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4 DE DEZEMBRO DE 1975 2885

O cumprimento do pacto implica a sua plena constitucionalização. Não pode haver duas Constituições, uma correspondente e outra não correspondente à Plataforma. Tem de haver uma só Constituição, inspirada, senão em valores absolutos de justiça, pelo menos em valores de certeza e de coerência jurídica e política. Essa unidade, com o constante influxo sistemático entre todas as suas partes, tem de ser salvaguardada a todo o custo; ela é essencial no respeitante aos direitos, liberdades e garantias e ao exercício democrático do poder político, sempre estreitamente conexos.
De resto, nós não admitimos contradição entre Constituição e Revolução. A Constituição tem de ser democrática e socialista para ser a Constituição da Revolução democrática e socialista. Em contrapartida, a Revolução deve entrar na Constituição, a legitimidade revolucionária deve passar a legitimidade constitucional e os órgãos revolucionários do Poder devem passar a órgãos constitucionais, sujeitos à Constituição - como prescreve, aliás já, o artigo 3.º dos princípios fundamentais - com as competências que estabelecer, independentemente uns em relação aos outros e em relação aos demais Órgãos de Soberania.
Admitir o contrário seria admitir ou a ditadura disfarçada sob a capa de vanguardas pretensamente progressistas ou o anarco-militarismo, sucedâneo do Anarco-populismo; e, num caso ou noutro, abrir a porta, consciente ou inconscientemente, ao golpismo fascista.

4. O pacto tem de ser interpretado e integrado de harmonia com os princípios da democracia, e não da autocracia, dirigido ao "exercício efectivo da liberdade política dos cidadãos" [a que se refere o Programa do MFA, n.º 5, alínea a)], e não ao exercício totalitário do Poder em nome de uma pseudo-revolução ou de um pseudo-socialismo.
Considerando, pois, a sua dependência funcional (apesar de tudo) do Programa, considerando as intenções expressas de criar condições para uma sólida democracia política, social e económica no nosso país, é evidente que o pacto tem de ser, ponto por ponto, confrontado com os princípios da democracia, é evidente que as soluções não democráticas que encerra devem ser integradas tanto na sua lógica interna como na lógica de uma democracia que quer fazer brotar e revigorar.
Por outro lado, o seu conteúdo é, por definição, de duração temporária, ao passo que nenhuma Constituição (mesmo se todo o direito é necessariamente circunscrito no tempo) pode ser feita pensando a termo certo. O próprio pacto prevê a revisão da Constituição, ao fim do período de transição, e não uma Constituição inteiramente nova (B, 3, e E, 1. 2.). Assim, o contributo do pacto para a Constituição de 1975 é o contributo do transitório e não do definitivo, do precário e não do duradouro.
Pois o definitivo e o duradouro - assim acreditamos e por isso estamos dispostos a lutar - há-de ser a democracia política e não as limitações à democracia política, a supremacia do poder civil e não a supremacia do poder militar, o Estado de direito e não a legalidade" de caserna, o primado do Parlamento e não o primado do executivo.
O excepcional nesta Constituição resulta do pacto, e não do que lhe é estranho. Tal como acerca dos direitos, liberdades e garantias não aceitaríamos - nem a Assembleia aceitou - restrições por causa dos imperativos de transformação da sociedade para o socialismo ou de quaisquer outros, também acerca da organização do poder político nunca renunciaríamos a dar um passo, por pequeno que fosse, no sentido da democracia política, ou seja, da soberania do povo institucionalizada.

5. A nossa tarefa é clara e precisa: fazer uma Constituição, coisa bem diferente de fazer qualquer lei constitucional transitória. Consequentemente, justifica-se no domínio da organização política como nos domínios dos direitos e deveres fundamentais e da organização económica, dar todo o desenvolvimento e equilíbrio - este, infelizmente, nem sempre alcançado - às matérias, tratá-las com rigor (embora sem preciosismo), avançar, se possível, para o aperfeiçoamento político e técnico do direito em gestação, colhendo as lições da nossa própria experiência e da experiência revelada pelo direito comparado.
Os representantes do PPD na 5.ª Comissão trabalharam, pois, de harmonia com os seguintes critérios, que mais não são do que outros tantos corolários das ideias acima enunciadas:
a) Aproveitamento de todas as virtualidades democráticas ínsitas na plataforma, a partir da Assembleia Legislativa ou Parlamento eleito por sufrágio universal, directo e secreto (5.1.);
b) Estabelecimento de um mínimo de garantias de democracidade de funcionamento dos órgãos de soberania com titulares não saídos do sufrágio universal, designadamente os órgãos militares;
c) Definição das relações entre os órgãos em termos de separação e interdependência, de modo a evitar conflitos de competência e a conferir a todos requisitos de operacionalidade;
d) Clara sujeição dos actos e actividades dos órgãos e agentes do Estado aos princípios da legalidade e da constitucionalidade, até por se entender que as opções que fizerem deverão ser dentro do espírito da Constituição [Pacto, 3.2, alínea a)];
e) Regulamentação pela Constituição - quer em sede de princípios gerais (título I) quer em cada título - de todas as matérias reconhecidamente constitucionais (como não podia deixar de ser, pois a organização do poder político não pode ser devolvido para a lei).

6. Até aqui a declaração de voto, tal como a tínhamos elaborado há já bastantes dias. Mas os acontecimentos ocorridos na semana passada obrigam-nos a acrescentar algo mais.
Esses acontecimentos vieram desmentir - com que júbilo o dizemos! - o pessimismo em que estávamos acerca da situação das nossas forças armadas. Pois eles vieram mostrar que ainda tínhamos forças armadas, que havia verdadeiros militares portugueses com capacidade de decisão, lucidez e coragem para enfrentar todas as dificuldades e combater pela liberdade e pela democracia, até ao sacrifício da própria