O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 599

I Série - Número 16

Sexta-feira, 15 de Fevereiro de 1980

DIÁRIO
da Assembleia da República

I LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1979-1980)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 14 DE FEVEREIRO DE 1980

Presidente: Exmo. Sr. Leonardo Eugénio Ramos Ribeiro de Almeida

Secretários: Exmos. Srs. Manuel Henriques Pires Fontoura.
Alberto Marques Antunes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Francisco Gonçalves Cavaleiro de Ferreira.

SUMARIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a reunião às 15 horas.

Antes da ordem do dia. - Foram aprovados os n.ºs 11 e 12 do Diário.
Deu-se conta do expediente e da apresentação de requerimentos.
Foram rejeitados dois votos de protesto um da UDP e outro do PS, contra a decisão do Governo de proibir a entrada no País de certos cidadãos estrangeiros para participarem no Encontro Internacional dos Povos em Luta. Proferiram
declaração de voto os Srs. Deputados Mário Tomé (UDP), Borges de Carvalho (PPM) Jorge Leite (PCP), Pedro de Vasconcelos (CDS). Almeida Santos (PS) ... que no fim motivou um protesto do Sr. Deputado Narana Coissoró (CDS) ao qual o orador deu um esclarecimento ... e Pedro Roseta (PSD).
Em seguida os Srs. Deputados Veiga de Oliveira (CDS) e Mário Tomé (UDP) procederam à apresentação em nome dos respectivos partidos de votos de pesar pelas vitimas do naufrágio da motora de pesca Cordeiro de Deus, verificando-se ainda uma intervenção do Sr. Deputado Carlos Espadinha (PCP). Aprovados os mesmos, fizeram declaração de voto os Srs. Deputados Borges Carneiro (PS), Adão e Silva (DR), Neiva de Oliveira (CDS), Mário Tomé (UDP), José Vitorino (PSD) e José Tengarrinha (MDP/CDE).

Ordem do dia. - O Sr. Deputado José Vitoriano (PCP) justificou uma proposta do seu partido para a criação de uma comissão eventual de solidariedade e apoio as vítimas do terramoto dos Açores, intervindo também os Srs. Deputados Castro Caldas (PSD) e António Esteves (PS). A Assembleia rejeitou a proposta, emitindo declaração de voto os Srs. Deputados Germano Domingos (PSD), António Esteves (PS), Carlos Brito (PCP). Helena Cidade Moura (MDP/CDE) e Luis Coimbra (PPM).
Foi aprovada a criação de uma comissão eventual para defesa do património da cerca e do Palácio de S. Bento, tendo usado da palavra sobre o assunto os Srs. Deputados Rui Pena (CDS), Gomes Fernandes (PS), Carlos Brito (PCP), Castro Caídas (PSD), Ferreira do Amaral (PPM) e Adão e Silva (DR). Verificaram-se declarações de voto dos Srs. Deputados Vítor de Sá (PCP), Gomes Fernandes (PS) e Oliveira Dias (CDS), foi concedida urgência para a discussão das proposta de lei n.º 289/I (torna aplicáveis durante o 1.º semestre de 1980 as disposições da Lei n. º 42/77 de 18 de Junho, e legislação complementar, excepto quanto à isenção do imposto do selo) n.º 290/I (considera determinadas áreas da Região Autónoma dos Açores afectadas pelo sismo de J de Janeiro de 1980, regiões rurais economicamente mais desfavorecidas para efeitos de benefícios fiscais estabelecidos na lei durante os anos de 1980-1984), participando no debate os Srs. Deputados João Cravinho (PS), José Tengarrinha (MDP/CDE) e Angelo Correia (PSD).
Foi lido pelo Sr. Deputado Raimundo Rodrigues (PSD), e em seguida aprovado, um relatório da Comissão de Regimento e Mandatos relativo à substituição de um Deputado do PCP.
Foi discutida e aprovada na generalidade a ratificação n.º 166/I, relativa ao Decreto-Lei n.º 448/79, de 13 de Dezembro, que aprova o Estatuto da Carreira Docente Universitária, tendo usado da palavra os Srs. Deputados Pereira de Meto (CDS), Vital Moreira (PCP). Helena Cidade Moura (MDP/CDE), Henrique Ruas (PPM). Mário Tomé (UDP), Maria Manuela Saraiva (PSD) e Bragança Tender (PS).
Após ter dado conta da entrada na Mesa de/vários projectos de lei e de ter anunciado a próxima ordem de trabalhos, o Sr. Presidente encerrou a reunião às 20 horas.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada. Eram JS horas.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD)

Afonso de Sousa Freire de Moura Guedes
Alcino Cabral Barreto.
Álvaro Barros Marques de Figueiredo.
Amândio Anes de Azevedo.
Amélia Cavaleiro M. de Andrade de Azevedo.
António Alberto Correia Cabecinha.

Página 600

600 I SÉRIE - NÚMERO 16

António Duarte e Duarte
António José Ribeiro Carneiro.
António José dos S. Moreira da Silva
António Mana Pereira.
António Mana de O. Ourique Mendes
Armando António Correia.
Carlos Encarnação.
Carlos Manuel Pereira de Pinho
Cecília Pita Catarino.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Eleutério Manuel Alves.
Fernando dos Reis Condesso.
Fernando José Sequeira Roriz.
Fernando Manuel A. Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro do Amarai
Fernando Raimundo Rodrigues.
Germano Lopes Cantinho.
Henrique Alberto F. do N. Rodrigues.
Jaime Adalberto Simões Ramos.
João António Sousa Domingues.
João Aurélio Dias Mendes.
João Baptista Machado.
João Luís Malato Correia.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Joaquim Marques Gaspar Mendes.
Jorge Rook de Lima.
José Adriano Gago Vitorino.
José da Assunção Marques.
José Baptista Pires Nunes.
José Bento Gonçalves.
José Henrique Cardoso.
José Theodoro da Silva.
Júlio de Lemos de Castro Caldas.
Leonardo Eugénio R. Ribeiro de Almeida.
Manuel António Araújo dos Santos.
Manuel António Lopes Ribeiro.
Manuel Henriques Pires Fontoura.
Manuel Maria Moreira
Manuel Pereira.
Marília Dulce C. P. Morgado Raimundo.
Mário Dias Lopes.
Natália de Oliveira Correia.
Nuno Aires Rodrigues dos Santos.
Pedro Manuel da Cruz Roseta
Rui Alberto Barradas do Amaral.
Valdemar Cardoso Alves.

Partido Socialista (PS")

Adelino Teixeira de Carvalho.
Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Marques Antunes.
Alberto Rodrigues Ferreira Gamboa.
Amadeu da. Silva Cruz.
António Cândido de Miranda de Macedo.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Duarte Arnaut.
António Fernandes da Fonseca.
António José Vieira de Freitas.
Avelino Ferreira Loureiro Zenha.
Beatriz M. cio Almeida Cal Brandão.
Bento Elísio de Azevedo.
Carlos Alberto Costa de Sousa.
Carlos Cardoso Lage.
Eduardo Ribeiro Pereira
Francisco Igrejas Caeiro.
Francisco Manuel Marcelo M. Curto.
Frederico A. F Handel de Oliveira.
Gualter Viriato Nunes Basílio.
Guilherme Gomes dos Santos
Herculano Rocha.
Herculano Rodrigues Pires.
João Alfredo Félix Vieira Lima.
Joaquim José Catanho de Meneses.
Joaquim Sousa Gomes Carneiro.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
José Gomes Fernandes.
José Maximiano de A. Almeida Leitão.
José Maria Parente Mendes Godinho.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Luís Silvério Gonçalves Saias
Manuel António dos Santos.
Manuel Francisco da Costa.
Manuel Joaquim de M. P. Tavares Santos.
Manuel José Bragança Tender.
Rodolfo Alexandrino Susano Crespo.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Teófilo Carvalho dos Santos.
Victor Manuel Gomes Vasques

Partido Comunista Português (PCP)

Alberto Jorge Fernandes
Álvaro Augusto Veiga de Oliveira.
Álvaro Favas Brasileiro
António da Silva Mota.
Carlos Alberto do C. da Costa Espadinha.
Carlos Alberto do Vale G. Carvalhas.
Carlos Alfredo de Brito.
Custódio Jacinto Gingão.
Ercília Carreira Pimenta Talhadas.
Fernando de Almeida Sousa Marques.
Francisco Miguel Duarte.
Hélder Simão Pinheiro.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.
Joaquim António Miranda da Silva.
Joaquim Victor Baptista G. de Sá.
Jorge do Carmo da Silva Leite.
José António Veríssimo Silva.
José Casimiro Sousa Correia.
José Ernesto I. Leão de Oliveira.
José Manuel Aranha Figueiredo.
José Manuel da Costa C. Marques.
José Manuel Maia Nanes de Almeida.
José Rodrigues Vitoriano.
Josefina Maria Andrade.
Lino Carvalho de Lima.
Manuel Gaspar Cardoso Martins.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Maria Ilda da Costa Figueiredo.
Marino B. de Vasconcelos B. Vicente.
Octávio Augusto Teixeira.
Vítor Henrique Louro de Sá
Vital Martins Moreira.
Zita Maria cie Seabra Roseiro.

Centro Democrático Social (CDS)

Adalberto Neiva de Oliveira.
Adriano Vasco da Fonseca Rodrigues.
Alexandre Correra de Carvalho Reigoto.
António Ferreira Pereira de Melo.
Artur Fernandes.
Domingos da Silva Pereira.

Página 601

15 DE FEVEREIRO DE 1980 601

Eduardo Leal Loureiro.
Eugénio Maria Anacoreta Correia.
Henrique Manuel Soares Cruz.
Isilda Silva Barata.
João Daniel Manques Mendes.
João José Magalhães F. Pulido de Almeida.
João da Silva Mendes Morgado.
José Augusto Gama.
José Manuel Macedo Pereira.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
Luís António Matos Lima.
Manuel António de A. e Vasconcelos.
Manuel Baeta Neves.
Maria Tabita L. F. Mendes Soares.
Pedro António J. B. Pestana Vasconcelos.
Rui Eduardo F. Rodrigues Pena.

Partido Popular Monárquico (PPM)

Gonçalo Pereira Ribeiro Teles.
Henrique José Barrilaro F. Ruas.
Luís Filipe Ottolini Bebiano Coimbra.

Agrupamento Parlamentar dos Reformadores

Armando Adão e Silva.

Pelágio E. de A. Matos Lopes de Madureira.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE)

Helena Tâmega Cidade Moura.
José Manuel Marques do C. M. Tengarrinha.

União Democrática Popular (UDP)

Mário António Baptista Tomé.

O Sr. Presidente: - Responderam à chamada 157 Srs. Deputados.
Temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 15 minutos.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Estão em aprovação os n.ºs 11 e 12 do Diário.

Pausa.

Como não há oposição, consideram-se aprovados.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai proceder-se à leitura do expediente.

Deu-se conta do seguinte:

EXPEDIENTE

Moção

Moção de trabalhadores das Minas da Panasqueira, em que exigem das administrações da RDP e da RTP a reintegração de todos os trabalhadores amnistiados e dos órgãos de Soberania o cumprimento da legislação em vigor que lhes é aplicável.

Carta

Carta de! Rui Dias Costa, de Tavira, insurgindo-se contra o aumento d» custo de vida e tecendo considerações a esse respeito.

Ofícios

Ofício do Sindicato dos Professores da Zona Norte a enviar cópia do» ofício que remeteu a todos os agrupamentos partidários com representação parlamentar no qual exprime a sua posição face à ratificação do Decreto-Lei n.º 448/79, de 13 de Novembro.
Quinze ofícios, respectivamente, das Santas Casas da Misericórdia de Vila Nova de Famalicão, Pinhel, Nisa, Moncarapacho, Ailvaiázere, Vila de Red., Torrão, Sarzedas, Leiria, Campo Maior, Ovar, Vala Nova da Barquinha, Marvão, S. João da Madeira e Fundão apelando para que os outros do totobola e da dotaria sejam distribuídos equitativamente por todas as Misericórdias de Portugal e não entregues apenas à de Lisboa.

Telegramas

Telegrama de funcionários do quadro paralelo dos serviços de registos e notariado dê Viana do Castelo solicitando a não ratificação do n,. º 2 do antigo n.º 40 e do n.º 4 do artigo n.º 88.º da Lei Orgânica, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 519-F2/79, por ignorar os direitos adquiridos.

Telegrama de Intermil Camilo Trindade comunicando a falta de pasta de papel e solicitando sejam tomadas as medidas necessárias para impedir a total paralisação do sector.

Telegrama dos oficiais de diligências dos tribunais do Porto, que requereram quadro privativo, solicitando que seja posta à discussão nesta Assembleia a Resolução, e. º 248/79, que suspendeu o artigo 158.º do Decreto-Lei n.º 450/78.

Dois telegramas, respectivamente, de sessenta e seis funcionários do Serviço de Fiscalização das zonas de Aveiro, Coimbra e Leiria e de quarenta e seis em serviço nas zonas de Viana do Castelo, Vila Real, Braga e Bragança e num
abaixo-assinado, cujo primeiro subscritor é João António Quintino Pinho, solidarizando-se com os técnicos superiores daquela Direcção-Geral, ao solicitar a imediata suspensão de inspectores coordenadores nomeados pelos 'Despachos n.ºs 13/79, 14/79 e 15/79, de 22 de Outubro, do director-geral de Fiscalização Económica,
Vinte telegramas, respectivamente, das Santas Casas da Misericórdia das Caldas da Rainha, Póvoa de Lanhoso, Meda, Tomar, Paços de Ferreira, Manteigas, Aveiro, Castro de Aire, Sardoal, Póvoa de Varzim, Oleiros, Torres Novas, Mangualde, Abrantes, Lousada, Évora, Mafra, Albufeira, Braga e Paredes apelando para que os lucros do totobola e da lotaria sejam equitativamente repartidos por todas as Misericórdias.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Na última reunião deram entrada na Mesa os seguintes requerimentos: aos Ministérios da Educação e Ciência e dos Assuntos Sociais, formulado pelo Sr. Deputado José Medeiros Ferreira; ao Governo, formulado pela Sr.ª Deputada Maria José Sampaio; aos Ministérios da Educação e Ciência e dos Assuntos Sociais, for-

Página 602

602 I SÉRIE - NÚMERO 16

mudados pelo Sr. Deputado José Niza; ao Governo. formulado pelos Srs. Deputados Octávio Teixeira, Ilda Figueiredo, Ercília Talhadas, Joaquim Miranda e Carlos Carvalhas; ao Ministério da Educação e Ciências, formulado pelos Srs. Deputado Rosa Maria Brandão e Fernando Rodrigues; ao Governo, formulado pela Sr.ª Deputada Ercília Talhadas; ao Governo, à Secretaria de Estado da Cultura e ao Governo Civil de Aveiro, formulados peio Sr. Deputado Vital Moreira; ao Governo, formulado pelos Srs. Deputados José António; Veríssimo Silva, Ercília Talhadas e Mariano Baptista de Vasconcelos Barbosa Vicente.
Seguidamente, Srs. Deputados, vamos passar à discussão e votação dos votos de protesto apresentados nas últimas sessões pela UDP e pelo PS, referentes ao Encontro Internacional dos Povos em Luta.
Dado que ninguém pede a palavra, passaremos à votação pela ordem de entrada. Assim, votar-se-á primeiramente o voto apresentado pela UDP.
Porém, antes disso, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Pena.

O Sr. Rui Pena (CDS): - Sr. Presidente, requeria à Mesa que cada um dos votos fosse lido antes da votação.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, tenho a informação de que já foram lidos e apresentados à Câmara. O Sr. Deputado Mário Tomé fez apresentação do voto apresentado pela UDP e o Deputado Almeida Santos fez a apresentação do voto do Partido Socialista.

O Sr. Rui Pena (CDS): - Peço desculpa. Sr. Presidente. Houve um lapso da minha bancada, dado que se julgava que estava já para votação o voto apresentado pelo MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Muito bem. Passemos então às votações. Está em votação o voto apresentado pela UDP.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos a favor do PCP, do MDP/CDE e da UDP, votos contra do PSD, do CDS e do PPM e a abstenção do PS.

O Sr. Presidente: - Passemos agora à votação do voto de protesto proposto pelo PS.

Submetido à votação, foi rejeitado, com 77 votos a favor do PS, do PCP, do MDP/CDE e da UDP e 85 votos contra do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Agora, para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.

O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Mal acabados de aprovar uma homenagem aos portugueses que fizeram da revolta e da luta contra a ditadura o sentido da sua vida, pela liberdade e pelo progresso, e eis-nos confrontados com a actuação arbitrária e reaccionária do Governo AD.
O Governo que leva o seu arbítrio, o seu desprezo pela Constituição, pelos direitos fundamentais dos cidadãos, a impedir um encontro de apoio aos povos em luta - em luta contra as ditaduras, contra o - imperialismo e o colonialismo, contra a opressão e a exploração. Uma luta que o povo português já conduziu durante décadas e para o qual de novo se levanta.
Deveria ser motivo de alegria e de orgulho poder ter entre nós, contando as suas vicissitudes, os seus problemas, as suas vitórias, as suas experiências, os valentes e heróicos representantes desses povos, que são o exemplo da dignidade e patriotismo, da coragem e sacrifício, num mundo em que as grandes potências pretendem reduzir os povos e governos a seus meros instrumentos e lacaios.
Pois o Governo Português, que a maioria de direita desta Assembleia apoia,
põe-se do lado dos inimigos dos povos.

O Sr. João Morgado (CDS): - Não diga asneiras, Sr. Deputado.

O Orador: - Ele próprio assume o papel de lacaio zeloso do imperialismo e tudo mexe e remexe para os seus patrões ficarem contentes, e garante que os terríveis estrangeiros, essas estranhas e desvairadas gentes não poderão usar o nosso solo pátrio, abençoado pela Coca e Ppsi-Colas, para daí ofenderem os Estados amigos dos Americanos, logo seus amigos. Estados esses que também reprimem o seus próprios povos ou impõe a sua vontade a outros povos, como seria de bom-tom nós ainda podermos fazer.
Mas se foi derrubada a ditadura, se os povos debaixo do nosso domínio colonial conquistaram a liberdade, eis que o Governo da AD dá livre curso ao seu revanchismo reaccionário e impede a realização do Encontro dos Povos em Luta, ma< permite que o fascista Blas Pinar, talvez porque não seja perigoso para os tais «estados democráticos amigos», venha a Portugal blasfemar na sua linguagem podre de fascista; cobre com a sua bênção o entendimento entre a JSD e os fantoches e colaboradores d? PIDE da Unita; e permite a venda à mais negra e retrógrada ditadura da América Latina, só comparável à de Somoza, à ditadura de Alfredo Strossmer, no Paraguai, de 14 000 espingardas G-3 e 60 morteiros, em 540 caixas, num total de 21 450 kg, via Libreville, no Gabão, transportados ainda este mês.
Os falcõezinhos portugueses não passam, na verdade, de ridículos abutres.
Entretanto, o PS, também ele se insurge contra a atitude governamental, mas na prática contribuiu pela apresentação de outra moção, pena que a Assembleia da República deixasse de tomar, em tempo oportuno, uma posição clara acerca de assunto tão grave.
Com a apresentação da sua moção e a abstenção no voto da UDP, o PS mostra-se incapaz de cortar com a prática ultralegalista conciliatória a que nos habituou...

O Sr. Presidente: - Terminou já o seu tempo, Sr. Deputado.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.

...nomeadamente enquanto o Governo, permitindo o crescimento e fortalecimento dos únicos beneficiários dessa política - as forças de direita, as forças reaccionárias f. os fascistas.
O PS contígua a fazer sinal para a esquerda mas a virar à direita.

Página 603

15 DE FEVEREIRO DE 1980 603

Vozes do PS: - Não apoiado!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Borges de Carvalho.

O Sr. Borges de Carvalho (PPM): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não discutimos hoje, como nunca discutimos no passado, o direito dos povos à insurreição contra a tirania e a opressão.

O Sr. Gualter Basílio (PS): - Nós discutimos. Sr. Deputado!

O Orador - O problema é vosso, Sr. Deputado! Trata-se de um direito inalienável, que decorre do princípio da liberdade política, da liberdade individual, e que é, além disso, fundamento moral da própria existência da comunidade internacional.
Portugal, não só através do seu texto constitucional como das posições políticas, claramente assumidas pelos partidos democráticos, reconhece oficialmente tal direito, o que a todos nos honra como homens públicos e honra o próprio país como membro de pleno direito daquela comunidade. Não foi outro, aliás, o direito exercido pelos Portugueses no dia 2 de Abril de 1974.
A luta pela libertação de povos sujeitos a regime tirânicos ou coloniais tem assumido formas que vão da luta diplomática à luta armada nos territórios a libertar, mas tem também assumido formas de puro terrorismo que têm posto em causa a segurança e a vida de inúmeros inocentes e - posto em causa também a própria aplicação dos princípios e normas que proporcionam a prossecução dos fins que 8 comunidade internacional se propõe realizar.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Que desfaçatez!

O Orador: - Por outro lado, é, em inúmeros casos, extremamente difícil analisar em justiça que lutas desses povos se integram e se fundamentam em aspirações legítimas e quais os que não têm a legitimidade minimamente' exigida ou a perdem, na prática, pela utilização de meios de acção claramente terrorista que repetimos, deliberadamente põem em risco vidas inocentes e bens públicos e privados e que nada têm a ver com a luta libertadora em causa.
Um governo não pode utilizar na apreciação de tal legitimidade os critérios ideológicos de um ou outro sector - de opinião. Tem, sim, que, no respeito pelas normas e princípios do direito internacional, reconhecer, política ou juridicamente, quais aqueles a quem deve dar um apoio> activo ou uma benevolência permissiva. E neste julgamento tem que entrar em linha de conta com os seus compromissos internacionais, com as suas relações diplomáticas e, fundamentalmente, com a imperiosa necessidade de não ofender os direitos, as convicções e a própria credibilidade interna e externa de governos legítimos e amigos.
Assim, porque os critérios de escolha dos movimentos beligerantes que eventualmente viriam a estar presentes na conferência de Lisboa escaparam ao julga mento e ao critério do Governo, que tem por obrigação zelar pelos interesses dos Portugueses e pelas boas relações do País com a comunidade international em geral, é perfeitamente lógica a proibição ala conferência de Lisboa chamada «Dos Povos em Luta», nos termos em que havia sido anunciada.
Portugal não é, como já em tempos terá quase sido, uma qualquer «República das bananas nem, tão-pouco, um local de refrigério para pseudolibertadores ou revolucionários de última hora, ainda que, honra nos seja, possa e deva ser pátria de refúgio de perseguidos por tiranos, perseguidos que tenham atrás de si um passado de luta pela liberdade e pela democracia. Uma posição deste tipo foi. aliás, em tempo, defendida pelo PS.

O Sr. Presidente: - Terminou o seu tempo, Sr. Deputado,

O Orador: - Vou terminar já, Sr. Presidente. Estranhamente, por pura necessidade de fazer oposição a todo o custo, vem agora, com argumentos brilhantemente jurídicos, defender posição diversa. O Governo não pode nem deve, sob pena de não cumprir os seus deveres para com os Portugueses e para com a comunidade internacional, assumir uma atitude acéfala e acrílica em relação a problemas tão graves como este. Por isso que o PPM tenha, em plena consciência democrática e para que à liberdade seja defendida, votado contra a presente moção.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr Deputado Jorge Leite.

O Sr. Jorge Leite (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votámos a favor cos dois projectos de moção - que, apesar da diferente fundamentação, tendem ao mesmo objectivo -, pelas seguintes razões fundamentais:
1.º A medida do Governo é ilegal e arbitrária. O Governo invoca o direito de proibir a participação de estrangeiros em qualquer tipo de manifestações em Portugal.

Vozes do PSD: - Não é verdade:

O Orador - Como se prova exuberantemente nos considerandos cia moção apresentada pelo PS, a invocação do Decreto-Lei n.º 582/76 é um pretexto sem qualquer consistência para um acto arbitrário de negação das liberdades constitucionalmente garantidas.
A nota oficiosa do Governo, da semana passada, pretendendo explicar a sua medida ilegal e arbitrária, é um monumento dei hipocrisia política, quando invoca o princípio da não ingerência nos negócios internos de outros Estados e dever dos Estados se absterem, de organizar, encorajar ou tolerar actividades armadas subversivas ou terroristas contra o regime do outro Estado, que obviamente não poderiam estar em causa, tratando-se como se tratava-se de uma simples conferência.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - 2.º Pela gravidade política e pelo precedente perigoso que esta medida constitui. Pela primeira vez nos últimos anos - que me

Página 604

604 I SÉRIE - NÚMERO 16

recorde, desde o 25 de Abril -, é proibida em Portugal uma conferência internacional de carácter político. É certo que o Governo não a proibiu directamente: «limita-se» a proibir a participação de cidadãos estrangeiros. Mas é óbvio que, por esse meio, o Governo impediu a realização da conferência com o carácter que os seus organizadores pretendiam.
Este facto tem um profundo significado político. Até agora em Portugal todos os sectores políticos puderam levar a cabo iniciativas políticas com a participação de cidadãos estrangeiros.
A decisão do Governo Sá Carneiro-Freitas do Amaral é mais uma manifestação da verdadeira mudança política que este Governo PSD/CDS se propõe executar: é a mudança para a restrição arbitrária, ilegal e inconstitucional das liberdades no domínio interno e para « alinhamento estreito no plano externo

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - O Governo arroga-se o direito - que nenhuma lei lhe confere - de, discricionariamente, proibir a entrada em Portugal e a participação de cidadãos estrangeiros em conferência de natureza política, quando, no seu parecer, conduzam uma luta contra «instituições ou governos legítimos de países democráticos e amigos de Portugal», tal como o Governo discricionariamente os entende.
A partir de agora, enquanto certamente continuarão a ser autorizadas novas conferências sobre a «ameaça russa», cabe perguntar se poderão realizar-se novas conferências sobre o apartheid ou sobre a causa palestiniana; enquanto certamente o Sr. Blas Pinar e o Sr. Giorgio Almirante poderão continuar a proferir conferências promovidas por grupos fascistas portugueses - que, de resto, caem, isso sim, sob a alçada da proibição constitucional de organizações de ideologia fascista - cabe perguntar se não passará a ser proibida a participação de qualquer personalidade política de esquerda; enquanto certamente continuarão d verificar-se em Portugal actos de organização de luta violenta contra Estados amigos ide Portugal, incluindo recrutamento de mercenários, cabe perguntar se passará a ser proibida, por expedita resolução governamental, a realização de uma simples conferência internacional.
Em suma, Sr. Presidente e Srs. Deputados, este acto arbitrário, prepotente, ilegal e inconstitucional do Governo mostra exuberantemente que este Governo não hesita em colocar-se à margem da Constituição e da lei, em infringir flagrantemente as liberdades e o regime democrático. Confirma-se: este é o Governo cada vez mais fora de lei.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PCP - é sabido - não nutre qualquer simpatia particular pelas iniciativas políticas do cariz político daquela que o Governo inutilizou no fim de semana passado. Mas, por isso mesmo, nós, Deputados comunistas, sentimo-nos muito mais legitimados para repudiar essa medida de discriminação política e de proibição arbitrária do exercício de uma liberdade constitucionalmente garantida.
As liberdades democráticas são para todos e não apenas para os amigos do Governo. Esta medida do Governo não pode passar sem o nosso mais vigoroso protesto. Por isso votámos a favor das moções. Não deixamos finalmente de registar a gravidade resultante do facto de...

O Sr. Presidente: - Terminou o seu tempo, Sr. Deputado.

O Orador - Termino já, Sr. Presidente.

... Deputados terem contestado, com a sua votação, um acto de violência administrativa, cuja gravidade não pode ser escamoteada.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro de Vasconcelos.

O Sr. Pedro Vasconcelos (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do CDS, o votar comina os protestos apresentados pio PS e a UDP, quis significar diariamente que apoiou o Governo nas medidas que tomou para preservar a dignidade e independência do Estado perante a insólita iniciativa de promover a participação política activa de organizações estrangeiras em reuniões cujos objectivos em nada se identificam com a violência democrática da comunidade internacional.
Consideramos que o Governo agiu dentro da legalidade.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Qual legalidade?

O Orador - Nenhuma norma nacional ou internacional obriga Portugal a abrir as suas fronteiras a qualquer estrangeiro e nenhum país do imundo concede a estrangeiros o direito incontrolado de reunião ou acção política no seu território.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Dispõe o n.º l do artigo 8.º da Constituição que as normas e os princípios de direito internacional geral ou comum fazem parte integrante do direito português. Estes princípios impõem aos Estados que não permitam, no seu território, a organização de acções hostis contra outros Estados ou que constituam ofensa da sua dignidade. E impõem, também, como se estatui no n.º l do artigo 7.º da Constituição ...

O Sr. Presidente: - Desculpe interromper, Sr. Deputado. Peço à Câmara um pouco de silêncio.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.

... a obrigação de não ingerência nos assuntos internos dos outros Estados.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - É isso mesmo!...

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Que é que isso tem a ver com a conferência?!

O Orador - A alta valia que a comunidade internacional atribui a estes princípios bem se apreende pela constante reiteração que deles fazem os mais solenes textos do direito internacional. Recordo a resolução n.º 2625 (XXV) da Assembleia Geral das

Página 605

15 DE FEVEREIRO DE 1980 605

Nações Unidas, aprovada em 1970, onde se afirma que «[...] cada Estado deve [...] abster-se de organizar, ajudar, fomentar, financiar, encorajar ou tolerar actividades armadas, subversivas ou terroristas destinadas a mudar, pela violência, o regime de outro Estado, assim como deve abster-se de intervir nas lutas internas dei outro Estado».

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Enquanto vocês recrutam mercenários para a UNITA! Que desfaçatez!

O Orador: - Trata-se, aliás, de repetição da declaração aprovada pela resolução n.º 2131 (XX) da mesma Assembleia, aprovada em 1965; do artigo 2.º do projecto de código elaborado pela Comissão de Direito Internacional das Nações Unidas, em 1954; do projecto de declaração elaborado pela mesma Comissão em 1949 e, também, do artigo 7.º da Convenção de Havana, que dispõe expressamente que «os estrangeiros não devem participar em actividades políticas, as quais são do âmbito exclusivo dos cidadãos do país no qual se possam encontrar; no caso de praticarem tais interferências, ficarão sujeitos às penalidades estabelecidas na lei local».
É neste contexto que a participação de estrangeiros sem actividades políticas no território português está condicionada a autorização do Governo.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador - O n.º l do artigo l.º do Decreto-Lei n.º 582/76, de 22 de Julho, a propósito da expulsão de estrangeiros, estatui claramente que a participação activa do estrangeiros em acções políticas, em Portugal, está sujeita a autorização do Governo.

O Sr. Presidente: - Já terminou o seu tempo. Sr. Deputado.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente. Bem fez o Governo em não autorizar que organizações estrangeiras, algumas das quais de legalidade duvidosa e legitimidade controversa, abusassem da hospitalidade portuguesa para conjugar esforços no sentido de derrubar, pela força, os regimes e as autoridades dos respectivos países, como tal admitidos e respeitados pelos demais países da comunidade internacional, com alguns dos quais mantemos, aliás, relações de amizade e estreita colaboração

O Sr. Presidente: - Pedia-lhe que abreviasse, Sr. Deputado.

O Orador: - Para além de legais, as medidas tomadas foram politicamente válidas e oportunas.
Só uma falsa ingenuidade poderia apagar a ligação imediata que se faz no espírito dos Portugueses e na classe política, entre algumas das organizações convidadas e o terrorismo internacional, ^e a verdade é que este não pode ser acolhido num país democrático e pacífico como o nosso. Repugna à consciência da esmagadora maioria dos portugueses o longo historial de montes inocentes de que se orgulham organizações que se dizem representativas de povos em luta. Não há qualquer compatibilidade entre a democracia e o terrorismo; entre a lei da maioria e a violência da minoria; entre o .mandato por grupos armados: entre a mão que vota e a mão que mata.

Aplausos do PSD. do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos igualmente para uma declaração de voto.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, isso que seria para duas declarações de voto, dado que vou justificar a nossa abstenção no voto de protesto apresentado pela UDP e, simultaneamente, o nosso próprio voto de protesto. Por isso, não sei se terei seis minutos para o fazer, não sei qual é a praxe da Assembleia nestes casos. De qualquer modo, penso que me chegam os três minutos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, estou absolutamente convencido de que, depois de todos os outros Srs. Deputados que o antecederam terem excedido sempre os três minutos, e dado que e sempre tão grato ouvi-lo, tem com certeza os seis minutos.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Muito obrigado, Sr. Presidente. Penso, porém, não precisar de tanto.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O voto de protesto apresentado pela bancada do meu partido encontra-se extensamente fundamentado e isso me permite agora ser sucinto.
Infelizmente o Sr. Deputado da UDP não quis ver nessa fundamentação aquilo que eu considero a melhor maneira de ter razão.
A UDP, aliás, vem-se caracterizando por perder a razão que tem, por defendê-la, normalmente, de forma excessiva e nem sempre apropriada.
De qualquer modo, a direcção do meu partido somos nós que a definimos e não precisamos de que ninguém funcione de sinaleiro em relação a nós. E, quanto a isso, penso que tenho dito.
De qualquer modo, quero dizer que se apresentámos um voto autónomo foi exactamente porque uma das alíneas do voto de protesto da UDP nos pareceu menos apropriadamente redigida. Na essência, estamos de acordo com o protesto ínsito no protesto da UDP.
Não for por acaso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que Portugal terá sido escolhido como o local para que nele tivesse lugar este encontro internacional dos povos em luta. Foi certamente, e eu diria seguramente, porque a imagem de Portugal no exterior é hoje, felizmente, depois de muitos anos o não ter sido, a imagem de um país onde os cidadãos podem livremente tecer opiniões e livremente expressá-las.
Foi, portanto, mais uma homenagem a Portugal do que a dificuldade de, na Europa livre e dos direito, do homem, encontrarem outro sítio para poderem encontrar-se.
Duvido, em todo o caso, de que neste momento a nossa imagem seja lá foram a mesma que era há apenas oito dias.

O Sr. João Lima (PS): - Muito bem!

O Orador: - E isto porque por de trás da fundamentação, só aparentemente técnica, do nosso voto

Página 606

606 I SÉRIE - NÚMERO 16

de protesto - e eu não me eximo de realçar que a melhor maneira de defender um protesto é dizer que aquilo contra o que sei protesta é contrário à nossa Constituição, e essa demonstração, foi feita-, para lá disso, há uma profunda apreensão política que consiste fundamentalmente no seguinte: é que nós vimos com muita apreensão este Governo confundir a acção política com o exercício de> um direito fundamental, que é o ter opiniões e exprimi-las livremente.

O Sr. João Lima (PS): - Muito bem!

O Orador: - Não têm nada que ver, em parte nenhuma, acção política activa com ter opiniões e trocar impressões sobre elas. Isto é um direito fundamental que existe na nossa Constituição por forma irrestrita, que se encontra consagrado, também por forma irrestrita na Declaração Universal dos Direitos do Homem, por tal forma que lá se diz que é independente das fronteiras e independente da origem nacional dos titulares desses direitos.
Se efectivamente o nosso Governo propende a confundir ingerência nos outros Estados a acção política activa com o simples direito de ter opiniões e de livremente as exercer, este Governo começa muito mal e, eu não gostaria dei tão depressa voltar a ter, em Portugal, vergonha da política do meu Governo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em política não se pode abusar da ironia, para não dizer do cinismo. E a verdade é que não posso chamar outra coisa se não ironia, ou talvez mesmo cinismo, isto de não proibir um encontro internacional, mas proibir que entrem em Portugal, fechando-lhes a poria na cara, os indivíduos que em nossa casa pretendem encontrar-se, para livremente trocarem opiniões nobre luta da causa que representam.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Parece-me que o actual Governo fez aquilo com que não concorda, que é uma nacionalização. Nacionalizou um encontro internacional e fez com que os únicos delegados que puderam, com sua autorização, reunir-se nesse encontro fossem os nossos próprios delegados, ou seja, os delegados de um país que neste momento já não em liberdades por que lutar. Mas eu não tenho a certeza de que não tenhamos de reiniciar em breve a luta pelos direitos fundamentais no nosso país.

Aplausos do PS e do MDP/CDE. Protestos do PSD, do CDS do PPM.

O Orador: - A verdade, e para terminar, é que a medida nem sequer é original porque o anterior regime muito abusou dela, bastando apenas proibir, por exemple, a entrada em Portugal de Deven, inglês, quando quis vir cá trocar impressões com a oposição portuguesa de então.
Sr. Presidente, Srs. Deputados. Só para terminar, poderia dizer, condensando nesta afirmação toda a gravidade que emprestamos a este problema, que
Salazar não teria sido mais intolerante, nem mais cínico.

Aplausos do PS, MDP/CDE, e de alguns Deputados do PCP.

O Sr. Presidente: - Também para uma declaração de voto tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Roseta.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apenas uma curta declaração de voto, dado que os Deputados da maioria, que usaram já da palavra, justificaram abundantemente a necessidade de votar contra os votos de protesto apresentados.
Porém, não queria deixar de afirmar claramente que o Grupo Parlamentar do PSD se congratula com a rejeição destes votos de protesto, quer da UDP. quer do PS.
Entendemos que a vida internacional não pode ser uma selva. Medidas semelhantes têm sido tomadas por governos de países democráticos da Europa e da América do Norte. Julgamos que uma coisa é a liberdade de expressão, que todos desejamos, outra é a prática de actos de inimizade para com países democráticos, feita através de grupos suspeitos de ligações com actividades armadas ou terroristas, que têm por fim mudar não apenas esse regime democrático de países amigos e até vizinhos, e nalguns casos até de fomentar o desmantelamento desses países através da separação de algumas regiões.
Isso constitui para nós uma flagrante violação dos princípios de direito internacional que, nos termos do artigo 8.º da Constituição, fazem parte integrante do direito interno português.
Como já aqui foi dito, tanto quanto sei, o Governo teve o cuidado de comunicar que não haveria problemas para quaisquer representantes que estivessem credenciados pelas respectivas embaixadas, o que, evidentemente, não sucedeu com uma parte deles.
Julgo que, muito sinteticamente, a dignidade de Portugal impunha a rejeição destes votos. Portugal não pode ser, nem será, um antro daqueles que pela falta de apoio popular, regional ou nacional pretendem mudar regimes democráticos pela violência.

Aplausos do PSD, do CDS e ao PPM.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer um protesto.

O Sr. Presidente: - Queira fazê-lo sucintamente. Sr. Deputado.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Com certeza, Sr. Presidente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apesar de muito respeito e estima que me merece o Dr. Almeida Santos, não posso deixar de protestar por na parte final da sua alocução ter insinuado, senão mesmo dito expressamente, comparar o actual Governo com as práticas do Dr. Salazar.

O Sr. Bento Gonçalves (PSD)- - Eles lá sabem!

O Orador: - Naturalmente que o Sr. Deputado Almeida Santos sabe que o Governo de Salazar nunca foi um governo democrático, ao passo que o

Página 607

15 DE FEVEREIRO OE 1980 607

actual Governo tem a legitimá-lo o voto da maioria do povo português.

Vozes do CDS: - Muito bem!

Vozes do PS: - Olhe que não!

O Orador: - Em segundo lugar, o Dr. Almeida Santos e esta Câmara sabem que há uma diferença fundamental entre ais práticas restritivas que o Dr. Salazar e os seus governos seguiam e a medida actualmente tomada peto Governo de não permitiu em Portugal actividades que estão expressamente proibidas por lei.
A lei invocada pelo actual Governo é uma lei saída depois da Revolução, assinada pelo Presidente da República, General Costa Gomes, bem como pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros, Sr. Melo Antunes ...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço desculpa de o interromper, mas gostada de lembrar-lhe que os protestos têm que ser simultaneamente feitos.

O Orador: - Com certeza, Sr. Presidente.
Só para terminar, gostaria de dizer que se alguém foi intolerante e cínico e só pode ser comparado ao Dr. Salazar foram aqueles que fizeram o decreto: Cosia Gomes e Melo Antunes.

Vozes do CDS: - Muito bem!

Risos do PCP

O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para prestar um esclarecimento.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, para prestar um esclarecimento não pode Certamente é para fazer um contraprotesto.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, se não puder ser para um esclarecimento, então não seira para nada, porque mão tenho razão paira contraprotestar. Não fui ofendido pelo que o Sr. Deputado disse.
Quero então dar um esclarecimento à Câmara, Sr. Presidente

O Sr. Presidente: - Então faça favor. Sr Deputado.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, era só para dizer que eu não comparei Governo a Governo mas acto a acto.

Vozes do PS e do Sr. Deputado Vital Moreira (PCP) Muito bem!

O Sr Presidente: - Srs. Deputados, encontram-se na Mesa unais quatro votos de pesar, apresentados, respectivamente, pelo Centro Democrático Social, pela UDP, pelo MDP/CDE e pelo Partido Socialista.
Pela ordem de entrada na Mesa, segue-se a discussão e votação dos votos de pesar, apresentados respectivamente pelo CDS e pela UDP. Com o seu
objecto é comum, se os Srs. Deputados não se opõem, parece-me conveniente
fazer-se a discussão em conjunto.
Tem a palavra o Sr. Deputado Neiva de Oliveira para fazer a apresentação do voto de pesar do CDS.

O Sr. Neiva de Oliveira (CDS): - É do seguinte teor o voto de pesar do CDS:

Considerando que, no dia 5 de Fevereiro, a motora de pesca Cordeiro de Deus naufragou, ao regressar ao porto da Póvoa de Varzim, em frente da praia de Labruge, provocando o desaparecimento de treze pescadores da Poça da Barca e daquela cidade;
Considerando que, paira além da perda mais que certa de tais vidas, há ainda, a lamentar a situação económica difícil em que se encontram as famílias respectivas, muitas das quais ficaram, por aquela razão, privadas do seu único sustento.
Os deputados abaixo assinados, em nome do Grupo Parlamentar do CDS, não podendo ficar insensíveis à situação angustiosa e dramática vivida pelos pescadores da Póvoa de Varzim e Poça da Barca (Via do Conde), bem como à perda de vidas e bens que os atingiu, vêm, nos termos regimentais, propor o seguinte voto de pesar
A Assembleia da República manifesta o seu mais profundo pesar pelas consequências trágicas do naufrágio da motora Cordeiro de Deus. enviando às populações da Póvoa de Varam e Poça da Barca (Vila do Conde) e, em especial, às famílias enlutadas, a sua mais completa solidariedade, transmitindo-lhes, igualmente, a profunda preocupação com que tem virado a seguir o desenrolar dos dias de angústia e expectativa aí vividos.
A Assembleia da República recomenda, assim, ao Governo da República a tomada das medidas adequadas, designadamente que mobilize os meios materiais e humanos necessários à recuperação dos corpos das vítimas e ao auxílio devido às respectivas famílias, de maneira a que sofram o menos possível as consequências da desgraça que as atingiu.

Lisboa e Palácio de S. Bento, 7 de Fevereiro de 1980. - Os Deputados do CDS; Adalberto Neiva de Oliveira - Domingos da Silva Pereira - João Marques Mendes - Luís Matos Lima - Américo Gomes de Sá - Henrique Soares Cruz - José Augusto Sanches Osório - Vítor Pinto da Cruz - Artur Fernandes - Manuel Azevedo e Vasconcelos - Isilda Sílvia Barata - António Ferreira Pereira de Melo - Eugénio Anacoreta Correia

O Sr. Presidente: - Tem agora palavra o Sr. Deputado Mário Tomé também para fazer a apresentação do voto de pesar do seu partido.

O Sr. Mário Tomé (UDP): - É do seguinte teor ò voto de pesar da UDP!

Página 608

608 I SÉRIE - NÚMERO 16

Considerando:

1 - Que anualmente morrem nas costas portuguesas dezenas e dezenas de pescadores devido à falta de apoio à actividade piscatória e ao estado precário em que se encontra grande parte da frota pesqueira;
2 - Que isso é também devido à inexistência de estruturas portuárias - ou à sua ineficácia - e aos insuficientes meios de socorro e assistência a náufragos e, sobretudo, às condições de vida e de trabalho impostas aos trabalhadores do mar;
3 - Que mais uma vez a família piscatória e, em particular, os pescadores da Póvoa do Varzim e Vila do Conde se vêem enlutados, devido ao naufrágio da traineira Cordeiro de Deus, com a perda de treze vidas, algumas ainda no fulgor da juventude:
A Assembleia da República, reunida em 14 de Fevereiro de 1980, expressa o seu profundo pesar pela morte dos pescadores poveiros vitimas do naufrágio de 5 de Fevereiro de 1980 e exige do Governo a satisfação das justas reivindicações dos pescadores portugueses.

O Deputado da UDP, Mário Tome.

O Sr. Presidente: - Estão em discussão.

Pausa.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Espadinha.

O Sr. Carlos Espadinha (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os pescadores portugueses têm sido uma das camadas mais violentamente exploradas, não só pelos patrões, como até por aqueles governos que nunca quiseram olhar de frente as suas condições de trabalho e a segurança das suas vidas. Por isso, ainda hoje continuam a acontecer casos onde tantos perdem 4 vida.
A Póvoa de Varzim está de luto. Treze homens do mar, treze pescadores, foram engolidos pelas águas e pelo nevoeiro ao largo de Vila do Conde.
Como pescador, em Sines recordo nesta Assembleia mais esta tragédia e saúdo os meus camaradas que continuam a sua faina no mar, ao mesmo tempo que reclamo medidas para que casos destes desapareçam de uma vez para sempre.
Estes meus camaradas não teriam morrido se na Póvoa de Varzim existisse: um porto que lhes desse garantias de entrada.
Já vêm de longe as reclamações dos pescadores da Póvoa, bem como de outras localidades do nosso país, nu sentido de lhes ser garantida a devida segurança. Muitas vezes, depois de andarmos horas e horas debaixo de grandes temporais e de nos livrarmos deles acabamos por encontrar a morte já com a casa à vista, como se costuma dizer, enquanto nenhum dos governos constitucionais se preocupou em fazer um levantamento de todas as carências das nossas barras e dos nossos portos.
Metade das verbas que os senhores do Governo querem dar aos grandes capitalistas e exploradores dá sem dúvida para construir em toda a costa portuguesa portos em condições onde acabem, dei uma vez para sempre, casos como este da Póvoa, que vêm a deixar na miséria dezenas de famílias.
O exemplo da Quarteira é significativo. Numa praia com mais de um milhar de pescadores, onde todos o» anos se assinalavam dezenas de mortos, deixou de haver acidentes. E por quê?
Porque os grandes capitalistas portugueses e estrangeiros resolveram criar ali uma colónia onde só eles pudessem estar, sem que ninguém os incomodasse. Naturalmente também tinham que ter os seus grandes e luxuosos barcos para as suas passeatas de Verão, e então resolveram fazer um porto onde os barcos não pudessem sofrer quaisquer danos. E fizeram-no. Os pescadores não tinham ordem para se aproximar e continuavam a morrer no mar. Mas veio o grande dia libertador do 25 de Abril, os grandes senhores fugiram para os brasis e outros lados, e então os pescadores começaram a utilizar aquelas docas. Hoje os senhores já cá estão outra vez, mas os pescadores também estão, já que entenderam não deverem sair dali.

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Este exemplo não é uma história, é a própria realidade. O que é certo é que se acabaram, para nós, as mortes em Quarteira.
Outra das questões que continua a preocupar-nos é a das condições de segurança e de assistência aos pescadores que pescam em águas internacionais. Durante o ano não são poucos os casos dos que ficam inutilizados por falta de tratamento a tempo. E quando é que os pescadores começarão a ter uma segurança social condigna que garanta também que es seus filhos não fiquem na miséria na sua falta?
Nós sentimos muitos outros e graves problemas. Sobre muitos deles iremos requerer ao Governo que nos dê respostas concretas.
Os pescadores portugueses já realizaram dois encontros onde aprovaram conclusões, todas elas entregues aos responsáveis. Até agora, silêncio. Não admira. Pois, por exemplo, o Sr. João Albuquerque, actual Secretário de Estado das Pescas e que já anteriormente tinha ocupado este cargo, trabalhou em tempos ao lado de Tenreiro...
Para terminar, como pescador e homem do mar e como Deputado comunista, quero aqui expressar o profundo pesar do meu grupo parlamentar pelas mortes dos pescadores da Póvoa e a nossa profunda solidariedade com as famílias das vítimas, bem assim como com todos os pescadores

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Vamos votar favoravelmente os votos em discussão.
Ao mesmo tempo, exigimos que o Governo tome medidas responsáveis que evitem que estas famílias enlutadas fiquem na miséria. Esperamos que tais medidas sejam tomadas rapidamente e sejam diferentes, por exemplo, das que o ditador Salazar prometeu, há cerca de trinta anos às famílias dos cento e sessenta pescadores mortos em Matosinhos. Ainda há bem pouco tempo se descontava meio tostão nas caixas de fósforos para essas vítimas e as suas famílias que quase nada receberam

Página 609

15 DE FEVEREIRO DE 1980 609

Da nossa parte, uma vez mais o afirmamos, os trabalhadores do mar e as suas famílias contam com - nosso apoio fraterno e solidário.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Continuam em discussão.

Pausa.

Como não há mais inscrições, passamos à votação do voto de pesar apresentado pelo CDS.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS, do PCP, do CDS, do PPM, do MDP/CDE e dos Deputados reformadores e a abstendo UDP.

Passamos agora à votação do voto de pesar apresentado pela UDP.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP. do MDP/CDE, dos Deputados reformadores e da UDP e as abstenções do PSD, do e do PPM.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Gomes Carneiro

O Sr. Gomes Carneiro (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PS associa-se aos votos de pesar pelas vítimas do naufrágio da motora de pesca Cordeiro de Deus, entre a Póvoa e Matosinhos, próximo da praia de Labruge. Tratou-se de mais uma tragédia devida não apenas à fúria do mar mas também à sobretudo à incúria dos homens.
Com efeito, os pescadores daquela zona vêm lutando para que a costa seja devidamente apetrechada de portos seguros, nomeadamente o da Póvoa de Varzim, que, nas condições actuais, não oferece garantias mínimas de protecção, como aliás se verificou neste caso.
O PS associa-se à dor dos pescadores, e em especial dos familiares das vítimas, e compromete-se a empenhar-se na concretização urgente dos justos anseios da classe piscatória.
Os pescadores, que fortemente contribuem para a economia nacional, bem merecem o interesse desta Câmara pelos seus problemas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Também para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Adão e Silva.

O Sr. Adão e Silva (DR): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Demos o nosso voto favorável ao voto de pesar apresentado pela UDP, simplesmente não damos a nossa concordância à expressão «exijo» constante desse voto.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Neiva de Oliveira.

O Sr. Neiva de Oliveira (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se bem que a justificação de voto formulado ç apoiado pelos Deputados da minha bancada seja evidente à sociedade, não será nunca de mais vincar a sua real e efectiva fundamentação.
E ela e, indubitavelmente, a de não poderem os Deputados do CDS ficar indiferentes às «reze vidas que, infelizmente, pereceram no mar da Póvoa e à angústia, sofrimento e desamparo, moral e material, s m que se mantêm e. porventura, ficarão as respectivas famílias.
Aprovado o voto de pesar formulado, não pode esta Câmara, em nosso entender, limitar a tal a uma intervenção. Pelo contrário: deverá, aliás, em conformidade com o que justificadamente deliberou, pressionar quem de direito com vista ao desencadeamento das medidas possíveis conducentes, designadamente, à recuperação dos corpos e seus funerais e à compensação justa e digna das suas famílias. É que estas ficarão, se não forem prontamente tomadas as providências devidas, sujeitas à concedida morosidade burocrática na atribuição das magras pensões de subsistência, cuja aceleração pode bem ser implementada por esta Câmara, a que, neste momento, estribado em atitude similar aqui adoptada aquando do sumo que atingiu os Açores, lanço repto no sentido de ser levada a cabo uma campanha de recolha de fundos que contribua para suavizar as grandes dificuldades com que se defrontam.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: - Mas falar só nas vidas que pereceram na dura e arriscada faina do mar e nas famílias que delas dependiam será deixar incompleto um quadro que tem outras determinante» fundamentais. Será, por outras palavras, esquecer a razão profunda e verdadeiramente causal do sucedido
Impõe-se, na verdade, que dentro do escasso tempo que nos é regimentalmente atribuído...

O Sr. Presidente: - Terminou o seu tempo, Sr. Deputado.

O Orador: - Sr. Presidente, como a minha intervenção é um pouco extensa...

O Sr. Presidente: - Nesse caso, pedia ao Sr. Deputado o favor de abreviar e ser sucinto.

O Orador: - Com certeza, Sr. Presidente ... queria apenas chamar a atenção para o estado do porto de pesca da Póvoa de Varzim que tem, de facto, necessidades tão grandes que impõe que todo o país e quem de direito olhe para esse problema, que é uma realidade viva, no sentido de se evitarem situações como a que se registou.
Em síntese, era só isto aquilo que queria dizer, referindo ainda que seria pertinente que o País olhasse para a Póvoa e para o problema dos pescadores não apenas na tragédia e na desgraça mas quando é necessário e a tempo.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Também para declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.

O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A UDP apresentou num voto de pesar pela morte dos treze pescadores poveiros. Mas se considera ser bom todo o apoio que possa ser prestado às famílias enlutadas, absteve-se aquando da votação do voto de pesar apresentado pelo CDS!

Página 610

610 I SÉRIE - NÚMERO 16

Em primeiro lugar, porque não entra no jogo - o CDS promete, o Governo cumpre.
Em segundo lugar, porque rejeite toda a hipocrisia subjacente à apresentação do voto, na medida em que o regime sustentado e imposto pelo CDS levará, como item levado, à morte de muitos mais pescadores, operários, trabalhadores, vítimas da superexploração capitalista.

Protestos do PSD e do CDS.

As piedosas intenções expressas pelo CDS não enganam os pescadores e os operários. Aliás, pergunta-se qual é o «devido auxílio» às respectivas famílias! São os 150 contos globais mais 1 300$ mensais à viúva? Mas isso, além de ser mais do que insuficiente, é um seguro pago pelo próprio pescador à Mútua dos pescadores. Qual é então o auxílio devido pelo Governo? Parece que é a recolha de fundos ...
Em terceiro lugar, porque considera que, paira evitar mais vítimas entre os pescadores, é necessário satisfazer as suas justa reivindicações salariais, as suas exigências de boas condições de trabalho, de regalias sociais, de estruturas portuárias e de socorro e assistência à altura do seu arriscado e corajoso trabalho, de apoio aos seus órgãos de classe e às suas cooperativas.
Não é nesse caminho que o CDS pretende caminhar.
Antes pelo contrário ...

O Sr. Presidente: - Ainda para uma declaração de voto, tem apalavra o Sr. Deputado José Vitorino.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como é evidente, o Partido Social-Democrata associa-se aos votos de pesar que aqui foram apresentados no sentido de lamentar a morte dos treze pescadores poveiros.
Apenas nos abstivemos aquando da votação do voto de pesar apresentado pela UDP devido à terminologia que aí é usada.
Escusado será dizer o grau de risco permanente a que os pescadores de todo o país estão sujeitos e, como já aqui foi abordado, a questão que se coloca é em relação às condições deficientes da maioria dos pontos de pesca portugueses, mas também haverá que ter em atenção as condições das próprias embarcações, quer com vista a aumentar o volume de pesca, quer tombem mo que respeita à segurança das tripulações desses barcos.
De qualquer maneira, o Partido Social-Democrata associa-se a esta grave ocorrência e garante que continuará na sua luta pela melhoria das condições de vida dos pescadores, quer no mar, quer em terra.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Ainda para uma declaração de voto. tem a palavra o Sr. Deputado José Tengarrinha.

O Sr. José Tengarrinha (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nós apoiámos ambos os votos, sobretudo porque nos parecia importante sublinhar não só o nosso apoio como o desta Assembleia no sentimento humanitário pelas vítimas da tragédia.
No entanto, ao apoiarmos ambos os votos, não queríamos deixar de sublinhar a diferença de qualidade, e de objectivos sociais subjacentes num e noutro votos no da UDP e no do CDS.
Parecemos que não é caso para, digamos, uma simples lágrima derramada em qualquer reunião mundana, mas sim para, e nesse aspecto estamos mais de acordo com o espírito do voto apresentado pela UDP, encararmos frontalmente as condições concretas que permitiram tal tragédia e, assim, promover as alterações sociais que permitam que os pescadores trabalhem em melhores condições
Actualmente, é preciso modificar a falta de estruturas portuárias, as pressões económicas, que igualmente são responsáveis, a falta de assistência portuária e de meios de salvamento nas costas portuguesas e até a falta de cultura e preparação técnica.
O nosso sentido humanitário é sobre esta modificação concreta das condições sociais que particularmente incide.

Aplausos da Sr.ª Deputada do MDP/CDE, Helena Cidade Moura.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais declarações de voto e porque decorre já mais de uma hora sobre as 15 horas e 17 minutos a que iniciámos exactamente os nossos trabalhos, declaro encerrado o período de antes da ordem, do dia.

ORDEM DO DIA

Vamos, portanto, entrar ao período da ordem do dia.
Do primeiro ponto da primeira paute da ordem do dia consta a eleição da comissão de apreciação dos actos do Ministério de Agricultura e Pescas (MAP), nos termos da Lei n.º 63/79, de 4 de Outubro, que, par consenso entre todos os grupos parlamentares, foi transferido para a sessão que se realizará amanhã.
Vamos, portanto, passar agora ao segundo ponto da primeira parte da ordem do dia com a proposta de criação de uma comissão eventual de solidariedade e apoio às vítimas do terramoto dos Açores.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Vitoriano paira fazer a apresentação.

O Sr. José Vitoriano (PCP): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: Está ainda bem viva na memória de todos nós a tragédia que atingiu dezenas de milhares de pessoas nas ilhas Terceira, S. Jorge e Graciosa, nos Açores, em consequência do sismo ocorrido neste arquipélago no primeiro dia deste ano de 1980.
Cerca de meia centena de mortos e centenas de feridos, mais de cinco mil fogos completamente destruídos e muitos milhares danificados, mais de vinte mil desalojados, além de muitos haveres materiais t valores culturais e históricos pendidos foi o trágico balanço do cataclismo.
E é mesmo assim, e infelizmente, um balanço insuficiente, pois continuam a morrer pessoas que não resistem aos ferimentos conforme ainda há dias - a imprensa noticiava.
Eu próprio estive mos Açores poucos dias depois da catástrofe e tive oportunidade de verificar, no local, a extensão dos estragos, a situação aflitiva em que ficaram muitos milhares de açorianos e os muitos

Página 611

15 DE FEVEREIRO DE 1980 611

e graves problemas que viveram e vivem as populações afectadas.
A reconstituição da vida económica desses milhares de portugueses e a criação das condições necessárias ao prosseguimento da sua inserção nas ilhas que sempre habitaram e onde sempre trabalharam deverá ser certamente um objectivo central das acções já em curso. A expectativa da emigração, cujas consequências são sempre a sangria dos elementos mais válidos da população, tornar-se-á numa visão aliciante se não forem criadas aos açorianos das ilhas atingidas pelo sismo as condições que lhes garantam na sua terra aquilo (ou boa parte daquilo) que, nas presentes circunstâncias, procurarão encontrar lá fora.
Está assim em causa a própria sobrevivência histórica de toda uma larga zona do território nacional, aspecto não menos relevante para que importa chamar a atenção da Assembleia e do País.
É certo que muitos dos problemas que neste quadro se colocam só poderão ter solução suficiente a médio ou mesmo a longo prazo. Mas é certo também que para outros problemas se poderá e deverá encontrar soluções prontas e urgentes.
Um dos problemas mais graves que neste momento se colocam é, sem dúvida, o do alojamento, logo o da reconstrução, reconstrução que deverá obedecer a um plano criteriosamente delineado e definido pelas entidades responsáveis.
A reconstrução das habitações é uma tarefa cuja responsabilidade e execução cabe em primeiro lugar e directamente ao Governo Regional e à população dos Açores, mas ela diz respeito a todos nós, desde o Governo da República e outros Órgãos de Soberania aos cidadãos deste País.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - A grande maioria da população desalojada continua a viver em alojamentos provisórios, alguns de carácter colectivo, como escolas e outros locais, com todo? os graves problemas que o viver em tais condições coloca e cria, sejam sanitários, sejam de higiene, sejam de desgaste nervoso, etc. Outros estão alojados em tendas, o que também não é solução que se possa manter por muito mais tempo.
Ainda muito recentemente, num documento publicado no Diário de Notícias em nome de um grupo de personalidades açorianas, se afirmava que, para além da urgência de resolver os problemas mais agudos que atingem os desalojados - e passo a citar -, «a experiência destes dias já mostrou que não constitui solução, nem mesmo a curto prazo, o alojamento em barracas e tendas, apesar do bom tempo excepcional que tem feito para a época». Que havia feito, aliás, porque entretanto já choveu bastante e a situação á se alterou. Mais adiante, no mesmo documento, aponta-se para a necessidade de - e volto a citar - «definir - e já tarda - uma política de habitação que responda cabalmente às necessidades sentidas».
A adopção de casas pré-fabricadas como medida a curto e médio prazo para resolver os problemas das barracas é uma direcção apontada por muitos açorianos, nomeadamente pelas referidas personalidades, e que em nosso entender urge pôr em prática.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma das qualidades maravilhosas que caracteriza o homem, para além de ledos os defeitos que também o afectam, é o seu espírito de solidariedade para com o seu semelhante.
Tal como entre as populações atingidas, um grande espírito de solidariedade e de entreajuda se sobrepôs à adversidade e actuou no sentido de a tornar menos dura para aqueles que mais a sofreram, também no Portugal continental e nas ilhas não afectadas um vasto movimento de solidariedade nasceu, desenvolveu-se e prossegue para com as vítimas do terramoto.
E se aos cidadãos individualmente considerados a questão se coloca fundamentalmente como um dever moral, aos cidadãos como colectivo, através dos Órgãos de Soberania do País, o problema é, para além de um dever moral, também um dever institucional.
Fica assim, por todas estas razões, plenamente justificada a proposta apresentada pelo Grupo Parlamentar Comunista da criação de uma comissão eventual de solidariedade e apoio às vítimas do Terramoto dos Açores, proposta que apresentámos, poucos dias após a data da catástrofe, logo no dia 8 de Janeiro, ou seja, há mais de cinco semanas.
O tempo decorrido entretanto não retirou a essa proposta nem a oportunidade nem a urgência.
Como já demonstrámos, a situação que se vive nas ilhas atingidas pelo terramoto e as medidas urgentes necessárias para resolver a situação angustiante em que se encontram as respectivas populações exigem um empenhamento nacional.
Com esta nossa iniciativa, não pretendemos, nem tal seria possível, sobrepor a competência do órgão de Soberania em que nos encontramos às competências das autoridades do poder local e regional e do próprio Governo da República no encontrar de soluções para a resolução deste problema, designadamente através dos organismos criados para o efeito. Aliás, não é a primeira vez que, sem prejuízo dessas competências, a Assembleia da República decide tomar parte activa no amplo esforço nacional de solidariedade e apoio a populações atingidas por situações de grave calamidade. Recordamos aqui a constituição e o trabalho realizado pela Comissão Eventual desta Assembleia para o apoio e solidariedade às vítimas das cheias, comissão constituída com o apoio unânime da Assembleia.
E neste espírito que deve ser encarada a presente iniciativa: no espírito do cumprimento do dever, que à Assembleia da República cabe, de participar nesse esforço colectivo, tanto no domínio da protecção aos interesses das populações como nas tarefas de reconstrução para as quais possam eventualmente ser necessárias medidas concretas da competência reservada desta Assembleia, designadamente, e por exemplo, em matéria de isenções no domínio fiscal. Nesta ordem de ideias, a nossa proposta visa também a sensibilização da própria Assembleia da República, nomeadamente para a necessária consideração de medidas de carácter financeiro ou outras que venham a ser propostas no sentido de minorar os sacrifícios e a angustiante situação dos nossos compatriotas atingidos pela catástrofe.
A constituição desta comissão eventual será, certamente, a mais cabal afirmação de que o Órgão de Soberania da Assembleia da República não está alheado das questões concretas que preocupam o nosso povo e antes está empenhado e solidário na adopção de medidas que possam reparar as graves

Página 612

612 I SÉRIE - NUMERO 16

consequências decorrentes do cataclismo que atingiu a Região Autónoma dos Açores.
Já aqui dissemos que a resolução deste problema e suas incidências exige um grande esforço nacional de que não se pode alhear o povo português, as organizações de trabalhadores, os órgãos de poder local e regional e, como é evidente, os próprios Órgãos de Soberania.
Por isso mesmo, neste quadro, e tendo em vista os objectivos propostos, nos podemos afirmar confiantes e convictos de que a Assembleia será unânime na votação favorável desta nossa proposta.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente António Arnaut.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Castro Caldas para uma intervenção.

O Sr. Castro Caldas (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A nossa bancada solidarizar-se-ia inteiramente com a constituição da comissão anunciada se efectivamente não compreendêssemos a intenção que lhe está subjacente, que seria cooperar na resolução dos problemas que afectam a Região Autónoma dos Açores.
No entanto, devemos dizer que não consideramos que a proliferação de comissões eventuais possa, de algum modo, contribuir para o bom andamento dos trabalhos parlamentares. Entendemos que esta Assembleia deverá ter um papel fiscalizador da actividade que os órgãos regionais, designadamente o Governo e a Assembleia Regional, vêm desenvolvendo e as medidas de política que o Governo irá tomando para resolver os problemas que afectam tão dramaticamente essa região.
No entanto, não podemos concordar que num momento em que encontramos a actividade e os trabalhos parlamentares perturbados por uma confrontação com a nova situação que advém da existência e uma multiplicidade de grupos e de agrupamentos parlamentares, não podemos concordar - repito - que a existência de uma nova comissão eventual possa, de algum modo, simplificar o andamento dos trabalhos desta Câmara.
Portanto, a posição do meu grupo parlamentar é a de não concordar com a nomeação da referida comissão.

O Sr. Presidente: - Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Esteves.

O Sr. António Esteves (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pedi a palavra para apoiar a iniciativa aqui tomada pelo Partido Comunista Português e inclusivamente as palavras proferidas pelo Sr. Deputado José Vitoriano.
Há poucos dias estive nos Açores e tive oportunidade de ver no local como foi trágico o sismo que ali ocorreu. Houve aldeias inteiras que ficaram completamente destruídas e isso é desolador. Só quem por lá passar pode de facto aperceber-se da dimensão trágica que o fenómeno ali teve.
Apesar de ter acompanhado o que se passou pelos meios de comunicação, a ideia que fazia da tragédia estava muito para além daquilo que de facto é possível ver para quem percorre qualquer das três ílha, sinistradas dos Açores. Por isso parece-me inteiramente oportuna a iniciativa aqui trazida à Assembleia da República.
Penso que o fenómeno que ali se passou e o quadro que ali se vê transcendem muito a situação do problema da região autónoma dos Açores. O sismo ocorreu há já quase um mês e meio e, tendo regressado de lá há quatro ou cinco dias, pude ver que de facto as iniciativas levadas a cabo até este momento não são de molde a satisfazer as populações e os sinistrados nas necessidades que advieram do desalojamento daquilo que se calcula ser de 15 000 pessoas e de um deficit de habitação que provavelmente será superior a 4000 fogos.
Trata-se, sim, de matéria financeira, de matéria de meios técnicos e de matéria de capacidade de realização de um problema extremamente grave que, a nosso ver, transcende a capacidade de realização do próprio Governo Regional. Mesmo assim, dentro das disponibilidades do Governo Regional, pensamos que já se poderia e deveria ter feito um pouco mais.
Não queremos fazer daquela tragédia a exploração política que, eventualmente, se pudesse fazer. Não é disso que se trata. Trata-se, sim, de encarar o problema em toda a dimensão da sua gravidade.
Houve um conjunto de donativos que foram entregues, cuja distribuição não tem sido até agora divulgada com muita clareza. Fala-se em linhas de crédito no sentido de apoiar financeiramente a reconstrução de habitações.... mas ainda há cinco dias não havia uma 'definição mínima daquilo que seriam as linhas de crédito da reconstrução. Imediatamente a seguir à catástrofe, como é óbvio, as pessoas estavam mobilizadas psicologicamente para uma reconstrução ...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Esteves, desculpe interrompê-lo, mas vejo uma flagrante e talvez indesculpável desatenção da Câmara, mesmo por parte da bancada do Partido Socialista, a que pertence o orador que neste momento usa da palavra.
Peço portanto, a atenção da Câmara.

O Orador: - Muito obrigado. Sr. Presidente e Srs. Deputados.
Pretendo ser muito breve e gostaria de dizer que a iniciativa levada a cabo pelo Partido Comunista tem, a nosso ver, inteiro cabimento; é o menos que, para já, a Assembleia da República pode fazer e deve a Assembleia, como qualquer dos outros órgãos, oferecer e tentar colaborar com o Governo Regional dos Açores no sentido de, o mais rapidamente possível, resolver os problemas graves e as situações de aflição que ali se vivem.
Assim, Sr. Presidente e Srs. Deputados, damos a esta iniciativa o nosso inteiro apoio.

Aplausos do PS do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Continua em debate.

Pausa.

Não havendo mais oradores inscritos, vou submeter à apreciação da Câmara a seguinte proposta de resolução, que passo a ler:

1 - É constituída a comissão eventual de soli-

Página 613

15 DE FEVEREIRO DE 1980 613

dariedade e apoio as vitimas do terramoto dos Açores.

2 - A comissão terá por finalidade:

a) Estudar e propor medidas, nomeadamente de carácter legislativo, necessárias à reparação dos gravíssimos danos que atingiram as populações:

b) Acompanhar as acções que nesse sentido estejam a ser ou vierem a ser tomadas pelo Governo da República e pelo Governo da Região Autónoma.

3 - A comissão deverá apresentar no prazo de trinta dias um primeiro relatório à Assembleia da República com um balanço da situação e as propostas que tenha por convenientes.

O Sr. Presidente: - Vamos então passar à votação.

Submetida à votação, foi rejeitada, com votos a favor do PS, do PCP, do MDP/CDE e da UDP e votos contra do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa entende não ser necessário proceder à contagem dos votos porque lhe parece evidente que a resolução foi rejeitada por maioria.
Em todo o caso, se algum Sr. Deputado requerer que se proceda à contagem, a Mesa não terá nenhuma dúvida em proceder assim.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, requeiro a contagem.

O Sr. Presidente - Assim se fará, Sr. Deputado Tenham paciência, Srs. Deputados, mas teremos de votar de novo a resolução para procedermos à contagem

Submetida à votação, foi rejeitada, com 100 votos a favor do PS, do PCP, do MDP/CDE e da UDP e 107 votos contra do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Germano Domingos.

O Sr. Germano Domingos (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PSD votou contra a resolução em causa, embora ela tenha para nós um grande significado, por que entende que não será de constituir mais uma comissão eventual

A Sr.ª Teresa Ambrósio (PS): - Isso e hipocrisia!

O Orador: - Logo no primeiro dia, nesta Assembleia, o Si Presidente pediu um voto de solidariedade para com as vítimas do sismo dos Açores; eu próprio agradeci esse voto, no dia 15 de Janeiro o Deputado António Mendes eleito pelo círculo dos Açores voltou a referir-se ao assunto, assim como outros Srs Deputados de outras bancadas; no entanto, existe um governo próprio que, desde a primeira hora, tomou o controle da situação, nomeou um gabinete de apoio a reconstrução, que está a funcionar, e existe ainda uma Assembleia Regional dos Açores que também tem poderes legislativos.
Qualquer assunto que tenha que vir aqui - e natural que venha a acontecer - sobre legislação para o assunto, será veiculado pela Assembleia Regional dos Açores e, certamente, esta Assembleia e todos os Deputados aqui presentes farão todo o possível por apoiar as populações açorianas perante uma catástrofe de tamanha natureza.
Além disso, todos os órgãos de Soberania, incluindo o Presidente da República, tudo o que foi veiculado pelo Sr. Ministro da República, tudo o que foi já trazido até ao Governo Central, e próprio lá foi inteirar-se dos assuntos e está a colaborar desde a primeira hora, tudo isso nos leva a crer, e faremos todos os possíveis para que, em muito pouco tempo, em menos do que aquilo que muita gente possa julgar, a situação será restabelecida.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Também para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr Deputado António Esteves.

O Sr. António Esteves (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: As razões fundamentais do nosso voto já foram explicadas na curta intervenção que fiz há pouco.
Para nós parece que não será compreensível, quer â população açoriana, quer à população do continente ou da Madeira, a atitude que e. maioria tomou em relação a esta constituição da Comissão Eventual.
Sabemos, Sr Deputado Germano Domingos, que há uma Assembleia legislativa, que há um Governo Regional, sabemos que, esta Assembleia é uma Assembleia de âmbito nacional. Não é isso que está em causa. Achamos que temos direito a ser solidários com a população açoriana na resolução deste problema.

Aplausos do PS.

Problemas desta ordem são muitas vezes resolvidos a custa da própria solidariedade internacional. Mal pareceria que todos os portugueses não pudessem comparticipar dos problemas graves que se vivem nos Açores.

A Sr.ª Teresa Ambrósio (PS): - Muito bem!

O Orador: - Porque a tragédia foi muito grande, a população vai, com certeza, ter que aguardar durante muito tempo a solução dos problemas da reconstrução. E nessa altura nós não sabemos como é que a maioria conseguirá explicar à população açoriana se é apenas pelo facto de haver uma Assembleia e um Governo Regional que todo o país não se pode empenhar, como quer e como deseja, na solução daqueles problemas.
A maioria dificilmente explicara, com certeza, essa sua perspectiva aos sinistrados dos Açores.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Ainda para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente

Página 614

614 I SÉRIE - NÚMERO 16

Srs. Deputados: Na intervenção há pouco proferida pelo meu camarada de bancada José Vitoriano justificámos largamente as razões que nos levaram a propor, há cerca de cinco semanas, a constituição de uma comissão eventual de solidariedade e apoio às vítimas do terramoto dos Açores.
Razões abundantes, razões que, passadas cinco semanas, se continuam a manifestar exuberantemente.
Demonstrámos o papel positivo que uma comissão eventual da Assembleia da República poderia desempenhar, inclusive na esfera legislativa. Esclarecemos que uma tal comissão eventual não tinha em vista sobrepor-se ou brigar, por qualquer forma, com o Governo Regional dos Açores, com, a Assembleia Regional ou com as estruturas nacionais que se constituíram junto do Sr. Presidente da República.
Em face de tudo isto, a coligação governamental argumenta dizendo que vota contra porque é contrária à proliferação de comissões eventuais.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Para os Portugueses é!

O Orador: - O voto e a justificação encerram todo um vastíssimo significado político: são a comprovação mais acabada do sectarismo feroz...

O Sr. Angelo Correia (PSD): - Eh!

O Orador - - ... da coligação governamental, do seu totalitarismo.

Vozes do PSD: - Eh!

O Orador: - A coligação governamental vota contra só porque não teve a iniciativa de propor a constituição desta comissão eventual.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Só por isso

Aplausos do PCP, do PS e do MDP/CDE.

Mas, ao demonstrar esse sectarismo, esse totalitarismo quando está em causa a população açoriana atingida pelo terramoto...

O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Exagerado!

O Orador: -..., mostra o que é que o povo português pode esperar desta coligação governamental.
E o povo português e as populações açorianas retirarão daqui, certamente, as suas conclusões.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou só dizer duas palavras porque pensamos que o Partido Comunista e o Partido Socialista já disseram o essencial do que poderíamos proferir sobre a nossa posição.
Contudo, gostaríamos de acrescentar que consideramos que esta Assembleia da República acaba de restringir a sua própria participação e que continuam com uma vocação para governamentalizar a vida nacional fora do espírito e dos valores democráticos.

Aplausos do PS, do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Germano Domingos (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Germano Domingos (PSD): - Sr. Presidente, era para .um esclarecimento à Câmara.

Protestos do PCP e do PS.

O Sr. Castro Caldas (PSD): - Não é regimental!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, apesar de se verificarem objecções por parte de alguns Srs. Deputados, vou-lhe conceder a palavra.
V. Ex.ª pode, se o entender, prestar esclarecimentos à Câmara, mas vamos ver se realmente se trata de um esclarecimento. Contudo, peço-lhe que seja sucinto.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito?

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, é para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputado. É, pois, com muito gosto que a Mesa, durante a minha Presidência, é sempre interpelada.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na reunião dos grupos parlamentares, com a presença da representação de todos os grupos parlamentares, foi decidido cumprir o Regimento e a praxe estritamente, eliminando para sempre a figura regimental e contra a praxe da prestação de declarações ou de esclarecimentos à Câmara. Esta figura não está prevista nem no Regimento nem na praxe e tem servido para impedir o bom funcionamento deste Plenário.
Os dirigentes do Grupo Parlamentar do PSD sabem disto muito bem e ou, esperava que tivessem sido eleva interpelar a Câmara e a explicar que o Sr. Deputado não pode usar desta figura. Se quer protestar proteste, mas faça-o ou por motivos pessoais, que se justifiquem, ou políticos do seu grupo parlamentar, mas não dê esclarecimentos que não lhe foram pedidos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Veiga de Oliveira, como V. Ex.ª interpelou a Mesa, quero dizer-lhe que da minha parte ignorava esse acordo obtido em reunião dos grupos parlamentares, nem tinha que < conhecer. Cumpro o Regimento e ele permite que o Sr. Deputado use da palavra para pedir ou dar esclarecimentos

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Para dar esclarecimentos quando lhos pecam!

Página 615

15 DE FEVEREIRO DE 1980 615

O Sr. Presidente: - Contudo, já que V. Ex.ª, Sr. Deputado Veiga de Oliveira, nos informou desse facto, assim se fará, visto ter que se cumprir esse acordo.
Tem a palavra o Sr. Deputado Castro Caldas.

Ò Sr. Castro Caldas (PSD): - Sr. Presidente, também tinha pedido a palavra simultaneamente com o Sr. Deputado Veiga de Oliveira para interpelar a Mesa e para confirmar que exactamente na reunião dos grupos parlamentares tinha ficado assente esse consenso de que a figura regimental dos esclarecimentos à Câmara não existia. Contudo, não posso deixar passar em claro o pequeno i aparo que o Sr. Deputado Veiga de Oliveira fez em relação à direcção do meu grupo parlamentar porque precisamente no mesmo momento interpelei V. Ex.ª no sentido de se prestar esse esclarecimento.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): mas não tinha reparado.
Peço desculpa,

O Sr. Presidente: - Sendo assim, Sr. Deputado Germano Domingos, um pouco à revelia do Regimento mas de acordo com o combinado na reunião dos grupos parlamentares, V. Ex.ª não pode dar desta vez esclarecimentos à Câmara.

O Sr. João Lima (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito?

O Sr. João Lima (PS): - É para informar V. Ex.ª que também estive presente nessa reunião dos grupos parlamentares e desejava...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa já aceitou isso como cento e por isso não se justificará dar-lhe a palavra paira esse efeito.

O Sr. João Lima (PS): - Em todo o caso, Sr. Presidente, queria dizer a V. Ex.ª que era meu dever corroborar as palavras dos meus colegas que usaram da palavra, até porque elas não traduzem uma posição violadora do Regimento, amimes pelo contrário.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Coimbra.

O Sr. Luís Coimbra (PPM): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PPM votou contra a criação desta comissão, pois somos da opinião de que a sua criação não passaria de um acto tipicamente paternalista e sem qualquer utilidade real, tanto mais que existem nesta Câmara Deputados eleitos pelo povo açoriano; tanto mais que quer o Governo Regional quer a Assembleia Regional! daquelas regiões autónomas, sempre que considerarem que esta Assembleia tem um papel decisivo na reconstrução das olhas afectadas pelo sismo, poderão recorrer à nossa actividade. É para isso que o povo português nos paga, é para osso que estamos aqui.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Que bela teoria!

O Orador: - Por outro lado. as medidas do Governo Central e tio próprio Governo Regional são positivas e começam a surtir os seus efeitos. E mais, as próprias populaças açorianas estão neste momento a iniciar todo o processo de (recuperação e o grupo parlamentar do meu partido só tem a regozijar-se com a situação de grande parte do património, da fachada dos edifícios e, enfim, da imagem da cidade...

Protestos do PCP e do PS.

... que foi destruída e está a ser reconstruída não em termos tecnocráticos, como alguns partidos aqui defendem, mas sim no sentido de se preservar o património daqule arquipélago que é também património nacional.

Aplausos do PPM, do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, permitam-me que vos dê a moinha opinião pessoal sobre o direito do Deputado dar esclarecimentos ou explicações. Esse direito está, pois, consignado no artigo 89.º do Regimento em termos gerais e não pode ou não deve ser derrogado.
Na verdade, nos termos da aliena i) do artigo 89.º, o Deputado pode pedir ou dar explicações ou esclarecimentos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Castro Caldas.

O Sr. Castro Caldas (PSD): - Sr. Presidente, preferia que esse assunto não 'fosse reaberto no Plenário, porquanto o consenso da conferência dos grupos parlamentares decidiu interpretar essa norma no sentido de que seriam explicações que o Deputado prestaria à Câmara sempre que a sua honra tivesse sido atingida por qualquer intervenção.
De facto, no nosso entender e no entender unânime das direcções aos .grupos parlamentares não existe a figura regimental dos esclarecimentos à Câmara que não seja única e exclusivamente esclarecimentos prestados pelo Deputado sempre que a sua honra e consideração ou a do seu grupo parlamentar tenham sido atingidas.
Era, pois, esta a interpretação que a Conferência dos grupos parlamentares deu à norma que o Sr. Presidente acabou de invocar. Portanto, este esclarecimento era para V. Ex.ª, uma vez que essa reunião foi presidida pelo Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado Sr. Deputado Castro Caudas. Os esclarecimentos que me deu não são pertinentes no meu entender, salvo o devido respeito, porque isto que o Sr. Deputado afirma é outro direito que compete ao Deputado e vem no artigo 92.º do Regimento. Contudo, não estamos agora aqui a discutir o Regimento.
Srs. Deputados, vamos agora passar ao ponto seguinte da ordem do. dia, que diz respeito à constituição da comissão eventual de defesa do património da cerca e do Palácio de S. Bento.
Está em discussão.
Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Pena.

Página 616

616 I SÉRIE - NÚMERO 16

O Sr. Rui Pena (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É desnecessário apresentar esta proposta para a constituição de uma comissão eventual de defesa do património da cerca e do Palácio de S. Bento.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - O CDS vai votar contra!

O Orador: - Esta bancada já o fez quando precisamente tomámos a iniciativa da criação desta comissão eventual, e o aplauso unânime que a iniciativa colheu dos demais grupos parlamentares dispensará qualquer outro aditamento.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Gomes Fernandes.

O Sr. Gomes Fernandes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de (referir o apoio da parte do Partido Socialista que já na altura foi expresso aquando da intervenção da Sr.ª Deputada Maria José Sampaio à criação desta comissão. Contudo, queria ainda reforça-lo nos precisos termos de manifestar-mos uma vez unais o interesse que nos vêm merecendo desde há longo tempo estes problemas de defesa do património histórico, arquitectónico e cultural, e, desde já, deixarmos os nossos votos e a nossa abdicação em representação do nosso partido para que esta comissão, a criar-se, como efectivamente esperamos, venha a produzir mm trabalho efectivo e que os frutos do seu trabalho resultem para exemplo e explicação a outros casos em outras situações idênticas por esse país fora, onde há valores do património histórico, arquitectónico e cultural que, infelizmente, estão abandonados.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, chamo mais uma vez a vossa atenção, e faço-o com toda a cordialidade, para prestarem o mínimo de interesse aos trabalhos. Habitualmente, durante o decurso dos trabalhos e mesmo durante intervenções de colegas, não vejo da parte da Câmara a atenção devida.
Tem a palavra o Sr. Debutado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PCP vai votar a favor da moção apresentada pelo Grupo Parlamentar do CDS, como tinha, aliás, ficado dano pelos aplausos que na a trina tivemos oportunidade de produzir à intervenção da Sr.ª Deputada Maria José Sampaio.
O meu camarada Vítor de Sá, que fará a nossa declaração de voto, aduzirá as razões mais largas relativamente à ,nossa posição nesta matéria. Entretanto, o Grupo Parlamentar do PCP estará muito atento à maneira como a coligação governamental votará relativamente à criação desta comissão eventual.
Como se torna evidente que a coligação governamental vai votar a favor desta comissão eventual que aliás, foi proposta à Assembleia depois daquela que propulsemos de soilidariedade e apoio às vítimas do terramoto dos Açores, creio que o voto da coligação governamental mesta comissão eventual vai demonstrar quanto era falso o argumento que há pouco utilizaram para impedir a criação de uma comissão eventual d(c) solidariedade apoio às vitimas do terramoto dos Açores.

Aplausos do PCP, do MDP/CDE e de alguns Deputados do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Castro Caldas.

O Sr. Castro Caldas (PSD): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: Gostaria de fazer uma curta intervenção, já que me é lançado o repto de definir, antes da votação, a posição do meu grupo parlamentar.
É evidente que o meu grupo parlamentar vai votar a favor da constituição desta comissão, já por que ela diz directamente respeito à própria Câmara, à sua organização e à sua projecção para o exterior, e é evidente que nisso estará o empenhamento da minha bancada de consolidai o prestígio das instituições parlamentares.

O Sr Ângelo Correia (PSD): - Muito bem!

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Às nossas comissões eventuais e às dos outros!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Ferreira do Amaral.

O Sr. Ferreira do Amaral (PPM): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de reafirmar o apoio do meu grupo parlamentar a esta iniciativa, que me parece muitíssimo oportunamente levantada pela Sr.ª Deputada Maria José Sampaio, e salientar que não há qualquer comparação possível entre a criação de uma comissão eventual para o património do Palácio de S. Bento e a comissão eventual que acabou de ser rejeitada relativa à tragédia dos Açores.
A primeira razão é simples de verificar, sobretudo para aqueles colegas que queiram verificar o estado de abandono a que estão votadas muitas das zonas e das secções deste Palácio e do património desta instituição, pois o que aqui tem havido é descuido e abandono, ao passo que o que se está a verificar nos Açores relativamente ao remédio da situação criada pelo sismo é exactamente o contrário: é actividade, é preocupação e eficácia na acção para combater os malefícios causados por essa catástrofe.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - É a incompetência e a incapacidade.

O Orador: - Portanto, no caso dos Açores, não e necessária uma intervenção da Assembleia, pois os poderes competentes estão, de facto, a actuar de uma maneira eficaz.
Em segundo lugar, a criação desta comissão permite suscitar uma série de actuações que julgo de primordial importância e para as quais creio que os colegas ainda não estão devidamente sensibilizados, nomeadamente, por exemplo, no que toca à biblioteca e ao arquivo da Assembleia da República.
Há dias tive oportunidade de conversar com a conservadora - não sei se é esse o termo apropriado - e cia queixou-se de que está praticamente sozinha e fazer todo o trabalho relativo à biblioteca e ao arquivo. E que nessa biblioteca e nesse arquivo estão

Página 617

15 DE FEVEREIRO DE 1980 617

não só espécies de uma valia incomensurável sob o ponto de vista do património cultural português e até relativo ao estudo da história política nacional, como estão documentos sobretudo relativos às eleições do século passado, que podem - penso eu - levar a teses e a trabalhos da maior importância na história económica desse século e até do actual.
Portanto, penso que essa comissão poderá vir a ser o embrião do desenvolvimento de um trabalho cultural bastante profícuo por parte de todos os nossos intelectuais, e se há entidade a quem compete imediatamente dinamizar e criar as condições necessárias para que esses trabalhos e esse esmero possam ser levados acabo, é exactamente a Assembleia, são exactamente os Deputados que têm a seu cargo o Governo desta Casa.
Nessa medida, o Grupo Parlamentar do PPM vai com todo o vigor votar a favor da constituição desta comissão e espera que os trabalhos se não reduzam apenas à constituição desta comissão, mas que seja isso o embrião do desenvolvimento de uma série de trabalhos não apenas de conservação do património, mas de desenvolvimento e de iniciativas culturais do maior interesse para todo o Portugal.

Aplausos do PPM, do PSD, do CDS e dos Deputados reformadores.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Adão e Silva.

O Sr. Adão e Silva (DR): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Agrupamento dos Reformadores manifesta-se inteiramente concordante com as afirmações aqui produzidas, quer por parte do PSD, quer por parte do PPM, e abraça-as com o maior entusiasmo.

Aplausos do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estando, portanto, findo o debate desta questão vamos submeter a seguinte resolução à Câmara.
Nos termos dos artigos 48.º e 49.º do Regimento, a Assembleia da República cria a comissão eventual para a defesa do património dia cerca e do Palácio de S. Bento nos seguintes termos:

1 - A comissão é composta por um Deputado de cada grupo parlamentar a designar oportunamente.
2 - A comissão tem por finalidade:

a) A eventariação do património da cerca e do Palácio de S. Bento;

b) A propositura de medidas adequadas à defesa, conservação e salvaguarda do mesmo património.

3 - A comissão funciona durante noventa dias renováveis mediante resolução da Assembleia da República.

Vamos, portanto, passar à votação da criação da comissão eventual de defesa do património da cerca e do Palácio de S. Bento.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto. tem a palavra o Sr. Deputado Vítor de Sá.

O Sr. Vítor de Sá (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português deu o seu voto positivo à proposta para a constituição da comissão eventual de protecção ao património cultural e artístico constituído pelo Palácio de S. Bento, porque uma tal proposta se integra no quadro das nossas perspectivas e propostas em tudo o que foca a protecção do património artístico, histórico e cultural do nosso país.
Entendemos que este Palácio, a despeito das sua" carências funcionais, tem uma unidade arquitectónica que reflecte uma tradição e uma prática seculares: que ao longo desta prática secular se acumulam neste Palácio obras de arte. elementos decorativos, peças de mobiliário, etc., que pela sua caracterização estilística acabam por definir a evolução estética de uma época: que, além destes aspectos materiais e estéticos, se tem acumulado nas suas instalações elementos documentais da actividade parlamentar em diferentes períodos, que constituem uni fundo arquivístico específico e fundamental não só para a história das instituições representativas, como para a história nacional, e ainda para a recolha de elementos relacionados com os problemas económicos e sociais de diferentes regiões do País, assim como para a biografia de numerosos homens públicos.
É por todas estas razões que entendemos dever-se não só preservar os valores patrimoniais deste Palácio, mas ainda dinamizá-los de modo a poderem desempenhar uma função pedagógica junto do público e especialmente das camadas jovens, habilitando, nomeadamente, as escolas a promover visitas de estudo a esta monumento nacional vivo, para o que será necessário organizar serviços apropriados e horários para as visitas, assim como documentação de divulgação adequada, nomeadamente a elaboração de uma monografia adequada.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - No sentido do nosso voto, estão, ainda implícitas três ideias fundamentais:

Uma, a criação de um dispositivo orgânico responsável que possa impedir o enxerto de excrescências e prevenir deteriorações irreparáveis.
Outra, é o alargamento do quadro de pessoal técnico habilitado às funções específicas enunciadas (bibliotecários, arquivistas, conservadores).
Finalmente, temos também presente a sentida necessidade de dotar de instalações condignas, amplas e funcionais o mais valioso arquivo histórico nacional, que é a Torre do Tombo, instalado neste Palácio quando ainda convento, mas cuja transitoriedade dura já há mais de dois séculos.

Aplausos do PCP e de alguns Deputados do PSD.

O Sr. Presidente: - Também para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Gomes Fernandes.

O Sr. Gomes Fernandes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Socialista, tal como já há bocado referi, votou favoravelmente está resolução

Página 618

618 I SÉRIE - NÚMERO 16

pelas seguintes razões: a primeira é a de que já em 1976, pela voz do meu camarada Igrejas Caeiro, o Partido Socialista levantou esta questão nesta Assembleia, manifestando já nessa altura a sua grande preocupação pelo que estava em causa e pela preservação e defesa de tão rico património artístico, arquitectónico e histórico.
Em segundo lugar, porque parece e entende o Partido Socialista, tal como na altura o afirmou, que entretanto foram retiradas deste Palácio algumas peças valiosíssimas, que foram para outros locais. Por isso entendemos que será uma tarefa desta própria comissão inventariar esses factos e, se possível, fazer regressar novamente essas peças a este Palácio.
Em terceiro lugar, e para salientar uma contradição das bancadas da maioria relativamente a este voto, que é da sua proposição e portanto logicamente, votaria a favor, e o voto anterior sobre os Açores, onde, como se sabe, e é indubitável, está em causa e em jogo* um património histórico ei arquitectónico extraordinário e onde, como se sabe e nós lemos elementos muito concretos sobre isso, neste momento se vive cem algumas tibiezas ao nível de decisão e, sobretudo, não se vê uma linha clara de orientação que garanta ao País, e em primeiro lugar ao povo açoriano, a salvaguarda, a reconstituição e a regularização em termos actuais desse património tão rico que por infelicidade foi atingido.

Aplausos do PS e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Oliveira Dias.

O Sr. Oliveira Dias (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do CDS propôs e naturalmente, votou a favor da constituição desta comissão, portanto a favor da resolução que lhe dá vida, uma vez que consideramos que a Assembleia tem deveres particulares relativamente ao património deste Palácio, que' nos termos da sua lei orgânica é património da própria Assembleia, sem prejuízo da sua utilidade nacional.
Este património é, como todos sabemos, composto por obras de ante e documentação de valor inestimável que é mercê estudar, inventariar e fazer servir, efectivamente e na medida de todas as possibilidades, a cultura nacional.
Depois das depredações de que foi alvo num passado antigo e num passado também relativamente recente, urge, por outro lado, tal como aqui já foi dito, tentar ainda recuperar aquilo que for possível deste património dessa maneira prejudicado.
Sem preocupações de estratégia gramsciana que não temos, também entendemos que todo este esforço deve ser canalizado nos termos tecnicamente mais correctos para pôr o património documental e artístico desta Casa ao serviço efectivo do povo português e da sua cultura.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Prezados colegas, ponto seguinte da nossa ordem de trabalhos é a apreciação e votação dos pedidos de urgência solicitados pelo Governo para a discussão dos seguintes diplomas: proposta de lei n.º 289/I, que torna aplicáveis durante o 1.º semestre de 1980 as disposições da Lei n.º 42/77. de 18 de Junho, e legislação complementar excepto quanto à isenção do imposto de selo; e a proposta de lei n.º 290/I, que considera determinadas áreas da Região Autónoma dos Açores afectadas pelo sismo de 1 de Janeiro de 1980, regiões rurais economicamente mais desfavorecidas para efeitos dos benefícios fiscais estabelecidos na lei durante os anos de 1980-1984.
O Regimento manda abrir um debate em que terão o direito de intervir apenas um dos requerentes e um representante de cada partido.
Creio que o Governo, que é o requerente deste pedido de urgência, não está presente, e, assim sendo, darei a palavra aos representantes dos partidos que a solicitarem.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Cravinho.

O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sejam as minhas palavras para lamentar mais uma vez a ausência de um membro do Governo quando o Governo toma a iniciativa de propor o processo de urgência. Já em anteriores intervenções tivemos ocasião de lamentar este procedimento do Governo que, não sendo obrigatório, revela, contudo, menos consideração por esta Câmara.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por isso não queríamos deixar de lavrar aqui o nosso protesto, pedindo que a praxe parlamentar seja respeitada.
Quanto ao teor da proposta em si, gostaríamos de chamar a atenção desta Câmara para dois aspectos: o primeiro é que o Partido Socialista compreende muito bem que o Governo tenha urgência em propor esta medida. Com efeito, vemos que o Governo se apressa a compensar os exportadores da sua medida recente de revalorização do escudo. Compreendemos perfeitamente a urgência do Governo, sabemos que o faz' em desespero de causa, mas nem por isso deixaremos de votar favoravelmente o pedido de urgência.
Quanto ao segundo aspecto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o Partido Socialista deseja realçar que vai votar favoravelmente o pedido de urgência porque entende que esta matéria assim o justifica, porque entende que, de facto, há que encarar a situação criada aos exportadores pelo próprio Governo e, portanto, votará o processo do pedido de urgência.
Contudo, ao fazer isto, quer deixar também muito claro que não votará pedidos de urgência senão quando houver justificação caso a caso e, sobretudo, não votará pedidos de urgência sempre que se tratar de uma proposta de subversão institucional como aquelas que infelizmente o Governo vem lançando sobre esta Câmara.
Por isso, gostaríamos de tornar claro que votamos o processo de urgência, não por simples rotina e por acto cego. mas por uma intenção deliberada de ocorrer a uma situação grave criada pelo próprio Governo em ^desfavor dos exportadores.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Tengarrinha.

Página 619

15 DE FEVEREIRO DE 1980 619

O Sr. José Tengarrinha (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O MDP/CDE vai votar favoravelmente o pedido de urgência feito pelo Governo. Compreende as razões agora aduzidas pelo Sr. Deputado João Cravinho e considera que elas são suficientes para justificar a aprovação por esta Câmara desse pedido de urgência.
No entanto, queria chamar a atenção para alguns aspectos que nos parecem relevantes no estudo a que posteriormente deverá proceder.
Assim, há que ter em conta inúmeros pedidos de alteração de que temos conhecimento feitos por empresários e sugestões apresentadas pelos mesmos; a Lei n.º 42/77 é, em nossa opinião, pouco operacional, muito pesada e burocrática: haverá que simplificá-la, torná-la mais operacional e menos burocrática; salienta-se, por outro lado, o inconveniente de legislar, «caso a caso», isto é, a curtíssimo prazo, estabelecendo regimes sempre transitórios, o que necessariamente gera nos empresários incerteza e indefinição quanto às suas previsões, planos de actividade e orçamentos; dessa má técnica legislativa resulta que as empresas possam vir a tomar compromissos com base em determinadas previsões e expectativas e tenham depois que alterá-las; ou possam ter de defrontar-se com o receio de tomar compromissos face à incerteza do regime seguinte. Isto e, o facto de nau conhecerem as «regras do jogo» válidas por um horizonte de tempo razoável transforma-se necessariamente em factor de perturbação.
Daí que se visse mais vantagem em que a prorrogação que o Governo vai decretar abrangesse não apenas o 1.º semestre deste ano mas todo o ano económico, enquanto se ultimam os estudos com vista a encontrar um regime desejavelmente mais perfeito e duradouro. Finalmente, ao mesmo tempo que o Governo considera que não possui ainda estudos sobre a conveniência em manter ou alterar o regime da Lei n.º 42/77, todavia vai já, contraditoriamente, introduzindo alterações que, pela razão apontada, ainda se não justificariam: é o caso de excepcionar dos benefícios fiscais contemplados na Lei n.º 42/77 a isenção do imposto do selo. Seria preferível prorrogar a lei na sua integralidade, precisamente por se desconhecerem razões que levem a alterá-la num ou noutro sentido.
Por outro lado, o facto de o Governo vir retirar este benefício fiscal traduz-se em mais onerações para as empresas, que deveriam ser tomadas «m linha de conta ou mais bem ponderada.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Angelo Correia.

O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo pediu o processo de urgência para uma proposta de lei tendente a manter por mais seis meses os benefícios fiscais à exportação consagrados na Lei n.º 42/77.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O facto de, quer o Partido Socialista, quer o MDP/CDE, terem antecipadamente explicado e compreendido as razões que justificavam tal prolongamento no tempo da vigência dessa lei é mais do que razão suficiente para explicar o conteúdo da mesma e tomar, portanto, desnecessária a presença de qualquer membro do Governo para explicar aquilo que ao fim e ao cabo já foi traduzido, e muito bem, pelo Sr Deputado João Cravinho.
A intenção do Governo, tanto quanto nos é dado conhecer, è estar presente em discussões que envolvam aspectos de relacionamento da Assembleia com o mesmo Governo. Mas numa questão que é apenas de votação de um processo de urgência e quando os próprios Deputados apoiantes da maioria governamental podem dar as explicações cabais que, no seu entender, legitimam essas propostas, tornam desnecessária e talvez mesmo ineficaz a presença de qualquer membro do Governo, já que a sua argumentação seria repetitiva daquela que nós próprios estamos a fazer. Por isso somos maioria governamental, por isso somos maioria de apoio a um Governo da Aliança Democrática.
As razões, Sr. Presidente, Srs. Deputados, são simples, são exactamente aquelas que o Partido Socialista enunciou, ou seja, no momento em que se lança uma política de revalorização do escudo, há, naturalmente, que prolongar no tempo um conjunto de medidas de manutenção de protecção e apoio à capacidade exportadora nacional, e é por essa razão que propomos isso.
Contudo, aí insere-se uma questão que o Sr. Deputado José Tengarrinha levanta e que é muito importante, que é a de que a Lei n.º 42/77, que, como ele diz e muito bem, é uma lei burocrática, é uma lei que não funciona. Apreciamos bastante a defesa dos empresários que o MDP/CDE fez nesta bancada. Registamos esse facto político, que é inovador, mas de qualquer das formas não podemos deixar de estar de acordo com o Sr. Deputado num ponto: a lei é burocrática e daí a razão de o prolongamento da lei ser apenas por seis meses e não por um período mais dilatado. É que realmente o Sr. Deputado José Tengarrinha tem razão quando diz que é preciso renovar o conteúdo da lei e dar-lhe outro enquadramento.
É precisamente por essa razão que o Governo está já a lançar os primeiros passos para a revisão geral do sistema de apoio exportação. E esse mesmo Governo pensa que o prazo de mais seis meses de vigência da Lei n.º 42/77 será o tempo suficiente para rever todo esse mecanismo e poder lançar uma bateria legislativa que substitua com/aniagens para Portugal esse mesmo sistema.
Por essa razão, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o PSD vai votar favoravelmente o processo de urgência.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM

O Sr. Presidente: - Vamos então passar à votação do pedido de urgência da proposta de lei n.º 289/I.

Submetido à votação, foi aprovado, com os votos a favor do PSD, do CDS, do PS, do MDP/CDE, do PPM e dos DR e com a abstenção do PCP.

O Sr. Presidente: - Está agora em debate o pedido de urgência para a proposta de lei n.º 290/I.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Cravinho.

O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Socialista considera esta matéria muito favoravelmente e apenas gostaria de aduzir ou de lembrar a esta Câmara os argumentos que já foram expendidos pelo meu camarada António

Página 620

620 I SÉRIE - NÚMERO 16

Esteves a propósito da situação nos Açores. E, de facto, urgente que esta matéria seja encarada e lamentável que esta urgência não seja uniformemente compreendida pelo Governo e que ele ou a maioria, selectivamente - consoante, ao que suponho, critérios algo duvidosos, pelo menos tanto quanto esta Câmara os possa apreciar -, venham agora solicitar urgência nuns casos e noutros negar medidas que poderiam ser favoráveis à consideração urgente dos problemas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Ângelo Correia.

O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penso que mais uma vez seria desnecessário fazer a explicação do processo de urgência que o Governo requer para estas propostas de lei. Mais uma vez o Partido Socialista, cuja magnanimidade política neste caso é justo realçar, faz a defesa do próprio Governo.
Curiosamente, o Sr. Deputado João Cravinho vai mais longe, consegue justificar por que é que a maioria dos partidos integrantes da Aliança Democrática não aprovam a criação de uma comissão eventual: porque, necessariamente, como se apoia os Açorianos e a reconstrução económica mos Açores não é através de comissões eventuais de vigilância, de apoio e de solidariedade, mas sim de actos eficazes, que têm relevância concreta no dia-a-dia da vida das populações.

Aplausos do PSD. do CDS e do PPM.

Não podemos, pois, deixar de penhoradamente agradecer mais uma vez ao Sr. Deputado João Cravinho a defesa que fez do Governo.

O Sr. Presidente: - Visto não haver mais inscrições, vamos votar o pedido de urgência para a discussão da proposta dei lei n.º 290/I.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, ambos os pedidos solicitados pelo Governo foram concedidos nos termos do artigo 245.º do Regimento, que estabelece a tramitação supletiva para estes casos, visto que o Governo nada requereu em especial quanto à tramitação da urgência.
Está agora pendente paira ser apreciado um relatório da Comissão de Regimento e Mandatos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Raimundo Rodrigues para a leitura do relatório.

O Sr. Raimundo Rodrigues (PSD): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: O relatório e do seguinte teor:

COMISSÃO DE REGIMENTO E MANDATOS
Relatório e parecer

Em reunião realizada no dia 14 de Fevereiro de 1980, pelas 17 horas e 30 minutos, foi apreciada a seguinte substituição de Deputados.

1 - Solicitada peio Partido Comunista Português:

Jaime dos Santos Serra (círculo eleitoral de Setúbal), por Maria da Conceição Morais Matias. Esta substituição é pedida por um período temporário.

2 - Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que o substituto indicado é real e actualmente o primeiro candidato não efeito ainda não solicitado na ordem de precedência da lista eleitoral de entre os apresentados a sufrágio pelo referido Partido no respectivo círculo eleitoral.

3 - Foram observados todos os preceitos regimentais e legais.
4 - Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:

A substituição em causa é de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

5 - O presente relatório foi aprovado por maioria, com os votos favoráveis ao PSD, PCP, CDS, PPM, MDP/CDE e do Agrupamento Parlamentar dos Reformadores, votos contrários do PS e abstenção da UDP.
A Comissão: Presidente, Mário Júlio Montai vão Machado (PSD) Vice-Presidente, António Cândido Miranda Macedo (PS), Secretário, José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP), Secretário, Alexandre Correia de Carvalho Rei goto (CDS), Fernando Raimundo Rodrigues (PSD), Alcino Cabral Barreto (PSD), Nicolau Gregório de Freitas (PSD), João Baptista Machado (PSD), António Duarte e Duarte Chagas (PSD), Bento Elísio de Azevedo (PS), Herculano Ramos Rocha (PS), Armando dos Santos Lopes (PS), Vítor Manuel Ribeiro Fernandes de Almeida (PS), Álvaro Augusto Veiga de Oliveira (PCP), João António Gonçalves do Amaral (PCP), Lino Carvalho de Lima (PCP), Victor Afonso Pinto da Cruz (CDS), Francisco Gonçalves Cavaleiro de Ferreira (CDS), Domingos da Silva Pereira (CDS), Nuno Maria Monteiro Godinho de Matos (Indep. Ref.), Augusto Martins Ferreira do Amaral (PPM), Luís Manuel Alves de Campos Catarino (MDP/CDE), Mário António Baptista Tomé (UDP).

O Sr. Presidente: - A Assembleia tem alguma objecção a formular?

Pausa

Visto não haver objecções, considera-se operada a substituição em causa.

Srs. Deputados, emitíramos agora na segunda parte da ordem dos nossos trabalhos de hoje com a discussão conjunta de vários diplomas.
Contudo, a Mesa pensa que seria agora conveniente fazermos o intervalo para que a discussão se iniciasse logo a seguir.
Tem a palavra o Sr. Deputado Castro Caldas.

Página 621

15 DE FEVEREIRO DE 1980 621

O Sr. Castro Caldas (PSD): - Sr. Presidente, gostaria de dar um esclarecimento à Mesa no sentido de que as alíneas b) e c) que estavam incluídas na ordem do dia devem ser retiradas, porquanto na reunião dos líderes dos grupos parlamentares ficou reservada a decisão sobre a discussão conjunta para o Plenário. E, no decurso dos trabalhos, foi possível reunir a manifestação de que não existe consenso para que a discussão se faça conjuntamente, pelo que deverá discutir-se unicamente a ratificação n.º 166/I.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, agradeço a sua informação e, portanto, se bem entendi, ficam retiradas da discussão de hoje as ratificações n.ºs 159/I e 172/I.

Srs. Deputados, fademos agora o nosso intervalo e recomeçaremos às 18 horas.

Eram 17 horas e 30 minutos.

Após o intervalo assumiu a presidência o Sr Vice-Presidente José Vitoriano.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão. Eram 18 horas e 25 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos iniciar a segunda parte do período da ordem do dia com a apreciação da ratificação n.º 166/I relativa ao Decreto-Lei n.º 448/79, de 13 de Dezembro, que aprova o Estatuto da Carreira Docente Universitária.
Tem a palavra o Sr. Deputado Pereira de Melo, subscritor do requerimento de sujeição a ratificação do referido decreto-lei.

O Sr. Pereira de Melo (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A publicação de um estatuto da carreira docente universitária constitui um desejo e uma necessidade desde há longo tempo sentidos pelos docentes da Universidade portuguesa.
Desde 1975 que os sucessivos titulares do Ministério da Educação vêm elaborando projectos de lei visando atingir este objectivo.
Finalmente, em 13 de Novembro de 1979, surgiu, sem consulta ou mesmo prévio conhecimento da instituição a que se destina, o Decreto-Lei n.º 448/79.
O diploma legal n.º 448/79 falha, contudo, no seu objectivo, visto sofrer de distorções, erros e omissões de tal modo graves que não pode de forma alguma servir os interesses da Universidade, nem dignificar a carreira profissional que pretende regulamentar. A aplicação das directivas nele expressas causarão irreparáveis perdas numa instituição cuja situação actual é já de si preocupante.
O Decreto-Lei n.º 448/79 é a etapa final de todo um movimento oportunista que num passado recente, valendo-se da flexibilidade do Decreto-Lei n.º 132/70, tomou de assalto o ensino universitário em Portugal.
As suas disposições transitórias (artigos 87.º a 108.º) constituem o conjunto necessário para assegurar a irreversibilidade do processo ao 'garantirem as posições alcançadas, enquanto o restante articulado estabelece duas vias complementares para o mesmo objectivo. A primeira, invocando uma pretensa dignificação da carreira (artigos 12.º e 13.º cria os mecanismos que cortam a ascensão de novos elementos e a Segunda através de promoções administrativas, incentiva o silêncio dos docentes que progrediram ao longo da carreira académica tradicional.
O Decreto-Lei n.º 448/79 concretiza a ideia, já expressa no Decreto-Lei n.º 132/70, da criação de duas carreiras docentes paralelas, pois a par com a carreira tradicional institucionaliza uma carreira de professores convidados (artigos 15.º e 16.º), cujas alternativas desprestigiam o valor intrínseco dos graus académicos. Esta manobra insere-se na política atrás exposta, uma vez que possui o objectivo duplo de gerar aquilo a que podemos chamar de «professores de aviário» (artigo 15.º) e, simultaneamente, afastar os docentes, muitos dos quais com alto nível científico, que embora trabalhando na Universidade em tempo parcial, quantas vezes em condições muito desfavoráveis, provaram possuir inteligência e tenacidade suficientes para obterem os sucessivos graus académicos (artigos 88.º, 90.º).
Sintetizando, os graus de «professor convidado» constituem a porta de saída de professores competentes e a de entrada de incompetentes. O perigo oa carreira paralela é de tal modo grave que se corre o risco de, num futuro, passar a constituir a carreira normal, uma vez que nenhum docente se exporá a reprovar na obtenção dos graus académicos quando existe uma via mais simples e isenta de perigos. Bastará assistir a duas conferências, frequentar três congressos, gozar das benesses de dois catedráticos amigos e contar com a tão em voga prática de tolerância que anima muitos conselhos científicos, para chegar a professor catedrático convidado (artigo 15.º, n.º 2).
As disposições transitórias vibram na qualidade da família docente universitária o mais rude golpe ao promoverem os docentes anteriormente na situação de equiparados, por falta de doutoramento (artigo 95.º) ou agregação (artigo 96.º), a categorias mais elevadas.
As grandes vítimas do Decreto-Lei n.º 448/79 são, sem sombra de dúvida, os docentes que seguem a carreira tradicional. Mais uma vez o processo anti-tradicional é utilizado para proteger o oportunismo! O estabelecimento da necessidade de obtenção do grau de mestrado, para passar de assistente estagiário a assistente, procura dignificar a carreira à custa dos que possuem qualificações para entrar pela porta correcta (artigo 12.º).
Se atendermos que a obtenção de um mestrado em qualquer universidade estrangeira exige regime de dedicação exclusiva durante, pelo menos, um ano logo se compreenderá que a sua instituição no início da carreira de um docente é incompatível com as suas funções (artigo 7.º) e horário (artigo 71.º). A estipulação de uma prova de «aptidão pedagógica e capacidade científica» (artigos 12.º, 53.º a 60.º) como alternativa ao mestrado deixa-nos contando se não estará no ideal do legislador um «mestrado à portuguesa», uma vez que não conseguimos estabelecer um paralelo entre as dificuldades das duas provas. Causa também surpresa o facto de se poder substituir uma prova de índole académica, aberta a todos os estudantes, como é o mestrado, por uma prova com características profissionais e de acesso limitado aos assistentes estagiários.

Uma voz do CDS: - Muito bem!

Página 622

622 I SÉRIE - NÚMERO 16

O Orador: - O índice de qualidade do diploma sujeito a ratificação pode facilmente estabelecer-se pelo facto de permitir que um assistente convidado possa exercer o seu cargo vitaliciamente, «providos por contrato anual, renovável >por sucessivos períodos de três anos» (artigo 32.º), enquanto a um assistente de carreira apenas lhe é permitido estar na carreira docente um número dígito de anos (artigo 26.º), findos os quais ou se doutora ou passa para a carreira técnica superior se não tiver requerido as provas de doutoramento ou tiver nelas sido excluído (artigo 28.º).
Verifica-se assim que, enquanto uns trabalham ao abrigo de um número ilimitado de renovações de contrato, os outros são aliciados a afastarem-se da carreira por disposições que os convidam a não realizar doutoramento, como seja a que prevê a oposição de vencimentos caso o docente peça dispensa de serviço e não requeira o doutoramento (artigo 27.º). Note-se que este processo maquiavélico de multa, já previsto pelo Decreto-Lei n.º 132/70 para as férias sabáticas, é também utilizado pelo Decreto-Lei n.º 448/79 na mesma área (artigo 77.º). É verdadeiramente degradante que um funcionário tenha que repor o seu vencimento por não ter concluído uma tarefa!
As tendências de carácter centralizador constituem, conjuntamente com as repressivas apresentadas, uma faceta constante do Decreto-Lei n.º 448/79. De facto, depois de no preâmbulo defender a descentralização e maior autonomia, consagra o despacho ministerial como mecanismo de decisão normal (artigos 10.º, 15.º, 31.º e 70.º) e estabelece o Diário da República coimo órgão controlador da seriedade da instituição universitária (artigos 13.º, 21.º e 24.º1)
A disposição que estabelece que o conselho directivo e responsável pela elaboração do horário temporal e espacial dos docentes (artigo 68.º> demonstra a mais profunda ignorância do legislador sobre a carreira que pretendeu regulamentar. A responsabilidade e criatividade de um docente investigador universitário não pode ser balizada no espaço e no tempo. As experiências e preparação de aulas são incompatíveis com a eficiência de um horário. O trabalho dos docentes tem de ser medido em termos de resultados alcançados e não em número de horas passadas no serviço.
Outra aberração do Decreto-Lei n.º 448/79 reside na consagração do direito de o assistente poder escolher o seu orientador sem que este tenha que ser previamente consultado ou lhe assista o direito de recusar (artigo 80.º). Esta prática, a concretizar-se, será. sem dúvida, uma boa fonte de conflitos e de investigadores frustrados.
A obrigação de reunião, quase permanente, do plenário do conselho científico para 'tarefas administrativas (antigos 6.º, 7.º, 8.º, 65.º) e escolha e confirmação de (funções docentes (antigos 4.º, 10.º, 13.º, 14.º, 15.º, 17.º, 18.º, 20.º 21.º, 24.º, 26.º, 27.º, 29.º, 30.º 31.º, 32.º, 33.º. 70º, 71.º, 77.º, 81.º, 83.º e 87.º - 23 artigos) decerto que não deixará aos elementos que o compõem muito tampo disponível para aulas e investigação. Note-se que não se pode aplicar o antigo 24.º do Decreto-Lei n.º 781-A/76, que rege a gestão das escolas de ensino superior, no qual se prevê uma delegação de poderes na comissão do conselho científico do grupo ou departamento, pois esta é especificamente referida nos artigos 12.º, n.º 2, 13.º n.º 4, e 16.º, n. º 2. É ainda de notar que a decisão a nível de um plenário, constituído na maior parte dos casos por uma vasta maioria de docentes que desconhecem os 'pormenores específicos dos problemas em discussão, não possui qualquer significado. Perante esta ignorância, e ma ausência de uma disciplina departamental de voto, cada docente vota de acordo com o princípio de não prejudicar o colega muitas vezes em detrimento dos interesses da própria escola.
No respeitante aos níveis de remuneração que o diploma institui em tabela anexa, verifica-se uma excessiva redacção do leque salarial, sem paralelo em qualquer outro país, que mão assegura a justa recompensa por um labor que se pretende progressivamente qualificado nem assegura a manutenção nos quadros Universitários dos profissionais mais competentes.
Quanto à técnica de atribuir uma (remuneração complementar de 35 % aos professores em regime de exclusividade que apresentem um projecto (artigo 70.º) constitui uma grave ameaça à actividade científica. Com efeito, desincentiva a na medida em que, quando muito, lhe atribui o valor de justificação de um suplemento aleatório de vencimento alem de que conduz a uma pulverização de projectos. Como há 35 % instituídos tanto cobrem uma «actividade científica» como «trabalhos de extensão e planeamento», em breve teremos um novo tipo de promoções e até, quem sabe, doutoramentos ((por tarefas administrativas» ou por «serviços prestados».
Do longo articulado do Decreto-Lei n.º 448/79 emergem apenas quatro pontos positivos, a saber: melhoria de vencimentos (antigo 74.º), alargamento de quadros (artigo 74.º), garantia de emprego para os assistentes (antigo 28.º) e o preâmbulo.
As vantagens que destes advêm para os docentes 539, contudo', discutíveis, pois já vimos que a garantia de serviço convida ao não doutoramento e que a técnica da remuneração complementar pode prejudicar a investigação, para além de não se saber se conta para efeitos de reforma. O alargamento de quadros apresentado é também insuficiente, pois relega para supranumerários os actuais professores agregados, mantendo-se a anterior asfixia. Quanto ao preâmbulo, que deixa antever nos cinco primeiros pontos uma canteira docente atractiva e dignificante, não passa de um cenário, uma vez que o extenso articulado que se lhe segue cedo desvanece tal ideia.
Numa tentativa de aproveitar o Decreto-Lei n.º 448//79, pretendeu-se elaborar uma proposta de alterações que o tornassem aceitável. Após longas horas de trabalho, concluímos que mesmo introduzindo 74 modificações em 43 dos 108 artigos que o constituem não era de todo possível construir uma estrutura aceitável, tão maus são os alicerces em que assenta.
Perante esta situação, o Grupo Parlamentar do CDS não pode concordar com a fixação do Decreto-Lei n.º 448/79 como Estatuto da Carreira Docente Universitária. Não vamos, contudo, propor a sua não ratificação ou suspensão, mão parque isso conduzisse a um vazia lega], visto que tal não aconteceria uma vez que este diploma não revoga a legislação anterior, mas porque reconhecemos que os

Página 623

15 DE FEVEREIRO DE 1980 623

pontos positivos do Decreto-Lei n.º 448/79 - melhoria de vencimentos, alargamento dos quadros, garantia de emprego devem ser preservados. Somos, contudo, da opinião de que o Governo, e daqui queremos desde já formular esse convite, promover no mais curto prazo possível, a elaboração e aprovação de um novo Estatuto da Carreara Docente Universitária que, entre outros, obedeça aos seguintes pontos:

a) Tabela de remunerações nunca inferior à prevista no Decreto-Lei n.º 448/79:

b) Alargamento do número de lugares nos quadros de professores para valores não inferiores aos especificados peto Decreto-Lei n.º 448/79:

c) Garantia de emprego para os assistentes que, findo um período máximo de serviço, cumpram determinadas condições;

d) Eliminação da carreira docente paralela;

e) Que sejam consultados, para efeitos de elaboração do novo Estatuto, os órgãos universitários apropriados, os sindicatos de professores e ouvidas as opiniões de grupos e individualidades especialistas no assunto.
Não propomos que o novo Estatuto seja elaborado pela Assembleia da República por julgarmos que apenas o Governo possui os meios técnicos de consulta suficientemente expeditos para permitirem a elaboração do novo decreto-lei, em curto prazo.

Aplausos do CDS, do PSD, do PPM e dos Deputados Reformadores.

O Sr. Presidente: - Continuando a discussão, tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por via desta ratificação, o Estatuto da Carreira Docente Universitária faz entrada na Assembleia após um longo e nem sempre transparente processo legislativo que vem, pelo menos, desde o Ministério Cardia.
Sob um ponto de vista jurídico-constitucional, teria sido justo que esta matéria tivesse passado pela Assembleia antes da sua transferência em letra de lei para o Diário da República, pelo menos naquilo que no Estatuto releva dos «princípios gerais do sistema de ensino» mencionados no artigo 167.º da Constituição da República. Mas também se concordará sem esforço que sem a sua publicação como decreto-lei provavelmente não teria ainda havido estatuto, nem existiria a curto prazo, persistindo assim uma situação de grave carência legislativa, de não satisfação de uma continuada reivindicação do estatuto por parte dos docentes, órgãos universitários e sindicatos.
A existência do Estatuto é, pois, em si mesma, um facto positivo, do ponto em que ele desenvolve sistematicamente o regime da carreira docente universitária, desenha extensamente a função, os direitos e deveres dos docentes, satisfaz expectativas, enfim, alimenta perspectivas de melhoria num sector que há muitos anos vem caracterizando-se peia insatisfação, pela insegurança e pela frustração.
Não e pequeno o saldo positivo deste decreto quanto ao regime de função docente universitária que institui, indo ao encontro de pretensões e expectativas longamente ansiadas. Estão entre esses pontos positivos, designadamente os seguintes: um perfil suficientemente transparente da carreira docente aos seus vários níveis, o alargamento dos quadros de professores em todas as escolas (actualmente sem vagas em muitas delas e outras superlotadas), a instituição do regime de tempo integral e de dedicação exclusiva, a instituição de condições mais favoráveis para os assistentes se doutorarem (dispensa de serviço lectivo, orientação permanente e planeamento de investigação), a garantia de emprego na função pública para os docentes que deixem de o ser (sobretudo para os assistentes que não obtenham o doutoramento), a justificação das votações em deliberações dos conselhos científicos e júris, quer em matéria de recrutamento de docentes, quer na apreciação dos concursos e provas previstos para promoção na carreira, a melhoria de vencimentos, a eliminação do favoritismo (político ou outro) no recrutamento dos assistentes estagiários (agora recrutados obrigatoriamente por concurso), etc.
Mas não são em pequeno número os aspectos criticáveis ou francamente negativos. Por um lado, alguns dos pontos positivos atrás mencionados aparecem pouco rigorosamente desenhados ou de tal modo excepcionados que põem em perigo a sua eficácia. É o que se passa com as excepções à segurança no emprego, quer para os professores auxiliares não reconduzidos, quer para os próprios assistentes; é o caso da deficiente definição de- tempo integrai que, por um lado, acaba por «funcionalizar» o estatuto da docência universitária, e, por outro lado, pode ser integralmente frustrada, já que não impede o desempenho de outras ocupações profissionais paralelas; é o que ocorre com um excessivo alongamento e rigidificação da carreira docente, especialmente na 1.º fase a de assistente -, através do alargamento do tempo de permanência nessa categoria; é o que sucede com os poderes discricionários deixados ao Ministério da Educação para não contratar docentes propostos pelas escolas (por exemplo, recondução de professores auxiliares), violando assim, no seu cerne, a própria autonomia universitária.
Num estatuto da carreira docente universitária há dois aspectos de fundo que importa considerar: em primeiro lugar, a concepção de docente universitário que ele realiza (o que, aliás, pressupõe uma certa concepção de universidade); em segundo lugar, o perfil de carreira docente, isto é, o número e a forma de articulação dos vários níveis de carreira.
A concepção de docente universitário subjacente ao Estatuto e que se encontra descritivamente enunciada no preâmbulo do decreto-lei com suficiente clareza é, a nosso ver, essencialmente correcta. Trata-se de uma concepção que concebe o professor universitário não apenas como um prestador de serviço docente, um dador de aulas, um transmissor de conhecimentos, mas sim como um docente que investiga o que ensina e ensina o que investiga, como um criador e gerador de ciência, como um animador de criação científica e cultural. A nosso ver, ainda, deveria acrescentar-se, como um cidadão da Universidade, interveniente activo em todos os aspectos da sua vida, participante da sua gestão, contribuinte para as tarefas de extensão universitária

Página 624

624 I SÉRIE - NÚMERO 16

Infelizmente não podemos dizei que o regime articulado no decreto corresponda inteiramente a esta concepção ou, sequer, aos aspectos dela explicitamente citados no preâmbulo. Em certas soluções é nítido- o privilegiamento do aspecto estritamente docente, do serviço de aulas, em prejuízo, quer da sua dimensão de investigação e criação de ciência, quer da sua dimensão de participação activa na vida da Universidade. Isso resulta muito claramente, quer do elenco e hierarquização das funções e deveres dos docentes, quer do horário de serviço docente, reduzido ele mesmo a aulas, sem referência a seminários, quer na própria concepção e regime das férias sabáticas. É esse o mesmo vício que ressalta da própria definição do regime de tempo integral, equiparado, nem mais nem menos, à prestação de um número de horas equivalente ao da função pública. Ora, a investigação universitária não se compadece com números de horas nem muito menos com horários. Mas também importa que se diga, muito menos se compadece com aquilo que o Estatuto e alguns dos seus críticos parecem admitir: o exercício de outras profissões paralelas à docência universitária.

Vozes do PCP e do PS: - Muito bem!

O Orador: - O argumento não pode ser invocado contra a burocratização para cobrir, ao fim e ao cabo, a justificação da existência de docentes que só o são em segunda, terceira e quarta via ao lado do segundo, terceiro e quarto emprego que têm ao lado da docência universitária.

Vozes do PCP e do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por isso propomos a correcção de todos estes aspectos.
Uma outra questão que importa considerar é o perfil da carreira docente desenhado no Estatuto. Quanto a este aspecto, o decreto, embora introduzindo novas designações («assistente estagiário» e «professor associado»), não altera, contudo, a estrutura da carreira, que continua com cinco níveis, dois, por assim dizer, vestibulares (assistente estagiário e assistente) e três de professor (agora designados «auxiliar», «associado» e «catedrático»). Na verdade, porém, existe um alongamento e rigidificação da estrutura, já que anteriormente, em várias escolas, já só havia na prática dois níveis de professor (professor auxiliar e professor catedrático), com salto por cima do nível de «professor extraordinário» através da fusão dos concursos para «extraordinário e catedrático».
O que se altera significativamente no decreto-lei é o regime de promoção ao longo da carreira. Isso resulta fundamentalmente do novo regime de graus académicos que entretanto foi objecto de nova regulamentação pelo V Governo, com a criação dos graus de mestrado e de agregação. Enquanto anteriormente a passagem de assistente eventual a assistente dependia de uma apreciação informal dos órgãos da escola, agora a passagem de assistente estagiário a assistente exige ou a aquisição do grau de mestrado ou a realização de provas públicas de aptidão pedagógica e científica; por outro lado, enquanto anteriormente a passagem de professor auxiliar a extraordinário e deste a catedrático se fazia por concursos de provas públicas, agora a passagem de auxiliar a associado e de associado a extraordinário, passará a fazer-se mediante concurso documental de apreciação curricular, exigindo-se, todavia, para a passagem a catedrático a prévia obtenção do novo grau de agregação.
Quando há cerca de um ano aqui foi discutido o decreto-lei dos graus académicos tive ocasião de expender as nossas reservas em relação a muitos aspectos desse novo regime dos graus académicos. Essas reservas mantemo-las no fundamental - e, de resto, já requeremos novamente a sujeição a ratificação do decreto do V Governo sobre o assunto. Os reflexos, porém, desse novo regime de graus académicos sobre a carreira docente, no decreto ora em discussão, parecem-nos traduzirem-se num excessivo alongamento, complexização e sobrecarga da carreira, que pode reflectir-se negativamente na vida universitária.
Isso parece-nos manifesto na fase vestibular da carreira. A nosso ver, os assistentes deviam ser concebidos sobretudo como doutorandos, e tudo deveria apontar para a mais rápida realização do doutoramento. O aspecto mais grave da actual situação universitária, no que aos docentes concerne, é a carência de docentes doutorados, é o facto de uma parte esmagadora do serviço docente em muitas escolas (quase todas) recair sobre os assistentes, por falta de docentes doutorados. A verdade é que as nossas Universidades não produzem doutoramentos ou os produzem a um ritmo nitidamente inferior àquele que seria necessário.
Ora, não é seguro que o Estatuto que, por um lado, traz inovações muito positivas neste campo - não tenha como resultado, por outro lado, contraditoriamente, a manutenção de uma situação na qual, em muitas escolas, o doutoramento não se faz, quando se faz, antes dos 40 anos. Refiro-me designadamente à introdução do grau de mestrado e das provas de promoção de assistente estagiário a assistente.
Em muitos países, importa recordá-lo, o primeiro grau universitário obtém-se ao fim de três anos (eventualmente quatro), o mestrado em dois ou três, o doutoramento em três a cinco, isto é, obtém-se o doutoramento antes ou cerca dos 30 anos. Entre nós, com um primeiro grau de cinco (e até seis) anos -a licenciatura -, prevê-se no decreto mais quatro anos para o mestrado e mais sete para o doutoramento.
É evidente que isso está ligado, em grande parte, a uma concepção extremamente exigente, fixista - e, até, em certas escolas e sectores, fetichista - do doutoramento, vigente entre nós.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Mas não é estulto questionar se a introdução do mestrado e das provas de passagem de assistente estagiário a assistente e, por outro lado, o alargamento dos prazos de contrato como assistente não contribuirão para alongar a preparação do doutoramento e não, como se pretende explicitamente no preâmbulo do decreto e como todos certamente pretenderemos, para o seu encurtamento.
Um outro aspecto susceptível de levantar objecções é o que respeita à hierarquização dentro da carreira docente, em favor dos professores catedráticos, que se manifesta na degradação da categoria de professores associados em relação ã anterior categoria de professores extraordinários - e só uma visão muito pela rama do decreto é que pretenderá fazer crer que

Página 625

15 DE FEVEREIRO DE 1980 625

o actual professor associado equivale ao anterior professor extraordinário -, e também na solução de submeter cada disciplina ou grupo de disciplinas a uma direcção individual encabeçada geralmente num professor catedrático designado pelo conselho científico.
É assim que os professores catedráticos passam a «supervisar a actividade pedagógica e científica dos professores associados e dos professores auxiliares» e que haverá sempre, em cada disciplina ou grupo de disciplinas, um coordenador, nomeado de entre os respectivos professores catedráticos, ou, na falta deles, de entre os respectivos professores associados. Trata-se de inovações que cremos serem extremamente negativas mas que curiosamente não vemos citadas naqueles que veiculam apenas a visam catedrática de crítica a este decreto. Trata-se de soluções que não merecem o nosso acordo, porque, entre outras coisas, põem em causa a autonomia científica e pedagógica que, a nosso ver, está incita na própria concepção de docente universitário.
Pela mesma razão, aliás, agravada, parece-nos censurável a alínea h) do artigo 63.º, que, pela sua própria existência, traduz um atentado à liberdade de ensino e à autonomia científica dos docentes, podendo vir a ser invocado para intoleráveis limitações dessa liberdade e dessa autonomia.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: As disposições transitórias do Estatuto têm constituído um cavalo-de-batalha de alguns sectores de docentes especialmente de catedráticos ou daqueles que já assumem essas vestes contra o decreto, esgrimindo designadamente com alegadas «promoções administrativas» referidas, em particular, nos artigos 87." a 90.º Cabe dizer que achamos algumas das soluções transitórias assaz discutíveis e que não encontram facilmente justificação convincente; num caso até (o do artigo 99.º. n.º 2, relativo aos processos pendentes de equiparação de doutoramentos de pessoas que não foram assistentes) parece que se trata de uma disposição com endereço individual, que nada pode justificar.
Entretanto, haverá que considerar que o próprio tacto da atribuição de categorias por via da lei criou um facto novo, gerador de expectativas que importa considerar, evitando uma precipitada solução de marcha atrás, que poderia criar mais problemas - e, sobretudo, mais injustiça - do que os criados pela lei.
Mas em matéria de disposições transitórias há muitas lacunas a preencher, de modo a contemplar reclamações de patente justeza que vêm sendo levantadas sobretudo em relação aos assistentes e falo neste caso particular pessoalmente com tanto mais à vontade quanto já o fui e já o não sou. Há que prevenir e defender a situação dos actuais assistentes eventuais, que não podem ser agora sujeitos às condições impostas aos assistentes estagiários para a passagem a assistentes, violando a expectativa contratual em que se encontravam; há que estender aos actuais assistentes os direitos à dispensa das funções e à garantia de emprego que agora tendem aos actuais docentes e à garantia de emprego que agora em geral se estabelecem no decreto mas que explicitamente não se estendem aos actuais assistentes; há que resolver o problema dos actuais equiparados a assistentes bem como dos actuais assistentes em comissão de serviço pertencentes aos quadros do ensino secundário, que não podem ser colocados numa situação de insegurança que a sua actual situação contratual de modo algum justifica.
Daí as nossas propostas de alteração aos artigos 92.º e seguintes, que dão satisfação a reclamações, que temos por justas, levantadas quer em reuniões de docentes por nós promovidas - como aquela que o meu camarada Jorge Leite e eu próprio promovemos em Coimbra, há duas ou três semanas- quer em reclamações dirigidas à Assembleia da República por grupos de docentes, órgãos universitários e sindicatos de professores (especialmente se não exclusivamente, é bom dizê-lo, pelo Sindicato de Professores da Grande Lisboa).
Por tudo isto, Sr. Presidente e Sais. Deputados, os deputados comunistas propõem-se votar favoravelmente a (ratificação do Estatuto da Carreira Docente, apresentando simultaneamente um conjunto de propostas de alteração que, julgamos, contribuirão - a serem aprovadas - para o aperfeiçoamento do Estatuto.
O Grupo Parlamentar do PCP de dada desde já opor-se a qualquer eventual proposta de suspensão da aplicação do decreto, seja global seja parcial - como já se sugeriu - do decreto, ao mesmo tempo que reclama a sua aplicação integral, o que não tem acontecido, como se sabe, por decisão administrativa (ilegal, obviamente) do Ministério da Educação. Enquanto não for alterado e na medida em que o seja, o decreto deve ser executado inos seus precisos e exactos termos.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Muito bem!

O Orador: - A posição do Ministério da Educação nesta matéria é insustentável e injustificável.
Finalmente, o Grupo Parlamentar do PCP entende que, uma vez trazido à Assembleia da República, o Estatuto não deve ser devolvido ao Governo para revisão, imediata ou a curto ou médio prazo. Nos termos em que a questão agora está colocada não se compreenderia que a Assembleia da República alijasse as suas responsabilidades e contribuísse, de algum modo, para prolongar um clima de instabilidade e de insegurança que não é propício, antes pelo contrario, para a tranquilidade e trabalho profícuo das nossas Universidades.
O Estatuto é suficientemente satisfatório paira, com algumas obras de aperfeiçoamento, poder transformar-se num bom estatuto. O Estatuto não é a «miséria» que na intervenção anterior se pretendeu dizer. E ao ouvirmos o libelo, em tantos pontos infundado, que aqui foi dirigido contra o Estatuto, o que seria de perguntar se porventura esse Estatuto fosse aquele que, ao fim e ao caibo, foi apresentado pelo II Governo Constitucional? Porque é justo dizer-se que muito do que de mais há neste Estatuto foi aquilo que não foi retirado desse projecto de 1977 e que muito daquilo que nele há de bom foi aquilo que lhe foi acrescentado e aquilo que lhe foi alterado. Diria mesmo que o vício fundamental deste decreto é não interrompido suficientemente com o chamado «Projecto Cardia» de Estatuto da Carreira Docente.
Em todo o caso, devemos afirmá-lo mais uma vez, este decreto-lei é um diploma fundamentalmente positivo que tem. infelizmente, alguns, bastantes,

Página 626

626 I SÉRIE - NÚMERO 16

do que seria desejável, pontos negativos. Importa corrigir os pontos negativos, salvaguardar os pontos positivos e dar a segurança, a estabilidade e a satisfação de expectativas que os docentes universitários do nosso país requerem da Assembleia da República.

Aplausos do PCP do MDP/CDE e do Sr. Deputado Gomes Carneiro (PS).

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura.

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Um estatuto da carreira docente e a consequente definição dos graus académicos que ele implica é uma das peças legislativas mais importantes e mais urgentes para que se concretize o sistema de ensino.
Não tendo ainda esta Assembleia debruçado a sua atenção sobre uma lei de ensino faltam referências para aferir, no concreto, a correcção deste diploma.
O MDP/CDE entende, porém, que as principais linhas orientadoras do sistema de ensino em Portugal têm já um consenso baseado nos objectivos constitucionais. É à luz dessas linhas que vamos referir as tónicas que devem orientar um Estatuto da Carreira Docente do Ensino Superior.
Uma primeira tónica é reconhecer que o ensino superior - tanto ou talvez mais do que qualquer outro- não se efectiva através da presença passiva de alunos ouvindo expor lições, segundo horários pré-fixados.
A aquisição da atitude mental critica e criativa perante a realidade exterior e perante os modelos teóricos que o trabalho dos professores, dos investigadores, vai propondo, só é possível num esforço conjunto de mestres e alunos.
Os alunos só apreendem o conhecimento que recriam e reelaboram e é no acompanhar o trabalho dos alunos, nessa tarefa de apropriação do conhecimento, que se centra a grande actividade do professor.
O professor terá de ser muito mais do que um brilhante expositor de teoria, terá de ser um guia, um orientador, tem de manter a sincera posição interrogativa perante o que vai propondo, dialogando com o aluno, atentando nas suas objecções e dúvidas e quantas vezes esse diálogo permite ao professor inflectir e modificar os modelos teóricos tradicionais!
Tomando como verdadeiro este quadro, o MDP/CDE entende que um estatuto da carreira docente deverá fomentar a dedicação plena ao ensino. O ensino superior não pode ser baseado em professores que têm a sua atenção centrada em actividades que não são o ensino e a investigação - por muito brilhantes que sejam as lições que expõem, de vez em quando, e elevada a capacidade científica ou técnica com que exercem a sua profissão. Ser professor, Srs. Deputados, não é um título, é uma forma de vida.
A meta será ter professores trabalhando permanentemente na escola e aí dividindo a sua atenção e o seu esforço pelo trabalho de investigação, pela preparação dos cursos e' pelo acompanhamento do trabalho dos alunos.
Todos os esforços visando tempos integrais, horários completos na escola e dedicação exclusiva merecem, na generalidade, o nosso aplauso.
O MDP/CDE apoia também, de igual modo, a abertura da Universidade às fontes do conhecimento e do saber, que hoje se diversificam, e que poderão, na medida em que a Universidade a elas seja permeável, tomar expressão mais institucionalizada, fortalecer a Universidade e dignificar a sua acção.
É o caso, por exemplo entre outros, do Laboratório Nacional de Engenharia Civil, que, por preconceitos «rácicos», não foi fundado em ligação com o Instituto Superior Técnico, e hoje é não só um local de investigação, mas uma escola de formação de renome mundial.
Dentro de critérios rígidos de qualidade, o MDP/CDE apoia as diferentes vias de entrada na docência universitária, pensando, para além disso, que elas são uma forma de vencer o vazio deixado por quarenta e oito anos de fascismo, quanto à qualidade e quantidade de docentes. Por isso nos parecem também as disposições transitórias deste decreto-lei uma forma correcta de se ultrapassar, de momento, uma estrutura ancilosada e desmobilizante.
Concordamos também que não se afunile a carreira docente de forma a encimar todo o esforço no catedrático. É conhecida a situação de cursos, onde a filosofia expressa do catedrático era catedrático, estou cá eu, chega!
O MDP/CDE entende que há muitos professores agregados e extraordinários que têm uma formação extremamente actualizada, que realizaram doutoramento em faculdades estrangeiras ou em Portugal e fizeram-no em contacto com o conhecimento mais actualizado; a sua promoção a posições em que possam orientar o trabalho científico, representa um avanço rápido no sentido em que a Universidade portuguesa tem de se orientar.
Só podem recear este rejuvenescimento e esta actualização os que temem os confrontos com as suas posições desactualizadas!
A flexibilidade inerente a uma estrutura viva dentro da Universidade deve permitir a diversificação dos meios cê avaliação, obrigando-se, no entanto, os conselhos científicos, pedagógicos e de gestão a defender a dignidade do acesso à Universidade e a transição dos vários graus deverá privilegiar as provas clássicas da carreira docente, considerando, em cada caso, as substituições aconselháveis e os elementos a tomar em conta.
De igual modo, damos o nosso acordo à avaliação permanente da capacidade científica e pedagógica, mas não concordamos, no entanto, que os relatórios sejam publicados no Diário da República, mas sim eventualmente, em revista da própria Universidade. O estabelecimento desta dinâmica impede que o professor universitário nasça e morra na sua Universidade, dando a público apenas a tese de doutoramento, como resumo de todo o esforço e de todo o diálogo com os alunos.
Na análise objectiva deste decreto o MDP/CDE entende que não se deve esquecer a realidade de que partimos: uma Universidade esvaziada durante gerações e gerações, sequestrada nas próprias paredes institucionais.
A abertura e a dinâmica que marcam a renovação da Universidade podem agora encontrar possibilidades

Página 627

15 DE FEVEREIRO DE 1980 627

de expressão neste decreto onde pontos essenciais estão suficientemente contemplados, apresentando este ainda a possibilidade de qualquer profissional se propor como professor convidado, o que intensifica o diálogo entre a Universidade e o meio profissional, medida que pensamos ser relevante e que apoiamos.
A via normal para o recrutamento de docentes deverá ser, no entanto, o concurso e a escolha entre os candidatos deverá basear-se em factos concretos e de análise objectiva: publicações científicas ou técnicas, actividades de ensino e profissionais.
Qualquer que seja o tipo de provas ou de documentos «m que se baseará a apreciação do júri, essa apreciação deverá implicar a plena responsabilização A& quem a faz. Não entendemos, assim, que uma votação secreta tenha mais dignidade do que uma votação nominal, justificada. Quem afirma que, extintas as votações secretas, nunca mais haverá reprovações nos concursos, está a fazer uma lamentável ideia da seriedade dos professores.
As decisões nos concursos devem ser altamente responsabilizantes. Deve saber-se quem aprova, quem reprova e por que o faz.
Consideramos neste ponto a legislação proposta altamente louvável e fulcral para o estabelecimento de uma relação de objectividade científica dentro da Universidade.
que a votação secreta levou, permanência da bola preta, que carregava de concurso mediocridade, da frustração júri, independentemente de e moral são opostas ao ensino podem ter lugar na Universidade.
Não podemos esquecer em muitas Faculdades, à em todos os concursos, para concurso o peso da e de raiva de alguém do qual fosse o candidato!
A cobardia intelectual e ao aprender, não universidade.
O MDP/CDE entende que o prosseguimento de uma carreira no ensino superior exige dedicação, opção por valores que não são os da riqueza ou do poder e, simultaneamente, uma permanente, e quantas vezes esgotante, tenção de espírito que tem de prosseguir no estudo, por vias novas e difíceis do conhecimento.
A consagração do docente às tarefas que vão constituindo a sua carreira universitária exige tranquilidade e paz de espírito; não é compatível com uma permanente incerteza quanto ao seu futuro, quanto aos caminhos que pode seguir e mesmo quanto ao sustento material para si e para a sua família.
Por isso o MDP/CDE aprova todas as disposições que garantam a continuação da carreira aos docentes com sucesso em provas e concursos e também aprova todas as disposições que garantam um lugar no serviço do Estado, sem redução de remuneração, aos docentes obrigados a abandonar a carreira do ensino.
Por estas razões, embora tendo em conta o direito à mobilidade no trabalho, o MDP/CDE entende que a entrada dos professores numa escola, por transferência de outras escolas, se deve rodear de extremas precauções: em caso algum a transferência de um professor deverá cercear as legítimas possibilidades do docente que está a fazer uma carreira normal, dentro da escola.
De sector para sector, de Universidade para Universidade, de escola para escola, são diferentes os condicionamentos, os problemas as necessidades e as metas específicas. Por isso, uma real responsabilização dos corpos colectivos e dos órgãos de gestão das instituições deverá estar em paralelo com uma autêntica autonomia.
Seria irrealista pensar que uma tal situação se cria fora de um quadro de uma grande democraticidade que assegure aos vários órgãos e individualidades que actuam no campo da coordenação e do contrôle uma autêntica representatividade. Nesse sentido sugerimos modificações.
A autonomia da Universidade, dado teoricamente aceite, não é compatível com o medo do poder que gera as cadeias hierárquicas centralizadoras. Desde a nomeação dos reitores, que deixaram de ter a dignidade de membros eleitos, obra de Governos anteriores, até aos actos de aterrada prepotência que já se desenham neste Governo, há todo um caminho inverso a ser percorrido. Aqui a mudança será útil e desejável!
Perante este enquadramento genérico, o MDP/CDE entende que o decreto-lei consagra princípios que, se bem entendidos, significam um aumento da autonomia das instituições do ensino superior, o seu enriquecimento. Nesse sentido, o MDP/CDE, votará a favor da ratificação e da sua baixa à Comissão de Educação.
De facto, o diploma abre muitas portas e fica a residir nos órgãos de gestão das escolas, designadamente nos conselhos científicos, o poder de utilizar essas portas ou de as fechar.
Aos vários conselhos que governam as escolas cabe agora regulamentar em muitos aspectos a aplicação do novo estatuto. Da maneira como o fizerem depende a dignificação do ensino. Nós esperamos que a dinâmica institucional possa ser correctamente expressa através dos seus órgãos representativos.
O ensino superior, Srs. Deputados, é um ensino caro e organizá-lo e dignificá-lo não será possível sem um grande aumento de despesas.
Mesmo que fosse desejável, que não é, não vemos como se possa organizar uma rede de ensino superior sem, a curto prazo, criar, através da Universidade, serviços à colectividade que minorem os seus custos e aumentem a sua eficiência.
Em resumo, as alterações que o Movimento Democrático Português irá apresentar visam:

1) Promover a presença de docentes nas escolas dando-lhes maiores possibilidades de dedicação predominante, executivo mesmo exclusiva, ao ensino e à investigação que o deve acompanhar:

2) Procurar melhorar a carreira docente dando facilidades aos docentes paira a obtenção de graus académicos (dispensa de serviço, orientadores); melhorando a objectividade das apreciações em prova e concurso? (concursos documentais, votações no mais); garantindo a estabilidade no e prego;
3) Procurar rejuvenescer os quadros dr com grande vantagem para a acti-

Página 628

628 I SÉRIE - NÚMERO 16

e para a orientação do ensino e da pesquisa;

4) Dar poderes aos órgãos de gestão para conduzir a política científica das escolas com grande autonomia.

O MDP/CDE está consciente de que o contexto do actual Governo confere certo tom irrealista ao decreto-lei; ele está pensado para servir uma sociedade planeada, responsável, dialogante, aberta e participada. Mas os governos são passageiros, e as sociedades seguem seu caminho natural!
É significativo que este decreto, que trata dos mais sagrados direitos de uma classe, como a dos professores, seja discutido sob o signo da ilegalidade e de uma verdadeira mudança: legislar por telex, como já c do conhecimento público!
O Sr. Ministro da Educação, utilizando meios altamente sofisticados e verdadeiramente inéditos, serviu-se dos reitores da Universidade para ferir os professores universitários.
Os reitores aceitando ser nomeados, e por vezes contra a vontade expressa da Universidade, estão obrigados - mesmo que a alguns o gesto insensato assuste - , a transmitir as ordens do Governo. É uma situação que urge rever.
O gesto do Sr. Ministro da Educação não poderá ser considerado uma precipitação, mas deverá antes alertar todos os democratas desta Assembleia, qualquer que seja o pautado em que se encontrem.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Qualquer que seja a nossa posição ideológica, por diferentes que sejam os valores que defendemos, por diferentes que sejam os objectivos que aqui nos trazem, uma mesma responsabilidade pesa em todos nós.
Na rua, manifestam-se hoje milhares de homens e mulheres, para muitos dos quais a escola nunca se abriu; para outros precocemente se fechou e foi substituída pelo monte, pelo campo, peia oficina, pelo emprego ou pela simples marginalização social, graças à falta de habitação, de transporte, de roupa e de comida. Tudo isto acontece contra a motivação individual, contra o projecto de vida do homem, contra, na grande maioria das vezes, a sua capacidade intelectual. Estas mulheres e estes homens representam hoje a grande força do trabalho nacional, é nessa força que assenta a possibilidade de estarmos aqui no desempenho correcto da nossa função, tentando melhorar a estrutura da nossa Universidade.

O MDP/CDE associa-se à sua luta e presta-lhes a sua homenagem.

Aplausos do PCP e do Sr. Deputado José Tengarrinha (MDP/CDE).

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Barrilaro Ruas

O Sr. Barrilaro Ruas (PPM): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A posição do PPM acerca do Decreto-Lei n.º 448/79 resume-se nos seguintes pontos:
Primeiro, a manifesta intenção igualitária que constitui a linha mestra do diploma tem certamente o aspecto positivo de tudo quanto procura o equilíbrio e a justiça.
E, no entanto, é aí mais saliente o aspecto «negativo, porque, quando o princípio da igualdade se degrada ao nível da ideologia, o que ele promove é o nivelamento arbitrário e não a equidade respeitadora dos valores e a verdade é que o decreto-lei de 13 de Novembro é essencialmente uma tentativa artificial e, em certos casos, ridícula, de retirar ao professor universitário o que é próprio da sua função de uma dignidade que se reflecte sobre todos os cidadãos e sobre a comunidade.

Vozes do PSD e do PPM: - Muito bem!

O Orador: - Segundo, a mesma atitude cegamente niveladora levou o legislador a aumentar, na prática, os poderes do Governo, em detrimento dos direitos da Universidade. Efectivamente, conforme tem sido acentuado por diversos conselhos científicos e grupos ide professores, o diploma em causa, depois de elaborado sem audição bastante dos interessados, é um convite à intervenção de critérios políticos e de poderes governamentais «um campo que deve estar, a mais possível, protegido contra tais intromissões.
Terceiro, o decreto-lei contraria o princípio, fundamental numa visão moderna da Universidade, ida ligação intima entre o ensino e a investigação. Contraria-o quando trata as duas actividades como compartimentos a bem dizer estanques. Contraria-o, quando, por exemplo, se, por um lado, força um professor a orientar os trabalhos de um assistentes que para tal o tenha escolhido, por outro lado limita indevidamente a liberdade de trabalho intelectual do mesmo assistente.
Quarto, o Decreto-Lei n.º 448/79 beneficia injustamente alguns dos actuais docentes sobre os futuros candidatos.
Quinto, tem o Decreto-Lei n.° 448/79 alguns aspectos menores que também não devem deixar de st mencionar. Parece inadequado, por um lado, que alguém possa candidatar-se a convidado e, por outro, que alguém seja honrado com o convite para simples assistente.

Uma voz do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Sexto, alguns momentos francamente positivos do diploma - como o dos vencimentos que por natureza, não podem ficar sujeitos a longa reflexão - bastam para que o Grupo Parlamentar do Partido Popular Monárquico vote na generalidade a ratificação do Decreto-Lei n.° 448/79, sem prejuízo da evidente necessidade de emendas a introduzir pela Comissão e até sem prejuízo do desejo de que o próprio Governo tome, em tempo oportuno, a iniciativa de legislar neste campo, depois de ouvidos, com o cuidado que se impõe, os organismos competentes e interessados.

Aplausos do PPM, do PSD, do CDS, dos Deputados Reformadores e do Sr. Deputado
José Luís Nunes (PS).

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.

O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com a publicação pelo V Governo

Página 629

15 DE FEVEREIRO DE 1980 629

do Decreto-Lei n.º 448/79, que define o esquema pelo qual é regulada a carreira docente universitária, abriu-se uma possibilidade de pôr termo à situação aberrante em que a Universidade portuguesa vivia, em perfeita dissonância com o papel que lhe era exigido pelas necessidades de desenvolvimento cultural e sócio-económico do País no rumo apontado pela Constituição.
Com efeito, a carreira docente universitária continuou, após o 25 de Abril, a ser regulamentada pelo Decreto-Lei n.º 132/70, de Veiga Simão, que, pretendendo adaptar a caduca e retrógrada legislação anterior à situação decorrente da expansão do sistema escolar, não permitia efectivamente a alteração significativa do papel marginal até então desempenhado pela Universidade na sociedade portuguesa.
Tal conclusão decorre imediatamente da análise da situação que se vivia, e ainda se vive, na Universidade portuguesa e que, na opinião da UDP, apresenta como traços mais característicos: a ausência do carácter profissionalizado da carreira docente, em que esta era encarada mais como um complemento de outras actividades do que como uma profissão a tempo inteiro; a concentração, nas mãos dos professores catedráticos, do poder sobre todo o conjunto da vida escolar; o desprezo dos estratos hierarquicamente superiores pela orientação científica e pedagógica dos assistentes que, no entanto, asseguravam a quase totalidade do trabalho docente; a instabilidade de emprego para as categorias inferiores -ao quadro só tinham acesso os professores catedráticos e extraordinários-, sobretudo para os assistentes que, independentemente da quantidade e da qualidade do serviço prestado, acabavam por ser obrigados a sair da Universidade num total desrespeito pelos direitos mais elementares de que qualquer trabalhador deve beneficiar; a falta de condições e meios que permitissem a valorização pedagógica e científica do corpo docente no seu conjunto, visível, aliás, na baixa qualidade do ensino ministrado e na escassez de trabalho científico, técnico e cultural produzido pelas Universidades.
Estes aspectos evidenciavam claramente os propósitos do regime fascista de Marcelo Caetano, a quem apenas interessava uma Universidade pouco dispendiosa, capaz de formar quadros médios, cultural e cientificamente controlados, aptos a manter e dirigir um sistema dependente do exterior, com uma investigação apenas virada para a actualização do conhecimento produzido pelos países mais avançados, com um corpo docente colhendo no exterior a realização profissional e os salários condignos.
Daí a necessidade sentida pelos docentes do ensino superior, particularmente após o 25 de Abril, de reformulação completa da sua carreira, por sinal materializada em inúmeras propostas que as escolas e as estruturas sindicais apresentaram aos sucessivos ministérios da educação.
Os esforços desenvolvidos pelos docentes, ano após ano, só viriam a ser reconhecidos, ainda que parcialmente, com a saída deste decreto-lei, cuja ratificação está hoje a ser objecto de debate, por iniciativa do governo AD, ainda que através dos seus apoiantes nesta Assembleia.
A UDP considera que este diploma contém pontos com os quais manifesta a sua concordância e dos quais destaca: a consagração do regime de prestação de serviço em tempo integral e a diversificação das tarefas dos docentes nesse regime; a obrigatoriedade de orientação permanente dos assistentes e assistentes estagiários por professores por eles indicados; a exigência de votação nominal justificada em todas as deliberações relativas ao provimento definitivo e recrutamento de pessoal docente; a obrigatoriedade dos professores catedráticos e associados de nomeação definitiva apresentarem um relatório curricular quinquenal: a garantia de emprego na função pública, tem perda de regalias, para os assistentes providos ao abrigo deste estatuto e que não concluíram o doutoramento e para os professores catedráticos e associados a quem venha a ser negada a nomeação definitiva; a possibilidade de contratação, como docentes convidados, de individualidades que, pela sua competência científica, pedagógica e profissional, podem ser úteis à Universidade; o alargamento e a revisão bienal dos quadros do pessoal docente; a subida às categorias mais elevadas de novos docentes com uma formação científica, uma mentalidade e disposição tais que constituirão uma garantia de mudança real da vida escolar.
No entanto, tais aspectos não nos levam a esquecer que este decreto-lei não contempla todo um conjunto de outras reivindicações fundamentais dos docentes, que, a não serem satisfeitas, ensombrarão, sem a mínima dúvida, os pontos positivos que acabámos de citar.
A UDP considera particularmente inaceitável: a persistência neste decreto da disposição legal que estabelece a dependência entre a manutenção na carreira e a obtenção do doutoramento; o condicionamento na concessão da dispensa de serviço docente para efeitos de preparação do doutoramento; a não concessão de garantia de emprego na função pública aos docentes nas seguintes situações:

a) Assistentes com provimento ao abrigo deste decreto, que tenham usufruído da dispensa de serviço por mais de um ano e não tenham concluído o doutoramento;

h) Actuais assistentes que, ao abrigo das disposições transitórias, tenham concluído os oito mais dois anos sem obtenção do grau de doutor.

Tais medidas são fortemente atentatórias do direito à estabilidade de emprego daqueles que asseguram, na prática, o funcionamento das escolas que assim se verão forçados a interromper a sua carreira e ainda, para cúmulo, sem qualquer contrapartida noutra carreira- mesmo que ao longo do desempenho das suas funções tenham dado provas da maior capacidade pedagógica e científica.
A UDP considera, pois, intolerável que a obtenção de um título académico, muitas vezes conseguido à custa de compadrios e de trabalhos científicos que pouca ou nenhuma importância apresentam para o desenvolvimento independente do País seja considerado um meio que lance para o desemprego um conjunto numeroso de quadros, quadros que devotaram o melhor dos seus esforços a uma plena realização profissional, apesar das dificuldades sobejamente conhecidas com que as escolas se têm defrontado.
Mas terá sido a necessidade de correcção destes

Página 630

630 I SÉRIE - NÚMERO 16

aspectos que motivou a apresentação deste pedido de ratificação pelos Deputados da AD?
A avaliar pelo que tem transparecido das posições expostas pelo partido apresentador, a resposta é negativa, como seria de esperar.
O alvo a atingir reside nos aspectos considerados positivos pela generalidade dos docentes dedicados à escola a tempo inteiro e que ameaçam os privilégios dos senhores catedráticos que, deste modo, esperam aos seus representantes, no Parlamento e no Governo, as medidas necessárias à correcção das «anomalias» que reponha a ordem e o poder nos seus fiéis e «competentes depositários» ...
Ou não será verdade que as chamadas promoções em bloco -ao abrigo das disposições transitórias - fazem perigar a estabilidade do domínio dos senhores feudais da Universidade?
E as votações nominais justificadas não vão terminar com os abusos, as discriminações e os compadrios que as votações secretas alimentavam?
Não é igualmente verdade que a institucionalização do regime de tempo integral, a responsabilização dos professores pela orientação dos assistentes e a obrigatoriedade de avaliação periódica dos currículos dos professores vão pôr em causa uma concepção e uma prática de docência em part-time e, em muitos casos, pôr em evidência a incapacidade pedagógica e científica 'de muitos professores das nossas Universidades?
A ânsia de travar a aplicação deste decreto levou mesmo o próprio Ministério da Educação a dar instruções às Universidades, através de um telegrama, para processamento dos vencimentos de algumas categorias segundo um esquema diferente do previsto no estatuto da carreira docente, numa verdadeira jogada de antecipação à decisão a tomar por esta Assembleia.
A justa decisão que alguns conselhos directivos tomaram de não respeitar tais instruções indica claramente o caminho que os docentes devem seguir para combaterem as ilegalidades que este Governo não deixará de cometer e para verem satisfeitas as reivindicações que este decreto ainda não contempla e pelas quais a UDP se vai bater dentro e fora da Assembleia.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Manuela Saraiva

A Sr.ª Maria Manuela Saraiva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Decreto-Lei n.º 448/79 surge nas páginas do Diário da República depois de anos de expectativa e como resultado de múltiplas contribuições e arranjos sucessivos, todos carrilhados num propósito de dar solução a inúmeros problemas que se arrastam desde há excessivo tempo e que, portanto, é urgente resolver.
Existia uma vetusta legislação de 1933 sobre problemas universitários a que sucedeu como diploma de maior vulto, sistematizador da carreira docente universitária, o Decreto-Lei n.º 132/70, saído logo após a tomada de posse do Ministro Veiga Simão, mas que se encontrava praticamente pronto muito tempo antes. Este diploma representou na altura alguma novidade e trouxe algumas medidas positivas, juntamente com projectos e promessas que ficaram por cumprir durante dez anos Neste lapso de tempo.
a explosão escolar, já então sensível, acelerou-se, a vida universitária alterou-se profundamente e a urgência de nova legislação sobre a carreira docente universitária faz-se sentir cada dia de maneira mais imperiosa.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - O decreto-lei que e hoje proposto à consideração desta Câmara tem o mérito de abordar de frente uma problemática complexa e tanto eu pessoalmente como o meu partido louvamos a intenção governativa de através de uma lei de fundo definir o novo Estatuto da Carreira Docente Universitária. Não fazemos tábua-rasa do decreto em questão mas propomos uma correcção cuidadosa e consciente do mesmo.
O texto que temos para analisar ressente-se das várias remodelações e redacções a que foi sujeito o que não faz dele, como seria para desejar, um todo coerente. Pelo contrário, na sua 'forma actual é possível detectar vestígios de intenções diversas que, não raro, se traduzem em contradições internas graves.
Se quisermos apontar a filosofia dominante que presidiu à sua redacção actual, não é difícil encontrá-la num pragmatismo preocupado com a resolução prática e expedita de uma situação conjuntural determinada, propondo para tal o uso de métodos que serão sem dúvida eficazes segundo essa mesma perspectiva mas que são profundamente anti-universitários.
Refiro-me, como é óbvio, às chamadas disposições transitórias, que abrangem os artigos 87.º a 96.º e que, apesar da designação, de «transitórias» teriam resultados perigosamente definitivos na vida das Universidades portuguesas se fossem aplicadas.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Com efeito, o decreto visa a modificação radical da estrutura actual do corpo docente universitário, decretando a promoção; por assim dizer automática de professores de um grau académico para o que lhe é superior -de uma categoria docente para a que lhe é superior, visto que graus e categorias docentes não são suficientemente distintos neste decreto -, sem que as escolas mas apenas o Ministério da Educação e Ciência, tenham de pronunciar-se sobre o assunto. Tais promoções administrativas revestem-se de carácter particularmente grave no tocante à passagem de professores extraordinários e equiparados, assim como de professores agregados a professores catedráticos. Para maior facilidade de manobra extingue-se a categoria de professor extraordinário e propõe-se outras alterações na tramitação curricular dos docentes, de que avulta a criação de uma nova categoria que pouco mais é do que uma nova designação: a de professor associado.
Destas alterações não se entende bem o alcance profundo, para além da resolução, como disse, de uma situação conjuntural. Delas resultaria entre outras coisas, uma inflação de professores catedráticos em todas as Universidades portuguesas, por uma simples imposição ministerial, semelhante a um toque de varinha mágica. Mas a dignificação, prestígio e eficiência da instituição universitária não se compadecem com estes métodos, muito menos a autonomia

Página 631

15 DE FEVEREIRO DE 1980 631

de que devem gozar as Universidades face ao poder político central.
Para além do mais, entre estas disposições e as que constam do n.º 1 do preâmbulo que salvo melhor memória é o do primeiro projecto, da responsabilidade do então Ministro Sotto Mayor Cardia -, existe uma contradição flagrante. Nesse preâmbulo se afirma que de todos os problemas universitários o de maior relevância para o progresso da Universidade e o da reformulação da carreira docente, acrescentando-se «basta lembrar, para se avaliar a sua importância, que a carreira docente universitária é uma das que mais cuidados exigem e maior estímulo necessitam para que os seus quadros continuem a ser preenchidos por quantos demonstrem a mais alta capacidade pedagógica e que a qualidade dos docentes do ensino superior é factor que afecta profundamente não só todos os níveis de ensino, mas o próprio desenvolvimento cultural e sócio-económico do País».
Depois desta afirmação, que me parece não oferecer dúvidas a ninguém, a parte final do decreto - que contém, nomeadamente, as disposições transitórias a que fiz referência - nega praticamente tudo o que aprovou no preâmbulo, pois a promoção administrativa, o provimento na categoria de catedrático ou outra, pela simples aceitação de uma situação de facto e de pretensos direitos adquiridos pela passagem do tempo, implica a demissão pelos órgãos universitários do direito de serem eles a seleccionar o seu próprio pessoal com critérios de valor que lhes são próprios.
A questão tem de ser posta com toda a clareza: o critério fundamental da promoção na carreira docente universitária tem de ser o do mérito científico, revelado por factos objectivamente apreciáveis, ou seja. um curriculum de valor no plano científico e idoneidade pedagógica que é fruto de inúmeras qualidades que traçam um perfil universitário incontroverso.
Só as escolas poderão ajuizar, mediante provas, que em certos casos podem ser apenas, mas têm de ser. pelo menos, a análise curricular por um júri de especialistas indicado pelas mesmas e, eventualmente, com o acordo do reitor, da capacidade científica e pedagógica dos seus docentes. Em caso algum se pode admitir uma tão frontal violação de autonomia da Universidade, em caso algum se pode admitir que uma simples prescrição ministerial, embora ela seja veiculada por um decreto-lei, se substitua à capacidade de juízo que só à Universidade compete.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Isto é uma questão de princípio, mas acresce que as decisões contidas nas chamadas «disposições transitórias», por atingirem só um certo número de docentes e não outros que estão praticamente nas mesmas condições quando não em condições de mérito superior aos felizes contemplados, seriam origem de inúmeras situações de injustiça. Um só exemplo: as regalias demagógicas que se querem oferecer a muitos docentes não vão beneficiar os que, na mesma altura, tiverem pedido ou estiverem a prestar provas de concurso para professor extraordinário ou agregado, podendo também acontecer que um docente a quem a escola, através dos seus órgãos competentes, negou idoneidade científica e/ou pedagógica para se apresentar a concurso, ou ainda que tenha sido rejeitado em provas públicas, venha a receber numa bandeja, pela via de um decreto ministerial, o que demonstrou ser incapaz ou ainda não. ou já não capaz, de receber por mérito próprio.
Parece, pois, legítimo concluir que estas medidas irrealistas de promoção, a concretizarem-se, não seriam factor de clarificação e pacificação na Universidade portuguesa, mas, pelo contrário, contribuiriam, de maneira talvez irreversível, para a confusão entre a rotina e o mérito entre o trabalho sério e a aventura, entre o talento e o oportunismo.
Como é bem de ver, e salvo raríssimas excepções de vária natureza, só necessita da muleta administrativa quem não tem capacidade de subir por esforço próprio.
Terminadas estas considerações, parece que tudo está claro, que o decreto é mau e não merece a ratificação desta Câmara. Na verdade, o decreto é mau em muitas das suas disposições e o seu articulado está mal feito em muitos pontos. Mas não é líquido que seja totalmente para rejeitar. E isto porque o que disse no início desta intervenção continua válido: e fora de dúvida que algumas das mais antiga:, e das mais justas aspirações do corpo docente universitário encontram eco neste diploma. Tratam-se de dois pontos de grande importância: a possibilidade de alargamento de quadros e a proposta de nova tabela salarial, por subida de letra, que abrange todas as categorias de docentes.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Por infelicidade, ambos os problemas estão ligados às propostas de promoções ministeriais, mas é minha opinião e do meu partido que estas questões devem dissociar-se.
No que toca ao alargamento de quadros, parece-nos necessário um novo estudo sobre o assunto. Quanto ao problema dos vencimentos e das remunerações em geral, para além de ajustes e correcções de que ainda carece este já está, no essencial, resolvido.
Com efeito, o decreto-lei tem efeitos a partir de 1 de Dezembro do ano transacto e uma nova tabela salarial decretada por lei e que introduza melhorias num determinado sector não pode deixar de ser aplicada. Simplesmente, neste caso, a aplicação gerou a confusão nas escolas, quer pela criação de uma nova categoria de professor, a de associado, quer pela necessidade do alargamento de quadros -que ainda não foi concretizada -, quer pelo conteúdo do artigo 104.º, que se refere às listas nominativas dos professores promovidos que deverão ser publicadas pelo Ministério da Educação. Em face destas dificuldades e para salvaguardar o interesse, justíssimo, como já foi dito, dos docentes, o Ministério esclareceu as Universidades no sentido da aplicação salarial.
Está, pois, entendido que os vencimentos subiram de letra, com efeitos retroactivos a partir de 1 de Dezembro de 1979, mas que tal questão é desvinculada das promoções administrativas.
Outros assuntos mereceriam aqui comentário, mas limito-me apenas a dois pontos que não posso deixar de referir, pela capital importância que têm no próprio decreto-lei. O primeiro refere-se à distinção, que constitui uma das grandes novidades do diploma, entre prestações de serviço. Com efeito, institui-se a distinção entre trabalho a tempo integral e trabalho a tempo parcial

Página 632

632 I SÉRIE - NÚMERO 16

Esta distinção, sobretudo se a conjugarmos com outra, que não é totalmente nova, mas a que se dá maior extensão e importância - a distinção entre pessoal de carreira e pessoal convidado -, pode constituir uma resposta mais eficaz às necessidades das Universidades actuais, na medida em que estas se não fossilizam e se não divorciam das carências da sociedade nacional e das áreas regionais em que estão implantadas afastar-se-ão cada vez mais do tipo tradicional uniforme e rígido. E, nesta medida, sem abandonar o que, é próprio do ideal universitário no que este tem de fundamental, ir-se-ão diversificando de múltiplas maneiras.
A esta evolução, que é manifestação de vida, é salutar que se responda com esquemas flexíveis em muitos aspectos da orgânica universitária e. também, por isso, na necessidade de formas diversas de prestação de serviço e com tipos especiais de docência.
A intenção destas duas distinções parece-nos, pois, correcta. Apenas lamentamos que o artigo 68.º, que especifica o regime de tempo integral de serviço, manifeste um espírito de" tacanhez e policiamento que vai ao ponto de vigiar os docentes e obrigá-los a uma presença no local acto trabalho que é totalmente alheia ao espírito universitário. Não ignoramos os abusos a que a adopção de serviço em tempo integral pode dar origem, mas há outras maneiras de controlar o rendimento do trabalho do docente universitário que não a discriminação exaustiva do tempo e dos locais onde os docentes exercem a sua actividade.
Este assunto, aliás, prende-se de muito perto com a necessidade de investigação que reputamos inerente à própria condição de docente universitário, assunto que não está devidamente contemplado no decreto que analisamos e prende-se também com a especificidade das diferentes escolas e com a abertura ou não abertura que dão para carreiras liberais. Prende-se igualmente com os próprios locais de trabalho, com os edifícios universitários que na sua maioria estão superlotados de docentes e discentes. Para referir o único caso que conheço bem, a Faculdade de Letras de Lisboa, que tem actualmente 9000 alunos e duas a três centenas de docentes, e de onde os gabinetes dos professores desapareceram, com algumas raras excepções, é impossível, além de ineficaz, fazer exigências desta ordem, a não ser que se crie uma nova escola peripatética em sentido restrito, onde os professores passeiam pelos corredores para cumprir o decreto.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por alguns exemplos mais relevantes que acabo de indiicar a esta Câmara, pode ajuizar-se dos pontos positivos do Decreto-Lei n.º 448/79, das suas tremendas lacunas, do carácter fragmentário que reveste e das falsas soluções para que pretende atirar a Universidade Portuguesa. Por tudo isto solicitamos a sua aprovação na generalidade e a baixa à Comissão de Educação para alterações.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Bragança Tender, antes de lhe conceder a palavra, gostaria de saber de quanto tempo necessita para fazer a sua intervenção, visto serem já quase 20 horas.

O Sr. Bragança Tender (PS): - Oito a dez minutos, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Bragança Tender (PS): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: O Decreto-Lei n.º 448/79, publicado a 13 de' Novembro no Diário da República, abrange toda uma Universidade da qual fazem parte múltiplas Faculdades e Institutos que divergem entre si pela distinta natureza dos seus objectivos e programas i ainda pelas diferentes características dos seus corpo docentes e discentes e pela feição das áreas geográficas em que se encontram inseridas.
Bastaria esta razão para podermos compreender a;, ingentes dificuldades que se depararam a quem teve de elaborar tal decreto-lei; mas outras razões não facilitam essa compreensão, tais como a sucessão de modelos provisórios do referido documento que vem verificando desde 1977, numa oposição de exergos seriados sobre um esqueleto original, a metamorfose rápida e fugidia de um meio universitário sempre diferente de si próprio e o impacte de múltiplas pressões e interesses nem sempre isentos de demagogia e nem sempre de raiz universitária.
Sr. Presidente, peço desculpa de fazer aqui uma pequena interrupção, mas queria pedir a V. Ex.ª o obséquio de solicitar aos Srs. Deputados o favor de 55 manterem em silêncio, tal como eu faço sempre que outro orador está no uso da palavra.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado tem toda a razão. Certamente que a Câmara ouviu o apelo do Sr. Deputado e vai tê-lo em consideração, pelo que me escuso dei o repetir.
Tenha a bondade de continuar. Sr. Deputado Bragança Tender.

O Orador: - A falta de ousadia ou de espírito de decisão, suficiente para o fazer a partir do nada. actuou no texto e na essência deste decreto-lei, imprimindo-lhe uma heterogeneidade que nos faz lembrar aqueles seres mitológicos metade ave e metade réptil.
Existe, de facto, uma inequívoca falta de proporcionalidade entre os objectivos sonhados na parte introdutória do documento e a possibilidade de es atingir através do cumprimento do respectivo articulado.
Efectivamente, se repararmos atentamente no texto introdutório deste decreto-lei, começamos por confirmar a nossa convicção de que se pretende fomentar o quadro do pessoal universitário (nomeadamente nos escalões do professorado) através da adopção de medida? visando o aumento do número de doutoramentos e a anexação de valores incontestáveis, embora estranhos à carreira universitária. E se pretende ainda fixar os docentes e investigadores às suas tarefas, assim como estabelecer uma relação mais íntima e objectiva entre a investigação científica e os problemas concretos das populações.
Transparece ainda o desejo de aumentar a autonomia dos estabelecimentos de ensino, através de uma descentralização de que tanto se tem falado.
E, no entanto, a leitura meditada dos seus cento e

Página 633

15 DE FEVEREIRO DE 1980 633

oito artigos, suscita no nosso espírito um desanimador pessimismo, na medida em que várias das determinações neles incluídas actuarão certamente em sentido oposto ao visado pelos legisladores., enquanto outras não terão significado pragmático positivo nas suas consequências.
Não se duvida de que a intenção dos legisladores é louvável e que eles pretendem o aperfeiçoamento do nível universitário e a ampliação de um quadro docente qualificado e apto a assegurar um melhor ensino e uma investigação científica de maior interesse e actualização.
Mas a verdade é que tais objectivos não vão ser atingidos com facilidade, na medida em que muitas das disposições contidas no articulado contribuem mais para entravar a carreira dos candidatos que para a incentivar, além de conduzirem inevitavelmente a um envelhecimento do quadro de professores da Universidade portuguesa.
Sirva de exemplo, o artigo 27.º que prevê que os assistentes possam ser dispensados das suas actividades docentes, a fim de prepararem os respectivos doutoramentos, mas com a ameaça da obrigatoriedade de reposição de remunerações auferidas no caso de, atempadamente, não requererem a prestação das provas respectivas; e ainda a desvantagem adicional de, nesse caso ou no de insucesso nas provas, não terem saída assegurada para qualquer carreira técnica superior.
Sirva ainda de exemplo o artigo J 5. º que, ao exigir votação favorável de dois terços dos membros do conselho científico, torna pragmaticamente contingente o referido artigo quanto ao resultado visado.
Para não falar da limitadíssima remuneração complementar, prevista no artigo 74.º, para aqueles que se dediquem em regime de .tempo integral (definido no n.º l do artigo 70.º) e, bem assim, da insuficiente definição de quantitativos destinados a custear a impressão tipográfica de teses de doutoramento e das publicações de textos actualizados sugeridos na alínea e) do artigo 63.º
Quanto à incontroversa intenção de fomento da autonomia dos estabelecimentos de ensino, parece-nos ser paradoxalmente contrariada pelo artigo 13.º, já que este, implicitamente, outorga ao Ministério uma desmedida intervenção no processo de recrutamento de assistentes estagiários, quando o acertado seria cometer a responsabilidade directa desse processo à Faculdade respectiva, na base da proposta fundamentada dos directores de serviço, que conhecem as qualidades dos seus monitores e outros colaboradores, e da aprovação pelo conselho científico local.
Não adianta criticar as novas categorias adoptadas para o pessoal docente, já que a própria natureza e seriação das mesmas as tornaram irreversíveis. Efectivamente, todos os professores extraordinários, de nomeação vitalícia à data de l de Dezembro de 1979. são catedráticos de facto a partir dessa mesma data e são-no irreversivelmente, dado que qualquer hipotética alteração deste decreto-lei pressupondo anulação da regalia adquirida os conduziria automaticamente à categoria de professores associados, isto é, a uma situação de evidente despromoção relativamente à posição hierárquica que ainda usufruíam a 30 de Novembro do ano transacto.
E teriam, congruentemente, a seu lado a força jurídica dos tribunais, incluindo o Supremo Tribunal de Justiça.
Evidentemente que o documento cuja ratificação está em causa apresenta aspectos positivos, para lá da sua louvável intenção. Sirva de exemplo a adopção da votação nominal justificada, técnica que a experiência nos impele a defender como conveniente e imprescindível no domínio universitário, não obstante os graves inconvenientes que da sua utilização por vezes resultam em outros ambientes e agrupamentos profissionais de posições profissionais menos inamovíveis.
Destacaremos igualmente como positiva a decisão de continuação da categoria de monitores (artigo 4.º através de cujas nomeações e convívio profissional os directores de serviço ficam habilitados a escolherem mais conscientemente, e mais acertadamente, os seus colaboradores definitivos: e não deixaremos de louvar o facto de os monitores serem proibidos de leccionar sem tutela.
Positiva também, embora pouco expressiva, a intenção de aumentar os vencimentos.
No caso especial das Faculdades de Medicina, bem pode dizer-se que, sem a concretização da legislação prevista no artigo 105.º, o Decreto-Lei n.º 448/79 quase não merece ser considerado, tantos são os problemas que, em virtude (dessa omissão de contexto. persistem sem solução.
Citaremos, a título de exemplo mas sem visar esgotar o assunto, a confusão e a da dificuldade de atribuição ida direcção de serviços clínicos, a instabilidade da colaboração, prestada às disciplinas de base por monitores e assistentes simultaneamente envolvidos nas tarefais hospitalares, e algumas estranhas e paradoxais situações, tais como o facto de certos assistentes da Faculdade desempenhando no hospitais funções de especialistas auferirem vencimentos nitidamente superiores aos de alguns assistentes da Faculdade desempenhando no hospital funções de chefes de clínica!
A situação é tão alarmante e difícil de conciliar - e as promessas não cumpridas têm sido tantas - que quase mos ocorre ao espírito a barbaridade humorística de propor que pelo menos por um curto perdoa destinado à assinatura de alguns documentos decisivos) as pastas da Educação e do Ministério dos Assuntos Sociais sejam confiadas ao mesmo Ministro.
O Partido Socialista opõe-se, pois, à suspensão do decreto-lei em discussão e tom prontas as modificações do articulado que em seu entender devem preceder a sua publicação urgente.

Aplausos do PS, do MDP/CDE e de alguns Deputados do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, visto não haver mais intervenções, vai proceder-se à votação do pedido de ratificação n.º 166/I, relativo ao Decreto-Lei n.º 448/I, de 13 de Dezembro.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai proceder-se à votação de um requerimento apresentado pelo PSD, do seguinte teor-

Página 634

634 I SÉRIE - NÚMERO 16

Os Deputados abaixo assinados, do Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata, requerem, nos termos regimentais a baixa à respectiva comissão do Decreto-lei n.º 448/79, de 13 de Dezembro, pelo prazo máximo de trinta dias.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente:-Srs. Deputados, em virtude do adiantado da .hora, as declarações de voto terão lugar na sessão de amanhã.
Entretanto, deram entrada na Mesa e foram admitidos os seguintes projectos de lei: n.º 377/I, da iniciativa do Sr. Deputado Carlos Brito e outros do PCP, relativo à comercialização de madeiras; n.º 378/I, também da iniciativa do Sr. Deputado Carlos Brito e outros do PCP, sobre cooperativas, e n.º 379/I, da iniciativa do Sr. Deputado Vítor Henrique de Sousa de Sá e outros do PCP, sobre a produção, recolha, concentração e abastecimento de leite. Estes projectos de lei baixam às respectivas comissões.
Srs. Deputados, a ordem de trabalhos para a sessão de amanhã, que terá início às 9 horas e 30 minutos e que terminará às 13 horas e 30 minutos, é a seguinte: continuação da discussão das ratificações agenciadas para hoje; eleições da Comissão de Apreciação dos Actos do MAP e do conselho de gestão do Centro de Estudos Judiciais; apreciação do pedido de urgência solicitado pelo Governo para a discussão dá proposta de lei n.º 288/I, que altera a Lei n.º 46/77; discussão e votação da proposta de lei n.º 286/I, que revoga a Lei n.º 77/79, relativa à alienação e oneração de bens das empresas nacionalizadas, e reapreciação do Decreto-Lei n.º 252/I, vetado pelo Sr. Presidente da República.

Está encerrada a sessão. Eram 20 horas.

Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Social-Democrata (PSD)

Américo Abreu Dias.
Arménio dos Santos.
Carlos Matos Chaves de Macedo.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Dinah Serrão Alhandra.
Fernando José da Costa.
Germano da Silva Domingos.
João Vasco da Luz Botelho de Paiva.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Manuel Meneres Sampaio Pimentel.
José Maria da Silva.
Luís António Martins.
Manuel Luís Fernandes Malaquias.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Maria Adelaide Santos de Almeida Paiva.
Maria Helena do Rego da C. Salema Roseta.
Maria Manuela Simões Saraiva
Mário Martins Adegas.
Miguel Camolas Pacheco.
Nicolau Gregório de Freitas.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.

Partido Socialista (PS)

Albano Pereira da Cunha Pina.
Alberto Arons Braga de Carvalho.
António de Almeida Santos.
António Chaves Medeiros.
António Fernando Marques R. Reis.
António Francisco Barroso Sousa Gomes.
António José Sanches Esteves.
António Manuel Maldonado Gonelha.
António Manuel de Oliveira Guterres.
Aquilino Ribeiro Machado.
Armando dos Santos Lopes.
Carlos Manuel Natividade da Costa Candal.
Edmundo Pedro.
Fernando Alves de Almeida Miranda.
Fernando Luís de A. Torres Marinho.
Francisco de Almeida Salgado Zenha.
Francisco Cardoso P. de Oliveira.
Jaime José Matos da Gama.
João Cardona Gomes Cravinho.
José Luís do Amarai Numes.
José Manuel Niza Antunes.
Luís Abílio Conceição Cacito.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Maria Emília de Melo Moreira da Silva.
Maria Teresa V. Bastos Ramos Ambrósio.
Raul de Assunção Pimenta Rego.
Victor Manuel Ribeiro Constâncio.

Partido Comunista Português (PCP)

António Dias Lourenço da Silva.
Dinis Fernandes Miranda.
Domingos Abrantes Ferreira.
Joaquim Gomes dos Santos.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
Maria da Conceição Morais Matias.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.
Rosa Maria Reis A Brandão Represas.

Centro Democrático Social (CDS)

Alfredo Albano de C. de Azevedo Soares.
Américo Maria Coelho Gomes de Sá.
António Martins Canaverde.
Carlos Alberto Faria de Almeida.
Emídio Ferrão da Costa Pinheiro.
Emílio Leitão Paulo.
Francisco Manuel L. V. Oliveira Dias.
Henrique José C. de Meneses P. Moraes.
Joaquim Rocha dos Santos.
Luís Carlos C. Veloso de Sampaio.
Luís Eduardo da Silva Barbosa.
Luís Filipe Pais Beiroco
Luís Gomes Moreno.
Manuel Eugénio P. Cavaleiro Brandão.
Narana Sinai Coissoró.
Ruy Garcia de Oliveira.
Victor Afonso Pinto da Cruz.

Partido Popular Monárquico (PPM)

António José Borges G. de. Carvalho.
Augusto Martins Ferreira do Amaral.

Agrupamento Parlamentar dos Reformadores:

Francisco José de Sousa Tavares.

Página 635

15 DE FEVEREIRO DE 1980 635

José Manuel Medeiros Ferreira.
Nuno Maria Monteiro Godinho de Matos.

Movimento Democrático Português

Luís Manuel A. de Campos Catarino.

Deputados que faltaram à sessão:

Partido Social-Democrata (PSD)

António Augusto Lacerda de Queiroz.
Mário Júlio Montalvão Machado.

Partido Socialista (PS)

Armando Filipe Cerejeira P. Bacelar.
João Joaquim Gomes.
Manuel Alfredo Tato de Morais.
Maria de Jesus Simões Barroso Soares.
Mário Alberto Nobre Lopes Soares.
Victor Manuel R. Fernandes de Almeida.

Partido Comunista Português (PCP)

Álvaro Barreirinhas Cunhal.
Fernando Freitas Rodrigues.

Centro Democrático Social (CDS)

Francisco António Lucas Pires.
José Eduardo Fernandes Sanches Osório.
Maria José Paulo Sampaio.

OS REDACTORES DE 1.ª CLASSE: Armindo Augusto Marques - Ana Maria Santos.

Página 636

PREÇO DESTE NÚMERO 38$00

IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×