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I Série-Número 43

Sábado, 26 de Abril de 1980

DIÁRIO
da Assembleia da República

I LEGISLATURA 4.ªSESSÃO LEGISLATIVA (1979-1980)

REUNIÃO SOLENE COMEMORATIVA DO 25 DE ABRIL

Presidente: Exmo. Sr. Leonardo Eugénio Ramos Ribeiro de Almeida

Secretários: Exmos. Srs. Manuel Henriques Pires Fontoura
Alberto Marques Antunes
José Manuel Maia Nunes de Almeida
Francisco Gonçalves Cavaleiro de Ferreira

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.
Eram 14 horas e 20 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD)
Afonso de Sousa Freire de Moura Guedes.
Alcino Cabral Barreto.
Álvaro Barros Marques de Figueiredo.
Amândio Anes de Azevedo.
Amélia Cavaleiro M. de Andrade de Azevedo.
Américo Abreu Dias.
António Alberto Correia Cabecinha.
António Augusto Lacerda de Queiroz.
António Duarte e Duarte Chagas.
António José dos S. Moreira da Silva.
António Maria Pereira.
Arménio dos Santos.
Carlos Manuel Pereira de Pinho.
Carlos Matos Chaves de Macedo.
Cecília Pita Catarino.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel da Cunha Dias.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Dinah Serrão Alhandra.
Eleutério Manuel Alves.
Fernando dos Reis Condesso.
Fernando José da Costa.
Fernando José Sequeira Rofiz.
Fernando Manuel A. Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Fernando Raimundo Rodrigues.
Germano da Silva Domingos.
Henrique Alberto F. do Nascimento Rodrigues.
Jaime Adalberto Simões Ramos.
João António Sousa Domingues.
João Aurélio Dias Mendes.
João Luís Malato Correia.
João Vasco da Luz Botelho de Paiva.
Joaquim Marques Gaspar Mendes.
Jorge Rook de Lima.
José Ângelo Ferreira Correia.
José da Assunção Marques.
José Baptista Pires Nunes.
José Bento Gonçalves.
José Manuel Meneres Sampaio Pimentel.
José Maria da Silva.
Júlio de Lemos de Castro Caldas.
Leonardo Eugénio R. Ribeiro de Almeida.
Luís António Martins.
Manuel António Araújo dos Santos.
Manuel António Lopes Ribeiro.
Manuel Henriques Pires Fontoura.
Manuel Luís Fernandes Malaquias.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Manuel Pereira.
Maria Adelaide Santos de Almeida Paiva.
Maria Helena do Rego da C. Salema Roseta.
Maria Manuela Simões Saraiva.
Marília Dulce C. P. Morgado Raimundo.
Mário Marques Ferreira Maduro.
Mário Martins Adegas.
Miguel Camolas Pacheco.

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Natália de Oliveira Correia.
Nuno Aires Rodrigues dos Santos.
Pedro Manuel da Cruz Roseta.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Alberto Barradas do Amaral.
Valdemar Cardoso Alves.

Partido Socialista (PS)

Agostinho de Jesus Domingues.
Albano Pereira da Cunha Pina.
Alberto Marques Antunes.
Amadeu da Silva Cruz.
António de Almeida Santos.
António Cândido de Miranda de Macedo.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Chaves Medeiros.
António Duarte Arnaut.
António Fernandes da Fonseca.
António Fernando Marques R. Reis.
António José Sanches Esteves.
António José Vieira de Freitas.
António Manuel Maldonado Gonelha.
Aquilino Ribeiro Machado.
Armando Filipe Cerejeira P. Bacelar.
Avelino Ferreira Loureiro Zenha.
Bento Elísio de Azevedo.
Carlos Alberto Costa de Sousa.
Carlos Cardoso Lage.
Edmundo Pedro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Fernando Alves de Almeida Miranda.
Fernando Luís de A. Torres Marinho.
Francisco de Almeida Salgado Zenha.
Francisco Igrejas Caeiro.
Francisco Manuel Marcelo M. Curto.
Frederico A. F. Handel de Oliveira.
Gualter Viriato Nunes Basílio.
Herculano Rodrigues Pires.
Jaime José Matos da Gama.
João Cardona Gomes Cravinho.
Joaquim José Catanho de Meneses.
Joaquim Sousa Gomes Carneiro.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
José Luís do Amaral Nunes.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Maximiano de A. Almeida Leitão.
José Maria Parente Mendes Godinho.
Luís Abílio da Conceição Cacito.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Manuel Francisco da Costa.
Maria Emília de Melo Moreira da Silva.
Maria de Jesus Simões Barroso Soares.
Maria Teresa V. Bastos Ramos Ambrósio.
Mário Alberto Nobre Lopes Soares.
Raul da Assunção Pimenta Rego.
Rodolfo Alexandrino Susano Crespo.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Teófilo Carvalho dos Santos.
Victor Manuel Gomes Vasques.
Victor Manuel Ribeiro Constâncio.

Partido Comunista Português (PCP)

Adalberto António de V. Casais Ribeiro.
Alberto Jorge Fernandes.
Álvaro Augusto Veiga de Oliveira.
Álvaro Barreirinhas Cunhal.
Álvaro Favas Brasileiro.
António Dias Lourenço da Silva.
António da Silva Mota.
Carlos Alberto do C. da Costa Espadinha.
Carlos Alberto do Vale G. Carvalhas.
Carlos Alfredo de Brito.
Custódio Jacinto Gingão.
Dinis Fernandes Miranda.
Domingos Abrantes Ferreira.
Ercília Carreira Pimenta Talhadas.
Fernando de Almeida Sousa Marques.
Fernando Freitas Rodrigues.
Francisco Miguel Duarte.
Hélder Simão Pinheiro.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.
Joaquim António Miranda da Silva.
Joaquim Gomes dos Santos.
Joaquim Victor Baptista G. de Sá.
Jorge do Carmo da Silva Leite.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
José Casimiro Sousa Correia.
José Ernesto I. Leão de Oliveira.
José Manuel Aranha Figueiredo.
José Manuel do C. Carreira Marques.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Rodrigues Vitoriano.
Josefina Maria Andrade.
Lino Carvalho de Lima.
Manuel Gaspar Cardoso Martins.
Maria Beatriz Ladeiras da Silva Nunes.
Maria da Conceição Morais Matias.
Maria Ilda da Costa Figueiredo.
Marino B. de Vasconcelos B. Vicente.
Octávio Augusto Teixeira.
Rosa Maria Reis A. Brandão Represas.
Victor Henrique Louro de Sá.
Vital Martins Moreira.
Zita Maria de Seabra Roseiro.

Centro Democrático Social (CDS)

Adalberto Neiva de Oliveira.
Adriano Vasco da Fonseca Rodrigues.
Alfredo Albano de C. de Azevedo Soares.
Alexandre Correia de Carvalho Reigoto.
António Ferreira Pereira de Melo.
Artur Fernandes.
Eduardo Leal Loureiro.
Emídio Ferrão da Costa Pinheiro.
Eugénio Maria Anacoreta Correia.
Francisco António Lucas Pires.
Francisco Gonçalves Cavaleiro de Ferreira.
Francisco Manuel L. V. Oliveira Dias.
Henrique Manuel Soares Cruz.
15ilda Silva Barata.
João Daniel Marques Mendes.
João José Magalhães F. Pulido de Almeida.
João J. S. Fernandes Homem.
João da Silva Mendes Morgado.
Joaquim Rocha dos Santos.
José Manuel Macedo Pereira.
Luís Eduardo da Silva Barbosa.
Luís Filipe Pais Beiroco.
Luís Gomes Moreno.

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Manuel António de A. e Vasconcelos.
Manuel Baeta Neves.
Maria José Paulo Sampaio.
Maria Tabita L. F. Mendes Soares.
Narana Sinai Coissoró.
Rogério Leão.
Rui Eduardo F. Rodrigues Pena.
Ruy Garcia de Oliveira.
Victor Afonso Pinto da Cruz.

Partido Popular Monárquico (PPM)

António José Borges G. de Carvalho.
Gonçalo Pereira Ribeiro Teles.
Luís Filipe Ottolini Bebiano Coimbra.

Agrupamento Parlamentar dos Reformadores

Armando Adão e Silva.
Francisco José de Sousa Tavares.
Nuno Maria Monteiro Godinho de Matos.
Pelágio E. de A. Matos Lopes de Madureira.

Movimento Democrático Português

Helena Tâmega Cidade Moura.
Herberto de Castro Goulart da Silva.
Luís Manuel A. de Campos Catarino.

União Democrática Popular (UDP)

Mário António Baptista Tomé.

O Sr. Presidente: - Responderam à chamada 204 Srs. Deputados.
Temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 14 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, em virtude do fim a que se destina esta reunião, interrompo-a neste momento, recomeçando os trabalhos cerca das 15 horas, quando chegar o Sr. Presidente da República.
Entretanto, pedia aos grupos parlamentares o favor de indicarem os nomes dos seus representantes que irão esperar o Sr. Presidente da República à porta principal do Palácio.
Está suspensa a sessão.

Pelas 15 horas deu entrada na Sala das Sessões a cortejo em que se integrava o Sr. Presidente da República, o Sr. Presidente da Assembleia da República, o Primeiro-Ministro, o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, os secretários da Mesa, a comitiva do Presidente da República, o secretário-geral da Assembleia da República, o chefe e os secretários do protocolo.
No Hemiciclo encontravam-se já os membros do Conselho da Revolução, os Ministros, o Ministro da República na Madeira, o Presidente da Assembleia Regional da Madeira, o Presidente do Governo Regional dos Açores, o Provedor de Justiça, o Procurador-Geral da República, o presidente do Supremo Tribunal Militar e alguns presidentes dos tribunais das relações e alguns membros da Comissão Constitucional.
Encontravam-se ainda presentes nas tribunas e galerias os Secretários e Subsecretários de Estado, o corpo diplomático, o cardeal-patriarca, altas autoridades civis e militares e numerosos outros convidados.
Constituída a Mesa, na qual o Sr. Presidente da República ocupou o lugar à direita do Sr. Presidente da Assembleia da República, a banda da Guarda Nacional Republicana, colocada na Sala dos Passos Perdidos, executou o Hino Nacional.

O Sr. Presidente: - Em nome de S. Ex.ª o Sr. Presidente da República declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 5 minutos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o representante do Agrupamento Parlamentar dos Reformadores Sr. Deputado Adão e Silva.

O Sr. Adão e Silva (DR): - Sr. Presidente da República, Sr. Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Srs. Conselheiros da Revolução, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr. Presidente da Assembleia da República e Srs. Deputados, minhas Senhoras e meus Senhores: É por inerência à minha qualidade de componente da força democrática e humanista testemunhada no Manifesto Reformador, mas muito especialmente da de representante do Agrupamento Parlamentar dos Reformadores, que me incumbe hoje o honroso encargo de usar da palavra nesta sessão comemorativa do 6.º aniversário da Revolução, essa corajosa arrancada dos militares de Abril na bela madrugada de 25, que pôs termo ao regime totalitário imposto ao povo português durante quase meio século, ao assumirem-se, eles, revolucionariamente e como corolário de sucessivas e desgastantes lutas políticas da oposição democrática, durante décadas, contra o regime salazarista decorrente desse outro movimento militar e anticonstitucional, qual o de 28 de Maio de 1926.
Não acrescentarei nesta aliás, limitada, intervenção nem conteúdo original, nem ênfase oratória ao muito que aqui será afirmado pelos ilustres oradores que se me seguirão, apenas a nossa voz concorrerá, com todo o entusiasmo, para a bem merecedora valorização dessa feliz data, festejada pelos cravos vermelhos e pela alegria popular irrepreensível trazida à rua nesse grande dia, marco histórico inolvidável para todo o povo e em particular para os muitos resistentes democratas e liberais que, anos e anos seguidos, vinham sofrendo no espírito e no coração a cruel fatalidade de se sentirem considerados apátridas na sua própria e querida terra, ao serem-lhes, sistemática e miseravelmente, recusados os mais elementares direitos de cidadania.
Teve a Revolução de Abril o inestimável mérito de restituir ao povo português as liberdades fundamentais de que se achava há tanto despojado e de contribuir para o gozo, que se quer inteiro e responsável e, também, permanentemente promovido, respeitado e defendido, dos direitos do homem, essas regalias humanas afirmadas na Declaração Universal proclamada pelo areópago das Nações Unidas, por essenciais à vida democrática dos povos e dos seus cidadãos; e logo, por isso mesmo, no respectivo preâmbulo, denominadas de ideal pacífico e nobilitante interessando a todos, os indivíduos e a todas as nações, independentemente de raças, de credos ou de ideologias e orientados pelo reconhecimento integral da dignidade humana, com direitos iguais e

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inalienáveis que constituem o fundamento autêntico da liberdade, da justiça e da paz no Mundo.
econquistadas que foram as liberdades essenciais e adquirida, com ânimo de a manter, a convicção de que vinha de instaurar-se no País, por forma definitiva e irreversível, a democracia política que a grande maioria do povo português há tanto ambicionava, resta ainda garantir a estabilidade e a consolidação dessa mesma democracia, que há-de caracterizar-se pelos seus nobres ideais de liberdade, igualdade e fraternidade, fazendo-a institucionalizar através do indispensável equilíbrio dos órgãos do poder político e de uma democratização frontal e autêntica, por económica, social e culturalmente justa, do País real, em ordem a prestigiar-se Portugal, quer internamente, quer face ao mundo democrático e designadamente face a este continente europeu de que constituímos ponta de lança, embora em muito reduzido espaço, situados como estamos no seu extremo ocidental, frente a esse mar imenso que sempre nos atraiu e persistirá em atrair-nos em projectos futuros a cuja assunção a nação empenhadamente se dará.
Obviamente que esteve, e permanecerá, bem latente a ideia de que somos, incontestavelmente, uma nação de largas tradições históricas e universalistas, que de descobridora de novos mundos passou a fautora de povos, terminando, por neste século de grandes sucessos e progresso mundial, assumir o orgulhoso papel de libertadora desses mesmos povos que, não obstante todos os conhecidos e graves acontecimentos, que se vêm processando internacionalmente, hão-de permanecer ligados a nós - ressalvada a sua inteira independência - por fortes laços humanos, afectos como estão à língua comum e aos sentimentos cristãos e liberais que, desde sempre, caracterizam os Portugueses.
Prestigiosa democracia a nossa, já que, para além desse tão grande exemplo de humanidade, há-de ser liberal, regeneradora e pluralista, exactamente por oriunda do espírito do 25 de Abril e porque consubstancia, em si mesma, todo um somatório de qualidades cívicas, morais e de justiça social que importa preservar contra todas e quaisquer tentativas anti-democráticas, partam elas de onde partirem e seja qual for o manto com que se cubram ou o cavalo de Tróia de que se sirvam, pois todas hão-de, felizmente, esbarrar contra as forças da liberdade e de resultar inúteis, dada a sua incapacidade de alterarem o curso do processo democrático, inerente ao regime de Estado de direito que, decididamente, se quer para Portugal. Tenhamos, pois, esperanças muito válidas de que há-de, ao longo da caminhada, em muito ainda a percorrer, mas sempre pela via da liberdade, prosseguir-se em democracia, por tal ser a promessa e o significado patriótico da Revolução de Abril, para a glória de todos os sinceros democratas deste país e para o bem do nosso tão sacrificado povo, que durante largos anos sofreu, penosamente, tantas e tantas lágrimas e algum sangue, para além dos prementes e duros sacrifícios económicos suportados a tudo se sobrepondo essa inesquecível perda de inúmeros combatentes democratas, cuja vida foi ceifada nas corajosas fases da luta, abnegada e idealista, contra o obscurantismo, a reacção e o totalitarismo em geral.

Aplausos do PSD, do PS, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores.

E vamos, ainda e sempre em homenagem ao espírito essencialmente liberal do 25 de Abril, empenhar-nos em renovar e fazer progredir o País, certos de que será em resultado do patriótico empenho dos verdadeiros democratas, seja qual for o seu estrato ideológico, que há-de, por força da liberdade reconquistada e da vontade comum, engrandecer-se a Nação.
Vamos constitucional e oportunamente, pondo-se termo a condenáveis projectos desestabilizadoras rever e aperfeiçoar a Constituição da República, em termos porventura ainda experimentais, dada a presumível evolução do regime, mas programáticos e condicionados à legalidade democrática, reforçando nela o
sentido cívico e extirpando-a da excessiva carga ideológica e do proteccionismo, revolucionário que a caracterizam, tornando-a numa segura e aberta lei fundamental, em que possa definitivamente assentar, em segurança, o Estado de direito que democraticamente pretendemos ser, em plena e responsável liberdade,
pondo-se acima de tudo o prestígio e o progresso do País.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E com tudo se valorizará o ideário do 25 de Abri1, que há-de ficar na história como a redentora Revolução da Liberdade!

Aplausos do PSD, do CDS, do PPM, dos Deputados reformadores e do Sr. Deputado José Luís Nunes, do PS.

Liberdade que já Montesquieu, magistralmente, definiu como "esse imenso bem sem o qual não é possível gozar verdadeiramente todos os outros bens". Liberdade que, num apelo veemente à luta pelos direitos do homem, Paul Édouard, ao estruturar-se a Declaração Universal, invocou assim: "Je suis né pour te connaître, pour te nommener, pour t'aimer, Liberté". Liberdade que um jurista democrata contemporâneo, ao levantar a sua voz contra um certo clima de medo de antes do 25 de Novembro de 1975, referiu assim: "Morrerá a liberdade quando no coração e no espírito dos homens pairar o medo." Liberdade, bem humano esse que supera todos os demais, e que esse cidadão insigne, grande português, que foi Jaime Cortesão, democrata indefectível e indomável lutador contra o poder totalitário e a reacção, em alguns dos belos e inesquecíveis versos da sua primorosa "Ode à Liberdade", cantou assim:

Quero-te, como quero ao ar e à luz
Porque não sou a ovelha do rebanho,
Nem vendi ao pastor a alma e a grei;
E onde não haja mais do que o redil,
És tu a minha Pátria e a minha Lei.
Leva-me onde as estrelas me pertençam.
Porque as vozes viris que me conduzem
Ninguém, melhor do que eu, sabe dizê-las;
Porque eu não temo as livres solidões,
nde habitam os ventos e as estrelas.

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Torna-me ágil e ardente, alma do Fogo,
Porque tu és a Inspiradora inquieta
Dos bailados da morte e da alegria;
E eu prefiro ao aprisco a vida heróica,
A que devora o ser, mas alumia.

ueima-me, embora custes, quando afirmas,
0 incêndio e as cinzas trágicas de Bruno
Ou o silêncio e a dor de Galileu.
Que importa? A Terra, a Humanidade, a Vida,
Não cabem, empalhadas, num museu.
Não és a flor da beira do caminho.
Bem sei que é necessário conquistar-te
A cada novo, dia e a duro preço.
Por ti tenho sofrido quanto os homens
Podem sofrer. Por isso te mereço.
Gerou-te, lentamente, com revolta
E dor, a consciência dos escravos,
Renasces mais perfeita a cada idade;
E, sempre, com dores cruéis do parto,
Dá-te de novo à luz a Humanidade.

Querem mãos assassinas sufocar-te
Nas entranhas maternas. Mas em vão.
Virás como a torrente desprendida,
Porque és o sopro e a lei da Criação
E não há força que detenha a Vida

Aplausos dois Deputados reformadores, do PSD, do PS, do CDS, do PPM e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o representante da UDP, Sr. Deputado Mário Tomé.

O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente da República, Sr. Presidente do Supremo Tribunal, Sr. Presidente da Assembleia da República, Srs. Conselheiros da Revolução, Srs. Membros do Governo, minhas Senhoras e meus Senhores, Srs. Deputados: Para comemorar hoje o 25 de Abril devemos ser claros e rigorosos, o nosso povo no-lo exige.
Há seis anos, o povo saudava, nas ruas com alegria de, que só ele é capaz, a liberdade. A prisão dos principais responsáveis do fascismo, o desmantelamento da PIDE-DGS, anunciavam o ruir do regime corrupto, construído, sobre o suor e o sangue dos trabalhadores portugueses. As massas populares, lado a lado com os soldados e marinheiros, saudavam a libertação dos presos políticos, o regresso dos exilados, o fim da guerra colonial. De norte a sul do País, o povo estava unido na mesma esperança de que acabaria o sofrimento e a miséria, na mesma determinação de liquidar uma a uma as raízes do fascismo o do colonialismo.
No 11 de Março e no 28 de Setembro, duas intentonas fascistas encontraram pela frente a unidade combativa dos trabalhadores portugueses. Às tentativas de sabotagem do patronato reaccionário, os operários respondiam tomando nas suas mãos as fábricas e instaurado o contrôle operário. Ao abandono das terras pelos agrários parasitas, os assalariados respondiam com as ocupações das terras. Os moradores pobres das barracas lançavam-se nas ocupações de casas vazias. As comissões de trabalhadores, as comissões de moradores, as comissões de soldados, organizavam a iniciativa criadora e espontânea das massas populares e defendiam as suas conquistas. A Reforma Agrária, as nacionalizações, as liberdades democráticas, conquistas revolucionárias dos trabalhadores portugueses, transformavam rapidamente, a face do País, abrindo um caminho novo de mudança. Essas conquistas democráticas revolucionárias, impostas pela luta do povo português, vêm a ser consagradas na Constituição da República. Portugal deixava de ser um país onde reinava o obscurantismo, as profundas desigualdades sociais, a opressão e a miséria que faziam de nós um dos países mais atrasados da Europa. Abria-se o caminho para um futuro radioso de bem-estar e de liberdade, para os trabalhadores portugueses. A independência nacional era uma possibilidade real e uma exigência do povo português.
Estas transformações radicais que em poucos meses se vinham operando na sociedade portuguesa, deviam-se à poderosa iniciativa e à energia criadora das massas populares. Perante as vacilações, as hesitações dos vários governos provisórios, perante um MFA que se desagregava, o movimento popular impunha-se como a única força realmente capaz de levar a cabo as profundas transformações sociais, que poderiam arrancar de vez as raízes profundas do fascismo. Em poucos meses, a PIDE-DGS estava desmantelada, o poder dos monopólios e dos latifundiários seriamente abalado. Abria-se o caminho para uma sociedade. verdadeiramente democrática.
Mas as debilidades do movimento popular eram ainda muitas. A confiança na protecção dos militares progressistas levou a que os trabalhadores não se tivessem preparado, de uma forma enérgica, para a defesa das suas conquistas revolucionárias. Assim, o golpe militar reaccionário do 25 de Novembro apoiado pela direita, veio surpreender as massas populares e apanhá-las desprevenidas. Este golpe reaccionário veio cortar o passo ao movimento transformador que de norte a sul varria o País. Os militares de Abril foram presos, os trabalhadores começaram a ser intimidados, mortos, com a Polícia e o Exército, impunha-se um regime autoritário e repressivo em tudo contrário ao 25 de Abril.
Seis anos passaram sobre o 25 de Abril. Hoje podemos dizer abertamente e com segurança que o golpe do 25 de Novembro abriu caminho a um regime fascizante, virado para o ataque aberto às conquistas revolucionárias do 25 de Abril. A direita reaccionária que hoje nos governa tem no centro da sua política o ataque à Reforma Agrária, às nacionalizações, às liberdades democráticas. 0 pano de fundo da sua política é a revisão reaccionária da Constituição. É voltar a instaurar no nosso país o regime opressor e explorador dos grandes monopólios e latifundiários. É transformar o nosso país numa coutada dos grandes monopólios da CEE e num campo de manobras da NATO.
A Aliança Reaccionária que nos governa está empenhada em destruir tudo aquilo que resta do 25 de Abril e fazer o País andar muitos anos para trás. Nos campos do Alentejo, e Ribatejo, os trabalhadores são mortos, espancados, perseguidos pela GNR, as terras, o gado, as máquinas conseguidas à custa do seu trabalho do seu suor e do seu sangue, são-lhes roubadas. Os trabalhadores das empresas nacionalizadas vêem ser-lhes retirados todos os seus direitos e as regalias

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conquistadas. A comunicação social é amordaçada, reinstaura-se a censura na rádio, na televisão, na imprensa. Montam-se novos tribunais plenários para julgar os antifascistas. Os preços sobem todos os meses, tornando a vida de todos os que trabalham cada vez mais difícil. Apesar de cem mil promessas, a economia continua mergulhada na crise e na estagnação. Não há novas obras, não há melhoramentos, nada se faz para criar novos postos de trabalho que absorvam o meio milhão de desempregados.
0 25 de Abril e as conquistas do nosso povo hoje, em Portugal, são o ponto de referência e demarcação de todas as forças políticas. Ou se é a favor ou se é contra. 0 golpe reaccionário do 25 de Novembro foi a grande arrancada contra o 25 de Abril, que mostrou claramente de que lado estavam as várias forças políticas irmanadas do mesmo desejo de travar o avanço dos trabalhadores para novas conquistas de uma sociedade nova, vamos encontrar desde as forças mais negras da reacção, que querem reinstaurar um regime fascizante em Portugal, como o CDS e o PPD, até ao PS, que teve mais modo dos trabalhadores do que de aliar-se com os militares reaccionários aos saudosos do 24 de Abril e com o imperialismo.

Vozes do PS: - Não apoiado!

O Orador: - 0 PCP, em vez de enfrentar abertamente o golpe reaccionário, adapta-se ao novo regime e continua, como antes, a aproveitar-se da força dos trabalhadores para negociar, para manobrar, sempre cedendo no essencial: a defesa das conquistas populares de 74 e 75.
Os homens que encabeçaram aquele golpe e por isso são dos principais responsáveis por toda a escalada a que temos assistido desde então contra os
trabalhadores, os democratas e antifascistas não podem ser os representantes do 25 de Abril.

Vozes do PSD e do CDS: - Não apoiado!

O Orador: - A UDP sempre afirmou que o 25 de Novembro foi um golpe contrário em tudo ao 25 de Abril e responsável pelas dificuldades que atravessa o País. Nós sempre afirmámos que, apesar dos ataques, que têm vindo a sofrer após o 25 de Novembro as conquistas populares, apesar da arrogância da direfta reaccionária que nos governa, há suficientes forças para impor uma mudança na situação política actual. Essas forças estão dispersas pe1as lutas populares, que têm vindo a ser travadas em todo o país, na Roforma Agrária, nas poderosas manifestações ainda recentes, como a de 19 de Abril.
Afirma-mos claramente: o único caminho possível para defender o 25 de Abri1 é confiar, sem reservas, na força e na luta dos trabalhadores, unir todas essas lutas numa só de norte a sul, capaz de impor derrotas a este governo e fazê-lo cair ainda antes das próximas eleições.

Risos do PSD, do CDS e do PPM.

Por isso, enganam-se aqueles que pensam que a política de cedências, vacilações e compromissos pode ser uma barreira eficaz contra os ataques da

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direita. Essa política leva a recuos sucessivos do movimento popular, ao abandono das conquistas populares uma após outra. Todos os trabalhadores, todos os democratas que querem defender o 25 de Abril dove empenhar-se juntamente com a UDP e outras forças revolucionárias, no levantamento de uma poderosa força de unidade popular que se afirme como alternativa revolucionária à política do PS e do PC nas próximas eleições. É a partir dos locais de trabalho, dos campos, das fábricas, é nas lutas de hoje contra o Governo reaccionário da AD que é preciso construir a força de unidade popular, capaz de derrotar a direita, se não for antes, nas próximas eleições. 0 25 de Abril está bem vivo no coração do nosso povo, não é uma mera recordação do passado. Em cada luta, em cada protesto, na revolta que brota dia a dia em milhar e milhares de trabalhadores, o 25 de Abril renasce com força redobrada. 0 crescer desta luta, o explodir desta revolta farão um Abril novo, um Abril dos trabalhadores, capaz de satisfazer as suas aspirações mais profundas e construir um Portugal novo.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o representante do MDP/CDE, Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura.

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Sr. Presidente da República, Sr. Presidente da Assembleia da República, Srs. Conselheiros da Revolução, Sr. Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, minhas Senhoras e meus Senhores: 0 Grupo Parlamentar do MDP/CDE sobe a esta tribuna, trazendo com ele a alegria e a força de milhares de portugueses que hoje saúdam o 25 de Abril.
Prestamos, em primeiro lugar, homenagem ao Movimento das Forças Armadas e a todos os militantes antifascistas, muito especialmente àqueles que na clandestinidade, na prisão, no exílio, dedicaram integralmente a vida à vitória dos ideais de liberdade, de fraternidade, e deram à causa da participação o povo oprimido, a grandeza de uma tarefa que pertence a toda a Humanidade.

Aplausos do MDP/CDE, do PS, do PCP, da UDP e dos Deputados reformadores.

Nesta homenagem estão connosco os democratas que, nestes anos difíceis da nossa Revolução, souberam encontrar o caminho da coerência, não perdendo nunca, o objectivo que escolheram. E ainda aqueles que souberam prescindir de regalias, com renúncia a comodidades e a gastos supérfluos e converteram o seu estatuto social de privilégio na alegria da participação colectiva.
Estão aqui, também, presentes as mulheres que transformaram, de um dia para o outro, a face visível da nossa vida social, e que hoje marcam a luta presente e marcarão a história futura.
É ainda a juventude que luta por emprego, por habitação, por melhores condições de vida, de profissiona1ização e de estudo, e que alicerça essa luta organizada numa consciência que garante a Revolução de Abri1.
MDP/CDE celebra hoje a revolução portuguesa nos órgãos do poder local, nas comissões de mora-

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dores, nas associações desportivas, recreativas e culturais que têm dado forma estruturada à participação popular, aprofundando as raízes da nossa democracia e alargando em cada dia o campo democrático.
Com o 25 de Abril, a cultura diversificou-se e enriqeceu-se e, apesar do boicote da rádio e da televisão, não se apaga a marca dos nossos intelectuais e artistas que souberam dar expressão à força da determinação de um povo, dos nossos ideais e à maravilhosa vivência da nossa Revolução.
O MDP/CDE saúda hoje todos os trabalhadores portugueses que lutam pelo progresso económico do País e que, apesar de todas as calúnias e perseguições, continuam, numa unidade cada vez mais profunda, a luta pelo direito à participação na vida política, económica e social, pelo direito ao trabalho, pela segurança social, pela valorização profissiona1, pelo direito à saúde, à habitação, ao ensino, pela melhoria de condições económicas e sociais da nossa Pátria.
O MDP/CDE saúda, neste dia, especialmente os trabalhadores da Reforma Agrária que consagram toda a sua energia à valorização da terra, que investiram o excedente dos seus salários de fome, na melhoria das condições agrícolas, em terras mesmo tradicionalmente abandonadas. Espancados, assassinados, espoliados do fruto do seu esforço gigantesco, os trabalhadores erguem-se na grandeza moral dos que lutam por uma causa colectiva.
Eles são o exemplo das revoluções que não param, se engrandecem, transbordam e que marcam o limite das suas derrotas, nas vitórias que iniciam.
O MDP/CDE saúda, hoje, neste 25 de Abril as sementeiras da Primavera, com a certeza de que pela força que representam contra as forças do passado, pela generosidade com que abrem os caminhos do futuro, e pelo patriotismo de que são expressão, elas trazem, em si, o germe da paz.

Aplausos do MDP/CDE, do PS e do PCP.

A maior parte dos militantes do nosso partido trabalha em cooperativas, órgãos do poder local, organizações profissionais, grupos de estudo, movimentos culturais. Orgulhamo-nos da nossa capacidade de trabalho unitário e estamos certos de que o caminho, para a democracia passa também por uma grande acção pedagógica, que dê aos homens capacidade de adaptação.
A posição do MDP/CDE é, porém, irredutível, face ao capitalismo monopolista, face ao latifúndio, pela certeza de que, sem a sua destruição, a democracia, não é possível.

Vozes do MDP/CDE: - Muito bem!

A Oradora: - É essa a razão por que, neste momonto, é clara e frontal a oposição do MDP/CDE ao Governo da AD: não só porque, a nível de medidas legistativas, tudo tem tentado fazer para repor a desordem do, passado, mas porque o tipo de relações tanto interna como externamente, para os quais se mostra vocacionado, não respeitam a dignididade de cidadão, adquirida com o 25 de Abril, nem a dignidade da Pátria independente, livre e dialogante que nasceu da Rovolução dos cravos e da descolonização.

Vozes do PSD: - Não apoiado!

A Oradora: - Responsáveis da AD sonham, pelo contrário, com a bipolarização, já não só de Portugal, mas do Mundo inteiro - clima ideal onde se desenvolvem os contravalores que vão invadindo o seu esquema de poder.
Embora as acções deste Governo obedeçam à estratégia mais conservadora e mesmo reaccionária da diminuta mas poderosa parte dos seus apoiantes, o discurso da AD procura manter uma formulação democrática: tanto por conveniência de difusão da mensagem dentro da própria AD como no exterior dela.
A AD escolheu um candidato às eleições presidenciais que se afasta do 25 de Abril...

Aplausos do MDP/CDE, do PS, do PCP e da UDP.

Manifestações de desagrado, dos Deputados do PSD, do CDS e do PPM, batendo com as mãos nas bancadas.

Peço desculpa aos Srs. Deputados, mas vou repetir.
AD escolheu um candidalo, às eleições presidenciais...

Vozes do PSD e do CDS: - Não apoiado! Provocadora!

O Sr. Presidente: - Desculpe interrompê-la, Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura, mas pedia a todos os Srs. Deputados que prestássemos pela serenidade das nossas atitudes a primeira e grande homenagem à data que hoje celebramos.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Queira continuar, Sr.ª Deputada.

A Oradora: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
AD escolheu hoje um candidato às eleições presidenciais...

Vozes do PSD e do CDS: - Outra vez!

A Oradora: - ... que se afasta do 25 de Abril ...

Vozes do PSD e do CDS: - Não apoiado! Provocadora!

A Oradora: mas nunca correrá o risco de o apresentar como tal.
que Portugal é hoje, na sua carne, o 25 de Abril.

Vozes do MDP/CDE e do PS: - Muito bem!

A Oradora: - As conquistas da Revolução aculturaram-se na essência da Pátria, são já parte da sua história.
falsa busca da identidade nacional (angústia suprema dos ideólogos fascistas), com a qual se procuram repor os labirintos do passado, pelos antigos caminhos do medo, do confusionismo e do obscurantismo, mais não é do que a recusa, consciente ou não, em assumir a imagem de uma Pátria renovada nos seus objectivos, projectada num futuro, que engrandece o seu passado.
e novo Portugal dá novos mundos ao mundo.

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Para além do esforço dos descobrimentos, hoje património de toda a Humanidade, podemo-nos orgulhar, porque dos movimentos de libertação, solidários com as forças democráticas portuguesas, nasceram países livres, iluminados pelo progresso, marcando, com determinação, os caminhos seguros da nova África.
Esta verdade é tão grande, tão verdadeira, tão vincadamente nacional, que o Governo, da AD não teve estatura para a assumir ...

Vozes do PSD e do CDS: - Não apoiado!

A Oradora: - ... e embrulhou em mediocridade o Congresso das Comunidades Portuguesas e o IV Centenário de Camões, criando, a nível nacional, um vazio pelo qual é responsabilizado, neste momento, e será ainda mais fortemente responsabilizado no futuro.

Aplausos do MDP/CDE, do PS e do PCP.

Porque a Revolução do 25 de Abril não é um facto isolado, ela gerou-se e cresce em uníssono com a luta generalizada da libertação dos povos. E é tão forte o chamamento da nossa época que os ditadores caem com uma frequência inesperada e, a cada momento, nascem novos líderes dos movimentos de libertação.
A conservação da própria vida deixou de ter sentido para aqueles que assumem a causa do povo.
Em muitos países a Igreja apoia a liderança destes movimentos.
No Brasil, a Assembleia do Conselho Nacional dos Bispos aprovou, em Fevereiro passado, o documento da terra, condenando o capital monopolista e exortando a entrega da terra a quem a trabalha.

Vozes do MDP/CDE: - Muito bem!

A Oradora: - Também no Brasil, missas campais imensas rezadas com os metalúrgicos, pelo arcebispo de S. Paulo, marcam a participação activa da Igreja, através não só da palavra ou de actos humanos isolados, mas no exercício do próprio mistério da missa. A contrapartida já aconteceu, o arcebispo Oscar Romero foi morto no próprio altar onde celebrava, e tudo leva a crer que actos como estes se repetirão.
É louco o desespero dos que querem travar a marcha natural do homem!

Uma voz do PSD: - Hipócrita!

A Oradora: - Pese embora aos mestres da contra-revolução, o 25 de Abril acertou o passo pela marcha da Humanidade e por isso ele persiste e avançará.
Não só a nossa Constituição continua a ser a lei que expressa os ideais de Abril, como se verificou já que os mais altos órgãos de Soberania têm capacidade institucional e sentido de dignidade humana, para assegurarem a legalidade democrática e a independência nacional.
Neste 6.º aniversário do 25 de Abril, no amplo momento, de unidade de todos os democratas portugueses, que caminha braço dado com a solidariedade dos outros povos, que o MDP/CDE afirma hoje, como ontem, a sua certeza na democracia

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Neste 6.º anivesário do 25 de Abril, é urgente a unidade resultante do empenhamento individual dos democratas e das forças políticas que partilham a tarefa da construção de uma sociedade justa, participada, onde as relações democráticas substituam a prepotência, onde a realidade objectiva substitua os mitos e onde a segurança individual trilhe os caminhos da 1iberdade colectiva.
Neste 6.º aniversário do 25 de Abril, as forças conservadoras, antidemocráticas e mesmo reaccionárias terão a certeza de que, embora abrigadas à sombra dele, o 25 de Abril cada vez lhes escapa mais das mãos.

Vozes do PSD: - Olhe que, não!

A Oradora: - A forma eleiçoeira e medíocre com tonalidades de caciquismo fascista, com que o Governo da AD resolveu integrar-se nos festejos nacionais, distribuindo os membros do seu Governo pelos distritos do País, melhor dizendo, pelos círculos eleitorais, levando, cada um, um regaço de promessas e de inaugurações, é prova da sua incapacidade para se identificar com os ideais de Abril.

Aplausos do MDP/CDE, do PS e do PCP.

Protestos do PSD e do CDS.

Mas a Revolução dos capitães; abriu janelas que rasgam horizontes, e abrem para o futuro, ela foi não só a nessa Revolução - a revolução dos Portugueses -, mas também a revolução dos nossos irmãos africanos.
A vontade dos povos não se quebra e a história não recua. Abril vencerá.

Aplausos do MDP/CDE, do PS e do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o representante do PPM. Sr. Deputado Luís Coimbra.

O Sr. Luís Coimbra (PPM): - Sr. Presidente da República, Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr. Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Srs. Conselheiros da Revolução, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, Sr. Cardeal Patriarca, Minhas Senhoras e Meus Senhores: 0 dia 25 de Abril é para nós, monárquicos do PPM, uma data histórica que representa a reconquista da esperança e da liberdade que há muito estava amordaçada.
Esperança e 1iberdade indispensáveis, antes de mais, à dignidade dos Portugueses como pessoas humanas e ao desenvolvimento social, económico e cultural das regiões e comunidades que constituem Portuga1 e são os objectivos prioritários por que luta o meu partido.
25 de Abril foi um passo importante na evolução histórica do nosso povo, que, mais uma vez, afirmou a sua vontade de querer ser o único responsável pelo seu futuro e de voltar a ser uma força viva ao serviço da Humanidade.
construção de uma nação não se faz sem suor, sangue e lágrimas, mas as conquistas que se vão realizando em prol do bem-estar de todo o povo e o persistente trabalho na obra de construção e valorização do território compensam bem aquele suor aquele sangue e aquelas lágrimas, o trabalho e os sacrifícios de toda uma comunidade.

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Os Portugueses estão ligados por laços históricos e comunditários que lhes permitem comemorar em unidade as datas verdadeiramente representativas da sua história e olvidar aquilo que não contribuir para a afirmação e o povir do povo português.

Vozes do PPM e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Os homens e movimentos que mais tarde vieram a constituir o Partido Popular Monárquico lutaram sempre com grande empenho e sacrifício pessoal, em várias frentes, para que Portugal recuperasse a via democrática, a única que nos conduzirá a um futuro digno e viável.
Não podemos também esquecer, na evocação que hoje se faz do dia 25 de Abril de 1974 a memória de outros monárquicos lutadores pela liberdade e pela Pátria: Paiva Couceiro, Rocha Martins, Luís de Almeida Braga, Hipólito Raposo, Vieira de Almeida, Rolão Preto, Alberto Monsaraz, Fernando Amado e tantos outros que os seguiram.
Os desvios da revolução, iniciada no dia 25 de Abril de 1974, foram oportunamente condenados pelo PPM.
0 meu partido negou-se a assinar o primeiro pacto MFA/partidos e negar-se-ia a assinar o segundo, se para tal tivesse sido convidado.
As nossas atitudes nortearam-se sempre por uma luta em prol da progressiva institucionalização da democracia, pela valorização do homem e da sua terra, pela melhoria da qualidade de vida de todos portugueses, vivam onde viverem, pela igualdade de direitos e deveres de todos os cidadãos, pelo desenvolvimento, de todas as regiões, comunidades e sectores da sociedade portuguesa.
Defendemos, sempre o direito à autodeterminação dos povos e não podemos por isso esquecer que Portugal é responsáve1 pelo direito à autodeterminação do povo de Timor; nem podemos deixar de sentir, como nossa, a angústia daquele povo nosso irmão.

Aplausos do PPM, do PSD, do PS, do CDS e dos Deputados reformadares.

Sentimo-nos, portanto, obrigados a continuar hoje a luta que iniciámos já antes do 25 de Abril para que o povo português, por meio de uma Constituição democrática e da institucionalização do referendo, a vários níveis, possa afirmar-se, em liberdade e dignidade, a fim de se reencontrar consigo próprio, moldando soberanamente as suas instituições e o seu futuro, e, através da restauração dos seus vínculos históricos e de sangue, ver garantida a perenidade de uma cultura e de uma pátria.
0 25 de Abril permitiu que se desse um passo importante na vivência e institucionalização da democracia em Portugal. A democracia pluralista e o desenvolvimento harmónico e regionalizado do nosso País, devendo ter sempre em vista a dignificação da pessoa humana e a justiça social, são as grandes vias de progresso abertas pela revolução que hoje comemoramos e que a Aliança Democrática, com o apoio do povo português, se esforça por continuar, e continuará.

Vozes do PPM, do PSD e do CDS: - Muito bem!

O Orador: - 0 PPM, trilhando estas vias, procurará sempre fazer vingar os objectivos do seu programa, aceitando a vontade soberana do povo português democraticamente expressa.
Lutamos e lutaremos sempre por uma sociedade que, balizada por uma constitucionalidade sã, evolutiva e democrática, se constitua não só em democracia pluralista ao nível político, mas também, ao nível social, em sociedade equilibradamente, diversificada em todas as facetas e planos da vida humana, em que não haja monopólios de qualquer espécie e em que o homem se liberte em cada acto, em cada gesto, em cada dia no cumprimento de um destino cada vez mais universalmente português.

Aplausos do PPM, do PSD, do CDS e dos Deputados reformadores.

O Sr. Presidente: - Do Centro Democrático Social tem a palavra o Sr. Deputado Luís Moreno.

O Sr. Luís Moreno (CDS): - Sr. Presidente da República, Sr. Presidente e. Srs. Deputados: Reúne-se hoje em sessão extraordinária e solene a Assembleia da República para comemorar a passagem do 6.º aniversário do movimento revolucionário de 25 de Abril de 1974.
Difícil seria encontrar para tal efeito instituição que reunisse mais requisitos de legitimidade do que esta Câmara, convertida, desde a eleição da Assembleia Coastituinte, em verdadeira sensitiva da já longa e tenaz luta do povo português pela construção de um sistema democrático aberto, livre e plural!
Difícil, com efeito, encontrar local mais apropriado e que assuma maior significação do que esta Casa, onde têm assento e trabalham os representantes da pluralidade das vozes do nosso povo, pelo povo eleitos em plena liberdade e independência, conquista fundamental tornada possível pela efeméride cuja passagem hoje se assinala!
A vitória do movimento revolucionário de 25 de Abril de 1974 só foi possível porque correspondeu à necessidade de ruptura a que chegara a sociedade portuguesa face a um regime político que, incapaz de diálogo e de abertura, de assumir a evolução e a mudança que são a essência da história, se bloqueara a si mesmo, caminhando a passos largos para a esclerose.
Esgotadas todas as formas de expressão pacífica e convivente, claramente demonstrada a incapacidade dos dirigentes para encontrar os caminhos da evolução necessária, só a alternativa da ruptura institucional restava para eliminar os estrangulamentos que impediam e asfixiavam a manifestação dos mais legítimos anseios populares.
Daí o imediato e enorme consenso gerado à volta do movimento dos «militares de Abril», as grandes manifestações de legítima alegria e regozijo, ao ver-se assim finalmente desbloqueado o caminho para a construção da almejada sociedade democrática; para a construção de uma sociedade dotada das instituições capazes de exprimir, em toda a sua ma1eabilidade e plasticidade, os sentires vivos e profundos de um povo que quer viver sem dependências que degradem, orgulhosamente solidário com os demais povos, que na livre expressão das ideias no respeito pelas opiniões opostas, no normal funcio-

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namento das instituições livremente eleitas e consentidas encontra o verdadeiro fundamento do seu progresso ético, económico e social!

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Cedo, no entanto, se verificaria que não era essa a intenção de uma minoria fortemente organizada e que, apoiada na sua ala militar, instalada no cerne do poder revolucionário, se desmultiplicaria nas mais diversas acções, com a finalidade oculta de capturar o Poder e impôr aos Portugueses o seu mode1o preestabelecido de sociedade, totalitário, bem mais duro e feroz do que o que caíra de apodrecimento na madrugada do 25 de Abril.

Vozes do CDS e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Foram então os tempos de manipulação das massas populares, da instauração de um crescente clima de ameaças, de medo, de coacção, de terror, contra todos quantos ousavam denunciar ou opor-se às intenções tal minoria.
oram então os tempos da tomada das grandes decisões, que outra coisa não visavam que desarticular e reduzir ao caos o sistema económico, que destruir os valores essenciais e perenes da sociedade portuguesa, por completamente avessos ao ideário dos que já se arvoraram em seus novos senhores e amos.
oram então os tempos que medearam entre o 11 de Março e o 25 de Novembro do 1975, época que não pode ser esquecida pelos democratas portugueses e que não poderá deixar de ser justamente verberada quando se comemora o 25 de Abril, porque ela é o seu contraproduto e é através da história da luta popular conduzida contra os factos então ocorridos e as forças que os comandavam que verdadeiramente se alcança o significado que para o povo português teve, e tem, o 25 de Abril de 1974.

Aplausos do CDS, do PSD e do PPM.

Sr. Presidente da República, Sr. Presidente e Srs. Deputados: A luta do povo, português pela instauração de uma democracia pluralista, que comparti1he dos valores que definem as democracias ocidentais, levada a cabo ao longo destes últimos seis anos, é verdadeiramente exemplar!
Contra as vanguardas partidárias e militares que quiseram desviar o 25 de Abril da sua pureza inicial erguer-se-ia a resistência popular, organizada nas estruturas partidárias e no seio dos militares democráticos, resistência que conduziria a uma luta sem quartel, hoje e sempre inacabada, enquanto subsistirem nas instituições tudo o que lhe é espúrio, excrescência ou ganga revolucionária, que são as sequelas deste longo amadurecimento democrático.
0s Portugueses aprenderam, ao longo destes anos, que a liberdade não se conquista sem dores nem sacrifícios, sem custos e sem perdas, que tem um
alto preço, que exige uma vigilância constante para não ser comprometida, mas que tudo isso vale a pena porque só livres assumiremos em plenitude a dignidade da nossa dimensão humana, porque só livres realizaremos um país mais digno, mais justo e mais

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próspero, onde todos os portugueses tenham o seu Lugar

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - 0 nosso povo, a quem se abriu a possibilidade de participação política, através da militância partidária, compreendeu que a história não lhe é mais imposta, mas é antes por ele criada, por ele feita!
Esta a lição do 25 de Abril, a grande razão por que importa lembrá-lo e por que não há que 1he regatear louvores: a de ter dado aos Portugueses a possibilidade de retomar nas suas próprias mãos o seu destino.
E é por isso mesmo que, quando solenemente se comemora mais um aniversário do 25 de Abril, importa publicamente dizer que é preciso desmitificar, não permitindo a sua transformação numa sigla mítica, símbolo de um sonho já perdido no passado ou mera esperança a realizar num futuro vago e nebuloso!
0 que importa, neste dia em que o 25 de Abril é tão justamente celebrado, é restituí-lo, sem sombras que o deformem, à ideia que impediu os democratas que tomaram para si a gloriosa tarefa de o levarem a cabo: a de que se tratou de conquistar revolucionariamente o poder político para o restituir intacto ao seu legítimo detentor - o povo português!

Vozes do CDS e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - 0 que importa, aqui e agora, é homenagear todos aqueles que, executantes desse gesto magnífico, souberam com a modéstia que caracterizam os verdadeiros cidadãos, integrar-se na plena legalidade da ordem democrática e por ela têm vindo a lutar constantemente ao longo de todos estes anos.
0 que importa, aqui e agora, é reflectir sobre os desafios que se põem à Nação Portuguesa, lembrando que também isso é possível porque o 25 de Abril de 1947 existiu.
Sr. Presidente da República, Sr. Presidente e Srs. Deputados: De acordo com o calendário constitucional, decorrorão ainda este ano as eleições para a segunda legislatura da Assembleia da República e para a Presidência da República, factos que não deixarão de ter as mais fundas repercussões no dia a dia da vida dos Portugueses nos anos que aí vêm.
A próxima Assembleia da República terá, nos termos do artigo 286.º da Constituição, «poderes de revisão constitucional», o que só por si é bem revelador da sua excepcional importância.
Todos os democratas estão conscientes da conjuntura que rodeou a Assembieia que votou a Constituição que hoje nos rege, do pacto imposto à partida pelo poder revolucionário e que irremediavelmente a feriu, o que tudo se veio a reflectir no espírito global que a enforma e, de modo parficularmente explícito, em muitas das suas disposições.
À futura Assembleia caberá a difícil, mas necesária, tarefa de expurgar da nossa lei fundamental tudo aquilo que mais não é do que afirmação ou afloramento revolucionário, contradição democrática, factor de divisão insanável da sociedade portuguesa, e

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restituí-la à dignidade de lei dos Portugueses, expressão do máximo consenso democrático possível, lei respeitada e amada porque nela todos os democratas vêem o espelho dos princípios fundamentais porque se regem e a possibilidade de realização concreta dos diversos projectos que a democracia consente!

Uma voz do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Não temos dúvidas de que contra isso se levantarão os novos fariseus da Constituição, aqueles que ainda ontem tudo fizeram para que o País não fosse dotado de qualquer lei constitucional, porque, de qualquer modo, ainda não era a sua, e hoje aparecem como os seus mais ferozes e acérrimos guardiões!
Impedido pela resistência popular da apropriação do poder político e de, assim, impor a sua ditadura, batido claramente nas umas pelo voto livre e conscientemente expresso, ao Partido Comunista e aos seus sequazes só resta, em desespero de causa, procurar a todo o transe manter na Constituição aquilo que só a conjuntura atrás mencionada tornou possível.

Vozes do CPS: - Muito bem!

O Orador: - A capacidade demiurga do povo para fazer o seu próprio destino não se deixará, no entanto, aprisionar nos espartilhos, sejam eles quais forem, que as forças antidemocráticas lhe queira impor.
Saberá encontrar o seu caminho e plasmar na lei a sua vontade e o seu querer.
0 povo é quem mais ordena!

Risos do PCP.
Que o saibam de uma vez por todas aqueles que tanto gritam o slogan para o desrespeitarem na prática continuada e sistemática da sua acção política!

Aplausos do CDS, do PSD e do PPM.
Sr. Presidente da República, Sr. Presidente e Srs. Deputados: A importância das eleições para a nova Assembleia, não se queda aí. Em Setembro os Portugueses vão também escolher, desse modo, o seu governo para o próximo quadriénio.
Um governo que dê forma ao projecto, de desenvolvimento de que agora se estão a lançar as bases e que, de uma vez por todas, seja a «pedra no charco» que faça sair finalmente o País do adiamento a que o têm condenado as constantes mudanças e inconsequências de responsáveis, ou um governo que, enredado nas suas contradições e compromissos, manterá a indefinição e a estagnação que cada vez mais nos afasta dos níveis de vida da Europa por que optámos!
Um governo que, sem hipotecas ideológicas, saiba construir com as ex-colónias portuguesas as relações paritárias, justas e mutuamente compensadoras que uma experiência acumulada e essa pátria que é a língua comum largamente favorecem e até impõem, ou um governo que, apesar das declarações grandiloquentes, seja incapaz de o fazer.
Um governo, finalmente, que saiba dar à nossa juventude - a esses que são a nossa esperança no futuro - a certeza de que vale a pena ser português, mobilizando-a para essa saga que é reconstruir um

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país, modernizá-lo, integrá-lo, como membro de pleno direito, na Comunidade Económica Europeia, torná-lo um país mais justo, mais fraterno, ou um governo que não mereça a sua confiança e que só servirá para alimentar o seu descontentamento, descrença e rebeldia!
Os Portugueses serão igualmente chamados, ainda em 1980, a eleger o Presidente da República.
Desnecessário sublinhar a importância e transcendência de um tal acto? A Presidência da República remata a arquitectura democrática do Estado e simboliza a unidade essencial da Nação Portuguesa.
Unidade essencial que o CDS, consciente do pluralismo, das clivagens e das tensões que vivificam a democracia, proeurou antes de tudo o mais ressalvar na sua aposta no mais alto magistrado do Estado, para tanto apoiando um candidato de verdadeira unidade, nacional,...

Aplausos do CDS, do PSD e do PPM.

Vozes do PS: - Não apoiado!

O Orador: - ... um candidato despido de ambiguidade, liberto da usura dos anos de compromisso, projectado para a construção do futuro!

Aplausos do CDS, do PSD e do PPM.

Sr. Presidente da República, Sr. Presidente e Srs. Deputados: 15to tudo que foi dito a propósito da comemoração de hoje, porque o 25 de Abril é isso tudo e muito mais, é ser português, aqui e agora, no país que é nosso e perante o povo que nos ouve o nos ergue à dígnidade de sua testemunha e de sua voz!

Aplausos do CDS, do PSD e do PPM.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Gomes, do Partido Comunista Português.

O Sr. Joaquim Gomes (PCP): - Sr. Presidente da República, Sr. Presidente da Assembleia da República, Srs. Conselheiros da Revolução, Sr. Primeiro-Ministro e Membros do Governo, Sr. Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Srs. Deputados, Senhoras e Senhores: As comemorações do 6.º aniversário do 25 de Abril realizam-se numa situação e num momento que lhes conferem um particular significado democrático e patriótico.
Os perigos e ameaças que pesadamente pairam sobre as esperanças, as realizações e as conquistas a que o 25 de Abril ficou historicamente associado conferem à celebração popular e nacional da libertação do fascismo o valor e a projecção de uma inabalável afirmação da vontade colectiva de assegurar o triunfo, na terra portuguesa, para hoje e para amanhã, dos ideais da liberdade, da democracia, da justiça e do progresso social, da independência nacional.
Hoje, dia 25 de Abril de 1980, seis anos volvidos sobre a data que restituiu, a liberdade ao povo português, o que importa reter é o profundo motivo de confiança que resulta do facto de os verdadeiros e decisivos obreiros da libertação do fascismo e da democratização da vida nacional - povo e forças armadas - comemorarem dignamente este acontecimento histórico.

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A seis anos de distância do 25 de Abril de 1974, quanto mais nítidas se desenham as ameaças e o plano subversivo da reacção contra o regime e as instituições democráticas, mais e mais se justifica que, desta tribuna, saudemos, com renovado calor, os heróicos capitães de Abril, que, com sua coragem e patriotismo, ganharam para sempre a gratidão e o reconhecimento do povo português, e um lugar irreversível na sua memória e no seu coração.

Aplausos do PCP, do PS e do MDP/CDE.

A seis anos de distância, quanto maior é a afronta da instalação em posições chaves da vida nacional daqueles contra quem o 25 de Abril foi feito, mais e mais se justifica que, desta tribuna, saudemos, com renovada emoção, o ememplo de todos quantos na resistência ao fascismo deram as suas energias, a sua liberdade e a sua vida para manter acesos os ideias democráticos, para manter viva a esperança e a luta pela libertação.

Aplausos do PCP, do PS e do MDP/CDE.

A seis anos de distância, quanto mais patente se torna o vendaval destruidor soprado pelas forças do passado contra tudo quanto o povo conquistou com o 25 de Abril, mais e mais se justifica que, desta tribuna, saudemos, com renovado destaque, todos os portugueses e portuguesas que deram a sua dedicação, a sua generosidade e a sua firmeza à obra exaltante da democratização, renovação e transformação progressista da vida nacional.

Aplausos do PCP.

Seis anos passados, o que está na ordem do dia é a necessidade urgente e imperiosa de defender as liberdades e as outras conquistas de Abril, defendendo a Constituição e a legalidade democrática, travando o plano subversivo em marcha para o regresso ao passado.
Portugal não tem hoje nem um Governo nem uma política identificados com os ideais libertadores do 25 de Abril. Tem um Governo que segue uma política que lhe é abertamente contrária.

Vozes do PCP: - Muito bem!

Vozes do PSD: - Não apoiado!

O Orador: - Para prosseguir o 25 de Abril, Portugal precisa de uma política que respeite rigorosamente a Constituição e a legalidade democrática, o regime e as instituições democráticas, as regras e os princípios democráticos.
Para prosseguir o 25 de Abril, Portugal precisa de uma política que respeite os direitos e liberdades dos cidadãos, que defenda a vida democrática do País, que estimule a participação activa dos cidadãos na vida pública e na solução dos problemas nacionais.
Para prosseguir o 25 de Abril, Portugal precisa de uma política que salvaguarde as grandes transformações democráticas realizadas pela Revolução, considerando-as instrumentos essenciais para o, desenvolvimento económico e social do País e garantia insubstituível de uma economia ao serviço do povo e de Portugal.

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Para prosseguir o 25 de Abril, Portugal precisa de uma política que respeite e apoie a Reforma Agrária, como conquista nacional historicamente indispensável à justiça social e ao progresso da agricultura nos campos do Sul e ao prosseguimento e consolidação da nova vida e das novas perspectivas que a sua realização significou depois de décadas de repressão, fome, miséria e desemprego.
Para prosseguir o 25 de Abril, Portugal precisa de uma política que defenda e apoie o sector nacionalizado da economia, que salvaguarde as posições do Estado em centenas de empresas, com condição essencial da recuperação e desenvolvimento económico, de acordo com os interesses nacionais e como factor de primeiro plano para a geral dinamização das actividades produtivas nacionais.
Para prosseguir o 25 de Abril, Portugal precisa de uma política orientada firmemente para a garantia dos direitos, liberdades e regalias conquistados pelos trabalhadores, para a elevação dos seus salários reais, que combata os despedimentos e o desemprego e estimule e reconheça a contribuição decisiva do trabalho criador, o esforço e a opinião dos trabalhadores portugueses como indispensáveis a progresso económico e social do País.
Para prosseguir o 25 de Abril, Portugal precisa de uma política que enfrente corajosamente os problemas de fundo da economia portuguesa, assegure a modernização e dinamização das estruturas e actividades produtivas, que vise o desenvolvimento independente da agricultura, da indústria e das pescas nacionais e reduza a perigosa dependência económica do estrangeiro.
Para prosseguir o 25 de Abril, Portugal precisa de uma política que dê resposta às grandes reivindicações e aspirações dos agricultores portugueses, que adopte medidas rápidas e eficazes para superar o atraso e as dificuldades da agricultura do Centro e Norte, garantindo o pleno aproveitamento nacional do trabalho abnegado e sacrificado dos pequenos médios agricultores, rendeiros e seareiros.
Para prosseguir o 25 de Abril, Portugal precisa de uma política de apoio às pequenas e médias empresas comerciais e industriais, que, aumentando o poder de compra e alargando o mercado interno, contribua para o escoamento da sua produção, que apoie, com créditos, redução de taxas de juro e meios técnicos, a sua reconversão e modernização.
ara prosseguir o 25 de Abril, Portugal precisa de uma política que corresponda às vivas aspirações e reivindicações das mulheres, dos jovens, dos intelectuais e quadros técnicos, dos reformados e idosos, dos deficientes, das camadas mais desfavorecidas.
ara prosseguir o 25 de Abril, Portugal precisa de uma política que garanta a independência da comunicação social do Estado, que salvaguarde o pluralismo e o confronto democrático de ideias, que actue como factor de formação democrática da opinião pública, liberta da manipulação e da prática de intoxicação.
ara prosseguir o 25 de Abril, Portugal precisa uma política externa baseada nos princípios constitucionais de paz, amizade e cooperação com todos os povos, de diversificações das relações diplomáti-

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as, económicas e culturais do Pais, favorável ao desanuviamento e ao desarmamento, de salvaguarda intransigente da soberania e independência nacional.
É esta a política de que Portugal precisa e a que s Portugueses aspiram. E é por isso que neste 6.º aniversário do 25 de Abril, contra um Governo e uma política ostensivamente inimigos dos ideais, realizações e esperanças do 25 de Abril, há um povo que se une e combate, um país que luta e um regime democrático que resiste.
As comemorações populares do 25 de Abril e do 1.º de Maio, na sequência da grandiosa movimentação popular dos últimos meses, vão confirmando que há forças e condições para fazer frente aos perigos que se adensam sobre o 25 de Abril e as suas enquistas, que há forças bastantes para derrotar a conspiração global contra o regime democrático.

O Sr. Bento Gonçalves (PSD): - Não apoidado!

O Orador: - Defendendo activamente os seus direitos, conquistas e aspirações, respondendo com a sua dignidade e a sua luta a uma política antipopular e antidemocrática, erguendo a sua voz contra a prepotência, a injustiça, a restauração dos privilégios e o poder dos inimigos da democracia e do 25 de Abril, preparando as condições para a vitória da democracia sobre os perigos que a ameaçam, há milhões de portugueses que tomam nas suas mãos tarefa patriótica da defesa e do prosseguimento o 25 de Abril.
Perante todos os portugueses que aspiram à defesa da liberdade, à estabilidade política, económica e social, à criação de um clima de convivência democrática, de trabalho criador e fecundo ao serviço do progresso económico e social do País, à realização da justiça social, à resposta colectiva aos graves problemas nacionais, à salvaguarda da dignidade, soberania e independência de Portugal, perfilha-se cada vez mais uma sólida certeza: é no caminho de Abril que tais objectivos nacionais podem ser alcançados!
O 25 de Abril é a razão, a verdade, o futuro do povo português. O regime democrático triunfará. O 25 de Abril vive e viverá. O 25 de Abril vencerá!

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente? - Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Almeida Santos (PS):- Sr. Presidente da República, Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr. Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Srs. Conselheiros da Revolução, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados: Encontram-se aqui reunidos representantes de todos os Órgãos de Soberania para celebrarmos a data histórica do reencontro de Portugal consigo
mesmo.
Por todo o país, o povo soberano, que nos dias certos não delega a sua alegria, comunga nesta festa nacional a que só se escusam os que deploram a concertação dos homens e dos povos, combatem a democracia, recusam a paz e encaram os direitos do homem, por mais categóricos e universais que se apresentem, como violação catastrófica, dos seu privilégios de classe.
Todo o bem tem o preço de algum mal. E é talvez preciso que continuem a subsistir alguns tiranos, belicistas e opressores para que a harmonia entre os homens e a sua organização em sociedades políticas livres, democráticas e justas continuem a revestir-se do atractivo de uma aspiração inatingida, de uma luta incessantemente renovada, do tempero dionisíaco de uma utópica civitas dei.
Tempos são estes, os que vivemos, que convidam à reflexão sobre a precariedade das vitórias alcançadas. O dia de hoje será mais belo se for só de alegria. Mas será mais útil se for também de medi tacão e de balanço. De aferição da nossa disposição de espírito para levarmos por diante a obra começada ou para repousarmos à sombra precária dos resultados conseguidos.
De Gaulle, em situação de algum modo paralela, teve um dia esta explosão cominatória: «É preciso saber se os Franceses querem refazer a França ou ir dormir. Eu não a reconstruirei sem eles.»
O devir será tanto menos fatídico quanto mais cuidadosamente o prepararmos. A melhor homenagem que poderemos hoje prestar ao 25 de Abril é a constante retomada do seu espírito. É impregnarmos dele o nosso quotidiano.
Celebramos hoje o reencontro de Portugal com a liberdade. E, como só se conhece verdadeiramente a liberdade quando se a perde, bom é que recordemos - sobretudo para os jovens que já não padeceram o sofrimento adulto da sua privação e para os que da liberdade nos privaram e de novo tentam destruí-la - o que foi esse holocausto civil de todo um povo abafado na sua espontaneidade, embrutecido no seu pensamento, amolecido na sua vontade, silenciado na sua voz, acovardado na sua coragem pela mais longa ditadura da Europa dos direitos do homem!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Os poderes do Estado concentrados num só homem; o voto reduzido a uma farsa; a justiça convertida numa comédia; a segurança traduzida num terror; a intimidade desfeita numa devassa; a consciência ultrajada numa tutela; a informação expressa num diktat; as colónias incendiadas numa guerra: as relações exteriores banzadas num cerco; o cidadão atolado num pântano.

Aplausos do PS, PCP e do MDP/CDE.

É profilático lembrar. Lembrar que vivemos com um esbirro em cada esquina; um ouvido em cada telefone; um pé-de-cabra policial em cada porta; uma espreitadela pidesca em cada carta; um expurgo em cada intimidade; um casse-tête em cada grito; um mandato de captura em cada capricho; uma ordem de morrer em cada jovem; uma injustiça em cada salário; uma violação em cada consciência.

Vozes do PS: - Muito bem!

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O Orador: - Era este o Portugal feudalizado, belicista, neurótico e solitário de 24 de Abril. A 25 foi a aurora, a descompressão, o pensamento livre, a palavra solta. Só que, já sem o hábito da liberdade, ninguém nos deteve nas fronteiras da embriagues de sermos livres, e a liberdade pôde de novo, e por momentos, abeirar-se 'da negação de si mesma.
Mas refez-se - aliás, refizemo-la - e seguiu rumo à forja de S. Bento, a aprontar num ápice a Constituição da República, assim ao jeito de quem edifica uma fortaleza de espírito -, de civilização e de história, e capta nela a alma do povo.
Escassos anos volvidos, tolda-nos de novo a alegria a sombra de uma apreensão. Para alguns a Uberdade começa a ser um hábito, mas não é ainda um sentimento.
E a Constituição da República, que no essencial devia ser um dogma, é claramente encarada por uns tantos como expressão apócrifa de um falso sentido de afirmação colectiva.
Bom é que nos entendamos. Depois de termos conhecido o doce sabor da liberdade, é duplamente difícil voltarmos a viver sem ela. E bom é que os sopradores de nuvens se tenham por notificados de que a tolerância confuciana de Abril não deve iludi-los sobre a possibilidade de recuperarem o «paraíso perdido» dos seus latifúndios, dos seus monopólios, dos seus privilégios, da glória indisputada de mandar.
Os Portugueses são definitivamente outros, por mais, que uns tantos permaneçam os mesmos.

Aplausos do PS, do PCP e do MDP/CDE.

Celebramos hoje o dia do reencontro de Portuga1 com a paz. Na véspera apenas, matávamos sem ideaal e morríamos sem esperança. Década e meia ia passada desde o primeiro tiro. E queimávamos cada vez mais soldados, mais riqueza, mais prestígio e mais justiça nessa cegueira em que o heroísmo se ia tornando difícil, à medida que a razão se ia tornando escassa.
Aproximavamo-nos da exaustão física e anímica, do completo isolamento internacional, do limite da capacidade das nossas forças para proporcionarem ao poder civil mais tempo para uma solução política negociada e honrosa.
Incapaz de compreender e de se adaptar aos melindres do problema da índia e de perspectivar historicamente a inevilabilidade da emancipação da África, o regime anterior optou pelo suicídio colectivo/desde que carlylianamente heróico.
A 25 de Abril foi a esperança; pouco depois, a trégua. O irreversível ensarilhar das armas. A confraternização expontânea dos que sem ódio, se matavam na véspera. A oposição popular ao embarque de mais soldados. A irreprimível ânsia do regresso. A psicose da pressa. O armistício das consciências. A paz de facto antes da paz de jure. A sua confirmação, já quase inútil, pelas chancelarias.
Dolorosa como havia sido a guerra viria a ser a paz. A descompressão violenta tornara impossível o pacto sem dor.
Mas aí temos, independentes, cinco novos Estados de expressão portuguesa a enriquecer, com o grande Brasil, a nossa expressão política e a nossa presença cultural no Mundo. Cinco pólos de revigoramento da língua, dei universalização da cultura, de diversificação do folclore, de relações políticas privilegiadas, de relações humanas particularmente fraternas.

Aplausos do PS, do PCP, do MDP/CDE, do PSD e dos Deputados reformadores.

E aí temos, enfim reabertos ao nosso convívio os países, para os quais o respeito dos direitos dos homens e dos povos é condição de amizade.
Não mais jovens que regressam «numa caixa de pinho», no dizer brutal do verso do poeta. Não mais jovens estropiados em cadeiras de rodas. Não mais a morte no coração das mães. Não mais a execração da comunidade das nações. Não mais a sensação do erro colectivo, da psicose de Caim, da amarga co-responsabilidade por estarmos vivos, por não estarmos presos, por a nossa voz nem sempre ser um grito.
Cabe aqui lembrar os que, com a sua luta tantas vezes heróica, e quase sempre silenciosa, padeceram nas prisões e no exílio, ou apenas mantiveram o facho da resistência cívica a esse erro trágico, ajudando a possibilitar Abril.
Celebramos hoje o dia do reencontro de Portugal com o pluralismo democrático consagrado pela Constituição da República e por uma prática política que conseguiu dobrar os seus cabos das Tormentas.
Antes era a ditadura de umas tantas famílias, com o seu banco, a sua seguradora, o seu jornal, os seus bonzos inamovíveis, o seu chefe carismático e previdente. Era a adoração imobilista de um passado d senhores e vassalos.
Depois foi, para muitos, a revelação da liberdade da igualdade ínsitas na própria definição de pessoa humana. Foi a reposição do poder legítimo, do primado da representação política. Foi o contrôle dos governantes pelos governados. Foi o voto.
Os Portugueses, é certo, ainda não votam como respiram. Mas o voto já não é um abcesso nas suas vidas. Concebem-no já como um direito do seu foro íntimo, como expressão da sua liberdade.
Impera ainda o cacique, eu sei. A ignorância ainda feudo político de inescrupulosos líderes de opinião. Mas tende a sê-lo cada vez menos. E à saída de meio século de tutela política o povo português adaptou-se admiravelmente ao exercício das suas responsabilidades cívicas.
A democracia evolui historicamente do politíco para o económico.
Neste seu regresso, a democracia surgiu mais como doida dos pobres. Este facto encontrou tradução no socialismo democrático que na nossa Constituição se desenha e que tanto parece incomodar alguns e tratos das classes possidentes.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Daí a necessidade revisionista que deles se apossa. Mas Abril é também a Constituição que temos. Celebrá-lo é saudá-la e defendê-la.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador - Não há - bem o sabemos - constituições perfeitas e muito menos eternas. Mas quan

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Justiça, Sr. Primeiro-Ministro e Membros do Governo, Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Conselheiros da Revolução, minhas Senhoras e meus Senhores: Reunimo-nos hoje aqui para celebrar, decorridos seis anos, o 25 de Abril. Esta e a data em que o povo português acolheu com alegria e entusiasmo a queda do regime salazarista-caetanista, que estava podre e não encontrou quem o defendesse.
Não podemos esquecer a iniquidade de um regime que durante perto de cinquenta anos desprezou as liberdades cívicas, manteve Portugal numa situação de subdesenvolvimento económico e social e sacralizou a tal ponto a questão ultramarina que tornou inviável uma solução pacífica para a independência das colónias portuguesas em África.
Mas esta é uma data em que não podemos olhar apenas para trás. O 25 de Abril anunciou-se como o fim de um regime ditatorial, o fim da guerra colonial e a esperança da liberdade e vida melhor para o povo português. Não esquecemos hoje aqui a homenagem justamente devida a todos os quantos directa ou indirectamente fizeram o 25 de Abril - e muitos deles aqui estão. Mas enquanto não se cumprir aquela esperança, o 25 de Abril não está completo, o 25 de Abril não está cumprido.
Da experiência destes seis anos devemos tirar alguns ensinamentos para o futuro. E o primeiro é o que esta datarão aceita donos nem tutelas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Esta é uma data que não pode ser abastardada nem estar ao serviço de nenhum partido, A resistência popular à perversão gonçalvista e a vitória das forças democráticas no 25 de Novembro aí estão para o demonstrar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Mas se, vencido o gonçalvismo, foi possível restituir à vida política portuguesa a normalidade democrática, o mesmo não podemos dizer ainda da Constituição que paralelamente ia sendo elaborada. Aí se contêm, é certo, princípios fundamentais para os quais o Partido Social-Democrata se orgulha de ter contribuído, e que garantem as liberdades cívicas e o primado da lei. Mas aí se contêm também disposições que consagram uma visão unilateral, fixista e colectivista do sistema económico e social português, imposta pela via dos factos consumados por certos sectores militares e pelo Partido Comunista em 1975.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - É à soberania popular que cabe corrigir estes desvios para que a próxima revisão constitucional seja um verdadeiro 25 de Novembro da Lei Fundamental, restituindo à Constituição da República a pureza dos ideais democráticos do 25 de Abril...

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: -- ...e conduzindo ao cabal cumprimento da promessa contida no programa do Movimento das Forças Armadas de «permitir ao País escolher livremente a sua forma de vida social e política».

Aplausos do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores.

Se o 25 de Abril não pode ser uma data de um só partido, tão-pouco aceitaremos que ele seja uma data só para alguns portugueses. Não podemos ignorar que apesar do 25 de Abril ainda há português que são cidadãos de primeira e outros que são considerados cidadãos de segunda. Refiro-me, nomeadamente, aos portugueses emigrantes, a quem uma maioria circunstancial do Partido Socialista e do Partido Comunista, aqui verificada há dias, pretende de novo impedir o direito de participação nos actos eleitorais em condições análogas às que se verifica para os portugueses residentes.

Vozes do PS e do PCP - É falso!

Aplausos do PSD, do CDS, do PPM e dos reformadores,

A Oradora: - Nós, sociais-democratas, não esquecemos que antes do 25 de Abril os emigrantes foram muitas vezes designados como aqueles portugueses que, abandonando o País, votavam contra o regime com os seus próprios pés. Nós, sociais-democratas não podemos deixar de dizer hoje aqui, em nome do 25 de Abril, que devem cessar as desigualdades políticas entre portugueses residentes e portugueses emigrantes;...

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - ... que ou o regime saído do 25 Abril compreende e aceita um novo conceito de povo português constituído por todos quantos estão ligados pela nacionalidade, pelo sangue, pela cultura pela língua a Portugal e não apenas pelos que aqui residem, ou o regime está condenado a segregar um dos factores mais decisivos para a manutenção secular cultura portuguesa no Mundo.

Aplausos do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores.

Uma terceira lição a retirar destes seis anos é de que nem sempre os que mais falam do 25 de Abril são os que maior fidelidade demonstram nos actos aos ideais que essa data representa.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Basta atentarmos no que foi a vidade de Governos anteriores para constatarmos que, ao contrário do que se propuseram, esses governos nem sempre respeitaram as liberdades e pois fizeram para a eliminação das desigualdades entre Portugueses.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Foi durante esses Governos que o nível de vida dos Portugueses mais se degradou. Proferiram-se slogans a actos, preferiu-se a pre-

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expressam a livre vontade do povo de que constituem o pacto social, devemos salvaguardar o que delas corresponde ao que nesse povo não muda. Por mais que disso se esqueçam os profetas da submissão, não somos, nunca fomos e nunca seremos um país de carneiros ou de escravos.

Aplausos do PS, do PCP, do MDP/CDE, do PPM dos Deputadas reformadores.

Celebramos hoje o dia do reencontro de Portugal com a justiça social e o respeito pelos direitos universais do homem e do cidadão.
Sobre o fundo do nosso humanismo franciscano, do nosso universalismo renascentista, inscreveram-se quarenta e oito anos de iniquidade.
E quando a Europa despertou para essa versão moderna do Sermão da Montanha que é a Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão, encontrou-nos divididos pelo mais fragmentário maniqueísmo, com chefes surdos aos mais comoventes apelos da piedade e da razão. Irmãos exploraram, delatavam, presidiam, seviciavam, matavam irmãos.
E de passo que esse evangelho cívico ia penetrando no coração dos homens - sem excluir os mais solidamente instalados nos cadeiras do poder -, os césares de Lisboa fechavam o coração e as fronteiras esse regresso do Conteúdo e de Cristo, e em nome Deus, da Pátria e da civilização continuavam a decretar o ódio.
O Abril trouxe-nos de regresso à Europa, de que instituímos um retábulo de terra e de cultura. Fechado o ciclo do mar, somos hoje mais um povo uma cultura do que um território, num mundo e se refaz de convulsões civilizadoras politicamente acantonado em grandes espaços que debatem fronteiras que a história demarcou. Regressámos a casa, tal como Ulisses à sua ítaca, depois de uma aventura de séculos que nos encheu e glória e de tragédia.
Esperava-nos uma nova aventura: a de reconstruir-se arrumarmos a casa e de fazermos o que outras esperam enquanto procurávamos a nossa própria identidade dispersos pelas sete partidas.
O balanço deste 6.º Abril diz-nos que somos capa de recolar ao pelotão do progresso. Tivemos de enfrentar dificuldades de epopeia: a crise económica cessante; a conversão de uma economia de guerra na economia de paz: a descolonização e a consequente mudança de uma economia de exploração na economia de auto-suficiência; a desmontagem de um regime semissecular, com as suas instituições, as suas leis, as suas rotinas, as suas mentalidades, e reconstrução, sobre as suas ruínas, de uma sociedade livre, participativa, democrática, o mais possível.
Mas se houve domínio em que o futuro nos encontra prontos para assumi-lo, esse foi, sem dúvida, o afirmação e do respeito dos direitos do homem e cidadão. De tal sorte que, ao ratificarmos as correspondentes declarações, já a nossa Constituição havia não apenas incorporado, mas aqui e além vigorosamente ultrapassado, já o nosso quotidiano decorria de acordo com.
Encontra-se aqui presentes muitos dos que prepararam, fizeram e salvaram Abril. Alguns cujo heroísmo, para encontrar a sua verdadeira dimensão, só defronta o obstáculo de continuarem felizmente vivos. O heroísmo oficial serve-se morto.
A verdade é que se Abril foi o ponto de chegada de toda uma epopeia de sofrimento e de luta, e o culminar de uma saga de anónimos combatentes pela liberdade, teve também, identificados, os seus heróis.

Aplausos do PS,

Não há senão que repelir o heroísmo motificado. Mas não menos que venerar a coragem dos que amam a liberdade ao ponto de aceitarem morrer por ela. Estão neste caso os «capitães de Abril» ...

Aplausos do PS, do PC P, do MDP/CDE e dos Deputados reformadores.

...nesta expressão, que é já uma legenda, devendo ser incluídos todos os militares que no Abril que memoramos, assumiram, por amor de sermos livres, o risco de morrer.

Aplausos do PS.

Justo é que os saudemos e neles todos os que prepararam, fizeram e salvaram Abril.
Muitos se retiraram já do palco onde se fez a história, outros se preparam para discretamente saírem dele.
Todos, embora em diferente medida, foram arquitectos e foram andaime. E nestes tempos de ingratidão em que se tende a amesquinhar o heroísmo e a oficializar a mediocridade, sabe bem lembrar estes versos de Hélder da Câmara:

Quando assistires
à retirada dos andaimes.
contempla ...é claro ...
o edifício que surge.
Mas pede pelos andaimes,
pois é duro servir de suporte
à construção,
per necessário à obra,
e na hora da festa
ser retirado como entulho.

Aplausos do PS.

Demo-nos então conta de que Abril não foi apenas uma revolução, mas uma redenção; não apenas uma data, mas o início de um processo; não um rasgo de que se repouse, mas um despertar de que se não descanse.
Abril é cada mês, cada dia, cada hora, cada sentimento e cada vontade. Abril é Portugal sem contradições. Abril somos todos nós sem mordaças.
Viva o 25 de Abril!
Viva Portugal!

Aplausos do PS, do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Roseta.

A Sr.ª Helena Roseta (PSD): - Sr. Presidenta da República, Sr. Presidente do Supremo Tribunal de

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ganda a realizações concretas, preferiram-se clientelas às competências.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - E são esses que, incapazes de cumprirem os seus compromissos eleitorais e assim também responsáveis por distorções ao 25 de Abril, aqui vieram hoje atacar o Governo da Aliança Democrática. Mas não precisa o Governo da Aliança Democrática de trazer constante e demagogicamente o 25 de Abril na boca, porque o que o preocupa é levar o 25 de Abril a todos os Portugueses. E não podem fazer-se milagres em quatro meses, mas quando o Governo se propõe comemorar esta data com realizações económicas e medidas sociais concretas; quando, pela primeira vez desde o 25 de Abril, distribuiu terras estatizadas a agricultores sem terra;...

O Sr. Vital Moreira (PCP): - A amigos!...

A Oradora: - ...quando actualiza as pensões de reforma e aprova o princípio da sua actualização futura sempre e na medida que for actualizado o salário mínimo; quando alarga a esfera dos passes sociais; quando abre novas instalações para a infância, para a terceira idade e para a administração de unidades de «saúde; quando lança as bases de uma reforma democrática do ensino; quando prevê medidas de valorização dos detidos prisionais; quando determina a integração dos adidos nos respectivos serviços, em igualdade com os restantes funcionários, pondo termo a injustíssima discriminação até agora vigente entre funcionários públicos residentes e regressados das ex-colónias; quando em medidas como estas e muitas outras o Governo demonstra o seu efectivo empenho em lutar contra todas as, formas de desigualdade e injustiça; quando assim sucede, não têm as forças da oposição autoridade para, em nome do 25 de Abriu, atacar este Governo.

Aplausos do PSD. do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores.

Nós, sociais-democratas, aceitamos como normal e democrático que cada partido ou força aqui presente interprete como entender o 25 de Abril; aceitamos e compreendemos que a oposição critique « ataque o Governo, porque é esse o seu papel em democracia. Mas não podemos calar-nos, nem hoje, perante ataques injustos e demagógicos, nem perante críticas que talvez pudessem ter sido feitas sobre a forma da autocrítica.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Nesta data de 25 de Abril, pela nossa parte, reafirmamos a nosso apoio exigente e estimulante ao Governo que saiu do voto popular para que continue a desenvolver a sua acção no sentido de cumprir os compromissos assumidos, da maior liberdade e da maior justiça. Mas o 25 de Abril não é nem pode ser obra de um Governo, seja ele qual for. Ele terá de ser obra de uma sociedade civil renovada e livre da opressão do Estado. Ele terá de ser obra de todos os Portugueses, se não, não é o 25 de Abril.

Aplausos do PSD, do PPM e dos Deputados reformadores.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Muito se tem falado, e por vezes sem propriedade das conquistas do 25 de Abril. A nossa presença aqui é indubitavelmente uma delas, e decisiva. E é de elementar justiça salientar a diferença abissal entre a liberdade de que hoje todos os Portugueses podem usufruir e o desprezo que a ela votava o regime ditatorial anterior.
É justo salientar o muito que no capítulo da democracia política, dos direitos humanos, dos direitos das mulheres e dos trabalhadores, da descentralização e do poder local, da abertura de Portugal a todos os povos fio mundo foi já conseguido depois do 25 de Abril.
Mas gostaria de salientar nesta data, e em consonância com os meus companheiros sociais-democratas das regiões autónomas, que há uma verdadeira conquista do 25 de Abril que frequentemente é ignorada ou deturpada: refiro-me à autonomia dos Açores e da Madeira, com a consequente tradução na experiência original das instituições regionais. Esta é uma das mais positivas lições a retirar destes seis anos.

Aplausos do PSD, do PPM e dos Deputados reformadores.

Mas porque o nosso desígnio é ir mais além e não contemplar apenas o que já fizemos, seremos os primeiros a afirmar aqui que esta conquista do 25 de Abril deve prosseguir e progredir, conforme legitimamente o desejam as populações açorianas e madeirenses, como factor decisivo na construção de um conceito; de Estado moderno, descentralizado e dinâmico que só dignifica o regime saído do 25 de Abril.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - A última lição que nesta data quereria aqui sublinhar tem a ver com a evolução das relações entre os Órgãos de Soberania que o actual regime consagrou.
A experiência passada demonstra, a nosso ver claramente, que sem maioria parlamentar não há estabilidade governativa e sem estabilidade governativa não pode haver progresso social e económico, porque a luta partidária por um poder efémero se sobrepõe à concretização das medidas de progresso e porque finalmente os sucessivos Governos acabam por se anular reciprocamente com políticas contraditórias.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Daí que a realização dessa promessa fundamental do 25 de Abril que é conseguir uma vida melhor para os Portugueses só possa ser conseguida se for encontrada uma correlação estável e equilibrada entre os Órgãos de Soberania. A experiência da maioria da Aliança Democrática é já um passo em frente para esse equilíbrio, a nosso ver essencial ao progresso do País. Mas as contradições com outros órgãos de Soberania, designadamente

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com o Conselho da Revolução e a distância assumida pelo Sr. Presidente da República em relação a este Governo, são ainda factores que afectam negativamente a necessidade nacional de progredir, e de progredir depressa.
Realizam-se este ano eleições decisivas para o País. De uma delas emergira uma nova Assembleia da República, com poderes de revisão constitucional na outra e será eleito o Presidente da República.
Pela nossa parte, e conforme aqui já dissemos, tudo faremos para que na futura Assembleia da República aqui se possa verificar de novo uma maioria da Aliança Democrática, com forte presença e participação do Partido Social-Democrata. Igualmente procuraremos que o Presidente da República possa assumir o seu mandato em convergência com a maioria parlamentar não em oposição ou alheamento
dela.

Aplausos do PSD.

É também nos o objectivo que o novo texto constitucional consagre a extinção do Conselho da Revolução, posto que deve terminar o período transitório da tutè1a militar' sobre o regime, iniciado com a Junta de Salvação Nacional logo após o 25 de Abril.
Sr. Presidente Srs. Deputados: 0 25 de Abril que aqui celebramos não pode ser pervertido riem usurpado por ninguém. Ele pertence já à história do nosso país, e marca uma decisiva etapa na realização dos valores seculares da nossa cultura, da nossa nacionalidade e da nossa independência. Não nos sirvamos do 25 de Abril para cavar mais fossos entre os Portugueses.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Não, cometamos mais agressões contra a liberdade de espírito que Abril representa.
Assumamos de novo, civicamente, o solene compromisso de, tudo fazer para que se cumpra, finalmente e para todos os Portugueses, o verdadeiro, livre e independente, Portugal de Abril.
Como dizia o poeta brasileiro: "Muita, diferença faz entre lutar com as mãos ou deitá-las para trás."

Aplausos do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores.

O Sr. Presidente: - Exmo. Sr. Presidente da República, Exmo. Sr. Primeiro-Ministro, Exmo. Sr. Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Exmos. Srs. Membros do Conselho da Revolução, Eminentíssimo Sr. Cardeal-Patriarca, Srs. Ministros, Sr. Provedor de Justiça, Srs. Deputados, minhas senhora e meus Senhores: Reúne esta Câmara hoje solenemente para, numa hora de júbilo e de alegria, festejar uma efeméride que está de há seis anos a esta parte e para sempre gravada Da história na nossa Pátria como facto verdadeiramente transcendente.
Aqui estamos pois para vivermos em uníssono e assim recordar a satisfação profunda com que, no dia 25 dei Abril de 1974, Portugal acordou na surpreendente certeza de se ver restituído ao pleno uso das suas liberdades cívicas e políticas.
Bem podemos assim proclamar a manhã de 25 de Abril de 1974 como a verdadeira madrugada do resgate, que proporcionou ao povo português o reencontro da sua verdadeira identidade,
E falo em reencontro de modo intencional: porque nas horas altas e simultaneamente difíceis da nossa história, nos oito séculos da sua gloriosa existência colectiva, o nosso povo soube conservar uni sentido tão profundo da sua liberdade, uma coincidência tão permanente dos seus direitos face aos abusos do poder, que tal atitude se pode e deve considerar como uma constante histórica do seu sentir colectivo.
Deste modo, sendo, a Assembleia da República a lídima representante, desse mesmo povo, ela é também e sem sombra de dúvida a voz mais autorizada para festejar e para afirmar, como se fosse todo o povo português que aqui estivesse presente, a alegria profunda com que há seis anos vimos aberto o caminho para um clima autêntico de liberdade, de paz e de justiça social.

Aplausos do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores.

São esses valores essencialmente democráticos que jamais aceitamos que se percam; e por isso julgo interpretar os sentimentos de quantos me escutam ao proclamar o empenhamento sincero de todos nós na defesa intransigente desses mesmos valores, sejam quais forem os sacrifícios que para tanto nos sejam pedidos.

Vozes do PSD:- Muito bem!

O Sr. Presidente : - Quem, se recorda ainda do tempo ignominioso em que tivemos de viver de espirito manietado; todos os que ainda não esqueceram o silêncio que era imposto nas mais simples necessidades de afirmação que definem um homem livre, não pode deixar de sentir hoje, de uma forma quase inebriante, esta possibilidade magnífica de festejarmos, aqui e agora, em jubilosa comunhão de sentimentos, a liberdade reencontrada em 25 de Abril de 1974.
Em democracia, o poder político encontra a sua plena e exclusiva legitimidade no voto popular, única fonte do poder que aos órgãos de Soberania cumpre exercer na defesa e garantia dos interesses do povo que os elege.
De resto, mais sugestiva do que a expressão "poder político" se me afigura esta outra: "dever político." Porque a função tão espinhosa de exercer a soberania não é um poder que se tenha jure proprio, mas tão-somente um meio indispensável ao cumprimento de um mandato sagrado que só o povo pode conferir e só o povo pode retirar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - 0 ideal da democracia, identifica-se de uma forma profunda e total com as mais íntimas exigências da natureza humana, e isto é de tal modo verdade que até aqueles que na prática negam constantemente os valores que a definem, sentem a necessidade de hipocritamente, apelida-

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rem como tais regimes que de democráticos nada têm. Tal é o sortilégio que da verdade democrática emana.
É assim, que em comunidades humanas onde o poder político se estrutura das, mais diversas formas o até naquelas onde a tirania e a, opressão imperam, em todo caso nos surge sempre como denominado comum a auto-designação de organizações políticas democráticas.
Por essa razão e pelos equívocos que a indevida apropriação da palavra pode gerar (e gera, com certeza), afigura-se-me inteiramente pertinente o que alguém escreveu há pouco tempo para se aferir se em determinada comunidade humana se vive em autêntica democracia, há que pôr de parte a designação formal que o seu sistema político a si próprio e atribui; é preciso e indispensável buscar, nos comportamentos políticos que nela se perspectivam, os índices substanciais que fornecerão, esses sim, a resposta correcta.
Portanto, para se averiguar se um sistema ou estrutura política é, em verdade, autenticamente democrático, a solução há-de encontrar-se pela resposta que se achar para todo um feixe de questões a pôr.
Deveremos então perguntar t indagar:
Ainda que rotulando-se de democrático, o regime que se analisa admite a pluralidade de partidos, com igualdade de, posições e de direitos e só com as diferenciações que resultem do maior ou menor apoio popular que cada um deles obtenha em eleições livres?
0 direito de voto é livremente exercido, sem pressões, sem influências estranhas e designadamente sem comportamentos e práticas incorrectas tendentes a falsear o resultado eleitoral e a violentar a livre decisão de cada eleitor?
Os resultados e o sentido dos actos eleitorais são religiosa e incondicionalmente respeitados por todos os órgãos de Soberania, sem que, nenhum se atreva a negar ou atentar com o sentido desse mesmo voto?
Reconhece esse regime o direito à greve como forma legítima dos trabalhadores defenderem os seus direitos?
Existe aí livre direito de expressão e de associação; designadamente concede-se aos trabalhadores o direito de liberdade sindical, em termos que só a eles compete definir e estabelecer?
É aí a economia posta ao serviço do homem, ou é o homem que é escravizado á economia pensada como valor absoluto e abstracto, e não como simples meio que é de realizar o desenvolvimento de todos os homens e do homem todo?
São aí respeitados e efectivamente protegidos os direitos fundamentais da pessoa humana, cuja protecção efectiva constitui como que a moldura indispensável à sua eminente dignidade?
Se para estas e muitas outras interrogações que poderiam pôr-se, encontrarmos uma resposta unanimemente positiva, poderemos então concluir, com segurança, que estamos perante um autêntico Estado de direito e democrático; mas basta que uma só dessas respostas seja negativa ou reticente para se poder concluir com igual certeza quão falaciosa então a qualificação de democráticos que falsamente tais regimes se atribuíam.
È por isso que, certo de que estamos em verdade construindo em Portugal um verdadeiro Estado de direito e que gozamos já o de modo irreversível das liberdades fundamentais a ele inerentes, que proclamo a felicidade, e a honra inigualável que para mim constitui a possibilidade de celebrar aqui um acontecimento que, como já disse e não é de mais repetir, ficará a con5tituir marco altamente positivo e da maior significação na história das nossas instituições políticas, acrescido do mérito de nos ter aberto a possibilidade de falarmos e vivermos livremente.
E maior honra sinto por esse facto quando, como Presidente eleito desta Assembleia, verifico o seguinte: chefes de Estado, Governos, conselhos mais ou menos consultivos ou menos ou mais interventores na vida pública e tribunais, iodos os regimes os têm ou pelo menos toleram, desde as democracias mais estabilizadas até às mais violentas ditaduras. Mas o sistema nervoso central de uma democracia autêntica, o traço definidor de um regime autenticamente democrático é a existência e o respeito generalizado de um parlamento livre e pluralista como é o nosso, porque livremente eleito pelo povo único detentor originário da soberania.

Aplausos do PSD, do PS, do CDS, do PPM e do Deputados reformadores.

Povo que pela sua vontade livremente expressa no voto é a única fonte de legitimidade do exercício de todo e qualquer poder político.
Por isso entendo que local não havia mais próprio nem outros tectos podiam abrigar com iguais pergaminhos democráticos a solenidade que estamos vivendo do que os desta Casa, cuja dignidade todos tanto prezamos.
De resto, em passado bem recente, foi V. Ex.ª, Sr. Presidente da República, quem expressamente e no exercício das suas elevadas funções, reconheceu a instituição parlamentar como único órgão de Soberania detentor das virtualidades democráticas necessárias para superar uma situação de impasse político.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Na verdade, perante essa situação, reconheceu V. Ex.ª que ela só podia ser passada pela auscultação imediata da vontade suprema do povo; assim se reconheceu que perante a delicadeza do problema, o povo era já o único com legitimidade para se pronunciar; que a ultrapassagem da crise passava inevitavelmente por esta Assembleia enquanto expressão directa, na sua composição, da vontade popular, e que só uma nova definição eleitoral da composição da Assembleia podia definir legitimamente a forma e ultrapassar a crise.

Aplausos do PSD, do PPM e dos Deputados reformadores.

Essa é, pois a grande e excepcional legitimidade da Câmara; aí está a maior honra o também a maior

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responsabilidade de todos e de cada um de nós, Deputados.
E o que acabo de dizer tem plena validade hoje como amanhã, ao presente, como no futuro, porque se os resultados eleitorais tivessem sido outros e se a maioria tivesse sido atribuída aos que hoje são na Assembleia, honrosamente, a oposição, isso será a contingência, que em nada alterava a verdade de, quanto venho de dizer.
Porque em qualquer das hipóteses o que permanece como valor máximo a respeitar é aquilo que em cada momento for a expressão inviolável da vontade do povo português, de quem todos e cada um de nós mais não é do que simples e modesto mandatário, a quem incumbe, o dever supremo e indeclinável de permanecer fiel, sejam quais forem as razões que e invoquem ou fabriquem, aos resultados obtidos em eleições livres, contra os quais ninguém pode sustentar o contrário sem atentar também o gravemente contra os mais elementares princípios democráticos.

Vozes do PSD- - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Creio ser o espírito que preside a quanto venho de dizer a maior e fundamental razão do uníssono vibrar dos nossos sentimentos nesta hora de exaltação e lembrança festiva da Revolução de 25 de Abril.
Uma última palavra é imprescindível deixar aqui honra e louvor aos militares que, por um sincero e autêntico desinteressado amor da Pátria e, da Liberdade, se empenharam no Movimento de 25 de Abril e que por cio tornaram possível o íntimo contentamento em que estamos vivendo o dia de hoje e este momento solene.
Todavia, e sem que daí resulte demérito para alguém, é uma - fatalidade historicamente - comprovada que em todas as revoluções, passada a primeira hora, da coragem do valor e da decisão militar, o que permanece - e é preciso que permaneça - é a tarefa muito tenaz e muito persistente de, pela liberdade e no trabalho, construirmos, uma pátria. cada vez mais próspera, mais justa e onde todos possamos viver com dignidade.

Aplausos do PSD, do PPM e dos Deputados reformadores.

Ao longo dos seis anos que hoje se perfazem, o povo português tem afirmado, pelos seus comportamentos um civismo, uma compreensão dos seus direitos, dos seus deveres políticos um amor à liberdade recuperada que o tornam credor, da nossa parte, a um grande, largo e incondicional respeito.
Foi assim que este, povo simultaneamente tão simples e tão nobre, soube desfazer num ápice a infamante mentira, durante quarenta anos intencionalmente propalada de que não podia viver em democracia porque não estava preparado para ela!
Julgo que se soubermos em todos os momentos ser dignos deste povo magnífico a que nos honramos de pertencer, estaremos então e assim em eficaz e permanente celebração da Revolução que hoje, pela dato que passa tão gostosamente se evoca dos nossos espíritos.
Alguém escreveu um dia que. a democracia era o reino de virtude. É, pois, perante os altos sentimentos e virtudes democráticas que o povo português vem inequivocamente revelando nos últimos seis anos que bem podemos afirmar, sem hesitação e em plena esperança, que nele se encontra a garantia mais segura da perenidade da Democracia Portuguesa.
Essa me parece a causa essencial da alegria serena e profunda que nesta hora nos une; e é-o também a reconfortante certeza de que, nos corações e nas inteligências de todos os Portugueses, permanece e se conserva intacto tudo quanto de mais puro houve em 25 de Abril no amor da liberdade, da justiça e sobretudo desta Pátria que incondicionalmente desejamos servir e, amar para que os nossos filhos e os filhos dos nossos filhos possam era verdade continuar a chamar-lhe ditosa.

Aplausos do PSD, de alguns Deputados do PS, de CDS, do PPM, do MDP/CDE e dos Deputados reformadores.

O Sr. Presidente. - Vai usar da palavra S. Ex.º o Sr. Presidente da República.

O Sr. Presidente da República: - Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr. Primeiro-Ministro, Sr. Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Srs. Conselheiros da Revolução, Srs. Deputados, Portugueses: 0 25 de Abril é uma data que, sendo digna de comemoração, exige a todos os portugueses uma responsável reflexão política.
Será importante recordar hoje a esperança colectiva que vivemos em várias ocasiões. Será oportuno ponderar os efeitos das divisões do presente, sobretudo quando elas se manifestam entre os que afirmam defender a democracia.
Mas mais útil será que aceitemos comemorar aqui o 25 de Abril, reflectindo sobre as experiências colhidas no difícil caminho já percorrido.
Um dos traços, mais nítidos deste percurso foi, sem dúvida, a intervenção dos militares na vida política.
Compreende-se que esta. interferência dos militares nos assuntos políticos tenha sido motivo de preocupação para os democratas. São poucos, de, facto, os exemplos de militares que abdicam democraticamente do poder que detêm para o entregar aos representantes do povo.
Essa preocupação era, como se privou, infundada. Nascia do desconhecimento das reais motivações dos militares portugueses, que assumiram a responsabilidade solidária de, promover esse movimento de liberdade e de democracia.
Durante treze anos, os militares asseguraram a possibilidade de defesa do interesse nacional, oferecendo todas as condições, aceitando todos os sacrifícios, para que fosse encontrada uma solução política adequada para a questão colonial.
0 regime que nos governava, na sua lenta agonia, não quis ou não soube aproveitar essas condições. Já na Índia tinham sido traídos os comandantes militares, a quem o poder político recusara os meios, as instruções, e o apoio que pediram e, mereciam.
Os jovens oficiais, a quem foi entregue a responsabilidade urgente de defender as colónias depois de décadas de passividade política, puderam então ver

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do que era capaz um regime autoritário, que fazia de um ideal nobre uma manifestação de hipocrisia.
As comodidades e a estreiteza de vistas da capital, o jugo da censura e da polícia política, permitiam ao regime fazer esquecer os que combatiam e tudo arriscavam para que se encontrasse uma solução que satisfizesse interesses que, durante muitos anos, eram efectivamente conciliáveis.
O movimento dos militares que conduzirá ao 25 de Abril não se desenvolve para acabar com as guerras: coloca frontalmente a questão de saber se há ou não solução política para essas guerras, se há ou não vontade dos responsáveis para assumir uma decisão que sabem ser inevitável.
O poder político de então prefere optar pela desistência - pela sua própria entrega e abdicação -, incapaz de aceitar ou de propor uma alternativa política convincente.
O movimento militar de 25 de Abril não quer o poder político. Defende a instauração da democracia, a justiça social, a solução política para as guerras coloniais, mas não deseja o poder político para os militares. Bem pelo contrário, são os mais diversos interesses políticos que procuram usar e instrumentalizar os militares, com objectivos que nada tinham a ver com a democracia e com a liberdade, mas apenas com a intimidação e a conquista do Poder por meios ilegítimos.
Este é um período que não será esquecido. Os militares recordam que, ao serem politicamente instrumentalizados, deixaram que fosse ameaçada a coesão, a disciplina e a independência da instituição, a que pertencem por uma escolha que é voluntária ei impõe um compromisso ético que não pode ser traído. Os militares recordam que essa instrumentalização política os leva ao confronto, ameaçando a sociedade que devem defender e colocando Portugal à mercê de interesses alheios.
Certos os ideais, do Abril. A sua defesa teve de continuar em 25 de Novembro, para que terminasse a divisão das forças armadas e findassem os apelos à intervenção militar.
Sendo o 25 de Novembro a reafirmação da democracia pluralista nas palavras e nos actos, é, também, a recusa do militarismo e a resposta firme àqueles que, esquecidos do que combatiam, se assemelhavam no momento da vitória aos seus adversários, na vontade totalitária da opressão e da destruição.
Para homens de menos escrúpulos e menos confiantes no povo e na democracia, teria sido fácil então a aventura pretoriana. Em alguns, terão mesmo ficado a germinar desejos desse poder sem limites.
Não foi essa a escolha da instituição militar, em coerência com os compromissos assumidos em 25 de Abriu. Não há, hoje problemas políticos criados pela instituição militar.
E o processo de normalização culminará, de modo natural, na revisão constitucional que consagrará a inteira devolução do Poder, real e formal, aos representantes da vontade popular.
Mas se, sob qualquer pretexto, as questões partidárias forem de novo (transportadas para a instituição militar, com a divisão, a partidarização e a criação de condições de confronto entre militares instrumentalizados, a resposta de todos os que na defesa da democracia pluralista se empenharam sem tibiezas será bem clara - política e democraticamente tão clara como o foi em 25 de Novembro de 1975.
Estes são pontos de honra da minha concepção política, valores que orientaram e hão-de orientar as minhas decisões, razões fundamentais dos compromissos irrevogáveis que assumi perante o nosso povo, o povo português, e em relação à democracia em Portugal.
Um outro traço marcante, que define o objectivo principal do percurso realizado nestes anos, é a consolidação das regras e do funcionamento das instituições democráticas.
Conhecendo o significado das ditaduras, os verdadeiros democratas sabem que a democracia é sempre obra incompleta e ameaçada, pois nunca aceitará degradante ao ponto de perseguir ou silenciar os seus adversários, já que não pode ter inimigos.
Mas não há democracias parciais ou democracias vigiadas. Há, ou não há vivência democrática, respeito pelas regras essenciais que definem a legitimidade, sem sofismas de propaganda nem manipulações de opinião. Por isso, não nos será difícil retirar da nossa experiência a conclusão de que a maior ameaça à consolidação da democracia será sempre a falta ou a insegurança de regras constitucionais que, tornando incerta, a legitimidade, favorecem a ambição do Poder sem limites e sem ética.
Fizemos também a prova de que há forças bastantes parai resistir aos antidemocratas, qualquer que seja o quadrante em que se situem, e de que, se estiver efectivamente assegurada a liberdade de informação, será sempre possível uma. eficaz pedagogia política, oferecendo ao povo português as condições necessárias para que ele possa fundamentar livremente - repito, livremente - a sua escolha.
Ficou igualmente bem claro, ao longo destes anos, que mais importante do que a luta pelo Poder é o exame ponderado dos problemas e a procura de soluções estáveis e seguras.
O poder político de nada serve se não estiver orientado para esse fim e se não houver, quanto às soluções, um consenso social bastante para impedir as discussões menores e as divisões paralisantes.
Por isso, continuarei a defender e a promover as soluções que mereçam o consenso democrático, condição indispensável para a segurança dos cidadãos e para a estabilidade das normas que impedem o uso autoritária do Poder.
Um terceiro traço característico da nossa evolução política encontra-se no processo de ajustamento e de recuperação económica, que tem constituído um dos mais importantes aspectos de debate político. Debate que tem sido feito esquecendo o ponto de partida - o Estado e a viabilidade do nosso sistema económico em 1974.
A economia confrontava-se então, como sabem, com uma tripla vulnerabilidade:
Na balança de pagamentos, por efeito da primeira alteração do preço do petróleo, apesar de ocorrida no último trimestre de 1973, o equilíbrio das contas estava destruído, desfazendo um dos mitos basilares da propaganda do regime;

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A fortíssima concentração do poder económico constituía um factor de evidente fragilidade, não só porque diminuía a eficiência de resposta à crise, mas ainda porque permitia fácil ataque político;
As importantes distorções na distribuição de rendimentos limitavam fortemente as possibilidades de resposta à crise com apoio no mercado interno e tornavam as variáveis económicas muito sensíveis às justas acções reivindicativas dos trabalhadores, que viam o seu poder de compra drasticamente diminuído.
É neste contexto que deve ser analisada a evolução económica após o 25 de Abril - as alterações radicais decididas, a sua discutível oportunidade e racionalidade, a deficiente avaliação técnica e política da maioria das medidas fundamentais, o clima de desconfiança e de insegurança alimentado nos gestores e investidores - a crise de produtividade acompanhada por sensíveis alterações na distribuição de rendimentos;
Não teria de ser assim se tivesse havido a serenidade bastante para realizar, com oportunidade, as reformas e as políticas que a instauração da democracia e o diálogo entre pessoas de diversas ideologias permitiam aprofundar.
Apesar de tudo, passados os anos, verificamos que não se confirmaram as previsões pessimistas que os economistas, mesmo os mais moderados, apresentavam e que foi possível reorganizar a economia portuguesa em novas bases, mais coerentes do que aquelas que existiam em 1974.
Devemos isso a uma extraordinária capacidade de sacrifício dos Portugueses e à efectiva adaptação de muitos empresários e gestores, que souberam enfrentar as dificuldades com ponderação e serenidade.
Sublinho estas duas realidades; porque elas têm sido sistematicamente esquecidas no calor do debate político e ideológico.
Por outro lado, o processo de normalização da actividade económica processou-se em ligação estreita com a normalização da democracia pluralista e com a clarificação das regras que oferecem estabilidade e segurança.
A publicação de legislação regulamentadora da actividade económica, baseada na procura do consenso e do equilíbrio, permitiu anular ou reduzir dúvidas e ambiguidades, demonstrando que era possível à cooperação entre concepções programáticas que puderam convergir no essencial.
Considero que os resultados obtidos, que finalmente se traduziram numa recuperação económica significativa, demonstraram a validade de uma concepção de política económica que concilia os princípios da economia de mercado com a procura de soluções negociadas que satisfaçam a justiça social e os imperativos de desenvolvimento.
Empenhei-me na defesa destes princípios. Continuarei a defendê-los e procurarei evitar que eles sejam adulterados ou iludidos por afirmações demagógicas.
O importante processo político e legislativo de consolidação das autonomias dos Açores e da Madeira é outro dos marcos fundamentais do caminho já percorrido desde o 25 de Abril.
Por certo, o principio da autonomia, no quadro amplo em que é definido na Constituição, não teria sido possível, nem mesmo concebível, sem o espírito de Abril e sem a instauração democrática.
O reconhecimento da realidade nacional portuguesa, implicando a noção das diferenças sem romper a unidade no que é essencial, exige a abertura de concepções e a defesa de direitos regionais que só a democracia pode garantir.
Por isso, não poderia haver uma real prática autonômica sem uma efectiva vivência democrática.
E também não haveria democracia completa se não fossem contempladas as aspirações de povos que, sendo inquestionavelmente portugueses, apresentam um quadro de vida e cultura que lhes confere uma identidade específica.
A autonomia é, ainda, um valor essencial para a definição consistente do Estado Português. De facto, sem a flexibilidade que é permitida pelo estatuto amplo de autonomia, a integridade da Pátria Portuguesa estaria sob permanente ameaça. Uma vez cortado o vínculo nacional entre o continente e as regiões, por acção de poderes adversos, explorando o fácil pretexto da falta de lealdade na concessão de autonomia, estaria desencadeado o processo que arrastaria os homens e as mulheres dos Açores e da Madeira à subordinação a interesses alheios.
O meu constante e inequívoco empenhamento no processo autonômico resulta de o considerar um programa urgente em múltiplas perspectivas: no plano histórico, porque esse é um compromisso do 25 de Abril; no plano político, porque essa é uma consequência da democracia e, como tal, prevista na nossa Constituição; no plano nacional, porque a integridade do Estado Português tem como uma das suas condições a efectiva realização dos objectivos da autonomia.
Continuarei, assim, a desenvolver todos os esforços para que a autonomia encontre rapidamente a concretização necessária em todos os seus aspectos.
Em plano semelhante, não posso deixar de apontar a política de descentralização regional como um dos pontos fulcrais da vida nacional dos últimos anos. Também este objectivo seria irrealizável num regime autoritário, que precisa ido controle exercido da capital para poder assegurar as fidelidades políticas que o sustentam.
Aqui, como na autonomia, só a vivência democrática oferece as condições para romper com o hábito de séculos, que faz da distribuição das benesses locais uma fonte de controle político e um meio de submissão das populações.
Por uma compreensível precaução de realismo no plano orçamental, os passos que se desejou dar na direcção do reforço dos poderes locais não foram tão nítidos quanto as expectativas criadas, sobretudo ao nível legislativo, poderiam justificar.
Mas os compromissos assumidos pelo poder democrático reforçam a minha convicção de que não serão dados passos atrás neste projecto essencial, com profundas raízes na nossa tradução municipalista.
O último aspecto marcante destes seis anos, a que me referirei, é o que se reporta ao posicionamento geopolítico, económico e estratégico de Portugal e à expressão da sua política externa. Terá

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sido este o domínio político em que ocorreram maiores transformações.
Do país colonialista e internacionalmente isolado, que era repudiado no Mundo e combalido em África, sem poder contar com o apoio dos aliados tradicionais, Portugal tornou-se num país respeitado, uma pequena potência que tem um papel a desempenhar no Mundo e que não se pode limitar a ser o instrumento passivo dos interesses alheios.
Mais do que isso: muitas das suas potencialidades no campo da cooperação internacional, no âmbito bilateral ou multilateral, esperam ainda o seu pleno desenvolvimento; já que estes últimos anos nada mais permitiram - nem poderiam permitir - do que atingir um posicionamento adequado no plano externo e, de mm modo mais preciso, no eixo das relações entrega Europa e a África.
Também neste plano, a democracia, a descolonização e a assunção do princípio da universalidade das relações permitiram a Portugal a abertura de horizontes que lhe estavam completamente vedados.
Importante será que este percurso muito positivo não sofra as consequências de orientações inseguras e movidas por preocupações de índole conjuntural, que podem afectar a credibilidade de Portugal no Mundo e os próprios interesses nacionais.
É está, aliás uma condição essencial do reforço da nossa posição no quadro político da Europa, de que somos e deveremos ser parte integrante.
Inseridos na Europa por motivos políticos, culturais, económicos e sociais, desenvolvendo nos últimos quatro anos um processo, seguro e realista, de negociações para a nossa entrada na Comunidade Europeia. Esta decisão implica a mobilização dos Portugueses e o empenhamento dos agentes políticos, económicos e sociais, o que passa necessariamente por um completo esclarecimento da opinião pública.
Trata-se de uma decisão política de fundo que implica, para ser válida, uma grande responsabilidade de negociação e uma indispensável capacidade de resposta da Administração portuguesa e a necessária reorganização do aparelho, produtivo nacional, sem o que a nova autonomia de decisão e o próprio desenvolvimento económico e social poderão ser afectado, com prejuízo óbvio para Portugal e sem vantagem significativa para a Europa.
Na verdade, a integração de Portugal na Comunidade Europeia apenas será útil para ambas as partes se Portugal mantiver e desenvolver aquilo que é específico da sua posição na Europa, seja em termos das relações económicas normais, seja em termos das afinidades históricas e culturais e, em particular, da sua capacidade de diálogo com os países da expressão portuguesa.
Por isso, este vector da nossa política externa, prioritário desde a primeira hora após a institucionalização democrática, exigindo resposta eficaz e organizada dos Portugueses, implica, também que não se subalternize, bem pelo contrário, que se reforce a posição e o prestígio que Portugal já hoje detém em África, no Mundo árabe e na América Latina.
Desta ligação, estável e justa depende, em grande parte, a autonomia económica de Portugal e das suas empresas no quadro altamente competitivo da Europa, como o comprova o largo conjunto de interesses que empresas portuguesas puderam já assegurar em diversas zonas do Mundo, em consequência da abertura política oferecida pelo 25 de Abril.
Mas dessa ligação depende, também, o interesse da função que Portugal pode desempenhar na Europa, que o mesmo é dizer que dela dependem, em medida substancial, as condições mais ou menos favoráveis das negociações de adesão, dos apoios que pudermos receber e das contrapartidas que viermos a prestar. Para o êxito desta política de credibilidade internacional muito tem contribuído a nossa participação crescente no âmbito do sistema das Nações Unidas, nomeadamente no Conselho d« Segurança, na UNESCO e noutros organismos especializados, e a seriedade com que temos satisfeito os nossos compromissos internacionais.
A nossa participação na Aliança Atlântica, que corresponde aos interesses de defesa da Europa e da democracia pluralista, reforçada pelas condições políticas criadas pelo 25 de Abril e consolidadas depois do 25 de Novembro, assumiu a sua plena coerência com a institucionalização do regime democrático.
A posição de Portugal é bem explícita: enquanto houver blocos militares na Europa, Portugal pertencerá à NATO.
A clareza e a autenticidade da expressão da nossa política externa reconduziu-nos a uma posição de parte inteira a todos os níveis da cooperação atlântica, ao mesmo tempo que permite intervir, na medida das nossas possibilidades, em favor do desanuviamento, da paz e da segurança internacionais.
A credibilidade entretanto adquirida dá-nos a possibilidade de contribuir também para a conciliação de interesses entre zonas de economias desenvolvidas e de regiões com recursos naturais de significativa importância em termos de desenvolvimento económico e social, orientação política que deverá ser entendida com realismo e com a determinação de se afirmarem interesses recíprocos.
É nesta perspectiva que se deve compreender o meu empenhamento em criar com os países de expressão portuguesa uma cooperação duradoura e permanente, isenta de ambiguidades ou falsas promessas ou quaisquer hipotecas.
Dentro das competências que a Constituição me confere e de acordo com o que a defesa do interesse nacional obviamente impõe, não deixarei de conjugar todos os esforços para que estas linhas de política externa sejam efectivadas e desenvolvidas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O período que decorreu desde o 25 de Abril é muito curto, demasiado curto, para realizar tudo o que então se desejou. Mas foi suficiente para que se realizasse mais do que muitos acreditaram possível. Seria fácil dizer que, do programa então apresentado, se cumpriu tudo o que era possível na sociedade portuguesa, tudo o que o povo português quis que fosse realizado.
Mas não basta dizer isso. A responsabilidade dos dirigentes políticos exige muito mais do que a repetição destas conclusões óbvias.
Em 25 de Abril de 1974 concretizou-se uma ruptura na sociedade portuguesa. Não há retorno possível à situação anterior, às regras e aos modelos mentais que definiam a eficácia do poder e a sua manutenção num regime assente em processos autoritários.

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A ruptura histórica, política e social marca o início de uma dinâmica democrática.
Numa sociedade democrática, as eleições, os partidos, os sindicatos, as associações empresariais e as outras realidades vividas da liberdade de expressão e de associação defendem em si mesmas e por si mesmas a continuidade da democracia, tornando inúteis as tentativas dos que ainda transportam sonhos ou vocações autoritárias, como ficou provado em 1975. E como tornaria a ser provado se idênticas tentativas surgissem, no futuro, independente da sua origem ou natureza.
Assegurada a institucionalização democrática, consumado o corte com o passado ditatorial, deixou de haver lugar para o conceito de ruptura. Em democracia não há rupturas. Há alternância de partidos e de concepções no poder. Será sempre na garantia de alternância que a democracia encontrará a sua principal defesa contra as vocações autoritárias. Ao contrário da ditadura, não precisamos de alimentar o mito de uma revolução que continua. Apenas temos de verificar que á democracia continua.
Esta é a verdadeira vitória do 25 de Abril, o objectivo que uniu os Portugueses há seis anos.
Mas é possível, e até compreensível, que muitos portugueses confrontem as realidades com as expectativas criadas em Abril de 1974. A observação fria dos factos conduzirá porém, a uma conclusão não pessimista sobre a nossa capacidade colectiva.
Os problemas que os Portugueses tiveram de resolver, neste curto período, foram graves e muito complexos. Enquanto outros países europeus dispuseram de duas décadas para realizar os seus programas de descolonização, Portugal foi forçado a encontrar as soluções possíveis em pouco mais de um ano, sofrendo o impacte considerável que representou a integração de centenas de milhares de desalojados.
Enquanto na Europa a fase principal das nacionalizações e da reorganização das relações económicas se processou imediatamente a seguir à guerra, com o apoio do Plano Marshall e com as populações preparadas para os sacrifícios; Portugal suportou esse processo no quadro de uma intensa luta política e num ambiente social de grandes expectativas de consumo.
E se é certo que vivemos várias crises políticas, não é menos verdade que elas não foram, nos seus fundamentos e nas suas manifestações, diferentes das crises que, ao longo de trinta anos, deram forma às actuais realidades políticas e partidárias dos países da Europa Ocidental.
Foi muito o que se fez. Más não basta para que se encarem com despreocupação os próximos anos. Resistimos eficazmente aos primeiros embates da crise económica, mas as dificuldades que se apresentam no horizonte internacional serão, certamente, ainda mais graves.
Os problemas económicos, nos quais a crise de energia se conjuga com um surto inflacionista mundial, com a perturbação das regras do comércio internacional e com a transição para novas tecnologias produtivas, são condicionamentos inevitáveis de qualquer programa político.
A crise dos equilíbrios mundiais, tanto nos planos político e militar como no plano económico, provoca situações de elevada tensão é pode rapidamente evoluir até ao conflito. Esta è uma ameaça evidente que, se não for encarada com firmeza, serenidade e ponderação, destruirá as sociedades e o quadro de relações em que o progresso é possível.
Nestas perspectivas, a incerteza será a característica principal da década de 80. Novas realidades, novas relações, novas coordenadas de acção, estão em rápida gestação e desenvolvimento. A nossa capacidade de as compreender e de para elas encontrar as respostas adequadas compromete o futuro e até a vida dos nossos filhos.
A resposta interna depende da solidez do consenso nacional. Consenso que implica a renúncia a soluções radicadizantes e bipolarizadoras que, inevitavelmente, gerariam situações de conflito permanente e agravariam os factores de crise. Seria impossível esperar obter uma resposta, eficaz e oportuna, para uma crise que é complexa e global, se a nossa sociedade estiver tão dividida que seja incapaz de se entender para as tarefas essenciais.
A necessidade de reforço da organização democrática não é apenas consequência da convicção de que a democracia é a forma superior de ordenamento da actividade política. Essa actividade é, também, um imperativo inerente à consciência da gravidade da crise que temos de enfrentar.
Por isso, não deixarei de defender o debate responsável orientado para as ideias, para os projectos e para os programas concretos, não deixarei de insistir na procura permanente do consenso eficaz, de modo que se atinja, com segurança, com determinação e sem sobressaltos, a resposta nacional oportuna. Este consenso nacional indispensável há-de encontrar uma tradução adequada no plano político.
Não penso que seja difícil a conjugação dos elementos e das formações partidárias à volta do regime democrático saído dó 25 de Abril e do que ele representa em termos de justiça e paz social, segurança e bem-estar.
Esta é a resposta natural em democracia. Esta é a resposta que não deixará de ser formulada pelos que recusam os extremismos e as vias autoritárias. Nada mais é necessário para que se opte pela negociação aberta e pelo esclarecimento público das; divergências superáveis e, para que se aceite a dinâmica normal em qualquer sistema político democrático.
As democracias europeias, longamente experimentadas, mostram-nos que é possível e necessária a construção de núcleos centrais democráticos estabilizadores, capazes de neutralizar os extremismos.
Na história recente da Europa há indicações suficientes sobre a conciliação possível das concepções políticas democráticas que o 25 de Abril quis viabilizar. Precisamos de estar bem conscientes de que poucas alternativas há, mesmo só no domínio das ideias, a esta conjugação do consenso nacional cora o consenso político. Não devemos esquecer que a gravidade dos problemas e a consequente instabilidade social podem alimentar em alguns a tentação da autoridade como um fim em si mesma, ainda que, com o pretexto de melhor organizar o esforço colectivo. É um engano e, a ser tentado, estará condenado à desilusão. Nenhum povo oprimido, nenhuma sociedade dividida, poderá responder com oportunidade às solicitações exigentes da crise.

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26 DE ABRIL DE 1980 1705

O que temos para fazer, neste quadro de dificuldades, tem vindo a ser clarificado ao longo dos últimos anos.
Por isso mesmo, não poderemos deixar de reforçar o que ide positivo existiu no caminho percorrido, nas vias experimentadas e nos ensinamentos que dos seus êxitos e dos seus fracassos já recolhemos.
Também por isso, continuará a ser um objectivo constante a recusa da militarização da vida política, porque nem os militares têm vocação institucional para a interferência nos consensos políticos, nem a democracia é compatível com a pressão de instituições que não são políticas e tudo têm a beneficiar com a sua posição de estrita independência.
Precisamos de clarificar, nos pontos onde ainda algumas dúvidas pertinentes possam subsistir, as negras da nossa organização económica, prolongando um trabalho seguro, ponderado e estabilizador de normalização das relações económicas internas.
A via seguida terá de continuar a ser a de assegurar a cooperação, sem privilégios especiais, dos agentes empresariais do Estado com os agentes empresariais privados, de modo que se consiga garantir, com estabilidade e sem incertezas, em verdadeira segurança, o maior benefício colectivo.
Pana que a liberdade valha a pena ser vivida é necessário perspectivar aos Portugueses condições de vida mais favoráveis. O desenvolvimento económico tem de ser um objectivo mobilizador para todos os trabalhadores, em especial para os jovens, que têm sido os mais afectados.
Seria inaceitável que a democracia impusesse sacrifícios sem limites, fechasse os horizontes, destruísse a convivência entre as gerações e perdesse a generosidade dos jovens e esquecesse ainda as aspirações de regresso de milhares de compatriotas nossos que no estrangeiro fazem a sua com dificuldade.
Para que se garantam a estabilidade e a segurança, teremos de encarar a oportunidade de revisão constitucional com a preocupação de nela consubstanciar o resultado da experiência recolhida e a manifestação do consenso nacional.
A Constituição de 1976 foi aprovada por mais de 90% dos representantes do povo português. E por razões de verdade histórica não posso deixar de chamar a atenção dos Portugueses para as posições assumidas pelos partidos políticos perante o II Pacto, nomeadamente pelos partidos com maior representação parlamentar, o PSD e o PS.
Como Lei Fundamental, que determina as condições de legitimidade, deverá ser revista, como em qualquer país democrático, tendo como objectivo a sua actualização. Mas deve ser preocupação imperativa não tornar essa revisão e as novas normas constitucionais um objecto de luta política constante.
Não se pode concordar com o paradoxo político de fazer da Lei Fundamental, que deverá estabilizar e normalizar o comportamento democrático, o tema e o pretexto principal de divisão política, de contestação e de instabilidade.
Por isso, também aqui - mais aqui do que em qualquer outro domínio -, importa preservar e estimular o consenso nacional e assegurar a articulação adequada entre o consenso nacional e o consenso político.
A pedagogia democrática, baseada na difusão cultural, na defesa intransigente da liberdade de expressão e de informação e no direito à livre afirmação de opinião política, continuará a ser a fonte das energias sociais necessárias as respostas nacionais oportunas. Por isso, não será nunca admissível que quem invoca ou exerce o poder democrático dele se pretenda servir.
Nem será aceitável que os meios de comunicação social, que devem ser o suporte da razão democrática, sejam pervertidos para se, colocarem ao serviço de objectivos e de interesses particulares. Não há democracias nem pátrias defendidas quando as populações são mantidas na ignorância ou afastadas das questões de fundo por sofismas e por manipulações da verdade.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os programas exigidos pela situação e pelo nosso compromisso consciente com a democracia pluralista são simples. Apenas precisamos da humildade suficiente, o que é natural em democracia, para esquecer as posições rígidas e procurar, confiadamente, o consenso nacional que está ao nosso alcance.
Podemos assim comemorar o 25 de Abril de 1980 com a confiança de quem acredita na vocação democrática de uma nação de mais de oito séculos e no anseio cristão de justiça, que deve fazer de Portugal livre a pátria-mãe de todos, mas de todos sem excepção, os Portugueses.

Aplausos do PSD, do PS, do PPM, do MDP/CDE e dos Deputados reformadores.

O Sr. Presidente: - Em nome de S. Ex.ª o Sr. Presidente da República declaro encerrada a reunião.
A banda da Guarda Nacional Republicana executou de novo o Hino Nacional.
Realizou-se então o cortejo de Saída, composto pelas mesmas individualidades da entrada, tendo o Sr. Presidente da República saudado o corpo diplomático com uma vénia ao passar diante da respectiva tribuna.

Eram 18 horas.

Deputados que faltaram à sessão:

Partido Social-Democrata (PSD)

António José Ribeiro Carneiro.
António Maria de O. Ourique Mendes,
Armando António Correia.
Germano Lopes Cantinho.
João Baptista Machado.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
José Henrique Cardoso.
José Theodoro da Silva.
Mário Dias Lopes.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Nicolau Gregório de Freitas.

Partido Socialista (PS)

Adelino Teixeira de Carvalho.
Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Rodrigues Ferreira Gamboa.
António Francisco Barroso Sousa Gomes.
António Manuel de Oliveira Guterres.
Armando dos Santos Lopes.
Beatriz M. de Almeida Cal Brandão.

Página 1706

1706 I SÉRIE-NÚMERO 43

Carlos Manuel Natividade Costa Candal.
Francisco Cardoso P. de Oliveira.
Guilherme Gomes rios Santos.
Herculano Rocha.
João Alfredo Félix Vieira Lima.
João Joaquim Gomes.
José Gomes Fernandes.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Luís Silvério Gonçalves Saias.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Manuel Joaquim, de M. P. Tavares Santos.
Manuel José Bragança Tender.
Victor Manuel R. Fernandes de Almeida.

Partido Comunista Português (PCP)

José António Veríssimo Silva.

Centro Democrático Social (CDS)

Américo Maria Coelho Gomes de Sá.
António Martins Canaverde.
Carlos Alberto Faria de Almeida.
Domingos da Silva Pereira.
Henrique José C. de Meneses P. Moraes.
José Augusto Fernandes Sanches Osório.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
Luís António Matos Lima.
Luís Carlos C. Veloso de Sampaio.
Manuel Cunha Moita.
Manuel Eugénio P. Cavaleiro Brandão.

Partido Popular Monárquico (PPM)

Augusto Martins Ferreira do Amaral.
Henrique José Barrilaro F. Ruas.

Agrupamento Parlamentar dos Reformadores

José Manuel Medeiros Ferreira.

O REDACTOR DE 1.ª CLASSE, José Diogo.

PREÇO DESTE NÚMERO 26$00

IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA

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