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2120 I SÉRIE - NÚMERO 60

suas equipas integrarão ergoterapeutas, cinesiterapeutas, puericultoras, assistentes sociais e auxiliares de família, havendo ainda quem pense neles incluir uma delegação do seguro de doença para efeito de prestações pecuniárias correspondentes. Esta organização decorre da ideia correcta de que a saúde deve ser considerada no seu ângulo mais amplo e não apenas do ponto de vista médico.
Para além destes pontos de convergência entre o projecto do PS e a posição dos sociais-democratas independentes, inspirada no Programa de Novembro de 1974, cumpre sublinhar como princípio comum fundamental o da própria socialização dos cuidados médicos em Portugal.
Á nossa situação caracteriza-se ainda hoje, como sublinha em interessante estudo o Dr. Fausto de Morais, pela marcada desigualdade de acesso dos utentes (por razões geográficas, sócio-económicas e carência de serviços), pela incapacidade de pagamento dos cuidados de saúde, por uma boa parte da população, pela grande carência de cuidados primários, nomeadamente no sector materno-infantil e escolar, bem como no da educação para a saúde e da higiene do meio ambiente, pela aguda necessidade de novos serviços para crónicos e idosos, e, finalmente, pela escassez de recursos, que impõe o planeamento e a racionalização na distribuição.
Face a tal panorama, bem fácil é de concluir pela indispensabilidade da intervenção da própria sociedade, pela assunção por esta de uma posição de garante face a cada um dos seus membros e, ainda, pela eliminação, tanto quanto possível, de quaisquer distinções de classe nos acessos a serviços e bens que se relacionem com a protecção da saúde. É este um dos imperativos do socialismo democrático e humanista que constitui o objectivo da social-democracia.
Sublinhados tão importantes pontos de convergência entre a posição dos socialistas e dos sociais-democratas independentes em matéria de SNS, é, no entanto, também necessário apontar algumas razões, da nossa parte, de reserva em relação ao projecto do PS, não num espírito de confronto estéril, mas porque se desejaria lançar as pontes para uma solução conjunta.
Em primeiro lugar, num plano metodológico, teríamos preferido uni texto de lei mais conciso, que tivesse deixado para o escalão regulamentar muitas das normas organizatórias que vão sobrecarregar a lei aqui votada e dificultar a adaptação do regime normativo às limitações impostas por factores de ordem económica e social. É, no entanto, tarde para uma alteração que exigiria que se reescrevesse uma boa parte do texto, dando-lhe uma feição mais sintética e programática.
Em contrapartida, há uma outra importantíssima questão, que condiciona forçosamente o sentido do voto dos sociais-democratas independentes: a dos regimes jurídicos dos médicos no SNS.
Os sociais-democratas procuram não sobrevalorizar o papel do acto médico no âmbito da política de saúde. Estudos científicos demonstram que os dois principais factores que influem no aumento da esperança de vida à nascença são o modo de vida e a higiene do meio ambiental e que o acesso aos cuidados médicos apenas ocupa a esse propósito um terceiro lugar, distanciado dos outros dois. Essa é inclusivamente uma razão para não sobrevalorizar politicamente, sob pena de demagogia, a lei quê vai ser votada.
Mas o SNS constitui precisamente uma organização dos serviços prestadores de cuidados médicos. É, pois, compreensível que assuma a tal propósito considerável relevo a questão do regime jurídico dos médicos, cuja importância se esbate um pouco no âmbito mais vasto da política de saúde, quando considerada na sua generalidade.
A este propósito, os sociais-democratas independentes crêem que as soluções deverão assentar nos seguintes pressupostos:

1.º A socialização da prestação dos cuidados médicos não implica a sua estadualização integral;
2.º Deverá ressalvar-se tanto quanto possível a liberdade de escolha do médico pelo doente;
3.º Não se poderá instituir na prática um SNS contra a vontade da grande maioria da classe médica;
4.º A grande maioria da classe médica aceitaria um SNS em que coexistissem um sector estadual e um sector privado funcionalmente articulado pela via de convénios, sem que o segundo fosse à partida considerado como meramente transitório ou tolerado em relação ao primeiro;
5.º O estabelecimento da dedicação exclusiva, como regra geral, do regime dos médicos integrados no sector estadual do SNS representaria uma solução demasiado constrangente, com fortes probabilidades de desvios e fugas, a qual nem sequer é seguida em países como a Polónia.

A socialização dos cuidados médicos significa que tais cuidados serão acessíveis a todos os membros da sociedade independentemente da distinção de classes. Em abstracto, uma tal garantia, prestada pela própria sociedade, pode materializar-se organicamente, quer através de serviços estaduais, quer através de cuidados prestados em regime de clínica privada, com pagamento total ou parcial pelo Estado ao clínico ou reembolso total ou parcial pelo Estado ao doente.
Num país como Portugal, a fraca capacidade económica de muitos cidadãos e as assimetrias regionais pressupõem, ao que cremos, uma rede estadual que cubra todo o território, se bem que a sua instalação se deva fazer por fases. Mas, ao mesmo tempo, constituiria violência, ética e sociologicamente inviável, quer contra médicos, quer contra doentes, tentar impedir, à semelhança do que se fez, por exemplo, em Moçambique, o livre acesso dos doentes a clínicos privados por eles escolhidos em função de razões de confiança pessoal e de preferência.
Mas se uma tal violência poderia em abstracto revestir a forma mais clara de uma abolição da medicina privada, ela não deixaria de se exercer, embora por forma mais subtil, se todo o financiamento público cobrisse apenas o funcionamento do sector estadual, não obtendo qualquer protecção, ainda que sob a forma de reembolso parcial aqueles que preferissem dirigir-se aos serviços de um médico em regime de clínica privada.