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I Série -Número 53

Quarta-feira, 21 de Maio de 1980

DIÁRIO da Assembleia da República

I LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1979-1980)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 20 DE MAIO DE 1980

Presidente: Exmo. Sr. Leonardo Eugênio Ramos Ribeiro de Almeida

Secretários: Exmos. Srs. Manuel Henriques Pires Fontoura
Alberto Marques Antunes
José Manuel Maia Nunes de Almeida
Francisco Gonçalves Cavaleiro de Ferreira

SUMÁRIO.- O Sr. Presidente declarou aberto o reunião ás 15 horas e 35 minutos.

Antes da ordem do dia. -Deu-se conta do expediente, de requerimentos ao Governo e da entrada das petições n.º 283/I e 284/I.
A Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura (MDP/CDE) respondeu a pedidos de esclarecimento, relativos à sua intervenção do passado dia 13, dos Srs. Deputados Jorge Lemos (PCP), Igrejas Caeiro, José Nisa e Raul Rego (PS).
O Sr. Deputado Eleutério Alves (PSD) falou sobre o problema das vias de comunicação no Nordeste transmontano. Respondeu no fim a um pedido de esclarecimento e um protesto do Sr. Deputado Chaves Medeiros(PS).
O Sr. Deputado Fernando Miranda, criticando a política do Governo, referiu-se a situação ocorrida com a inauguração do pavilhão gimnodesportivo de Matosinhos e a Agro/80, em Braga.
O Sr. Deputado Handel de Oliveira PS) acusou o Governo de não cumprir a Lei das Finanças Locais com a dotação inscrita no OGE para a Câmara Municipal de Guimarães. Respondeu no fim a um protesto do Sr. Deputado Fernando Roriz (PSD).
O Sr. Deputado Vítor Louro (PCP) referiu-se ao sector das empresas produtoras de pasta de papel, condenando a política seguida pelo Governo no mesmo. Respondeu no fim a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Luís Coimbra (PPM.), Valdemar Alves e Mário Alves (PSD).
Ordem do dia. - Pela Sr.ª Deputada Rosa Brandão (PCP) foi apresentado o projecto de lei n.º 45/II -criação de licenciatura em Artes Plásticas e Design -, a qual respondeu depois o pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Carlos Sousa (PS), Adriano Vasco Rodrigues (CDS) e Helena Cidade Moura (MDP/CDE).
Depois de lido pelo Sr. Deputado João Machado (PSD), foi aprovado um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos relativos á substituição de um Deputado do PSD.
Na continuação da discussão da ratificação n.º 319/II Decreto-Lei n.º 10-A/80 de 18 de Dezembro , pedido pelo PCP, intervieram, a diverso titulo, os Srs. Deputados António Esteves (PS), Narana Coissoró (CDS), Amândio de Azevedo (PSD), Marino Vicente(PCP), Igrejas Caeiro(PS), Almeida Santos(PS), João Amaral (PCP), Sousa Tavares (DR) Armando Bacelar(PS) e Adalberto Ribeiro(PCP).
Concedida a ratificação, registraram-se declarações de voto dos Srs. Deputados Marino Vicente (PCP), Mário Tomé (UDP) e Armando Bacelar {PS).
Discutiu-se e aprovou-se na generalidade a proposta de lei n.º 294/I - Define as medidas legais de protecção contra a reprodução ilícita de fonogramas, tendo intervindo os Srs. Deputados João Amaral (PCP), José Nisa (PS), Castro Caldas (PSD) e Baeta Neves (CDS). A requerimento do PS, baixou o disposto à Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias, para discussão e votação na especialidade.
O Sr. Presidente encerrou a reunião eram 20 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai proceder-se â chamada.

Eram 15 horas e 20 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD)

Álvaro Barras Marques de Figueiredo.
Amândio Anes de Azevedo.
Amélia Cavaleiro M. de Andrade de Azevedo.
Américo Abreu Dias.
António Duarte e Duarte Chagas.
António José dos S. Moreira da Silva.
António Maria de O. Ourique Mendes.
António Monteiro de Freitas.
Armando António Correia.

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Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel da Cunha Dias.
Daniel Abílio Forrara Bastos
Eleutério Manuel Alves.
Fernando José Sequeira Roriz.
Fernando Manuel A. Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Francisco Mendes da Costa
Germano da Silva Domingos.
Henrique Alberto F. do Nascimento Rodrigues
Jaime Adalberto Simões Ramos.
João António Sousa Domingues
João Aurélio Dias Mendes.
Jorge Rook de Lima.
José Baptista Pires Nunes.
José Henrique Cardoso
José Luís Figueiredo Lopes
Leonardo Eugênio R. Ribeiro de Almeida.
Manuel António Araújo dos Santos.
Manuel Henriques Pires Fontoura.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Manuel Pereira.
Manuel da Silva Leça.
Maria Manuela Simões Saraiva,
Marília Dulce C. P. Morgado Raimundo.
Mário Dias Lopes.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Mário Marques Ferreira Maduro.
Mário Martins Adegas.
Miguel Camelas Pacheco.
Nuno Aires Rodrigues dos Santos.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Alberto Barradas do Amaral.
Valdemar Cardoso Alves.

Partido Socialista (PS)

Adelino Teixeira de Carvalho.
Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Marques Antunes
Alberto Rodrigues Ferreira Camboa.
António Cândido de Miranda de Macedo.
António Curiós Ribeiro Campos.
António Chaves Medeiros.
António Duarte Arnaut.
Amónio José Sanches Esteves.
António Manuel Maldonado Gonelha.
Aquilino Ribeiro Machado.
Avelino Ferreira Loureiro Zenha.
Beatriz M. de Almeida Cal Brandão.
Bento Elísio de Azevedo.
Carlos Alberto Costa de Sousa.
Carlos Cardoso Lage.
Edmundo Pedro.
Eduardo Ribeiro Ferreira.
Fernando Alves de Almeida Miranda.
Francisco Igrejas Caeiro.
Francisco Manuel Marcelo M. Curto.
Frederico A. F. Handel de Oliveira.
Gualter Viriato Nunes Basílio.
Guilherme Gomes idos Santos
Herculano Rocha.
Herculano Rodrigues Pires.
João Alfredo Félix Vieira Lima.
Joaquim José Catanho de Meneses.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Maria Parente Mendes Godinho.
Luis Abílio da Conceição Cacito.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Silvério Gonçalves Saias.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Manuel António dos Santos.
Manuel Francisco da Costa.
Manuel José Bragança Tender.
Raul da Assunção Pimenta Rego.
Rodolfo Alexandrino Susano Crespo.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Teófilo Carvalho dos Santos.
Victor Manuel Gomes Vasques.

Partido Comunista Português (PCP)

Adalberto António de V. Casais Ribeiro.
Álvaro Favas Brasileiro.
Carlos Alberto do C cia Costa Espadinha
Carlos Alberto do Vale O. Carvalhas.
Carlos Alfredo de Brito.
Custódio Jacinto Gingão.
Ercília Carreira Pimenta Talhadas.
Fernando de Almeida Sousa Marques
Francisco Miguel Duarte
Hélder Simão Pinheiro
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João Amónio Gonçalves do Amarai.
Joaquim António Miranda da Silva.
Joaquim Victor Baptista G. de Sá.
Jorge do Carmo da Silva Leite.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
José António Veríssimo Silva.
José Casimiro Sousa Correia.
José Ernesto J. Leão de Oliveira
José Manuel Aranha Figueiredo
José Manuel do C. Carreira Marques.
José Manuel Maia Nunes de Almeida
José Rodrigues Vitoriano.
Josefina Maria Andrade.
Manuel Gaspar Cardoso Martins
Maria da Conceição Morais Matias.
Maria lida da Costa Figueiredo.
Marina Grou Lanna Silva.
Marino B. de Vasconcelos B. Vicente.
Octávio Augusto Teixeira.
Rosa Maria Reis A. Brandão Represas.
Victor Henriques Louro de Sá.
Vital Martins Moreira.
Zita Maria de Seabra Roseiro.

Centro Democrático Social (CDS)

Adriano Vasco da Fonseca Rodrigues.
Alfredo Albano de C. de Azevedo Soares.
Alexandre Correia de Carvalho Reigoto.
António Ferreira Pereira de Melo.
Artur Fernandes.
Carlos Alberto Faria de Almeida.
Domingos da Silva Pereira.
Eugênio Maria Anacoreta Correia,
Francisco Manuel L. V. Oliveira Dias.
Henrique José C de Menezes P. Morais.
Henrique Manuel Soares Cruz.
Isilda Silva Barata.
João Daniel Marques Mendes.

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João José Magalhães F. Pulido de Almeida.
José Eduardo Fernandes Sanches Osório.
José Manuel Macedo Pereira.
Luís António Matos Lima.
Manuel Augusto Couto de Azevedo.
Manuel Baeta Neves.
Manuel Cunha Mota.
Maria José Paulo Sampaio.
Rogério Ferreira Monção Leão.
Victor Afonso Puno da Cruz.

Partido Popular Monárquico (PPM)

António José Borges G. de Carvalho.
Gonçalo Pereira Ribeiro Teles.
Henrique José Barrilaro F. Ruas.
Luís Filipe Ottolini Bebiano Coimbra.

Agrupamento Parlamentar dos Reformadores

Armando Adão e Silva.
Francisco José de Sousa Tavares.
Pelágio E. de A. Matos Lopes de Madureira.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE)

Helena Tâmega Cidade Moura.
Herberto de Castro Goulart da Silva.

União Democrática Popular (UDP)

Mário António Baptista Tomé.

O Sr. Presidente: - Responderam à chamada 153 Srs. Deputados. Temos quórum, pelo que declaro aberta a reunião.

Eram 15 horas e 35 minutos.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário Pires Fontoura vai agora proceder à leitura do expediente.

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Exposição

Da Comissão de Reformados de Santiago do Escoural, na qual solicitam o aumento das suas pensões, bem como das regalias sociais, de forma a poderem fazer face ao aumento do custo de vida.

Carta

De Jorge dos Santos Girão, residente em Lisboa, reclamando contra o pagamento de horas extraordinárias ao pessoal, considerando que poderiam criar-se mais; postos de trabalho.

Ofícios

Dez ofícios de diversos órgãos autárquicos com moções exigindo a aplicação integral da Lei das Finanças Locais.
Da Assembleia de Freguesia da Parede a enviar uma proposta de apoio ao Governo, aprovada em sessão realizada em 9 de Abril.
Da Sociedade Portuguesa de Autores apresentando algumas considerações que julga puderem ser úteis para a discussão sobre a ratificação dos Decretos-Leis n.ºs 53/80 e 54/80, de 26 de Março.
Da Assembleia Distrital de Castelo Branco a enviar cópia de uma proposta respeitante ao processo sobre a criação da freguesia de Coutada, no concelho d« Covilhã.
Da Direcção do Sindicato dos Trabalhadores dos Transportes Fluviais a enviar uma moção na qual se manifestam contra os despedimentos na ITT - Standard Eléctrica.
Da Assembleia de Freguesia de Pernes, manifestando o seu apoio a cerca de 400 moradores residentes nas áreas limítrofes da freguesia, ao pretenderem o alargamento dos limites da freguesia de- Pernes por motivos sócio-económicos.
Da Federação de Sindicatos dos Trabalhadores do Sector dos Espectáculos a remeter as moções aprovadas no seu congresso constitutivo.
Da comissão de trabalhadores da Transtejo tecendo considerações sobre a Ordem de Serviço n.º 4/80, emitida pelo conselho de gerência da Transtejo, E.P.
Da Assembleia de Freguesia de Queluz com uma moção em que repudia a prisão de antifascistas e as penas aplicadas aos indivíduos ligado» ao chamado «caso PRP».

O Sr. Secretário (Pires Fontoura): - Foram apresentados na última reunião os seguintes requerimentos: ao Governo, formulados pelos Srs. Deputados Mendes Godinho. Vítor Louro, Octávio Teixeira e Carlos Carvalhas, respectivamente; ao Instituto Nacional de Estatística, formulado pelo Sr. Deputado Manuel Malaquias; ao Ministério da Administração Interna, formulado pela Sr.ª Deputada Isilda Barata; ao Ministério dos Assuntos Sociais, formulado pelos Srs. Deputados. João Amaral e José Ernesto Oliveira; ao Ministério da Educação e Ciência, formulado pelos Srs. Deputadas Fernando Rodrigues, Rosa Brandão e Jorge Lemos.
Foram apresentadas as seguintes petições: n.º 283/1 - pelo conselho pedagógico da Escola Preparatória de Manuel da Maia, Lisboa, que baixou á 3.ª Comissão; n.º 284/1- por Manuel José Fortunato Fero e outros - Standart Eléctrica - Casais, que baixou à 5.ª Comissão.

O Sr. Presidente:- Srs. Deputados, feita a leitura do expediente, recordam-se VV. Ex.ªs que havia vários pedidos de esclarecimento que por se ter atingido o termo do período de antes da ordem do dia da última sessão não chegaram a ser feitos â Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura e que, por isso mesmo, ficaram interessados para a reunião de hoje, Inscreveram-se os Srs. Deputados Jorge Lemos, Igrejas Caeiro, José Nisa, Raul Rego e Sousa Tavares. São esses os pedidos de esclarecimento que a Mesa vai facultar que sejam solicitados, pela ordem por que acaba de enumerar, pelos Srs. Deputados inscritos. Como VV. Ex.ªs sabem, para cada pedido de esclarecimento dispõe cada um dos interpelamos do período de três minutos.
Tem então a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura:

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Ouvi com atenção a sua intervenção e o caso que trouxe â Assembleia da República sobre «saneamento de Camões da RTP» é bem a prova de que este Governo tem um espirito tacanho, mesquinho e obscurantista e que por isso, não pode acreditar em valores como o do grande poeta Camões.
Queria, contudo, ultrapassar a questão Camões e já que falou na televisão e na comunicação social aproveito para lhe fazer algumas perguntas:
Tem a Sr.ª Deputada conhecimento de que o presidente da comissão administrativa da Radiotelevisão Portuguesa reconheceu já o favoritismo da televisão em relação ao Governo?
Sabe a Sr.ª Deputada, e é capaz de me dizer alguma coisa sobre uso, qual a situação em que se encontram ainda os trabalhadores que foram abrangidos pela Lei da Amnistia e que ainda não estão ao serviço da Radiotelevisão?
Considera a Sr.ª Deputada que, no quadro que descreveu, a Radiotelevisão Portuguesa está a cumprir o papel que constitucionalmente lhe está consagrado, ou seja, fornecer aos Portugueses uma informação independente e pluralista?
Aproveitava, Sr.ª Deputada, já que falou na comunicação social, para lhe colocar duas ou três questões sobre outro importante meio de comunicação social estatizado: a Radiodifusão. Já trouxemos a esta Assembleia o tema relacionado com a suspensão do conselho de redacção da RDP, mas o que se está a passar toca as raias do escândalo, toca, até, as raias do absurdo. Sendo assim, pergunto-lhe:
Sabe a Sr.ª Deputada que jornalistas do serviço informativo estão a ser colocados, só porque eram incómodos, no serviço desportivo do canal l e do canal 3?
Sabe a Sr.ª Deputada que vários trabalhadores do canal l e do canal 3 da RDP, contrariamente à sua vontade e sem serem ouvidos estão a ser transferidos para o canal 2 e são postos à frente de programas com os quais nada têm a ver e para cuja produção não estão preparados?
Sabe a Sr.ª Deputada que a comissão administrativa da RDP pretende impor aos trabalhadores da informação um director de informação, que foi recusado pelos trabalhadores do Diário Popular?
Considera a Sr.ª Deputada, através de todo este conjunto de factos, que a RDP está a cumprir a função que compete, num Estado democrático, num órgão tão importante como a rádio, designadamente, informar livremente e contribuir com a sua informação para a formação de um povo livre?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado igrejas Caeiro.

O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Exactamente a propósito da intervenção da Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura gostaria de lhe perguntar, porque não aflorou isso na sua intervenção, o que pensa da utilização do canal l, que até aqui estava imune da publicidade, como veículo publicitário. Isto parece-me, que acaba por ser uma forma de violentar os ouvintes que pagam uma taxa e que tinham reservadas as emissões do canal l e do canal 2 sem publicidade. A partir de agora, a RDP faz uma publicidade que não está ainda esclarecida, não se sabe bem que tabela é feita para o efeito, não se sabe quem recebe essa publicidade... só se sabe que aos domingos aparece um programa com produtores que já estavam reformados, que pertenciam ao 24 de Abril, no programa l! Esta situação contraria tudo quanto estava decidido e por isso parece-me que era imponente ouvir a opinião da Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura a esse respeito.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Nisa.

O Sr. José Nisa (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura: Gostaria de lhe fazer uma pergunta acerca da sua intervenção, com a qual, aliás, concordo inteiramente apesar de considerar que o tema perdeu um pouco de actualidade em sentido positivo, uma vez que a opinião pública, depois da sua intervenção e através da divulgação em órgãos da comunicação social, foi alertada para o caso focado, isto é, a censura exercida pela televisão sobre programas das comemorações do Ano Camoniano.
A pergunta resulta de uma entrevista, em que participei ao nível do conselho da informação para a RTP, com o presidente da televisão, Dr. Vítor Cunha Reco, e com o Secretário de Estado da Comunicação Social. Nessa entrevista foram focados vários casos da actualidade da televisão, da situação antidemocrática que ai se vive, designadamente em relação á suspensão dos programas sobre o Ano Camoniano. O Dr. Vítor Cunha Rego responsabilizou-se se as direcções de informação e de programas pelas decisões tomadas na televisão, fugindo portanto á responsabilidade dele próprio como presidente da comissão administrativa. No entanto, deu um esclarecimento que me parece importantes que determina esta minha pergunta: o Dr. Vítor Cunha Rego referiu em relação à suspensão dos programas sobre Camões não só dois programas -conforme foi referido pela Sr.ª Deputada-, mas dois contratos sobre programas. Ora uma coisa é um programa, outra coisa é um contrato, que pode englobar variadíssimas unidades de programas, muitas vezes mais do que uma dezena, e por outro lado, temos conhecimento de que independentemente dos cortes sobre o programa do Ano Camoniano, houve um concurso alusivo às comemorações camonianas que tinha por título Vide ou Ditos que foi censurado e proibido na RTP.
Por tudo isto gostaria de saber se a Sr.ª Deputada teve conhecimento destes caso e se, quando se referiu à suspensão e á censura de dois programas, tinha conhecimento de que se tratava de dois contratos conforme foi informado pelo presidente da RTP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Raul Rego.

O Sr. Raul Rego (PS): - Sr.ª Deputada, ouvi com o maior interesse a sua comunicação e queria saber qual a sua opinião acerca dos problemas levantados à volta da comemoração do Ano Camoniano. Os problemas repetem-se e, certamente, conhece o que se passou em 18X0 a propósito do III Centenário da Morte de Camões, pois essa data foi o principio da grande propaganda republicana e por isso mesmo fui mal vista pelos elementos da direita monárquica.

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Será por isso que as comemorações deste ano estão a ser mal vistas pela direita portuguesa, a ponto de serem sabotados programas na televisão e a pomo de ainda não ter havido uma comunicação ao Pais sobre o assunto a vinte dias apenas do dia do centenário? Será por isso que se cortam na televisão programas, por exemplo, como o da Dr.ª Maria Antonieta Soares de Azevedo sobre a possibilidade de Camões ser um cristão-novo? Em que é que isso afectaria a glória de Camões? Será por isso que já não vai para o ar um programa do Dr. Silva Dias sobre a cultura contemporânea de Camões?
Pergunto-lhe, Sr.ª Deputada: não será tudo isto uma sabotagem às comemorações do IV Centenário da Morte do maior poeta português. Símbolo da Raça portuguesa?

Vozes do PS:- Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Tavares.

Pausa.

Os Srs. Deputados reformadores podem informar a Mesa se o Sr. Deputado Sousa Tavares se encontra na Assembleia?

O Sr. Medeiros Ferreira (DR): -Sr. Presidente, o Sr. Deputado Sousa Tavares está no Palácio, mas não &e encontra na Sala.

O Sr. Presidente: - Penso que a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura poderá responder de imediato aos pedidos de esclarecimento que lhe foram agora formulados. Tem a palavra, Sr.ª Deputada, e dispõe de doze minutos para responder.

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Sr. Presidente, penso que poderia de facto responder desde já aos pedidos de esclarecimento que me foram formulados por uma questão de economia de tempo. Os Srs. Deputados compreenderão perfeitamente que comece por responder ao Sr. Deputado Raul Rego. por várias razões: porque ele é um símbolo da liberdade de imprensa porque ele é um símbolo da liberdade em Portugal e porque penso que esta Câmara é sensível às pessoas que dedicaram a sua vida inteira à causa da democracia.

Aplausos do MDP/CDE, do PS e do PCP,

O Sr. Deputado Cunha Rego...

Vozes: -Raul!

A Oradora: - Raul Rego. Peço-lhe imensa desculpa.

Risos.

O Sr. Deputado Raul Rego tem uma sensibilidade superior à minha para entender o que significa, no contexto político em que nos encontramos, o facto de a figura de Camões não ter sido assumida na plenitude dos dados que a investigação e a historia dos últimos cem anos lhe poderia dar neste momento. Entendemos que essa data, o seu centenário, não foi assumida por duas ordens de razões: a primeira, deriva da falta de poder político que tem a maioria desta Assembleia; a segunda, é fruto da incapacidade existente para ser sensível a certos valores essenciais ao povo português e à cultura. É grave, é gravíssimo, que seja sobre a imagem de Camões que pese esse conjuro dos medos da maioria parlamentar.
Respondendo agora ao Sr. Deputado Jorge Lemos gostaria de dizer o seguinte: falou que o Sr. Deputado Cunha Rego...

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Já é monomania!...

A Oradora: - Não é Deputado ,..

Risos.

...que o Sr. Dr. Cunha Rego tinha reconhecido o favoritismo da RTP em relação ao Governo. Não estive presente no conselho de informação, embora já soubesse o que aí se passou; no entanto, não sei até que ponto é que ele assume esse favoritismo, se o assume como coisa normal, se o assume como uma desigualdade que é preciso corrigir. É difícil não assumir uma coisa, que é controlada por todos os partidos!
Sobre os amnistiados que não caíram para os lugares a que tem direito, é uma situação que pode ser explicada pela falta do poder político desta maioria e pela incapacidade de assumir as suas responsabilidades.

O Sr. Luís Catarino (MDP/CDE): - Muito bem!

A Oradora: - Acerca da pergunta que fez sobre «se a televisão oferece uma informação independente e pluralista», devo responder que todos nós podemos verificar que não. Além de não ser pluralista, nem independente, piorou muito em qualidade, hoje é um écran morto e s>e não fosse a .telenovela brasileira nada mais a fazia viver!

O Sr. Luís Catarino (MDP/CDE): - Muito bem!

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - A que ponto isto chegou!...

A Oradora: -Sobre o afastamento dos trabalhadores da Radiodifusão para os serviços que não lhe são especificamente destinados, quanto a mim, para além de ser uma prepotência do poder, esta por detrás deste afastamento um problema que terá de ser equacionado nesta Assembleia - neste momento não há condições políticas para o fazer nem há condições de trabalho para nos debruçarmos sobre elas -, ou seja, e um problema relacionado com a falta de profissionalização, com a falta de um estatuto, com a falta de reconhecimento de todas as pessoas da necessidade de defesa dos jornalistas e dos outros trabalhadores da comunicação social. É impressionante ver as condições em que trabalham os profissionais da Radiodifusão, Radiotelevisão e os jornalistas nesta Assembleia para se ter uma ideia do que isso significa em termos gerais. O jornalismo é uma profissão que não está dignificada.
Este assunto relaciona-se com as considerações levantadas pelo Sr. Deputado Igrejas Caeiro, são

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truto da falta de respeito pela profissão e da falta de respeito pela dignidade humana. São males antigos que foram retomados por este Governo.

O Sr. Luís Catarina (MDP/CDE): - Muito bem!

A Oradora: - Quanto à pergunta do Sr. Deputado José Nisa parece-me haver aí um problema de fundo importante. Esta intervenção na Assembleia da República e o pedido de demissão do Presidente da RTP feito pelo MDP/CDE não alertaram suficientemente a opinião pública, o que só veio a ser feito através de acções mais directas das pessoas que fizeram intervenções sobre o assunto, através da mobilização dos trabalhadores e através de afirmações de intelectuais.
Tudo isto dá uma ideia de como é difícil aleitar a opinião pública com os serviços de comunicação social que temos, que só são favoráveis ao Governo.

Vozes do MDP/CDE: - Muito bem!

A Oradora: - Nós sabemos que existe censura interna nos jornais e não envolvo nisto os trabalhadores da comunicação social mas as condições em que trabalham.
De uma maneira geral penso que todas as intervenções vieram ajudar e foram mais elementos a fornecer para chegarmos à seguinte conclusão: se o Governo AD quer, já não digo fazer aquilo que prometeu, porque penso que nunca teve intenção de o cumprir, mas sair da área do governo com o mínimo de cariz democrático deverá cuidar em primeiro lugar deste gravíssimo problema da Comunicação Social e das Comemorações do IV Centenário da Morte de Camões.

Aplausos do MDP/CDE, do PS e do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Tavares para pedidos de esclarecimento à Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura. Dispõe de três minutos para o efeito.
V. Ex.ª, como deve estar recordado, ficou inscrito na última sessão - tal como os Srs. Deputados que já usaram da palavra - para formular pedidos de esclarecimento. Só não foi possível tê-lo feito na sessão anterior porque, entretanto, se extinguiu o período de ames da ordem do dia. Esses pedidos de esclarecimento ficaram para hoje, e os inscritos eram os Srs. Deputados Jorge Lemos. Igrejas Caeiro, José Nisa, Raul Rego e V. Ex.ª. Já todos usaram da faculdade de pedir esses esclarecimentos e obtiveram já resposta da Sr.ª Deputada interpelada. Como V. Ex.ª na altura exacta em que lhe seria dada a palavra não estava na Sala, a Sr.ª Deputada prestou os esclarecimentos às interpelações que lhe tinham sido feitas e ficou V. Ex.ª para, se quiser, usar ainda da palavra.

O Sr. Sousa Tavares (DR): - Eu prescindo, Sr. Presidente. Mas já agora, que estou no uso cia palavra, gostaria de me inscrever para hoje fazer uma intervenção no período de antes da ordem do dia.

O Sr. Presidente: - Como V. Ex.ª sabe, a inscrição para uma declaração política tem de ser anunciada antes da abertura da sessão, se não é o caso, na série de inscrições para intervenções no período de antes da ordem do dia. V. Ex.ª fica em quarto lugar, estando em primeiro o Sr. Deputado João Domingues, seguido dos Srs. Deputados Carlos Lage e Jorge Lemos.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Domingues.

O Sr. João Domingues (PSD): - Prescindo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado João Domingues cedeu a sua posição na ordem de inscrições ao Sr. Deputado Eleutério Alves, a quem por isso, de imediato, é concedida a palavra.
Faz favor Sr. Deputado.

O Sr. Eleutério Alves (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Um dos graves problemas com que hoje se debate o Nordeste transmontano é o das vias de comunicação.
Deste sector, estão sem dúvida dependentes algumas outras variáveis, pelas quais passa o desenvolvimento daquela região, pois sem uma rede de transportes capaz não há desenvolvimento económico possível.
Vou aqui distinguir dois aspectos respeitantes ao distrito de Bragança.
Em primeiro lugar, as ligações ferroviárias: nas ligações ferroviárias aos concelhos deste distrito são feitas através de duas linhas estreitas, antiquadas e deficitárias-Tua e Sabor.
Através delas se faz o transporte de bens essenciais para a região, como os adubos, o ferro, materiais de construção e outras mercadorias a preços de transporte que são considerados viáveis para os agricultores, armazenistas e empresários.
Através delas se fax. o escoamento de alguns produtos da região, entre os quais a batata, o cereal, a castanha e outras.
Acontece é que com base no déficit que essas linhas apresentam, a CP não só diminuiu as viagens de comboios que diariamente ligavam nu linha do Tua as estações do Tua a Bragança, como praticamente encerrou a linha do Sabor, que liça as estações do Pocinho a Duas Igreja; em Miranda do Douro, numa extensão de cerca de 120 km. servindo quatro concelhos, ou seja, um terço do total de concelhos daquele distrito.
Como consequência disso, verifica-se saturação em mercadorias das estações do Tua e do Pocinho, onde se acumulou mercadorias e produtos essenciais que não chegam a horas ao seu destino.
Ai estiveram retidas grandes quantidades de adubo, a fazer falia aos lavradores transmontanos, falta essa cujos prejuízos ainda não podem ser avaliado:» mas que serão de certeza elevados, já que muitas culturas foram mesmo abandonadas devido à falta de adubos em tempo oportuno.
Tal situação, que continua a manter-se e continuará, por tempo indeterminado, é inaceitável, e tem de ser rapidamente alterada.
Pôs a CP um autocarro em substituição do comboio da linha do Sabor, para transporte de passageiros.

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Só que, uma linha de caminho de ferro não se justifica só pelos passageiros que ai transitam, mas também pelas mercadorias que transporta.
Os problemas que o encerramento desta linha está acarretando para o Nordeste são graves e muitos deles insolúveis.
É, além disso, uma situação injustificável, pela argumentação expendida pela administração da CP já no tempo do V Governo Constitucional.
Justificar o encerramento de uma linha de caminho de ferro por motivo de déficit e nu verdade uma razão demasiado fraca para um facto de tão graves consequências sócio-económicas para as populações servidas.
Há muitas outras linhas deficitárias neste país, tanto ou mais que as transmontanas e não foram encerradas.
Porquê a linha do Sabor?
Terá sido por ser a linha mais afastada de Lisboa?
Terá sido por ser uma linha que serve uma população afastada dos centros de decisão e assim incapaz de, devido à distância, fazer ouvir a sua voz e a sua vontade?
Terá sido por ser uma linha que serve uma população pouco identificada politicamente com os governos que antecederam o actual?
Ou terá havido qualquer outra razão?
Mas para além disso, mesmo que o único recurso que se deparasse à CP fosse o encerramento da linha do Sabor (o que não acreditamos), impunha-se, como e óbvio, uma solução alternativa adequada, que garantisse aos cidadão-» o fornecimento regular e sem custos agravados dos bens que necessitam, para não acontecer o que actualmente acontece, pois que com a estagnação dos produtos, nas estações do Tua e do Pocinho verifica-se o agravamento das taxas de armazenagem e custos de transportes, já que estes têm de ser feitos por empregas privadas, para já não falar no surto especulativo decorrente do açambarcamento de produtos, como aconteceu ainda há bem pouco tempo com os adubos.
É grande e já vem de longe o desprezo manifestado pela CP para com o povo do Nordeste.
Há vários anos que os comboios ali circulantes vêm queimando searas de pequenos agricultores, sem pagamento de indemnizações e só há um ano foram postos a circular comboios a diesel na linha do Tua, já que na do Sabor nem isso aconteceu.
Dizem os responsáveis da CP que a remodelação daquelas linhas custa ria mais de l milhão de contos.
Mesmo que assim seja, parece ser tempo de as gentes do Nordeste começarem a beneficiar do facto de serem de há muito parte importante do sustentáculo das necessidades agrícolas, alimentares e energéticas dos maiores centros.
Procurar tirar a linha do Sabor ou do Tua, deixando a região apenas com unia deficiente rede rodoviária, é votar o Nordeste à miséria e ao abandono.
Todos os transportes públicos são em regra deficitários.
Mas como transportes públicas, e sendo um bem essencial para as populações, deve o Estado assegurar esse mínimo indispensável à satisfação das necessidades dessas mesmas populações.
Assim devem não só as linhas do Tua e do Sabor entrar em funcionamento pleno, como deve ser aí colocado material circulante, confortável e seguro, digno de servir uma população há muito tempo habituada a ver benefícios só de um lado e restrições só do outro.
É o mínimo que a justiça social, que iodos dizem defender pode exigir.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Em segundo lugar, temos as ligações ferroviárias.
Também neste aspecto o panorama não se apresenta melhor.
Só que as estradas quando 'forem encerradas não o serão por acção, mas sim .por falia de actuação adequada, e a tempo, do Governo, uma vez que o seu traçado e estado de conservação já de si pouco famoso não só não corresponde às necessidades actuais como se deteriora ano a ano, à espera que alguém se lembre que por ali circulam milhares de automóveis nacionais e estrangeiros.
Bragança é hoje uma das entradas e saídas para a Europa a que queremos pertencer.
Por ali entram milhares de turistas e emigrantes que esbarram com estradas aberrantes e inseguras, ficando com uma primeira imagem de Portugal, pouco recomendável para o incremento do nosso turismo, fonte ainda hoje importante de desenvolvimento daquela região.
Todos os que ali se deslocam facilmente reconhecem que estradas só existem até Viseu, Amarante e Celorico da Beira.
Para lá, só com muito boa vontade se pode dizer que há estradas e só com muita perícia se pode ali circular e evitar o acidente.
Sem vias ide comunicação e penetração capazes, seguras e rápidas, o progresso será para os Nordestinos letra morta, realidade adiada.
É assim urgente que se façam as ligações do Nordeste aos grandes centros através do melhoramento e rectificação das estradas Bragança-Porto, Bragança-Miranda do Douro-Moncorvo e Macedo de Cavaleiros-Pocinho, que ligaram a capital do Nordeste ao litoral. Beira Alta e Centro do País.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Trás-os-Montes é, como se disse, a região mais mal servida de vias de comunicação e por isso também a menos desenvolvida do País, embora não a menos pobre, nem a que menos dinheiro dá para os cofres do Estado.
Vários membros dos vários governos se têm deslocado ao Nordeste, a fim de se inteirarem da situação que ali se vive.
Muitas têm sido as promessas, mas poucas, ou nulos as realizações.
Resta aos residentes daquela região esperar que o Governo se lembre que o Nordeste é tão português como as demais regiões do Puís.
Governar é, entre outras coisas, gerir o bem público e uma gestão para ser boa tem de ser justa.
É essa justiça que os Transmontanos aguardam do Governo.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Chaves Medeiros para pedir esclarecimentos.

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O Sr. Chaves Medeiros (PS): - Sr. Presidente, queria fazer uma cúria pergunta ao Sr. Deputado Eleutério Alves.

De facto, Trás-os-Montes está muito débil em transportes, falta-lhe uma ligação ao litoral, que poderá ser a espinha dorsal do desenvolvimento e o Sr. Deputado disse que para remodelar as linhas do distrito de Bragança era preciso 1 milhão de contos. Quero perguntar ao Sr. Deputado se não achava mais útil que se gaitassem os 500000 contos; que foram para cinzeiros e flores, na remodelação da linha, do que utilizá-los para esse fim.

Vozes do PS e do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Se V. Ex.ª deseja responder, Sr. Deputado Eleutério Alves, faça favor.

O Sr. Eleutério Alves (PSD):- Eu entendo que, de facto, o Nordeste transmontano exige já que qualquer Governo se lembre da sua existência.
Trás-os-Montes tem sido votado, desde há muito, a um ostracismo arrepiante, que impede o seu desenvolvimento. Claro que falar de l milhão de contos que a linha do Sabor e do Tua implicaria na sua remodelação pode achar-se ser muito dinheiro. É possível que seja muito dinheiro, mas parece-me que sem vias de comunicação capazes não pode haver desenvolvimento do Nordeste. Parece-me, pois, que aquela população exige já que 1 milhão de contos lhe é devido, que deve ser ali gasto. Isto se for necessário, efectivamente, 1 milhão de contos para remodelar as linhas estreitas, do Sabor e do Tua.

O Sr. Vítor Louro (PCP): - E o desperdício com os cinzeiros?...

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Chaves Medeiros para um protesto.

O Sr. Chaves Medeiros (PS): - Eu protesto porque o Sr. Deputado Eleutério Alves não respondeu à minha pergunta. De facto, o Governo da Aliança Democrática destinou uma verba de 400 ou 500000 contos à CP para ser utilizada -e é lá bem especifico no comunicado que fez à CP- em cruzeiros e flores na estação, e gasta até ao mês de Outubro. Essa verba era de 500000 contos e vai ser gasta.
Eu perguntei ao Sr. Deputado se não achava melhor que essa verba de 500000 contos fosse utilizada na remodelação das linhas do distrito de Vila Real, em vez de ser utilizada em coisas que podem ser consideradas futilidades eleiçoeiras.

O Sr. Presidente:- Tem a palavra para responder o Sr. Deputado Eleutério Alves.

O Sr. Eleutério Alves (PSD): - Entendo que não seria necessário responder a essa pergunta. Qualquer transmontano vê imediatamente que o dinheiro deve ser gasto em coisas úteis. Claro que o Transmontano não tem culpa se algum dinheiro foi gasto em cinzeiros. Eu desconheço isso e o que me interessa é defender que as linhas férreas do Sabor e do Tua devem ser remodeladas, custe o que custar, e já por que preço for. Isso é que interessa às populações. Se há cruzeiros ou não e como foram pagos, não sei, embora entenda que, se isso aconteceu, o dinheiro deve ser gasto, de facto, com coisas que interessa a população.

O Sr. Vítor Louro (PCP): ~ Tem de votar contra a AD. Está aí mal colocado.

A Sr.ª Ercília Talhadas (PCP): - Está aí por engano...

O Sr. Presidente: - Tem a palavra para uma intervenção o Sr. Deputado, Fernando Miranda.

O Sr. Fernando Miranda (PS): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Numa altura em que se celebrou com espontaneidade, com convicção e, apesar de tudo, com esperança, o 25 de Abril, e no momento em que se discutiam as grandes opções do Orçamento e do plano, contrariamente àquilo que seria de esperar, senão mesmo de exigir, o actual Governo tudo fez, como aliás vem vindo a ser prática, para desviar as atenções do povo português do verdadeiro significado e alcance quer daquela data com a qual a AD cada vez tem menos a ver), quer das leis em apreço, cujo alcance e significado terão incidências populacionais em toda a vida nacional.
As contradições e ambiguidades com que te debate este Governo, desde a teoria da «competência» que (pregoou, até à prática da incompetência que alardeia em cada acto; a atitude ridiculamente comicieira de que o terror da proximidade de eleições o não deixa libertar-se a preocupação obsessiva de retribuir aos Governos que o anteriores de todos, os males com que o debate e a nossa sociedade, empurram o Governo Sá Carneiro/Freitas do Amaral para situações que seriam cómicas se não fossem trágicas e a discussão do Plano e Orçamento, com tocou o chorrilho de intervenções e declarações por parte de membros do Governo, desde o Primeiro-Ministro ao Ministro das finanças, veio pôr a nu todo o desnorte e incapacidade que o caracterizam.

Vozes do PS:- Muito bem!

O Orador: - Incapacidade que o aterra e o amedronta. Incapacidade que o enerva e arrelia.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Que medo!

O Orador: - Incapacidade que lhe gera sobressaltos doentios, imprimindo-lhe uma dinâmica de actualização pela contradita que se aceita e vai ampliando à medida que o tempo se vai esvaindo e as promessas se vão comprometendo...
Assim, e no período que atrás citamos espalhou este Governo os seus Ministros pelo País, quais caixeiros viajantes em busca de clientela, a inaugurar obras que Governos anteriores fiscalizaram, ou a valer-se de realizações, todas, para chamarem a si louros que a outros pertencem.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - A Ponte 25 de Abril, por exemplo...

O Orador: - Política de cuco, a deste Governo, que se vem limitando a pôr o ovo no ninho feito por outrem!

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Citarei dois casos que, por elucidativamente caricatos, demonstram à sociedade até que ponto vai a ânsia incontida de conservação do poder deste Governo e a imoralidade de meios que utiliza para esse fim.
Através do Fundo de Fomento de Desporto foram construídos, na vigência de Governos anteriores e em diversas localidades, pavilhões gimnodesportivos.
Matosinhos foi um dos concelhos contemplados.
Entretanto, resolveu este Governo inaugurar esse pavilhão, sem sequer curar de saber se ele estava apetrechado! E, então, há que pedir emprestadas tabelas, balizas e redes, para que se puderem realizar os joguinhos de inauguração! O Sr. Ministro discursou, cumpriu a «missão» e... veio-se embora. Os apetrechos, foram devolvidos à procedência e o pavilhão «inaugurado» continua vazio!
Comentários?

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Não é preciso!

O Orador: - Esses vão-nos fazendo as gemes de Matosinhos, glosando a farsa com a perspicácia e o sentido do anedótico com que o nosso povo costuma brindar tais actos.
O Parque Municipal cias Exposições, em Braga, e um serviço municipalizado, cujo concelho de administração é nomeado pela Câmara. Esta, por sua vez, nomeia também a comissão da feira.
É, pois, a Agro/80, de iniciativa exclusivamente municipal.
Nesta perspectiva, a comissão competente fez diversos convites para a inauguração, tendo a mesma sido presidida pelo brigadeiro Garcia dos Santos, em representação do Sr. Presidente da República.
Pois, Sr. Presidente e Srs. Deputados, em dado momento, o- presidente da Câmara de Braga, por telefonema feito - pelo adjunto do governador civil, é convidado, em nome do Ministro da Agricultura a estar presente à inauguração! ..

Risos do PS.

Mas não se ficou por aqui o Governo e, neste caso, o Sr. Ministro da Agricultura: «no almoço oferecido pelo presidente da Câmara, para além da lista fornecida do seu Gabinete, levou mais alguns convidados seus e entre eles, dois Srs. Deputados da AD!

O Sr. Narana Coissoró (CDS): ~ Foi o Presidente da Comissão de Agricultura!

O Sr. Vítor Louro (PCP): - Pior a emenda que o soneto, oh Narana!

O Orador: - Resultado - Não cabiam todos...

Risos do PS.

Cabe-me, pois, perguntar: onde está, senhores do Governo, a vossa ética, a vossa moral e o respeito pelo poder local e pelos seus intervenientes?

Vozes do PS: - Não sabem o que é isso!

O Orador: - Onde está a vossa ética e a vossa moral ao elegerdes como inimigo principal os Governos que vos antecederam de responsabilidade socialista. E sobretudo estes, quando vos tendes limitado a destruir os alicerces da recuperação sócio-económica que estavam lançados ...

Aplausos do PS.

Risos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Que grande baralhada!

O Orador: - ..., e a acção legisladora que consequentemente se concretizou, e a inaugurar as realizações doa mesmos?

Uma voz do PSD:- Que tristeza!...

O Orador: - Onde está o vosso respeito pela Constituição, quando afirmais que essa mesma Constituição será mudada para dar cobertura legal a actos inconstitucionais como se depreende dessas afirmações que estão já a ser consumados? Onde estão as exigências transformadas em promessas na campanha eleitoral, de integral cumprimento da Lei das Finanças Locais?
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Trouxe hoje, aqui. dois casos que são, afinal, duas gotas d;- oceano de contradições em que se debate e afoga este Governo.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Disparates ..

O Orador: - Deixo-os á consideração desta Câmara e do País como contributo sereno e objectivo para a análise da paradoxal e desastrosa política deste Governo.

Aplausos do PS e do Sr. Deputado do PCP Jorge Leite.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Handel de Oliveira para uma intervenção.

O Sr. Handel de Oliveira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Guimarães é dos concelhos cuja contribuição para os cofres do Estado assume maior relevo. Tal se deve à capacidade de trabalho das suas gentes e ao facto de constituir um grande pólo industrial. Apesar disso, a população de Guimarães sente-se defraudada em cerca de 100 000 contos em consequência da não aplicação integral da Lei das Finanças Locais. No Estado Novo sempre assim foi. mas nós, vimaranenses, nunca aceitámos o esquecimento a que então éramos votados. Nessa altura nada podia fazer - foram as regras do jogo. Hoje as coisas são bem diferentes, estamos num Estado de direito, a lei está do nosso lado é portanto levantaremos bem alto a nossa voz para mostrar o repúdio do povo de Guimarães pela atitude centralizadora, só própria de um poder autocrático, que aliás tem sido o timbre do Governo AD. É claro que mais do que centralismo trata-se de guardar dinheiro para fins eleitorais.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta situação assume maior gravidade porque o executor de uma tal sentença é também um «vimaranense» e curiosamente, como já tive ocasião de o afirmar durante

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o debate do OGE, o hoje Ministro da Administrarão Interna, quando vereador da Câmara de Guimarães, arvorado no mais acérrimo defensor da lei das Finanças Locais, parece lutar tanto por esta (agora já se sabe que hipocritamente) que em 31 de Março de 1978 renunciava ao cargo de vereador declarando:
«A continuada centralização administrativa local, a perspectiva de acentuadas carências materiais[...] são razões de sobejo para a desilusão de quem lutou e trabalhou para a criação de algo diferente do que era, mas também do que 'e».
Se não fosse a incoerência do Sr. Ministro aqui sobejamente demonstrada seria caso para perguntar se pelas mesmas razões o Sr. Eng.º Eurico de Melo vai agora demitir-se do cargo que ocupa. Seria uma atitude coerente, mas a coerência não cabe nas actuações dos Srs. Ministros do Governo AD.

Aplausos do PS.

O Sr. António Lacerda (PSD): - Não apoiado!

O Orador:- Se isto não basta para exemplificar - pela atitude do mais alto responsável do Governo na matéria- qual a atitude real da AD relativamente ao poder local, que exalta hipocritamente na oposição, menosprezando-o e prejudicando-o quando instalada no Governo - se isto não basta, invoco também o testemunho de um outro elemento do PSD no executivo da Câmara de Guimarães, que ao demitir-se igualmente em 1978 declarava: «A dois meies do termo da 2.ª sessão legislativa a Assembleia da República não- aprovou a Lei das Finanças Locais sem a qual a autonomia administrativa e gestora das autarquias não é possível. Tendo perdido a esperança de que a descentralização e a autonomia do poder local sejam uma realidade, convencido, de vez, que, nas condições em que vivem as autarquias, é praticamente impossível exercer o cargo com um mínimo de eficiência, dignidade e coerência, renuncio [...]»
Estará este elemento em discordância profunda com o seu partido? Estará em rebeldia tal como em 1978?
Não, Srs. Deputados: é o actual Governador Civil de Braga!

Risos do PS.

Guimarães tem inúmeros problemas, onde se salientam a escassez de habitações sociais, a falta de um Hospital condigno, o encarecimento espectacular das rendas das casas novas, educação, etc.,. Se esses problemas só podem ser resolvidos numa actuação gradual e progressiva, do que não há dúvida é que imporia tornar claro quem está e quero não está ao serviço das populações. Daí o sentido veemente da presente denúncia.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Roriz

O Sr. Fernando Roriz(PSD): - Eu desejava protestar contra a intervenção do Sr. Deputado Mande! de Oliveira, intervenção, essa que primou pela quase insólita ligeireza com que tratou alguns problemas ...

Risos do PS.

Ligeireza que se demonstra desde já, muito facilmente. O Sr. Deputado começou por invocar o nome do povo de Guimarães arrogando-se nessa atitude, o direito de representar alguém que de facto, não representa.
Quando muito poderá representar uma parcela do povo de Guimarães. Há aqui outros Deputados que representam Guimarães, eu sou um deles e tenho legitimidade para falar de outro povo de Guimarães que não é o povo do Partido do Sr. Deputado.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado definiu ainda a sua ligeireza ao invocar aqui demagogicamente alguns problemas, como o do Hospital de Guimarães. Pareceria a quem ouvisse, menos prevenidamente o Sr. Deputado que é Governo AD e efectivamente é responsável pela falta do Hospital de Guimarães. O Sr. Deputado esqueceu-se de que foi neste Parlamento que o secretário-geral do seu partido, o Sr. DR. Mário Soares, há dois ou três anos, declarou solenemente que o seu Governo iria dar inicio as obras do Hospital de Guimarães, nas Guimarães continua á espera que essas obras se iniciem. Não seria necessariamente o Governo da AD que, com cinco meses de actividade iria resolver um problema que o Partido Socialista e o seu secretário-geral não souberam resolver quando no Governo.
O Sr. Deputado falou nas carências de Guimarães, esquecendo que a Câmara de Guimarães; foi, até ao dia 2 de Dezembro, dirigida pelo Partido Socialista, sem que essa administração municipal soubesse resolver um só dos problemas de Guimarães, uma que fosse, e desafio o Sr Deputado a demonstrar aqui que a Câmara Municipal de Guimarães, quando o seu partido esteve á frente, tenha resolvido um só dos problemas da terra.
O Sr. Deputado invocou a demissão de dois elementos, do PSD a pretexto da Lei das Finanças Locais. Eles demitiram-se efectivamente pela não entrada em vigor dessa lei e o que se passa agora é que a Lei das Finanças Locais foi efectivamente cumprida, como aqui foi claramente demonstrado no debate do Orçamento.

Risas do PS.

Esta è a nossa convicção e por isso fica demonstrado que a intervenção do Sr. Deputado Handel de Oliveira não foi mais do que uma manifestação de demagogia balofa que não podemos deixar de julgar.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Vítor Louro (PCP): - Mais valia estar calado!

O Sr. Presidente: - Se V. Ex.ª deseja responder, faça favor, Sr. Deputado Handel de Oliveira.

Uma voz do PSD: - Outra vez?

O Sr. Handel de Oliveira (PS):- Irei contraprotestar uma vez que a figura utilizada pelo meu amigo e Sr. Deputado Fernando Roriz foi exactamente a do protesto.
Talvez não seja um bom leitor, mas o Sr. Deputado Fernando Roriz, tambem não é um bom ouvinte e não percebeu o que eu disse.

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Para já, fez uma grande confusão quanto ao conceito de representatividade. Se mais não fosse, os Deputados aqui presentes representam o País e, por conseguinte, cada um pode representar o povo. Independentemente disso, afirmo com todo o gosto que pertenço ao partido mais votado no concelho de Guimarães, quase na ordem de 2 para l em relação ao PSD, que o Sr. Deputado Fernando Roriz representa. Isso é mais do que suficiente.

Aplausos do PS.

Quanto ao problema fundamental que nqui levantei e é esse que importa sublinhar foi o da não aplicação da Lei das Finanças Locais e as palavras que eu citei do Sr. Ministro da Administração Interna quando vereador na Câmara Municipal de Guimarães e do actual Governador Civil de Braga, também na altura vereador da Câmara Municipal, foram apenas para demonstrar a incoerência dos elementos que compõem o Governo AD. Era exclusivamente essa a minha intenção.
Quanto ao que fez ou não fez a Câmara Municipal quando o Partido Socialista não tinha a maioria - e é preciso que se diga que o Partido Socialista era minoritário na Câmara, apenas detinha a presidência - devo dizer que fez muito. Aceito que o Sr. Deputado não esteja a par daquilo que se lá fez porque tem passado a maior parte do seu tempo aqui por Lisboa, naturalmente em serviço ... Por conseguinte, está desculpado pelo facto de desconhecer aquilo que se faz na nossa terra

Aplausos do PS.

Ainda quanto ao Hospital de Guimarães, também houve falta de atenção do Sr. Deputado Fernando Roriz porque eu não disse que o lacto de o Hospital de Guimarães não estar construído nem iniciado se devia ao Governo AD. Mas, pela forma como o Sr. Deputado respondeu, agora começo a ficar convencido de que há entravei, criados pelo Governo AD, porque senão não havia razão para esse aborrecimento ... Parece-me que respondi ao protesto do Sr. Deputado Fernando Roriz.

Vozes do PS:- Muito bem!

Uma voz do PSD:- Não nos convence!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Louro.

O Sr. Vítor Louro (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Fomos há meses surpreendidos nesta Câmara pelo alerta de uma empresa de transformação de papel, que aqui verificamos ser extensível a todas elas: as empresas desse ramo estavam ameaçadas de paralisação!
Como se sabe, as empresas produtoras de pasta de papel eram obrigadas a satisfazer as necessidades do mercado nacional, designadamente, em pasta kraft branqueada de pinho. No entanto a relutância de uma das empresas (exactamente a de capital maioritariamente sueco) em cumprir as suas obrigações, levou a que a responsabilidade e abastecimento do mercado passasse integralmente para a empresa pública Portucel, com as pesadas consequências económicas e financeiras que lhe advieram, já que, por razões de funcionamento do equipamento fabril, tem tido de recorrer á importação a preços superiores ao dobro dos preços de venda no mercado interno). Essa decisão foi tomada pelos Secretários de Estado do V Governo que para ele transitaram do Governo Mota Pinto/PPD.
Entretanto, o Governo da AD preparou uma nova regulamentação em Fevereiro passado, segundo a qual as empresas produtoras de pasta de celulose eram libertadas da obrigação de fornecerem o mercado nacional do tipo de pasta que lemos vindo a tratar. Tal decisão foi, todavia, provisoriamente modificada, seguramente em consequência da justa resistência oferecida pelos industriais de papel. E assim, apenas até ao final de Junho próximo volta a vigorar a obrigação daquelas empresas forneceram o mercado interno.
Daqui resulta que a partir do mês que vem - a menos que a própria Portucel encontre maneira de os defender- os industriais de papel vão ver se obrigados a adquirir no mercado livre, em época absolutamente inoportuna, a pasta branca de pinho necessária para a indústria. Isto é: por força de uma decisão do Governo AD vão ser obrigados a adquirir a preços exorbitantes e em condições aleatórias aquilo que ate agora lhes era fornecido em condições de preço e segurança garantidas e satisfatórias.
Deste modo, uma indústria nacional que tinha de facto condições de concorrência nos mercados internacionais, designadamente nos da CEE, é posta em cheque de repente, em plena campanha, por uma errada (e talvez não desinteressada) decisão do Governo da AD.
Claro que essa situação era uma falsa solução, já que significava de facto que era a indústria nacional de celulose a subsidiar a indústria papeleira. Mas e possível chegar à definição de um preço, que, sendo compensador para as celuloses, seja aceitável pelas papeleiras, uma vez que a pasta fabricada em Portugal resulta a preços inferiores aos dos mercados internacionais.
Essa via imporia justamente que a Celbi, de capital maioritariamente sueco, fosse efectivamente obrigada a cumprir a obrigação de fornecimento do mercado nack>nail, tendo designadamente em conta que não deve ela ser privilegiada em relação â empresa pública, e que ela tem rompido desde o princípio da sua actividade as próprias condições do alvará. Aliás, este tratamento, que faria juz aos interesses do País e ds todos os milhares de trabalhadores, da indústria papeleira, não é contrário aos interesses dos trabalhadores da Celbi, pois a sua única consequência em relação àquela empresa seria uma ligeira diminuição dos enormes lucros obtidos, pelo grupo económico sueco (e que afinal só ilicitamente atingem esses valores, em detrimento de Portugal e dos Portugueses).
E enquanto isto assim vai, ao sabor de interesses que não são os de Portugal, o Pais continua a ver passar diariamente para Espanha parte considerável da sua riqueza florestal.
A exportação extraordinária que se tem verificado não tem afectado o capital florestal nacional, isto é, não tem sido acima da possibilidade de corte das matas portuguesas. Mas essa exportação é altamente condenável na medida em que, por um lado, cria

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problemas de abastecimento da indústria portuguesa e, por outro, opera a transferência para Espanha do produto acrescentado que devia ficar em Portugal. Quer dizer: contrariando os mais dementares princípios do desenvolvimento económico, o País exporta matéria-prima em vez de exportar produtos fabricados com ela dentro das nossas fronteiras; - facto que, como se sabe, causa espanto na própria Espanha.
Deve aqui salientar-se a necessidade urgente de reestruturar a produção industrial que utiliza a madeira como matéria-prima. Note-se, a propósito,, que, apesar de sermos dos poucos países da Europa Ocidental que tem uma produção de madeira superior ao seu consumo, e que exporta pasta para papel, estamos em total dependência do grupo sueco Svenska no que toca a papel de jornal (esta indesejável situação torna-se mais clara quando, como agora, corremos o risco de ficar sem jornais devido à crise do capitalismo que assola a Suécia).
Ora, a razão objectiva de tal exportação e o facto de os preços serem em Espanha muito superiores aos praticados em Portugal! Curiosamente, porém, não são os proprietários que ganham com isso, pois «sés continuam a receber na base do preço oficial português: são alguns (intermediários que «e enchem de dinheiro. Imporia, pois, atacar o mal pela raíz, isto é, aumentar os preços da madeira em Portugal para níveis idênticos àqueles que são pagos em Espanha e não -como alguns sugerem- proibir a exportação., pois essa medida redundaria em prejuízo exclusivo dos produtores já que, como se adivinha, os intermediários fariam repercutir sobre eles a diminuição dos seus lucros com o argumento da falta de procura.
Mas aqui levanta-se um outro problema: é que a Portucel dificilmente suportaria um tal aumento porque item de suportar encargos financeiros elevadíssimos resultantes da falia de saneamento financeiro da responsabilidade do Governo.
É daqui resulta claramente que, em última análise, a factura da política financeira de direita, dita de recuperação capitalista, é paga pelos agricultores, enquanto os grupos económicos estrangeiros prosperam à custa dos 'agricultores e dos outros trabalhadores portugueses (note-se que são as celuloses estrangeiras que ganham com o baixo nível de preço da matéria-prima em Portugal).
As dificuldades vêm ainda acrescidas porque o Governo AD, em vez de criar alternativas aos produtores para venderem as suas madeiras, designadamente pelo incremento do consumo interno, permite-se manter escandalosamente fechada uma fábrica de aglomerados no Fundão (al Garpan), ao mesmo tempo que alegremente negoceia com um ou outro senhor a venda do capital que o Estado detém nessa empresa e que é ide cerca de 72 % (possivelmente preparando-se para emprestar por tuta-e-meia, através da banca nacionalizada, cinco ou seis vezes mais do que os 100000 contos que seriam necessários para fazer entrar a fábrica em laboração).
Uma outra pincelada necessária no estoco que vimos fazendo consiste no seguinte. Existe um equipamento para uma fábrica de celulose que custa caro ao erário público todos os dias, e que se destinava à Soporcel. Pois segundo parece, a empresa de capital sueco de que vimos falando insiste em adquirir ao Estado esse equipamento em detrimento da empresa pública. Importa salientar que se tal acontecesse o grupo sueco esse detém o seu capital obteria por este meio o domínio completo da Europa em pasta de eucalipto. E, em consequência, a empresa pública portuguesa teria de concorrer com um enorme portentado internacional, praças ao referendo do poderio deste pelo Governo AD ao serviço do capital monopolista. E simultaneamente tornar-se-ia mais crítica a situação cio País quanto à poluição, uma vez que como a experiência demonstra, não é «fácil» obrigar em Portugal os grupos económicos estrangeiros a acatarem as determinações ido Governo Português (e não é por acaso que a Caima Pulp actua no nosso país como aqui já foi denunciado há semanas: nem é por acuso que nos países capitalistas desenvolvidos a opinião pública rejeita cada vez mais a instalação de indústrias poluentes como a de celulose).
Finalmente, enquanto se degrada (como acabamos de ver) o ambiente da comercialização e transformação das madeiras, em matérias de reflorestação o panorama é desolador. Apesar da demagogia de governantes e Deputados da AD sobre a necessidade evidente de arborizar pelo menos as áreas incendiadas, o que se verifica de facto é que no OGE a AD aprovou uma verba que dá apenas para florestar 2000 dos 48 000 ha que arderam no ano passado.
Do que acabamos de expor resulta que o Governo AD: cria complicações desnecessárias à indústria papeleira nacional, perturbando-lhe: a produção e diminuindo-lhe a sua capacidade concorrencial; não se esforça pela diminuição das importações; sobrecarrega as empresas nacionalizadas e sujeita-as a condições mais desfavoráveis na concorrência com outras; protege, os intermediários, sendo indiferente aos interesses dos agricultores e dos operários fabris; retrata o desenvolvimento económico nacional.
Face ao exposto, bem se pode colocar a questão nos seguintes termos: de costas voltadas para os empresários nacionais e para os agricultores e para os interesses directos :do próprio Estado, o Governo AD serve-se do Poder para defender em Portugal os interesses dos intermediários e de grupos estrangeiros.

Aplausos do PCP.

Entretanto assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente José Rodrigues Vitoriano.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Coimbra.

O Sr. Luís Coimbra (PPM): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, nau desejo fazer um protesto, pois na generalidade: estou razoavelmente de acordo com o Sr. Deputado Vítor Louro. Devo esclarecer que, para o meu Partido -e mais uma vez terei do reafirmar e si a posição-, o problema de indústria celulósica em Portugal não é apenas um problema de sector público e sector privado: para além de que o problema de preços de pasta de papel, de políticas de maiores exportações, do valor acrescentado ou não de matéria-prima portuguesa, é um problema muito mais fundo.
É pena que o Partido Comunista não tenha a são que nós temos, pois talvez fôssemos mais uns tantos a lutar contra a política do «mau cheiro» em Portugal que é, para todos, os efeitos, aquilo que todos nós pensamos ser a politica das celuloses ao serviço, diga-

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mós, da pasta de papel nacional e internacional, publica e privada. Devo dizer que o Governo da AD tem preocupações quanto a colocar em detrimento o sector público da indústria de celuloses- em relação ao sector privado, e ainda hoje de manhã, no Conselho de Ministros foi aprovado um financiamento do Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento de 50 milhões de dólares, dos quais cerca de 60 % serão para financiar a Portucel o resto seira financiado pelo Estado, através do Ministério da Agricultura e Pescas. Nenhuma empresa privada de celulose: é contemplada neste programa, de investimento florestal em Portugal.
Por outro lado, gostaria que o Sr. Deputado Vítor Louro, que é uma pessoa interessada nestes assuntos, dissesse claramente se defende a continuada instalação, seja da Soporcel, seja de mais fábricas de celulose pelo sector público ou pelo sector privado. Aonde é que isto nos levaria?! E devo dizer-lhe com regozijo que, felizmente, os planos de florestação em Portugal, que ainda hoje foram contemplado, em Conselho de Ministros, não contemplavam a instalação da fábrica da Soporcel. fábrica essa de que pelo menos, o meu partido já aqui tinha feito uma condenação pública quanto à sua instalação em Muge.

O Sr. João Amara) (PCP>: - Hoje fala muito! No outro dia ...

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Lopes para pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Vítor Louro.

O Sr. Vítor Louro ('PCP): - Não é para fazer um protesto?! ...

O Sr. Mário Lopes (PSD): - Desta vez, Sr. Deputado, não é para um protesto, mas para um pedido de esclarecimento.
O Sr. Deputado Vítor Louro disse que b Governo da Aliança Democrática e os Deputados da Aliança Democrática fazem demagogicamente uma campanha no que diz respeito às rearborizações das zonas ardidas. Mas o Sr. Deputado deve compulsar os números de 1974 e, se quiser, até dos últimos dez anos, porque V. Ex.ª, Sr. Deputado, só se debruça sobre o número de hectares ardidos em 1979, que foi de 45(000 ha. É evidente que terei de lhe perguntar, e agradecia que me fosse capaz de informar e a esta Câmara, qual foi a taxa de arborização no ano de 1976 - quando em 1975 arderam 81 000 ha - e quais foram aí, taxas de arborização feita pelos serviços oficiais, nomeadamente polo Fundo de Fomento Florestal, daí até esta data. Pelo monos há uma coisa que lhe posso dizer: com pouca verba que possa estar despendida no Orçamento Geral do Estado, o Governo da Aliança Democrática já iniciou, o que até aqui não foi feito, as rearborizações nas zonas críticas da floresta.

Vozes do PSD: -Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Louro para responder, se desejar.

O Sr. Vítor Louro (PCP): - Em relação ao problema da Soporcel que o Sr. Deputado Luís Coimbra levanta, devo dizer que é mais um dos sectores de natural fissura dentro da Aliança Democrática porque o PPM, pela boca do Sr. Deputado Luís Coimbra, acaba de se. manifestar absolutamente contrário à instalação de uma nova unidade de fabrico de pasta celulósica, enquanto o Deputado Cardoso Alves do PSD, a semana passada, reivindicou aqui veementemente a instalação desse equipamento! Creio que é um problema a decidir, antes de mais, entre vós...
Nós somos, efectivamente contra a política de mau cheirou, por isso somos contra a AD ...

Risos do PCP.

O Sr. Luís Coimbra (PPM): - Ena pá!... Manifestações de desagrado do PSD e do CDS.

O Orador: - Os Srs. Deputados precipitaram-se e não me deixaram concluir ...
Porque somos contra o «mau cheiro», somos contra a AD. na medida em que o Governo da AD não tem obrigado as fábricas do celulose a cumprir as regras normais e mínimas indispensáveis para a despoluição atmosférica.
Fala-me o Sr. Deputado de um acordo de financiamento de 50 milhões de dólares ... Bom, quando isso vier a público saberemos do que se trata. E não estranho que só - tenha contemplado a Portucel e nenhuma outra empresa privada - primeiro, as outras empresas privadas são apenas duas segundo, têm lucros fabulosos em Portugal; terceiro, não cumprem as determinações do Governo português, pelo menos uma delas; quarto, a Portucel, par causa exclusivamente da política que lhe está imposta pelo Governo, tem do pagar este ano 2 milhões 750000 contos só de juros. É natural, portanto, que o Governo tenha de dedicar-lhe alguma atenção!
O Sr. Deputado Mário Lopes volta a insistir com o problema das taxas de arborização. Oxalá eu contribua para que- compreenda finalmente este problema, porque o problema que se põe é este: nós também condenamos a reduzidíssima taxa de arborização que se tem verificado no País nos últimos anos e sempre. A taxa de arborização e extremamente baixa. No entanto, se refiro este problema é porque os partidos da AD utilizaram a sua maioria aqui. na Assembleia (Ia República, para votar e como rejeitar o projecto de lei comunista, de defesa da floresta contra os incêndios dizendo que o que é preciso é arborizar, e arborizar já, as áreas ardidas. Mas, em absoluta incoerência com esse seu pretexto, aquilo que vieram a aprovar uma semana depois, ao votarem a favor do OGE, foi uma verba que dá para arborizar apenas 2000 dos 48000 ha ardidos o ano passado!
Ora, nós entendemos que a área a arborizar deve ser de facto muito maior, a taxa do arborização deve ser muito maior mas não ê com a política da AD, menos quando demagogicamente aqui se invoca essa política.

Uma voz do PSD: - É a sua opinião!

O Sr. Luís Coimbra (PPM): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer um curto protesto.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

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O Sr. Luís Coimbra (PPM): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há pouco solicitei a palavra para um pedido de esclarecimento, agora peço-a para um curto protesto porque julgava que a intervenção do Sr. Deputado Vítor Louro se tinha revestido de uma seriedade...

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Seriedade?!

O Orador: - .... que agora vejo que é apenas aparente. Estávamos a discutir, embora em termos muito breves e sucintos, a política de celulose e o Sr. Deputado levou este problema para a brincadeira...

O Sr. Narana Coissoró {CDS): - Ele só sabe fazer isso!

O Orador. - .... e falou na política, de «mau cheiro» do Governo da AD, o que penso ser perfeitamente ridículo e demagógico!
Além do mais, o meu protesto e para dizer- que não se trata de o PPM assumir aqui uma posição e de um Deputado do PSD assumir outra. Isso não se chama uma fissura, Sr Deputado, isso, dentro da Aliança Democrática, chama-se, democracia, a qual defendemos. Tenho dúvidas de que o Sr. Deputado também a defenda...

Aplausos do PPM, do PSD e do CDS.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Ele não sabe o que isso é. Ele só .sabe receber ordens!

O Sr. Valdemar Alves (PSD):- Sr. Presidente, o meu nome foi invocado pelo Sr. Deputado Vítor Louro. Desejava protestar.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Valdemar Alves (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É evidente que há um ponto em que não posso concordar com as palavras do Sr. Deputado Vítor Louro, quando falou em fissura. Aquando da minha intervenção, um elemento da bancada do Partido Comunista perguntou-me qual era a minha posição, se era pessoal ou se era uma posição do meu partido, e respondi que era uma posição pessoal.
Por outro lado, o adjectivo da minha intervenção, embora focasse a possibilidade da instalação de uma nova unidade de celulose no nosso país ou a possibilidade da exportação de matéria-prima se não tivéssemos suficiente consumo para ela, era única e simplesmente a defesa dos pequenos e médios produtores de madeira, que atravessam um momento de certa dificuldade na colocação da matéria-prima. Era, portanto, um aleita que eu deixava para as entidades competentes, a fim de remarem resolver este problema e minurar o problema dos pequenos e médios agricultores que têm a sua madeira para exportar.
Se a solução é a montagem de uma nova unidade industrial, se a solução é a exportação ou se e o aumento das actuais unidades existentes, pois com certeza que qualquer delas, melhores ou piores, poderá ir de encontro ao problema. Era este o objectivo final e prioritário da minha intervenção.

Aplausos do PSD e do Sr. Deputado do PPM Barrilaro Ruas.

O Sr. Mário Alves (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer um protesto.

O Sr. Presidente: - Com certeza. Sr. Deputado. Faça favor.

O Sr. Mário Alves (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pedi a palavra para fazer um protesto uma vez que o Sr Deputado Vítor Louro muito aqui fala de coerência no que diz respeito a uma intervenção feita por num, em nome do meu grupo parlamentar, aquando da discussão do projecto do lei do Partido Comunista Português sobre a defesa da floresta contra o fogo e, depois no que diz respeito ao Orçamento Geral do Estado.
Sr. Deputado Vítor Louro, é evidente, que não foi da nossa parte nenhuma incoerência. E tanto não há que, após a votação do Orçamento Geral de Estado ou até mesmo antes dessa votação, reiniciámos as arborizações nas zonas mais criticas afectadas pelo fogo. V. Ex.ª sabe isso perfeitamente. Sabe que e eu já aqui o afirmei várias vezes, arderam de 1974 a 1078, 331 000 ha de terra e ainda não houve nenhum governo que tivesse esboçado o princípio de uma rearborização, o princípio da construção de aceiros ou postos de vigia.

O Sr. António Lacerda (PSD):- Muito bem!

O Orador: - No entanto, o Governo da Aliança Democrática, com cinco meses de existência, já o fez. Faz este ano 1200 ha, poderá fazer 50 000 ha para o ano, 100 000 ha daqui a dois anos e poderá, dentro de cinco anos, ter os 300 000 ha de terra arborizados.

Aplausos do PSD e do PPM.

O Sr. João Amurai (PCP): - Não pode, porque já não é Governo!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Louro, se assim o entender

O Sr. Vítor Louro (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É evidente que não vamos iniciar, num período de esclarecimentos, com disponibilidade de apenas três minutos para pergunta e resposta, um debate sobre um problema tão magno como é o do fabrico da pasta de celulose em Portugal. Naturalmente que não me deixaria arrastar para semelhante campo.
No entanto, o Sr. Deputado Mário Lopes referiu que o Governo da AD já iniciou n rearborização. Pudera, Sr. Deputado! O aparelho de Estado existe, as máquinas estão lá. Mal seria se o Governo da AD obrigasse a que os caterpillars, os trabalhadores, etc., estivessem parados sem fazerem nenhum ... É evidente que tudo isto faz parte do ritmo normal da máquina do Estado e devo dizer que o Governo da AD não fez nada de espacial, aliás como os outros governos também o não fizeram neste campo.
O que parece é que o Sr. Deputado não tem nenhuma noção disto, porque ate diz que daqui a dois anos o Governo AD é capaz de rearborizar 100 000 ha de terra ... Com certeza que o Sr. Deputado não sabe o que são 100 000 ha de terra, porque senão não dizia semelhante coisa!

Risos do PS e do PCP.

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O Sr. Mendes Godinho (PS): - Ele sabe lei alguma coisa disso!

O Orador: - Quanto no Sr. Deputado Vá Ide mar Alves: infelizmente, na altura em que produziu a sua intervenção eu não estava presente no Plenário e não tive então oportunidade de lhe manifestar o meu acordo em relação a muitas das afirmações que fez.
No entanto, lia-a depois com cuidado e compreendi não só o objectivo da mesma, como lambem a posição do Sr. Deputado de defender -o que, de resto, não critico- a necessidade de implementar o funcionamento do equipamento que eslava destinado á Celengol, agora Soporcel. Trata-se de um equipamento que, assim encaixotado, custa hoje ao Pais 4000 contos por dia, e naturalmente que isto tem de ter uma resolução, seja ela qual for.
Agora pergunto: em que é que isto entra em colisão com a posição manifestada pelo PPMV. É que o PPM rejeita a possibilidade de instalação de qualquer novo equipamento para fabrico de pasta de celulose, independentemente, de concordarmos ou nau com isso, o que verificamos é que o Governo AD não só está disposto a autorizar a instalação deste equipamento - o que se em si, a priori, não criticamos--, como ainda pretende atribuí-lo a uma empresa de capital maioritariamente sueco, portanto estrangeiro, em detrimento da empresa pública Portucel, com as mesmas agravantes de poluição, etc., que o Sr. Deputado contesta.
O problema é de facto, dentro da AD entre um partido - o PPM - e um Governo que o PPM apoia!
Finalmente, se o Sr. Deputado acompanhou, e creio que sim a minha intervenção terá compreendido que o que fazemos é exactamente e desmontagem, a prova, de que o actual Governo alenta contra os interesses dos pequenos e médios produtores florestais, entre outros interessados, nomeadamente os trabalhadores fabris, com a política que desenvolve. Embora a preocupação de V. Ex.ª fosse uma, a acção electiva e objectiva do Governo AD é efectivamente contrária àquilo que o Sr. Deputado preconiza.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, esgotamos o período de antes da ordem do dia. A intervenção do Sr. Deputado Sousa Tavares ficará para a próxima reunião.

O Sr. Sousa Tavares (DR)- Sr. Presidente, faço a minha intervenção em cinco minutos. O que não quero é que ela perca a oportunidade.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Sousa Tavares, já ultrapassámos em oito minutos o período de antes da ordem do dia. Não posso prolongar este período, a não ser que a Assembleia apresente um requerimento pedindo o seu prolongamento.

O Sr. Sousa Tavares (DR). -Sr Presidente, é pena que o Sr. Presidenta tenha permitido um diálogo extra-regulamentar, porque o que há são protestos e contraprotestos e mais nada.

Sr. Presidente: - Sr. Deputado, eu consenti-o aos outros Srs. Deputados para terminarmos este ponto. Poderia efectivamente ter reservado a palavra para protestos e contraprotestos para a próxima reunião, não o fiz precisamente para terminarmos este ponto.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Entramos na primeira parte do período da ordem do dia com a apresentação do projecto de lei n.º 451/I - Criação da licenciatura em Artes Plásticas e Design, apresentado pelo PCP.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Rosa Brandão.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, era só para informar que a minha camarada Rosa Brandão não está neste momento no Plenário, mas já 11 atámos de a chamar.

O Sr. Presidente: - Demora muito tempo, Sr. Deputado?

O Sr. João Amaral (PCP):- Penso que não, Sr. Presidente.
De qualquer forma, se entender melhor pedimos uma breve suspensão da reunião.

O Sr. Presidente: - Então dava a palavra ao Sr. Deputado Sousa Tavares...

O Sr. Ferreira do Amaral (PPM): - Muito bem!

O Sr. João Amaral (PCP):- Sr. Presidente, é evidente que com isto não estou abrir caminho a qualquer alteração do Regimento em termos que V. Ex.ª considerou inaceitáveis. Se o Sr. Presidente não emendar de outra forma possível, peço dez minutos de suspensão da reunião.

O Sr. Presidente:- Podíamos até fazer já o intervalo. Não é verdade Srs. Deputados?

O Sr. Borges de Carvalho (PPM): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Borges de Carvalho (PPM): -Sr. Presidente, nessa altura requero a V Ex.ª que consulte a Câmara no sentido de saber se se deve dar ou não a palavra ao Sr. Deputado Sousa Tavares.

O Sr Presidente: -Sr. Deputado, de qualquer modo penso que, depois de ter encerrado o período de antes da ordem do dia, reabri-lo seria unia irregularidade. Só por irreflexão é que há pouco admiti essa hipótese.
A única solução que tenho é suspender a reunião por cinco minutos

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente:- Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD):- Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penso que os intervalos são concedidos pelo Regimento expressamente para reunião do grupo parlamentar e reflexão do mesmo. Que

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não se exteriorizem os motivos, que não cabem aqui, para pedir os intervalos -nós não temos o poder de exigir às pessoas que digam o motivo para que o pedem - é uma coisa; agora quando se diz expressamente que se pede o intervalo porque o Deputado que devia intervir não se encontra presente, parece-me que as coisas estão muito mal. Até porque, de acordo com o que várias vezes tem acontecido, compreendemos que tenha havido algum problema com a Sr.ª Deputada do Partido Comunista e aceitamos que se arranje uma solução qualquer.
Poderia aproveitar-se o tempo com uma intervenção do Sr. Deputado Sousa Tavares -e estranho que o Partido Comunista não tenha aceite esta solução-, assim como acenamos que o intervalo seja antecipado e que haja tempo para, no reinicio, estar presente a Sr.ª Deputada do Partido Comunista. O que não posso aceitar, de maneira nenhuma, e que se peça um intervalo apenas porque não está presente a Deputada que quer intervir porque nessa altura a norma que deve intervir é a de passar à frente e não intervir.

O Sr. Vital Moreira (PCP):- Mas não tem de aceitar nem deixar de aceitar! Não é você que decide!

O Sr. João Amaral (PCP):- -Peço a palavra, Sr. Presidente

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Amaral (PCP). --Sr. Presidente, pus as questões com lealdade e franqueza, e fomos chamados à atenção pelo Sr. Deputado Amândio de Azevedo para a utilização estrita que deve ser feita do período regimental de interrupção nos termos regimentais.
Lamento que, depois de uma entrada ião bonita, uma entrada de leão. tenha uma saída de sandeiro e que proponha para resolver o problema utilizar-se irregimentalmente o tempo, precisamente para dar a palavra ao Sr. Deputado Sousa Tavares Não tenho nada contra a utilização da palavra pelo Sr. Deputado Sousa Tavares; o que espero é que isso seja feito nos termos regimentais que tão prestemente o Sr. Deputado se permitiu invocar. Se se trata de dar a palavra ao Sr. Deputado Sousa Tavares, então há um sistema que é o de prolongar o período de antes da ordem do dia e então cada grupo parlamentar terá cinco minutes para uma intervenção.
De qualquer forma, e insisto neste ponto, expus a questão com lealdade e, evidentemente, pensava que ela poderia ler-se resolvido com a simplicidade e sem estas questões.

O Sr. Sousa Tavares (DR):- Sr. Presidente, peço a palavra para fazer uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Sousa Tavares (DR): - Sr. Presidente, é que não compreendo que se tenha permitido um diálogo perfeitamente extra regulamentar como foi o diálogo em que intervieram os Deputados Vítor Louro e os, Srs. Deputados que pediram esclarecimentos e que fizeram protestos, quando o que está regulamentado é que se façam protestos e contraprotestos. O que aqui houve foi depois a continuação do diálogo por duas vezes, não é me permitindo que eu fizesse a minha
intervenção por ter terminado o período de antes da ordem do dia. Talvez o Partido Comunista não saiba qual é a a questão que aqui quero levantar ..

O Sr. Presidente:- Sr. Deputado Sousa Tavares, talvez V. Ex.ª, não conheça ainda bem o Regimento. O Regimento prevê que haja pedidos de esclarecimento a seguir a uma intervenção ou então que haja respostas aos pedidos de esclarecimento, que os Srs. Deputados que pediram esclarecimento possam fazer protestos ...

O Sr. Sousa Tavares (DR): - Não, não, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, faça favor de consultar o Regimento e verificará que é assim.

O Sr. Sousa Tavares (PR)- Sr. Presidente, não tem sido assim que se tem feito.

O Sr. Presidente: - Então faça favor de consultar o Regimento, Sr Deputado.
ti tenho a dizer-lhe que o Sr. Deputado interveniente pode ainda responder aos contraprotestos que lhe foram feitos.

O Sr. Sousa Tavares (DR): - Não é isso que tem sucedido.

O Sr. Presidente:- Continuamos, portanto, os trabalhos do período da ordem do dia.
Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Rosa Brandão, que dispõe de quinze minutos para fazer a apresentação do referido projecto de lei n.º 451/T.

A Sr.ª Rosa Brandão (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É hoje unanimemente reconhecido o papel fundamental das artes plásticas e do design no mundo contemporâneo, pela ordem de problemas científicos, técnicos, sociais e culturais, cuja resolução se enquadra em qualquer projecto de desenvolvimento.
Nesta óptica, assumem particular relevância as escolas superiores de belas-artes, que de início foram declinadas a cobrir certas áreas de estudo a que o País não vetava uma atenção útil. Detentoras de patrimónios valiosíssimos e tendo prestado serviços que não podem ser ignorados, as escolas superiores de belas-artes beneficiaram em 1914 e depois em 1932 de reformas significativas ainda que lacunares e atrasadas no tempo, as quais reconduziram a formação artística e o estatuto dos diplomados a um mínimo de dignidade.
A reforma mais profunda destas escolas, contudo, verificou-se nos anos 50 que, apesar da grande desinformação existente e dos vários preconceitos, neste campo, constituiu um verdadeiro passo em frente, um passo importante na história do ensino superior artístico.
O estatuto daqueles estabelecimentos, de ensino pasmou com toda a clareza a parauniversitário, na medida em que expressa e inequivocamente consagrava cursos de Pintura, Escultura e Arquitectura (para todos os efeitos considerados superiores). Esse decreto no seu articulado conferia aos diplomados qualificação profissional, direitos e garantias

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aos licenciados pelas Faculdades, sendo a carreira docente nas escolas superiores de belas-artes inteiramente concordante com a da Universidade.
Acresce que o Decreto-Lei n.º 39/74, de 9 de Fevereiro, colocou o acesso aos cursos de Pintura e Escultura inteiramente dentro das condições previstas dentro de qualquer Faculdade. Porém, em 1970 cria-se o primeiro precedente sério depois de 1957, de abandono das escolas à sua sorte, com a remodelação da carreira docente universitária não aplicável às escolas superiores de belas-artes.
Com o 25 de Abril, as Escolas Superiores de Belas-Artes de Lisboa e Porto assumiram as transformações de novos contextos económicos, sociais, políticos e culturais, avançando propostas de reestruturação que veiculam estudos entretanto efectuados.
Professores e alunos dos cursos de Pintura e Escultura, servindo-se da experiência acumulada e procurando ir de encontro às novas exigências do Portugal democrático, lançam-se nesta tarefa.
Assim, a par do curso de Agricultura, criam-se os cursos de Artes Plásticas com pintura e escultura como áreas de preferência e Design com design de comunicação ou de equipamento também como áreas de preferência. Qualquer destes cursos tem a duração de cinco anos, com curriculum completo, e ao fim dos quais é concedida a licenciatura.
Estes, novos cursos são imediatamente aceites pelas escolas, em Janeiro de 1975, não mais deixando de funcionar, com o reconhecimento sumário e precário ao nível de despachos por parte do Ministério da Educação.
Em 1975-1976 estias escolas em vão enfrentaram algumas expectativas legítimas ao verem que por parte dos responsáveis do Ministério havia uma correspondência de interesses e objectivos! Nessa altura e por proposta do então Ministro da Educação e com o acordo das escolas ficou definido que se criaria uma estrutura departamental, com separação de arquitectura noutro departamento e que estes; dois departamentos seriam integrados nas Universidades das respectivas academias. Esta nova estrutura entrou logo em funcionamento quanto à homologação dos cursos, apesar de anunciada ao Pais não chegou a ser concretizada.
Entretanto acerca de seis meses, é reconhecido o estatuto universitário aos Departamentos de Arquitectura de Lisboa e Porto. Nada se disse do Departamento de Artes Plásticas e Design, que funcionando sem sobressaltos estranhou o silêncio do Ministério.
E são muitas e de vária ordem as razões! a favor do reconhecimento de nível universitário aos Departamentos de Artes Plásticas e Design.
Os antecedentes históricos destas duas escolas constituem um primeiro argumento de força no sentido de se lhes reconhecer nível universitário. Fazer o contrário do que se fez em 1957, negando-lhes aquilo que lhes foi reconhecido há mais de vinte, anos, significaria um enorme e imperdoável retrocesso.
E a propósito é bom que se recorde o facto de a pintura ter sido reconhecida oficialmente como arte, e não como ofício em 1577, quando hoje há quem contrarie o enquadramento universitário destas escolas com base na defesa da arte como ofício.
A análise do estatuto que permanece em vigor nas escolas superiores de belas-artes, em comparação com a legislação aplicada às Universidades, constitui um segundo argumento a favor destas escolas. Aos alunos das escolas superiores de belas-artes são aplicadas as mesmas disposições que aos alunos das Universidades, nomeadamente quanto à oneração dos seus estudos, à frequência simultânea de outro curso, à exigência para ingresso e ao apoio social.
As categorias docentes são equiparadas. Toda a legislação que tem sido publicada, nomeadamente o decreto de gestão, as comissões interuniversitárias, é extensiva às escolas artísticas.
Desde na bastantes anos que as escolas superiores de belas-artes estão dependentes da Direcção-Geral do Ensino Superior.
Podem ainda ser aduzidas razões de ordem profissional. E quanto a isso não na dúvidas de que as escolas de artes plásticas e design «visam assegurar aos alunos uma sólida preparação científica e cultural, proporcionar uma formação técnica que os habilite para o exercício de actividades profissionais e culturais e fomentar neles o desenvolvimento do pensamento, da inovação, da análise critica e de julgamento independente». Acabo de citar a base XV, n.º 1, da proposta de lei de bases do sistema educativo, que define os objectivos dos cursos do ensino superior ministrados nas Universidades. Estes propósitos aplicam-se em absoluto aos objectivos dos curtos de Artes Plásticas e Design.
Senão vejamos: nos nossos dias as disciplinas de índole artística só evoluem se se lhes reconhecer o âmbito de investigação por elas abarcado, desde a forma plástica ao planeamento, projectos e abordagem de espaços e de equipamentos. Facilmente se aceita que um investigador do campo da biologia necessite de um suporte técnico próprio e exterior do mais elevado nível, para fazer avançar em termos úteis as aquisições da ciência a que se dedica, mas é por vezes mais difícil de compreender que muitas descobertas e obras de investigação teórica, no domínio das artes visuais, só foram ou só são possíveis e com não menos utilidade através de meios técnicos igualmente complexos e de avanços culturais profundos.
Ao nível de formação profissional os cursos de Artes Plásticas e Design encontram soluções várias e todas elas importantes. Forma quadros para o ensino, já que estes cursos são reconhecidos oficialmente como habilitação própria para o exercício da actividade docente. Por outro lado, a formação de operadores artísticos do âmbito das artes plásticas e do design, permitem enquadramentos profissionais em gabinetes técnicos diversos, em esquipas de arquitectura, de tratamento do espaço urbano e do ambiente, em ateliers de artes gráficas, em órgãos de comunicação social (jornais e TV) em gabinetes de planeamento e consulta, em órgãos ligados à actividade cultural (museus, estudo e conservação do património), etc.
E apesar da falta de formação, apoio e estímulo os departamentos de Artes Plásticas e Design, articulando-se interdisciplinarmente, têm-se desenvolvido, com a preocupação de ligação ao exterior quer através de um acordo programático com o IAPMEI, quer trabalhando em colaboração com vários organismos públicos e privados.
E se estas solicitações de exterior não se fazem sentir com maior intensidade, tal se deve à indefi-

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nição em que estas escolas se encontram, levando a que por vezes se privilegiem técnicos com preparação inferior só porque têm um diploma estrangeiro que lhes concede um grau superior.
A subestimação das possibilidades de aproveitamento dos nossos próprios recursos leva a que muitas empresas importem do estrangeiro proteicos de equipamento, por exemplo, quando os poderiam obter com muito menores custos servindo-se dos profissionais portugueses.
Procurei desta forma dar uma imagem o mais fiel possível da actividade e dos adjectivos destes cursos para concluir que também a nível profissional nada pode ser objectado a estas escolas.
Vemos assim reunidas no ensino das artes plásticas e do design duas componentes essenciais: a investigação científica, a criatividade, a formação cultural e a componente técnica garantida pelas várias saídas de formação profissional. Parque estes objectivos nos parecem inteiramente coincidentes com os objectivos traçados para o ensino universitário mais estranhos se nos afigura que não lhes seja reconhecido este estatuto. E aqui convém que se diga, que não em causa nem em discussão o ensino superior ou politécnico. E não o está porque consideramos que seria grave erro retirar para o ensino politécnico as únicas escolas artísticas e que tradicionalmente se encontram em actividade para o nível universitário.
A criação de Institutos Politécnicos não pode ser pretexto paru a destruição e despersonalizarão de escolas que, pela sua actividade, pelos seus currículo e pelo seu nível de formação a conhecimentos não admitam qualquer possibilidade de desqualificação, sob pena de se cometer um grave atentado.
Que o ensino artístico venha a ter vários níveis de formação, podendo mesmo vira ser criados cursos artísticos de curta duração, é ideia aceitável, desde que seja garantida a ligação entre estes dois níveis. Forçar estas escolas a aceitarem aquilo que não podem aceitar por que é contra a sua própria natureza, é altamente incorrecto e, no fundo, contraria a lógica da história que, embora caminhando numa linha sinuosa, proeurou em certa altura qualificar e dignificar o ensino artístico através das escolas que melhor o representavam.
É pois urgente a formalização da licenciatura para os cursos de Artes Plásticas e Design. Não há, pelo que ficou exposto, qualquer disposição de fundo justa, técnica e cientificamente correcta que possa recusar às artes plásticas e ao design, consagradas nos currículo, dos cursos complementares, e em grande parte do mundo integradas em instituições universitárias e similares, um papel social inferior ao de outros ramos do conhecimento e a possibilidade de neles se obterem os graus académicos conferidos pelos estabelecimentos universitários.
Tais foram os propósitos do PCP ao apresentar o projecto de lei de criação da licenciatura em Artes Plásticas e Design.
Resta-nos, por fim, dizer que à Assembleia da República cabe a partir de agora fazer justiça às legítimas aspirações de professores e alunos destas escolas, dizendo um sim ao presente projecto de lei.

Aplausos do PCP, do MDP/CDE e do Sr. Deputado do PPM Barrilaro Ruas.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Sousa.

O Sr. Carlos Sousa (PS): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: O problema que hoje aqui nos é trazido pela colega Rosa Brandão é delicado e tem sido alvo de múltiplas atenções por parte de estudantes e professores das escolas superiores de belas-artes, tanto de Lisboa como do Porto.
De facto, a ausência de enquadramento legal com que os Departamentos de Design e Artes Plásticas das escolas superiores de belas-artes se têm defrontado na sequência do 25 de Abril, da remodelação e das alterações profundas que o 25 de Abril desencadeou, muito principalmente, nas escolas superiores de belas-artes e todas as experiências pedagógicas que, daí para cá, têm sido feitas, não permitiu que fosse dada a melhor das atenções e a atenção que de facto tantos estudantes e professores mereciam.
É evidente que, mesmo estando neste momento em discussão pública as bases gerais do sistema educativo, é difícil neste país estar-se contra o projecto de lei do PCP sem se cair numa posição fechada e ultrapassada.
De qualquer maneira, penso que o projecto de lei do PCP, embora vindo melhorar e trazendo inovações, já que permite uma saída para os estudantes que têm vindo a frequentar os departamentos de Artes Plásticas e Design ...

O Sr. Presidente:: - Esgotou o seu tempo, Sr. Deputado. Faça favor de abreviar.

O Orador: - Vou abreviar, Sr. Presidente. Queria eu dizer que seria importante que o projecto de lei fosse mais ousado.
Assim pergunto: tendo em atenção aquilo que já se passa hoje nas escolas superiores de belas-artes, que saídas profissionais vem possibilitar, já que o mercado dt emprego que pode vir, digamos, a absorver estes artistas está de facto repleto...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não se esqueça que tem só dois minutos e V. Ex.ª já esgotou quase quatro minutos. Peco-lhe o favor de terminar.

O Orador:- Com certeza, Sr. Presidente.
Tendo em atenção a dignificação que é preciso dar às pessoas que saem licenciadas em Artes Plásticas e Design, pode-se com este projecto de lei em discussão atingir esse objectivo?

O Sr. Presidente: - Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Vasco Rodrigues,

O Sr. Adriano Vasco Rodrigues (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há cerca de dois meses, fomos visitados por um grupo de professores da Escola Superior de Belas-Artes que nos entregou um relatório-síntese expondo a pretensão daquele departamento quanto às propostas que acabam de ser apresentadas pela Sr.ª Deputada Rosa Brandão.
Segui com atenção a exposição da Sr.ª Deputada e verifico que, quer na sequência, quer quanto aos objectivos, eles encontram-se contidos no referido relatório-síntese que foi presente ao Secretário de

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Estado do Ensino Superior em 29 de Setembro de 1979.
Neste sentido, perguntava à Sr.ª Deputada se a sua intervenção se pode entender como uma identificação com o relatório apresentado pelo departamento, portanto uma solução seria a apresentação feita pelo PCP dessa proposta, ou se a Sr.» Deputada admite que possa haver outras soluções para os anseios que eu, pessoalmente, considero legítimos, apresentados pelo Departamento de Artes Plásticas e Design da Escola Superior de Belas Artes de Lisboa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura.

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O MDP/CDE considera de grande importância o projecto de lei do Partido Comunista Português porque o desenvolvimento ao nível de licenciaturas do design e das artes plásticas é o reconhecimento da importância que eles têm já, não só para a instrumentalização dos técnicos, mas para um correcto desenvolvimento intelectual do Pais.
Queria fazer apenas duas perguntas ao Partido Comunista Português: a primeira é a que nível se colocam estas licenciaturas. São licenciaturas universitárias?
Segunda, dado que se trata de um curso que não tem tradição em Portugal, o recrutamento dos professores será feito pelos graus académicos ou propor-se-ão novas formas de recrutamento dos professores?

O Sr. Presidente: - Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Rosa Brandão para responder. Dispõe de seis minutos.

A Sr.ª Rosa Brandão (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quanto à questão que foi colocada pelo Sr. Deputado Carlos Sousa,, penso que na apresentação que fiz do projecto de lei do meu partido, em traços gerais, lhe respondi.
Do meu ponto de vista, a possibilidade de criação d«i novas saídas profissionais para 05 Departamentos de Artes Plásticas e Design está estritamente ligada com a própria credibilidade que estes departamentos venham a assumir na nossa sociedade e a nível do próprio ensino. Isto é: é necessário que estas escolas sejam reconhecidas, que tenham um estatuto- definido e que não se; mantenham, como até agora, na indefinição. A partir daí, penso que há de facto grandes possibilidades de saídas profissionais e quanto à afirmação que o Sr. Deputado fez -pelo menos entendia assim de que o marcado de (trabalho estaria esgotado neste campo, tenho a dizer que penso que não está de forma nenhuma, saturado, bem pelo contrário. Por exemplo, o curso de Design é um curso novo que foi criado com base numa nova experiência pedagógica levada a cabo por esta Escola e posto em prática há cerca de quatro ou cinco anos, e sendo certo que ainda há uma grande inexperiência neste campo, acredito mesmo que, a nível dos próprios professores, eles também tenham tido que aprender ao mesmo tempo que ensinavam. No entanto, &ão cursos, que só agora estão a dar os seus frutos e que
poderão, a partir do momento em que dignificarmos estas escolas, em que definirmos um estatuto para dês, criar uma série de possibilidades a nível do mercado de trabalho que tem neste aspecto muitas carências.
Há experiências bastante importantes que, inclusivamente, foram referidas pelos representantes do Departamento de Artes Plásticas e Design da Escola Superior de Belas-Artes de Lisboa, como sejam, o acordo programático com o IAPMEI, a colaboração a nível de estágio com outras empresas públicas e primadas. Tudo isto é um trabalho experimental.
No entanto, a partir do momento em que se incentivei e se criem estímulos para esta Escola, estou convencida de que as saídas profissionais ec multiplicarão e que estas escolas, de certeza absoluta, fornecerão bons quadros para o País.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Quanto à pergunta do Sr. Deputado Adriano Rodrigues: pois para fazer a apresentação do projecto de lei eu não ia inventar. Tentei, e penso que esse era tanto meu dever como de qualquer Deputado desta Câmara, informar-me dos objectivos que os professores e alunos das escolas de artes plásticas e design tinham quanto ao futuro das suas escolas. Informe-me não só com base em conversas que tive com os membros, do conselho directivo e do conselho científico da Escola,, como também em documentos que existiam e que não foi só o dossier apresentado pelos representantes dos órgãos de gestão destas escalas, mas até um relatório sobre ensino artístico, da responsabilidade da Dr.ª Helena Perdigão.
Além disso para me informar melhor e para poder saber aquilo que estava a dizer tive, inclusivamente, a oportunidade de visitar a Escola e do conhecer de permeio aquilo que lá se passa. Portanto, tudo o que digo na. minha intervenção, se contém uma ou outra passagem do dossier, contém também muitas das impressões que colhi quando lá fui.

O Sr. Jorge Lemos (PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Por isso mesmo é que mais me convenci de que eram justas as reivindicações dos professores e dos alunos destas escolas e precisamente por isso é que o Grupo Parlamentar do PCP apresentou o projecto de lei. Não fui só eu que f«i à Escola, outros camaradas meus também lá foram e considerámos que, de facto, era inteiramente justo apresentar aqui um projecto de lei criando a licenciatura em Artes Plásticas e Design.
Quanto a outras aplicações, penso que há uma que está mais ou menos clara: é que a estas escolas seja reconhecido o nível universitário, fazendo-se, como é evidente, uma distinção entre a possibilidade de reconhecerem estas duas escolas. Isto é, por um lado, reconhecerem aos Departamentos de Artes Plásticas e Design de Lisboa e Porto o nível universitário pelas razões que foram aduzidas na apresentação do projecto de lei...

O Sr. Presidente: - Faltam trinta segundos, Sr.ª Deputada.

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A Oradora: - Termino já, Sr. Presidente.
Por outro lado, poderemos vir a admitir a criação do ensino artístico noutros níveis ou graus de ensino, nomeadamente a nível do ensino superior curto. Pelo menos esta é a nossa posição muito clara.
Quanto ao trajecto a seguir, isto é, como alcançar a licenciatura caso ela seja aprovada aqui nesta Assembleia, penso que há um espírito de abertura muito grande da parte dos órgãos de gestão do Departamento de Artes Plásticas e Design, que deverá existir também da parte de todos os grupos parlamentares nesta Assembleia, no sentido de se encontrar uma solução conjunta que vá de encontro às aspirações dos. professores e dos alunos destas escolas.

A Sr.ª Alda Nogueira (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Finalmente, já tenho pouco tempo para responder, mas gostaria só de me referir a uma pergunta da Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura quanto à questão da licenciatura universitária. Penso que, em certa medida, na resposta que dei ao Sr. Deputado Adriano Rodrigues já lhe respondi. mas afectivamente, o que propomos é a licenciatura universitária e não aquilo que vem na propo-la da lei de Bases do Sistema Educativo, apresentada pelo Governa que, quanto a nós, é um bacharelato encapotado. O curso chama-se licenciatura, em Artes, mas não é licenciatura nenhuma.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - É um bacharelato encapotado, que só se chama licenciatura para dentar talvez iludir alguém que ainda esteja distraído nestes aspectos.

O Sr. Presidente: - Terminou o seu tempo, Sr.ª Deputada.

A Oradora: - Não concordamos de forma nenhuma com aquilo que vem na proposta de lei de bases. No entanto, o nosso projecto de lei, foi apresentado antes da proposta de lei, pensamos Que a discussão pode inclusivamente, ser feita em separado e é isso que neste momento está de facto em causa.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminada a apreciação deste diploma, vou dar a palavra ao Sr. Deputado João Machado para proceder à leitura de um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos.

O Sr. João Machado (PSD): - É do seguinte teor o relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos:

COMISSÃO DE REGIMENTO E MANDATOS

Relatório e parecer

Em reunião realizada no dia 20 de Maio de 1980, pelas 17 horas, foi aprovada a seguinte substituição de Deputados:

l -Solicitada pelo Partido Social-Democrata:

Afonso de Sousa Freire de Moura Guedes (círculo eleitoral de Lisboa) .por José Alberto Mendes. Esta substituição é pedida por um período não superior a um mês.

2- Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que p substituto indicado e real e actualmente o primeiro candidato não eleito ainda não solicitado na ordem da precedência da lista eleitoral de entre os apresentados a sufrágio pelo referido partido no respectivo círculo eleitoral.

3 - Foram observados todos os preceitos regimentais e legais.

4 - Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:

A substituição em causa é de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

5 - O presente relatório foi aprovado por maioria, com os votos favoráveis do PSD, PCP, CDS, PPM, MDP/CDE e: do Agrupamento Parlamentar dos Reformadores, votos contrários do PS e abstenção da UDP.

A COMISSÃO: O Presidente, Mário Júlio Montalvão Machado (PSD). Vice-Presidente, António Cândido Miranda Macedo (PS). Secretário, José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP). Secretário, Alexandre Correia de Carvalho Reigoto (CDS), Fernando Raimundo Rodrigues (PSD), Fernando Monteiro do Amaral (PSD), Nicolau Gregário de Freitas (PSD), João Baptista Machado (PSD), António Duarte e Duarte Chagas (PSD), Bento Elisa de Azevedo (PS), Herculano Ramos Rocha (PS), Armando dos Santos Lopes (PS), Vítor Manuel Ribeiro Fernandes de Almeida (PS), Álvaro Augusto Veiga de Oliveira (PCP), João António Gonçalves da Amurai (PCP), Lino Carvalho de Lima (PCP), Victor Afonso Pinto de Cruz (CDS), Francisco Gonçalves Cavaleiro de Ferreira (CDS), Domingos da Silva Pereira (CDS), Nuno Maria Monteiro Godinho de Matos (Indep. Ref.), Augusto Martins Ferreira do Amaral (PPM), Luís Manuel Alves de Campos Catarino (MDP/CDE), Mário António Baptista Tomé (UDP).

O Sr. Presidente: - Vamos votar.

Submetido] à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PCP, do CDS, do PPM, do MDP/CDE e dos Deputados reformadores e votos contra do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminada a primeira parte do período da ordem do dia, fazemos agora um intervalo de trinta minutos. Os trabalhos recomeçam às 18 horas.

Está suspensa a reunião.

Eram 17 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a reunião.

Eram 18 horas e 25 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos entrar na segunda parte da ordem do dia de cujo primeiro ponto consta a continuação da apreciação, na generalidade, da ratificação n.º 319/1-Decreto-Lei n.º 10-A/80, de 18 de Fevereiro, que revoga o Decreto-Lei n.º 356/79, de 31 de Agosto, solicitada pelo PCP. Tem a palavra o Sr. Deputado António Esteves para uma intervenção.

O Sr. António Esteves (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na continuação do debate iniciado na última reunião nós gostaríamos de reflectir um pouco sobre como se chegou a este decreto-lei publicado pelo Governo da AD.
No tempo do I Governo Constitucional foi publicado um decreto-lei tendo fundamentalmente, em vista respeitar a legalidade democrática, respeitar os interesses dos trabalhadores da função pública e respeitar as próprias instituições, e quem para ser mais claro, vou passar a ler o seu articulado relativo à parte que nos interessa:

Artigo 1.º

1 - Para além dos casos em que a lei especialmente o exija, devem ser fundamentados os actos administrativos que, total ou parcial mente:

a) Neguem, extingam, restrinjam ou por qualquer modo afectem direitos ou imponham ou agravem deveres, encargos ou sanções;
b) Afectem, de igual modo, e no uso de poderes discricionários, interesses legalmente protegidos.

Com este decreto-lei o problema que hoje aqui se coloca é o de que qualquer transferência ou exoneração dos titulares da Administração Pública que exerçam cargos de chefia, dos responsáveis pelos institutos autónomos do Estado e dos gestores das empresas públicas, por parte do Governo teria de ser fundamentado através de despacho. Este não é assunto de pouca importância porque através desse despacho as pessoas tinham a possibilidade de exercer um controle jurisdicional sobre a actividade do Governo. E foi isso que o I Governo Constitucional autolimitou, o seu direito de exonerar ou de transferir as pessoas que exerciam o& cargos a que me referi.
O que estava consignado nesse decreto-lei era, portanto, o respeito por um princípio de legalidade mínima na actuação da Administração, ora o exercício, embora com alguma margem de poder discricionário, do respeito pela lei e pelos interesses legítimos dos cidadãos.
Tudo parecia normal, tudo parecia correcto. Todavia, com o Governo Mota Pinto; as. coisas modificaram-se completamente, através de um decreto-lei que veio significar que a fundamentação que o decreto-lei do I Governo Constitucional exigia deixava de ler qualquer sentido e que a invocação da mera conveniência de serviço, bastava para afastar quem quer que fosse.
Isto não era nem mais nem menos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, do que a abertura do maior impudor ao saneamento de todos aqueles que - e são alguns milhares - ocupam lugares de responsabilidade na Administração Pública, nas empresas públicas e nos institutos autónomos.
Claro que perante esta duas atitudes - a do I Governo Constitucional e a do Governo Mota Pinto - estamos face a duas políticas que nada têm a ver uma com a outra. E é por essa razão que o V Governo Constitucional vem, passado pouco tempo depois de ter tomado posse, revogar o decreto-lei do Governo Mota Pinto e repor em vigor o artigo 1.º do decreto-lei do I Governo Constitucional.
Tudo tinha voltado à normalidade. Mas eis que chega o Governo da AD que, através do decreto-lei que hoje se encontra submetido a ratificação, vem repor em vigor o decreto-lei do Governo Mota Pinto e dizer que afinal não é necessário fazer-se qualquer fundamentação para exonerar, transferir ou afectar direitos que constituem interesses legítimos dos trabalhadores da função pública e de outros gestores, declarando que basta para isso a invocação da mera conveniência de serviço.
São, como já disse, Sr. Presidente e Srs. Deputados, duas políticas, duas concepções, duas maneiras de governar.
E quais são as consequências deste diploma do Governo do Dr. Sá Carneiro e dói Prof. Freitas do Amaral? Ele constitui, sem margem para dúvidas, o campo livre para se sanear ao abrigo da lei. Basta que titulares de um destes cargos não sejam do agrado do Governo - neste caso do Governo da AD, amanhã de qualquer outro Governo - e aí estão milhares de pessoas, porventura pessoas honestas, competentes e capazes, a serem postas na rua sem qualquer justificação.
E isto não é de somenos importância porque amanhã, e no caso dos gestores das empresas públicas, quando algum desses gestores procurar trabalho no campo das empresas privadas não será certamente uma bondade figurar no seu curriculum ter sido afastado de um cargo de uma empresa pública por mera conveniência de serviço.
Trata-se afinal de politizar aquilo que não devia ser politizado. Trata-se de equiparar os lugares de chefia da Administração Pública e os lugares de gestão de empresas a lugares de confiança política.
Um gestor de uma empresa pública não tem que ser um homem de confiança política do Governo da AD nem de qualquer outro Governo; tem de ser um técnico capaz e competente que responda pelo modo como gere essa empresa pública.

Vozes do PS:- Muito bem!

O Orador. - A confusão do móbil político, a confusão daquilo que há muitas décadas se chamava a teoria dos actos do Governo não tem aqui qualquer sentido e qualquer aplicação.
Assim, com este decreto-lei o que está em causa são os postos de trabalho e a dignidade de milhares de pessoas que porventura ocupam com eficiência e com honestidade os seus cargos e que podem ser afastados pelo simples facto de não serem da confiança política do Governo.
Não foi isso que se fez durante o I Governo Constitucional. Esse Governo, e os que se lhe seguiram até ao Governo Mota Pinto, entendeu que nesses casos o Governo devia estar sujeito ao controle jurisdicional da sua actividade, porque, contrariamente ao que aqui

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foi dito na passada sexta-feira, o Governo não tem nem pode ter nestes casos um completo poder discricionário para tirar e pôr a seu bel-prazer os gestores, os directores-gerais e todos aqueles que desempenham cargos de chefia, ou porque não pertencem ao seu partido político, ou porque não são das suas simpatias, ou por quaisquer outras razões.
Isto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é absolutamente escandaloso. Nunca se tinha visto, começa-se agora a ver.

Vozes do CDS -Oh!...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - No antigo regime exigia-se uma declaração de anticomunismo para exercer determinados lugares ou para se exercer qualquer lugar na função pública. Agora, pelos vistos, vai passar a exigir-se um emblema da AD.

Aplausos do PS, do PC P e do MDP/CDE.

Mas mesmo assim, ainda que fosse de admitir que de algum modo o poder discricionário da Administração tinha aqui algum fundamento, é ilegítimo confundir o poder discricionário com a arbitrariedade e com o «quero, posso e mando». Entender isto como um acto discricionário é mesmo assim ter sempre em vista que terá sempre de respeitar o móbil do interesse público. E esse interesse público há-de ser justificado não por mera conveniência de serviço mas por razões de incompetência, de incapacidade ou por quaisquer outras que tenham a ver com a maneira como se exerce o cargo e não com a religião ou com a politica que cada um professe.

Aplausos do PS, do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Lembro aos Srs. Deputados que por deliberação da conferência dos grupos parlamentares foi atribuído para o conjunto dos três diplomas que constam desta segunda parte da ordem do dia o tempo global de quarenta minutos para cada um dos quatro maiores partidos e 22 minutos para cada um dos restantes.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No seu afã de elogiar o Governo de Maria de Lurdes Pintasilgo disse o Sr. Deputado António Esteves que esse Governo, logo após a sua entrada em função, tinha revogado o decreto-lei do Governo Mota Pinto. Eu gostava de lhe perguntar se o dia 22 de Dezembro -dia em que foi revogado esse decreto-lei - se pode englobar na expressão «logo após a sua entrada em funções». É que o Governo de Maria> de Lurdes Pintasilgo foi empossado em Julho e o dia 22 de Dezembro corresponde a 20 dias depois da vitória da AD nas eleições.
Eu gostava, pois, de saber se «logo após» quer dizer passados sete meses, dois dias antes de deixar o Governo.
Pergunto-lhe também se o Governo Pintasilgo, quando exonerou muitos directores-gerais ou gestores, não se serviu do decreto-lei do Governo Mota Pinto para o fazer sem invocar a discricionaridade e se quando inundou o seu aparelho de Estado de. pessoas que deixou para o Governo AD não se lembrou de fazer esse decreto-lei exactamente para impedir o Governo da AD de afastar as pessoas de confiança de Maria de Lurdes Pintasilgo agora atiradas ao colo dos Ministros e Secretários de Estado do Governo da AD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Esteves.

O Sr. António Esteves (PS): - Sr. Deputado Narana Coissoró, V. Ex.ª falou em 7 meses, mas o Governo de Maria de Lurdes Pintassilgo foi o Governo dos cem dias, ou seja, de três meses.
Mas do que se trata, Sr. Deputado, não é dessa questão de pormenor e de prazos, mas sim de se saber se qualquer Governo aceita ou não que os tribunais controlem actos desta natureza.
É através deste decreto-lei que o CDS e o PSD estão a revelar como concebem o tratamento que pretendem dar àqueles que trabalham e exercem cargos de alta responsabilidade na função pública, onde mais do que em qualquer sector deviam ter sidas em conta a competência e a honestidade.
Eu quero ver como é que o PSD e o CDS vão explicar aos milhares de gestores portugueses a razão deste decreto-lei. Parece-me que os gestores das empresas públicas e os responsáveis por altos cargos da Administração são igualmente trabalhadores que devem ver os seus direitos respeitados. Não é isso que aqui se passa, não é isso que este decreto-lei visa.
Ao menos, Srs. Deputados, dêem a essa gente a possibilidade de recorrer aos tribunais para que com justiça vejam apreciadas, as situações e que este decreto-lei conduz.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para um protesto.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - É simplesmente para dizer que o Sr. Deputado do Partido Socialista, em vez de responder às minhas perguntas concretas, infringiu o Regimento, fazendo uma nova intervenção que não tinha absolutamente nada a ver com o que lhe perguntei.

Vozes do CDS: - Muito bem!

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Amândio de Azevedo.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Deputado Marino Vicente, na passada reunião, começou a sua vertiginosa intervenção com o ditado popular: «Pela boca morre o peixe.» Eu contrapunha-lhe um outro ditado popular: «Quem mal usa, mal cuida.»

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Efectivamente, do que se trata é de a oposição pretender aproveitar,

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O Orador: - A opinião de quem quer que seja é uma simples opinião e é contrária à que aqui expendi com argumentos concretos e perfeitamente objectivos, que o Sr. Deputado não rebateu nem conseguirá rebater.

Aplausos do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores.

O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - Eu gostava de pôr a seguinte questão ao Sr. Deputado Amândio de Azevedo: Os estatutos da RDP e da RTP, decretados pelo Governo da AD, foram considerados inconstitucionais, entre outros aspectos por estipularem ambos que os seus gestores poderiam ser exonerados em qualquer altura e\ portanto, ao livre arbítrio do Governo, em contraposição com o estatuto aprovado por esta Assembleia para a RDP, CJTI que os gestores tinham realmente um tempo para exercerem as suas funções sem poderem ser retirados da, sua gestão pelo livre arbítrio do Governo. Assim, pergunto ao Sr. Deputado Amândio de Azevedo se não vê a diferença que existe entre uma e a outra posição, na medida, em que a oposição nessa altura apoiou este estatuto e deliberou que os gestores estariam mais dependentes desta Assembleia do que do próprio arbítrio do Governo - e, no entanto, nós tínhamos a possibilidade de vir a ser Governo, e lemo-la, mas queremos que a Assembleia da República tivesse a possibilidade de nomear grande parte dos gestores e de lhes assegurar a sua inamovidade. Ao contrário, o Governo actual quer exactamente dispor dos gestores da comunicação social estatizada, substituíndo-os quando realmente não sirvam exactamente para o que os querem utilizar.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Amândio de Azevedo, deseja responder já ao pedido de esclarecimento ou aguarda para responder no fim?

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Respondo já, Sr. Presidente, e de, uma maneira muito simples, que o Sr. Deputado não deixará de entender como inteiramente satisfatória.

O que aqui está em causa, Sr. Deputado Igrejas Caeiro, é saber se quanto aos gestores da Radiodifusão e da Radiotelevisão Portuguesa deve vigorar um regime que permuta ao Governo a sua exoneração por um acto puramente discricionário. Ora eu admito perfeitamente, sem querer estar aqui a discutir o problema, que nesse caso não deve ser descricionário.

Simplesmente, o decreto-lei que está em causa parte do pressuposto que estes actos são praticados no uso de um poder discricionário. É assim que a lei diz. Não está, portanto, aqui em causa saber se todos os actos hão-de ser discricionários ou não. Isso é um problema que se avalia era relação, a cada caso concreto.

Eu não estou dentro do problema que colocou e não vou agora discuti-lo. Admito perfeitamente que para a salvaguarda de uma maior independência dos órgãos de comunicação social se possa encontrar um regime em que não seja dado ao Governo um poder total e absoluto quanto á nomeação e exoneração dos cargos nos órgãos de comunicação social.

Admito isso tudo, mas não é isso que agora está aqui em causa. O que estamos aqui a discutir é uma matéria referente a casos em que, como hipótese e como pressuposto, o Governo tem o poder discricionário de nomear ou de exonerar. É só nestes casos que estamos a pensar.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos, certamente para um protesto.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Deputado Amândio de Azevedo quis hoje antecipar uma discussão que aqui terá lugar em breve a propósito de um pedido de interpelação ao Governo feito pelo meu partido.

Considere, em primeiro lugar, que as acusações que nos fez são, antes de mais, despropositadas, até porque terão a sua oportunidade de serem, feitas.

Em segundo lugar, considero-as injustificadas e daí o meu protesto. Não vou necessariamente responder com factos porque hoje esses factos foram patenteados perante os órgãos de informação e o Sr. Deputado Amândio de Azevedo limitou-se a fazer afirmações. É velha a estratégia de dizer "disto que me acusas te acuso eu". Oportunamente aqui discutiremos isso mas, de momento, limito-me só a dizer que a realidade e a evidência estão pelo nosso lado, que a ansiedade de tudo que é órgão de informação e de que é país está pelo nosso lado e essa resposta é a mais evidente de todas as que poderia dar.

Aplausos do PS e protestos do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, tem a palavra o Sr. Deputado Amândio de Azevedo.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - O Sr. Deputado Almeida Santos falou em factos. Quando o Partido Socialista assumiu o Governo encontrou os órgãos de comunicação social povoados por militantes do Partido Comunista. Com o nosso apoio muitos desses militantes do Partido Comunista foram afastados dos órgãos de comunicação social e sem o nosso apoio foram substituídos sobretudo por votantes do Partido Socialista. E se o Sr. Deputado quiser posso mencionar imensos casos pessoais: na Radiotelevisão, um presidente socialista; na Radiodifusão, um presidente socialista; para um programa de emigrantes, um Deputado socialista. Eu sei lá bem que mais. Posso mencionar dezenas de casos porque é essa a realidade, Sr. Deputado.

Aplausos do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Contra factos não há argumentos!

O Orador -Em segundo lugar, devo dizer-lhe que não gosto de estar sempre a malhar no ferro frio, e portanto a repetir a mesma coisa, mas não me calarei quando, injustificadamente, nos fizerem acusações, quer da bancada do Partido Comunista,

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como muitas vezes tem acontecido -e nessa altura recordo-lhe aquilo que pesa sobre o seu passado, que são autênticas nódoas negras que demonstram bem que o Partido Comunista não é um partido democrático ...

Vozes do PSD: - Muito bem!

Vozes do PCP: - Provocador!

O Orador: - ... - quer da parte do Partido Socialista quando nos faz acusações relativamente a actos que estão muitíssimo longe de atingir aquilo que, confessadamente, constitui prática no Partido Socialista, que hoje já declara que aconteceu erros. Mas agora os erros do Partido Socialista escondem-se debaixo de uma pedra e o que é preciso é pôr em relevo os erros da Aliança Democrática.

Protestos do PS.

Não, Srs. Deputados. Todas as vezes que fizerem acusações desse género podem estar bem cientes de que nós saberemos recordar aquilo que o Fartado Socialista fez enquanto esteve no Governo.

Aplausos do PSD. do CDS e do PPM.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Leonardo Ribeiro de Almeida.

O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - Peço a palavra, para um protesto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputado.

O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - Um protesto pela veracidade que o Sr. Deputado Amândio de Azevedo acabou agora de proferir, dizendo que foi nomeado um presidente socialista para a RDP, o que não é verdade...

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Dá-me licença, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Desculpe a interrupção, Sr. Deputado Igrejas Caeiro.

Sr. Deputado Amândio de Azevedo, o que é que pretende?

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Pretendo interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, com certeza que o Sr. Deputado Amândio de Azevedo pode interpelar a Mesa e foi nesse sentido que a Mesa entendeu que devia conceder-lhe a palavra.

Tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Interpelo a Mesa porque entendo que não deve ser concedida a palavra ao Sr. Deputado Igrejas Caeiro para fazer um protesto. Está estabelecido nesta Assembleia que a um protesto se responde com um contraprotesto e não é pelo facto de se utilizar outro Deputado do mesmo grupo parlamentar que esta norma deve ser violada. O Sr. Deputado Almeida Santos fez um protesto e eu fiz um contraprotesto e penso que este ponto deve terminar aqui senão nunca mais acabamos. Aliás a prática da Assembleia é exactamente no sentido de não ir além do protesto e do contraprotesto.

Protestos do PS.

O Sr. Raul Rego (PS): - A lei da rolha!

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Rolhas é com o PS!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como V. Ex.ª tiveram ocasião de verificar, estive ocupado no meu gabinete durante algum tempo em que fui substituído pelo Sr. Vice-Presidente José Vitoriano. Cheguei precisamente nesta altura e acabo de ser informado sobre a situação com que estamos confrontados.

O problema é o seguinte, Sr. Deputado Amândio de Azevedo: como se estabeleceu um esquema especial de tempos e de trabalho para estes três diplomas, o Sr. Deputado Igrejas Caeiro vai usar da palavra e se pretender aproveitar esse uso da palavra para fazer contraprotesto ao contraprotesto de V. Ex.ª pode fazê-lo, mas com a certeza absoluta de que esse contraprotesto será descontado no tempo de que o Partido Socialista ainda dispõe para intervir na discussão dos três diplomas em causa.

O Sr. João Amaral (PCP): - Peço a palavra. Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. João Amaral (PGP): - Ê para um protesto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Neste momento não o poderá fazer. A Mesa interrompeu o Sr. Deputado Igrejas Caeiro porque havia um pedido de interpelação que tinha prioridade sobre esse protesto. Portanto, V. Ex.ª fará o seu protesto a seguir ao Sr. Deputado Igrejas Caeiro.

Pode continuar, Sr. Deputado Igrejas Caeiro.

O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pedi a palavra apenas para dizer a esta Câmara que o Sr. Deputado Amândio de Azevedo no seu calor e no seu entusiasmo de tudo pôr em causa acaba por informar a Câmara erradamente, dizendo que foi nomeado pelo Governo do Partido Socialista um presidente socialista para a Radiodifusão portuguesa. Eu gaitaria que ,o Sr. Deputado Amândio de Azevedo esclarecesse esta Câmara, dizendo que se enganou, e que, efectivamente, nunca o Partido Socialista nomeou qualquer presidente socialista para a RDP. Pedi a palavra realmente para esclarecer este aspecto, que me parece importante. Compreende-se que no meio do desejo de atrapalhar a situação, e de atacar aquilo que vai ser o ataque sério e justo pelas acções do Governo no domínio da comunicação social, se pretendeu, efectivamente, virar o feitiço contra o feiticeiro, apresentando-se como acusador quando neste momento estão na qualidade, de acusados e não .podem ser acusadores.

Aplausos do PS.

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O Orador: - A opinião de quem quer que seja é uma simples opinião e é contrária à que aqui: expendi com argumentos concretos e perfeitamente objectivos, que o Sr. Deputado não rebateu nem conseguirá rebater.

Aplausos do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores.

O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - Eu gostava de pôr a seguinte questão ao Sr. Deputado Amândio de Azevedo: Os estatutos da RDP e da RTP, decretados pelo Governo da AD, foram considerados inconstitucionais, entre outros aspectos por estipularem ambos que os seus gestores poderiam ser exonerados em qualquer altura e portanto, ao livre arbítrio do Governo, em contraposição com o estatuto aprovado por esta Assembleia para a RDP, CJTI que os gestores tinham realmente um tempo para exercerem as suas funções sem poderem ser retirados da, sua gestão pelo livre arbítrio do Governo. Assim, pergunto ao Sr. Deputado Amândio de Azevedo se não vê a diferença que existe entre uma e a outra posição, na medida, em que a oposição nessa altura: apoiou este estatuto e deliberou que os gestores estariam mais dependentes desta Assembleia do que do próprio arbítrio do Governo - e, no entanto, nós tínhamos a possibilidade de vir a ser Governo, e lemo-la, mas queremos que a Assembleia da República tivesse a possibilidade de nomear grande parte dos gestores e de lhes assegurar a sua inamovidade. Ao contrário, o Governo actual quer exactamente dispor dos gestores da comunicação social estatizada, substituindo-os quando realmente não sirvam exactamente para o que os querem utilizar.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Amândio de Azevedo, deseja responder já ao pedido de esclarecimento ou aguarda para responder no fim?

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Respondo já, Sr. Presidente, e de, uma maneira muito simples, que o Sr. Deputado não deixará de entender como inteiramente satisfatória.
O que aqui está em causa, Sr. Deputado Igrejas Caeiro, é saber se quanto aos gestores da Radiodifusão e da Radiotelevisão Portuguesa deve vigorar um regime que permita ao Governo a sua exoneração por um acto puramente discricionário. Ora eu admito perfeitamente, sem querer estar aqui a discutir o problema, que nesse caso não deve ser discricionário.
Simplesmente, o decreto-lei que está em causa parte do pressuposto que estes actos são praticados no uso de um poder discricionário. É assim que a lei diz. Não está, portanto, aqui em causa saber se todos os actos hão-de ser discricionários ou não. Isso é um problema que se avalia era relação, a cada caso concreto.
Eu não estou dentro do problema que colocou e não vou agora discuti-lo. Admito perfeitamente que para a salvaguarda de uma maior independência dos órgãos de comunicação social se possa encontrar um regime em que não seja dado ao Governo um poder total e absoluto quanto á nomeação e exoneração dos cargos nos órgãos de comunicação social.
Admito isso tudo, mas não é isso que agora está aqui em causa. O que estamos aqui a discutir é uma matéria referente a casos em que, como hipótese e como pressuposto, o Governo tem o poder discricionário de nomear ou de exonerar. É só nestes casos que estamos a pensar.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos, certamente para um protesto.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Deputado Amândio de Azevedo quis hoje antecipar uma discussão que aqui: terá lugar em breve a propósito de um pedido de interpelação ao Governo feito pelo meu partido.
Considere, em primeiro lugar, que as acusações que nos fez são, antes de mais, despropositadas, até porque terão a sua oportunidade de reinem, feitas.
Em segundo lugar, considero-as injustificadas e daí o meu protesto. Não vou necessariamente responder com factos porque hoje e os factos foram patenteados perante os órgãos de informação e o Sr. Deputado Amândio de Azevedo limitou-se a fazer afirmações. É velha a estratégia de dizer «disto que me acusas te acuso eu». Oportunamente aqui discutiremos isso mas, de momento, limito-me só a dizer que a realidade e a evidência estão pelo nosso lado, que a ansiedade de tudo que é órgão de informação e de que é país está pelo nosso lado e essa resposta é a mais evidente de todas as que poderia dar.

Aplausos do PS e protestos do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, tem a palavra o Sr. Deputado Amândio de Azevedo.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - O Sr. Deputado Almeida Santos falou em factos. Quando o Partido Socialista assumiu o Governo encontrou os órgãos de comunicação social povoados por militantes do Partido Comunista. Com o nosso apoio muitos desses militantes do Parindo Comunista foram afastados dos órgãos de comunicação social e sem o nosso apoio foram substituídos sobretudo por militantes do Partido Socialista. E se o Sr. Deputado quiser posso mencionar imensos casos pessoais: na Radiotelevisão, um presidente socialista; na Radiodifusão, um presidente socialista; para um programa de emigrantes, um Deputado socialista. Eu sei lá bem que mais. Posso mencionar dezenas de casos porque é essa a realidade, Sr. Deputado.

Aplausos do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Contra factos não há argumentos!

O Orador -Em segundo lugar, devo dizer-lhe que não gosto de estar sempre a malhar no ferro frio, e portanto a repetir a mesma coisa, mas não me calarei quando, injustificadamente, nos fizerem acusações, quer da bancada do Partido Comunista,

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como muitas vezes tem acontecido -e nessa altura recordo-lhe aquilo que pesa sobre o seu passado, que são autênticas nódoas negras que demonstram bem que o Partido Comunista não é um partido democrático ...

Vozes do PSD: - Muito bem!

Vozes do PCP: - Provocador!

O Orador: - ... - quer da parte do Partido Socialista quando nos faz acusações relativamente a actos que estão muitíssimo longe de atingir aquilo que, confessadamente, constitui a prática no Partido Socialista, que hoje já declara que aconteceu erros. Mas agora os erros do Partido Socialista escondem-se debaixo de uma pedra e o que é preciso é pôr em relevo os erros da Aliança Democrática.

Protestos do PS.

Não, Srs. Deputados. Todas as vezes que fizerem acusações desse género podem estar bem cientes de que nós sabemos recordar aquilo que o Partido Socialista fez enquanto esteve no Governo.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Leonardo Ribeiro de Almeida.

O Sr. Igrejas Caeiro (PS): -Peço a palavra, para um protesto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputado.

O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - Um protesto pela inveracidade que o Sr. Deputado Amândio de Azevedo acabou agora de proferir, dizendo que foi nomeado um presidente socialista para a RDP, o que não é verdade...

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): -Dá-me licença, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Desculpe a interrupção, Sr. Deputado Igrejas Caeiro.
Sr. Deputado Amândio de Azevedo o que é que pretende?

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Pretendo interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, com certeza que o Sr. Deputado Amândio de Azevedo pode interpelar a Mesa e foi nesse sentido que a Mesa entendeu que devia conceder-lhe a palavra.
Tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Interpelo a Mesa porque entendo que não deve ser concedida a palavra ao Sr. Deputado Igrejas Caeiro para fazer um protesto. Está estabelecido nesta Assembleia que y. um protesto se responde com um contraprotesto e não é pelo facto de se utilizar outro Deputado do mesmo grupo parlamentar que esta norma deve ser violada. O Sr. Deputado Almeida Santos fez um protesto e eu fiz um contraprotesto e penso que este ponto deve terminar aqui senão nunca mais acabamos. Aliás a prática da Assembleia é exactamente no sentido de não ir além do protesto e dó contraprotesto.

Protestos do PS.

O Sr. Raul Rego (PS): - A lei da rolha!

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Rolhas é com o PS!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como VV. Ex.ªs tiveram ocasião de verificar, estive ocupado no meu gabinete durante algum tempo em que fui substituído pelo Sr. Vice-Presidente José Vitoriano. Cheguei precisamente nesta altura e acabo de ser informado sobre a situação com que estamos confrontados.
O problema é o seguinte, Sr. Deputado Amândio de Azevedo: como se estabeleceu um esquema especial de tempos e de trabalho para estes três diplomas, o Sr. Deputado Igrejas Caeiro vai usar da palavra e se pretender aproveitar esse uso da palavra para fazer contraprotesto ao contraprotesto de V. Ex.ª pode fazê-lo, mas com a certeza absoluta de que esse contraprotesto será descontado no tempo de que o Partido Socialista ainda dispõe para intervir na discussão dos três diplomas em causa.

O Sr. João Amaral (PCP): - Peço a palavra. Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. João Amaral (PCP): - Ê para um protesto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Neste momento não o poderá fazer. A Mesa interrompeu o Sr. Deputado Igrejas Caeiro porque havia um pedido de interpelação que tinha prioridade sobre esse protesto. Portanto, V. Ex.ª fará o seu protesto a seguir ao Sr. Deputado Igrejas Caeiro.
Pode continuar, Sr. Deputado Igrejas Caeiro.

O Sr. Igrejas Caeiro (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pedi a palavra apenas para dizer a esta Câmara que o Sr. Deputado Amândio de Azevedo no seu calor e no seu entusiasmo de tudo pôr em causa acaba por informar a Câmara erradamente, dizendo que foi nomeado pelo Governo do Partido Socialista um presidente socialista para a Radiodifusão portuguesa. Eu gostaria que o Sr. Deputado Amândio de Azevedo esclarecesse esta Câmara, dizendo que se enganou, e que, efectivamente, nunca o Partido Socialista nomeou qualquer presidente socialista para a RDP. Pedi a palavra realmente para esclarecer este aspecto, que me parece importante. Compreende-se que no meio do desejo de atrapalhar a situação, e de atacar aquilo que vai ser o ataque sério e justo pelas acções do Governo no domínio da comunicação social, se pretendeu, efectivamente, virar o feitiço contra o feiticeiro, apresentando-se como acusador quando neste momento estão na qualidade, de acusados e não podem ser acusadores.

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente:- Tem agora a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Já lhe concedo a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - É que depois perde a oportunidade, Sr. Presidente. Era agora!

O Sr. João Amaral (PCP): - Comigo sucede o mesmo, Sr. Deputado Amândio de Azevedo.

O Sr. Presidente: -Paira que efeito pede a palavra, Sr. Deputado João Amaral

O Sr. João Amaral (PCP): - Era para um protesto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputado.

O Sr. João Amaral (PCP): - O Sr. Deputado Amândio de Azevedo deliberou, no meio das suas várias perorações, referir o Partido Comunista Português, e é por isso que protesto.
Sr. Deputado Amândio de Azevedo, devo dizer-lhe que nódoa negra no regime democrático e constitucional é precisamente o Governo da AD e a sua prática antidemocrática.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE e protestos do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores.

Não vem. aliás, a despropósito dizer que esse carácter antidemocrático se revela «m muitas actuações do Governo da AD e recordo o que ainda recentemente se está a passar no que toca à (tentativa de subverter e pôr em questão e decisão do Comité Olímpico Português de ir aos Jogos Olímpicos, com mera chantagem.

Risos do PSD, do CDS e do PPM.

Mas, esse carácter antidemocrático do Governo da AD não lhe traz seguramente benefícios a crédito nacional, mas também não lhos traz a crédito internacional. E veja-se ainda, no curto prazo, o significado do desaire da operação europeia que desde logo, no seu começo na fase londrina, obrigou os que iam passear a regressar 'e a acabarem mal o que queriam fazer.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE e protestos do PSD e do CDS.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD):- Sr. Presidente, Srs. Deputados: Eu não vou responder ao protão do Sr. Deputado João Amaral, até porque estou muito mais interessado na discussão dos diplomas que aqui estão em causa do que em entrar em protestos e contraprotestos...

A Sr.ª Ercília Talhadas (PCP): - O Sr. Deputado, mas responda lá, que a gente gostava de saber!

O Orador: -.... até porque a falta de razão total e completa do seu discurso é tão patente que não é, sequer, escondível com as manobras de diversão dos Jogos Olímpicos e da exploração, que eu considero muito baixa, de um acidente de automóvel que vitimou o Primeiro-Ministro deste país.

Aplausos do PSD.

Risos do PCP e do PS.

No que respeita ao Sr. Deputado Igrejas Caeiro, quero dizer-lhe que não tenho, evidentemente, a pretensão de não cometer qualquer lapso de memória. O que interessa é a ideia de fundo que está perfeitamente correcta. Devo dizer-lhe, de memória e com nomes para não haver dúvidas...

Protestos do PS.

.... que o Partido Socialista nomeou para responsável do programa de agricultura o Sr. Deputado Rico Calado; nomeou para responsável de um programa de emigrantes, a Sr.ª Deputada Etelvina Lopes de Almeida; por sua vez, o Sr. Deputado Igrejas Caeiro era chefe dos programas não tem de quê e nomeou ainda tantos outros que eu poderia, aqui mencionar.

Protestos do PS.

Estes são meros exemplos. O que conta é isto e não o facto perfeitamente normal de eu ter proferido uma afirmação que não corresponde à realidade. Admito um lapso de memória, mas a ideia de fundo, infelizmente, é uma verdade como um punho, Sr. Deputado.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM e protestos do PS.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - E não foram poucos. Não tiveram foi tempo para mais.

O Sr. António Esteves (PS):- Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputado.

O Sr. António Esteves (PS):- O Sr. Deputado Amândio de Azevedo, à falta de melhores argumentos para defender o seu decreto-lei, vem transferir a discussão desta questão para os actos do passado. O que está em discussão neste momento não é o passado...

Protestos do PSD e do CDS.

...mas o futuro negro de milhares de pessoas que vão ser atingidas por este decreto-lei. É isto que está em discussão.

Aplausos do PS.

Diz o Sr. Deputado que se trata de um acto discricionário e eu pergunto se os actos discricionários estão ou não estão sujeitos a controle jurisdicional. É com a justificação da mera conveniência de ser-

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viço que se pode impugnar no tribunal administrativo uma decisão do Governo de nomear ou de sanear quem quer que seja? É possível com essa conveniência de serviço fazer qualquer recurso para um tribunal administrativo? É isso que lhe pergunto.
Considera o Sr. Deputado Amândio de Azevedo, ia como o Prof. Freitas do Amaral em declarações feitas há oito dias ao semanário Expresso, que os lugares que estão aqui em causa e em discussão de gestores: de empresas públicas, de directores-gerais e de directores dos institutos autónomos são lugares de confiança política?

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, desculpe, mas há dois pedidos de palavra que precedem o de V. Ex.ª.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD:- Mas eu respondo imediatamente, porque me dá menos trabalho. São tantas as perguntas que se eu não fosse responder uma a uma como é que era possível fá-las todas?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o problema é este: . Ex.ªs estão a discutir um diploma para o qual e fixaram determinadas normas.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, eu respondo brevemente e é precisamente para não perder tempo que prefiro responder já.

O Sr. Presidente: - Então, faça favor. É tempo que conta.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Sr. Deputado, António Filipe, em primeiro lugar, os actos discricionários não são efectivamente susceptíveis de controle jurisdicional, a não ser no que respeita à ideologia do Poder. Já o informei de que é assim que acontece.
Em segundo lugar, não tenho que estar aqui a pronunciar-me sobre se, são ou não são da confiança política do Governo. Estou aqui a pronunciar-me apenas sobre actos praticados no uso de poderes discricionários e, portanto, o resto não me interessa.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Carlos Lage (PS): - Registamos!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Prescindo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, Sr. Deputado Sousa Tavares, tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Sousa Tavares (DR): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Parece-me que este decreto-lei está a ser discutido em termos um 'bocado falseados e apaixonados por todas as bancadas. É evidente que compete a um Governo nomear os funcionários superiores de gestão nos vários serviços. Todos os Governos o fizeram e é escusado estarem a atirar pedradas uns aos outros, porque é evidente que um Governo não pode deixar de o fazer. É até ridículo que esta discussão se tenha processado.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Apoiado!

O Orador - Toda a gente sabe que os Governos da presidência do general Vasco Gonçalves, que eram Governos normalmente de tendência comunista, nomearam todos os gestores que puderam da sua feição política. Depois os Governos socialistas: fizeram naturalmente o mesmo. É evidente que em todas as nomeações há, pelo menos, um conhecimento e uma confiança nas pessoas quando se trata de lugares de confiança. Em todas as democracias do Mundo quando muda o Governo mudam também uma quantidade bastante grande de superiores e de gestores. O problema está essencialmente na questão dos gestores técnicos, problema de que até aqui ninguém falou o me parece dever ser aflorado.
Existe uma lei que regula o exercício de gestor das empresas públicas e que fixa. Normalmente. O prazo de três anos para essas funções. Temos já um contencioso notável de imensíssimos casos de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, não só por actos cometidos por este Governo mas também por actos cometidos pelo Governo anterior, e até por outros Governos anteriores, de demissão de gestores das empresas públicas sem respeito pelos prazos fixados pela lei.
Até aqui não há ainda jurisprudência fixada pelo Supremo Tribunal Administrativo e o que há até hoje, na verdade, é a prática evidente e uniforme de todos os Governos de que quando os gestores das empresas públicas não agradam se substituam por outros. O único problema é o de saber se o faz à sombra da lei ou ilegalmente. Até aqui tem sido feito ilegalmente porque, de facto, existe um decreto-lei que regula o exercício de funções do sector público que ninguém tem observado, na medida em que ninguém tem respeitado o prazo de três anos fixado, para o exercício da função da gestor público.
De resto, o elemento um pouco sentimental e fadista introduzido na discussão pelo Sr. Deputado socialista que falou há pouco parece-me completamente irrelevante, porque não é normalmente por este motivo que estas pessoas vão para a miséria, na medida em que se trata de transferências de serviço, isto é, quando terminam as suas comissões de serviço regressam normalmente a outros postos e ao exercício de funções noutros locais de trabalho.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não se trata, de maneira nenhuma, de mandar pessoas para o desemprego e, portanto, não confundamos as questões. Estamos aqui a discutir como é que um Governo pode reagir em relação aos gestores das empresas públicas e em relação às comissões de serviço em cargos de chefia. A prova é que até aqui tem-se verificado, na verdade, uma acumulação de certos cargos - e este é um problema que deveria ser visto nesta Câmara. Por exemplo, como os directores-gerais de nomeação livre dos Ministérios há casos em que existem mais de vinte e trinta directores-gerais além do quadro, porque cada Minis-

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iro que chega nomeia os directores-gerais que lhe apetece e isto tem sido uma prática permanente e constante e só pode terminar com uma regulamentação séria da função pública.
Nós sabemos que antigamente os directores-gerais eram inamovíveis mas agora são funcionários de confiança política e podem ser mudados livremente pelos Governos, mas conservam a sua categoria de directores-gerais. Quer dizer, tudo isto resultou numa embrulhada que tem de ser vista desapaixonadamente por esta Câmara com uma mentalidade de homenzinhos e não com uma mentalidade de desportistas que estão a jogar à pancada uns com os outros.
Tenho a impressão de que o exercício da função pública e o exercício das comissões de serviço tem de ser regulamentado com cabeça e sem paixão, procurando criar situações legais e não um cúmulo de situações ilegais como até aqui, porque se forem â 1.ª secção do Supremo Tribunal Administrativo encontram lá dezenas « dezenas de processos de gestores públicos a reclamarem contra a destituição das suas funções e isto em relação ao I, II, III, IV, V e VI Governos Constitucionais. De maneira, que ninguém pode, «reste, momento, atirar pedras aos outros.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Armando Bacelar (PS): - Peço a palavra para uma curta intervenção, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Armando Bacelar (PS): - Sr. Presidente e caros Colegas: O que está em causa é bastante mais do aquilo de que aqui se tem falado. Efectivamente, o Decreto-Lei n.º 256-A/77, de 17 de Junho, foi uma medida do I Governo Constitucional que visou introduzir na administração pública um princípio de legalidade administrativa e de direitos individuais dos cidadãos perante a administração pública. Ele refere-se, portanto, a toda a gama de funcionários, de gestores ou de particulares que, tendo direitos, porventura vejam esses direitos potencial ou realmente afectados por qualquer acto da administração pública.
Toda a geme sabe que os despachos ministeriais tinham no nosso país uma tradição de dispensa da sua justificação e da sua fundamentação. Eram despachos ditatoriais que apenas enunciavam uma vontade administrativa, que não tinham de ser fundamentados e que em quase todos os casos o não eram, mesmo quando' ao cidadão competia o direito de ter correr dessa decisão ao Supremo Tribunal Administrativo.
Ora, num regime ditatorial isso estava de acordo com a própria essência do regime.
Por outro lado, todos sabemos que um regime democrático, que é um estado de direito, como aquele que está legislado na nossa Constituição, é um regime que tem de assentar no princípio de que os actos devem ser fundamentados sempre que sejam susceptíveis de ofender os interesses de alguém. E isso é exigido para uma simples declaração de despedimento de um trabalhador numa empresa, à face da Lei do Trabalho.
Desde há muitos anos, quando um trabalhador é despedido numa empresa, a entidade patronal tem de dizer concretamente qual o motivo concreto desse despedimento e, portanto, não se compreende que um Ministro ou um Secretário de Estado não deva fundamentar a sua decisão em relação à exoneração de um funcionário, de um gestor ou de qualquer particular. É que se assim não for a actividade dos tribunais administrativos fica muitíssimo prejudicada, visto que os fundamentos são invocados a posteriori no próprio recurso.
Foi por estas razões que se introduziu este decreto que não visa mais do que obrigar a uma fundamentação em face de actos de exoneração e não em relação a todos os actos ou, como aqui foi dito, em relação a actos de nomeação, porque os actos de nomeação não são deste género. Trata-as, portanto, de actos de exoneração, que negam, extinguem, restringem ou, por qualquer modo, afectem direitos ou imponham ou agravem deveres em cargos ou sanções.
Todos estes actos num Estado democrático, e portanto um Estado de direito, devem ser fundamentados, e este é precisamente, Sr. Presidente e Srs. Deputados, um caso de direitos humanos e de defesa dos princípios da Constituição. Nós não temos uma administração democrática, portanto não temos uma administração que corresponda a um Estado de direito e nem temos sequer a legalidade da Administração quando, para realizar um acto destes, basta a um governante dizer «eu posso, quero e mando», como se disse durante cinquenta anos neste país.
Ora, Sr. Presidente e Srs. Deputados, este decreto--lei que o Governo Mota Pinto restringiu drasticamente nestes casos que aqui menciona -e que são «os actos de transferência e exoneração de funcionários da Administração Pública, de institutos autónomos, sobre empresas públicas» -, dizendo que se consideram suficientemente fundamentados quando o fundamento invocado for da conveniência do serviço, o que, quanto a nós, é o mesmo que não fundamentar, na medida em que nem sequer há a obrigação de dizer em que é que essa conveniência de serviço consiste.
Na realidade, esta restrição torna inútil este princípio e derroga-o numa esfera importantíssima, qualquer que seja o Governo que esteja no Poder, seja o socialista, seja o da AD ou qualquer outro Governo que futuramente nos governe. Portanto, é isto que está aqui em causa.
Este decreto-lei tem uma história, que é a seguinte: nos últimos anos do regime anterior, havia difusa uma aspiração que vinha de muito longe, mas as pessoas apercebiam-se de que nos iríamos encaminhar para a instauração de uma democracia em Portugal. E então mesmo certos defensores do antigo 'regime tinham uma esperança e uma atitude de certa liberalização.
Houve um homem, o Dr. Silva Tavares, comprometido pelo regime anterior, que foi governador de Angola e, posteriormente, presidente do Supremo Tribunal Administrativo, cargo que depois do 25 de Abril naturalmente não continuaria a ocupar, que me proeurou - era eu então Secretário de Estado da Justiça - e que me trouxe o essencial deste decreto-lei. Disse-me então que nos últimos tempos do consulado de Marcelo Caetano teve a pretensão de ver se as esferas governativas acolhiam esse diploma para a liberalização do sector. Possivelmente pretendeu com isso mostrar-me que era um espírito liberal e que, efectivamente, mesmo no regime anterior, havia forças

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que queriam e não conseguiam estudar um princípio moral e politicamente são como este.
Sr. Presidente e Srs:. Deputados: Esse decreto ficou na minha mesa, esteve no Ministério da Administração Interna, foi a vários Governos Provisórios, com alterações que se achou por bem introduzir-lhe, e veio a ser promulgado, com essas alterações, precisamente durante a vigência do I Governo Constitucional, como era natural, porque aí começava a democracia institucionalizada.
Portanto, Sr. Presidente e caros Colegas, aquilo a que aqui estamos a assistir é a um atentado contra os direitos das pessoas visadas que deixam de, poder ler defesa válida, porque todos os dias o abuso do poder é muito difícil de demonstrar num tribunal administrativo, o que, aliás já se tinha iniciado com as alterações introduzidas pelo Governo Mota Pinto que lhe inutilizou uma grande fatia, talvez um dos seus principais princípios.
Na realidade, não se pode dizer apenas que estão muitos recursos no Supremo Tribunal Administrativo, porque esses recursos estão esperando precisamente este diploma, que é lei no Supremo Tribunal Administrativo enquanto nós o não alteramos.
Ora, independentemente de quem está ou não está no Poder, de quem está ou não está no Governo, hoje são uns, amanhã serão outros, penso que há que manter por um princípio, em primeiro lugar, de moral, em segundo lugar, de justiça, em terceiro lugar, de acordo com a Constituição, com a democracia e com a legalidade, o diploma que por duas vezes foi derrogado. E isto só honra e só prestigia a nossa democracia, que todos pretendemos estar a estabelecer. É para isso que eu apelo para esta Assembleia. Peco que, para além das posições partidárias, meditem neste diploma e tomem em consciência aquela posição que não leva ao passado, que não leva efectivamente a antes do 25 de Abril - quando um decreto destes se revelou impossível de estabelecer-, mas que, na realidade, esteja no espirito democrático da Constituição que nos rege.

Aplausos do PS e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Adalberto Ribeiro.

O Sr. Adalberto Ribeiro (PCP): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: É evidente que as bancadas da AD não conseguiram até agora refutar com uma argumentação minimamente consistente os nossos argumentos de inconstitucionalidade e de violação grave da legalidade democrática deste decreto-lei, mas eu queria sobretudo chamar a atenção para um outro tipo de problemas que são as implicações de ordem prática que este decreto-lei tem na vida de milhares de portugueses.
É conhecida a actual situação no sector da função pública, no qual cerca de um terço dos trabalhadores, ou seja, cerca de 100000 -e isto segundo as estimativas da própria Administração -, se encontram fora dos quadros. Basta lembrar que os poucos de entre estes que possuem contrato, os chamados contratados além do quadro, podem vê-lo cessar de um momento para o outro, mediante simples pré-aviso de sessenta dias, para se aquilatar da situação de extrema precariedade de emprego existente.
O Decreto-Lei n.º 356/79, do Governo de Mota Pinto, reposto em vigor pelo actual Governo, embora no preâmbulo pareça restringir o seu âmbito de aplicação a funcionários de escalão superior da Administração Pública, institutos autónomos e empresas públicas, o que é verdade é que no articulado refere apenas e 'genericamente funcionários -só se refere a funcionários -, ou seja, pode entender-se como aplicável a todo e qualquer funcionário, independentemente do seu escalão, pelo que não seria difícil, numa interpretação extensiva, deste artigo, mas quanto a nós alusiva - e nós já estamos habituados aos abusos deste Governo e o mínimo que podemos esperar são abusos da mesma natureza ou ainda pior-, considerar que poucos serão os trabalhadores da função pública não nomeados no uso de poderes discricionários, à excepção talvez dos sujeitos a concurso de provas públicas que constituem, como se sabe, uma escassíssima minoria. E isto é evidente para quem conheça a floresta que e hoje em dia o problema da vinculação à função pública.
Mas admitamos que, tal como no preâmbulo se diz, o decreto se aplica apenas aos funcionários de escalão superior da Administração Pública. Que conteúdo tem hoje em dia este conceito? O que quer dizer um funcionário de escalão superior da Administração Pública? Um chefe de secção, um chefe de repartição, um inspector superior, um professor catedrático, um professor do ensino médio? Todos os elementos inseridos na carreira técnica superior que trabalham nos vários Ministérios e autarquias locais são eu não são funcionários de escalão superior da Administração Pública? Se assim é, não vemos, como pode- deixar de ser, nem o fascismo se atreveu a exonerar com tamanha ligeireza, por mera conveniência de serviço, este chefe de repartição incómodo ou aquele engenheiro recalcitrante.
Finalmente, tomemos a interpretação mais restritiva, admitindo que o diploma apenas se aplica àquilo que no Decreto-Lei n.º 191-F/79 se consideram cargos de direcção e chefia. No mínimo terão de ser estes, parece-me, os lugares cimeiros da hierarquia administrativa, a que se referiu o Sr. Deputado do CDS Narana Coissoró na sua intervenção de sexta-feira passada, e aqueles a que se referiu também o Sr. Deputado Amândio de Azevedo. No mínimo terão de ser estes, ou seja, os cargos de direcção e chefia que neste momento, por via do Decreto-Lei n.º 191-F/79, são exercidos todos em comissão de serviço.
Da simples leitura do preâmbulo deste diploma resulta à evidência que o decreto-lei agora ratificado contraria frontalmente o espírito, os objectivos e as intenções desse mesmo diploma, que visava entre outras coisas «um maior rigor na selecção dos dirigentes, que deverá basear-se no critério da competência.
A delimitação das áreas de recrutamento para os lugares de dirigente e a procura do ponto de equilíbrio entre carácter vitalício e a total instabilidade na ocupação do cargo».
Estou a citar do preâmbulo desse diploma. Ou seja, visava uma concepção do funcionalismo público capaz de assegurar o funcionamento minimamente isento do aparelho de Estado e onde a independência e o critério da competência profissional e do mérito prevalecesse sobre quaisquer outros. Era, aliás, o que o CDS se propunha quando, em 1978, «defendia

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ser necessários - cito palavras do Sr. Deputado Rui Pena, então Ministro da Reforma Administrativa - «incentivar as chefias e definir o seu perfil próprio. Determinar quais são os requisitos de promoção e de acesso dessas chefias. Jogar entre a necessidade de correlação e confiança que deve existir entre os governantes e as chefias e, por outro lado, as próprias garantias de independência que a essas mesmas chefias e no interesse superior da Administração Pública devem ser concedidas».
Era, aliás, o que o PPD/PSD, então campeão da competência e da despartidarização do aparelho de Estado, estávamos em 1977, dizia nas conclusões do seu Encontro Nacional dos Trabalhadores Sociais--Democratas da Função Pública, que passo a ler:

Há que respeitar sempre o princípio do mérito. A construção de um Estado verdadeiramente democrático exige uma função pública independente e altamente eficaz. É, por isso, de exigir a instituição a constante aplicação do princípio democrático do mérito, com objectiva determinação da capacidade profissional sem qualquer discriminação de sexo, ideologia politica ou credo religioso.
A função pública tem por base o profissionalismo dos seus agentes. São, pois, de excluir do seu âmbito quaisquer cargos de natureza política ou cujo exercício lenha exclusivamente apoio em razões de confiança política.
No entanto a intervenção do Sr. Deputado Narana Coissoró, na passada sexta-feira, é perfeitamente elucidativa, quanto a nós, do que é que a AD, dois unos depois, pensa a este respeito e do que pretende com a ratificação deste decreto-lei.
Depois de em menos de cinco minutos falar dez vezes dos comunistas e quatro de subversão e de propósitos subversivos, sem responder no concreto a um único dos nossos argumentos, confunde o Sr. Deputado alvos funcionários da Administração Pública com o pessoal dos gabinetes ministeriais, esquecendo que este último pode em qualquer altura, por via do Decreto n.º 267/77, de 22 de Julho, ser livremente provido e exonerado, sem necessidade sequer de invocação da conveniência de serviço. É, realmente, a este pessoal que deve aplicar-se a designação de agentes políticos de confiança do Governo, pois eles nem sequer são funcionários públicos, a não ser que já tivessem essa qualidade anteriormente u sua ida para os gabinetes.
Quanto ao arrepio do Decreto-Lei n.º 191-F/79 se quer igualar o estatuto dos directores-gerais e demais chefias ao pessoal dos gabinetes, quando se quer reduzi-los a meros agentes políticos da confiança do Governo, está a regressar-se realmente à concepção salazarista do aparelho de Estado de forma, quanto a nós, ainda mais arbitrária e alargada, porque durante esse período o director-geral era o único que era considerado o lugar de confiança política. Todos sabemos como eles eram recrutados e da sua nomeação estavam arredados quaisquer critérios de competência técnica ou profissional.
Mas neste momento, meus senhores, não é só o director-geral, porque estão em igualdade de circunstâncias o director-geral, o subdirector-geral, os directores de serviço e os chefes de divisão, ou seja, defendendo a teoria que foi defendida pelo Sr. Deputado Sousa Tavares e pelas bancadas da AD, cada vez que mudasse o Governo e a orientação política do Governo, poderiam mudar todas as chefias da função pública. Basta que nos lembremos do que isto significa de instabilidade para o aparelho do Estado, mesmo em termos funcionais, já não falo em termos dos direitos dos trabalhadores, porque sei perfeitamente o desprezo que esses direitos lhes merecem ...

O Sr. Lacerda de Queirós (PSD): - Não apoiado!

O Orador: -..., para se ver que toda a argumentação da direita é uma argumentação que cai pela base, é uma argumentação que visa apenas partidarizar descaradamente o aparelho de Estado, tomar conta dele. E não tenho dúvidas, Sr. Deputado Amândio de Azevedo, que uma vez feito esse serviço, os senhores revogariam o Decreto-Lei n.º 191-F/79, para declararem que os directores--gerais -os vossos directores-gerais-, nessa altura, seriam nomeados vitaliciamente.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Sousa Tavares (DR); - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente:- Tem V. Ex.ª a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Sousa Tavares (DR): -Sr. Presidente, já tinha pedido a palavra antes do Sr. Deputado Adalberto Ribeiro para pedir um esclarecimento ao Sr. Deputado Armando Bacelar. O Sr. Presidente não viu, de maneira que vou agora usar tia palavra para esse fim.

O Sr. Presidente: - Se me dá licença, Sr. Deputado, só um esclarecimento.
Como V. Ex.ª pode imaginar, pode acontecer que às vezes haja um lapso da Mesa quanto à ordem por que são retidos os pedidos de palavra. Faz a justiça de acreditar que só por lapso, que a Mesa mais do que ninguém lamenta, não lhe foi concedida a palavra.

O Sr. Sousa Tavares (DR): - De facto, quando o Sr. Presidente deu a palavra ao Deputado do PCP, eu estava com o braço levantado e pensei que ele também tinha pedido a palavra para pedir esclarecimentos. Quando ele começou a falar e me apercebi que estava a fazer uma intervenção, já era tarde para reclamar.

O Sr. Presidente: - É que, realmente, quando o Sr. Deputado pediu a palavra, o Sr. Secretário informou-me que o Sr. Deputado do PCP tinha pedido a palavra antes de V. Ex.ª

O Sr. Sousa Tavares (DR): - Eu tinha pedido a palavra para formular um pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado Armando Bacelar.

O Sr. Presidente:- Se assim é, V. Ex. está ainda a tempo de pedir esse esclarecimento.
Sem contar o tempo que durou este diálogo, tem V. Ex.ª a palavra.

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O Sr. Sousa Tavares (DR): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Eu queria pôr ao Sr. Deputado Armando Bacelar o seguinte problema: estou de acordo com a teoria que o ST. Deputado expendeu, mas não a acho aplicável a este caso, porque estamos a tratar da justificação ou não justificação ido acto discricionário.
Ora, o problema todo anda à volta disso e é isto que se, está a pretender querer obliterar: é que se trata simplesmente de actos discricionários. Esses actos discricionários é que ficam na prática dispensados de qualquer justificação, o que, aliás, está na própria definição legal de acto discricionário. Se um acto é discricionário, é evidente que não precisa de justificação. A justificação está nele próprio, está na conveniência de serviço, está na óptica de quem o pratica, e por isso é que é um acto discricionário. Senão chegaríamos ao ponto, por exemplo, de amanhã não poder ser demitido o Chefe do Estado-Maior do Exército. É evidente que este acto é discricionário, mas tem de haver uma justificação. Se não for a simples conveniência de serviço, o Chefe de Estado-Maior-General das Forças Armadas não pode demitir o Chefe do Estado-Maior do Exército, não pode demitir um comandante diz coisa nenhuma. Isto, por exemplo, indo para as leis militares, mas para as leis civis acabaríamos no mesmo. Isto é um absurdo que paralisaria a Administração da Nação. É claro que nem se leva a sério a argumentação que pretende ser expendida em contrário. Certamente, o Sr. Deputado Armando Bacelar, que defende a este respeito uma teoria séria, com a qual estou de acordo, não pode deixar de concordar que o acto discricionário é livre e não precisa de justificação.
Quanto à opinião do Sr. Deputado do PCP que me atribuiu determinadas opiniões, digo-lhe que as minhas opiniões são estas que estou a dar, as dele não sei bem quais são. Gostaria de ver amanhã se o PCP respeitaria todos os funcionários em exercício nomeados por outros governos. Deveria ser curioso, sobretudo parece que é uma prática usual nos países onde os partidos comunistas governam.
De maneira que o único problema que ponho é este: esta Câmara reconhece ou não a existência de actos discricionários do Governo? Se reconhece, esses actos discricionários não podem ser condicionados a uma justificação, têm de, ser considerados livres.
Agora há um problema que se insere e que é um problema que eu levantei, que é o problema da existência de leis especiais - que é precisamente o problema dos gestores públicos. Os gestores públicos têm uma lei especial que é a lei que regulamenta o exercício das suas funções, que marca prazos mínimos para o exercício dessas funções e que normalmente não são respeitados. Portanto, esta lei não pode tocar na questão dos gestores públicos porque eles estão regulados por uma lei especial. Só a revogação da lei especial que regulamenta a actividade dos gestores públicos é que poderia fazer com que a sua demissão passasse a ser livre e não justificada.
Tenho a impressão que (isto é inatacável e que andamos todos à roda de uma moção com que todos os governos e todos os partidos no Governo estarão certamente de acordo: é que o acto discricionário não precisa de justificação.
Era a isto que eu queria que o Sr. Deputado Armando Bacelar me respondesse.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Peço a palavra para pedir um esclarecimento, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, V. Ex.ª, como já lhe disse, dispõe do tempo que foi estabelecido por consenso para a discussão do diploma, podendo dispor dele como entender. Tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apenas queria dizer ao Sr. Deputado do PCP que interveio que nós produzimos os nossos argumentos políticos e jurídicos que julgámos válidos, o PCP produziu os dele e parece que tem a pretensão de dizer que apenas os seus argumentos são rigorosamente certos e os das outras bancadas são todos errados. Não temos a pretensão de dizer que os nossos argumentos é que são 100% certo* e que o Partido Comunista só diz asneiras. Tomámos nota dos argumentos dela e ficámos com os nossos. Mas parece que a maneira como o Sr. Deputado do PCP terminou a sua intervenção, a dizer «nossos directores-gerais» e «vossos directores-gerais», destruiu a sua própria tese de objectividade, quando reconheceu que há «nossos directores-gerais» e «vossos directores-gerais.»

Aplausos do CDS, do PSD e do PPM.

O Sr. Alberto Ribeiro (PCP):- Não disse nada!

O Sr. Presidente:- Tem agora a palavra o Sr. Deputado Armando Bacelar.

O Sr. Armando Bacelar (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Teria muito gosto em responder às perguntas do meu amigo Deputado Sousa Tavares, mas não disponho de tempo. Em todo o caso vou dizer-lhe, sem que isso esgote - a resposta que lhe poderei dar a título particular -de resto já estivemos a trocar impressões-, três coisas apenas.
A primeira é a de saber se os actos da natureza daqueles que têm estado aqui a ser discutidos devem ser actos discricionários num Estado democrático.
A segunda é a seguinte: como o Sr. Deputado Sousa Tavares reconheceu, as empresas: públicas têm lei substantiva. Os actos relativos aos funcionários das empresas públicas são actos vinculados e portanto o contrarie de actos discricionários. Por outro lado, os Ministérios têm leis orgânicas e as leis orgânicas devem determinar os casos em que os funcionários são nomeados, demitidos, exonerados ou transferidos. Por conseguinte, num Estado democrático eu continuo a defender a minha teoria porque me parece não poder haver outra, de que estes actos devem estar sujeitos a critérios de moralidade, de justiça, de subordinação à Constituição.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Marino Vicente.

O Sr. Marino Vicente (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É para muito rapidamente tentar que

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se vai dia teoria dos actos arbitrários para que não se confunda com actos discricionários e da necessidade da fundamentação destes face ao nosso ordenamento jurídico-constitucional.
Com efeito, toda a gente sabe e aqui foi dito, ou ,por ignorância ou, por má fé, que na base do artigo 19.º da Lei Orgânica do Tribunal Administrativo os actos discricionários só podiam ser atacados na base do desvio do poder. Isso não é verdade. A nossa jurisprudência já começa a acolher na base da jurisprudência já consagrada em países estrangeiros de que, efectivamente, assim não é.
Mas vamos ver face ao valor que tem .para a direita o direito de reacção contenciosa contra actos administrativos definitivos e executórios e o valor que tem para a direita o direito fundamental de acesso aos tribunais.
Como é sabido, o Supremo Tribunal Administrativo é extremamente rigoroso na apreciação do próprio desvio do poder - foi nessa sede que falaram -, fazendo impender sobre o recorrente, como sabem, a alegação do ónus da prova dos factos demonstrativos desse vício, exigindo, que o recorrente indique concretamente e logo na petição o fim ou fins prosseguidos pelo autor do acto diversos daqueles para que a lei lhe conferiu o poder discricionário.
Se quiserem folhear os acórdãos doutrinários, pois dou-lhes três ou quatro: de 10 de Novembro de 1977, de 12 de Junho de 1970, de 7 de Fevereiro de 1974, de 12 de> Julho de 1976, de 9 de Fevereiro, etc.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Há dezasseis!

O Orador: - Isso significa, como reconhece o Prof. André Gonçalves Peneira, no seu trabalho Erro e Legalidade do Acto Administrativo, que é praticamente impossível reagir contenciosamente contra actos não fundamentados, designadamente em sede de discricionariedade. E, mais, no XIV Congresso Internacional de Ciências Administrativas considerou-se que uma das quatro garantias dos cidadãos n» processo administrativo gracioso era precisamente a motivação do acto administrativo, nomeadamente em sede de discricionariedade, sob pena de não haver recurso contencioso.
Podia muito mais citar. Não são argumentos jurídicos que estão aqui a ser aduzidos. Estão a ser aduzidos expedientes meramente políticos que mostram o perfil efectivo da direita,- de revanchismo, de perseguição política. É disto que se trata. É essa máscara que está a cair agora perante a argumentação aqui aduzida pela direita.

Aplausos do PCP.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - A direita está desse lado!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Como não há mais inscrições, vamos votar na generalidade o pedido de sujeição a ratificação do Decreto-Lei n.º 10-A/80, de 18 de Fevereiro, que revoga o Decreto-Lei n.º 356/79, de 31 de Agosto (ratificação n.º 319/I).
Consultada a Assembleia, foi concedida a ratificação, com votos a favor do PSD, do CDS, do PPM e dos Deputados reformadores e votos contra do PS, do PCP, do MDP/CDE e da UDP.

O Sr. Presidente: - Há declarações de voto?

Pausa.

Sr. Deputado Marino Vicente, antes de lhe conceder a palavra, desejava fazer uma dupla consideração.

A primeira é a de que deixo as direcções dos grupos parlamentares avisadas de que amanhã, às 10 horas e 30 minutos, reuniremos no meu gabinete. Por compromissos anteriormente assumidos, pedia ao Sr. Deputado Martins Canaverde se amanhã não se importaria de presidir à reunião dos grupos parlamentares. Se tiver algum problema, pedirei a outro Sr. Vice-Presidente.

O Sr. Martins Canaverde (CDS): - Está bem, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - O segundo ponto que desejava pôr às direcções dos grupos parlamentares é se há algum consenso quanto à forma do funcionamento da presente reunião para além das 20 horas. É que, Srs. Deputados, não somos só nós, são também os Serviços de Apoio Parlamentar. Precisávamos de saber que consenso é que está estabelecido, isto é, se se faz intervalo para depois continuar.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, nas sessões legislativas anteriores, o período final de trabalhos da Assembleia da República foi em geral caracterizado por reuniões que se prolongaram muito para além das horas normais de trabalho. Este ano, na conferência dos presidentes dos grupos parlamentares, fez-se uma tentativa para evitar que isso acontecesse, pelo menos em medidas excessivas. Com esse fim, estabeleceram-se tempos-limites para o uso da palavra e o programa estabelecido só pode ser cumprido se as agendas de cada dia forem realmente cumpridas. Por isso penso que é preferível ultrapassar um bocadinho a hora, afias de acordo com o que estava previsto na conferência dos presidentes dos grupos parlamentares, a estar a deixar acumular matérias que depois irão, necessariamente, provocar reuniões muito mais demoradas do que é normal e desejável.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, chega-me a informação de que parece que o consenso já estava formado.
O problema que ponho agora é de distribuição dessa tempo. Posso dizer a V. Ex.ª e a toda a Câmara que, pelos tempos já utilizados; e pelos que faltam utilizar, há ainda quase três horas para esgotar a discussão dos diplomas. A pergunta que faço é se aproximando-se as 20 horas, VV. Ex.ªs têm algum consenso sobre uma interrupção dos trabalhos para jantar ou se se continua.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS): -Sr. Presidente, de facto ficou acordado na conferência dos grupos parlamen-

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tares que hoje seria esgotada a ordem de trabalhos e foi distribuído a cada partido um certo tempo.
Não há dúvida nenhuma de que muito dificilmente podemos prosseguir, em condições que, aliás, não estavam previstas, um debate por mais três horas. Nessa sentido, propunha uma solução intermédia, que talvez não seja muito violenta para a Assembleia, e que consistiria em fazerem-se as declarações de voto sobre a ratificação n.º 166/I, relativa ao Decreto-Lei n.º 448/79, de 13 de Novembro, que aprova o Estatuto da Carreira Docente Universitária ainda hoje, e amanhã terminava-se a ordem de trabalhos de hoje e cumpria-se também a ordem de trabalhos de amanhã, marcando-se a reunião não para as 15 horas mas para as 14 horas e 30 minutos,

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, com o programa de amanhã e supondo o cumprimento total do de hoje na reunião de hoje, a reunião de amanhã já está marcada para as 14 horas e 30 minutos ...

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, de qualquer maneira, penso que a solução mais sensata será fazerem-se hoje as declarações de voto sobre a ratificação n.º 166/I, relativa ao Decreto-Lei n.º 448/79, de 13 de Novembro, que aprova o Estatuto da Carreira Docente Universitária e reservarmos para amanhã a proposta de lei que se lhe segue. Ficará assim muito pouco tempo dos partidos para amanhã ser utilizado.
Julgo que haverá consenso, visto que o grupo parlamentar do PSD parece também estar de acordo, embora não saiba qual o pensamento dos outros grupos parlamentares. De qualquer modo, aqui fica a nossa sugestão.

O Sr. Presidente: - O que interessava à Mesa acima de tudo era o estabelecimento de um consenso. Parece-me que, à partida, a situação é neste momento a seguinte: o consenso está estabelecido para se cumprir hoje integralmente a ordem do dia. Esse parece que está estabelecido.

O Sr. Oliveira Dias (CDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Oliveira Dias (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Devo informar a Mesa de que os documentos referentes à ratificação n.º 166/I, relativa ao Decreto-Lei n.º 448/79, que aprova o Estatuto, da Carreira Docente Universitária, designadamente o texto da lei de emendas, não está ainda concluído pelos Serviços. De maneira que, à falta de melhor opinião, suponho que efectivamente não estamos em condições de cumprir esse ponto da agenda.

O Sr. Presidente: - Entretanto deu entrada na Mesa mm requerimento pedindo, ao abrigo das disposições legais, a avocação ao Plenário de alguns pontos da votação na especialidade desta ratificação.
Assim, penso que, por uma razão de ordem, poderíamos votar este requerimento e os artigos ou números de artigos a que o mesmo se refere, deixando para amanhã a votação final global, uma vez que, entretanto os Serviços terão tempo paira acabar de elaborar a respectiva lei de emendas que, aliás, deve incluir os resultados da votação que vier eventualmente a ser efectuada no Plenário, se for aprovado este requerimento de avocação.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, penso que poderíamos chegar a um consenso muito rápido se com um intervalo de cinco minutos, sem que os Srs. Deputados saíssem dos seus lugares, fizéssemos uma reunião dos grupos parlamentares ...

O Sr. Carlos Lage (PS): -Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não podendo discutir-se este ponto - aliás, ignorávamos a situação que acaba de nos ser descrita peto Sr. Deputado Oliveira Dias - , passa-se ao ponto seguinte, que é o último e, consiste) na apreciação da proposta de lei n.º 294/I, que define medidas legais de protecção contra a. reprodução ilícita de fonogramas. Como todos os grupos parlamentares estão preparados para intervir sobre essa matéria, não é difícil apreciarmos e voltarmos este último ponto da ordem de, trabalhos, transitando pana amanhã a questão levantada pelo Sr. Deputado Oliveira Dias, ou seja, a votação final global' e as declarações de voto relativas à ratificação n.º 166/I.
Penso que isto não sofrerá contestação de nenhum grupo parlamentar.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o único problema que pus e volto a pôr é se VV. Ex.ªs desejam continuar ininterruptamente os trabalhos ou se se faz
algum intervalo?

Vozes: - Continuamos.

O Sr. Presidente: - Portanto, desejam continuar. Tem a palavra o Sr. Deputado Marino Vicente para uma declaração de voto.

O Sr. Marino Vicente (PCP):- Sr. Presidente, Srs. Deputados: É para dizer que votámos a ratificação desta aberração jurídica, social e política que acabou- de passar, com a responsabilidade, da direita.
Com efeito, dissemos que o Governo usurpa, captura poderes da Assembleia da República legislando contra o que dispõe o artigo 167.º, alínea b), da Constituição, em matéria de direitos, liberdades e garantias, o que configura uma inconstitucionalidade orgânica.
Perante este facto, a direita aos costumes disse nada. É conivente, é autora moral da inconstitucionalidade orgânica.
Como dissemos, a direita negou, de novo, aos trabalhadores o direito de participação no processo de elaboração de tal diploma, contra o que dispõe o artigo 58.º, n.º 2, alínea, a), da Constituição, o que configura, uma inconstitucionalidade formal.
A direita aos costumes disse nada. É conivente, é autora moral de uma inconstitucionalidade formal.
A direita viola, de novo e frontalmente, o direito à segurança no emprego, contra o que estabelece

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o antigo 52.º, alínea b); viola, de novo e grosseiramente, o direito de acesso aos tribunais e o da reacção contenciosa contra actos administrativos definitivos e executórios - contra o que impõem os artigos 20.º, n.º 1, e 269.º, n.º 1, da Constituição; viola, de novo e grosseiramente, o direito de os cidadãos serem informados e esclarecidos, objectivamente, sobre os actos das entidades públicas - contra o que estatuem os antigos 48.º, n.º 3, e 269.º, n.º 2; restringe, de novo e gravemente, direitos e interesses legalmente protegidos, contra a norma imperativa constante do artigo 18.º, n.º 2; subverte, de novo e totalmente, o princípio dia legalidade democrática, que deveria conformar todos os actos do Governo - como preceituam, os artigos 3.º, n.º 4, 9.º, alínea b), e 207.º -, o. que configura uma inconstitucionalidade .material. Face a isto, a direita, aos costumes disse nada. É conivente, e autora material de mais esta inconstitucionalidade.
Isto é, a violação da nossa Leu Fundamental não podia ser mais completa, grosseira em todos os seus aspectos - orgânica, material e formalmente. Mais: utilizante, de novo, o expediente interpretativo, o que significa a restrição, ou, melhor, a destruição retroactiva de direitos, liberdades e garantias, o que é de todo em todo intolerável face ao ordenamento democrático constitucional. Face a esta atrocidade, aos costumes a direita disse, nada. É conivente, é autora material desta atrocidade.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - De tudo!

O Orador: - Para além disto, o diploma que agora foi ratificado significa a instabilidade no emprego de milhares de portugueses, que têm, o direito constitucional de ter esse mesmo emprego, de ter uma estabilidade e uma dignidade no seu posto, de trabalho.
Isto significa que a direita quis institucionalizar em Portugal as interdições profissionais e uma obtusa perseguição política aos trabalhadores.

O Sr. Mário Adegas (PSD): - Eh!...

O Orador: - Foi bom, mesmo assim, que chamássemos a ratificação este diploma. Ficou aqui claro quem está com os trabalhadores e quem é contra os trabalhadores; ficou aqui bem claro quem está com o regime democrático e quem está em sublevação constante contra o regime democrático, e isso já é importante, porque a direita será efectivamente derrotada.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.

O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A UDP votou contra a ratificação do diploma que foi apreciado nesta Assembleia na medida em que o mesmo consagra à evidência e inconstitucionalmente a permissão dos saneamentos por motivos que nada têm a ver com o comportamento do trabalhador visado mas sim com as ideias políticas ou sindicais que o mesmo professa, ficapidlo por isso mesmo, na mira do revanchismo e dos «comissários» da AD.
Nada nos faz lembrar melhor os velhos tempos do fascismo do que o afastamento dos democratas e dos antifascistas sob ai hipócrita e conveniente justificação de «conveniência de serviço».
Passados cinco anos após o 25 de Abril de 1974, devia estar de todo afastado o espectro do saneamento dois democratas e dos antifascistas neste país.
Contada, a realidade, de todos os dias é, preocupante, bem diferente:
Todos os dias são afastados dos seus cargos e privados do seu salário profissionais honestos e dignos que se vêem substituídos por indivíduos sem qualquer competência, mas que para este Governo têm uma virtude invulgar - são fiéis lacaios de uma política antipopular e antinacional, recrutados nas hostes apoiantes do odioso regime fascista.
Referiu-se e a bancada da AD à actuação dos seus parceiros europeus, ditos países democráticos. É bem natural que o faça!
Como se sabe, na República Federal da Alemanha, por exemplo, os trabalhadores acusados ou «suspeitos» de serem de esquerda são despedidos ou nem sequer arranjam emprego.
É claro que o Governo para governar não o pode fazer sem o simples recurso aos mecanismos normais e democráticos da governação. De tal forma governa contra os interesses do povo! Precisa, pois, de usar os seus homens-de-mão -primeiro a alto nível, depois a todos os níveis-, aproveitando, ao mesmo tempos para manter os trabalhadores de uma forma geral debaixo da permanente ameaça de despedimentos ou de transferências discricionárias, obtendo assim um rebanho doei porque atemorizado. É este o objectivo fundamental da AD, o que, convenhamos, é consequente com a sua prática reaccionária, fascizante e antipopular. Mas este Governo será efectivamente derrotado!

O Sr. Manuel Moreira (PSD): -É só demagogia barata!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Armando Bacelar.

O Sr. Armando Bacelar (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Socialista votou contra a ratificação pelos princípios que expôs durante a discussão.
Este é um campo onde a prática dos Governos socialistas e do Governo AD contrastam nitidamente.

Vozes do PSD: - É verdade!

O Orador: - Enquanto o I Governo Constitucional instituiu, no campo da Administração, legislação que introduziu o princípio da legalidade através do dever de fundamentar, este decreto-lei que agora aqui acaba de ser ratificado, com os votos da maioria, estabelece o arbítrio, regressou à falta de justificação em actos lesivos de interesses de funcionários, de gestores com a simples e velha invocação da conveniência de serviço. O Partido Socialista reserva-se o direito, que irá exercer, de e contestar através dos meios

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próprios, impugnando a constitucionalidade desta decisão ministerial.

Aplausos do PS.

O Sr. Bento Gonçalves (PSD): - Mais um recado para o Conselho da Revolução!

O Sr. Presidente: - Não havendo mais pedidos de palavra para declarações die voto, e atendendo à sua formação prestada peto Sr. Deputado Oliveira Dias de que as ratificações. n.º 166/I o 189/I não podem ser votadas hoje, vamos passar à apreciação da proposta de lei n.º 294/I, que define as medidas legais de protecção contra a produção ilícita de, fonogramas.
Está em discussão; na generalidade.

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nós vamos votar favoravelmente na generalidade esta proposta de lei. Isso suscita, desde logo, uma questão, que é a de saber que proposta estamos a votar e em que quadro é que a votamos.
Esta é uma proposta antiga, que foi feita,, em 1976, pelo Grupo Português de Produtores de Fonogramas e apresentada ao I Governo Constitucional. Houve um primeiro anteprojecto; houve um parecei da Procuradoria-Geral da República; houve depois um segundo anteprojecto e um segundo parecer da Procuradoria-Geral da República; e, finalmente, houve uma proposta de lei que deu entrada na Assembleia - aliás não sob a forma de proposta de lei, mas sob a forma de autorização legislativa, tendo em anexo o texto da proposta de lei-, que foi aqui votada mas que não chegou a ser posta em prática por, entretanto, ter caído o Governo que a solicitou.
Uma outra proposta de lei sobre, esta matéria, apresentada pelo IV Governo e que reproduzia a primeira, teve destino semelhante.
Claro que vamos votar uma matéria que tem história, i» o que poderemos perguntar neste momento - e não queria deixar de o fazer - é se em relação à lei que eventualmente saia do processo legislativo agora aberto o Governo vai efectivamente aplicá-la ou se vai fazer o mesmo que tem feito com tantas outras leis, como a~ referende às comissões consulares de emigrantes e outras que mão vale a pena aqui citar para não maçar os Srs. Deputados.
Quanto à matéria em questão, é evidente que ela carece de regulamentação urgente.
Importa proteger os autores, a qualidade das reproduções, a genuidade da obra e os direitos materiais. Importa também dar protecção eficaz aos património cultural e artístico nacional, garantindo a, sua autenticidade e combatendo os falsificadores e usurpadores.
Importa proteger o público, vítima permanente dia rede de falsificadores que lhe apresentam para venda cassettes sem qualquer qualidade, produzidas sem o mínimo de condições.
A concorrência desleal que realizam as redes que se dedicam ao rendoso negócio de reproduzir fonogramas transparece desde logo na fuga ao fisco, no não pagamento dos direitos de autor, na manipulação de produtos de baixa qualidade, na ausência dos investimentos necessários à criação de condições de fidelidade e qualidade.
Por todas lestas razões, como já afirmei, vamos votar favoravelmente esta proposta de lei na ideia de que é preciso regulamentar urgentemente a matéria. Regulamentar, sim, mas não de qualquer forma, e por isso temos algumas dúvidas.
Importa verificar se a regulamentação proposta não ofende princípios gerais de direito ou outros interesses.
Suscitam-se-nos dúvidas quanto ao âmbito das excepções ao princípio da autorização prévia, e chamo a tenção dos Srs. Deputados para esta questão.
Pergunto: estarão suficientemente protegidas as iniciativas de alcance cultural que necessitam, para completa eficácia, de proceder à reprodução de fonogramas? Não nos parece.
A proposta, tal como está configurada, pode estar a cair no oito ou no oitenta. O que se quer combater são as redes Ide falsificadores e usurpadores, não certamente aqueles que, pela intervenção cultural que realizam, fomentam a procura dos meios de cultura e contribuem para a formação cultural, base indispensável para a escolha de qualidade.
As consequências sociais da proposta não são em ponto nenhum afloradas ou equacionadas. Também aqui há que distinguir e há que reafirmar que o que se combate não são os retalhistas, pequenos comerciantes ou vendedores ambulantes, que procuram servir, o público, e que dependem para a sua subsistência ida existência de circuitos sérios de comercialização. Importa equacionar toda a problemática do preço dos fonogramas, o que tem directamente a ver com a impossibilidade de a grande maioria da população a eles poder ter acesso em condições aceitáveis, e, por outro lado, importa decidir rapidamente as medidas de política -designadamente fiscal- que permitam alterar a situação.
A matéria penal do texto tem vindo a suscitar bastantes dúvidas - e não só a nós -, desde o que diz respeito à medida da pena até a forma de punição de comparticipação criminosa, passando pela punição da reincidência, a possibilidade de apreensão, etc.
Independentemente de outras questões, tudo isto se liga à própria concepção que se tenha dos direitos do produtor de fonogramas. A proposta não adianta muito nesse campo.
A configuração deste direito como um direito de propriedade intelectual, decorrente da criação que resulta da actividade do produtor dos fonogramas
- ou seja, da fixação-, necessita de explicitação - que não existe na proposta de lei- pelo menos para que fique claro se se trata ou não de um direito a fim do direito de autor.
De resto, sempre estará em questão também a própria protecção dos direitos dos produtores nacionais de fonogramas (e dos autores nacionais) no estrangeiro.
Portugal não subscreveu ainda a Convenção de Roma de 1961, nem a Convenção assinada em Genebra em 1971, ou seja, nem a Convenção para Protecção dos Executantes, idos Produtores de Fonogramas e das Organizações de Radiodifusão, nem a Convenção dos Produtores de Fonogramas. E é evidente, é óbvio, que para a protecção dos produtores nacionais no estrangeiro se torna necessário que Portugal subscreva estas Convenções.

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Será dentro destas linhas, e de acordo com o que for decidido em sede de especialidade, que nos pronunciaremos no final do processo legislativo. No entanto, e desde já, iremos votar favoravelmente esta proposta de lei.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Nisa.

O Sr. José Nisa (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A presente proposta de lei sobre as medidas de protecção legal contra a reprodução ilícita de fonogramas, apresentada a esta Assembleia pelo actual Governo, resulta de uma iniciativa do II Governo Constitucional, discutida em Junho de 1978, através de uma autorização legislativa então solicitada pelo Governo de Mário Soares.
O Secretário de Estado da Cultura desse Governo, António Reis, tinha preparada a legislação que agora volta a esta Câmara. Trata-se, portanto e no fundo, de uma iniciativa socialista que durante, dois anos se manteve em hibernação legislativa e que o Governo da AD agora recuperou para a vida.
E já que se trata ide um diploma que visa também a .protecção de direitos autorais, bom ser que se diga e reconheça que o pagamento desses direitos deverá ser feito, embora a título póstumo, ao II Governo Constitucional e ao meu camarada António Reis.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Socialista vai votar favoravelmente, na generalidade, a proposta de lei que define as medidas legais de protecção conífera, a reprodução activa de fonogramas por um conjunto de razões que interessa explicitar.
Em primeiro lugar, por razões de ordem financeira, já que a actua] legislação se revela incompleta omissa, privando o Estado de receitas fiscais de considerável importância.
Em segundo lugar, por razões de ordem cultural, a que os produtos fonográficos de origem clandestina, que são lançados no mercado, se revelam de péssima qualidade dm relação aos originais, contribuindo assim parai uma deterioração do gosto do público e degradação do património cultural. Em terceiro lugar, por razões de justiça industrial comercial, já que a concorrência ilegal das organizações «piratas» em relação às produtoras e editoras legalmente constituídas assume atropelos tais que a democracia não pode ignorar ou permitir. Finalmente, uma quanta razão, e esta diz respeito protecção dos direitos autorais, já que os circuitos e produção e venda ilegal dei fonogramas piratas ao declaram às sociedades de autores, nem em Portugal nem no estrangeiro, os dados relativos, à cobrança desses direitos, com imenso prejuízo dos criadores, autores, compositores, artistas, etc. Por esse conjunto de razões, vamos votar favoravelmente e na generalidade a proposta em causa, tendente a domesticar a «selva fonográfica» em que tem vivido o que o PS, oportunamente, pretendeu disciplinar.
O problema, da «pirataria» de cassettes, discos, cartridges e, até, videocassetes, não é um problema só, nem exclusivamente português. Com o desenvolvimento tecnológico da indústria fonográfica, sobretudo no campo das gravações magnetofónicas, surgiram equipamentos altamente sofisticados, de fácil instalação e grande reprodutividade que, em todo o mundo, fizeram proliferar um negócio altamente rentável e nada fácil de controlar. De tal modo que, rapidamente nos últimos anos e a nível mundial, os números de unidades licitamente vendidas se tornam irrisórios quando comparados às quantidades de unidades «piratas» ia cada momento introduzidas no mercado.
Assim, e simultaneamente, se prejudica o Estado nas suas receitas, se deterioram os valores culturais, se produz concorrência desleal e se privam criadores e antistes da sua justa compensação.
Quantificando estes prejuízos - Segundo cálculos feitos e publicados em 1977 - estima-se que só nesse ano o Estado terá sido prejudicado em cerca de 100000 contos de receitas fiscais! Calcula-se ainda que, no caso da «pirataria» de cassettes, terão sido então ilegalmente vendidas 3 milhões de unidades, enquanto as vendidas legalmente se cifram em cerca de 500 000. Isto é, mais de 85 % do total de unidades vendidas são ilegais.
Pensamos que estes números falaram por si, tão escandalosos são.
Permitirá ainda a aprovação da proposta elaborar legislação que permita a adesão de Portugal a acordos e convenções internacionais, dos quais o nosso país sempre esteve excluído por razões, do seu isolamento histórico dês cinquenta anos .
Por todas estas razões, vamos votar a favor da proposta de lei n.º 294/I e reparar a sua baixa à comissão para que seja discutida na especialidade, já que carece de, aperfeiçoamentos técnicos.
Aprovamos, no fundo, uma iniciativa nossa de há dois anos e só estranhamos que tendo o PSD votado contra, em 12 de Junho de 1978, venha agora votar a favor só porque mudou; o Governo... sem que, no entanto, tivesse mudado a proposta.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Castro Caldas.

O Sr. Castro Caldas (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apenas para uma curta justificação da minha bancada em relação à votação da proposta de lei que o Governo apresenta, justificação que muito rapidamente passarei a expor, dado que os argumentos que para tal eu tinha reservado foram já aqui amplamente apontados, quer pelo Sr. Deputado João Amaral quer pelo Sr. Deputado José Nisa.
Não é pelo facto de a proposta ter uma paternidade que é neste momento avocada pelo Partido Socialista que impede a sua justeza e daí que nos sintamos, perfeitamente à vontade para a trazer aqui e nos congratulemos que ela seja votada pela unanimidade do Plenário.
Não podemos também deixar de acompanhar as preocupações do Sr. Deputado João Amaral no tocante à ratificação da Convenção de Roma de 1961 e da Convenção de Genebra de 1971, que são, efectivamente, instrumentos muito importantes de protecção dos direitos autorais. Aliás, acompanhamos também as preocupações do Sr. Deputado João Amaral no sentido de ver, na especialidade, consignadas

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no diploma medidas que protejam, de uma forma mais eficaz, os direitos autorais registados dos fonogramas.

Nada mais adiantarei e julgo que a votação unânime desta Câmara sobre a matéria virá trazer, ao fim deste longo percurso de gestação legislativa, a consagração de um direito que os autores Vinham reclamando insistentemente.

Aplausos do PSD e do PPM.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Baeta Neves.

O Sr. Baeta Neves (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: As razões por que o meu grupo parlamentar também vai votar favoravelmente esta proposta foram já aqui expendidas, e, assim, limitar-me-ei a enunciá-las rapidamente, referindo que essencialmente foram três os argumentos que nos levaram a tomar esta posição favorável.
Com efeito, as reproduções ilícitas são normalmente, senão sempre, de péssima qualidade constituem grave violação dos mais elementares direitos dos consumidores, que, atraídos por preços pretensamente convidativos, vêm a adquirir produtos sem o mínimo de qualitativo exigível.
Existe aqui, por outro lado, uma forma de concorrência desleal que, além de já em si negativa, é também desincentivadora da procura pelos industriais e comerciantes honestos de uma melhoria de qualidade e de uma busca de maiores exigências artísticas e culturais, o que convinha precaver na maior medida possível, e esta proposta de lei contribui bastante decisivamente para tal objectivo.
Finalmente não se pode deixar de considerar os interesses Piscais do Estado, que tem de tomar todas as medidas ao seu alcance para evitar escandalosas fugas de impostos, como no caso, sendo certo estarmos perante um negócio altamente rendoso para os seus beneficiários, que, evidentemente -e gostaria de chamar a atenção da Câmara para isto - não são aqueles que têm a banca montada na rua ou os pequenos retalhistas, pois esses, normalmente, não passam de meros instrumentos de outras forças bem mais poderosas.
Não queria acabar esta minha pequena intervenção sem deixar de me associar ao que já aqui foi exposto sobre a adesão às Convenções de Roma e de Genebra, devido à necessidade que existe de os subscrevermos.

Aplausos do CDS, do PSD e do PPM.

O Sr. Presidente: -Não havendo mais intervenções, vamos votar a proposta de lei n.º 294/I.

Submetido à votação, foi aprovada por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, deu entrada na Mesa um requerimento do PS do seguinte teor:

Ao abrigo das disposições regimentais aplicáveis, requeremos a baixa à 2.ª Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias da proposta de lei n.º 294/I, para discussão na especialidade.
Vamos, pois, votá-lo.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, dado que se verificou o adiamento da votação final global das ratificações n.ºs 166/I e 189/I para a sessão de amar nhã, vamos dar por terminados os nossos trabalhos de hoje.
A reunião de amanhã começa às 14 horas e 30 minutos.
Está encerrada a reunião.

Eram 20 horas e 30, minutos.

Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Social-Democrata (PSD)

António Alberto Correia Cabecinha.
António Augusto Lacerda de Queiroz.
António José Ribeiro Carneiro.
Arménio dos Santos.
Carlos Manuel Pereira de Pinho.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Cecília Pita Catarino.
Dinah Serrão Alhandra.
Fernando José dia Costa.
Germano Lopes Cantinho.
João Baptista Machado.
João Luís Malato Correia.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Joaquim Marques. Gaspar Mendes.
José Alberto Mendes.
José Angelo Ferreira Correia.
José da Assunção Marques.
José Bento Gonçalves.
José Manuel Cochofel Ferreira da Silva.
José Manuel Meneres Sampaio Pimentel.
José Maria da Silva.
José Teodoro da Silva.
Júlio de Lemos de Castro Caldas.
Luís António Martins.
Manuel António Lopes Ribeiro.
Manuel Luís Fernandes Malaquias.
Maria Adelaide Santos de Almeida Paiva.
Nicolau Gregório de Freitas.
Pedro Manuel da Cruz Roseta.

Partido Socialista (PS)

Amadeu da Silva Cruz.
António de Almeida Santos.
António Fernando Marques R. Reis.
António José Vieira de Freitas.
António Manuel de Oliveira Guterres.
Armando Filipe Cerejeira P. Bacelar.
Armando dos Santos Lopes.
Fernando Luís de A. Torres Marinho.
Francisco de Almeida Salgado Zenha.
João Cardona Gomes Cravinho.
João Joaquim Gomes.
Joaquim Sousa Gomes Carneiro.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
José Gomes Fernandes.
José Maximiano de A. Almeida Leitão.

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Maria de Jesus Simões Barroso Soares.
Mário Alberto Nobre Lopes Soares.
Victor Manuel Ribeiro Constando.
Vítor Manuel R. Fernandes de Almeida.

Partido Comunista Português (PCP)

Alberto Jorge Fernandes.
Álvaro Barreirinhas Cunhal.
António Dias Lourenço da Silva.
Domingos Abrantes Ferreira.
Fernando Freitas Rodrigues.
Joaquim Gomes dos Santos.
Lino Carvalho de Liana.
Maria Alda Barbosa Nogueira.

Centro Democrático Social (CDS)

Adalberto Neiva de Oliveira.
António Martins Canaverde.
Eduardo Leal Loureiro.
Francisco António Lucas Pires.
Francisco Gonçalves Cavaleiro Ferreira.
Henrique Augusto Rocha Ferreira.
João José de Sousa Fernandes Honrem.
Joaquim Rocha dos Santos.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
Luís Carlos C. Veloso de Sampaio.
Luís Eduardo da Silva Barbosa.
Luís Filipe Pais Beiroco.
Luís Gomes Moreno.
Manuel António de A. e Vasconcelos.
Manuel Eugénio P. Cavaleiro Brandão.
Narana Sinai Coissoró.
Rui Eduardo F. Rodrigues Pena.

Partido Popular Monárquico (PPM)

Augusto Martins Ferreira do Amaral.

Agrupamento Parlamentar dos Reformadores

José Manuel Medeiros Ferreira.

Nuno Maria Monteiro Godinho de Matos.

Movimento Democrático Português

Luís Manuel A. de Campos Catarino.

União Democrática Popular (UDP)

Mário António Baptista Tomé.

Deputados que faltaram à sessão:

Partido Social-Democrata (PSD)

Carlos Matos Chaves de Macedo.
João Vasco da Luz Botelho de Paiva.

Partido Socialista (PS)

Albano Pereira da Cunha Pina.
Alberto Arons Braga de Carvalho.
António Fernandes da Fonseca.
António Francisco Barroso Sousa Gomes.
Carlos Manuel Natividade Costa Candal.
Francisco Cardoso P. de Oliveira.
Jaime José Matos da Gama.
José Luís do Amaral Nunes.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Manuel Joaquim de M. Pires dos Santos.
Maria Emília de Melo Moreira da Silva.
Maria Teresa V. Bastos Ramos Ambrósio.

Partido Comunista Português (PCP)

Álvaro Augusto Veiga de Oliveira.
António da Silva Mota.

Centro Democrático Social (CDS)

Américo Maria Coelho Gomes de Sá.
João da Silva Mendes Morgado.
Maria Tabila L. F. Mendes Soares.

O Redactor Principal, Manuel Adolfo de Vasconcelos. - O Redactor de 1.ª Classe, Maria Leonor Coxarda.

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PREÇO DESTE NÚMERO 40$00

IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA

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