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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIADO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE

DIÁRIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE

QUARTA-FEIRA, 3 DE DEZEMBRO DE 1975 * NÚMERO 88

SESSÃO N.º 87, EM 2 DE DEZEMBRO

Presidente: Exmo. Sr. Henrique Teixeira Queiroz de Sarros

António Duarte Arnaut
Secretários: Exmo. Srs. Carlos Alberto Coelho de Sousa
José Manuel Maia Nunes de Almeida

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 42 minutos.

Antes da ordem do dia. - Aprovado o n.º 84 do Diário da Assembleia Constituinte, o Sr. Presidente, em curta declaração, regozijou-se por conservarem os seus lugares e funções as autoridades legitimamente constituídas, entre as quais a Assembleia Constituinte; prestou homenagem a S. Ex.ª o Presidente da República pela coragem, serenidade e dignidade de que deu provas na difícil conjuntura que o País acaba de viver,- manifestou satisfação por ver terminado o estado de sitio e plenamente restabelecidas as liberdades cívicas conquistadas pela Revolução do 25 de Abril; exortou todos os Deputados acelerarem, na medida do possível, os trabalhos da Constituinte, para que em breve o País esteja dotado da Constituição que lhe permita viver sob o império pleno da legalidade democrática.
Depois de dada conta do expediente, foi lido na Mesa um protesta do Sr. Deputado Américo Duarte (UDP), dirigido ao VI Governo, segundo o qual «a situação por que o povo português acaba de passar é uma consequência directa da luta pelo controle do Governo pelas partidos da burguesia e do ambiente de guerra civil que criaram».
A Mesa informou ter sido recebida, do Ministério da Comunicação Social, resposta a um requerimento do Sr. Deputado Jaime Gama (PS). Mais informou que o Sr. Presidente dera como oficiosamente justificadas todas as faltas dadas por Srs. Deputados à sessão da última sexta-feira.
Foi lido na Mesa um requerimento do Sr. Deputado Pires Pereira (PS) solicitando do MEIC informação sobre a possibilidade de concessão de subsídios de transporte aos alunos do ensino primário, já reveladores de reais possibilidades, que, por dificuldades económicas e ausência de estabelecimentos de ensino na área da sua residência, se vêem impossibilitados de prosseguir estudos.
Foi aprovado um requerimento do CDS no sentido de o período de antes da ordem do dia ser prolongado por mais uma hora.
Usou em seguida da palavra o Sr. Deputado Mota Pinto (PPD) para dar conta aos legítimos representantes do povo português do juízo do seu partido sobre a aventura criminosa que sobressaltou o Pais, face patente e aberta de uma conspiração antidemocrática mais vasta, com agentes e instigadores semiencobertos».
O Sr. Deputado José Augusto Seabra (PPD), referindo-se aos «gravíssimos atentados contra a legalidade democrática que grupos aventureiros perpetraram», denunciou o que seria um plano de imposição de «uma ditadura minoritária e totalitária, contra a vontade da imensa maioria das portugueses».
O Sr. Deputado Carlos Brito (PCP), referindo-se às recentes sublevações militares e suas repercussões na situação de crise político-militar existente desde há meses, acentuou a «declarada oposição do PCP a uma política de força, de confronto militar e de guerra civil, que só à reacção podem aproveitar, e a insistência numa solução política global resultante de negociação, forma mais eficaz de assegurar a defesa da Revolução e das suas conquistas».
No fim desta intervenção, solicitaram esclarecimentos os Srs. Deputados do PS Sottomayor Cardia, Manuel Ramos e Artur Cortês.
O Sr. Deputado José Luís Nunes (PS), sobre a rebelião de 25 de Novembro visando «pôr em causa o princípio do respeito pela vontade popular e impor ao País um regime que os portugueses claramente repudiaram, descreveu-a como o «lógico desembocar de uma política em que o PCP tem muitas responsabilidades». Terminada a sua intervenção, propôs à votação da Assembleia uma declaração em que, entre outros pontos, se condena a insurreição.
Aprovada por maioria esta declaração, emitiram declarações de voto as Srs. Deputados Carlos Brito (PCP) e Levy Baptista MDP/CDE).
O Srs. Deputado Freitas do Amaral (CDS), referindo-se aos antecedentes e consequências do 25 de Novembro, analisou a luta que se vem travando entre as três revoluções do 25 de Abril de 1974, a revolução democrática, a revolução comunista e a revolução socialisto-militar, acabando por preconizar o reexame, a redefinição e a reconversão do MFA, de forma a possibilitar o triunfo da revolução democrática.
O Sr. Deputado Levy Baptista (MDP/CDE) foi de opinião que os acontecimentos do 25 de Novembro, «longe de tra-

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duzirem qualquer golpe preparado e amadurecido», surgem na sequência da luta reivindicativa que há muito vinha sendo travada, nas fileiras das forças armadas, pelos pára-quedistas, congregando «em torno de si diversas linhas de resistência ao desvio da direita que o processo revolucionário vinha sofrendo».

Ordem do dia. - Deu-se conta de duas declarações do PS, segundo as quais as vagas resultantes da renúncia ao mandato por parte dos Srs. Deputados Fernando Alves Tomé dos Santos, Fernando José Capelo Mendes e Alberto Marques Antunes devem ser preenchidas pelos candidatos do mesmo partido Fernando Jaime Pereira de Almeida, Maria da Conceição Rocha dos Santos e Gilianes Santos Coelho.
A Mesa deu em seguida conta de uma proposta, subscrita por oito Deputados do PPD, no sentido de a Assembleia Constituinte não apreciar imediatamente o parecer da 5.ª Comissão, passando a apreciar o parecer da 6.ª Comissão ou o daquela que, entretanto, estivesse em condições de ser examinado pela Plenário.
Depois de o Sr. Deputado Marcelo Rebelo de Sousa (PPD) justificar o teor da proposta, pronunciaram-se ainda sobre ele os Srs. Deputados José Luís Nunes (PS), Vital Moreira (PCP), de novo o S. Deputado Marcelo Rebelo de Sousa (PPD), e Sottomayor Cardia (PS).
Rejeitada por maioria a proposta, emitiram declarações de voto o Sr. Deputado Vital Moreira (PCP), que, entretanto, solicitara a interrupção da sessão por meia hora para a elaborar, Levy Baptista (MDP/CDE), Freitas do Amaral (CDS) e Marcelo Rebelo de Sousa (PPD).
Finalmente, foi dada a palavra ao Sr. Deputado Olívio França (PPD), presidente da 5.ª Comissão «Organização do poder político», que fez um breve resumo da forma como tinham decorrido os trabalhos da Comissão.
Usou ainda da palavra o Sr. Deputado Carlos Candal (PS) que, na qualidade de relator, leu o relatório e parecer da Comissão.
Em nome dos respectivos grupos parlamentares representados na Comissão, fizeram declarações de voto sobre as posições tomadas os Srs. Deputados Vital Moreira (PCP) e Leitão Paulo (CDS).
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 19 horas e 56 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 15 horas e 15 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

ADIM - MACAU

Diamantino de Oliveira Ferreira

CDS

António Francisco de Almeida.
Carlos Galvão de Melo.
Diogo Pinto de Freitas do Amaral.
Domingos José Barreto Cerqueira.
José António Carvalho Fernandes.
Manuel Raimundo Ferreira dos Santos Pires de Morais.
Maria José Paulo Sampaio.
Victor António Augusto Nunes Sá Machado.

MDP/CDE

Álvaro Ribeiro Monteiro.
Levy Casimiro Baptista.
Orlando José de Campos Marques Pinto

PCP

António Malaquias Abalada.
Avelino António Pacheco Gonçalves.
Carlos Alfredo de Brito.
Eugénio de Jesus Domingues.
Fernanda Peleja Patrício.
Fernando dos Santos Pais.
Francisco Miguel Duarte.
Herculano Henriques Cordeiro de Carvalho.
Hipólito Fialho dos Santos.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João Terroso Neves.
José Manuel da Costa Carreira Marques.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel Marques Figueiredo.
Manuel Mendes Nobre de Gusmão.
Maria Alda Nogueira.
Vital Martins Moreira.

PPD

Afonso de Sousa Freire Moura Guedes.
Alfredo António de Sousa.
Alfredo Joaquim da Silva Morgado.
Amândio Anes de Azevedo.
Amélia Cavaleiro Monteiro de Andrade de Azevedo.
Antídio das Neves Costa.
António Joaquim da Silva Amado Leite de Castro.
António Júlio Simões de Aguiar.
António Maria Lopes Ruano.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Roleira Marinho.
António dos Santos Pires.
Arcanjo Nunes Luís.
Artur Videira Pinto da Cunha Leal.
Carlos Alberto Branco de Seiça Neves.
Carlos Alberto Coelho de Sousa.
Carlos Alberto da Mota Pinto.
Carlos Francisco Cerejeira Pereira Bacelar.
Custódio Costa de Matos.
Eduardo José Vieira.
Emanuel Nascimento dos Santos Rodrigues.
Emídio Guerreiro.
Eugénio Augusto Marques da Mota.
Fernando José Sequeira Roriz.
João Baptista Machado.
João Manuel Ferreira.
Joaquim Coelho dos Santos.
Jorge Manuel Moura Loureiro de Miranda.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Augusto de Almeida Oliveira Baptista.
José Augusto Baptista Lopes e Seabra.
José Bento Gonçalves.
José Carlos Rodrigues.
José Ferreira Júnior.
José Francisco Lopes.
José Gonçalves Sapinho.
José Manuel Burnay.
José Theodoro de Jesus da Silva.
Luís Eugénio Filipe.
Luís Fernando Argel de Melo e Silva Biscaia.
Manuel Joaquim Moreira Moutinho Manuel José Veloso Coelho.
Maria Élia Mendes Brito Câmara.
Maria Helena da Costa Salema Roseta.
Nicolau Gregório de Freitas.
Nuno Aires Rodrigues dos Santos.
Olívio da Silva França.
Orlandino de Abreu Teixeira Varejão.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Rúben José de Almeida Martins Raposo.

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PS

Adelino Augusto Miranda de Andrade.
Agostinho Martins do Vale.
Alberto Augusto Martins da Silva Andrade.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Alfredo Fernando de Carvalho.
Alfredo Pinto da Silva.
Álvaro Monteiro.
Álvaro Neto Órfão.
Amarino Peralta Sabino.
Amílcar de Pinho.
António Alberto Monteiro de Aguiar.
António Duarte Arnaut.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Gomes Teles Grilo.
António José de Sousa Pereira.
António Mário Diogo Teles.
António Riço Calado.
Aquilino Ribeiro Machado.
Armando Assunção Soares.
Artur Cortez Pereira dos Santos.
Artur Manuel de Carraca da Costa Pina.
Beatriz Almeida Cal Brandão.
Carlos Alberto Andrade Neves.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Natividade da Costa Candal.
Casimiro Paulo dos Santos.
Domingos do Carmo Pires Pereira.
Etelvina Lopes de Almeida.
Eurico Faustino Correia.
Eurico Manuel das Neves Henriques Mendes.
Eurico Telmo de Campos.
Flórido Adolfo da Silva Marques.
Francisco Carlos Ferreira.
Francisco Igrejas Caeiro.
Francisco Xavier Sampaio Tinoco de Faria.
Gualter Viriato Nunes Basílio.
Henrique Teixeira Queiroz de Barros.
Isaías Caetano Nora.
Jaime José Matos da Gama.
Jerónimo Silva Pereira.
João Joaquim Gomes.
João Pedro Miller de Lemos Guerra.
João do Rosário Sarrento Henriques.
Joaquim Laranjeira Pendrelico.
Joaquim de Oliveira Rodrigues.
José Augusto Rosa Courinha.
José Fernando Silva Lopes.
José Luís de Amaral Nunes.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
Jorge Manuel Vassalo de Oliveira.
José Maria Parente Mendes Godinho.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Júlio Pereira dos Reis.
Laura da Conceição Barraché Cardoso.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Maria Kalidás Costa Barreto.
Luís Patrício Rosado Gonçalves.
Manuel Amadeu Pinto de Araújo Pimenta.
Manuel Ferreira Monteiro.
Manuel Ferreira dos Santos Pato.
Manuel Francisco da Costa.
Manuel João Vieira.
Manuel Joaquim de Paiva Pereira Pires.
Manuel Pereira Dias.
Manuel de Sousa Ramos.
Maria Emília de Melo Moreira da Silva.
Maria Fernanda Salgueiro Seita Paulo.
Maria Helena Carvalho dos Santos Oliveira Lopes.
Maria Rosa Gomes.
Maria Teresa do Vale de Matos Madeira Vidigal.
Maria Virgínia Portela Bento Vieira.
Mário António da Mota Mesquita.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.
Mário de Castro Pina Correia.
Mário de Deus Branco.
Mário Nunes da Silva.
Nuno Maria Monteiro Godinho de Matos.
Pedro Manuel Natal da Luz.
Raquel Júdice de Oliveira Howell Franco.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Rui António Ferreira da Cunha.
Rui Maria Malheiro de Távora de Castro Feijó.
Vasco da Gama Fernandes.
Vitorino Vieira Dias.

UDP

Américo dos Reis Duarte.

O Sr. Presidente: - Responderam à chamada 165 Srs. Deputados.
Srs. Deputados, vamos retomar as nossas actividades, passado como está o período de forçada interrupção resultante dos perturbadores acontecimentos dos últimos dias. De modo que declaro a sessão aberta.

Eram I5 horas e 42 minutos.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Está à aprovação da Assembleia o n.º 84 do Diário. Se alguém se opõe à aprovação desse Diário, agradeço que se manifeste.

Pausa.

Damos por aprovado o n.º 84 do Diário.
Recebemos reclamações respeitantes ao n.º 85.

Pausa.

Srs. Deputados, como presidente da Assembleia Constituinte, embora falando em nome pessoal, sem de modo algum querer envolver a responsabilidade de qualquer grupo ou de qualquer pessoa presente neste hemiciclo, eu quero iniciar esta sessão com uma muito curta declaração, relativamente à qual peço vénia para focar quatro aspectos.
Primeiro, queria manifestar o meu regozijo, repito, o meu regozijo pessoal, por verificarmos que conservaram os seus lugares e as suas funções as autoridades legítimas deste País, entre as quais peço vénia para colocar em lugar de destaque a nossa Assembleia Constituinte.

Vozes: - Muito bem!
Aplausos de pé.

O Sr. Presidente: - Em segundo lugar, também a título pessoal, queria prestar a minha homenagem ao S. Ex.º Sr. Presidente da República, pela coragem,

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firmeza, serenidade, comedimento e perfeita dignidade de que deu e está a dar provas, em toda esta difícil conjuntura.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Em terceiro lugar, gostaria de manifestar a minha satisfação por se ter dado fim ao período de estado de sítio parcial. E, consequentemente, por se encontrarem de novo restabelecidas plenamente, se encontrarem portanto inteiramente em vigor, como é desejo de todos nós, as liberdades cívicas conquistadas pela Revolução de 25 de Abril, liberdades que nenhum de nós deseja ver perdidas.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Em quarto lugar, peço licença para dirigir uma exortação a todos os Srs. Deputados no sentido de, na medida do possível, e sem prejuízo de quem quer que seja, fazermos um esforço no sentido de acelerarmos os nossos trabalhos de modo a que possamos ter muito em breve votada a Constituição. A lei fundamental do País, que será o elemento basilar, o elemento fundamental, para nos colocar a todos sob o império da legalidade democrática, pela qual todos, creio, sem excepção ansiamos.

Aplausos.

Vamos dar informação sobre o expediente recebido na Mesa, que é relativamente extenso, dada a grande interrupção dos nossos trabalhos.

Expediente

O Sr. Secretário (António Arnaut):
Telegrama de um grupo de trabalhadores da MEC:
Pedimos publicação total nosso telegrama enviado 14 Novembro referido Diário Sessões 19 mesmo mês a fim evitar falsas interpretações já verificadas.
Confirmamos texto assinatura estamos com Pinheiro Azevedo e VI Governo para construção Pátria livre e socialista conforme vontade esmagadora maioria nosso povo livre imperialismos e seus agentes nacionais.
Um grupo trabalhadores MEC Fábrica Aparelhagem Industrial.

O telegrama cuja publicação pedem na íntegra e de que se deu um resumo na altura própria é o seguinte, que vou ler, dado que é curto:
Estamos com Pinheiro Azevedo e VI Governo construção país livre e socialista conforme vontade esmagadora maioria nosso povo e livre imperialismos e seus agentes nacionais.
Um grupo trabalhadores MEC Fábrica Aparelhagem Industrial.
Outros telegramas:
Trabalhadores agrícolas e construção. civil Alcobaça apoiam Assembleia. Defesa liberdade.
Professores de Escola Lajes Rebordosa manifestam confiança ao VI Governo e aplaudem decisões Presidente da República, Conselho da Revolução, defesa de disciplina, ordem, trabalho e democracia Portugal. O Conselho Escolar.

Os trabalhadores da Iberoplas deliberaram por maioria não aderir a paralisação do dia 14 e rejeitar sempre e qualquer ordem cúpula que vise interesses partidários.
Secção PS Quarteira apoia intervenção Sottomaior Cardia. Com ele não tememos bofetadas nem de Alpoim Galvão nem de Otelo Saraiva de Carvalho.
Assinado: Secretariado.
Apoio total incondicional VI Governo, trabalhadores da Misericórdia Lisboa, repudiando manobras activistas minoritárias que queriam paralisar trabalho. Trabalhadores da Misericórdia.
Horas graves que país atravessa, maioria trabalhadores Sicomol, Figueira da Foz, apoia incondicionalmente VI Governo.
A maioria dos trabalhadores da Sociedade Central de Cervejas, Coimbra, apoia incondicionalmente VI Governo e forças armadas fiéis.
Irmanados mesma recusa fascismo e social-fascismo, adversários falsos progressismos golpistas da contra-revolução com fachada de esquerda, conscientes socialismo em liberdade e não o contrário e de que só poderá fazer-se com o povo nunca contra o povo. Núcleo trabalhadores socialistas Efacec Arroteia-Maia repudiam vivamente acções aventureiristas de risíveis e autoproclamadas vanguardas civis ou militares, exigem severa punição bandos civis armados que ruas de Lisboa derramam sangue valorosas soldados. Apoiam brigadeiros Vasco Lourenço e Pires Veloso, almirante Pinheiro de Azevedo, coronel Jaime Neves, VI Governo, tentativa devolver País a tranquilidade sem quais reconstrução não será possível sociedade fraterna que pretendemos não passará de uma miragem. Núcleo trabalhadores socialistas Efacec Arroteia-Maia.
Tendo os trabalhadores da agência de Ponta Delgada do Banco Fonsecas & Burnay tomado conhecimento através dos órgãos de comunicação social da manobra pseudo-revolucionária e de carácter golpista que exige o saneamento do general Altino de Magalhães, reuniram-se no dia 24 de Novembro de 1975 em R. G. T. e deliberaram:
1) Apoiar firmemente acção governativa da junta regional e particularmente o seu Presidente, general Pinto de Magalhães;
2) Repudiar o recurso que sistematicamente é feito aos meios depressão, ditos populares, para servirem de acusação de reaccionarismo;
3) Expressar a nossa irredutível determinação de evitar que os Açores sirvam jamais de joguete a estratégias aventureiristas estranhas ao povo açoriano e que estão a conduzir o País para a bancarrota, que o mesmo será dizer pana um regime totalitário.

Os trabalhadores do Banco Fonsecas & Burnay em Ponta Delgada.

Pausa.

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Os Srs. Deputados que vierem chegando durante a sessão escusam de vir à Mesa para tirarem a sua falta. Basta que do seu lugar façam notar a sua presença. Talvez assim não haja perturbação da sequência dos trabalhos.

Pausa.

248 funcionários do IRA enviam-nos uma moção, a qual contém, em resumo:
1.º Manifestar o seu apoio às últimas medidas adoptadas pelo Conselho da Revolução, em particular a nomeação do Sr. Capitão Vasco Lourenço para comandante da Região Militar de Lisboa;
2.º Reiterar a sua confiança e intransigente apoio a S. Ex.ª o Almirante Pinheiro de Azevedo e ao VI Governo, enquanto representante da esmagadora maioria do povo português;
3.º Repudiar energicamente todas as manobras de boicote sistemático à actuação do VI Governo, levadas a cabo por personalidades e organizações políticas e militares que, autodenominando-se de progressistas e revolucionárias, fazem objectivamente o jogo da reacção;
4.º Decidem ainda manifestar o seu repúdio pelo comunicado apresentado ontem nas estações emissoras em nome de um grupo de trabalhadores do IRA, Lisboa, e que, ao que temos conhecimento, teve aprovação de menos, de nove pessoas das trezentas que aqui trabalham. Informa-se que os trabalhadores que aprovaram esta moção representam 75 % dos funcionários daquela instituição.

64 trabalhadores das firmas Inatextil, de Manufacturas Têxteis, Lda. e Brasão Pinto & Ca. Lda. com sede no Porto, testemunham o seu incondicional apoio ao VI Governo Provisório, na pessoa do almirante Pinheiro de Azevedo, ao brigadeiro Pires Ve1oso, comandante da Região Militar do Norte, e à Assembleia Constituinte, na pessoa do seu presidente, Prof. Henrique de Barros, solidarizando-se também com todos os portugueses verdadeiramente democráticos. Seguem as 64 assinaturas.
A maioria dos trabalhadores da empresa Fertor, de Boça da Macieira, Ermesinde, enviam-nos a fotocópia de uma moção, que também remeteram a S. Ex.ª o Sr. Presidente da República, de apoio ao VI Governo Provisório.
Grupo de trabalhadores da indústria hoteleira do Hotel D. Filipa - Algarve vêm manifestar o seu profundo pesar pela morte de militares do Regimento de Comandos que, cumprindo o seu dever, tombaram na defesa do povo português contra traidores a esse mesmo povo.
Manifestam igualmente ao coronel Jaime Neves e a todos os militares do Regimento de Comandos a sua gratidão por terem sabido mais uma vez comportarem-se como soldados defensores das mais justas aspirações do povo português, aspirações essas que se identificam com a política seguida pelo Grupo dos Nove executada pelo VI Governo Provisório. Seguem algumas dezenas de assinaturas.
Os trabalhadores da Empresa Japanauto, Automóveis, S. A. R. L., reunindo os sectores de escritório e comércio, aprovaram por maioria a moção que resumem da seguinte forma:
Propostas aprovadas:
1) Repudiar as manobras divisionistas que algumas facções políticas ultraminoritárias têm vindo a desencadear contra a vontade do povo português.
2) Repudiar as paralisações de trabalho, que mais não visam do que a destruição completa das empresas, levando os trabalhadores ao desemprego e à miséria.
3) Repudiar os sequestros ao Primeiro-Ministro do VI Governo Provisório e aos Deputados eleitos pelo povo.
4) Repudiar as manipulações dos órgãos da comunicação social, particularmente os órgãos estatais.
5) Apoiar incondicionalmente o Primeiro-Ministro, almirante Pinheiro de Azevedo.
6) Apoiar incondicionalmente o VI Governo e a sua decisão de suspensão, até ser restaurada a autoridade militar.
7) Apoiar a decisão tomada pelo Conselho da Revolução, nomeando para comandante da Região Militar de Lisboa o Sr. Capitão Vasco Lourenço.
8) Apoiar os comandantes das regiões militares do Norte, Centro e Sul.
9) Apoiar a posição tomada pelo Sr. Coronel Jaime Neves, digníssimo comandante do Regimento de Comandos da Amadora.
10) Apoiar a luta dos trabalhadores do jornal O Século pela aplicação do referendo.

Exigimos de S. Ex.ª o Sr. Presidente da República:

l.º Que faça respeitar as decisões tomadas pelo Conselho da Revolução.
2.º Que restabeleça a ordem neste país, tendo em vista acabar com a degradação social, económica e militar.
3.º Que crie as condições favoráveis ao aumento da produção nacional, satisfazendo assim as justas aspirações das classes trabalhadoras.

A Federação Norte de Lisboa do Partido Socialista, que inclui as secções de Mafra, Torres Vedras, Lourinhã, Sobral de Monte Agraço, Arruda das Vinhos e Alenquer, reunidas em assembleia geral em 21 do mês passado, reafirma perante o Sr. Presidente da República, Primeiro-Ministro, Conselho Superior da Revolução, VI Governo e militares da Escola Prática de Infantaria de Mafra a sua determinação em defender por todos os meios e até às últimas consequências a vontade popular democraticamente expressa. A Revolução e a construção em Portugal de uma sociedade socialista em que desapareça de vez a exploração do homem pelo homem ou pelo Estado e com o respeito pelos direitos e dignidade da pessoa humana.
O Sr. J. N. Soares, de Nova Iorque, envia-nos mais um dos seus boletins informativos, este com o n.º 232, abordado os seguintes temas: «Situação do café»; «A situação em Angola»; «American Portuguese Society»; «É fartar vilanagem» - que se refere ao assalto à Assembleia Constituinte -, e, finalmente, « Organização Internacional do Café» e «MPLA». Para quem

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tenha curiosidade de conhecer o seu conteúdo, fica à disposição de qualquer curioso.
Recebemos uma exposição que contém uma assinatura ilegível, que por isso não dá conta, e que tem por título «Para quando o respeito pela maioria do povo português e a autoridade militar e paramilitar».
O Sr. João António envia-nos uma exposição em que refere a sua atribulada e difícil vida de homem pobre, para se referir igualmente a um assalto injustificado a uma sua propriedade. Pede providências e faz um apelo aos Deputados para que abordem este problema.
O Sr. Joaquim Pereira Fernandes escreve-nos também para nos referir as dificuldades com que se debate para educar uma filha, visto que o seu salário não lhe permite custear todas as despesas resultantes desses estudos. É um assunto que escapa à nossa competência, mas sugerimos ao nosso correspondente que se dirija ao Ministério da Educação e Cultura, que, certamente, remediará a difícil situação do nosso correspondente.
O Sr. António de Carvalho da Cunha envia-nos uma cópia de uma exposição que dirigiu a várias entidades relativamente à construção de uma casa na cidade do Porto, que esbarrou com algumas dificuldades, especialmente do SAAL. Pede justiça, mas nós, infelizmente, não lhe podemos fazer justiça neste caso. Sugerimos, porém, que o governador civil do Porto, a quem foi endereçada a exposição e que é um ilustre Deputado desta Assembleia, se debruce sobre este problema.
O Sr. António Mendes, de Vila Adelaide, escreve-nos uma carta com as cores nacionais, muito interessante, sobre o problema dos retornados de Angola, sugerindo que eles vão trabalhar para o Alentejo, «o País precisa de quem produza», diz, não se pode estar a dar dinheiro a quem nada faz».
O STAL, Sindicato dos Trabalhadores da Administração Local, escreve-nos a propósito da carta recentemente lida nesta Assembleia sobre os trabalhadores da função pública.
Os nossos correspondentes repudiam o conteúdo dessa carta e afirmam a certa altura que «é insofismável verdade o serem os trabalhadores da função pública e, mormente de entre estes, os trabalhadores da administração local os trabalhadores portugueses mais mal pagos»; referem depois os respectivos vencimentos e continuam: «Usando o autor da carta um método já cansado, a denúncia feita no vácuo inominal, entende-se levar ao vosso conhecimento a seguinte proposta aprovada em conselho de secretariados do STAL, onde, nomeadamente, se diz: b) Recordar que, se o saneamento das autarquias locais não está completo, isso não é imputável aos trabalhadores, que sempre o têm solicitado; c) Exigir do Governo Provisório que efectivamente o saneamento seja levado a cabo, de modo que não se lance o labéu de reaccionários (sic) a trabalhadores tão progressistas como os melhores e dos mais sacrificados em Portugal. Assim, ao repudiar da forma mais veemente a carta referida, entende-se que aos Deputados da Nação, melhor do que sublinhar a sua leitura com risos, caberá a exigência de que as denúncias que lhe são dirigidas sejam factuais, nominais e responsáveis. Tal exigência, não permitindo a crítica gratuita e demagógica, dará lugar à crítica revolucionária, àquela que permite uma correcção dos erros e abusos apontados. É assinado pela Comissão Coordenadora Transitória.
Trabalhadores do Palácio de S. Bento e em serviço nesta Assembleia apresentaram oportunamente no dia 25 do mês passado um comunicado. Dado esse comunicado já ter sido revelado através dos órgãos de informação e estar um pouco desactualizado, vou apenas dar, com a devida vénia, o seu resumo: O comunicado é assinado por 79 funcionários do Palácio de S. Bento repudiando o que chamam «mais uma das já razoáveis séries de proezas ou golpes em que é useira e vezeira a célula social-fascista do Palácio de S. Bento».

Uma voz: - Muito bem!

O Sr. Secretário: - O golpe consistiu, dizem os signatários, na aprovação de uma moção de solidariedade com o movimento da chamada cintura industrial de Lisboa, na sua reivindicação de um Governo dito de esquerda, aprovação esta efectuada sem que o assunto constasse da convocatória, mas que, segundo informam, mesmo assim teve a votação ridícula de 16 votos a favor, 5 contra e 6 abstenções, o que, acrescentam, «numa casa onde existem cerca de 200 trabalhadores é mais do que insignificante». Concluem afirmando «não terem esses colegas qualquer procuração nossa, nem tão-pouco competência, para falarem em nome dos trabalhadores que constantemente apunhalam pelas costas».

Aplausos.

Finalmente, vou proceder à leitura de um protesto apresentado na Mesa pelo Sr. Deputado Américo Duarte.

Burburinho.

Protesto

A situação por que o povo português acaba de passar é uma consequência directa da luta pelo controle do Governo pelos partidos da burguesia e o ambiente de guerra civil que estes criaram.
A situação criada, apesar dos dispositivos militares desencadeados, veio mostrar que o mal não era um mal militar, mas sim um mal político que resulta da luta entre os partidos burgueses que dividem o povo.
A prova disso é a luta surda que continua hoje nos corredores dos Ministérios, onde reina uma paz podre, constantemente desfeita pelos comunicados com que os partidos governamentais se digladiam entre si.
A UDP alerta todo o povo trabalhador para os sombrios jogos de corredor e as manobras de divisão que esses partidos continuam a preparar nas costas das massas populares.
A UDP protesta firmemente contra a situação de estado de sítio que foi imposta na Região Militar de Lisboa. Essa situação só serviu para dar liberdade aos fascistas e para reprimir o povo.
A política da UDP não é uma política de golpes. A UDP não participa em golpes.

Agitação na Assembleia.

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A exploração e o fascismo, os inimigos do povo, não se destroem com golpes feitos em nome do povo, mas sim pelas próprias massas populares.
A UDP não tem nada a esconder.
A sua posição é bem clara - não permitir que, por detrás de qualquer aventura, a direita possa avançar e consolidar-se impunemente. Toda a actuação e mobilização da UDP teve em vista mobilizar o povo para a defesa das suas conquistas democráticas.
Aparecem neste momento certos sectores rebocados pelo PS a propor a dissolução da UDP. Esses sectores mais não fazem do que exprimir os anseios da burguesia, porque sabem bem que a UDP é a força que mais decididamente defende as liberdades democráticas (risos), luta contra todos os falsos amigos do povo e pela democracia popular.
A UDP saúda de punho erguido a luta dos pára-quedistas. É uma luta justa, pela democracia ... (Vozes de protesto) ... contra o ... (Apupos) ... militarismo reaccionário.

Apupos.

Dão-me licença que continue? Informo os Srs. Deputados de que a Mesa lê este protesto cujo conhecimento desconhecia, ou melhor, cujo conteúdo desconhecia, em virtude de o Sr. Deputado pretender fazer pela sua própria voz; simplesmente como não estava inscrito, e para não pedir que o Sr. Deputado em nome do partido que representa expressasse aqui livremente a sua posição, a Mesa entendeu que devia dar conhecimento deste protesto à Assembleia Constituinte.
Continuo, portanto, a leitura:

A UDP saúda de punho erguido a luta dos pára-quedistas. É uma luta pela democracia, contra o militarismo reaccionário. É uma luta justa.
Saudamos a heróica luta dos soldados da PM, que tantas provas deram de estar ao lado dos explorados e oprimidos. Lembramos, entre tantas outras, o apoio dado pela PM aos operários da construção civil, vivo exemplo da unidade entre operários e soldados.
Denunciamos toda a campanha de calúnias desencadeada pela rádio e pela televisão, nas mãos do Governo, contra a PM. Significativo é que nesses meios de comunicação não digam que Jaime Neves, na guerra colonial, usava um porta-chaves feito com uma orelha de um patriota africano.
Saudamos a classe operária e o povo, que em muitos locais se organizaram para resistir às manobras fascistas. Saudamos particularmente a classe operária da margem sul pela combatividade e exemplos dados.
Foi nestas circunstâncias que os traidores de Cunhal, que estavam interessados numa 1.8 fase em apoiar as lutas dos pára-quedistas com intuitos diferentes dos próprios pára-quedistas, desaparecem por completo, traindo os soldados e preferindo ir negociar com vista a um novo Governo, em vez de mobilizar o povo contra o avanço do fascismo. A actuação desse partido traidor foi inversa - foi a de fazer tudo para que o povo não saísse à rua, foi incitar os seus militantes ao obedecimento completo ao estado de sítio, foi destruir propaganda da UDP e agredir militantes da UDP que a colavam ou distribuíam, como em Santa Iria de Azoia e Beja.
O estado de sítio deu azo à suspensão das liberdades democráticas; à instauração da censura; à existência, como antes do 25 de Abril, de uma única fonte de informação; à proibição de reuniões e do direito de expressão; a buscas a meio da noite a casas de antifascistas; à repressão sobre o povo.
O objectivo actual dos reaccionários, que da presente crise saem vitoriosos, e que têm no bolso o actual Conselho da «Revolução» e o Presidente da República, é a transformação do estado de sítio temporário em estado de sítio permanente.

Uma voz: - Não leias isso.

O Sr. Secretário:

Contra esse objectivo é preciso unir as amplas massas populares e reconstruir uma barreira inexpugnável contra o fascismo e contra os falsos amigos do povo.

Uma voz: - É preciso ter lata.

O Sr. Secretário:

Jaime Neves disse com o despudor que o caracteriza que ainda não está contente (fim de citação).
Jaime Neves e os fascistas da sua laia querem mais e pretendem obter muito mais. Jaime Neves, Pires Veloso, os fascistas do Estado-Maior do Exército e seus comparsas civis não estão satisfeitos: após terem obtido a cabeça de Otelo, de Dinis de Almeida e de outros, pretenderam a de Melo Antunes e a de Pezarat Correia.

Vozes de protesto.

O Sr. Orlandino Varejão (PPD): - É um comunicado da UDP ou do ELP?

Burburinho.

O Sr. Secretário: - Desculpem, Srs. Deputados eu tenho que continuar a ler sem que da minha parte haja qualquer adesão ao seu conteúdo.
O Sr. Presidente admitiu a leitura. É o que estou a fazer neste momento, cumprindo o meu dever de secretário, e nada mais.

O Sr. Presidente: - Como, aliás, é óbvio.

O Sr. Secretário:

A conciliação tem um preço e os nove e os que os apoiam verão a curto prazo qual é ele. Hoje, saneados do 11 de Março e do 28 de Setembro encontram-se de novo no comando de unidades.
Os fascistas levantam a cabeça por todo o lado.

Ao mesmo tempo, militares e quartéis vítimas do 11 de Março são destroçados, militares progressistas são presos.
É esta a verdade da democracia portuguesa.

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As massas populares cabe dar a resposta organizando-se e desenvolvendo a sua actuação nos órgãos de vontade popular.
A UDP protesta contra a prisão dos militares progressistas e exige a sua libertação.
A UDP protesta contra a integração de oficiais saneados no 28 de Setembro e 11 de Março nas estruturas militares.
A UDP protesta contra a censura e não publicação de todos os jornais que se publicavam até aqui e exige que a informação seja livremente assegurada.
A UDP protesta contra a demissão dos conselhos de redacção e administração dos jornais estatizados, porque essa decisão só compete aos trabalhadores, e é em última análise uma medida antidemocrática contra os direitos dos trabalhadores.
Protestamos contra a suspensão dos contratos colectivos de trabalho decretados pelo Governo.
Protestamos contra as prisões de revolucionários que faziam chegar informação ao povo.

O Deputado da UDP, Américo dos Reis Duarte.

O Sr. Presidente: - Recebemos na Mesa um requerimento que vai ser lido.

O Sr. Secretário (António Arnaut): - Antes disso, e se o meu colega secretário me permite, ainda queria dar duas informações.

O Sr. Presidente: - Peço a atenção!

O Sr. Secretário (António Arnaut): - A primeira, é que chegou uma resposta a um requerimento do Sr. Deputado e meu camarada Jaime Gama, do Gabinete da Comunicação Social. A segunda é de que o Sr. Presidente entendeu dar oficiosamente como justificadas as faltas à última sessão de sexta-feira, visto que a Assembleia não chegou a funcionar, e assim os Srs. Deputados que porventura tivessem chegado um pouco tarde estavam impedidos de marcar a sua presença. Nestas circunstâncias torna-se inútil que os Srs. Deputados requeiram a justificação de falta à última sessão de sexta-feira, dia 28.
Temos, pois, um requerimento na Mesa que vai ser lido.

O Sr. Secretário (Coelho de Sousa): - Um requerimento do Deputado do Partido Socialista Domingos Pires Pereira:

Considerando:

Requerimento

1. Que o Portugal de amanhã será conduzido pela juventude de hoje, que, por isso, necessita ser preparada eficazmente para as tarefas ingentes que a irão reclamar;
2. Que há crianças em idade escolar que, ao longo do ensino primário, revelaram excepcionais qualidades de inteligência e reais capacidades que urge aproveitar e desenvolver, a bem do progresso do País;
3. Que muitas destas crianças não têm ainda hoje possibilidade de prosseguirem estudos, porque no meio em que vivem não existem ainda estabelecimentos de ensino e perdem-se, desta forma, valores que tão úteis e necessários são para a vida do País;
4. Que a sociedade socialista, em que todos estamos empenhados, deve facultar iguais oportunidades a todos os portugueses, porque só desta forma é que poderemos efectivamente falar em livre acesso a uma educação e cultura a que toda a gente tem direito;
5. Que a concessão d.e subsídios de transporte, que não deixem nenhuma criança marginalizada, seria a solução necessária e conveniente para obstar a estas injustiças sociais que se verificam ainda entre nós!
6. Que, a título de exemplo, temos conhecimento pessoal de que uma aluna do 2.º ano da Telescola se vê agora impossibilitada de prosseguir estudos por lhe ser recusado o subsídio de transporte que lhe permitiria deslocar-se diariamente de Assumar para Arronches, onde está matriculada no respectivo posto da Telescola;

Requeiro:

Que o MEIC proceda aos necessários estudos e me informe da possibilidade de serem concedidos subsídos de transporte aos alunos, já reveladores de reais possibilidades, que, por dificuldades económicas e ausência de estabelecimentos de ensino na área da sua residência, se vêem impossibilitados de prosseguirem estudos.
Lisboa, 26 de Novembro de 1975. - O Deputado do PS, Domingos do Carmo Pires Pereira.

O Sr. Presidente: - Temos também na Mesa um requerimento requerendo uma prorrogação do período de antes da ordem do dia por mais uma hora, que vai ser lido.
O Sr. Secretário (Coelho de Sousa):

Requerimento

Nos termos do n.º 2 do artigo 43.º do Regimento requeremos a prorrogação do período de antes da ordem do dia por mais uma hora, afim de versar um assunto dos mencionados na alínea d) do artigo 42.º

Lisboa, 2 de Dezembro de 1975.

Assinado por 11 Deputados do CDS.

O Sr. Presidente: - Bem, vamos pôr desde já este requerimento à votação, embora, evidentemente, a sua influência surja apenas depois de concluído o primeiro período.
Submetido à votarão foi aprovado.

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O Sr. Presidente: - Consideramos o requerimento aprovado. Ora, vamos entrar, portanto, na discussão ...
Ah, não assinalei o pedido de abstenções.
Os Srs. Deputados que desejam abster-se em relação a este requerimento ... desculpem, fazem o favor, foi uma omissão involuntária.

Pausa

Eu agradecia que registassem então ...

O Sr. Secretário (António Arnaut): - O requerimento foi aprovado, com 23 abstenções (PCP, MDP e dois Deputados do PS) e 1 voto contra (PS).

O Sr. Presidente: - Está, portanto, decidida esta prorrogação.
Na primeira parte do período de antes da ordem do dia usarão da palavra, pela ordem de inscrição, os Srs. Deputados. Na segunda parte teremos de dar, segundo a Regimento, preferência a cada um dos grupos de Deputados que tiverem oradores inscritos.
Ora, o primeiro Deputado inscrito é o Sr. Deputado Mota Pinto.

Pausa

Esclareço que o período de antes da ordem da dia terminará às 17 horas e 42 minutos. Teremos a seguir o intervalo.

O Sr. Mota Pinto (PPD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PPD tem feito ouvir a sua voz nesta tribuna, reiteradas vezes, em apoio à realização em Portugal de uma política de construção progressiva e democrática do socialismo, de defesa da liberdade, de salvaguarda da independência e da dignidade nacionais.
Nas últimas semanas, na defesa dessa linha política, aquela que corporiza genuinamente os anseios do povo português, apoiámos o VI Governo, reclamámos o respeito integral, sem duplicidades nem golpes, da plataforma que presidiu à sua constituição, exigimos a instauração de uma firme e decidida autoridade democrática. Fizemo-lo em momentos difíceis, em coerência com a nossa doutrina e com o nosso programa, empenhados em contribuir para a realização efectiva em Portugal da ideia democrática e em denunciar quantos têm tentado criar-lhe dificuldades para a desacreditar ou, até mesmo, apunhalá-la, para sujeitar os portugueses a uma nova servidão.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Nestes dias conheceu o processo de edificação de um Portugal democrático uma nova e gravíssima provação. Com coima e serenidade - com a calma e serenidade de quantos vivem o ideal democrático - impõe-se-nos dar conta aos legítimos representantes do magnífico povo português do nosso juízo sobre a aventura criminosa que sobressaltou o País.
Condenamos vivamente e sem ambiguidades - o golpe antidemocrático e contra-revolucionário perpetrado contra o poder legitimamente constituído, contra entidades e órgãos indesmentivelmente apoiados pela esmagadora maioria do povo. O golpe contra-revolucionário, nos termos em que aflorou, é a face patente e aberta de uma conspiração antidemocrática mais vasta, com agentes e instigadores semiencobertos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O povo português, disposto a sacrificar-se pela democracia, exige o completo esclarecimento de todas as peripécias golpistas ...

Vozes: - Muito bem!

O Orador: -... a identificação de todos os responsáveis e o apuramento justo e humano das suas responsabilidades.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Os jovens militares que constituíram a face visível e primeira da sublevação foram induzidos à acção directa e contrária à democracia, através do aproveitamento do seu ardor revolucionário de um ardor revolucionário decorrente da adesão precipitada e, muitas vezes, epidérmica a falaciosos e dourados embustes que escondem a face negra da opressão, da miséria, da quebra da dignidade nacional.

O Orador: - Foram manipulados por forças políticas e grupos extremistas, adversários da democracia - grupos minoritários de extremistas militares ao serviço da ex - 5.ª Divisão e pela direcção aventureira e golpista de forças políticas representadas nesta Casa.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Refiro-me obviamente ao Partido Comunista Português.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E não exprimo apenas um ponto de vista pessoal e partidário.
Ainda há dias, em entrevista ao Nouvel Observateur, um revolucionário da primeira hora do Movimento dos Capitães, o major Melo Antunes, revelava a existência de um plano e de uma acção do Partido Comunista para destruição das Forças Armadas, criando toda a espécie de fracturas entre os seus escalões, fomentando a sublevação e a indisciplina paralisadora.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Alguns elementos insurrectos, que se prestaram a esta manipulação golpista, podiam estar convictos dia sua capacidade de direcção do processo que punham em movimento. Mas a dura realidade dos factos mostrar-lhes-ia, mais tarde e já sem remédio, que seriam subjugados e, também eles, vítimas de opressão, quando as forças manipuladoras consolidassem o seu poder.

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O Sr. Presidente da República e Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas decretou o estado de sítio parcial para defesa dos objectivos da Revolução. O Povo, na sua quase totalidade, apoiou claramente a acção decidida em defesa da legalidade e autoridade democráticas. Assim procederam os nossos militantes e simpatizantes, bem como os que foram mobilizados, por outros partidos democráticos, numa actuação que foi decisiva nalguns pontos, como o reconheceram, por exemplo, o Estado-Maior-General das Forças Armadas acerca do domínio da situação na Base de Monte Real.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - A cooperação entre os democratas, independentemente do seu enquadramento partidário, mostrou, uma vez mais, o apego do povo português à democracia como elemento irrenunciável na construção de uma sociedade justa e fraterna.
Impõe-se-nos dirigir desta tribuna uma saudação aos trabalhadores portugueses, a todo o povo português, civil ou fardado, que sem equívocos soube compreender a necessidade de uma acção decidida contra a provocação do golpismo, anunciador da ditadura, da irresponsabilidade e da miséria, e de uma acção decidida, a favor da democracia e do socialismo. Saudamos comovidamente a têmpera e a reserva moral deste povo, civil ou fardado, e seria imperdoável não mencionar especialmente o Regimento de Comandos da Amadora, pela sua corajosa e intrépida acção em defesa da dignidade das Forças Armadas, da democracia e, em última análise, da independência nacional.

Vozes: - Muito bem!
Aplausos de pé.

O Orador: - Saudamos este povo, civil ou fardado, com o compromisso de, na qualidade de seus legítimos representantes, sermos dignos dele.
Dos acontecimentos contra-revolucionários e da resposta que desencadearam, muitas lições se podem colher, que seria grave erro olvidar. Entre elas avulta:
1) A certeza de que as manobras antidemocráticas só podem oferecer ao povo português o espectro da guerra civil ou da opressão; só a democracia e o pluralismo, proclamados e vividos, fornecem o quadro de vida cívica, susceptível de permitir a convivência pacífica entre, todos os portugueses e a participação de todos os cidadãos na construção de uma sociedade que eles escolherão, seguramente, justa e progressista.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Deixe-se ao povo a escolha livre dos seus destinos e ele, na sua sabedoria empírica, saberá sempre optar por soluções progressistas e em liberdade. Os democratas não podem aceitar restrições ao princípio da plena soberania popular, que são formas embrionárias de futuras ditaduras. Os democratas confiam no povo. Por mim, e pelo Partido Popular Democrático, confio no povo.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - 2) Esta Revolução fez-se para o povo trabalhador de Portugal. Mas os acontecimentos contra-revolucionários estiveram na iminência de provocar confrontos entre trabalhadores que só foram impedidos pela sabedoria popular, pelo sentido das realidades, pelo seu apego à democracia. Só uma política decididamente progressista no sentido da realização de um projecto socialista, democrático e pluralista, mas a conceber e praticar nos parâmetros do realismo, da objectividade antidemagógica, em suma, do que é viável, pode corresponder aos autênticos interesses dos trabalhadores.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Animados por um ideal progressista, pisemos caminhos seguros e realistas, a fim de superarmos a grave crise económica e social em que a demagogia e também a intenção deliberada nos prostrou. De outro modo, a demagogia e a irresponsabilidade minarão a confiança do povo português na democracia e nas soluções socialistas.
3) A Nação está profundamente ferida com o Partido Comunista Português, que ao longo deste ano e meio tem violado sistematicamente as regras da democracia. . .

Uma voz:- Muito bem!

O Orador: - ... tem empreendido a política da terra queimada em relação ao aparelho produtivo, e não só relativamente ao grande capital monopolista ou latifundiário, tem prosseguido uma política pouco consentânea com a dignidade e a independência de Portugal.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Além disso, é notório que, em aliança com forças militares e civis do impropriamente chamado poder popular, que no fundo controlava, se comprometeu no golpe contra-revolucionário recém-abortado.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Continuar a inserir o PCP, ao lado de partidos autenticamente democráticos, entre as forças democráticas, desacredita aos olhos do povo a democracia.

Vozes: - Muito bem!

Aplausos.

O Orador: - Fala-se hoje, e o perigo é real, de uma revivescência do perigo do regresso da extrema direita. A circunstância que mais potencia e favorece esse perigo é a identificação, total ou parcial, do processo político português com as concepções e a actuação do PCP.

Vozes: - Muito bem!

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O Orador: - Então, escancaradas as portas do desânimo e do desespero, o povo português tornar-se-á vulnerável à propaganda insidiosa da direita.
Cabe, assim, ao Partido Comunista ...

Uma voz: - Conspiradores.
Vozes de protesto.

O Orador: - ... o encargo de provar inequivocamente o abandono da linha política antidemocrática até hoje seguida.
4) As forças armadas assumiram corajosamente o seu papel de garantes da ordem democrática. Nessa tarefa se corporiza o aspecto mais nobre e elevado da sua missão no presente momento histórico e, a essa luz de garantes da ordem democrática, se deve perspectivar qualquer novo projecto global com as forças democráticas.
Se soubermos compreender estas lições, não temos dúvidas que o povo português será o obreiro de um Portugal transformado, inserido no seu tempo, aberto a todo o mundo e ao futuro, enraizado sem chauvinismo no que houver de mais nobre e generoso no nosso passado e na nossa cultura. Não temos dúvidas de que o povo português será o esclarecido agente da consolidação em Portugal da liberdade, dos direitos do homem, do socialismo pluralista, da dignidade e independência nacionais.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem!

Aplausos.

(O orador não reviu, tendo efectuado a sua intervenção na tribuna.)

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Augusto Seabra.
Queria informar que a primeira parte do período de antes da ordem do dia terminará às 16 horas e 42 minutos.

O Sr. José Augusto Seabra (PPD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: As horas dramáticas que o País vem vivendo, sem retirarem às palavras que na última sessão ia pronunciar nesta Assembleia a sua actualidade, impõem-me que hoje me dirija a todos vós, representantes legitimamente eleitos do povo português e detentores da soberania popular, em termos bem diferentes, embora no mesmo tom sereno e firme.
São do domínio oficial e público os gravíssimos atentados contra a legalidade democrática que grupos aventureiros perpetraram, obedecendo, sem dúvida, a um plano mais vasto de destruição das instituições políticas e militares do 25 de Abril e de imposição pela força de um poder que, a coberto da designação de popular, não seria senão o de uma ditadura minoritária e totalitária, contra a vontade da imensa maioria dos portugueses.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - A liberdade e os direitos que tão preciosamente alcançámos, com o derrubamento da ditadura fascista, de triste memória, foram de novo postos em causa: a democracia correu perigo. Para a sua defesa, para a defesa do socialismo pluralista que queremos construir, para a salvaguarda de um futuro de progresso e de paz para o nosso país, temos todos de continuar preparados e atentos.
Ao prestar homenagem aos militares democratas, entre os quais se destacaram os corajosos comandos, que asseguraram o respeito do poder revolucionário legítimo, ao prestar homenagem a esse bravo povo que acorreu prontamente ao apelo dos partidos democráticos, ao apelo do nosso partido como aconteceu na base de Monte Real em apoio da Revolução ameaçada, não fazemos mais, pela nossa parte, do que ser fiéis à nossa posição coerente e intransigente de sociais-democratas, de homens livres e de cidadãos progressistas.

Vozes: - Muito bem!

Aplausos.

O Orador: - Desde o 25 de. Abril que o Partido Popular Democrático, ao lado do MFA, se tem batido pela instauração de uma democracia política, económica e social, como meio de emancipação do nosso povo de todas as formas de repressão, de exploração e de alienação, de modo a caminhar para uma sociedade mais justa e humana.
Estivemos sempre contra todos os que, desrespeitando as regras democráticas, os direitos do homem e a dignidade das pessoas, se arrogaram a veleidade de querer travar a marcha do povo português para a sua libertação, quer pelo regresso ao passado, quer pela instauração de um novo tipo ou já velho de repressão da sua vontade. Para nós, esta e só esta é fonte de poder legítimo. E orgulhamo-nos de ter conquistado em 25 de Abril de 1975, através de eleições livres, a confiança de milhão e mexo de portugueses. Por isso condenámos sem apelo todos aqueles que, antes e depois dessa data, de que decorre a legitimidade que temos para falarmos em nome do povo, se quiseram substituir à sua vontade soberana.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:- Por isso denunciámos e repudiámos as intentonas do 28 de Setembro e do 11 de Março, como agora denunciamos e repudiamos a do 25 de Novembro, exigindo o apuramento de toda a verdade e o julgamento dos responsáveis. Por isso alertámos incansavelmente, desde há longos meses, contra os riscos que as ambições de poder dos grupos extremistas de esquerda ou de direita, e de quem os utiliza ou favorece para atingir os seus desígnios totalitários, fazem correr ao País, lançando-o em conflitos sangrentos e trágicos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Os últimos acontecimentos deram-nos, infelizmente, razão. Aqueles que, como o Partido Comunista e partidos ou movimentos subsidiários, sabendo da sua fraca implantação no País e procurando, através das infiltrações e da subversão nas forças armadas, através do controle do aparelho de Estado e dos órgãos administrativos centrais e locais,

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através do monopólio dos principais meios de comunicação social, empolar a sua força, encenando não apenas teatralmente, mas, como se vê, através de operações golpistas a tomada do poder, por sucessivas fases, são gravemente responsáveis da situação a que se chegou, dos factos que se passaram.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - As personagens e comparsas do golpe estão identificados, assinaram proclamações ou inspiraram-nas, montaram e dirigiram as operações, enfim, denunciaram-se a si mesmos: neles sobressaem elementos gonçalvistas e da ex-5.ª Divisão, bem como unidades e organizações por eles controladas, como a Policia Militar e grupos civis armados, que já deram origem à morte traiçoeira de portugueses, como a do tenente «comando» que hoje vai a enterrar, no meio do respeito e da emoção do povo.

Vozes: - Muito bem!

Aplausos.

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Eu não quero deixar de salientar um facto que me parece gravíssimo e que teve lugar, segundo foi denunciado por porta-vozes oficiais, dentro da Polícia Militar, e de que é responsável a sua «brigada especial».
Acabo de ter conhecimento de um abaixo-assinado, de um documento que intelectuais portugueses, que escritores portugueses, vão dirigir ao País, e permito-me ler esse documento, pois que ele nos impõe uma reflexão profunda:
Os abaixo assinados tiveram conhecimento, através dos meios de comunicação social, das sevícias degradantes e atentatórias dos mais elementares direitos do Homem, praticados pela «brigada especial» da Polícia Militar de Lisboa, implicada no golpe contra-revolucionário do 25 de Novembro, processos que, no dizer de um porta-voz oficial, «eram mais repugnantes do que os da própria PIDE», havendo prisioneiros civis que apresentam vestígios de tortura e de flagelos físicos impressionantes. Essas práticas torciárias e abjectas comprovam que o pseudo-revolucionarismo de certos grupos extremistas mais não é do que a camuflagem de atitudes de inspiração nazi-fascista e estalinista, vergonhosamente ofensivas dos eminentes valores da liberdade e da dignidade da pessoa humana, sem cujo respeito estrito não pode haver democracia socialista digna desse nome.
Porque não aceitam que se tenha tentado transformar a Revolução portuguesa num campo de concentração e porque entendem que hoje mais do que nunca, se impõe aos intelectuais portugueses responsáveis não se demitirem de uma intervenção constante e decidida, na defesa intransigente daqueles valores, os signatários exigem que a opinião pública seja cabalmente esclarecida sobre esses crimes totalitários, e que os responsáveis, tal como os seus famigerados colegas da polícia política fascista, sejam pronta e severamente julgados. Mais convidam todos os intelectuais portugueses a associarem-se-lhes no repúdio veemente de actos como os referidos, responsabilizando desde já todos aqueles pseudo-intelectuais cuja actuação corporativa, do mais puro estilo policial e penal, contribuiu para a criação de um clima propício à intentona contra-revolucionária e à consumação de tais crimes, em que foram, portanto, colaboracionistas.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há que fazer um rigoroso inquérito, há que publicar imediatamente os elementos já conhecidos e exigir o respeito das leis e da justiça democrática, nem mais nem menos. Há que estabelecer, de uma vez para sempre, um estado de direito, em que as liberdades dos cidadãos sejam garantidas e em que os diferentes órgãos de Soberania, com independência e sem pressões, funcionem de facto, desde a Assembleia Constituinte ao Governo e aos tribunais, para além dos órgãos de poder revolucionário. É essa a essência da democracia, é essa a essência do socialismo pluralista e humanista que desejamos construir.
Todos os partidos que, dentro da legalidade e com métodos inequivocamente democráticos, concorrerem para a expressão política da vontade popular têm o seu lugar próprio, sejam eles maioritários, no Governo, sejam eles minoritários, na oposição. Mas nenhum se pode arrogar uma posição dominante, nem impor uma qualquer hegemonia, e muito menos quando representa uma pequena, se não uma minúscula parte dos cidadãos.

Uma voz: - Muito bem!

O Orador: - Falar em nome de uma classe, em nome dos trabalhadores, reclamar-se do povo por simples autoproclamação ou decreto, é abusivo. Esse miro, ou melhor, essa mistificação, não pode continuar: o povo português abriu já os olhos, e agora que as máscaras caem, que a encenação não é mais possível, pela perda do controle da rádio, da Televisão, dos jornais do Estado, com que os ideólogos e propagandistas do Partido Comunista e seus acólitos pensavam condicionar a opinião dos cidadãos «ingénuos», isto é, livres, no sentido originário do termo, agora, a realidade nua e crua vem à tona, e os aprendizes de feiticeiros mostram-se .tais quais são: simples aventureiros ávidos, de poder, sem princípios nem escrúpulos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sempre o dissemos: como partido democrático, não somos no Partido Popular Democrático, particularmente, um partido anti, com uma única excepção - a de sermos um partido antifascista. Mas também nunca tivemos, nem teremos, como é nosso direito, complacências para com o comportamento dos que são, afinal, antidemocratas, permitindo-nos criticá-los, dizer-lhes não, e mesmo considerar inadmissível a sua actuação prática, embora respeitando os homens e as suas convicções.

Uma voz: - Muito bem!

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O Orador: - E por isso afirmamos: a atitude dos inspiradores do golpismo, nos últimos tempos, sobretudo nos últimos dias, passou a ser não apenas disfarçada, mas claramente hostil aos órgãos do poder revolucionário e democrático implantado no 25 de Abril. Não somos só nós que o dizemos: disse-o o Ministro dos Negócios Estrangeiros, Melo Antunes, um militar fidedignamente revolucionário e progressista da primeira hora, ao denunciar no Nouvel Observateur um plano em várias fases agora precipitado pelo golpe dos pára-quedistas de «conquista do poder» pelo Partido Comunista e pelos « partidos de extrema-esquerda que lhe estão tacticamente ligados».
Não é continuando a fazer-se hipocritamente ignorante do golpe, a negar a existência do golpe, a negar a evidência dos factos - como o fez, aliás, aqui, o Deputado Vital Moreira, na última sessão, no preciso momento em que o Presidente da República declarava o estado de emergência, depois seguido pelo estado de sítio parcial na Região Militar de Lisboa -, não é assim que o Partido Comunista dá provas de sinceridade democrática; antes pelo contrário. Não é publicando comunicados em que apela ambiguamente para uma solução ,política e negociada da crise, sem condenar a sublevação, que ele dá garantias de respeitar o poder legítimo. Não é minando a, autoridade do Governo de que faz parte, ao mesmo tempo que reclama a sua demissão, que esse partido ganha credibilidade, como partido governamental, mas quando muito como partido de oposição. Não é sendo conivente no cerco e no sequestro dos Deputados à Assembleia Constituinte, como ficou demonstrado ultimamente há dias, com o - desprezo da mais elementar solidariedade e mesmo do pudor, que pode esperar de nós, representantes eleitos do povo, qualquer espécie de - transigência cívica. Não é, enfim, fazendo violência no País e ameaçando lançá-lo numa aventura sangrenta, que pode granjear o respeito do povo português, por mais que este seja paciente e tolerante.
Que fique bem claro: nós pensamos que qualquer partido tem o seu lugar na democracia portuguesa, maior ou menor, significativo ou insignificante, desde que respeite os direitos e as liberdade dos outros partidos e de todos os cidadãos. Mas o seu peso político terá de corresponder à sua verdadeira força (ou fraqueza) expressa pela, escolha soberana do povo.
E só em eleições livres - como o foram as da Assembleia Constituinte, como o terão de ser as próximas eleições legislativas, a que ainda há dias o Presidente da República se referiu como garantia de um regime democrático - se poderá tirar a prova real da representatividade efectiva, e portanto da possibilidade de governar ou não, dos diferentes partidos. Transportar para o terreno político, como elementos de pressão intolerável, as próprias formas de acção terrorista armada, os métodos de instrumentalização sindical e as técnicas de manipulação da opinião pública é pôr em risco, constante a existência da democracia.
Esta Revolução foi já vítima de tantos golpes baixos, como aquele que acaba de lhe ser desferido, que não se pode mais permitir que outros lhe venham ainda a ser assestados pelas costas ou pelas flancos, sejam eles da esquerda ou da direita extremas, fascistas ou fascizantes.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Há que tirar sem demora a lição política desta crise: identificados que estão os instigadores da rebelião dos pára-quedistas e do plano mais amplo em que se inseria, o povo português tem o direito de exigir que eles sofram as consequências da sua irresponsabilidade cívica. Como poderão ser dignos da confiança para continuarem a participar na condução dos seus destinos aqueles que persistem em desrespeitar a vontade do povo e dos seus representantes, sem darem provas de que vão acatá-la? Por outro lado, os partidos verdadeiramente democráticos, que nesta como noutras conjunturas comprovaram a sua fidelidade à Revolução, aos seus órgãos superiores e legítimos, mostrando estar assim à altura das suas responsabilidades, viram confirmado de moda inequívoco o apoio que largamente lhes foi dispensado pelo povo português, de norte a sul do País, durante a campanha em favor do VI Governo, contra aqueles que o abocavam do interior e do exterior. Reunidas que estejam as condições do exercício normal do poder político, com o apoio das forças armadas sãs, dentro do acatamento da autoridade democrática, devem ser esses partidos a assumir as suas responsabilidades, no quadro de um projecto global e viável de transformação progressista da sociedade portuguesa. Só eles são, na verdade, os promotores autenticamente credenciados de uma via democrática para o socialismo, quaisquer que sejam as diferenças ideológicas que as distinguem. Só eles poderão resolver de frente, com uma base popular ampla, os difíceis problemas que o País atravessa, garantindo a independência nacional, bem como a superação da crise económica e dos conflitos sociais que se agudizam, no interesse do povo português e antes do mais do povo trabalhador.

O Partido Popular Democrático está pronto, pelo que lhe diz respeito, a continuar a dar o seu contributo mais do que nunca indispensável para a construção em Portugal de uma sociedade mais livre, mais justa e mais fraterna.

(O orador fez a sua intervenção na tribuna.)

Vozes: - Muito bem!

Aplausos

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Vamos agora entrar na segunda parte do prolongamento do, período de antes da ordem do dia. Nos termos do Regimento poderão usar da palavra os partidos que ainda o não fizeram, aliás são todos menos o PPD.

O orador inscrito pela ordem que temos na Mesa é o Sr. Deputado Carlos Brito. Tem a palavra.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A posição do Partido Comunista Português face às recentes sublevações militares e às suas repercussões na situação de crise político-militar em que vivemos desde há meses foi já definida pelos órgãos executivos do Comité Central do meu partido, nomeadamente em duas notas da Comissão Política, com as datas de 25 e 28 de Novembro, e numa nota do Secretariado, inserta no Avante de 30 de Novembro.

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O Sr. Barbosa de Melo (PPD): - E de que maneira ...

O Orador: - Tomo a palavra para transmitir a esta Assembleia algumas das posições essenciais do meu partido, posições que não constituem uma apressada adaptação às novas condições, mas que estão límpida e coerentemente na linha do que temos vindo a preconizar desde que a crise se agudizou, há quatro meses atrás, e temo-lo feito tanto na nossa actividade política geral, na propaganda e informação, na mobilização das massas trabalhadoras e populares, em declarações feitas nesta mesma Assembleia, como em encontros e diligências feitos junto de órgãos do poder e de representantes das diversas tendências militares e das diversas organizações políticas.

Uma voz: - Hipocrisia.

O Orador: - No cerne da nossa orientação e actividade está a declarada aposição a uma política de força, de confronto militar e de guerra civil, que só à reacção poderiam aproveitar, e a insistência numa solução política global resultante de negociação, forma mais eficaz de assegurar a defesa da Revolução e das suas conquistas.

Vozes de protesto.

Lembro-vos que já em 10 de Agosto a Comissão Política do Comité Central do PCP afirmava: «A cristalização de ideias, a incapacidade de confrontar opiniões, o sectarismo, só podem dificultar a busca de solução.» E noutro passo: «Existem perigosas tensões. A todo o custo é necessário evitar confrontos irremediáveis que possam conduzir a Revolução à sua perda. »
Em 21 de Novembro declarava o Comité Central do meu partido: «O PCP pronuncia-se firmemente par uma solução política e não por actuações inconsideradas que criem condições favoráveis para um golpe de força da direita.»
Hoje afirmamos (nota da Comissão Política do Comité Central, de 28 de Novembro): «O PCP defendeu com insistência uma solução global da crise, consistindo na reaproximação e reunificação das tendências do MFA e no reforço da representação das forças de esquerda (civil e militar) no Governo, de onde deveria sair o PPD, partido da reacção.»

Uma voz: - Apoiado!

Aplausos do PCP.

Vozes de protesto.

O Orador: - « [...] Ainda no momento presente, apesar da nova situação criada e de uma nova correlação de forças, as linhas gerais fundamentais de solução da crise preconizada pelo PCP continuam a ser o único caminho que pode cortar o passo à contra-revolução.»

Vozes de protesto.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os partidos e os agentes da reacção e da extrema-direita, as porta-vozes do imperialismo, os grupelhos provocatórios com fachada de esquerda ...

Risos.

.. os esquerdistas e aventureiristas, ...

Risos.

... todos se reúnem, agora, para lançar sobre o PCP uma campanha de calúnias, da qual sobressai a tentativa de responsabilizar o meu partido pelos recentes acontecimentos.

Uma voz: - Que o diga a DORN ...

O Orador:- São evidentes e óbvios os objectivos desta campanha de mentiras.
Os que reclamam agonia a cabeça dos comunistas, ao mesmo tempo que continuam a reclamar as cabeças de todos os militares de esquerda, visam, para além da liquidação dos homens e das forças revolucionárias, a liquidação imediata das grandes conquistas dia Revolução as liberdades, as nacionalizações, a reforma agrária, o controle operário, visam a liquidação das traves-mestras do processo revolucionário português, nomeadamente o MFA e o seu papel na Revolução. Visam ganhar as posições mais avançadas donde partam para a liquidação da situação democrática adquirida com o 25 de Abril e donde preparem o regresso do terror e da tirania fascistas. As declarações e comunicações de dirigentes do CDS e do PPD, entre outros, são já muito esclarecedoras a este respeito.
Os que nos atacam tão freneticamente são exactamente os mesmos que com argumentos reaccionários e de direita, ou com argumentos aventureiristas e esquerdistas, impediram e boicotaram até agora a negociação e o entendimento entre as diferentes tendências do MFA e entre as diferentes forças políticas progressistas na busca de uma solução política global para a crise. Os que nos atacam são exactamente os responsáveis morais pelas sublevações militares de 25 de Novembro e dos demais acontecimentos que lhes estão associados.

Burburinho.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Peço a vossa atenção. Os oradores têm sido ouvidos com atenção, não há motivo nenhum para não ouvirmos o Sr. Deputado Carlos Brito.

Prossegue a agitação.

Peço a vossa atenção.

O Orador: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: A viragem à direita que se procurou operar em todos os domínios da vida política portuguesa, após a formação do VI Governo e em clara aposição aos aspectos fundamentais da plataforma política que lhe serviu de base, não podiam deixar de provocar um amplo e generalizado descontentamento.

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As massas trabalhadoras, as massas populares, manifestaram esse descontentamento de modo poderoso e significativo em greves, concentrações e manifestações, donde sobressai a manifestação de 16 de Novembro, que concentrou no Terreiro do Paço mais de 300 mil trabalhadores.

Vozes (em uníssono): - Eh! . . .

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Peço a vossa atenção.

O Orador: - Mas o traço predominante dessas grandes demonstrações de massas, legitimas num país democrático, foi, contrariando os falsos alarmes e atoardas lançados pulos partidas da direita e pelo próprio PS, o seu carácter pacífico e disciplinado

Burburinho.

Vozes: - Eh! ...

Risos.

O Sr. Presidente: - Peço a atenção da Assembleia. O Sr. Deputado está no uso do seu direito.

O Orador: - ... e a natureza realista das reclamações no que toca à solução da crise político-militar, pois, em todas, as mais importantes, se defendeu o entendimento entre as tendências do MFA e entre as forças políticas progressistas, em todas se preconizou modificações no Poder favoráveis à esquerda, mas em nenhuma se ensaiou qualquer assalto ao poder, ou sequer a contestação de todo o poder.
A viragem à direita tomou aspectos particularmente profundos nas Forças Armadas com a sucessão de saneamentos à esquerda, o afastamento de comandantes revolucionários, a liquidação e tentativas de liquidação por métodos administrativos de unidades que sempre estiveram com a Revolução. Para as massas trabalhadoras, para as massas de militares progressistas, para todas as forças revolucionárias, a aliança direitista PPD-PS estava a estabelecei a força e os meias militares para impor pela repressão uma política a que vastos sectores populares resistiam firme e decididamente, uma política que não polira vingar par processos democráticos. É nessa política de repressão que têm que se procurar as razões de indignação e de revolta de muitos militares na dia 25 de Novembro, as sublevações espontâneas dos pára-quedistas, e as manifestações de solidariedade que despertaram.

Uma voz: - Explica-te!

Aplausos.

Vozes de protesto.

O Orador: - Como se diz no editorial do Avante do dia 30, «Ao mesmo tempo que manifesta a sua solidariedade para com as militares revolucionários e progressistas que lutaram e lutam ao lado do povo trabalhador, em defesa da Revolução, o PCP atribui graves responsabilidades nas acontecimentos a certos partidos, grupos e elementos esquerdistas irresponsáveis que, julgando poder-se brincar às insurreições e às tomadas do poder, comprometeram uma solução política pela qual o PCP se tem batido persistentemente e conduziram ao desastre alguns sectores militares. »
As forças da esquerda militar sofreram uma pesada derrota. A viragem à direita defendida até agora pelo PPD e pelo PS tende a adquirir uma base de força militar mais favorável. Será, no entanto, um grave erro de cálculo que as forças conservadoras e reacoionárias pensem que podem impor ao País a política que entenderem. O movimento operário é poderoso e as massas populares estão decididas, como já demonstraram, a defender as liberdades e as outras conquistas da Revolução.

Vozes de protesto.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: A repressão contra a esquerda .militar e a desarticulação de unidades progressistas, a nomeação de reaccionários para postos de comando, ameaçam de grave debilidade as posições de todas as forças da democracia, incluindo a dos sectores moderados do MFA e do PS.

Burburinho.

Os golpes contra a esquerda militar são golpes que repercutem centra todas as foiças democráticas e antifascistas.

Uma voz: - Não apoiado.

O Orador: - O perigo do fascismo, que desde há tempo paira no horizonte político português, toma expressão mais carregada.
Todas as forças reaccionárias estão a preparar-se para explorar ,a derrota da esquema militar, reforçarem a iniciativa, ocuparem novas posições, ultrapassarem e remeterem a um papel secundário todos os sectores democráticos, mesmo as moderados, que até há pouco apoiavam e empurravam aia luta contra a esquerda.
A par de reacções positivas a estas ameaças, verifica-se, lamentavelmente, que a direcção do PS, a avaliar pelo seu mais recente comunicado, não se dá conta dos perigos que ameaçam a marcha da Revolução e as liberdades, persistindo no anticomunismo e no divisionismo das forças antifascistas e democráticas.

Uma voz: - Vocês não se importam de viver no fascismo.

O Orador: - O PCP regozija-se com o levantamento do estado de sítio que permitirá uma salutar resposta das massas trabalhadoras e populares e das forças da democracia aos avanços da reacção e da direita. Mas certas práticas realizadas à sombra do estado de sítio tornam-se extremamente preocupantes. As perseguições contra a esquerda, as buscas passadas par forças militares es e militarizadas a casas de militantes do PCP e outros elementos progressistas ...

Burburinho.

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... a busca passada a pelo menos um dos nossos centros de trabalho e às instalações de dois sindicatos em Lisboa, e um do Porto, este sem a presença de nenhum elemento da direcção, podem prenunciar uma «caça às bruxas» que serviria a pleno os planos dos conspiradores fascistas.
Os grupos terroristas ELP e MDLP prosseguem a sua actividade impunemente e aproveitam-se das recentes convulsões pana se fortalecer.

Burburinho.

É nesta situação que o PCP apela para a unidade, sem qualquer discriminação.

Risos.

Burburinho.

O Sr. Presidente: - Os Srs. Deputados por favor deixem o orador concluir.

O Orador: - É nesta situação que o PCP apela para a unidade, sem qualquer discriminação, sem reserva por filiações partidárias, de todas aqueles, civis e militares, que estejam dispostos a tudo fazer para conter e derrotar a ameaça do fascismo, salvar as liberdades e as conquistas fundamentais da Revolução, para participarem decidida e empenhadamente na busca de uma saída política para a crise, com a supressão dos critérios repressivos e a recuperação de todas as forças válidas para o processo revolucionário.
Muito obrigado.

Aplausos.

O Sr. Presidente: - Peço atenção. Pediu a palavra, penso que para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Sottomayor Cardia, assim como o Sr. Deputado Moura Guedes.

O Sr. Sottomayor Cardia (PS): - Sr. Presidente: Eu desejava perguntar ao Sr. Deputado Carlos Brito se o Partido Comunista repudia ou não a insurreição daquilo a que esse mesmo Partido Comunista chama de militares de esquerda.
Queria, em segundo lugar, perguntar ao Sr. Deputado Carlos Brito se o Partido Comunista Português está disposto a apoiar o VI Governo Provisório e a deixar de o combater.

O Sr. Presidente: - Ora, dentro do nosso Regimento, vamos primeiro ouvir as perguntas dos diversos Deputados que queiram pedir esclarecimentos.
O Sr. Deputado Moura Guedes.

O Sr. Moura Guedes (PPD): - Os pedidos de esclarecimento que eu queria formular eram exactamente os dois que acabam de ser formulados pelo Sr. Deputado Sottomayor Cardia.

Vozes (em uníssono): - Ah!

Risos.

O Sr. Avelino Gonçalves (PCP): - É absolutamente natural ... Por isso é que se fala na reacção do PS e não do PS.

O Sr. Presidente - O Sr. Deputado Manuel Ramos também para pedir esclarecimentos.

O Sr. Manuel Ramos (PS): - O Sr. Deputado Carlos Brito referiu-se à nomeação de reaccionários para postos de comando. Eu pergunto se ele pode dizer a quem concretamente se refere, eu repito, concretamente?

O Sr. Presidente: - Mais alguém deseja pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Carlos Brito?
Tem a palavra o Sr. Deputado Artur Cortez.

O Sr. Artur Cortez (PS): - Ora, eu queria simplesmente perguntar ao Sr. Deputado Carlos Brito se quando ele se refere aos militares progressistas, se está a referir também aos oficiais da PM que conduziram os processos de tortura dentro deste regimento?

O Sr. Presidente: -Mais alguém deseja pedir esclarecimentos?

Pausa

Terminámos a inscrição pára pedir esclarecimentos. Se o Sr. Deputado Carlos Brito quiser responder, tem a palavra.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Respondendo primeiro ao Deputado Sottomayor Cardia sobre a fórmula que ele utiliza: creio que é «se repudiamos». Esta prática do repúdio, creio que, o Sr. Sottomayor Cardia sabe isto, era um convite que era geralmente feito pela PIDE aos presos políticos ...

Apupos.

Grandes manifestações na Sala.

O Sr. Presidente: - Peço o favor de deixarem o orador responder às perguntas que lhe foram feitas da maneira como ele, evidentemente, entender.

O Orador: - Pois, quanto à, expressão «repúdio» que o Dr. Sottomayor Cardia utilizou agora, e suponho que já não pela primeira vez, já a teria utilizado há dias na entrevista que deu à imprensa, a minha resposta é essa. O termo « repúdio», quanto a nós, tem essa forte significação e essa forte ressonância.

Vozes de protesto impossíveis de registar.

O Sr. Presidente: - Os Srs. Deputados podem formular as perguntas que quiserem e terão de ouvir a resposta que o interpelado entender dar.

O Orador: - Posso continuar, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Orador: - Quanto aos acontecimentos, na declaração que acabo de ler está a nossa apreciação, aliás contida já nos documentos do meu Partido,

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que acabo de citar. Portanto, é evidente que o meu Partido desaprova os acontecimentos como se verificaram.
Gargalhadas.
Manifestações na Sala.

O Sr. Presidente: - Peço a vossa atenção, Srs. Deputados.
Temos mais oradores inscritos.

O Orador: - Posso continuar, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Com certeza.

O Orador: - Eu não compreendo a hilariedade da Câmara.

Risos.

O Sr. Vital Moreira: - Está divertida!

O Orador: - Posso continuar, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Pode continuar. Tem esse direito.

O Orador: - Eu quero significar com isso que nós não concordamos com o rótulo de reaccionários que é posto a esses militares por alguns partidos presentes ou por alguns dirigentes dos partidos presentes.
Nós condenamos a sua acção mas compreendemos a sua indignação. É isso, aliás, que está implícito na declaração que acabo de fazer. Portanto, nós entendemos que a sua indignação era justificada, como já dissemos, pelo prosseguimento dos saneamentos à esquerda e todas as medidas administrativas de carácter repressivo que contra militares progressistas estavam a ser adoptadas.

Aplausos.

Quanto à forma utilizada, ela está perfeitamente em oposição àquilo que nós, comunistas, temos defendido, que é o entendimento, que é a conversação, que é a negociação entre as diferentes tendências do MFA.

Vozes de protesto.
Burburinho.

Posso continuar, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Pode continuar

O Orador: - Quanto à segunda pergunta do Dr. Sottomayor Cardia, relativamente ao VI Governo, nós participámos na elaboração da plataforma do VI Governo.

A Sr.a Maria Emitia Moreira da Silva (PS):- Mas não parece...

O Orador: - Portanto, o que temos condenado na política do VI Governo é o seu afastamento e, por vezes, o realizar uma política contrária à da plataforma.
É sempre nessa base que temos feito a nossa crítica. Portanto, mantemo-nos fiéis à plataforma que com outros partidos elaborámos e que subscrevemos.
Portanto, quanto à nomeação de oficiais reaccionários para os comandos, eu pergunto ao Sr. Deputado se não tem conhecimento de alguns.

Vozes de protesto.

Burburinho.

Certamente são conhecidos casos ...

Vozes - Isso não é resposta.

O Orador: - Quanto aos oficiais progressistas, quanto aos oficiais da PM, portanto, eu desconheço até agora, não dou como provado, que oficiais da PM tenham participado em torturas. Não tenho uma base fundamentada para fazer qualquer apreciação nesse sentido.

O Sr. José Augusto Seabra (PPD): - Isso é o que diziam os juizes dos tribunais plenários.
Burburinho.

O Sr. Presidente: - Os Srs. Deputados deixem o Sr. Deputado Carlos de Brito concluir a sua resposta, por favor!

O Orador: - Portanto, desconheço esses factos.

Manifestações diversas.

E é tudo, Sr. Presidente.

Burburinho.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José Luís Nunes.

Pausa.

Burburinho.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Atravessa o País um momento em que às objurgatórias, às situações passionais, às ondas de violência verbal, e não só, importa que suceda a frieza e a análise concreta das circunstâncias concretas, para que a partir dessa análise se tirem implacavelmente as conclusões.
Em primeiro lugar, voltaríamos uns momentos atrás, a uns meses atrás, que neste processo de aceleração da história parecem anos, e diremos que a revolução iniciada em 25 de Abril de 1974 veio pôr aos portugueses graves problemas que a hora presente, como qualquer hora de crise, não faz mais do que tornar mais claras, mais críticas, mais visíveis, mais evidentes, na sua realidade, na sua verdade. Correndo o risco de sermos acusados de simplificar demasiado, diremos que as grandes opções nacionais se sintetizam nas respostas que dermos às seguintes questões:
Que tipo de sociedade pretendemos construir?
Que caminho vamos trilhar para atingir esse tipo de sociedade?

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As eleições de 25 de Abril de 1975, mostrando claramente que o povo português pretende construir uma sociedade democrática e socialista, em que às desigualdades gritantes das sociedades capitalistas não sucedam as desigualdades ainda mais gritantes, já que ideologicamente justificadas, das sociedades pseudo-socialistas, em que uma burocracia estatal no poder beneficiará dos privilégios sociais negados ao comum dos cidadãos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - As eleições do 25 de Abril de 1975, mostraram também que o povo português não pretende que ao liberticídio fascista suceda o liberticídio de cariz comunista, mesmo oculto sob a designação, do conceito, da ditadura do proletariado.
As eleições de 25 de Abril de 1975 mostraram, enfim, que o povo português pretende ver estruturadas as instituições democráticas que permitam construir, sob o seu controle e ao ritmo que julgar mais conveniente, a sociedade socialista por que anseia.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - A esta luz ressalta a necessidade de definir as directrizes tendentes a concretizar a vontade; assim, vamos ter sobre nós a reprovação, a oposição, a cólera e, pior do que tudo, o desespero do povo português.
Só um louco ou um ditador ousa governar contra a vontade do povo. O fascismo mostrou-nos quanto custam as ditaduras e os homens que as incarnam. A esta luz importa analisar os acontecimentos do nosso passado próximo.
Iniciados, Sr. Presidente, Srs. Deputados, importa repeti-lo, porque é curta, é muito curta a memória dos homens, não no dia 25 de Novembro, mas naquele dia, uma semana antes, em que esta Assembleia foi cercada e os Deputados que aqui estão serviram de reféns e de objecto de chantagem na obtenção de reivindicações ilegítimas.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Em 25 de Novembro eclodiu uma rebelião que visava pôr em causa o princípio do respeito pela vontade popular e impor ao nosso país um regime que os Portugueses claramente repudiaram. A vitória das forças constitucionalistas põe-nos directamente perante o problema das responsabilidades pessoais e políticas dos intervenientes e, em consequência, diante da composição do actual Governo Provisório. Na verdade, a intentona subversiva de 25 de Novembro é o lógico desembocar de uma política em que o Partido Comunista Português tem muitas responsabilidades e que se centrou no ataque ao Governo Provisório. Para tudo, desorganizaram-se as forças armadas, através dos soldados ancapuçados dos SUV, definiu-se uma política de constante confronto no campo económico que a Intersindical tem dado um claro apoio, quer fomentando reivindicações idealistas, quer criando nas empresas um ambiente de ódio e de violência que impede o necessário trabalho produtivo.
A divulgação do sequestro e da extorção como forma salarial lançaram o País na beira do abismo. Na esteira desta política de terra queimada vinha, como veio, inevitavelmente a confrontação violenta. Assim nos compete a nós, Partido Socialista, dizer se o Partido Comunista Português deve ou não fazer parte do VI Governo. Terá de ser essa decisão política que o próprio PCP terá de tomar na base da solução das suas responsabilidades. Assim, é preciso que cá dentro e lá fora se saiba com muita clareza se o PCP pensa dar a sua adesão claramente e sem sofismas, por palavras e por actos, ao princípio da democracia representativa como única expressão real da vontade popular ou, ao contrário, entende chegado o momento das privilegiadas chamadas organizações populares que noutra época e noutra terra se chamaram sovietes, para sobre elas construir um Estado de ideologia vanguardista e de tipo antidemocrático ou policial.

Vozes: - Muito bem!

Aplausos

O Orador: - É preciso saber se o PCP pensa apoiar claramente e sem subterfúgios, por palavras e por actos, a plataforma que se deve levar ao VI Governo, desenvolvendo a sua política em conformidade, ou pretende continuar a considerar os governantes comunistas, como cito, «guerreiros do território inimigo», a perturbar o funcionamento da máquina governamental. É necessário que cá dentro e lá fora se saiba se o PCP pretende iniciar a execução de uma política que permita reconstruir a economia nacional, como, de resto, fizeram outros tantos partidos da mesma ideologia no pós-guerra, ou persiste nas reivindicações anarco-populistas, nas ruas e nas fábricas, na base de uma implantação mais aparente do que real da cintura industrial de Lisboa.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Em suma, e tomando as palavras que Álvaro Cunhal pronunciou no debate com Mário Soares na Televisão Portuguesa, importa dizer que aquilo que separa radicalmente o nosso partido do PCP é que, enquanto para o PCP uma revolução se faz essencialmente contra alguma coisa, nós, socialistas, consideramos que uma revolução se faz essencialmente em nome de alguma coisa.

Aplausos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Pretende o PCP condenar, finalmente, como partido democrático e responsável, o golpe de 25 de Novembro ou prefere continuar a afirmar não ter tomado parte nele, muitas vezes em clara divergência com algumas das suas bases ou algumas das suas direcções regionais? Demarcando-se, de vez e para sempre, dos seus aliados contra natura da extrema-esquerda.
Pretende ou não pretende, enfim, o PCP dizer que está claramente pela ordem democrática contra a anarquia, pelo VI Governo contra a aventura, pela defesa das forças armadas contra a subversão e a violência?

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Pretende o PCP reconhecer ou não claramente que as medidas ordenadas do estado de sítio não se equiparam, de perto nem de longe, àquelas que anárquica e muitas vezes injustamente foram empreendidas a seguir ao 11 de Março?

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Desejaríamos que o PCP respondesse firmemente a sem evasivas a estas questões. Uma resposta afirmativa mostraria estar o PCP disposto a colaborar na edificação de uma sociedade democrática e socialista e, a este título e conforme a sua representatividade eleitoral, teria o lugar que lhe compete no VI Governo.
Se o PCP seguir o caminho das escusas, das evasivas, das ambiguidades, da situação anfíbia, de um pé lá e outro cá, não se terá o Partido Socialista, não se terão os outros partidos, serão eles próprios a auto-excluírem-se da execução deste projecto político nacional, onde efectivamente não querem ter cabimento.
Tem o PCP todo o direito de considerar que a via para Portugal é coincidente ou igual à das sociedades do Leste. Tem o PCP todo o direito de pretender que em Portugal se instaure a ditadura do proletariado.
Tem o Partido Comunista Português todo o direito de pensar que sobre os escombros de uma economia de um país destruído poderá construir o paraíso do futuro. Mas nós também temos o direito, em nome do mandato que nos foi dado pelo povo português, de dizer que o povo português não quer esse caminho, e os que assim querem e os que usam esse direito excluem-se do actual processo revolucionário e o povo português poderá um dia excluí-los da comunidade nacional.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Nem o fascismo o conseguiu.

Aplausos.

Vozes:- Muito bem!

O Orador: - Não se vejam nestas palavras quaisquer intenções de ódio, de vindicta ou de incitamento à repressão, não temos vocação para versalheses. E para mim a voz não fala de qualquer forma, a voz do general Gallifett.

O Sr. Avelino Gonçalves (PCP): - Fala o general Spínola.

O Orador: - Fala-se tão-só e muito claramente na necessidade de dar ao povo português as opções políticas fundamentais, e na necessidade para o povo português perante as efectivas escolhas que os partidos políticos lhe põem. O Partido Comunista Português tem perfeita legitimidade para fazer a sua escolha, mas sofrerá as consequências da escolha que fizer, não em cadeias ou em torturas, mas perante aquele juiz inexorável que são as urnas onde os votos são depositados, e nessa hora de verdade não mentem.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - A vitória constitucionalista do 25 de Abril é também a vitória da democracia sobre os seus adversários subversivos da direita. O ELP e o MDLP perderam completamente qualquer base social que, porventura, tivessem obtido em virtude de uma política irresponsável e aventureirista de certas forças pseudo-revolucionárias. Aí também a política de terra queimada não parou. Importa ainda, enfim, que o Partido Comunista Português una os seus esforços a uma só voz a todos aqueles que defendem unicidade do Estado Português e a unicidade das forças armadas portuguesas e que dizem não há existência de armas nas mãos dos civis e há existência de milícias privadas.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Não podemos, porém, deixar de manifestar a nossa preocupação pela criminosa actividade de certa imprensa, certa rádio e certa televisão. As palavras são para serem ditas e nós sabemos que editoriais ou artigos do Diário de Notícias, que alguns editoriais ou artigos do jornal O Século, que alguns editoriais do telejornal, e, sobretudo, que alguma programação dessa emissora, que foi da liberdade e que agora já o não é, o Rádio Clube Português, constituíram a base essencial que tornou possível criar o clima próprio a esta aventura militar.

Vozes: - Muito bem!

Vozes de protesto.

O Orador: - Não se pense que com estas palavras se pretende transferir ou transformar questões políticas em questões pessoais. Não se pretende perseguir ninguém individualmente e exige-se que as pessoas sejam colocadas perante as suas tremendas responsabilidades. Pretende-se e exige-se que se diga claramente que a informação manipulada e irresponsável a que vínhamos assistindo não pode continuar a existir, porque não se trata de um uso legítimo de liberdade, mas de um manifesto inqualificável abuso das liberdades.

Aplausos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado: Tenho que lhe pedir o favor de concluir, porque está no limite do seu tempo.

O Orador: - Sim, sim, Sr. Presidente. Como também não pode continuar a indisciplina nas forças armadas. As forças armadas têm como missão defender Portugal nas suas fronteiras contra qualquer inimigo, interno ou externo, venha de onde vier. Não podemos, de forma nenhuma, permitir que os princípios da hierarquia, da subordinação e da disciplina militar sejam postos em causa.
Estamos abertos, continuamos abertos às modificações necessárias de modo a adaptar estes princípios que permanecem eternos à realidade presente e deve dizer-se que, para nossa salvação, um dos pontos que pôs em causa ou que evitou ou provocou a tomada relativamente fácil das posições rebeldes foi a indisciplina das unidades militares, que na altura própria

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não souberam actuar como actuou, com a capacidade e brilho militar e humanidade, o Regimento de Comandos da Amadora.

Vozes: - Muito bem!

Aplausos.

O Orador: - É este o mais instante dever das forças armadas e o maior desejo do povo português. Torna-se necessário, assim, rever o pacto assinado entre o MFA e os partidos políticos, de forma a corresponder aos anseios do povo português e a colocar neste País as instituições e organizações no seu verdadeiro lugar. É justo, é necessário, porque nenhum homem é apolítico.
Mas para que os militares façam política partidária terão de despir a farda, passarem à reserva, e vestirem um fato civil como qualquer cidadão.

Vozes: - Muito bem!

Aplausos.

O Orador: - Cabe aos partidos políticos ser ou servir de correia de transmissão, de forma de actuação da vontade das diversas camadas populares do povo português. Cabe às nossas gloriosas forças armadas garantir a democracia, defender a democracia, garantir que a vontade do povo português seja efectivamente respeitada e que não mais teremos aventuras.
Assim, saudamos todos os oficiais sargentos e praças, com especiais palavras de respeito para o Regimento de Comandos, a quem, na pessoa do seu comandante, coronel Jaime Neves, apresentamos as nossas mais sinceras condolências pelos que foram assassinados.
Os momentos difíceis que vivemos mostraram que o povo português pretende também viver com paz, na ordem e na tranquilidade. E é justo, é digno, é nobre que assim seja. «Viver perigosamente» é palavra de ordem - slogan concebidamente fascista.

O Sr. Jorge Miranda (PPD): - Muito bem!

O Orador: - São estas as preocupações do nossa partido, que num futuro próximo desejaríamos ver concretizada.
Os dolorosos acontecimentos da passada semana poderiam ter lançado o País numa guerra civil, donde, cimentados em sangue, só sairiam escombros sobre os quais, tão-só, uma feroz ditadura poderia construir algo. Torna-se necessário, é necessário um inquérito que dê ao povo português a verdade, toda a verdade e só a verdade.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado: Lamento insistir, mas tem que concluir a sua intervenção, que já está ultrapassado o seu tempo.

O Orador: - Concluo imediatamente.
O PS, partido dos trabalhadores e, consequentemente, da serenidade e da responsabilidade, está certo de que o povo português não se furtará a assumir as suas responsabilidades com a mesma serena coragem com que o tem feito até aqui. A demagogia pseudo-revolucionária, fascista ou fascizante, não passará.
Portugal é uma causa livre!

Vozes: - Muito bem!

Aplausos.

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em nome do grupo parlamentar do meu partido, vou submeter a esta Assembleia uma declaração. para ser posta à votação e ser aprovada ou rejeitada.

Declaração

Considerando ter sido jugulada pelas forças armadas, de forma exemplar, a insurreição de 25 de Novembro desencadeada por sectores político militares pseudo-revolucionários;
Considerando o alto significado da vitória das forças democráticas, que, derrotando os adversários da liberdade, restauraram os verdadeiros princípios do 25 de Abril;
Considerando a compreensão manifestada pelo povo português, que, disciplinada e confiadamente, obedeceu às palavras de ordem das autoridades legítimas;
Considerando a coragem, a firmeza e a dignidade das forças armadas, a que se deve não nos encontrarmos perante uma sangrenta tragédia;
A Assembleia Constituinte. declara:
1.º Condenar, nos termos mais veementes, a insurreição de 25 de Novembro, incitando as autoridades a procederem a um claro e inequívoco inquérito que traga à luz toda a verdade;
2.º Lembrar a necessidade de se proceder ao justo julgamento dos culpados em tribunais comuns, extinguindo-se, desde já, todos os tribunais excepcionais, nomeadamente o que visa julgar os implicados no 11 de Março;
3.º Lamentar as mortes verificadas, nomeadamente as do tenente Coimbra e do segundo-furriel Pires, encarregando-se o Exmo. Presidente de expressar às famílias das vítimas, ao seu comandante, coronel Jaime Neves, bem como a todos os seus camaradas, o profundo pesar desta Assembleia;
4.º Saudar as forças armadas portuguesas pelo alto sentido profissional e patriótico com que actuou nas difíceis missões que lhes foram atribuídas;
5.º Saudar o povo português, manifestando a firme intenção de sempre e em qualquer altura ser o fiel intérprete da sua vontade.

Pelo Grupo Parlamentar do PS: José Luís Nunes - Sottomayor Cardia - António Reis - Luís Filipe Madeira - Carlos Lage - José Niza - Manuel Pires - Aquilino Ribeiro Machado - Kalidás Barreto.

(O orador fez a sua intervenção na tribuna.)

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Tomaram conhecimento desta declaração.
Pausa .

Vamos pô-la à votação.

Submetida à votação, foi aprovada, com 21 abstenções (PCP e MDP/CDE).

Uma voz (a propósito dos Deputados que se abstiveram): - A reacção está de pé.

Aplausos de pé.

O Sr. Presidente: - Poderá haver lugar para declarações de voto. Será isso que o Sr. Deputado Carlos de Brito quer fazer?
Pausa.

Tem a palavra.

O Sr. Carlos de Brito (PCP): - Queria explicar que o Grupo de Deputados do PCP se absteve pelas razões seguintes:
1.º A moção não tem lugar, porque esta Assembleia não tem competência para aprovar moções como esta.

Risos.

Uma voz: - Não apoiado!

O Orador: - 2.º O PCP não está de acordo com os termos da moção, em virtude de, no seu entender, não ter havido na dia 25 de Novembro uma insurreição, mas ter havido, sim, uma convergência, por motivos diversos e com objectivos diversos, de actos de sublevação militar.
Risos.

3.º Por considerar que na complexa situação que atravessamos, em que se avolumam os perigos do fascismo, e em que é necessária a reunificação de todos aqueles que estão dispostos a salvaguardar as liberdades e as conquistas fundamentais da Revolução, que nestas condições se exige grande serenidade na apreciação da crise que atravessamos e dos últimos acontecimentos, nomeadamente os do dia 25, e que será necessária não fazer incitamentos ao ódio, incitamentos a retaliações e à divisão irremediável daqueles que estão interessados na construção de um Portugal democrático a caminho do socialismo.
Manifestações noa Sala.

Vozes: - Fora!

O Sr. Presidente: - Deixem o Sr. Deputado concluir a sua declaração de voto, que deverá ser, evidentemente, breve.

Agitação na Sala.

O Sr. Deputado Levy Baptista deseja fazer uma declaração da voto? Tem a palavra.

Burburinho.

Peço a atenção.
Burburinho.

O Sr. Levy Baptista (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O MDP/CDE absteve-se ...

Manifestações.

Uma voz: - CD era ...

O Orador: - ... porque os termos em que a moção do Partido Socialista foi apresentada não correspondem à visão que temos dos acontecimentos...

Gargalhadas.

...conforme oportunamente teremos oportunidade de esclarecer.

Pausa.

Entendemos, portanto, que também neste momento são prematuras quaisquer afirmações do género das que já aqui hoje foram proferidas, na medida em que parece que aqueles que tão afirmativamente aqui se manifestam em determinados sentidos, pensamos nós, que não terão ainda conhecimento exacto, peto menos nós não temas ainda, dos factos.
Por essa razão nos abstivemos.

(O orador não reviu.)

Risos.
Manifestações na Sala.

O Sr. Presidente: - Devo esclarecer, seria, aliás, desnecessário, que a Mesa considerou que a declaração estava perfeitamente contida dentro do nosso Regimento. e, por isso, se pôs à votação.
Tem a palavra o Sr. Deputado Freitas do Amaral.
Devo dizer que, em virtude das muitas interrupções a que fomos forçados, temos de prolongar o tempo suficiente para que cada um dos partidos se possa fazer ouvir.

Uma voz: - Força, Freitas!

O Sr. Freitas do Amaral (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Portugal viveu na semana passada uma grave crise. Levantada já hoje o estado de sítio parcial e concluído, assim, o período mais agudo dessa crise, importa encará-la de frente, não tanto para repisar aqui factos e acontecimentos que todos conhecemos, mas, sobretudo, para entender em profundidade o que se passou e para examinar, mais do que o 25 de Novembro em si mesmo, os seus antecedentes e as suas consequências.
Devemos, é certo, congratular-nos efusivamente nesta Assembleia Constituinte com a vitória da liberdade, da ordem, do Estado, sobre a rebelião armada, que destruiria as primeiras e subverteria o último.
Devemos também dar solenemente testemunho da nossa gratidão a todos os que souberam, com notável aprumo militar e grande coragem moral, cumprir o seu dever, bem como prestar comovida homenagem àqueles que tombaram em defesa da liberdade.
Devemos, enfim, denunciar a comportamento insurreccional de alguns militares e a autoria moral de alguns partidos, nomeadamente o PCP, que uma vez mais mostraram bem para que lado pende o seu coração, mesma quando a cabeça lhes recomenda uma certa prudência de última hora.
Risos.

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Mas não podemos ficar-nos por aqui. Precisamos de ir mais fundo na nossa análise e mais longe nas nossas proposições.
Conforme o CDS já tem dito por várias vezes, ã partir do 25 de Abril de 1974 têm-se desenvolvido no nosso país, não uma, mas várias revoluções que se combatem entre si e procuram triunfar umas sobre as outras.
A primeira é a revolução democrática - que corresponde ao espírito original do Movimento das Forças Armadas e tem o apoio da grande maioria do povo português, designadamente através dos três partidos democráticos representados nesta Assembleia.
A segunda é a revolução comunista que habilmente se procura fazer avançar sob a capa e a pretexto da primeira, com o apoio do PCP e seus satélites, dos movimentos de extrema esquerda e de alguns, poucos, elementos do radicalismo militar.
E outra, a terceira, é a revolução socialisto-militar que procura seguir uma linha de compromisso entre os elementos das duas primeiras e tem como inspiradores, entre outros, destacados membros do chamado «grupo dos 9».
Seria interessante estudar a doutrina, a estratégia e os blocos de apoio de cada uma destas revoluções e, bem assim, as relações, os contactos e as alianças tácticas entre umas e outras. Não é, porém, este o momento nem o local para tanto. Aqui e agora, apenas nos importa sublinhar alguns aspectos de maior relevo.
Assim, e antes de mais, convém chamar a atenção para que cada uma das revoluções referidas conduzirá, se triunfar, a regimes políticos bem diversos: a revolução democrática levará a uma democracia pluralista (regime democrático), a revolução comunista produzirá a ditadura do proletariado (regime totalitário) e a revolução socialisto-militar desembocará num fascismo de esquerda ou nacional populismo (regime autoritário).
Resulta do exposto que das três revoluções em despique apenas uma, a primeira, tem verdadeira natureza democrática; as outras duas são antidemocráticas e redundarão necessariamente em ditaduras.
O 25 de Novembro foi uma vitória, não. definitiva, mas importante, sobre a revolução comunista. Essa vitória pertenceu à revolução democrática e à revolução socialisto-militar, que, em face do perigo comum, se aliaram e levaram a melhor. Mas, batida e controlada provisoriamente a revolução comunista, a disputa entre as outras duas recomeçou imediatamente e não se encontra ainda terminada; pode dizer-se que, verdadeiramente, só agora começa.
As declarações públicas de alguns distintos militares, com particular destaque para o major Melo Antunes e para o brigadeiro Franco Charais, não acompanhadas ou contraditadas pela defesa das teses democráticas que existem no seio do MFA, fazem crer que se procura neste momento, nas cúpulas militares, privilegiar a opção socialisto-militar relativamente à opção democrática.
Pretender-se-á, pois, no plano ideológico, valorizar o socialismo em detrimento da democracia; no plano político, preconizar um socialismo pluralista em vez de uma democracia pluralista; no plano estratégico, relançar o MFA como vanguarda incumbida da condução do processo revolucionário, com prejuízo da liderança partidária assente nos resultados eleitorais; no plano da organização do Estado, instituir a supremacia do poder militar sobre a plenitude da democracia civil; no plano táctico, associar ao MFA apenas os partidos em cada momento identificados com a sua linha política, considerando a oposição, não como uma alternativa de Governo, mas como o resíduo agonizante de um passado definitivamente enterrado.
No momento em que os adeptos deste modelo, procurando tirar vantagem política de uma vitória militar que pretendeu ser original, tentam lançá-lo, sobretudo aos adeptos da revolução democrática, o CDS deseja declarar de uma forma muito nítida e inequívoca que rejeita categoricamente aquela solução.
Depois de tantos anos de uma ditadura de direita, o povo português não está disposto a experimentar uma ditadura de esquerda. O pluralismo dos partidos de nada servirá se não funcionar em conexão com a soberania popular, isto é, se não se destinar em cada momento a pôr no Governo os partidos que ganharem as eleições e na oposição os que as perder em qualquer que seja a sua linha ideológica ou o seu programa político.
Admitir uns tantos partidos, mas apenas no âmbito do «socialismo» definido superiormente pelo MFA e para colaborar com este sob as ordens de um conselho da revolução militar, não é aceitar a democracia pluralista, mas impor uma ditadura pluralista. Uma ditadura pluralista de esquerda, perfeitamente simétrica à ditadura pluralista de direita que associava à ANP, no Governo, a Legião, a Liga dos Antigos Graduados e a Sedes ... (Risos) Sabendo-se, todavia, de antemão quem havia de perder as eleições e quem havia de as ganhar e, dentro destes, para quem iria o bolo e para quem as migalhas.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Está a falar um democrata.

Uma voz: - Cala-te.

O Orador: - Não: para trocar uma ditadura agrária de direita por uma ditadura militar de esquerda não valia a pena fazer o 25 de Abril, nem este teria tido metade do apoio popular que de início teve.
O que caracterizou o 25 de Abril e motivou a adesão maciça deste país foi a promessa da devolução do poder ao povo de acordo com eleições livres: foi isso que deu a vitória ao MFA; e só isso o pode salvar.
Ao defender, uma vez mais, esta concepção o CDS louva-se agora também na lição colhida do 25 de Novembro. Se o golpe insurreccional foi tentado, isso deveu-se à excessiva politização de alguns quartéis e à sedução de alguns chefes militares com vocação teatral pela representação de papéis relevantes na cena política. (Risos.) Por outro lado, se o restabelecimento da autoridade do Estado e da legalidade democrática foi possível, isso deveu-se a que certas unidades militares souberam manter-se imunes à intoxicação psicológica, ao mesmo tempo que alguns militares autênticos souberam resistir à tentação de trocar a ética militar pela controvérsia política.
Este exemplo tem de servir de lição. A política incrustada institucionalmente no âmago das forças

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armadas gera fatalmente a divisão interna destas e, por consequência, a desorganização, a inoperacionalidade e a dissolução da instituição militar. É preciso assim, que os militares portugueses compreendam que a paz, a liberdade e a justiça em Portugal reclamam deles que se coloquem, quanto antes, à margem do processo político civil.
Quer o CDS dizer com isto que o MFA deve ser dissolvido imediatamente? Não. Pensa o CDS que o MFA tem ainda funções muito importantes a desempenhar, antes de se dar por concluída a sua missão histórica, e que são: defender a soberania nacional, ajudar a manter a ordem pública e, sobretudo, implantar, consolidar e garantir o funcionamento, livre e regular, de uma democracia pluralista.
Só que, para este efeito, o MFA não pode governar, nem fazer opções ideológicas, nem condicionar a liberdade do voto, nem sobrepor-se aos partidos, nem fazer discriminações entre os diferentes projectos políticos.
O único objectivo não militar que pode e deve ser prosseguido pelo MFA é o da democracia política.
Entretanto, será naturalmente legítimo a este ou àquele militar com inclinações políticas bater-se publicamente pelo seu projecto pessoal de democracia económica ou social: mas, como o CDS vem repetindo desde o Verão, deverá para isso deixar o serviço activo e inscrever-se num dos partidos existentes ou formar o seu. O eleitorado lhe dirá, depois, o que pensa das suas ideias.
O que não se pode admitir é que as forças armadas sejam transformadas em palco de estreia para vocações políticas e, muito menos, que a efectiva condução política do País seja entregue, não aos eleitos do povo, mas a figuras que, como Napoleão, preferem sagrar-se a si próprias.
Não se pode, sobretudo, aceitar que se venha invocar a legitimidade revolucionária do MFA para fundamentar a sua função de liderança política. Porque a legitimidade revolucionária que o povo português concedeu ao MFA não foi a passagem de um cheque em branco, foi a aceitação de uma proposta. Os Portugueses aderiram ao MFA com base no seu Programa e nos ermos deste: ora o que o MFA prometeu foi restaurar e garantir a democracia pluralista, não foi arvorar-se em vanguarda motora de uma revolução de esquerda. Não se invoque, pois, o consentimento dado à implantação de uma democracia livre para justificar o exercício, nunca aprovado, de uma forma moderna de despotismo iluminado.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para que a revolução democrática triunfe, quer sobre a contra-revolução, quer sobre as revoluções socialisto-militar e comunista, é necessário que o MFA se reexamine, se redefina e se reconverta.
O 25 de Novembro traz-lhe essa grande oportunidade. Esperemos que ela não se perca.
Os caminhos da liberdade são longos. Para já, a ordem venceu a ameaça totalitária. Resta ainda que a democracia vença a ameaça de ditadura.
Tenho dito.

O orador fez a sua intervenção na tribuna.

Aplausos.

O Sr. Presidente: - Nos termos do nosso Regimento, tem ainda prioridade no uso da palavra um Sr. Deputado do MDP/CDE, caso, evidentemente, queira usar dela.
O Sr. Deputado Levy Baptista.

Pausa.

Burburinho na Sala.

Peço atenção ao orador.
Burburinho.

Peço atenção à Assembleia.

Pausa.

Faremos o intervalo a seguir a esta intervenção.

Pausa.

Peço a atenção à Assembleia.
Tem a palavra o Sr. Levy Baptista.

O Sr. Levy Baptista (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A situação criada depois dos acontecimentos de 25 de Novembro, pela gravidade de que se reveste, justifica sérias apreensões por parte das forças progressistas.
Longe de traduzirem qualquer «golpe» preparado e amadurecido - pois é por demais clara a ausência de qualquer plano que tenha funcionado ou estivesse em vias de funcionar, do lado das forças militares que vinham empenhando-se na democratização das estruturas militares -, tais acontecimentos surgem na sequência da luta que há muito vinha sendo travada, por estes objectivos, nas fileiras das forças armadas, na qual sobressaiu, no período imediatamente anterior, a luta reivindicativa dos pára-quedistas, que congregou em torno de si diversas linhas de resistência ao acentuado desvio da direita que o processo revolucionário vinha sofrendo, e de que são expressões mais evidentes os saneamentos à esquerda e as medidas repressivas tomadas contra militares e democratas consequentes.
A gravidade e o perigo da evolução da situação a que vimos assistindo, nos últimos dias, resultam do aproveitamento que as forças de direita delas estão fazendo, permitindo-se desencadear iniciativas que se caracterizam por acentuados avanços dessas mesmas forças de direita.
A forte repressão contra os militares progressistas; as demissões de cargos de pessoas que mereciam, e continuam a merecer, a confiança dos trabalhadores; a passagem forçada à disponibilidade de soldados, sargentos e oficiais progressistas; a destruição das estruturas democráticas e progressistas do MFA; a suspensão dos órgãos de informação e dos organismos representativos da vontade dos seus trabalhadores; o congelamento da contratação colectiva de trabalho; a instauração do estado de sítio, medida extrema que nem no 25 de Abril nem no 28 de Setembro ou no 11 de Março chegou a ser decretada, com tudo o que significa de grave limitação das liberdades democráticas conquistadas em Abril de 1974 - tudo isto são medidas com as quais se enfraquecem as posições das forças progressistas e se criam as condições para o avanço das forças de direita e o regresso do fascismo.

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Sr. Presidente, Srs. Deputados: No momento difícil que a Revolução Portuguesa atravessa é, mais do que nunca, necessário que as forças progressistas mantenham a serenidade e a lucidez suficientes para verem que a solução para as tenções existentes na sociedade portuguesa não se resumem a uma simples questão de relações de forças no plano militar, de supremacia desta ou daquela tendência e marginalização de outras.
Só os que, erradamente, tenham pensado e continuem a pensar que a solução para os graves problemas nacionais está na imposição de uma ordem e autoridade de que sejam suporte de uma política que não tenha o apoio da classe operária, dos trabalhadores e das massas populares em movimento, só esses podem deixar-se invadir por uma euforia que, perante a força poderosa da realidade, cedo se desvanecerá.
Que ninguém tenha ilusões a este respeito. Em Portugal não haverá liberdade nem democracia nem socialismo sem activa participação dos trabalhadores, do movimento de massas, com as suas estruturas organizadas, sem o sério reconhecimento do papel e da importância das foiças e dos sectores revolucionários.
Foi este movimento amplo de forças que minou o regime fascista, enfraquecendo-o, e preparando as condições para o seu derrubamento, pelo MFA, em 25 de Abril; foi este amplo movimento de forças que operou, em aliança com os militares patriotas, a passagem da queda do fascismo para o início de um processo revolucionário, que impulsionou as mais importantes transformações económicas e sociais realizadas na nossa pátria.
Sem o respeito e consideração dos interesses dessas forças populares, do seu peso e influência determinantes, capacidade combativa e dedicação à Revolução, pode a linguagem oficial continuar a utilizar as palavras mais queridas do nosso povo, mas a prática política, os actos, a realidade, já nada terão que ver com os ideais libertadores do 25 de Abril.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Temos vindo a assistir, nos últimos dias, à utilização - até, ou sobretudo, por forças políticas que já demonstraram, na prática, nada terem a ver com a Revolução - de uma linguagem confusionista, difamatória e caluniosa, a respeito de homens que ninguém, de boa fé, pode negar que se empenharam séria e profundamente no 25 de Abril e no processo de democratização dele decorrente.
Para referir, a título de exemplo, um único nome: será que alguém, que se pretenda democrata, serenamente, poderá considerar contra-revolucionário o major Eurico Corvacho, que foi o homem do 25 de Abril no Norte?
E tantos, tantos outros - dos quais se poderá discordar, mas que, sem dúvida, merecem o respeito de todos os portugueses que não estejam obcecados por interesses partidários.

Voes de protesto.

Por isso, nós, Deputados e militantes do MDP/CDE, manifestamos a nossa apreensão perante a vaga repressiva que está a abater-se sobre militares revolucionários e protestamos contra a sua situação prisional, em especial quanto à sua transferência para o Norte do País, longe das famílias, dificultando-se assim o conhecimento das condições em que se encontram, o apoio a que têm direito.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: No momento particularmente perigoso que a Revolução Portuguesa atravessa é de vital importância para a defesa da liberdade e da democracia que se unam todas as forças antifascistas e que se reúnam todas as suas energias para vencer o perigo que nos espreita, e que continua a ser o nosso principal inimigo: o fascismo.
Só a estreita unidade das forças políticas e sectores militares, que, apesar da divergência quanto à construção do socialismo, estão dispostas a impedir o regresso do fascismo, pode travar o passo ao avanço da direita e da reacção.
Só a unidade dos trabalhadores e das massas populares, em aliança com o MFA progressista e revolucionário, pode assegurar eficazmente a defesa da Revolução.
A todos os democratas consequentes, a todos os revolucionários empenhados sinceramente no processo revolucionário a caminho do socialismo, aos militantes e Deputados do Partido Socialista - em especial àqueles que connosco travaram, antes do 25 de Abril, a mesma luta contra a ditadura fascista -, apelamos a uma larga unidade antifascista, em defesa das liberdades alcançadas, das conquistas dos trabalhadores, no caminho firme da defesa da democracia e do socialismo.
Tenho dito.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Vamos agora suspender a sessão e daqui a meia hora entraremos na ordem do dia.

Eram 17 horas e 50 minutos.

O Sr. Presidente: - Peço o favor de ocuparem os vossos lugares.

Pausa.

Está reaberta a sessão.
Eram 18 horas e 20 minutos.

ORDEM DO DIA

O primeiro ponto da nossa ordem de trabalhos é a informação sobre renúncias de alguns Srs. Deputados de que a Mesa vai dar conhecimento.

O Sr. Secretário (Coelho de Sousa): - São ambos do Partido Socialista.
O primeiro, em ofício assinado, pelo Grupo Parlamentar, por António Reis, que refere o seguinte:

Exmo. Sr. Presidente da Assembleia Constituinte:

O Partido Socialista vem declarar que a vaga resultante da renúncia ao mandato do Deputado Fernando Alves Tomé dos Santos, por motivos profissionais, deve ser preenchida pelo candidato do mesmo partido Fernando Jaime Pereira de Almeida, comerciante, segundo a ordem de pre-

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cedência da respectiva lista e tendo em conta a impossibilidade de aceitação dos quatro candidatos que se seguiam na lista de precedência do círculo do Porto, conforme se prova pelas declarações anexas, solicitando a V. Ex.a que se promova a correspondente verificação de poderes.

O segundo é igualmente assinado pelo Deputado
António Reis, pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista; diz o seguinte:

Exmo. Sr. Presidente da Assembleia Constituinte:

O Partido Socialista vem declarar que as vagas resultantes dos Deputados Fernando José Capelo Mendes e Alberto Marques Antunes, ambos pelo círculo de Setúbal, que renunciaram aos respectivos mandatos, devem ser preenchidas por Maria da Conceição Rocha dos Santos, professora, e Gilianes Santos Coelho, operário metalúrgico, segundo a ordem de precedência da respectiva lista, tendo em conta a impossibilidade de aceitação de dois candidatos, conforme se prova pelas declarações anexas, solicitando, pois, a V. Ex.ª que se promova a correspondente verificação de poderes.
Com as melhores saudações socialistas.

Pelo Grupo Parlamentar do PS, António Reis.

O despacho dado pelo Sr. Presidente é:
Enviar à Comissão de Verificação de Poderes.

O Sr. Presidente: - Temos na Mesa uma proposta que pelo seu carácter prévio tem de ser posta à apreciação.
Vamos dar conhecimento dessa proposta.

Foi lida. É a seguinte:

Proposta

Considerando a gravidade da actual situação político-militar do País;
Considerando a clarificação em curso no âmbito das forças armadas, em consequência da vitória dos seus sectores democráticos sobre o último golpe contra-revolucionário;
Considerando a profunda alteração de circunstâncias relativamente ao contexto da celebração da Plataforma de Acordo Constitucional entre o MFA e os partidos, e a necessidade de, em face dela, repensar a matéria da Organização do Poder Político;
Propõe-se:

1) Que a Assembleia Constituinte não aprecie imediatamente o parecer da 5.ª Comissão;
2) Que a Assembleia Constituinte passe a apreciar o parecer da 6.ª Comissão ou aquela que, entretanto, estiver em condições de ser examinado por este Plenário.

Sala das Sessões, 28 de Novembro de 1975. - Os Deputados do Partido Popular Democrático:
(Seguem-se oito assinaturas.)

O Sr. Presidente: - A proposta está admitida. Está em apreciação.

Um dos Srs. Deputados apresentantes é que poderia usar da palavra para justificar a proposta.
O Sr. Marcelo Rebelo de Sousa tem a bondade. O Sr. Vital Moreira terá de esperar que lhe dê a palavra.

O Sr. Marcelo Rebelo de Sousa (PPD): - Como um dos Deputados subscritores desta proposta queria rapidamente fundamentá-la, embora me pareça que fundamentação decorre, quer dos considerandos, quer da parte dispositiva. Efectivamente, o PPD pensa que isso ficará expresso no aditamento à declaração de voto, se porventura se entrar na apreciação na generalidade desta matéria, e quando se entrar, pensa que a alteração de circunstâncias relativamente ao contexto que caracterizava o actual momento político, quando foi celebrada a plataforma entre o MFA e os partidos.
Essa alteração conduz, em nosso entender, à revisão da plataforma, à revisão do pacto. Sendo, haveria duas alternativas de interesse: a primeira alternativa seria a de entrar imediatamente na discussão na generalidade da matéria correspondente aos trabalhos da 5.ª Comissão e, depois, no fim, optar ou não, verificada essa alteração de circunstância, optar ou não pela constatação da necessidade de revisão do pacto MFA-partidos. A segunda alternativa que nos pareceu, por razões de celeridade processual, que era preferível era a de não entrarmos imediatamente na apreciação, mesmo na generalidade, da matéria constante do parecer da 5.ª Comissão e a Assembleia Constituinte passar a ocupar-se dos trabalhos que lhe parecerem já prontos de outras comissões, fosse a 6.ª, fosse outra qualquer comissão que tivesse já concluídos os seus trabalhos. Portanto, foi por razões essencialmente de celeridade processual que, dentro do pressuposto de que partimos da alteração de circunstâncias conduzindo à revisão do pacto, apresentamos esta proposta.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente: Era para solicitar à Mesa o texto da proposta que acaba de me chegar e, portanto, antes de me pronunciar sobre ela queria exactamente examiná-la.

O Sr. Presidente: - Mas o Sr. Deputado já tem o texto da proposta?

O Orador: - Acaba de me ser transmitido.

O Sr. Presidente: - O Deputado José Luís Nunes pediu a palavra.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta proposta enferma do mesmo erro que enferma também ou que enfermou nalgumas pessoas a interpretação do pacto. O pacto celebrado como MFA foi celebrado entre o MFA e os partidos

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políticos. Admitamos, por hipótese, meramente absurda, e que só por hipótese se chama a sua atenção, o facto de que a maioria dos Deputados desta Assembleia deixava de pertencer a partidos políticos e se constituía em grupos como Deputados individuais. É uma hipótese absurda, é só para fundamentar um raciocínio.
Pois, muito bem, se isso acontecesse a Assembleia poderia na sua maioria pronunciar-se contra o pacto, porque o pacto não foi celebrado entre a Assembleia, órgão constituinte, mas sim entre os partidos políticos que presumivelmente integrariam e não só. Houve partidos políticos como, por exemplo, o Partido Comunista de Portugal (marxista-leninista) e Aliança Operária Camponesa, que deram a sua adesão ao pacto e que, efectivamente, não estão aqui representados. Portanto, o alue é que acontece? Acontece que o nosso partido tem sobre o problema do pacto uma posição muito clara e uma posição muito evidente.
Nós consideramos que o pacto correspondeu a uma determinada conjuntura política. Nós consideramos que essa conjuntura política mudou, nós consideramos que não há textos mistificados. Os textos valem pela sua colação à conjuntura. E consideramos que ambas as partes, o MFA e os partidos, devem rever o problema, de modo que o pacto possa ser renegociado. Simplesmente, entendemos também que a Assembleia Nacional Constituinte só pode pronunciar-se sobre este assunto como Assembleia, essencialmente depois de se ter procedido a uma efectiva discussão na generalidade, que permita compreender os diferentes e recíprocos pontos de vista. Nesta base, nós votaremos contra a proposta do PPD, ressalvando-nos o direito de fazermos uma proposta semelhante, diferente, parecida, conforme o que resultar do decorrer do debate na generalidade da 5.ª Comissão, neste hemiciclo.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Continua em discussão.
O Sr. Deputado Vital Moreira deseja usar da palavra sobre o assunto ou não?

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente: Nas últimas sessões, vinha sendo marcada para o período de antes da ordem do dia a apresentação e discussão na generalidade do tento da 5.º Comissão, cujo articulado, de resto, já foi publicado no Diário da Assembleia Constituinte e cujo texto de apresentação da Comissão já foi aprovado na respectiva Comissão, estando, pois, em condições de ser apresentado.
Não podemos, pois, deixar de manifestar a nossa surpresa perante a proposta que acaba de ser apresentada à Assembleia. Na realidade, nós julgamos que há apenas que cumprir aquilo que estava programado para a tarefa da Assembleia Constituinte, que é tomar conhecimento do texto da Comissão, discuti-lo e aprová-lo, se for caso disso.
Não vimos, por parte dos apresentantes desta proposta, qualquer razão - já não direi válida -, mas qualquer razão revelante para que isso, o conhecimento, a discussão e a votação do texto da Comissão não possa, não deva ser feito imediatamente. E era apenas isto que eu queria dizer.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Contínua em apreciação.

Pausa.

O Sr. Deputado Rebelo de Sousa.

O Sr. Marcelo Rebelo de Sousa (PPD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, um breve considerando em relação à intervenção do Sr. Deputado José Luís Nunes. É óbvio que o Partido Popular Democrático tem presente que o pacto foi celebrado entre partidos e o MFA e não entre a Assembleia Constituinte e o MFA, nem existia sequer Assembleia na altura que houve essa celebração. É óbvio que, como ficou expresso pelas minhas palavras, que pensamos que a alteração de circunstâncias conduz, no entendimento do Partido Popular Democrático, à revisão da plataforma assinada pelo MFA e por alguns partidos políticos.
Simplesmente houve uma consideração para a qual chamei a atenção, foi uma consideração de natureza processual que nos pareceu importante, consideração tanto mais premente quanto entramos hoje, precisamente hoje, em mais um período de prorrogação de actividade, por noventa dias e, portanto, o que é proposto pelo Sr. Deputado do Partido Socialista Português é, efectivamente, a entrada num debate necessariamente exaustivo acerca da matéria do texto da 5.ª Comissão. Depois, eventualmente, pelos vistos, já foi anunciada pelo Partido Socialista a apresentação de uma proposta, se esse for, digamos assim, o resultado do debate.
Mas deve-se juntar a isso que, numa declaração feita hoje no período de antes da ordem do dia, o Partido Socialista acrescentou que «desde agora considera que deve ser revisto o pacto»; logo, portanto, é provável a incoerência com essa afirmação no período de antes da ordem do dia, que mantenha a posição no debate que se vai seguir na generalidade. Portanto, o que vamos fazer é debater duas vezes a matéria de organização do poder político do Estado, em primeiro lugar agora sobre o texto da 5.ª Comissão e depois subsequentemente sobre o novo texto a sair do trabalho, eventualmente, de uma nova Comissão. Como disse o Sr. Deputado Vital Moreira, de facto vai-se entrar agora na discussão na generalidade sobre o texto da 5.ª Comissão, e é isso precisamente que conduziu à apresentação da proposta por parte do Partido Popular Democrático. É que nós considerávamos que a alteração de circunstâncias - posterior à subscrição pelos Deputados do PPD do texto da 5.ª Comissão - conduzia a que o partido entendesse oportuno agora o adiamento do debate para reformular a sua posição, relativamente a um documento que foi subscrito noutras circunstâncias. Isto em relação ao que disse o Sr. Deputado José Luís Nunes, em relação ao que disse o Sr. Deputado Vital Moreira, eu queria dizer que a proposta apesar de ser apresentada hoje, foi apresentada já há alguns dias atrás. Efectivamente, entrou até datada de 27 ou de 28 do mês passado ...

O Sr. Presidente: - De 28 ...

O Orador: - De 28, quando esperávamos firmemente que houvesse sessão e não foi possível realizá-la,

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e entrou datada daquela ocasião pela razão seguinte: entendiam os Deputados, e entendia o partido também que tinha subscrito o texto que vai passar a ser apreciado na generalidade, que não podia manter-se vinculado, ainda que na apreciação na generalidade, às posições definidas na Comissão. Logo, porque era assim, parecia um contra-senso ler-se o parecer da Comissão, seguidamente as declarações de voto concebidas sobre um texto que foi subscrito noutras circunstâncias e então só finalmente sobre esse texto fazer-se uma apreciação genérica.
Parecia-nos, a nós, isto um contra-senso, e porque nos parecia um contra-senso, e porque nos parecia que o prazo de que dispomos é muito curto, por razões também de celeridade processual, passar-se-ia a um exame, à apreciação de outras matérias, nas quais o pacto não tivesse directa relevância, voltando posteriormente às matérias constantes do texto da 5.ª Comissão. Foi esta a razão que levou à apresentação, não hoje, mas há alguns dias atrás, da proposta.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Sottomayor Cardia.

O Sr. Sottomayor Cardia (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Independentemente do mérito ou demérito do pacto de acordo constitucional, actualmente em vigor, e assinado entre o MFA e os partidos políticos em Abril, há a referir que a circunstância que condicionou a sua assinatura representa uma hipoteca prévia em relação ao debate público e à deliberação nesta Assembleia Constituinte, e esse foi um aspecto que, naturalmente, nós não consideramos o mais adequado na forma como se chegou a esse acordo.
Se agora fôssemos negociar o pacto, imediatamente, sem prévio debate nesta Assembleia, nós recairíamos no mesmo vício, estaríamos de novo a travar um debate importante sobre o destino institucional deste país, em privado, e no desconhecimento da Nação. Pelo contrário; o debate imediato desta matéria não apenas poderá permitir a elaboração mais aperfeiçoada de um novo acordo constitucional, mas realizará publicamente, será a realização pública de um debate constituinte normal, respeitante a esta matéria de tão fundas implicações.
Nós, Partido Socialista, somos pelo respeito dos acordos firmados, somos pela revisão da actual Plataforma de Acordo Constitucional, mas somos, finalmente e acima de tudo, pelo livre debate entre os constituintes. Estamos certos que não apenas o País tem direito a saber o que os seus eleitos pensam sobre esta questão, mas o debate que haverá, provavelmente em privado, entre o MFA e os partidos políticos terá a beneficiar da discussão política que aqui se travar. É essa a razão fundamental pela qual discordamos da proposta que acaba de ser apresentada pelo PPD.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Continua em apreciação a proposta.
Pausa.
Vamos proceder à sus votação, se ninguém pede a palavra.
A proposta foi rejeitada, com 53 votos a favor (PPD).

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Vital Moreira, para uma declaração de voto.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Não, Sr. Presidente, é para pedir meia hora para elaborar a declaração de voto.

O Sr. Presidente: - Então voltaremos a reunir às 19 horas e 10 minutos. Está suspensa a sessão.

Eram 18 horas e 40 minutos.

O Sr. Presidente: - Façam o favor de tomar os vossos lugares para reabrirmos a sessão.
Está reaberta a sessão.

Eram 19 horas e 15 minutos.

Foi interrompida, como se recordam, a pedido do Sr. Deputado Vital Moreira, a fim de elaborar uma declaração de voto, que provavelmente quererá agora apresentar.
Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.
Peço a atenção da Assembleia.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os Deputados do PCP votaram contra a proposta do PPD, que visava adiar a discussão e votação do texto proposto pela 5.8 Comissão sobre a «organização do poder político». Os Deputados do PCP votarão contra qualquer outra proposta que venha a ser apresentada visando o mesmo efeito.
O texto da 5.ª Comissão - de resto já publicado no Diário da Assembleia Constituinte - colheu, na esmagadora maioria das suas disposições, a apoio dos Deputados do PCP, bem como dos outros partidos.
O anteprojecto elaborado pela Comissão foi mesmo submetido previamente pelos Deputados que a integravam aos respectivos partidos, a fim de estes se pronunciarem sobre o articulado antes da sua votação final na Comissão.
Não pode, pois, deixar de estranhar-se que, poucos dias após a sua votação formal, venham agora os partidos invocar «alterações de circunstâncias» para obterem o adiamento de sua discussão e votação no Plenário da Assembleia.
O texto da 5.ª Comissão respeita e integra - a nosso ver com pequenas violações de pormenor - a plataforma constitucional oportunamente celebrada entre o MFA e vários partidos políticos, a que pertence a quase totalidade dos Deputados desta Assembleia.
Os Deputados do PCP consideram a plataforma constitucional como um compromisso político constitucional que tem de ser lealmente cumprido. Os Deputados do PCP não consideram terem sobrevindo quaisquer «alterações de circunstâncias» que exijam uma revisão dessa plataforma.
A plataforma constitucional visa garantir na Constituição a permanência dos órgãos do MFA criados a seguir ao 11 de Março. A plataforma constitucional foi confirmada pelo PAP do Conselho da Revolução e constitui uma das bases expressas de compromisso da plataforma política do VI Governo Provisório.
O PCP não se furtará, se tal for solicitado pela outra parte interessada na plataforma - o MFA - , ao reexame do assunto. Mas o PCP não apoiará iniciativas que, a coberto de pretensas «alterações de
circunstâncias», visem colher efeitos políticos contra

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o processo revolucionário na base de derrota da esquerda militar.
Os Deputados do PCP não deixarão também de se opor a que o debate do texto da 5.ª Comissão seja utilizado como instrumento de pressão para promover uma revisão da plataforma que ponha em causa o curso revolucionário, as conquistas revolucionárias e as expressões revolucionárias do poder político anda existentes.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Levy Baptista tem a palavra para uma declaração de voto.

O Sr. Levy Baptista (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nem a gravidade da actual situação político-militar nem a «clarificação em curso no âmbito das forças armadas», segundo a expressão do PPD, podem, no entender do MDP/CDE, ter alterado profundamente quaisquer circunstâncias a considerar no âmbito do pacto assinado entre os partidos e o MFA.
Os partidos não se modificaram, e não pode, objectivamente, admitir-se também uma mudança estrutural do MFA, cuja Assembleia se não deve, como é óbvio, confundir com algumas personalidades militares substituídas.
Por outro lado, não poderia ser admitida numa atitude meramente partidária em termos de vincular a Assembleia Constituinte a uma decisão que a esta não compete.
A proposta do PPD traduz claramente uma forma ilegítima de pressão partidária sobre os órgãos do Poder, especialmente sobre o Conselho da Revolução e o MFA no seu todo, no sentido de ser denunciado o pacto constitucional MFA - partidos.
Isto com a agravante de se estar a pretender instrumentalizar a Assembleia Constituinte como órgão dessa pressão ilegítima.
O MDP/CDE votou contra a proposta do PPD de não apreciação do parecer da 5.ª Comissão por entender que constitui uma clara manobra no sentido de aproveitar a situação criada após os acontecimentos do 25 de Novembro para impor profunda viragem na orientação do processo revolucionário através de um novo ordenamento de organização do poder político-militar, até aqui inscrito na plataforma.
No entender do MDP/CDE a actual situação, longe de aconselhar ou justificar a revisão do pacto MFA-partidos, impõe que se mantenha o papel relevante e decisivo na vida nacional dos militares progressistas que estejam dispostos a defender a natureza revolucionária do processo português, a garantir as liberdades, a actuar em favor das profundas transformações económicas e sociais em direcção ao socialismo.
As tentativas de rever as disposições do pacto, conjugadas com a política de revanche e hostilidade para com a esquerda...

O Sr. Pedro Roseta (PPD): - Qual esquerda?

O Orador: - ... e de ataque ao movimento de massas, visam destruir o processo revolucionário e permitir o acesso e o domínio da situação pelas forças mais reaccionárias que se têm flagrantemente oposto às conquistas populares e democráticas mais significativas.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Freitas do Amaral.
O Sr. Freitas do Amaral (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do CDS votou contra a proposta do PPD porque entende que a decisão de suspender ou não o tratamento da matéria em causa deve resultar de um debate prévio e não precedê-lo.

O Sr. Presidente: - Ninguém mais pede a palavra?

Pausa.

O Sr. Deputado Rebelo de Sousa.

O Sr. Marcelo Rebelo de Sousa (PPD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PPD apresentou a proposta de alteração da ordem .de trabalhos, que depois votou, essencialmente por razões de celeridade processual. Na verdade, a proposta visava evitar, no início da segunda prorrogação das actividades da Assembleia Constituinte, uma discussão ameaçada de ter de se repetir, ameaça esta tanto mais provável quanto três dos partidos presentes nesta Assembleia que celebraram o pacto já hoje aqui anunciaram a sua intenção de defenderem a revisão do mesmo.
Não pretendeu, obviamente, a proposta pôr em causa o princípio da livre discussão pública da futura orgânica do poder político do Estado, dentro da Assembleia Constituinte, tal como fora dela. Assim como não pretendeu, como facilmente se infere do seu texto dispositivo, pôr em causa, de forma unilateral e arbitrária, o compromisso assumido, que, ao invés, se pretende honrar, na medida dos interesses da consolidação do processo democrático e socialista português, que outros não são, ao fim e ao cabo, senão os interesses defendidos pelo MFA.
Efectivamente, é à luz destes interesses que o PPD defende a revisão do pacto, mas como resultado de uma ponderação plurilateral, envolvendo os seus signatários.
Tem-se, pois, por demagogicamente desproporcionados, entendimentos que mais não pretendem do que emprestar a uma proposta processual um dramatismo político fictício, criando um substituto para o debate das verdadeiras causas da crise político-militar, de que o 25 de Novembro foi uma demonstração evidente.

(O orador não reviu.)

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Ninguém mais pede a palavra?

Pausa

Vamos, portanto, continuando na ordem do dia, tomar conhecimento do relatório da 5.ª Comissão, para o que darei a palavra ao Presidente, ou ao Relator.
Sr. Deputado Olívio França.

O Sr. Olívio França (PPD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este pequeno relatório, ou antes, apresentação, a sua elaboração é anterior aos acontecimentos a que todos nós assistimos. E, portanto,

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o que vier a acontecer e que, de certo modo, venha a modificar muito daquilo que porventura aqui se diz, não terá importância, pois que em relação àquilo que já foi ouvido, V. Exas. Sr. Presidente e Srs. Deputados, saberão que tudo o que vier a acontecer só poderá ser feito com a observância inteira de uma bilateralidade de todas as pessoas que intervieram no pacto.
Aproveito o ensejo que me é dado, antes da leitura propriamente desta pequena apresentação, para vos falar dos mortos, para vos falar daqueles que em prol da liberdade ofereceram o seu sangue generoso. Com os anos que já pesam sobre mim, eu pude assistir, nos últimos cinquenta anos, às provações mais extraordinárias em que outro sangue foi vertido por parte de muitos mártires, daquilo que eu considero mártires da liberdade.
Inclino-me perante os jovens que morreram, pois, efectivamente, nestas andanças políticas de tipo revolucionário ou contestatário, o que aconteceu durante quarenta e tantos anos de fascismo, foi quase sempre o sangue generoso dos jovens que na sua terra nos deu a nós a esperança de que algum dia a liberdade havia de aparecer no território de Portugal.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na minha qualidade de Presidente da 5.ª Comissão, encarregada de redigir o projecto de organização dos poderes políticos, venho apresentá-lo, depois de laborioso trabalho, à consideração e decisão desta magna Assembleia Constituinte.
É esta a terceira Constituição que nascerá de uma Assembleia Constituinte na terra portuguesa.
A dificuldade que houve em a plasmar não foi mal do nosso tempo. A história se encarregou de trazer até aos nossos dias os climas em que as outras Constituições nasceram e as preocupações que os coevos tiveram em realizar uma obra estável, onde a liberdade do homem obtivesse uma definitiva consagração.
Embora os sinais capazes de mostrarem a suprema aspiração à liberdade sejam tão velhos como a história do homem e da sua cultura sobre a Terra, sem dúvida que a sua marca na antiguidade só teve verdadeiramente algum brilho na civilização do mundo greco-romano.
A frouxa claridade desse tempo sofreu a tempestade de muitos acontecimentos, mas nem por isso foi apagada totalmente.
Em breves cintilações, muito débeis, é certo, surgiram tímidos sinais da liberdade, em limitados estatutos, mais com o aspecto de uma doação que de uma conquista. Disso são exemplos entre nós os forais dados a vilas e cidades pelos reis, limitando a capacidade e ambições da nobreza.
Com o desenvolvimento do mundo quinhentista, no qual os descobrimentos rasgaram novas rotas nos oceanos, é que aconteceu transformar-se o aspecto da civilização e comércio, que de mediterrânico se transformou em mundial, e posteriormente a grande revolução industrial, que o dinheiro e o progresso da ciência e da técnica possibilitou, mudaram a fisionomia europeia do fim do século XVII e princípios do século XVIII. É nesta fermentação que as ideias de liberdade humana se desenvolvem, as quais atingem os próprios salões da aristocracia francesa.
Os salões da burguesia de Duffand e de M.me Necker eram frequentados por Fontenelle, Montesquieu e D'Alembert; e, na expressão de Marois, foram a «antecâmara do poder», onde a força de oposição às instituições absolutistas, embora de modo suave, era permitida.
O desenhar desta apresentação, breve por sua natureza, não permite grandes desenvolvimentos, mas pode acrescentar-se que nesta atmosfera dois caminhos se abriram à liberdade: um de pacífica evolução, na Inglaterra, e outra de violência revolucionária, em França; o inglês assente em velhos costumes e alguns escritos, nos quais avultou o Bill of Rights, de 1689, e o francês que revolucionariamente se traduziu na Declaração dos Direitos do Homem, votada em 1789, e na Constituição de 1791.
Pode dizer-se que o século XIX foi o século das Constituições na Europa e em Portugal, como parte da Europa.
A nossa primeira Constituição nasceu em 1822. Outras surgiram e morreram, mas de entre elas a Carta, restaurada por Costa Cabral em 1842, conseguiu viver, alterada por vários adicionais, até 1910.
Em 1911 uma Assembleia Constituinte deu-nos a primeira Constituição da República e uma grande esperança de liberdade, que bem depressa se malogrou.
É de esquecer a Constituição de 1933. Nem houve poder constituinte, nem qualquer intenção de respeitar as liberdades humanas, pelo contrário, o seu sentido era esmagá-las e destruí-las.
Finalmente, hoje, este Plenário irá debruçar-se sobre o nosso projecto, como já o fez em relação a outros projectos essenciais , os quais não darão no seu conjunto o edifício de uma Constituição com feição notavelmente virada para a democracia e o socialismo.
A 5.ª Comissão, encarregada de redigir o projecta de organização dos poderes políticos, aqui o apresenta, e dele ressalta o carácter saliente de democraticidade e de firme marcha para uma sociedade socialista, o que, aliás, é factor evidente nos títulos que já foram aprovados nesta Assembleia.
Esta Constituição projectada não podia ser a Constituição de um partido, mas não podia deixar de reflectir a predominância das partidos maiores.
Contudo, nem por isso aconteceu que a flutuação variasse de tal maneira que se não conseguissem muitas convergências parciais dos partidos, conforme as várias concepções que os respectivos programas permitiam.
É de acentuar o espírito transaccional de todos os componentes da Comissão, o que tornou possível tornear muitas dificuldades e encontrar consenso onde poderia parecer impraticável qualquer entendimento.
A organização dos poderes políticos entrou em choque de forma mais visível com o pacto entre os partidos e o MFA, pelas dificuldades que a técnica constitucional encontrava em adaptá-lo dentro do projecto.
Sem dúvida que este pacto representou uma associação híbrida entre aqueles que democraticamente foram eleitos e os que, embora dispostos a apoiar o advento de uma democracia, só tinham a legitimá-los a força de uma revolução.
Falo em termos técnicos e não políticos acerca das dificuldades que esse hibridismo trouxe à elaboração constitucional.

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Penso que é exemplo ímpar no mundo político e constitucional o acasalamento de dois pensamentos que, embora de diferentes justificações, se pressupõem inclinados a uma caminhada única, apontando para a criação de uma democracia pluralista em Portugal. Isso deu em resultado que, por causa dos diferendos dos programas dos partidos políticos, tiveram estes de fazer esforço considerável, no intento de descobrirem fórmulas de entendimento naquilo que foi possível.
Mas nesse caldo de fusão ou amalgamento ideológico quanto aos partidos haviam de mergulhar as regras do pacto, as quais não eram susceptíveis de qualquer suavizarão, já que os seus autores não intervinham, ainda que a título puramente circunstancial, para ajudar a vencer certas dificuldades.
Esta Constituição não tem paralelo com quaisquer outras que foram outorgadas, constituídas ou impostas em Portugal.
A presente nasce sob o signo de uma democracia plural, onde as liberdades do homem floresçam sem ambiguidades e a própria força dessa democracia instaurada mostre, e de maneira vigorosa, o propósito de proteger as classes mais desfavorecidas, pelo ordenamento de regras que apontem de forma decidida o caminho de uma sociedade socialista e democrática.
Há que pôr em relevo o esforço sereno de todos os componentes da 5.ª Comissão, com especial destaque dos constitucionalistas que nela intervieram, os Deputados Jorge Miranda e Vital Moreira, sem qualquer desprimor para todos os outros da Comissão, cujo labor certamente foi muito útil.
Não deve ser esquecido nesta emergência o pessoal de apoio desta Câmara, que não se poupou a horas contínuas de trabalho e de sacrifício, colaborando assim, de boa vontade, com a 5.ª Comissão.
É esta a opinião que pessoalmente vos transmito e que gostei de vo-la apresentar antes do início da discussão das matérias em causa.
Muito obrigado por me .terem ouvido sem cansaço, que, aliás, a curteza da minha intervenção não deveria justificar.
Tenho dito.

(O orador não reviu.)

Aplausos.

O Sr. Presidente: - Portanto, ouvimos o Sr. Presidente da 5.ª Comissão não sei se há mais alguma comunicação a fazer em nome da Comissão.
O Sr. Deputado Carlos Candal tem a palavra como relator.
O Sr. Carlos Candal (PS):

5.ª Comissão

Relatório e parecer

1. Genericamente encarregada de se pronunciar sobre a parte III da Constituição, referida ao tema «Organização do poder político», mais concretamente sobre os seus títulos «Princípios gerais», «Presidente da República», «Conselho da Revolução», «Assembleia do MFA», «Assembleia Legislativa, ou Assembleia Legislativa Popular, ou Câmara dos Deputados», « Governo», «Administração Pública» e «Forças Armadas», reuniu-se numa sala do Palácio de S. Bento a 5.ª Comissão, cujos trabalhos se desenrolaram ao longo de trinta e oito sessões.
2. Esta Comissão era inicialmente constituída pelos seguintes Deputados:
Álvaro Monteiro, António José Sanches Esteves, António Alberto Correia Mota Prego Faria e Carlos Manuel Natividade da Costa Candal, do Partido Socialista (PS).
Jorge Manuel Moura Loureiro de Miranda, Marcelo Nuno Duarte Rebelo de Sousa e Olívio da Silva França, do Partido Popular Democrático (PPD).
José Manuel Maia Nunes de Almeida e Vital Martins Moreira, do Partido Comunista Português (PCP).
Carlos Galvão de Melo, do Partido do Centro Democrático Social (CDS.).
Orlando José de Campos Marques Pinto, do Movimento Democrático Português (MDP/CDE).

3. Em substituições ocasionais ou permanentes, intervieram também nos trabalhos da Comissão os Deputados seguintes:
Emídio Pedro Águedo Serrano (PS).
Arnaldo Ângelo de Brito Lhamas, Mário José Pimentel Saraiva Salvado. Fernando Alberto Matos Ribeiro da Silva, Rúben Raposo, José Theodoro da Silva e António Roleira Marinho (PPD).

Emílio Leitão Paulo (CDS).

Álvaro Ribeiro Monteiro e Levy Casimiro Baptista (MDP-CDE).

4. Na sua primeira reunião, efectuada aos 6 de Agosto de 1975, e nos termos do artigo 27.º do Regimento da Assembleia Constituinte, a Comissão elegeu os Deputados Olívio França (PPD) para presidente, Vital Moreira (PCP) para secretário e Carlos Candal (PS) para relator.
5. Subsequentemente, a Comissão passou a apreciar - quanto à matéria da sua competência - os projectos de Constituição apresentados, respectivamente, pelo Partido Socialista, Partido Popular Democrático, Partido Comunista Português, Partido do Centro Democrático Social, Movimento Democrático Português/CDE e União Democrática Popular.
6. Entendeu a Comissão - liminarmente - que nenhum dos articulados oferecidos pelos diversos partidos era susceptível de aprovação exclusiva ou sequer poderia servir de base privilegiada para a elaboração de um texto de substituição, que desde logo foi decidido formular; isto não só pelas lacunas encontradas mas, sobretudo, porque as divergências conceituais que os afastavam dificultariam um consenso mínimo, que se afigurava viável.
7. Passou então a Comissão a articular livremente em relação a cada um dos diversos títulos que de antemão lhe estavam propostos.
Valeu-se, no entanto, das várias soluções conceituais e literais apresentadas pelos diversos projectos já mencionados.
E teve naturalmente presente o trilho essencial que a plataforma de acordo constitucional (vulgo pacto) oportunamente estabelecida entre o MFA e os partidos políticos representados na Comissão - aliás, maiori-

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tários na Assembleia Constituinte; no entanto, e não obstante a obrigatoriedade conferida e a permanência atribuída a esse contrato político, foram ponderadas as diversas leituras possíveis do respectivo texto.
8. Na sua tarefa - e para além dos elementos de trabalho aludidos - a Comissão considerou diversos artigos integradores formulados pelos seus membros, principalmente pelos Deputados Jorge Miranda (PPD) e Vital Moreira (PCP).
9. Ao fim da sua 36.ª reunião, no dia 29 de Outubro de 1975, tinha sido possível encontrar certo entendimento quanto a um articulado preliminar, que os membros da Comissão distribuíram como anteprojecto aos Deputados dos respectivos partidos - para uma primeira recolha de críticas e sugestões.
10. Posteriormente, foi então fixado o articulado que faz parte do presente relatório-parecer e que - nos termos do artigo 75.º do Regimento - é sugerido ao Plenário da Assembleia como de substituição, solicitando os signatários, desde já, que as votações se façam de preferência sobre ele.
11. Como se verá, foi possível um razoável consenso quanto a tal texto, para o que muito terá contribuído, naturalmente, a circunstância de o pacto partidos-MFA constituir afinal o cerne convencionado dos temas que fomos incumbidos de tratar, afastando opções genéricas divergentes, que de outro modo certamente teriam surgido.
12. Apesar de considerar cuidadoso e aprofundado todo o estudo a que procedeu, sempre caracterizado pelos abertos debates travados, tem a Comissão consciência de não ter procedido a uma análise exaustiva da matéria tratada, sendo o texto final gizado susceptível de críticas e correcções, não só de índole conceptual, mas ainda quanto às fórmulas alcançadas, que algumas vezes poderão merecer uma melhor redacção, que só a premência do tempo não permitiu encontrar.
13. Importa, no entanto, acautelar expressamente que algumas lacunas do projecto que entregamos à apreciação do Plenário são meramente aparentes, porquanto o tema sobre que nos debruçamos implica diversos preceitos que entendemos diferir e remeter para a rubrica «Disposições finais e transitórias», a ser abordada oportunamente.
14. Passando a referir especificadamente os vários títulos destrinçados, com referência especial ao apoio que os sucessivos artigos merecerem, dir-se-á desde logo e quanto aos «Princípios gerais» que o artigo 1.º obrigará à reconsideração de disposições já votadas em sede de «Princípios fundamentais»; uma outra nota avulsa, que interessará, refere-se à não alusão a outros órgãos da administração pública no n.º 2 do artigo 3.º, onde apenas se mencionam os órgãos de Soberania ou de poder local, pela sua particular relevância.
Neste título, apenas o artigo 1.º, n.º 1 do artigo 2.º, n.º 1 do artigo 3.º, n.ºs 1, 3 e 4 do artigo 5.º e artigos 6.º e 8.º não lograram aprovação por unanimidade dos membros da Comissão, já que mereceram alguns votos contra ou abstenções.
15. Quanto ao título II - Presidente da República -, subdividido em dois capítulos, consigna-se que os artigos 13.º e 14.º, n.º 2, e prazo aludido no n.º 1 do artigo 15.º e artigo 27.º foram aprovados por maioria; as demais disposições obtiveram unanimidade, salvo o texto do n.º 1 do artigo 26.º, que - transitado do anteprojecto - não alcançou sequer a maioria exigida pelo n.º 3 do artigo 62.º do Regimento (aplicável ao funcionamento da Comissão por força do artigo 29.º do mesmo diploma), sendo certo que, não obstante, foi decidido mantê-lo para apreciação superior do Plenário.
Anota-se que a alínea j) do artigo 23.º foi propositadamente deixada aberta à eventual referência a outras nomeações, que, porventura, se entenda deverem pertencer à competência do Presidente da República.
16. Quanto ao articulado do título III - Conselho da Revolução , só os artigos 28.º e 29.º, n.º 2 do artigo 30.º e alínea e) do artigo 32.º se quedaram pela aprovação maioritária; os demais preceitos justificaram a aceitação unânime dós componentes da Comissão.
17. Por seu turno, com excepção do artigo 34.º, todas as disposições formuladas no título IV - Assembleia do MFA - foram aprovadas por unanimidade.
18. Passando agora ao título v, que - conforme o parecer da Comissão de Sistematização oportunamente aprovado trataria da Assembleia Legislativa, ou Assembleia Legislativa Popular, ou Câmara dos Deputados, nas hipóteses disjuntivas propostas, diga-se antes de mais que a Comissão optou pela designação alternativa de «Assembleia dos Deputados» para o órgão em questão, não obstante ter designadamente ponderado que do Pacto consta a expressão « Assembleia Legislativa».
Nessa rubrica, repartida em três capítulos, mereceram a aprovação unânime os artigos 38.º, 39.º, 44.º a 51.º, 55.º, 56.º, 58.º, 60.º a 64.º, 66.º e 68.º e ainda as alíneas a) e b) do artigo 52.º, as alíneas a), b), c), f), g), h), i), j), m), n), o), p) e q) do artigo 53.º, os n.ºs 1, 2 e 4 do artigo 59.º e n.º 3 do artigo 65.º; as demais disposições foram aceites apenas por maioria (incluindo o corpo do artigo 53.º).
Acautela-se, no entanto, que o teor das alíneas n), o) e q) do artigo 53.º depende dos textos definitivos do tema «Organização económica».
19. Quanto ao título vi, que trata do Governo, foi subdividido em três capítulos, tendo merecido aprovação unânime quanto consta dos seus artigos 75.º a 79.º, 81.º, 82.º e 84.º a 86.º e ainda dos n.ºs 1 e 3 do artigo 73.º, 1 e 2 do artigo 74.º, 1 e 2 do artigo 80.º e 2, 3 e 4 do artigo 83.º, alíneas a), b), c), e), f) e g) do artigo 87.º, alíneas a), b), d), e), f) e g) do n.º 1 e n.º 2 do artigo 88.º e n.º 1 e alínea b) do n.º 2 do artigo 89.º
Quanto a este título, resta referir que o n.º 5 do artigo 83.º não conseguiu aprovação por maioria, tendo no entanto a Comissão deliberado apresentar ao Plenário o respectivo texto, que fazia parte do anteprojecto.
20. No que respeita às disposições propostas para o título «Administração Pública», apenas o n.º 2 do artigo 1.º e os n.ºs 1 è 2 do artigo 5.º conseguiram obter unanimidade.
Isto em razão da genérica abstenção do representante do MDP/CDE na Comissão quanto à quase totalidade dos preceitos que foram enquadrados nesta rubrica; de facto, defendera a eliminação de toda a matéria deste título, com excepção do seu artigo 5.º, que entendia, aliás, dever transitar para o título x.

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Assinale-se ainda que a expressão intercalar «designadamente por intermédio das organizações populares ou de outras formas de representação democrática», que consta do n.º 1 do artigo 2.º e que veio do aludido anteprojecto, não obteve a maioria absoluta regimental.
21. Referindo, finalmente, o título que se ocupa das forças armadas, consigne-se que apenas o n.º 3 do artigo 1.º e a expressão «da ordem democrática» que consta do n.º 2 do artigo 3.º não alcançaram aprovação unânime.
22. Resta sublinhar que as epígrafes que figuram no articulado proposto são apresentadas como meros instrumentos de referência, visando facilitar os trabalhos do Plenário - isto à falta de uma deliberação genérica da Assembleia sobre tal questão.
23. Em anexo a este relatório e parecer, mas dele fazendo parte integrante, figurarão as «declarações de voto» partidárias que os membros da Comissão entenderem lavrar.
Lisboa e Palácio de S. Bento, 20 de Novembro de 1975. - Álvaro Monteiro - António José Sanches Esteve. - Emídio Pedro Águedo Serrano - José Manuel Moura Loureiro de Miranda Olívio da Silva França - António Roleira Marinho - José Manuel Maia Nunes de Almeida - Vital Martins Moreira - Emílio Leitão Paulo - Levy Casimiro Baptista - Carlos Manuel Natividade da Costa Candal (relator).

Este parecer é integrado, como ficou dito, pelo articulado proposto, e que já foi distribuído, mas que, contra o que o Deputado Vital Moreira disse, segundo creio, não foi publicado ...
Ah! Foi publicado no Diário das sessões.

O Sr. Presidente: - Foi publicado.

O Orador: - Foi publicado de antemão, o que pode ter até vantagens.
É tudo.

O Sr. Presidente: - Seguir-se-á agora a leitura das declarações de volto que os Srs. Deputados desejem apresentar.
Portanto o Sr. Deputado Vital Moreira tem a palavra para uma declaração de voto.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Bom, para pegar nas palavras do Deputado Carlos Candal «como tinha dito o Deputado Vital Moreira o texto estava publicado».
Sr. Presidente, Srs. Deputados:
1. Os Deputados do PCP que integraram a S.a Comissão, destinada a tratar da matéria respeitante à organização do poder político, entendem dever salientar o amplo espírito do compromisso que conduziu os trabalhos da Comissão.
2. Os Deputados do PCP votaram a favor da maioria das disposições do articulado agora apresentado à Assembleia, mas não puderam dar o seu acordo a um certo número de disposições.
Os Deputados do PCP opuseram-se, por um lado, àquelas disposições que temos por incompatíveis com a plataforma constitucional. É o caso, entre outros, dos artigos 27.º (que estabelece um órgão subsidiário de soberania não previsto na plataforma), 26:º (que exige referenda para as leis do Conselho da Revolução) e 51.º, alínea c) (que exige a ratificação pela Assembleia dos decretos-leis do Governo).
Os Deputados do PCP opuseram-se também àquelas disposições que acentuam desmesuradamente o papel da Assembleia Parlamentar, em prejuízo de outros órgãos de Soberania, nomeadamente o Governo e o Conselho da Revolução. É o caso, entre outros, dos artigos 53.º (sobre a competência legislativa exclusiva da Assembleia dos Deputados), 65.º (que permite o funcionamento permanente da Assembleia) e 70.º (que prevê a existência de uma Comissão Permanente da Assembleia, e que a substitui para certos efeitos, nos intervalos do seu funcionamento).
3. Os Deputados do PCP confiam em que os pontos indicados sejam objecto de correcção na discussão e votação no Plenário.
Disse.

O Sr. Presidente: - Mais alguma declaração de voto?

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado Leitão Paulo.

O Sr. Leitão Paulo (CDS): - Quanto à apreciação na generalidade do texto apresentado ao Plenário da Assembleia Constituinte pela 5.ª Comissão, o principal problema que se põe é o do pacto MFA-partidos.
A propósito desse pacto, não quer o CDS deixar de declarar, uma vez mais, que as suas soluções não coincidem, em muitos pontos, com as grandes linhas da doutrina constitucional do CDS. Algumas delas, até, não se ajustam hoje às circunstâncias da evolução política, pelo que, como o CDS vem afirmando desde Julho, deveriam ser objecto de revisão, e quanto antes.
Quanto à apreciação do texto da 5.ª Comissão na especialidade, o CDS congratula-se com o facto de vários e importantes preceitos terem sido aprovados por proposta sua. Sucintamente referirá as principais disposições que por motivos de ordem política não merecem a concordância do CDS:

a) Artigo 14.º, n.º 2:

Entende o CDS que dada a possibilidade de um Presidente da República em exercício se candidatar à eleição presidencial, não deve ser ele a presidir ao colégio eleitoral perante o qual se apresenta como candidato;

b) Artigo 27.º, n.º 2:

O CDS considera que a Constituição deve ser interpretada nos termos gerais da doutrina de interpretação das leis, e não, exclusiva ou restritivamente, apenas «em face do processo revolucionário»;

c) Artigo 32.º, alínea e):

O pacto MFA-partidos só atribuiu ao Conselho da Revolução, em desvio aos princípios democráticos, a fiscalização da

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constitucionalidade das leis e outros diplomas legislativos, nada dizendo sobre o das convenções internacionais. Deve, portanto, entender-se que estas estão incluídas na competência normal dos tribunais, em vez de proceder-se ao alargamento escusado da competência excepcional do Conselho da Revolução;

d) Artigo 41 º, n.º 1:

O CDS discorda da referência ao "método da média mais alta de Hondt", não só porque lhe parece ser essa uma opção própria da lei eleitoral, e não da Constituição, mas também porque se lhe afiguram notórias as distorções e os desvios da representação política que tal método deliberadamente provoca;

e) Artigos 80.º, n.º 3, e 83.º, n.º 5:

O CDS discorda energicamente do disposto nestes dois preceitos, por vários motivos. Primeiro, porque eles introduzem uma diminuição, ou um limite, no princípio da responsabilidade política do Governo perante a Assembleia dos Deputados que, sendo contrários às normas gerais da democracia parlamentar e não sendo impostos pelo pacto MFA-partidos, não deve ser admitido. Em segundo lugar, porque se é certo que no pacto se estipula haver no Governo três Ministros da confiança do MFA, isso não permite concluir que eles sejam apenas da confiança do MFA: deve entender-se, sim, que são, simultaneamente, da confiança do MFA e da Assembleia dos Deputados. Em terceiro lugar, porque é verdadeiramente impensável, em termos democráticos, que a Assembleia dos Deputados não venha a poder exigir a responsabilidade política do Governo por discordâncias que incidam sobre matérias de administração interna ou, mais obviamente ainda, sobre matérias relativas ao planeamento económico.
A terminar esta declaração, quer o CDS afirmar que esta parte da Constituição aponta para um modelo estrutural de sistema governativo que, se aperfeiçoado, se prestará ao início e à aprendizagem dos métodos próprios da democracia parlamentar. O CDS deseja, por isso, que a adopção de tal modelo ajude a encaminhar o Pais para uma genuína democracia pluralista e emite o voto de que, pela realização de eleições legislativas na data prevista, a democracia parlamentar de tipo ocidental comece o mais depressa possível a ser posta em prática, reintegrando, assim, o sistema político nacional na tradição portuguesa e europeia que nunca devia ter abandonado.

O Sr. Presidente: - Dispomos de quatro minutos, não sei se algum dos Srs. Deputados quer apresentar alguma declaração de voto.

Pausa.

A reunião fica convocada para amanhã, às 10 horas, a fim de prosseguirmos a discussão na generalidade do parecer da 5.ª Comissão. A sessão está levantada.

Eram 19 horas e 56 minutos.

Nota de rectificação ao n.º 84 do Diário da Assembleia Constituinte:

Na p. 2775, col. 2.ª,1. 38 e 39, onde se lê: "um movimento pan-helénico socialistas, deve ler-se: "0 Movimento pan-helénico Socialista".

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

CDS

António Pedreira de Castro Norton de Matos.
Basílio Adolfo Mendonça Horta da Franca.
Emílio Leito Paulo.
Manuel Januário Soares Ferreira Rosa.
Manuel José Gonçalves Soares.

MDP/CDE

Manuel Dinis Jacinto.

PCP

Adriano Lopes da Fonseca.
António Branco Marcos dos Santos.

PPD

Armando António Correia.
Armando Rodrigues.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Eleutério Manuel Alves.
Fernando Adriano Pinto.
Fernando Barbosa Gonçalves.
José Manuel Afonso Gomes de Almeida
Leonardo Eugênio Ramos Ribeiro de Almeida.
Marcelo Nuno Duarte Rebelo de Sousa.
Maria Augusta da Silva Simões.
Mário Campos Pinto.
Miguel Florentino Guedes de Macedo.
Victor Manuel Freire Boga.

PS

Adelino Teixeira de Carvalho.
António José Sanches Esteves.
Bento Elísio de Azevedo.
Carmelinda Maria dos Santos Pereira.
Emídio Pedro Águeda Serrano.
Florival da Silva Nobre.
Joaquim Gonçalves da Cruz.
Ladislau Teles Botas.
Luís Geordano dos Santos Covas.
Manuel da Mata de Cáceres.
Maria da Assunção Viegas Vitorino.
Rosa Maria Antunes Pereira Rainho.
Sophia de Mello Breyner Andresen de Sousa Tavares.

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Srs. Deputados que faltaram à sessão:

CDS

Adelino Manuel Lopes Amaro da Costa.
Francisco Luís de Sá Malheiro.
Francisco Manuel Lopes Vieira de Oliveira Dias.

MDP/CDE

Luís Manuel Alves de Campos Catarino.

PCP

António Dias Lourenço da Silva.
Dália Maria Félix Ferreira.
Dinis Fernandes Miranda.
Hermenegilda Rosa Camolas Pacheco Pereira.
Hilário Manuel Marcelino Teixeira.
Jaime dos Santos Serra.
Joaquim Diogo Velez.
José Alves Tavares Magro.
José Pedro Correia Soares.
José Pinheiro Lopes de Almeida.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.

PPD

Abel Augusto de Almeida Carneiro.
Abílio de Freitas Lourenço.
Américo Natalino Pereira de Viveiros.
António Coutinho Monteiro de Freitas.
António Júlio Correia Teixeira da Silva.
Artur Morgado Ferreira dos Santos Silva.
Fernando Monteiro do Amaral.
Germano da Silva Domingos.
João António Martelo de Oliveira.
João Bosco Soares Mota Amaral.
José António Camacho.
José António Valério do Couto.
José Casimiro Crespo dos Santos Cobra.
José Manuel da Costa Bettencourt.
Manuel Coelho Moreira.
Manuel da Costa Andrade.
Nívea Adelaide Pereira e Cruz.
Nuno Guimarães Taveira da Gama.

PS

Afonso de Carmo.
Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Marques Antunes.
Alcides Strecht Monteiro.
António Cândido Miranda Macedo.
António Carlos Ribeiro Campos.
Fernando Alves Tomé dos Santos.
Fernando José Capelo Mendes.
Joaquim Antero Romero Magalhães.
Joaquim da Costa Pinto.
José Alberto Menano Cardoso do Amaral.
José Alfredo Pimenta Sousa Monteiro.
Luís Abílio da Conceição Cacito.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Mário Alberto Nobre Lopes Soares.
Mário Manuel Cal Brandão.
Pedro do Canto Lagido.
Vítor Manuel Brás.

OS REDACTORES, José Alberto Pires - José Pinto.

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