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2884 DIÁRIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE N.º 89

No entanto, circunstâncias de ordem vária levaram o MFA a afastar-se da pureza desta linha, avocando um poder de condução política que se traduziu na sua institucionalização, independentemente da Assembleia Constituinte e, mais ainda, na deliberada intenção de conservar o Poder por um período de três a cinco anos, dito período de transição. Tal ai origem do pacto ou Plataforma de Acordo Constitucional. celebrado em Abril com os principais partidos políticos, entre os quais o Partido Popular Democrático.
O pacto, ao impor a existência de órgãos não baseados na vontade popular expressa em eleições e ao manter, para além do interregno constitucional, a autonomia do poder militar relativamente ao poder civil democrático, põe em causa frontalmente alguns dos princípios fundamentais por que sempre se bateram os democratas portugueses. Ele não afecta todos os princípios da democracia, mas afecta-os suficientemente para se poder dizer que não vivemos, nem iremos viver, nos próximos anos, em Portugal, num, regime plenamente democrático. Se bem que fiquem garantidos as liberdades e o pluralismo, trata-se afinal de uma democracia limitada ou condicionada e de um parlamentarismo truncado por um sistema directorial militar.
Quais as razões que, sendo assim, conduziram o Partido Popular Democrático a assinar a Plataforma?
O PPD assinou-a por entender, na já então gravíssima situação que o País vivia, que era conveniente uma "plataforma política comum" (Pacto B, l) entre todas as forças políticas significativas do País, capaz de assegurar a evolução pacífica para a democracia e o socialismo e, antes de mais, um "projecto comum de reconstrução nacional"; por estar convencido de que, se os partidos não assinassem o pacto, poderia correr-se o risco de não haver eleições, perdendo-se, assim, a única oportunidade de conhecimento da vontade política do povo português e o factor dinamizador essencial da instauração da democracia política em Portugal, e por acreditar na força e coesão do MFA como garante do processo revolucionário democrático e socialista.
Como consta do comunicado então publicado, que se reproduz:

A Comissão Política do PPD, não obstante preferir, de acordo com o ideário do partido, um compromisso com o MFA nos termos das reservas que fez no seu documento entregue ao Conselho da Revolução em 4 de Abril de 1975, aceita a proposta do Conselho da Revolução na esperança de que esta será, de entre as possíveis, a melhor solução para a construção da democracia pluralista em Portugal, perante as circunstâncias concretas da presente situação histórica. E proclama o seu firme propósito de continuar a trabalhar, nos termos do programa do PPD aprovado em congresso por uma ordem política democrática e por uma sociedade mais justa, livre e humana, na qual sejam escrupulosamente respeitados os direitos fundamentais do homem e do cidadão.

2. De Abril até agora a situação portuguesa degradou-se consideravelmente em todos os domínios.
Realizaram-se eleições, mas os seus resultados - iniludíveis no sentido da democracia pluralista e do socialismo em liberdade - logo foram escamoteados e tentou-se contrapor-se-lhes formas artificiais ou imprecisas de poder, dito popular. Sucederam-se três Governos Provisórios, mas não puderam governar por carência de autoridade. A grande maioria dos portugueses continuou a ser agredida pêlos jornais estatizados de Lisboa, pela rádio e pela televisão, mas nada se fez para restabelecer o pluralismo.
Aumentou o sentimento de insegurança em casa, nas ruas e no trabalho e surgiu verdadeira angústia perante os problemas económicos, financeiros, administrativos, educacionais e sociais do País, mas estes tão-só se têm agravado pelo adiamento das soluções, pela instabilidade política e pela falta de confiança generalizada.
Porém, mais do que tudo, o que tem caracterizado os últimos meses é a crise do aparelho militar, corroído pela indisciplina, pela irresponsabilidade, pela infiltração partidária, pelo oportunismo, e corroído ainda, pela própria assunção de funções políticas estranhas à natureza das forças armadas. O MFA entrou em desagregação; ao mesmo tempo, e paradoxalmente, alguns dos seus sectores, desprezando o espírito e a letra do pacto, pretenderam impor fórmulas a ele contrárias e contrárias à vontade expressa do povo português (basta relembrar o chamado documento-guia, o projecto de vanguarda política de Vasco Gonçalves e o triunvirato de generais).
Por tudo isto, o Partido Popular Democrático considera necessária e urgente para defesa da unidade das forças armadas, para salvaguarda da ordem democrática, para salvação da Revolução e, porventura, até do País - uma revisão do pacto que vá ao encontro do circunstancialismo actual da vida portuguesa.
Entretanto, queremos deixar bem claro que a nossa posição é de cumprimento do pacto, tal como fizemos no projecto de Constituição apresentado a esta Assembleia e nos votos emitidos na 5.ª Comissão Respeitaremos, pois, o pacto, na medida em que os outros também o respeitarem com idêntica boa fé.

3. Documento sem precedentes em direito constitucional, a Plataforma tem de ser compreendida simultaneamente à luz do Programa do MFA - que não vem revogar, mas tão-só parcialmente suspender ou derrogar - e à luz da própria Constituição que estamos a elaborar.
Embora contenha cláusulas contrárias ao Programa, o pacto pretende ser um instrumento ao serviço dos seus princípios, supostos insusceptíveis de efectivação sem recurso a ele. Daí que expressamente fale "no cumprimento dos princípios do Programa do MFA e na consolidação e alargamento das conquistas democráticas já alcançadas" (A, 4) e na "continuação da revolução política, económica e social iniciada em 25 de Abril de 1974" (B, l) que "empenhou o País na via original para um socialismo português" (E, 2).
O pacto não se converte numa espécie de super-constituição, a que fiquem vinculados juridicamente a Assembleia Constituinte e, mais tarde, os órgãos do poder político constituído. Não paira de fora da Constituição, porquanto, muito pelo contrário, a sua função específica - e nela se esgota - consiste em integrar-se no conjunto do texto constitucional (C, 6 e E, 2).