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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA DA ASSEMBLEA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES

8.º SUPLEMENTO AO N.º 192

ANO DE 1938 15 DE JULHO

CÂMARA CORPORATIVA

Parecer sôbre a proposta de lei n.º 223

(Estatuto Jurídico dos Caminhos de Ferro)

A Câmara Corporativa, a quem o Govêrno desejou ouvir sôbre a proposta de lei que deve constituir o Estatuto Jurídico dos Caminhos de Ferro, emite, pelas suas secções 10.ª, 18.ª, 20.ª, 21.ª e 24.ª, o seguinte parecer:

A necessidade da Proposta

Visa a nova proposta de lei a reformar e substituir o decreto sôbre a construção, exploração e polícia dos caminhos de ferro de 26 de Dezembro de 1864.
Poucos diplomas legais terão tido como êste tam gloriosa carreira. Constituiu durante setenta e quatro anos, quási sem alterações, a nossa verdadeira constituição ferroviária, tam acertadas foram as suas disposições, tam cuidada a sua forma e tam equilibrado o seu espírito, que se pôde manter até agora em vigor e, pode-se dizer, que até há pouco sem inconveniente sensível. Na data em que a mudança das circunstâncias em que se exerce a indústria de transportes impõe a sua revogação, justo é prestar esta homenagem ao seu ilustre autor, o general João Crisóstomo de Abreu e Sousa.
Precisamente por se tratar dum diploma notável, os sucessores do venerando estadista hesitaram em o remodelar e em acompanhar com uma nova disciplina legal as inevitáveis transformações que, através de tantas dezenas de anos, sofreu a indústria ferroviária.
É que, na verdade, a matéria regulada no decreto de 1864 é de natureza muito complexa e torna difícil o encontro de soluções que dêem satisfação plena aos muitos interêsses divergentes que elas virão afectar.
Há a considerar, com efeito:
1.º Os interêsses de usuários ou clientes do caminho de ferro. O comerciante, o agricultor, o industrial carecem igualmente dum bom serviço de caminho de ferro,
não só para as suas relações com o mercado interno, como até nas suas transacções nos mercados estrangeiros, onde um concorrente ferroviàriamente mais favorecido os poderá vencer sem remissão.
2.º Os interêsses da colectividade. São os clientes do agricultor, do industrial ou do comerciante que sofrem os efeitos dos encargos que àqueles forem impostos pelo caminho de ferro. Os preços variam necessariamente em função das tarifas;
3.º O interêsse do Estado, que representa outro aspecto do interêsse colectivo e que é geralmente afectado até pela situação financeira das emprêsas ferroviárias;
4.º O interêsse das emprêsas, que tem de manter e assegurar a exploração.
A dificuldade de conjugação dêsses interêsses divergentes explica, a relutância que houve em remodelar a lei, conceituosamente elaborada, de 1864. Mas não podia o argumento da dificuldade impressionar o actual Govêrno, ao qual se deve já a feliz solução de tantos problemas da vida nacional.
Para mais, nos últimos anos o problema transformou-se completamente. Di-lo em sucintos e expressivos termos o relatório da Proposta:

«É chegado o momento de o modificar (o Estatuto dos Caminhos de Ferro), tendo em atenção que a indústria dos caminhos de ferro deixou, de facto, de ser um monopólio ...».

Êste é o preceito geral que, como se vê, informa o projecto de reforma e é à luz dêle que teremos de apreciar as suas disposições.
Mas desde já queremos tributar ao Govêrno o nosso louvor por ter defrontado um árduo problema e procurado resolvê-lo em harmonia com as condições reais de hoje, bem diversos das de há setenta e quatro anos.