reforma - não.

Só por ignorância ou inimizade à República, poderá alguém fazer uma tão ingénua insinuação.

Nota-se neste Orçamento que o Govêrno da República tem fomentado tanto quanto possível a agricultura nacional, e o agravamento orçamental que daí provêm encontra uma feliz compensação nesta fonte de riqueza, cuja decadência ou vitalidade tem sido em Portugal a primeira causa de decadência ou vitalidade das outras fontes de riqueza - a indústria e o comércio.

É de louvar a criação da Repartição de Turismo, que representa o início duma indústria tão adaptável ao nosso país e cujo desenvolvimento pode trazer uma explêndida fonte de receita, e dar ao conforto português um aspecto civilizado e artístico.

Esta repartição onera o Orçamento com a despesa relativamente insignificante de 3:900$000 réis.

Chama-se a vossa atenção para averba de 800:000$000 réis, que no artigo 21.° figura sob a rubrica de "Conservação e reparação de edifícios públicos". Esta verba figurava na última tabela de despesas da monarquia com o valor de 374:000$000 réis, o que representa depois de feita a dedução, um aumento de despesa no valor de réis 426:000$000. Por indagações oficiais, sabemos que tem sido principalmente aplicada com os operários sem trabalho. É humano e é justo.

A pequena alteração que o país experimentou durante os primeiros meses do novo regime, enfraqueceu um pouco a procura de trabalho, e tanto bastou para que a crise operária - crise que a República já encontrou de pé - tomasse maior volume.

Daí, a necessidade do Govêrno tomar sôbre si mais essa despesa que, com o carácter que tem hoje, é meramente transitória.

Como se aproveita o trabalho dêsses homens?

Reparando edificios que não pensavam ver-se reparados?

Não seria mais útil o aproveitamento dêsse trabalho, para iniciar a construção do indispensável Palácio de Justiça ou pelo menos, para a reparação interior daquilo a que se chama Boa-Hora?

Esta verba, a do turismo, e todas as outras que foi preciso ampliar para fomentar a agricultura do país, trouxeram como consequência um aumento de despesa - despesa que deverá encontrar uma compensação nas receitas de seu próprio esforço.

Nem todas as verbas descritas neste Orçamento começaram a realizar-se no princípio do ano económico, a que se referem e algumas há que se conservam intactas.

Isto deve trazer uma pequena diminuição na despesa, que será encontrada no fechar das contas.

Chama-se muito especialmente a vossa atenção para e relação a pag. 65 dos diferentes empregados alêm de quadro, sob a rubrica de "extraordinários, adidos e em diversas situações".

Vem aí uma legião de "disponíveis".

A disponibilidade é uma espécie de estação de repouso cujo trabalho se cifra apenas nisto - receber um vencimento DO fim do mês e repousar. Não há nada mais cómodo para o empregado, nem mais corruptor para a vida burocrática de um país.

Isto dum empregado disponível quando há tanto que fazer, é situação que não faz sentido.

A lei dispõe que o empregado na disponibilidade apenas o possa estar dois anos, findos os quais ou regressa ao seu lugar ou se aposenta. Mas apesar desta curiosa lei admitir que um empregado posta estar dois anos de braços cruzados a sugar os cofres do Tesouro Publico, alguns há que se sentem tam bem na situação de disponíveis, que nunca mais voltaram nem se aposentaram.

A aposentação do empregado público torna-se dificílima. Para lhe ser concedida é indispensável que haja vaga na Caixa de Aposentações - vaga! - e como estas se dão de longe a longe, acontece que o Estado tem de ir aguentando o funcionário no Orçamento para não cometer a crueldade de o abandonar quando êle está efectivamente inválido.

Esta má organização da Caixa de Aposentações, com e abuso das disponibilidades, agrava a despesa dêste Orçamento.

Nos serviços agronómicos figuram cinco regentes agrícolas - curiosa cousa! - sem respectivo curso. Foram feitos regentes agrícolas por meio de uma lei da monarquia e dura lex sed lex.

Emfim, tantas outras cousas, que só tem um remédio - a revisão de todas as leis anteriores a 5 de Outubro e que dizem respeito à colocação, situação e aposentação dos empregados públicos.

A vossa comissão propõe-vos a aprovação dêste Orçamento para o ano económico de 1911-1912 com as alterações que se indicam.

Sala das sessões da comissão de finanças, em 26 de Dezembro de 1911. = Inocêncio Camacho Rodrigues = José Barbosa Tomé de Barros Queiroz = Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães = Álvaro de Castro = Aquiles Gonçalves Fernandes.

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Alterações à proposta do Orçamento do Ministério do Fomento, para o ano económico de 1911-1912:

[Ver valores da tabela na imagem]

Capitulo 1.° Secretaria Gerai do Ministério:

Artigo 1.º Adicionar a gratificação a um chefe de secção administrativa da Secretaria do Conselho Superior de Obras Públicas, que por lapso deixou de ser descrita
Artigo 3.° Eliminar o vencimento de um chefe de repartição, aposentado, que faleceu
Artigo 4.° Deduzir da verba para remunerações extraordinárias do pessoal superior
Artigo 6.° Deduzir da verba para expediente e outras despesas
Idem, idem, para assinaturas de publicações
Para menos
Capítulo 2.° Direcção Geral de Obras Públicas:
Artigo 2.° Eliminar os vencimentos de dois inspectores gerais - generais de divisão
Eliminar os vencimentos relativos ao segundo semestre de 1911-1912, dum inspector geral - general de divisão - gratificação
Eliminar a importância duma gratificação de exercício, dum engenheiro chefe de 1.ª classe, general de divisão, por lapso repetida no Orçamento
Artigo 12.° Eliminar o vencimento dum analista que faleceu e prestava serviço como empregado extraordinário de laboratório de estudos de resistência de materiais de construção
Artigo 31.° Deduzir da verba para expediente, material, etc., da Direcção Fiscal da Exploração dos Caminhos de Ferro
Idem, idem, da Comissão de Serviço Geológico
Para menos
Capítulo 3.° Direcção Geral da Agricultura:

Artigo 38.° Deduzir as verbas para ajudas de custa do pessoal que constitui a Comissão do Viticultura Duriense
Artigo 49.° Deduzir da verba para aquisição de material, etc., da Estação Trasmontana do Fomento Agrícola
Artigo 49.° Deduzir da verba para instalação e mobiliário da Junta do Crédito Agrícola
Adicionar à verba de 700$000 réis para jornaleiros dos armazéns do Mercado Central dos Produtos Agrícolas
Adicionar à verba para aquisição de artigos de secretaria, impressos da Secretaria do Mercado Central de Produtos Agrícolas
Inscrever seguidamente a epígrafe seguinte:
"Diversas despesas de material, fretes, propaganda comercial, informações, etc."
Na epígrafe, sob o título "Regime de cereais", eliminar as seguintes palavras "telegramas, franquias do correio"; e as verbas descritas sob o título "Diversos serviços" é totalmente eliminada
Artigo 51.° Deduzir da verba para despesas imprevistas e diversos encargos da Direcção Geral da Agricultura
Para menos
Capítulo 4.° - Direcção Geral do Comércio e Indústria.

Artigo 55.° Deduzir as seguintes verbas:

Da Escola Industrial Afonso Domingues:
1 professor
1 professor - vencimento de exercício
Da Escola Preparatória Rodrigues Sampaio:
1 professor
Da Escola Industrial Machado de Castro:
1 professor - vencimento de exercício
Artigo 68.° Deduzir da verba de despesas de expediente e eventuais da secretaria, telegramas oficiais, etc., da secretaria da Direcção Geral do Comércio e Indústria
Deduzir da verba para aquisição de livros e assinatura de publicações de interesse para o serviço da secretaria da Direcção Geral do Comércio e Indústria
Artigo 70.° Deduzir da verba para aquisição de impressos, etc., da secretaria da Direcção Geral do Comércio e Indústria
Para menos

Capítulo 5.° Direcção Geral dos Trabalhos Geodésicos e Topográficos:

Artigo 71.°:

Aumentar os vencimentos descritos para um tenente de engenharia, adjunto da Repartição da Geodésia, para os de capitães, sendo:

No sôldo
Na gratificação
Substituir a designação de "1 capitão de artilharia", pela de "1 capitão de engenharia".
Na Repartição de Topografia, substituir as palavras "1 chefe engenheiro de 1.ª classe", por "1 chefe engenheiro chefe de 1.ª classe".
Ao primeiro adjunto, substituir a palavra "major" pela "tenente-coronel", e adicionar:
A importância do sôldo
A importância da gratificação
Adicionar às gratificações dos dois capitães adjuntos a importância de 60$000 réis, por serem de 360$000 réis e não de 300$000 réis, como por engane estão descritos
Para mais

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SESSÃO N.º 17 DE 29 DE DEZEMBRO DE 1911 19

[Ver valores da tabela na imagem]

Capítulo 6.° - Despesas de exercícios e anos económicos findos:

Adicionar a seguinte verba:

Para pagamento aos herdeiros de um pagador falecido - seus vencimentos de 19 dias do mês de Setembro de 1908
Para mais

Resumo

Alterações para menos
Alterações para mais
Para menos

Senhores Senadores. - A primeira impressão que sofre quem rapidamente folheia o Orçamento do Ministério do Fomento é a pletora de serviços que a fúria centralizadora da monarquia acumulou neste departamento da administração Geral do Estado e que a legislação republicana ainda não logrou corrigir. A monarquia, centralizando nos Ministérios serviços que só às corporações administrativas competem, procurava fazer uma obra de defesa do regime; sabendo que nas terras pequenas o progresso local apaixona tão intensamente que se antepõe por vezes aos ideais políticos, punha dependente do poder central tudo o que representava melhoramentos materiais, por forma que as povoações onde a ideia republicana germinava, encontravam péssimas condições de desenvolvimento nos indivíduos que tinham interesses ligados à localidade.

Assim o quadro dos engenheiros, condutores, desenhadores, apontadores e mais pessoal das obras públicas que actualmente congestiona o orçamento geral do Estado necessita ser distribuído pelas administrações dos distritos e dos concelhos, dividindo-se tambêm equitativamente as verbas que o Estado hoje dedica à policia, construção e conservação de estradas e edifícios e manutenção dos serviços hidráulicos e de transportes.

Assim tambêm o serviço dos armazéns gerais agrícolas, adegas sociais, estações agrícolas e a fiscalização dos produtos agrícolas pode deixar de pesar tão fortemente sôbre o Orçamento Geral do Estado, passando grande parte dêstes serviços a serem atribuições dos corpos administrativos.

Outro cancro do orçamento do Ministério do Fomento que não escapa à mais superficial observação é a população burocrática que o enxameia; não teve a comissão tempo para distrincar no amálgama orçamental, o que se gasta com a administração e o que se destina ao fomento, mas êsse trabalho será feito no próximo orçamento, que em breve deve ser entregue ao nosso estudo, entretanto umas notas conseguiu a comissão coligir que são já bastante interessantes, é a proporção entre a burocracia graduada e a pequena burocracia. Assim, vejamos a organisação burocrática de 3 Direcções Gerais dêste Ministério:

Direcção Geral do Comércio:

4 Chefes de Repartição.
3 Chefes de secção.
3 Primeiros oficiais.
6 Segundos oficiais.
12 Amanuenses.

Direcção Geral de Obras Públicas:

4 Chefes de Repartição.
8 Chefes de secção.
2 Primeiros oficiais.
4 Segundos oficiais.
17 Amanuenses.

Direcção Geral de Agricultura:

4 Chefes de Repartição.
9 Chefes de secção.
1 Primeiro oficial.
4 Segundos oficiais.
8 Amanuenses.

O que dá as seguintes proporções:

Na Direcção Geral do Comércio há 1 chefe para 3 burocratas subalternos;

Na Direcção Geral de Obras Públicas há 1 chefe para 1,916 burocratas subalternos:

Na Direcção Geral da Agricultura há l chefe para um burocrata subalterno.

Os efeitos perniciosos do cancro burocrático não se sentem só na administração central do Ministério, alastram por todas as suas dependências, apresentaremos apenas um exemplo edificante. O antigo Instituto de Agronomia e Veterinária foi dividido por uma bem concebida reorganização em dois estabelecimentos de ensino destinados a substituir o diplomado à antiga portuguesa, por indivíduos capazes de contribuir para o desenvolvimento do progresso agrícola e pecuário da metrópole e das colónias; a escassez dos recursos orçamentais impediu porem que a nova organização se completasse, o pessoal de ensino não foi nomeado na sua totalidade apesar das suas atribuições terem sido acrescidas.

O movimento administrativo pouco aumentou, o número de alunos é o mesmo, o edifício e o director são ainda comuns, mas nada evitou que o polvo burocrático estendesse os seus tentáculos, o pessoal de ensino não se completou em nenhuma das duas escolas, mas o pessoal administrativo duplicou, ambas as secretarias tem o respectivo quadro completo e até com adidos.

Na relação do pessoal adido extraordinário e em diversas situações alem do quadro encontram-se nas situações de inválido, não presta serviço, na disponibilidade e na inactividade, 147 indivíduos, que representam para êste Ministério a despesa absolutamente improdutiva de réis 33:607$830.

Surpreende tambêm dolorosamente que no orçamento de 1911-1912, cujo início dista 9 meses da proclamação da República ainda figure na lista dos supranumerários da Direcção Geral das Obras Públicas com o ordenado de 2:880$000 réis o general de divisão Manuel Afonso de Espregueira.

Muitas verbas injustificadas há neste orçamento que se deveriam transferir para serviços parcamente dotados e que representam despesas altamente produtivas, mas não sendo possível fazê-lo nesta ocasião, dadas as condições muito especiais em que o Senado recebeu o actual orçamento, a comissão aguarda a vinda do segundo orçamento da República. A comissão prepara-se para desde já elaborar propostas de lei que hajam de modificar êste estado de cousas, arrancando as raízes corcomidas que o regime monárquico deixou no nosso organismo social e não conta a comissão para êste serviço moralizador com a iniciativa

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20 DIÁRIO DO SENADO

do poder executivo, o principal trabalho de modificação da administração pública há-de originar-se no Parlamento.

Postas estas considerações, a comissão de finanças do Senado da República Portuguesa, apesar de reconhecer que houve justificadas razões para tão tardia apresentação do Orçamento Geral do Estado, sente êste facto e lamenta não haver já oportunidade para introduzir neste Orçamento as modificações que o espírito republicano exige, vendo-se na dura necessidade de vos propor que aproveis o Orçamento tal como êle veio da Câmara dos Deputados.

Senado, 29 de Dezembro de 1911. - A Comissão. = José Maria Pereira, presidente = Peres Rodrigues = José Nunes da Mata = Abel Botelho = Alfredo Botelho de Sousa = Tomás Cabreira = José Miranda do Vale.

O Sr. Miranda do Vale (Relator): - Como se afirma ao parecer que acaba de ser lido, a impressão que o orçamento do Ministério do Fomento deixou no espírito da comissão, não foi das mais agradáveis.

A comissão sentiu, perante êste orçamento, a mesma impressão que já havia experimentado quando analisou os outros orçamentos, impressão que foi aqui frisada por alguns Srs. Senadores.

Em todo o caso, eu entendo que foi bom que viesse ao Parlamento o Orçamento Geral do Espado.

Eu prefiro a apresentação dêste orçamento, tal como êle está, a termos que nos limitar à aprovação de duodécimos.

Já ouvi dizer a alguém que êste orçamento era um orçamento monárquico.

Pois eu direi que estou realmente convencido de que o actual orçamento vem eivado de quási todos os defeitos de que enfermaram os orçamentos monárquicos.

Nós aprovamos êste orçamento, porque reconhece caos a necessidade de que seja lei do país, no dia 31 do corrente mês.

Aprovamo-lo como nível de confiança que o Parlamento deposita no actual Govêrno. (Apoiados).

Os Srs. Senadores que fazem parte da comissão, segundo as informações que tenho, não atribuem a êste Govêrno, nem a qualquer dos Governos da República, os defeitos do actual orçamento.

Êste orçamento é o fruto natural da administração monárquica, que ainda hoje, e infelizmente por muito tempo se fará sentir na vida da República.

O pessoal ao serviço da República, é ainda em grande parte, o pessoal que vinha do tempo da monarquia.

Êste mal não pode melhorar dum momento para outro.

É preciso acentuar que nós mesmos, os próprios republicanos, fomos educados em escolas onde predominava a influência deletéria da monarquia. A salvação do país não depende duma só geração. Depende das gerações futuras.

Nós próprios, os republicanos, os que mais vivamente combatemos o regime deposto, não estamos isentos cos defeitos que a monarquia incutiu em todos aqueles que administrou.

Ora êstes defeitos, não se modificam dum dia para outro.

A administração do país estava entregue a uma burocracia, que há-de ainda exercer o seu domínio durante muito tempo nos diferentes Ministérios.

Eu e os meus colegas da vereação de Lisboa, sabemos muito bem as dificuldades que temos encontrado para a solução conveniente dos assuntos que estão a nosso cargo.

Na Câmara Municipal não se ventilam os altos problemas da administração do Estado.

Pois, na Câmara Municipal, ainda hoje se notam muitos dos defeitos do tempo da monarquia.

E necessário que isto se diga. E necessário que isto se não ocultei

O que não convêm, o que seria uma obra anti-patriótica, era esconder a verdade.

É preciso dizer-se a. verdade. E preciso afirmar a verdade, custe o que custar. (Apoiados).

Ninguém podia esperar que no Ministério do Fomento se tivessem feito grandes cortes.

Há efectivamente Ministérios onde êsses cortes são admissíveis, e até imprescindíveis; mas o Ministério do Fomento precisa de gastar muito dinheiro, mas gasta Io

E forçoso que as despesas sejam feitas de modo a torna as produtivas; e sem de forma alguma lesarem o contribuinte.

Nós temos obrigação, pelo Ministério do Fomento, de autorizar fortes despesas, mas com a condição de serem essas despesas seguramente produtivas. Caberia aqui elogiar a obra reformadora que, pelo Ministério do Fomento, se tem feito, procurando melhorar a instrução agrícola da qual muito há a esperar para fomento da riqueza do país; mas não faço êsse elogio por duas razões: 1.ª porque tenho pouco feitio para fazer elogios; 2.ª porque o Senado não está agora habilitado a discutir as reformas que, pelo Ministério do Fomento, se fizeram: Por conseguinte o elogio que a essas obras se fizesse poderia ser tomado como menos delicadeza, menos atenção pelas pessoas que, ou as não conhecessem ou não concordassem com essas meei das. Por todas estas razões, abstenho me de fazer qualquer elogio à acção reformadora do Govêrno Provisório em matéria do fomento, mesmo porque entendo que a orientação do Govêrno Provisório, sobretudo nos primeiros momentos da proclamação da República, deveria antes ser uma acção moralizadora do que uma acção reformadora.

O que vale estar a reformar e a ampliar serviços se a moralidade, dentro dos serviços, não é aquela que devia ser?

Acho preferível, primeiro, adquirir funcionários com aquele zelo e competência indispensáveis para compreender as grandes reformas e saber executá-las e, triste é dizê-lo, e faço-o com tanto mais desassombro quanto o caso me toca pela porta, o professorado português, em todas as escolas, deixa bastante a desejar, salvas as excepções da tabela.

O professorado português é filho da monarquia, por consequência tem os defeitos que ela lhe legou.

É necessário que nós, a geração actual, reconheçamos como fomos mal educados para fazermos a diligência de educar melhor a geração seguinte para que ela eduque a outra, e essa salve o país. E se a acção do Govêrno Provisório tivesse sido esta, se êle tivesse feito compreender a todos os cidadãos que os primeiros momentos da República seriam de sacrifício e não de satisfação de ambições, mais ou menos legítimas, noutras condições estaríamos agora. O Govêrno Provisório porêm, entrou a fazer essas reformas e, entrando nêsse caminho, as classes iam pedir melhoramentos para si, à sombra dos melhoramentos que se tinham feito para outras.

Não se fez assim na Câmara Municipal de Lisboa, isso lhe dá uma grande forja. Numa ocasião perguntaram-nos se nós os vereadores republicanos não éramos muito importunados com pedidos de empregos e admiraram-se da luta que a Câmara Municipal tinha sustentado para nunca ter concedido empregos, nem aumento de vencimentos e eu disse "não sustentámos luta nenhuma, não tivemos dificuldades nenhumas, a qualquer pedido que nos faziam, dissemos sempre: não".

Nunca se fez e não se fará. Agora, depois de fazer o primeiro aumento de vencimento ou a primeira colocação, é difícil resistir à segunda, mais difícil resistir à terceira e torna-se totalmente impossível resistir às que se seguem; a questão é começar. Por consequência o Orçamento não é bom; não lanço á comissão as culpas nem ao actual Ministro, nem aos anteriores; todos fizeram o que poderam.

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Poder-se há discordar em pequenos detalhes, mas te mós de nos curvar perante a evidência e reconhecermos que êles serviram o seu país e que todos merecem a confiança inteira da República.

Mas é conveniente que o Parlamento diga aquilo que aqui se tem afirmado, para que todos saibam o que deve ser o Orçamento.

O Ministério do Fomento não é para grandes cortes não é um Ministério de economias, mas deve ser dirigido por um Ministro reflectido que saiba colocar bem o dinheiro dos contribuintes.

Assim, por exemplo, afirmou-se no parecer, e continuou-se a afirmar, que é preciso que se completem as reformai da instrução agrícola; que é necessário arranjar indivíduos habilitados e experimentados, que na prática saibam valorizar a educarão que na escola receberam.

O estado actual das escolas é pior do que estava; há professor que rege duas e três cadeiras, quando um professor deve ser um especialista, tratar só duma matéria para o fazer com toda a proficiência.

Deve-se gastar largamente nas medidas de fomento mas quando haja a consciência de que essas despesas são remuneradoras, não é só delinear grandes medidas no papel sem se saber se há ou não pessoal competente para as executar, porque assim é deitar dinheiro à rua.

A monarquia decretava muitas medidas, que muita vezes eram mais para satisfazer a ambição dêste ou daquele, do que para satisfazer os interesses do Estado

A República, o que primeiro deve fazer, é educar o seu pessoal e só então as medidas de fomento poderão dai algum resultado.

No que se pode fazer economia, é no pessoal administrativo e respectivo expediente.

Cita-se no parecer a desproporção que há entre o pessoal superior, grande número de chefes de repartição chefes de secção com um pequeno número de amanuenses.

É preciso, é urgente que neste capítulo importantíssimo de despesas se economize bastante, porque em grande número os chefes de repartição e chefes de secção, em regra, produzem muito pouco.

O Ministério do Fomento tem a seu cargo grande número de serviços que deveriam competir às administrações locais.

Nas localidades diz-se que os contribuintes andam constantemente a pagar, e sem compreenderem porque se lhe não dá um determinado melhoramento local.

Tendo de administrar o dinheiro dos seus impostos, então êles saberão por que não tem êsses melhoramentos locais.

Não os tem, porque o Estado é lauta Ioda.

Cada localidade deve contribuir para os seus melhoramentos locais.

Assim terá maior consciência em pagar os seus impostos. Para que os funcionários a quem paga o Ministério do Fomento e que são adidos, e para que a administração local não pague a outros, é preciso que o Parlamento afirme bem a disposição em que está, de reorganizar êstes serviços.

É preciso que cada localidade, contribuindo com o seu dinheiro, saiba o que rendem os impostos.

Finalmente, para terminar, visto que estas observações já vão longas, farei umas ligeiras observações a respeito desta lista porque termina êste orçamento.

É uma relação extensíssima de pessoal adido e extraordinário, em diversas situações.

Há aqui pessoal que presta serviços; mas entre êstes 147 indivíduos, há muitos que não prestam serviços de espécie alguma ao Estado, e que recebem dinheiro.

Quantos são os indivíduos nestas condições?

Não sei, mas tem sido um dinheiro injustamente gasto.

Há aqui lugares vagos, pessoal licenceado e eu estou certo de que isto escapou ao exame do Sr. Ministro do Fomento, mas representa da parte dos funcionários que organizaram êste orçamento um mau serviço para um orçamento republicano. Tenho dito.

O Sr. Ministro do Fomento (Estêvão de Vasconcelos):- lar. Presidente, corre-me o dever de falar, não propriamente para responder ao Sr. Miranda do Vale, pois estou absolutamente, de acordo com S. Exa. nas linhas gerais do seu discurso.

Não há dúvida de que o orçamento vem eivado de todos os vícios, defeitos e imoralidades da administração monárquica.

Não podia deixar de ser assim, pois êste orçamento é ainda o da administração monárquica e portanto não podia deixar de se resentir disso e de ser um orçamento defeituoso.

Mas, Sr. Presidente, é preciso que se diga e que se assente bem que a República já tem feito alguma cousa. E preciso que se diga tambêm que há muitos indivíduos que trabalham de má fé contra a República, porque ela já tem coibido abusos. Seria platónico pensar que a administração financeira dum país se podia transformar de um momento para o outro.

Sr. Presidente, alguma cousa se tem feito, e para prova de que alguma cousa se tem feito, está aqui êste orçamento do Ministério do Fomento.

O facto de se apresentar êste orçamento não quere dizer que o Ministro não acabasse já com alguns abusos e imoralidades com que a monarquia nunca pôde arcar.

Disse V. Exa. que a lista do pessoal adido era a prova da incúria que existe nas repartições. Ora isto é um serviço que a República inaugurou.

O que é certo é que esta mesma lista tem aparecido em todos os orçamentos dos governos monárquicos e nunca foi tão discutida nas Câmaras como agora.

Quere dizer, apesar desta discussão ser muita rápida, muito precipitada, apesar de tudo, no Parlamento republicano se estão a notar os vícios duma lista completa, que os próprios empregados da repartição respectiva nunca trataram de rever, por isso que nunca lhes passou pela cabeça que se preocupassem com o que representa um escândalo e uma verdadeira vergonha, como esta lista mostra.

Êste facto, já por si, representa alguma cousa, mas há mais.

É certo que eu, tendo entrado para o Ministério do Fomento e sabendo que o Orçamento já estava organizado, não tive o prurido de estar a desfazer a obra dos meus antecessores, simplesmente, é claro, para ter o orgulho de fazer uma cousa nova.

Desde o momento em que o Orçamento já estava feito, eu, que tenho tantas cousas que resolver, inadiáveis, não pensei mais nesse documento, certo de que as Câmaras fariam nele os cortes que entendessem; mas bastou o simples facto do Sr. Relator da Comissão de Finanças da Câmara dos Deputados ir uma noite ao meu Ministério e principiarmos a ver esta lista, para se avaliar que havia um certo número de abusos com os quais, em princípio, nos não conciliávamos.

V. Exa. sabe que no Ministério do Fomento havia, no eu mais alto corpo consultivo, porque representa precisamente o corpo onde estão os engenheiros mais graduados das obras públicas, de há muito tempo, a seguinte praxe, que é absolutamente irregular.

A lei determina que os indivíduos, quando porventura estejam em situação de inactividade, não recebam gratificação de exercício, a não ser quando esta situação resulte de doença adquirida no serviço.

Era uma praxe inteiramente inaceitável que aqueles Q, em virtude de doença, não comparecem nas suas re-

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partições, continuassem a receber gratificação, como se realmente estivessem a exercer o seu lugar.

Já acabei com esta irregularidade.

E mais ainda: consta-me que noutras repartições do Ministério do Fomento se dá o mesmo abuso. Se assim for, eu, é claro, não admitirei que um empregado receba uma gratificação, Jogo que não exerça o seu lugar.

É uma cousa muito simples, muito pequena, mas que a República não deve consentir, porque só a monarquia a faria.

E é necessário que nós aceitemos isto, para que todo o país se convença de que a República não fez tudo já, mas fez alguma coisa para cumprimento das suas promessas; e salvamento da administração pública.

E claro que concordo absolutamente com a orientação do Sr. Miranda, do Vaie, de que a primeira função da República deve ser moralizadora.

Não há vantagem nem oportunidade nenhuma em fazer reformas, desde o momento que existam na administração pública as mesmas individualidades e, que os serviços estejam a cargo dumas ressoas que não lhes dão orientação consentânea com os modernos princípios.

A primeira acção do Govêrno deve ser moralizadora.

Se eu tivesse tido qualquer intervenção no Govêrno Provisório, talvez êle não tivesse sido tão largo na realização de reformas e não procedesse a alguma que não correspondesse em resultados imediatos e não oferecesse garantias de estabilidade.

O próprio Sr. Miranda do Vale concordou neste ponto.

Só pode haver uma certa contradição com o que S. Exa. disse; é que se não pode pôr de parte a aplicação das reformas de ensino.

Eu posso dar a feliz notícia de que, realmente, não tenciono pôr de parte a reforma do ensino agrícola.

Vozes: - Muito bem.

O Orador: - Mas voltando à questão da moralidade administrativa, há um ponto que eu desejo acentuar, para salvaguardar as minhas responsabilidades, e para, como costuma dizer-se, sangrar-me em saúde.

O Parlamento vota êste Orçamento porque estamos no fim do ano, e porque seria uma cousa absolutamente condenável, absolutamente indecorosa, que votássemos novos duodécimos, o que seria a sequência do Orçamento monárquico.

A Câmara vota êste Orçamento sem uma discussão ampla, rasgada; mas ao mesmo tempo impõe-me a obrigação indeclinável de no Orçamento que tem de ser apresentado em Janeiro, se suprirem as deficiências do que está em discussão.

Perante esta imposição, cumpre-me salvaguardar as minhas responsabilidades, e, como disse, sangrar-me em saúde.

O Sr. Miranda do Vale disse, e disse muito bem que as despesas do Ministério do Fomento não podem ser diminuídas.

Há necessidades a que o Ministério do Fomento não pode deixar de atender.

Evidentemente o Ministério do Fomento não pode fartar-se a despesas que sejam produtivas, e que correspondam às justas exigências da opinião pública.

Há despesas que tem de desaparecer do orçamento do Ministério do Fomento.

São aquelas que se fazem com empregados que não cumprem os seus deveres.

Êsses empregados tem às ser eliminados é certo, mas não vá ninguém supor que eu, daqui a onze dias esteja habilitado a saber quais são os funcionários dispensáveis, e aqueles que não cumprem os seus deveres.

Ba ainda um outro ponto que eu preciso acentuar.

Muita gente julga lá fora que a discussão do orçamento, é tanto mais proveitosa, quanto mais duradoura é.

Entende-se que a discussão do orçamento em três meses é mais profícua que a mesma discussão em alguns dias apenas.

Parece-me que não é assim.

A discussão do orçamento, para ser útil, para ser proveitosa, tem de ser precedida dum largo inquérito a todos os serviços públicos. (Apoiados).

Urna pessoa, por muito inteligente, por muito ilustrada que seja, não pode pronunciar-se facilmente sôbre determinado assunto, sem ter na mão os elementos que o habilitem a êsse juízo.

Êsses elementos de informação é que nos podem dizer quais os funcionários que podem ser eliminados.

Esta maneira de proceder, e que pode produzir uma obra útil.

Foi precisamente por obedecer a êste critério que eu. em 1909, discutindo um orçamento-monárquico na Câmara dos Deputados, disse que essa discussão para ser útil, para ser profícua, devia ser precedida dum inquérito parlamentar a todos os serviços públicos.

Os próprios membro" do Parlamento, que fazem parte das comissões de finanças, deviam ir a todos os Ministérios, e indagar o que lá se passa.

Eu já disse na Câmara dos Deputados, e torno a dizê-lo no Senado, que no meu Ministério há muito que fazer, e que nem sempre sobra o tempo para se estudarem assuntos completamente diversos.

O que eu posso garantir à Câmara é que. se pudesse ser organizado êste ornamento só pela minha intervenção, já estaria liquidada esta vergonha. Mas, evidentemente, eu não posso mistificar o Parlamento vindo garantir a probidade, a assiduidade dos funcionários tanto maiores, como menores do meu Ministério, que êles se transformarão de tal forma que hão de poder esclarecer e averiguar em quinze dias o que não tem podido esclarecer e averiguar durante tantos anos. Portanto, o que disse na Câmara dos Deputados foi que havia toda a vantagem em que a comissão de finanças fôsse ao meu Ministério e inquirisse e averiguasse tudo o que pudesse inquirir e averiguar, porque desta forma é que se esclareciam, certas irregularidades e abusos que eu por mim só não tenho tempo de esclarecer nem averiguar. De resto, lá mesmo, no meu Ministério, bastou o simples facto de lá ter ido o relator da comissão de finanças da outra Câmara para eu chamar o meu contínuo e averiguar que alguns empregados que, nesta longa lista estavam inscritos como fazendo serviço nas repartições do Ministério do Fomento, nem se quer eram conhecidos do contínuo. Alem disso, é conveniente acentuar que não basta apurar quais são os disponíveis e obrigá-los a trabalhar; é necessário, depois, haver energia bastante para os demitir porque a maior parte deles são, absolutamente incompetentes ou por falta de ilustração, ou por falta de inteligência ou senso moral, são pessoas que nunca na sua vida trabalharam e que pouco se importam com que a República os obrigue a trabalhar, desde que não os demita.

De resto, toda a gente sabe a razão de ser da disponibilidade dêsses cavalheiros; a monarquia fazia reformas, não se limitando já aos serviços de interesse do país, mas a serviços de interesse da sua clientela política, aumentando o pessoal, mas para que êste pessoal aumentasse, passavam à disponibilidade determinados indivíduos que eram tão faltos de decoro que não se importavam passar a essa situação, ganhando menos, contanto que gozassem o prazer de não fazer cousa nenhuma.

Eram indivíduos absolutamente inábeis, que corriam de umas repartições para as outras, e eu achei isto na Caixa Geral de Depósitos, para onde, em geral, costumavam mandar êstes disponíveis, a maior parte dos quais, em lugar de constituir uma utilidade para o serviço, constitui

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verdadeira calamidade, não faz nada e serve só para desorganizar o serviço e atrapalhar os outros funcionários.

O que se conclui das minhas considerações é que não basta que venhamos fazer afirmativas com respeito à moralidade administrativa, é necessário que compreendamos o problema em toda a sua complexidade, e ao mesmo tempo nos compenetremos de que êle não se resolve com discursos, nem com palavras.

Se o. Parlamento Português quer realmente contribuir para que o próximo Orçamento do Ministério das Finanças não seja o que é êste orçamento, é necessário que os Senadores, e muito especialmente os membros da comissão de finanças, vão ao meu Ministério e lá tratem de indagar todas as irregularidades, porque doutra forma não posso acabar com êsses abusos.

Há um facto interessante no nosso país, que é nos Ministérios haver muito abuso, muita irregularidade e muito pouca vergonha, mas simplesmente não há quem tenha a coragem moral para apontar aos Ministros os indivíduos que praticam êstes abusos e estas irregularidades.

Eu estou constantemente a receber cartas anónimas, mas V. Exas. sabem perfeitamente bem a importância que posso ligar a estas certas, às vezes porque principio a ler sem saber que é um anónimo, e o assunto é tão palpitante que se chego a chamar o director geral ou o chefe da repartição, à primeira dúvida que se apresenta, se êles negam o facto, nada posso dizer, porque não posso apresentar um anónimo.

E para notar que muitos dêstes anónimos adoptaram agora um novo sistema: êstes cavalheiros assinam agora com o seu nome, mas como não dizem a sua residência, admititido mesmo que sejam verdadeiras as assinaturas, nós ficamos sem saber quem são.

Eu já disse que é absolutamente necessário que os Srs. Senadores vão ao meu Ministério ajudar-me neste serviço, para que o ornamento do futuro ano económico venha melhorado quanto possível em relação ao que estamos discutindo.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Eusêbio Leão: - Peço a V. Exa. que consulte a Câmara sôbre se quere que haja uma sessão nocturna hoje para a discussão do Orçamento.

Posto à votação, êste requerimento foi aprovado.

O Sr. Arantes Pedroso: - Requeiro que se prorrogue a sessão até se votar o orçamento do Ministério do Fomento.

A Câmara aprova o requerimento.

O Sr. Sousa da Câmara: - Devo declarar a V. Exa. que voto o Orçamento, mas que o voto simplesmente por um caso de fôrça maior, visto que o temos de aprovar até o fim do mês, mas que exactamente como sucedeu ao Sr. Miranda do Vale, o orçamento não me agrada absolutamente nada.

Encontram-se nele deficiências grandes principalmente em questões de ensino agrícola.

Outras verbas que nele se encontram, julgo-as por com pleto desnecessárias, e nelas não falaria se porventura não verificasse grandes reduções em relação ao ensino superior de agricultura.

Pelos decretos do Govêrno Provisório êstes serviços eram fixados pela seguinte forma.

Leu.

São verbas dependentes de disposições legais, em todo o caso não há nada que as justifique.

Vou por exemplo referir me à escola de pomicultura criada em Queluz em condições péssimas para uma escola

desta natureza. Ali o que se poderia fazer, era um aproveitamento para moinhos de vento. Aquela região, pela intensidade de vento que ali há, não está indicada para uma escola de pomicultura tanto mais que ela está comandada (é o termo) e não dirigida, por um oficial de marinha, aliás muito distinto, ilustrado e inteligente mas sem competência nestes assuntos técnicos.

Alem desta verba de 9 contos, que vem descrita no orçamento, para ser entregue á Associação de Agricultura, figuram ainda nesse mesmo orçamento mais 2:500$000 réis para a mesma sociedade e destinados a um museu agrícola-comercial.

Há uma propriedade do Estado, próximo de Torres Vedras, que se adaptaria perfeitamente a uma escola dêste género e com a criação da qual se limitaria muito a despesa; de mais nas proximidades de Queluz não há árvores de fruto, e não obstante criou se ali uma escola de pomicultura sem ter portanto utilidade alguma. Nós tinha-mos próximo de Lisboa relativamente centros produtores de velhíssimos frutos como Alcobaça, Várzea de Colares, etc. Portanto não havia necessidade nenhuma na preferência de Queluz para a fundação da 1.ª escola de pomicultura. Não estou atribuindo êste facto ao Sr. Ministro do Fomento, porque, realmente, S. Exa. entrou há pouco, e isto nada tem que ver com S. Exa., mas entendo que é meu dever, como Senador, chamar a atenção de S. Exa. para que no futuro orçamento êste caso seja remediado ; assim como para o facto de se não haverem nomeado professores substitutos para o Instituto Superior de Agronomia, obrigando os catedráticos a leccionarem várias cadeiras, o que se não admite : é deprimente que os mesmos alunos sejam leccionados em várias cadeiras pelo mesmo professor, constrangendo êste a fazer de enciclopédico, ou talvez melhor, de charlatão. (Apoiados).

As reformas do Govêrno Provisório quando postas integralmente em execução deviam dar bons resultados.

Chamo ainda a atenção de S. Exa. o Ministro do Fomento para fazer a comparação entre os ordenados dos professores do Instituto Superior de Agronomia, e da Escola de Medicina Veterinária com os do Instituto Superior Técnico.

Os vencimentos do professorado desta escola foram bastante elevados; elevação que não acho demasiada, é facto, mas entendo que não deve haver diferenças nos vencimentos dos funcionários da mesma categoria e do mesmo Ministério.

Há outros casos para que desejo chamar a atenção de S. Exa.

Pela nova organização dêsse Instituto Superior de Agronomia, entrou em efectividade o antigo professor adido de desenho e, todavia, no orçamento não figura o respectivo exercício para êste empregado: tem apenas o vencimento de categoria.

E necessário tambêm que não seja permitida nova emissão á Companhia União Vinícola, a qual no meu entender deveria ser liquidada, visto que não tem cumprido o contracto.

Eu não me referia a essas cooperativas, se visse que elas tinham dado quaisquer resultados proveitosos, mas apenas tem servido para embaraçar o mercado e absolutamente para mais nada.

Muitos outros pontos poderia citar e tenho aqui apontamentos, mas não vale a pena discuti-los agora, reservar-me hei para o fazer durante a discussão do próximo orçamento.

Declarei no princípio que votava êste orçamento e mantenho essa declaração, porque julgo preferível proceder assim a votar novos duodécimos.

O Sr. Ministro do Fomento (Estêvão de Vasconcelos): - Sr. Presidente, V. Exa. compreende bem que eu não venho aqui discutir a obra do Govêrno Provisório.

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Em todo o caso o Sr. Sousa da Câmara tocou em dois pontos mais concretos, sôbre os quais desejo dar algumas explicações a S. Exa.

Sr. Presidente, eu não venho discutir se a Escola de Pomicultura foi criada bem ou mal ou se há conveniência em que êsse estabelecimento seja ou não dirigido por um oficial de marinha, tanto mais que êle se encontra ali como delegado da Associação de Agricultura.

Sr. Presidente, neste lugar que ocupo, compreendi que seria desvario reformar o que está feito há um ano e isso dum momento para o outro.

Ainda não pensei em codificar o que os meus antecessores deixaram estabelecido.

As verbas a que se referiu o Sr. Sousa da Câmara, acham-se inscritas no Orçamento, porque provêm de leis decretadas pelo Govêrno Provisório.

Emquanto o Parlamento não alterar essas leia, é claro que hão de continuar a ser inscritas.

Disse S. Exa. que o professor de desenho do Instituto Superior de Agronomia, devia receber alêm do seu ordenado, o que lhe pertence, como gratificação de exercício, pois que estava fazendo serviço.

Segundo as informações que tenho, esta verba não foi descrita, porque na ocasião em que se elaborou o Orçamento, êsse empregado não tinha ainda voltado a fazer serviço, mas será inscrita no próximo Orçamento.

Ainda o Sr. Sousa da Câmara tratou doutro ponto meus interessante, que não posso resolver única e simplesmente por meu arbítrio.

Referiu-se S. Exa. verba que se dá à Companhia União Vinícola, e declarou ao mesmo tempo que era conveniente suprimir esta verba, que se não devia continuar a subsidiar esta Cooperativa, porque não tem cumprido os seus estatutos.

Em resposta direi que não está na mão do Ministro resolver se a União tem ou não cumprido os seus estatutos.

O que é certo, é que esta cooperativa pediu autorização ao Govêrno para emitir mais 1:000 contos de réis de obrigações.

Êste pedido foi mandado a informar à Fiscalização das Sociedades Anónimas e eu julguei conveniente que se consultasse a Procuradoria Gerei da República, e esta foi de parecer que se devia obrigar a União a cumprir as prescrições que realmente não tem cumprido ou a regularizar a sua situação, por forma que não tivessem razão de ser as observações que a Fiscalização das Sociedades Anónimas fez em relação aos haveres desta companhia.

E claro que vou mandar cumprir o despacho da Procuradoria Geral da República.

Pode ser que esta cooperativa não tenha realmente condições de existência e que o Estado não lhe deva dar o subsídio que dá e, desde o momento que isso se prove, será eliminada do Orçamento esta verba, mas emquanto se não provar que é assim, esta eliminação não se pode fazer.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Miranda do Vale.

O Sr. Miranda do vale: - Como soube que o Sr. Faustino da Fonseca está inscrito peço a V. Exa. que me reserve para falar depois de S. Exa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Anselmo Xavier.

O Sr. Anselmo Xavier: - Desisto da palavra.

O Sr. Faustino da Fonseca: - Sr. Presidente, aplaudo as palavras do Sr. Ministro do Fomento. É preciso proceder com grande energia moral.

E a peço a V. Exa., que faça com que se publiquem todas as sindicâncias.

Muitas das comissões que foram nomeadas cumpriram o seu dever, mas depois levantaram-se campanhas de chantage contra os sindicantes e moveram-se empenhes de tal forca, que as sindicâncias ficaram fechadas nas gavetas dos Ministros e nunca se publicaram.

Publiquem-se essas sindicâncias feitas pelas comissões para êsse fim nomeadas.

S. Exa. falou como devia, mas quando disse que não se publicaram as sindicâncias por falta de recursos, levou-me a perguntar: mas qual é a falta de recursos que justifica para a República uma falta de moralidade?

Qual a falta de dinheiro que impede de fazer cumprir aquele dever? Pois já não temos a fôrça necessária para arcar com a responsabilidade que emane de todas essas sindicâncias para fazer frente ao banditismo?

A maneira muitíssimo simples de calar toda essa gente é apresentar-lhe o rol de misérias, de roubos e de abusos.

O Sr. Ministro do Fomento (Estevão de Vasconcelos): - Pedi a palavra para agradecer ao Sr. Faustino da Fonseca os aplausos que me dirigiu, e que eu atribuo à amisade que nos liga há muitos anos.

O Sr. Faustino da Fonseca quer que se publiquem as sindicâncias ao meu Ministério.

O Sr. Faustino da Fonseca: - A todos.

O Orador: - A que diz respeito aos paços riais já está publicada no Diário do Govêrno, e independentemente disso, foi enviada ao Ministério da Justiça e daí à Procuradoria Geral da República; mas há outras sindicâncias sôbre as quais tambêm tem de ser ouvido o Sr. Procurador Geral da República, afim de se saber se há nelas matéria incriminável.

Ao mesmo tempo o regulamento do Ministério do Fomento não me dá autoridade para determinado procedimento, nem mesmo para uma simples suspensão sem eu ouvir a estação competente, que é o Conselho Superior de Obras Públicas e Minas.

Ele é que há-de dizer se a alguns dos empregados envolvidos nessas sindicâncias se podem aplicar penas disciplinares.

Mas alêm dêstes factos, há outros que tem de ser atendidos pelo poder judicial.

O meu primeiro empenho ao entrar para o Ministério do Fomento foi fazer publicar todas as sindicâncias, mas observaram-me e com uma certa razão, que eu não devia ordenar essa publicação, emquanto o Procurador Geral da República me não dissesse, que havia matéria incriminável.

Isto é, as sindicâncias não devem ser publicadas no Diário do Govêrno sem se saber se realmente se pode exigir responsabilidade criminal a indivíduos, que são acusados de cometerem determinadas iregularidades.

Foi o próprio Sr. Br. Afonso Costa quem me aconselhou a que não mandasse publicar as sindicâncias no Diário do Govêrno, sem que o Procurador Geral da República me dissesse se havia matéria incriminável.

Logo que o Procurador Geral da República me der o seu parecer, e o poder judicial cumpra o seu dever, eu imediatamente darei publicidade a essas sindicâncias.

S. Exa. não reviu.

O Sr. José Maria Pereira: - Referiu-se o Sr. Sousa da Câmara ao artigo 46.° do capítulo m.

Refere-se êsse artigo á garantia do juro que o Govêrno tem de pagar à Companhia União Vinícola.

Como funcionário público, cumpre-me dar a êste respeito algumas informações.

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Quando o Sr. José Relvas organizou a Fiscalização das Sociedades Anónimas, um dos primeiros serviços de que essa estação foi encarregada, foi uma sindicância á referida cooperativa.

Em Julho do ano corrente essa sindicância ficou concluída, como o Sr. Ministro do Fomento deve ter conhecimento, estando o Govêrno perfeitamente habilitado para ver se deve ou não autorizar a emissão de obrigações.

Esta observação vem para que se não diga que a Fiscalização das Sociedades Anónimas não cumpria com toda a solicitude, zelo e celeridade os seus deveres.

Estou pronto a fornecer todos os elementos que permitam ao Govêrno defender o Estado nos seus interesses.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Ministro do Fomento (Estêvão de Vasconcelos): - Sr. Presidente, eu não quis atribuir â Fiscalização das Sociedades Anónimas qualquer demora na solução dêste caso. Suponho que o assunto é duma simplicidade única. Se consultei a Procuradoria Geral da República, foi porque recebi informações um pouco graves acerca dos prejuízos que podiam recair sôbre a agricultura, dando-se o indeferimento do pedido da cooperativa e das consequências que a sua solução podia ter no agravamento da questão operária.

Como ainda há pouco tive ocasião de acentuar, o parecer da Procuradoria Geral da República é para que a Companhia seja obrigada a cumprir o que deve.

Está-se a tirar uma cópia para lhe enviar.

S. Exa. não reviu.

O Sr Nunes da Mata: - Em primeiro lugar, peço desculpa ao Senado de lhe tomar tempo e de sôbre êste assunto pedir a palavra.

Desde o momento porêm que tenho conhecimento de alguns factos referentes à Escola de Pomicultura de Queluz, é do meu dever dizer o que sei, começando por explicar que o distinto oficial de marinha que dirige a Escola não recebe gratificação por êsse serviço.

Esta é a informação que tenho, e que suponho ser verdadeira.

O Sr. Sonsa da Câmara: - (Interrompendo) Não disse que recebia gratificação.

Disse apenas que não tinha competência técnica.

O Orador: - Não tem curso, mas creio que tem competência, mas no que entendo do meu dever insistir, é em que não recebe qualquer gratificação para superintender no ensino da Escola.

Em segundo lugar, não me parece que o Govêrno Provisório possa merecer censura nem o Ministro do Fomento de então, pela escolha de um tal local, pois o terreno onde vai ser instalado o pomar parece ubérrimo, havendo perto árvores gigantescas e pomares de laranjeiras, tangerineiras e nespereiras, que parecem dar-se bem no terreno, que, para mais, demora em uma baixa abrigada dos ventos dominantes.

Alêm disso, a verba destinada para o jardim e pomar e para a Escola de Pomologia, a qual creio ser da importância de 9:500$000 réis, foi entregue pelo ex-Ministro Sr. Brito Camacho, à Direcção da Associação Central de Agricultura, que superintende superiormente, dispendendo à sua custa as verbas as mais necessárias para a manutenção de tam importante estabelecimento de ensino. Ora eu entendo, Sr. Presidente que, tendo conhecimento dêstes factos, deixava de cumprir o meu dever, se os não mencionasse conforme os conheço.

O Sr. Miranda do Vale: - A minha situação de relator do parecer sôbre o projecto do orçamento do Ministério do Fomento é uma situação muito especial; não e uma questão de defesa, porque aqui não há que defender, mas tenho que juntar às considerações que fiz, umas breves palavras em resposta ao discurso do Sr. Sousa da Câmara.

Evidentemente, a obra do Ministro do Fomento, criando a Escola de Pomologia em Queluz foi baseada nas melhores intenções e a isso devemos fazer justiça, porque os subsídios ás associações agrícolas são abençoados. A tendência mesmo em toda a parte do mundo, é descentralizar êstes serviços de instrução primária agrícola, entregando-os à direcção das associações de agricultura.

Ora há no nosso meio rural, infelizmente, muito atraso no que respeita à ideia associativa, que está pouquíssimo desenvolvida. A Associação Central de Agricultara é chamada a exercer, no nosso meio, uma função importante no fomento agrícola, por consequência, todo o dinheiro que o Estado lhes der é abençoado, o que é indispensável é que essa associação empregue bem êsse dinheiro e a maneira de o conseguir é os indivíduos, com a autoridade que possui o sr. Sousa da Câmara, que é um professor muito distinto, fazerem nessa associação, a propaganda dos bons princípios agrícolas.

O Sr. Sousa da Câmara disse que o sitio foi mal escolhido; ^mas o que é que isso prova?

Prova que o Ministro foi mal informado e que as nossas competências técnicas deixam a desejar. Assim, por exemplo, disse-se que era bem escolhida a Tapada da Ajuda para nela instalar o Instituto Superior de Agronomia e, nos últimos tempos estou farto de ouvir dizer que o local é impróprio, o que mostra que os nossos técnicos ainda não conhecem bem o país, as nossas riquezas e recursos.

Por consequência, o que tudo isto prova é a afirmação que aqui produzi de que as grandes reformas só se podem fazer, depois de haver indivíduos competentes para bem as executar.

A Associação de Agricultura, desde o momento que esteja bem amparada, que os técnicos sabedores lhe prestem o seu auxílio e se empenhem no sentido da boa propaganda, há-de prestar á agricultura portuguesa óptimos serviços.

O Govêrno não pode nem deve regatear êsses benefícios, porque a classe agrícola é uma classe essencialmente conservadora que recebeu a República bem, mas com uma certa reserva, e é preciso mostrar que a República está ao lado da agricultura, e que há-de concorrer quanto possível para o seu desenvolvimento.

O Sr. Sousa da Câmara referiu-se aos ordenados dos professores; não há dúvida de que os ordenados são pequenos; mas nestes primeiros anos, as classes superiores devem dar o exemplo de abnegação, contentando-se com pequenos ordenados.

O Sr. Sousa da Câmara: - Eu não disse isso, o que fiz foi comparar os ordenados que tinham uns professores com os que outros de igual categoria tinham.

O Orador: - O que é preciso saber-se é que êstes professores não reclamam aumento de ordenados, desejam que se façam economias; há diferenças de ordenados entre professores e directores de escolas =; é bom que isto se organize por forma a satisfazer as exigências do serviço sem aumento de despesa.

O Sr. Faustino da Fonseca referiu-se à necessidade de se publicarem todas as sindicâncias.

Ora, parece-me isso um trabalho inútil, porque ninguém as lia; julgo que seria suficiente que o Sr. Ministro das Finanças mandasse publicar as suas conclusões e que mandasse castigar aqueles que porventura tivessem cometido qualquer falta: mas nem sempre isso será possível, porque as leis com que o país se governa, são leis ainda da monarquia, mais próprias para proteger aqueles que não cum-

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prem os seus deveres, que não cumprem as suas obrigações.

Há urna grande necessidade de se reformarem, de se corrigirem as leis, para castigar aqueles que prevaricaram ou que venham a prevaricar.

Por consequência, não há necessidade da publicidade, porque são documentos muito volumosos.

O Sr. Goulart de Medeiros: - Peço a V. Exa. que me informe se há alguma emenda sôbre a mesa.

O Sr. Presidente: - Não, senhor.

O Sr. Sousa da Câmara: - Apenas duas palavras para explicar o que disse.

Eu não me referi ao Govêrno Provisório da República; o que eu disse foi que entendia que, antes de nos ocuparmos em discutir o Orçamento, deveríamos discutir a obra do Govêrno Provisório, essa obra que não deve ser nunca intangível, que pode e deve ser discutida.

O Sr. Ministro do Fomento de então, podia ter uma orientação e qualquer de nós não concordar com ela; era por isso que eu desejava que, antes de tudo, discutíssemos aqui em que devia versar e ensino agrícola.

Mas o que se fez, ainda é pior, porque só se pôs em execução parte das medidas do Govêrno Provisório.

Quanto ao directos da Escola de Pomicultura é um belo carácter, mas falis-lhe exactamente a parte mais importante, que é a competência técnica.

Para agronomia é preciso um agrónomo, assim como para dirigir um navio é preciso um: oficial de marinha. Tinha graça que eu fôsse incumbido de governar no navio!

Disse o Sr. Miranda do Vale que não vê a necessidade da publicação das sindicâncias. Há funcionários sôbre quem pesam responsabilidades e que, se já se tivessem publicado as sindicâncias, talvez não figurassem neste orça mento.

Há ainda um assunto importante, o crédito agrícola, mas não me referi a êle porque não quero tomar mais tempo à Câmara.

O Sr. Faustino da Fonseca: - Sr. Presidente: a situação é grave. Uns atacam os republicanos por elos serem violentos, outros atacam-nos por êles serem cobardes. O que é certo é que há muitos funcionários que são homens de bem, há outros que o não são.

Ora as responsabilidades devem ir a quem de direito.

É preciso publicar todas as sindicâncias; começarem-se a fazer bem as contas a todos para, depois, facultar £s secretarias a quem deve lá estar legitimamente.

O Sr. Presidente: - Vai votar-se na generalidade o orçamento em discussão.

Foi aprovado.

Em seguida foi posto à discussão na especialidade, sendo aprovados todos os capítulos com as alterações que sofreram na Câmara dos Deputados, bem como a parte que diz respeito às despesas extraordinárias.

O Sr. Presidente: - Há um requerimento para ser posto à discussão, uma proposta de lei para a suspensão da reforma de instrução primária decretada pelo Govêrno Provisório.

Êsse pedido foi já aprovado pelo Senado. Vai portanto ler-se a proposta.

Leu-se na mesa, foi admitida e aprovada sem discussão, tanto na generalidade como na especialidade o seguinte

N.º 22

Senhores Deputados: - Determina o decreto com fôrça de lei de 29 de Março de 1911, no seu artigo 176.°, in fine, que os serviços de administração e dotação escolares da instrução primária passarão para as câmaras municipais, a partir de 1 de Janeiro de 1912. E êste o texto legal que, a não ser desde já modificado, terá de executar-se dentro de breves dias. E assim o pretendia e pretende o legislador de 29 de Março, na sua aspiração generosa de reformar o ensino popular, em moldes verdadeiramente democráticos.

Mas a transferência imediata do Estado para o município dum serviço de tamanha importância e ponderação produziria, sem dúvida, perturbações e acarretaria dificuldades de momento, sobretudo no que respeita ao pagamento dos vencimentos dos professores, assunto que ao Parlamento cumpre apreciar e resolver, sem demora, atentas as circunstâncias especiais em que nos encontramos.

Nos termos do artigo 65.° do aludido decreto, o pagamento aos professores tem de ser feito antecipadamente, até o dia 10 do mês a que disser respeito. Ora, alêm da perturbação inevitável que a transferência dum serviço de tanta magnitude infalivelmente vai lançar nos restantes serviços que já pesam sôbre as câmaras municipais, há uma circunstância a que necessariamente temos de atender e que impede a imediata execução da lei, nesta parte importantíssima da administração do ensino: - queremos referir-nos à falta de orçamento, já organizado e aprovado, com que as câmaras possam fazer face aos encargos que sôbre elas ficam a pesar. Com efeito, não estando ainda aprovado o Orçamento Geral do Estado nem sequer determinadas as percentagens com que, nos termos do n.° 2.° do artigo 53.° do decreto com fôrça de lei de 29 de Março de 1911, as câmaras municipais terão de constituir principalmente o seu fundo de instrução primária, impossível se nos afigura que para elas possam passar, desde já, os serviços, aliás complexos, a que nos estamos referindo. É evidente que, sem orçamento organizado e aprovado e sem a constituição prévia do aludido fundo, não podem as câmaras municipais ocorrer aos encargos que sôbre elas vão pesar, e assim sucederia que, durante alguns meses, deixariam de pagar aos professores os seus vencimentos com a regularidade que a lei exige e a situação dos mesmos professores imperiosamente reclama. Fáceis são de calcular as desastradas consequências da situação que daí necessariamente se derivaria. E pagar com rigorosa pontualidade a todos os seus funcionários, mormente àqueles que, em regra, vivem apenas dos seus parcos vencimentos, como sucede aos professores, é dever que imperiosamente se impõe ao Estado e que de nenhum modo poderá declinar.

Para obviar aos inconvenientes que ligeiramente deixamos esboçados, duas propostas de lei foram apresentadas á vossa consideração: a primeira pelo Sr. Deputado Baltasar Teixeira, a segunda pelo Sr. Deputado Alexandre de Barros. Na proposta dêste último Sr. Deputado estatui-se:

1.° Que o Govêrno adiantará a todas as câmaras municipais, durante o prazo de três meses, as quantias necessárias, para elas ocorrerem aos encargos da instrução primária;

2.° Que as mesmas câmaras procedam á imediata apresentação dos seus orçamentos, assim que apela discussão do Orçamento Geral do Estado fique estabelecida a importância com que devem concorrer para os serviços da instrução primária concelhia";

3.° Que as folhas de vencimento dos professores sejam processadas pelos inspectores, individualmente para cada professor, e remetidas ás câmaras para que estas, a registando-as, as tenham à disposição dos interessados, até o dia õ de cada mês";

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4.° Que estas folhas, "reclamadas, pelos respectivos professores às câmaras constituam documentos obrigatoriamente pagáveis ao portador, nas tesourarias de finança do concelho, no momento da sua apresentação";

5.° Que, para os tesoureiros de finanças constituam "valores correntes";

6.° Que "na mesma qualidade os entreguem às cama rãs municipais", para serem levados em conta na arrecação da parte que lhes compete, nos impostos directos;

7.° Que às câmaras municipais "se apliquem as disposições coercivas do decreto de 29 de Março de 1911 quando não dêem cumprimento ao que fica legislado" Do resumo que deixamos exposto da proposta do Sr Deputado Alexandre de Barros resulta para nós a condi cão profunda de que ela é impraticável, porque, complicando, sem vantagem real, o expediente do pagamento dos vencimentos mensais aos professores, torna a sua execução pouco menos de impossível.

Na verdade, quem conhecer os múltiplos serviços que pesam sôbre os inspectores escolares, facilmente concluirá sem sombra de dúvida, que se torna absolutamente impossível àqueles funcionários a organização de folhas individuais, para que cada um dos professores do respectivo círculo vá receber mensalmente os seus vencimentos.

E depois ocorre muito naturalmente perguntar: que vantagens poderão resultar para a boa ordem e regularidade do serviço, do facto das folhas, em vez de irem directa mente, como agora para as tesourarias de finanças, vão ante transitar pelas câmaras municipais? A vossa comissão não descobre em tal processo conveniência de qualquer ordem, que a possa levar a aceitar a solução proposta pelo ilustre Deputado Sr. Alexandre de Barros. Era todos os serviços a simplificação é recomendável, e condição essen ciai da sua regularidade.

Demais, se o Estado há-de adiantar aos municípios as despesas da instrução primária, até que a transferência dêste serviço se possa efectuar, sem perturbações nem dificuldades de qualquer natureza, absolutamente lógico nos parece que se mantenha a situação actual com carácter transitório, aguardando-se a oportunidade, que não virá longe, de se entregar às câmaras a administração do ensino. E, como a base essencial em que assenta a proposta que estamos analisando se nos afigura de todo o ponto inaceitável, salvo o muito respeito que nos merecem as excelentes intenções do seu ilustre e ilustrado autor, prejudicadas ficam necessariamente as demais cláusulas da mesma proposta.

Mais prática e por isso mais aceitável se nos antolha a proposta do ilustre Deputado Sr. Baltasar Teixeira. Por ela, fica suspensa a execução da reforma da instrução primária, "na parte que respeita à administração e dotação escolares, até que entre em vigor o novo Código Administrativo", continuando os encargos desta administração provisoriamente a cargo do Estado. Por isso, e porque o que principalmente importa, desde já, é assegurar a uma classe numerosa e por tantos títulos respeitável e digna da consideração do Parlamento, o pagamento integral dos seus vencimentos consignados na lei, a fim de não irmos perturbar, embora transitoriamente, a sua vida económica, que já não é demasiadamente desafogada, e considerando ainda o inevitável atraso na elaboração, discussão e aprovação do Orçamento Geral do Estado; e

Que dêsse Orçamento depende em parte considerável a elaboração dos orçamentos municipais, nos termos da parte 2.a, especialmente nos artigos 53.°, 54.° e 55.° do decreto com fôrça de lei de 29 de Março de 1911;

Que o projecto da reforma administrativa, com a qual a descentralização da instrução primária tam intimamente se prende, depende ainda da análise e aprovação parlamentar;

Que o actual regime de administração, não sendo democraticamente o mais perfeito, se tem praticado, contudo, sem graves inconvenientes nem protesto da parte dos interessados:

Temos a honra de propor à vossa esclarecida apreciação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° Para os efeitos da administração do ensino primário continuará em vigor a antiga legislação escolar, até ulterior resolução, exceptuando o disposto nos artigos 58.ºe 59.° do decreto com fôrça de lei de 29 de Março de 1911.

Art. 2.° A descentralização administrativa do ensino, nos termos da parte li do decreto com fôrça de lei de 29 de Março de 1911, será posta em execução e convenientemente regulamentada, depois da aprovação da nova reforma administrativa.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrário.

Sala das sessões da Comissão da Instrução Primária e Secundária, em 21 de Dezembro de 1911. = António José Lourinho = Pádua Correia = Baltasar Teixeira = Angelo Vaz = António Albino de Carvalho Mourão, relator.

N.° 11-P

PROJECTO DE LEI

Artigo 1.° A execução do decreto com fôrça de lei de 29 de Março de 1911, na parte que respeita à administração e dotação escolares, continua suspensa até que entre em vigor o Código Administrativo, que brevemente vai ser discutido pelo Congresso da República.

§ único. Os encargos desta administração continuam, portanto, e provisoriamente por conta do Estado.

Art. 2.° O disposto nó artigo 1.° não prejudica a execução dos artigos 58.° e 09.u, do decreto de 29 de Março de 1911.

Art. S.° Fica revogada a legislação em contrário.

Lisboa, em 14 de Dezembro de 1911. = Baltasar Teixeira.

N.º 11-T

PROJECTO DE LEI

Para que integralmente se execute, desde 1 de Janeiro próximo, o decreto de 30 de Março de 1911, sôbre a reorganização dos serviços da instrução primária, é o Govêrno autorizado a adiantar a todas as Câmaras Municipais, por intermédio das respectivas Tesourarias de Finanças, as quantias indispensáveis ao pagamento dos actuais serviços da mesma instrução, durante o prazo de três meses, que termina a 31 de Março de 1912.

Para a execução do que fica disposto, o Govêrno determinará:

Art. 1.º Que as Câmaras Municipais procedam à imediata apresentação dos seus orçamentos, mandado" suspender pelo Ministério do Interior, logo que, pela discussão do Orçamento Geral do Estado para o ano económico de 1911-1912, fique estabelecida a importância com que devem concorrer para os serviços da instrução primária concelhia.

Art. 2.° Que as folhas de vencimento dos professores sejam processadas nas inspecções primárias até o dia 28 de cada mês e imediatamente remetidas ás Câmaras Municipais, de modo que estas, registando-as devidamente, as tenham até o dia 5 do mês seguinte à disposição dos interessados.

Art. 3.° Que essas folhas, reclamadas pelos respectivos professores às secretarias dos municípios, constituam documentos obrigatoriamente pagáveis ao portador, nas tesourarias de finanças do concelho, no momento da sua apresentação.

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Art. 4.° Que as tesourarias de finanças possam arrecadá-las como representando valores correntes.

Art. 5.° Que na mesma qualidade os entreguem às Câmaras Municipais quando elas tenham de arrecadar a parte que lhes compete pelas suas percentagens nos impostos directos.

Art. 6.° Que ás Câmaras Municipais se apliquem as disposições coercivas do decreto de 30 de Março de 1911, quando não dêem cumprimento ao que fica legislado.

Câmara dos Deputados, em 19 de Dezembro de 1911. = Alexandre de Barros, Deputado.

Senhores Senadores. - A vossa comissão de instrução, conformando-se com o projecto aprovado na Câmara dos Deputados mandando suspender a execução da reforma do ensino primário, na parte que respeita à descentralização administrativa do ensino, propõe que seja aprovado por esta Câmara o referido projecto remetido com urgência nesta data.

Sala das Sessões do Senado, 3 de Dezembro de 1911. = Ladislau Piçarra = Faustino da Fonseca = Sousa Júnior = António Maria da Silva Barreto (relator).

Proposta de lei

Artigo 1.° Para os efeitos da administração de ensino primário continua em vigor a antiga legislação até ulterior resolução, exceptuando o disposto nos artigos 58.° e 59.º do decreto com fôrça de lei de 29 de Marco de 1911.

Art. 2.° A descentralização administrativa do ensino, nos termos da parte u: do decreto com fôrça de lei de 29 de Março de 1911, sara posta em execução e convenientemente regulamentada depois da aprovação da nova reforma administrativa.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrário.

Palácio do Congresso, em 29 de Dezembro de 1911. = António Aresta Branco = Baltasar de Almeida Teixeira = Francisco José Pereira.

O Sr. Presidente: - A próxima sessão é hoje às nove horas da noite, com a continuação do mesmo assunto, que e discussão do Orçamento, para ordem da noite.

Está encerrada a sessão.

Eram seis horas e quarenta e cinco minutos da tarde.

O REDACTOR = F. Alves Pereira

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