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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIADO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE

DIÁRIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE

SEXTA-FEIRA, 3 DE OUTUBRO DE 1975 * NÚMERO 57

SESSÃO N.º 56, EM 2 DE OUTUBRO

Presidente: Ex.mo Sr. Olívio da Silva França

António Duarte Arnaut
Secretários: Ex.mos Srs. Carlos Alberto Coelho de Sousa
José Manuel Maia Nunes de Almeida

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberra a sessão às 15 horas e 40 minutos.

Antes da ordem do dia: - Foi aprovado o n.º 54 do Diário da Assembleia Constituinte.
Deu-se conta da expediente.
Foram lidos dois requerimentos, apresentados pelo Sr. Deputado Américo Duarte (UDP), solicitando informações sobre a repressão militar à luta dos deficientes das forças armadas e a viabilidade de serem pagas as indemnizações devidas; e acerca da invasão das estações de rádio e TV.
O Sr. Deputado Pires de Morais (CDS) apresentou um requerimento pedindo informações sobre a comercialização e produção do vinho do Porto.
O Sr. Deputado Costa Andrade (PPD) referiu-se à forma como o povo da cidade do Porto, respondendo à chamada do PPD, se manifestou na defesa do VI Governo Provisório e do Primeiro-Ministro Pinheiro de Azevedo e, apontando a posição do PCP na actual crise política, fez uma análise da situação.
O Sr. Deputado António Campos (PS) contestou as formas revolucionárias demagógicas, de importação, de que se reveste, por vezes, a acção revolucionária em Portugal, chamando a atenção para os problemas económicos que afligem a Nação, apontando os mais oprimidos deste pais, o campesinato, que se mantém na miséria enquanto outros sectores viram os seus rendimentos substancialmente aumentados.
O Sr. Deputado Álvaro Monteiro (PS) ocupou-se dos problemas graves que afectam, na hora presente, a vida nacional e referiu-se aos perigos de uma guerra civil e à necessidade de se evitar essa catástrofe. Terminou manifestando o seu apoio ao VI Governo Provisório.
O Sr. Deputado Teles Grilo (PS) referiu-se à situação da revolução em Portugal e apontou os problemas que afligem o povo português, designadamente o do distrito de Vila Real, fazendo um apelo para que mude, definitivamente, a situação dos desprezados naturais dessa região.
O Sr. Deputado Dias Lourenço (PCP) fez uma análise dos problemas políticos que determinaram a crise dos últimos dias, referiu-se às responsabilidades do PS e do PCP na resolução dos mesmos e teceu considerações acerca do significado do reaparecimento do Dr. Sá Carneiro na vida pública portuguesa.
Os Srs. Deputados José Luís Nunes (PS) e Barbosa de Melo (PPD) responderam à intervenção proferida pelo Sr. Deputado Dias Lourenço (PCP).
No decorrer do debate, usaram da palavra para invocar o Regimento os Srs. Deputados Coelho dos Santos (PPD), Vital Moreira (PCP), Freitas do Amaral (CDS) e Cunha Leal (PPD).
Tendo sido aprovado pela Assembleia um requerimento apresentado pelo Sr. Deputado Vital Moreira (PCP), o Sr. Deputado Dias Lourenço usou da palavra para encerrar o debate.
Entretanto, interveio o Sr. Deputado Júlio Calha (PS), que, invocando o direito de resposta, rebateu afirmações produzidas pelo Sr. Deputado Joaquim Velez (PCP) na sessão anterior.

Ordem do dia: - Foram lidas na Mesa declarações do Sr. Deputado João Lima (PS), informando ler de abandonar os trabalhos da Assembleia por motivo de ter sido nomeado chefe do Gabinete do Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros, e do Sr. Deputado Joaquim da Silva Lourenço (PPD), informando ter optado pelo manutenção do cargo de Secretário de Estado do Fomento Agrário.
Prosseguiu o debate na especialidade e votação do parecer da 3.ª Comissão, Direitos e Deveres Fundamentais - Título III (Direitos e Deveres Económicos, Sociais e Culturais).
Em relação ao artigo 15.º, já aprovado, formularam declarações de voto os Srs. Deputados José Niza (PS) e Martelo de Oliveira (PPD).
Foram discutidos e aprovados, era relação ao artigo 16.º, os n.ºs 1, 2, 3 e 4, com alterações, tendo usado da palavra os Srs. Deputados Miller Guerra (PS), Sousa Pereira (MDP/ CDE), Sá Machado (CDS), Vital Moreira (PCP), Mário Pinto (PPD), Avelino Gonçalves (PCP), Américo Duarte (UDP), Luís Catarino (MDP/CDE), José Luís Nunes (PS), Coelho dos Santos (PPD), Theodoro da Silva (PPD), Hilário Teixeira (PCP) e Barbosa de Melo (PPD).
Formularam declarações de voto os Srs. Deputados Sousa Pereira (MDP/CDE), Miller Guerra (PS), Vital Moreira

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(PCP), Casimiro Cobra (PPD), Mário Pinto (PPD), Américo Duarte (UDP), Luís Catarino (MDP/CDE) e José Luís Nunes (PS).
Os Srs. Deputados Sousa Pereira (MDP/CDE) e Casimiro Cobra (PPD) referiram-se às declarações de voto dos Srs. Deputados, respectivamente, Mário Pinto (PPD) e Sousa Pereira (MDP/CDE), tendo o Sr. Deputado José Luís Nunes (PS), a propósito, invocado o Regimento.
O Sr. Deputado José Luís Nunes (PS) requereu que os trabalhos da Assembleia prosseguissem, para além da hora regimental, por mais meia hora.
Sobre este assunto pronunciaram-se os Srs. Deputados Luís Catarino (MDP/CDE) e Vital Moreira (PCP).
O Sr. Deputado Ribeiro de Almeida (PPD) propôs que a meia hora requerida começasse a contar a partir da aprovação do requerimento.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 20 horas e 40 minutos.

O Sr. Secretário (António Arnaut): - Assume a presidência, enquanto não comparecer nenhum dos vice-presidentes, nos termos do nosso Regimento, o Deputado mais idoso. Não digo o mais velho, mas digo o mais idoso.
Creio que neste momento é nosso colega Olívio França.

Aplausos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada, Srs. Deputados.

Eram 15 horas e 20 minutos. Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

ADIM - MACAU

Diamantino de Oliveira Ferreira.

CDS

António Pedreira de Castro Norton de Matos.
Carlos Galvão de Melo.
Diogo Pinto de Freitas do Amaral.
Domingos José Barreto Cerqueira.
Emílio Leitão Paulo.
Francisco Luís de Sá Malheiro.
Manuel Januário Soares Ferreira-Rosa.
Manuel José Gonçalves Soares.
Manuel Raimundo Ferreira dos Santos Pires de Morais.
Maria José Paulo Sampaio.
Victor António Augusto Nunes Sá Machado.

PCP

Adriano Lopes da Fonseca.
António Dias Lourenço da Silva.
António Malaquias Abalada.
Carlos Alfredo de Brito.
Eugénio de Jesus Domingues.
Fernanda Peleja Patrício.
Fernando dos Santos Pais.
Francisco Miguel Duarte.
Herculano Henriques Cordeiro de Carvalho.
Hermenegilda Rosa Camolas Pacheco Pereira.
Hilário Manuel Marcelino Teixeira.
Jaime dos Santos Serra.
Joaquim Diogo Velez.
José Manuel da Costa Carreira Marques.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel Marques Figueiredo.
Manuel Mendes Nobre de Gusmão.
Vital Martins Moreira.

PPD

Abel Augusto de Almeida Carneiro.
Abílio de Freitas Lourenço.
Afonso de Sousa Freire Moura Guedes.
Alfredo Joaquim da Silva Morgado.
Amândio Anes de Azevedo.
Amélia Cavaleiro Monteiro de Andrade de Azevedo.
Antídio das Neves Costa.
António Joaquim da Silva Amado Leite de Castro.
António Júlio Correia Teixeira da Silva.
António Júlio Simões de Aguiar.
António Maria Lopes Ruano.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Roleira Marinho.
Armando António Correia.
Artur Morgado Ferreira dos Santos Silva.
Artur Videira Pinto da Cunha Leal.
Carlos Alberto Branco de Seiça Neves.
Carlos Alberto Coelho de Sousa.
Carlos Alberto da Mota Pinto.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Emanuel Nascimento dos Santos Rodrigues.
Fernando Alberto Matos Ribeiro da Silva.
Fernando Barbosa Gonçalves.
Fernando José Sequeira Roriz.
Germano da Silva Domingos.
João António Martelo de Oliveira.
João Manuel Ferreira.
Joaquim Coelho dos Santos.
Jorge Manuel Moura Loureiro de Miranda.
José António Camacho.
José António Nunes Furtado Fernandes.
José Augusto Seabra.
José Carlos Rodrigues.
José Casimiro Crespo dos Santos Cobra.
José Ferreira Júnior.
José Francisco Lopes.
José Gonçalves Sapinho.
José Manuel Burnay.
José Manuel da Costa Bettencourt.
José Theodoro de Jesus da Silva.
Manuel Coelho Moreira.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Joaquim Moreira Moutinho.
Maria Augusta da Silva Simões.
Maria Élia Mendes Brito Câmara.
Maria Helena da Costa Salema Roseta.
Nicolau Gregório de Freitas.
Nívea Adelaide Pereira e Cruz.
Nuno Aires Rodrigues dos Santos.
Olívio da Silva França.
Orlandino de Abreu Teixeíra Varejão.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Rúben José de Almeida Martins Raposo.
Victor Manuel Freire Boga.

PS

Adelino Teixeira de Carvalho.
Afonso do Carmo.
Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Augusto Martins da Silva Andrade.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Marques Antunes.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Alcides Strecht Monteiro.

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Alfredo Fernando de Carvalho.
Alfredo Pinto da Silva.
Álvaro Monteiro.
Álvaro Neto Órfão.
Amarino Peralta 5abino.
Amílcar de Pinho.
António Alberto Correia Mota Prego Faria.
António Cândido Miranda Macedo.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Duarte Arnaut.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Gomes Teles Grilo.
António José Sanches Esteves.
António José de Sousa Pereira.
António Mário Diogo Teles.
António Riço Calado.
Armando Assunção Soares.
Artur Manuel de Carraca da Costa Pina.
Aquilino Ribeiro Machado.
Bento Elísio de Azevedo.
Carlos Alberto Leitão Marques.
Carlos Cardoso Lage.
Domingos do Carmo Pires Pereira.
Emídio Pedro Águedo Serrano.
Etelvina Lopes de Almeida.
Eurico Faustino Correia.
Eurico Manuel das Neves Henriques Mendes.
Eurico Telmo de Campos.
Fernando Alves Tomé dos Santos.
Francisco Carlos Ferreira.
Francisco Igrejas Caeiro.
Francisco Xavier Sampaio Tinoco de Faria.
Gualter Viriato Nunes Basílio.
Isaías Caetano Nora.
Jaime José Matos da Gama.
João Pedro Miller de Lemos Guerra.
João do Rosário Sarrento Henriques.
Joaquim Antero Romero Magalhães.
Joaquim da Costa Pinto.
Joaquim Laranjeira Pendrelico.
José Alfredo Pimenta Sousa Monteiro.
José Augusto Rosa Courinha.
José Fernando Silva Lopes.
José Luís de Amaral Nunes.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Vassalo de Oliveira.
José Maria Parente Mendes Godinho.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Júlio Pereira dos Reis.
Ladislau Teles Botas.
Laura da Conceição Barraché Cardoso.
Luís Abílio da Conceição Cacito.
Luís Geordano dos Santos Covas.
Luís Maria Kalidás Costa Barreto.
Luís Patrício Rosado Gonçalves.
Manuel Ferreira Monteiro.
Manuel Ferreira dos Santos Pato.
Manuel Francisco da Costa.
Manuel João Vieira.
Manuel Joaquim de Paiva Pereira Pires.
Manuel da Mata de Cáceres.
Manuel Pereira Dias.
Manuel de Sousa Ramo.
Maria da Assunção Viegas Vitorino.
Maria Emília de Melo Moreira da Silva.
Maria Fernanda Salgueiro Seita Paulo.
Maria Helena Carvalho dos Santos Oliveira Lopes.
Maria Teresa do Vale de Matos Madeira Vidigal.
Mário António da Mota Mesquita.
Mário de Castro Pina Correia.
Pedro Manuel Natal da Luz.
Raquel Júdice de Oliveira Howell Franco.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Rosa Maria Antunes Pereira Rainho.
Rui António Ferreira da Cunha.
Rui Maria Malheiro de Távora de Castro Feijó.
Sophia de Mello Breyner Andresen de Sousa Tavares.
Vítor Manuel Brás.

O Sr. Presidente: - Estão presente 171 Deputados, pelo que declaro aberta a sessão, mas antes disso eu queria dizer duas palavras a esta Assembleia Constituinte.
As minhas palavras vão ser muito simples. Em razão da idade, o triste jus da idade, é que me encontro nesta cadeira, apesar dela, apesar dos meus 74 anos, eles não puderam com certeza suprir a falta de experiência do exercício deste lugar. Conto com a vossa indulgência e conto também com a ajuda dos ilustres Secretários que aqui estão ao meu lado.
A plausos.
Eram 15 horas e 40 minutos.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Está em aprovação o n.º 54 do Diário da Constituinte.

Pausa

Se ninguém tem nade a declarar, está aprovado.
Também se aceitam rectificações ao n.º 55 do Diário da Constituinte.
Pausa.
Vai proceder-se à leitura do

Expediente

O Sr. Secretário (António Arnaut): - A Comissão Administrativa da Câmara Municipal de Arganil envia-nos o seguinte ofício:
Porque o concelho de Arganil foi criminosamente atingido no presente estio com pavorosos incêndios nas florestas, e dado que toda a madeira atingida, a não ser retirada, no prazo máximo de três meses, ficará inutilizada, está esta Comissão Administrativa a envidar todos os esforços no sentido de o Governo da Nação tomar as providências que se impõem. Rogo a V. Ex.a, cota todo o empenho, o obséquio de se dignar advogar tão justa causa junto de quem de direito.
O problema é gravíssimo e, segundo creio, atinge grandes áreas do País, principalmente no Centro e Norte.
A economia concelhia, que assenta basicamente na floresta, sofrerá rude golpe se as madeiras queimadas não forem comercializadas.
O desemprego, agora agravado com a chegada dos retornados das ex-colónias, poderia ser atenuado se se resolvesse a compra de madeiras.
Remeto a V. Ex.ª cópias de dois documentos em que o grave problema é tratado, bem como o caso de Cepos.

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Pela atenção que se dignar dispensar, apresento a V. Ex.ª os meus antecipados agradecimentos.
Com os melhores cumprimentos.
O Presidente da Comissão Administrativa, Fernando Vale.

Os dois documentos referidos são a acta de uma reunião efectuada na Câmara de Arganil em 10 de Setembro passado, com a presença de várias entidades, juntas de freguesia e comissões de trabalhadores, para a análise do problema, e uma exposição enviada ao Sr. Primeiro-Ministro, pela Comissão Administrativa daquela Câmara, na qual se refere a origem criminosa da maior parte dos incêndios. De facto, foram vistos homens e uma avioneta a atear fogos e encontrados dois pára-quedas equipados com bombas incendiárias. Pede-se, por isso, um rigoroso inquérito e informa-se que só no concelho de Arganil se verificaram as seguintes perdas: área queimada, 1200 ha; árvores destruídas, 1 455 000; bicas de resina perdidas, 300 000; madeira queimada, 500 000 st. A exposição conclui por solicitar do Governo as ajudas e providências adequadas para melhorar a dramática situação das populações afectadas, e designadamente a reconstrução das casas queimadas, a arborização nacional das áreas atingidas, a construção de sedes de abastecimento de água e saneamento, o escoamento da madeira queimada antes da próxima época das chuvas.
O Sr. Jaime Oliveira, da Austrália, envia-nos uma carta em inglês, que eu não tive tempo de traduzir e que não posso referir porque não existem serviços de tradução.
Telegrama, do seguinte teor:

Pessoal administrativo Escola Industrial Fonseca Benevides discorda e considera discriminação condições exigidas para concurso aberto para preenchimento vagas abertas na Escola.

A Comissão de Moradores do Penedo e Eirós, Valadares, Vila Nova de Gaia, envia-nos o texto de uma moção aprovada em plenário, do seguinte teor:

Considerando que a luta do povo espanhol é a justa luta e que o Governo fascista daquele país acaba de assassinar cinco dos seus mais valentes filhos, exigem que o Governo Português denuncie o Pacto Ibérico e corte relações diplomáticas com o regime de Franco, assassino. Abaixo o fascismo, morte aos opressores do povo.
Viva a luta do povo espanhol pela sua liberdade.

A Sociedade Aristen, Pereira & Filhos, L.da, de Guimarães, que explora a indústria de aluguer de automóveis ligeiros, insurge-se contra a ocupação das suas instalações por parte dos trabalhadores e diz que o que eles pretendem é locupletar-se à custa do património alheio. Pede providências, visto que, segundo foi afirmado várias vezes, o Governo deverá ajudar as pequenas e médias empresas.
O Sr. Fernando Almeida de Azevedo envia-nos a seguinte carta:

Junto envio a V. Ex.ª uma fotocópia de um requerimento-exposição dos terceiros-oficiais em serviço na Escola Industrial e Comercial de Oliveira de Azeméis dirigido a S. Ex.ª o Ministro da Educação e Investigação Científica, em que solicitam medidas de reivindicações e apelam para que seja apresentado nessa Assembleia Constituinte e que, se possível, algum dos Srs. Deputados nos ajude nas nossas aspirações. A fotocópia referida refere-se ao Decreto-Lei n.º 459/75, respeitante ao pessoal administrativo.

A Adega Cooperativa de Azoeira envia-nos a cópia de uma moção apresentada relativamente ao Decreto-Lei n.º 390/75, pedindo a sua imediata suspensão por outra lei, desde que sejam ouvidos expressamente os representantes dos organismos interessados.
Os trabalhadores da Sociedade Anónima Monteiro Ribas, do Porto, alarmados pelo risco de vida que correm os prisioneiros portugueses em Timor, comunicam ter enviado à Comissão Nacional de Descolonização a lista das assinaturas dos trabalhadores presentes na empresa e solicitam a intercedência no sentido de que os prisioneiros sejam imediatamente libertados. Está em anexo a fotocópia dessa lista, que contém 425 assinaturas.
O Sr. João Luís dos Santos envia-nos uma carta sobre os acontecimentos que se estão verificando, dizendo que eles estão a ultrapassar tudo o que ele e outros imaginavam, estando o País a cair numa completa anarquia.
Um correspondente, cuja assinatura não consigo ler, declara que tem havido desvios do Programa do Movimento das Forças Armadas e apela para os legítimos representantes do povo, os Deputados a essa Assembleia Constituinte, para que se batam pelo integral cumprimento, quer na letra, quer no espírito.
É tudo, Srs. Deputados.

O Sr. Presidente: - Vão ser lidos dois requerimentos.

O Sr. Secretário (Maia Nunes de Almeida): - Os dois requerimentos são do Sr. Deputado da UDP, Américo dos Reis Duarte, do seguinte teor:

Requerimento

1 - Considerando a justa luta que os deficientes das forças armadas têm vindo a travar pela sua integração na sociedade e pelo direito ao trabalho como qualquer trabalhador neste país;
2 - Considerando que os deficientes das forças armadas foram vítimas da guerra assassina contra os povos das colónias, para onde muitos filhos do povo português foram obrigados pelos fascistas a ir combater;
3 - Considerando que os deficientes das forças armadas há mais de um ano vêm a lutar sem que qualquer Governo tenha resolvido a sua situação;
4 - Considerando que uma das razões que os Governos têm apresentado é o facto de não haver dinheiro;
5 - Considerando que após o protesto em Lisboa de milhares e milhares de trabalhadores na noite de 26 para 27 contra o assassinato de cinco antifascistas espanhóis o Governo Português logo se prestou servilmente a indemnizar o Governo fascista Espanhol:

Requeiro que o Governo me informe:

a) Quem deu ordem ao reaccionário do Jaime Neves ...

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Vozes: - Não apoiado!

Assobios.

O Sr. Secretário:

... para mandar os comandos carregarem sobre os deficientes das forças armadas com chaimites, quando as únicas armas dos deficientes eram as suas cadeiras de rodas, as suas muletas e as suas pernas ou braços artificiais;
b) Por que é que há dinheiro para indemnizar o Governo fascista de Franco, quando esse Governo assassino é o único responsável pelo que acontece às suas embaixadas em toda a Europa, e não há dinheiro para os deficientes das forças armadas.

O Deputado da UDP, Américo dos Reis Duarte.

Requerimento

1 - Considerando que a liberdade de informação é um direito do povo trabalhador que o fascismo durante anos e anos retirou ao povo;
2 - Considerando que a seguir ao 25 de Abril os trabalhadores sempre têm lutado contra as tentativas reaccionárias de alguns partidos de controlarem certos órgãos de informação e as tentativas dos vários Governos Provisórios de impedirem a liberdade de informação, como sejam a comissão ad-hoc, a lei Correia Jesuíno, a última lei do Conselho da Revolução proibindo a informação sobre as lutas dos soldados e marinheiros;
3 - Considerando que a liberdade de informação é um direito inalienável de todo o povo trabalhador e que só deve ser retirado aos fascistas, reaccionários e aos inimigos do povo;
4 - Considerando as recentes medidas do VI Governo Provisório em mandar invadir as rádios e a televisão por forças militares;
5 - Considerando que o Governo e o reaccionário Jaime Neves desligaram as antenas dos emissores da Rádio Renascença;
6 - Considerando que o Governo quer começar a acabar com todas as liberdades já alcançadas pelo povo trabalhador, querendo já impor uma censura aos órgãos de informação sobre os comunicados das organizações e partidos revolucionários:

Requeiro que o Governo esclareça:

a) Se as invasões das rádios e da TV e a censura faziam parte dos acordos sobre os órgãos de informação assinados por Mário Soares e Álvaro Cunhal;
b) Se o Governo pretende, para instaurar a sua autoridade contra a das massas populares, cortar todas as liberdades conquistadas pelo povo português, recorrendo à repressão, como já o fez agora com a ocupação das rádios.

O Deputado da União Democrática Popular, Américo dos Reis Duarte.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Pires de Morais para a leitura de um requerimento.

O Sr. Pires de Morais (CDS):

Requerimento

Considerando que acaba de vir a lume o comunicado da vindima de 1975, para o vinho do Porto, instrumento que regulamenta a forma como se há-de produzir aquele famoso produto da nossa região duriense, no aspecto quantitativo e, até, qualitativo, se atendermos que ali se refere quais os mostos beneficiáveis, com limite máximo de graduação e as quantidades de aguardentes vínicas que se deverão adicionar para beneficiar esses mesmos mostos;
Considerando que lavra a maior indignação e, até, espírito de revolta entre os produtores contra tão insólito documento;
Considerando que por ele é imposto aos lavradores do Douro a aquisição de aguardentes vínicas por preços especulativos que seriam uma vergonha mesmo para uma política de capitalismo monopolista;
Considerando que o comunicado em questão traz o princípio dirigista, de outros tempos, de fixar os quantitativos de mosto a beneficiar;
Considerando que é criado um tipo de aguardente que só os produtores do Douro terão de engolir, aos preços de 21 400$ e de 26 400$;
Considerando que essa aguardente, no mercado livre, ronda os preços de 9000$ e 10 000$ a pipa;
Considerando que tais medidas só parecem encontrar uma justificação se se pretender colocar aos ombros dos lavradores do Douro a pesada, injusta e incomportável missão de salvadores da vinicultura de outras regiões nacionais;
Considerando que todo este artificialismo não fará mais que criar um ambiente de tensão e de injustiça, com gravíssimas repercussões na economia da região;
Considerando que para obter os preços médios do vinho do Porto, atendendo à subida do preço das aguardentes, se baixou o preço do mosto;
Considerando que tal facto só prejudicou a região do Douro, pois os mostos são seus e as aguardentes poderão ser provenientes de outras regiões;
Considerando que ainda foi criado um imposto que varia entre 5 % a 15 % sobre os preços de venda;
Considerando que, além de tudo, ainda o produtor é sobrecarregado com o imposto sobre a indústria agrícola;
Requeiro ao Governo que, pelo Ministério respectivo, me informe com a urgência que o caso requer:

1 - Por que motivo não foi destilado o vinho que foi exportado para a Rússia a preços líquidos duas ou três vezes menores que os correntes - o que significa uma aquisição de divisas ou poder de compra no estrangeiro duas ou três vezes menor -, fornecendo a aguardente vínica resultante, aos produtores do Douro, a preços entre duas e três vezes menores daqueles que são obrigados a pagar?

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2 - Qual a razão de ser exigido aos vinicultores o pagamento da aguardente por preços tão elevados?
3 - Por que não é autorizado o benefício de todo o vinho da região demarcada que seja de qualidade?
4 - Por que terão de ser os produtores do Douro a suportar, totalmente, o peso do encarecimento artificial da aguardente vínica;
5 - Por que se não ouve, no local, a opinião dos produtores?
6 - Por que se prejudica, tão flagrantemente, uma região tão necessitada de ajuda técnica, económica e financeira?
7 - Por que se agravou a situação com o imposto de 5 % a 15 % referido?
8 - Que estudos ou planos tem o Governo para a região do Douro?
9 - Que medidas vai tomar o Governo para resolver, prontamente, este momentoso e grave problema?

Obrigado.

O Sr. Presidente: - O período de antes da ordem do dia termina às 16 horas e 40 minutos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PPD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados:
1- O povo do Porto veio ontem mais uma vez, numa das mais impressionantes manifestações da sua história, testemunhar a sua fé na liberdade e sua determinação de lutar ao lado de um Governo democrático. Democrático pelas provas que o inspiraram, pelo programa que assumiu e pelos patriotas que o integram. Ao fazê-lo, e desta vez respondendo à chamada do PPD, a cidade do Porto honrou os seus pergaminhos e a sua história. Diz a tradição que o maior dos filósofos escreveu no frontispício da sua escola: sejam benvindos todos os que são amigos da sabedoria. Bem podemos nós dizer que o Porto escreveu às suas portas: sejam benvindos todos os que são amigos da liberdade e democracia. Bem podemos nós dizer que é seguramente paladino da democracia e da liberdade todo aquele a quem o Porto abre as suas portas. Como ontem a Humberto Delgado. Como hoje a Pinheiro de Azevedo.
Por isso, Sr. Almirante, já chamado de sem medo, o PPD traz-lhe da cidade invicta um testemunho de adesão e solidariedade. As preocupações do seu Governo de ordem, tranquilidade, disciplina democrática, recuperação da economia para que o socialismo desejado não seja a igualdade na miséria, para que as saudades das cadeias de ontem ou das cebolas do Egipto não envenenem a alma de um povo em revolução, essas preocupações, que são companheiras das luras de dedicação de V. Ex.ª, são seguramente as preocupações da cidade do Porto.
O Porto veio para a rua: a saudar por um lado na pessoa do governador civil o exemplo da resistência antifascista de ontem, de dignidade e coragem democrática de hoje. Confessamos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que é com mágoa e desencanto que recordamos palavras ontem aqui proferidas e segundo as quais o Dr. Cal Brandão teria esgotado a sua capacidade revolucionária. (Aplausos.) Cremos bem que tais palavras só são possíveis para quem pensa que o futuro desta Revolução não deve estar nas mãos de democratas da mais fina têmpera.
A saudar por outro na pessoa do Comandante Militar as Forças Armadas de 25 de Abril.
Ontem à voz do PPD, anteontem à voz do PS. Duas vozes diferentes, sem dúvida, de duas mensagens diferentes, a apontar caminhos diferentes. Mas que se encontram no desfiladeiro desta crise que ambos têm que transpor. Duas vozes que serão porventura três se esta noite, amanhã à noite porventura, a outra voz do VI Governo passar também pelo Porto a dar vivas ao VI Governo. Que é também o seu.
Em Lisboa foi diferente. Tentou-se inscrever na mesma partitura, em pautas naturalmente diferentes, essas três componentes, mas três vozes que são as do VI Governo Provisório. A convite do PS. Veio quem quis. Não veio o PCP, que talvez prepare a sua manifestação de apoio ao VI Governo. Pena foi que essa manifestação de Lisboa, que foi grande, tenha aprendido o que de triste teve a do 1.º de Maio. E sem razão. Ninguém se quer confundir com ninguém. Nem é o PPD que reivindica o espaço ideológico ou político que outros ocupam. Assumimo-nos tais como somos: sociais-democratas.

Uma voz: - Muito bem!

O Orador: - Uma imagem que se tem tentado deformar, mas que é a nossa. Dentro deste país e fora dele. Nas tradições históricas da ideologia social-democrata que bebe no revisionismo marxista de Bernstein a sua inspiração primeira. E que se foi enriquecendo à luz de uma realidade sempre rica, sempre criadora, que não cabe nas páginas de nenhuma bíblia.

Vozes: - Muito bem!

Aplausos.

O Orador: 3 - Entretanto que fez o PCP? Prepara, sem dúvida, formas inequívocas de apoio ao VI Governo Provisório. Simultaneamente, porém, vai distribuindo estranhos e fugazes comunicados. Tem um por título, ontem distribuído: «Portugueses! Portuguesas!» Um comunicado curioso, onde existem incisos como este: «cooperação do povo com os militares!» e «unidade, acção comum, determinação e confiança de todos aqueles que querem defender as liberdades e as conquistas da Revolução».
Cooperação do povo com os militares, reza o comunicado. Com que militares? É sem ironia que nos arriscamos a aventar que o PCP aponta naturalmente para aqueles que se integram na hierarquia encimada pela Presidência da República e pelo Governo - VI - o único em que o PCP participa, o único que reconhece.

Unidade, acção comum, recomenda o comunicado do PCP.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Com os revolucionários, não com a reacção.

O Orador: - E recomenda bem. Pena é que haja mal, ao apoiar separadamente o Governo.
4 - Nesse comunicado lê-se também: «O PS e o PPD devem explicar-se imediata e publicamente.»

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Subjacente a estas palavras recorta-se nítida a imagem a que o PCP nos tem habituado: tutor mau que chama à disciplina; professor de férula na mão; dono da revolução e da contra-revolução.

Burburinho na sala.

Vozes: - Abaixo a reacção!

O Sr. Presidente: - Peço para não interromperem o orador. Haja mais calma na discussão, como verdadeiros democratas que são.

Vozes: - Eles não são!

O Orador: - Ou melhor devo dar etiquetas da revolução e da contra-revolução. Dono que tem um pouco de menino mimado que quando não jogam com ele ameaça logo chamar contra-revolucionário. Ou das direitas. É um papel - este de estigmatizador - que o PCP assume com certo fascínio. Fascínio a que nem o seu celebrado secretário-geral se escapa. Não ouvimos há dias dizer Álvaro Cunhal na Cometna que o PPD virou 180 % à direita? Para o colocar agora onde? Na extrema-direita? Então antes estava na extrema-esquerda, o que é uma ofensa à extrema-esquerda de que nós não temos culpa.

Risos.

Nem a extrema-esquerda deve estranhar, pois também com ela brinca o secretário do PCP, chamando-lhe de extrema-direita. Enfim, nós somos o que somos...

Vozes: - Fascistas!

O Orador: - ... fazemos o que fazemos, independentemente do lugar e da marca que o PCP nos seus divertimentos nos aplique.
Explicação imediata e pública. A quem? ao PCP que nos habituou à coerência e à transferência de hoje se aliar a quem ontem chamou agentes da CIA e a quem amanhã enjeita envergonhado? Ao PCP que coseu com linhas de anedota e humor o seu comportamento quanto ao período de antes da ordem do dia desta Assembleia, cuja dissolução pediu?

Uma voz: - É falso!

Outra voz: - É verdade!

Burburinho na Sala.

O Orador: - Ao PCP de religioso ciúme perante o MFA, enquanto ia dizendo a Falacci que era amor a prazo, enquanto precisassem apenas dele?
Explicação imediata e pública. Explicar o quê? Que apoiamos incondicionalmente um Governo cujo programa exprime um acordo em que participámos e em cujo elenco participamos? Este PCP estranho, com um silêncio estranho em relação a um Governo que é também seu, convence-se narcisicamente que é possível passar de acusado a acusador. Pois, salvo melhor opinião, o que importa é que o PCP explique porque não apoia.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Explicar que fazemos comícios, manifestações? É porque não conspiramos e dizemos na praça pública o que diríamos a Oriana Falacci.

Risos.

Ou será que o PCP, assume o papel de estéril a quem dói que os outros tenham filhos, que os outros entram sem camionetas nem tractores na Praça Humberto Delgado?

Vozes: - Muito bem!

Burburinho na Sala.

O Sr. Presidente: - Peço aos Srs. Deputados para não interromperem o orador.

Prosseguem as manifestações.

Vozes: - São os trabalhadores ...

O Orador: - São 100 mil latifundiários ...
Que apoiamos as forças armadas? Estas forças armadas são as do Movimento do 25 de Abril. O seu programa aí está ainda. Se alguma diferença existe é que foram apartados do MFA os elementos de progressismo mais duvidoso. Oxalá que não tenha sido esta circunstância que tenha provocado a mudança de máscara do PCP de adulador incontido a astigmatizador etiquetando - por exigências de divertimento - de direita quem antes era de esquerda, de reaccionário quem antes era progressista, de contra-revolucionário quem antes se considerava o motor da Revolução?

Vozes: - Muito bem!

Aplausos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Campos.

O Sr. António Campos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É decisivo para o êxito da Revolução criar uma certa estabilização e ganhar a batalha da economia.
Se a demagogia produzida por esta Revolução tivesse a contrapartida nos centros de produção, com a sede de justiça social em que vivemos, tínhamos já construído o socialismo.
A realidade é outra bem diferente.
Da análise do país real passou-se à delinquência intelectual.
Do poder criativo passou-se à manipulação.
À noção do caminho e do tempo foi criado o imperativo «já».
Para se parecer mais revolucionário é fundamental ajeitar e fazer coincidir a nossa análise com um naco de Marx ou Lenine ou de qualquer outro revolucionário importado.
Cada um procura ser o mentor de cada um de nós.
Ah, mas para mim, o grande mentor desta Revolução continua escondido nas prateleiras das livrarias.
Cinquenta anos de frustrações, de opressão e de recalcamentos, uma guerra de catorze anos, onde a primeira preparação de cada jovem era aprender a arte

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de matar, é o preço de uma certa alienação a que o cidadão importado Freud poderia dar uma ajuda preciosa.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Analisar declarações de alguns homens em postos-chaves da Revolução é com certeza um manancial riquíssimo para o nosso processo, ver-se-ia até que ponto fala neles o ressentimento e a frustração.
Em nome do povo vai-se desrespeitando permanentemente o povo.
Em nome dos oprimidos, em vez de os libertarem, têm criado ou mantido sistemas de opressão.
Como o rigor de António Sérgio é esquecido.
Como o apelo de Miguel Torga a um socialismo de raízes portuguesas não é escutado.
Tudo se procura devorar, cultura popular, intelectos, economia, sem conseguirmos acertar o passo na criatividade do processo.
Demagogia, mais demagogia, vamos prometendo o paraíso, atirando as pessoas cada vez mais para a miséria.
A máquina de Estado parada e o socialismo só pode avançar com uma planificação económica.
O pequeno e médio investidor amedrontado e o produto nacional bruto a diminuir.
As nacionalizações dos monopólios feitas para as colocar ao serviço do povo, e o povo, por falta de não ter havido planificação, a ter de produzir milhões de contos para enterrar nos monopólios.
Os mais oprimidos deste país que são o pequeno campesinato, mantêm-se na miséria, enquanto determinados sectores de trabalhadores aumentaram já os seus vencimentos 200 % ou 300 %.

Vozes: - Muito bem!

Aplausos.

O Orador: - Reivindicações e mais reivindicações, por, vezes irrealistas, enquanto esse pequeno campesinato de trabalhadores rurais e pequenos cultivadores se mantêm sem reforma, sem assistência médica nem boa nem má, sem habitação, sem estradas, sem transportes, sem horário de trabalho, enfim, na pobreza mais degradante a que um ser humano pode ser sujeito.

Vozes: - Muito bem! Apoiado!

Aplausos.

O Orador: - Na sociedade da anarquia ocupam-se casas, não para os mais necessitados, mas sim para os mais oportunistas e aventureiristas.

Vozes: - Muito bem!

Aplausos.

O Orador: - As revoluções não se ganham na aventura.
O socialismo não se constrói por decreto e na irresponsabilidade e duplicidade.
Os aliados da direita não são só o capitalismo internacional, a CIA ou os capitalistas portugueses.
Os aliados do Sr. Spínola não são só o Sr. Alpoim Calvão e á sua organização.
São sim também as organizações que, pela sua actuação e prática política, vão contra a vontade da maioria do povo, ferindo-o nas suas mais legítimas aspirações e sentimentos.
São ainda as organizações que, no seu ódio recalcado, tudo destroem, sem nada construírem.
São também aqueles que, em nome da luta de classes, não querem distinguir o possível do impossível, e na sua aventura vão espalhando mais desemprego, mais ódio, mais violência.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Temos uma sociedade a debater-se com problemas de sobrevivência terríveis.
300 000 desempregados, 500 000 retornados, consumimos o dobro do que produzimos, quem não percebe que só uma unidade muito grande à volta da Revolução a pode salvar?
Quem não percebe, ou com que intuito o esquece, de que só um Governo de autoridade democrática, bem apoiado pela legalidade revolucionária, dos que a conquistaram na manhã de 25 de Abril, permitirá a este povo a construção de uma sociedade livre, democrática e socialista?

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Seria curioso fazer um levantamento, e saber o que pensavam na manhã de 25 de Abril os capitães Fernandes e os almirantes Coutinhos e companhia limitada ...

Uma voz: - Limitadíssima!

Vozes: - Muito bem!

Aplausos.

O Orador: - ... e donde lhes vem a legalidade revolucionária, do passado ou da manhã de 25 de Abril?
Donde vem ao Sr. Almirante Coutinho a força moral para atacar os partidos, comparando-os a crianças?
Quero dizer-lhe daqui: antes do seu oportunismo já muitos de nós militávamos activamente dentro desses partidos ou de associações secretas para a libertação deste país.

Vozes: - Muito bem!

Aplausos.

O Orador: - Se a política, e na política se sente ainda uma criança, é fundamental saber que há muitos portugueses que à luta dos mais oprimidos aderiram ainda quase crianças.
Vamos, pois, combater sem tréguas o oportunismo, o sectarismo e a demagogia.
O socialismo constrói-se com o povo, para o tirar da miséria económica, social e cultural.
É da análise real que nascerá o socialismo possível.
As atitudes de cada um de nós terão como parâmetro a noção do serviço prestado à causa que defendemos.
O oportunismo e a manipulação são inimigos que os verdadeiros amantes do socialismo e da Revolução têm de combater sem tréguas.

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A FUR e o fascismo são organizações aliadas na política de terra queimada, são dos principais inimigos dista Revolução.

Vozes: - Muito bem!

Aplausos.

O Orador: - Espalham o ódio, a violência, a destruição.
Querem erguer-se nas cinzas das ruínas por eles arquitectadas.
A FUR e a SUV são neste momento e neste país as melhores organizações a trabalhar para o fascismo.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - A destruição da autoridade democrática é obra que interessa a extremistas da direita e esquerda.
É fundamental denunciar com veemência alguns órgãos de informação que, em nome do povo, suportados pelo povo, tanto o têm dividido.
A mentira campeia nesses órgãos. Milhares de trabalhadores viram junto da Emissora Nacional como se fabricam notícias falsas.
Na grande manifestação convocada pelo PS, perante uma multidão pacífica, forças sectárias e minoritárias dispararam sobre o povo.
Perante essa verdade comprovada por milhares de pessoas, leva-se o descaramento provocatório a transformar imediatamente os agressores em agredidos.
O País precisa de saber urgentemente quais as forças que sem reservas apoiam um Governo que é constituído com o mínimo de respeito pela vontade popular, expressa em 25 de Abril de 1975.
É urgente que a duplicidade de posições, que as declarações platónicas, dêem lugar ao empenhamento das forças que sinceramente defendem a democracia, o socialismo e a Revolução.
Só na coerência se pode criar a unidade.

Aplausos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Monteiro.

O Sr. Álvaro Monteiro (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os objectivos da Revolução de 25 de Abril de 1974, tão exemplarmente definidos no programa do MFA, que essencialmente visava estabelecer a concórdia nacional através da instituição de um regime que garantisse a fidelidade às regras do jogo democrático, de entre elas o rigoroso cumprimento da vontade popular que deveria ser traduzido no resultado do sufrágio - para que se apelava -, estão em perigo, em perigo manifesto!
Se é verdade que a consulta ao povo português se efectuou em condições de absoluta regularidade e em termos que só o honraram; se é verdade que as respectivas eleições não tiveram nada que ofuscasse a sua clara expressão democrática; se é verdade, também, que a realidade política nacional expressa no resultado do sufrágio de 25 de Abril de 1975 não pôs em causa o programa do MFA - também é certo que a partir desta última data se vem assistindo a repetidas tentativas para anular as consequências lógicas e irreversíveis (e inevitáveis) que aquelas eleições em si continham e, creio, ainda contêm!
Após o V Governo (que deliberadamente esqueceu a vontade popular expressa nas eleições, que calcou a pés juntos os mais legítimos direitos dos Portugueses, designadamente quanto à exacta função que aos meios de comunicação social o programa do MFA desejou imprimir-lhe; e o recurso aos processos discriminatórios da então endeusada 5.ª Divisão, que pretendeu ser, de facto, o órgão superior de soberania nacional, com o mais absoluto desprezo de todos os demais que mergulhavam as suas raízes na legitimidade revolucionária ou constitucional - não falando já nos inúmeros factos que durante várias semanas lançaram o País num estado de angústia), depara-se-nos actualmente um problema extremamente grave: a indisciplina que lavra, infrene, nas forças armadas!
Como exemplo, e apenas como exemplo (bem significativo, aliás), o desvio de 1000 G-3 ou mais de 1000 G-3 e a confissão clara do facto por um oficial do COPCON! E {coisa de pasmar), a cobrir todo esse estranho acto, a declaração do mais directo e alto responsável dessa força militar, de que as aludidas armas estavam em «boas mãos»!
Para além de tal declaração corresponder, na prática, a uma dirimente para um acto criminal que todas as legislações do mundo punem (inclusivamente as dos países de maior expressão socialista) e que abre as portas à indisciplina total, não só nas forças armadas, mas também na vida civil (não será privilégio das forças armadas poderem ser indisciplinadas e o povo não ...), põe-se o problema fundamental para todo o Governo que realmente deva e queira governar: quem lhe garantirá a execução das medidas que repute úteis ao progresso político, económico e social?
Quem assegurará às leis e demais actos do Governo a força coerciva sem a qual governar não passará de imagem puramente poética, para não dizer ridícula?
O Sr. Primeiro-Ministro do VI Governo Provisório, Almirante Pinheiro de Azevedo, declarou que essa força estava assegurada, pois tinha o apoio, parece que pleno, dos militares que servem a Revolução na pureza das suas intenções: construir uma sociedade democrática, socialista e pluralista.
Tal afirmação que os órgãos da informação reproduziram, com mais ou menos destaque, consoante o agrado ou desagrado que provocaram, sossegou, durante alguns dias, infelizmente poucos, extensas camadas sociais do País, bem podendo dizer-se que o povo português, na sua enorme maioria, ficou tranquilo, já que tinha um Governo expressão da vontade popular e uma força que efectivamente o apoiava com os meios adequados!
Seria essa a almejada aliança Povo-MFA que os sucessos do anterior Governo tinham, infelizmente, posto em causa!
Era, de resto, o mínimo que se poderia exigir das forças armadas: que fizessem respeitar, na integra, um Governo que traduzia um sentimento nacional expresso no resultado das eleições de 25 de Abril de 1975! Que cumprisse o programa da Revolução!
Sem tergiversações, isto é, sem concessões à direita reaccionária ou contra-revolucionária, nem afagos aos

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movimentos supostamente revolucionários da extrema-esquerda, que, consciente ou inconscientemente, andam a preparar as condições óptimas para a eclosão de um novo 28 de Maio, que nos conduzirá, a breve trecho, a um regime fascista, seja ele o de um Pinochet, seja o dos coronéis gregos!

O Sr. Américo Duarte (UDP): - Fascista és tu! Fascista és tu!

O Orador: - Não aceito lições antifascistas! Nunca!

Agitação na Sala.

Vozes: - Rua! Embora!

O Sr. Presidente: - Não pode interromper o orador.

Vozes: - Rua!

Burburinho.

O Sr. Presidente: - Advirto o Sr. Deputado Américo Duarte de que não pode interromper o orador nem insultar ninguém.

O Orador: - Eu só queria dizer ao Sr. Deputado Américo Duarte que desde os meus 17 anos, ainda estudante, enfileirei sempre junto das forças antifascistas e que desde então sou socialista, não oportunista!

Aplausos.

O Orador: - Continuo, meus amigos.
Pois que sentido diferente se pode encontrar na análise do citado facto, ou seja na afirmação de que «as armas estão em boas mãos», quando se não conhecem as mãos que as tomaram, nem a quem foram entregues?
As mãos dos homens para quem a «Revolução» é o demolir imediato das estruturas económico-sociais que, abaladas embora, ainda estão presentes?
As mãos dos homens para quem o anarco-populismo (aparente ou real) será o destino próximo deste país?
Só os movimentos esquerdizantes que não têm em conta nem a situação geopolítica nem a situação geo-económica de Portugal e pretendem isolá-lo como Salazar o isolou?
Serão aqueles homens, muito ilustrados e sábios embora, que vêem em Cuba ou na Albânia o modelo que convém a este país?
Ou para as mãos daqueles que, por oportunismo, são ou parecem ser mais antifascistas do que aqueles que, como muitos de nós, o são há mais de quarenta e oito anos?
Ou ainda para aqueles indivíduos que, por mera táctica, se disfarçaram em vanguardas e guardam no seu íntimo a esperança de voltarem a um caetanismo ou salazarismo moderado ou supostamente moderado?
De qualquer modo, esse acto, que não pode deixar de se considerar altamente perigoso para as instituições democráticas e acerca do qual não se poderão deixar de considerar responsáveis não só os seus autores morais e materiais, mas também quem lhes deu o seu aval - isto é, quem dele se tornou cúmplice, ou pelo menos encobridor - conduzirá a breve prazo a uma confrontação física, que, com extrema mágoa o digo, será a guerra civil!
Lembra-me da angústia que nós, os democratas e socialistas de então, sofremos com a guerra civil na vizinha Espanha.
Os horrores de toda a espécie que trouxe às populações espanholas, eu desejaria, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que estivessem, hoje e sempre, presentes no nosso espírito e lembrança!
Para os evitar na nossa terra!
Para que não nos esfacelemos em lutas estéreis e que na sua origem podem e devem ser resolvidas por meios pacíficos, que, no caso, serão tis do recurso aos métodos democráticos. É que, não o olvidemos, as armas só estarão «em boas mãos» quando na mão dos militares que queiram e saibam defender a legalidade democrática, anseio bem sentido do povo português!

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Daqui, desta tribuna, que deve ser livre, permito-me lançar um apelo às forças militares:

Que se organizem disciplinadamente para garantir ao VI Governo Provisório, como a todos os demais que vierem a ser democraticamente escolhidos, a autoridade e acatamento que as suas decisões merecem!

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta minha intervenção, determinada por um perigo iminente que ameaça, no dizer do Sr. Primeiro-Ministro, a própria independência nacional, deveria ter sido produzida na passada sexta-feira.
Circunstâncias estranhas à minha vontade só hoje permitiram ser proferida, o que talvez possa acarretar-lhe o senão de carência de oportunidade, além de outros defeitos intrínsecos meramente pessoais.
Não o entendi assim, pois os perigos não estão definitivamente afastados, como se depreende da mensagem de segunda-feira do Primeiro-Ministro ao povo português, e que constitui um aviso solene para todos aqueles que não têm na devida conta as realidades do momento presente!
Há, sim, que afirmar - e pela minha parte o faço sentida e sinceramente, e também em nome do PS toda a nossa solidariedade e apoio ao VI Governo, a fim de lhe dar a autoridade que carece para levar a bom termo o programa que anunciou e traduz, na verdade, o querer da comunidade nacional.
Há que salvar o País e com ele a Revolução!
Há que caminhar com passos firmes e seguros para não deixarmos cair o 25 de Abril na anarquia da indisciplina, que só aproveitará a contra-revolução!
Há, em suma, que estabelecer, rápida e eficazmente, a legalidade democrática, que nos permitirá avançar em direcção ao socialismo!
Disse.

(O orador fez a sua intervenção na tribuna.)

Aplausos.

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O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Teles Grilo.

O Sr. Teles Grilo (PS): - Constituinte do meu país, Sr. Presidente e Srs. Deputados:
Num povo que colonizou outros povos e foi colonizado pelo capital e pela ditadura;
Num povo que andou a descobrir novos mundos e só agora se descobre a si próprio;
Num povo que foi conquistador, missionário e servo da gleba - nesse povo aconteceu a Revolução!
E no entanto, passadas que são 12 615 horas, contadas segundo a segundo, a partir da hora primeira desse dia 25:

Há gente colonizada neste país.
Há gente por descobrir neste país.
Há gente por conquistar neste país.

Falo-vos da gente desse outro país que é Trás-os-Montes. Um Trás-os-Montes pobre, doente e resignado; um Trás-os-Montes desprezado, esquecido e emigrado; um Trás-os-Montes analfabeto, descrente e sacrificado.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Do nada que lhe deram e do tudo que lhe tiraram, apenas lhe resta a beleza austera da sua natureza e a incomensurável grandeza de alma daqueles que têm ainda a coragem de o habitar.

Uma voz: - Muito bem!

O Orador: - Pobre concelho de Chaves, fronteira desse outro Portugal acocorado atrás do Marão. Providencial serra aquela que tão pudicamente vai escondendo dessa outra pátria, mais desenvolvida no seu subdesenvolvimento, a granítica desgraça do distrito de Vila Real!
Constituinte do meu país, Sr. Presidente e Srs. Deputados, aqui, na capital, discutem-se, com uma indignação burocraticamente revolucionária, as assimetrias regionais. Faz-se o esquema, estabelece-se o plano, desenha-se o organograma ... Ele há-de discutir-se e transformar-se em anteprojecto; ele há-de enroupar na forma de despacho ou portaria ou assumir até a solenidade de decreto-lei; ele há-de ... bom, evidentemente que há prioridades e prioridades.
VV. Ex.as compreendem?! A barragem do Alqueva para o Alentejo, as pirites de S. Domingos para o Alentejo, as fábricas de beterraba sacarina para o Alentejo, o projecto de Sines para o Alentejo, a reforma agrária para o Alentejo.
«É necessário acarinhar, proteger e estimular as vanguardas revolucionárias das cinturas industriais e das províncias verdadeiramente progressistas» ...

Aplausos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:-... assim proclama Lisboa, ex-capital das especiarias indianas, ex-capital do ouro brasileiro, ex-capital dos escravos africanos, ex-capital do império, onde passaram 12 615 horas de Revolução!

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Em Trás-os-Montes, no entanto, o tempo há muitas décadas que parou.
Constituinte do meu país, Sr. Presidente e Srs. Deputados: O fascismo acabou! A colonização acabou! A democracia desponta! A opressão vai findando!
Que pesadelo é este no sonho primaveril da libertação?
Acaso não sabes, camarada, que nesse longínquo distrito de Vila Real há um médico para cinco mil habitantes, enquanto a Lisboa cosmopolita tem um para seiscentas pessoas!?
Acaso não sabes que a população continua ali a decrescer em ritmo agónico, desde os primórdios de sessenta!?
Que a mortalidade infantil atinge taxas de crueldade adulta!?
Que o rendimento por pessoa é um rendimento infra-humano, a nível de subsistência física!?
Que o analfabetismo germina triunfalmente nas montanhas e nos vales!?
Acaso não sabes, camarada, que os homens se precipitam, em torrentes caudalosas, em patente estado de necessidade, para essa Europa calculista que lhe paga o suor em francos, as lágrimas em marcos e as saudades em pesetas, enquanto beatificamente vai arrecadando anafada mais-valia!?
Que nesse desgraçado distrito há lugares e lugares onde pouco a pouco as portas se foram fechando, as lareiras apagando e os cães deixando de ladrar!?
Acaso não sabes, finalmente, que há centenas e centenas de aldeias onde tudo falta, incluindo a terra dura e fria de um cemitério, onde para sempre se cubra com sete palmos a servidão inútil de uma vida!?
Então se sabes isto tudo, camarada, diz-nos que é da Revolução, e, se a encontrares, embarca-a, nem que seja à força, num barco rabelo que suba o Douro e a leve à Régua; despacha-a, nem que seja em pequena velocidade, pela linha do Corgo, pese embora a via estreita e o comboio vagaroso, e, finalmente, em Chaves, arruma-a com jeitinho no estrado da camioneta que decerto a levará, se tempo e ânimo houver, até aos confins de Valpaços, até às rudes entranhas da terra fria de Barroso.
Mais além, camarada, é a Espanha, onde se garrotam os cravos e se fuzila a ânsia da liberdade!

Aplausos.

Vozes: - Muito bem!

Constituinte do meu país, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a todos tomo como testemunhas do requerimento que agora faço, nisto de angústia e apreensão, mescla de exigência e oração, fruto de um anseio atávico de justiça, mergulhado nas raízes dos séculos.
Sendo assim:
Porque não se pode assistir indiferente à crescente assimetria das linhas de força políticas, económicas e sociais, do processo histórico em curso; porque se quer caminhar tranquila, consciente e eficazmente rumo à sociedade socialista;
Considerando que Trás-os-Montes em geral, e o distrito de Vila Real em especial (não obstante os inestimáveis contributos das civilizações Celta e Romana) continua a ser uma colónia de Portugal, ao qual fornece bens de primeira necessidade, incluindo

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a força de trabalho dos seus naturais, ao preço módico de saldos de fim de estação;

Risos.

Uma voz: - Muito bem!

O Orador: - Considerando que se trata de um distrito eminentemente agrícola, onde emergem de quando em quando, envergonhadamente, quatro ou cinco chaminés fabris, possivelmente receosas de poluir esse alfobre de dinheiro que é a cultura do centeio e da batata (?);
Considerando que, não obstante sermos uma nação fundamentalmente agrícola continuamos a importar metade daquilo que consumimos, interpretando fielmente o papel de mulher esbanjadora que, recebendo de seus pais, marido e filhos a féria da emigração, alegre e despreocupadamente a remete à procedência, trocando-a pelo pão que lhe falta no celeiro;
Considerando que só pela emancipação deste sector se construirá um país novo que se baste a si próprio, o que necessariamente implica a dignificação do trabalho e do trabalhador rural; o apoio técnico e financeiro a esse trabalho; a reconversão da mentalidade de gestão e do sistema de produção; a rápida promoção do sistema cooperativo, e a urgente eliminação de todas as sanguessugas - ditos «intermediários» - que com as suas ventosas chupam 50 % do que deveria ficar nas mãos calejadas de quem, curvado para a terra, trabalhou e produziu, para logo a seguir empalmarem outros 50 % que deveriam ficar no bolso (às vezes cheio de cotão) de quem comprou e consumiu;
Considerando, finalmente, que se torna necessário quebrar as algemas de sobreexploração da população transmontana expurgando-a para sempre do cacique reaccionário, do clero conservador e do governo absentista, requeiro:

1.º Que os órgãos revolucionários claramente afirmem que o 25 de Abril foi feito para todo o povo português, especialmente para as classes mais desfavorecidas e que abrange, por conseguinte, as regiões situadas a norte do rio Tejo, incluindo as bacias hidrográficas do Mondego, Douro e seus afluentes, os maciços rochosos de Bornes, Nogueira, Padrela, Montezinho, Gerês e Marão e particularmente o distrito de Vila Real, onde teimosamente tentam subsistir as populações mais desprezadas deste país;

Vozes: - Muito bem!

O Orador:

2.º Que o Governo tome desde já as medidas necessárias para, de acordo com o seu programa, que é também o do MFA, evite que se agravem as condições de vivência, já de si impiedosas, que quotidianamente fustigam os habitantes de Trás-os-Montes;
3.º Que os partidos progressistas, as organizações unitárias de base e as massas populares exerçam verdadeira pedagogia e militância revolucionárias, não descurando nunca a vigilância atenta e serena a todos os ex-senhores e mandadores locais, eixos normais da contra-revolução.

Finalmente, mais requeiro a todos os católicos progressistas do Norte do meu país:

Que na sua missão apologética proclamem bem alto que Cristo é dos oprimidos e não dos opressores; que é dos explorados e não dos exploradores; que a Igreja, neste Portugal em mutação, tem de ser cada vez mais a Igreja de João XXIII e cada vez menos a de Inocêncio III; tem de ser cada vez mais a Igreja do bispo do Porto e cada vez menos a Igreja do arcebispo de Braga!

Aplausos.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Joaquim Velez (PCP): - Não queiras ir a passo de burro, vai mais depressa.

O Sr. Presidente: - Eu peço aos Srs. Deputados para não interromperem o orador.

O Orador: - Lisboa, 2 de Outubro de 1975. Na capital 12 615 horas são passadas, contadas segundo a segundo, a partir da hora primeira da libertação!
Em Trás-os-Montes o tempo há muito que parou!

Aplausos prolongados.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Dias Lourenço. Quero adverti-lo de que só tem seis minutos para falar. Tem de aproveitar o tempo. Faça o favor de usar a palavra, a menos que queira realmente proferir a sua oração na próxima sessão.

O Sr. Dias Lourenço (PCP): - Realmente com seis minutos fico um pouco desfavorecido em relação aos meus ilustres colegas ...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado: A Mesa não será demasiadamente exigente. Faça favor de tomar a palavra, se assim quer.

O Orador: - Muito obrigado.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O nosso país foi sacudido nos últimos dias por acontecimentos graves que geraram profundas inquietações e perturbações entre os Portugueses.
Na crise por que actualmente passa a Revolução Portuguesa - a qual atingiu o seu ponto mais grave -, os acontecimentos das duas últimas noites, em particular de ontem para hoje, não contribuíram em nada, antes pelo contrário, nem para uma necessária normalização da vida nacional nem para a salvaguarda das conquistas revolucionárias do nosso povo.
Fomos ontem surpreendidos por iniciativas que reputamos de alarmistas da parte do PS, compreensivelmente secundadas pelo PPD.

Vozes: - Abaixo a reacção!

O Orador: - Aqui mesmo, o Sr. Deputado José Luís Nunes, que julgávamos insusceptível de se deixar

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enredar no alarmismo, proferiu palavras altamente perturbadoras, enquanto pelo Norte e Centro da País o PS fazia circular um alarmante documento dirigido ao povo português denunciando um pretenso assalto aos órgãos de informação por forças de esquerda - pseudo-esquerda, dizia o comunicado da Federação de Lisboa do PS - e a eminente eclosão de um golpe de Estado contra o almirante Pinheiro de Azevedo e o VI Governo Provisório.
Consideramos de facto surpreendente a iniciativa do PS ...

Uma voz: - Muito mal!

O Orador: - ... tanto mais que se um perigo grande existe para a nossa Revolução ele não vem, fundamentalmente, de «grupos ultra-minoritários de pseudo-esquerda» e de «elementos irresponsáveis», mas sim da reacção fascista e fascisante da ultradireita, que, contando com cumplicidades de vária ordem, prepara uma desforra sangrenta das irreversíveis derrotas sofridas depois do 25 de Abril.

Agitação na Assembleia.

Sim, há grupos aventureiros de ultra-esquerda que fazem consciente e objectivamente o jogo da contra-revolução, alguns deles por vezes em estranhas alianças com o PS e também com o PPD e o CDS...

Risos. Aplausos das galerias.

... em acções claramente hostis ao processo revolucionário, mas supomos que não é a esses que se refere a proclamação do PS. Para nós o PPD e o CDS, pelo seu carácter abertamente conservador e contra-revolucionário ...

Apupos.

... estão à margem de qualquer participação no processo revolucionário.
Entretanto gostaríamos que o PS fizesse mais do que tímidas referências aos realíssimos perigos da contra-revolução fascista, que denunciasse com o necessário vigor e consequência a crescente ameaça que pesa sobre as liberdades e a independência do nosso povo, oriunda das forças coligadas da reacção interna e do imperialismo estrangeiro, que denunciasse a descarada ingerência nas nossas questões internas por parte das grandes potências capitalistas.
Em Espanha - na Espanha franquista que acaba mais uma vez de se tingir com o sangue dos cinco patriotas fuzilados - o ELP e o MDLP dispõem de bases operacionais e organizam incursões de grupos armados através da fronteira. Contando com cumplicidades estranhas, atentados terroristas são praticados contra vidas e bens de portugueses sem que os seus autores sejam detidos e exemplarmente castigados.

Vozes: - Morte a essa gente!

O Orador: - O PS não mostra por tudo isto grande preocupação.
O PS nada nos diz dos saneamentos à esquerda, fomentados até pelo próprio PS, de oficiais e funcionários do aparelho de Estado, fiéis ao processo revolucionário, e do afastamento dos seus postos de comando de militares que puseram o melhor de si próprios ao serviço do seu pote e da Revolução.
O PS continua a acusar jornais nacionalizados, a rádio e a TV de manipularem a informação, ...

Burburinho na Assembleia. Apupos.

... de difundirem boatos alarmistas, de terem um comportamento irresponsável.

Vozes: - O orador é demagógico!

O Orador: - O nosso partido, o PCP, é concretamente alvo de críticas dos dirigentes do PS, que aludem a um pretenso assalto dos comunistas aos órgãos de informação.

Risos.

Já agora, à parte, quero declarar que assaltamos o Expresso, O Tempo, o Jornal Novo e estamos a pensar assaltar A Luta, o Comércio do Porto e alguns outros jornais.

Vozes: - Não queria mais nada!

Burburinho na Sala.

O Orador: - Posso continuar, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor de continuar. Eu peço aos Srs. Deputados que deixem falar o orador, a que, aliás, tem todo o direito.

O Orador: - Os factos estão aí a demonstrar com clareza quem espalha boatos, quem assume um comportamento irresponsável, quem se esforça por tomar de assalto os órgãos de informação. Quem sugeriu a suspensão imediata de O Século? O PS. Quem se propunha destituir discricionariamente as administrações e direcções dos jornais nacionalizados? O PS. Quem pretende impor a sua vontade arbitrária aos trabalhadores da Emissora Nacional, do Rádio Clube Português e da Radiotelevisão? O PS.
Os dirigentes do PS - com o apoio do PPD - proclamam diariamente que defendem a ordem democrática e que desejam evitar a violência e a anarquia. Perguntamos: quem, durante a manifestação de terça-feira, tomou a decisão de encaminhá-la para a Emissora Nacional e de provocar, portanto, confrontações com os trabalhadores que a defendiam?

Grande burburinho.

Uma voz: - Isto é demagogia pura!

O Orador: - Quem é o responsável pelos choques violentos que ali se verificaram?
Quem insultou os deficientes das forças armadas, lançando contra eles os manifestantes do PS e do PPD? O Sr. Manuel Alegre, um dirigente e Deputado socialista.

Uma voz: - Eu sou obrigado a ouvir mentiras?

Gera-se grande tumulto.

O Sr. Presidente: - Peço aos Srs. Deputados, mais uma vez, para não interromperem o orador.

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3 DE OUTUBRO DE 1975 1709

No uso desse direito de resposta pedia a V. Ex.ª que, por breves minutos, me concedesse a palavra.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Eu pergunto ao Sr. Deputado se, porventura, quer requerer o prolongamento do tempo de antes da ordem do dia.

O Orador: - Não, Sr. Presidente. Eu não requeiro o prolongamento do tempo de antes da ordem do dia, porque isso é errado e anti-regimental. O que requeiro é que me seja concedido, nos termos gerais, o direito de resposta.
O prolongamento do período de antes da ordem do dia só pode ser concedido para tratar de assuntos da alínea d) do artigo 71.º e requerido por uma maioria de dez Deputados, suponho eu. Portanto, o direito de resposta nada tem a ver com o prolongamento do período de antes da ordem do dia. É um lapso, permita-me a observação, que a Mesa comete ao confundir o direito de resposta com o prolongamento ou não prolongamento de antes da ordem do dia.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - O direito de resposta, segundo o Regimento, é só dado às pessoas que, no uso da palavra, tenham sido atingidas.

Burburinho.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - O meu nome é José Luís Nunes ...

Vozes: - Pedimos então todos a palavra!

O Sr. Presidente: - Depois de consultada a Mesa, ela acabou por interpretar o assunto nesse sentido. Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Muito obrigado, foi muita generosidade da Mesa.
Eu vou tentar fazer aqui, assim, Sr. Presidente e Srs. Deputados, aquilo que ontem já fiz.
Tem sido aqui várias vezes citada uma frase de Mao Tsé-Tung, que eu vou citar novamente: «Quem não sabe ouvir, não pode governar». Portanto, vou tentar dizer com muita clareza três ou quatro pontos, lembrando ao Sr. Deputado António Dias Lourenço que, evidentemente, se trata de uma resposta de improviso, espontânea, e que me reservo o direito, se for necessário, ou qualquer camarada meu, em dias posteriores, de tratar mais detidamente num discurso.
O que se passa, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é o seguinte: ontem o Partido Socialista emitiu um comunicado que veio publicado nos jornais e que é do conhecimento geral. Esse comunicado, e porque o nosso partido é um partido responsável, corresponde exactamente à realidade daquilo que se passou.

Uma voz: - Provas?

O Orador: - Pedem-me efectivamente provas, e eu vejo com espanto, quando me pedem provas com vinte e quatro horas de antecedência, vejo com espanto que aquelas pessoas que tinham obrigação de saber que a história não é um julgamento com provas tarifadas, mas que é um processo em que as peças se articulam em comportamentos objectivos.

Uma voz: - Toma e embrulha!

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Ora, o que é que acontece? Acontece que o meu partido emite um comunicado que corresponde à realidade ... .

Vozes: - Qual?

O Orador: - ... e que eu assumi a responsabilidade, em uníssono com os meus camaradas do Grupo Parlamentar e de acordo com a direcção do meu partido, porque todos somos um. Assumi a responsabilidade de dar dele conhecimento aos Srs. Deputados e de fazer um apelo à serenidade. Quanto ao comunicado, pois afirmo e reafirmo que ele corresponde à realidade ...

Uma voz: - Provas?

O Orador: - ... e que é tão ilegítimo pôr em causa por falta de provas, como era ilegítimo, na opinião do PCP e na minha opinião, pôr em causa a realidade do 28 de Setembro por falta de provas antes da saída do competente relatório.

Aplausos. Apupos.

O Orador: - Ora, dizia eu, que, depois de saído esse comunicado, que integralmente mantemos e que consideramos essencial no facto de que nada de grave se passou ontem à noite, se fez aqui um apelo à vigilância das massas populares, se fez aqui um apelo a todos os partidos aqui representados, nomeadamente aos que fazem parte do Governo, especificando: PCP, PPD e PS. Esse apelo foi feito e foi dito que o povo português, nesta hora grave, esperava de nós que mantivéssemos a nossa serenidade, que o povo português, nesta hora grave, esperava que cumpríssemos o nosso dever, que o povo português nesta hora grave, esperava que soubéssemos apelar em defesa da liberdade, do Governo legítimo e da Constituição. E é curioso ainda que o Partido Comunista Português emita um comunicado que vem hoje nos jornais e faz uma declaração pela voz do seu Deputado António Dias Lourenço, que diz o seguinte: «que a situação é grave, que é necessário que haja vigilância popular e que é necessário que os partidos integrados no Governo Provisório apoiem o VI Governo».
Que revolução é esta? Que revolução é esta em que as pessoas, quando dizem a mesma coisa, estão a dizer coisas diferentes? Que revolução é esta em que as pessoas quando apelam à vigilância popular, estão a ser alarmistas e outros partidos, quando apelam à vigilância popular, estão a combater a reacção? O que é que queremos dizer com este dúplice e difícil significado do jogo das palavras? Será o problema da unidade das forças democráticas em Portugal uma questão de mera filologia? Será o problema da unidade das forças democráticas em Portugal uma questão de processo de intenção? Será que o Partido

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O Orador: - Contra quem se dirigem todas as estranhas iniciativas dos últimos dias? É tempo de se explicarem publicamente.
A solução da crise actual implica exactamente uma clara posição de defesa das conquistas e dos objectivos da revolução democrática, rumo ao socialismo. O divisionismo entre as forças democráticas no seio das duas componentes motoras da Revolução é um crime contra o povo.
O PS e o PCP têm grandes responsabilidades na resolução dos problemas principais do País. Há uma crise do Poder que só pode ser vencida através de um esforço porfiado de reunificação das diversas tendências do MFA.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O papel dos partidos verdadeiramente interessados no desenvolvimento do processo revolucionário deve ser o de facilitar, e não obstaculizar essa necessária condição.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - É, por outro lado, necessário que a vocação unitária das massas populares não seja contrariada por interesses alheios às próprias massas.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - No movimento sindical, no movimento mais geral das classes trabalhadoras na formação das estruturas populares da aliança povo-MFA é preciso um esforço convergente de todos os partidos de esquerda, de todos os que, querem efectivamente barrar o caminho ao fascismo.

Vozes: - E ao social-fascismo!

Outras vozes: - Fascistas são vocês!

O Orador: - É sintomático dos perigos actuais a tentativa de intervenção na manifestação do PS de anteontem do Dr. Sá Carneiro, isto um ano depois do, 28 de Setembro.

Uma voz: - É trágica é a vossa atitude!

O Orador: - Que por razões estratégicas o PPD tenha substituído o seu secretário-geral é certamente uma questão interna do PPD.

Apupos.

Mas o reaparecimento do Dr. Sá Carneiro e a sua intervenção na vida pública portuguesa os moldes em que já o fez e a forma cada vez mais provocadora como elementos responsáveis do PPD se pronunciam em público, como ouvimos há pouco aqui, reconduz-nos ao negregado período do spinolismo, no qual o Dr. Sá Carneiro desempenhou um papel contra-revolucionário que o nosso povo não esquecerá.

Aplausos. Apupos.

As manifestações intensificam-se. Trocam-se palavras que no meio do tumulto é impossível registar.

O Sr. Presidente: - Eu peço a maior calma! Os Srs. Deputados que queiram responder ao orador tomarão as suas notas e pedirão na sua altura a palavra.

O Orador: - Para terminar desejaria referir aqui a posição pública do meu partido. Nem precisamos repetir quanto desejamos ajudar o almirante Pinheiro de Azevedo, um revolucionário militar do 25 de Abril, nos seus esforços para debelar a crise. Mas na situação actual os órgãos do poder político só estarão em condições de governar e reforçar a sua autoridade se as suas decisões não só corresponderem aos interesses e aspirações das massas populares como tiverem em conta a sua vontade e estado de espírito.
Medidas de direita, ou qualquer política decidida nos gabinetes sem ter em conta esta realidade, encontrarão pela frente a firme resistência popular e estão irremediavelmente condenadas ao fracasso.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, queria avisar de que já ultrapassou o seu tempo, mas pode continuar durante mais três minutos.

O Orador: - A situação é extremamente complexa e perigosa. É necessária vigilância popular em relação à conspiração contra-revolucionária que pode traduzir-se em iniciativas terroristas, manobras provocatórias ou tentativas de um golpe. É também necessária a prevenção contra actos inconsiderados movidos por grupos irresponsáveis, que em vez de lutarem contra a reacção voltam os seus ataques contra o PCP. Tais actos poderiam conduzir à formação de uma vasta aliança de todas as forças moderadas, vacilantes e da direita e precipitar a constituição de um Governo assente em medidas repressivas.
Antes que seja tarde, a situação exige um rápido exame conjunto por todas as forças interessadas no processo revolucionário, sem exclusões ou discriminações.
A classe operária, as massas populares, as forças revolucionárias, civis e militares, têm confirmado em grandes acções de massas estar firmemente dispostas a lutar contra a reacção, contra qualquer golpe de direita, a lutar pelas liberdades, em defesa das conquistas da Revolução, pelo prosseguimento do processo revolucionário rumo ao socialismo.

Agitação na Assembleia.

A situação é perigosa. Certas declarações, atitudes e actividades nas últimas horas causam legítimas preocupações. O PCP chama os trabalhadores e as massas populares a estarem vigilantes e prontos a darem rápida resposta a quaisquer manobras que visem pôr em causa a Revolução Portuguesa.
É o que queríamos deixar claro quanto à posição do PCP.

Aplausos.

O Sr. Presidente: - Entramos neste momento no período da ordem do dia.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, existe um direito de resposta que está, para além dos períodos da ordem do dia, devidamente tutelado.

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Comunista Português não considerou a situação suficientemente grave para que alguns dos seus elementos, não aqui assim nesta Assembleia, não fossem legitimamente informar do que se passava? Será que alguém acusou alguém de estar implicado em alguma coisa? Será que alguém acusou alguém de pretender pôr em causa o que quer que seja? Será que alguém disse alguma coisa contrária àquilo que aqui foi dito pelo Sr. Deputado Dias Lourenço? Será que, quando se fala em forças minoritárias e ultra-esquerdistas, o PCP se encontra incluído?
Nós não consideramos assim.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Agora vamos pôr um outro problema. Quem é o inimigo principal da nossa Revolução? Pois nós dizemos que há vários inimigos da nossa Revolução. Ninguém põe em dúvida que a direita contra-revolucionária pretende recuperar o actual processo.
É ou não é válida a plataforma de governo que foi assinada pelos partidos?

Vozes: - Sem o PPD!

O Orador: - É ou não é válido o almirante Pinheiro de Azevedo como Primeiro-Ministro?

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - É ou não é válido, isto pergunta-se com toda a clareza, é ou não é válido, ou são ou não são válidas as atitudes que foram tomadas por este VI Governo Provisório em defesa da legalidade?
Porque nós não estamos aqui, nem temos aqui assim o dever de dar lições de democracia do programa em relação a partidos políticos.
Nós respondemos perante as bases e perante os nossos próprios militantes,
O programa do PPD diz respeito ao PPD. O programa do CDS diz respeito ao CDS e aos seus militantes. O programa do PCP diz respeito ao PCP e aos seus militantes.
O que se nos afigura estranho é o seguinte: é que o PCP participe com militantes seus ao lado do PPD num Governo Provisório e ao nosso lado e ponha constantemente em causa a presença do PPD; é que a direita contra-revolucionária pretende recuperar o actual processo e criar condições para um golpe contra-revolucionário.
Mas nós dizemos também que essas condições para o contragolpe revolucionário estão a ser criadas por minorias provocadoras e irresponsáveis ao serviço de quem nós não sabemos exactamente e desconhecemos onde começa a irresponsabilidade e onde começa a intenção provocatória.
Isto eram palavras que o próprio Partido Comunista Português dizia quase textualmente, por exemplo, no relatório do radicalismo pequeno-burguês de fachada-socialista, de Álvaro Cunhal.
Ora, se efectivamente diz e mantém estes problemas, o problema que se tem de pôr, com toda a clareza, não é saber ou interpretar o que nós queremos dizer quando apelamos para as massas. Se estamos ou não a fazer o mesmo apelo, se as massas para que falamos são iguais, o problema que se tem de pôr fundamentalmente é o seguinte: é ou não é o VI Governo Provisório um Governo revolucionário que defende a Revolução?

Vozes: - Muito bem!

Vozes: - Não apoiado!

Aplausos.

O Orador: - Não defendemos, nem discutimos a posição do Partido Comunista, porque não nos compete fazê-lo. O que dizemos é o seguinte: é que, como diz o povo, perdoe-se-me a expressão, «é impossível comer de duas gamelas ao mesmo tempo».

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Ou se colabora e se aceita colaborar neste Governo, tal como ele está formado, e se é um partido de defesa da legalidade democrática, ou então também, defendendo, porventura, a legalidade democrática, se passa para a oposição ...

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Ora, nós estamos certos de que este Governo não é um Governo contra-revolucionário, estamos certos de que é necessária a presença do PCP neste Governo como é necessária também a presença do PPD.

Uma voz: - Fora!

Burburinho na Sala.

O Orador: - Estamos certos de que esta posição corresponde aos interesses mais sentidos pelo povo português e é o resultado fiel do actual processo eleitoral.

Vozes: - Não apoiado!

O Orador: - E foi isto mesmo que Mário Soares, secretário-geral do nosso partido, afirmou na manifestação de anteontem. Ora, acontecem, para finalizar e para responder a todas as questões que aqui foram afloradas, duas realidades. Em primeiro lugar, que ainda não foi criado nenhum movimento de libertação da Rua do Quelhas, ...

Risos.

... o que quer dizer que a Rua do Quelhas continua a pertencer à cidade de Lisboa, o que quer dizer ainda que qualquer cidadão se pode manifestar no Rossio, na Rua do Quelhas, na Praça da Liberdade, nos Restauradores ou em qualquer outro sítio, que é mister que o faça em ordem e em disciplina, Ora, acontece que não só fizemos constantes apelos à ordem e à disciplina, como, inclusive, a manifestação, com um carro levando o secretário-geral à frente e outros membros do partido, ia a passar em silêncio em frente à Rua do Quelhas, o que não quer dizer que não houvesse um ou outro grito, que não houvesse um ou outra berro. Portanto, quem põe em causa o processo ou o direito de manifestação não são os manifestantes que passam em frente à Rua

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do Quelhas, são as pessoas que pura e simplesmente disparam e atiram sobre esses manifestantes.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Quem põe em causa o direito de manifestação não são as pessoas que se manifestam na rua ordeiramente, são aqueles que impedem as manifestações ordeiras por meios violentos ou se manifestam desordeiramente ou de forma provocatória. Nós manifestamo-nos ordeiramente e assumimos a dignidade e o direito de nos manifestarmos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Terminamos com uma referência expressa à Associação dos Deficientes das Forças Armadas. Dissemos aqui ontem nesta tribuna, e temo-lo dito constantemente, que o povo português tem uma dívida de gratidão, tem de resolver o problema dos deficientes das forças armadas. O que lamentamos e lastimamos é que aquilo que não pôde ser feito por cinco Governos Provisórios, em tanto tempo de governo, se exija ao VI Governo Provisório que seja feito em dias, e denunciamos isso como manobra que é dirigida contra os próprios deficientes das forças armadas e visa criar dificuldades e pôr em causa o VI Governo.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Ora, se, efectivamente, as disposições dos partidas políticos são essas, se estamos de acordo em criar condições e caminhar em frente para defender a legalidade democrática, para defender o Governo Provisório, para construir em Portugal uma sociedade livre e socialista.
Sr. Presidente, Srs. Deputados do PCP, as últimas palavras que me restam dizer são: se é esta a disposição de todos, que morram as querelas estéreis e os debates inúteis, porque a povo português está, efectivamente, a olhar para nós.

(O orador não reviu.)

Vozes: - Muito bem!

Aplausos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Melo, com o seu direito de resposta.

O Sr. Barbosa de Melo (PPD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não pedi a palavra para fazer um comentário às afirmações que acaba de fazer, na bancada do Partido Comunista Português, o Sr. Deputado Dias Lourenço. Pedi a palavra apenas para lavrar aqui veementemente o meu protesto por observações que S. Ex.ª fez.

O Sr. Dias Lourenço (PCP): - Não sou excelência ...

O Orador: - Não protesto pela circunstância de o Sr. Deputado Dias Lourenço se ter imiscuído em assuntos internos do meu partido, porque o meu partido é um partido democrático e pratica a sua política, à luz clara do dia.

Uma voz: - Muito bem!

O Orador: - Se quer saber as razões por que actuámos de uma maneira ou de outra, leia os jornais, costumamos dar conta delas aos cidadãos portugueses.

Uma voz: - Muito bem!

O Orador: - Não é por isso, portanto, que protesto; protesto apenas, e isto é muito grave, contra a circunstância de o Sr. Deputado Dias Lourenço se ter permitido insinuar a respeito do secretário-geral do Partido Popular Democrático considerações que repudio enérgica e veementemente.

Vozes: - Muito bem!

Aplausos.

O Orador: - Mas não reconhecemos ao Sr. Deputado Dias Lourenço competência de juiz, competência para julgar aqui, diante do povo, quem quer que seja.
Para nós, porque somos um partido democrático, o único juiz é o povo e o povo tem o seu modo de julgar os partidos, de julgar as instituições, tem o seu modo de julgar os homens.
E é para o povo, portanto, que o PPD apela nesta circunstância, não reconhecendo ao Sr. Deputado Dias Lourenço qualquer competência neste assunto.
Tenho dito.

(O orador não reviu.)

Aplausos.

O Sr. Júlio Calha (PS): - Sr. Presidente ...

Vozes: - Vamos ao trabalho!

O Sr. Manuel Ramos (PS): - Nós temos uma Constituição para aprovar!

O Sr. Secretário (António Arnaut): - Peço à Sr.ª Funcionária que ligue o som ao meu camarada Júlio Calha, que se levantou primeiro que o Sr. Dias Lourenço.

O Sr. Júlio Calha (PS): - Sr. Presidente: Também ontem aqui foram feitas algumas declarações que se dirigiram especialmente à minha pessoa e à actuação do meu partido no distrito de Portalegre.
Nos termos regimentais, solicito também ao Sr. Presidente que me autorize a responder.

O Sr. Presidente: - Tem o Sr. Deputado a palavra.

O Sr. Júlio Calha (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Foram ontem aqui proferidas várias considerações em relação à maneira por que actuou o PS a nível do distrito de Portalegre.
Não seria bem caso para necessitar dar resposta a considerações feitas em tom provocatório, calunioso e demagógico.
A baixeza de quem, falho de argumentos, utiliza ataques pessoais, como última arma política, a resposta merecida teria o silêncio de quem efectivamente tem consciência do que é a dignidade das pessoas, do que é proceder-se válida e não irresponsavelmente.

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1712 DIÁRIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE N.º 57

Mas na medida em que se focaram aspectos inerentes ao meu partido, gostaria de dizer alguma coisa, breve, que elucidasse e esclarecesse esta Assembleia.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tentou aqui dar-se a ideia de que o Partido Socialista estava a favor dos agrários e contra a reforma agrária.
Embora eu pudesse remeter os interessados para as minhas intervenções onde defini claramente qual a posição do PS, não me abstenho de referir novamente que o meu partido quer e deseja a reforma agrária, mas que a mesma tenha como objectivos uma alteração das estruturas agrárias que venham beneficiar os trabalhadores rurais e os pequenos e médios agricultores (trabalhadores directos da terra).
Não há, pois, qualquer tipo de confusão que daqui possa advir.
O que já aqui critiquei e criticarei as vezes que achar necessárias é a maneira anarquizante de como se estão a fazer ocupações, que nalguns casos já dividem as classes trabalhadoras.
A sabotagem económica, falta de pagamentos de salários e subaproveitamento das terras poderiam ser razões para justificar as ocupações.
Mas isso não acontece. Não só se passa ao lado de latifúndios subaproveitados como se acaba por ocupar pequenas propriedades bem aproveitadas.

Vozes: - Cita!

O Orador: - Impõem-se ocupações e, oportunisticamente, nalguns lugares, esbanjam-se alimentos, que bem poderão ser necessários amanhã, quando talvez a fome se generalize.

Uma voz: - Dá exemplos!

O Orador: - O PS não faz, não fez, nem fará o jogo dos agrários, que denunciará sempre que necessário, mas também não embarca na demagogia que se pretende instalar à sombra de uma pretensa defesa dos trabalhadores.
Também o PS não reivindicou a organização dos trabalhadores rurais no meu distrito. Colaboramos no seu esclarecimento e consciencialização. Mas o que condenamos neste capítulo é o sectarismo de que essa organização está imbuída ...

O Sr. Presidente: - Eu pedia ao Sr. Deputado o favor de se limitar exclusivamente ...

O Orador: - Peço desculpa.

O Sr. Presidente: - ... àquelas partes onde foi directamente atingido.

O Orador: - São estas as partes, Sr. Presidente. ... e a total manipulação de trabalhadores que nela se faz.
Por que é que em muitos locais se tem de assinar a ficha de aderente do PC para pertencer ao Sindicato?

Vozes: - Mentiroso!

Burburinho.

O Orador: - Por que é que já se negou trabalho a rurais só porque eram socialistas?
Por que é que um dirigente sindical em Montargil é afastado desse cargo pelo simples facto de não aderir à ideia das ocupações e é ao mesmo tempo e imediatamente substituído por outro que diz o «amen» ao que o partido quer?
Por que é que nalguns concelhos os trabalhadores mal conhecem os seus representantes? Em Arronches, há tempos, o descalabro foi de tal ordem, por ocasião dá assinatura de um contrato de trabalho, que a páginas tantas os trabalhadores desataram a chamar fascistas aos seus dirigentes, aos seus próprios representantes.
Por que é que este sindicato é utilizado para, por exemplo, servir de capa a uma investida a Portalegre, onde, como já aqui se disse ontem, irresponsáveis provocaram agressões a trabalhadores?
Não, o PS não reivindica a organização daquele sindicato. Mas exige que. ele não obedeça a paternalismos partidários que à viva força o querem colocar na órbita de um partido.
Louvo a organização. Condeno o paternalismo e o sectarismo, a manipulação e todas e quaisquer formas de colocar um sindicato ao serviço de um partido.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Ainda há dias o PC achou por bem «aconselhar» o referido sindicato a levar a efeito uma greve cujos objectivos mal se vislumbravam.
Que aconteceu?
Em Avis uma fábrica perdeu 5000 l de leite.
Em Campo Maior e Elvas fábricas de concentrado de tomate perderam milhares de escudos.
Obrigaram-se os trabalhadores a aderir, mesmo que não o quisessem. Invadiram-se as casas bancárias, onde trabalhadores quase foram agredidos por trabalhadores.
Não. O sindicato deve ser dos trabalhadores, sejam eles comunistas ou não. Poderão os partidos sugerir linhas de actuação, mas são os próprios trabalhadores que decidirão o que se há-de fazer. Só assim haverá unidade no seio dos trabalhadores. O contrário, como já se viu, é divisionista e coloca trabalhadores contra trabalhadores.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Diria ainda, a título de informação, que em tempos o meu partido decidiu, a nível de distrito, uma cooperação com o PCP sobre um problema agrícola importante. Ao tempo era responsável pela agricultura o Dr. Esteves Belo.
Lá combinámos na véspera da reunião em Portalegre com aquele responsável a maneira de actuar, tendo em vista que nessa reunião estariam presentes latifundiários.
Lá combinado foi. A verdade é que no dia seguinte o PC faz precisamente o contrário do ajustado.
Era interessante que a cooperação tivesse sido viável, mas deste modo o que se fez foi muito simplesmente uma traição. O PS é um partido muito cioso da lealdade e da honestidade de meios.

Risos.

Burburinho.

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3 DE OUTUBRO DE 1975 1713

O PS não pensou mais em cooperação de fins dúbios.
As considerações aqui expendidas pretenderam ainda dar a ideia que em determinada reunião eu próprio teria preconizado a liquidação dos comunistas ... e que havia uma gravação e tudo ...
Bom, sobre este assunto há a considerar duas hipóteses:
Ou se tratava de uma reunião de militantes do meu partido, na qual à maneira pidesca se infiltrou alguém para espiar;
Ou se o que disse foi em público, seria desnecessária naturalmente a gravação.

Burburinho.

O que importa, no entanto, é isto:
Já aqui fiz críticas ao Partido Comunista dentro de bases realistas ou de carácter meramente ideológico.
Mas aquilo que sublinho agora é que fiz duras críticas a este partido em certos locais do distrito e tornarei a fazê-las, as vezes que julgar necessárias e convenientes.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Ninguém pode ficar indiferente quando se chega a certas zonas do distrito e se vêem as pessoas atemorizadas. Eu próprio fiz sessões de esclarecimento com guardas partidários à minha volta à espera de apanharem o microfone e boicotar a reunião.
Em Ervedal, uma pequena localidade, um camarada meu, com a família, foi obrigado a abandonar a terra por meia dúzia de militantes do PC acompanhados também por um tal Sr. Capitão Andrade e Silva, bem conhecido no meio.
Em Avis, outro camarada teve de abandonar a terra e vir viver em péssimas condições, e desempregado em Lisboa, porque não lhe era permitido entrar na vila e teve de fugir de casa.

Uma voz: - Era fascista!

Burburinho.

O Orador: - Há mais exemplos. Mas estes já bastam para dar ideia do clima criado.
E quando se chega ao extremo de seduzir as pessoas para agredirem quem fale mal do PC, que é que se poderá pensar ... senão de uma autêntica violação à inteligência que atinge as raias do terrorismo psicológico.
Repito. Farei as críticas que achar convenientes e as vezes que forem necessárias.
É assim que entendo a liberdade. É exprimindo opiniões diferentes que se pratica a democracia.
O PC já devia estar convencido de que não é intocável.
Considero e respeito o passado de muitos militantes comunistas. Mas daqui a tirar-se a ilação de que a sua maneira de agir partidária estará sempre certa, tendo como suporte o tal passado ... vai um passo muito grande.
Finalmente, atacaram-se elementos de secretariados do PS.
Não. Também está mal.
O nosso partido é democrático. São os nossos militantes e aderentes que elegem os seus secretariados. Só a eles é que compete julgar, só a eles é que reconheço idoneidade moral para fazer tais afirmações.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Lamento que tivesse de ocupar algum do vosso tempo para esclarecer os pontos ou considerações que demagógica, desenfreada e desmioladamente aqui foram feitos.
Era necessário, no entanto, e é necessário dizer ainda que o PS sempre se orientou no meu distrito, aqui o afirmo, por uma política honesta e verdadeira.
O PS não fez qualquer campanha anticomunista, embora tenha existido campanha anti-socialista.
O PS e os seus elementos não vêm para esta Assembleia atacar A, B ou C. Estamos aqui eleitos para fazermos a Constituição baseada na vontade expressa do povo português.
O PS tem sabido, sem demagogias, sem ataques assanhados, sem calúnias e provocações, corresponder à responsabilidade e à confiança do povo português.
Enfim, cada um sabe as linhas com que se cose, e o povo de Portugal percebeu quem estava com ele. Nas eleições de 25 de Abril votou maciçamente no Partido Socialista, escolhendo de entre os quatro Deputados representantes distritais à Assembleia três socialistas.
Ou seja, mais de 53 % do povo portalegrense escolheu o Partido Socialista.

Vozes: - Muito bem!

Aplausos.

O Orador: - Diz-se e disse-se que o povo não estava preparado. O povo estava preparado. Votou em quem lhe merecia mais confiança, naturalmente.
A pura demagogia verbalística e comicieira, aos slogans gastos e regastos, aos chavões vazios de qualquer sentido (e parece que é isso que se quer trazer para a Assembleia, pois que não foi só ontem que tal aconteceu), o povo de Portalegre disse que não.
Optou claramente por aqueles que nada prometiam para obter lucros políticos, mas tão-só falaram da natureza das eleições e do seu significado para a elaboração da Constituição, de uma Constituição ao serviço das classes trabalhadoras e exploradas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Havia que dar estes esclarecimentos. E para os que só sabem a verborreia de chapa para uso propagandístico que façam a sua autocrítica e que avaliem melhor, de uma vez para sempre, o povo real, no País real que nós somos.
E ponto final no assunto.
Tenho dito.

(O orador não reviu.)

Aplausos.

O Sr. Presidente: - Entrámos na ordem do dia.

Vão ser lidos dois requerimentos.

O Sr. Coelho dos Santos (PPD): - Peço a palavra para interrogar a Mesa.

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1714 DIÁRIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE N.º 57

Há dias, mesmo em cima do termo da hora, isto é, quando findava a ordem do dia, tentou negar-se-me a palavra, em que utilizava o direito de resposta.
Alguns dos que votaram contra a utilização da palavra por mim próprio, hoje, que passa quase uma hora, estão a tentar protelar o período de antes da ordem do dia. Assim, eu pergunto: a Mesa põe ou não põe termo, nos termos do Regimento, a esta discussão?

(O orador não reviu.)

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - A Mesa já pôs termo a esta discussão.

O Sr. Dias Lourenço (PCP): - Bem, Sr. Presidente, se V. Ex.ª deu o direito de resposta ao Sr. Deputado José Luís Nunes, eu tenho também todo o direito de responder.

Geram-se grandes manifestações.

O Sr. Presidente: - Eu quero dizer ao Sr. Deputado o seguinte: efectivamente, e o Regimento prevê o direito de resposta a quem for atacado directamente, se, no uso do direito de resposta, atingir outro Deputado, a mim parece-me que se não pode adoptar já o mesmo critério, porque senão, e posso dar-lhe o exemplo do homem da lata de tinta, que sustenta uma lata de tinta e essa lata de tinta ainda sustenta outra lata de tinta, e assim até ao infinito, ...

Risos.

... de maneira que, com o direito de resposta, perdíamos todo o tempo para a discussão no período de antes da ordem do dia, e, portanto, peço desculpa ao Sr. Deputado, que amanhã poderá tomar a palavra.

O Sr. Dias Lourenço (PCP): - Eu, já agora, admirando o espírito de humor do Sr. Presidente, eu queria apenas dizer o seguinte:

Burburinho.

Eu vou já calar-me.

O Sr. Presidente:- Não, não, não.

O Sr. Dias Lourenço (PCP): - Aqui ...

Burburinho.

Eu vou já calar-me.

O Sr. Coelho dos Santos (PPD): - Se não me for dada a resposta, Sr. Presidente, eu interponho recurso para a Assembleia.

O Sr. Presidente: - A resposta já foi dada ao Sr. Deputado, que já tinha terminado o tempo pari esse efeito, hoje.
Daquilo que se passou na outra sessão eu não sou nada responsável.

O Sr. Dias Lourenço (PCP): - Eu queria apenas dizer que já que agora aqui foi dado ao Sr. Deputado do Partido Socialista que acabou de falar direito de
responder, em que largamente não havia nada de resposta ao que lhe foi dito ontem, portanto ...

Burburinho.

O Sr. Presidente: - Com licença. O direito de resposta, se porventura foi mal usado, não é da responsabilidade da Mesa. Além do que, muitas e variadas vezes, as pessoas que pedem a palavra, dentro deste hemiciclo e indiferentemente por todos os partidos, têm efectivamente pedido a palavra para depois a usarem mal.

Uma voz: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Eu, neste momento, quero que efectivamente se determine, como exercício de um pretenso direito que daria lugar àquele absurdo, de que já mencionei ao Sr. Deputado e que o Sr. Deputado julgava que era um dito de humor, quando afinal de contas é simplesmente uma dedução lógica.

O Sr. Dias Lourenço (PCP): - Em conclusão, V. Ex.ª não me permite usar da palavra hoje. É isso?

O Sr. Presidente: - Não, Sr. Deputado, com esse fundamento. Agora, se quiser recorrer da decisão ...

U Sr. Vital Moreira (PCP): - É para invocar o Regimento.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Considerando que nada há no Regimento que permita o direito de resposta quando as pessoas não são pessoalmente atacadas; considerando que a Mesa deu, erradamente, a palavra ao Deputado José Luís Nunes depois de ter terminado o período de antes da ordem do dia; considerando que, apesar de tudo, nós não protestámos por entendermos que não devia cortar-se a palavra à pessoa interessada em responder aos argumentos políticos aqui produzidos; considerando que a Mesa errou mais uma vez ao dar a palavra ao Sr. Deputado Barbosa de Melo, do PPD, que nem sequer tinha sido pessoalmente referido; considerando que a Mesa errou ainda mais uma vez, e desta da forma mais flagrantemente, ao dar a palavra ao Deputado Júlio Calha para responder a argumentos políticos de uma intervenção produzida ontem, a Mesa o que fez foi abrir um debate que agora não pode encerrar, quando outras pessoas querem intervir no debate, especialmente aquele que se iniciou.

O Sr. Presidente: - Ora, quero dizer ao Sr. Deputado ...

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente, ainda não terminei.
A Mesa tem de decidir, que tendo deixado abrir um debate ...

Apupos.

Manifestações tumultuosas.

Manifestações das galerias.

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3 DE OUTUBRO DE 1975 1715

O Sr. Presidente: - Continue, Sr. Deputado.

O Orador: - A Mesa pode, eventualmente, dar o direito de resposta, mesmo não previsto no Regimento, quando algum dos Deputados seja pessoalmente interpelado ou atacado pessoalmente. Não foi isso que aconteceu. A Mesa errou três vezes ao dar o direito de palavra fora destas circunstâncias, a Mesa o que fez foi abrir um debate com três pessoas que deixou falar ilegitimamente, a Mesa não pode agora, quando a pessoa interpelada quer responder, dar por encerrado o debate, que por sua culpa deixou abrir. Nós não podemos deixar de reclamar perante a decisão da Mesa, que pretende retirar a palavra ao meu camarada Dias Lourenço, e, no caso de a Mesa não reconsiderar a sua posição, nós recorreremos para a Assembleia, não deixaremos de protestar pela ilegitimidade, pela irrazoabilidade da decisão que está a tomar.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Ora, Sr. Deputado, queria dizer-lhe o seguinte: a Mesa poderia ter errado duas, três vezes, mas o Sr. Deputado errou uma vez, mas num tamanho tal que equivale necessariamente às três vezes do pretenso erro da Mesa.

Risos.

Ora, o Sr, Deputado Vital Moreira estava aí sentado no seu lugar e contra o erro da Mesa teria o direito de recorrer para a Assembleia, não o fez.
Portanto, o Sr. Deputado Vital Moreira errou de uma maneira catastrófica e pôs em causa a Mesa, apesar de tudo quanto tinha dito à Assembleia no início da mesma sessão.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente: Acaba de dizer...

O Sr. Presidente: - A Mesa neste momento acaba de não lhe conceder a palavra. Desculpe, mas é uma decisão com um voto contra.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - O Sr. Presidente acaba de responder a argumentos que eu utilizei. Tenho direito, pelo menos, de responder, já que não é o
debate.

Vozes: - Fora! Fora!

Apupos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Vital Moreira sabe perfeitamente...

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente e Srs. Deputados:...

Vozes: - Fora! Fora!

Agitação na Sala.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Vital Moreira sabe perfeitamente que a consideração na ordem pessoal pelas pessoas não autoriza a modificar as fórmulas do Regimento. Portanto, desculpe, mas eu não lhe posso conceder a palavra nesta altura.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - O que se passa é que há um problema. Há um problema ...

Vozes: - Rua! Fora!

A agitação na Assembleia prossegue.

O Sr. Presidente: - Não concedo a palavra ao Sr. Deputado.

Pausa.

Entramos na ordem do dia e o Sr. Secretário tem a palavra para ler o requerimento.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Eu devo protestar ...

O Sr. Secretário (António Arnaut): - Requerimento de substituição de Deputados.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - ... para o facto de o Partido Comunista Português ...

Vozes: - Fora!

Agitação na Sala.

O Sr. Secretário (António Arnaut): - Em nome dos princípios, nem nome do Regimento ...

O Sr. Vital Moreira (PCP): - ... não poder ...

O Sr. Presidente: - Não vale a pena ...
Eu interrompo mas é a sessão. Não está quase na hora do intervalo?
Sr. Deputado Vital Moreira, eu peço-lhe para não usar da palavra. Além de lha ter retirado, neste momento, segundo a Regimento peço-lhe pessoalmente para não insistir no uso da palavra. Só está a contribuir, com a sua tentativa, para causar nesta Assembleia uma efervescência desnecessária.

Assobios.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - A efervescência é da Mesa que me retira o direito de usar da palavra. A Mesa não o pode fazer ...

A agitação tumultuosa generaliza-se a toda a Assembleia.

Proferem-se expressões que no meio do barulho produzido não podem registar-se.

O Sr. Freitas do Amaral (CDS): - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Freitas do Amaral.

O Sr. Freitas do Amaral (CDS): - Queria invocar o Regimento para dizer o seguinte, Sr. Presidente.

Outra voz: - Então dá a palavra a um fascista!

O Sr. Presidente: - Foi para invocar o Regimento que dei a palavra ao Sr. Deputado.

Continua o pandemónio.

Ai ... que história! ...

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1716 DIÁRIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE N.º 57

O Sr. Freitas do Amaral (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Eu queria invocar o Regimento. O Partido Comunista Português propôs que fosse dada a palavra para encerrar o debate que aqui se abriu. A Mesa decidiu em sentido contrário. A Mesa não pode negar ao Partido Comunista Português o direito de usar da palavra para recorrer dessa decisão, se assim o entender.

Aplausos.

Agitação na Sala.

Assobios.

O Sr. Presidente: - Eu quero dizer que, efectivamente, a fórmula de recurso não foi usada ...

Burburinho.

O Sr. Deputado pretende recorrer da decisão da Mesa?

As manifestações prosseguem.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Até que enfim, Sr. Presidente, me é dado o microfone! Eu reclamei para a Mesa e no caso de a Mesa, mais uma vez errando, me indeferir a minha reclamação, eu requeiro para o Plenário no sentido de que, tendo a Mesa aberto um debate, não pode discricionariamente e irregularmente tentar fechar o debate quando a pessoa interpelada é objecto do debate, e quer responder.

O Sr. Presidente: - Vai-se pôr à votação o requerimento do Sr. Deputado Vital Moreira.

Submetido à votação, foi aprovado com poucos votos contra e algumas abstenções.

Vozes: - Então está tudo de acordo!

Uma voz: - Para, que foi tanto barulho?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Dias Lourenço.

O Sr. Secretário (António Arnaut): - Há antes uma declaração de voto.

Burburinho.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Costa Andrade para que é que deseja a palavra?

Agitação na Sala.

O Sr. Costa Andrade (PPD): - Para fazer uma curtíssima declaração de voto.

O Sr. Presidente: - A Mesa decidiu que não há declarações de voto neste caso especial.

O Sr. Secretário (António Arnaut): - Não, não ...

O Sr. Presidente: - Por amor de Deus! Caramba! Deixem ficar assim!

Pausa.

O Sr. Dias Lourenço (PCP): - Bom, eu vou falar, é que exactamente, enfim ... até queria ...

O Sr. Secretário (António Arnaut): - Só um momento, Sr. Deputado.

O Sr. Dias Lourenço (PCP): - Posso falar, Sr. Presidente?

O Sr. Secretário (António Arnaut): - O Secretário Maia e eu próprio não aderimos a esta justificação do Sr. Presidente. Pensamos que o Sr. Deputado Costa Andrade tinha direito a fazer a sua declaração de voto.

Agitação na Sala.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Cunha Leal, para invocar o Regimento.

O Sr. Kalidás Barreto (PS): - Não brinquem com o dinheiro do povo!

Agitação na Sala

Assobios. Apupos.

O Sr. Cunha Leal (PPD): - Determina o artigo 43.º do nosso Regimento que o período de antes da ordem do, dia só pode comportar normalmente o decurso, de uma hora e pode ser prolongado, em determinadas circunstâncias, por mais uma hora. Quer dizer, na sua totalidade, esse período de antes da ordem do dia só pode atingir um máximo de duas horas. Não sei se foi concedido bem ou mal o direito de certas explicações que aqui se produziram. Devo dizer que, em minha opinião, foi mal concedido. Não sei se deveria ter sido concedido o período reclamado pelo Sr. Deputado Vital Moreira, para recorrer para a Assembleia, não sei.
Na minha opinião eu acho que devia ter sido concedido; agora o que em plena consciência entendo é que em circunstância alguma pode ser transcendido o período de duas horas, demarcado para o período de antes da ordem do dia, invocando até, para o efeito, a circunstância já aqui posta em relevo de que estamos a discutir uma Constituição e que é esta, acima de tudo, o que mais importa.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, por deliberação desta Assembleia, o Sr. Deputado Dias Lourenço.

O Sr. Dias Lourenço (PCP): - Bem, Sr. Presidente, eu quando intervim tinha a intenção de manifestar a opinião do Grupo de Deputados Comunistas sobre os acontecimentos de ontem.
Houve o direito de resposta e o Sr. Deputado José Luís Nunes fez algumas considerações quanto à minha intervenção.
Eu quero dizer, e deixar muito claro, que quando se trata de definir o inimigo principal, definir o adversário, eu não tive em vista estar a pôr o PS e os Deputados socialistas como inimigos principais do processo revolucionário, ou até, enfim, pessoas que estão absolutamente contra o processo revolucionário.

Uma voz: - Era o ELP!

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3 DE OUTUBRO DE 1975 1717

O Orador: - Não, eu não quis dizer isso. Eu quis exactamente chamar a atenção para aspectos que objectivamente são contra o processo revolucionário.
E ontem aquilo que se passou tinha exactamente esse carácter. Quer dizer, na medida em que, por motivos que não foram suficientemente justificados pelo PS, não foram comprovados pelo povo português, pelas forças políticas mais responsáveis do País, pelas forças mais interessadas no processo revolucionário, na medida em que estes factos não foram comprovados, é evidente que nós não podemos aceitar que o País seja perturbado, como foi toda esta noite passada, por razões aleatórias. Também queria dizer, já que se falou aqui no 28 de Setembro, e nós podíamos falar não só no 28 de Setembro, no 11 de Março e noutras coisas ... Na altura, quando o Partido Comunista alertou para os perigos da contra-revolução fascista e de golpes conservadores que estavam no «choco», que estavam preparados, na altura foi dito que não era nenhuma intentona, mas que era um inventona do PCP. Hoje, a história, os factos, já demonstraram que, afinal, a inventona tinha todos os factos reais para demonstrar a sua realidade, a sua existência.
Eu penso que em relação ao que ontem foi feito pelo PS, eu aqui e creio que os elementos do Partido Comunista e muitos trabalhadores de Portugal e muitos portugueses não estão aptos a compreender a razão objectiva da mobilização que ontem foi feita pelo Partido Socialista. Falou-se aqui na questão da vigilância e que o comunicado do Partido Comunista Português apela também à vigilância. É verdade, mas, Sr. Presidente, Srs. Deputados, o Partido Comunista Português apela à vigilância contra as manobras da direita, contra os reaccionários fascistas que prepararam o golpe contra a democracia e contra a Revolução Portuguesa rumo ao socialismo. Portanto, essa vigilância popular tem um sentido de classe, um sentido político muito claro. A vigilância que era posta, ontem, no documento do Partido Socialista não tinha exactamente esse carácter. Falavam nos perigos, enfim, da direita, mas eram objectivamente virados noutra direcção. É claro que nós ficámos, inclusivamente, sem saber a que grupos minoritários se referia o Partido Socialista e, portanto, se é ao ELP, não está lá isso.

Burburinho.

Não está! Não está! E eu posso garantir, porque li com muita atenção os documentos do Partido Socialista, que não é isso que está nos documentos.
E, portanto, Sr. Presidente, Srs. Deputados, acho que toda a afirmação que fiz tem, continua a ter, toda a validade. Eu não quis ofender nenhum Sr. Deputado.
Eu não quis, inclusive, criar um problema, um qui pro quo, em relação às questões do VI Governo Provisório. E já agora queria deixar bastante claro: o Partido Comunista Português está no Governo Provisório por duas razões. Uma, porque quis ajudar a saída da crise, uma crise de poder que não pode ser resolvida, que não é resolvida e que não está a ser resolvida pelo VI Governo Provisório. E que não pode ser resolvida por ele.

Agitação na Assembleia.

Esta crise é uma crise muito mais vasta, é uma crise de poder político, é uma crise que exige outros meios, outras formas não só de movimento popular, não só de violência popular, como de medida do aparelho de Estado, da política governamental, são essenciais para a defesa da Revolução. E, portanto, não pode realmente o VI Governo Provisório, tal como as coisas estão, não pode resolver esta crise, mas nós estamos aí para ajudar o almirante Pinheiro de Azevedo nos seus esforços para solucionar a crise ...

Aplausos.

... e estamos aí principalmente para combater, contrariar todos os rasgos de direita que se possam manifestar dentro desse Governo, pela presença nele de elementos objectivamente da direita que estão interessados numa política de direita como os Ministros do PPD.

Aplausos. Apupos.

Portanto, é por isso que o PCP está no Governo. A outra razão ... Eu não me interferi nas questões internas do PPD.
Eu disse muito claramente que a mudança de secretário-geral do PPD era uma questão interna do PPD. Disse-o com todas as palavras.
O que disse também é que as declarações públicas do dirigente do PPD já não pertencem ao PPD, pertencem a quem as ouve, ao povo português. E foram essas declarações que eu aqui referi.

Apupos.

Não toquei nas questões internas do PPD. É muito curioso ouvir os Srs. Deputados atacarem o Partido Comunista Português pela minha intervenção, quando uma grande parte do trabalho nesta Assembleia de muitos dos Srs. Deputados tem sido exactamente atacar, por vezes de maneira soez, o PCP.

Apupos.

E agora está a usar o direito de crítica que os Srs. Deputados invocam. Quando o Partido Comunista a usa, ficam os Srs. Deputados muito feridos.
Isto é uma estranha concepção de democracia nesta Câmara. Portanto, Sr. Presidente, era isto que eu queria dizer em relação à minha intervenção.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, entramos na

ORDEM DO DIA

O Sr. Secretário vai ler dois requerimentos.

O Sr. Secretário (António Arnaut): - Um requerimento de substituição do Deputado João Lima dirigido ao Sr. Presidente da Assembleia Constituinte.

Por haver sido nomeado chefe do Gabinete do Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros, vejo-me forçado a abandonar os trabalhos da Assembleia Constituinte, nos quais participei com o maior entusiasmo, crença e confiança durante quatro meses.
Quedando-me no simples formalismo de comunicar o facto a V. Ex.ª, faltaria certamente àquilo que julgo ser também cumprimento do meu dever de Deputado, que acredita na demo-

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1718 DIÁRIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE N.º 57

cracia e no socialismo, se, na pessoa de V. Ex.ª, não saudasse mais uma vez a Assembleia Constituinte, órgão de soberania com autêntica legitimidade popular, porque eleita em liberdade pelos portugueses, mediante sufrágio directo e secreto.
Saudar a Assembleia Constituinte como emanação da vontade popular, verdadeira e única fonte de soberania, é acto de indeclinável e de exigível patriotismo perante os que, em arruaças destrutivas e na histeria das palavras de ordem de demagogia contra-revolucionária, procuram a todo o custo corroer a capacidade de resistência do povo e, assim, o colocar sob o seu domínio e a sua manipulação exploratória.
Neste contexto de salvação da Revolução democrática interessa mais do que nunca a manutenção e o funcionamento das instituições democráticas, como válida e decisiva forma de oposição a tais bandos, armados ou não, que objectivamente fazem o jogo das forças contra-revolucionárias e que mais não pretendem do que comprometer, se não destruir, a própria independência nacional.
Depois de quase cinquenta anos de opressão moral, física e psicológica, os portugueses elegeram, enfim, a sua Assembleia Constituinte na mais completa liberdade.
Elegeram-na para que fosse elaborada uma lei fundamentalmente revolucionária e adaptada, no espaço e no tempo, ao nosso povo, aos seus interesses, às suas legítimas aspirações.
Completar a Constituição, pô-la em execução e respeitá-la é certamente a concretização do exercício normal da democracia política, como será também pôr em marcha certa, compassada, mas definitiva, a Revolução Portuguesa.
Por isso, no momento em que o Sr. Primeiro-Ministro, Almirante Pinheiro de Azevedo, pede ajuda ao «genuíno povo português» na enorme e urgente tarefa de repor neste País a legalidade democrática e de banir a manipulação, a mentira e a indisciplina contra-revolucionárias, há efectivamente que saudar a Assembleia Constituinte e incentivar os Srs. Deputados, representantes legítimos do povo, no sentido de, com celeridade, sem demagogia e com justeza, ultimarem a consagração constitucional das grandes aspirações do povo português: a da democracia política e a da marcha para o socialismo.
Em V. Ex.ª, Sr. Prof. Henrique de Barros, saúdo o antifascista e o socialista de sempre, que, como Presidente eleito, tem sabido prestigiar a Assembleia Constituinte na condução dos trabalhos e na sua própria representação.
Para V. Ex.ª, Sr. Presidente, e para os colegas Deputados endereço calorosas saudações socialistas.

João Lima (PS).

O Sr. Presidente apôs o seguinte despacho:

Ao Grupo Parlamentar do PS, para indicar o substituto, e, posteriormente, à Comissão de Verificação de Poderes.

Pausa

Vou ler o requerimento do Deputado do PPD Sr. Joaquim da Silva Lourenço:

Nos termos e para os efeitos do artigo 10.º dos Decretos-Leis n.ºs 621-A/74 e 621-B/74 e de acordo com a deliberação tomada pela Comissão Política do Partido Popular Democrático, informo V. Ex.ª de que opto pela manutenção do lugar para que fui designado - Secretário de Estado do Fomento Agrário.
Com os melhores cumprimentos.

Joaquim da Silva Lourenço.

Declaração do Partido Popular Democrático

O Partido Popular Democrático vem declarar que a vaga resultante da perda de mandato do Deputado Joaquim da Silva Lourenço, em consequência da incompatibilidade com o exercício de cargos governamentais prevista nos Decretos-Leis n.ºs 621-A/74 e 621-B/74, de 15 de Novembro, deve ser preenchida pelo candidato do mesmo partido José Augusto de Almeida Oliveira Baptista, residente em Tomar, segundo a ordem de precedência da respectiva lista, solicitando a V. Ex.ª que se promova imediatamente a correspondente verificação de poderes.
Com os melhores cumprimentos.

Lisboa, 1 de Outubro de 1975. - Pelo Grupo Parlamentar, Mota Pinto.

O Sr. Presidente exarou o seguinte despacho:

«A Comissão de Verificação de Poderes.»

O Sr. Presidente: - Intervalo de quinze minutos.

Eram 17 horas e 50 minutos.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.

Eram 18 horas e 15 minutos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Niza.

O Sr. José Niza (PS):

Declaração de voto

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta Assembleia Constituinte aprovou ontem o reconhecimento, a todos os cidadãos, do direito à segurança social. O Partido Socialista e o seu Grupo Parlamentar congratulam-se com o facto, pois foi colocada mais uma pedra dos alicerces da sociedade socialista que desejamos.
Há, no entanto, que pôr em evidência as implicações inerentes à medida que acaba de aprovar-se, tendo em conta a sua amplitude social e económica.
1 - Em primeiro lugar - e dentro de uma perspectiva socialista - há que acentuar que se trata não só do reconhecimento de um direito, mas da verdadeira socialização de uma responsabilidade; é que, ao falar de socialização da responsabilidade, o PS quer com isso significar que os diversos meios que garantirão materialmente a concretização das valências da segurança social terão de ter como proveniência não os descontos dos trabalhadores por-

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tugueses - que assim continuariam a ser explorados - mas o contributo de toda a comunidade - através de um imposto sobre rendimento -, que por esses será responsável.
Isto é, ao contrária do que outros meios defendem quando, através do reconhecimento de um direito, apenas pretendem um investimento que lhes proporcione um melhor rendimento da exploração do trabalho, o PS entende que se trata de uma verdadeira socialização da responsabilidade comunitária.
2 - Em segundo lugar - e na sequência do que acabo de afirmar - o reconhecimento do direito à segurança social só terá sentido e poderá ser garantido se se sintonizar com toda a articulação dos componentes económicos, sociais e culturais que caracterizam uma sociedade socialista, isto é, se não for um acto isolado.
3 - Finalmente, o direito à segurança social representa uma das grandes conquistas das classes trabalhadoras e, também, de todos os que, por razões de idade, doença, invalidez, família, etc., deverão ter os seus direitos assegurados.
Importará, finalmente, clarificar dois conceitos.
O primeiro é o de que, na fase de transição para o socialismo, os meios materiais que hão-de garantir o funcionamento da segurança social terão de ser conseguidos à custa de um imposto sobre rendimento, a considerar pela futura reforma fiscal, e não, como agora acontece com a Previdência, com um desconto de 23,5 % sobre os salários dos trabalhadores, isto é, de um desconto sobre o rendimento do trabalho.
O segundo conceito é o de que o PS considera ultrapassada a noção tradicional (e ainda actual) que corresponde à ideia de um desconto monetário corresponder a um benefício também monetário.
Pensamos que, para além das prestações financeiras ou monetárias, tais como pensões, subsídios, abonos, etc., outros meios terão de criar-se de modo que a segurança social tenha uma capacidade de resposta permanente e universal em relação às necessidades da comunidade. Refiro-me a todo um conjunto de instituições que garantam um efectivo apoio às necessidades e aos direitos das crianças, dos jovens, dos velhos, dos diminuídos, etc., isto é, à criação de creches, infantários, instituições para a terceira idade, centros de recuperação, etc.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Acabamos de tomar uma resolução histórica.
Se a unanimidade verificada significa um acto de solidariedade social, significa também que, talvez, por detrás do manto diáfano da fantasia se esconde a nudez forte da verdade.
Por fantasia, entendo eu todos os fenómenos que, sob a aparência do manto da justiça social, não mais pretendem que esconder a dura realidade que é a eterna descoberta de novas formas de exploração do homem.
Por nudez forte da verdade, quero eu significar, inequivocamente, que a sociedade socialista terá de ser construída pelos trabalhadores, aos quais Bertolt Brecht dizia: «Devem desconfiar de tudo, até do mais pequeno pormenor, mesmo que, aparentemente, seja simples.»

Vozes: - Muito bem!

Aplausos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Martelo de Oliveira.

O Sr. Martelo de Oliveira (PPD): - Sr. Presidente: É para fazer uma declaração de voto, também, em relação à segurança social.
O Partido Popular Democrático congratula-se com o que ontem acabámos de aprovar, em matéria de segurança social.
Ontem, alguns Deputados fizeram considerações sobre o artigo. Mais importante, entendemos nós, do que criticar o que se fez de mal no antigo regime, há que nos congratularmos com o que ontem aprovámos e ontem reconhecemos para a nova sociedade democrática portuguesa e socialista, que desejamos construir. E eu, sem menosprezo pelos outros Deputados aqui presentes, sinto-me com autoridade para me congratulai com o que aprovámos, pois que nas tipificações que fizemos no artigo se incluem as viúvas e os órfãos. É um reconhecimento que acabamos de fazer das pessoas que neste país talvez tenham sido mais vítimas e talvez tenham sido mais exploradas no tempo do fascismo. É um reconhecimento da sociedade activa portuguesa por aqueles que, involuntariamente, deixaram de ter rendimentos. É um reconhecimento da sociedade activa portuguesa por todos aqueles que, depois de terem dado todo o seu esforço à sociedade, foram marginalizados e atirados para o cesto do lixo. Eu, como órfão, pois fiquei órfão aos 7 anos, como já disse nesta Câmara, fui atirado e, em boa hora, fui para uma instituição que, felizmente, fez de mim alguma coisa, mas a melhor pedagogia que se pode dar à juventude e às crianças é o lar. E nós, ao consagrarmos a segurança social para todos os portugueses, estamos a proporcionar à juventude que fica órfã neste país os mesmos direitos e as possibilidades de se realizarem da mesma forma e da mesma maneira daqueles que têm pais vivos para olharem pela sua subsistência. E evitamos os asilos, que, por muito bons que sejam, não são efectivamente os verdadeiros educadores da sociedade. Portanto, eu congratulo-me e o Partido Popular Democrático congratula-se também com o que acabam de consagrar e com o importante passo que demos na construção do socialismo.

(O orador não reviu.)

Aplausos.

O Sr. Presidente: - Vai entrar em discussão o artigo 16.º e as respectivos proposta, que vão sei lidas.

O Sr. Secretário (Maia Nunes de Almeida): O artigo 16.º é o seguinte:

ARTIGO 16.º

(Saúde)

1 - Todos os cidadãos têm direito à saúde e o dever de a defender e promover.
2 - O Estado, apoiado nas organizações populares, garante este direito através da melhoria das condições económicas, sociais e culturais das classes trabalhadoras e da criação de um serviço nacional de saúde, geral, universal e gratuito.

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3 - Este direito é realizado pela criação das condições económicas, sociais e culturais que garantam a protecção da infância, da juventude e da velhice, pela melhoria sistemática das condições de vida e de trabalho, pela criação de um sistema de saúde eficiente ao serviço do povo, por uma política social orientada para a satisfação de todas as legítimas necessidades, pela promoção da cultura física e desporto escolar e popular, e ainda pela promoção da educação sanitária do povo.
4 - Constituem obrigações prioritárias do Estado:

a) Garantir o acesso de todos os cidadãos, independentemente da sua condição económica, aos cuidados da medicina preventiva, curativa e de reabilitação;
b) Assegurar uma racional e eficiente cobertura médica e hospitalar de todo o País;
c) Disciplinar e controlar as formas empresariais e privadas da medicina, articulando-as com o Serviço Nacional de Saúde;
d) Controlar progressivamente o fabrico, a propaganda, a comercialização e o preço dos produtos químico-farmacêuticos, até à nacionalização desses sectores.

5 - O Estado deve orientar a sua acção no campo da saúde no sentido de ser atingida a socialização da medicina.

O Sr. Secretário (António Arnaut): - São numerosas as propostas que temos sobre o artigo em discussão.
Elas serão lidas na devida oportunidade, e já se encontram distribuídas, por fotocópia, aos representantes dos grupos parlamentares.
Quanto ao n.º 1 temos duas propostas.
A primeira, de emenda subscrita pelos Deputados socialistas Miller Guerra e Júlio Pereira dos Reis, do seguinte teor:

Proposta de emenda

Propõe-se no n.º 1 a substituição da frase «Direito à saúde» por «Direito à protecção da saúde».

Outra de aditamento dos Deputados Vítor Sá Machado e mais dois colegas cujos nomes não posso identificar, pelo que peço desculpa, em virtude de as assinaturas serem ilegíveis, do seguinte teor:

Proposta de aditamento

Entre as palavras «cidadãos» e «têm direito», no texto da Comissão, propõe-se o aditamento de:

Sem qualquer discriminação.

O Sr. Presidente: - Estão em discussão as propostas que acabam de ser lidas.
Tem a palavra o Sr. Deputado Miller Guerra.

O Sr. Miller Guerra (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Mercê de causas e circunstâncias de variada ordem, umas históricas, outras procedentes do regime político transacto, outras já dimanadas do regime actual, aglomeraram-se insuficiências graves no campo da saúde.
Podem compendiar-se em poucas palavras os erros e desconcertos principais neste capítulo da administração pública. São os seguintes:

1.º Falta quase completa de uma política da saúde que subordine as acções parciais e isoladas a um pensamento ordenado, coerente e adaptado às necessidades médico-sociais;
2.º Anacronismo da organização administrativa e gestionária;
3.º Péssima repartição dos recursos humanos (médicos, enfermeiros, farmacêuticos, técnicos, administradores) pelo território nacional, de tal modo que se concentram nas zonas urbanas e industriais da orla costeira, escasseando ou faltando de todo nas zonas do interior;
4.º Aumento dos doentes com enfermidades súbitas e graves, especialmente de origem traumática (tipo acidentes de estrada), de doenças crónicas de origem cardiovascular e outras, designadamente as doenças nervosas e mentais;
5.º Procura cada vez maior de serviços médicos, proveniente da menor tolerância ao sofrimento e à enfermidade, o que determina, por sua vez, dois fenómenos próprios da civilização e da cultura: a valorização da doença e o aumento das necessidades médicas;
6.º Desactualização do curso de Medicina e das estruturas hospitalo-universitárias; ausência quase completa de educação de médicos pós-graduados, assim como lacunas graves no ensino da enfermagem e das profissões paramédicas;
7.º Irregularidade e incerteza das carreiras médicas hospitalar e de saúde pública e falta de articulação com a carreira docente universitária;
8.º Dispersão dos doentes, dos médicos, dos meios técnicos e financeiros por variadíssimos locais e serviços, quase todos incapazes de prestar assistência satisfatória (hospitais, serviços médico-sociais das caixas de previdência, casas de saúde, empresas, associações, consultórios privados, etc.).

Isto resulta dos serviços estarem divididos em três sectores paralelos e, o que é pior, concorrentes entre si: um sector estadual, que grosseiramente se pode designar por rede hospitalar, um paraestadual, a Previdência, e outro privado, a medicina livre ou liberal.
Se qualquer destes serviços prestasse a assistência que lhe competia prestar, os doentes não precisavam de recorrer ao sector privado, como tantas vezes sucede.
Os da província seriam tratados no centro de saúde ou no hospital local e não viriam em massa convergir nos hospitais dos grandes centros urbanos, que estão

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constantemente superlotados. Mas as insuficiências técnicas locais, juntas com a falta de confiança, repito, juntas com a falta de confiança, que as populações têm nos serviços médicos das suas terras, provocam o seu deslocamento ao Porto, a Coimbra e, sobretudo, a Lisboa, em busca da cura ou do alívio para os seus padecimentos.
Assim se gerou, agravando-se dia a dia, o estado em que há longos anos nos encontramos, como seria de prever.
É claro que o maior peso cai nas classes trabalhadoras rurais e dos bairros periféricos das zonas industriais, porque não têm posses nem possuem meios de compensar as deficiências dos serviços colectivos, recorrendo à medicina privada. Paradoxalmente, a medicina privada prospera, contra o que se diz, à medida que se efectua a extensão dos serviços médico-sociais dás caixas de previdência. A razão é simples: como a medicina praticada nas caixas é o que todos sabemos, os doentes procuram a clínica livre, embora à custa de sacrifícios financeiros. A Previdência, tratando mal os seus beneficiários; defrauda-os nos seus direitos, levando-os a pagar na medicina privada a assistência que se obrigara a prestar-lhes gratuitamente.

9.º Predomínio esmagador da medicina curativa sobre a medicina preventiva, recuperadora, e, sobretudo, sobre os meios de promoção da saúde (cultura, alimentação, habitação, trabalho, transportes, etc.);
10.º Finalmente, imperfeita participação dos trabalhadores da saúde e dos utentes dos respectivos serviços na gestão local e central.

Decorrem desta sucinta caracterização as seguintes medidas que conduzem à socialização da medicina, isto é, a colocar os serviços médicos ao alcance de toda a população em condições de igualdade, designadamente das classes trabalhadoras.
As diversas entidades e serviços que dispensam a assistência médico-sanitária à população devem ser integrados num único serviço - o Serviço Nacional de Saúde -, cuja finalidade é prestar gratuitamente a todo o cidadão, sem distinções de classe, categoria ou posição social, os cuidados médicos de que carece.
Para lograr este desiderato torna-se necessário fundir a previdência social com a saúde, acabando gradualmente com a medicina privada, ou livre, em particular com a de carácter empresarial.
A medicina privada tenderá naturalmente para a extinção, no caso de a eficiência do Serviço Nacional de Saúde a tornar dispensável.
A saúde é um conceito muito mais lato do que a simples ausência de doença ou enfermidade. A sua conservação e restabelecimento dependem de um extenso leque de condições, tais como o grau de cultura, a alimentação, a habitação, a higiene do trabalho, o meio ambiente, etc.
Os problemas sanitários não se resolvem aplicando medidas estritamente médicas - estas de pouco ou nada são capazes no caso de as estruturas sócio-económicas persistirem fiéis ao modelo capitalista.
Só pode haver verdadeira igualdade de acesso aos serviços médicos na sociedade socialista. Porém, como a saúde é um bem de valor inestimável, a socialização da medicina deve preceder, ou acompanhar de perto, a socialização geral.
Foi à luz destas considerações, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que o PS elaborou as propostas de alteração do artigo 16.º

(O orador não reviu.)

Aplausos.

O Sr. Presidente: - Como mais ninguém pediu a palavra, vai votar-se a proposta de emenda do Partido Socialista.

Pausa.

O Sr. Secretário (António Arnaut): - Com autorização do Sr. Presidente vou recordar a proposta. A proposta visa a substituição da frase «direito à saúde», por «direito à protecção da saúde».

O Sr. Presidente: - Vamos então, agora, proceder à votação.

Submetida à votação, foi aprovada, com 2 votos contra e 17 abstenções.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Pereira para declaração de voto.

O Sr. Sousa Pereira (MDP/CDE): - Votámos contra a proposta de alteração, porquanto nos parece que o seu conteúdo é restritivo do teor da formulação inserta na proposta da Comissão. Os fins que se pretendem atingir parece-nos que estão amplamente conseguidos quando se diz no texto da Comissão «o dever de a defender e promover». Suponho que a promoção da saúde atinja o objectivo que o Sr. Deputado Miller Guerra pretendia atingir com a sua alteração.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Miller Guerra.

O Sr. Miller Guerra (PS): - Agradeço as objecções que fez o Sr. Deputado Sousa Pereira através da declaração de voto, e sugerindo-me esta outra declaração de voto.
É que, diz-se, nós emendamos...

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado desculpe, más só para declaração de voto é que V. Ex.ª tem a palavra.

O Orador: - Disse que era declaração de voto.

O Sr. Presidente: - Não ouço!

O Orador: - Disse que era para declaração de voto.

O Sr. Presidente: - Pode ter dito e não ser.

Parece que pela maneira como estava a expor não era uma declaração de voto.

O Orador: - Vai ser, então!

O Sr. Presidente: - Faz favor de continuar.

O Orador: - Nós introduzimos esta modificação do «direito à protecção da saúde» porque é mais correcta do que «direito à saúde».

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«Direito à saúde» não se pode garantir, ninguém o pode garantir. A saúde é um bem inatingível ou pelo mentos não é um bem atingível.
Portanto, é mais correcto e, aliás; outras Constituições que eu tive ocasião de consultar e já conhecia há muito tempo - e cito a Constituição Francesa e a Constituição Soviética - nenhuma delas fala em «direito à saúde», porque de facto é incorrecto falar em «direito à saúde», mas sim direito à assistência médica, aos serviços médicos, aos cuidados médicos, etc.
Foi o que nós dissemos. Por outro lado, o dever de defender e promover está aqui considerado neste articulado.

(O orador não reviu.)

O Sr. Secretário (António Arnaut): - Há, finalmente, quanto a este n.º 1, uma proposta de aditamento do CDS, que visa introduzir a seguinte expressão entre a palavra «cidadãos» e as palavras «têm direito»: «sem qualquer discriminação».
O texto ficaria, pois:

Todos os cidadãos, sem qualquer discriminação, têm direito à protecção da saúde e o dever de a defender e promover.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o. Sr. Deputado Sá Machado.

O Sr. Sá Machado (CDS): - Este, nitidamente, não necessita, efectivamente, de maior explicitação, é bastante claro. Queria apenas dizer que, pela sua natureza, o direito à saúde, o direito à protecção de saúde é porventura o que menos se compadece com qualquer tipo de discriminação ou privilégio de pessoas, sectores ou classes sociais. Por isso se afirma e se propõe mais adiante que o Serviço Nacional de Saúde tem carácter geral, universal e gratuito.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Mais ninguém pede a palavra?

Pausa.

Vai ser posta à votação esta proposta.
Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Para dizer as razões porque vamos votar contra esta proposta de emenda.
Em primeiro lugar, por uma questão de lógica sistemática, na medida em que nos direitos aprovados até agora não tem sido aprovado este inciso.
Em segundo lugar, porque na sua parte útil, ele já está atingido pelo principio da igualdade dos cidadãos. E em terceiro lugar, pela sua parte inútil naquilo em que ela pode, porventura, proibir discriminações positivas que, apesar de tudo, o princípio da igualdade pode admitir. Por isso mesmo vamos votar contra.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Vai ser posta à votação esta proposta.

Submetida à votação, foi rejeitada, com 7 votos a favor e 51 abstenções.

O Sr. Presidente: - Vai-se votar o texto emendado.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (António Arnaut): - O texto aprovado é o seguinte:

Todos os cidadãos têm o direito à protecção da saúde e o dever de a defender e promover.

O Sr. Presidente: - Propostas relativamente ao n.º 2. A primeira é a dos Deputados socialistas, Miller Guerra e Júlio Pereira dos Reis, e é de eliminação deste n.º 2. Tem prioridade na discussão e votação. Tem a palavra o Sr. Deputado Miller Guerra.

O Sr. Miller Guerra (PS): - A justificação é simples, é que nos pareceu redundante o conteúdo deste parágrafo e resolvemos elimina-lo, deixando com algumas modificações o seguinte.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Pereira.

O Sr. Sousa Pereira (MDP¡CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na verdade, nós também entendemos que havia, efectivamente, uma repetição parcial no conteúdo dos n.ºs 2 e 3 deste artigo. Simplesmente, pensamos que a solução que, em nosso entender, deve ser adoptada, não será aquela proposta pelo Partido Socialista.
Realmente, verifica-se o seguinte:
O n .º 2 contém dois planos. O primeiro plano, define os agentes que promoverão ou, que garantirão o direito dos cidadãos à saúde.
A outra parte, é os meios. É aquela que se refere aos meios.
Na verdade, nós pensamos que se devem manter estes dois aspectos no texto final e por isso propomos a proposta que já está na Mesa e que pedia que fosse lida para consideração dos Deputados do Partido Socialista.
Suponho que a nossa proposta vem ao encontro das nossas preocupações.
Dizia eu, propõe-se que no artigo 2.º se mantenha de facto:

O Estado apoiado pelas organizações populares, garante a criação de um serviço nacional de saúde geral, universal e gratuito.

A seguir, no ponto n.º 3, propomos que se mantenha com ligeiras alterações, mas é só uma questão de pormenores.
Na realidade, propomos, o que também não será intenção do Partido Socialista, eliminar a definição da garantia deste direito.
Por outro lado, isto, para nós, parece-nos muito importante e corresponde de resto a uma preocupação que resultou, como conclusão, das normas democráticas que o Movimento Democrático Português promoveu no ano passado, na qual eu posso dizer que diz realmente isto:

Ausência na população e nos próprios profissionais de uma consciência dos, problemas da saúde, concluídas geralmente com a prática da medicina.

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Deste facto resulta uma ausência das forças de expressão política progressivas como contribuição para a solução dos problemas de saúde. Necessidade de criação de uma nova consciência política dos problemas de saúde, não só ao nível da população, mas também, de maneira importante, ao nível dos profissionais de estruturas sanitárias, com realce para os médicos. Nós pensamos que eliminar o artigo correspondia a eliminar uma parte muito positiva que é a mobilização popular em torno deste problema. Na verdade, não concebemos que se atinja, finalmente, os objectivos que aqui são propostos no n.º 1, se não conseguirmos mobilizar a população para este problema. Pensamos, sim, que o problema da saúde é mais que um problema de medicina, é mais que um problema da protecção dessa saúde, é um problema de mobilização popular na realização de condições materiais que protejam verdadeiramente os cidadãos.
É isto que queríamos dizer.

(O orador não reviu.)

O Sr. Secretário (António Arnaut): - O Sr. Deputado Sousa Pereira solicitou a leitura da sua proposta, relativamente ao n.º2 e tem plena razão.
Vou ler essa proposta, assim como mais duas apresentadas quanto ao texto em discussão, porque interessa conhecê-las antes de iniciar a votação.
Há uma proposta de substituição do Deputado Américo dos Reis Duarte, do seguinte teor:

Proposta de substituição do n.º 2

A UDP propõe que seja retirada desta alínea a expressão «apoiado nas organizações populares», e que seja acrescentado no final da alínea o seguinte: «O Estado apoiará todas as decisões tomadas pelos órgãos de vontade popular.»

O texto, modificado segundo a proposta do Sr. Deputado Américo Duarte, é, salvo erro, o seguinte, para o qual peço a sua atenção:

O Estado garante este direito através da melhoria das condições económicas, sociais e culturais das classes trabalhadoras e da criação de um serviço nacional de saúde geral, universal e gratuito. O Estado apoiará todas as decisões tomadas pelos órgãos da vontade popular.

Há uma proposta de emenda, do Deputado Furtado Fernandes, do PPD, do seguinte teor:

Proposta de emenda do n.º 2

Em nome do Grupo Parlamentar do Partido Popular Democrático, proponho a substituição da expressão «classes trabalhadoras» por «classes mais desfavorecidas».

E há, finalmente, a proposta de emenda do Sr. Deputado Sousa Pereira, que passo a ler:

Proposta de emenda do n.º 2

2. O Estado, apoiado nas organizações populares, procederá à criação de um serviço nacional de saúde, geral, universal e gratuito.
A proposta em discussão, como o Sr. Presidente anunciou, é a eliminação deste n.º 2, apresentada pelos Deputados socialistas Miller Guerra e Júlio Pereira dos Reis.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Miller Guerra.

O Sr. Miller Guerra (PS): - Pedia o favor à Mesa de ler a nossa proposta de substituição do n.º 3 do artigo 16.º

O Sr. Secretário (António Arnaut): - Vou já ler essa proposta. Peço desculpa de o não ter feito, como anunciei de início. Temos muitas propostas relativamente aos vários números do artigo e tornava-se talvez fastidioso lê-las, tanto mais que, como já disse também, elas foram distribuídas por fotocópias aos diversos grupos parlamentares e grupos de deputados.
A proposta dos Deputados socialistas quanto ao n.º 3, e que se encontra para ler, é a seguinte:

Proposta de substituição

Propõe-se a substituição do n.º 3 do artigo 16.º pela seguinte redacção:

Este direito é realizado pela criação de condições económicas, sociais e culturais que garantam a protecção da infância, da juventude e da velhice, pela melhoria sistemática das condições de vida e de trabalho, pela criação de um sistema nacional de saúde universal, geral e gratuito, bem como pela promoção da cultura física e desportiva, escolar e popular, e ainda pelo desenvolvimento da educação sanitária do povo.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Pinto.

O Sr. Mário Pinto (PPD): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Popular Democrático chegou, no estudo que fez acerca desta matéria, às mesmas conclusões, aparentemente, que levaram o Sr. Deputado Miller Guerra, com o seu colega, a propor as alterações para os n.ºs 2 e 3 do artigo em discussão.
Por essa razão, nós iremos votar ambas as propostas apresentadas em nome do Grupo de Deputados do Partido Socialista, apesar de termos pendente na Mesa uma proposta de alteração ao n.º2.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Pereira.

O Sr. Sousa Pereira (MDP/CDE): - Era para fazer uma interrogação ao Sr. Deputado Mário Pinto. Se o Sr. Presidente me dá licença e o Sr. Deputado me quiser responder, eu agradecia. Era para perguntar o seguinte: na verdade, com as propostas que estão na Mesa, do Partido Socialista, é eliminada, entre outras coisas, a consagração do apoio que as organizações populares deverão dar ao Estado neste aspecto da promoção da saúde. Eu pergunto ao Sr. Deputado Mário Pinto se entendeu que a eliminação deste aspecto do problema é ou não impor-

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tante, e, se entendeu que o é, eu perguntava qual a razão por que não apoia a nossa proposta de alteração, que, de resto, completa a vossa.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Pinto, se quiser responder.

O Sr. Mário Pinto (PPD): - Na minha opinião, o Partido Popular Democrático considera com a maior importância a colaboração que as organizações populares possam dar no planeamento e execução de toda a política social, neste aspecto como em muitos outros.
Quero crer que não está na intenção da proposta que foi apresentada e não está na intenção do nosso voto favorável excluir o apoio que essas organizações populares possam dar na matéria. Penso que isso resultará necessariamente da organização político-administrativa que vai ser, com certeza, consagrada na parte adequada da Constituição e que resultará ainda da dinâmica natural de todas as organizações populares. Com certeza que o Estado não vai recusar o apoio e a cooperação dessas organizações. De qualquer modo, não está na nossa intenção, ao aprovarmos a proposta do Partido Socialista, que se entende que excluímos ou proibimos ou menosprezamos essa cooperação.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Avelino Gonçalves.

O Sr. Avelino Gonçalves (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Era para esclarecermos a nossa posição relativamente à votação da proposta de eliminação apresentada por Deputados do PS.
Votaremos contra essa proposta por razões que se aproximam das que já aqui foram aduzidas pelo MDP/CDE, porque entendemos que a referência, quer às organizações populares, quer à necessária ligação entre a actividade das organizações populares e o papel do Estado relativamente a muitas outras coisas, é fundamental e deve ser feita, quer porque entendemos que há que deixar claro que a melhoria das condições de saúde da população portuguesa passa por uma melhoria das condições de vida, do ponto de vista económico, social e cultural das classes trabalhadoras.
Votaremos, pois, contra a proposta de eliminação, e, por maioria de razão, agora, após o esclarecimento dado pelo Sr. Deputado Mário Pinto, através da qual, portanto, se compreende que para o PPD votar a eliminação deste número do artigo em discussão é, de certo modo, pré-resolver questões que para nós são claras já, e acerca das quais temos uma posição bastante diferente da do PPD.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Américo Duarte.

O Sr. Américo Duarte (UDP): - A UDP votará contra uma e outra proposta, mesmo a do MDP/ CDE.

Vozes: - Muito bem!

As restrições da liberdade do povo que o Governo começa a querer impor aparecem desde o início, a torto e a direito, nas propostas apresentadas pela Comissão.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Neste artigo mais uma vez se vê isso. Hoje, todos os partidos burgueses são obrigados a reconhecer a existência dos órgãos de vontade popular. Daí que tentem pô-los a reboque, ao serviço e à disposição do aparelho de Estado burguês, como este artigo sugere.
Enquanto não for a classe operária, os camponeses e o povo trabalhador a estarem no poder, os órgãos de vontade popular não podem servir nem servirão de apoio ao Estado dos patrões.

Uma voz: - Muito bem!

O Orador: - O povo trabalhador tem de ter toda a liberdade. Hoje a burguesia reaccionária começa a atacar essas liberdades para poder manter o seu sistema de opressão e exploração.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Ao contrário do que todos os burgueses pensam, não serão os órgãos de vontade popular que servirão de apoio ao Estado, porque será o Estado que será obrigado a vergar-se a todas as decisões tomadas por esses órgãos, porque são eles a expressão viva da vontade popular, e não umas eleições burguesas que dependem do dinheiro gasto em propaganda, da demagogia dos doutores secretários-gerais e das promessas falsas.

Vozes: - Muito bem!

Uma voz: - É de homem! Em Portimão disseste o mesmo.

Outra voz: - Quem te pagou a passagem?

Vozes: - Ah, grande Américo!

O Sr. Presidente: - Mais ninguém está inscrito, vai proceder-se à votação da proposta de eliminação.
Submetida à votação, foi aprovada, com 19 votos contra e 1 abstenção.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Pereira, para uma declaração de voto.

O Sr. Sousa Pereira (MDP/CDE): - O MDP votou contra por duas razões, que invocou na sua intervenção, e lamenta, realmente, que tenha deixado de ficar consignado constitucionalmente um elemento fundamental de pressão para resolver os problemas da saúde em Portugal. Por outro lado, considera demagógica a razão invocada pelo Sr. Deputado Mário Pinto, do PPD, porquanto também ,já nesta Assembleia se aprovou, e segundo essa argumentação seria desnecessário, números como estes: «compete ao Estado organizar, coordenar e subsidiar um sistema de segurança social unificado e centralizado de acordo

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com a participação das associações sindicais e outras organizações das classes trabalhadores e dos utentes, como foi proposto pelo PPD. Pergunta-se: que lógica existe em aprovar uma e em reprovar a outra?

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Pelas razões que o meu camarada Avelino Gonçalves apontou, votámos contra a proposta de eliminação. O Grupo de Deputados do PCP não quer deixar também de manifestar a sua preocupação perante o facto de normas da Comissão, que considerávamos satisfatórias, estarem a ser eliminadas, isto é, formulações que estão a ser substituídas. por outras ou eliminadas, ou substituídas por outras mais recuadas.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Casimiro Cobra.

O Sr. Casimiro Cobra (PPD): - Abstive-me porque, independentemente da orgânica das próprias organizações populares, entendo que, efectivamente, deviam participar nessa auscultação e nesse apoio.

(O orador não reviu.)

O Sr. Secretário (António Arnaut): - As outras propostas apresentadas para substituição do texto do n.º 2 estão, naturalmente, prejudicadas.
Vou ler de novo a proposta do PS relativa ao n.º 3 e subscrita pelos Srs. Deputados Miller Guerra e Júlio Pereira Reis.

Foi lida de novo.

O Sr. Secretário: - Vou agora lera proposta referente ao mesmo número apresentada pelo Sr. Deputado Sousa Pereira, do MDP/CDE:

Proposta de substituição

O Grupo de Deputados do MDP/CDE propõe a substituição das palavras «Este direito é ...»o por «O direito à saúde é ... ».

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Pereira.

O Sr. Sousa Pereira (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Era apenas para dizer que o MDP retira a sua proposta. Na verdade, a proposta era de razão formal, que agora deixa de ter razão de existir perante a eliminação do n.º 2.

O Sr. Presidente: - Está em discussão a proposta do Partido Socialista.

Pausa.

Ninguém pede a palavra?

Pausa.

Então vamos proceder à votação.

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado José Catarino.

O Sr. Luís Catarino (MDP/CDE): - Luís, Sr. Presidente, Luís.

O Sr. Presidente: - Desculpe, Luís Catarino!

O Sr. Luís Catarino (MDP/CDE): - O MDP/CDE já fez, ainda que lateralmente, comentários acerca da proposta do Sr. Deputado Miller Guerra, relativamente a este n.º 3 do artigo 16.º
Todavia, na sequência de um reparo que fez o meu colega Sousa Pereira, nós agradecíamos ser esclarecidos, ou eu agradecia ser esclarecido, sobre o que é que terá determinado e qual o sentido que estará presente ou subjacente a esse facto, a eliminação da expressão «ao serviço do povo»; que parece ao MDP que era uma expressão rica de sentido e que vinha na proposta da Comissão, onde se diz «pela criação de um sistema de saúde eficiente ao serviço do povo».
Nós já ramos, com preocupação, que na votação anterior foi eliminada a referência a organizações populares. Estamos sentindo igual ansiedade relativamente à eventual eliminação desta expressão.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Ora, antes de prosseguirmos a discussão, queria avisar os Srs. Deputados, antes que este hemiciclo se despovoe, que amanhã a sessão começa às 14 horas.

Tem a palavra o Sr. Deputado Miller Guerra.

O Sr. Miller Guerra (PS): - É para responder à objecção do Sr. Deputado Luís Catarino, que estranha ter-se eliminado «ao serviço do povo, mas está aqui consignado o seguinte: «pela criação de um sistema nacional de saúde universal, geral e gratuito». Como o Sr. Deputado sabe, «universal», quer dizer tecnicamente que é para todos; «geral quer dizer para todos os serviços médicos.
Noutras condições, não parecia necessário sublinhar o «povo».

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Pereira.

O Sr. Sousa Pereira (MDP/CDE): - Já tivemos ocasião de dizer, várias vezes, nesta Assembleia que esta Constituição - Constituição de transição - tinha de ter um valor apologético, um valor que definisse o seu sentido de orientação rumo ao socialismo.
Na verdade, nós entendemos perfeitamente o significado das palavras «geral» e «universal». Mas, mesmo a todo o território, o Serviço Nacional de Saúde pode ter intenções que, efectivamente, não sejam aquelas que nós não desejaríamos ver aqui consignadas. Parece-me que, por outro lado, não haveria qualquer mal em, mesmo assim, reforçar esta expressão. Por isso mesmo, proporíamos que à proposta do Partido Socialista, e nós entendemos que as palavras que acima estavam ditas tinham de ser retiradas para baixo, mesmo assim, propomos que à proposta do

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Partido Socialista, e este Partido verá da viabilidade de aceitar ou não esta sugestão, fosse dada a seguinte redacção: «Criação de um sistema nacional de saúde universal, geral, gratuito e ao serviço do povo, etc.»

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado proponente quer, porventura, usar da palavra?

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado Miller Guerra.

O Sr. Miller Guerra (PS): - Já que V. Ex.ª me chamou à colação, eu vou repetir aquilo que disse: «universal e geral» não necessita de uma determinação «povo», porque universal é para todos. Agora, de facto, eu compreendo que teria mais força pôr «povo», mas não alterava em nada, porque o sistema nacional de saúde é verdadeiramente um sistema nacional, um sistema que engloba toda a população. Parece, portanto, redundante acrescentar «povo».

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à votação desta proposta.

Submetida à votação, foi aprovada, com 2 votos contra.

O Sr. Secretário (António Arnaut): - A proposta foi aprovada porque houve apenas duas abstenções. Perdão, eu quis dizer que houve apenas dois votos contra e nenhuma abstenção, naturalmente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Pinto.

O Sr. Mário Pinto (PPD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma curtíssima declaração de voto. O voto do Partido Popular Democrático foi solidário para a proposta de eliminação do n.º 2 e esta redacção proposta para o n.º 3. Aproveito a oportunidade para dizer que as referências que mais uma vez o Sr. Deputado Avelino Gonçalves e o Sr. Deputado Sousa Pereira quiseram fazer ao Partido Popular Democrático manifestam um particular gosto daqueles Srs. Deputados relativamente a ataques ao nosso Partido. Já uma vez aqui disse e repito que se isso lhes dá muito gosto poderão continuar a fazê-lo, na certeza de que lhes sobeja o direito, mas lhes falta a razão.

(O orador não reviu.)

Aplausos.

O Sr. Secretário (António Arnaut): - Como se recordam, há ainda uma proposta de aditamento, mas o Sr. Américo Duarte quer pedir a palavra. O Sr. Presidente, é que dirá.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Américo Duarte.

O Sr. Américo Duarte (UDP): - Ao ser votado este artigo é bom ter presente o que é a mortalidade infantil em Portugal e o que são as condições de vida do povo trabalhador.
Em cada 1000 crianças que nascem em Portugal 40 morrem antes de 1 ano de idade. A média é das mais elevadas da Europa.
As causas desta situação - alimentação deficiente, poucos recursos de assistência, falta de assistência médica durante a gravidez, falta de médicos em zonas rurais, falta de água, inexistência de esgotos, falta de vacinação - não são desconhecidas de ninguém.
São é ignoradas por muitos, pela larga maioria que costuma aqui aprovar propostas.
De nada serve este artigo se não se apontar desde já para a resolução destes problemas.
As condições de vida do povo português estão também intimamente ligadas com este artigo.
Em Portugal 60 % da população não tem água ao domicílio. Em Portugal 83 % da população não tem esgotos. Em Portugal 61 % das habitações não têm recolhas de lixo. Em Portugal 80 % das habitações não têm as mínimas condições para uma vida saudável.
Salazar, Caetano e os seus Ministros conheciam estes dados, mas não lhes ligavam. O Governo hoje conhece estas situações, mas parece ignorá-las.
Os partidos burgueses fazem promessas e nada cumprem.
É cada trabalhador, cada explorado, que tem de ver que na sua situação vivem milhões de outros trabalhadores. São os trabalhadores que têm de avançar para a resolução destes problemas.
O sector da construção civil é um dos que tem maior número de desempregados. Que se formem comissões de desempregados e entrem em contacto com as comissões de moradores e que estas exijam às autarquias locais os meios materiais de solucionar este problema, em conjunto com as comissões de desempregados.
Estes problemas estão todos ligados, e não se pode falar em melhorar as condições de vida sem se avançar na sua resolução.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Secretário (António Arnaut): - Como estava dizendo, há uma proposta de aditamento dos Deputados do CDS - Oliveira Dias e Vítor de Sá Machado.
Com vénia do Sr. Presidente, pergunto aos proponentes se desejam manter a proposta, visto que ela é de aditamento ao texto da Comissão e foi aprovada, em substituição, a proposta do Partido Socialista.

O Sr. Vítor de Sá Machado (CDS): - Sim, Sr. Presidente. Nós pretendemos manter esta proposta, como aditamento ao novo texto votado e da proposta do Partido Socialista.

O Sr. Secretário (António Arnaut): - Então, o Sr. Deputado proponente, esclareceu que deseja manter esta proposta de aditamento que vou ler:

Proposta de aditamento ao n.º 3

O Serviço Nacional de Saúde é financiado por verbas do Orçamento Geral do Estado. A respectiva gestão obedecerá aos princípios da centralização normativa e descentralização na execução, mediante a participação, nesta, dos utentes

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e dos grupos sociais em que se integrem, devidamente representados nos termos a definir pela lei.

Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Pereira.

O Sr. Sousa Pereira (MDP/CDE): - Tenho o direito de resposta, já levantei várias vezes o braço, mas a Mesa não viu.
Era para responder ao Sr. Deputado Mário Pinto, da referência pessoal, e apenas essa, que fez à minha intervenção.
Queria dizer que as minhas intervenções aqui nunca o são a nível pessoal. Portanto, não é o Deputado Sousa Pereira, mas o partido que eu aqui represento, que tem posições perfeitamente demarcadas em relação ao partido que o Sr. Deputado Mário Pinto representa. Em relação aos direitos que aqui tenho de expressar as minhas ideias e as minhas razões, pois ele não me será conferido pela declaração do Sr. Deputado Mário Pinto. Quanto às razões que ele diz que me faltam, também não será o Partido Popular Democrático, nem o seu Deputado Sr. Mário Pinto a julgá-las, mas as pessoas que analisarem calmamente a forma como o PPD tem votado contra as aspirações populares e a forma como o MDP tem votado pelas aspirações populares.

O orador não reviu.

Agitação na Assembleia.

Vozes: - Não apoiado!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Pinto.

O Sr. Mário Pinto (PPD): - Sr. Presidente: Eu fiz uma declaração de voto, não discuto, se bem, se mal. O Sr. Deputado Sousa Pereira entendeu que devia usar da palavra em função disso. Creio que tenho o mesmo direito, e talvez se eternize, rogando este mesmo direito de resposta. Só quero dizer ao Sr. Deputado uma coisa.
Não contesto que ele fale em nome do seu partido. Isso para mim é-me indiferente, mas aproveito a oportunidade para lhe dizer o seguinte: além de manter o que disse, quero salientar mais uma vez que escusa o Sr. Deputado Sousa Pereira ou o seu partido de querer marcar distâncias relativamente ao Partido Popular Democrático, porque, além do mais, os satélites não mantêm distâncias de quem quer que seja.

Risos.

Em segundo lugar, o Partido Popular Democrático tem marcado, muito claramente, as distâncias relativamente ao MDP. O povo sabe-o muito bem. Soube-o quando foi das eleições, e reconheceu-o pelo voto, soube-o posteriormente e tem reconhecido pelas suas manifestações, e há-de reconhecê-lo posteriormente, pelo voto. O futuro o dirá.
É ridícula a preocupação que o Sr. Deputado Sousa Pereira manifesta em seu nome, ou em nome do seu partido, relativamente a quaisquer distâncias do Partido Popular Democrático. É a única palavra que eu acho adequada para não ir mais longe: «ridículo».

(O orador não reviu.)

Vozes: - Muito bem!

Aplausos.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Para provocador não está mal ...

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Pereira.

O Sr. Sousa Pereira (MDP/CDE): - Invoco mais uma vez o meu direito de resposta.

Apupos. Vozes dispersas impossíveis de registar.

O Orador: - Quero aqui declarar que considero provocação da pior espécie, mas que não me admira as referências feitas ao meu partido,

Uma voz: - Já não existe, pá!

O Orador: - É evidente, mas muito evidente, que a sectarização de que nos acusa não nos importa muito, importa-nos e deveria, com certeza, o Partido Popular Democrático importar-se com a sua aproximação à direita e relativamente aos contra-revolucionários.

(O orador não reviu.)

Aplausos. Apupos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, era para invocar o Regimento. Esta Assembleia não pode continuar a assistir a um jogo clássico de ping-pong, em que as pessoas devolvem a bola umas para as outras.
Em primeiro lugar, o uso do direito de resposta é um direito individual que, evidentemente, compete ao visado e ao bom senso do visado em responder ou não responder.
Segundo, o Regimento não o permite nos termos em que está a ser utilizado.
Em terceiro lugar, o principal e aquilo que nos interessa é fazer a Constituição.

(O orador não reviu.)

Vozes: - Apoiado!

O Sr. Presidente: - A Mesa está de acordo com as palavras do Sr. José Luís Nunes, mas não tem culpa nenhuma daquilo que se tem passado hoje neste hemiciclo. Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Ainda sobre este assunto, Sr. Presidente, quero apoiar as palavras do deputado José Luís Nunes, dizendo que elas se aplicam a todos, inclusive o Deputado José Luís Nunes (risos) e dizer que a Mesa de facto não pode enjeitar as responsabilidades que tem tido hoje e noutras sessões. Particularmente neste caso a Mesa não devia

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ter concedido naturalmente o direito de resposta uma vez que nenhum deputado tinha sido atingido pessoalmente.

Vozes: - Apoiado!

O Sr. Presidente: - Está em discussão a proposta do CDS.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Ora, sobre a proposta do CDS, nós vamos abster-nos. E vamos abster-nos não porque não consideremos que muitos dos princípios que aqui estão consagrados não sejam importantes e necessários. Simplesmente não dispomos, neste momento, da necessária capacidade de tirar as necessárias consequências e de integração deste nos preceitos constitucionais. Portanto, pareceu-nos mais correcta a posição de abstenção.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Mais ninguém pede a palavra?

Pausa.

Vai proceder-se à votação.

Submetida à votação não foi aprovada, tendo obtido 18 votos contra e 9 a favor.

O Sr. Secretário (António Arnaut): - Temos agora as propostas respeitantes ao n.º 4 do artigo em discussão. Proposta dos deputados socialistas Miller Guerra e Júlio Pereira dos Reis do seguinte teor:

Proposta de substituição

Propõe-se a substituição do corpo do n.º 4 do artigo 16.º pela seguinte redacção: «Compete ao Estado:»

Outras propostas:
De emenda do Deputado Vital Moreira (PCP), respeitante à alínea a):

a) Garantir o acesso de todos, em especial das classes trabalhadoras, aos cuidados da medicina preventiva, curativa e de reabilitação.

Proposta de eliminação da alínea b) dos Deputados socialistas já citados do seguinte teor:

Propõe-se a eliminação da alínea b) do n.º 4 do artigo 16.º

Proposta de aditamento da alínea c) do Deputado Américo dos Reis Duarte.

A UDP propõe que seja acrescentado a esta alínea o seguinte: com vista a poder acabar com elas.

Risos.

Proposta de substituição da alínea d) dos Deputados socialistas Miller Guerra, Júlio Pereira dos Reis e Amílcar Pinho:
Propõe-se a substituição da alínea d) do n.º 4 do artigo 16.º pela seguinte redacção:

Disciplinar e controlar a produção, a comercialização e o uso dos produtos químicos, biológicos e farmacêuticos.

Proposta de substituição da alínea d), do Deputado Américo dos Reis Duarte, com a seguinte redacção:

Proposta de substituição da alínea d)

O acesso aos medicamentos é gratuito e os laboratórios farmacêuticos serão nacionalizados.

Ainda quanto à alínea d), do Deputado Vital Moreira.

Até à nacionalização desses sectores.

Ainda quanto à alínea d), do Deputado social-democrata Teodoro da Silva. Proposta de aditamento à proposta de substituição do PS da alínea d) do artigo 16.º:

Proposta de aditamento à proposta de substituição do PS da alínea d) do n.º 4 do artigo 16.º:

E outros meios para diagnóstico e tratamento.

Ficando: disciplinar e controlar a produção e comercialização dos produtos químicos, biológicos, farmacêuticos e outros meios para diagnóstico e tratamento.

Quanto à alínea e) (nova), os Deputados socialistas Miller Guerra, Júlio Pereira dos Reis e Amílcar Pinho propõem a seguinte redacção:

Orientar a sua acção, no campo da saúde, visando a socialização da medicina e dos sectores médico-medicamentosos.

Finalmente, e quanto à alínea f) (nova), o Deputado comunista Vital Moreira propõe a seguinte redacção:

Apoiar todas as iniciativas das organizações populares que visem promover os objectivos referidos no presente artigo.

Voltarei a ler estas propostas na devida oportunidade. A primeira refere-se ao corpo do número, dos Deputados socialistas já referidos, e visa substituir a expressão «constituem obrigações prioritárias do Estado» por «compete ao Estado».

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Parece-nos que a proposta de alteração significa um amolecimento em relação à fórmula que vem da Comissão. De facto, o que vem da Comissão, «constituem obrigações prioritárias do Estado», pretender que seja substituído por «compete ao Estado», que, na sua significação, significa apenas a

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atribuição de uma competência, não nos parece que seja razoável sequer. Admitiria que, a exemplo do que já se fez noutras disposições, se substituísse esta expressão por «incumbe prioritariamente ao Estado», ou semelhante. Não me parece que a substituição pela simples palavra «compete» tenha algum sentido, a não ser efectivamente tirar o sentido que a expressão da Comissão tem. Significa, sem dúvida, um enfraquecimento, um amolecimento grave da proposta que vem da Comissão.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Catarino.

O Sr. Luís Catarino (MDP/CDE): - O MDP também entende que é uma desvirtualização, digamos, da força do texto que vinha da Comissão. Esta preocupação do MDP insere-se, exactamente, na linha das suas preocupações já manifestadas anteriormente, relativamente aos outros números. Parece que, efectivamente, toda a força, até programática, que era apontada pelo texto da força é perdida, e é perdida completamente, independentemente até, de um mau rigor formal, através da redacção proposta.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Pinto.

O Sr. Mário Pinto (PPD): - Eu não quero, efectivamente, Sr. Presidente e Srs. Deputados, não desejo alimentar a guerrilha a das «incumbes» contra os «competes», o Partido Popular Democrático entende que, em lugares como este, a palavra tecnicamente correcta é «incumbe» e não «compete». Espero que a Comissão de Redacção, sem prejudicar o conteúdo essencial dos preceitos, escolha a melhor terminologia. Relativamente ao problema de conservar ou não a referência a «prioridades», trata-se obviamente de uma questão com alcance técnico no domínio da política de saúde, não nos oporíamos a que se preservasse o advérbio se, efectivamente, fosse feita uma proposta nesse sentido. A sugestão do Sr. Deputado Vital Moreira com a fórmula «incumbe prioritariamente ao Estado» merecia a nossa aprovação prioritária.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Nós temo-nos preocupado em, desde já, fazer uma uniformização terminológica e, como temos utilizado o «compete», parece que é necessário continuarmos a utilizar o «compete».
Quanto ao «prioritariamente ao Estado», nós não vemos inconveniente nenhum em que fique aqui «compete prioritariamente ao Estado», mas desde o momento em que se diz «compete ao Estado» e se enunciam quatro coisas, e já sé sabe que há outras coisas que competem ao Estado nesse campo, está-se a ver, é redundante que estas coisas são prioritárias, senão não eram aqui enunciadas. De qualquer forma, atendendo á sugestão dos grupos parlamentares aqui presentes, nós alteramos a nossa proposta e ficaria «compete prioritariamente ao Estado».
Quanto ao «incumbe», como já para trás temos usado a terminologia «compete», pareceu-me que, desde que isso foi dito, temos de uniformizar mesmo a terminologia tanto quanto possível.
Portanto, ficaria «compete prioritariamente ao Estado».

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Pinto.

O Sr. Mário Pinto (PPD): - Não quero demorar os trabalhos.
Para mim, é mais importante a correcção da terminologia do que manter a uniformidade de um erro.

Uma voz: - Muito bem!

O Orador: - De modo que, se houver duas propostas, uma com «incumbe» e outra com «compete», nós votaremos «incumbe».

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Há aqui dois problemas. Um aparentemente terminológico, que é a transformação para «incumbe», e o outro que é manter, ou não, a expressão «prioritariamente».
Talvez uma solução fosse votar-se separadamente uma e outra das questões.

(O orador não reviu.)

O Sr. Secretário (Maia Nunes de Almeida): - De qualquer maneira, parece-me que a proposta para a transformação para «incumbe» ainda não está na Mesa.

Pausa.

Talvez alguém dos grupos parlamentares queira apresentar essa proposta, na medida em que não está.

Pausa.

Já agora pedia-se ao Sr. Deputado José Luís Nunes se fica, na verdade, «compete prioritariamente ao Estado» na sua proposta.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Não vemos inconveniente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Nós mantemos aí na proposta da Comissão:

São obrigações prioritárias ou prioritariamente são obrigações do Estado ...

Há três propostas, portanto.

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O Sr. Presidente: - Como mais ninguém pede a palavra, vai-se votar a primeira proposta. Do Partido Socialista, bem entendido.

Submetida à votação, foi aprovada com 19 votos contra e os restantes a favor.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Pinto. Creio que está em primeiro lugar.

O Sr. Mário Pinto (PPD): - Sr. Presidente, queria esclarecer-me acerca do que foi votado. Foi acerca da palavra «compete»? Queria que a Mesa me esclarecesse acerca do que estava em causa nesta votação. Há aqui dúvidas no meu Grupo acerca do que estava em causa nesta votação.

O Sr. Secretário (Maia Nunes de Almeida): - A votação em relação à proposta, como o Sr. Presidente acabou de dizer, do Partido Socialista tinha o seguinte texto:

Compete prioritariamente ao Estado ...

O Sr. Mário Pinto (PPD): - Portanto, era na sua totalidade. Então, nessa altura, quero afirmar que a nossa votação está conforme a nossa vontade.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Era apenas para dizer que julgávamos estar em discussão e em votação, apenas, a primeira questão: saber se ficava «incumbe» ou «compete». Naturalmente votámos prioritariamente e, neste sentido, as nossas votações em relação à proposta do PS devem ser tomadas como uma abstenção.

O Sr. Secretário (Maia Nunes de Almeida): - Rectificamos assim a votação da proposta, passando a ser 19 abstenções e os restantes votos a favor.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Catarino.

O Sr. Luís Catarino (MDP/CDE): - O Sr. Secretário já deu conta da nossa preocupação. É que há a acrescentar também os nossos votos contra. Os nossos votos foram contra.

O Sr. Secretário (Maia Nunes de Almeida): - É que eu realmente passei dos votos contra para as abstenções. Foi um falha minha. De qualquer maneira, e rectificando por último, são, na verdade, 19 abstenções, 1 voto contra e os restantes a favor.

O Sr. Luís Catarino (MDP/CDE): - 2 votos contra, Sr. Secretário.

O Sr. Secretário (Maia Nunes de Almeida): - Então, pronto, são 3 contra, pois o Deputado da UDP também votou nesse sentido.

Risos.

A proposta que está a seguir é sobre a alínea a).
Foi lida de novo.

O Sr. Presidente: - Está em discussão a proposta do Deputado Sr. Vital Moreira. Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Ao votarmos contra a eliminação do n.º 2, afirmamos que uma das razões que nos levava a fazê-lo era o facto de se eliminar uma defesa às classes trabalhadoras. A proposta de emenda que agora fazemos, sem retirar o sentido à expressão «garantir a todos o direito a esses cuidados da Medicina», a apontar para a necessidade de atenção especial dada à sua condição de desprotecção às classes trabalhadoras. É este o sentido da emenda.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Se mais ninguém usa da palavra, vai-se proceder à votação da proposta do Sr. Vital Moreira.

Submetida à votação, foi rejeitada, com 20 votos a favor e 1 abstenção.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Catarino.

O Sr. Luís Catarino (MDP/CDE): - O MDP votou a favor da proposta pela razão indicada pelo Partido Comunista Português e mais por outra. É que seria de alguma maneira um meio de recuperar aquilo que me parece que foi perdido relativamente à eliminação ao serviço do povo do n.º 3 anterior.

(O orador não reviu).

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente: Manifestando a nossa surpresa pelo resultado da votação, particularmente pela votação do Partido Socialista, não podemos deixar de notar que, afinal, a proposta de eliminação do n.º 2 não era apenas uma questão técnica. Visava, efectivamente, eliminar a referência «a classe trabalhadora».

(O orador não reviu).

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Em declaração de voto, diremos somente o seguinte: que garantir o acesso de todos os cidadãos, em especial das classes trabalhadoras, é menos lato do que está aqui assim: «garantir o acesso a todos os cidadãos, independentemente da sua condição económica». Pode haver trabalhadores ricos e até de uma aristocracia operária.

(O orador não reviu).

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Pinto.

O Sr. Mário Pinto (PPD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O nosso voto fundamentou-se na razão que invocámos, no sentido de que o bem da

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saúde é um bem universal, que deve ser concedido a todas as pessoas, independentemente da sua classe ou situação.
Nesta medida, é evidente que o Estado não poderá descurar ou proporcionar este bem às classes trabalhadoras.

m segundo lugar, quero assinalar mais uma vez que existem categorias ou estratos de pessoas que não são trabalhadoras, porque, naturalmente, podem estar impedidas de o ser, designadamente as pessoas diminuídas física ou mentalmente, que, porventura, poderiam ter, a fazer-se qualquer referência ou a dar-se qualquer privilégio, essas sim, aqui uma referência ou um privilégio. Portento, somos contra qualquer espécie de discriminação e é, nessa medida, que fizemos o nosso voto.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Mais ninguém pede a palavra?

Pausa.

Vai proceder-se à votação do texto da Comissão.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Mata Nunes de Almeida): Está na Mesa uma proposta de eliminação da alínea b) do mesmo n.º 4, assinada pelos Deputados do Partido Socialista Miller Guerra e Júlio Pereira dos Reis.

O Sr. Presidente: - Algum dos Srs. Deputados pretende usar da palavra?
Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Pereira.

O Sr. Sousa Pereira (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se me desse licença eu faria uma pergunta aos proponentes.
Desejaria uma justificação, mesmo que breve, da razão desta eliminação.
Eu queria acrescentar apenas que, há bocado, uma das deficiências que eu apontava ao nosso sistema foi uma má cobertura regional hospitalar e parece-me que a supressão desta alínea vem contrariar a resolução desta deficiência, que o Sr. Deputado Miller Guerra manifestou.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Avelino Gonçalves.

O Sr. Avelino Gonçalves (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Era para declarar que pela nossa parte nos opomos à proposta de eliminação. Parece-nos razoável pensarmos que esta proposta de eliminação, relacionadamente com a exclusão do corpo do artigo, referente a prioridades das tarefas que incumbem ao Estado quanto à saúde. Uma vez que se mantém o corpo do artigo referente a essas prioridades, queremos que entre elas se conte esta que a alínea b) contempla.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Miller Guerra.

O Sr. Miller Guerra (PS): - Aparentemente, os Srs. Deputados, e particularmente o Sr. Deputado Sousa Pereira, tem razão. Realmente o que avulta no serviço de saúde não é talvez o mais importante, são os serviços de medicina curativa, dos quais a rede hospitalar, que é o mais importante e o mais conhecido. Mas a rede hospitalar, nas palavras aqui do texto, a cobertura médica e hospitalar de todo o país é apenas um dos aspectos do desiderato e um dos aspectos do serviço nacional de saúde.
Desde que se diga que há um serviço nacional de saúde que é universal e que é geral, é desnecessário estar a falar em cobertura médica e hospitalar, visto que é uma e a mesma coisa.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente, a explicação do Deputado Miller Guerra pode ter algum fundamento, isto pode ser uma particularizante do serviço de saúde.
Simplesmente este argumento tem aqui tido tão pouca importância, e em muitos casos com razão, que não devemos atribuir-lhe qualquer valimento.
Se é uma particularização, é uma particularização importante, e eu, que estive atento à intervenção de alguns Deputados sobre o sistema de saúde existente e sobre as condições de saúde existentes, devo lembrar que um dos pontos que foi apontado foi a concentração de equipamentos e de médicos em determinadas cidades do País, foi o próprio Deputado Miller Guerra que apontou isso. Creio que até por isso esta disposição se deve manter como particularizante privilegiada do serviço nacional de saúde.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Pereira.

O Sr. Sousa Pereira (MDP/CDE): - Nós votaremos contra esta proposta de eliminação. E votaremos contra esta proposta de eliminação pelos motivos que já foram aqui invocados e a que nós já nos referimos numa das intervenções anteriores. Não entendemos que o Serviço Nacional de Saúde se restrinja apenas à cobertura médica e à cobertura hospitalar. É muito mais do que isso, mas agora não está em causa esse aspecto. Eu recordo-me, não sou especialista da matéria, mas recordo-me das discussões que tivemos em volta deste assunto na Comissão. E mais importante parece-me aqui a criação e a cobertura, parece-me ser outra ideia que está aqui expressa e que foi esquecida na intervenção do Sr. Deputado Miller Guerra, que é assegurar uma racional e eficiente cobertura. Isso mesmo, e foi lá referido várias vezes na Comissão, que se verifica em determinadas zonas do país, haver hospitais praticamente vazios ou por falta de médicos ou até por falta de equipamento e haver nas zonas referidas de concentração hospitalar e médica deficiências graves que perturbam realmente o exercício e o livre direito à protecção da saúde. Nós queremos aqui chamar a atenção deste aspecto que nos parece importante. Não só está

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aqui expressa a ideia de cobertura, mas também está expressa a ideia da sua eficiência e nacional aproveitamento. Era aqui que queríamos chamar a atenção e parece-nos que na verdade isto não esgota de maneira nenhuma o conteúdo de uma coisa que consideramos muito mais importante que o Serviço Nacional de Saúde.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Coelho dos Santos.

O Sr. Coelho dos Santos (PPD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Eu, e esta intervenção é a título meramente pessoal, também tenho sérias dúvidas sobre a eliminação deste número. E porque as tenho eu vou pedir ao Sr. Deputado que apresentou a proposta de eliminação que me esclareça sobre o seguinte: no n.º 2 há realmente uma referência a um Serviço Nacional de Saúde, geral, universal e gratuito. Esta universalidade pode ser uma universalidade de pessoa ou geográfica.
Ora, parece que se impõe efectivamente a correcção das assimetrias no campo da saúde.
E se assim é, eu pessoalmente estou convencido de que a alínea h) do n.º 4 seria mais concisa quanto a uma actuação nesse campo.
Agradecia uma melhor explicitação.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Miller Guerra.

O Sr. Miller Guerra (PS): - Eu não quero prolongar esta discussão e embora mantenha argumentação e seria ainda mais lata mas que não exponho. E retiro a proposta visto que isso estará de acordo com uma boa parte dos Srs. Deputados. Ficam muito satisfeitos, julgando que se trata de uma alta modificação, ficando assegurada nacionalização eficiente. E isto, volto a dizer, é a essência do Serviço Nacional de Saúde. Desde que há um Serviço Nacional de Saúde, isto implicitamente está cumprido.
Mas eu retiro a proposta.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Ninguém mais pede a palavra?

Pausa.

Vai votar-se o texto da Comissão.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Maia Nunes de Almeida): - Sobre a alínea c) há uma proposta de aditamento do Sr. Deputado Américo Duarte, da UDP, em que propõe que a seguir ao texto da alínea seja acrescentado o seguinte: «com vista a poder acabar com elas».

Risos.

Pelo que se votará primeiro o texto da Comissão.

O Sr. Presidente: - Se ninguém mais pede a palavra, vai votar-se.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Peço imensa desculpa a V. Ex.a, mas não foi lida nesta altura uma proposta do PS completamente nova em relação a este texto. Foi só lido o aditamento do Sr. Deputado Américo Duarte. Para que os Srs. Deputados possam determinar era conveniente que fosse lida também a nossa proposta, e não só a proposta do Sr. Deputado Américo Duarte.

O Sr. Secretário (Mais Nunes de Almeida): Queira desculpar, Sr. José Luís Nunes, mas na verdade a proposta não se encontra na Mesa, pelo que me parece que a culpa não será da Mesa.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Desculpe, foi engano.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Pinto.

O Sr. Mário pinto (PPD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com certeza é minha deficiência, mas não consegui alcançar o sentido do aditamento, e até suspeito de que possa haver confusão. Agradecia que a Mesa fizesse uma análise da proposta de aditamento e considerasse a que alínea se refere e a que texto se refere.

O Sr. Secretário (Mais Nunes de Almeida): - De qualquer maneira, quem poderia responder a isso seria o Sr. Deputado Américo Duarte. Mas, mesmo assim, parece-me, quanto a mim, terá um certo cabimento, em relação, claro, à alínea c) - «Disciplinar e controlar as formas empresariais» -, pelo que eu penso que será relacionado com vista a poder acabar com elas, penso eu.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Pinto.

O Sr. Mário pinto (PPD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se o que está em causa é a alínea c), tanto quanto sei ela ainda não foi votada, logo não pode haver votação de qualquer proposta de aditamento.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Se ninguém mais pede a palavra, vamos votar o texto da Comissão.

Pausa.

Submetido à votação, o texto foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Vai-se agora proceder à análise do aditamento. Ninguém quer usar da palavra?

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado Américo Duarte.

O Sr. Américo Duarte (UDP): - A medicina privada tem que acabar. Há médicos que levam contos de réis por uma consulta. Há médicos que numa consulta tiram quase o ordenado de um trabalhador.

Vozes: - Muito bem!

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O Orador: - Há médicos que para fazerem uma operação levam o que o trabalhador ganha durante um ano.

Uma voz: - Muito bem!

O Orador: - Há médicos que ganham nos hospitais - eu dispenso que a burguesia me diga «muito bem!» -  (risos) e ainda vão ao consultório encher mais os bolsos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Alguns dos ladrões estão a dizer que é muito bem! (Risos.) Na mira do lucro, grande número de médicos fica nas cidades e monta consultórios.

Uma voz: - Muito bem!

O Orador: - Nos campos não há médicos. A única forma de combater esta situação é combater a medicina privada. Não há serviço nacional de saúde que possa ter sucesso enquanto a medicina for predominantemente de tipo privado.
Algumas medidas para combater a medicina privada são:

1 - Acabar com os vários empregos que um mesmo médico tem. Para isso é necessário que se estabeleça um horário médico nacional, que não poderá ser compatível com o exercício da medicina privada.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:

2 - Nacionalização das casas de saúde e estabelecimentos termais particulares e integração dos mesmos na rede hospitalar e assistencial oficial.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:

3 - Integração no serviço nacional de saúde dos consultórios e laboratórios particulares de análises clínicas, electrocardiogramas, electroencefalogramas (risos), radiologia, medicina física e de reabilitação, próteses, etc., de modo a fazer cessar toda a prática de exploração capitalista de tais serviços de assistência.

Aplausos.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Se ninguém mais pede a palavra, vai proceder-se...
Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O fim da medicina privada mercanlizada tem de ser um dos objectivos na construção do
socialismo.
Nesse sentido, nós aprovamos a proposta de aditamento do Deputado da UDP, embora seja a sua formulação um tanto, digamos, pouco precisa.

(O orador não reviu.)

Uma voz: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Vai-se proceder à votação.

Submetida à votação a proposta, foi rejeitada, com 21 votos a favor e 71 abstenções.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Pereira.

O Sr. Sousa Pereira (MDP/CDE): - O MDP votou a favor da proposta do Deputado da UDP porque concorda com ela na sua essência.
Na verdade, estávamos convencidos, que após os efusivos aplausos desta Assembleia a proposta merecesse aprovação unânime da mesma.
Tal não aconteceu.
Provavelmente, o cinismo da burguesia ...

(O orador não reviu.)

Apupos.

Aplausos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Votámos contra esta proposta porque é demagógica e não formulada e já se encontra devidamente prescrita em proposta séria e bem formulada, que nós fizemos para a alínea e) do n.º 4 do artigo 16.º

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Pinto.

O Sr. Mário Pinto (PPD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A nossa abstenção significa que não nos opomos de modo nenhum ao sentido da socialização que neste domínio se torna imprescindível imprimir, mas não nos opomos a esse sentido, mas consideramos que isso resultará de outras disposições constantes deste artigo; consequentemente, nessa medida, não aprovamos esta formulação. Iremos apoiar, no sentido que consideramos correcto da socialização neste domínio, as propostas subsequentes, pendentes na Mesa. É óbvio que esta nossa posição não decorre da nossa qualificação individual ou colectiva, de burgueses ou proletários, como também não aceitamos, obviamente, a declaração do Sr. Sousa Pereira como sendo a de um proletário, que o não é.

(O orador não reviu.)

Voes: - Muito bem!

Burburinho.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Casimiro Cobra.

O Sr. Casimiro Cobra (PPD): - Era só para dizer, Sr. Presidente, Srs. Deputados, que, em relação à declaração de voto do Sr. Deputado Sousa Pereira, eu

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1734 DIÁRIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE N.º57

acho que, independentemente daquilo que se defende aqui na Assembleia por cada pessoa, o Sr. Deputado Sousa Pereira há pouco defendeu-se dizendo que não havia ataques pessoais. Neste momento houve, ele chamou-nos que era o «cinismo da burguesia». Que somos burgueses, já sabemos que é essa a qualificação que o MDP nos traz. Não somos cínicos, tenha paciência, Sr. Deputado, mas ultrapassou-se e enganou-se, principalmente na sua declaração anterior.

(O orador não reviu.)

Burburinho.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Penso, Srs. Deputados, que são 20 horas, está encerrado, portanto, o período normal de trabalho.
O meu partido propõe a esta Assembleia que prolongue estes trabalhos por mais meia hora, dada a celeridade e aproveitamento com que vem decorrendo até aqui, de forma a conseguirmos aprovar mais alguns artigos da Constituição. Devo dizer que contactei o Sr. Pires, que aqui tem representado os trabalhadores da Assembleia, e que ele manifestou o seu acordo em trabalharem mais meia hora.

(O orador não reviu.)

Aplausos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Catarino.

O Sr. Luís Catarino (MDP/CDE): - O Sr. Deputado José Luís Nunes acaba de nos comunicar que teve o cuidado de consultar o pessoal de apoio aos serviços da Assembleia. Não foi tão cuidadoso em consultar o que era minimamente indicado, o MDP/ CDE. À semelhança do que o MDP/CDE tem notícia da consulta que o Sr. Deputado José Luís Nunes terá feito aos outros partidos representados nesta Assembleia, Sr. Presidente, Srs. Deputados: estou nesta Assembleia desde as 10 horas para trabalhar no texto da Constituição. Eu suponho ainda que os Srs. Deputados estão dispostos a trabalhar no texto da Constituição, embora eu hoje tivesse dúvidas em relação a isso, e só às seis e meia é que comecei a trabalhar neste hemiciclo no texto da Constituição, porque às 10 horas da manhã, se me dá licença, Sr. Deputado, em apresentando-me para começar a , trabalhar na Comissão para a qual fui deslocado pelo meu Partido, não pôde funcionar essa Comissão por falta de quórum. O MDP/CDE variadíssimas vezes chamou a atenção, ou antes, já tomou atitudes perfeitamente claras, perfeitamente expressas, acerca do que entendia do uso anormal da capacidade de trabalho e do tempo reservado aos Deputados desta Assembleia Constituinte. Hoje tivemos um exemplo acabado de desaproveitamento e de uma imagem, degradada, desta Assembleia, incapaz de. assumir as suas responsabilidades em tempos normais.

Uma voz: - Lá se vaia meia hora.

O Orador: - Aquilo que se passou hoje com completa desafectação do MDP/CDE, dadas as exposições que sempre tem tomado relativamente à discussão do texto constitucional, primeira obrigação desta Constituinte, aquilo que se passou hoje é uma imagem aviltada que demos da incapacidade desta Assembleia, superada pelas suas próprias contradições. Eu continuo a ouvir comentários contraditórios de bancadas que não contam o tempo, as meias-horas e as horas em discussão de matéria que nada terra ver com a Constituição que nós somos obrigados a fazer.

Burburinho.

Apupos.

O MDP/CDE toma uma atitude, que é abster-se relativamente ao requerimento do Sr. Deputado José Luís Nunes. E isto não quer dizer que não deixe o seu protesto muito veemente acerca da maneira como estão sendo conduzidos, quase a roçar a zona da irresponsabilidade, os trabalhos desta Assembleia Constituinte.

(O orador não reviu.)

Vozes: - Não apoiado!

Apupos.

Alguns Srs. Deputados vociferam, dirigindo-se ao orador que acabou de intervir.

O Sr. Presidente: - Peço, silêncio, Srs. Deputados. Tem a palavra o Sr. Deputado Ribeiro de Almeida.
As manifestações de desagrado continuam.

Sr. Secretário (Coelho de Sousa): - Por ordem de inscrição, está inscrito o Sr. Deputado Ribeiro de Almeida e, posteriormente, o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes para invocar o Regimento.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os requerimentos não consentem discussão. Requeiro que se passe imediatamente à votação.

Aplausos.

Uma voz: - Olha o povo a sair! (Quando o Sr. Deputado da UDP abandonava o hemiciclo.)

O Sr. Américo Duarte (UDP) (à porta): - Reaccionário, o que é que queres?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

Manifestações de desagrado.

O Sr. Presidente: - Está na Mesa, ou por outra, foi feito um requerimento pelo Sr. Deputado José Luís Nunes.
Por outro lado, o Sr. Deputado Vital Moreira pediu a palavra para invocar o Regimento. Eu pretendo saber o que pensava a Assembleia acerca da prioridade que é admissível ou não ao pedido de palavra do Sr. Vital Moreira para invocar o Regimento.

Pausa.

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Então, se ninguém se opõe à invocação do Regimento por parte do Deputado Vital Moreira, eu concedo-lhe a palavra para esse efeito.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Comunista Português não se vai opor à prorrogação dos trabalhos nos termos em que o Deputado José Luís Nunes a propôs. No entanto, não queremos deixar de produzir os argumentos que invocámos quando privadamente nos foi posta a questão.
Entendemos que esta solução não pode ...

Vozes discordantes e exaltadas.

Para os Deputados exaltados devo dizer que a norma de que os requerimentos não são discutidos vale normalmente para aqueles requerimentos que não se propõe violar ...

Vozes discordantes.

Desculpe, Sr. Deputado que não se propõe violar o Regimento que diz que os trabalhos terminam às 20 horas.

[O Sr. António Macedo (PS) dirige-se exaltado ao orador, mas de forma ininteligível.]

O Orador: - Não se exalte! Não vale a pena exaltar-se, Sr. Deputado. Nós não estamos a pôr objecções a que, por mera votação de requerimento, se viole o Regimento e se prolonguem os trabalhos para além do termo regimental deles. Não queremos, contudo, deixar de afirmar que esta solução não pode de modo nenhum valer como solução para os erros da Assembleia, da Mesa ou dos Grupos de Deputados, em particular ou em geral. Para as perdas de tempo, nomeadamente as que têm lugar em esgrimas antiregimentais.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à votação do requerimento.
O Sr. Deputado Ribeiro de Almeida pretende invocar o Regimento?

O Sr. Ribeiro de Almeida (PPD): - Não, não é para invocar o Regimento.

O Sr. Presidente: - Vamos então proceder à votação.

Submetido à votação, foi aprovado com 12 abstenções.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Ribeiro de Almeida.

O Sr. Ribeiro de Almeida (PPD): - Na sequência da aprovação que deu ao requerimento do Partido Socialista, o Partido Popular Democrático sugere que, para ele ter alguma coisa de útil, a meia hora comece a contar imediatamente a seguir e apenas depois da aprovação do mesmo requerimento.

(O orador não reviu.)

Aplausos.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Secretário (Maia Nunes de Almeida): - Sobre a alínea d) existem na Mesa quatro propostas.
A primeira é de substituição, assinada pelos Deputados do Partido Socialista Miller Guerra, Júlio Pereira dos Reis e Amílcar de Pinho.
A segunda proposta é de substituição também e é do Deputado da UDP, Américo dos Reis Duarte.
A terceira proposta é de emenda do Deputado do Partido Comunista Vital Moreira.
A quarta proposta é uma proposta de aditamento do Partido Popular Democrático, assinada pelo Deputado Teodoro da Silva.

Foram lidas de novo.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Teodoro da Silva.

O Sr. Teodoro da Silva (PPD): - Prescindo da palavra Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Vai pôr-se à votação a proposta, que antes vai ser lida.

Foi lida de novo.

O Sr. Presidente: - Vai votar-se.

Submetida à votação, a proposta foi aprovada, com 2 votos contra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nós tínhamos uma proposta de emenda que foi contemplada por esta proposta do Partido Socialista. Entretanto, como esta proposta que acaba de ser aprovada não contém os elementos quer do texto da Comissão quer da proposta do Partido Comunista Português, nós propomos o seguinte aditamento ao texto acabado de aprovar:
Até à nacionalização desses sectores.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Ora eu desejo dizer que nós retiramos a expressão.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Catarino.

O Sr. Luís Catarino (MDP/CDE): - Muito obrigado, Sr. Presidente. Nós votamos contra a proposta porque parece-me restritivo o sentido da proposta apresentada pelo Partido Socialista.
Uma das nossas preocupações, e supondo que respondendo às preocupações do povo português, é a carga de propaganda a que é sujeito o povo português relativamente a todos os produtos medicamentosos. Esta proibição ou este contrôle que vinha apontado relativamente a esse ponto grave de ordem social, pelo texto da Comissão, desaparece no texto da proposta do Partido Socialista.

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Aguardamos que a Assembleia se pronuncie relativamente à proposta de aditamento agora apresentada ou sugerida pelo Partido Comunista.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nós cortamos a nacionalização desse sector porque entendemos que devem ser a medicina e os sectores médicos e medicamentosos socializados.
Portanto, numa preocupação de arrumação, o que é que fizemos? Pura e simplesmente metemos mais uma única alínea, a alínea e), a seguinte redacção, e ficará «compete prioritariamente ao Estado adiantar a sua acção no campo da saúde, visando a socialização da medicina e dos sectores médico ou medicamentosos».
Portanto, está explicado porque tiramos a nacionalização, e por nossa parte não vamos perder mais tempo com isso.

(O orador não reviu.)

Cr Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Teodoro da Silva.

O Sr. Teodoro da Silva (PPD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Eu pedia à Mesa prioridade para o nosso aditamento.
E queria fazer uma breve, curta e simples justificação do aditamento à proposta do PS que foi votada e aprovada.
Efectivamente, nós propomos este aditamento porque entendemos que se deve alargar aos mais modernos e variados meios e processo terapêuticos. E que, por isso, também é necessário prever outros meios que não estão englobados na proposta do Partido Socialista, tais como os mais diversos meios de próteses, agentes físicos, radioterapia, tratamentos termais, etc. Desta maneira parece que fica alargado e mais generalizado o conceito que me parece incorporado na proposta do PS.

(O orador não reviu.)

O Sr. Secretário (Maia Nunes de Almeida):- Estão ainda na Mesa a proposta de substituição da UDP e de emenda do PCP que, dada a aprovação da proposta de substituição do PS, se considera prejudicada
Entra agora em discussão a proposta de aditamento do Sr. Deputado Teodoro da Silva, do PPD, que propõe o seguinte aditamento:

E outros meios para diagnóstico e tratamento.

Lembramos também que existe uma proposta de aditamento do PCP, em que prevê o seguinte aditamento:

Até à nacionalização desses sectores.

O Sr. Presidente: - Está em discussão a proposta do Sr. Deputado Teodoro da Silva.
Ninguém pede a palavra?

Pausa.

Vai proceder-se à votação.

Submetida à votação, a proposta foi aprovada por unanimidade.

O Sr. Secretário (Maia Nunes de Almeida): - Está agora em discussão a proposta de aditamento do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente: A nossa proposta de aditamento reproduz aquilo que estava na proposta da Comissão; continuamos a considerá-la válida. Entendemos que numa sociedade que se dirige à construção do socialismo, pois terá de ter como um dos seus objectivos a nacionalização do fabrico e da comercialização dos produtos médicos e semelhantes. Nestes termos não são convincentes os argumentos, se tal se podem considerar, adiantados pelo Deputado José Luís Nunes.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Se ninguém mais quer usar da palavra, vai proceder-se à votação.

Submetida à votação, a proposta foi rejeitada, com 14 votos a favor.

O Sr. Secretário (Maia Nunes de Almeida): - Quanto à alínea e), temos duas propostas de aditamento.
A primeira proposta, de aditamento a uma nova alínea, é assinada pelos Deputados do PS Miller Guerra, Júlio dos Reis e Amílcar de Pinho.
A segunda proposta, do Partido Comunista Português, é assinada pelo Deputado Vital Moreira.

Foram lidas de novo.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente, apenas para chamar a atenção da Mesa que a proposta do PS é uma proposta de substituição do texto que está no n.º 5 desse artigo em discussão. A proposta do Partido Comunista Português é que é verdadeiramente uma proposta de aditamento. Em relação à proposta de substituição do PS está na Mesa, também, uma proposta de aditamento do Partido Comunista Português, que pediu à Mesa para ler, deixando agora de lado a proposta do PCP que acabou de ser lida.

O Sr. Secretário (Maia Nunes de Almeida): Perdão, Sr. Deputado. Se fizesse o favor repetia, pois estava de volta dos papéis e não me apercebi do que disse.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Dizia eu que a proposta do Partido Socialista é uma proposta de substituição do n.º 5 elo projecto da Comissão.
A proposta de aditamento que foi lida, do Partido Comunista Português, não tem relação directa com essa matéria.

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Portanto, nós propúnhamos à Mesa que para já fosse deixada de fora. E, entretanto, há uma outra proposta de aditamento do PCP que se refere precisamente à matéria da proposta de substituição do PS.
Nós propúnhamos que ela fosse lida para poder ser considerada em conjunto.

Pausa.

O Sr. Secretário (Maia Nunes de Almeida): - Sim, mas para isso é necessário que o Deputado José Luís Nunes a considere como sendo o n.º 5.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Para tentar resolver, o que acontece é o seguinte: nós acrescentamos uma alínea e). Vamos depois propor a eliminação do n.º 5.
Portanto, parece que logicamente se deveria votar primeiro a nossa proposta, como acrescento; depois o aditamento do Sr. Deputado Vital Moreira à nossa proposta, e depois a eliminação do n.º 5.
Se nada disto fosse votado, pois haveria as outras propostas que poderiam merecer o consenso da Assembleia.
É isto que parece mais lógico.
De acordo? Pronto.

O Sr. Secretário (Maia Nunes de Almeida): - Está então em discussão a proposta de uma nova alínea e), do Partido Socialista, com o seguinte texto:

Foi lido de novo.

O Sr. Secretário (Maia Nunes de Almeida): - Está também uma proposta de aditamento a esta mesma alínea, do Partido Comunista Português, com o seguinte texto:

Proposta de aditamento à alínea e)

... visando a eliminação das formas comerciais de medicina.

Pelo Grupo de Deputados do PCP, Vital Moreira.

O Sr. Presidente: - Vamos portanto votar em 1.º lugar o texto do Partido Socialista, necessariamente.
Ninguém quer usar da palavra?

Pausa.

Vai proceder-se, portanto, à votação.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Está agora em discussão um aditamento do Partido Comunista Português.
Tem a palavra o Sr. Deputado, Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Apenas queria dizer, Sr. Presidente, que a nossa proposta, unicamente visando a eliminação das formas comerciais de medicina, deve ser introduzida a seguir à expressão da proposta agora aprovada «a socialização da medicina».

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.
Parece que tem prioridade.

Pausa.

Afinal é o Sr. Deputado Hilário Teixeira que tem a palavra.

O Sr. Hilário Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Era só para tecer algumas considerações acerca deste aditamento, proposto pelo Partido Comunista Português, sobre a proibição das formas comerciais de medicina.
Como já sabemos, Sr. Presidente, Srs. Deputados, na organização social capitalista, em que a classe trabalhadora produz a mais-valia e a classe burguesa explora e consome, devemos notar alguns aspectos característicos fundamentais no que respeita à problemática da saúde. Assim, em primeiro lugar, a organização da produção capitalista, na sua corrida aos lucros especulativos de classe, mantém-se inteiramente indiferente às consequências nefastas do seu sistema de produção e exploração, tendo o estado de saúde das populações, da degradação do ambiente e desequilíbrio ecológico.
Em segundo lugar, a classe burguesa exploradora consome a melhor quantidade e qualidade de serviço que a tecnologia da saúde é capaz de produzir e fornecer.
Em terceiro lugar, para manter o ciclo de reprodução do sistema, organiza a classe eminente do sistema capitalista o fornecimento de cuidados médicos, especialmente curativos, destinados às classes trabalhadoras de modo a manterem um mercado de trabalho explorável, bem como a obter a mobilização política e sindical dessas mesmas massas trabalhadoras. A consciência de classe e consequente luta política das massas trabalhadoras recusa, porém, um conceito de saúde que sirva apenas a uma produção e fornecimento de cuidados curativos que tenham por finalidade o simples repor em estado de produzir os indivíduos afectados pela doença.
As massas trabalhadoras, para além da satisfação concreta do direito de tratamento e reabilitação da doença, exigem condições sociais e de organização da produção económica, de modo a evitar a doença, e a que se criem as possibilidades objectivas do real desenvolvimento de todas as potencialidades de realização humana dos indivíduos, sem qualquer discriminação.
Esse objectivo, como é evidente, só poderá ser alcançado através do controle da produção-organização jurídico-política da sociedade por parte das classes trabalhadoras.
Na realidade, o Conselho de Saúde ultrapassa largamente o que a prática médica, tanto no campo da prevenção como no da cura e recuperação, pode dar a uma sociedade.
A saúde humana da organização desta sociedade, porque defende as condições de vida criadas para todos os cidadãos, abrange um leque de realização que visa o homem integralmente considerado, desde a sua cultura e do seu equilíbrio emotivo até às infra-estruturas materiais de vida em comum, como técnicas urbanísticas ou redes de esgotos, por exemplo.

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1738 DIÁRIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE N.º 57

É necessário atender que não é a um Serviço Nacional de Saúde que podem pedir responsabilidades pelas carências globais de saúde que resultam da exploração do homem, numa sociedade para a qual esse homem não é mais do que um produtor de lucros.
Entretanto, na actual fase da estratégia e do processo de democratização, há que extrair as possibilidades oferecidas por esse mesmo processo e lutar pela criação de um Serviço Nacional de Saúde que ponha ao serviço do povo uma organização de prestação de cuidados de saúde da qual todos os portugueses possam beneficiar por direito próprio e em cuja organização, planificação e gestão as massas trabalhadoras intervenham de modo decisivo e efectivo.
Como é óbvio, não deverão ser as massas trabalhadoras já desfavorecidas e exploradas que deverão pagar a produção de cuidados médicos, de que carecem e têm direito. E esse custo deve ser suportado pelos estratos sociais detentores de maiores rendimentos, pois que os mesmos resultam, em última análise, da mais-valia e lucro produzidos pelas classes trabalhadoras. Daí que nós, realmente, tenhamos certo empenho em que essa proposta que o Partido Comunista Português propõe de eliminação das formas comerciais de medicina seja, portanto, tido em conta pelos Srs. Deputados.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Muito singelamente para explicar porque é que vamos votar contra. Em primeiro lugar, porque não existe socialização da medicina onde existam formas comerciais da medicina. Em segundo lugar, porque a expressão formas comerciais é singularmente restritiva, porque há medicina também de carácter empresarial. Em terceiro lugar, porque naqueles pontos em que efectivamente a proposta do PCP aparece incluída é pleonástica, naqueles pontos em que não está incluída é restritiva. Portanto vamos votar contra.

(O orador não reviu).

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Já aqui chamei várias vezes a atenção nesta Assembleia, Sr. Presidente e Srs. Deputados, para um facto, para o qual temos que estar precavidos: a capacidade de cooptação e transfiguração de certas expressões. Se a expressão, por exemplo, socialismo é capaz de ser cooptada e transfigurada de modo a designar um capitalismo.

O Sr. Pedro Roseta (PPD): - Diz que é socialismo o capitalismo de Estado!

O Orador: - Nós não temos dúvidas também em admitir que a socialização da medicina possa vir a entender-se como sendo compatível com formas comerciais- de medicina e por esse motivo, o primeiro argumento do Deputado José Luís Nunes nem é válido, na realidade, este aditamento nossa visa concretizar de forma indubitável o que se entende por socialização da medicina, e o segundo também não tem qualquer validade, na medida em que, formas comerciais de medicina» abrange todas as que ele citou e certamente algumas de que se poderia ter esquecido.

(O orador não reviu).

O Sr. Presidente: - Para melhor esclarecimento vai ser lido novamente o aditamento.

O Sr. Secretário (Maio Nunes de Almeida): - O aditamento já foi rectificado pelo Sr. Deputado Vital Moreira, ficando definitivamente com a seguinte redacção:

... bem como a eliminação das formas comerciais da medicina.

Tanto que o texto ficaria da seguinte forma:

Orientar a sua acção no campo da saúde, visando a socialização da medicina e dos sectores médico-medicamentosos, bem como a eliminação das formas comerciais da medicina.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira. Afinal, não.
Como ninguém quer usar da palavra, vai proceder-se à votação.

Submetida à votação, foi rejeitada, com 13 votos a favor e 3 abstenções.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Pinto.

O Sr. Mário Pinto (PPD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Popular Democrático votou contra a proposta que acabou de ser votada na medida em que considera que já resulta de todo o articulado, de uma maneira muito clara e unívoca, que nesta matéria política, social, vai ser no sentido da socialização.
Com isso, estamos inequivocamente.
Aproveito a oportunidade para dizer que não aceitamos qualquer espécie de dogmatização neste domínio como em tantos outros e, pelo contrário, propugnamos que a socialização aqui, como noutros domínios, tenha que ser sempre e necessariamente concretizada em termos de decisão do povo português.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não é de admirar o facto da votação do Partido Popular Democrática e porventura de outros partidos. E a declaração que acaba de ser feita apenas testemunha e confirma o argumento por mim utilizado de que a socialização da medicina não tem um sentido unívoco e que pode inclusivamente admitir formas comerciais e capitalistas da medicina na interpretação de certos sectores.
E porque pretendíamos que esse entendimento não pudesse ser válido é que o nosso aditamento era dirigido ao Partido Socialista.

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O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Uma declaração de voto.
Votamos contra esta eliminação ou esta proposta de aditamento por vários motivos. Entre os quais avultam experiências práticas da socialização da medicina.
É preciso lembrar aos Srs. Deputados, e esse motivo pesou na nossa decisão de voto, que na União Soviética, na Hungria, na Checoslováquia, na Polónia, existe medicina privada.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Casimiro Cobra.

O Sr. Casimiro Cobra (PPD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É para dizer que votamos contra, porque, para mim e para o Partido Popular Democrático, a socialização é tida pelo socialismo humanista que na prática dos actos encontraremos. De certeza que não é capitalismo de Estado, nem qualquer espécie de capitalismo, ainda existente neste País.

(O orador não reviu.)

O Sr. Secretário (Maia Nunes de Almeida): Existe agora na Mesa, e em relação ainda ao n.º 4, mais uma proposta de aditamento de uma nova alínea, que seria então a alínea f).

Foi lida de novo.

O Sr. Presidente: - Ninguém quer usar da palavra sobre esta alteração?
Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente, quando foi proposta e votada a eliminação do n.º2 do artigo em discussão, argumentou-se com razões técnicas de repetição com o número seguinte. Argumentámos nós para votar contra essa eliminação que, entre outras coisas, eliminava a referência, o papel, a participação e iniciativas das organizações populares. É isso que precisamente pretendemos repor, e exactamente para recuperar aquilo que aparentemente se eliminou sem querer por parte da proposta do PS.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - É simplesmente para dizer o seguinte:
Nós achamos muito bem que o Estado apoie as iniciativas das organizações populares. Nós, o que não concordamos é que isso seja o princípio constitucional, pelo seguinte:
É que este sistema é um sistema particularmente delicado para se consagrar como princípio constitucional o apoio das organizações populares. Isto é de uma delicadeza, a saúde, muitíssimo grande. Portanto, nós entendemos, dentro de uma visão que achamos absolutamente progressista, que o Estado poderá e deverá fazer isso, mas naqueles momentos e naquelas circunstâncias que a sua política impuser, e não como princípio constitucional. É por isso que votamos contra.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Casimiro Cobra.

O Sr. Casimiro Cobra (PPD): - É para esclarecimento, Sr. Deputado Vital Moreira. Eu abstive-me no artigo 16.º em relação a uma proposta idêntica.
Gostaria que me explica-se qual é o tipo de participação neste capítulo que me parece que não será idêntico ao do artigo 16.º Gostaria de saber que tipo de organizações populares de base, comissões de trabalhadores ou qual outra forma; gostaria que me explicasse.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Evidentemente que não estamos aqui em matéria de definição de comissões populares de base. As organizações populares de base competem a um capítulo especial da constituição, qualquer que elas sejam, e certamente que caberão nas comissões de trabalhadores, as comissões de moradores e outros tipos de organizações. As iniciativas que elas tiveram neste campo, e usando objectivos previstos neste artigo no sentido de a defender, de garantir o direito à protecção da saúde e o seu dever, pois nós entendemos que o Estado deve apoiar isso.
Devo aproveitar para responder ao argumento do Deputado José Luís Nunes no sentido de que esse argumento provaria de mais.
Provaria que, por exemplo, no artigo 2.º do artigo ontem aprovado sobre a segurança social não fizéssemos qualquer referência às organizações das classes trabalhadoras.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Melo.

O Sr. Barbosa de Melo (PPD): - O Partido Popular Democrático não vem apoiar esta proposta e por esta razão: As organizações populares, ainda que devam, e talvez devam em alguns aspectos, ser reputados na Constituição, devem sê-lo num capítulo próprio, suponho que há-de ser o do poder local ou coisa similar. Admitindo que a propósito de qualquer tema constitucional se deva fazer referência a está parte organizativa do Estado seria cair numa via técnica na formulação do texto constitucional.
Por esta razão fundamentalmente o Partido Popular Democrático vai votar contra esta proposta.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Como ninguém mais usa da palavra, vai proceder-se à votação.

Submetida à votação, a proposta foi rejeitada com 12 votos a favor.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira para uma declaração de voto, necessariamente.

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1740 DIÁRIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE N.º 57

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Para uma pergunta à Mesa, Sr. Presidente. Se terminou a discussão e votação deste artigo, ou se há ainda propostas de alteração.

O Sr. Presidente: - Mas não hoje.

O Sr. Secretário (Maia Nunes de Almeida): - Sim, deste artigo ainda há: que é a eliminação do n.º 5 e proposta de substituição também deste n.º 5.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados está encerrada a sessão. Amanhã às 14 horas. Não esquecer.

Eram 20 horas e 40 minutos.

Rectificações ao n.º 54 do Diário da Assembleia Constituinte:

Na p. 1596, col. 1.ª, l. 16, onde se lê: «E falando de Paredes de Coura, confere-me dar ...», deve ler-se: «E falando de Paredes de Coura, compete-me dar ...».
Na p. 1596, col. 1.ª, l. 11, a contar do fundo, onde se lê: «com a mão firme e ... », deve ler-se: «com mão firme e ...».

António Roleiro Marinho (PPD).

Rectificações ao n.º 55 do Diário da Assembleia Constituinte:

Na p. 1638, coluna da esquerda, l. 36, onde está assinalada uma vírgula que precede a expressão «Muita tinta correu», deverá estar a expressão: «e», 1. 37, o ponto final que se segue à expressão «unicidade sindical» deve ser substituído por uma vírgula. Coluna da direita, 1. 50, na expressão «de que depende» deve ser eliminada a palavra «de».

O Deputado do Partido Comunista Português, Hilário Teixeira.

Rectificação ao n.º 56 do Diário da Assembleia Constituinte:

O meu nome deve ser incluído na lista dos Deputados que entraram durante a sessão, e não na dos Deputados que faltaram à sessão, conforme se pode, aliás, provar pela minha intervenção, referida na p. 1684, col. 2.ª

Diogo Freitas do Amaral (CDS).

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

CDS

Adelino Manuel Lopes Amaro da Costa.
Basílio Adolfo Mendonça Horta da Franca.

MDP/CDE

Álvaro Ribeiro Monteiro.
Luís Manuel Alves de Campos Catarino.
Manuel Domingos de Sousa Pereira.

PCP

António Branco Marcos dos Santos.
Avelino António Pacheco Gonçalves.
Hipólito Fialho dos Santos.
José Pedro Correia Soares.

PPD

Alfredo António de Sousa.
Eduardo José Vieira.
Emídio Guerreiro.
Fernando Adriano Pinto.
João Bosco Soares Mota Amaral.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Manuel Afonso Gomes de Almeida.
José Manuel Nogueira Ramos.
Leonardo Eugénio Ramos Ribeiro de Almeida.
Mário Campos Pinto.
Nuno Guimarães Taveira da Gama.

PS

Alberto Arons Braga de Carvalho.
Artur Cortez Pereira dos Santos.
Carlos Alberto Andrade Neves.
Carlos Manuel Natividade da Costa Candal.
Carmelinda Maria dos Santos Pereira.
Fernando José Capêlo Mendes.
Florival da Silva Nobre.
José Alberto Menano Cardoso do Amaral.
Luís Filipe Nascimento Madeira.

UDP

Américo dos Reis Duarte.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

CDS

António Francisco de Almeida.
António Pais Pereira.
Francisco Manuel Lopes Vieira de Oliveira Dias.

MDP/CDE

José Manuel Marques do Carmo Mendes Tengarrinha.
Orlando José de Campos Marques Pinto.

PCP

Dália Maria Félix Ferreira.
Dinis Fernandes Miranda.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
José Alves Tavares Magro.
José Carlos.
José Pinheiro Lopes de Almeida.
Maria Alda Nogueira.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.

PPD

Américo Natalino Pereira de Viveiros.
António dos Santos Pires.
Arnaldo Ângelo de Brito Lhamas.
Carlos Francisco Cerejeira Pereira Bacelar.
Eleutério Manuel Alves.

Página 1741

3 DE OUTUBRO DE 1975 1741

Fernando Monteiro do Amaral.
Francisco José Pereira Pinto Balsemão.
João Baptista Machado.
Joaquim da Silva Lourenço.
José António Valério do Couto.
José Bento Gonçalves.
Luís Fernando Argel de Melo e Silva Biscaia.
Marcelo Nuno Duarte Rebelo de Sousa.
Miguel Florentino Guedes de Macedo.
Sebastião Dias Marques.

PS

Adelino Augusto Miranda de Andrade.
Agostinho Martins do Vale.
António Alberto.
Monteiro de Aguiar.
António Jorge Oliveira Aires Rodrigues.
António Miguel de Morais Barreto.
Francisco Manuel Marcelo Monteiro Curto.
Henrique Teixeira Queiroz de Barros.
Jerónimo Silva Pereira.
João Alfredo Félix Vieira Lima.
João Joaquim Gomes.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
Luís Manuel Cidade Pereira de Moura.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Manuel de Brito de Figueiredo Canijo.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.
Mário de Deus Branco.
Mário Manuel Cal Brandão.
Nuno Maria Monteiro Godinho de Matos.
Vasco da Gama Fernandes.
Vitorino Vieira Dias.

Os Redactores: José Alberto Pires - Filomeno Sobreira.

Página 1742

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