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3242 DIÁRIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE N.º 100

Que isto deve resultar da legalidade em geral e, da consciência do corpo de magistrados ou de agentes do Ministério Público, que procurarão pôr em prática essa legalidade.
Por outro fado, o texto da Comissão aponta para uma ideia que nos parece também importante.
E é a ideia de se dizer que o Ministério Público só tem sentido, só funciona, só actua na órbita dos tribunas. Quer dizer, o Ministério Público não se pode arvorar num qualquer órgão que proceda à gestão de outras tarefas do Estado que nada tenham a ver com o Poder Judicial, nomeadamente não pode encabeçar, não pode dirigir nenhuma, polícia que não seja a polícia criminal. Portanto, estas duas ideias estariam, em princípio, certas, assim entendidas do ponto de vista do Partido Popular Democrático. Em todo o caso, reconhece o Partido Popular Democrático que a proposta apresentada pelos Deputados do Partido Socialista tem a vantagem de não pôr em causa, de imediato, nenhuma destas duas ideias.
Ao devolver, na verdade, para a lei, e espera-se que seja a lei a emanar do órgão de representação popular, que será a Câmara dos Deputados, com uma ou outra designação, ao remeter para a lei a competência para modelar, modelar em concreto, este estatuto próprio que o Partido Popular Democrático espera que seja inspirado num princípio de autonomia e no princípio da funcionalidade parajudicial do Ministério Público.

(O orador não reviu.)

Uma voz: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Continua em apreciação.

Pausa.

O Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nós estamos de acordo com o que disse o Sr. Deputado Barbou, de Melo no sentido de que a nossa formulação não põe em causa que há uma futura Câmara Legislativa que possa optar por essa, orientação que o Sr. Deputado deu. Simplesmente, eu gostaria que ficasse bem vincado que nós não estamos de acordo com essa orientação. Eu gostava de fazer publicamente nesta Assembleia uma confissão, e vou fazê-la publicamente para que a minha reprovação também seja pública. É que em questões judiciais sou extremamente conservador.

Uma voz: - Só em questões judiciais?

O Orador: - Só! E tenho verificado que o regresso à pureza de determinados princípios, que não são os princípios que de um modo geral estão maus, é a sua errada aplicação, que efectivamente é errada.
Por exemplo o nosso Código Penal de 1860, que é um código avançadíssimo para a época e excelente, foi completamente escavacado e distorcido pelo fascismo para conseguir cometer as suas arbitrariedades, e o nosso próprio Código Civil de 1866, com todas as qualidades que tem o novo Código, certamente se revela muito mais avançado para a época presente do, que o Código actual fundado na pandectística ,e de toda a orientação alemã. Isto, Sr. Presidente, Srs. Deputados, é necessário dizer-se. Ora para mim, e até ao momento em que nós modifiquemos toda a estrutura dos tribunais do Ministério Público, tem que funcionar subordinado ao poder político. E agora dir-se-á: esta relação de subordinação do Ministério Público ao poder político é uma relação discricionária, e aí eu acompanho o Sr. Deputado Barbosa de Melo. Esta relação nunca pode ser uma relação discricionária, tem que ser uma relação tomada nos termos da lei. O Estado, qualquer que seja o partido do poder, possui um poder fundamental, que é prosseguir, que é promover a punição dos culpados, que é promover e defender o julgamento dos inocentes, e para isso institui uma magistratura, que é um Ministério Público e que dentro da lei deve obediência ao Estado. Nós não podemos cair na concepção corporativa da uma magistratura de um Ministério Público ou de uma magistratura judicial que constituísse como que uma classe autónoma, ou uma casta com o poder de deliberação própria independentemente de ser controlada por um executivo ou por um Governo eleito. Em Portugal e numa democracia, Sr. Presidente, Srs. Deputados, só têm essa capacidade os eleitos do povo, mais ninguém.
Só têm a capacidade aqueles em quem os eleitos do povo delegam os seus poderes, que é o Governo. E o que é Ministério Público, o que é um juiz? São pessoas que têm uma função elevada, que são licenciadas em Direito, que tiveram o privilégio de frequentar uma Universidade.
Mas esse privilégio não lhes dá direitos especiais para constituírem, eles próprios, uma função judicativa.
A divisão entre poder legislativo, poder executivo e poder judicial é uma divisão oriunda da Revolução Francesa, quando, pura e simplesmente, a justiça era prestada sobre os sujets ou súbditos em nome de uma entidade suprafeudal - nessa altura ainda havia o fim do feudalismo -, que era pura e simplesmente o rei.
Na actual situação, nós entendemos que a lei tem de ser modificada, que a relação de subordinação tem de ser modificada, que se tem de criar actos muito restritos, de modo que entre a raison d'État e, pura e simplesmente, a razão do juiz a justiça não seja postergada, de forma que não se criem conflitos de consciência, de forma que o juiz tenha uma ampla, uma amplíssima possibilidade de interpretar a lei.
De qualquer forma, entendemos também que não podemos permitir ou cair na tentação de erigir os juízes em casta autónoma.
E é curioso que eu aproveitei estas férias da Natal para ler as actas do debate do Sindicato da Magistratura Francesa, aquilo a que o patronato, um certo sector do patronato francês, e certos sectores reaccionários franceses chamam os «juízes vermelhos». E é curioso que a renovação que neste momento se faz em França da jurisprudência francesa é feita não através - calcule-se - da introdução de elementos populares, ou da reivindicação de um magistrado como casta autónoma dentro da Nação, mas sim através desta coisa muito simples e muito clara que é aplicar a lei até às suas últimas consequências.