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I Série-Número 23

Terça feira, 4 de Março de 1980

DIÁRIO da Assembleia da República

I LEGISLATURA

4.ªSESSÃO LEGISLATIVA (1979-1980)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 3 DE MARÇO DE 1980

Presidente: Ex.º Sr. Leonardo Eugénio Ramos Ribeiro de Almeida

Secretários: Ex.º Srs. Manuel Henriques Pires Fontoura
Alberto Marques Antunes
José Manuel Mala Nunes de Almeida
Henrique Manuel Soares Cruz

SUMARIO.

- O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 25 minutos.

Antes da ordem do dia. - Foram aprovados os n.ºs 16 e 17 do Diário.

Deu-se conta do expediente e dos requerimento apresentados na última sessão.

O Sr. Deputado Jerónimo de Sousa (PCP) condenou a decisão do Governo de considerar a Rodoviária Nacional e outras empresas públicas em situação económica difícil. A propósito desta intervenção/iteram pedidos de esclarecimentos ou protestai, a quem o orador respondeu, os Srs. Deputados António Cabecinha (PSD) Carlos Lage (PS), Nascimento Rodrigues (PSD) e José Cardoso (PSD).
O Sr. Deputado José Cardoso (PSD) defendeu a entrega da terra em regime de posse plena aos agricultores do Colónia Agrícola de Pegões. Respondeu no fim a um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado António Compôs (PS), que originou um protesto do Sr. Deputado Sousa Tavares (DR).

O Sr. Deputado Luís Coimbra (PPM) chamou a atenção para a crescente poluição das águas e o incremento dg práticas ilegais de pesca no estuário do Tejo.
f) Sr. Deputado Adão e Silva (DR) fez um apelo a todos os partidos representados na Assembleia para, ultrapassando a pura luta ideológico, colaborarem na resolução dos problemas essenciais da Nação. Respondeu no fim a protestos dou Srs. Deputados Carlos Lage (PS) e Vital Moreira (PCP).
O Sr. Presidente anunciou a desistência de dois pedidos de ratificação de decreto-lei por parte do PSD e a entrada na Mesa de três propostas de lei.
Ordem do dia. - Foi aprovado um relatório da Comissão de Regimento e Mandatos, lido pelo Sr. Deputado Bento de Azevedo (PS), sobre a substituição de um Deputado do MDP/CDE.
Prosseguiu o debate da proposta de lei n.º 288/1, que concede autorização ao Governo para alterar a Lei n.º 46/77, de 8 de Julho. Usaram da palavra os Sn. Deputados Ferreira do Amaral (PPM). Manuel dos Santos (PS). Gaspar Martins (PCP). Herberto 'Goulart (MDP/CDE). Maríno Vicente (PCP), Luís Barbosa (CDS). Veiga de Oliveira (PCP) e Nuno Godinho de Matos (DR).
Em pedidos de esclarecimento, protestos ou contraprotestos intervieram os Srs. Deputados Ferreira do Amaral (PPM), Pedro Roseta (PSD), Vital Moreira (PCP), João Cravinho (PS), António Guterres (PS) e Manuel dos Santos (PS).

O Sr. Presidente encerrou a sessão às 20 horas e 50 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai proceder-se à chamada.

Eram 15 horas e 10 minutos.

Fez-se a chamada, á qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD)

Afonso de Sousa Freira da Moura Guedes.
Álvaro Barros Marques de Figueiredo.
Américo Abreu Dias.
António Augusto Lacerda de Queiroz.
Carlos Matos Chaves de Macedo.
Dinah Serrão Alhandra.
Fernando Manuel A. Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Henrique Alberto F. do Nascimento Rodrigues.
João António Sousa Domingues.
João Aurélio Dias Mendes.
João Luís Malato Correia.
José Baptista Pires Nunes.
José Henrique Cardoso.
Júlio de Lemos de Castro Caldas.
Leonardo Eugénio R. Ribeiro de Almeida.
Luís António Martins.
Manuel Henriques Pires Fontoura.

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Manuel Luís Fernandes Malaquias.
Maria Manuela Simões Saram.
Mário Dias Lopes.
Mário Martins Adegas.
Miguel Camolas Pacheco.
Nuno Aires Rodrigues dos Santos.
Pedro Manuel da Cruz Roseta.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.

Partido Socialista (PS)

Adelino Teixeira de Carvalho.
Albano Pereira da Cunha Pina.
Alberto Marques Antunes.
Amadeu dia Silva Cruz.
António Francisco Barroso Sousa Gomes.
António José Sanches Esteves.
António José Vieira de Freitas.
Aquilino Ribeiro Machado.
Carlos Cardoso Lage.
Francisco Manual Marcelo M. Curto.
Gualter Viriato Nunes Basílio.
Guilherme Gomes dos Santos.
Herculano Rocha.
João Alfredo Félix Vieira Lima.
João Joaquim Gomes.
Joaquim Sousa Gomes Carneiro.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Maximiano de A. Almeida Leitão.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Manuel António dos Santos.
Maria de Jesus Simões Barroso Soares.
Raul da Assunção Pimenta Rego.

Partido Comunista Português (PCP)

Álvaro Augusto Veiga de Oliveira.
Álvaro Favas Brasileiro.
António da Silva Mota.
Carlos Alberto do C. da Costa Espadinha.
Carlos Alberto do Vale G. Carvalhas.
Custódio Jacinto Gingão.
Ercília Carreira Pimenta Talhadas.
Fernando de Almeida Sousa Marques.
Fernando Freitas Rodrigues.
Francisco Miguel Duarte.
Hélder Simão Pinheiro.
João António Gonçalves do Amaral.
Joaquim António Miranda da Silva.
Jorge do Carmo da Silva Leite.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
José Casimiro Sousa Correia.
José Manuel Aranha Figueiredo.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Josefina Maria Andrade.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Maria Ilda da Costa Figueiredo.
Marino B. de Vasconcelos B. Vicente.
Octávio Augusto Teixeira.
Vital Martins Moreira.

Centro Democrático Social (CDS)

Adriano Vasco da Fonseca Rodrigues.
Alexandre Correia de Carvalho Reigoto.
António Ferreira Pereira de Melo.
Artur Fernandes.
Francisco Manuel L. V. Oliveira Dias.
João Daniel Marques Mendes.
João J. S. Fernandes Homem.
José Augusto Fernandes Sanches Osório.
José Manuel Macedo Pereira.

Partido Popular Monárquico (PPM)

Augusto Martins Ferreira do Amaral.
Gonçalo Pereira Ribeiro Teles.
Henrique José Barrilaro F. Ruas.
Luís Filipe Ottolini Bebiano Coimbra.

Agrupamento Parlamentar dos Reformadores

Armando Adão e Silva.
Pelágio E. de A. Matos Lopes de Madureira.

O Sr. Presidente: - Responderam à chamada 87 Srs. Deputados. Temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 25 minutos.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estão na Mesa para aprovação os n.ºs 16 e 17 do Diário.

Se nenhum Sr. Deputado tem qualquer objecção a fazer, declaro-os aprovados.

Vai proceder-se à leitura do expediente.

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Exposição

De Jorge Faro Vaiadas, capitão de artilharia, solicitando a revisão do seu caso, para o que pede a continuação do exercício do supremo poder de inquirição e juridiscional desta Assembleia, de forma que lhe seja feita justiça.

Moção

Aprovada pelos delegados sindicais dos trabalhadores da indústria vidreira da zona sul em reunião de 13 de Fevereiro, na qual exigem a publicação dos contratos congelados e manifestam a disposição de mobilizar os trabalhadores para jornadas de luta.

Ofícios

Do Sindicato dos Trabalhadores Gráficos dos Distritos do Porto, Bragança e Vila Real a remete: moções aprovadas em plenários gerais de trabalhadores da Tipografia Marca e da firma Simão Guimarães Filhos, L.da, em que manifestam o seu protesto pelo congelamento dos contratos colectivos de trabalho e o aumento do custo de vida.
Do Sindicato das Indústrias Eléctricas do Centro, no qual chamam a atenção desta Assembleia para a situação dramática em que vivem os trabalhadores da Audio-Magnética- Material para Gravações, Lda., nas Caldas da Rainha, que se mantém quase inactiva desde o princípio do ano, solicitando, ao mesmo tempo, a atenção das entidades competentes, a fim de tentar solucionar esta grave situação.
Da Câmara Municipal de Vendas Novas a enviar duas moções aprovadas pela Assembleia Municipal em

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(...)reunião de 11 de Fevereiro: uma em que repudiam o aumento do custo de vida e outra exigindo a aplicação imediata da Lei das Finanças Locais, de acordo com a lei aprovada na Assembleia da República em Janeiro de 1979.
Do Sr. Governador Civil do distrito de Portalegre a remeter uma exposição de um grupo de trabalhadores do internato Distrital de Santo António sobre a reciassificação operada por aplicação do Decreto-Lei n.º 466/79, de 7 de Dezembro, e para o qual solicita o melhor interesse.
Da Assembleia Municipal de Montemor-o-Novo a remeter cópia de um telegrama acerca dos acontecimentos de Montemor-o-Novo e Arraiolos e que deveria ter seguido as vias normais, mas cujo envio foi recusado pelo chefe da estação dos CTT daquela vila.
Da Assembleia Municipal de Évora a enviar cópias de duas moções aprovadas pela mesma em reunião de 8 de Fevereiro relativamente à ratificação por esta Assembleia do decreto-lei que determinou a criação da Universidade de Évora.
Do Sindicato dos Trabalhadores da Imprensa a enviar uma moção aprovada na assembleia geral de 15 de Fevereiro, na qual manifestam o seu repúdio pelo critério que presidiu às nomeações de administrações para as empresas públicas da comunicação social e exigem a lápida reintegração dos trabalhadores afastados da RTP e da RDP, bem como o pagamento das dívidas do Século e garantia de emprego àqueles que o não conseguirem entretanto.

Telegrama

De associações presentes em Joueltours exigindo a continuação da realização do Congresso das Comunidades Portuguesas e a constituição imediata de comissões consulares.

O Sr. Secretário (Pires Fontoura): - Foram apresentados na última sessão os seguintes requerimentos: ao Ministério da Agricultura e Pescas formulado pelos Srs. Deputados Vítor Louro, lida Figueiredo e Alberto Jorge Fernandes; aos Ministérios dos Assuntos Sociais e da Educação e Ciência formulado pelo Sr. Deputado João Vasco Paiva; ao Governo formulados pelos Srs. Deputados Carlos Espadinha e Ercília Talhadas; ao Governo e ao Ministério da Educação e Ciência formulados pelo Sr. Deputado Miranda Calha; ao Ministério dos Transportes e Comunicações formulados pelos Srs. Deputados Jaime Gama e Vieira de Freitas; ao Governo formulados pelos Srs Deputados Ercília Talhadas, Alda Nogueira e Carlos Carvalhas; aos Ministérios da Justiça, da Administração Interna e da Agricultura e Pescas formulados pêlos Srs. Deputados Vítor Louro, Lino Lima, Gaspar Martins, lida Figueiredo e Alberto Jorge Fernandes.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo da AD ao declarar em situação económica difícil a Rodoviária Nacional, a RDP e a EPNC e anunciando simultaneamente «medidas especiais» para a TAP, CP e Companhia de Transportes Marítimos parece interessado em continuar a sua acção de desestabilização social, numa clara afronta aos interesses, direitos e liberdades dos trabalhadores portugueses.
Há que ter bem presente o alcance destas medidas. Os trabalhadores de uma empresa declarada em situação económica difícil estão sujeitos, nomeadamente, à não aplicação total ou parcial de cláusulas dos instrumentos de regulamentação colectiva (como tabelas salariais, subsídios e outras regalias), podem ver suspensos os contratos individuais de trabalho e podem ser atingidos por outras medidas adequadas (na terminologia legal) que podem ir até às alterações e aumento do horário de trabalho.
É este colete de forças que se pretende agora aplicar em larga escala. Olhando a situação concreta das empresas logo se percebe o que visa este Governo. Os trabalhadores da Rodoviária Nacional, após esforçada luta, já tinham conseguido o acordo para a entrada em vigor das novas tabelas salariais; os trabalhadores da RDP lutam há cerca de um ano por novos aumentos. Os trabalhadores da CP tiveram de recorrer à greve para fazer cumprir acordos resultantes de arbitragem e de negociação directa com o conselho de gerência ... Pretende-se, pois, restringir drasticamente os direitos dos trabalhadores e o que se torna espantoso em tudo isto é que o Governo, pela boca de alguns Ministros e Secretários de Estado, ainda por cima acuse os trabalhadores dessas empresas de culpados pela situação que se está a criar!
Nesta mesma Assembleia um Deputado AD inventa planos diabólicos do PCP, mistura fantasmagóricas acusações aos soviéticos, para concluir que os trabalhadores se deixam manipular correndo atrás de reivindicações, supostamente irrealistas e «incomportáveis».
É o que se chama fazer o mal e a caramunha ...
A verdade não é esta! ...
Será reivindicação irrealista lutar pela aplicação de uma nova tabela salarial na ordem dos 23% para a Rodoviária Nacional?
Não é social e humanamente justo que os trabalhadores da CP lutem pelas promoções adiadas, nalguns casos desde 1974, e pelos acordos bilateralmente estabelecidos?
Podem os Srs. Deputados acusar de subversivo um motorista de autocarro de passageiros que no fim de um mês de trabalho leva 9 000$ para casa? E só porque recorre à greve com os seu companheiros, esgotadas que foram as possibilidades de negociação, pode admitir-se que o Governo retire os aumentos salariais obtidos e ainda por cima o ameace de despedimento ou de ficar na prateleira a receber pelo Fundo de Desemprego? São estes milhares de trabalhadores que lutam pelo direito a uma vida mais digna a quem os jornais reaccionários acusam de preparar um clima pré-insurreccional.
É inteiramente inadmissível, Srs. Deputados!
Por que não se diz que os ex-patrões deixaram à Rodoviária Nacional uma dívida de 3 306 100 contos?! Que o fundo de maneio era negativo em 2 230 836 contos e a situação líquida negativa de l 503 542 contos? O acordo de saneamento económico e financeiro da Rodoviária Nacional tem sido sistematicamente violado. As medidas de viabilização para a empresa a nível de indemnizações compensatórias, plano de investimento e introdução do agente único, propostas pelos trabalhadores estão há muito(...)

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(...)nas gavetas dos responsáveis governamentais aguardando discussão e decisão.
E por que é que não se diz que o aumento do gasóleo - esse sim decidido pelo Governo! - vai provocar um enorme aumento nos custos de produção da empresa? Com esta medida não procura o Governo atirar para os ombros dos trabalhadores o odioso dos novos aumentos dos transportes anunciados por um responsável governamental?!
Ficou inteiramente claro aos olhos do País que para este Governo a viabilização das empresas tem de ser feita exclusivamente à custa de sacrifícios e de uma maior exploração sobre os trabalhadores, à custa do agravamento das suas condições de vida e de trabalho. Mas se eles lutam, se eles recorrem ao direito de manifestação e de greve que a lei e a Constituição lhes reconhecem, que faz o Governo? Logo brada que estão em curso «manobras subersivas», procurando voltar as populações contra aqueles que se inserem no quadro da legalidade democrática. Quem, senão o Governo, se põe fora da lei e da Constituição quando opta pela chantagem para cilindrar a negociação? Quem, senão o Governo, procura a desestabilização no campo social quando substitui a negociação pela acção coerciva?
É este o Governo que aqui nesta Assembleia e no seu programa afirmava ir defender o nível de vida dos trabalhadores portugueses!... Fica demonstrado que para o Governo e para os partidos que o apoiam os Portugueses não deveriam usar dos seus direitos e das suas liberdades para defender os seus justos interesses seriamente ameaçados. Contra o exercício dos seus direitos ergue-se agora um cutelo que o Governo se prontifica fazer baixar a qualquer momento... Com este grave precedente aberto na Rodoviária Nacional, RDP e EPNC, e a ameaça latente que pesa sobre os trabalhadores da TAP, CP e CTM, o Governo AD quer impor a sua vontade contra a lei e a Constituição, atirando com as consequências para cima dos ombros dos trabalhadores.
Tal como já havia tentado com o bloqueamento de quarenta convenções colectivas de trabalho, tal como está fazendo na zona da Reforma Agrária e tomando de assalto os órgãos de comunicação social estatizados, o Governo PPD/CDS procura deliberadamente o confronto com o movimento operário e com as forças democráticas, procurando afirmar uma força que não possui.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Cada vez mais claro aparece aos olhos dos Portugueses que o plano de mudança prometido pela AD visa a restauração da dinâmica de exploração, acumulação e concentração capitalista, conduzindo à restauração do poder do grande capital e dos latifundiários à custa do agravamento das condições de vida dos trabalhadores e das classes médias, visa limitar as liberdades e destruir, através da acção governativa, as grandes conquistas da revolução portuguesa.
Tal como fizeram no passado dia 14 em vários pontos do País, manifestando o seu protesto contra o bloqueamento da contratação colectiva e contra o aumento do custo de vida, tal como o heróico proletariado do Alentejo está neste momento resistindo e lutando para evitar a destruição da mais bela conquista de Abril, os trabalhadores portugueses não abdicarão de nenhum dos direitos consagrados nas leis e na Constituição para defender as liberdades e o regime democrático. Os trabalhadores do sector dos transportes e da comunicação social estalizada saberão inserir a sua luta no quadro da legalidade democrática, não temerão ameaças nem chantagens e acabarão por vencer pela razão e pela luta.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Nesta Assembleia reafirmamos a esses trabalhadores e aos milhões de homens e mulheres, à maioria do povo português que está com o 25 de Abril, que os comunistas se baterão ao seu lado, intransigentemente, para derrotar os desígnios dos que sonham com o regresso ao passado da opressão e da ditadura. Apesar das dificuldades e dos perigos ha forças bastantes para defender os valores constitucionais e a pátria de Abril.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Certamente que para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Cabecinha.

O Sr. António Cabecinha (PSD): - É sim, Sr. Presidente.
O Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, no fundo, mais não veio do que confirmar a intervenção do Partido Social-Democrata feita na 3ª feira passada. Ou seja, confunde os legítimos direitos e as legítimas reivindicações dos trabalhadores portugueses, para através delas tentar uni clima insurreccional, para através delas tentar desestabilizar o País e inviabilizar este Governo.

O Sr. Ferreira do Amaral (PPM):-Muito bem! O Sr. Vitor Louro (PCP): - Mas que música!

O Orador: - Mas queria fazer ao Sr. Deputado Jerónimo de Sousa três perguntas concretas a que desejaria que ele respondesse linearmente.
A primeira é se o Sr. Deputado está contra as empresas que, de facto, estão em situação económica difícil, ou se está contra o reconhecimento que o Governo naturalmente tem de fazer dessa situação económica difícil quando ela exista de facto.
Em segundo lugar, queria perguntar-lhe se neste país já tudo anda ao contrário, inclusive se a óptica do Partido Comunista se inverteu totalmente. Ou seja, os sindicatos aceitaram as intermitências de horários, em termos dos transporte rodoviários, para o sector privado e já não os aceitam, no entanto, para o sector público que é de todo o povo português.
Fez o Sr. Deputado uma afirmação em que refere que se tenta restaurar uma dinâmica de exploração. Quero perguntar-lhe se essa dinâmica de exploração permite também explorar os trabalhadores que utilizam esse serviço social.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra para responder o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Cabecinha: Mais uma vez o Sr. Deputado confunde as lutas justas dos trabalha-(...)

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dores com a questão da criação de um clima pré-insurreccional, como afirmou. Pergunto-lhe se é só por o Partido Comunista Português e outras forças democráticas apoiarem a luta justa dos trabalhadores da Rodoviária Nacional, da CP, da EPNC e da RDP que se cria um clima pré-insurreccional. Mas, colocando a questão ao contrário, não é de facto desestabiliza a situação social o Governo ameaçar os trabalhadores com a declaração das empresas em situação económica difícil só porque os trabalhadores lutam através da greve, através da negociação? De agora para a frente quando é que os trabalhadores dessas empresas podem fazer greve, sabendo que sobre eles se abate o cutelo desta ameaça do Governo?

Aplausos do PCP.

Por outro lado, qual é a vossa concepção de pluralismo quando aparece um Ministro a falar na televisão sem permitir o direito de resposta aos trabalhadores para que estes possam esclarecer o público?

Aplausos do PCP.

Quanto à sua pergunta de estamos contra as empresas em situação económica difícil, pois contra o que nós estamos é que sejam apenas os trabalhadores a pagar as consequências dos erros dos governos anteriores, a pagar os erros e os crimes que o grande patronato cometeu em relação a essas mesmas empresas. Portanto, quando este Governo procura apenas impor aos trabalhadores sacrifícios, retirar-lhes regalias, impor-lhes a lei da rolha, com certeza que da parte do PCP, do Partido Socialista, de outras forças democráticas e se calhar de forças que votaram AD, de homens e mulheres que votaram AD, não pode haver acordo com esta solução que o Governo AD encontrou.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador. - Quanto à questão das intermitências nos horários, o Sr. Deputado de certeza que não está de acordo - e se está, isso é mau - que um camionista trabalhe treze ou catorze horas e receba apenas oito horas. É uma questão que tem de ser posta em temos de negociação, pois os trabalhadores da Rodoviária Nacional não abdicam desta e a imposição, pura e simples, para além de outras medidas que os ameaçam, não é solução, já que não pode haver dois pesos e duas medidas. Os trabalhadores ainda não se declararam nem contra nem a favor das intermitências, pois isso faz parte da negociação. O que eles não podem é negociar apenas as intermitências, retirando-lhes o aumento de 23 % nos salários que já tinha sido acordado entre as duas partes.
Quanto à última pergunta, Sr. Deputado, pedia-lhe o favor de a repetir, já que não a percebi muito bem.

O Sr. António Cabecinha (PSD): -t O Sr. Deputado falou que havia uma dinâmica de exploração. O que lhe perguntei era se esse conceito que acabou agora mesmo de expender - naturalmente que sempre através do materialismo dialéctico, já que o seu conceito e as suas respostas não podem fugir dessa «chapa» - pode ser transferido da exploração que, naturalmente, o patronato faz para & dinâmica de exploração que as empresas públicas fazem dos trabalhadores que são os utilizadores maiores desse serviço social. Portanto, a minha pergunta era se o Sr. Deputado concorda com isto e se acha que essa dinâmica é justa.

O Orador: - Pois o Sr. Deputado vai permitir-me aprofundar ainda mais uma questão.
O que está em causa na Rodoviária Nacional não é apenas uma tabela salarial e uma negociação. É que, levantando dificuldades aos trabalhadores, estão-se a criar condições para entregar os terminais mais rentáveis da Rodoviária Nacional e para desmembrar a empresa por zonas, em centro, sul e norte, procurando assim reparti-la de forma a facilitar a entrega às entidades patronais do; seus sectores mais rentáveis. Assim, o que está em causa neste momento é impor uma major exploração aos trabalhadores e, por outro lado, atacar o próprio sector público. É isso que este Governo AD tenta fazer neste momento.

Aplausos do PCP.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito?

O Sr. Carlos Lage (PS): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: De facto não há uma figura regimental que eu possa invocar para pedir a palavra. No entanto, o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa fez uma referência às posições do Partido Socialista e como estamos numa Câmara política em que se está a gerar um debate à volta desta questão, das greves que são anunciadas para amanhã, o Partido Socialista pensa poder dizer alguma coisa em três minutos e isso não violará, com certeza, o Regimento.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Também o Partido Socialista já tomou oportunamente posição na Assembleia pela voz do Sr. Deputado João Cravinho sobre a declaração em situação económica difícil feita pelo Governo da empresa Rodoviária Nacional. O Partido Socialista condenou e condena totalmente essa atitude arbitrária e inexplicável do Governo, como sendo uma tentativa de atacar a Rodoviária Nacional e de ' a desmembrar, de intimidar os seus trabalhadores e assim subjugar não só os trabalhadores desta empresa, mas também outros trabalhadores de empresas públicas, sob a ameaça da declaração das empresas em situação económica difícil.
Por .conseguinte, a nossa posição e de total repúdio dessa situação e de solidariedade com as lutas que os trabalhadores resolveram empreender para defesa dos seus postos de trabalho, para defesa da sua dignidade e do seu futuro.
Relativamente aos outros processos de greve desencadeados, também o Partido Socialista, sem estar a fazer uma análise casuística de cada um desses processos de greve, não pode deixar de manifestar o seu aceno de simpatia a todos os trabalhadores que se batem pelos seus direitos constitucionais, que se batem pelas reivindicações justas e que, enfim, se opõem às prepotências e à acção inconveniente do Governo da AD, do actual Governo que dirige, mal, o nosso pais.

Aplausos do PS e PCP-

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O Sr. Presidente: - A Mesa pretende salientar que ao permitir a intervenção excepcional do Sr. Deputado Carlos Lage o fez, porque ele, por sua vez, invocou uma referência especial ao seu partido que foi realmente feita pelo Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.
Portanto, a Mesa entendeu que deveria haver razão para que, invocado um partido, um seu representante legitimo pudesse responder. Só nessas condições lhe foi dada a palavra, ST. Deputado Carlos Lage.

Pede de novo a palavra para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, é só para agradecer a decisão da Mesa e para, de qualquer maneira, sublinhar que, não obstante as figuras regimentais serem bastantes rígidas e nós devermos interpretá-las, com respeito, há circunstâncias, tal como esta, em que a Mesa terá de permitir que os partidos se pronunciem quando se trata de casos de importância nacional.

É por isso que agradeço ao Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Não tem de agradecer, Sr. Deputado, pois creio que a Mesa já usou, uma vez ou outra, este critério.

O Sr. Deputado José Cardoso pede a palavra para que efeito?

O Sr. José Cardoso (PSD): - É para uni protesto.

O Sr. Presidente: - Lembro, em todo o caso, a todos os Srs. Deputados que, como já foi anunciado, os pedidos de esclarecimento devem ser objecto de inscrição imediatamente a seguir à intervenção do orador.

O Sr. José Cardoso (PSD): - Sr. Presidente, eu tinha pedido a palavra antes do Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Presidente: - Não está em causa o Sr. Deputado, mas é que vejo o Sr. Deputado Nascimento Rodrigues também a pedir a palavra só agora.

O Sr. Nascimento Rodrigues (PSD): - Eu fi-lo na altura devida, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Basta que diga que o fez, Sr. Deputado.

Então, antes do protesto do Sr. Deputado José Cardoso, há ainda um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Nascimento Rodrigues.

Tem a palavra.

O Sr. Nascimento Rodrigues (PSD): -Sr. Presidente, eu tinha pedido a palavra logo a seguir à intervenção do Sr. Deputado Jerónimo de Sousa para lavrar um protesto.
O meu protesto vai ser muito breve e, ao mesmo tempo, muito sereno, pois penso que este problema é um problema essencial e que deve ser analisado com o máximo de objectividade.
A intervenção do Sr. Deputado estribou-se fundamentalmente em duas ideias centrais: por um lado, a ideia de que a declaração' de certas empresas tem situação económica difícil se deveria a tinia finalidade da parte do Governo de impor uma maior exploração aos trabalhadores e, por outro lado, a ideia de que existia uma finalidade de atacar o sector público.
Protesto contra estas afirmações do Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, pela simples razão de que, quer no caso da Rodoviária Nacional, quer noutros casos, aquilo que o Governo está a pretender fazer é exactamente defender o sector público.

Risos do PS e do PCP.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Boa piada!

O Orador: - Pergunto-me, Sr. Deputado, se no caso da Rodoviária Nacional, uma empresa que declaradamente e publicamente tem tido repetidos déficits de exploração, o Governo ao declará-la em situação económica difícil não está a pretender, ao fim e ao cabo, através de uma reformulação do acordo de saneamento económico e financeiro dessa empresa, defender os postos de trabalho dos seus trabalhadores. O que é que é preferível: permitir que as coisas continuem como estão e deixar afundar as empresas, ou implementar medidas que preservem efectivamente os postos de trabalhos? Quem é que na realidade, defende as empresas públicas? Este o primeiro ponto.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

Quanto ao segundo ponto, Sr. Deputado, confesso que não entendi. Afirmou aqui claramente, e gostei de o ouvir dizer isso, que os trabalhadores não consideraram ainda a questão das intermitências de horários como uma questão fechada e que ainda não se declararam contra ela. Ora bem, quanto à questão das tabelas salariais já sabemos que elas f fiam acordadas, que foram depositadas e enviadas para publicação oficial, restando, portanto, o problema das intermitências e das diuturnidades. Mas se efectivamente os trabalhadores, como o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa disse, não estão contra as intermitências e desejam a negociação, pergunto-me, ao fim e ao cabo, qual é a razão desta greve. Pois que se continue com a negociação e não se faça a greve.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

Em relação à CP o Sr. Deputado referiu que o problema se põe relativamente a promoções adiadas e a acordos celebrados. Este problema, tanto quanto sei, arrasta/se de há quatro anos para cá. Pergunto: que medidas foram adoptadas pelos sindicatos para defender, efectivamente, a realização dessas promoções e a efectivação dos acordos celebrados em relação a Governos anteriores? Por que é que isto aparece no momento em que toma posse o novo presidenta do conselho de gerência da CP, que não teve ainda tempo, como é natural, de se pôr a par dos problemas?

O Sr. Macedo Pereira (CDS): - Muito bem!

O Orador - Tudo isto é simultâneo tudo isto tem o objectivo dei criar uma instabilidade social e é isso que não aceitamos. Estamos pela defesa dos legítimos interesses dos .trabalhadores, não estamos é pela manipulação desses interesse visando outros objectivos.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: Tem a palavra o Sr. Deputado José Cardoso,.

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Entretanto o Sr. Deputado Veiga de Oliveira pede a palavra para que efeito?

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP):- Sr. Presidente, é para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP):- Sr. Presidente, se bem entendo as normas regimentais, o protesto que foi feito pelo Sr. Deputado que acabou de falar foi em nome do Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata. Isto é, não se tratou de nenhuma ofensa pessoal, mas sim de um protesto em nome do partido. Se agora vamos reeditar um protesto em nome do mesmo partido, penso que nos podemos fazer, pelo menos, quarenta e quatro contra protestos em nome do meu partido.
Assim, não me parece que seja esta a norma regimental. E se o Sr. Deputado que agora pede para fazer um protesto não invoca razões pessoais, parece que já não há lugar para mais um protesto do Partido Social-Democrata.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, regimentalmente tem razão. Mas pelas mesmas razões que me levaram a usar de uma certa latitude ao conceder a palavra ao Sr. Deputado Carlos Lage, que expressamente reconheceu no início da sua intervenção que rigorosamente não tinha figura regimental em que se apoiasse, a Mesa cedei a palavra ao Sr. Deputado José Cardoso. E como não há mais pedidos de palavra, a Mesa dará depois a palavra ao Sr. Deputado Jerónimo de Sousa para responder.

Tem a palavra o Sr. Deputado José Cardoso.

O Sr. José Cardoso (PSD): - Muito obrigado, Sr. Presidente. Compreendo bem a preocupação do Partido Comunista em não me deixar fazer este protesto.

Protestos do PCP.

O Sr. Mário Quintino, funcionário da Rodoviária Nacional, por sinal motorista, julga-se que tem um problema na coluna e não pode conduzir as viaturas da sua empresa. Não obstante, é o motorista privado do núcleo do Montijo do Partido Comunista.

Risos do PSD.

Os funcionários da Rodoviária Nacional faziam quatro carreiras diárias Barreiro-Montijo e agora só podem fazer três. Porquê? Porque há pessoal a mais.
Os autocarros saem com frequência sem gasóleo, originando que muitas vezes fiquem estacionados na via pública e obriguem outras viaturas a fazer o seu abastecimento no local onde ficaram paradas. Isto só porque não há o cuidado de antes de saírem com as viaturas se verificarem os respectivos níveis de gasóleo.
A fiscalização que era exercida com frequência à actuação dos condutores e daqueles funcionários que vendem os bilhetes deixou de ser feita. A razão para este facto é simples: os fiscais são eleitos pelas comissões de trabalhadores e se se portarem mal são despedidos.
Mais de 30% dos funcionários da Rodoviária Nacional não aderiram à greve, neste momento. Irão possivelmente fazê-la, porque os restantes os impedem de trabalhar.

Risos e protestos do PCP.

Compreendo que estas verdades sejam muito difíceis de ouvir.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Vital Moreira (PCP): -Essas aldrabices!...

O Orador: - Depois disto tudo não é difícil ver que uma empresa nestas condições tinha de ser declarada em situação económica difícil.

Mas mais: uma empresa assim ainda consegue distribuir cerca de l 000 000$ par amo aos CEPs para actividades desportivas. Não sei se os Srs. Deputados sabem o que é um CEP. É um centro de exploração ds passageiros e a Rodoviária Nacional tem dez, o que equivale a 10000000$, que são distribuídos por ano. E ainda por cima na situação de crise em que a empresa está foram agora adquiridas dez viaturas Renault-4.
Portanto, meus amigos, o Governo tem de tomar medidas muito concretas contra esta anarquia.

Aplausos do PSD. do CDS e do PPM.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Proponho que este Deputado vá para fiscal da Rodoviária!

O Sr. Ferreira do Amaral (PPM): - Bastante falta fazia!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa para responder.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não vou perder muito tempo a responder aos dois protestos, para que a AD não vá dizer, mais uma vez, que a oposição está a fazer obstrução no Parlamento.

Poderia sintetizar o último protesto que ouvimos nisto: para a AD os trabalhadores da Rodoviária Nacional são uns malandros e, por isso, há que lhes dar na cabeça.

Aplausos do PCP.

O Sr. José Cardoso (PSD): - Não a todos!

A Sr.ª Helena Roseta (PSD): - Vocês é que fazem as frases e batem as palmas!

O Orador: - Quanto ao protesto do Sr. Deputado Nascimento Rodrigues, e vou tentar responder-lhe também em tom sereno, sempre lhe posso dizer, quanto à questão de quem é que faz a desestabilização e que é que procura o diálogo e a negociação, que se o Governo AD estivesse, de facto, interessado no diálogo, por que razão é que o Sr. Ministro dos Transportes, sabendo que há uma greve amanhã, só vai receber os trabalhadores da Rodoviária Nacional e os sindicatos representativos no dia 12 de Março?

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Porque não tem tempo!

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O Orador: - Isto significa que não há qualquer vontade política e social por parte do Governo AD em tentar negociar.

O Sr. Nascimento Rodrigues (PSD): - Posso interrompê-lo, Sr. Deputado?

O Orador: - Faz favor.

O Sr. Nascimento Rodrigues (PSD): - Agradeço ao Sr. Deputado a interrupção que me permite.

Só queria esclarecer que nenhum Governo democrático pode dialogar perante uma coacção como é uma greve.

Protestos do PCP.

O Orador: - Sr. Deputado, acaba de dar mais um importante subsídio para demonstrar qual é o conceito de greve que tem a AD.

Aplausos do PCP.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Na Rússia há greves?

O Orador: - Quanto às questões que levantou, na nossa opinião, o Governo com esta medida "come a vários carrinhos": primeiro, retira o direito da livre negociação aos sindicatos dos trabalhadores da Rodoviária Nacional; segundo, se eles fizerem muita bulha têm sobre si um cutelo, porque estão sujeitos a serem despedidos, estão sujeitos a que lhes retirem outras regalias sociais e ao aumento do horário de trabalho. Por outro lado, é possível que no dia 12 o Sr. Ministro dos Transportes vá dizer aos trabalhadores e aos sindicatos que devido à grave situação económica e financeira há necessidade de repartir a empresa em três zonas, que há necessidade de possivelmente vender os terminais mais rendíveis, ou então, como alternativa, terão de se fazer despedimentos, terão os trabalhadores que passarem a receber pelo Fundo de Desemprego. Veremos no dia 12 quais irão ser as propostas do Sr. Ministro dos Transportes. O que está em causa, Sr. Deputado, como aqui mesmo há pouco o afirmou, é o direito à greve...

O Sr. Carlos Lage (PS): - Muito bem!

O Orador: - ..., é aumentar a exploração sobre os trabalhadores, é atacar o sector público e, neste caso concreto, a Rodoviária Nacional. E que se a Rodoviária Nacional tem de dar lucros, tal como a mentalidade dos Srs. Deputados da AD indica, qualquer dia também os hospitais e as escolas têm de dar lucros.

Aplausos do PCP.

Ora os custos sociais, Srs. Deputados, também têm o seu preço e as indemnizações compensatórias que deviam ser dadas à Rodoviária Nacional estão em atraso e são cerca de 600 000 contos, a compra de autocarros novos e outras medidas como o agente único não foram tomadas. Então, Sr. Deputado, se é assim faça-se primeiro a reestruturação da empresa e que não se obriguem apenas os trabalhadores a pagar os custos disto tudo.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr..Deputado José Cardoso para uma intervenção.

O Sr. José Cardoso (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao usar da palavra neste Parlamento, pela primeira vez, para uma intervenção, não o devo fazer sem primeiro desejar a V. Ex.ª, Sr. Presidente a continuidade da boa condução dos trabalhos. Uso da palavra para defesa real dos agricultores portugueses e não na defesa dos pontos de vista de partidos que não o nosso e que nada tem a ver com os interesses dos agricultores.

Vozes do PSD: - Muito bem! Uma voz do PS - Essa agora!

O Orador. - Vou falar-vos da Colónia Agrícola de Pegões. Situada na margem sul do Tejo, mais propriamente no concelho do Montijo, com uma superfície total de 4615 ha, cujo solo apresenta a característica essencialmente arenoso, muito permeável e de espessura variada, com fraca aptidão para culturas cerealíferas. Os vales & certas zonas baixas, embora mantendo o carácter arenoso, têm, no entanto, maior grau dei fertilidade e boa aptidão para o regadio. A vinha e a figueira vegetam em boas condições.
Nesta Colónia foram instaladas a partir de 1947 206 famílias, distribuídas por três núcleos de povoamento: Pegões Velhos, 94; Figueiras, 50; Faias, 62, num total de 3843 ha.
A população actual da Colónia Agrícola é de cerca de 2000 indivíduos, sendo 200 menores de 12 anos.
A superfície total da unidade económica prevista e atribuída a cada colono é, em média, a seguinte: Pegões Velhos, 20 ha; Figueiras, 18,5 ha; Faias, 15 ha.
A sua composição média para todos os núcleos é aproximadamente de regadio e laranjal, 12- ha; vinha, 4 ha; cultura de sequeiro, 10,7 ha; pinhal e montado, 2 ha, o que perfaz um total de 17,9 ha.
O agregado familiar de cada casal agrícola é composto em média por 4 ou 5 pessoas.

As culturas usuais são:

No regadio: milho, feijão batatas, arroz, forragens, produtos hortícolas, como a cebola, o tomate, alho, cenoura, couve-flor, repolho e lombardo;
No sequeiro: trigo, milho, aveia, cevada, pasto e fruteiras;
A vinha destina-se à produção dei vinho (três quartas partes) e de uva de mesa (uma quarta parte).
Na exploração pecuária, além dos animais utilizados nos trabalhos dos chamados animais de capoeira para consumo próprio, existe neste momento quantidade: apreciável de suínos, motivada pelo desenvolvimento da indústria de carnes na vila do Montijo. Graças ao crédito agrícola de emergência foi possível também desenvolver a engorda de bovinos.
O casal agrícola é dotado das seguintes construções: casa de habitação, com superfície! coberta de 63 m2, e estábulo para os animais de trabalho, tendo os colonos aumentado os estábulos à medida das suas possibilidades; financeiras.
Os colonos e respectivas famílias foram orientados e assistidos por técnicos especializados do IGEF, de-

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vendo no entanto salientar que a assistência técnica aos gados era prestada por um funcionário deste organismo que prestava assistência vinte e quatro horas por dia e agora foi transferido para outro organismo, deixando a assistência de ser prestada com esta assiduidade, com graves prejuízos para os agricultores. Por isso daqui lançamos o nosso alenta para que esta falta seja corrigida o mais depressa possível.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como agricultor e como Deputado não posso deixar de salientar a actividade destes colonos, que transformaram esta terra estéril, quase desértica, fazendo aqui uma autêntica, uma verdadeira Reforma Agrária.

O Sr. Moura Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Esta é, em suma, a nossa concepção de Reforma Agrária, transformando terras de pousio e abandonadas em terras férteis, aumentando assim o rendimento per capita e o produto agrícola global, ao mesmo tempo que se concretiza a ligação directa dos agricultores à terra dentro do que (tecnicamente é aconselhável.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador - Por tudo isto e de acordo com o Programa do Governo, em relançar a entrega de terras a pequenos agricultores, entendemos nós que se deve entregar a terra em regime de posse plena a estes agricultores.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

Porque só assim se fará justiça social, proporcionando às -pessoas que durante trinta anos trabalharam a terra afincadamente a possibilidade de no final da sua vida poderem obter algum rendimento do produto do seu trabalho. Não obstante, devendo ser salvaguardados os investimentos que o Estado ali fez, não alterando os fins para os quais a Colónia foi criada, terá de se garantir que a venda do casal agrícola só possa ser efectuada para um agricultor ou em forma de emparcelamento com os casais confinantes, cuja dimensão está desactualizada nos tempos que correm.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Falei-vos da Colónia Agrícola de Pegões porque representa 207 casais, para além das restantes colónias espalhadas pelo País que são cerca de 7.

Por isso o Partido Social-Democrata, ao entender que esta terra deve ser entregue em regime de posse plena aos agricultores, está a cumprir mais una promessa do seu Programa do Governo.

Aplausos do PSD. do CDS e do PPM.

Entretanto assumira a presidência o Sr. Vice-Presidente António Arnaut.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Campos.

O Sr. António Campos (PS): - Vou apenas fazer uma pequena pergunta ao Sr. Deputado, dado ter feito, na sua intervenção, uma referência à distribuição pelo Governo de terras aos pequenos agricultores.
Tanto quanto sei, pelos números que foram publicados, há 40000 trabalhadores a trabalharem nas UCPs e cooperativas, o que dá uma média de 23 ha por cada trabalhador na zona do Alentejo.
O Sr. Deputado referiu que na zona de Pegões - zona dei regadio- a media por colonato andará à volta dos 20 ha. Mas, apesar disto tudo, o Sr. Deputado anunciou a distribuição de terras aos pequenos agricultores.
Gostaria que explicasse a esta Câmara como é que o Governo vai distribuir terras aos pequenos agricultores. Só retirando dei lá os trabalhadores, porque as terras estão todas a ser trabalhadas. Que me conste, se há terras que não estão a ser trabalhadas não estão nas mãos dos trabalhadores - poder-lhe-ei provar isso.
Gostaria, pois, de saber se a política do Governo será a de desempregar trabalhadores para distribuir terras a pequenos agricultores. Como é que o Governo vai fazer o milagre de duplicar ou triplicar as terras da modo a poder contemplar os pequenos agricultores e, simultaneamente, não colocar no desemprego os trabalhadores rurais? A não ser que o Governo avance com mais expropriações, o que penso não deverá acontecer, segundo as explicações que têm sido dadas a esta Câmara.
Como essa política já foi expendida nesta Câmara, por duas ou três vezes, nós gostaríamos de saber qual é o milagre que o Governo vai fazer, onde vai buscar a terra para a distribuir.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Cardoso.

O Sr. José Cardoso (PSD): - Parece-me que o Governo não tem hipóteses de fazer milagres.

Risos do PS.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Ah não?

O Orador: - ... e muito menos de fazer milagres para corrigir uma Constituição que vocês fizeram e da qual nós não temos culpa nenhuma.

Risos do PS e do PCP.

Além disso, eu estava a referir-me à questão da distribuição de terras que o Sr. Deputado António Campos fez o favor de confundir. Falei na Colónia Agrícola de Pegões, que já existia antes da Reforma Agrária e que não está inserida na zona da Reforma Agrária, podendo, portanto, ser entregue em posse plena. Isto já não pode acontecer na zona da Reforma Agrária cuja posse da terra tem de ser útil.
Isto era precisamente para estabelecer uma confusão que não feita...

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Disse bem: estabelecer uma confusão.

O Orador: - Nós dissemos claramente que na zona de Pegões a terra pode ser dada em posse plena, o que não pode acontecer nas UCPs.

Além disso, o Governo também disse no seu Programa, e está a cumprir, que é preciso haver uma

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alternativa para os trabalhadores que estão em demasia nas UCPs.
Quando falo de agricultores refiro-me aos homens que são agricultores, que vivem da agricultura; não estou a referir-me aos sapateiros, aos padeiros, aos pedreiros que foram para a zona de intervenção da Reforma Agrária e que hoje se consideram também agricultores.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Vital Moreira (PCP): - E os funcionários da alfândega, a, quem vocês dão tarjas?

O Orador - Também esses não são agricultores.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Mas vocês dão-lhes terras!

O Orador: - Além disso, Sr. Deputado António Campos, há a necessidade absoluta, para resolver o problema da Reforma Agrária e dos trabalhadores que existem em excesso na respectiva zona de intervenção, de se criarem indústrias anexas.

A Sr.ª Helena Roseta (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sem indústrias na zona de intervenção da Reforma Agrária não é possível resolver-"e o problema dos trabalhadores que lá estão em excesso.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. António Campos (PS): - Dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - Com certeza.

O Sr. António Campos (PS): - Sr. Deputado eu perguntei-lhe, muito concretamente, onde é que os senhores, que têm anunciado a distribuição de terra a pequenos agricultores, vão buscar a terra. Desempregam os trabalhadores que lá estão para distribuírem essa terra a pequenos agricultores? Põem--nos no desemprego ou onde é que os vão colocar?
Sabendo que nesses 40000 poderá haver 1000 a 500 nessas circunstâncias que o senhor anunciou - admito que os haja -, gostaria de saber como é que o vão fazer.
Se calhar - o que é diferente - vão pegar nas terras, chamam os trabalhadores e dizem-lhes: "Os meais caros amigos passam agora a ser empresários, senão vão para a rua e são despedidos."
Posso trazer-lhe cópias de despachos, Sr. Deputado, deste teor, mas asso é outra questão.

O Orador: - Mas quem está a fazer essa afirmação é o Sr. Deputado e não o Governo.

O Sr. António Campos (PS): - O Sr. Deputado é que referiu "é pouco, na sua intervenção, que iam distribuir terras aos pequenos agricultores.

O Orador: - E já o fizeram!

O Sr. António Campos (PS):-Mas como, Sr. Deputado? Explique-nos onde vão buscar a terra. Vão pôr no desemprego os trabalhadores ou vão expropriar mais terras?

O Orador: - Oh Sr. Deputado, não está em causa pôr os trabalhadores no desemprego. O .que está em causa é o excesso de pessoas que estão na zona de intervenção da Reforma Agrária...

Risos do PS e do PCP.

... e que eram de outros sectores.
Eu já disse, mais do que. uma vez, que o Governo propõe-se criar indústrias junto da zona de intervenção da Reforma Agrária. O Sr. Deputado sabe perfeitamente que a maioria das populações dessa zona nem saneamento básico têm. Esta é uma nova iniciativa a que o Governo se propõe, é um novo tipo de trabalho para que os pedreiros, os serventes da construção civil que foram para a zona de intervenção da Reforma Agrária voltam paca as suas actividades iniciais, com a criação de indústrias intermédias.
O Governo está neste momento a fazer um inquérito para saber, antes de entregar as terras, quem é que quer optar por ficar como empresário, quem é que quer ir para outras indústrias afins e, inclusivamente quem é que quer beneficiar do Fundo de Desemprego.
Entretanto, nós sabemos que são mais os trabalhadores rurais que têm, neste momento, idade para serem reformados do que para andarem na Reforma Agrária.

Aplausos do PSD.

O Sr. Sousa Tavares (DR)- - Sr. Presidente, peço i palavra para formular um protesto em relação às palavras do Sr. Deputado António Campos.

O Sr. Presidente: - Queira formulá-lo sinteticamente.

O Sr. Sousa Tavares (DR): - Protesto contra o abuso permanentemente demagógico do Sr. Deputado António Campos, já pela terceira vez nesta Câmara, acerca dos eventuais desempregados da Reforma Agrária, no caso de se fazer uma racionalização da exploração agrícola do Alentejo.
Eles já são, neste momento, apenas artificialmente empregados -e o Sr. Deputado António Campos sabe que isto é verdade -, o que é uma situação económica e social indecorosa, porque, se a terra não sustenta aquela gente, e ela está a ser sustentada pela terra, há uma situação artificial indecorosa...

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Indecoroso é este protesto!

O Orador: - ...tendo, portanto, de se pôr cobro a ela de outra maneira, ou através do subsídio de desemprego ou pela invenção de novos empregos.
Além disso, protesto também contra a exploração demagógica que o Sr. Deputado António Campos faz permanentemente deste argumento, porque o Sr. Deputado .sabe que o Alentejo das UCPs continua a manter um sistema de exploração de cultura extensiva que é criador de poucos empregos e que não dá possibilidades económicas à mão-de-obra.

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Todo o programa racional agrícola em relação ao Alentejo deve ser o de passar de uma cultura extensiva e de monocultura para a cultura intensiva.
Portanto, o argumento que o Sr. Deputado António Campos emprega sistematicamente é um puro argumento demagógico e sem qualquer razão de ser do ponto de vista técnico e social.

Aplausos dos Deputados reformadores, do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. António Campos (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para um contraprotesto.

O Sr. Presidente: -Paca favor, mas seja também breve,

O Sr. António Campos (PS): - É claro que, pela idade que tenho, alguns dos meus defeitos posso-os ter aprendido com o Sr. Deputado Sousa Tavares...

O Sr. Sousa Tavares (DR): - Devia ter aprendido mas não aprendeu.

O Orador: - ...e acima de tudo o defeito de às vezes me meter em questões que não conheço com profundidade.
De qualquer maneira, queda explicar, clara e serenamente, ao Sr. Deputado Sousa Tavares...

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado não pode explicar, pode contraprotestar.

O Orador: - Irei então contraprotestar em relação a afirmações que foram feitas.
A racionalização da exploração no Alentejo passa por um plano de aproveitamento dos recursos naturais, por um plano de formação profissional, planos estes a longo prazo.
A estratégia que o Sr. Deputado pretendia desencadear para o sector agrário levaria a que no Centro e no Norte do País metade da população rural fosse totalmente para o desemprego.
Cerca de 32% da população portuguesa está ligada à agricultura. Os recursos naturais aproveitados não dariam para mais de 15 % e o que o senhor aqui está a defender é o aumento de 15 % do desemprego da população agrícola portuguesa.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador - O senhor não tem os problemas do mundo rural porque os não conhece. Desde sempre essas populações têm vivido miseravelmente exploradas pelas teses da reconversão e o que é facto é que nunca ninguém lhes fez essa reconversão.
Não vá agora o Sr. Deputado pegar nos trabalhadores alentejanos ou nos agricultores do Centro e Norte do País -que têm pequenas fatias de terra, porque eles têm de subsistir ali- e atirá-los para o desemprego. Essa é a tese da AD, é a tese do Sr. Deputado.

A Sr.ª Helena Roseta (PSD): - É a sua!

O Orador: - O Sr. Deputado é que é um demagogo permanente quando em A Capital ou publicamente se refere a isto.
Posso ter muita consideração pelo senhor como homem de direito mas considero-o o rei dos demagogos quando se refere à agricultura portuguesa.

Aplausos do PS e do PCP.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente, até agora -e creio que faço uma boa interpretação do Regimento- só eram possíveis protestos em relação a intervenções produzidas e não se admitiam, logicamente, protestos em relação a pedidos de esclarecimento ou em relação a outros protestos.
O Sr. Deputado Sousa Tavares, na sua conhecida vontade de "botar faladura" sempre que esta questão vem aqui ao de cima, achou-se no direito de fazer um protesto.
Eu poderia agora achar-me no direito de fazer um protesto ao protesto do Sr. Deputado Sousa Tavares; um Sr. Deputado qualquer da AD poderia fazer um protesto em relação ao meu protesto e, de protesto em protesto, de esclarecimento em esclarecimento, podíamos estar aqui até ao fim do dia.
Salvo melhor opinião, o Sr. Deputado Sousa Tavares não tinha direito a fazer qualquer protesto em relação a um pedido de esclarecimento feito pelo Sr. Deputado António Campos. Creio que o decoro parlamentar -para utilizar uma expressão do Sr. Deputado Sousa Tavares- começa por respeitar o Regimento e por não utilizar atrabiliariamente a sua vontade inesgotável de se ouvir falar nesta Assembleia.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa responde-lhe que é sempre difícil avaliar da pertinência ou não do direito de protesto. Esse direito está consignado no Regimento não só para responder a ofensas pessoais como também para contrabater afirmações inexactas.
A Mesa entendeu que era pertinente dar a palavra ao Sr. Deputado Sousa Tavares e, já que lha deu, deu-a também ao Sr. Deputado António Campos para contraprotestar.

O Sr. Sousa Tavares (DR): - Sr. Presidente, peço a palavra também para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Sousa Tavares (DR): - Quando há pouco me levantei para pedir a palavra disse à Mesa qual o efeito do meu pedido e a Mesa concedeu-ma.

O Sr. Presidente: - Exactamente.

O Orador: - O Sr. Deputado Vital Moreira usou da palavra não sei ao abrigo de que disposição regimental...

Risos.

..., sem que tenha explicado à Mesa para que é que a usava.
Gostava, pois, de saber onde está a diferença.

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O Sr. Presidente: - Já respondi à Câmara quando respondi ao Sr. Deputado Vital Moreira.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Coimbra para uma intervenção.

O Sr. Luís Coimbra (PPM): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do meu partido traz hoje a este Plenário e tal como tem vindo a afirmar há longos anos uma questão política da maior relevância para a vida nacional e que por o ser deveria ser objecto das maiores preocupações de todos os partidos políticos aqui representados.
O estuário do Tejo e as suas margens e zonas limítrofes constituem uma das maiores riquezas do nosso país. O estuário é uma zona propícia à desova das espécies tradicionais, contribuindo de forma decisiva para o repovoamento piscícola permanente de praticamente toda a nossa costa.
Em termos de fauna marinha o estuário poderá hoje ser considerado uma zona quase dizimada, vítima permanente de um processo de pseudo-progresso industrial, em que estão envolvidas empresas públicas e privadas localizadas ao longo das suas margens e que inclusivamente se expandem à custa de aterros criminosos. Zonas como as da cala do Montijo, por exemplo, já apresentam hoje das maiores concentrações em mercúrio, chumbo e arsénio que se registam nos estuários europeus, substâncias estas que uma vez introduzidas na cadeia alimentar acabam por provocar fatalmente a doença, quando não a morte.
Resíduos e detritos são lançados para o estuário sem qualquer tratamento. Dos esgotos urbanos à Quimigal ou à UFA, toda uma tecnocracia acéfala tenta sobreviver e viabilizar "economicamente" as suas empresas, sejam de capital público ou privado, à custa da inviabilização do estuário do Tejo, património e riqueza nacional que por o ser, não pode continuar à mercê do saque a que tem estado sujeito por uma ou duas gerações sob a irresponsabilidade e ignorância, quando não má fé, de poderes políticos e económicos moribundos, frutos de uma era que tem fatalmente os dias contados.
Não podemos continuar a permitir que se comprometa o futuro, a possibilidade de existência das gerações que hão-de continuar Portugal. Oito séculos de história e de vida própria não podem acabar no final deste século com a simples transformação do País na lixeira e no cano de esgoto da Europa.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O PPM, convicto de representar neste campo as mais legítimas ambições do povo português neste hemiciclo, não se eximirá a todos os esforços no sentido de que sejam aplicadas em Portugal, com força de lei, todas as directivas emanadas da Comissão e do Conselho de Ministros da Comunidade Europeia, designadamente quanto à qualidade das águas balneares (recomendação de 25 de Julho de 1975) e à de 18 de Maio de 1976 sobre a poluição causada por substâncias perigosas descarregadas no ambiente aquático da Comunidade, directivas essas que constituem parte do programa de acção ambiental adoptado para o período de 1977-1981.
A juntar a esta situação em que a poluição se agrava de dia para dia, não só no estuário, mas na própria qualidade do ar para muitos portugueses que vivem junto dele - casos do Barreiro, Seixal, Moita, Montijo-, estado de coisas que o PPM tem vindo há longos anos a denunciar, atingiu-se agora uma nova situação crítica e que respeita às práticas de pesca que diariamente se processam no estuário do Tejo.
Técnicas ilegais com total desprezo pelas leis em vigor estão a ser utilizadas por grupos e sociedades sem escrúpulos.
Redes são lançadas sistematicamente a menos de 20 m das margens nos pesqueiros de Algés, Paço de Arcos, Santo Amaro, Carcavelos, Parede, Estoril, até em Cascais em frente da própria Capitania, em pleno dia!
A prática de "tapa-esteiros" utilizada no Seixal, Moita e Montijo está a exterminar corripletamente espécies em fase embrionária.
Nenhum Governo até à data teve a coragem de terminar com tais práticas.
Confiamos que o Governo ponha cobro a esta situação.
Uma exposição assinada por cerca de 1200 ecologistas, pescadores desportivos e cidadãos preocupados com este estado de coisas, e com o apoio da Liga para a Protecção da Natureza, foi enviada às autoridades competentes e ao Grupo Parlamentar do PPM.
Ao alertarmos esta Assembleia e a opinião pública para este assunto -tal como o fizemos junto do Governo a semana passada, em requerimento subscrito igualmente pelo Deputado reformador Sousa Tavares -, o PPM quer deixar bem claro que dentro e fora desta Assembleia não poupará esforços para evitar a continuação de situações como esta. doa a quem doer.

Aplausos do PPM, do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Pergunto ao Agrupamento dos minutos para o termo do período de antes da ordem do dia.
A seguir encontravam-se inscritos o MDP/CDE e o Agrupamento dos Deputados Reformadores. Pergunto ao MDP/CDE se esse período de tempo é suficiente para produzir a sua intervenção.

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Sr. Presidente, a nossa intervenção demora mais de cinco minutos, pelo que podemos ceder esse tempo a outro

O Sr. Presidente: - Pergunto ao Agrupamento dos Deputados Reformadores se deseja utilizar os cinco minutos que restam.

O Sr. Adão e Silva (DR): - Com certeza Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Adão e Silva (DR): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: As brilhantes intervenções dos Srs. Deputados representantes mais responsáveis do Partido Comunista e do Partido Socialista justificam que, também eu, intervenha pelo Agrupamento dos Reformadores para pôr em relevo alguns aspectos que julgo de interesse para a actuação útil desta Assembleia.

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Este Governo encontra-se, como o demonstram as notícias que vêm até ao povo, a governar e governará em principio, durante pouco mais de nove meses até que o povo português decida se deve prosseguir na governação ou se deve ser substituído.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não pode, portanto, exigir-se a este Governo mais do que pode, efectiva e humanamente, dar nas precárias condições em que está a governar, perante uma estudada agitação social conducente à desestabilização.

Aplausos dos Deputados reformadores, do PSD, do CDS e do PPM.

A verdade é que, se os "partidos da oposição se não assumirem acima de um excessivo partidarismo, de uma atitude cívica e de satisfação dos deveres parlamentares, e se tiverem apenas em mira impedir o Governo de enfrentar e resolver os problemas nacionais e, ao fim e ao cabo, de governar, é então evidente que é o País que perde, tanto quanto o povo continuará a ser o maior sacrificado.

Aplausos dos Deputados reformadores, do PSD, do CDS e do PPM.

Impõe-se, assim, deixar ir por diante esta nova experiência de governo e que esta Assembleia Parlamentar se prestigie, ultrapassando-se a pura luta ideológica e procurando-se, sem prejuízo do seu legítimo contrôle sobre o Executivo, colaborar civicamente na resolução dos essenciais problemas da Nação.
É, de resto, isto o que o povo, confiante e serenamente, espera dos partidos da maioria, tanto como dos da oposição.
Vamos pois, Srs. Deputados, trabalhar, evitando-se provas de força e greves políticas e não apenas reivindicativas, esforçando-nos por realizar construtivamente o País em termos da defesa, que deve sobrelevar tudo, do interesse nacional, como melhoramento do nível de vida dos Portugueses em geral e dos trabalhadores e das classes mais desfavorecidas em especial.

Aplausos dos Deputados reformadores, do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr Presidente, peço a palavra para um protesto.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Socialista não pode deixar de protestar quanto ao conteúdo da intervenção do Sr. Deputado Adão e Silva.
De facto, das palavras do Sr. Deputado Adão e Silva pode retirar-se a seguinte ilação: o Governo governa e os partidos da oposição não têm mais que fazer do que assistir à governação do Governo e sempre que protestam ou criticam estão sujeitos a ser classificados como promovendo a agitação social ou Incentivando as greves políticas.
Esta atitude do Sr. Deputado Adão e Silva reflecte, da parte dos Deputados reformadores, uma lamentável cobertura do actual Governo e da sua política direitista e é também sintoma de que os reformadores aderiram a uma concepção altamente conservadora da política portuguesa e estão dispostos, ainda que com algumas palavras de crítica muito ligeira, a apadrinhar uma política que vai consistindo no seguinte: provocar reacções naturais dos trabalhadores, que classificam de agitação social; gera no Parlamento atitudes de protesto naturais da oposição, que consideram como obstrução; se os trabalhadores exercem legitimamente o seu direito à greve, as greves são consideradas políticas
Por este caminho não ha dúvida de que o Governo terá tendência a querer silenciar a oposição e os trabalhadores ou, pior ainda do que isso, criar uma artificial indignação das pessoas através de uma manipulação da opinião pública para tomarem medidas mais graves e drásticas contra os trabalhadores e contra os próprios partidos da oposição.
É uma tentativa lamentável, a de condicionar a opinião pública, que nós rejeitamos, porque a consideramos ser repassada de laivos antidemocráticos.

Aplausos do PS, do PCP e da Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura (MDP/CDE).

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra também para um protesto.

O Sr. Presidente: - Vou-lhe conceder a palavra nos mesmos termos em que a concedi há pouco ao Sr. Deputado Sousa Tavares.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Não, Sr. Presidente. É para um protesto em relação às palavras do orador que interveio há pouco.

O Sr. Presidente: - É que V. Ex.ª não pediu a palavra logo a seguir à intervenção do orador.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - É verdade, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente, a intervenção do Sr. Deputado Adão e Silva é, a nosso ver, merecedora de um protesto, não ligeiro. Na realidade, ela releva de uma concepção política que não podemos compartilhar e que e, a nosso ver, extremamente perigosa.
Na verdade, ela significa um alinhamento com as posições governamentais, segundo o qual todos os actos da oposição são ilegítimos e, inclusivamente, subversivos.
Importa dizer que este Governo mão pode esperar que a oposição não se oponha. O nosso papel é de oposição e não contamos deixar de o fazer. E o Governo se quiser governar tentando tornar toda a oposição ilegítima este é, ele próprio, a colocar-se numa posição ilegítima.
Não podemos também deixar de lamentar que Deputados que embora não fazendo parte da AD, fazem parte da maioria governamental, mas que nos habituámos a considerar pelas suas posições democráticas, em vez de virem atacar a oposição pela utilização dos seus legítimos direitos de oposição não

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venham desmarcar-se -como seria lícito esperar - de acções de prepotência, de discriminação, de tentativa de silenciamento da oposição, como é aquilo que, infelizmente, está a acontecer...

Vozes do PSD e do CDS: - É falso!

O Orador: - ... e que não alinhem com a oposição na denúncia do projecto de implantar na Assembleia da República a "lei da rolha" e transformar esta Assembleia num túmulo, em que só fada a maioria e em que, inclusivamente, leis possam passar sem que, oralmente, possam aqui ser discutidas.

O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Não apoiado!

O Orador: - Era esta denúncia que nós não desistimos de ouvir de alguns Deputados que, embora integrados na maioria governamental, não deixámos ainda de considerar como sensíveis a um aspecto fundamental de todo o regime democrático: é o de que a oposição não pode ser silenciada; é o de que, sobretudo a nível parlamentar, aquilo que se prepara é um perfeito golpe de Estado parlamentai que tem de ser denunciado e que esperamos, inclusivamente, não seja apoiado por esses Deputados.

Aplausos do PCP e protestos do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Adão e Silva, para contraprotestar.

O Sr. Adão e Silva (DR): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Foi com o maior interesse -como sempre - que ouvi as palavras do Sr. Deputado Vital Moreira.
O brilhantismo com que de intervém nas discussões desta Câmara justifica, evidentemente, este elogio, de que ele aliás não carece. Mas foi extremamente infeliz quando disse que os Deputados reformadores, pela minha humilde voz, procuram provocar um golpe de Estado ou coisa parecida. Ou que procuram, pelo menos, impedir a oposição de utilizar os seus direitos de crítica.
Na minha intervenção afirmei que havia que controlar o Executivo. É esse o papel da oposição. Simplesmente, para além disso é preciso construir alguma coisa.

Aplausos dos Deputados reformadores, do PSD, do CDS e do PPM.

Ao utilizar os termos em que fiz a minha intervenção, não com a preocupação de que esta Câmara, toda ela, mesmo a oposição, colabore na resolução dos interesses nacionais, no aumento do nível de vida dos trabalhadores e, de uma maneira geral, das classes mais desprotegidas deste País. E isso só se faz não atacando o Governo em termos de o impossibilitar de executar e praticar as diligências próprias do Executivo.

Aplausos dos Deputados reformadores, do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Está terminado o período de antes da ordem do dia, vamos passar à ordem do dia. Antes, porém, informo a Assembleia d& que o Grupo
Parlamentar do Partido Social-Democrata comunicou que retira os seguintes requerimentos de sujeição a ratificação: ratificação n.º 233/I, relativa ao Decreto-Lei n.º 519-F/79, de 28 de Dezembro, e ratificação n.º 186/I, relativa ao Decreto-Lei n.º 519-C 1/79, de 29 de Dezembro.
O Governo apresentou as seguintes propostas de lei: a º 291/I, da iniciativa do Primeiro-Ministro, do Vice-Primeiro-Ministro e do Ministro da Justiça, que aprova a, Lei Orgânica dos Tribunais Administrativos - baixa à 2.ª Comissão; também da iniciativa do Sr. Primeiro-Ministro e do Sr. Ministro da Justiça, a proposta de lei n.º 292/I, que concede ao Governo autorização legislativa para introduzir alterações na legislação em vigor sobre a organização judiciária - baixa à 2.º Comissão; e a proposta de lei n.º 293/I, da iniciativa do Primeiro-Ministro e do Ministro das Finanças e do Plano, que autoriza o Governo a rever o regime legal dos benefícios fiscais a conceder ao investimento em unidades produtivas nos sectores da pesca e das indústrias extractivas e transformadoras - baixa à 8.ª Comissão.
Para todas estas propostas de lei o Governo requereu a prioridade e a urgência, Relativamente à prioridade, requerida em todas as propostas, foi proferido o seguinte, despacho: "Cumpra-se o artigo 69.º do Regimento."

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Para proceder à leitura de um relatório da Comissão de Regimento e Mandatos, dou a palavra ao Sr. Deputado Bento de Azevedo.

O Sr. Bento de Azevedo (PS): - O relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos é o seguinte:

Em reunião realizada no dia 3 de Março de 1980, pelas 16 horas, foi apreciada a seguinte substituição de Deputados:

1 - Solicitada pelo Partido do Movimento Democrático Português/CDE:

José Manuel Marques do Carmo Mendes Tengarrinha (círculo eleitoral de Lisboa), por Herberto de Castro Goulart da Silva. Esta substituição é pedida por um período de seis meses.

2 - Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que o substituto indicado é real e actualmente o primeiro candidato não eleito ainda não solicitado no ordem de precedência da lista eleitoral de entre os apresentados a sufrágio pelo referido partido no respectivo círculo eleitoral.

3 - Foram observados todos os preceitos regimentais e legais.

4 - Finalmente a Comissão entende proferir o seguinte parecer:

A substituição em causa é de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

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5 - O presente relatório foi aprovado por maioria, com os votos, favoráveis do PSD, PCP, CDS, PPM, MDP/CDE e do Agrupamento Parlamentar dos Reformadores, votos contrários do PS e abstenção da UDP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à votação do relatório, que acabou de ser lido, da Comissão de Regimento e Mandatos.

Submetido à votação, foi aprovado, com os votos a favor do PSD, do PCP, do CDS, do PPM, do MDP/CDE e dos Deputados reformadores e os votos contra do PS.

O Sr. Presidente: - Portanto, Srs. Deputados, está operada a substituição em causa e verificado o mandato do novo Deputado, que pode desde já tomar lugar no hemiciclo.
Entramos agora no ponto da ordem do dia que é a continuação da apreciação da proposta de lei n.º 288/I, que autoriza o Governo a alterar a Lei n.º 46/77, de 8 de Julho.
Na última reunião tinham ficado inscritos para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Vital Moreira os Srs. Deputados Sousa Tavares, Ferreira do Amaral, Oliveira Dias, Rui Pena, Amândio de Azevedo e Lucas Pires. Portanto, peia ordem indicada, vou dar a palavra aos respectivos Deputados para formularem os pedidos de esclarecimento pretendidos.
Como o Sr. Deputado Oliveira Dias me informa que prescinde do uso da palavra, tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Tavares.

O Sr. Sousa Tavares (DR): - Sr. Presidente, uma vez que usarei da palavra sobre este mesmo assunto na intervenção dos Deputados reformadores, prescindo dos pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Ferreira do Amaral.

O Sr. Ferreira do Amaral (PPM): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de usar da palavra não tanto para um pedido de esclarecimento mas sim para um protesto.
Como disse o Sr. Deputado Sousa Tavares no final da reunião de sexta-feira, a intervenção do Sr. Deputado Vital Moreira daria lugar a uma imensidade de protestos. Por isso mesmo não me é possível sintetizar todos os pontos que considero importantes e susceptíveis de protesto na sua intervenção e limitar-me-ei apenas a três.
Em primeiro lugar, o Sr. Deputado Vital Moreira - e julgo que já não é a primeira vez que o faz - referiu ou insinuou que a maioria teria tentado aprovar aqui a revogação da Lei n.º 77/79 "pela calada da noite". Evidentemente que se trata de uma frase literária, naturalmente com algum sal. Contudo, por baixo desta frase literária poderia, efectivamente, estar uma acusação que repudiamos inteiramente.
O que se passou aqui não foi de forma nenhuma tentar subtrair aos direitos da oposição e de todo o Parlamento a intervenção activa sobre uma matéria da maior importância como era a da proposta de revogação da Lei n.º 77/79. Pelo contrário, não só a maioria não votou naquela sessão porque não quis, porque não foi buscar os Deputados que seria necessário para haver quórum, como, por outro lado, se a discussão se prolongou até àquela hora adiantada, isso deveu-se fundamentalmente à chicana que o partido do Sr. Deputado Vital Moreira aqui usou nessa noite.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Portanto, o protesto não é contra a "calada da noite" que tivéssemos intentado fazer, mas sim contra a chicana do PCP que naquela noite andou a permutar entre si as perguntas mais absurdas.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

Ainda por outro lado, nunca seria de forma nenhuma aprovada pela calada da noite uma proposta legislativa quando os partidos estavam todos representados nesta Assembleia - no caso do seu partido, aliás, brilhantemente por si e pelo Sr. Secretário da Mesa, e porque o PCP tinha assim deixado aqui, para governo dos seus interesses, o seu guarda-nocturno.

Risos.

Por outro lado, protesto contra as repetidas afirmações de inconstitucionalidade com que o Sr. Deputado Vital Moreira mimoseou a proposta agora em discussão. E faço-o porque a acusação de inconstitucionalidade provinda da boca do Sr. Deputado Vital Moreira vale exactamente, o mesmo que vale o nosso escudo inflacionado. E tanto foi lançada em circulação pelo Sr. Deputado Vital Moreira que a acusação de inconstitucionalidade da sua boca não vale neste momento rigorosamente nada.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): -Muito bem!

O Orador: - Em terceiro lugar, protesto porque acusou a proposta de autorização legislativa de pretender restaurar uma economia feudal em Portugal. O Sr. Deputado sabe perfeitamente que não é o caso, sabe perfeitamente que se hoje em dia há feudalismo em Portugal, esse é o feudalismo existente, pela cisão da soberania, numa parte do território nacional que tem vigorado até agora e em que o senhor feudal é o PCP e os suseranos são as UCPs.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente:-Os outros Srs. Deputados que estavam inscritos para formular pedidos de esclarecimento não se encontram presentes. Contudo, se algum destes Srs. Deputados pretenderia usar da palavra em nome do grupo parlamentar, poderá ser substituído. Se era a título pessoal, obviamente que não.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito?

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Sr. Presidente, por motivos justificados, o Deputado Amândio de Azevedo neste momento não se encontra presente e ele iria usar da palavra para fazer um protesto em nome do Grupo Parlamentar do PSD. Portanto, eu queria fazê-lo.

O Sr. Presidente: - Então tenha a bondade, Sr. Deputado.

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O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de fazer um curto protesto - já esbatido pelos três dias passados- para dizer que o meu grupo parlamentar, como o maior grupo parlamentar português de momento, escolhido há poucos meses pelo povo, não liga excessivamente aos exercícios retóricos de um sofista a que o Sr. Deputado Vital Moreira já nos habituou.

A Sr.ª Ercília Talhadas (PCP): - Mas sempre liga alguma coisa!

O Orador:-Contudo, queria chamar a atenção - com a serenidade que lhe dá a consciência da sua força e do seu apoio popular maioritário -para o facto de as críticas quando são excessivas se anularem a si próprias pela sua própria enormidade Quando se diz -e isto é apenas a título de exemplo, pois poderia citar mais- que o Governo não governa, governa-se; que o Governo quer desnacionalizar o próprio Estado, que a Aliança Democrática quer o golpe de Estado ou está a fazer .um golpe de Estado, que quer restaurar a monarquia feudal - como acaba de ser referido-, estas críticas são de tal maneira caricatas, ridículas e enormes que se consomem pela sua própria enormidade. Por isso deixam-nos indiferentes, não têm qualquer impacte na opinião pública e no povo que em nós confiou.

O Sr. Ferreira do Amaral (PPM): - Muito bem!

O Orador: -Contudo, queria dizer que, além disso não passam de meras opiniões subjectivas, que nada têm de objectivo, que são de um partido minoritário na sociedade portuguesa e que são apenas delírios megalómanos e excessivos, tal como acabo de demonstrar.
Finalmente, como já várias vezes disse, o Partido Comunista não tem autoridade para fazer destas críticas; o seu projecto é um projecto leninista e vanguardista, e ou tirai o seu .projecto original que diz defender há cinquenta e tal anos, ou então está-nos a enganar a todos nós e a si .próprio.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Cassette n.º 3!

O Orador: - O seu projecto é fundamentalmente um projecto antidemocrático que concede o poder a uma minoria, a uma vanguarda. O seu secretário-geral acaba de o reafirmar em discursos recentíssimos ontem, na semana passada e sistematicamente. O seu modelo não é o da democracia parlamentar mas sim uni modelo mais ou menos soviético que não é o da Constituição Portuguesa. E se o é, é apenas porque neste momento sente que a correlação de forças ainda lhe é desfavorável e não pode impor o seu modelo.
Portanto, com toda a serenidade, quero dizer que estas opiniões subjectivas e minoritárias são, efectivamente, irrelevantes para nós, serão relevantes para o povo português, e não atribuímos ao Partido Comunista qualquer autoridade para fazer destas críticas, porque elas caem sobre a sua cabeça e ele afunda-se ainda mais no ridículo minoritário em que já está.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Não estando presentes os Srs. Deputados Rui Pena nem Lucas Pires, nenhum membro do CDS quer usar da palavra em nome do grupo parlamentar?

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, gostaria de dar a justificação de que prescindimos dos protestos que tínhamos para fazer porque, efectivamente, a intervenção do Sr. Deputado Vital Moreira não deixou quaisquer vestígios e a nossa memória já está passada e ligada à terra.

Risos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quando na sexta-feira passada solicitei ao Sr. Deputado Ferreira do Amaral a troca da inscrição - o que ele me concedeu e que agora lhe agradeço publicamente previa não podar estar hoje aqui e por isso pretendia fazê-lo na sexta-feira. Lamentavelmente, a barragem da pedidos de esclarecimento e de protestos obrigou-me a vir aqui, e confesso que vinha para continuar a tratar com alguma profundidade as matérias, que meti na minha intervenção.
Lamentavelmente isso não aconteceu. Apesar dos três dias do fim-de-semana, os partidos governamentais e os seus porta-vozes não encontraram meio de, através de protestos ou de pedidos de esclarecimento, tentarem infirmar aquilo que produzi na minha declaração.

Vozes do PCP: - Muito toem!

O Orador: - O protesto do Sr. Deputado Pedro Roseta é - devo dizer - uma decepção. Na realidade, para ouvir mais uma vez a cassette n.º 1 do Sr. Deputado, para ouvir dizer que só fazia um protesto porque não ligava à minha intervenção - o que ele sabe que não é assim, porque, apesar do silêncio da imprensa que a AD domina cada vez mais, calou fundo em muitos círculos, inclusivamente da AD...

Vozes do PSD e do CDS: - Presunção e água benta!...

O Orador: - Tenho testemunhos disso. E a própria barragem de pedidos de esclarecimento e de protestos apenas prova que ela foi directa à bancada da AD, e que agora esta desistência, esta "greve" de protestos e pedidos de esclarecimento é apenas uma tentativa de desvalorizar uma intervenção que sabem que não podem fazê-la porque está produzida e vai continuar a produzir a sua argumentação. E o que prova é que nos seus protestos a maioria governamental não produziu um único argumento contra aqueles que eu produzi.

Vozes do PSD e do CDS: - Nem mereciam!

O Orador: - Na verdade, pegando nos pontos que o Sr. Deputado Ferreira do Amaral levantou -ao menos esse, porque o Sr. Deputado Pedro Roseta não levantou nenhum e não posso ser eu a tentar desço-

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brir nenhum deles vale a pena dizer alguma coisa.
Quanto à "chicana parlamentar" que nós tínhamos. Utilizado, importa dizer mais uma vez que não utilizámos chicana parlamentar nenhuma, mas sim os nossos direitos parlamentares, e quem chicaneou foram depois os partidos da direita através da sua imprensa, acusando infundadamente de ilegitimidade os partidos da oposição que aqui se limitaram a utilizar os seus direitos de oposição parlamentar.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Direito de greve!

O Orador: - Em relação à acusação de inconstitucionalidade, lamento desiludi-lo, Sr. Deputado. As minhas opiniões aqui produzidas, não como constitucionalista mas como Deputado, e portanto em termos políticos, não serão certamente tão inócuas como isso. E o Sr. Deputado teme precisamente isso. Contudo, até a sua tentativa de desvalorização não chegará para as aniquilar -e verá que não.
Em relação à questão do feudalismo, que prova mais provada de um Governo privado, como neste momento lemos, do que aquilo que se está a passar na Reforma Agrária, em que a CAP, que está no MAP (e o MAP é a GAP), distribui aos seus amigos e aos amigos dos seus amigos as terras públicas e créditos ao desbarato, sem qualquer respeito pela legalidade?! Que é isso senão um grupo de interesses a governar-se a si mesmo, à custa do Estado e à custa do povo português?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O que é isto senão uni Governo privado, que já nem sequer é um Governo feudal, porque neste ainda havia uma distância entre o suserano dos suseranos e os suseranos propriamente ditos?! Aqui não existe nada, é a, CAP em si mesma a governar os seus interesses privados à custa do Estado e do povo.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - É falso!

O Orador: - E o que se passa com a CAP passa-se noutros campos.

Aplausos do PCP.

O que acontece é que é uma captura privada do Estado.
Eu não disse que o Governo se governa, mas sim que a direita governa-se através do Governo. A direita não está a governar, mas sim a governar os seus interesses de pequeno e mesquinho grupo de interesses privados através do património do Estado, do património público e do património do povo português.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - É falso!

O Orador: - O que acontece e que dentro da AD e dentro da classe política activa que a apoia, existem, obviamente, interesses privados na criação da banca e dos seguros privados; existem candidatos a grandes accionistas da banca privada e das seguradoras. E o que aqui existe é a tentativa de transformar interesses privados e pessoais e fazê-los passar por interesses públicos, porque o que aqui se está a passar é que, enquanto a oposição que defende o exclusivo da banca e dos seguros para o Estado não defende nem interesses particulares nem pessoais, está a defender um interesse exclusivamente público, a direita tenta fazer passar interesses privados, pessoais, de grupos de interesse, muito marcados, por interesses públicos. Isto é, está a transformar o Governo e, através deste, o Estado numa coutada privada, numa quinta privada da CAP. da CIP e de outros grupos de interesses.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - É a classe burocrática?!

O Orador: - Isto pode e deve ser dito porque é verdade, toda a gente o sabe e é relevante para esta discussão. Pode, deve e tem que ser dito...

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Pode dizer, que ninguém acredita.

O Orador: - ... porque o que aqui está em causa e fundamentalmente a tentativa de captura privada do Estado e de* património público a favor de uma pequena oligarquia que está atrás da AD, dentro da AD, no Governo e na Assembleia da República.

Aplausos do PCP.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - É o desespero da classe burocrática! A classe burocrática também tem os seus interesses próprios.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Hoje está rezingão, Sr. Deputado.

Entretanto haviam tomado lugar na bancada do Governo o Sr. Ministro Adjunto do Primeiro-Ministro (Pinto Balsemão) e os Secretários de Estado da Presidência do Conselho (Brás Teixeira) e do Tesouro (Tavares Moreira).

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Ferreira do Amaral para uma intervenção.

O Sr. Ferreira do Amaral (PPM): - Sr. Presidente" Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A Aliança Democrática apresentou-se ao eleitorado com um programa muito claro e definido. Violentas críticas lhe dirigiram os partidos e coligações concorrentes que por vezes caricaturaram as intenções. Certo é, porem, que triunfou a Aliança e na base do seu programa, mesmo deformado por essas caricaturas, o povo português, pelo voto, elegeu uma maioria.
A democracia começa por ser o Governo segundo a vontade maioritária, expressa pelo voto livre e universal.
Assim, é insofismável que a democracia não apenas permite, mas exige, que o programa eleitoral da AD seja levado por diante. Ainda que as oposições reeditem ou ampliem os ataques que lhe dirigiram durante a campanha eleitoral. O quo está em causa é a coerência, a capacidade para respeitar a palavra dada, a fidelidade serena, mas firme, a vontade expressa pelos eleitores.

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A política não é prioritariamente a arte da negociação; começa por ser a arte da opção.
O programa eleitoral da AD, aprovado em eleições livres, foi patente, com rara franqueza, à opinião pública.
Nele se lê que a Aliança Democrática "quer uma economia nova, que valorize a responsabilidade, a competência e a coragem das decisões. E para a conseguir defende que, a par do sector público, a iniciativa privada tenha o seu papel na construção de um futuro de bem-estar e segurança. Sem ela, e muito menos contra ela, nunca se vencerá a crise". E, mais adiante, anunciou-se, entre as acções concretas a levar a efeito: "Substituir a lei de separação do sector público do sector privado e abrir progressivamente os diversos sectores à iniciativa privada, incluindo a banca e os seguros, respeitando as disposições constitucionais em vigor."
E ainda: "Analisar cuidadosamente a exploração das empresas públicas e admitir a possibilidade de exploração, em regime de concessão, pelo sector privado, daquelas que se consideram fora da vocação do Estado ou da sua capacidade de agir."
É por de mais evidente que o Governo e a maioria pretendem respeitar o resultado do último acto eleitoral. E se o pretendem, haverão de rever a lei do sector público/sector privado, no sentido expresso no programa.
Ora é isso exactamente o que agora está em causa.
Poderia, decerto, questionar-se sobre se o processo mais adequado para fazê-lo seria o que foi desencadeado, ou seja, decreto-lei precedido de autorização legislativa.
A questão não é indiferente, por isso que se trata de legiferar sobre matéria da maior importância para a fixação das estruturas do nosso sistema social e económico.
Mas não será também tão primordial que ofusque a substância do assunto. O que é fundamental, sim, é que nos não deixemos enredar pelas questões prévias e meramente instrumentais, sem embargo de pautarmos a conduta pelas regras do jogo em vigor.
Ninguém fundadamente negará que o processo utilizado é regular e constitucional.
Todavia, deve acrescentar-se que não só é constitucional, como também perfeitamente proporcionado com a ética parlamentar.
O debate e a votação parlamentares não são escamoteados. Senão, o que estamos a fazer neste momento?
Mais. São até susceptíveis de repetir-se. Para isso basta que os insatisfeitos usem da faculdade prevista no n.º 2 do artigo n.º 172.º da Constituição, chamando para ratificação o decreto-lei que o Governo emitir ao abrigo da autorização legislativa que venha a ser-lhe concedida.
Abrindo-se a possibilidade, pelo menos, de duas instâncias parlamentares de debate e votação sobre a delimitação dos sectores público e privado, poderia dizer-lhe tudo sobre a presente iniciativa do Governo e da maioria, menos que ela contraria a essência do regime representativo.
Há que abordar, porém, a substância do problema.
Como disse já, esta começa por emergir do cumprimento do programa eleitoral vitorioso. Mas não fica por ai. Faz parte do imperativo, a nosso ver, válido, de desbloquear alguns factores de imobilismo da nossa economia.
A reacção notada nas bancadas comunistas não espanta.
Para os marxistas-leninistas reabrir sectores já monopolizados pelo Estado à iniciativa privada, ou seja, a uma lógica de concorrência, é, antes de tudo, um pecado contra a natureza.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O apertado espartilho ideológico em que se encaixam, a mística "religiosa" com que adoptaram as leis do materialismo histórico, a nenhuma margem de manobra que lhes confere a sua escola "teológica" puramente exegética, o totalitarismo das suas concepções sobre a filosofia da história, faz que, mais do que aversão àquilo a que chamam recuo revolucionário, os nossos comunistas tenham medo dele! Não lhes nego coragem externa. O meão é interior, é subconsciente. É o medo conservador dos católicos integristas, é o pânico que grande parte do mundo cristão do século passado sentiu perante as hipóteses de Darwin. É a sensação de que as próprias convicções possam ser abaladas pela força poderosa da realidade empírica. Não é tanto o receio dos outros, mas de si próprios. E, por cima disso tudo, a indignação instintiva perante a "blasfémia".
Em última análise, estará aí o desvirtuamento da essência de uma filosofia anti-idealista como quis ser a de Marx. Estão, afinal, a antepor a ideia ao facto, o valor à realidade, a cristalização à evolução. Estão a mergulhar irremediavelmente numa escatologia simplista e profana. Não é provável que estejam no bom caminho.
Considero, pois, ao contrário dos comunistas, perfeitamente natural que a plena estatização de sectores de produção possa ser reversível. E que, permitindo-a a Constituição, à etapa dos monopólios estatais, suceda uma outra, mais realista, mais dinâmica, da abertura dos vários sectores ao confronto entre diversos modos de apropriação e de gestão dos meios de produção. Se o povo assim o disse querer, faça-se a vontade declarada do povo e não aquilo que a cartilha de uma minoria afirma que tem de ser a única vontade não alienada do povo.
Este degrau doutrinário não é indiferente. A sua abordagem permite localizar um dos nós do problema.
Mas desçamos a um plano mais concreto.
Tem sido dito por muitos - e de modo bem mais brilhante - que a realização da justiça social e do progresso económico no nosso país deverão desviar-se de um falso itinerário que até agora precipitadamente vem sendo trilhado.
Assim, não está na estatização dos meios de produção a solução dos problemas. E nem sequer o princípio dessa solução. Tantas vezes, pelo contrário, a realidade nos revela que a estatização foi, na prática, uma medida negativa, um passo atrás. O alargamento do sector público de produção não é um fim em si, nem sequer, necessariamente, um meio eficaz de gerar avanço social.
Sucede frequentemente - e a nossa história recente revela-o- que a eliminação do factor dinâmico da concorrência, o fecho sobre si mesmo, a burocratização, a irresponsabilidade, o predomínio da segurança

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sobre o incómodo da imaginação e da criatividade, negam aquilo a que Octave Gelinier chamou o "segredo das estruturas competitivas".
Por isso, os males que se assacavam a serviços tradicionalmente públicos, tantas vezes têm alastrado a sectores nacionalizados.
É por isso, também, as maiores queixas, os maiores cancros, os maiores atrasos na justiça social são hoje imputados à zona pública, incapaz de garantir ordenamento ao território, saúde aos doentes, habitação aos Portugueses, reforma condigna aos inválidos, transporte válido aos que se deslocam, saneamento básico e infra-estruturas aos povos rurais, educação e cultura aos mais pobres, produtividade à economia, bem-estar ao País.

O Sr. Lacerda de Queirós (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Quer dizer, os resultados foram adiados ou lateralizados. Descansou-se à sombra da bananeira, "resolvendo" os problemas com base no manual ideológico e no Diário da República. Considerou-se mais importante estatizar do que socializar, mais válido é mais útil nacionalizar as fontes de riqueza do que deixar criá-la e distribuí-la.
Foi um erro colectivo.
A iniciativa do Governo & da maioria destina-se a corrigi-lo. Abordando a questão da delimitação dos sectores público e privado sem preconceitos (o que não significa sem cautelas), o Executivo emergente da Aliança Democrática aposta na maior abertura de vários sectores da economia, no factor dinamizador da iniciativa privada, sobretudo pelo potencial competitivo que lhe é inerente.
Que, com isso, se arrisque a prejudicar o progresso económico, dificilmente poderá ser dito em Portugal, que se tem debatido nos últimos anos com uma perigosa tendência para a estagnação, atribuível a razões de estrutura jurídica e de conjuntura política. Mas muito menos poderá dizer-se que essa abertura venha a representar um retrocesso na justiça social. Ou poderá considerar-se que a justiça social atingiu, no nosso país, algum grau suficientemente digno de ser preservado? Ou será que as afirmações de retórica dos ideólogos e dos revolucionários terão contribuído utilmente para minorar as carências de rendimento e qualidade da vida da maioria do povo português, ou para diminuir as escandalosas assimetrias entre litoral e interior, entre urbanos e rurais, entre os profissionais da greve q os das mariscadas e tantos subconsumidores discretos e anónimos que dependem de rendimentos fixos? Ou será que haverá alguma correspondência entrei os solenes princípios socializantes dos primeiros artigos da Constituição e a incapacidade, até agora verificada, de praticar uma correcta redistribuição dos rendimentos, ou mesmo uma simples politica salarial coerente?
A chave não está, pois, no exclusivo estatal dos meios de produção. Nem mesmo em sectores, como a banca e os seguros, que contêm em si mesmos uma tradição de determinantes da definição do sistema económico.
Só por um mal-entendido simplista se dirá o contrário.
Há poucos anos, a actividade bancária era privada, nos países que vou indicar, nas seguintes percentagens:

Percentagens

Reino Unido ................................. 85 a 90
Suécia ......................................... 75 a 80
Noruega ....................................... 65 a 70
Alemanha .................................... 30 a 35
França ......................................... 20 a 35
Itália .......................................... 10

Quer dizer: enquanto o sector estatizado da banca, na Suécia, em pouco excedia 20 %, na Itália atingia 90%.
Poderemos arriscar a afirmação de que a França e a Itália se encontram à frente da Suécia e do próprio Reino Unido em matéria de justiça social, ou mesmo, se preferirem, que são mais "socialistas" do que estes últimos?
Desmistifique-se, pois, a falsa correspondência entre dimensão do sector público e socialização. O que importa é que as forças criadoras de riqueza desenvolvam as suas virtualidades, que o poder criativo da Nação não soçobre nas malhais inextricáveis de uma imensa burocracia de Estado sem génio nem motivação. O que imponta é que essas forcas sejam balizadas em termos de não transbordarem de um ordenamento capaz e do respeito pelos direitos dos que trabalham e dos que consomem. O que importa é que a riqueza criada seja redistribuída, pelos meios mais eficazes, como são os fiscais, sem sufocá-la à nascença. O que importa é preservar a liberdade e a independência das instruções e dos mecanismos democráticos contra os excessos e desvios pelos quais as forças económicas podem ser tentadas a enveredar.
E aqui suscitasse um dos temas versados pelas bancadas das oposições: a questão da interferência do poder económico no poder político.
O problema começa por colocar perante nós um dilema que vai direito ao fundo, das nossas convicções democráticas. Será que acreditamos mesmo nas instituições representativas, ou, pelo contrário, estamos dispostos a pô-las de remissa, antepondo-lhes reservas e condicionalismos que lhes são estranhos? Acreditamos mesmo na regra da maioria, no sufrágio universal, na liberdade jurídica, no princípio de alternância, ou, ao invés, a maioria só o será quando se verifiquem certos pressupostos, o sufrágio universal pode não corresponder à vontade do povo, a liberdade só é verdadeira se for limitada, e a alternância não pode contrariar as etapas fundamentais do materialismo dialéctico?

O Sr. Carlos Lage (PS): - Não se faça ingénuo!

O Orador: - Por outras palavras: o que é que está primeiro -a liberdade jurídica ou a económica? Ou então: o que é a liberdade - a possibilidade de optar ou a necessidade de seguir o caminho profetizado pela cartilha de 1848?
Se seguirmos - como é o nosso caso - o primeiro termo deste dilema, então não tenhamos dúvidas: as nossas declarações são democráticas de raiz. Mais. Não estão vedadas, mas abertas, as virtualidades para a realização da democracia económica. Ou seja: tor-

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na-se possível -e deve-se fazê-lo- continuar a reduzir as alienações, a valorizar o homem, a sua autonomia pessoal e a independência das suas opções. Mas se o não fizermos, ou seja, se antepusermos às instituições democráticas os pressupostos, discutíveis, da chamada liberdade económica, se fizermos uma époché às regras da democracia formal é que entramos num beco sem saída, ou caímos no poço da autocracia feroz, fechada, imobilista, gerontocrática e anti-crítica.
Mas a prioridade da democracia formal não significa que ela baste. É condição necessária, mas não suficiente. Justificam-se plenamente as preocupações de assegurar um mínimo aceitável de abundância económica bem distribuída, sob pena de o sistema ser distorcido e de se limitar a uma simples cobertura de aparências farisaicas. Como disse Berdieeff, "a liberdade real na vida material implica a garantia económica da vida de todo o homem". E, aí, estamos com todos aqueles que tem em vista neutralizar a influência do poder económico sobre o político. Não e tarefa despicienda munir a Nação, ainda que pelo auxílio do Estado, com sucessivas linhas de defesa contra a força política das organizações económicas. Entre essas linhas, a par de normas jurídicas cuidadosamente articuladas, haverá que- praticar decididamente uma política anti-trust. tanto na área da economia como na da comunicação social. Numa e noutra, quanto mais transparentes foram as situações, quanto mais pluralistas e menos próximas de estruturas de monopólio ou oligopólio, melhor se alcança o desiderato de evitar os gânglios de poder político exteriores à própria política.
Por isso, deve ser preocupação dos órgãos de soberania, como dos cidadãos, montar sistemas normativos que contrariem a concentração de poderes, quer no domínio da economia, quer no da comunicação social.
Contudo, uma realidade deve ser tida em conta. É que a concentração, o trust, o grupo de pressão não são fenómenos exclusivos do capitalismo, ou de um sistema de apropriação privada da maior parte dos meios de produção.
Pelo contrário, eles emergem do mesmo modo, por vezes até em grau mais aberrante, em sistemas de economia estatizada.
Lembremos, com Fean Meyanud, que os grupos de pressão mais poderosos são muitas vezes de carácter profissional e não classista.
Tenhamos presente, por outro lado, o papel quo a tecnoestrutura assumiu no novo Estado industrial, não só em regimes capitalistas, como muito bem acentuou Galbraith, como em regimes de economia estatizada, patente nas "esferas do influência", como tantos tem feito notar e, entre eles, Roy Medvedev.
Recordemos a luta semiconsciente de interesses que opõem, em qualquer Estado, as forças localizadas nas áreas urbanas,- economicamente mais desenvolvidas, e as que sobrevivem nas zonas rurais ou continentalmente periféricas.
Em Portugal, a amplitude demasiada do sector público faz que surjam nele fenómenos deste género, quando 6C manifesta a Intenção de grupos de poder económico, dentro desse sector, distorcerem a opinião pública e 'influenciarem as decisões dos políticos e dos cidadãos.
Apontem-se, a título de exemplo, o lobby da celulose em grande parte do público, que utiliza até, às escâncaras, os meios de comunicação social para promoção por propaganda paga dos seus interesses específicos; ou o dos hidráulicos, que move influências com vista à distorção da política de obras públicas e irrigação; ou lembremos ainda a férrea interferência movida por tantas unidades colectivas de produção, no Alentejo, na liberdade individual e nas próprias opções políticas dos cidadãos locais e das mais altas instâncias.
Não nos iludamos, pois. A independência do poder político é uma causa imperiosa. Mas não tem lugar somente num regime de predominante iniciativa privada. Pode ser mesmo bem mais necessária quando o sector público se alarga desmesuradamente, quando o poder se centraliza e se burocratiza, quando toda a Nação estiola na tentação alienante de se entregar nas mãos do Estado todo-poderoso.
A defesa da independência, a que melhor chamaríamos pureza democrática do poder político deve fazer-se, pois. não numa perspectiva ideológica maniqueísta e de raiz profundamente autoritária, de contrapor a pureza do Estado à do sector privado, de entender que quando este apresenta problemas de tendências concentracionistas ou oligopolizantes, a solução estará em nacionalizá-lo, monopolizando-o.
Pelo contrário. A luta contra os gânglios de poder económico vocacionados para a actuação no plano político deve passar, na nossa óptica, por um lado pelo reforço da legislação antimonopolista e contra o nepotismo e a corrupção, e, pelo outro lado, pelo reforço e distribuição de centros de decisão da sociedade, regionalizando-a, descentralizando-a, fomentando a criação livre de associações e cooperativas apontadas à existência disseminada de poderes compensadores.
A organização democrática tios Órgãos de Soberania e do Poder Central é primordial. Mas não chega. Sem o reforço de uma efectiva multiplicação de centros de limitação do poder, de raiz livre e democrática, não deixará de permanecer vulnerável à pressão de interesses económicos concentrados e menos transparentes, quer estes venham do sector privado, quer do sector público.
Preservar a independência interna do Estado é uma preocupação a que não devemos fechar os olhos em momento algum. Todavia, não será um argumento válido para que nau modifiquemos a actual delimitação entre sector público e sector privado, em ordem a introduzir factores de abertura, de dinamização, de competitividade e de- pluralismo, na nossa economia.
Aproveitemos a seiva vivificante da iniciativa privada, fomentemos o livre associativismo e o cooperativismo, reforcemos o papel e a capacidade das instituições regionais e comunitárias, asseguremos a liberdade e a diversificação das estruturas e não tenhamos receio de que a justiça social venha a sofrer com isso. Restituamos à Nação o que o Estado lhe usurpou e velemos por que a Nação se apresente como um todo harmónico porque diversificado, desconcentrado e imune aos trusts quer aos antigos, quer aos pós-revolucionários.
Deixemos quo o Estado confie na Nação para que esta possa confiar no Estado.

Aplausos ao PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores.

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O Sr. Presidente: - Paia pedir esclarecimentos, apenas se inscreveram 00 Srs. Deputados João Cravinho, António Guterres e Sousa Marques.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Cravinho.

O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Ferreira do Amaral: Ouvi com muita atenção a sua intervenção. Muitos dos problemas que levantou assentam em tais falácias que me parece que não vale a pena abordá-los. Em todo o caso vou pedir alguns esclarecimentos porque contas palavras suas tem sido repelidas nesta Câmara e julgo que é tempo não de me responder mas de esclarecer a Assembleia sobre o que na realidade pensa quanto a alguns conceitos que vêm utilizando, na minha opinião, abusivamente.
Uma primeira questão diz respeito à justiça social e a situação portuguesa. A ouvir V. Ex.ª, deu-me a impressão que aquilo que não se resolveu desde a monarquia até 1974 teria sido obrigação restrita da revolução tê-lo resolvido falou V. Ex.ª da habitação, do saneamento básico, lutou de iodos os problemas que são graves e, infelizmente, nos afligem, mas falou de uma maneira que me parece totalmente descabida. Por isso, julgo que é altura de o Sr. Deputado usar da palavra para esclarecer a Câmara de que não imputa, portanto, à revolução os 500 000 fogos de habitação em falta em 1974, isto é, não imputa à revolução a carência habitacional e de equipamento social que havia por todo o lado; que também não imputa à revolução o facto de termos 30% de analfabetos, bem como o facto de não haver escolas e o nível de escolaridade dos portugueses ser o mais baixo da Europa, e por aí fora, e por aí fora... Tenho a certeza de que o Sr. Deputado não imputa, de facto, isso à revolução. Com certeza não vai fazer perante a Assembleia esta prova de falta de gosto. Se venho aqui referir este assunto, é apenas para lhe dar a oportunidade de se corrigir a si próprio, numa atitude que me parece apenas de elementar justiça para consigo mesmo.
Quanto à questão da justiça social, gostaria de perguntar ao Sr. Deputado se tem alguma ideia sobre qual era em Portugal a distribuição funcional do rendimento antes do 25 de Abril. Em todo o caso, digo-lhe que documentos, por exemplo, do Banco Mundial -que, aliás, escondeu sempre esse facto até ao 25 de Abril, só depois é que se lembrou disso-, mostram que Portugal está na mesma situação em que está uma índia ou uni Paquistão. Se V. Ex.ª tem a noção de qual é a distribuição funcional do rendimento na índia e no Paquistão, julgo que a Câmara ficará esclarecida. Se V. Ex.ª tem a ideia de que essa distribuição funcional do rendimento era diferente, que o Banco Mundial está criado, que nós todos estamos errados, gostaria que desse os seus números.
Quanto ao problema da concorrência, V. Ex.ª fala de concorrência em termos que são do século XIX.

O Sr. Sousa Marques (PCP): - Não admira, é natural!

O Orador: - Infelizmente, o seu conceito de concorrência é um conceito liberal, é um conceito atomístico, é um conceito de livre concorrência, e hoje o mundo não é assim. Gostaria que nos esclarecesse sobre isso, uma vez que o facto de haver três ou quatro empresas sobre um mercado não tem de maneira alguma o significado que V. Ex.ª empresta essa ideia da concorrência. Em todo o caso, também não me deteria muito sobre isso, porque isso é um facto de tal maneira notório que não valeria a pena. Mas digo-me que não percebo o pensamento da Aliança Democrática em relação a esta questão da concorrência: tão depressa se diz que é preciso abrir ao sector privado determinados sectores, porque a concorrência estrangeira, instalada em Portugal por força da abertura externa torna nula a ideia de que esses sectores ficariam reservados ao sector público, como diz absolutamente o contrário, que é preciso abrir esses sectores, como se não houvesse efectivamente concorrência no sentido que acabei de referir. Das duas uma: ou sim ou não! As duas coisas ao mesmo tempo, consoante os dias, é que de maneira nenhuma.
Finalmente, quanto ao dinamismo das empresas públicas, aos números que V. Ex.ª cita, gostaria de fazer uma correcção: nas primeiras quinhentas empresas não americanas que constam da lista da Fortune, há 59 empresas controladas pelo sector público dos diversos países. Essas 59 empresas entre quinhentas detêm qualquer coisa como 50% da riqueza criada e o seu ritmo de crescimento é duplo daquele que cabe ao sector privado.
Primeiro, gostaria que o Sr. Deputado dissesse se conhece estes números; segundo, que explicasse porque e assim.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Guterres.
Estou a pressupor que o Sr. Deputado interpelado deseja responder no fim.

O Sr. Ferreira do Amaral (PPM): - Assim é, Sr. Presidente.

O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Deputado Ferreira do Amaral, em primeiro lugar gostaria de lhe dizer que por parte da bancada do PS não há, em política, factos consumados que possam perdurar para sempre nem aspectos que sejam irreversíveis. É perfeitamente natural que a Aliança Democrática, que dispõe hoje nesta Câmara da maioria, faça alterar legislação anterior, mas nós gostaríamos quis fizesse menos filosofia em torno dela e nos dissesse mais claramente que aliterações é que vai fazer à Lei n.º 46/77, porque só assim é que nos sentiríamos habilitados a votar em consciência uma autorização legislativa -mas prevemos o sentido dessas aliterações. Assim, será perfeitamente natural - e assim acontecerá certamente uma vez conhecidos os resultados das eleições de Outubro próximo, se alterada a maioria desta Câmara, como esperamos- que as alterações agora introduzidas venham a ser novamente introduzidas em sentido contrário. É nisso que consiste o funcionamento dos órgãos democráticos.
A única coisa que importa é que se respeite a Constituição. A Constituição diz que os sectores básicos da economia devem ser vedados à iniciativa privada. Deste modo, gostaríamos de saber o que é que para a maioria são sectores básicos da economia. E ficaríamos com algumas dúvidas se a maioria nos dissesse que os sectores básicos da economia são o saneamento básico ou a distribuição de energia eléctrica.

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A questão essencial é de facto a questão do poder económico e da sobreposição possível do poder económico ao poder político. Devo dizer que a intervenção do Sr. Deputado apenas ajudou a reforçar as nossas próprias convicções. Porque se levássemos o seu testemunho de fé no poder político democrático independentemente da existência de poder económico que a ele se possa sobrepor ou que com ele se possa confrontar, eu seria levado a perguntar-lhe: então porque não autorizar a constituição de exércitos privados? Porque é que o Estado não confia na Nação e não autoriza que os elementos dessa mesma Nação formem também os seus exércitos para equilibrar o terrível lobby que poderia constituir a existência de um único exército, ao qual poderia corresponder uma terrível tecnocracia, a militar, que poderia sobrepor-se ao próprio poder político? Ora o seu tipo de raciocínio, se fosse levado até às últimas consequências, chegaria a este absurdo.

O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Que ignorância completa!

O Orador: - O Sr. Deputado Ângelo Correia perdeu, quanto a mim, uma boa oportunidade de estar calado ao dizer que eu defendo estas concepções por ignorância.
Nas sociedades modernas este tipo de problemas tende a generalizar-se a outras formas de poder que, tal como a forma de poder que é dada por se dispor de um exército, tendem a condicionar fortemente o próprio poder democrático. E o que para nós, fundamentalmente, está em causa é que o poder democrático tenha de facto à sua disposição os mecanismos indispensáveis para definir qual o futuro dos Portugueses. E, em nosso entender, a detenção do sistema financeiro é uma condição indispensável para isso num país como o nosso que, ao contrário da Suécia ou da Dinamarca ou da Inglaterra, não teve uma burguesia industrial, nos finais do século passado e no início desde, que lhe imprimisse um ritmo de industrialização e factores de equilíbrio social que nesses países existiram e que não existiram na generalidade dos países do Sul da Europa. E é por isso que os problemas do desenvolvimento económico e da repartição do poder económico são de facto diferentes nos países do Sul da Europa, onde tende a haver um sector público com uma intervenção na economia muito mais forte, qualquer que seja até o tipo de partido político que está no Poder, do que nos países do Norte da Europa, em que o processo social foi completamento diferente. Nestes países a industrialização deu-se de outra forma, criaram-se mecanismos de equilíbrio social que não se verificaram nos países do Sul da Europa.
Era apenas esta chamada de atenção que lhe queria fazer e que não envolve, de maneira nenhuma, o facto de nós pensarmos que não existe um modelo colectivista viável para uma sociedade moderna e que nada é irreversível no funcionamento das sociedades modernas. O que pensamos que está em causa é discutir se é ou não conveniente para Portugal, neste momento, permitir - com as características que tem e tinham os grupos económicos que são conhecidos no nosso país, e cuja performance é conhecida - que se constituam formas de poder económico que, em nosso entender, tenderiam a opor-se negativamente ao poder político democrático que nós constituímos. E isso nada tem a ver com a máxima liberdade que deve ser dada ao sector privado para se desenvolver, desde que se salvaguarde a condição, para nós indispensável, de que o poder económico esteja, efectivamente, subordinado ao poder político, num pais com as características do nosso, que teve a evolução histórica que o nosso teve, que teve o regime político que o nosso teve, durante os anos que teve, e que teve o ritmo e o tipo de desenvolvimento económico que se verificaram em Portugal, que, como lhe disse, são profundamente diferentes, se não antagónicos, daqueles que se verificaram nos países do Norte da Europa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Marques.

O Sr. Sousa Marques (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estávamos na dúvida se havíamos de insistir nalgumas perguntas que queríamos colocar ao Sr. Deputado Ferreira do Amaral. Atendendo a que algumas das questões que já foram levantadas pelo Partido Socialista são pertinentes e nós próprios pensávamos colocá-las, julgamos que o melhor, até paira abreviar este debate um pouco filosófico, é prescindir da palavra por agora.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Ferreira do Amaral, por seis minutos, para responder a dois intérpretes.

O Sr. Ferreira do Amaral (PPM): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Relativamente aos pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado João Cravinho, anotei que o Sr. Deputado tinha dúvidas sobre se eu pensava ou não que a situação insuficiente ou mesmo degradada, como lhe queiramos chamar, da justiça social neste momento seria imputável ao período posterior ao 25 de Abril. Ora eu nunca fiz essa afirmação e até lhe agradeço o facto de ter permitido que o esclareça. Nunca fiz esta afirmação, nem nunca a faria, primeiro porque entendo que o processo de injustiça social vem de longe O que pretendi foi chamar a atenção para o facto de a tentativa de solução dos tremendos problemas que a justiça social punha em 25 de Abril de 1974, tal como foi feita, o ter sido pelo itinerário simplista de estatizar em vez de procurar ir ao fundo dos problemas, em vez de procurar soluções por vezes mas maleáveis mas não menos eficazes, esse caminho é que terá sido errado e não terá levado, possivelmente, em muitos sectores, à necessária melhoria que se deu em vários aspectos e em vários sectores, mas que noutros se não deu.

o que toca à necessidade de fogos para habitação, parece-me ser exactamente dos aspectos negativos em que os últimos anos funcionaram contra a evolução desejável, porque hoje em dia esse deficit de 500000 fogos para habitação é superior. Há quem o calcule em cerca de 700 000 ou mesmo de l milhão.

O Sr. António Guterres (PS): - E a vinda dos retornados?

O Orador: - Havia antes uma carência de 500 000, agora de 700000, Sr. Deputado.

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O Sr. António Guterres (PS): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado.

O Orador: - Faça favor.

O Sr. António Guterres (PS): - Peço desculpa, mas gostaria de esclarecer o seguinte: se tomarmos os indicadores em relação à construção civil, que são, por exemplo, os da produção e consumo de cimento, é indiscutível que o volume de construção aumentou bastante desde o 25 de Abril até agora; só que houve um aumento substancial na população portuguesa, que foi de 600 000 pessoas, ou seja, um aumento de 7 % da população em seis meses, fenómeno que nunca ocorreu em nenhum outro país da Europa e, que eu saiba, apenas tem paralelo em Israel, nos tempos modernos. Fenómeno esse que, naturalmente, fez aumentai* substancialmente o número de fogos carenciados.

O Orador: - Com certeza, Sr. Deputado. Em parte isso terá contribuído, mas parece-me que o exemplo é extremamente infeliz, porque, de facto, esse aumento de construção é exactamente uma demonstração do que tem sido uma política de habitação completamente desordenada e até contrária aos interesses nacionais.

Vozes do PSD e do PPM: - Muito bem!

O Orador: - O que tem acontecido é que se têm degradado terrenos próprios para produção agrícola, tem proliferado a construção clandestina, faltam as urbanizações a sério e um ordenamento capaz, feito nas regiões e nas autarquias.
Portanto, eu preferia não falar do caso da habitação, porque aí parece-me que o balanço destes últimos anos é negativo. É o Sr. Deputado que está a puxar a questão para a habitação. Eu preferia falar de outras.

Aplausos do PSD e do PPM.

O Sr. António Guterres (PS): - Dá-me licença que o interrompa de novo, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. António Guterres (PS): - Quem referiu a habitação foi o Sr. Deputado e não eu, mas gostaria de lhe dizer que todo o problema das infra-estruturas em relação à urbanização, todo o problema da construção clandestina, é um problema que vem de antes do 25 de Abril. E se alguma coisa devemos considerar neste momento é prestar homenagem ao esforço que tem vindo a ser feito pelas câmaras municipais saídas da gestão democrática. E devo dizer-lhe que nisso estou completamento à vontade, uma vez que o Partido Socialista não tem nem nunca teve a maioria das câmaras municipais neste país e muitas delas são geridas, como sabe, por pessoas que pertencem aos partidos da maioria - neste momento até uma maioria de câmaras municipais. É verdade incontestável que ao longo deste tempo essas câmaras municipais fizeram um esforço da urbanização e de enquadramento que não teve paralelo no passado recente.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Só que isso ocorreu num país que tem profundos vícios estruturais e em que é extremamente difícil pôr de repente a funcionar nos eixos uma coisa qua está viciada desde a sua base e com largos e largos anos de prática e de viciação em que há um poder económico tradicional - o da construção privada mal encarada ou dos chamados "patos-bravos", se quiser- que na prática tem vindo a impor-se ao longo do tempo. É um bom exemplo a ilustrar o raciocínio que há pouco fiz e que, infelizmente, ainda hoje se impõe em demasiadas zonas à própria autoridade que devia decidir sobre o que se constrói e onde se constrói, que são essencialmente as autoridades decorrentes do próprio poder local.

O Orador: - Sr. Presidente, a Mesa desconta o tempo da intervenção do Sr. Deputado António Guterres?

O Sr. Presidente: - Naturalmente que desconta, a Mesa não será excessivamente rigorosa. Queira continuar.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente. É que eu, sem prejuízo do interesse enorme que tenho de ouvir o Sr. Deputado António Guterres, tenho de responder ainda a várias questões.
Penso que a política de habitação é realmente das mais infelizes e que não deve ser chamada à colação para efeitos de valorizarmos o período pós-revolucionário. Agora o que não obsta é a que não reconheça que as deficiências estruturais, mesmo no próprio sector da habitação, venham de longe; nunca disse que tinham sido criadas com o 25 de Abril. O que digo - e é isso que realmente me escandaliza, como escandaliza muitos portugueses -, é que uma revolução que se. blasona de ser uma revolução de justiça social, de ser uma revolução de realização de anseios quase milenários do povo português, que, julgo eu, tem como intenção profunda esse fim de justiça social, não seja capaz, através dos meios enviesados que entretanto adoptou, de a realizar com o mínimo de espectacularidade que era necessário. Ë por isso que há que corrigir e que verificar onde é que está errado para que o caminho seja mais eficaz.
Quanto à concorrência e ao conceito de concorrência que adoptei na minha intervenção, penso que a concorrência não é um conceito que tenha conteúdos diferentes tanto no século XIX como na época actual. O que de facto os teóricos da economia têm modificado é o papel que a concorrência tem vindo a desempenhar e o papel que nas realidades económicas a concorrência tem hoje ou tinha há cinquenta ou sessenta anos. A concorrência em si é uma realidade igual, qualquer que seja a época considerada. É um facto que hoje a concorrência não desempenha o mesmo papel, mesmo nos regimes mais capitalistas, que desempenhava anteriormente. Nunca disse o contrário, mas o que considero é que a concorrência é um factor em si sempre saudável. E aqui agarro um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado António Guterres, que me acusou de em linha recta ir parar, pelo meu raciocínio, à existência de exércitos privados. Vou voltar o argumento para o sentido inverso e pôr o problema aos Srs. Deputados António Guterres e João Cravinho, dizendo-lhes que a não existência de concorrência é que leva em linha directa

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ao completo monopólio de tudo. Esse é que é o verdadeiro perigo que existe em qualquer sistema económico e que há que contrabalançar e que combater.

O Sr. Guerreiro Norte (PSD): - Muito bem!

O Orador - Não é o perigo da privatização, porque a privatização é compatível com sistemas sociais, com sistemas cooperativos, com sistemas associativos, com a defesa comunitária de interesses privados. O que nunca e compatível com a defesa dos interesses do homem e com os interesses da defesa humana é a completa colectivização. Nesse aspecto, a Colectivização é muito mais arriscada do que a privatização e que a concorrência.

Vozes do PSD e do PPM: - Muito bem!

O Sr. António Guterres (PS): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Desculpe, Sr. Deputado. Eu teria o maior gosto, mas não lenho, realmente, possibilidades, em tempo, de responder a tudo.
No que toca às grandes empresas do mundo e que, segundo o Sr. Deputado João Cravinho, são responsáveis pela produção de grande parte da riqueza, penso que este argumento poderia funcionar a favor da minha tese. O que defendi foi uma política, no que toca a estrutura económica e portanto às normas jurídicas necessárias para o efeito, profundamente anti-trust e contrária à concentração de interesses, quer sejam nacionais quer, neste caso, internacionais. Assusta-me que existam cinquenta empresas entre as quinhentas que referiu - parece-me que o número citado é de 50- responsáveis pela produção de 50% da riqueza mundial. Julgo que isso é contrário aos interesses nacionais e aos interesses da justiça social e que, mesmo apesar de essas empresas serem do sector público dos respectivos países, isso é tão grave, tão perigoso para a pressão do poder económico sobre o poder político como a existência de grupos privados com um potencial financeiro efectivamente grande. Penso que isso é especialmente grave, pelo facto de se tratar de empresas multinacionais com um poder económico que tem expressão não apenas no plano interno mas também no plano mundial.

Vozes do PSD e do PPM: - Muito bem!

O Sr. João Cravinho (PS): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Presidente: - Terá de abreviar, porque o Sr. Deputado Ferreira do Amaral está a terminar o seu tempo.

O Sr. João Cravinho (PS): - É só para dar razão ao Sr. Deputado Ferreira do Amaral e dizer o seguinte: e que o fenómeno do gigantismo é praticamente inelutável em certas esferas da actividade económica e daí que, como acentuou o mau camarada António Guterres, quando se não dá a aparência do contrôle do sector público, mas a realidade do contrôle dos interesses privados sobre o próprio sector público, então 6 que estamos exactamente na situação que o Sr. Deputado acaba de referir. E quando eu citei aquelas cinquenta e tal emprestas entre as maiores quinhentas empresas não americanas que devem essa percentagem de rendimento, o que sucede é que na maior parte dos casos na realidade não há efectivamente contrôle democrático do sector público. O que nós estamos aqui a tratar é das condições que permitam efectivamente garantir o contrôle democrático não só do sector público como até do sector privado.

O Orador: - Mas também do sector público.

O Sr. João Cravinho (PS): - Exacto, Sr. Deputado. Por isso dou-lhe toda a razão.

O Orador: - Portanto, vem dar-me razão no final e agradeço nesse aspecto o apoio que me deu.
Consideraremos, por outro lado - isto em resposta ainda a esse pedido de esclarecimento - , que o desvio dos interesses verdadeiros do Pais pode dar-se tanto por força dos tais gânglios do poder económico com interferência no poder político como pela própria estatocracia. Deu aqui exemplos concretos. Temos em Portugal inclusivamente, um exemplo flagrante e recente do que e o poder de um lobby, que é liderado por uma empresa pública, a Portucel, que faz propaganda nos jornais - e até nos jornais estatizados- para defender os específicos interesses de lobby. Isso não é coincidente com os interesses nacionais. É a defesa dos interesses de unia tecnoestrutura que é tão reprovável, nesse aspecto, como é qualquer poder económico privado que tenta interferir no poder político.

O Sr. António Guterres (PS): - Posso interrompê-lo, Sr. Deputado?

O Orador: - Peço desculpa, mas o Sr. Presidente, há pouco chamou-me a atenção para o facto dei o meu tempo estar a terminar.
Finalmente, no que toca. à questão da detenção do poder financeiro como decisiva e a divisão do mundo, pelo menos da Europa, em dois casos - o caso português e o caso Norte da Europa - não estou nada de acordo com o Sr. Deputado António. Guterres, porque a Suécia, ha quarenta ou cinquenta anos, quando começou o poder do Partido Social-Democrata, que durou mais de quarenta anos, encontrava-se numa situação e com um regime económico com maior atraso do que neste- momento se verifica em Portugal. E quarenta ou cinquenta anos de Poder do Partido Social-Democrata na Suécia, até pelo senso e pela capacidade de adaptação que o próprio Partido Social-Democrata da Suécia manifestou, não conduziram à maior estatização da banca, mas à existência de mm sector privado da ordem dos 80%, como eu indiquei aqui, não obstante ser considerada dos países de mais alta manifestação die justiça social do mundo.
Parece-me que esse argumento, a distinção entre a Suécia e Portugal, evidencia que um país com um partido social-democrata no Poder durante quarenta anos proferiu um modelo que não teve a ver nada com aquele que nós tentámos impor cá e que produziu efeitos muitíssimo mais importantes, com um con-

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traste muitíssimo maior há quarenta anos, do que o que sã está a verificar em Portugal. Louvo-me do sou argumento pura reforçar o meu ponto de vista de que o caminho du estatização pode ser, e no nosso caso tem sido, um caminho enviesado, um desvio dos verdadeiros interesses da realização de uma justiça social. Finalmente, quero sublinhar a sua afirmação, que considero inteiramente valida e que perfilho com agrado, de que qualquer sistema devo ser considerado reversível de acordo com a regra da alternância democrática. Como devo ter verificado, pois julgo que ouviu com atenção a minha intervenção, a acusação de defesa da irreversibilidade, que eu lancei, dirigiu-se para a bancada do Partido Comunista Português, não atingiu a bancada do PS. Portanto, não foi uma acusação que eu tivesse feito ao PS e registo com muito agrado que o tenha dito. Só o que realmente estranhei ó que o Sr. Deputado Sousa Marques, não obstante ler dito que realmente considerava que os pedidos de esclarecimento feitos pelo PS eram representativos do seu ponto de vista, tenha também, implicitamente, aceitado a opinião sobre irreversibilidade do Sr. Deputado António Guterres.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Sousa Marques (PCP): - Posso interrompê-lo, Sr. Deputado?

O Orador: - Com certeza.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Ferreira do Amaral, V. Ex.ª já esgotou largamente o seu tempo, peço-lhe para concluir. V. Ex.ª usou da palavra durante catorze minutos, o que excedeu o tempo de que dispunha.

O Orador: - Já concluí, Sr. Presidente. Era apenas para permitir a interrupção pedida pelo Sr. Deputado Sousa Marques.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado António Guterres tinha pedido há pouco a palavra, para que efeito?

O Sr. António Guterres (PS): -Era >para, se fosse possível regimentalmente, dar um esclarecimento à Câmara.

O Sr. Presidente: - Visto que estamos na discussão na generalidade, V. Ex.ª pode em qualquer altura pedir a palavra para uma intervenção, mas para um esclarecimento, segundo a última interpretação regimental, não o poderá fazer, uma vez que não foi particularmente visado na intervenção do Sr. Deputado Ferreira do Amaral.

O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, gostaria de saber se é possível fazer uma curta intervenção.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado. Antes disso falará o nosso colega Manuel dos Santos, mas depois do intervalo, visto que estamos agora na hora regimental.
A reunião está suspensa por meia hora.

Eram 17 horas e 45 minutos.

Após o intervalo reassumiu a presidência o Sr. Presidente Leonardo Ribeiro de Almeida, encontrando-se também presente, na bancada do Governo, o Sr. Ministro da Defesa (Amaro da Cosia).

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 18 horas e 30 minutos.

O Sr. Castro Caldas (PSD): - Peço a palavra para apresentar um requerimento, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputado.

O Sr. Castro Caldas (PSD): - Sr. Presidente, em nome do meu grupo parlamentar, peço, nos termos regimentais, a suspensão da sessão por um período de dez minutos.
Aproveito a oportunidade para pedir ao Sr. Presidente que solicitasse a comparência dos representantes dos grupos parlamentares no gabinete de V. Ex.ª, a fim de considerarmos o aproveitamento do tempo de que dispomos para este debate.

O Sr. Presidente: - O requerimento é regimental, pelo que suspendo a sessão por um período de dez minutos.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 18 horas e 50 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, comunico à Câmara que na reunião havida entre os representantes dos grupos parlamentares se estabeleceu o seguinte condenso: para que não haja limitação de tempos que impedissem o debate amplo da matéria em discussão, foi decidido que os trabalhos da sessão de hoje- se prolongariam até as 21 horas e 30 minutos, hora a que se suspenderão os trabalhos. A sessão de amanhã começará às 9 horas 30 minutos, tendo ainda ficado decidido por unanimidade que na sessão de amanhã não haverá período de antes da ordem do dia. Como tal, a sessão será logo iniciada com a continuação da ordem do dia, que terá por objecto a continuação do presente debate.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com a aprovação por este Parlamento da Lei n.º 46/77, de 8 de Julho, referente à delimitação dos .sectores público e privado da economia, deu-se cumprimento e conteúdo a alguns dos preceitos constitucionais, designadamente ao artigo 85.º da Constituição, que se refere à iniciativa privada, impulsionou-se a clara definição do modelo económico português e optou-se, definitivamente, pela coexistência e reconhecimento da igual importância dos sectores privado e público no desenvolvimento da economia portuguesa.
O debate então havido nesta Câmara testemunha que uma maioria confortável dos representantes do povo português reconheceu na Lei n.º 46/77 equilíbrio, bom senso; sentido democrático e, sobretudo, capacidade para contribuir, sem subversão da ordem constitucional, para o desenvolvimento económico do

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País e para o arranque da economia portuguesa na prossecução de objectivos de modernidade e- progresso.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Lei n.º 46/77 foi especialmente saudada pelos que se reconheciam no espírito da Revolução de Abril, porque consagra e consolida uma das mais importantes conquistas alcançadas pelo povo português - as nacionalizações e a consequente subordinação do poder económico e financeiro ao poder político e porque, através da se definem regras claras de funcionamento do sistema económico de transição para o socialismo democrático, objectivo expressamente consagrado na Constituição de 1976 e que a maioria dos Deputados desta Câmara dizia então defender e desejar prosseguir.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Muito bem!

O Orador: - O debate que o Governo, apesar de tudo, não pôde impedir, a propósito da autorização legislativa solicitada para a modificação da lei, reveste-se, pois, a nosso ver, de imenso significado pelo que aquela representa de viragem quanto ao entendimento do modelo económico ajustado à sociedade portuguesa -e ao ordenamento jurídico e institucional- e pelo que prenuncia sobre os ventos de "mudança" que decisivamente a Aliança Democrática pretende semear sobre a vida portuguesa.
Não se exagera quando se afirma que, com a modificação da lei nos "termos em que, e tardiamente, o Governo a enuncia, se pretende a subversão completa do ordenamento económico português e se abandona definitivamente, e agora, sem máscara, o compromisso de honra assumido com a votação e aprovação da Constituição da República.
A importância desta viragem a que a Aliança Democrática chama mudança só é comparável com o estado de desinformação e intoxicação em que vem mantendo-se, nesta como noutras matérias, a opinião pública portuguesa e com o golpe de rins ou hipocrisia que hoje é a posição do partido numericamente mais forte da coligação, noutros tempos e com outras vontades um dos defensores da filosofia política contida na lei.
Proeurou o Governo, sem necessidade, uma vez que possui uma maioria aparentemente domesticada e servil ...

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Não apoiado!

O Orador: - ... escamotear ao debate parlamentar a discussão desta matéria.
A autorização legislativa agora solicitada, substituindo-se à possibilidade constitucional de apresentação de uma proposta de lei de alteração no Parlamento pelos grupos parlamentares da maioria, tem incontestavelmente esse significado, a não ser que queira afinal dizer que o Governo confia pouco na sua maioria e sobretudo na capacidade da maioria para a defesa de uma modificação e adulteração constitucional de tal envergadura.
O Partido Socialista não reconhece ao Governo e à sua fraca maioria legitimidade moral e política para a alteração que pretende consubstanciar.
Não lhes reconhece legitimidade moral e política, em primeiro lugar porque a maioria existe efemeramente...

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Mas é maioria!

O Orador: - ..., materializando-se apenas no plano parlamentar, sem ter correspondência no plano nacional e porque o Governo, como é de entendimento relativamente pacífico, tem características de Governo intercalar.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Mas é Governo!

O Orador: - Isto não significa que não reconheçamos a validade daquela maioria no Parlamento e do seu Governo no plano da resolução dos problemas concretos do País; a ilegitimidade que imputamos ao Governo e à sua maioria significa, tão-só, que o seu comportamento em democracia se deve pautar por critérios de equilíbrio e de ponderação, abstendo-se de modificar o quadro constitucional vigente relativamente ao qual, provadamente, não foram sufragados e, se se entender que o foram não recolheram o consentimento maioritário dos Portugueses.

Vozes do PS e do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Em segundo lugar, a ilegitimidade da actuação do Governo para a alteração que propõe resulta dos sinais concretos e recentes de manifestação de vontade dos trabalhadores de alguns dos sectores que se pretende abrir à iniciativa privada, que são manifesta e inequivocamente no sentido de manutenção das nacionalizações e da sua consolidação, como o provam os resultados dos últimos actos eleitorais para as comissões de trabalhadores da banca, para o Sindicato dos Seguros do Sul e Ilhas e como o testemunham as tomadas de posição dos seus organismos sindicais representativos, com destaque para a UGT e para o já referido Sindicato de Seguros do Sul e Ilhas.

O Sr. Avelino Zenha (PS): - Muito bem!

O Orador: - Em terceiro lugar, a ilegitimidade do Governo resulta do facto de o partido numericamente mais forte da actual maioria (o PPD/PSD) ser co-responsável e sujeito activo da formulação e aprovação da Lei n.º 46/77, lei que considerou componente essencial do modelo económico decorrente do seu projecto social-democrata.
Este argumento, como é óbvio, apenas é válido na pressuposição, porventura ingénua, de que o PPD/PSD se mantém fiel ao seu ideário social-democrata e que, simultaneamente, não se deixou colonizar ideologicamente no seio da Aliança pelo seu parceiro da direita.
Finalmente, a ilegitimidade deste debate resulta da sem-razão deste debate; a maioria não foi capaz ainda de alinhar juízos fundamentados e coerentes que justifiquem a alteração proposta, e o Governo, no próprio memorando justificativo que nos entregou, não foi também pródigo em explicações e convencimentos.
Dos argumentos da maioria, expendidos aquando da discussão do processo de urgência, relemos dois o de que a modificação da lei se impõe pela necessidade de abertura dos sectores bancário e segurador entre outros não naturalmente os transportes) à iniciativa privada, a fim de compatibilizar o nosso ordenamento jurídico-económico com as disposições do

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Tratado de Roma, que importam, como é sabido, para os países integrantes da Comunidade Económica Europeia ou para aqueles que, como Portugal, são candidatos à integração.
Este argumento, tradicional e constante nestas discussões por mérito da direita, é inconsistente, como já por mais de uma vez foi demonstrado, pois o actual sistema económico português não viola o artigo 222.º do Tratado de Roma e o tantas vezes invocado direito de livre estabelecimento não é manifestamente aplicável ao caso.
Convém aqui sublinhar que, ainda este fim-de-semana, em declarações prestadas no nosso país, o vice-presidente da Comunidade Económica Europeia, Sr. Lorenzo Natali, afirmou expressamente que o ordenamento jurídico-económico português não contraria de forma alguma as disposições da Comunidade. Apesar disto, alguns dos dirigentes dos partidos da Aliança Democrática afirmaram precisamente o contrário. Até agora pensávamos que apenas se tratava de desinformação; agora estamos convencidos de que se trata de má fé.

O Sr. Avelino Zenha (PS): - Muito bem!

O Orador: - O segundo argumento é o da não regulamentação da lei, apesar de a mesma conter disposição expressa nesse sentido.
Este argumento, partindo embora de uma constatação de facto, apenas poderá justificar e legitimar a própria regulamentação da lei e poderá mesmo dizer-se que a não regulamentação - e portanto o não aproveitamento de todas as possibilidades que a 'própria lei contém- só fortalece a ideia da dispensabilidade de uma modificação profunda. Regulamente-se, pois, a lei, não se altere o seu conteúdo fundamental.
Pela parte do Governo, registamos o argumento de que é necessário e urgente o relançamento do investimento.
Não nos parece que a redistribuição da iniciativa nos sectores bancário e segurador pelo sector público e pelo sector privado assegure o desejado relançamento do investimento.
Com efeito, sem procurar localizar esta discussão na análise do papel do grande capital financeiro na lógica, conteúdo e dimensão do desenvolvimento económico nacional, bastar-me-á referir que, antes das nacionalizações, os sectores referidos foram evidentemente privados e o efeito deste facto sobre o crescimento e desenvolvimento nacional foi a colocação do País numa situação concreta de grande empobrecimento e dependência e distribuição desigual.
É que não chega, Sr. Presidente e Srs. Deputados, reconhecer a indispensabilidade da democracia política. A verdadeira justiça social assenta na extensão da democracia política à democracia social e cultural e à democracia económica: e a democracia económica só é possível com a subordinação definitiva e estável do poder económico e financeiro ao poder político.
Não nos tranquilizam as declarações do Sr. Ministro no sentido de que também ele e o seu Governo desejam a subordinação do poder económico e financeiro ao poder político. Não nos tranquilizam porque de boas palavras está o País cheio, do que cada vez mais nós podemos aperceber através desses actos concretos em que essa subordinação é evidente.
Aproveito aqui para dizer, à laia de parêntesis e procurando de certo modo integrar uma intervenção que eventualmente deveria fazer o meu camarada António Guterres mas que não se encontra presente na Sala neste momento -, que a diferença que o Sr. Deputado Ferreira do Amaral fez há pouco relativamente à celulose é, em nosso entender, mais um argumento a favor da necessidade imperiosa da subordinação do poder económico e financeiro ao poder político. Só através dessa subordinação é que os problemas graves -e nós reconhecemos que o são- da celulose poderão ser contidos. Se essa subordinação não existir é óbvio que esses problemas se agravarão e não serão resolvidos democraticamente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A "mudança" (entre comas, obviamente) no sentido de ruptura política está pois em marcha. Paulatinamente e na incapacidade de resolver os graves problemas dos Portugueses, apesar de a situação que herdou no campo económico, no campo financeiro e no campo social ser indubitavelmente mais favorável que a dominante há uns tempos atrás, o Governo vai destruindo o modelo económico constitucional e vai criando condições para a contra-revolução económica.
Depois da revogação da lei que limitava a venda dos bens das empresas nacionalizadas, o Governo avança na abertura ao sector privado de sectores económicos decisivos para a opção social dos Portugueses, o que evidentemente só importa a uma minoria de capitalistas e financeiros nacionais com provas dadas ao longo de anos de inépcia e acumulação financeira sem função social.
Para que o edifício se complete, para que a contra-revolução económica seja obra acabada, faltará agora alterar a Lei das Indemnizações e entregar aos grandes capitalistas do passado ou aos seus sucessores os meios necessários à reconstrução do seu poder.
Infelizmente não temos razões para julgar que a ofensiva vá parar; o sistema económico vigente está realmente a ser desmantelado.
Nós mantemo-nos fiéis aos ideais de Abril e aos acordos parlamentares assumidos, relativamente aos quais empenhámos o nosso compromisso de honra. Portanto, votaremos contra esta proposta de lei.
Mantemo-nos fiéis à necessidade de esclarecer a opinião pública portuguesa sobre a importância da modificação em causa. Por isso, lançamos daqui um repto ao Governo e às bancadas da maioria para que abram um debate público sobre esta matéria...

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - É este!

O Orador: - ...e que utilize, se necessário, os órgãos de comunicação social e, logo, a televisão, de forma a fazer-se um debate que esclareça os Portugueses sobre a modificação que se está a pretender.
Independentemente desse debate, o PS procurará alertar a opinião pública para a gravidade da situação actual e para o carácter antidemocrático, demagógico e ilegítimo do comportamento do Governo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Gaspar Martins.

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O Sr. Gaspar Martins (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O anúncio pressuroso da Aliança Democrática e do "eu Governo de abrir o sector bancário à iniciativa privada, isto é, aos ex-banqueiros, criou nos trabalhadores bancários um clima de preocupação e de. repúdio, já manifestados, de resto, em tomadas de posição de várias estruturas sindicais representativas dos bancários. O próprio Congresso do Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas, recentemente realizado e cujas conclusões foram já enviadas a esta Câmara, pronunciou-se de forma inequívoca contra a reprivatização da banca.
A AD e o seu Governo julgam dominar os sindicatos bancários e que, por isso, os trabalhadores não farão ondas e acatarão, sem resistência, esta ameaça à banca nacionalizada e aos seus empregos; Mas os bancários não têm a memória curta e sabem bem o que significa a banca nas mãos dos capitalistas:
Sabem que os bancos privados eram o sustentáculo de grupos económicos dominadores da vida do País;

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Outra vez?!

O Orador: - Sabem que os grupos económicos, como os Mellos, Champallimaud, Espírito Santo, Quinas e companhia não tinham bancos para servir o País, mas apenas para satisfazer a avidez insaciável de lucro desse punhado de tubarões que depois era delapidado em iates, palácios, colecções de automóveis, coutadas do caça etc...

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Rica vida!

O Orador: - ... enquanto a esmagadora maioria do nosso povo vivia na miséria ou tinha de recorrer à emigração para sobreviver;
Sabem que os bancos privados e os respectivos grupos foram o sustentáculo do fascismo, modelo político a que recorreram para dominar e sobreexplorar os trabalhadores;
Sabem que os banqueiros sustentavam o fascismo, financiando a PIDE e a Legião e até militando nela, como o fizeram vários membros da família Espírito Santo e o Sr. A vides Moreira, alto dirigente da Legião Portuguesa, e sacrificaram o nosso povo com uma longa e vergonhosa guerra colonial, por não quererem abdicar dos seus interesses egoístas em África;
Sabem que os banqueiros manobraram à farta com as pequeníssimas poupanças de milhares e milhares de portugueses para proveito próprio, especulando desenfreadamente e lucrando na mesma escala, através, por exemplo, da emissão de acções por valores artificiosamente muito acima do par;
Sabem das variadas vigarices, até agora impunes, de tais senhores, como o Sr. Pinto de Magalhães, com um processo na Polícia Judiciária cujo andamento, por artes do Diabo, se ignora, ou as múltiplas empresas fictícias do Grupo Quina, ou as centenas de milhares de contos de dívidas abusivas de membros e amigos das famílias Espírito Santo e Mellos aos respectivos bancos, ou as falcatruas do Sr. Jorge Brito que iam levando à falência, em 1973, o BIP se não fora a intervenção do próprio Governo fascista, etc, etc.
Sabem que, na revisão de 1973 do seu CCT, os banqueiros, apesar dos seus chorudos lucros, tiveram a desfaçatez de invocar a "incapacidade" dos bancos de repor o poder de compra dos bancários, tese defendida calorosamente pelo seu árbitro, na comissão arbitrai e que, naturalmente, vingou com o voto de desempate do árbitro-presidente nomeado pelo Ministério das Corporações (curiosa e significativamente, o árbitro que tão bem e com calor defendeu os interesses dos banqueiro, prejudicando gravemente dezenas de milhares de bancários, inclusive recusando actualizar as pensões dos reformados, ocupa hoje um lugar destacado nas bancadas da AD desta Assembleia);
Sabem que, desde a manhã libertadora do 25 de Abril, quem, sistematicamente, conspirou contra a nova situação democrática foram os banqueiros e os seus homens de mão, jogando com o boicote económico, nomeadamente com a transferência legal de divisas para o estrangeiro e na criação e financiamento de partidos fascistas, como o Partido Liberal e o Partido do Progresso, ou mesmo dando uma oportuna mãozinha nos novéis PPD e CDS.
Foi por tudo isto que os bancários, apoiados pelos trabalhadores de outros sectores, cedo se aperceberam de que, para defender a democracia era imperioso e urgente tirar das mãos dos banqueiros as alavancas de um sector fundamental da economia e, em assembleias gerais e exposições, reclamaram a nacionalização até a conseguirem.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os pequenos e médios comerciantes e industriais, os agricultores e os trabalhadores não ignoram as consequências que adviriam para si e para o País da abertura do sector bancário ao grande capital.
A banca privada dos ex-monopolistas iria tentar controlar a 'actividade económica do País em sectores fundamentais, chamando a si não apenas os melhores negócios, como a clientela do grande capital, em prejuízo das pequenas e médias empresas. Por outro lado, a banca nacionalizada seria esvaziada das operações importantes, o que iria contribuir para a diminuição da capacidade de apoio à pequena e média empresa, ao sector público e, até, pondo em causa os postos de trabalho dos bancários.
Por exemplo, imagine-se só as vultosas verbas que tais bancos privados obteriam para seu proveito, passando a dispor das contas de milhares de trabalhadores de muitas empresas que, actualmente, pagam salários por crédito em conta na banca nacionalizada.
Os bancários temem, legitimamente, pela segurança do seu emprego e interrogam-se que carências há que a banca nacionalizada não supra, cobrindo, nalguns locais até ao exagero, praticamente todo o território nacional e tendo ao seu serviço mais de 40 000 trabalhadores, muitos deles altamente especializados.
O País iria assistir à reconstituição dos grupos económicos, de resto já visível hoje pelas iniciativas de alguns grupos financeiros de adquirirem várias empresas industriais.
Depois não se estranhará, porque lhes está na massa do sangue, que fomentem e financiem toda as actividades reaccionárias e os grupos políticos avessos ao regime constitucional, de modo a reporem o regime terroristas do grande capital que permita a sobreexploração do nosso povo.
E, se não fora o desfavor dos ventos da história, não deixariam de tentar uma guerrinha de reconquista colonial...
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Dizem o Governo e os seus apoiantes nesta Câmara que apenas visam

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estimular o investimento e a concorrência entre sector público e privado. Mas a abertura do sector bancário à iniciativa privada garante o investimento?
É óbvio que não, pois a actual queda 'do investimento em Portugal não resulta da falta de meios financeiros, como o mostra o excesso de liquidez de que sofrem os bancos nacionalizados.
Se o Governo estivesse de facto interessado no aumento do investimento não tentaria a criação de bancos privados, antes baixaria as taxas de juro, aumentaria os limites de crédito e criaria condições económicas que o incentivassem. A iniciativa privada deste país (que não se confunde e muito menos se limita ao grande capital, assim como o sector empresarial do Estado não necessitam de novos bancos: necessitam, sim, de crédito em quantidade e a preço razoável.
Dou apenas um exemplo significativo que os bancários apontam:
Em 1975, os bancários conquistam, entre outras, uma regalia notável que é o crédito à habitação própria, segundo o qual, cada banco, em função do número dos seus trabalhadores, é obrigado, em cada ano, a destinar uma verba ao crédito à habitação própria concedido a juro igual ao praticado pelo Banco de Portugal no redesconto menos 1%.
Nos primeiros anos, as dotações de cada banco eram rapidamente esgotadas, ficando muitos bancários excluídos nas listas de inscrição. Actualmente, as dotações ficam por preencher. Isto significa que os bancários rião têm também possibilidades de amortizar o empréstimo para aquisição de habitação própria e que menos fogos são construídos anualmente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Concorrência entre sector público e privado? Os bancários, em particular, sabem o que significa tal concorrência.
É a lei da selva de pala calada captar negócios em condições desleais para os outros; é o saco azul com os resultados da contagem de menos uns dias no apuramento dos juros dos depósitos e mais uns dias nos descontos de letras; são as conta a descoberta de amigalhaços e familiares sem serem cobrados juros; são as transferências ilegais de divisas para o estrangeiro; é o jogo da especulação com a emissão de títulos de valor despudoradamente superior ao valor facial para captar as pequenas poupanças e utilizar os dinheiros dos outros nos próprios empreendimentos, etc., etc.

O Sr. Angelo Correia (PSD): - Este rapaz sabe muito de vigarices!

O Orador -- De resto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, não se é o porquê da pressa em criar bancos privados. Pois se a banca nacionalizada está infiltrada de gestores da íntima confiança dos antigos banqueiros...
Por isso se assiste a uma desastrosa gestão dos recursos humanos, estando os bancos inflaccionados de pessoal nuns serviços e carenciados deles noutros; por isso renasce a proverbial política de favoritismo típica dos banqueiros; por isso abrem balcões em concelhos onde já existem vários, inclusive do próprio banco inaugurador; por isso se esbanjam recursos em obras de fachada e sumptuários ou em anúncios na imprensa reaccionária nacional e estrangeira ao jeito de haraquiri, etc., etc.
Os propósitos são bem claros, Sr. Presidente e Srs. Deputados. O objectivo é destruir as nacionalizações, recuperar o contrôle da economia para os tubarões do antigamente, criar condições económicas para o enterro da Constituição e da democracia, repor a ditadura terrorista do grande capital
Mas contra tais propósitos está a maioria do nosso povo e, sobretudo, a sua parte mais activa - os trabalhadores, incluindo os bancários.

Aplausos do PCP.

Afirmamos aqui, solenemente, que o PCP apoiará todas as lutas desenvolvidas, pelos meios constitucionalmente consagrados, na defesa das nacionalizações, do regime democrático e da' Constituição da República e que nos esforçaremos para que sejam nacionalizados todos os bancos privados abertos à sombra desta investida do Governo e coligação da Aliança Democrática.

Aplausos do PCP.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Mas que nível tão baixo!

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Falou o eloquente!

O Sr. Presidente. - Ainda para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Herberto Goulart.

O Sr. Herberto Goulart (MDP/CDE): - Antes de iniciar a minha primeira intervenção nesta Câmara, permita-me, Sr. Presidente, que cumprimente V. Ex.ª e que saúde todos os Deputados desta Assembleia.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado.

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Já anteriormente o Grupo Parlamentar do MDP/CDE teve a oportunidade de manifestar a sua oposição à usurpação que o Governo tenta fazer da competência específica da Assembleia da República, através do mecanismo das autorizações legislativas.
Naturalmente que não pomos em causa a concessão, constitucionalmente estabelecida, de autorizações legislativas que permitam ao Governo elaborar decretos-leis em matérias reservadas à Assembleia da República.
Uma coisa, porém, é conceder poderes legislativos ao Governo em matéria de competência desta Assembleia, por exemplo, para questões pontuais ou para o preenchimento de vazios legais em extensão de um espírito legislativo já definido neste orgão de Soberania, outra coisa é autorizar o Governo a sobrepor--se à Assembleia da República, concedendo-lhe competência para, tão simplesmente, alterar a Lei n.º 46/77.
Invoque-se embora a possibilidade que sempre resta de submeter a ratificação os decretos-leis que o Governo venha a elaborar, o que se trata, em matéria de tal importância para o regime político e económico como a constante da Lei n.º 46/77, é de uma subalternização do papel da Assembleia da República, com a qual o MDP/CDE não contemporiza.
Ao repeti-lo hoje, somos conduzidos a apreciar com maior detalhe as intenções do Governo com esta sua proposta de lei.

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Do lacónico preâmbulo que o Governo introduziu na proposta de lei, da curta nota que o Sr. Ministro Adjunto do Primeiro-Ministro distribuiu aos grupos parlamentares e da própria introdução ao debate que o Sr. Ministro Pinto Balsemão aqui produziu, retiraríamos que este pedido de autorização legislativa se fundamenta, inocentemente, nas urgentes necessidades de intensificar o investimento nacional e de preparar o processo de adesão à CEE.
Para a primeira invoca-se, sem qualquer demonstração, ser "entendimento do actual Executivo que o necessário e urgente relançamento do investimento depende, em decisiva medida, da abertura à iniciativa privada de domínios de actividade que hoje lhe estão vedados".
Para a segunda reconhece-se que a adesão é uma opção política, mas imediatamente se conclui que "a adesão é também a opção por um modelo económico baseado nas regras do mercado".
A prudência ou insegurança do Governo é tal que, pela voz do Sr. Ministro Adjunto do Primeiro-Ministro, afirmou que "enquanto este Governo estiver no poder a Constituição será cumprida" e, na nota distribuída aos grupos parlamentares, teve o cuidado de referir não pretender alterar o artigo 2.º da Lei n.º 46/77, o qual, aliás, não é mais do que a transcrição de .um preceito constítucional.
Respeito pelo texto constitucional, irreversibilidade das nacionalizações, relançamento do investimento, considerado indispensável para a efectiva melhoria do bem-estar do povo português, são pressupostos que o Governo pretende exibir neste período ainda de transição da estratégia política que a AD definiu para a restauração do poder económico dos grandes grupos capitalistas.
Mas de facto o que se procura pôr em marcha, melhor dito, a marcha que se procura acelerar, é a que conduz à liquidação do sector público produtivo, designadamente das suas unidades potencialmente rentáveis.
A direita tem usado uma barragem de argumentos de grande fragilidade contra a existência de sectores de actividade económica vedados à iniciativa privada. Um desses argumentos é o de que a reserva de actuação para o Estado em certos sectores coarcta as possibilidades da iniciativa privada, assim como quem diz que se coarctam os direitos individuais dos cidadãos.
A actual lei de delimitação dos sectores económicos público e privado - e sem que de momento pretenda fazer qualquer juízo de valor sobre tal lei- nunca constituiu um entrave aos empresários que efectivamente se proponham investir, como de resto se tem verificado em actividades privadas viradas para a exportação e em múltiplas pequenas e médias empresas.
Porque são de facto em número limitado os sectores que estão vedados à iniciativa privada, sem prejuízo de se reconhecer que são os sectores determinantes da nossa economia.
Não tem a iniciativa privada um mundo infindo de possíveis aplicações de capital na indústria transformadora - a têxtil e o vestuário, a curtimenta e o calçado, a metalomecânica ligeira e pesada, a cerâmica, o campo vastíssimo de indústrias químicas, as transformadoras agro-pecuárias, as indústrias de alimentação e das bebidas e tantas, tantas outras -e ainda na indústria de construção civil, na indústria do turismo, no comércio ou nos serviços mais diversos?
Desde Julho de 1977 que alguns sectores total ou predominantemente nacionalizados deixaram de estar vedados à iniciativa privada. Apesar disso, assistimos durante dois anos e meio a algum novo empreendimento privado em tais sectores?
O que acontece é que não são os empresários não monopolistas, por muito dinamismo e espírito de iniciativa que tenham, que podem investir em sectores básicos ou sectores-chave da economia pela sua natureza de capital intensivo.
Nos três últimos anos acentuou-se no nosso país o processo de desigualdade social, em resultado de uma política de distribuição orientada a favor do capital. Mas tal política não se traduziu em nenhum surto do investimento privado, continuando, pelo contrário, a ser mais significativo o investimento do sector público.
E isto porque os representantes dos antigos grupos monopolistas não têm, que se conheçam, quaisquer projectos de investimento que acrescentem algo de novo ao património e riqueza do nosso país. Eles sempre privilegiaram e continuam a privilegiar as aplicações de recuperação rápida, o lucro fácil. Para eles não está em causa o lançamento de novos projectos viáveis, envolvendo um risco normal e exigindo uma mobilização adequada de capitais próprios. A grande burguesia tradicional joga apenas no negócio de ocasião, na especulação bolsista ou no investimento com capitais alheios (e por isso exige uma banca dócil perante os seus interesses menos legítimos, como sucedia no passado anterior ao 25 de Abril). Esta burguesia tradicional, monopolista pode de facto pensar que lhe coarctam a iniciativa de desenvolver o seu papel parasitário,
Mas os verdadeiros empresários, aqueles que estão dispostos a aplicar nas actividades produtivas a que se dedicam ou querem dedicar, os seus conhecimentos, o seu entusiasmo, a sua capacidade de iniciativa, esses não podem sentir-se coarctados nos válidos empreendimentos que projectem pela existência de sectores económicos vedados à iniciativa privada.
Outro argumento utilizado pela direita é o glosar em vários tons - alguns tocando a raia do ridículo - que os empresários portugueses seriam cidadãos de segunda relativamente aos empresários estrangeiros. O argumento é capcioso, pois escamoteia que as actividades vedadas à iniciativa privada tanto o são para empresários nacionais, como para novos investidores estrangeiros.
A adesão à CEE é outro dos argumentos, que também vimos obsessivamente repetido pelo Governo no início deste debate, para justificar o ataque ao sector público empresarial.
Não me desviando agora para a discussão da temática da adesão à, CEE, deve em primeiro lugar recordar-se - já o foi afirmado por mais de uma vez nesta Câmara- que, mesmo que a adesão à CEE venha a verificar-se, tal em nada impede a manutenção no nosso país do sistema produtivo que soberanamente o nosso povo definiu. Em segundo lugar, devo referir, que as afirmações aqui produzidas pela área governamental neste domínio são bem a comprovação da adesão cega à CEE que o Movimento Democrático Português tem denunciado como linha

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política da AD. Na nossa opinião, não se trata de encarar o processo de adesão à CEE na perspectiva de prováveis inconvenientes e hipotéticas vantagens para a economia nacional, estudá-las cuidadosamente, negociar em termos de minimizar os primeiros e maximizar as segundas, defendendo voluntariamente a soberania e a dignidade nacionais. Não, para a AD a adesão é uma tautologia, afirma a intenção de adesão... porque é preciso aderir, porque no fundo encara a adesão às comunidades europeias principalmente como um contributo para a liquidação do regime económico-social que a Constituição configura.
Outro argumento utilizado é o de que a coexistência concorrencial entre o sector privado e público dinamizaria este último. E aqui estamos perante uma desvirtuação das nacionalizações e do papel que ao sector público produtivo cabe na planificação' democrática da economia, no esforço articulado e coordenado de incremento da produção nacional.
Invocar analogias com a França é, além de outros aspectos, ignorar as profundas diferenças entre um país industrialmente desenvolvido e este nosso pequeno país europeu atrasado, industrial e profissionalmente, apoiado num mercado interno assaz diminuto.
Finalmente, usa-se a argumentação de que a abertura da banca à iniciativa privada nacional é indispensável para ultrapassar não provadas insuficiências do nosso actual sistema bancário e que só o estímulo da banca privada poderá levar os investidores privados nacionais à concretização de empreendimentos projectados.
Neste campo, a primeira questão a colocar é a seguinte: quem pretende investir em capital bancário? Serão os pequenos e médios empresários, quase sempre com insuficiência de capital para o desenvolvimento dos seus novos projectos produtivos?
Ou será a antiga oligarquia financeira que sabe, pela experiência passada, que o domínio da banca lhe é indispensável para reconstituir os seus mecanismos de acumulação e concentração capitalista ou, dito de outro modo, para reconstituir o seu poderio monopolista?
Ou será ainda que a abertura da banca à iniciativa privada projecta ser um primeiro passo para a instalação de novos bancos estrangeiros em Portugal, acaso segundo compromissos não confessados mas já assumidos? Aqui o problema seria bem mais grave. Já não se trataria da simples protecção de interesses ilegítimos da antiga oligarquia financeira nacional, mas da submissão servi] a interesses estrangeiros.
Não pode falar-se de incapacidade da banca nacionalizada para estimular o investimento. Os bancos andam hoje, através de forte actividade promocional e até com processos de concorrência desregrada entre as várias instituições, a oferecer dinheiro para investir por todo lado.
Também não é verdadeiro, numa invocada ineficiência da banca nacionalizada, que esta não disponha hoje, como nunca o tivera no tempo da banca monopolista, de uma grande capacidade técnica para o apoio ao estudo e equacionamento económico-financeiro dos projectos de investimento, nomeadamente na banca especializada no crédito a médio e longo prazo.
A banca nacionalizada, se gerida de forma a transformar-se num instrumento do Estado para o relançamento da economia, o que não é o caso actual - não por razões intrínsecas imputáveis à nacionalização da banca, mas pela orientação política em que tem sido envolvida -, tem capacidade para dar um grande apoio às actividades empresariais públicas ou privadas.
Seguramente que, interpretando o sentir dos verdadeiros empresários portugueses, recordados da intervenção asfixiante da banca monopolista de antes do 25 de Abril, poderemos dizer, um tanto brejeiramente, que a banca privada não é cá precisa para nada.
Por detrás dos argumentos aparentemente inocentes com que se tenta impedir que sectores económicos fundamentais permaneçam vedados à iniciativa privada, está uma grande operação e uma estratégia a médio prazo de liquidação do sector empresarial do Estado e da reconstituição do poder dominante da antiga oligarquia financeira. Já o dissemos, mas não é de mais repeti-lo.
As fortunas enormes criadas durante o fascismo à custa dos sacrifícios do nosso povo e do empobrecimento e atraso do País, aspiram à gestão das empresas públicas em condições favoráveis e à reprivatização das de maior rentabilidade, mediante o investimento de pequenas verbas a titulo de capital. E nem pensam tei muito que arriscar: os seus representantes a nível político, nomeadamente os que hoje estão no Governo do CDS e do PSD, a título das indemnizações lá lhes procurarão dar as verbas necessárias.
Nesta estratégia, em primeiro lugar e a larga operação de descrédito que as forças de direita lançam sobre o sector empresarial do Estado. São os mitos da ineficiência - não ignoro que é necessário um grande esforço de racionalização do sector público empresarial -, da incapacidade dos gestores, da anarquia que reinaria nas empresas públicas, da baixa produtividade do trabalho, dos desperdícios, do absentismo dos trabalhadores.
Em segundo lugar, é o uso a nível do poder político de instrumentos para obstaculizar o funcionamento, o desenvolvimento e a rentabilidade das empresas públicas ou das empresas onde o Estado é participante maioritário. A título de exemplos:
A política de saneamento económico e financeiro destas empresas, incluindo os necessários esquemas de dotações para capital social, não é concretizada ou é-o tardiamente com custos sociais para o País incomparavelmente mais elevados.
A política de preços no sector público empresarial tem-se caracterizado por extrema rigidez, que em geral decorre da circunstância de um número apreciável de empresas públicas estar sujeito ao regime de preços máximos. Os atrasos e as dificuldades que são levantadas à homologação de novos preços propostos pelas empresas contribuem significativamente para a deterioração da sua situação económica e financeira.
O processo da tomada de decisões de investimento no sector empresarial de Estado, em que tem chegado a haver orçamentos anuais, incluindo o plano de investimentos, aprovados apenas no 2.º semestre, tende a provocar de facto ineficiências no sector público produtivo.
Em terceiro lugar, é a colocação como gestores das empresas públicas (nomeadamente da banca) de

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fiéis serventuários dos antigos interesses privados monopolistas. A actual filosofia de gestores como "comissários públicos" não e mais do que- a sublimação daquela orientação.
Em quarto lugar e em extensão mais evidente da orientação anterior, vem a reafirmação, de resto já prevista na Lei n.º 46/77, mas agora com maior clareza e sem limitações, de que a exploração ou a gestão de empresas públicas seja confiada a entidades privadas, passo transitório para a sua posterior reprivatização.
Em quinto e último lugar, refira-se que a abertura de sectores nacionalizados à iniciativa privada visa também que grandes grupos capitalistas possam instalar novas unidades, tecnicamente bem equipadas, que pela tal coexistência concorrencial inviabilizariam empresas públicas com pesadas estruturas herdadas do fascismo, amanhã adquiridas por "tuta-e-meia" pelo sector privado ou quedando-se com funcionamento subsidiado polo Estado por razões sociais, para permitir a realização de sobrelucros nas novas unidades privadas. E tudo isto em nome da coexistência concorrencial.
Esta é a lógica da estratégica desenvolvida na presente fase transitória. Transitória porque a direita não pode investir frontal o directamente contra a Constituição da República.
Na fase seguinte, revista a Constituição da República segundo os seus objectivos restauracionistas, o património público, a nível de actividades produtivas, ficaria reduzido às unidades não rentáveis, às prestadoras de serviços de natureza social, no velho processo de transferir para o sector privado tudo o que é lucrativo e de manter ou transferir para o sector público as áreas ruinosas, mas que são infra-estruturas de suporte das actividades privadas.
Porque o MDP/CDE acredita que o povo português terá força, suficiente para se opor a este projecto e defender Abril e as suas conquistas populares, encara o sector empresarial do Estado em perspectiva diversa.
Consideramos a existência de um forte e dinâmico sector empresarial do Estado, com actividades económicas fundamentais vedadas à iniciativa privada, como indispensável ao impedimento da reconstituição dos monopólios privados, o que, na nossa opinião, é em Portugal condição sine qua non de preservação e defesa do regime democrático.
Consideramos que o sector público empresarial, pela sua preponderância na economia industrial portuguesa, por dominar os sectores estratégicos da economia, por estar envolvido numa grande malha de relações intersectoriais, por poder e dever ser gerido fora de meros mecanismos de lucro, mas dentro de objectivos planificados e imperativos emanados do interesse, nacional, é o único que pode desempenhar um papel privilegiado de dinamizador do processo de recuperação económica do País.
Consideramos que a existência de um forte e dinâmico vector público empresarial é indispensável para que este nosso atrasado país, vítima de meio século de desenfreada exploração, possa sofrer o embate internacional de uma economia mundial em crise acentuada. E, neste contexto, consideramos que tal sector é necessário à indispensável diversificação das nossas relações económicas externas e mesmo à eventual adesão à CEE, processo onde apenas a existência de
um potente sector produtivo estatal poderá ser contrapartida para a dinamização interna da nossa economia e, em consequência, para a defesa do próprio sector da iniciativa privada portuguesa, em especial do vasto mundo das nossas pequenas e médias empresas.
Consideramos que o sector público estatal, gerido de acordo com o projecto constitucional, longe de ser um travão à iniciativa privada, é antes um factor da sua dinamização. Que a actividade do sector empresarial do Estado coordenada pelo Plano e os contratos - programa que se pode estabelecer com o sector privado, faculta a este balizas estáveis que reduz em o risco das decisões a tomar pelos empresários. Com efeito, os planos siderúrgico nacional, energético, de reequipamento da CP, Metro e Rodoviária Nacional, bem como os projectos nos sectores das químicas, cimento, vidro e pasta de papel, constituem alavancas que podem fazer movimentar a economia portuguesa e em particular muitas das empresas fornecedoras de bens e serviços de capital.
Por tudo isto, porque consideramos que o que está por detrás do pedido de autorização legislativa consubstanciado na proposta de lei n.º 288/I é a abertura da estrada que conduz a desligar o sector público produtivo do seu papel constitucional, que conduz à reprivatização sem limites, que conduz à reconstituição do poder económico monopolista numa fornia antecipada da revisão da Constituição, portanto inconstitucional, o Grupo Parlamentar do MDP/CDE não dará o seu voto favorável à proposta governamental.

Aplausos do MDP/CDE e do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Marino Vicente.

O Sr. Marino Vicente (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A delimitação dos sectores público e privado constitui pedra-de-toque de um regime e reflecte a configuração do poder político.
Quem domina quem eis a questão...

O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Muito bem!

O Orador: - ... o poder económico dos proprietários dos meios de produção e da banca ?obre a esmagadora maioria do povo, ou esse mesmo povo sobre os meios da sua emancipação económica, cultural, social e política.
A Constituição do Povo (que é a de 1976 e não a de 1933, pese embora a muitos da escassa maioria parlamentar) resolve, imperativamente, tal interrogação: a soberania reside no povo e não na ultraminórica casta de monopolistas e latifundiários e a apropriação colectiva dos. principais meios de produção é garantia o condição para a efectivação dos direitos económicos, sociais e culturais desse mesmo povo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A proposta de lei n.º 288/I está a ser dissecada pela bancada comunista, no que se refere às intenções frontalmente anticonstitucionais e de subversão do regime que transporta.
Ater-me-ei, preferencialmente, a aspectos complementares que, no entanto, concorrem para um mesmo quadro normativo com que o Governo e o seu suporte

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parlamentar intentam destroçar o sector público da economia e satisfazer a sua clientela imediata. E com a pressa e com o afã de quem tem boa consciência da efemeridade do seu poder e má consciência na forma do exercer.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Muito bem!

O Orador: -Com efeito, não parece suficiente para a coligação governamental instituir medidas inconstitucionais para destruir por fora o sector público da economia: complementa-as com instrumentos que possam minar por dentro as empresas públicas e nacionalizadas. Não vá o Diabo tecê-las...
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este Governo está a utilizar, neste campo, outras armas de arremesso contra a democracia portuguesa.
Explicitemos o alcance de tais medidas.
A primeira dá-se pela forma do Decreto-Lei n.º 10-A/80, de 18 de Fevereiro, que veio desenterrar o Decreto-Lei n.º 356/79, de chancela Mota Pinto. O PSD e o CDS são pressurosos a enjeitar a paternidade do Governo Mota Pinto, mas vão lá desenterrar Ministros e Secretários de Estado, mas vão lá desenterrar iniciativas legislativas e métodos para aprofundar os contornos de uma política e práticas já derrotadas.
A história deste diploma é fácil de contar.
O Decreto-Lei n.º 256-A/77, de 17 de Junho, na sequência do novo ordenamento jurídico-constitucional, veio consagrar medidas de prevenção da legalidade dos actos administrativos, estatuindo a obrigação de fundamentação ciáramos actos que denegassem direitos e garantias dos cidadãos.
Tal estatuição permitia, designadamente, a reacção contenciosa contra actos discricionários, arguíveis de desvio de poder, com base na apreciação do mérito dos fundamentos expressamente invocados, face aos fins dos poderes correlativos definidos na lei.
O Governo Mota Pinto, simulando interpretar, derrogou tal norma e decretou que para os actos do Governo relativos à transferência ou exoneração dos funcionários da Administração Pública e das empresas públicas, nomeadas no exercício de poderes discricionários, constituía fundamento bastante a alegação seca da mera conveniência de serviço. Assim sem mais: tal ou tal trabalhador não se cosia pelas linhas políticas do Governo, então podia ser exonerado por "conveniência de serviço"; tal ou tal gestor não era da cor do Governo, então podia ir para a rua ou para as Berlengas por "conveniência de serviço".
O Decreto-Lei n.º 356/79, que chamámos a ratificação, foi revogado pelo V. Governo Constitucional, mas o Governo Sá Carneiro/Freitas do Amaral, repescou-o e fê-lo reentrar na ordem jurídica, não obstante violar princípios e normas constitucionais.
E o objectivo é claro: as empresas públicas precisam de homens "competentes" do PSD, de homens "competentes" do COS, de homens que compitam com "competência" na demonstração da inviabilidade de empresas públicas rentáveis, depois de destruídas "competentemente" pelo Governo das "competências".
O semanário O Tempo (14 de Fevereiro de 1980), citando fontes que tinha por autorizadas e, portanto, "competentes", teve o mérito de explicitar as linhas
de força desta política: assim, administradores competentes para a banca seriam só e apenas os banqueiros. Sabendo nós que no Banco Borges & Irmão, entre 1973 e 1974, seis pessoas físicas ocupavam cento e nove lugares de gerência, concluímos Que a megalomania feita Governo pretende para a banca e sectores mais rentáveis o regresso às "hipercompetências".
"Incompetentes" que trabalhem, esses poderão ir para a rua ou para o desterro por "conveniência de serviço".
Por outro lado, era necessário à AD colocar à frente das empresas públicas e nacionalizadas, não entregues à gestão privada, homens de palha dos Melos, dos Champallimauds, dos Quinas e Companhia Limitada.
Veio a público, veiculado por um semanário, um projecto de decreto-lei do Governo Sá Carneiro, com vista a alterar o Estatuto do Gestor Público, instituído pelo Decreto-Lei n.º 831/76, de 25 de Novembro. Que saibamos, nem numa linha, foi desmentido.
Segundo a versão referida, os gestores públicos seriam designados, com excepção do governador e dos vice-governadores do Banco de Portugal, por simples despacho do Primeiro-Ministro e Ministro da tutela, em regime de comissão de serviço, que poderia ser dada por finda a todo o tempo, designadamente por "conveniência de serviço".
Assim, ficaria institucionalizada a perseguição política e consagrados os meios, não menos competentes, para minar mais e mais o que restasse do sector público, no concernente a empresas rentáveis, está bem de ver.
O expediente não se fez lei, ao que suou.
No entanto, o Governo tinha já uma na manga o famigerado Decreto-Lei n.º 10-A/80 e a sua "conveniência de serviço".
Para completar o quadro faltará talvez institucionalizar as beruf verboten, as chamadas interdições profissionais, pois que a cruzada contra os infiéis, isto é, contra os moiros do trabalho, já começou com todo o arsenal do Maccarthismo patológico.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Mas, ao que parece, tais expedientes eram ainda escassos e os saneamentos ainda curtos para a plutocracia; Com efeito, o Governo e seu suporte parlamentar compartam-se como se, dois meses passados de governação, já estivessem em mora em relação ao cumprimento "de obrigações assumidas para com ex-monopolistas, que se teriam aprestado, no imediato, a apresentar factura de apoios eleitorais facultados.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - E o nervosismo instala-se nas bancadas da direita:

O Sr. Carlos Macedo (PSD): - Que coisa horrível!

O Orador: - Dir-se-ia que juros altos estão a vencer juros não menos elevados, como é de "bom-tom" nas práticas anatocistas dos usurários da vossa praça.

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Há um Deputado que já treme.

O Sr. Teodoro da Silva (PSD): - De facto a tribuna abana!

O Orador: - Era preciso mais. Sôfrego, o Governo Sá Carneiro Freitas do Amaral não cessa de agredir os trabalhadores, de agredir a democracia, de destruir pólos de relançamento económico.

O Sr. Lacerda de Queirós (PSD): - Não apoiado!

O Orador: - E vem mais um expediente: a declaração de empresas públicas e nacionalizadas em situação económica difícil.
Como é público, contestámos o Decreto-Lei n.º 353-H/77, de 29 de Agosto, denunciámos os perigos que dele a adviria para os trabalhadores, sublinhámos as nossas fundas apreensões.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Por conveniência de serviço!...

O Orador: - Este instrumento legislativo, nas mãos deste Governo, vai ser, está já a ser, um meio de tentar o contrôle político-administrativo dos, direitos dos trabalhadores, designadamente o direito fundamental de greve.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Que medo!

O Orador: - Este instrumento legislativo, nas mãos de tal Governo, vai ser um meio de pôr em causa o direito ao trabalho, a estabilidade de emprego, os direitos e regalias adquiridos petos trabalhadores.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Que horror!...

O Orador: - Estou a falar de trabalhadores, é natural que o Sr. Deputado não entenda.

Aplausos do PCP.

E este instrumento legislativo, nas mãos de um Governo revanchista e totalitário...

Vozes do PSD: - Eh!...

O Orador: - ...vai ser um meio de perseguição política contra os trabalhadores mais combativos e mais conscientes.

O Sr. Lacerda de Queirós (PSD): - Não apoiado!

O Orador: - Este instrumento legislativo, nas mãos de um Governo golpista ...

O Sr. Luís Coimbra (PPM): - Que é isso?!

A Sr.ª Natália Correia (PSD): - É de mais, é uma linguagem feia!

O Orador: - ... vai ser um meio de pôr em causa as empresas d" sector público.
Este instrumento legislativo., nas mãos de um Governo dos monopolistas e latifundiários, vai ser um meio de intentar, pela via da instabilidade, a
entrega aos exploradores do nosso povo de empresas que escapem à iniciativa legislativa em apreço ou aqueloutra, já aprovada, que, ao revogar a Lei n. º 11/19, concorre no quadro da subversão do regime.
Com efeito, não é de mais sublinhar que nos termos do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 353-H/77, a declaração pode acarretar a adopção de medidas que poderão ir até à redução das condições de trabalho vigentes na empresa, aos mínimos fixados nos instrumentos de regulamentação colectiva, à não aplicação de outras cláusulas constantes dos mesmos instrumentos e à suspensão de contratos individuais de trabalho, a par de outras cujos limites só alcançam contornos ,em sede de discricionariedade.
A recente resolução do Conselho de Ministros que veio a público, relativa à Rodoviária Nacional, Empresa Pública Notícias/Capital e Radiodifusão Portuguesa frustra bem que o Governo nem se valerá ao preenchimento dos pressupostos dia situação económica difícil, constantes do artigo 2.º ou que então gerá-los-á dolosamente.
Ficou bem claro que para este Governo transformar os próprios poderes vinculados em discricionários, e estes em puro arbítrio, constitui mero exercício de prestidigitação. O objectivo que se subsume da resolução é o contrôle inconstitucional dos processos de luta dos trabalhadores, é a ameaça obtusa, é a tentativa de desarticulação de empresas integradas em sectores básicos, é a mordaça para a informação estatizada, é o império do arbítrio sobre a lei.
A resposta dos trabalhadores não se fez esperar. E ela é legítima, é patriótica.

Vozes do PSD: - Ui!

O Orador: - Merece o apoio solidário dos democratas e antifascistas, na razão inversa do repúdio que este Governo lhes suscita. Pela nossa parte tê-lo-á!

Vozes do PSD: - Que fúria!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Das bancadas da direita e de seu Governo exala-se o cheiro, fonte, a naftalina política.

O Sr. Teodoro da Silva (PSD): - Estás é cheio de traça!

O Orador: - Cuidando de ressalvar, antecipadamente, excepções, citarei um autarca do CDS para quem à AD é a União Nacional possível. Para não retirar genuinidade à afirmação produzida por terceiro, acrescentarei, pela minha paute, que se a União Nacional se tomou impassível, as suas versões possíveis virão a ser impossibilitadas pela luta crescente do povo português.

Aplausos do PCP e MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção tem a palavra o Sr. Deputado Luís Barbosa.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Ora aí vem um interessado!

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Ele ainda lhe arranja um lugarzinho!

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O Sr. Luís Barbosa (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Desde o início dos trabalhos desta Assembleia têm os partidos da oposição ressuscitado o estofado tema dos grupos económicos.
Durante o debate do Programa do Governo foi o Sr. Primeiro-Ministro claro a este respeito ao dizer que o Governo cumprira o seu Programa e não o dia oposição.
Não haverá privilégios para ninguém.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: O passado está enterrado, há que dedicar os nossos esforços a construir um futuro que queremos diferente, livre, democrático sem privilégios políticos, sem privilégios económicos. Antes de encerrar este assunto ainda uma palavra.
Na passada sexta-feira surgiram aqui alusões mais directas e insinuações a que quero dar uma resposta. Embora não atribua às insinuações grande relevância pretendo tratar o assunto com frontalidade.
Estou nesta Assembleia eleito pela população do distrito da Guarda.
Nos comícios em que participei sempre disse claramente quem sou, um empresário profissional, e de quem sou filho, de um muito modesto operário da OP. Da população do distrito da Guarda objectivo como resposta mais de 80000 votos.
Profissionalmente nunca trabalhei para pessoas mas sempre trabalhei para empresas. Nunca escondi, nem aos meus companheiros de partido, nem aos eleitores as empresas para as quais trabalhei ou trabalho.
No desempenho dia minha actividade profissional respeito e sou respeitado. No desempenho da minha actividade política respeitarei e exijo, igualmente, ser respeitado.

Vozes do CDS e PSD: - Muito bem!

O Orador: - Quero também aproveitar a oportunidade para expressar o meu apreço por todos os empresários que têm posto a sua energia e inteligência ao serviço do País, criando postos de trabalho, lançando empreendimentos que nos prestigiam internacionalmente, aceitando riscos e dissabores sem voltar a cara e sem se deixarem atingir pelo desânimo.
A intervenção aqui feita na sexta-feira não me fará criar complexos. Estou perfeitamente consciente do papel político dos empresários num Estado de direito democrático, dentro de uma filosofia em que os valores humanos são o fim último e a economia apenas um meio para os atingir, dentro de um contrôle do poder económico pelo poder político.
Se à estratégia de certos partidos convêm as alusões permanentes aos antigos grupos económicos, como tema de combate, teremos de as ouvir. Por minha parte considero o assunto encerrado.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Sr. Sousa Marques (PCP): - Isso era o que querias!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos numa hora de opções. Nos últimos anos a ruína crescente das finanças públicas teve como causas a destruição premeditada, o desvario revolucionário, as experiências falhadas, a falta de competência.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Não encerrou o passado!

O Orador: - É o preço de uma revolução, há que pagá-lo.
Mas não é possível continuar a marcha para o abismo por que enveredámos.
As reservas que gastámos foram fruto do sacrifício imposto pelo regime salazarista às. gerações que hoje auferem escassas reformas.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Diz mal do Salazar?!

O Orador: - Delapidámos as reservas acumuladas pelos» nossos pais. Teremos de dizer «basta» quando começamos a comprometer o futuro dos nossos filhos.
Repito: estamos numa hora de opções.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: No que respeita ao modelo de sociedade em que vai viver, Portugal tem à sua frente três alternativas:

Ser colonizado política e economicamente pela União Soviética;

Criar uma estrutura económica baseada em empresas públicas monopolistas e multinacionais;
Avançar decididamente para a integração no Mercado Comum.
Algumas tendências políticas optam claramente pela primeira alternativa, dada a sua manifesta adesão ao bloco soviético. Outras tendências oscilam entre a segunda e a terceira alternativas.
A Aliança Democrática optou pela integração económica europeia. De facto só esta alternativa pode representar uma forma segura de consolidar a democracia em Portugal. A Europa parece ter este mesmo entendimento.
As afirmações de que o poder político deve controlar o poder económico não passarão de meros processos de intenção se as estruturas económicas do País não forem diluídas em espaços mais amplos e contrabalançados nos seus poderes específicos.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Essa agora!

O Orador: - Portugal é um país pequeno. Meia dúzia de projectos como o anunciado projecto Ford porão esta Assembleia a discutir o sexo dos anjos por mais que qualquer dessas empresas sequeira abster de interferir nos negócios internos do País.
O próprio poder das empresas estatais na forma como hoje se apresenta é uma ameaça permante ao poder político, muito pouco favorável ao normal desenvolvimento de um regime democrático.
O assalto que os partidos da oposição fizeram aos conselhos de gestão dessas empresas para controlar os sectores básicos da economia, a utilização dessas empresas para satisfação de clientelas políticas são a prova da que afirmo e constituem indício claro do grau de politização do sector público.
Quando se discutem nesta Câmara os problemas da fronteira entre sector público e sector privado, ou a alienação dos bens das empresas nacionalizadas, as clientelas políticas estão apenas preocupadas com a

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manutenção dos seus lugares. Dizem-no sem rebuço. Perante tão grande coerência ideológica temos de nos curvar respeitosamente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É no alargamento dos espaços económicos, na diversificação das origens e dos detentores do investimento que o poder político encontra as formas práticas de supremacia, de progresso económico e de progresso democrático.
Quando um país tem uma declarada propensão para se fechar sobre si próprio, isolando-se, é natural que a expansão da iniciativa privada conduza rapidamente à formação de grupos económicos. Com um mercado restrito qualquer empresa dinâmica absorve rapidamente uma parcela importante desse mesmo mercado e resta-lhe como via normal de expansão a entrada em novos sectores da actividade, e a constituição de conglomerados de empresas. Assim, o peso que os grupos económicos representaram no passado está muito mais ligado à diversidade dos sectores ae actividade em que operavam do que à sua dimensão. Repare-se que um único grupo português entrava normalmente na lista das duzentas maiores empresas mundiais. Para lá chegai dispersava-se pelas mais variadas actividades.
Esta dispersão é inibitória de um desejável desenvolvimento tecnológico. Só uma empresa que cresce e ganha experiência em novos mercados, sobre uma mesma actividade, consegue a dimensão e a acutilância que lhe permitam desenvolver e aperfeiçoar tecnologias próprias.
Se não é aceitável que a formação de conglomerados de empresas represente uma certa asfixia a nível nacional também não nos podemos dar ao luxo de asfixiar o dinamismo e a capacidade de realização dos empresários.

O Sr. Rui Pena (CDS): - Muito bem!

O Orador: - A solução terá de passar por uma abertura ao exterior tanto no que respeita à concorrência no mercado nacional como ao estímulo para os empresários portugueses, com base em empresas nacionais, se implantarem em mercados estrangeiros.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!

O Orador: - A integração no Mercado Comum proporcionará a abertura ao exterior que preconizamos e evitará os aspectos eventualmente nocivos. É por esta via que os pequenos países da Europa têm processado a sua expansão. Não nos parece possível inventar outra.
Até porque se alguns grupos económicos foram desmantelados após o 11 de Março, como aqui afirmou ontem o Sr. Ministro Pinto Balsemão, outros perduraram e novos grupos vão lançando raízes dentro da fatalidade política e económica em que estruturalmente temos estado envolvidos desde há dezenas de anos e de que o 25 de Abril não nos conseguiu libertar. São as estruturas que estão erradas, são as estruturas que devem ser alteradas.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - A integração no Mercado Comum neste contexto representa uma importantíssima opção económica mas é ainda muito mais uma opção política.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Isto é mesmo pré-25 de Abril!

O Orador: - A abertura ao exterior passa também pelo nosso relacionamento com os países africanos e com os povos da América do Sul.
Portugal tem de partir de novo à descoberta do Mundo.
Desta vez, sem armas. Numa missão pacífica de entreajuda e solidariedade entre povos.
Nada disto é compatível com a miopia burocrática nem com os debate e políticos melodramáticos.
O que se anuncia é um programa de trabalho árduo de um povo que sabe o que quer e está determinado a pô-lo em prática.
A nossa posição de país intermédio nas escalas de desenvolvimento económico, a nossa capacidade de convivência racial, o nosso espírito de sacrifício e a capacidade de improvisação colocam-nos numa situação ideal para estabelecer pontes entre países desenvolvidos e subdesenvolvidos.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Somos um país com destino. Temos uma missão a cumprir.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: A alteração à lei de separação entre sector público e sector privado para a qual o Governo pede uma autorização legislativa tem de ser analisada nesta dimensão.
A lei tal como está é um obstáculo ao livre desenvolvimento da democracia económica e consequentemente da democracia política. Sem uma a outra estiola-se. Temos nesta matéria uma experiência de cinquenta anos.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - E alguns benefícios!

O Orador: - A alteração da lei é a primeira das medidas antimonopolistas que o Governo toma. Tem imediatamente um valor económico relativo mas t«m um significado político importantíssimo...

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Ah! pois tem!

O Orador: - ... tanto sob o ponto de vista nacional como internacional. É a afirmação categórica de um Governo que se sente democrático ...

O Sr. Sousa Marques (PCP): - Uma coisa é sentir-se, outra é ser-se!

O Orador: -... europeu, respeitador dos valores morais e culturais dos países livres do Ocidente.
Mas a alteração agora proposta é também uma medida indispensável de racionalização do sector público e um desafio ao sector privado que se quer economicamente saudável e socialmente responsável.
Não vale a pena discutir se as nacionalizações foram um bem ou um mais. É um facto que foram feitas e que são, de acordo com a Constituição, irreversíveis.
Só falta torná-las úteis.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Para os Melos!

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O Orador: - É essa a nossa preocupação dominante.
As empresas públicas terão de estar ao serviço do povo português e não ao serviço de certas forcas políticas.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Os Ministros e Secretários de Estado tem de deixar de ser super empresárias para se dedicarem às suas tarefas de Governo.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Os consumidores têm de ser defendidos.

O Sr. Rui Pena (CDS): - Muito bem!

O Orador: - As empresas têm de ser financeiramente saneadas e postos os gestores perante tarefas possíveis pelas quais terão de se responsabilizar.

O Sr. Rui Pena (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Quem quiser realmente defender o sector público empresarial terá de defender estes princípios. Se estes princípios não forem postos em prática o sector empresarial do Estado estará irremediavelmente condenado em termos de opinião pública e em termos de gestão dos recursos do Estado.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Para além disto, a alteração da Lei n.º 46/77, cuja autorização agora se discute, é a consequência natural do modelo de sociedade que as forças políticas que compõem a Aliança Democrática defendem. Nós acreditamos na concorrência, nos princípios da economia de mercado e nos valores democráticos que representam. Não somos socialistas de inspiração marxista, nem comunistas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não quero terminar sem dirigir aqui uma palavra de apreço a todos os gestores do sector empresarial do Estado que têm sabido pôr os interesses empresariais acima das manobrais político-partidárias. Vai para esta a nossa simpatia e o nosso apoio.
Para os restantes que fazem afinal da política a sua missão fundamental formulo um convite. Venham para esta Câmara que é o lugar próprio para fazer política.
Srs. Presidente, Srs. Deputados: Vamos cumprir as promessas feitas ao eleitorado. Vamos pôr em prática o nosso Programa de Governo.
Não haverá privilégios para ninguém.

Aplausos do CDS, PSD e PPM.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. 'Deputado Manuel dos Santos para um pedido de esclarecimento

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Será para um pedido de esclarecimento mas também para Mie dar um conteúdo de protesto. Parecer-me-ia que a intervenção do Sr. Deputado poderia eventualmente não merecer contestação da nossa parte se ela não reflectisse como reflecte - e nisso ela tem bastante mérito - a filosofia que está por detrás da apresentação, par parte do Governo, deste pedido de autorização legislativa para alteração da Lei n.0 46/77. Penso, no entanto, que o Sr. Deputado usou algumas expressões e referiu algumas circunstâncias, inclusivamente tentando identificar algumas situações, que não podem ficar sem resposta por parte da 'bancada do meu partido. Desta forma, começaria por lhe fazer uma pergunta: se o Sr. Deputado, que tanto falou, e nesse aspecto tem o meu apoio, no papel que os empresários portugueses tem desempenhado e podem vir a desempenhar mo processo de desenvolvimento do País, considera que os pequenos e médios empresários que são realmente a grande maioria dos empresários deste país- têm alguma coisa a ver com a abertura da banca ou dos seguros à iniciativa privada, e se estão, de alguma forma, interessados nisso.
Quanto às suas referências sobre a destruição premeditada e falta de competência que referiu em relação aos governos anteriores, eu perguntar-lhe-ia se também fazia esse juízo de valor relativamente PO Governo que constituiu o pré-ensaio do Governo da Aliança' Democrática, que foi o Governo Mota Pinto e ao Governo em que vocês próprios do CDS estiveram representados, o II Governo Constitucional. Pergunto se essa destruição premeditada aliás, considero extremamente grave a aplicação desta expressão - e a falta de competência também se aplicam a esses Governos e particularmente ao Governo Mota Pinto.
Gostaria também de protestar contra a afirmação várias vezes aqui reiterada - apesar de todos os desmentidos oficiais- sobre a incompatibilidade do nosso ordenamento jurídico com a integração europeia. Parece que já ficou demonstrado -aliás, se fosse preciso, as declarações do Sr. Lorenzo Natali no último fim-de-semana tinham-no provado...

O Sr. Macedo Pereira (CDS): - Não é isso que está em causal

O Orador: - ...que não existe incompatibilidade entre a actual lei que delimita os sectores público e privado da economia portuguesa e o ordenamento jurídico-económico das comunidades económicas europeias.
Portanto, a insistência com que as bancadas da maioria e em especial a bancada do CDS faz, nesta matéria, esta afirmação, levamos a pensar que se pretende de dentro para fora - isto é, do país para os negociadores que estão do outro lado, da CEE - pôr logo à partida um certo número de condições que de forma alguma os negociadores da CEE até agora levantaram e não levantarão com certeza. Gostaria também que sobre esta matéria o Sr. Deputado se pudesse pronunciar.
Finalmente, gostaria de referir que não nos parece bem pelo contrário - que a existência de sectores extremamente importantes vedados ao sector privado seja um obstáculo à democracia. Pelo contrário, na nossa opinião, a subordinação do poder financeiro e económico ao poder político só se pode fazer nas condições concretas, reais, conjunturais e, se quiserem, geográficas do País que nós somos, do

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País que é efectivamente Portugal. Só se pode fazer se determinadas indústrias de base, se determinados sectores económicos de base estiverem subordinados ao poder democrático, ao poder político-democrático. Parece-nos ser, pois, uma inversão de valores, uma inversão de juízos, a afirmação de que a existência de sectores vedados à iniciativa privada - sendo esses sectores obviamente os que; a lei define - constitui um obstáculo intransponível para a consolidação da democracia e sobretudo para a consolidação da democracia económica, que é um conceito que me parece não ser exactamente o mesmo que esteve na intervenção do Sr. Deputado do CDS.

O Sr. Presidente: - Ainda para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente, não é para um pedido de esclarecimento, mas para um breve protesto.
Na realidade, o Sr. Deputado Luís Barbosa, embora sem me fazer referência, citou duas vezes a minha intervenção da passada sexta-feira e fê-lo em termos que me merecem, de facto, o breve protesto que vou fazer.
O Sr. Deputado acusou-me de ter feito insinuações. Eu não faço insinuações, faço afirmações e acusações concretas. Foi o que fiz.
Não insinuei, por exemplo, que esta lei era a tradução da hegemonia do CDS dentro da coligação governamental, afirmei-o. A própria prova é o facto de a primeira intervenção na Assembleia por parte das bancadas parlamentares do Governo ser feita por um Deputado do CDS e logo por um Deputado exemplar do* CDS, como é o Sr. Deputado Luís Barbosa. Aí está, mais unia vez, a confirmá-lo com mais um sintoma.

O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Não é verdade, foi o PPM.

O Orador: - O PPM não faz parte da coligação governamental, é apenas unia muleta de apoio ao Governo.

Risos.

Que eu saiba, o Governo é PPD/CDS - ou CDS/PPD, melhor dizendo.

Não insinuei, acusei e afirmei que esta lei e esta discussão traduzem uma cedência directa a interesses privados muito marcados e que por detrás da invocação de interesses públicos o que está é a satisfação de interesses privados.
É certo que não citei nomes, mas o Sr. Deputado Luís Barbosa vêm-nos agora, pelo menos, satisfazer em parte essa ânsia de saber da Assembleia e do País. Sabemos, a partir de agora, um nome. O Sr. Deputado Luís Barbosa enfiou a carapuça. Não vou eu dizer que a enfiou mal, acho que a enfiou muito bem: Ó País e a Assembleia sabem-mo a partir de agora.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Ferreira do Amaral pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Ferreira do Amaral (PPM): - Sr. Presidente, era para um protesto; não sei se me é permitido.

O Sr. Presidente: - Com que fundamento, Sr. Deputado?

O Sr. Ferreira do Amaral (PPM): - Penso que a afirmação feita pelo Sr. Deputado Vital Moreira não corresponde à verdade e que atingiu o meu partido.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, parece-me que regimentalmente não tem direito a usar da palavra, mas atendendo à jurisprudência que há pouco se seguiu em relação ao Sr. Deputado Carlos Lage, quando da referência feita ao seu partido, a Mesa entende - em uniformidade de critério - poder conceder-lhe a palavra.
Em todo o caso, se não se importasse, por uma questão de disciplina, o Sr. Deputado Luís Barbosa com certeza quererá responder aos protestos que lhe foram dirigidos a V. Ex.ª usará da palavra a seguir.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Barbosa.

O Sr. Luís Barbosa (CDS): - Procurarei ser muito breve nas respostas a dar. Começarei pelo Sr. Deputado Vital Moreira. Diz ele que formulou acusações e eu pergunto-lhe se, ao dizer que o PPM é unia muleta da Aliança, faz uma acusação, uma insinuação ou como é que classifica.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Dá-me licença, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Eu creio que o PPM não faz parte da coligação governamental, porque não conheço no Governo nenhum membro do PPM. Por isso é que digo que é uma muleta parlamentar do Governo CDS/PPD.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Provocador como sempre.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Mas sem graça!

O Orador: - Pois, Sr. Deputado Vital Moreira, eu próprio poderia dizer mais alguma coisa quanto às tentativas que têm vindo a ser feitas, desde o início, para que eu fale. E eu falei. Tinha mais alguns dados concretos para acrescentar acerca de pessoas presentes e não presentes nesta Câmara e fazer alguns termos de comparação com a minha própria .pessoa, mas disse, na minha intervenção, que pela minha parte considerava o assunto encerrado.
Sr. Deputado Vital Moreira, peço-lhe desculpa de não cumprir as regras do seu jogo, cumpro as do meu. O assunto para mim está encerrado.

Aplausos do CDS e da Sr.ª Deputada Natália Correia (PSD).

Vozes do PCP: - Para nós não está.

O Orador: - Com certeza, é o vosso direito democrático e eu respeitá-lo-ei. Quero só dizer que não

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fugi ao debate, aqui estive e encarei-o frontalmente como referi. Isso é uma coisa, outra é fazer as regras do jogo dos adversários e neste caso o Sr. Deputado Vital Moreira está do outro lado.
No que respeita às perguntas que me foram dirigidas pêlo Sr. Deputado do Partido Socialista, queria dizer o seguinte: na minha intervenção afirmei...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço desculpa de o interromper, mas desejava chamar a atenção da Assembleia de que, embora tenhamos neste momento uma margem ainda confortável de presenças a assegurar o quórum, resolvemos trabalhar até is 21 horas e 30 minutos e seria conveniente que o assegurássemos até essa mesma hora.
Pareceu-me oportuno fazer agora esta intervenção e peço-lhe desculpa, por isso, Sr. Deputado.

O Orador: - Dizia eu que na minha intervenção referi que nos últimos anos a ruína crescente das finanças públicas teve como causas a destruição premeditada, o desvario revolucionário, as experiências falhadas, a falta de competência. Não referi nenhum Governo, nenhuma força política em particular, este porque considero que a experiência que vivemos não pode deixar de ser uma interacção permanente entre várias forcas políticas, Governos, os poderes que esses Governos tinham, a capacidade que tinham para governar e as possibilidades que o próprio contexto social e político de cada momento permitiam. Não acusei ninguém; se o Sr. Deputado se ressentir, julgo que não terá sido pelas minhas afirmações.
Quanto ao problema do sistema financeiro e de independência desse sistema face ao poder político, eu considero que esta Câmara tem realmente uma fraca concepção do poder político. Entende-o sempre de uma forma extremamente débil porque o poder político está constantemente ameaçado, na boca de uma parte importante dos Srs. Deputados desta Câmara. Parece-me que, no fundo, isto representa uma falta de convicção daquilo que deve ser o poder político...

O Sr. Rui Pena (CDS): - Muito bem!

O Orador: - ...que não podemos deixar de aqui registar e de combater porque em qualquer Estado democrático - e às vezes oiço aqui alguns comentários que me parece que estou não sei em que país...

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Não sabe, não!

O Orador -... um país de abstracções, porque quando chegámos à Europa, à Europa para a qual a maioria democrática deste Parlamento quer caminhar, naturalmente que nós encontramos os modelos à vista, não é preciso andar a fazer longas pesquisas. £ não me consta que em país algum da Europa bancos privados ou bancos do Estado não sejam controlados pelo poder político. Acho que todos são controlados pelo poder político.
Esse é o erro. E devo até dizer o seguinte: é que realmente durante o regime salazarista pôde acusa-se o Salazar de muitas coisas mas nunca de alguma vez ter prescindido do poder político em favor de quem quer que fosse, do poder económico, do poder militar
ou mesmo das oposições que nunca conseguiram fazer mais, no seu tempo, do que golpes de Estado frustados. Esta é uma realidade que temos de entender. E parece-me que a realidade está nisto o poder político tem de ser reforçado, tem de controlar efectivamente o poder económico e não só. Tem de controlar outros poderes, pois parece-me que esse é, na realidade, o fundamento da própria democracia.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Mais claro não se pode ser!

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Dá-me licença, que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Agradeço a elevação com que está a responder às minhas questões mas gostaria só de chamar a atenção para o facto de que me não parece muito legítimo que, com tanta frequência, por todos os Deputados da bancada da maioria, sejam focados os exemplos existentes na Europa, pois que não serão perfeitamente caracterizados como o Sr. Deputada Luís Barbosa o fez, mas que de qualquer forma me parecem ser menos importantes para o caso.
Efectivamente, e como aliás há pouco foi referido pelo meu camarada António Guterres, a situação dos países do Sul da Europa é completamente diferente. O processo de acumulação capitalista e financeira neste país fez-se de outra forma. Aliás, o Sr. Deputado acabou de referi-lo agora ao falar no regime salazarista. A nós parece-nos que, na situação concreta e real do País que somos, é importante, é imprescindível, é mesmo fundamental - para que haja essa tal subordinação do .poder económico-financeiro ao poder político - que os processos de acumulação financeira, maxime a banca e os seguros, estejam efectivamente controlados pelo poder político. Não me parece curial, nem muito lógico, que se faça a comparação que os Srs. Deputados fazem sistematicamente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Barbosa, descontado o tempo das interrupções dispõe de um minuto.

O Sr. Luís Barbosa (CDS): - Com certeza, Sr. Presidente, vou acabar.
Queria dizer que quanto ao contrôle do poder político sobre a banca não tenho nenhuma dúvida. Estou perfeitamente de acordo com o Sr. Deputado. Quanto ao modelo de sociedade para o qual vivemos aí julgo que estaremos em desacordo. Isso não é novidade, de contrário estaríamos sentados na mesma bancada e não estamos.
Quanto ao problema da integração europeia, não tenho tempo para o tratar, mas sê-lo-á ainda nesta sessão ou amanhã. No entanto, independentemente daquilo que os acordos com o Mercado Comum possam ou não permitir, parece-me que há outro problema muito mais importante: é que este é o modelo de sociedade que a Aliança Democrática defende.
Defendemos um sistema de economia de mercado igual ao da Europa, da República Federal da Alemanha, com o qual o vosso partido tem tantas rela-

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coes de amizade e de vário tipo. Não queremos algo de diferente, queremos a mesma coisa. Não vamos inventar nada, acho que em Portugal já se gastou todo o dinheiro e todo o tempo que havia para tentar descobrir um novo modelo de sociedade. Alguém uma vez sugeriu que deveria ser alguma coisa entre a Suécia e a Jugoslávia. Passados cinco anos, não encontrámos nenhum modelo novo, então o melhor 5 aproveitarmos um dos antigos, porque com certeza é isso que a população portuguesa espera.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Tem agora a palavra o Sr. Deputado Ferreira do Amaral. Pedia-lhe o favor de ser breve.

O Sr. Ferreira do Amaral (PPM): - Sr. Presidente, vou ser telegráfico.
Pedi a palavra para protestar contra a afirmação feita pelo Sr. Deputado Vital Moreira de que o PPM não era um partido da coligação governamental, mas uma simples muleta.
Vou protestar por três razões: primeiro, porque o PPM é um partido solidário com este Governo, como o afirmou pela votação no voto de confiança, sendo, portanto, solidariamente responsável com ele e solidariamente participante da coligação governamental; segundo, porque uma muleta é um objecto inerte e o PPM julga não ser um objecto inerte no conjunto da maioria parlamentar.

Vozes do PSD e do PPM: - Muito bem!

O Orador: - Terceiro, porque essa afirmação pressupõe que o Governo está coxo e penso que este Governo está, felizmente, são.

O Sr. Lino Lima (PCP): - É uma muleta articulada!

Risos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente, concedo que, de facto, o PPM não é uma muleta inerte. Tem alguma dinâmica. Felizmente!

Risos.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Veiga de Oliveira.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quando em Maio de 1977 aqui interviemos no debate do qual sairia a Lei n.º 46/77, também conhecida por lei de delimitação dos sectores público e privado, nunca imaginámos que as portas então entreabertas ao grande capitai pela aliança PS/PPD viessem a ser, volvidos menos de três anos, completamente franqueadas por uma equívoca maioria desta Assembleia.
A proposta de autorização legislativa e os esclarecimentos dados por escrito e oralmente pelo Governo tem um duplo carácter que importa analisar e desvendar. O Governo furta-se à discussão das soluções concretas não enviando a proposta de lei ou mesmo o projecto de decreto-lei quê pensa fazer publicar ao abrigo da autorização legislativa. E furtando-se à discussão evita ser confrontado com propostas de alteração que por serem aceites ou recusadas no todo ou em parte, melhor esclareceriam os verdadeiros propósitos e objectivos da sua iniciativa. Furtando-se à discussão evita também a argumentação de natureza política e constitucional, à qual só o conhecimento preciso dos textos daria total credibilidade e eficácia.
Mas o Governo da AD visa mais longe, mais do que a simples abertura ao grande capital dos sectores-chave da economia e em primeiro lugar da banca! Com uma candura insuspeitada, invoca-se a si próprio, diz que se trata de «dar seguimento ao estabelecido no seu programa» e diz-nos que fará um decreto-lei que se promulgado e publicado não só significaria a revogação da Lei n.º 46/77 mas mais do que isso significaria retirar-lhe todo o conteúdo, mantendo-a como um invólucro vazio, obtendo por tabela o esvaziamento das normas constitucionais que a Lei n.º 46/77 deveria acautelar. É que abrindo-se completamente o exercício da actividade bancária e dos seguros ao grande capital e eliminando-se todos os entraves à invasão dos sectores básicos quer Directamente através do direito de novos estabelecimentos e participações, quer de forma ainda mais monstruosa e lesiva, propiciando os estabelecimentos públicos à exploração e gestão do grande capital, cria-se uma situação em que a ausência de lei seria melhor do que a sua existência. De facto, o Governo começou por se invocar a si próprio mas conseguida, se o conseguir, a publicação de um tal decreto-lei acabará por invocar a lei para afrotosamente atentar contra a Constituição e preparar o caminho para a destruição de uma das principais conquistas de Abril - a liquidação dos juros monopolistas cujo domínio terrorista constituía a essência da ditadura de Salazar-Caetano.
No discurso introdutório do Governo adiantam-se alguns elementos reveladores que valerá a pena referir. Assim, o Ministro qualificado para o efeito, afirmando a despropósito e com relapsa candura que não haverá desnacionalizações, procura reduzir a questão da constitucionalidade à repartição das competências legislativas entre a Assembleia da República e o Governo. A técnica é conhecida, construir um castelo de cartas e derrubá-lo de um só golpe sem se escusar mesmo à citação de conhecidos constitucionalistas. Ninguém arguiu de inconstitucional a apresentação de propostas de autorização legislativa por parte do Governo. Quanto a este ponto, a nossa crítica é justa, mas essencialmente política. A questão de inconstitucionalidade que se coloca só decorre de o Governo pretender através de decreto-lei autorizado riscar da Constituição o seu artigo 83.º
Fala depois do relançamento do investimento sem dizer em quê, com que meios e objectivos. Sempre em tom leve e algo rápido refere o que poderíamos classificar como «outros defeitos e responsabilidades do sector público», e sem mais passa à grande mola real ao suposto estimulante que faltaria para uma melhor eficiência das empresas públicas - sem rir - a concorrência.
Chegado aqui o Governo, através de um Ministro qualificado afirma, pasme-se, trata-se de «passados alguns anos, se concretizar com coragem e realismo, o

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objectivo do PS». Espantoso! Porque o único objectivo que com evidência podemos atribuir ao PS é aquele que se consubstancia na Lei n.º 46/77 votada aliás pelo PS e PSD. Ora tal lei, pesem as deficiências e mesmo graves cedências, e ainda assim uma lei de delimitação dos sectores público e privado visando regulamentar as normas constitucionais sobre o assunto, e o que nos propõe o Governo é o seu esvaziamento completo que melhor se poderia conseguir com a sua substituição por uma lei muito simples, onde se estipulasse:

Artigo 1.º Doravante nenhum domínio ou sector da economia é vedado ao grande capital, nacional, estrangeiro ou em associação de grupos económicos, incluindo as multinacionais;
Artigo 2.º Em casos de dúvida o Governo intervirá por forma a garantir completamente o disposto no artigo anterior;
Artigo 3.º Fica expressamente revogado o artigo 83.º da Constituição da República! Ê esta a essência da proposta de lei que o Governo anuncia para preencher a autorização legislativa que pede a esta Assembleia.
Como, pois, invocar o objectivo do PS? E porquê, nas actuais condições, uma tal muleta? É evidente que os partidos da AD e o seu Governo pretendem fugir às; responsabilidades e projectar no presente passadas cumplicidades de alianças agora recusadas...

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Não apoiado!

O Orador: - Mas o Governo continua em frente, aposta-se em «desmistificar», «c, o espantalho do «regresso» que a oposição agita e depois de algumas frases de sabor propagandístico, diz-nos finalmente, como argumento absoluto, o que todos já sabíamos mas que vale a pena ouvirmos de um ministro da AD. Cito: «E os próprios empresários privados, na sua esmagadora maioria, serão os primeiros a não estar interessados no apregoado regresso.» Já o sabíamos, Sr. Ministro, e têmo-lo repetido incansavelmente. Na sua esmagadora maioria os empresários privados são os pequenos e médios comerciantes e industriais portugueses, que estão interessados objectivamente na defesa e consolidação do regime democrático-constitucional. Na sua esmagadora maioria os empresários privados são os pequenos e médios comerciantes e industriais portugueses, que estão interessados na resolução dos seus problemas mais agudos - crédito, taxas de juro, aquisição de matérias-primas, escoamento de produtos, apoio técnico e tecnológico, margens de comercialização, etc. -, e que olham com justificado temor e reprovação as aventuras políticas ligadas com a entrada na CEE.
Certo, Sr. Ministro, na sua esmagadora maioria, os empresários privados são os pequenos e médios comerciantes e industriais portugueses que honradamente procuram contribuir para a produção e o progresso do País e não aspiram, nem podem aspirar, à constituição de um banco, ao estabelecimento de uma nova siderurgia ou cimenteira, ou a criação de um complexo petroquímico ou adubeiro.
Muito bem? E a ínfima minoria dos empresários privados? Quem são? Com o risco de esquecer alguns posso começar a adiantar nomes - Melos, Champalimaud, Quinas, Espíritos Santos, etc...., talvez mais uma ou duas dezenas. Esmagadora minoria, sem dúvida, mas é esta minoria esmagadora de grandes ex-monopolistas que oprimiram, exploraram e tripudiaram Portugal durante quase meio século de ditadura. São eles e os seus sócios imperialistas que poderão abrir novos bancos, estabelecer novas cimenteiras, comer por dentro as empresas e a banca nacionalizadas, tentar destruir a democracia e regressar ao 24 de Abril, e tudo isto, por acréscimo, utilizando os milhões de contos de títulos de indemnização que são o resultado das fortunas amassadas com o sangue e o suor de muitas gerações de portugueses.
É para esta ínfima minoria de empresários privados, na classificação do Sr. Ministro, que o decreto-lei do Governo da AD se fará. Isso bastaria para fazer dele uma lei iníqua e isso basta também para compreender o que faz correr a AD e o seu Governo, isso basta para perceber o que faz perder a serenidade a gente habitualmente tão «distinta», como se verificou na última sessão.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: São conhecidas as reservas da Comissão Constitucional quando apreciou há cerca de 3 anos a actual lei de delimitação dos sectores público e privado e é duvidoso ou mesmo certo que qualquer alteração que aumente a sua permissividade será intolerável ainda que com um entendimento razoavelmente elástico idas normas constitucionais. Ora os anunciados propósitos da AD e do seu Governo conduziriam não a uma lei permissiva, mas à total revogação do sentido e da letra da Constituição. Sendo assim e excluindo obviamente qualquer ingenuidade do Governo e dos partidos que o apoiam, impõe-se reconsiderar os objectivos da manobra. Obtida a autorização legislativa o Governo aprovará o seu decreto e enviá-lo á para promulgação. Se, dada a matéria' e os antecedentes, for, como é razoável, pedida a verificação prévia de constitucionalidade, então de duas uma, ou a AD e o seu Governo conseguem por métodos ínvios e inconfessáveis que a constitucionalidade lhe não seja negada, ou se for nega-o a, como parece ser obrigatório, o Governo terá ganho mais uma peça forte no conflito institucional que afanosamente procura para justificar os seus verdadeiros planos de golpe anticonstitucional e antidemocrático.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - É falso!

O Orador: - Nós vimos de longe e temos raízes lançadas fundo na luta do povo português contra a opressão e a exploração. E cada Primavera que chega e por nós passa encontra-nos sempre do mesmo lado.

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Do lado e ao lado dos trabalhadores e das restantes camadas laboriosas do povo, labutando e lutando em defesa de uma pátria democrática, por um Portugal mais justo, próspero e feliz. Tenazes e fiéis à causa do povo e da democracia, os comunistas lutarão, aqui na Assembleia da República, junto dos Órgãos de Soberania, nas eleições e ombro a ombro com as massas populares em luta por melhores condições de vida e em defesa das liberdades democráticas e das restantes conquistas de Abril.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Muito bem!

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O Orador: - Perderemos certamente a votação nesta Assembleia, mas os votos aqui perdidos multiplicar-se-ão por milhares de votos ganhos nas próximas eleições.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Veremos!

O Orador: - Para vós, para os partidos da AD e para o seu Governo, ficará o ferrete de terem abusado das promessas ao eleitorado e de pretenderem destruir a democracia e o 25 de Abril, objectivo que, estamos certos, não conseguirão.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, seguir-se-ia no uso da palavra o Sr. Deputado Sousa Tavares. Como não se encontra na Sala pergunto a algum dos Srs. Deputados Reformadores se deseja usar agora da palavra.

O Sr. Nuno Godinho de Matos (DR): - Sr. Presidente, como o meu colega de bancada não está presente e eu próprio estou inscrito para usar da palavra neste debate, pedia-lhe para trocar a ordem das inscrições.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, as duas inscrições são contíguas. O Sr. Deputado usaria da palavra imediatamente a seguir ao Sr. Deputado Sousa Tavares.
Tem, portanto, a palavra o Sr. Deputado Nuno Godinho de Matos.

O Sr. Nuno Godinho de Matos (DR): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O objectivo principal dos subscritores do Manifesto Reformador é procurarem contribuir, ou consiste em procurar contribuir, para que em Portugal se consiga criar uma sociedade mais livre, onde as classes sociais com menor capacidade de consumo, com menor capacidade de compra, tenham acesso aos benefícios do consumo e vejam fortalecidas a sua posição económica e a sua posição social.
Desejamos, assim, que em Portugal, de uma vez para sempre, se afastem e se controlem por completo todos os desejos de restauracionismo e toda as hipóteses de tentativa para se procurar restabelecer um regime em que não existam as garantias de liberdade aos diferentes cidadãos, em que se possam voltar a levantar as sombras de tribunais plenários, do lápis azul dos censores, em que não se respeitem os direitos da oposição e as garantias que têm de ser dadas a qualquer oposição e a qualquer Governo.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Pensamos que a liberdade que foi conquistada terá de ser mantida, e será seguramente mantida. Mas se isso é assim, também não queremos que volte a surgir em Portugal o espectro da legislação - tentativa essa feita depois da conquista da liberdade - que tentou criar o tribunal revolucionário do 11 de Março que mais não era do que um novo tribunal plenário de sentido inverso.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Desejamos garantir, desejamos ter a certeza que os princípios fundamentais da liberdade não voltarão a ser postos em causa e julgamos que a votação da autorização legislativa, que agora o Governo solicita, pode contribuir para esse desiderato. Na nossa opinião não existirá liberdade, nem existirá possibilidade de justiça social, nem de dar uma maior faculdade de acesso aos bens materiais que dão o conforto e a comodidade aos homens, se a riqueza nacional, se o desenvolvimento económico no nosso país não se transformar numa realidade.
Como admitimos que a alteração da lei da delimitação dos sectores público e privado pode ser uma alavanca, pode ser um instrumento importante, no relançamento do desenvolvimento da actividade económica nacional e pode vir a possibilitar a criação de novas unidades económicas e de novos empreendimentos, estamos convictos de que, dando condições a que essa lei de delimitação dos sectores público e privado seja alterada, estamos a contribuir, pelo menos, para que seja mais amplo, para que seja mais larga, o espectro das 'possibilidades -pelo menos ao nível das possibilidade - de a riqueza nacional vir a aumentar e por essa via poder vir a assistir-se 'a um aumento das condições de subsistência e das condições materiais d» todos os portugueses.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Que querubim! Que erudito!

O Orador: - Desejamos que em Portugal se defina com clareza um modelo económico onde as regras de acção e de iniciativa do sector privado estejam delimitadas com muita segurança e onde os empresários, ou os indivíduos que se dedicam à iniciativa económica, não tenham quaisquer dúvidas sobre as suas garantias e sobre a possibilidade que se abre à sua capacidade empreendedora.

O Sr. Ferreira do Amaral (PPM): - Muito bem!

O Orador: - Pensamos que isso é essencial porque não sabemos muito bem qual teria sido a capacidade de subsistência de iodos os portugueses se em Portugal, no período que sucedeu à libertação do nosso país, não tivessem continuado a 'existir empresas que garantiram os postos de trabalho. Foram essas empresas que possibilitaram à esmagadora maioria dos trabalhar dores do nosso país ganhar diariamente os bens indispensáveis ao sustento das suas famílias. Por isso, e se esta situação é uma realidade facílima de constatar - aliás, é quase um lugar comum e é quase supérfluo falar nela -, por que motivo se poderá discutir que sejam dadas a essas empresas a faculdade de alargarem o seu âmbito e a faculdade de entrarem em campos da actividade económica onde até ao' momento lhes está cercada essa mesma faculdade?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Pensamos que esse abrir de caminhos que até ao momento tem catado vedados ao sector privado só vem de facto possibilitar, ou criar a possibilidade, de se enriquecer no nosso país.
Também julgamos, e estamos seguros que assim será feito, que esse alargamento de caminhos, que esse rasgar de novas iniciativas - provocado pela revisão da lei de delimitação dos dois sectores - que se vai dar aos empreendedores privados, não pode ser feito à

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custa de uma degradação das condições sociais e à custa de um maior sacrifício dos trabalhadores e daqueles que diariamente, juntando o seu esforço e a sua capacidade de trabalho, também contribuem para o enriquecimento dessas unidades económicas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Queremos que o alargamento da iniciativa privada se verifique, «mas queremos que ele tenha forçosamente uma contrapartida e uma consequência: assistir-se a um melhoramento das condições de vida e das condições sociais de subsistência dos trabalhadores do nosso país.

O Sr. Moura Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Desejamos assim que esta lei seja revista, desejamos assim que a iniciativa privada veja novas fronteiras nos limites da sua actividade, não para que única e exclusivamente os seus lucros aumentem e é bom que aumentem - mas para que também aumente a redistribuição social, também aumente a riqueza de todos os que trabalham.

Aplausos do PSD, do CDS, do PPM e do Deputado reformador Medeiros Ferreira.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Godinho de Matos, pode informar-me sobre se o Sr. Deputado Sousa Tavares está presente na Assembleia ou se eventualmente desejará reservar o não da palavra para amanhã?

O Sr. Godinho de Matos (DR): - De facto, Sr. Presidente, o meu colega não se encontra presente, donde eu julgar que talvez seja melhor reservar-lhe o uso da palavra para amanhã, se for possível.

O Sr. Presidente: - Se a Assembleia não vir inconveniente nisso...

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Está a obstruir os trabalhos por ausência!

O Sr. Carlos Lage (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente,

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penso que se o Sr. Deputado Sousa Tavares reserva a palavra para amanhã deve ser o primeiro a intervir e não o último.

O Sr. Presidente: - Então, se ninguém se opõe, considera que o Sr. Deputado Sousa Tavares beneficia de um adiamento que a Assembleia lhe concede até à sua presença. Assim, logo que esteja presente usará da palavra como usaria agora.

O Sr. Sousa Marques (PCP): - Esperemos que ele não chegue no fim ...

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Luis Coimbra.

O Sr. Luís Coimbra (PPM): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como até aqui, 'neste debate, no fundo apenas temos assistido a uma discussão entre a delimitação de mitos e realidades e entre* perspectivais possíveis e fantasmas, prefiro prescindir dia palavra.

O Sr. Sousa Marques (PCP): - Mas olhe que foi a sua melhor intervenção...

Risos.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Porque era a que tinha maior razão.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, pelo que me é dado observar nem o Sr. Deputado Ângelo Correia nem o Sr. Deputado Vítor Constâncio se encontram presentes, e eram dês os próximos oradores pela ordem de inscrições...

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, se me permite, penso que a melhor solução é encerrar o debata e reiniciá-lo amanhã, tal como estava convencionado.
Aliás, isto provou-nos o seguinte: não se trata, na minha opinião, de desatenção por parte dos Deputados que estavam inscritos mas apenas do facto de os trabalhos se terem processado com mais rapidez do que* o que nós estiávamos a prever.
Ninguém na conferência dos líderes parlamentares estava a prever que hoje fosse possível esgotar a lista de inscrições que havia.
Portanto, proponho ao Sr. Presidente que d& a sessão por encerrada e que amanhã se reinicie a discussão com os oradores que quiserem usar da palavra e que estavam inscritos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Castro Caldas.

O Sr. Castro Caldas (PSD): - É para pedir à Mesa que me informe sobre quantos oradores estão inscritos.

O Sr. Presidente: - Exactamente aqueles que foram sucessivamente anunciados, Sr. Deputado.
Segundo o critério que usámos o Sr. Deputado Sousa Tavares tem a palavra reservada, o Sr. Deputado Luís Coimbra prescindiu de a usar e estão ainda inscritos os Srs. Deputados Ângelo Correia e Vítor Constâncio. Não há mais inscrições além destas.
Em síntese, estão ainda inscritos os Srs. Deputados Sousa Tavares, Ângelo Correia e Vítor Constâncio.
Tem a palavra, Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, é apenas para lhe recordar que isso não significa que não possa haver novas inscrições, embora dentro das limitações que hoje foram indicadas na conferência dos representantes dos grupos parlamentares.
O meu partido disse que poderia fazer duas intervenções, mas não reduziu estritamente as suas intervenções a duas.
Por conseguinte tem de ser deixada esta flexibilidade para amanhã.

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964 I SÉRIE - NÚMERO 23

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, efectivamente as intervenções que se previam para hoje foram menos morosas do que seria de prever e nessas condições, se a Câmara concorda...

O Sr. Pedro de Vasconcelos (CDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro de Vasconcelos (CDS): - Sr. Presidente, pedi a palavra para perguntar à Mesa se o consenso que foi obtido de que amanhã a votação se fará por volta das 12 horas e 45 minutos ou até às 13 horas ficou prejudicado por esta alteração da ordem dos trabalhos, ou se mantém.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa entende que a votação deveria seguir-se ao encerramento do debate, mas não é menos verdade que se estabeleceu um consenso no sentido de que a votação se realizará cerca das 12 horas e 45 minutos, o que pode ter confundido alguns Srs. Deputados na presunção de que será a essa hora que se faz a votação.
Nessas circunstâncias, veremos amanhã o ritmo a que correm os trabalhos e oportunamente teremos ocasião de decidir, tomando como certos estes dados.
Estabeleceu-se para amanhã um debate sem existência de período de antes da ordem do dia na presunção de que os trabalhos ocupariam toda a manhã e por isso até antecipámos a hora da chamada. Porque esse consenso se mantém, começaremos a chamada às 9 horas e 30 minutos e, conforme os trabalhos forem decorrendo, se necessário, trocaremos impressões em nova reunião de representantes dos grupos parlamentares, para que não haja prejuízo para ninguém de uma eventual aceleração do debate e da sua condução.
Fica, pois, assente que o consenso foi o. que V. Ex.ª definiu, Sr. Deputado Pedro Vasconcelos.
Nestes termos declaro encerrados os trabalhos por hoje.

Eram 20 horas e 50 minutos.

Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Social-Democrata (PSD)

Amândio Anes de Azevedo.
Amélia Cavaleiro M. de Andrade de Azevedo.
António Alberto Correia Cabecinha.
António Duarte e Duarte Chagas.
António José Ribeiro Carneiro.
António Maria Pereira.
Carlos Manuel Pereira de Pinho.
Cecília Pita Catarino.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Eleutério Manuel Alves.
Fernando José da Costa.
Fernando Raimundo Rodrigues.
Germano Lopes Cantinho.
Germano da Silva Domingos.
Jaime Adalberto Simões Ramos.
João Baptista Machado.
João Vasco da Luz Botelho de Paiva.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Joaquim Marques Gaspar Mendes.
Jorge Rook de Lima.
José Ângelo Ferreira Correia.
José da Assunção Marques.
José Manuel Meneres Sampaio Pimentel.
José Theodoro da Silva.
Manuel António Araújo dos Santos.
Manuel António Lopes Ribeiro.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Manuel Pereira.
Maria Adelaide Santos de Almeida Paiva.
Maria Helena do Rego da C. Salema Roseta.
Marília Dulce C. P. Morgado Raimundo.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Mário Marques Ferreira Maduro.
Natália de Oliveira Correia.
Nicolau Gregório de Freitas.
Rui Alberto Barradas do Amaral.
Valdemar Cardoso Alves.

Partido Socialista (PS)

Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Rodrigues Ferreira Gamboa.
António de Almeida Santos.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Chaves Medeiros.
António Duarte Arnaut.
António Fernandes da Fonseca.
António Fernando Marques R. Reis.
António Manuel Maldonado Gonelha.
António Manuel de Oliveira Guterres.
Avelino Ferreira Loureiro Zenha.
Beatriz M. de Almeida Cal Brandão Bento.
Elísio de Azevedo. Edmundo Pedro.
Fernando Luis de A. Torres Marinho.
Francisco de Almeida Salgado Zenha.
Francisco Igrejas Caeiro.
Frederico A. F. Handel de Oliveira.
Herculano Rodrigues Pires.
João Cardona Gomes Cravinho.
Joaquim José Catanho de Meneses.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Luís Silvério Gonçalves Saias.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Francisco da Costa.
Mania Emília de Melo Moreira da Silva.
Teófilo Carvalho dos Santos.
Victor Manuel Gomes Vasques.
Victor Manuel Ribeiro Constâncio.
Victor Manuel R. Fernandes de Almeida.

Partido Comunista Português (PCP)

Alberto Jorge Fernandes.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
Joaquim Victor Baptista G. de Sá.
José Ernesto I. Leão de Oliveira.
José Manuel da Costa Carreira Marques.
José Rodrigues Vitoriano.
Lino Carvalho de Lima.
Manuel Gaspar Cardoso Martins.
Maria da Conceição Morais Matias.
Rosa Maria Reis A. Brandão Represas.
Victor Henrique Louro de Sá.
Zita Maria de Seabra Roseiro.

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Centro Democrático Social (CDS)

Alfredo Albano de C. de Azevedo Soares.
António Martins Canaverde.
Domingos da Silva Pereira.
Emídio Ferrão da Costa Pinheiro.
Eugénio Maria Anacoreta Correia.
Francisco António Lucas Pires.
Henrique José C. de Meneses P. Moraes.
Henrique Manuel Soares Cruz.
Isilda Silva Barata.
João José Magalhães F. Pulido de Almeida.
José Augusto Gama.
Luís António Matos Lima.
Luís Carlos C. Veloso de Sampaio.
Luís Eduardo da Silva Barbosa.
Luís Filipe Pais Beiroco.
Luís Gomes Moreno.
Manuel Baeta Neves.
Maria Tabita L. F. Mendes Soares.
Narana Sinai Coissoró.
Pedro António J. B. Pestana Vasconcelos.
Rui Eduardo F. Rodrigues Pena.
Victor Afonso Pinto da Cruz.

Partido Popular Monárquico (PPM)

António José Borges G. de Carvalho.

Agrupamento Parlamentar dos Reformadores

Francisco José de Sousa Tavares.
José Manuel Medeiros Ferreira.
Nuno Maria Monteara Godinho de Matos.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE)

Helena Tâmega Cidade Moura.
Herberto de Castro Goulart da Silva.

Deputados que faltaram à sessão:

Partido Social-Democrata (PSD)

Alcino Cabral Barreto.
António José dos S. Moreira da Silva.
António Maria de O. Ourique Mendes.
Armando António Correia.
Arménio dos Santos.
Daniel da Cunha Dias.
Fernando dos Reis Condesso.
Fernando José Sequeira Roriz.
José Bento Gonçalves.
José Maria da Silva.

Partido Socialista (PS)

Alberto Arons Braga de Carvalho.
António Cândido de Miranda de Macedo.
Armando Filipe Cerejeira P. Bacelar.
Armando dos Santos Lopes.
Carlos Alberto Costa de Sousa.
Carlos Manuel Natividade Costa Candal.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Fernando Alves de Almeida Miranda.
Francisco Cardoso P. de Oliveira.
Jaime José Matos da Gama.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
José Gomes Fernandes.
José Luís do Amaral Nunes.
José Maria Parente Mendes Godinho.
Luís Abílio Conceição Cacito.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Manuel Joaquim de M. P. Tavares Santos.
Manuel José Bragança Tender.
Maria Teresa V. Bastos Ramos Ambrósio.
Mário Alberto Nobre Lopes Soares.
Rodolfo Alexandrino Susano Crespo.
Rui Fernando Pereira Mateus.

Partido Comunista Português (PCP)

Álvaro Barreirinhas Cunhal.
António Dias Lourenço da Silva.
Carlos Alfredo de. Brito.
Dinis Fernandes Miranda.
Domingos Abrantes Ferreira.
Joaquim Gomes dos Santos.
José António Veríssimo Silva.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.

Centro Democrático Social (CDS)

Adalberto Neiva de Oliveira.
Américo Maria Coelho Gomes de Sá.
Carlos Alberto Faria de Almeida.
Eduardo Leal Loureiro.
Francisco Gonçalves Cavaleiro de; Ferreira.
João da Silva Mendes Morgado.
Joaquim Rocha dos Santos.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
Manuel António de A. e Vasconcelos.
Manuel Eugénio P. Cavaleiro Brandão.
Maria José Paulo Sampaio.
Ruy Garcia de Oliveira.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE)

Luís Manuel A. de Campos Catarino.

União Democrática Popular (UDP)

Mário António Baptista Tomé.

O DIRECTOR DOS SERVIÇOS DE APOIO PARLAMENTAR, Januário Pinto.

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PREÇO DESTE NÚMERO 46$00

IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA

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