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REPUBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA-GERAL DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 8

ANO DE 1965 15 DE DEZEMBRO

ASSEMBLEIA NACIONAL

IX LEGISLATURA

SESSÃO N.º 8, EM 14 DE DEZEMBRO

Presidente: Exmo. Sr. Mário de Figueiredo

Secretários: Exmos. Srs.
Fernando Cid de Oliveira Proença
Mário Bento Martins Soares.

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão 16 horas.

Antes da ordem do dia. - Foram aprovados os n.ºs 3 e Diário dos Sessões.
Deu-se conta do expediente.
O Sr. Deputado Colares Pereira foi autorizado a depor no 5.º juízo criminal de Lisboa.
O Sr. Deputado Amaral Neto apresentou três requerimentos solicitando elementos a fornecer pelo Ministério do Economia.
O Sr. Deputado Moreira Longo referiu-se à visita que os Srs. Ministros da Educação Nacional e do Ultramar efectuaram recentemente à província de Moçambique.
O Sr. Deputado Henriques Moura falou sobre os processe de beatificação dos Papas Pio XII e João XXIII, enaltecendo a personalidade e a obra daqueles dois chefes da Igreja.
O Sr. Deputado José Manuel da Costa traçou um perfil da rainha D. Amélia, a propósito do centenário do seu nascimento.
O Sr. Deputado Leonardo Coimbra produziu considerações sobre a criança deficiente e subnormal, sublinhando a necessidade de melhorar a sua protecção.
O Sr. Deputado Proença Duarte referiu-se ao 48.º aniversário da morte de Sidónio Pais, prestando homenagem à sua memória.

Ordem do dia. - Procedeu-se à eleição das Comissões de Legislação e Redacção e de Contas Públicas.
Prosseguiu a discussão na generalidade da proposta d de automação das receitas e despesas para 1966.
Usaram da palavra os Srs. Deputados Calheiros Lopes, Frazão, Ferrão Castelo Branco, Sebastião Alves, António St da Cunha e Barras Duarte.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 20 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai fazer-se a chamada.
Eram 15 horas e 50 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Alberto Henriques de Araújo.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
André Francisco Navarro.
André da Silva Campos Neves.
António Augusto Ferreira da Cruz.
António Calheiros Lopes.
António Dias Ferrão Castelo Branco.
António Furtado dos Santos.
António José Braz Regueiro.
António Júlio de Castro Fernandes.
António Manuel Gonçalves Rapazote.
António Maria Santos da Cunha.
António Moreira Longo.
Armando Acácio de Sousa Magalhães.
Armando Cândido de Medeiros.
Armando José Perdigão.
Artur Águedo de Oliveira.
Artur Correia Barbosa.
Artur Proença Duarte.
Augusto Salazar Leite.

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Aulácio Rodrigues de Almeida.
Avelino Barbieri Figueiredo Batista Cardoso.
Carlos Monteiro da Amaral Neto.
Deodato Chaves de Magalhães Sousa.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Fernando Afonso de Melo Geraldes.
Fernando Alberto de Oliveira.
Fernando Cid de Oliveira Proença.
Fernando de Matos.
Filomeno da Silva Cartaxo.
Francisco António da Silva.
Francisco Cabral Moncada de Carvalho (Cazal Ribeiro).
Francisco Elmano Martinez da Cruz Alves.
Francisco José Cortes Simões.
Francisco José Roseta Fino.
Gabriel Maurício Teixeira.
Gonçalo Castel-Branco da Costa de Sousa Macedo Mesquitela.
Henrique Veiga de Macedo.
Hirondino da Paixão Fernandes.
Horácio Brás da Silva.
Jerónimo Henriques Jorge.
João Duarte de Oliveira.
João Mendes da Costa Amaral.
João Ubach Chaves.
Joaquim de Jesus Santos.
Jorge Barras Duarte.
José Alberto de Carvalho.
José Fernando Nunes Barata.
José Gonçalves de Araújo Novo.
José Henriques Mouta.
José Janeiro Neves.
José Manuel da Costa.
José Maria de Castro Salazar.
José de Mira Nunes Mexia.
José Pais Ribeiro.
José Pinheiro da Silva.
José Soares da Fonseca.
José Vicente de Abreu.
Júlio Dias das Neves.
Leonardo Augusto Coimbra.
Luciano Machado Soares.
Luís Arriaga de Sá Linhares.
Luís Folhadela Carneiro de Oliveira.
Manuel Colares Pereira.
Manuel João Cutileiro Ferreira.
Manuel José de Almeida Braamcamp Sobral.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel Marques Teixeira.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
Mário Amaro Salgueiro dos Santos Galo.
Mário Bento Martins Soares.
Mário de Figueiredo.
Miguel Augusto Pinto de Meneses.
Paulo Cancella de Abreu.
Rafael Valadão dos Santos.
Raul da Silva e Cunha Araújo.
Rui Manuel da Silva Vieira.
Sebastião Alves.
Sebastião Garcia Ramirez.
Sérgio Lecercle Sirvoicar.
Simeão Pinto de Mesquita.
Carvalho Magalhães.
Teófilo Lopes Frazão.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 82 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Eram 16 horas.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Estão na Mesa os n.ºs 3 e 4 do Diário das Sessões, correspondentes, respectivamente, às sessões de 30 de Novembro passado e 10 do corrente.
Se algum dos Srs. Deputados tiver alguma reclamação a deduzir, peço o favor de o fazer.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como nenhum dos Srs. Deputados deduz qualquer reclamação, considero aqueles números do Diário das Sessões aprovados.

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Telegrama

De um grupo de funcionários a Apoiar considerações de alguns Srs. Deputados sobre os servidores do Estado.

O Sr. Presidente: - Está na Mesa um ofício do 5.º juízo criminal da comarca de Lisboa a pedir para que o Sr. Deputado Colares Pereira seja autorizado a depor como testemunha em audiência de julgamento no dia 16 do corrente.
Consultado sobre se via inconveniente em ser autorizado a depor, aquele Sr. Deputado declarou que não.
Nestas condições, ponho a VV. Exas. o problema da autorização.
Consultada a Câmara, foi concedida a autorização.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Amaral Neto.

O Sr. Amaral Neto: - Sr. Presidente: Pedi a palavra para apresentar os seguintes:

Requerimentos

«Nos termos, constitucionais e regimentais, requeira que, pelo Ministério da Economia, através da Direcção-Geral dos Serviços Industriais e da Junta Nacional das Frutas, me sejam prestadas as seguintes informações, em relação à indústria de conservas de tomate, designadamente sol as formas de concentrados e de frutos pelados.
1 .ª Número de fábricas em laboração em 31 de Agosto de cada um dos anos de 1947. 1950, 1950. 1960, 1964 e 1965;
2.ª Número de pedidos de licenciamento de novas fábricas pendentes de despacho em 30 de Novembro próximo passado;
3.ª Idem dos que hajam sido indeferidos dentro do período de 1 de Dezembro de 1960 e 30 de Novembro de 1965, com indicação sumária dos motivos de indeferimento;
4.ª Quantidades totais de frutos empregados na fabricação em cada uma das campanhas de 1947, 1955, 1960, 1964 e 1965, por categorias de qualidade;
5.ª Preços médios de aquisição dos frutos aos produtores, segundo as mesmas categorias, em cada uma das referidas campanhas;
6.ª Quantidades e valores das produções industriais e respectivas exportações nos períodos anuais começados com o início de cada uma dessas referidas campanhas.»

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«Nos termos constitucionais e regimentais, requeiro que, pelo Ministério da Economia, me seja dada informação dos números de engenheiros agrónomos, engenheiros silvicultores, médicos veterinários e regentes a colas ao serviço do referido Ministério, nos seus diversos departamentos e ainda nos organismos de coordene económica e outros sujeitos à sua autoridade, na qualidade de funcionários dos quadros, de contratados ou qualquer outro modo providos em funções com carácter duradouro, reportada ao fim do corrente ano e com indicação dos serviços em que se encontram ocupados e sedes das suas funções.
Outrossim, requeira que me seja dada informação, mesmas bases, dos números desses funcionários que, ventura, hajam abandonado voluntariamente os serviço em cada um dos anos de 1963, 1964 e 1965.»

«Nos termos constitucionais e regimentais, requeiro que, pelo Ministério da Economia, através das Direcções-Gerais dos Serviços Industriais e dos Serviços Flores e Aquícolas, me sejam prestadas as seguintes informações, com respeito, separadamente, às industrias de pastas e de aglomerados de partículas e de fibras de madeira.

1.ª Números de fábricas do uma e de outra especialidade em laboração no fim de cada um anos de 1960, 1961, 1962, 1963, 1964 e 1965 e suas localizações;
2.ª Idem das que estejam presentemente licencia ou em vias de montagem, suas localizações capacidades previstas;
3.ª Quantidades e valores globais das respectivas produções em cada um dos anos de 1960 1964, inclusive, e, se possível, ainda no 1.º semestre de 1965:
4.ª Ordens de grandeza dos valores - ou pré pago» - nas matas das madeiras para indústrias no decurso dos anos de 1963, e 1965;
5.ª Preços médios de compra dessas madeiras p fábricas nos mesmos anos;
6.ª Se tanto constar de dados ao alcance de alguns dos departamentos citados, valores mais rentes das madeiras para análoga* aplica» industriais nas florestas e suas evoluções de curso dos três referidos anos em outros países europeus.»

O Sr. Moreira Longo: - Sr. Presidente: Ao usar palavra pela primeira vez nesta legislatura, tenho a subida honra de apresentar a V. Exa., em meu nome pessoal e em nome da província de Moçambique, as nossas sai coes, com votos de uma feliz saúde, para que a Nação continue, por largos anos, a contar com a prestígios inteligente colaboração de V. Exa. na grandiosa obra governo de Salazar, que ficará para tudo o sempre gravada na história do povo português.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - A VV. Exas., Srs. Deputados, entre quais me é imensamente grato tornar a encontrar o hemiciclo alguns colegas com quem tive a honra de trabalhar na transacta legislatura, eu cumprimento efusivamente, oferecendo-lhes a minha muito modesta, mas muito leal colaboração.
Aos órgãos de informação, que tão dignamente se acham representados nesta Assembleia, eu desejo também dirigir uma saudação de justo agradecimento pelos inestimáveis serviços que têm prestado através de uma inteligente e criteriosa actuação.
Sr. Presidente: Moçambique não pode conservar-se em silêncio perante tão grande acontecimento de larga projecção e das maiores perspectivas, tanto no campo do ensino como no campo económico-social e político, traduzido pela visita conjunta dos Srs. Ministros da Educação e do Ultramar àquela província.
Ninguém oculta a grande satisfação que tal visite causou, tal-qualmente ninguém esconde o entusiasmo que a presença de tão altos magistrados da Nação tem suscitado em todos os pontos visitados.
O Sr. Ministro da Educação Nacional, cujo objectivo principal foi a cerimónia da inauguração solene da abertura do ano lectivo dos Estudos Gerais de Moçambique, teve na capital da província uma entusiástica recepção, que a população, em geral, e toda a massa estudantil lhe ofereceram, em cujas manifestações transparecia o grande amor dedicado a Portugal e a firmeza e lealdade que a gente de Moçambique, constituída por várias etnias, mas de uma só alma portuguesa, quis patentear à Mãe-Pátria.
O Sr. Ministro do Ultramar, pouco tempo depois da sua entusiástica e calorosa recepção na capital da província, tomou imediatamente rumo ao Norte, onde a situação, algo alterada por circunstâncias conjunturais que nos têm sido impostas por inimigos da paz e da civilização vindos do exterior, constitui uma das grandes preocupações do Governo.
Sem se poupar a esforços nem canseiras, S. Exa. visitou s Moçambique de lês a lês, tendo marcado, patriòticamente, a sua presença em todos os pontos afectados pelo terrorismo, correndo por vezes sérios riscos devemos dizê-lo com sinceridade -, onde, conjuntamente com o Sr. Governador-Geral e governadores de distrito, estudou atentamente a situação e os problemas locais que tanto nos afligem.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - Naquelas regiões teve o Sr. Ministro oportunidade de verificar que as populações, numa amálgama de cores e raças que não têm confronto, têm conservado sempre, apesar de todas as vicissitudes, um elevado nível moral e o seu nunca desmentido amor à Pátria.
Firmes o vigilantes, sem temerem sacrifícios, aquelas almas nobres mantém-se sempre prontas paru defender com o maior estoicismo e integridade da Pátria, que nos é sagrada, seguindo assim o nobre exemplo das nossas forças armadas.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O Norte de Moçambique merece que o Governo Central, ainda que com prejuízo de outros pontos menos necessitados, lhe preste homenagem, concedendo às suas terras maiores possibilidades de um rápido desenvolvimento que tanto ajuda a debelar os perigos que nos ameaçam.
Nem só o moral das populações conta no panorama hostil que nos criaram, mas também a parte material,, que muito o eleva e fortalece, tem especial relevância no ânimo de quem ali moureja.
E os dois distritos de Cabo Delgado e Niassa, especialmente, carecem de mão protectora que os ajude no seu progresso e os defenda com todas as nossas forças da insistente cobiça alheia.

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Esta tão oportuna quão proveitosa decisão do Sr. Ministro visitando Moçambique com larga demora de um mês, onde S. Exa. se deslocou aos mais recônditos lugares, exclusivamente em objecto de estudo e de trabalho, sem pompas nem grandezas que nada traduzem, merece que aquela nossa província do Índico registe jubilosamente o facto, trazendo a esta Assembleia uma palavra de reconhecimento pela acertada decisão de S. Exa. e preste as maiores homenagens ao Governo Central pelo apoio concedido a tão feliz visita.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - De facto, dada a distância que nos separa da Mãe-Patria, agravada com uma orgânica de sistema pouco funcional, onde os assuntos nem sempre correm com a celeridade exigida pelos tempos actuais, a deslocação do titular da pasta do Ultramar a Moçambique é medida de largo alcance e do maior interesse para o progresso e segurança daquela nossa província.
A presença naquelas terras de quem cá longe olha por nós, se preocupa connosco e vela pela nossa segurança, numa tão difícil fase da nossa vida, em que inimigos da tranquilidade e da civilização cobiçam os nossos haveres, atacando-nos implacàvelmente sem que tenhamos a menor protecção ou mesmo compreensão por parte de algumas nações responsáveis pela condução do Mundo, encontrando-nos só no combate contra o comunismo, na sua desenfreada carreira para a Europa através da África, traduz o alto interesse que a Nação põe na defesa da nossa integridade territorial e significa que a posição de Portugal será cada vez mais firme e corajosa, porque assim o impõe a missão civilizadora que iniciámos em África vai para cinco séculos e jamais terá fim.
Esta gloriosa jornada de portuguesismo e trabalho do Sr. Prof. Silva Cunha, que tanto tem possibilitado a auscultação dos anseios das populações, permitindo o largo estudo dos problemas que interessam ao desenvolvimento de Moçambique e bem-estar de todos, responde também, de certo modo, aos traidores que se intitulam oposicionistas, autores do vergonhoso e infame manifesto publicado durante o último período eleitoral, no qual essa frente inimiga se permitiu sugerir a negociação das nossas províncias ultramarinas, como se algum dia a Nação e as nobres populações que ali nasceram, ali têm os seus filhos e os seus próprios netos consentissem em tão criminosa acção.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - A presença do Ministro em Moçambique, para com o governador-geral estudarem conjuntamente as soluções mais apropriadas aos problemas que urge resolver, marca um precedente que deve considerar-se irreversível e que Moçambique exalta e aplaude com o maior entusiasmo.
E um passo firme e bem consciente da hora difícil que atravessamos e traduz o alto interesse e uma vontade indómita de vencer os obstáculos que nos são criados por inimigos do exterior, ao mesmo tempo que nos incute a major fé e esperança no futuro daquela bem portuguesa província de Moçambique.
Esta iniciativa deve constituir um exemplo a seguir, sobretudo em visitas anuais às duas grandes províncias de Angola e Moçambique, sem qualquer desprimor para as províncias de governo simples, pela magnitude dos seus múltiplos problemas, requeridos pela grandeza da sua superfície e especial situação geográfica que ocupam.
Uma mais efectiva presença do Sr. Ministro é medida quo nos* é imposta pelas circunstâncias autuais e que um maior e mais rápido desenvolvimento vem reclamando.
Os comandos à distância, num ambiente de características absolutamente diferentes, nem sempre tem dado resultados inteiramente satisfatórios.
Apesar do maior interesse posto no progresso do ultramar, concedendo delegações aos governadores para que desse modo poisam resolver prontamente e tomar decisões para além da sua alçada, temos de confessar que dificilmente se substitui a presença do Ministro, quando os assuntos são de âmbito ministerial.
A deslocação de comissões e de representantes de várias empresai, à metrópole, a fim de tratarem de assuntos junto do Ministério do Ultramar, obriga a largas despesas, a uma grande perda de tempo, e nem sempre é coroada de êxito, por falta de elementos que só muitas vezes na própria província podem esclarecer quem procura decidir com inteira justiça.
Por isso, Moçambique, reconhecendo o mérito destas visitas, reitera os seus agradecimentos, crendo, com fundadas razões, que delas advirão sempre os maiores benefícios.
Por toda a parte S. Exa. foi alvo das maiores manifestações patrióticas oferecidas pelos povos moçambicanos, numa expressão bem significativa de quererem ser sempre portugueses!
Numa resposta categórica a quem na O. N. U. ousa atacar-nos e se permite condenar a nossa política ultramarina, aliás a que melhores frutos tem produzido, o que está sobejamente demonstrado perante o descalabro que se regista nos novos estados africanos, as populações de Moçambique, na sua maior força, patentearam a Nação, na pessoa ilustre do Ministro do Ultramar, as maiores provas de verdadeiro portuguesismo.
Sr. Presidente: Quando se discutiu a Lei Orgânica do Ultramar, fui dos que advogaram entusiasticamente uma descentralização mais ampla de poderes e uma autonomia maior aos governadores-gerais que lhes permitisse uma acção mais rasgada, ao nível ministerial, sem peias, nem embaraços, sempre prejudiciais e muitas vezes desanimadores.
Apesar de volvido ainda pouco tempo sobre a entrada em vigor da referida lei, nota-se que tal autonomia, não obstante as maiores facilidades do Ministério do Ultramar, não é ainda em escala suficiente que permita tomar decisões de larga envergadura com vista ao arranque de empreendimentos de vulto de que tanto depende a nossa prosperidade económica.
Quando a orgânica possibilitar uma larga estada do Ministro do Ultramar, principalmente nas duas grandes províncias de Angola e Moçambique, 'teremos atingido uma alta posição na escala integracionista para que tanto estamos trabalhando.
De igual modo obteremos também uma grande vitória na caminhada política ultramarina, onde somos injustamente atacados com o apoio inconsciente de algumas nações ocidentais.
Nações que seriam bem mais úteis à humanidade se antes enfileirassem ao nosso lado na luta contra o comunismo, que está minando a África, onde Portugal heroicamente se bate, não apenas pela sua integridade territorial, mas pela própria sobrevivência da civilização ocidental.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi minto cumprimentado.

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O Sr. Henriques Mouta: - Sr. Presidente: Ao pronunciar aqui as minhas primeiras palavras, é-me grato endereçar a V. Exa. respeitosas saudações, homenagem de quem se habituou a admirar, desde menino e modo, a robusta inteligência de V. Exa., através de uma tradição com ecos que não morrem, na cidade onde fiz grande parte da minha formação.
Srs. Deputados: Saúdo também VV. Exas. e evoco, respeitosamente, quantos nesta Casa souberam servir a Pátria, não atraiçoando nunca o mandato das nossas gentes respeitando a consciência do nosso povo e colocando bem comum acima de quaisquer interesses, por mais tentadores que eles fossem.

O Sr. André Navarro: - Muito bem!

O Orador: - Pois o bem comum, que ultrapassa esferas do político e do sócio-económico, deve sobre; a todos os particularismos, mesmo dos nossos círculos e províncias, que não se integrem no bem-estar de toda grei e se lhe oponham decisivamente.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Porque nem só de pão vive o homem ... e porque se me representa de interesse geral, social e humano, e até nacional sob e bem relevantes aspectos, pedi a palavra para sublinhar um acontecimento recente e já decisão histórica, que as agências transmitiram de Roma para todos os pontos do Planeta. Em 18 de Novembro, no ocaso da assembleia conciliar, carregado de esperanças de uma nova madrugada a suceder à noite dos tempos presentes S. S. Paulo VI anunciou ao Mundo a introdução processos de beatificação dos Papas Pio XII e João XXIII.
O facto, em si mesmo considerado, é um desmentido ao asserto do autor dos Préceptes do Philosophic Centemporaine, nas vésperas da conflagração de 1939:

A sociedade civil ou militar mantém os seus heróis a sociedade religiosa perdeu os seus santos; ou ainda os há, já se não fala deles ...

Os santos não desapareceram. E hoje não são menores nem menos, que ontem.
A Igreja tem os seus heróis; hoje, como ontem, sofre-se e morre-se pela fé. Mortas estão a fé e as convicções quando não há quem morra por elas, como também mortas estão as pátrias quando os cidadãos se recusa: morrer por elas. Ai do Mundo sem os santos, se dos os jardins desaparecesse tão bela espécie! Se alguns olfactos não sentem as flores, o facto não anula a sua existir. Os santos não acabaram. Simplesmente, os santos m se têm por santos, não se exibem, são discretos, violetas. E fala-se deles, não com anúncios ou cai como se fala dos artistas ... da cena e do pincel, sons e das cores, mas como obra-prima de Deus i colaboração do homem com a graça, ao serviço de Deus dos homens.
Pio XII e João XXIII são exemplos típicos, contemporâneos, humaníssimos e rutilantes, a brilhar mi cabeça da sociedade cristã, diante do Mundo que 01 e ouviu, respeitou e admirou, amou e chorou, como e protectores e, sobretudo, como mestres na vida morte.

O Sr. António Santos da Cunha: - Muito bem!

O Orador: - Unidos ontem na missão e responsabilidade, unidos hoje na glória de candidatos às honras altares, que a Igreja tributa só aos seus maiores heróis e grandes modelos de vida humana. Unidos, embora, em determinado momento, se haja tentado opô-los e contrapô-los.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Soara a grande notícia:
- Já temos papa!
Quem seria e que nome assumiria?
- Chama-se João, João XXIII - esclareceu um alvissareiro.
- E um velho octogenário ... - observou-se do lado. E acrescentou-se:
- A Igreja deve estar muito pobre de valores ... para escolher personalidade tão decrépita! E, demais a mais, para suceder a um astro como Pio XII ...
Recordo-me perfeitamente desta reacção que afinava pelo diapasão de alguns círculos bem informados, onde João XXIII era considerado um papa de transição. Estou ainda a ver, mentalmente, o lugar e as pessoas, felizmente vivas. Que dirão agora? Que a um astro sucedeu outro e que a pobreza do ancião era riqueza de juventude, e a transição não era pausa, mas dinamismo empreendedor e renovador.
Dois erros, talvez propósitos, se vieram a assinalar. Um foi supor-se que João XXIII era na Igreja viragem de tal sentido que não ficaria pedra sobre pedra, na moral e no próprio dogma. Confundia-se uma lufada de ar fresco com um ciclone e um sopro do Espírito Santo com um terramoto.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Apontavam-se as atitudes do Pontífice como inéditas e revolucionárias, quando elas se situavam na linha histórica da Igreja, como elo de uma cadeia, um passo na sua marcha para o futuro, levando como sempre em conta o contexto social, mas sem se negar ou desviar, fiel as raízes. E verificou-se enorme alarido, tão ruidoso que atordoou alguns, cujo horizonte não passava além da sua geração, incapazes de abarcar a complexidade do fenómeno cristão, por miopia ou incorrigível daltonismo. Acentuou-o recentemente Paulo VI, ao esclarecer o aygiornamento da Igreja, preconizado por João XXIII:

Este Pontífice, ao empregar tal palavra-programa, não lhe dava certamente a significação que alguns homens tentam dar-lhe e que permitiria «relativizar», segundo a mentalidade do Mundo, tudo o que toca à Igreja, dogma, leis, estruturas, tradições, quando é certo que houve, pelo contrário, um sentido tão furte e too firme que permanecia da doutrina e das estruturas da Igreja, ao ponto de o tornar a ideia mestra do seu pensamento e da sua acção. (Ao Concílio em 18 de Novembro de 1965).
Esquece-se que a Igreja é tão imutável como adaptável, como o lembrou Pio XII já em 1949.
Outro erro era opor as duas grandes figuras de João XXIII e de Pio XII. Na base desta tentativa estava algo que não era ortodoxo, nem sequer religioso. E fazia intervir a literatura e subia aos palcos para achincalhar a memória veneranda de um morto, para acusar um homem defensor do homem, talvez o maior defensor da pessoa humana em todos os ciclos da história.

Vozes: - Muito bem!

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O Orador: - Esta interferência não foi do Cardeal-Diabo, porque ele só entra no debate durante o rigoroso e ultra-severo processo que é das atribuições da Sagrada Congregação dos Eitos. Parece, sim, antecipação da Diabo ... com suas artes de dramaturgo e de encenador.
Ensaiou-se fazer de Pio XII um pai cobarde ou indiferente aos sofrimentos dos filhos, quando a verdade é que ele fez saber que só não proferia palavras de fogo para as atrocidades cometidas contra o povo da Polónia a fim de evitar mais vítimas, como foi recentemente revelado.
Mas a calúnia correu. E suscitou alguns pontos de interrogação na gente nova, ainda ausente do palco da história, no momento em que Pio XII interveio na história do seu tempo. E a juventude, na limpidez da sua alma que a leva a pensar que todas as almas são transparentes como a sua, sentia-se, aqui ou ali, algo perturbada. Era preciso convidá-la a ler a Pacem in Terris, onde João XXIII invoca Pio XIL, insistentemente, em quase todos» os pontos de doutrina, em quase todas as páginas e várias vezes em cada página. Era necessário chamar-lhe a atenção para a concordância, paralelismo, inspiração ou raízes comuns da doutrina daqueles dois astros do Vaticano, que encheram da mesma luz os caminhos dos homens. Ainda a propósito, ao anunciar a introdução dos processos de beatificação de Pio XII e d* João XXIII, Paulo VI anotou:

Assim, a posteridade poderá receber, com inteira segurança, o património espiritual que legaram. Evitar-se-á, enfim, que outros motivos, estranhos ao culto da verdadeira santidade - que apenas serve a glória de Deus e a edificação da Sua Igreja -, intervenham em detrimento da autenticidade na sua maneira de apresentar estas gratas figuras à veneração da geração presente e das gerações futuras.

O próprio João XXIII chamou a Pio XII «grande em doutrina e bondade» e afirmou que a sua «palavra era um eco da de Pio XII».
Sr. Presidente: A sequência ou continuidade dos dois pontificados, na sua linha de profundidade, ressalta do enunciado dos temas. No pontificado de Pio XII surgiram no horizonte os primeiros sinais dos acontecimentos que surpreenderam o Mundo, desde o alivio do jejum eucarístico e reformas litúrgicas de sentido pastoral até à disciplina eclesiástica e ao sacerdócio, incluindo missões, vida religiosa, institutos seculares e matrimónio.
No campo teológico, são marcos miliários as encíclicas Mistici Corporis, Divino Aflante Spiritu e Humani Generis, relativas ao corpo místico, estudos bíblicos e a certas opiniões que ameaçavam destruir os fundamentos da doutrina católica.
Na ordem, social deu orientação as classes trabalhadoras e patronais; dirigiu-se às Semanas Sociais de vários países; ocupou-se da função individual e social das instituições bancárias, do conceito de economia social, dos problemas da vida rural, do valor da estatística e de viagens e turismo. Nos domínios dá educação, tratou do desporto s da ginástica perante a consciência religiosa e moral da educação popular, da educação da juventude, missão dos jornalistas, cinematografia, rádio e televisão e teatro. No plano médico-social, enfrentou os delicados problemas da reanimação, fecundidade e esterilidade, legitimidade de transplantação das córneas, dos limites morais dos métodos de investigação científica e tratamentos da medicina, dos novos métodos psíquicos, e os preceitos da moral, do parto sem dor, etc.
Nos domínios científico-culturais, prestou especial atenção à recristianização da alta cultura, à sua unidade na diversidade e universalidade e à grandeza e finalidade da investigação científica. Quanto aos estudos jurídicos, tratou de normas e indicações sobre direito privado, profundas harmonias entre o direito romano e a doutrina de Cristo e da Igreja e os direitos do homem. Não Lhe escaparam as técnicas, desde as telecomunicações à agronomia e enologia. Dirigiu-se às instituições científicas e sociais, por ocasião dos seus congressos, nacionais, internacionais e mundiais, como Instituto Mendel, Psicoterapia e Psicologia Clínica, Oftalmologia, Histopatologia do Sistema Nervoso, Estomatologia, Ultra-Sons, Câmaras de Comércio, Estudos Humanísticos, etc.
Falou aos embaixadores e às nações, ao povo espanhol, ao povo da Rússia e ao povo da China.
Preocupação obsidiante era a paz. Para evitar a guerra, para a sustar, empenhou-se a fundo, pelas intervenções diplomáticas e por cruzadas de orações, aproveitando todos os ensejos, insistindo, oportuna e importunam ente, doutrinando a, propósito das mensagens natalícias, Conselho Mundial da Paz, do Movimento Universal para a Confederação Mundial, etc. Inaugurou o Movimento para Um Mundo Melhor e fez a primeira denúncia do terror atómico. Acolheu os perseguidos, na sua casa e no seu coração, sem olhar a credos, nacionalidades ou opiniões políticas. Por se privar da comida em benefício dos pobres, durante a guerra, chegou a pesar 59 kg, não obstante o seu metro e oitenta e dois de altura. E tudo e sempre como um pai que mão enjeita nenhum filho, por mais desgostos que lhe dê, respirando caridade e insuflando espírito em todas as coisas.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Os Romanos semearam de sal, depois da guerra, a terra lavrada de Cartago. Pio XII não semeou sal, mas verdade e caridade, fé e esperança, sobre as ruínas fumegantes do Mundo queimado pela guerra. Estou a vê-lo, na sua silhueta esguia e ascética, ao encontro dos feridos e dos escombros do bombardeamento de Roma, e faz-me lembrar Leão I a sair à frente dos Hunos para salvar a cidade dos césares e dos papas. Alguns parece que tinham esquecido p teólogo de vasto horizonte e o jurista de raro equilíbrio; o diplomata consumado e o humanista insigne;; o místico inflamado e o trabalhador infatigável; o mestre simples; o gula seguro e o poliglota das principais línguas dos povos civilizados; o doutrinador sereno, surpreendendo a todos pelo à-vontade e exactidão dos conhecimentos, membro nos sectores mais alheios às suas especializações.
Sr. Presidente: Ao esquecimento somava-se a deformação, e o gigante era transfigurado em pigmeu, e o benemérito em prevaricador.
Nós é que não esquecemos o seu diálogo com o Mundo, e muito menos u diálogo com Portugal. Foi o primeiro papa a falar em português aos povos de expressão portuguesa, o Papa de Fátima, da Coroação de Nossa Senhora na sua imagem da Cova da Iria em 1946, da consagração do Mundo ao Coração Imaculado de Maria.
Na Cova da Iria, onde se encontravam representações dos vários quadrantes do Mundo, encerrou o Ano Santo. Falou aos peregrinos portugueses à canonização de S. João de Brito, símbolo do sentido da nossa acção ultramarina, e dirigiu-se ao Exmo. Sr. Cardeal-Patriarca de Lisboa a propósito do centenário de outro santo português, S. João de Deus. Dirigiu-se também ao povo e Governo de Portugal nos centenários 8.º e 3.º da sua fundação e (restauração (Excunte sacculo octavo. ..). E selou, solenemente com uma concordata, a pacificação religiosa do nosso país, em que à Igreja foram reconhecidos

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os seus direitos essenciais, nomeadamente em matéria apostolado e da educação da juventude...

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Por isso, a histórica decisão de Paulo II encontrou ressonância e acolhimento agradecido na Terra de Santa Maria, nos corações portugueses.
O Sr. António Santos da Cunha: - V. Exa. dá-me licença?

O Orador: - Faz favor.

O Sr. António Santos da Cunha: - Desejava em primeiro lugar dizer da emoção, da alegria, com que vi evocar aqui a figura de Pio XII e, com ela, a dos dois pontífices que lhe sucederam. E, para que ficasse completo o exaustivo documento que é o discurso de V. Exa. e que irá ficar registado no Diário das Sessões. queria lembrar que o grande Pio XII, a quem bem se pç chamar a grande coluna de luz do nosso século, se dirigiu também aos Portugueses por ocasião do encerramento do Congresso do Apostolado da Oração, a uma multidão de mais de 200 000 peregrinos, no alto do monte do Sameiro, e foi nessa altura que disse alto ao Mundo em Portugal se deviam comparar os tempos antigos e com os de hoje, em que a Igreja e o Estado viviam em plena concórdia. Aproveito o momento para recordar também que Portugal foi o primeiro país do Mundo a levantar uma estátua a Pio XII, estátua que se encontra situada no centro de uma das praças da Roma portuguesa.
Peço desculpa de ter interrompido V. Exa.

O Orador: - Muito obrigado pela contribuição V. Exa. Não é, porém, só como portugueses que de mus agradecer, aplaudir e exultar com o gesto do Santo Pontífice, que vai consagrar a veneranda memória Pio XII, pela autoridade máxima da Igreja, assisti pelo Espírito Santo. Também e antes de mais como filhos da Igreja e depois como homens. Vemos, Pio XII, como em João XXIII, expressões autênticas consciência cristã e da consciência humana.
E não será temerário vaticinar que, se a Providência dispuser que Pio XII seja elevado pela infalível autoridade da Igreja à glória máxima dos heróis da virtude resplandecerá na sua fronte, como gema rutilante sua auréola, o titulo de doutor da Igreja. Logo no jataí de 1959, João XXIII afirmou que o título tríplice de Doutor Excelente, Lume da Santa Igreja e Amante da Divina Lei (Doctor Optimus, Eclesiac Sanctac (...) et Divinac Legis Amator) quadrava, muito bem, à memória abençoada do Pontífice do nosso atribulado tempo.
E o Osservatorc Romano, em Outubro de 1959, ao informar que a Igreja considerava, atentamente, a sugestão popular de canonização de Pio XII, acenava à ideia ele vir a ser proclamado doutor da Igreja.
Para se ter uma ideia mais expressiva do significado do acontecimento, lembra-se que o último papa a ser canonizado foi Pio X, em 1954, 40 anos depois da sua morte: que S. Pio X foi o único papa canonizado últimos 242 anos; que Pio X é o 78.º pontífice canonizado na história bimilenária da Igreja: que mais de 30 dos 78 papas canonizados morreram mártires, até dealbar do século IV: que a Igreja já conta 263 papas que os primeiros e únicos papas a quem a Igreja atribuiu o título de doutor foram S. Leão Magno e S. Gregório Magno.
Este, no século vi e num pontificado eminentemente missionário, pastoral e de cunho acentuadamente diplomático, orientou a reconciliação dos povos invadidos e invasores, no abraço da mesma fé que os fez Irmãos na cidadania europeia. Aquele, no século V, também diplomata o teólogo de raça, pôde mais que os exércitos romanos, deteve os Bárbaros não com as armas, mas pela autoridade mural que os Atilas daquele tempo respeitavam. E os dois trabalharam por aproximar Oriente e Ocidente, como Pio XII e Joao XXIII, derretendo o gelo, por infinita paciência, pelo contacto dos corações, pela luz da fé e pela chama da caridade e dando tempo ao tempo.
Também agora a desejada aproximação se há-de operar, não pela confusão, nem pela humilhação, nem pela diplomacia, somente, muito menos pela força, sequer pelo pavor atómico. As soluções violentas ou diplomáticas costumam falhar em tarefas desta natureza. Fracassaram com Genserico e com Teodorico, com os Vândalos e com os Ostrogodos. Não se dispensa a defina, nem u manobra, mas requer-se algo mais. Algo que satisfaça a inteligência, solicite a vontade, alimente o espírito e encha os corações. Será pela fé, pela espiritualidade e pela cultura, assente na comum raiz humana e nu comum vocação ao sobrenatural, que fortaleceremos a marcha para o entendimento universal.
Até por isso a resolução de S. S. Paulo VI, sucessor e colaborador íntimo de Pio XII e de João XXIII, é bem-vinda e recolhida como bênção e esperança, no coração dos homens, mesmo daqueles que, não crendo num pai comum, instintivamente pretendem sentir-se irmãos e formar família com todos os outros homens
Consciente, embora, de ser bem modesto componente desta Câmara e apelando exclusivamente para a minha qualidade de sacerdote, daqui, do seio da representação nacional, quero exprimir a satisfação que sinto, sinto e palpo, no meio da nossa gente e o agradecimento da Nação fidelíssima, missionária da mais humana de todas as mensagens, pioneira da revelação geográfica e antropológica do Planeta, autora do primeiro ensaio verdadeiramente sério de uma universal permuta de valores, mestra na arte de conciliar o nacional com o mundial, obreira desinteressada da aproximação de raças, nações e continentes, rumo à unidade na pluralidade e na diversidade como destino da história e plano de Deus.
E, ao mesmo tempo, evoco :i memória veneranda de Pio XII e do João XXIII, colunas de fé, obeliscos levantados pela mão de Deus nos caminhos da história a apontar-nos ns alturas ... ou segredar-nos que fomos criados paru subir e que os braços dos homens são para eles trabalharem e se abraçarem, e não para se agredirem.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentaria.

O Sr. José Manual da Costa: - Sr. Presidente: Nos dias iniciais desta nova legislatura, reafirmo a V. Exa. o rendido preito da nossa sincera homenagem. Se alguma coisa posso acrescentar de novo, é que são ainda mais profundos e enternecidos os nossos sentimentos de veneração e de respeito, de ternura e de carinho, pelo nosso mestre e guia nos trabalhos desta Casa e nos caminhos do pensamento - o Prof. Mário de Figueiredo.
É meu desejo ser apenas uma voz do povo com serena intenção de autenticidade - que essa é a nossa obrigação -, colocado para além de conceitos ou preconceitos sobre formas de regime e, muito designadamente, sobranceiro ao subjectivismo partidarista, tão desolador e triste, daquela época da vida nacional em que se desenvolve o tema que vou abordar e a vida que vou trazer a relem-

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brança desta Câmara. Apenas uma voz saída de entre o povo, desse generoso e bom povo português que soube ver claro na densidade de bruma das paixões e no deflagrar das tempestades de ódios que afligiram a Nação no fecho do século passado e no primeiro quartel daquele em que vamos vivendo.
Venho a esta tribuna, no ano centenário do seu nascimento, invocar e tentar definir a figura grácil de uma princesinha nascida no exílio de sua Mãe-Pátria, que depois foi rainha destas terras de Portugal e havia de ir morrer num outro exílio, fora daquela outra pátria a que pelo coração se ligara, à qual dera os filhos do seu sangue e o sangue do seu filho, sem nunca lhe tirar o veemente amor desse coração que um dia lhe havia dado.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Ao cabo de um século já se pode pôr objectividade na apreciação, já se pode ser justo na admiração e no respeito sem se haver de cair na adulação do falso louvor ou na lisonja do prosélito.
Venho aqui invocar - e não parecerá excessivo se disser: venho aqui honrar e desagravar - a figura e a memória dessa insigne senhora que foi a última rainha de Portugal. Sra. D. Maria Amélia de Orleães e Bragança, ou, à clara e espontânea maneira do povo, a rainha D. Amélia, esse salvo lírio da França», que acrescentou ao férreo brasão da Borgonha, de Avis e de Bragança, ao seu orgulho da conquista, a «suavidade e o encanto de uma flor, um sorriso de graça e um perfume de amor», no delicioso dizer do sublime poeta brasileiro Olavo Bilac, de quem precisamente também neste ano, por coincidência, se comemora o primeiro centenário do nascimento.
Veremos mais adiante onde veio poisar esse sorriso de graça e esse perfume de amor!
Quando, na calma serenidade do estudo e da meditação, se pretende saber alguma coisa, nos limites da proximidade, sobre a época social e o tempo político em que aquela princesinha foi rainha de Portugal, chega-se a ter a desoladora noção, desoladora e terrível, de que por esses tempos, nesta deliciosa terra lusitana, ninguém era capaz de amar ninguém, não havia na vida publica nem lugar nem jeito para o amor do próximo e para o respeito do semelhante. Vivia-se na intriga, na vaidade, na ambição do mando, quase só se cultivavam as más paixões e nelas se engendravam os ódios, e os ódios alastravam tanto que em certo dia se concentraram todos ali no Terreiro do Paço, e foi então essa abominável coisa do regicídio, a morte nefanda e pública do rei e do príncipe real, como se aquela morte de ignomínia na praça pública fosse a solução única para refazer a dignidade de um regime ou o alicerce necessário para sobre ele se assentarem os fundamentos do edifício novo de um regime de redenção!

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Pois foi nestes horizontes de insânia e abominação, de que era culpado o escol desorientado e rebelde, foi aqui e então que veio descer um sorriso de graça e um perfume de amor, sendo de tal modo bem evidente que o lodo e a lama haviam de macular a pureza da« pétalas e o sorriso de graça teria de esmaecer n» dor e 110 martírio daquele coração que todo inteiro se tinha doado a Portugal, num casamento feliz e por uma tarde primaveril e linda do mês de Maio de 1886.
A rainha era católica, pois logo a maldade fez dela depreciativamente uma beata:

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - ... a rainha era francesa, pois logo os belos espíritos de então a tornaram numa hipócrita; a rainha era uma mulher de impressionante beleza física, pois então a calúnia tinha necessariamente de abocanhada na honra de senhora e de esposa de el-rei (oh, ecos de S. Bento, não queirais repercutir as infâmias que aqui se ouviram ...); a rainha era mãe enérgica e firme na condução dos filhos, que sabia estar instruindo e educando para serem homens e para serem reis, reis de oito séculos de História e de Pátria, mas por isso mesmo a vilania tinha de fazer da rainha uma mulher dura e fera para com os próprios filhos; a rainha era caritativa e esmoler, não podia, pois, deixar de ser acusada de esbanjamento e prodigalidade e até os maiores responsáveis da governação ousaram dizer que enquanto a rainha se entretinha com esmolas não fazia outra coisa e que bem lhe podia ter dado para pior!
Que tempos aqueles e que gentes! Perdoai que me recuse de agora em diante a acompanhá-los e segui-los e vou só pensar na figura da rainha, como que desintegrando-a de um ambiente social, moral e político que ela teve estatura e vulto para dominar, sobrepondo-se-lhe pelas qualidades naturais, pelos méritos da educação e da cultura, pela noção da grandeza das responsabilidades, pelo estímulo da fé, pela ombridade de ânimo, pela capacidade de resistência que tantas vezes se colhe nas angústias e nas profundas amarguras do sofrimento.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Todos temos diante dos olhos a alucinante imagem mora) e física desse momento - o mais ignóbil da vida dos últimos 100 anos em Portugal - em que a família real, regressada do seu querido Alentejo, vai baquear à fúria das balas, que, até já se disse, levaram versos de Junqueiro, e em que a rainha, de pé, no carro, intrépida, procura com flores defender os seus amores que ali estavam caídos para sempre. Alguém então escreveu: «Estava de pé. De pé ficará na história!»
Essa parte da história realmente vivida em Portugal durou 24 anos, alguns dos quais terão sido de felicidade e alegria pessoal, muitos de apreensão e angústia, todos de energia e de trabalho, de compreensão e de acção, de acomodamento à sensibilidade lusíada, de esforço de adaptação própria e daqueles de quem era responsável ao preciso sentido das tradições nacionais, de heroísmo e de bondade, pois que os seus filhos haviam de ser reis de Portugal, eles tinham de ser os portugueses maiores servidores e mais responsáveis por Portugal. E que os reis ou são assim ... ou não são ...

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Ao rei D. Carlos, que tantos anos foi rei à moda do seu tempo (reina, mas não governa), se atribui o desabafo de que se vivia uma «monarquia sem monárquicos ...». É-se levado a crer que talvez instintivamente a rainha, com sensibilidade feminina, o cartesianismo da bua inteligência e a lúcida visão das circunstâncias nacionais - que como estranha podia ver com algum sentido de objectividade -, talvez a rainha se tivesse luminosamente compenetrado de que o asserto do rei bem se podia colocar ao contrário: havia, sim, monárquicos e gente de mérito, muitos inconscientemente desmonarquizados, outros convictamente, não poucos acomodados numa cobardia política confrangedora, mas o certo é que a própria monarquia - empurrada pelos ven-

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tos da história, que são de sempre - , ela própria republicanizando no sentido pejorativo da palavra...

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - e assim, aos olhos da rainha o que era mister e acima de tudo se impunha era realizar aturado e árduo e penoso trabalho de educação dos para que eles fossem de verdade reis em plenitude, pela devoção e pela doação de suas pessoas ao bem comum, como sempre havia sido timbre de todos aqueles reis que
mais atentos souberam estar ao interesse da Nação.
Esta obra de educadora da rainha Sr.ª D. Amélia toma, em nosso entender, uma dimensão tamanha no seu sentido positivo que pode ter estado aí, em razão inversa, : oculta razão das forças ocultas que mandaram disparar os tiros naquela tarde trágica do Terreiro do Paço.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Era preciso não só liquidar uma monarquia renascente, mas cortar do mesmo golpe os ramos novos que iam despontando, em beleza e virilidade, no calor das velhas seivas e ao amparo de uma aliança densa de energia, de vigor e de raça. No Terreiro do Paço a rainha perdeu o marido e o filho e ali lhe afogaram em sangue os fins e os desígnios da sua obra mais profunda e penetrante.
Com sobeja razão e com certo exclusivismo se tem salientado a acção altruísta da rainha D. Amélia pela fundação da Assistência Nacional aos Tuberculosos do Instituto Bacteriológico de Câmara Pestana, do Dispensário de Crianças de Alcântara, do Hospital do Instituto Ultramarino e, mais ainda, por uma calada actividade desenvolvida nas sendas de S. de Paulo pelo contacto directo e discreto com o sol alheio e a miséria humana.
Mas pretendo agora vincar e salientar um aspecto da vida e acção da rainha Sra. D. Amélia que só mais incidentalmente tem sido referido, mas que tem, na perspectiva da nossa actual posição no Mundo um significado relevante. Estou indicando a posição da rainha perante o ultramar português Foi a rainha quem teve a ideia da viagem do príncipe da Beira aos territórios ultramarinos de África, mas a ideia da rainha era mais completa e mais complexa, era de que fossem todo i a família real inteira, mas todos, à nossa África! Essa grande rainha portuguesa estava fundamente incorporada na alma, na essência, no destino da Nação Portuguesa! Toda a família real inteira, num primeiro, espantoso inteligentíssimo gesto e exemplo de soberania e de posse como a egrégia senhora disse ao jornalista Leitão de Barros, acrescentando:

Na Câmara dos Deputados e até na dos Pares cegou-se a dizer que o príncipe ia degredado!

Hoje, na Câmara dos Deputados, enche-se a minha voz de orgulho e de comoção ao invocar a gloriosa rainha que soube sentir a comunhão, a comunidade e identidade de Portugal com o seu ultramar, quando os políticos a acusavam de tirania matéria medida em que desoladoramente entendiam ser ir às terras de África o principal herdeiro do Por aquém e de além-mar e do descobrimento e da conquista! ...
Ao grande jornalista António Ferro, numa e hora comovida hora de recordações, a rainha disse:

Todas as minhas saudades são de Portugal.
E numa evocação dessas saudades ajuntou:

... vivi sobretudo essa admirável epopeia africana, que renovou o heroísmo português, que lhe deu figuras como Mouzinho, Paiva Couceiro, Roçadas.
Vivi esse período da História de Portugal, não há dúvida, e é esse o meu orgulho! Gosto que me falem dele! Gosto que mo evoquem!

Mas oiçamos as palavras desse extraordinário homem de letras e de acção que foi o Comissário régio António Enes, num delicioso envoi à rainha do seu livro. A Guerra de África em 1895:
Assim nos fomos acostumando a considerar a guerra também como serviço de Vossa Majestade, estimulando-se em nós os instintos cavaleirosos do coração português, p esses instintos, lisonjeados, afervoraram as dedicações ao País e fortaleceram a obediência a El-Rei. Se éramos afortunados, pensávamos no gosto que sentiria a rainha. Assoberbados por contrariedades, doía-nos a inquietação que ela sofreria; e tremíamos com a ideia de passar por fracos a seus olhos confiantes. Finalmente, Senhora, quando, no regresso a Lisboa, Vossa Majestade nos recebeu, radiante das nossas alegrias, ufana dos nossos triunfos, feliz da nossa felicidade, todos saudámos na rainha uma encarnação da Pátria que se fizera mulher para nos enfeitiçar com os sorrisos do seu agrado, que se coroara princesa para dar maior preço às prendas da sua magnificência ...

e continua:

... a expedição de 1895, Senhora, faz homenagem a Vossa Majestade, por minha voz, de todos os seus feitos e serviços que o meu livro relata, e os expedicionários sobreviventes juram, pelo reconhecimento indelével que à rainha devem, que ainda de maior esforço serão capazes se alguma vez forem apelidados para defender o trono, que Vossa Majestade enaltece, e a Pátria, que Vossa Majestade sabe tornar mais querida a quem a serve.

É impressionante. Senhores, a figura da rainha assim alevantada na alma de um homem do ultramar e na pena do um escritor da estirpe de António Enes, que já ante-visava a ressurreição da Pátria pelos fulgores das vitórias nas terras sempre invejadas e apetecidas da África Portuguesa. Diga, quem saiba e possa, quem foi que traiu a esperança e a confiança contida nas palavras de António Enes. A rainha de certeza não foi, porque já depois de 1908 Carlos Malheiro Dias pôde dizer da Sra. D. Amélia.

É necessário vê-la para só poder avaliar a firmeza da sua alma varonil, a inteligência vigilante e clarividente com que esta mãe admirável cuida desbravar o caminho por onde terá de passar, com o silício da coroa, o seu filho adolescente. A fatalidade tornou-a uma leoa. Sai-se de ao pé dela impressionado pela fé que a varoniza, comovido pela esperança que a anima, enleado de admiração e respeito.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Quem traiu fui quem é sempre o sujeito da traição: aquela retaguarda acomodada e ambiciosa, caluniadora e incapaz de acção, gozadora e estrangeirada, soprada pelos ventos da história, mas incapaz de fazer história com o sangue das próprias veias ...

Vozes: - Muito bem!

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102 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 8

O Orador: - ... a retaguarda que se dissolve na calúnia, na inveja, na ambição ou na cobardia.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Deus dela nos defenda hoje melhor do que defendidos fomos na segunda metade da vida e da acção da rainha Sra. D. Amélia em Portugal.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Não nos falta o exemplo de altura da rainha; não fiquemos cegos ao exemplo da cegueira e da baixeza de tantos que traíram uma obra admirável na tentativa do renascimento nacional.

ozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Em 1892 a rainha Sra. D. Amélia recebeu de S S. o Papa Leão XIII a célebre rosa de ouro, dom nau muito prodigalizado, pois, antes, apenas cinco vezes ela tinha tido concedida a reis de Portugal. Diz o cronista da época:

A noite os edifícios públicos iluminaram e o povo saiu à rua satisfeito com as honras tributadas à sua rainha ...

Ora, a rosa de ouro é pela sua cor símbolo da alegria da Santa Igreja e o seu perfume a figuração de todas as boas obras. Voltou a rainha à sua pátria de eleição em 1945. também então num suave mês de At aio, igual àquele em que viera pela primeira vez para ser esposa do rei e rainha de Portugal, a terra de todas as suas boas obras.
Aqui recebeu então as rosas de Maio, já não rosa de ouro, mas rosas dos campos que a gente humilde do povo lhe ia levar em recordatório de gratidões, testemunho de reconhecimentos, talvez remorsos fugidios, mas de certeza significações de ternura e de bondade de uma gente verdadeira e sã que tinha saudades de uma grande senhora que fora rainha de Portugal e aqui vivera um grande calvário de amargura e sofrimentos, aqui onde só tinha querido ser boa e útil para todos os portugueses.
A rainha quis morrer na sua doce França, onde o exílio dos pais lhe não permitiu que nascesse, ma» quis ter o seu eterno repouso aqui, na Pátria de eleição, onde não pudera viver nem morrer na graça de Deus e na paz dos homens. Aqui vieram ficar para sempre os seus restos mortais e foram colocados além, em cima, no panteão real, encerrados em mármore da sua querida Vila Viçosa e sob a lembrança de um epitáfio que tem a singeleza das coisas grandes e belas: «Aqui descansa em Deus Dona Amélia de Orleães e Bragança, Rainha do Trono, na Caridade e na Dor».
Sr. Presidente: A rainha Sra. D. Amélia deu grandes e nobres exemplos à Mãe-Pátria de escolha o de legitimidade e já no seu segundo exílio não quis desobrigai-se de acompanhar a vida portuguesa dos últimos decénios, vendo no pensamento e na acção que se iam seguindo a realização de ideais aparentemente inatingíveis pelas quais no seu tempo se esforçara, lutara, sofrera e vira perderem-se as vidas queridas e até talvez a esperança que sempre fica para além da vida que na morte se perde.
A rainha soube reconhecer, estimar e amar quem tomara em mão o facho dos ideais de grandeza nacional a sempre levá-los a bom caminho, renovando as fibras do corpo da Nação e revigorando a têmpera das almas pela vitória do trabalho e da vontade sobre a abulia e a decadência dos tempos que a rainha vivera e contra os quais obstinadamente se havia erguido. A rainha se deve mais este exemplo e esta lição. Um século depois do seu nascimento não vemos a rainha morta, vemo-la de pé, flor da altura que se levanta acima da tragédia e à dimensão da grande história que, por mercê de Deus, em Portugal se vai continuando e prosseguindo. Que Deus ilumine a, alma da rainha e os trilhos novos da sua Pátria de eleição. Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Leonardo Coimbra: - Sr. Presidente: Sinto a responsabilidade de erguer pela primeira vez a minha voz nesta alta Assembleia.
E ao fazê-lo quero saudar a nobre figura de V. Exa. Sr. Presidente, cujas qualidades do tantos modos têm sírio salientadas.
A vós, Srs. Deputados, companheiros de horas futuras de trabalhos e responsabilidades comuns, dirijo a mais respeitosa e amiga saudação.
Sabemos que a emergente missão da comunidade portuguesa neste momento crucial da sua história e da sua presença no afundo se concerteza na salvaguarda da sua continuidade histórica.
E não ignoramos que à prioridade da defesa corresponde a solidária e urgente necessidade de investimentos para aumento de produto da Nação, como garantia de estabilidade e segurança da economia futura.
Mas o próprio progresso económico-social exige a difusão da cultura e impõe uma decidida política da educação e do espírito.
Também não podemos silenciar os perigos resultantes, a prazo curto, da emigração interna do funcionalismo mais válido e dos mais qualificados valores docentes que se deslocam para actividades privadas em busca de melhores condições de segurança económica, com inevitável enfraquecimento das estruturas administrativas do Estado e dos seus instrumentos de ensino. Assim, é urgente que a Lei de Meios consinta uma acelerada e ampla preparação de quadros humanos, pois sem médicos e enfermeiros os hospitais não funcionam, sem técnicos as empresas não podem competir o sem professores e investigação adequada permaneceremos em ultrapassados escalões de cultura e de progresso.
São pontos vitais da vida da Nação sobra os quais já se pronunciaram, clara e pertinentemente, muitos dos Srs. Deputados, quando focaram as condições de promoção e desenvolvimento do espaço económico português e do fundamental progresso do factor humano.
Quanto a mini, a minha já longa experiência do dramático subsolo do mundo social conduz-me a chamar em especial a atenção de todos para o grave e dramático desamparo da criança deficiente e subnormal, enredada no dinamismo complexo e cada vez mais exigente de uma sociedade moderna em rápida evolução.
Não podemos ignorar que pesa sobre todos os portugueses de boa vontade, e mais particularmente sobre os órgãos do Estado, a imensa e inalienável responsabilidade de preparar condições para assegurar a normal eclosão de todos os valores humanos que constituem o capital vivo da Nação.
Esse é o único caminho que conduz a dignificação e máxima valorização do homem e ao mesmo tempo realiza a eficaz prevenção das sociopatias do adulto, que quase sempre resultam de uma infância infeliz e mal vivida.

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E a promoção social, moral e espiritual do homem é o fim último em ordem ao qual todas as outra formas de promoção e investimentos devem ser orientadas.
Todo o progresso deve ser orientado para a vi espiritual e moral do homem, que constitui o vá ciai em ordem ao qual todas as técnicas e promoção humana e social devem ser ordenados.
O ponto de impacte e de penetração do d mo no humano realizou-se na Encarnação, e a integração ascendente do homem no divino faz-te pela incorporação do homem em Cristo no seu corpo místico que é Igreja considerada como comunidade universal de salvação.
E como a humanidade é um todo orgânico não é lícito evoluir somente uma parte da comunidade social e deixar pendentes como membros dilacerados os seus elementos menos dotados, e mais desamparados.
Como Cristo assumiu a humanidade, a boa ova de vida eterna tem de se incorporar em todas as realidades terrenas de ordem social e humana, para as renovar e sobrenaturalizar.
O destino eterno da humanidade foi assumido do por Cristo, e o sangue desse corpo é a caridade, que s estende preferencialmente até ao mais ignoto extremo os seus mais desconhecidos membros. Na ordem da caridade, é o mais pequeno que ocupa o lugar mais íntimo no amor de Deus.
A esta luz devemos considerar as maravilhores palavras de Cristo ao proclamar a prioridade dos pequenos como final para o julgamento final dos homens. «O que fizestes ao mais pequenino de entre vós, a (...) o fizestes.», pois «Conhecer-se-á que sois meus discípulos se vos amardes uns aos outros.»
Estas são definitivas palavras que terrivelmente nos obrigam quando pretendemos servir o espírito caminhar na rota de um destino cristão.
O valor do homem é essencial e tem prioridade em si mesmo sobre todas as outras razões.
Perante esta Assembleia quero somente apontar concretos de uma problemática social angustiante.
Não vou falar na legião de crianças famintas, enregeladas, que vagueiam sem carinho pelo que tantas formas de sofrimento imerecido mais profundas raízes da sua frágil personalidade mação.
Assim vai pelo Mundo e mesmo na nossa ta e bela terra portuguesa.
Muito teria que contar sobre sofrimentos ignorados terríveis, mais pungentes na sua crua realidade descritivos de Vítor Hugo ou de Dickens.
Para tentar lutar, em nome do amor de Cristo homens, contra as causas de sofrimento desnecessárias deformador do carácter e da personalidade da pensámos e lançámos uma obra social, nascida parti rastreio e protecção de casos de crianças habituais de maus tratos e abandono, tendo mais Janeiro de 1960, sido iniciada a fase de recupera pedagógica e médico-social, através do Centro de cão e Recuperação de Crianças, assim nascido dedicação Protectora da Criança contra a Crueldade e a sua missão é procurar estar presente em qualquer do País onde exista uma criança que sofra injusta necessariamente para a recolher em clima familiar assegurar condições normais de formação.
O Centro de Recuperação de Crianças as observação e a recuperação médico-social e psicopedagógica de crianças inadaptadas sociais e deficientes que apresentam anomalias de carácter e comportamento, procura promover a suo readaptação e integração sócio-familiar normal e, portanto, realizar a prevenção das distorções da personalidade e das decorrentes expressões de sociopatias e criminalidade.
O seu raio de acção estende-se a todo o Norte, pois que a elevada pluriespecialização e a carência de técnicos exige a concentração de serviços desta natureza.
O que conhecemos de outras actividades, nomeadamente do Instituto de António Aurélio da Costa Ferreira, e a nossa própria experiência pessoal e voluntária, colhida no afrontamento directo com o imenso tumultuar da problemática sociológica da infância desamparada, dá-nos uma visão inquietante das suas imensas e mal lembradas exigências.
No Centro de Observação de Crianças deficientes psíquicas e inadaptadas sociais, única clínica psicopedagógica existente no Norte do País, que tem sido ajudada pelo Ministério da Saúde e Assistência, Fundação Gulbenkian, autarquias locais e múltiplas entidades particulares, e que procura assegurar a cobertura assistencial dos diminuídos mentais e caracterizais do Norte do País, foram assistidos em tão curto prazo cerca de 1500 crianças, com um total de 5000 consultas, e ainda beneficiaram de internamento demorado 260 crianças. Se completarmos o nosso ângulo de visão local com as estatísticas das consultas de higiene mental do Instituto de Assistência Psiquiátrica (em 1965: 2145 consultas); consulta de neuro-psiquiatria infantil da Federação de Caixas de Previdência (em 1964: 2718 consultas; 1.º semestre de 1965: 1504 consultas); o Dispensário de Dias de Almeida, da Misericórdia do Porto (com 3290 fichas de inscrição), todos acusando um movimento crescente, podemos verificar o violento impacte das exigências de uma infância desemparada em busca desesperada de ajuda.
Falei nesta experiência social porque ao promover a prospecção desta zona do social e ao realizar uma missão de higiene mental infantil, pelas suas fases preventiva e recuperadora, se me afigura poder constituir válida experiência com valor paradigmático.
De qualquer modo, o que é preciso é promover medidas técnicas e eficientes ao serviço de um superior ideal humano e cristão de serviço do próximo. E, como é hoje do consenso universal e unanime, os problemas da saúde montai são de extrema acuidade e importância e devem ocupar a linha da frente de toda a cobertura assistencial verdadeiramente eficiente.
Por falta de tempo não me alongarei em estatísticas estrangeiras fundamentadoras destas afirmações.
Entretanto, alguns dados esparsos me parecem úteis e esclarecedores.
Segundo o sociólogo Hobson, foram observadas em 1957 em instituições inglesas mais de 60 000 crianças com deficiências psíquicas e mentais.
Na opinião do psiquiatra António Vallejo, de Madrid, existem em Espanha mais de 170000 crianças anormais.
E na publicação Éducation et Santo Mentale, da U. N. E. S. C. U., podemos ler (p. 255) que spara uma população de 40 a 50 milhões de habitantes deve haver, pelo menos, 500 000 crianças dessa categoria no grupo dos 7 a 14 anos».
Uma proporção permite-nos extrapolar, como número provável para Portugal, mais de 100 000 crianças carecidas de assistência médico-social e psicopedagógica.
Na mesma publicação (p. 277) é afirmado:

... 5 por cento das crianças de idade escolar são gravemente inadaptadas e que além de 20 ou mesmo 25 por cento teriam necessidade de receber uma assistência especial.

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Na França existem 600 000 crianças deficientes, e os institutos italianos de recuperação prestam assistência a 400 000 crianças e adolescentes.
Ora, aã situações de deficiência psíquica e inadaptação social envolvem um largo risco de pré-delinquência ou mesmo de delinquência juvenil declarada.
Assim, o tratadista americano Glueck considera as psicopatias como factor criminogéneo em 51,4 por cento dos casos.
Se abrirmos o volume dedicado ao Ano Mundial da Saúde Mental da revista A Criança Portuguesa (boletim do Instituto de António Aurélio da Costa Ferreira), podemos ler na p. 14:

Não julguemos que o problema é limitado no seu significado estatístico. 12 por cento dos indivíduos com mais de 20 anos sofreram, uma ou mais vezes, de afecções do foro psiquiátrico; 1 por cento de atrasados mentais, ou sejam 10 000 em cada milhão; 1 por cento de esquizofrénicos: 2 a 3 por cento de outras psicoses; 7 por cento de neuroses e de psicopatias graves; 12 a 13 por cento de neuroses e de afecções psicossomáticas.

Por isso, Baraona Fernandes comenta com razão:

... se qualquer doença infecciosa atingisse as proporções dos desvios mentais de uma população, seria decretado um «estado de emergência epidémico e tomadas medidas adequadas de salvação pública urgente», o que está longe de acontecer!

Quanto mais se exigir da criança numa sociedade cada vez mais complexa e em evolução técnica, mais eficiente suporte educacional e social lhe deve ser assegurado. Ora, em Portugal verificou-se um aumento de doenças mentais, nos últimos dez anos, de cerca de 10,7 por cento.
Já é da oportunidade de desenvolvimento, quando criança, em face do que lhe vai ser exigido, quando adulto, que resulta a possibilidade de adaptação ou de fracasso para o indivíduo, com todos os prejuízos humanos a sociais que desse desajustamento resultam.
Entretanto, quer das estatísticas estrangeiras, quer da experiência do único centro de observação e clínica psicopedagógica existente no Norte, conclui-se que são recuperáveis por técnicas médico-psicopedagógicas muito diferenciadas entre 75 e 80 por cento das crianças diminuídas, o que torna de inestimável alcance e interesse as medidas de recuperação e reeducação utilizadas.
Obviamente, os resultados são mais fecundos na infância enquanto podem sei- despertadas as virtualidades latentes por um anel fechado e completo de estímulos psicopedagógicos formativos.
A prova evidencia-se no êxito colhido por crianças deste centro, inicialmente destituídas de qualquer capacidade aparente, mas que nas já numerosas exposições de arte infantil em que têm colaborado obtiveram excelentes classificações.
Assim se passou mais recentemente, por exemplo, numa exposição de pintura de crianças epilépticas organizada pela British Epilepsy Association, que hoje é itinerante por moitas nações e que entre os melhores classificados contém três nomes de crianças portuguesas.
O mesmo sucedeu em 1964 e de novo agora com n notável iniciativa «o Natal visto pelas crianças», levada a efeito pelo Diário de Lisboa, em que foram igualmente obtidos resultados excelentes. Recordo ainda o salão apresentado no X Congresso Internacional de Psiquiatria Infantil, no S. N. S. e na Escola de Belas-Artes do Porto.
Estes factos são referidos somente para objectivar o mundo maravilhoso de possibilidades que urge valorizar cada vez mais, como condição fundamental de um futuro progressivamente mais rico de possibilidades sociais e humanas.
E é tão grave o problema que o médico psiquiatra e sacerdote jesuíta P. Verlun, no seu livro O Perigo Mental, considera que os dois graves flagelos que ameaçam a Humanidade são a bomba atómica e a loucura.
O último perigo, que too largamente se espalha e avoluma nas sociedades complexas dos nossos dias, resulta da desarmonia da vida moderna e exige um amplo e eficiente equipamento de saúde mental. Para tal fim, a Organização Mundial de Saúde estabelece a necessidade de existência de um serviço por cada grupo de 50 000 habitantes. E o Dr. Bailley-Salin, perito da Organização Mundial de Saúde para a saúde mental, propõe o esquema de um centro de saúde meutal pura cada 200 000 habitantes.
Por seu turno, Jacques Goclard diz que sas normas da saúde pública requerem um dispensário de higiene mental por cerca de 70 000 habitantes» (Colloque sur la planifi-cafcion dês équipements sociaux en Lorraine - Editions Centre d'Etudes Belations Extérieures, Paris).
Em Estocolmo existe um pedopsiquiatra por cada 1100 alunos, que trabalha em equipa com o psicólogo, a assistente social e os professores.
Em Genebra, pequena cidade de 280 000 habitantes, existem cinco serviços de neuropsiquiatria infantil, o que corresponde à proporção considerada óptima pela Organização Mundial de Saúde.
Vemos, pois, que os números, embora variáveis, se aproximam bastante entre si.
Mantida essa proporção, a metrópole precisaria de cerca de 160 unidades, não falando já na necessidade das províncias ultramarinas.
E tempo, pois, de criar condições económicas não só para a planificação de um praticável programa mínimo de estruturas indispensáveis, como também para assegurar n emergente necessidade de formação de técnicos. Um vigoroso esforço está a ser realizado pelo Ministério da Saúde e Assistência nesse sentido, mas o programa de saúde mental em curso precisa instantemente de verbas que lhe permitam desenvolver-se amplamente, de acordo com um mínimo de imprescritíveis exigências sociais e humanas.
O número de atrasados profundos que vivem em condições infra-humanas (alguns conheci que viviam sequestrados e amarrados como pequenas feras) é imenso e exige solução humana e técnica adequada. Os educáveis com Q. I. entre 50 e 65 precisam de oficinas e classes especiais. Os treináveis com Q. I. inferior a 50 serão adaptáveis a actividades agrícolas, jardinagem, manufacturas da peças simples, etc.
Mas numa fase inicial deveríamos enquadrar num eficiente esquema assistencial os deficientes médios, quase totalmente recuperáveis, e os inadaptados sociais, capazes de reintegração sócio-familiar e profissional normal em 75 a 80 por cento dos casos, e que representam um valioso património, não só humano, como económico-social da Nação.
A economia dos valores humanos é essencial, e ao bem da pessoa e ao interesse humano colectivo todas as técnicas devem estar subordinadas, como já dissemos. Na tensão explosiva de um mundo em trepidante evolução, a autoridade tradicional e exterior é mal aceite pela juventude exigente de calor humano, verdade e justiça.
As novas gerações esperam e exigem uma resposta autêntica aos seus anseios de ajustamento às realidades e

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o encontro de finalidades superiores para uma existência desolada e inquieta. E essa resposta somente e sempre poderá ser dada pela mensagem de amor fraterno, que precisa de ser servido em termos de acção técnica eficiente para ser verídico e fecundo.
E uma opção se nos impõe inexoravelmente ou amparamos a formação espiritual, moral, social e profissional das novas gerações, ou deixamos perder uma grande parte da imensa messe de esperanças por falta de adequada protecção.
Vítima inocente e involuntária das imperfeições da ordem social, as suas frustrações e pulsões psicoafectivas voltam-se contra a sociedade, semeando incalculáveis ruínas no plano económico, social e humano.
Desse modo a carga social negativa será inexaurível fonte de inumeráveis e tentaculares sociopatias. Os cuidados que dispensarmos ser-nos-ão retornados em concórdia e amor e os que omitirmos transformar-se-ão em fantasmas perseguidores e em ressacas de incompreensão e desacordos. Mais concretamente, o que investirmos em educação e em cobertura psicopedagógica e médico-social, para além do eminente serviço de dignificação humana, será ainda uma missão de elevada rentabilidade social.
E é para o drama oculto que se desenrola no subsolo das novas gerações, que vão constituir o alicerce vivo do futuro, que quero deixar a ressoai- uma palavra de alerta como verídica exigência de um amor fecundo, única força verdadeiramente criadora do destino do homem no tempo e na eternidade.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Proença Duarte: - Sr. Presidente: Não pensava eu que hoje teria de usar da palavra nesta tribuna, mas acaba de ser evocada em termos primorosos e justos pelo Sr. Deputado José Manuel da Costa uma figura que foi vítima da propaganda do ódio e do rancor, que levou à perpetração de um crime nefando no Terreiro do Paço, qual fosse o da morte de um rei e de um príncipe.
Pois faz também hoje 48 anos, Sr. Presidente, que foi vítima desse mesmo sentimento, que se deixou divulgar e cultivar no meio de uma sociedade responsável, um professor célebre da Universidade de Coimbra, que então ocupava também a chefia do Estado, o Doutor Sidónio Pais.
Fiz parte, Sr. Presidente, da Câmara no tempo de Sidónio Pais e aqui, neste mesmo lugar, pude assistir aos primeiros sintomas de desagregação e de divisão que se seguiram à morte de Sidónio Pais. Apagaram-se para sempre vozes eloquentes que em anos anteriores aqui fizeram a evocação dessa figura que nos precedeu e que constitui um precursor da Situação, que depois veio salvar o Pais em 28 de Maio.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Elas puseram aqui muitas vezes em destaque a obra notável, o pensamento que inspirava A acção de Sidónio Pais com vista a reestruturar e a renovar uma pátria.
Não me proponho, Sr. Presidente, referir qual o pensamento dominante desse curto período governativo, a que já se chamou o «consulado de Sidónio Pais». Mas sinto-me no dever moral de relembrar hoje essa figura de bom português, esse outro professor ilustre da Universidade de Coimbra que quis também dar novo rumo aos destinos desta Pátria, que então tão mal encaminhada vinha.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Ao fazê-lo, Sr. Presidente, presto assim homenagem à memória de Sidónio Pais e de todos quantos já desta vida desapareceram e com ele colaboraram esforçadamente, entusiasticamente, pondo ao serviço da Pátria, ao serviço da disciplina social, a sua juventude, a sua verdade, a sua dignidade e o seu amor por Portugal.
Tenho dito.

Vozes: -Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Começaremos por fazer a eleição das Comissões de Legislação e Redacção e de Contas Públicas.
Interrompo a sessão por alguns minutos para VV. Exas. prepararem as listas.

Eram 17 horas e 50 minutos.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.

Eram 18 horas.

O Sr. Presidente: - Vai fazer-se a chamada para a eleição das comissões já referidas.
Fez-se a chamada.

O Sr. Presidente: - Designo para escrutinadores, quanto à Comissão de Legislação e Redacção, os Srs. Deputados Pontífice de Sousa e Pui Vieira e, quanto à Comissão de Contas Públicas, os Srs. Deputados Hirondino da Paixão Fernandes e Filomeno Cartaxo.

Fez-se o escrutínio.

O Sr. Presidente: - Para a Comissão de Legislação e Redacção entraram na uma 92 listas, tendo sido eleitos por igual número de votos os Srs. Deputados António Magro Borges de Araújo, Fernando Cid de Oliveira Proença, Joaquim de Jesus Santos, João Mendes da Costa Amaral, José Soares da Fonseca, Manuel Colares Pereira e Manuel Lopes de Almeida e, com 91 votos, os Srs. Deputados Albino Soares Pinto dos Beis Júnior e Henrique Veiga de Macedo.
Para a Comissão de Contas Públicas entraram na uma 92 listas, tendo sido eleitos por igual número de votos os Srs. Deputados José Dias de Araújo Correia, Luís Folhadela de Oliveira, Manuel Amorim de Sousa Meneses e Manuel João Correia e, com 91 votos, o Sr. Deputado José Fernando Nunes Barata.
Proclamo eleitos os Srs. Deputados que constavam das respectivas listas.
Vai passar-se à segunda parte da ordem do dia: continuação da discussão na generalidade da proposta de lei de autorização das receitas e despesas para 1966.
Está na Mesa uma proposta, classificada pelo seu autor, de aditamento a proposta de lei em discussão.
Vai ser lida.

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Foi lida. É a seguinte:

Proposta de aditamento

Proponho que, a seguir ao artigo 17.º, um novo artigo, com a seguinte redacção:

Serão intensificados os investimentos na formação e doutrinação da juventude para serão inscritas e reforçadas no ordenamento ordinário as dotações necessárias à civilização e desenvolvimento das organizações e dos serviços que tenham por mias Só a defesa da família e a educação dos jovens.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 14 de Dezembro de 1965. - O Deputado, Manuel José de Almeida Braamcamp Sobral.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Calheiros Lopes.

O Sr. Calheiros Lopes: - Sr. Presidente: No início das breves palavras que vou pronunciar, o meu voto de aprovação à proposta de lei das receitas e despesas para o exercício de gostosamente o dever de apresentar a V. Exa. as minhas muito sinceras saudações, felicitando V. Exa., e ao mesmo tempo a Assembleia, pela recondução de V. Exa. no alto posto que, com tanta eficiência e a contento geral, tem exercido.
Na verdade, pelas altas qualidades que pela sua formação doutrinária, pedagógica brilho e ponderação da sua inteligência e cortesia com que concilia a autoridade dl com os direitos e liberdade de acção das desta Assembleia, V. Exa. tem sabido a instituição e para o cargo um elevada constitui, a meu ver, uma das melhores às críticas com que, em determinadas emergências ultrapassados sectores demoparlamentaristas pretendem orgânica e funcionamento da Assembleia.
A verdade é que, Sr. Presidente e ilustre Colegas nenhum de nós se sentiu ainda, em qualquer forma de pressão liberdade de exprimir as suas opiniões e cão no debate dos problemas que nos como representantes da Nação. E isto, si mente está explícito no Regimento da igualmente, em alto grau, da forma elevada e inteligente como V. Exa. a tem orientado assim inteiro jus ao apreço e consideração mito renovar-lhe.
Não posso deixar, ao mesmo tempo, de dirigir a todos os ilustres Deputados participantes desta sessão legislativa as minhas expressivas saudações, envolvendo nelas tanto os que tomaram já parte nas legislaturas anteriores e tal como eu, mereceram a honra da ré que pela primeira vez receberam da Na dato de a representarem nesta Assembleia trazer o entusiasmo, a fé, a dedicação, o feliz apanágio da mocidade.
Sr. Presidente: As breves considerações sublinhar o meu voto à proposta de lei das receitas e despesas para 1966 e a análise do valioso relatório que a antecede verificar com satisfação, mais uma vez, que se mantém na administração pública, desde que há 37 anos o Ministro das Finanças Prof. Doutor Oliveira Salazar iniciou a sua grande obra de reforma financeira e administrativa, o lema essencial da ordem, equilíbrio e verdade das contas públicas.

O Sr. Serras Pereira: - Muito bem!

O Orador: - São do preâmbulo do primeiro Orçamento Geral do Estado elaborado por esse então quase desconhecido professor universitário as seguintes palavras:

A falta de ordem, homogeneidade e clareza das cantas públicas é um resultado e um incentivo da má administração. É funesta ao crédito público e à produção do País.

De então para cá, esse princípio basilar não deixou de estar presente na orientação dos vários estadistas que. se têm sucedido na pasta das Finanças.
Na mesma linha política e administrativa se situa o actual Ministro, o nosso ilustre colega Dr. Ulisses Cortês, que com esta sua primeira proposta de lei e através do esclarecido e brilhante relatório em que é analisado o panorama económico e financeiro interno e externo afirma, ou, antes, confirma, as suas altas qualidades de inteligência, a sua cultura especializada económico-financeira, o seu conhecimento dos problemas da Administração e até. no aspecto pessoal, a entrega que de si fez às funções que lhe foram confiadas, com sacrifício da sua própria saúde.
Tenho para mim, Sr. Presidente, que quem pretender inteirar-se e estudar com seriedade a evolução da vida económica portuguesa não precisa de muito mais do que ler e meditar as publicações oficiais que anualmente dimanam do Ministério das Finanças ...

O Sr. Serras Pereira: - Muito bem!

O Orador: - ... - os relatórios da Lei de Meios e o relatório das Contas Gerais do Estado --, bastando completar esses estudos com o do não menos lúcido e esclarecedor parecer sobre as contas públicas, que tanto valoriza os anais desta Assembleia e se tem devido, desde há largos anos, ao exaustivo trabalho do nosso ilustre colega Eng.º Araújo Correia.

O Kr Serras Pereira: - Muito bem!

O Orador: - É por isso, por considerar que, mais do que o texto ou o articulado do projecto, interessa essencialmente apreciar o seu relatório, que me permitirei ocupar alguns minutos para umas ligeiras considerações sobre os pontos que nele mais prenderam a minha atenção.
Tal como vem sucedendo nos anos últimos, a proposta de lei de meios para 1966 é dominada por três imperativos essenciais a que devem subordinar-se Os recursos financeiros do Estudo e as preocupações primárias do Governo e, atrevo-me a dizê-lo, da própria Nação.
A frente desses imperativos, como no relatório se salienta, e no artigo 15.º do projecto de lei se estabelece, situa-se a prioridade na aplicação dos recursos orçamentais à defesa nacional, no que se refere aos respectivos encargos normais e aos derivados dos nossos compromissos externos, como participantes que somos do Pacto do Atlântico, mas, em especial, quanto ao dever de, à custa de todos os esforços e sacrifícios, prosseguirmos intransigentemente a política da manutenção da integridade territorial de todas as parcelas da Nação. Encontram-se estas separadas pelos mares e terras distantes, mas sem-

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pre unidas pelo princípio radicado no coração de todos os bons portugueses de que a Pátria não é apenas este cantinho minúsculo da Europa e que a sobrevivência de Portugal como nação independente e forte está estreitamente ligada a presença portuguesa nas terras de África, Ásia e Oceânia, que há séculos silo nossas.
Esta prioridade não tem, por assim dizer, discussão, nem exige qualquer esforço para merecer o aplauso de todos nós.
A luta contra Portugal, desencadeada nas assembleias e conluios, internacionais e por influência destes transformada em guerra nas fronteiras de Angola, Moçambique e Guiné, ameaçadas pelos terroristas armados no exterior, tem se ser, e é. na realidade, o primeiro problema nacional. Temos de ganhá-la, sobretudo, no interesse futuro dos nossos filhos e para defesa da própria civilização comum do Ocidente.
Não somente não regateamos, mas afirmamos sem quaisquer hesitações ou dúvidas, o nosso propósito de a esta orientação sacrificarmos todas as restantes necessidades, mesmo as mais justas, do povo português.
Logo a seguir à defesa nacional vem a realização dos investimentos públicos previstos no Plano Intercalar de Fomento como segundo ponto das prioridades estabelecidas.
Também este capítulo da Lei não pode deixar de merecer a nossa aprovação. E, se me é permitido formular a este respeito uma aspiração, pedirei que na execução do estabelecido no artigo 21.º, sobre a «programação regional», se tenha em vista, de forma mais positiva do que até aqui se tem verificado, a necessidade de descentralizar n localização das indústrias a criar.

O Sr. Serras Pereira: - Muito bem!

O Orador: - Penso que deve contrariar-se, pelos vários meios de que o Estado dispõe e por um planeamento bem estudado e insofismavelmente seguido, o fenómeno, aliás explicável, mas inconveniente do ponto de vista social, que leva a concentrar em poucas zonas, com predominância nos arredores das grandes cidades, as unidades industriais ultimamente instaladas.
Há que reconhecer que as medidas legislativas promulgadas, os planos delineados, mesmo algumas afirmações de entidades estaduais responsáveis quanto a este problema da descentralização industrial, não têm sido aplicados. E existem regiões, como (para citar a que mais directamente conheço) A cidade e concelho de Santarém, que não receberam até agora, de forma sensível, esse benefício económico e social representado pela instalação de novas indústrias.
Por essa carência, e continuando a viver quase exclusivamente da actividade agrícola e pecuária, tão contingente e nos últimos anos tão duramente experimentada pelas adversidades climatéricas, o distrito de Santarém, e especialmente a cidade capital de distrito, tem direito inegável a ser incluído nas regiões que o Governo, ao abrigo do disposto no artigo 21.º, se propõe favorecer através da «programação regional», para, como consta do artigo citado, corrigir as disparidades do desenvolvimento e elevar o nível de vida das populações.
Idêntica aspiração devo exprimir quanto ao fomento do bem-estar rural, previsto no artigo 24.º, pois o distrito de Santarém, sobretudo em matéria de estradas e caminhos secundários, carece certamente, como poucos, do uma aceno extensa e intensa de realizações e melhoramentos, para a qual as autarquias locais não dispõem de recursos e somente o Estado pode executar ou, pelo menos, estimular, apoiar e financiar.
Não quero terminar sem chamar a atenção (para um outro «problema, abordado com largueza e proficiência no relatório e traduzido no texto do artigo 18.º do projecto de lei: refiro-me à determinação de concentrar em princípio os investimentos públicos nos sectores de maior reprodutividade e com mais decisiva influência na aceleração do crescimento do produto bruto nacional.
Julgo que está neste caso o sector agrícola.
Sem falar agora no que representa, social, política e economicamente, a população que vive directamente da agricultura, formulo sobre o assunto duas considerações essenciais.
Direi primeiro que não podemos encarar a actividade agrícola apenas segundo a maior ou menor (percentagem com que concorre para o produto nacional, pois essa contribuição é fortemente influenciada, em sentido positivo ou negativo, pelos bons ou maus anos agrícolas, e todos sabemos como os últimos, têm decorrido, tanto no que respeita a produções como a outros factores económicos.
Outra faceta a considerar, quanto a mim, reside no que a produção agrícola, sobretudo de géneros alimentares - cereais e gados -, pode concorrer, se for protegida e orientada tecnicamente, para a diminuição do déficit da nossa balança do comércio externo.
Lê-se no relatório do projecto de lei que esse deficit ascendeu no 1.º semestre deste ano a 4 825 000 contos, o que representa, em relação a igual período do ano passado, um acréscimo de 1486 000 contos.
Esta evolução desfavorável que se nota desde 1963 deriva do grande aumento nas importações, dentro das quais se verificaram volumosos contingentes de produtos alimentares.
Este facto, em grande parte motivado, como salientei já, pelos maus anos agrícolas, deve levar-nos a apoiar a política anunciada no relatório de dar prioridade aos investimentos que proporcionem a redução tanto quanto possível das importações de produtos alimentares. E parece-me evidente que para este fim não podemos, por assim dizer, abandonar a agricultura a sua sorte adversas nos últimos- anos é certo, mas susceptível de ver atenuada essa adversidade se nos investimentos a realizar se incluírem, entre outras, estas modalidades essenciais: assistência técnica, facilitação de créditos a taxa especial de juro, expansão do parque de maquinaria, construção, cada vez mais necessária e urgente, de instalações de armazenagem e conservação dos produtos, numa palavra, a renovação e modernização dos meios de trabalho em muitos aspecto» desactualizados que dominam ainda hoje a nossa actividade agrícola e que está ao alcance do Estado reformar.
Na agricultura como na indústria devemos lançar-nos no caminho de uma maior produtividade, tanto pela modernização dos processos de cultura, desenvolvimento e valorização de certas culturas como a fruticultura, horticultura, prados; pela introdução de novas' culturas: beterraba, soja, tabaco, etc, e ainda pela necessária protecção à pecuária, para um melhor abastecimento de carnes de que tanto necessitamos.

O Sr. Pinto de Mesquita: - V. Exa. dá-me licença? A cultura da beterraba, que pode interessar industrialmente a sacarina, não pode ser cultivada ...

O Orador: - Mas sei que todos os anos se importa um contingente razoável de açúcar do estrangeiro e podia-se estabelecer esse contingente para a metrópole. Aliás, não

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pretendo que seja apenas considerada a beterraba, mas também os subprodutos para a ai gado de que muito necessitamos.

O Sr. António Cruz: - Se me desse licença, queria também lembrar a V. Exa. que talvez fosse recordar que temos uma boa produção de tabaco nos Açores mas são inúmeras as dificuldades levantadas à importação desse tabaco no continente. Entretanto, continuamos a importar tabaco do estrangeiro e, por força dessa importação, a exportar divisas.
Apoio inteiramente as considerações de V. Exa. no sentido de promovermos a cultura do tabaco d lembrando ao Governo a conveniência de importação do tabaco açoriano, nomeadamente não os colocando aqui a preços quase proibitivos podem entrar em competência com os charutos estrangeiros.

O Orador: - Tem V. Exa. razão. Realmente grande parte do tabaco aqui consumido é importado estrangeiro.
Com as obras de hidráulica agrícola realizadas aumentou consideràvelmente a produção de determinadas culturas e com as obras em execução e projectadas devem obter-se produções muito maiores e possivelmente criação de novas culturas.
Relativamente à industrialização do País, afigura-se-me que a situação geográfica dos centros de produção fabril dentro do nosso território é problema que requer estudo e resolução adequados, uma vez que a sua localização tem influência decisiva no equilíbrio social do desenvolvimento da Nação - porque de uma equilibrada distribuição do trabalho por todo o território do País depende o equilíbrio demográfico dessa população e a anulação, ou pelo menos a redução, dos inconvenientes graves que representam a emigração e mesmo a concentração à volta dos grandes centros urbanos.

O Sr. Serras Pereira: - Muito bem!

O Orador: - Localizando o problema, creio que a orientação que preconizo poderia modificar substancialmente o ambiente social da região ao sul do Tejo entre Vila Franca de Xira e Almeirim, região bastante populosa.
Para isso seria necessário que esta região, que sofreu o terramoto de 1909 - que tanto prejudicou o seu desenvolvimento -, deixasse de suportar encargos que outras regiões não suportam e que limitam a sua expansão.
Constituem elementos indispensáveis ao desenvolvimento económico a organização do serviço de emprego, a formação e a orientação profissionais, que contribuem ainda para assegurar o equilíbrio da oferta e da procura de mão-de-obra e evitar o flagelo do desemprego, com todas as suas desastrosas consequências sobre agregado familiar do empregado, do operário ou do trabalhador rural.
Julgo que não é possível progresso económico sem justiça social, mas tão-pouco é possível fazer autêntica justiça social sem esse progresso.
Sr. Presidente: Terminei as minhas considerações vão também as solicitações que formulo ao d a satisfação, o meu voto concordante a proposta da lei de Meios para 1966.
E, conforme já tenho manifestado nesta tribuna, julgo que não há apenas que investir, mas também crer.

Confiar nas nossas instituições.
Crer num Portugal melhor.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Lopes Frazão: - Sr. Presidente e Srs. Deputados. Ë com a mais viva emoção, devemos confessá-lo, que a minha tamanina pessoa, de voz apagada por um valimento modesto e com o sentir de uma responsabilidade que ó tamanha, pela primeira vez se alcandora a esta tribuna alta de julgamento político.
E a atemorização é grande, muito grande mesmo, porquanto somos humilde técnico da terra, a ela, e só a ela, totalmente entregue neste três decénios de uma vida profissional intensa, toda vivida a margem do mais ínfimo pensamento de alguma vez ser parte, húmile é certo, na soberania nacional.
Isso me faz a todos pedir a benevolência maior para o desatavio da forma e a acanheza das ideias que porventura eu tenha, por dever de acção, de transmitir a VV. Exas. De antemão agradeço a generosidade daqueles que me escutarem.
Sr. Presidente: Muito mais expressão do que as palavras, por maior que seja o seu empolamento, têm os actos, e aquele a que aqui assistimos há dias da reeleição, em voto unânime, da pessoa de V. Exa. para o subido cargo de Presidente desta Assembleia, da mais elevada projecção na vida nacional, a todos quantos, como eu, não tínhamos a honra de conhecer V. Exa. pessoalmente, deu-nos a dimensão exacta das altas virtudes que o exornam, não só como político clarividente, mas ainda, e sobretudo, como mestre distinto e homem cheio de dignidade.
Para mim é sumamente honroso tê-lo na tribuna cimeira desta Assembleia, de que sou fraquíssima parte, conduzindo-a, ninguém o duvida, com a segura mão de leme de hábil timoneiro.
A V. Exa., pois, Sr. Presidente, eu dirijo o preito da minha homenagem sincera.
Ao Sr. Dr. Soares da Fonseca, conceituado e distinguido leader, eu testemunho o meu grande respeito e muito apreço.
Srs. Deputados, meus pares nesta Casa alta da Nação: De credos abatidos, e apenas com a alma tensa de um acendrado sentimento pátrio, todos vamos aqui viver neste quadriénio, há pouco iniciado, uma vida plena de canseiras e de sacrifícios, mas de verdadeira satisfação pelo dever a cumprir. Para VV. Exas. vão os meus sentimentos da mais profunda estima e admiração, afirmando-lhes que estarei sempre convosco, colaborando em tudo quanto seja em favor deste Portugal, que é tão nosso e tão querido.
Seja-me consentido que destaque aqui, endereçando-lhes n cordialidade maior do meu sentir, os eleitos das províncias ultramarinas, que connosco vêm trabalhar, comungando nos mesmos ideais, numa afirmação total da perenidade e indivisibilidade da Pátria Portuguesa.
E ainda mais uma palavra queremos pronunciar, aquela que é devida à presença no seio desta Assembleia da mulher portuguesa, lídima representante da Mãe excelsa de todos os tempos, e que mais uma vez, neste momento de amargura que vivemos, de olhos humedecidos, sem dúvida, mas de alma fortalecida, continua a sobrepor ao seu arraigado sentimento materno a imperiosidade da sobrevivência da Pátria.
bem hajam, minhas senhoras!

O Sr. Sousa Magalhães: - Muito bem!

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O Orador: - Sr. Presidente e meus Pares: A aceitação do mandato, que não queríamos por nos sentirmos ai capacitados para o seu perfeito cumprimento, teve a motivação num imperativo de consciência, que em quietude jamais poderia ficar com os dois filhos estremecidos a guarnecerem a frente de combate e o pai negando o s eu saber, que é bem pouco, mas sobretudo o seu esforços e esse é que poderá ser muito, ao fortalecimento da retaguarda, que hoje, mais do que nunca, precisa de t na firmeza grande.
E porque entendemos, assim o dissemos vão passados aos poucos dias, «que neste momento grave da Pátria e comprometida se impõe a presença, e a presença activa de todos quantos anseiam pela sua imaculação e robustez maior», aqui estamos determinados para a luta, por mais dura que ela seja.
Somos um homem por inteiro devotado à terra, já o dissemos, e por isso não pode causar estranheza que nesta Assembleia a tenhamos, a ela e às suas gentes, por dever primeiro.
Vimos do meridião alentejano, daquele plano imenso e promissor que arrecada em si uma potencialidade enorme, capaz de uma achega extraordinariamente vultosa ao robustecimento económico de que tanto precisamos para uma vivência melhor.
A rudeza dessas terras e o sol que as escalda, ao mesmo tempo que requeima a tez do homem que as percorri, as vive e as sente num dia a dia estuante, tempera-lhe a alma e endurece-a, sem contudo a despojar de espiritualidade, que a tem e muita, e é tão preciosa ao adoçam ito da vida.
Na incompreensão, vezes sem conta verificada i los seus problemas que tanto lhe custa ver postergados que são muitos e instantes no equacionamento, para seu e do País que ele deseja ver robusto e forte, e sempre ensombrado pelas condições mais adversas de mesologia de franco desfavor, com um solo que quase toda a parte assenta num xisto empobrecido, e por muito sítio mesmo esquelético, sujeito a um clima que rara: é bom, o alentejano, se mal amparado, e tem-no sofre, e muito, mas com uma resignação impressionante!
E tanto isto é assim que numa sequência infindável de anos maus, suportando uma comercialização defeituosa das suas já de si minguadas produções, e ainda por cima com preços rebaixados, a lavoura do Alentejo, estaticamente, sem uma reacção forte e apenas com vagos queixumes lançados de quando em vez, vai continuando a deitar a semente à terra, num apego a ela que comissiona, com a esperança sempre posta em dias melhores, que teimavam em não vir.
Atente-se na imagem tantas vezes absolutamente deformada dessa lavoura, que muitos aferem só pelos grades.
Na verdade, tudo o que é grande vê-se bem e geralmente apaga a pequenez das coisas!
Não! A lavoura do Alentejo é outra, totalmente diferente. É a lavoura do nosso «Campo Branco», das terras magras de Almodôvar e de Mértola, dos contraforte do Caldeirão, da serra de Serpa e mais da serra de Portel, e eu sei lá de quantos outros retalhos, imensos, dispersos pela imensidão alentejana.
O Baixo Alentejo, todos o sabem, é uma província de feição eminentemente agrícola, ou não seja a actividade primária nela expressivamente representada na percentagem alta de 76 por cento, cabendo-lhe apenas no sector secundário uns diminuídos 10 por cento!
É de atentar que a grande exploração se exprimi tão-sòmente por 3,6 por cento no todo provincial e a pequena e média, somadas, percentuam-se no número extraordinariamente agrandado de 96,4 por cento! Desta soma à pequena exploração cabem 73,5 por cento!
É toda esta infimidade que, extremamente minguada na sua renda, está vivendo uma vida dificílima, quase à beira da exaustão. Por isso ela é incapaz de ser prestimosa, se não fortemente acarinhada, na reconversão que se pretende e urge em absoluto para o nosso revigoramento económico.
E nós que aqui estamos neste lugar cimeiro por vontade dela, que nos elegeu para sermos eco dos seus lamentos e arauto dos seus anseios, obviamente nos obrigamos a criticar, numa acção determinada de só construir, que é aquela que a nossa consciência nos impõe, na ânsia de uma Revolução Nacional perfeitamente realizada para um Portugal bem erguido.
Negar pura e simplesmente, isso é que nunca, porque fazê-lo é destruir e o País não pode suportar a mínima ofensão.
Somos por princípio inconformista, porque «quem quer ser homem - assim o proclamou Emerson - tem que o ser mesmo».
Também o progresso só se gera no seio da insatisfação.
Atraiçoaríamos a verdade, a confiança e o crer daqueles que aqui nos guindaram, a causa nacionalista que defendemos e queremos fortalecida e a nossa própria consciência se a esta Casa não trouxéssemos o proclame do nosso sentir exacto. Assim o faremos.
Neste momento, e com que prazer imenso o afirmamos, somos portadores de uma mensagem de sincera gratidão da lavoura alentejana, pela esperança, bem fundada, nos diplomas recentes, que já não são poucos, saídos do pensamento justo e perfeito e do saber extenso e profundo de S. Exa. o (Ministro da Economia. Com a ajuda operante dos Srs. Secretários de Estado da Agricultura, Comércio e Indústria, o sector grandemente deprimido da nossa agricultura está em plena revivescência. Podemos mesmo dizer que, tal como a Fénix, o nosso agro está sa renascer das próprias cinzas».
Pela parte que nos toca, como técnico agrário, com uma vida toda dada ao serviço da recuperação nacional, esteio enorme da nossa economia, e de tamanha importância por ser ela que ao homem concede os seus alimentos mais nobres e o agasalho, eu, que tenho assistido, de Sempre, impotente, ao seu encaminhamento entregue aos baldões do acaso, não posso deixar aqui, agora que lhe vislumbro um caminhar seguro, de dirigir a quem a está a comandar, e tão bem, o meu «bem-haja»!
Para melhor oportunidade, e no consentimento de V. Exa., Sr. Presidente, guardarei o desenvolvimento do problema de tanta grandeza como é este do fomento pecuário.
Mas antes de entrarmos propriamente na apreciação da chamada Lei de Meios, muito rápida, porque outra não pode ser, por limitação tão grande de tempo, devo anotar, por justiça, no que respeita à situação aflitiva em que a lavoura se vem debatendo, que qualquer terapêutica só é eficaz, digamos perfeitamente operosa, quando verificado todo um condicionalismo, que talvez não se tenha processado convenientemente até ao momento.
A proposta de lei de autorização das receitas e despesas para 1966, conhecida por Lei de Meios, diploma da maior transcendência na vida da Nação, necessitava de tempo dilatado para bem se poder apreciar, tão grande é e tanta a sua importância.
Esta meia dúzia de dias de que se dispõe mal chega para uma leitura apressada, quanto mais a um debruçamento francamente meditado.

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Contudo, a opinião colhida, do estudo breve que fizemos, é de extraordinário favor e tornáramos nós que tudo possa ser cumprido como nela se contém.
Todo o conteúdo da proposta de lei se subordina a dois imperativos, qual deles o de maior poder - a «defesa nacional, para salvaguarda da integridade territorial da Nação», e o «crescimento económico».
Estes dois desígnios, a que chamámos «firmeza na frente e esforço na retaguarda», são afinal as duas (razões ponderosas que aqui me trouxeram, as mesmas que dominam no dia de hoje, como não pode deixar de ser, o sentir de todo o português bem formado.
Acima de tudo há que pôr a Pátria agredida.
Já Guilherme de Orange, o grande restaurador da Holanda, disse que «antes uma pátria arruinada, do que ficar sem nenhuma».
Sendo esta também a expressão autêntica do nosso pensar, damos & proposta de lei o voto de inteira aprovação na sua generalidade.
E descendo à especialidade, para além de dois simples reparos, ou, antes, da clarificação de dois pontos, que vemos mais obscurecidos, há só que dizer muito de bem e fazer rasgado elogio de conteúdos novos que a nós nos parecem ser fundamentais para o alevantamento da economia.
No bem elaborado, minucioso e muito elucidativo relatório preambular é dada conta de que o produto nacional bruto foi influenciado com grande desfavor por quebra do sector agrícola no ano que passou, de 1064, numa contracção de 2,7, como já o tinha sido antes, em 1963.
O sector secundário, esse é que tem ido num crescendo continuado.
A nós não nos parece bem esta marcada divergência desses dois sectores da economia, porque, em modesto entender meu, ela só é gravosa para o todo económico nacional.
Achamos antes que ambos os sectores, para se realizarem perfeitamente, necessitam de um absoluto paralelismo no seu caminhar.
Em apoio deste nosso entendimento, vimos recentemente a opinião expressada pelo Dr. Bruno Knall, economista de renome, que disse, em conferências entre nós produzidas, sque nos países subdesenvolvidos, com predominância agrícola, a industrialização apareceu como a condição sine qua non do desenvolvimento económico». E opina, afirmando haver unanimidade nesta sua asserção, «que o desenvolvimento económico de um país agrícola pouco evoluído não é possível sem uma certa industrialização». Desta conclusão tira uma segunda: «A industrialização de um país agrícola subdesenvolvido é uma condição necessária, mas insuficiente, do desenvolvimento económico». E termina assim: «Nesse país não se terá um crescimento económico harmonioso senão aumentando a produção e a produtividade da agricultura».
Há tanto tempo que também assim nos queria parecer e o afirmávamos!
«Por mim, se tivesse de haver competição, continuaria a preferir a agricultura à indústria», assim o ditou o nosso Presidente do Conselho, a quem tanto devemos, com a razão forte da sua palavra esclarecida.
E o conde de Gasparin, com a autoridade que lhe dava o seu saber grande de economista, proclamou, o bem, que a «agricultura é a base da população, riqueza e vitalidade das nações».
Portanto, tudo que seja feito em benefício da nossa diminuída agricultura e se contém na linha geral do artigo 18.º da proposta e, mais especificadamente, no n.º 32 do relatório que a antecede merece o nosso inteiro aplauso.
Com tais medidas ideadas, e porque acreditamos na lavoura do Alentejo, estamos certos de que a aceleração esperada será mesmo conseguida.
Para esse aceleramento também muito há-de contribuir a programação regional, que consta no artigo 21.º, a investigação aplicada, referida no artigo 19.º, e que para nós é um dos fulcros maiores para um agro desenvolvido, e ainda a acção, que pode e deve ser extremamente proveitosa, das comissões técnicas regionais, no seu papel de fautoras da reconversão cultural, citada no n.º 32 do relatório prefacial.
A formação profissional, a que faz referência o artigo 19.º, merece-nos uma palavra destacada.
Em país algum do Mundo ela é hoje subestimada, e, bem pelo contrário, considera-se primacial para uma agricultura francamente evoluída.
Estes números têm expressivo significado: na Bélgica há 15 por cento de lavradores com formação profissional; na Suécia, 20 por cento; na Dinamarca, 45 por cento, e na Holanda, 46 por cento, tendo os agricultores actuais 90 por cento dos seus filhos em frequência de escolas de agricultura.
Neste último país há 300 escolas agrícolas secundárias e milhares de cursos primários; tem ainda 5 escolas de formação de economia doméstica rural.
Na Dinamarca há 27 escolas de agricultura, 2 de horticultura e 29 de economia doméstica.
Sem bons técnicos, empresários perfeitamente mentalizados e portanto, esclarecidos, com saber aprofundado, rurais, tanto homens como mulheres, bem qualificados para as tarefas que lhes cumpre, cada vez mais especializadas, e ainda uma juventude campesina técnica e moralmente bem formada, então sim, e só assim, teremos uma agricultura que valha.
Lembro aqui a vastidão do Baixo Alentejo, a sua feição de hoje, caracterizadamente agrícola, com uma mancha de regadio projectada de 100 000 ha, a maior do País, parte dela já em execução adiantada. Desta intensificação agrícola fatalmente que há-de resultar uma industrialização extensa, já a esboçar-se com relativa celeridade.
Haja em vista a indústria têxtil que vai ser montada na Mina de S. Domingos, a fábrica de descaroçamento de algodão, já com a maquinaria em Beja, outras indústrias criadas e em montagem nos concelhos de Cuba e Aljustrel, a mineração dos Algares, neste último concelho, e mais promessas que não serão vãs certamente.
Por tudo isto, permito-me, deste tribuna, pedir ao Governo da Nação, que nunca descura as realizações do interesse nacional, e antes as acarinha sempre que pode, e faço-o com o maior empenho, sabendo que traduzo um anseio velho de muitos anos das gentes do sul do Alentejo, que em Beja, logo que possível, sejam criados os ensinos primário e médio agrícolas, passo largo e seguro para a formação profissional pretendida.

O Sr. Francisco António da Silva: - Muito bem!

O Orador: - O grande lavrador da região que foi Miguel Fernandes, ao mesmo tempo que filantropo, conferencista e jornalista de valia, e que tanto contribuiu para o progresso da agricultura nacional, teve a aspiração, que só a morte prematura truncou, de dotar Beja com uma escola agrícola. Bem merecia, preiteando-se a sua memória, que a ideia por ele lançada, tivesse agora consecução. Já nem sequer falta local, e bem próprio, para a instalar.
E por estarmos em maré de pedidos, outro faço, por sabermos da necessidade instante de mais institutos técnicos médios e cujo pensamento é localizá-los nos cen-

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tros económicos e demográficos mais afastados das sedes dos actuais. Com a indústria a multiplicar-se a sua potencialidade futura e o grande afastamento de L toa, em Beja ficaria bem a criação do instituto industrial do Sul. Os três existentes - Porto, Coimbra, este recente, e Lisboa - e mais o de Beja já promoveriam uma cobertura perfeita do País, satisfazendo a procura, que é e escassa a oferta, de elementos tão prestantes ao osso progredir económico, como são os agentes técnicos engenharia.
Ainda um muito bem para a proposta da Lei de Meios. Um país como o nosso, de fontes de energia ele rica pouco hiantes e necessidades multiplicadas, com ima agricultura que mal a tem, por pouca e cara, bem precisa a intensificação dos estudos nucleares, agora considerada.
Quanto aos reparos, como dissemos, são muito pç cos: apenas dois.
O primeiro é a omissão no artigo 23.º, na sua alínea a), que referencia a saúde, dos dois complexos nosológicos hoje mais destacados no comprometimento da anos humana - o cancro, o maior flagelo que suportamos, e as doenças cardiovasculares.
E afinal cremos judiciosa esta observação, porquanto depois vimos, no douto parecer da Câmara Corporativa sobre a Lei de Meios do ano transacto, que ela lá s encontrava já expressada.
Para qualquer dessas andronoses graves, que se põe serem enfrentadas com denodo, necessário se torna um programa heróico, em cuja execução sejam utilizados dos os recursos científicos, financeiros e técnicos.
O reparo feito não quer de forma alguma dizer que em favor daqueles males se abrande a luta com peste branca, que. por Infelicidade, no Mundo mercê de circunstâncias várias, está ultimamente mar um carácter de assustador alastramento. Bem contrário, entendemos que deve ser continuada em alto a batalha em que se anda empenhado e na a ciência veterinária, permitam-me que o digamos tido papel de relevo, tanto através das campanhas tuberculosas dos bovinos leiteiros e de carne, que sistemáticamente se vêm realizando no nosso país com eficiência, tanto pelo saber fecundo desse veterinário insigne que foi o Dr. Camile Guérin, que com o Dr. Calmette, ambos do Instituto Pasteur, em 1908, conseguiram o B. C. U., a vacina antituberculosa à qual humanidade tanto deve.
Preciso é que os três dolos maiores que nos aí sejam tratados a par.
Quanto ao segundo reparo, esse incide sobre a a assistência técnica, relegada para a alínea/), a última artigo 23.º, e não enunciada no relatório.
Em nossa opinião, ela é fundamental para o cimento económico, devendo assim ser-lhe dado lugar primazia.
O grande economista da terra que é Sauvy diz «um bom conselheiro agrícola custa caro, mas pode amortizado num ano ou dois pelo aumento do pró nacional que ele permite», e ainda que sem nenhum do Mundo deve haver um trabalho subprodutivo e ao acaso». Isto só se consegue com uma assistência nica eficiente.
Ë de notar que, enquanto a Alemanha e a Ho! têm 1 técnico agrário para 300 habitantes, a para 3000, Israel 1 para, em Beja, província de cultura extensa, há 1 para 22 000 habitantes!
Besta-nos, para atermar esta nossa apreciação à de Meios, observarmos o bem-estar rural e as províncias sobre o funcionalismo.
É, na verdade, extraordinariamente volumoso o dispêndio feito no ano passado com as obras de valorização local - 169 600 contos gastes em águas, electricidade, habitação, saneamento, etc. Não há dúvida alguma de que são realizações de primeira monta para o melhor viver do nosso rural, imas também é de considerar que são, por si só insuficientes, já porque as necessidades se multiplicam por factor acrescido, já por tudo isso ter lugar apagado relativamente aos proventos directos, que esses sim são fundamentais. E a prova está em que verbas tão quantiosas despendidas não têm fixado o trabalhador à terra, que em crescendo continua a abandonar procurando melhor viver nas indústrias ou nos serviços dos centros urbanos, quando não carreado, o que é pior, por correntes migratórias para países mais evoluídos.
Só uma agricultura robusta e capitalizada, como se quer e se impõe, poderá ter mão neste êxodo de extremo dolo, tal como se (processa, não pela contracção da mão-de-obra, que não podia nem devia continuar sobrante e nada garantida, mas sim, e sobretudo, pela debandada dos mais aptos. E estes ficarão com certeza se os remunerarem justamente e lhes concederem um abono de família de atracção, por forma a terem um nível de vida verdadeiramente digno.
No que toca aos servidores do Estado, quem não vê que é extremamente enegrecido o seu viver actual?!
Com um custo de vida a subir em ritmo de vertigem e uma debilidade de provento que dia a dia mais se mingua, o seu sustento está a tornar-se impossível.
Louvemos o anseio bem expresso na Lei de Meios, mais do que no artigo 25.º, decalque do 28.º da proposta do ano transacto, que não pôde ter efectivação positiva, o que é dito no n.º 148 do relatório, na afirmação que nos enche do redobrada esperança de que o problema da situação económica dos funcionários do Estado e dos corpos administrativos se reveste de particular importância e se encontra presente na linha das preocupações do Governo.
Xão podem os funcionários, nem que queiram, por melhor vontade que tenham, apreender o saber preciso e darem um rendimento de trabalho capaz para a perfeita execução das tarefas cada vez mais complexas que lhes são exigidas. Temos como prova disso os queixumes insertos no n.º 122 do relatório, dizendo-nos da insuficiência, em qualidade, do pessoal encarregado da reforma fiscal, havendo necessidade de providências urgentes e adequadas para que se não percam as virtualidades dessa reforma. E nós acrescentaremos, não diminuindo a importai: cia dela, que por igual a tom todo o exercício do Estado, que sem servidores e bons servidores nada feito.
As empresas privadas, por mais justamente remunerarem, levam os melhores. Ficam em geral os idosos e os piores, e com esta selecção ao contrário fatalmente que os trabalhos se hão-de ressentir, e muito, não podendo ter a eficiência devida.
Estou a lembrar-me exactamente da assistência técnica, tão necessária à nossa progressão económica, e de quanto ela é afectada, por cometida a funcionários com vencimento que não chega, líquido, a 1000$, isto para não falarmos nos próprios técnicos que a comandam e - são obrigados, para proverem ao viver seu e dos familiares, a verdadeiros prodígios do equilíbrio, neste momento absolutamente instável.
Estou a lembrar-me ainda da nossa juventude rural, que precisa de uma instrução esmerada para que seja inteiramente útil ao País, que precisa de uma educação cívica de primeira plana, que precisa de uma educação moral sólida, para que sejamos todos fortes e bons, e sabedores

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(...) e capazes. E vejo toda esta tarefa ingente a cargo de uma classe a quem compete um verdadeiro sacerdócio, que é a do professorado primário, tão insuficientemente retribuído. Não é possível, é mesmo impossível, que numa inquietude de vida material possa haver a espiritualidade precisa para um perfeito exercício.
E eu atrevo-me aqui a sugerir que para estes tão prestimosos servidores, e para uma dignidade maior da sua nobre função, nos recônditos aldeamentos onde a exercem, e se alojam em precárias e tantas vezes menos próprias locações, se vão adquirindo instalações condignas, em vez de só se construírem, como está consignado na Lei n.º 2107, de 5 de Maio do 1961, o que nos parece mais viável, por menos caro.
Na verdade, a unificação do abono de família pelo Seu limite mais elevado, a aquisição e construção de habitações e ainda a assistência na doença, em tão boa hora concebida, e que acaba de ter efectivação real, são padrões válidos a atestarem o grande interesse do Estado pelos seus servidores, mas não chegam. Tal como já o afirmámos, o provento directo é que sobretudo conta.
Sabemos, todos o sabem, da extrema dificuldade do viver actual do nosso país, pelo nefando terrorismo que nos consome.
Mas quer-nos parecer que com uma restruturação de quadros e mais uma simplificação efectiva e substancial do nosso prolixo mecanismo burocrático seria possível darmos um passo alargado para a aproximação dos funcionários do Estado dos da actividade privada, tal como é justo, necessário e imperioso.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Chegámos ao fim. Desculpem VV. Exas. todo este tempo que lhes tomei com tamanho e mal urdido arrazoado. Com ele outro intento não tivemos do que sermos úteis ao nosso distrito de Beja, que aqui nos trouxe, ao Estado Novo, que desejamos sempre moço e perene de vitalidade, e ao País, que é a nossa chama e nos atormenta ver debilitado.
Vou atermar pedindo consentimento para mais uma palavra, a última, modesta mas sentida, de homenagem, de admiração e de grande apreço, para S. Exa. o Ministro das Finanças, a quem desejamos rápidas melhoras, pela sua Lei de Meios, que considero cheia de vontade de bem servir a Nação, que queremos forte, inteira e rejuvenescida.
Disse.

Vozes: -Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Ferrão Castelo Branco: - Sr. Presidente: Ao usar pela primeira vez da palavra nesta douta Assembleia, quero apresentar a V. Exa., não como mero cumprimento protocolar, mas como sendo a expressão dos meus mais respeitosos cumprimentos de respeito e consideração pela alta figura de V. Exa., não só como perfeito homem de bem, mas ainda como jurista insigne, como plenipotenciário de altos méritos e como político de rara clarividência sobejamente demonstrada, quer como Ministro de Estado, quer como Deputado ilustre a esta Assembleia Nacional e seu muito digno Presidente.
Para VV. Exas., Srs. Deputados, os meus cumprimentos.
Sr. Presidente: Em obediência a preceito constitucional, enviou o ilustre Ministro das Finanças a esta Assembleia a proposta de lei de autorização das receitas e despesas para o ano de 1966, que fez preceder de um esclarecedor e notável relatório que nos dá um perfeito quadro da conjuntura económica actual e da que se desenrolará no próximo ano, segundo as suas previsões e em conformidade da proposta de lei apresentada.
Louvores são, pois, devidos ao trabalho do ilustre Ministro das Finanças, Sr. Dr. Ulisses Cortês.
Sr. Presidente: Como Deputado pelo círculo de Beja, em cuja região, destacadamente avultam as explorações agro-pecuárias, oferece-se-me fazer algumas considerações sobre a proposta de lei em discussão e que com o sector agrícola se prendem.
Este sector é, na mesma proposta de lei, tratado, dentro do quadro da expansão económica do País, em situação não prioritária, pois que o artigo 18.º dá a primazia aos investimentos públicos dos sectores de maior reprodutividade.
A gravíssima crise da lavoura em Portugal é sobejamente conhecida e uma vez mais, quando da discussão do Plano Intercalar de Fomento nesta Assembleia, tal situação foi larga e proficientemente debatida e constatado que os investimentos previstos para o fomento da agricultura não poderiam atingir as realizações programadas e que se desejam alcançar.
O estado de depressão em que se encontra a agricultura nacional deve-se a vários factores, de entre eles se destacando as condições de clima, a maior parte das vezes adversas, os preços estabelecidos, a falta de mão-de-obra, o aumento de salários, a elevação dos preços das alfaias, dos adubos e do mais que a lavoura carece.
É certo que a Lei de Melhoramentos Agrícolas de 25 de Junho de 1946, posteriormente ampliada e remodelada pelos Decretos-Leis n.ºs 43 355, de 24 de Novembro de 1960, 43 661, de 4 de Maio de 1961, e 45 401, de 2 de Dezembro de 1963, e outros diplomas, exerceu benéfica acção na lavoura, mas, só por si, como é evidente, não podia resolver todos os seus problemas.
No decurso do presente ano, porém, o Governo, pela pasta da Economia, deu um decisivo passo em frente para solucionar alguns dos problemas que afligem a lavoura ao publicar o despacho de 1 de Maio sobre fomento pecuário, de grande alcance e projecção, e ao promulgar o notável Decreto-Lei n.º 46 593, de 15 de Outubro, que estabelece o novo regime cerealífero a vigorar já este ano e nos quatro que se lhe seguem.
Com efeito, neste último diploma, além de se aumentar o subsídio de cultura de trigo em $20 e o preço do centeio em $10 por quilograma, legislou-se ainda, quanto ao trigo e ao centeio, que o preço dos mesmos será aumentado de $30 por quilograma e 500$ e 700$ por hectare cultivado de milho híbrido, respectivamente, para grão e forragem, para os produtores que façam a reconversão dos seus métodos de cultura.
Além de que, quanto aos preços do trigo, serão estes revistos se as suas produções, durante o quinquénio, forem inferiores aos mínimos ali previstos.
Definindo-se o que é acção de reconversão, diz o relatório do mesmo notável Decreto-Lei n.º 46 595 que é «toda aquela que conduza a uma elevação técnica e economicamente correcta, do grau actual do aproveitamento da capacidade da produção do solo, e, consequentemente, do aumento da rentabilidade global das explorações agrícolas».
Para se pôr em funcionamento esta acção de reconversão determinou-se que fossem criadas comissões técnicas regionais, constituídas pelos chefes de todas as delegações e brigadas que os serviços do Ministério da Economia possuam em cada região.
Estas comissões, quando proponham as directrizes a que deva obedecer a acção, pública e privada, para o progresso da agricultura em cada região, devem ajustar estas directrizes com os órgãos regionais da lavoura e submetê-las (...)

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(...) à apreciação dos conselhos regionais da agricultura e depois aos órgãos que se lhes seguem na categoria hierárquica.
E ainda, seguindo uma lúcida visão das realidades regionais e dentro de um perfeito espírito corporativo, se diz no douto preâmbulo do decreto-lei em causa que, «sempre que as comissões técnicas regionais reunam para apreciar questões relativas à concessão, aos empresários agrícolas das dotações para reconversão ou melhoria cultural, deverão convocar, para tomar parte na reunião, como representante da Corporação da Lavoura, o presidente da federação dos grémios da lavoura da região».
É, pois, em seguimento das providências legislativas tomadas pelo Governo e daquilo que também já constava do Plano Intercalar de Fomento que, no artigo 21.º da proposta de lei ora em discussão, se prevê «a programação regional com vista a correcção das disparidades do desenvolvimento e à elevação do nível de vida das populações» para o que «será dotada com verbas especiais».
Assim, parece que, além da florestação nos terrenos que estejam indicados para este fim, há que intensificar as culturas cerealíferas nas terras aptas para tal fim, pois que como é sabido, é nos alqueives destinados à cultura do trigo que se produz o grão-de-bico - leguminosa exportada para o estrangeiro em grande escala e com tão grande aceitação -, feijão, meloal e muitas forragens absolutamente necessárias à apascentação dos gados.
E é também no aproveitamento dos subprodutos das culturas cerealíferas - do trigo, da aveia, da cevada, do milho - e das leguminosas a elas consociadas - o grão-de-bico, a fava, por exemplo - que os gados se mantêm e produzem carne em condições económicas.
E é facto que para a realização de uma política de fomento pecuário há que cuidar das terras menos aptas, a fim de que elas possam produzir pastagens com abundância e a permitir que os montados criem bolota e deles se tirem outros produtos valorizadores do agro português.
Nas disposições contidas no artigo 13.º podemos ver um complemento da programação regional ao propor-se a concessão pelo Governo dos incentivos fiscais para o desenvolvimento das explorações agrícolas ou pecuárias.
Na alínea f) do artigo 23.º da proposta de lei em discussão prevê-se a inclusão no orçamento para l966 de dotações para a assistência técnica e, assim, é de prever que para a acção de reconversão prevista no decreto-lei que instituiu o actual regime cerealífero lhe seja atribuída uma forte e substancial dotação, sem o que se nos afigura inviável a sua execução.
O artigo 24.º preconiza o prosseguimento da acção de fomento do bem-estar rural com obras de electrificação, acesso a povoações isoladas, abastecimento de água e saneamento, estradas e outros caminhos, construção de caminhos, construção de edifícios para fins assistenciais e sociais ou de casas e mercados.
Melhoramentos estes que, no seu conjunto, darão uma maior vida e valorização aos meios rurais dispersos do norte ao sul do País, contribuindo, assim, para que a vida no campo deixe de ser um pesado fardo que tem de suportar, mas onde se não sente a alegria de viver.
Como é sabido, o êxodo agrícola que se verifica, quer em Portugal, quer no estrangeiro, traz à agricultura largos e cruciantes problemas, pois que, geralmente, emigram os mais aptos e capazes.
Consequentemente, como se pondera no relatório da proposta de lei em discussão, «o nível de salários na agricultura tem vindo a acusar desde 1961 expressiva elevação».
É, por isso, que todas as providências tendentes a fomentar a melhoria de vida nos centros agrícolas se devem incentivar para que aos trabalhadores rurais também cheguem as comodidades e benefícios de que usufruem os que noutras profissões se ocupam.

Vozes:- Muito bem!

O Orador: - Na proposta de lei das receitas e despesas para 1966 é dada primazia às despesas a efectuar com a defesa nacional e julgo, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que não haverá nenhum português digno deste nome que não sinta pulsar-lhe o coração de orgulho patriótico ao saber que, em terras do nosso ultramar, estão combatendo, heroicamente, as nossas tropas em defesa do sagrado território da Nação e que aqui, na metrópole, Salazar continua a velar pela prosperidade e pela integridade de Portugal!

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Sebastião Alves:- Sr. Presidente: Serão para saudar V. Exa., um dos mais lídimos representantes da linha do pensamento que tem guiado os Portugueses através das vicissitudes do tempo e da história, as minhas primeiras palavras nesta Assembleia. Saúdo ainda o mestre insigne de direito, o ex-Ministro que tantos serviços prestou à grei e ainda o colaborador dilecto de Salazar nesta nova batalha de restauração.
Para V. Exa., pois, as minhas primeiras palavras, de saudação, de admiração e de apreço.
Trago ao debate um ligeiro apontamento que consistirá, afinal, num pedido ao Governo e que julgo bem integrado no espírito da lei em discussão.
Dou a priori o meu aplauso à proposta de S. Exa. o Ministro das Finanças e, não será de mais repeti-lo, anotarei a clareza, e quase beleza do texto, a largueza de vistas e inteligência que a ditaram, porque, sendo uma norma de acção, um programa das actividades do Estado, nela o rigor técnico do jurista não obscureceu a intenção do político.
Quero louvar o propósito expresso na proposta, que promete encarar a candente questão do planeamento regional. Para este ponto trarei modesto contributo.

O Sr. Serras Pereira: - Não apoiado!

O Orador: - Admitido e aceite por todos o primado da defesa nacional, será aquele porventura o capítulo da actuação do Estado que mais esperanças terá suscitado e que maiores aplausos há-de receber do País inteiro.
Não sendo ideia de hoje, é uma ideia nova e muito grande. Disse grande pelos benefícios de todas as ordens que produzirá e grande ainda porque vai de arrepio a certo fatalismo pobretana que se apoderou há muito de certas regiões onde não medram as iniciativas de promoção económica e donde desertam os homens válidos.
São conhecidos os dados do problema através da secura dos números: há graves e fundas distorções, quer económicas, quer demográficas, a corrigir por quase todo o País. Ao anunciar o propósito de atacar a questão, o Governo manifesta o intento de proceder a um ensaio de dimensão limitada devido à falta de experiência neste domínio e a própria complexidade do problema.
Efectivamente, não poderá o Governo por ora ir mais longe, provavelmente por carência de meios e talvez de técnicos experimentados.

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114 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º (...)

O ensaio a efectuar, ao que me consta, no vale do Mondego, custará quase 2 milhões de contos e levará uns anos a executar. Ao fim de uma dúzia de anos começaremos a tirar conclusões sobre a obra feita.
Ora, é evidente que os tais 70 por cento da população dos distritos pobres não esperarão nem doze anos, nem mesmo seis.
O êxodo, primeiramente rural, agora já nacional, continua a processar-se em ritmo amplo. Um emigrante que parte chama outros que timidamente não cederam ao primeiro apelo.
Há já centenas de aldeias onde não há um homem capacitado para o trabalho com mais de 18 anos e menos de 50.
Anoto a situação com pesar, sobretudo porque nenhuma medicina poderá estancar rapidamente esta sangria.
As medidas anunciadas pelo Governo produzirão algum efeito dentro de uma dúzia de anos ou mais. E até lá? Penso eu que uma actuação governamental menos técnica que a prevista, de tipo psicopedagógico e informativo, não só poderá ser compatível com os recursos disponíveis, como é susceptível de se converter em forte motor de desenvolvimento local e regional.
O que a seguir exponho não tem a pretensão de ser original e traz a desvantagem de não ter sido largamente aplicado aos casos conhecidos e próximos do planeamento regional, como o da França, o da Itália, o da Espanha e o dos Estados Unidos, países que, aliás, praticaram um planeamento de custo incompatível com os nossos recursos. Mas traz o mérito de ter sido aplicado por Israel e pelo Japão, por exemplo, com sucesso seguro e criteriosa parcimónia de meios.
Na verdade, o Estado poderá intervir profundamente nas nossas regiões mais desprotegidas de várias maneiras, que, sem envolverem grandes dispêndios, desencadearão um desenvolvimento tão imprevisto como espectacular. Começaria tal actuação estatal por extensa campanha pedagógica, que, elevando o nível cultural dos agricultores, dê padrões consentâneos com o saber de hoje às nossas produções com mais possibilidades: pomicultura, horticultura, viticultura e florestas.
Com um caso concreto aclararei mais facilmente o ponto exposto.
Há semanas, um agricultor que conhecia e considerava remediado procurou-me para pedir conselho se sim ou não havia de ir juntar-se a um irmão que trabalha em, França em muito boa situação.
Considerava-o remediado e deveria sê-lo, pois possui dez milhares de videiras, um bom milhar de fruteiras e outro de oliveiras, tudo em período de boa produção.
Que se passa então?
É que o pomar e a vinha são podados e desinfectados por processos que a tradição instalou e a rotina não actualizou. Daí uma produtividade baixíssima.
Este caso repete-se por todas as regiões de todo o País. De acordo com dados de uma entidade estrangeira que mandou estudar as possibilidades nacionais de pomicultura, menos de 10 por cento das explorações agrícolas portuguesas trabalham a nível técnico aceitável. Fácil é concluir: um dos motores actuais da emigração é a ignorância.
Um dos eixos da actuação governamental será, pois, uma resposta rápida a esta ignorância.
Outro eixo de tal actuação residirá na informação. Tomo como exemplo a floresta, que não é convenientemente explorada, tratada e desbastada, porque o aproveitamento e consequente industrialização dos seus produtos requer um nível de informação a que não têm acesso as camadas populacionais situadas nas respectivas regiões.
Um exemplo só: há dois anos fez-se um inquérito à indústria de serração de madeiras, donde se concluiu que havia no País cerca de 1000 unidades, das quais menos de uma dúzia laborava com uma produtividade 30 a 40 por cento mais baixa que a média da indústria francesa. Todas as restantes trabalhavam muito abaixo deste nível, com equipamentos obsoletos e técnicas próprias do século XIX.
Os serviços centrais do Estado sabem, todavia, com algum rigor, onde há florestas e sabem também o que noutros países se tem feito dos produtos florestais e como se tem feito.
Porque não divulgar, propagandear mesmo, muito rapidamente, a extensão aproximada das florestas, as respectivas possibilidades de produção anual e que tipo de indústrias as mesmas poderão alimentar?
Porque não divulgar por toda a parte as técnicas de certas indústrias que a priori têm viabilidade económica, por abundância de matéria-prima e mercados externos assegurados?
Porque não convocar seminários zonais, distribuir publicações técnicas, fazer cursos de especialização?
No princípio do ano findo fora eu convocado para participar em trabalhos, de planeamento regional em Castelo Branco.
De começo as ideias não abundavam e informação concreta sobre esta ou aquela indústria não aparecia nenhuma.
Fez-se, todavia, um inventário de possibilidades. Não será tecnicamente perfeito, porque se baseou sobre estudos sumários de empresários ou técnicos, todos trabalhando em regime de voluntariado, mas as questões agitaram-se, as indústrias discutiram-se, os homens mentalizaram-se e por fim já há mais empresários que possibilidades. Até os capitais apareceram.
Esta tentativa de planeamento foi provocada pelo Governo Civil local e não custou ao Estado um centavo.
Daqui concluo que, se queremos um desenvolvimento regional a curto prazo, o poderemos pôr em marcha ao longo dos dois eixos apontados: uma acção pedagógica que desbaste tanta ignorância; uma acção psicológica e de propaganda que convença, que conquiste a adesão dos povos interessados e lhes imprima uma dinâmica nova em proveito próprio.
Outro poderoso motor deverá imprimir ao desenvolvimento regional uma fortíssima e imprevista aceleração: refiro-me ao turismo.
Das declarações produzidas há dias por S. Exa. o Subsecretário de Estado da Presidência do Conselho infiro que entre 1969 e 1971 teremos de receber cerca de 4 milhões de turistas.
Muito embora certos especialistas interessados minimizem as nossas possibilidades de turismo que não seja de praia, sabemos todos dos importantes movimentos turísticos adentro de países sem praias, como a Suíça ou a Áustria, e sem montanhas nem praias, pelo menos sem praias do tipo das nossas, como a Dinamarca, a Holanda ou a Bélgica.
Atendendo ao facto de a nossa taxa de ocupação hoteleira estar nos seus níveis cimeiros, portanto incapaz de receber mais de 1 500 000 turistas, é evidente que teremos de triplicar as infra-estruturas existentes para receber os 4 milhões anunciados para daqui a cinco anos.
E evidente ainda que, se fizermos depender de planos e meios estatais o erguer de toda esta poderosa máquina, não poderemos aproveitar os grandes, embora (...)

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(...) discutíveis, benefícios da anunciada invasão turística somente porque a não poderemos receber nem alimentar.
Ladear-se-á a dificuldade diversificando os motivos orientando a propaganda para todos os atractivos de praia, de campo ou de montanha, numa palavra, dispersando as instalações pelo território nacional numa sã divisão de esforços a realizar e de proventos a arrecadar.
E há ainda o turismo interior. O nível de vida cresce, os salários aumentam, os períodos de férias dilatam-se e os Portugueses, que primeiramente buscam viajar o estrangeiro, procurarão depois férias e lazeres adentro do País. Pois organizem-se festivais, mostre-se o folclore, propagandeiem-se as romarias, divulgue-se o artesanato. Tudo para estrangeiros que cheguem e portugueses que não partam.
E não se descuidem na propaganda as gargantas do Douro, os cimos nevados da Estrela, as cidades antigas, os monumentos -que são história-, os museus, as estações arqueológicas, etc.
Tudo são e serão atractivos.
Turismo do interior ou do exterior será poderoso motor de desenvolvimento regional, quer queiramos, quer não.
Acresce que as infra-estruturas turísticas a disseminar pelas zonas menos desenvolvidas serão sempre de médio ou pequeno porte, portanto acessíveis a iniciativas locais. Mostrem-se um pouco os caminhos, apontem-se somente as soluções, não se regateiem os créditos, como, aliás, se tem feito para as zonas mais evoluídas, e as iniciativas surgirão como por milagre.
O Governo poderá assim, paralelamente a projectos e experiências de planeamento regional, que custarão dinheiro e tomarão muito tempo, pôr em movimento uma máquina relativamente leve em custo e de efeitos práticos que me parecem assegurados: ensinar, divulgar, propagandear de medo a dinamizar as possibilidades e iniciativas de região por região, distrito por distrito, e nasceriam indústrias pequenas ou médias, uma pomicultura actualizada e uma florestação racionalizada melhorariam a produtividade rural e o turismo ocuparia
braços que não desertariam e canalizaria receitas suplementares que mitigariam a pobreza das terras e as carências da população.

O Sr. Pontífice de Sousa: -Muito bem!

O Orador: - Bastará que o órgão central de planeamento regional a criar, através de pequenas delegações zonais, oriente, canalize e coordene os esforços dos organismos já existentes, alguns dos quais, como a Junta de Colonização Interna, têm útil e sã experiência na matéria.

Vozes: -Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. António Santos da Cunha: - Sr. Presidente: Enche-se-me de alegria o coração ao subir a esta tribuna, pois começarei jubilosamente por dirigir louvores a Deus, agradecendo-lhe o restabelecimento do Sr. Ministro das Finanças, que dentro em pouco, estou certo, teremos o prazer de afectuosamente abraçar. Se isso é motivo de viva satisfação para os seus numerosos amigos, no número dos quais, embora dos mais humildes, me quero incluir, é-o também de regozijo para o País, que sabe que o Sr. Dr. Ulisses Cortês, além de estadista de largos conhecimentos, conhecimentos que bem tem demonstrado através da sua vida como Ministro e como parlamentar, é homem de profundo sentido político,
sentido sem o qual, seja qual for a obra em que nos empenhemos, esta sairá imperfeita, incompleta, pois lhe falta o calor humano, agasalho imprescindível à vida e à felicidade do homem.
Também me é grato - e é de inteira justiça -, ao apreciar na generalidade, e tanto quanto possível não me afastarei dela, a proposta de lei de autorização das receitas e despesas para 1966, ter uma palavra de agradecimento, como Deputado da Nação, para o Prof. Pinto Barbosa, responsável pelas finanças públicas durante tantos anos, ...

O Sr. Serras Pereira: -Muito bem!

O Orador: - ... continuador da tradição, nunca quebrada, de austeridade e respeito pelos mais sagrados interesses nacionais que o Sr. Presidente do Conselho instaurou no Ministério das Finanças, quando o foram arrancar à sua cátedra de Coimbra, para salvar o País e a Revolução de 28 de Maio em vias de cavar a sua própria derrota, pois se não lhe faltavam vontades generosas e firmes, não dispunha, não tinha encontrado o cérebro que fosse capaz de a conduzir.
O Prof. Pinto Barbosa, a quem não devo favores especiais, pôde serenamente, ao abandonar a pasta das Finanças, dizer com propriedade «saio como entrei, de consciência inteiramente tranquila, com a consciência de apenas haver cumprido um dever - o meu dever - o melhor que pude e soube, com os elementos que Deus e os homens puseram à minha disposição». E ainda retratar-se com fidelidade dizendo ser «um homem simples, que sempre pôs o interesse nacional acima das ideologias, e que acredita no futuro da sua Pátria».
Sr. Presidente: As linhas mestras da proposta de lei em discussão são aquelas a que nos habituámos e estão na base de toda a notável obra levada a efeito pelo Regime. Sem essas linhas, sem o equilíbrio financeiro, que continua sendo preceito basilar da nossa Administração, nada seria possível do que se tem realizado a bem da comunidade nacional e muito menos fazer face aos encargos da luta que Portugal sustenta em prol da sua integridade territorial. A afirmar a necessidade e eficiência dessa política aí está o nosso escudo, que na sua robustez nos, faz lembrar as carvalheiras das serras do Gerês e da Cabreira - falo da minha terra, porque é sempre doce falar do que se ama -, que de pé, com sólidas raízes, desafiam a violência das tempestades e dos ventos.
Ela nos tem permitido que ao mesmo tempo possamos sustentar a guerra que somos forçados a manter em várias frentes e continuar a obra de desenvolvimento económico que nos permita vencer o atraso de séculos que sobre nós pesa.
O nosso esforço em África - nosso colossal esforço em África - não se tem limitado à defesa das nossas fronteiras, mas também a uma substancial ajuda da metrópole às províncias do ultramar, reconhecida pela Organização de Cooperação e Desenvolvimento Económico, organismo que tem feito sentir a sua acção com os mais benéficos resultados, levando os seus membros a uma útil cooperação no campo monetário, financeiro e fiscal, e na assistência técnica e financeira aos países e regiões em vias de desenvolvimento, como muito bem o acentuou o preâmbulo da proposta de lei que estamos discutindo.
Foi-me dado visitar em Paris a sede deste organismo e poder assim verificar o alto espírito de cooperação internacional que, a bem de uma humanidade mais feliz, ali existe e o entusiasmo com que ali se trabalha para atingir tão altos objectivos.

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A. O. C. D. E., como ia dizendo, reconheceu o auxilio que a metrópole tem dado ao desenvolvimento económico e social das nossas províncias de além-mar e que, em consequência desse auxílio, a expansão industrial nessas províncias se tem acentuado satisfatoriamente.
O comité especial que sobre o assunto se pronunciou reconheceu plenamente o esforço feito pelo nosso Governo, esforço que se tem tornado maior de ano para ano, com vista ao desenvolvimento das regiões menos favorecidas.
Só em 1964 o sector público contribuiu com perto de 2 milhões de contos para o desenvolvimento das províncias de além-mar, isto além dos avales que ofereceu a vários empreendimentos de empresas privadas. Que isto seja reconhecido pelos nossos irmãos do ultramar, que eles assim possam mais uma vez verificar que a metrópole, abrindo as suas veias, abrindo-as mais naquilo que lhe é mais caro, lhes envia não só o melhor da sua juventude, que lhes garante a ordem e a tranquilidade dos territórios, mas, dentro das possibilidades, meios que permitem pouco a pouco melhorar o viver das suas gentes.
O Mundo, se ainda tem uma réstea de senso e espírito de justiça, tem de considerar a nossa acção em terras de África e de julgar o nosso esforço digno de admiração e respeito.
A. O. C. D. E. foi ao ponto de reconhecer que esse esforço deve vir a ser considerado como exemplo. A verdade manda reconhecer que muito se tem, na verdade, feito. Podemo-nos alegrar com o constante aumento do produto nacional e com a subida do nível de vida do povo português que as estatísticas insofismavelmente demonstram, se é que são precisas estatísticas para demonstrar aquilo que todos os dias verificamos pela paisagem geográfica e humana que o País nos oferece.
Só o sector primário não deu nos últimos anos, dadas circunstâncias que os homens não podem controlar, a comparticipação devida a este crescimento de riqueza. Também, por isso, devemos pensar nele com mais carinho e auxiliá-lo capazmente.
Algumas medidas recentes dizem-nos que assim se começa a fazer, como sejam a promulgação do novo regime cerealífero e as disposições que se tomaram quanto às carnes e ao leite.
Pensa o Governo -numa louvável orientação- que, além das medidas de natureza estrutural que visam ao futuro, é necessário auxiliar a lavoura com providências que tenham frutos imediatos, dada a situação aflitiva da mesma.
Ninguém o pode deixar de reconhecer a esta Assembleia ao louvar essa orientação, que há que manter, pode e deve reivindicar para si grande parte do trabalho realizado para que governantes e governados se mentalizassem nesse sentido.
A instalação de novas indústrias de celulose vai com certeza desempenhar largo papel para que se efective a reconversão agrária que se preconiza e todos desejamos, mas que tem de ser feita gradual e inteligentemente e mais pelas circunstâncias aliciantes que forem surgindo do que pela imposição utópica das leis.
A lavoura não é rotineira, como em tempos se pensou e disse; a lavoura o que não tem é poder divino de fazer milagres, como o da multiplicação dos pães. Ponham-se à sua disposição -como incipientemente se começam a pôr- os meios adequados e ela os saberá utilizar. A comparticipação prevista para a lavoura nas novas indústrias de celulose, que bem se poderia estender às que já estão em laboração, em possíveis e necessários aumentos de capital, bem como igual comparticipação em outras indústrias que com ela tenham interferência, é política que merece largos aplausos. Será uma maneira de a lavoura -a grande sacrificada- estar em condições de vigiar e pugnar para que os lucros que legitimamente lhe pertencem lhe não sejam surripiados. Também nos regozijamos com o progresso da industrialização do País, e não podemos deixar de pedir a atenção do Governo para o alto papel que na nossa balança de pagamentos representa a nossa indústria têxtil, credora de especial carinho do Estado, merecedora de auxílio para o seu necessário apetrechamento, pois só assim poderá continuar a desempenhar o saliente papel que tem desempenhado nas nossas exportações.

O Sr. Pontífice de Sonsa: -Muito bem!

O Orador: - O preâmbulo da proposta de lei que está presente à discussão desta Assembleia refere-se de uma maneira especial à nova fábrica de aparelhos electrónicos em Braga. Devo neste aspecto, e acho oportuno fazê-lo, uma palavra de justiça ao antigo Secretário de Estado da Indústria Dr. Esteves da Fonseca, que, quebrando e ultrapassando redes espessas de arame farpado, teve sempre em conta a necessidade da colocação das unidades industriais tanto quanto possível nas regiões menos industrializadas, como é necessário que se continue a fazer, se na verdade queremos, como se advoga no documento que estamos a discutir, dar execução efectiva - quero dizer que o pensamento não fique amarrado ao papel- a programas regionais que visem a corrigir as disparidades de desenvolvimento e a estabelecer uma elevação do nível de vida por igual das populações.
O desenvolvimento turístico do País está a ter cada vez maior importância no rendimento nacional e a pesar beneficamente na balança de pagamentos.
2 142 000 contos em 1963; 3 480 000 contos em 1964, e 4 500 000 contos previstos para 1965, no bem elucidativo esclarecimento que ao País ofereceu o Sr. Subsecretário de Estado da Presidência, são números que bem justificam um esforço cada vez maior em prol da propaganda do País e do estabelecimento das necessárias estruturas, de modo a podermos continuar a manter a progressão registada no esclarecimento que o Sr. Dr. Paulo Rodrigues louvavelmente nos prestou. É de desejar que essas estruturas e essa propaganda sejam estendidas a todo o País, como se impõe, ...

O Sr. Pontífice de Sousa: - Muito bem!

O Orador: - ... e. aqui repetidamente, eu, acompanhando outros ilustres Deputados, por mais de uma vez advoguei. Este ano verificou-se uma maior afluência de turistas no Norte e temos de nos preparar para manter esse ritmo animador.
Sr. Presidente: Não me foi possível, por razões de ordem familiar - a afectividade à família tem para mim direitos muito especiais-, assistir ao acto de posse do Sr. Ministro das Finanças, mas li com o devido interesse as declarações que o ilustre homem público proferiu nesse momento. Permito-me recordar esta afirmação de S. Exa.:

Assentam as finanças públicas num sistema de prioridade, numa hierarquia de precedências. A política financeira pode condensar-se nestes postulados: primado da defesa, prosseguimento do desenvolvimento económico, forte compressão das despesas não reprodutivas.

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A proposta que discutimos afirma essa orientação; mas temo seriamente que, como até aqui, quanto às despesas não reprodutivas, fraqueje na execução, o que se propõe seja lei a cumprir.
Os investimentos que tenham em vista o desenvolvimento económico do País têm de ter prioridade absoluta a seguir aos da defesa nacional, que não discutimos sequer.
É necessário pulso de ferro para que assim seja. Sou, como todos sabem, não um técnico, mas um político, mas entendo que o interesse nacional exige neste capítulo uma segura e forte orientação técnica. Suprima-se tudo o que seja de carácter sumptuário, faça-se uma revisão de dotações, pois é necessário mais do que nunca uma política de poupança quanto a gastos supérfluos de modo a garantir a conveniente dotação de tudo que tenha rentabilidade imediata ou próxima. Nesse sentido deve ser igualmente orientado o crédito público e a banca privada.
Uma mão de ferro - eis o que as circunstâncias exigem.
Sr. Presidente: Apesar de tudo o que acabo de dizer, apesar do apoio que acabo de expressar às linhas gerais da proposta de lei de meios, que com sábia orientação continua a assegurar condição essencial ao progresso do País, hesito seriamente, e não sei se o farei, em lhe dar o meu voto. É que o Governo na proposta que estamos discutindo denuncia e diz ir encarar - como, aliás, já o fez ao apresentar à Assembleia Nacional análogo documento referente a 1965 - a mais que precária situação económica em que se encontram os servidores do Estado, não oferecendo entretanto garantias de que a situação deplorável em que os mesmos se encontram seja prontamente resolvida. É necessário que o seja, pois há um valor insuperável a que devemos respeito: é o homem, em toda a sua dimensão, com os seus direitos e deveres, e com as suas consequentes necessidades de ordem moral e material.
Quando se fala na revisão das condições económico-sociais dos servidores do Estado, não se podem apresentar a sério como resultado palpável dessa política providências e números que estão longe, muito longe, do mínimo dos mínimos, de uma situação aceitável e compatível com a dignidade que é devida à pessoa humana.
Falemos a linguagem da verdade, se é que queremos que o País nos acredite.
As medidas, já longinquamente anunciadas, e agora em vias de entrar em execução, no que diz respeito à assistência médica são mais que insuficientes e continuam a manter o funcionário em situação de atraso quanto ao que foi estabelecido para os beneficiários da previdência e deixaram de fora uma classe de funcionários esforçados e dignos de atenção: os funcionários dos corpos administrativos.
Quanto ao problema da habitação, os esquemas apresentados não têm o mais pequeno reflexo na vida da grande massa de funcionários, e é essa que é necessário ter em conta.
Sr. Presidente: Se a situação neste aspecto da vida nacional é portadora de uma flagrante injustiça- e o Estado é uma pessoa de bem- e põe em sérias dificuldades financeiras a vida de numerosas famílias, com os seus reflexos de toda a ordem, ela é também portadora do gérmen de um verdadeiro descalabro nacional. Os serviços públicos estão a atrofiar-se, pois a máquina administrativa não funciona como devia funcionar. A fuga do funcionalismo é já torrente que cada vez mais se acentua. Os mais moços e os mais capazes buscam novas actividades e os que - muitos por carolice - ficam têm de repartir o seu tempo por outras actividades e não há quem com moral possa reprimir o facto. O Governo não ignora a situação e tem forçosamente que, sem demora, tomar imediatas medidas para resolver o problema, nem que para isso tenha de lançar mão de meios fiscais, se não se lhe oferecer outro caminho.
Não estou fazendo demagogia, nem procurando aumentar influências ou buscar simpatias. Quando falo em fisco, sei que estou tocando em interesses poderosos, o que me leva a ter bem presente que na referência não encontro vantagens, mas o que sei é que é de toda a justiça que os encargos extraordinários que pesam sobre o País neste momento devem, por igual, caber a todos os Portugueses, e não só a uma classe.
Já no ano passado alguns Srs. Deputados se referiram ao problema. Eu próprio o tratei nesta Assembleia, acompanhando-os na sua justa inquietação. Queria destacar a intervenção que sobre o assunto aqui fez um dos mais ilustres membros desta Câmara, o Sr. Deputado Dr. Alberto Araújo.
Mas agora a situação atingiu o cume do intransponível, não pode manter-se por mais tempo. A vida encareceu, a própria proposta o refere; as empresas particulares subiram, até por força de acordos colectivos e despachos ministeriais, os vencimentos aos seus servidores. O contraste é mais flagrante. O desespero está a apoderar-se dos servidores do Estado, que não se vêem atendidos nas suas mais justas aspirações. Os reflexos da situação quanto ao futuro deste país são tremendos.
Em voz alta, quanto ao sector do ensino universitário, o denunciou há dias o magnífico reitor da Universidade de Lisboa, na presença do venerando Chefe do Estado. Denunciou o ilustre professor o que se está passando no meio universitário, denúncia que não chega a sê-lo, porque é situação que todos conhecem, mas a autoridade que falou bem diz da premência em se remediar o mal que atinge todos os sectores do ensino. O Deputado José Alberto de Carvalho já aqui, nesta tribuna, denunciou os seus efeitos quanto ao ensino primário, que, como poucos, conhece. Precisamos de educadores, mas temos de lhes criar ambiente necessário.
Não preguem o Evangelho a estômagos vazios, dizia-me um humilde funcionário em carta que me dirigiu durante a campanha eleitoral, ao mesmo tempo que afirmava a sua fé inquebrantável em Salazar, para quem pedia eu apelasse nesta Assembleia.
Há dias escutei atento as amarguradas queixas de um professor do ensino técnico, a quem prometi, em breve, tratar nesta Assembleia da situação de flagrante injustiça em que a sua classe se encontra. Já o fiz na última legislatura, sem qualquer resultado, e não deixarei de o voltar a fazer. O que se passa com o professorado passa-se com os técnicos indispensáveis ao desenvolvimento dos planos em execução.
O problema, quanto a mim, só tem uma faceta: pronto e imediato aumento substancial ao funcionalismo público, porventura escalonado no tempo, se isso se tornar necessário, mas de modo a dar confiança, garantia e estabilidade aos funcionários. Não creio na eficácia de remendos.
Reforma cuidadosa dos serviços públicos que assegure uma melhor eficiência dos mesmos ...

O Sr. Gonçalves Rapazote: -Muito bem!

O Orador: - ... e o aproveitamento do trabalho produzido, o que pode levar à supressão ou diminuição de alguns quadros e categorias.

Vozes: -Muito bem!

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O Orador: - Em tempos veio a público a nomeação de um grupo de trabalho que tinha como objectivo a reforma da administração pública que, julgo, visava este e outros objectivos, nomeadamente a mecanização de alguns serviços. Nada mais se soube desses trabalhos, nem da sua actividade. Vou requerer, em breve, me sejam fornecidos elementos sobre este assunto.
Julgo que estes problemas -o da reforma dos serviços públicos e o dos aumentos aos servidores do Estado - estão intimamente ligados. A situação, volto a repeti-lo, é aflitiva. A ela voltarei, com assiduidade, porque assim o prometi e é imperativo do meu sentimento cristão e ainda da minha ideologia política, que, como disse já aqui, coloca acima de tudo Deus, Pátria e Família. Ora, Deus está ofendido, porque está ofendida a justiça, e a justiça devida a quem nos serve é grave ofensa aos céus; a Pátria ameaçada, porque o está a ordem social e o seu futuro, dado o descalabro que se aproxima: a Família, mais do que ofendida e ameaçada, está desprezada por falta de um mínimo de subsistência económica sem o qual a sua própria moral não pode ser assegurada.
Sr. Presidente: A verdade acima de tudo! O povo desta Nação atingiu, por culpa -feliz culpa- do Regime, um grau de civismo que a ninguém é lícito esquecer. A justiça que é devida às diferentes classes não lhes pode ser negada, porque elas não podem compreender nem aceitar disparidades chocantes. Nem elas, nem nós, os que temos uma consciência límpida e receamos o julgamento do Senhor de todos os homens e de todas as coisas.
Disse.

Vozes: -Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Barros Duarte: - Sr. Presidente: Para V. Exa. as minhas primeiras palavras, de sinceras homenagens de respeito e admiração, pela profundidade e vastidão do saber, pelo cúmulo da experiência adquirida em varias décadas de actividade, na cátedra e na vida pública, pelo enorme prestígio da personalidade de mestre insigne de estadista e político clarividente que, de há muito, todos em V. Exa. sumamente respeitam.
E para VV. Exas., ilustres Deputados da Nação as minhas cordiais saudações, com os protestos de uma colaboração leal e amiga nos trabalhos que, nesta alta Assembleia, nos forem cometidos durante o presente mandato.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há cinco anos que o Mundo assiste, estupefacto, a um fenómeno aparentemente inexplicável. Um povo, por todos, considerado pequeno, fraco e pobre, mantém, só em campo, num esforço heróico e com uma persistência e capacidade gigantescas, duas frentes simultâneas, eriçadas de dificuldades e de perigos de vária ordem. Uma, frente de guerra, não de ambições expansionistas, mas de legítima defesa. Outra, frente de paz, traduzida numa política de intensa valorização da terra e gente portuguesas. Aquela, a frente de guerra, foi-nos imposta de fora. Esta, a frente de paz, surgiu espontânea de uma necessidade interior, com a mesma espontaneidade com que a árvore cresce, floresce e frutifica.
Na frente de guerra, entre outras armas, o inimigo, dentro e fora, procura, traiçoeiramente, substituir por uma ideologia puramente pragmática o conceito intrinsecamente valorativo e sagrado do heroísmo. Como se a História Pátria, a Antiguidade profana e até a bíblica não tivessem legado à posteridade preciosas e heróicas lições de virtudes militares, sintetizadas no grito magnânimo de um grande Macabeu: «Não manchemos com este crime a nossa glória». E o crime era se 800 heróis negassem luta ao inimigo, um exército de 22 000 homens!
E com a mesma coragem, o mesmo heroísmo, que se batem no ultramar os nossos valorosos soldados. Bem merecem a gratidão e o auxílio de todos os portugueses.
Mas, na luta que nos foi imposta, os que nos hostilizam ou que não querem compreender-nos nem mesmo hesitaram em lançar mão até de textos isolados de venerandas encíclicas dos papas, particularmente do saudoso Papa João XXIII, para nos recusarem direitos que a outros pronta e largamente reconhecem. Mas, na sua temeridade ou fingida ingenuidade, sabem que esses textos, assim arrancados da sua natural contextura e interpretados a uma luz diferente do seu espírito evangélico, se tornam, necessariamente, perigosamente angulosos. O mesmo, no fim de contas, se poderia, em sentido inverso, fazer também de qualquer texto marxista, mais ou menos adaptado ...
E tudo para quê? Para em substituição da tradicional e sempre válida ética de pátria, se apregoar uma pretensa ética de humanidade. E o paradoxo, foi levado tão longe que aqueles mesmos que, a coberto dessa ética de humanidade, pregam um governo mundial único são também os que reclamam, a murro e gritos, ou pedem a Deus o direito de autodeterminação a favor de qualquer pequeno aglomerado humano da mesma cor.
Afinal não parece que pátria e humanidade sejam termos antónimos ou conceitos antagónicos. Ou será que se acredita sinceramente que uma coisa terá, por força, que destruir a outra? Ou que numa nova organização mundial, varridas as pátrias (as pequenas, entenda-se), se eliminariam, infalivelmente, com leis sapientíssimas e com uma nova estrutura económica, social e política, a todos os respeitos a mais perfeita, se eliminariam, digo, todas as ambições dos mais fortes ou mais hábeis, todos os ódios nascidos de egoísmos contrariados ou de desigualdades inevitáveis, e que deixaria de haver na terra infelizes, doentes e pobres? ....
É bom parar um momento e pensar na sentença de Cristo: «Pobres, sempre os tereis convosco» ...
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O propósito destas reflexões é realçar dois aspectos muito importantes da proposta de lei de autorização das receitas e despesas para 1966, agora em discussão na sua generalidade. Ambos os aspectos se situam no ultramar e a ele se referem. Penso na defesa nacional e no auxílio económico ao ultramar nas suas diferentes modalidades, como reza o artigo 22.º do respectivo texto.
A defesa nacional, agora, por imperativo das circunstância anormais da política internacional em que involuntariamente nos vemos envolvidos, com preponderância de efectivos nos territórios ultramarinos, não é susceptível de debate, uma vez tida a certeza da sua prioridade absoluta. Pode, sim, essa característica ser avaliada como índice seguro da cobiça e consequentes ódios de outrem.
Para nós e para os que nos compreendem a nossa capacidade e tenacidade na luta pela conservação do ultramar começa a esclarecer um facto político. Já não é só aos Portugueses que interessa que Portugal continue nos seus territórios ultramarinos. Interessa também a outros, mesmo àqueles, de entre os ocidentais, que mais renitentes se mostravam contra a nossa permanência naqueles territórios e que, durante muito tempo, viveram a ingenuidade de pretenderem possível uma distinção efectiva entre Europa ocidental e Atlântico, como se não corresse os mesmos riscos toda a civilização ocidental, representada (...)

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(...) na raça branca, tanto aquela que habita a Europa como a que povoa as Américas.
Não tardará mesmo que o Africano, após amargas experiências de relações afro-asiáticas, venha finalmente a aperceber-se de que sempre lhe será mais vantajoso integrar-se num bloco euro-africano do que numa composição afro-asiática.
Ouve-se dizer que o perigo vem do Este ou do Oriente, e este, amarelo, cada vez mais hirsuto, mais eruptivo e, ao mesmo tempo, infinitamente transbordante, versátil e mimético, conseguindo assim, facilmente, infiltrar-se, instalar-se e minar.
Por outro lado, aponta-se como seu objectivo. O ocidente, potencializado no branco. Tudo o mais é periférico.
Para o estrangulamento da cidadela europeia é operação imprescindível a conquista do continente negro pelos inimigos do Ocidente. Sabe-se o que ali se está processando.
Contra o branco norte-americano pressente-se uma intenção do inimigo, fazer preceder a ameaça de uma forma situada nas Américas do Centro e do Sul, através de uma persistente e poderosa infiltração, facilitada por missões técnicas e diplomáticas de vasta composição e por uma relativamente densa colonização oriental, feita por comerciantes e trabalhadores rurais.
Resta uma posição ocidental de importância, mas isolada: o continente australiano, com cerca de 9 milhões de quilómetros quadrados de superfície e uma população de, aproximadamente, 11 milhões e meio de habitantes.
Contra esta posição o tigre oriental projectaria o saldo em três sucessivos trampolins: o Vietname, a Malásia e a Indonésia. Não é afinal senão o mesmo itinerário pacientemente estudado pelo alto comando nipónico antes da ultima guerra mundial e percorrido quase com pleno êxito nos anos de 1941 a 1945. Só que, então, era mais densa e mais efectiva a presença ocidental naquela zona.
Isto explica toda a pertinácia americana na campanha do Vietname, todos os empenhos britânicos na questão da Malásia e as graves apreensões do Governo Australiano, traduzidas no fomento de uma intensa corrente migratória da Europa rumo à Austrália, que, no final da segunda guerra mundial, contava pouco mais de 7 milhões de habitantes.
Quanto às Américas do Centro e do Sul, não teria escapado ao general De Gaulle o fenómeno do perigo oriental, a avaliar pelo interesse que lhe despertou a visita aos países latino-americanos. Sobretudo pensando no perigoso isolacionismo dos Estados Unidos em relação ao resto do bloco ocidental.
Assim, com uma sólida presença ocidental na Austrália como eixo de um gigantesco compasso Indico - Pacífico que tivesse as extremidades apoiadas em posições bem firmadas na costa ocidental de toda a América, com a guarda avançada das ilhas havaianas e, por outro lado, na costa de África ao sul do Sara, ter-se-ia porventura obtido uma cobertura triangular eficaz daquela zona de influência, presentemente sob a mancha do perigo.
Em face deste panorama político, pelo menos enquanto persistir o mesmo perigo comum, poderá ainda, no bloco ocidental, parecer a alguém proveitoso que se fragmente de ano para ano, o continente negro em soberanias liliputianas, despersonalizadas, e, por outro lado, varrer da África no sul do Sara a presença branca - do Português, do Sul-Africano ou do Rodesiano? Mormente se essa presença, como no caso de Portugal, é forte, sem constituir ameaça nem empecilho, nem agravo para ninguém principalmente para o Europeu ou o Americano e muito menos para o Africano? ...
E o Timor português?
Ali, não só Portugal, também a Indonésia e a Austrália preferem certamente uma política de vizinhança pacífica e amiga. A Indonésia, após a abolição do partido comunista e a eliminação ou o afastamento pelo exército dos elementos mais responsáveis do mesmo partido, e sobretudo avisada, como foi, do perigo de uma propaganda e manobra comunistas, de inspiração chinesa, que procuravam divertir e entreter as atenções e brios do Governo e do povo com uma política de poderio bélico e confrontações armadas para melhor minarem o país e o dominarem, após tudo isso, não parece poder preferir outra política à de uma boa vizinhança.
Quanto à Austrália, pelas inferências atrás deduzidas, não pode propender para outra política, pois seria quase suicida.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Da análise da situação política internacional, no que se relaciona connosco, parece emergir o ultramar português com proporções mais gigantescas, tanto em importância política como em interesse económico, não só ao nível nacional, mas ainda no campo internacional.
E importa atentar num fenómeno grave da história dos povos. Quero referir-me à possível ou talvez inevitável deslocação do grosso da população metropolitana para o ultramar africano, atenta a estreiteza dos limites geográficos de Portugal continental e o rumo da História.
Nem mesmo seria de todo ocioso ou atentatório do sentimento patriótico vislumbrar, a grande distância, uma possível transferência de importância política, da Europa para a África, embora dentro da unidade nacional e no movimento próprio dos grandes glaciares através das idades. É fenómeno que pode não ser desejado - e não o é -; pode não ser planeado, porque nos magoa e nos falta, por isso, coragem para o encarar, mas que pode vir a surgir pelo ímpeto natural das coisas ou dos acontecimentos. E quem sabe se daqui a 30, a 40 ou 50 anos? ...,
Não seria avisado, por tudo isto, anteciparmo-nos inteligentemente, corajosamente, ao fenómeno? E tudo sem golpear a unidade da Nação nem ofender a hierarquia histórico-geográfica da metrópole, veneranda de séculos.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Não se poderá negar que é em África que se ocultam as nossas mais ricas potencialidades económicas. Assim, parece bem que seria para o ultramar africano, especialmente Angola e Moçambique, que teria de derivar toda a emigração metropolitana que demanda o estrangeiro, como também todo o excedente demográfico dos restantes territórios da Nação.
Cumpria, a par disso, movimentar na mesma direcção maiores auxílios financeiros da Administração Central e ainda interessar investimentos privados, quer nacionais, quer estrangeiros.
Neste ponto, sem querer antecipar-me à discussão da matéria na sua especialidade e ressalvado o máximo respeito e admiração pelo imenso valor intrínseco ao notável documento que é a proposta de lei ora em debate, afigura-se-me pouco realçada, no capítulo que se lhe refere, a posição ultramarina, pois figura em último lugar, sob o artigo 22.º
Esta particularidade do articulado não deixou de ferir a atenção da Câmara Corporativa, que, em seu douto parecer, prefere um critério oposto ao da proposta de lei. Com efeito, lê-se naquele parecer:

Igualmente julga ser mais adequada a inserção deste artigo a seguir ao artigo 17.º

Este juízo mostra-se mais coerente com o plano geral de desenvolvimento do espaço português e de acelerada (...)

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DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 8 120

promoção económica e social das populações ultramarinas, com vista à sua plena integração na vida nacional portuguesa.
Contudo, penso que, pelas suas estreitas afinidades com os problemas de defesa e pela sua própria importância no conjunto nacional, deveria a matéria do artigo 22.º situar-se logo a seguir à rubrica da defesa nacional, embora, por outro lado. não deixe também de ter fortes analogias com o artigo 21.º, que, no entanto, tem uma incidência muito menos ampla.
Resta-me, Sr. Presidente e Srs. Deputados, falar da província que escolheu honrar-me com a sua confiança: o Timor português.
Os seus problemas económicos continuam a ser grandes, a sua economia mantém-se débil. Não quer isto dizer que Timor não tenha recebido da Administração Central importantes subsídios financeiros e que com estes se não tenham levado a efeito importantes obras e introduzido relevantes melhoramentos, como: o aeroporto internacional de Baucau, a ponte-cais de Díli, a electrificação da capital, abertura de estradas, construção de edifícios escolares e sanitários, irrigação de campos de arroz, aquisição de alfaias agrícolas mais aperfeiçoadas, etc. Só que nem sempre as importantes verbas orçamentadas são totalmente aproveitadas ou inteligentemente aplicadas. E isto sem culpa de quem governa, mas apenas pela rotina das coisas e hábitos inveterados das terras pequenas, onde o conceito de rentabilidade não é definido com a necessária precisão, mas relegado a preocupações denunciadamente domésticas e imediatas de alguns agentes da administração pública.
E é assim que se levantam clamores e se forma um coro anónimo de lamentações que definem toda a casa onde não há pão.
Que fazer pois?
Primeiro, rectificar critérios e comportamentos, métodos de trabalho e processos de administração. Depois, descobrir e aproveitar fontes de receita de maior garantia, criar condições propícias à rentabilidade.
Neste aspecto, penso que, em relação a Timor, indústria turística e comunicações constituem os dois problemas mais importantes da sua economia. O turismo: um verdadeiro filão de ouro, uma indústria moderna, rica mas complexa.
Timor possui condições extraordinárias climáticas, paisagísticas e outras características para uma intensa exploração turística. Darwin fica-lhe a cerca de 450 milhas a sul, distância coberta por um avião tipo Friendship em hora e meia de voo, pelo custo de 9 libras. O australiano que ali vive, numa população de possivelmente 25 000 habitantes, não tem para onde ir passar ou um fim de semana ou umas férias, depois de longos dias ou meses de trabalho a uma temperatura escaldante.
No próprio território do Norte, cuja capital é Darwin, nada há de aliciante. Uma digressão pelos outros estados australianos mais próximos? As distâncias e consequentes despesas são muito superiores às que se verificam em relação ao Timor português, onde há variedade de clima, de paisagem, de altitudes, de distracções à base da natureza. Timor é para o australiano do território do Norte a estância de férias e de turismo mais ao seu alcance, geográfica e economicamente. Já duas empresas australianas iniciaram os primeiros contactos com a Comissão de Informação e Turismo de Timor para uma exploração turística regular da ilha. Uma dessas empresas é a Australian England Air Charter Co. Pty, Ltd., cujo director afirma, em relatório referente ao assunto: «O Timor português tem imenso que oferecer ao turista australiano».
O quotidiano News Terrítory ainda é mais explícito: «Timor poderá ser, no futuro, o local de férias do Norte da Austrália». Todas estas informações foram extraídas do relatório do Plano de Fomento para 1965-1967, elaborado pelo presidente da Comissão de Informação e Turismo de Timor. Do mesmo relatório consta que a afluência de turistas australianos e ingleses a Timor se processa em ritmo crescente, sendo a despesa de cada turista de 3 a 4 contos por semana.
Por muito que tenha realizado a Comissão de Informação e Turismo, deve reconhecer-se, todavia, que muito há ainda a fazer e que as verbas orçamentadas (12 000 contos aproximadamente) são insuficientes. Por outro lado, verifica-se que não é possível incrementar a indústria turística em Timor só com os meios locais, nem se pode pensar que os subsídios da metrópole sejam inesgotáveis. Assim, haveria que interessar nesta indústria capital estrangeiro australiano, uma vez que outro capital privado, nacional ou estranho, se não encontra. Os capitais assim atraídos seriam aplicados na construção e exploração de hotéis e pensões e restaurantes e num serviço de camionagem para excursões turísticas.
Isto quanto ao turismo. O outro problema importante que prometi abordar é o das comunicações. Quero tratar apenas dos transportes aéreos e marítimos.
Timor tem as mesmas características da Nova Guiné. Uma e outra são ilhas muito acidentadas. Ora, o problema dos transportes na Nova Guiné começou a resolver-se, em certa escala, com aviões, e isto há mais de 30 anos. Não se poderia tentar o mesmo em Timor, onde o próprio natural já prefere o «crocodilo que voa», como ele designa o avião, a outro género de transporte? Não seria oportuno criar já um serviço autónomo de transportes aéreos internos?
Quanto às carreiras internacionais com a Austrália, desde que existem interesses comuns criados pelo turismo, não parece inaceitável que se dê a exploração delas a uma ou mais companhias daquele país. Para rotas internacionais de maior raia seria avisado concretizar conversações já entabuladas com as companhias Air France e Lufthansa. O ideal seria se os Transportes Aéreos Portugueses ampliassem as suas linhas até ao Oriente.
Quanto a transportes marítimos, o existente reduz-se a um navio-motor de 400 t, uma barcaça e uma lancha particulares, utilizados no serviço de cabotagem da província. As comunicações directas com a metrópole contam apenas com três navios nacionais por ano. Por essa razão, Timor vive na dependência quase absoluta de um ou dois navios por mês, de matrícula estrangeira, no que se refere a comunicações marítimas com o exterior.
Não seria inoportuna uma proposta no sentido da criação de uma carreira nacional triangular entre Díli, Macau e Beira, escalando portos intermediários estrangeiros e flectindo para a costa ocidental e do Norte da Austrália. O assunto é complexo e requer aturado estudo. Permita-se-me, no entanto, a sugestão a quem de direito.
No fim desta fastidiosa resenha de sugestões pergunto merecerá o povo de Timor todos estes empreendimentos para uma mais rápida promoção humana? A resposta podemos colhê-la da lealdade ensanguentada dos timorenses que morreram pela Pátria Portuguesa e da lealdade e amizade simples dos timorenses vivos, desse povo que não veio para o património lusíada à ponta da lança ou ao fio da espada, mas por amizade e pela força do baptismo.

Vozes: - Muito bem!

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O Orador: - Foi assim que um antigo régulo de Timor respondeu a um capitão-mor:

Lembre-se Vossa Senhoria de que esta terra não foi conquistada pela espada, mas pela água e sal.

Vozes: -Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vou encerrar a sessão.
Amanhã haverá duas sessões: uma de manhã, às 10 horas e 30 minutos, e outra de tarde, à hora regimental.
Está encerrada a sessão.

Eram 20 horas e 30 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
Aníbal Rodrigues Dias Correia.
Antão Santos da Cunha.
António Barbosa Abranches de Soveral.
António Calapez Gomes Garcia.
António Magro Borges de Araújo.
Artur Alves Moreira.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Henrique Ernesto Serra dos Santos Tenreiro.
Jaime Guerreiro Rua.
James Pinto Bull.
João Nuno Pimenta Serras e Silva Pereira.
José Coelho Jordão.
José Dias de Araújo Correia.
José dos Santos Bessa.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Manuel Henriques Nazaré.
Manuel Nunes Fernandes.
D. Maria Ester Guerne Garcia de Lemos.
D. Maria de Lourdes Filomena Figueiredo de Albuquerque.
Martinho Cândido Vaz Pires.
Rogério Noel Peres Claro.
Rui Pontífice de Sousa.
D. Sinclética Soares Santos Torres.
Tito de Castelo Branco Arantes.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Albano Carlos Pereira Dias de Magalhães.
Alberto Pacheco Jorge.
Álvaro Santa Rita Vaz.
António dos Santos Martins Lima.
Arlindo Gonçalves Soares.
Augusto César Cerqueira Gomes.
D. Custódia Lopes.
Elísio de Oliveira Alves Pimenta.
Gustavo Neto de Miranda.
Joaquim José Nunes de Oliveira.
José Guilherme Rato de Melo e Castro.
José Rocha Calhorda.
Manuel Amorim de Sousa Meneses.
Manuel João Correia.
Raul Satúrio Pires.
Tito Lívio Maria Feijóo.
Virgílio David Pereira e Cruz.

O REDACTOR - António Manuel Pereira.

IMPENSA NACIONAL DE LISBOA

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