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I Série-Número Sexta-feira, 2 de Maio de 1980 1835

DIÁRIO da Assembleia da República

I LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1979-1980)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 30 DE ABRIL DE 1980

Presidente: Exmo. Sr. Leonardo Eugénio Ramos Ribeiro de Almeida

Secretários: Exmos. Srs. Manuel Henriques Pires Fontoura
Alberto Marques Antunes
José Manuel Mala Nunes de Almeida
João Daniel Marques Mendes

SUMÁRIO.- Prosseguiu e concluiu-se o debate na generalidade das propostas de lei n.º 307/I e 308/I (sobre o Orçamento Geral do Estado e as Grandes Opções do Plano para Í980. respectivamente), tendo ai mesmas sido aprovadas.
Intervieram no debate, a diverso titulo, além dos Srs. Ministros da Habitação e Obras Públicas (João Porto}, da Agricultura e Pescas (Cardoso e Cunha), dos Assuntos Sociais-(Morais Leitão) e das Finanças e do Plano (Cavaco e Silva), os Srs. Deputados João Pulido (CDS). Carlos Espadinha (PCP), Igrejas Caeiro (PS), Ilda Figueiredo (PCP). Helena Cidade Moura (MDP/CDE), Manuel Pereira (PSD), Portugal da Fonseca (PSD). Vítor Vasques (PS), Oliveira Dias (CDS), Manuel Malaquias (PSD), Sousa Tavares (DR). Eduardo Ferreira (PS). Marino Vicente (PCP). Jaime Gama (PS), João Vasco Paiva (PSD). Alcino Barreto (PSD). Amândio de Azevedo (PSD), Azevedo e Vasconcelos (CDS), Mário Tomé (UDP). José Cardoso (PSD), Luis Coimbra (PPM). Rosa Brandão (PCP), Adriano Rodrigues (CDS), Vítor Louro (PCP), Miranda da Silva (PCP), António Campos (PS). Mário Lopes (PSD), José Manuel Casqueiro (CDS), João Cravinho (PS), Luis Barbosa (CDS), Octávio Teixeira (PCP), Mário Adegas (PSD). José Antónia Veríssimo (PCP), Fernando Roriz (PSD), Sousa Gomes (PS), Ferreira do Amaral (PPM), Veiga de Oliveira (PCP), Herberto Goulart (MDP/CDE). Lucas Pires (CDS), Zita Seabra (PCP), António Guterres (PS) e Carlos Carvalhas (PCP).
Depois de anunciar a entrada na Mesa de uma proposta de lei (n.º 318/I) e de quatro projectos de lei (n.ºs 463 a 466/I), o Sr Presidente deu a sessão por encerrado eram 0 horas e 45 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 10 horas.

Fez-se a chamada, à qual Responderam os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD)

António Duarte e Duarte Chagas.
António José Ribeiro Carneiro.
Armando António Correia.
Carlos Manuel Pereira de Pinho.
Cecília Pita Catarino.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Fernando José Sequeira Roriz.
Fernando Raimundo Rodrigues.
Germano Lopes Cantinho.
Germano da Silva Domingos.
Hermenegildo José da Silva Tavares.
João António Sousa Domingues.
João Baptista Machado.
João Luís Malato Correia.
Joaquim Marques Gaspar Mendes.
Jorge Rook de Lima.
José Baptista Pires Nunes.
José Henrique Cardoso.
José Maria da Silva.
Leonardo Eugénio R. Ribeiro de Almeida.
Manuel António Araújo dos Santos.
Manuel António Lopes Ribeiro.
Manuel Henriques Pires Fontoura.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Manuel Pereira.
Mário Martins .Adegas.
Nuno Aires Rodrigues dos Santos.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Valdemar Cardoso Alves.

Partido Socialista (PS)

Adelino Teixeira de Carvalho.
Alberto Marques Antunes.
Amadeu da Silva Cruz.
António Cândido de Miranda de Macedo.
António Carlos Ribeiro Campos.

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António Fernando Marques R. Reis.
António Manuel de Oliveira Guterres.
Carlos Cardoso Lage.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Francisco de Almeida Salgado Zenha.
Francisco Igrejas Caeiro.
Herculano Rocha.
Herculano Rodrigues Pires.
Joaquim José Catanho de Meneses.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
Luis Abílio da Conceição Cacho.
Manuel Francisco da Costa.
Manuel Joaquim d& M. P. Tavares Santos.
Mário Alberto Nobre Lopes Soares.

Partido Comunista Português (PCP)

Adalberto António de V. Casais Ribeiro,
Alberto Jorge Fernandes.
Álvaro Favas Brasileiro.
António da Silva Mota.
Carlos Albano do C. da Costa Espadinha.
Carlos Alberto do Vale G. Carvalhas.
Custódio Jacinto Gingão.
Dinis Fernandes Miranda.
Ercília Carreira Pimenta Talhadas.
Fernando Freitas Rodrigues
Francisco Miguel Duarte.
Hélder Simão Pinheiro.
João António Gonçalves do Amarai.
Joaquim António Miranda da Silva.
José Casimiro Sousa Correia.
José Manuel Aranha Figueiredo.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Rodrigues Vitoriano.
Josefina Maria Andrade.
Manuel Gaspar Cardoso Martins.
Maria Beatriz Ladeiras da Silva Nunes.
Maria da Conceição Morais Matias.
Maria Ilda da Costa Figueiredo.
Rosa Maria Reis. A. Brandão Represa».
Victor Henrique Louro de Sá.

Centro Democrático Social (CDS)

Adriano Vasco da Fonseca Rodrigues.
Alfredo Albano de C. de Azevedo Soares.
Alexandre Correia de Carvalho Reigoto.
António Ferreira Pereira de Melo.
João Daniel Marques Mendes.
João José Magalhães F. Pulido de Almeida.
João da Silva Mendes Morgado.
Luís António Matos Lima.

Victor Afonso Pinto da Cruz.

Partido Popular Monárquico (PPM)
Gonçalo Pereira Ribeiro Teles.
Luís Filipe Ottolini Bebiano Coimbra.

Agrupamento Parlamentar dos Reformadores Pelágio E. de A. Matos Lopes de Madureira.

O Sr. Presidente: - Responderam à chamada 85 Srs. Deputados. Temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão,

Eram 10 horas e 20 minutos.

O Sr. Presidente: - Prosseguindo o debate na generalidade das propostas de lei do Orçamento e das Grandes Opções do Plano, tem a palavra o Sr. Deputado João Pulido para uma intervenção.

O Sr. João Pulido (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Subo hoje a esta tribuna para me debruçar sobre um problema da maior relevância e transcendência política, em sistema democrático e de direito, e que, por isso mesmo, não poderia escapar sem uma análise honesta e reflexão profunda à luz da cristalina transparência que um sistema deste tipo permite e até exige ou aconselha seja feita, para que através de correcta exigisse se possa concluir, ou não, pelo caminho que havia sido apontado como mais acertado e dar-se conta da firmeza na execução que havia sido prometida e de uma realidade que pode ser alcançada.
Refiro-me, concretamente, às propostas de lei do Plano e do Orçamento ora em apreço. São estes documentos que consubstanciam, em realidade, a mudança pela AD prometida ao povo português e que este, em 2 de Dezembro, escolheu porque ansioso por se reencontrar consigo próprio, na tradição histórica mas, simultaneamente, ambicioso, porque desejoso de arrancar para uma dinâmica de vida político-económico-social conducente a um melhor bem-estar, em que a paz e a abastança em liberdade sejam vectores e. realidade palpável, a todos beneficiando.
E esse povo, que em nós outros confiou, aí tem, como à saciedade fica demonstrado, que nós tínhamos razão quando preconizávamos que a solução para 05 problemas que afligiam, e ainda afligem todo o povo português - mas todo ?,£m excepção - teria de passar por linha bem divergente e diversificada, na filosofia política, económica e social que a enforma e distancia da preconizada e seguida pelos governos que, directa ou indirectamente, geriram a coisa pública até à constituição do actual Governo.
Compulsem-se, analisem-se e comparem-se as propostas de lei dos vários planos e orçamentos que vieram a esta Casa, apresentados por anteriores Executivos, e veja-se como é diferente o realismo que este encerra, porque conjugado com as possibilidades e capacidades de um povo e recursos de uma Nação que reflecte as realidades, da conjuntura e se conjuga com a necessidade imperiosa de «mudança», para melhor bem-estar e prosperidade de um povo, a quem tudo se prometeu de bom, como fruto da Revolução de Abril, mas muito pouco ou quase nada do real e concreto alardeado fora concretizado.
Mas, enfim, pôde chegar o momento, em que esse mesmo povo, que é o povo português, toma consciência de si próprio e das realidades possíveis e pode começar a lobrigar «saída do túnel» para que o tinham empurrado - e isto para usar a imagem do Sr. Ministro das Finanças - e pode sentir o renascer das suas esperanças e redobrar a sua confiança neste Governo do presente e que reconduzirá no futuro, estou certo, porque executa o que promete, e só promete o que lhe é possível executar, com realismo e autenticidade democrática, tendo em vista atingir o que é possível, com coerência e firmeza, sem desvios utópicos ou «sonhos de cores» que se não quadram com a índole e o querer de um povo que tem a sua tradição, que muito preza a sua sensibilidade, e que

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não tolera, como deu provas, ser conduzido por caminhos de «certa aventura», que repugnem à sua consciência e ou sejam negadas pela sua inteligência.
E o Governo, porque sendo também povo, idêntico nestes e noutros predicados aos seus concidadãos, retribui no exercício e desempenho das suas funções a confiança que em si depositou, trazendo aqui, aos representantes legítimos do povo e por ele mandatados, o plano de realizações e o modo e meios como as executar, demonstrando, assim, a sua capacidade executória, a sua coerência e fidelidade aos princípios programados e prometidos ao povo português pela Aliança Democrática.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Um dos «cavalos de batalha» em que a polémica mais viva se tem aflorado, dentro e fora desta Câmara pela oposição, parece ter sido a que decorre da aplicação da Lei das Finanças Locais, no OGE para 1980.
Parece pretender-se fazer crer ao povo português que o Orçamento em apreço e apresentado a esta Câmara não contempla as autarquias com as verbas que pela Lei n.º 1/79 o Governo deveria inscrever e vir a transferir do OGE para a área jurisdicional dos municípios.

O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Muito bem!

O Orador: - Ora, tanto pelo que os documentos em apreço nesta Assembleia da República, como pelas intervenções aqui já produzidas, em que destaco as intervenções do Sr. Ministro das Finanças, há dois dias, e a do Sr. Ministro da Administração Interna, ontem, os meios financeiros atribuídos às autarquias locais virão a possibilitar, através do OGE, recursos financeiros superiores em 38 % ao ano de 1979.
Mais receberão ainda os municípios a totalidade das receitas da contribuição predial e do imposto sobre veículos, que este ano registam substancial aumento dado o ajustamento de taxas, devido a ter sido abolido o imposto extraordinário em vigor no ano de 1979, cujo valor revertia na totalidade para o Estado.
E, se isto, por um lado, não é menos importante, a proposta do Governo de criação de uma linha de crédito especial e bonificado destinada às autarquias locais, tendo em vista o financiamento de investimentos nos sectores da habitação social, saneamento básico, ensino, viação rural e outros.
De evidenciar ainda e igualmente a criação de financiamentos intermunicipais, o que integra duas novas fontes alternativas de financiamento, que este Governo cria e pela primeira vez constam das propostas de lei do Plano e do OGE.
Deste modo, e com tais medidas, proeurou o Governo assegurar aos municípios meios financeiros que permitam realizações significativas no investimento de interesse local.
Também considera o Governo, e acertadamente, que o aumento de capacidade financeira se traduz em uma das formas, de apoio à consolidação do Poder Local, que deve ser conjugada inerentemente com o apoio ao aumento da capacidade técnica e â melhoria da gestão económico-financeira das autarquias.
E, em conjugação com estas medidas, veio o Sr. Ministro da Administração Interna ontem, de manhã, trazer ao conhecimento desta Câmara uma série de medidas tomadas pelo Governo e todas elas atinentes ao reforço do Poder Local e ao seu regular e bom funcionamento, tendo-se em vista valorizar esse mesmo poder e torná-lo eficiente nas múltiplas e complexas tarefas que cabem na vida político-económica, cultural e social dos povos, que intervêm na sua conduta e desejam viver em verdadeiro sistema democrático que institucionalizam, gerem e defendem.

O Sr. Macedo Pereira (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Deste modo, e neste sector, vem o Governo também actuando atempada e acertadamente e, assim, estão sendo criadas as condições para um «progressivo robustecimento do Ainda uma palavra de apoio que o CDS manifesta ao Governo e à sua atenção para com H situação das regiões autónomas que, como não podia deixar de ser, é devida e logicamente tornada. em conta.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Medidas inovadoras pela primeira vez são apresentadas e essa honra de imaginação e criatividade se fica devendo a este Governo, que não a outro qualquer anterior. A consolidação da democracia passa iniludivelmente pela consolidação do Poder Autárquico descentralizado, o que não seria possível conseguir-se sem que meios financeiros compatíveis e adequados constituíssem o suporte dessa estruturação.
Mas, dada a complexidade do sistema da mesma, que implica, além do mais, .um conjunto de normas legais que permitam sincronismo e eficiência de funcionamento das Administrações Central e Local, que ainda não existem no todo, dentro das quais se destaca, com real incidência, a legislação sobre delimitação de poderes entre Administração Central e Local, se viu forçado o Governo a inscrever e orçamentar, em vários ministérios, verbas avultadas em consignação a investimentos não definidos ainda nas competências próprias quer do Poder Central, quer do Poder Autárquico e que, naturalmente, passarão à jurisdição dos municípios, uma vez aprovada legislação adequada.
Porque o Governo tem a consciência perfeita., e clara e noção do indeclinável dever na defesa dos legítimos interesses das populações e porque das dificuldades na aplicação prática e correcta da Lei das Finanças Locais, sem que ainda existam os necessários suportes legais para uma perfeita aplicação, com os benefícios efectivos e práticos daí decorrentes, ponderada e sensatamente, sem atropelar o espírito da Lei n.º 1/79, encontrou fórmula para conciliar os verdadeiros interesses nacionais, respeitando o império da Lei das Finanças Locais e compatibilizando-a, na execução, com os interesses dos povos, cuja defesa será sempre ponto de honra, para um Governo que governe, sem tergiversação e fiel à ortodoxia dos princípios programáticos e apontados como rumo e acção a levar a cabo e que a maioria do povo mandou, em acto histórico, solene e público, a 2 de Dezembro passado.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Porque somos parte desse povo e legitimamente também aqui o representamos, o Partido do Centro Democrático Social, um dos parceiros da Aliança Democrática,

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que apoia o Governo, aprovará as propostas de lei do Plano e do Orçamento, pois tais documentos significam, no concreto, a promessa feita ao eleitorado e traduzem, no tempo, o começo de mudança que o povo livremente votou e deseja ver concretizado em plenitude.

Aplausos do CDS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra para uma intervenção o Sr. Deputado Carlos Espadinha.

O Sr. Carlos Espadinha (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Ministros: Nas Grandes Opções do Plano sobre a pesca diz exclusivamente assim: «aumentar a produção de pescado de modo a regular o abastecimento do consumo ao público e o fornecimento de matérias-primas às indústrias delas carecidas; controlar a subida de preços, nomeadamente quanto a 'determinados tipos de pescado; contribuir para a melhoria da balança de pagamentos mediante a diminuição de importações».
E é só isto que o Governo diz de um sector com tantas carências.
Mas vejamos se será ao menos isto possível? Daquilo que nos mostra o Orçamento, pensamos que não. Como se sabe, o sector sofreu agravamento em 1979 e apesar disso o Governo diminui o Orçamento em 10% para o ano corrente.
Além da diminuição do Orçamento, ainda temos o seguinte: estamos a mês e meio do final do contrato com a Mauritânia e neste momento o Governo nada fez para o renovar, as nossas cotas de pesca na África do Sul deminuíram e, em consequência, o País este ano vai ter menos pescada e no bacalhau a situação é igualmente crítica.
Entretanto nada foi feito nem se anuncia para valorizar a exploração das nossas 200 milhas.
Como é que podemos contribuir para a melhoria da balança de pagamentos mediante a diminuição de importações se continuarmos a não ter uma rede de frio que abranja o País? E ainda por cima as câmaras frigoríficas que temos estão nas mãos dos intermediários por forma tal que quando há peixe em mais abundância os pescadores têm que jogá-lo fora, tal como tem sucedido em todo o mês de Abril, designadamente na pesca da sardinha, trabalhando algumas das nossas fábricas de conservas com sardinha congelada que está a vir de Espanha, sendo apanhada nas nossas águas.
Entretanto, o Governo nada responde às propostas construtivas apresentadas com vista ao desenvolvimento de várias empresas do sector nacionalizado, que têm por fim o desenvolvimento em geral.
E o que é feito do velho plano nacional das pescas que já vem sendo anunciado desde os governos de Nobre da Costa e Mota Pinto e que também já foi anunciado no Governo Amaral/Sá Carneiro?
Seria este o pacote que estava anunciado para as comemorações do 24 de Abril? Digo... do 25 de Abril! Mesmo assim, ainda não foi desta. Acabou por ficar no bolso!
Por «todas estas questões se torna evidente que não pode haver aumento de produção nem o peixe pode chegar à maioria dos portugueses.

Uma voz do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, dizemos não ao Plano e Orçamento tudo o que o Governo diz sobre este sector é pura demagogia e por este andar a nau dará à costa...

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra para uma intervenção o Sr. Deputado Igrejas Caeiro.

O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: É infelizmente muito limitada a capacidade de acesso da grande maioria do povo português à comunicação social escrita e daí a evidência de os Portugueses não usufruírem efectiva e generalizadamente da direito constitucional de informai e ser informado, hoje em todo o mundo considerada prioritário sobretudo em países como o nosso, com imperiosa necessidade de desenvolvimento, sem o qual é impossível integrar comunidades cultural e economicamente avançadas.
Organismos internacionais recomendam a utilização da rádio e da televisão para suprir a fácil distribuição da comunicação escrita.
É o caso da Comissão Internacional de Estudo dos Problemas de Comunicação, no âmbito da UNESCO, de onde emanou o já famoso Relatório Mac Bride, acerca do qual 0 Governo Português terá de definir a sua posição.
Tendo presente esta necessidade urgente de tornar efectiva a cobertura hertziana do espaço nacional, concedendo a todos os Portugueses a possibilidade de receberem em condições convenientes «missões de rádio e televisão, a propósito da discussão das propostas de lei sobre as Grandes Opções do Plano e do Orçamento Geral do Estado para 1980, parece-me oportuno perguntar ao Governo.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Igrejas Caeiro, tenha a bondade de me desculpar mas constata-se um ruído no sistema sonoro da Sala que prejudica, com certeza, a gravação com nitidez da sua intervenção.

Pausa.

Queira continuar, Sr. Deputado.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Quando se promete assegurar a satisfação das necessidades reais de comunicação da população portuguesa?
Quando se programa projectos visando a segurança social, a saúde, a educação, a cultura, o ordenamento físico e ambiente?
Prevê o Governo, nas suas propostas de lei, o investimento indispensável para que estes temas possam efectivamente ser levados a todos os Portugueses através de emissões de rádio e televisão que não sejam de propaganda governamental mas de informação objectiva e culturalmente formadora e esclarecedora?
Está o Governo disposto a considerar os custos sociais da rádio e da televisão estatizadas, dotando-as de verbas orçamentais realistas, tendo em conta os verdadeiros interesses do povo português, em substituição dos subsídios discriminatórios e quase sempre

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destinados a explorar dificuldades financeiras no sentido de afectar a independência desses órgãos, como determina a Constituição?
Não considera o Governo que o reapetrechamento da rádio, da (televisão e- até da imprensa estatizada poderia ser integrado nos sectores a desenvolver com o auxílio da CEE, já que o apoio financeiro das Comunidades Europeias seria por certo visto com simpatia desde que a comunicação social portuguesa fosse inatacável do ponto de vista de democraticidade e objectividade?
Pode o Governo explicar quais os objectivos do decreto-lei que obriga os trabalhadores da RDP, optantes pela função pública, a serem transferidos para um novo quadro de pessoal muito semelhante ao dos adidos, exactamente no momento em que se projecta fazer justiça aos actuais funcionários nessa situação frustrante?
Como resolve o Governo no presente Orçamento, a situação que vai ser criada aos trabalhadores da RDP que forem forçados a integrar esse nova quadro e que critérios serão seguidos para as aquisições que a RDP se dignar fazer a seu bel-prazer?
Como explica o Governo manter em situação económica difícil a RDP, ao mesmo tempo que continua a permitir o aumento de despesas através de admissões desnecessárias e promoções escandalosas, apenas justificadas no clientelismo e no projecto de completo domínio dos meios de comunicação social estatizados?
Como considera o Governo o pagamento de cacheis de elaboração elevadíssimos a elementos externos para tarefas de que deveriam encarregar-se funcionários e trabalhadores das empresas afastados das suas funções por mera discriminação política?
Valerá a pena sobrecarregar de tal modo as: despesas da RDP e de outros órgãos de comunicação social estatizados só para que o Governo e os agentes, pela recuperação gritante de nomes e de vozes do passado, possam demonstrar despudoradamente que, de facto, tudo mudou para o «antigamente»?
A propósito, è indispensável aproveitar este debate para denunciar aqui os mais recentes sinais de prepotência, confirmadoires de completo desrespeito pelas leis e que nada tem a ver com a vivência democrática e bem ao contrário recordam a deplorável pratica do anterior regime.

O Sr. Carlos Lage (PS): -Muito bem!

O Orador: - A comissão administrativa da RDP, não satisfeita com as promoções e admissões de figuras capazes de servir a propaganda do Governo e tratar a informação! longe de toda a ética profissional, ainda vem intimidar os restantes profissionais declarando não reconhecer o Conselho de Redacção, suspendendo, com procedimento disciplinar, alguns dos seus elementos pelo simples facto de terem apontado casos flagrantes de censura ao trabalho dos jornalistas da RDP.
Gabriel Correia, Jorge Moreira, Fernando Alves e Emídio Rangel são as novas vítimas, entre as quais figuram exactamente jornalistas que têm tratado os debates da Assembleia da República com assinalável seriedade profissional...

O Sr. Carlos Lage (PS): - É um escândalo!

O Orador: -... e daí, por certo, a perseguição de que são alvo, dado ser bem diferente o seu trabalho do que está a ser feito, por exemplo, pelo Diário de Notícias.
Reparem, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, nas edições de ontem e de hoje desse seguidista matutino. Páginas inteiras dedicadas às intervenções do Governo, transcrevendo quase na íntegra alguns discursos. Quanto à oposição, meia dúzia de linhas, e mesmo essas carregadas de manipulação!...
É isto jornalismo sério? É isto respeito pela oposição e pelo seu tão falado estatuto? É isto prática democrática?
São estas as questões que a propósito da comunicação social a bancada do Partido Socialista gostaria de ver respondidas pelos Srs. Membros dói Governo.

Aplausos do PS e do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Na continuação da política demagógica tão propagandeada nas últimas semanas pelos ministros ambulantes, tem sido aqui reafirmado que os preços continuam a baixar apenas porque não têm subido tanto como poderiam subir e que as condições de vida das famílias vão melhorar, talvez porque os Srs. ministros confundem o País com as famílias do grande capital. Vejamos os traços fundamentais desta política de agravamento da desigualdade de distribuição dos rendimentos.
O Governo reafirma que a contratação colectiva deverá proporcionar, em 1980, acréscimos de salários reais, enquanto o Primeiro-Ministro restaura o famigerado tecto salarial dos 18% de Mola Pinto. O que entende afinal o Governo por acréscimos de salários reais?
O exemplo dos trabalhadores da função pública é deveras elucidativo das verdadeiras intenções deste Governo. Enquanto reafirma que a taxa de inflação será de 20%, pretende aumentar os trabalhadores da função pública em apenas 11%, o que significa uma diminuição do salário real superior a .9%. E aqui nem sequer pode servir de desculpa a teoria, ou melhor dizendo, a manipulação do Ministro das Finanças, retomada pelo Primeiro-Ministro, sobre o aumento do rendimento disponível através da diminuição dos impostos, já que na função pública os trabalhadores não pagam impostos sobre rendimentos do trabalho.
As largas dezenas de milhares de trabalhadores do sector empresarial do Estado não têm melhor sorte porque a resolução aprovada em Conselho de Ministros de 9 de Fevereiro condiciona os aumentos salariais ou prestações complementares à situação económico-financeira das empresas e à redução do ritmo de crescimento dos preços. Se conjugarmos esta medida com as propostas do Plano e do OGE sobre o decréscimo real do montante de subsídio às empresas públicas que produzem bens ou serviços sociais, cujo preço é inferior ao custo real, concluímos que o Governo pretende colocar os trabalhadores destas empresas públicas perante o falso dilema: ou aceitam a

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redução dos salários reais ou serão responsáveis pela sua situação de total degradação económico-financeira.
As recentes declarações de empresas em situação económica difícil, desde a RN até à Sorefame, são uma prova eloquente das intenções governamentais. E repare-se no caso da Petrogal: apesar de a empresa ter apresentado em 1979 lucros superiores a l 300000 contos os trabalhadores não vêem os, seus salários alterados há mais de ano e meio, período durante o qual o custo de vida aumentou mais de 35%. Será porque o Governo diz querer aumentar os salários reais e os trabalhadores apenas pediram 30% de aumento de salários, ou seja, menos 5% do que o aumento dos preços entretanto verificado, que as atitudes do Governo tem sido a calúnia, as tentativas, de impedimento da greve, através da requisição civil e do levantamento Mas nós acusamos aqui o Governo de continuar deliberadamente o degradar as empresas nacionalizadas, como são exemplos flagrantes o caso da Quimigal e da Rodoviária Nacional.

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - E o que se verifica é que tem sido o OGE que tem vivido à custa das empresas nacionalizadas e não o contrário. Em três anos (de 1977 a 1979) as empresas públicas e nacionalizadas transferiram 12,5 milhões de contos para o Estado e nós desafiamos o Governo e o Sr. Ministro das Finanças a vir aqui, ou em qualquer debate público, negar esta realidade.

Vozes do PCP: -Muito bem!

A Oradora: - Com tão nobres exemplos dos seus chefes de fila, o grande patronato da CTP e da CAP vai fabricando as suas leis nas empresas e nos campos, aumentando a repressão, impedindo o cumprimento da lei sindical, desconhecendo as cláusulas contratuais e intensificando os ritmos e cargas de trabalho, usando e abusando dos, contratos a prazo, pondo, afinal, na prática os princípios governamentais das tristemente célebres quinze medidas ditas anti-inflacionistas, que visaram, a contenção dos salários e o aumento, a todo o custo, da produtividade do trabalho. O Sr. Primeiro-Ministro, na passado domingo, explicitou melhor o princípio da contenção dos salários quando clarificou que afinal o tecto salarial é de 18% ...

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Embora o Governo afirme, nas Opções do Plano, que a melhoria das condições de vida dos Portugueses se fará pela «conservação do valor real dos rendimentos brutos, através da adequada evolução dos salários, face ao crescimento dos preços», a realidade destes quatro meses já demonstrou que o Governo não só limita a contratação e impede tais aumentos no sector empresarial do Estado e aos trabalhadores da função pública como incita e apoia o patronato a seguir política semelhante, através do contrôle administrativo e dos atrasos na publicação, no Boletim do Ministério do Trabalho, das convenções colectivas. Quer dizer, mesmo admitindo que a inflação se situaria nos 20% e os aumentos brutos da massa salarial fossem de 18%, os trabalhadores não veriam os seus salários reais aumentados por várias razões: a primeira, é que os prazos de vigência das tabelas salariais são, em média, de dezasseis meses. Por exemplo, no caso dos trabalhadores metalúrgicos e químicos, que estão actualmente a negociar os seus, contratos colectivos, as tabelas actuais são de Outubro/Novembro de 1979, o que significa que entretanto o aumento do custo de vida já ultrapassou os 35%.
Em segundo lugar, mesmo que os: trabalhadores consigam negociar novas tabelas salariais no prazo de doze meses, o Ministério do Trabalho está a demorar no mínimo três/quatro meses a respectiva publicação no Boletim do Ministério do Trabalho, assim que por exemplo, das contenções colectivas de trabalho publicadas em Janeiro deste ano no Boletim do Ministério do Trabalho, a vigência média, por trabalhador, das tabelas revistas foi superior a dezasseis meses.
Creio que estes exemplos são suficientes para concluir que os salários reais dos trabalhadores vão continuar a baixar, mesmo tendo em conta a redução da carga fiscal que incide sobre os rendimentos do trabalho. E aqui, como já denunciámos, os mais beneficiados são os rendimentos mais elevados. Aqueles que recebem salários inferiores a 92 contos por ano não têm qualquer benefício, ou seja, a maior parte dos trabalhadores rurais, muitos trabalhadores dos serviços e mesmo largos milhares de trabalhadores da indústria. E cerca de 80% dos- restantes trabalhadores serão beneficiados apenas com pouco mais de 2 % de redução de impostos sobre o trabalho. Só os rendimentos anuais superiores a 450 contos beneficiarão mais de 5 pontos e os rendimentos compreendidos entre 600 e 1050 contos beneficiarão mais de 7 pontos. Isto quer dizer que o tão proclamado aumento do rendimento disponível através dos impostos apenas poderá ser uma realidade para pouco mais de 20% da população trabalhadora!
E o Governo, que tanto gosta de fazer promessas, continua calado sobre o aumento do salário mínimo nacional e a forma de melhorar de facto os salários reais das classes mais desfavorecidas, dos, trabalhadores desempregados e dos pensionistas das pensões mínimas. Às pergunta formuladas: sobre estas questões na Comissão de Economia, o Sr. Ministro anunciou a resposta para o Plenário, mas no Plenário a resposta continua a ser: Nada! Talvez daqui por algum tempo, em vésperas de eleições, surja a resposta numa conferência de imprensa ou no corte de alguma fita!

O Sr. Carlos Lage (PS)': - Muito bem!

A Oradora:- Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao analisarmos mais em pormenor as afirmações contidas nas pp. 9, 10 e 11 das Opções do Plano acerca das tentativas, de explicação da taxa de inflação de 24,2% em 1979, fica-se com uma ideia clara dos princípios subjacente?, à política de rendimentos do Governo. Com efeito, não se refere logo de início, no ponto 10, a variável lucro como causa fundamental da inflação, a par dos preços das importações em moeda estrangeira e da desvalorização do escudo, que afecta estes preços em moeda nacional. Só no fim

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do ponto 11 é que se refere, quase a medo, que «com incidência específica em alguns sectores, terá ainda funcionado a recuperação da taxa de lucro». £ de novo se pretende incutir a ideia de que os salários contribuíram com 5,9% para a taxa implícita na procura final, o que poder dar a ideia, evidentemente errada, que em 1979 os salários contribuíram de algum modo para a inflação.
Esta ideia é completamento falsa porque resulta de uma interpretação mecanicista de uma equação contabilística, ex post, que nos indica apenas o resultado do processo inflacionista, sem nada explicar sobre esse fenómeno. O reflexo da inflação sobre os salários é que foi de 5,9%, e não o contrário!

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Os salários não podem ter sido qualquer causa de inflação nos últimos quatro anos, devido ao sistemático decréscimo dos salários reais e ao aumento da produtividade entretanto verificado. De acordo com o quadro das Opções do Plano, a produtividade do trabalho aumentou, durante os últimos quatro anos, mais de> 13%, o que permitiria idênticos aumentos de salários reais sem que a taxa de lucro diminuísse, nem os preços aumentassem. Por exemplo, em 1979 os salários reais poderiam ter crescido 2,7% em vez de diminuírem 3,5%!
Mas em contrapartida o que se verificou foi que durante estes quatro anos, apesar dos aumentos da produtividade, os salários reais diminuíram mais de 16%.
Assim, confirma-se que os (trabalhadores .portugueses produzem cada vez mais e ganham cada vez menos.
Ora, se nas Opções do Plano agora apresentadas o Governo mantém o mesmo princípio, isto significa que em 1980 os salários reais vã» continuar a diminuir, porque os preços vão continuar a subir muito mais do que os salários.
Mas, tal como nos anos anteriores, a produtividade continuará a aumentar, o que significa que os lucros das empresas aumentarão e prosseguirá a apropriação por parte das empresas de rendimentos que deveriam pertencer aios trabalhadores, como o demonstra a parcela do rendimento nacional que é afectada a salários e que item vindo sempre a decrescer. A parte dos assalariados no rendimento nacional caiu de 63% em 1975 para apenas 48% em 1979. Actualmente a nossa posição já é a pior da Europa.
Se este processo só foi possível por uma política de estímulo à concentração e centralização do capital iniciada em 1976, a política que este comité executivo do grande capital está a tentar pôr em prática acelera de forma vertiginosa a concentração capitalista, escancarando as portas do País ao. grande capital financeiro internacional. No Norte do País assiste-se diariamente a negociatas de médias e grandes empresas a favor dos antigos monopolistas e dos banqueiros internacionais, enquanto o Governo intensifica as negociações com as multinacionais, os Morgan e Rockefeller, o que não faz prever nada de bom nem para o desenvolvimento do País nem para a distribuição do rendimento nacional, nem para o nível de emprego do País.

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Com quatro meses de governação de um Governo que .não governa mas que se governa...

Protestos do PSD.

...já está claro para o povo que o interesse do Executivo Sá Carneiro/Freitas do Amaral não é aumentar os salários reais mas sim diminui-los, não é congelar os preços mas sim aumentá-lo. E repare-se até onde vai o descaramento do Governo que planeia uma inflação de 20% e prevê diminuir os encargos do Estado com os circuitos de distribuição em cerca de 50%, ao mesmo tempo que prevê uma diminuição de encargos com o sector agrícola da ordem dos 11%. É mais uma prova eloquente das prioridades deste Governo! Talvez entretanto o Sr. Ministro do Comércio descubra o mistério da batata: estarão as estatísticas erradas ou aparecerá batata podre? Os pequenos e médios agricultores e os. consumidores conhecem a resposta para o mistério que o Governo que* tornar mais misterioso, tentando fazer de 1980 o ano da especulação, da demagogia, do revanchismo e da restauração do poder económico' de meia dúzia de famílias. É tempo de acabar com a demagogia,

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Então cale-se!

A Oradora: - Mesmo com o domínio dos órgãos de informação, já não é possível continuar a enganar o povo. E mesmo que o Governo continue no seu palácio de cristal, repetindo que os preços vão baixar e os salários subir, nas aldeias, vilas e cidades, os homens e as mulheres, os operários e os camponeses, ou pescadores e os trabalhadores dos serviços vão sentindo diariamente que os salários chegam cada vez menos para as despesas do mês. E, se este Governo de curta duração...

Risos do CDS.

...e que cada vez está mais fraco continua a abusar da violência e da repressão é sinal claro da sua fraqueza e do seu desespero!

Aplausos do PCP.

A melhoria das condições de vida de todas as famílias portuguesas e o combate à inflação só será possível com uma política diferente, quando houver um Governo' que respeite a Constituição da República, que apoie a iniciativa privada não monopolista, a Reforma Agrária e o sector empresarial do Estado, que acredite no contrôle de gestão pelos trabalhadores, que respeite os interesses nacionais nas negociações com os outros governos e as multinacionais, que utilize a voz do diálogo para a resolução dos conflitos sociais e ponha de lado a repressão, a confrontação e a violência.

A Sr.ª Ercília Talhadas (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Os trabalhadores e o povo português têm direito a uma política económica e social diferente da anunciada nas Opções do Plano e do OGE para 1980, e tê-la-ão!

Aplausos do PCP, do MDP/CDE e do Sr. Deputado do PS Amadeu Cruz.

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1842 I SÉRIE-NÚMERO 46

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.» Deputada Helena Cidade Moura,

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: As relações entre o Poder Local e o Poder Central -a descentralização, a centralização', a desconcentração- representam formas de relacionamento que item a ver com o projecto de sociedade que se quer construir.
O nível de compatibilidade destas fases de relacionamento constituem uma luta justa porque representa, de facto, valores sociais e humanos diferenciados.
Em Portugal, os municípios são tradicionalmente livres, o meto dos caciques e dos distribuidores de benesses e de sacos azuis foi tradicionalmente ridicularizado na nossa literatura: são os comendadores, os bacharéis, os beneméritos cidadãos e os seus lacaios, desde o «Joãozinho das Perdizes» até aã «André Cavaleiro», figuras que o nosso povo rejeitou.
Em 1867, o povo de Évora, pela voz de Eça de Queirós, manifesta-se contra a tentativa de subalternização da sua câmara: «O 'homem livre nos municípios livres, representados por uma livre Câmara - é a forma mais fecunda do poder democrático», grita o panfleto.
A acção das populações organizadas, logo a seguir ao 25 de Abril, a capacidade de trabalho, a inteligência que demonstraram na resolução dos seus problemas, levaram a: que, na Assembleia Constituinte, e depois na Assembleia da República, se tivessem gerado leis que consagram um nível de Poder Local de que nós, portugueses e democratas, nos deveremos orgulhar.
Porque o Poder Local não se decreta, mas antes gera as leis que lhe dão expressão jurídica e o institucionalizam - e é, em si, índice de maturidade cívica e de capacidade de assumir responsabilidades de um Povo.
Não é um Poder Central em ponto pequeno, é um poder específico, que procura valorizar e mobilizar todos os recursos locais para a solução de problemas que cada localidade sente como mais urgentes.
A forma de resolver esses problemas e a prioridade que lhes é dada pode sair fora das mais, onde os ministros do Poder Central se especializaram; e podem mesmo revelar escolhas que dificilmente se sentaram à mesa do Conselho de Ministros. Elas são, no estatuto, as mais acertadas, porque a tecnocracia pode ignorar- o homem, mas o Poder Local é nele que se baseia.
Assim se entende que o Governo Mota Pinto e o actual Governo, que tomaram um posicionamento redentor, face aos outros portugueses, tenham tido muita dificuldade na efectivação integral da Lei das Finanças Locais.
Justa, democrática, dinamizadora, ela corresponde, de facto, não a uma diminuição real do Poder Executivo, mas a uma leve arranhadela no estatuto social do Poder.
O discurso do Sr. Ministro da Administração Interna, que seguimos com atenção, está cheio de sobressaltos interiores, de entrelinhas, de frases circulares. Não foi um discurso fácil de elaborar...
Depois de acesa e ramificada discussão, ficaram sem resposta as dúvidas geralmente suscitadas pela alínea c) do artigo 5.º da Lei das Finanças Locais, que o relatório do OGE não ajuda a esclarecer, pois se a alínea b) é explícita, 12,1 milhões de contos que correspondem aos 18% da previsão de cobrança dos impostos directos, a alínea c) diz apenas 18 milhões de contos, mais 4 milhões do que no ano anterior, não explicitando a percentagem de que aquele número é resultante.
Por outro lado, os artigos 33.º e 35.º da proposta de lei do OGE parecem inspirar-se de novo nas tais remotas relações eleitores/eleitos, que no tempo em que não havia censura foram ridicularizados pelos nossos escritores e artistas e durante o fascismo destruíram as relações de vizinhança, a vida cultural e autónoma dos nossos concelhos.
As próprias autarquias julgarão o procedimento do Governo.
O Governo, não cumprindo a lei, vai obrigar os municípios, pelo menos os mais dinâmicos, a não cumprirem os seus compromissos.
Mas será que este Governo, refugiado na sua auto-suficiência, amparado pela sua estável e duradoura maioria, será sensível ao não cumprimento dos seus compromissos?
Receamos que não, por várias razões ligadas ao seu estilo de Governo e aos seus conceitos de democracia, que levam a que, em todos os sectores, das Opções do Plano e do OGE, as populações não sejam consideradas peça fundamental no progresso do Pais.
Por motivos semânticos e políticos o MDP/CDE opõe-se a tal conceito de democracia.

Aplausos do MDP/CDE, do PCP e do Sr. Deputado do PS Amadeu Cruz.

O Sr. Manuel Pereira (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Manuel Pereira (PSD): - Para um protesto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Manuel Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura continua a insistir no mesmo princípio que já aqui foi posto pelos Deputados da bancada comunista, e que é o de afirmar que o Governo não está a cumprir integralmente a Lei das Finanças Locais, sem provar tal afirmação.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - E não está!

Uma voz do PCP:- Essa é boa!

O Orador: - Já aqui foi demonstrado pelo Sr. Ministro das Finanças, na sua primeira intervenção, que a Lei das Finanças Locais estava a ser cumprida ...

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Não está nada!

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2 DE MAIO DE 1980 1843

O Orador: - ...segundo uma interpretação do artigo 5.º da referida Lei.

Continuamos a pedir à oposição que faça a sua própria interpretação desse artigo e que a justifique.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Nunca leu a lei!

O Sr. João Amaral (PCP): - Olhe que a Lei também foi aprovada pela sua bancada!

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Peça a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Sr. Presidente, o meu grupo parlamentar não dispõe de tempo. Não sei se a resposta seria descontada no nosso tem pó...

O Sr. Presidente: - Sr.» Deputada, se o seu grupo parlamentar não dispõe de tempo não pode usar da palavra.

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Então, prescindo de responder ao Sr. Deputado.

Aplausos do PCP.

O Sr. Fernando Roriz (PSD): - Gostei dessas palmas!

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - São as palmas da inteligência!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Portugal da Fonseca para uma intervenção.

O Sr. Portugal da Fonseca (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: É objectivo prioritário do VI Governo Constitucional relançar o investimento produtivo, como factor essencial do crescimento do nível de emprego.
Este relançamento do investimento produtivo passa por dotas componentes decisivas: o fomento do investimento público e o incentivo ao investimento privado, nacional e estrangeiro.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - É falso!

O Orador: - É (imperioso, como consequência da opção de Portugal de entrar no Mercado Comum Europeu, que tanto um sector como o outro avancem decisivamente para a própria dinamização. Seria injusto, todavia, que as empresas públicas e intervencionadas continuassem a usufruir de privilégios excepcionais relativamente às privadas.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - É falso!

O Orador: - Os anos transactos provaram que esta política não reactivou, a economia.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Falso!

O Orador: - O sector público não provou ser o motor do (progresso nacional, a sua situação financeira não é brilhante e pode até conduzi-lo ao colapso.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - É por isso que não querem a bancai

O Orador: - De facto, o Governo da Aliança Democrática herdou muitas empresas públicas era situação de preocupante descapitalização. É que os Governos anteriores deram o seu aval a grandes projectos industriais, prometendo-lhes as convenientes dotações de capital, &ó que- depois os não concretizaram. Como exemplo, só dezanove empresas tuteladas pelo Ministério da Indústria e Energia têm um volume de descapitalização de cerca de 25 milhões de contos.
Seria impossível, como é óbvio, dar imediata satisfação a esta debilidade na sua estrutura de capital.
Não pode o País desgastar as suas energias económicas somente com algumas empresas do sector público.
Em regime de economia mista é salutar uma certa concorrência entre os diversos sectores, principalmente: se dela resultarem benefícios acrescidos para a generalidade do povo. No caso específico de Portugal, não poderão os Portugueses suportar deficits permanentes das empresas públicas, cobrindo-as através do sistema tributário geral, quando a austeridade que, lhes é imposta já atinge o nível da sobrevivência.
É, pois. necessário desbloquear a situação com realismo e eficiência.
As medidas propostas nas Grandes Opções do Plano irão introduzir no sector público um novo factor de dinamização da sua eficácia económica e contribuirão também para evitar que o equilíbrio das empresas do sector se faça à custa de um contínuo agravamento dos preços dos bens e serviços produzidos.

O Sr. Guerreiro Norte (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Acusa-se o Governo de não apoiar suficientemente os projectos apresentados pelo sector empresarial do Estado. Parece-nos que a acusação é infundada.
Em três meses apenas foram apreciados, só na área do Ministério da Indústria e Energia, diversos projectos de investimento no sector público, entre os quais, e como exemplo, se destacarão: empreendimentos diversos, a curto e médio prazo, no domínio da energia, cujo valor se deva a 126 milhões de contos; desbloqueamento da situação encontrada no Plano Siderúrgico Nacional, cujos primeiros contratos de fornecimento já foram assinados; dinamização do aproveitamento integrado das pirites alentejanas, com a aprovação dos estatutos da EMMA (Empresa Mineira e Metalúrgica do Alentejo, E.P.), e do seu arranque e aprovação também da exploração mineira de Aljustrel; assinatura do contrato com a Renault, em que o Estado participa; conclusão dos trabalhos da 1.ª fase do Complexo Petroquímico de Sfoies; novas linhas ou ampliação das existentes em unidades produtivas da Cimpor; conclusão de diversos empreendimentos da Petrogal; construção de uma nova unidade industrial para o fabrico de plastificantes na P.G.P.
Também no campo da subsidiação, prevê-se que o seu volume -e para isso foi atribuída dotação orçamental- não seja inferior ao de 1979, em termos absolutos, ou seja, 11 milhões de contos.

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I SÉRIE - NUMERO 46

O crescimento do investimento do sector empresarial do Estado será, segundo a proposta de lei das Grandes Opções do Plano, de cerca de, 6 %, em termos reais, e deverá ser co-financiado pelo OGE em 20 milhões de contos.

Estas acções e estes números atestam que o Governo não pretende boicotar nem aniquilar o sector público empresarial. O que pretende, isso sim, é responsabilizá-lo por uma maior eficiência e racionalí-dade económica, de modo que os subsídios à exploração somente sejam atribuídos à cobertura dos excedentes de prejuízos causados pelas verdadeiras prestações sociais.

Os estímulos aos ganhos de produtividade terão de ser efectivos, de modo a preservar a não repercussão integral dos acréscimos de custos nos preços.

É necessário que o sector empresarial público adquira uma verdadeira mentalidade empresarial produtiva e eficaz, não perdendo de vista a noção de excedente de exploração, de modo a dele poder retirar o necessário ao incremento do capital estatutário e até ao autofinanciamento para o desenvolvimento da formação do capital fixo.

Relativamente aos estímulos ao investimento privado, pediu o Governo autorização legislativa —e vai efectivamente legislar—, instaurando um sistema integrado de incentivos fiscais e financeiros devidamente graduados em função da própria produtividade do investimento e das prioridades sectoriais e regionais.

A solução do desemprego em Portugal, e conse-auentemente a melhoria do nível de vida do povo português, passa pelo incremento do investimento. As medidas propostas pelo Governo, consignadas nas Grandes Opções do Plano, apontam nesse sentido.

Em 1979 a formação bruta do capital fixo no sector privado baixou de 3,4%, o que, dados os condi-cionalismos políticos, só poderá ser atribuído à falta de confiança do investidor privado,

Os incentivos programados, a possibilidade de mobilização dos direitos de indemnização para o financiamento de investimentos produtivos e a dinamização dos contratos de viabilização criarão aquele clima de confiança necessário à dinâmica dos operadores económicos.

A política do Governo, expressa nas Grandes Opções, do Plano, e as respectivas dotações orçamentais inserem-se no espírito de mudança expresso no Programa do Governo, em sequência do Programa eleitoral da Aliança Democrática.

• O Sr. Manuel Moreira (PSD): — Muito bem!

O Orador: — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A degradação económica nacional está suficientemente caracterizada nos documentos apresentados.

A inércia do crescimento, os graves problemas do desemprego e da inflação, os profundos deficits da produção em relação à procura global e a débil propensão ao investimento, tudo aliado a uma conjuntura internacional desfavorável, exigem que o Governo da Aliança Democrática tenha ao seu dispor os instrumentos necessários à sua superação para que

os Portugueses tenham melhores condições de vida no País que é o seu.

Aplausos do PSD, do PPM e dos Deputados reformadores.

Durante esta intervenção assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente José Vitoriano.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): — Sr. Presidente, peço a palavra para formular um protesto.

O Sr. Presidente: — Tem V. Ex.ª a palavra,

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Vou formular um protesto relacionado com a intervenção anterior.

Em primeiro lugar, de acordo com a intervenção que há momentos fiz e já que o Governo está de facto tão interessado em resolver estes problemas, como o Sr. Deputado da maioria afirmou, o que não fez o Sr. Ministro das Finanças, que hoje não apresentou o PISEE, por exemplo...

O Sr. Pedro Roseta (PSD): —O debate ainda não acabou!

A Oradora: — ..., queria lançar de novo um desafio para um debate público sobre as empresas nacionalizadas, aqui ou lá fora, onde o Sr. Ministro das Finanças entender.

Em segundo lugar, queria protestar *em relação às propostas de criação de emprego e de combate ao desemprego, porque no Plano apenas está prevista a criação de 19 000 postos de trabalho, quando é certo que todos os anos há 29000 jovens que procuram trabalho.

Tamtém queria prostestar e>m relação aos números respeitantes às empresas públicas e referir que, por exemplo, durante os anos de 1977 a 1979, como já disse há bocado, estasi empresas entregaram de lucros 12,5 milhões, de contos.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): — É falso!

A Oradora: — O Sr. Ministro das Finanças que prove que é falso.

Acrescento que estas empresas entregaram, durante os anos de 1977 a 1979, ao Estado 68,4 milhões de contos e apenas receberam do Estado 52,3 milhões de contos, o que significa que entregaram de lucros Üquidbs 12,5 milhões de contos.

Já pedimos, nomeadamente na Comissão de Economia, Finanças e Plano, que nos fosse entregue um estudo .recente, encomendada pelo Governo a uma empresa privada, sobre o sector nacionalizado e continuamos a aguardar que o estudo nos seja entregue.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): — Grande protesto!

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Vasques,

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): — Então o Sr. Ministro das Finanças não diz nada!

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O Sr. Vítor Vasques (PÇ): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Orçamento é, por definição, uma previsão, tão realista quanto possível, de receitas; e de despesas. Ora, o documento apresentado a esta Assembleia, no que respeita à segurança social, não é, de facto, uma previsão de receitas e despesas.
No capítulo das receitas, não é concreta a estimativa das. contribuições arrecadadas, não são verdadeiras certas afirmações nele contidas.
Nas despesas, a hipocrisia é a mesma. Ocultam-se despesas que item. efectivamente, de ser efectuadas, paira que, como e óbvio, o orçamento se apresente equilibrado.
Mas vamos aos factos.
São estimados, mo capítulo das receitas, 92,9 milhões de contos para contribuições contra 64,6 milhões de contos arrecadados no ano de 1979. admitindo-se, assim, um aumento de mais de 40 %.
Para conseguir este milagre, o Governo afirma que todos os vencimentos de todos os portugueses beneficiários da Previdência vão sofrer uni aumento de mais de 20 % desde Janeiro do corrente ano. Não me dirijo agora ao Governo, dirijo-me a todos os trabalhadores para que julguem desta afirmação, aliás contraditória com a que pelo Sr. Primeiro-Ministro foi feita em 27 deste mês na sua comunicação ao. País.
Outra fantasia do Governo reside no facto de por um decreto-lei ainda não publicado pretender conseguir que todos os: contribuintes paguem integralmente, as suas contribuições desde Janeiro último, incluindo as dívidas. Mas, para espanto de todos, o decreto-lei agora em causa apresenta sugestivas inovações: dos seus 34 artigos apenas uma escassa meia dúzia contém matéria nova e os restantes: ou são cópias integrais de artigos constantes do Decreto n.º 45266, dos Decretos-Leis n.ºs 511/76, 512/76, 513/76, 25/77 e 146/79, ou são adaptações de artigos existentes naqueles diplomas, ou são arada integrações de despachos regulamentares já emitidos nos anos de 1977 e seguintes.
Entretanto, se com base nos artigos inovadores, a cobrança das dívidas se processar do modo como é preconizado, às empresas que se encontram em fase de recuperação vão ser criados graves problemas financeiros, que nalguns casos poderão mesmo originar situações de falência. Concordamos com a recuperação das dívidas, mas não aceitamos o método.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Poder-se-á atingir o paradoxo de um trabalhador ver o seu abono de família aumentado em Agasto ou Setembro, mas passados poucos meses ver também o seu emprego perdido.
O que é preciso é iludir o povo; os medos não interessam; os fins são claros.
A ânsia de autopromoção do actual Governo é tal que não se coíbo de levar ao orçamento afirmações falsas, como a de que no ano em curso a venda de títulos será de 500 mil contos inferior à verificada em 1979.
É preciso ter ousadia Sr. Ministro!
A última venda de títulos efectuada pela Previdência foi em 1977. Quer em 1978, quer em 1979, não se realizou qualquer venda.
As mentiras utilizadas na campanha eleitoral pela Aliança Democrática parecem Ter continuidade neste Orçamento.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Isso 6 falso!

O Orador: - Outro pequeno engano (quase meio milhão de contos está na verba a transferir pelo Ministério dos Transportes para o orçamento de segurança social e que se destina ao pagamento de pensões a ferroviários reformados. O Ministério dos Assuntos Sociais parte do princípio de que, no corrente ano, não há melhoria de vencimento ao pessoal da CP.
Tudo «à vontade do freguês»!
Quando se pretende, ainda que artificialmente, criar receitas, os vencimentos de todos os portugueses são aumentados mais de 20 %, segundo o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais, 18 %, segundo o Sr. Primeiro-Ministro, ou seja, mais da 20 %, segundo o CDS, 18 %, segundo o PSD.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): -Isso é ridículo!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo; Passemos à segunda parte da farsa: as despesas. Quando em Janeiro último foram publicados os decretos do Governo da engenheira Maria de Lurdes Pintasilgo, que aumentavam as pensões de reforma, que alargavam a todas as crianças o direito ao abono dei família e que, entre outros, instituíam o subsídio de orfandade, foram os mesmos imediatamente chamados a- esta Assembleia, tanto pelo PSD como pelo CDS, para ratificação, o que quer dizer, obviamente, que a AD não estava de acordo com a& medidas de largo alcance social neles contidas.

O Sr. Carlos Lage (PS):- Muito bem!

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Não apoiado!

O Orador: - Na voz da AD, estes decretos provocariam despesas muito elevadas, iriam originar grandes deficits, etc.
Mas agora o que se observa?
A ratificação do decreto sobre pensões foi retirada e os pensionistas já receberam os respectivos aumentos; o que era necessário era fazê-los receber tão (tarde quanto possível para que os lucros fossem para aqueles que nada fizeram paira os dar. Sejamos claros: esses aumentos, da autoria do Governo da engenheira Maria de Lurdes Pintasilgo, tinham cobertura orçamental, como, aliás, é perfeitamente demonstrado pelo orçamento em discussão; a questão era outra.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Muito bem!

O Orador:- Como é do conhecimento geral, só foram então aumentados os valores das pensões até ao montante de 3600$, assim como a pensão social e dos rurais, tendo ficado sem qualquer melhoria as pensões acima daquele valor.
O actual Governo já anunciou que vai aumentar novamente as pensões. Porém verifica-se este facto de digno registo: os pensionistas que tinham, amo

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dormente pensões entre 2250$ e 2750$, assim como os pensionistas da pensão social e os pensionistas rurais, viram, pelo decreto da engenheira Pintasilgo, as suas pensões melhoradas em valores da ordem dos 500$ a 850$; porém, e como exemplo, aqueles que tem pensões de 10000$ vão, segundo as medidas agora anunciadas, receber aumentos da ordem dos 2100$, sem que haja qualquer benefício adicional para os pensionistas abrangidos pela pensão mínima.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: É preciso que fique bem claro que o mérito do aumento das pensões de reforma até agora efectuado se deve exclusivamente ao Governo Lurdes Pintasilgo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: -: Este Governo, que inicialmente fez grandes objecções a estes aumentos, acabou por se . resignar, visto que as preocupações eleitorais assim obrigam.

Aplausos do PS.

Quanto ao abono de família, o escândalo foi maior.
O Governo, ao não permitir a execução do decreto--lei que institui o esquema mínimo de protecção social, está a prejudicar gravemente mais de meio milhão de crianças, ias quais desde Dezembro de , 1979 não recebem o abono de família que, por direito, a lei lhes confere. E não diga o Governo que essas crianças são filhas de gente rica. Bem iria o País! Não, essas crianças são em grande número filhas de trabalhadores rurais, de pequenos comerciantes, de engraxadores, de vendedores de jornais, de vendedores de lotaria, etc.
O que pretende o Governo é fazer deste direito da criança, já legalmente reconhecido, uma arma eleitoral, congelando o abono para o atribuir perto das eleições, adoptando como saia uma iniciativa que, de facto, lhe não pertence totalmente.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Não apodado!

O Orador: - É a sua opinião, Sr. Deputado!
Outra situação de autovalorização, mas que mais «ma vez resultou numa demonstração de incompetência, é a que se verifica na rubrica «Administração». Diz o Governo, a propósito da verba inscrita: «Independentemente do aumento de cerca de 18% em relação ao ano de 1979, este valor traduz um decréscimo em termos reais.» Ficamos espantados com tal objectividade. Só que, para achar o volume de contribuições, das quais partiu para a obtenção daquela percentagem, o Governo considerou um aumento de mais de 20 % aos funcionários da Previdência. Por outro lado, o mesmo Governo, aliás o mesmo Ministro, nas despesas ide «Administração» não conta com qualquer tipo de aumento para os referidos trabalhadores, escamoteando, assim, uma despesa adicional da ordem de l milhão de contos.
Este é o critério do Governo AD. Quando precisa de aumentar artificialmente receitas, é tudo piara os trabalhadores. Quando é necessário diminuir despesas, é nada para os trabalhadores.
Que confiança podemos ter em tal Governo?

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Toda!

O Orador: - É a sua opinião, Sr. Deputado. Não corresponde à da maioria dos portugueses!

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Que conceito de democracia!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro dos Assuntos Sociais: Não é como V. Ex.ª afirmou: «Preso por ter cão, preso por não ter cão.» O problema é outro e que se acusa o Governo é de falta de lealdade. V. Ex.ª sabe, como eu, que o orçamento corrente de segurança social é deficitário em cerca de 8 milhões de contos. V. Ex.ª também sabe como é possível atribuir os benefícios agora anunciados fazendo uma análise concreta da receita. Só que, se existisse honestidade da parte do Ministério dos Assuntos Sociais, o Sr. Ministro das Finanças ficaria em condições muito difíceis paru justificar o deficit global do Orçamento Geral do Estado. É preciso haver alguém que se sacrifique, desta vez calhou ao Sr. Ministro dos Assuntos Sociais, logo ao CDS.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Quanto às receitas e consequentes despesas de capital, elas reflectem mais uma vez o desprezo que este Governo vota aos Portugueses, principalmente às crianças, aos deficientes e aos idosos.
Os valores consignados no Orçamento são insuficientes para terminar as obras projectadas e iniciadas pelos Governos socialistas, não havendo por maioria de razão possibilidades de iniciar novos empreendimentos. Para o Governo de direita, o País já tem número suficiente de creches, jardins-de-infância, lares para a terceira idade.
Para este Governo, o que é fundamental é acabar até Setembro as obras iniciadas pelos socialistas, obras que não programaram nem realizaram, com a agravante de atacarem violentamente esses Governos!
Os Srs. Ministros corta-fitas percorrem todo o País inaugurando empreendimentos para cujas iniciativas em nada contribuíram.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Os Portugueses estão atentos a estas manobras.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma nova edição do Movimento Nacional Feminino vem percorrendo as Cerras deste país, prometendo mundos e fundos, incluindo subsídio especial para donas de casa.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Vocês não fizeram nada disso!

O Orador: - Um espanto! Mas vejamos. De acordo com, a análise que me foi, dado fazer, julgo poder afirmar que para a Secretaria de Estado de Família terá sido inscrita uma dotação da ordem dos 10 mil contos, verba que será insuficiente para pagar os passeios que a Sr.ª Secretária de Estado tem dado pelo Pais.

O Sr. Teodoro da Silva (PSD): -Quo espanto!

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O Orador: - Como prevíamos e agora ficou cabalmente demonstrada, esta Secretaria de Estado não visa resolver os problemas das famílias portuguesas, mas tão-somente ser mais um ponto de apoio à campanha eleitoral da Aliança Democrática, ou melhor do CDS.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - É falso!

O Orador: -Pela análise concreta deste Orçamento se deduz, facilmente, que o Governo não está interessado em resolver os problemas dos Portugueses, em particular daqueles mais carenciados, mas apenas manter o Poder a todo o custo, recorrendo à mentira, às falsas promessas, às «benesses» imediatas. O Governo da AD não só adia o nosso país como também o hipoteca. Com tal Governo o futuro dos nossos filhos é sombrio.

Disse.

Aplausos do PS e de alguns Deputados do PCP.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Disse muito mal! Parece-me se estava a ver ao espelho!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Oliveira Dias.

O Sr. Oliveira Dias (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou pedir alguns esclarecimentos ao Sr. Deputado Vítor Vasques, prescindindo, obviamente, de fazer qualquer referência à adjectivação que usou abundantemente na sua intervenção e que é própria de uma oposição dura, aguerrida, que o Governo e os partidos que o apoiam apreciam e agradecem.
Em todo o caso, o Sr. Deputado deixa-me algumas dúvidas, na medida em que se insurge contra o facto de o Governo pretender promover medidas eficientes para que sejam entregues aos cofres da segurança social as prestações descontadas aos trabalhadores pelas entidades patronais, bem como aquelas que são devidas- pelas próprias entidades patronais, e acena com o espectro das falências, do desemprego, do abono de família recebido agora à custa do desemprego para daqui a uns meses, etc. No entanto, o Sr. Deputado Vítor Vasques abundou, enquanto teve responsabilidade nesta área governamental, em afirmações relativas à necessidade de cobrar essas dívidas em mora.
Penso que isto é verdade e cabe aqui uma pergunta: foi então propositadamente e com esses receios que o Sr. Deputado Vítor Vasques, ao tempo Secretário de Estado da Segurança Social, não utilizou os procedimentos adequados à cobrança das dívidas em mora? Foi por causa desses receios que não cobrou, propositadamente, essas dívidas em mora relativas aos descontos feitos aos trabalhadores? Foi propositadamente que deixou o sector da segurança social na situação de caos e de quase ruptura financeira, até há pouco tempo, ou descobriu entretanto outros meios para cumprir esse imperativo legal e esse requisito de funcionamento de qualquer sistema social?
Se descobriu, seria talvez bom que nos esclarecesse a esse respeito, ou entende o Sr. Deputado que a função da segurança social quanto ao risco de desemprego se resolve deixando de cobrar as prestações? Será esta a pedra filosofa] que o Sr. Deputado Vítor Vasques entretanto descobriu, porque ao mesmo tempo diz que as prestações são insuficientes? E estamos de acordo que este ano não estarão ao nível que todos desejaríamos, ou que pelo menos eu e o meu partido desejaríamos. Mas, Sr. Deputado, pretende que não se cobrem as dívidas em mora? Não apresento métodos para suprir essa insuficiência nem para obstar a que ela se prolongue no tempo e pretende aumentar as prestações? Como é que pretenderia então incrementar os montantes das pensões?
Por outro lado preocupa-se com as deslocações dos membros do Governo pelo País e faz uma referência especial à Sr.ª Secretária de Estado da Família.
Sr. Deputado, todos temos presentes as deslocações em conjunto dos Governos socialista, a fazer Conselhos de Ministros no Porto e não sei mais por onde, acompanhados de povo e vivas, pompa e circunstâncias e não sei que mais.
Sr. Deputado, eu tinha dito que deixaria a parte adjectiva do seu discurso, mas, desculpe, não o encontro em posição de autoridade para fazer observações deste género.

Aplausos do PSD e do CDS

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Vítor Vasques deseja responder?

O Sr. Vítor Vasques (PS): - Não, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Malaquias para pedir esclarecimentos.

O Sr. Manuel Malaquias (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de fazer umas perguntas muito simples ao Sr. Deputado Vítor Vasques. Mas antes disso digo ao Sr. Deputado que a Aliança Democrática não é PSD e CDS. É efectivamente uma aliança política para governar este país e que obteve a- maioria dos Deputados nesta Câmara. Essa é que é a verdade e esse é que é o facto. Não há aqui Ministros do PSD, nem Ministros do CDS nem Secretários de Estado do PSD. Há, sim, um Governo da Aliança Democrática a governar este país.

Aplausos do PSD e do CDS.

Por outro lado, repetindo as palavras do Sr. Ministro dos Assuntos Sociais proferidas aqui na segunda-feira, digo que mais uma vez o PS advoga em favor dos diplomas da engenheira Maria de Lurdes Pintasilgo, parecendo até que efectivamente o Governo da engenheira Maria de Lurdes Pintasilgo era um Governo do Partido Socialista. Longe não estaremos da verdade, provavelmente, porque, na verdade sistematicamente aqui se invocam os diplomas da Sr.ª Engenheira Maria de Lurdes Pintasilgo em favor do Partido Socialista.
Será que o Partido Socialista também quer retirar daí os seus dividendos e os seus lucros políticos? Será que o Sr. Deputado não sabe que as pensões

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de reforma, aumentadas por um diploma de 29 de Dezembro último, não podem ser pagas pelos esquemas da segurança social, por burocracia do próprio sistema, antes de determinados mecanismos serem accionados? O Sr. Deputado não sabe isso? Parece que não foi Secretário de Estado da Segurança Social neste país!
Por outro lado relativamente ao abono de família e ao Decreto-Lei n.º 513-L/79, já ontem referi à Sr.ª Deputada Zita Seabra, do PCP, que este decreto-lei embora generalizando o abono de família, generalizava-o ma], pela simples razão de que em função desse diploma iriam receber o abono, na linguagem do PS e do PCP, os grandes latifundiários, os grandes tubarões, os grandes empresários. Esses também tinham direito ao abono de família e esta Governo retirou esse direito a essas pessoas e disse que o direito ao abono de família era pura e simplesmente para os carenciados, para os mais desprotegidos. Para esses, sim, o abono de família foi, efectivamente generalizado. Esta é a verdade.
O Sr. Deputado também sabe que durante o seu Governo, quando foi Secretário de Estado, várias vezes tentou a recuperação de dúvidas com diplomas que se mostraram ineficazes, com diplomas que não resultaram, com diplomas que também vinham dentro da mesma óptica do de agora e que também poderiam ter levado à falência efectiva das empresas. Será que um diploma que o Sr. Deputado, na sua análise, diz que é súmula dos diplomas publicados pelo PS, que só tem determinadas inovações, leva a falência? Os diplomas publicados pelo PS não levavam à falência das empresas?
Estas são as perguntas que lhe coloco.

Aplausos do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Tavares.

O Sr. Sousa Tavares (DR): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Também desejava fazer duas ou três perguntas muito simples e muito rápidas ao Sr. Deputado Vítor Vasques.
O Sr. Deputado Vítor Vasques está ou não de acordo com o aumento das pensões de reforma da Previdência Social que se encontravam acima do mínimo e que não foram contempladas pelo decreto-lei da Sr.ª Engenheira Lurdes Pintasilgo ou, pelo contrário, entende que essas pensões não deveriam ser aumentadas?
Pode o Sr. Deputado Vítor Vasques explicar a referência que fez de 10 mil contos gastos em viagens da Sr.ª Secretária de Estado da Família pelo. País? Como é que pode justificar esse número ou como é que se pode atrever a dizê-lo à Assembleia?
Outra questão; que é fundamental e que diz respeito a tudo: está ou não de acordo o Sr. Deputado Vítor Vasques, ex-Secretário de Estado da Segurança Sócia), com o aumento geral de pensões e como do abono de família? Receia a falência ou receia que esses abonos não sejam pagos? Qual é, afinal, a sua versão? Se neste caso o Ministro das Finanças está de acordo com o Ministro dos Assuntos Sociais, qual é a oposição que o Sr. Deputado Vítor Vasques pretende levantar ao problema do aumento das pensões? É por não estar de acordo com ele ou por ser feito por um Governo que não lhe agrada?

O Sr. Presidente: - Para responder,' tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Vasques.

O Sr. Vítor Vasques (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Serei breve As minhas respostas baseiam-se na seguinte questão: Srs. Deputados, há da vossa parte uma questão muito grande. O Orçamento não é do Partido Socialista, o Orçamento é do Governo. Estamos aqui para obter esclarecimentos do Governo e não para darmos esclarecimentos aos nosso colegas Deputados.
Em Outubro, com certeza, estarei ali na bancada do Governo e prestarei os esclarecimentos devidos.

Aplausos do PS.

O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Não tenha ilusões, mesmo que ganhe não vai para lá!

O Sr. Oliveira Dias (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: -Tem V. Ex • a palavra.

O Sr. Oliveira Dias (CDS): - Sr. Presidente, pretendia que V. Ex.ª me dissesse se estou ou não estou no meu direito de fazer perguntas aos Srs. Deputados da oposição acerca das exposições que eles fazem nesta Câmara,

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Oliveira Dias está inteiramente dentro do seu direito regimental de fazer pergunta, tal como qualquer Sr. Deputado está no direito de responder ou não responder.

O Sr. Vítor Vasques (PS): Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Vítor Vasques (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se a Aliança Democrática me contabilizar o tempo das respostas no sou tempo ou no tempo do Governo, responderei às perguntas com todo o gosto.

Vozes do PSD e do CDS: - Querias!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Tavares.

O Sr. Sousa Tavares (DR): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Agrupamento dos Deputados Reformadores gostaria de ver discutir o Orçamento em alguns dos seus aspectos técnicos que até aqui não têm merecido o menor interesse nem à oposição nem de certa maneira, como aliás lhes não compete, às bancadas da maioria.
Em todo o caso gostava de levantar determinados problemas ao Sr. Ministro das Finanças sobre a observação técnica do Orçamento. Entendo que o Orçamento é preocupante sob vários aspectos e sobretudo no aspecto do magro volume dos impostos directos para cobrir as despesas correntes. Continuamos, fundamentalmente, numa distorção já antiga em Portugal, em que a massa dos impostos directos cobre, deficientemente, 25 % das despesas correntes.

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Por outro lado, verificam-se de certo modo distorções que pesam indirectamente sobre toda a população, como seja o volume do imposto do selo ser superior u contribuição industrial, isto é, a massa fundamental dos rendimentos do Estado é obtida através de impostos directos. Sabemos que para a eficácia da recepção de receitas pelo Estado, imposto indirecto ,tem-se manifestado sempre, e é tradicional desde os tempos do Ministro das Finanças Oliveira Salazar, como a base fundamental das finanças portuguesas.
Pergunto ao Sr. Ministro das Finanças, a quem reconheço uma raríssima competência evidenciada neste Orçamento, se não será tempo de, finalmente, empreender a reforma fiscal de que todos os Governos falam, mas nenhum até hoje esboçou o mais teve gesto nesse sentido.
Espero, confiadamente, que o Orçamento para 1981 apresente já um esboço de reforma fiscal, que, aliás, é visível em certos sintomas deste.
Não há dúvida de que marchamos para a unidade orçamental e isso é importante. A inclusão do Fundo de Desemprego, que sempre funcionou como um fundo secreto de financiamento de todos os Governos e a partir de agora passou a ter o seu lugar claro no OGE. Há uma verdade indiscutível nesse princípio, como há em vários outros apresentados por este Orçamento. De forma que gostaria de encontrar para além do Orçamento, e espero que o Sr. Ministro das Finanças possa corresponder a estas observações no seu discurso final, um esboço das intenções do Governo no sentido de uma reforma fiscal, fundamental em Portugal, que possa levar pelo menos os impostos directos a um nível de financiamento das despesas correntes do Estado de 50 % e não abaixo de 25 %, como infelizmente se mantém como tradição antiga do País.
Suponho que são estes os aspectos; fundamentais que interessam aos portugueses numa discussão do Orçamento. Infelizmente, a discussão do Orçamento tem servido até aqui para ataques completamente imponderados e pá rã discussões que não envolvem a sua apreciação técnica.
Por outro lado, também gostaria de falar sobre o problema das autarquias locais. Este problema das autarquias locais também tem sido explorado num sentido demagógico...

Vozes do PS: - Não apoiado!

O Orador: - ...mas não têm sido feitas as perguntas fundamentais que há a fazer em relação aos orçamentos das autarquias locais. É evidente que a criação do Poder Loca! e a deslocação de verbas de dezenas de milhões de contos do Orçamento Geral do Estado para os orçamentos das autarquias locais tem de. envolver uma diminuição de despesas dos serviços centrais do Estado. Não é compreensível que estejamos a- multiplicar despesas e que a Lei das Finanças Locais corresponda única e simplesmente a uma multiplicação de serviços em todos os municípios a somar aos serviços centrais que existem. Não é esse o espírito da descentralização nem é isso de maneira nenhuma aquilo que pode correspondei à necessidade económica do País e do Estado.
Portanto, tenho a impressão de que uma aplicação verdadeira e integral das autarquias locais envolve todo um plano de destruição de serviços centrais do Estado e de deslocação desses serviços centrais para a periferia. Enquanto isso não estiver feito, falar na Lei das Finanças Locais e exigir a sua aplicação total é um puro aspecto demagógico, como, aliás, foi demagogia de todos os partidos, sem excepção de nenhum, a aprovação da Lei das Finanças 'Locais como foi feita o ano passado. Foi apenas uma exigência eleitoralista de todos os partidos, porque, todos os partido sabiam perfeitamente que não existiam nem as estruturas, nem a preparação técnica nem a reorganização de serviços necessárias para justificar em toda a sua amplitude a Lei das Finanças Locais tal como foi votada!
Nós, reformadores, não nos encontrávamos representados no Parlamento nessa altura, porque teríamos votado contra. Não contra & descentralização do Poder, que é um dos nossos programas fundamentais, porque cremos que ela corresponde a uma verdade administrativa e não simplesmente a uma disposição de fundos postos ao serviço dos poderes locais que ocasiona, por exemplo, que neste momento existam milhões de contos de depósitos a prazo em nome das autarquias locais. Isto quer dizer que as autarquias locais não têm sequer nem os projectos nem as disponibilidades de dar razão ao dinheiro que têm na mão: não têm serviços, não têm projectos, não têm organização para isso. Este desfasamento entre as possibilidades financeiras criadas às autarquias e a organização de serviços necessários para corresponder a ele tem de ser suplantado. E por 'isso 'há realmente uma exigência a apresentar a qualquer Governo e à reorganização do Estado Português: é que à aplicação da Lei das Finanças Locais corresponda uma deslocação dos serviços do Governo Central para as periferias, a extinção de determinados serviços centrais que oneram o Orçamento Geral do Estado e, simultaneamente, a criação de serviços verdadeiramente descentralizados.
São algumas das observações que desejava fazer sobre este Orçamento.

Aplausos do PSD. do CDS e dos Deputados reformadores.

O Sr. Presidente: -Sr. Deputado Angelo Correia, inscreveu-se algum Sr. Deputado do seu partido para intervir?

O Sr. Angelo Correia (PSD): - Ainda não, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - É uma pergunta que se justifica, visto que o Sr. Deputado tinha informado a Mesa nesse sentido.
Srs. Deputados, estamos sem inscrições.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Que se inscreva o Governo, nós já fizemos duas intervenções.

O Sr. Presidente: - Srs. (Deputados, acaba de se inscrever o Sr. Ministro da Habitação e Obras Públicas.
Para uma intervenção, tem V. Ex.ª a palavra, Sr.ª Ministra

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O Sr. Ministro da Habitação e Obras Públicas (João Porto): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No campo da habitação, impõe-se ao Ministério da Habitação e Obras Públicas o desenvolvimento conjugado de duas grandes linhas de actuação. Por um lado, desbloquear e incrementar a produção pública e apoiada do Estado; por outro, estimular a iniciativa e a promoção privadas.
Os factos revelam bem a necessidade deste duplo esforço.
Na verdade, no que respeita à actividade do Fundo de Fomento da Habitação, há que distinguir, por um lado, a promoção pública -que. inclui a promoção directa, as casas pré-fabricadas e os empréstimos às câmaras_ municipais- e, por outro, a promoção apoiada - que envolve as obras comparticipadas, os empréstimos às cooperativas de habitação económica, associações de moradores e outras entidades, a autoconstrução e os contratos de desenvolvimento.
Em 1979, no âmbito da promoção pública, foram iniciados 849 fogos, concluídos 3971 e encontravam-se em curso, em 31 de Dezembro, 18832 fogos. Isto é, ao ritmo de 1979, os fogos em curso no fim do ano passado demorariam a ser concluídos quatro anos e oito meses.
No que se refere à promoção apoiada foram iniciados 1343 fogos, concluídos 4134 e transitaram em curso 10550, que, a manter-se o ritmo da construção, demorariam mais dois anos e meio a ser concluídos.
Por estes números se vê que, sobretudo no tocante à promoção pública, o ritmo da conclusão dos fogos é incomparavelmente lento. Isto deve-se, entre outros motivos, à paralisação de diversos empreendimentos em curso, entre os quais alguns dos planos integrados: paralisações e outros entraves que estão a ser objecto da atenção e do esforço do Ministério.
Por outro lado, a produção global de fogos, que atingiu um máximo em 1974, caiu verticalmente em 1975, sobretudo por quebra da iniciativa privada, que praticamente restringiu a sua actividade à construção de fogos para utilização própria, não tendo sido possível ao Estado, nem mesmo remotamente, compensar esse desinteresse dos promotores privados.
Posteriormente, tem-se assistido a uma muito lenta recuperação do nível de produção de fogos, sem que, contudo, em 1979 se tivesse ainda alcançado o montante de 1972.
É pois evidente que só com a criação de novos incentivos à iniciativa privada, designadamente para a promoção de habitação social, a par de um esforço enérgico de promoção pública, se poderão atingir níveis de produção capazes de, a longo prazo, ultrapassarem as carências habitacionais do nosso pais.
Entre as medidas tendentes a alcançar estes objectivos destacam-se, no relançamento da promoção habitacional privada, o estabelecimento de condições bonificadas de financiamento à construção de habitações, a revisão do sistema de crédito bonificado à aquisição de casa própria, com vista a dar-lhe uma nova eficácia, a revisão do regime de bonificações fiscais em transmissões de prédios destinados à habitação própria e o estudo, com vista à sua reformulação, de todo o sistema de imposições fiscais sobre â habitação.
Em particular, o regime de crédito bonificado, pelo Estado, à aquisição de casa própria, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 515/77, de 14 de Dezembro, vem apresentando algumas distorções, carecendo por isso de ser melhorado no tocante à sua eficácia e equidade.
De facto, a redução dos rendimentos reais das famílias nos últimos anos, em paralelo com o crescimento dos custos de construção, conduziu a que as prestações a cargo daquelas se tenham tornado cada vez mais difíceis de suportar, apesar dos acentuados níveis de bonificação das taxas de juro actualmente praticadas.
Por outro lado, o mecanismo de estabelecimento e contrôle de custos contido neste regime conduz a uma desactualização dos seus parâmetros, cuja revisão periódica vem efectivando-se com sensíveis atrasos, face à efectiva evolução dos? custos de construção.
Nestas circunstâncias, está já em fase adiantada o estudo da reformulação daquele regime, tendo em vista, por um lado, a graduação das bonificações de juros atendendo cada vez mais à efectiva capacidade económica das famílias e, por outro, a introdução de novas modalidades de pagamento dos encargos resultantes da contracção de empréstimos, adequadas à evolução dos rendimentos e poupanças das mesmas famílias.
No que se refere à dinamização do sector privado social, o Ministério tem vindo a actuar sobretudo através do desbloqueamento do programa de contratos de desenvolvimento de habitação, da dinamização da promoção cooperativa de habitações e do alargamento de intensificação do sistema de autoconstrução. Neste sentido, estão em estudo a revisão de alguns aspectos do regime de financiamentos às cooperativas de habitação, a reformulação da legislação sobre cooperativismo habitacional, tendo em vista eliminar discriminações dentro do movimento cooperativo, e a reestruturação do programa de apoio à autoconstrução.
Está também em causa o relançamento da promoção habitacional pública, quer pelos câmaras municipais, quer pelo FFH, intensificando o seu ritmo, conferindo maior eficácia aos organismos executores e maximizando os resultados face aos meios financeiros disponíveis. Assim, além dos desbloqueamentos já referidos dos empreendimentos em" curso e dos novos lançamentos do plano, estão em estudo normas técnicas de habitação social, bem como a elaboração de projectos-tipo adequados às condições sociológicas e climáticas das diferentes regiões do País; o mesmo se diga da revisão dos regimes de arrendamento e de .propriedade resolúvel das habitações promovidas pelo sector público.
A recuperação do parque habitacional e a renovação urbana são igualmente preocupações do Governo, estando já reestruturado o programa de recuperação do parque habitacional existente, ao mesmo tempo que se esboçam as linhas gerais orientadoras de um programa de renovação urbana, inventariando e definindo prioridades de actuação.
No domínio do planeamento urbanístico, está já em fase adiantada a criação e regulamentação de novas figuras do planeamento local, municipal e intermunicipal e a revisão da legislação sobre loteamentos particulares; o mesmo se poderá dizer da

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reformulação da legislação de solos, face & experiência recente, e regulamentação do direito de superfície.
Quanto ao sector da indústria da construção, está já para aprovação pelo Governo a actualização de algumas disposições da legislação geral de empreitadas, ao mesmo tempo que se procede à actualização e melhoria das fórmulas de revisão de preços de empreitadas do sector público, à revisão da actual legislação sobre alvarás de construção civil e obras públicas, bem como à revisão e actualização do Regulamento Geral das Edificações Urbanas (RGEU).
Está igualmente em curso a elaboração dos estatutos do Instituto da Construção.
No sector das obras públicas tem-se dado desenvolvimento, tão acelerado quanto os meios financeiros o permitem, aos programas solicitados pelos diversos departamentos do Estado, assumindo especial relevância, pelo seu volume, os programas das construções escolares e da rede rodoviária.
Em particular, no que se refere às: construções escolares, é de salientar o Programa Especial de Execução das Escola Preparatórias e Secundárias, lançado recentemente, mas que já envolve doze escolas, num investimento global da ordem dos 800000 contos.
De igual modo, decorrem acções de cooperação no prosseguimento das negociações com o Banco Mundial e outras entidades, com vista à obtenção de financiamentos externos, e de execução de planos globais e plurianuais que sirvam de base à sua negociação. Da mesma forma, está em curso o estabelecimento de normas, de escolha de terrenos com aptidão para construções escolares e sua compra, que mereçam igualmente o acordo do MEIC e das autarquias locais, destinados a futuras escolas, assim como o ajustamento da tipologia dos projectos às condições ecológicas, e a inventariação de áreas cobertas, disponíveis ou restauráveis, para adaptação a equipamento escolar.
No que se refere às estradas, foi já incrementado o reforço da pavimentação dos principais itinerários nacionais, com a rectificação de alguns troços mais desajustados às exigências actuais.
Procede-se, por outro lado, à revisão do Plano Rodoviário estando neste momento a proposta de revisão em apreciação no Conselho Superior de Obras Publicas e Transportes. No entanto, algumas linhas mestras dessa proposta e dos seus estudos preparatórios serviram já de base à elaboração da proposição portuguesa relativa às acções comuns com a CEE, no sector da política regional, tendo, para o efeito, dela sido escolhidos os principais itinerários; de penetração para o interior do País e para a fronteira espanhola, assim como um grande eixo longitudinal interior que permita melhorar condições de vida e de desenvolvimento à província portuguesa, tradicionalmente desprotegida.
Poderia alargar, quase indefinidamente, a listagem de actuações e iniciativas, designadamente nos campos do saneamento básico, das construções hospitalares, dos edifícios e monumentos nacionais, etc. Mas julgo dispensável tal enumeração.
Para fazer face a este programa, sucintamente referido, o Ministério da Habitação e Obras Públicas disporá, segundo a proposta de Orçamento apresentada à consideração desta Câmara, de 32.7 milhões de conto».
No que x refere aos investimentos, o OGE proposto atribui 19,9 milhões de contos ao MHOP, sendo 13,5 ao sector das obras públicas e 6,4 ao da habitação e urbanismo. Estes valores representam acréscimos nominais relativamente a 1979, respectivamente de 23,4% para o conjunto do Ministério, 21,6% para as obras públicas e 27,6 % para a habitação e urbanismo.

MHOP tem, assim a seu cargo 49,75 % do conjunto de investimentos! do OGE para 1980, que totaliza 40 milhões de contos.
Além disto disporá o Ministério de mais 10,2 milhões de contos provenientes de outras fontes de financiamento, sendo 9,6 para o sector de habitação e resultantes, fundamentalmente, de empréstimos de instituições de crédito; a parte restante, relativa às obras públicas, é sobretudo constituída por saldos da v Junta Autónoma de Estradas.
Prevê-se ainda a mobilização de mais 1,6 milhões: de contos para financiamento à construção, directamente pelas instituições de crédito, no âmbito do programa de contratos de desenvolvimento.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Entretanto, não era possível parar! Como já aqui foi referido, até ao dia 11 de Abril já tinham sido adjudicados 8205 novos fogos, dos quais se destacavam 3485 do programa de promoção directa e 3810 do programa de cooperativas e associações de moradores, distribuindo-se os restantes pelos programas de empréstimos à& câmaras municipais, de obras comparticipadas & de autoconstrução.
Muitos destes novos lançamentos tinham sido objecto de concurso público ainda no Outono de 1978, o que dá uma ideia da mudança que este esforço representa no ritmo de promoção habitacional que vinha sendo praticado.

O Sr. Manuel Pereira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Idêntico esforço tem vindo a ser feito noutros sectores, designadamente no lançamento de escolas e de estradas. E assim continuará a acontecer, até ao limite dos meios financeiros que forem postos à disposição do Ministério da Habitação e Obras Públicas.

Aplausos do PSD e do CDS.

O Sr. Eduardo Pereira (PS): -Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: -Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Sr. Presidente, para juntar uma pequena intervenção com alguns pedidos de esclarecimento.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade.

O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr. Ministro da Habitação e Obras Públicas, Srs. Deputados: Um membro do actual Governo, com particulares responsabilidades no sector da habitação, afirmava, no dia 4 de Abril, à Anop ser «inaceitável que, até hoje, não tenha sido definida e posta em prática uma política habitacional clara, coerente e integrada, que per-

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mita perspectivar para os Portugueses a solução do grave problema habitacional, fixando objectivos finais e intermédios e prazos para a sua realização f...]
Este Governo, disse ainda, «já desencadeou os estudos necessários [...j de uma verdadeira política habitacional de âmbito nacional e integrado que [...] vai definir e pôr à consideração dos Portugueses».
Depois de ouvir o Sr. Ministro e de ter escutado com toda a atenção, afinal, uma listagem de actuações, ainda fico mais perplexa em relação às afirmações desse membro do Governo.
Em 16 de Abril, suponho que já na linha dos estudos feitos, perante a Comissão de Habitação e Obras Públicas desta Assembleia, afirmava V. Ex.ª, Ministro, existirem carências da ordem dos 650000 •d 700000 fogos (números seguramente mais actualizados que haverá que contrapor aos 653 000 apurados em 1970, ames de terem regressado a Portugal cerca de 200000 famílias residentes nas ex-colónias) e ser esta área prioritária do ponto de vista do investimento para o seu Ministério.
Porquê? Respondeu V. Ex.ª, porque neste país apenas 1U% a 15% das famílias não necessitam de qualquer auxílio para aquisição ou arrendamento de um fogo, e onde 15 % a 20% são, deste ponto de vista. insolventes.
Disse, ainda, V. Ex.ª da sua preocupação em mobilizar, no curto prazo, 100 a 150 milhões de contos, para um adequado ataque a estas carências.
E, continuando o relato das suas angústias, disse V. Ex.ª que o seu Ministério teria ainda de mobilizar cerca de 90 milhões de contos para a rede nacional a cargo da Junta Autónoma de Estradas; 60 milhões de contos para salas de aulas; 10 milhões de contos para hospitais - e não baixou de verbas da ordem dos 10 milhões-, etc.
Depois, falou-nos V. Ex.ª dos 20 milhões de contos do OGE de 1980, dos quais 6,4 milhões para departamentos da Secretaria de Estado da Habitação e 13,5 milhões para departamentos da Secretaria de Estado das Obras Públicas. Disse ainda V. Ex.ª que algumas direcções-gerais do seu Ministério tiveram acréscimos de verba muito pequenos ou não tiveram mesmo acréscimos. Que a Lei das Finanças Locais não está em cumprimento integral. Com isso respondeu V. Ex.ª a algumas perguntas que tem sido feitas das bancadas da AD. Aliás, hoje mesmo, ao dizer que o seu Ministério é responsável e é ele que dirige 49,75 % do conjunto de investimentos do OGE, V. Ex.ª acabou por afirmar mais uma vez que não existe mais Lei das Finanças Locais neste país.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Depois disse-nos ainda que estamos muito longe de dispensar dos programas da habitação à Administração Central e que tem uma esperança - esperança que suponho que todos os Ministros tem tido a meio dos seus mandatos - de que a verba que foi atribuída ao MHOP no OGE de 1980 possa vir a ser reforçada antes do fim do ano, visto que a capacidade de realização dos organismos está bastante desaproveitada. Isto quer dizer que não se destinou este ano verba suficiente sequer para pôr em pleno os trabalhos dos departamentos ministeriais.
Segundo o Sr. Secretário de Estado da Habitação, cito outra vez as declarações à Anop, «a responsabilidade desta situação», referindo-se às carências, às paralisações dos empreiteiros, e suponho que também às deficiências do OGE/80, «é dos governos mais ou menos comunistas, mais ou menos socialistas, que nos governam desde 1974 [...]»
Para o Secretário de Estado da Habitação, os socialistas acompanham os comunistas a comer criancinhas em Portugal!
Para nós socialistas o direito à habitação, que corresponde à satisfação de uma necessidade básica, é um assunto sério que não pode ser assim tratado. A limitação à plena realização do objectivo de fundo - o de garantir a todos o direito a uma habitação condigna - decorre não só das limitações existentes no sector produtivo da construção como também da impossibilidade de mobilizar os recursos económicos necessários, sem ser num contrato de médio e longo prazo.
A satisfação do direito à habitação supõe ainda que a sociedade esteja organizada de modo que do direito ao exercício do trabalho resultem rendimentos familiares que permitam suportar, a níveis razoavelmente., aceitáveis, o custo da habitação.
Torna-se assim claro a ligação entre a política de habitação e a política de rendimentos. Em Portugal, como os rendimentos familiares ;>e situam para a grande maioria em níveis relativamente baixos, os custos dg habitação absorvem fracções excessivas de rendimentos disponíveis. Nestas circunstâncias, torna-se indispensável uma política redistributiva que transfira para os sectores da .população menos favorecida o volume de recursos indispensável! a viabilizar um mínimo de satisfação de determinadas necessidades básicas, como é o caso da habitação. Espero que seja a este» tipo de política que se tenha referido o Sr. Secretário de Estado da Habitação.
Sr. Ministro, perante o OGE de 1980, que nos foi apresentado, perante as declarações do Sr. Secretário de Estado da Habitação à Anop, perante as suas declarações à Comissão de Habitação e Obras Públicas, e hoje, perante a intervenção do Sr. Ministro das Finanças e do Plano na apresentação do Orçamento e do Plano e perante a intervenção do Sr. Ministro da Administração Interna defendendo a descentralização de poder na pobreza, gostaria de começar por afirmar que as Linhas de acção da campanha encetada em 4 de Abril são demagógicas, procuram encobrir com o lançamento de. empreendimentos .parados a falta de programas próprios, revelam tendências centralizadoras, são asfixiantes do Poder Local e são socialmente pouco justas.
Para melhor esclarecimento desta Assembleia, gostaria que o Sr. Ministro me respondesse às seguintes perguntas:

1.º Considerando o Governo que ainda há dois anos as comparticipações do MHOP somavam apenas 2 milhões de contos e as do MAI eram também insignificantes, conti-

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nua V. Ex.ª, Sr. Ministro, a sustentar que a situação financeira das autarquias com este OGE de 1980 sara desafogada?
2.º Segundo um Deputado do CDS, para a manutenção do nível de mão-de-obra que deveria estar afecto ao sector da construção civil seria necessário produzir o valor bruto d0 construção de cerca de 120 milhões de contos a preços de 1979. Afirmou V. Ex.ª que o sector já não está em crise, que a iniciativa privada e o sector industrial «arrancaram» e que a Cimpor não resistiu a dois .meses da AD. Significará isto que o OGE e o Plano abrem perspectivas para se alcançar aquele volume de trabalho? Ou que querendo V. Ex.ª autuar sobre a produtividade empresarial o desemprego aumentará?
3.º É do conhecimento gerai que o MHOP pretende introduzir alterações na Lei dos Solos e no Código de Expropriações. É também sabido que desde 1978 não têm os sucessivos Governos expropriado terrenos para os entregar às autarquias locais para as suas urbanizações. Pode V. Ex.ª esclarecer também esta Assembleia da República por que razão um projecto de lei-quadro da administração urbanística, peça fundamental para a Administração Autárquica, continua a aguardar a sua aprovação e continua portanto a demorar a sua apresentação na Assembleia da República?
4.º Afirmou o Sr. Secretário de Estado da Habitação que quando V. Ex.ª tomou posse se encontravam paralisados 13 139 fogos da 221 empreendimentos. Pode V. Ex.ª confirmar se os 8088 fogos lançados até 11 de Abril fazem parte deste lote? Depois de lançados os restantes 5000 fogos haverá novos terrenos, novos projectos e verbas para lançar alguma coisa deste Governo da AD?
5.º Anunciou o MHOP que foram concedidos empréstimos a cooperativas e a associações de moradores para a construção de 3810 novas habitações distribuídas por 39 empreendimentos. Grande parte destes fogos foram também anunciados no V. Governo - estamos à beira de começar a inaugurar pontes pelos dois lados

Risos.

Dizem as cooperativas e associações que não receberam qualquer verba. Diz o FFH quo não possui nesse sentido qualquer dês» pacho de V. Ex.ª Diz a Secretaria de Estado da Habitação que para este ano irá pôr à disposição deste programa 4,5 milhões de contos, diz o FFH que são 3,5, dizem os institutos de crédito que apenas porão à disposição do MHOP 2,5 milhões. Por outro lado continuam por regulamentar os antigos 9.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 268/78, de 31 de Agosto. Poderá o Sr. Ministro esclarecer estas situações?
6.º Pode o Sr. Ministro esclarecer esta Assembleia sobre a repartição de programas habitacionais entre, a Administração Central e a Administração Local, para melhor se perceber que não está a ser cumprida a Lei das Finanças Locais? Não é essa repartição o melhor argumento dia prova de. quo não se pensa sequer cumprir essa lei e que as verbas este ano incluídas no OGE para as autarquias locais são inferiores a 50 % do que deviam sor?
7.º Pode o Sr. Ministro anunciar alguma nova medida política habitacional, a forma como pensa descentralizar essa medida, quando? Estamos em Maio, pode o Sr. Ministro assegurar que lançados nesta data esses programas poderão contribuir para a melhoria da economia, do emprego, da qualidade de vida, no ano de 1980?

Aplausos do PS e da Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura, do, MDP/CDE.

O Sr. Presidente: -Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro, se assim o entender.

O Sr. Ministro da Habitação e Obras Públicos: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Eduardo Pereira: Foi pena que o Sr. Deputado não me tivesse fornecido essas perguntas antes de eu fazer a minha intervenção, porque então teria aproveitado para responder a todas nessa altura, É que agora receio bera que para o fazer teria que produzir uma nova intervenção...

O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Dá-me licença que o interrompa. Sr. Ministro?

O Orador: - Com certeza, Sr. Deputado

O Sr. Eduardo Pereira (PS): -Talvez o Sr. Ministre João Porto possa guardar para mais tarde as respostas às perguntas que fiz agora.

O Orador: - Na verdade, creio que para responder integralmente- às perguntas que acaba de me colocar teria de fazer uma nova intervenção, naturalmente mais longa até do que a que ainda há pouco produzi.
Queria, em todo o caso, chamar a sua atenção para alguns aspectos que eu julgava evidentes, mas que, pelo que vejo, não ficaram ainda esclarecidos.
Quando, na reunião que tive o prazer de ter com a Comissão de Obras Públicas e Habitação sobre este problema, falei nas carências, que computei em 90 milhões de contos para as estradas da rede fundamental, em 60 milhões de contos para as escolas e que o Estado deveria poder contar com 100 a 150 milhões de contos para a habitação, etc., logicamente que me referia, e julguei que tinha sido claro, aos cômputos a preços actuais da remoção global das carências que neste momento se verificam. Nunca me passou pela cabeça que isso pudesse ser resolvido em dois ou três anos e muito menos num só.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E isto é apenas para termos uma ideia do volume do que há a fazer nos anos futuros. Não

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vou deter-me aqui sobre o problema das finanças locais. A Assembleia é soberana e aprovará ou não este Orçamento. Estará em causa, porventura, um ajustamento daquilo que a própria Assembleia aqui há dois anos aprovou. Não vejo que isso seja grave. Agora do que não tenho dúvidas nenhumas é de que as câmaras municipais vão dispor de verbas muito mais volumosas do que aquelas de que dispuseram no ano passado, para não falar já num passado mais remoto. E não tenho dúvidas nenhumas também de que as câmaras vão ter possibilidade de se lançar, agora, sim, no desenvolvimento dos seus próprios programas habitacionais, descentralizando, desse modo, a construção de habitações sociais no nosso país.
Agora o que não cabe ao Ministério das Obras Públicas é impor às câmaras municipais a construção disto ou daquilo. Se as câmaras entenderem que as suas prioridades se dirigem para outros campos, não cabe ao Ministério da Habitação e Obras Públicas dizer-1hes que não é assim. Isso seria contrariar precisamente a autonomia que as- câmaras têm neste momento.
Portanto, sobre o que não tenho dúvidas é que, dispondo de mais meios e reconhecendo as câmaras as carências que têm no campo habitacional, certamente de moto próprio, destinarão a esse fim uma pane, com certeza significativa, das verbas de que dispõem.
Queria finalmente referir a observação que fez acerca de capacidade desaproveitada dos serviços era face deste Orçamento. Reconheço que não tive a felicidade do Sr. Ministro Eduardo Pereira, que não conseguiu gastar no ano de 1977 cerca de 2400000 contos que lhe sobraram do seu Orçamento!...

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador:- Eu gostaria de ter tido essa sorte. Infelizmente, a situação do nosso país, analisada friamente por este Governo, não permite que o Ministério da Habitação e Obras Públicas disponha de verbas para que não tem capacidade de execução. Estou certo de que as verbas que são destinadas ao meu Ministério serão integralmente gastas, e bem gastas, e não tenho qualquer dúvida em confirmar aqui que teria possibilidade de fazer mais alguma coisa se, porventura, durante o ano houver possibilidade de destinar ao Ministério da Habitação e Obras Públicas outros recursos.
No entanto, como parte de um Governo que tem uma responsabilidade, global pela gestão do nosso país que todos reconhecemos em condições económicas difíceis, tenho de aceitar que: os desejos do Ministro da Habitação e Obras Públicas possam não ser satisfeitos em 100%.

Aplausos do PSD. do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores.

O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro: Penso que não merece a pena continuar esta troca de impressões, mas queira apenas esclarecer dois ou três .pontos.
V. Ex.ª referiu-se na Comissão de Habitação o Obras Públicas desta Assembleia a 100 ou a 150 milhões de contos e falou agora como sã eu tivesse pensado que esse ora o programa para este ano. Eu sei que não é assim. Aliás, não é o programa das carências, como V. Ex.ª disse, porque » programa de 650 000 fogos de carência representa 650 milhões de contos, a preços de 1980, e, portanto, os 100 ou 150 milhões de contos é a primeira gota de água nas suas carências. É um problema a $gr resolvido nos primeiros..,

O Sr. Ministro da Habitação e Obras Públicas: - Posso interrompê-lo, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Habitação e Obras Públicas: - Desculpe, Sr. Deputado, mas 100 ou 150 milhões de contos será o montante da contribuição que o Estado deve dar para a resolução do problema habitacional, porque, a nosso ver, a iniciativa privada tem de contribuir com a parte fundamental.

O Orador: - Sr. Ministro, a iniciativa privada pode contribuir do ponto de vista da construção em tudo quanto o Sr. Ministro quiser, mas o que não pode fazer é dar casas de borla ou a preços astronómicos a 80 % das famílias portuguesas que são praticamente insolventes ou que precisam de ajuda. Não há iniciativa privada, nem com o Governo AD, que consiga fazer isso!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - V. Ex.ª disse ainda, e agradeço o remoque e a graça, que gostaria de ter a felicidade que eu tive em 1977, porque me sobraram 2 milhões de contos. Essa felicidade vai V. Ex.ª ter em Novembro deste ano, porque quando abandonar o Ministério haverá mais de 2 milhões de contos. Aliás, acabou de dizer que as casas que são dirigidas pela Administração Central levam quatro anos e meio a fazer e as outras dois anos e meio e V. Ex.ª não é capaz de descentralizar e tem como verba principal este ano a promoção directa que é toda feita a partir não do Tenreiro do Paço - nisso descentralizou -, mas da Avenida de Columbino Bordalo Pinheiro.
Por fim, só queria ler ao Sr. Ministro, visto que se desinteressou do problema das finanças locais, uma nata que aqui tenho preparada:
No que se refere às finanças locais, o Governo não considerou no seu Orçamento o cumprimento da Lei das Finanças Locais.
Admitimos que, face à gravidade do Estado financeiro do País, haja redução nalgumas das verbas que a Lei das Finanças Locais prevê que sejam desde já atribuídas às autarquias locais. E se a Câmara viesse a aprovar essa alteração, é evidente que estaria a derrotar - ainda que transitoriamente, visto que só seria aplicável neste exercício - a própria Lei das Finanças Locais. Quanto ao maré, a lei tem de ser cumprida.
É por isso que há uma discordância de fundo -e parece que essencial- com o Go-

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vemo. É mais uma vez o problema do País e o problema da descentralização que está em causa. Nenhum poder político se descentraliza de moto próprio. O Poder tende a manter-se centralizado e nós temos assistido a isso. Precisamente por isso a Assembleia da República aprovou a Lei das Finanças Locais, que não é mais do que dar às autarquias os meios de elas serem efectivamente Poder Local, deixando de estar subordinados ao Poder Central do Estado. É que enquanto houver a subordinação financeira não há efectivo Poder Local.
Esta é uma transcrição de um texto de Sá Gameiro do dia 22 de Março de 1979.

Risos do PS e do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estamos novamente sem inscrições.

Pausa.

Penso que estamos a perder um tempo precioso que, logo, nos vai fazer falta para terminarmos o debate à hora estipulada pelo Regulamento.

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado Marino Vicente, para uma intervenção.

O Sr. Marino Vicente (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A AD pretendeu transformar a promessa de uma casa num voto. Daí o facto de se ler no Programa Eleitoral da Aliança a afirmação, peremptória, de que por mero efeito da sua vitória haveria uma casa para cada português. Assim deveríamos ter hoje, decorrido metade do período possível do seu mandato, mais 350000 fogos, construídos em lotes devidamente infra-estrutarados, adornados por excelentes adornos exteriores e sitiados por uma verdadeira rede de equipamentos sociais. Só que, conseguido o voto, a mesma AD, erigida em Governo, opôs um severo dique às promessas de fresca data e remeteu-» a um rotundo silêncio durante mais de dois meses de governação.
Inopinadamente, os responsáveis do sector vieram a terreiro e multiplicaram-se em declarações. As eleições aproximavam-se e convinha aliciar o voto nem que fosse com a promessa de um tijolo.
Vejamos então a estratégia do voto, atrelado à promessa de um tijolo.
Em reunião realizada no dia 16 último com a Comissão de Habitação e Obras Públicas desta Assembleia, o Sr. Ministro afirmou que já tinham sido adjudicados 8205 fogos pelo Fundo de Fomento da Habitação e hoje repetiu a afirmação até ao dia 11 de Abril, como disse.
Devemos esclarecer o Sr. Ministro do que efectivamente se passa no seu Ministério e temos obrigação de explicar ao País a que se devem e a que se referem estes números.
Até àquela data foram tomadas medidas, meramente administrativas, em relação aos seguintes, casos:
Foram adjudicados, sem cobertura financeira, apenas 2970 fogos, pelo que o Sr. Ministro meteu por conta própria mais de 5000 adjudicações;
Foi autorizada a concessão de empréstimos, a mais das vezes sem cobertura financeira, para 4370 fogos.
Dos 8205 fogos publicitados, apenas foram iniciados 2022.
Quanto às habitações promovidas por cooperativas e associações de moradores, diga-se que o V Governo já havia concluído negociações com a Caixa Geral de Depósitos para um empréstimo de 3,5 milhões de contos e que já tinha aprovado financiamentos e respectivas minutas de contrato para 3600 fogos. Quando o actual Secretário de Estado afirma ter já concedido empréstimos para o lançamento de 2000 novos fogos, apenas significa que se apropriou e mal do trabalho do Executivo de Maria de Lurdes Pintasilgo e aprovou minutas de financiamentos, já anteriormente aprovadas
No sector apoiado e contrariamente ao que, inseguro, afirmou o Sr. Ministro, em reunião com a Comissão desta Assembleia e agora aqui, não assinou sequer" um novo contrato de desenvolvimento, pois que nem sequer uma proposta de contrato foi ainda aceite, como primeiro passo para um percurso burocrático que conduza ao lançamento de novo empreendimento.
No que se refere à proposta de lei do OGE constatamos que a rubrica «Habitação e Equipamentos Urbanos» é subalternizada e merece uma verba ainda inferior em 4027113 de contos, à dotação revista de 1979.
Descendo ao pormenor do orçamento privativo do Fundo de Fomento da Habitação, verificamos que para uma dotação global de 15524 milhões de contos, 8,8 milhões serão financiados pela Caixa Geral de Depósitos. Questionado por nós na Comissão de Habitação, o Sr. Ministro manifestou alguma incerteza quanto aos encargos financeiros daí decorrentes e supôs que a taxa de juro praticada por aquela instituição de crédito rondaria os 8 % a 8,5%5. Devemos esclarecer o Sr. Ministro que a taxa de juro praticada é cie 19,75% e que os encargos financeiros, incluindo os juros já vincendos, serão de 2 571 470 contos, se a taxa de realização financeira atingir os 10%. Devemos informar o Sr. Ministro qua desconhece o impacte financeiro das decisões tomadas para o seu sector, de que havia alternativas de financiamento, mesmo fora do quadro de uma nova política de crédito e, do empolamento das verbas do OGE. se se não pretendesse dificultar ou mesmo paralisar a acção do Fundo a médio prazo e inviabilizar obras então em curso.
Devemos esclarecer, que com tal dotação financeira as obras a iniciar em 1980 trarão pouca expressão e que de maneira alguma se atingirão os 20 000 fogos previstos ou sequer os 16 000 fogos (níveis de 76) que o Sr. Ministro admitiu, num rasgo de modestia, na Comissão de Habitação.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Foi promessa várias vezes repetida pela AD que o seu Governo iria rever as taxas de juro de crédito para a habitação própria, inculcando a ideia de que aumentaria significativamente a bonificação. No entanto, do que veio a público, pela voz dos seus responsáveis, retira-se esta ideia: para além da progressividade das amortizações

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cujo quanto se desconhece, beneficiam-se escalões de rendimento mais elevados, entreve-se a possibilidade de subsidiar a venda, de fogos a preços especulativos, enterram-se as promessas de bonificação, ilude-se a expectativa das populações mais carenciadas e especialmente dos jovens casais.
Muito mais poderia dizer do Ministério da Habitação e Obras Públicas, cuja sigla MHOP passa a significar Ministério da Hipocrisia e Obras Prometidas.
Optamos, no entanto, por razões de tempo e pelo facto de o Executivo não ter uma política de habitação, por uma radiografia breve de um Governo que se pretende muito breve.

Aplausos do PCP e do M DP/C DE

O Sr. Presidente: - Igualmente para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Malaquias.

O Sr. Manuel Malaquias (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Pretendo nesta minha exposição pôr de maneira clara e inequívoca, sem chavões nem demagogia, e dizer dos pontos que considero mais importantes na apresentação destas duas propostas em matéria de segurança social.
Este Governo deixou para irás as palavras vãs, ucas e sem sentido e aplicou na prática aquilo que foi prometido pela AD durante a sua campanha eleitoral.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Aos que dizem que o Governo não cumpre as promessas nós respondemos que aqui está, ali esteve e além estarão os diplomas que vão aproximando os Portugueses, vai-se consolidando e generalizando o acesso da população mais carecida aos esquemas de protecção, que vai, numa palavra, proceder-se a uma redistribuição mais equitativa dos rendimentos para códigos Portugueses.
E quem não o reconhece e por mero sectarismo, ou por que sistematicamente prática a política de terra queimada.
É tempo de se terminar com isso, e os Portugueses lá fora, na rua, nos campos e nas fábricas, esperam não palavras, mas actos que lhes demonstrem que lhes dêem o que necessitam e o que justamente lhes pertence.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Este Governo encontra-se a cumprir e estão aqui consignados no Plano e no Orçamento as promessas.
Aliás disse aqui o Ministro dos Assuntas Sociais, como já o tinha feito aquando da discussão do Programa do Governo, que é necessário dar prioridade à melhoria da gestão financeira do sector.
É difícil seja a quem for, e daqui se lança o desafio a quem o quiser receber, fazer omeletas sem ovos, ou seja, pôr de pé um sistema digno de segurança social sem uma gestão financeira organizada e justa.
Mas, se isso não bastasse, preocupou-se o Governo em tomar medidas de âmbito social que só têm por objectivo o desenvolvimento social das populações e compensá-las através das medidas económicas que às mesmas são impostas. A isto chama-se caminhar para um sistema de desenvolvimento integrado, que nós apoiamos.
Mas vejamos medida por medida.
O abono de família agora aumentado não o era desde 1974, sendo o seu aumento de 25%. Chama-se agora que esse aumento deveria ser maior, e porquê só agora? Não herdou este Governo o quantitativo de 240S? Ao longo de seis anos o valor do abono de família vinha descendo, se atendermos ao valor do salário mínimo ou do aumento do custo de vida, e nunca foi o mesmo aumentado.
Aí dizemos que esses governos não eram da Aliança Democrática, mas sim da oposição, e somente este Governo teve a vontade política de o aumentar

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Amadeu Cruz (PS): - É mentira!

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - É verdade!

O Orador: - Mas se isso não chegasse, fez o aumento de maneira progressiva e escalonada, indo de encontro aos esquemas em vigor em países europeus, encontrando-nos assim mais afins com eles para uma plena integração europeia. Por outro lado, foi generalizado a quem dele necessitava, não foi Governo proteccionismo aos que economicamente não precisavam, mas sim aos que dele carecem. Aqui se vê a justiça, aqui se vê a vontade política e o cumprimento das promessas.
Falemos agora das pensões de reforma, e aqui mais uma vez o Governo teve que nivelar o que estava desnivelado, teve de corrigir o que estava errado, .pois que as pensões situadas entre as chamadas «mínimas» e as que se situam entre esses valores e os aumentados em Dezembro sofreram aumentos pouco significativos. Para além disso, não foi visto o problema dos reformados no seu todo, mas sim e somente alguns, Havia reformados que não tinham aumentos há dois anos e só agora foram todos eles contemplados, e se juntarmos os dois diplomas, o actual e o n.º 315-M/79, verifica-se que todos os reformados foram aumentados.
Esta é a verdade, estes são os factos. Não houve migalhas, nem «folclore eleitoral», mas sim o cumprimento de um programa eleitoral e do Governo, dado a conhecer aos Portugueses e de que resultou a maioria desta Assembleia,

Vozes do PSD:- Muito bem!

O Orador: - Há que realçar ainda as medidas tomadas pela aprovação do diploma que concede o esquema mínimo de segurança social e que revoga e anterior. Na sua essência ele é mais justo, como, aliás, já o expressei anteriormente quando do abono de família.
Não ficam esquecidos os deficientes e só especificarmos que o Governo -e daqui vai uma chamada* de atenção- prossiga na sua acção de modo que eles sejam verdadeiramente integrados na sociedade a que têm direito.
Satisfaz-nos que o Governe- tenha a vontade política de progressivamente aproximar os regimes especiais do regime geral.

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Isto nunca foi até agora feito, será altura de o fazer e este Governo quer fazê-lo.

O Sr. Manoel Moreira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Concluindo, Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este Governo, como aliás já foi dito, não se preocupa com as palavras, mas, sim, com os actos, e esses são evidentes.
À oposição cabe a crítica fácil, simples e mesquinha com a inveja de não ter feito o que este Governo até agora já realizou e pensa realizar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Risos do PS.

O Orador: - A oposição cabe o apresentar propostas que não quis pôr em prática quando Governo e não soube fazê-lo agora.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - À oposição cabe agora ver os erros cometidos e sobre eles reflectir.

À maioria cabe exigir do Governo a execução do que se propõe, exigir do Governo uma melhor política social.
O Governo cumpre e executa o que prometeu, pois que continue, porque o povo português confiou e confia nele.
Poucas palavras, muitas realizações, melhor justiça social, são os lemas da mudança, e o que é um facto é que efectivamente houve mudança.

Aplausos do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputadas reformadores.

O Sr. Amadeu Cruz (PS): - Mudança para pior!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa está novamente sem inscrições. O PPM ainda não interveio hoje, o CDS só fez uma intervenção, a UDP também ainda não interveio mas não se encontra presente o o Governo também já fez uma intervenção. E o PS, o PSD e o PCP foram os partidos que fizeram mais intervenções.

O Sr. Alexandre Reigoto (CDS): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - É para intervir, Sr. Deputado?

O Sr. Alexandre Reigoto (CDS): - Não, Sr. Presidente. Nós, de facto, devíamos intervir ainda esta manhã a estão a acabar de dactilografar a intervenção, pelo que pediríamos: a qualquer partido que, porventura, tenha intervenções paro fazer, o faça agora, aipos o que o CDS faria a sua, uma vez que, pelo motivo já apresentado, não a podemos produzir de imediato.

O Sr. Presidente: - Os Srs. Deputados dos outros partidos ouviram o apelo do Sr. Deputado Alexandre Reigoto. Portanto, se desejarem corresponder, a Mesa aceita inscrições.

Pausa.

Srs. Deputados, se não há inscrições, vejo-me forçado a suspender a sessão, o que, na verdade, só resulta em prejuízo dos trabalhos...

Pausa.

A Mesa continua à espera por mais uns momentos. Faltam ainda vinte minutos, que poderíamos aproveitar. E se não houver mais intervenções, então, passaremos imediatamente à votação ...

Risos.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Dá-me licença. Sr Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, o Partido Socialista já fez três intervenções, mos, para cooperarmos no andamento dos trabalhos, o Deputado Jaime Gama vai 'fazer uma intervenção.

O Sr. Presidente: - Obrigado, Sr. Deputado, pela sua compreensão.
Então, tem a palavra o Sr. Deputado Jaime Gama,

O Sr. Jaime Gama (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao apresentar o Programa do Governo na Assembleia da República em Janeiro passado, o Primeiro-Ministro garantiu que seriam ajustados os apoios financeiros indispensáveis ao desenvolvimento regional dos Açores e da Madeira. No passado fim-de-semana, o Dr. Sá Carneiro voltou a referir-se em idênticos termos ao apoio que, o Governo Central continuaria a conceder ao desenvolvimento das regiões autónomas.
Em anos anteriores, sempre Os Governos Regional dos Açores e da Madeixa reclamaram a cobertura dos respectivos deficits orçamentais, constituindo tal reclamação ponto importante da argumentação do PSD enquanto partido da oposição ao nível nacional
Entre as reclamações na oposição, as promessas feitas enquanto Poder nestes quatro meses e a realidade da política efectiva a diferença é, porém, bastante grande.
O Governo AD recusa-se, na sua proposta orçamental, a efectuar a cobertura integral dos deficits regionais, aprovados pelos órgãos de Governo próprio dos Açores e da Madeira. Facto inédito na história dos Governos Constitucionais; esta atitude da AD é tanto mais irracional e discriminatória quanto Q PSD integra 05 Executivos regionais e é o principal suporta do Governo da República.
A perspectiva da centralização financeira com que a proposta orçamental do Governo encara os orçamentos regionais, asfixiando as possibilidades do investimento público regional e impedindo a execução dos planos aprovados pelas Assembleias Regionais, insere-se numa óptica de autoritarismo cujo agravamento se ateve, igualmente, da escolha do candidato presidencial por parte dos sectores mais conservadores da Aliança Democrática e que, por isso, não pode deixar tranquila a opinião pública das regiões autónomas.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Muito bem!

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O Orador: - A solução encontrada no Orçamento de 1979 -a proporcionalidade dos deficits regionais em relação ao deficit do OGE, tendo como base a proporcionalidade das respectivas populações - é certamente conjuntural, como reconheceu o Ministro das Finanças na sua intervenção. Mas o critério da igualdade da capitação das despesas públicas só fará sentido se for aplicado ao Orçamento Regional propriamente dito e não incluir neste, artificiosamente, despesas com serviços que pertencem à administração estadual. O raciocínio inerente ao corte financeiro aplicado às regiões autónomas, se alargado às autarquias, levaria à completa asfixia do Poder Local, pela redução das suas receitas, a níveis mínimos.
Não se compreende que as regiões autónomas sejam a única parcela do Pais a ter que suportar o rigorismo do deve e do haver em matéria de finanças quando a situação de atraso em que se encontram justificaria plenamente uma capitação de despesas públicas nos seus orçamentos superior à média nacional.
A AD fala em descentralização na retórica da sua propaganda política, mas quando se trata de a pôr em prática revela-se centralizadora, incapaz de corrigir as assimetrias regionais e. profundamente desigualitária na afectação dos recursos financeiros às necessidades do desenvolvimento real das zonas mais atrasadas do território nacional.
O Programa do Governo da AD referia a necessidade de ((aperfeiçoar as ligações que interessam aos Açores e à Madeira». O Primeiro-Ministro aludiu em Janeiro à definição de «uma nova política de transportes e infra-estruturas» para os arquipélagos atlânticos, pretendendo minimizar, através de promessas - como a que fez para o novo aeroporto da Madeira -, o carácter reduzido e lacónico das propostas contidas no Programa governamental. Porém, verifica-se agora que a proposta ide lei sobre as Grandes Opções do Plano é omissa em termos de investimentos públicos no sector dos transportes, das comunicações e da meteorologia com incidência nos arquipélagos dos Açores e da Madeira.

O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Não é verdade!

O Orador: - Com efeito, nada significa aludir ao problema nos termos ultragenéricos em que o faz a proposta governamental sem quantificar o montante dos investimentos nem apresentar um calendário concreto para a execução dos mesmos.
Da mesma forma que não pode ser deixado em silêncio o facto de as Grandes Opções do Plano omitirem deliberadamente uma política pecuária, de pescas e de integração na CEE que tenha em conta a especificidade das regiões autónomas. A leviandade com que tais pontos são omitidos na proposta governamental significa que, uma vez mais, a dinâmica centralizadora se sobrepõe a uma efectiva concretização das aspirações regionais. O Governo AD não descentraliza, unifica; não desconcentra, reabsorve. o Governo AD é antiautonomista nos actos, fruto do seu cariz conservador.

Vozes do PS: - Muito bem!

Vozes do PSD: - Ô falso!

O Orador: - Tendo anunciado em Janeiro que se iam promover «os projectos e estudos destinados a assegurar as ligações intercontinentais da Madeira», omitindo o caso dos Açores, mesmo assim, nas Grandes Opções do Plano agora apresentadas o arquipélago madeirense é totalmente silenciado. De nada vale o serviço prestado com Alberto João Jardim no lançamento presidencial do chefe da associação dos comandos nem a capitulação do Governo Regional da Madeira em matéria orçamental, abdicando pronta ei servilmente de um deficit, megalómano de 8 milhões de contos, demagogicamente fabricado a contar com outro cenário eleitoral em 2 de Dezembro último.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por razões de coerência, e em perfeita harmonia com o rigor financeiro, o PS apresentará nesta Assembleia propostas de alteração ao OGE que assegurem a plena cobertura do deficit orçamental dos Açores e a concessão de l milhão de contos para subsídios a título de fundo perdido destinados à reconstrução das ilhas Terceira, S. Jorge e Graciosa.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Com efeito, torna-se perfeitamente indigno em termos de soberania que o Estado Português tenha afectado até ao momento às ilhas atingidas pelo sismo de l de Janeiro último um montante manifestamente inferior à ajuda particular e ao próprio auxílio de um Estado estrangeiro. A reconstrução das ilhas Terceira, S. Jorge e Graciosa é uma questão nacional e não regional que vincula o próprio Governo Central, pelo menos nos mesmos termos em que ele se sente envolvido quando anualmente decorrem as cheias do Tejo.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Muito bem!

O Orador: - Esperamos que esta Assembleia aprove as nossas propostas, dada a justiça que as anima. E fazemos votos para que o próprio Governo abdique da sua arrogância financeira e se decida de uma vez por todas a compreender com largueza de vistas a problemática da regionalização e, muito em particular, a da consolidação das autonomias regionais dos Açores e da Madeira, nomeadamente no plano financeiro.
Não correspondendo às suas promessas, a AD e o seu Governo aparecem hoje aos olhos do povo dos Açores e da Madeira como os herdeiros de toda a tradição centralizadora da direita nacional.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - É falso!

O Orador: - Com efeito, nunca o pulsar das aspirações locais e regionais foi sentido e protagonizado pelo Poder conservador em Lisboa. Só uma política democrática e redefinidora dos poderes do Estado é capaz de garantir .as legítimas reivindicações insulares e de harmonizar em termos de equidade os interesses regionais com a solidariedade nacional. Só um Governo diferente corresponderá aos interesses de duas regiões autónomas que não tem culpa, porque, de certa maneira, elas também não votaram AD.

Aplausos do PS, do MDP/CDE e de alguns Deputados do PCP.

Risos do PSD.

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2 DE MAIO DE 1980 1859

O Sr. Presidente: -Suponho que para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Vasco Paiva.

O Sr. João Vasco Paiva (PSD):- Sr. Presidente, Srs. Deputados: É para um breve protesto, porque o Sr. Deputado e meu amigo Dr. Jaime Gama, na sua intervenção, deixou a ideia de que o diálogo entre o Governo do continente e os Governos regionais não se verificaria, o que não é certo porque, em boa verdade, não corresponde ao que tem sucedido. Aliás, o diálogo agora, muito pelo contrário, é bem mais cristalino e eficiente do que foi outrora, nomeadamente aquando da passagem do Partido Socialista pelo Governo.

Aplausos do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores.

O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - Não apoiado!

O Orador: - E para terminar queria fazer um ligeiro apontamento relativo à expressão utilizada de «arrogância financeira do Governo», que não posso acoitar porque, por exemplo, como se pode verificar em relação às regiões autónomas, o Governo, quanto aos transportes, as contemplou com a manutenção das tarifas existentes em benefício das populações daquelas regiões.

Aplausos do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Alcino Barreto.

O Sr. Alcino Barreto (PSD): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: Pedi a palavra também para formular um ligeiro protesto.
Em primeiro lugar, queria protestar pelas palavras um tanto ou quanto malévolas do Sr. Deputado Jaime Gama, que, no fundo, pretende lançar aliás contra o continente, quando penso que os Deputados, pelo menos os que integram a bancada do Partido Social-Democrata, têm procurado manter um clima de estabilidade e de cordialidade nas relações políticas entre a minha região e o continente, a que também pertencemos.
Disse o Sr. Deputado Jaime Gama que nos Governos anteriores se reclamou a cobertura do deficit. mas a verdade é que, se foi feita a reclamação, o deficit do Orçamento Regional nunca foi totalmente coberto pelo Governo da República.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, o Governo Regional tanto quanto me é dado saber, não propôs ao Governo da República a cobertura integral do deficit. Ele tem enunciados no seu próprio Orçamento os meios e «cursos financeiros a que terá de lançar mão além da parcela que for coberta eventualmente pelo Orçamento Regional. E é-me dado também saber que neste momento as negociações entre o Governo Regional e o Governo da República estão mais ou menos concluídas e chegaram a bom termo, de maneira que se pode pensar que houve um entendimento capaz e cabal quanto a este aspecto.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Não entendi o que o Sr. Deputado Jaime Gama queria extrair do critério de igualdade de capitação das despesas aplicado à minha região, porque parece que, além desse factor, foram também considerados outros índices para se encontrar u montante que o Orçamento Geral do Estado havia de cobrir em relação ao deficit da região autónoma.
Quanto às afirmações feitas sobre a demagogia ou megalomania do Orçamento Regional da Madeira, creio que essas considerações devem ser feitas no local próprio, sobretudo para quem defende, como o Sr. Deputado Jaime Gama. as estruturas autonómicas das regiões.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): -Muito bem!

O Orador: - Na Madeira temos Governo e uma Assembleia Regional onde esses problemas são amplamente debatidos e amplamente discutidos e votados

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Parece-me que não se deve trazer para um local completamente diferente dissenções ideológicas, procurando-as capitalizar e politizar num campo que nada tem a ver com a discussão do Orçamento Geral do Estado

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Finalmente, queria dizer que a solução do aeroporto e de outras infra-estruturas necessárias ao desenvolvimento da minha terra têm sido discutidas e negociadas nos locais próprios, nomeadamente com o Governo. E que também neste momento não se podia pedir nem exigir que o Orçamento Geral do Estado, sobretudo pela insipiência das soluções que estão sendo apontadas, já viesse trazer soluções completas e definitivas, nomeadamente no que diz respeito ao aeroporto internacional que há muito tempo a Madeira vem reclamando e que, estamos certos, vamos conseguir.

Aplausos do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores.

O Sr. Jaime Gama (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputado.

O Sr. Jaime Gama (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Muito rapidamente, queria dizer que a situação é claríssima em relação ao Orçamento Regional da Madeira. O Governo Regional da Madeira apresentava um deficit de 8 milhões de contos e aceitaram a cobertura desse deficit apenas em 3 milhões de contos. Ou a primeira proposta era megalómana, ou capitularam - penso não haver terceira saída para esta questão.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Quanto à intervenção do Sr. Deputado João Vasco Paiva, compreendo a situação em

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que ele se encontra e a intervenção que, em certa medida, é condicionado a fazer, fruto da posição política em que se encontra no seu partido. Mas, manifestamente, prefiro, porque acho bastante mais saudáveis, as declarações que os Srs. Deputados do PSD pelos Açores, designadamente o Sr. Deputado João Vasco Paiva, fazem aos órgãos de comunicação locais quando estão nos Açores e que são manifestamente diferentes.
Compreendo a posição em que se encontram, a dificuldade que sentem, e penso que, no fundo, eles também estão de acordo com o conteúdo essencial cias duas propostas que o PS vai apresentar para a cobertura integral do deficit e para a concessão de um subsídio de l milhão de contos, destinado à reconstrução das ilhas Terceira, S. Jorge e Graciosa.

Aplausos do PS e de alguns Deputados do PCP.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Boa!

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Dá-me licença, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faz favor, Sr. Deputado.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É para lamentar que, uma vez mais, o Sr. Deputado Jaime Gama reincida na tentativa de criar problemas mo seio de outros grupos parlamentares.

Risos do PS.

É uma tentativa que deve ser denunciada porque não está de acordo com os interesses do povo português. E aproveito para lhe dizer, Sr. Deputado Jaime Gama, que, contrariamente àquilo que pensa, aceitamos como perfeitamente natural que hajam posições de divergência de interesses entre as regiões autónomas e o continente, tal como aceitamos como perfeitamente natural que haja diálogo e conversações e que as partes mudem de posições.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Isso só demonstra que têm capacidade de diálogo e que são capazes de superar uma visão que é parcial, na medida em que há interesses próprios específicos em conflito, para se integrarem numa visão nacional.
O Sr. Deputado Jaime Gama é capaz de não compreender isto e eu só tenho de o lamentar.

Aplausos do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, há um pedido de autorização para que o Sr. Deputado Dinis Miranda preste declarações na delegação da Procuradoria da República Ida comarca de Évora. O Sr. Deputado em questão já foi ouvido e está de acordo, a Comissão de Regimento e Mandatos também está de acordo e pergunto ao Plenário se há alguma objecção.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP):- Sr. Presidente, suponho que este meu pedido de palavra, na medida em que diz respeito ao que o Sr. Presidente acaba de referir, não conta para o tempo que o meu partido dispõe para a discussão do OGE e do Plano ...

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado. Tenha a bondade de dizer.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Eu não sei se o Sr. Deputado em questão já foi ouvido ou não ...

O Sr. Presidente: - Eu acabei de dizer que já tinha sido ouvido, Sr. Deputado.

O Orador: - E também não conheço o relatório ida Comissão de Regimento e Mandatos que autorizou este Deputado a depor, ainda mais que vai ser ouvido como acusado. E a norma que se tem seguido até ao momento é que exista sempre uni parecer da Comissão que é votado em Plenário, como aliás é exigido pelo nosso Regimento e pela Constituição, e nada disso foi feito.
Se há parecer, penso que deve ser dado conhecimento dele à Câmara, e se não há sugiro que se transfira esta questão para a próxima sessão.

O Sr. Presidente: - O parecer encontra-se realmente na Mesa e é do seguinte teor:
Comunico a V. Ex.ª que a Comissão de Regimento e Mandatos, reunida hoje, deliberou por unanimidade emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Dinis Fernandes Miranda a prestar declarações na delegação da Procuradoria da República na comarca de Évora, de acordo com o solicitado através do ofício n.º 324, de 22 de Abril, daquela delegação.
Portanto, isto é para prestar declarações no dia 2 de Maio, pelo que não pode ficar para a próxima sessão. Ou se autoriza ou não se autoriza.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, em todo o caso- suponho que esta questão não estava agendada na ordem de trabalhos para hoje. Trata-se de .uma questão que oferece discussão e tem de ser votada, o que não se pode fazer hoje porque, como já disse, não estava na ordem de trabalhos. É sugeria que fosse agendada numa futura ordem de trabalhos para ser discutida e votada.

O Sr. Presidente: - É claro que estas questões costumam ser introduzidas em qualquer momento da sessão e não precisam de ser agendadas, mas, uma vez que há objecções, é óbvio que fica para ser decidido oportunamente.
Srs. Deputados, a sessão está suspensa até às 15 horas.

Eram 13 horas.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a reunião.

Eram 15 horas e 30 minutos.

Vamos retomar os nossos trabalhos. Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Azevedo e Vasconcelos.

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2 DE MAIO DE 1980 1861

O Sr. Azevedo e Vasconcelos (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Designado pelo meu grupo parlamentar para intervir neste debate, na área da segurança social, começarei por uma referência aos quatro acordos que, no passado domingo, se celebraram em Viseu, nos quais foram outorgantes o Ministro dos Assuntos Sociais, por um lado, e os provedores das Misericórdias de Viseu, Mangualde, Celorico de Basto e Proença-a-Nova, por outro.
Assim procedo, dado que sou Deputado eleito pelo circulo de Viseu, mas mais ainda pelo transcendente significado de que tal acto se revestiu. Sobretudo com a transferencia a título gratuito, melhor diria, com a usurpação dos imóveis de sua pertença, em que estuo instalados os hospitais integrados na ride nacional, iniciou-se um feroz ataque às Misericórdias, que quase culminava com a sua pura e simples extinção.
Ao longo de cerca de um lustro, as Misericórdias portuguesas passaram por gravosas vicissitudes, com reflexos bem negativos no desenvolvimento de uma acção social relevantíssima, em tantos casos mantida através da aceitação consciente de medidas estatais cerceadoras de unia autonomia que se impõe preservar.
As Misericórdias: merecem inteiramente a reparação que agora se augura próxima, na medida em que se não vislumbram obstáculos sérios à rápida celebração da totalidade dos acordos que lhes assegurem o pagamento pelo Estado de justas rendas e indemnizações relacionadas com a utilização de edifícios e aquisição do respectivo equipamento hospitalar.
No último domingo, em Viseu, o Estado e as Misericórdias comprometeram-se a uma colaboração extremamente útil ao País, pois que no vastíssimo campo da acção social e designadamente nos domínio da infância e terceira idade, há espaço para a actuação de ambas as partes, e mesmo vantagem para as instituições privadas de solidariedade social.

O Sr. Macedo Pereira (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Desta tribuna saúdo jubilosamente a efeméride..

Sr. Presidente, Srs. Deputados,: O objectivo de melhoria da gestão financeira da segurança social, explicitado nas proposta de. lei em debate e desenvolvido no discurso da sua apresentação, feito pelo Sr. Ministro dos. Assuntos Sociais, suscita incondicional apoio do Grupo Parlamentar do CDS.
Não podia, com efeito, continuar a protelar-se a adopção de providências realistas que alterem substancialmente o panorama das dívidas em mora.
Não se ignoram, bem pelo contrário, as imensas dificuldades que a crise económica levantou aos empresários para solverem as suas obrigações perante a Previdência. Mas igualmente se não desconhecem as atitudes de cedência dos responsáveis, entre as quais avultam as que tem a ver com os acordos de pagamento em .prestações, não cumpridos em grande percentagem, e muitos deles, seguramente, logo à partida insusceptíveis de o serem.
O anunciado decreto-lei sobre esta matéria, cuja publicação é realmente urgente, contempla medidas muito esperançosas, designadamente no que se prende com os contratos de viabilização e estímulos para imediato pagamento.

Intolerável seria que os contribuintes cumpridores., conscientes dos seus deveres, pudessem continuar a suportar a concorrência de outros que, de forma bem diferente, têm encarado as suas obrigações sociais,

O Sr. Macedo Pereira (CDS): -Muito bem!

O Orador: - Entretanto, é animador o facto de nas receitas das contribuições arrecadadas já neste ano se haver ultrapassado a percentagem do aumento prevista no Orçamento até ao termo de 1980. Não é ousada a afirmação de que os agentes económicos confiam na política deste Governo e no empenho posto na redignificação da Previdência.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo é também designado por executivo, certamente porque executa. O Governo Pintasilgo decidiu um aumento das pensões mínimas retrotraído a l de Dezembro, sem dúvida necessário, mas que bem rabia já não iria pôr em execução.
O povo português tem agora os olhos bem abertos, como inequivocamente demonstrou com as escolhas que fez nas eleições realizadas no final do ano passado.

O Sr. Macedo Pereira (CDS): - Apoiado!

O Orador: - Ele precisa de ser claramente informado de que aquele aumento, representando um encargo anual da ordem dos 12 milhões, de contos, foi concretizado por este Governo e sem que o seu antecessor verdadeiramente se tivesse preocupado com o financiamento correspondente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: em nossa opinião, agiu bem o Governo optando por comemorar o 25 de Abril com a tomada de medidas concertas, muitas delas no sector da segurança social os Portugueses querem muito à democracia, à liberdade, que sacrificadamente conquistaram e jamais estarão depostos a voltar a perder. Mas também pretendem, muito legitimamente, ver equacionados e- resolvidos os problemas que condicionam a melhoria das suas condições de vida.
Com a sua opção, possibilitou o Governo que esta Câmara discutisse o Orçamento e o Plano dispondo de elementos importantes para uma decisão mais consciente.

O Sr. Macedo Pereira (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Pela nossa parte, muito nos congratulamos com os novos benefícios sociais. Naturalmente, não vou, neste momento, tecer considerações sobre todos eles. Mas direi que achamos justo e significativo o aumento das pensões de velhice e invalidez, que complementará o montante mínimo há meses fixado, pois que se impunha contrariar a tendência para a igualização dessas pensões.
Direi ainda que achamos justo e significativo o aumento do abono de família, tanto mais que se inicia agora a sua modulação, de grande interesse para as famílias mais numerosas e carecidas.
Direi também que achamos justos e significativos os aumentos dos subsídios de nascimento, casamento, funeral e aleitação, em alguns dos quais há subidas para mais, e até bem mais do dobro.
No seu conjunto, os benefícios que brevemente deverão passar a ser concedidos representam um largo

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passo na caminhada difícil para uma justiça social que sempre há-de constituir meta a perseguir.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Apenas mais umas breves palavras, relacionadas com o esquema mínimo definido em mais um decreto serôdio do Governo Pintasilgo. Exprimimos o nosso pomo de vista concordante com a filosofia que o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais aqui anunciou ter presidido à sua recente revisão em Conselho de Ministros.
Consideramos inteiramente correcta a orientação de, em relação aos não contribuintes da Previdência, restringir os benefícios a quem deles efectivamente careça, assim se preferindo o conceito de universalidade social ao de universalidade demográfica.
Sr. Presidente Srs. Deputados: Não quero terminar esta intervenção sem mais uma breve reflexão suscitada pelo debate em curso.
A criação da Secretaria de Estado da Família é uma inovação ma estrutura do Governo da Aliança Democrática relativamente a qualquer outro que tenha existido neste pais; não é inovação relativamente ao que acontece por esse mundo adem, nem e sobretudo qualquer originalidade quando se consideram os requisitos necessários para que a orgânica governamental possa dar resposta às grandes correntes, dei actividade requeridas pelas necessidades reais da população.
Foi a criação desta Secretaría de Estado, ao principio, acusada como atitude passadista por aquedes que, como se sabe, não encontram para o desenvolvimento da sociedade- motor que não seja a luta de classes que, naturalmente, não tem lugar na família - nem entendem a orgânica social como criada a partir das suas células fundamentais, ma» das superestruturas do poder.

O Sr. Macedo Pereira (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Agora, continuam os mesmos, os seus adversários, a atacá-la de outra maneira, invejando-a, acusando-a de insuficiências e até, imagine-se, criticando a Secretária de Estado pela sua abertura ao diálogo com as autarquias, com as famílias, com as associações, em Lisboa, fora de Lisboa, sejam apoiantes do Governo, sejam socialistas, sejam comunistas, quem quer que sejam.
A criação da Secretaría de Estado da Família foi pois, está mais uma vez comprovado neste debate, uma inovação corredia, justa, prometedora, A sua acção será incrementada e, não rejeitando contributos de ninguém, não nos parece que seja quem for se encontre em melhor posição- que a Aliança Democrática para, através do seu Governo e do desenvolvimento da acção nesta área, na consideração devida pelas carências de que sofrem as famílias portuguesas, promover as medidas mais adequadas para lhes dar - não as luas que agora lhes pretendam prometer aqui - as respostas, cada vez maus concretas e completos, às suas profundas necessidades com que, até agora, ninguém mais se tinha preocupado.

Aplausos do CDS, do PSD e do PPM.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra, o Sr Deputado Mário Tomé.

O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Orçamento Geral do Estado e as Grandes Opções do Plano apresentadas pelo Governo a esta Assembleia venham concretizar a prometida e estafada mudança anunciada pela AD na campanha eleitoral.
Mudança que implica um maior desemprego, que diminui o poder de compra dos trabalhadores, que retira verbas ao bem-estar do povo para as desviar para as forças armadas, PSP e GNR, que desfalca em 25 milhões de contos as autarquias locais, que baixa os impostos a quem bom ganha e prejudica, a quem (pouco recebe. Mudança amarga que, a concretizar-se, faria da nossa vida um estendal de humilhações e vexames.
Mas o OGE e as Opções, de Plano são apenas peças de uma manobra maus. vasta do Governo Sá Carneiro/Freitas do Amaral. Ao mesmo tempo que prossegue a sua política repressiva visando destruir as conquistas de Abril e a^ liberdades, a AD lança uma bom orquestrada e demagógica campanha na vã tentativa de iludir o povo A AD promete aumentar as reformas, promete aumento dos abonos de família e outras regalias sociais. Mas, e paira além de ser uma suja manobra eleitoral, estes aumentos não correspondem à realidade, porque o custo de vida em muito ultrapassa os prometidos aumentos. É, pois, uma inqualificável burla que este Governo tenta cometer sobre os sectores mais sofridos do nosso povo.
Mas a AD tem medo de ser desmascarada porque sabe que é men/tira aquilo que os seus dirigentes vêm apregoando ao País. Então, piara tentar impedir que o povo seja informado, controla com mão de ferro a comunicação social, principalmente a RDP e a RTP. Assim, o Governo e os seus apoiantes usam estes métodos, comunicação para fazerem autênticos comícios, enquanto a oposição se vê impedida dio direito de resposta; enquanto a UDP e a CGTP se vêem impedidas de usufruir de um direito legai, quando o conselho administrativo da RTP impede a transmissão de programas dedicados aos seus congressos, conforme a lei estipula.
Na RDP, por exemplo, o desrespeito pela lei, pela dignidade da informação e dos jornalistas e o atropelo às normas constitucionais atingem já a paranóia de um regime fascista.
Um administrador da RDP, numa reunião com o director da informação, declarou que, se «eles tinham a fama de controlar a informação, tinham também de ter iodo o proveito...!» E acrescentou: «Por isso é imperioso afastar o jornalista que presta serviço na Assembleia da República, afastar alguns elementos da redacção, bem como dar outra orientação a outros jornais radiofónicos.»
A reportagem da RDP sobre o Congresso do MDM foi censurada previamente com a menção expressa de que nada iria para o r que dissesse mal do Governo!

O Sr. Vital Moreira (PCP):- Pluralismo!!...

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O Orador: -A Rádio Comercial, que três semanas antes da Conferência sobre a Reforma Agrária tinha projectado deslocar aí uma equipa, não foi autorizada.
Ao jornalista da RDP l que aí se deslocou foram dadas as seguintes instruções:

Não podia fazer entrevistas;
Não podia registar nada ao vivo;
Não podia, ainda que em transcrição em crónica, incluir nada que pudesse conter qualquer crítica ao Governo.

O Sr. Vital Moreira (PCP): -Pluralismo!

O Orador; - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É este o conceito de liberdade do Governo da AD. É este o respeito que lhe merecem os profissionais da informação. Ou se submetem como lacaios ou perdem o trabalho e o pão.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Não apoiado!

O Orador: - A Administração na RDP não reconhece o Conselho de Redacção, pondo-se claramente fora da lei, melhor, de todas as leis: está contra o Código Deontológico e Estatuto dos Jornalistas, aprovado por esta Assembleia, está contra o contrato colectivo de trabalho, assinado pela própria administração, está contra a Lei de Imprensa, etc.
A Censura está instaurada e, por último, o Director da informação da RDP proíbe qualquer referência nos noticiários à suspensão de quatro trabalhadores por serem do Conselho de Redacção, mesmo que com base em fontes noticiosas externas.
Também no Diário Popular, os trabalhadores resistem à segunda investida para a nomeação de elementos da direcção do jornal que reforcem a censura existente e ponham o Diário Popular ao serviço da AD.
Os Conselhos de Redacção são órgãos democráticos dos trabalhadores e tem todo o direito de se pronunciarem sobre as questões que lhes dizem respeito.
Daqui saudamos todos os jornalistas dignos, apelamos para a sua consciência cívica e para a sua coragem que tão bem têm demonstrado para com a sua lura, derrotarem as manobras reaccionárias deste Governo e dos seus lacaios. Um Governo como este não é já só um Governo de direita, é um Governo que tem um comportamento e uma prática fascistas.
A nível da política externa, o comportamento do Governo é ridículo, servil e atenta contra os interesses nacionais.

Vozes do PSD: - É falso!

O Orador: - Basta um gesto de Cárter para que Sá Carneiro/Freitas do Amaral cumpram de forma servil e prazenteira aquilo que o imperialismo trama contra os interesses dos povos.

Vozes do PSD: - É falso!

O Orador - Cárter decide tentar vergar pela força o povo do Irão na sua justa luta contra o imperialismo, e eis que o Dr. Sá Carneiro se agiganta nos seus lições e por essa Europa fora grita, orgulhosamente aos quatro ventos que as ordens de Cárter não são para discutir, mas sim para aplicar, contrariando até uma certa prudência dos seus parceiros europeus.
Como estão em jogo os interesses das grandes multinacionais e da NATO, vá de sacrificar os interesses dos povos, neste caso do povo português, do povo iraniano e do próprio povo americano.
Reflexo fiel da política da AD é o que se passa no campo da justiça onde o critério novembrista de repressão para os antifascistas e de libertação .paira os pides, e- bombistas e seguido à risca. Senão veja-se a escandalosa condenação a penas pesadas, aplicadas a Isabel do Carmo, Carlos Antunes e outros antifascistas e a revoltante libertação dos pides Carvalho e Tienza, assassinos do general Humberto Delgado e da sua secretária.
Esta trama contra as liberdades e contra o 25 ás Abril e as suas conquistas ...

O Sr. Ângelo Correia (PSD): - O PCP empresta a a cassette a este rapaz, não?!

O Orador: - ...conhece agora um dado novo: a apresentação do candidato da AD às eleições presidenciais. E aqui a coligação reaccionária perde toda a réstia de pudor, colocando abertamente as cartas na mesa. Soares Carneiro é o homem certo para a AD, porque é um homem que esteve e está contra o 25 de Abril, porque é um antigo governante do regime fascista, porque é um defensor acérrimo do grande capital e dos interesses do imperialismo sobre a nossa pátria.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - O que é que isso tem a ver com o Plano e o Orçamento?!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O ramalhete está assim completo. Só que uma coisa são as tenebrosas maquinações da AD, outra e a realidade que os 'trabalhadores irão impor no futuro que queremos construir. E os trabalhadores, através das suas greves, das manifestações e outras formas de luta, têm demonstrado que não têm medo da AD, das suas demagogias ou das suas ameaças.
O 25 de Abril foi uma impressionante jornada de luta popular anti-AD. As grandes manifestações populares, as comemorações nas autarquias, os convívios dos soldados, oficiai j e sargentos...

O Sr. Ângelo Correia (PSD): - E marinheiros!

O Orador: - ... foram uma demonstração que o 25 de Abril está vivo e demonstraram que comemorar o 25 de Abril hoje é lutar para derrubar o Governo AD.
Também o l.º de Maio será uma importante demonstração popular de luta e repúdio por este Governo e por esta política.

O Sr. Ângelo Correia (PSD): - Você devia fazer intervenções com esporas!

O Orador: - A UDP está com os trabalhadores e com as suas lutas, e com os trabalhadores cerrará

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fileiras para defender o 25 de Abril, as suas conquistas e para derrubar este Governo antipopular e antinacional.

O Sr. Ferreira do Amaral (PPM): - Deus nos dê paciência para aturar estas baboseiras!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Cardoso.

O Sr. José Cardoso (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Deputados: Mais uma vez a oposição não se assumiu como tal.
No debate do OGE e das Grandes Opções do Plano mostrou que não tinha qualquer tipo de alternativa a apresentar.

Vozes do PSD e do PPM: - Muito bem!

Vozes do PS e do PCP: - Não apoiado!

O Orador:- Em matéria de agricultura e pescas, a oposição já fez até ao momento cinco intervenções e em nenhuma delas, apresentou algo de útil ou construtivo. Faz demagogia, gasta tempo e dinheiro ao Pais, fala em saneamentos, apenas em defesa dos seu compadrios, sem se importar com os erros acumulados de alguns técnicos. A título de exemplo cito o caso da importação das sementes da Noruega pela EPAC, ilustração" da incompetência a todos os níveis. Sabe-se que os cereais, num clima frio com chuvas de Verão, como o da Noruega, são seleccionados para exigências de frio muito maiores, para um ciclo vegetativo muito mais comprido e dias longos, ignorar estes acontecimentos elementares, como fez o Sr. Ministro Saias, significa revelar-se na ignorância ou tentar encobrir os correlegionários.

Vozes da PSD: - Muito bem!

O Orador: - Permitiu-se com a política agrícola do PC e do PS a destruição indiscriminada da classe dos empresários agrícolas e alguns havia de valor verdadeiramente excepcional, mas nem estes foram poupados; alguns dos melhores feitores agrícolas seriam seus substitutos naturais, mas foram em regra afastados por terem exercido a chefia. A classe dos pequenos agricultores poderia ter fornecido alguns chefes de empresa, mas o PC preferiu a selecção política e colocou à frente, das suas explorações os comunistas mais ferverosos, que, como se sabe, se recrutaram em regra entre os frustrados, que falharam na competição, mais por falta de vontade do trabalhar do que por outra coisa qualquer.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Não diga asneiras!

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Nem de galinhas percebe!..

O Orador: - Uma verdadeira selecção negativa.

Protestos do PCP.

A via de substituição natural seria por técnicos, dada a dimensão das. explorações. Por simples que pareça a profissão, um agricultor que mal saiba ler não está normalmente em condições de planear e dirigir as enormes explorações colectivas que o PC. para sua desgraça, criou.

O Sr. Vital Moreira (PCP): -Cala-te galináceo!

O Orador: -- O primeiro resultado da incompetência dos novos gestores foi ama queda espectacular das produções. Em 1977 a produção de figo do País foi de 224000 t e a estimativa do INE para 1978 foi de 213000 t. Para se ter consciência do que estas produções representaram, recuemos no tempo, tomando por base as décadas:

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Seu ignorante!

O Orador: - De 1971 a 1976, 622000 t (produção média do continente), em 1971, 799000 t (maior produção), e em 1973. 516000 t (produção mais baixa).
É preciso recuarmos alte 1928 para se atingir os números de 1977/1978.

Protestos do PCP.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - É preciso ter lata!

O Orador: - Vejamos a que se devem estas produções-baixíssimas. Em 1977, a deficiência foi das sementeiras. A área semeada, no conjunto dos três distritos do Alentejo, neste ino foi dei 174000 ha; este número deve-se comparar à média do decénio imediatamente anterior, 1967 a 1976, que foi de 307 000 ha.

Protestos do PCP.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - O fascismo é que era bom!

O Orador: - A maneira como decorreu o tempo na época ter que se fazem estes trabalhos. Novembro e Dezembro, não poderá justificar de maneira alguma a exiguidade das áreas semeadas.
As pequenas áreas de sementeira de trigo não resultaram de uma mudança de orientação que desse preferência a outros cereais de Inverno: caso da aveia e da cevada, pois estes cercais baixaram de 226000 L para 212000 t. Quanto à aveia, baixou, da mesma forma, de 94000 t para 59000 it.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - E a bolota?!

O Orador: - Em todos estes registos estatísticos, que começaram em 1915, só se encontram produções tão baixas, pasme-se, nos anos de 1916 e de 1940!

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

Protestos do PS e do PCP.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Ai, Jesus!

O Orador: -- As produções unitárias nos anos de 1977 e 1978 foram extremamente baixas, respectivamente de 407 kg/ha e 307 kg/ha.

Protestos do PCP.

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Uma voz do PCP: - É preciso ter lata!

O Orador - Acusa-nos a oposição de repor os latifúndios. Mas a verdade é que o PS e o PCP apenas lhes mudaram a posse, estando agora o Governo da Aliança Democrática a reparti-los, de acordo com os agregados familiares...

Vozes do PSD e do PPM: - Muito bem!

O Orador:- ..., com ar sua capacidade de rendimento, aplicando, finalmente este Governo integralmente a Lei das Bases Gerais da Reforma Agrária.

Aplausos Jo PSD, do CDS e do PPM. Vozes do PS e do PCP: - Ah!

O Orador: - Apenas quatro meses apôs a sua posse, o Governo da Aliança Democrática demonstrou já a sua capacidade. O Governo da Aliança Democrática, cumprindo as promessas que tinha feito ao eleitorado, em apenas dois meses possibilitou a posse plena da terra aos agricultores de Pegões ei a posse útil aos trabalhadores do Alentejo.

Protestos do PS e do PCP.

Receavam alguns meios da oposição que com o Governo da Aliança Democrática jamais haveria estabilidade no Alentejo, quando é precisamente no Governo da Aliança Democrática que. se consegue cumprir (integralmente uma lei, a Lei dias Bases Gerais da Reforma Agrária...

Vozes do PSD e do PPM: - Muito bem!

O Orador: - ..., sem que até ao momento tenha havido qualquer problema grave -ao contrário do que se passou com o Governo Pintasilgo-, sem quedas de. Governos -ao contrário do que aconteceu com o Governo do PS-, sem prisões selvagens...

O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Não é verdade!

O Orador: -... - ao contrário do que aconteceu com o Governo de "Vasco Gonçalves-, sem prendar comunistas - ao Contrário do que aconteceu com Governos fascistas.

Vozes do PSD e do PPM: - Muito bem!

O Orador: - Acusa-nos também a oposição de não entregarmos terras aos agricultores: possivelmente ignora o que aconteceu em Pegões; o que aconteceu na herdade dos Machados; o que vai a seguir acontecer na Comporia, Barrozinho, Palma, Alcafozes e tudo o que mais se verá.

Aplausos do PSD. do CDS f do PPM.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Há limites para a cabulice!

O Orador - Ê contra tudo isto que a oposição protesta, porque o Governo da Aliança Democrática vai cumprindo as promessas eleitorais.
Acusam-nos também a oposição de não termos uma política correcta de preços. E ou não verdade que foi o Governo da AD o primeiro Governo que, após o 25 de Abril, estabeleceu antes das sementeiras da Primavera os preços de garantia das principais, produções?

Vozes do PSD e do PPM: - Muito bem!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Não!

O Orador - Estes preços são pela primeira vez reportados às especificações de qualidade garantidas na CEE, dos quais sé aproximam tanto quanto possível. A correcção dos seus valores relativos é feita no sentido de promover o melhor ordenamento agrário, com o duplo objectivo de aumentar as produções e melhorar substancialmente a economia do produtor. Significa isto a prática de aumentos muito consideráveis de preços à produção, o que se espera venha a ser correspondido pelos agricultores com o aumento da produção, não por aquilo que as bancadas da oposição dizem.

Protestos do PCP.

Para algumas produções, nas quais se verificaram situações eventuais de excesso, determinaram-se mecanismos específicos tendentes a corrigir os artificialismos económicos que têm marcado vincadamente os respectivos circuitos.
Não se aumenta preços indiscriminadamente só para favorecer os padrinhos ou os afilhados.

O Sr. Vítor Louro (PCP): - Quem fala! Veja lá se consegue ter vergonha!

O Orador: - Aumentam-se de acordo com as necessidades do País.

Aplausos do PSD. Estas medidas englobam.

a) Medidas correctoras de carácter sazonal da produção do leite;
b) Medidas incentivadoras do aumento do consumo do leite em natureza;
c) Quanto às culturas de Inverno em curso, foram tornados públicos os preços de garantia a produção.

Protestos do PCP.

Em conclusão, Srs. Deputados: a nova política de preços agrícolas permitirá uma estabilidade futura nos esquemas culturais que dê ao agricultor liberdade de fazer a melhor gestão da sua empresa.
À medida que os preços praticados no mercado nacional se vão aproximando dos níveis de preços europeus, 'terá de claramente se compreender que os aumentos dei custo dos factores que vierem a verificar-se terão de ser principalmente compensados no aumento da produtividade e na melhor adaptação das culturas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador - Os aumentos verificados nos preço dos produtos agrícolas, que alguns chegam a rondar 50%, conjuntamente com o aumento da produção

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prevista para o corrente ano. dirão claramente aos agricultores quem os quer proteger e quem os quer arrastar para outras lutas que não são as suas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Muito se tem especulado nesta Assembleia com o preço e com a importação da batata.
Quanto à batata nova, já aqui foi dito, nesta sessão, que o preço andava entre os 20$ e os 25$. Mais uma falsidade, pois o preço corrente é apenas de 15$ ao público e 10$ à produção.

O Sr. Vítor Louro (PCP): - Você compra batata?!

O Orador: - Também a oposição fala nos preços do bovino e do suíno. Será que o Sr. Deputado António Campos ainda não foi a nenhum talho desde que o Governo da AD tomou posse? Quer o Sr. Deputado acompanhar-me a um atalho aqui em frente à Assembleia para verificar a baixa dos preços?

Uma voz do PS: - Vamos lá!

Vozes do PCP: - Provocador!

O Orador: - Mas a verdade é que o MAP desenvolveu uma política integrada de apoio ao agricultor, que engloba a garantia de existência em quantidade e qualidade de sementes e adubos.

Vejamos:

a) Cultura do milho e sorgo: melhoria das condições de recepção, conservação e armazenagem, descentralizando estas actividades, o que não aconteceu no Governo em que o Sr. António Campos esteve e que se fomentou a produção mas depois não havia capacidade de armazenagem; correcção de acidez dos solos e da sua fertilidade, mediante o lançamento de projectos concretos e melhoria dos serviços de extensão rural.
Quero aqui salientar os projectos de calagem. A maioria dos nossos terrenos são deficientes em calcário. É importantíssimo que se faça a respectiva correcção para que se possa melhorar a produção deste pais.

Vozes do PSD e do PPM: - Muito bera!

O Orador: - No tocante ao arroz, estabeleceu-se uma linha de crédito bonificado específica para a adaptação de novos terrenos para a cultura do arroz, num montante de 10000S por hectare, a os resultados são, pura e simplesmente, existir já cerca de um aumento de 1000 hectares para este ano.
Srs. Deputados, muito mais haveria para dizer...

Vozes do PCP: - Diga, diga!

O Orador. - ... em relação àquilo que nada se fez e àquilo que antecedeu o Governo da Aliança Democrática, mas não quero deixar de referenciar que na área ao perímetro de Odivelas, quo tem uma capacidade para regadio de 3700 ha apenas se tem aproveitado 900 ha, ou seja, cerca de 24 % da sua capacidade. Apesar do aproveitamento dos regadios oferecer dificuldades, as diminutas áreas regadas testemunham notável desinteresse pela utilização dos factores de produção. Mais de estranhar ainda que as explorações sofrem excesso de mão-de-obra. Por tudo isto, quero aqui deixar bem claro que o Governo, cujo Plano e Orçamento vão aqui ser aprovados, ia fez mais que alguns Governos em dois anos de actividade.

Vozes do PS: - Não apoiado!

O Orador: - Como Deputado da maioria, mas acima de tudo como agricultor...

Uma voz do PCP: - O quê?!

O Orador: - ...não posso deixar de manifestar a certeza de que o Governo governa, que a maioria o apoia e de que os portugueses se sentem satisfeitos com ele.

Aplausos do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Louro.

O Sr. Vítor Louro ('PCP): - Prescindo, Sr. Presidente.

O Sr. Pedro Roseta (PSD). - Então, tanto barulho para nada!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Coimbra.

O Sr. Luís Coimbra (PPM): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O Grupo Parlamentar do PPM vai hoje votar favoravelmente as propostas governamentais sobre o Plano e Orçamento para 1980.

Uma voz do PS: - Já sabíamos!

O Orador: - E fazêmo-lo, não para simplesmente honrarmos e respeitarmos os compromissos que estabelecemos com o PSD e o CDS no seio da Aliança Democrática, mas porque o Plano e o Orçamento apresentados pelo Governo confirmam o início positivo e significativo de uma grande caminhada de inversão nas desordenadas políticas de anteriores Governos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador - Início positivo e significativo porque, em nossa opinião, o Governo começou a arrumar a casa onde mais necessitada ela estava de reparação. Referimo-nos às medidas de saneamento económico e financeiro do Estado, dos sectores empresariais públicos e privados e do cidadão contribuinte; referi-mo-nos aos campos da educação e da segurança social. De facto, e só para citar um exemplo, muito se tem dito e escrito pelas oposições quanto ao apoio às empresas públicas e ao sector estatizado da economia, acusando-se a AD de querei reprivatizar muitas empresas ou conduzidas mesmo à sua

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própria ruína. Mais a verdade é que com as anteriores políticas de inspiração do Partido Socialista e do Partido Comunista, as empresas públicas do sector de indústria e transportes se encontram neste momento descapitalizadas em cerca de 40 milhões de contos. E estão descapitalizadas, não por culpa dos seus trabalhadores, mas por culpa dos Governos anteriores, que arrancaram com políticas de fomento industrial sem contrapartida nas fontes de financiamento. E estão descapitalizadas, não só por este motivo, mas porque os grandes projectos de desenvolvimento do sector, à data em que arrancaram, estavam ultrapassados, correspondiam, a uma visão tecnocrática e passadista do progresso, não tinham em conta a crise energética, correspondiam a interesses sectoriais e corporativos megalómanos, vultosos encargos financeiros incomportáveis perante os nossos ilimitados recursos e a conjuntura económica internacional.

O Sr. Ferreira do Amaral (PPM): - Muito bem!

O Orador: - Os Governos apoiados pelos partidos que estão hoje na oposição lançaram de facto as bases da sociedade nacional do desperdício, dos elevados consumos supérfluos e dos projectos gigantescos. E exigem agora ao Governo que se resolva num ano o caos causado em quatro.
A não revisão do projecto da refinaria de Sines, o lançamento dos complexos petroquímicos, entre os quais a fase do de Sines, o disparate do complexo de Estarreja, são exemplos significativos do modelo da sociedade que os colectivistas queriam implantar em Portugal, e em que se comprometeram mais de uma centena de milhões de contos, sem criação significativa de novos postos de trabalho.

Vozes do PPM e do PSD: - Muito bem!

O Orador - E mais neste sentido não foi feito porque os sectores conscientes da opinião pública portuguesa, em particular o PPM, combateram frontalmente e desde a primeira hora, com todos os meios democráticos ao seu alcance, o projecto nuclear de Ferrei, o da florestação industrial, ou a 2.º fase do complexo petroquímico de Sines.

O Sr. Ferreira do Amaral (PPM): - Muito bem!

O Orador: - O projecto da central nuclear de Ferrei chegou a ser anunciado por um Ministro do Governo socialista como um facto consumado. Caso tivesse há data sido aprovado, corresponderia já hoje. a encargos na ordem dos 150 milhões de contos; o segundo, da concepção da então Secretaria de Estado das Florestas do Governo socialista, em que já hoje teríamos assumido compromissos inevitáveis de desertificação de um terço do nosso território a médio prazo, com a correspondente minimização do papel fundamental e primordial da agricultura e da pastorícia em termos económicos, financeiros e sociais para o futuro do País.

Vozes do PPM: - Muito 'bem!

O Orador: - É de salientar que ai política de capitalização do sector público foi já iniciada pela AD.

como claramente o demonstram as verbas cabimentadas no Ministério das Finanças e do Plano em 19 milhões de contos para aumentos estatutários, 11 milhões de contos de subsídios, mesmo porventura parte das transferências para o Fundo de Abastecimento, que este ano se cifram em 13 milhões de contos, ou até algumas das rubricas consideradas em «Transferências - Sector público» da classificação económica constante do quadro vi.
E que melhor elogio se poderá fazer ao Plano e Orçamento em matéria de educação senão o simples facto de «ião se ter ouvido uma única voz crítica sobre esta matéria vinda das bancadas da oposição?
E que dizer no campo social, quando nos é dado constatar que as despesas com a infância e juventude aumentam 71,3%, ou seja, mais 5,8 milhões de contos, «família e comunidade) mais 67,2 %, «invalidez e reabilitação» mais 33,2 %, apoio à terceira idade mais 56,1%, aumento este de 14,3 milhões de contos.

O Sr. Ferreira do Amaral (PPM): - Muito bem!

O Orador -Que dizer, Sr. Presidente e Srs. Deputados, da posição geral aqui tomada pelas oposições, as perguntas e críticas que aqui foram formuladas ao Governo?
Será que se ouviu, por exemplo, algum Deputado das oposições, propondo uma redução de verbas orçamentadas para um determinado sector como contrapartida para um aumento, por exemplo, no sector de agricultura? Ou maiores despesas com o sector empresarial do Estado, implicando uma redução das verbas, por exemplo, na área da justiça ou das forças armadas?
Não, Sr. Presidente e Srs. Deputados. Os estrategas das oposições limitaram-se a pedir, a pedir, a exigir, a exigir, mais e mais despesas nos sectores que não sofreram aumentos significativos neste Orçamento e neste Plano ou reduções drásticas em relação a Orçamentos anteriores.
Mas caso o Governo viesse a satisfazer todas as pseudopropostas das oposições com o inevitável aumento do deficit, cairia por certo o Carmo e a Trindade e todas as bancadas das oposições se ergueriam como uma mola acusando o Governo de demagogia eleitoral e de conduzir o País à bancarrota.

Vozes do PPM: - Muito bem!

O Orador - Que dizer do Partido Socialista e do Partido Comunista quando uma das mais positivas e interessantes intervenções da oposição foi a do Deputado Luis Catarino, do MDP? Que dizer do Partido Socialista, quando numa das suas intervenções de fundo afirmou que o País precisa de uma política mais expansionista, assente no aumento do consumo privado?
Srs. Membros do Governo: A actividade de VV. Ex.ªs no futuro próximo não vai ser fácil, mesmo tendo em conta que a acção governativa está extremamente facilitada, na medida em que as oposições não só não têm uma alternativa estável e coerente caso pudessem ser governo, como não conseguem cumprir cabalmente o seu papel de oposição útil e criticamente construtiva, como seria de esperar para quem como nós acredita na democracia pluralista.

Vozes do PPM e do PSD: - Muito bem!

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O Orador: - Mas a acção governativa não vai ser fácil, porque as perspectivas internacionais são de facto sombrias no campo económico, energético e político-militar.
No campo económico, porque os países desenvolvidos, seguindo caminhos convencionais, se encontram nos limites máximos de crescimento compatíveis com os recurso* disponíveis e os sistemas de produção actuais e com a dignidade e as aspirações dos países subdesenvolvidos. Porque os países desenvolvidos ainda não conseguiram adaptar às suas estafadas economias de escala as escalas do tempo, as escalas do homem.
No campo energético, porque o aumento dos preços do petróleo nos mercados internacionais não tem contrapartida na própria viabilidade económica de exploração ou descoberta de novas fontes de energia fóssil ou convencional no Globo, já que os custos energéticas na obtenção dessas novas fontes energéticas implica um cada vez menor saldo positivo quando o já não é negativo.
No campo político-militar, porque o expansionismo soviético se mostra cada vez mais arrogante e ameaçador, como é o caso do Afeganistão e outras acções expansionistas se desenvolvem aqui bem perto de nós, como é o caso da luta da Frente Polisário, contra os direitos históricos e legítimos da nação marroquina.
Tempos difíceis de facto nos esperam a todos. E se aceitamos a possibilidade de vir a registar-se um aumento de 6% na taxa de crescimento, tendo em consideração a situação concreta em que nos encontramos no País, há que afirmar que dificilmente essas taxas de crescimento se registarão no futuro, se o aumento do produto não tiver por suporte energias renováveis ou leves, criação d,e indústria de baixo consumo energético, de utilização racional dos nossos recursos naturais, uma forte prioridade aos transportes públicos e de mercadorias por caminho de ferro, uma política de urbanização e de equilíbrio do território e de dispersão geográfica da população portuguesa que acabe com a dicotomia cidade-campo e em que o nível de vida não aumente apenas em detrimento da qualidade de vida, e dos consumos inúteis que conduzem à alegre estupidificarão, standarização e contínua proletarização dos povos, em nome da economia de mercado ou da economia socialista.
Tempos difíceis de facto nos esperam, mas os primeiros passos estão dados. £ foram dados pelo Governo, e sê-lo-ão dados por certo no futuro.
Por estes quatro meses de Governo e durante os próximos quatro anos, vamos recuperar o País, arrancar para o progresso autêntico e concretizar o projecto da Aliança Democrática, o espírito de mudança, a inovação que ele representa, que muitos de nós ajudaram a elaborar e que o povo português escolheu em 2 de Dezembro, e que, com redobrado vigor, aprovará por certo nas eleições de Outubro próximo.

Aplausos do PPM, do PSD. do CDS e do Sr. Deputado reformador Adão e Silva,

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rosa Brandão.

A Sr.ª Rosa Brandão (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O Sr. Ministro da Educação, num Jogo discurso aqui produzido ontem de manhã, concluiu, em resumo, o seguinte:
As verbas inscritas no OGE para o sector da educação são suficientes. Que ninguém as critique por serem escassas*
Esta previsão e esta defesa antecipada (e cerrada) de críticas, obviamente justificadas a um OGE em que as despesas com a educação continuam a representar menos de 12% do total das despesas, públicas, traduz bem a dificuldade insanável com que os responsáveis da AD se deparam: as verbas previstas pelo Governo não chegam para corresponder às necessidades reais do sistema educativo e muito menos para cumprir integralmente as promessas eleitorais da AD. Em termos reais, o OGE da educação mantém a estagnação.
Compreende-se, pois, a posição defensiva do Ministro. E melhor se percebe porque é que. quando o Governo inscreve uma verba ou prevê o financiamento de um programa educacional, logo o facto é saudado com trombetas e o Governo canta do galo. Mesmo que se trate simplesmente de não adiar por mais tempo o início do cumprimento de uma lei -como a do analfabetismo- aprovada por unanimidade nesta Assem blefa, e como se restasse ao Governo outra alternativo ... legal.
É também o caso dos programas em matéria de ensino básico, educação pré-escolar, educação especial, 12.º ano de escolaridade ...
O Governo que assim propagandeia não dá, porém, quaisquer garantias de execução do que promete ... É o destino tradicional das promessas da AD (ou pelo menos de algumas promessas, visto que, quanto ao apoio ao ensino privado, o crescimento de despesas proposto denota a reiterada intenção de privilegiar a escola de alguns em detrimento do ensino público!).
Em matéria de promessas que beneficiem a generalidade da população, a AD tem-nos habituado, sim, ao bluff. Um caso típico: as construções escolares. «Seriam necessários para já (segundo reconhecia há tempos o director-geral do Equipamento Escolar) 200 novos edifícios e um ritmo de construção que conduzisse a mais 400 novas escolas até 1985. Só assim», sublinhava o mesmo membro do Governo, «seria possível atingir um nível mínimo de qualidade de instalações e um funcionamento normal e regular das escolas.» Pois bem. Em despacho recente, o MEC acaba de anunciar o seu plano de emergência: vai construir afinal 11 escolas (onze), todas na zona metropolitana de Lisboa. Estão assegurados os terrenos para essas escolas? Não estão. Há garantias de execução do plano de emergência? Não há. Ou pretende começar a construir para inaugurar lá para Outubro, com fanfarras e foguetes, uma ou duas salas de aula em cada uma das onze unidades projectadas? E que significará em termos, nacionais a concretização desse plano, caso o Governo, de olho nas eleições, vencesse o contra-relógio em que se vai lançar?
A não resolução imediata deste problema vai ainda agravar a situação daqueles que, de há uns anos para cá, têm sido as maiores vítimas de uma política educativa aberrante e obsoleta. Refiro-me, como é óbvio, aos estudantes candidatos à Universidade. Anunciando o fim do Propedêutico fica um 12.º ano

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cujo funcionamento concreto se desconhece, ignorando-se o conteúdo das matérias e as escolas onde vão ser dadas as aulas.
Para estes estudantes o futuro é uma incógnita, frustram-se objectivos profissionais, nega-se-lhes qualquer possibilidade de participação na vida activa, são lançados no desemprego. As consequências são muitas e diversas. O marginalismo, a revolta, a atracção inesperada por formas e .padrões de vida que se afastam das realidades e dos problemas do dia-a-dia são, designadamente, algumas das manifestações concretas de alguns dos estudantes que se encontram nesta situação.
Já por várias vezes os responsáveis pelo MEC foram advertidos deste grave problema. Os próprios estudantes atingidos dirigiram-lhes críticas e acusações concretas, desafiando-os a dar uma resposta definitiva. O MEC nada fez e o seu texto orçamental é um forte indício de que nada fará.
Outro tanto se pode dizer da política de juventude, ocupação dos tempos livres e desenvolvimento desportivo. Na DGD a diminuição de verbas é tão patente que nem os mais entusiásticos defensores do Governo omitem os elogios remetendo-se a uni prudente silêncio.
E os trabalhadores-estudantes? Nada foi dito pelo Sr. Ministro. Será que o MEC vai continuar a ignorar o peso e a importância de 100000 estudantes que simultaneamente trabalham, sentindo por isso mesmo problemas e dificuldades específicas?
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Resta-me dizer que as presentes propostas de lei sobre o OGE e as Grandes Opções do Plano no sector dia educação não ultrapassam a rotina, não investem no futuro.
São propostas que fazem cair por terra todas as declarações de princípio do Governo, AD sobre o desenvolvimento e modernização do sistema educativo português.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimento tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Rodrigues.

O Sr. Adriano Rodrigues (CDS): - Sr.ª Deputada Rosa Brandão, ouvi a crítica formulada pela Sr.ª Deputada quanto às verbas destinadas à educação e queria lembrar-lhe que quem faz uma opção faz uma escolha.
Portanto queria perguntar-lhe se, ao pretender ver aumentadas as verbas destinadas à educação, ia buscar essas verbas à saúde e assistência, às pensões de reformados, às construções de casas ou às destinadas aos militares, que tanto são do agrado do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Rosa Brandão para responder, se assim entender.

A Sr.ª Rosa Brandão (PCP): - Sr. Deputado Adriano Rodrigues, ao acusar o Governo por não ter atribuído a verba suficiente para a educação tenho em conta o problema do ensino, que tem sido de há uns anos para cá esquecido, e digo inclusivamente que a verba atribuída à educação pode dizer-se que está a nível dos países da Europa, na sua cauda. Menos 12% é de facto uma percentagem bastante diminuta relativamente às despesas públicas, mas com isto não pretendo de forma nenhuma dizer que se deve reduzir a verba atribuída à saúde ou a outros sectores- sociais, que, tal como a educação, também cão importantes.
Quem faz o Orçamento Geral do Estado é o Governo; o Governo é que tem de estabelecer prioridades; não sou eu que as estabeleço. A única coisa que estou a fazer é a acusar o Governo de, relativamente a determinadas promessas que a AD fez durante a sua campanha eleitora], se verificar que, através da verba que é atribuída à educação no OGE, essas promessas não são sequer realizáveis.
Assim, parto do princípio que a campanha eleitoral da AD foi de facto um bluff, porque se assim não fosse de certeza que agora o Governo teria o cuidado de, na análise e no projecto de verba destinada à educação, atribuir verbas anais elevadas para este sector, ou até mesmo na própria verba que é atribuída para a educação não lhe tocando, poderia também ter em conta outros sectores. Por exemplo, dar prioridade ao ensino privado quando há enormíssimas carências no sector público, quando inclusivamente, a nível do ensino pré-primário, é necessário dar um maior apoio às creches que são do Estado. A partir daqui .penso que de facto o Governo teve em conta critérios, quanto a mim de carácter elitista, que nada têm a ver com o desenvolvimento do sistema educativo numa perspectiva democrática, critérios esses que, ao fim e ao cabo, estão errados. E isto, independentemente de criticar ou não a verba por ser escassa, já tendo em conta a própria distribuição interna que é estabelecida, embora continue a considerar, como é evidente, que a verba para a educação item sido e continua a ser escassa.

Aplausos do PCP.

O Sr. Adriano Rodrigues (CDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado

O Sr. Adriano Rodrigues (CDS): - Sr. Presidente, queria apenas corrigir algumas afirmações da Sr.ª Deputada Rosa Brandão, quando disse, por exemplo, que falseámos a propaganda eleitoral, porquanto algumas das respostas dadas pelo Orçamento agora em debate, quer em relação às verbas vultosíssimas destinadas à campanha de alfabetização, quer em relação ao Ano Propedêutico, quer em relação ao IASE são as mais vultosas que até hoje se destinaram, dando assim uma resposta às promessas eleitorais.

O Sr. Ferreira do Amaral (PPM): - Muito bem!

O Orador: - Portanto, não é exacto o que a Sr.ª Deputada acaba de afirmar de que falseámos a campanha eleitoral.
Era isto que queria corrigir

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Palavras, palavras!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Agricultura e Pescas.

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O Sr. Ministro da Agricultura e Pescas (Cardoso e Cunha): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Registo que mais uma vez a discussão dos problemas agrícolas não se libertou de um clima emocional. À objectividade e pragmatismo da discussão que se impunha, a Câmara optou por esquemas subjectivos, com vociferações, por vezes insídias, chegando até aos insultos.
Lamento a situação porque entendo que o principal perdedor deste processo será certamente a agricultura e os agricultores.
A agricultura tem em Portugal problemas gravíssimos, cuja solução exigia naturalmente a possibilidade de se encontrarem soluções consensuais. Verificamos que o caminho para esse consenso se vai cada vez mais estreitando e isso é profundamente lamentável.
Não entendam, por favor, estas palavras como crítica à acção dos Deputados. Estou em vossa Casa; os senhores orientarão a discussão da forma que melhor entenderem.
Como vós, sou também Deputado efeito e recuso-me a admitir a ideia de que, para o pragmatismo de uma discussão, haja alguma necessidade de se ser incorrecto.
Foi este Governo e, nomeadamente, o Ministério da Agricultura acusado durante o debate fundamentalmente de duas coisas: a primeira, de se dedicar a manobras eleitoralistas e de captação da simpatia das grandes massas; a segunda, de estar feito com minorias e fazendo o jogo de interesses privados-
Ambas as acusações são incompatíveis uma com a outra. Não seria estranho que elas proviessem de lados diferentes desta Assembleia. Provieram, sim, do mesmo partido, provieram, sim, do mesmo orador.
Entrando em problemas concretos que foram aqui levantados sobre o meu Ministério, gostaria de começar por dizer que também eu teria prazer em poder dispor de maiores verbas no orçamento do Ministério da Agricultura.
Imperativos de contenção geral obrigaram todos os Ministérios a esforços especiais, que resultaram, para o Ministério da Agricultura, numa verba proposta que é de facto inferior à que foi proposta no ano transacto. Lembro, no entanto, e é estranho que isso não tenha sido aqui acentuado, que, em relação à execução real do Orçamento do ano anterior, o Orçamento de 1980 a ultrapassa positivamente em 15%.
Com efeito, em 1979 ficaram por consumir no Ministério da Agricultura 3 600 000 contos, sendo portanto o grau de utilização de cerca de 70%. Nestes termos, os meios financeiros que o Ministério da Agricultura dispõe este ano para as suas funções excedem, em termos monetários, 15% as reais despesas do ano passado.
Quanto às observações sobre as verbas existentes no Gabinete do Ministro, gostaria die tranquilizar a Assembleia no sentido de que elas se não destinam a qualquer acção de caciquismo pessoal, elas estão endereçadas a acções específicas e, dentro da acção de fiscalização desta Câmara, o Ministério terá o maior prazer em, durante a execução do Orçamento, demonstrar a sua utilização nos subsídios a indústrias agro-alimentares que, infelizmente, se situam em condições económicas precárias a jusante de produções agrícolas que não podem fechar, aos programai de extinção dos grémios da lavoura, ao programa nacional de calagem e fertilização e às bonificações do seguro de colheitas, finalmente iniciado em Portugal.
Um dos Srs. Deputados notou também que as verbas de funcionamento corrente da Secretaria de Estado de Estruturação Agrária tinham acusado particular subida. Devo dizer que, em virtude da aprovação da nova lei Orgânica do Instituto de Gestão e Estruturação Fundiária foram nele incorporados vários serviços anteriormente dispersos, o que justifica o aumento das verbas de despesas correntes.
Nas verbas gerais da Secretaria de Estado de Estruturação Agrária, nota-se sim uma diminuição em termos globais de 30% em relação ao ano anterior.
Um dos pontos mais curiosos e mais interessantes e penso que mais importante para discutir neste debate foi a posição que o Partido Socialista apresentou sobre uma forma curiosa de fixação de preços de produtos agrícolas.
Sustentou o Partido Socialista que se deveria seguir o método de indexação de preços desses produtos à inflação corrente no respectivo ano. E com alguns cálculos aritméticos justificou também o motivo por que, segundo eles, o Ministério da Agricultura, não tendo seguido este método, teria defraudado -utilizaram ate outra palavra - os agricultores em verbas muito importantes.
É evidente, parece-me importante acentuar, que os preços de intervenção dos produtos agrícolas não se podem em parte nenhuma do Mundo fixar por este processo. Eles não podem deixar de ter em atenção os custos dos factores de produção, nomeadamente aqueles que por esquemas nacionais o Governo .subsidia e, fundamentalmente, a enorme influência das produções unitárias de cada ano.
A agricultura é atenta a alterações fundamentais de produção e é evidente que essas alterações têm uma incidência brutal sobre o preço de custo das respectivas culturas.
Aquilo que conta para o agricultor não é o valor absoluto dos preços; o que conta para o agricultor é o saldo da sua conta de exploração, a diferença entre as suas receitas e as suas despesas.
Tentei, no entanto, reproduzir as contas apresentadas, comparando os valores fixados este ano polo Ministério da Agricultura para os principais produtos agrícolas, com os valores que decorreriam dos preços do ano anterior, acrescidos do valor da inflação. Fiz essas contas não para um valor de 20%, como o Governo pensa apresentar este ano, mas para o valor dos últimos doze meses, 22,3%. E reparo que, curiosamente, em relação à quase esmagadora maioria dos produtos agrícolas, o preço de intervenção fixado este ano pelo Governo é superior ao preço calculado pela via da indexação.
Não queria maçar a Assembleia com números, aliás o tempo é muito curto, gostaria, no entanto, de acentuar que, dos produtos milho, trigo, centeio, cevada vulgar, aveia, cevada dística, arroz, leite e vinho apenas o leite e o vinho apresentam situações invertidas, ou seja, a indexação atiraria os valores destes produtos para valores francamente superiores aos que o Ministério fixou. E fê-lo conscientemente e permito que em condições de o poder justificar sem dificuldades

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Com efeito, e gostaria de me deter em particular nestes dois produtos, em relação ao preço do leite, existe neste momento o seguinte problema: é de 13S50 o preço pago ao agricultor em Portugal o ano passado e será o preço base para este ano. Não obstante, nos países da Comunidade Económica Europeia, cujo preço dos factores de produção são muito superiores aos nacionais, pratica-se o preço equivalente a l ISSO, ou seja, 2$ mais baixos que o preço praticado em Portugal. Mesmo assim este preço de 11 $50 é responsável pela maior crise que a agricultura do Mercado Comum apresenta; é responsável pelo consumo de 60% do orçamento agrícola da Comunidade e por uma situação de fomento de produção que causa enormes stocks de produtos lácteos de milhões de contos que infelizmente não são vendáveis e que também nos afectam pela via da fixação do preço internacional.
De farto, como foi assinalado por alguns Deputados da oposição, o preço do leite subiu ao público IS e aparentemente esse escudo não foi entregue aos produtores. Digo que foi só aparentemente porque de facto, tendo a consciência da racionalização que se impõe neste sector, o Governo resolveu atribuir esse escudo de uma forma original que foi dividi-la em dois tipos de subsídios: um deles, para premiar o leite cuja produção for desviada paira as alturas de carência - nos finais de Setembro até Abril - e outra, para premiar as cooperativas agrícolas que consigam aumentar as vendas de leite em natureza, relativamente ao ano anterior.
É evidente que subsidiar as cooperativas é subsidiar os agricultores, pois estes são exactamente os donos das cooperativas e tendo em atenção as previsões de resposta a este esquema, podemos admitir que de facto o agricultor vai receber em média, ponderada mais 1$ que o ano passado.
O problema da sazonalidade é gravíssimo para o País; todo o leite excedente que se produz na altura do Verão não tem outra alternativa que não seja ser transformado em leite em pó, com enorme prejuízo. Este ano estimamos em 240000 contos o encargo dessa transformação. Neste encargo de 240000 contos não estão infelizmente ainda incluídos os prejuízos adicionais decorrentes das dificuldades de exportação destes stocks, na medida em que o preço interno do leite em pó é de cerca de 120$ e, infelizmente, não conseguimos exportar stocks para os mercados mundiais, exactamente por causa dos excessos europeus, a mais que 53$. O valor do prejuízo da sazonalidade aproxima-se do meio milhão de contos e justifica, portanto, um programa como este.
No caso do vinho, o critério da indexação dos preços seria ainda mais estranho. Com efeito, depois de duas más colheitas, em 77 e em 78, cada uma com 6 a 7 milhões de hectolitros de vinho, o que provocou a subida de preços que todos conhecem do ano passado e a fixação do preço de intervenção do vinho em 22$, verificou-se e>m 1979 uma produção que podemos considerar de muito boa, superior a 11 milhões de hectolitros.
Seria, penso, profundamente insensato indexar o preço de 22$ da colheita escassa dos anos anteriores, transformando-a, segundo as contas, em cerca de 27$ no ano em que a produção é aproximadamente dupla.
A fixação este ano de 15$ para preço de intervenção do vinho dá ainda ao produtor, que tem de facto o dobro da produção por hectare, uma situação francamente mais favorável.
As aritméticas mostram que se considerássemos a diferença entre o preço indexado de 27$ e o preço que logicamente se pratica este ano de 15$, o diferencial de 12$ multiplicado pela produção deste ano conduziria ao valor absurdo de 13 milhões de contos, parcela mais importante dos 30 milhões de contos referidos pelo Partido Socialista.
O vinho e o leite são problemas muito comuns na agricultura; estão nesta Câmara imensas pessoas com contactos directos com este sector; penso que não interessa adiantar mais para demonstrar a falta de lógica do esquema apresentado.
Quanto aos cereais, gerou-se ontem aqui alguma controvérsia em relação ao subsídio de 2S20 concedido pelo Ministério da Agricultura no ano passado para compensar os agricultores de uma colheita particularmente ruinosa.
Com efeito, em Portugal são comuns com tecnologias acessíveis ao normal dos agricultores, produções da ordem de 1200 kg por hectare quando o ano passado a produção média oscilou por 600 kg por hectare. O ano era profundamente ruinoso para os produtores de trigo e daí a razão do subsídio.
Manter este ano o subsídio, num ano em que, felizmente, se afigura ser de excepcionais condições climatéricas, será quanto a mim não justificado.
Referiu-se também que os novos preços de intervenção que se fixaram em 12S55, se reportariam a condições de qualidade mais exigentes do que as do ano passado. Isso não é verdade; é exactamente o contrário. Este ano as condições do preço base referem-se tal como na Europa, a um peso específico de 75 kg por hectolitro em vez dos tradicionais 79 kg por hectolitro.
Relativamente ao milho, foi apresentado um critério curioso de, tradicionalmente, se fazer seguir o preço do quilo de milho pelo preço do quilo de trigo. Pode ser um processo tradicional, mas é profundamente errado. Há só duas formas de calcular estes valores: a primeira, pela análise do custo de produção, a segunda, pela utilização desse cereal. Seguimos este ano no Ministério da Agricultura a segunda fórmula, ou seja, a relação entre o preço do trigo e o do milho foi feita na base da relação dos seu valores energéticos, portanto, reportados à utilização final.
De qualquer modo, mesmo que se tivesse optado pela outra solução, ou seja, pela análise dos preços de custo, teríamos de considerar que de facto, como ontem aqui foi afirmado, l ha de milho tem custos de produção mais elevados que l ha de trigo, no entanto tem também logicamente, todos sabem disso, uma produção muito maior. Para níveis equivalentes de tecnologia, podemos admitir que a 1500 kg de trigo se poderá contrapor 4000 kg de milho com tecnologia, digamos, médias e em tecnologias um pouco forçadas, mas ainda ao nosso alcance, podemos passar esses valores para 1800 kg de trigo e 6000 kg de milho. É portanto profundamente ilógico a fixação contínua do preço do milho agarrado constantemente ao preço do trigo.

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Partilho das afirmações aqui feitas acerca do interesse dos cereais secundários e o aumento considerável dos seus preços foi feito exactamente numa óptica de favorecer essas culturas para as aplicar nas terras onde são mais apropriadas. É curioso que no cálculo que fiz só consegui atingir, mesmo segundo o método há pouco indicado, o total de 17 milhões de contos que não se compara com os 30 milhões donde presumo que a aritmética do PS deve ter utilizado ainda outros diferenciais que não os que indiquei aqui.
Falou-se de rações e de forragens. É importante acentuar que partilhamos inteiramente do interesse aqui demonstrado pelo fomento da criação animal com base de forragens naturais. É no entanto menos correcto que o decréscimo do consumo de rações verificado em 1978 de 8%, se tenha ficado a dever a um aumento de consumo de forragens. Ele ficou a dever-se, fundamentalmente, a uma crise na actividade de produção suína e, portanto, foi justificado por isso.
Neste momento, o Governo desbloqueou finalmente o Plano de Crédito Agrícola do Alentejo, que pretende, basicamente, espalhar em 1,5 milhões de hectares de terras marginais, prados que constituam, eles sim, a capacidade de fixação de energia solar, isto será a primeira central solar de real significado físico, porque corresponde, de facto, a centenas de megawatts solares: retidos por uma actividade com nível de tecnologia perfeitamente acessível aos agri1cutores menos diferenciados.

Aplausos do PSD, do CDS, do PPM e do Sr. Deputado Reformador Sousa Tavares.

Gostaria de circunscrever a minha intervenção a problemas deste tipo económico, uma vez que se trata da discussão do Orçamento e do Plano, mas, como foram apresentadas ontem incorrecções graves relativamente às últimas acções de estruturação fundiária, em particular na Herdade dos Machados, gostaria de evidenciar que dos 311 originais empregadas da Herdade são 170, e não 94, os interessados na distribuição de terra. Todos os outros 141 foram voluntariamente indemnizados de acordo com as regras normais, com a assistência dos sindicatos, em regime de total voluntariado e nenhum deles optou pelo subsídio de desemprego previsto pelo decreto do V Governo.
Uma vez que o tempo está a terminar, uma última observação sobre as referências feitas às consequências sobre o desemprego das acções de reestruturação da Reforma Agrária. Temos perfeita consciência da gravidade que pode representar um ou mais desempregados em Portugal. O problema social do desempregado não se mede por números, um só desempregado é já um problema muito grave. No entanto, gostaria de dizer qua me parece acentuarem-se ideias incorrectas em relação à libertação de desempregados por acções de estruturação.
Consegui ontem alinhar dois tipos de informação: uma, fornecida pelo Ministério do Trabalho, que me mostra que nos serviços de desemprego no Alentejo, no distrito de Beja -distrito onde o actual Governo fez o maior inúmero de entregas de reservas-, o número de trabalhadores agrícolas inscritos no desemprego tem vindo a diminuir: 383, 379, 301 nos últimos três meses; e outra, uma acção feita pelo Ministério da Agricultura contactando todas as UCPs afectadas pelas acções de restruturação deste Ministério. Foram todas contactadas, acusaram todas a recepção dessas notas. Tentando captar todos os elementos que nos indicaram como excedentes provocados por acções de restruturação, totalizaram esses elementos 119 homens e 90 mulheres. Isto é, portanto, um elemento importante. Lamento não ter mais tempo para tratar deste assunto.

Aplausos do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Louro.

O Sr. Vítor Louro (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Ministro assentou grande parte da sua argumentação no facto de o Orçamento ser pródigo, dado que os serviços do Ministério da Agricultura e Pescas - às pescas lamentavelmente não se referiu, apesar das críticas aqui tecidas ontem pela minha bancada e por não terem publicado o tal «pacote das pescas» nas comemorações do 24 ... perdão, do 25 de Abril...

Uma voz do PSD: - Que gracinha!

O Orador: - ... - não têm tido capacidade de execução do plano orçamental que, segundo se lê na proposta de lei, rondou os 68%. Só gostaria de lhe perguntar, Sr. Ministro, o seguinte: sabendo nós que os serviços do Ministério da Agricultura e Pescas, salvo os relativos à entrega de reservas, estão pura e simplesmente parados, e se o Sr. Ministro continuar a manter parado o seu Ministério, não acha que as verbas orçamentadas são excessivas?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Miranda da Silva.

O Sr. Miranda da Silva (PCP): - Sr. Ministro, apenas algumas questões que decorrem da sua intervenção.
Antes de formular algumas perguntas, gostaria de começar por me referir a uma afirmação que fez no início da sua intervenção. O Sr. Ministro referiu-se à «necessidade» de um consenso que seria possível em matéria de agricultura, É espantoso, Sr. Ministro, que o responsável por uma política de violência, de arbitrariedade, de ilegalidade, como aquela que temos vindo a focar...

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Isso é falso! É preciso descaramento!...

O Orador - ..., que não tem sido desmentida, peio menos comprovadamente, faça uma afirmação dessas. Por tudo isto parece-nos espantoso que se venha aqui falar em consenso, dando a ideia de que esse mesmo consenso não é possível porque a oposição não o pretende.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Não é a oposição, é o PCP!

O Orador: - O que o Sr. Ministro não disse é que esse consenso não é possível porque há uma política

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deste Ministério que não pode de forma alguma ser aceite, particularmente pelo Partido Comunista Português, porque é uma política virada, nitidamente, para a recuperação dos latifúndios, para a recuperação dos interesses dos senhorios ricos no que toca ao Norte e Centro do País.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - isso é falso!

O Orador: - Relativamente ao resto da sua intervenção, gostaria de referir mais algumas questões:
Fala o Sr. Ministro num decréscimo de 15% para o Ministério da Agricultura e Pescas. Nós diremos que esse decréscimo e de 15 % apenas em termos monetários e que em termos reais é na realidade da ordem dos 30 %. O Sr. Ministro fala num «esforço» que é exigido a todos os Ministérios, mas a verdade, porém, e o Sr. Ministro não o referiu, é que, no conjunto das verbas orçamentadas para a globalidade dos Ministérios, foi em 1979 4% para o MAP e este ano só 2,7 % é que lhe é atribuído.
Tentou o Sr. Ministro justificar o aumento de 70 % que é atribuído a mais à Secretaria de Estado da Estruturação Agrária em relação a outros organismos dispersos. Do nosso ponto de vista pensamos que não é isso e esperamos que o Sr. Ministro ainda tenha oportunidade de explicar claramente para onde vão esses 70 % de aumento num Ministério cuja verba, como já referi, é bastante mais baixa do que aquela que se verificou em anos passados.
Apenas mais uma questão que decorre da sua intervenção relacionada com a Herdade dos Machados. Tive ocasião na semana passada, a propósito de uma declaração política, de referir algumas questões relativas à pretensa entrega de terras a pequenos agricultores, aos trabalhadores agrícolas. Fiz diversas acusações, lancei mesmo um repto e alguns Deputados da AD manifestaram-se então um tanto indignados porque não podiam responder a esse repto. Sempre esperei que hoje o Sr. Ministro ou mesmo os Deputados da AD viessem responder a esse mesmo repto, no entanto nem uma palavra foi dita sobre esse assunto.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Não foi assim!

O Orador: - A verdade é esta: não há contratos feitos com aqueles a quem se pretende entregar a terra, nem se diz quais as condições em que essa terra é entregue, não se diz sequer qual o tipo de classificação e selecção dos indivíduos a quem a terra é entregue, não se divulgam as normas de entrega; mais: não foi entregue qualquer terra, nem será certamente, nas zonas onde não há cooperativas agrícolas, onde não há terra que já antes do 25 de Abril estivesse na posse do Estado.
Esta é a realidade e gostaríamos que sobre ela houvesse uma resposta.

O Sr. Presidente: - Igualmente para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Campos.

O Sr. António Campos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sr. Ministro, tenho muito pouco tempo, porque o meu partido já quase o esgotou, para lhe pedir duas informações.

Uma voz do PSD: - Este gajo é teimoso!

O Orador: - A primeira está relacionada com a Herdade dos Machados: é verdade ou não, Sr. Ministro, que entregaram terra a 94 trabalhadores, que indemnizaram, com cerca de 10 mil contos, 175 trabalhadores e que aguardam (indemnização mais 41 trabalhadores? Ë ou não verdade que o número de trabalhadores que recebeu terra é muito menor do que aquele que ficou desempregado?
O segundo pedido de informação é este: se pode fornecer-nos os números de desempregados do ano passado relativos aos meses que referiu para este ano, porque, como sabe,, a .parte sazonal tem fortes implicações no desemprego.

O Sr. Presidente: - Tem ainda a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Sousa Tavares.

O Sr. Sousa Tavares (DR): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O pedido de esclarecimento que queria pedir ao Sr. Ministro da Agricultura e Pescas é o seguinte: em que ponto se encontram os estudos que visa o lançamento do imposto agrícola- sobre o rendimento. A não existência desse imposto é uma deficiência do nosso orçamento, visto que não concebo que a contribuição industrial no conjunto do País renda apenas 22,2 milhões de contos. O lançamento desse imposto é fundamental para o relançamento da economia nacional.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro da Agricultura e Pescas.

O Sr. Ministro da Agricultura e Pescas: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Infelizmente partilho do mesmo problema do Sr. Deputado António Campos: não temos tempo para responder convenientemente a todas as perguntas.
O Orçamento não é pródigo, todos gostaríamos que ele fosse mais avultado; no entanto, conforme disse na minha intervenção, resulta de um rateio entre os vários Ministérios através de esquemas que nos ultrapassam e que não podemos logicamente resolver por nós. Penso que não é unicamente de dinheiro que um Ministério precisa; um Ministério precisa fundamentalmente de uma motivação, de administração concreta, da pôr a funcionar serviços que, de facto - como o diz o Sr. Deputado Vítor Louro-, em alguns casos estão bastante parados. Neste aspecto em escassas três meses de trabalho e olhando para trás, sem fazer qualquer auto-elogio, entendo que se tentou desbloquear suficientes actividades imobilizadas no passado, para nos sentirmos dentro do caminho correcto.
Partilho da sua opinião, e aqui volta a jogar a questão de tempo, em relação às perguntas que «obre pescas foram feitas. Penso que tinham menos amplitude que os problemas relacionados com a agricultura, no entanto estou à disposição da Comissão da Agricultura e Pescas para, quando quiserem, retomar este debate.

Vozes do PSD: - Muito bem!

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O Orador: - O Sr. Deputado Miranda da Silva deu-me razão; de facto o que se verifica é que, pelas posições assumidas - e não digo que sejam de um ou de outro lado da bancada - ao longo dos debates sobre agricultura, se estreitou o campo de consenso. Não estou a acusar este ou aquele, estou a lamentar um facto. Todos os Srs. Deputados são responsáveis ao mais alto grau dentro da Nação, compete-lhes tentar ultrapassar essa posição, e, com as dificuldades próprias de posições muito dificilmente conciliáveis, deveremos todos tentar, pelo menos naqueles pontos onde haja possibilidade de discussão, estabelecer as vias para esse consenso.
Os números que referiu sobre o Orçamento não são exactos. O Sr. Deputado não entendeu bem as minhas palavras; o que eu disse é que o orçamento real do Ministério cresceu ...

O Sr. Vítor Louro (PCP): - E a inflação?

O Orador: - ... em termos monetários 15%.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Isso é falso!

O Orador: - O que quer dizer que, se a desvalorização for de 20 %, poderá ter um decréscimo, em termos reais, de 5 %, e não de 30% como acabou de dizer.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Isso é falso!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - O Sr. Ministro deve ter um orçamento diferente, porque os números não são esses

O Orador: - Talvez, é possível!
Os números, respondendo ao Sr. Deputado António Campos, da Herdade dos Machados são exactamente esses que referiu: 141 empregados receberam indemnizações voluntariamente e saíram da Herdade, apareceram 170 empregados interessados na distribuição de lotes, e tem razão em relação aos 10 mil contos atribuídos aos 141 empregados que optaram pelas indemnizações.
Os números de desemprego do ano passado lamentavelmente não os tenho, posso certamente obtê-los através do Ministério do Trabalho e terei muito prazer em lhos passar.
Partilho da opinião do Sr. Deputado Sousa Tavares quanto ao interesse em estabelecer, de uma forma clara e concreta, os estudos para a racionalização e instalação de um justo imposto sobrei a (indústria agrícola. Imposto que terá de ser estabelecido, porque não se compreende que rendimentos portugueses, de sectores diferentes, paguem impostos uns e outros não. Devo dizer-lha que, dentro das capacidades do Ministério da Agricultura e Pescas, tudo será feito para que asso ultrapasse a forma, que neste momento consideramos bastante primitiva, de recolha de dados dos agricultores que não dispõem de contabilidade própria. Esse é o grande desafio que não é nosso, é do Ministério das Finanças, ao qual o Ministério da Agricultura e Pescas nesta via dará toda a colaboração.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Cravinho.

O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, desejava perguntar à Mesa se o Sr. Ministro das Finanças não se encontra no Palácio; as minhas palavras são-lhe dirigidas e não as queria proferir na sua ausência.

O Sr. Presidente: - Pergunto a algum dos Srs. Membros do Governo presentes se o Sr. Ministro das Finanças se encontra no Palácio.

O Sr. Ministro Adjunto do Primeiro-Ministro (Pinto Balsemão): - Se o Sr. Deputado João Cravinho exige a presença do Sr. Ministro das Finanças, certamente que vamos providenciar para que ele esteja presente.

O Sr. João Cravinho (PS): - Não exijo, compete-me apenas respeitar a ética política.

O Sr. Ministro Adjunto do Primeiro-Ministro: - O Governo agradecei esse respeito. Sr. Presidente, penso que, paira adiantar os trabalhos, seria preferível dar a palavra a outro orador.

O Sr. Presidente: - Tem então a palavra o Sr. Deputado Vítor Louro.

O Sr. Vítor Louro (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Já aqui demonstrámos abundantemente que o Governo não tem uma .política agrária e que o que inscreve como objectivos para a agricultura e silvicultura é mera demagogia. Esta afirmação é fácil de provar através dos meios orçamentais previstos para o sector. Depois da demonstração feita em desenvolvida intervenção do nosso grupo parlamentar, gostaríamos de cuidar de alguns pormenores bem elucidativos dos investimentos da Administração Central.
A anunciada alteração dos circuitos comerciais - que para ser positiva tem de passar pelo alargamento da capacidade de armazenamento em frio dos organismos estatais- é contemplada exclusivamente a nívea dos produtos 'pecuários, e com apenas 35 000 contos que não chega para metade de uma câmara frigorifica das mais pequenas.
Sabe o povo quanto custa a carne e o leite. Pois para fomentar a produção animal o Governo dedica investimentos no valor de 13000 contos que não chega para vinte reprodutores e, apesar dos vastos problemas de brucelose e peste suína, dedica a este campo 86000 contos. Por outro lado, apenas dedica, apesar da importância há pouco referida pelo Sr. Deputado Luís Coimbra, 2000 contos para a silvo-pastorícia, em oposição a 11000 contos para fomento de produção de peixes e abelhas, isto é, cinco vezes e meia mais ....

Risos do PCP.

Há dias, para rejeitar o nosso projecto de lei de defesa da floresta contra os incêndios, a direita deramou-se aqui em afirmações de que o que é preciso é arborizar o que foi queimado - e já! De resto, fez disso bandeira eleitoral. A demagogia do direito e do Governo traduz-se nestes números lapidares: a

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verba orçamental de que dispõe permite arborizar 2000 ha, dos 48 000 ha que arderam no ano passado!
Fala o Governo e os seus apoiantes na necessidade de valorizar profissionalmente os que trabalham no sector agrícola: a sua demagogia estatela-se nos 5000 contos que dedica no Orçamento a essas acções.
Sendo o regadio um factor decisivo do desenvolvimento económico e social do sector, o Governo dedica-lhe - não sou eu que estou a brincar é o Governo - 38 000 contos de investimento, sendo 4000 deles para o aumento da área regada (creio que não dá sequer para uma pequena barragem de terra das mais pequenas).
E, pasme-se, as infra-estruturas de base no meio rural - essas são contempladas com cem contos!
Como classificar tudo isto. Sr. Presidente, Srs. Deputados? Demagogia, irresponsabilidade, mentira? Escolham'
Desejo, porém, assinalar um outro pormenor orçamental, que vem ilustrar a razão que nos assiste quando denunciamos que a política da Aliança Democrática se alimenta da liquidação dos pequenos agricultores e da Reforma Agrária, por interesses seus e da CEF

O Sr. Alexandre Reigoto (CDS): - Isso não é verdade!

O Orador: - Eu vou-lho já demonstrar, ouça se faz favor.

A produção animal, numa região leiteira por excelência como é a Beira Litoral, não é contemplada com um tostão sequer - recorde-se que a CEE é excedentária, como há pouco lembrou o Sr. Ministro; o Alentejo, onde os efectivos pecuários são tradicionalmente tão atacados de brucelose e onde se expande a grande mancha da 'peste suína, é contemplado com 6000 contos para a protecção da produção animal; os estudos de obras de valorização económica e social, com vista ao futuro redimensionamento das explorações minifundiárias, estão inscritos no Orçamento com zero escudos.
A direita na pessoa dos Deputados e do próprio Ministro da Agricultura e Pescas tem-se derramado, aqui, durante o debate do Plano e do Orçamento, à volta dos feitos da Herdade dos Machados e de Pegões, olvidando que a ((liberdade de escolha» que dá aos trabalhadores -e que o Sr. Ministro ainda agora referiu - é a seguinte: aceitar a terra nas condições indefinidas em que é cedida, aceitar o subsídio de desemprego ou uma indemnização de cinco anos quando ali trabalham há vinte e trinta!

Uma voz do PSD: - Na Rússia é que é bom!

O Orador: - Repete -e esta é especialmente para o Deputado do PSD - a mentira de Pegões, não vendo que o que fez não foi diferente do que fez o fascismo: o regime deposto tinha reconhecido, em lei, o direito dos agricultores à posse plena da terra que eles mesmo desbravaram; a AD deu-lhes um papel a prometer que lhes daria a posse plena prevista na lei.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Enfim, nos actos materiais e no planeamento orçamental, este Governo fica como é - delusório e mofatrão.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Tavares.

O Sr. Sousa Tavares (DR): - Queria perguntar ao Sr. Deputado Vítor Louro se ele próprio e o seu partido estarão dispostos a votar a alteração da Constituição que permita dar a propriedade plena da Herdade dos Machados aos actuais possuidores Dado que a Constituição proíbe a desintegração de terras que pertencem ao Estado só lhes podendo ser dada a posse útil, e como o Sr. Deputado não considera isso bastante, gostaria que esclarecesse este Parlamento se o seu partido e ele próprio estão dispostos a votar a alteração da Constituição que permite a atribuição da propriedade plena.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Louro.

O Sr. Vítor Louro (PCP): - Sr. Deputado Sousa Tavares, para além de, através da vossa prática, estar provado que cada proprietário custa três desempregados, nós não estamos aqui hoje a tratar da revisão constitucional.

Risos do PSD, do CDS. do PPM e do Sr. Deputado Sousa Tavares,

Creio que estamos ..., não percebo essa gargalhada ... Eu ia classifica-la, mas vou evitar.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Riam-se também!

O Orador: - Naturalmente que o Sr. Deputado Sousa Tavares não entendeu aquilo que eu disse.

Protestos do PSD, do CDS, do PPM e do Sr. Deputado Sousa Tavares.

O que eu disse é que os Srs. Deputados só deram um papel a dizer que iam cumprir a lei, nada mais do que isso.

O Sr. Sousa Tavares (DR): - Isso é mentira!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Tavares.

- O Sr. Sousa Tavares (DR): - Não foi um papel, foi um título de atribuição de posse plena da terra, irrevogável por parte do Estado e revogável livremente por parte da outra entidade.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

Por que é que se há-de estar sempre a deformar as questões e a mentir num sítio como a Assembleia da República! O problema pode ser criticado em base política, pode ser criticado em base económica mas não deve -quanto a mim, porque me honro de ser Deputado eleito pelo povo - ser analisado por mentiras.

Uma voz do PCP: - O senhor é que está a dizer mentiras!

O Orador: - O Sr. Deputado Vítor Louro sabe que o que foi atribuído foi um título de posse plena, para

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cise título de posse plena ser transformado em título de propriedade é preciso uma alteração da Constituição. O Sr. Deputado censurou o não valor desses títulos, pergunto: está disposto a atribuir a esses títulos o valor pleno que o Governo lhes quer atribuir?
Isto não é um sofisma, o que é um sofisma é a sua resposta. Não tem resposta!

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Lopes.

O Sr. Mário Lopes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Têm os partidos da oposição procurado fazer uma campanha contra o Governo da Aliança Democrática no sector da política agrícola.
O Partido Comunista fomenta a instabilidade na zona de intervenção da Reforma Agrária tentando mobilizar os trabalhadores, mas não contabiliza o valor das suas pretensões que se têm cifrado pela negativa.
O Partido Socialista, consciente da sua incapacidade de mobilização, tem escolhido esta Assembleia, pela voz do seu Deputado António Campos, para lançar falsidades e calúnias sem consistência e fundamentadas em bases falsas.
Entretanto o Sr. Deputado Vítor Louro fez várias afirmações que atacam directamente a bancada do meu partido.

Uma voz do PCP- - É verdade!

O Orador: - Fui eu próprio que rejeitei, em nome do Partido Social-Democrata, o projecto de lei que visava a defesa das florestas contra os incêndios. Defendi essa rejeição porque continuo a dizer sim a uma lei que defenda os pequenos e médios agricultores florestais, e a dizer não a uma lei e a um articulado que vá fazer uma nacionalização a longo prazo. Era isso que pretendia o Partido Comunista Português e isso nós não aceitamos.

Aplausos do PSD e do CDS.

Além do mais, o Sr. Deputado Vítor Louro diz que as verbas do Orçamento Geral do Estado destinadas ao «frio» não chegam sequer para construir uma câmara

O Sr. Vítor Louro (PCP): - Meia câmara!

O Orador: - Isso é uma opinião!
É evidente que o Governo da Aliança Democrática sempre perspectivou a não entrega ao sector público, que tem sido altamente deficitário neste país, da possibilidade daquilo que não é capaz de governar.

Uma voz do PCP: - É mentira!

O Orador: - Também atacou as verbas que vão ser entregues no Alentejo para defesa do sector pecuário. Gostaria de perguntar ao Sr. Deputado Vítor Louro por que é que no tempo das unidades colectivas de produção, em 1975, se destruiu e se comercializou gado a preços irrisórios para Espanha, tudo isto falo não por homens do Norte, mas por indivíduos ligados ao Partido Comunista no Alentejo.

Aplausos do PSD do CDS e do PPM

O Sr. Miranda da Silva f PCP): - Foram os agrários!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Era este o protesto que queria fazer. Fiz o protesto em defesa da política que o Governo está a praticar, política certa a caminho do desenvolvimento das populações rurais, evitando assim os salários de miséria dados pelas unidades colectivas, evitando assim os correntes dadas pelos sindicatos ligados à Intersindical.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

Protestos do PCP.

O Sr. Presidente. - Tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Louro.

O Sr. Vítor Louro (PCP): - Era só para acalmar a bancada do PSD.

Como os Srs. Deputados e o Sr. Presidente devem ter reparado, o protesto que o Sr. Deputado Mário Lopes fez vinha escrito e preparado para o Sr. Deputado António Campos.

Risos do PCP.

Como não teve oportunidade de o meter nessa altura, meteu-o agora a propósito daquilo que eu

Misse.

Risos do PCP.

Enfim, trata-se da capacidade do PSD, nem sequer soube escolher as ocasiões.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Ou os Deputados!

O Orador: - Que fique claro que uma política de «fazer» proprietários à custa de três trabalhadores despedidos é completamente rejeitada por nós.

Vozes do PSD: - Isso é falso!

O Orador: - Isso é o que vocês têm feito!

O Sr. Deputado Mário Lopes deve achar que as câmaras frigoríficas para frigorificar animais mortos são assim uma espécie de frigorífico doméstico. Não é isso, é um bocado diferente.

Risos do PCP.

É evidente que estes investimentos devem ser financiados pelo Estado, porque senão verifica-se aquilo que já foi aqui denunciado peio meu camarada Carlos Espadinha a propósito das pescas. Ou seja, as próprias câmaras frigoríficas do Estado estão a ser geridas pelos interesses privados e por isso mesmo não adquirem a sardinha, obrigando os pescadores a deitá-la para o mar, tudo isto ao mesmo tempo que se importa de Espanha sardinha pescada nas nossas águas

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Finalmente, e em relação à protecção animal - oh Sr. Deputado!-. o Sr. devia ter mais cuidado na afirmação que fez, e isto porque acaba de se descobrir uma rede de contrabando de gado, ligada às forcas de direita, e o Sr. Deputado vem para aí com a partitura do costume...

Risos do PCP.

...quanto ao gado que se comprou, que se comeu, que se gastou .... que morreu, etc., em 1975. Não é isso que está em causa ...

O Sr. Ferreira do Amaral (PPM): - É, é!

O Orador: - ..., o que está em causa é que, perante um estado que é grave, embora a níveis não elevados, de alastramento da brucelose e da peste suína africana, o irresponsável Governo da Aliança Democrática atribuiu 6 mil contos para contrariar essas acções em toda a província do Alentejo.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Quanto às áreas queimadas, isto é irrefutável, a questão é esta: rejeitaram o nosso projecto de lei para defesa da floresta contra incêndios, porque entendiam que era preciso arborizar já aquilo que ardeu. A resposta dada pelo Sr. Ministro da Agricultura e Pescas - se não for isto ele que desminta - foi no sentido da atribuição orçamental dei verbas paira 2000 hectares dos 48 000 que arderam o ano passado. Ficam 46 000 por arborizar: se não concorda vote contra o Orçamento!

Aplausos do PCP

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Casqueiro.

O Sr. José Manuel Casqueiro (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer um brevíssimo protesto. Ó Sr. Deputado Vítor Louro identificou a política e a decisão governamental, em relação ao caso de Pegões, com aquilo que ocorria durante o regime passado.

A Sr.ª Ercília Talhadas (PCP): - É sobre o almoço de Braga?

O Orador: - Quero protestar, porque finalmente, e ao fim de trinta e tal anos em que os colonos de Pegões lutaram para que lhes fosse possível adquirir a título definitivo a terra que eles próprios começaram a cultivar -pretensão que várias vezes em sessões públicas o seu partido manifestou intenção de realizar, mas que, em 1975, quando teve o poder, nunca o fez-, isso foi realizado pelo Governo da Aliança Democrática e com pleno agrado de todos os colonos de- Pegões, independentemente da sua filiação partidária.

Vozes do PSD, do CDS e do PPM: - Muito bem!

O Orador: - Um outro aspecto que queria referir está relacionado com a distribuição individual de terras a trabalhadores rurais. O Sr. Deputado Vítor Louro, e o seu partido, mais uma vez não respondeu àquilo que é essencial, ou seja, está de acordo ou não com a criação de uma nova geração de agricultores, farta pela divisão e doação da terra pelos trabalhadores rurais em explorações agrícolas perfeitamente viáveis e não em pequenas courelas que mantenham os trabalhadores em condições de explorados e de assalariados.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Colonizados!

O Orador: - Ou se, pelo contrário, o Partido Comunista deseja, acima de tudo, manter no Alentejo os proletários rurais explorados e oprimidos pelo sindicatos qua o seu partido controla. Pergunto ao Partido Comunista, de u>ma forma clara, se está disposto ou não a alterar a Constituição para que os trabalhadores 'rurais individualmente possam livremente ter acesso à terra e não forçadamente, como pretende. Diria, para terminar, que o Sr. Deputado Vítor Louro, talvez por uma questão de alianças, desta vez meteu o pé na argola.

Aplausos do PSD. do CDS e do PPM

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Louro.

O Sr. Vítor Louro (PCP): - Como se vê, Sr. Presidente, aquilo que a AD está a fazer é inconstitucional, porque precisam de alterar a Constituição paira fazer aquilo que estão a fazer.

Risos do PCP.

Vozes do CDS: - É falso!

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Esta é mesmo de argola!

O Orador: - Esta de forjar novos proprietários faz lembrar aquela promessa da AD de uma «casa para cada família portuguesa», já vimos no que é que isso deu.
Quanto à nova geração de agricultores não percebo como é que a quer formar com homens de 40 e 60 anos de idade!

O Sr. Sousa Tavares (DR): - Isso não é verdade! Mentiroso!

O Orador: - E agora, Sr. Deputado José Manuel Casqueiro, devo dizer-lhe o seguinte: pessoas como o senhor, que voltam a querer sentar-se à mesa dos banquetes oficiais, como no «tempo da outra senhora», mesmo sem para tal ser convidado, não percebem, e isso não nos admira, a diferença que há entre o que fizeram em Pegões e aquilo que o fascismo lá fez.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Casqueiro.

O Sr. José Manuel Casqueiro (CDS): - Sr. Deputado Vítor Louro, o senhor não foi capaz de responder ...

O Sr Narana Coissoró (CDS): - Nunca foi!

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O Sr. Vítor Louro (PCP): - Ou o Sr. não foi capaz de perceber!

O Orador: - ... e por isso fugiu às questões.
A terra que nesta altura está a ser distribuída individualmente aos trabalhadores rurais circunscreve-se, em relação bastante clara e que lhe atribui esse direito, a um título de uso da terra e com isto respondo a toda a bancada do Partido Comunista, que parece que desconhece, ao contrário do que é usual, a legislação publicada. Portanto, não estamos a violar a Constituição, nem precisamos de violar a Constituição para atribuir individualmente terra aos trabalhadores rurais.

O Sr. Vítor Louro (PCP): - Então porque é que o estão a fazer?

O Orador: - Mas queremos alterá-la porque não nos chega dar a terra como uso privativo aos trabalhadores rurais, nós queremos dá-la como propriedade plena, para que amanhã a possam dar aos seus filhos por herança É este o princípio que defendemos.

Aplausos do CDS.

Era estie o princípio que gostava que o Partido Comunista afirmasse publicamente: se concorda ou não concorda com este princípio? Quer ou não manter como proletários rurais e assalariados os trabalhadores rurais do Alentejo?

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - O Sr. Deputado é um hipócrita!

O Sc. Vítor Louro (PCP): - Afinal aquilo do almoço sempre era verdade!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.

O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tenho a impressão de que esta discussão está a fugir ao essencial. O que se passa é que. O Governo AD, para mascarar e camuflar a entrega das terras aos agrários, está a fomentar o aparecimento de alguns agricultores individuais. Isto é tanto mais criminoso quanto o Governo AD, toda a AD, e os latifundiários capitalistas, sabem que os agricultores individuais vão desaparecer, e vão desaparecer porque. 0 sentido da concentração capitalista na agricultura da própria CEE os vais liquidar.

O Sr. José Cardoso (PSD): - Não percebe nada disso!

O Orador- - E vão desaparecer porque o próprio Governo vai seleccionar os abonos, os juros bonificados e tudo isso para aqueles que mandam no Governo AD!
Gostava de perguntar ao Sr. Deputado José Manuel Casqueiro, quantos hectares de terra é que cabem a cada um desses agricultores. Pergunto isto porque no vale do Mondego, onde está 9 ser feita a regularização do rio Mondego e onde os pequenos agricultores têm à volta de 3000 m2. o plano de regularização exige que cada exploração familiar perfeita tenha entre os 30 ha e os 50 ha, o que vai conduzir à proletarização de cerca de 4000 agricultores no vale do Mondego.

Uma voz do PSD: - Não percebe nada disso!

O Orador: - Os Srs. sabem o que é a CEE, os Srs. sabem que a vossa política é feita para destruir os agricultores individuais, os Srs. sabem que a agricultura da CEE é dos grandes agrários capitalistas, os Srs. sabem que na CEE saem 100 000 camponeses do campo para as cidades por causa das grandes herdades capitalistas. Tudo isto tem de ser dito e é aqui que está a essência da questão; o que estão a fazer é uma tentativa de mascarar a entrega de terra aos latifundiários.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - É ignorante!

O Sr. José Cardoso (PSD): - Foi mau militar e é um péssimo agricultor!

O Sr. Mário Tomé (UDP): - Mau militar, calma aí!...

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Casqueiro.

O Sr. José Manuel Casqueiro (CDS): - Sr. Deputado Mário Tomé, lamento ter pouco tempo para responder e limito-me a esclarecê-lo, para seu descanso, que na perspectiva da Aliança Democrática ninguém será fuzilado, ninguém precisará de emigrar para outros países, ninguém irá pana a Albânia.

O Sr. Mário Tomé (UDP): - Isso e agricultura?

O Orador: - Limito-me ainda a fazer-lhe uma pequena observação: o Sr. Major Tomé costuma por hábito vir com afirmações de um grande verbalismo e de um revolucionarismo...

A Sr.ª Natália Correia (PSD): - Ingénuo!

O Orador: - ....impressionante; parece que o Sr. Major Tomé já esqueceu o 'período em que era ajudante de campo de um general do regime passado.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Toma lá!

O Sr. Mário Tomé (UDP): - Responde ao que eu perguntei!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Tavares.

O Sr. Sousa Tavares (DR): - O Sr. Deputado Mário Tomé, profeta confesso desta Assembleia da República, fez como de costume algumas das profecias que costuma fazer; todos nós estamos habituados ao seu jeito profético.

Risos do PSD, do CDS e do PPM

Agora só queria compreender onde é que o Si. Deputado Mário Tomé foi buscar a ideia de que 30 ha ou 40 ha de regadio correspondiam a uma

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proletarização de agricultores. Realmente 30 ha a 40 ha de regadio, em qualquer país civilizado, é uma fortuna formidável, é uma fortuna a que o Sr. Profeta Deputado nunca terá acesso, nem eu, por isso gostaria de saber onde é que foi buscar esses números extraordinários.

Risos do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.

O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Deputado, eu não sou profeta...

Risos do PSD, do CDS e do PPM.

... e assim como eu não sou profeta o Sr. Deputado não percebe nada.

Risos do PSD do CDS e do PPM.

Eu disse que o que correspondia à proletarização dos agricultores era a necessidade de, ao cumprir as regras da 'exploração capitalista, impor a cerca de 5000 agricultores, que têm 3000 m2 de terra, os 30 ha e 40 ha de terra...

Risos do PSD. do CDS e do PPM.

... que vai originar, sabendo o Sr. Deputado como funcionam as regras capitalistas, a venda dessas terras, visto que não têm dinheiro nem sequer para comprar a rega, e ao vendê-la Vão fazê-lo a quem já é proprietário e a quem nunca foi prejudicado, nem sequer peto 25 de Abril, e que, ainda por cima, são apoiados pelo Governo AD.

Risos do PSD. do CDS e do PPM.

É assim que se tem processado há cento e tal anos a proletarização dos agricultores.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Tavares.

O Sr. Sousa Tavares (DR): - Pedi a palavra, Sr. Presidente, para constatar o facto de que maus uma vez se tratava de uma profecia. O Sr. Deputado Mário Teme não falou com razão de ciência, mas falou apenas como profecia, «vai ser assim», ele profetiza que «vai ser assim». Não há nada a fazer, não se pode discutir com os profetas.

Aplausos do PSD. do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: a sessão está suspensa por trinta minutos. Convoco os Srs. Presidentes dos Grupos Parlamentares para uma reunião com o Sr. Presidente da Assembleia da República.

Eram 17 horas e 30 minutos.

Após o intervalo assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Martins Canaverde.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.
Eram 18 horas e 10 minutos.
Srs. Deputados e Srs. Membros do Governo, esta reunião vai prosseguir até às 20 horas, hora a que serão suspensos os trabalhos para recomeçarem impreterivelmente às 21 horas e 30 minutos. Prosseguirá o debate, far-se-á a votação na generalidade e as declarações de voto serão feitas na próxima terça-feira, ao abrir da reunião.
Tem a palavra o Deputado João Cravinho para uma intervenção.

O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Até agora o Sr. Ministro das Finanças e do Plano evitou cuidadosamente abordar algumas questões de fundo que lhe foram postas. Por exemplo, nada disse quanto aos inconvenientes da revalorização. Mas eles existem. De facto, não poderia confessar que a revalorização determina uma deterioração 'global da balança de pagamentos da ordem dos 300 milhões de dólares. Aliás, os industriais exportadores têxteis já deram ao Sr. Ministro a resposta devida que, como toda a gente sabe, foi totalmente negativa.
Outras questões mereceriam análise circunstanciada se o tempo o permitisse. Mas não o permite. Deste modo, sou forçado a denunciar aqui apenas algumas graves inexactidões que o Sr. Ministro pretende inculcar como se de factos autênticos se tratasse. Refiro-me, em particular, ao facto de o Sr. Ministro prever o aumento quer do peso da fiscalidade, quer do deficit orçamental, enquanto o mesmo Sr. Ministro vem aqui manipular abusivamente os seus próprios números para tentar convencer o País do contrário, isto é, para tentar convencer o País de algo que, não é verdadeiro. Ater-me-ei exclusivamente a factos, sem sequer referir o seu significado político.
O peso fiscal em 1980 aumentará relativamente a 1979. Vejamos os números:

a) Impostos em 1979: 244 milhões de contos, ou seja 24,6 % do produto interno bruto a preço de mercado;
b) Impostos em 1980: 338 milhões de contos, ou seja 27,8 % do produto interno bruto a preços de mercado;
c) O aumento de 1980, já expurgado do efeito da variação de preços e de crescimento do produto, é de cerca de 40 milhões de contos. O Sr. Ministro das Finanças não pode refutar estes números; pode manipulá-los, pode omiti-los mas não pode refutá-los.

Vozes do PS: -Muito bem!

Quanto ao deficit orçamental, os factos também não podem ser manipulados como o Sr. Ministro o faz.
Em 1979, o deficit orçamental aumentará significativamente de quase 10%.
Vejamos os factos: o deficit de 1979 foi de 107,5 milhões de contos, ou seja, 10,8% do produto interno bruto; em 1980 será de 141 milhões de contos, ou seja, 11,6% do produto interno bruto; o aumento do deficit orçamental em 1980, também já expurgado do efeito de variação de preços e do crescimento do produto, é de cerca de 10 milhões de contos.
Apesar disso, o Sr. Ministro ficaria muito satisfeito se o País acreditasse que a previsão para 1980 representa uma diminuição do deficit orçamental!

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O Sr. Ministro compara o previsto para 1980 não com o deficit verificado em 1979, mas sim com o deficit que outros julgaram, -e digo julgaram - que poderia ocorrer, mas que, efectivamente, não ocorreu. O Sr. Ministro utiliza um deficit não verificado, porque isso dá jeito à sua propaganda.

O Sr. Vítor Vasques (PS): - Muito bem!

O Orador: - Mas, repare-se, quando lhe convém, altera o seu critério e põe de lado o orçamento previsto para 1979, passando a comparar o executado de 1979 com o previsto para 1980. É o que sucedeu mesmo na sua. própria apresentação, a p. 16 do texto distribuído. É ainda o que sucede sistematicamente nas Grandes Opções do Plano, por exemplo, a pp. 24 e 28. A conclusão é óbvia: o Sr. Ministro muda de critério de acordo com as verdades que quer fabricar.

Aplausos do PS.

Vozes do PSD: - Não apoiado!

O Orador: - Para certas coisas baseia-se no Orçamento executado em 1979; para outras baseia-se numa previsão completamente ultrapassada, ignorando o que sucedeu na realidade.
Em 1979 foram apresentados dois orçamentos previsionais. Qual deles serve ao Sr. Ministro? A habilidade utilizada pelo Sr. Ministro, se- fosse válida, daria origem a situações absurdas e ridículas, como toda a gente sabe. Por exemplo: mantendo invariante o deficit previsto de 141 milhões de contos, a comparar com o deficit verificado de 107,5 milhões de contos, também obviamente invariante, ter-se-ia de entender que o deficit em 1980 aumentaria 16,7% se se tomasse para base uma das previsões feitas em 1979, mas já aumentaria de 40% se se tomasse para base a outra previsão. Isto é, a mesma realidade, a variação do deficit entre 1979 e 1980 teria tantas medidas diferentes quantas as bases de comparação puramente arbitrárias que conviessem ao Sr. Ministro.
O artifício é de tal maneira grosseiro que este meu protesto não deve ter nem mais uma palavra, senão para dizer o seguinte: as graves inexactidões do Sr. Ministro e a sua agressividade inteiramente deslocada testemunham a sua falta de razão, a sua insegurança e o seu nervosismo. Mas isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, não é do foro da política.

Aplausos do PS. do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Barbosa.

O Sr. Luís Barbosa (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Estamos a terminai o debate sobre o Orçamento e o Plano para 1980.
O Grupo Parlamentar do CDS votará favoravelmente.

Vozes do PS: - Ah!

O Orador: - Dará, assim, expressão ao apoio que é sua obrigação prestar ao Governo.

Vozes do PS: - Ah!

O Sr. Gualter Basílio (PS): - Afinal é só por obrigação!

O Orador: - O Orçamento e o Plano são dois documentos elaborados com competência, honestidade e determinação e o País precisa de competência, precisa de honestidade, precisa de determinação.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - O debate do OGE e do Plano tem decorrido normalmente dentro do estilo a que as oposições já nos habituaram: disperso, sem uma linha técnica definida, sem veia política.

Risos do PS e do PCP

Tendo as oposições sido Governo durante quase todo o período que decorreu desde Abril de 1974, pode dizer-se que durante este debate as oposições se autocriticaram.
Pela nossa parte, como partido da maioria, não podemos aceitar que sejam imputadas ao Governo responsabilidades que lhe não cabem.
O Governo da Aliança Democrática encontrou a economia portuguesa numa crise grave...

Vozes do PS: - Não apoiado!

O Orador: - ... a que o conduziram os Governos anteriores.

Vozes do PS: - Falso!

O Orador:- O único ponto favorável -a redução do deficit da balança de transacções correntes - foi afectado logo no início do ano pelo aumento dos preços do petróleo.
Pode dizer-se que o Governo tem governado em circunstâncias particularmente adversas. Dispondo de um curto período de nove meses, sofrendo uma hostilidade sem regras das oposições, suportando igualmente a oposição de membros de outros órgãos de Soberania o Governo da Aliança Democrática tem apenas contado com os partidos que o apoiam e com a esperança da grande maioria dos portugueses cansados de verbalismos e de experiências sem êxito.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - O Orçamento e o Plano para 1980 balizam uma nova época para a vida portuguesa, mas o seu debate não vai ficai para a história. As oposições sentem que o mundo de fantasmas, de medos e de terrores que existiram no passado ou que elas próprias erraram, após o 25 de Abril, está em extinção.

Uma voz do PS: - Antes é que era bom!

O Orador: - Mas não são capazes de aceitar que a democracia portuguesa vai entrar numa nova fase, seguindo finalmente os rumos que deveria ter seguido no dia 26 de Abril de 1974.

Vozes do PSD e do CDS: - Muito bem!

O Orador: - É no balanceamento para o futuro que os Partidos da Aliança Democrática devem em-

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penhar-se, desde já, traduzindo com fidelidade o espírito de mudança que foi teimotiv da campanha eleitoral de 1979.
O ano de 1980 vai quase a meio. Os quadros e dirigentes dos Partidos da AD devem estar já de olhos postos no período 80-84 e nas grandes «areias do Governo que apoiamos, no futuro próximo.
Os primeiros quatro meses de governação estabeleceram bases de trabalho, criaram os alicerces de uma acção que vai certamente intensificar-se nos próximos meses.
Aprovado o Orçamento e o Plano estará o Governo em condições de fazer uma ainda mais clara demonstração de capacidade realizadora.
Coragem política, serenidade, firmeza, clarividência não lhe faltam para levar por diante as tarefas que ainda estão por realizar.

O Sr. Gualter Basílio (PS): - Presunção e água benta...!

O Orador: - Os homens dividem-se em dois grandes grupos: os que criticam e os que fazem. Deixamos a crítica para a oposição. Temos de ir muito mais longe nas nossas realizações,

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Num ano em que foi possível através da reavaliação das reservas de ouro reduzir em cerca de 15 milhões de contos os juros a pagar, verificamos com apreensão que os encargos com a dívida pública atingirão, mesmo assim, 50 milhões de contos. Se a eles adicionarmos 11 milhões de subsídios às empresas públicas, 19 milhões para aumentos de capital estatutário, 13 milhões transferidos para o Fundo de Abastecimento e 3,3 milhões de encargos com a descolonização, passaremos de 50 para 96,3 milhões de contos.
Isto é, os encargos resultantes de compromissos assumidos no passado recente, as necessidades de capital e subsídios das empregas do sector público e os subsídios ao consumo, dados pelo Fundo dê Abastecimento, atingirão com grande probabilidade no ano de 1980 os 100 milhões de contos -71 % do deficit global.
Quando um país chega a semelhante situação terá de interrogar-se muito realisticamente sobre o futuro. Esta foi a herança que a Aliança Democrática encontrou. Se esta via fosse mantida, o Estado estaria, dentro em breve, sem recursos financeiros para fazer face às suas obrigações mínimas no domínio dos investimentos em infra-estruturas: hospitais, escolas, estradas, portos, aeroportos, etc.
Quando o Conselho da Revolução declara inconstitucionais as alterações à lei de separação entre sector público e sector privado, procurando manter a todo o custo na esfera do Estado o investimento em sectores produtivos largamente consumidores de capitais, terá de responsabilizar-se perante o País pelas opções políticas que toma.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - 30 milhões de contos levarão este ano ao Orçamento Geral do Estado as empresas públicas. 30 milhões de contos poderiam representar 30 hospitais de l milhão de contos cada um. Isto é, de uma só vez, uma revolução no que respeita ao Serviço Nacional dei Saúde.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - 30 milhões de contos poderiam representar 600 escolas de 50 000 contos cada uma. Isto é, de uma só vez, uma infra-estrutura capaz de democratizar efectivamente o ensino em Portugal.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

Estes dois exemplos chegam para demonstrar o absurdo da situação em que estamos. Dirão que uma parte dos 30 milhões de contos se destina a subsidiar serviços e produtos de utilidade social. Mas ninguém já sabe distinguir onde acaba a utilidade social para começar a desorganização, o esbanjamento, a irresponsabilidade.

Vozes do PSD e do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Dirão ainda que uma parte dos 30 milhões de contos se destina a investimento reprodutivo, mas tal afirmação não invalida que sob o ponto de vista da tesouraria do Estado se ponha a opção: escolas, hospitais, estradas ou empresas?
Para as empresas sempre, se poderá dispor de capitais privados, mas para investimento em infra-estruturas sociais só os capitais do Estado poderão responder à grande massa de necessidades existente.
Na banca o crédito mal parado deve ascender no fim de 1980 a mais de 120 milhões de contos. 120 milhões de contos que em grande parte são irrecuperáveis Q representam prejuízos acumulados em empresas públicas, arrastadas, intervencionadas, em autogestão e também em empresas privadas.
120 milhões de contos que são parte dos custos da Revolução.
Este é um problema que terá de ser encarado bem de frente. De uma forma ou de outra, mais tarde ou mais cedo, directa ou indirectamente, há-de ser o povo português que terá de pagar esta factura.
As empresas portuguesas precisam de ser financeiramente saneadas. Não podemos avançar com rapidez paira o Mercado Comum tendo como lastro na nossa economia uma vasta gama de empresas em degradação.
Em muitos casos a resolução dos problemas obrigará a mudança de mãos no que respeita aos títulos de propriedade. Será o Estado que terá de alijar uma grande parte das participações que detém, serão os particulares que terão de aceitar esquemas de falência administrativa para saneamento de deficits incomportáveis.
Em qualquer caso, nesta operação, não podemos desperdiçar uma única estrutura produtiva, não podemos perder um único posto de trabalho.
Define-se, assim, uma das primeiras grandes tarefas que o Governo vai ter de enfrentar no período de 80-84: o saneamento financeiro da actividade empresarial, tanto do sector público como do sector privado.
Mas outras três tarefas se apresentarão como inadiáveis para o período de 80-84:
A formação intensiva de poupança e a sua canalização para investimento;

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O aumento da produtividade do trabalho; A racionalização do Orçamento Geral do Estado e do sector público administrativo.
Analisaremos cada uma das grandes tarefas enunciadas. Nenhum Governo, qualquer que ele seja, lhes poderá fugir sem perpetuar a crise com que nos debatemos. Estamos num domínio onde a demagogia se paga com língua de palmo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Num país em que se destruíram os valores tradicionais dos aforradores, o problema da formação intensiva de poupança exige grande realismo e determinação.
Ocuparam-se casas e deixaram-se degradar os rendimentos imobiliários; nacionalizaram-se empresas cujas acções ainda não foram indemnizadas; ocuparam-se e expropriaram-se terras que continuam por indemnizar; ocuparam-se empresas quer pela acção directa dos trabalhadores, quer pela intervenção do Estado.
Aos aforradores restam os depósitos a prazo cujas taxas de juro não chegam a cobrir a taxa de inflação, as jóias e os metais preciosos, as obras de arte, a aquisição de habitação própria.
O problema está em transformar os aspectos negativos actuais em elementos motores de sinal positivo.
As carências em habitação podem dar lugar ao incremento da aquisição de habitação própria. Com esquemas de financiamento adequados aumentaremos a poupança, reduziremos o impacte do consumo sobre a balança de transacções correntes e criaremos mais postos de trabalho. O financiamento de 50 000 novos fogos por ano em condições acessíveis às classes de rendimentos mais baixos está já estudado e é possível.

Risos do PS e do PCP.

Eu acho que as gargalhadas são boas, mas terão a sua resposta adequada, e julgo que dentro em breve.
O problema da habitação em Portugal só pode resolver-se com a aquisição de habitação própria. Proporcionar casa própria a todos os cidadãos é um desafio que vai demorar tempo a cumprir, mas que a Aliança Democrática deverá aceitar.
A degradação das rendas de casa só poderá encontrar uma solução que seja menos injusta para os senhorios e política e socialmente aceitável para os inquilinos, desde que «e avance decididamente nos esquemas que possibilitem a aquisição pelos inquilinos das casas que habitam, em condições de financiamento suportáveis.

Aplausos do PSD e do CDS.

A questão está em transformar obrigatoriamente os pagamentos efectuados pelos inquilinos, ao abrigo de esquemas de financiamento acessíveis, em novos investimentos com níveis de remuneração adequados e motivantes.
As enormes massas de capitais investidas em habitações alugadas podem ser transformadas em novos investimentos atractivos. A intensificação da poupança ao nível dos inquilinos com o objectivo de amortizar os financiamentos obtidos, para aquisição de habitação própria, pode representar uma operação de efeitos espectaculares e resolver o problema escaldante das rendas de casa.
Por outro lado, a mobilização das indemnizações para investimento será outra forma de aproveitar eficazmente poupanças acumuladas no passado. É preciso que os aforradores voltem a acreditar num conjunto de valores referenciais e que tenham à sua disposição instrumentos adequados de estimulação da poupança e da sua canalização para investimento.
No binómio poupança/investimento tantos cuidados nos devem merecer os instrumentos que favoreçam e dinamizem os investimentos como aqueles que permitam a criação e canalização das poupanças a aplicar nesses mesmos investimentos.
A Aliança Democrática, ganhando as próximas eleições de Outubro...

Vozes do PCP. -Querias!?

O Orador: -... e estabelecendo um programa político solidário com um novo Presidente da República, poderá trazer ao País a estabilidade política e social que radique a confiança dos aforradores. Só essa confiança nos poderá livrar de uma atitude conjunturalista permanente de curto prazo para proporcionar horizontes rasgados e uma visão de médio prazo.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Estamos ainda num país de aplicações a noventa dias, queremos ser um país de investimentos reprodutivos a longo prazo.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Estimulando a poupança estaremos em condições de suportar maiores ritmos de desenvolvimento com menores riscos no domínio da inflação e menores gravames para a balança de transacções correntes.
Paradoxalmente foram os partidos que mais criticam a sociedade que denominam «de consumo» os que mais contribuíram para a destruição dos mecanismos de captação de poupança.

O Sr. Amando de Azevedo (PSD): -Muito bem!

O Orador: - São esses mesmos partidos que têm medo de ver mais amplamente representados nesta Câmara os cidadãos que residindo no estrangeiro enviam para Portugal as suas poupanças.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Daqui se conclui que o significado político profundo dos incentivos à poupança é considerado perigoso para as ideologias defendidas pelos partidos da oposição.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Assim, às razões económicas que impõem o estímulo à poupança temos de acrescentar poderosas razões políticas.

Aplausos do PSD e do CDS.

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Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não precisaremos de pedir ao povo português nem sangue nem lágrimas. Estamos em paz. Mas teremos de pedir ao povo português o seu suor.

Vozes do PCP: - Ah, isso!

O Orador: - Verificamos que para certos Deputados de certa bancada, o suor dos trabalhadores é coisa que não se deve pedir.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Valha-nos essa franqueza!

O Orador: - A nossa força de trabalho é a nossa maior riqueza.

Vozes do CDS: - Muito bem!

Protestos do PCP.

O Orador: - Não podemos desperdiçá-la. Trabalho em cada dia mais justamente remunerado, em cada dia mais produtivo. Trabalho no seu sentido mais lato. Trabalho de quem decide, de quem imagina, de quem arrisca, de quem usa os seus braços, mas todo ele trabalho digno, útil, reprodutivo.. Portanto, suor de quem trabalha e não suor de quem tem apenas calor.

Risos do PSD e do CDS.

É preciso que cada médico que concede uma baixa injustificada, cada trabalhador que falta ou mantém baixa a sua produção, cada empresário que mantém obsoletos, os seus equipamentos ou desmotivados os seus trabalhadores, sinta que a sua acção é reprovável, que a sua atitude está a sapar o progresso do País e o bem-estar dos seus concidadãos.
Combater o absentismo, aumentar a produtividade, melhorar o nível tecnológico das nossas actividades económicas, constituem outra das grandes tarefas do presente e do futuro.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Chegamos, assim, à última das grandes tarefas enunciadas: racionalizar o Orçamento Geral do Estado e o sector público administrativo.
Esta é uma área em que teremos de arrostar com o conservadorismo imobilista, com as concepções clássicas que se manifestam tanto à esquerda como à direita.
Em matéria de despesas, a Aliança Democrática foi encontrar uma casa desarrumada, e numa casa desarrumada toda a gente se sente à vontade para deitar papéis para o chão.
Em nosso entender, a racionalização do Orçamento passa forçosamente por uma arrumação das despesas que diferencie o passado, o presente e o futuro, que não subsidie por um lado para ir cobrar em impostos por outro, que. distinga prejuízos de subsídios, que ponha fim aos ciclos viciosos de um Estado que não recebe porque não paga e não paga porque não recebe.
O Estado está hoje numa situação idêntica à de uma grande empresa falida, tem deficits acumulados, uma estrutura de custos indirectos pesada de mais para a actividade produtiva que a suporta, vive assoberbado pelos deficits de tesouraria tanto externos como internos.
E tal como uma empresa precisa de um período de carência durante o qual os credores aguardam que a actividade se reorganize propiciando numa nova fase a solvência dos seus créditos. Também o Estado Português precisa de uma trégua orçamental que lhe permita inverter a deterioração em que se arrasta.
Se relativamente aos credores externos e ao público em geral o Estado Português tem de continuar a solver os seus compromissos com regularidade, o mesmo não é imperativo no que respeita as instituições de crédito nacionais.
Poderá assim ser possível, por exemplo, arrumar o serviço de divida pública dos anos de 1981 e 1982 num fundo de estabilização orçamental, financiado pelas instituições de crédito portuguesas.
O país terá no entanto de contrair o compromisso de amortização nos restantes anos da década de 80 os financiamentos feitos ao fundo nos anos de 81 e 82. Dir-se-á que esta é uma operação de simples cosmética orçamental mas a ideia que defendemos' não é de mascarar a realidade. Bem pelo contrário, a nossa intenção é explicitar a realidade. É preciso que o Pais saiba que as dívidas contraídas pelo Estado nos últimos anos custarão em 1980 (amortizações e juros) cerca de 65 milhões de contos. E ainda que com estes 65 milhões de contos o Estado está longe de satisfazer os seus compromissos. É o caso das indemnizações e do crédito mal parado acumulado no sistema bancário.
Queremos, naturalmente, que os Portugueses tirem deste facto as correspondentes ilações políticas, mas queremos, sobretudo, habituar os gestores do Estado e os governos a níveis de deficits mais reduzidos e ao compromisso inalienável de no futuro criar as condições que permitam amortizar o passado.
Outro exemplo diz respeito à constituição de uni fundo de recuperação de empresas, que absorvesse os prejuízos acumulados nos últimos anos. Um tal saneamento permitiria às empresas recuperar capacidade de financiamento junto da banca. Por outro lado, a contabilização dos juros e das amortizações tem de ser feita em termos adequados à taxa de inflação.
Outro aspecto a ter em conta diz respeito ao património imobiliário do Estado e das empresas públicas. O Estado carece de edifícios para instalar os seus serviços administrativos, para escolas, hospitais, etc. Porque razão deverá o Estado continuar a ser proprietário de edifícios que não têm qualquer valor cultural e valem apenas pela sua utilização funcional? O Estado deve passar de proprietário a locatário, vendendo património sem valor cultural a sociedades de investimento imobiliário que vão captar à poupança privada os recursos disponíveis. Contratos de locação com prazos longos, garantias adequadas, e rendimentos indexados poderão tornar os rendimentos provenientes dos títulos de tais sociedades adequados à situação inflacionária actual.
O que se refere a propósito da venda de património existente é da mesma forma adequado para novos edifícios, a construir. Esta será uma forma de canalizar para fins sociais capitais privados aligeirando as necessidades do Estado em termos de despesas do capital.

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Estas sugestões poderão ser veemente criticadas. Mas nós não defendemos um Estado capitalista. Defendemos um Estado que optimize os recursos financeiros, tanto públicos como privados, utilizando-os imaginativamente e pondo à disposição dos cidadãos um máximo de utilidade social.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Decididamente não queremos um Estado proprietário e patrão.

Uma voz do PS: - Só da imprensa é que è patrão!

O Orador: - Queremos um Estado social.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Quer o Melo!

O Orador: - Tais operações poderiam fazer baixar o deficit global do Orçamento para valores da ordem das escassas dezenas de milhões de contos apresentando um Ornamento que equilibrado. Seria uma tal prática demagógica? Ou antes 'um esforço para utilizar de forma diferente os recursos actualmente existentes que se repartem entre o Estado e os cidadãos?
Ainda uma palavra sobre a organização do sector público administrativo.
É urgente a criação de centros de responsabilidade autónomos. É confortável estar à mesa do orçamento sem cuidar de saber se os serviços que e prestam representam uma contrapartida aceitável dos gastos que se fazem.

O Sr. Rui Pena (CDS): - Muito bem!

O Orador: - É preciso estabelecer critérios que meçam utilidade social dos serviços públicos e que definam com rigor o cujo unitário de cada serviço.
A gratuitidade dos serviços é uma forma de sustentar a irresponsabilidade recíproca.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Os cidadãos tornam-se menos exigentes porque nada pagam, os servidores desleixam-se porque nada cobram, as hierarquias resolvem todos os problemas sacando sobre o Orçamento.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Não nos repugna que certos serviços deixem de ser gratuitos. Em mossa opinião as transferências do Estado paca os cidadãos devem concentrar-se num número restrito de serviço essenciais: saúde, educação, segurança social, habitação.
Mesmo nestes casos deverão montar-se esquemas que permitam subsidiar cada família de acordo com as suas necessidades específicas. Esperemos que neste aspecto a oposição concorde connosco. Este é um dos slogans preferidos da oposição.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP):- É falso!

A Sr.ª Teresa Ambrósio (PS): - Não são famílias, são os cidadãos!

O Orador: - A Aliança Democrática não só vai cumprindo o seu programa como st propõe dar conteúdo prático aos slogans da aposição.
Sr. Presidente, Srs Membros do Governo, Srs. Deputados: A propósito do Orçamento e do Plano para 1980 ralamos do futuro, dizemos sugestões, tentamos construir.
Algumas das ideias apresentadas são certamente controversas. É também para discutir ideias controversas que esta Assembleia existe.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: - Como o Sr. Presidente da República afirmou no dia 25 de Abril, a Revolução não continua. A Revolução acabou.

Uma voz do PCP: - Acabou?'

O Orador: - Temos à nossa freme para percorrer o caminho da democracia e do progresso.

Aplausos, do PSD, do CDS e do PPM.

Entretanto reassumiu a presidência o Sr. Presidente Leonardo Ribeiro de Almeida.

O Sr. Luís Coimbra (PPM): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr Presidente: - Para que efeito?

O Sr. Luís Coimbra (.PPM):- É para um ligeiro e curto protesto em relação a intervenção do meu colega de bancada Dr. Luis Barbosa.

Uma voz do PS: - Dá saneamento!...

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Luís Coimbra (PPM): - É apenas para corrigir um número que o Dr. Luís Barbosa forneceu e que, aliás, há pouco eu também tinha referido na minha intervenção: é que não foram 30 milhões de contos para o sector público, mas sim 33.2 milhões de contos.
Portanto, houve aí um ligeiro esquecimento sobre os 3,2 milhões de contos de dotações para o Gabinete da Área de Sines, Gabinete esse que - como toda esta Casa sabe - tem sido um exemplo, pela negativa, do que não é ou do que não deve ser o planeamento em Portugal e de como não se devem gastar despesas públicas neste país.

Aplausos do PPM, do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Barbosa para, se assim o desejar, responder.

O Sr. Luís Barbosa (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É para, talvez pela primeira vez nesta Câmara, agradecer um protesto.

Aplausos do PSD.

O Sr Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira para formular também pedidos de esclarecimento.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Infelizmente o tempo é curto, o Sr. Deputado Luís Barbosa, logo de início, referiu

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que o debate estava a ser demasiado disperso, com falta de linha técnica definida, sem veia política, etc. Sobre isto, apenas não lhe retiraremos a veia política, porque, de facto, o Sr. Deputado mostrou-a com uma linguagem repassada de saudosismo. Contudo, isso não se verificou quanto à linha técnica; sobre o OGE e o Plano que neste momento estão em discussão nesta Assembleia, o Sr. Deputado não disse nada; sobre a dispersão, conseguiu dizer e dispersar-se tanto que até chegou a referir que estávamos aqui a discutir um Orçamento e um Plano.
No entanto, houve uma sua passagem que não gostaria de deixar passar em claro e que é a seguinte: quando o Sr. Deputado fez contas para chegar ao número dos 100 milhões de contos que estavam incrivelmente a sobrecarregar o Orçamento Geral do Estado, incluiu os- subsídios às empresas públicas, leia-se «as compensações indemnizatórias a empresas públicas pelo fornecimento de serviços a preço inferior ao seu custo, por obrigação imposta pelo Governo, e os subsídios ao (cabaz de compras;»... é claro para o povo português que o que o Sr. Deputado Luís Barbosa acabou de afirmar é que, se a AD eventualmente ganhasse as próximas eleições, ...

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - E vai ganhar!

O Orador: - ...estes subsídios desapareceriam ao «cabaz de comprar»» e desapareceriam os subsídios aos serviços essenciais, como seja o dos transportes.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Barbosa para responder.

O Sr. Luís Barbosa (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Deputado Octávio Teixeira fez a análise da minha exposição, está no seu direito, é a sua opinião e, nesse aspecto, não vou responder-lhe.
Quanto ao problema dos subsídios às empresas públicas, julgo que a sua intervenção significa que o que eu disse bateu no sítio certo, isto é, é um sítio onde doi, e foi com esse muito que, realmente fiz esta afirmação.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Na sua perspectiva, está enganado!

O Orador: - Só queria dizer o seguinte: com certeza que o Sr. Deputado Octávio Teixeira nos fará a honra de não nos considerar parvos de todo. Portanto, essas duas hipóteses que levantou sobre o desaparecimento dos subsídios ar «caba», de comprai» ou dos subsídios aos transportes não é o que nesta altura está em discussão.
Mas, já que falou do «cabaz de compras», gostaria de dizer mais alguma coisa- é que não se afigura possível manter os subsídios do «cabaz de compras» no futuro, nos termos em que tem sido postos até agora. Isto é, é preciso fazei mais justiça social do que a que se está fazendo ...

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - ... porque possivelmente o Sr. Deputado Octávio Teixeira saberá que nesta altura em Vila Real de Santo António, nos supermercados, existam bichas de cidadãos espanhóis que vêm abastecer-se a Portugal com os subsídios que o Fundo de Abastecimento concede às mercadorias essenciais que estão a ser concebidas em Portugal.

Vozes do PSD e do CDS: - Muito bem!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - O Governo é fraco!

O Orador: - Aliás, não foi a Aliança Democrática que enveredou por este caminho, mas sim o Governo gonçalvista, que começou a utilizar o Fundo de Abastecimento para além daquilo que naturalmente seria legítimo.

Vozes do PSD e do CDS: - Muito bem!

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - O fascista é que era melhor!

O Orador: - Mas isto terá de se alterar, porque estamos nesta altura não só a subsidiar, através do Orçamento Geral do Estado, os cidadãos espanhóis das zonas fronteiriças como, por outro lado, estamos a subsidiar igualmente os turistas. Portanto, pergunta-se se realmente estamos a querer desenvolver a nossa actividade turística em Portugal para depois a subsidiar em produtos alimentarei através do Orçamento Geral do Estado.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Não foi possível ao Governo da Aliança Democrática, nos curtos quatro meses que teve pela frente, alterar este esquema para passar a trocá-lo por um outro mais ambicioso de abono de família. A nossa proposta é trocar as verbas que hoje são gastas nestas condições, distribuídas por cidadãos portugueses e estrangeiros, por abono de família gasto única e exclusivamente para os cidadãos nacionais, os mais desfavorecidos,

Aplausos do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Adegas.

O Sr. Mário Adegas (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Ministros e Secretários de Estado, Srs. Deputados: Nos termos dos artigos 94.º e 108.º da Constituição da República Portuguesa, esta Assembleia está a proceder à apreciação das Grandes Opções do Plano e do Orçamento Geral do Estado para 1980.
Mas, decorrido já um terço do período a que respeita, fácil é concluir que, tanto como a exacta definição das grandes opções da política macroeconómica, visando a revitalização das estruturas produtivas e o combate aos principais desequilíbrios da economia portuguesa, importa reflectir sobre as capacidades do Governo para a implementação das medidas decorrentes das próprias opções que, como consta do anexo à proposta de lei do Governo, visarão atingir os seguintes objectivos globais: melhorar as condições, de vida das famílias portuguesas; afrouxar o ritmo da inflação; relançar o investimento produtivo. E, em termos de modelação do sistema económico e de

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opção de política fundamental, o reassumir, plenamente e com vigor, a vontade nacional de integração na Comunidade Económica Europeia.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Ora estas Grandes Opções são a resposta, correctamente formulada, ao projecto político que havia sido submetido a escolha do eleitorado no programa da Aliança Democrática que, como se sabe, conferiu particular ênfase aos domínios económicos o social.
Torna-se, pois, evidente que as opções da política económica e social do Governo não podem ser seriamente contestadas, particularmente no que concerne à melhoria da distribuição de rendimentos, à significativa inversão da política fiscal que vinha sendo fatalisticamente prosseguida e à criação de postos de trabalho (ainda que em número insuficiente) através do relançamento do investimento e de uma prometedora política de emprego.
Mas sejamos claros. O Governo não vai encaminhar o País para uma situação em que resultem totalmente satisfeitas, ou superadas, tais opções como as oposições temem, e, por isso se esforçam por minimizar, como tem sido evidente ao longo deste debate.
Com efeito, o Governo e a maioria parlamentar que o apoia sabem que a realização integral de tão grandiosos objectivos não é possível de ultrapassar no horizonte de 1980, pelo que importa vincar bem, como o Governo aliás séria e expressamente o afirma, que se trata apenas de iniciar o caminho seguro e certo que nos há-de retirar da situação em que nos encontramos de reduzido crescimento económico, elevada taxa de inflação, graves problemas de desemprego e insatisfatório nível de investimento.
Por isso o Governo e a maioria parlamentar sempre consideraram, ao contrário do que foi afirmado pela oposição no primeiro dia deste debate, da maior urgência a aprovação das propostas de lei em apreciação, como forma de actuar mais decisivamente no combate aos desequilíbrios existentes.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E, por isso, se deseja que o Governo aprove de seguida e rapidamente o próprio Plano, logo após a aprovação das Grandes Opções agora em discussão, e concretize a prevista divulgação de um conjunto de directrizes que deverão passar a constituir as bases para as Grandes Opções do Plano a Médio Prazo e a preparação de um vasto programa de investimentos públicos: para o$ próximos anos, naturalmente da maior importância e interesse para a actividade e planos de acção de todo o sector empresarial, quer público, quer privado.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas se a economia portuguesa se encontra sob os efeitos negativos da crise internacional e designadamente da resultante da subida do preço do petróleo e da laxa de juro nos mercados financeiros, situação que as oposições bem conhecem, devíamos nós tentar encontrar o maior consenso técnico e político, para podermos dispor de uma política económica onde a coordenação e o grau de execução atingissem um bom nível.
Mas que vemos nós?
As oposições tentam aproveitar esta oportunidade para desfazerem os primeiros sintomas de estabilização política através de uma discordância sistemática em todas a$ áreas, dificultando, para além do razoável, a recuperação económica, pressuposto essencial do progresso social e, cultural desejado pelo povo português.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E, por isso, permitem-se considerar excessivo o deficit do Orçamento. Mas o deficit, como resultante que é de uma política económica, encontra-se justificado pela própria política prosseguida ...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - ... onde avultam os objectivos do relançamento do investimento, o combate à inflação e a manutenção sob adequado contrôle do deficit previsto na balança de transacções como correntes.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E, por isso, na sua excessiva defesa da Lei das Finanças Locais, a partir de argumentos formais ou meramente ideológicos, não dão, as oposições, o apreço devido ao verificado aumento de 38%, em relação ao ano de 1979, no montante de recursos financeiros que o Governo, através do OGE, põe à disposição dos municípios a que acresce a totalidade das receitas da contribuição predial e do imposto sobre veículos, objecto de aumento pelo verificado ajustamento de taxas e, ainda, a verba de 1,8 milhões de contos incluída no programa de investimentos do Plano ao financiamento de investimentos intermunicipais e o apoio contido na prevista linha de crédito especial para investimentos nos sectores de habitação, saneamento básico, construção de escolas e viação rural.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E, por isso, não reparam que o Governo acaba de lançar uma pedrada no charco no imobilismo do nosso sistema fiscal, de indiscutível amplitude para quem tem responsabilidades de poder apenas há quatro meses e que tem todo o sentido de alteração correctas e duradouras por inverterem a anterior tendência do?, adicionais e dos sistemáticos aumentos da tributação dos rendimentos do trabalho e por se decidir a atacar o cancro económico e social da evasão e fraude fiscais.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E, por isso, as oposições reparam, mas recusam-se a aceitar, por rigidez ideológica, que o Governo está mesmo a lançar as bases de melhoria do clima de confiança indispensável aos investidores nacionais e estrangeiros, a criar um esquema integrado de incentivos fiscais e financeiros ao investimento, a desmistificar a delimitação dos sectores do

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actividade económica, a actualizar a política de crédito, a promover a correcta gestão do sector empresarial do Estado e a apoiar os investimentos da Administração Central e Local.

Aplausos do PSD. do CDS e do PPM.

E, por isso, as oposições, em jeito de intromissão, aguardam que, problemas correntes entre um Governo Centrai e um Governo Regional, designadamente os relativos à cobertura dos deficits das regiões autónomas, com sede de resolução própria em reuniões de trabalho e de estudo dos dossiers respectivos, descambe em divergências políticas que não existem nem existirão.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas podem as oposições estar descansadas quanto à capacidade de concretização de uma autêntica política económica de que as duas propostas de lei, em apreciação na generalidade, são vectores fundamentais.
Por isso, o Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata não tem quaisquer dúvidas sobre o sentido do seu voto, naturalmente por razões político-partidárias, mas também por reconhecer que o nosso país não poderia ter, neste momento, quem melhor do que este Governo mais fundamentadamente pudesse atacar, e com firmeza, os principais desequilíbrios da economia portuguesa,

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

Com efeito, o Governei teve, inclusive na formulação e fundamentação das Grandes Opções, a preocupação de não transformar os desejos ou as necessidades, nomeadamente a de combater o desemprego, em objectivos globais, por obediência ao rigor. Utilizado na compatibilização da própria política económica, sem embargo de lhe conferir a importância devida, como d& resto resulta da análise das medidas enumeradas na política de emprego.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas se de um ponto de vista de preocupações estritamente políticas ainda se compreendem algumas das divergências apresentadas pelas oposições quanto às Grandes Opções do Plano, o mesmo já não sucede com o Orçamento. Geral do Estado, que, como se sabe, não pode deixar de reflectir a situação e as obrigações passadas e a própria circunstância resultante da sua tardia apreciação e aprovação.
E, assim, ainda que admitindo sempre que outras poderiam ser as verbas incluídas nas despesas orçamentais, com a inalterabilidade da maior parte delas por resultarem, por um lado, de propostas devidamente fundamentadas por «parte dos diversos departamentos e, por outro lado, por (traduzirem a assumpção de responsabilidades herdadas do passado como é o caso; por exemplo, dos 49 904 000 contos para encargos da dívida pública e 11 milhões de contos de subsídios às empresas 19 milhões de contos para aumentos de capital estatutário. È mesmo de notar, neste particular, que isso provavelmente as oposições não esperassem tanto no que concerne à verba considerada para aumento de capital das empresas públicas, no sentido da clarificação das suas situações patrimoniais ainda que acompanhado da estagnação de subsídios (togo diminuição em termos reais) tradutora de uma opção fundamental em que avulta a necessidade de se desmistificar o próprio funcionamento do sector público, cuja eficácia e prestígio defendemos, nunca pairem como resultado de solidariedade de objectivos ideológicos patente, no discurso da oposição.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: -Mas do lado das receitas orçamentais efectivas o Governei vai mais longe, introduzindo mesmo alterações! significativas no campo da política fiscal.
Assim, e desde logo por concretizar nesta proposta a redução do peso de tributação sobre os rendimentos do trabalho e pessoais e por dar mostras de se empenhar no combate frontal à evasão e fraude fiscais de que tem de sair vitoriosos, não obstante a magnitude do problema até por acumulação excessiva de situações antigas (com significativa responsabilidade do Partido Socialista) e cujo êxito terá efeitos de acrescido prestígio para o Governo em geral e para o Ministério das Finanças e do Plano em especial, que as oposições) dificilmente poderão minimizar neste seu jeito de oposição sistemática, ainda quando são os interesses do próprio Estado que estão em jogo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Participantes nesta face do debate na generalidade, queremos deixar bem clara a nossa total concordância à proposta das Grandes Opções e do Orçamento Geral do Estado, sem a preocupação de repetir os convincentes argumentos de fundamentação constante: nos próprios documentos a que se. juntaram informações adicionais apresentadas pelos Srs. Membros do Governo nas reuniões efectuadas no seio das próprias comissões especializadas e nos debates no Plenário de que me permito destacar, pela responsabilidade directa, na elaboração das próprias propostas, as convincentes intervenções do Sr. Ministro das Finanças e do Plano pela alta competência demonstrada e pela convicção e confiança política que são uma realidade segura no seio da Aliança Democrática e cuja impressão altamente favorável na opinião pública traz preocupados os próprios adversários.

Aplausos do PSD, do CDS É do PPM.

À maioria parlamentar e a esta Assembleia não compete apresentar, na apreciação ma generalidade, objectivos globais diferentes dos preconizados nas Grandes Opções do Plano e Orçamento Geral do Estado diversos dos apresentados pelo. Governo, mas sim pronunciar-se sobre o mérito das propostas e reflectir sobre, as: críticas formuladas pelas oposições, inclusive através de alternativas que até agora se não vislumbraram.

Vozes do PSD: - Muito bem!

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O Orador: - A intensidade e a quantidade das criticas não tiveram, porém, até agora, objectivos construtivos. Esperemos pelo debate na especialidade.
Mas deixemos desde já, para finalizar, transmitida uma preocupação e formulado um pedido ao Governo em nome do Grupo Parlamentar do PSD. A preocupação surge da necessidade de melhorar significativamente a execução do OGE, que estamos certos este Governo garantirá, ao contrário dos Governos anteriores, não apenas na sua. expressão quantificada, mas principalmente na eficiência económica e social, na. execução das despesas e na eficácia, equidade, e justiça na cobrança das receitas por julgarmos: que muito do êxito ou êxito da política orçamental depende dos ganhos ou melhorias a obter na sua fase executiva. O pedido consiste em que o Governo considere de alta prioridade o rigoroso cumprimento dos prazos normais de elaboração e apreciação do Orçamento Geral do Estado e da formulação das Grandes Opções do Plano para o próximo ano, por forma que o mesmo Governo, ou o que se lhe seguir, e esta Assembleia da República, com esta. O PJ diferente composição, aprovem atempadamente estes poderosos e decisivos documentos da vida económica e financeira do País, eventualmente com acrescida possibilidade de contribuírem para a melhoria das condições de vida dos Portugueses.
É tempo de os Governos não deixarem de accionar os mecanismos normais ou deixarem atrasar trabalhos importantes, como aconteceu com o V Governo, para fundamentar e possibilitar as escolhas políticas adequadas, em tempo oportuno.
Pela nossa parte, temos a certeza de que este Governo accionará, desde já, os mecanismos necessários e providenciará pelo imediato arranque de todas as tarefas preparatórias que, aliás, devem revestir a natureza de acto normal na Administração Pública.
Também aqui se provará que este é o Governo da mudança, para bem do progresso material, social e cultural dos portugueses e para prestígio e reforço das instituições democráticas que possibilitam, cora as divergências aqui tão duramente sentidas, que as leis se façam e se aprovem.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Não havendo pedidos de esclarecimento, tem a palavra para uma intervenção o ST. Deputado José António Veríssimo.

O Sr. José António Veríssimo (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: que até ao momento foi dito, durante este debate, acerca da Lei das Finanças Lotais confirma plenamente o que temos vindo a afirmar e a denunciar: que a Lei das Finanças Locais não é cumprida na proposta de lei do OGE apresentada pelo Governo e que, em consequência, as autarquias locais serão defraudadas em cerca de 25 milhões de contos.
Da nossa parte, PCP, deixamos bem clara, mais uma vez, a nossa oposição frontal a este atentado à lei, à autonomia do Poder Local e aos interesses das populações, e por isso mesmo entregámos já na Mesa uma proposta de alteração, com vista a devolver as autarquias locais os 25 milhões de contos a que têm direito e que o Governo lhes quer tirar.
Entendemos hoje, como quando aprovámos a Constituição e como quando aprovámos a Lei das Finanças Locais, que o reforço do Poder Local é uma componente necessária à defesa da democracia.
A resolução de uma larga área dos problemas concretos das populações faz-se em democracia; e faz-se em democracia com a garantia de um Poder Local forte que disponha dos meros financeiros e dos instrumentos necessários.
Da nossa parte, PCP, afirmamo-nos, sem tibiezas, neste sentido: estamos com a devida aplicação integral da Lei das Finanças Locais, como estamos e estaremos com a defesa da autonomia do Poder Local.
O debate serviu, entretanto, também para mostrar que a perspectiva do Governo e dos partidos que o apoiam é, precisamente, a contrária.
O Sr. Ministro das Finanças pretendeu convencer-nos de que o Governo cumpriu integralmente a lei e veio dizer que a oposição nos seus cálculos entrou erradamente em linha de conta com os encargos de pessoal. O Ministro ignorou quo os diversos partidos, a Comissão de Administração Interna e Poder Local, os técnicos do MAI e o próprio Governo Mota Pinto estiveram de acordo com a aplicação a este respeito da interpretação tradicional na Administração Pública que integra as despesas de pessoal nas despesas correntes. Tal integração foi aliás praticada no Orçamento Geral do Estado até 1978, ano em que foi elaborada a Lei (ias Finanças Locais.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A vingar o absurdo ponto de vista do Governo ficaria aberto o caminho possível para um qualquer Ministro Cavaco e Silva violar a lei e defraudar as autarquias: bastaria ir alterando os critérios de classificação das despesas do Estado e a verba para as autarquias ir-se-ia reduzindo, reduzindo cada vez mais.
A lei não tem duas leituras: os partidos do Governo que aqui em 1978 aprovaram a lei, esses sim, é que (em duas posições, conforme estão ou não no Governo...

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - O PCP &ó tem uma: sempre, sempre pela ditadura do proletariado!

O Orador: - Numa outra linha de considerações afirmaram aqui os membros e os apaniguados do Governo que as autarquias locais não estariam em condições e não teriam capacidade para aplicar as verbas que lhes cabem por força da Lei das Finanças Locais. Trata-se de um argumento estafado e é bem que se diga, hoje e aqui. que é o mesmo argumente que o povo português ouviu durante dezenas de anos: o de que não estava preparado para a democracionarem tinha capacidade para servir os seus próprios interesses.
Tal argumento vaie o que vale e caracteriza quem o produz!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas tal como o povo português demonstrou, nos últimos anos, que quer a democra-

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cia, que a vive e que saberá defendê-la, que se desenganem os detractores do Poder Local: as populações e os seus eleitos nas autarquias saberão defender o Podei Local contra quem quer torpedeá-lo. Não espanta que das bancadas da maioria se tenha vindo aqui admitir que a aplicação integral da Lei das Finanças Locais entra em contradição com o poder do Estado, o que leva em linha recta a considerar que, para esses, atrás de cada autarca deveria haver um agente do poder do Estado ou, o que seria mais fácil, cada presidente da câmara deveria ser nomeado pelo Governo.
Mas quem argumenta assim quer esconder as responsabilidades da Administração Central no apoio às autarquias locais e ocultar a real capacidade de realização que estas demonstram. Podem citar-se centenas de freguesias e concelhos em que o valor global das realizações efectuadas é muito superior à sua capacidade de investimento financeiro, dada a participação voluntária das populações, coisa que Poder Central jamais foi ou seria capaz de promover e assegurar.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

Segundo estatísticas divulgadas pelo MAI, a participação das autarquias locais nas despesas públicas, no período de 1963-1976, variou entre os 20,7% e os 60,9% nos restantes países capitalistas europeus. Com a aplicação integral da Lei' das Finanças Locais essa percentagem passaria a ser em Portugal da ordem dos 16%, inferior portanto, mesmo assim, aos mais baixos daqueles valores. Com a proposta de lei do OGE para 1980 essa percentagem será de 9,2%, regressando-se assim a um nível inferior ao verificado no último ano do regime fascita, em que a descentralização não existia e em que a percentagem foi de 9,3%. É esta a verdade. É este o caminho de regresso por onde a AD e o Governo Sá Carneiro Freitas do Amaral pretendem levar o povo e o País.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Ministro das Finanças diz que o Governo transferirá este ano mais 38% de verbas para as autarquias. Mas o que o Sr. Ministro não diz é que se a lei tivesse sido cumprida em 1979 o aumento das receitas de capital das autarquias teria sido 92%. O que o Sr. Ministro das Finança não diz é que a inflação medida em termos de índices de revisão de preços das empreitadas é bastante superior à taxa média dos 24%, pelo que absorve o aumento das verbas de capital a transferir.
Contra a usurpação» que este Governo pretende cometer face aos direitos do Poder Local, o Partido Comunista Português propõe a esta Assembleia e continuará firmemente a bater-se pelo cumprimento integral da Lei das Finanças Locais na lei do OGE, que é dizer, o cumprimento da Constituição da República.
Daqui reiteramos aos eleitos dos órgãos de Poder Local e às populações a nossa convicção de que, contra a ambição e a prática da AD e do Governo Sá Carneiro/Freitas do Amaral, o Poder Local democrático continuará a desenvolver-se e a prestigiar-se, porque, como tudo tem demonstrado, o 25 de Abril está vivo e bem vivo.

Aplausos do PCP e do MDP l CDE.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Fernando Roriz.

O Sr. Fernando Roriz (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O tratamento da Lei das Finanças Locais no OGE e cuja discussão estamos procederão foi, sem nenhuma dúvida, e esta última intervenção do Sr. Deputado do Partido Comunista confirma-o amplamente, um dos temas de força da oposição na sua tentativa de inculcar no espírito da opinião pública a ideia de que o Governo, para além de não pretender dar vigor ao princípio da descentralização do poder, busca por atalhos e travessas travar o seu passo, nele travando a perspectiva democrática que presidiu à institucionalização dessa lei.
Aqui está aquilo que facilmente se demonstrará ser um sofisma claro da oposição, usado, a maioria das vezes, sem o decoro mínimo que o respeito pela inteligência das pessoas impõe a quem faz política e ao fazê-la não pode deixar de fazer prevalecer a verdade.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Já aqui se demonstrou, sem desmentido minimamente convincente, que a lei foi cumprida no espírito possível da sua formulação, nem sempre clara. Mas o sofisma da oposição, que nos cumpre denunciar, resulta muito mais claro se o projectarmos à luz de uma visão mais simples e directa, por isso mais acessível à compreensão do cidadão comum que nos ouve e pretende entender.
Vejamos: o Orçamento Geral do Estado para o ano em curso, atribui às autarquias uma verba que excede em 9 milhões de contos a do ano de 1979, o que em lermos de percentagem corresponde a um aumento de 38 %, o maior de todos os verificados, de um ano para o outro, desde a vigência da lei. E será que a verba atribuída a essa rubrica poderia ser maior? A oposição grita que o deficit orçamental é excessivo... A oposição não aponta uma despesa - uma só- susceptível de ser diminuída, para que nessa diminuição se encontrasse um reforça possível da verba destinada às autarquias locais.
Em que ficamos então? O que pretende a oposição, afinal? Maior (lotação para 55 autarquias, sem nenhuma diminuição das outras despesas e com a diminuição do deficit orçamental!
Estamos, evidentemente, perante a exigência dt uni milagre financeiro. E a oposição sabe que em finanças os milagres não são possíveis - e em que sector o serão? Logo, ao exigir do Governo aquilo que é impossível à luz da lógica mais elementar, a oposição faz demagogia.
Se assim não é, estará ainda a oposição a tempo de nos dizer onde entende se deve encontrar a receita que satisfaça a sua pretensão de maior aumento para as autarquias. Na saúde? No ensino? No fomento da economia? A oposição não o disse Nem o dirá. Não o dirá, porque não pode nem quer

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apresentar soluções construtivas, apenas interessando em confundir a opinião pública e nessa confusão tentar denegrir um Governo que já demonstrou inteira capacidade de realismo e bom senso.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Só que o povo português sabe raciocinar e não se deixa enganar.
Sobrasse o dinheiro neste Orçamento que reflecte inevitáveis dificuldades, herdadas de um passado de desvario, e certamente ninguém perdoaria qualquer parcimónia na entrega de mais meios ao Poder Local Mas o dinheiro não sobra ... Fosse possível detectarem-se excessos em luxos ou despesas supérfulas deste Orçamento, e nenhum português aceitaria que o Governo regateasse maiores recursos aos autarcas deste nosso país. Mas onde estão tais luxos e exageros?
Fácil é entender, portanto, que a oposição caiu num descarado sofisma. Tão descarado quanto é certo que quem pretende sustentá-la não só não soube fazer melhor quando Governo, como fez muito pior. A prova disso está feita. Foi ela que determinou, nas umas, a derrota da oposição em 2 de Dezembro.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador:- Se o PS, por exemplo, não tivesse sido um confrangedor exemplo da arte de mal governar, decerto não estaríamos aqui hoje, nós, Aliança Democrática, eleitos pelo povo com esperança de uma mudança que o Governo está, de facto, a conceber. Nenhum governo cai por governar bem e por alguma razão a oposição perdeu as eleições de 2 de Dezembro.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José António Veríssimo.

O Sr. José António Veríssimo (PCP): - Queria fazer um curto protesto, Sr. Presidente, em relação à intervenção anterior.
Era de facto, o que faltava ouvir que a oposição estava a sofismar, depois do tipo de intervenções que a direita aqui fez e que não são outra coisa senão um conjunto de sofismas do princípio ao fim. £ vou referir-me a dois deles.
Os senhores sabem tão bem como nós, e se querem esconder isso do povo português nós lembramo-lo, que o cálculo das despesas correntes, e de capital deveriam entrar em conta para o cálculo dos 18% de participação para as autarquias das verbas do OGE. Para isso, basta lembrar a confissão aqui feita neste sentido e neste debate pela voz de dais Deputados da maioria, os. Srs. Deputados Amândio de Azevedo e Rui Pena. Efectivamente nós temos razão, pois as despesas de capital sempre foram consideradas, para efeito da aplicação da Lei das Finanças Locais, por esta Assembleia quando aprovou a Lei das Finanças Locais. O Sr. Deputado Amândio de Azevedo confirmou aqui ontem que o PSD tinha inicialmente estado, no ano passado, contra o Governo Mota Pinto por exactamente esse Governo desrespeitar a foi, fazendo a mesma sonegação das despesas de capital no conjunto das despesas correntes. O Sr. Deputado Rui Pena disse também aqui que o CDS estava unia vez mais, tal como o ano passado, contra a aplicação integral da Lei das Finanças Locais, confessando uma coisa que todos sabíamos e que os senhores querem esconder do povo português. Basta, portanto, ler as vossas intervenções do debate havido acerca do OGE do ano passado.
Finalmente, a outra questão é a do deficit. Também em relação a isto os senhores estão fartos de saber que não haverá deficit orçamental pela aplicação integral da Lei das Finanças Locais. Quando esta foi feita nós sempre sustentámos, e continuamos a sustentar, que ela deveria ser acompanhada de imediato pela elaboração e aprovação, tal como o foi, mas precisando agora de o ser confirmada rapidamente, da Lei de Delimitação e Coordenação dos Investimentos da Administração Central, Regional e Local. Se esta lei for aprovada dentro de dias, como efectivamente pode ser e como temos proposto, os senhores sabem que efectivamente não chegará a haver, devido à aplicação integral da Lei das Finanças Locais, qualquer deficit do Orçamento Geral do Estado, porque ocorrerão transferências de responsabilidades, correlativamente, da Administração Central para a Administração Local.
Portanto, é um perfeito sofisma aquilo que o Sr. Deputado referiu na sua intervenção.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Roriz, para responder. Tenho, no entanto, a informá-lo de que o seu partido dispõe apenas de um minuto.

O Sr. Fernando Roriz (PSD): - Muito rapidamente, Sr. Deputado, queria dizer-lhe que a sua intervenção de agora confirmou tudo aquilo que eu tinha afirmado.
Efectivamente, este problema tem sido aqui abordado numa perspectiva puramente demagógica e demagogia foi também o Sr. Deputado invocar aqui a nossa posição no debate do OGE no Governo Mota Pinto. O Sr. Deputado não conhece os 'pressupostos que levaram à nossa posição e seria conveniente que os lesse no Diário da Assembleia da República, pois quando o fizer não poderá sustentar a afirmação que agora fez.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Quanto ao mais, permanece de pé a questão que aqui pôs: é ou não é verdade que o Partido Comunista, como toda a oposição, considera exagerado o deficit do Orçamento? É ou não é verdade que nenhum partido da oposição apresentou aqui qualquer sugestão, tendente à transferência de verbas que permitisse uma maior dotação para a Lei das Finanças Locais?
Não se fala nisso e é evidente que posto o problema como o Sr. Deputado o pôs continua a fazer-se aqui pura demagogia.

Vozes do PSD e do PPM: - Muito bem!

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O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Além do mais é ignorante!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Sousa Gomes.

O Sr. Sousa Gomes (PS): - Sr. Presidente, Srs, Deputados, Srs. Membros do Governo: Em 1980, seis anos depois do regresso à vida democrática em Portugal, a aplicação integral do novo regime de finanças locais consagrado na Lei n.º 1/79, aprovado por unanimidade na Assembleia da República, é uma questão vital para todos os que desejam efectivamente a construção do Estado democrático.
Para o Grupo Parlamentai do Partido Socialista, a importância política que assume a aplicação, ou não, desse novo regime resulta, como é evidente, de que não existirá em Portugal um Poder Local democraticamente .representativo sem a prática real de mm mínimo de autonomia financeira, como- a consagrada na Lei n.º 1/79. Julgo que nenhuma das forças políticas representadas nesta Assembleia aceita pôr em causa a necessidade dessa autonomia e a sua tradução na atribuição dos recursos financeiros previstos na lei. A provar esta posição está, a meu ver, o voto positivo e por unanimidade que recolheu a referida lei. Estão sobretudo as próprias declarações políticas que cada partido quis formular como. explicitação do seu voto.
Acontece que, se ninguém parece querer pôr era causa de fornia explícita o regime consagrado ma Lei n.º 1/79, a verdade é que a AD e o seu Governo vêm, no âmbito da aprovação da Lei do Orçamento para 1980, tornar claro que afinal não querem ver aplicado o novo regime das finanças locais.
Com efeito, a proposta do Governo recusa a transferência para as autarquias municipais dos recursos financeiros que resultariam da aplicação dos mínimos fixados na Lei.
Admitimos que a AD, no desejo de evidenciar mudanças, não defenda, já o, regime das finanças locais, que os partidos que a integram aqui votaram. Mas então que o Governo AD tenha a coragem de; explicitar claramente essa mudança. Mas então que apresente na Assembleia da República à maioria que o apoia a sua proposta de revogação ou revisão da Lei das: Finanças Locais. Só que, se o fizesse, temos dúvidas de que o Governo encontrasse o apoio necessário por parte da sua própria maioria parlamentar. Por isso preferiu o Governo, de forma escondida e nem sequer justificada, propor uma aplicação parcial, mas não legítima, da Lei n.º 1/79. Com isso o Governo AD defrauda todos- os portugueses que acreditam na necessidade de um Poder Local democrático, mostra ainda que não cumpre o que prometeu no seu programa.

Vozes do PS:- Muito bem!

Vozes do PSD: - É falso!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como poderão os eleitos autárquicos acreditar mais na existência de um regime de autonomia financeira, se a própria Lei n.º 1/79, aprovada por unanimidade for derrogada na sua aplicação pelo voto dos que, sendo hoje maioria, participaram na aprovação dessa Lei?
Não aceitamos que se (invoque o facto de não ter sido já possível em 1979 fazer cumprir integralmente a Lei n.º 1/79. O regime de aplicação parcial aprovado para 1979 decorreu de normativos previstos na própria Lei, como foi o caso da inexistência da delimitação das responsabilidades entre a Administração Central e a Administração Local em matéria de investimentos.
Acontece que essa delimitação foi entretanto aprovada, também por unanimidade, em 27 de Julho último. Acontece que nova aprovação na generalidade, na reapreciação do diploma, em 26 de Fevereiro deste ano, foi feita. A votação na especialidade encontra-se desde essa data nas mãos da decisão da maioria e não é por isso legítimo ao Governo invocar que ignora a aprovação já feita.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao contrário das afirmações alteradas pelo Governo de que as autarquias viram os seus recursos aumentados, a proposta apresentada representa mesmo, em termos globais, um retrocesso. Com efeito, não basta dizer que o Fundo de 'Equilíbrio Financeiro tem este ano mais 4 milhões de contos. É preciso dizer que as verbas atribuídas este ano ao Fundo de Equilíbrio Financeiro correspondem a uma percentagem de cerca de 10%, e não de 18%, como mínimo fixado na mesma Lei. Ë preciso ainda dizer que a dotação para o Fundo de Equilíbrio Financeiro é em termos reais 25% inferior à de 1979.
De que tem medo o Governo AD ao recusar o que é devido às autarquias? Deixou de acreditar no mérito da descentralização? Pensa que afinal a autonomia financeira, nos níveis mínimos fixados .pela Lei n.º 1/79, é excessiva? Considerará o Governo incapazes os responsáveis autárquicos eleitos pelo voto democrático? Não o sabemos. Nada está justificado na proposta do Governo.
Mas vai mal o Governo da AD se minimiza como pretende a questão da autonomia financeira dos municípios, se julga que o Poder Local é um mal menor que não tem ainda direito de maioridade. E não se utilize o argumento de que os recursos colocados à disposição dos municípios são excessivos. A aplicação da Lei n.º 1/79 tornaria a participação da Administração Local responsável por cerca de 15% das despesas do sector público (e não de menos 10%, como actualmente). Ora, as finanças locais são responsáveis por níveis da despesa pública significativamente mais elevados, entre 27% e 30%, na grande maioria dos países da Europa onde nos pretendemos integrar.
Do mesmo modo não se argumente com o agravamento do deficit global do OGE, que a aplicação integral da Lei n.º 1/79 poderia originar. O aumento dos recursos a atribuir aos municípios, por corresponder à transferência de despesas de capital ainda mantidas na Administração Central, não conduz forçosamente ao aumento do deficit.
Queremos deixar claro que a nossa rejeição da proposta do Governo tem sobretudo a ver com a questão de fundo da não aplicação integral da Lei n.º 1/79. No entanto, não podemos deixar de fazer referência a alguns outros aspectos que nos parecem inaceitáveis.
O que entende o Governo por investimentos intermunicipais, previstos no artigo 33.º da sua proposta?

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Quer-se retomar de forma encoberta a atribuição de subsídios a certos investimentos por parte da Administração Central? Porque não se aguarda, nesta matéria, pela aprovação final da lei de delimitação dos" investimentos? Os municípios não foram ouvidos neste assunto e causa estranheza a inclusão no articulado da lei orçamental de matéria não coberta pela legislação de base relativa às autarquias locais, legislação que é da competência exclusiva da Assembleia da República.
Por outro lado, o Governo anuncia, magnânimo, a fixação de uma linha de crédito especial, sem referir os termos e condições da sua concretização, embora, ao que se depreende do n.º 3 do artigo 33.º, destinada apenas aos tais investimentos intermunicipais. E então como pensa o Governo efectivar a bonificação dos empréstimos municipais previstos na Lei n.º 1/79 e regulamentados, aliás, de forma assaz incompleta e precária, no Decreto-Lei n.º 258/79.
Finalmente temos que denunciar a duplicação de recursos colocados à disposição das Finanças Distritais em termos que desrespeitam uma vez mais a Lei n.º 1/79 e que não tornam possível quaisquer ilusões quanto ao tipo de utilização que tais dinheiros vão ter.
Um novo espírito centralizador e restauracionista »e revela em toda a proposta do Governo. Se dúvidas restassem da leitura do articulado da proposta do Governo AD sobre o sentido de recusa em aplicar integralmente a Lei n.º 1/79 aí está o relatório da proposta governamental a mostrar o jeito tutelar da Administração AD sobre a gestão financeira da Administração Local. Assim esquece-se a autonomia que a lei confere aos municípios e definem-se quais vão ser os saldos das despesas correntes e dt capital, e mesmo a sua eventual aplicação. Ao que parece, o Governo considera possível a formação de forte poupança corrente através da contenção que se verificará nas despesas de pessoal da Administração Local (leia-se limitação aos aumentos salariais) e consegue ainda prever uma poupança nas despesas de capital. Mas afinal aceita-se ou não a autonomia financeira do Poder Local? Mas afinal quer-se permitir o crescimento de uma Administração Local ou deseja-se voltar ao centralismo do antigo regime?
Porque não é capaz, entretanto, o Governo AD de formular as condições de harmonização dos investimentos públicos e de programar os níveis de despesa pública a realizar pela Administração Local, no âmbito da regionalização do Plano, como previsto de resto na Lei n.º 37/77. A esse nível, sim, existirá legitimidade na programação das metas globais, existirá a possibilidade de debate público das questões principais, existirá legitimidade democrática para compatibilizar os objectivos nacionais com as tarefas cometidas à Administração Local.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Socialista não poderá deixar de recusar o seu voto à proposta do Orçamento relativo às Finanças Locais. Mas não o faz apenas por discordância das formulações apresentadas pelo Governo AD, fá-lo sobretudo porque rejeita o espírito centralizador que enforma a posição do Governo. Fá-lo, ainda, porque a recusa em aplicar integralmente a Lei n.º 1/79 é uma mudança de regresso ao passado, é atoai mudança de recusa da construção democrática do Poder Local, é uma mudança que não serve o povo português.

Aplausos do PS, do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Ferreira do Amaral.

O Sr. Ferreira do Amaral (PPM): - Queria fazer um pedido de esclarecimento ao' Sr. Deputado Sousa Gomes.
O pedido de esclarecimento, e que me parece que não foi feito também quanto às intervenções anteriores, diz respeito às críticas das oposições em relação ao deficit do Orçamento, já que têm criticado continuadamente a escassez de verbas nos vários sectores do Orçamento e agora em relação às finanças locais a crítica parece ser reproduzida sistematicamente., esquecendo que o Orçamento consagra mais 35% de verbas para as autarquias locais do que em 1979, o que não pode ser, de forma nenhuma, considerado um retrocesso em relação ao centralismo, mas sem dúvida um poderoso e significativo avanço relativamente ao reforço do poder local. Ora a pergunta concreta que lhe queria pôr era a de saber se para o Sr. Deputado Sousa Gomes, que é um brilhante engenheiro e portanto um homem com formação matemática, para que dois e dois possam somar quatro e para que possamos extrair alguma conclusão da sua intervenção -toda a oposição não deve limitar-se a criticar, mas deve sim propor também a alternativa que sugere para aquilo que critica - o Governo deveria aumentar as verbas para as finanças locais, aumentando ainda mais o deficit orçamental, ou aumentar ainda mais a carga fiscal, aumentando assim as receitas, ou se então o Orçamento no capítulo de despesas deve ser cortado, deve ser cerceado para efeitos de obter o resultado que o Sr. Deputado Sousa Gomes pretende.

O Sr. Luís Coimbra (PPM): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Gomes, para responder.

O Sr. Sousa Gomes (PS): - Penso que a resposta a esta questão está na minha intervenção. Talvez o Sr. Deputado não lhe tenha prestado a atenção devida e, por isso, vou facultar-lhe o texto respectivo. Não tendo, por outro lado, o meu grupo parlamentar muito tempo disponível, fitarei à sua disposição na discussão na especialidade para lhe dar todos os outros esclarecimentos complementares que sejam necessários,

O Sr. Presidente: - Não há, neste momento, nenhuma inscrição para intervenção, Srs. Deputados.

Pausa.

Como nenhum Sr. Deputado pretende usar da palavra, a Mesa suspende por agora os trabalhos, retomando-se às 21 horas e 30 minutos a sua continuação.

Está suspensa a sessão.

Eram 19 horas e 45 minutos.

No reatamento dos trabalhos reassumiu a presidência o Sr. Presidente Leonardo Ribeiro de Almeida.

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O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.

Eram 21 horas e 55 minutos.

Srs. Deputados, informo o Plenário de que não há oradores inscritos.

Pausa.

Srs. Deputados, a Mesa está a aguardar que os Srs. Deputados que desejem usar da palavra façam as. suas inscrições.
Entretanto, informo que a distribuição de tempo é neste momento a seguinte: o Governo dispõe ainda de trinta e quatro minutos, o PS dispõe de 15 minutos, o PCP dispõe de vinte e nove minutos e trinta segundos, o CDS dispõe ainda de dez minutos e trinta segundos, o PPM dispõe de cinco minutos, o MDP/CDE dispõe de doze minutos e trinta segundos, a UDP dispõe de oito minutos e trinta segundos e os Srs. Deputados reformadores dispõem de cinco minutos e trinta segundos. O PSD já esgotou o seu tempo. Como tal, temos ainda cerca de duas horas e trinta minutos de debate.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Veiga de Oliveira.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Deputados e Srs. Membros do Governo: A política fiscal deste Governo da AD, deste Governo de Sá Carneiro...

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - E de Freitas do Amaral!

O Orador: -... e de Freitas do Amaral...

Risos do PSD, do CDS e do PPM.

..., é por si só um retrato de corpo inteiro...

Uma voz do CDS: - Essa é do Vital Moreira!

O Orador: - ...da direita reaccionária e restauracionista...

Risos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - E o social-fascismo do PCP?

O Orador: -... que se esconde por detrás de promessas demagógicas e eleitoralistas.

Risos do PSD. do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peco-vos que mantenham o silêncio necessário para que o orador possa ser escutado em condições normais.

O Orador: - Se os Srs. Deputados fizerem um pouco de silêncio será mais rápido e dói menos.

Aplausos do PCP.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Jantaram bem e comeram melhor!

O Orador: - De facto, as propostas, promessas e palavras dos responsáveis da AD e, em particular, do Primeiro-Ministro Sá Carneiro e do Ministro das Finanças, Cavaco Silva, não são o que parecem, mos atestam exemplarmente os métodos do Governo. Vejamos, como exemplo, os impostos profissional e complementar, que lhes interessam.

Risos do PCP e do PS.

O Governo propagandeou por todos os meios, legítimos e ilegítimos, os benefícios fiscais que propõe com vista à suposta melhoria do nível de vida dos Portugueses.
Entretanto, o que podemos constatar nas propostas de lei em apreço resume-se, no que toca ao imposto profissional, num benefício de dois pontos para os rendimentos até 450 contos anuais e um benefício de 6 pontos para os rendimentos entre 750 e 1050 contos anuais. Isto é: enquanto mais de um milhão de contribuintes - os de mais baixos rendimentos- obtém um benefício de 1 pontos, cerca de menos de 24000 contribuintes dos rendimentos mais elevados obtém um benefício de 6 pontos.
No que toca ao imposto complementar pode verificar-se distribuição semelhante. Assim, enquanto mais de 300000 pessoas abrangidas pela secção A praticamente em nada beneficiam e menos de 250 000 contribuintes beneficiam de 2 a 6 pontos, cerca de menos de 26000 têm um benefício de 14 a 38 pontos. A lógica é num caso e noutro clara: traia-se de favorecer mais ainda os estratos e camadas que dispõem de maiores rendimentos e, por essa via, penalizar ainda mais aqueles que menos podem.
E deve acrescentar-se que, se forem tidos em conta os aumentos fictícios de rendimentos devidos à inflação (com as correspondentes subidas de escalão e com a tributação de contribuintes até agora isentos) mais gravosa? serão ainda as conclusões da apreciação da política fiscal que a AD e o seu Governo se propõem levar a cabo.
Ao apresentar à Assembleia da República as propostas de lei do Plano e OGE para 1980, o Governo produziu grandes tiradas e propagandeou inúmeras medidas demagógicas. Mas mal disfarçou a política sectária e de protecção de clientelas do PSD e do CDS. Os dois maiores partidos da AD, sem escrúpulos e sem pudor, adoptam afinal um lema muito claro: «Da mentira sempre fica alguma coisa. Pague-se o que for necessário, mistifique-se o suficiente, ganhem-se; as próximas eleições. Depois se verá.»

Vozes do PSD e do CDS: - Não apoiado!

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD); - Esses são os grandes princípios do PCP!

O Orador: - Entretanto, os interesses nacionais com que tanto enchem a boca não passam de mera frase propagandística.
Mas a política subjacente as propostas de lei do Plano e OGE para 1980 não se confina à matéria fiscal. A mesma orientação eleitoralista e demagógica caracteriza a política financeira, monetária e cambial.
Sr. Presidente, eu gostaria, pelo menos, de me ouvir.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - O Sr. Deputado não fala para nós. Fala à TV!

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O Orador: -Os Srs. Deputados não têm nada a perder se me ouvirem.
O Governo da AD encheu os meios de comunicação social da muito falada revalorização do escudo. Disse «nada» a respeito da manutenção da desvalorização deslizante que mantém para a moeda nacional.
Mas dois factos importa salientar: em primeiro lugar, a quem beneficiou a revalorização de 6%? Em segundo lugar, qual o significado (ía desvalorização deslizante (que é mantida) em termos de inflação?

O Sr. Teodoro da Silva (PSD): - Beneficiou o País!

O Orador:- Sem outras medidas a revalorização de 6% do escudo fica quase por inteiro nos lucros do grande capital que domina o comércio de importação. O Governo reconhece isto mesmo quando resolve ser necessário decretar a obrigatoriedade da repercussão da ditada revalorização sobre os preços (sem outro efeito visível que- não seja o da propaganda). O mito da eficácia do sistema do mercado é duramente atingido por esta absoluta necessidade de medidas administrativas. Mas o sistema de mercado - falso - não só não reage automaticamente (porque dominado pelo grande capital), como não obedece contra os seus próprios interesses - quaisquer que sejam as medidas administrativas governamentais. Em realidade, não é o grande capital que recebe ordens do Governo. É o Governo que, fingindo dá-las, as recebe.
Em segundo lugar, a manutenção da desvalorização deslizante significa de facto -contra todas as pretensas verdades do Governo - que a inflação prevista de 13 % dos nossos, principais parceiros se projectará em Portugal, sem intervenção de outros factores, em 22%. E nem se argumente que a revalorização de 6% levaria essa inflação para 16% no ano de 1º80 porque o processo é essencialmente dinâmico e os agentes no mercado não o ignoram. O grande capital, que domina o mercado de importação, recolherá como benefício extra os 6% e fará repercutir por inteiro a desvalorização deslizante no aumento dos preços no mercado interno.
Mas inflação, salários e poder de compra são questões que não podem desligar-se. O Sr. Primeiro-Ministro e os> seus Ministros esforçaram-se por demonstrar que este Governo adoptava uma política tendente no mínimo a conservar os salários reais. As contas propostas reduziam-se no essencial ao seguinte: os salários subiam em média 18 %, a carga fiscal sobre o trabalho desceria em média 5 %, a inflação não ultrapassaria (ou ultrapassaria pouco) os 20%.
Nada mais mentiroso e falaz.
Em primeiro lugar, as medidas administrativas do Governo, no que toca à contratação colectiva, têm visado e visam manter aquém dos 18 % a actualização dos salários nominais dos trabalhadores. Veja-se o caso. escandaloso dos trabalhadores da função pública e de tantos outros já aqui citados.
Em segundo lugar, a pretensa diminuição da. carga fiscal só atinge os 5 pontos (que não os 5 %) para um número reduzido de contribuintes (30 000), que evidentemente não são a grande massa de trabalhadores do País - esses, sim, apenas obtêm um não agravamento máximo de 2 pontos-, menos de 2%! A inflação garantidamente atingirá os 20% (diz textualmente o Governo). E finalmente o Governo escusou-se a falar na intensificação da exploração da força de trabalho, ou seja, ao que habitualmente eles chamam aumento de produtividade.
Daqui se conclua, sem margem para dúvidas, que as propostas do Governo da AD conduzirão com absoluta e irrefutável certeza, por um lado, à diminuição dos salários reais e, por outro, ao aumento dos lucros do grande capital, em prejuízo do erário público e dos objectivos sociais que por via der poderiam ser alcançados.

Vozes do PSD: - Olha para ele a olhar para a televisão!

Risos do PSD, do CDS e do PPM.

O Orador: - Se os Srs. Deputados não sabiam, ficam a saber que eu gosto de falar para quem me está a ver. Neste momento, é aquela câmara, aquela que está filmando.

Risos do PSD, do CDS e do PPM.

Mas vai mais longe a política profundamente classista deste Governo. Anuncia em grandes parangonas a diminuição dos deficits, desde Jogo o deficit do do OGE. Di-lo sem rebuços, sem pejo -diríamos: sem vergonha. Porque a única evidência detectável nas propostas do Governo é o aumento real do deficit.
O Governo pretende que o deficit não é em si mesmo um objectivo. Será antes a resultante de objectivos-, de uma política.
Daí se conclui que o que temos de condenar ou aprovar é a sua política, não o deficit que dela resulta.
Vimos acima qual era a política deste Governo: beneficiar os mais favorecidos, prejudicar os que menos têm.
Mas o deficit tem em si mesmo um valor - e antes de tudo um valor que resulta da verdade ou da falsidade com que é exposto. Ora, o Governo da AD empenhou-se em mistificar também o deficit. Para tal, recorreu a operações de contabilidade que, como é obvio, são em si mesmas pouco compreensíveis para a grande maioria dos portugueses.
É discutível o critério utilizado para a revalorização, das reservas de ouro do Banco de Portugal. Mas, a ser efectuada uma revalorização, é óbvio que ela não altera minimamente os dados económicos da nossa situação, já que, quer exteriormente, quer interiormente, as reservas de ouro valem como tal, independentemente da imputação contabilística que delas se faça. O que é no mínimo espantoso é que este Governo pretenda averbar como feito seu a mera imputação contabilística do valor de reservas de ouro para, de, uma penada, suprimir das despesas públicas cerca de 15 milhões de contos de juros da dívida pública.
E não seremos nós a contestar que a contabilidade tenha em si própria um valor, mas o que é intolerável é que o Governo pretenda comparar aquilo que não é comparável. Ou seja: o deficit do ano anterior -sem revalorização das reservas de ouro- com o deficit deste ano, que repercute a manobra contabilística de revalorização da* mesmas reservas de ouro.

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Em todo o caso, vale a pena relembrar que o valor do ouro -repito: valor e não preço- nem sequer sofreu sensível alteração entre o ano passado e> o corrente ano. Entretanto, a questão não se esgota aqui: é para nós indubitável que qualquer que foste a revalorização possível das reservas do Banco de Portugal ela jamais devia ser afectada (coimo mera mais-valia) à dívida interna. As contas nacionais e a dívida interna devem confrontar-se exclusivamente com a produção e o consumo nacionais. Por outras palavras, as reservas de ouro deveriam servir para garantir não a dívida interna, mas a dívida externa, e, portanto, a independência económica -e política- do País.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Isto dito, significa que a operação contabilística do Governo da AD, por força da afectação de uma parte da mais-valia das reservas de ouro à dívida interna, diminuiu, de facto, a parte disponível para garantir a dívida externa e, por isso mesmo, tendencialmente diminuía a nossa independência económica e política.
Mais uma vez o Governo da AD se assume como Governo do grande capital e dos seus sócios imperialistas.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - É falso!

O Orador: - Mas esta operação tem uma lógica ainda mais profundamente ligada à natureza classista deste Governo. A contabilidade tem, como dissemos, em si própria, um valor. São afinal os 15 milhões de juros de dívida pública, que deixam de figurar no OGE, que servem a este Governo para favorecer, através de 'medidas fiscais e financeiras, os interesses capitalistas que representa. Já vimos como as alterações em matéria fiscal se reflectem em relação às classes de contribuintes e isso basta para concluirmos o que se passará em matérias menos transparentes, como sejam as isenções fiscais, bonificações e outras benesses deste Governo para a sua clientela.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Receio não ter conseguido, apesar do esforço e do tempo despendido significar totalmente quanto este Governo, por sobre ser reaccionário não tem o decoro mínimo para assumir as suas próprias responsabilidades.

O Sr. Vítor Louro (PCP): - Muito bem!

O Orador: - É aliás um facto que começa a ser notório. Vejam-se, por exemplo, as falas do Ministro das. Finanças.
Ele garante que os 'preços baixam, no próprio momento em que anuncia o aumento dos preços. Ele garante que vai travar a inflação quando anuncia precisamente a manutenção dos níveis inflacionistas para este ano. Proclama que os deficits do OGE diminuem quando propõe o seu aumento em termos comparativos. Ele garante que o deficit da balança de transacções corrente, não ultrapassará os 750 milhões de dólares, quando propõe uma política que conduzirá a um deficit de 900 milhões.
Não hesita em afirmar a disponibilidade do Governo para satisfazer os aumentos, justamente requeridos pelos trabalhadores da função pública, quando propõe no seu OGE que esses aumentos se quedam por cerca de metade do necessário e justamente requerido.
Ele jura que cumpre a Lei das Finanças Locais, quando aberta e declaradamente retira, cerca de dois dezenas de milhões de contos aos municípios para o ano de 1980.
O produto interno bruto -diz a quem o quer ouvir- crescerá 3,6 %, mas propõe uma política que no máximo assegurará a estagnação da produção nacional.
Este Ministro afirma peremptoriamente que haverá uma melhor redistribuição dos rendimentos, mas propõe maiores benefícios para quem melhor vive e maiores dificuldades para quem já dificilmente sobrevive.
Ele garante, de repete, ele afirma sempre. Com ar tranquilo, sempre com convicta aparência ...
É realmente notável este Ministro das Finanças deste Governo Sá Carneiro, apoiado pela maioria da AD.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

Ê coriáceo!

Risos do PSD, do CDS e do PPM.

Não há razão que o peneire, não há argumentação que o sensibilize, não há evidência que o convença, não há luz que o ilumine. É coriáceo. É bem o exemplar fóssil de outros Ministros; das Finanças que com outros nomes (Ulisses e outros;)...

Aplausos do PS e do PCP.

... preenchem a galeria dos Ministros das Finanças do regime que findou em 24 de Abril de 1974.

Aplausos do PS e do PCP.

Protestos do PSD e do CDS.

Este Governo deixa atrás de si um rasto de destruições e prejuízos que mais uma vez terão de ser pagos pelos únicos que podem pagá-los, por aqueles que trabalham e que produzem, pelos trabalhadores portugueses. Impõe-se abreviar e diminuir a sua existência,

Uma voz do PSD: - Estão desesperados!

O Orador: - Se este Governo não for substituído antes ...

Vozes do PSD e do CDS: - Não é, não!

O Orador: -..., confiamos que o povo português nas próximas eleições para a Assembleia da República arredará pelo voto e definitivamente a autêntica calamidade que o Governo da AD constitui para a democracia e para os Portugueses.

Aplausos do PCP, do PS e do MDP/CDE e risos do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé, que dispõe de oito minutos e trinta segundos.

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O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma das mais brutais e escandalosas ofensivas do Governo AD tem-se centrado numa das grande* conquistas de Abril, a Reforma Agrária.

Vozes do PSD e do CDS: - Oh!

O Orador: - Enquanto o Governo retira à cacetada terra aos trabalhadores para a entrega aos novos reservatórios capitalistas, e aos latifundiários, Sá Carneiro procura esconder a face da violência com a máscara da demagogia, encenando em terras do Alentejo a baixa comédia da pseudo-entrega de terras a trabalhadores rurais e a pequenos agricultores.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Quem escreveu isto era poeta!

O Orador: - Isto é, não se fazem as expropriações que a própria Lei Barreto contempla para se entregar a torra aos pequenos agricultores, mas tenta-se destrui as cooperativas e UCPs no sentido da reconversão capitalista do Alentejo e a manutenção de certos privilégios dos latifundiários.
A encenação montada por Sá Carneiro visa também apagar o clamor da indignação popular devido ao escândalo e a corrupção reinante a nível da Reforma Agi ária praticados pelos homens de mão do Governo e do próprio Governo AD.
É caso para perguntar: que inquéritos se fizeram quando nessa própria Assembleia foram exigidos? Qual o resultado desses inquéritos se se realizaram? A que conclusões levaram os chamados «fumos da corrupção» reconhecidos pelo ex-Ministro Vaz Portugal? O que é facto dos escândalos dos créditos avultados concedidos fraudulentamente às famílias que dominam a CAP?
A estas perguntas o Governo não responde. Na sua tacanhez mental e na sua argúcia provinciana ...

Risos do PSD e do CDS.

... julga a AD que o povo tem memória curta. Mas o povo não esquece e, mais .tarde ou mais cedo, a AD prestará contas pelos crimes cometidos contra os trabalhadores do País.

O Sr. Ferreira do Amaral (PPM): - No Campo Pequeno!

O Orador: - A todos aqueles que procuram impor a reaccionária Lei Barreto ou àqueles que a procuram adocicar, os trabalhadores tem respondido: só temos uma lei - as máquinas, o gado e tudo o que existe na terra é de quem a trabalha.
À ofensiva brutal da GNR e dos agrários os trabalhadores respondem: vamos reocupar as terras, recuperar o gado roubado, fazer as colheitas, as ceitas, as sementeiras nas reservas, manter sempre a vigilância e tomar medidas para que os agrários, os lacaios e a GNR não se instalem à vontade.
Cresce igualmente o sentimento da necessidade de greve no Alentejo e no Pais para estancar a ofensiva do governo AD. Ganha corpo entre os assalariados rurais do Alentejo uma manifestação em Lisboa para unir os trabalhadores da Reforma Agrária aos operários da cintura industrial de Lisboa e Setúbal e ao povo em geral. Porque só a força do povo 6 o único caminho da vitória. Os trabalhadores do Alentejo e do País usarão a sua unidade e a sua força para defender Abril e a Reforma Agrária.
Sr. Presidente. Srs. Deputados, as opções e directivas para a educação expostas nas Grandes Opções do Plano para 1980 do Governo AD não passam de princípios gerais, muitos deles já derrogados pela própria prática desta Executivo, e, como tal, não nos merecem qualquer credibilidade.
Na verdade, estes princípios que andaram de programa &m programa ao longo dos diversos Governos pós-25 de Novembro são lambam aproveitados por este, que revela aqui uma notável economia de esforço.
A expansão das redes de educação pré-escolar e escolar, o aperfeiçoamento e completamento de habilitações do pessoal docente, o alargamento do sistema d; educação especial e o lançamento do Plano Nacional de. Alfabetização e Educação de Adultos são aspirações há muito desejadas pelo povo português.
Contudo, estes princípios gerais, agora laconicamente repetido no Plano não poderia ser entendidos e dissociados do próprio Programa do Governo. É no seu programa, nas declarações e sobretudo nas medidas já tomadas pelo MEC - Lei de Bases do Sistema Educativo, revisão de programas, etc. - que este Governo mostra claramente a sua política e as saias reais intenções.
Pôr o sistema escolar ao serviço de um modelo económico dependente e integrado na Europa das multinacionais, servidor de interesses imperialistas.
O modelo que o Governo nos pretende impingir já provou que não pode resolver os graves problemas com que se debatem os países que a ele aderiram - o desemprego crescente, a miséria de grandes massas de camponeses, a inflação, etc.
A proposta de orçamento para a educação, se- tivermos em conta os efeitos previsíveis da inflação, não sofre qualquer aumento real.
Tendo ainda em atenção que o Governo, quer no seu programa, quer nas Grandes Opções, mostra grande empenho no desenvolvimento, apoio e incentivo do ensino particular de acordo com o princípio - cínico na boca deste Governo- da igualdade d« oportunidades, que verbas ficam então disponíveis para: ampliação urgente prioritária da rede de construções escolares com vista à expansão do ensino pré-escolar, escolar a lançamento do 12.º ano; apetrechamento técnico das escolas; apoio ao desenvolvimento da investigação científica; alargamento do sistema de educação especial; lançamento do Plano Nacional de Alfabetização e Educação de Base de Adultos, apoio económico a estudantes- transportes gratuitos, alimentação, material escolar, etc.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para a UDP é evidente que este Governo não irá aplicar as verbas na formação do cidadãos de acordo com as regras da democracia que permitam o aparecimento de homens e mulheres deste país, críticos, inventivos e transformadores de uma sociedade rumo ao socialismo, mas irá sim aplicá-las no contrôle ideológico do aparelho escolar e da nossa juventude na tentativa de criar cidadãos respeitadores dos valores da sociedade deva-

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dente que mantêm, fiais como o individualismo, a competição e a aceitação incondicional das ideias que lhes quer impor.
É evidente que o Governo ao apoiar o ensino particular não o faz no sentido de complementar a acção do ensino oficial, mas s»im no sendo de criar maiores desigualdades e favorecer o reaparecimento esforço de uma elite que com o mesmo se identifica e

O Sr. Luís Moreno (CDS): - Não apoiado!

O Orador: - Na educação, tal como noutros sectores, o Governo cumpre a sua tarefa. Reimplantar o 24 de Abril.
No sector da habitação e obras públicas, o Orçamento e as Grandes Opções respeitam integralmente o Programa do Governo. Isto é, nada dizem. É por de mais evidente a ausência de uma política de habitação deste Governo. Ainda hoje o Ministro da Habitação e Obras Públicas apresentou nesta Assembleia uma listagem de obras, de promessas e de considerações sem princípios nem prioridades bem reveladoras da inaptidão da sua política.
Mais uma vez as promessas da baixa de juro para aquisição de casa própria. Mas para quanto e quando essa baixa?
Quanto au apoio às cooperativas e às associações de moradores SAAL, è manifesta a vontade deste Governo de as destruir, com a demora no financiamento da sua inteira responsabilidade.
Quanto ao apoio a prestar aos sinistrados cios Açores, a UDP apoia firmemente a proposta de concessão de l milhão de contos de subsídio a fundo perdido que permita a reconstrução de um grande número de habitações, sobretudo aos moradores mais pobres. Mas este Governo guando é preciso passar das promessas aos actos mostra efectivamente o seu carácter demagógico e o seu mais profundo desprezo pelos interesse, do nosso povo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por último, gostaríamos de perguntar ao Governo com que verbas está a ser implantado o denominado Conselho das Comunidades Portuguesas. Qual a responsabilidade do Governo na criação deste organismo?
O Governo não regulamenta nem dá cumprimento a lei da Assembleia da República que criou as comissões consulares de emigrantes, mas fomenta à sua margem a criação, de um Conselho de Comunidades por forma a poder controlar a seu bel-prazer todos os assuntos relativos à emigração, por forma a impor a sua política.
As propostas de lei para o Orçamento e Opções do Plano revelaram, se já não bastasse a prática diária do Governo, até que ponto este está disposto a ir para fazer aos trabalhadores pagar a crise que os interesses da própria AD provocam.
São para rasgar e deitar ao caixote do lixo. A UDP votará contra. Os trabalhadores unidos e com a sua luta imporão as suas próprias soluções.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Herberto Goulart, que dispõe de doze minutos e trinta segundos.

O Sr. Herberto Goulart (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo:
Bem podia prever-se que o debate aqui travado sobre as Grandes Opções do Plano e do Orçamento Geral do Estado para 1980 não afectaria a sua finalização formal, a expressar-se nas votações.
Do lado dos partidos que apoiam o Governo sabia-se, de acordo com o seu anterior comportamento parlamentar, que o apoio incondicional às duas propostas de lei já estaria previamente decidido.
Os partidos que constituem a oposição terão definido como imediatas posições a partir de uma primeira análise dos projectos de diploma recebidos, como os debates vêm confirmando.
O interesse desta discussão circunscrevia-se por isso ao confronto de ideias sobre algumas das mais importantes questões económicas, sociais, culturais e ao cotejo de projectos de política económica diferenciados, que a relevância nacional de um Plano e Orçamento anuais largamente justificam.
Politicamente seria salutar que a discussão se fizesse vem subterfúgios, com a lealdade de quem acredita >na razão dos seus argumentos e na força do diálogo. O que serviria para esclarecimento dos Portugueses, para a sua melhor compreensão da actual situação política, nomeadamente se os debates aqui produzidos tivessem adequada cobertura pelos principais meios de comunicação social.
Do lado do Governo e das bancadas que o apoiam não pareceu ser este o entendimento ou o desejo.
Quanto à cobertura dos debates pela comunicação social, recorde-se a redução do tempo global negociado com a televisão e o escasso relevo dado nos noticiários radiofónicos e televisivos à presente actividade da Assembleia da República.
Quanto à lealdade da discussão, todos temos elementos para, em consciência, a apreciar...
O MDP/CDE nas curtas intervenções efectuadas pelos seus Deputados apontou omissões, contestou orientações explícitas ou implícitas nas Grandes Opções e no OGE, levantou questões concretas em matéria económica, cultural e social.
Fizemo-lo em questões como: as directrizes para a defesa dos interesses do País nas negociações com a CEE; a decomposição sectorial e os principais projectos a contemplar pelo Plano de Investimentos do Sector Empresarial do Estado; a diversificação das relações económicas externas; a disciplina da comercialização de produtos agrícolas; a estratégia de exploração da Zona Económica Exclusiva; a desactualização tecnológica da nossa frota pesqueira; a pesquisa dos novos recursos energéticos, o aproveitamento de fontes alternativas e a mudança de hábitos e de opções de consumo de energia; a insuficiência de instalações escolares; a efectivação da escolaridade obrigatória de seis anos: a dinamização e democratização da cultura; a política nacional do> medicamento; a promoção dos cuidados primários de saúde.
Sobre todas as questões citadas, o Governo não se pronunciou e a lista poderia ser significativamente alargada se tivéssemos sido exaustivos no que a nós se refere ou incluíssemos contestações apresentadas por outros partidos da oposição.
O Governo apresentou e justificou - melhor dito, explicou - as suas Opções e o seu OGE, como aliás lhe competia, redefendeu os mesmos pontos de vista na repetição do discurso que vem monocordicamente fazendo desde o debate do Programa do Governo. E explanou-se aã auto-afirmação do que considera

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o sucesso das principais medidas governamentais, evidenciando o sentido eleitoralista do seu discurso, do seu comportamento e da sua prática governativa.
Da especulação sobre insuficientes indicadores conjunturais à afirmação de que as metas: programáticas estão a caminho de ser atingidas não foi mais do que um passo. Para o Governo, na sua auto-avaliação desligada da realidade, é como se a expansão económica fosse um facto, é como se os salários reais aumentassem, é como se os pensionistas tivessem as suas dificuldades ultrapassadas, é como se o nível de vida do povo tivesse melhorado.
Mas a realidade, Srs. Ministros, não se ilude.
Os Portugueses conhecem-na, especialmente os de mais modestos recursos, e vêem-na empenhada na degradação contínua dos seus orçamentos familiares.
Amanhã os trabalhadores -os operários, os camponeses, os empregados do comércio, os bancários, os trabalhadores da função pública, os trabalhadores de escritório e serviços, os quadros técnicos, mas também os reformados e as donas de casa- dirão ao Governo, seguramente melhor do que nós aqui, o que sentem desta realidade e o que pensam da política governamental.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Sr Presidente, Srs. Deputados: Na opinião do MDP/CDE, o debate que está prestes a concluir-se nesta Câmara confirmou as contradições da estratégia política que enforma as Grandes Opções do Plano para 1980 e o correspondente Orçamento anual.
É o aumento do rendimento individual disponível que o Governo coloca como principal objectivo para o crescimento do consumo privado.
Pela alteração de escalões nos impostos profissional e complementar e medidas rectificativas quanto à incidência deste último, pretende-se aligeirar a carga dos impostos sobre os rendimentos do trabalho.
Mas com o aumento dos impostos indirectos, a diminuição da carga fiscal directa é absorvida e anulada.
E não é de esquecer a injustiça fiscal que está associada às alterações nos impostos profissional e complementar, com benefício relativo dos vencimentos mais elevados. Também aqui, tendo em conta áreas de eleitorado de que obteve acidentalmente o voto instável em Dezembro passado, o Governo sobrepõe objectivos eleitoralistas a preocupações de justiça social.
A manutenção, pelo menos, dos salários reais seria a outra face necessária ao incremento do rendimento disponível dos cidadãos, segundo anteriores e repetidas afirmações governamentais.
Mas tal objectivo é incompatível com a tentativa de estabelecer um tecto salarial psicológico de 18 %, com os baixos aumentos propostos para os trabalhadores da função pública, com as dificuldades criadas às empresas públicas carecedoras de subsídios por exploração de serviços sociais.
As lutas reivindicativas dos trabalhadores e o movimento grevista a que nos últimos tempos se tem assistido com inusitada dimensão, dão bem a resposta de como o Governo tem uma orientação concreta que é contraditória com o anunciado objectivo de defesa dos salários reais.
Os atrasos na assinatura e publicação dos contratos colectivos de trabalho, a sabotagem às negociações por parte do patronato com cobertura pelo Ministério do Trabalho, a vigência real dos contratos colectivos que nunca é de um ano mas que se estende por períodos médios que chegam a atingir os dezoito mesas, são procedimentos para os quais o Governo não tem esquemas funcionais, nem vontade política para os alterar. E são procedimentos que entravam o crescimento dos salários.
O desemprego crescente entra também em contradição com o objectivo de elevação do consumo privado. Não serão os 18000 novos postos de trabalho que inflectirão a tendência, pois que nem sequer compensam a diminuição de postos de trabalho que a incapacidade de entendimento da 'Reforma Agrária e as tentativas da sua destruição vem provocando.
Os esforços desesperados do Governo para a contenção artificial dos preços por via administrativa jogarão, pelas concepções dominantes, contra o aumento dos salários.
Mas entrarão também em rápida contradição com o objectivo declarado de intensificação do investimento.
Alguns grandes empresários aceitariam um sacrifício temporário das suas margens de lucro sem abrandamento dos seus projectos de investimento se tivessem a certeza de que em breve teriam condições melhoradas para se ressarcirem dos prejuízos temporários.
Mas tais empresários manterão agora, e a cinco meses de Outubro, o esfusiante entusiasmo propalado pelo Governo quanto ao clama de confiança do investidor privado?
As pequenas e medis empresas industriais, que o Governo «abe serem suporte importante da estrutura produtiva nacional, estão apertadas pelas contradições da política económica e financeira do Governo.
Nem admira, não são estes os investidores privados que o Governo quer privilegiar. Elas não estão ligadas aos grandes capitalistas, nem trazem atrás de si a penetração e o domínio das multinacionais sediadas em Nova Iorque, Zurique, Paris ou Londres.
As pequenas e médias empresas o que reconhecem é que nas Opções do Governo nada se define como linhas de política económica necessária à sua dinamização, à sua actualização e reapetrechamento, à sua defesa perante um espectro de dificuldades, quiçá ruína que a adesão à CEE implica.
Não conseguiu a Assembleia da República ter a menor aproximação ao conteúdo provável do Plano de Investimentos do Sector Empresarial do Estado. Mas suspeitamos, pelo que se supõe quanto a alguns projectos que estarão em marcha, que se limitarão a investimentos em capital intensivo. O lançamento de investimentos produtivos foi afirmado pelo Governo como forma privilegiada de combate eficaz e estável ao desemprego. Mas, para o relançamento de produção nacional e para um efectivo contributo ao crescimento do consumo privado - e até deixando de lado uma visão humana da economia, de uma economia que se faz com homens e que não é um simples repositório de números agregados- a política de investimentos necessária não pode deixar, agora, de ter uma grande componente de mão-de-obra intensiva.

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No mesmo sentido está uma política decidida de fomento da produção 'agrícola e piscatória, comple-tamente ausente 'das Grandes Opções do Plano, que além do mais seria contributo para o combate à inflação e para a redução da nossa dependência externa.
A dependência externa serve ao Governo para justificar as limitações à evolução económica do País pela conjuntura internacional desfavorável. Mas, contraditoriamente, as Grandes Opções do Plano não induzem qualquer perspectiva tendente à atenuação dessa mesma Dependência.
As Grandes Opções fazem-nos recordar as linhas de pensamento económico que norteavam os últimos planos de fomento. O que não será de admirar.
Mas o que faz meditar sobre a incapacidade de compreensão das grandes transformações económicas, sociais e políticas que ocorreram em Portugal.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Destas Opções e deste Orçamento estão de facto afastados os cidadãos, na dimensão ao menos do que para nós, MDP/ODE, a Revolução de Abril trouxe de mais rico: essa enorme esperança que abriu no coração dos Portugueses, os prodígios de imaginação, tenacidade, inteligência e capacidade de realização que a participação popular, por aquela despertada, arrancou da vontade do povo português.
Nestas Opções e neste Orçamento não há trabalhadores nas empresas, não há agricultores nos campos, não há populações no Poder Local. Ou se os há, é como complementos 'passivos do Poder que governa, do Executivo que decide.
Com estas Opções e este Orçamento, as condições de vida não serão melhoradas, o ritmo da inflação não será significativamente reduzido, o investimento produtivo não será relançado.
Com estas Opções e este Orçamento fica de pé apenas o objectivo da vontade de integração na CEE. Mas numa perspectiva limitada, condicionada à eufemisticamente chamada «modelação do sistema económico».
E surge então transparente a outra opção prioritária do Governo, que o discurso público não explicita: rasgar a Constituição económica do País, procurar o apoio do grande capital internacional e das multinacionais para consigo arrastarem a grande burguesia nacional na reconstituição do poder dos monopólios, o que esta sozinha não tem vitalidade, nem base interna de apoio, para conseguir.

Vozes do PCP e do MDP/CDE: - Muito bem!

O Orador: - No entender do MDP/CDE, esta 6 a filosofia que está por detrás das Opções do Governo, como já o estava no seu Programa, motivo suficiente para que rejeitemos as propostas de lei em apreciação, tal como já o fizéramos em relação ao Programa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Ministros: O marcelismo de tentar liberalizar o antigo regime e manter a estrutura económica de um poder monopolista talvez tenha tentado limitada censura a certas áreas, mas não foi capaz de ir além da alteração de nome para exame prévio. Talvez tivesse desejado humanizar a PIDE, mas quedou-se pela mudança de designação para DGS; pensou eliminar a homologação prévia das direcções sindicais, mas depressa teve de passar à nomeação de comissões administrativas, pensou liberalizar a contratação colectiva de trabalho, mas breve teve de criar comissões arbitrais que maioritariamente controlava.
Esta experiência do nosso passado recente parece--nos ser a comprovação de que em Portugal são incompatíveis direitos e liberdades não mitigados com uma democracia que o seja simultaneamente nos campos políticos, económico e social. A tentativa de reconstituição de formas económicas do passado a que hoje se assiste começa a cercear liberdade e a provocar rupturas nas regras de vivência democrática. É, pois, por isto que o nosso partido tem ultimamente afirmado e aptidão que se levantam nuvens negras no futuro da democracia em Portugal.

Vozes do PSD: - Olhe que não!

O Orador: - Não é que a maioria da maioria não queira manter as regras da democracia formal. A questão é outra, Srs. Deputados: é saber se o poderá compatibilizar com a estratégia política-económica que prossegue. O MDP/CDE pensa que não.

Aplausos do MDP/CDE, do PCP e de alguns Deputados do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Tavares.

O Sr. Sousa Tavares (DR): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Ao irem votar este Orçamento, os Reformadores fazem-no com a consciência de votarem um Orçamento sério, ponderado, sem dúvida ousado nos riscos que toma, mas promissor na esperança de melhores dias que deixa entrever ao povo português.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: -Os traços fundamentais pelo qual o consideramos realista e verdadeiro são a sua claridade manifesta e a tentativa que representa de uniformidade orçamental. Não podemos deixar de registar que, pela primeira vez, são incluídas no Orçamento Geral do Estado as receitas do Fundo de Desemprego e nele se exibe todo o jogo das transferências entre o OGE e os fundos autónomos. O OGE assume honestamente e sem disfarces a importância do seu deficit, que não deve ser esquecido, muito embora se torne transparente que se trata de um deficit calculado e controlado.

Vozes do PSD e do PPM: - Muito bem!

O Orador: - O quadro das receitas revela a fragilidade extrema da economia portuguesa e a má identificação da massa fiscal. Apesar dos crescimentos previstos, continuam a ser extremamente reduzidas as expressões numéricas dos impostos directos, nomeadamente da contribuição industrial e do imposto sobre os rendimentos.
Torna-se urgente a formulação de uma reforma fiscal. Não culpamos obviamente o presente Governo de não a ter ainda formulado em quatro meses, mas queremos deixar aqui registado como exigência para o futuro que os Reformadores defendem um diferente

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sistema fiscal, no qual se verifique a realidade da distribuição da carga sobre os mais altos rendimentos e a inversão da equação, que consideramos injusta, actualmente existente entre os impostos directos e indirectos. Torna-se urgente a criação de um autêntico imposto, que 'hoje praticamente não existe, sobre os rendimentos agrícolas.
Se este OGE é já um Orçamento de libertação, é evidentemente um orçamento de sacrifício.
A oposição pretendeu exigir, em vez de empreender uma discussão técnica sobre as possibilidades orçamentais actualmente existentes, que o Orçamento fosse simultaneamente social em todas as frentes, de fomento em todos os ramos, desenvolvimentista em todos os campos. Mas, para além da exigência demagógica, nem uma palavra foi dita sobre os processos de financiamento para ocorrer a todas as exigências apresentadas. E tanto se critica o Orçamento como Orçamento de falência, e trágico o deficit nele previsto, como insuficiente em todas as alíneas. Como harmonizar a equação do desenvolvimento do equilíbrio orçamental e das melhorias sociais, nem uma palavra foi dita sobre qual o ponto de equilíbrio a atingir.
O nosso elogio a este Orçamento é porque, dentro da realidade económica actual e das possibilidades financeiras e económicas do País, nos parece ser um Orçamento que contempla as três facetas fundamentais, a busca de uma contracção de despesas e de um aumento de receitas e, como tal, o equilíbrio fundamental do Orçamento; por outro lado, buscou uma melhoria social dentro do possível e, simultaneamente, proeurou libertar as forças sociais do desenvolvimento.

Vozes do PSD e do PPM: - Muito bem!

O Orador: - Acho difícil, a não ser desequilibrando-o de um destes três sentido», atingir tão equilibradamente a possibilidade financeira do País.
É por isso que, em perfeita consciência e para além do compromisso que nos unia na votação deste Orçamento, nós o votaremos com prazer, com esperança e com uma certa alegria. Alegria porque verificamos uma continuidade governamental de intuitos sérios e esperança de que este Orçamento possa ser a promessa que nele se contém.

Aplausos do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores.

Uma voz do PCP: - O que a arteriosclerose pode fazer a unia pessoa!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lucas Pires.

O Sr. Lucas Pires (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Humildemente eu vou falar da minha bancada.

O Sr. Vítor Louro (PCP): - Depois de uma tentativa frustrada de ir à tribuna!

O Orador: - Aliás, penso que a Assembleia se está a transformar num conjunto de monólogos e que uma das expressões mais visíveis do carácter monologar desta Assembleia está a ser o facto de toda a gente se querer considerar uma estátua parlamentar subindo à Tribuna, embora muita gente recuse, até em matéria de economia, as Olimpíadas e os recordes da economia liberal.
Apesar da humildade com que ponho o problema, espero - seria muito lisonjeiro para mim - merecer das bancadas da oposição as mesmas palmas que o Sr. Deputado Veiga de Oliveira teve das bancadas da maioria.

Vozes do PCP: - Querias, querias!

O Orador:- Suponho que esse facto seria uma prova de fair-play reciproco, bastante grande, que ajudaria certamente a melhorar o clima do debate parlamentar.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começaria precisamente por me referir à intervenção do Sr. Deputado Veiga de Oliveira.
Esta intervenção ajuda a situar as questões. Julgo que é preciso manter viva uma noção de conjunto sobre a revolução portuguesa. O Sr. Deputado Veiga de Oliveira demonstrou bem a concepção épica que o PCP tem da revolução portuguesa. Este Sr. Deputado parecia ser uma espécie de patrão perante um país que se emancipa e que recusou o patronato do PCP definitivamente,

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Em termos literários, a intervenção do Sr. Deputado Veiga de Oliveira foi aquilo que de mais próximo se pode encontrar dos «Órgãos de Stalin» em matéria militar.

Risos do PSD, do CDS e do PPM.

A sua voz teve a estridência de uma parada militar, tentando mais uma vez aplicar a um domínio como o da economia, que é de fragilidades e de sensibilidades, toda a panóplia de agressão de que o PCP é capaz e de que ninguém lhe retira essa grande capacidade.
Pelo contrário, no outro dia, aqui também, o PS fez-se eco de uma noção de revolução algo diferente, mas porventura complementar desta em termos literários. Com efeito, o discurso do Sr. Deputado Almeida Santos, aquando da comemoração do 6.ª Aniversário do 25 de Abril, foi um típico discurso a exprimir uma concepção lírica da revolução. Logo, a concepção épica do lado do PCP e a concepção lírica da parte do PS.

Risos do PS e do PCP.

É uma concepção doce, mas igualmente estéril, tão estéril quanto a concepção violenta do PCP.
Pela parte da maioria, mais uma vez uma grande humildade - e é por isso que falo deste lugar -, é uma concepção puramente realista da revolução.

A Sr.ª Teresa Ambrósio (PS): - Que cinismo!

O Orador: - É uma concepção realista, porque, no fundo, sabemos que temos de pagar os castos do estilo épico do PCP ...

Vozes do PCP: - Está muito iludido!

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O Orador: - ..., os custos do estilo lírico do PS e, ainda por cima, temos de conseguir mais algumas mais-valias para o futuro.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Coitadinho!

O Orador: - No fundo, a linguagem da teoria literária é adequada para descrever concepções económicas tão bem falantes mas pelos vistos tão improdutivas, como são a do PCP e a do PS.
No fundo, o engenho do PCP e do PS gastou-se enquanto estiveram no Governo a desbaratar os presentes da festa, tal como as crianças mimadas que no meio da festa recebem uma série de presentes, uns do estrangeiro -foi o grande empréstimo -, outros do anterior regime - foi a pesada herança -, outros dos contribuintes portugueses - foi o enormíssimo imposto. Afinal, foi a mania das grandezas, mesmo quando na miséria.
Depois de a criança ter gasto esses brinquedos, foi a altura de o processo político em Portugal atingir a sua maioridade. Esta maioridade tem a ver com maioria, isto é, arranjar-se uma maioria. Pois é essa maioria que agora se apresta a resolver realisticamente os problemas dos portugueses.

Uma voz do PCP: - Você anda atrás de uma chucha!

O Orador: -Pelo nosso lado, somos partidários de uma revolução realista. Para já teremos de fazer as contas e pagar os gastos, pagar os consumos supérfluos do socialismo e do comunismo, luxos nas sociedades ocidentais actuais.
Por isso, este Orçamento é ainda um Orçamento que se situa entre o passado recente que herdámos e o futuro próximo que propomos. Trata-se para já de aguentar, estancar a sangria, manter a respiração, para preparar o relançamento, Por isso, estou de acordo com o Sr. Deputado Sousa Tavares que diz que este é um Orçamento de sacrifício.

O Sr. Gualter Basílio (PS): -O Salazar dizia o mesmo!

O Orador: - Não é, porém, uma política ad hoc. Nós temos um Plano.

Vozes do PS: -Tem, têm!

Risos do PS e do PCP.

O Orador: - Sr. Presidente, estão-me a roubar o tempo de que disponho. Espero que no final este tempo me seja descontado.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Queixinhas!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, volto a pedir-lhes que deixem o orador fazer a sua intervenção.
Sr. Deputado Lucas Pires, para o tranquilizar, sempre que V. Ex.ª, assim como qualquer outro Sr. Deputado, seja interrompido, é imediatamente descontado esse tempo pela Mesa.
Tenha a bondade de continuar, Sr. Deputado Lucas Pires.

O Orador: - Nós temos um plano. O PCP também tinha um plano, nós reconhecemos isso.

Vozes do PS: - É igual!

O Orador: - Foi um plano que ficou a meio e que ainda não perdeu a esperança de avançar. Ê uma peça escrita há mais de um século por Karl Marx, cujo encenador foi Lenine, cujo intérprete principal é Brejnev e que tem uma série de figurantes que compõem o espectáculo através do mundo inteiro.

Risos do PSD, do CDS e do PPM.

Simplesmente, até por a peça já estar muito vista, nau teve entre nós muitos espectadores, apesar das insistências com que chama a atenção do público.
A peça do PS tinha de tudo. Tinha todos os ingredientes. Já uma vez disse que era uma sopa de pedra, pois tinha todos os ingredientes, mas não sabia a receita. Os actores e os actos que se sucederam foram muito. Os actores entravam e saíam, dirigidos por uma batuta, que ás vezes lhes parecia alheia e ora vinha mais da esquerda, ora vinha mais de cima. Mas, como em algumas revistas, não se chegou à apoteose final.
A certa altura verá ficou-se, porém, que, para além da movimentação dos actores, nenhuma peça existia. Era apenas um cenário para entreter os espectadores no intervalo.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

Talvez por isso tenham sido os históricos do PS que vieram interpretar neste debate o Partido Socialista. compreensivelmente, a história é o melhor que o PS ainda tem para oferecer.

Risos do PSD, do CDS e do PPM.

Verificou-se afinal que os dirigentes do PS -de quem toda a gente dizia: «Coitados, eles não são bons no Governo, mas são muito bons na oposição» - são ainda piores na oposição do que no Governo.

Risos do PSD, do CDS e do PPM.

Dos dirigentes da Aliança Democrática dizia-se o contrário: que eram .pessoas um pouco agressivas e só no Governo se poderia saber como é que seria. Verifica-se afinal que no Governo são ainda melhores do que na oposição.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

Por outro lado, o PS pareceu aqui hoje quase um partido municipal. A única coisa de que falou foi das finanças locais. Esse o seu motivo principal. Penso que o PS tem proporções para a assembleia municipal. Penso também é que tem cada vez menos proporções para a Assembleia da República e, mais uma vez, vai votar ao lado do PCP. Ele, que no Governo parecia ser o progressismo do capitalismo, continua na oposição a fazer o simples papel de decadência do socialismo, chegado à fase da tremura na linguagem, na acção e no pensamento.
Pelo nosso lado, como sabem, depois deste triste espectáculo...

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A Sr.ª Teresa Ambrósio (PS): - Triste espectáculo que é o seu!

O Orador: - ... da peça do PCP e do PS ...

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Não convences o povo com essa reprise!

O Orador: - ..., foi a altura de o povo português subir ao palco através de uma maioria. Subiu ao palco justamente em termos económicos, com um programa muito claro e que assenta no equilíbrio entre estes três pontos: a noção da ordem económica, a noção da Liberdade económica e a noção do interesse económico nacional.
Afinal, não existe ordem económica sem liberdade económica. Precisamente, estes três pontos realizam--se, sem ter nada que ver com capitalismo, defendendo em primeiro lugar os indivíduos, as famílias e as empresas, e não entidades abstractas, como até agora. O próprio socialismo de rosto humano só aceita um rosto, embora humano, e eu não conheço nenhuma entidade que tenha apenas um rosto. E os indivíduos de quem as forças fascistas diziam «vós nada contais, a nação tudo conta», dizem afinal: «vós nada contais, a classe tudo conta».
Ora é justamente em nome dos indivíduos que se diminuem os impostos, em nome das famílias que se aumentam os abonos, é em nome das empresas que se criam condições para o investimento. Isto parece bastante simples, bastante elementar e vem nos livros.
Um segundo ponto é o da criação de uma economia nacional. Foram vocês que desbarataram o poder económico nacional e que são responsáveis por isso. É certo que vocês podem dizer que o nosso problema é simples.
O que nós devemos ao estrangeiro é, no fundo, metade de um porta-aviões. Portanto os americanos, que não querem aqui um foco de infecção, vão pagar a metade do porta-aviões toda a vida e nós podemos ser independentes toda a vida. Simplesmente o problema consiste em saber se nós queremos ou não ser dignos, ganhar a nossa própria vida, ser independentes e prescindir da metade do porta-aviões que os americanos nos podiam entregar.

Aplausos do CDS, do PSD, do PPM e dos Deputados reformadores.

E depois queremos uma verdadeira estrutura económica.
Até agora o processo político português tem sido uma série de recusas. O Partido Socialista recusou o projecto do PCP, ou melhor liberalizou o projecto do PCP. Não haja ilusões. Nós não nos vamos limitar, ainda que isso possa ser motivo de algumas ilusões por enquanto, a liberalizar o projecto do PS. Nós vamos construir uma verdadeira ordem económica, com cabeça, tronco e membros.

Vozes do PS: - A do passado!

O Orador: - A do passado não, a do futuro. São vocês o passado, são vocês que não têm nada a dizer para o futuro.

Aplausos do CDS. do PSD e do PPM,

Nós, realmente, só somos tentados a ter uma dúvida: é que não sabemos se este Orçamento vai passar no Conselho da Revolução.

Risos do CDS, do PSD e do PPM.

Ai de nós se o Conselho da Revolução tivesse a ver com este Orçamento.
Mas a questão pertinente que eu ponho é a de desfazer este equívoco que, eu acho muito importante: o Conselho da Revolução existe para defender a Revolução ou existe para impedir a Revolução?

O Sr. Raúl Rego (PS): - Existe para impedir a reacção!

O Orador: - Realmente o Conselho da Revolução existe para impedir a revolução dos mais pobres, dos mais humildes, daqueles que foram até agora os mais sacrificados com este processo.
E quando o Partido Socialista aqui fala de inquérito ao Sr. Ministro da Defesa, que é Ministro de um Governo democrático, eu sugeria que se fizesse um inquérito ao Conselho da Revolução, que não foi eleito, que não é membro de qualquer orgão democrático.

O Sr. Carlos Lage (PS):- Que engraçado!

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Já estão a recuar!

O Orador: - E ainda por cima lamento que alguns membros da Comissão Constitucional se comportem mais como funcionários do Conselho da Revolução do que como juízes independentes. Não sei se é uma coincidência um dos relatores ser do PS e outro ser da ASDI, mas a verdade é que a Comissão Constitucional começa-se excessivamente a parecer com o Conselho da Revolução à civil, o que é bastante mau para uma entidade que, apesar de tudo, se preservava de ema certa independência.
E é portanto nesta equação matemática -agora para os tecnocratas do PS, já faiai dos históricos-, que é no fundo a equação da nossa Constituição - equação socialismo Conselho da Revolução ou maioria -Conselho da Revolução-, que nós, apesar do «menos» da segunda, continuaremos a bater-nos por isso. Porque nós queremos acabar com um país laçado, um país por onde se derrama a laca que escorre dessa fonte de laca política que é o artigo 290.º da Constituição. Estamos fartos de personalidades de laca, de pessoas que não são capazes de enfrentar o futuro...

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Estamos, estamos!

O Orador: - ...com esperança, com alegria, com a maioria, com a capacidade do povo português.
Vamos pois acabar com o academismo da Comissão Constítucional que, assim como todo o academismo, e sempre ridículo, mas é tanto mais ridículo quando se choca com a necessidade de salvar um país, quando se choca com a liberdade e quando se choca com a maioria. Por isso nós vamos avançar.
Para terminar, direi apenas que espero que, apesar de tudo, vamos lá chegar, porque por detrás dos números do Orçamento há uma coisa com que os Srs. Deputados da oposição devem contar. Por de-

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trás dos números do Orçamento, há uma inteligência, uma vontade de uma alma que são a da maioria do povo português. Os Srs. Deputados da oposição devem contar com isso.
Nós estamos fartos de excesso de tratamento. Nós sabemos salvar-nos a nós próprios. Os Portugueses salvam-se a si próprios), ainda agora o constatei numa longa viagem que fiz por comunidades de emigrantes. E é justamente com esse tipo de portugueses que a AD vai salvar o País.
Somos um pequeno país, mas 'temos uma grande ambição. Vamos pedir produtividade ao trabalho, investimento ao capital e nunca talvez esta fórmula foi tão real em Portugal, a fórmula die que precisamos de uma economia concreta. Quer dizer, de uma economia que precisa de conserto, por um lado, e de uma economia que deve ser o acordo de todas as pessoas, por outro. É esta a ambição da AD.
Temos, por um lado, a noção de um sistema que se está a destruir e, por outro lado, a noção de um sistema que se está a reconstruir. E felicito, pela minha parte, o Sr. Ministro das Finanças que tem sabido dar a noção de que uma das grandes chances dos países pobres é a imaginação, o risco, e a solidariedade.
Há pessimistas e optimistas em Portugal, há pessoas que dizem que somos um país, que vai morrer e pessoas que dizem que somos um país que está a renascer. No fundo o relógio da morte é o relógio desse lado, é o do PCP; o contra-relógio da vida é o deste lado, é o contra-relógio do renascimento de Portugal contra uma obra de destruição que foi consumada durante estes últimos cinco anos.
Vamos, pois, realizar o 25 de Abril para lá da conspiração, vamos realizar o 25 de Abril da maioria.

Aplausos do CDS, do PSD, do PPM e dos Deputados reformadores.

O Sr. Lino Uma (PCP): - Muito bom para o Circo Mariano!

O Sr. Presidente: - Neste momento o Governo dispõe de trinta e quatro minutos, o PS, de quinze minutos, o PCP de nove minutos, a UDP de l minuto; o PPM de cinco minutos, os Deputados reformadores de um minuto e o PSD, o CDS e o MDP/CDE esgotaram o seu tempo.
Tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais.

O Sr. Ministro dos Assuntos Sociais (Morais Leitão): - Sr. Presidente, Srs Deputados: Está a chegar ao fim o debate sobre o Orçamento Geral do Estado. Creio terem terminado as intervenções sobre a segurança social e a saúde.
Sobre a segurança social a oposição entreteve-se neste debate a reivindicar pana o Governo da engenheira Maria de Lurdes Pintasilgo parte das medidas sociais, por um lado, a dizer que as medidas sociais deste Governo eram benesses a mais e a dizer que as medidas sociais deste Governo levariam a Previdência à falência.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Não ouvi ninguém dizer isso.

O Orador: - Creio que nesta matéria presunção e água benta cada um toma a que tem. Pela parte do Governo estou confiante em que quem apreciará as medidas sociais tomadas serão os seus beneficiários que são aqueles que realmente serão favorecidos por essas medidas.
Quanto à saúde, o Sr. Deputado António Arnaut teve ontem a amabilidade de me entregar previamente a sua longa intervenção. Procurei lê-la cuidadosamente! e esperei hoje todo o dia, por razões éticas similares, às invocadas há pouco, que o Sr. Deputado António Arnaut pudesse estar presente para eu dar resposta às perguntas concretas que formulou ao Governo.
Ter-lhe-ia dito, quanto às perguntas que respeitam ao Orçamento Geral do Estado em matéria de saúde, que o aumento das despesas públicas da saúde, este ano. se comparado entre a previsão do Orçamento Geral do Estado de 1979 e a previsão do de 1980, é de 34 %, e não de 10,7 %.
Ter-lhe-ia também dito que nunca os; Governos anteriores dos últimos quatro anos, na diferença entre o Orçamento realizado e gasto e o previsto no ano seguinte, alguma vez atingiram ou superaram o aumento do custo de vida.
Dir-lhe-ia também que o Sr. Deputado António Arnaut sabe bem quão deficientes são as condições de elaboração dos orçamentos de saúde e quanto de vontade tem havido, supondo eu -pelo menos continua a haver em conter gastos, em racionalizar despesas e em não deixar evoluir as despesas da saúde para volumes absolutamente incomportáveis.
Dir-lhe-ia ainda que o emprego dos jovens médicos está e continua garantido neste Orçamento. Este Governo não tem culpa de em Outubro de 1978 para se colocarem médicos na província ter sido aberto um concurso para 600 vagas nos hospitais distritais e de esse concurso ter sido aberto em condições tão deficientes que ainda hoje não pôde ser fechado. Estamos há ano e meio para fechar um concurso de colocação de 600 médicos nos. hospitais distritais só por causa das deficiências das condições em que o mesmo foi aberto.
Ter-lhe-ia também dito que este Governo espera na próxima semana abrir um novo concurso paira 400 médicos especialistas, que serão colocados nos hospitais distritais até aos finais de Julho próximo.
Dar-lhe-ia também que os 1000 policlínicos que regressaram do serviço médico à periferia em 1979 serão sujeitos ao seu exame final até Julho próximo, dos quais 650 irão paira especialistas dos hospitais e 350 serão convidados para cursos, a completar até ao fina do ano, de modo a integrarem a carreira de generalista.
Ter-lhe-ia também dito que é esperança deste Governo poder, através da formação nesta carreira, em 1982 vir a acabar o serviço médico à periferia, pela simples razão de que já então será possível, se nos deixarem trabalhar, ter médicos de clínica geral e generalistas, com a carreira devidamente formada, devidamente instalados e implantados na província.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas, como não é preciso dizer isto pessoalmente ao Sr. Deputado António Arnaut, interessa dizê-lo ao povo português e a esta Câmara,

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pelo que permitir-me-ia acrescentar que talvez já fosse tempo de deixarmos de fazer política com a saúdo e passarmos a ter uma política de saúde.

Aplausos do PSD. do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores.

Até para não cairmos no ridículo de virem organizações internacionais insuspeitas como o Banco Mundial que em Julho de 1979, a pedido do Governo anterior, v um estudo sobre o sector público e os investimentos do sector público em Portugal e que, a respeito da saúde, em vinte e cinco páginas brilhantes conclui dizendo que, é uma pena que os Portugueses, que tem equipamento suficiente, têm profissionais de saúde suficientes, tem meios materiais e humanos suficientes, continuem a discutir e a tratar o Serviço Nacional de Saúde mais como uma bandeira política do que como um programa realista de acções para defesa da saúde em Portugal.

Aplausos do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores.

Entretanto assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente José Vitoriano.

O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra d Sr.ª Deputada Zita Seabra paira um protesto, aproveito para informar o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais que o Sr. Deputado António Arnaut se encontra ausente por ter sido designado responsável pela delegação portuguesa que acompanha a delegação parlamentar inglesa na sua visita ao Norte.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - O que o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais acaba de referir em relação a oposição, no que respeita à segurança social e no que diz respeito ao PCP, corresponde tão-pouco à verdade que o PCP apresentará na especialidade, como já anunciou, propostas para aumentar o abono de família de 300$ para 500$ e das pensões de reforma para um mínimo de 3750$ e 4500$, respectivamente.
Isto é prova evidente de que não consideramos que o Governo tenha um orçamento demasiado largo, demasiado generoso e que, pelo contrário, consideramos, este orçamento da segurança social do Governo um orçamento de miséria, uma burla, uma demagogia.

Aplausos do PCP.

Vozes do PSD e do CDS: - Não apoiado!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Guterres.

O Sr. António Guterres (PS): -Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo: O Grupo Parlamentai- do Partido Socialista votará contra as propostas de lei do Orçamento e do Plano para 1980.
Este voto não provêm só da oposição a um Governo que objectivamente se comporta como um Governo dê ruptura, avesso ao diálogo e à procura do consenso e interessado no extremar de campos na sociedade portuguesa, fazendo pairar sobre o País a ameaça do autoritarismo, suportada já num contrôle férreo da Comunicação Social.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Votaremos contra as propostas de lei também porque são opostas aos interesses fundamentais das classes trabalhadoras, por desprezarem a resolução dos verdadeiros problemas do País, provocando o crescimento do desemprego e a degradação do nível de vida dos Portugueses.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - É falso!

O Orador: - Não é o facto de o Governo ter montado uma espectacular máquina de propaganda, com base no princípio de que uma mentira muitas vezes repetida acaba por ser tomada como verdade- pela opinião pública, que altera o carácter fundamentalmente negativo da política deste Governo, ao serviço da restauração dos privilégios do passado.

Aplausos do PS e protestos do PSD.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Ministro das Finanças e do Plano terminou a sua intervenção nesta Câmara, ao apresentar as propostas de lei do OGE e do Plano para 1980, com a seguinte frase: «O Orçamento proposto é bem... o Orçamento da mudança»
Clarifiquemos este conceito de mudança.
Não é fácil, num Pais em que se registam desequilíbrios estruturais e em que se verifica, infelizmente, a existência de uma certa economia paralela, não é fácil, particularmente em períodos de incerteza na conjuntura internacional, elaborar um Orçamento e um Plano com a garantia do cumprimento fiel das suas previsões.
Participei já como Deputado na discussão de propostas de lei equivalentes em três anos sucessivos. Fi-lo quer como membro dó partido do Governo que na qualidade de seu opositor. Sempre se verificaram nos três casos naturais deficiência de previsão, que só os resultados vieram a revelar. Em todas as vezes, porem, os documentos apresentados representaram um esforço honesto de retractar a realidade, esforço que as oposições, menino a nossa, quando foi o caso, nunca puderam em dúvida. Em debate esteve sempre, sim, a orientação da política económica e as opções por ela determinadas nas propostas de lei então- em apreço.
O mesmo não se passa infelizmente desta vez. Os documentos enviados a esta Câmara e as declarações dos Membros do Governo, a começar pelo Sr. Primeiro-Ministro, utilizam artifícios facilmente detectáveis, com o objectivo claro de esconder a realidade aos Portugueses e permitir a controlacão de uma política unicamente orientada para tentar ganhar as eleições, escamoteando os efeitos respectivos nos deficits orçamental e da balança de pagamentos, e procurando suportar a sua credibilidade aparente no contrôle maciço dos órgãos de comunicação social estatizados, onde a oposição poucas oportunidades tem de aparecer. Aí está a mudança de que falou o Ministro Cavaco Silva. De facto, não é uma verdadeira mudança. Ë sim um retrocesso.

Vozes do PS: - Muito bem!

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O Orador: - O objectivo fundamental de qualquer política económica tem a ver com o bem-estar dos cidadãos. Nas sociedades modernas, e talvez infelizmente, para o bem-estar conta decisivamente o nível do rendimento disponível desses mesmos cidadãos. Essa é, aliás, a mais profunda das motivações eleitorais.
Por isso mesmo o Dr. Sá Carneiro, na sua última comunicação ao País, perante as câmaras da Televisão, insistiu sobretudo na ideia de que, com o Governo AD, o nível de vida dos trabalhadores portugueses iria aumentar. Como?
Passo a citar o Sr. Primeiro-Ministro a partir do relato transcrito no oficioso Diário de Notícias, de 28 de Abril.
Este ano os preços não subirão mais do que 20%, se tanto. Se os salários subirem 18 %, se os impostos baixarem, como vão baixar a partir de l de Janeiro, cerca de 4% a 6%, libertando, portanto, os salários numa média de digamos, 5 %, teremos que, para uma inflação de 20 %, há aumentos de salários de 18 %, diminuição de impostos de 5 %, um total de 23 %. Os trabalhadores e as famílias ficarão a ganhar. (Fim de citação.)
Só que as contas do Sr. Primeiro-Ministro estão erradas: a massa salarial foi, em 1979, superior a 400 milhões de contos. Para simplificar, tomemos, no entanto, este valor paca o calculo de percentagens.
No mesmo ano foram pagos 16 milhões de contos em imposto profissional e 7,2 milhões de contos em imposto complementar. Embora esta simplificação favoreça Sr. Primeiro-Ministro, vamos admitir que a totalidade do imposto complementar proveio dos rendimentos do trabalho.
Sendo assim, o Estado cobrou por essas duas vias, em 1979, 23,2 milhões de contos.
Se em 1980 os salários forem aumentados de 18%, como prevê o Sr. Primeiro-Ministro, e se as tabelas dos imposto»» tivessem sido actualizadas por forma a manter a mesma percentagem do rendimento cobrado em impostos, pagar-se-iam este ano 27,4 milhões de contos. Manter-se-ia assim um aumento de 18% no rendimento disponível dos trabalhadores a preços correntes.

a realidade, o Governo prevê, em 1980, a cobrança de 26,7 milhões de contos nos impostos profissional e complementar Destes, cerca de 1,5 milhões correspondem, no dizer do Governo, ao resultado do combate à evasão e fraude fiscais - palavras do Sr. Ministro das Finanças na Comissão de Finanças e do Plano. Ficam-no, pois, se quisermos descontar, e temos boa vontade, esta parcela - 25,2 milhões de contos. Em termos de variação do nível de vida dos trabalhadores, a diferença real entre 1980 e 1979, devida aos desagravamentos fiscais, é, pois de 27,4--25,2, ou seja, a cerca de 2 milhões de contos Tal corresponde a 'uma subida do poder de compra dos salários de 0,5 % e não de 5 %, como pretendia o Sr. Primeiro-Ministro e na hipótese que lhe e favorável de que o imposto complementar tributa apenas rendimentos do trabalho, 18% de aumento de salários mais 0,5% de efeito do desagravamento fiscal, segundo os números do Governo, somam 18,5% e não 23 % de aumento do rendimento disponível]. Face a 20% de inflação estimada, os trabalhadores e as suas famílias, em conjunto e afinal, ficam mas é a perder, e os números são do Governo.

Aplausos do PS.

O Governo tenta iludir esta questão considerando que é subida de rendimento a não verificação de uma descida. Para o Governo os salários sobem se descerem menos, tal como os preços baixam se subir rendimentos - são palavras do Sr. Ministro das Finanças.

Risos do PS.

De facto, se se mantivessem as tabelas de 1979, os rendimentos disponíveis diminuiriam com as subidas de escalão devidas à inflação. Mas isso nada tem a ver com as contas do Sr. Primeiro-Ministro, que referem aumentos de rendimento e não supressão de hipotéticas diminuições.
O Sr. Ministro das Finanças ofereceu a um partido da oposição a possibilidade de utilizar a sua máquina de calcular. Pela nossa parte, menos sofisticadamente, recomendamos-lhe, bem como ao Sr. Primeiro-Ministro, a leitura atenta da tabuada.

Aplausos do PS.

É que, por muito que pese ao Governo, 2 e 2 não são 10 quando se trata de benefícios concedidos por este e 2 e 2 não são 0,5 se se referem a impostos a pagar pelos cidadãos. 2 e 2 são 4.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vejamos agora desagregadamente estes valores.
Desde logo os funcionários públicos ficam excluídos dos benefícios fiscais. Apetece perguntar ao Governo por que razões não propôs a estes um aumento do 23 % em coerência com as afirmações do Dr. Sá Carneiro sobre os aumentos médios de rendimento dos trabalhadores.

Aplausos do PS.

Se excluirmos estes e se considerarmos que abaixo dos 14 contos por mês de rendimento, os cidadãos em 1979, não pagavam imposto complementar ficam de fora dos benefícios do imposto complementar mais de 60% dos trabalhadores portugueses. Resta, pois, à esmagadora maioria dos portugueses o hipotético benefício do imposto profissional.
Só que, se os salários subirem 18 % de 1979 a 1980 o que e afinal o tecto salarial do Governo, apenas cerca de metade dos níveis de rendimento interiores a 14 contos mensais são beneficiados e mesmo os que o são, só com uma redução de 2 % na respectiva taxa. Assim acontece se tivermos as contas, para quem ganhava 8, 9, 12 ou 13 contos por mês. Pelo contrário e pelo mecanismo do ajustamento dos escalões quem ganhava 7, 10, 11 ou 14 contos por mês, com os aumentos deste ano, fica na mesma taxa de imposto e não (tem qualquer benefício.

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Mas vamos mais longe. Adoptemos o método, aliás incorrecto, por não ter em conta os aumentos salariais deste ano, com que o Governo faz as suas contas.
Suponhamos três cidadãos com famílias tipo de mulher e dois filhos e só com rendimentos do trabalho, ganhando, efectivamente, 12, 30 e 70 contos por mês.
O primeiro ganha como disse, 12 contos por mês, o que corresponde aproximadamente ao salário médio de 1979. Pagou de impostos em 1979, incluindo também a Previdência e o Fundo de Desemprego, 27 600$. Passa a pagar pelas novas tabelas, se mantiver o mesmo salário, para fazermos as contas como o Governo as faz, 24300$. Ganhou assim 236$ por mês, o que representa um acréscimo de 1,95 no seu rendimento.
O segundo cidadão ganha aproximadamente como nós, os Deputados, 30000$ por mês, embora seja funcionário de entidades privadas. Pagava, nas mesmas condições, 109200$ em 1979. Passa a pagar 81 300$ em 1980, beneficia em 1993$ por mês, ou seja, 6,6% do seu rendimento e oito vezes mais que o primeiro cidadão.
O terceiro cidadão ganha o salário máximo nacional- 70000$. Pagava 398700$ em 1979, passa a pagar 302 100$, ganha com isso 6900$ por mês, ou seja, cerca de 10% do seu rendimento e vinte nove vezes mais do que o benefício do primeiro cidadão.
Quer dizer, quem ganha já seis vezes mais tem um benefício superior em vinte e nove vezes mais.

Aplausos do PS.

Estes números calculados segundo o método do Governo, falam por si, mostram com clareza quem ganhou com o Governo AD e quem tem a ganhar com o Governo AD no futuro. Certamente não é -os números o provam- a esmagadora maioria da população, mas sim os que já hoje são os mais ricos no País.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Mas o Governo vai mais longe e afirma com insistência quo este ano os impostos baixam. Vejamos a verdade de tal afirmação.
A cobrança, no conjunto do sector público, dos impostos directos e indirectos e das contribuições para a Previdência foi, em 1979, de 246 milhões de contos, segundo o mapa que, estranhamente, só foi entregue pelo Governo a pedido dos grupos parlamentares da oposição na Comissão de Economia, Finanças e Plano.
A previsão da execução fiscal correspondente, para este ano, constante do quadro l, p. 7, do relatório do OGE, é de 338,6 milhões de contos.
O aumento -e os números são do Governa - cifra-se, pois, em 37,6%, num ano em que o produto aumentará, segundo o Governo apenas 22,8 % - quadro 26 do relatório das Grandes Opções do Plano.
Isto significa que a pressão fiscal, medida polo quociente entre as receitas fiscais e o produto, passa de 25 % em 1979 para 27,8 % em 1980, o que corresponde ao maior valor de sempre, pelo menos desde o 25 de Abril, conforme se pode verificar no mapa n.º 16 do relatório das Grandes Opções do Plano, elaborado pelo Governo.
O ano em que o Governo anuncia que os impostos baixam é, paradoxalmente, o ano em que, segundo os números do próprio Governo, eles vão aumentar mais do que nunca, em percentagem do rendimento dos Portugueses. Ë certo que baixam algumas taxas, mas o que conta «m .termos de rendimento que fica disponível para os cidadãos são os impostos efectivamente cobrados. O Governo tira com uma mão muito mais do que aquilo que parece dar com a outra, agravando ainda a injustiça fiscal.
Ou então, hipótese que dia a dia ganha credibilidade, as receitas fiscais previstas são totalmente Talseadas, com o objectivo de esconder um deficit real cujo valor, se conhecido publicamente, impediria a continuação da política demagógica que o Governo prossegue para tentar ganhar as eleições. Os números do OGE a este respeito são totalmente irrealistas.
Basta ver as previsões de cobrança do imposto de transacções, da contribuição industrial e das contribuições para a Previdência, que aumentariam, respectivamente, 40 o/o, 109 % e 43,8 %.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não param aqui as incorrecções nas declarações do Governo. Um novo exemplo. Para o Sr. Ministro das Finanças o deficit do OGE diminui este ano em termos reais.
Vejamos a verdade.
O deficit global previsto para 1980 é de 141,2 milhões de contos. Foi em 1979, na primeira previsão orçamental, de 100,9 milhões. O aumento é de 39,9%.
Se tomarmos, no entanto, a execução orçamental de 1979, o deficit real foi nesse ano de 107,5 milhões. O aumento é ainda assim de 30,4 %, muito superior, portanto, ao aumento do produto a preços correntes. Este é, pois, o maior deficit dos últimos anos em percentagem do produto nacional.
Para adulterar a verdade, o Governo faz a única comparação que não é legítima, usando como termo de referência o Orçamento corrigido no último trimestre do ano passado e que se não verificou na prática.
Vejamos ainda e no que diz respeito às Grandes Opções do Plano, o capítulo da balança de pagamentos.
O Governo afirmou sucessivas vezes que o aumento do preço do petróleo custará este ano ao País cerca de l bilião de dólares. Se assim for, o preço do petróleo aumentará portanto na ordem dos 90 %, como o Governo repetidamente tem afirmado também. Sendo assim, e se tomarmos para as restantes, importações as taxas de aumento previstas pela OCDE, o preço médio das importações portuguesas deverá subir este ano cerca de 29 %.
Ora, a proposta de lei do Plano prevê apenas 22 %, em manifesta contradição com as declarações que citei, só para falsear o deficit previsto da balança de transacções correntes, retirando-lhe uma fatia que se pode estimar, em 438 milhões de dólares, que assim desaparecem por magia. A verdade obrigará a prever um deficit de cerca de 1,2 biliões de dólares, ou seja, o nível de deficit de 1976.
Ao ouvir falar o Sr. Deputado Lucas Pires de independência nacional seria de facto uma farsa, se não fosse uma tragédia, face à realidade dos números.

Aplausos do PS.

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Ora, o Sr. Ministro Cavaco Silva sabe bem que o deficit cambial dos primeiros três meses deste ano é da ordem dos 400 milhões de dólares, o que ele atribui em grande parte a efeitos da sazonalidade.
Só que no 1.º trimestre do ano passado se verificou um saldo positivo de 80 milhões. Estranha sazonalidade esta em que as estações mudam de um ano para o outro.

Risos do PS.

Espero não ter de ver em Dezembro próximo o Sr. Ministro das Finanças passando as suas férias de Verão na praia do Guincho.

Risos do PS.

Porquê isto? Porque mais uma vez é preciso esconder aos Portugueses a verdadeira situação da economia nacional. Só assim se poderá continuar até Outubro uma política que bem pode arrumar o País, o que para a AD pouco parece contar, mas que é essencial para ganhar as eleições. Isso mesmo o reconheceu, aliás;, um 'Ministro do actual Governo, em declarações à revista Time ao admitir, em momento fugaz de sinceridade, que isto pode ser assim, e passo a citar, «porque as eleições são em Outubro e o povo só pagará as contas em Dezembro».

Risos do PS e do PCP.

Não faz pois muito sentido discutir aqui este Orçamento e este Plano. Valeria a pena, sim, discutir o verdadeiro Orçamento e o verdadeiro Plano, que o Governo escondeu e cuja análise seria certamente bem mais eloquente A proposta do Governo não é um orçamento, é uma fraude.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por isso mesmo, e atendendo à gravidade das distorções contidas nos documentos apresentados pelo Governo, bem como nas declarações dos seus membros, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista requererá desta Assembleia que à Comissão Parlamentar de Economia, Finanças e Plano seja facultado o contacto directo com os departamentos da Administração Pública que intervieram na elaboração das propostas de lei e respectivos relatórios para completo apuramento da verdade.
Só assim os Deputados e o povo português ficarão a conhecer a verdadeira situação da economia ei as previsões da sua evolução para este ano.
Só assim todos conheceremos antes de Outubro o verdadeiro valor da factura que os Portugueses pagarão em Dezembro, em resultado da política da AD.

Aplausos do PS, do PCP e do MDP/CDE. Entretanto reassumiu a presidência o Sr. Presidente Leonardo Ribeiro de Almeida.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Ferreira do Amaral.

O Sr. Ferreira do Amaral (PPM): - Vou fazer um breve comentário à intervenção do Sr. Deputado António Guterres, que demonstra, aqui, com ou sem máquina de calcular, uma extraordinária habilidade para manipular os números.

Vozes do PSD e do PPM: - Muito bem!

O Orador: - Há uma coisa que é certa: é que não apresentou qualquer espécie de alternativa!...

Protestos do PS.

O Orador: - ...e veio aqui para mostrar não o que o Partido Socialista pensa sobre o Orçamento, mas simplesmente paira o denegrir.

Aplausos do PPM, do PSD e do CDS e protestos do PS.

O Sr. Raul Rego (PS): - Então a oposição é que tem de apresentar o Orçamento?

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peco-lhes o favor de conservarem o mínimo de serenidade compatível com a gravidade do problema que estamos a debater.

O Orador: - O Sr. Deputado António Guterres não mostrou aquilo que pensa sobre o Orçamento, mas a melhor forma de tentar, por todas as maneiras, denegrir o primeiro projecto de Orçamento apresentado nesta Câmara, no qual se reduzem os impostos, fazendo-se, assim, aquilo que o seu partido não conseguiu fazer enquanto esteve no Poder, que í reduzir as taxas dos impostos.

Aplausos do PPM, do PSD e do CDS e protestos do PS.

O Sr. Deputado António Guterres devia dizer aqui como é que, consegue criticar o deficit e ao mesmo tempo achar insuficiente a redução dos impostos e os subsídios para fins sociais, como é que, com a sua excelente matemática dos 24-2=4, tudo isso se liga no seu computador. Era isto que a Câmara precisava de saber.

Aplausos do PPM, do PSD, do CDS e dos Deputados reformadores.

O Sr. António Guterres (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu, partido já esgotou todo o seu tempo.

O Sr. António Guterres (PS): - Mas, Sr. Presidente, considero-me atingido pelas declarações proferidas pelo Sr. Deputado Ferreira do Amaral, pelo que pediria o legítimo direito de resposta.

O Sr. Ferreira do Amarai (PPM): - Sr. Presidente, se me dá licença, a débito do meu tempo ainda disponível e pedindo ao Sr. Deputado António Guterres quo não exceda o minuto que resta no meu partido, gostava que o Sr. Deputado me respondesse.

Aplausos do PPM, do PS, do PSD, do CDS e dos Deputados reformadores.

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O Sr. Presidente: - Até parece que dá para unia abertura dei crédito.

Risos.

O Sr. António Guterres (PS): - Agradeço com muito gosto a gentileza do Sr. Deputado Ferreira do Amaral, atoas inteira monte correspondente ao seu justo comportamento nesta Câmara.
Direi apenas, uma coisa muito simples: contrariamente ao que disse o Sr. Deputado Ferreira do Amaral, eu não critiquei este Orçamento por ter um deficit e, grande ou, pequeno, por ter ou não, prioridades de natureza social.
Limitei-me a apontar um facto: é que este Orçamento nos seus próprios números é a contradição total daquilo que o Governo diz e daquilo que o Governo promete.
A nossa própria alternativa é conhecida: é a alternativa do projecto para os anos 80 aprovado no Congresso Nacional do PS, e do Programa de Governo que nós próprios apresentámos aquando das últimas eleições.

Risos do PSD do CDS e do PPM.

Estiamos convencidos de que era possível reduzir o desperdício que é necessário paira conquistar benesses em termos eleitoralistas que era possível concentrar esforços em melhorar as condições de criação de emprego e as condições de vida dos Portugueses.
Naturalmente, porém, o que aqui está hoje, em causa é a proposta de lei do OGE do Governo da AD. Para o ano, estou certo de que o Sr. Deputado Ferreira do Amaral terá oportunidade dei discutir uma proposta de, lei do OGE e do Plano elaborada por um Governo com base no Partido Socialista.

Aplausos do PS e risos do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Tavares

O Sr. Sousa Tavares (DR): - Ouvi com o maior interesse a exposição do Deputado António Guterres, que acho notável, e queria só colocar-lhe duas ou (três questões, às quais ele responderá se quiser, que eu não tenho tempo para lhe dar.

O Sr. Presidente. - Sr. Deputado, pedia-lhe o favor de, se fosse possível, fazer a sua intervenção na forma afirmativa, porque eu já não posso dar mais tempo ao Sr. Deputado António Guterres, sob pena de abrir um procedente que nos poderá conservar aqui toda a noite.

O Orador: - Assim sendo, eu afirmo que os números-índices pelos quais é calculado de custo de vida não incidem indiferentemente sobra os trabalhadores. Pelo contrário, há constantes na vida da maior parte dos trabalhadores ou que esses números-índices não operam e, portanto, um aumento real de salários verifica-se mesmo em face de um aumento por vezes superior ao custo de vida.
Em segundo lugar, queria dizer que a carga fiscal foi mal comparada pelo Sr. Deputado António Guterres. O Sr. Deputado criticou o Governo por este ter
dito que os impostos tinham baixado. Ora o Governo apenas falou nos impostos sobre o trabalho e no imposto complementar.
Suponho que é ambição de toda a gente em Portugal fazer subir a carga fiscal notai, porque ela é insuficiente. É evidente que há uma massa fiscal que está por descobrir e que tem de ser descoberta. Basta falar, por exemplo, em todos os rendimentos de especulação, que são fantásticos nesse país, são os maiores e sobre os quais não incide nenhuma carga fiscal.

Aplausos dos Deputados reformadores, do PSD e do PPM.

E essa especulação foi posta em Uberdade pelos anteriores Governos.
Como o próprio Sr. Deputado António Guterres reconheceu, nós lemos hoje uma economia paralela, temos uma economia teórica que paga impostos, que esta fundamentada em empresas e temos uma economia por onde passa grande parte da actividade comercial e produtiva portuguesa, que é uma actividade clandestina, uma actividade de especulação. Essa não paga impostos e foi em grande parte posta em marcha pelos Governos socialistas.

Aplausos dos Deputados reformadores, do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Dispõem apenas de tempo o Partido Comunista e o Governo.

O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - É a bipolarização!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças e do Plano.

O Sr. Ministro das Finanças e do Plano (Cavaco Silva): - Sr. Presidente, Srs. Deputados. Foram aqui levantadas várias questões que vou tentar esclarecer dentro de um clima de honestidade e rigor que deve caracterizar-se uma discussão do Plano e do Orçamento.
O primeiro ponto que queria abordar é o da Lei das Finanças Locais quanto ao seu cumprimento ou não cumprimento:.
Eu tive já oportunidade em anterior intervenção de afirmar claramente como é que se tinha chegado ao valor que consta da proposta de lei dói Orçamento e em complemento tive oportunidade de acrescentar que, se tomássemos as rubricas que constam da Lei das Finanças Locais e as rubricas correspondentes do quadro que consta da página 28, em que se somam, tal como manda a Lei das Finanças Locais, as aquisições de bens, as- aquisições de serviços, as transferências correntes., os juros, os investimentos e as transferências de capital, nós obteríamos precisamente 18%.
Eu não quis garantir que esta era cem por cento a interpretaçâo do legislador. O certo é que esperei até agora que aparecessem outras interpretações.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Muito bem!

O Orador: - No entanto, na minha própria intervenção inicial não quis invocar esta interpretação, porque preferi fundamentá-la na quantidade de meios

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suficientes que este Governo se propunha transferir para as autarquias locais e que sem dúvida manifestavam o apoio inequívoco ao reforço do Poder Local.
De facto, em 1978, a título de comparticipações, as autarquias locais receberam dez milhões de contos, no ano de 1979 vinte e três milhões de contos e este ano propõe-se trinta e dois milhões de contos.
Penso, e isso é que é mais importante, que esta quantidade de recursos financeiros vai permitir dar um impulso muito significativo aos investimentos de carácter local. Estou certo -nesse ponto posso dizê-lo- de que não faltarão meios para que as autarquias locais levem por diante os seus investimentos. No dia 31 de Janeiro passado, as autarquias locais em conjunto tinham depositado nos bancos portugueses 7 milhões e 570 mil contos.

Vozes do PS: - Segredo bancário!

O Orador: - Não é segredo bancário, consta das estatísticas que são divulgadas a qualquer cidadão pelo Banco de Portugal.

Aplausos do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores.

Depois surpreendeu-me que certo engenheiro viesse aqui armar-se em paladino defensor das autarquias quando tentou implementar uma orgânica de planeamento ignorando as autarquias locais, mesmo a nível de planeamento regional.

Vozes do PSD e do PPM: - Muito bem!

O Orador: - Um problema muito levantado é o do deficit, indo-me demorar um pouco mais sobre esta problemática.
A questão que aqui foi levantada era a da validade de comparar um Orçamento com um outro orçamento anterior. Penso que o argumento por detrás de tudo isto é o de que era possível que a execução deste Orçamento não fosse coincidente com a execução do Orçamento anterior. O próprio Governo KC podia propor executar o Orçamento de 1980 em margem superior à do Orçamento de 1979. Logo, não seda inteiramente válido fazer a comparação entre uni Orçamento e o anterior.
Sendo assim, as comparações têm de se fazer entre a previsão de execução desse Orçamento e o que foi executado na ano passado. O Orçamento fornece-nos elementos para isso. Vamos à comparação.
Na página 7 -e eu vou falar agora um pouco mais lentamente, não para que cada um faça já as contas, mas para que possa anotar o número e depois fazer a conta em casa, para que não surjam mais dúvidas de como. se faz o cálculo das percentagens, o ainda por cima vou utilizar o único orçamento que fornece um saldo que os economistas consideram que é o único válido para efeitos de análise económica, isto é aquele que é expresso em termos de contabilidade nacional-, na página 7, dizia eu, refere-se que o deficit do orçamento corrente previsto para este ano, 1980, é de 47,9 milhões de contos. Em mapa que foi fornecido à Comissão de Economia -embora com algum atraso, não estou a negar, mas foi fornecido há muitos dias consta o número para 1979, que é de 45,2 milhões de contos. Acréscimo em termos monetários: 6%; decréscimo em termos reais, penso que podemos dizê-lo, superior a 10%. São dois valores de execução-ninguém poderá negar.
Eu referi apenas o deficit corrente, mas no total o valor é diferente. Vou mencionar a página 7 do texto do Orçamento deste ano: deficit total, previsão da realização: 113,5 milhões de contos; realização do ano passado: 96 milhões de contos; acréscimo 18%, em termos monetários; decréscimo em termos reais: pelo menos 20%.
Se fizermos a comparação com o produto interno - e dispensam-me de indicar qual é o valor a utilizar para o produto interno -, verificam que a porcentagem também diminui, e significativamente.
Não concebo como é que a partir de comparações de duas realizações ainda se podem vir invocar sofismas na utilização dos números. Poder-se-ia dizer: mas este Governo revalorizou o ouro. O Sr. Deputado que falou nisso não de«via estar aqui quando fiz a minha primeira intervenção, em que disse que de facto este ano há menos 15 milhões de contos a pagar ao Banco Central, mas também expliquei como este Governo recebeu uma herança muito especial, que foi a de pela primeira vez se ter emitido dívida, o ano passado, à taxa de 18% a pagar pelo Banco Central quando nos anos anteriores &ra de 7,5%, o que lançava imediatamente sobre este, Orçamento uma verba que era de 10 milhões de contos, a que acrescia, pejo simples facto de as taxas de juro terem subido nos mercados internacionais', que este Governo, mesmo que não contraísse qualquer empréstimo externo, já tinha que pagar mais 2 milhões de contos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador:- Por isso é que foi dito aqui várias vezes que este Orçamento escondia a realidade, só que preparava-me para tomar nota e aguardar a indicação afinal de qual era a realidade, mas ela não chegou a ser indicada.

Aplausos do PSD. do CDS e do PPM.

Voltando, a intervenções anteriores, foi dito que eu ainda não adquiri a experiência de ser contrariado em matéria de inflação. De facto eu estava à espera de ser contrariado, isto é, de que alguém me dissesse que o índice de preços não subiu em Março de 1,3%, que não subiu em Fevereiro de 2,0%, que não subiu em Janeiro de 0,5% e que estas três verbas, média trimestral analisada, dá apenas 17%.

O Sr. Ferreira do Amaral (PPM): - Muito bem!

O Orador: - Eu aguardo que este facto seja contrariado, que seja dito que estes valores não são aqueles que constam das estatísticas oficiais que demonstram claramente uma desaceleração da inflação no primeiro trimestre, o que é reconhecido pelas instâncias internacionais.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

Sobre a questão dos impostos, devo dizer que existiu uma certa confusão que de facto me deixou perplexo: a confusão entre variação de taxas e variação de receitas.

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A variação de taxas constitui uma variação na percentagem do rendimento que cada um transfere para o Estado. Como podem variar as receitas? As receitas podem variar porque variam as taxas -esta é apenas uma das formas -, pode variar porque cresce a economia. Surpreendo-me até de facto que isto venha de certas pessoas que sabem que a elasticidade da receita fiscal é superior a l quando temos um sistema de impostos progressivos.
Outra razão por que sobem as receitas resulta da recuperação de atrasos, resulta do combate à evasão e resulta de que certas receitas que anteriormente não estavam contabilizadas em impostos do Governo Central agora aparecem. Por isso é que fiquei satisfeito de há pouco um outro Sr. Deputado ter chamado a atenção para. uma certa confusão do que é carga fiscal, calculada como ratio entre a receita total e o produto dos impostos. Eu próprio, num artigo que escrevi em Janeiro de 1978, que se chama «Nível e estrutura da fiscalidade», começava por uma introdução a chamar a atenção que não e podia confundir baixa de impostos com a carga fiscal. E só chamava a atenção «porque se tratava de matéria demasiado elementar.
Sou autor, não sou co-autor como o Prof. Bento Murteira, mas não tenho nenhum pejo em neste momento oferecer uma cópia do artigo, se necessário com um autógrafo.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM e risos do PCP e do PS.

Aliás ele está disponível e já tem sido objecto de discussão pública. De resto, só nessa parte é que não é discutido porque confundir a variação da receita com a variação da taxa e a baixa dos impostos é matéria demasiado elementar.
No entanto, a matéria é tão óbvia que as pessoas tão claramente percebem que este ano este Governo tomou uma decisão, em relação à hipótese de manter as taxas que estavam em vigor, que não tinha sido tomada desde 1974, pelo menos, de reduzir essas mesmas taxas.
Depois foi invocado várias vezes o aumento, e bastante grande, que ocorre nos impostos indirectos. Foi dito que os impostos indirectos são injustos. Isso não está em causa; o que está em causa é que o aumento dos impostos indirectos resulta de uma acção vigorosa, que se decidiu empreender, de combate à evasão e fraude fiscais.
Não posso acreditar que exista aqui nesta Sala alguém, que esteja contra essa campanha contra a evasão e fraude fiscais que se localiza em grande parte, pelo menos nos montantes absolutos, nos impostos indirectos. Logo, se me vêm dizer que este ano sobe a importância relativa dos impostos indirectos, eu só direi que no passado a sua importância estava oculta, isto é, havia uma distorção por não serem cobrados os impostos que deviam ser cobrados.

Aplausos do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores.

Depois, sobre a questão de como foram feitas as variações de impostos, já outro dia tive oportunidade de expor aqui, nesta Assembleia, que, quando se pretende corrigir os efeitos da inflação sobre a taxa 'dos
impostos - e também gostaria que fosse mostrado o contrário-, não se pode deixar de fazer um ajustamento proporcional nos escalões, porque, e disse-o também nessa altura, se esta Assembleia, por exemplo, vota este ano que um rendimento de 100 contos é tributado com 2 % e um .rendimento de 200 con-(tos é tributado com 4 %, se entretanto ocorrer uma inflação de 100%, quem me diz que para manter o que ela votou não é necessário actualizar os escalões na mesma proporção? Gostaria que me demonstrassem que não é assim.
Assistimos ainda há pouco a uma serie de demonstrações aritméticas que partiam todas de um certo número que me deixou perplexo. Até parti da hipótese de ter ouvido o número errado, que era o de a massa salarial em. Portugal ser de 470 milhões de contos. A diferença foi só dia 130 milhões.

Risos do PSD e do CDS.

É que a massa salarial em Portugal sobre que podem incidir -está ali o relatório do Banco de Portugal, que pode ser consultado- o imposto profissional e o imposto complementar é um valor próximo de 330 a 340 milhões de contos, o que para 470 milhões de contos é uma diferença muito grande.

O Sr. António Guterres (PS): - Em média!

O Orador: - Chegado a este ponto, podia tentar reconstituir o Orçamento que a oposição queria. Muito rapidamente direi que a oposição queria um Orçamento em que as despesas fossem mais elevadas, principalmente -e até toleravam quase todos- que fossem mais elevadas em despesas de consumo público. Mas o Governo não perfilha essa opinião, porque entende que se impõe exigir eficiência e é possível obter ganhos substanciais no domínio da Administração Pública. Não aceita, porque entende que é tempo de passar a autoridade para o sector público, quando até aqui esteve colocada e sempre no sector privado; não acedia, porque sem a diminuição do consumo público não era possível este ano baixar os impostos e aumentar o rendimento disponível das pessoas.
Alguns também queriam o aumento das despesas de capita], mas eu ditei que a posição do Governo está claramente expressa: este ano destinou 77 milhões de contos a investimentos que vão permitir que o investimento do sector público cresça cerca de 6 %. Pretendo também qua o investimento privado cresça e isso pressupõe que se deixe o montante adequado de crédito paira esse mesmo sector privado.
Por outro lado, queria a oposição que o deficit fosse menor. Ora, eu já expliquei como é que se determina o deficit que está determinado o que é consistente com o aumento da procura interna que permite que a economia adquira expansão adequada, que a inflação não ultrapasse os 20 % e que o investimento seja relançado, ao mesmo tempo que é mantido o controle sobre a balança de pagamentos.
Mas, como queriam mais despesas e1 um deficit menor, só podiam querer impostos maiores, mas aí o Governo foi claro: tinha tomado a opção de que as taxas de alguns impostos não se podiam manter, que havia que fazer ajustamentos mo domínio doe

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impostos profissional e complementar, principalmente em ordem a aumentar o rendimento disponível das pessoas e a permitir o aumento do consumo privado. Por isso, não é esta o Orçamento que a Oposição defendia. Ela queria que nos fizéssemos um orçamento que não permitisse a obtenção dos resultados que nos propusemos e, como os resultados neste momento já estão a surgir, eu aceito que a verdade dói, especialmente a quem não gosta delia, e aquilo a que asais t imos até estie momento foi a expressão dessa dor, mas, mesmo assim, a verdade não deixa de ser verdade.

Aplausos do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores.

O Sr. Sousa Marques (PCP): - É a chamada verdade da aldrabice.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas, que dispõe de oito minutos e trinta segundos.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): -Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Passando por cima dos. floreados do Sr. Deputado Lucas Pires, vamos directamente às últimas afirmações do Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro das Finanças confirmou aqui solenemente, que de facto o deficit deste Orçamento é o maior de sempre, e nós lembramos isso boje às bancadas da situação e ao Sr. Ministro, que quando foi Deputado, sempre criticou os deficits elevados.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - E, curiosamente, mesmo com este deficit, o Sr. Ministro não conseguiu inscrever uma verba que desse um aumento ao funcionalismo público que cobrisse, pelo menos, a inflação que prevê e que não vai cumprir-
Não desmentiu que o deficit da balança de transacções correntes ultrapassasse os 900 milhões de dólares, e isto para umas opções que vão levar a economia portuguesa à estagnação, Pois nós, já que fomos acusados de não apresentar alternativas, dizemos muito claramente que com um deficit de 900 milhões de dólares era possível uma taxa de expansão superior a 5 %. O modelo está à disposição do Sr. Ministro, basta pedi-lo ao Departamento Central de Planeamento.

Sr. Ministro não desmentiu, antes confirmou, que o Governo em matéria de impostos faz pagar mate a quem menos tem. Ê isso que pretende e que aliás o meu camarada Veiga de Oliveira há pouco demonstrou, contra o que o Sr. Ministro nada disse.

Vozes do PCP: - Muito bem!

Vozes do PSD: - Muito mal.

O Orador: - Não respondeu ao desafio que lhe foi feito hoje aqui de manhã, na sua presença, para um debate, nesta Assembleia ou fora dela, acerca dos lucros das empresas públicas.
Não respondeu se é ou não verdade que foi o Orçamento que recebeu nestes últimos três anos 12,5 milhões de contos das empresas públicas nacionalizadas e não o contrário, e seria bom que respondesse
Fizemos-lhe perguntas muito concretas e até agora nada respondeu.
Gostaríamos também que nos dissesse se é ou não verdade que o Governo - porque já o disse publicamente - prevê criar para este ano, pura e simplesmente, dezoito mil postos de trabalho e se é verdade ou não que afluem ao mercado, pelo menos, vinte e quatro mil jovens e se é esta a justiça social: aumentar o desemprego.
Ficamos de facto muito esclarecidos com a manipulação de números, mas lamentamos ter de dizer ao Sr. Ministro das Finanças que um qualquer Ulisses Cortês apresentaria esses dados.

Aplausos do PCP, do MDP/CDE e de algum Deputados do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira, que dispõe de seis minutos.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs Deputados: O Sr. Ministro das Finanças até ao fim continua a manipular números sem o mínimo de vergonha.

Protestos de PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores.
Se os Srs. Deputados não gostam da palavra «vergonha», substituo-a por «pudor».
Apenas dois exemplos muito breves. O Sr. Ministro acabou de tentar manipular mais uma vez os números, fazendo comparações entre os dois deficits em termos de execução orçamental de 1979 e previsão de execução orçamental para 1980, comparando 96 milhões de contos com 113 milhões de contos. Esqueceu-se, pura e simplesmente -e passo a referir o que vem no próprio texto do Orçamento -, da verba de 15,1 milhões de contos relativa a amortizações e outros encargos financeiros que também pesam no deficit orçamental
Assim, concreta e realmente, a comparação é entre 128,6 milhões de contos e 107 milhões de contos, o que dá uma percentagem de 20,6% de aumento.
O segundo exemplo é em relação às finanças locais. O problema que está em discussão é o n.º 3 do artigo 8.º da Lei n.º 1/79. O conjunto dessas despesas, Sr. Ministro, dá 305,8 milhões de contos, 18 % significam 55 milhões de contos, o Governo atribui 30 milhões de contos, faltam 25 milhões de contos.
Se mesmo assim o Sr. Ministro tiver dúvidas -e nós não admitimos dúvidas em termos de interpretaçâo da lei-e retirar 93 milhões de contos de serviço do pessoal, mesmo assim os 18% significam 38 milhões de contos, faltam por conseguinte 8 milhões de contos naquilo que o Governo estabelece na proposta de lei do Orçamento.

Disse.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

Vozes do PSD: - Disse, mas mal.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, V. Ex.ª pretende responder os perguntas que lhe foram formuladas?

Página 1912

1912 I SÉRIE - NÚMERO 46

O Sr. Ministro das Finanças e do Plano: - Sim, Sr. Presidente, mas gostaria de responder a todas em conjunto. Caí que pretenda saber se há mais algum Sr. Deputado inscrito para mas formular pedidos de esclarecimento.

O Sr. Presidente: - Não, Sr. Ministro, não há. Portanto, tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Ministro das Finanças e do Plano: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na sua intervenção o Sr. Deputado Carlos Carvalhas focou que eu tinha feito várias afirmações, que eu tinha confirmado isto e aquilo. Não está na minha intenção oferecer aparelhos de Sonotone a ninguém ...

Risos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - O Sr. Ministro é que precisa de aparelhos de som.

O Orador: - ... e penso que também não é necessário confirmar aqui que não fui Deputado na última Assembleia, isso é conhecido.
Todavia t relativamente à pergunta sobre as empresas públicas, julgo que já tive ocasião de explicar que, contrariamente àquilo que alguns afirmam ou sugerem nas suas afirmações - alguns que não percebem a função da taxa de lucro nas empresas públicas em qualquer país, até nos países totalitários, porque a função é semelhante à afectação de recursos - , eu disse aqui que em princípio todas as empresas públicas devem gerar uma poupança positiva, considerado que seja o montante do valor dos benefícios sociais que resultam da actividade dessas empresas. A excepção, o erro é quando não sucede assim.
Mas tomo foram pedidos alguns esclarecimentos quanto a valores, posso dizer-lhe que em 1979 apareceu no Orçamento como receitas de empresas públicas para o Orçamento 12,576. Desses 12,576 10,884 milhões, ou seja. 86,7% são lucros do Banco de Portugal.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

A Sr.ª Ilda de Figueiredo (PCP): - Sem o Banco de Portugal.

O Orador: - Já disse que foram 12,5 milhões no total. Mas tem o Banco de Portugal foi: Caixa Geral de Depósitos 601 milhões, outros bancos 171 000 contos. Portanto 12,576 milhões, 86,7 % do Banco de Portugal cujos lucros são determinados pela política monetária que é prosseguida - se há muito, de redesconto, existem lucros, se não há muito de redesconto não existem lucros.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Continua a não responder a nada.

O Orador: - Eu julgo que toda a explicação tem um limite e a partir de certo momento eu exijo que as pessoas façam um certo esforço.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

Um outro ponta que voltou novamente - e aí até com um insulto a que eu não respondo - foi que eu tinha voltado a fazer a comparação entre unia previsão é uma execução e nesse caso eu leio as pp. 6 e 7 para que remeti - a p. 7 é a do quadro e a p. 6 é a da explicação, e amues de for o quadro é melhor ler a explicação. Diz: «A partir dos valores das projecções das contas nacionais do sector público administrativo, torna-se possível analisar [...], foram admitidos como níveis de realização» e até se diz depois as percentagens que sã admitiram para realização para cada' unia dai componentes.
Por isso se ainda não tinham percebido eu digo: o quadro que está na p. 7 é o quadro de execução do Orçamento Geral do Estado, no ponto, de vista das contas nacionais, para 1980, que foi comparado com o quadro equivalente de 1979.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Leia o § 4.º do n.º 5 do seu documento.

Protestou do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não lhes parece que o estai mos a discutir deve ser encarado com uma serenidade, com uma ponderação e sobretudo com uma honradez de princípios e de verdade que impede todas as manifestações emocionais e nos deve conter nos puros limites do raciocínio?
É isto que vos peço.

Aplausos do PSD e de alguns Deputados do PS e do PCP.

O Orador: - Eu não queria invocar novamente que há sempre limites para a explicação, mesmo quando se tem bastante paciência.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Não seja ridículo, Si. Ministro.

O Orador: - A última questão que foi levantada novamente, e ou já tinha dada a resposta, é a da Lei das Finanças; Locais.
Voltando a afirmar aquilo que já afirmei anteriormente, de que o Governo, eu próprio não quero reivindicar uma interpretaçâo única e canta, absolutamente certa da Lei das Finanças Locais, o que posso garantir, e nesse caso o Ministério também pode fornecer os números, é que, se utilizar a classificação económica do Orçamento, que contém rubricas com títulos praticamente coincidentes com aqueles que conotam do antigo que foi mencionado da Lei das Finanças Locais, chega à conclusão de que o valor transferido é precisamente de 18% do montante dessas despesas.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - A sua máquina está estragada, Sr. Ministro!

O Orador: - Eu não queria referir novamente que podia emprestar a máquina, agora posso dizer que não a empresto, porque receio que ma estraguem.

Aplausos do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

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2 DE MAIO DE 1980 1913

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Ministro das Finanças, queria apenas dizer-lhe que não respondeu a algumas das perguntas e fugiu a uma pergunta concreta que lhe formulei.
O problema não era se a maior percentagem dos lucros de 1979 eram do Banco de Portugal, mas se, sim ou não, de 1977 a 1979, 12,5 milhões de contos foram a contribuição das empresas ao OGE, em termos líquidos. Quanto a esta questão nada respondeu, como também não respondeu em relação ao deficit da balanço de transacções correntes nem respondeu à pergunta que lhe formulei relativamente ao deficit do Orçamento.
Mas mais, Sr. Ministro: o Sr. Ministro tem em seu poder um documento, melhor dizendo, um trabalho feito por uma empresa privada, onde se encontram discriminadas todas as verbas relativas às empresas públicas. Já foi pedido, em comissão, em requerimento, e eu já o desafiei na interpelação ao Governo e o Sr. Ministro manteve-se mudo. Hoje também não respondeu nem distribuiu esse documento. Porquê, Sr. Ministro? Terá isto a ver com a sua máquina ou é falta de corrente?

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças e do Plano.

O Sr. Ministro das Finanças e do Plano: - Vou responder à questão relativamente à qual tem razão, porque não lhe respondi, que foi a questão relativa ao deficit de 900 milhões de dólares, que me parece estar bastante apostado em, daqui a um ano, dizer que acertou, que o deficit foi mesmo de 900000 ou mesmo 1 bilião de dólares.
Quanto à outra questão relacionada com as empresas públicas, penso que já respondi e acho que não vale a pena votar a ela, porque lhe disse até que, no ano anterior, ela tinha contribuído com receitas de 12 milhões de contos, e já disse aqui que o valor do capital que neste momento se encontra nas empresas públicas devia justificar anualmente uma transferência para o Orçamento de valores muito, repito, muito mais elevados, tal como acontece em qualquer país que tem bastantes empresas públicas. É assim que deve ser, é prática normal, deve ser assim e quando não acontece assim é porque existe ineficiência no funcionamento dessas empresas.
Penso que dei a resposta da forma como se pode responder a tal pergunta.
A segunda questão é a do deficit e já tive oportunidade de dizer, está escrito no discurso que fiz aqui, que este Governo não tinha erguido à categoria de objectivo absoluto a manutenção de um baixo deficit da balança de transacções correntes em 1980.
Tive mesmo oportunidade de afirmar que considerava, e considero, um erro na nossa política económica o facto de termos obtido um superavit em 1979. Não nos podemos dar ao luxo de ter um decrescimento no investimento de cerca de 2 a 3% para apresentar um superavit de 50 ou 100 milhões de dólares. Já tive a oportunidade de salientar isso aqui nesta Câmara.
Os objectivos do Governo são outros: aumentar o poder de compra das populações e por isso baixa os impostos.

Risos do PCP.

Eu estou apenas a explicar os instrumentos que o Governo utiliza.
Mas, como eu ia dizendo, por isso baixa os im postos, aumenta as pensões e tenta controlar a inflação para que este ano seja possível um crescimento dos salários reais. Este é um objectivo.
Outro objectivo do Governo é o relançamento do investimento para o qual o Governo prevê um crescimento de 6%. Já expliquei aqui várias vezes como é que o prevê e uma das formas que referi é o crescimento do investimento do sector público de 0% para 6 %. Ainda outro objectivo do Governo, que também já referi várias vezes, é controlar a inflaria económica com um objectivo dessa mesma política entrada no Mercado Comum.
Queremos manter e também já o afirmei aqui - sob contrôle o deficit externo, não podemos voltar a uma situação de descontrole desse mesmo deficit, mas nada de confundir aquilo que é uma restrição da política económica com um objectivo dessa mesma política económica.
Aliás também referi que não me importava nada e não riscava nada preocupado se o Sr. Deputado acertasse relativamente ao número de 900 milhões de dólares de deficit, mas diz-lhe da que era uma glória muito pobre ter acertado nisso.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Peço a palavra. Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Ministro das Finanças, a questão não é essa. A questão que eu lhe pus foi a seguinte: com 900 milhões de dólares de deficit da balança de transacções correntes é possível uma taxa de expansão da economia da ordem dos 5 %, se não fosse uma política demagógica aquela que o Governo está a praticar.
Mas, como o Sr. Ministro já admite que o deficit chegue a 1 bilião de dólares, então nós afirmamos, matemática e precisamente - e sem máquinas nem corrente -, que era possível numa taxa de expansão de 5,5 %.
Mais uma vez lhe digo, Sr. Ministro, que o modelo econométrico está à sua disposição, as opções políticas é que são outras, não são as do grande capital.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Ferreira do Amaral (PPM): - Peço a palavra. Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Ferreira do Amaral.

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1914 I SÉRIE - NÚMERO 46

O Sr. Ferreira do Amaral (PPM): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Era só para um breve comentário em relação ao que acabou de passar-se com este breve diálogo. É que nós já sabíamos que a bancada do Partido Comunista Português tinha medíocre em comportamento e agora ficámos a saber que tem mau em aproveitamento.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Mário Tomé (UDP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado Mário Tomé, mas devo avisá-lo de que dispõe apenas de um minuto.

O Sr. Mário Tomé (UDP): - Como a UDP tem tão pouco tempo, não posso desprezar um minuto de qualquer forma.
Há pouco ouvi dizer que a AD vai votar positivamente este Orçamento..

Uma voz do PSD: - Bruxo!

O Orador: - ...e, tendo apoiado e aplaudido tão vibrantemente o discurso do Sr. Deputado Lucas Pires, não quero que isto passe sem um comentário da minha parte. Para o Sr. Deputado Lucas Pires, no seu discurso, não há classes nem há explorações, há capitalistas que, vendidos ao imperialismo, nos vão salvar do imperialismo, que vão investir e os trabalhadores vão produzir alegremente.
O Sr. Deputado Lucas Pires fez um discurso contra a história, contra a sociedade e contra a cultura. Por detrás dos números do Orçamento do Sr. Deputado Lucas Pires não está a ousadia e a inventiva do Sr. Ministro Cavaco e Silva - como ele próprio disse -, o que está, e isto é preciso que o povo saiba, é a GNR, a polícia de choque ...

Risos do PSD e do CDS.

... e as milícias patronais.
O Sr. Deputado Lucas Pires, no clímax solitário da AD, fez um discurso estruturalmente fascista e era apenas isto que eu queria dizer.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Mário Tomé, peço licença para lhe chamar a atenção de que, por um consenso muito elegantemente estabelecido entre todos os partidos e a que V. Ex.ª aderiu, o termo fascista foi há muito tempo arredado da terminologia desta Câmara.

O Sr. Lucas Pires (CDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Lucas Pires (CDS): - Apenas para dizer que por detrás de mim não está nem nunca esteve a Polícia Militar e todos homens que o major Tomé serviu nessa altura.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Está encerrado o debate na generalidade.

Vamos agora suspender a sessão por trinta minutos ...

O Sr. Amando de Azevedo (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creia que existe um consenso na Câmara. Não pude consultar todos os partidos, mas, concretamente, consultei o Partido Socialista, o Partido Comunista e a UDP, não tive oportunidade de consultar o MDP/CDE nem os outros partidos...

O Sr. Luís Catarino (MDP/CDE): - É hábito, é hábito!

O Orador: - Não é hábito, foi falta de tempo, Sr. Deputado, e estou exactamente a referir as circunstâncias em que a consulta foi feita, porque não havia tempo para mais.
Mas, exactamente, porque o Sr. Presidente estava para suspender a sessão...

O Sr. Presidente: - Nos termos estabelecidos pelo Regimento.

O Orador: - Exacto, Sr. Presidente, mas, desde que haja um consenso unânime dos partidos no sentido de dispensar o intervalo, e penso que esse consenso existe de facto, nós pedia-mos que a votação se fizesse imediatamente.

O Sr. Presidente: - Se todos os partidos estiverem de acordo de modo que esse consenso possa ser estabelecido, vamos proceder de imediato à votação.

Pausa.

Vamos votar, na generalidade, a proposta de lei das Grandes Opções do Plano.

Submetida à votação, foi aprovada, com 125 votos a favor (PSD, CDS, PPM e Deputados reformadores) K III votos contra (PS, PCP, MDP/CDE e UDP).

O Sr. Presidente: - Vamos agora votar, na generalidade, a proposta de lei do Orçamento Geral do Estado.
Submetida à votação, foi aprovada, com 125 votos a favor (PSD, CDS, PPM e Deputados reformadores) e III votos contra (PS, PCP, MDP/CDE e UDP).

O Sr. Presidente: - Antes de encerrar a sessão, cumpre-me anunciar que deram entrada na Mesa a proposta de lei n.º 318/I, sobre disciplina reguladora da criação de novas freguesias, o projecto de lei n.º 463/I, apresentado pelo Sr. Deputado Godinho de Matos e restantes Deputados reformadores, sobre o regime jurídico de protecção do património cultural, e os projectos de lei apresentados pelo Sr. Deputado Mário Marques Ferreira Maduro e outros do PSD, n.º 464/I, sobre a criação da freguesia de Seixos no concelho de Mira, n.º 465/I, sobre a criação da freguesia de Carapelhos, também no concelho de

Página 1915

2 DE MAIO DE 1980 1915

Mina, 466/I, sobre a criação da freguesia de Santana no concelho dia Figueira da Foz.

Srs. Deputados, os nossos trabalhos continuam, conforme estabelecido, na próxima terça-feira, às 9 horas e 30 minutos.

Rectificação ao n.º 35 do Diário

Na 1.º col. do «Sumário», 1. 32 a 1. 34, onde se lê: «tendo ainda o Deputado comunista respondido a um protesto da Sr.ª Deputada Natália Correia (PSD)», deve ler-se: «tendo ainda a Sr.ª Deputada Natália Correia (PSD) feito um protesto relativamente à declaração de voto do Deputado comunista».
Na p. 1434, 2.ª col., onde se lê: «por aqueles que se mostram à frente deste Governo», deve ter-se: «por aquelas que se encontram à frente deste Governo».
Nas mesmas página e coluna, último parágrafo, onde se lê: «muito para além dó Dia Internacional para a Eliminação da Discriminação Racial cuja aclamação aqui propusemos com a apresentação deste voto», deve ler-se: «muito para além ao Dia Internacional pana a Eliminação da Discriminação Racial cuja comemoração aqui propusemos com a apresentação deste voto».

Rectificação ao n.º 40 do Diário

O Presidente da sessão foi, não como por lapso se indicou o Sr. Deputado António Duarte Arnaut, mas o Sr. Deputado José Rodrigues Vitoriano.

Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Social-Democrata (PSD)

Afonso de Sousa Freire de Moura Guedes.
Alcino Cabral Barreto.
Álvaro Barros Marques de Figueiredo.
Amândio Anes de Azevedo.
Amélia Cavaleiro M. de Andrade de Azevedo.
Américo Abreu Dias.
António Alberto Correia Cabecinha.
António José dos S. Moreira da Silva.
António Maria Pereira.
Arménio dos Santos.
Carlos Matos Chaves de Macedo.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel da Cunha Dias.
Dinah Serrão Alhandra.
Eleutério Manuel Alves.
Fernando dos Reis Condesso.
Fernando José da Costa.
Fernando Manuel A. Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Henrique Alberto F. do Nascimento Rodrigues
Jaime Adalberto Simões Ramos.
João Aurélio Dias Mendes.
João Vasco da Luz Botelho de Paiva.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
José Ângelo Ferreira Correia.
José da Assunção Marques.
José Manuel Meneres Sampaio Pimentel.
José Theodoro da Silva.
Júlio de Lemos de Castro Caldas.
Luís António Martins.
Manuel Luís Fernandes Malaquias.
Manuel Maria Moreira.
Maria Adelaide Santos de Almeida Paiva.
Maria Helena do Rêgo da C. Salema Roseta.
Maria Manuela Simões Saraiva.
Marília Dulce C. P. Morgado Raimundo.
Mário Dias Lopes.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Mário Marques Ferreira Maduro.
Miguel Camolas Pacheco.
Natália de Oliveira Correia.
Nicolau Gregório de Freitas.
Pedro Manuel da Cruz Roseta.
Rui Alberto Barradas do Amaral.

Partido Socialista (PS)

Agostinho de Jesus Domingues.
Albano Pereira da Cunha Pina.
Alberto Rodrigues Ferreira Gamboa.
António Chaves Medeiros.
António Francisco Barroso Sousa Gomes.
António José Sanches Esteves.
António José Vieira de Freitas.
António Manuel Maldonado Gonelha.
Aquilino Ribeiro Machado.
Armando Filipe Cerejeira P. Bacelar.
Armando dos Santos Lopes.
Avelino Ferreira Loureiro Zenha.
Beatriz M. de Almeida Cal Brandão.
Bento Elísio de Azevedo.
Carlos Alberto Costa de Sousa.
Carlos Manuel Natividade Costa Candal.
Edmundo Pedro.
Fernando Alves de Almeida Miranda.
Fernando Luis de A. Torres Marinho.
Francisco Cardoso P. de Oliveira.
Francisco Manuel Marcelo M. Curto.
Frederico A. F. Handel de Oliveira.
Gualter Viriato Nomes Basílio.
Guilherme Gomes dos Santos.
Jaime José Matos da Gama.
João Cardona Gomes Cravinho.
João Joaquim Gomes.
Joaquim Sousa Gomes Carneiro.
José Gomes Fernandes.
José Luís do Amarai Nunes.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Maximiano de A. Almeida Leitão.
José Maria Parente Mendes Godinho.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Silvério Gonçalves Saias.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Manuel António dos Santos.
Manuel José Bragança Tender.
Maria Emília de Melo Moreira da Silva.
Maria Teresa V. Bastos Ramos Ambrósio.
Raul da Assunção Pimenta Rego.
Rodolfo Alexandrino Susano Crespo
Rui Fernando Pereira Mateus.
Teófilo Carvalho dos Santos.
Victor Manuel Gomes Vasques.
Victor Manuel R. Fernandes de Almeida.

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1916 I SÉRIE - NÚMERO 46

Partido Comunista Português (PCP)

Álvaro Augusto Veiga de Oliveira.
Álvaro Barreirinhas Cunhal.
António Dias Lourenço da. Silva.
Carlos Alfredo de Brito.
Domingos Abrantes Ferreira.
Fernando de Almeida Sousa Marques.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
Joaquim Gomes dos Santos.
Joaquim Victor Baptista G. de Sá.
Jorge do Carmo da Silva Leite.
José António Veríssimo Silva.
José Ernesto I. Leão de Oliveira.
José Manuel do C. Carreira Marquês.
Lino Carvalho de Lima.
Marino B. de Vasconcelos B. Vicente.
Octávio Augusto Teixeira. Vital Martins Moreira.
Zita Maria de Seabra Roseiro.

Centro Democrático Social (CDS)

Adalberto Neiva de Oliveira.
Américo Maria Coelho Gomes de Sá.
António Martins Canaverde.
Artur Fernandes.
Carlos Alberto Faria de Almeida.
Domingos da Silva Pereira.
Eduardo Leal Loureiro.
Eugénio Maria Anacoreta Correia.
Francisco António Lucas Pires.
Francisco Gonçalves Cavaleiro de Ferreira.
Francisco Manuel L. V. Oliveira Dias.
Henrique José C. de Meneses P. Moraes.
Henrique Manuel Soares Cruz.
Henrique Rocha Ferreira.
Isilda Silva Barata.
João J. S. Fernandes Homem.
Joaquim Rocha dos Santos.
José Augusto Fernandes Sanches Osório.
José Manuel Macedo Pereira.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
Luís Carlos C. Veloso de Sampaio.
Luís Eduardo da Silva Barbosa.
Luís Filipe Pais Beiroco.
Luís Gomes Moreno.
Manuel António de A. e Vasconcelos.
Manuel Baeta Neves.
Manuel Cunha Mota.
Maria José Paulo Sampaio.
Maria Habita. L: F. Mendes Soares.
Narana Sinai Coissoró.
Rogério Leão.
Rui Eduardo F. Rodrigues Pena.
Ruy Garcia de Oliveira.

Partido Popular Monárquico (PPM)

António José Borges G. de Carvalho.
Augusto Martins Ferreira do Amaral.
Henrique José Barrilaro F. Ruas.

Agrupamento Parlamentar dos Reformadores

Armando Adão e Silva.
Francisco José de Sousa Tavares.
José Manuel Medeiros Ferreira.
Nuno Maria Monteiro Godinho de Matos.

Movimento Democrático Português

Helena Tâmega Cidade Moura.
Herberto de Castro Goulart da Silva.
Luís Manuel A. de Campos Catarino.

União Democrática Popular (UDP)

Mário António Baptista Tomé.

Deputados que faltaram à sessão:

Partido Social-Democrata (PSD)

António Augusto Lacerda de Queiroz.
António Maria de O. Ourique Mendes.

Partido Socialista-(PS)

Alberto Arons Braga de Carvalho.
António de Almeida Santos.
António Duarte Arnaut.
António Fernandes da Fonseca.
João Alfredo Félix Videira Lima.
Maria de Jesus Simões Barroso Soares.
Victor Manuel Ribeiro Constâncio.

Partido Comunista Português (PCP)

Jorge Manuel Abreu de Lemos.

Centro Democrático Social (CDS)

Manuel Eugénio P: Cavaleiro Brandão.

Está encerrada a sessão. Eram 0 horas e 45 minutos.

O CHEFE DA DIVISÃO DE REDACÇÃO, José Pinto.

PREÇO DESTE NÚMERO 82$00

IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA

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