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REPUBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 37

ANO DE 1958 16 DE ABRIL

ASSEMBLEIA NACIONAL

VII LEGISLATURA

SESSÃO N.º 37, EM 15 DE ABRIL

Presidente: Exmo. Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior

Secretários: Ex.mos Srs.
José Venâncio Pereira Paulo Rodrigues
Manuel José Archer Homem de Melo

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 15 minutos.

Antes da ordem do dia. - Foram aprovados os n.ºs 33, 34, 35 e 36 do Diário das Sessões.
Leu-se o expediente.
Receberam-se na Mesa os elementos fornecidos pelo Ministério das Obras Publicas em satisfação de um requerimento do Sr. Deputado Nunes Barata, a quem foram entregues.
Para os efeitos do disposto no § 3.º do artigo 109.º da Constituição recebeu-se na Mesa, remetido pela Presidência do Conselho, o Diário do Governo n.º 70, 1.ª série, de 3 do corrente, inserindo o Decreto-Lei n.º 41 580, sobre a concessão do abono de família aos militares das forças terrestres ultramarinas.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Armando Cândido, para um requerimento: Urgel Horta, sobre assuntos ligados ao problema siderúrgico português; Teixeira da Mota, para agradecer ao Governo o contrato, recentemente firmado com uma empresa estrangeira para a exploração de jazigos de carbonetos de hidrogénio e produtos afins na Guiné; Abranches de Soveral, que louvou o Governo pela recente publicação do Decreto-Lei n.º 41 380, do maior interesse para Viseu e a, sua região, e Manuel Luís Fernandes, para recordar a, figura, do eminente professor Henrique de Vilhena, recentemente falecido.

Ordem do dia. - Continuou a, discussão do aviso prévio do Sr. Deputado Homem de Melo sobre emigração.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Ramiro Valadão e Bagorro de Sequeira.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 18 horas e 15 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 16 horas e 10 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Adriano Duarte Silva.
Afonso Augusto Finto.
Agnelo Orneias do Rego.
Agostinho Gonçalves Gomes.
Aires Fernandes Martins.
Alberto Carlos de Figueiredo Franco Falcão.
Alberto Henriques de Araújo.
Alberto Pacheco Jorge.
Alberto da Bocha Cardoso de Matos.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Alfredo Rodrigues dos Santos Júnior.
Américo Cortês Pinto.
Américo da Costa Ramalho.
André Francisco Navarro.
António Barbosa Abranches de Soveral.
António Bartolomeu Gromicho.
António Calapez Gomes Garcia.
António Calheiros Lopes.
António Carlos dos Santos Fernandes Lima.
António de Castro e Brito Meneses Soares.
António Cortês Lobão.
António Jorge Ferreira.
António José Rodrigues Prata.
António Maria Vasconcelos de Morais Sarmento.
Armando Cândido de Medeiros.
Artur Águedo de Oliveira.

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Artur Máximo Saraiva de Aguilar.
Artur Proença Duarte.
Avelino Teixeira da Mota.
Belchior Cardoso da Costa.
Camilo António de Almeida Gama Lemos Mendonça.
Carlos Alberto Lopes Moreira.
Carlos Coelho.

astilho Serpa do Rosário Noronha.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Fernando António Munoz de Oliveira.
Fernando Cid Oliveira Proença.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco José Vasques Tenreiro.
Frederico Bagorro de Sequeira.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Jerónimo Henriques Jorge.
Jerónimo Salvador Constantino Sócrates da Costa.
João Augusto Dias Rosas.
João de Brito e Cunha.
João Mendes da Costa Amaral.
João Pedro Neves Clara.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim Mendes do Amaral.
Joaquim Pais de Azevedo.
Joaquim de Pinho Brandão.
Jorge Pereira Jardim.
José António Ferreira Barbosa.
José Dias de Araújo Correia.
José Fernando Nunes Barata.

osé de Freitas Soares.
José Garcia Nunes Mexia.
José Guilherme de Melo e Castro.
José Hermano Saraiva.
José Monteiro da Rocha Peixoto.
José Rodrigo Carvalho.
José Sarmento de Vasconcelos e Castro.
José Soares da Fonseca.
José Venâncio Pereira Paulo Rodrigues.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Laurénio Cota de Morais dos Reis.
Luís Maria da Silva Lima Faleiro.
Luís Tavares Neto Sequeira de Medeiros.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel José Archer Homem de Melo.
Manuel Luís Fernandes.
Manuel Maria de Lacerda de Sousa Aroso.
Manuel Maria Sarmento Rodrigues.
Manuel Seabra Carqueijeiro.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
Manuel Tarujo de Almeida.
D. Maria Irene Leite da Costa.
D. Maria Margarida Craveiro Lopes dos Reis.
Mário Angelo Morais de Oliveira.
Mário de Figueiredo.
Martinho da Costa Lopes.
Paulo Cancella de Abreu.
Purxotoma Ramanata Quenin.
Ramiro Machado Valadão
Sebastião Garcia Ramires.
Teófilo Duarte.
Tito Castelo Branco Arantes.
Urgel Abílio Horta.
Venâncio Augusto Deslandes.
Virgílio David Pereira e Cruz.
Vítor Manuel Amaro Salgueiro dos Santos Galo.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 92 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.

Eram 16 horas e 15 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Estão em reclamação os n.º 33, 34, 35 e 36 do Diário das Sessões.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Visto nenhum dos Srs. Deputados desejar fazer qualquer reclamação aos referidos números, considero-os aprovados.

Deu-se, conta do seguinte

Expediente

Telegramas

Vários a propósito da renovação da iniciativa do projecto de lei do Sr. Deputado Carlos Moreira para a integração de cinco freguesias do concelho de Bailo no de Mesão Frio.

O Sr. Presidente: - Estão na Mesa os elementos fornecidos pelo Ministério das Obras Públicas em satisfação do requerimento apresentado na sessão da Assembleia Nacional de 20 do mês findo pelo Sr. Deputado Nunes Barata.
Vão ser entregues àquele Sr. Deputado.
Enviado pela Presidência do Conselho e para cumprimento do disposto no § 3.º do artigo 109.º da Constituição, está na Mesa o Diário do Governo n.º 70,1.º série, de 3 do corrente, que insere o Decreto-Lei n.º 41 580, sobre a concessão de abono de família aos militares das forças terrestres ultramarinas.
Tem a palavra para um requerimento o Sr. Deputado Armando Cândido.

O Sr. Armando Cândido: - Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a Mesa o seguinte

Requerimento

«Usando das faculdades que me concedem o artigo 96.º da Constituição e o artigo 11.º, alínea c) e § 3.º, do Regimento desta Assembleia, requeiro que me seja fornecida, com a maior urgência, pelo Ministério da Economia, cópia do despacho final porventura já proferido no processo a que deu lugar o pedido da União das Fábricas Açorianas de Álcool, datado de 21 de Setembro de 1957, para que fosse autorizado o reapetrechamento da sua fábrica de álcool em instalação nora, a construir dentro do distrito de Ponta Delgada, e que me seja concedida, também com a maior urgência, autorização para consultar o referido processo na Direcção-Geral dos Serviços Industriais».

O Sr. Urgel Horta: - Sr. Presidente: no decorrer da ultima sessão legislativa tratei desenvolvidamente o problema siderúrgico português, problema de que se ocuparam, animados das mesmas intenções, outros Deputados.
Empreendimento da mais alta importância na valorização da nossa economia, factor de reconhecido valor na solução do problema básico da industrialização nacional, em que andamos empenhados, originou aqui discussão viva, acalorada, sempre conduzida e orientada por um alto e devotado sentimento de amor patriótico. Nas diferentes intervenções que realizei sobre questão de tanta actualidade procurei, dentro do campo da minha acção como Deputado, demonstrar o interesse que a todos merecia o estabelecimento da siderurgia no nosso país, visto desse estabelecimento se deverem tirar magníficos resultados para melhoria de condições de vida que todos ambicionamos e defendemos.

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Encarei o problema, de tão extraordinário alcance, com toda a realidade, observando-o na grandeza da sua realização e na profundidade das consequências de ordem social resultantes da sua execução, que presentemente deve encontrar-se já em fase adiantada de preparação. Hoje como ontem, dentro do mesmo espirito, volto a tratar o problema, sem outro interesse que não seja aquele que sempre me tem animado e guiado: o interesse verdadeiramente nacional.
Não me movem, Sr. Presidente, outro sentimento ou outros objectivos que não seja trabalhar, dentro do acanhado âmbito das minhas funções, pelo bem-estar e pelo progresso da comunidade, servindo a Nação com aquela seriedade que sempre norteia todos os actos da minha vida, encontrando na tranquilidade da minha consciência a justa recompensa pelo dever cumprido.
Sr. Presidente, pouco sabemos de quanto se passa acerca do estado em que actualmente se encontram as múltiplas operações de ordem técnica e administrativa respeitantes à montagem da indústria siderúrgica em Portugal. E tenho pena que semelhante facto se dê, por bem merecer a Assembleia Nacional estar no conhecimento da marcha seguida por processo de tanta grandeza e responsabilidade, visto, como organismo da mais alta soberania, ser instituição viva e capaz, que sempre no desempenho da sua função demonstrou com verdade e com eloquência encontrar-se à altura da sua delicada missão no estudo consciente e defesa serena e firme dos problemas que interessam a vida e o progresso da grei portuguesa.
Sr. Presidente: em 14 de Janeiro do ano corrente, através do Decreto-Lei n.º 41 504, publicado no Diário do Governo, foi concedida à Siderurgia Nacional, S. A. R. L., a garantia de 800000 contos, destinados ao pagamento do material de equipamento para realização do empreendimento siderúrgico. Este facto é demonstrativo de que a fase preparatória de instalação se encontra em estado de louvável adiantamento, tudo fazendo supor haver sido aprovado quase sem alterações o projecto apresentado pela Siderurgia Nacional, S. A. R. L., projecto que de tantas e tão bem fundamentadas críticas foi alvo.
Partindo, pois, desse princípio, levantam-se ao meu espírito certas dúvidas, que bem mereciam ser desvanecidas, para tranquilidade de todos quantos têm manifestado o seu interesse pela montagem da indústria do ferro, a caminho do definitivo.
E, sendo assim, ouso formular desta bancada algumas interrogações:
Qual o progresso seguido ou estabelecido para se assegurar o abastecimento de minérios, cinzas de pirite, coque, fundentes, sucatas, energia eléctrica e tantos outros elementos indispensáveis à laboração?
Foram realizados já acordos com as diferentes empresas mineiras respeitantes a preços do fornecimento de minérios postos no local do seu aproveitamento?
Fizeram-se os ensaios necessários de concentração e metalúrgicos para se chegar ao conhecimento dos melhores leitos de fusão para o alto forno, dentro do melhor aproveitamento económico dos nossos recursos?
Todo este conjunto de informações nos poderia ter sido dado pelos serviços oficiais, industriais e mineiros, visto essas operações esclarecedoras da boa marcha do empreendimento siderúrgico estarem dentro do âmbito da sua função.
São, sem sombra de dúvida, os jazigos minerais de Moncorvo, jazigos do hematite, fonte inesgotável duma riqueza, que hão-de, pelo seu eficiente e económico aproveitamento, dar a maior parcela para a progressiva actividade da nova indústria siderúrgica. Porque, Sr. Presidente, dêem ao problema a volta que quiserem, encarem-no da forma que desejarem, mas não esqueçam que a base sólida da sua efectivação assenta nos jazigos de minério do norte de Moncorvo. E perder-se-á um sem-número de vantagens para a nossa economia se agora for esquecida esta verdade.
Fala-se, Sr. Presidente, da instalação naquela zona de fornos Krupp Ren; mas não se sabe quando, não se conhece a sua localização e nada se fez ainda de experimental para conhecimento das possibilidades técnicas e económicas da aplicação desse processo aos minérios daquela região, grande riqueza nacional.
Fomos sempre defensor sincero e constante da montagem de siderurgia no Norte do Pais, pela garantia que ele nos oferece, quer no aspecto demográfico, quer no aspecto de salubridade, atendendo sempre a caudais de água, à existência de boas instalações portuárias, à facilidade de transportes, às localizações das fontes de energia, da situação dos jazigos minerais abastecedores e de outras circunstâncias, por mim tantas vozes repetidas.
A minha voz não é a voz dum técnico: é apenas dum português que, acima de todos os interesses, coloca o interesse nacional. Contrariei a tese, que outros defenderam, do aproveitamento da zona de Alcochete para sede das grandes oficinas de siderurgia, e tenho pena, sinceramente confesso, de nada haver resultado do meu esforço.
Setúbal, Alcochete, Leixões e Moncorvo eram as localizações que se discutiam. Surge agora nova localização: o Seixal, de que nunca se havia falado. E eu pergunto: quais os motivos que conduziram a esta mudança, a esta alteração de pensamento, visto nunca se haver posto o Seixal como ponto indicado para sede da nossa primeira unidade de siderurgia? Fortes razões de ordem técnica e económica se encontraram - e eu não as vislumbro - para justificarem, perante as instancias superiores, a mudança, que deveria ser objecto de profundo estudo, a fim de habilitar o Governo a decidir dentro do mais defensável critério. Na verdade, o Seixal fica bem perto de Lisboa, mas os jazigos abastecedores e as fontes de energia, essas, mantêm-se bem longe!
Fui dos que, bem fundamentado, combati a escolha do Alcochete, que outros afirmavam ser o lugar ideal, o lugar próprio, satisfazendo todas as condições exigidas. Infelizmente, assim não era, e a demonstração cabal está feita perante o que se passa. No Norte, Leixões e Moncorvo, conjugação admirável, ofereciam todas as garantias para o melhor êxito de empreendimento de tanto valor.
Sr. Presidente: outro ponto que chamou a minha atenção e que a imprensa noticiou diz respeito ao encargo, confiado pela Siderurgia Nacional a um grupo germano-belga, para construir, perto de Lisboa, unia unidade siderúrgica, produzindo anualmente 250 000 t de aço bruto, devendo entrar em plena laboração nos meados do ano de 1961. Isto faz-me pensar se para este efeito não haveria conveniência em ter sido aberto concurso entre firmas especializadas, dentro de certo programa, obedecendo a determinadas condições, a que concorreriam firmas de reputado valor e crédito.
Quer-me parecer não se haver procedido como é de uso corrente. E se na realidade houve concurso, o que desconheço, ponho aqui esta interrogação: quais foram os concorrentes, as suas propostas e as condições a que obedeceram?
Sr. Presidente: corre também, e já tive ocasião de o ler no Boletim da Indústria do Norte, que entre Portugal e a Espanha se realizaram negociações relativas ao mercado comum envolvendo os dois países, sendo esse o motivo determinante que levou a encomendar no ano presente as instalações siderúrgicas. Se o facto aceita confirmação, não seria justificado o conhecer-se,

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em linhas gerais, quais as vantagens que advirão para a siderurgia dos acordos feitos entre os países ibéricos?
Sr. Presidente: muito haveria a dizer acerca da questão, de tanta magnitude e de tanta projecção futura, mas aos técnicos cabe o papel de o pormenorizarem nos seus benéficos e múltiplos aspectos.
O que acabo de expor, e pouco é, embora represente muito, bem merecia ser devidamente esclarecido pelas entidades que o podem fazer e a quem compete fazê-lo. As interrogações que acabo de formular, dúvidas que seria bom desvanecer, só tom em vista um único fim: esclarecer determinados pontos e certas decisões, à volta das quais se fazem conjecturas, que estou em absoluto convencimento serem destituídas de base e apenas cimentadas no erro ou na mentira.
Por mim, Sr. Presidente, continuarei na trincheira que escolhi, dentro do espirito que sempre me guiou, e como sempre pronto a lutar pela doutrina da verdade perfilhada pelo Estado Novo e a trabalhar a bem da Nação.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Teixeira da Mota: - Sr. Presidente: durante a permanência do Sr. Ministro do Ultramar na Guiné foi publicado o Decreto n.º 41 537, autorizando-o a celebrar com a Esso Exploration Guiné Inc. um contrato de exclusivo de pesquisas e exploração de jazigos de carbonetos de hidrogénio e produtos afins numa área da província.
Pela mesma altura fez o Sr. Ministro, em sessão extraordinária do Conselho de Governo, uma larga exposição sobre tal contrato, explicando a sua natureza e a maneira como foram salvaguardados os interesses da província. Há poucos dias, finalmente, foi assinado tal contrato.
Estes factos foram acompanhados com o mais vivo interesse na Guiné, e, na certeza de que estou exprimindo os sentimentos unânimes da população, venho agora dar público testemunho da gratidão das gentes da província pela maneira firme e criteriosa como o Sr. Ministro do Ultramar conduziu, perante tantos interesses em jogo, as negociações que levaram à assinatura de tal contrato, conseguindo para a Guiné um máximo de vantagens.
Tais vantagens manifestam-se sob vários aspectos. A Guiné receberá em qualquer caso 50 por cento dos lucros da exploração, desde que ela venha a fazer-se.
É-lhe permitido adquirir metade do petróleo produzido, para depois o vender como melhor entender.
Se a concessionária vier a pagar mais a outro pais situado em África ou no golfo Pérsico, automaticamente se entrará em negociações para modificar no mesmo sentido o contrato com a Guiné.
A Esso Exploration Guiné Inc. terá 20 por cento de capital português, inteiramente gratuito e que será entregue à província. O conselho de administração deverá ter uma maioria de membros portugueses e na assembleia geral só serão válidas as deliberações quando tomadas por 85 por cento dos votos, o que permite que nada seja resolvido sem o acordo da Guiné.
A concessionária obriga-se a investir nos cinco anos previstos de pesquisas capitais no montante de 254 000 contos. Em tal período terá de pagar de renda 72 000 contos, dos quais 28 600 imediatamente.
Tendo havido sete ou oito empresas interessadas na concessão, a todas foi dada oportunidade de apresentar sucessivamente propostas mais vantajosas, tendo sido
escolhida a que ofereceu o máximo de regalias. Tal concorrência de empresas permite uma animadora esperança para a Guiné, levando a julgar que são grandes as probabilidades da existência do petróleo, e as pessoas entendidas são unânimes em afirmar que a província conseguiu um contrato particularmente vantajoso.
Sr. Presidente: expostos do forma muito breve, são estes os principais aspectos a destacar nas negociações levadas a cabo pelo Sr. Ministro do Ultramar.
O Sr. Ministro, que tão bem conhece as pouco brilhantes condições económicas e financeiras da Guiné, procurou com o maior empenho que as possibilidades de existência de petróleo na província fossem utilizadas para melhorar aquelas condições. Mesmo que venha a verificar-se que não existe o petróleo, a Guiné terá colhido consideráveis benefícios só pela pesquisa que agora se vai iniciar.
É, portanto, no cumprimento do mais elementar dever de gratidão que renovo ao Sr. Ministro do Ultramar os agradecimentos, que são os de toda a Guiné.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Abranches de Soveral: - Sr. Presidente: não posso retardar por mais tempo o público agradecimento da cidade de Viseu ao Governo da Nação e em especial ao Sr. Ministro da Economia pela publicação do Decreto-Lei n.º 41 380, de 20 de Novembro de 1957.
Dentro da remodelação efectuada por este decreto, criou-se o Laboratório de Patologia Veterinária de Viseu e a Estação de Fomento Pecuário da Beira Alta.
Representam estes organismos o indispensável complemento da acção da Intendência de Pecuária e dos serviços de inseminação artificial já existentes naquela cidade e comprovam que o Governo tem exacta noção do alto valor pecuário daquela região.
Num pais como o nosso, que a cada passo se via na desoladora necessidade de importar carne do estrangeiro, o imediato, urgente e efectivo fomento pecuário constitui necessidade inadiável para quem tiver em vista apenas o verdadeiro interesse nacional.
Por isso o Decreto n.º 41 380, informando em novos e amplos moldes a organização da pecuária nacional, pode prestar inapreciáveis serviços ao bem comum, desde que se não deixe envelhecer nas páginas do Diário do Governo e seja logo seguido das medidas necessárias para extirpar, também neste sector, o cancro comum a toda a agricultura portuguesa: os múltiplos intermediários, prolíferos como ervas daninha», que inçam toda a vida económica nacional e que chegaram a criar a situação anómala, que seria caricata se não fosse dramática, de o produtor ser legalmente inibido de vender directamente os seus produtos nos maiores mercados consumidores, que lhe ficam a meia dúzia de quilómetros, tendo de deixar o melhor do seu esforço nas garras desses parasitas.
Deixemos por agora esse cancro da nossa agricultura, que merece mais ampla análise, a que nos dedicaremos em breve, para revertermos ao caso concreto que provocou esta intervenção.
No desenvolvimento lógico de um cuidado estude elaborado há anos pelo distinto veterinário Dr. Anta de Barros, podemos afirmar que o valor da pecuária nos treze concelhos que formam o sul da Beira Alta tende para a ordem dos 500 000 contos.
Tais concelhos, que constituem a área da Intendência de Pecuária de Viseu, situam-se ao redor da capital da província e podem dividir-se, grosso modo, em cinco

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núcleos distintos: o do vale do Vouga, o do vale do Dão, o do Caramulo e terras de Besteiros, o dos planaltos centrais e o da cidade capital.
O primeiro núcleo, abrangendo os concelhos de S. Pedro do Sul, Vonzela e Oliveira de Frades, é o mais importante, porque deve englobar hoje mais de 100 000 cabeças de gado de toda a ordem, exceptuadas as aves; o do vale do Dão, com os concelhos de Mangualde, Nelas e Carregal do Sal, é o menor em número, porque não possui mais de 50 000 cabeças, embora o não seja nas possibilidades de futuro desenvolvimento; o núcleo de Besteiros, em que, por contiguidade e afinidade geográfica, incluímos os concelhos de Tondela, Santa Comba Dão e Mortágua, tem mais do 80 000 cabeças de gado, além de uma avicultura em promissor desenvolvimento; o do planalto central do distrito, formado pelos concelhos de Penalva do Castelo, Sátão e Vila Nova de Paiva, tem mais de 65 000 cabeias de gado; enquanto que o concelho de Viseu, em torno do qual todos os outros se agrupam, tem hoje, por si só, mais de 60.000 cabeças de gado.
A simples análise deste esquema faz ressaltar a justeza da decisão governamental de localizar na cidade de Viseu os novos organismos de fomento pecuário.
A todas as demais razões ponderosas acresce esta, verdadeiramente decisiva: a da posição geográfica.
Na verdade, os organismos agora criados são o complemento natural e lógico dos já existentes (Intendência de Pecuária e serviço de inseminação), de tal sorte que só a sua concentração no mesmo local permite aquele convívio e colaboração estreita entre todos eles que são necessários ao cabal desempenho da, missão de cada um.
Por outro lado, os recursos sociais, que são indispensáveis à acção de toda e qualquer actividade social, encontram-se mais na capital da província do que em qualquer outro ponto dela, acrescendo ainda a circunstancia de as condições materiais especificadamente necessárias ao funcionamento prático dos serviços de que estamos tratando (propriedades que permitam a sustentação dos animais necessários e a condigna instalação dos serviços) se verificarem amplamente na periferia da cidade e ato dentro dos seus limites.
Finalmente, a cidade de Viseu, que constitui desde todo o sempre o nó das comunicações daquela parte central do País - dispondo de amplos meios de comunicação -, constitui o centro e ponto de passagem obrigatório para a ligação entre os diferentes concelhos da região, que já atrás agrupei de acordo com as realidades materiais; e esta posição central ainda mais se destaca se lhe juntarmos a parte norte do distrito, que é tão beira como o sul e sem a qual a Beira Alta não apresentaria aos nossos olhos aquela forma inteiriça de coração, que já despertou a atenção de poetas e de pensadores.
Por isso a cidade de Viseu, à qual por todos os títulos pertencem os organismos recentemente criados, agradece efusivamente ao Governo a criação de tais organismos, já hoje indispensáveis ao seu pujante desenvolvimento pecuário, e fica aguardando ansiosamente - quase diria, impacientemente- a instalação dos referidos serviços.
E digo impacientemente porque não é impunemente que trinta anos de governo de Salazar habituaram a Nação a ver realizado imediatamente o que lhe é prometido.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Manuel Fernandes: - Sr. Presidente: foi hoje a enterrar o professor catedrático jubilado Doutor Henrique de Vilhena, sábio anatomista de grande renome no País e no estrangeiro, figura eminente de mestre, que dedicou toda a sua vida ao estudo profundo e minucioso da ciência anatómica e que tanto ajudou a elevar o prestígio da antiga Escola Médica e da actual Faculdade de Medicina de Lisboa.
Várias gerações, foram iniciadas por ele, no estudo da medicina, pois a cadeira de Anatomia, tradicionalmente das mais difíceis, era a primeira que se deparava aos estudantes.
A figura austera, mas ao mesmo tempo bondosa, do Prof. Henrique de Vilhena, inspirava aos seus discípulos o maior respeito, disciplinando o seu trabalho e os métodos de estudo, que os levariam a vencer as dificuldades de um curso assaz difícil.
Várias gerações puderam apreciar as suas invulgares qualidades e decerto é das mais gratas a recordação que dele perdura no espírito de todos os que puderam receber os seus ensinamentos e os seus ponderados e paternais conselhos.
Henrique de Vilhena era um pensador e linha um subtil espírito de artista e de crítico. Cultivava as letras com elevação, tal como sucedera ao seu antecessor na cátedra, o Prof. José António Serrano.
Publicou vários discursos, romances e novelas, onde se patenteavam invulgares méritos literários.
Professor na Escola de Belas-Artes, na cadeira de Anatomia Artística, aí defendeu uma tese brilhante sobre a «Expressão que para os alunos daquela Escola passou a constituir um livro fundamental.
Acendeu à cátedra, na antiga Escola Médica, sem concurso e por méritos próprios, tais eram os trabalhos notáveis que sobre anatomia já então havia publicado. Fundou o Instituto de Anatomia, centro de estudos para todos os que quisessem aprofundar a especialidade. Mais tarde, com o professor Rodriguez Cadarso, fundava a Sociedade de Anatomia Luso-Hispano-Americana e, com o professor Celestino da Costa, a Sociedade Anatómica Portuguesa. Foi ainda reitor da Universidade de Coimbra e senador da República.
O contacto frequente com o cadáver podia fazer supor que possuía um coração frio e impenetrável às dores alheias. Mas tal não acontecia. Henrique de Vilhena possuía, na realidade, uma sensibilidade delicadíssima, como demonstra um pequeno episódio que me ocorre referir.
Há anos, em plena vilegiatura pelo Norte do País, soube pelos jornais que se encontrava gravemente enfermo, numa clínica de Abrantes, o grande escritor Hipólito Raposo. Mal o conhecia pessoalmente, mas a admiração que os seus escritos lhe mereciam levou-o imediatamente a interromper as suas férias, vindo propositadamente àquela cidade para se inteirar directamente do estado de saúde de um escritor que considerava como um dos mais notáveis estilistas portugueses.
E dizia comovidamente Henrique, de Vilhena que a morte de tão notável romancista representava para as letras pátrias uma perda nacional.
Era assim a delicada sensibilidade do eminente professor e sábio anatomista português, cuja morte eu, como seu antigo discípulo e grande admirador das suas excelsas qualidades e virtudes, não podia deixar de sentidamente lamentar perante esta Assembleia.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

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800 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 37

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Continua em discussão o aviso prévio do Sr. Deputado Archer Homem de Melo sobre a emigração.
Tem a palavra o Sr. Deputado Ramiro Valadão.

O Sr. Ramiro Valadão: - Sr. Presidente: tem tradições nesta Câmara o debate sobre os problemas relativos à emigração, e isto significa que ao País, pomo aos que o representam, sempre preocupou o conhecimento do que se revelava como reflexo das condições gerais da vida nacional.
Oliveira Martins, apresentando, em 1887, ao exame da Assembleia Legislativa da época, o projecto de lei relativo ao que classificou de fomento rural e emigração, escreveu trabalho de tão grande valia que ainda hoje não pode deixar de ser citado por quem pretenda pronunciar-se sobre o que é matéria de inegável interesse nacional. Ficou sem grande eco a voz do alto desta tribuna erguida, não obstante ter o parlamentar de então solicitado da Câmara e dos partidos que ali tinham representação uma pax Dei política, durante a qual, como expressamente afirmava, «as paixões, não digo os ódios, as inimizades, se calassem perante um motivo de força maior».
Eram assim os tempos, que, mais tarde, tão extraordinariamente se agravariam, ao ponto de tornarem inviável qualquer esquema de trabalho sério. Estava escrito nos misteriosos livros do destino que Oliveira Martins não veria realizados os seus sonhos e que a propositura do seu projecto de lei ficaria apenas como marca do seu talento gravada na nossa história económica.
«Fomento rural» - fomento, afinal, do País, onde o fenómeno emigratório atingia expressões dolorosas, perante a insuficiência das instituições e a carência de medidas apropriadas para evitar agravamento que melhor se compreende e acentua se recordarmos que as estatísticas de há meio século não reproduziam os factos com exactidão e se não esquecermos que a emigração clandestina assumia foros de doença com o mais grave prognóstico.
Sessenta e cinco anos depois de Oliveira Martins - passando em claro intervenções que, na balbúrdia a que pôs termo a Revolução Nacional, não poderiam ter melhor resultado que a do esforçado parlamentar de 1887 -, o Dr. Armando Cândido expunha à Assembleia Nacional o fruto de laboriosos e esclarecidos estudos, que muito justamente mereceram a atenção da Câmara, que os debateu com a esperada elevação e o natural interesse.
Não teve, nesse momento, o ilustre Deputado necessidade de propor quaisquer tréguas políticas para que o exame dos problemas fosse feito sem paixões, sem ódios, sem inimizades, pois, graças a Deus, apenas o interesse nacional condiciona a fala dos que a esta tribuna sobem, e as terríveis disciplinas partidárias, que determinavam a orientação dos homens que nelas por completo se integravam, desapareceram dos nossos hábitos políticos.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Louvado seja Deus, que em trégua permanente vivemos, na firme certeza de que todo o tempo será pouco para, unidos, trabalharmos ao serviço da grandeza e prosperidade da Pátria.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Terminou o debate de 1952 com a unânime aprovação de uma moção, na qual a Assembleia Nacional exprimia no Governo o voto de que «se intensificasse o mais possível a valorização e o consequente povoamento da metrópole e do ultramar».
Creio, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que o Governo de Salazar bem tem cumprido essa missão, e ao Plano de Fomento que terá o seu termo no final deste uno seguir-se-á aquele cujo projecto foi há dias enviado à apreciação das Câmaras.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - A elaboração e execução desses documentos bem atestam a nossa capacidade realizadora em diversos e tifo importantes domínios de acção, porque exprimem a constante e crescente valorização da gente e da terra portuguesas, correspondendo assim ao voto desta Assembleia.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - E indiscutível - qualquer que seja a opinião dos antigos ou novas economistas que se enovelam em nebulosas teorias e apenas aceitam as realidades que mais convêm no desenvolvimento dos seus juízos - que o nível de vida dos Portugueses, a despeito do acréscimo da população, subiu no decurso os últimos trinta anos. Para o sentirmos e compreendermos não é necessário citar estatísticas nem fazer cálculos complicadas; basta diluirmos à nossa volta e não fecharmos os olhos.
Não sei, senhores, se este é o lugar próprio para a longa citação de números e eruditas referências, em grande medida incompatíveis com o tempo regimental e porventura mais próprias para assinalar experiências vividas e formular opiniões baseadas nelas e no resultado de trabalhos e investigações oportunamente realizadas. Ouso, por isso, afirmar que no distrito de Angra do Heroísmo - círculo que nesta Câmara represento - é particularmente clara essa elevação do nível de vida das suas populações e penso que diferentemente não ocorre nas outras regiões do País.
Nunca a densidade demográfica foi tão alta no meu distrito, mas em nenhuma época foi tão grande o rendimento de cada qual, tendo mesmo em linha de conta a desvalorização monetária. Isto não significa que se deva parar no caminho a percorrer, mas exprime que a rota traçada é secura e que apenas há que continuar. Isto significa realmente que foram coroado» de êxito bastantes dos nossos esforços e que, portanto, podemos ter plena fé e confiança no triunfo dos que vamos continuar te desenvolver.
Queremos mais? É evidente que queremos mesmo muito mais, mas podemos estar possuídos da firme convicção de que temos nas nossas mãos os meios bastantes para realizarmos triunfalmente a tarefa. Desconhecer os factores de optimismo é, em meu crer, tão grave como ignorar os que nos podem magoar ou entristecer nos casos e ocasiões em que haja razão para redobrar as energias, a fim de levarmos a bom termo a missão comum.
A vida do modesto camponês da minha Vila Nova distante - também tenho ai minha pequena mas transparente experiência - não sofre actualmente comparação com a do seu avô e o mesmo acontece com o rural das ilhas Graciosa ou de S. Jorge, muito embora nestas últimas a diferença não seja tão notória e sensível. Daqui se concluirá que novos e bem mais distribuídos esforços têm de ser feitos no mesmo sentido, mas do facto se hão-de também arrancar con-

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clusões optimistas, conquanto tenha por seguro que são serrados os mundos de Pangloss, mas tão errados como os que lhes são diametralmente opostos.
O ilustre Deputado Homem de Melo trouxe a esta Câmara - seis anos depois do Dr. Armando Cândido - o resultado das suas preocupações, expressivo documento dos seus estudos e da sua experiência.
Não serei eu quem negue louvor aos seus intentos, antes gostosamente afirmo não só o meu apreso pelas suas qualidades de inteligência, mas ainda o contentamento com que ouvi o que constituía generosa contribuição da sua juventude promissora para a solução de problemas de fundo interesse nacional.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - A emigração não é apenas resultado da miséria: é-o também do tradicional desejo de aventura da nossa gente, conforme notou, aliás com muito brilho, o ilustre Deputado Homem de Melo. Em grande parte intervém, todavia, o baixo nível de vida dos indivíduos nesse esforço desintegrador dos ambientes em que se nasceu e tradicionalmente viveu. Baixo nível de vida é, no entanto, uma coisa, e miséria outra. A uma e outra temos de dar combate total, mas quando por completo se eliminarem os casos mais pungentes se tiver integrado a totalidade de gente portuguesa num grau de desenvolvimento desejável, vencendo assim, por consequência, períodos de depressão colectiva de ânimo, vividos em épocas felizmente ultrapassadas, não teremos estancado a emigração na parte em que tal matéria é responsável. Só no instante em que igualássemos os países mais ricos do Mundo é que leríamos secado essa sede de melhor. Não nos bastaria, no entanto, tentar esse impossível, pois alguns dos países para onde seguem correntes emigratórias nacionais não são daqueles onde se pode considerar de alto nível a vida dos seus povos. O que pode ser mais fácil é o acesso a uma maior riqueza por parte dos que, possuídos de energias gigantescas, se lançam com tenaz empenho na conquista desse objectivo.
Ninguém emigra, efectivamente, para a Suíça ou para a Suécia, e julgo não haver quem discuta a existência de um alto nível de vida das suas populações.
A emigração constitui, assim, um fenómeno em que intervêm inúmeros factores, que não desaparecem integralmente com o desenvolvimento económico.

que pode e deve fazer-se é procurar limitar os inconvenientes desse movimento, tentando facilitar-lhe os caminhos nas direcções mais convenientes e acautelando os interesses dos portugueses que por eles pretendam seguir.
Proibir a emigração - para evocar ideia alguma vez exposta - constituiria atentado contra a liberdade essencial, e, em defesa deste princípio basilar, não poderia deixar de ao menos enunciar o pensamento que aqui exprimi em breves palavras. Definido e garantido o exercício desta liberdade, há evidentemente que rodear o nosso emigrante das cautelas aconselháveis para que não caia em logros e desastres irremediáveis.
Neste tão importante capítulo há-de reconhecer-se que o Governo tem tomado todas as medidas convenientes. Para isso publicou, entre o mais, o diploma que criou a Junta da Emigração, sendo justo destacar a notável acção do engenheiro Augusto Cancella de Abreu, que nessa altura ocupava o alto cargo de Ministro do Interior.
Devo ainda acrescentar, por exclusiva homenagem à verdade, que nenhum organismo haverá cuja acção menos divirja das intenções do legislador do que a Junta da Emigração. Não falo apenas da eficiência e prontidão dos seus serviços ou da honorabilidade dos seus agentes, mas do modo humano e carinhoso como os executa.
A bordo de diferentes navios, a caminho de vários e distantes pontos do Mundo, tenho tido ocasião de testemunhar o alto grau de preparação dos funcionários do organismo nacional da emigração; os cuidados tidos para com a saúde moral e Física dos emigrantes; cuidados com as suas saudades e problemas. Não quero - até para não alongar as minhas considerações - referir em pormenor esses casos, mas poderia lembrar a emoção daquele pai a quem se arranjou padrinho para o filho nascido a bordo e do enxoval completo que ali mesmo, lhe foi entregue: ou o do velhote que, roído de saudades, ia ter com os filhos ausentes, mas que não esquecia a sua terra minhota e durante toda a viagem foi carinhosamente tratado pelo inspector da emigração.
Lembrar tais factos perante a Assembleia Nacional é acto de mera justiça, que muito especialmente me compraz realizar. É que os homens que, esforçadamente, realizam essas delicadas missões, desde o que se encontra no mais alto grau de hierarquia até ao mais humilde, bem merecem sentir que ao menos a sua dedicação e até sacrifício são compreendidos.
Isto significa que o emigrante português já não é espoliado nem maltratado como noutros tempos, pois em absoluto deixou de ser o tal animal para exportação que nos porões de navios infectos partia para a grande aventura em terras distantes. Ainda não há muitos meses, com algumas centenas de emigrantes convivi a
bordo de um dos nossos maiores navios, pelo que posso assegurar-vos que o ambiente nada tinha de dramático, pois, bem pelo contrário, era de confiante esperança. Nem sequer ouvi cantar o fado ..... mas alegre música popular do Minho ao Algarve.
O emigrante da literatura de há trinta anos desapareceu completamente do quadro da vida portuguesa, o que não pode deixar de constituir razão de forte optimismo.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Um problema fica de pé: o da assistência ao nosso emigrante no país onde realiza a sua nova vida. Aí tem de ser mais funda a nossa acção, por forma que a amargura de derrota insofrida ou o inebriamento de alguma vitória rápida não faça o emigrante esquecer o tronco comum a que pertence. Mais grave ainda o problema dos filhos.
Importa, efectivamente, cuidar que a língua se não perverta ou se não esqueça a religião, para que nada se perca do essencial, e nos emigrantes a Pátria continue na grandeza das suas virtudes, lios mais longínquos países amigos.
A essa missão temos de consagrar maiores verbas e mais cuidada atenção, para que a saudade e a distância não diluam ou desvaneçam amores e, antes, mais as afervorem.
Eis uma tarefa que urge empreender em novos e vastos termos, pois é indispensável, urgente e inadiável.
O aproveitamento das províncias portuguesas do ultramar no relativo à fixação de portugueses da metrópole é instante problema que, a meu ver, nada tem com o da emigração, tomada esta expressão no sentido que verdadeiramente lhe deve caber.
Não se emigra dentro do mesmo país - muda-se do residência. Assim o entende a legislação em vigor, e por isso mesmo a ida de colonos para o ultramar não depende da Junta da Emigração.
Também penso, como o autor do aviso prévio - mas quem o terá negado em terras de Portugal? -, ser indispensável promover um afluxo constante da nossa gente aos grandes espaços de África. Não entendo, porém, que tal possa ser eficientemente feito sem o amplo

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auxílio do Estado, porquanto sem estarem totalmente criadas as condições de vida necessárias correr-se-iam os riscos mais graves.
Para isso não verbas que me pareçam excessivas, e as que foram utilizadas, por exemplo, no colonato da Cela, em Angola, não podem ser consideradas, dividindo o seu montante total pelo número de famílias que as aproveitarem. Os laboratórios, por exemplo, são vitais aos grandes empreendimentos, mas não representam encargo amortizável apenas em função dos produtos um momento obtidos, mas por todos os seus resultados no futuro.
Há tanto a aprender com o colonato da Cela e, por certo, muito se tem aprendido já ...
As grandes obras de fomento ultramarino, como as de saneamento e outras, são base de futura fixação de grandes núcleos populacionais, na certeza de que - como um dia escreveu esse notável pensador e homem de Estado que é o Prof. Marcelo Caetano, citado pelo Dr. Armando Cândido no seu magnífico aviso
prévio de 1952 - «a colonização é uma grande batalha, com seus mortos e seus desaparecidos. A selecção natural segue os triunfadores e relega os vencidos para a vala comum. Haja possibilidade de orientar as qualidades que se revelam e de ajudá-las a vingar e o resto será obra da energia de cada qual».
Neste vasto aspecto do problema temos de acrescentar novos capítulos a uma obra, na verdade, imensa, mas não nos esqueçamos, com o louvável desejo de tudo rapidamente realizarmos, de que em África nada se faz de um jacto.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - A este respeito têm os Portugueses alguma experiência a fornecer a si próprios e aos outros. É que nós pretendemos construir para o futuro, duradoura e fortemente.
Não vejo, todavia, como se pode desejar este caminho e achar excessivo o seu custo.
Sr. Presidente: ao terminar as minhas considerações, não posso deixar de acentuar quão louvável se me afigura que nunca se perca o sentido da nossa emigração para o Brasil.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - É que do lado de lá do Atlântico espera-se, com ansiedade, a nossa gente, mesmo quando se faz alguma caricatura de patrício e com ela em certas ocasiões se brinque. Na verdade, a comunidade luso-brasileira não é uma expressão vã ou letra morta de um tratado - é a vivência de sentimentos entre os dois povos com a mesma alma.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Trabalhar para a prosperidade e glória do Brasil é trabalhar - como disse no Rio de Janeiro o Chefe do Estado - pela prosperidade e glória de Portugal.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Bagorro de Sequeira : - Sr. Presidente : ao subir a esta tribuna quero que as minhas primeiras palavras sejam de cumprimentos no ilustre Deputado Homem de Melo, autor do aviso prévio de que nos estamos ocupando, pela feliz oportunidade que ofereceu à Assembleia de tratar mais uma vez dos importantíssimos problemas da emigração nacional e do povoamento das nossas províncias do ultramar, considerados estes dois problemas com ponto de partida nos excedentes demográficos que se diz existirem na metrópole e ilhas adjacentes, visando, fundamentalmente, na ordem superior das suas directrizes e objectivos, a interligação e interdependência de que se rodeiam, por forma a encontrar-se-lhe solução que satisfaça ao interesse nacional.
Ao participar neste debate não ignoro a grandeza, a profundidade e a complexidade dos assuntos - emigração e colonização -, que, entre nós e desde longa data, têm constituído temas aliciantes para muitos estudiosos destes problemas, tendo, por isso, dado origem a uma enormíssima diversidade de conceitos e opiniões, quase tantas quantos os tratadistas, sobre a sua solução.
Desta forma a achega que posso trazer ao debate será breve e bem modesta e sem outro propósito que não seja a de lhe juntar num curto apontamento a minha contribuição, principalmente no que respeita ao povoamento de Angola, que, agora mais do que nunca, considero do maior interesse e da maior projecção para o futuro desenvolvimento e valorização política, económica e social daquela nossa província, e que, na extensão e generalização dos seus objectivos s benefícios, deixou há muito de ter uma característica local, para se enquadrar inteiramente dentro do pensamento e da obra da Nação, que, neste período histórico de reconstrução e na sua sequência em ritmo cada vez de maior expansão, há-de alinhar entre as realizações mais fecundas e mais significativamente construtivas de uma época que definiu, enfrentou e realizou a maior grandeza da Nação.
Não vou ocupar a atenção da Assembleia com o primeiro assunto tratado no aviso prévio - a emigração. Em primeiro lugar, porque me não sinto perfeitamente à vontade para bem interpretá-la no conjunto de fenómenos de toda a, natureza que a determinam, sobretudo à luz das premissas ou realidades económico-sociais que a fomentam, até ao ponto de atingir, em ordem de grandeza, a expressão numérica que se lhe atribui.
Em segundo lugar, porque o problema da emigração, a sua origem e as suas consequências têm largo desenvolvimento na exposição feita pelo ilustre autor do aviso prévio, com ajustada actualidade e perfeito conhecimento das suas causas, que bem merecem a cuidadosa atenção que o ilustre Deputado lhe dedicou para bem nos esclarecer sobre a sua importância, e ainda porque me foi oferecida recentemente a feliz oportunidade de ler com a maior atenção o magnífico trabalho da autoria de um dos mais ilustres membros desta Assembleia, o Deputado Armando Cândido, aqui apresentado e discutido em legislatura anterior, também em aviso prévio, em moldes de esplêndida clareza, farto de conhecimentos cuidadosamente estudados e firmemente demonstrados na sua incidência ao caso nacional, mais especialmente referidos ao que se tem passado nas nossas ilhas dos Açores, essa portentosa reserva de valores humanos.
Por consequência, para o meu caso, o de trazer ao debate a minha modesta contribuição, no que respeita ao povoamento das nossas províncias do ultramar, especialmente de Angola, basta-me ter em conta a realidade verificada de uma emigração exagerada, originária da metrópole e ilhas adjacentes, já formulada pelos Srs. Deputados que já referi e pelos que nesta tribuna me antecederam, além de muitos outros colonialistas e economistas que à emigração têm dedicado os seus estudos e a público têm trazido as suas fundamentadas opiniões sobre a forma de lhe dar remédio, no ambiente dos interesses nacionais.
Vou, pois, ocupar-me, ainda que ligeiramente, do povoamento da nossa província de Angola, considerando-o no momento presente da vida nacional como um dos

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mais prementes imperativos das nossas obrigações, em ordem de continuarmos a desempenhar e a dilatar cada vez mais a nobilíssima missão de povo civilizador, que a história já confirmou em realizações de inigualável valor e mérito, e também para fazermos, em prova de realidade, a demonstração da nossa consciente e efectiva capacidade administrativa e ocupação utilitária do imenso domínio territorial, confiado à nossa guarda e posse, para dele colhermos os benefícios materiais e morais, indispensáveis às melhores condições de vida da Nação, levados s crédito do contributo que nos compete dar ao bem da humanidade.
Assim, o problema da colonização agrícola da província de Angola, como base de povoamento, tendo em conta os objectivos gerais e específicos que resolve, deve ser considerado de alto interesse nacional e visto segundo a sua múltipla função: técnica, transformando em terras agrícolas produtivas e trabalhadas, até onde for possível, por braços portugueses, as terras ainda improdutivas; económica, elevando os índices de rendimento das terras transformadas, criando novas fontes de riqueza: social, transformando em realidades os postulados do movimento social que está na base da nossa política de justiça humana, facilitando a um maior número o acesso à propriedade e finalmente, ao melhoramento da vida rural.
Para bem realizarmos este objectivo global muitos são os factores a que temos de atender, todos de ordem funcional, resolutamente dispostos na complexa organização que há-de prevalecer para a sua normal efectivação no tempo e conforme os objectivos a atingir.
Em nossa opinião, esses factores são principalmente os seguintes:

a) A colonização agrícola e o povoamento precisam de um órgão centralizador superior de direcção que conduza e englobe todo o conjunto de operações e interferências respeitantes a colonizar e ao mesmo tempo, que ordene para o efeito a colaboração que lhe hão-de dar os serviços técnicos e assistenciais da província;
b)A colonização agrícola tem de ser enfrentada com ia determinação prévia e precisa de que representa e tem de representar largos investimentos, sobretudo se continuarmos a praticar a colonização dirigida para a formação de núcleos populacionais exclusivamente ocupados na actividade agrícola, devidamente acompanhados, como convém e é indispensável, por todas as modalidades de assistência colectiva - assistência administrativa, assistência técnica, assistência médica, assistência escolar, assistência religiosa, assistência moral, etc:
c) A colonização agrícola de Angola tem de, ser de acção permanente para ser expressiva do ponto de vista da sua representação numérica; concentrada em zonas e regiões devidamente estudadas e cadastradas para s efeito, para ser mais económico, pois desta forma se evita a repetição de muitas despesas e se facilitam todos os actos assistenciais indispensáveis;
d) O reconhecimento prévio e decisivo de que a colonização agrícola, na sua efectivação, não pode ser uma operação apressada, no que respeita à deslocação e instalação dos colonos, nem quanto à interpretação e julgamento dos resultados, no que se refere à sua adaptação e estabilidade económica;
e) O recrutamento dos colonos deve ser estimado ao máximo, pois não haverá boa colonização com ruins colonos, sobretudo do ponto de vista das suas qualidades morais e aptidão agrícola;
f) A indispensabilidade de ordenar a colonização em regime de aldeamentos, em que os casais instalados e suas famílias desfrutem com maior comodidade e menor despesa os benefícios de toda a acção assistêncial posta à sua disposição, possam ser melhor assistidos na sua vida civil e sintam no convívio das relações que estabelecem melhor conforto moral, de todos os pontos de vista necessário à vida rural, especialmente à vida dos aglomerados agrícolas, em que a troca de impressões sobre os acontecimentos do dia a dia é motivo de satisfação colectiva quando tudo está correndo bem e motivo de resignada consolação quando as dificuldades e contrariedades acodem.

Neste particular, estamos em desacordo com a opinião do ilustre colega Br. Armando Cândido, que preconiza a vantagem das fazendas isoladas, sobre o sistema dos aldeamentos de agricultores, certos de que o sistema da dispersão dos colonos foi a causa primordial do insucesso de algumas iniciativas de colonização experimentadas em Angola.
Com efeito, o sistema de instalar os colonos a alguns quilómetros uns dos outros, com o pretexto de que é imprescindível terem as suas habitações no próprio local da exploração e até com a explicação de que há vantagem em estarem afastados uns dos outros, do todo nos parece inconsistente e inconveniente, pelas razões que já expusemos e ainda porque esse maior isolamento a que obrigamos os colonos é uma das mais imperantes razões para avolumar as dificuldades quanto à sua adaptação a um meio estranho, sendo certo que essa fase da adaptação do colono é de uma extraordinária importância para a estabilização de qualquer empreendimento de colonização.
A outros factores temos ainda que atender, também importantes, logo que os agrupamentos de colonos estejam já no exercício da suas explorações agrícolas, para que estas sejam rodeadas das maiores garantias, com vista aos melhores resultados.

O Sr. Manuel Aroso: - Tenho ouvido com imensa atenção a exposição de V. Ex.ª e ouvi agora a forma como entende que se deve fazer a colonização, isto é, por meio de concentrações, discordando do que o nosso ilustre colega Dr. Armando Cândido tinha dito há anos nesta Assembleia.
Gostava que V. Ex.ª me explicasse como poderia obviar à dificuldade que existe da distância entre os locais das concentrações e os aglomerados da colonização.
Tem inconvenientes a dispersão, mas o deslocamento que exige a concentração, desde o local onde ela se faz até à zona ocupada pelos colonos para nela trabalharem, ainda tem inconvenientes maiores, e não vejo qualquer inconveniente em que a colonização se continue a fazer como até aqui, tanto que é essa a forma tradicional usada na metrópole para os trabalhos agrícolas, a qual não exige, assim, grandes deslocações.

O Orador: - Sou de uma aldeia onde quase ninguém vive junto dos terrenos onde trabalha. Toda a população agrícola, vive na aldeia e de manhã cedo vai para o seu trabalho.
Acho muito pior pôr os colonos a grandes distâncias uns dos outros, pois todo o aglomerado agrícola precisa de ter relações.

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O Sr. Jorge Jardim: - V. Ex.ª tem de África anos de experiência que eu não tenho, mas sabe que é quase impossível à deslocação ali (e V. Ex.ª conhece melhor do que eu como é difícil deslocarmo-nos em África), nas condições de certos colonos, 13 km ou 20 km para irem amanhar as suas terras.

0 Orador: - Eu não punha essa hipótese das distâncias. O que não acho conveniente é que os colonos vivam isolados nas propriedades onde trabalham.

O Sr. Manuel Aroso: - Vejo que V. Ex.ª limita a distância, mas eu não tinha depreendido isso, e por tal motivo é que pedi licença a V. Ex.ª para o interromper.

O Orador: - Mais adiante faço referência a este factor apontado por VV. Ex.ªs - o da distância.
Mas dizia ou que outros factores eram necessários.
São eles:

a) O conveniente ordenamento disciplinador sobre a vida social dos aglomerados de colonos e sobre a orientação económica das explorações, sem, contudo, interferir demasiadamente no sentido das suas iniciativas, do seu trabalho e dos seus gostos e preferências funcionais, no desenvolvimento da sua actividade de agricultores;
b) A excessiva regulamentação relativa à prática agrícola é em muitos casos incompatível com o condicionalismo natural e contingências imprevisíveis a que a mesma prática está sujeita;
c) O incitamento à colectivização da produção, principalmente no que respeita à transformação no local dos produtos que hão-de ser entregues aos mercados de consumo e exportação, em modos de serem imediatamente utilizados:
d) A garantia de escoamento dos produtos, principalmente enquanto se não criar organização comercial própria, de natureza particular, que resolva esse assunto.

Expusemos assim o que em nosso entender, consideramos fundamental ter em conta na ordenação e seguimento de um empreendimento de colonização dirigida, isto é, aquela que resulta da acção directa do Estado, em todas as suas fases, ao mesmo tempo que assume a responsabilidade de custear todos os encargos que daí derivam e que depois e a longo prazo, serão restituídos pelos colonos.
Não quer isto dizer que só consideramos desejável e aconselhável esta modalidade de colonização, ou até que lhe atribuímos vantagens absolutas sobre qualquer outro sistema, especialmente em confronto com a chamada colonização livre.
Não!
Para nós todos os sistemas e processos de intensificar o povoamento de Angola são bons, porque todos conduzem ao seu maior desenvolvimento e valorização.
Se esse aumento de povoamento, tão indispensável, puder ser conseguido com gente portuguesa a sair das regiões da metrópole e ilhas, mais superpovoadas em que se verificam maiores depressões de vida económica, o resultado será ainda mais de desejar, porque, simultâneamente, dois problemas de interesse nacional serão resolvidos.
Todavia, a colonização dirigida é aquela que proporciona transferir para Angola, em menor tempo, maior número de colonos, com a vantagem de ser a única, precisamente porque é dirigida que realiza em maior grau objectivos especificadamente agrícolas, que são, sem qualquer contestação, os que mais convém atender, não só em relação à origem rural dos colonos a transferir, como também às conveniências da ocupação económica de Angola.
Esta circunstância, porém, não se verifica quanto a colonização livre, que, precisamente porque é livre, deixa ao arbítrio do colono escolher e determinar a sua orientação de ocupante, que todos sabemos é, na quase totalidade, encaminhada para o emprego público ou particular, que é a forma mais imediata e menos contingente de assegurar a subsistência, embora em alguns casos como solução transitória, para o comércio, que é o caminho de maiores aspirações de fortuna, e só raramente é orientada para a actividade agrícola.

O Sr. Homem de Melo: - Se bem depreendi das considerações de V. Ex.ª, seguidas por mim com o maior interesse, V. Ex.ª é partidário da, colonização dirigida, o decide-se por essa forma devido à facilidade que o colono tem de trabalhar a tem. E eu perguntaria só V. Ex.ª vê essa faceta de trabalhar a terra pelo interesse que dá ao colono ou pelo interesse agrícola que representa para a província. Segundo penso, as nossas províncias de Angola e Moçambique não têm tido até hoje vantagens de ordem agrícola no trabalho dos seus colonos. E daí o eu perguntar se V. Ex.ª visa directamente o colono pelo seu trabalho agrícola ou o interesse da província.

O Orador: - Eu viso os dois objectivos.
Todos os sistemas de povoamento são desejáveis, e estou convencido de que as obras de fomento hão-de levar muita gente para Angola.

O Sr. Manuel Aroso: - Mas pode haver um tipo de colonização que elimine os inconvenientes apontados, de modo a que a mesma seja estimulada.

O Orador: - A verdade é que os barcos partem cheios de emigrantes, e, contudo, não vai ninguém para a agricultura. Dedicam-se a outras profissões.
Mas estou a tratar da colonização dirigida, quer dizer, aquela em que o Estado controla toda a actividade.
Não se criaram ainda as condições para os emigrantes se fixarem na agricultura.

O Sr. Jorge Jardim: - Há outras modalidades, e entre elas uma é a de o Estado criar as condições básicas para os colonos se fixarem na agricultura. E esses processos têm dado resultado em territórios muito vizinhos dos nossos.

O Orador: - É certo que o sistema de colonização dirigida, inteiramente a expensas do Estado, é o mais dispendioso ou, por outra, o que acarreta maiores encargos, por antecipação, e compreende-se que assim seja, dada a multiplicidade das despesas, resultantes, desde o angariamento do colono até à sua instalação, e em muitos casos até que ele vença o período difícil de adaptação e consiga estabilizar a sua exploração.
Mas a verdade é que ... não se fazem limonadas sem limões.
É caso, pois, de a fazer com a extensão que as disponibilidades financeiras permitirem, sem euforias de grandeza perturbadoras, não deixando, todavia, de a considerar na ordem dos investimentos mais indispensáveis e mais úteis e de acção permanente, ainda, que tenhamos de reduzir a ritmo menos acelerado algumas outras realizações fundiárias, que nem por andarem mais

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depressa têm mais decisiva e oportuna influência lia valorização económica de Angola.
É caso ainda de se aproveitarem ao máximo os ensinamentos colhidos de experiências de coloniza-lo anteriores, para que se tornem mais económicas as operações de colonizarão futuras.
Efectivamente, recordando algumas iniciativas de colonização oficial agrícola experimentadas em Angola, somos forçados a reconhecer muitas deficiências na sua condução, sucedendo até que em alguns casos tais iniciativas não foram mais do que episódios administrativos, em que a boa vontade e as melhores intenções não puderam superar as contrariedades que surgiram, entre as quais uma foi decisiva: a de não ter sido possível conseguir a adaptação dos colonos à vida do campo e muito menos interessá-los no amanho e cultivo das terras.
Verdadeiramente, nunca essas experiências de colonização agrícola, realizadas por acção directa do Estado, passaram do período inicial de dificuldades, que é comum a qualquer empreendimento de colonização dirigida, nem foram baseadas em planos preestabelecidos e estudados, que lhe assegurassem condições de vida e continuidade, tudo devido à falta de recursos.
Por outro lado, ao tempo havia o conceito de que o factor clima era condição preponderante para que os Europeus se pudessem fixar em África; quer dizer: só as regiões planálticas de maiores altitudes eram consideradas susceptíveis de colonização, de nada valendo, para o efeito, o factor económico, pois se sabia que, à parte algumas excepções de menos importância, aos bons climas dos planaltos correspondem as terras mais fracas e mais pobres.
Começaremos por nos referir à colonização do planalto da Huíla, por ser a primeira que representou o tipo de colonização de altitude. Teve por objectivo ocupar as regiões do Lubango, Humpata e Chibia com colonos madeirenses, que ali se fixaram, não há dúvida, porque o clima é esplêndido, mas sempre em condições precárias de manutenção económica, em consequência da invalidez das terras, da falta de, mercados de consumo e principalmente da falta de assistência técnica, do que resultou terem os colonos de ser convertidos em funcionários sem funções, pela atribuição de um subsídio mensal em dinheiro, não retribuível, que é a pior de todas as formas de assistir a colonos, seja qual for a modalidade de colonização adoptada.
Todavia, se essa colonização da Huíla foi pouco eficiente e de modesta influência e projecção no desenvolvimento económico dessa zona sul de Angola, foi, por outro lado, de noção apreciável, pela contribuição que forneceu a definitiva ocupação territorial do Sul da província e também porque foi com base nessa colonização que se criaram os núcleos de povoamento hoje ali existentes e que são numericamente dos mais importantes de Angola.
Temos ainda a considerar que foi deste núcleo de colonização e da sua progressão natural que saíram muitos outros ocupantes que se foram estabelecer em várias regiões da província.
Não foi, por consequência, desperdiçada, como já temos ouvido dizer, pois desempenhou um papel importante, em curto sentido, no complexo problema que é colonizar.

O Sr. Melo Machado: - Aquilo que V. Ex.ª acabou de dizer sobre a colonização no planalto da Huila traz-me à ideia essa outra colonização, já aqui referida. A colonização, que deve ser orientada e não dirigida, exige que o Estado a possa efectivamente orientar para determinadas regiões, dando facilidades às pessoas que nelas se desejam instalar, tendo aí a assistência técnica absolutamente indispensável. Nestas condições, estou convencido de que a colonização já aqui aludida não teria falhado, como falhou a da Huíla.

O Orador: - Essa colonização falhou porque as terras daquele planalto são das mais pobres que há e os colonos foram desacompanhados e não tinham experiência. O Estado começou a dar-lhes dinheiro - um subsídio mensal -, mas depois teve do acabar com ele.

O Sr. Melo Machado: - Esse é o pior processo de colonização que pode imaginar-se, ainda pior que a colonização directamente dirigida, visto que custa muito dinheiro e não dá os resultados precisos.

O Orador: - Vamos agora ocupar-nos das iniciativas de colonização mais recentes, levada a efeito pelo Governo do Alto-Comissário Vicente Ferreira, e que julgo em condições de- nos fornecerem elementos de apreciação sobre colonização dirigida - diga-se já, mal dirigida.
Pretendeu essa iniciativa de colonização criar três núcleos de povoamento agrícola, localizados um nas terras da Palanca, concelho da Humpata, outro nas faltas da serra do Lépi, concelho do Huambo, e ainda um terceiro na Quibala, mais ao norte.
Devo dizer a VV. Ex.ªs que todas estas iniciativas de colonização foram, inspiradas pelo elevado pensamento, prodigiosa inteligência e inexcedível fé patriótica do coronal Vicente Ferreira e do seu secretário. Dr. Torres Garcia, com o propósito de contribuírem para a expansão do povoamento de Angola, dando vazão aos excedentes demográficos da metrópole, e ao mesmo tempo incentivarem a sua economia rural, pela criação de novas fontes de produção.
Levar para Angola mais portugueses e instalá-lo como agricultores foi uma das grandes preocupações desse período governativo daquela província.
Pois bem: apesar de toda essa boa vontade e esforço, as três iniciativas de colonização referidas foram insucessos totais, porque não deixaram, nas regiões indicadas os mais leves vestígios de ocupação agrícola nem qualquer influência de outra natureza a marcar uma nulidade ou benefício.
Mas, a par do esforço perdido e do dinheiro despendido, o insucesso verificado deixou em Angola um ambiente de prevenção e falta de confiança contra a colonização dirigida, que ainda hoje perdura e faz descrer desse tipo do colonização.
Todavia, é fácil e é simples fazer a demonstração das causas que originarem aqueles insucessos.
Foram, fundamentalmente, as seguintes:

a) A péssima localização dos núcleos: bom clima, terras más e quase desprovidas de água para regadio;
b) A dispersão dos colonos, espalhados a esmo por montes e vales, com o propósito de ficarem junto das terras que iriam agricultar, mas completamente isolados uns dos outros;
c) A falta de recursos para dar segurança e continuidade ao sistema, mesmo que fossem corrigidos os erros iniciais;
d) A péssima, escolha dos colonos, em que muitos nunca tinham sido agricultores, porque eram barbeiros, alfaiates, sapateiros e ainda outros eram simplesmente deportados políticos.

Num dos casos, o da Quibala, para a sua instalação prevaleceu até um objectivo político imediato, ou fosse o de contrabalançar com o aumento de população portuguesa, certa influência estrangeira, que na mesma região se estava estabelecendo com bastante insistência.

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Assim, foram os colonos instalados, em grupos de dois, a 10 km de distância uns dos outros, ao longo da estrada Quibala-Bailundo, porque também foi considerado indispensável que ficassem à beira da estrada.
Resultado: abandonados à sua sorte, sem recursos nem assistência de qualquer natureza, os colonos abandonaram as suas casas e as terras.
As casas, com o tempo, ruíram e tudo se perdeu, com excepção de uma habitação, que veio depois a ser ocupada por um colono açoriano e é hoje centro do grupo do Catofe.
No Lépi e na Palanca foi total o abandono.
Fosse como fosse, o que não há dúvida é que tais iniciativas de colonização praticamente não existiram, porque lhes faltou tudo quanto é necessário para proporcionar a estabilização de colonos agrícolas e até o mínimo indispensável para lhes facilitar a fixação.
Sr. Presidente: chegámos, finalmente, ao momento de informar a Câmara sobre o que se passa quanto aos colonatos do Cunene e da Cela, que são os últimos e muito recentes casos de colonização agrícola dirigida levados a efeito em Angola e cujo desenvolvimento prossegue em ordem a atingirem a importância dos respectivos planeamentos.
Sempre fiel ao propósito de apenas transmitir a VV. Ex.ªs as minhas opiniões pessoais, fundamentadas na observação dos factos de meu conhecimento, começarei por dizer que estes dois colonatos não têm, na sua orgânica nem na sua efectivação, quaisquer pontos de contacto ou semelhança com os casos de colonização quo atrás descrevi como tristes fracassos.
Não!
Aos colonatos do Cunene e da Cela não pode já suceder o que aconteceu aos colonatos da Palanca, Lépi e Quibala, porque, ao contrário daqueles, foram pensados e estruturados com firmeza e convicção, à base de possibilidades efectivas, que, apesar da curta duração a sua existência, já foram confirmadas como realidades, discutíveis é certo, sob alguns aspectos, mas inquestionavelmente demonstradas quanto ao fundamental por todos os que julgam com a razão dos factos e não são apressados em formular conjunturas sobre os acontecimentos.
Não!
Estes dois colonatos são já duas obras de grande envergadura, devidamente aparelhadas, para marcarem, na percussão do tempo, quando atingirem a grandeza prevista, um lugar do maior relevo na nossa acção civilizadora e colonizadora, terras adentro de Angola, em regiões ainda há poucos anos desaproveitadas e praticamente desabitadas.
Infelizmente, não conheço o colonato do Cunene, porque a região onde está instalado fica lá muito para o sul da província, fora dos caminhos que habitualmente percorro nas minhas andanças por Angola adentro.
Não posso, por isso, ser mais descritivo nem melhor informador, como desejava, a respeito deste colonato.
Vou, pois, ocupar a minha atenção e a de VV. Ex.ªs sobre o colonato da Cela, que conheço relativamente bem.
Conheço a região da Cela desde há quase quarenta anos, quando por ali andei à procura de terras para a instalação de uma grande empresa agro-pecuária.
No final do reconhecimento a que procedi indiquei para demarcação, entre outras, as terras por onde o colonato começou há muito poucos unos a sua ocupação.
Quem me havia de dizer que aquelas planícies, à data quase cobertas de água, que encantaram os meus olhos, seriam mais tarde abrigo e sustento de centenas de milhares de pessoas e o lugar escolhido para a instalação de dezenas de aldeias genuinamente portuguesas!
Aquele vale imenso, meus senhores, outrora grandioso pela solidão, que nos infundia temor, é hoje campo vastíssimo de trabalho, como colmeia em grande actividade, onde os colonos do Alentejo, das Beiras ou Trás-os-Montes, guiando a sua junta de bois ou o seu tractor, rasgam a terra ou carreiam para as eiras o pão de todos os dias.
Aquela é a Cela, que tem por cabeça administrativa a risonha vila de Santa Comba e onde se está cumprindo, sem desunimos nem maiores dificuldades, a nobilíssima tarefa de instalar portugueses, com todos os rodeios e cuidados indispensáveis, paru que sejam - e bastantes já o são hoje - agricultores de verdade, com o seu lar constituído e montada a tralha das suas lavouras em crescente desenvolvimento e aperfeiçoamento.
Aquela é a Cela, onde há já milhares de hectares de ternas amanhadas e em cultivo, providas com dezenas e dezenas de quilómetros de valas de enxugo e de rega, tecnicamente estabelecidas; onde há parques e ordenamentos florestais e uma estação de piscicultura; onde há cerca de dúzia e meia de aldeias povoadas, todas com a sua capela, a sua escola, a sua eira e armazém colectivos e os seus marcos fontanários e em que cada habitação tem à sua volta um pomar aprazível; onde foram rasgadas dezenas de quilómetros de bons estradas, com as respectivas obras de arte; onde pastam já para cima de duas mil e quinhentas cabeças de gado bovino.
Onde se ergueu a vila de Santa Comba, centro administrativo e técnico do colonato, com avenidas e jardins agradáveis, ladeados pelas edificações públicas, as habitações dos técnicos e pessoal administrativo, o hotel, o cinema, o clube, com seu salão de festas e conferências, grandes armazéns, oficinas, parques de máquinas, central eléctrica - geradora de energia e de luz - e campos desportivos.
Onde se ostentam, com um simbolismo de ternura, cópias autênticas do pelourinho e igreja matriz da vila beiroa que lhe deu o nome, em homenagem a Salazar, o maior dos Portugueses de todos os tempos e filho dilecto daquela ditosa terra.
Esta é a Cela, onde reforçam centenas de crianças, que hão-de ser os colonos de amanhã, a dar continuidade e maior expansão à obra de seus pais.
Esta é, meus senhores a Cela, que centenas de estrangeiros ilustres - cientistas, homens de letras e jornalistas- têm admirado e elogiado, com compreensão e louvores a Portugal.
Sr. Presidente, meus senhores: apesar de tudo isto, eu sei, todos o sabemos, que à volta da Cela se geraram, desde a início, incompreensivelmente, más vontades, se formularam julgamentos injustos e precipitados vaticínios, que fizeram escola noa cafés e noutros sítios onde se não constrói nada, talvez para confirmar o que tantas vezes observamos: que muitos portugueses ainda se ofendem com os grandes realizações e começam sempre por ver o mau onde ainda nem sequer se avizinha o sofrível.
Neste diapasão tudo se tem dito da Cela:

Que a Cela está ficando muito dispendiosa;

É verdade, mas não pode ser barata, além de que não temos outra obra similar, que nos permita fazer confrontos de custos. Há ainda a considerar que, nesta 1.ª fase, se realizou um grande volume de despesas fundiárias que se não repetem, a que, no final, quando distribuídas por maior número de colonos, diminuirão o encargo de instalação de cada um.

Que as terras são más;

Não é verdade. São, na sua grande maioria, boas. Dizem-no os técnicos e dizem-no os próprios colonos.

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Que a falta de comunicações conduz ao não escoamento dos produtos;

Têm-se ali produzido milhares de toneladas de milho, de arroz, de batata, etc. Ainda nenhum quilograma destes produtos deixou de ser vendido e entregue no consumo. Só os produtos frescos não têm podido ser cultivados em grande escala, por falta de mercados acessíveis.
Mas para esses mesmos o problema estará resolvido dentro de um ano ou ano e meio, com a abertura ao trânsito da estrada Luanda-Nova Lisboa, que no seu traçado atravessa a Cela.

O Sr. Homem de Melo: - Queria que ficasse bem expresso, uma vez que V. Ex.ª está a fazer, e brilhantemente, a defesa do colonato da Cela, que eu não sou contra o Cela nem contra qualquer outra forma de colonização, livre ou dirigida.
Apenas pretendi por à Câmara o seguinte problema: se a colonização deverá subordinar-se ao princípio de os resultados serem relativamente proporcionais aos investimentos.

O Sr. Águedo de Oliveira: - Explique V. Ex.ª, Sr. Dr. Homem de Melo, à Câmara como é que nesta altura se podem saber quais os resultados do colonato da Cela a não ser por perspectivas ou hipóteses.

O Sr. Homem de Melo: - V. Ex.ª, que é um financeiro muito distinto e uma pessoa com muito mais experiência do que eu, pode muito melhor avaliar a perspectiva do futuro.

O Orador: - Mas, como ia dizendo, qualquer destas grandes cidades ficará a umas escassas horas do colonato.

Que alguns colonos, desanimados, têm regressado à metrópole;

Não é bem assim. Os poucos colonos que tom regressado à metrópole têm sido mandados embora por inadaptáveis.

Que os colonos não podem passar sem o auxílio de mão-de-obra indígena;

A avaliar pelo número de colonos que há mais de três anos conseguem, sem grandes dificuldades, amanhar as suas terras e fazer as suas colheitas sem o auxílio de pretos, está provado que todos o podem fazer.

O Sr. Melo Machado: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faz favor.

O Sr. Melo Machado: - Queria perguntar a V. Ex.ª se me poderia informar se nesses colonatos há efectivamente alguns serviços centrais, de forma cooperativa, que ajudem essa gente a fazer os seus serviços, isto é, se existe, por exemplo, uma central leiteira onde uma pessoa possa levar o seu leite, etc.

O Orador: - Se V. Ex.ª reparou, num dos passos do meu discurso eu disse que um dos factores a considerar para melhorar a eficiência dos colonatos depois de instalados e a funcionar é essa fundão das cooperativas.

O Sr. Melo Machado: - Mas ainda não existem?

O Orador: - Ainda não. Todavia, está a pensar-se na montagem de uma fábrica de descasque do arroz, numa central leiteira, etc.

O Sr. Melo Machado: - Muito obrigado a V. Ex.ª

O Orador: - O número de pessoas já instaladas na Cela é de 2111, ocupando 11 aldeias, de 26 casas cada, e 9 casais isolados.
O número de famílias é de 285, tendo cada uma em média 7 pessoas. Além das 11 aldeias já ocupadas, estão já quase construídas mais 3.
Cada família, ao chegar ao colonato, recebe terras e casas com as respectivas áreas e tamanhos variáveis; assim, se o colono fizer um depósito inferior a 100.000$, recebe normalmente 5 ha a 7 ha de terra de regadio e 10 ha a 12 ha de sequeiro.
Se o colono fizer um depósito superior a 100.000$ recebe terras e instalações agrícolas consoante o tipo de exploração a que se quer dedicar e o montante do capital. E. assim, ó que para este caso temos já instalados colonos com propriedades variáveis entre 100 ha e 1000 ha.
Cada colono recebe também no primeiro caso apontado, isto é, quando o depósito for inferior a 100.000$, 4 bois de trabalho, 2 vacas indígenas, 1 vaca de raça leiteira, 3 suínos (duas fêmeas e um macho), além do coelhos, galináceos, etc.
As terras são geralmente entregues aos colonos devidamente desbravadas e preparadas, a não ser para os colonos de maior área que possuam, maquinaria própria e dispensem neste aspecto o auxílio do Estado.
Para a manutenção do agregado familiar até às primeiras colheitas o Estado concede um crédito, variável consoante as unidades de consumo, isto para os pequenos colonos.
O colono terá de pagar ao Estado a casa de habitação, todas as instalações agrícolas, terras, gado, alfaias agrícolas, móveis, etc., isto lê, tudo quanto recebeu após a sua chegada ao colonato. A sua dívida para com o Estado é paga - em vinte e cinco anuidades, vencendo-se a primeira após o terceiro ano de permanência no casal agrícola.
Como se depreende do que ficou dito, o colono nada paga ao Estado da despesa referente à viagem da sua terra de residência na metrópole até à Cela.
Entre o Estado e o colono é celebrado um contraiu escrito no qual estão estipulados os direitos e deveres recíprocos. No caso de o colono querer abandonar o colonato, terá de saldar as dívidas que contraiu até à data da sua saída.
Das famílias de colonos que foram para o colonato voltaram para a metrópole quinze; daquelas, duas ausentaram-se por motivo de saúde. Para outros pontos de Angola saíram do colonato oito famílias, das quais duas também por motivos de saúde.
O não pagamento das amortizações, quando não seja por motivo de força maior devidamente justificado, implica a expulsão. Até à data foram expulsos por este motivo sete.
Os produtos que se vendem na Cela são, além dos da pecuária, os seguintes: milho, arroz, Feijão, batata, trigo, soja, hortaliças, etc. Estes produtos são vendidos pelos colonos livremente, garantindo no entanto o Estado, nalguns casos, a sua compra a preços previamente estabelecidos, de modo a assegurar ao colono preços fixos para o produto que é aconselhado a cultivar.
Há, na verdade, colonos que conseguem com facilidade pagar os seus débitos antes de terminados os prazos. Alguns compraram já tractores e alfaias agrícolas sem necessidade de auxílio do Estado, embora com facilidades oferecidas pelas casas fornecedoras, mas geralmente o colono aproveita o auxílio que o Estado dá no sentido de prolongar os prazos do pagamento daquelas e doutras máquinas agrícolas.

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Pensa-se em instalar no colonato da Cela um total de duas mil famílias.
Deixemos, pois, a Cela prosseguir e desenvolver-se até atingir o máximo de aproveitamento das suas terras ainda disponíveis, e façamo-lo de alma aberta, compreensivamente, combatendo todas as más vontades e críticas desalentadoras e destrutivas, porque ali se está criando o maior núcleo populacional de Angola, a viver da terra e para a terra.
Porque ali se está firmando, com solidez e abnegado ardor patriótico, mais uma manifestação da nossa capacidade realizadora e a cumprir com estoicismo e fé a continuidade da nossa acção civilizadora.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vou encerrar a sessão.
Na de amanhã haverá duas partes na ordem do dia, sendo a primeira a continuação do debute sobre o aviso prévio que está em discussão e a segunda a apreciação das Contas Gerais do Estado e das da Junta do Crédito Público relativas a 1956.
Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 15 minutos.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Alberto Cruz.
Antão Santos da Cunha.
António Pereira de Meireles Rocha Lacerda.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
César Henrique Moreira Baptista.
João da Assunção da Cunha Valença.
João Augusto Marchante.
João Carlos de Sá Alves.
João Cerveira Pinto.
João Maria Porto.
José Gonçalves de Araújo Novo.
José Manuel da Costa.
José Rodrigues da Silva Mendes.
José dos Santos Bessa.
Luís de Arriaga de Sá Linhares.
Manuel Cerqueira Gomes.
Manuel Colares Pereira.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel Nunes Fernandes.
Rogério Noel Peres Claro.
Simeão Pinto de Mesquita de Carvalho Magalhães.

O REDACTOR - Luís de Avillez.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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