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I Série - Número 45

Quarta-feira, 30 de Abril de 1980

DIÁRIO

da Assembleia da República

I LEGISLATURA 4.ªSESSÃO LEGISLATIVA (1979-1980)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 29 DE ABRIL DE 1980

Presidente: Exmo. Sr. António Duarte Arnaut

Secretários: Exmos. Srs. Manuel Henriques Pires Fontoura
Alberto Marques Antunes
José Manuel Maia Nunes de Almeida
João Daniel Marques Mendes

SUMÁRIO. -O Sr. Presidente declarou aberta a reunião às 10 horas e 10 minutos.
Na continuação da discussão das Propostas de Lei do Orçamento e das Grandes Opções do Plano para 1980, fizeram intervenções, além dos Srs. Ministros da Educação e Ciência (Vítor Crespo) da Administração Interna (Eurico de Melo) e da Defesa Nacional (Amara da Costa), os Srs. Deputados Macedo Pereira (CDS), Carlos Carvalhas (PCP), Manuel dos Santos (PS), Sousa Marques (PCP), Adriano Vasco Rodrigues (CDS). José Leitão (PS), Nuno Godinho de Matos (DR), Natália Correia (PSD), José Casimiro (PCP), Helena Cidade Moura (MDP/CDE), José Ernesto de Oliveira (PCP), António Mota (PCP), António Arnaut (PS), Zita Seabra PCP), Neiva de Oliveira (CDS), Rui Amaral (PSD), António Campos PS), Manuel Pereira (PSD), Jerónimo de Sousa (PCP), João Amaral (PCP), Mário Tomé (UDP), Miranda da Silva (PCP), Luís Catarino (MDP/CDE) e Borges de Carvalho PPM).
Usaram também da palavra, a diverso título, além dos Srs. Ministros do Comércio e Turismo (Basílio Horta), Adjunto do Primeiro-Ministro (Pinto Balsemão) e das Finanças e do Plano (Cavaco e Silva), os Srs. Deputados Mário Adegas (PSD), Ângelo Correia (PSD), Luís Beiroco (CDS), Renda[ de Oliveira (PS), Veiga de Oliveira (PCP), Jaime Gama (PS), Amândio de Azevedo (PSD), Carlos Brito (PCP), Malato Correia (PSD), Oliveira Dias (CDS), Sousa Tavares (DR), Manuel Malaquias (PSD), Sousa Marques (PCP), Adalberto Ribeiro (PCP), Rui Amaral (PSD), Álvaro Figueiredo (PSD) e José Manuel Casqueiro (CDS). a alguns dos quais os oradores responderam.
No primeira parte da reunião a Assembleia saudou a Delegação Parlamentar Britânica à União Interparlamentar, presente numa das Tribunas.
O Sr. Deputado Carlos Lage (PS) requereu, em nome do seu partido, a constituição de uma comissão parlamentar de inquérito à actividade do Sr. Ministro da Defesa Nacional.
Foi anunciada a retirada, pelo CDS, do pedido de ratificação (n.º305/I) relativo ao Decreto-Lei n.º 540/79, de 31 de Dezembro, e a interposição de recurso, pelo PCP e pelo PS, quanto à admissão decreto de lei n.º 455/I sobre o processo de recenseamento dos cidadãos residentes no estrangeiro).
O Sr. Presidente encerrou a reunido às 22 horas e minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 10 horas.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados.

Partido Social-Democrata (PSD)

Álvaro Barros Marques de Figueiredo.
Amândio Anes de Azevedo.
Amélia Cavaleiro M. de Andrade de Azevedo.
António Alberto Correia Cabecinha.
António José Ribeiro Carneiro.
Armando António Correia.
Carlos Manuel Pereira de Pinho.
Cecília Pita Catarino
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Fernando José Sequeira Roriz.
Fernando Raimundo Rodrigues.
Henrique Alberto F. do Nascimento Rodrigues.
Hermenegildo José da Silva Tavares.
Jaime Adalberto Simões Ramos.
João Aurélio Dias Mendes.
João Baptista Machado.
Joaquim Marques Gaspar Mendes.
José Baptista Pires Nunes.
José Henrique Cardoso.
Leonardo Eugénio R. Ribeiro de Almeida.
Manuel António Lopes Ribeiro.

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Manuel Henriques Pires Fontoura.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Manuel Pereira.
Marília Dulce C. P. Morgado Raimundo.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Mário Martins Adegas.
Miguel Camolas Pacheco.
Nuno Aires Rodrígues dos Santos.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Valdemar Cardoso Alves.

Partido Socialista (PS)

Adelino, Teixeira de Carvalho.
Alberto Marques Antunes.
Amadeu da Silva Cruz.
António Duarte Arnaut.
António Fernando Marques R. Reis.
Beatriz M. de Almeida Cal Brandão.
Francisco Igrejas Caeiro.
Guilherme Gomes dos Santos.
Herculano Rocha.
José Maximiano de A. Almeida Leitão.
Manuel António dos Santos.
Maria Emília de Melo Moreira da Silva.
Raul da Assunção Pimenta Rego.
Victor Manuel Gomes Vasques.

Partido Comunista Português (PCP)

Adalberto António de V. Casais Ribeiro.
Alberto Jorge Fernandes.
Álvaro Augusto Veiga de Oliveira.
Álvaro Favas Brasileiro.
António da Silva Mota.
Carlos Alberto do C. da Costa Espadinha.
Carlos Alberto do Vale G. Carvalhas.
Custódio Jacinto Gingão.
Dinis Fernandes Miranda.
Fernando de Almeida Sousa Marques.
Francisco Miguel Duarte.
Hélder Simão Pinheiro.
João António Gonçalves do Amaral.
Joaquim António Miranda da Silva.
Joaquim Victor Baptista G. de Sá.
José Casimiro Sousa Correia.
José Ernesto I. Leão de Oliveira.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Rodrígues Vitoriano.
Josefina Maria Andrade.
Manuel Gaspar Cardoso Martins.
Maria Beatriz Ladeiras da Silva Nunes.
Maria da Conceição Morais Matias.
Maria Ilda da Costa Figueiredo.
Marino B. de Vasconcelos B. Vicente.

Centro Democrático Social (CDS)

Adriano Vasco da Fonseca Rodrigues.
Alexandre Correia de Carvalho Reigoto.
António Ferreira Pereira de Meio.
Artur Fernandes.
Domingos da Silva Pereira.
Francisco Manuel L. V. Oliveira Dias.
João Daniel Marques Mendes.
João José Magalhães F. Pulido de Almeida.
José Manuel Macedo Pereira.
Luís António Matos Lima.
Luís Eduardo da Silva Barbosa.
Luís Filipe Pais Beiroco.
Maria José Paulo Sampaio.
Rui Eduardo F. Rodrigues Pena.

Partido Popular Monárquico (PPM)

António José Borges G. de Carvalho.
Gonçalo Pereira Ribeiro Teles.
Henrique José F. Barrilaro F. Ruas.

Agrupamento Parlamentar dos Reformadores

Armando Adão e Silva.
Pelágio E de A. Matos Lopes de Madureira.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE)

Helena Tâmega Cidade Moura.

União Democrática Popular (UDP)

Mário António Baptista Tomé.

O Sr. Presidente: - Responderam à chamada 92 Srs. Deputados e, como sabem, neste período em que não há deliberações a Assembleia pode funcionar com apenas 85 Deputados.
Temos quórum, pelo que declaro aberta a reunião.

Eram 10 horas e 10 minutos.

O Sr. Presidente: - Entretanto, alguns colegas nossos estão neste. momento a acompanhar a delegação britânica que se encontra de visita ao Palácio de S. Bento.
A Mesa aguarda inscrições para o debate que vai seguir-se.

Pausa.

Acaba de inscrever-se, facilitando, desta forma o início dos nossos trabalhos, o Sr. Ministro da Educação e Ciência, Vítor Crespo, a quem vou dar a palavra.
Peço aos Srs. Deputados que se inscrevam, para que o debate possa iniciar-se e prosseguir com normalidade.
Tem V. Ex.ª a palavra, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Educação e Ciência (Vítor Crespo): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em qualquer país, em qualquer povo, verifica-se, no que à educação respeita, um conjunto de tendências uniformes: - 0 aumento da escolarização das populações, o crescimento da complexidade dos sistemas educativos, o consequente aumento dos custos da Educação.
Por isso, todos os Governos se debatem com problemas de racionalização dos custos da educação e com a procura teórica de até onde devem ir os sistemas educativos e qual a sua organização que permita conseguir iguais fins com menores encargos.
Problema complexo, pois ainda não é possível calcular os custos/benefícios da educação. No que se refere aos benefícios, estão envolvidos aspectos de natureza qualitativa relacionados com o bem-estar e satisfação pessoal que se repercutem pelo período dilatado da vida activa de cada indivíduo.
E mesmo os custos da educação não são facilmente contabilizáveis. Podem determinar-se com alguma previsão as verbas inscritas nos orçamentos do Estado

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para suporte do sistema educativo, mas já não é fácil determinar outros custos o da quantidade de trabalho não realizado pelo jovem enquanto estudante, o não aproveitamento da criatividade máxima do indivíduo, por estar ocupado em tarefas ainda formativas, para não falar nos encargos directos das famílias.
Pelas razões apontadas, pelo reconhecimento de que a educação é o motor fundamental 'do desenvolvimento da sociedade, nenhum educador, nenhum Ministro da Educação de um Governo tecnicamente competente, afirma que são excessivas as verbas inscritas em orçamentos para o sistema educativo.
Daqui se conclui que não faz qualquer sentido produzir uma crítica geral de que são insuficientes as verbas inscritas no Orçamento do Estado no sector da* educação.
É que o problema tem de ser visto de outra maneira.
Só pode ser medido o empenhamento de um Governo na educação através da análise da distribuição das verbas disponíveis e da verificação da percentagem que delas coube à educação.
Um Governo que se preocupa com o bem-estar do povo, que reconhece o papel da educação como factor do progresso social, que sabe que na igualdade de acesso e fruição do sistema educativo se consubstancia o princípio da igualdade de oportunidades, que respeita o desenvolvimento da personalidade e da possibilidade da realização integral de cada um, um Governo que preza todos aqueles princípios investe na educação e faz aumentar os gastos relativos com o sector.
Assim faz o Governo da Aliança Democrática!

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Estudos comparativos na educação, como, aliás, em qualquer sistema ou subsistema, só têm validade quando feitos entre conjuntos equivalentes, o que nem sempre acontece!
Nas estatísticas portuguesas são normalmente considerados como gastos com a educação apenas os orçamentos do Ministério da Educação e Ciência, ficando assim de fora outras parcelas importantes. A construção e manutenção de escolas e as verbas correspondentes estão a cargo do Ministério da Habitação e Obras Públicas ou das autarquias locais. Muitas das acções relativas ao ensino especial e à educação pré-escolar são suportadas por orçamentos doutros departamentos, designadamente o Ministério dos Assuntos Sociais.
Daí que uma correcta comparação dos gastos com a educação de Portugal e de outros países careça de uma análise das estruturas da repartição de encargos que não cabe aqui fazer. No entanto, a estrutura de encargos com a educação, a cargo do Estado, tem sido essencialmente constante no longo dos anos, pelo que são legitimas comparações internas e o estudo da evolução dos custos com o sistema educativo.
De todos os índices, o valor geralmente reconhecido como pedra de toque do lugar do sistema educativo nas preocupações de um Governo é a percentagem do produto nacional gasta com a educação.
A análise dos orçamentos a partir de 1965 até ao presente mostra quais os aumentos das percentagens do produto nacional bruto de um ano para o seguinte: de 1965 a 1970 houve um acréscimo médio de 2,9%; de 1970 a 1973, um acréscimo médio de 8,3%; de 1973 a 1974, um acréscimo médio de 200/o; de 1974 a 1975, um acréscimo médio de 12,5%, e de 1975 a 1976, um acréscimo de 70%. A partir de 1976 verificou-se um decréscimo. Em 1977 decresce 5%; em 1978 decresce 22.2 % e em 1979 decresce ainda 9,1%, para em 1980 crescer 36,4%.
Daqui se conclui que há um nítido decréscimo de 1976 a 1979, sendo neste último ano a percentagem do produto nacional bruto apenas 22% superior à percentagem de 1975, ano a que corresponde o primeiro orçamento do Portugal democrático.
Repare-se que a percentagem de aumento deste ano é de 36,51%, maior do que a do ano passado, ou seja, o acréscimo de 1979 para 1980 é superior a 1,5 vezes o acréscimo global de 1975 a 1979.
E isto apesar de, pelo facto de se dar um novo avanço no sentido da aplicação da Lei das Finanças Locais, terem sido retirados do orçamento do Ministério da Educação e Ciência projectos de equipamento dos ensinos primário, preparatório e secundário no valor de 1246 000 contos, que serão financiados pelas dotações das autarquias locais, passando a correspondente verba, tradicionalmente inscrita no orçamento do MEC, a deixar de nele figurar.
Podia fazer-se uma análise de outros índices. As conclusões a que se chegaria seriam idênticas, uma vez tido em conta o significado de todas as variáveis.
Daqui se tira uma conclusão óbvia e irrefutável.
0 Governo da Aliança Democrática manifesta no sector educação uma determinada vontade política de justiça social e da criação de condições para uma
efectiva igualdade de oportunidades. Manifesta o seu empenho em ver melhorado todo o sistema educativo e há neste contexto um aspecto que deve ser
realçado.
A educação corresponde a um investimento a longo prazo, o que faz com que os seus orçamentos sejam normalmente sacrificados em tempo de austeridade, onde o imediato se sobrepõe ao distante.
Assim, porém, não aconteceu no Orçamento do presente ano, ocupando o Ministério da Educação e Ciência uma posição de relevo na estrutura orçamental.
Comecei por afirmar não ter grande sentido a crítica baseada nos encargos globais com a educação, quando feita em termos absolutos.
0 mesmo deve ser dito relativamente a análises das diversas rubricas,
Uma análise das diferentes rubricas mostra que de entre as de mais significado e dimensão as que tiveram maiores aumentos foram: "Obra Social do MEC", mais 54%; "Direcção-Geral do Ensino Básico", mais 53%; "Direcção-Geral do Ensino Secundário", mais 68%; "Direcção-Geral da Educação de Adultos", mais 110%; "Fundo de Apoio da Educação Popular", mais 1127%; "Novos serviços", mais 38%, a que há a acrescentar a verba de 140 000 contos no OGE para o 12.º ano de escolaridade.
Situação paralela se verifica no PIDDAC, que sofre de 1979 para 1980 um aumento de 87%. Também aqui a tónica aparece nos aspectos mais rele-

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vantes da educação - à expansão e dignificação do ensino que engloba a educação pré-escolar, o ensino da maior parte dos estudantes e um apoio em favor dos mais desfavorecidos.
0 Orçamento não poderia deixar de conter em si, de um modo subjacente, certos aspectos da proposta de Lei de Bases do Sistema Educativo, que acaba de ser enviada a esta Câmara.
Não ainda de forma muito acentuada, pois que quaisquer alterações funcionais do sistema educativo terão lugar de, Outubro em diante, isto apenas num trimestre do ano económico.
Porém, no Orçamento já se encontram as provisões para o lançamento do 12.º ano de escolaridade e o correspondente fim da experiência do Ano Propedêutico, a expansão da educação pré-escolar e do ensino básico, já entendido como uma escolarização de nove anos, o alargamento do ensino superior, a criação de condições para uma melhor formação dos corpos docentes, os apoios sociais indispensáveis e um esforço no sentido da concretização do princípio da liberdade de ensinar e aprender.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estas são as considerações gerais que julguei oportuno fazer sobre o sector da educação, no âmbito da discussão do Orçamento Geral do Estado.
A estrutura do orçamento do MEC enquadra-se naturalmente nas prioridades, estabelecidas no Programa do Governo.
De entre elas, e, por estarem na fase final de preparação, destacarei:

1) A institucionalização dos cursos, de mestrado e doutoramento nas Universidades, passo fundamental para o desenvolvimento, da investigação científica e, em particular, para a preparação de professoras dos ensinos superiores.
É fundamental a expansão deste ensino, o qual irá preparar os diplomados com os perfis próprios para o desenvolvimento cultural, científico e tecnológico do País. Entre esses diplomados encontram-se os professores necessários para o d2envolvimerito, da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário.
Mas não fica por aí a importância da institucionalização dos cursos de mestrado e doutoramento. Com eles podem preparar-se os investigadores capazes de criar ciência e tecnologia ou simplesmente preparar as transferências de tecnologia necessárias para o desenvolvimento, industrial do País;
2) Elaboração do estatuto e carreira do investigador. Com ela procura dar-se a estabilidade suficiente aos investigadores e proporcionas as condições de trabalho que originem um melhor rendimento de actividades de investigação e de investigação e desenvolvimento no âmbito do Ministério de Educação e Ciência;
3) Preparação da Lei de Bases do Ensino Especial. - Faltam no País escolas de atendimento dos deficientes, faltam igualmente professores habilitados para o acompanhamento das crianças; para a resolução de um e de, outro daqueles problemas é essencial a publicação da Lei de Bases do Ensino especial, actualmente em fase de discussão;
4) Estatuto do Ensino Particular o Cooperativo. - A sua falta é por todos tida como manifestamente inconveniente. Com o Estatuto irão estabelecer-se as normas de apoio técnico, pedagógico e financeiro a uma actividade do maior interesse público, que contribui decidamente para a cobertura da rede escolar do País e para o aparecimento de novas facetas, da educação, que irão abrir melhores perspectivas no âmbito da liberdade de ensinar e aprender.
No sector da educação, nunca há um objectivo final. A educação é o pré-requisito da tecnologia, da cultura, da produção, da política. Evolui com elas sem nunca, no entanto, com elas se deixar confundir. Nos tempos modernos, as oportunidades de realização pessoal estão intimamente, ligadas aos níveis de escolarização, que cada uni atinge, o que torna o sistema educativo um factor de igualização. ou, pelo contrário, um grave sector de discriminação. Tudo depende da sua abertura à igualdade de oportunidades. Contribuirá para uma maior justiça social se fornecer a cada indivíduo as qualificações, os conhecimentos e o desenvolvimento da personalidade de acordo, com as suas capacidades e vontades e proporcionar-lhe-á um enriquecimento, que, faz com que tenha uma vida melhor em família, na comunidade e nos tempos livres.

Vozes do PSD e do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Para tanto é preciso dotar a educação com os meios necessários e é o que, está a fazer o Governo da Aliança Democrática.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

0 Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Macedo, Pereira, para uma intervenção.

O Sr. Macedo Pereira (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A análise da proposta de lei orçamental para 1980 leva-nos a constatar que o Governo da AD s propõe, cumprir a sua promessa de redução, de dois importantes impostos directos: o imposto profissional e o imposto complementar. Nada mais justo!
Desde 1974 que o contribuinte português vinha sentindo os sucessivos agravamentos dos impostos que mais especificamente lhe dizem respeito, pois que, apesar das promessas que lhe eram feitas sobre um melhor nível de vida, assistiu-se a um empolamento do sector público da economia com o consequente aumento das despesas do Estado e, naturalmente, a necessidade de cada vez maiores receitas.
Apesar do deficit apresentado neste Orçamento ser menor, em termos reais, do que do ano anterior esperemos que o deficit das contas não se agrave pois há que tomar medidas, integradas num todo coerente, para estimular e disciplinar a economia.

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Os dois principais iproblemas que o governo tem, de enfrentar são, em nosso entender, o deficit da balança de pagamentos e o riltino de inflação.
Contrariando uma tondência, recente, urge disciplínar a ap'ricação das receitas de capita-l, que só deverão o ipod"o sor afectadas a investimentos bem def inidos.
Na realidade, tem-se verifi-cado os últ,i,mos anckg uma absorção crescente da massa,monetária por aplicaçõcs no seictorpúblioo, administrativo e empresarial, pelo que, a possibilidade de se libertarem recursos destinados ao crédito às empresas privadas passa pola contenção dbs defioits orçamentais.
Se, por um lado, concluímos que é fundamental a libertação de, recursos para investimento privado, também ~nlhecemos que o sonquadramonto conjuntural da variável. investimento é desfavorrável e só uma -gestão muito oficaz conseguirá :relançá-lo de forma consistente.
Quanto aos preços há que acentuar o facto de tL sua itendência altista tor sido com,bati*.da através de implomentação do esquemas de política monetária restritiva.
Pensamos, oon.tludo, que se acham praticamente esgotados todos os efeitos Tesu1tntes de aplicação de políticas de contrôle da procura, pelo que a acção futura do governo se deverá localizar, sobretudo, ao nívi-1 da utilização do instrumentos potenciadores da oferta, concretizando-se uma política de investimentos efectivamente produtivos, conseguirá contTalar-se, ou ,mesmo atenuar-se, a taxa de inflação. Há que -pensar a economia portuguesa a médio pra.zo, digamos para os próximos quatro a cinco anos! Trara-se de um facto ineontroverso e, essencial, -pois que no nosso país subs,istem problemas graves e só -nessa perspectiva é possível a sua resolução, havendo, portanto, que a programar.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os actua-is estrangulamentos financeiros terão de ser superados, na medida em que a próxima adesão à CEE exige do actual gove.rno uma actuação firme e disciplinadora, nos mais diversos domínios, designada mente na impossibilidade de os contribuintes não deverem continuar a suiportar com o dinheiro dos seus impostos, os excessivos deficits de determinadas empresas públicas. Factos incontroversos e exemplificadores fora-m referidos pelo Sr. Mínistro das Finanças -na reunião da Comissão Parlamentar de Economia, Finanças e Plano em que part icipou, pois há empresas do sector público onde os subsíd:Ios são como que engolidos por faltas de produtividade, para não usar outras referências.
Srs. -Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo.: Há forças neste País apostadas cmrn l,iqu!:dar a 4niciativa privada, criadora de, riqueza e emprego.
Uns fazem-no desde 1975, bem às claras, não escondendo os seus desígnios itotal-itários, impondo os seus gigantescos -monopólios doEstado. Outros, mais sinuosamente, jogam nesta situação -confusa em que vi-vemos, objectivando verdadeiros golpes contra a tradição do espírito que preside à i-niciativa da livre empresa em Portugal. Atesta-m-no as declarações de inconstitucionalidade à inicia,tiva governamental para redilimilar o sector público e privado de economia.
Neste quadro geral refiram-se estas e, outras -pesadas dificuldades que o governo enfrenta, -face a bem de-

uerminados contrapodores que jamais poderão querer Portugal como uni -país aberto ao sistema europeu, pluralista e com uma eficaz e dinâmica economia de mercado.

Vozes do PSD-. - Muito bem!

O Orador: - Muito complexa e dificultada fica assim a acção do Sr. Ministro das FA'nanças que vê cerceada, entTe outras, a possibilidade de dinamizar importantes iínstrumonítos como é o mercado de capitais.
Nu-ma altura em que se comemoram os se,is anos que já decorreram desde o restabelecimento das liberdades políticas em Portugal, é de uma lamentável injusfiça e mesmo cinismo -esquecer os milhares de indemnizandos que aguardam, há anos, -receber os valores de que foram esbulhados.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: --Ponsamos assim tios aocionistas das das -em-presas nacionalizadas, nos -fundos Fides e Fia e nos propricitários de, terrenos rústicos expropriados!
Se conquistámos a 1',,berdad-e política, perdeu-se a liberdade de acção no campo wonómico com profundos e negativos reflexos na vida dos cidadãos e só algumas -multinacionais ganharam com este processo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os impostos aparecem na loi do orçamento já -não só como fonte de rece,iita mas também como instrumento de uma política económica,
-Compreendemos tal situação não só pelo curto espaço de tompo de que o Governo dispôs para elaborar a proposta, como pelas sucessivas distorções a que o &istema dos impostos foi sujeito, em especial de 1976 para cá. Aí está um trabalho decisivo para os Dróximos anos, qual seja o de adequar o sistema de política fiscal à concreta defin-ição da política económica que o Governo da Aliança Democrática deseja para este país.
Depois de o Governo ter aliviado a carga tributária das -pessoas -através do imposto profissional e do imposto complementar-, pensamos que no futuro se deverá estimular o investimento -na medida em que a progrçõ,-Qivklade das taxas da contribuição industrial, penW;izarão, assim, a produtividade das empresas, e, nemssariamente, o investimento. Aliás, o englobamento, nas taxas de contribuição industrial. dos adicionais e do imposto de comércio e indústria poderá ter um efeito psicológico negafivo, -pois, aos offios do contribuinte, a lei orçamental apresenta-se como agravando para o dobro as taxas desta cédula. Afastados assim potenciais investidores, quer nacionais, quer estrangeiTos, que não compreonderão esta aparonte subida de taxas, o que acarretará, naturalmente, ser encam:n
, hado para o consumo -com efeito na inflação e não para -a poupança e, desta, para o investimento- aquilo com que se vai aliviar o contn-buinte -no imposto profissional e comple-mentar. Naturalmente que não esquecemos, e apoiamos até, todo o quadro de referência relativo a benefícios fiscais que o Governo elabora actualmente mas pensamos que a pressão sobre os preços poderá ser agravada face à situação descrita.
Sr. Presidente, Srs. -Deputados: No passado, já aqui,

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referimos que a progressividade das taxas em relação à contribuição industrial, criada no período Gonçalvista, é, a todos os títulos, condenável e condenada, no sistema de impostos parcelares, pois que se trata de uma verdadeira penalização de produtividade e do dimensionamento das empresas. No futuro, em nosso entender, dever-se-á fixar uma única taxa, embora, nesse caso, se devesse estabelecer a possibilidade de redução para certas pequenas e médias empresas, económica e socialmente apoiáveis, e para as empresas que aumentem a produtividade e a qualidade, sobretudo para a exportação.
O imposto sobre a industria agrícola foi incluído, pelo anterior Governo, na Lei n.º 21-A/79, que não teve a coragem de o estabelecer. Trata-se de um imposto inadequado às estruturas da agricultura portuguesa e que por isso, já foi criado, resuspenso, retornado, mas não reposto em 1979 e foi agora relembrado... Compreendemos o princípio que leva o Governo a repô-lo mas pensamos que é urgente a revisão do seu regime jurídico. Efectivamente, o regime jurídico deste imposto está impraticável, entregando os agricultores nas mãos de funcionários inaptos para o conhecimento e decisão da complexa problemática do apuramento dos rendimentos da exploração agrícola. Esta cédula do rendimento, pensamos, só num sistema de imposto único poderá ser tratada, com estabelecimento de métodos adequados para a sua determinação. Notamos que a aplicação deste imposto aos rendimentos de 1979 é um desiderato de difícil aplicação pois es contribuintes nada têm preparado quanto a dados para a determinação da matéria colectável, ficando ao arbítrio dos serviços, igualmente desapetrechados para qualquer tributação justa.
Quanto ao imposto profissional, é de referir a forma pronta como o Governo veio ultrapassar a complexa questão referente a algumas medidas introduzidas pelo Governo anterior no Código do Imposto Profissional e quo foram declaradas inconstitucionais. Parecem-nos francamente positivas as medidas referentes a benefícios para aquisição de casa própria.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na parte final desta intervenção pensamos ter aflorado algumas questões com que nos próximos anos o Governo da AD se tem de debater e resolver.
Durante esta I Legislatura nada se fez para implementar o sistema de impostos definido na Constituição, com o qual, aliás, concordamos inteiramente. Não interessou à democracia de alguns, mas agora n contribuinte sente quanta distorção e irrealismo este Governo herdou de um passado recente. O pano de fundo de 'toda esta matéria é bastante complexo pois os encargos do nosso Estado são vultosos. Pode-se apontar o exemplo do serviço de dívida pública que de 3 milhões de contos em 1974 passa para 50 milhões de contos em 1980.
Convém que fique muito claro a nossa posição quanto à verba dedicada às nossas Forças Armadas, que crescem 5,4% em termos reais. O seu valor representa 9% das despesas orçamentais e 2,9% do produto interno bruto. No ano anterior essas percentagens foram 9,8 %. E 2,8 %, respectivamente pelo que, em valores relativos, se podem considerar estabilizados.
Sabemos da forma construtiva e patriótica como decorreu o diálogo entre o Governo e as forças armadas quanto à definição das verbas atribuídas à defesa nacional, facto que só legitima a satisfação com que aprovamos tão sintomático concerto de opiniões. De facto e por comparação, podemos citar que nos países europeus da NATO a percentagem média em relação ao produto interno bruto é de 3,6 % e só o Luxemburgo, com 1%, a Itália, com 2,3%, e a Dinamarca, com 2,4%, apresentam valores inferiores. No Leste as percentagens variam entre os 11% e 13%, pelo que será lícito afirmarmos, que desejamos para o nosso país mais manteiga do que canhões. Recordamos a esta Câmara que sendo Portugal um País alinhado pela NATO, na Conferência de Washington em 1978 os chefes de Estado e de governo dos países que pertencem à NATO estabeleceram um programa de defesa a longo prazo que requer um esforço financeiro considerável dos países membros, com um aumento de 3%) nas despesas de defesa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A situação da economia não permitiu a este Governo melhores conquistas a nível orçamental, face à situação degradada a que se chegou mas competência e espírito de sacrifício da equipa chefiada, pelo Sr. Ministro das Finanças garantem-nos que se está no bom caminho face a tão volumoso trabalho que urge empreender para reformular as nossas finanças públicas.
É que, estando a Europa à porta, Portugal vai aderir a um espaço moderno política e economicamente, como é a CEE, pelo que o Governo da AD e a maioria que o apoia não pouparão esforços para que o próximo quadriénio seja o de real mudança nesta sociedade que cada vez mais se deseja livre, pluralista e próspera, uma sociedade de bem-estar. Este orçamento; é, Sr. Presidente e Srs. Deputados, em nosso entender, o orçamento possível e, em certo sentido, o desejável pelo que o vamos votar favoravelmente.

Aplausos do CDS. do PSD e do PPM.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Deputados: As promessas eleitorais da AD - e já não falo de uma casa para cada português - vão caindo por terra uma a uma, ficando de pé a sua verdadeira política: política de confronto, de desestabilização, de agudização dos conflitos de trabalho, política ao serviço dos grandes barões da indústria e da finança, da guerra fria e da manipulação da informação.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Muito bem!

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Não apoiado!

O Orador: - À paz social prometida, o Governo apresenta ao povo português uma política de confronto e de conflitos, quer com os trabalhadores urbanos e alentejanos, quer com os Órgãos de Soberania, quer ainda no domínio da política externa.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Deve estar a falar do PCP!

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O Orador: - Os trabalhadores são obrigados a lutar para defenderem o seu pão, os seus postos de trabalho. Os conflitos laborais e as greves sucedem-se. E o que faz o Governo? Procura resolvê-los? Não! Começa por classificá-los de políticos e quando pode procura virar a população contra os trabalhadores mesmo que tenha de falsificar números e factos, mesmo que tenha de lançar o pânico na população, como aconteceu ainda há pouco com a vergonhosa intervenção do Sr. Ministro da Indústria no caso da greve da Petrogal.

Vozes do PCP: - Muito bem!

Vozes do CDS: - Não apoiado!

O Orador: - Aqui está, pois, na prática o que significa para este Governo uma política de paz social, de estabilidade, uma política de respeito pelos trabalhadores e pelo povo português.
Na verdade onde está o desenvolvimento económico, a expansão da produção, os projectos industriais, a criação de empregos, a contenção das despesas, a redução do déficit orçamental? Onde está a melhoria do nível de vida do povo e das famílias que no fim do mês, por mais que estiquem os rendimentos não vêem como é que a tão propagandeada revalorização do escudo e do ouro lhes cobre as despesas, nem têm, por outro lado, como o Sr. Ministro das Finanças, a possibilidade de, por meros artifícios contabilísticos, reduzir os deficits dos seus orçamentos pessoais e familiares.
No entanto, pondo e dispondo dos meios de informação estatizados o Governo continua a martelar com a propaganda auto-elogiosa, não se coibindo de utilizar e repetir a mentira, a manipulação de dados e de factos. Assim, com o mesmo descaramento com que o Ministro das Finanças diz que os preços vão baixar...

O Sr. Macedo Pereira (CDS): - Não apoiado!

O Orador: - ..., o Primeiro-Ministro, depois de anunciar na televisão um tecto salarial de 18 º/o, junta-lhe uma pseudo diminuição de impostos e uma promessa de 20 % de inflação, para concluir, como mágico que tira coelhos da cartola, que os salários reais irão aumentar ... E da mesma maneira repete serenamente e sem tremura de voz que os impostos vão baixar.
Ao analisar os documentos, apresentados pelo Governo, fácil é verificar que se agrava a distorção entre os impostos directos e indirectos, a favor destes últimos, e que as modificações do imposto profissional beneficiam, no fundamental, as classes de altos rendimentos. Esta é a mudança no campo dos impostos: reduzir a quem mais tem para tributar a quem menos recebe!
E o mesmo se passa no domínio da assistência social. O Sr. Ministro anunciou aqui ontem, em tom de pregão, alguns aumentos ridículos, repetindo a conversa em família do Sr. Primeiro-Ministro. Mas, a verdade é que l milhão de reformados não terão aumentos em 1980. É certo que o Governo deixa, para efeitos eleitorais, cair algumas migalhas do Orçamento, mas reserva o grande banquete para os Meios e os Espíritos Santos.
Por outro lado, o Governo diz que vai relançar o investimento produtivo, incentivando o investimento privado, mas, como nas Grandes Opções do Plano não apresenta qualquer política de investimento, quer para o sector privado, quer para o sector empresarial do Estado; é lícito perguntar: será que o Governo acredita mesmo que é mantendo as taxas de juro actualmente em vigor, que é com o congelamento ou limitação de importantes projectos das empresas públicas como o Alqueva, a beterraba sacarina e o plano siderúrgico, que é com o controle administrativo do crédito em limites de autêntica estagnação, ou com um crescimento da produção nacional a 3,5% ao ano que o investimento produtivo será efectivamente relançado? Ou pensa ainda que é com o pomposo, diria mesmo monárquico, anúncio da criação de um SII (Sistema Integrado de Incentivos ao Investimento) que este iniciará a sua retoma?
Mas se isto não é assim por que não publica então o Governo o PISEE para este ano?
Aliás, como pode o investimento aumentar em 6% em termos reais se o Governo anuncia nas Grandes Opções do Plano ir autorizar 71,5 milhões de contos de investimentos. Isto é, menos 6,2% do que o montante aprovado em 1979, quando nada faz crer que o grau de realização do Plano de Investimento do Sector Empresarial do Estado seja diferente do ano anterior?
E em relação às empresas públicas é ou não verdade que o Governo afirma que a verba para as dotações do capital estatutário destas empresas (19 milhões de contos segundo o OGE, e não 20 como se escreve nas Grandes Opções do Plano) se destina a investimentos do PISEE? E sendo assim não é verdade também que desta verba cerca de 6 milhões de contos já estão comprometidos por decisão do Governo Mota Pinto, pelo que se o Governo procedesse com honestidade só deveria apresentar a diferença? Porquê então tal mistificação? E como se há-de classificar um Governo que afirma ir reduzir o desemprego, quando depois se vê obrigado a confessar publicamente que os postos de trabalho que vai criar este ano nem sequer dão para a afluência dos jovens que afluem todos os anos ao mercado de trabalho?
E o que se pode dizer de forças políticas que sempre combateram os deficits orçamentais e que agora se mantêm mudas ou aplaudem quando o seu Governo apresenta um Orçamento com um déficit global e corrente de que não há memória? E como devemos apreciar um Primeiro-Ministro que diz, com todo o despudor, que o déficit do Orçamento não pode ser maior de que 141,2 milhões de contos, quando sabe que na realidade aquele déficit é de 161,8 milhões? E que julgar da competência de um Ministro das Finanças, mestre em repetir que o preto é branco, quando diz que os salários contribuíram com 5,9% para a taxa implícita na procura final, procurando dar a ideia de que os salários contribuíram de algum modo para a inflação, quando a única coisa que pode afirmar é que os reflexos da inflação sobre os salários foi de 5,9% e não o contrário.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Muito bem!

O Orador - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os documentos apresentados pelo Governo, OGE e Grandes Opções do Plano são não só um testemunho claro de manipulação de dados como de mediocridade a

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toda a prova. No que respeita às receitas do OGE o Governo apresenta uma revisão de receitas efectivas, sem contas de ordem, de 213,8 milhões de contos, isto é, mais 32% que o efectivamente cobrado no ano anterior. A diferença entre o previsto em 1979 e o efectivamente cobrado resulta, fundamentalmente, das transferências das autarquias que se não chegaram a realizar no exercício, o mesmo sucedendo com parte da receita do imposto extraordinário, num total de cerca de 7 milhões de contos.
Mas tal aumento de receitas é em grande parte aparente, devido às alterações registadas, nomeadamente, na contribuição industrial e no imposto de capitais em resultado da Lei das Finanças Locais. Nestes dois impostos, haverá cerca de 10 milhões de contos previstos como receita que anteriormente eram cobrados pelas autarquias locais e, não constituíam receita do OGE. Assim, o aumento das receitas em termos efectivamente comparativos será da ordem dos 16% relativamente ao Orçamento de 1979 e de 22 % relativamente aos valores cobrados.
No que respeita às receitas fiscais, o aumento previsto relativamente às cobranças de 1979 é da ordem dos 40 milhões de contos, sendo 17,5 milhões nos impostos directos e 22,5 milhões nos impostos indirectos.
Do ponto de vista dos contribuintes, e no que respeita aos impostos directos, de facto, apenas, se prevê um aumento do imposto profissional de 2 milhões de contos. Os aumentos das receitas previstas na contribuição industrial e no imposto de capitais resultam fundamentalmente da integração dos adicionais. Em relação às despesas, na óptica económica, o que se verifica é que as despesas correntes aumentam o seu peso relativo no conjunto das despesas, passando de 73% no Orçamento final de 1979 para 74,1% no Orçamento proposto para 1980, em detrimento das despesas de capital.
As despesas propostas pelo Governo para 1980 significam um aumento real das despesas correntes e uma redução real das despesas de capital, o que não deixa de ser significativo. Da mesma maneira não deixa de ir revelador da política deste Governo o facto de as despesas globais do OGE, de acordo com a classificação funcional, registarem decréscimos reais nas despesas com a saúde, segurança e assistência. social, habitação e equipamentos urbanos, agricultura e pescas, transportes e comunicações ...
Em relação ao documento das Grandes Opções, vale a pena registar que a desculpa, mil vezes repetida, para a política do Governo é o contexto internacional desfavorável. Não se nega que a crise do capitalismo vem arrastando-se desde o início desta década, tendo um dos pontos mais agudos no ano de 1975, onde foi possível, mesmo assim, aguentar a economia portuguesa e reduzir a inflação de 20 % para 15 %, e não apenas quatro pontos como agora promete o Governo, sabendo inclusivamente de antemão que nem isso vai realizar!
Mas como íamos dizendo, se o Governo reconhece a crise das economias capitalistas, o que se poderia esperar era um conjunto de medidas efectivas para diversificar as nossas relações externas. Mas não! O Governo não só agrava deliberadamente as relações com os países socialistas e com os novos países africanos ...

O Sr. Azevedo Soares (CDS): - É falso!

O Orador: - ..., como teima em afunilar as nossas relações externas. Apresenta a CEE como a prioridade das prioridades, mas confessa em comissão parlamentar não ter os dossiers estudados nem saber os efeitos da crise na nossa economia.
Diz que o calendário da integração será acelerado, mas não apresente um único elemento comprovativo de uma negociação em que os interesses nacionais sejam defendidos.
Acena mitologicamente com a CEE, mas nada esclarece: sobre o que acontecerá à nossa indústria naval, ao nosso plano siderúrgico, á têxtil, aos produtores de vinho e de leite. Não nos diz porque não avança, por exemplo, com o projecto da beterraba sacarina, ou o que é que acontecerá à esmagadora maioria dos retalhistas e comerciantes portugueses quando confrontados com as grandes cadeias de supermercados e superfícies comerciais apoiadas por poderosos grupos financeiros.
E isto era elementar para um Governo que tanto faz a na iniciativa privada. Era elementar se a sua iniciativa privada não fosse no fundo o grande capital, não fosse as 100 famílias que dominaram Portugal.
Por outro lado, na mesma linha de coerência não é feita qualquer referência ao sistema constitucional vigente e aos objectivos consignados. O papel que cabe ao sector nacionalizado é simplesmente omitido e não há qualquer afirmação positiva no sentido da sua consolidação e desenvolvimento ... Enquanto isto agrava-se a situação financeira de milhares de empresas, agrava-se a crise de numerosos sectores, industriais como o sector da metalo-mecânica e o seu ramo pesado, o mobiliário metálico, etc.
Em relação ao sector energético nada nos é dito sobre a política seguida pelo Governo. Nada nos é dito, por exemplo, como é que o Governo encara a energia nuclear, como também em relação à política de (transportes, nem sequer é feita qualquer referência à necessidade de um plano nacional de transportes que promova a coordenação e distribuição das cargas e passageiros numa óptica de interesse nacional.
O que fica claro do OGE e das Grandes Opções do Plano é que o Governo não vai cumprir a Lei das Finanças Locais, que o desemprego vai aumentar, que a situação dos pequenos e médios empresários se: vai agravar e que o déficit da balança de transacções correntes vai ultrapassar os 900 milhões de dólares, sem que se promova uma política de desenvolvimento e de expansão da economia!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Seríamos injustos se, para terminar, não referíssemos que num ponto estamos completamente de acordo com o Sr. Ministro das Finanças. É que, de facto, nós também pensamos que este Orçamento é de mudança, mudança para o passado ...

O Sr Macedo Pereira (CDS): - Não apoiado!

O Orador: - ..., mudança para o 24 de Abril, mudança para a reconstituição dos privilégios.

Aplausos do PC P.

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O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Sempre caluniador e provocador!

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - É um provocador!

O Orador. - Para os Srs. Deputados e Srs. Ministros diremos mesmo um Sinel de Cardes ou um Correia de Oliveira, também perito em baralhar os números, não teriam perito em subscrever tal Orçamento. Só que Srs Ministros e Srs. Deputados AD estamos em 1980 e o 25 de Abril, como ainda há pouco se viu, continua vivo e bem vivo em milhares de corações portugueses e aqueles que foram ludibriados belas vossas promessas muito em breve - mais breve do que o que julgam - dar-vos-ão a resposta.

Aplausos do PCP, do MDP/CDE e do Sr. Deputado Armando Bacelar (PS).

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Que cassette tão estafada!

O Sr. Presidente: - Para interpelarem o Sr. Deputado Carlos Carvalhas pediram a palavra os Srs. Deputados Macedo Pereira e Mário Adegas.
Tenha a bondade Sr. Deputado Macedo Pereira.

O Sr. Macedo Pereira (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de mais, queria fazer um curtíssimo protesto quanto à forma falaciosa como o Sr. Deputado Carlos Carvalhas fez a sua intervenção sobre a análise do Orçamento Geral do Estado.
Começo por apresentar dois exemplos muito concretos. O Sr. Deputado Carlos Carvalhas refere o peso da tributação indirecta face à directa. De facto, nós sabemos que os impostos indirectos são injustos, porque cegos, e concordamos com a injustiça que isso representa, mas pergunto-lhe: foi ou não durante o Governo de Vasco Gonçalves e durante os Governos socialistas que esse exagero de tributação indirecta face à directa se verificou?
Disse-nos também o Sr. Deputado Carlos Carvalhas uma coisa que, de facto, é de espantar: que no gonçalvismo a inflação se reduziu de 20 % para 15%. Mas é ou não verdade que estamos hoje a pagar toda essa política, por um lado, através do aumento brutal do serviço da dívida pública, como eu demonstrei há pouco, e, por outro, através dos deficits acumulados nas empresas, quer públicas, quer privadas?

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Não é verdade!

O Orador: - E disse mais o Sr. Deputado Carlos Carvalhas: disse que as promessas eleitorais da AD vão caindo uma a uma. Para terminar, Sr. Presidente e Srs. Deputados, direi que as promessas eleitorais da AD vão sendo cumpridas uma a uma e é isso que dói ao Sr. Deputado Carlos Carvalhas!

Aplausos do CDS e de alguns Deputados do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Adegas.

O Sr. Mário Adegas (PSD): - Eu desejava formular ao Sr. Deputado Carlos Carvalhas três perguntas que são as seguintes: o Partido Comunista Português normalmente apresenta nesta Câmara e fora dela discordâncias profundas quanto à integração europeia. Assim, pergunto quando é que o Partido Comunista Português provavelmente já não nesta sessão legislativa, mas talvez na seguinte tem a coragem de fazer uma interpelação nesta Assembleia para que se reassuma, de uma vez por todas, a opção nacional de adesão ao Mercado Comum Europeu, a fim de que esta discordância sistemática deixe de se verificar.
Em segundo lugar, e cada a já referida situação económico-financeira determinada de muitas empresas portuguesas, eu gostaria de perguntar ao Sr. Deputado Carlos Carvalhas se considera que a responsabilidade da política económica e financeira de Governos anteriores e a falta de estabilidade política verificada no País são ou não as causas responsáveis por esta situação. Considera ou não injusto esperar que este Governo, em apenas quatro meses, não obstante o trabalho já efectuado, consiga a recuperação que todos desejamos?

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Muito bem!

O Orador. - Finalmente, gostaria de perguntar ao Sr. Deputado Carlos Carvalhas se não considera que o teor de algumas das suas declarações é despropositado no ambiente e no regime democrático em que estamos a viver.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas para responder, se assim o desejar.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Quanto ao peso da tributação indirecta relativamente à directa, e vice-versa, o Sr. Deputado Macedo Pereira sabe perfeitamente que ela se tem agravado e que se agravou fundamentalmente quando o seu partido esteve no Governo e, portanto, seria lícito esperar, já que tanto criticam esta situação - aliás, como aos - que este Governo, o vosso Governo, agora a viesse alterar. Mas não! Este Governo em vez de a alterar vem agravá-la quando eleitoralmente, demagogicamente, afirma e repete que os impostos vão diminuir, que a tributação fiscal vai ser realizada de modo a efectivar-se uma justiça social, quando, efectivamente, o que se verifica é o contrário. E com isto o Sr. Deputado acabou por confirmar aquilo que eu disse.
Em relação à época de 1974-1975, o que nós podemos afirmar tem como fonte os dados estatísticos oficiais que o Sr. Deputado bem conhece e nessa altura, segundo esses dados estatísticos, a inflação foi travada, a economia aguentou-se apesar da crise do capitalismo de 1974-1975, apesar da sabotagem dos grandes grupos económicos e do cerco do imperialismo. E em 1975 não só as reservas de ouro estavam intactas como foram deixados 16 milhões de contos em divisas e inclusivamente foram pagos alguns débitos anteriores, isto é, a balança comercial sofreu uma redução do seu déficit. Esta é a

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realidade e contra a realidade o Sr. Deputado apenas pode falsificar os números e os dados, pois a realidade encontra-se escrita nos documentos oficiais, nas estatísticas oficiais.

Uma voz do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Quanto ao problema da integração europeia é, de facto, de lamentar que um Governo, por intermédio de um Deputado que o apoia, necessite de uma interpelação para conhecer quais as objecções que o Partido Comunista Português põe à dita integração.
Mas será que o Sr. Deputado e o Governo desconhecem os efeitos que tal integração poderá ter para os pequenos e médios empresários, para os produtores de vinho e de leite, para os produtores de carne? Desconhece o Sr. Deputado que em comissão o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros não apresentou qualquer dado nem qualquer elemento sobre os efeitos da crise provocada pela CEE em Portugal, nem tão-pouco sobre os efeitos de tal integração na indústria naval, no plano siderúrgico nacional, sobre projectos que a OCDE tem avançado, como o da beterraba sacarina?
Quanto ao facto de os Governos anteriores serem ou não responsáveis pela situação financeira das empresas, para mim, eles são-no de facto. O vosso outro Governo, o Governo Mota Pinto, contribuiu, e muito, para o agravamento da situação financeira das empresas, nomeadamente optando pela política do FMI e segundo a à risca, nessa altura com aplausos da vossa bancada.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Da do PS!

O Orador: - Quanto às declarações despropositadas, elas poderão ser despropositadas para o Sr. Deputado, mas eu afirmei que este Governo manipula números e confirmei tal afirmação.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Não confirmou nada!

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Confirmou onde?!

O Orador - Eu disse que este Governo vai apresentar no fim do ano um déficit da balança de transacções correntes, não de 700 milhões de dólares, mas sim de 900 milhões de dólares e veremos se é assim ou não, se é ou não essa a realidade. Mas mais: este déficit de 900 milhões de dólares não é, como disse o Sr. Ministro das Finanças, para seguir uma política justa, porque se fosse para seguir uma política justo o Governo deveria apresentar uma taxa de expansão muito superior àquela que apresenta e não é isso que vai acontecer. O déficit da balança de transacções correntes vai ser superior a 900 milhões de dólares para fazer uma política demagógica, pura e simplesmente para encher os bolsos de meia dúzia de intermediários, para preparar o banquete do Orçamento Geral do Estado para os Meios e Champallimauds. Esta é que é a realidade!

Aplausos do PCP.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Caricato!

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Essa é uma cassette nula, uma cassete ordinaríssima!

O Sr. Mário Adegas ('PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem novamente a palavra o Sr. Deputado Mário Adegas.

O Sr. Mário Adegas (PSD): - Era apenas para aclarar uma afirmação que fiz. Eu não protestei contra o despropósito das declarações do Sr. Deputado Carlos Carvalhas, porque, evidentemente, respeito a maior parte delas, apenas queria referir-me àquelas que tinham ligação com Governos não democráticos.

O Sr. Macedo Pereira (CDS): - Peço a palavra. Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Macedo Pereira (CDS): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: Era apenas para um brevíssimo comentário. É que, depois de ouvir o Sr. Deputado Carlos Carvalhas, eu diria que depois de Sinel de Cordes e do Sr. Correia de Oliveira, quanto à manipulação de números, só ele Deputado Carlos Carvalhas!...

Risos do PCP.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Só vou respondei ao Sr. Deputado Mário Adegas, porque em relação ao Sr. Deputado Macedo Pereira já respondi.
Relativamente aquilo que o Sr. Deputado Mário Adegas referiu queria apenas dizer que lamento muito, mas, de» facto, quem não quer ser lobo ou cordeiro, como preferir, não lhe veste a pele.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Mas há loborinho que gostam de vestir a pele de cordeiro!

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Hoje acordou ma disposto, Sr. Deputado Amândio!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos para uma intervenção.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O programa eleitoral da Aliança Democrática, recheado de promessas concretizáveis nos domínios económico e social, atribuiu ao presente debate e, em relação aos mais crédulos, a importância da confirmação para todos e a curto prazo, de uma vida melhor.
A presença frouxa do Governo na apresentação do seu Programa e, mais tarde, na discussão de proposta de lei de alteração da delimitação dos sectores público e privado da economia, bem como incapacidade, a despeito da propaganda oficial em contrário revelada durante a interpelação sobre.

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matéria económica, asseguraram contrariedades e desilusões, mas a expectativa, apesar de tudo, manteve-se.
Decorreram já cerca de quatro meses desde que o Governo do Dr. Sá Carneiro iniciou a sua actividade - estamos pois com um terço do exercício de 198U decorrido e só agora o Governo foi capaz de trazer à Assembleia da República a discussão da Lei Orçamental e das Grandes Opções do Plano para 1980, documentos de inquestionável valor jurídico-político e económico-social que em todo o mundo democrático constituem momentos altos da vida parlamentar e representam, paira os respectivos Executivos, propostas fundamentais da sua actividade para os quais se exige discussão aprofundada, documentada e desapaixonada e votação consequente e consciente.
Incapaz de apresentar com a rapidez necessária o Orçamento e o Plano para 1980, o Governo fê-la ainda ineficientemente, entregando na Assembleia da República documentos incompletos face a exigências da lei e, nalguns casos, documentos errados, que foi substituindo quando o debate se iniciara já ao nível das comissões especializadas.

O Sr. José Leitão (PS): - Muito bem!

O Orador: - Foi ainda o Governo incapaz de dialogar com a oposição a propósito dos trabalhos preparatórios das Grandes Opções do Plano, pois os contactos que manteve foram realizados apenas na fase final desses trabalhos e revelaram, pela rapidez e formalismo que revestiam, a intenção meramente propagandística de induzir na opinião pública a ideia de que o diálogo era desejado pelo Executivo e que o Estatuto da Oposição se cumpriu.
Perdeu-se assim a oportunidade, por exclusiva culpa do Governo, de se fazer tempestivamente um debate conjunto sobre a economia portuguesa neste ano de 1980, que 'bem poderia ser, deveria ser, mas não é, um ano de arranque decisivo para a evolução económica do País e, consequentemente, para a melhoria das condições de vida do povo trabalhador.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Os Governos PS não arrancaram com nada.

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O objectivo essencial da política económica do Governo, concretizado nos documentos em debate, é fundamentalmente um objectivo político-eleitoral.
Depois do ano de 1979, perdido em termos de relançamento da economia portuguesa na senda do crescimento e do progresso por exclusiva responsabilidade do Governo Mota Pinto, cuja composição, filosofia e apoios sociais eram semelhantes aos do actual Executivo, prepara-se o Governo de Sá Carneiro para fazer perder ao País mais um ano, sacrificando o crescimento e o desenvolvimento económicos ao seu principal objectivo estratégico que é de vencer as próximas consultas eleitorais.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador - O Plano e o Orçamento são, pois, suas faces da mesma moeda -as eleições- e o discurso eleitoralista da AD.
Apesar das inigualáveis condições de que desfrutou à partida - balança de transacções equilibrada, inversão de tendência do movimento ascensional dos preços, adaptação progressiva dos agentes económicos as regras de funcionamento do novo sistema, competitividade internacional assegurada para o grosso das nossas exportações, situação internacional favorável à revalorização do ouro e, até, paradoxalmente, inércia no desaproveitamento da conjuntura por parte do Governo Mota Pinto- o Governo de Sá Carneiro foi incapaz de concretizar e apresentar à Assembleia uma política económica ao serviço do crescimento e desenvolvimento do país, uma política social favorável, na essência, às classes mais desfavorecidas e uma política de rendimentos que ponha fim à hemorragia dos ganhos económicos e sociais dos trabalhadores aos quais mais uma vez, e agora sem necessidade aparente, se procura fazer pagar a factura da crise económica.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: São quatro as grandes opções do Plano para 1980.
Num documento que se entende mais como o cumprimento formal e, tão-só, de uma determinação da lei -a apresentação do Plano anual -, anuncia o Governo que pretende: melhorar as condições de vida dos Portugueses afrouxar o ritmo da inflação; relançar o investimento; e reassumir, plenamente e com vigor, a vontade nacional da integração na CEE.
Deixando de lado uma referência aprofundada à quixotesca afirmação opção de reassumir a vontade de integração europeia, que desde 1976 é efectivamente uma vontade nacional porque assumida pela esmagadora maioria do povo português e concretizada no plano de abertura das negociações/por Governos socialistas, não necessitando, portanto, de ser reassumida mas antes exigindo aprofundamento e concretização que só o trabalho e o esforço de aproximação europeia podem viabilizar, procuraremos analisar mais de perto aquelas opções.
A melhoria das condições de vida dos Portugueses entende-a o Governo como consequência da sua capacidade em afrouxar o ritmo da inflação - cumprindo o objectivo dos 20%-, em aligeirar a carga fiscal e ainda no acompanhamento dos preços pela melhoria dos salários reais e na criação do emprego que o relançamento produtivo suscitar.
Por outro lado, a inflação e o cumprimento do objectivo dos 20% dependerá da capacidade da política macroeconómica para suscitar a redução da componente auto-sustentada da inflação e da melhoria da produtividade.
Para justificar o relançamento do investimento produtivo agarra-se o Governo à recuperação da confiança da iniciativa privada e ao projecto de sistema integrado de incentivos ao investimento, aquela miraculosamente conseguida com a aprovação pelo Governo, ao arrepio das normas constitucionais como o prova a evolução posterior do respectivo processo legislativo, da nova lei de delimitação dos sectores e este prestes a surgir no sistema jurídico-económico português, constituindo, só por isso e no convencimento do Governo, a varinha de condão que atenuará

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todas as expectativas e todos os cálculos e eliminará todas as angústias.

Com base nestas opções e no seu desenvolvimento, o Governo do Dr. Sá Carneiro prevê que o produto interno cresça, em 1980, cerca de 3,6%. Este valor, semelhante ao verificado no ano transacto, é manifestamente insuficiente e a sua enunciação representa, por si só, a incapacidade do Governo em optar por um modelo de crescimento adequado às condições reais da economia portuguesa e testemunha, por comparação com o programa eleitoral da AD, a falsidade das promessas feitas com o objectivo de caçar votos.
Este crescimento é ainda incomparável com a necessidade de avançar rapidamente na aproximação às economias europeias, condição essencial e fundamental para atenuar o efeito-choque da integração plena.
O crescimento proposto é, no entanto, mais do que insuficiente, inatingível, pois o seu cálculo e as premissas em que assenta são manifestamente irrealistas.
Assim, prevê o Governo o crescimento de foi para o investimento, partindo contudo de uma situação - a do ano anterior que se saldara, por inércia do IV Governo, num decréscimo da ordem dos 3%, o que significa que o crescimento real em 1980 proposto por Sá Carneiro e o seu Governo será, relativamente a 1978, pouco superior a 2%. Pretende o Governo que para o crescimento da Formação Bruta do Capital Fixo (FBCF) em 1980 contribua o crescimento do sector privado em cerca de 6,2%, valor ligeiramente superior ao que se espera para o crescimento do sector empresarial do Estado e que, a verificar-se, constituiria uma inversão total e naturalmente irrealista, da situação concretizada no ano anterior (-3.4%).

O Sr. José Leitão (PS): - Muito bem!

O Orador: - Para este autêntico milagre conta o Governo, como vimos, com a recuperação da confiança do sector privado e com o SIII (sistema integrado de incentivos ao investimento).

Risos do PSD.

Ora, a lei da nova delimitação dos sectores, aprovada pelo Governo foi declarada inconstitucional e o sistema de incentivos está ainda na fase de estudos preparatórios - entretanto decorreram já quatro meses do exercício de 1980.
O Governo, que se prepara para sacrificar parte considerável do sector empresarial do Estado, permitindo paulatinamente a recuperação de alguns grupos económicos e financeiros, apostou exageradamente na recuperação da confiança do sector privado, e muito naturalmente vai falhar a previsão quanto ao crescimento.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Mais um ano portanto de estagnação da economia portuguesa, mais um ano de agravamento do desemprego e sobretudo do desemprego entre os jovens.
É sintomático, de resto, que constituindo o desemprego um dos grandes desequilíbrios da economia portuguesa - pois representa 9% a 10% da população activa e atinge fundamentalmente os jovens- este Governo não lhe dedique uma atenção prioritária e, sobretudo, não subordine o seu modelo económico à erradicação progressiva, mas irreversível, deste desequilíbrio social. Aplausos do PS.
Com este Governo e a sua política económica o desemprego vai agravar-se, pois aos 19000 novos postos de trabalho que o Sr. Ministro das Finanças prevê possam ocorrer opor-se-ão os 40000 a 50000 novos candidatos ao primeiro emprego ou ao emprego que entretanto se perdeu.
Neste momento assumiu a Presidência o Sr. Presidente Leonardo Ribeiro de Almeida.
A constatação desta inépcia é tanto mais grave quanto se sabe não ter este Governo que ocorrer à integração social dos desalojados das ex-colónias (cerca de 500 000 pessoas) tarefa que exigiu a outros Governos, e particularmente aos Governos socialistas, a afectação de recursos essenciais para a criação de emprego, tendo sido concretizada com notável êxito, interna e externamente reconhecido.
A grande opção deste Governo parece ser, no entanto, a contenção da inflação ao nível dos 20%.
A terapêutica a utilizar, direccionada na redução da componente auto-sustentada da inflação, exigirá a conveniente utilização dos instrumentos da política monetária, cambial, orçamental e de rendimento e preços, apostando, simultaneamente, em elevados ganhos de produtividade.
Deixando de lado a intenção platónica de aumentar a produtividade, uma vez que poucas medidas concretas são enunciadas, não parece difícil concluir que, independentemente da utilização de medidas como a redução do consumo público e a restrição de expansão de crédito, o Governo vai deitar mão a medidas de natureza administrativa como o congelamento artificial de alguns preços e a criação de obstáculos à elevação salarial.
O Governo decidiu não optar decididamente por medidas de estímulo à produção e, particularmente à produção agrícola, e de fomento do cooperativismo, que seriam as mais eficazes em termos de combate à inflação.
Teremos, pois, com este Governo e neste ano de 1980 mais do que a correcção dos desequilíbrios estruturais da economia portuguesa a reedição da política dos controles administrativos dos preços e da «plafondização» salarial, com a consequente desorganização do aparelho produtivo e a apresentação da factura da crise aos trabalhadores.
As empresas públicas, grandes vítimas desta política, serão conduzidas a uma situação de desequilíbrio económico e financeiro e transformadas em bode expiatórios da inépcia governamental, pela utilização dos chavões habituais bem conhecidos: baixa produtividade, deficits de exploração, ausência da capacidade de gestão e incapacidade de desenvolvimento.
Pouco importa que o sector público tenha revelado no ano transacto, um crescimento de produtividade bem superior ao do sector privado e que a formação bruta do capital fixo tenha resultado, naquele ano. essencialmente da sua capacidade de

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Por outro lado, os trabalhadores terão cada vez mais dificuldades em negociar as suas convenções de trabalho e o Governo, que afirmou não estabelecer norma salarial, prepara-se já, e algumas acções concretizou nesse sentido, para impedir ia subida de salários para além dos 18 %.
Esta intenção, anunciada na última comunicação pública do Sr. Primeiro-Ministro, é bem a prova, ao contrário do que afirma o Dr. Sá Carneiro, de que 3 Governo pretende conter a inflação essencialmente à custa dos rendimentos de trabalho, que verão de novo reduzida a sua parle no rendimento nacional, Fortemente diminuída durante o ano de 1979 (-6% que no ano anterior) ...

Aplausos do PS.

... independentemente de estes rendimentos estarem muito longe de constituir a variável mais significativa na taxa de crescimento dos preços que é, como se sabe, constituída pela elevação dos outros rendimentos, em particular os juros e os lucros.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço desculpa de interromper mas desejo anunciar à Câmara que acaba de dar entrada na tribuna do corpo diplomático i representação inglesa da União Interparlamentar. Fartando-se de uma representação britânica, país a que estamos ligados por laços (Históricos tão estreitos tão amigos, peço à Câmara uma saudação cordial para esta representação.

Aplausos, de pé, do PSD, do PS, do PCP, do CDS, do PPM, do MDP/CDE e dos Deputados reformadores.

O Sr. Presidente: - Pode continuar, Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Orador: - É pois profundamente demagógico e altamente escamoteador das verdadeiras intenções este Governo que o Dr. Sá Carneiro prometa ao País, a véspera deste debate, uma vida melhor e um futuro mais risonho para os trabalhadores portugueses.
Não é difícil, de resto, afirmar que o objectivo de ontem a inflação a 20 % é um objectivo que este governo não cumprirá, mesmo sacrificando, como se repara para o fazer, os salários reais dos Portugueses.
Um crescimento da economia insuficiente, um relançamento do investimento produtivo erradamente equacionado, uma contenção artificial, e discutível que já atingida, da alta do custo de vida, à custo dos entendimentos do trabalho, a prossecução das tarefas e integração europeia iniciadas por Governos socialistas e a apropriação do seu mérito, são as grandes acções do Plano deste Governo que, afinal, são bem esquemas.

Vozes do PS: - Muito bem!

Vozes do PSD: - Muito mal!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se as landes Opções do Governo são más, o seu Orçamento é ainda pior.
Foi aqui dito ontem pelo Sr. Ministro das Finanças mental não é, em si próprio, um objectivo da política económica, mas sim o resultado das acções propostas para alcançar os objectivos definidos.
Bom seria que o Sr. Ministro aproveitasse a sua presença no Governo, e, naturalmente, a legítima influência que daí lhe advém, para explicar aos parlamentares da maioria e, em especial, aos do seu partido que efectivamente assim é.
Em tempos recentes o Grupo Parlamentar do PSD e em especial os então Deputados Sá Carneiro e Angelo Correia fizeram do ataque aos deficits, sem curar da validade das acções propostas e da exequibilidade dos objectivos definidos, a pedra de toque das suas críticas demagógicas aos Governos socialistas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Como quer que seja, o Governo não pode esconder que o déficit orçamental previsto é o maior de sempre (141,2 milhões de contos), pese embora à artificialidade da sua redução, como consequência da anulação de 15 milhões de contos nos juros da dívida pública, e sem embargo de não considerar o mais que possível déficit do orçamento da segurança social e de penalizar exagerada e injustamente os trabalhadores da função pública que são confrontados com aumentos salariais irrisórios, mesmo se comparados com a norma salarial oficiosa anteontem anunciada ao País pelo Sr. Dr. Sá Carneiro.
Num déficit global tão elevado é ainda de referir que o déficit corrente previsto foi fixado em cerca do 54 milhões de contos correspondendo um e outro a significativos aumentos relativamente aos valores homólogos de ano de 1979.
Ocorre-nos perguntar se o Governo não aceita a regra de ouro do orçamento corrente equilibrado defendida nesta Câmara pelo Ministro das Finanças do IV Governo, Prof. Jacinto Nunes e na altura tão prontamente apoiada pelos Deputados do PPD/PSD e, naturalmente, por alguns membros de destaque do actual Governo, como os Srs. Ministros da Indústria e do Trabalho.
Não é provável que a política do Governo, centrada no objectivo fulcral de conter a inflação, seja consistente e compatível com um déficit desta envergadura (11,6% do produto interno bruto) a não ser provisoriamente recorrendo ao expediente do controle administrativo dos preços que o Governo concretizará até às próximas eleições com o propósito evidente de deixar «a tarefa de fechar a porta a quem chegar depois».
Salazar inventou um método de apresentar o Orçamento que lhe serviu para mentir, inculcando a ideia de que as contas estavam equilibradas e não havia déficit orçamental. O Governo AD pretenderia usar uma apresentação que lhe servisse para dizer que existe déficit mas que ele teria diminuído. Ao fim de três ou quatro dezenas de anos, Salazar teve de esconder todo o déficit. Ao fim de três ou quatro meses o Governo AO pretenderia esconder não todo o déficit, mas sim o seu aumento. Onde o cidadão comum não pode senão ver duas formas diferentes de faltar à verdade, talvez a AD veia nesta diferença um enorme «progresso». Se assim for, ficaremos todos a saber para que passado nos aponta o futuro da AD.

Vozes do PS: - Muito bem!

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O Orador: - Depois de procurar mistificar o brutal aumento do déficit orçamental, o Governo quer fazer crer que a carga fiscal vai baixar.
Foi já feita a demonstração cabal da falsidade do raciocínio do Governo; a carga fiscal agravar-se-á este ano em cerca de 38 %, o que se traduzirá num aumento da relação repostos/produto interno bruto de 24% para 28%.
O valor previsto para o aumento da carga fiscal é de mais, de 44 milhões de contos, com a agravante de 60 % deste montante corresponder a subidas nos impostos indirectos, o que agravará a injustiça fiscal na sociedade portuguesa.
É ainda necessário fazer uma referência ao tratamento que este Governo reserva para os trabalhadores da função pública e do sector empresarial do Estado.
À boa maneira de outros regimes cuja filosofia julgávamos definitivamente erradicada da sociedade política nacional, o Governo quer transformar os trabalhadores da função pública e do sector empresarial do Estado nas principais vítimas da crise que não é capaz de resolver.
Àqueles oferece-lhes um ridículo aumento salarial de 11% quando reconhece que a alta dos preços em 1979 foi de 24.2 % e que este ano nunca será inferior a 20%.
Mas mais do que ridícula esta proposta de aumento é um insulto depois da enunciação feita pelo Sr. Primeiro-Ministro do aumento salarial médio para este ano (18%) compatível com o objectivo da inflação, sendo certo que para os restantes trabalhadores e segundo a matemática confusionista do Dr. Sá Carneiro sempre acresceria cerca de 5 % da diminuição dos impostos.
Aos trabalhadores do sector empresarial do Estado é feita permanente pressão quer impedindo a concretização de justa contratação colectiva quer ameaçando as empresas públicas directa e indirectamente, responsabilizando-as por déficit e mau aproveitamento de recursos de forma aligeirada. A segurança do emprego destes trabalhadores é ainda posta em causa quando se pretende abrir sectores, já inteiramente preenchidos em termos de função social e económica, à iniciativa privada.
A este propósito parece oportuno sublinhar que a resposta dos trabalhadores destes sectores à política deste Governo é já uma realidade.
Há dias paralisou a função pública; hoje estão em greve os bancários. Dificilmente poderá o Governo atribuir às suas movimentações reivindicativas a qualificação de greves políticas e desestabilizadoras.
Não acreditamos que o Governo considere os trabalhadores da função pública e os trabalhadores do sector empresarial do Estado como trabalhadores de 2.ª classe.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O debate está a demonstrar que o Governo e a sua maioria, perante a fragilidade da sua política, insistem nas críticas indiscriminadas e distorcidas à política dos Governos anteriores. O Governo assume-se assim não como Governo nacional que pretende ser mas sim como Governo sectário e particularista.

O Orador: - Além da deselegância deste comportamento manifesta-se nesta atitude uma lamentável tentativa de confundir os espíritos e os julgamentos.
Com efeito, a política económica e financeira ver tida no OGE de 1979 e concretizada por Mota Pinto Jacinto Nunes e alguns membros proeminentes de actual Governo foi de facto desastrosa: não aproveitou as condições existentes para o relançamento aí economia e reduziu, consequentemente, de foram drástica, as condições de vida dos trabalhadores portugueses, quando teria sido possível melhorá-la: significativamente.

O Sr Pedro Roseta (PSD): - Não votamos o Orçamento.

O Orador: - Perante estes factos irrefutáveis parece-nos legítimo não reconhecer autoridade e sinceridade a este Governo e à sua maioria parlamentar quando condenam a política de 1979 insinuando deslealmente que essa política é da responsabilidade cio Partido Socialista.

Vozes do PS: - Multo bem!

O Orador: - Pretender esconder o que é evidente em operações de ilusionismo político e de moldagem da opinião pública que só o domínio da comunica cão social pode facultar não parece um objectivo sério e digno.
Face ao aumento do custo de vida não por falar-se da melhoria de condições reais dos Portugueses.
Perante deficits orçamental e cambial tão elevados não pode manter-se a demagogia da crítica a situações semelhantes anteriores.
Quando a evidência da subida dos preços é tão forte não pode manter-se a afirmação de que o preços estão a baixar.
Mesmo quando quem o afirma, sendo um técnico de razoável envergadura, não adquiriu ainda a experiência de, em política, poder ser contraditado.

Aplausos do PS e do M DP/CDE.

Entretanto, assumira a presidência o Sr. Presidente Leonardo Ribeiro de Almeida.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Angelo Correia para formular um protesto.

O Sr. Angelo Correia (PSD): - Sr. Presidente Srs. Deputados: A intervenção do Sr. Deputado Manuel dos Santos é o símbolo presente e evidente d contradição que se gera no discurso político do Pai tido Socialista.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador. - Contradição a três níveis: o primeiro é a contradição que releva da própria posição pretérita do Partido Socialista, quando ataca ferozmente o Orçamento, as concepções do Plano, Programa do IV Governo, quando foi o próprio Partido Socialista que viabilizou nesta Assembleia o IV Governo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - E o

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Orador: - Se o Partido Socialista hoje quisesse uma atitude coerente com o seu discurso tinha votado a favor ou não se tinha abstido votação da proposta de lei do Orçamento do Governo. Tinha logo à partida votado contra o mesmo Orçamento.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas não o fez, e tornando essa posição legítima é que nós hoje o rotulamos de contrário, para não dizer demagógico.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Primeira contradição de âmbito político entre um passado político que manifestado e discurso político hoje aqui manifestado. O Partido Socialista, símbolo da contradição no tempo, parece o seu passado, contradiz o seu próprio passado.
Mas a segunda contradição é de natureza económica, ou seja, o Partido Socialista vem hoje criticar acto de a taxa de crescimento do produto interno vista por este Governo ser limitada, dizendo que não atinge a Europa, não favorece mais facilmente bem-estar e o crescimento económico português, ao mesmo tempo vai criticando o montante do [...] cambial. Isto é: se o Partido Socialista quisesse maior aumento da taxa interna do produto, o é que isso significaria? Significaria que a taxa crescimento do investimento tinha de ser maior, que significa que a crítica que ele formulou em função ao montante de crescimento de 6% previsto, que ele próprio considera como dificilmente atingível, nessa altura seria ainda mais dificilmente atingível. Mas pior do que isso, e como sabe, a compo- [...] externa do investimento tem uma percentagem que ronda os 40%, o que significa que para aumentar taxa de crescimento interno do produto teríamos aumentar a componente externa do investimento tal a forma que nessa altura o saldo da balança cambial ficaria ainda muito mais desequilibrado, o e significa uma profunda contradição, profunda demagogia ou profunda ignorância por parte de um deputado e de um partido que no fundo querem simultaneamente duas coisas contraditórias.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador - É a permanente imagem do estar e do estar, do ser e não ser, do querer e não querer o Partido Socialista.

Aplausos do PSD.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Só leiras sobram do seu nabal.

Risos do PSD.

O Orador: - Mas em terceiro lugar, Sr. Presidente Srs. Deputados, vem o Sr. Deputado Manuel dos Santos fazer um desabafo - a sua intervenção não foi uma intervenção foi um conjunto de desabafos -, em que no fundo vem dizer que o déficit do Orçamento Geral do Estado é elevado, dizendo ao mesmo tempo que as condições de vida dos Portugueses não poderão melhorar, pelo contrário, até poderão piorar. Sabendo-se que o déficit do Orçamento Geral do Estado é fundamentalmente um déficit que se concentra na área do orçamento capital, ou seja, numa área em que a repercussão dos investimentos públicos., sector administrativo do Estado, é poderosa, e esses sim funcionam como uni verdadeiro estímulo, um verdadeiro promotor do emprego e do bem-estar, o que o Sr. Deputado Manuel dos Santos nos quer dizer é o seguinte: não- tenham déficit s tão elevados, ou seja, o Estado não invista tanto para que nessa altura as condições de vida dos Portugueses sejam piores do que aquelas que hoje em dia nós criticamos. Isto é, o PS critica por um lado um de fiei í que. encerra em si um forte conteúdo de aumento de despesas de capital para satisfazer a necessidade de bem-estar e de crescimento da economia portuguesa, para, simultaneamente, exigir que essas condições sejam ainda mais melhoradas.

O Sr. Macedo Pereira (COS): - Exacto!

O Orador: - Ou seja, criticam-se mais uma vez os dois pontos opostos.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Em síntese, perante os três aspectos que referi, a crítica do PS é uma crítica que nem demagógica é. É uma crítica primaríssima de alguém que está neste momento a formular os primeiros passos ou na política ou então na demagogia.

Aplausos do PSD e do CDS.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Primário é o senhor!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Beiroco.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pedi a palavra para formular um pequeno protesto.
O Sr. Deputado Manuel dos Santos começou por criticar o Governo por só agora apresentar a esta Câmara as propostas de lei do Plano e do Orçamento Geral do Estado para 1980. Esta crítica é profundamente injusta, pois se alguém havia que ser criticado era o Executivo anterior que não realizou os trabalhos necessários à elaboração do Orçamento em tempo oportuno.
Mas mais: cabe também perguntar se os Governos socialistas que detiveram longa e continuadamente a pasta das Finanças conseguiram na altura em que tiveram essa gerência, apresentar os Orçamentos nos períodos previstos na lei.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador.- Em segundo lugar, o Sr. Deputado Manuel dos Santos insistiu mais uma vez em que este Governo tinha à partida condições económicas extremamente favoráveis. Mas já foi claramente demonstrado que não é assim porque, por exemplo, um dos argumentos que o Sr. Deputado utilizou para fundamentar a sua afirmação é o equilíbrio da balança

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de transacções correntes verificado em 1979, cujo equilíbrio foi imediatamente destruído pelo simples aumento do preço do petróleo.
Por outro lado, as perspectivas das exportações portuguesas, que em 1979 cresceram espectacularmente em volume, não se podem manter este ano, como é sabido, dadas as condições de recessão generalizada que se verificam nos países da OCDE e sobretudo nos países que são os principais clientes de Portugal.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador - Finalmente, o Sr. Deputado 'Manuel dos Santos na sua intervenção referiu a existência de greves numerosas para justificar que existe uma contestação generalizada à política económica e à actuação do Governo. Ora, nós efectivamente temos verificado nos meios de comunicação social o anúncio de numerosíssimas greves, mas temos verificado também que as greves que depois se efectivam são muito menores do que esse número.

O Sr. Angelo Correia (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Para além disso tem-se também verificado que as greves que se chegam a efectuar duram pouco porque normalmente, através do diálogo, os conflitos têm ?ido resolvidos.
Cabe pois perguntar, perante o cansaço generalizado dos trabalhadores portugueses, quem afinal em Portugal tem medo das greves: se é o Governo e a maioria ou se são os partidos da oposição.

Aplausos do CDS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a 'palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por fazer uma afirmação que hoje quando aqui entrei estava muito longe de fazer. É que de facto o baixo nível do final da intervenção do Sr. Deputado Angelo Correia não merece da minha .parte a mais pequena consideração. Apenas lhe referirei que se efectivamente eu poderei estar a dar os primeiros passos nas lides parlamentares e na demagogia o senhor está com certeza a dar os últimos parque está condenado.

Aplausos do PS e do PCP.

Quanto às questões postas pelo Sr. Deputado Luís Be i roço, se mais não fosse pela contradição do estilo relativamente ao Sr. Deputado Angelo Correia - aliás já é habitual, pois de uma maneira geral nesta Câmara todos os Deputados se comportam bastante melhor que o Sr. Deputado Angelo Correia...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - ..., terei muito prazer em responder. Aliás agradeço-lhe a elevação com que me colocou as questões.
Começarei por lhe dizer que para lá do protesto que anunciou e que presumo eu foi meramente simbólico, é um facto que este Governo não cumpriu o prazo - e eu não direi que exagerou extraordinariamente no atraso, uma vez que tem apenas quatro meses de actividade. Mas não há dúvida nenhum que o Governo tinha anunciado que brevemente muito mais rapidamente do que o fez, teria oportunidade de apresentar a esta Câmara os documento; que hoje aqui estão em discussão. Mas relativamente a isso limitei-me a referir um juízo de existência não me parece que isso mereça da parte de V. Ex.ª um protesto.
Quanto à referência que fiz à existência à partido de condições extremamente mais favoráveis, parece-me que isso é uma evidência. O Sr. Presidente da República já o declarou por duas ou três vezes penso que o Sr. Presidente da República não é um irresponsável. O Sr. Presidente da República naturalmente possui dados concretos, reais, que lhe permitem suportar esta afirmação e nós também. Aliás afirmação é facilmente comprovável e o Sr. Deputado Luís Beiroco sabe bem que sim.
Já agora gostaria de lhe dizer, pegando um pouca numa observação que foi anteriormente feita por um Deputado, que a questão do déficit cambial até nem foi per mim analisada em pormenor. E isso por um razão muita simples: é que eu não sei qual é o deficit da balança de transacções correntes previsto pó este Governo. Tal acontece pelo seguinte: é que n Plano fala-se em 700 ou 800 milhões de dólares, Sr. Ministro das Finanças falou aqui ontem ei 800 milhões de dólares e o Sr. Ministro do Comerei e Turismo informou a Comissão Parlamentar de Comércio e Turismo que esse déficit seria concerteza superior a 900 milhões de dólares.
Portanto, quando o Sr. Ministro do Comércio e Sr. Ministro das Finanças, que são duas pessoas importantíssimas na área económica do Governo dizem coisas completamente diferentes, eu tenho realmente muita dificuldade em descobrir qual é déficit da balança de transacções correntes que este Governo prevê, com a agravante de que para Sr. Ministro do Comércio e Turismo a evolução rendas exportações para este ano seria no mínimo 12%, podendo eventualmente chegar a 15%, quanto Governo no seu Plano apenas prevê uma taxa de 9%.
Quer dizer que através de condições mais favoráveis, o Sr. Ministro do Comércio e Turismo a que o déficit da balança de transacções corrente deste ano será bastante superior ao déficit que er definido no Plano.
Portanto eu não tenho dados demasiado bom géneros fornecidos pelo Governo que me permita entrar nesse campo.
Quanto à questão do petróleo e de certo modo d dificuldades que induziu na situação cambial relativamente favorável que este Governo recebeu, isso um facto.
Penso no entanto que os aumentos do petróleo não justificam a quebra brutal das divisas existente no País que se verificou no 1.º trimestre de 1980.
Até seria importante, e já agora aproveito es oportunidade para o pedir, que um dos Srs. Ministro tivesse a oportunidade de nos referir

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evoluiu a situação cambial do País durante o 1.º trimestre de 1980 e dessa evolução negativa da situação cambial qual a parte que é efectivamente devida à questão do petróleo.
Quanto à questão das exportações também já respondi. Efectivamente também tenho alguma dificuldade em me manter nesse campo uma vez que o próprio Governo, através de dois departamentos responsáveis, tem ao que parece perspectivas bastante diferentes quanto à evolução das exportações em 1980.
Finalmente, quanto à questão da existência das greves, penso que é um pouco ridículo que o Sr. Deputado venha aqui afirmar que as greves são da responsabilidade da oposição.
Penso que as greves são assumidas responsavelmente pelos trabalhadores e que a sua dimensão, quer em termos de número de greves quer em termos de adesão a elas, é uma questão controversa. O Sr. Deputado lerá os seus jornais e eu lerei os meus, no entanto é um facto evidente e concreto que este Governo se defronta com um surto de grevas que já não pode ser arvorado pelo Governo como um assunto de greves essencialmente demagógicas e políticas, uma vez que na maioria dos casos estão por detrás do seu lançamento organizações sindicais e até centrais sindicais que não são conotadas com aquelas forças políticas que normalmente os Srs. Membros do Governo transformam em «bombo da festa» relativamente a estas questões.
Portanto parece-me que é muito difícil para o Governo defender que não há uma acção concertada e contestada, grevista e reivindicativa de uma maneira geral relativamente à sua acção. Penso que isto é muito difícil de esconder, apesar do grande domínio que o Governo possui sobre a comunicação social. Realmente esse facto não pode ser escondido e é evidente que isso traduz e concretiza na prática uma acção de oposição muito grande dos trabalhadores democráticos deste país à acção do Governo da Aliança Democrática.

Aplausos do PS e do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro Basílio Horta.

O Sr. Ministro do Comércio e Turismo (Basílio Horta): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pedi a palavra para dar um esclarecimento ao Sr. Deputado Manuel dos Santos, que referiu declarações feitas por mim na Comissão de Comércio e Turismo desta Assembleia.
Quero dizer, ao Sr. Deputado Manuel dos Santos que as declarações que fiz na Comissão eram declarações que, como de resto foi referido na altura, eram feitas «em trabalho conjunto» - isso foi referido muito, até por si.
De qualquer forma tenho muito gosto em voltar a referi-las no Plenário, porque aquilo que é dito em Comissão pode perfeitamente e com o mesmo à-vontade ser aqui referido.
Antes de mais, em relação à taxa de 12% de crescimento de exportações que referi na Comissão ela deve-se ao facto de se ter analisado o comportamento das exportações no 1.º trimestre. Quando se previu uma taxa de 9% não se sabia obviamente qual era o comportamento das exportações até ao fim de Março.
Com base nos mínimos que o Ministério tinha até ao fim de Março podia prever-se que o crescimento em volume das exportações não se ficasse pelos 9 %, mas pudesse atingir qualquer coisa como 12 %.
No entanto o Governo .procede com honestidade e com correcção quando prevê uma taxa mais baixa. Era mais fácil ao Governo prever uma taxa mais elevada que não fosse cumprida. Para nós, no entanto, é mais correcto prever uma taxa mais reduzida mas que temos a certeza de poder cumprir se não de ultrapassar.
No que respeita ao déficit da balança de transacções correntes aquilo que referi foi que não me espantaria se ele atingisse os 900 milhões de dólares. E porquê?
A conta do petróleo é mais de 60 milhões de contos, como o Sr. Deputado sabe, mais de l bilião de dólares. Ora se é mais de l bilião de dólares do que o ano passado, e havendo a tendência das exportações que eu tinha apontado, não seria de estranhar que ela atingisse 900 milhões de dólares. Isto foi referido como previsão, como um número que se, podia facilmente atingir. Não vejo, pois, em que é que isso está em desacordo com as previsões do Governo.
Acontece que há efectivamente previsões que estão a ser actualizadas de acordo com os números que vamos recebendo. Quero dizer ao Sr. Deputado que no 1.º trimestre deste ano o licenciamento de importação de petróleo se cifra em 98 milhões de contos - não executado mas licenciado.
Portanto é previsível que a continuarem a crescer em valor as importações e a economia dos combustíveis a assumir esse valor o déficit atinja 900 milhões de dólares.
Continuo é a dizer como aliás ontem aqui disse o Sr. Ministro das Finanças - que é um número que de todo não é impressionante, que é um número perfeitamente possível e que por consequência não tem o dramatismo, longe disso, que o Sr. Deputado lhe quer atribuir.
De qualquer forma este número foi atribuído em termos de previsão de acordo com os elementos disponíveis numa Comissão, em estilo de «trabalho conjunto». Portanto, Sr. Deputado, quero dizer-lhe que compreendo que o senhor os traga aqui a Plenário, mas não foi isso que previamente tinha ficado combinado nos trabalhos da Comissão.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Realmente é verdade, Sr. Ministro. O que se passou na reunião da comissão especializada foi considerado um trabalho conjunto, mas não fui eu que violei estas regras. No dia seguinte, um semanário afecto à actual maioria, concretamente o jornal Tempo, trazia uma descrição pormenorizada e falaciosa de tudo o que se tinha passado, naturalmente invocando essencialmente as posições do Governo e afirmando inclusivamente que perante a sua exposição tão clara a oposição teria ficado perfeitamente «batida».
Portanto não fui eu que violei essas regras, não estou habituado a violadas, não as violarei, excepto se, como efectivamente sucedeu neste caso, outros as tenham violado previamente.

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O Sr. Ministro do Comércio e Turismo: - Não fui eu!

O Orador: - Não estou a dizer que foi o Sr. Ministro, estou apenas a dizer que efectivamente o jornal Tempo no dia seguinte trazia uma descrição pormenorizada e falsa daquilo que se tinha passado na Comissão de Comércio e Turismo.
Quero dizer-lhe também que V. Ex.ª acabou exactamente por confirmar aqui aquilo que eu afirmei, isto é, V. Ex.ª prevê um déficit da ordem dos 900 milhões de dólares. Foi exactamente isso que eu disse. Não atribuí ao facto nenhum dramatismo, apenas referi que o Governo começou por mencionar no Plano um déficit provável entrei 700 e 800 milhões de dólares e que V. Ex.ª já vai em 900 milhões, e esqueceu aqui dos 700 milhões, só falou nos 800, e que V. Ex.ª na Comissão Parlamentar e hoje mesmo aqui refere 900 milhões de dólares.
Não estamos a discutir o dramatismo ou o não dramatismo da situação. Estamos sim a discutir que o Sr. Ministro das Finanças começou em 700 milhões de dólares e, que V. Ex.ª já vai em 900 milhões, e provavelmente iremos muito mais acima.
Relativamente às exportações, também eu folgaria muito que as Mias previsões se viessem a confirmar porque isso seria bom. Simplesmente, o que eu quis aqui realçar foi que V. Ex.ª tendo partido de uma taxa de crescimento real das exportações da ordem dos 12% chegava a um déficit de 900 milhões de dólares, enquanto o Governo colegialmente, partindo de uma taxa real de evolução das exportações bastante inferior - 9 % -, chegava a 700 ou 800 milhões de dólares, o que realmente me parece ser, no mínimo, extremamente contraditório, sendo possível concluir-se daqui, que afinal de contas o déficit nem sequer irá ficar nos 900 milhões de dólares que o Sr. Ministro referiu, mas que provavelmente irá para 1 bilião ou 1 bilião e qualquer coisa de; dólares.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Marques para uma intervenção.

O Sr. Sousa Marques (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Também para as empresas públicas, quer as chamadas Grandes Opções do Plano, quer o Orçamento Geral do Estado, que agora se discutem. se integram afinal nas grandes mistificações do Governo.
Em consonância, não ouvimos nós, ontem, o Sr. Ministro das Finanças e do Plano, no seu (estilo habitual, afirmar a intenção de «fomentar o investimento do sector público, administrativo e empresarial»?
E no entanto, a primeira conclusão que somos obrigados a tirar é a de que não é apresentada uma política global de investimento. Em compensação o que ressalta claramente é a insistência nos velhos cavalos de batalha da mobilização das indemnizações e da abertura do sector público ao grande capital financeiro. A imaginação continua estreita, mas a ambição reafirma-se desmesurada.
A segunda conclusão, não menos importante e significativa, é a de que, relativamente à política de investimentos sectoriais, o Governo não passa de generalidades e incongruências. Nada se concretiza quanto ao Plano Siderúrgico Nacional, ao Alqueva, ao projecto Renault, etc. Em compensação, este autopropagandeado Governo propõe-se (rever o Plano Rodoviário Nacional» que (pasme-se!) não existe ... E, por outro lado, entusiasma-se com a preparação de um programa que já existe, pois o Banco Mundial até lho entregou feito e de bandeja. Trata-se, como é sabido, do programa de investimentos a três ou cinco anos a que eu próprio já fiz referência, nesta mesma Assembleia, durante o debate das interpelações ao Governo e que este, repito, afirma estar a preparar!
Alguns números são clarificadores e merecem ser avançados.
Por exemplo, o Governo, demagogicamente, fala de um reforço «especial» nos sectores sociais do programa de investimentos e despesas de desenvolvimento da Administração Central. Nada mais falso, já que os 48 % previstos são iguais aos 47,15 % afectados em 1979. Onde está então o anunciado reforço «especial»?
Quanto ao sector empresarial do Estado importa sublinhar algumas questões.
Primeira, tendo sido estabelecido um plafond de 71,5 milhões de contos para o investimento das empresas públicas, basta dizer que ainda faltam milhões (relativamente aos investimentos previstos). Onde os vai buscar?
Segunda, as chamadas Grandes Opções do Plano referem 20 milhões de contos de dotações para capital estatutário das empresas públicas, enquanto o Orçamento refere apenas 19 milhões de contos e as necessidades 'ascendem afinal a 58,1 milhões.
Terceira, os 11 milhões de contos de subsídios ou indemnizações compensatórias inscritos no Orçamento estão longe dos 21,2 milhões necessários e são iguais em valor absoluto aos dos dois últimos anos.
Quarta, a política deste Governo face às empresas nacionalizadas é e será a de lhes dificultar a vida enquanto as ver sistematicamente caluniando. Prevê, de lucros, no Orçamento, 10,5 milhões de contos, enquanto em 1979 a receita terá ultrapassado os 12 milhões.
Às vezes, no entanto, até parece o contrário. Tomo-se, por exemplo, a ida do Ministro da Indústria, Bissaia Barreto, à Siderurgia. Iluminado pelas luzes da TV do Governo e o a anunciar um milagre chamado Plano Siderúrgico Nacional, ignorando as desgraças do sector siderúrgico do Mercado Comum e as consequências para Portugal dos planos anticrise do atarefado visconde de Davignon.
Mas uns dias antes, na Comissão de Indústria desta Assembleia, não soube ou não quis respondei a questões como a da colocação de excedentes, a do aproveitamento do minério de Moncorvo ou das pirites alentejanas, ou a anunciada entrega da central de oxigénio ou do forno da cal, por serem rentáveis, ao grande capital estrangeiro. O Sr. Ministro não quis afinal reconhecer que o Plano Siderúrgico Nacional não é um plano nem nacional. Limita-se a ser, por enquanto, uma mera expansão da fábrica do Seixal, com a agravante de serem retiradas à Siderurgia, empresa pública, instalações que são sua parte integrante. Enquanto meia dúzia de grandes monopólios estrangeiros, fornecedores de equipamento, esfregam aí mãos de contentes.

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Pode o Governo mistificar à vontade. Pode utilizar despudoradamente a rádio que. quer obediente ao seu serviço, a televisão que sonha de rastos a seus pés, os pouco angélicos Deputados Correias (de transmissão), ou o ruir das Penas de meter dó.

Risos do PCP.

Pode o Governo ter como cento que, por esta vez e for uma magra maioria, fará aprovar aqui o Orçamento dos seus planos de restauração.

O Sr. Angelo Correia (PSD): - Os senhores estão a perder qualidades.

O Orador: - Mas o Governo e os seus frágeis apoiantes enganam-se a prazo. E bem curto. Os que se lhe opõem são bem mais numerosos e bem mais fortes. As mãos e as inteligências de; quem trabalha forjarão, na lua, uma história bem diferente. Este Orçamento e estes pianos serão derrotados.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Falou e não disse nada.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Vasco Rodrigues.

O Sr. Adriano Vasco Rodrigues (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Deputados: Houve já quem classificasse a educação como a primeira das energias da Humanidade, procurando evidenciar o importante papel deste sector no desenvolvimento sócio-económico.
Foi principalmente a partir da 2.ª Guerra Mundial que os economistas pressentiram o valor da educação como factor de desenvolvimento. Contudo, não é fácil a qualquer economista determinar o ponto óptimo da planificação educativa, pois não basta um conhecimento intuitivo dos problemas da educação, normalmente relegados aos políticos, nem científico, conectado com os tecnocratas, para acertar de forma incontroversa no melhor investimento, na mais sábia opção, ou nas relações mais exactas e ponderadas entre o rendimento e o custo-benefício. E tudo isto porque é discutível tomar opções em campos como o da educação, o da saúde e o da habitação, que exigem resposta prática a carências humanas.
Por outro lado, a introdução de conceitos de medida no sector das ciências sociais não pode fazer-se sem riscos. Daqui o terem concluído os técnicos de planificação de ensino que o valor dos rendimentos não reside no resultado obtido mas na afirmação de uma orientação ou direcção, isto é, na iniciação de um método.
Mesmo que fosse possível calcular com exactidão o rendimento da educação, seria fundamental notai que esta não constitui um investimento qualquer ou, mais correctamente, um pré-investimento, mas sim um investimento essencial a toda a economia. Tal afirmação não deve arrastar-nos à conclusão errada e perigosa de que a educação é um sector da economia, por vezes numa visão estreita, como aconteceu com a política de salários de miséria do Ministério da Educação Nacional e uma escolaridade reduzidíssima.
Este conceito retrógrado e limitado, desenvolvido em finais do século XIX, identificava ensino, instrução e escola.
Hoje felizmente está superado, pois todas as profissões e ramos de actividade humana tendem para a intelectualização, só assim ganhando sentido o conceito de educação permanente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Todos, os que nos preocupamos com a problemática da educação, desejaríamos ver destinadas para este campo verbas mais vultosas. Contudo, os 45 119 milhões de contos propostos para este Orçamento representam um aumento significativo em relação aos 32 443 milhões do Orçamento inicial de 1979.
O dinheiro nunca é da mais para se fazer o que pretendemos e daí que a sua distribuição tenha de obedecer a prioridades. Suponho que é aqui que residem as divergências dos partidos. Tão importante como fazer opções e zelar pela aplicação eficiente das verbas, porque ao que já ouvimos calculam-se as perdas de má administração em cerca de 1 milhão de contos. Embora difícil, urge rever o problema das gestões escolares.
A análise comparativa do Orçamento em relação aos anos anteriores mostra o aumento das verbas da educação, tomando mesmo em conta a inflação e as variações de mercado. A percentagem ultrapassa os 11 % e em relação ao PNB verificou-se a subida para 4,5. Em 1979 foi de 3,3.
A Espanha e a Grécia estão numa situação inferior à nossa.
Verificamos com muito agrado que, dentro das opções tomadas pelo MEC, a prioridade foi para a alfabetização. Concordamos com esta proposta, que vem responder aos anseios desta Assembleia, manifestados através de um diploma, que aqui aprovámos, e da criação de um concelho nacional de alfabetização.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Esta Assembleia pugnou pela erradicação do analfabetismo, que no nosso país mantém índices dos mais elevados do mundo ocidental.
Foram destinados à educação popular 107000 contos, dos quais cerca de 100000 especificadamente para actividades de alfabetização. Isto significa um crescimento dez vezes maior que o da verba distribuída no ano passado para essas acções.
Pretende-se neste Plano realizar 20000 acções de alfabetização. A cobertura actual é de 2000, o que significa, em relação àquele projecto, apenas um décimo. Esta opção do Plano representa um passo importante na solução deste grave problema e uma esperança para os que não tiveram oportunidades de escolarização.

O Sr. Azevedo Soares (CDS): - Muito bem!

O Orador: - O Orçamento do MEC revela um grande esforço, que não está totalmente nos quadros que foram postos à nossa disposição pois há

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que cornar para lá das verbas que lhe estão orçamentadas com cerca de 1 milhão de contos, retirados do projecto inicial, os quais passaram para as autarquias locais e são destinados a construções escolares, acção social, residências, aquecimentos, equipamentos de estabelecimentos pré-escolares e postos de Telescola, no âmbito do ensino básico.
O Orçamento real terá de considerar, pois, o orçamento ordinário mais de 41 milhões de contos -, os 400 000 contos do plano de investimentos da Administração Central (PIDDAC) e o milhão que transitou para as autarquias, mercê da lei. Não referimos as construções escolares, que passam a depender exclusivamente do Ministério das Obras Públicas e das autarquias. Chamo, contudo, a atenção para a necessidade de apoio às autarquias mais pobres, que são aquela que mostram, normalmente, mais carência de instalações e cujos orçamentos não chegam para realizar estas obras.
O capital destinado ao ensino básico, 625 000 contos, representa, em relação ao ano passado, 50 % em valores absolutos, o que, em conjugação com a verba vultosa do Instituto de Acção Social Escolar (cerca de 2 800 000 contos no orçamento ordinário), revela o grande esforço do Governo no sentido da escolaridade obrigatória de seis anos, de modo a apoiar os alunos com transporte e alimentação.
Estimulando e incrementando esse programa, iniciou o MEC, nos jornais, uma campanha destinada a levar à escola todas as crianças.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Outro aspecto particularmente significativo deste Plano é o que se relaciona com o ensino particular e cooperativo, cuja lei foi aprovada por este Parlamento.
No orçamento ordinário não há valores reais, mas no PIDDAC foi inscrita uma verba de 100000 contos, verba que aparece pela primeira vez e que representa o desejo de concretizar as medidas de apoio ao ensino particular e cooperativo. Essas1 medidas revestem dois aspectos: em primeiro lugar, o da criação de condições de viabilidade imediata de apoio a colégios em situação crítica, e, em segundo lugar, B aplicação do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo.
Outro sector que merece o nosso apreço neste orçamento é o da educação especial, dotada com 142600 contos, o que mostra uma duplicação em relação ao ano passado.
Quanto à educação pré-escolar, foram-lhe destinados cerca de 90000 contos, quase o dobro do que recebeu no ano passado. Este quantitativo permite duplicar a rede pública dos jardins-de-infância até ao final do ano, cumprindo-se assim uma promessa eleitoral da AD.
Também o lançamento do 12.º ano de escolaridade, criado em substituição do Ano Propedêutico, tão criticado por esta Assembleia, significa um esforço financeiro notável, pois foram-lhe atribuídos cerca de 350000 contos.
Cumpre-se assim também uma promessa eleitoral e dá-se satisfação a um tipo de ensino presencial, mais eficiente e pedagogicamente mais válido.
Digno de realce é o facto de o MEC passar a fornecer material escolar ao ensino primário e aos postos de Telescola. Há dois anos que estes estabelecimentos não recebem qualquer material de trabalho. Ainda este ano, ao que fomos informados, será feito esse fornecimento às escolas.
A adjudicação para o próximo ano lectivo é de cerca de 100 000 contos, significando que a todas as crianças serão fornecidos gratuitamente os instrumentos de trabalho. Além desta verba será distribuído, a partir de Outubro, um suplemento monetário a cada escola, de modo que os professores possam adquirir materiais necessários para o ensino.
Também no sector da investigação científica as verbas distribuídas são encorajadoras, não obstante ser nosso desejo vê-las mais elevadas e também reestruturado este campo.
Os vários departamentos foram dotados com quantitativos que somam cerca de meio milhão de contos, o que permitirá manter as infra-estruturas da investigação a níveis aceitáveis.
Vimos, com muito agrado, fazer-se referência à cooperação na investigação científica com os países de expressão portuguesa, naturalmente os intertropicais, com os quais desejamos uma aproximação cada vez maior.
A política de juventude, a ocupação de tempos livres, o desenvolvimento desportivo também foram contemplados com dignidade no plano de investimentos.
Sr. Presidente, Srs, Deputados: Como escreveu o grande pensador Descartes, «o bom senso é a coisa melhor distribuída do Mundo».
Certamente, entre nós, os. Deputados, a quem ninguém nega o bom senso, embora nos mingúe o dinheiro, haverá opções diferentes quanto às prioridades da educação e à distribuição das verbas. Para nós, esta escolha das prioridades pareceu-nos ter sido a mais acertada, a mais realista e a de maior projecção no futuro de modo a impulsionar o desenvolvimento do País e a consolidação da democracia e da liberdade, que só se alcançam com uma verdadeira educação popular.

Aplausos do CDS, do PSD do PPM e dos Deputados reformadores.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Leitão.

O Sr. José Leitão (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O Sr. Ministro das Finanças e do Plano na sua última intervenção de ontem subestimou o problema do desemprego, que é sem dúvida um dos mais graves problemas nacionais.
Ninguém ignora a importância de que se reveste o desemprego e particularmente o desemprego juvenil no nosso país.
As estimativas do Departamento de Estudos e Planeamento do Ministério do Trabalho, em Junho de 1977, calculavam existirem 483000 desempregados, dos quais 249000 à procura do primeiro emprego.
A procura do primeiro emprego tem vindo, aliás, a aumentar relativamente à procura de novo emprego nos últimos anos, 66% dos que procuram emprego têm menos de 25 anos.
O Governo nada tem feito no sentido de o combater.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - É falso!

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O Orador: - Prevê a criação de 18 000 novos postos de trabalho, quando vão existir 300 000 novos activos.
Nem se diga que será através de um sistema integrado de incentivos ao investimento que será possível provocar a criação de novos empregos. O facto de os partidos do Governo terem rejeitado na discussão da correspondente autorização legislativa, a ligação que pretendíamos estabelecer, através das propostas de alteração que apresentámos, entre a concessão dos incentivos à criação de novos empregos, leva-nos a concluir que assim não será.
O País tem o dever de através dos seus Órgãos de Soberania, fazer todos os esforços para combater o desemprego juvenil.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Muito bem!

O Orador: - As medidas que têm vindo a ser anunciadas peio Governo, por exemplo, na função pública, levam-nos a temer, pelo contrário, que o desemprego e designadamente o dos jovens venha a aumentar.
Esta situação leva-me a formular ao Governo as seguintes questões:

1.ª Por que não propõe o Governo como um dos objectivos do Plano o combate ao desemprego, lançando um programa de emergência de integração dos jovens no mundo do trabalho, à semelhança do que foi feito com êxito em 1977 relativamente aos desalojados, tendo em conta a experiência do programa CIFRE?
2.ª Tendo já sido apresentado pelo Partido Socialista o projecto de lei n.° 437/I, que cria um sistema de estímulos à criação de novos empregos, qual o sentido de o Governo vir anunciar agora a sua vontade de instituição de «prémios de emprego» com idêntica finalidade? Significa que o Governo considerou que de facto tinha sido oportuna a iniciativa socialista, mas que não pretende reconhecê-la e procurará vir a anulá-la por este meio?
3.ª Por que é que o Governo não atribui verbas do Orçamento para a realização de um programa de combate ao desemprego juvenil e anuncia que a implementação das acções que propõem no campo do emprego estão dependentes das negociações com a CEE com vista a conseguir para elas apoio financeiro? Significa isto que o Governo não considera o combate ao desemprego juvenil uma prioridade nacional? Quer isto dizer que responsabilizará os nossos parceiros da CEE pela sua eventual não concretização?
4.ª Pretende o Governo proceder a milhares de despedimentos na função pública de trabalhadores contratados além do quadro ao dificultar a renovação desses contratos, utilizando porventura na prática um subtil critério de discriminação política, agravando ainda mais o desemprego dos jovens que constituem a maioria dos trabalhadores nesta situação?
5.ª Tem o Governo consciência de que a revogação dos diplomas de responsabilidade do Governo de Maria de Lurdes Pintasilgo que visavam iniciar a regulamentação do Serviço Nacional de Saúde são uma ameaça de desemprego paira muitos médicos jovens que acreditaram na concretização do Serviço Nacional de Saúde, para além de revelarem desinteresse pelo direito à saúde da população?

A resposta a estas perguntas é para nós muito importante, porque consideramos fundamenta] tomar medidas para combater o desemprego juvenil e porque ficámos com a ideia da leitura do Plano, que as medidas aí propostas no que se refere ao emprego o foram apenas porque parecia mal que dele nada constasse e daí talvez o aparecerem como um último capítulo porventura acrescentado apenas antes da sua apresentação pública.
Disse.

Aplausos do PS.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Disse e mal!

O Sr. Carlos Lage (PS): - Disse muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Godinho de Matos.

O Sr. Nuno Godinho de Matos (DR): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Ontem um Deputado da bancada comunista com inegável sentido de humor, aliás louvável, disse que o Governo, com a prova escrita que tinha apresentado, merecia um zero e que, com tal nota na escrita, nada o poderia salvai na oral.

Uma voz do PCP: - Olhe que assim é!

O Orador: - Não penso que o Governo mereça um zero - também não tenho ilusões de ir alterar o pensamento desse Sr. Deputado comunista -, mas quanto mais não fosse, dado o esforço que representa a elaboração do Orçamento Geral do Estado, penso que mais do que zero seria devido. E quando o critério do examinador é de tal forma exigente que a curva de reprovações se torna exagerada, quem fica em causa não são os examinados mas. sim, por vezes os examinadores.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Vivemos efectivamente numa crise económica, aliás já referida e diversas vezes repetida por membros do Governo e por outros membros da maioria, a qual é condicionada por circunstâncias, entre outras, externas, das quais se destacam a inflação internacional, o aumento dos custos do petróleo e os limites de desenvolvimento dos próprios países ocidentais com os quais temos mais relações económicas.
É indiscutível que estas circunstâncias externas têm de limitar a nossa própria actividade e a nossa própria acção como País autónomo e soberano.

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E isso, forçosamente, também tem de se repercutir no Orçamento Geral do Estado agora apresentado pelo Governo.
Por isso vê-se, necessariamente, o Governo obrigado a apresentar um Orçamento Geral do Estado, no qual entram em conflito políticas de certo modo contraditórias ou que, pelo menos tendencialmente, se anulam. Por um lado, pretendesse promover o desenvolvimento económico, pretende-se alargar o número de postos de trabalho existentes no País, pretendem-se dar melhores condições de vida aos cidadãos, pretende-se também aumentar o volume das despesas de capital, mas é evidente que estas medidas têm de ser contrariadas por outras que prosseguem efeitos diversos, tais como o procurar redigir a inflação, o procurar controlar o aumento das despesas públicas e o limitar os deficits. designadamente os das empresas públicas.
É portanto das condições de estabelecer um equilíbrio entre estes dois balanços que se vão auto-anulando, que tem de sair o actual Orçamento Geral do Estado. E parece-nos, embora sempre podendo errar, que o Orçamento Geral do Estado consegue, com alguma felicidade, satisfazer esses objectivos. Dizemos com alguma felicidade porque, apesar dos limites que exogenamente se impõem a quem elabora este Orçamento, surgem medidas que nos parecem merecer um real e efectivo destaque: o alargamento das isenções para a contribuição predial e para a sisa, o alargamento de benefícios fiscais para as empresas que celebrem contratos de viabilização, o combate à evasão fiscal - e fazemos votos bem profícuos para que, neste domínio, o Ministro das Finanças e todos aqueles que o acompanharem nessa luta consigam levar a cabo um efectivo combate à evasão fiscal, sejam quais forem as reticências ou dificuldades que venham a surgir no percurso, porque elas surgirão de certeza absoluta e surgirão de vários lados e de vários sectores e é bastante importante que, nesse domínio, não se claudique, embora, estou certo, seja difícil não claudicar nesse domínio, mas também estamos certos ou pelo menos desejamos que assim seja, de que aí o Governo irá saber não claudicar -, o incentivo à iniciativa privada que o Governo se propõe fundamentar e que tem efectivamente fomentado, e o aumento das despesas de capital, nas quais avultam as transferências para as autarquias locais. São estas medidas que julgamos poder e dever destacar, são estas medidas que pensamos que, dentro dos limites realmente existentes, contribuem para uma melhoria do nosso panorama económico.
Todavia, estas medidas têm um custo, têm uma contrapartida que nos gera uma certa preocupação, que é a de assistirmos a um déficit de 141,2 milhões de contos, déficit este que é bastante pesado e que c preocupante porque ele só pode ser assumido a partir do momento em que vai ser coberto com o recurso ao aumento da dívida pública.
E tendo a dívida pública os encargos que já tem, este novo alargamento é, sem dúvida alguma, preocupante e tão mais preocupante quanto é certo que seremos nós a pagá-lo; mas mais do que nós, são gerações que se nos seguem e que não foram ouvidas nem achadas, não foram consideradas minimamente nesta decisão.
Ao longo do debate do Orçamento Geral do Estado têm-se sempre introduzido também elementos de política geral, designadamente, pelo menos na sessão de hoje, dois grandes temas: a problemática das comunidades económicas e o estarmos ou não perante um Orçamento que propicia a um regresso ao 24 de Abril.
Quanto às comunidades económicas, parece-nos que deverão naturalmente existir dificuldades resultantes da adesão do nosso país às comunidades. Mas não podem ser essas dificuldades a vir limitar a decisão política predominante de se aderir às comunidades económicas europeias. Essas dificuldades de natureza económica e de compatibilização da nossa estrutura económica com a estrutura dos pauses integrados nas comunidades económicas devem ser negociadas, devem ser trabalhadas e tratadas pelos próprios acordos ou tratados de adesão que venham a condicionar a nossa adesão ao Tratado de Roma.
Mas o que não pode ser posto em causa, o que não pode ser questionado é a adesão de Portugal às comunidades económicas europeias e a nossa adesão ao Tratado de Roma. Esse é um princípio que nós, reformadores, desejamos ver afirmado e reafirmado com constância.

O Sr. Vítor Louro (PCP): - Uma atitude muito científica!

O Orador: - Agradeço a sua aprovação, Sr. Deputado. Honra-me bastante!
Quanto a estarmos perante um Orçamento que inicia uma política de retorno ao 24 de Abril ou a uma política de restauração, parece-nos que este pensamento político é manifestamente abusivo.
Efectivamente, o retorno ao 24 de Abril ou a uma política de restauração, ou criar o banquete para que as taifa seis famílias venham banquetear-se, ou para que os Meios e os Champalimauds venham beneficiar da «mesa» do Orçamento Geral do Estiado exigiria indicadores políticos que não podem ser atribuídos a este Governo. Ainda em caso algum as liberdades públicas foram postas em causa, ainda em caso algum foi tolhida a possibilidade a quem quer que fosse de se manifestar e não foi criada qualquer mesa de censura, nem qualquer lápis azul.
Existe, portanto, uma real situação totalmente diferenciada daquela para a qual se pretende empurrar o actual Executivo.
Existirão manifestações políticas contestáveis, existirão acções políticas naturalmente susceptíveis de serem postas em causa na acção do actual Executivo; certamente que existem e tão-somente, a título de exemplo, irei referir talvez uma excessiva agressividade em política externa que se revela assaz pioneira ...

Uma voz do CDS: - Não apoiado!

O Orador: - ..., embora ponha em causa tão-somente manifestações e não o alinhamento de fundo com os Estados Unidos, porque considero que essa opção de fundo é correcta. Mas se existem manifestações que podem ser criticadas e se existem aspectos passíveis de crítica porque de facto existem, isso não significa que o Governo esteja a restaurar algo que

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foi derrotado e quanto a nós, reformadores, desejamos que tenha sido irreversível e indiscutivelmente derrotado em 25 de Abril de 1974.

Aplausos dos Deputados reformadores, do PSD e do PPM.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Natália Correia.

A Sr.ª Natália Correia (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Uma primeira palavra para expor a razão funda e determinante que, na discussão do Orçamento e do Plano, impõe que consideremos a cultura uma questão de levo.
É na tradição cumulativa da cultura que a memória dos povos mantém viva e nela se apuram as virtualidades desses povos por uma dinâmica própria que vai integrando novos elementos. Tal é o motor da evolução das sociedades que se degradam quando esse património é descurado.
Humilhados parceiros seríamos da União Europeia se nela nos diluíssemos num mero comercialismo e economismo incaracterísticos. A nossa entrada no Mercado Comum implica, como termo de ingresso dignificaste, a afirmação da nossa individualidade nacional, cujos instrumentos naturais são os meãos que a cultura detém e nos transmite.

Vozes do PSD e do CDS: - Muito bem!

A Oradora: - Por coerência com o exposto, o encarecimento da nossa cultura deverá constituir uma forte componente da mudança que este Governo assumiu como manca da sua acção.

O Sr. Guerreiro Norte (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Porque em política cultural não hesitámos em advertir o Governo em questões que nos mereceram reservas, essa atitude isenta, coonesta o agrado com que registamos os esforços desenvolvidos pela SEC para alcançar maior verba orçamental, assim como a resposta que de certo modo obteve do Ministério das Finanças e do Plano.
De certo medo, porque vejamos: em termos de OGE, conseguiu-se um acréscimo de cerca de 30% em reacção ao Orçamento de 1979; em matéria de investimentos, o aumento foi de 20,8%, também em redacção a J979. Globalmente, o aumento de verbas para a SEC atingiu 28% em relação ao ano passado. Considerando a taxa de inflação, trata-se de um aumento real.
Contudo, em termos comparativos, verifica-se que o ano passado as verbas para a cultura representavam 0,39% e que este ano esse valor passou para 0,30%. Contínua, pois, a cultura a ser insuficientemente dotada para se cumprir como força iluminante do nosso destino histórico.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Seria, contudo, desonestidade ignorar as limitações financeiras que obstam a um financiamento desejável do sector cultural. Mas compreendendo a inviabilidade actual daquilo que teríamos por justo, não abdicamos de recomendar ao Governo que, na ampla carreira que tem como perspectiva, inscreva o desenvolvimento cultural na sua lista de prioridades.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Nas Grandes Opções do Plano para 1980, apresentou a SEC duas Linhas de acção: a conservação e defesa do património cultural e o desenvolvimento da acção cultural. No primeiro sistema, deu a SEC um ipasso em frente com a Lei Orgânica que vem institucionalizar, através do Instituto Português do Património Cultural, a coordenação da política patrimonial. É realmente um passo em frente.
Uma vez regulamentado o Instituto Português do Património Cultural e transitando para a sua tutela um conjunto importante de monumentos, destes teremos de destacar o caso da Batalha em que flagrantemente se parentela a degradação patrimonial do País.
Entre as iniciativas que urgem neste campo, ficaríamos decepcionados se, no âmbito de sua dotação orçamental para 1980, a SEC não concretizasse projectos que, de resto, sabemos estar na sua intenção, tais como: o financiamento de centros de formação técnica e de restauro, de cursos de conservadores, a remodelação dos cursos de bibliotecários, arquivistas e documentalistas, a organização do cadastre dos bens patrimoniais, o estabelecimento de políticas sectoriais do património, nomeadamente, escavações, arquivos e levantamentos de situações.
A reabertura do Museu de Arte Contemporânea e o de Arqueologia e a instalação da Torre do Tombo fim edifício apropriado, apoiada racionalmente pelo afincamento de uma política arquivista nacional, são acções que não poderão sofrer adiamento.
Também se assinada, como facto positivo, a política que considera a importância da Cinemateca Nacional, através da qual não só se salvaguarda o património cinematográfico, como se obtém a divulgação dos filmes portugueses que não logram ser exibidos pela via dos circuitos comerciais. E aqui já entramos no campo da acção cultural.
Ficaram os novos pedidos de apoio financeiro ao IPC comprometidos, desde 1979, por uma reformulação compreensível de política de cinema devido a desatinos e abusos cometidos por grande parte dos realizadores e produtores contemplados que não completaram as suas obras. Se se entende que há que poder os erros para se relançar uma acção idónea em matéria de apoio financeiro ao filme português, não deixaremos de lastimar que, pelos culpados, paguem os que estão isentos de culpa, vendo frustrados os seus projectos. Que esta preocupação ética e animadora de uma criação cinematográfica íntegra oriente a SEC em data adequada e que desejamos seja próxima, para relançar uma política de cinema que a vida cultural não dispensa.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Ainda no domínio da acção cultural, esperamos que se estimulem os agentes da dignidade linguística, assaz rebaixada por aberrações fiscais

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que ofendem os nossos ouvidos nos próprios meios audiovisuais e pelos brasileirismos inculcados por telenovelas de ínfima qualidade.

Vozes do PSD e do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Neste contexto, não podemos deixar de aplaudir a institucionalização do Instituto Português do Livro.
Será bom não esquecer que Alcácer Quibir é precedido pela espanholização da língua. Nela se plasma a alma dos povos. Os que maltratam a língua que falam, tecem a mortalha paira a sua alma. A língua portuguesa é o vaso comunicante que nos liga às terras que descolonizámos e às nossas gentes que emigraram.
Não espezinhemos as raízes desses ramos da nossa língua que longinquamente florescem.

Aplausos do PSD, do CDS, do PPM, dos Deputados reformadores e de alguns Deputados do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Casimiro.

O Sr. José Casimiro (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nas propostas de lei do Plano e do Orçamento não há a mínima referência aos problemas graves dos produtores de vinho, que tanta importância têm na economia nacional.
O Governo e a Junta Nacional do Vinho não têm resolvido minimamente o problema do vinho, tanto que os preços ao produtor são bastante inferiores aos já baixos preços de intervenção, especialmente o dos vinhos de queima.
Porque é que a Junta Nacional do Vinho e o Governo não aumenta o número dei pipas da sua intervenção e não divulga mais aos agricultores através da RTP, RDP e jornais esta intervenção? Como o Governo encara o crédito às adegas cooperativas e aos vinicultores isolados que ainda não venderam o seu vinho? Como pensa o Governo e a Junta Nacional do Vinho resolver o .problema de armazenamento da próxima colheita que tudo indica que vai ser grande? Quando se dignará o Governo e a Junta Nacional do Vinho a fiscalizar e combater os preços especulativos ao consumidor que tanto tem prejudicado os vinicultores? Por que é que o Governo e a Junta Nacional do Vinho não subsidia em dinheiro as adegas cooperativas para estas poderem exportar, nomeadamente para Angola, Guiné e Moçambique? Se se faz tanta propaganda acerca da diminuição dos impostos, porque é que agora o Governo não propõe a abolição da taxa do vinho tão desejada pelos agricultores?
Estamos a sofrer as consequências de uma ruinosa importação de vinho feita pela Junta Nacional do Vinho dei que é presidente o Sr. Tomás Correia da CAP.
Encontram-se ainda na Junta Nacional do Vinho 300000 hl dessa surpresa importada. Que pensa a Junta Nacional do Vinho e o Governo fazer a este vinho? Pensará continuar a trocar este vinho tinto pelo branco que se encontra na falida União das Adegas Cooperativas de que o Sr. Tomás Correia foi presidente? E já agora, tendo sido feita uma inspecção técnica e administrativa a essa União das Adegas Cooperativas porque não divulga o Governo os resultados?
Os produtores exigem que os seus problemas sejam resolvidos rapidamente e lutarão pela sua resolução.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura.

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O Governo intenta expandir o sistema escolar, o que é natural, se se tiver presente que Portugal é o País europeu com menor taxa de escolarização. Como conciliar porém esta intenção com uma descida percentual das despesas com a educação de 12,5% para 11,5%, entre 1979-1980. relativamente às despesas totais?
Esta descida significará fatalmente um agravamento das condições dá docência e da distância, implicando a deterioração do estatuto económico do professor, das instalações e do apoio social escolar.
A manter a melhoria registada na qualificação dos docentes, entre 1974 e 1979, o custo do professor irá fatalmente acrescer. Deste modo, por carência de meios financeiros do OGE, o estatuto económico dos professores sofre, na verdade, um grande risco de deterioração.
Se o Governo intentar, como é necessário, num ensino democrático, instituir uma só via de obrigatoriedade escolar, um ensino único, deixando de admitir a persistência de vias qualitativamente diferenciadas, onde irá buscar a verba? Se o Governo encarar o problema das instalações escolares, numa dupla perspectiva: a de ultrapassar graves carências de instalações existentes e a do seu alargamento, tendo em vista a urgente expansão da escolaridade, mas não a admitindo sem a efectivação da escolaridade obrigatória de seis anos, onde irá o Governo buscar recursos para a resolução destes problemas?
O Governo ainda não explicitou suficientemente os pontos vagos do seu Programa e não deu elementos suficientes, para com seriedade podermos avaliar da coerência da sua política, em matéria de educação.
A verdade, porém, é que, por mais esforço que o Ministério da Educação e Ciência esteja disposto a empreender, num país onde se agravam as condições dos que vivem do seu trabalho, será certamente paradoxal criar um sistema escolar democrático, pois que a democracia social enfraquece em cada dia.
O País não tem a mínima garantia dei que venha a efectivar-se, através deste OGE e das amplas vagas e sem conteúdo Opções do Plano, a obrigatoriedade escolar de seis anos. Temos a certeza, pelo contrário, que 20% das crianças que frequentam a escola primária não terão possibilidades de seguir os seus estudos.
Conhecemos de perto a grandeza do problema. Na freguesia do Lumiar, aqui a dois passos desta Assembleia, existem para 50000 habitantes, cinco escolas primárias degradadas e nenhuma escola de ensino pós-primária.
Infelizmente, o Ministério da Educação e Ciência recusou resposta a todos os requerimentos, pedidos

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de informação que, no melhor sentido de diálogo, lhe foram dirigidos pelo Grupo Parlamentar do meu partido.
Legislar a obrigatoriedade escolar de nove anos é percorrer o caminho inverso ao objectivo constitucional. Durante ainda muitos anos só terão acesso ao mercado de trabalho as elites provenientes de zonas onde os nove anos de escolaridade se efectivaram e aumentará assim significativamente a desigualdade de oportunidades entre os Portugueses.

O Sr. Aquilino Ribeiro (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Nós temíamos, desde início, que neste Governo o Ministério da Educação e Ciência, pelas características que apresentava e pelos objectivos que cegamente lhe impõe os seus chefes responsáveis, não tivesse força, nem determinação para enfrentar a realidade, equacionar sistematicamente os problemas com os olhos postos no País que serve, e não se deixar condicionar por uma formal e hipotética entrada na CEE.
Quando da discussão do Programa do Governo, já advertimos os perigos de legislar sem efectivar, vincando que a democracia se alimenta de verdade.
Em nome deste princípio apresentámos a esta Assembleia um trabalho concretizando o problema das carências de escolaridade básica e do esforço necessário à efectivação urgentíssima da escolaridade obrigatória.
Pese embora a eventual boa vontade do Ministro da Educação e dos funcionários do Ministério da Educação & Ciência, este Governo não pode alimentar-se de verdade, porque os seus objectivos não se enquadram na vivência da nossa realidade.
Em 1975, com todos os erros cometidos em matéria educativa, o País acreditava na sua própria força e esse dinamismo fez com que 18,4% do OGE fosse dedicado à educação. Hoje, em 1980, investe-se menos do que em 1970, que se investiu 12%.
Decorrente desta política, também no OGE não se encontram verbas bastantes que possam corrigir as desigualdades sociais, e todos sabemos que muitas crianças, no decurso da própria instrução primária são forçadas ia contribuir para a débil subsistência do agregado familiar. Neste cenário não é possível legislar mais três anos de obrigatoriedade escolar.
Seria legislar para esquecer!
No tempo do fascismo, aqueles que teimaram em trabalhar, em educação, gastavam dinheiro e dias de férias, na sede da UNESCO, em Paris, lendo relatórios de vários países onde se tentavam acertar experiências, muitas vezes falhadas e recomeçadas.
Onde, porém, tudo corria no melhor dos mundos, era em Portugal, onde os relatórios eufóricos, certinhos contavam, a nós portugueses, verdadeiras histórias de fadas. Hoje, em democracia, devemos ter a grandeza de assumir os nossos problemas, e não galgar por cima deles.
Este OGE propõe ainda o lançamento do 12.º ano de escolaridade.
O MDP/CDE já se pronunciou contra o Ano Propedêutico, mas Sr. Ministro, onde se vai buscar meios para encaixar milhares de alunos, num sistema superlotado?
Pensamos que a organização do Ministério da Educação e Ciência e o seu esquema financeiro se vai parecer muito com aquele orçamento doméstico dos dez filhos, com menos de 11 000$ de renda mensal, imaginado pelo Sr. Primeiro-Ministro Sá Carneiro! Nada nos leva a pensar que o Governo raciocina nas mesmas coordenadas do MDP/CDE e isso é para nós evidente, e se situa perante os problemas do País de forma igual, e o consenso técnico é difícil, porque de facto, no fundo, ele depende de grandes opções políticas que nos são divergentes. Assim, o MDP/CDE apoia e louva o aumento das verbas para a Direcção-Geral da Educação Permanente. Para além das tarefas enormes que esta Direcção-Geral tem de desempenhar já neste momento, o nosso sistema educativo insuficiente aumenta-as em cada dia.
Poderemos dizer que a nossa escola formal fornece um material inesgotável ao quadro da educação de adultos. A legislação da escolaridade obrigatória de nove anos rebentará então com qualquer possibilidade de satisfazer as necessidades do sistema educativo não formal de adultos, certamente nos próximos vinte anos.
Foi com satisfação que ouvimos do Sr. Ministro a perspectiva de colaboração das autarquias no ensino, mas essa colaboração nunca poderá ser feita apenas ao nível das instalações; sem uma grande movimentação de bases populares, generalizando e diversificando as fontes de aprendizagem, os nossos problemas irão crescendo e o MEC acabará por ser um poço fundo onde se somem todos os esforços.
A obra de educação para ser eficiente terá de ter uma base de dinamização e de participação. Porém, tanto os elementos que temos sobre o sector da cultura, como sobre o sector da saúde são suficientes para nos certificarmos de que voltamos aos pelouros estanques e que se rejeita a desburocratização, naturalmente nascida da movimentação popular. Ò mau uso do Poder volta a paralisar as acções governamentais e a sacar-lhes o conteúdo vivo, tentando suspender o exercício da democracia.
A elevada percentagem do OGE destinada à Secretaria de Estado da Cultura não subsidia, não dinamiza, não democratiza; as suas opções medem-se pela estreiteza de objectivos meramente tecnocratizantes, exposto no Plano para 1980: Nus, formais e elitistas. A Secretaria de Estado é assim uma espécie de fábrica de cultura e temos receio que sem operários que a fabriquem.
A situação das companhias de teatro sem subsídios, a ausência de qualquer dinamismo institucional, autárquico e social não nos fazem prever nada de positivo.
No que diz respeito ao sector da saúde, a primeira preocupação do Governo foi precisamente propor uma destruição: a da Lei das Bases do Serviço Nacional de Saúde, opção que a esmagadora maioria da população aguardava com justificada esperança.
Por outro lado, uma das medidas previstas no Plano, apresentado pelo Governo, preconiza a criação de um serviço de urgência e atendimento permanente, serviço que a Secretaria de Estado da Saúde tentou pôr em funcionamento a partir do Dia Mundial da Saúde.

O MDP/CDE tem plena consciência dei que se impõe na verdade a implementação de tal medida. Mas não da forma como o Governo a implantou, ou

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seja, totalmente isolada da indispensável dinâmica do Serviço Nacional da Saúde.
É muito claro o empenhamento do Governo em produzir legislação que é uma forma de substituir a ausência de uma filosofia ao nível da saúde. E afinal, muito mais importante do que legislar seria, indubitavelmente, criar condições adequadas para que o Serviço Nacional de Saúde se pudesse realizar.
O Plano do Governo não dedica uma só palavra sobre o estabelecimento urgente de uma indispensável política nacional de medicamento. E não se vê qualquer menção à promoção dos cuidados primários de saúde que fazem parte de uma vasta campanha empreendida pela Organização Mundial de Saúde a partir de 1978 com a recomendação expressa aos Governos de todos os países do Mundo que fomentem os cuidados primários de saúde!
Esquece-se de que a medicina moderna, tendo como objectivo os cuidados com a saúde e evitando a doença, tem de contar com a participação activa e íntima da população. Está mais do que provado que a medicina isolada está longe de produzir os resultados que se lhe desejam e necessitam. Só em contacto permanente com os utentes e as suas estruturas de base eles se conseguem atingir. Por opção política de fundo, o Governo mais uma vez excluiu a participação das populações.

Aplausos do MDP/CDE do PCP e da UDP.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Martins Canaverde.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna, caso possa usá-la durante 05 dez minutos que ainda restam.

O Sr. Ministro da Administração Interna (Eurico de Melo): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: Permita-me, Sr. Presidente, que as minhas primeiras palavras nesta Câmara sejam de cumprimento para V. Ex.ª e para VV. Ex.ªs, Srs. Deputados.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A consolidação de um Estado democrático passa, no entender do Governo, por amplas reformas a concretizar na Administração.
Um dos princípios em que assentam essas reformas respeita à intenção deliberada de devolver funções e responsabilidades para níveis de administração onde o cidadão mais facilmente possa controlar e fiscalizar a actuação do Estado: ganhar-se-á mais eficácia no modo de administrar; contribuir-se-á para o reforço da sociedade civil; serão assegurados níveis de participação mais elevados do cidadão na vida pública; serão atenuados progressivamente os graves desequilíbrios regionais existentes.
A tradução municipalista em Portugal faz com que se actue no sentido de reforçar este escalão da administração sem prejuízo da procura de níveis espaciais mais amplos, onde funções que exijam outros limiares geográficos e demográficos possam ser cometidas a responsáveis legítimos das populações.
Infelizmente, o tema poder local Item sido especialmente usado por certas forças políticas, quando se trata de discutir o Orçamento Geral do Estado, no que respeita a transferências de verbas para as autarquias.
É, sem dúvida, uma área onde a demagogia encontra terreno fértil, escamoteando as dificuldades que terão de ser encaradas e vencidas para que. em Portugal, venha a existir uma Administração Local cada vez mais forte.

O Sr. Macedo Pereira (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Convém, por isso, desmistificar a situação.

O Governo afirma solenemente que aposta com afinco na consolidação do poder local em Portugal. Fá-lo conscientemente porque o robustecimento deste nível de administração é fundamental para a concretização do projecto de sociedade que queremos. Todavia, não significa que alinhe numa política fácil, simpática e demagógica de transferência só de verbas. O reforço do poder local passa pela actuação firme e concertada em várias frentes.
A frente financeira é apenas uma delas; a distribuição de fortes recursos financeiros pelas autarquias não padeira dissociar-se de uma actuação acompanhada noutras frentes, algumas delas de mais complexo tratamento.
Referirei algumas delas: o robustecimento da capacidade técnica e administrativa ao serviço dos eleitos locais; a introdução de novas técnicas de gestão, o fomento do associativismo entre municípios.
De nada adiantará canalizar para as autarquias» locais muitos milhões de contos se, conjuntamente, não se criarem as condições de crescente capacidade para se lançarem projectos que contribuam para a elevação do nível de vida e bem-estar.

Vozes do PSD e do CDS: - Muito bem!

O Orador: - A situação que o Governo encontrou neste domínio é caótica. E este termo não é usado com ligeireza.
Existem sessenta e duas câmaras municipais sem chefe de secretaria; em muitas delas esse lugar é exercido interinamente, por indivíduos sem preparação adequada; não existia à data da posse deste Governo qualquer sistema de formação e valorização profissional dos funcionários ao serviço das autarquias; desde 1974 não se realizaram quaisquer concursos baseados em provas prestadas; não se introduziram nem se motivaram os eleitos locais a adoptarem modernas técnicas de gestão, sendo os métodos os mesmos de há cinquenta anos; nada se fez para fomentar o associativismo entre municípios; não encontrou o Governo um modelo claro no domínio das instituições regionais, da reforma da administração e da divisão administrativa.
Isto são factos indesmentíveis.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não desconhece o Governo as dificuldades que o processo de reforço do poder local obrigará a vencer. Contudo, não pode deixar de mostrar a sua perplexidade perante os ataques de determinadas forças que aqui e ali surgem como paladinas e defensoras do poder local quando, enquanto estiveram no poder, muito pouco ou nada fizeram em áreas que acabei de enunciar e são fundamentais.

O Sr. Fernando Amaral (PSD): - Muito bem!

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O Orador: - O Governo pretende responder com factos.
Em termos de associativismo autárquico, fez apresentar uma proposta de lei sobre associação de municípios; no que respeita a formação de pessoal, inventariou a situação, definiu critérios e acabou de criar o Centro de Estudos e Formação Autárquica; elaborou um diploma que regulamenta os concursos e levará a cabo, pela primeira vez desde 1974, concursos com vista ao preenchimento dos lugares existentes nas câmaras municipais através de provas; porque entende que os municípios terão de ter cada vez mais parte activa em processos de decisão; propôs a todos os municípios, para crítica e sugestão, uma forma institucional que visa a criação do Conselho Nacional de Municípios.
Sabe o Governo que a fixação de técnicos qualificados em zonas menos desenvolvidas é um factor essencial para o reforço do poder local. Também aqui nada estava preparado ou sequer levemente estudado.
Assim, e em esforço conjunto de vários Ministérios, iniciou-se um trabalho que culminará com a criação de uma série de incentivos que visam a fixação de técnicos na periferia.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo aposta num poder local forte. Por isso, não pode deixar de denunciar a situação que veio encontrar em domínios que são fundamentais para a concretização desse objectivo.
O Governo não vê a Lei das Finanças Locais como um fim em si mesmo, mas como um instrumento que, paralela e concertadamente com outros, criará as condições para o progressivo robustecimento do nível de administração local.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Governo não alinhará em política de fácil simpatia. Tem um programa claro nesta matéria e honrá-lo-á com factos muito concretos.
Existe uma filosofia geral de actuação por parte do Governo, no domínio da administração regional e local, que permitiu avançar em tão curto espaço de tempo com a série de actuações enunciadas.
Queremos que se atenuem os graves desequilíbrios regionais entre o litoral e o interior. Por isso, e paralelamente ao estudo da criação de incentivos de fixação de técnicos na periferia, negociou-se com a CEE a construção a muito curto prazo de vias de penetração que liguem de forma rápida o litoral e o interior.
Pretende-se, apesar da ausência de instituições regionais devidamente formalizada, fomentar a participação dos representantes legítimos das populações no traçado de estratégias e políticas de desenvolvimento regional. Por isso, já dispõem oitenta e cinco câmaras municipais da Região do Norte de uma proposta de estratégia de desenvolvimento para a Região. Em breve se estenderá a experiência a outras regiões do País.
Que fique claro que o reforço do poder local passa, muito mais e no momento actual, pela actuação nas áreas enunciadas do que pelo pedido fácil e politicamente simpático de distribuição de dinheiros.
Por estranho que possa parecer, reforço do poder local também tem a ver, e muito, com as reformas a operar a nível de administração central. Também
aqui as inovações foram inexistentes nos últimos anos. Muito trabalho há a desenvolver para que a Administração Central se adapte à época de mudança que já introduzimos.
Mais uma vez afirmámos: optamos pela criação de condições para a existência de um poder local cada vez mais forte na sociedade democrática que queremos construir. Faz parte integrante do nosso projecto e com entusiasmo e determinação venceremos as dificuldades próprias do processo, mais aquelas que demagogicamente quererão criar-nos.

Aplausos do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos interromper aqui a reunião para recomeçar às 15 horas.

Os Srs. Deputados que se inscreveram para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro da Administração Interna, os Srs. Deputados Manuel de Oliveira e Veiga de Oliveira, tomarão a palavra após o almoço.
Está então suspensa a reunião.

Eram 13 horas.

Antes do reinicio da reunião reassumiu a Presidência o Sr. Presidente Leonardo Ribeiro de Almeida.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a reunião.
Eram 15 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro da Administração Interna, tem a palavra o Sr. Deputado Handel Oliveira.

O Sr. Handel de Oliveira (PS): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: Apesar de o Sr. Ministro da Administração Interna não se encontrar presente, vou formular a pergunta.

O Sr. Presidente: - Então, se o Sr. Deputado me desse licença, é só um momento, porque vou pedir aos serviços de apoio para providenciarem no sentido de verificar se o Sr. Ministro já se encontra presente, pois será conveniente que ele ouça o seu .pedido de esclarecimento.

Pausa.

Informo os Srs. Deputados que têm pedidos de esclarecimento a fazer ao Sr. Ministro da Administração Interna que ele ainda se não encontra na Assembleia.
Desejam VV. Ex.ªs reservar esses pedidos de esclarecimento para logo que de esteja presente ou formulá-los imediatamente?

O Sr. Handel de Oliveira (PS): - Sr. Presidente, pela minha parte deixaria expressa a questão que tenho a pôr, e o Sr. Ministro quando chegar, responderá, se entender.

O Sr. Presidente: - Nesse caso, tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Handel de Oliveira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Ministro da Administração Interna classificou a nossa afirmação «acentuada

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afirmação», na expressão dele - de demagógica pela forma como vimos afirmando consecutivamente o problema da transferência de verbas para as autarquias locais, no cumprimento da Lei das Finanças Locais.
Dá-se o caso que - hoje podemos afirmá-lo claramente -, demagogicamente, o PSD foi o partido que se reclamou de maior defensor da aplicação integral e sem gradualismos da Lei das Finanças Locais.
O Sr. Ministro, quando era membro de executivo camarário de Guimarães, numa atitude de protesto pela não aplicação integral da Lei das Finanças Locais, abandonou pura a simplesmente o cargo.
É caso para se perguntar, Sr. Presidente, será que o Sr. Ministro tem uma forma de actuar quando membro de uma câmara municipal e outra forma de actuar quando membro de um Governo. Será isto ou não caso para se classificar de ambiguidade e inclusivamente incoerência da parte do Sr. Ministro que acaba de fazer um discurso que, se nesta Câmara não estivéssemos habituados, como estamos, a ouvir os discursos da maioria, seria caso para dizer que é um espanto para a oposição ouvir um discurso de tal teor?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Veiga de Oliveira para pedir esclarecimentos.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, tenho a palavra porque V. Ex.ª deu-ma, mas quero reservá-la para pedir os .esclarecimentos quando o Sr. Ministro da Administração Interna estiver presente. É fundamental que ele esteja já presente, embora possa responder ou não.

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª o direito de reservar-se para essa oportunidade e a Mesa registará a sua pretensão. Logo que o Sr. Ministro chegue, ser-lhe-á concedida a palavra.

O Sr. Ministro Adjunto do Primeiro-Ministro (Pinto Balsemão): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Ministro Adjunto do Primeiro-Ministro: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Ministro da Administração Interna vai chegar dentro de momentos. Nessa altura, como é evidente, teremos o prazer de ouvir o Sr. Deputado Veiga de Oliveira.
Quanto ao pedido de esclarecimento do Sr. Deputado do Partido Socialista, também será respondido na altura, embora desde já nos pareça importante classificar a expressão utilizada como um pouco exagerada.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Não é nada exagerada. O Sr. Moreira da Silva (PSD): - É um espanto!

O Orador: - Mas, enfim, o Sr. Ministro da Administração Interna responderá oportunamente.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Ernesto.

O Sr. José Ernesto (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Orçamento deste Governo para a saúde demonstra claramente o tipo de interesses que defende e como para o fazer não tem os mínimos escrúpulos em mentir e até em afrontar os justíssimos e mais elementares direitos do nosso povo.
É conhecido o ódio que este Governo demonstrou desde a primeira hora ao Serviço Nacional de Saúde. Foi por isso com alguma surpresa, mas vendo de imediato a patranha que se preparava, que deparámos com uma verba de 36,8 milhões de contos inscrita neste OGE, e destinada ao Serviço Nacional de Saúde! Seria que este Governo, tão entretido em destruir todo o edifício legislativo do SNS, se tinha convertido ao projecto constitucional e democrático estipulado pelo artigo 64.º da Constituição?
A exposição do Sr. Secretário de Estado da Saúde na Comissão respectiva e a do Sr. Ministro dos Assuntos Sociais nesta Sala vieram, cada uma à sua maneira, mostrar que assim não era e que o que se tramava, afinal, era apenas mais uma das suas «habilidades». É bom no entanto que se diga, desde já, que aqui foi esse intento muito mal conseguido, talvez porque o presidente da direcção da Ordem dos Médicos ainda não pode vir defender na Assembleia da República o Orçamento Geral do Estado!
Quando se tenta rasgar a Constituição, e se diz defendê-la. Quando se tenta destruir a Reforma Agrária e se diz defendê-la. Quando se afronta o povo português e se diz respeitá-lo, porque não utilizar a expressão «Serviço Nacional de Saúde» como forma de subverter e esvaziar de conteúdo um conceito que hoje cala bem fundo no coração do povo português?
Para o Sr. Secretário de Estado, o Serviço Nacional de Saúde é apenas uma expressão que traduz a globalidade dos serviços de saúde actualmente existentes (sic). Sendo assim, os gastos com esta rubrica não se destinam a incrementar o verdadeiro SNS a que a Constituição e a lei obrigam, mas apenas a lançar uma baixa provocação a todos quantos sabem o que custa em sofrimento e desgraça ser-se doente em Portugal.
Não teria talvez o Governo, quando decidiu inscrever tal patranha no OGE, a noção de que um seu membro, antes mesmo do debate se iniciar, era o primeiro a denunciá-lo!
Mas disse mais o Sr. Secretário de Estado, ao afirmar que o aumento do orçamento para a saúde em cerca de 3,2 milhões de contos em relação ao anterior, apenas mais 10%, quando a inflação foi de cerca de 24%, seria praticamente todo absorvido pelos aumentos com custos de medicamentos! Não é só o povo português que desmente o Governo quando diz que os preços dos medicamentos baixam. São também os próprios membros do Governo quando a sua habilidade não chega para o camuflar.
E ainda não ficou por aqui o Sr. Secretário de Estado da Saúde. Certamente com a mesma irresponsabilidade com que se atreveu a modificar por um simples decreto prazos de regulamentação que lhe tinham sido fixados por esta Assembleia ao aprovar a lei do SNS, anunciou que irá dentro em breve pôr em prática o famigerado sistema da medicina convencionada, a coberto de verbas inscritas

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mas não especificadas neste OGE. Quanto pensa o Governo gastar com esta fornia de aumentar os lucros dos grandes patrões da medicina à custa da doença do nosso povo? A isto não respondeu o Sr. Secretário de Estado, ficando-se apenas pela defesa acalorada do princípio de que a compensação a receber pelos utentes seria a mesma para todos, independentemente de qual seja a sua necessidade e de se recorrer aos serviços públicos ou privados. Ou seja, o universalismo «massificado».
Gostávamos de ouvir o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais como articula o ataque que ontem demagogicamente moveu a esse mesmo universalismo massificado para a segurança «social com a defesa acalorada que o Sr. Secretário de Estado faz do mesmo no âmbito da saúde.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É assim o Governo da direita. Diz-se e contradiz-se com o maior dos à vontades, pois a isso obriga o pretender-se ludibriar com falsas justiças a esmagadora maioria, para satisfazer com lucros escandalosos o egoísmo de uns poucos.
O Governo Sá Carneiro/Freitas do Amaral encontra-se numa flagrante situação de ilegalidade ao não cumprir a Lei do Serviço Nacional de Saúde aprovada pela Assembleia da República.

O Sr. António Arnaut (PS): - Muito bem!

O Orador: - E não a cumpre, porque ela não serve os seus interesses de classe!
Na prática, o que se vê é que os serviços de saúde estão cada vez piores. Os Portugueses estão cada vez mais mal servidos no campo da saúde e neste domínio a melhor terapêutica é também derrotar este Orçamento e assim contribuir para o fim deste Governo.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Encontra-se já presente o Sr. Ministro da Administração Interna.
Se o Sr. Deputado Veiga de Oliveira deseja formular agora os pedidos de esclarecimento, tem a palavra para o efeito.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro da Administração Interna: Eu, que tenho meio século de existência ...

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Não é muito!

O Orador: -..., não coro e já dificilmente sinto a cólera, mas o seu discurso fez-me corar e fez-me encolerizar, Sr. Ministro. É muito difícil fazê-lo, mas fez!
Provocou-me autenticamente náuseas, porque, Sr. Ministro, eu, que tenho meio século de existência, e nós, que temos toda a história portuguesa atrás de nós, ficámos perplexos, quando ouvimos um discurso que traduz uma pendência centralista de tal maneira evidente, de tal maneira caciqueira, bafienta e saudosista, que era difícil fazer melhor, se alguém se propusesse fazer um discurso com tal índole.
Em substância, o Sr. Ministro limitou-se a dizer que o Governo Sá Carneiro não vai cumprir a lei. Não é a primeira vez que o faz nem será a última - a última será antes de cair -, mas o que é lamentável é que o Sr. Ministro nos venha dizer que, afinal, o poder local não tem autonomia administrativa nem financeira, que os municípios não participam, como diz a Constituição, nas receitas do Estado por direito próprio, que será regulamentado por lei que existe e que o Governo se recusa a cumprir, porque acha que há outros valores mais altos que se levantam.
Sr. Ministro, o Governo, por enquanto, é livre de cumprir ou não cumprir as leis e continua a ser livre de declarar que não as cumpre, mas digam ao povo português nós não cumprimos a Lei das Finanças Locais porque temos, horror da descentralização, porque sabemos que a descentralização para além de tudo mais é uma grande barreira de defesa da democracia e porque não somos democratas. Diga isto e nós, ficaremos contentes, porque dirá a verdade.

Aplausos do PCP e protestos do PSD, do CDS e do PPM.

Porque nós, que somos democratas, admitimos que o Sr. Ministro não seja.

Protestos do PSD, do CDS e do PPM.

Tenham calma, Srs, Deputados, protestem na altura devida.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Temos o direito de dizer apartes!

O Orador: - Faça apartes, mas audíveis.

O Sr. Pedro Roseta (PSD). - É a democracia dos gulagues!

O Orador: - O Sr. Ministro terá o direito de concordar ou não concordar com a descentralização, mas chamo-lhe a atenção para o seguinte: a Constituição diz que é direito próprio dos municípios participar nas receitas do Estado; diz que esse assunto será regulado por lei. A lei existe e o Governo deve cumpri-la, como devia cumprir outras, e não devia vir aqui dizer que não a cumpre porque acha que há outros valores mais altos. Um Governo que se preza, mesmo que seja reaccionário, altera a lei, mas, enquanto ela existe, cumpre-a. E os Srs. nem isso fazem.

O Sr. Presidente: - O Sr. Ministro deseja responder às questões que lhe foram colocadas já ou no fim de todos os pedidos de esclarecimento?

O Sr. Ministro da Administração Interna: - Respondo no fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Nesse caso tem a palavra o Sr. Deputado Jaime Gama.

O Sr. Jaime Gama (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ouvi com o maior apreço a intervenção que aqui proferiu o Sr. Ministro da Administração Interna. Não me vou referir ao pensamento que exprimiu em relação à administração local e à extensão concreta e ao significado real das medidas que anunciou como constituindo um património revolucionário da política governamental nesse sector. Referirei

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apenas que na intervenção do Sr. Ministro houve uma lacuna importante. Essa lacuna, que tem sede de apreciação e discussão exactamente nas propostas de lei do Orçamento e das linhas gerais do Plano, é a que se refere às forças de segurança. O Sr. Ministro foi, porventura, deliberadamente omisso na sua intervenção em relação a esse problema. E o que gostaria de ver esclarecido, da parte governamental, nesta matéria é o que se refere exactamente à inserção das opções financeiras neste campo numa política global de modernização das forças de segurança.
Gostaria que o Sr. Ministro desenvolvesse este ponto não só pelo interesse que ele merece a todo u País mas também pela natural curiosidade que igualmente suscita em relação ao pessoal dessas forças. As verbas que são afectadas às forças de segurança, naturalmente numa opção governamental, são parte de uma política. Essa política carece de ser delineada perante o Parlamento.
Era isso que eu pedia que o Sr. Ministro da Administração Interna tivesse a bondade de nos explicar.

O Sr. Presidente: - Como não há mais pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna para responder.

O Sr. Ministro da Administração Interna: - Sr- Presidente, Srs. Deputados: Estou extremamente satisfeito pela reacção que as minhas poucas palavras produziram num Deputado da bancada do Partido Comunista. Se elas tivessem tido o seu aplauso, estaria extremamente insatisfeito ...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - ..., porque a doutrina de descentralização que defendemos com certeza não é a mesma do Partido Comunista - descentralização burocrática.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

Nós entendemos o poder local como qualquer coisa que nasce dos eleitos locais e não uma coisa que facilmente se faz por leis nesta Assembleia.

Protestos do PS e do PCP.

Há-de ser a experiência e o consenso que se estabelece entre as populações que há-de dizer como se faz o poder local e não a vontade sem experiência para decretar esse poder local.

Vozes do PSD: - Muito bem! Protestos do PS e do PCP.

O Orador: - E a prova de que isso é uma realidade é a Lei das Finanças Locais, cheia de omissões e cheia de erros.

O Sr. Raul Rego (PS): - A lei é da Assembleia e não do Governo!

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - A lei foi aprovada pela Assembleia, é paira se cumprir!

O Orador: - A lei é para ser cumprida ... Vozes do PCP: - Exactamente!

O Orador: - ... e só o não será se outra lei - porque o Orçamento é também uma lei- for rejeitada por esta Câmara. Se o Orçamento for aprovado por esta Câmara, é uma lei que se sobrepõe a outra lei.

Aplausos do PSD. do CDS e do PPM.

Respondendo ao Sr. Deputado Jaime Gama, dir-lhe-ei que, no âmbito do Ministro da Administração Interna...

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Ministério do Interior!

O Orador: - ...e dentro da austeridade que se procurou no Orçamento, foram cortadas bastantes verbas em relação àquelas que eram pretendidas pelas forcas de segurança, e com a compreensão dessas próprias forcas de segurança, porque não poderemos, numa altura em que as finanças não dispõem dos quantitativos necessários para/toda a política financeira, estar a propiciar às forças de segurança meios que parecem, pelo menos de momento, não muito necessários.
Há uma política de aplicação unais em (investimento de meios do que em mobilização de pessoas. As nossas forças de segurança são tecnicamente deficientes em muitos aspectos. Procurámos travar o quantitativo do pessoa e procurámos aumentar os meios à sua disposição tanto no aspecto de mobilidade como de comunicação. Por isso, se tiver o cuidado de ver, o Orçamento no respeitante às forças de segurança é bastante diminuto em relação ao orçamentos anteriores e a sua subida é uma subida que apenas tem em conta o factor real da desvalorização da moeda.

O Sr. Herculano Pires (PS): - Não respondeu à pergunta!

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: A resposta do Sr. Ministro fez voltar-me, subitamente, a calma.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Ainda bem!

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Reconhece que estava excitado!

O Orador: - A calma que é exigida pela gravidade das afirmações do Sr. Ministro, porque o Sr. Ministro nada objectou ao não cumprimento da Lei das Finanças Locais. O Sr. Ministro reincidiu na afirmação de dizer quais são as opiniões do Governo a respeito do cumprimento da Lei das Finanças Locais e da Constituição, opiniões que não interessam a esta Câmara. Opiniões pode ter as que quiser, Sr. Ministro, estamos em democracia, mas cumpra a lei e cumpra a Constituição.
O Sr. Ministro não repetiu, mas deixou subentendido que as verbas que a Lei das Finanças Locais e a Constituição atribuíram aos municípios não serão dadas, porque supostamente os municípios não são

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capazes de empregar essas verbas TIO desenvolvimento e nos interesses das populações. Foi isso que o Sr. Ministro disse em substância.
Devo lembrar-lhe que esse é um argumento estafado, um argumento velho, um argumento muito repassado e muito utilizado pata negar a autonomia financeira aos municípios, e que esse argumento não colhe, Sr. Ministro.
Se quiser, um dia o Sr. Ministro pode dar-se ao trabalho de verificar qual é o aproveitamento e qual é a eficácia do escudo quando empregue pela Administração Central e quando empregue peia administração Local. Verificará que a eficácia, quando empregue pela Administração Local, é muito maior.
E digo-lhe mais, mesmo um Governo como o vosso, que tem interesses reaccionários...

Protestos do PSD. do CDS e do PPM.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - A reacção está desse lado!

O Orador: - Já sabia.
Como ia dizendo, mesmo um governo como o vosso teria todo o interesse em transferir o escudo para a Administração Local. E só não o faz porque além de reaccionário é cego, porque além de reaccionário é incompetente.
O seu discurso a única coisa que mostrou não foi ser reaccionário. Isso, nós já sabíamos. Sabíamos tanto como o Sr. Ministro sabe que se eu estivesse a seu favor alguma coisa de errado tinha dito. Se eu estivesse a seu favor, o senhor teria cometido algum erro. Do seu ponto de vista, teria.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Nós estamos habituados à linguagem dos sociais-democratas!

O Orador: - Mas não só não estou a seu favor como digo que não devia ter vindo a esta Câmara garantir, a pés juntos, que não cumpre a Lei das Finanças Locais, que não cumpre a Constituição, e que não dá por esse meio possibilidades aos municípios de resolverem problemas que só a nível local serão resolvidos com custo muito mais baixo do que o serão quando resolvidos a nível central.
Esta, Sr. Ministro, é a questão. É a questão da democracia e da eficácia que está em causa. Esta é uma questão que não preocupa, porque o que preocupa este Governo, pela sua voz e mal -, são as próximas eleições.

Aplausos do PCP

O Sr. Ministro da Administração Interna: - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Creio que o Sr. Deputado Handel de Oliveira também item um protesto a fazer. Se o Sr. Ministro preferir, responde no final aos dois.

O Sr. Ministro da Administração Interna: - É apenas para dar um pequeno esclarecimento ao Sr. Deputado Veiga de Oliveira.

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Ministro da Administração Interna: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em 1978 as câmaras municipais despenderam uma verba, que consta de publicações, de 10300000 contos; em 1979 foram transferidos pana as câmaras municipais 23 milhões de contos; este ano serão transferidos paira as câmaras municipais 32 milhões de contos.
Em primeiro lugar, isto representa um aumento, em relação ao amo passado, de 38%.
Em seguindo lugar, o Sr. Ministro das Finanças, não sei se o Sr. Deputado Veiga de Oliveira estava presente ontem, quando de demonstrou, e sem contestação, que a Lei das Finanças Locais foi aplicada.

Vozes do PCP: - Não demonstrou nada! Isso é facto.

O Orador: - Se alguma coisa tem a objectar a isso, faça o favor de objectar às observações que foram feitas pelo Sr. Ministro das Finanças.
Também queria prestar-lhe um esclareci mento complementar que talvez o deixe um bocadinho atónico: é que há um mês atrás existiam, em bancos, como depósitos de câmaras municipais de dinheiro não utilizado relativamente às dotações do ano passado, 5 milhões de contos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Veiga de Oliveira.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Ministro certamente aprendeu a andar, visto que o vi entrar na Sala...

Risos do PCP.

O Sr. Ministro foi criança de colo, bebé, e aprendeu a andar e já não se recorda, porque a sua memória é curta, que caiu muitas vezes até aprender. Se eu recusasse a um bebé a possibilidade de cair, ele nunca aprendia a andar, e o que o Sr. Ministro está a fazer é recusar aos municípios, em nome das verbas que não foram capazes de gastar - é verdade que não foram -, as verbas a que têm direito.

O Sr. Rui Pena (CDS): - Não são certamente aquelas que gastaram em autocarros para vir a Lisboa!

O Orador: - Isso não é forma de um governo que se quer ou que se diz democrático agir.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Uma governo democrático atribui as verbas e depois tenta ajudar as autarquias no modo como as devem usar. Era isto que o Sr. Ministro devia fazer.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

Protestos do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Handel de Oliveira.

O Sr. Handel de Oliveira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sr. Ministro, pela omissão que fez, em parte, em relação às perguntas que levantei, re-

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gisto, a contradição das torças que constituem este Governo: quando estavam fora do Governo, reclamavam a aplicação integral e imediata da Lei das Finanças Locais ...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - .... agora que estão no Governo, classificam de demagógicos os apelos feitos no sentido de a lei ser respeitada. O Sr. Ministro é a encarnação mais viva desta ambiguidade visto que abandonou o executivo da Câmara Municipal de Guimarães porque a lei não estava a ser integralmente cumprida e chegado ao Governo escamoteia a questão.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Registamos com desagrado a ambiguidade e a contradição em que a AD quando está no Governo, quer ainda da maioria que o apoia.

Aplausos do PS e do Sr. Deputado do PCP Sousa Marques.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.

O Sr. Ministro da Administração Interna: - Queria esclarecer o Sr. Deputado Mandei de Oliveira porque está a fazer uma grande confusão. Fui vereador da Câmara de Guimarães e deixei de o ser porque mudei de residência para Santo Tirso.

Vozes do PSD: - Estão enganados!

Risos do PCP.

O Orador: - Foi um colega meu que se demitiu da Câmara de Guimarães alegando o não cumprimento da Lei das Finanças Locais.

O Sr. Raul Rego (PS): - Era seu correligionário!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Handel de Oliveira.

O Sr. Handel de Oliveira (PS): - É efectivamente verdade que não foi só o Sr. Ministro que se demitiu, foram todos os representantes do PSD no executivo camarário de Guimarães que se demitiram em bloco, declarando publicamente que o faziam em forma de protesto pela não aplicação da Lei das Finanças Locais. Hoje apelidam de demagógicos aqueles que defendem intransigentemente a sua aplicação.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.

O Sr. Ministro da Administração Interna: - O Sr. Deputado poderá ter ocasião de consultar os livros de actas da Câmara de Guimarães e poderá ler lá a minha declaração dizendo os motivos pelos quais abandonei o Município. Já lhe disse que mudei de residência, fui viver para Santo Tirso e não me sentia, a 30 km de distância, habilitado - mais o meu trabalho normal - a ser vereador da Câmara de Guimarães. Esta é a verdade e o Sr. Deputado poderá voltar a repetir, consultar as actas daquele órgão municipal e verificará que está a faltar à verdade.

Risos do PS.

Aproveitava a ocasião para responder ao Sr. Deputado Veiga de Oliveira e para lhe dizer o seguinte: lenho mais de 50 anos e já cá ando possivelmente há tantos anos como o Sr. Deputado. Mas respondendo agora ao caso da criança que tem de se deixar cair para aprender a andar, digo-lhe, também, que devemos evitar que essa criação se aproxime de precipícios.

O Sr. Veiga de Oliveira: - É óbvio!

O Orador: - Nós sabemos muito bem que é preferível um somatório de pequenas asneiras na administração municipal...

Vozes do PCP: - Na Administração Central!

O Orador: - ... à asneira grande da não atribuição de meios financeiros às autarquias locais. O que queremos evitar é os tombos pequenos para a criança aprender a andar e, acima de tudo, evitar o aproximar da criança do precipício de modo que ela perca a vida. Talvez seja essa uma das intenções do Partido Comunista ...

Vozes do PSD e do CDS: - Muito bem!

O Orador: - ... deixá-la andar depressa de mais e cegamente, para que caia no abismo ...

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - O Rapazote não diria melhor!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Veiga de Oliveira.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Ministro da Administração Interna: Em primeiro lugar, registo o facto de o Sr. Ministro estar um pouco lento... responde ao retardador. Para Ministro não é bom sinal e olhe que fala quem tem experiência disso.

Risos do PCP.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Mas que argumento!

O Orador: - Queria contar-lhe uma história muito rapidamente. Um dia uma professora, tentando ensinar que a Terra anda à volta do Sol, fê-lo com uma laranja e explicava ao aluno: o Sol está aqui, aqui está a laranja e ia movendo a laranja em volta do Sol. No fim, perguntou à criança se tinha percebido, coisa a que ela respondeu que sim. E a criança depois pediu à professora para fazer o mesmo com uma banana!

Risos do PCP, do PS e do MDP/CDE.

O Sr. Ministro deixou-se levar pela linguagem metafórica que eu usei para explicar do que se tratava e fez exactamente o que a criança fez pediu para dar um exemplo com uma banana...

Risos do PCP e do PS.

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Realmente não se trata disso, Sr. Ministro. A questão que se põe é esta: um escudo usado a nível central tem muito menos eficácia, apesar dos depósitos, do que tem a nível local. Esta é que é a questão, é a questão da utilidade das provas das populações, mesmo com erros, é a questão da democracia e da participação das populações. É isto que o senhor não é capaz de compreender, facto que eu compreendo.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Mas é disto que se trata e não de saber 52 se faz o exemplo com uma banana. Com uma banana é difícil porque a Terra é assim de uma forma esferóide que não item nada a ver com uma banana.

Risos do PCP. do PS e do MDP/CDE.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.

O Sr: Ministro da Administração Interna: - Só queria fazer uma pergunta ao Sr. Deputado Veiga de Oliveira.
Que o dinheiro não é de mais neste pais, sabemos nós, que o dinheiro não é de mais em termos de finanças neste país, sabemos nós. Houve portanto necessidade de o repartir dentro das possibilidades monetárias e, com um esforço que não foi pequeno, atribuíram-se os autarquias locais, por transferência, 32 milhões de contos. Há mais uma verba de 1,8 milhões de contos que foi orçamentada tendo em vista as iniciativas intermunicipais...

Vozes do PCP: - Para o compadrio!

O Orador: - ...por fornia a incentivar o associativismo entre municípios, matéria em que, creio, toda a gente está de acordo 1,8 milhões de contos, não é muito dinheiro, verba que há-de ser aplicada criteriosamente e fiscalizada pelos Srs. Deputados, mas podem ler a certeza que não irá ser distribuída com fins eleitoralistas.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Como o fez o PCP!

O Orador: - Ora são 32 milhões de contos mais 1,8 milhões de contos. O Sr. Deputado diz que o escudo deve ser distribuído a nível local porque tem mais rendimento do que a nível centrai! e aí estamos perfeitamente de acordo. No entanto, pergunto, dentro do orçamento do Ministério a Administração Interna nas verbas que colocaram à nossa disposição, num inicial rateio que ha neste país para as finanças públicas, onde 6 que há mais alguma verba no MAI que possa ser administrada a nível central. Tudo o que nos foi possível foi distribuído a nível local à excepção dos 1,8 milhões de contos com finalidades bem compreensíveis para quem as quiser compreender.
O Ministério da Administração Interna neste momento não tem 100300 para comparticipação, não ficou com um centavo para administrar a nível central, distribuiu-o todo pelas autarquias e temos muita pena de não nos terem sido ciadas mais possibilidades ou seja, em vez de 32 milhões não nos terem dado 52 milhões.

O. Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Amândio de Azevedo pede a palavra para que efeito?

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, pedi a palavra para intervir neste debate utilizando o tempo do meu partido.

O Sr. João Amaral (PCP): - Só faltava querer o tempo dos outros partidos!

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado pediu à palavra, mas, e embora seja certo que devia ter interveio antes do Sr. Ministro da Administração Interna e do Sr. Deputado Veiga de Oliveira, há um outro Deputado nas mesmas condições de V. Ex.ª A Mesa interpreta a situação nestes termos: falou o Sr. Ministro, o Sr. Deputado Veiga de Oliveira pediu a palavra, mas: antes dele havia dois pedidos, um do Sr. Deputado Jaime Gama e outro de V. Ex.ª Por ordem de pedidos, dou a palavra ao Sr. Deputado Jaime Gama.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, depois de. eu ter pedido a palavra já fizeram uso dela dois Ou três Deputados que a não tinham pedido, mas não faço questão. Tinha interesse em usai da palavra para quebrar este diálogo que não está. a meu ver, a servir o prestígio do debate.

Aplausos do PSD.

Vozes do PCP: - Essa agora, então porquê? É a lei da rolha, não?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jaime Gama.

O Sr. Jaime Gama (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A opinião pública do País e em particular os próprios elementos das forças de segurança são sensíveis a dois pontos. Em primeiro lugar, a partidarização na utilização da forças de segurança e a sua instrumentalização ao serviço das políticas governamentais; em segundo lugar, a situação de aumento da criminalidade que acompanhou cronologicamente a tomada de posse do Governo da AD...

Risos do PSD e do CDS.

Perante este dois factos, registei, com algum interesse, as declarações do Sr. Ministro da Administração Interna segundo as quais a opção do Governo era a de não realizar investimentos no sector da segurança interna, mantendo os níveis da opção orçamental nos padrões em que se situaram no ano anterior. Esta situação, em meu entender, merece uma discordância caracter verifico que nesta matéria, dentro do Governo; nas próprias opções governamentais, foi muito mais afortunado o Sr. Ministro Amaro da Costa.

Risos do PS.

O que me parece natural, de Tesouro. Em primeiro lugar, porque o Sr. Ministro Amaro da Costa se tem caracterizado nos últimos tempos como verdadeiro dinamizador cultural das forças armadas.

Risos do PS.

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...e tem posto o Gabinete do seu Ministério ao serviço da agitação política e da propaganda dentro das estruturas militares como, aliás, está mais do que demonstrado nas recentes declarações que proferiu comparando os perfis militares e políticos dos responsáveis pela hierarquia militar, o que é manifestamente inédito nos países democráticos e nos países membros da NATO -, e, em segundo lugar, porque o Sr. Ministro Amaro da Costa e dentro do Governo o símbolo e o expoente do sector político vencedor.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Não só em matéria de liderança política mas também em matéria de liderança orçamental o CDS conseguiu a maioria. Era esta a conclusão que gostaria de retirar nesta simples discussão em matéria de afectação das verbas orçamentadas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - A interpelação que V. Ex.ª acaba de fazer foi feita também ao Sr. Ministro da Defesa.
Tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.

O Sr. Ministro da Administração interna: - Queria fazer apenas um pequeno comentário.
Registo, e as forças de segurança e a Nação também registam, a ofensa que foi feita pelo Sr. Deputado Jaime Gama ao dizer que essas mesmas forças de segurança estão partidarizadas.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Não, não.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Raul Rego (PS): - O que se disse é que estão a partidarizá-las!

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - O Governo é que tenta partidarizá-las.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jaime Gama.

O Sr. Jaime Gama (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria fazer um ligeiro contraprotesto.

O Sr. Ministro deturpou manifestamente as minhas palavras, pois eu nunca disse que as forças de segurança eram instrumentalizadas, ou que o desejassem ser, o que eu disse é que a política do Governo nessa matéria era a de pretender a sua instrumentalização e a sua utilização partidária. Coisa em relação á qual discordo, coisa em relação à qual discordam todos os democratas portugueses e certamente os. membros da Aliança Democrática que procedem como tal e, muito em particular, a totalidade, dos elementos das forças de segurança que têm' a consciência plena do desempenho cabal da sua 'missão em democracia.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Amândio de Azevedo.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Finalmente, depois deste jogo de para dar resposta, que é o novo estilo dos debates na Assembleia da República...

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Não gosta?

O Orador: - .... tenho, finalmente, oportunidade de intervir e penso que se tivesse intervindo mais cedo talvez o debate sobre o Orçamento e o Plano se não afastasse tanto dos seus objectivos. Temos assistido pura e simplesmente a declarações de insulto e a declarações puramente demagógicas!

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Do Partido Comunista já não esperamos outra coisa porque, à mingua de argumentos para criar as posições da maioria, não tem outra linguagem que não seja a de insultar essa maioria.

Protestos do PCP.

É o «governo antidemocrático», é o «governo reaccionário», e, como toda a gente sabe e nem precisaríamos de reafirmar todas as vezos que é necessário, governos totalitários, reaccionários e sociais-fascistas só podem vir da bancada do Partido Comunista!

Aplausos do PSD do CDS e ao PPM.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Queriam é que todos fossem iguais a eles!

Protestos do PCP.

O Orador: - Já tivemos um exemplo no período posterior ao 25 de Abril; o único partido que retira as liberdades fundamentais dos cidadãos portugueses é o Partido Comunista exactamente na m e ima medida, ou até numa medida mais feroz, que aquelas que foram usadas pelos Governos fascistas...

Protestos do PCP

... dos ditadores Salazar e Marcelo Caetano.

Vozes do PSD e do CDS: - Muito bem!

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Provocador! Provocador!

O Orador: - É bom que o Partido Comunista não insista com insultos e ataques desta natureza, porque é bom que fique perfeitamente ciente de que, com o risco de não podermos fazer outras intervenções, terá todas as vezes a resposta que merece: governos totalitários que retirem as liberdades fundamentais aos cidadãos em Portugal só podem vir da banda do Partido Comunista.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Da AD!

O Orador: - ... não podem vir da banda de nenhum outro partido representado nesta Assembleia.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

Protestos do PCP.

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É de lamentar profundamente que o Partido Socialista não tenha também outra linguagem para discutir o Plano e o Orçamento que não seja a da intriga baixa de meter veneno entre os grupos que compõem a maioria desta Assembleia. Sonegue, Sr. Deputado Jaime Gama, que o Partido Social-Democrata não tem complexos e jamais se incomodará com a repetição do estafado slogan de que o CDS coloniza o PSD e que o CDS é que manda na Aliança Democrática.

Vozes do PS: - É verdade!

O Orador: - A vossa raiva está no facto de os vossos prognósticos de que a Aliança Democrática se ia desfazer ao cabo de algum tempo se terem revelado afinal de contas completamente infundados!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Nós estamos amidos, nós estamos fortes, porque há um interesse que sobreleva os objectivos de cada uma das forças que compõem a Aliança Democrática: O interesse nacional!

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

Risos do PS e do PCP

O Sr. Jaime Guina (PS): - Dá-me licença, Sr. Deputado?

O Orador: - Não dou licença, Sr. Deputado. Já se desviou demasiado do objectivo que aqui nos trouxe!
Temos projectos políticos diferentes, a linguagem do PSD não é a linguagem do CDS, nem do PPM, nem dos Deputados reformadores, estamos bem conscientes disso, mas somos, capazes de nos; unir na diversidade, de prosseguir um objectivo comum, sobretudo quando está em causa a salvaguarda da democracia e a salvaguarda dos destinos de Portugal.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Vozes do PCP: - Que exagero!

O Orador: - Queria, ainda, Sr. Presidente, Srs. Deputados, para repor as coisas no seu devido lugar, dizer que, em termos de defesa do poder local, no seio da Aliança Democrática estão os partidos - falo essencialmente pelo PSD - que mais se bateram, desde a primeira hora, por um poder local autêntico e forte.

Vozes do PCP: - Vê-se! Vê-se!

O Orador: - Recordo aos Srs. Deputados do Partido Comunista e do Partido Socialista o facto de terem boicotado totalmente o projecto de lei do PSD que visava dotar as autarquias locais de meios legais suficientes para poder exercer os seus poderes. Nós estávamos interessados em definir aqui claramente as suas competências e o Partido Socialista e o Partido Comunista' coligados impediram a aprovação de uma única norma das muitas que nós propusemos nesse sentido.

Risos do PCP.

O Partido Socialista acorda tarde porque enquanto esteve no Governo foi um partido que, surpreendentemente, adoptou uma política perfeitamente centralista ligada àquela que sempre tem sido defendida pelo Partido Comunista Português. Aliás, tudo isso ó compreensível porque o Partido Comunista não tem apoio na autarquias locais e se quiser ter o podar nas mãos tem de os concentrar no Poder Central, que era o único que dispunha.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Nós podemos seguir facilmente a nossa política porque o nosso apoio não está apenas no Poder Central, ele está também, e felizmente, no poder local onde dispomos da maioria na maior parte das câmaras do nosso país.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Nós prosseguiremos constantemente uma política descentralizada, de autêntico poder local, dando aos autarcas a possibilidade de resolverem, no âmbito dos seus interesses, os problemas que lhes dizem respeito. Nós batalhámos para que fosse aqui aplicada, no máxima possível, sem sermos, naturalmente, alheios, cegos e surdos às realidades concretas da vida política portuguesa, a Lei das Finanças: Locais. Nós não fomos ao ponto, na discussão do Orçamento Moía Pinto de exigir uma aplicação total e integral da Lei das Finanças Locais, nós pretendíamos, mais do que aquilo que era oferecido e por isso votámos contra o Orçamento; no entanto, nunca afirmámos o princípio rígido e absoluto de que a Lei das Finanças Locais tinha de ser cumprida houvesse o que houvesse, nem que o País ficasse destruído, nem que a democracia se perdesse.

Vozes do PCP: -Que exagero, Sr. Deputado!

O Orador: - Há, portanto, um sentido de equilíbrio e de ponderação em todos, estes- problemas e, como disse o Sr. Ministro da Administração Interna, o Orçamento é aprovado por uma lei que, por circunstâncias muito espaciais e atendíveis, pode determinar uma aplicação por farei, não inteiramente completas. De resto, nós não dizemos que a Lei das Finanças Locais não é cumprida, ò que o Sr. Ministro das Finanças disse aqui que a interpretação da lei não é unívoca e que há uma interpretação que ele adiantou, que não foi contrariada, de acordo com a qual este Orçamento representa uma aplicação total e integral da referida lei.

Vozes do PCP: - Ele não afirmou isso!

O Orador: - A verdade das coisas manda que se diga que em matéria de poder local não é o Partido Comunista e não é o Partido Socialista quê podem vir dar lições aos partidos da maioria. Nomeadamente o PSD reivindica para si, sem receio de poder ser contrariado, o papel dominante na defesa de um poder local autêntico e forte, porque é exactamente aí que reside a grande defesa a democracia do PCP só interessa «ter» poder locais e este servir para con-

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seguir o? seus objectivos de manipulação e de escravização do nosso país.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Lá sabe, lá sabe ...

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jaime Gama.

O Sr. Jaime Gama (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Um breve esclarecimento. Obtivemos aqui neste debate a garantia, por intermédio do Sr. Deputado Amândio de Azevedo, de que e PSD não se deixa colonizar pelo CDS. Era perfeitamente desnecessário que o Sr. Deputado Amândio de Azevedo nos viesse, dar essa garantia porque é do domínio público a sua oposição à constituição da Aliança Democrática e ao papel do CDS na vida política portuguesa.

Risos do PSD e do CDS.

Mas se isso não bastasse, Sr. Presidente, Srs. Deputados, bastar-nos-ia as reacções do CDS à actual política financeira do Sr. Ministro Cavaco e Silva e, ainda hoje nesta Assembleia, à maneira como o Grupo Parlamentar do CDS reagiu à intervenção do Sr. Deputado Angelo Correia, particularmente quando o Sr. Deputado Angelo Correia fez uma referência especial ao sector público.
De qualquer forma, as palavras do Sr. Deputado Amândio de Azevedo tiveram neste debate o mérito de esclarecer aquilo que não precisava de ser esclarecido.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Angelo Correia (PSD): - Não seja intriguista! Já não tem idade para isso!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Amândio de Azevedo, porque entendo que o Sr. Deputado tem o direito de defesa.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, talvez direito de resposta. Não me sinto ofendido; mas entendo que, depois do estilo que aqui foi consagrado, me deve ser dada a palavra para ura esclarecimento.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - O Sr. Deputado está muito pálido!

O Orador: - Em primeiro lugar, ponho em relevo o facto de o Sr. Deputado Jaime Gama não abandonar o estilo da intriga - pelos vistos, é a única coisa que sabe fazer!

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

Em segundo lugar, queria informar o Sr. Deputado Jaime Gama - não admira que não esteja correctamente informado porque ultimamente tem estado ura bocado afastado dos centros de poder do seu partido...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - ... - de que nunca tive qualquer posição contrária à Aliança Democrática. Votei no Congresso do meu partido a favor de um acordo com o CDS, com o PPM e com os Reformadores, que veio mais tarde a ser concluído e que constitui e representa hoje a Aliança Democrática. A única posição que assumi no meu partido, com a inteira liberdade que me é reconhecida e que não causa qualquer problema, foi a de ser contra as listas conjuntas PSD/CDS/PPM/Reformadores. Simplesmente, mesmo que isso não fosse já um facto consumado - que hoje não pode ser objecto de qualquer problema - devo lembrar-lhe que sempre foi meu timbre, como penso que deve ser timbre dos democratas, acatar não só as deliberações maioritárias como, depois de tomadas, acatá-las como minhas próprias.

Vozes do PSD e do PPM: - Muito bem!

O Orador: - Devo esclarecer que me empenho e empenharei tanto nas deliberações que tiverem o meu voto favorável, como naquelas em que assim não acontecer. Até lhe devo dizer que já exprimi muitas vezes, em nome do meu partido, posições que não são as minhas, porque não estou aqui a falar em meu nome próprio - a minha opinião pessoal não interessa para ninguém -, mas sim a falar em nome do meu partido.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Veiga de Oliveira.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria, antes de tudo, fazer uma interpelação à Mesa, não contando portanto o tempo do meu partido.
Sr. Presidente, está concedido o uso da palavra para fazer a interpelação?

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputado.

O Orador: - Fui acusado, conjuntamente com outros senhores, entre eles um Ministro, de termos desviado a discussão do objectivo deste debate da Assembleia: as propostas de lei do Plano e do Orçamento. Como neste caso estou bem acompanhado, inclusive por um Sr. Ministro do Governo da AD, gostaria...

O Sr. Angelo Correia (PSD): - Agora já está bem acompanhado!

O Orador: - ... de saber se a Mesa pensa que, na minha troca de palavras com o Sr. Ministro da Administração Interna, eu ou ele nos afastámos da questão essencial que aqui está a ser debatida, a saber, as Leis do Plano e do Orçamento, nomeadamente na discussão do Orçamento quanto ao cumprimento ou não cumprimento, parcial, etc., da Lei das Finanças Locais, das verbas que serão atribuídas às autarquias.
Se a Mesa entende que nos afastámos do assunto, Sr. Presidente, ficarei muito triste, mas aceitarei o

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entendimento da Mesa. Se assim não for, gostaria de saber a opinião da Mesa.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa, na sequência...

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, gostaria de interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, estou a responder a uma interpelação à Mesa.
A Mesa tem dado aos Srs. Deputados e aos Srs. Ministros a liberdade de se expressarem pela forma como entendem e administrando o seu tempo como entenderem. É possível o entendimento expresso pelo Sr. Deputado Amândio de Azevedo, mas a Mesa não se apercebeu de que tivesse havido um afastamento tão substancial que pudesse levar a uma intervenção no sentido de chamar as pessoas ao assunto em questão, e mesmo que. o tenha havido e se assim aconteceu a Mesa agiu mal -, o que é certo é que o debate prosseguiu nos próprios termos a que a Câmara assistiu.
O debate vai continuar, VV. Ex.ªs farão as intervenções que entenderem dever fazer e se a Mesa,, no respeito pela liberdade de todos os Srs. Deputados, entender que há realmente um flagrante desvio da matéria orçamental, tomará a iniciativa de chamar a atenção a quem o fizer.
Tem a palavra o Sr. Deputado Amândio de Azevedo.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, tinha pedido a palavra para interpelar a Mesa. No entanto, V. Ex.ª acaba de dar uma resposta que considero correcta e por isso o felicito.
Permita-me que registe, entretanto, que o Sr. Deputado Veiga de Oliveira pretende que as opiniões dos Deputados sejam sujeitas ao controle da Mesa.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Ah, Ah, Ah,!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para prosseguir o debate sobre o Plano e o Orçamento, o Sr. Deputado Veiga "de Oliveira.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, em primeiro lugar uma gargalhada de escárnio.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Só sabe dar dessas!

O Orador: - Sr. Deputado, é óbvio que temos a uberdade de usar o tempo de que dispomos como entendermos e apenas com uma condição: a de tratarmos da matópia que está em debate. Esta condição é válida para todos, de uma forma democrática.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - A esse respeito há só uma opinião: a do Sr. Deputado Veiga de Oliveira!...

O Orador: - Não é só a minha opinião, Sr. Deputado. É a opinião da Câmara e a dos grupos parlamentares quando reunidos paira o efeito oa conferência dos grupos parlamentares.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - A eterna tendência dos carimbos!

O Orador: -Sr. Ministro da Administração Interna: Em relação ao que V, Ex.ª disse, quero juntar algum «poses»...

Vozes do PSD: - «Poses»?

O Orador: - ... -e permitam-me a expressão propositadamente usada - àquilo que disse.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - «Poses»?

O Orador: - Eu sei que não se diz «poses», para descanso de quem esteja desconfiado...

Risos do PSD e do CDS.

Trata-se do seguinte: as verbas dos municípios são deles por direito próprio e não pertencem à Administração Interna. O Sr. Ministro não tem de lamentar-se de não ter verbas próprias, pelo menos nesse caso.
Quanto ao 1 800 000$, não temos nada a objectar, excepto no que respeita ao n.º 2 do artigo 33.º, antigo que ofende a Lei das Finanças Locais e sem que esta tenha sido alterada. Tanto é assim que chamo a sua atenção, Sr. Ministro, para o seguinte: qualquer Governo: que se preze pode propor alterações às leis vigentes; simplesmente, enquanto estas se encontrem em vigor, o Governo tem a obrigação estrita de dar o exemplo e cumpri-las. Se o não fizer não é digno de ser Governo, qualquer que seja a orientação política de que se reclame.
Quanto ao Sr. Deputado Amândio de Azevedo - que desapareceu neste momento...

O Sr. Calos Brito (PCP): - Pirou-se!

O Orador: - ... -, sem querer ser muito agressivo, pois de não se encontra presente, devo dizer que já estamos habituados às provocações que, mais uma vez, o Sr. Deputado 'reeditou agora.
Mas acrescentaria o seguinte: depois de ter escutado o Sr. Deputado Amândio de Azevedo, e depois de muitas vezes o ter escutado também em Conselhos de Ministros durante o VI Governo Provisório, percebo finalmente qual a razão., de o Sr. Deputado Amândio de Azevedo não ser Ministro do Governo da ADI.

Risos do PCP e do PS.

É que seda totalmente intolerável, pois este Sr. Deputado é irrascível e confunde democracia com bom humor ou com o seu humor. Como tal, limita-se a, sempre que não esteja satisfeito ou de acordo com o que os outros dizem invocar não sei que diabos e sonhos maus, para assim fazer acusações a torto e a direito, que aliás não poupam os próprios membros da sua maioria ou do seu Governo.
Desta forma, muito menos- pouparia o PCP. Simplesmente, já estamos habituados a ser o «bode» da história, o «bode expiatórios. Este é um facto que já vem desde o tempo de Salazar. Mas nós temos coragem e paciência suficiente para continuarmos a

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ouvir a acusação de sermos os responsáveis de todos os males de que sofre este país. Na vossa opinião podemos ser nós os responsáveis desta situarão; mas na nossa opinião somos o grande obreiro, da liberdade que o 25 de Abril trouxe a este pais, bem como os grandes obreiros da liberdade que há-de ser garantida neste país no futuro.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministre da Defesa Nacional.

O Sr. Ministro da Defesa Nacional (Amaro da Costa): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O parecer da Comissão Parlamentar de Defesa acerca da proposta de lei orçamental é sereno, objectivo e presidente.
Sereno, porque procura cingir-se à tentativa de explicitar de forma mais «acessível e transparente» o orçamento da Defesa Nacional.
Objectivo, enquanto reconhece vários dos condicionalismos a que se encontra sujeito o esforço de defesa no nosso país.
Vê é; enfim, prudente ao assumir, as dificuldades de se promover, em clima de austeridade das despesas públicas, «melhorias, muito sensíveis» nas correspondentes dotações orçamentais.
O Governo permite-se sublinhar estas características positivas do parecer elaborado pela competente Comissão Especializada Parlamentar, no que elas representam de convergência política com o seu próprio pensamento.
Neste momento em que se debate a afectação dos recursos financeiros às necessidades do País, cabe, no entanto, reflectir sobre, o sentido e o significado dos meios que a Nação, através dos seus legítimos representantes, autoriza a despender com a sua Defesa.
Na verdade, Portugal realiza - neste domínio um esforço que é. em termos relativos, muito inferior ao do conjunto dos seus parceiros da NATO.

O Sr. Macedo Pereira (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Os membros, europeus da Aliança Atlântica atribuem em média, 3,6-% do seu produto interno bruto no sector da Defesa. Portugal, nos últimos dois anos, ficou-se pelos 3%.
Julgo não ser ousadia comentar a este propósito que o nosso país, para o efeito de assumir em coerência a solidariedade defensiva, de que é parte, deverá realizar um esforço intenso, no sentido de, pelo menos, afectar aos departamentos de Defesa uma quota-parte dos seus recursos nacionais que não seja inferior à média dos seus aliados europeus.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Tal só será possível e conseguir proporcionar, em termos reais, um acréscimo continuado, das. verbas atribuídas, ao longo dos próximos anos, aos sectores mais directamente envolvidos na Defesa Nacional.
Que esse acréscimo deva estar associado ao aumento percentual das dotações para material e equipamento afigura-se ser uma tese pacífica.
E, a este propósito, convirá justamente sublinhar que o Governo propõe à Assembleia da República um crescimento de 4 % em termos reais, em relação a 1979, das dotações de funcionamento dos departamentos da Defesa, excluindo as verbas atribuídas à remuneração de pessoal. É importante esse facto se tivermos em conta que a política económica global que foi estabelecida e nos é proposta assenta na estabilização do consumo público de 1979 para 1980, a fim de se permitir o relançamento do investimento, o combate à inflação e o acréscimo real do consumo privado.
Está o Governo profundamente convencido de que a sua orientação é correcta. Só através de uma política desta natureza será possível caminhar-se, seriamente, para a dignificação- profissional das forças armadas.

O Sr. Rui Pena (CDS): - Muito bem!

O Orador: - A opção é claro: ou se reduzem drasticamente, em volume e em qualidade, as missões atribuídas à instituição militar ou, então, torna-se necessário dotá-la dos meios mínimos para que a sua actividade não seja estéril, improdutiva ou desmobilizadora.
Trata-se, afinal, de uma escolha política. O Governo assume-a, pelo seu lado, optando por este segundo caminho.
Decerto, será preciso encaminhar progressivamente os trabalhos de reestruturação das forças armadas no sentido de potenciar os meios aéreos e navais requeridos pela nossa situação geoestratégica, pela nossa extensa zona económica exclusiva e pelo triângulo Açores-Madeira-Continente. sem descuidar a indispensável ocupação do território, a participação nos objectivos de forças da Aliança Atlântica e as especiais responsabilidades atribuídas ao Exército na organização do serviço militar obrigatório. Tal objectivo não poderá, porem, cumprir-se se permanecermos: numa situação em que o País não atribui verbas próprias paca a suficiente modernização das suas forças armadas. E essa é a situação em que vivemos há vário? anos, sem cuidarmos, na prática, de que o fim das guerras em África reclamava uma pronta readaptação de equipamentos militares.
O facto é grave e deverá ser motivo de preocupação. Não é pois, sem alguma perplexidade que comprovo em relevantes sectores parlamentares tem tom de relativa resignação perante o facto de á ajuda externa para o apetrechamento das forças armadas ser mais um fruto de necessidade do que resultado de uma escolha voluntária.
Portugal não poderá assumir com maior plenitude o sentido da sua independência se não quiser, ou não souber fazer da cooperação militar externa, apenas, um importante complemento dos meios ao seu alcance para contribuir para a melhor dignificação profissional das forças armadas.

O Sr. Rui Pena (CDS): - Muito bem!

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O Orador: - Também neste sector, o País tem de investir para promover e não apenas para conservar. Até porque, em questões desta natureza, conservar retroceder.

O Sr. Rói Pena (CDS): - Muito bem!

O Orador: - A escolha política que o Governo faz leva-o, assim, mais longe. Somos na verdade conduzidos, se quisermos ser coerentes, à preparação de novos instrumentos de trabalho que permitam uma acção mais programada e com maior participação nacional no sentido da modernização das forças armadas. A própria cooperação militar externa poderá, deste modo, ser canalizada através de meios mais numerosos e diversificados como forma de se potenciar largamente o esforço próprio de Portugal e não como. meio de integralmente o substituir.
Tem aqui lugar uma referência às indústrias nacionais de defesa ou à utilização de equipamentos industriais, existentes para a produção militar. Pelo seu lado, o Governo está empenhado em dar os necessários passos, designadamente de natureza legislativa, para conseguir a curto prazo uma acentuada dinamização da capacidade produtiva nacional neste domínio, com os consequentes reflexos positivos na fixação ou na criação de emprego, na contribuição para a balança comercial e na utilização de novas tecnologias.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Julgo ter ficado claro que, do ponto de vista do Governo, o esforço requerido ao nosso país em matéria de defesa nacional se justifica pela necessidade de, também neste domínio, nos aproximarmos da Europa. Como ficou claro que ele se justifica pela importância de se contribuir para a dignificação profissional das forças armadas; como se justifica pela urgência de elas serem convenientemente dotadas para as missões que devem cumprir; como se justifica pela ausência de providências financeiras suficientes e atempadas para acompanhar, lio plano do material, a reestruturação militar posterior ao termo das guerras; como se justifica pelo peso excessivo que, em termos relativos, é representado pela indispensável contribuição externa em matéria de reequipamento; como se justifica, enfim, pelo efeito multiplicador que pode representar na economia nacional.
Haverá, na entanto, quem pergunte, apesar de toda) essas razões, se tal esforço é razoável. Não insisto na explicitação das missões atribuídas às forças armadas. Deixo de lado a referência aos importantes contributos que elas vêm proporcionando à Nação no domínio da protecção civil em situações dê emergência. Abstenho-me de referir a relevância a esperar da sua acção em face de eventuais crises graves ou a sua participação em tarefas civis, especializadas. Não desenvolvo o profundo sentido moral e patriótico da instituição militar ê o seu papel no equilíbrio histórico e na independência da Nação.

O Sr. Azevedo Soares (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Enfim, não comentarei as incidências formativas das forças armadas junto de uma juventude que se confronta com o desemprego e em que, amiudadas vezes, continuam a verificar-se preocupantes fenómenos de analfabetismo regressivo.
Seria redondamente tratar de todos estes temas perante os Srs. Deputados. Julgo, no entanto, que vate a pena situar o esforço da Defesa Nacional no quadro externo em que nos é dado viver.
E, a este título, devo expressar-vos a grande preocupação com que o Governo segue o crescente afloramento de factores de insegurança na cena internacional.
Não ignoro que este tipo de referências suscita sorrisos de complacência ou de cínico desprezo da parte de alguns sectores que propõem para Portugal o papel pobre envergonhado. O Governo, porém, não. contraiu responsabilidades . específicas perante esses sectores, mas sim perante b povo que o mandatou, perante - o Estado que deve servir e perante a Nação que dele aguarda seriedade, prudência e dignidade.
Vivemos, na verdade, hoje, uma situação bem diferente daquela que caracterizava o equilíbrio de forças mundiais aquando da assinatura do Acto Final de Helsínquia, em 1975. Símbolos flagrantes dessa nova conjuntura foram a invasão do Camboja por tropas regulares do Vietname e a ocupação do Afeganistão pelas forças armadas soviéticas: Sinais preocupantes. dessa alteração são dados pela presença de fortes contingentes cubanos em Angola e na Etiópia. O desanuviamento e a distensão, por força destes e de outros factores, tem vindo a suscitar nos homens que amam a paz ç a liberdade um crescente cepticismo.
Na realidade, encontramo-nos, muito provavelmente, perante a mais potente e insidiosa manifestação expansionista de uma potência mundial no corrente século, com paralelo, apenas, na loucura de Hitler. E as nações livres, perante esse formidável desafio, oscilam com frequência entre a fidelidade militante dos princípios democráticos e a defesa dos seus próprios interesses económicos. As regras mínimas do direito e da moral internacionais são postas em questão e assiste-se à espantosa hipocrisia daqueles que, apoiando a invasão soviética do Afeganistão, lançam farisaicos gritos de escândalo pela tentativa falhada do Governo Americano de garantir, por. recurso limitado à força, a segurança e a liberdade de um grupo dos seus concidadãos.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Não desejaria pecar por excesso de pessimismo. Mas o certo é que começamos á sentir, na cena internacional, uma psicose de guerra. E para aqueles que julgam que tudo se passa lá longe, nos confins do Mediterrâneo, convirá lembrar que temos à porta, logo a sul do Algarve, um conflito, armado grave que suscita da parte de alguns democratas, portugueses uma incompreensível simpatia pela parte que hostiliza um Governo, amigo de Portugal.
Perante: esta situação, valerá a pena quedos portugueses amantes da paz é da liberdade e empenhados na garantia, da nossa independência e do nossos valores históricos e democráticos comecem a reflectir, em profundidade, sobre o papel, que o sistema da Defesa Nacional deverá poder desempenhar em caso de sério agravamento da cena mundial.
Dir-se-á, porém - e com isso vou a outro povo -, que essa não é uma responsabilidade do Governo ou da Assembleia da República. Permito-me discar

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dar frontalmente dessa perspectiva. A Constituição é clara na definição das competências do Conselho da Revolução e entre elas não se inclui a do estabelecimento da política da Defesa Nacional. Por muito que isto custe a alguns membros do referido Conselho, essa é uma matéria que deve ser fundamentalmente encarada peio Governo, desde que o respectivo Programa esteja - como está - aprovado pela Assembleia da República. O Governo faz questão, porém, que tema de tanta delicadeza possa obter um consenso político tão amplo quanto possível, pois estão em causa neste domínio os próprios fundamentos do Estado Português e do regime democrático.

O Sr. Rui Pena (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Defesa Nacional requer, pois, uma renovada atenção do País, não só pelo volume de recursos que a ela a Nação dedica, mas também pelos condicionalismos da hora presente e do Mundo em que vivemos. Neste momento em que os legítimos representantes do povo português debatem a política do Governo traduzida no Orçamento Geral do Estado é nas Grandes Opções do Plano para 1980, é de esperar que nesta Casa se saiba distinguir aquilo que, juridicamente, é o período de transição constitucional que atravessamos daquilo que é, na prática e de facto, a herança que para esse período foi transposta dos anos em que maiores transformações se deram em Portugal.

O Sr. Macedo Pereira (CDS): - Muito bem!

O Orador: - A Assembleia da República pode e deve debater a política de Defesa Nacional. Deve-o a si mesma, deve-o ao País e deve-o àqueles que na instituição militar, portugueses como nós, têm sabido aceitar os sacrifícios que. a austeridade impõe ao seu estatuto pessoal e familiar, somados às dificuldades que resultam da falta de suficientes estímulos profissionais para a sua maior dignificação.
Estou certo de que a Assembleia da República não se eximirá das suas responsabilidades.

Aplausos do PSD. do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jaime Gama. .

O Sr. Jaime Gama (PS): - Sr. Ministro Amaro da Costa, ouvimos com a maior atenção :a sua exposição. Para além daquilo que ela tem de elementar e em que reproduz o próprio Programa do Governo, gostaria de perguntar ao Sr. Ministro, da Defesa se considera curial e condigno com o desempenho das suas funções o facto de o titular da pasta da Defesa, em democracia, num país membro da NATO e que se integra no quadro institucional da Europa Ocidental,' proferir declarações Duramente partidárias, feitas em sede partidária, relativas à comparação de perfis entre responsáveis da alta hierarquia militar.
Será que esta atitude, imprudente e potencialmente divisionista no interior das forças armadas ...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - ..., potencialmente desestabilizadora da dignidade das instituições militares em democracia, corresponde àquilo que é de exigir de um Governo democrático?
O Sr. Ministro da Defesa Nacional iludiu na sua intervenção esta questão. Peco-lhe que, para bem da dignidade do País, para bem da isenção partidária das forças armadas -que não toleram que o Gabinete do Ministro da Defesa Nacional se transforme numa instituição onde se faça a dinamização político-partidária das forças armadas- estas questões sejam esclarecidas perante o Pais, que sejam esclarecidas perante as próprias forças armadas e que sejam esclarecidas perante a Europa e os países ocidentais.

O Sr. Presidente: - Aí está uma matéria que à Mesa se afigura que talvez tivesse melhor sede numa Interpelação ao Governo de que numa discussão do Orçamento Geral do Estado...
Em todo o caso e porque o Sr. Deputado Jaime Gama já há pouco colocou esta questão e agora voltou a fazê-lo, dou a palavra ao Sr. Ministro da Defesa Nacional, se entender usar dela para responder.

O Sr. Ministro da Defesa Nacional: - Há mais
Deputados inscritos, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Se V. Ex.ª preferir responder a todos os interpelantes em conjunto - e há mais- oradores inscritos -, a Mesa não vê inconveniente.

O Sr. Ministro da Defesa Nacional: - Sr. Presidente, eu, gostaria de prestar homenagem ao Sr. Deputado Jaime Gama e responder-lhe isoladamente. Se os outros Srs. Deputados interpelantes me consentem este privilégio, assim farei.

O. Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Defesa Nacional: - O Sr. Deputado Jaime Gama, desde que abandonou as funções de secretário nacional do Partido Socialista tem revelado uma imaginação delirante...

Risos do PSD e do CDS.

Desde logo, não se entende nada do tipo de questões que acaba de me colocar. Se o Sr. Deputado considera que um membro' do Governo, pelo simples facto de o ser, deixa de ser político, deixa de ter convicções, deixa de ter pontos de vista, deixa de ter uma política a defender para o seu país, então é porque os nossos pontos de vista sobre, aquilo que deve ser o comportamento de um membro do Governo em democracia, não coincidem de facto.
Eu não ponho o meu casaco de CDS, nem o meu casaco de membro da Aliança Democrática no cabide ao entrar para o Ministério da Defesa Nacional
ou ao estar no Governo. Contínuo a ser fiel ao que sempre fui e não tenho que mudar nada.

Vozes do PSD e do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Seria absurdo se eu fizesse comentados, internos sobre o comportamento da hierarquia

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milhar numa fase em que o poder de organização, de legislação e disciplina das forcas armadas pertence a outro Órgão de Soberania.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não tenho, portanto, de comentar aspectos internos da organização interna das forças armadas e jamais o fiz.
Mas tenho todo o direito de em Portugal, em 1980, ano de eleições presidenciais, fazer os comentários que bem entenda, como político, sabre o candidato que eu entendo também dever apoiar e sobre quem se afirma, de certa forma, candidato pelo seu lado. Comparar os projectos políticos e as atitudes políticas, o estilo político dessas duas personalidades, em nada ofende as forças armadas e em nada ofende a ética que me corresponde como membro da Governo. O facto de o Sr. Deputado estar a tentar confundir as situações é ignorar que, aã realidade, não há confusão possível nesta matéria.
Aliás, estranho que, repontando-se o Sr. Deputado aos meus comentários sobre discursos públicos de carácter político de duas personalidades ligadas, uma
à Presidência da República, e outra - estou certo disso - à Presidência da República no futuro...

Vozes do PS: - Querias, querias!
Risos do PS e do PCP.

O Orador: -.... tenha deixado passar em claro, observações que, praticamente na mesma data, foram feitas por personalidades portuguesas submetidas à disciplina militar e, ainda por cima membros de um órgão de Soberania,

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM,

Leio, por exemplo, uma iraste que o Sr. Deputado não comentou, já que está tão preocupado com a unidade das forças armadas - suponha que elas dispensam a sua ajuda ...

Vozes do PSD e do CDS: - Muito bem!

Uma voz do CDS - Rejeitam...

O Sr. Jaime Gama (PS): - E a sua também!

O Orador: - ...-, de um distinto oficial no activo que afirmou recentemente: «Que operacionalidade é essa, inventada sobre as falsas ajudas externas e o culto de ultrapassadas relações de comandos? Assistimos ao reinventar da censura em meios de comunicação social estatizados...

O Sr. António Arnaut (PS): - Muito bem!

O Sr. Vital Moreira (PCP): - E é verdade!

O Orador: -..., o obscurantismo lança as suas garras e tema instalar-se no povo.»

Os Srs. Deputados podem dar todo o apoio que quiserem a estas afirmações e a muitas outras. A liberdade de apoiar disparates é total.

Risos e aplausos do PSD. do CDS e do PPM.

Aplausos do Sr. Deputado do PS Jorge Sampaio.

Mas o que quero deixar claramente esclarecido ao Sr. Deputado Jaime Gama é que, afirmações desta natureza, do meu ponto de vista, é que se podem considerar como altamente desportivas, do ponto de vista daquilo que penso dever ser - e julgo que o Sr. Deputado estará de acordo comigo neste ponto - uma ética correcta da relação militar num Estado democrático membro da NATO.
Do meu lado,: nada me acusa, mas talvez o acuse a si, à sua consciência e à sua vocação de homem público, o facto de do seu lado haver ainda tantas hesitações sobre o problema da Presidência da República ...

Aplausos do PSD. do CDS e do PPM.

O Sr. Jaime Gama (PS): - Peço a palavra para formular um protesto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jaime Gama (PS): - Ouvimos a intervenção de Sr. Ministro Amaro da Costa, cuja autoridade em matéria militar e em matéria de defesa é reforçada pelo facto de, durante o exercício do seu mandato, apenas ter passado revista as tropas de uma fragata estrangeira...

Risos do PS e do PCP.

Vozes do PSD: - Não seja ridículo!

O Orador: - Mas, de qualquer modo, ouvimos as palavras do Sr. Ministro com atenção, por aquilo que elas contêm de grave na necessária estabilização da vida democrática. O Sr. Ministro Amaro da Costa teve o mérito de falar a verdade.
Com efeito, teve o mérito de dizer perante esta Assembleia e o País que coloca o exercício do seu cargo de Ministro da Defesa Nacional ao serviço da política partidária, do CDS ...

Protestos do PSD e do CDS.

... e que está disposto a levar por diante, no quadro da Aliança Democrática e do exercício da sua função governamental, a determinação partidária- do CDS.
De resto, não me fica qualquer dúvida, nem junto da opinião pública ou das próprias forças armadas, de que o Gabinete do Ministro da Defesa é uma espécie de nova 5.º Divisão, que tem como função exclusiva assegurar e promover a candidatura presidencial de um responsável, por um dos departamentos do Estado-Maior do Exército. Nunca sé viu num regime democrático, nunca se viu num país ocidental, nunca se viu num país membro da NATO, semelhante política prosseguida pelo Ministro dá Defesa!

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Que despautério!

O Orador. - E extraordinariamente grave que este Governo, que diz ser um Governo de unidade nacional, proceda com tanta leviandade, com tanta ligeireza em relação às instituições militares; é extraordinário- que este Governo esteja, a partir de um departamento civil da Defesa - visto que é assim que é entendido o Gabinete do Ministro da Defesa, pois não existe em Portugal Ministério da Defesa -, a proceder desta fornia em relação à própria desestabilização na instituição militar.

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O Sr. Ministro Amaro da Costa teve ao menos o mérito de confirmar perante a Assembleia da República aquilo que tem andado a dizer em reuniões partidárias do CDS e que constitui afirmações inéditas nas instituições democráticas europeias e particularmente graves em relação à situação política portuguesa.
Penso que nem só nenhum democrata, mesmo no quadro da Aliança Democrática," mas particularmente nenhum membro das forças armadas consciente da dignidade da missão militar e da necessária isenção partidária que deve presidir ao exercício das suas funções, acompanhará o Ministro da Defesa Nacional, Amaro da Costa, nos seus devaneios partidários e politiqueiros!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados e Srs. Membros do Governo: A Mesa declara, de maneira formal e decidida, que discussões deste tom sobre o objecto da ordem do dia se afastam por completo dela. A Mesa não consentirá na repetição de discussões deste teor, ou de qualquer outro, que por completo se afastem da ordem do dia, para a discussão da qual estamos aqui reunidos, aliás sem limite de tempo. Tem a palavra o Sr. Ministro da Defesa Nacional.

O Sr. Ministro da Defesa Nacional: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sinto-me no direito de exigir ao Sr. Deputado Jaime Gama que faça prova publica das imputações que me fez ...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - ..., quer seja através de documentos, ou de declarações ou de testemunhos pessoais.

Vozes do PSD e do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Eu sugeria à maioria que pedisse um inquérito parlamentar ao meu comportamento e que fosse aqui requerida a necessária presença de toda a chefia militar, de todos os membros do meu Gabinete, desde os contínuos aos motoristas ou ao meu chefe de Gabinete ou aos meus adjuntos, para que testemunhem em público, diante do Sr. Deputado Jaime Gama e do País, as calúnias a quê .V. Ex.ª chegou, que não é digno - desculpe que lhe diga - de uma modo de comportar-se democrático.

Aplausos do PSD. do CDS e do PPM.

V. Ex.ª inventou totalmente da primeira à última palavra, com base em especulações publicadas ou não na imprensa, publicadas ou não nos mentíderos das cortes políticas que V. Ex.ª frequenta, sem qualquer fundamento, sem qualquer base, sem qualquer testemunho e sem qualquer evidência! Isto é intolerável Sr. Deputado Jaime Gama! Não há nenhum processo político idóneo, democrático e limpo, compatível com este tipo de procedimento!

Vozes do PSD e do CDS: - Muito bem!

O Sr. António Aruant (PS): - Não se faça irritado!

O Orador: - Gostaria que as minhas relações pessoais, que sempre foram excelentes, com o Sr. Deputado Jaime Gama cão fossem afectadas por este incidente.

Risos do PS e do PCP.

O calor que aqueles que não sabem perder, por vezes, emprestam às suas afirmações justifica o nervosismo de. quem não sabe manter ura mínimo de dignidade no seu comportamento político.

O Sr. Fernandes da Fonseca (PS): - É o seu caso!

O Orador: - Pelo meu lado, Sr. Deputado, queria deixar ficar bem claro que em nada, nem um milímetro, me ofende a minha consciência e a minha ética o modo como me tenho comportado coma elemento responsável pela ligação entre o Governo e as forças armadas.
Faço-lhe notar, de resto, que esta foi a primeira vez que neste Parlamento, representante do povo português, um Ministro da Defesa Nacional veio discursar para defender e expor os pontos de vista do Governo acerca da Defesa Nacional.

O Sr. Rui Pena (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Isso jamais tinha acontecido até agora. Pergunto se é legítimo que a representação nacional configurada nesta Câmara seja arredada de debates de matérias tão importantes e tão relevantes como esta.
Julgaria eu que o Sr. Deputado iria querer fazer um debate de fundo sobre isto. Contudo, limitou-se à intriga. Concedo-lhe o direito de o fazer, mas repudio a intenção e, sobretudo, o propósito com que o fez!

Aplausos do PSD, do CDS. do PPM e dos Deputados reformadores.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, não pedi a palavra propriamente na sequência da intervenção do Sr. Ministro Amaro da Costa, mas porque, ao regressar à .minha bancada tive conhecimento de que o Sr. Deputado Veiga de Oliveira fez afirmações a meu respeito, às quais gostaria de fazer uns breves e ligeiros comentários.
No entanto, estarei perfeitamente de acordo em que esta minha intervenção seja feita depois de todos os pedidos de esclarecimento ao. Sr. Ministro Amaro da Costa.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - No fim da sessão!

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Ou amanhã!

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Em qualquer, momento é oportuno.

O Sr. Jaime Gama (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

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O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Jaime Gama (PS): - Para; um contraprotesto, Sr. Presidente.

Vozes do PSD e CDS: - Não pode ser, já o fez!

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra, Sr. Deputado Jaime Gama.

O Sr. Jaime Gama (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Serei muito breve, tanto mais que a vivacidade com que o Sr. Ministro Amaro da Costa reagiu à primeira parte da minha intervenção...

O Sr. Ministro da Defesa Nacional: - Quem não
sente não é filho de boa gente!

O Orador -... - aliás, não constitui timbre da necessária serenidade e tranquilidade com que um Ministro da Defesa Nacional de actuar em circunstâncias semelhantes...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - ... - é ,por si só a justificação de que não me deverei alongar demasiado.
O Sr. Ministro Amaro da Costa ,não negou, nem através de um comunicado do seu Ministério, nem através da intervenção que aqui proferiu, nenhuma das afirmações que lhe são atribuídas pela imprensa em matéria de, comparações...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jaime Gama, V. Ex.ª desculpe, unas está a tentar voltar à mesma discussão. V. Ex.ª pediu a palavra para um protesto e peço que o apresente rapidamente e sobre o motivo concreto.

O Sr. José Niza (PS): - Isto É um protesto, Sr. Presidente.

O Orador: - O Sr. Ministro Amaro da Costa não desmentiu nenhuma das minhas acusações e teve uma intervenção .pouco serena de protesto. Pessoalmente, considero que, em termos de democracia, as afirmações do Sr. Ministro são extremamente graves. Penso que atitude mais ourial neste campo não seria a realização de um inquérito às minhas declarações que, de forma alguma, são caluniosas, visto quê o Sr. Ministro são as desmentiu. Mas, em circunstâncias semelhantes, num regime democrático -e o Sr. Ministro Amaro da Costa: será a primeira pessoa a reconhecê-la- afirmações dessa gravidade, proferidas por um Ministro dai Defesa na Alemanha Federal, na Holanda, na França ou na Itália, por exemplo, levariam à sua demissão pura e simples!

Aplausos do PS.

Risos do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro da Defesa Nacional.

O Sr. Ministro da Defesa Nacional: - Sr. Deputado Jaime Gama, não pedi nenhum inquérito parlamentar ás suas afirmações. Pedi um inquérito parlamentar ao meu comportamento.

Vozes do PSD e do CDS: - Muito bem!

Vozes do PS - Muito bem!

O Orador: - Se o Sr. Deputado sente que é necessário que essa questão seja levada até ao fim, tenham a coragem, o Sr. Deputado e o seu partido, de solicitarem a esta Câmara um inquérito parlamentar ao meu comportamento e tenho a certeza que a maioria o apoiará - e isso eu peço desde já ...

Vozes do PS: - Vamos pedir!

O Orador: - ... -, para que foque claro com que fundamento, com que firmeza e com que base é que o Sr. Deputado fez ás afirmações que fez.
De facto, o Sr. Deputado faltou à verdade - e não vou usar a palavra dura que se costuma dizer nestes casos...

Vozes do PSD e do CDS: - Diga, diga!

O Orador: - O Sr. Deputado mentiu quando disse, primeiro, que o meu Gabinete é posto ao serviço de uma candidatura própria da Aliança Democrática - é falso! -; terceiro, o Sr. Deputado mentiu quando disse que eu procurava criar condições de contradição entre a hierarquia militar - é falso! -; terceiro, o Sr. Deputado mentiu quando disse que o meu gabinete era uma 5.ª Divisão a fazer propaganda não sei bem de quê - é falso!
Tudo isto pode ser provado, pode ser demonstrado e pede ser autenticado. Foi isto o que o Sr. Deputado afirmou e é isto que é falso. O Sr. Deputado mentiu. Se o seu grupo parlamentar tivesse algum sentido de solidariedade para com a social-democracia alemã, porventura, pedir-lhe-ia a si um inquérito pelas afirmações insanes que fez.

Aplausos do PSD, do CDS, dó PPM e dos Deputados reformadores.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: As afirmações que o meu camarada Jaime Gama fez em relação ao Sr. Ministro da Defesa são da maior gravidade para o Sr. Ministro. Assim, o seu comportamento carece de um esclarecimento público, já que, como é visível, o Sr. Ministro não toma a iniciativa de se demitir.

Risos do PSD, do CDS e do PPM.

Nesse sentido, o Grupo Parlamentar do PS vai propor a constituição de unia de comissão parlamentar de inquérito à actividade do Sr. Ministro da Defesa Nacional. Esperamos que as bancadas da maioria sejam favoráveis à constituição dessa comissão ...

Aplausos do PS.

Risos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, teja a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.

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1788 - I SÉRIE - NUMERO 45

O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, penso que vou trazer um pouco de paz ao coração e ao espírito, dos Portugueses...

Risos do PSD, do CDS e do PPM.

...porque vou dizer-lhes daqui que o inquérito não vai resultar, que vai tudo ficar na mesma, como sempre tem acontecido neste país, em que constantemente se pedem inquéritos e em que tudo fica na mesma.
Além disso, aproveito para referir, na mesma linha, que o Sr. General Soares Carneiro fez declarações .políticas estando no activo e nada lhe aconteceu, ao contrário do que por exemplo aconteceu ao major Otelo Saraiva de Carvalho que, pela mesma razão; apanhou vinte dias de prisão disciplinar agravada; cumpridos na prisão de Caxias.

O Sr. Alexandre Reigoto (CDS): - Só?

O Orador: - Pelas palavras do Sr. Ministro da Defesa também o nosso povo pode ficar descansado, porque vai ter de pagar a súbita honra de poder vir a ser comprometido e envolvido nas aventuras militares dos Estados Unidos da América, nas aventuras militares da NATO. Para tal, já o Sr. Ministro disse que o orçamento das forças armadas - e este já é desmesurado - não chega e deverá ser aumentado.
Aliás, o sentido da actuação das forças armadas está implícito e explícito no discurso do Sr. Ministro da Defesa quando disse, de uma forma preocupada, que alguns democratas no nosso país assumiam posições de apoio à luta do povo - e ele não o disse - do povo Saauri contra um país amigo. Esse país amigo é o Marrocos, de Hassan II, um monarca fascista.

Vozes do PSD: - Mentiroso!

O Orador: - Como tal, à preocupação do Sr. Ministro perante. actividade dos democratas em defesa da luta do povo Saauri também dá ao nosso povo o sentido da forma como o Governo pensa dirigir a sua política em relação às nossas forças armadas.
Finalmente, só queria perguntar ao Sr. Ministro da Defesa se não sabe que um dos factores fundamentais da inflação -já que se discute o Orçamento e toda a gente está preocupadíssima com a inflação - é provavelmente o aumento das despesas militares, das despesas improdutivas. Será que o Sr. Ministro não sabe isso? Se o sabe, como é que concilia o aumento das nossas despesas militares com o combate à inflação?

O Sr. Presidente: - Também para pedir esclarecimentos, (tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Ministro da Defesa: eu tinha pensado iniciar as considerações com que penso preceder as perguntas que lhe vou formular, assinalando que é a primeira vez que um Ministro da Defesa vem à Assembleia da República, em sede de um debate orçamental, fundamentar as despesas com as forças armadas.
Entretanto, devo lamentar não ter sido isso o que aconteceu. Foi nessa qualidade que o Sr. Ministro
usou da palavra, mas usou-a chamando a si a fundamentação ideológica das duas propostas de lei que estão em debate nesta Assembleia. Ai é que eu não sei dizer se o Sr. Ministro chamou a si essa tarefa ou se foi o Governo que lhe atribuiu essa missão. Mas a verdade é que o que o Sr. Ministro aqui fez não foi fundamentar, não foi discutir, não foi trazer novos elementos e novos esclarecimentos ao Plenário; foi isso sim, discorrer largamente acerca das razões político-ideológicas, geopolíticas, geideológicas que levam o Governo a apresentar estas duas propostas de lei.
Quanto à sua concepção das funções que desempenha no Governo, creio que a questão já aqui foi largamente debatida através das perguntas que foram formuladas pelo Sr. Deputado Jaime Gama. Creio que vieram para o Plenário questões suficientemente graves para que se justifique o pedido de inquérito que o Sr. Ministro insistentemente reclamou. Creio que uma vez que o Sr. Ministro reclama esse inquérito, estão realmente reunidas as condições e são graves as motivações para que um tal inquérito tenha cabimento.
Depois destas considerações, faria algumas perguntas relativamente às, questões que o Sr. Deputado desenvolveu.
A primeira é em relação ao Irão. O Sr. Ministro da Defesa Nacional não esclareceu esta questão quanto a um ponto que seria essencial e que tem inteiro cabimento, e, com efeito, o Sr. Ministro é que trouxe o problema à Assembleia. A pergunta é a seguinte: teve o Governo Português qualquer participação na acção de comandos dos Estados Unidos? A .pergunta é tanto mais natural quanto é certo que o Sr. Primeiro-Ministro, ainda não tinha assumido funções, já oferecia aos Estados Unidos os préstimos da Base das Lajes, como forma de apoiar uma qualquer acção de comandos ou uma acção militar que os Estados Unidos tentassem realizar em relação ao Irão.
A segunda pergunta é a seguinte: o Sr. Ministro está seguro de que a acção de comandos a que se referiu tinha em vista a libertação dos reféns? O Sr. Ministro está seguro de que as sequelas dessa acção já terminaram? O Sr. Ministro pensa que o Ministério da Defesa de Portugal pode falar tão ligeiramente destas questões? O Sr. Ministro pensa que dessa forma está a realizar aquele conceito de dignidade de membro de um Governo de Portugal em relação aos interesses nacionais e à paz mundial?
A segunda questão - as duas perguntas anteriores constituem uma questão - refere-se ao sentido ideológico destas duas propostas de lei, uma vez que o Sr. Ministro abordou a questão nesta perspectiva. Com efeito, o Sr. Ministro escreveu nos jornais e assinou -pelo menos tinha a sua assinatura e; não foi desmentido, assinalando o aparecimento de uma nova República. Pergunto-lhe muito singelamente: este Orçamento e este Plano são o Orçamento e o Plano de uma mudança der regime?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder aos pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Ministro da Defesa Nacional.

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1789 - 30 DE ABRIL DE 1980

O Sr. Ministro da Defesa Nacional: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Mário Tomé: Queria dizer-lhe que o Orçamento Geral do Estado está elaborado no respeito de uma deliberação do Conselho de Ministros de 7 de Fevereiro passado, segundo a qual o consumo público da Administração Central, em termos reais, cresceria 0 % no corrente ano. Esse é o valor fundamental do ponto de vista das incidências da inflação. Eis a resposta que tenho a dar à sua pergunta.
Quanto ao Sr. Deputado Carlos Brito, deixo de lado toda a teorização que fez sobre o meu discurso- da minha parte, considero-o um discurso puramente fundamentante da necessidade das dotações orçamentais que estão inscritas no Orçamento Geral do Estado para efeitos de Defesa Nacional. Como tal, não posso comungar nem partilho dos seus pontos de vista e rejeito-os.
O Governo Português não leve naturalmente, como é público e foi objecto de uma nota do Governo, conhecimento prévio da realização de qualquer operação por parte das forças armadas americanas no Irão. O Sr. Deputado, em contrapartida, coloca-me algumas perguntas sobre o efectivo objectivo dessa operação. Talvez o Sr. Deputado saiba mais do que eu, pois que só sei aquilo que vem nos jornais sobre essa matéria. Seria bom que o Sr. Deputado esclarecesse a Câmara sobre as alegadas ou eventuais hipóteses de que V. Ex.ª dispõe e de que eu não disponho, aparentemente com conhecimento de causa superior ao meu, já que nesta matéria apenas conheço, como já disse, aquilo que é público.
Quanto a estas propostas de lei serem ou não de mudança de regime, a pergunta não é com certeza para ser respondida... Este Orçamento e este Plano respeitam a lei...

Vozes do PCP: - Olhe que não!

O Orador: -.... respeitam a constitucionalidade e respeitam as características da legalidade democrática que está estabelecida.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Esta lei é uma lei democrática, de um regime democrático. Não há aqui mudanças de regime. Como tal, a pergunta do Sr. Deputado é puramente especulativa.

Aplausos do PSD. do. CDS. e do PPM.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Ministro da Defesa Nacional, vou fazer dois breves comentários.

O primeiro respeita ainda à política externa e às considerações feitas por V. Ex.ª nessa matéria. Se o Sr. Ministro sabe tão pouco, são temerárias as suas afirmações... Não quero dizer que elas sejam irresponsáveis, mas não estão à altura da responsabilidade de um membro do Governo de Portugal.

Vozes do PCP e do PS: - Muito bem!

O Orador: - A segunda questão é a seguinte: só na óptica da pergunta que lhe fiz é que as duas propostas de lei em apreço ganhavam sentido. Perguntei-lhe se alas eram para mudança de regime, porque não cumprem nem a lei, nem a Constituição.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem agora a palavra. o Sr. Deputado Amândio de Azevedo.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou fazer um brevíssimo comentário a afirmações que considero pouco correctas da parta do Sr. Deputado Veiga de Oliveira a meu respeito.
O Sr. Deputado Veiga de Oliveira terá afirmado que compreende agora porque é que eu não sou Ministro, pois tenho um comportamento muito irascível... Não sei se o critério para se ser ou não Ministro é correcto. Devo dizer que não me considero irascível, mas não estou imune, como qualquer ser humano, a ser dominado por sentimentos de indignação perante afirmações graves e caluniosas como aquelas que constantemente são feitas peto PCP.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Eu gosto de reagir. Quem não se sente não é Pilho de boa gente! O PCP pode estar seguro de todas as vezes que dirigir ataques à minha bancada terá a conveniente e a devida resposta.

Vozes do PSD e do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Já agora gostaria de lhe dizer Sr. Deputado Veiga de Oliveira, que se o critério fosse esse nunca o Sr. Deputado deveria ter passado pelo VI Governo Provisório. Com efeito, V. Ex.ª já demonstrou nesta Casa bem mais do quo qualquer outro Deputado que a sua irascibilidade muitas vezes vai muito mais longe do que é tolerável ...

Vozes do PSD: - Muito bem !

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Escusava de ouvir esta!

O Orador: - Em segundo lugar, diz o Sr. Deputado que eu faço as mesmas acusações que lhe eram feitas pelo fascismo. Recordo-lhe de que, à partida, esse não é argumento, que se use, pela mesma razão que em nada me preocupa o facto de casualmente estar de acordo com o PCP. Logo, nada me afecta o facto de estar em alguns aspectos de acordo com quaisquer pessoas que juntamente possam ser consideradas fascistas. Daí talvez deva tirar a conclusão que já são demasiadas pessoas a afirmar a mesma coisa em relação ao PCP.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não importa saber se estou ou não de acordo com A ou com B; o que importa saber é se o que eu, digo tem ou não tem correspondência

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1790 - I SÉRIE - NÚMERO 45

com a realidade. Esse juízo é que eu não tenho dúvidas nenhumas de que é feito a meu favor por parte da opinião pública portuguesa, como o PCP teve oportunidade de demonstrar claramente nesta processo revolucionário posterior ao 25 de Abril.

Vozes do PSD e do CDS: - Muito bem!

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Foi obreiro!

O Orador: - Diz ainda o Sr. Deputado que o PCP, , contra o que eu digo, é o responsável por tudo o que de bom há neste país, que o PCP foi o grande obreiro da liberdade conseguida no 25 de Abril. Permita-me que cite uma pessoa que neste momento não está nó meu partido, mas que já esteve. Essa pessoa afirmou nesta Assembleia uma coisa que tem grande correspondência com a realidade: que o PCP lutou peta liberdade, mas não peta liberdade de todos.

O Sr. Vítor Louro (PCP): - De todos! De todos!

O Orador: - Lutou apenas pela sua própria liberdade que, como se demonstrou, só servia para retirar a liberdade aos outros.

Aplausos do PSD.

Protestos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Veiga de Oliveira.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou ser muito breve...

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Ainda bem!

O Orador: -.... independentemente do apreço que me merecem as invectivas do Sr. Deputado Amândio de Azevedo.
Em primeiro lugar, não é só por o Sr. Deputado ter um temperamento irascível que eu disse que percebia porque' è. que o Sr. Deputado não era Ministro. O que eu disse é que também era por isso. É bom que fique clara esta questão.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): Já estou mais sossegado!

O Orador: - Além do temperamento há outras exigências...

Risos do PCP.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Com certeza!

O Orador: - Quanto às afirmações graves e - caluniosas, é só aqui que lhe quero responder. O Sr. Deputado, quando digo que a Aliança Democrática - assim chamada - e o seu Governo são reaccionários, considera essa afirmação como unia aleivosia, quando se trata de uma opinião democrática que o Sr. Deputado não tolera. O Sr. Deputado sente-se mal.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Essa é, boa!...

O Orador: - O Sr. Deputado deve ê contestar e demonstrar que não é verdade. Simplesmente, tolere que outros exprimam, claramente, democraticamente, as suas opiniões.

O Sr. Amando de Azevedo (PSD): - Se eu lhe chamar assassino, o Sr. Deputado demonstra-me o contrario, não?

O Orador: - Não, Sr. Deputado. Assassino é punível pela lei, pois é um crime. Ser reaccionário, por enquanto, não é crime, pois se o fosse os Senhores estavam todos na cadeia!...

Aplausos do PCP e do PS.

Risos.

Quanto às coincidências de opinião - e para terminar -, lembro-lhe o que o povo diz em relação às companhias: se o Sr. Deputado acompanha bem, sabe com quem, Sr. Deputado. Por isso, se a sua opinião ..coincide com a dos fascistas a respeito do PCP, o Sr. Deputado deverá tirar as ilações que entender. Mas não me peça á mim nenhuma, responsabilidade sobre o assunto.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a .palavra o Sr. Deputado Amândio de Azevedo.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Queria apenas informar o Sr. Deputado Veiga de Oliveira que em matéria de companhias tenho acompanhado muitíssimo mais com comunistas do que cora fascistas.

Risos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Mota.

O Sr. António Mota (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Mais uma vez o Governo, com a sua demagogia, tema enganar novamente o povo, dizendo que os preços não subiram! Até alguns Ministros, quando se passeiam por diversos pontos do nosso país, aproveitando uma data popular, tentam dizer ao povo que vivemos num paraíso à beira-mar plantado.
No passado domingo assistimos pela TV a uma conversa do Sr. Primeiro-Ministro, prometendo que tudo vais bem neste país e ofereceu mais um grande cesto de promessas.
Razão tinha uma dona de casa à saída de um supermercado aqui bem perto que isto lhe fez lembrar as velhas conversas em família dos outros velhos tempos. Tinha razão! ...
Para este Governo os preços, não sobem, afirma o Sr. Ministro das Finanças que chega ao descaramento de dizer que os preços descem porque podiam ter subido mais. De facto, os preços não sobem pouco - o que sobem é muito. - A batata, onde está ela ao preço de 13$50? A batata tem os intermediários uma parte dela, vendem-na como semente; a outra vai para os restaurantes e hotéis, etc. Para o
povo, fica-lhe a nova, a 20$ e a 25S. Foi para isto que o Governo a importou?
Bacalhau? O tal prometido, nem cheiro, não obstante o Sr. Ministro do Comércio, mesmo dentro

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1791 - 30 DE ABRIL DE 1980

deste hemiciclo o ter afirmado que a partir da Páscoa não faltaria. De facto, não! Nas montras dos restaurantes, onde uma posta custa o preço de um bacalhau inteiro. E agora com a sua liberalização, de importação, para onde vai o preço dele no mercado negro? E o povo o que vai comer! Nada.
O peixe, é ir aos mercados e verificar os preços à subirem de semana para semana.
A fruta, quem lhe chega? Laranja, a. 20$ e 25$, pêros a 25$ e 30$, quando o produtor a vende entre 1$ e 5$ o quilograma.
A partir de Fevereiro podemos fazer algumas comparações: o açúcar passou de 24$ para 30$; o leite, de 10$ para 11$; pão, de 1$10 para 1$30; o arroz, de 24$ para 30$; o óleo, de 53$50 para 65$; o queijo flamengo, de 195$ para 230$; os ovos, de 48$ para 55$; a bolacha, de 52$ para 64$; a gasolina super de 39$ para 45$; a normal, de 35$ para 41$; o gasóleo de 13$ para 17$50; o gás doméstico de 279$50 para 306$20. A electricidade sobe entre 35% a 50% e em casos como no Porto, onde a Câmara Municipal de maioria AD, pretende aumentá-la para 146%. A água sobe também entre os 50%. O azeite custa agora 135S e é falsificado, o Governo liberalizou o seu preço, este é o resultado. Assim este Governo afirma aqui mesmo que nada subiu já é preciso ter desfaçatez!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há duas coisas que não subiram com este Governo: foram os salários dos trabalhadores, a cotação e a vergonha deste Governo. : .

Aplausos de PCP.

Aproveita-se este Governo das câmaras da TV para agitar a sua propaganda, mas não cola, porque o povo já não acredita.
Há um Sr. Deputado, que faz tanto malabarismo, que até fala na aplicação da terapêutica económica A quem? Aos grandes capitalistas e intermediários? Ou aos trabalhadores? Com certeza; o Sr. Deputado se referia a estes.
Afirmou aqui o Sr. Ministro que o poder de compra dos trabalhadores e do povo subiu. Quando, Sr. Ministro? Este assunto é demasiado sério para a gente se rir. As donas de casa que o digam quando vão ao mercado.
Sr. Ministro, os trabalhadores e o povo não têm nem subsídios de renda de casa nem de alimentação. É com os seus 6600$ e 7500$ e, por vezes, menos (mesmo os pensionistas com as suas reformas de miséria), que têm de pagar todos estes aumentos. Mas para este Governo tudo é um mar de rosas.
Gostava de formular ao Governo algumas perguntas:

1.º Perguntava ao Governo como pensa combater o açambarcamento da batata e regular o seu abastecimento?
2.º Com a liberalização da importação do bacalhau, como vai o Governo controlar a sua distribuição e preço?
3.º Que medida pensa tomar este Governo contra os falsificadores, do azeite e combater o seu aumento constante?
4.º Como pensa o Governo manter os preços no consumidor quando ele passa para os
mixordeiros, intermediários e falsificadores a importação de bens essenciais?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está suspensa a reunião, para um intervalo de trinta minutos.

Eram 17, horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a reunião.

Eram 18 horas e 20 minutos.

Para uma intervenção tem a palavra o Sr. Deputado António Arnaut.

O Sr. António Arnaut (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados e Sr. Ministro dos Assuntos Sociais: Vou ocupar-me apenas-e com a brevidade que o tempo impõe - da política, de saúde expressa pelo Governo nos dois diplomas em apreço.
Direi liminarmente que tal política merece a mais firme oposição dos socialistas, por não corresponder aos interesses do povo português, especialmente dos trabalhadores e reformados pobres, e não respeitar a lei nem os mais elementares princípios constitucionais.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Não entrarei, porém, nas questões polémicas, pois sei que a política de um Governo de direita não pode estar virada para a defesa das classes mais desfavorecidas - o país real que continua a sofrer e a morrer por falta da indispensável cobertura sanitária e da urgente reestruturação dos serviços, previstos, aliás na Lei do Serviço Nacional de Saúde.

Vozes do PS: - Muito bem!

Uma voz do CDS: - Viu-se!

O Orador: - A lógica deste Governo não é proteger os que precisam, mas satisfazer as suas clientelas; não é acabar com as desigualdades e as injustiças, mas manter os privilégios de uma minoria exploradora; não é, em suma, defender a saúde como bem colectivo, mas considerá-la, antes uma qualquer mercadoria, sujeita à ganância desenfreada de uns tantos industriais da medicina.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Deixando, assim de parte, certas questões de fundo, seguro de que a actual maioria, além de precária, coma se item visto, será efémera, e o próximo Governo retomará o caminho de Abril, vou fazer algumas perguntas concretas, esperando obter respostas claras e objectivas. - O País precisa de saber o que pensa a AD sobre um problema tão importante e, conhecer os custos sociais da sua política. Se o Governo responder com verdade, deixará cair a mascara da hipocrisia e não voltará a enganar os incautos. Se deturpar, os factos evidentes que vou denunciar, ou guardar de Conrado o prudente silêncio, será, da mesma forma, implacavelmente condenado

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1792 - I SÉRIE - NUMERO 45

pela opinião pública, que compreenderá, enfim, em toda a sua crueza, o seu verdadeiro cariz antipopular.
O repto fica lançado...
Primeira questão Sr. Ministro dos Assuntos Sociais: No Plano para 1980 o Governo anuncia, a p. 40, que vai alterar a Lei do Serviço Nacional de Saúde. Como esta Lei, proposta pelo Partido Socialista e democraticamente aprovada pela Assembleia da República, represena a concretização fiel do artigo 64.º da Constituição, que impõe a qualquer Governo a criação de um serviço nacional de saúde universal, geral e gratuito, tendo em vista a socialização da medicina, quer o Governo significar que vai, dessa forma, revogar aquele normativo constitucional?
Segunda questão: refere o Governo que essa alteração se destina a contemplar a «adesão diversificada dos utentes». Quer isto dizer que a clínica privada será considerada paritária com os serviços públicos, de modo que os utentes possam recorrer indistintamente a uma e a outros? Na afirmativa, e sabendo nós que 80% dos clínicos gerais e 90% dos especialistas se encontram apenas nas cidades de Lisboa, Porto e Coimbra, como pensa o Governo proteger as populações do resto do País, especialmente do interior, secularmente as mais sacrificadas, onde há concelhos que não têm um médico residente? Não será esta medida uma forma de beneficiar aqueles que, por terem dinheiro, são clientes habituais das casas de saúde, agora subsidiados pelo Estado?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Pois se é certo que os utentes terão, inevitavelmente, de pagar uma comparticipação, não é óbvio que apenas as classes mais favorecidas poderão recorrer à clínica privada? Continuarão, assim, os ricos a ser tratados nas casas de saúde, e os pobres nos hospitais públicos, cada vez mais degradados, intencionalmente degradados, para satisfazer a cupidez de centos profissionais livres? Ou será que tal medida visa antes, ou também, a manutenção ou até o reforço dos subsistemas sectoriais de saúde, destinados apenas a certas camada da população? Pelo exposto, como concedia o Governo a solução anunciada com o imperativo legal e ético de um serviço nacional de saúde universal, geral e gratuito? E como respeita o objectivo constitucional da cobertura médica hospitalar de todo o País e da socialização da medicina?
Terceira questão: O Governo informa ainda que o «sistema de saúde» a instituir (nota-se que fala em «sistema» e não em «serviço nacional») deve «concitar o apoio dos profissionais». A intenção do Governo é clara: pagar a factura à Ordem dos Médicos, mantendo os privilégios remuneratórios de uma parte da classe. Pergunta-se, pois: não haveria outros meios, menos materialistas, de concitar o apoio dos profissionais? Por exemplo, libertando os hospitais centrais da pletora de médicos sem lugar nos quadros, colocando-os nos hospitais distritais, onde há mais de seiscentas vagas e são melhores, em muitos casos, as condições de trabalho? Por exemplo, regulamentando o Estatuto Médico, quanto ao regime de trabalho de tempo inteiro e dedicação exclusiva, em condições que permitam a profissionalização dos médicos e a sua devoção integral ao serviço? Por exemplo, proibindo as acumulações escandalosas que, em alguns casos, somam mais de horas por dia, ou criando a carreira de clínico geral, garantindo, assim, a colocação de milhares de jovens médicos? Em vez disso, o Governo preferiu revogar toda a regulamentação dia Lei do Serviço Nacional de Saúde, elaborada pelo anterior Executivo, que criava o ramo da clínica geral, o Departamento de Cuidados Primários, os centros comunitários de saúde, restruturando o ramo da saúde pública e as administrações distritais de saúde, e acabava com as acumulações...
O que o Governo pretende não é, afinal, «concitar o apoio dos profissionais»,
mas antes manter o apoio de um pequeno número de plutocratas, que continuarão a auferir grossos proventos por causa das suas múltiplas acumulações - em alguns casos chegam à dezena- e ao mesmo tempo com «pulso livre» para, sem tabela nem limites, cobrarem à clientela rica ou à classe média desiludida com as péssimas condições dos serviços oficiais, que eles próprios aviltam. Ao lado deste pequeno grupo subsiste, porém, a maioria de classe, sobretudo os jovens médicos que têm de optar pelo trabalho no interior, sem condições, sem formação permanente nem garantia de carreira, ou por ficarem «pendurados» nos hospitais centrais, na situação de tolerados, mercê dos grandes «patrões»...

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: E, entretanto, até 1984, o número já elevado de médicos aumentará em cerca de 8500! Como vai o Governo resolver o problema? Irá colocá-los no Hospital de Santa Maria onde, como o Sr. Ministro sabe, para 1300 doentes há actualmente 1800 médicos?
Quarta questão: afirma o Governo pretender um «sistema de saúde» que «possa ser assegurado pelos meies humanos, materiais e financeiros disponíveis». O orçamento da saúde é, contudo, inferior, em termos reais, ao do ano anterior. De facto, sofreu apenas o aumento de 10%, quando a inflação foi superior a 20%, sendo certo que a quantia destinada a medicamentos é igual à de 1979. Aliás, o Secretário de Estado da Saúde declarou há dias na Comissão Parlamentar da especialidade que a verba proposta para o sector sofreu um corte de mais de 4 milhões de contos.
Está o Governo consciente da retracção de fundos com que vai castigar a saúde dos Portugueses? Se está, dois cenários são possíveis: ou o Governo tem a reserva mental de ampliar o orçamento da saúde imediatamente antes das eleições, para recompor a sua imagem, ou então faz orelhas moucas às necessidades da população, endividando os hospitais e os Serviços Médico-Sociais para que o Governo progressista que se lhe seguir tenha novos 'contenciosos envenenados com as farmácias, prestadores privados e pequenos comerciantes fornecedores.

O Sr. Herculano Pires (PS): - Ê asso, é!

O Orador: - Ou há uma terceira alternativa? Fazer pagar à população taxas progressivamente maré elevada?, enquanto é reduzido o imposto profissional e complementar dos grandes contribuintes e se não tomam medidas para evitar a fuga fiscal dos «capita, listas da saúde»?

O Sr. Vital Moreira (PCP): - É isso mesmo!

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1793 - 30 DE ABRIL DE 1980

O Orador: - Quanta questão: o Governo criou, como se vê do Plano, e já o anunciou pelas trombetas da comunicação social que lhe está arregimentada, um sistema de «serviços de emergência, urgência e atendimento permanente». São óbvios os intuitos propagandísticos numa área sensível à opinião pública pelo seu; mau funcionamento crónico: as urgências dos grandes hospitais. É um facto que o crescimento da procura dos serviços de urgência, rondando os 20% ao ano, provoca mau funcionamento dos serviços hospitalares situados a jusante. Mas o problema não se coloca apenas nos hospitais, nem na criação de barreiras geográficas para tiragem dos casos menos graves. O problema situa-se a montante e nas motivações que levam o utente aos serviços de urgência para uma simples consulta de cuidados primários. Com efeito, estes representam 80% a 90% das pessoas que acorrem aos bancos dos hospitais. Mas a situação lambem não se resolve criando mini-bancos em cinco ou seis postos da cidade que a breve trecho ficarão saturados. A motivação do contacto do utente com o sistema tem de ser canalizada através do seu médico de família, do seu clínico geral - figura que neste momento não existe nem existirá enquanto a AD for Governo, pois o diploma que criava a carreira acaba de ser revogado, como já referi.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Muito bem!

O Orador: - O que há são médicos impessoais, que geralmente não conhecem o doente, porque, regra geral, o que lhes convém é a sua clínica particular.

Vozes do PSD: - Não apoiado!

O Orador: - Por isso e porque estas consultas demoram meses, o recurso para os pobres é o banco do hospital. Se, pelo contrário e como se previa na Lei do Serviço Nacional de Saúde, o contacto médico doente fosse personalizado através do clínico geral que no centro comunitário de saúde era permanentemente responsável por uma dada população, a facilidade de contactes pessoais e a consequente humanização do acto médico dispensaria muita da procura desnecessária, libertando os serviços de urgência para tratarem apenas e eficazmente as verdadeiras urgências. O projecto da AD nesta área é, assim, um simples golpe publicitária Tal como a inauguração, à moda antiga, de obras ou serviços acabados por outros Governos ...

Vozes do PS e do PGP: - Muito bem!

O Orador: - Não sei até como não foi inaugurado o Hospital de Santa Maria. Certamente porque já o foi no tempo de Salazar.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Ultima questão: o Plano anuncia ainda a intenção de reduzir ais assimetrias funcionais e geográficas. Se não se tomam medidas para fixar médicos na preferia, como poderá alcançar-se a redução das gritantes desigualdades existentes? Por outro lado, o Governo propõe-se racionalizar o consumo de cuidados de saúde e de medicamentos, bem como a «administração do sector». Como vai, Sr. Ministro obter-se tal objectivo? No que respeita a medicamentos, através do seu racionamento, ou da «redução da parte comparticipada da custo? Quanto a racionalizar a Administração, será expulsar de cargos dirigentes pessoas competentes e nomear outras afectas à linha política- do Governo mesmo que não tenham qualquer experiência, como é o caso do novo provedor da Misericórdia de Lisboa? nacionalizar os gastos será ainda, num orçamento social mais ido que modesto, atribuir demagogicamente prioridade a indemnizações às Misericórdias?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os factos que acabo de expor permitem concluir, de forma indesmentível, que a política do. saúde deste Governo não se destina a proteger os interesses do povo nem da maioria dos profissionais...

Vozes do PSD: - Não apoiado!

O Orador: - ...mas antes os privilégios da meia dúzia de senhores que, por natural coincidência, são dirigentes da. Ordem dos Médicos & dos partidos da direita.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - É falso!

O Orador: - Em vez de melhorar os serviços oficiais num sector tão importante para a qualidade de vida dos Portugueses, o Governo preocupa-se apenas em desenvolver a clínica privada. Às legítimas aspirações das classes mais desfavorecidas trabalhadores, deficientes e reformados pobres - o Governo, sobrepõe os interesses das suas clientelas. De facto, adia a aplicação da Lei do Serviço Nacional de Saúde, revoga, os diplomas do Governo Pintassilgo que regulamentavam essa lei e criavam, assim, as condições para o bom e articulado funcionamento dos serviços de saúde do Estado, apresenta um orçamento de miséria, aliás, com uma redução de mais de 4 milhões de contos em relação à verba inicialmente proposta, mantém a mesma quantia de 1979 para medicamentos e meios auxiliares de diagnóstico, sem ter em coma o natural aumento do consumo e a inflação, não regulamente a carreira médica e continua a permitir a escandalosa acumulação de cargos, indiferente à situação, cada vez mais desesperada, de subemprego ou mesmo de desemprego, de milhares de jovens, médicos...

O Sr. Avelino Zenha (PS): - Muito bem!

O Orador. -...; não se preocupa em assegurar a cobertura sanitária de todo o País, deixando ao abandono milhões de portugueses, especialmente das regiões rurais, mantendo assim, ou mesmo agravando, as gritantes desigualdades entre a cidade e o campo, o litoral e o interior, os ricos e os pobres...
O Governo da AD está desmascarado. Aqueles que, por ingenuidade ou frustração, acreditaram na «mudança» sabem agora o que isso significa: mais sacrifícios e mais repressão; menor liberdade, menor justiça social.

Vozes do PS: - Muito bem!

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O Orador: - O PS, coerente com o seu programa e a sua pr tica, fiel …s suas responsabilidades como partido dos trabalhadores, continuar  a lutar pela defesa dos interesses dias popula‡äes mais desfavorecidas, pelo direito … sa£de de todos os Portugueses. Porque, como disse Antero de Quental, o socialismo ‚ o protesto dos quˆ sofrem contra organiza‡Æo viciosa que os faz sofrer.

O Sr. Amƒndio de, Azeredo (PS): - Que bela defini‡Æo!

O Orador: - � a reclama‡Æo da justi‡a e da igualdade, nas rela‡äes entre os homens, que a natureza criou livres de iguais e que a organiza‡Æo social fez como que duas ra‡as inimigas, uma que manda, goza e oprime, outra que obedece, trabalha e sofre! De- um lado, senhores, aristocratas e capitalistas, do outro, escravos, servos e prolet rios.

O Sr. Amƒndio de Azevedo (PSD): - Eis a bipolariza‡Æo!

Risos do PSD e do CDS.

O Orador: - NÆo seriam, Srs. Deputados, porque vos afirmo para concluir a minha interven‡Æo que havemos de derrubar essa barreira e construir, em liberdade, uma sociedade mais justa e solid ria: uma sociedade, sem classes. EntÆo, a sa£de nÆo ser  um privil‚gio de alguns, mas um direito de todos. � esse o sentido humanista da nossa luta.

Aplausos do PS. do PCP e do MDP/CDE,

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Malato Correia.

O Sr. Malato Correia (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Deputados: Pedi a palavra para protestar contra as afirma‡äes feitas pelo Sr. Deputado Ant¢nio Arnaut.
Contudo, ‚ natural que ele tenha proferido essas afirma‡äes porque gerou um filho que nasceu um aborto, e sabe perfeitamente que desde o programa eleitoral da Alian‡a Democr tica, esto tinha, efectivamente, uma alternativa para o projecto do Servi‡o Nacional de Sa£de que o Sr. Deputado preconizou e que ate foi aprovado pela maioria de entÆo desta Assembleia, Simplesmente, esse Servi‡o Nacional de Sa£de nÆo era politicamente aceit vel, nÆo era socialmente justo e nÆo era tecnicamente vi vel.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Por isso, nÆo o aceit mos e fizemos uma campanha mostrando claramente ao eleitorado que esse projecto nÆo ‚ vi vel, para Portugal, e foi esse um dos motivos porque a Alian‡a Democr tica ganhou nalguns distritos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Repudiar o Servi‡o Nacional de Sa£de que foi gerado pelo Sr. Deputado Arnaut...

Vozes do PS: - Por exemplo?

O Orador: - Por exemplo no distrito de Portalegre, onde vocˆs perderam dois deputados.
Vozes do PSD: - E hÆo-de perder todos!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Ministros e Srs. Deputados: Quando se discute o Or‡amento Geral do Estado h  que real‡ar que pela primeira vez ‚ concretamente atribu¡da uma dota‡Æo do OGE ao Servi‡o Nacional de Sa£de, e nÆo, como dantes sucedia   sectores como por exemplo a Direc‡Æo--Geral dos Hospitais, a Direc‡Æo Geral de Sa£de, etc. que pouco significavam em termos de uma pol¡tica global der sa£de...

O Sr. Angelo Correia (PSD): - Muito bera!

O Orador: - ... de como deve ser um Servi‡o Nacional de Sa£de que n¢s defendamos e continuamos a defender.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - No que respeita …s verbas para a sa£de, ‚ evidente que nÆo temos que discutir nesta Assembleia o Servi‡o Nacional de Sa£de. NÆo iria fazˆ-lo o PSD, como partido da maioria, se nÆo tivesse o discernimento suficiente para saber tratar dos assuntos da forma mais correcta e na altura mais pr¢pria.
Mal ir  a oposi‡Æo se, nÆo tendo possibilidade de criticar o Or‡amento ontem magistralmente apresentado pelo Governo, tiver de recorrer a subterf£gios e manobras de diversÆo que tentem desviar as aten‡äes dos Portugueses da aprecia‡Æo de um Or‡amento Geral do Estudo com cabe‡a, tronco e. membros e que permite pela primeira vez depois d.§ 25 de Abril que a popula‡Æo beneficie das medidas apontadas do Governo...

Risos do PS e do PCP.

... e que conduzem eficazmente a uma melhor qualidade de vida.

O Sr. Angelo Correia (PSD): - Muito bem!

A Sr.¦ Zita Seabra (PCP): - Quem ‚ que escreveu isso ao Sr. Deputado?

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Governo encontra-se em efectividade de fun‡äes h  apenas quatro meses, mas, apesar disto, tal como nas outras  reas, tamb‚m na pol¡tica, sectorial da saudei estÆo: a ser tra‡ados novos caminhos para se realizar a pol¡tica global que sempre defendemos: O Servi‡o Nacional de Sa£de

O Sr. Avelino Zenha (PS): - Apoiado, apoiado,...

O Orador: - No entanto, enquanto tal nÆo tem sido poss¡vel, poderemos constatar que tem sido preocupa‡Æo deste Governo melhorar os servi‡os existentes, o que, efectivamente, tem conseguido. Lembremos, a que disto possa duvidar, a cria‡Æo do Gabinete de Emergˆncias M‚dicas, precursor daquilo

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que irá ser o Instituto Nacional de Emergência Médica, por acaso esquecido no Serviço Nacional de Saúde do Sr. Deputado Arnaut...

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - É natural...

O Orador: -... - e isto não é para defender os tais barões da medicina nem os tubarões do direito, é apenas um serviço gratuito prestado à população ...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: -... e que permitirá salvar cerca de 20% das vidas que actualmente se. perdem antes da chegada ao hospitais; a criação do. Serviço de Atendimento Permanente, o SAP, tendente a descongestionar os bancos dos hospitais centrais e que, apesar de ter apenas cerca de três semanas de existência, já tem, só em Lisboa, uma frequência diária de cerca de 500 consultas; a próxima efectivação dos concursos para especialistas para os hospitais centrais e distritais e que se arrastam desde 1978, e a criação dos lugares de consultor, que permite uma melhor qualidade de assistência médica em hospitais que não dispõem de condições para manter no seu quadro esses especialistas.
Acabei de enumerar algumas das medidas já tomadas pela Secretaria de Estado da Saúde para poder melhorar os serviços existentes, e temos de reconhecer que tem sido uma política não dogmática e bem realista dentro dos condicionalismos que a rodeiam.

O Sr. Ernesto de Oliveira (PCP): - Quem é que escreveu o discurso?

O Orador: - Segundo a classificação funcional, o orçamento para a saúde foi em 1979 de 32,5 milhões de contos, e no ano de 1980 estão orçamentados 42 milhões de contos. Mas este aumento de quase 10 milhões de contos exige uma melhor administração das verbas previstas porque é do conhecimento de todos que a qualidade dos serviços médicos não melhorou proporcionalmente ao aumento substancial das verbas atribuídas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Pelo contrário, se pontualmente se obtiveram benefícios, na generalidade podemos afirmar que as verbas investidas serviram apenas para manter a má qualidade dos serviços.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Há pois, que terminar com a anarquia na administração dos dinheiros públicos em matéria de saúde. Por isso, o Ministro dos Assuntos Sociais provocou a dinamização do departamento de gestão financeira que permitirá racionalizar as despesas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O que acama dissemos não é a meta que se pretende- atingir, mas apenas o início do longo caminho que é necessário percorrer para a resolução do difícil problema que é o da saúde em Portugal. Através da criação de um Serviço Nacional de Saúde para servir os reais
interesses do povo português, nunca poderá estar sujeito à burocracia e à estatização que são a negação da verdadeira resposta às necessidades reformadoras que o nosso país exige em termos de saúde.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Governo terá que aceitar as críticas, mas não poderá aceitar conselhos porque estes não se recebem de quem apregoa saber mais, mas sim de, fluem, tendo sido Governo, tenha feito mais. Não é caso.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Oliveira Dias.

O Sr. Oliveira Dias (CDS): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: Desejava pedir alguns esclarecimentos relativamente simples ao Sr. Deputado António Arnaut, que vejo que continua apaixonado .pela sua Lei do Serviço Nacional de Saúde.

Vozes do PS: - Ainda bem!

O Sr. Aquilino Ribeiro (PS): - Não é só ele, é a Assembleia.

O Orador: - Ê, pois, preciso um bocado de força de vontade... mas gosto de o ver com um ideal. Contudo, anotei dois ou três pontos acerca dos quais penso que, de facto, é preciso que o País seja esclarecido e, designadamente, eu pretenderia ser esclarecido.
O Sr. Deputado, citando Antero de Quental, disse que as suas palavras exprimiam um protesto contra uma organização viciosa. Peço desculpa de não completar a citação, mas queria perguntar se o Sr. Deputado, legítimo, como os outros, representante do povo nesta Câmara, entende ou não que seja legítimo que também protestem contra uma organização viciosa que é aquela que está prefigurada na Lei de Bases do Serviço Nacional de Saúde que o Sr. Deputado com tanto vigor patrocinou e defende.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Não apoiado!

O Orador: - Eu não pedi apoio, só perguntei se admitia ou não.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Mas eu posso dizer «não apoiado»!

O Orador: - Pois claro que pode dizer «não apoiado», quando calha ou quando não calha...

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Posso e desta vez até calha, e bem!

O Orador: - Pois calha. Risos do: CDS e do PSD.

Em segundo lugar, o Sr. Deputado preocupa-se injustamente com a carência de médicos na periferia e pretende que tudo isso seria solucionado

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criando-se uma série de quadros, etc., e as pessoas iriam automaticamente preencher esses lugares nas zonas mais deprimidas, onde as carências são mais graves.
Contudo, o Sr. Deputado disse que nos hospitais periféricos há seiscentas vagas sem provimento. Ora bem, então o problema resolve-se com mais vagas ou criando mais vagas o problema pode ficar em aberto?
Em terceiro lugar, o Sr. Deputado, protestando - não sei bem porquê - contra as preocupações que me parecem consonantes com as da maioria da população que o Governo expressa e a que procura dar acolhimento relativamente ao atendimento permanente dos doentes, ;disse que haveria necessidade de humanizar os cuidados. Evidentemente que nesse sentido tem todo o meu apoio.
Contudo, acusou - e também não sei bem porquê - que as funções exercidas por pessoal sanitário que eventualmente aceitar, como estou certo que aceitará, o esquema agora aberto pelo Governo nas disposições recentes, seriam funcionários impessoais, médicos - impessoais, burocratas, etc. Sr. Deputado, porque é que faz essa acusação ao Governo e não olha para a sua lei e não pensa que tanto o Sr. Deputado António Arnault como as pessoas que apoiaram essa lei estão em muito maiores culpas quanto à despersonalização dos cuidados e quanto à funcionalização dos cuidados médicos?

Vozes do CDS e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Um outro ponto que me suscita uma certa perplexidade - e o Sr. Deputado António Arnault sabe que não lhe faço estas perguntas com má intenção; aliás, as nossas relações não o permitiriam - é ver .º Sr. Deputado protestar contra a preocupação que ,o Governo tem de racionalizar o consumo de medicamentos e a administração dos serviços de, saúde. E o Sr. Deputado diz -aliás, com grande espanto meu - que não imagina outros métodos 'de racionalizar o consumo de medicamentos senão racionando, e de racionalizar a administração dos serviços senão expurgando, saneando - usando a palavra a que os senhores e outras pessoas que estão para além dos senhores, deram esse significado em Portugal - dos serviços pessoas competentes.
Sr. Deputado António Arnault, reconhece que há ou não outras maneiras de racionalizar o consumo dos medicamentos e a administração dos serviços? Nunca pensou -se é que realmente pensou fazê-lo - que se o fizesse estava a expulsar pessoas das funções que exercem com competência e a racionar o consumo de - medicamentos?
O Sr. Deputado tem uma paixão pela sua lei. Aceito. Contudo, o que é difícil de aceitar é que, para rever a sua lei, afirme à Assembleia que é preciso modificar a Constituição.
O Sr. Deputado está, de facto, convencido de que o artigo 64.º da Constituição requer, por exemplo, que no Ministério dos Assuntos Sociais ou na Secretaria de Estado da Saúde exista o número de direcções-gerais que o Senhor fixou na sua Lei de Bases do Serviço Nacional de Saúde? Aliás, tivemos ocasião de discutir em pormenor este ponto.
O Sr. Deputado está convencido de que é preciso alterar a Constituição para reconhecer a legitimidade da actividade privada, que, aliás, a sua lei também reconhece, e apoiá-la em termos mais eficazes do que aqueles que prevê?

O Sr. António, Arnaut (PS): -A nossa lei!

O Orador: - Sr. Deputado, efectivamente, a sua lei...

Vozes do PS: - A nossa lei!

O Orador: - ... é a lei que o senhor apadrinha, que está em vigor e que eu evidentemente respeito.

O Sr. Raul Rego (PS): - A nossa lei!

O Orador: - Contudo, o Sr. Deputado está convencido de que é a única interpretação possível do artigo 64.º da Constituição, com aquelas precisas direcções-gerais, com aqueles precisos serviços, com aquele organigrama dos serviços, etc., e que isso não se pode modificar sem modificar a Constituição? Com franqueza, Sr. Deputado António Arnault! De facto, é preciso força de vontade!...

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Tavares.

O Sr. Sousa Tavares (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não fazia intenções de intervir neste debate porque gostaria que os problemas da saúde fossem exclusivamente vistos sob um prisma orçamental. Mas, infelizmente, foi levantado novamente o debate, que periodicamente se levanta nesta Câmara sobre a bondade ou a maldade do Serviço Nacional de Saúde e sobre a sua intangibilidade constitucional. É, pois, sobre esses problemas que desejo intervir.
Nós, Deputados reformadores, temos todo um conceito daquilo que deve ser o Serviço Nacional de Saúde, aliás, sucintamente exposto no nosso manifesto eleitoral, e que difere profundamente tanto da situação actual da medicina como da lei Arnaut.
A lei que existe é uma lei de bases. Portanto, se as bases são intangíveis, enquanto a lei não for modificada, a sua aplicação prática, a sua regulamentação, é sempre alterável em qualquer momento. E não me parece que exista incompatibilidade constitucional desde que essas alterações não visem a supressão de um serviço, tanto quanto possível, universal da medicina para todos os cidadãos portugueses, que é isso que a Constituição prescreve.
Creio, pois, que todo este problema está sempre envenenado por se querer ver um problema de princípios onde muitas vezes existe apenas problemas de racionalidade prática. Aquilo que se gasta em Portugal com a medicina é, em grande parte, mais gasto...

Uma voz do CDS: - Muito bem!

O Orador: - ...: não temos o Serviço Nacional de Saúde que deveríamos ter, em atenção àquilo que se está gastando, e o esforço económico e financeiro

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do Governo e da comunidade nacional para termos os péssimos serviços de saúde
que temos não são justificáveis.
Tenho a impressão de que qualquer esforço governamental meritório em relação ao
problema da saúde devia começar por uma total racionalização e pela aplicação de
princípios sãos de administração àquilo que existe. Por exemplo, hoje em dia
temos uma rede hospitalar que cobre mais do que suficientemente as necessidades
do País; temos mesmo uma proporção de camas população praticamente superior à de
todos os países da Europa, mas, simplesmente, grande parte desses hospitais,
encontram-se fechados e não funcionam, ou porque não têm dotação para serviços
ou porque- não têm elementos adjacentes da medicina, quer dizer, não têm
carreiras paramédicas que possam servir para o funcionamento desses hospitais.
É evidente que isso acarreta desde Jogo um gravame completamente absurdo nas
despesas e no consumo que se faz da medicina centralizada nas grandes cidades. O
pôr a funcionar, por exemplo, todos os hospitais distritais e inclusivamente os
próprios hospitais concelhios para convalescença, diminuindo o tempo-cama dos
doentes que é ridiculamente alto nos 'hospitais centrais e até nos distritais,
seria uma primeira obrigação de qualquer Governo consciente sobre os problemas
da saúde, e tenho a impressão de que (preocupa a Governo actual embora não tenha
preocupado nenhum dos anteriores Governos.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Orador: — Por outro lado, também penso que não é servir os interesses da saúde
nem é de forma nenhuma .conceber um Serviço Nacional de Saúde estruturado como
deve ser a aprovação feita, por exemplo, da construção do Hospital de Coimbra,
que vai custar à Nação pelo menos 5 a 6 milhões de contos e que está concebido
em termos que na medicina internacional se encontram condenados há mais de
trinta anos.
Já o professor Cid dos Santos foi praticamente maldito pela Assembleia Nacional
do tempo do Estado Novo por se ter oposto à construção do Hospital de Santa
Maria e do Hospital de S. João, no Porto, por os considerar impossíveis de
funcionar e ultrapassando o óptimo racional hospitalar. E, no entanto, em 1979,
o Governo Português fechou contrato com firmas espanholas para a construção do
Hospital de Coimbra em termos que são completamente irrevogáveis, e hoje a Nação
está perante esse ónus de ter que construir um hospital que não vai funcionar,
um hospital que vai ser uma ruína, como é em grande parte o de Santa Maria e que
representa um ónus e um peso financeiro nas nossas finanças completamente
incomportável. A isso chamo eu não fazer Serviço Nacional de Saúde mas sim
destruir a possibilidade da saúde nacional em termos .possíveis para o País.

Vozes do PSD e do PPM: — Muito bem!

O Orador: — Por outro lado, tenho a impressão de que aquilo que hoje existe do
Serviço Nacional de Saúde não pode de maneira nenhuma continuar a
existir. Não é dar assistência médica às populações, mandar os estudantes recém
formados...

Vozes do PCP: — Estudantes não, médicos!

O Orador: — ..., sem qualquer espécie de prática e com uma ciência médica
profundamente limitada, obrigatoriamente para a província, como médicos, para
poderem iniciar a sua carreira médica.
Tenho a impressão de que isso envolve um certo desprezo pela saúde das
populações da periferia e, além disso, envolve uma despesa e um gravame
espectacular para as finanças do Estado, porquanto esses médicos vão com um
ordenado teórico de 16000$ por mês, mas todos sabemos que, na prática, tiram em
geral mais de- 30, até 40 e, nalguns casos, 50 contos por mês, com os princípios
burocráticos dos serviços extraordinários, das horas extraordinárias, da
utilização dos médicos nos dias feriados, etc., etc., etc.
Portanto, o que se passa nesse campo é um escândalo e tem de acabar.

O Sr. António Arnaut (PS): — Isso é verdade!

O Orador: — Por outro lado, é completamente irracional que esses módicos que são
deslocados para a província e que passam lá um ano quando não sabem, ser médicos
e ao fim de um ano venham para Lisboa fazer os concursos para os postos
hospitalares e neles fiquem situados para Lisboa, Porto, e Coimbra, onde existem
hospitais centrais e, quer sejam aprovados quer não, continuem a fazer serviços
nesses hospitais, acumulando o número de médicos com uma inutilidade
extraordinária, ganhando um ordenado que é um gravame para o Estado e
«sobrecarregando a comunidade com a existência de uma carreira privilegiadíssima
e paga em termos de segurança e de dinheiro que mais nenhuma carreira o é em
Portugal.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Orador: — Tenho, pois, a impressão de que isso não é um serviço médico que
nós, portugueses, possamos desejar; isso é, pura e simplesmente, uma situação
atrabiliária e, quando muito, demagógica.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Orador: — Por outro lado, penso que o problema fundamental não é o de mandar
meninos recém formados para a província a fingirem de médicos para, depois de um
ano de periferia em que ganham muito dinheiro, virem para Lisboa acumularem a
carreira...

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Sousa Tavares, peço-lhe imensa desculpa ...

O Orador: — Eu vou abreviar, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Não lhe peço sequer que abrevie. Interrompi-o apenas para
lhe fazer uma prevenção: o tempo destinado para hoje ao Agrupamento dos
Reformadores está já a ser excedido por V. Ex.ª

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e, portanto, já está a entrar no tempo reservado para a sessão de amanhã.

O Orador: - Sr. Presidente, penso que o tempo reservado hoje aos Reformadores não foi utilizado.

Vozes do PS: - Pois, ele não esteve cá!

O Sr. Presidente: - Foi exactamente agora esgotado por V. Ex.ª

O Orador: - Então eu já falei dezassete minutos, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Não, Sr. Deputado, é que o Sr. Deputado Nuno Godinho de Maios já hoje teve uma intervenção.

O Orador: - Mas às 12 horas a 15 minutos foi-me entregue uma folha vinda da Presidência ande eslava escrito que os Reformadores leriam hoje dezassete minutos ...

O Sr. Presidente : - Sr. Deputado, já depois de V. Ex.ª ter sido informado à hora que foi, falou o Sr. Deputado Nuno Godinho de Matos nove minutos e trinta segundos.

O Orador: - Então eu tenho oito minutos.

Vozes do PS: - Tinhas!

O Sr. Presidente: - Tinha sete minutos e trinta segundos ,e é exactamente esta prevenção que lhe faço, pois já esgotou o seu tempo.

O Orador: - Então vou terminar, Sr. Presidente.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Por que é que há-de insistir em falar sobre tudo?

O Sr. Pedro Roseta (PSD) : - Sempre, resmungando...

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Orador: - O que eu queria dizer é que, por outro lado, nós sabemos que os quadros dos hospitais distritais estão por preencher, sabemos que desde 1978 estava, até há poucos dias, por fechar o concurso para o preenchimento das vagas nos hospitais distritais por razões burocráticas que ninguém pode compreender e que apenas representam desleixo dos Governos anteriores.
Ora, isto é que é um Serviço Nacional de Saúde)? Enquanto não tivermos hospitais distritais a funcionar, enquanto não tivermos os quadros preenchidos, enquanto os concursos não se realizarem com rapidez, não há Serviço Nacional de Saúde, há palavras infinitamente repetidas pelo Sr. Deputado António Arnaut. E a saúde dos Portugueses não se compadece com palavras de Deputados nem com demagogias de. sistemas, mas compadece-se sim com um sistema racional de» prestação de serviços médicos era todo o território português.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Ernesto de Oliveira para um protesto.

O Sr. José Ernesto de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar queria fazer um protesto em nome pessoal, porque não poderia deixar de ser de outra forma, mas penso que nele cabe também o protesto da imensa maioria dos médicos portugueses que, para infelicidade, do Sr. Deputado Sousa Tavares, são jovens.
Actualmente, cerca de 9000 médicos portugueses são jovens para os quais o futuro é negro e para os quais o Governo AD não encontrou não só uma única resposta como, pelo contrário, tudo tem feito para agravar a sua situação.
Na minha intervenção desta tarde a naquilo que o Sr. Deputado António Arnaut acabou de dizer, há passos concretos de que a legislação foi renovada, sonegando-se absolutamente a sua discussão nesta Assembleia, e que prejudica e coloca esses jovens médicos muna situação quase que desgraçada em relação ao futuro e à fase dos seus colegas apenas pelo facto de serem mais velhos.
O ataque que o Sr. Deputado Sousa Tavares nos fez é, no entanto, sintomático da fornia como a direita, da forma como a Ordem dos Médicos, que aqui tem como patrono o Deputado Sousa Tavares à falua de outros porque mais incompetentes na matéria, trata o problema. O Sr. Deputado Sousa. Tavares, ao atribuir ou ao lançar para os ombros das jovens gerações médicas todo o peso dos grandes males que afligem a saúde do povo português não fez mais do que colocar-se ao lado daqueles que; efectivamente, defende e, no fundo, escamotear, esconder e ocultar aos olhos desta Câmara e do País as verdadeiras razões' do escândalo da saúde do nosso povo.
Não são os jovens médicos que com os sacrifícios, com as impreparações, com as dificuldades, muitas vezes arrostando com as próprias incompreensões dos colegas mais velhos, vão para a província e que asseguram lá os cuidados médicos à população que são os culpados. Concelhos há, distritos há, como é o caso, por exemplo do distrito por onde sou eleito e de que, infelizmente, o Sr. Deputado também é, mas que não conhece, que é o distrito de Évora, onde, à parte a cidade de Évora, nos restantes concelhos há apenas oito médicos residentes, sendo todo o resto da assistência médica garantida precisamente por esses jovens médicos que merecem o desprezo do Sr. Deputado Sousa Tavares!
São, pois, estas as realidades quo o Sr. Deputado desconhece e é por es desconhecer que se permite vir a esta Câmara lançar calúnias e provocações contra estes jovens, como aquelas que acabou de lançar.

Aplausos do PCP. do PS e do MDP/CDE.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente António Martins Canaverde.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Sousa Tavares, faça favor.

O Sr. Sousa Tavares (DR): - Eu não deveria responder ao Sr. Deputado José Ernesto porque vou

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queimar ingloriamente o tempo reservado ao meu partido, mas é que realmente a demagogia das suas palavras não tem descrição: eu falei de factos e o Sr. Deputado disse apenas palavras. O que eu disse - e que é muito claro - é que, em qualquer curso, sejam médicos ou advogados a fazer serviço nacional de justiça, não são com certeza recém formado que têm competência para o serviço.
Portanto, o problema é o de que não se deve enviar médicos para a periferia como quem os manda para um serviço militar; deve-se, sim, provocar a revolução social e a revolução na organização de saúde...

Risos do PS e do PCP.

... necessária para que os médicos que se deslocam para a periferia se fixem. Não está certo é que vão lá fazer um biscate no fim do curso para depois voltarem para as grandes cidades. Isso é uma batota e uma aldrabice, chame-lhe o Sr. Deputado José Ernesto o que quiser!...
É evidente que mandar fazer um serviço militar médico por um ano à província quando se acaba o curso e. depois os médicos recolherem da periferia para a cidade, para os hospitais centrais, é uma aldrabice de um Serviço Nacional de Saúde. Não é sério para portugueses, embora possa ser sério para comunistas.

Aplausos do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores .

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Arnault para responder, se assim o desejar.

O Sr. António Arnaut (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Fiz uma intervenção colocando-me no terreno da discussão que aqui se processa, isto é, relativamente às propostas de Lei do Orçamento e do Plano, fiz perguntas concretos ao Governo e espero que o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais, a quem, aliás, tive o prazer de entregar pessoalmente uma cópia da minha intervenção, dê à Câmara e ao Partido Socialista os esclarecimentos que entender por convenientes no sentido de responder às questões muito concretas que objectiva e serenamente lhe coloquei.
Não esperava que a AD saísse á estacada, mostrando assim que, afinal, se doeu com a minha intervenção...
Por outro lado, é preciso dizer, Srs. Deputados, sem que isto signifique qualquer desprimor para os colegas, que não estou disposto - até pelo respeito que me merece esta Câmara e esta discussão- a fazer resvalar o nosso debate para um problema que não está agora em apreço.
Daqui por alguns dias, quando discutirmos a ratificação de um diploma deste Governo que consideramos ilegal e que revogou vários decretos-leis do Executivo anterior e até - pasme-se! - alterou uma disposição de uma lei democrática aqui votada, a Lei n.º 56/79, terei, então, oportunidade e muito prazer em responder a todas as perguntas que me forem postas sobre o Serviço Nacional de Saúde.
O comentário que desejaria fazer é apenas este: houve aqui um Deputado que falou em aborto, mas, afinal, quem teve dores de barriga foi esse mesmo Sr. Deputado que. por coincidência, também é médico.

O Sr. Malato Correia (PSD): - Não é por coincidência, é porque tirei o curso.

O Orador: - Quanto ao Sr. Deputado Oliveira Dias, que fez, aliás, perguntas pertinentes, peço desculpa de não lhe responder neste momento, mas pelas razoas que expus responderei noutra altura. Apraz-me, no entanto, salientar a sua correcção que, aliás, também é habitual. Podemos discutir as questões sem azedarmos os ânimos e guardaremos as amizades e o respeito mútuo.
Quanto ao Sr. Deputado Sousa Tavares, apenas direi que o Sr. Deputado não sabe o que é um Serviço Nacional de Saúde porque falou como se ele já existisse. E infelizmente não existe porque a lei não foi ainda aplicada. Um Serviço Nacional de Saúde pressupõe um serviço coordenado, descentralizado e unificado e o que existe é a nossa já conhecida manta de retalhos dos vários sectores e subsistemas prestadores de cuidados de saúde.
Só digo ao Sr. Deputado que o problema da saúde, mesmo nesta discussão do Orçamento, não pode ser visto em termos estritamente técnicos e financeiros; o problema da saúde tem sempre subjacente uma concepção política da sociedade. E é por isso também que agora digo ao Sr. Deputado Oliveira. Dias que não me admira o seu protesto porque a direita sempre protestou contra o Serviço Nacional de Saúde universal, geral e gratuito.

O Sr. António Lacerda (PSD): - Quem é a direita?

O Orador: - A direita sempre protestou contra esse esforço verdadeiramente humanista que é o de garantir, a saúde a todos os portugueses, principalmente àqueles que hoje morrem sem assistência médica.

O Sr. Oliveira Dias (CDS): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Diga, Sr. Deputado.

O Sr. Oliveira Dias (CDS): - Sr. Deputado António Arnaut eu estava apenas a pedir licença para partilhar também o protesto de Antero de Quental que o Sr. Deputado citou: Não sei se o Antero de Quental era um homem da direita...

O Orador: - Antero de Quental, fundador do Partido Socialista...

Risos do PSD e do CDS.

...protestou contra as injustiças e as desigualdades.,

O Sr. Oliveira Dias (CDS): - Mas eu também protesto.

O Orador: - Os Srs. Deputados da direita riem-se de quê? Riem-se de Antero de Quental ou da citação que eu fiz desse grande poeta português?

O Sr. Anseio Correia (PSD): - Da sua contradição!

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O Orador: - Os Srs. Deputados têm o direito de se rir mesmo os alveitares da medicina podem rir-se...
Estava eu a responder ao Sr. Deputado Sousa Tavares e vou já concluir também com um protestos relativamente à afirmação, que me abstenho de classificar, relativa aos jovens médicos, dizendo que são meninos que vão para o província a fingir de médicos... O Sr. Deputado vai à província de vez em quando em ferras, em viagens de recreio e, até ultimamente fazer comícios...

Uma voz do PS: - E fazer campanha eleitoral!

O Orador: - Mas o Sr. Deputado nunca viveu pelo menos dias seguidos .na província e não sabe o que é o desespero e a angústia de muita gente que só viu o médico pela primeira vez quando os jovens clínicos do serviço médico à periferia foram para o interior do País!

Aplausos do PS, do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Deputado não pode compreender isso.
E por isso, Sr. Deputado Sousa Tavares, mais uma vez eu concluo que perdeu uma boa ocasião de estar calado.

Aplausos do PS, do PCP e do MDP/CDE.

O Sr.. Sousa Tavares (DR): - Peço a palavra, Sr. Presidente. ..

O Sr. Presidente: - Paira que efeito é, Sr. Deputado?

O Sr. Sousa Tavares (DR): - É para lamentar simplesmente que sempre que se apresentam factos e se colocam problemas...

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Factos?

O Sr. Vital Moreira (PCP):- Factos?... Aleivosias!

O Orador: -.... os grandes Deputados da oposição respondem desta maneira lamentável, com laracha e brincadeira para terem palmas. Gostaria que respondessem a sério.

Aplausos do PSD.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - A quê?

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A demagogia mais descarada é uma das armas fundamentais com que este Governo procura enganar os Portugueses.

Protestos do PSD e do CDS.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Está vestida à burguesa...

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço a vossa atenção, por favor. Como sabem, neste momento não pode haver diálogo que interrompa a continuação dos trabalhos. Faça favor de continuar, Sr.ª Deputada.

A Oradora: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A demagogia mais descarada é uma das armas fundamentais com que este Governo procura enganar os Portugueses.

Vozes do CDS: - Outra vez? Não apoiado!

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Outra vez a mesma cassette!

A Oradora: - A acreditar no que dizem Ministros, Secretários de Estado e Deputados da direita estamos num paraíso com a vida a baixar, os salários a subir, reformas chorudas, cheios de saúde, as donas de casa estão felizes, pois na praça tudo baixou de preços, come-se bifes e peixe fresco, bacalhau desde a Páscoa, impostos quase que já nem, há...
O problema está em que quando os Ministros e Secretários de Estado ou os Deputados da direita se calam e se regressa à dura realidade da vida, os Portugueses têm a dimensão exacta do que é deixar tudo na mesma e pôr a propaganda a vender política.
Na segurança social o esquema seguido é o mesmo acrescentado de uns quantos números manipulados, bem misturados: para o povo engolir.

Aquela do Primeiro-Ministro, repetida ontem pelo Ministro dos Assuntos Sociais, do aumento do abono para uma família de dez filhos com o ordenado inferior a 11 000$ é um espanto!

Risos do PS.

Perguntámos ao Governo quantas dessas famílias existem com dez filhos e 11 contos de rendimento. E o Ministro não respondeu.

Vozes do PSD e do CDS: - Respondeu, respondeu...

A Oradora: - Srs. Deputados, o Sr. Ministro só disse quantas famílias existem com dez filhos, mas não disse quantas dessas tinham menos de 11 contos de rendimento. E quantas existem com dez filhos já nós sabíamos...

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Não parece!

A Oradora: - Gostaria, porém, em primeiro lugar e ao referir-me ao orçamento da segurança social, salientar que este Governo não cumpriu a lei e a Constituição, pois afastou completamente do debate do orçamento da segurança social os parceiros sociais e entre eles o movimento sindical, chegando ao cúmulo de só nomear o conselho de gestão do Instituto de Gestão Financeira (IGF) depois de entregar o orçamento da segurança social na Assembleia da República. Nu entanto, o controle dos dinheiros da segurança social pelos trabalhadores é um princípio constitucional.
O Governo fugiu e foge deste controle para ficar com as mãos livres para gerir a seu belo prazer os 100 milhões de contos que são descontados aos bolsos de quem trabalha;

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Para poder, por exemplo, destinar uma parte desse dinheiro para o distribuir às Misericórdias. O esquema é simples. Os trabalhadores descontam, o Governo dá uma parte desse dinheiro às Misericórdias para que, sem nenhum controle nem fiscalização, os caciques aí pelo País possam fazer obras de fachada com o dinheiro de quem trabalha, ficando, dês com os touros, quando não, como o fizeram no tempo do fascismo em tantos casos, com o próprio proveito.
Outra questão importante são as dívidas do patronato à Previdência.
A AD desde que é Governo tem-se multiplicado em comoventes apelos aos patrões para que paguem as dívidas à Previdência, a fim de que o Governo da AD tenha dinheiro que lhe permita fazer umas «flores» até às eleições.
E até mostram o jogo.
O insuspeito, para a direita, jornal Expresso, há dias; desmentindo tudo o que o CDS e o PPD até aqui sempre disseram, vem confessar que afinal o PCP tinha razão, pois quem deve à Previdência não são as empresas nacionalizadas mas sim o sector privado.
Dos 28,7 milhões de contos de dívidas, 23,3 milhões correspondem a dívidas de empresas privadas, ou seja, 81,2% do total.
E o Expresso diz mais adiante:

Se se pretende manter uma maioria parlamentar favorável do desenvolvimento do sector privado não é possível continuar a entravar o funcionamento de instituições com particular impacte nas condições; de vida de grande parte dos portugueses!
É o reconhecimento de que nem havido sabotagem. Que o patronato, com claros fins políticos tem ficado com o dinheiro da Previdência para que as carências sociais dos Portugueses não sejam superadas.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A propaganda, a venda de banha da cobra é o segredo do negócio do Governo.
A família e a respectiva Secretaria de Estado aí estão a mostrá-lo se dúvidas houvesse. Já repararam os Srs. Deputados que esta Secretaria de Estado não tem orçamento? O Governo esclareceu que as verbas para a Secretaria de Estado da Família estão englobadas no Gabinete do Sr. Secretário de Estado da Segurança Social que tem 37 000 contos orçamentados, isto é, mais 10 000 contos que o ano passado quando não existia a dita Secretária de Estado. A Secretaria de Estado da Família não precisa, de verba para cortai fitas e inaugurações ou para dar entrevistas para os jornais! Neste ponto estou de acordo, com o Governo! Mas então o que se passa com o prometido salário és donas de casa que um Deputado da AD disse publicamente já estar em decreto-lei!
Na verdade, a demagogia não tem limites: paira este Governo, a propósito do abono de família dizia ontem aqui na Assembleia da República o Ministro dos Assuntos Sociais: «caminha-se assim, pela primeira vez, no sentido da criação da igualdade real de oportunidades para todas as crianças», pasme-se Srs. Deputados! Com um aumento de 60S no abono caminha-se para a criação da igualdade de oportunidades a todas as crianças.
Por que na verdade 1 117 000 crianças terão o abono aumentado em 60$. Se acrescentarmos 403 000 cuja aumento é de 76$ por mês temos a medida real da política social do Governo: 71% das crianças com direito a abono têm um aumento mensal que não chega a 80$, muitas das quais, senão a maioria, vivem em famílias de condições económicas profundamente carenciadas.
Dizia então o Ministro que nunca tinha ouvido reivindicar aumento do abono de família! Mas em que país terá estado o Sr. Ministro. Até no Diário da República já veio publicado um despacho há meio ano com a previsão do aumento dto abono de família para 400$ mensais em 1980. A Intersindical de há muito reivindica o aumento do abono de família para 500$.
O PCP concorda com esta reivindicação, que considera não só possível como .içá mesmo propor em sede de especialidade que o aumento do abono de família passe para 500$ mensais e não fique nos exíguos 300$ propostos pelo Governo. Basta para tanto recuperar efectivamente uma parte das dívidas do patronato e até não são necessários 28 milhões, bastam 5.
Quanto às pensões de reforma o bluff não é menor.
Os rurais a quem a AD prometeu aproximar do regime geral passam mais um Orçamento sem aumento.
Na verdade, dos 1 600 000 reformados existentes o Governo de Sá Carneiro/Freitas do Amaral não chega a aumentar 300 000 e destas metade são aumentados num valor que vai de 105 a 250$ por mês!
O Governo, e mais uma vez, tenta enganar os reformados e dúvidas houvesse vejam os títulos de um dos jornais da maioria que diziam pomposamente: «Reformados aumentados em 21 %». Mas, do 1 600 000 reformados existentes só aproximadamente 33 969 terão as suas pensões aumentadas em 21 %.
O PCP condena profundamente esta política e concorda com esta reivindicação da Intersindical, do MURPI e do MAPRU para que a pensão mínima seja pelo menos igual a metade do salário mínimo, isto é 3750$ para os rurais, desalojados e pensão social e 4500$ de pensão mínima do regimento geral.
Enquanto na realidade as pensões mínimas não estiverem indexadas e não puderem ser inferiores a pelo menos metade do salário mínimo nacional - e já o foram - a situação dos reformados não passará da miséria actual.
Esta proposta do movimento sindical, além de ser justa, é realista e viável através de uma efectiva recuperação de dívidas, mesmo sem o Governo ter, de recorrer ao financiamento do orçamento da segurança social pelo Orçamento Geral do Estado.
Um Governo ao serviço do capital, dos latifundiários e do grande patronato não podia, evidentemente, ser veículo de uma maior justiça social e de medidas sociais sérias que melhorassem efectivamente a situação das classes e camadas mais desfavorecidas da população.
Ao que assistimos, sim, é a uma brutal ofensiva dei propaganda, em que os órgãos de comunicação social estafados estão a ser meros veículos de propaganda governamental.

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Hoje mesmo, o jornal A Tarde anuncia que o Ministro dos Assuntos Sociais irá à televisão logo. A seguir ao Dancing Days anunciar o aumento do abono de família e das pensões de reforma.

Vozes do PS: - Ah!.

A Oradora: - Os Portugueses não se deixarão enganar e darão sem dúvida a resposta nas urnas a este Governo, à sua política e às suas fraudes.

Aplausos do PCP, do PS e do MDP/CDE.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Mais outra cassette.

O Sr. Oliveira Dias (CDS): Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Oliveira Dias.

O Sr. Oliveira Dias (CDS): - Muito obrigado, Sr. Presidente, eu desejava fazer só uma pergunta à Sr.ª Deputada Zita Seabra.
A Sr.ª Deputada disse - e eu acompanho o seu ponto de vista - que o montante dos abonos de família, apesar de, pelo menos, tenderem a diminuir em valores reais, é insuficiente e disse que as pensões de reforma, apesar de aumentadas, continuam insuficientes: disse, enfim, que uma série de prestações de segurança social são insuficientes.
Queria simplesmente perguntar à Sr.ª Deputada qual seria, segundo o projecto do seu partido, o montante global do orçamento da segurança social? E esta pergunta tem uma consequência lógica, que é a seguinte: qual seria, então, o aumento dos descontos feitos aos trabalhadores e quais seriam, no fundo, os aumentos nos impostos a todos os portugueses que pagam... para- o Fisco destinados a cobrir o aumento que o seu partido preconiza?

O Sr. Vital Moreira (PCP): - É uma questão de distribuição e não de termos absolutos!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra, para responder, se assim o desejar.

A Sr. Zita Seabra (PCP): - Sr. Deputado Oliveira Dias, a resposta, até é simples. Em relação ao orçamento da segurança social, foi afirmado pelo Sr. Secretário de Estado que o Governo vai sair com legislação para recuperar as dívidas da Previdência. Mas quando nós perguntámos qual é o montante da recuperação da dívida, o Sr. Secretário de Estado disse que não está orçamentado nenhum montante de recuperação das dívidas, o que o Governo procura é chegar ao fim de 1980 com o mesmo quantitativo de dívida, sem que esta tenha sido agravada.

O Sr. Oliveira Dias (CDS): - Dá-me licença, que a interrompa, Sr.ª Deputada?

A Oradora: - Deixe-me acabar e depois dou-lhe a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Oliveira Dias (CDS): - Mas é que a Sr.ª Deputada não entendeu a minha pergunta...

A Oradora: - Desculpe, mas eu estou no meu direito de uso da palavra.

Ora, se há, na verdade, 28 milhões de contos de dívidas, dos quais 23 milhões são de entidades privadas, segundo consta do jornal Expresso...

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - O jornal Expressou...

A Oradora: - ... creio que é relativamente simples, até sem recorrer ao Orçamento Geral do Estado, aumentar o abono de família para um valor na verdade que permita fazer minimamente frente ao agravamento brutal do custo de vida.
Porque, Sr. Deputado, aumentar o abono de família em 60$ por mês é perfeitamente ridículo, tanto mais que desde o passado mês de Agosto os Portugueses, porque lhes foi criada uma legítima expectativa por um despacho de um Governo anterior - podem estar descansados que não é o da Sr.ª Eng. Pintassilgo, é o do Ministro Pereira Magro - que apontava exactamente para um aumento do abono de família para 400$ por mês.
Ora, quanto a nós, do que se trata é de uma maior e melhor redistribuição dos rendimentos que este Governo não é capaz de levar para a frente.
Não indemnizem o Sr. Champalimaud, aumentem o abono de família e isso criará certamente uma maior justiça social!

Aplausos do PCP.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - A AD é mesquinha!

O Sr. Presidente: - Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Malaquias.

O Sr. Manuel Malaquias (PSD): - Sr.ª Deputada Zita Seabra, ouvi atentamente as suas palavras e só queria fazer-lhe uma pergunta.
A Sr.ª Deputada falou muito em dívida? à Previdência, do aumento das pensões de reforma é do aumento do abono de família. De qualquer maneira, queria perguntar se, na sua análise, viu qual era o quantitativo do montante das dívidas à Previdência em 1973 e qual é o valor da sua distribuição ao longo dos anos até 1980. E nesse sentido gostaria que me dissesse, na sua óptica, a que se deve esse grande aumento das dividas à Previdência. Será devido à ineficácia dos Governos anteriores quanto às medidas próprias a aplicar para a recuperação de dívidas ou será, como diz sistematicamente, e como o PCP utiliza muitas vezes, a tal greve dos patronatos na cobrança ou no pagamento das dívidas à Previdência a causadora desse aumento?
Por outro lado, relativamente às pensões de reforma, queria dizer à Sr.ª Deputada que no último aumento não foram incluídos grande parte dos pensionistas com pensões entre 3 500$, que viram a sua pensão aumentada; só para 3600$, e os pensionistas com 3 750$ que não viram a sua pensão aumentada. Agradecia que visse bem os números que possui e que o PCP não tentasse sistematicamente, através de meios demagógicos mas com números, vir para a Assembleia, para o povo português e para a televisão dizer coisas que não correspondem à realidade.

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O Sr. Carlos Brito (PCP): - Correspondem, correspondem!

O Sr. Vital Moreira (PCP): - E isso é que os magoa!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra para responder, se assim o entender,

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Deputado Malaquias, eu desafio aqui o Ministro dos Assuntos Sociais para que leve à televisão os partidos da oposição para então, sim, podermos esclarecer os números.

Aplausos de PCP, do PS e do MDP/CDE.

A Oradora: - E para aí, Sr. Deputado, perante o povo português, mostrarmos quem é que manipula os números, se é o Primeiro-Ministro e o Ministro dos Assuntos Sociais, que vêm aqui falar do grande benefício que há para famílias de dez filhos com um salário de 12000$, ou se é o meu partido e os partidos da oposição ao denunciarem como demagógicas essas medidas do Governo e á manipulação desses números.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Que amálgama!

O Sr. Carlos Brito (PCP): - É verdade! Há documentos!

O Sr. Manuel Malaquias (PSD): - Dá-me licença que a interrompa, Sr.ª Deputada?

A Oradora: - - Só um momento, Sr. Deputado.
Quanto a pergunta que me coloca, e muito sinteticamente porque o tempo é curto, penso que a questão das dívidas é muito simples, na medida em que foi o patronato sabotado ...

Risos do PS.

... algum do qual eleitor da Aliança Democrática, que sabotou e até foi comandado pela CIP para não pagar as dívidas à Previdência.
E recordo-lhe ainda que a CIP propôs ao Instituto de Gestão Financeira que a taxa de juro de mora por pagamento das dívidas do patronato à Previdência fosse ainda mais baixa do que a já existente, o que, por isso, ia era um escândalo porque ficava mais barato ao patronato ficar a dever à Previdência do que ficar a dever à banca.
Creio que com isto respondo às perguntas do Sr. Deputado, mas aqui lhe deixo o desafio: entre os números dos partidos da Oposição e os números do Governo vamos à televisão para perante o povo português esclarecermos esses dados. O resto, Sr. Depurado, é deslealdade, quando aqui na Assembleia da República se está a debater o Orçamento do Estado e o Sr. Ministro se aproveita dessa situação para ir exactamente a seguir ao Dancin Days fazer a propaganda das medidas do Governo, sem permitir que os partidos da Oposição participar. Direito que os partidos da Oposição têm e que a AD lhe está a recusar, não permitindo igualmente a sua ida à televisão para um esclarecimento do povo português sobre o que são, no fundo e na realidade, estas medidas e o que é realmente a demagogia do Governo da AD.

Aplausos do PCP.

O Sr. Manuel Malaquias (PSD). - Peço a palavra Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputado.

O Sr. Manuel Malaquias (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os Deputados da maioria da Aliança Democrática não têm medo de ir à televisão fazer em debate directo com os partidos da Oposição e esclarecer junto das câmaras quais são os problemas reais da segurança social ao povo português. Digo-lhe isto muito claramente, Sr.ª Deputada.

Vozes do PCP: - Vamos a isso, vamos a isso...

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Aí nessa bancada está tudo muito irrascível!

O Sr. Carlos Brito: - Sempre mal disposto!...

O Orador: - Por outro lado, tenho a dizer-lhe ainda que, relativamente às dívidas a Sr.ª Deputada falou simplesmente no valor que corresponde a 51% da dívida e disse que as empresas nacionalizadas devem pouco à Previdência... quanto a isto lembro que a pergunta que lhe fiz foi a seguinte: quais foram os mecanismos legais que os diversos Governos desde 1974 até agora introduziram para recuperação das dívidas? E se, por outro lado, não foram alguns Ministros do Partido Socialista que ao longo do tempo conseguiram que por exemplo, as UCP'S não pagassem à Previdência mas isto não é dito ao povo português!...
Muitas vezes diversos Ministros presentes em colóquios aceitaram que muita gente não pagasse à Previdência sancionando essas mesmas decisões.

O Sr. Carlos Brito(PCP): - A AD é mesquinha!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Deputado Manuel Malaquias, sobre as dívidas à Previdência o jornal Expresso é extremamente claro: há 28 milhões de contos de dívidas, as empresas privadas devem 23,3 milhões de contos, isto é, 80% das dívidas totais à Previdência.
Mas se tem dúvidas, pergunte ali ao Pinto Balsemão, que foi director do Expressa e que talvez o possa esclarecer...

Aplausos do PCP.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Ainda não leu os desmentidos!

O Sr. Manuel Malaquias (PSD): - Peço a palavra Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

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O Sr. Manuel Malaquias (PSD): - Sr.ª Deputada Zita Seabra, eu queria números não do Expresso mas números oficiais, e parece-me que o Expresso não é nenhum órgão oficial.

Protestos do PCP

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - O Expresso não é o Diário, que para vocês é o Pravda.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Neiva de Oliveira.

O Sr. Neiva de Oliveira (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs, Deputados: É dramática a situação da imprensa em Portugal. Este é um facto infelizmente mais. que conhecido. E tal situação agrava-se de há anos a esta parte, sem que nada nem ninguém por ela faça algo que seja suficientemente lúcido e efectivamente construtivo.
Encerraram-se jornais com tradições, intervencionaram-se e desintervencionaram-se outros, sucederam-se os responsáveis no sector sem, contudo, tempo, capacidade ou disposição para tomar as medidas adequadas, tal- a rotação do poder verificada ao longo de toda a evolução política última.
Notaria, é certo, quem de perto acompanhasse o evoluir dos acontecimentos, que responsáveis houve que, com indiscutível boa vontade, tudo fizeram para tentar concretizar um pouco do muito que havia a fazer. Todavia, a voragem da vida política não só lhes dispersava a atenção constantemente como, também, a queda dos governos de que faziam parte lhes, precludia e frustava a actuação desejada e desejável.
Vitoriosa a coligação AD, em 2 de Dezembro, uma nova esperança se suscitou aos expectastes de alguém que, finalmente, começasse a resolver o problema, pelo menos nos seus pontos fundamentais.
O Orçamento Geral do Estado, agora em discussão, prevê uma dotação para a Comunicação Social de apenas 368 684 contos, o que, se e manifestamente pouco, face às necessidades do sector, é, no entanto, o possível, e o adequado e realista, atenta a necessidade da sua insenção num todo global.
É consabido que parte substancial da imprensa privada acumula passivos significativamente vultosos, que ou paulatinamente asfixiam a sua existência ou, então, implicam encargos financeiros incomportáveis para quem queira mante-los a níveis fixos.
A imprensa estatizada, por seu lado, arruina-se diariamente, somando prejuízos de milhões de contos, vivendo um dia-a-dia angustiante, à custa de injecções sucessivas para ela canalizadas (com sacrifício de outros sectores, porventura mais carecidos) e em flagrande desfavor para a congénere privada.
Tudo, afinal, devido a factores de ordem vária, como sejam, no passado, a incompetência administrativa e a falta de uma linha de orientação, a obsolescência do equipamento, a proliferação quase selvagem de jornais. Isto para não falar no aumento galopante dos principais factores de produção - só em 1979, 37% nos salários, 120% nas tintas, 52% no papel, bem como agravamentos significativos nos combustíveis, na energia, nas peças sobressalentes, nas taxas de telex e telefone, nos fretes, etc.
O abastecimento do papel, por sua vez, com todas is suas consequências e particularidades, é, sem duvida, um dos problemas mais relevantes em ioda esta temática, na medida em que se prende, por natureza, com a matéria-prima base da produção dos jornais.
Postas à mercê do grupo escandinavo que lhes fornece o papel, praticamente em regime de monopólio de mercado, mau grado a intervenção da Portucel, E. P., as empresas jornalísticas vêem o seu preço constantemente aumentado, seja por razão da desvalorização do escudo face ao dólar, seja, cumulativamente, em razão do aumento do preço do petróleo e outros custos de produção, invocados pelo fornecedor para, praticamente a bel-prazer, impor condições que há que suportar de boa cara, sob pena da eventualidade de um corte de fornecimento, aliás, sempre confirmados segundo a sua vontade, parcimónia ou capricho.
É certo que, apesar de tudo, ao que este diz, faz um grande favor em fornecer o nosso mercado e à cotação mais barata da Europa. Porém, ê impossível fazer contas ou previsões quando não se podem fazer stocks e, como aconteceu na realidade, só de 31 de Dezembro de 1978 até 1 de Janeiro de 1980 o preço do papel do jornal sofreu oito aumentos abruptos e inesperados, que o elevaram de 15 918$50, por tonelada CIF, naquela data, para 25 334S, nesta última, prevendo-se, ainda como se prevê face a indícios já familiares, novo aumento associado a uma diminuição da gramagem tradicional.
No entrementes, o preço de capa dos jornais diários foi alterado, uma única vez, para 10$ por exemplar (33 %) e só ultimamente para 12$50, sendo que a contrapartida, por parte dos sucessivos governos, se ficou para além de uma complacência cúmplice com todo este estado de coisas, pela atribuição, em meados de 1978, de um subsídio de $70 centavos por exemplar, o que correspondia, então, a .ura montante mínimo equivalente ao preço médio de 50 g de papel de jornal, agravado pelos atrasos de meses na sua entrega, e extensivo também aos jornais que iam surgindo ainda à imprensa regional.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Perguntado há dias, em reunião com a Comissão Parlamentar da Comunicação Social, o responsável pelo sector asseverou que, para além de medidas pontuais visando designadamente a empresa Diário de Notícias/Capital, E. P., e o Século, não seria possível, de imediato, alterar este estado de coisas.
É óbvio que o problema é vasto e complicado. No entanto sempre direi que urge tomar providências, em conformidade com as achegas que, quer pela pena de jornalistas conscientes quer através das associações de imprensa ou administradores, têm sido canalizadas por quem de direito.
Razão por que, mais uma vez e agora nesta Assembleia, com inequívoca construtividade se me afigura pertinente aduzir algumas das medidas, pacificamente tidas por necessárias, com vista à sua oportuna concretização com a brevidade possível.
Assim, quanto ao subsídio do papel, impõe-se proceder à sua institucionalização e correlativa actualização, a fim de que se torne automática todos es anos, cumprindo, assim, cabalmente e com pereni-

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dade, o objectivo tido em vista aquando da sua criação.
No que toca aos auxílios financeiros, algumas hipóteses se poderiam equacionar sem perder de vista, no entanto, as condicionantes da política global do Governo. Por exemplo: a implementação dos contratos de viabilização que se encontram em curso, com vista a regularizar em tempo útil a vida das empresas neles outorgantes; a consolidação dos passivos existentes, e o estabelecimento de linhas de crédito para capital circulante até â percentagem de 20% da facturação dos anos precedentes, incluindo nesta tanto a receita da venda como da publicidade.
Quanto a auxiliares para renovação e ampliação tecnológicas e com o mesmo espírito acima referido: um subsídio não reembolsável equivalente a 25% do investimento; um crédito oficial para investimento até 90% do resto do montante total do mesmo investimento, em condições a determinar; aplicação de mecanismos de fixação de câmbio nas compras de equipamento ao estrangeiro.

eria aliciante, por outro lado, e com vista a aliviar as dificuldades com que se debatem as empresas jornalísticas, proporcionar-lhes a subvenção de encargos diversos, isenções e benefícios fiscais, tais como: redução de 50% nos preços dos telexes, telefones e telegramas de impresa; a redução de 50% nos transportes de jornais, sendo os restantes 50% a pagar por permuta de publicidade; a eliminação das taxas de importação de máquinas e matérias-primas; o desconto de 50% para-os jornalistas, em serviço, nos preços dos bilhetes das transportadoras do Estado; o estudo de condições que estimulem a melhoria da rede de distribuição dos órgãos de imprensa, no sentido de facilitar uma colocação mais rápida e económica dos jornais em todo o território nacional e no estrangeiro, nomeadamente junto das comunidades de portugueses; a regulamentação da utilização da televisão e da rádio estatizadas, em termos de impedir a sua concorrência desleal com a imprensa, e a concessão gratuita de parte deste espaço à .promoção da imprensa escrita; a subvenção em 50% dos encargos com agências noticiosas, etc.
Quanto à imprensa regional portuguesa haveria que, atendendo às suas especiais características, proporcionar-lhe apoio a nível noticioso, à sua divulgação por assinatura o à divulgação publicitária de assuntos de interesse público, auxiliar a sua reestruturação (técnica (tão necessária, atenta a sua quase geral desactualização) e, ainda, patrocinar uma subvenção específica e suplementar por cada exemplar vendido.
Sr. Presidente, Srs. membros do Governo, Srs. Deputados: Só assim, com efeito, se logrará alcançar totalmente na prática os objectivos de liberdade de expressão e do informação.
Só assim será possível a existência de uma imprensa forte e independente, quer do poder político, quer das correntes com expressão partidária, quer do poder económico' ou de quaisquer grupos de pressão.
Só assim se corresponderá, com justiça, à necessidade imperiosa de valorizar a actividade profissional dos jornalistas e dos demais trabalhadores de informação.
Só assim sei afastarão os espectros do desemprego e da miséria para quanto» desenvolvem a sua actividade na nobre e tão incompreendida missão de informar.
Só assim o Estado democrático cumprirá o seu dever de- assegurar, pelos meios ao seu alcance e sem discriminações, as condições devidas e propiciadoras da sobrevivência das empresas jornalísticas.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Passados escassos quatro meses sobre a posse do Governo, os Portugueses não têm já dúvidas quanto à firmeza com que este cumpre as suas promessas e quanto à seriedade e competência com que aborda e trata os problemas nacionais.
Todos os dias aumenta a confiança no Governo e a esperança no futuro.
É partilhando dessa confiança e com redobrada esperança que avançáramos, certos de que só a política de honestidade e de transparência que vem sendo seguida permitirá, em devido tempo, resolver os enormes problemas com que se debatem os meios de comunicação social e, em especial, a imprensa escrita.

Aplausos do CDS, do PSD, do PPM e dos Deputados reformadores.

O Sr. Presidente: - Igualmente para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Amaral.

O Sr. Rui Amaral (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Sensivelmente a meio do debate das propostas de' lei do Orçamento e das Grande Opções do Plano para 1980, penso ser útil começar por fazer uma brevíssima reflexão sobre o modo como este debate tem vindo a decorrer.
Há pouco mais de um trimestre, esta Assembleia teve oportunidade- da aprovar o Programa do VI Governo e, na sua sequência, pela primeira vez, votar uma moção de confiança que naturalmente, e para sermos claros, vincula não somente a maioria parlamentar, mas toda a Câmara, ou seja, toda a expressão democrática da vontade dos Portugueses.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - E esta, anote-se, publicamente demonstrada de fresca data e, acentue-se, traduzindo no continente, que não nas regiões autónomas, uma modificação sensível da posição do eleitorado.
Foi um acto profundamente democrático bem demonstrativo de que os Portugueses dispõem já de um apurado sentido crítico colectivo, que não tem receio de o exprimir e estão dispostos a atribuir o poder a quem melhores garantias lhe der de o exercer, do mesmo passo que manifestam com igual vigor e coerência a concordância ou a confiança em administrações regionais que se impuseram pela sua capacidade e pelo seu modelo político mesmo arrostando com a oposição e as dificuldades levantadas por Governos da República com opções politico-partidária diversas e mesmo conflituantes.
Nessa altura, há três meses, à Assembleia da República cumpria, no exercício do mandato conferido aos Deputados, aferir da coerência e da copatibilidade do Programa do Governo da Aliança Democrática com as grandes linhas da orientação do seu 'projecto apresentado antes ao eleitorado, designa-

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damente na parte em que a execução dos objectivos era integrável temporalmente no período de vida do Governo previamente conhecido como não podendo ir atém de cerca de nove meses.
Foi o que a Assembleia da República fez não se limitando, como se disse, a passar um mero cheque em branco ao Governo, traduzido na recusa de um voto, mas assumindo plenamente a sua capacidade e a sua confiança fundamentadas.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O Governo, pela primeira vez em muitas décadas, estava legitimado para governar, mas para governar com plena autoridade com um Programa que tinha sido expressamente aprovado e não meramente consentido.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Aos Deputados coube assumir a responsabilidade da confiança dada ao Governo na base do seu Programa e essa responsabilidade foi na circunstância seriamente, reforçada como nunca fora antes pelo conhecimento e pela premência da actuação dos Deputados perante um novo acto eleitoral já fixado e a escassos meses da prazo.
Hoje, três meses volvidos cabe novamente à Assembleia da República pronunciar-se pela afirmativa ou pela negativa, sobre os instrumentos legais de base da política económica e financeira do Governo. Não creio que possa m suscitai-se dúvidas quanto à única interpretação legítima do acto democrático que estamos a viver. Trata-se, não de refazer a avaliação do Programa do Governo porque esse é também o programa que esta Assembleia assumiu democraticamente como seu. Esse juízo pode ser legitimamente; revisto na única sede adequada - a aprovação de uma moção de censura ao Governo que invalide a confiança que a Câmara lhe concedeu em Janeiro.
Desconheço que algum grupo parlamentar tenha apresentado qualquer moção de censura, o que, nas circunstâncias especiais de estar de pé uma moção de confiança, não pode deixar de ser interpretado como, pelo menos, a não discordância fundamentada relativamente ao- Programa e ao modo como tem vindo a ser executado.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Cm contrapartida o que está em causa aqui e agora é novamente o exercício, de um direito de controle (parlamentar fundamental sobre a actuação do Governo. Trata-se não de pôr em causa e Programa, porque ninguém o fez quando o poderia ter feito, mas, sim, de aferir da coerência do Orçamento e do Plano relativamente ao Programa do Governo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Importa pois, e desde já, sublinhar para que fique perfeitamente claro que as oposições não têm neste debate o direito de contestar o Programa do Governo mas somente o de criticarem as propostas de lei em análise na exclusiva base da sua incompatibilidade eventual com aquele.

Vozes do PSD: - Muito bera!

O Orador: - Proceder de outro modo como tem sido patente, isto é, pretender retomar a discussão do Programa do Governo quando este não foi posto em causa por ninguém é perverter um debate, é manifestamente iludir ou pretender iludir os mais incautos, é abusar de direitos, democráticos fundamentais e é alterar radicalmente as regras do jogo democrático.

Aplausos do PSD e de alguns Deputados do CDS.

E se isso não nos surpreende de certa bancada da oposição que, coerentemente com a sua ideologia e os seus princípios nunca publicamente negados, está aqui para impedir o funcionamento adequado de instituições com as quais, positivamente, não pode mais do que ser forçado a conviver com manifesta dificuldade, já de outra bancada da oposição a surpresa é legítima ainda que, infelizmente e paradoxalmente, os factos nos obriguem a constatar que também para ela as instituições democráticas terão perdido muito do seu interesse e validade no meio de contradições ideológicas insanáveis ou, em alternativa, esteja a confirmar-se plenamente a ausência completa de um projecto coerente de sociedade e de orientação política que era possível constatar-se já na sinuosidade de uma prática governativa expressa directamente num Governo Provisório e nos dois Governos Constitucionais que se lhe sucederam, bem como noutros a que nunca foram capazes de negar a simpatia e até o apoio.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Quando é assim, a força e a coerência do grupo oposicionista mais coeso, mesmo que com menor expressão numérica, tende a prevalecer e a impor a sua linha de rumo. Nem mesmo as sensíveis diferenças de linguagem aqui patentes neste debate são suficientes, em análise mais profunda, para apagar uma identidade de processos e de objectivos, servida e simulada embora por uma repartição de tarefas de acordo com as competências técnicas e sobretudo com o maior ou menor descomprometimento partidário com Governos e políticas que estão suficientemente ainda na memória e no espírito de todos para poderem ser postos em causa frontalmente.

Vozes do PSD: - Muito bera!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O que está aqui em causa, por parte das oposições ou da oposição, é uma tentativa falhada do debate político do projecto da Aliança Democrática. O voto que iremos exprimir no seu final dar-nos-á seguramente a razão e os Portugueses a quem gostosamente nos voltaremos a submeter em breve dar-nos-ão a sua soberana confiança.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Pena é que aqui e agora com plena propriedade não, seja possível à televisão transmitir em tempo útil à totalidade deste debate.

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O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - É verdade!

O Orador: - Pela nossa parte- não o recearíamos, antes seria verdadeiramente e por certo o primeiro passo positivo de uma campanha eleitoral que se aproxima e onde nos apresentaremos pela afirmativa, com factos, com projectos, com objectivos e não meramente com palavras vãs de conteúdo e de objectivo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O País já se apercebeu - e as oposições manifestamente não o fizeram por miopia política, de que estão a pagar e continuarão a pagar o preço implacável do eleitorado - de que terminou a fase de destruição do nosso país e de que o plano inclinado em que Portugal vinha afundando-se se inverteu. Parafraseando um Primeiro-Ministro da oposição não chega ver a luz na extremidade do túnel, é indispensável caminhar para ela sem complexos nem tergiversações. É o que vem fazendo-se) há três meses e è hoje público que já não somos nós a vermos essa luz de intensidade crescente, é todo um povo que começa a ver a luz e a ver-se a si próprio na claridade aumentada do progresso económico e social e da esperança fundamentada em melhores dias.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É o 25 de Abril que se vai fazendo finalmente em alguns dos seus aspectos essenciais, mormente no desenvolvimento económico e social e na melhoria das condições de vida das classes mais desfavorecidas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não ó minha missão nem missão da maioria apoiante do Governo submeter-se a este atenta, veneradora e obrigada. O meu partido em caso nenhum aceitaria essa posição e os Deputados do PSD têm dado provas, e continuarão a dá-las, de que o Governo terá o nosso apoio enquanto cumprir as suas obrigações, designadamente enquanto cumprir com o seu Programa.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Já um companheiro de bancada aqui ontem afirmou que o PSD vai votar as presentes propostas de lei. Desejamos deixar perfeitamente claro que o fazemos porque reconhecemos nelas a expressão competente e adequada dos compromissos assumidos aquando da aprovação do seu Programa.

Vexes do PSD: - Muito bem!

O Orador - Também não é meu objectivo defender um Governo que logo no primeiro dia do debate provocou, pela serenidade, pela competência e pela coerência, a manifesta perda do sentido de uma presença democrática nesta Assembleia pela parte de Deputados a quem não se contesta a competência técnica mas a quem manifestamente faltaram os ovos para a omeleta de uma contestação sólida e
coerente sem sério risco de perder a cobertura da retaguarda temporal.

Aplausos do PSD e do CDS.

.. Não vou aqui, pois sequer comentar certos ataques das oposições, designadamente daqueles que, como atrás se assinalou, são inadequados e quiçá ilegítimos por serem um aproveitamento indevido de um debate para tentarem fazer outro. A maioria é quem manda nesta Assembleia, e talvez isto deva ser recordado cora esta acentuação uma vez ou outra.

Protestos do PS e do PCP.

O Sr. Raul Rego (PS): - Salazar não diria melhor!

O Orador: - A maioria é quem manda nesta Assembleia e talvez isto deva ser recordado com esta acentuação uma vez ou outra.
Por nós, queira ou não, a oposição não nos desviará do objecto deste debate para um outro debate que a mesma oposição pode perfeitamente suscitar e para o qual estamos naturalmente sempre disponíveis. Hoje, porém, não.
Entendemos a nossa missão, pelo contrário, não como uma atitude repetitiva de um Governo que já demonstrou à saciedade que pode e sabe defender-se, mas sobretudo porque importa acentuar a incoerência de certos actos da oposição, mormente daquela que mais recentemente teve responsabilidades mais longas e pessoais, na condução da política geral e da política económica e financeira em Portugal.
Não irei tornar-lhes muito tempo.
Dos documentos em apreço salientarei fundamentalmente os grandes objectivos da política económica: a melhoria do poder de compra dos Portugueses, acrescentarei, como demonstrarei, das classes mais desfavorecidas e o aumento da produção e da riqueza em termos sólidos, permitindo a absorção definitiva do desemprego.
Vejamos como as coisas mudaram de facto a partir destas propostas e relativamente a propostas correspondentes em Governos anteriores de representação directa ou indirecta das oposições parlamentar e extraparlamentares.
No que respeita à melhoria do poder de compra dos Portugueses cumpre recordar que, como é sabido, o poder de compra, mormente dos trabalhadores, se degradou significativamente desde 1976 e isso foi feito não por meras actuações menos responsáveis, mas porque, importa clarificá-lo, esse foi um objectivo claro dos primeiros Governos Constitucionais. Os Governos de então sabiam que a degradação do poder de compra se podia obter através da acção combinada de três mecanismos que utilizaram e que introduziram: pelo aumento de inflação servido por uma desvalorização inadequada do escudo em pretenso louvor do aumento da competitividade externa das nossas empresas, bem à moda da política salarial dos anos só em Portugal, ou seja, através de uma política de baixos salários; 6 óbvio que uma política restritiva e repressiva dos salários não só não era possível de manter-se muito tempo como representava uma autêntica fraude a prazo.

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Tratava-se de pretender tornar competitivo quem o não era à custa de uma redução completamente inadequada dos custos de mão-de-obra.
A segunda via era a redução dos salários reais que Se obteve à custa do estabelecimento de um conjunto coerente de mecanismos de repressão dos direitos sindicais fundamentais e cito-se, a título de exemplo, o tecto salarial imposto arbitrariamente, o qual abolido pelo V Governo relativamente ao sector privado, não foi nem será reposto por este Governo; o tecto salarial arbitrário e conjuntural para as empresas públicas estabelecido casuísticamente e à revelia de uma norma «previamente anunciada como acontece agora» com este Governo; a negação dó exercício à negociação colectiva na função pública e, peste caso, a manutenção dos sindicatos representativos dos funcionários públicos numa situação de mero consentimento legal o uso reiterado e indevido e, a nosso ver, verdadeiramente inconstitucional do mecanismo de requisição civil em casos em, que não estava em causa a segurança física de pessoas e bens; a criação do mecanismo de declaração, em situação económica difícil com o cortejo de consequências ameaçadoras dos postos de trabalho e que foi incontestavelmente um eficaz processo de intimidar os trabalhadores. Quanto aos trabalhadores aposentados e reformados, sem qualquer capacidade reivindicativa, o contínuo abandono a que foram votados e bem o exemplo de uma política cujos resultados estão à vista. A distribuição funcional do rendimento sofreu reveses sucessivos, situando-se a parte dos salários no rendimento nacional em 1979 em 48,2% no termo de mais um plano inclinado que citaremos: em 1974, 52,2%; em 1975, 63,4%; em 1976, 61,8%; em 1977, 54,5%; em 1978, 51,5%; e em 1979, 48,2%.
Era isto a defesa das classes trabalhadoras? Os trabalhadores que respondam. A nós basta-nos citar os números.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A terceira via na política de repressão do poder de compra foi a via dos impostos sobre os rendimentos pessoais e dos impostos indirectos, mormente do imposto de transacções, quer através do agravamento de taxas, quer através do mecanismo da introdução de novos bens na tributação ou da transferência de bens para escalões diferentes de tributação. Todos sabemos como os imposto» pessoais sobre o rendimento afectaram e afectam os trabalhadores. Recordarei que o responsável pela política económica e financeira dos primeiros Governos Constitucionais explicou uma vez em público o aumento das taxas do imposto profissional, porque. dizia, independentemente de considerações sociais, o que importa é aumentar as receitas do Estado e era ali que isso era mais fácil e eficaz, mormente quanto aos trabalhadores por conta de outrem.
Sem nos alargarmos demasiadamente é público e notório que a política deste Governo é exactamente a inversa. Ergueu-se finalmente o combate à inflação como mecanismo privilegiado de defesa do poder de compra e sobretudo acentuou-se que a inflação é sempre, e está demonstrado, o instrumento mais pernicioso de degradação dos mecanismos de distribuição do rendimento e do aprofundamento das desigualdades sociais. Será este o socialismo do PS?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É que, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o que se passa desde Janeiro é Reduzindo-se a inflação torna-se naturalmente muito mais simples a actuação dos sindicatos na sua corrida para a sua compensação pela negociação colectiva, o que constitui para estes um novo desafio. Cessaram ou pelo menos atenuaram-se os mecanismos que impedem a força negociai dos sindicatos de se revelar e produzir efeitos. Cessam as razões pelas quais certos sindicatos irresponsavelmente acusam outrem, mormente o Estado, da sua própria impotência e incapacidade. É altura de os trabalhadores, saudavelmente, saberem distinguir quem é capaz de os defender e quem é meramente capaz de os arrebanhar para manifestações colectivas, alimentando os seus bolsos e os seus familiares com slogans de ideologia revolucionária,

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Governo comprometeu-se a cumprir no sector público não só o princípio do não agravamento do poder de compra, mas a respeitar a norma salarial conhecida. Estamos seguros de que vai cumprir o que prometeu.
Finalmente, quanto ao segundo grande objectivo, o aumento da produção e da riqueza, permitindo a absorção definitiva do desemprego, também aqui, finalmente, se fala claro, e; deixa de se escamotear as realidades. É sabido que o nível do desemprego é extremamente elevado em Portugal, mas é menos sensível, por escapar às estatísticas, que sobretudo os níveis de desemprego oculto e de subemprego, se traduzidos em desemprego estatístico, acentuariam brutalmente as taxas conhecidas. Mas não tenhamos ilusões, o pleno emprego não se obtém aumentando o efectivo dos subempregados, como se tem feito sobretudo com dois exemplos bem conhecidos: o aumento de efectivos na f unção, pública e nas empresas públicas já claramente excedentárias em termos de mão-de-obra e a manutenção dos níveis de efectivos humanos no sector primário. No Alentejo não sei resolveu nenhum problema de desemprego, simplesmente, à custa de todo o País, e na linha da improdutividade e da ineficiência económica das eco-

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nomias colectivizadas do Leste, procurou-se, diga-se com algum sucesso, esconder o desemprego, transformando-o em subemprego.
Por outro lado, complexos ideológicos insuficientemente digeridos e assumidos mantiveram o investimento privado, fonte essencial do desenvolvimento económico, da riqueza e do emprego era níveis completamente desadequados. Poderes estranhos a esta Assembleia o manifestamente sem suporte- democrático (parecem, obstinar-se agora em negai aos empresários e investidores portugueses igualdade de. direitos para com investidores estrangeiros. E, mais do que isso pretendendo-se, do nosso ponto de vista, objectivamente, destruir prazo, o sector público da actividade produtiva.
Disse em tempos o secretário-geral do PS que as empresas públicas deviam viver numa sã concorrência com empresas privadas. E disse-o em momento raro de lucidez económica, infelizmente sem continuidade ou coerência. O sector público produtivo, só pode justificar-se por razões económicas ou socais, nunca por motivos, meramente ideológicos. Pretender mante-lo com esta mulata dei prestígio. As empresas públicas não estão feridas de um mal insanável só porque são. públicas. Necessário é que sejam dinâmicas e capazes. É isso que pretendemos fazer, é desse modo que pretendemos salvá-las, recuperando a sua rentabilidade social e o seu prestígio.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador. - Mas não seria razoável terminar esta minha intervenção sem uma referência ao que se passa no sector em que de uma forma mais profunda e sólida, se1 gera a riqueza nacional a prazo - o capital humano. Não me referirei às trevas de repressão e de contenção orçamental que foram os últimos anos no plano da educação. O Governo também aqui introduziu a mudança ei pela primeira vez em muitos anos a percentagem, das despesas públicas relativamente ao produto no sector dia educação sofreu um aumento significativo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: O Partido Social-Democrata honra-se de ser o principal partido da coligação que permitiu a existência deste Governo. O seu ideário social-democrata de defesa, dos princípios fundamentais do 25 de Abril, de defesa da democracia política e das transformações sociais que permitam o caminho para a democracia económica e social está em vias de execução, é altura de outros como nós reiterarem a sua coerência com os seus ideais e com os factos pelos quais foram, são e, serão responsáveis. Nós assumiremos plenamente a responsabilidade, por estas palavras, mas sobretudo petos actos que praticarmos.

Aplausos do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Marques.

O Sr. Sousa arques (PCP): - Sr. Deputado Rui Amaral, uma pergunta muito simples e muito clara sem qualquer comentário.
O Sr. Primeiro-Ministro anunciou na televisão um aumento salarial de 18%, acrescentando a este valor 5% de redução de impostos. As propostas de lei do Plano e do Orçamento que o Governo apresentou nesta Assembleia prevêem um aumento para os trabalhadores da função pública de 11%. Está o Sr Deputado Rui Amaral disposto a apoiar nesta Assembleia uma proposta que vise-o aumento salarial para os trabalhadores da função pública de 23%, como de facto o Sr. Primeiro-Ministro anunciou na televisão?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Rui Amaral, há ainda outro Sr. Deputado para lhe pedir esclarecimentos. Quer responder já ou no fim?

O Sr. Rui Amaral (PSD): - No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem então a palavra o Sr. Deputado Adalberto Ribeiro.

O Sr. Adalberto Ribeiro (PCP): - O Sr. Deputado afirmou! entre outras coisas, que o meu partido impede o funcionamento das instituições, que não consegue conviver, e quase nos proibiu de discutir o Programa do Governo, com base numa concepção de que esta Câmara assumiu tal Programa.
Ainda há três dias, numa intervenção que tive oportunidade de fazer sobre problemas da função pública, citei directamente uma sua intervenção nesta Câmara. E nessa intervenção dizia o Sr. Deputado: «Quer no capítulo sobre a reforma administrativa, quer no capítulo de rendimentos e preços, quer aio capítulo do trabalho, existem dados objectivos e compromissos claros que o Governo se propõe cumprir.»
Bom, uma das perguntas que desejava fazer-lhe já foi feita pelo meu camarada de bancada e eu perguntava-lhe agora se o Sr. Deputado, que teve especiais responsabilidades governativas nos Governos Provisórios, principalmente no que respeita à Administração Pública, onde lhe lembro que aí não parece haver dúvida nenhuma que o meu partido não teve responsabilidades nenhumas, ignora que este Governo se comprometeu a entregar aos trabalhadores da função pública até 12 de Março um projecto sobre os direitos sindicais e que não o fez, realmente, até hoje. Perguntava-lhe ainda se, em relação à negociação colectiva, ignora que o actual Secretário de Estado da Reforma Administrativa, dialogando com os sindicatos, voltou novamente a adoptar uma tese ia utilizada aqui por outro partido, e muito criticada pelo Sr. Deputado, segundo a qual na função pública não há lugar nem direito à negociação colectiva, mas haverá sim uma lei da participação.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Amaral para responder, se assim o desejar.

O Sr. Rui Amaral (PSD): - Com certeza, Sr. Presidente, responderei muito gostosamente às perguntas que me foram feitas.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Agradeça.

O Orador: - Agradeço, sim, porque é facto isso me vai dar oportunidade de revelar aqui umas coisas que não revelei e que talvez seja útil que o país conheça.

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Referiu-se aqui que o Sr. Primeiro-Ministro tinha falado num aumento salarial de 18%. Também assisti a essa intervenção pela televisão...

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Muito bem!

O Orador. - ...e, de facto, como ontem foi dito, salvo erro, pelo Sr. Ministro das Finanças, aquilo foi apontado a título meramente exemplificativo para demonstrar que, além dos salários e da redução de impostos, isso cobriria a massa salarial.

Protestos do PCP.

Vozes do PSD: - Tenham calma.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, tenham paciência, mas peco-lhes que prestem a atenção devida.

O Orador: - Portanto, que eu saiba, a norma salarial, como tive oportunidade de dizer da tribuna, sendo naturalmente mais que imperativa para o sector público produtivo e administrativo e meramente indicativa pára o sector privado, é de 20%. Essa é norma coincidente, digamos, com a previsão de inflação que o Governo mantém para este ano.
Relativamente à questão de saber se os trabalhadores da função pública deveriam ter ou não um aumento de 23%, gostaria de recordar que os sindicatos subscritores da chamada proposta reivindicativa comum, onde pontua a chamada CGTP - Intersindical, não pediram sequer um aumento de 23%; pediram uma média, salvo erro, de 20%, que é menos de 23%. Penso que nenhum Governo do mundo, nenhuma oposição negociai a um sindicato vai normalmente oferecer mais do que aquilo que os sindicatos pedem; os sindicatos só pediram 20% e, portanto, isso está contido dentro da norma salarial.
Gostaria, já agora, de recordar, que em 1975, quando eu era Secretário de Estado da Administração Publica e em negociações conduzidas por mim com sindicatos já então ligados à Intersindical, os trabalhadores não tiveram maiores aumentos. porque pela primeira vez, possivelmente, na história da negociação colectiva em todo o Mundo, o Governo de então, por meu intermédio, ofereceu fundamentadamente aumentos maiores do que aqueles que os sindicatos aceitavam. E era de tal modo o controle que esses sindicatos já nessa altura exerciam sobre o Governo que de facto o que os funcionários públicos receberam foi a proposta dos sindicatos, abaixo nitidamente da proposta do Governo.

Risos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Viva o Gonçalves! Relativamente às perguntas do Sr. Deputado Adalberto Ribeiro...

O Sr. Sousa Marques (PCP): - Foi no tempo do gonçalvismo!...

O Orador - Com certeza que foi. Foi exactamente no tempo do gonçalvismo.
Mas quanto ao segundo grupo de questões, gostaria ainda de recordar um facto que me parece extremamente interessante. Agora agradeço de facto ao Partido Comunista a oportunidade que me dá quando o Sr. Deputado Adalberto Ribeiro fala num projecto de direitos sindicais, e que é o de que a Lei Sindical hoje em dia em vigor não se aplica aos trabalhadores da função pública, porque na minha presença isso foi impedido pela CGTP - Intersindical com o argumento de que anos não controlamos ainda os sindicatos da função pública».

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

Vozes do PCP: - É falso!

O Orador: - Existem provas testemunhais disto e se for necessário serão presentes e citarei, se quiserem, o nome das pessoas que participaram nessa reunião em que estive presente.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Então apresente essas provas!

O Orador: - Portanto, os trabalhadores da função pública não têm direitos sindicais desde 1975, porque a Intersindical impediu que esses direitos lhe fossem reconhecidos.

Vozes do PCP: - É falso!

O Orador: - É verdade e posso apresentar testemunhas que participaram nessa reunião onde eu também estive.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

Nenhuma das pessoas aqui presentes esteve nessa reunião, mas eu estive e não era uma reunião secreta.

Vozes do PSD: - Já não se lembram?!...

O Orador: - E a respeito de negociação colectiva gostava de lembrar, pois talvez os Srs. Deputados não se recordem, já que deu entrada no final da sessão de ontem na Mesa, que o Governo apresentou à Assembleia da República uma proposta de lei da ratificação da Convenção n.º 151 da OIT. Para os que eventualmente não conhecerem essa proposta de lei, penso que está aí a resposta, definitiva do Governo, o compromisso público definitivo do Governo de respeitar es direitos sindicais, mormente o direito à negociação colectiva na função pública que foi durante algum tempo abertamente não desejado pelos sindicatos da Intersindical.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, não tenho dúvidas nenhumas, em face desta posição pública que o Governo toma perante esta Assembleia, em afirmar que é este Governo, contrariamente ao que aconteceu, por exemplo, com o último Governo do Partido Socialista, que obrigou na Conferência da OIT a delegação governamental a abster-se quando foi votada esta Convenção, o tal Governo reaccionário, o tal Governo contra os trabalhadores...

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: -..., que vai de facto propor a esta Câmara a ratificação da Convenção n.º 151 da OIT.

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Se outras perguntas eventualmente forem levantadas, gostaria de responder, porque há mais coisas para dizer.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Adalberto Ribeiro.

O Sr. Adalberto Ribeiro (PCP): - Sr. Presidente, é para um protesto.
Já hoje aqui nesta Câmara se apresentou uma proposta, em relação ao Ministro da Defesa, de um inquérito à sua actuação. Agora é contra um ex-Secretário de Estado que tenho de protestar e de levantar a voz pelas falsidades que aqui disse. Falsidades, mais uma vez, incompetência que continua a revelar e que revelou quando foi membro do Governo.
Assim, a proposta reivindicativa comum dos trabalhadores da função pública, subscrita por vinte e três associações sindicais, onde há certamente algumas que não estão de acordo com a linha da Intersindical, como o Sr.. Deputado, ex-Secretário de Estado e ex-sindicalista, não ignora, propõe um aumento de 21,4% só na (tabela salarial, contendo ainda outras reivindicações, como o aumento das diuturnidades, os subsídios de refeição actualizados, etc., que no seu conjunto somam efectivamente mais.
Quanto à proposta maior em 1975, é de rir. Disse o Sr. Deputado, na altura Secretário de Estado, que foi graças à acção dos sindicatos que os trabalhadores obtiveram menos, pois o Secretário de Estado dava mais. Bom, revelou aqui um ponto que considero ser falso e vou também recordai outras coisas.
Também posso aqui relembrar reuniões que os representantes dos trabalhadores tiveram consigo, em que a imagem que ficou de si, e posso prová-lo com testemunhas, foi a de afirmar aos trabalhadores que caso as suas posições não vingassem em Conselho de Ministros se demitiria- e vinha no dia seguinte defender as posições que - não eram as suas, ignorando as suas promessas. E assim se foi deixando ficar, nessa autora ainda independente, até que deixou de ser membro do Governo.
Queria ainda referir-me à questão da negociação colectiva na função pública e que revela da sua parte grande demagogia ou incompetência. A ratificação da Convenção n.º 151 da OIT, cuja proposta de lei deu ontem entrada nesta Assembleia, é unia reivindicação fundamental dos sindicatos subscritores da proposta reivindicativa comum. Ora, essa Convenção permite varras formas de participação dos trabalhadores na sua condição de emprego, indo desde a forma da mera participação a uma forma efectivamente de negociação. Ou seja, permite aquilo que o Sr. Deputado Rui Amaral defendia em Março deste ano: «...não há negociação sem que as posições de ambas as partes sejam maleáveis, isto é, sem que qualquer das partes se disponha a ceder em busca atenta e interessada da zona de acordo possível». A referida Convenção permite isto, mas também uma mera participação, e o que o actual Secretário de Estado da Reforma Administrativa afirmou às organizações de trabalhadores era que exactamente a negociação colectiva seria entendida como uma mera participação e sem qualquer conteúdo negociai na função, pública.

Aplausos do PCP,

Uma voz do JP3: - Ele está lá em cima e diz que sim.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Amaral.

O Sr. Rui Amaral (PSD): - Sr. Presidente, queria fazer um contraprotesto para rectificar algumas das afirmações do Sr. Deputado Adalberto Ribeiro.
O Sr. Deputado tem o direito de interpretar a Convenção n.º 151 da OIT como entender e nós vamos ter oportunidade de debater o problema dentro de breves dias e «essa altura penso que será a sede adequada para o fazermos.
Quanto à minha imagem como Secretário de Estado da Administração Pública, gostada de lembrar ao Sr. Deputado, dirigente, sindical de um sindicato ligado à Intersindical, que outros sindicatos nessa altura já negociavam com o Secretário de Estado da Administração Pública e penso que os trabalhadores deste país têm um sentido critico apurado. O Sr. Deputado disse que eu era. um ex-sindicalista. Infelizmente ainda não sou, pois há pouco tempo fui reeleito por 66% dos votos expressos no major sindicato da função pública que existe neste país e a lista do PCP levou o remanescente dos 66% para os 100%. Isto não é falso, é verdade. E, como digo, isto foi a reeleição, porque a eleição foi logo em 1977, quando saí de Secretário de Estado. É notável como os trabalhadores, sabendo que era eu que estava a fazer isso que referiu...

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Não sabiam, Sr. Deputado. Não tenha ilusões.

O Sr. José Cardoso (PSD): - Considera os trabalhadores assim tão ignorantes?!

O Orador: - Há pouco o seu colega de bancada falava em aumentos de 23%, agora o Sr. Deputado fala em 21,4%. Sinceramente, não sei em que ficamos.

Vozes do PCP: - O Sr. Deputado fica nos 11%.

O Orador: - O que lhe digo é que - e está aqui o Governo para; falar por si, não estou aqui para falar pelo Governo-, como disse. há bocado, me limito a observar aquilo que se passa e, de facto, peço meças a muitos dos Deputados do Partido Comunista que aqui estão que nunca se sujeitaram livremente ao sufrágio sindical como eu me sujeitei.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças e do Plano.

O Sr. Ministro das Finanças e do Plano (Cavaco Silva): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria apenas acrescentar um complemento relativamente a um ponto que aqui tem sido mencionado várias vezes, que é o dos aumentos da função pública.

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O Governo tem vindo a dialogar com os representantes dos trabalhadores da função pública e, quanto eu sei, até este momento não se chegou a qualquer acordo. Por isso não tem qualquer sentido falar em verbas totais ou em percentagens de aumento; no entanto, foi referida aqui várias vezes uma percentagem de 11%. Quando muito, o que posso dizer é que no seio do Governo nunca essa percentagem foi mencionada nem nunca ouvi mencionar uma percentagem que fosse inferior àquela que foi atribuída o ano passado, que foi de 14,5 %. Sempre ouvi falar no seio do Governo em percentagens superiores aquela que foi atribuída o- ano passado, quando a inflação era 25 %. Logo, não consigo encontrar qualquer fundamento para números ou percentagens que aqui têm sido referidas. Por isso o que posso dizer é que o Governo, tal como fez até aqui; vai continuar a dialogar com os representantes dos trabalhadores da função pública.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Adalberto Ribeiro (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para solicitar um esclarecimento ao Sr. Ministro das Finanças e do Plano.

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Adalberto Ribeiro (PCP): - Sr. Ministro, é sabido pelo decreto de vencimentos do ano passado que a massa salarial afecta à tabela foi de 6 115 000 contos e neste ano a proposta do Governo é de 6 280 000 contos relativa a salários que o ano passado foram aumentados 15%. Portanto, se o aumento do ano passado foi de 15%, pergunto como é que é possível que o aumento este ano possa ser também de 15% quando a massa salarial é a mesma sobre salários mais altos.
A segunda pergunta, que também me parece muito importante, é a seguinte: é que ontem o meu partido teve oportunidade de fazer um requerimento ao Governo pedindo para esclarecer quanto da provisão dos 10 milhões de contos referidos na p. 24 da proposta de lei do OGE para o ano corrente pensa destinar às despesas resultantes ida melhoria das remunerações a atribuir aos funcionários do Estado. A resposta que me foi dada pela Secretaria de Estado da Reforma Administrativa diz: «Os elementos solicitados serão definitivamente acertados aquando da discussão do próprio Orçamento, na sequência, aliás, de decisão tomada em Conselho de Ministros.» E o mesmo disse ontem o Presidente do Grupo Parlamentar do CDS quando interpelou o Governo sobre este assunto, afirmando que o Governo referiu que a massa salarial a atribuir à função pública seria definida, naturalmente, no OGE. O que queremos saber é qual é concretamente, a massa salarial que o Governo pensa destinar este ano ao aumento de remunerações na função pública.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças e do Plano.

O Sr. Ministro das Finanças e do Plano (Cavaco Silva): - O Sr. Deputado pediu-me um esclarecimento e eu vou dar-lhe um esclarecimento.
E o primeiro esclarecimento que tenho que lhe dar é informá-lo como é que são pagos os vencimentos do pessoal da função pública. Penso que é ai que está a falta de esclarecimento.
Existem em cada serviço verbas para pessoal que, quando ocorre qualquer ajustamento, são reforçadas de acordo com as necessidades. Pode até acontecer, e já tem acontecido em anos anteriores, que não precise de ocorrer qualquer reforço na verba de pessoal de um certo serviço para poder contemplar aumentos que corram em qualquer momento do ano. E isso porquê? Porque frequentemente e normalmente os serviços fazem previsões para pagamento de despesas com o pessoal na base dos seus quadros completos. Logo, há uma pergunta que não tem qualquer lógica -ainda por cima esclareci há pouco que não há qualquer verba determinada -, que é saber na dotação provisional o que é para A ou o que é para B. Não, ia dotação provisional, de acordo com a lei do enquadramento do Orçamento, destina-se a fazer face: a insuficiências que, venham a manifestar-se durante o ano em determinadas verbas. Logo, não se diz que dos 10 milhões de contos é isto para aqui ou para ali. O Governo não estabelece isso, nem podia estabelecer. De acordo com as insuficiências que se manifestem nas diferentes rubricas, assim será contemplado.
É este o esclarecimento que o Sr. Deputado pediu. É este o esclarecimento que dou, que é a explicação de como. se faz o reforço das verbas destinadas a pagamento do pessoal.
Portanto, ainda .por cima, no momento em que, como eu disse e é de facto, não há uma decisão, porque se vai continuar a dialogar, não era possível dizer, naquela verba, quanto é para isto ou é para aquilo. Será até para outras coisas, de acordo com o que diz a lei do enquadramento do Orçamento.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Não era preciso ser ministro para dar esse esclarecimento,

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Campos.

O Sr. António Campos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A actual maioria fez toda a campanha eleitoral e apresentou o seu programa de governo informando os Portugueses de que o sector agrário era prioritário.
Pela prática política seguida e pelo Orçamento apresentado, sabemos que a prioridade dada pela AD é somente o regresso ao passado para os agricultores, embora utilizando outra linguagem e fazendo demagogia que choca o mais; ingénuo dos cidadãos.
Com uma política de preços que a curto prazo atirará para a falência centenas d& milhares de agricultores.
Com uma política de, estruturação fundiária de dar a terra a quem sempre a teve, fazendo dezenas de milhares de desempregados.
Com uma política global de desincentivação do aproveitamento das potencialidades produtivas existentes, através de uma política de subsídios às importações.
Com um orçamento inferior em 10% ao do ano anterior, mas que em termos reais representa uma diminuição de 35%, ainda com a agravante de cerca

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de 10% ficarem retidos nos gabinetes do Ministro e dos Secretários de Estado.
Com um Ministério revanchista, que saneia os técnicos, por mais competentes que sejam, só porque não estão com eles.

O Sr. Lacerda de Queirós (PSD): - Parece que está a falar de si próprio.

O Orador: - Enfim, com uma tacanhez de espirito própria do uma mentalidade medieval, a agricultura recua séculos no tempo.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - É falso!

O Orador: - É a defesa dos interesses de meia dúzia por uma classe política sectária, desumana, que, embora com outra linguagem, executa uma velha política que deixou profundas e dramáticas recordações aos agricultores.
A maioria AD nesta Câmara só desmente, adjectiva, mas foge a discussão pública das afirmações, não se atrevendo a desmenti-las com factos concretos.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - É falso!

O Orador: - De 1977 a 1979 os agricultores viram os preços dos seus produtos acrescidos em média 30%. O seu nível de vida melhorou em termos reais.
Hoje, quando dizemos que centenas de milhares de agricultores vão ser atirados para a miséria através de uma política de preços ruinosa, não é uma afirmação demagógica, é a prática política do Governo AD.
Basta comparar o índice inflacionário com a evolução dos preços dos principais produtos produzidos pelos agricultores para tornar indesmentível tal afirmação.
Se não vejamos: Leite - de 1977 a 1979, inclusive, o aumento do preço médio/ano aos agricultores foi de 20%. Com o Governo AD os agricultores já foram avisados de que não receberiam mais um tostão, a não ser em Setembro, para ver se lhe caçam os votos.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - É falso!

O Orador: - É falso, pergunte ao membro do Governo responsável que está presente.
Apesar disso, o Governo subiu o leite ao consumidor em 10 % e o queijo, seu derivado, em 20%.
Vinho - a média de subida de preço anual de 1977 a 1979 foi de 17%. Com o Governo AD o preço baixou 45%. O consumidor, esse, continua a pagá-lo pelo mesmo preço.

Vozes do CDS: - É falso!

O Orador: - Azeite-de 1977 a 1979 a média anual de subida foi de 20% ao ano. Com o Governo AD os agricultores viram o seu produto valorizado em 5%, mas os grandes intermediários conseguiram deste Governo, seu- fiel servidor, um aumento na margem comercial de 12 %.

O Sr. Lacerda de Queirós (PSD): - Lá vem ele com as calúnias!

O Orador: - Trigo - a média anual de valorização de 1977 a 1979 foi de 28%. A AD valorizou-o em mais 11 %....

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: -... mas são fictícios, na medida em que aumentou as imposições de qualidade mínima para a sua entrega. No entanto, subiu o pão em cerca de 20%.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Não aprendeu nada.

O Orador: - O preço do milho foi em 1977 e 1978 igual ao do trigo não Lhe sendo atribuído o subsídio em 1979. O Governo AD fixou, o sou preço 1$ abaixo do do trigo.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Parece que está num supermercado!

O Orador: - Todos os técnicos sabem que os custos da cultura do milho não são inferiores aos do trigo, pelo contrário.
O gado bovino « suíno baixou, mas o consumidor em nada beneficiou.

O Sr. Lacerda de Queirós (PSD): - E centeio, não há?!

O Orador: - A ervilha ficou pelo aumento de 6%. A batota aguardamos interessadamente a fixação do preço pelo Governo para a nova campanha. Enfim, a falsa contenção da inflação é debitada aos agricultores, os grandes intermediários e grandes senhores, esses, são creditados a duplicar, o, que retiram aos agricultores e o que o Governo lhes dá. Este, é um Governo que, a continuar, lançará a fome e a miséria pelos campos de Portugal.

Aplausos do PS e do PCP e protestos do PSD, do CDS e do PPM.

Os agricultores sabem que o fascismo fez deles a grande reserva de mão-de-obra barata e o grande sustentáculo de uma política de salários baixos.
Hoje, em nada difere a actual política de preços daquela que obrigou à fuga centenas e centenas de milhares de agricultores para não morrerem de fome,
O comportamento deste Governo para com os agricultores é criminoso e, só a título de exemplo, se os preços de cinco produtos - vinho, leite, azeite, trigo e milho- estivessem indexados à inflação, os agricultores teriam de rendimento mais 32 milhões de contos.
A política deste Governo, só nestes cinco produtos, retirou 32 milhões de contos dos bolsos dos agricultores e ainda por cima tem o despudor de se apresentar com um ar protector do sector e das classes mais desfavorecidas. Dá-lhes 5, mas antes tira-lhes 50.

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Os agricultores e trabalhadores pagam caro toda u demagogia económica deste. Governo, que a continuar por muito tempo...

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Há-de continuar!

O Orador: - ... poderá diminuir a inflação, mas atira de certeza para o desespero centenas de milhares dei agricultores.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - É só demagogia!

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Olhe que não, Sr. Deputado!

O Orador: - Sr. Deputado, agradecia-lhe que contestasse com números, como eu estou a fazer, e que ponha a claro a política do seu Governo. É difícil de engolirem, mas esta é a política do vosso Governo.

Aplausos do PS.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Alentejo é um palco diário de desrespeito pela lei, de protecção aos compadres, de prepotência e de corrupção imposta por membros deste Governo. A afirmação do Governo da dar a terra a quem sempre a teve está a ser cumprida. A demagogia aqui é rainha.

Vozes do PSD e do CDS: - Cale-se!

O Orador: - Ainda há dias assistimos ao Primeiro-Ministro, no distrito de Beja, na Herdado dos Machados, a distribuir terras a 94 trabalhadores rurais.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

É bom que aplaudam também o que vou dizer a seguir.
Mas o que e Primeiro-Ministro não informou o Pais, e a imprensa escondeu, é que a distribuição de terras aos 94 trabalhadores custou o desemprego para 250.

Aplausos do PS, PCP e do MDP/CDE.

Vozes do PSD e do CDS? - É falso!

O Orador: - Estes 250 trabalhadores foram despedidos da Herdade dos Machados para arranjar espaço para esta política demagógica e eleitoralista desta Governo. Foram 250 que foram para a rua.

Aplausos do PS, PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - É falso!

O Orador: - Este Governo e este Primeiro-Ministro optam por meros actos de propaganda eleitoral, mesmo que esses actos custem a subsistência de 250 famílias.
Para este Governo, que amordaça a informação, governar não é o seu objectivo, o eleitoralismo é a sua actividade diária, indiferente, às consequências para o povo português.

O Sr. Lacerda de (Queirós (PSD): - Não apoiado!

O Orador: - A desincentivação da produção a custa do abandono dos recursos naturais por impossibilidade de concorrência com os subsídios às importações é um crime que, viola os mais elementares princípios da independência nacional.
Subsidiar os alimentos compostos em 7 milhões de contos, quase na totalidade importados, sem que se subsidiem as pastagens e forragens é fomentar a produção de leite e de ruminantes (bovinos e ovinos) à custa do aumento de consumo das rações, que agravam o déficit da balança de pagamentos em dezenas de milhões de contos.
Ao milhão e meio de hectares, hoje subaproveitados, vão juntar-se com certeza muitos mais.
O esforço feito pelo Partido Socialista com o objectivo de aumentar o aproveitamento das potencialidades existentes através do fomento de pastagens e forragens « que culminou com um decréscimo de consumo de concentrados de 8% ,em 1978, apesar de a produção de leite e de carne de ruminantes ter aumentado, está a ser destruído por uma política que ninguém conscientemente poderá deixar de acusar de ser contra os mais elementares interesses nacionais. O déficit da balança de pagamentos, que tanto custou a equilibrar, volta a subir em flecha, já ultrapassando os 500 milhões de dólares.
Com um orçamento diminuído em 10%, paralisa-se assim um Ministério que tem uma grande tarefa à sua frente, se quiser minimizar os efeitos sociais no sector com a integração na Europa. Orçamento esse ainda por cima colocado em grande parte nos gabinetes para poderem cacicar, desgovernar e proteger os amigos.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Fala a vossa experiência!

O Orador: - Um orçamento que tem quase o valor dos subsídios dados às rações; que faz desaparecer verbas de organismos ainda existentes, como a Direcção-Geral de Fomento Florestal; que diminuiu o orçamento à coluna dorsal de todo o Ministério da Agricultura, que é a Extensão Rural.
Um Ministério incompetente que faz do revanchismo e do ódio político a sua principal actividade.
Saneamentos como o do engenheiro Dias Nogueira, director-geral da Extensão Rural...

O Sr. Lacerda de Queirós (PSD): - E seu amigo!

O Orador: -.... o mais competente existente em Portugal, o Dr. Pais de Sousa e o Dr. Silva Pereira, aqueles que conseguiram transformar a JEPAC, o Dr. Vicente e o Dr. Beato, directores regionais do Centro e da Beira Interior, o engenheiro Dinis Monteiro, director-geral do Fomento Florestal, etc...

O Sr. Lacerda de Queirós (PSD): - Todos compadres!

O Orador: - .... mostram o desrespeito total pelas competências.
Aqui a lei vigente é de que quem não é por nós tem de ser abatido de imediato.

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Aos agricultores aumentam-lhes de preço tudo o que consomem, só lhes não aumentam o que produzem. Não cumprem as leis e até o abono de família legislado pelo Governo anterior lhes continua a ser negado. A prioridade anunciada, está à vista, este é o orçamento da tão apregoada mudança na agricultura.
Os agricultores saberão no momento próprio julgar a incompetência, o revanchismo e a miséria para que os querem atirar.

Aplausos do PS, do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro de Figueiredo.

O Sr. Álvaro de Figueiredo (PSD): - Sr. Presidente, pedi a palavra para fazer um protesto. Protesto porque o Sr. Deputado António Campos tem tido para com o Governo uma atitude permanente de desgastei e de descrédito...

Vozes do PS: - E muito bem!

O Orador. - ... por via de uma critica que, quanto a nós, tem na maioria dos casos um elevado teor de inconsistência, irrealismo e demagogia.

Vozes do PSD, do CDS e do PPM: - Muito bem!

O Orador: - Na verdade, afirmam-se com bases que se julgam seguras coisas que se não provam e ao fazê-lo conta-se, certamente, que através da repetição monocórdica algo fique, mesmo que inverosímil, no fim de tudo.
Para além disso, esquece-se sistematicamente muito do que de positivo se tem feito...

Vozes do PS - Oh!

O Orador: - ... - e sobretudo do que tem sido feito num ambiente interno e externo perfeitamente desfavorável.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Governo é acusado por não fazer e, se fizer, pelo que fez, ficando assim na posição de ter culpa por ter o cão e por não o ter. É este o típico das críticas injustas e injustificadas que nesta Casa se ouvem repetidamente até à saciedade. Tenho a certeza de que o Governo, sem se impressionar, vai, hoje como ontem e amanhã como hoje, fazendo a sua política, que é aquela que o interesse nacional exige e a sua formação reclama.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Tem u palavra o Sr. Deputado José Manuel Casqueiro.

O Sr. José Manuel Casqueiro (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados...

O Sr. Vital Moreira (PCP): - O controleiro do Ministro!

O Orador: - ... era minha intenção não voltar a interpelar ou responder ao Sr. Deputado António Campos enquanto ele não justificasse perante esta Câmara as razões por que tinha faltado à verdade quando da interpelação ao Governo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Nessa altura, o Sr. Deputado António Campos faltou à verdade, como pude comprová-lo, nessa altura tornou menos digna esta Câmara.

Protestos do PS.

Hoje reincide na sua ofensiva contra o Governo. E hoje quis fazê-lo a coberto de números, fazendo uma habilidade curiosa, dando uma imagem de 1977 e 1979, alturas em que, quanto eu saiba, o Partido Socialista não estava no Governo, nem tinha qualquer responsabilidade com esses Governos.

O Sr. Raul Rego (PS): - Essa é boa!

O Orador: - Mas penso que e necessário falar dos números, exactamente para referir alguns factos que julgo importantes.
O aumento das rações foi, durante os Governos socialistas, em média, de mais de 60%, com o Governo da Aliança Democrática não houve qualquer aumento das rações.

Aplausos do CDS.

A Sr.ª lida de Figueiredo (PCP): - Houve aumento na falsificação das rações!

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Escrevam, vão aprendendo!

O Orador: - Os combustíveis para a agricultura aumentaram, durante os Governos socialistas, exactamente 25 %, os combustíveis para a agricultura com o Governo da Aliança Democrática não irão ter qualquer aumento.

Protestos do PS e do PCP.

O Sr. António Campos (PS): - É só promessas, não se vê nada.

O Orador: - Os fungicidas aumentaram durante os Governos socialistas em mais de 38%, com o Governo da Aliança Democrática não vai haver qualquer aumento.

O Sr. António Lacerda (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Quanto ao problema dos preços dos produtos agrícolas, registo com agrado que o Sr. Deputado António Campos, mais uma vez, precisou de faltar à verdade e refiro claramente porquê: é que os preços, por exemplo, do trigo aumentaram durante os Governos socialistas 25% e este ano 42,5%. O preço da tabela do trigo era de 8$80 e passou para 12$54.

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O Sr. Vital Moreira (PCP): - Era 10$, que aldrabice!

O Sr. António Campos (PS): - 11$!

O Orador: - Eu explico, porque parece que em questões agrárias os Srs. Deputados não sabem trabalhar com os números.
Risos gerais.

Os Srs. Deputados confundem o preço de tabela de um produto com um subsídio que foi concedido pelos Governos, dadas as, condições climatéricas e a baixa produção de trigo em Portugal.

O Sr. António Campos (PS): - Quanto é que os agricultores recebiam?

O Orador: - É por essa razão que foi instituído um subsídio de trigo de 2$20 por quilograma,

O Sr. António Campos (PS): - O que dá 11$!

O Orador: - Eu explico-lhe, para que o Sr. Deputado fique a perceber. É preferível para o agricultor receber o preço de 12$54 com uma produção de 1300 quilos do que receber 11$ com uma produção de 600 quilos, que foi a produção de 1978 e de 1979:

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Essa é digna do Casqueiro!

Risos do PCP

O Orador: - Claro que os especialistas em economia do Partido Socialista sabem que o preço do trigo em Portugal é fixado tomando por base, o preço das contas de cultura, dividindo-o depois por 1300 quilos, que é a quantidade que se calcula como média desejável por hectare de trigo para o nosso país.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - E por hectómetro?

Risos do PCP.

O Orador: - Mas falando nos outros produtos, concretamente do caso do milho, este teve durante os Governos socialistas um aumento de 25% no, Governo da Aliança Democrática teve um aumento de 28,4%.

Risos do PCP.

Como se demonstra, o Governo da Aliança Democrática não é um Governo contra os agricultores. Pelo contrário, apoia-os e é por uma perspectiva de desenvolvimento para a agricultura portuguesa..

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Sr. Vital Moreira (PCP): - De almoços percebe!

Uma voz do PCP: - E o preço do tomate?

O Orador: - Mas como falaram do problema do leite e o fizeram de uma forma mais do que demagógica, perfeitamente, desonesta, dando a esta Câmara uma imagem que não é correcta, gostaria de esclarecer.
Há neste momento em Portugal uma produção de leite que é excedentária durante um determinado período do ano, de Abril a Setembro, o que obrigou o Governo a adoptar para este ano uma nova política do preço do leite. O resultado está à vista.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Ai está, está!

O Orador: - Durante o mês de Fevereiro de 1979 o consumo de leite foi de 29 milhões de litros, durante o mês de; Fevereiro de 1980, mercê da política que vem seguindo-se de apoio às cooperativas e ao fomento do consumo de leito em Portugal, aumentou-se o consumo para 39 milhões d& litros, ou seja mais 10 milhões de litros.

Vozes do PS e do PCP: - Que exagero!

O Orador: - O excesso de leite em Portugal dá origem ao seguinte facto: em 1979 tiveram de se gastar mais de 100000 contos para transformar o leite em natureza, que havia em excesso, em leite em pó. A política do Governo visa exactamente aumentar o consumo de leite no nosso país e diminuir os custos da transformação para leite em pó.
Devo ainda esclarecer os Srs. Deputados que o consumo de leite em Portugal é de 52 quilos por habitante, enquanto nos países desenvolvidos da Europa se Situa acima dos 100 quilos de leite por habitante. Esta é uma política que, defendemos, apoiamos e queremos prosseguir.

O Sr. Manuel da Costa (PS): - Então não há leite a mais.

O Orador: - Referiu o Sr. Deputado António Campos que o Governo contribuía para diminuir o nível de vida e para tornar mais pobres os agricultores portugueses. No entanto, e em relação à população rural do nosso país, os dados de 1973 são os seguintes: o produto agrícola bruto era em 1973 de 18300000 contos, tendo, mercê da política seguida pelos Governos comunistas e- socialistas, em 1978, para 14 milhões de contos.

Risos do PCP.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - O CDS estava no Governo, era o acordo PS/CDS!

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - E os acordos secretos PS/PCP?

O Orador: - Dado que houve...

Uma voz do PCP: - São efeitos do almoço de Braga.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peco-lhes o favor de ouvir em silêncio.

O Orador: -- Sr. Presidente, compreendo que a aposição esteja nervosa, porque não gosta de ouvir a verdade.

Risos do PS e do PCP.

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Dizia eu que o nível da população rural baixou, porque o produto agrícola diminuiu de 18300000 contos em 1973 para 14 milhões em 1978 e, como a população activa na agricultura aumentou e é de cerca de 1 158 000, isto origina que o quinhão de cada agricultor passou de 23,15 cantos para 19,75 em 1978.
Como se prova, não é o nosso Governo que fez diminuir o rendimento da população rural, mas sim os Governos que nos antecederam, que não geriram o País e levaram os agricultores para á situação que estamos a herdar.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O déficit da balança comercial agrícola era em 1970 de 500 000 contos e passou em 1979 para mais de 23 milhões de contos. Este aumento do déficit é um bom exemplo do que foram. os Governos que nos antecederam e que aqui vêm, com certeza, fazer a sua autocrítica.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Quanto ao problema da distribuição de terras e à afirmação feita, devo registar com agrado que o Governo tomou algumas medidas - e estamos ainda no início - que com certeza fazem inveja ao Partido Socialista ...

O Sr. António Lacerda (PSD): - Muito bem!

O Orador: - ...que em 1977, na Figueira da Foz, pela voz do seu então Secretário de Estado António Campos, afirmava que se opunha à distribuição de terras no sul porque isso era contribuir para o minifúndio no Alentejo. Quer dizer, o Partido Socialista dava como alternativa, à semelhança do Partido Comunista que este tanto aplaude, a escolha entre serem proletário?, rurais por conta dos agricultores privados ou por conta dos latifundiários das UCPs.

Vozes do PSD e do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Foram precisos seis anos sobre o 25 de Abril para que finalmente se fizesse um acto que não posso deixar de referir aqui nesta Câmara pela importância que tem - trata-se da entrega a título definitivo aos agricultores de Pegões, aos velhos colonos de Pegões, da terra que Vinham cultivando há longos anos. Portanto, posso dizer perfeitamente à vontade que foram precisos seis anos sobre o 25 de Abril para se fazer a descolonização de Pegões.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

Quanto à velha e estafada questão da distribuição de terras, assumimos clara responsabilidade de. apoiar o Governo na distribuição de terras, que está e vai continuar a fazer. Mais de um milhar de novos agricultores irão ter acesso à posse, agora a título provisório, mas mais tarde a título definitivo, porque ganhamos as próximas eleições e vamos alterar a Constituição de forma a poder dar a título definitivo a terra que agora demos em uso a título provisório.

Vozes do PSD e do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Contudo, não posso deixar de referir, nesta altura, algo que com certeza provoca tanto ódio e tanta frustração por parte do ex-Secretário de Estado António Campos, possivelmente pelo facto de ver um Governo fazer em quatro meses, aquilo que durante dois anos e meio os diversos Governos socialistas1 não foram capazes de realizar, apesar do esforço que tinham alguns dos elementos que nessa altura passaram pelo Governo e que tão boicotados foram, como é o caso que aqui quero registar do ex-Ministro da Agricultura António Barreto.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

Isto para dizer que o Governo, em nosso entender, tomou uma medida bem mais importante Jo que a distribuição de tenras individualmente, por forma a criar uma nova geração de agricultores. Refiro-me, pois, concretamente à possibilidade da compra da terra por parte dos rendeiros aos senhorios, por forma a dar o acesso aos rendeiros com um juro de 4,5% a 4,7%, com pagamento a vinte anos, o que representa a medida social mais importante tomada na agricultura portuguesa depois do 25 de Abril

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

Pode a oposição estar certa que o Governo terá o apoio da maioria parlamentar que o apoia para continuai a governar calmamente, com segurança, com tranquilidade, o que levará a que em Outubro próximo os Portugueses se apercebam das novas e profundas alterações da agricultura portuguesa.

Aplausos do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Chagas.

O Sr. Duarte Chagas (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de formular uma pergunta ao ilustre Deputado António Campos.

Vozes do CDS: - Ilustre?!

O Orador: - Disse ele aqui que os técnicos da EPAC eram altamente competentes. Portanto gostaria de perguntar se, sendo esses técnicos altamente competentes, como é que o Sr. Deputado explica que fossem importados 23 872 t de cevada da Itália para sementeira que forragem não deu e que também para cevada não serviu, e como é que explica que ainda só no concelho de Almodôvar cento e tal pequenos agricultores, paupérrimo agricultores, ainda estejam por receber o subsídio dessa cevada?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Campos para responder.

O. Sr. António Campos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou começar a responder pelo fim às perguntas que me foram formuladas, ou seja, ao Sr. Deputado Duarte Chagas. Contudo, é melhor que, em vez de ser eu a responder-lhe, o Sr. Deputado pergunte aos seus colegas de bancada, que eles explicar-lhe-ão essa história das sementes...

Vozes do PSD e do CDS: -Ah, não sabe!

O Orador: -..., porque eles estão junto de si, fazem parte da maioria e talvez tenham mais dados

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do que eu para lhe explicar essa história das sementes, pois é provável que agora a maioria tenha mais possibilidades para o fazer.
Portanto, vou começar por responder ao Sr. Deputado Álvaro de Figueiredo. Eu tenho vindo a denunciar a prática da AD...

O Sr. António Lacerda (PSD): - Mas ninguém o leva a sério!

O Orador: -..., porque de facto ela baseia-se simplesmente em demagogia; desmente, mas não é capaz de apresentar factos. Estou munido dos respectivos diplomas e o S. Deputado não pode dizer que utilizo demagogia nem que faço desgaste ao Governo. Se faço desgaste é porque de facto defendo uma política que tem muitos adeptos e o Governo defende, a política só dos grandes senhores, de uma pequena minoria que precisa de «cacicar» muito e de utilizar muita demagogia para poder levar a sua política à prática.
O Sr. Deputado diz que o Governo vai continuar, Ainda bem que o Governo da AD e a equipa da Agricultura vão continuai no mesmo estilo, pois dar-nos-ão garantias suficientes para o próximo acto

Vozes do CDS: - Querias!

Ò Orador: - Gostaria que o Sr. Deputado José Manuel Casqueiro - que aliás nesta Câmara é o serventuário máximo dos grandes senhores da- terra e que utiliza permanentemente a mentira, o que casos recentes provam - provasse que de facto a política de- créditos que aqui denunciei não era verdadeira e que a prepotência do Governo e da actual equipa do MAP - com os inquéritos, inclusive, e juristas que provam sobejamente todo o clima que se vive dentro do MAP - também não era verdadeira.
Portanto, quem aqui mente permanentemente é o Sr. Deputado.

Vozes do CDS: - Não apoiado!

O Orador: - Mas mentiu em mais coisas. Mentiu porque o Sr. Deputado falou aqui, por exemplo, na questão do trigo. Como o Sr. Deputado sabe, o que os agricultores receberam o ano passado foi 11$ porque havia os 8S80 e mais os 2$20 do subsídio, e as contas que eu fiz de milhões de contos foi relativamente aos escudos que deixaram de entrar nos bolsos dos agricultoras. O Sr. Deputado é que, por uma arte demagógica, queria tirar ao preço do trigo 2$20, mas o que 0$ agricultores receberam foi 11$ e aquilo que os senhores vão pagar este ano são 13$30, com a agravante de imporem mais condições, o que não dará os 12S30, mas sim qualquer coisa como 12$, o que portanto não chega ao acréscimo dos 11% de que falei.
Por outro lado, o Sr. Deputado José Manuel Casqueiro sabe que a política dós Governos socialistas foi sempre, em 1977 e 1978, de igualdade do preço entre o trigo e o milho. E, ao contrário dos números que o Sr. Deputado dá, no ano de 1977 o preço do milho foi aumentado 50 % e no ano da 1978 foi aumentado 25%. Portanto, o Sr. Deputado falta à verdade: o preço em 1976 era de 4$, em 1977 foi para 6$ e em 1978 passou para 7$50.
Mas o que todos os técnicos sabem é que a cultura do milho é mais cara que a cultura do trigo e os senhores retiraram a centenas de milhares de pequenos agricultores do Centro e Norte do País 1$/kg no preço, porque lhe pagam menos 1$ que pagam ao trigo. Isto é que é a realidade.
Em relação ao leite, o Sr. Deputado também sabe que o preço dó leite evoluiu sempre, em grandes percentagens de aumento, que aliás se situa entre 1977 a 1979, em que há aumentos de 20%; em 1977 era de 8$50, em 1978 foi de 12$, em 1979 foi de 13S50 e em 1980 os agricultores não recebem de facto mais um tostão e os senhores vão-lhes dar mais 0$15 em Setembro para ver se lhes apanham os votos.

Vozes do PSD: - Outra vez?!

O Orador: - E isto porque, apesar de terem subido o preço do leite e do queijo ao consumidor, ao produtor os senhores não subiram um tostão e não é porque haja excedentes, porque os senhores são de facto a classe política que defende os interesses dos grandes intermediários, dos grandes senhores, e têm de ir fazer um frete de manhã à noite no Governo e aqui nesta Casa...

Aplausos do PS.

O Sr. Manoel Moreira (PSD): - É falso! Não diga disparates!

O Orador: - Queria ainda dizer-lhe que de facto, o Sr. Deputado José Manuel Casqueiro continua a não perceber nada de agricultura.

Protestos do CDS.

O Orador: - E talvez lhe possa já provar. O Sr. Deputado andou agora três anos seguidos a dizer. que a Reforma Agrária era uma desgraça...

Vozes do CDS: - E é!

O Orador: -..., que a produção baixou astronomicamente, que estava tudo perdido. Este ano o senhor tem as maiores produções, superiores ao ano de 1975 e as maiores produções do decénio.
Quando a AD foi para o Governo, já as sementeiras estavam feitas, porque de facto o senhor da agricultura só faz demagogia e sabe que as condições climatéricas têm uma extrema influência, e este ano não só a aveia como a produção do trigo' e dos cereais secundários vão ser superiores, porque as condições climatéricas foram extremamente favoráveis ...

Protestos do CDS.

O Sr. Deputado atribui tudo isso à Reforma Agrária e sabe que está a faltar permanentemente à ver dade, porque é um demagogo tanto nesta Câmara como fora dela.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Demagogo é o senhor!

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O Orador: - E o Sr. Deputado vai dizer este ano: «que grande vitória da Reforma Agrária», porque bateu e vai bater todos os recordes produtivos dos últimos dez anos.

Vozes do CDS: - Ainda bem!

O Orador: - Por outro lado, o senhor falou em aumentos e diz que não aumentaram, os combustíveis. O Sr. Ministro da Agricultura informou o País, através de um comunicado público, que após sessenta dias do aumento dos combustíveis tinha já dado ordens para o reembolso aos agricultores. Os agricultores hoje, apesar de já lá ir mais de noventa dias, não sabem como vão ser reembolsados e o que sabem é que estão a pagar os combustíveis ao mesmo preço de todos os outros cidadãos. Isso 6 a única coisa que sabem, porque os agricultores não vivem de promessas nem de demagogias, mas sim de dinheiro real.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Ainda em relação â distribuição de terras; e porquê me parece importante, queria dizer que os senhores que manipulam de facto grande parte da imprensa esconderam que para entregar a terra a 94 trabalhadores rurais tiveram de despedir 250 que foram para o total desemprego. Os senhores sabem que esta é uma política criminosa quando há 400 000 desempregados e aqueles homens não sabem onde podem ir ganhar o pão. O senhor diz-me que vão distribuir terra a mais de um milhar, mas eu ficarei pesaroso porque sei que são mais 10 000 que vão para o desemprego, para que os senhores possam fazer uma política simplesmente eleitoralista e que vai contra os interesses da grande1 maioria dos trabalhadores portugueses.
O senhor sabe que pagaram indemnizações antes e compraram os trabalhadores, dando-lhes cerca de 10 000 coutos e obrigaram a própria herdade dos Machados a pagar esses despedimentos, para que os trabalhadores não fossem fazer barulho quando o Sr. Primeiro-Ministro distribuísse a tenra aos tais agricultores. ..

Protestos do PSD.

O senhor é de facto aqui um demagogo permanente, um homem que quer vender gato por lebre, um agente dos grandes senhores da terra que eu conheço há muito e que também me habituei a combater com coragem, mas sempre com dignidade.

Aplausos do PS, do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Olha quem fala!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Casqueiro.

O Sr. José Manuel Casqueiro (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Lamento a linguagem utilizada pelo Sr. Deputado António Campos que não utilizarei por certo porque não está nos meus hábitos.

Protestos do PS.

Não lhe chamarei mentiroso...

O Sr. Raul Rego (PS): - Já chamou!

O Orador: - O que eu disse foi que o Sr. Deputado António Campos nesta Câmara aquando da interpelação ao Governo tinha faltado à verdade - fundamentei-o e depois vim a prová-lo quer nesta Câmara quer perante milhões de portugueses que puderam assistir a este debate.

Vozes do PSD e do CDS: - Muito bem!

O Sr. António Campos (PS): - Não provou, não, Sr. Deputado!

O Orador: - Quanto ao problema dos preços do trigo, o Sr. Deputado António Campos confirmou que havia um subsídio de 2S20 precisamente por causa das condições climatéricas e porque o preço, como disse há pouco e o Sr. Deputado não desmentiu, é feito tomando por base 1300 kg por hectare quando a produção dos dois últimos anos foi inferior a 600 kg por hectare.
Quanto ao problema das virtudes ou não da Reforma Agrária e da culpa da baixa produção de trigo nessa zona, poderia demonstrar-lhe que efectivamente em anos semelhantes, como foi o ano de 1965/1966 e o ano de 1976/1977, na verdade se produziu bastante menos em 1976/1977 do que no ano anterior. Mas com outros argumentos que são bem mais válidos, digo-lhe que nos três distritos da zona da Reforma Agrária em 1965/1966 havia 5000 tractores e em 1976/1977 havia 11 000 tractores e semeou--se bem menos do que se linha semeado dez anos antes.

Protestos do PCP.

Claro quê eu não tiro conclusões apressadas, como o Sr. Deputado António Campos fez, dizendo que este ano vamos ter a maior produção de trigo de sempre. Essa é uma afirmação que ouvi de alguém que o Sr. Deputado talvez goste de seguir nas suas afirmações e que é o Sr. Dr. Álvaro Cunhal, que em 1975 o disse para exaltar as virtualidades da Reforma Agrária.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Não são os trabalhadores do Alentejo os culpados da diminuição da produção de trigo nessa zona. A culpa é única e simplesmente do sistema político para que os trabalhadores do Alentejo foram conduzidos e que em Portugal fez diminuir a produção, como aliás aconteceu noutros países que seguiram igual sistema de produção.

Uma voz do PCP: - São os agrários que são os responsáveis!

O Orador: - Mas poderá estar certo o Sr. Deputado António Campos de que será fácil demonstrar que a diminuição da produção de trigo é diferente no sector privado e no sector colectivo. É que, enquanto diminuiu no sector colectivo, aumentou no sector privado.

O Sr. António Lacerda (PSD): - Muito bem!

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O Orador: - Isto, e torno a afirmá-lo, não é da responsabilidade, dos trabalhadores rurais do Alentejo, por quem tenho o maior respeito...

Protestos do PCP

... tanto mais que tive o voto da maioria da população do distrito de Portalegre ...

Vozes do PCP: - É falso!

O, Orador: - ..., fundamentalmente uma população rural.

Aplausos do CDS, do PSD, do PPM e dos Deputados reformadores.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Isso é que lhes dói!

O Sr. Vital Moreira (P.CP): - A sua maioria é um terço!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Campos.

O Sr. António Campos (PS): - Sr. Deputado, aquilo que eu disse é que era a melhor colheita de trigo, somado com cereais secundários, e referi até a aveia. Porque, como o Sr. Deputado sabe muito bem, os trabalhadores estão a «diminuir a área às sementeiras do trigo e a aumentar a das sementeiras de aveia, pelo que penso estarem no bom caminho, e que deverão encurtar ainda mais as áreas semeadas de trigo, pára avançarem com os cereais secundários. E, se o Sr. Deputado Álvaro Cunhal em 1975 gritava pela vitória da Reforma Agrária, o Sr. Deputado Casqueiro andou três anos, em que as condições climatéricas eram extremamente desfavoráveis, a gritar a derrota da Reforma Agrária. Ora isto é demagogia, porque de facto o Alentejo tem condições produtivas excelentes, mas que estão subaproveitadas e a sua solução não passa pelas mãos dos trabalhadores, mas sim pelo Governo no sentido de avançar com o plano de drenagem, de avançar com o plano de pequenas barragens e de irrigação do Alentejo.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - E o que é que vocês fizeram?

O Orador: - E então, sim, teremos uma verdadeira Reforma Agraria.
Agora o que o Sr. Deputado andou a fazer foi permanentemente a caluniar e a fazer demagogia, porque sabia que as condições climatéricas tinham sido extremamente desfavoráveis. Este ano o Sr. Deputado tem que engolir tudo o que andou a dizer durante três anos É o que acontece normalmente aos vendedores de banha de cobra.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, pedia a vossa atenção para o seguinte: ainda há uma hora e quinze minutos de tempos que podem ser utilizáveis. Se as luzes me consentem ver bem o relógio, considerando os tempos mortos, a reunião pode terminar às 23 horas se se utilizarem estes tempos todos..
Nos termos do Regulamento, estava previsto terminar, como sabem, às 21 horas e 30 minutos. Eu, sem interromper o tempo que ainda falta, vou dar a palavra ao orador seguinte e agradecia que os grupos parlamentares se consultassem e o Governo também e nos viessem transmitir se querem utilizar estes tempos até às 23 horas ou se encerramos às 21 horas e 30 minutos.
Entretanto, vou dar a palavra ao Sr. Deputado Manuel Pereira, para uma intervenção.

O Sr. Manuel Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Todos os especialistas fazem ressaltar o facto de o poder local ser uni tema que suscita sempre a maior emoção, quando se discute o grau de autonomia dos municípios. Aquilo a que. assistimos há pouco nesta Assembleia fez-me lembrar a notável lição que ainda há dias recebemos do Sr. Presidente desta Assembleia da República na sessão comemorativa do 25 de Abril sobre o que se deve entender por democracia. Eu gostaria de recolocar a questão, transposta desta vez para um outro conceito que exalta os ânimos, mas que possui sempre uma interpretação de acordo coro o partido que a defende.

O Sr. Guerreiro Norte (PSD): - Muito bem!

O Orador: - E, tal como acontece relativamente à democracia, colocar em plano de igualdade o conceito de autonomia defendida pelo PSD, CDS, PS ou PPM e o significado que o Partido Comunista lhe atribui constitui tarefa impossível e ide resultado absolutamente negativo. Tudo o que aqui se passou foi portanto um diálogo de surdos.
Com efeito, o Sr. Deputado Veiga de Oliveira, em quem eu me tinha habituado a ver um exemplo de calma e de serenidade, concentrou toda a sua acusação nas atitudes do Governo, que afirmou serem de cariz centralista, caciqueiro e não sei que mais. Mas esqueceu-se de explicar qual o conceito de autonomia local que o Partido Comunista defende e sobretudo o que pretende praticar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Que nos dissesse onde acaba para ele a autonomia e começa a independência. Que nos dissesse a nós e ao povo português, muito claramente, se o conceito de autonomia e de descentralização que o Partido Comunista Português sustenta é o mesmo quando é oposição e se algum dia for Governo. Que nos dissesse se em alguma nação, fora do mundo ocidental, este poder poderá ser aplicado contra as normas do plano global elaborado pelo Estado. Se, finalmente, este poder originário é uma medida destinada ao confronto entre as instituições democráticas, ou antes uma maneira organizada de definição de poderes, de obrigações e de responsabilidades.
Porque o Sr. Deputado, com a sua teoria municipalista, o seu entusiasmo autonômico, sem barreiras nem limites, fez-nos recuar aos tempos românticos e lembrar a polémica sobre quem nasceu primeiro - se o Estado se o município. Curioso regresso para quem defende uma interpretação científica do Estado, da Sociedade e da História.

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Eu desejaria, por isso, desdramatizar e pôr um pouco- de calma na discussão deste assunto. Tentarei expor o tema em termos de serenidade e de realismo. Eu também tenho mais de 50 anos e mais alguma coisa, isto é, 27 anos de experiência ligada à administração autárquica, em todos os níveas e funções.

Vozes do PCP: - Ah!...

O Orador: - Julgo conhecer mais de três quartos dos municípios do País, com os seus anseios, as suas dificuldades de organização, a sua capacidade de conseguir planear, projectar obras e fiscalizá-las.

Uma voz do PCP: - Este é dos velhos tempos!

O Orador: - Dos velhos tempos em que trabalhava na Administração Local - como trabalhador, devo acrescentar, se não sabia.

Aplausos do PSD e de alguns Deputados do CDS.

Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Nós não vamos discutir aqui nem a perfeição técnica nem as possíveis {interpretações da Lei das Finanças Locais. Sabemos, por exemplo como foi aqui claramente salientado pelo Sr. Ministro das Finanças que - a expressão «despesas em bens e serviços» é susceptível de significados diversos; podemos duvidar da justiça do método de relacionar o montante das verbas a atribuir às autarquias com o volume dos juros da dívida pública, a fazer realçar o absurdo deste juízo - os municípios ganham com o endividamento do Pais; existem erros manifestos, como seja o contido no n.º 3 da alínea 6) do artigo 8.º que faz incidir percentagens de receitas para as autarquias sobre valores que nem sequer passam pelo OGE.
Com todas estas imperfeições, mau grado os erros que contém e as dúvidas de interpretação que suscita, somos os primeiros a reconhecer que a Lei: das Finanças Locais representou e continua-a ser um marco importantíssimo na construção de um poder local autónomo, prestigiado e responsável.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas também é necessário que se diga que a lei visou, como todas as normas, o interesse geral e não pode nem deve servir de meio de confronto entre o Estado e as autarquias, como não pode ser objecto de interpretações que sirvam de bandeira a objectivos políticos.
Há que dizer também que a Administração Autárquica n3o fica completa por ter visto consagrada a autonomia política mais a capacidade de dispor de recursos próprios. Para além destas condições que são essenciais, há todo um sistema a construir e a consolidar, com interligações estruturais, distribuídas por fases sucessivas, segundo um plano coerente, onde incluímos, antes de mais nada, a racionalização dos escalões que compõem a estrutura local. Entre o município e o Estado existe, de momento, um vazio que impede o poder local de desenvolver todas as suas potencialidades. E por isso se corre permanentemente o risco de intervenção do Governo Central, quando a dimensão do município se mostra inadequada à concretização de certos empreendimentos ou ao lançamento de equipamentos de maior vulto.
Daí que a correcta repartição de tarefas entre o Estado e o poder local só poderá, em definitivo, ser plenamente construída, quando for estruturado um nível intermédio apto à realização de certos investimentos. E cabe ao actual Governo o mérito da sensibilidade para este problema, «aduzido na aprovação em Conselho de Ministros da Lei Quadro sobre Associações de Municípios que virá a ser apreciada por esta Assembleia.

Vozes do PSD e do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Mas a assunção da plenitude dos poderes e deveres dos nossos municípios passa também pelo aperfeiçoamento da organização quer dos serviços administrativos e de gestão quer da capacidade técnica ao seu alcance. Para levar a cabo empreendimentos que impliquem avultados financiamentos, impõe-se muita capacidade de planeamento, projectos concebidas, em termos adequados, serviços de gestão eficientes, análises de custos e da resultados, equipas de fiscalização e muitos outros requisitos demasiado conhecidos. O reconhecimento destes factos, como essenciais ao pleno aproveitamento das potencialidades locais, deveria ter-se traduzido há muito num projecto de formação administrativa- e técnica dos quadros locais e na organização da sua carreira.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E por isso continuamos a ser dos poucos países do Mundo onde não existe uma escola nacional de administração, com centros especiais para formação e reciclagem do pessoal das autarquias. Seremos igualmente dos poucos países em cujas universidades se não ministram disciplinas de direito e de ciência municipal, para já não falarmos, de planeamento, de finanças locais, de economia ou sociologia urbanas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O reforço da capacidade de acção do poder local, como pressuposto da sua plena responsabilidade, requer ainda instrumentos jurídicos ou de normalização relacionados com as actividades técnicas e empresariais dos nossos municípios, nomeadamente as que assegurem os requisitos de certos projectos, que garantam a isenção e concorrência dos concursos públicos, que estabeleçam regras de gestão adequada aos serviços de natureza empresarial, etc. Há, em resumo, que assegurar, por meio de estruturas adequadas, a rentabilidade máxima de cada escudo despendido pelas autarquias locais.
Salientemos, por último, que a reforma de todo o nosso sistema local passa também pelos serviços do Estado, através de uma adequada desconcentração. Cabe a este Governo o mérito de pela primeira vez ter reconhecido no seu Programa que a reforma do poder local terá de ser levada a cabo simultaneamente com a revisão das estruturas centrais.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: já aqui ficou de-

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monstrado que o Governo não se furtou ao cumprimento da Lei das Finanças Locais. A oposição não apresentou nunca as razões em que se baseou para defender o contrário.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Foram também claramente explicados os factores intrínsecos determinados pelo equilíbrio global, pela capacidade de organização, pela possibilidade de resposta, em- suma, pela correcta distribuição dos recursos que são de todos nós. Nada disto é novo: já na altura da apresentação dos dois últimos orçamentos estas mesmas realidades foram reconhecidas, sem terem então provocado tantas objecções.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Governo interpretou correctamente a Lei das Finanças Locais? O Orçamento Geral do Estado prevê ou não uma repartição satisfatória dos recursos globais? Poderia o mesmo Orçamento ter considerado outras alternativas? Estão os municípios em condições de aplicar correctamente toda a massa de investimentos que a oposição (sobretudo a comunista) sugere? É pura demagogia a exigência de um aumento do volume financeiro proposto ou há nisso algum fundamento científico?
Todas as questões, umas de ordem técnica, outras de natureza política, não podem ocultar esta verdade elementar: se existem partidos que têm interesse em ver prestigiado o poder local, garantindo-lhe o máximo da sua operacionalidade, são precisamente os que sustentam o Governo que detém politicamente dois terços do número de municípios e de freguesias.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Se o Governo pretendesse instrumentalizar a actividade, das autarquias com objectivos eleitoralista, que melhor maneira poderia encontrar senão a de dotar os responsáveis pelos seus duzentos municípios e pelas quase três mil freguesias com o máximo de recursos que lhes permitissem uma acção de efeitos imediatos?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por que é que se nega ao Governo o direito de interpretar uma lei confusa de uma forma correcta. O oposição tem outra interpretação? Está no seu direito, mas tem de a fundamentar ou, de outro modo, terá de demonstrar que o Governo podaria ter tido outra política financeira que lhe permitisse dotar as autarquias com maiores recursos. Onde está a alternativa apresentada?
O povo português precisa de saber que em 1978 o montante das receitas que foram transferidas pelo Estado para os municípios foi de 10 689 476 contos; em 1979, 23 milhões e em 1980, 33 milhões. Quer isto dizer que triplicámos os recursos relativamente a 1978, e que do ano anterior para 1980 o Governo concedeu aumentos de 10 milhões de contos.
Precisa também de saber que com a totalidade das receitas cobradas directamente quer em impostos quer em taxas, os municípios irão dispor este ano de quase 40 milhões de contos para a realização de empreendimentos essenciais á vida e ao bem-estar das populações.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Quem poderá dizer que este. Governo não está atento ao revigoramento do papel das autarquias?
Pela primeira vez, estabelecem-se estímulos ao associativismo local, permitindo-se que os municípios de menores recursos prossigam programas já aprovados, que excedam as suas possibilidades financeiras ou realizem obras avultadas que isoladamente nunca conseguiriam. Ao mesmo tempo, promove-se uma maior racionalidade e economia nos investimentos destinados a infra-estruturas básicas.
Pela primeira vez ainda fomenta-se a criação- de linhas de crédito bonificado que servirão paia estimular os gestores mais dinâmicos e facilitarão a realização de um programa de equipamentos colectivos essenciais, tais como habitação, saneamento básico, escolas, etc.
É por isso que tem pouco interesse para o País o tipo de argumentos formais que a oposição aqui produziu, mas não provou.
Quanto a nós, o Governo defendeu os interesses do País, procedeu sem demagogia e, ao aumentar tão substancialmente a capacidade financeira das autarquias, facultou-lhes os meios necessários ao aperfeiçoamento progressivo da sua capacidade técnica e de organização-

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Se, simultaneamente, for capaz de promover as reformas institucionais que atrás enunciámos, poderemos ir construindo o poder local que todos ambicionamos: eficiente, respeitado pelas populações, motivador de participação e capaz de por si próprio promover e levar a cabo os justos anseios dos povos.

Aplausos do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Desejo apenas dizer em relação a esta matéria que o Governo actua com demagogia e com desrespeito pela lei. As nossas posições em matéria de autonomia do poder local são por demais conhecidas. Não deixaremos passar em claro o que aqui foi dito e responderemos amanhã através de uma intervenção autónoma sobre a matéria.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra para uma intervenção o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quando no passado dia 27 o Primeiro-Ministro anunciou perante as câmaras da

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televisão que os aumentos salariais se quedariam pelos 18%...

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Outra vez!

O Orador: - ...ficou inteiramente a nu a política de trabalho que está na base do Orçamento Geral do Estado e do Plano para 1980. Os trabalhadores portugueses ficaram a saber que este Governo - de forma torcida - vai tentar ressuscitar a tese motapintista da imposição do tecto salarial dos 18%•
Compreende-se agora a tentativa feita em Fevereiro pelo Ministério do Trabalho quando procurou bloquear quarenta convenções colectivas de trabalho que envolviam meio milhão de trabalhadores.
Compreende-se melhor agora o porquê da resistência, o à-vontade e a desvergonha do patronato durante as negociações das convenções colectivas de trabalho quando apresenta aos sindicatos contrapropostas de miséria provocando propositadamente a ruptura e o confronto.
Se pegarmos em dois exemplos concretos como é o caso dos químicos e dos metalúrgicos, com tabelas salariais em vigor desde 1 de Outubro de 1978 e 1 de Novembro de 1978, e, tendo em conta que o aumento do custo de vida durante este espaço de tempo rondou os 28,5 %, não é uma afronta e uma provocação querer impor um tecto salarial de 18%?
Os trabalhadores da metalurgia e da química dirão que esta pergunta e um pouco «como chover no molhado» porque o Governo que assim actua é o mesmo que propõe aumentos salariais de 11% para a função pública, que responde com a requisição civil, com o alarmismo e com processos disciplinares à luta reivindicativa dos trabalhadores da Petrogal, que declara a RN e a RDP em situação económica difícil, quando os trabalhadores do sector reivindicavam melhores salários, melhores condições de vida e de trabalho, que recusa a publicação do acordo colectivo de trabalho da TAP. É um Governo que não só dá cobertura ao patronato mas também o incentiva e lhe dá o exemplo.

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

O Orador:-Procurando distorcer a verdade dos factos, o Governo baralha e joga com números. Diz querer combater a inflação, mas o que quer é aumentar os lucros à custa dos sacrifícios e do abaixamento dos salários reais dos trabalhadores.
Quanto aos 5% de redução de impostos que o Sr. Primeiro-Ministro foi apregoar à TV, seria bom que respondesse à pergunta que lhe formulámos: quantos trabalhadores beneficiaram dessa redução? A resposta seria simples: só bem poucos, só os que ganham mais de 32 contos por mês!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A resposta justa e dura dos trabalhadores portugueses tem feito recuar este Governo e os seus patrões. Bem pode o Governo continuar a acenar com promessas ocas, bem pode proclamar ameaçadoramente a velha e falsa tese de que as centenas de milhares de trabalhadores em luta por melhores salários e condições de vida são manipulados pelo PCP. A verdade que este Orçamento Geral do Estado e do Plano procuram esconder, está à vista, na política que este Governo tem seguido, se propõe continuar e agravar, e que o movimento operário e sindical está disposto a não permitir. O tecto salarial de, 18% de Mota Pinto caiu, o tecto salarial de 18% de Sá Carneiro cairá se for tentado.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Perguntem Srs. Ministros, perguntem Srs. Deputados aos trabalhadores da panificação, da metalurgia, dos químicos, da função pública, das indústrias extractivas, dos gráficos, do sector automóvel, dos têxteis; perguntem aos reformados, aos trabalhadores da Reforma Agrária, a vastas camadas e classes médias e, verão que jogar com números na televisão ou nesta Assembleia não chega e muito menos convence quem sofre os efeitos desta política condenada ao fracasso.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé para uma intervenção.

O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O Orçamento Geral do Estado e as Grandes Opções do Plano para 1980 apresentados pelo Governo de Sá Carneiro/Freitas do Amaral constituem documentos que, mau-grado as roupagens demagógicas com que surgem envoltos, concretizam e quantificam, de facto, a política abertamente antipopular e repressiva que vem caracterizando a actuação deste executivo.
Desde as medidas de âmbito fiscal aí consignadas, à implementação do Serviço Nacional de Saúde, que se quer impedir, ao problema grave do desemprego, tudo aponta no mesmo sentido: avançar na destruição de tudo aquilo que resta do 25 de Abril e restaurar uma nova ordem, não só política mas também económica e social, decalcada o mais possível da existente antes de 25 de Abril de 1974.
Ardilosamente o Governo vem acompanhando o lançamento de medidas efectivamente lesivas dos interesses da esmagadora maioria da população, com uma campanha de intoxicação da opinião pública através dos órgãos de informação que, em número crescente, lhe são completamente subservientes.
Transformar reais agravamentos das condições de vida dos trabalhadores em melhorias, aumentos da corrupção e do compadrio «m saneamentos da administração pública, afastamentos e perseguições políticas em critérios de competência, constituem expedientes por de mais utilizados por um Governo que, aos olhos de um número cada vez maior de portugueses, se apresenta tal como efectivamente é: um Governo do grande capital e do imperialismo que age centra os interesses de quem trabalha, um Governo visceralmente contra o 25 de Abril.

O Sr. António Lacerda (PSD): - Não apoiado!

O Orador: - E um Governo deste tipo apenas pede merecer dos trabalhadores a luta decidida pelo seu derrube. Deixar prosseguir a sua acção, sob

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quaisquer pretextos, apenas levará à criação de condições tais que se tornará mais difícil a mudança radical da situação hoje existente, como é desejo bem fundo da maioria do povo português que nas eleições de 2 de Dezembro votou, de facto, contra esta Aliança feita Governo por virtude das contradições das leis burguesas que nos regem.
O OGE para 1980, e pese embora o carácter demagógico da respectiva embalagem, acaba por denunciar as reais intenções deste Governo. Assim do lado das despesas é significativo que alguns aumentos propostos para certas rubricas sejam feitos à custa de reduções em termos reais nas verbas declinadas a fins sociais e à melhoria das condições de vida das populações. É igualmente elucidativo que um Governo que desde a campanha eleitoral vem apregoando a sua intenção de aumentar o nível de vida dos portugueses, inscreva unia verba para aumentos dos salários aos funcionários públicos, que não cobre sequer metade do aumento do custo, de vida registado em 1979.
Deste Orçamento a maior fatia destina-se ao pagamento de juros e amortizações da dívida pública, que absorverá 50 milhões de contos. E seriam 65 milhões não fora mais uma jogada deste Governo ao revalorizar as reservas de ouro do Banco de Portugal. Esta situação de crescente endividamento público vem traduzindo-se, na afectação de crescentes recursos financeiros a fins que nada têm a ver com a satisfação das necessidades do povo e do País e deve-se à inexistência de uma política fiscal assente em impostos fortemente progressivos sobre os altos rendimentos dos capitalistas e na compressão de despesas improdutivas que permitisse eliminar os enormes deficits orçamentais. Este Governo, que tanto criticava os deficits de Orçamentos anteriores, apresenta a esta Assembleia uma proposta de Orçamento em que se atinge o recorde de sempre: 141 milhões de contos...
Quer isto dizer que em 1981 os encargos com a dívida pública irão absorver recursos bem maiores do que o verificado no ano corrente.

ara um Governo que tanto se queixa dá herança recebida, é deveras elucidativo o seu empenho em avolumar essa herança...
Na actual situação do Pais, em que o povo se debate com problemas de desemprego e constante degradação das suas condições de vida, o Governo propõe aumentos sensíveis nas verbas para a chamada Defesa Nacional e para a segurança e ordem públicas que absorverão, em conjunto, de acordo com o previsto no OGE, cerca de 50 milhões de contos - mais 8 milhões que em 1979.
Num pais onde a guerra acabou e onde as populações de tudo estão carenciadas, é por de mais evidente a vontade do Governo em prosseguir esta drenagem de recursos financeiros, que não param de crescer, para fins que lhe são alheios e mesmo adversos.
Em contrapartida, se compararmos as verbas atribuídas no OGE aos sectores sociais, como a educação, a saúde, a habitação ou às actividades económicas com as despesas efectivamente realizadas em 1979, e descontarmos os efeitos inflacionistas esperados para 1980, chegamos à conclusão que muitas dessas rubricas evidenciam quebras em termos reais comparativamente ao ano anterior.
São pois manifestamente insuficientes os acréscimos nominais previstos para as rubricas mais directamente voltadas para a resolução dos problemas mais sentidos pelas populações.
A este propósito caberá destacar a intenção do Governo em liquidar o Serviço Nacional de Saúde, o qual lhe merece na Proposta sobre Grandes Opções do Plano a seguinte referência: «Há que propor a alteração da Lei de Bases de modo que a progressiva criação de um sistema de saúde tenha em conta a situação real existente [...] e concite o apoio dos profissionais do sector [...] é possa ser assegurado pelos meios materiais e financeiros disponíveis.»
É bem patente o desprezo que este Governo vota às aspirações mais sentidas e às necessidades mais prementes das populações, mesmo daquelas que os partidos apoiantes da AD vêm ludibriando com falsas promessas que depois não cumprem...

O Sr. António Lacerda (PSD): - Não apoiado!

O Orador: - Relativamente às receitas orçamentadas, o aspecto mais saliente emerge da sua confrontação com a campanha demagógica que há vários meses vem sendo desencadeada sobre a pretensa diminuição dos impostos. De facto, como vão diminuir os impostos se é esperado um acréscimo das receitas fiscais superior a 30%? Será o combate à evasão e fraude fiscais, tão: apregoado pelo Governo, assim tão farto de resultados, esperados, que permita ao Governo inscrever aumentos brutais em impostos, como o de transacções, sem ter criado mecanismos efectivos de controle sobre os prevaricadores que apontem para a repressão sobre os mesmos?
Como vai diminuir o imposto profissional se é esperada em 1980 uma receita superior em 16% à cobrada em 1979, sem que haja qualquer garantia que os salários subam mais do que isso?
E como vai diminuir o imposto complementar se e esperado recolher em 1980 mais 14% que em 1979, a título desse imposto, e sendo conhecidas as alterações sensíveis das1 taxas e escalões que vieram beneficiar essencialmente os detentores de rendimentos elevados, designadamente os que exercem profissões liberais e os capitalistas?
Como podem o Governo e os seus apoiantes propalar tão intensamente baixas de impostos quando se esperam aumentos sensíveis nas receitas provenientes daqueles que afectam predominantemente quem trabalha, como é o caso do imposto de transacções, do imposto de selo ou sobre o consumo do tabaco?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A elaboração deste Orçamento assenta, na parte das receitas, num pressuposto êxito no combate à fuga e fraude fiscais, que anualmente desviam dos cofres do Estado dezenas de milhões de contos. No entanto, muitas e ponderosas razões nos levam a pôr em causa que um Governo deste tipo tenha os êxitos nesta tarefa que o OGE para 1980 consagra e quantifica.

O Sr. António Lacerda (PSD): - Espere e verá!

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O Orador: - Este Governo é da confiança dos sectores mais corruptos e parasitários da sociedade portuguesa.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Isso é a UDP!

O Orador: - Os grandes intermediários e os capitalistas em geral, que, anualmente, ludibriam o fisco em milhões e milhões de contos, têm finalmente um Governo que é o seu. Por isso mesmo não será agora que esses prevaricadores vão ter rebates de consciência pelos crimes que sempre praticaram, indo acatar as mesmas leis que ontem espezinharam. Para esses; o que conta são os milhões de contos roubados que juntam às suas imensas fortunas. Para esses só processos de fiscalização: apertados, conjugados com punições severas, poderão pôr cobro à escandalosa situação que se vive.
A divulgação pública dos elementos contidos na proposta de OGE para 1980 tem assentado em bases comparativas incorrectas. De facto, as receitas previstas e as despesas orçamentadas devem comparar-se com as receitas efectivamente cobradas em 1979 e com as despesas realizadas de facto nesse ano. E só assim se, pode aferir realmente as reais intenções deste Governo.
Assim, e como atrás demonstrámos, não só os impostos que recaem sobre os trabalhadores vão aumentar, como as despesas destinadas às mais relevantes áreas sociais denotam quebras, em termos reais, contrariamente ao que vem sendo propalado exaustivamente pelos órgãos de comunicação afectos ao Governo.

O Sr. António Lacerda (PSD): - É falso!

O Orador: - O OGE e as Grandes Opções estão voltados para a defesa e reforço dos interesses privados dos capitalistas, em detrimento do povo e das próprias empresas públicas e nacionalizadas que poderiam desempenhar papel relevante numa política radicalmente diferente, orientada, para a defesa dos interesses do povo e do País.

O Sr. João Morgado (CDS): - Não sabe ler o Orçamento!

O Orador: - Neste OGE e nas Grandes Opções transparecem claramente dificuldades crescentes para o sector nacionalizado, visando o seu enfraquecimento, desmembramento, ou para o esvaziar do seu significado efectivamente antimonopolista.
É assim que, ao lado de maiores verbas para aumento do capital estatutário, surgem cortes de 20%, em termos reais, nos subsídios às empresas deficitárias, por força das características dos bens e serviços que produzem, se aponta para maiores dificuldades na concessão de créditos para que mais capitais possam ficar à mercê dos capitalistas privados. É assim que vai continuar a drenagem de recursos dessas empresas para o sistema bancário por força das elevadas taxas de juro, que vão manter-se, e as profundas distorções da estrutura financeira dessas empresas que nenhum Governo corrigiu significativamente. Essas quantias fabulosas, indo directamente! para os bancos credores, vão indirectamente para os bolsos dos muitos capitalistas que vivem à sombra das actividades usurárias, que, têm vingado na economia portuguesa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Muito se tem falado do peso excessivo da carga fiscal no nosso país, sendo o mesmo objecto de acerbas críticas por parte das forças mais reaccionárias. No entanto, deve referir-se que, sendo verdadeira, essa constatação escamoteia o facto de os rendimentos dos capitalistas pouco contribuírem para as receitas fiscais.
Assim, e por exemplo, no ano de 1979 enquanto os trabalhadores pagaram em média, cerca de 30% de que receberam sob a forma de salários, em impostos directos e indirectos, os capitalistas apenas pagaram, em impostos, cerca dê 7% dos ganhos auferidos. Concretizando, enquanto os trabalhadores contribuíram com 125 milhões de contos de impostos, os, capitalistas pagaram apenas cerca de 30 milhões, Isto apesar do rendimento nacional der sido dividido sensivelmente ao meio entre capitalistas e trabalhadores.
É esta profunda e revoltante desigualdade que este Governo se propõe acentuar no seu Orçamento, que merece a nossa total discordância e repúdio. Não foi para isso que se fez o 25 de Abril!
Para além das receitas fiscais referidas, o Governo inscreve ainda uma verba de 10,5 milhões de contos, referente! à participação nos lucros das empresas públicas, que vêm merecendo, no seu conjunto, ataques desenfreados por parte das forças integrantes da actuai! coligação no Poder. Fica assim posta em causa a solidez e consistência dos ataques a essa - afinal importante - fonte, de receitas orçamentais.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: As propostas de lei sobre o OGE e as Grandes Opções para o Plano de 1980 apresentadas pelo executivo AD a esta Assembleia constituem, de facto, documentos elucidativos das reais intenções deste Governo. Representam, de facto. o reafirmar das posições e da política que o povo português tem combatido e significam o esfarelar das promessas demagógicas atiradas ao vento com propósitos exclusivamente eleitoralistas.

O Sr. António Lacerda (PSD): - Não apoiado!

O Orador: - A mudança prometida pela Aliança Democrática é a mudança que vimos sentindo nestes já longos meses do ano e que se, pretende prosseguir. A realidade dos factos aí está a sobrepor-se e a desmentir falsas intenções. Os textos destas propostas comprovam o que: vimos afirmando.
Prometia o Governo atacar a inflação para o que, na opinião de alguns dos seus mais destacados responsáveis, muito contribuíram os sucessivos deficits orçamentais. Mas o Governo apresenta um OGE onde o déficit atinge, os 141 milhões de contos.
Prometia o Governo reduzir o desemprego, tendo sido este objectivo inscrito como prioritário no seu Programa. Mas esse mesmo objectivo não surge agora como prioritário nas Grandes Opções, onde apenas são referidas medidas, por si só ineficazes, como a formação profissional e a instituição de «prémios de emprego», meio efectivo de dar aos capitalistas o dinheiro, sacado aos trabalhadores através dos impostos.

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Prometiam reduzir o desemprego, mas as próprias estatísticas oficiais comprovam o seu agravamento nos primeiros meses de governação da AD. São os encerramentos de empresas, as falências provocadas por roda uma política económica e financeira ruinosa, é o lançamento contínuo de trabalhadores no desemprego, é a insegurança total no dia de amanhã que para sobre um numera crescente de trabalhadores.
O que se passa na Plessey Automática, nos Móveis Sousa Braga, na Standard Eléctrica, na Audio Magnefics e em tantas outras empresas aí está a comprovar que este: Governo não vai combater o desemprego, aniles seguirá uma política que levará ao seu agravamento.

O Sr. António Lacerda (PSD): - Não apoiado!

O Orador: - E é tanto mais seguro vir a ser seguida uma política nesse sentido, quanto mais frequentes são as referências feitas nas Grandes Opções à questão da integração de Portugal no Mercado Comum. Com efeito, numa situação internacional de crise profunda do capitalismo, as medidas de reestruturação capitalista da economia portuguesa, na perspectiva da sua integração, apontam claramente para o encerramento de um sem-número de explorações agrícolas, empresas industriais e de serviços, que enxameiam o aparelho produtivo português e estão mortalmente ameaçadas.
Tudo isso aponta claramente para o agravamento do desemprego no nosso país ...
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os partidos da AD e o seu Governo item feito cavalo de batalha do aumento do poder de compra dos trabalhadores portugueses. Mas ao que temos assistido?
Continua a arrogância das entidades patronais, ao negar aos trabalhadores aumentos que, no mínimo, reponham o poder de compra. Os trabalhadores têm sabido enveredar na via da luta decidida e prolongada, designadamente sob a forma de greves e manifestações de rua. Mas o patronato vem provocando impasses nas negociações das condições de trabalho que acabam por perpetuar os antigos salários, sem que o Governo tome medidas que vão no sentido do prometido aumento do poder de compra.
A intenção do Governo não é, pois, a de ver melhoradas as condições de vida dos trabalhadores portugueses. E se mais provas não houvesse do que afirmamos, bastaria atentar no facto de que para os quase quatrocentos mil funcionários públicos, o Governo, sua entidade patronal, inscreveu no OGE para 1980 uma verba que cobre apenas metade do aumento do custo de vida registado.
E vejamos como reage o Governo à justa luta por melhores salários, dos trabalhadores da Petrogal: pela calúnia, pela repressão, pelo terrorismo político.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este Governo e as forças que o apoiam prometiam avançar no sentido da crescente descentralização do poder, por forma a conferir às autarquias locais as funções que, legal e constitucionalmente, lhes estão reservadas. No entanto, verificamos que este Governo pretende espezinhar, mais uma vez, esse direito elementar das populações, em verem resolvidos localmente alguns dos problemas com que se debatem. E é assim que as autarquias locais aparecem defraudadas neste OGE em cerca de 25 milhões de contos que, à face da lei, lhes pertenceriam.
Nós entendemos que a Lei das Finanças Locais deve ser integralmente aplicada, por forma a contribuir para que, de uma vez, por todas, ne saia deste círculo vicioso em que os Governos se. desculpam com a falta de capacidade das autarquias em gerir as verbas a que têm direito.
Por tudo aquilo que acabamos de referir estas propostos do Governo não podem deixar de merecer a nossa total rejeição.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Miranda da Silva,

O Sr. Miranda da Silva (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ninguém desconhece o valor dos produtos agro-alimentares que anualmente importamos, face às baixas produções obtidas no País e à fraca produtividade alcançada na nossa agricultura.
É incontestável a necessidade e a obrigatoriedade do Estado em apoiá-la e em apoiar particularmente 03 pequenos e médios agricultores e trabalhadores agrícolas.
Mas não é isso, no entanto, que este Governo entende.
Se a proposta do Plano o coloca numa clara posição de afronta para com os pequenos e médios agricultores e trabalhadores agrícolas, tal a forma vaga e demagógica que utiliza no tratamento dos problemas respeitantes à agricultura, a proposta do OGE, por seu lado, não pode deixar de indignar, quantos vivem e trabalham naquele sector de actividade, já que, face ao decréscimo das verbas orçamentadas, o Governo lhes mostra bem o seu desprezo para além de tornar claras as razões da imprecisão e do recurso à demagogia utilizados na proposta do Plano.
É que, Srs. Membros do Governo, dizer-se na proposta do Plano generalidades como de que se irá «satisfazer as necessidades básicas [...]», ou que se irá (contribuir para a redução do déficit [...]», ou que se irão «reduzir as assimetrias [...]», dizer isto -e é no fundamental o que nele consta para o sector agrícola - nada significa quando, simultaneamente, na proposta do OGE se reduzem significativamente as verbas a destinar à agricultura.
Se não vejamos: ao MAP é atribuída uma dotação, em termos reais, de menos cerca de 3 milhões de contos do que a atribuída em 1979, passando para cerca de 2,5 % a participação deste Ministério nas verbas orçamentadas para os diversos Ministérios contra quase 4% em 1979. À Agricultura e Pescas apenas são atribuídos 9850000 contos, contra quase 11 500 000 contos em 1979, ou seja, uma diminuição que, em termos percentuais e atendendo ao processo inflacionário, se traduz numa quebra de quase 30%.
Ainda no mesmo âmbito - classificação funcional- a verba orçamentada para a Agricultura, Silvicultura e Pescas, no conjunto das verbas atribuídas aos chamados serviços económicos, não representa na proposta do Governo mais do que 13%, contra 24% em 1979.
E significativo é ainda a análise das distribuições das verbas orçamentadas para o MAP pelos diferentes organismos dele dependentes.

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Decrescem as verbas orçamentadas para a extensão rural, para os serviços veterinários, para as indústrias agrícolas alimentares, para o comércio e indústria agrícolas, para a investigação agrária, para o Instituto de Qualidade Alimentar, para os organismos de regulamentação e regularização do mercado e também para o fomento agrário, embora neste caso apenas em termos reate, e ainda para diversos organismos ligados às pescas.
Reduzem-se em quase 1 750 000 contos as verbas para investimentos do Plano, que passam de mais de 5,5 milhões de contos, em 1979, para bem menos de 4 milhões de contos em 1980, o que representa, em termos reais, uma diminuição superior a 55 %.
No entanto, pese embora todas estas diminuições, o Sr. Goulão e a Secretaria de Estado da Estruturação Agrária vêem as suas verbas aumentadas em 76%, o que nos leva a concluir que aquele poderá continuar, poderá mesmo agravar, a política inconstitucional, arbitrária e violência contra a Reforma Agrária, transformando-se esta ofensiva num dos objectivos prioritários deste Governo.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O que se torna claro, através do reforço orçamental da SEEA e da retirada de verbas a outros organismos, é a demagogia deste Governo. O que fica claro são as intenções reaccionárias deste Executivo.

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bera!

O Orador: - E não deixa de ser caricata a posição do Governo e dos seus apoiantes:
Por um lado, bradam aos quatro ventos estar em marcha a «verdadeira Reforma Agrária»; por outro lado, minimizam o apoio ao sector agrícola, como é claro pelas propostas aqui apresentadas.
A fixação de preços justos, o fornecimento e escoamento de produtos- com qualidade garantida e em tempo oportuno, o desenvolvimento de uma política que determine o aumento da produção e da produtividade, a cedência de créditos de curto, médio e longo prazo, com juros acessíveis e prazos de amortização dilatados, o apoio à formação profissional e à investigação, numa palavra: a melhoria das condições de vida dos trabalhadores agrícolas e pequenos e médios agricultores, pouca, importância têm, para este Governo.

O Sr. António Lacerda (PSD): - Não apoiado!

O Orador: - Os pequenos e médios agricultores e os trabalhadores agrícolas da Reforma Agrária vão continuar a esforçar-se para produzir batata, azeite, vinho, tomate ou cereais...

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - ..., o Estado continuará a não garantir o seu oportuno escoamento nem a fixação de preços justos.
Vamos continuar a importar produtos agro-alimentares no valor de milhões de contos, porque este Governo nada faz no sentido de incrementar a produção de forragens que possibilitem o aumento da produção pecuária sem recurso a concentrados; nada faz com vista a aumentar a área regada e a introdução de novas culturas; nada faz que determine o aumento da produção e da produtividade.
Vamos continuar a ter uma agricultura pobre de investimentos, porque este Governo não protege os rendeiros das arbitrariedades dos senhorios ricos, nem incentiva o investimento através de uma correcta política de créditos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Mas este Governo vai continuar o ataquei à Reforma Agrária, embora aí tenham sido dados importantes passos no sentido de tirar a agricultura da situação- de atraso, mesmo sem quaisquer apoios.
A campanha demagógica a que vimos assistindo ultimamente não ilude quantos trabalham a terra.

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Experimentados estão nas promessas ridículas e no escamotear da efectiva concretização dos problemas que os afligem.
E é nesta perspectiva que se tornam compreensíveis os documentos que o Governo agora nos apresenta.
O que lhe importa, para já, é a reconstituição do poder dos latifundiários e a garantia dos privilégios dos senhorios ricos, a que este Governo está ligado!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É também conhecido que este Governo estabeleceu como prioridade fundamental da sua política a entrada de Portugal na CEE. E são igualmente conhecidas as dificuldades que a agricultura portuguesa acarreta para tal entrada.
Enganam-se aqueles que pensam que este Governo, com tal prioridade, daria a melhor atenção aos problemas da agricultura.
Pelo contrário, o Governo sabe que a entrada na CEE acarretará a liquidação de milhares e milhares de pequenas explorações agrícolas, e por isso, esforça-se, sim, por limpar desde já todos os obstáculos colocados no caminho que levaria Portugal à CEE; ou seja: as pequenas explorações agrícolas e a Reforma Agrária.
Aquelas, porque dificultam tal entrada e porque logo seriam inviabilizadas, do que decorreriam enormes custos económicos, sociais e também políticos, estes para as forças da direita.
A Reforma Agrária, porque não se coaduna com os princípios políticos das multinacionais do Mercado Comum.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: As propostas do Plano e do OGE apresentadas por este Governo encerram uma política contrária aos interesses dos pequenos e médios agricultores e dos trabalhadores da Reforma Agrária.
Estas propostas são uma afronta à agricultura e à economia e de forma alguma se coadunam com a defesa dos interesses dos agricultores e com o Portugal de Abril.
Por isso, nos opomos a elas.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Catarino.

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O Sr. Luís Catarino (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É estranho que o Governo se limite a enunciar umas quantas intenções, relativas à agricultura, pescas, energia e transportes, tão vagas, que bem se poderá afirmar que não existe matéria susceptível de ser discutida e criticada.
Sabemos que se trata das Grandes Opções do Plano, das grandes linhas gerais da nossa actividade económica, mas a sua vacuidade é de tal ordem, que esta Assembleia tem dificuldades graves em perspectivar o sentido das medidas que o Governo irá adoptar na elaboração futura do Plano.
Assim, resta-nos colocar algumas questões que julgamos essenciais, a fim de saber quais as posições do Governo no desenvolvimento e caracterização futura das suas grandes opções.
Nas áreas da agricultura, tendo em vista o Governo incrementar a produção de matérias-primas, falta saber como ele vai compatibilizar tal objectivo, com a sua actuação contra a Reforma Agrária e os arrendamentos ao cultivador directo.
A acção do Governo tem incentivado o absentismo, o abandono, a destruição das UCPs e cooperativas, a reconstituição do latifúndio e da grande exploração individual que conduz à extensificação e não à intensificação cultural; tem, com a sua actuação, permitido, a instalação de condições, de insegurança social e profissional nos arrendatários cultivadores, tem con sentido até o ressurgimento de formas de exploração ultrapassadas e mesmo ilegais, como a parceria rural e as rendas em géneros.
Todos os anos o País tem notícias sobre o problema do abastecimento da batata, que se instala com impressionante regularidade, numa repetição cíclica que não abona a eficácia dos Executivos.
Como pensa o Governo resolver esse problema de modo, a garantido escoamento pronto do produto, a impedir á actuação, especulativa dos grandes armazenistas e intermediários e a satisfazer o consumo público?
Sabendo que a distribuição dos bens de consumo é um problema grave num país que importa grande parte dos seus produtos alimentares, nada temos, nas Grandes Opções, que aponte ao critério de solução dos problemas idos respectivos circuitos, nomeadamente quanto à eventual integração das cooperativas de produção agrícola em cooperativas de transformação e comercialização, meio que bem poderia oferecer uma base autodefensiva e de garantia de controle das estruturas de comercialização dos produtos.
Ainda relativamente à questão dos circuitos de comercialização e também quanto à defesa dos preços à produção, que pensa o Governo da instalação da rede nacional do frio?
Afirma ainda o Governo que se propõe reduzir as assimetrias do desenvolvimento agrícola, mas não vemos como isso poderá. decorrer da sua actuação governativa de reconstituição do latifúndio e do reaparecimento do desemprego e da fome no Alentejo. Impor-se-á que o Governo explique como compatibilizará o seu propósito com esta situação.
Contradição patente se encontra ainda entre o enunciado do Programa do Governo no sentido de incentivação da agricultura de grupo e de realização das tarefas comuns e o seu actual propósito de distribuição de terras no Alentejo, a título individual.
Para além dos possíveis esclarecimentos sobre este ponto, conviria que o Governo nos elucidasse acerca da expressão jurídica que tomam, as adjudicações feitas até agora e a fazer no futuro.
E ainda quanto a esta matéria haveria que poder perspectivar-se o que pensará o Governo do estabelecimento do aparelho técnico-jurídico de suporte dos meios que, por sua natureza, devem ser usados em comum, seja no domínio técnico, seja no domínio das estruturas comerciais a montante e a jusante da actividade, produtiva dessas empresas individuais. Por exemplo, no tocante à utilização de maquinaria, de custos elevadíssimos, ao apoio técnico de natureza especializada, como pode perspectivar-se a inserção de cada pequeno empresário individual de forma a poder ele suportar- os custos daqueles apoios, ou seja, como viabilizará ele a sua exploração em face daquelas necessidades?
Também não se vê das Grandes Opções, como vai o Governo resolver os problemas sociais, técnicos e económicos decorrentes da pulverização minifundiária do Norte do País. Num tempo de necessidade de aumento de produção do sector e do declarado propósito do Governo acelerar a integração na CEE, necessário seria podermos desde já antever o que neste ponto irá suceder no desenvolvimento do Plano, mas, tal como noutras matérias, não é possível descortinar a intenção do Governo!
Finalmente, e para terminar as nossas considerações relativamente à agricultura, que medidas pensa tomar o Governo para não agravar o desemprego num momento em que se assiste ao despedimento de numerosos trabalhadores rurais no Alentejo e ao despedimento de muitos rendeiros no Centro e no Norte do País, vítimas de uma Lei de Arrendamento Rural toda ela assente no regime de denúncia dos contratos numa base de interesses individualistas dos proprietários da terra?
Quanto ao sector dás pescas, igualmente o Governo, nas opções que nos apresenta, não deixa adivinhar que soluções em. concreto irá apontar no Plano. Pior, desde já se pressente, dada a filosofia política da AD, da reconstituição dos grande interesses privados que tal vacuidade é intencional e disfarça o propósito de tomar medidas de destruição do sector nacionalizado e da reconstituição dos grupos exploradores que dominaram as pescas, antes do 25 de Abril.

O Sr. António Lacerda (PSD): - Não apoiado!

O Orador: - Alguns pontos nos inquietam sobremaneira, nomeadamente a estratégia de exploração da Zona Económica Exclusiva Portuguesa quanto a investigação científica e aos novos meios técnicos necessários a essa exploração. Nada o Governo aponta sobre isto.
Igualmente uma outra questão para a qual as Grandes Opções deveriam já apontar o sentido das soluções prende-se com o nosso eventual acesso a zonas de pesca sob jurisdição de outros Estados e aos necessários acordos com outros países, nomeadamente as nossas antigas colónias. E, todavia, nada vem perspectivado nesse sentido no documento agora em análise.
Ainda uma outra questão: que pensa o Governo da, articulação dos interesses da CEE com os interesses

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de Portugal na Zona Económica Exclusiva? E ainda, com referência à CEE, o que pensa o Governo quanto ao futuro da nossa industria conserveira em função das Comunidades Europeias?
Todo o País sabe que o volume de captura de pescado vem diminuindo regularmente de ano para ano. Ligando este problema necessariamente a aspectos científicos que não estão tratados em Portugal, mas dizendo mais directamente respeito ao problema imediato da desactualização tecnológica da nossa frota pesqueira, bom seria adivinhar das intenções do Governo quanto ao reapetrechamento dos barcos pesqueiros, agora naturalmente virados para a exploração da Zona Económica Exclusiva. Como também seria útil podermos prever a posição do Governo quanto, ao apoio das estruturas portuárias e de assistência e, bem assim, quanto à decantada rede nacional do frio como elemento estabilizador de preços a pagar ao armador, do fornecimento de matéria-prima à indústria e à regularização do consumo.
A perspectiva de desenvolvimento económico-social que o Governo oferece da agricultura e das pescas não assenta na consideração de que tais sectores são áreas de desenvolvimento prioritário onde os investimentos a realizar teriam alta reprodutividade em termos de futuro nacional, contribuindo decisivamente para a melhoria da nossa balança comercial, pois que o Governo ainda não considera atingidos, na agricultura, as alterações fundiárias que prossegue e não confessa e que são a liquidação das formas de exploração colectiva da Zona da Reforma Agrária e a eliminação do minifúndio no Norte através do livre funcionamento das regras do mercado e não pela prática dos princípios do associativismo; na pesca, a destruição do sector público e a reconstituição das estruturas tenreiristas do 24 de Abril.
Relativamente à energia, apesar dela constituir um dos eixos em volta dos quais gira hoje o destino das nações e dos homens, o Governo, lacónica e displicentemente, apenas se propõe «assegurar maior grau de satisfação, das crescente necessidades energéticas do País com o menor agravamento possível da actual dependência energética». É uma intenção louvável mas, como ideia, exprime uma banalidade e como opção de Governo não tem conteúdo.
Bastaria atentar, na sensibilidade da comunidade internacional relativamente ao problema da energia para se esperar que os Portugueses tivessem os frutos da reflexão dos seus governantes sobre esta questão. Diferentemente, parece que o propósito do Governo será deixar correr as coisas como têm corrido até aqui, inscrevendo cada ano cifras mais gigantescas no passivo da nossa balança comercial.
A situação no nosso país é clara: as fontes de energia nacionais referenciadas são muito limitadas, o consumo cresce todos os anos e continuará a crescer, dada a baixa capitação actual.
Temos, todavia, recursos hidroeléctricos importantes; num clima ameno que não exige grandes consumos para aquecimento ou para refrigeração da habitação e dos locais de trabalho; o País situa-se numa latitude que já permite uma rendível apropriação de energia solar; dispomos de condições naturais que favorecem o estabelecimento de uma rede barata de transportes fluviais e marítimos temos
Reservas de urânio; temos boas esperanças de encontrar significativas reservas de carvão; há, ainda, possibilidades de encontrar petróleo e gás natural (que os espanhóis já encontraram na costa a pequena distância de Ayamonte).
Perante este quadro, que irá o Governo fazer? Várias coisas deveria ter o propósito de executar, como a imediata pesquisa de recursos energéticos, designadamente carvões, apropriação de energias novas com particular relevo para a energia solar, mudança de hábitos e de opções de consumo.
Perante 130 milhões de contos que a importação de petróleo nos vai custar em 1980 o Pais exigiria medidas imediatas: programas de investigação, pesquisa de carvões e da gás natural, substituição de formas de emergia, promoção de empresas que lhes ofereçam a produção de energia sob novas formas, etc. Todavia, as Opções apresentadas nada apontam nesse sentido. Será que as quatro linhas incompletas, que são as Opções em matéria energética, são para o Governo a base para a elaboração de um Plano anual para a resolução destes problemas?
As Opções enunciadas em matéria de transportes são igualmente demasiado vagas e insuficientes.
O aspecto mais concreto que se apresenta é o da revisão do Plano Rodoviário Nacional apontado para o prosseguimento da construção de auto-estradas, o que, de alguma forma, poderá ser mais uma exigência dos interesses de futura integração na CEE, do que a satisfação das questões importantes do desenvolvimento regional.
Teme-se, todavia, que o esforço, económico canalizado para tal empreendimento não venha obter a contrapartida suficiente em vantagens significativas para compensar o esforço despendido.
Relativamente à «satisfação das necessidades reais de deslocação e comunicação portuguesa» não se transmite a menor ideia dos processos por que se pretende assegurar tal satisfação e dos critérios a usar para a determinação dessas necessidades. Problema grave e complexo, pois a sua solução passa por considerações sobre a ocupação de solos, horários de trabalho e outros aspectos que influenciam a organização de uma resposta adequada por parte do Executivo.
Sabemos que reina uma grave desorganização nos serviços das repartições públicas ligados aos transportes interiores, sem planeamento, com serviços altamente burocratizados e com deficiências de organização graves por parte dos operadores.
O aspecto fundamental da reorganização é o do aproveitamento dos recursos disponíveis, evitando-se o actual desperdício pela total ausência de coordenação e a existência de. concorrência desenfreada.
A reorganização do sistema de transportes deve ser orientada no sentido de conferir prioridade às medidas de fomento do transporte público em detrimento do transporte individual, cuja utilização congestiona o tráfego e implica maior consumo de combustível...
São estas, Sr. Presidente, Srs. Deputados e Srs. Ministros, algumas objecções que o MDP levanta às Grandes Opções. São criticas à forma vaga,

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imprecisa e completamente indefinida como o Governo perspectiva a sua futura actividade.

Aplausos do PCP e de alguns Deputados do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, o Sr. Deputado Borges de Carvalho.

O Sr. Borges de Carvalho (PPM): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Tal como ontem anunciámos, cabe-nos hoje, para além de unia curta declaração de carácter político que farei no fim desta intervenção, colocar à consideração do Governo e desta Câmara algumas das interrogações que o Plano apresentado suscita ao Grupo Parlamentar do PPM, e que gostaríamos de ver focadas e esclarecidas com algum pormenor.
Assim, no ponto 32 do Plano, declara, o Governo a sua intenção de focalizar o desenvolvimento da agricultura no sentido de prover à dieta alimenta; dos portugueses e ainda de fornecer matérias-primas para as indústrias transformadoras. Perguntamos até que ponto uma e outra destas finalidades será prosseguida e quais os respectivos limites.
Julgamos que, antes de mais, a produção de bens alimentares é fundamental para o futuro do País. Portugal não é país de aptidão florestal em que a política tecnocrática o pretende transformai, mas sim um país onde é necessário continuar a promover o desenvolvimento da agricultura, a fim de se garantir a ocupação do território, a alimentação dos Portugueses e a própria segurança das populações.
No ponto 34 (industria), uma expressão nos causa alguma estranheza. É ela a de «maximizar o aproveitamento dos recursos minerais». Cremos que tal expressão corresponde a um conceito errado, pois que uma pura maximização de tal aproveitamento redunda fatalmente, em intervenções delapidadoras que provocam a desertificação e a entrega à irrecuperabilidade prática de vastas extensões do solo pátrio.
Em muitas áreas, onde se deu a exploração superficial de minérios, não há qualquer medida, de recuperação dos solos para outro uso, como o agrícola, por exemplo. O que há, pois, a fazer é não maximizar, mas optimizar o aproveitamento dos recursos minerais no sentido de não permitir que esse Escrevam, vão aproveitamento deixe atrás de si uma paisagem desértica e irrecuperável por largos anos.
No ponto 37 (transportes e comunicações), notamos que não há qualquer referência aos sistemas de estradas regionais, ou a um sistema viário rural. É facto que a execução de tais empreendimentos deverá pertencer fundamentalmente às autarquias. No entanto, julgamos que, a nível de política geral viária, deveriam constar, pelo menos, os princípios orientadores de uma política viária local até no sentido de compatibilizar as pequenas redes com a rede de estradas principais que se pretende implantar e que merece o nosso inteiro aplauso.
No capítulo que se refere ao auxílio da CEE, julgamos que não está incluída ou, se o está, encontra-se diluída noutras alíneas, uma acção de desenvolvimento regional que consista na recuperação das paisagens deprimidas, degradadas ou em vias de abandono, através da implantação de infra-estruturas, de comparticipação adequada segundo a zonagem ecológica, tendo em vista o máximo de diversificação agrícola e de polimorfia paisagística.
Também na política de emprego, julgamos que, deveria ter sido incluída uma alínea respeitante ao emprego de mão-de-obra temporariamente excedentária da agricultura em obras de valorização regional.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Foi este Governo colocado no Poder por expressa vontade popular. Vontade expressa, que não é o resultado de uma inércia eleitoral, mas sim de uma reflexão nacional que veio alterar substancialmente o curso do fenómeno político português e colocá-lo sob a orientação de forças políticas, até então afastadas da condução da coisa pública.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Por este facto, reforçada ficou a autoridade deste Governo para cumprir as suas promessas eleitorais, nomeadamente naquilo que elas representam de inovador ou de diferente em relação aos caminhos anteriormente seguidos.
Para operar a mudança prometida e, além de tudo o mais, para viabilizar, a sua proposta orçamental, impossível de cumprir se não obtiver resposta adequada por parte dos investidores e dos cidadãos, necessitava o Governo da publicação de diversos diplomas, entre os quais avulta a Lei de Delimitação do Sector Púbico e do Sector Privado, sem a qual difícil será a atracção dos capitais indispensáveis ao desenvolvimento económico, sem a qual não será possível corrigir o desequilíbrio que o empolamento do Estado como entidade económica, sempre potencialmente monopolista, provoca, a todos os níveis.

Vozes do PSD e do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Por isso, deu esta Assembleia autorização ao Governo para legislar nesse sentido, dando nova redacção a diversos artigos da Lei n.º 46/77, de 8 de Julho.
Mas, por estranha determinação dos fados, a vontade popular representada nesta Câmara e neste Governo não ê soberana, ou não tem soberania plena.
A Constituição entrega a órgãos que nada têm a ver com os tribunais, que deveriam ser a única entidade legítima nestes casos, o «julgamento» (e digo julgamento entre - aspas) da constitucionalidade dos diplomas legais-a Comissão Constitucional e o Conselho da Revolução. Naquela, o voto não é unânime. Muito pelo contrário, quatro dos seus membros votam vencidos e dos que votam a favor, três fazem declarações de voto restritivas.
Apesar disso, o Conselho da Revolução -órgão saído do período revolucionário e fruto dos estranhos e pouco democráticos pactos MFA/partidos -, a quem pertence a decisão final, opta pela inconstitucionalidade do diploma. E persiste, Sr. Presidente e Srs. Deputados, pois, segundo se soube hoje, o Conselho da Revolução acaba de considerar também inconstitucional o novo decreto-lei proposto pejo Governo.

O Sr. João Amaral (PCP): - Oh, Sr. Deputado. Olhe que isto é o Orçamento!

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O Orador: - Isto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, são decisões claramente políticas, claramente artigo-vernamentais, claramente concebidas e executadas para «retravar a actividade do Governo da Aliança Democrática e de o impedir de cumprir as suas promessas e, naturalmente, o não cumprimento dessas promessas, terá reflexos negativos no eleitorado. A atitude do Conselho da Revolução é, assim, uma atitude eleitoralista a favor da oposição, atitude claramente desestabilizadora e antidemocrática.

Vozes do PSD e do CDS: - Muito bem!

Vozes do PS e do PCP: - Não apodado!

O Orador: - O órgão constitucionalmente encarregado de «vigiar» a democracia e as leis, é o primeiro a dar o exemplo claro dos ataques aos órgãos do Estado que o são por efectiva escolha popular.

Vozes do PSD e do CDS: - Muito bem!

a Orador: - Onde estão neste momento os clamores do Partido Socialista de que é preciso respeitar a vontade popular? Onde a euforia democrática em que o voto servia para legitimar um Governo minoritário, quando este era socialista, mas hoje já não serve para legitimar um Governo maioritário, só porque este é da Aliança Democrática?

Vozes do PSD e do CDS: - Muito bem!

Vozes do PS e do PCP: - Não apoiado!

O Orador: - Porque não se ouvem agora os protestos do Partido Socialista quando a maioria desta Casa é posta politicamente em causa pelo Conselho da Revolução, mesmo servindo-se de um parecer mais que discutível até para quem o elaborou e assinou?

O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - Que é o respeito pela Constituição!

O Orador: - Por que hão se ouve a voz da oposição responder afirmativamente quando a Aliança Democrática fala em revisão constitucional, no sentido de devolver ao País uma via para um poder puramente oriundo da vontade popular?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A democracia portuguesa, a legitimidade do Governo a soberania popular são postos em causa, de maneira grave, pelas decisões do Conselho da Revolução de declarar a inconstitucionalidade das alterações legisladas pelo Governo da Aliança Democrática, seguindo aquele Órgão sem parança uma política de provocação e confrontação sistemática com este Governo.

Vozes do PSD e do CDS: - Muito bem!

Vozes do PS e do PCP: - Não apoiado!

O Sr. João Amaral (PCP): - De provocação segue a Aliança Democrática!

O Orador: -O Pais tem de ser alertado para este facto, para que não fique a ninguém dúvidas sobre quem defende e quem não defende os princípios da democracia política, da soberania popular e da sua expressão em eleições..
O povo de Portugal tem de saber que é, de facto, ele quem mais ordena, ou se alguém, autonomeado, lhe cerceia a soberania.
O povo português julgará, a breve prazo, quero tem razão nesta querela.

Aplausos do PPM, do PSD e do CDS.

O, Sr. Presidente: - Srs. Deputados, comunico que o Centro, Democrático Social retira o pedido de sujeição, a ratificação que tomou o n.º 305/I, relativo ao, Decreto-Lei n.º 540/79, de 31 de Dezembro e que o Partido Comunista e- o Partido Socialista interpuseram o recurso quanto à admissão do projecto de lei n.º 455/I, apresentado pelos Deputados Pedro Roseta, Rui Pena e outros tendo sido admitido, como sabem, terá de cumprir-se o artigo 137.º do Regimento.
A Comissão de Regimento e Mandatos, em obediência ao disposto no artigo 141.º do Regimento, é de opinião que o projecto de lei n.º 368/I deva ser apreciado pela Comissão de Obras Públicas e Habitação e que a proposta de lei n.º 301/I, relativa às regiões autónomas, e quanto a diplomas provindos dos Órgãos de Soberania, deva ser apreciada pela Comissão de Assuntos Constitucionais.
Quanto a estes dois relatórios, se não houver oposição da Câmara, eles seguirão para as comissões indicadas no parecer.
Posto isto, creio que recuperámos alguma coisa em relação ao horário previsto. Amanhã, como sabem, os trabalhos iniciar-se-ão às 9 horas e 30 minutos.
Está encerrada a sessão.

Eram 22 horas e 25 minutos.

Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Social-Democrata (PSD)

Afonso de Sousa Freire de Moura Guedes.
Alcino Cabral Barreto.
Américo Abreu Dias.
António Augusto Lacerda de Queiroz.
António Duarte e Duarte Chagas.
António José dos S. Moreira da Silva.
António Maria Pereira.
Arménio dos Santos.
Carlos Matos Chaves de Macedo.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel da Cunha Dias.
Dinah Serrão Alhandra.
Eleutério Manuel Alves.
Fernando dos Reis Condesso.
Fernando José da Costa.
Fernando Manuel A. Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Germano da Silva Domingos.
João António Sousa Domingues
João Luís Malato Correia.
João Vasco da Luz Botelho de Paiva.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Jorge Rook de Lima.
José Angelo Ferreira Correia.

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1832 I SÉRIE - NÚMERO 45

José da Assunção Marques.
José Manuel Meneres Sampaio Pimentel.
José Maria da Silva.
José Theodoro da Silva.
Júlio de Lemos de Castro Caldas.
Luís António Martins.
Manuel António Araújo dos Santos.
Manuel Luís Fernandes Malaquias.
Maria Adelaide Santos de Almeida Paiva.
Maria Helena do Rego da C. Salema Roseta.
Maria Manuela Simões Saraiva.
Mário Dias Lopes.
Mário Marques Ferreira Maduro.
Natália de Oliveira Correia.
Nicolau Gregório dê Freitas.
Pedro Manuel da Cruz Roseta.
Rui Alberto Barradas do Amaral.

Partido Socialista (PS)

Agostinho de Jesus Domingues.
Albano Pereira da Cunha Pina.
Alberto Rodrigues Ferreira Camboa.
António Cândido de Miranda de Macedo.
António Carlos Ribeiro Campos,
António Chaves Medeiros.
António Fernandes da Fonseca.
António Francisco Barroso Sousa Gomes.
António José Sanches Esteves.
António José Vieira de Freitas.
António Manuel Maldonado Gonelha.
António Manuel de Oliveira Guterres.
Aquilino Ribeiro Machado.
Armando Filipe Cerejeira P. Bacelar.
Avelino Ferreira Loureiro Zenha.
Bento Elísio de Azevedo.
Carlos Alberto Costa de Sousa.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Natividade Costa Candal.
Edmundo Pedro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Fernando Alves de Almeida Miranda,
Francisco de Almeida Salgado Zenha.
Francisco Cardoso P. de Oliveira.
Francisco Manuel Marcelo M. Curto.
Frederico A. F. Handel de Oliveira.
Gualter Viriato Nunes Basílio.
Herculano Rodrigues Pires.
Jaime José Matos da Gama.
João Cardona Gomes Cravinho.
João Joaquim Gomes.
Joaquim José Catanho de Meneses.
Joaquim Sousa Gomes Carneiro.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Maria Parente Mendes Godinho.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Luís Abílio da Conceição Cacho.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Manuel Francisco da Costa.
Manuel Joaquim de M. P. Tavares Santos.
Manuel José Bragança Tender.
Maria Teresa V. Bastos Ramos Ambrósio.
Mário Alberto Nobre Lopes Soares.
Rodolfo Alexandrino Susano Crespo.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Teófilo Carvalho dos Santos.
Victor Manuel R. Fernandes de Almeida.

Partido Comunista Português (PCP)

António Dias Lourenço da Silva.
Carlos Alfredo de Brito.
Domingos Abrantes Ferreira.
Ercília Carreira Pimenta Talhadas.
Fernando Freitas Rodrigues.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
Joaquim Jorge dos Santos.
Jorge do Carmo da Silva Leite.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
José António Veríssimo Silva.
José Manuel Aranha Figueiredo.
José Manuel do C. Carreira Marques.
Lino Carvalho de Uma.
Octávio Augusto Teixeira.
Rosa Maria Reis A. Brandão Represas.
Victor Henrique Louro de Sá.
Vital Martins Moreira.
Zita Maria de Seabra Roseiro.

Centro Democrático Social (CDS)

Adalberto Neiva de Oliveira.
Alfredo Albano de C. de Azevedo Soares.
Américo Maria Coelho Gomes de Sá.
António Martins Canaverde.
Carlos Alberto Faria de Almeida.
Eduardo Leal Loureiro.
Eugênio Maria Anacoreta Correia.
Francisco Gonçalves Cavaleiro de Ferreira.
Henrique Manuel Soares Cruz.
Henrique Rocha Ferreira.
Isilda Silva Barata.
João J. S. Fernandes Homem.
João da Silva Mendes Morgado.
Joaquim Rocha dos Santos.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
Luís Carlos C. Veloso de Sampaio.
Luís Gomes Moreno.
Manuel António de A. e Vasconcelos.
Manuel Baeta Neves.
Manuel Cunha Mota.
Maria Tabita L. F. Mendes Soares.
Narana Sinai Coissoró.
Rogério Leão.
Ruy Garcia de Oliveira.
Victor Afonso Pinto da Cruz.

Partido Popular Monárquico (PPM)

Augusto Martins Ferreira do Amaral.
Luis Filipe Ottolini Bebiano Coimbra.

Agrupamento Parlamentar dos Reformadores

Francisco José de Sousa Tavares.
José Manuel Medeiros Ferreira.
Nuno Maria Monteiro Godinho de Matos.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE)

Herberto de Castro Goulart da Silva.
Luis Manuel A. de Campos Catarino.

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Deputados que faltaram à sessão:

Partido Social-Democrata (PSD)

António Maria de Orneias Ourique Mendes.
Germano Lopes Cantinho.

Partido Socialista (PS)

Alberto Arons Braga de Carvalho.
António de Almeida Santos.
Armando dos Santos Lopes.
Fernando Luís de Almeida Torres Marinho.
João Alfredo Félix Vieira Lima.
José Gomes Fernandes.
José Luís do Amaral Nunes.
Luís Silvério Gonçalves Saias.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Maria de Jesus Simões Barroso Soares.
Vítor Manuel Ribeiro Constâncio.

Partido Comunista Português (PCP)

Álvaro Barreirinhas Cunhal.

Centro Democrático Social (CDS)

Francisco António Lucas Pires.
Francisco Manuel Lopes Vieira Oliveira Dias.
José Augusto Fernandes Sanches Osório.
Manuel Eugênio P. Cavaleiro Brandão.

O CHEFE DA DIVISÃO DE REDACÇÃO, José Pinto.

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PREÇO DESTE NÚMERO 90$00

IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA

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