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I Série - Número 86

Quinta-feira, 19 de Julho de 1979

DIÁRIO

da Assembleia da República

I LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1978-1979)

SESSÃO SUPLEMENTAR

REUNIÃO PLENÁRIA DE 18 DE JULHO DE 1979

Presidente: Exmo. Sr. Teófilo Carvalho dos Santos

Secretários: Exmos. Srs. Alfredo Pinto da Silva
João Gabriel Soeiro de Carvalho
Eurico Manuel das Neves Henriques Mendes
José Manuel da Costa Carreira Marques

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 45 minutos.
Foi concedida urgência para a discussão do projecto de lei n.º 317/I, apresentado pelo CDS, sobre alterações à Lei Orgânica da Assembleia da República.
O Sr. Deputado Armando Bacelar (PS) deu conhecimento à Câmara do teor de uma exposição, subscrita por quarenta e cinco Deputados do PS, acerca de um artigo publicado no jornal O Dia e da autoria de João Garin, considerado ofensivo do honra da Assembleia, na qual solicitam imediato procedimento judicial.
Os Srs. Deputados Matos Gago (PCP), Teresa Ambrósio (PS), Amélia de Azevedo (PSD), Oliveira Dias (CDS) e Gabriel da Frada (Indep.) proferiram declarações de voto sobre os projectos de lei relativos ao ensino especial, aprovados na generalidade na sessão anterior, tendo os referidos projectos de lei, a requerimento do PS, baixado à respectiva comissão para discussão e votação na especialidade dentro do prazo de cinco dias. Acerca do mencionado prazo, que mereceu a concordância da Câmara, emitiu declaração de voto o Sr. Deputado Jorge Lemos (PCP).
Em seguida procedeu-se à discussão e votação na generalidade dos projectos de lei n. os 204/I, do PSD, e 294/I, do PCP, sobre formação de docentes, tendo sido aprovado este último. Usaram da palavra, a diverso título, os Srs. Deputados Pedro Roseta (PSD) e Jorge Lemos (PCP) - que também justificavam os projectos dos respectivos partidos -, Adriano Rodrigues (CDS), Magalhães da Silva (PS), Nuno Abecasis (CDS) e Gabriel da Frada (Indep.). Emitiram declaração de voto os Srs. Deputados Jorge Lemos (PCP), Magalhães da Silva (PS), Adriano Rodrigues (CDS), Américo de Sequeira (Indep.) e Pedro Roseta (PSD). 0 projecto de lei aprovado baixou, a requerimento do PCP, à respectiva comissão para discussão e votação na especialidade.
Seguiu-se a discussão e aprovação, na generalidade e na especialidade, do projecto de lei n.º 279/I, do PS, relativo à actualização das remunerações dos titulares de cargos municipais, tendo produzido intervenções, após a leitura, pela Mesa, do relatório da Comissão de Administração Interna e Poder Local, os Srs. Deputados António Esteves (PS) e Fernando Pinto (Indep.) e declarações de voto, a seguir à votação na generalidade, os Srs. Deputados Moura Guedes (PSP), António Pedrosa (PCP) e Abreu Lima (CDS).
Por fim, discutiu-se e aprovou-se na generalidade o projecto de lei n.º 280/I, do PS, sobre alterações de disposição da Lei da Reforma Judiciária. Intervieram no debate, a título diverso, os Srs. Deputados Carlos Candal (PS), João Morgado (CDS), Herculano Pires (PS), Marques Mendes (Indep.) e Vital Moreira (PCP). Emitiram declaração de voto os Srs. Deputados Herculano Pires (PS) e Brito Lhamas (PSD), tendo o projecto de lei, a requerimento do PS, baixando à respectiva comissão para discussão e votação na especialidade.
O Sr. Deputado Amândio de Azevedo (PSD) interpelou a Mesa sobre o significado de um documento distribuído ao seu grupo parlamentar e assinado, em nome do Agrupamento dos Deputados Sociais-Democratas Independentes, pelo Sr. Deputado Magalhães Maia, interpelação a que se seguiram um protesto do Deputado independente e um contraprotesto do Deputado do PSD.
Após ter dado conta da entrado na Mesa de vários diplomas, o Sr. Presidente encerrou a sessão às 20 horas e 25 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai proceder-se à chamada.

Eram 15 horas e 30 minutos.

Fez-se a chamada à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS)

Adelino Teixeira de Carvalho.
Albano Pereira da Cunha Pina.
Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alfredo Fernando de Carvalho.
Alfredo Pinto da Silva.
Álvaro Monteiro.
Amadeu da Silva Cruz.
António Barros dos Santos.
António Cândido Miranda Macedo.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Chaves Medeiros.

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António Francisco Barroso Sousa Gomes.
António José Pinheiro da Silva.
António José Sanches Esteves.
António Magalhães da Silva.
Armando F. C. Pereira Bacelar.
Armando dos Santos Lopes.
Avelino Pereira Loureiro Zenha.
Beatriz Almeida Cal Brandão.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel da Costa Moreira.
Carlos Manuel Natividade da C. Candal.
Delmiro Manuel de Sousa Carreira.
Dieter Dellinger.
Edmundo Pedro.
Eurico Manuel das Neves H. Mendes.
Fernando Jaime Pereira de Almeida.
Fernando Reis Luís.
Florival da Silva Nobre.
Francisco António Marcos Barracosa.
Francisco de Assis de M. Lino Neto.
Francisco Cardoso Pereira de Oliveira.
Francisco Igrejas Caeiro.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
Herculano Rodrigues Pires.
Jerónimo da Silva Pereira.
João Alfredo Félix Vieira Lima.
João Francisco Ludovico da Costa.
João da Silva.
Joaquim Manuel Barros de Sousa.
Joaquim Oliveira Rodrigues.
José dos Santos Francisco Vidal.
José Ferreira Dionísio.
José Gomes Fernandes.
José Maria Parente Mendes Godinho.
Ludovina das Dores Rosado.
Luís Alfredo Cardoso Monteiro.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís José Godinho Cid.
Manuel Branco Ferreira Lima.
Manuel do Carmo Mendes.
Manuel Francisco Costa.
Manuel Joaquim Paiva Pereira Pires.
Manuel Lencastre M. de Sousa Figueiredo.
Manuel Pereira Dias.
Maria Emília de Melo Moreira da Silva.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Rodolfo Alexandrino Suzano Crespo.
Sérgio Augusto Nunes Simões.
Teófilo Carvalho dos Santos.
Victor Fernandes de Almeida.

Partido Social-Democrata (PSD)

Afonso de Sousa Freire de Moura Guedes.
Álvaro Barros Marques de Figueiredo.
Amândio Anes de Azevedo.
Amélia Cavaleiro M. de A. de Azevedo.
António Augusto Lacerda de Queiroz.
António Coutinho Monteiro de Freitas.
António Júlio Simões de Aguiar.
Armando António Correia.
Augusto Nunes de Sousa.
Casimiro Gomes Pereira.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Eduardo José Vieira.
Fernando Barata Rocha.
Fernando José Sequeira Roriz.
João Gabriel Soeiro de Carvalho.
João Vasco da Luz Botelho Paiva.
José Adriano Gago Vitorino.
José Rui Sousa Fernandes.
Manuel Henriques Pires Fontoura.
Manuel Sérgio Vila Lobos Menezes.
Maria Élia Brito Câmara.
Nuno Aires Rodrigues dos Santos.
Pedro Manuel da Cruz Roseta.

Centro Democrático Social (CDS)

Adriano Vasco da Fonseca Rodrigues.
Alexandre Correia Carvalho Reigoto.
Álvaro Dias de Sousa Ribeiro.
Ângelo Alberto Ribas da Silva Vieira.
Basílio Adolfo Mendonça Horta da Franca.
Carlos Martins Robalo.
Eugénio Maria N. Anacoreta Correia.
Francisco Manuel L. V. Oliveira Dias.
João Carlos F. Malhó da Fonseca.
João da Silva Mendes Morgado.
Joaquim A. da F. P. de Castelo Branco.
José Cunha Simões.
José Luís R. de Albuquerque Christo.
José Manuel Cabral Fernandes.
José Manuel Macedo Pereira.
José Vicente J. Carvalho Cardoso.
Luís Esteves Ramires.
Manuel A. de A. de Azevedo e Vasconcelos.
Rui Fausto Fernandes Marrana.
Rui Mendes Tavares.

Partido Comunista Português (PCP)

António Joaquim Navalha Garcia.
António Marques Juzarte.
António Marques Pedrosa.
Cândido Matos Gago.
Custódio Jacinto Gingão.
Eduardo Sá Matos.
Fernanda Peleja Patrício.
Fernando de Almeida Sousa Marques.
Joaquim da Silva Rocha Felgueiras.
Jorge do Carmo da Silva Leite.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
José Cavalheira Antunes.
José Manuel da Costa Carreira Marques.
José Manuel Paiva Jara.
Lino Carvalho de Lima.
Manuel Duarte Gomes.
Manuel do Rosário Moita.
Nicolau de Ascenção M. Dias Ferreira.
Raul Luís Rodrigues.
Vital Martins Moreira.
Victor Henrique Louro de Sá.

Independentes

Américo de Sequeira.
Antídio das Neves Costa.
António Augusto Gonçalves.
António Egídio Fernandes Loja.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Joaquim Veríssimo.
António Poppe Lopes Cardoso.
Arcanjo Nunes Luís.

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Artur Videira Pinto da Cunha Leal.
Fernando Adriano Pinto.
Francisco Barbosa da Costa.
Francisco Braga Barroso.
Francisco da Costa Lopes Oliveira.
Gabriel Ribeiro da Frada.
João Manuel Ferreira.
Joaquim Jorge de Magalhães S. da Mota.
José António Nunes Furtado Fernandes.
José Gonçalves Sapinho.
José Joaquim Lima Monteiro Andrade.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
Júlio Maria Alves da Silva.
Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho.
Manuel Cunha Rodrigues.
Manuel Valentim Pereira Vilas.
Olívio da Silva França.
Reinaldo Jorge Vital Rodrigues.
Rui Manuel Parente de C. Machete.

O Sr. Presidente: - Responderam à chamada 153 Srs. Deputados.
Temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 45 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como hoje não há período de antes da ordem do dia, vamos entrar imediatamente no período da ordem do dia, de cuja primeira parte consta a apreciação do pedido de urgência solicitado pelo CDS para a discussão do projecto de lei n.º 317/I - Alterações à Lei Orgânica da Assembleia da República.
Como ninguém pede a palavra, vamos votar o pedido de urgência.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Armando Bacelar (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Armando Bacelar (PS): - Sr. Presidente, é apenas para dar conhecimento à Câmara do teor de uma exposição que é assinada por quarenta e cinco Deputados do PS, agora mesmo apresentada na Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Armando Bacelar (PS): - É do seguinte teor:

Lisboa, 18 de Julho de l979.

Exmo. Sr. Presidente da Assembleia da República:

Os signatários, Deputados eleitos e em exercício desta Assembleia, a que V. Ex.ª mui dignamente preside, vêm trazer ao seu conhecimento de que do diário O Dia, de hoje, a p. 5, col. 1.ª, num escrito do seu colaborador habitual João Garin, se insere a seguinte passagem criminosa, duplamente atentória do prestígio das instituições democráticas que nos regem, da revolução do 25 de Abril e do imperativo constitucional da Reforma Agrária, dele saída, e do respeito e consideração devidos à Assembleia da República e seus Deputados: "[ ... ] chamar pela milionésima vez a atenção pública para o facto de, até ao momento actual, nenhum governo produzido pela abrilada ter manifestado a coragem, a inteligência, o senso administrativo e o patriotismo suficientes para encerrarem a Reforma Agrária - desprezando, evidentemente, o coio de parasitas chamado Assembleia da República [ ... ]"
Estas gravíssimas afirmações, que se inserem nitidamente numa campanha fascista contra as nossas instituições democráticas visando a restauração do regime anterior ao 25 de Abril de 1974, não podem passar impunes e exigem a pronta instauração de procedimento criminal para que ao seu autor e outros eventuais responsáveis sejam aplicadas as sanções legais.

Vozes do PS: - Muito bem!

Por de mais sabem os signatários que V. Ex.ª, democrata de sempre e fiel intérprete das altas funções que desempenha, não deixaria de tomar a iniciativa de tal procedimento, independentemente da solicitação. Mas pode dar-se o caso de o atentado cometido não ter chegado ao seu conhecimento devido à multiplicidade dos seus afazeres.
Por isso e para os devidos efeitos, incluindo o da salvaguarda da honra, consideração e prestígio desta Assembleia e dos seus membros, vêm do facto dar conhecimento, solicitando imediato procedimento, depois de esta exposição ser lida na primeira sessão plenária após a sua entrega.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a exposição que acaba de ser lida constitui matéria de crime, segundo o que nela se diz, pelo que será enviada às instâncias oficiais a fim de seguir o devido procedimento.
Srs. Deputados, vamos seguidamente proceder às declarações de voto sobre os projectos de lei relativos ao ensino especial.
Para o efeito tem a palavra o Sr. Deputado Matos Gago.

O Sr. Matos Gago (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PCP propôs a criação de um Instituto de Educação e do Ensino Especial (como primeiro passo para a reestruturação desse importante sector, onde reina a mais completa descoordenação); bateu-se arduamente pelo amplo debate público de tal iniciativa; exerceu os seus direitos regimentais por forma a garantir a apreciação da Matéria antes do termo dos trabalhos da presente sessão suplementar da Assembleia da República.
0 debate público caracterizou-se pela intensa participação e pela riqueza dos resultados; o debate em Plenário realizou-se em tempo e o Instituto da Educação e do Ensino Especial será criado. Foi rejeita-

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da a hipótese alvitrada pelo PSD de criação de duas débeis estruturas, inadequadamente enquadradas e pior definidas.
0 Grupo Parlarnentar do PCP considera atingidos
os objectivos do seu projecto de lei n.º 165/I e não pode deixar de congratular-se com tal resultado.
Na sequência das votações ontem realizadas, e tal como era previsível, foi aprovado o projecto de lei n.º 264/I, do PS, e rejeitada a solução de fundo preconizada pelo PSD.
Não foram explicitadas (e não curaremos de indagar) as razões que levaram à abstenção do Partido Socialista, e logo à não aprovação formal do projecto de lei n.º 165/I, do PCP, que estivera na origem de todo o processo. Não as encontrará por certo quem tenha acompanhado a discussão pública e o debate travado ontem mesmo nesta Assembleia.
Voto «político» (no pior dos sentidos da palavra), assente em critérios de oportunidade (no mínimo), alheio ao fundo da matéria e aos problemas dos deficientes - dele tirarão todos os interessados as pertinentes conclusões, na altura adequada, para os efeitos devidos.
A nossa posição em relação ao projecto de lei do Partído Socialista foi claramente expressa - dentro e fora do Plenário da Assembleia da República antes da votação ontem realizada e (nos precisos termos que adiante exporei) não sofrerá qualquer alteração dentro da comissão que o votará na especialidade (ou fora dela).
Tendo assumido a responsabilidade e a iniciativa de desencadear o processo de discussão dos problemas da educação e do ensino especial na Assembleia da República, o Grupo Parlamentar do PCP aceitou o texto do PS como base de trabalho para a futura lei. Continuamos a aceitá-lo como tal e estamos abertos à discussão e ao diálogo que permitam e seu aperfeiçoamento de acordo com os interesses dos deficientes.
E isso por três razões fundamentais.
Em primeiro lugar, porque o projecto do PS e o projecto do PCP são inteiramente coincidentes quanto aos objectivos, quanto à filosofia inspiradora e até quanto a muitas soluções concretas. O projecto socialista retomou, como se sabe (nuns casos por alteração, noutros por incorporação pura e simples), disposições que reputamos essenciais do texto por nós apresentado. Importará que as que omitiu (sem qualquer vantagem) venham a afigurar na versão final da futura lei.
Em segundo lugar, porque, ao sistematizar em projecto próprio pontos de vista comuns aos nossos em matéria de ensino especial, o Partido Socialista veio afinal reprovar a longa e gravíssima ausência
de medidas de reestruturação dos departamentos públicos por ele responsáveis e condenar as lastimosas características de que se vem revestindo o chamado apoio ao importante sector cooperativo hoje existente.
Tal facto representa em grande medida uma autocrítica.
Pela nossa parte condenámos na devida altura o ostensivo alheamento dos Ministros responsáveis (em especial do Ministro Cardia) em relação aos problemas da educação e do ensino especial. Criticámos muito particularmente a sua indiferença chocante face aos problemas e dificuldades das CERCIS. Pronunciámo-nos vigorosamente contra as tentativas de ingerência na vida interna destas organizações.
Só podemos, por isso, congratular-nos com a rectificação de tal política.
Como certamente se congratularão com essa rectificação os professores do ensino especial. Eles, que a partir de Outubro de 1977 viram progressivamente cerceados (e até negados) os seus direitos adquiridos, eles, que esperam há anos medidas que lhes garantam uma carreira estável e dignificante, não deixarão de aguardar com expectativa que, tal como se mostra disposto a obviar às consequências da reestruturação que não efectuou, o Partido Socialista abra agora caminho à correcção das injustas medidas com que, a nível governamental, agravou a situação dos professores do ensino especial ...
Estas razões bastariam para que aceitássemos o projecto do PS como base de trabalho. Mas há uma terceira, pelo menos tão relevante como as anteriores e com elas relacionada. É que o Partido Socialista assumiu ontem - perante o Plenário desta Assembleia - o compromisso de acolher sugestões e propostas provenientes das organizações de deficientes, CERC15, sindicatos e do próprio Secretariado Nacional de Reabilitação, no sentido do aperfeiçoamento do articulado base.
A incorporação na futura lei das conclusões resultantes do debate público (aqui resumidas ontem pela minha camarada Zita Seabra) reveste-se, em nosso entender, de importância decisiva. No que depender dos esforços do PCP, tudo será feito para que assim aconteça.
Aquando da votação final global todos poderão aferir os resultados alcançados.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a luta dos deficientes pela realização dos seus direitos visa um amplo conjunto de objectivos a que a iniciativa agora aprovada não poderia, obviamente dar resposta global.
Há que prosseguir na via agora encetada.
Tão importantes como as questões do ensino especial são as relativas à prevenção e tratamento, à segurança social, à habitação, aos transportes, à reabilitação e preparação profissional, ao emprego, à ocupação dos tempos livres, à cultura e ao desporto.
Estamos certos de que o I Congresso de Todos os Deficientes não constituirá apenas um instrumento fundamental para a mobilízação de todos os interessados na concretização dos direitos dos deficientes no nosso país; será uma fonte imprescindível para o conhecimento dos seus problemas e dos grandes objectivos e soluções cuja realização depende em grande medida do exercício pela Assembleia da República das suas competências constitucionais.
Tal como sucedeu no tocante ao ensino especial, o Grupo arlamentar do PCP não deixará de assumir claramente as suas responsabilidades nestas matérias e está aberto à consideração e preparação de novas iniciativas legislativas que dêem à resolução dos problemas dos deficientes portugueses o quadro legal a que constitucionalmente têm direito.

Aplausos do PCP.

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O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Ambrósio.

A Sr.ª Teresa Ambrósio (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 sentido do voto dado ontem pelo Partido Socialista aos três projectos de lei em discussão está plenamente justificado na intervenção por nós feita durante o debate.
Desejamos afirmar, no entanto, que reconhecemos o esforço de todos os partidos no sentido de trazerem a esta Assembleia o seu contributo para a resolução do problema dos deficientes, e mais uma vez declaramos, como fizemos nessa intervenção, que, dado o reconhecirnento expresso do PS dos aspectos positivos contidos nalguns dos projectos ontem rejeitados, nomeadamente no projecto do PCP, estamos abertos, na especialidade, à introdução de todos esses aspectos positivos.
Assim, desejamos a contribuição de todos os partidos para a votação rápida na especialidade desta lei.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Amélia de Azevedo.

A Sr.ª Amélia de Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votámos contra o projecto de lei n.º 165/I, do PCP, porque, como referimos expressamente na nossa intervenção, cria um Instituto de Educação e Ensino Especial que, desgarrado das estruturas do ensino regular, conduz à segregação e à simples tolerância social dos deficientes. Por outro lado, caracterizando-se esse Instituto pela sua autonomia administrativa, financeira e técnica, redundaria numa estrutura formalmente dependente do MEIC, mas na prática a ele estranha, conduziria ao nascimento de um minigoverno semelhante ao IARN. Só que o IARN teve a sua justificaçâo histórica num momento de grave emergência nacional, com o êxodo em massa dos desalojados das ex-colónias.
0 Instituto de Educação Especial do PCP não tem sequer essa justificação - os perturbados, os inadaptados, os deficientes são uma constante no nosso processo educativo e no nosso sistema de ensino. 15olá-los numa ilha burocrática e centralizadora será, estamos certos, aprisioná-los num gueto. Aliás, o projecto do PCP só integra os deficientes nas estruturas regulares de educação quando, no seu dizer, tal for aconselhável.
Ora, o PSD defende, no seu projecto de lei n.º 271/I, que os deficientes são integrados nas estruturas regulares de educação. Só nos casos imperiosos os deficientes dela são retirados.
Portanto, a filosofia subjacente ao nosso projecto é contrária à do projecto do PCP.
Abstivemo-nos na votação do projecto de lei n.º 264/I, do PS, porquanto ele aponta no sentido da descentralização e regionalização, embora em termos não tão amplos como nós defendemos no nosso projecto para os centros regionais de educação especial.
Apresenta, contudo, também, a criação de um Instituto de Educação Especial que, embora não o configure em termos tão monopolizadores como o do PCP, tern ainda o grave inconveniente de aparecer no projecto de lei do PS como que «em órbita», uma vez que nem está enquadrado no MEIC, nem na Presidência do Conselho, nem em lugar algum.
Enferma ainda o projecto de lei do PS de contradições cuja apreciação terá mais cabimento na especialidade.
De qualquer modo, o projecto de lei do PS iambém conduz à segregação, por mais que os seus autores proclamem a eficácia e operacionalidade do tal Instituto.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Oliveira Dias.

O Sr. Oliveira Dias (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em nome do Grupo Parlamentar do CDS desejava dar por reproduzidas nesta oportunidade as considerações que ontem fizemos acerca dos três projectos de lei e dos critérios que conduziram à nossa votação sobre eles.
Resultou aprovado na generalidade o projecto de lei n.º 264/I, do PS. Pensamos que, não obstante a conveniência de introduzir na especialidade algumas correcções que nos parecem importantes e que decorrem das observações que aqui ontem fizemos, se trata de uma base de trabalho útil, da qual esperamos e fazemos votos para que possa resultar uma lei da educação especial à altura, que possa dar resposta aos problemas prementes que nesta área se levantam no nosso pais.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Gabriel da Frada.

O Sr. Gabriel da Frada (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votámos favoravelmente o projecto de lei do PS por ele se aproximar do nosso próprio pensamento, apesar de todas as suas imperfeições, como ontem aqui esclarecemos.
Abstivemo-nos em relação ao projecto de lei apresentado pelo PSD pelas limitações que ele apresentava ao não estabelecer qualquer espécie de contrôle sobre a parte do ensino e coordenação do mesmo.
Votámos contra o projecto de lei do PCP por nos ter parecido demasiado centralizador e não respeitar integralmente a iniciativa privada e cooperativa neste domínio.

Vozes dos Independentes sociais-democratas: Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, deu entrada na Mesa um requerimento a pedir a baixa à comissão destes projectos de lei sobre o ensino especial.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Laje.

O Sr. Carlos Laje (PS): - Sr. Presidente, lembro que nesse requerimento se propõe um prazo de cinco dias para a discussão na especialidade, ponto esse que também tem de ser votado.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, há alguma oposição ao requerimento ou ao prazo de cinco dias para a discussão na especialidade?

Pausa.

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Como não há, considera-se aprovado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, é para uma curta declaração de voto para justificar porque é que o PCP não se opôs a que se desse o prazo de cinco dias para a discussão na especialidade na respectiva comissão dos projectos de lei em causa.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 PCP votou a favor de que fosse dado um prazo curto para a comissão poder votar na especialidade os projectos de lei sobre o ensino especial por considerar que todo o processo se iniciou devido a uma iniciativa do PCP, que considera estar em grande parte constante do projecto de lei do PS, que é posterior, e, como tal, como queremos ver o problema do ensino especial resolvido, não poderíamos opor-nos à sua rápida resolução e votação.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estão em discussão os projectos de lei n.ºs 204/I, do PSD, e 294/I, do PCP, sobre formação de docentes.
Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Roseta para proceder à apresentação do projecto de lei do PSD.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Já várias vezes Deputados do PSD se referiram nesta Assembleia à situação dos docentes sem habilitações próprias, à necessidade da sua formação em serviço, à indispensável garantia do seu emprego.
Foi a falta de professores com as qualificações exigidas que obrigou a que se tivesse de recorrer, de alguns anos para cá, a outros docentes, muitos dos quais se encontram ao serviço do MEIC desde há vários anos.
Se é certo que tal recurso acarretou manifestos inconvenientes quanto à qualidade do ensino, a verdade é que a situação actual não pode manter-se e muito menos pôr em perigo o emprego daqueles que deram, apesar de tudo, uma contribuição indispensável para o ensino em Portugal. Seria impensável, por injusto e imoral, despedir tais docentes à medida que aparecessem professores habilitados.
Por outro lado, há que pôr termo à instabilidade profissional que afecta os docentes sem habilitação própria, em primeiro lugar por motivos de ordem pessoal, em segundo lugar por ser geradora de tensões dentro dos corpos docentes das escolas secundárias e do ciclo preparatório do ensino secundário.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Também o sistema actual de realização dos estágios pedagógicos não permite a obtenção rápida das condições necessárias para a profissionalização dos professores com habilitação académica, o que impossibilita o alargamento dos quadros.
Todas estas circunstâncias convergem em si na necessidade urgente de alterar o sistema de formação em serviço dos docentes sem habilitação própria, uma vez qe as duas soluções antes adoptadas, em 1972 e em 1977, respectivamente, não permitiriam a resolução do problema no âmbito das Universidades. Ambas obrigavam o docente sem habilitação a obter aprovação nas disciplinas que lhe faltavam para terminar o curso universitário normal, fosse através de cursos intensivos a realizar nas férias, no prímeiro caso, fosse concedendo-lhe um regime especial para frequência da Universidade, no segundo caso.
Entende, por consequência, o PSD que é preciso inovar, tendo em conta que os docentes sem habilitações próprias foram adquirindo uma certa preparação durante os anos passados a leccionar e que são pessoas adultas com maturidade e experiência adquirida.
Por isso, apresentámos no início de Fevereiro deste ano o projecto de lei n.º 204/I, que propõe um esquema realista para o prosseguimento de estudos enquanto os referidos docentes permanecem em serviço e que, tendo em atenção a experiência acima referida, permite a criação, para cada docente, de um currículo que, uma vez cumprido, lhe fornecerá uma habilitação equivalente à dos professores profissionalizados.
Propõe-se, assim, a criação nas Universidades e Institutos Universitáros de centros de formação externa de professores, nos quais se poderão matricular, com o fim de obter uma licenciatura em educação, os docentes sem habilitação própria que tenham obtido aprovação em, pelo menos, quatro disciplinas de um curso superior, uma das quais deverá corresponder às matérias que os docentes leccionam.
Poderá haver ainda no âmbito desses centros cursos de preparação para o Exame de Estado e cursos de especialização em áreas educacionais específicas.
Interessante inovação, que importa destacar, é a constante do artigo 9.º do nosso projecto: a cada docente inscrito nos cursos destinados a obter a habilitação será fornecido um plano de preparação, que incluirá as matérias em que o docente deverá obter aproveitamento, os seminários e colóquios em que participará e os trabalhos práticos a realizar.
O artigo 12.º assegura aos referidos docentes o seu lugar na escola em que prestem serviço ao tempo da matrícula ou numa das escolas da mesma área, durante o tempo de duração do curso, devendo ser organizados horários que, atribuíndo-lhe um serviço máximo de doze horas semanais, permitam cumprir as suas actividades docentes e concluir o curso.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos, como sempre, abertos às sugestões na especialidade que permitam melhorar o nosso projecto, tanto mais que, muitos meses depois de nós, o CDS e o PCP apresentaram também projectos sobre a mesma matéria.
Entretanto, só o do PCP, o n.º 294/I, se encontra também em discussão. Embora a preocupação fundamental seja a mesma - resolver esta situação injusta e perigosa -, as situações concretas que propõe são bastante diferentes das nossas. Este curto projecto, a nosso ver cheio de lacunas, limita-se a manter uma solução semelhante às duas que vigoraram sem êxito até agora.
Julgamos que as instituições de ensino superior dificilmente poderão responder à proposta do PCP.

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Por essa razão, propomos antes uma resolução ad hoc para os professores especialmente motivados para estas tarefas - a criação dos centros que referi.
Há também outros pormenores em que não estamos de acordo com o projecto daquele partido, mas não interessa estarmos a esmiuçar num debate na generalidade.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Julgo que esta curta intervenção é suficiente para trazer a esta Câmara aquilo que importa. 0 cerne desta questão é a situação dos docentes sem habilitação própria, que de qualquer forma tem de ser resolvida sem pôr em perigo os legítimos direitos adquiridos, o direito ao emprego, mas simultaneamente permitindo uma melhoria na qualidade de ensino que complete a experiência prática que esses professores já adquiriram.

A Sr.ª Amélia de Azevedo (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Este é o escopo fundamental do nosso projecto de lei, é a sua intenção fundamental que importa salvaguardar.
Ainda que outro mérito não tivesse tido, teve pel o menos o mérito de chamar a atenção dos outros partidos, provocar a apresentação de dois projectos de dois outros grupos parlamentares, e estamos certos que de uma forma ou de outra esta situação será, por obra desta Assembleia e ao contrário do que aconteceu no passado, finalmente resolvida para bem do ensino em Portugal e com respeito pelos direitos destes docentes.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos para proceder à apresentação do projecto de lei n.º 294/I, do PCP.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Assembleia da República analisa hoje dois projectos de lei sobre completamento de habilitações para os professores do ciclo preparatório e do ensino secundário não portadores de habilitações próprias.
Tal debate, que desde há muito se vinha impondo, tem como objectivo fundamental possibilitar a todos os professores em exercício com habilitações suficientes a aquisição de habilitação própria para o ensino. Tal objectivo justifica-se quer pela necessidade de pôr fim à discriminação profissional actualmente existente e garantir a estabilidade no emprego quer, na medida em que se trata de melhorar a qualidade psicopedagógica dos docentes, pela necessidade por todos sentida da meihoria da qualidade do ensino.
Aliás, este problema nãp é novo. Ele tem as suas raízes pofundas na indefinição para que o fascismo remeteu a classe profissional dos docentes, na politica de mão-de-obra barata que fomentou e na total inexistência de planos concretos para a sua resolução. Compreende-se, assim, que esta tenha sido uma das questões por que mais têm lutado os sindicatos de professores, sem que da parte dos responsáveis ministeriais pela educação tenha havido a necessária abertura para a consideração de soluções que permitissem ultrapassar a situação actual.
A própria Assembleia da República não tem estado ausente de toda esta luta dos professores. Por várias vezes e pelas mais diversas formas (audiências, petições, cartas, telegramas, etc.) esta Assembleia, e em particular a Comissão de Educação, tem tido conhecimento dos problemas que se colocam e da necessidade de rapidamente se encontrar para eles uma solução que tenha em conta as justas aspirações e reivindicações destes profissionais. Mais, esta Assembleia da República já assumiu perante os professores um claro compromisso de empenhamento na resolução destes problemas quando, em sede de ratificação do decreto-lei sobre contratos de professores, aprovou por unanimidade a inclusão de um novo preceito que prevê a celebração de contratos plurianuais com os docentes não portadores de habilitação própria, desde que estes se comprometam a completar as habilitações no prazo de vigência do contrato em termos a definir por lei.
É, pois, pertinente e vem na sequência lógica dos trabalhos da Assembleia da República que ela hoje se pronuncie, a nível de diploma legal, sobre a definição das condições em que se deve basear o sistema de completamento de habilitações para os professores actualmente em exercício e que não possuam habilitação própria para a docência.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É, assim, dentro dos pressupostos que acabámos de enunciar que surge o projecto de lei n.º 294/I, do PCP, sobre o completamento de habilitações. Em linhas gerais este projecto de lei tentou recolher as principais reivindicações avançadas pelas estruturas sindicais dos professores e dar-lhes a resposta pssivel no quadro do sistema de ensino actualmente existente, com todas as lacunas e carências de que sofre. Importa, contudo, que desde já fique claro que os Deputados do PCP não consideram este seu projecto como algo de acabado, antes sustentam que ele é passível de correcções e melhoramentos na especialidade, aspectos esses que, desde já, nos manifestamos dispostos a considerar.
0 projecto de lei n.º 294/I parte do princípio de que o sistema de completamento de habilitações dos professores dos ensinos preparatório e secundário deve ter por base o próprio sistema pedagógico e orgânico da formação de professores. Ou seja, o sistema de completamento de habilitações deve ter por base o curso já iniciado pelo professor, ainda que com especificidades e adaptações a definir pelo próprio estabelecimento de ensino superior em colaboração com a estrutura sindical e tendo em conta que se trata de completar um curso especificamente destinado à docência
opta-se, pois, pelo sistema de formação em serviço, que pode assumir as formas de presencial ou à distância, neste caso apoiado em experiências positivas já realizadas, como a criação de centros de apoio regional, competindo ao MEIC fornecer o apoio didáctico ou pedagógico para a realização dos cursos.
A estes cursos terão acesso professores que não possuam habilitações próprias no grupo em que exercem funções, exceptuando aqueles que as já possuam noutro grupo. No que se refere aos curricula a seguir pelos docentes candidatos aos cursos de completamento de habilitações, eles deverão ter em conta as matérias já realizadas pelo docente e ainda

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o seu curriculum profissional. Prevê-se mesmo a hipótese de realização de exames ad hoc para as disciplinas em que o docente se considere à partida suficientemente qualificado.
As nossas propostas consideram ainda que o sistema de completamento de habilitações não deve acarretar uma ausência da prática da docência, mas sim realizar-se a formação em serviço. Não optamos, pois, pela redução de horários ou mesmo dispensa de serviço, mas sim pela concessão de benefícios a nível da atribuição de horários de modo a facilitar o maior número de tardes ou manhãs livres a dedicar ao estudo.
Prevê-se, ainda, que sejani dadas garantias de emprego aos docentes que se inscrevam nos cursos de completamento de habilitações. Finalmente, e por, considerarmos que este projecto de lei não tem como objectivo definir a lei de bases sobre formação de professores, lei absolutamente necessária e da qual o completamento de habilitações se deve considerar um capítulo, dá-se um prazo ao Governo para apresentação a esta Assembleia de uma proposta de lei de bases sobre formação de docentes.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sobre o assunto hoje em discussão existe também um projecto de lei do PSD - o projecto de lei n.º 204/I. No nosso entender as soluções nele propostas não permitiriam a rápida solução do problema, quer por propor a criação de cursos absolutamente desligados dos seguidos pelos professores até então, quer por deixar por definir aspectos fundamentais para a sua concretização.
Ao contrário do PCP, o PSD optou pela criação de estruturas totalmente novas, prevê esquemas de redução de horários (com o que não podemos concordar, pois só viria agudizar ainda mais o problema da admissão de novos docentes sem habilitação para ocupar os lugares em aberto), introduz de novo o Exame de Estado - não sabendo nós muito bem para quê - e não define com clareza a que docentes se destinam tais cursos, etc. Consideramos, contudo, que, apesar destes aspectos negativos, a iniciativa do PSD se integra no esteio das reivindicações dos docentes, pelo que não iremos votar contra o referido projecto de lei. Em sede de especialidade haverá certamente oportunidade de corrigir os aspectos considerados mais negativos.
Queria nesie pónto fazer um pequeno parêntesis porque não tinhamos pensado referir o projecto de lei do CDS, dado que ele não estava agendado para esta reunião. No entanto, consideramos que ele poderá entrar como propostas de especialidade aquando da discussão em comissão.
Finalmente, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o Grupo Parlamentar do PCP está confiante que a Assembleia da República não deixará de ter em consideração a importância de que se reveste a rápida resolução do problema dos professores em exercício sem habilitações próprias. Fazê-lo é corresponder aos anseios e reivindicações de todos aqueles que ao longo de anos e anos se viram impossibilitados, pelas mais diversas razões, de completarem as suas habilitações, de melhorarem a sua capacidade pedagógico-cientifica e desse modo darem um contributo mais válido para a melhoria da qualidade do ensino no nosso país.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Rodrigues.

O Sr. Adriano Rodrigues (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 problema da formação de professores terá de se basear numa eficaz preparação científica e cultural que torne o docente capaz de transmitir conhecimentos, pois ninguém poderá comunicar o que ignora ou conhece mal.
Uma complementarização de habilitações curriculares para docentes do ciclo preparatório e do secundário em exercício terá de obedecer a certas condições. A primeira exige uma formação funcional, isto é, uma formação que procure resolver as verdadeiras dificuldades que o professor encontra. Esta primeira condição não é tão fácil de cumprir como os projectos agora em debate parecem defender, não obstante as suas boas intenções e metas que visam.
Uma formação em serviço de docentes terá de atender à realidade escolar. A profissão de educador, ou, mais exactamente, a missão de educar, exige uma formação base, que não pode ser restrita ou limitada, procurando filantropicamente a recuperação dos que falharam cursos universitáríos, como da leitura dos documentos em debate parece deduzir-se.
Devemos preocupar-nos com o problema do insucesso escolar, mas a sua solução não passa por uma promoção à docência.
0 ideal seria que os estudantes melhor preparados viessem para o ensino, pois, com maus docentes haverá fatalmente maus professores e maus alunos e o progresso e o bem-estar social do Pais exigem técnicos capazes e gente competente.

Uma voz do CDS: - Muito bem!

O Orador: - A massa juvenil, que, mercê do processo de democratização, cada vez tem mais acesso às escolas, reclama professores eficientes e condições de aprendizado que tornem as instituições pedagógicas válidas, de modo a evitarem o escândalo nacional que há anos se vem agravando neste país e é o de muitos alunos, desde o ensino básico ao superior, precisarem de se apoiar em muletas dos leccionadores, tornando o ensino um luxo extraordinariamente caro, oneroso para os encarregados de educação, muitos dos quais não têm rendimentos que lhes permitam manter a fraude.

Aplausos do CDS.

O Orador: - Por outro lado, a capacilade de inciativa e autoconfiança é diminuída ou limitada em alunos naquelas condições.
A escola deve corresponder ao que dela se exige e se espera no plano formativo e informativo.
Estes projectos terão de tomar em consideração as dificuldades que requer a organização de um horário escolar. Deve-se ser previdente e esclarecido ao recomendar horários especiais para os que se formam em serviço. Elaborar um horário, nas condições presentes de elevado número de disciplinas, de professores, de escolas superlotadas sem salas disponíveis, de prograrnas e de desdobramentos escolares, exige cuidado esforço, meses de trabalho atento e de experiência na elaboração de programas.

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Uma formação em exercício reclama muita atenção aos problemas dos discentes e às necessidades de assiduidade, cumprimento dos programas, horários e melhoria do rendimento escolar. Com um horário impróprio serão os alunos os primeiros prejudicados, depois os outros professores e, finalmente, todos os objectivos e fins da educação atingidos e contrariados.

O Sr. Nuno Abecasis (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Os alunos, que deviam cada vez estar mais vinculados à escola e ali encontrar condições de trabalho, cada vez, infelizmente, são mais segregados da instituição, pois não só as condições de espaço, mas as condições humanas da docência, aparecem com mais limitações.
Os projectos de lei n.ºs 204/I, do PSD, e 294/I, do PCP, têm o mérito de se preocupar com o problema da conclusão das carreiras escolares dos professores e da sua formação. Mas fazem-no de uma maneira apressada, preocupados com a resolução imediata de um problema que se agravou de há vinte anos para cá e é o resultado do sistema elitista escolar que vigorou durante os primeiros trinta anos do regime deposto, não obstante o esforço despendido depois dos anos 70 para mitigar os erros acumulados.
Não é realista procurar resolver de uma penada tamanho mal, pelos vícios acumulados ao longo de decénios.
0 problema terá de ter uma solução metodológica a médio prazo, terá de vincular os professores ao ensino, pois nada se exige de indivíduos que frequentam cursos não específicos da docência e que, terminadas as licenciaturas, irão ser médicos, engenheiros ou advogados e só estarão na docência enquanto forem desempregados.

O Sr. Nuno Abecasis (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Ora, uma escola não é uma instituição de desemprego. Uma escola é uma instituição que terá de ser rentável em termos de aprendizado, pois nela a comunidade investe os rendimentos nacionais.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Nos projectos em questão terá de ser defendido o interesse público e compensado com uma contrapartida o encargo do Estado. Não há uma retribuição em serviço em troca daquilo que o Estado concede. Neste sentido, entendemos que o contrato devia ser sinalagmático, impondo direitos e obrigações simultâneas.
Em nosso parecer os professores com os cursos incompletos devem, em condições que o justifiquem, ser ajudados a concluir os cursos, dispensando-os totalmente da docência no caso de lhes faltarem cadeiras, de modo a seguirem com eficiência os seus cursos, sem os prejuízos que trazern as faltas às aulas, o preparar mal as lições por terem de preparar os seus exames, o avaliarem mal os alunos, o viverem em estado de tensão permanente. Em termos económicos será mais rentável para o Estado a formação de um bom professor, de um bom técnico,que lhe pagará prodigamente a ajuda despendida em tempo e eficiência, do que o remedeio de um professor fraco ou incapaz, que será a mutilação de centenas de milhares de jovens, que lhe sofrerão os erros de fabrico ...
Não pretendemos a criação utópica de bons professores. Será difícil encontrar definição para o conceito geral de bom professor. Contentamo-nos em defender professores com êxito ou, se preferirem, professores com menos dificuldades, professores que melhor se adaptem ao seu trabalho, que tenham consciência do papel da empatia cognitiva, que estejam técnica, científica e psicologicamente preparados para o exercício da função docente. Pretendemos professores que saibarn comunicar e levar os alunos a aprender por si da maneira mais eficaz. Pretendemos professores que se adaptem à realidade nacional, à actualização científica e técnica constante, ao ensino necessário, pois um ensino inútil não é o mesmo que um ensino inofensivo, professores que sintam a responsabilidade das tarefas nacionais que lhes forem cometidas, que formem e não deformem, que amem os seus alunos e não sintam o tédio da profissão, enfim, professores que tenham uma ética profissional.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei n.º 204/I, do PSD, pareceu-nos muito regulamentar. Este sistema de formação de professores poderá gerar professores de 2.ª classe, o que em termos sociais é reprovável. Os limites dos contingentes de professores em formação devem ser determinados em função do número de cadeiras e do tempo que exige a sua conclusão.
Por que motivo atribuir subsídios de deslocações? Entendemos que o Governo tem também uma palavra importante sobre este assunto, particularmente através do MEIC, e que os sindicatos dos professores deveriam ser ouvidos. Quanto ao Exame de Estado, os seus inconvenientes levaram a suprimi-lo. Contudo, o sistema que o substituiu não apresenta vantagens. Terá de ser encontrada uma nova forma de avaliação.
Os pontos de vista de que discordamos dentro destes projectos levaram o Grupo Parlamentar do CDS a avançar com um projecto de lei, que foi presente a esta Assembleia, mas não pôde ser agendado. Esse projecto baseia-se no princípio de que o esforço deve incidir imediatamente nos docentes com cursos quase concluídos, libertando-os das tarefas escolares. De acordo com o número de docentes em exercício e prevendo a irradiação de um professorado deficienternente apto, propôs-se um prazo médio de oito anos. É irrealista dispensar de uma só vez ou possibilitar essa dispensa aos milhares de professores que infelizmente leccionam nas condições referidas, se, mal ou bem, deles depende o funcionamento de muitas escolas.
Não desejamos travar os objectivos a atingir e oportunamente faremos as propostas de alteração que entendermos necessárias. Iremos, pois, abster-nos nas votações.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

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O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É para dar um curto esclarecimento à Câmara que decorre da intervenção do Sr. Deputado Adriano Rodrigues.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - A questão que o CDS coloca da necessidade de os docentes para os quais foi dada a possibilidade de frequentarem cursos de completamento de habilitações poderem vir a estar vinculados à profissão em tempo posterior ao terem acabado o seu curso colhe junto do Partido Comunista.
Aliás, essa é uma questão que tem estado na linha das reivindicações dos sindicatos e pensamos ser uma proposta que poderemos considerar e, em sede de especialidade, chegar a uma redacção que convenha aos interesse do povo português, do ensino e dos professores.

O Sr. Adriano Rodrigues (CDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputado.

O Sr. Adriano Rodrigues (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Eu queria precisamente agradecer ao colega Jorge Lemos o que acaba de dizer, porque me parece necessária uma contrapartida de modo que o Estado não possa ser defraudado, permitindo a conclusão de cursos durante a docência e depois a própria docência não tirar esses benefícios.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra do Sr. Deputado Magalhães da Silva.

O Sr. Magalhães da Silva (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os projectos de lei n.ºs 204/I e 294/I em apreciação nesta Câmara, apresentados pelo PSD e pelo PCP, terão sido elaborados com o objectivo de, por um lado, melhorar a qualidade de ensino provendo o preparatório e secundário em Portugal de professores com habilitação própria e, por outro lado, permitir que aqueles que até agora serviram o ensino, sem qualquer contrapartida válida em termos de futuro profissional, possam completar a sua formação científica ou até pedagógica.
Em linhas gerais, o principal objectivo a ter em conta nestes diplomas é válido. Tem o nosso apoio por considerarmos que o nível de conhecimentos ministrados aos Portugueses poderá obter um equitativo nivel científico e pedagógico que agora manifestamente não tem.
Por outro lado, os cerca de 20% de professores não habilitados que leccionam nas escolas portuguesas passariam a dispor de legislação que lhes permitiria, a curto ou a médio prazo, consoante os casos, solucionar os problemas com que todos os anos se debatem quanto ao seu futuro, obtendo a preparação que a grande maioria ambiciona.
Todavia, não é simples uma solução válida que permita conseguir os resultados que, estamos certos, todos pretendemos neste particular.
Os projectos em discussão não apresentam, contudo, para além dos princípios já enunciados, uma visão global da situação, nem propõem soluções capazes de, na prática, alterarem substancialmente, quer em qualidade quer em tempo, este problema sentido por todos aqueles que estão ligados ao ensino em Portugal.
Com efeito, ambos os projectos apontam para um curriculum específico, o que pode permitir sérias discriminações em relação aos professores que seguiram um curriculum de formação normal e a completaram. Corre-se assim o risco de, ao pretendermos corrigir o que esteve e ainda continua mal, incorrer em injustiças para com os professores que completaram cursos e estágios que habilitam para a docência.
Conhecemos o descontentamento que existe nalgumas escolas do País no tocante aos privilégios concedidos aos professores dos ramos educacionais relativamente às facilidades para ingresso nos estágios pedagógicos, em detrimento dos docentes provenientes de cursos universitários não pertencentes ao ramo educacional.
O que propõem os projectos do PCP e do PSD viria criar certamente profundas tensões no seio das escolas, porventura mais agudas do que as referidas e ainda sem possibilitar a formação científica que se pretende para uma melhoria da qualidade de ensino.
Consideramos inaceitável a criação de um centro externo de formação de professores proposto pelo projecto de lei n.º 204/I, do PSD, com autonomia científica e pedagógica.
Nada nos permite pensar que, se tal se verificasse, o atrás expandido não se viria a concretizar.
Há já múltiplos problemas no seio dos docentes deste país, problemas verdadeiramente lamentáveis, em que professores com graus de habilitação absolutamente distintos estão em igualdade de circunstâncias perante a lei, sem contudo ser possível uma equiparação mínima no que se refere a conhecimento científicos e pedagógicos. Permitir que tal situação se amplie com o que propõe o projecto de lei n.º 204/I é contribuir para a manutenção do que de mal há neste particular no ensino em Portugal.
O projecto de lei n.º 294/I, do PCP, ao apontar para a criação de centros de apoio regionais como extensões das Faculdades, merece também a nossa discordância. Não sabemos exactamente o que seriam estes centros de apoio, mas afigura-se-nos que conduziriam a uma perda de qualidade de ensino, que acabaria por trazer consequências análogas aos centros de formação externa de professores propostos pelo projecto do PSD.
Aspecto importante a ter em conta é o modo de acesso a esses cursos que ambos os projectos preconizam. Quer um quer outro permitem que tal acesso seja aberto a todos aqueles que não possuem habilitações próprias. Não estabelecem um critério mínimo que permita compensar os que serviram o MEIC na falta de outros candidatos, quando nós sabemos que as condições de recrutamento deste tipo de professores estão hoje bem definidas na legislação vigente. Há que ter em conta, prioritariamente, a defesa dos direitos que julgamos assistir aos que servem a educação há vários anos, arrostando ao longo de todo este tempo com inúmeras dificuldades e que na prática são autênticos profissionais do ensino. Principalmente para estes estão voltadas as nossas preocupações. Hoje leccionam nas nossas escolas profes-

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sores que, à falta de acesso aos empregos noutros ramos de actividade, para os quais se sentem até mais vocacionados, acabaram por ingressar no ensino. Muitos destes têm até cursos superiores, embora sejam abrangidos por qualquer dos diplomas a serem aprovados, apesar de o projecto do PCP fazer uma ressalva nesse sentido, que, no entanto, não chega para a solucionar em todos os casos existentes.
Entendemos que numa primeira fase só deveriam ter acesso aos cursos especiais de formação de professores aqueles que estão vinculados ao MEIC. Assim garantir-se-ía uma quase total seriedade no processo em causa, exigindo-se porém uma contrapartida que nenhum dos projectos propõe. Em l975 e 1976 foram consideradas como habilitações próprias para a docência certos cursos universitários que permitiram a profissionalização de indivíduos que, após a obtenção do estágio, «mandaram o ensino às urtigas». Nessa altura outros, que continuam ainda a leccionar e que abraçaram a carreira docente, foram preteridos por aqueles, com todos os inconvenientes e prejuízos que daí resultaram. 15to, Sr. Presidente e Srs. Deputados, para dizer que há a considerar o real interesse do professor não habilitado quanto à preferência da carreira docente. É necessário criar legislação que permita ao Estado saber que faz um investimento que virá a ser aproveitado. Doutro modo é depauperar os cofres públicos sem quaisquer benefícios para a comunidade. Nenhum dos projectos de lei em discussão teve isto em conta e este ponto é, a nosso ver, importante.
O acesso aos cursos de formação por parte dos professores não habilitados do ensino particular, como propõe o PSD, viria avolumar ainda o negativismo das considerações que atrás desenvolvernos. Por isto mesmo não entraremos em linha de conta com outros aspectos sobre o disposto no artigo 7.º do projecto de lei apresentado pelo PSD.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ambos os projectos em discussão pretendem que os docentes sem habilitação própria mantenham os seus postos de trabalho. O projecto do PSD vai mais longe e pretende a manutenção do posto de trabalho na mesma escola enquanto o candidato não acabar a sua formação especial. Esta medida, sem qualquer contrapartida por parte do professor após a sua habilitação, parece-nos profundamente discriminatória.
Na verdade, nem os docentes já habilitados nem os próprios beneficiados, após a conclusão do curso, terão regalias que se comparem a esta. Um dos problemas mais agudos do ensino preparatório e secundário neste pais - e não apenas no que respeita aos professores - é a constante mobilidade a que todos eles estão sujeitos, com excepção dos efectivos.
Sabemos que isto é um problema de difícil solução que, julgamos, melhorará substancialmente com as alterações introduzidas por esta Assembleia ao Decreto-Lei n.º 342/77. Todavia, não entendemos correcto este benefício a um grupo de professores, só porque não reúne condições que outros já possuem para o desempenho de determinadas funções.
A melhoria das condições de estabilidade é uma reivindicação justa de todos os professores e não apenas de alguns. Aceitaremos de bom grado o proposto, mas enquadrado em legislação que não trate a uns como filhos e a outros como enteados.
A nossa relutância em aceitar outras regalias propostas pelo projecto do PSD vem nesta mesma linha de pensamento. Dificilmente são justificáveis horários especiais e reduzidos, julgo que remunerados como completos, e subsídios de deslocação a conceder aos docentes matriculados em cursos de formação de professores.
15to, a ser aprovado, constituiria uma medida profundamente discriminatória, já que inúmeros casos de professores habilitados sofrem, por inexistentes condições de alojamento, sangria no seu vencimento mensal em transporte, às vezes da ordem dos 50%.
Tal como na manutenção dos postos de trabalho, não nos agrada legislação restrita. Esta acentuará as injustiças, embora com a intenção de as atenuar. Nada teremos a opor a medidas que abranjam, embora com as necessárias limitações, a globalidade dos professores, quando em condições semelhantes se debatem com problemas afins.
O projecto de lei do PSD propõe ainda, para leccionarem nos centros de formação externa de professores, docentes possuidores de graus académicos diversificados. Já dissemos que não concordamos com o âmbito que o PSD propõe para estes centros, mas, ainda que a isso nada tivéssemos a opor, entendemos ser cientificamente inconveniente propor, para ministrar um curso de formação de professores de grau superior, professores efectivos do ensino preparatório e secundário.
As nossas preocupações referentes à preparação dos futuros docentes avolumam-se, pois, quando deparamos com o proposto no artigo 18.º do projecto de lei n.º 204/I.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pelo exposto entendemos que nenhum dos projectos equacionou convenientemente este problema, mesmo no que respeita a princípios gerais. O projecto do PSD apresenta logo no seu preâmbulo algumas incorrecções. A matéria de fundo de alguns artigos é pouco menos que utópica e por isso mesmo irrealizável; outros não entram em linha de conta com a realidade da vida escolar deste pais e, por isso, este projecto, a ser aprovado, iria levar às escolas, ao contrário do que se pretende, um mal-estar que só seria pernicioso para a melhoria da qualidade do ensino a que os Portugueses têm direito.
O projecto de lei do PCP, embora um pouco mais realista, apresenta também lacunas de fundo com as quais não estamos de acordo. É confuso quanto ao modo de apreciação que propõe para as equivalências das habilitações; sofre dos mesmos erros de visão quanto ao acesso de candidatos, não sabemos exactamente o que serão os centros de apoio que preconizam e não merecem o nosso consenso, salvo em condições especiais, os exames ad hoc que constam do seu artigo 3.º
Por tudo isto, o Partido Socialista não pode dar o seu voto favorável a nenhum dos projectos em discussão.
Esta Assembleia aprovou por unanimidade as alterações introduzidas ao Decreto-Lei n.º 342/78. Estamos convictos de que, na sequência do aprovado, o Ministério da Educação legislará sobre formação de

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professores sem habilitação própria. Pensamos que o Ministério respectivo estará interessado em resolver este agudíssimo problema no mais curto espaço de tempo. Se o não fizer, e se nenhum dos projectos merecer a aprovação desta Câmara, o Partido Socialista compromete-se a apresentar um projecto de lei que contemple as preocupações dos docentes sem habilitação própria, mas sem perder de vista os princípios gerais enunciados nesta intervenção, de molde a não cairmos em soluções parcelares que possam trazer mais prejuizos do que benefícios aos principais agentes da educação neste pais e à educação dos Portugueses, em especial.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É apenas para dar duas explicações suscitadas pela intervenção do Partido Socialista.
Em relação aos centros de apoio regional, que estão previstos no projecto de lei do PCP, a proposta para a sua criação parte de uma realidade que já existe. Várias Faculdades, concretamente as Faculdades de Letras e de Economia de Lisboa, têm centros de apoio regional em Faro e em Castelo Branco, onde se deslocam os seus professores, e,ao que sei, o ensino ministrado não é de modo nenhum de segunda qualidade.
No que se refere à contrapartida para os docentes que tiverem acesso aos cursos de formação, na explicação que dei ao Sr. Deputado do CDS que interveio creio que está respondida a questão levantada pelo Partido Socialista.
No respeitante à manutenção do posto de trabalho, o nosso projecto de lei vai no sentido de garantir ao docente - que necessariamente terá de estudar mais, de frequentar aulas - uma certa estabilidade por um período necessariamente transitório. Mas creio que na especialidade podemos considerar as diferentes hipóteses para que não advenham prejuízos para os restantes docentes e para que, como o Sr. Deputado afirmou, não haja filhos e enteados.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Abecasis para pedir esclarecimentos.

O Sr. Nuno Abecasis (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado António Magalhães da Silva: Pareceu-me entender que o seu grupo parlamentar partilha das preocupações que foram expressas pelo Sr. Deputado Adriano Rodrigues em nome do CDS, nomeadamente no que se refere à limitação global do tempo da recuperação global dos professores e não individual, à contrapartida que é necessário exigir para salvaguardar o bem comum, designadamente os bens públicos, e ao risco que se correria se se adoptassem as disposições previstas em qualquer dos projectos de lei em apreço de se vir a formar professores de segunda categoria. Riscos de que viriam a sofrer os próprios professores e, o que era bem mais grave, o sistema nacional de ensino, porque me parece que é importante pôr uma tónica no início desta discussão. Não tem qualquer justificação a apresentação, a discussão e a votação destes projectos de lei não só por causa dos professores, mas por causa dos alunos e da qualidade de educação que é ministrada ao povo português. Aliás, o meu colega de bancada Adriano Vasco Rodrigues teve a preocupação de salientar que não podemos, de modo nenhum, transformar as escolas nem o sistema de ensino em qualquer instituição de tipo assistencial, seja para os professores ou não seja.
Nós insistimos sobre este ponto: os beneficiários e aqueles para quem foi criado o sistema nacional de ensino são fundamentalmente os alunos, e os direitos deles é que é necessário preservar, custe o que custar.
Mas se eu bem entendi, como disse ao princípio, partilhamos deste mesmo tipo de preocupações. Pareceu-me contudo que quanto ao PS só nos fica uma dúvida: se o PS partilharia de um outro tipo de preocupações que nós temos. É evidente que se pode dizer que este problema devia estar - e tenho a certeza que estava - na primeira linha das preocupações de todas as equipas ministeriais da educação, pelo menos nos governos constitucionais. Mas também é verdade que isso não conduziu a que até hoje se tivesse legislado sobre um dos problemas que consideramos que é um nó fundamental, um nó vital, do sistema da educação em Portugal. E nada nos garante que isso venha a acontecer no futuro, por mais boa vontade que as equipas ministeriais, que se venham a suceder, tenham. E isto pela razão simples de que, enquanto não atingirmos uma verdadeira estabilidade democrática, as equipas governamentais haverão de estar pressionadas pelos acontecimentos do dia-a-dia, faltando-lhes tempo para meditar nos verdadeiros problemas de fundo.
Ora, nestas condições e, fundamentalmente, por esta razão, o Grupo Parlamentar do CDS não contrariará estes projectos de lei, embora não lhes possa dar a sua aprovação. Daí a razão da nossa votação, já anunciada, de abstenção.
Chamo a atenção do Grupo Parlamentar do PS para que, se estes projectos de lei vierem a ser aprovados, haverá a oportunidade de os corrigir no âmbito da Comissão de Educação, Ciência e Cultura. Se isso for feito com o empenho e o desejo de todos os grupos parlamentares transformarem estes projectos de lei naquela lei que, verdadeiramente, é necessária já hoje - porque já era ontem necessária - para o nosso sistema de ensino, será possível dotar este pais da solução para um dos seus problemas mais aflitivos. Para que tal aconteça, é necessário que a votação passe pela abstenção daqueles grupos parlamentares que, não concordando com as disposições agora apresentadas, sentem contudo a premência de resolver tão depressa quanto possível um problema desta gravidade.
Era sobre esta dificuldade de interpretação que eu gostaria de saber se o Grupo Parlamentar do PS, que partilhou de tantas das nossas preocupações, também partilha esta.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Roseta.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É para dar um curto esclarecimento à Câmara sobre o artigo 12.º do nosso projecto de lei.

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O Sr. Deputado do Partido Socialista fez muitas críticas de especialidade. Evidentemente, podemos concordar com umas, mas não com outras. Dentro do espírito da importante Lei n.º 9/79, sobre o ensino particular e cooperativo, não vimos motivo para se criticar a possibilidade de os docentes do ensino particular, sem habilitação própria, terem acesso a estes cursos. Mas não vamos agora discutir aqui esses pontos. Queria dar um esclarecimento sobre vários aspectos, nomeadamente sobre o artigo 12.º do nosso projecto de lei, porque o resto são críticas de especialidade, que na sede própria poderão ser aceites nalguns casos. Nós próprios afirmámos que o nosso projecto de lei não era obra perfeita, que estávamos abertos a contribuições de outros partidos. Mas o que interessa é o escopo fundamental subjacente a este projecto de lei, e que é, como acaba de ser dito, em primeiro lugar, melhorar a qualidade do ensino e, em segundo lugar - não apenas no sentido figurado, mas no sentido real -, não podemos esquecer que, efectivamente, houve docentes que se sacrificaram, que têm direitos adquiridos ou pelo menos expectativas legítimas e que adquiriram uma certa preparação, muitos deles à custa própria. Volto a dizer que o fundamental é melhorar a qualidade de ensino para que os alunos tenham todos, por igual - e não um pouco, como se fosse uma lotaria -, acesso a professores com uma preparação equivalente. Neste ponto estamos de acordo.
O Sr. Deputado do PS disse que nós queriamos dar direitos especiais a estes docentes. Isso não é bem assim. O n.º 1 do artigo 12.º do nosso projecto de lei diz que «os docentes inscritos nos cursos referidos no artigo 4.º têm assegurado o lugar de docentes na escola em que prestam serviço ao tempo da matrícula ou em uma das escolas da mesma área geográfica, durante o tempo de duração do curso, desde que obtenham aproveitamento». 15to é completamente diferente. Não se trata de um lugar cativo numa determinada escola. É um compromisso mútuo, digamos assim, entre o Estado e o professor que durante um determinado tempo estará numa determinada área. 15to porque, se ele for estudar para um curso destes no Porto e estivesse a prestar serviço em escolas da área do Porto, não faria sentido que fosse colocado em Faro. Isso seria a mesma coisa que impedi-lo de concluir este curso. Não se trata, portanto, de um lugar na mesma escola. Trata-se de algo realista para não permitir que por uma via enviesada a lei fique sem qualquer sentido.
Insisto na parte final do n.º 1 do artigo 12.º: «apenas durante o tempo de duração do curso» - em que, tal como, aliás, outros Srs. Deputados, eu já disse que deve ser dada uma determinada estabilidade -, «desde que obtenha aproveitamento». Se o professor não tiver aproveitamento, é evidente que o compromisso desaparece.
Julgo que esta perspectiva é muito diferente daquela do lugar privilegiado, cativo. Não é nada disso que se trata. É de qualquer coisa que impeça que todo o espírito da lei seja defraudado.
Concluía como o Sr. Deputado Nuno Abecasis: aqui a questão está em que este problema é urgentíssimo. Já devia ter sido resolvido ontem ou há muito tempo. Os decretos publicados em 1972 e em 1977 vieram dentro da estrutura clássica das Universidades e não resultaram. É preciso, realmente, ter em conta necessidades especiais e criar uma estrutura própria, chame-se-lhe centros de apoio ou outro nome qualquer.
Sem os centros de apoio, que nós queríamos que fossem centros externos de formação de professores, não é possível garantir uma regionalização destes cursos. E sem essa estrutura regionalizada, embora, como nós defendemos, integrada nas Universidades e nos Institutos Universitários, também esta lei não servirá para nada. Esta é a verdade. Como é possível um professor colocado numa área do interior estar simultaneamente nessa área, embora em regime especial, a dar as suas lições e a frequentar cursos nas Universidades hipercentralizadas no litoral - contra a nossa opinião? Temo-nos batido contra essa hipercentralização no litoral, mas ela é um facto. Assim, entendemos que esta existência de centros externos - chame-se-lhes centros externos ou centros de apoio - é indispensável para que a lei tenha um cumprimento real.
Quanto ao facto de prometer, para futuro, a apresentação de um projecto de lei, é evidente que isso não vem adiantar nada. Se continuamos de adiamento em adiamento, prometendo a apresentação de um diploma que, como neste caso, poderá ficar pendente durante largos meses antes de a lei ser publicada e entrar em vigor, corremos o risco de a situação morrer por si, com graves prejuízos não só para o ensino como para os professores sem habilitação própria.
Julgo que importa aprovar estes projectos de lei em discussão na generalidade e depois, na especialidade, chegar a um consenso sobre a melhor forma de dar execução cabal a este espírito, que julgo estar em todos nós, porque esta situação não se pode manter. Adiar é que julgo ser extraordinariamente pernicioso.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tern a palavra o Sr. Deputado Magalhães da Silva.

O Sr. Magalhães da Silva (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Nuno Abecasis: Nós partilhamos alguns dos pontos de vista que o CDS apontou na intervenção do Sr. Deputado Adriano Rodrigues e só não nos referimos mais prornenorizadamente ao projecto de lei que o CDS apresentou porque ele não foi discutido na reunião de hoje.
Por outro lado, dizemos ao Sr. Deputado Nuno Abecasis que o que está no fundo das nossas preocupações são de facto os alunos e o ensino em Portugal. Mas pensamos que não podemos atingir este objectivo se porventura não tivermos em conta as condições de quem vai ministrar este ensino, porque, se aparecem dificuldades de toda a monta, como hoje têm a maior parte dos professores não efectivos, e se não criarmos condições para que as dificuldades que eles encontram no quotidiano e de ano a ano se comecem a desvanecer, teremos imensas dificuldades para conseguir que os docentes tenham possibilidades de ministrar um ensino à altura daquele que pretende qualquer uma das forças políticas representadas neste Hemiciclo.

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O Sr. Nuno Abecasis (CDS): - Dá-me licença que o interrompa Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Nuno Abecasis (CDS): - Sr. Deputado António Magalhães da Silva, vejo que de facto conhece o nosso projecto de lei sobre esta matéria, embora não esteja em discussão, e certamente se apercebeu de que foi essa uma das preocupações que tivemos quando quisemos estabelecer um prazo limite para a recuperação de todos os professores e repartir anualmente o seu contigente, precisamente para minimizar os prejuízos causados ao sistema e, por outro lado, para dar aos professores que iam beneficiar dessa regalia todas as condições para se lhes poder exigir o máximo de preparação.
É exactamente na conjugação dessas preocupações que caba de se manifestar.

O Orador: - Sr. Deputado Nuno Abecasis, de facto até me referi, embora marginalmente, a esse aspecto. Mas o que temos de ter em conta é que o número de professores sem habilitação própria que está lançado no sistema é enorme e não apenas aquilo que seria o nosso desejo. Não tenho dúvidas de que todas as bancadas estão interessadas na resolução deste problema, mas o que devemos ter em conta é que consigamos o mínimo de coerência num projecto de lei que aprovemos para que ele seja realizável, porque de outra maneira não conseguiremos arranjar nada. Antes pelo contrário, vamos complicar ainda mais a situação existente, que é complexa, como quem está ligado ao problema sabe.
No que se refere ao Sr. Deputado Pedro Roseta, é evidente que não será difícil na discussão na especialidade conseguirmos uma melhoria de qualquer um dos projectos de lei em discussão. Mas parece-me que há aspectos de fundo que não foram tidos em conta no projecto de lei do PPD/PSD e com os quais teremos imensas dificuldades em concordar, pesem embora outros contributos valiosos que esse projecto de lei tem.
No que se refere à mobilidade dos professores não habilitados, que me pareceu ser um dos pontos de honra do Sr. Deputado Pedro Roseta, chamava a sua atenção para o facto de ser imensamente difícil conseguir isso para todos os professores não habilitados, porque são muitos -são possivelmente 10 000.
Também lhe direi que os professores habilitados, mesmo os que já têm estágio, estão sujeitos a essa mobilidade. Portanto, o grande problema que se coloca, e que nos preocupa bastante, é saber se vamos conceder-lhes condições que outros professores, até já com estágio, não têm. Se conseguirmos uma fórmula que não venha criar um tipo de discriminação em relação a estes docentes, com certeza que daremos a nossa aprovação neste particular.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Gabriel da Frada.

O Sr. Gabriel da Frada (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na impossibilidade de o Sr. Deputado Gonçalves Sapinho estar presente, vou ler uma intervenção preparada por ele, que representa a posição face a este assunto do Agrupamento Social-Democrata Independente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A relativa explosão escolar verificada nos últimos anos não foi precedida ou acompanhada de medidas que respondessem, de modo satisfatório, com meios materiais e humanos, a esse desafio. A carência de instalações adequadas, aliada à falta de docentes qualificados, tem constituído um factor de perturbação no ensino, cujo fim não se vislumbra. Tal como no presente e no passado, também no futuro iremos continuar, ou agravar, as actuais carências. Consta que o Ministério da Educação se prepara, e a nosso ver bem, para, a curto prazo, alargar o período de escolaridade obrigatória para nove anos. Se não houver uma planificação adequada que responda com celeridade às necessidades de equipamento e à preparação de docentes qualificados, a perturbação actual transforma-se em pandemónio. Referimos esta questão com a consciência de que muito do futuro deste pais se joga na educação, sector onde é necessário investir com prodigalidade. Se continuarmos a viver no reino da «ad-hocracia», empenhados em soluções casuísticas e cada vez mais avessas a uma correcta planificação, cumpriremos irremediavelmente a missão de nos afastarmos da Europa, ao mesmo tempo que vamos sonhando com a integração europeia.
Recorreu-se e irá recorrer-se, cada vez mais, a instalações provisórias; recorreu-se e irá recorrer-se a professores também provisórios, com reflexos notórios na qualidade do ensino, que só não é provisório porque é tomado como definitivo. A existência de professores sem habilitação académica e de professores portadores de habilitação; a distinção entre professores com habilitação própria e habilitação específica; o role de professores profissionalizados e não profissionalizados, de efectivos e não efectivos, de adjuntos e extraordinários de quadro, agregados, provisórios, etc., constitui, dentro da mesma classe profissional, uma miscelânea que provoca divisões e tensões e em nada contribui para a criação de um clima de estabilidade, imprescindível ao bom êxito escolar.
A dança das colocações verificada anualmente provoca, em milhares de docentes, um clima de insegurança incompatível com as exigências da profissão e lesivo dos interesses dos alunos. Urge encontrar soluções para esta situação quase caótica, facilitando os acessos aos estágios profissionalizantes, alargando os quadros, reduzindo o leque de categorias profissionais, possibilitando o completamento de habilitações e fazendo tudo isto de forma coordenada para que não haja lesão de legítimos interesses.
Uma das realidades do nosso ensino, por falta de previsão, traduz-se na existência de uma verdeira legião de professores sem habilitação. Constatada esta realidade, somos colocados perante a necessidade inelutável de remendar a situação. Até hoje foram ensaiadas duas tentativas de responder positivamente a este momentoso problema, e a apresentação nesta Assembleia de dois projectos de lei sobre o mesmo assunto constitui a prova de que o inêxito dessas tentativas são outra dura realidade a que corresponde uma perda de tempo irreparável.
Analisemos as novas propostas apresentadas pelo PSD e pelo PCP, respectivamente através dos projectos de lei n.ºs 204/I e 294/I, que visam o completamento de habilitações para docentes sem habilita-

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ção própria. Um e outro projectos optam claramente pela modalidade de formação, dos docentes em serviço. A solução óptima seria a de desafectar os docentes do serviço e facilitar-lhes a formação académica e profissional em plena dedicação. Mas entre o desejável e o possível vai uma grande distância, e porque não dispomos de elementos de análise que nos permitam avaliar a diferença de custos entre uma e outra solução, nem podemos medir as consequências que tem para os alunos a manutenção de professores nesta situação, aceitamos como mais realista a formação em serviço.
Um e outro projecto preocupam-se com a garantia de emprego para os docentes sem habilitação, tese a que também aderimos inequivocamente. Ambos os projectos têm como objectivo elevar a qualidade do ensino e promover a rentabilidade dos professores individualmente considerados e do corpo docente das escolas, objectivo que consideramos salutar.
Ambos os projectos se preocupam em criar para o Estado a obrigação de formar professores sem que exiga aos beneficiários directos uma contrapartida. Concluídos os cursos, os professores não se constituem na obrigação de permanecer nas fileiras do ensino, durante alguns anos, ou, em alternativa, indemnizar o Estado dos custos de uma formação. Por esta via, o Estado investe na formação de professores sem ter uma garantia de que eles o venham a ser efectivamente, durante algum tempo. Este problema é mais agudo no projecto de lei do PCP, dado que prevê a concessão de licenciaturas do tipo tradicional, enquanto o projecto de lei do PSD prevê licenciaturas em Educação, limitando assim a possibilidade de o professor escolher outra via profissional.
Outro problema com que nenhum dos projectos se preocupa é com o estabelecimento de prioridades no acesso aos cursos de formação e o seu relacionamento com as necessidades do sistema educativo. Mais uma vez vamos formar professores sern curarmos da planificação. O caso dos professores da instrução primária é suficientemente elucidativo, para que não se volte a cair em erros dificilmente corrigíveis. As carências de professores qualificados são iguais em todas as áreas?
Ambos os projectos, apesar de com nuances diversas, adoptam como princípio básico um sistema especial de formação, algo distinto do que foi exigido aos professores que já adquiriram habilitação própria. Sinceramente temos receio de que por esta via se caminhe no sentido da facilitação conducente a uma deficiente formação de professores que em nada dignificava a função docente nem o ensino em geral. Receamos também que no futuro sejam inevitáveis as discriminações resultantes de diferentes tipos de formação. Neste sentido, entendemos que o projecto do PCP, ao introduzir o exame ad hoc, o sistema de equivalências e os centros de apoio, que funcionarão como extensões das Faculdades, leva longe de mais a facilitação, com todas as consequências já apontadas.
Os dois projectos de lei divergem na opção pelo modelo de formação adoptado. O projecto do PSD opta, claramente, pelo novo modelo de formação de professores, assegurando-lhes, simultaneamente, a formação científica na ou nas disciplinas curriculares e a formação pedagógica e didáctica, isto é, adopta, em certa medida, o modelo de formação integrada, conjugando-o com a formação em serviço. 15to significa que o professor-aluno, ao concluir o seu curso de formação, tem logo acesso ao concurso para professores efectivos. A opção, enquanto tal, merece o nosso apoio, porque forma para um fim profissional específico. A ciência e a pedagogia interligam-se quer na aquisição de conhecimentos para o profissional do ensino, quer na sua correcta transmissão, quer ainda para uma melhor compreensão para o último destinatário, que é o aluno. Apesar disto, esta opção levanta-nos uma grave objecção: é que, sendo benéfica para os professores sem habilitação própria, pensamos que ela vai colidir com interesses legítimos de professores que, tendo habilitação própria obtida há anos no modelo de formação tradicional, ainda não tiveram acesso a estágio e, portanto, à profissionalização. Estes professores seriam ultrapassados, com ajuda oficial, pelos novos professores, o que não é justo. O Estado tem em relação àqueles, pelo menos, as mesmas obrigações. Esta situaçao só seria ultrapassável se os quadros fossem alargados e o acesso aos estágios desbloqueado. Dado que não se prevê que uma e outra situações estejam em vias de solução, seria muito injusto não estabelecer mecanismos que salvaguardassem a profissionalização e efectivação dos docentes com habilitação própria, adquirida no sistema de formação tradicional. A não garantia de que este problema é resolvido constitui um obstáculo importante para que dêmos o nosso voto favorável ao projecto do PSD. Depois de discutido na especialidade votaríamos contra se a situação referida não obtivesse solução favorável. Pretendendo fazer-se justiça a uns, abrern-se as portas para novas injustiças, aumentando as tensões entre a mesma classe profissional e deteriorando o clima das escolas.
O projecto de lei do PCP, ao contrário do do PSD, opta claramente pelo modelo de formação tradicional, ou seja, primeiro a formação académica e, necessariamente, o estágio, não apresentando portanto o inconveniente apontado ao projecto de lei do PSD. De qualquer modo, solucionada a objecção apontada, parece-nos ser, neste ponto, mais certa a opção do PSD, porque, dado que tem de haver um esforço do Estado e dos docentes para resolver o problema do completamento de habilitações, o modelo do PSD parece-nos ser o caminho mais curto e mais eficiente. O projecto de lei do PCP propõe-se resolver um problema e deixar outro em aberto, que é o problema do estágio. Sem quebra da qualidade e da exigência razoável, neste campo tem de haver inovação. Para além do mais, o projecto do PCP não prevê, expressamente, que a estes cursos de formação tenham acesso os professores do ensino particular. Pelo exposto entendemos não dever dar ao projecto de lei do PCP o nosso voto favorável.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A ausência de qualquer estrutura institucionalizada para formação de professores, a não existência de escolas ou institutos de ciências de educação, a acentuação de barreiras entre diversos tipos de formação, a carência total de uma planificação da educação que permita avaliar as necessidades e determinar as medidas práticas que permitirão satisfazê-las, a continuação des-

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te malfadado espírito do «vamos andando», a apetência para sermos profissionais do «remendo», leva-nos a encarar, com muito cepticismo, o problema da educação nacional. E nisto não basta dizer que a herança de cinquenta anos foi pesada; é preciso que se diga, cruamente, que até agora pouco ou nada se fez para a aliviar.
Paises há, dos mais diversos regimes, onde o professorado é um verdadeiro protagonista de toda a problemática da educação. Em Portugal, tem-se a impressão de que deixaram de recair sobre ele as primeiras e mais importantes atenções, como se tem a impressão de que a imagem do professor está social e profissionalmente degradada. Exigem-se do professor novos esforços, novos conhecimentos e uma maior dedicação, mas nada se descortina que venha em seu auxílio para responder positivamente a estas novas exigências.
O problema dos professores não reside apenas na insuficiência de qualificação, tem que ver também com a reciclagem permanente dos já qualificados, como tem que ver ainda com a cada vez mais exigente melhoria na qualificação dos candidatos a professor.

Aplausos dos Deputados independentes social-democratas.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pedi a palavra para colocar apenas duas ou três questões ao Sr. Deputado Gabriel da Frada.
Começando pelo fim, creio que o Sr. Deputado, na intervenção que produziu, colocou a seguinte questão: por que é que o PCP não prevê, no projecto de lei que apresentou, um sistema de estágios, um sistema de alargamento de quadros, etc. Se leu todo o projecto de lei, viu que o espírito que presidiu à sua apresentação não foi de modo nenhum o de querer resolver imediatamente o problema de toda a formação de professores - e aí teriam de haver os estágios, o alargamento de quadros, as escolas onde se fica, as questões do acesso, etc. -, mas tão-só resolver um problema que está a afectar uma grande massa de professores, que se vê impossibilitada de completar habilitações e de ter habilitações próprias. Se leu o último artigo do nosso projecto de lei, o artigo 6.º, pode constatar que se fixa ao Governo um prazo de noventa dias para apresentar à Assembleia da República uma proposta de lei sobre bases gerais de formação de professores. Em nosso entender é essa a sede em que deverá ser discutida toda a problemática que foi levantada pela intervenção do Sr. Deputado Gabriel da Frada.
A segunda questão é a seguinte: no princípio da sua intervenção reconheceu aos professores que não têm habilitações concretas que o facto de estarem há muito tempo ligados ao ensino lhes criou competências especiais para completarem os cursos, e passarem a ter habilitação própria. Neste sentido creio que também seria compreensível que aceitassem a solução por nós prevista, pois se é um professor - como já se faz hoje para o acesso à universidade - que demonstra estar qualificado numa certa matéria, por que não prever que ele, através de um exame ad hoc, possa demonstrar a sua capacitação, a sua qualificação, nessa mesma disciplina.
No que diz respeito aos centros de apoio regionais, já expliquei ao Partido Socialista a ideia que presidiu à apresentação dessa proposta, pelo que não volto a repetir.
No que se refere às equivalências, uma vez que propomos que os cursos a frequentar para completamento de habilitações não tenham de ser necessariamente os mesmos que o docente frequentou até então, terá de haver uma tabela de equivalências, que será definida pelas próprias Faculdades.
Considerando todas estas questões, considerando que temos um problema entre mãos que é preciso resolver, colocava à sua consideração a posição de voto que vão assumir face aos dois projectos em apreço.

O Sr. Presidente: - Igualmente para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Rodrigues.

O Sr. Adriano Rodrigues (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apoio na quase totalidade a intervenção do colega Gabriel da Frada. Estou de acordo com as suas preocupações, mas gostaria de lhe fazer uma pergunta em relação a uma afirmação - que me parece força de expressão - que se refere ao investimento periódico no ensino. Perguntava-lhe se nas condições actuais de contrôle da administração escolar, nas condições dos gastos das verbas que se investem no ensino, com estruturas em que faltam gestores devidamente preparados e em que os dinheiros são mal administrados, se o colega Gabriel da Frada pensa que esse investimento periódico poderá ser feito de uma maneira arbitrária de acordo com os nossos desejos de ver o ensino dotado com mais dinheiro, ou se - como em muitos casos de países do Terceiro Mundo que pensaram que a educação lhes iria resolver todos os problemas e por isso investiram sem contrôle de verbas, o que provocou situações económicas muito graves - exige uma reestruturação e uma preparação eficiente daqueles que estão ligados nas escolas à gestão dos gastos públicos.

O Sr. Presidente: -Tem a palavra o Sr. Deputado Gabriel da Frada.

O Sr. Gabriel da Frada (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em relação à questão posta pelo Sr. Deputado Jorge Lemos, devo dizer-lhe que a nossa afirmação foi no sentido de encarar o projecto de lei com vista a prosseguir toda uma formação de tipo tradicional, com o seguimento de estágios. Afirmámos, e já o tínhamos feito, que não podíamos fazer qualquer discriminação entre o novo pessoal docente, que há necessidade de preparar, e aquele que obteve uma formação de tipo tradicional, que passaría a não ter o mesmo número de regalias. Foi esta afirmação em relação ao conteúdo geral ...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Deputado, dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

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O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Donde é que o Sr. Deputado Gabriel da Frada retira, no projecto de lei do PCP, que vai ser concedido qualquer tipo de regalias aos docentes que frequentarem estes cursos de completamento de habilitações?

O Orador: - A não previsão do alargamento dos quadros que o permitem provoca a dedução.
De qualquer maneira, o nosso ataque ao projecto de lei do PCP vai no sentido de não concordarmos de maneira nenhuma como se vai resolver o problema da avalancha de gente que se candidatou à docência sem um mínimo de condições e sem um mínimo de motivação vocacional para a docência - muitas vezes fazem-no para fugir ao desemprego -, visto que se pode cair facilmente numa situação de chamar para o ensino gente que não oferece as condições de actuação pedagógica capaz, o que provocará uma influência negativa no ensino e nos próprios alunos.
Em relação ao Sr. Deputado Adriano Rodrigues, creio que colocou duas questões na mesma pergunta. Uma coisa é a maneira anómala como funcionam os serviços estatais e a maneira como se gastam indevidamente os poucos dinheiros que podemos dispor para a educação e a outra - e essa defendemo-la acerrimamente - é a necessidade de se investir ao máximo numa preparação autêntica de todo o pessoal docente que ofereça condições de dar às nossas crianças, aos nossos educandos, ao pessoal que estamos a formar para o futuro, todas as possibilidades e garantias. Creio que não devemos ter limites no investimento. Se as coisas funcionam mal a nível estatal, há que remediar a situação.

O Sr. Adriano Rodrigues (CDS): - Dá-me licença, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Adriano Rodrigues (CDS): - O Sr. Deputado conhece o projecto que apresentámos a esta Câmara?

O Orador: - Não conheço, uma vez que não faço parte da Comissão de Educação, Ciência e Cultura.

O Sr. Adriano Rodrigues (CDS): - É pena porque talvez chegássemos em muitos pontos a acordo e talvez complementarizássemos os nossos pontos de vista.

O Orador: - Terei todo o gosto em conhecê-lo e, se o merecer, dar a minha adesão.

O Sr. Presidente: - Uma vez que não há mais nenhum orador inscrito, passamos à votação dos projectos de lei.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para pedir uma interrupção dos trabalhos com vista a considerarmos a posição do nosso voto.

O Sr. Presidente: - Como se aproxima a hora regimental do nosso intervalo, fazemos de imediato a interrupção. Retomamos os trabalhos às 18 horas.
Está suspensa a sessão.

Eram 17 horas e 30 minutos.

A seguir ao intervalo assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Martins Canaverde.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.

Eram 18 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai proceder-se à votação na generalidade do projecto de lei n.º 204/I, sobre formação de docentes, apresentado pelo PSD.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, votos a favor do PSD e as abstenções do CDS, do PCP e dos Deputados independentes sociais-democratas.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai agora proceder-se à votação na generalidade do projecto de lei n.º 294/1, também sobre formação de docentes, apresentado pelo PCP.

Submetido à volaçdo, foi aprovado, com votos a favor do PCP e as abstençôes do PS, do PSD, do CDS e dos Deputados independentes sociais-democratas.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou fazer uma curta declaração de voto para não atrasar muito os trabalho deste Plenário.
O PCP congratula-se por o seu projecto de lei ter sido aprovado, não só por corresponder à aprovação de uma iniciativa do PCP, mas porque considera ser o primeiro passo para a resolução dos problemas que se colocam neste momento aos docentes sem habilitação própria.
Pensamos que a Assembleia terá agora de fazer um esforço no sentido de - se possível - votar em votação final global a lei sobre a matéria em discussão ainda nesta sessão suplementar.

O Sr. Presidente: - Também para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães da Silva.

O Sr. Magalhães da Silva (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pelos motivos já amplamente tratados na minha intervenção, o Partido Socialista não pôde dar o seu voto favorável a nenhum dos projectos de lei agora votados. A matéria em discussão é, a nosso ver, complexa e não se compadece com paliativos, ainda que, não o duvidamos, as intenções que presidiram à apresentação destes projectos de lei não nos mereçam quaisquer reparos. Julgamos, porém, que tentar tratar parcelarmente o problema é adiá-lo e não resolvê-lo, pois que as correcções a introduzir num determinado sector vão acentuá-las certamente noutros. Há que encarar globalmente a formação de professores, a estabilidade dos mesmos e o acesso que todos possam vir a ter à habilitação completa para exercerem a sua profissão, com os direitos e deveres inerentes à carreira que abraçam.
Só assim poderemos exigir, depois de dar, um ensino de qualidade, em que todos, estou certo, estamos interessados.
Foram estas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, as motivações que condicionaram o nosso voto.

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O Sr. Presidente: - Ainda para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Rodrigues.

O Sr. Adriano Rodrigues (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O CDS absteve-se na votação dos projectos de lei n.ºs 204/I, do PSD, e 294/I, do PCP, sobre formação de docentes, pelo facto de não querer travar a resolução de um problema tão importante como o que agora acabou de ser debatido, embora tivesse discordado de alguns pontos fundamentais, que espera possam ser corrigidos ou alterados na especialidade.
Sentindo a importância do problema em questão, avançou o CDS também com um projecto de lei, que não foi ainda agendado.
A profissionalização dos professores e a sua eficiente preparação é um problema candente de interesse nacional e por essa razão formulamos o voto de que tal situação seja remediada com brevidade, a fim de melhorar o rendimento escolar e a preparação da juventude do nosso país, permitindo-lhe um trabalho eficiente na construção do Portugal de amanhã.

O Sr. Presidente: - Também para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Américo de Sequeira.

O Sr. Américo de Sequeira (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Qualquer construtor minimamente dotado de bom aviso sabe que a segurança do edifício que pretenda alevantar depende da solidez dos alicerces e da qualidade dos materiais não lhe sendo, por outro lado, despicienda a competência dos artífices que hão-de pôr por obra o projecto idealizado.
Penso que ninguém contesta esta comezinha verdade e dela me permito fazer a seguinte transposição: o grande edifício que todos nós projectamos, e, certamente, queremos alevantar, é o de uma sociedade solidamente culta, solidamente justa, solidamente livre. Dessa solidez são condições a cultura, a qualidade da educação e dos bons agentes, bem como o rigor científico do ensino a produzir. Aí reside uma componente essencial e determinante do futuro que havemos de ter, do país que havemos de ser.
Ora, nos últimos anos, as nossas Universidades têm vindo a debitar a granel licenciados e bacharéis que, dada a exiguidade da procura no mercado do trabalho, ao sector do ensino vêm parar, como se de actividade se trate onde caibam todos os indiferenciados e excedentes de outras áreas. Acresce juntarem-se aí a um mundo de gente que no ensino trabalha sem, para tanto, ter adquirido ainda a habilitação própria e, muito menos, a profissionalização. O que é também consequência, por outro lado, da exploração escolar a que se tem vindo a assistir nesta década de setenta.
O que fica dito configura, a traços largos, uma realidade que é imperioso modificar. E a nós, Deputados desta Câmara, cumpre a tarefa exaltante de estudar e descobrir os melhores instrumentos legislativos que hão-de abrir o caminho e a possibilidade daquela necessária transformação.
Revalorizar a função dos docentes e assegurar deles o recrutamento qualificado pressupõe a criação de novas condições legais que lhes permitam complementar habilitação cientifica adequada e ascender ao estágio pedagógico, este a carecer de urgente revisão no seu actual sistema, como de ver removidas, em termos de justiça, as dificuldades que rodeiam os seus acessos.
Parece-me inadiável, por outro lado, a ampliação dos quadros para acolhimento dos profissionalizados. 15to se impõe se queremos preservar, como cumpre que aconteça, a dignidade dos professores, assegurar o seu prestígio pessoal, dar-lhes uma situação material e moral consentânea com o seu valor técnico e humano e o lugar eminente que têm na vida nacional. 15to se queremos, enfim, ter um ensino de qualidade.
Providenciar para que àqueles que hão-de ser os formadores de gerações se proporcione uma formação tão completa e correcta quanto possível é um repto que se nos lança e a que importa responder com decisão e com sentido de justiça.
Não sendo tarefa simples, deve sê-lo, no entanto, mobilizadora do nosso sentimento de responsabilidade.
Os projectos que, sobre a matéria, o Partido Social-Democrata e o Partido Comunista Português trouxeram a esta Câmara e hoje estiveram em discussão na generalidade constituem um bom estímulo, se não mesmo um bom ponto de partida, para as acções que importa empreender.
Projectos, porém, são sempre, pela sua própria natureza, perfectíveis, e a perfeição possível deve ser uma salutar ambição de todos e em tudo, mormente no que concerne à qualidade do ensino e da educação.
Entendem os sociais-democratas independentes que os dois projectos de lei que aqui estiveram em análise são bastante deficientes e pouco imaginativos, mas, de qualquer modo, susceptíveis das reais e indispensáveis melhorias em sede de comissão.
E, porque na matéria vertente é preciso e urgente arrancar para uma nova situação, decidimos não recusar, na generalidade, nenhuma das duas iniciativas.
Oxalá que, na especialidade, onde daremos o nosso concurso, se possa conseguir o melhor. Tomaremos então, e aí, a nossa posição definitiva.

Aplausos dos Deputados independentes sociais-democratas.

O Sr. Presidente: - Ainda para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Roseta.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quer se queira quer não, foi o PSD quem desencadeou este processo legislativo em Fevereiro deste ano, com a apresentação do seu projecto de lei. Foi também o PSD que, no uso dos seus direitos regimentais, marcou para hoje a ordem do dia. Sem o PSD os professores não teriam visto, nem veriam, resolvidos os seus problemas tão cedo, pese embora os efectivos adiamentos que o PS pretendia.

Vozes do PSD: - Muito bem!

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O Orador: - Daqui não se pode fugir. Só quem não quiser ver é que poderá contestar essa realidade.
Tratava-se de um problema urgente e grave, que tinha tido soluções deficientes nos termos de dois decretos-leis, um de l972 e outro de l977, que não serviam e que o nosso projecto de lei, claramente inovador, vinha modificar. Tivemos em vista, ao apresentar este projecto de lei, a posição dos sindicatos de professores, como é evidente. Igualmente tivemos em vista, como não podia deixar de ser, a necessidade de não esperar mais tempo, de não esperar por um perfeccionismo absoluto - como parece ser às vezes o vezo da bancada do Partido Socialista -, para pôr cobro a uma situação que põe em risco o ensino de qualidade e viola direitos adquiridos e expectativas legítimas de certos docentes. Não se poderia permitir mais adiamentos. Ora, não fora esta nossa dupla iniciativa e não teria sido votada nesta sessão esta matéria. Quanto a este ponto não há resposta que valha, pois, a não ser assim, passaria mais um ano lectivo sem que este problema fosse encarado. Negar este aspecto é negar a evidência.
É evidente que lamentamos que certo sectarismo tenha levado a que o nosso projecto de lei não tenha sido aprovado por esta Assembleia. De qualquer modo, durante a discussão na especialidade daremos o nosso contributo para que surja um projecto de lei realista e simultaneamente inovador.
Quanto ao projecto de lei apresentado pelo Partido Comunista Português, a nossa abstenção foi ditada pelos motivos que já grosso modo indicámos. Pensamos que esse projecto de lei não é suficientemente inovador, que ainda está muito preso ao modelo anterior ao entregar, sem mais, às Universidades - embora através de uns centros de apoio semidescentralizados - o complemento da formação de docentes.
O projecto de lei apresentado por nós vai mais longe. Pretendíamos que fossem formados dentro das Universidades os centros de formação externa de professores, que teriam embriões ou subdelegações regionalizadas e descentralizadas. Ao contrário do que aqui foi dito, pretendíamos salvaguardar os direitos destes docentes sem pôr em causa os direitos dos professores com habilitações.
Para irmos mais longe ainda, pretendiamos preparar o Exame de Estado e facilitar os estágios, promover cursos de especialização em áreas educacionais específicas para todos os professores.
Desta forma, com as atribuições que prevíamos no artigo 3.º do nosso projecto de lei para os docentes, não podemos ser acusados de querer dificultar a vida aos outros professores que não fizeram o Exame de Estado ou que ainda não fizeram o estágio. Pelo contrário, o PSD pretendia, harmoniosamente e sem estar a remeter para as calendas gregas, salvaguardar os direitos de todos eles.
Não podemos deixar de manifestar de passagem alguma estranheza pela posição assumida pelo Sr. Deputado Gonçalves Sapinho - que aliás se encontra ausente - na intervenção que elaborou. Na verdade, o Sr. Deputado Gonçalves Sapinho foi um dos subscritores do projecto de lei n.º 204/I. Penso que este Sr. Deputado deveria ter feito essas críticas nessa altura, pois este projecto de lei é dele, tal como é meu e de outros Deputados.
Para além desta manifestação de estranheza, queria ainda dizer que o projecto de lei do CDS - embora ainda não votado - tem algumas coisas úteis, mas tem também alguns aspectos com os quais nós não concordamos. Penso que, se vier a ser aprovado, o projecto de lei do CDS atirará para as Universidades docentes do ensino universitário a quem faltam algumas disciplinas para terminarem os cursos, disciplinas estas que na maior parte dos casos já não são leccionadas, o que daria origem a lançar-se a confusão nas Universidades. Neste aspecto, o nosso projecto de lei era inovador, pois que, com as ajudas que o Estado poderia dar a estes docentes no sentido de completarem a sua formação, era lógico que eles deveriam ter acesso exclusivamente a uma licenciatura em Educação para depois poderem continuar a leccionar. Foi neste campo que esses professores adquiriram a sua experiência e não tem sentido dar-lhes todas estas vantagens para depois eles irem exercer uma qualquer outra profissão.
É precisamente o facto de estes centros visarem apenas este aspecto que nos levou a estabelecer no artigo l2.º do nosso projecto de lei a garantia dos lugares para os professores e, sobretudo, a garantia de que estariam numa determinada área geográfica e não na mesma escola, como há pouco já esclareci um Deputado do Partido Socialista. Estes professores teriam toda a garantia de permanecerem numa determinada área, desde que obtivessem aproveitamento.
Se o projecto de lei que foi aprovado não vier a ser completado e, em certo ponto, corrigido na discussão na especialidade, o PSD pensará que estivemos aqui a fazer chover no molhado, pese embora as boas intenções de todos os partidos, e que não se teve a coragem de inovar, remetendo-se, pelo contrário, mais uma vez, para as calendas gregas. Andamos sempre à procura dos projectos globais superperfeitos...
Desta forma, continuarão as Universidades assoberbadas por mais este afluxo de candidatos a uns determinados cursos e não será possível resolver o problema.
Esperamos que durante a discussão na especialidade haja o bom senso de superar certos chauvinismos e de fazer algo útil, que daqui não resulte claramente.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, encontra-se na Mesa um requerimento do PCP para que a discussão e votação na especialidade do projecto de lei n.º 294/I seja feita em comissão no prazo de cinco dias.
Se não houver oposição, considera-se aprovado.

Pausa.

Entramos agora na discussão na generalidade do projecto de lei n.º 279/I, relativo à actualização das remunerações dos titulares dos cargos municipais, apresentado pelo PS.
Para proceder à leitura do relatório da Comissão de Administração Interna e Poder Local, tem a palavra o Sr. Secretário Pinto da Silva.

O Sr. Secretário (Pinto da Silva): - O relatório da Comissão de Administração Interna e Poder Local é o seguinte:

No dia 13 de Julho de 1979, reuniu a subcomissão encarregada do exame do projecto de

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lei n.º 279/I, relativo à actualização das remunerações dos titulares dos cargos municipais.
O projecto foi considerado em condições de subir ao Plenário e todos os representantes dos grupos parlamentares declararam reservar as suas posições para o Plenário, pelo que se considerou dispensável nova reunião da 11.ª Comissão.

Palácio de São Bento, 13 de Julho de 1979. - O Presidente da Comissão de Administração Interna e Poder Local, Carlos Martins Robalo. - A Subcomissão: António J. Sanches Esteves - João Gomes de Abreu de Lima - António Marques Pedrosa - Afonso de S. F. de M. Guedes.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o projecto de lei referido.

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado António Esteves.

O Sr. António Esteves (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: o Partido Socialista apresentou o projecto de lei n.º 279/I, que vem actualizar as remunerações dos titulares dos cargos municipais, e pensa que o referido projecto se justifica por si próprio e não precisa, digamos, de uma apresentação especial.
Efectivamente, as remunerações auferidas actualmente pelos autarcas foram fixadas e iniciaram-se com os quantitativos actuais em 1 de Janeiro de 1977. Posteriormente, como é do conhecimento público, houve já dois aumentos na função pública e todos aqueles que auferem desses vencimentos viram, ao longo destes quase três anos, os seus vencimentos actualizados.
Assim, passaria muito rapidamente a dar alguns esclarecimentos sobre o sentido das alterações que propomos.
A função pública sofreu em 1978 um aumento nos seus vencimentos que rondou pelos 17,3 %. Em 1979 o mesmo aumento foi da ordem global dos l5 %. Sendo assim, pretendemos que o mesmo tratamento seria de aplicar às remunerações dos titulares dos cargos municipais. Por isso, no nosso projecto de lei propomos que o aumento que se pretende atribuir àqueles vencimentos seja o somatório das duas percentagens de que foram objecto as actualizações dos vencimentos da função pública em 1978 e 1979.
Quanto ao critério da retroactividade previsto no artigo 3.º do projecto de lei também estabelecemos um critério paralelo àquele que foi adoptado na actualização deste ano dos vencimentos da função pública.
Acrescentamos ainda um outro artigo, que prevê a actualização automática destas remunerações sempre que os vencimentos da função pública sejam actualizados. 15to por uma razão muito simples: é que de alguma maneira, talvez por um pouco de incúria ou o deixar arrastar-se a questão, estes vencimentos estiveram intocados durante quase três anos. Para evitar isso, preconizamos que, sempre que se verifique um aumento na função pública, as remunerações dos autarcas devam ser também aumentadas, através da aplicação do coeficiente que seja a média geral do aumento da função pública.
O outro artigo, que se traduz também numa inovação que parece perfeitamente justa e adequada, é aquele que prevê a aplicação a estes titulares dos cargos municipais de um regime de previdência social. Esse regime é instituído em termos paralelos àqueles que já funcionam para os Deputados da Assembleia da República e que consta do Estatuto dos Deputados e que lhes dá a possibilidade de optarem pelo regime da função pública que seja o mais favorável e que inclui, nomeadamente, como é sabido, os benefícios da ADSE e outras garantias de segurança social previstas para a função pública.
Todavia, embora sejam estas as linhas gerais que consagramos no projecto de lei, verificámos posteriormente que, nomeadamente o artigo 1º, tal como consta do projecto inicial, se podia prestar a alguma confusão, nomeadamente porque os diplomas dos aumentos da função pública não previam no seu articulado esses montantes das percentagens aplicadas.
Assim, entendemos reformular o artigo 1.º do projecto de lei em discussão dando uma redacção nova à tabela A anexa à Lei n.º 44/77, de 23 de Junho, que é reformulada em termos de o aumento destes vencimentos ser conseguido através da aplicação das taxas somadas do aumento médio da função pública em 1978 e 1979.
Depois destas considerações, gostaria apenas de dizer que esta solução não virá a pôr termo a algumas situações de injustiça que se verificam na dita tabela A anexa à Lei n.º 44/77. Há remunerações que estão desadaptadas. O Partido Socialista tentou em tempos fazer uma reformulação de todo o sistema; no entanto, as condições não foram favoráveis a essa nossa iniciativa legislativa e acabámos por, para evitar o pior, propor esta solução que de alguma maneira vem remediar.
Todavia, esta solução não obsta a que, na primeira oportunidade, a Assembleia da República volte a debruçar-se sobre o problema para então fazer uma apreciação de fundo e corrigir as eventuais anomalias que sejam consideradas na actual tabela.
Pensamos que o objectivo que propomos é mínimo, assim como pensamos que a dignificação do Poder Local exige que o grande trabalho e as responsabilidades que se pedem aos autarcas devem ser remunerados de uma maneira compatível com esses trabalhos e essas responsabilidades. E na primeira oportunidade estaremos dispostos a fazer uma reformulação total desta questão.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Pinto.

O Sr. Fernando Pinto (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Iremos votar favoravelmente o projecto de lei n.º 279/I, apresentado pelo PS, porque é, desde já, uma questão de justiça.
Os titulares dos cargos municipais parecem desde logo ter nascido mal neste país. E parece que assim nasceram porque só viram definida a sua situação de remuneração a partir de Junho, quando afinal foram eleitos em Dezembro do ano anterior. E nes-

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sa altura viram também ainda limitadas as suas possiblidades ao serem estabelecidas na Lei n.º 44/77 algumas incompatibilidades que não vinham na Lei Eleitoral anterior e que deu origem aos seus cargos.
Pensamos que é de toda a justiça fazer-se hoje esta reactualização, mas, mais importante do que isso, será rever toda a Lei n.º 44/77, de 23 de Junho, para que, de uma vez por todas, se dignifiquem os cargos dos presidentes das câmaras e dos vereadores. E, para nós, a dignificação vai não só no sentido da remuneração, que também é um dos modos de dignificar a função, mas nas prerrogativas que a cada um se dá, e, fundamentalmente, fazendo com que os presidentes das câmaras não estejam amarrados a qualquer espécie de horário, conforme a Lei n.º 44/77 acaba por estipular ao fazer uma distinção entre regime de permanência e regime de não permanência, ao criar também por essa via e pela via da remuneração incompatibilidades que não devia ter criado.
Por tudo isso, pensamos que a Lei n.º 44/77 deve ser profundamente reformulada, deve ser profundamente revista. Mas como agora se trata apenas e só de rever a tabela anexa à Lei n.º 44/77, nós nada temos a opor e iremos, por isso, votar favoravelmente.
Aplausos dos Deputados independentes sociaisdemocratas.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como não há mais ninguém inscrito, passamos à votação na generalidade do projecto de lei n.º 279/I - Actualização das remunerações dos titulares dos cargos municipais, apresentado pelo PS.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do CDS e dos Deputados independentes sociais-democratas e a abstenção do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Moura Guedes.

O Sr. Moura Guedes (PSD): - Sr. Presidente Srs. Deputados: Não há dúvida de que os montantes das retribuições dos titulares dos cargos municipais, fixados pela Lei n.º 44/77, de 23 de Junho, se encontram profundamente desactualizados, não correspondendo hoje de forma alguma nem à importância dos cargos nem à responsabilidade das funções nem ao prestígio que todos desejamos de que se revista o Poder Local.

Uma voz do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Há dois anos, como já aqui foi referido, desde que foi votada a Lei n.º 44/77, que se não faz qualquer actualização, não obstante a função pública já ter entretanto sofrido dois aumentos. 15to conduz a uma evidente situação de injustiça relativa que poderia, a manter-se, ter gravíssimas consequências de toda a ordem.
Nós tínhamos dúvidas de que o método preconizado para a fixação das retribuições, no artigo 1.º do projecto de lei n.º 279/I, do PS, não pudesse conduzir a algumas indeterminações, algumas dúvidas, algumas confusões, tal como vinha, efectivamente, redigido na sua formulação original.
Pensamos que estas propostas de alteração, de que há pouco tivemos conhecimento na minha bancada, vêm efectivamente dar de certo modo resposta a essas dúvidas, uma vez que vêm fazer uma determinação quantitativa concreta, que nos parece altamente vantajosa.
Pensamos que não é o projecto de lei que acabámos de votar na generalidade que vem resolver toda a problemática suscitada pela Lei n.º 44/77 relativa ao Estatuto dos Gestores Municipais. Ficam muitos problemas pendentes que urge apreciar nesta Câmara, mas também nos parece que efectivamente o problema da fixação das respectivas retribuições era sem dúvida nenhuma o problema de carácter mais agudo e mais urgente, porque era nele que residia a fonte principal da situação de injustiça em que se encontravam esses gestores autárquicos.
Congratulamo-nos, por isso, com a aprovação na generalidade do projecto de lei em discussão; cotámos-lo tendo em atenção estas considerações sem levantarmos portanto quaisquer outros problemas, tanta era a urgência que víamos na sua aprovação.
Daí a razão do sentido do voto do Partido Social-Democrata.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Também para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado António Pedrosa.

O Sr. António Pedrosa (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português está evidentemente de acordo com a necessidade de proceder à actualização das remunerações dos eleitos das autarquias, pelo que obviamente não se poderia opor ao projecto de lei em discussão. Trata-se de vencimentos fixados com efeitos a partir de 1 de Janeiro de 1977; são conhecidos os efeitos corrosivos do poder de compra provocados pelas altas taxas de inflação verificadas nos últimos dois anos, pelo que é indiscutível providenciar-se no sentido de resolver os problemas daí decorrentes.

A posição de abstenção do PCP não se justifica assim na nossa reserva ou oposição à ac'tualização agora proposta, independentemente da nossa apreciação critica em relação aos critérios seguidos, que não estão em questão.
A nossa posição de abstenção justifica-se, sim, pela nossa discordância em relação às soluções contidas na Lei n.º 44/77, de 23 de Junho, soluções que constituem a matriz onde se insere a presente actualização.
Abstivemo-nos na votação final global do texto da Lei n.º 44/77, porque discordávamos e discordamos do critério de classificação dos municipios adoptados, que não passa da adopção pura e simples dos critérios do Código Administrativo marcelista; discordávarnos é discordamos das discriminações que resultam para os eleitos das autarquias da adopção de tais critérios e que pão encontram justificação séria e suficiente em diferenças de empenhamento e em diferenças de níveis de responsabilidade.
A posição-de abstenção que definimos na generalidade mantê-la-emos na votação na especialidade, pelas mesmas razões.

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Entretanto, afirmamos mais uma vez a nossa disponibilidade e o nosso empenho em proceder a uma revisão de fundo desta matéria, no sentido de se encontrarem soluções adequadas que tenham em conta o esforça e a dedicação que, em condições de igual responsabilidade, os eleitos da autarquias desenvolvem nas autarquias locais de norte a sul do País.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Abreu Lima, também para uma declaração de voto.

O Sr. Abreu Lima (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Centro Democrático Social votou favoravelmente o projecto de lei n.º 279/I, apresentado pelo Partido Socialista em 6 de Junho do corrente ano, que tem por objecto a actualização das remunerações dos titulares dos cargos municipais, porque considera que tal projecto de lei encerra o mínimo de justiça devida aos autarcas municipais, que continuam no exercício de funções com as suas remunerações inalteradas desde as datas de posse ou de entrada em funcionamento, enquanto a generalidade de vencimentos neste país, tanto no sector público, como no privado, tem beneficiado de sucessivas actualizações.
O nosso voto favorável não significa nem representa uma satisfação plena e cabal, ou uma adesão inquestionável e total à solução proposta pelo Partido Socialista, pois entendemos que as remunerações dos titulares dos cargos municipais deverão ser corrigidas nos seus valores base e terão de ser avaliadas, medidas e ponderadas em função de uma série de condicionalismos, factores e circunstâncias que não podiam ser suficientemente conhecidos ao tempo em que foi publicada a Lei n.º 44/77, de 23 de Junho, que definiu os subsídios que lhes estão a ser atribuídos, nem se tinha ainda consciência do volume das receitas municipais resultantes da autonomia financeira das autarquias locais, aprovada por esta Assembleia da República em 12 de Outubro de l978 e finalmente instituida com a publicação oficial da Lei n.º 1/79, de 2 de Janeiro do ano em curso.
Com o actual projecto de lei, que apenas corrige os subsídios aprovados pela Lei n.º 44/77, através da aplicação de um factor correspondente à acumulação da média dos aumentos verificados para a função pública provenientes do Decreto-Lei n.º l06/78 e da nova tabela de actualização a publicar em 1979, continuam a subsistir as deficiências da Lei n.º 44/77.
A Lei das Finanças Locais criou novas condições de trabalho, donde resultou, necessariamente, uma muito maior responsabilidade efectiva para os presidentes das câmaras e para os vereadores em regime de ocupação completa, na medida em que põe praticamente à sua disposição recursos financeiros muito mais elevados, que deverão ser utilizados depois de uma profunda e minuciosa análise dos múltiplos problemas a resolver e depois de justificar, circunstanciada e fundamentadamente, as opções a tomar e a orientação a seguir, entre o leque das possíveis soluções que o município pode adoptar.
O estado de permanente atenção e a situação de constante cuidado em que os autarcas, que exercem as suas funções a tempo inteiro, se encontram ao
longo do seu mandato, quer pelas normais e naturais exigências dos munícipes, que na grande maioria dos concelhos vivem em situação de absoluta precaridade em relação às necessidades primárias e fundamentais, quer em face do sistemático contrôle, para não dizer, como sucede em alguns casos, da feroz e pertinaz oposição dos colegas de outros partidos, obriga aqueles autarcas a um enorme esforço, a um cuidadoso estudo dos problemas e a uma sistemática ponderação e avaliação de vida municipal, cuja dimensão e responsabilidade não é de modo algum compensada ou retribuída pelos subsídios fixados pela Lei n.º 44/77, mesmo depois de actualizados pelo factor que o projecto de lei, que acabamos de aprovar, vem estabelecer.
Entendemos que este problema da remuneração dos autarcas devia ser revisto de forma diferente daquela que o projecto de lei n.º 279/I agora introduz, mas compreendemos também que nas actuais circunstâncias em que se encontra a Assembleia da República, a escassos momentos da sua dissolução, se limite mais a um simples remédio de uma situação de injustiça do que à institucionalização de uma forma mais correcta, equilibrada e justa de pagamentos aos titulares dos cargos municipais.
As possibilidades criadas e atribuídas pela Lei das Finanças Locais às Câmaras Municipais vem permitir-lhes a inversão de condições sociais, sanitárias, educacionais, económicas e culturais do País, mas esta inversão não se consegue, apenas, pela circunstância de os municípios passarem a dispor dos meios financeiros necessários; é condição concomitante que, pelo menos, os autarcas a tempo inteiro sejam pessoas aptas, qualificadas e idóneas para que os municípios possam dar a melhor utilização às receitas municipais.
Ora estas qualidades e valimentos merecem uma retribuição adequada, como acontece nos muitos sectores de actividade e da vida nacional, nomeadamente nas empresas públicas, e as câmaras municipais têm de entrar num ritmo e sistema de funcionamento que muito as deverão assemelhar da vida empresarial, abandonando a vida anquilosada e a actuação quase acéfala de algumas delas.
A administração municipal não pode continuar a ser gerida à custa do permanente sacrifício, da constante generosidade e da continua abnegação dos gestores, sem uma correspondente e adequada compreensão económica; esta situação, esta mentalidade e tais critérios cansam, saturam e afastam as pessoas válidas, úteis, lúcidas e qualificadas para a gestão municipal, que hoje não se compadece com a simples boa vontade e a abnegação dos medianos, mas envolve, necessariamente, conhecimentos de técnica e de administração que terão de ser justamente retribuídos.
Só assim se conseguirá e assegurará uma gestão municipal à altura das necessidades locais e do interesse das populações.
Chegou a hora de valorizar as câmaras municipais; é tempo de exigir aos municípios que reduzam as carências de toda a ordem na generalidade dos concelhos deste país; é tempo de os partidos principiarem a escolher pessoas qualificadas, pelo menos as que hão-se trabalhar a tempo inteiro, para dirigir e administrar as autarquias locais e não simples ca-

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ciques. Mas tudo isto só se conseguirá desde que se
garanta uma adequada compensação pelo exercício
de tais funções.
Por todas estas razões votámos a favor do projecto de lei n.º 279/I, que corrige o montante dos subsídios presentemente em vigor para as diversas
classes de gestores municipais; mas votámos mais
com a consciência de que a solução é mais um remendo do que com a convicção de que ela é uma reforma adequada, correcta e ajustada daquilo que
os gestores municipais devem auferir.

Aplausos do CDS e de alguns Deputados do PS.

O Sr. Presidente: - Vamos passar à discussão na
especialidade do projecto de lei n.º 279/I.
Relativamente ao artigo l.º há uma proposta de
alteração, apresentada pelo Partido Socialista, que
vai ser lida.

Foi lida. É a seguinte:

O artigo 1.º passa a ter a seguinte redacção:

ARTIGO 1º

A tabela A anexa à Lei n.º 44/77, de 6 de Junho, passa a ter a seguinte redacção:

Tabela A

Subsídios dos presidentes das câmaras municipais e comissões administrativas, dos vereadores em regime de permanência e dos administradores de bairro, a que se refere o artigo 109.º-A do Código Administrativo.

l - Presidentes das câmaras municipais e
comissões administrativas de:

Lisboa e Porto.....34 400$00
Outros concelhos ur-
banos de 1ª ordem
e concelhos rurais
de l.ª ordem com
sede em capital de
distrito.......... 26 500$00
Concelhos rurais de
1ª ordem e urbanos
de 2.ª ordem .....21 200$00
Concelhos rurais de
2.ª ordem e urbanos
de 3.ª ordem........17 200$00
Concelhos rurais de
3.ª ordem........ l5 900$00

2 - Vereadores em regime de permanência
em:

Lisboa e Porto........26 500$00
Outros concelhos ur-
banos de 1ª ordem
e concelhos rurais
de 1ª ordem com
sede em capital de
distrito........... 21 200$00
Concelhos rurais de
1ª ordem e urbanos
de 2.ª ordem.......17 200$00
Concelhos rurais de
2.ª ordem..........13 300$00

3 - Administradores de bairro.....13 400$00

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

Como não há inscrições, vamos passar à votação da proposta de alteração relativa ao artigo 1º.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD, do CDS e dos Deputados independentes sociais-democratas e a abstenção do PCP.

O Sr. Presidente: - Passamos ao artigo 2.º, para o qual existe também uma proposta de alteração, apresentada pelo Partido Socialista, que vai ser lida.

Foi lida. É a seguinte:

O artigo 2.º passa a ter a seguinte redacção:

ARTIGO 2.º

As remunerações constantes da tabela A referida no artigo 1.º serão atribuídas a partir de 1 de Julho de 1979.

O Sr. Presidente: - Visto não haver qualquer inscrição, vamos votar a proposta de alteração ao artigo 2.º, apresentada pelo PS.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a
favor do PS, do PSD, do CDS e dos Deputados Independentes sociais-democratas e a abstenção do PCP.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 3.º para o qual existe também uma proposta de alteração, apresentada pelo Partido Socialista, que vai ser lida.

Foi lida. É a seguinte:

O artigo 3.º passa a ter a seguinte redacção:

ARTIGO 3.º

As remunerações relativas aos meses de
Janeiro a Junho de 1979 são acrescidas
com metade do aumento agora verificado
nos respectivos escalões.

O Sr. Presidente: - Vamos votar a proposta de
alteração ao artigo 3.º

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a
favor do PS, do PSD, do CDS e dos Deputados independentes sociais-democratas e a abstenção do PCP.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o texto inicial relativo ao artigo 4.º, que vai ser lido.

Foi lido. É o seguinte:

ARTIGO 4.º

Sempre que tiver lugar uma actualização dos vencimentos da função pública serão actualizados os vencimentos dos titulares dos cargos municipais através da aplicação do coeficiente equivalente à média dos aumentos atribuídos às várias letras da tabela.

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O Sr. Presidente: - Como ninguém pede a palavra, vamos votar o artigo 4.º

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do CDS e dos Deputados independentes sociais-democratas e a abstenção do PCP.

O Sr. Presidente: - Vai ser lido o artigo 5.º, em relação ao qual também não existem propostas de alteração.

Foi lido. É o seguinte:

ARTIGO 5.º

1 - Os presidentes das câmaras e de comissões administrativas e os vereadores em regime de permanência beneficiam do regime de previdência social mais favorávei aplicável ao funcionalismo público.
2 - Nos casos em que se não verifique a opção prevista no número anterior, cabe à respectiva câmara municipal a satisfação dos encargos que corresponderiam à entidade patronal.

O Sr. Presidente: - Vamos votar o artigo 5.º

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do CDS e dos Deputados independentes sociais-democratas e a abstenção do PCP.

O Sr. Presidente: - Seguidamente entramos na discussão do projecto de lei n.º 280/I, apresentado pelo Partido Socialista, que se refere a alterações de disposições das leis de reforma judiciária.

O Sr. Carlos Candal (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito?

O Sr. Carlos Candal (PS): - É para dar um curto esclarecimento.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Carlos Candal (PS): - Era apenas para dizer que a subcomissão que foi incumbida do estudo deste diploma, não se tendo efectuado duas reuniões da Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias, aceitou, com o consenso dos grupos parlamentares, que este diploma viesse a Plenário sem que houvesse um relatório que tivesse sido submetido à Comissão pertinente.

O Sr. Presidente: - Sendo assim, está aberto o debate na generalidade sobre o projecto de lei n.º 280/I.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Candal.

O Sr. Carlos Candal (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Dada a falta de tempo, vou fazer apenas breves considerações e algumas notas avulsas sobre este diploma.
Desde logo se dirá que já aquando da discussão do diploma regulamentar, Decreto-Lei n.º 269/78, trazido a ratificação a esta Assembleia, o Partido
Socialista acentuou a necessidade de serem revistas certas disposições das leis de organização judiciária, nomeadamente aquelas que se referiam aos vencimentos dos magistrados.
Entretanto, foi presente a este Parlamento uma proposta do IV Governo, sob a forma de pedido de autorização legislativa, que retardou uma iniciativa do Partido Socialista, que acabou por se efectivar e que está agora em apreciação.
A proposta feita pelo IV Governo Constitucional, é preciso dizer-se, tinha um certo tom saudosista e repunha, em diversas disposições, não só a letra mas, o que é mais preocupante, o espírito do Estatuto Judiciário que vigorava antes do 25 de Abril.
Assim sendo, era contra a filosofia democrática da organização da justiça e violava, mesmo frontalmente, algumas das disposições constitucionais, era um texto «passadista» que, desde logo, ignorava a orientação moderna da organização judiciária em numerosíssimos países, nomeadamente da Europa em que nos propomos inserir.
Para além disto, essa proposta do IV Governo, a pretexto de pôr termo a alguns temas da crise no mundo judiciário, vinha alimentar as polémicas que se levantaram e criar ou renovar outros temas da crise.
Assim, e a propósito dessa temática, direi que não é ao 25 de Abril nem tão pouco às leis aprovadas nesta Assembleia, relativas ao Estatuto da Magistratura Judicial, à Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais e à Lei Orgânica do Ministério Público, que se pode assacar a falta de juízes que se sente em diversas comarcas, com a consequente demora no processado, e os prejuízos inerentes para a população que recorre à justiça.
O problema da falta de juizes é velho neste país, é anterior às novas leis da organização judiciária e, quanto muito, elas poderão ser culpadas de não criarem um incentivo para o acesso a carreiras, principalmente à judicatura.
Pensamos que este projecto de lei, fazendo a actualização de vencimentos, por um lado, é justa, dada a desvalorização da moeda, por outro pode ser um incentivo para os recém-licenciados se interessarem pela carreira de judicatura e pelo Ministério Público.
Defendemos o pressuposto de que o Ministério Público e a judicatura mantenham carreiras paralelas - pressuposto constitucional que vinha sendo posto em crise pela proposta do Governo Mota Pinto - e salvaguardamos, através deste projecto de lei, algumas das razões, justificadas, de desgosto de muitos magistrados da judicatura que se viam igualados, em vencimento, a magistrados do Ministério Público com muito menos tempo de serviço. Mas esta correcção, que se reconheceu ter sido necessária, está feita.
Não damos guarida a críticas que são feitas ao Conselho Superior da Magistratura, pois entendemos que a sua composição - designadamente com a intervenção do Presidente da República, do Provedor de Justiça e de individualidades eleitas pela Assembleia da República -, deve subsistir, pelo menos durante um mais largo período, para tirarmos uma prova. Criticamos ainda indirectamente, a sugestão de que do Conselho Superior da Magistratura fizes-

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sem parte elementos eleitos pelo Governo - era um preceito inaceitável da proposta do IV Governo - e também não aceitamos as regras propostas para a designação dos presidentes do Supremo Tribunal de Justiça e das relações e a recuperação da existência de vários tribunais cíveis em Lisboa e no Porto, mas, em compensação, aceitamos que a secção especial, prevista no Conselho Superior da Magistratura para a acção disciplinar, seja alargada à apreciação do mérito profissional dos magistrados judiciais.
De notar, apenas em apontamento, o dispositivo que possibilita o estabelecimento de um subsídio de fixação para os magistrados que estejam colocados nas regiões autónomas, que tem um cariz de justiça e de incentivo, dado o facto de às vezes se verificar dificuldade em recrutar juízes para o Ministério Público que queiram exercer a sua função nessas regiões, o dispositivo que recupera, a título transitório excepcional, para a função judicativa os conservadores e o dispositivo a propósito da demora na eleição e designação dos juízes sociais que estão previstos na lei, o que vinha trazendo alguns empenos na administração da justiça.
O Partido Socialista vai propor uma alteração a um dispositivo que, recuperando o que é tradicional, estabeleça para os magistrados o mesmo tributário dos funcionários públicos de que tinham sido afastados por terem saído das letras. 15to é, os magistrados passarão a dispor de um regime idêntico ao dos funcionários públicos e idêntico também à mesma remissa que o Estatuto dos Deputados faz.
Para terminar, sem prejuízo do teor literal de algumas propostas de emenda que faremos chega à Mesa, diremos que é de lamentar que ainda não tenha sido instituído o Centro de Estudos Judiciários - que foi esquematizado na sua necessidade e no seu esquema orgânico e funcional já pelo I Governo Constitucional, pelo Governo socialista -, sendo certo que todos os governos subsequentes ao primeiro, inclusivamente o Governo Mota Pinto, falavam nessa institucionalização. É um órgão, um colégio fundamental, para a formação de juízes competentes e é também, de algum modo, um incentivo para o acesso às duas magistraturas e pode ter uma utilidade decisiva na nossa colaboração e bom entendimento com países africanos de expressão portuguesa, já que pode servir para reciclagens e estágios de magistrados dessas terras.
Queria apenas acrescentar que este texto mereceu o apoio da Associação, Sindical dos Magistrados Judiciais e do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Morgado para formular pedidos de esclarecimento.

O Sr. João Morgado (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Deputado Carlos Candal, ao fazer a introdução do debate, disse que a falta de juízes não se deve à publicação das leis da reforma judiciária.
O assunto já aqui foi focado mais de uma vez e eu queria perguntar ao Sr. Deputado se é ou não verdade que a falta de juízes se agravou fortemente
após a entrada em vigor das novas leis da reforma judiciátia, particularmente nos fins do 2.º semestre de l978, com o movimento de juízes que superou, por virtude da entrada em vigor das referidas leis.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Candal para responder.

O Sr. Carlos Candal (PS): - Sr. Deputado João Morgado, para prestar o esclarecimento solicitado, devo dizer que o deficit de juizes à data da entrada em vigor destas leis era completado em cerca de duzentos juizes, incluindo juízes de instrução criminal, numa necessidade total de cerca de oitocentos magistrados da judicatura.
Penso, pois, que esta lei não agravou, nem esse deficit, por lhe ser posterior, é responsável pela falta que existia. Contudo, o que acontece é que estas leis - não quero fazer processos de intenção -, porventura por serem inovadoras, por quebrarem uma rotina anterior, foram mal recebidas em certos sectores ligados às carreiras da magistratura e foram mal interpretadas e aplicadas por outros sectores. Por exemplo, e muito concretamente, devo dizer e surpreender-me - e é uma crítica legítima - que o Conselho Superior da Magistratura tenha preenchido cerca de cinquenta juizes em Lisboa, cujos postos foram criados posteriormente a esta lei, e suponho que cerca de vinte no Porto, desnecessariamente, porque eram comarcas que já tinham um bom elenco de julgadores. Contudo, todas essas novas vagas que foram criadas - suponho que cinquenta em Lisboa e vinte no Porto - foram preenchidas roubando setenta magistrados às comarcas vagas da província, algumas delas há muito tempo.
É claro que isto é um problema de execução da lei, de que não podem ser responsabilizados os próprios diplomas, mas sim, no caso concreto, o Conselho Superior da Magistratura.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Morgado para uma intervenção.

O Sr. João Morgado (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei do Partido Socialista ora em debate debruçou-se primordialmente sobre o aspecto económico, retributivo, dos magistrados judiciais. E poderá, por isso, fazer crer que na organização judiciária portuguesa apenas o quantitativo das remunerações dos magistrados e as suas regalias de ordem económica estavam carecidas de alteração.
Ora a verdade é que, como mais de uma vez o CDS aqui denunciou, é evidente a degradação a que estão a chegar quase todos os tribunais judiciais: degradação que se deve precisamente aos diplomas surgidos quando foi Ministro da Justiça o Dr. Almeida Santos, contra os quais o CDS votou, na certeza de que o resultado da sua aplicação seria o caos dos tribunais.
E outra coisa não era de esperar, uma vez que nem a Associação dos Magistrados Judiciais nem qualquer outro órgão da classe apoiou as reformas introduzidas por aquele Ministro, via Assembleia da República. Elas foram tomadas, a maior parte das vezes, sem conhecimento da classe dos magistrados

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judiciais e, quando com o seu conhecimento, também com a sua oposição.
Nem a Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais nem o Estatuto dos Magistrados Judiciais partiram, como se impunha, da realidade existente. Esqueceram-se os seus autores de que a administração da justiça não tolera alterações bruscas e profundas que perturbem a sua continuidade.
Infelizmente, o método de destruir para construir de novo foi profusamente aplicado em todo o período de governação socialista, que felizmente está a expirar. E os resultados estão à vista.
Se em vez de tal método o Partido Socialista tivesse procurado completar a organização existente, pondo-a de acordo com o fim que se destina a realizar, não se teria chegado à situação de quase ruptura em que se encontram numerosas comarcas e que, no preâmbulo do projecto de lei n.º 280/I, o Partido Socialista aceita expressamente.
Não caberá neste acto referir, exaustivamente, as alterações de que carecem a Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais e o Estatuto dos Magistrados Judiciais para que a situação da maioria dos tribunais seja reconduzida à normalidade do funcionamento que se impõe e a que os cidadãos têm direito.
Mas não pode deixar de sublinhar-se que não é com qualquer das medidas preconizadas no projecto de lei n.º 280/I que tal desiderato se conseguirá.
Um tanto surpreendentemente, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista desenvolve no preâmbulo do projecto de lei uma catilinária contra a proposta de autorização legislativa que o IV Governo apresentou a esta Assembleia e esgrime contra ela com vigor, aproveitando o ensejo de mimosear o Governo Mota Pinto com epitetos que bem mais ajustadamente serviriam ao Executivo socialista, em particular ao seu ex-Ministro da Justiça, responsável, sem dúvida, pelo descontentamento claro nas populações e nos tribunais no que concerne à administração da justiça.

O Sr. Armando Bacelar (PS): - Não apoiado!

O Orador: - E na sua fúria anti-IV Governo, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista esqueceu até que os diplomas do «seu Ministro Almeida Santos» entraram em vigor em 31 de Julho de 1978 e se revelaram desde logo inteiramente desadaptados e inconformes com a realidade portuguesa.
O que aliás seria de esperar, dado que esses diplomas não atenderam nem consideraram que somos um povo europeu, mas com uma idiossincrasia própria e com características específicas, consolidadas com o decorrer dos séculos, povo que não precisa de lições de outros países no domínio de determinadas instituições mormente das instituições judiciais.
O projecto de lei em debate representa apenas o ataque a duas ou três das anomalias existentes na organização judiciária. Repete-se, por isso, que não convence do mérito de contribuir para consecução dos resultados que se propõe.
Praticamente aflora três matérias: remunerações aos magistrados; substituição dos juízes até 31 de Dezembro de 1980, e constituição do tribunal nas causas em que seja obrigatória a intervenção dos juízes sociais.
Mas serão as soluções destas questões suficientes, ou mesmo as mais prementes, para se poder aguardar, com um mínimo de perturbação para a administração da justiça, a formação dos quadros necessários e a atracção de candidatos à magistratura judicial? É evidente que não!
Entretanto, dado que, pela demissão do IV Governo, caiu a proposta de autorização legislativa por este apresentada a esta Assembleia, o CDS vai votar favoravelmente o presente projecto de lei, fazendo notar, entretanto, que o seu teor representa a confissão do Partido Socialista de que as leis judiciárias da sua lavra são responsáveis pelo caos em que se encontra a administração da justiça na maioria dos tribunais portugueses. Ficarão pelo menos corrigidas algumas das graves anomalias que enformam as leis da reforma judiciária.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Herculano Pires.

O Sr. Herculano Pires (PS): - O Sr. Deputado João Morgado mostra-se muito preocupado com a falta de juízes e, inclusivamente, imputa a responsabilidade por esta falta às leis da reforma judiciária que foram promulgadas pelo Sr. Ministro Almeida Santos.
Contudo, não sei se o Sr. Deputado João Morgado tem conhecimento, relativamente à carência de magistrados, dos dados mais recentes no que respeita à magistratura judicial e à magistratura do Ministério Públíco. Posso, por exemplo, dizer ao Sr. Deputado que o quadro de juízes é de setecentos e dezassete lugares e, segundo a própria Associação dos Magistrados, há uma falta de duzentos magistrados, o que dá, portanto, uma percentagem de 27,8 %. Quanto ao quadro de delegados do Ministério Público é de trezentos e sessenta e seis, estão ao serviço duzentos e vinte e seis e existem cento e quarenta vagas, sendo a carência de 38 %, portanto manifestamente superior à dos juízes.
Queria, pois, perguntar ao Sr. Deputado João Morgado se apenas lhe preocupa a carência de magistrados judiciais e se não o preocupa também a carência de magistrados do Ministério Público, à qual, aliás, não aludiu na sua intervenção.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Morgado para responder.

O Sr. João Morgado (CDS): - Sr. Deputado Herculano Pires, é evidente que a bancada do CDS está preocupada com a carência de magistrados judiciais e do Ministério Público. Só que, neste momento, o que aqui está em debate é uma lei que se vai aplicar aos magistrados judiciais, embora esteja proposto que o Governo legisle de maneira a fazer aplicar a nova tabela de vencimentos aos magistrados do Ministério Público.
Contudo, queria dizer ao Sr. Deputado o seguinte: é que a carência de magistrados judiciais actualmente verificada, pese embora as considerações feitas pelo Sr. Deputado Carlos Candal, é superior em cerca de cinquenta à que se verificava antes da apli-

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cação das leis da reforma judiciária aos tribunais e não consta que a carência de magistrados no Ministério Público tenha aumentado com a publicação dessas leis. O que se verificou foi uma corrida de magistrados judiciais para o Ministério Público, e não o contrário, o que se significa que alguma coisa estava mal, como nós sabíamos que era muito mais fácil recrutar elementos para o Ministério Público do que recrutar elementos para exercer funções de juizes.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Sr. Carlos Candal (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito?

O Sr. Carlos Candal (PS): - Para dar uma explicação.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Candal (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Fazendo réplica a uma conhecida paródia televisiva brasileira, o Sr. Deputado João Morgado esquece que foram criados muitos lugares para juízes da judicatura, nomeadamente os lugares de juízes de instrução criminal. Daí que o problema é inverso, pois não aumentou em si a falta de juízes, mas sim os lugares de juízes, e indirectamente pôs-se em relevo uma carência de magistrados.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Onde é que está a piada? Não a ouvi.

O Sr. João Morgado (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito?

O Sr. João Morgado (CDS): - É também para dar uma explicação.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. João Morgado (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria dizer que, apesar de o Sr. Deputado Carlos Candal ter estado com atenção àquilo que referi, contudo mencionei concretamente que tinha havido entre quarenta a cinquenta magistrados judiciais que tinham transitado para o Ministério Público, e essa transição é que realmente reflecte os vícios de que enforma a legislação da autoria do Partido Socialista.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Mendes, para uma intervenção.

O Sr. Marques Mendes (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não será certamente esta a última vez que esta Assembleia terá de discutir matéria relacionada com a reforma judiciária. E não será porque já várias vezes tive aqui oportunidade de dizer que as leis da reforma judiciária que esta Assembleia votou enformavam de variadíssimos vícios e que, a pouco e pouco, os seus autores terão de ir dando conta e trazendo aqui verdadeiros remendos.
Oxalá, pois, que não se tenha limitado apenas este
projecto a aproveitar a oportunidade que o Governo
adoptou de apresentar aqui uma proposta de autorização legislativa, para depois, criticando essa proposta, vir à actual.
Era bom, e já aqui tive ocasião de o dizer, que esta Assembleia, e designadamente através da comissão respectiva - a de Direito, Liberdades e Garantias - encarasse de frente e de uma vez por todas este problema e procedesse a um estudo profundo no sentido de remediar males que afectam a orgânica dos tribunais, vícios que enformam a magistratura judicial e o Ministério Público.
É com espanto que, ao justificar-se esta proposta, se vê fazer apenas uma crítica, quer no preâmbulo quer nas palavras do Sr. Deputado Carlos Candal, ao pedir a autorização do IV Governo. Esperava, pois, vê-lo pela positiva, e não pela negativa.
Há um ponto que reputo de extremamente importante e que já na altura foi salientado: é a actualização dos vencimentos. Contudo, já agora aproveito a oportunidade isto é matéria para ser discutida na especialidade para salientar que tal como o Partido Socialista volta a propor o texto, teremos, constantemente, de proceder aqui à actualização desses vencimentos.
Ainda agora votámos a lei sobre os vencimentos dos dirigentes autárquicos, mas houve o cuidado de introduzir uma disposição em que se dizia que sempre que fosse alterada a função pública fossem alterados. A ideia é essa, mas, no entanto, ao dizer-se que será revisto, imporá que haja de cada vez uma dessas leis. Ora, creio que isso dará azo a várias modificações, como aquelas que se verificarn agora aqui.
Portanto, direi que nós estamos perante uma legislação que enferma de vários vicios e não irei dizer que foi ela a responsável pela carência, que é bern conhecida e notória, de magistrados. Porém, o que digo é o que sempre disse: é que ela em nada contribuiu para resolver esse gravissímo problema e continua a não contribuir em nada. Não é através de um aumento de vencimentos que se resolve o problema, porque este aumento limitar-se-á a corrigir o vencimento que havia sido fixado por outra lei e adaptá-lo às circunstâncias do tempo.
O que importa é encontrar mecanismos que permitam evitar certas situações, como seja aquela, por exemplo, de juízes de círculo - e cada vez temos mais vagas nesses lugares - de passarem a desempenhar funções em comarcas antigas, de 2.ª classe; a vermos juízes da antiga l.ª classe a requererem passagem para comarcas da antiga 2.ª classe e muitas coisas deste género.
Por outro lado, não se diga também que é errada a classificação das comarcas. Eu, pessoalmente, não defendo isso. Porém, o ter-se acabado bruscamente com essa classificação só criou problemas. Apesar disso, há uma manutenção de classificação. Assim, temos comarcas de ingresso, e comarcas de acesso.
Contudo, se analisarmos atentamente - e o preâmbulo do projecto de lei em causa faz uma análise em certo aspectos - veremos também que, em matéria de classificação de comarcas de ingresso e comarcas de acesso, poderíamos apontar defeitos

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muito semelhantes àqueles que são apontados no preâmbulo.
Fala-se também muito - e o preâmbulo também refere, e isso foi uma tónica referida da outra vez - do direito comparado. Pena é que, por vezes, se compare um aspecto e não se comparem outros e, sobretudo, se compare demais e se esqueça bastante a realidade portuguesa e a situação em que vivem os tribunais.
Por isso, eu volto a insistir: sem tribunais que funcionem, sem tribunais que dêm satisfação aos anseios daqueles que os procuram, que se mantenham em estado de absoluto caos, como acontece por esse país fora, não estaremos de forma nenhuma a dignificar um Órgão de Soberania que é fundamental e que são os tribunais, que são realmente o garante da legalidade, da aplicação da lei e que são o garante da defesa dos interesses dos cidadãos.
Que é fundamental incrementar o Centro de Estudos Judiciários, estou de acordo. É matéria que urge levar a cabo. Mas oxalá que essa -legislação, quando aqui vier, seja em condições de o Centro de Estudos Judiciários poder dar uma resposta cabal a muitos e muitos problemas que encontraram na magistratura.
Há vários aspectos que esta lei aproveita, a titulo de actualízar os vencímentos, para fazer algumas correcções. Por exemplo, o problema das susbtituições pelos conservadores.
Dada a redacção, fico na dúvida se esta substituição que aqui se prevê é uma substituição total - digamos assim - para substituir em todas as circunstâncias, ou se é só para substituir nos termos do n.º 3 do artigo 28.º do decreto e que é, aliás, o que consta da lei: substituir apenas nos casos urgentes com a posição dos tribunais colectivos a réus presos.
É que, se é para fazer apenas esta substituição, creio que este preceito terá pouco a ver com a sua inclusão neste domínio, a menos que se pretenda que, por exemplo, venha a suceder este fenómeno, e que seria, a meu ver, absolutamente errado, de, qualquer dia, termos um colectivo constituído apenas por um único juiz de direito e por dois conservadores.
Quanto aos juízes sociais, essa medida afigura-se-nos correcta e só lamentamos que já não tenha sido feita há mais tempo, como já em tempos, quando pertencíamos ao PSD, pensávamos fazer, apresentando uma proposta nesse sentido.
Assim, aproveitaria para propor que se elaborasse um estudo e para pedir aos autores do projecto que esclarecessem se, quando usam a expressão «o vencimento será revisto», querem referir-se a que esta Assembleia terá de rever, ela própria, quando houver vencimento, ou se essa revisão poderá ser feita automaticamente, através de coeficientes.
Além disso, gostaríamos de saber o seguinte quanto às «ajudas de custo nos limites legais e contra documentos». Efectivamente, gostaríamos de saber se se referem a uma ajuda uniforme, ou se e uma ajuda de custo sobre as despesas efectivamente feitas pelo magistrado que tem de deslocar-se.
Não se trata de um problema de redacção, mas que eu gostaria de ver clarificado.

Aplauços dos Deputados independentes sociais-democratas.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Candal.

O Sr. Carlos Candal (PS): - Quanto às ajudas de custo, a razão de ser da lei é a seguinte: pretende-se que não sejam excedidos os limites das ajudas de custo. Simplesmente, pretende-se dispensar os magistrados de apresentarem as facturas do restaurante ou do snack-bar, porque se vinham verificando situações embaraçosas ... Quando os juízes pediam a factura, havia um lugar paralelo para idêntica solicitação que os caixeiros-viajantes fazem. Então, os gerentes dos restaurantes perguntavam: - O Sr. Doutor que dinheiro é que quer que eu ponha aqui como tendo sido o preço da refeição?
Entendia-se que isto era uma situação embaraçante e que, aos juízes, lhes deve ser possibilitado declararem, tão somente, quanto gastaram, dentro dos limites legais.
Quanto ao problema da maçada de termos de estar sempre nesta Câmara a actualizar os vencimentos dos juízes sempre que sejam revistos em termos gerais os vencimentos da função pública, concordo com isso. Simplesmente, não é possível, nem é isso que se pretende, porque, senão, ter-se-ía dito. Não é possivel uma revisão automática dos vencimentos dos juízes sempre que sejam revistos os salários da função pública, à semelhança do que se decidiu há pouco para os responsáveis das autarquias. Não é possível, por uma razão muito simples: é que seria inconstitucional.
Se essa actualização dos vencimentos dos magistrados fosse automática, mediante um coeficiente estabelecido, os vencimentos dos magistrados ficavam na dependência do Governo, o que seria manifestamente inconstitucional, porque, nos termos da alinea u) do artigo 167.º da Constituição, é da competência legislativa reservada da Assembleia da República a remuneração não só do Presidente da República, dos Deputados e dos membros do Governo, mas também dos juízes dos tribunais superiores.
É claro que à estatuição constitucional «deu-se-lhe uma volta» - como se costuma dizer - para as remunerações dos membros do Governo poderem ser actualizadas em termos de referência aos funcionários públicos sempre que estes sejam aumentados por lei da Assembleia ou por decreto-lei ratificado pela Assembleia.
Entendeu-se não seguir esse critério um bocado discutível, sem desprimor para a solução que, quanto aos membros do Governo, esta Câmara encontrou.
O que se pode dizer quanto ao n.º 1 do artigo 27.º do Estatuto dos Magistrados Judiciais é isto: é que um estatuto especialmente para este sector de actividade profissional deve ter uma certa estabilidade e não é muito razoável que, de ano a ano, se vá alterar o n.º l do artigo 27.º A subcomissão tem já pensada uma solução para isso e que é no n.º 1 do artigo 27.º dizer-se que o vencimento dos juízes do Supremo Tribunal de Justiça será fixado por lei, que será revista sempre que se verificar revisão geral dos vencimentos da função pública. Esta lei poderá vir a Plenário - é uma lei de um artigo único - com a votação na especialidade deste próprio projecto de lei. E, se for aprovada, o estatuto ganha tal estabilidade, e sempre que tiverem de se ac-

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tualizar os vencimentos dos magistrados vai-se tocar nesse artigo único dessa lei, que eu chamarei de especial, e não neste diploma.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Mendes.

O Sr. Marques Mendes (Indep.): - Quero apenas dizer o seguinte: quanto a esta parte dos vencimentos creio que o Sr. Deputado Carlos Candal não tem razão.
Efectivamente que é da competência exclusiva da Assembleia a fixação dos vencimentos dos juízes dos tribunais superiores. No entanto, não vejo - não sou constitucionalista - que seria inconstitucional que a própria lei que fixa o vencimento dos juízes do Supremo Tribunal de Justiça em 45 000$ dissesse que seriam automaticamente revistos, mediante a aplicação do coeficiente x sempre que haja alteração dos vencimentos da função pública.
Também compete a esta Assembleia fixar os vencimentos dos Deputados e, no entanto, não é preciso que o Governo intervenha sempre que haja alterações aos vencimentos da função pública.
É que eu, há bocado, quando falei em fazer revisão automática, não era pelo Governo, mas sim por decreto-lei. É a própria lei que estabelece um mecanismo dessa mesma revisão. É isto que eu entendo preferível, uma vez que se diga que será revisto «sempre que [...]»
Ora, sempre que haja uma revisão de vencimentos da função pública, tem esta Assembleia de aprovar novamente uma lei para corrigir - e eu chamo-lhe corrigir, indexar - os vencimentos dos juízes. 15to, quanto a mim, não é nada inconstitucional.
Quanto às ajudas de custo, Sr. Deputado, o que sugeria é que nem se deve exigir ao magistrado que tenha de pedir a factura do restaurante ou do transporte, mas que também não tenha de fazer qualquer declaração. Ele deverá ter para as suas deslocações uma determinada ajuda de custo.
Esta parece-me ser a situação mais adequada à dignificação do próprio magistrado. Já agora, devo dizer uma coisa que me choca: é o caso de os magistrados terem de se deslocar em transportes colectivos. Eles reagiram, e com razão.
Isso são aspectos que contendem muito com a dignidade do magistrado, seja ele judicial ou do Ministério Público.
Nenhum deles pode estar sujeito a ter que pedir ao restaurante, ou onde quer que seja, a factura. Mas também entendo que não se deve sujeitá-lo a ter de fazer uma declaração a dizer: «eu gastei tanto».
Entendo que devem estar antecipadamente fixadas as ajudas de custo em função de um dia, meio dia, etc.
No entanto, apreendida a explicação do Sr. Deputado Carlos Candal, creio que em sede de comissão já talvez seja possível acertar estes pontos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Candal.

O Sr. Carlos Candal (PS): - Quanto ao problema dos transportes colectivos, felizmente que já está ultrapassado. Já não se coloca esta questão, pelo que
não é contemplada neste diploma quanto à indexação, que está feita, dos vencimentos dos Deputados. Note o Sr. Deputado o seguinte: a Constituição não diz «estabelecer o regime dos vencimentos». Diz, sim, fixar.
Assim, quanto aos vencimentos dos Deputados, penso tratar-se de um preceito inconstitucional, mas de uma inconstitucionalidade benévola, porque terá sido por decoro que os Deputados remeteram para actualização dos vencimentos da função pública a actualização dos nossos próprios salários.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A minha intervenção é breve e é, desde já, uma declaração de voto.
Nós consideramos que este projecto do Partido Socialista é necessário e oportuno. É necessário na medida em que vai efectuar, no conjunto das suas disposições, a actualização dos vencimentos dos magistrados judiciais e, também, embora indirectamente, do Ministério Público.
É oportuno porque é, até certo ponto, a resposta que a Assembleia da República devia ter dado à inacreditável proposta de autorização legislativa que o IV Governo teve a ousadia de apresentar à Assembleia da República no sentido de subverter no seu cerne as leis da reforma judiciária.
A Assembleia da República ao aprovar uma lei
com este âmbito, como a que agora é proposta pelo
PS, diz, implicitamente, e muito bem, como se diz
na memória justificativa do projecto de lei socialista, que tal proposta de autorização legislativa, que não chegou - infelizmente, a meu ver - a ser discutida, era completamente inaceitável dado o grau último da sua insensatez política.
São dois os grupos de disposições deste projecto. Em primeiro lugar, a actualização de vencimentos e outras regalias de carácter financeiro e, em segundo lugar, um conjunto de alterações de natureza diversa, uma delas relativa à antiguidade de juízes de círculo, outra relativa à competência da secção disciplinar do Conselho Superior da Magistratura e algumas relativas à substituição de juízes e ao funcionamento dos tribunais sem juízes sociais nas questões de arrendamento rural, disposições estas últimas de carácter transitório.
Ora bem, se o projecto nos parece necessário e oportuno e se o conjunto das suas propostas de alteração não nos parece inaceitável, já as suas disposições nos parecem merecer sérias reservas. Referimo-nos, e desde logo, àquelas que se referem à alteração substancial das regalias de carácter financeiro dos magistrados.
Na realidade, o projecto não se limita a actualizar de 35 000$ para 45 000$ os vencimentos dos juizes do Supremo Tribunal de Justiça e, correspondentemente, de todos os juízes, a actualização do subsídio base, mas vai também até ao ponto de atribuir aos juízes as diuturnidades gerais da função pública, ao reduzir drasticamente os anos de contagem para as fases ou diuturnidades especiais dos juízes de direito, e à concessão de regalias especiais aos juízes presidentes do círculo judicial.

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Ora, estas alterações de carácter financeiro que inicidem sobre regalias acessórias em relação ao vencimento merecem-nos algumas sérias reservas.
Não compreendemos, por exemplo, qual a razão e a justificação para reduzir de vinte para doze anos a atribuição da última das fases ou diuturnidades especiais dos juízes de direito, tendo em conta que a carreira da magistratura judicial, com o preenchimento e o alargamento dos quadros dos tribunais superiores a que se procedeu, vai sofrer uma certa estagnação e, até, cristalização da 1ª instância. Admite-se até que os juízes de direito vão passar agora a ficar bastantes mais anos na 1ª instância, porventura bastante mais do que doze anos, não nos parecendo razoável que o tecto das fases dos juízes da 1ª instância seja atingido ao fim de doze anos, atingido um quantitativo monetário que nos parece, de todo em todo, excessivo.
O mesmo, aliás, vale para as regalias especiais concedidas aos juízes presidentes de círculo. Aqui, cabe chamar a atenção para o facto de igual regalia não estar prevista no projecto para os procuradores da República juntos dos círculos judiciais.
Quanto às alterações de outra natureza, entendemos que elas se justificam, nomeadamente aquelas que são de carácter transitório, e outras se justificaram, designadamente algumas vieram já a lume nos encontros que a subcomissão, como o Sr. Deputado Carlos Candal já teve oportunidade de dizer, teve com a Associação Sindical dos Magistrados Judiciais, e com o Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, que tiveram oportunidade de apresentar à subcomissão as perspectivas sobre este projecto de lei.
De resto, na subcomissão está em vias de chegar-se a um certo consenso em relação a algumas alterações a este projecto de lei que vão ao encontro de algumas das nossas principais reservas e, portanto, que podem, na especialidade, eliminar as nossas reservas em relação a esse projecto de lei.
Em todo o caso, como essas alterações ainda não estão formalizadas e porque o que estamos a votar é este projecto que está perante nós, não podemos dar-lhe o nosso voto favorável, embora não tendo, obviamente, razões para votar contra ele.
Nestes termos, vamos abster-nos, confiando em que as perspectivas já encontradas na subcomissão levem a que as nossas razões que nos levam agora a não votar a favor sejam eliminadas e que na votação final global o Grupo Parlamentar do PCP possa, sem quaisquer reservas, votar a favor. 15to é, fazer aquilo que neste momento não pode fazer.

O Sr. Carlos Candal (PS): - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Carlos Candal (PS): - Para dar um esclarecimento sobre o porquê da concentração em doze anos das diuturnidades especiais, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Candal (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É discutível se essa concentração se deve fazer em doze anos ou se se deve alastrar até aos
vinte da lei que se está a rever, se se deve ir para uma solução de dezoito anos, como foi aventado na subcomissão, prevendo-se diuturnidades aos três, sete, doze e dezoito anos.
A explicação é bifocal. Desde logo esta concentração nos doze anos tinha em vista desagravar um certo mal-estar que se criou nos tribunais pelo facto de magistrados do Ministério Público muito novos ganharem tanto e por vezes mais do que magistrados judiciais com muitos anos de serviço. Seria, digamos, uma terapêutica de choque, mas, enfim, talvez seja excessiva e se deva alongar os doze para, porventura, dezoito anos, segundo as diuturnidades que já foram previstas.
Por outro lado há um certo calculismo, porventura, nesta proposta e a verdade é que a deserção de elementos da magistratura - e importa manter pelo menos os quadros que há - verificava-se sobretudo nos doze primeiros anos de carreira. Dai que isso teria um certo calculismo de desmotivar e de prender à carreira magistrados.
Quanto a não estar prevista uma contrapartida para o Ministério Público para os procuradores da República, também há uma perspectiva prática nesta maior valorização do serviço dos juízes de círculo. É que, enquanto não se vem verificando falta de procuradores da República - dado esse quadro estar até preenchido por gente muito nova, o que significa uma apetência pela carreira e pelos lugares -, tanto não se verificava nos juízes de círculo, havendo círculos de imenso movimento, por exemplo Vila Nova de Gaia, onde não havia preenchimento dos quadros.
Por outro lado, se o artigo 46.º não vier a ser aprovado - ele diminui a exigência de antiguidade dos juízes de círculo de dez para oito anos-, se for mantida a exigência de dez anos de antiguidade, este benefício ao juíz de círculo fica muito atenuado, porque um juiz de círculo com dez anos de serviço tem pelo menos já duas diuturnidades e metade da terceira, daí que a mais-valia fosse relativamente escassa.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar na generalidade o projecto de lei n.º 280/I, do PS.

Submetido à votação, foi aprovado com os votos a favor do PS, do PSD, do CDS e dos Deputados independentes sociais-democratas e a abstenção do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Herculano Pires, para uma declaração de voto.

O Sr. Herculano Pires (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Persistentemente empenhado na política de recuperação que caracterizou a sua actuação, o Governo Mota Pinto apresentou à Assembleia da República uma estranha proposta de lei de autorização legislativa, visando a introdução de alterações na organização judiciária.
Inserida nos indisfarçáveis propósitos de tal política, a referida proposta evidenciava um somatório de características que deveriam conduzir à sua rejeição liminar.
Na verdade e fundamentalmente, tratava-se do primeiro passo para a concretização de uma autênti-

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ca contra-reforma de pendor reaccionário, visando a recuperação de soluções do passado, anacrónicas e obsoletas, totalmente ultrapassadas no contexto europeu.
Por outro lado, era uma proposta nitidamente revanchista, no sentido de que esboçava uma espécie de «desforço» da magistratura judicial sobre a magistratura do Ministério Público.
Finalmente, era uma proposta claramente demagógica, na medida em que pretendia seduzir uma classe pelos benefícios de ordem material que lhe proporcionava.
A demissão do Governo Mota Pinto libertou a Assembleia da República do encargo de dar a tal proposta o justo destino que ela merecia.
Acontece que, ao tempo da apresentação da mencionada proposta de lei, o Grupo Parlamentar do PS já se vinha debruçando sobre certos aspectos da organização judiciária com manifestas e preocupantes repercussões no funcionamento do sistema.
Esses aspectos relacionavam-se, nomeadamente, com a alarmante carência de magistrados, a qual vinha provocando situações de quase rotura em numerosas comarcas do Pais.
Multiplicavam-se diariamente as informações, as queixas e as reclamações, que confirmavam e reforçavam a autenticidade dos dados que íamos colhendo.
Urgia, portanto, a adopção de medidas que, ao menos em parte e na medida do possível, pude-ssem obviar a um estado de coisas cuja manutenção se revelava claramente perniciosa e inconveniente.
Dai a apresentação que fizemos de dois projectos de lei: um, criando o Centro de Estudos Judiciários ; outro, o ora em discussão, introduzindo algumas alterações nas leis da reforma judiciária.
Lamenta-se que a sobrecarga de trabalho da Assembleia não tenha permitido que o primeiro viesse a ser agendado, já que o mesmo, a nosso ver, postula a solução adequada, quiçá decisiva, para a solução do problema da falta de magistrados.
Ficaremos, assim, pelo segundo, que aponta meramente soluções de emergência, que reputamos de inadiáveis, visando a formação de quadros e a chamada de candidatos à magistratura.
Neste sentido, e como se realça no preâmbulo do projecto, apontam-se como necessárias e adequadas as seguintes medidas:
1) Ampliação, a título excepcional e transitório, das funções de substituição dos conservadores;
2) Introdução de melhorias no regime de remuneração dos magistrados e eliminação de distorções salariais, relegando para o Governo, por falta de competência da Assembleia para tal efeito, a revisão das remunerações dos magistrados do Ministério Público observando escrupulosamente a regra do paralelismo entre as duas magistraturas;
3) Possibilidade de funcionamento dos tribunais sem os juízes sociais, dado que o Governo entravou o processo de nomeação destes juízes e não regulamentou a forma processual da intervenção destes em acções que tenham por objecto questões de arrendamento rural;
4) Introdução de alterações no sistema de funcionamento do Conselho Superior da Magistratura, tornando-o mais operacional.
Cremos que as medidas preconizadas pelo nosso projecto têm cabal e adequada justificação. Serão as mesmas susceptíveis de alterações que as melhorem? Justificar-se-ía também a adopção de outras medidas? Coube à Assembleia pronunciar-se a tal respeito. Não cultivamos o fetichismo da perfeição absoluta e na nossa actuação parlamentar sempre nos mostrámos abertos às sugestões alheias que julgamos cabidas e razoáveis.
Apresentando e defendendo este projecto cremos estar no caminho certo para a solução pontual de algumas anomalias que se vêm revelando claramente perniciosas para o bom funcionamento do sistema judiciário.
O problema, como dissemos, não fica esgotado.
Por isso, desde já assumimos o compromisso de a ele retornar quando e se tal nos for possível.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto tem a palavra o Sr. Deputado Brito Lhamas.

O Sr. Brito Lhamas (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votámos a favor do projecto de lei n.º 280/I por entendermos que ele vem ao encontro de duas necessidades essenciais: a da actualização dos vencimentos dos magistrados e a de encontrar uma solução para a enorme quantidade de acções pendentes nos tribunais. Essas acções versam problemas do arrendamento rural e não têm tido seguimento por não ter sido ainda possível a criação e funcionamento do Instituto dos Juízes Sociais.
Parece-me que a actualização dos vencimentos dos magistrados judiciais era uma necessidade não só para que, de facto, se pudesse fazer justiça em relação aos vencimentos de outros funcionários e de outros trabalhadores, como também porque é, sem dúvida, um meio de procurar que não se continuem a desertificar os quadros da magistratura judicial.
Aliás, o Partido Social-Democrata, a propósito da discussão da ratificação do Decreto-Lei n.º 269/78, tinha já apresentado uma proposta no sentido de os vencimentos dos juízes serem actualizados.
No entanto, não houve acordo dos restantes partidos representados na subcomissão encarregada de estudar o problema por entender, e talvez bem, que não era aí a sede própria para a discussão desse problema, uma vez que se tratava apenas de um decreto regulamentador da Lei n.º 82/77.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É claro que não concordamos inteiramente com tudo quanto vem no decreto. As alterações introduzidas ao artigo 155.º são, por exemplo, um dos aspectos que, segundo o nosso ponto de vista, não está perfeitamente correcto.
Entendemos que a secção disciplinar do Conselho Superior da Magistratura deveria ser constituída exclusivamente por juízes eleitos pelos próprios magistrados. E não compreendemos bem que numa secção especializada como essa haja intromissão de pessoas estranhas à própria magistratura. Se se entende que a magistratura deve ser uma instituição com au-

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togoverno, parece-nos que devem ser os próprios juízes, e eles só, a elegerem e a escolherem de entre os seus pares as pessoas que hão-de constituir essa secção disciplinar que é de extrema importância, como é óbvio e desnecessário demonstrar.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Procuraremos na discussão na especialidade que alguns destes aspectos, que a nós não nos parecem perfeitamente correctos, sejam melhorados.
Contudo, não vimos razões - antes pelo contrário - para não votarmos a favor deste projecto de lei.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Informo os Srs. Deputados de que se encontra na Mesa, apresentado por Deputados do Partido Socialista, um requerimento de baixa à Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias, fixando o prazo de cinco dias para discussão e votação na especialidade do diploma que acabámos de aprovar.
Há alguma oposição?

Pausa.

Como não há oposição, considera-se aprovado.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito é, Sr. Deputado?

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, foi distribuído à bancada do PSD um documento assinado por um pretenso presidente de um pretenso grupo parlamentar, Agrupamento de Deputados ou lá como se chama, a distribuir uma série de Deputados por pretensas vagas em comissões.

O Sr. Olívio França (lndep.): - Pretenso quê?! ...

O Orador: - Gostaria de saber quais os efeitos deste documento, uma vez que não me consta que a composição das comissões em termos de distribuição dos seus elementos pelos partidos tenha sido alterada nos termos regimentais.
Lembro à Assembleia que o Regimento, no seu artigo 39.º, que não foi alterado na vaga de alterações da semana passada, diz que «o número de membros de cada comissão e a sua distribuição pelos diversos partidos são fixados, salvo para a Comissão de Regimento e Mandatos, por deliberação da Assembleia, sob proposta do Presidente, ouvidos os representantes dos grupos parlamentares' e partidos não constituídos em grupo».
E diz o n.º 1 do artigo 41.º do mesmo Regimento, também não alterado, que «a designação dos representantes na Comissão de Regimento e Mandatos e nas comissões permanentes far-se-á pelo período da sessão legislativa».
Tendo presentes estas disposições, pergunto qual é o significado de um documento como este que acaba de ser distribuído pela bancada do PSD e, ao que creio, pelas outras bancadas.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Amândio de Azevedo, suponho que esse documento vem na sequência daquilo que esta manhã foi acordado na conferência dos grupos parlamentares.

O Sr. Magalhães Mota (Indep.): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado.

O Sr. Magalhães Mota (Indep.): -É para um curtíssimo protesto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade.

O Sr. Magalhães Mota (Indep.): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que o Sr. Deputado Amândio de Azevedo pode ter as pretensas opiniões que quiser, mas não está autorizado por ninguém a exceder os limites da boa educação.

O Sr. Agostinho do Vale (PS): - Muito bem!

O Orador: - Creio que outros limites não lhe são sequer aplicáveis e, portanto, não falo nem do acatamento das votações da Assembleia nem das deliberações que democraticamente...

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Inconstitucionalmente!

O Orador: - ... aqui são tomadas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Muito mal!

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Amândio de Azevedo, temos todos um Regimento a cumprir e esta matéria não consta da ordem de trabalhos. Em todo caso, pode dizer-me para que pretende usar da palavra?

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Para fazer um brevíssimo contraprotesto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É para dizer que tenho toda a razão em considerar que pretende existir aqui um grupo parlamentar que é pretenso porque creio que ainda ninguém contestou que as leis têm uma hierarquia e a Constituição, ao que eu penso, sobrepõe-se às leis aprovadas nesta Assembleia da República. A Constituição não permite a constituição de agrupamentos de Deputados independentes, é essa a nossa opinião, e vamos promover a declaração de inconstitucionalidade das deliberações aqui tomadas.
Tenho toda a legitimidade, o direito e até o dever de considerar que não há nenhum agrupamento de Deputados independentes nesta Assembleia.

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Em segundo lugar, é evidente que os lugares que se pretendem preencher são pretensos porque não há nenhuma deliberação a modificar a composição das comissões que foi fixada no princípio da sessão legislativa.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, apresentada pela Assembleia Regional da Região Autónoma dos Açores, deu entrada a proposta de lei n.º 257/I, que pretende a alteração da Lei n.º 1/79, de 2 de Janeiro. Foi admitida e baixa à 11.ª Comissão.
A ordem de trabalhos para amanhã, cuja sessão começa à 9 horas e 30 minutos, é a seguinte: da primeira parte consta uma informação acerca de uma comissão de inquérito; da segunda parte, a discussão dos diplomas que transitam de hoje, que são os seguintes: votações finais dos projectos de lei n.ºs l35/I, do PCP, e 155/I, do PS -Alterações ao arrendamento rural -, e dos projectos de lei n.ºs 131/I e 133/I, do PSD, que criam os Institutos Universitários de Trás-os-Montes e Alto Douro e da Beira Interior, e discussão conjunta dos projectos de lei n.ºs 196/I, do PSD, e 112/I, do PCP. Teremos ainda a votação final global do projecto de lei n.º 143/I, do PS, sobre comissões de trabalhadores, a discussão dos projectos de lei n.ºs 315/I e 317/I, a discussão conjunta dos projectos de lei n.ºs 295/I, 296/I, 297/I e 206/I. Serão também discutidos os projectos de lei n.ºs 272/I, 313/I, 96/I e 98/I.
Está encerrada a sessão.

Eram 20 horas e 25 minutos.

Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Socialista (PS)

Agostinho Martins do Vale.
Alberto Augusto M. da Silva Andrade.
António Fernandes Marques Ribeiro Reis.
Bento Elísio de Azevedo.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Etelvina Lopes de Almeida.
Florêncio Quintas Matias.
Francisco de Almeida Salgado Zenha.
Gualter Viriato Nunes Basílio.
Jaime José Matos da Gama.
Joaquim José Catanho de Menezes.
Joaquim Sousa Gomes Carneiro.
Jorge Augusto Barroso Coutinho.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José M. de Albuquerque de A. Leitão.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Maria Teresa Vieira Bastos R. Ambrósio.
Pedro Amadeu de A. dos Santos Coelho.
Telmo Ferreira Neto.

Partido Social-Democrata (PSD)

Anatólio Manuel dos Santos Vasconcelos.
António José dos Santos M. da Silva.
Arnaldo Ângelo Brito Lhamas.
Carlos Alberto Coelho de Sousa.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Bento Gonçalves.
Luís Fernando C. Nandim de Carvalho.
Maria Helena do Rego da Costa S. Roseta.
Nicolau Gregório de Freitas.

Centro Democrático Social (CDS)

Alcino Cardoso.
António Jacinto Martins Canaverde.
Emídio Ferrão da Costa Pinheiro.
Francisco António Lucas Pires.
João Gomes de Abreu de Lima.
João José M. F. Pulido de Almeida.
Narana Sinai Coissoró.
Nuno Krus Abecasis.
Rui Eduardo Ferreira Rodrigues Pena.
Ruy Garcia de Oliveira.
Victor Afonso Pinto da Cruz.

Partido Comunista Português (PCP)

Álvaro Augusto Veiga de Oliveira.
Carlos Alberto do Vale G. Carvalhas.
Carlos H. S. Aboim Inglez.
Ercília Carreira Pimenta Talhadas.
Francisco Miguel Duarte.
Georgete de Oliveira Ferreira.
Hermenegilda Rosa C. Pacheco Pereira.
Jaime dos Santos Serra.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
Joaquim Gomes dos Santos.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Manuel Mendes Nobre de Gusmão.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.
Severiano Pedro Falcão.
Zita Maria de Seabra Roseiro.

União Democrática Popular (UDP)

Acácio Manuel de Frias Barreiros.

Independentes

Amantino Marques Pereira de Lemos.
António Jorge Duarte Rebelo de Sousa.
António Jorge Oliveira Aires Rodrigues.
Carmelinda Maria dos Santos Pereira.
João António Martelo de Oliveira.
João Lucílio Cacela Leitão.
José Alberto Ribeiro.
José Justiniano Taborda Braz Pinto.
Victor Hugo Mendes dos Santos.

Deputados que faltaram à sessão:

Partido Socialista (PS)

Alberto Marques Antunes.
António Alberto Monteiro de Aguiar.
António Duarte Arnaut.
António Fernandes da Fonseca.
António Jorge Moreira Portugal.
António Manuel Maldonado Gonelha.
António Manuel de Oliveira Guterres.
Aquilino Ribeiro Machado.

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Carlos Alberto Andrade Neves.
Fernando Tavares Loureiro.
João Joaquim Gomes.
José Cândido Rodrigues Pimenta.
José Luís do Amaral Nunes.
Luís Abílio da Conceição Cacito.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Maria de Jesus Simões Barroso Soares.
Mário Alberto Nobre Lopes Soares.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.

Partido Social-Dernocrata (PSD)

Fernando José da Costa.
Francisco M. L. de Sá Carneiro.
José Manuel M. Sampaio Pimentel.
José Theodoro de Jesus da Silva.
Mário Júlio Montalvão Machado.

Centro Democrático Social (CDS)

Adelino Manuel Lopes Amaro da Costa.
Álvaro Manuel Brandão Estêvão.
António Simões Costa.
Carlos Alberto Faria de Almeida.
Diogo Pinto de Freitas do Amaral.
Henrique José C. M. P. de Moraes.
João Lopes Porto.
José Duarte A. Ribeiro e Castro.
Luís Aníbal de Sá de Azevedo Coutinho.
Maria José Paulo Sampaio.

Partido Comunista Português (PCP)

Carlos Alfredo de Brito.
Domingos Abrantes Ferreira.
José Rodrigues Vitoriano.

Independentes

António Luciano Pacheco de Sousa Franco.
Carlos Galvão de Melo.
José Ferreira Júnior.
Mário Fernando de Campos Pinto.
Rúben José de Almeida Martins Raposo.
Vasco da Gama Lopes Fernandes.

O CHEFE DA DIVISÃO DE REDACÇÃO, José Pinto.

PREÇO DESTE NÚMERO 17$00

IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA

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