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REPÚBLICA PORTUGUESA

DIÁRIO DO SENADO

SESSÃO N.º 18

EM 28 DE MARÇO DE 1922

Presidência do Exmo. Sr. José Joaquim Pereira Osório

Secretários os Exmos. Srs.

Luís Inocêncio Ramos Pereira
José Joaquim Fernandes de Almeida

Sumário. - As 15 horas e 5 minutos, estando presentes 25 Srs. Senadores, o Sr. Presidente declara aberta a sessão.

Antes da ordem do dia. - O Sr. Costa Júnior reclama o cumprimento dos contratos existentes entre o Estado e as companhias coloniais produtoras de açúcar, respondendo-lhe o Sr. Ministro da Agricultura.

Os Srs. Pereira Gil e Godinho do Amaral mandam documentos para a Mesa.

O Sr. Ministro da Guerra, a uma observação do Sr. Costa Júnior, sôbre remessa de documentos, responde que os funcionários do seu Ministério cumprem os seus deveres e que se os documentos pedidos ainda não foram remetidos é, por certo, por não ter havido tempo para os coleccionar.

O Ar. Ribeiro de Melo ocupa-se do movimento revolucionário de 19 de Outubro de 1921, replicando-lhe o Sr. Presidente do Ministério.

O Sr. Ramos de Miranda apresenta um requerimento pedindo documentos.

O Sr. Oriol Pena pede que se repare a estrada de Sintra ao Estoril e protesta contra o abuso do jôgo em Viseu, respondendo-lhe o Sr. Presidente do Ministério e o Sr. Ministro da Agricultura.

O Sr. Pais Gomei reclama facilidades para os transportes na região do Douro.

O Sr. Ramos de Miranda pede que o substituam na Comissão Interparlamentar de Comércio, para que foi escolhido.

O Sr. Ribeiro de Melo pregunta se está na Mesa a cópia de um processo que correu pelo Ministério da Agricultura, replicando-lhe o respectivo Ministro.

O Sr. Vasco Marques chama a atenção do Sr. Ministro das Finanças para a necessidade imperiosa de serem bem aproveitados os chamados sanatórios da Madeira, que se encontram ao abandono, replicando-lhe o Sr. Ministro das finanças.

Antes de se encerrar a sessão. - O Sr. Joaquim Crisóstomo reclama documento" que ainda não lhe foram enviados, contra o que se insurge,

documentos que se referem ao comissariado português na Exposição do Rio de Janeiro. Replicou-lhe o Sr. Presidente e o Sr. Ministro da Agricultura.

O Sr. Presidente pede que as comissões enviem os seus pareceres para a Mesa, a fim de poder haver ordem do dia e encerra a seguir a sessão.

Srs. Senadores presentes à abertura da sessão:

Abílio de Lobão Soeiro.
Afonso Henriques do Prado Castro e Lemos.
António Alves de Oliveira Júnior.
António da Costa Godinho do Amaral.
António Gomes de Sousa Varela.
António Maria da Silva Barreto.
Artur Augusto da Costa.
Artur Octávio do Rêgo Chagas.
Duarte Clodomir Patten de Sá Viana.
Ernesto Júlio Navarro.
Francisco José Pereira.
Francisco Vicente Ramos.
Frederico António Ferreira de Simas.
João Maria da Cunha Barbosa.
Joaquim Pereira Gil de Matos.
José Augusto Ribeiro de Melo.
José Joaquim Fernandes de Almeida.
José Joaquim Pereira Osório.
José Mendes dos Reis.
Júlio Maria Baptista.
Luís Augusto de Aragão e Brito.
Luís Inocêncio Ramos Pereira.
Roberto da Cunha Baptista.

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Tomás de Almeida Manuel de Vilhena (D.)
Vasco Gonçalves Marques.

Entraram durante a sessão os Srs.

Alfredo Narciso Marçal Martins Portugal.
Aníbal Augusto Ramos de Miranda.
António Xavier Correia Barreto.
Elísio Pinto de Almeida e Castro.
Francisco António de Paula.
Francisco de Sales Ramos da Cesta.
Herculano Jorge Galhardo.
João Catanho de Meneses.
João Manuel Pessanha Vaz das Neves.
Joaquim Crisóstomo da Silveira Júnior.
Joaquim Manuel dos Santos Garcia.
Joaquim Xavier de Figueiredo Oriol Pena.
José António da Costa Júnior.
José Joaquim Fernandes Pontes.
Querubim da Bocha Vale Guimarães.
Ricardo Pais Gomes.
Rodolfo Xavier da Silva.
Rodrigo Guerra Álvares Cabral.
Silvestre Falcão.

Srs. Senadores que não compareceram à sessão:

António de Medeiros Franco.
Augusto Casimiro Alves Monteiro.
Augusto César de Almeida Vasconcelos Correia.
César Justino de Lima Alves.
Francisco Xavier Anacleto da Silva.
João Alpoim Borges do Canto.
João Trigo Motinho.
Joaquim Teixeira da Silva.
Jorge Frederico Velez Caroço.
José Augusto de Sequeira.
José Machado Serpa.
José Nepomuceno Fernandes Brás.
Júlio Augusto Ribeiro da Silva.
Júlio Ernesto de Lima Duque.
Luís Augusto Simões de Almeida.
Manuel Gaspar de Lemos.
Nicolau Mesquita.
Pedro Vírgolino Ferraz Chaves.
Raimundo Enes Meira.

Pelas 15 horas o Sr. Presidente manda proceder à chamada.

Fez-se a chamada.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 25 Srs. Senadores. Está aberta a sessão.

Vai ler-se a acta.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como nenhum Sr. Senador pede a palavra, considera-se aprovada. Vai ler-se o

Expediente

Requerimentos

Requeiro que, pela Direcção Geral dos Correios e Telégrafos, me sejam fornecidos esclarecimentos sôbre o procedimento do encarregado da estação telégrafo-postal de Tôrres Novas, que recebendo um telegrama do Sr. Presidente da República expedido pelo seu secretário geral para um Senador do distrito e endereçado para aquela localidade; em vez de o dirigir para o Senado, visto não estar presente em Tôrres Novas o seu destinatário, adoptou um expediente singular devolvendo-o à Secretaria da Presidência da República, com a nota de ser desconhecido o destinatário, que demais é Senador eleito pelo distrito. O Senador a que me refiro é o signatário.

Sala das sessões do Senado, 21 de Março de 1922. - Aníbal A. Ramos de Miranda.

Para a Secretaria.

Requeiro que, pelo Ministério do Interior, me seja fornecida a nota, a que se refere o oficio dessa Secretaria, n.º 7/39 livro 72 de 23 do corrente na parte respeitante e Lisboa e Pôrto. - Joaquim Crisóstomo.

Para a Secretaria.

O Sr. Ramos de Miranda foi substituído na Comissão Interparlamentar da Comércio pelo Sr. Ernesto Júlio Navarro.

Aprovado.

Requeiro que, nos termos da segunda parte do artigo 32.° da Constituição, seja enviada à Presidência da República, para ser promulgado como lei o projecto n.° 25 iniciado na Câmara do Senado, e por êste aprovado em sessão de 11 de Agosto de

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1920, e nesse mesmo dia remetido com. o ofício n.° 264 à Câmara dos Deputados, onde ficou com o n.° 585-E, mas sôbre o qual esta Câmara se não pronunciou até hoje.

Sala das sessões do Senado, em 28 de Março de 1922. - Joaquim Pereira Gil de Matos.

Papa à Secretaria para informar.

Do Ministério do Interior satisfazendo o requerimento n.° 12 de 3 do corrente.

Para a secretaria para dar conhecimento ao interessado.

Do Ministério da Justiça satisfazendo o requerimento n.° 62 de 21 do corrente do Sr. Joaquim Crisóstomo.

Para a Secretario para dar conhecimento ao interessado.

Telegramas

De vários cidadãos de Carregai do Sal sôbre a paragem do rápido ascendente.

Para a secretaria para dar conhecimento ao Sr. Ministro do Comércio.

Da Associação Comercial e Industrial de Caseais, pedindo a reparação das estradas,

Para a secretaria para dar conhecimento ao Sr. Ministro do Comércio.

Do Administrador do concelho de Évora, protestando contra a sua demissão dada pelo governador daquele distrito.

Para a secretaria para dar conhecimento ao Sr. Ministro do Interior.

Da Câmara Municipal de Sant'Ana, Madeira, pedindo para que nenhuma alteração seja feita ao actual regime sacarino sem ficar assegurada a laboração em cada zona.

Para o "Diário do Govêrno".

Da Câmara dos Deputados acompanhando a proposta de lei que manda cessar a aplicação do decreto n.° 7:984, de 22 de Janeiro de 1922, a partir dia em que a Companhia Carris de Ferro de Lisboa iniciar a cobrança das passagens nos seus carros.

Para a comissão de administração pública.

Pedido de licença

Pedido de 15 dias de licença do Sr. José Nepomuceno Fernandes Brás.

Aprovado.

Pedido de 10 dias de licença do Sr. Herculano Galhardo. Aprovado.

Projectos de lei

Dos Srs. Sá Viana e Santos Garcia, obrigando as Direcções dos Serviços de Obras Públicas e as Câmaras Municipais a plantarem ao longo das estradas, castanheiros, sobreiros ou oliveiras.

Para. a comissão de obras públicas.

Da comissão de faltas sôbre a justificação de faltas dos Srs. Querubim da Rocha Vale Guimarães e Aníbal Augusto Ramos de Miranda.

Aprovado.

Justificação de faltas

Dos Srs. Lima Alves o Querubim Guimarães.

Pará a comissão de infracções e faltas.

Pareceres

Da comissão de finanças, sôbre o projecto de lei n.° 8, concedendo às viúvas e filhos dos Srs. António Granja, vice-almirante Machado dos Santos, capitães de fragata José Carlos da Maia e Carlos Freitas da Silva, coronel Carlos de Almeida Botelho de Vasconcelos, a pensão mensal de 350$ e à família do chauffeur Carlos Gentil a pensão mensal de 160$.

Para imprimir e distribuir.

Da comissão de finanças, sôbre o projecto de lei n.° 12, exceptuando da desamortização estabelecida no artigo 2.° da lei n.º 742, todos os imóveis situados no concelho da Anadia que pela mesma lei foram cedidos à Irmandade da Misericórdia de Ovar.

Para imprimir e distribuir.

Da comissão de instrução, sôbre o projecto de lei n.° 15, extinguindo o curso integral de educação da mulher e restabelecendo o curso de preceptoras.

Para imprimir e distribuir.

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Ofícios

Da Câmara dos Deputados, acompanhando a proposta de lei que autoriza o Govêrno a aplicar ao pagamento das despesas dos serviços públicos, no corrente ano económico, mais três duodécimos, respeitantes aos meses de Abril, MEIO e Junho, do total das dotações de cada um dos Ministérios.

Para a comissão do Orçamento.

Do Presidente da comissão de inquérito aos presos, convidando os Sr. Senadores, que desejem prestar êste alto serviço, a enviarem as suas comunicações à Comissão.

Para o "Diário do Govêrno".

Do Bloco Croata remetendo exemplares duma declaração do mesmo bloco a fim de ser distribuído pelos membros da Câmara.

Para a Secretária.

Da Câmara dos Deputados, acompanhando a proposta de lei melhorando as pensões anuais dos societários reformados do Teatro Nacional Almeida Garrett.

Para as comissões de finanças e instrução.

Do Ministério da Agricultura, satisfazendo o requerimento n.° 49 de 10 do corrente, do Sr. Querubim dá Rocha Vale Guimarães.

Para a Secretaria, para dar conhecimento ao interessado.

Da família do vice-almirante Machado Santos agradecendo o voto de sentimento pelo seu falecimento.

Para a Secretaria.

Antes da ordem do dia

O Sr. Vasco Marques: - Sr. Presidente: pedi a palavra para V. Exa. me inscrever para quando estiverem presentes os Srs. Ministros das Finanças e Comércio.

O Sr. Costa Júnior:-Sr. Presidente: chamo a atenção do Sr. Ministro da Agricultura para o contrato feito com os produtores de açúcar e para o decreto n.° 6:911, de 8 de Setembro de 1920, publicado no Diário do Govêrno, assinado por todos os ministros, sendo Presidente do Ministério o Sr. António Granjo, em que ioi estabelecido o regime para os açúcares produzidos nas nossas colónias.

Segundo êste decreto, o importador era obrigado a transportar para o continente uma certa quantidade de açúcar em rama. Êste era estabelecido para o açúcar amarelo e as condições do decreto obrigavam o importador a dar ao Estado, para a Assistência, diversas quantidades de açúcar.

Dizem que as minhas afirmações, produzidas numa entrevista que tive com um jornalista, são erradas, indo eu demonstrar que não é assim.

O que é certo é que nenhum dos importadores cumpriu o contrato com rigor e o que é mais curioso é que nenhum dêsses Srs., deixou de exportar para o estrangeiro a quantidade que Lhe era permitida, o que nessa parte cumpriram com o contracto.

Mas para a metrópole é que não importaram o que deviam.

O curioso é que o Sr. Comissário dos Abastecimentos, ao abrigo duma disposição, alterou o preço fixado para mais oito centavos.

Pois êsse simples despacho do Sr. Comissário dos Abastecimentos deu lugar, para os importadores, a uma diferençado 1:000 contos, aproximadamente.

A Companhia do Buzi foi, ainda assim uma das que mais se aproximou do contrato.

O Sr. Ministro da Agricultura não tem culpa das irregularidades cometidas.

Mas esta Companhia, ao abrigo dum célebre edital, recebeu a mais a importância de 6.283$. E ainda foi modesta porque houve quem recebesse mais. Vejamos o que se passa com a Companhia do Açúcar de Angola.

Sôbre esta Companhia não pude fazer cálculos, porque ela fala apenas em ramas, não especifica. Não se sabe se importou açúcar amarelo ou branco, e por consequência não se sabe se cumpriu ou não o contrato.

Veja a Câmara como no Comissariado dos Abastecimentos se tratam êsies assuntos.

Quanto à firma Henry Burnay, só tenho a dizer que ela não cumpriu o contrato

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simplesmente por não ter í eito as importações nos meses em que deviam ter sido feitas.

A Companhia do Cazengo teve de lucros, em virtude do célebre edital, uma importância elevada.

A Companhia Agrícola do Sul da África, teve um caso de fôrça maior que a inibiu de fazer as importações, e em virtude disso o Estado dispensou-a de cumprir o contrato.

A Companhia do Boror foi uma das que menos faltou ao contrato.

Quanto à Companhia Agrícola da Ganda, basta ver o contrato para demonstrar que ou a cópia que me mandaram está errada ou não condiz com os mapas.

á O que está certo? São os mapas ou a cópia do contracto?

No contrato fala-se de um milhão de kilogramas; no mapa figuram simplesmente 99:000.

Portanto, a afirmação que eu fiz no Século, dizendo que havia êrro, era certa.

Deixei para o fim o maior importador de açúcar o Sr. Hornung. Segundo diz um jornal, a importação feita por essa casa devia ser maior e portanto o mapa respectivo também está errado.

Fica assim provado que o Estado deixou de importar, por conta dessas companhias e firmas, alguns milhões de quilos de açúcar, e que os documentos que me foram enviados pelo Comissariado dos Abastecimentos estavam errados.

O funcionário que os assina, depois da nota de está conforme, deve ser um mau funcionário, e nestas condições êle não deve continuar a desempenhar um lugar de tanta responsabilidade.

Chamo, portanto, a atenção de Sr. Ministro do Comércio para o procedimento dêsse funcionário, e termino agradecendo à Câmara a benevolência que teve para comigo.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro da Agricultura (Ernesto Navarro): - Sr. Presidente, ouvi com toda a atenção as considerações que acabou de fazer o Sr. Costa Júnior, relativamente aos fornecimentos de açúcar que os produtores deviam ter feito ao Estado, em harmonia com os compromissos tomados, de harmonia com as disposições legais.

Disse S. Exa. que um dos documentos que lhe foram, enviados pelo meu Ministério estava errado.

Do que S. Exa. se não pode queixar é de ter havido demora na sua remessa e como justamente se tratava de numerosas cópias natural é que pudesse haver qualquer engano nalgum documento.

O Sr. Costa Júnior: - Tenho a agradecer a V. Exa. a prontidão com que me mandou os documentos, assim como lastimo que, pelo Ministério da Guerra, não tenha havido a mesma consideração pelo Senado. Há mais de 15 dias que me chegaram os documentos vindos do Ministério da Agricultura, ao passo que, dos documentos que pedi pelo Ministério da Guerra, ainda me não chegou nenhum.

Sei que o Sr. Ministro da Guerra, não tem responsabilidade nisso, que essa responsabilidade é dos directores gerais, mas chamo a atenção de S. Exa. para o caso.

O Orador: - O que devo concluir das considerações do Sr. Costa Júnior é que S. Exa. se queixa do não cumprimento rigoroso, por parte dos fornecedores de açúcar, dos contratos feitos, sobretudo por não se fazerem os fornecimentos mensais correspondentes aos duodécimos que eram obrigados a satisfazer.

S. Exa. compreende que há casos de fôrça maior, que de facto se deram, que não podem deixar de ser considerados como por exemplo a falta de transportes nas ocasiões próprias.

A informação que tenho é que todas as casas cumpriram, excepto uma, entregando o açúcar devido, satisfazendo assim os seus compromissos.

Quanto à firma que constitui a excepção, já providenciei para a obrigar a cumprir o seu contrato.

Foi só relativamente a essa que eu tive de intervir, pelo facto de não ter cumprido as disposições legais, com o mau fundamento de que uma lei posterior tinha estabelecido disposições donde resultava não ser obrigada aos fornecimentos a que se tinha comprometido.

Em virtude disso, eu confirmei um despacho do meu antecessor pelo qual, ao abrigo das disposições da lei, se tomaram providencias no sentido dessa casa entregar as quantidades de açúcar em dívida.

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Quanto às outras casas, a justificação da falta consta dos próprios processes e, se não forneceram o açúcar só tempo competente, forneceram-no mais tarde.

Relativamente ao funcionário a que se referiu o ilustre Senador, devo dizer que tenho dêle as melhores informações no que respeita ao seu zêlo e assiduidade no serviço.

Julgo ter respondido às considerações do ilustre Senador Sr. Costa Júnior.

O orador não reviu.

O Sr. Costa Júnior: - Agradeço a resposta de V. Exa.

O Sr. Pereira Gil: - Envio para a ilesa um requerimento relativo a um projecto que, não lendo tido discussão numa cias Câmaras, deve ser publicado ao abrigo da Constituição.

O Sr. Godinho do Amaral: - Mando para a Mesa o parecer sôbre o projecto n.º 445, vindo da outra casa do Parlamento.

O Sr. Ministro da Guerra (Correia Barreto): - Pedi a palavra para dizer ao Sr. Costa Júnior que ia só um Ministro da Guerra, que sou eu, cumprindo, como pode, a minha missão; e devo dizer também a S. Exa. que os directores gerais, do meu Ministério são oficiais inteligentes, disciplinadores, cumprindo todos os seus deveres. Se tal não sucedesse, se êsses oficiais não tivessem essas qualidades, já não estavam à testa das respectivas repartições. Se alguma demora tem havido na remessa dos documentos que S. Exa. pediu, deve haver qualquer razão...

O orador não reviu.

O Sr. Costa Júnior: - A demora não tem explicações. Eu pedi que me mandassem os documentos à proporção que fôssem sendo copiados. Peço a V. Exa. que dê ordens terminantes para que me sejam facultados, para leitura, os documentos que preciso conhecer, pois creio alegar-se que há ordem para eu ver só determinados papéis.

O Sr. Ministro da Guerra (Correia Barreto): - Darei as ordens no sentido por V. Exa. desejado.

O Sr. Ribeiro de Melo: - Começo por Agradecer a presença do Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior, porque desejava a comparência de S. Exa. para tratar de casos que se referem à vida do Outubrismo.

A presença do Sr. António Maria da Silva é-me particularmente agradável, porque desejo que S. Exa. venha a esta Câmara o maior número de vezes possível, a fim de que nós possamos transmitir-lhe a impressão que sentimos por factos que pesam sôbre a administração pública.

O Sr. António Maria da Silva, que é um velho republicano com imensas responsabilidades na propaganda pela República o que foi, por assim dizer, um dos meus mestres políticos, tem uma alta responsabilidade em supurar a ferida lancinante que teve lugar na noite sangrenta de 19 de Outubro de 1921.

Não estranhe S. Exa. que eu defenda o Outubrismo pelos seus actos e que os justifique ou tente justificá-los, embora o Sr. Presidente do Ministério saiba, como sabe, que eu sou um dos Senadores filiados no Partido Republicano Português que dá o sou incondicional apoio aos actos do Govêrno presidido por S. Exa. quando êles não briguem, com a verdade e com o coração.

E que estou numa situação muitíssimo especial, Sr. Presidente!

Por acaso, e somente por um acaso, eu fui convidado, dadas as minhas relações pessoais com a alta figura da República e do movimento de 31 de Janeiro, o coronel Manuel Maria Coelho, para secretário particular de S. Exa.

No exercício dêsse cargo, todo de confiança, consagrei-me à obra do Govêrno da presidência de tam preclaro homem da República.

Integrado, portanto, no movimento de 19 de Outubro, eu não podia deixar de prestar os meus serviços ao Govêrno que se organizou a seguir a êsse, sob a presidência do coronel Maia Pinto, velho republicano, homem duma honestidade inconcussa o também com bastantes serviços prestados à República.

Conhecendo, tanto um como outro Presidente do Govêrno, pelo seu passado de republicanos e de homens públicos, eu deixei-me integrar, como disse, no movi-

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mento de 19 de Outubro, e acompanhei todos os actos dêsses governos com acrisolado carinho político e interêsse de republicano em satisfazer os desejos abnegados de todos quantos entraram nesse movimento, que teve por fim, segundo a declaração tácita dos seus dirigentes, fazer entrar nos princípios democráticos os destinos da República, que porventura, em governos anteriores, tinham sido mal amparados, embora fôssem dirigidos por pessoas de alta envergadura política e de confiança do regime.

Isto pôsto, é natural que eu estranhe a fobia encarniçada com que têm sido tratados alguns oficiais do exército de terra e mar pelo Govêrno republicano como é aquele a que preside o Sr. António Maria da Silva.

Sr. Presidente, fazer a história das revoluções em Portugal é uma cousa bem difícil, para a qual eu, neste momento, não estou preparado, embora a traga no coração.

Eu sei que o Sr Presidente do Ministério não tem a menor responsabilidade na prisão de alguns oficiais de terra e mar, e sei também que S. Exa. tem procurado - e isso só lhe faz honra e o dignifica- aliviar, tanto quanto possível, o sofrimento moral dêsses oficiais, que foram atirados para a Torre de S. Julião da Barra como se fôssem criminosos da pior espécie, quando com outros oficiais, que cometeram crimes de homicídio voluntário, foi diverso o procedimento.

Como exemplo, eu citarei o tenente Viegas Lata que, tendo assassinado o presidente da Câmara Municipal do Seixal. foi recolhido ao depósito de adidos, onde gosa duma certa liberdade que não o impede de passear pelas ruas da cidade.

Se nós quizéssemos comparar, a frio, o procedimento havido com êsse oficial, que é um criminoso que matou voluntariamente um cidadão prestimoso, com o procedimento tido para com os oficiais que estão presos na Torre de S. Julião da Barra, é natural que estranhemos essa inadmissível desigualdade de tratamento e aplicação de justiça.

Nesta estranheza, eu não envolvo o actual Govêrno, que me merece a maior simpatia e consideração, tanto mais que êle é composto de homens saídos do meu partido.

Perguntarei, no emtanto porque é que se prenderam êsse oficiais e os mandaram para a Torre de S. Julião da Barra?!

Segundo tenho lido nos jornais, pelo simples critério do Dr. Alexandrino de Albuquerque, que foi encarregado pelo Govêrno anterior, presidido pela Sr. Cunha Leal, e a pedido das famílias das vítimas, de investigar os acontecimentos sangrentos da noite de 19 de Outubro.

Sr. Presidente: por maior que seja a consideração que me merece o Sr. Cunha Leal, e merece-ma como soldado da Re: pública, eu não posso deixar de dizer que, se na ocasião em que foi aceita tal intimação das famílias das vítimas tivesse voz no Parlamento, eu lavraria aqui o meu protesto solene contra a nomeação do Dr. Alexandrino de Albuquerque, pelo carácter de suspeição que provoca iniludivelmente.

Nomeado que foi êsse magistrado, como juiz investigador dos acontecimentos de 19 de Outubro, o que é facto é que até hoje pouco mais do que nada investigou, tendo-se limitado a procurar na lei de contabilidade qualquer artigo por onde possa receber os respectivos vencimentos, e isto com menosprezo pela situação em que se encontram êsses oficiais, por êle, parece, votados ao esquecimento e às proporções de vítimas inocentes.

Mas, pregunto eu: Se a lei que criou a polícia de investigação criminal estabelece que à de Lisboa pertençam apenas três juizes, qual a razão porque o Sr. Alexandrino de Albuquerque foi, inconstitucional e ilegalmente, acrescentado ao quadro?

O Sr. Dr. Alexandrino de Albuquerque foi nomeado por imposição das famílias das vítimas - não quero dizer que S. Exa. não seja pessoa competente para desempenhar as funções do cargo - e os seus antecessores podiam ter-se conduzido doutro modo.

O Sr. Joaquim Crisóstomo (interrompendo): - Poderia dizer com mais coragem ...

O Orador: - Diz V. Exa. muito bem e eu quero agora referir-me a um dos adjuntos, o Sr. Paiva Lereno, que incumbido e encarregado de proceder ao inqué-

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rito dos acontecimentos da "noite trágica", tendo verificado que os depoimento e eram de muita gravidade, assustou-se da tal maneira, que terminou por dar parte de doente e pedir a troco de serviços um consulado em Xangai.

O Sr. Paiva Lereno sem a menor consideração pelos deveres do seu cargo, ausentou-se, passando a gozar as delicias dum hotel na cidade de Viseu. Mandado chamar, pediu desculpa e escusa de se apresentar imediatamente. No respectivo arquivo do Ministério do Interior, deve estar cópia de um telegrama que eu assinei em nome do Sr. Presidente do Ministério de então, determinando a S. Exa. que seguisse imediatamente, no primeiro comboio a apresentar-se ao Sr. Ministro do Interior.

De modo que, o primeiro encarregado pelo Govêrno do outubrismo de procurar os criminosos e investigar sôbre os crimes, por medo ou falta de competência, deu parte falsa de doente e foi para a província ou tonar.

Já vê o Senado que o Govêrno do Sr. Manuel Maria Coelho quis honrar os seus compromissos de castigar os criminosos e a ninguém é licito pôr dúvidas na minha afirmação, porque sei bem quantos esforços o chefe da revolução empregou como Chefe do Govêrno para castigar inexoravelmente os criminosos e os seus mandatários.

V. Exa. não ignora talvez que o Sr. Presidente de então, o Snr. Manuel Alaria Coelho jurou sôbre o cadáver 3êsse oficial de marinha, dêsse homem de bem a quem a proclamação da República tanto deve e cujo nome está esculpido em letras de ouro na história da República o capitão de fragata Carlos da Maia, que havia de castigar inexoravelmente os criminosos e que se os encontrasse os mandaria fuzilar.

Devo dizer também que sempre se encontroa da parte dos oficiais que estão presos na Torre do S. Julião da Barra o melhor propósito de contribuírem para a descoberta dos criminosos e o melhor desejo de dar toda a fôrça aos chefes do Govêrno para que se descobrissem os criminosos da noite de 19 de Outubro.

Isto são factos que eu garanto absolutamente, pois fui testemunha de presença.

As rainhas responsabilidades na revolução de 19 de Outubro são nulas; apenas como republicano que sou entendi sempre que não me devia recusar ao pedido de um sincero republicano e amigo para auxiliar os ministros que repute e considere como homens de bem e creaturas sem mácula.

Nesse momento bem trágico em que foram, assassinados êssses homens e republicanos sinceros, Machado dos Santos, António Granjo e Carlos da Maia, eu vi pela, primeira vez lágrimas nos olhos do heroe de 31 de Janeiro, dêsse republicano sem mácula, cuja vida pode ser para nós um exemplo de moralidade e de honestidade e modelo de virtudes cívicas.

Essas lágrimas de Manuel Maria Coelho eram sinceras, e tão sinceras que estando-se ainda no período revolucionário êle mandou chamar o chefe interino da Polícia de Segurança do Estado, que era então o Sr. Reis Júnior incumbindoro de de descobrir os criminosos da noite sangrenta de 19 de Outubro, chegando-lhe até a dar o prazo de 48 horas.

Êsse prazo porém findou, e os criminosos não puderam ser descobertos.

Imediatamente o Sr. Presidente do Ministério tratou de o substituir nesse lugar interino, nomeando o republicano sincero, o magistrado ilustre que apesar de ser novo ainda é porém uma pessoa competentíssima e de uma grande inteligência, o Sr. Barbosa Viana que era como actualmente integérrimo vogal do Tribunal de Defesa Social.

O desejo do Sr. Manuel Maria Coelho e dos seus colaboradores do Govêrno em descobrir os criminosos da noite de 19 de Outubro eram tão grandes que, tendo aparecido uma testemunha ocular dêsses acontecimentos sangrentos, foi ela protegida a tal ponto pelo Presidente do Ministério, que tendo após dias declarado que lho era manifestamente Impossível continuar a residir em Lisboa e que tinha naturalmente de embarcar para a África a exercer o seu mester ou a sua profissão, foi-lhe dada uma mensalidade para acudir às suas necessidades, para quês desta maneira não faltasse com o seu testemunho e com a sua presença para o apuramento dêsses crimes.

Sosseguem V. Exas. e em especial a minoria monárquica, porque a mensalidade

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que lhe foi arbitrada era insignificante e tirada da dificientíssima verba para despesas do gabinete.

Vejam pois V. Exas. como o Govêrno do Sr. Manuel Maria Coelho procurava descobrir êsses criminosos.

Analisado assim o procedimento do Sr. Manuel Maria Coelho, escalpelizado o procedimento de um adjunto da investigação, criminal, o Sr. Paiva Lereno, e apurado em simples palavras o procedimento correcto, republicano e honesto de todos quanto auxiliavam o Sr. coronel Manuel Maria Coelho, eu pregunto se há porventura o. direito de se adoptar a atitude que se está tendo com os oficiais que estão encarcerados na Torre de S. Julião da Barra como se fôssem criminosos indignos de lhes estendermos as mãos.

Perdoe-me a Câmara que eu mais uma vez proteste contra a forma desapiedada, injusta, como se estão tratando oficiais que envergam a farda do exército português, detidos por simples e muito discutíveis indícios de culpabilidade vistos atravez de uma parcialidade manifesta por parte do representante, primeiro oficioso e em seguida oficial das famílias das vítimas.

O Sr. Presidente: - Devo lembrar a V. Exa. que o Regimento apenas lhe permite falar durante 15 minutos. V. Exa. há meia hora que está falando. Só consultando a Câmara é que poderei autorizar a que V. Exa. continue no uso da palavra.

Vozes: - Fale, fale.

O Sr. Presidente: - Em vista da manifestação da Câmara pode V. Exa. continuar as suas considerações.

O Orador: - Agradeço à Câmara o ter autorizado que eu continue no uso da palavra; procurarei, porém, ser breve.

Sr. Presidente: é bom não esquecer de modo nenhum e por forma alguma o procedimento que se está tendo com os oficiais indigitados criminosos ou co-autores dos crimes de 19 de Outubro, comparado com o tratamento havido para com os autores do 5 de Dezembro e da Leva da Morte.

Se V. Exa., Sr. Presidente do Ministério, consultar a sua consciência, há-de ver que o procedimento dos governos republicanos que se seguiram a Monsanto não está do harmonia nem de acôrdo com os princípios democráticos e republicanos, e que V. Exa. pretende, e nisso tem todo o meu apoio, iniciar dentro da República, que todos desejamos honrar e dignificar.

Eu quero referir-me à revolução de 5 de Dezembro e a essa horda de salteadores que invadiram a casa de Afonso Costa, de Norton de Matos e de Leote do Rogo.

Êsses crimes não estão felizmente esquecidos na alma republicana de Lisboa, nem na consciência republicana do País.

A pregunta que eu agora vou fazer ao Sr. Presidente do Ministério e à Câmara dificilmente poderá ter resposta.

Se porventura os Srs. Afonso Costa, Norton de Matos e Leote do Rêgo tivessem sido encontrados nas suas residências quando êsses díscolos foram assaltar, o que teria sido feito e acontecido a essas grandes figuras da República?

Eu tenho a certeza de que não os levariam para o Arsenal, nem seriam justiçados numa encruzilhada da rua, mas nas próprias residências, ali. esquartejados e arrastados depois pelas ruas, e nem os cabelos ficariam para recordação das suas famílias e amigos, cuja fôrça e coragem seria incapaz de os salvar da fúria danada dos que invejavam o seu talento e refinadas qualidades de bons republicanos.

Quais foram, Sr. Presidente, as investigações que se fizeram para acudir à justiça republicana? Até hoje, que me conste e se saiba, absolutamente nenhumas!

O dezembrismo, do qual eu também fui uma das vítimas, nada fez para que êsses criminosos e salteadores fôssem castigados.

Todos decerto ainda devem estar bem lembrados dêsse monstruoso crime chamado a Leva da Morte, na qual perdeu a vida, entre outros, o nosso dedicadíssimo correligionário, o grande Visconde da Ribeira Brava, grande democrata, desde que êle foi Deputado progressista e que depois acompanhou a dissidência aberta nêsse Partido pelo falecido José de Alpoim.

O Visconde da Ribeira Brava trabalhou para a proclamação da República, desde o tempo em que se tentou fazer apear do

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Poder João Franco, e trabalhos com alma e coração ao lado dos revolucionários do Partido Repúblicano.

Todavia as homenagens póstumas que se oneram a êste grande homem, a êste dedicadíssimo correligionário. Limitaram-se, por parte da Câmara Municipal, a mandar substituir o nome da rua onde se deu êste aviltante crime pelo nome de Leva da Morte.

Está dito tudo: os criminosos desapareceram e apenas foram chamados à barra dó tribunal dois polícias que nada disseram e que tiveram do ser absolvidos.

Eu sei, com franqueza, que a nessa polícia não se pode tomar para medeio de comparação com o procedimento que deve ter o Govêrno da presidência do Sr. António Maria da Silva.

O que eu queria que S. Exa. me disse era qual a razão por que ainda [...] homens.

Se porventura os Governos que se seguiram [...] sangrema [...] outros, se os chefes dos Governos, Manuel [...] Coelho e [...] Pinto, me fôssem [...] conhecida e de uma severidade de costumes políticos que os nobilita, onde é que tinha ido parar o movimento de 19 de Outubro e o que tinha sucedido à Republica e à Pátria, mormente no tempo em que a nacionalidade foi espreitada petos cruzadores de duas ou três nações amigas e aliadas?

Na província não houve revolta contra os actos praticados pelos Govêrnos de Manuel Maria Coelho e Maia Pinto. O movimento de 19 de Outubro fez-se nem contra nem a favor dos partidos. Não há ninguém que depois de constituído o Govêrno da presidência de Manuel Maria Coelho possa dizer que foi menosprezado qualquer republicano pelo Govêrno de S. Exa., è perseguido de qualquer modo.

Se S. Exa. o Sr. Fernandes de Almeida está naturalmente revoltado contra os acontecimentos do Arsenal, mas S. Exa. não pode trazer à Câmara um exemplo até perseguição da parte do Govêrno de Manuel Maria Coelho.

Nem o velho republicano de 31 de Janeiro, nem o Sr. Maia Pinto, seu sucessor, em tal consentiriam.

O Sr. Maia Pinto, entro outras razões quando lhe falavam de ditaduras, dizia bem alto que não promoveria uma ditadura nem de facto nem de direito, porquanto êle, como governador numa província do ultramar tinha-se negado a cumprir um acto de ditadura eleitoral, preferindo vir prisioneiro do Govêrno para a metrópole, do Govêrno, que é bom lembrar, da Presidência do Sr. Pimenta de Castro.

No espírito dêstes homens verdadeiramente patriotas e republicanos e de muitos outros que trabalharam para o movimento de 19 de Outubro não cabia fazerem um movimento para que perdesse a vida António Granjo, para que uma horda, de assassinos matasse pelas costas Machado Santos, e não fizeram êsse movimento para que fôssem a casa de Carlos da Maia arrancá-lo dos braços de sua esposa e de seus filhes e de todos êsses que pagaram com a vida a sua dedicação às instituições vigentes, e por serem figuras tam altas e tam nobres da República, é que a província se revoltou cheia de indignação pelos acontecimentos...

O Sr. Fernandes de Almeida: - E que sucederam só quer tivesse aparecido um Govêrno a manter a ordem?

A província teria intervindo desde que não aparecesse um Govêrno como o actual, que tem sabido manter-se à altura que exige o prestígio da República!

O Orador: - Não me admira a interrupção de V. Exa. A revolução de 19 de Outubro apeou um Govêrno saído do partido a que V. Exa. pertence. Se V. Exa. tem que acusar o movimento peça a palavra, que eu me apressarei a responder-lhe no caso de não corresponderem à verdade as suas afirmações.

O Sr. Fernandes de Almeida: - A revolução de 19 de Outubro representa se por uma porção de lama lançada às faces do regime.

O Orador: - Ora, Sr. Presidente, se V. Exa. quiser olhar com olhos de ver e com a consciência de bom republicano, se V. Exa. quiser apreciar os acontecimentos políticos que se produziram com imparcialidade, V, Exa. há-de ficar convencido, como eu, de que a justiça republicana, a justiça portuguesa, não pode cen-

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surar os governos dos Srs. Manuel Coelho e Maia Pinto, os quais prestaram relevantes serviços ao país, já por não terem aumentado a circulação fiduciária, não abriram as portas das repartições para as entregar a uma nova avalanche de funcionários e porque puseram em todos os seus actos a maior moralidade administrativa, como sucedeu no caso de haver um Ministro do Trabalho que, aproveitando-se duma verba existente, no seu Ministério, lançou sôbre a sua região eleitoral dezenas de contos de réis sem consultar os colegas no Ministério e sem atender às necessidades do resto do país. O outubrismo soube fazer justiça. O Govêrno do Sr. Manuel Maria Coelho lançou à margem êsse Ministro, que saiu sem o respectivo decreto de demissão mencionar as sacramentais palavras de que servira com zelo e proficiência. Assim procedeu o outubrismo. E eu não conheço na história da República facto semelhante, a não ser aquele que se deu com o Govêrno presidido pelo intemerato republicano e nosso Ministro plenipotenciário em Paris, o Sr. João Chagas que também demitiu, secamente, o Ministro da Guerra, general Sr. Pimenta de Castro, que já só preparava, naquela altura, para entregar a honra e a dignidade da República aos inimigos do regime.

Veja V. Exa., Sr. Presidente, qual é a obra dos dois governos outubristas, os quais puseram também cobro às roubalheiras e traficâncias da Exploração do Pôrto de Lisboa, dos Transportes Marítimos do Estado e caminhos de ferro do mesmo Estado. Foi preciso que viesse um Govêrno saído da revolução de 19 de Outubro para que se fizesse a substituição imediata duma administração imoralíssima. E, escusado é negá-lo, os Govêrnos dos Srs. Ounha Leal e António Maria da Silva reconheceram a boa orientação administrativa do outubrismo, pois o primeiro conservou o Ministroda Marinha outubrista, e o segundo manteve aquele que mais responsabilidades tinha em todos êsses actos apontados.

Sabido que esta revolução de 19 de Outubro foi uma revolução de carácter puramente militar, está-se no entanto especulando a tal ponto que eu vejo nos jornais a todo o instante o desejo que há de ir procurar até o mais íntimo do lar sagrado os civis que porventura surgiram depois do triunfo dêsse movimento.

Não tenho dúvida em afirmar que quási 80 por cento dos revolucionários conhecidos como tal, pertenciam ou estavam filiados no Partido Republicano Português; mas o seu partidarismo é tam nobre, que êles não renegaram o seu Partido pelo facto de terem entrado nessa revolução republicana.

Não tenho também dúvida em afirmar que quasi toda a população de Lisboa estava com êsse movimento.

Eu sou de opinião que o Sr. Presidente do Ministério quererá que toda a luz se faça sôbre êste caso, e que S. Exa. será o primeiro interessado em que a mais ampla das discussões recaia sôbre os acontecimentos de 19 de Outubro.

O Sr. Presidente: - Peço a V. Exa. a fineza de resumir as suas considerações, visto que a hora vai adeantada.

O Orador: - V. Exa., Sr. Presidente, é o soberano democrático desta Câmara e eu acato as resoluções que V. Exa. tomar.

Não posso, porém, terminar já as, minhas considerações, visto que ainda tenho alguns pontos a tratar. Nestas circunstâncias peço a V. Exa. a fineza de me reservar a palavra para amanhã.

Vozes: - Fale, fale.

O Orador:-Agradeço à Câmara a sua atenção para comigo. Eu vejo com desgosto o tratamento que está sendo dado aos oficiais presos em S. Julião da Barra, e estranho que êsses oficiais fôssem mandados como reclusos para essa prisão quando pelo seu passado e péla sua categoria, pois um dêles foi antigo ministro da República e por quem deve haver por emquanto toda a consideração.

Eu bem sei que o Sr. Presidente do Ministério me irá responder com o caso Caillaux e com outros sucedidos no estrangeiro e que nós pretendemos imitar.

Mas êste não é um caso idêntico ao que lá fora se poderia ter cometido, pois há apenas leves indícios de suspeita.

Melhor fora portanto que a êsses oficiais se tivesse dado uma prisão nos quartéis respectivos, ou prisão com homenagem na cidade.

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Isto seria mais humano e mais justo. Não se fez porém isso, e atiraram se êsses oficiais para a torre de S. Julião da Barra. Não faz sentido que em quanto êsses oficiais estão ali presos apenas por suspeita, outros acusados de homicídio voluntário estejam presos em quartéis.

E já lá vão três meses quando o agitador Ghandi, da Índia, já em menos tempo, foi julgado e condenado por crime de insurreição. É que a justiça inglesa, prefere em matéria política aos crimes comuns.

E preciso haver justiça. E preciso que V. Exa., Sr. Presidente do Ministério, trate de indagar e fazer novas sindicâncias ao caso da Leva da Morte e do 5 de Dezembro, e que mande para a cadeia todos aqueles que assaltaram as casas de Afonso Goste, de Norton de Matos e de Leote do Rêgo.

E preciso que isto se faça; só depois disto feito é que a minha alma de republicano se ajoelhará perante a alta envergadura de V. Exa. e lhe agradecerá ter implantado dentro da República a mais alta noção da Justiça.

Até lá, porém, esteja V. Exa. de sobreaviso e não consinta que as investigações estejam prejudicando êsses oficiais, pois que as estão demorando propositadamente e protelando-as sistematicamente.

E preciso que V. Exa. desfaça a lenda de que nem todos os outubristas são Dentes de Ouro.

Dente de Ouro há apenas um, assalariado por integralistas monárquicos para fazer baquear aquelas altas figuras da República.

O caminho que eu aconselho a V. Exa. é o de dedicar-se completamente a essas investigações, pois a elas está intimamente ligado o problema da ordem pública, e só terão bom resultado quando se lhes imprimir brevidade no apuramento de responsabilidades.

Faça V. Exa isso mas com aquele espírito de Justiça e decisão que V. Exa. costuma pôr em todos os seus actos e creia que com isso dignificará o regime.

Tenho dito.

O Sr. Alves de Oliveira: - Pedi a palavra para mandar os pareceres respeitantes aos projectos de lei n.ºs 8 e 12.

O Sr. Vicente Ramos: - Pedi a palavra para mandar para a Mesa o relatório da comissão cessante que tinha sido encarregada da sindicância ao extinto Ministério dos Abastecimentos e Transportes, pedindo a V. Exa. para que se digne mandá-la publicar no Diário do Govêrno, caso a Câmara dos Senhores Deputados ainda não tenha resolvido essa publicação.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (António Maria da Silva): - Sr. Presidente, eu tinha sabido por V. Exa. que o Sr. Ribeiro de Melo desejava que eu estivesse presente numa das sessões desta casa do Congresso e, logo que os serviços da outra casa me permitiram, vim aqui.

Infelizmente, porém, nesse dia já tinha terminado a sessão do Senado.

S. Exa. surpreendeu-me hoje com uma verdadeira interpelação, e se neste assunto eu posso prontamente responder, em qualquer outro poderia não ter a mesma facilidade e seria para mim uma contrariedade grande não dar uma resposta pronta às considerações de qualquer dos ilustres ornamentos desta Câmara.

O Sr. Ribeiro de Melo queixou-se de actos desapiedados do Govêrno prendendo, como S. Exa. disse, oficiais indiciados nos morticínios de 19 de Outubro.

Devo dizer a S. Exa. que essa queixa não é cabida, porque não foi o Govêrno que mandou prender quaisquer pessoas indiciadas nesses morticínios, mas sim quem de direito.

Digo quem de direito, apesar do Sr. Ribeiro de Melo ter afirmado que o 3.° adjunto do juízo de investigação criminal fora nomeado inconstitucional e ilegalmente.

Nunca na minha vida política me acobertei no seguimento de determinados actos com a responsabilidade de quem quere que seja, principalmente quando estou convencido de que, como agora, o Govêrno do Sr. Cunha Leal, nomeando o Sr. Dr. Alexandrino de Albuquerque 3.° adjunto do juízo a que me referi, procedeu nos termos da lei.

Estavam nomeados simplesmente dois, a lei permitia nomear três, e o orçamento incluiu na respectiva rubrica o terceiro simplesmente não marcou a importância a abonar-lhe.

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Foi um lapso do orçamento de que não tem culpa o Govêrno do Sr. Cunha Leal nem o Govêrno actual.

Fui, portanto, coagido a trazer ao Congresso da República uma proposta de lei tendente a sanar êsse defeito do orçamento. Pedi a urgência e estou convencido que a Câmara dos Srs. Deputados não deixará de aprovar essa proposta de lei e que o Senado lhe dará também o seu assentimento, ficando o assunto devidamente arrumado.

Relativamente aos autos levantados pelo Sr. Dr. Alexandrino de Albuquerque, devo dizer que têm fôrça de corpo de delito e mal tem sido - até para a administração da justiça neste capítulo - que tanta entrevista, que tanta cousa se dissesse que se não devia ter dito, pela perturbação que tudo isso causa.

Quere dizer, o Sr. Dr. Alexandrino de Albuquerque foi nomeado legalmente, ao abrigo da disposição da lei. Os autos nos tribunais têm também fôrça de corpo de delito.

Mas o Govêrno encontrou o Sr. Dr. Alexandrino de Albuquerque no exercício das suas funções e o Govêrno não tem que ver com questões de justiça.

Depois, Sr. Presidente, acima de todas as espingardas e de todas as baionetas está a opinião dêste país.

O Sr. Ribeiro de Melo (interrompendo): - Eu não culpei o Govêrno de V. Exa....

O Orador: - O que eu posso dizer a V. Exa. é que as diversas étapes da minha vida política não dão direito a ninguém do suspeitar sequer do que acabo de afirmar.

Praticou-se um acto que enodoa a história da política portuguesa; afirmou-se que havia receio de mandar prender pessoas categorizadas e verificou-se que assim não é, para honra do regime e prestígio do Poder Executivo.

Mas não é só em crimes de tal natureza que assim se procede.

O Sr. Ribeiro de Melo (interrompendo): - Oportunamente tratarei dêsse assunto e me referirei à parte relativa ao coronel Sr. Liberato Pinto e a outro oficial.

O Orador: - Mas há mais, ainda. Há o que se diz no artigo 70.° da Constituição da República.

Quem é militar sabe perfeitamente que não se segue no foro militar do mesmo modo que no foro civil.

O Sr. Ribeiro de Melo (interrompendo): - Não se cumpre religiosamente o que V. Exa. acaba de dizer e eu trarei o assunto à Câmara...

O Orador: - O argumento apresentado pelo ilustre Senador, de que nem sempre assim se fez, não serve, para mim.

Se me dissesse "o Sr. não tem feito isso", então, sim, poderia apresentá-lo e com razão ;• era uma censura, mas merecida. Mas, estar agora a dizer cousas que eu não fiz e que eu não tenho culpa naquilo que outros fizeram, não pode ser.

O Sr. Alexandrino de Albuquerque requisitou êsses oficiais por intermédio do Comandante Geral da Guarda Repúblicana, do Ministério da Guerra e do da Marinha, porque havia oficiais incluídos no processo. Estava no seu pleno direito.

O Govêrno, logo que recebeu estas requisições, entendeu, e eu entendi também, que se lhe devia dar plena satisfação. E então, ao Sr. Alexandrino de Albuquerque, que havia feito um só ofício, eu pedi que o desdobrasse em dois e fôssem dirigidos a quein de direito. Foi o que se fez.

Estranhou o ilustre Senador que os oficiais presos fôssem para um forte. Eu é que tenho que admirar-me da estranheza de S. Exa. porquanto S. Exa. sabe que isso sempre se dá quando os oficiais estão implicados em crimes â que corresponda pena maior.

O Govêrno não pode discutir com pessoas de direito. Cumpre simplesmente o seu dever. O que o Govêrno tem feito e fará é fazer com que os processos caminhem. (Apoiados).

Nunca persegui ninguém. Tenho, por consequência, autoridade para falar.

Entre os oficiais presos encontra-se um que numa reunião de militares protestou contra aqueles que queriam tentar contra a minha vida e apesar disso estará preso até se verificar, pelos meios legais, a sua inculpabilidade nos crimes de 19 de Outubro.

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Bem se pode dizer que não houve idêntico procedimento àquele havido em õ do Outubro de 1910, quando eu e Machado Santos proclamávamos o respeito à vida dês nossos semelhantes, e que de levou em 10 de Maio pelos mesmos sentimentos a colocar-me em atitude agressiva diante de um oficial.

Os revolucionários não são assassinos.

Mas em 19 de Outubro não se evitaram êsses assassínios, e a êsse oficial que me procurou para me avisar do perigo em que eu estava, a êsse mesmo eu mais tarde disse que seria bom sacudir de si a responsabilidade de uma camaradagem que lhe era prejudicial.

Quanto se Sr. Manuel Maria Coelho, S. Exa. que não tinha a intenção de entrar em revoluções, entrou contado nela.

Ora, são os actos que provam as boas intenções, e as boas intenções sem os actos nada significam.

Disse o Sr. Ribeiro de Melo que teve comparticipação no movimento, e eu tive-a em sentido contrário.

Está S. Exa. dentro do Partido Democrático, e assim podemos defender as nossas opiniões.

Dêste modo afirmo, que se se evitasse êsse movimento sem finalidade, não tínhamos que lamentar nem a prisão dêstes nem a morte daqueles.

Era desnecessário êsse movimento. Sabia que António Granjo caía quando se quisesse; que o nosso partido tomaria ES rédeas do Govêrno quando as pretendesse e essas pessoas que me caluniara hoje, no momento em que a cidade estava sem Govêrno, vinham ter comigo para 38 aconselharem com receio doma intervenção, para que realmente se evitasse o que era natural numa cidade onde existia a anarquia.

Eu ocultei muita cousa porque entendi que para se praticar a justiça não havia necessidade de se trazer o rol da roupa soja.

Não sei pura que, estar a afirmar sempre que o Govêrno tinha a fôrça pública, eu não desejo que êste Govêrno tenha a força pública e a fôrça da polícia; o que eu desejo é que êste Govêrno tenha a fôrça e o apoio de todos, os portugueses. Os militares o que têm é de cumprir os seus deveres; os comandos não são para manter esta ou aquela política, êste ou aquele Govêrno, são para manter a disciplina e não poder haver exército tem que a disciplina se mantenha.

O nosso exército, ainda há pouco, deu suficientes provas da sua disciplina, sabendo cumprir rigorosamente o seu dever, respeitando as ordens dos seus superiores.

Foi por faltas do comando, por falsos princípios de educação que nós chegámos a êsse estado e à prática de actos que temos a lamentar.

O Govêrno não deseja violências para ninguém, o seu desejo é apenas assegurar a marcha da justiça, ela tem a palavra, mas só eu, mais ninguém. (Muitos apoiados).

Emquanto aos crimes anteriores o Govêrno não tem a responsabilidade do que então se passou e se algum funcionário não cumpriu o seu dever, basta V. Exa. dizer ao Sr. Ministro da Justiça, que êle pelos meios directos ou indirectos os fará cumprir o seu dever.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem. Muito bem.

O orador foi muito cumprimentado por todos os lados da Câmara. O orador não reviu.

O Sr. Ribeiro de Melo: - Agradeço ao Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior á resposta que se dignou dar-me. S. Exa. reconheceu, pela forma como falei, que não sou um réprobo, mas sim um republicano que teve por fim provocar explicações da parte do Govêrno actual.

O Sr. Presidente: - Estão sôbre a Mesa dois pedidos de licença - um do Sr. José Fernandes, e outro do Sr. Herculano Jorge Galhardo. O primeiro pede 15 dias de licença e o segundo 10 dias para tratar da sua saúde.

Consultado o Senado sôbre êstes pedidos de licença, resolveu afirmativamente.

O Sr. Ramos de Miranda: - Mando para a Mesa, um requerimento relativo a uns atropelos praticados nos correios e telégrafos.

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O Sr. Oriol Pena - Senhor Presidente: Mando para Mesa um telegrama, quê acabo de receber, da Associação Comercial de Cascais, para o qual peço a atenção do Govêrno, e em que se fazem reclamações fundadas para se acudir urgentemente ao estado miserável das estradas daquele concelho, algumas das quais estão intransitáveis.

Como está presente o Sr. Presidente do Ministério, a quem apresento os meus cumprimentos, desejo também chamar a atenção de S. Exa. para o que me contam a respeito do jôgo de azar, que está tomando aspecto de gravidade na cidade de Viseu.

Dizem da bela cidade de Viseu que se joga ali desenfreadamente a "roleta" e o "monte" e que as casas de jôgo são frequentadas também por menores e estudantes.

Que os exploradores dessas tavolagens levam a falta de escrúpulos a terem contratado raparigas de costumes duvidosos como colaboradoras, na exploração que fazem dos vícios dos frequentadores, e que o descaro chega ao ponto de, nas casas de jôgo, haver também camas à disposição das visitas.

S. Exa. há pouco afirmou, no seu discurso, feliz e brilhante, a intenção de fazer cumprir a lei e manter a ordem, seja como e contra quem fôr, e ouviu os aplausos das pessoas que o escutavam e assim confirmaram o apoio que nessas questões, todos os lados da Câmara lhe afirmarara, já há tempo.

É isso que eu lhe peço mande fazer naquela cidade, dando ordens terminantes nesse sentido aos seus delegados.

Está também presente o Sr. Ministro da Agricultura, a quem desejo dizer algumas palavras, a respeito do decreto sôbre vinhos que vem publicado no Diário do Govêrno de hoje.

Lamento que S. Exa. tivesse conservado o eixo em torno do qual girou toda a nocividade do mau decreto, que eu sustentei aqui não poder ter conserto digno dêsse nome.

Ainda assim S. Exa. sempre afastou de companhias duvidosas os vinhos do Douro, limitou a tolerância à cidade do Pôrto e baixou a graduação exigida para 10 grau, reconhecendo assim, implicitamente, que a colheita do ano é tam má, que até os vinhos do Douro podem não ter mais de que 10 graus.

S. Exa. melhorou o decreto num ponto e, aí, é de louvar o que fez. Trucidou deliberadamente a coorte de improvisados analistas que os decretos anteriores tinham inventado es com essa decisão, livrou-nos duma praga que devia ser abominável e bastante incómoda.

E de simples justiça afirmá-lo e louva-lo por o ter feito, embora isso não seja suficiente para tornar o decreto aceitável.

A hora vai adiantada; nada se lucra em que alargue as minhas considerações; termino aqui.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (António Maria da Silva): - O Sr. Oriol Pena chamou a minha atenção para o jôgo na cidade de Vizeu.

Eu devo dizer a S. Exa. que tenho telegrafado a todas as autoridades da República, proibindo terminantemente o jôgo.

Emquanto fôr lei da República a proibição do jôgo, as autoridades de mim dependentes têm do cumprir as minhas ordens, tanto mais que elas são absolutamente legais.

Como S. Exa. compreende eu não posso ter conhecimento de todas as transgressões que se fazem nem de todos os abusos que se praticam. Eu vou telegrafar a essa autoridade ordenando-lhe mais uma vez que reprima com energia o jôgo, se é que êle se está fazendo naquela cidade, como S. Exa. acaba de afirmar.

Emquanto o jôgo não fôr regulamentado, óós tomamos isso como ama indicação e neste caso o Govêrno reprimirá com energia o jôgo.

O orador não reviu,

O Sr. Ministro da Agricultura (Ernesto Navarro): - Respondendo ao Sr. Oriol Pena, eu devo dizer a S. Exa. que na verdade foi publicado o decreto a que S. Exa. se referiu.

Como já há dias declarei, estive estudando as modificações a fazer ao decreto sôbre a marcação alcoólica dos vinhos. São essas modificações que aparecem agora no decreto há pouco publicado, modificações que muitas delas estão de harmonia com o que S. Exa. aqui expôs e que decerto o satisfarão.

Outras reclamações aqui apresentadas

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16 Diário das Sessões do Senado

por S. Exa. é que não puderam ser atendidas.

O orador não reviu.

O Sr. Pais Gomes: - Eu já por vezes aqui me tenho referido na presença do Sr. Ministro do Comércio ao facto da Companhia dos Caminhos de Ferro da Beira Alta estar a levantar dificuldades de toda a ordem ao transporte dos vinhos da região do Dão.

Ainda há pouco eu recebi um telegrama do concelho tributário daquele. Carregai do Sal, no qual me pedem providências. Eu mando êsse telegrama para a Mesa pedido a V. Exa. Sr. Presidente a fineza de o fazer chegar ás mãos do Sr. Ministro do Comércio.

O Sr. Ramos de Miranda:-Sr. Presidente: Eu tive a honra de ver o meu nome incluído na Comissão Interparlamentar do Comércio. No entretanto, circunstâncias especiais impõe-me o dever de solicitar que o meu nome seja substituído por outro indicado pelo leader do meu partido, que é segundo me parece o Sr. Ernesto Navarro.

Posto à votação o requerimento da escusa, foi aprovado.

O Sr. Ribeiro de Melo: - Pedi a palavra para preguntar à Mesa se porventura já foi satisfeito o pedido que eu fiz relativo ao Ministério da Agricultura.

Êsse pedido é um extracto do processo de demissão que foi dado ao 1.° oficial Sr. José Augusto Sousa Campos.

No caso de ainda não estar aqui êsse extracto, eu pedia ao Sr. Ministro da Agricultura a fineza de me informar se êsse processo já deu entrada no seu Ministério.

O Sr. Ministro da Agricultura (Ernesto Navarro): - Êsse processo já deu entrada no meu Ministério.

Como V. Exa. compreende, êsse processo não é fácil copiar de um dia para o outro, e nestas circunstâncias eu pedia a S. Exa. a fineza de ir ao meu Ministério analisar êsse processo, e pedir cópia dos documentos que julgue precisos.

Creio que desta maneira êsse pedido poderá ser satisfeito em muito menos tempo do que se fôr copiar todo o processo, além de que daria muito menos trabalho à repartição competente. Êste pedido que eu faço a S. Exa. torno-o extensivo a todos os Srs. Senadores e é: Quando S. Exas. quiserem quaisquer documentos irem consulta-los ao meu Ministério e depois pedirem uma cópia dos documentos que necessitarem. Desta maneira não só se poderá satisfazer com mais brevidade êsses pedidos como se evita trabalho e atraso para as respectivas repartições.

O orador não reviu.

O Sr. Vasco Marques: - Sr. Presidente: eu desejo chamar a atenção do Sr. Ministro das Finanças para uma questão que reputo muito importante, e que, infelizmente, até hoje não teve solução alguma, muito embora por mais de uma vez eu aqui tenha chamado a atenção dos anteriores Ministros para tal assunto.

Da última vez em que o fiz, era Ministro das Finanças o Sr.. Cunha Leal, que ouviu muito atento a minha exposição, prometendo estudar o assunto e resolvê-lo.

Todavia, e certamente por absoluta impossibilidade, nada fez, continuando tudo como dantes.

Eu refiro-me Sr. Presidente aos chamados bens dos Sanatórios da Madeira.

O Sr. Ministro das Finanças, que é pessoa muito viajada, talvez conheça de vista tais bens, cuja história sucintamente farei.

No tempo da monarquia, foi pedida uma concessão na Madeira por parte de alguns alemães que obtiveram deferimento, e depois, por questões que surgiram, essa concessão foi anulada e o Estado teve de pagar uma indemnização que creio ter sido de 1:200 contos.

Os bens, que até então pertenciam aos alemães, passaram para a posse do Estado. Eis resumidamente o caso.

Tais bens constam de móveis e imóveis, como roupas, mobílias, vinhos, ferragens, louças, propriedades rústicas e urbanas, água potável e de irrigação, etc., haveres êstes que representam uma autêntica fortuna.

Pois o Estado, na posse de bens tam importantes, tem-se limitado a mante-los como pode e sabe, encontrando sempre no Sm de cada ano um déficit, quando no geral as propriedades dos particulares apresentam saldo positivo!

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O mal, porém, não reside só nisto, mas muito principalmente na desvalorização que tanto as casas como os bens móveis estão a sofrer dia a dia, bastando dizer que o chamado "sanatório dos pobres", que era um belíssimo edifício situado numa aprazível encosta, do Funchal, se encontra perfeitamente abandonado à acção do vento, das chuvas, com as janelas sem vidros e as portas desconjuntadas, sendo hoje uma triste sombra do que era quando o Govêrno português dêle tomou posse.

A continuar tam estranho abandono, o Estado acabará por possuir apenas ruínas, porque os demais edifícios acusam também evidentes estragos.

Numa época em que, mais do que nunca e bem justificadamente se fala em aproveitar escrupulosamente o que temos, para corrigir a má situação em que nos encontramos, não faz sentido que o Estado esteja na posse de bens tam importantes e dêles não faça caso, deixando-os abandonados e improdutivos.

Demais as estações competentes têm chamado a atenção dos respectivos Ministros para a necessidade absoluta de procurar uma solução para êste caso e o actual Sr. Ministro, com os dados que há-de encontrar nas respectivas repartições pode e deve achar essa solução.

Continuar o Estado de abandone criminoso em que se encontram os bens a que me venho referindo é que se torna inconcebível.

De notar é que neste momento o Sr. Portugal Durão está numa situação bem melhor do que os seus antecessores porquanto, entre os bens aludidos há uma quinta por sinal muito importante e valiosa, por ser talvez a mais bem situada de toda a ilha da Madeira, a chamada Quinta Vigia, verdadeiro mimo de gôsto e formusura, que até. agora se encontrava na posse da guarda republicana, pois lhe fora dada para quartel, o que de todo cessou por ter o Sr. Ministro do Interior praticado um acto de boa administração, acabando com a guarda na Madeira.

De facto, uma cidade como o Funchal que tem um regimento de infantaria, uma bataria de artilharia e um corpo de polícia cívica, não precisa de que o Estado dispenda muitos milhares de escudos com a guarda republicana.

O actual Sr. Ministro das Finanças encontra a Quinta Vigia despejada, e, portanto, arredado um importante óbice, podendo, por isso, dar a esta quinta como aos demais bens, uma proveitosa aplicação, ao passo que neste particular os seus antecessores esbarravam com a dificuldade de não ter onde colocar a aludida guarda.

Tem, pois, o caminho completamente desembaraçado para agir à vontade e consoante os verdadeiros interêsses da Nação.

S. Exa. vai naturalmente dizer-me que estudará o assunto, resposta que é costume dar a todas as reclamações dos parlamentares; mas eu peco-lhe o obséquio de, após êsse estudo, tomar uma resolução e comunicá-la ao Senado, para assim ficarmos inteirados de que o Govêrno na verdade... governa.

Quero também chamar a atenção do Sr. Ministro das Finanças para o seguinte:

Os povos da Ilha do Pôrto Santo vêm reclamando, desde há muito, contra o factor que lhes foi aplicado para o lançamento das contribuições, porque, em virtude dum êrro manifesto, êsse factor é demasiadamente elevado, resultando daí que sendo o Pôrto Santo a terra mais pobre e mais abandonada em todo o arquipélago é exactamente aquela que paga mais contribuição.

Em face de tam prejudicial e injusta, situação os contribuintes reclamaram, e a Junta Geral, achando justos os clamores, reclamou também no mesmo sentido.

E preciso notar que da redução do factor nenhum prejuízo resulta para o Estado, porquanto tal contribuição não reverte em seu favor, mas sim constitui receita da Junta Geral do Distrito, que prefere ver um pouco diminuídos os seus rendimentos a aproveitar duma flagrante injustiça.

Eu vou entregar a V. Exa. Sr. Ministro, um memorial sôbre o assunto, a fim de que melhor possa estudá-lo e resolvê-lo com a desejada brevidade.

Tenho dito.

O Sr. Ministro das Finanças (Portugal Durão): - Sr. Presidente: conheço a questão dos sanatórios da Madeira, porque na ilha passei algumas vezes.

É verdadeiramente uma pena que este-

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18 Diário das Sessões do Senado

jam votados ao abandono. Não tive arada ocasião de tratar de tal questão, mas vista que o ilustre Senador me chama agora a atenção para ela, vou ocupar-me dela falando assim, é evidentemente uma promessa que ou cumprirei se tiver tempo para isso, é claro, e não me suceder o mesmo que sucedeu aos meus antecessores.

Com respeito à Quinta da Vigia, que também conheço, é realmente quási um crime tê-la aplicado para um quartel. Como porêm, ela hoje está desocupada, é caso para estudar a sua aplicação.

Relativamente às contribuições, de Pôrto Santo, entregou-me o ilustre Senador um memorial, que vou estudar, e logo que tenha ocasião, eu trarei a S. Exa. as informações que sôbre o assunto colher.

Tenho dito.

O orador não reviu.

Antes de se encerrar a sessão

O Sr. Joaquim Crisóstomo - Sr. Presidente: pedi a palavra para voltar de novo a falar sôbre o caso a que já me referi, de não me tereis sido ainda remetidos vários documentos, que solicitei pelo Ministério do Comércio. Importa isto uma desconsideração a esta casa fio Parlamento, pois não se trata dum assunto de interêsse pessoal, e tam somente do exercício dum direito, que a constituição me reconhece, de fiscalizar os actos do Govêrno, e seguindo para tal fim os dados que julgar necessários.

Se eu pedisse, uma nota dos numerosos funcionários públicos que andam pelo estrangeira a gastar milhares de contos ao Estado, ainda só compreendia relutância do Govêrno em me fornecer, mas tratando-se duma nata relativa à exposição Internacional do Rio de Janeiro o vencimentos dos respectivos funcionários, não vejo explicação para o que se está passando.

Dado tal procedimento devo dizer que o meu propósito, é versar o caso escandaloso de se estarem a esbanjar avultadas quantias do tesouro, confiadas à administração descricionária do Sr. Lisboa de Lima, que sem o menor exemplo, tem requisitado uma aluvião de funcionários públicos, para os colocar ao seu serviço conferindo-lhes elevados vencimentos.

Segundo se diz, alguns dêsses empregados recebem o triplo das quantias que aufeririam se estivessem desempenhando nas suas repartições as funções que lhes competem.

Também pedi uma nota das importâncias entregues à Sra. Virgínia Quaresma a título de fazer publicar nos jornais alguns artigos de reclamo respeitantes à referida exposição, e até hoje ainda não consegui obtê-la.

Afirma-se lá fora que essa senhora recebeu para tal fim 150 contos.

Será isto verdade?

Não sei: só pelos documentos que requeri o poderei verificar.

O Sr. Ministro da Comércio declarou, há dias, aqui que ia pôr em execução algumas medidas a fim de evitar esbanjamentos, e de harmonia com êsse critério já, havia suprimido á carreira do vapor Gil Eanes para os Açôres.

Ora, é preciso que S. Exa. seja coherente e se convença que não estamos em Barracos ou na Hotentotia.

A política das economias tem de ser para, todos os serviços do Estado, sem se abrirem excepções para os amigos e afilhados, Sr. Presidente.

Como V. Exa. vê a situação do Sr. Ministro do Comércio é muito melindrosa emquanto não me forem fornecidos, os referidos documentos, porque tudo deixa prever, que há irregularidades e abusos que não convém tornar conhecidos do país e que comprometem o Sr. Lisboa de Lima e os que o protegem.

Peço portanto a V. Exa. que comunique ao Sr. Ministro do Comércio as considerações, que acabo de fazer na certeza de que continuarei a insistir pelo meu pedido até ser atendido.

Tenho dito.

O Sr. Presidente: - V. Exa. pediu alguns documentos, parte dos quais já lhe foram fornecidos.

O Sr. Ministro da Agricultura (Ernesto Navarro): - Sr. Presidente: Estranhou o Sr. Joaquim Crisóstomo que ainda lhe não fôssem fornecidos todas os documentos cito pediu pelos diversos ministérios. Se êsses documentos são muito numerosos como os que pediu pelo meu ministério, não é de estranhar que S. Exa. os não recebesse ainda.

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Sessão de 28 de Março de 1922 19

A S. Exa. faço o mesmo pedido que fiz ao Sr. Ribeiro de Melo, é o de ir ao Ministério examinar os processos; mais ràpidamente S. Exa. ficaria habilitado a tratar dos assuntos que deseja.

O Sr. Joaquim Crisóstomo: - Sei que no seu Ministério se trabalha, e que estão passando os documentos.

O Orador: - O que lhe posso afirmar que da parte do Sr. Ministro do Comércio, cujo carácter e coração ninguém nesta Câmara porá em dúvida, não há nem podia haver a menor vontade em satisfazer os pedidos de documentos de qualquer Sr. Senador.

O Sr. Presidente: - Peço mais uma vez aos Srs. Senadores que pertencem às comissões, para enviar para à Meza os pareceres, a fim de poder marcar ordem do dia para a sessão que marco para amanhã.

Amanhã há sessão, à hora regimental, sem ordem do dia.

Está encerrada a sessão.

Eram 17 horas e 55 minutos.

O REDACTOR - Adelino Mendes.

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