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3 DE ABRIL DE 1976 4451

Faço-a ainda em total comunhão de espírito com a declaração de voto do meu partido lida por António Barbosa de Melo, a quem presto a minha homenagem.
Por isso, quero dizer, de novo, aqui e agora, que considero a Constituição de 2 de Abril de 1976 uma importante conquista da democracia e do povo português, um marco na nossa história multissecular e, porventura, também um exemplo para outros povos que, em circunstâncias semelhantes, procuram uma via de liberdade para uma sociedade de justiça.
Sim, a Constituição é uma grande conquista. Porque resulta do labor de uma Assembleia Constituinte livremente eleita apesar do entorse à democracia proveniente da Plataforma de Acordo Constitucional celebrada pelo Conselho da Revolução e pêlos partidos políticas. Porque, fundando a República na dignidade da pessoa humana, consagra os direitos fundamentais dos cidadãos enquanto tais e como trabalhadores (pois o meu projecto de sociedade é o de uma sociedade baseada no trabalho). Porque, definindo um quadro institucional de pluralismo ideológico, primado de vontade popular e limitação do Poder, cria uma verdadeira democracia política não obstante algumas deficiências graves.
Especificando um pouco, salientarei como principais notas positivas da Constituição: o apelo à fraternidade, que consta do preâmbulo; o rigor na enumeração, no tratamento e na protecção dos direitos, liberdades e garantias; o generoso programa de direitos económicos, sociais e culturais de cuja realização depende a efectiva concretização da solidariedade entre todos os portugueses; a abolição dos monopólios e dos latifúndios, a tensão entre propriedade social e iniciativa privada numa economia dualista em transição, o cooperativismo, a planificação democrática; a institucionalização dos partidos políticos e o estatuto de oposição; a eleição por sufrágio universal, directo e secreto do Presidente da República, o relevo do parlamento, assembleia representativa, com o primado do poder legislativo, e perante a qual o Governo é politicamente responsável: a independência dos tribunais e a sua competência de apreciação da inconstitucionalidade (ao lado, porém, da competência reconhecida ao Conselho da Revolução); a autonomia político-administrativa dos Açores e da Madeira; o poder local e o reconhecimento das organizações populares de base; enfim, o apuramento técnico dos preceitos que a Comissão de Redacção pode obter.
Não ignoro alguns aspectos menos satisfatórios, entre os quais indiciarei: a referência ao Estado de direito com todos os imensos valores que encerra apenas no preâmbulo; a formulação ideológica, de cariz marxista, de muitos dos preceitos; a deficiente garantia da liberdade de ensino como corolário de liberdade religiosa e de convicções e da liberdade de criação cultural; a não consagração constitucional do direito dos trabalhadores à participação na gestão das empresas; a tímida afirmação da unidade dos tribunais; a relativa confusão acerca das missões das forças armadas; o sistema de relações entre
Governo e Parlamento (já que o Governo não carece do apoio da maioria do Parlamento, ao passo que o Presidente da República é eleito por maioria absoluta dos cidadãos - o que pode conduzir ao presidencialismo e, eventualmente, ao cesarismo).
A Constituição é uma Constituição feita sobre o acontecimento e uma Constituição de compromisso.
Reflecte o traumatismo de quarenta e oito anos de ditadura e alienação e de treze anos de guerra. Reflecte o inebriante ambiente de dois anos de revolução. Produto dó concurso de diversos partidos, acumula materiais aparentemente contraditórios, cuja síntese há-de encontrar-se através do esforço de políticos e juristas, e, sobretudo, através da vivência democrática dos cidadãos. Mas não é a democracia compromisso e não foi já, de per si, a Assembleia Constituinte um grande factor de integração democrática?
Portugal tem de vencer a crise económica, reforçar todo o ensino, fazer justiça a tantos que antes e, infelizmente, mesmo depois do 25 de Abril, foram vítimas de perseguição, opressão, exploração e sectarismo. Acima de tudo, porém, Portugal carece de viver em democracia e em paz, na base de um consenso de que esta Constituição deve ser a pedra angular; e carece de redefinir o seu papel na Europa e no mundo-e só há independência nacional quando é o próprio povo que escolhe os destinos do seu país.
Apesar de não concordar com tudo quanto a Constituição estipula, aceito todas as suas disposições, incluindo aquelas de que divirjo porque acredito na democracia. O povo quis esta Constituição, por meio dos seus representantes livremente eleitos.
O povo lhe dará cumprimento com a interpretação e o ritmo que preferir, nas próximas e nas sucessivas eleições. O povo, em futura revisão constitucional democrática, alterará a Constituição se assim julgar necessário ou conveniente.
E porque acredito no direito, nos seus valores e na sua força em que se consubstancia, no fundo, a Constituição acredito em que, sob o seu império, os Portugueses saberão viver e progredir.
A terminar, saúdo todos os meus companheiros do PPD, com os quais tive a honra de lutar por um socialismo democrático e humanista-por um socialismo que, para mim, tem de equivaler a democracia em plenitude e libertação integral do homem todo e de todos os homens, em liberdade, igualdade e fraternidade.
Saúdo os cidadãos do círculo eleitoral de Braga, cuja confiança me permitiu estar presente na Assembleia Constituinte.
Saúdo todos os Deputados de todos os partidos e grupos, com quem pude conviver a criar laços de amizade, com quem pude concordar e de quem pude divergir.
Saúdo todo o povo português a que me orgulho de pertencer. Tenho profunda fé nele e na sua vontade de não mais perder a liberdade alcançada.
O Deputado do Partido Popular Democrático, Jorge Miranda.

Requerimento enviado para a Mesa no decorrer da sessão:

Considerando que o grau de autonomia conseguido para as ilhas dos Açores tem de estar baseado numa estabilidade económica real-daí a necessidade premente de um orçamento e de um plano económico para a região;