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I Série - Número 90

Quarta-feira, 1 de Julho de 1981

DIÁRIO da Assembleia da República

II LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1980-1981)

SESSÃO SUPLEMENTAR

REUNIÃO PLENÁRIA DE 30 DE JUNHO DE 1981

Presidente: Exmo. Sr. Leonardo Eugénio Ramos Ribeiro de Almeida

Secretários: Exmos. Srs.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes
Alfredo Pinto da Silva
Maria José Paulo Sampaio
José Manuel Maia Nunes de Almeida

SUMÁRIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 30 minutos.

Antes da ordem do dia. - Foram aprovados os n.ºs 72 e 73 do Diário.
Deu-se conta do expediente, da apresentação de vários requerimentos e do recebimento de respostas a alguns outros.
Na continuação da discussão do voto do PCP condenando a actuação da polícia de intervenção no final de jogo de futebol Nazarenos-Académico de Viseu, intervieram, a diverso titulo, os Srs. Deputados Jorge Lemos (PCP), António Moniz (PPM), Sousa Tavares (PSD), Fleming de Oliveira (PSD), Carlos Lage (PS), Carlos Brito (PCP), Lopes Cardoso (UEDS), Veiga de Oliveira (PCP), Herberto Goulart (MDP/CDE), e Mário Tomé (UDP). Rejeitado o voto do PCP, emitiram declaração de voto os Srs. Deputados Carlos Lage (PS) e Oliveira Dias (CDS), tendo ainda o deputado centrista respondido a um protesto do Sr. Deputado Mário Tomé (UDP), o qual por sua vez também respondeu a um protesto do Sr. Deputado Sousa Tavares (PSD).
Em declaração política, o Sr. Deputado Herberto Goulart (MDP/CDE) criticou a política seguida pelo Governo.
Também em declaração política, o Sr. Deputado César de Oliveira (UEDS) teceu considerações sobre a não aplicação da Lei da Amnistia aos «presos do PRP».
Ainda em declaração política, o Sr. Deputado Carlos Brito (PCP) referiu-se ao modo como decorreu o funcionamento da Assemblea da República na sessão legislativa de 1980-1981. Respondeu no fim a protestos dos Srs. Deputados Moura Guedes (PSD) e Borges de Carvalho (PPM) e a um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado João Morgado (CDS).
Em declaração política, o Sr. Deputado Mário Tomé (UDP) falou das condições de vida do povo português e criticou a acção do Governo no campo económico e político.
Igualmente em declaração política, o Sr. Deputado Almeida Carrapato (PS) falou da não aplicação da Lei das Finanças Locais ao sector das finanças distritais.
Finalmente, também em declaração política, o Sr. Deputado Moura Guedes (PSD) fez um curto balanço do que foi a acção política da AD nos últimos meses. Respondeu depois a um protesto do Sr. Deputado Carlos Lage (PS) - que também usou da palavra a título de defesa - e a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados António Vitorino (UEDS), Carlos Brito (PCP) e Herberto Goulart (MDP/CDE).

Ordem do dia. - Concluiu-se a discussão na generalidade da proposta de lei n.° 48/II, que concede ao Governo autorização para revogar a Lei n.° 56/79, de 15 de Setembro (Serviço Nacional de Saúde). Intervieram no debate a diverso titulo, além do Sr. Ministro dos Assuntos Sociais (Carlos Macedo), os Srs. Deputados Zita Seabra (PCP), António Arnaut (PS), Silva Marques (PSD), Jaime Ramos (PSD), Henrique de Morais (CDS), Fernandes da Fonseca (PS), Sousa Tavares (PSD), César de Oliveira (UEDS), Vidigal Amaro (PCP), Silva Graça (PCP), Gomes Carneiro (PS), Helena Cidade Moura (MDP/CDE), António Moniz (PPM), António Vitorino (UEDS), Luís Filipe Madeira (PS) e Mário Tomé (UDP). Aprovada a proposta de lei na generalidade e na especialidade, fizeram declaração de voto os Srs. Deputados Zita Seabra (PCP), Teresa Ambrósio (PS), Sousa Tavares (PSD) e Magalhães Mota (ASDI).
Na discussão na generalidade da proposta de lei n.° 52/II - Concede ao Governo autorização para legislar sobre o planeamento urbanístico e o regime jurídico de solos, bem como sobre as medidas tendentes a incentivar a utilização de solos urbanos e a urbanizar e penalizações consequentes - que foi aprovada na generalidade e na especialidade, com alteração do artigo 1.°, participaram, além do Sr. Ministro da Habitação e Obras Públicas (Luís Barbosa), os Srs. Deputados Magalhães Mota (ASDI), Veiga de Oliveira (PCP), Anselmo Aníbal (PCP), Silva Graça (PCP), Aquilino Ribeiro Machado (PS) e João Porto (CDS). Registaram-se declarações de voto dos Srs. Deputados Sousa Gomes (PS), João Porto (CDS), Silva Graça (PCP), Borges de Carvalho (PPM), Fernando Costa (PSD) e Magalhães Mota (ASDI).
Depois de lido pelo Sr. Deputado Jorge Lemos (PCP), foi aprovado um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos sobre substituição de deputados do PCP.
Sobre a proposta de lei n.° 54/11 - Concede ao Governo autorização para rever o sistema integrado de incentivos ao investimento - intervieram a diverso título, além do

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Sr. Secretário de Estado do Planeamento (Alberto Regueira), os Srs. Deputados Magalhães Mota (ASDI), Manuel dos Santos (PS), Octávio Teixeira (PCP) e Joaquim Miranda (PCP). A proposta de lei foi aprovada na generalidade e na especialidade, seguindo-se declarações de voto dos Srs. Deputados Herberto Goulart (MDP/CDE) e Joaquim Miranda (PCP).
Discutiu-se o projecto de lei n.º 245/II - Alteração do Estatuto dos Deputados -, apresentado pelos partidos que integram a AD, o qual foi aprovado na generalidade, usando da palavra, a diverso título, os Srs. Deputados Araújo dos Santos (PSD), Lopes Cardoso (UEDS), Mário Tomé (UDP), Veiga de Oliveira (PCP), Natália Correia (PSD), Santana Lopes (PSD), Herberto Goulart (MDP/CDE), Almeida Santos (PS), Magalhães Mota (ASDI) e João Morgado (CDS). A requerimento do PS, o diploma baixou à Comissão de Assuntos Constitucionais para discussão e votação na especialidade.
A Assembleia aprovou depois na generalidade o projecto de lei n.º 223/II - Vencimentos e pensões de reforma dos mais altos servidores do Estado -, do PS, tendo intervindo na sua discussão os Srs. Deputados Carlos Candal (PS), Rui Pena (CDS) e Mário Tomé (UDP). A requerimento do PS, o projecto de lei baixou também à Comissão de Assuntos Constitucionais para discussão e votação na especialidade.
Foi discutido e aprovado na especialidade o texto alternativo à proposta de lei n.º 29/II - Lei da Nacionalidade - apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, tendo feito uma intervenção o Sr. Deputado Jorge Miranda (ASDI) e usado ainda da palavra sobre a maneira de se proceder à votação o deputado da ASDI e os Ss. Deputados Azevedo Soares (CDS), Lino Lima (PCP), Carlos Candal (PS) e António Vitorino (UEDS). À votação na especialidade seguiram-se declarações de voto dos Srs. Deputados António Vitorino (UEDS), Sousa Lara (PPM), Margarida Salema (PSD), José Manuel Mendes (PCP), Azevedo Soares (CDS), Carlos Candal (PS) e Jorge Miranda (ASDI).
Procedeu-se em seguida à votação final global da ratificação n.º 5/II, relativa ao Decreto-Lei n.º 70/79 de 3l de Março, que regula a concessão de passaportes diplomáticos, tendo sido aprovadas as alterações ao decreto-lei. Emitiram declaração de voto os Srs. Deputados Herberto Goulart (MDP/CDE) e Custódio Gingão (PCP).
Seguiu-se a votação final global da ratificação n.º 22/II, sobre o Decreto-Lei n.º 523/79, de 31 de Dezembro, que estabelece normas relativas à concessão e emissão de passaportes especiais. Aprovadas as alterações ao decreto-lei, emitiram declaração de voto os Srs. Deputados Custódio Gingão (PCP) e Henrique de Morais (CDS), tendo a declaração de voto do deputado centrista sido extensiva à ratificação anterior.
A Assembleia resolveu adiar a discussão na especialidade da proposta de lei n.º 24/II e do projecto de lei n.º 194/II, sobre a delimitação e coordenação das actuações da administração local em matéria de investimentos, após debate em que intervieram os Srs. Deputados Veiga de Oliveira (PCP), Silva Marques (PSD), Carlos Brito (PCP), José Niza (PS), Sousa Lopes (PS), Moura Guedes (PSD) e Abreu Lima (CDS).
Seguiu-se a votação final global do projecto de lei n.º 7/II, sobre a igualdade dos cônjuges, tendo sido aprovado o texto final elaborado pela Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias. Emitiram declaração de voto os Srs. Deputados Zita Seabra (PCP), Isilda Barata (CDS), Montalvão Machado (PSD), Jorge Sampaio (PS) e António Vitorino (UEDS).
Após debate em que intervieram os Srs. Deputados Silva Marques (PSD), Silva Graça (PCP), Abreu Lima (CDS) e Veiga de Oliveira (PCP), foi também decidido retirar da agenda dos trabalhos a discussão dos projectos de lei n.ºs 48/II, apresentado pelo PCP, e 143/II, apresentado pelos partidos da AD, e relativos ao regime de criação e extinção de freguesias e municípios e fixação da categoria das povoações.
Seguiu-se a votação final global do projecto de lei n.º 96/II, sobre a amnistia dos crimes previstos pelo Decreto-Lei n.º 274/75, de 4 de Junho. Aprovado o texto final, emitiu declaração de voto o Sr. Deputado Sousa Marques (PCP).
Seguiu-se a votação final global do projecto de lei n.º 245/II, apresentado pelos partidos da AD, sobre alterações ao Estatuto dos Deputados, após explicações do Sr. Deputado Carlos Candal (PS) àcerca do teor do relatório elaborado pela Comissão de Assuntos Constitucionais. Aprovado o texto final fizeram declaração de voto os Srs. Deputados Carlos Brito (PCP), Lopes Cardoso (UEDS), Carlos Candal (PS), Vilhena de Carvalho (ASDI), Rui Amaral (PSD) e Rui Pena (CDS), tendo o deputado centrista respondido depois a um protesto do Sr. Deputado Veiga de Oliveira (PCP) e a uma intervenção do Sr. Deputado Carlos Brito (PCP) ao abrigo do direito de defesa. Houve ainda interpelações à Mesa por parte dos dois deputados comunistas.
Finalmente, em votação final global, foi aprovado o texto final do projecto de lei n.º 223/II, apresentado pelo PS, relativo aos vencimentos e pensões de reforma dos mais altos servidores do Estado, após explicações prévias do Sr. Deputado Nunes de Almeida (PS) sobre o teor do relatório da Comissão de Assuntos Constitucionais. Seguiu-se uma declaração de voto da Sra. Deputada Natália Correia (PSD).
Após intervenções dos Srs. Deputados António Vitorino (UEDS), enaltecendo o trabalho de toda a Mesa, Lopes Cardoso (UEDS), louvando o esforço dos funcionários, Silva Marques (PSD), registando a presença da PSP e José Niza (PS), endereçando uma saudação aos jornalistas que acompanharam a sessão, o Sr. Presidente encerrou a sessão eram 9 horas e 10 minutos do dia 1 de Julho.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum.

Está aberta a sessão.

Eram 10 horas e 30 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados.

Partido Social-Democrata (PSD)

Adérito Manuel Soares Campos.
Afonso de Sousa F. de Moura Guedes.
Álvaro Barros Marques Figueiredo.
Américo Abreu Dias.
António Duarte e Duarte Chagas.
António Maria de O. Ourique Mendes.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
António Vilar Ribeiro.
Armando Lopes Correia Costa.
Arménio Jerónimo Martins Matias.
Bernardino da Costa Pereira.
Carlos Manuel Pereira Pinho.
Cecília Pita Catarino.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Fernando José F. Fleming d'Oliveira.
Fernando José Sequeira Roriz.
Fernando Manuel Cardote B. Mesquita.
Fernando dos Reis Condesso.
Francisco de Sousa Tavares.
Jaime Adalberto Simões Ramos.
Germano Lopes Cantinho.
João Evangelista Rocha de Almeida.
João Manuel Coutinho Sá Fernandes.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Joaquim Pinto.
José Adriano Gago Vitorino.
José Augusto de Oliveira Baptista.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Manuel Pinheiro Barradas.
José Mário de Lemos Damião.
José Theodoro de Jesus da Silva.
José de Vargas Bulcão.
Leonardo Eugénio R. Ribeiro de Almeida.
Leonel Santa Rita Pires.
Luís António Martins.
Manuel António Araújo dos Santos.
Manuel da Costa Andrade.

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Manuel Ferreira Martins.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Manuel Ribeiro Arruda.
Manuel João Vaz Freixo.
Maria da Glória Rodrigues Duarte.
Maria Dulce Coelho Pires D. Raimundo.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Nicolau Gregório de Freitas.
Nuno Aires Rodrigues dos Santos.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Alberto Barradas do Amaral.
Valdemar Cardoso Alves.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.

Partido Socialista (PS)
Adelino Teixeira de Carvalho.
Alfredo Pinto da Silva.
António de Almeida Santos.
António Duarte Arnaut.
António Fernandes da Fonseca.
António Fernando Marques R. Reis.
António José Sanches Esteves.
António Magalhães da Silva.
Aquilino Ribeiro Machado.
Armando dos Santos Lopes.
Beatriz Cal Brandão.
Bento Elísio de Azevedo.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel N. Costa Candal.
Fernando Torres Marinho.
Fernando Verdasca Vieira.
Guilherme Gomes dos Santos.
Jaime José Matos da Gama.
João Alfredo Félix Vieira Lima.
João Cardona Gomes Cravinho.
José Gomes Fernandes.
Júlio Filipe de Almeida Carrapato.
Luís Manuel dos Santos Silva Patrão.
Luís Silvério Gonçalves Saias.
Manuel Trindade Reis.
Maria Teresa V. Bastos R. Ambrósio.
Teófilo Carvalho dos Santos.
Virgílio Fernando M. Rodrigues.
Vítor Manuel Brás.
Victor Manuel Ribeiro Constâncio.

Centro Democrático Social (CDS)
Adalberto Neiva de Oliveira.
Adriano José Alves Moreira.
Adriano Vasco da Fonseca Rodrigues.
Alexandre Correia de Carvalho Reigoto.
Américo Maria Coelho Gomes de Sá.
António Jacinto Martins Canaverde.
António Mendes de Carvalho.
Armando Domingos L. Ribeiro Oliveira.
Daniel Fernandes Domingues.
Emídio Ferrão da Costa Pinheiro.
Emílio Leitão Paulo.
Francisco G. Cavaleiro de Ferreira.
Francisco Manuel L. V. de Oliveira Dias.
Francisco Manuel de Menezes Falcão.
Henrique José C. M. Pereira de Moraes.
15ilda da Silva Barata.
João Cantinho M. Figueiras de Andrade.
João Gomes de Abreu de Lima.
João José M. Ferreira Pulido Almeida.
João da Silva Mendes Morgado.
José Augusto Gama.
José Eduardo F. de Sanches Osório.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
José Vicente de J. Carvalho Cardoso.
Luísa Freire Cabral Vaz Raposo.
Manuel Eugénio P. Cavaleiro Brandão.
Maria José Paulo Sampaio.
Mário Gaioso Henriques.
Narana Sinai Coissoró.
Rogério Ferreira Monção Leão.

Partido Comunista Português (PCP)
Álvaro Augusto Veiga de Oliveira.
Álvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António José de Almeida Silva Graça.
António José M. Vidigal Amaro.
António da Silva Mota.
Armando Teixeira da Silva.
Carlos Alberto do Carmo da C. Espadinha.
Carlos Alfredo de Brito.
Custódio Jacinto Gingão.
Custódio Silva Ferreira.
Ercília Carreira Pimenta Talhadas.
Fernando de Almeida Sousa Marques.
Francisco Miguel Duarte.
Georgete Ferreira de Oliveira.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
Joaquim António Miranda da Silva.
Joaquim Gomes dos Santos.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
José Fernando V. Cabral Pinto.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida
José Rodrigues Vitoriano.
Josefina Maria Andrade.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria Ilda Costa Figueiredo.
Mariana Grou Lanita da Silva.
Zita Maria de Seabra Roseiro.

Partido Popular Monárquico (PPM)
António Cardoso Moniz.
António José Borges G. de Carvalho.
Henrique Barrilaro Ruas.

Acção Social-Democrata Independente (ASDI)
Joaquim Jorge de Magalhães S. da Mota.
Jorge Manuel M. Loureiro de Miranda.
Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho.

União da Esquerda para a Democracia Socialista
(UEDS)
António Manuel de C. Ferreira Vitorino.
António Poppe Lopes Cardoso.
António César Gouveia de Oliveira.
Maria Teresa Dória Santa Clara Gomes.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE)
Helena Cidade Moura.
Herberto de Castro Goulart da Silva.

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União Democrática Popular (UDP)

Mário António Baptista Tomé.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Estão em aprovação os Diários n.°s 72 e 73.

Pausa.

Se nenhum dos Srs. Deputados tem qualquer correcção a solicitar, consideram-se aprovados.
Vai proceder-se à leitura do expediente.

Deu-se conta do seguinte.

Expediente

Exposições

De José Furtado, demitido dos serviços da GNR, expondo a maneira de pouca equidade como tem sido tratado em termos de promoção.

Cartas

Da Sociedade Filarmónica Incrível Almadense, da Sociedade Filarmónica Ereirense e do Grupo Sport Chinquilho União 9 de Abril Lavradiense, manifestando o seu protesto contra a acção de despejo movida ao Centro Recreativo de Estarreja.
Da comissão de apoio à criação da freguesia do Padrão da Légua, no concelho de Matosinhos, a remeter o dossier contendo cerca de 7000 assinaturas de apoio ao projecto de lei n.° 112/II, que visa a criação daquela freguesia.
De Artur José da Silva Palma Duarte, residente, em Lisboa, tecendo considerações acerca do novo. horário de trabalho dos porteiros.

Ofícios

Da Assembleia Municipal de Mealhada a transcrever uma moção, na qual protestam contra a não aplicação integral da Lei das Finanças Locais.
Da Assembleia de Freguesia de S. Domingos de Benfica a enviar fotocópia de uma moção relativa à proposta de lei sobre delimitação de sectores.
Da Direcção de Serviços de Emprego, de Mirandela, a enviar fotocópias de exposições dos funcionários daquele centro, Augusto José Pires e José Martins Pinto.
Da Câmara Municipal de Montemor-o-Velho a enviar cartas reclamativas da Liga de Pequenos e Médios Agricultores daquela localidade e da Federação das Uniões e Ligas de Agricultores do Baixo Mondego.
Do Sindicato dos Professores da Zona Centro alertando para a necessidade de uma reflexão profunda acerca de legislação sobre o sistema educativo.
Do Sindicato dos Trabalhadores da Construção, Mármores e Madeiras do Distrito de Lisboa a enviar uma moção relativa à preocupante situação da empresa.
Do Sindicato dos Trabalhadores da Agricultura, Pecuária è Silvicultura do Distrito de Lisboa a enviar um comunicado no qual os trabalhadores agrícolas exigem novos aumentos salariais.

Telegrama

De Cooperativas de produtores de frutas das Beiras, apelando para a intervenção governamental urgente no sentido de ser esgotada a existência de maçã nas cooperativas ou a concessão de um subsídio sobre a existência.

O Sr. Presidente: - O Sr. Secretário vai agora dar conta de requerimentos apresentados e de respostas a requerimentos recebidos.

O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Na última sessão foram apresentados os seguintes requerimentos: ao Governo, formulados pelos Srs. Deputados Álvaro Brasileiro e Custódio Ferreira; ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado José Niza; ao Governo e a diversos Ministérios, no total de três, formulados pelo Sr. Deputado António Mota; ao Ministério do Comércio e Turismo, formulado pelo Sr. Deputado António Vilar; ao Ministério ia Indústria e Energia, formulados pela Sr.ª Deputada Isilda Barata; ao Ministério da Administração Interna, formulado pelos Srs. Deputados Jorge Lemos e Jerónimo de Sousa; ao Ministério da Administração Interna e ao Comando-Geral da GNR, formulado pelo Sr. Deputado Fleming de Oliveira; à Secretaria de Estado da Cultura, formulado pelo Sr. Deputado Magalhães Mota; à Electricidade de Portugal, (EDP), E. P., formulado pelo Sr. Deputado Vítor Brás.
Foram ainda recebidas as seguintes respostas a requerimentos: do Governo, aos requerimentos apresentados pelos Srs. Deputados: José Ernesto Oliveira, na sessão de 8 de Janeiro; Maria Odete Santos e António Mota, na sessão de 10 de Fevereiro; Cabrita Neto, na sessão de 12 de Fevereiro; Luís Saias e Maldonado Gonelha, na sessão de 17 de Fevereiro; Magalhães Mota, nas sessões de 17 e 20 de Fevereiro e 31 de Março; Lopes Cardoso, na sessão de 26 de Fevereiro; lida Figueiredo, na sessão de 5 de Março; António Campos e Vilhena de Carvalho, na sessão de 6 de Março, respectivamente; João Dias Mendes, na sessão de 12 de Março; Fernando Cardoso Ferreira, na sessão de 17 de Março; Nandim de Carvalho, na sessão de 19 de Março; José Vitorino e Borges de Carvalho, na sessão de 20 de Março, respectivamente; Mário Lopes, na sessão de 26 de Março; Raul Rego e Vergflio Rodrigues, na sessão de 26 de Março; Jaime Ramos e Cipriano Martins, na sessão de 31 de Março; Rui Pena, na sessão de 2 de Abril, e Mário Tomé, na sessão de 10 de Abril.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, continua em discussão o voto, do PCP, relativo à actuação da força de polícia de intervenção no final do jogo de futebol Nazarenos-Académico de Viseu, realizado no último domingo.
Para um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, não desejava protestar, mas sim, fazer alguns pedidos de esclarecimento em relação, à intervenção produzida

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ontem pelo Sr. Deputado Luís Coimbra. No entanto, acho difícil produzi-los, uma vez que não terei interlocutor válido .para elas.

O Sr. Presidente: - Na realidade tem razão, Sr. Deputado. O Sr. Deputado Luís Coimbra não se encontra presente na Sala.
Como V. Ex.ª estava inscrito para uma intervenção, fá-la-á desde já e a Mesa entende que prescinde de formular os pedidos de esclarecimento que pretendia fazer ao Sr. Deputado que ontem o precedeu no uso da palavra.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, se ene permite, utilizarei os três minutos que decorrem de eu ter algumas considerações a tecer sobre a intervenção do Sr. Deputado Luís Coimbra ...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, se V. Ex.ªprescinde de fazer pedidos de esclarecimento, prescinde necessariamente do tempo.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, uma vez que está prejudicada a hipótese de eu pedir esclarecimentos, utilizarei o tempo para fazer um protesto.

O Sr. Presidente:- Tem então V. Ex.ª a palavra, Sr .Deputado Jorge Lemos. Dispõe de dois minutos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): -. Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PPM parece que se está a habituar a engolir muita coisa. Começou por engolir «elefantes», engoliu «torres do Tejo» e parece que agora quer engolir cargas brutais da polícia contra os cidadãos.
É uma conduta que só o PPM é responsável por ela. Simplesmente, isso não lhe dá o direito de vir dizer nesta Câmara que o PCP pretende aproveitar politicamente o acontecimento desportivo.
O que trouxemos a esta Câmara foi o resultado da violência exercida contra cidadãos nazarenos pela polícia, seja ela de intervenção ou sejam os corpos de polícia normal, de que resultaram feridos bastante graves.
Chegou-se mesmo ao ponto de disparar balas de fogo real e não balas de borracha. É deste caso que aqui trouxemos que devemos falar. Não podemos continuar a refugiamo-nos em canduras hipócritas que nada beneficiam esta Casa. Temos de tomar uma decisão. Temos de saber se vamos continuar a permitir que a policia actue da forma como o fez e temos de saber, com clareza, donde lhe vêm as ordens para actuar de maneira brutal contra cidadãos, como aconteceu na Nazaré e há algum tempo no Estádio da Luz.
É sobre isto que, de uma vez por todas, temos de tratar nesta Assembleia da República.

O Sr. Presidente:- Sr. Deputado Sousa Tavares, V. Ex.ª pediu há pouco a palavra para que efeito?

O Sr. Sousa Tavares (PSD): - Para fazer uma intervenção sobre a matéria em discussão, Sr. Presidente.

0 Sr. Presidente: - Fica inscrito. Sr. Deputado.

O Sr. António Moniz (PPM): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - O seu partido foi visado sem individualização de nomes. Tem V. Ex.ª o direito de contraprotestar, Sr. Deputado António Moniz.

O Sr. António Moniz (PIPM) : - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A falta de correcção do Sr. Deputado Jorge Lemos passa todas as marcas.

Não se encontra presente, neste momento, na Sala o meu colega de bancada Luís Coimbra e mesmo assim o Sr. Deputado Jorge Lemos achou conveniente vir aqui falar nas declarações feitas pelo meu colega de bancada.

A Sr. Zita Seabra (.PCP): - A culpa é do ST. Deputado Luís Coimbra, que não está presente!

O Orador: - Desejava dizer ao Sr. Deputado Jorge Lemos que o que se passou na Nazaré é muito estranho e, naturalmente, ainda fará correr rriuita tinta.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Não me digam que foram os comunistas que provocaram os incidentes!

O Orador: - Estive ontem com habitantes de Viseu que me declararam, peremptoriamente, que se não fosse a intervenção da polícia ficavam todos mortos na Nazaré.

O Sr. Jorge Lemos (PCP'.: - Foi o chefe da Policia de Viseu que lhe disse isso!

Risos do PCP.

O Orador. - 15so é significativo.

Ficará também por esclarecer quem atirou pedras para a multidão, porque os habitantes da Nazaré dizem que quem cometeu tal acto não é gente conhecida. Talvez tivessem sido pessoas interessadas em criar outros problemas (talvez em desacreditar a polícia para depois tirarem os respectivos proveitos políticos).

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - É espantoso!

A 6r.• Zita Seabra (,PCP): - Foi o rei!

O Orador: - A polícia deve ser criticada, mas tem de existir. Não podemos estar permanentemente a criticar pessoas que muitas vezes, para cumprirem o seu dever, passam por grandes riscos. Não podemos estar a aproveitar-nos de acontecimentos, principalmente nos campos de futebol - onde, infelizmente, há tanta violência e inconsciência, para transformar este Parlamento num tribunal para julgar a polícia ...

O Sr. Carlos Brito (PCP):- .Para julgar o Governo!

O Orador. - ..., que, afinal de contas, está a zelar pela defesa e segurança dos cidadãos portugueses.

Aplausos do PPM, do PSD e do CDS.

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dsf
I :dfsSÉRIE -= NÚMERO 90
fds
.. fsdO Sr. Presidente: - Sr. Deputado Sousa Tavares, .. .
fds
O Sdfr. Sousa Tavares (PSD): -Prescindo, Sr. Fre_sidente. .
dfs
O Ssr. Presidente:- Nesse cadfsso já não necessitdfo ded colocar um problema que querdfia pdsfôr à Câmara. É fdsque estafffvam inscridsftos parafs intervir dois Srs. Deputados do PSDfsd e, nos termosf fdo Regimdsfento, na discdfsussão de -um voto só pode dfsdinterdvidrd dudmd dddeputadfsdo de cada pardsftido. Como V. Ex.ª dsfdprescinde, dou a palavra, para um aintervenção, ao Sr. Deptuado Jorge Lemos. ,f

Vozes do CDS. -Outra vez!

O Sr. Jorge Lemos (,fPCP) : -df Sr. Presidente, Srs. Deputados: Farei curtas considerações dadods que a Assembleia tem hoje mais matérias para abordar.
De qualquer modods, importará ddsfdizer que no final
do jogo, quandsfdo tudo paredsfcia cfdalmo e sereno e um
pequeno codsfnflito surgiddso entre odsf massagista do Aca
démico ded Viseu e algudsfns adeptos do Ndazarenos já
tinha sdfsitio solucionado pelos própridos,, se dá uma
brutafl carga da poldsfícia contra os especdstadores, con
trasd cidadãos da Nazaré. .. '
dsf
Este tipo sdde actuações reforça, no entender do PCP, a necessidade de, rapidamendte', a Assembleia da Repúblicsdfda avançar com o inquérito parlamentar, oportusdfnamente solicitado pelos partdfsidossfd que integram a FSR, para completo apuramento das respondfssabilidades pela actuaçãfso das polícias. ,
É estranho, Sr. Presfsidente e Srsdfs. Deputados,df que tal tipo de actuações tenha recrudescidod nos últimòs tempdsfos! Em facedf disto é legítimo pôr-se a seguinte quesdfsfdasdfstão: por que é qdfue estas coisfdas acontecem? Terão ou não as -políciasfds indicações dfspara actuardf, da maneira dfscomo o estão a fazer? É sobre istdsfo que esta Câmara tedfsdfm que, de uma vez por todas, ,se pronunciar. É sobre dfsisto que é preciso ficarmos dfesdfclarecidos.sd
Vou abordar apenas madfis um ponto. Veio a lume a quedfsstão dó filme - da RTP sobre os incidentes dá Luz. O Ministério da Administração Interna diz que tem -um fume sobre os acontecimentos no Estádio da Luz e o presidente do conselho de gerência da RTP diz que não há filme nenhum. Afinal em que ficamos? É sobre tudo-isto que temos que nos esclarecer para que, de uma vez por todas, as polícias não possam continuar a actuar com impunidade contra cidadãos, violando os direitos, liberdades e garantias constitucionalmente consagrados.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.
fd
O Sr.fg Sousa Tavares (PSD): -, 9r. Presidente, peço a palavra para fazer um profgtesto. .

-fgO Sr. Presidente: -Faça favor, Sr. Deputado.
f
fOfg Sr. Sfdousa Tavares . (PSD) : - Sr. Presidente, Srs. - -Deputados: Aquando dos acontefcimentos no Estádio da Luz, eu próprio tomei a palavra, neste hemiciclo, .para me associar aos protestos sobre a actuação da policia que, tendo excedido infdfdclusiva-
df
mente' aquilo fdque é --- normal para manter a ordem, fez uma repressão indiscriminafgda- sobre a 'multidão.
Aliás, várfgios outros aspectos da actuação da Polícia de Segurança Pública me têm causado fdapreensões nos ;últimos ' tempos, tais como a intervenção -inteiramente injustfdiâiéada na igreja da Encarnação e , várias cenas de espancamento, sobrfdetudo nas esquadras da- Alégria , e do Bairro Alto. Recordo in-clusive aos spfdancamentos, aqui há anos, de marginais na'Polícia Militar.
fd
Vofgdzes do PSD: -Muito bem! - - `
fg
Ò Oradoar:f - Contudo, já, -não posso, de, forma
nenhuma,df estar de acordo que, em ielação aos acon
'tecimefntos ocorridos na Nazaré, .se queira continuar
com afds mesmas intervenções' críticas e a' mesma
persfeguição -poder-se-á chamar, assim- à Polícia
'ded Segurança Pública. -
Òfg que se passou na Nazaré foi extremamente grave ... '
f
'. ' A Sr.ª Teresa AmbrósW a;PS): -Muito bem!
fd
O Ofdrador: - ::. devido' ào éomportamento do público e de provocadores pdfossivelmente organizados. A pqlícia não cumpriu mais do que a sua obrigação.
d
A fSr.ª Teresa Ambrósio (ÍPS):=- Olhe que não!
fg
O Orador.º = São estas as informaçõefds fidedignas que, todos os jornais anunciam. -Aliás, bastafgrá vermos a fotografdfia publicada pelo insuspeitíssimo Didrio de Lisboa que, fmofstra a estado fídfsico em que ficou o massàgista do Acadêmico' de - Viseu -qufgde fdesteve à beira da morte e que seria assassinado se não fosse a pronta intervendçãfdo da polícifa -, para se compreender que o que se passou foi extremfdamente sériofd fdefd fdque estas cenas de desordem colectiva (e o Partido Comufgnista- devia, nesta matéria, associar-se a nós) não se podem continuar a dar. Temos de impedir que nos campos de futebol continue; a desedueação do povo e fdse cultivem instintos de selvajaria como aqueles que se vêm verificando.
fd
-Afgplausos do PSD, do:CDS e do PPM.
fd
O Sr. Presidente:g =- Para contraprotestar, ` tem a palavra o , Sr. Deputado Jorge Lemos, se assim o

entender. .O Sr. Jorge Lemos (PQP):,-15r. Deputado Sousa .Tavares, . estranho que V. Ex.ª confgsidere actuação normal da polícia e defesa dos cidadãos o dispdfdfadfrfdgar fogo real contra esses mesmos cidadãos. .
Estranho que o Sr. Deputado Sousa Tavares considere que, a polícia resolveu o prfdoblema do massagista do Académico de Viseu, pois ele já estava resolvido ...
df
Ofg Sr. Valdemar Alves: (PSD;c -Não estava!
d
. O Oragdor: - ... muito antes de a força da polícda ter-intervindo como o fez contraf os cidadãos da Nazaré. 15to é que é preciso ser dito.
O profblema ficou resolvido entre o massagista do Académico de Viseu e -as gfpfgessoas que se encontravam

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na Nazaré. O massagista estava em condições de se ir embora. Aliás, isso sucedeu e a carga de violência da polícia é muito posterior a isso.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção tem a palavra o Sr. Deputado Flemíng Oliveira.

O Sr. Fleming de Oliveira (PSD): -- Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não nos causou qualquer surpresa o teor e oportunidade da moção apresentada pelo PCP sobre os graves acontecimentos ocorridos, no passado domingo, após o jogo de futebol realizado na Nazaré. Ela insere-se deliberada e cuidadosamente na estratégia que as forças antidemocráticas desenvolvem contra o poder constituído e nomeadamente as forças da ordem.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Comunico deputado em exercício de funções residente na zona centro do distrito de Leiria, não posso permanecer indiferente perante mais esta iniciativa do PCP. Porque ela é desleal, provatória e visa muito mais do que apurar o sucedido e prevenir a repetição de factos semelhantes - a condenação pura e simples de quem agiu no pressuposto de uma actuação correcta.

Não posso nem quero atacar qualquer franja, ainda que perfeitamente delimitada e reconhecida, da população da Nazaré
A maioria ordeira e laboriosa das gentes desta terra não deve ser, injustamente, confundida com um grupo de marginais que frequentemente a compromete, cobardemente, no seu bom nome.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador - Infelizmente, acontecimentos como os que agora apreciamos nesta Câmara não são originais no passado recente da Nazaré. Assim, não posso deixar de referir o que ali aconteceu em plena campanha para as últimas eleições legislativas, aquando do comício que a Aliança Democrática levou a efeito com a presença, entre outros, do Ministro Vítor Crespo, em que cadeiras voaram pela sala, navalhas foram abertas, tiros disparados para o ar, apedrejamentos, perante a total passividade da Polícia de Segurança Pública local.

Uma voz do PCP - Tanto sangue!

O Orador: - Não posso deixar de referir ainda o que aconteceu tempos depois, quando da passagem da caravana automóvel apoiante do general Soares Carneiro, a' qual foi apedrejada, teve carros amolgados e vidros partidos, perante a passividade da Polícia de Segurança Pública, aliás reforçada para o efeito, de Leiria. A mesma PSP que agora ê acusada de exageros.
Aceito perfeitamente, tal como ontem aqui foi referido por um deputado do PCP, que a Polícia de Segurança Pública não existe para bater em cidadãos indefesos. Mas o que não posso defender, tal como ninguém de boa fé, é que a troco das chamadas «amplas liberdades» a PSP se mantenha impávida e serena perante a arruaça de certos marginais que

ofendem a tranquilidade e o bem-estar dos que com eles não se identificam.

Vozes doo PSM - Muito bem!

O Orador:- Não estive, no passado domingo, no campo de futebol da Nazaré.

O Sr. Carlos Brito (,PCP): - Vê-se!

O Orador. - Conheço-o .todavia e desde já afirmo que é totalmente impróprio para jogos de certa importância. Admira-me que os autarcas do PS-APU (maioria tradicional na Câmara Municipal da Nazaré após o 25 de Abril), tidos por tão «aptos e competentes», não tenham tomado a iniciativa de mandar construir um novo parque de jogos que evite assistir a espectáculos que tem pela sua crueza e barbaridade algo de semelhante a um circo romano.

Vozes do PSD - Muito bem!

O Sr. Gomes Fernandes (PS): - É preciso ter lata!

O Orador - Porque essa iniciativa, aliás em curso, foi da responsabilidade do precário executivo da Aliança Democrática que geriu a Câmara da Nazaré entre princípios de Novembro e fins de Março últimos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador - Noutro campo de futebol nada disto, eventualmente, teria acontecido. Nestas condições precárias em que o público é instalado não é possível controlar devidamente a situação.
Posso acrescentar e esclarecer esta Câmara que no sábado anterior aos acontecimentos já se dizia na Nazaré que ou os Nazarenos ganhavam o jogo ou tudo se rachava.

O Sr. Jerónimo doe Sousa (PCP): - Onde ouviu isso?!

O Orador: - Era o fumo de que resultou fogo. Era a paixão clubista a sobrepor-se à razoabilidade.
Os factos que consegui apurar, de fonte tida por idónea, permitem-me, Sr. Presidente e Srs, Deputados, concluir o seguinte: até ao fim do jogo nada «aparentemente» fazia esperar que depois aconteceu. Digo aparentemente pelas razões que atrás referi, que levaram a que « Polícia de Segurança Pública local tivesse de ser reforçada com um contingente de cerca de 80 homens ido de Leiria, Caldas da Rainha e Lisboa.
Após o termo do jogo, a agitação começou imediatamente um pouco por toda a parte e dentro do estádio, imputando-se certa responsabilidade a um indivíduo da terra tido por ligado à direcção dos Nazarenos.
A confusão instalou-se e alguns de ânimo mais exaltado agrediram tudo e todos, muito especialmente os adeptos do clube visitante e o seu massagista, barbaramente atingidos a murro, a pontapé e à pedrada. Os próprios jogadores do clube visitante, antes de recolherem às cabinas, foram também agredidos, inclusive com pedras.

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Foi nesta altura, sob pena de se demitir totalmente da sua responsabilidade, que apareceu a força policial...
Esgotado o tempo de que o orador dispunha, foi-lhe cortada a palavra pelo controlo automático.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer um protesto.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Foi com algum espanto que ouvimos a intervenção do Sr. Deputado Fleming de Oliveira acerca dos incidentes ocorridos na Nazaré aquando do jogo de futebol entre os Nazarenos e o Académico de Viseu. O Sr. Deputado extrapolou para o campo político uma matéria que não gostaríamos de ver aqui misturada com essa questão.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Nesse sentido, deixou de ter autoridade moral para atacar os autores do voto, pretendendo fazer especulação política de maneira totalmente incorrecta porque, em primeiro lugar, quis apresentar a população da Nazaré como sendo agressiva, intratável....

Aplausos do Sr. Deputado Lopes Cardoso (ASDI).

Vozes do PSD: - Não é verdade!

Protestos do PSD.

O Orador: - ..., que em todas as campanhas eleitorais...

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Deputado Carlos Lage está no uso regimental da palavra e o Sr. Deputado Fleming de Oliveira terá a oportunidade de lhe responder.
VV. Exas., sem prejuízo do direito de fazerem os comentários que se entendam ou possam ser entendidos como manifestação em aparte, não podem interromper qualquer orador que esteja no uso da palavra.
Tenha a bondade de continuar, Sr. Deputado Carlos Lage.

O Orador: - Como ia há pouco a dizer, e insisto, o Sr. Deputado Fleming de Oliveira caracterizou a população da Nazaré como sendo agressiva...

Vozes do PSD: - É falso! È falso!

O Orador: - ..., desordeira...

Vozes do PSD: - É falso. O Sr. Deputado Fleming de Oliveira não disse isso!

O Orador: - ..., tendo, em todas as campanhas eleitorais, usado sobretudo da violência....

Vozes do PSD: - É falso!

O Sr. António Vitorino (UEDS): - Assumam a responsabilidade!

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peco-lhes o favor de permitirem que o Sr. Deputado Carlos Lage conclua a sua intervenção.

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta psicologia e este tipo de mentalidade que o Sr. Deputado Fleming de Oliveira quis atribuir - num quadro, na minha opinião, grosseiro e irreal -, à população da Nazaré só pode receber da nossa parte reprovação.
Cremos ainda que a intervenção do Sr. Deputado Fleming de Oliveira é uma clara manifestação de frustração e de desencanto pêlos precários resultados eleitorais que a Aliança Democrática tem obtido na Nazaré e pela última derrota que ali sofreu nas eleições autárquicas.

Aplausos do PS e da UEDS.

O Sr. António Vitorino (UEDS): - Da Nazaré a minoria é AD!

O Sr. Presidente: - Também para um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, as palavras que acabam de ser proferidas pelo meu colega do Partido Socialista...

Vozes do CDS: - Que aliança!

O Orador: - ..., Sr. Deputado Carlos Lage, levam-me a prescindir.

Vozes do PSD: - Então não há palmas?!

O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, tem a palavra o Sr. Deputado Fleming de Oliveira.

O Sr. Fleming de Oliveira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É uma pena que o Sr. Deputado Carlos Lage não tenha tido a sensibilidade intelectual ou política para poder compreender minimamente aquilo que referi.

Aplausos do PSD e do PPM.

O Sr. António Vitorino (UEDS): - É que o senhor fala chinês!

O Orador: - Tive o cuidado de começar por referir, ao fazer certas considerações acerca do comportamento de certo público da Nazaré, que não pretendia minimamente atingir a maioria da população ordeira e trabalhadora, imputando estes factos precisamente a um grupo que reputei de marginais.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não posso apoiar qualquer tipo de actuação de marginais nem faço qualquer injúria ao Partido Socialista ao referir que, no comício da Aliança Democrática que se realizou para as eleições legislativas, os grupos de marginais que apareciam com autocolantes do Partido Socialista ...

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O Sr. Gomes Fernandes (PS): - O senhor está a fazer uma provocação!

O Orador:- ... eram comandados por forças que não tinham nada a ver com o Partido Socialista.
Foi por isso que não tomámos medidas, porque reconhecíamos que eram indivíduos telecomandados por forças que nada tinham a ver com o Partido Socialista.

Aplausos do PSD.

O Sr. Gomes Fernandes (PS): - Eram comandados pela AD.

O Orador: - Estes factos foram perfeitamente concretizados e tivemos oportunidade de saber o que é que se passava.
Esclareço que não confundo o Partido Socialista, que reputo de força democrática, com o Partido Comunista ou outro grupo de marginais que na Nazaré têm actuado.

Protestos do PCP.

O Sr. António Mota (PCP): - Marginal é ele!

A Sr. Zita Seabra (PCP): - Provocador!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não consentirei que uma intervenção a respeito de um voto se transforme ...

Vozes do PCP: - Foi um insulto!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, espero que todos saibamos discutir os acontecimentos que ocorreram na Nazaré com a serenidade, a ponderação e a cautela com que nos permitimos censurar ou propor a censura daqueles que não souberam conservar a mesma serenidade.
Está um colega vosso no uso da palavra, tem pleno direito de o fazer até ao termo do seu tempo.

Vozes do PCP: - Não, não! Foi um insulto!

O Sr. Presidente: - Os Srs. Deputados protestarão pela forma que entenderem na altura própria.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Protestos do PCP.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado que estava há pouco no uso da palavra acabou de afirmar que se tratavam de grupos de marginais do Partido Comunista.

O Sr. Fleming de Oliveira (PSD): - Não foi isso o que eu disse!

Vozes do PSD: - Não senhor! Não foi nada disso!

Vozes do PCP: - Foi sim senhor!

O Orador: - Foi isso o que o Sr. Deputado Fleming de Oliveira afirmou. Aliás, está gravado.
O Sr. Deputado pode ter querido dizer qualquer outra coisa diferente, no entanto o que afirmou foi o que há pouco eu disse. Foi por essa sua afirmação que reagimos.

A Srª. Zita Seabra (PCP): - Corrija-a, Sr. Deputado!

O Orador: - O que reclamamos é que o Sr. Deputado retire essa sua afirmação e esclareça o seu pensamento.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Brito, sem prejuízo, de o seu partido ter o direito de se sentir ofendido por quaisquer expressões que possam ter sido proferidas por qualquer deputado, o que a Mesa ainda entende e manterá é que VV. Ex.as têm figuras regimentais que lhes permitem, na altura própria, exercer o direito de defesa. Consequentemente, não é pela intervenção maciça dos Srs. Deputados e pelo impedimento do uso da palavra a quem está a fazê-lo ...

Vozes do PCP: - É, é!

O Sr. Presidente: - ... que os trabalhos podem continuar.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lopes Cardoso, para que efeito pede a palavra?

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, gostaria de perguntar a V. Ex.ª por que razão entendeu que não deveria chamar a atenção do Sr. Deputado que estava no uso da palavra quando fez a seguinte afirmação: «o Partido Comunista e outros grupos de marginais».

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Penso que era o dever da Mesa ter chamado a atenção do Sr. Deputado que interveio no sentido de que não são termos que se usem nesta Sala em relação a partidos políticos, sejam eles quais forem, que estão representados nesta Assembleia.

Aplausos da UEDS, do PS, do PCP, da ASDI e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lopes Cardoso a Mesa não o fez - é certo -, mas também não é menos certo que antes mesmo de ter tempo de pensar sequer na possibilidade de o fazer foi desde logo tomada a sua atenção pela reacção que imediatamente se desencadeou por parte do Partido Comunista.

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Em todo o caso, não tenho dúvidas nenhumas em dizer que a expressão que o Sr. Deputado Fleming de Oliveira, que a Mesa ouviu perfeitamente e que reproduz com inteira fidelidade, foi a seguinte: «membros do Partido Comunista ou outros grupos marginais». Não foi «e», foi «ou».
A Mesa não deixa, em todo o caso, de entender que o uso dessa expressão, mesmo com a mudança da conjunção, não deixa de ser uma expressão, que pode e deve ser entendida pelo Partido Comunista como atentatória. Não tenho dúvida nenhuma em reconhecer isso.
A esse respeito, o Sr. Deputado Fleming de Oliveira tomará a atitude que entender. A verdade é que a Mesa, que neste momento pensa que já não é oportuno chamar a atenção ao Sr. Deputado Fleming de Oliveira, deixa para a altura própria, a oportunidade de o Sr. Deputado tomar, a respeito da sua expressão, a posição que entender.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, agradeço a V. Ex.ª e à Mesa a explicação que entendeu por bem dever dar-me.

O Sr. Presidente: - VV. Ex.as não têm nada que me agradecer. Não faço mais do que cumprir o meu dever, com a esperança de que vou tentando cumpri-lo bem.
Sr. Deputado Fleming de Oliveira, tenha a bondade de continuar no uso da palavra.

O Sr. Fleming de Oliveira (PSD): - Sr. Presidente, gostaria então de dar uma breve explicação relativamente ao conteúdo daquilo que pretendia dizer.
O que referi - e esse era o apontamento que entretanto consegui recapitular - foi o de que não faria a injúria de comparar o Partido Socialista ao Partido Comunista e a outros grupos de marginais.

Protestos do PCP.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Vá repetir isso para a sua terra! ...

O Orador: - Calma, Srs. Deputados. Ainda não acabei.

Protestos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs, Deputados, o Sr. Deputado Fleming de Oliveira está a pretender dar uma explicação...

O Sr. António Vitorino (UEDS): - Ele não sabe falar português! ....

O Orador. - Se quiseram, oiçam. Se não quiserem, não oiçam.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados vejamos se conseguimos encerrar o assunto com a serenidade que pretendemos.
Tenha a bondade de continuar, Sr. Deputado.

O Orador: - Admiro que, mau grado a violência que o Partido Comunista entende ter havido na expressão que há pouco disse, a mesma, da minha parte, não pretendia ter o sentido de fazer equivaler o Partido Comunista a esses grupos, tal como resultaram da expressão.
Simplesmente, o que não retiro é que há certos comportamentos de forças marginais na Nazaré que, em termos formais - salvo melhor opinião -, se parecem muito com alguns dos comportamentos que ali são adoptados (e não retiro qualquer expressão) por elementos ligados ao Partido Comunista.

Vozes do PSD e do CDS: - Muito bem!

0 Orador: - Finalmente, gostaria ainda de dizer, já que não tive oportunidade de acabar aquilo que tinha previsto, que não me compete a mim defender a Polícia de Segurança Pública ou qualquer outro organismo policial. Simplesmente, penso que é uma pura hipocrisia política estarmos a atacar um corpo policial deste género, por um lado, por usar de total passividade, tal como aconteceu, como já referi, em determinadas alturas, por outro, condená-lo quando em perfeito exercício das suas funções, depois de terem sido provocados pessoalmente, têm que se defender e actuar no cumprimento daquilo que lhes é exigido.
Se o Partido Comunista entende que, de algum modo, se sente ofendido, então que se sinta ofendido consigo próprio. Mais do que isto não tenho nada a esclarecer nem a retirar.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Zita Seabra. (PCP): - 15so é baixo!

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer um protesto.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, só pelas circunstâncias excepcionais em que decorreu o facto de o seu partido se ter sentido ofendido é que lhe dou a palavra. É prática da Mesa as inscrições para protesto serem feitas na altura própria. Por essas circunstâncias especiais e porque o Sr. Deputado Fleming de Oliveira acaba de dar a interpretação e o valor às palavras que proferiu inicialmente, à Mesa parece ter cabimento, neste caso, a abertura de uma excepção na forma de conduzir o processo.
Tem V. Ex.ª a palavra, Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, agradeço ter-me dado a palavra. Como V. Ex.ª compreenderá, eu não podia pedi-la antes de ouvir o Sr. Deputado Fleming de Oliveira dar as explicações. Só agora, portanto, estou em condições de formular o protesto.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: As explicações do Sr. Deputado Fleming de Oliveira são manifestamente insuficientes. O Sr. Deputado continua a ofender o meu partido, continua a ofender os militantes do meu partido aqui representados na Assembleia da República com o voto popular, com a confiança do povo, que aqui nos trouxe, e continua a ofender os militantes do meu partido na Nazaré. E mais do que isso: o Sr. Deputado calunia. O Sr. Deputado não tem base para fazer as afirmações que faz.

Vozes do PCP: - Muito bem!

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O Orador: - Nós estamos aqui a discutir e a procurar trazer factos concretos à Assembleia da República. Informámo-nos. Trouxemos notícias concretas que nenhum Sr. Deputado desmentiu. Trouxemos, inclusivamente, o facto de a polícia ter atirado sobre pessoas indefesas, que estão hospitalizadas, e até agora ninguém nos desmentiu. O Sr. Deputado diz apenas que no passado havia arruaceiros com autocolantes do Partido Socialista que seriam comunistas.

O Sr. Fleming de Oliveira (PSD): - Não disse nada disso!
Vozes do PSD: - Não foi nada disso!

O Orador: - 15so é calúnia Sr. Deputado. 15so é calúnia baixa, é calúnia reles.

Vozes do PCP - Muito bem!

O Orador - O Sr. Deputado, como tal, não tem o direito de fazer isso.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Mas Sr. Deputado, creio que não temos muitas razões para estarmos impressionados: é que o Sr. Deputado, em todas as suas alegações, revelou tanta animosidade partidária contra o povo da Nazaré ...

O Sr. José Vitorino (PSD): - É falso!

O Orador: - ... e invocou tantos factos, que acabou por justificar os acontecimentos de domingo passado. O Sr. Deputado revelou que não é um democrata.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Revelou que não é capaz de compreender a oposição política.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Foi esse o pensamento que aqui trouxe, foi essa a afirmação de antidemocrático que aqui revelou.

Aplausos do PCP, da UEDS e do MDP/CDE.

Vozes do CDS: - 0lhe que não!

O Sr. Carlos Lage (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito deseja usar da palavra, Sr. Deputado?

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, queria apenas pedir à Mesa que, para conhecimento das declarações feitas pelo Sr. Deputado Fleming de Oliveira e do meu protesto, envie à Câmara Municipal da Nazaré a intervenção do Sr. Deputado Fleming de Oliveira e o meu protesto, para que a população da Nazaré possa avaliar qual dos dois tem razão.

Aplausos do PS, do PCP, da ASDI, da UEDS e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, tem a palavra o Sr. Deputado Fleming de Oliveira.

O Sr. Fleming de Oliveira (PSD): - Relativamente à sugestão, do Sr. Deputado do Partido Socialista, começo por ela. Aliás, acho que ela nem sequer seria necessária, porque, seja a título de requerimento, seja a qualquer outro título, costumo dar informação às câmaras municipais dos assuntos que aos respectivos concelhos dizem directamente respeito.

E, se o Sr. Deputado Carlos Lage soubesse minimamente o que se passa naquela região, então até se dispensaria de fazer este tipo de observações.

Vozes do PSD - Muito bem!

O Orador: - Quanto ao Partido Comunista, gostava de dizer que se os senhores se informaram, eu também me informei. As nossas fontes de informação poderão ser diferentes, e naturalmente as vossas, na vossa perspectiva, serão tão idóneas como as minhas, na minha perspectiva. Mas aceito as vossas fontes de informação pelo valor que me merecem, assim como acho que os senhores devem aceitar as minhas pelo valor que também merecem.
Quanto ao facto de eu ter dito - segundo a vossa opinião, falsamente - que os autocolantes do Partido Socialista no referido comício eram usados por elementos ligados ao Partido Comunista, quero dizer-lhes que não referi absolutamente nada disso. O que disse foi simplesmente, que não fazia a injúria ao Partido Socialista de aceitar a ideia de que eram elementos do Partido Socialista que estavam a tomar essas atitudes provocatórias.
Ainda quanto ao facto de o Sr. Deputado Carlos Brito ter dito que não sou democrata, dir-lhei que, efectivamente, sou democrata. Todavia, tenho,
como os senhores bem sabem, e não pretendo convencê-los do contrário, um conceito de democracia completamente diferente do vosso.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Vozes da UEDS: - Vê-se!

Vozes do PCP: - 15so é claro!

O Orador: - Portanto, também me parece absolutamente ocioso estarmos neste momento a discutir aqui conceitos de democracia. Aliás, penso que a expressão de que um deputado é mais ou menos democrata ou de que até nem o é devia ser banida
da linguagem desta Câmara. Por isso, se havia alguém que se pudesse sentir ofendido, esse alguém era eu.
Assim sendo, devolvo a expressão à procedência, isto é, ao Partido Comunista.

Aplausos do PSD.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Veiga de Oliveira, poderá informar a Mesa dos motivos por que pediu a palavra?

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3620 I SÉRIE - NÚMER0 90

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - É para, com todo o rigor, interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, pedi a palavra para interpelar realmente a Mesa, isto é, não se trata de usar indevidamente uma figura regimental, mas sim de interpelar a Mesa neste preciso sentido: foi aqui dito por um Sr. Deputado que não confundia o Partido Socialista com o Partido Comunista e outros marginais - isto em segunda versão, uma versão mais amaneirada. E a minha pergunta é se a Mesa acha que a linguagem é correcta e se eu posso passar a dizer, por exemplo, que não confundo o CDS com o PSD e com outros marginais.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Porque, se a Mesa não admoesta o Sr. Deputado Fleming de Oliveira pelo uso daquela expressão, então terei de considerar que a expressão passa a ser parlamentar e poderei, assim, utiliza-la, usando o pêlo do mesmo animal para curar a doença.

Risos.

Sr. Presidente, era esta a minha pergunta.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Veiga de Oliveira, quando o Sr. Deputado Lopes Cardoso interpelou a Mesa, exactamente no mesmo sentido de V. Ex.ª, creio que os termos da resposta que lhe dei se pronunciaram já neste sentido.
Ao dizer ao Sr. Deputado Lopes Cardoso que só não tinha intervindo porque, entretanto, a minha atenção fora desperta pelos protestos que ruidosamente surgiram na Sala, resultava daqui que, inequivocamente - e, agora, embora a interpelação tenha sido dirigida à Mesa, é o Presidente quem, pessoalmente, responde, para se assumir inteiramente na resposta - , considero que qualquer associação da expressão «grupos marginais», mesmo que não tivesse sido essa a intenção do Sr. Deputado Fleming de Oliveira, como ele próprio já esclareceu, à menção de qualquer partido político é manifestamente imprópria e não pode ser considerada como terminologia parlamentar.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, chamo a sua atenção para o facto de eu ter referido a expressão que o Sr. Deputado Fleming de Oliveira utilizou no esclarecimento que prestou. 15to é, eu não referi o nome da expressão, mas sim a insistência do Sr. Deputado em utilizá-la. Por outras palavras, e como diria Eça de Queirós, eu não referi o nome do marquês que foi nomeado para ministro em Portugal e que depois foi retirado pelo nome, não pelo nome mas pela insistência ...

Risos.

Efectivamente, o Sr. Deputado inicialmente disse «ou marginais», e, quando o Sr. Presidente manifestou, por alguma forma - com que concordo -, sua discordância relativamente ao uso da expressão, o que o Sr. Deputado Fleming de Oliveira fez foi dizer que não era «ou marginais», mas sim «e marginais».

O Sr. Presidente: - Ó Sr. Deputado, eu considero que com e ou com ou, ou com qualquer outra espécie de conjunção - já eu usei também a expressão, ...

Risos.

... entendo que o uso ou a associação das duas expressões, seja qual for a ligação gramatical que delas se faça, em termos de suscitar dúvidas ou de não ser clara, é suficiente para não ser própria de um Parlamento.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - É este o meu entendimento, Sr. Deputado Veiga de Oliveira. A posição que o Sr. Deputado Fleming de Oliveira depois tomou pode ou não satisfazer V. Ex.ª, mas eu não posso ir mais longe do que isto.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, liquidado o incidente, chamo a atenção de VV. Ex.as para o facto de termos iniciado o período de antes da ordem do dia cerca das 10 horas e 31 minutos e que, por isso, o voto terá de ser discutido e votado até às 11 horas e 31 minutos.
Tem agora a palavra o Sr. Deputado Herberto Goulart, para uma intervenção, ainda sobre o voto em apreço.

O Sr. Herberto Goulart (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Dos incidentes na Nazaré temos conhecimento apenas pela imprensa e nem sequer de uma forma total, mas, para nós, não restam dúvidas de que se verificou mais uma vez uma acção brutal por parte da polícia, como se pode constatar por muitos jornais. E eu cito um só exemplo, pese embora o que possa nele haver de exagero, como noutros poderemos encontrar de menor exagero ou até de menor veracidade. Mas penso que este exemplo é significativo e citarei a notícia inserta num jornal diário de hoje de manhã:

O aparecimento da força de intervenção da polícia, quando tudo fazia prever o oposto, e a quantidade de agentes que, de rompante, invadiram o campo pela bancada superior, a distribuir pancada a quem esperava a vez para sair pelas estreitas portas do campo, bem como o sangue que correu de pessoas que nada tinham a ver com o jogo, são uma demonstração de que algo vai mal na polícia deste país.

O que nos preocupa, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é que tão pouco tempo após os incidentes no Estádio da Luz não tivessem sido tomadas medidas para prevenir que se voltassem a reflectir acções violentas policiais em recintos desportivos, mesmo que tenhamos, neste caso, de aceitar que a intervenção era necessária para proteger a integridade física dos jogadores e dirigentes do Académico de Viseu ou até que tenha havido provocações por parte de elementos da Nazaré que assistiam ao jogo.

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Mas será que os responsáveis da PSP não são capazes de tirar ilações dos anteriores acontecimentos verificados no Estádio do Benfica?
Será que não se imporia que medidas cautelares, nomeadamente quanto à orientação e às formas de intervenção da polícia, já tivessem, entretanto, sido tomadas?
O que significa, em termos de democracia, este ódio popular contra as polícias?
Foram apenas provocadores que se agitaram nas ruas da Nazaré ou foi uma reacção natural da população contra a violência policial no campo dos Nazarenos?
Tal reacção, Sr. Presidente e Srs. Deputados, significa, infelizmente, que a PSP, não em todos, mas, pelo menos, nalguns comportamentos, está junto do nosso povo a perder a imagem de uma força de ordem imbuída de um verdadeiro espírito democrático. E, naturalmente, tal situação é preocupante para o próprio regime democrático. Por isso é que, com tranquilidade, com serenidade, subscrevemos totalmente o voto proposto pelo PCP no que se refere à firme condenação das acções brutais praticadas pela PSP no campo dos Nazarenos, na reclamação do integral apuramento das responsabilidades verificadas e ainda para que esta Assembleia da República se pronuncie pela adopção imediata de medidas que impeçam e previnam acções futuras equivalentes das forças de segurança.

Aplausos do MDP/CDE e do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.

O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há nas últimas intervenções uma mudança de quantidade em qualidade. De facto, à medida que vai actuando, a polícia assume comportamentos cada vez mais violentos e, enquanto a cobertura dessas actuações é cada vez mais clara por parte do Governo e da AD, mais rápidas se podem tornar as intervenções, na medida em que são repetitivas.
A intervenção da polícia está ligada - como eu já aqui disse - a toda a forma como a AD está no Poder, as próprias leis repressivas que a AD aqui faz aprovar contra a liberdade, os direitos e as garantias dos cidadãos. E neste caso só há de novo a retirar uma coisa, que, no meu entender, é muito importante, e que é efectivamente a reacção corajosa e valente da população da Nazaré, que deu um exemplo de como é que se reage à polícia de intervenção, de como é que se reage a esses espancadores, actuando da mesma forma, lançando a, violência das massas contra a violência reaccionária e repressiva ao serviço do governo da direita.

O Sr. Carvalho Cardoso (CDS): - 15to é um escândalo!

O Orador - Esta é a lição que a UDP retira e que aponta como exemplo a todo o povo, aos trabalhadores, porque é esta a forma de reagir a quem efectivamente não tem o mínimo de respeito pelos direitos e pela liberdade dos cidadãos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo, mais ninguém inscrito, vamos votar o voto em apreço.

Submetido à votação, foi rejeitado, com 56 votos a favor (do PS, do PCP. da ASDI, da UEDS, do MDP/CDE e da UDP) e 76 votos contra do PSD, do CDS e do PPM).

O Sr. Presidente: - Para declarações de voto, estão inscritos os Srs. Deputados Carlos Lage e Oliveira Dias.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Socialista preocupa-se seriamente com a violência que se tem verificado nos recintos desportivos. Cremos que é necessário empreender uma acção pedagógica, uma acção preventiva, para evitar a eclosão dessa violência nos recintos desportivas. O que, no entanto, não podemos admitir é que sejam as próprias forças policiais a contribuir ou a ser a causa principal dessa violência e de climas de confrontação nos recintos desportivos.
Para nós, a polícia deve prevenir, deve evitar que a violência se desencadeie, mas nunca deve ser o principal fautor ou agente de violência.
Há casos que nos mostram que a polícia, designadamente a polícia de intervenção, tem um modelo de comportamento e de acção que temos de reprovar e condenar.
Esse modelo consiste em intimidar a população, em bater a torto e a direito, e sem dúvida nenhuma que isso põe em causa o tipo de treino, os valores que são incutidos a esses elementos da PSP e as missões que lhes são cometidas.
Num Estado democrático não se pode aceitar esse padrão de comportamento das forças de segurança. Por isso, o Partido Socialista protesta e considera que é o próprio Governo que está em causa, atendendo aos valores e às missões que às forças policiais são confiadas.
O Partido Socialista e a FRS quiseram instaurar uma comissão de inquérito para os acontecimentos no Estádio da Luz. Era útil que essa comissão de inquérito tivesse sido criada e o inquérito levado a cabo, porque podíamos apurar muitas coisas acerca da actuação das forças de segurança. A AD não o quis, e naturalmente que este escamotear das razões fundamentais também tem significado político.
Queremos, finalmente, dizer que, quanto à Nazaré nós já não temos dúvidas do sentido que a AD dá aos acontecimentos lá ocorridos, e por isso o nosso voto.
Realmente, pela voz do Sr. Deputado Fleming de Oliveira foi dito que até era de louvar a actuação da PSP na Nazaré, porque ela acabou por dar uma lição, no entender daquele Sr. Deputado, aos Nazarenos por eles não votarem AD.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Oliveira Dias.

O Sr. Oliveira Dias (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O CDS votou contra o voto de pro-

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testo apresentado pelo PCP por três ordens de razões.

Em primeiro lugar, porque é manifesto que o Partido Comunista, contra o que aqui foi dito, ao trazer à Assembleia estes casos, está; evidentemente, a fazer uma intervenção política, contrariamente ao que pensou o Sr. Deputado Carlos Lage, que, objectivamente - e isso é o mais grave -, terá como resultado o incremento da violência nos recintos desportivos, e é contra isso que nós estamos.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Em segundo lugar, porque o voto proposto pelo Partido Comunista tem como objectivo desprestigiar a Polícia de Segurança Pública, porque esta não se aproxima, nem na formação nem na sua intervenção, dos critérios de polícia útil ao Partido Comunista...

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - ...nem se aproximará daquela que o Sr. Major Tomé comandou, seja em fase revolucionária, seja em fase de poder estável.

Aplausos do CDS e do PSD.

Nós estamos contra qualquer um desses modelos de polícia e prestamos homenagem à Polícia de Segurança Pública e aos seus comandos, designadamente ao seu comandante-geral.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Finalmente, o Partido Comunista pretende, com esta intervenção e a propósito de incidentes desagradáveis, separar a maioria desta Assembleia do seu governo. Mas digo-lhe muito claramente que, pela nossa parte, esse esforço é escusado. Não é fazendo apelos desse género que não farão perturbar a confiança que temos no Governo e que reafirmamos.
O Governo promoverá os inquéritos que considerar convenientes, o Governo, recorrendo-se, se necessário for, do poder. judicial, apurará a verdade, promoverá a justiça, e para isso não precisamos para nada dos votos do Partido Comunista.

Aplausos do CDS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Lage, para que efeito, pede V. Ex.ª a palavra?

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para um protesto, mas antes quero perguntar ao Sr. Deputado Oliveira Dias se entendi bem uma expressão que ele utilizou. É que me pareceu que o Sr. Deputado Oliveira Dias terá dito que a minha intervenção contribuía objectivamente para a violência nos recintos desportivos. Foi essa a sua afirmação, Sr. Deputado Oliveira Dias?

O Sr. Oliveira Dias (CDS): - Sr. Deputado Carlos Lage, quando me referi a si, referia-me às suas palavras, em que retirava a este voto do Partido Comunista qualquer intenção política, e disse que estava manifestamente em desacordo consigo porque o voto proposta pelo PCP, no meu entender, foi ditado por motivos, por intenções e objectivos políticos - defensáveis, razoáveis, no seu entender -, com os quais não estamos de acordo, e não por motivações de critério desportivo e motivações de ordem clubista.

O Sr. Presidente: - Está esclarecido, Sr. Deputado Carlos Lage?

O Sr. Carlos Lage (PS): - Penso que o Sr. Deputado Oliveira Dias não fez a afirmação que eu julguei ter ouvido, por isso não tem razão de ser o protesto que eu queria fazer.
Muito obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Mário Tomé, V. Ex.ª aparece inscrito para intervir, mas não sei a que propósito.

O Sr. Mário Tomé (UDP): - É, para usar do direito de defesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Mas a que pretexto, Sr. Deputado?

O Sr. Mário Tomé (UDP): - Ó Sr. Presidente, é que eu fui implicitamente insultado, digamos assim, pelo Sr. Deputado Oliveira Dias.

Risos do CDS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa concede-lhe a palavra, mas informa a Câmara de que encerrará o período de antes da ordem do dia imediatamente a seguir à sua intervenção e à resposta que lhe der o Sr. Deputado Oliveira Dias.

O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Deputado Oliveira Dias, no seguimento, aliás, do que também insinuou o Sr. Deputado Sousa Tavares, veio uma vez mais trazer à Assembleia da República o processo de intenções calunioso que foi criado a seguir ao 25 de Novembro contra a Polícia Militar. Esta Polícia diferenciava-se de uma forma clara e evidente da Polícia de Intervenção e das actuações que em geral a polícia desenvolve no nosso país.
À partida, essa delimitação era política, para além da própria prática, mas já lá chegamos. A Polícia Militar actuava sempre e permanentemente ao lado dos mais fracos, dos oprimidos, apoiando as ocupações das casas devolutas, apoiando a luta dos trabalhadores.
Essa era uma perspectiva revolucionária que nós não renegamos e que desejamos ver reimplantada neste país, isto é, que o povo possa efectivamente lutar com toda a sua força contra aqueles que o querem reprimir e explorar.
Em relação aos métodos utilizados pela Polícia Militar, questão insinuada pelo Sr. Deputado Sousa Tavares, o Sr. Deputado deve abordar o problema porque subscreveu, creio eu, um relatório calunioso, um relatório forjado, um relatório assente na audição de pseudotestemunhas de uma forma totalmente intolerável, sob a maior pressão política das forças de direita reaccionárias. Esse foi efectivamente um relatório que ficou na história deste país como uma das mais escandalosas cabalas que se montaram contra qualquer grupo de pessoas.

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O Sr. Deputado Sousa Tavares sabe isso perfeitamente, sabe perfeitamente que as sevícias nunca caíram debaixo da alçada da Lei da Amnistia aqui aprovada, e sabe também perfeitamente que o Regimento de Polícia Militar e aqueles que foram directamente acusados de quaisquer práticas nesse sentido não foram amnistiados.
O seu processo foi assim arquivado por evidente falta de ilícito, por evidente falta de provas e de matéria objectiva.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados Veiga de Oliveira e Sousa Tavares, poderão informar a Mesa dos motivos por que pediram a palavra?

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, eu pedi a palavra para me esclarecer sobre uma questão processual.
A questão é esta: ouvi V. Ex.ª anunciar que, mal o Sr. Deputado Oliveira Dias terminasse o contraprotesto relativamente ao protesto do Sr. Deputado Mário Tomé, encerraria o período de antes da ordem do dia.
Ora, a questão é que hoje é a última sessão desta sessão suplementar e há declarações políticas pendentes - pelo menos a nossa já está anunciada desde há dois ou três dias -, e as declarações políticas não podem ser prejudicadas, mormente por ser hoje a última sessão desta já longa sessão legislativa.

O Sr. Presidente: - De facto, Sr. Deputado, há seis inscrições para declarações políticas, e é praxe desta Câmara que as declarações políticas não fiquem por produzir. E, como a Câmara deliberou na última sessão que os trabalhos de hoje continuariam, desde o início do período de antes da ordem do dia, com a discussão do voto de protesto que acabámos de votar, seguiremos os nossos trabalhos com as declarações políticas e só com elas.
Sr. Deputado Sousa Tavares, V. Ex.ª a que pretexto pediu a palavra?

O Sr. Sousa Tavares (PSD): - Sr. Presidente, pedi a palavra porque penso ter o direito de dizer umas palavras de defesa sobre aquilo que o Sr. Major Tomé acabou de dizer.

O Sr. Presidente: - Tem, sim, Sr. Deputado.
Tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero dizer muito simples e calmamente ao Sr. Major Tomé que o relatório das sevícias foi feito por iniciativa e ordem exclusiva do actual Presidente da República, então Chefe do Estado-Maior do Exército, General Eanes.
Portanto, a grande pressão das forças de direita de que fala o Sr. Major Tomé é um cumprimento dirigido ao Sr. Presidente da República.

Risos do PSD e do CDS.

Em segundo lugar, quero dizer-lhe que o Sr. General Eanes tomou essa iniciativa exclusivamente, como me disse, para salvar a honra militar, que tinha sido conspurcada pela actuação de vários militares.
Em terceiro lugar, quero dizer-lhe que, se quer encontrar as provas dos espancamentos feitos no quartel da Polícia Militar, antigamente chamado Quartel da Ajuda, pode pedir essas provas ao Sr. Presidente da República, que constam de 1100 páginas que estão em seu poder.
Em quarto lugar, dir-lhe-ei que a Comissão das Sevícias foi constituída por seis oficiais do Exército, que trabalharam com o maior zelo, competência e isenção, e por dois juristas, um dos quais tem sido até hoje director da Polícia Judiciária de Lisboa e é um nome insuspeito, o Dr. Lourenço Martins.
Em quinto lugar, quero dizer ao Sr. Major Tomé que nenhum facto que não tivesse sido provado por depoimentos de ambas as partes transitou para o relatório das sevícias, a não ser com o aspecto da dúvida.
Se lá ficou assente que houve marginais do Bairro Alto que foram obrigados a lamber o chão do quartel e a comer esterco de cavalo e que foram também espancados no Regimento de Cavalaria n.º 2, é porque isso foi verdade.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Mário Tomé pediu a palavra para usar do direito de defesa. No decurso do uso desse direito visou o Sr. Deputado Sousa Tavares, a quem, por esse motivo, foi dada a palavra. Portanto, a situação é esta: V. Ex.ª, Sr. Deputado Mário Tomé, usou do direito de defesa, o Sr. Deputado Oliveira Dias tem o direito de contraprotestar em relação ao seu protesto e, em virtude de o Sr. Deputado Sousa Tavares ter intervindo, V. Ex.ª tem também o direito de lhe responder.
Assim sendo, tem em primeiro lugar a palavra o Sr. Deputado Oliveira Dias, para contraprotestar.

O Sr. Oliveira Dias (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Serei muito breve.
O Sr. Deputado Mário Tomé, no seu protesto, não faz mais do que confirmar aquilo que eu disse. Os seus critérios acerca da maneira como se comandam e como actuam órgãos com funções policiais são completamente divergentes dos nossos.
O Sr. Deputado Mário Tomé está convencido de que a actuação da Polícia Militar, na qual - segundo penso - teve funções de comando, foi uma página gloriosa para si, mas nós estamos convencidos de que foi uma vergonha da revolução portuguesa.

Vozes do CDS e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Quando o relatório a que o Sr. Deputado Sousa Tavares se referiu for publicado, esse opróbrio recairá sobre os senhores, e o povo os julgará.
Estamos convencidos de que, embora todas as dificuldades que se lhe apresentam e, inclusivamente, alguma intervenção menos ponderada, a Polícia de Segurança Pública sempre mereceu (e continua a merecer) uma consideração, um respeito e uma homenagem completamente diferentes dos desmandos revolucionários.

Aplausos do CDS, do PSD e do PPM.

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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Mário Tomé, tem então V. Ex.ª a palavra, para responder ao, protesto do Sr. Deputado, Sousa Tavares.

O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Deputado Sousa Tavares entrou por um caminho que, em meu, entender, é grave.

Vozes do PSD: - Olhe que não!

O Orador: - Aliás, o relatório que foi referido pelo Sr. Deputado Sousa Tavares, e agora também pelo Sr. Deputado Oliveira Dias, já foi publicado. Foi publicado antes da concretização de qualquer julgamento, foi publicado exactamente para cumprir a função para que foi feito e porque o Sr. General Ramalho Eanes o mandou fazer, ou seja, para desautorizar e caluniar as forças militares que, estiveram ao lado do povo - e é por isso que o Sr. Deputado Oliveira Dias tanto as odeia e tanto aprecia a actuação das polícias hoje no nosso país.
É que, efectivamente, e eu comecei a minha intervenção por aí, quer os métodos quer os objectivos a que se propunham eram totalmente opostos aos desejados pelo Sr. Deputado Oliveira Dias.
Em relação ao Sr. Deputado Sousa Tavares, digo-lhe que esse relatório não deu origem aos julgamentos, como aliás, foi reivindicado e exigido por aqueles que nele foram caluniados, até porque nós próprios, mesmo que fôssemos amnistiados, não aceitávamos a amnistia, porque não aceitámos essas acusações. Portanto, sublinho, esse relatório não deu origem aos julgamentos e foi arquivado, Sr. Deputado.

Portanto, o Sr. Deputado Sousa Tavares pode dizer aí tudo o que quiser e à vontade, porque o relatório, está arquivado.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Sousa Tavares (PSD): - Para um esclarecimento, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Desculpe Sr. Deputado, mas não lhe posso dar a palavra.
Desculpe, sei que V. Ex.ª tem todo o interesse em discutir o assunto, mas, na verdade, neste momento, não é regimental conceder-lhe a palavra.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): - Mas, Sr. Presidente, é que o que foi dito é uma mentira. O relatório não foi arquivado, acabou de ser feita a amnistia há quinze dias.

O Sr. Presidente: - Desculpe, mas não posso dar-lhe a palavra.

O Sr. Mário Tomé (UDP): - 0 Sr. Deputado não sabe que a amnistia não cobre esses, crimes?

0 Sr. Sousa Tavares (PSD): - Está a mentir.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, tenham a bondade de não estabelecer diálogo nem discussão no Plenário, a não ser nos termos regimentais.

Para uma declaração política tem a palavra o Sr. Deputado Herberto Goulart.

O Sr. Herberto Goulart (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos a terminar a 1.ª sessão legislativa desta II Legislatura num contexto governamental que à partida apresentava características diferenciadoras dos antecedentes.

Tratava-se de um governo apoiado por apreciável maioria parlamentar, afirmando-se como governo de legislatura.

Por isso, o Governo apresentava um programa para quatro anos, prometendo uma acção profícua em favor da melhoria da situação dos Portugueses.

Meio ano passado, temos o espectáculo de um governo corroendo-se em contradições internas, vegetando sem uma estratégia política visível, arrastando-se numa governação sem perspectivas.
Poucos meses foram suficientes para, aos olhos da opinião pública, se degradar a imagem do VII Governo.

A situação económica do País agrava-se com a redução do ritmo de crescimento da produção industrial e a recessão da produção agrícola, com o desequilíbrio acentuado da balança comercial, com os elevados saldos negativos da balança de pagamentos, afectando perigosamente a independência nacional.

E reflecte-se, indiscutivelmente, no poder de compra da população. A política económica prosseguida não arrasta apenas à deterioração salarial para os trabalhadores, mas afecta todas as camadas laboriosas.

O Plano para 1981 é expressão da falência da política económica do VII Governo. A taxa de crescimento económico projectada, de apenas 2,9 %, trará não só gravíssimas consequências no plano do desemprego (como o CNP, por consenso, reconheceu), como, em geral, nas condições de vida dos Portugueses.

A alteração das metas planificadas, quando comparadas com o que era proposto nas grandes opções do Plano que a Assembleia da República por maioria aprovou, a alteração, dizia, num curto intervalo de três meses, sem que os dados envolventes se tivessem modificado, é um bem nítido sintoma da incapacidade de previsão do VII Governo.
Sr.. Presidente, Srs. Deputados: A imagem degradada do Governo acentua-se em todas as áreas da esfera sócio-política.

Na comunicação social, a mediocridade instala-se à sombra da instrumentalização pelo Governo dos principais meios de informação estatizados. Na educação somam-se os insucessos, desde a aberração do 12.º ano de escolaridade à anarquia do funcionamento escolar, ao desajuste dos programas, à incapacidade de avançar - sequer de discutir - um quadro geral definidor do sistema de ensino.
Na habitação, de um ambicioso objectivo de construção de 50 000 fogos por ano, fala-se agora em menos de 40 000 e fixam-se esquemas sociais inacessíveis aos detentores de mais baixos rendimentos, precisamente os mais carenciados. Na segurança social, na

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via da deturpação do Serviço Nacional de Saúde, dificulta-se a acessibilidade aos Serviços Médico-Sociais e, na via de um orçamento de previdência auto-sustentado, restringem-se os montantes justos dos benefícios sociais. No domínio externo, pelo conservadorismo das posições ideológicas e pela falta de apoio social interno, o Governo pratica uma política de subserviência perante as orientações dos governos das grandes nações capitalistas.
O descontentamento alastra e generaliza-se a vastíssimos sectores sociais.
Não terão conteúdo imediato de directa hostilização ao Governo, num conteúdo imediato de contestação política, muitas das reclamações que são apresentadas,
algumas das manifestações realizadas. Sempre assim foi, aliás, quando os cidadãos lutam imediatamente pelas suas aspirações sociais.
Mas não deixa de ser relevante que, neste fervilhar da vida social do País, não surjam posições de apreço pelas acções governamentais, não se verifiquem quaisquer manifestações de apoio social ao governo da AD.
O VII Governo está a ficar isolado.
O próprio apoio político das forças cujo projecto o Governo consubstanciaria é hesitante, não escondendo as divergências e desentendimentos internos.
Na área do Poder, assiste-se ao espectáculo dos jogos pessoais, das insinuações e recriminações, da política transformada em intrigas palacianas, que acarretam o próprio desprestígio das instituições democráticas.
Em complemento do descontentamento dos cidadãos, levam em linha recta à degradação da imagem do Governo. Este tem disso consciência, pelo que tentará operações de estética.
A primeira está anunciada como uma operação de «marketing político» e significa que o VII Governo vai jogar na intensificação da governamentalização da comunicação social estatizada.
A segunda será, em tempo mais oportuno, talvez com a Assembleia da República encerrada, uma nova remodelação do Governo, mais profunda do que os ajustes feitos ao fim de cinco meses de governação, e que apontará mesmo para nova estrutura do Executivo.
Alguns interesses pessoais poderão, momentaneamente, ser satisfeitos, e o Governo ganhará um fogo adicional para se arrastar por mais algum tempo.
A contradição fundamental não será, porém, ultrapassada.
Porque a crise que os partidos da AD atravessam, a quebra da sua dinâmica e o esvaziamento do conteúdo do seu projecto político são fruto de uma incapacidade de avaliar a profundidade das transformações que em Portugal ocorreram e as linhas de força da evolução mundial.
O projecto AD é um projecto inviável enquanto estratégia de governação num quadro democrático estabilizado.
Como há dias disse aqui o meu companheiro António Galhordas, «o projecto da AD era apenas, como se está a demonstrar, uma acção voluntarista que obteve alguns êxitos por acção e muitos por omissão [ ... ) ».
O projecto da AD foi, acima de tudo, uma táctica para conquista do Poder, a qual não visou sequer, alcançar o seu objectivo - decisivo para o projecto- de concentração de poderes.
A AD afirmou-se por oposição, explorando sentimentos populares de descrença
numa situação política que estava associada a dificuldades na vida económica e social dos Portugueses.
A AD governou, tem governado, ainda por simples oposição.
Mas a AD não se afigura capaz de se afirmar pela positiva, pela realização de uma política válida que mereça a concordância dos Portugueses.
A AD, hoje, precariamente unida, mantém-se apenas pelo usufruto do Poder, pela partilha de áreas do aparelho de Estado.
No Portugal saído do 25 de Abril, a democracia só será reforçada e o poder político só estará em uníssono com a maioria da população e por ela apoiado se o orientar uma visão progressista da evolução social, se estiver determinado na construção de uma sociedade que reflicta as esperanças que Abril criou.
Nesse projecto, o País não estará só.
No Mundo ganham força as aspirações e os esforços para uma nova ordem internacional, de relações mais igualitárias entre os povos e preservadora da paz mundial.
Na Europa, também novos ventos de esperança começam a levantar-se. A roda da história parece, no velho continente, começar a movimentar-se num
sentido contrário aos caducos projectos das forças conservadoras.
Em França, um novo caminho de renovação encontra-se aberto, pelas vitórias eleitorais das forças de esquerda, correspondentes à unidade e encontro das que acreditam na possibilidade das transformações democráticas que conduzam a um estádio de progresso e de justiça social.
Em Portugal é muito largo o bloco social interessado numa democracia avançada, que às liberdades formais associe uma justiça social, no triplo aspecto da distribuição dos rendimentos, dos benefícios sociais e da igualdade de oportunidades, assegure uma participação constante dos cidadãos no espaço social em que se inserem e garanta um sistema económico onde não seja possível a grande concentração capitalista e que esteja liberto da dependência externa.
São potencialmente grandes as perspectivas de cooperação e convergência entre os democratas que constituem tal bloco social. Têm as suas mais profundas raízes na luta e no esforço comum para banir a opressão que o nosso povo tão duramente sofreu e para concretizar a esperança que anteviu.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vão hoje suspender-se os trabalhos do Plenário desta Câmara.
Vai iniciar-se, em sede mais restrita, o trabalho de revisão constitucional.
Para ele partimos com forte confiança no futuro da democracia. O MDP/CDE pensa que o processo de revisão constitucional poderá e deverá ser, nas novas condições políticas nacionais e internacionais, o retomar das esperanças do povo português, na perspectiva natural do aperfeiçoamento e melhoria

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do texto actual, colhendo a experiência rica dos cinco anos que entretanto passaram.
A lógica do processo de revisão é a busca do mais largo consenso entre as forças políticas. Esperamos que tais consensos só venham a ser encontrados no quadro do respeito dos grandes princípios da Constituição em vigor.
Entendemos que o processo de revisão constitucional não pode ser estrangulado dentro da Assembleia da República. A revisão não deve ser um trabalho hermético de técnicos juristas e dirigentes políticos.
É um processo que interessa ao povo, que está ligado ao seu direito de intervenção activa na vida política.
Trazer a revisão constitucional à discussão dos Portugueses e alargar em torno do processo as perspectivas de cooperação entre os democratas serão importantes tarefas para a defesa da Constituição de Abril.
Da parte do MDP/CDE, um sério empenhamento haverá em tal esforço. Com a convicção de que também neste campo, se prevalecer o entendimento entre todas as forças democráticas, na sua natural diversidade, se caminhará gradualmente para uma acção concertada da maioria dos portugueses, que permitirá transformar em certeza um projecto nacional, que é a esperança de Abril aberta aos portugueses.

Aplausos do MDP/CDE, do PCP, da UEDS e de alguns deputados do PS.

Entretanto assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente José Vitoriano.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado César de Oliveira.

O Sr. César de Oliveira (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A greve da fome que há perto de dez dias Carlos Antunes vem fazendo é uma forma de luta decidida por. este e outros dirigentes do PRP e que visa a satisfação de três reivindicações formuladas creio que por todos aqueles detidos envolvidos no que já é conhecido como «caso do PRP». Essas três reivindicações são a aplicação da Lei da Amnistia o julgamento de eventuais sevícias praticadas pela Polícia Judiciária sobre elementos do PRP detidos e a anulação do julgamento que condenou os «presos do PRP».
Sobre a aplicação da Lei da Amnistia, um dos deputados da maioria, o Sr. Deputado Sousa Tavares, considerava ontem, nas páginas do jornal de que é director, que, «tal como disse em tribunal, fui e sou contrário à amnistia. Mas ela foi votada como lei pela Assembleia da República e enquanto existir a lei tem de ter uma aplicação clara, rigorosa e uniforme». O Sr. Deputado Sousa Tavares chamava a atenção para a dualidade de critérios que têm sido usados e para o absurdo a que o subjectivismo do Estado ou do julgador podem conduzir nesta matéria e creio poder afirmar que das palavras do Dr. Sousa Tavares se infere, indirecta mas claramente, que aos «presos do PRP» se deveria aplicar a Lei da Amnistia que, entretanto, foi já aplicada noutros casos.
No que respeita ao julgamento de eventuais sevícias praticadas por elementos da Polícia Judiciária, sabemos que há cerca de dois anos existia, no Ministério da Justiça um processo devidamente organizado cujo conteúdo obviamente desconhecemos sobre a prática de eventuais torturas sobre «presos do PRP». Este processo estava, faz agora dois anos, para ser enviado aos tribunais, como foi dito pelo Ministro da Justiça de então aos advogados de alguns dos «presos do PRP», Drs. Jorge Fagundes e Guilherme da Palma Carlos.
No que concerne à anulação do julgamento, a Comissão Constitucional, por unanimidade, e o Conselho da Revolução consideraram inconstitucional o artigo 439.º do Código de Processo Penal ao abrigo do qual foram utilizados como meios de prova, no julgamento, depoimentos e declarações de indivíduos que não compareceram no tribunal, retirando à defesa dos réus a possibilidade de interrogar os autores desses depoimentos e declarações acto, que por si só justifica a anulação do julgamento.
Não há, por tudo isto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, qualquer razão que possa justificar a não satisfação das três reivindicações que motivam a greve da fome de Carlos Antunes e que hoje entra no seu décimo dia.
Sr. Presidente, Srs., Deputados: a UEDS não se identifica .politicamente com as posições que Carlos Antunes, 15abel do Carmo e outros militantes do PRP têm publicamente defendido. Pode dizer-se até que a UEDS considerou sempre incorrecta e inadequada às condições políticas gerais do Portugal pós-25 de Abril a prática política preconizada nomeadamente por Carlos Antunes e 15abel do Carmo. Para a UEDS não há lugar, sob qualquer pretexto, no Portugal democrático, à insurreição armada ou à violência revolucionária para a conquista do poder político. Separam-nos de 15abel do Carmo, de Carlos Antunes e do PRP diferenças abismais que decorrem das nossas próprias concepções no que respeita à luta política no quadro das instituições democráticas. Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, se qualquer identificação não existe entre a UEDS e os «presos
do PRP», não podemos, em nome dos valores políticos que intransigentemente defendemos, calar a nossa voz quando Carlos Antunes, 15abel do Carmo e outros homens e mulheres envolvidos no «caso PRP» são vítimas de critérios subjectivos na aplicação da Lei da Amnistia, de prepotências diversas e, de tratamentos discriminatórios.
A Revolução de Abril tem sido generosa. Generosa até para com aqueles que, durante estes sete anos, atentaram contra, ela.
No exacto momento em que um ministro da PIDE se vê ele próprio absolvido, seja pela sua reintegração na Função Pública seja pela pequena fortuna que o Ministério das Finanças lhe concedeu, a UEDS, parafraseando um deputado, da própria maioria, não pode admitir que, Carlos Antunes e 15abel do Carmo sejam transformados em vítimas de uma justiça incapaz de se criticar a si própria. A UEDS não pode admitir nem consentir que Carlos Antunes e outros homens e mulheres ligados ao que

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vai sendo designado por «caso do PRP» possam pagar com a própria vida os erros judiciários cometidos, o uso de dois pesos e de duas medidas no julgamento de quaisquer crimes ligados à luta política.

Aplausos da UEDS, do PS, do PCP. da ASDI, do MDP/CDE e da UDP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito para uma declaração política.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta é realmente, tudo indica, a última reunião do Plenário da Assembleia da República na sessão legislativa de 1980/1981. É verdade que nos anunciam agora que a AD vai convocar nova reunião para o dia 7, mas isso é apenas para o colossal e escandaloso negócio da EPAC.
Já suspiram de alívio o Governo e o conjunto da AD que tão empenhados e apressados se têm mostrado em evacuar o hemiciclo e remeter para férias estivais os deputados, com a redução da actividade parlamentar ao funcionamento de uma silenciosa Comissão de Revisão Constitucional.
Já o Primeiro-Ministro anunciou, seguro do silêncio da Assembleia, uma alocução ao País feita, naturalmente, através das câmaras de televisão, e, evidentemente, sem contradita.
Não seria preciso mais para que se tornasse oportuno exprimir aqui, na brevidade regimentalmente imposta, os pontos de vista do Grupo Parlamentar do PCP sobre as experiências parlamentares e políticas deste último período bem como as tendências e as perspectivas que, a nosso ver, se desenham para diante.
Nenhum deputado, incluindo os da maioria, que conserve um pouco de bom senso pode deixar de nos acompanhar na conclusão de que a Assembleia da República não pode voltar a trabalhar como aconteceu neste último mês.
O que se passou foi a completa subversão das prioridades - as mais indiscutíveis regimental e politicamente -, com a inclusão na agenda de tudo aquilo que interessava ao Governo, à AD e aos grandes senhores do capital e da terra, como a delimitação dos sectores, as indemnizações, a chamada legislação antiterrorista, e com a exclusão daquilo que interessava e interessa aos trabalhadores, ao povo em geral e ao País, por exemplo, os diplomas referentes aos contratos a prazo, às novas tabelas salariais da função pública, à criação de freguesias, à reorganização dos tribunais administrativos e fiscais ...
O que se passou ao longo deste mês foi também a subtracção ao debate vivo na Assembleia da República da legislação que é da sua competência constitucional e que, pela sua importância política, só nela deve ser discutida, como a legislação que o Governo prepara para acabar com o Serviço Nacional de Saúde.
Foi o abuso dos mecanismos de autorização legislativa para que o governo cozinhe na sombra dos gabinetes aquilo que a AD teme discutir em público.
O que se passou neste mês foi ainda a inclusão ou a tentativa de inclusão a golpe, à última hora, de novas matérias, sem respeito pelo próprio processo de admissão, como aconteceu ontem com uma autorização legislativa sobre a legislação declarada inconstitucional relativa à EPAC, foi a redução até ao absurdo do período de apreciação de matérias da maior complexidade e importância para o nosso povo e as votações a mata-cavalos de disposições de grande melindre.
Estas péssimas condições de trabalho impostas pela AD à actividade parlamentar não afectam apenas o labor legislativo, afectam ainda mais e têm em vista realmente obstruir as competências de controle e fiscalização da Assembleia da República sobre o Governo e sua política, particularmente nos aspectos mais desastrosos em que ela se manifesta - a subida vertiginosa dos preços, a queda progressiva e generalizada do poder de compra dos Portugueses, os atentados aos direitos dos trabalhadores e às transformações democráticas feitas com o 25 de Abril.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

Sob a égide do segundo governo do PSD e do CDS, a Assembleia da República é uma assembleia amordaçada. Nunca como este ano a publicidade dos trabalhos parlamentares foi tão reduzida na rádio e na televisão, controladas pela AD, mesmo quando se tratava de debates da maior importância para o País, como as Leis do Orçamento e do Plano ou as interpelações sobre a saúde e sobre a educação. Mais grave ainda: com a actividade deste órgão de soberania permitem-se manipular, descaradamente, aqueles órgãos de comunicação social estatizados, omitindo ou deturpando as posições aqui assumidas pelos deputados e os partidos.

Uma voz do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A transparência e a publicidade dos trabalhos constituem a maior força de uma Assembleia representativa com latíssimos poderes constitucionais como é a nossa.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

Mas a AD não quer uma Assembleia da República forte.

O prestígio da Assembleia da República como instituição democrática e o prestígio da função parlamentar não se faz outorgando aos deputados vencimentos escandalosamente altos ...

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador:- ...para o País pobre que nós somos e a que se somam outros privilégios e regalias igualmente chocantes em face das difíceis condições de vida do nosso povo, como estabelece o projecto de alteração ao Estatuto que mais logo discutiremos e contra o qual o Grupo Parlamentar do PCP vai votar.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

Uma orientação política que tenha em vista reforçar o prestígio da Assembleia e da função de deputado deve começar por garantir a fronteira das suas competências contra as invasões governamentais; deve assegurar o pleno exercício dos seus poderes de fiscalização, o que implica, por exemplo, a pres-

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tação de informações actualizadas pelo Governo e a resposta por parte deste atempadamente e sem evasivas aos requerimentos e outras interpelações dos deputados deve velar para que seja assegurado ao deputado o acesso a todos os processos onde possam ser postos em causa os direitos e os interesses do nosso povo, o que implica que seja assegurado o direito de livre trânsito nas empresas públicas e privadas; deve criar as condições propícias à função de representação para que o deputado é escolhido, incluindo, as condições de instalação que continuam a ser péssimas, não só para os deputados mas também para os jornalistas que fazem a cobertura dos trabalhos parlamentares e para os trabalhadores da Assembleia.
Não são estas, porém, as preocupações da AD como ficou provado em mais um ano de trabalho.
Digam o que disserem os seus porta-vozes, o plano da AD é um plano de segundarização da Assembleia da República.

Uma voz do CDS: - Olha quem fala!

O Orador: - Ouça, ouça que vai concordar!
Testemunho inequívoco dessa orientação é o seu projecto de revisão constitucional que estabelece a redução dos poderes parlamentares no que se refere às competências legislativa e de fiscalização bem como à competência política geral.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

Aí temos a redução da área de competência reservada, o regresso às famosas leis de bases, o esvaziamento completo do instituto de ratificação e até a diminuição dos poderes dos grupos parlamentares.

0 Sr. Narana Coissoró (CDS): - Como em França!

O Orador: - Se algum dos Srs. Deputados da Aliança Democrática - particularmente do PSD, que vejo com o olhar interrogador - não conhece, leia o projecto e verificará que isto é verdade.

O projecto da AD é um projecto de revisão inconstitucional, visando a destruição do regime democrático-constitucional e a liquidação das grandes transformações sócio-económicas realizadas com o 25 de Abril.
O projecto da AD é um projecto de desforra em relação ao 7 de Dezembro. A AD pretendeu impor o seu presidente e por essa forma tomar conta de todo poder político sem excepção. Mas a AD perdeu. Agora, pela via da revisão constitucional, quer vingar-se e suster a sua derrocada, quer tomar conta de todo o poder político sem excepção, esvaziando de poderes o Presidente, que não é o seu candidato e transferindo esses poderes para os órgãos de soberania que controla.
Havia, no entanto, diferentes maneiras de tentar atingir este objectivo. O projecto da AD elege uma significativamente - a governamentalização do regime, mais precisamente, elege o figurino constitucional de 1933.
Não são só os homens do regime fascista que reaparecem na cena política, que reaparecem na AD pela mão do CDS, é também a filosofia política desse regime que reaparece na AD pela mão do CDS.
Em vésperas do início dos trabalhos da Comissão Parlamentar para a Revisão Constitucional, conhecidos e comparados os diferentes projectos, torna-se muito claro que os democratas nada têm de comum com o projecto da AD. Torna-se, por isso, evidente que a defesa da democracia exige aos democratas não a busca de consensos com a direita, nem que se lhe lançem pontes ou bóias de salvação, exige, muito ao contrário, a definição de uma clara, firme, decidida política de oposição e a urgente preparação de uma alternativa democrática sem equívoco, marcada pela ideia do combate sem tréguas à reacção.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

No termo dos trabalhos públicos da Assembleia da República está ampla e exuberantemente confirmada a incapacidade do governo da AD para dar solução a qualquer dos grandes problemas nacionais.
A crise política e as crescentes dificuldades económicas e financeiras com que se debate o País não vão para férias.
A AD pode fechar a Assembleia da República, mas já não pode fechar o processo de tensão e desagregação que lhe corrói as entranhas.

Vozes do PCP : - Muito bem!

O Orador: - A consciência de que a maioria parlamentar actualmente existente não tem correspondência no país real e de que é necessário substituiu o Governo e a maioria é uma corrente que se afirma e desenvolve como se viu na manifestação de sábado passado e que irá continuar a engrossar no decorrer do Verão.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

A realização - e vou fazer uma proposta constitucional - de eleições legislativas antecipadas surge cada vez mais aos olhos do País como a saída necessária que acabará por se impor a mais ou menos curto prazo.
E é por isso que a alternativa democrática está cada vez mais na ordem do dia, como uma questão que compete aos democratas resolver urgentemente, inadiavelmente.
E é por isso que, ao suspenderem-se os trabalhos parlamentares por um largo período, o PCP reafirma a sua decidida vontade de encetar os caminhos do diálogo, da negociação, da cooperação com as outras forças democráticas para que se possa construir a alternativa democrática à AD e ao seu governo, condição essencial para preservar e prosseguir o 25 de Abril e para a resolução dos problemas dos Portugueses e de Portugal.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Moura Guedes.

O Sr. Moura Guedes (PSD): - Sr. Presidente, é para um protesto.
Tenho pena de dispor de tão pouco tempo, porque a intervenção do Sr. Deputado Carlos Brito convidava a um protesto bastante extenso.

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Raras vezes terei ouvido uma semelhante intervenção. Desculpe-me o Sr. Deputado Carlos Brito se eu estivesse de olhos fechados e não soubesse quem estava a fazer esta intervenção, diria que era uma intervenção perfeitamente paranóica, delirante. Mas, sabendo que era o Sr. Deputado Carlos Brito que a estava a fazer, consequentemente, nunca poderia aplicar estes qualificativos.
E também sei a explicação desta intervenção, porque, a certa altura, essa explicação transpareceu com clareza na apreensão, por parte do Partido Comunista, do receio de que, porventura, em volta do tema da revisão constitucional possam a vir ser feitos certos acordos, alargando-se assim a base de acordo entre as forças democráticas deste País.

O Sr. Roleira Marinho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - 15so é perfeitamente transparente e creio que encontrei - o diagnóstico é fácil - a razão desta delirante intervenção.
Diz o Sr. Deputado do Partido Comunista que houve violências por parte da Aliança Democrática e que nunca, como agora, houve um tal esmagamento das minorias.
Refere o Sr. Deputado as ratificações, por exemplo, mas recordo-lhe que nunca - é a primeira vez que isso aconteceu - os pedidos de autorização legislativa vieram acompanhados do respectivo projecto de decreto-lei.
Foi a primeira vez que fizemos um debate final acelerado. Houve um respeito profundo pelo desejo de agendar matérias manifestado por todas as forças da oposição, de tal forma que o Governo e nós, maioria, chegámos a retirar matérias que desejávamos agendar.
Recordo ao Sr. Deputado Carlos Brito que foi a primeira vez que não foi imposto qualquer contigente de tempos de intervenção, na proporção da representação numérica aos partidos menores.

Aplausos do PSD e de alguns deputados do CDS.

Foi a primeira vez que isto se fez e, portanto, é profundamente injusta a intervenção do Partido Comunista e contra ela deduzo o meu veemente protesto, com pena de não ter tempo para me referir a toda uma série de pontos de fácil refutação.

Aplausos do PSD e de alguns deputados do CDS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Brito, há ainda mais um protesto e um pedido de esclarecimento. Deseja responder em conjunto?

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sim Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Nesse caso, tem a palavra o Sr. Deputado Borges de Carvalho.

O Sr. Borges de Carvalho (PPM): - Sr. Presidente, é claro que o Sr. Deputado Carlos Brito fez do Plenário uma caixa de ressonância das posições ultimamente assumidas pelo seu partido, cuja legitimidade não contesto.
A estratégia golpista e subversiva do PCP ficou mais uma vez demonstrada através da repetição nesta Casa dos discursos ultimamente pronunciados pelo secretário-geral do mesmo partido.

O Sr. Sousa Marques (PCP): - Olha a cassette!

O Orador: - No entanto, dado que o tempo é escasso, não irei fazer um protesto sobre o conteúdo dessa intervenção mas sobre uma parte dela que, particularmente, me choca.
É que, sendo o Partido Comunista um partido que afirmou, peremptoriamente, que Portugal nunca seria uma democracia parlamentar, isto é, que nunca haveria um parlamento em Portugal ...

A Srª. Zita Seabra (PCP): - Quem disse isso?!

O Orador: - ..., um partido que apoiou o cerco à Assembleia Constituinte - de que todos os Srs. Deputados estão bem lembrados - um partido que defende regimes onde não existe parlamento, mas, sim, máscaras de parlamento, assembleia de sim-sim e de unanimidade permanente, ...

Aplausos do PCP .

... foi esse partido que veio aqui armar-se em defensor estrénuo da democracia parlamentar e da instituição parlamentar.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O inarrável cinismo destas posições não pode deixar de ser denunciado nesta Assembleia. E é contra isso que levanto o meu veemente protesto.
O cinismo, a insinceridade, a falta de verdade entre aquilo que se sente e aquilo que se diz é que é verdadeiramente antidemocrático, subversivo e inconstitucional.

Aplausos do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Tem a .palavra o Sr. Deputado João Morgado.

O Sr. João Morgado (CDS): - Sr. Presidente, pretendo usar da palavra, mas para pedir um esclarecimento.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: A intervenção do Sr. Deputado Carlos Brito foi dirigida em dois sentidos.

Vozes do PCP: - Só dois!

O Orador: - Primeiro, abordou a questão da revisão constitucional e, numa segunda parte, fez aquilo que classificou, em aparte, como «uma proposta constitucional», isto é, apontou para a necessidade de se realizarem eleições antecipadas.

Risos do PCP.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Não percebeu!

O Orador: - Creio que foi isto, embora a sua repetição tenha provocado agora o riso dos Srs. Deputados do Partido Comunista.
Quanto a nós, tomámos isso a sério. Simplesmente não entendo muito bem.

Risos do PCP..

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Uma proposta de eleições antecipadas saída da bancada do Partido Comunista, dado que este partido, nas últimas eleições, viu o número dos seus deputados extremamente reduzido, tendo, inclusivamente, perdido alguns ilustres deputados. O Partido Comunista deixou, assim, de contar com deputados que tinham, nesta Assembleia, intervenções muito válidas, designadamente os Srs. Deputados Vítor Louro e Carlos Carvalhas. Não se conhecem sondagens que dêem, neste momento, alguma possibilidade de o Partido Comunista, ver aumentado o número de deputados que presentemente tem. Será que com a proposta de eleição antecipada o Partido Comunista pretende perder mais alguns deputados (dos mais ilustres) da sua bancada?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito para responder aos dois protestos e a este pedido de esclarecimento.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Primeiro, responderei com uma resposta global, abarcando os três interpelantes.

Assim, começo por dizer, em relação ao Sr. Deputado Moura Guedes, que o senhor não só esteve de olhos fechados, como tem andado de olhos fechados, a avaliar pelo que disse.
E mais, tem andado com os ouvidos tapados e tem, andado distraído...

O Sr. Amadeu dos Santos (PSD): - Olhe que não!

O Orador: - Em relação ao Sr. Deputado Borges de Carvalho, impressionou-me, sobretudo, a falta de inspiração.

Risos gerais.

Provavelmente foi provocada por não ter feito nenhuma referência ao PPM e ter-me referido apenas ao Governo do PSD e do CDS.
Já em relação ao Sr. Deputado João Morgado, quero salientar, como algo positivo, o grande esforço que fez para ter um certo sentido de humor.

Risos do PCP.

Não o conseguiu, mas este passo é positivo.

Aplausos do PCP.

Sr. Deputado Moura Guedes, creio que temos feito esta jornada de vida parlamentar portuguesa em conjunto, mas não me venha dizer que o debate nunca foi tão democrático e tão vivo.
Não, Sr. Deputado. O senhor sabe perfeitamente que foi com a Aliança Democrática que houve uma restrição muito séria, muito drástica do debate parlamentar. E, para além do mais, até citei, na minha intervenção, as situações concretas em que isso aconteceu. Portanto, podemos, realmente enumerá-las.
Citei, em primeiro lugar, o desrespeito pelas prioridades. É ou não assim? Não há prioridades regimentais. Por exemplo, as ratificações não têm prioridade regimental. E o Sr. Deputado sabe perfeitamente que ficaram pelo caminho ratificações da maior importância, do maior interesse, cuja discussão foi vivamente reclamada pelos grupos parlamentares da oposição, como, por exemplo, aconteceu com a ratificação referente ao diploma que fixou as tabelas salariais da função pública e com outras ratificações mais.
Ora estas matérias gozam de prioridade regimental, como sabe. E o Sr. Deputado não introduziu, ou não quis introduzir na agenda desta sessão suplementar matérias que desfrutam de prioridade regimental e introduziu matérias que não são contempladas sequer pelos prazos de admissão.
Tudo isso aconteceu e todos os factos que citei são verdadeiros.
Repito: se o Sr. Deputado não aceita isto, é porque tem andado um bocado distraído, é porque tem andado, há um tempo para cá, de olhos fechados.
Quanto ao Sr. Deputado Borges de Carvalho, digo-lhe que foi de uma tristíssima pobreza, unicamente aceitável por o Sr. Deputado não estar preparado e não contar com a minha intervenção, pelo que utilizou todas as cassettes mais comuns dos jornais A Rua, A Barricada, O Dia. De uma pobreza tal foi a sua intervenção que eu até se o Sr. Deputado estivesse de acordo, pedia aos serviços que ela não ficasse registada no Diário, porque é de menos para o presidente da Comissão de Revisão Constitucional. Portanto, não nos. sentiremos bem daqui para o futuro com uma intervenção tão pobre.
Quanto ao Sr. Deputado João Morgado, o Sr. Deputado percebeu umas coisas, mas outras não.
A proposta que faço é constitucional, mas o Sr.Deputado disse que não percebe porque a fazemos. O Sr. Deputado com certeza está recordado que em 1977 levantámos, a certa altura, a questão das eleições antecipadas. Houve então um grande barulho. Uns meses depois, o CDS estava também a propor eleições antecipadas. Nessa altura o presidente do Grupo Parlamentar era o Sr. Adelino Amaro da Costa, que, ao menos ele, percebeu.
Depois a Aliança Democrática acabou por transformar isso na sua principal bandeira de luta.

O Sr. João Morgado (CDS): - E ganhou as eleições!

O Orador: - 0 Sr. Deputado diz agora que não percebe a nossa proposta porque perdemos deputados nas últimas eleições. Ora, Sr. Deputado, torna-se claro o que nós pretendemos.
Em primeiro lugar, contribuir para uma saída que sirva os interesses do nosso país, isto é, estamos numa situação de impasse com um Governo a apodrecer, uma coligação maioritária a desagregar-se num processo de apodrecimento a que todos estamos a assistir.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Não apoiado!

O Orador: - 15to do ,ponto de vista nacional, que colocamos sempre acima dos interesses partidários.

Em segundo lugar, em relação aos deputados que perdemos, pois queremos recuperar os Srs. Deputados Vítor Louro, Carlos Carvalhas e João Amaral para melhorarem e reforçarem a nossa bancada.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

Entretanto, assumiu a Presidência. o Sr. Vice-Presidente, José Vitoriano.

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O Sr. Presidente:- Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.

O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A situação que as massas trabalhadoras e o povo em geral têm de enfrentar no nosso país degrada-se cada vez mais, não só em função directa da crise económica que afecta todo o sistema mas também em consequência da forma como a AD e o seu Governo tratam de tentar resolvê-la.
Já uma vez dissemos que, se o capitalismo está em crise, o mesmo não acontece com os capitalistas. E isto muito simplesmente porque os capitalistas da CAP, da CIP, da COP têm os seus homens de mão na maioria da Assembleia da República e no Governo e os seus esbirros nas FA's e nas polícias, que, legislando, executando e reprimindo, cumprem a sua missão de destruir as conquistas de Abril e possibilitar a concentração monopolista do capital, da terra e das grandes fortunas à custa da miséria dos trabalhadores, do ataque às liberdades, do espezinhamento da Constituição e da entrega do País ao estrangeiro.
Assim, à medida que crescem o luxo desmesurado e os gastos supérfluos, à medida que os ricos são cada vez mais ricos, tratam de pagar cada vez mais aos seus lacaios e querem fazer dos próprios deputados uma casta gananciosa e do lugar no Parlamento uma verdadeira sinecura a ser bem regateada e negociada. O povo português - cada vez mais esquecido e desprezado, cada vez mais afastado da possibilidade de, pelas vias consideradas institucionais, influenciar decisivamente os seus próprios destinos - defronta-se com a carestia e a contenção de salários, com o agravamento da assistência médica, da habitação e do ensino, com o autêntico roubo que foi mais este corte das verbas para as autarquias - golpe fatal para aqueles que sonhavam com a efectiva descentralização e possibilidade de as populações poderem, local e regionalmente, ter voz activa na defesa dos seus interesses.
Paralelamente, os grandes patrões, com a reconversão monopolista de vastos sectores na indústria e na agricultura, provocam o aumento do desemprego, o subemprego, a insegurança no futuro com o alastramento - incontido e incontível pela legislação reformista e criadora de ilusões que a AD deixara, magnanimamente, passar há semanas atrás - dos contratos a prazo, com os despedimentos colectivos, a aceleração dos ritmos de trabalho impostos à custa da repressão e dos despedimentos selectivos com a cumplicidade objectiva da estrutura judiciária expressa na inoperatividade dos tribunais de trabalho.
A pequena agricultura nas mãos dos intermediários, especuladores e açambarcadores, estrangulada pelo aumento dos factores de produção, prepara-se arduamente para a entrada na CEE com o respectivo redimensionamento da exploração agrícola à custa da falência e da miséria de milhares de camponeses. Na Zona da Reforma Agrária os ataques e roubos às UCP's e cooperativas e o lançar no desemprego de milhares de assalariados, se corresponde por um lado ao revanchismo político e alarve dos latifundiários parasitas, destina-se hoje, essencialmente, à criação de explorações agrícolas capitalistas modelo CEE.
Uma banca e seguros privados, a abertura de sectores produtivos de base à ganância privada e o povo português a pagar, através do Orçamento Geral do Estado e das medidas de contenção salarial, a inflação e repressão sobre os trabalhadores, os custos da modernização e reconversão que possibilitem aos capitalistas os lucros astronómicos que obtêm completam a panóplia.
Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, para conduzir uma política deste tipo num país onde houve um 25 de Abril, a direita teve de contar com o apoio económico, político e militar do imperialismo e das grandes multinacionais, aos quais garante que podem fazer tudo o que lhes apetecer, sem condições, com o apoio político e ideológico dos pensadores e executores do fascismo que vai recompensando, como fez agora ao Moreira Baptista, com a bênção nunca regateada da hierarquia da Igreja e, finalmente, com o apoio das forças políticas encarregadas historicamente de dizer ao povo: umas, que tudo isto faz parte do 25 de Abril e que se chega ao socialismo reforçando o chamado capitalismo não selvagem (qual é?) e prendendo os revolucionários e antifascistas que não se comportem segundo as regras impostas pelos reaccionários e fascistas; outras, que os trabalhadores podem defender o 25 de Abril e as suas conquistas movimentando-se apenas no quadro político e institucional imposto pelos seus inimigos, lutando apenas dentro dos limites impostos pelo 25 de Novembro e com o fito primeiro de defender a chamada economia nacional controlada pelos capitalistas e determinada pela AD, confiando na revisão Constitucional determinada pelas forças que se impuseram a ferro e fogo e a golpes de mão contra o 25 de Abril e a Constituição.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A caracterização da situação do nosso país pode fazer-se de várias formas. Mas talvez a mais exemplar e a mais acutilante seja o que se passa hoje com Carlos Antunes, 15abel do Carmo e seus companheiros. Presos há três anos numa operação policial dirigida contra o PRP, suportaram dois anos de prisão preventiva, julgamentos arbitrários e inconstitucionais, sevícias e toda a sorte de provocações.
Passado um ano de cumprimento de pesadas penas, foi necessário encetarem, pela terceira vez uma greve de fome, esta por tempo ilimitado, para que o Poder se debruçasse sobre a inconstitucionalidade dos julgamentos e concluísse aquilo que já todos sabíamos: foram de facto inconstitucionais os julgamentos. Consequentemente, os julgamentos deverão ser anulados e postos em liberdade os presos, pois três anos de prisão preventiva ultrapassam todas as marcas admissíveis.
É verdadeiramente incrível, e que isto sirva de exemplo ao povo português, que num país que se diz em democracia seja preciso que Carlos Antunes ponha em risco a sua vida - a saúde já está irremediavelmente comprometida - para as altas instâncias do Poder se dignarem mexer uma palha. Incrível e revoltante.
Mas não menos incrível é o silêncio desta Assembleia - saúdo, aliás a intervenção da UEDS hoje aqui feita, o silêncio dos partidos que dizem ter como referencial a liberdade. Ou esperam que Carlos An-

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tunes morra para depois virem verter lágrimas de crocodilo e apresentar votos piedosos?
Mas a AD, que não pode deixar os seus créditos por mãos alheias, vem muito jurisdicionalmente dizer, pelo boca do Ministro Pimentel, que isto de justiça é sempre justiça mesmo quando a injustiça é flagrante e insulta os mais elementares direitos das pessoas.
Outra coisa não era de esperar da parte de quem impõe a aprovação de leis tão monstruosas como a chamada lei antiterrorista, as aceleradas alterações do Código de Processo Penal e a lei sobre expulsão de estrangeiros.
Para garantir os lucros dos patrões e os altos vencimentos aos deputados, ministros e funcionários superiores é preciso não deixar os trabalhadores porem, o pé em ramo verde. Aumentem-se também, por isso as polícias.
É por isso também que os trabalhadores de fábricas militares e agora da chamada INDEP são mantidos até condições intoleráveis de restrição de direitos e liberdades. Não têm liberdade sindical nem de se organizarem nos seus órgãos de classe. Logo, naturalmente, não têm capacidade reivindicativa mínima. 15to, outra monstruosidade anticonstitucional que se mantém há seis anos, sob os auspícios dos vários governos, do CR e do CEMGFA. 15to até quando? Os trabalhadores estão decididos a não tolerar por mais tempo esta situação iníqua de verdadeira escravatura e as lutas que têm desenvolvido irão engrossar e unificar-se.
Também na Panasqueira a submissão ao imperialismo é patente. Cerca de 1500 trabalhadores deixam o suor, a saúde e tantas vezes a vida na mina para que a Beralt Tin arrecade, em 1979, 382 000 contos de lucros e, em 1980, 490 000, faça uma exploração gananciosa dos filões, desprezando camadas inteiras, só para não perder alguns, poucos, milhares de contos de aumento dos lucros, e pondo em risco a duração da exploração da mina e os postos de trabalho dos mineiros, marimbando-se, ostensivamente, para os interesses do nosso povo, aproveitando, aliás, a veneradora submissão dos governos antipopulares que nos têm governado. De acordo com os métodos perfilhados a nível central pelo próprio governo AD, também os aumentos na Beralt Tin são à percentagem progressiva para os mais altos escalões: 15 % aos técnicos, 10% aos operários. Despreza-se a segurança dos trabalhadores e as condições de salubridade e de apoio social, tratando os acidentados e silicóticos como lixo e permitindo e fomentando, na mira de maiores lucros, todos os atropelos às próprias leis do trabalho e da segurança. Os mineiros da Panasqueira já têm experiência da luta e de novo estão em luta, já que o Governo se comporta como lacaio da multinacional. E hão-de sair vitoriosos dessa luta, se mantiverem a coragem e a determinação já reveladas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A AD não é de ferro e pode e deve ser derrotada e derrubado o seu governo antinacional e antipopular.
Por um lado, a crise económica e política manifestada nas divisões no seio da coligação reaccionária, nos choques entre esta e os sectores eanistas, na instabilidade e na tendência para reajustamento nas relações de forças partidárias e, por outro lado, a grande amplitude das movimentações operárias e populares, abrangendo nomeadamente sectores que serviram de base eleitoral à AD, que apontam para a ampliação dos confrontos de classe em respostas às medidas capitalistas reaccionárias, são factores que apontam para uma instabilidade prolongada e com possibilidades reais de viragem.
Mas apontar aos trabalhadores como saída para a situação a constituição de um bloco central em aliança com a direita ou de um bloco democrático em torno de Eanes e a possibilidade de formação, a curto prazo, de um novo governo com uma nova política, ambas chamadas democráticas, é criar ilusões nos trabalhadores que os põem na expectativa e desviá-los do caminho de luta dura e firme que leve à, desagregação da AD e à queda do Governo.
É na ampliação e unificação de lutas populares que os trabalhadores reunirão as forças necessárias para se libertarem das cadeias do regime novembrista e para afirmar uma alternativa que sirva os seus interesses no caminho do 25 de Abril, abrindo caminho a um governo que revogue todas as leis antipopulares e antioperárias e garanta a mais ampla liberdade de afirmação e imposição da, vontade do povo. Mas decerto que não era essa a intenção dos promotores da manifestação de 27 de Junho, formal e presencialmente apoiada pelo PCP, quando decidiram a todo o transe impedir a participação do Sindicato dos Marinheiros e representantes de trabalhadores e delegados sindicais de dezenas de empresas que dentro da CGTP lutam por uma política sindical de classe em oposição à maioria reformista do Secretariado. E foi tão grande o seu empenhamento na não participação daquelas centenas de trabalhadores, tão grande a sua oposição à perspectiva de unificação das lutas dos trabalhadores como factor de unidade dos próprios trabalhadores à clara rejeição da CEE e da NATO, à defesa intransigente da Constituição e ao derrube do governo Balsemão - palavras de ordem que se liam nas faixas empunhadas pelos elementos do Sindicato dos Marinheiros e pelos outros representantes dos trabalhadores - que utilizaram todos os meios ao seu alcance como caceteiros e provocadores, que espancaram a torto e a direito homens, mulheres e crianças. Mas também levaram e bem ...

Esgotado o tempo de que o orador dispunha, foi-lhe cortada a palavra pelo controle automático de tempo.

O Sr. Presidente: - Terminou o seu tempo, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Coimbra (PPM): - Estava no melhor do discurso.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Carrapato.

0 Sr. Almeida Carrapato (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não serve ao intento fazer a história e o balanço da actividade desta Assembleia na sessão legislativa que hoje finda. Não quero, no entanto, deixar de sublinhar que o saldo seria negativo e que os esforços do Partido Socialista no sentido de enriquecer, prestigiar, e tornar mais eficaz esta

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Assembleia se revelaram, em grande parte, baldados e votados à ineficácia.
Com efeito, a esterilidade dos partidos da maioria e a sua ausência de iniciativa levam-nos a remeter para o Governo o grosso da competência do Parlamento, desvalorizando-o.
Por sua vez o Governo, em manifesta crise, sem projecto, tem seguido na esteira de defender os interesses dos grupos que o apoiam.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Muito bem!

O Orador: Não querendo, portanto, insistir em considerações de natureza geral, permito-me fazer algumas considerações, no findar desta sessão legislativa, de interesse local e regional.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A lei que aprovou o Orçamento Geral do Estado arrumou a matéria respeitante às finanças distritais num único artigo, o 48.º. Este preceito dispõe:

1 - As receitas arrecadadas pelos cofres privativos dos governos civis destinam-se a assegurar a cobertura financeira das respectivas despesas, nos termos do Código Administrativo, e de acordo com os orçamentos aprovados.
2 - Será incluído na dotação prevista no n.º 1 do artigo 22.º da Lei n.º 1/79 um montante em correspondência com o das receitas referidas no número anterior que, nos termos do n.º 2 do mesmo artigo, deveriam reverter para os distritos.

Prima facie, o legislador de 1981 reconheceu que as receitas referidas no n.º 1 do artigo 48.º da lei que aprovou o OGE, isto é, as receitas arrecadadas pelos cofres privativos dos governos civis, deveriam reverter para os distritos, e não revertem. Essas receitas são gastas nos governos civis, revertendo para o Estado os saldos que remanescerem.
O artigo 48.º da lei que aprovou o OGE, proposta pelo Governo, deverá entender-se em conotação com o artigo 22.º da Lei n.º 1/79, de 2 de Janeiro. Este preceito dispõe:

1 - Enquanto as regiões não estiverem instituídas os distritos são dotados através de uma verba anualmente transferida do Orçamento Geral do Estado.

2 - As receitas arrecadadas pelos cofres privativos dos governos civis revertem para os distritos.

Assim, observar-se-á, ab initio, que o disposto no artigo 48.º da lei que aprovou o OGE está em desconformidade com o artigo 22.º, n.º 2, da Lei das Finanças Locais. Será isto a «aplicação cuidada» desta Lei?
Portanto, o artigo 22.º da Lei das Finanças Locais dispôs que as receitas dos distritos, logo das assembleias distritais, promanam de duas origens:

a) Uma dotação a transferir anualmente do OGE;

b) As receitas dos cofres privativos dos governos civis.

Em cúmulo material

Agora, o Governo propôs e a Assembleia da República, por maioria, aprovou que as receitas dos cofres privativos dos governos civis não sejam remetidas aos distritos e que continuem a ter a aplicação que o Código Administrativo lhes dava antes da publicação da Lei das Finanças Locais. Como se esta Lei não existisse ...
Mas o n.º 2 do artigo 48.º da lei que aprovou o OGE determinou que as dotações previstas no n.º 1 do artigo 22.º da Lei das Finanças Locais, a transferir anualmente do OGE, incluam um montante em correspondência com o das receitas dos cofres privativos dos governos civis, que deveriam ser encaminhadas para as assembleias distritais, e não o são.
Poderá parecer que, dentro deste esquema -mais ou menos gongórico -, ficam salvaguardados os interesses das assembleias distritais. Mas não. O artigo 22.º da Lei das Finanças Locais fixa uma dualidade, um cúmulo material: a dotação de uma verba a transferir anualmente do OGE e as receitas dos cofres privativos dos governos civis. Agora, o Governo dispôs não uma dualidade material de receitas mas sim uma mera unidade: uma dotação a transferir do OGE.
Diz-se que o regime recentemente aprovado manda incluir na dotação a transferir do OGE um montante em correspondência com o das receitas dos cofres dos governos civis. Mas não é a mesma coisa. É que o montante da dotação a transferir do OGE poderá ser tão comprimido que nele mal caiba ou, porventura; apenas caiba o montante igual ao das receitas dos cofres privativos dos governos civis.
Se assim proceder, e poderá proceder, o Governo terá defraudado a Lei das Finanças Locais no sector das finanças distritais, mas não deixou de observar a lei que aprovou o OGE. Uma fraude legal à lei. Um golpe desferido contra o poder local.
O Governo podia, e devia, proceder de forma menos sinuosa. Podia, e devia, enveredar por caminho menos ínvio, se queria cumprir o artigo 22.º da Lei das Finanças Locais, na sua plenitude. Podia, e devia, encaminhar directamente para as assembleias distritais as receitas dos cofres privativos dos governos civis, tal como a Lei das Finanças Locais ordena; e para assegurar a cobertura financeira das despesas dos governos civis deveria dotar os respectivos cofres de verbas correspondentes às receitas orçamentadas.
Procedendo diferentemente, o Governo está a subtrair à autarquia distrital receitas que a Lei dispunha que eram dela e para ela deviam ser directamente canalizadas. E pode, embora não deva, reduzir, num ou noutro caso, ou porventura em vários ou em todos, as receitas dos distritos a montantes equivalentes aos das receitas dos governos civis.
Nem se diga que a autarquia distrital acabará por receber as receitas dos cofres do governo civil por intermédio do Governo Central. Se assim fosse, seria de registar a anacrónica tutela, sendo pelo menos muito estranho que o Governo Central retire aos distritos verbas que legalmente lhes pertencem para depois as restituir como que paternalmente, como quem está concedendo uma dádiva, uma doação graciosa ... Enfim, como o poder central é muito cioso do seu império ...
O regime agora fixado, ínvio e sinuoso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, envolve grave perigo para os distritos.

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A Lei das Finanças Locais, como disse, estabelece um cúmulo material em matéria de receitas distritais: as cobradas pelos governos civis e as. provenientes de uma dotação autónoma. No, ano de 1981 as assembleias distritais irão receber apenas a dotação a transferir no OGE.
A dotação a transferir no OGE (na vigência da Lei n.º 1/79, autónoma relativamente às. receitas cobradas pelos governos civis) deveria compensar as assembleias distritais da quebra das receitas que deixaram de arrecadar. Entre essas receitas cessantes avultavam os adicionais aos impostos directos do Estado, que foram extintos. No Algarve quase chegavam aos 8000 contos que a assembleia distrital arrecadava provenientes desses adicionais.
Alguém acredita que o Governo, no ano de 1981 quando as câmaras municipais protestam, alegando terem sido defraudadas em cerca de 1 milhão de contos, no Algarve, por virtude de uma aplicação «cuidada» da Lei das Finanças Locais -, vá dotar a Assembleia Distrital de Faro da verba que ela arrecadaria se se não verificassem os mencionados rendimentos cessantes, acrescida da verba correspondente às receitas do governo civil - desviadas do seu destino legal - em cúmulo material?
O que se sabe, por ora, é que vamos entrar no 2.º semestre do ano e até ao presente apenas está prevista uma dotação para a Assembleia Distrital de Faro, a transferir do OGE em 1981, de 6000 contos. As receitas livres dos cofres privativos do Governo Civil de Faro arrecadadas em 1980 foram de 4 698 956$90. Portanto, compreendendo-se esta receita, ou semelhante em 1981, na dotação mencionada no n.º 2 do artigo 48.º da lei que aprovou o OGE, teremos encontrado este resultado: tão-somente 1300 contos acrescerão ao montante provável arrecadado pelo cofre do Governo Civil. Quer dizer: a dotação com que será contemplada a Assembleia Distrital de Faro, em que se incluirá uma verba em correspondência com as receitas arrecadadas pelo cofre do Governo Civil, ficará longe de atingir o montante dos rendimentos cessantes em 1979.
Como se vê, a situação não é de molde a encarar com segurança, nem com esperança, o futuro. O Ministério da Administração Interna deverá atentar no panorama que se apresenta. Para ele se apela.
É bom não esquecer que só a despesa prevista com o pessoal é de cerca de 370 contos por mês, o que permite alcançar mais de 5000 contos no ano. É com os 800 contos remanescentes que o órgão deliberativo do distrito, que subsistirá enquanto não for instituída a região administrativa do Algarve a que tão veementemente aspiram os Algarvios, poderá acudir às solicitações que lhe são feitas, incentivar o desenvolvimento económico, social e cultural do distrito, promover actividades que visem o desenvolvimento dos sectores produtivos? Não cremos. Não significará esta penúria planificada asfixiar as finanças do distrito? Um distrito que, por natureza, corresponderá à região administrativa instituída, o que anda por demais esquecido, como se não se tratasse de uma previsão constitucional...

Aplausos do PS, do PCP e da UEDS.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política tem a palavra o Sr. Deputado Moura Guedes.

O Sr. Moura Guedes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao chegarmos ao fim da primeira sessão desta legislatura creio ser oportuno esboçar um rápido balanço do que foi, nalguns aspectos, a nossa acção política neste curto período da vida nacional, definindo, simultaneamente, algumas das nossas intenções principais, viradas ao futuro.
O Grupo Parlamentar do PSD apoiou e continuará a apoiar firmemente o governo de Pinto Balsemão, sem hesitações nem reservas mentais, com toda a clareza e frontalidade que são apanágios dos sociais-democratas.
15to não exclui, porém, que acompanhemos a acção governativa com a mais exigente atenção, no desejo legítimo de que a mesma seja cada vez mais eficaz, em termos de resposta às grandes necessidades e aspirações do povo português.

Uma voz do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Se é certo que isto depende sobretudo do Governo e do Primeiro-Ministro, não é menos certo que, nalguma medida, continuará também a depender de nós, parlamentares da maioria, da nossa capacidade de colaboração com o Executivo, dentro e fora do Parlamento, não com certeza em. termos de adesão passiva às orientações deste, mas antes como expressão construtiva do apoio crítico e liberto, que nunca lhe recusámos. Pensamos que o saldo da acção deste governo, no decurso da meia dúzia de meses em que vem sendo poder, é largamente positivo.
Antes de mais, pela imagem de estabilidade e de equilíbrio que soube transmitir ao País - estabilidade das instituições, estabilidade das relações políticas e das relações sociais, comunicando confiança e serenidade aos cidadãos.
Ao contrário do que alguns querem fazer crer, os Portugueses não viram nunca nessa estabilidade, em tudo contrária ao fogo de artifício de uma criação permanente de sensacionalismo políticos, qualquer sinal de fraqueza de liderança ou de falta de imaginação política.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Antes viram sempre nela, e justificadamente, a afirmação inequívoca do amadurecimento da democracia portuguesa, que atinge, finalmente, os umbrais da sua institucionalização em termos europeus e ocidentais. Com isso, estou certo, se congratulam os Portugueses.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Assim, soube o Governo, nas suas relações com os demais órgãos de soberania, respeitar o seu quadro institucional, fazendo-se respeitar a si mesmo, em todas as circunstâncias, sem que para isso tivesse que desencadear absurdas guerrilhas sistemáticas e sem sentido com esses órgãos. Louvamo-lo por esse facto. Daí só adveio proveito final e global para o sistema das instituições constitucionais vigentes, para o Estado democrático e para a própria democracia, como muitos portugueses, de todos os quadrantes, já vão reconhecendo.

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No domínio das relações laborais, deve-se destacar a promoção da contratação e as diligências com vista a um acordo orientado pelos imperativos do progresso económico e da justiça social.

O Sr. Guerreiro Norte (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Como há que salientar ainda a firmeza revelada pelo Executivo face ao maximalista de certas reivindicações extremistas ou corporativistas, provindas quer do sector assalariado, quer do sector empresarial, que representaram outros tantos testes à sua capacidade governativa e que ele soube vencer.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Numa conjuntura internacional francamente desfavorável (basta lembrar que o dólar, com o qual temos de pagar quase todas as nossas importações, subiu 15 % nos primeiros meses deste ano) propôs-se o Governo defrontar-se com o desafio enorme de conter a inflação no corrente ano nos limites de 16 %.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Tudo leva a crer que o Governo irá vencer essa batalha, uma vez que após o saldo de 2,8 %, em Abril último, antecipadamente previsto, já a taxa de inflação baixou para 0,57 % no passado mês de Maio. A vitória está, pois, à vista, segundo tudo leva a crer, o que representará um grande triunfo da política governamental e será com certeza motivo de júbilo para todos os portugueses.

Aplausos do PSD e do PPM.

Não desistirá o Governo tão-pouco da sua luta para acabar com os monopólios do Estado. No comércio dos cereais, como na importação do açúcar, no comércio da importação de oleaginosas, como que em qualquer outro ramo.
Como disse o Primeiro-Ministro em intervenção recente, «isto é mudança e é mudança pela primeira vez».
Trata-se de, pela primeira vez, termos tido a coragem de começar a mexer no problema das rendas de casa, através do regime de rendas condicionadas que já lançámos.
Trata-se de, pela primeira vez, dizer e pôr em prática que a saúde deve ser paga por quem pode pagá-la.
Trata-se de definir uma política industrial a médio prazo, e principiar também a fazê-lo no campo extremamente delicado e difícil da energia.
Trata-se de, pela primeira vez, inverter a tendência estatizante e centralizadora das grandes empresas públicas: da Rodoviária Nacional à EDP, passando pela Portucel, passando muito recentemente pelos CTT, nos quais, através de um projecto de lei que aprovámos, chamado «projecto de lei das comunicações», o Estado recupera a posição que ao longo dos anos tinha sido desviada para uma empresa majestática.
Trata-se, em termos de mudança (continuo a citar), de libertar a sociedade civil. É assim que foi revogada a legislação sobre a intervenção do Estado nas
sociedades privadas, que foi recriado o mercado de capitais, de modo a evitar que os Portugueses se limitem a depositar passivamente as suas poupanças na banca portuguesa ou, pior, na Suíça.
É assim que constitui um grande êxito a emissão de obrigações das grandes empresas nacionalizadas.
É assim que a seguir vamos incentivar a compra de acções, de modo a criar um envolvimento directo de milhares e milhares de aforradores na actividade dessas empresas.
É assim que vamos continuar a distribuir terras no Alentejo, seguindo uma política claramente social-democrata e que tem obtido pleno êxito. É a isso que eu chamo mudança.

Aplausos do PSD.

No domínio das relações externas verificaram-se importantes contactos com os países da Comunidade Económica Europeia, com vista a acelerar o ingresso de Portugal na CEE, e ainda, o que se reveste também da maior importância, francas aproximações com os países de expressão oficial portuguesa. Neste último aspecto basta referir que os ministros de cinco países africanos ...

O Sr. António Vitorino (UEDS): - Cinco!

O Orador: - ... de língua portuguesa estiveram em Portugal, em visita oficial ou particular, nos primeiros meses deste ano e que membros do Governo se deslocaram a Moçambique e a Angola, onde resolveram problemas tão importantes como os de Cabora Bassa e da Sonefe, entre muitos outros. Só como indicador desta aproximação referir-se-á que o comércio com Angola está a duplicar, o que é bem significativo do êxito de uma política de aproximação com as antigas colónias portuguesas, hoje países livres e amigos de Portugal.

Aplausos do PSD e do PPM.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estas são, entre muitas outras que poderiam ser referidas, algumas das razões que levam o Partido Social-Democrata a afirmar ao Dr. Pinto Balsemão e ao seu governo o mais franco apoio. Daqui lhe manifestamos a nossa determinação de lhe darmos, no âmbito da nossa acção, a colaboração crítica, mas construtiva, insatisfeita, mas realista, que o saldo positivo da acção do Governo nos impõe a nós, deputados da maioria.
No âmbito da acção parlamentar, o PSD, pautando-se pelo objectivo da consolidação e reforço da coligação governamental, proeurou dar sempre o seu contributo específico, quer no quadro da Aliança Democrática, quer no quadro mais amplo das forças democráticas em geral. É isso que continuará a fazer.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Desejamos apenas salientar, pela importância da matéria, do ponto de vista das instituições democráticas e da reforma do Estado e da sociedade portuguesa, as medidas tomadas nesta Assembleia, quer da iniciativa dos partidos políticos, quer da iniciativa do Governo, relativas ao poder local, que contribuíram de forma clara e inovadora para a dignificação, prestígio e crescente reforço da autonomia deste.

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Mas cabe ao Parlamento dar um contributo, aliás determinante, para a reforma da sociedade portuguesa, no sentido da sua democratização e modernização, que está longe de ter sido atingida ou mesmo de ter adquirido expressão satisfatória. Urge que o Parlamento se reforme a si mesmo, com a revisão do seu Regimento, no sentido de adquirir maior operatividade legislativa e fiscalizadora, o que terá de passar, sem dúvida, pelo reforço e incentivação da actividade das comissões parlamentares.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Com a reverão da Constituição esperamos que se alcance uma lei fundamental do povo português que não seja um espartilho apertado pela rigidez dogmática das ideologias, mas antes um instrumento eficaz da vida colectiva, um factor de congregação da Nação e, simultaneamente, de libertação das suas energias civis, que todos os portugueses possam sentir como seu.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas para além disso muitas outras matérias e sectores da vida do País esperam a nossa iniciativa: o poder local, a descentralização do Estado, a regionalização, a reforma da Administração Pública, a organização da economia, a adaptação à Europa, a fiscalidade, a protecção do ambiente, a defesa nacional, entre muitas outras. Para elas também se virarão as nossas atenções e o nosso trabalho futuro.
O Grupo Parlamentar do PSD fará todos os seus esforços no sentido de consolidar e reforçar a coligação governamental da Aliança Democrática, no respeito equilibrado dos seus parceiros, pois que ela é um instrumento essencial e estrutural da expressão civil do poder, portanto, da democracia, e representa a inequívoca expressão da vontade política do povo português.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Grupo Parlamentar do PSD esforçar-se-á, sem reticências, para obter um acordo de regime com todas as forças democráticas. Pensamos que esse amplo consenso, que acreditamos ser possível, só virá reforçar a solidez dos alicerces sociais e políticos em que desejamos ver assentar firmemente o Estado democrático.

Será imbuídos deste espírito construtivo que partiremos para a empresa da revisão constitucional, esperando encontrar noutros partidos democráticos a mesma abertura e igual determinação.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: A terminar, uma breve palavra de saudação para o Sr. Presidente da Assembleia da República e para os Srs. Deputados de todos os partidos com assento nesta Câmara.
Para o Sr. Presidente, a expressão da nossa sincera homenagem pela independência e dignidade com que presidiu aos nossos trabalhos ao longo. de mais esta sessão legislativa.

Uma voz do PSD:- Muito bem!

O Orador: - Para todos os Srs. Deputados da maioria e das oposições, a manifestação do nosso respeito por aquilo que VV. Ex.as representam no conjunto pluralista de todas as vossas ideologias e opções partidárias, e que é nada mais nada menos que a própria democracia.
E é a essa democracia que nós, sociais-democratas, prestamos homenagem nesta Assembleia da República, que, para lá de todas as campanhas com que pretendem denegri-la, é e será sempre a sua mais lídima e autêntica expressão e a mais viva e perfeita encarnação da liberdade que merecemos e nós, Portugueses, soubemos reconquistar no 25 de Abril.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Estão inscritos para usar da palavra os Srs. Deputados Carlos Lage, António Vitorino, Carlos Brito e Herberto Goulart. Suponho que haverá consenso da Câmara no sentido de terminarmos este assunto para se encerrar o período de antes da ordem do dia.

Pausa

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS): - O Sr. Deputado Moura Guedes acaba de fazer uma declaração política à qual se pode aplicar, integralmente, a expressão que ele usou relativamente à declaração política do Partido Comunista Português, ou seja uma declaração delirante, divorciada da realidade, e uma ficção, na qual apenas o Sr. Deputado Moura Guedes e os seus pares podem acreditar, relativamente à política governamental, relativamente a acção da AD durante os tempos mais recentes.
Efectivamente, a política que a AD tem seguido, com o apoio da maioria neste Parlamento, não é verdadeiramente uma política nacional, mas uma política de consagração e de defesa dos interesses de grupos e de lobbies que têm apoiado a AD e que têm logrado alcançar os objectivos que tinham ao apoiar a AD nos mais diversos campos e pelas mais diversas formas.

Efectivamente, a política económica da AD é uma política retrógrada, de reconstituição dos grandes grupos económicos, de degradação do poder de compra e do nível de vida da população, como se pode provar pelas últimas decisões e pelos índices estatísticos, que podem ser invocados. A política económica da AD é, assim, contrária aos interesses dos trabalhadores, é contrária ao projecto económico ínsito na nossa Constituição, é uma política que recusamos, é uma política que condenamos e é uma política que, a curto prazo, está votada ao fracasso.
Por outro lado, a política social da AD é uma política às arrecuas, que culmina, como se sabe, na revogação da Lei, do Serviço Nacional de Saúde. É, portanto, uma política contrária aos interesses da população. O seu projecto educativo, é um projecto retrógrado, sem perspectiva, sem rasgo, sem capacidade de inovação e de mudança. A sua tendência centralizante é manifesta, a sua oposição à regionalização é clara. Enfim, o projecto político da AD é

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um projecto condenado, é uma coligação de interesses que começa a ser repudiada na Europa - e o caso da França é para nós um caso sintomático. Por outro lado, pensamos que é necessário prestigiar o Parlamento. É necessário modernizá-lo. Temos feito largos esforços nesse sentido, e eles nem sempre têm sido coroados de êxito, embora tenhamos conseguido algumas coisas positivas. E modernizar o Parlamento e prestigiá-lo, Sr. Deputado Moura Guedes, começa por ser o seguinte: impedir que as competências legislativas do nosso Parlamento sejam, sistematicamente, transferidas para o Governo.
Por isso, o Partido Socialista e a FRS, no seu projecto de revisão constitucional, determinam que há um campo de reserva absoluta de competência do Parlamento que não pode, de modo nenhum, ser alienado e que não pode ser usurpado pelo Executivo. O prestígio do Parlamento passa pelo seu melhor funcionamento interno, pela actuação das suas comissões pelo melhor empenhamento dos Srs. Deputados.

O Sr. Presidente: - O Sr. Carlos Lage fez um protesto?

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, a minha intervenção deve ser entendida por um critério político lúcido, e não apenas por uma perspectiva regimental.

O Sr. Presidente: - Ó Sr. Deputado, tenha paciência, mas tenho que considerar a sua intervenção ao abrigo das disposições regimentais. O Sr. fez um protesto?

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, eu considero que pode ser tomado a título de ...

O Sr. Presidente: - Bom, eu tomo a sua intervenção como um protesto.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Eu penso que pode ser tomada a título de esclarecimento.

O Sr. Presidente: - Não é possível, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, estamos num Parlamento em que há debate político, e isso faz parte do debate político, como é óbvio para qualquer deputado que esteja atento, e penso que o Sr. Presidente deve ser o primeiro a entender que isto é um debate político.

O Sr. Presidente: - Exactamente, mas eu tomo a sua intervenção como um protesto. Porque só utilizando a figura regimental do protesto ou do pedido de esclarecimento é que o Sr. Deputado podia usar da palavra.

O Sr. Amadeu dos Santos (PSD): - 15to não é uma anarquia!

O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, tem a palavra o Sr. Deputado Moura Guedes.

O Sr. Moura Guedes (PSD): - Sr.Deputado Carlos Lage, a minha intervenção foi fundamentalmente substantiva, enquanto a sua foi uma intervenção adjectiva, foi uma intervenção de qualificativos, e é muito difícil responder aos qualificativos.
Não queria entrar em jogos florais, para isso teria que usar o desqualificativo. Recuso-me a entrar nesse jogo e apenas me referirei aos raros pontos concretos que resultam da sua intervenção, que são, se não estou enganado, por exemplo, a revogação da Lei do Serviço Nacional de Saúde, o que considerou contrário aos interesses da população.
Pergunto ao Sr. Deputado Carlos Lage se considera contrário aos interesses da população, num Estado que tem escassas possibilidades financeiras para fazer uma política social séria, que aqueles que podem (note, aqueles que podem, e na medida em que o podem) paguem os custos da saúde para que o dinheiro com que o pagam possa reverter em proveito aos mais desprivilegiados em todo o tipo de benefícios sociais.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Acha que isto é uma política contra a população ou é o contrário de uma política perfeitamente retórica e inaplicável, como aquela que o Partido Socialista preconizou através do seu Serviço Nacional de Saúde?
Quanto a prestigiar o Parlamento, Sr. Deputado Carlos Lage, muito teríamos que falar. Há muitas maneiras de prestigiar ou desprestigiar o Parlamento. Recordo a V. Ex.ª que já tive ocasião de ter que acentuar e pedir a atenção da bancada do Partido Socialista para o facto de dos seus 76 Deputados chegarem a estar apenas 2 num debate parlamentar.

Aplausos do PSD.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - Ó Sr. Deputado Carlos Lage, não posso dar-lhe a palavra.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Moura Guedes fez referência à ausência dos deputados socialistas numa sessão de debate parlamentar, referência que considero desprimorosa.

O Sr. Presidente: - Então, o Sr. Deputado poderá usar da palavra ao abrigo do direito de defesa.

Protestos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Borges de Carvalho (PPM): - 15to é uma balda!

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Considero que a referência do Sr. Deputado Moura Guedes foi de mau gosto e que é um recurso político a que a nível intelectual do Sr. Deputado Moura Guedes não devia recorrer num debate que devia ser político. De fato, pus uma questão ao Sr. Deputado Moura Guedes sobre o prestígio do Parlamento que é essencial se este Parlamento vá ter uma competência reservada absoluta

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em determinadas leis fundamentais ou não. O Sr. Deputado Moura Guedes podia ter respondido concretamente a essa questão, e aí, sim, o debate político colocava-se num nível superior.
O Sr. Deputado Moura Guedes veio dizer, afinal, que o Partido Socialista prima pela falta aos debates parlamentares. Protesto contra esta afirmação. Já tem havido aqui debates parlamentares em que a AD pede um intervalo de quinze minutos ou de vinte porque não dispõe de maioria nesta Câmara. Também já verificámos que a AD utilizou vários artifícios e subterfúgios por estar em minoria, quando as bancadas socialistas e as bancadas da oposição poderiam vencer as suas posições. Penso que desprestigiante é usar de subterfúgios e de expedientes para não ser derrotado numa votação, como então aconteceria inevitavelmente e como se pôde provar em várias circunstâncias que se verificaram na nossa Câmara.

Protestos do PSD.

Há provas relativamente a isso, Srs. Deputados.

O Sr. Borges de Carvalho (PPM): - O que é. desprestigiante é o senhor estar a falar sem ter direito ao uso da palavra. 15so é que é um abuso.

O Sr. Presidente: - Se o Sr. Deputado Moura Guedes quiser responder, dispõe de dois minutos.

O Sr. Moura Guedes (PSD): - Sr. Presidente eu prefiro cumprir o Regimento.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado António Vitorino.

O Sr. António Vitorino (UEDS): - Sr. Deputado Moura Guedes, começaria por lhe agradecer o cumprimento que dirigiu a todos os deputados desta Assembleia e em nome do Grupo Parlamentar da UEDS expressar-lhe a estima que temos por V. Ex.ª, pela sua afabilidade política e pelo seu estilo de líder do Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata, que muito nos cumpre registar.

Aplausos do PSD.

Em segundo lugar, gostaria de dizer que V. Ex.ª fez nesta Câmara um panegírico do Governo e da Aliança Democrática. É a sua função, competia-lhe fazê-lo. Mas o Sr. Deputado colocou-se numa situação semelhante à da bruxa da história da Branca de Neve e dos sete anões, que se vira para o espelho e pergunta: - Espelho, espelho meu, há algum governo mais belo do que o meu?
E o Sr. Deputado espera que o espelho, que é a sua maioria parlamentar, lhe diga: - Claro que não há governo mais belo do que o teu!

Aplausos do PSD.

Mas ó Sr. Deputado Moura Guedes, é a sua própria maioria parlamentar, é o seu próprio espelho que lhe diz: - Não, não! Há governo melhor do que esse teu! É a própria maioria parlamentar que desencadeia campanhas políticas de contestação a este Governo, ao Sr. Primeiro-Ministro. É da sua própria maioria parlamentar que saem críticas duras e que pedem a cabeça do Primeiro-Ministro e a substituição do Governo.
Ó Sr. Deputado Moura Guedes, não haveria que ser mais comedido na intervenção que fez? Não haveria que ser mais realista ao dizer que, por exemplo, a Aliança Democrática não tem projecto cultural, que a esta maioria parlamentar falta o élan vital fundamental que assegure os benefícios de termos uma maioria parlamentar?
Não haveria que ser mais realista em reconhecer que no «Reino da Dinamarca», no «Reino da Aliança Democrática» nem tudo vai pelo melhor, e que o País terá de pagar, gravemente, os perigos para que esta maioria e este Governo estão a conduzir todo o povo português? Sr. Deputado Moura Guedes, pelo respeito que V. Ex.ª me merece (compreendo que esteja condicionado na sua intervenção parlamentar), cumpria-lhe fazer um balanço optimista para o futuro. O futuro, Sr. Deputado Moura Guedes, pertence ao conjunto do povo português, mas os senhores serão responsabilizados pelo que de errado têm feito nestes meses e nem sequer têm a coragem de o assumir, para ao menos procurarem, democraticamente, corrigi-lo.

Aplausos da UEDS, do PS e do MDP/CDE.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): - Não é com as patacoadas do Sr. Carlos Lage, é assim que se dignifica esta Assembleia!

O Sr. Presidente: - Para responder tem a palavra o Sr. Deputado Moura Guedes.

O Sr. Moura Guedes (PSD): - Sr. Deputado António Vitorino, agradeço-lhe muito sinceramente a amabilidade das suas palavras, que sei serem sinceras. E só para não fazer aqui uma troca da galhardetes não acrescentarei, neste momento, outras que produziriam também a muita consideração que tenho por si e pelo seu grupo parlamentar. Mas dir-lhe-ei, Sr. Deputado António Vitorino, que um dos encantos da democracia é justamente cada um de nós ter o seu espelho e não termos um único espelho em que vejamos as coisas todas da mesma maneira, como acontecia, infelizmente, antes do 25 de Abril.

Aplausos do PSD e do PPM.

E se no meu espelho, como V. Ex.ª diz e eu admito, vejo, porventura, as coisas excessivamente cor-de-rosa, o espelho de V. Ex.ª faz com que as veja demasiado negras. Mas isto será sempre assim enquanto houver democracia em Portugal e Deus queira que assim continue a ser.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Carlos Brito deseja usar da palavra para pedir esclarecimentos ou para fazer um protesto?

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O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, é com certeza para formular pedidos de esclarecimento.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Anacoreta Correia (CDS): - Agora é a história do lobo mau.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - O Sr. Deputado Moura Guedes não disse nada que mereça protesto da nossa parte.
Enquanto ouvia o Sr. Deputado Moura Guedes, a certa altura dei-me conta de que a incredibilidade não era da minha parte, era das bancadas da AD. Servindo-me da história do Sr. Deputado António Vitorino, digo-lhe que enquanto o Sr. Deputado falava o espelho daquele lado estava um bocado baço (o deputado apontou para a bancada do CDS).

Risos.

Bem, o Sr. Deputado fez o panegírico do Governo. Pela minha própria declaração política já se vê aquilo que nós pensamos desse panegírico e, portanto, não vou tomar tempo à Câmara. Apenas farei algumas perguntas muito concretas.
O Sr. Deputado falou da EPAC, deu a EPAC como um símbolo de mudança. Ora o que pensamos acerca da reprivatização da EPAC (o Sr. Deputado dirá se estamos enganados) é que se trata, ao fim e ao cabo, de passar a EPAC para as mãos dos grandes moageiros.
15to é negócio de muitos milhões. São muitos milhões de contos que entravam nos cofres públicos que passam a entrar nos cofres dos senhores moageiros. Então é isto a mudança social-democrata que o Sr. Deputado Moura Guedes apregoou há pouco?
Outra pergunta. Em relação à distribuição de terras na Zona da Reforma Agrária, o Sr. Deputado diz que vão continuar com os critérios que têm sido seguidos. O Sr. Deputado sabe quantas terras é que foram entregues aos grandes senhores da terra, aos latifundiários, e quantos é que foram entregues aos pequenos agricultores? É capaz de nos dizer os números?
Por último, o Sr. Deputado diz que tudo vai pelo melhor dos mundos possíveis, que tudo vai bem, que a inflação está nos 16 %, etc.
O Sr. Deputado pode dar-nos, já que o Governo não o faz, alguns números acerca do défice da balança de transacções correntes? Qual o previsível até final do ano?

O Sr. Presidente: - Para responder tem a palavra o Sr. Deputado Moura Guedes.

O Sr. Moura Guedes (PSD): - Sr. Deputado Carlos Brito, quanto à EPAC, penso que se trata muito concretamente daquilo que eu disse na minha intervenção: trata-se de arrancar a EPAC ao monopólio do Estado. E a nossa política - e nisso se distingue da do PCP, como em muitos outros aspectos -, não é apenas antimonopolista quando se trata de monopólios privados. A nossa política é sempre antimonolista, trata-se de monopólios privados ou de monopólios de Estado. Somos coerentes com os princípios que afirmamos no nosso programa.
Quanto à entrega de terras no Alentejo, Sr. Deputado Carlos Brito, o que sei e o que referi foi a entrega de muitas terras naquela região. Os pedidos de terras, ultimamente, chovem e hoje há uma enorme bicha de espera de pequenos rendeiros e seareiros que querem ter o direito de amanhar a própria terra e possuírem esse sentido fortíssimo (que é um grande motor da vida humana) de saber que trabalham para si próprios.
E era a isto que eu me referia, foi esta política que eu aplaudi e continuarei a aplaudir e a procurar incentivar.
Quanto ao facto de o Partido Comunista discordar do panegírico que fiz do Governo, pois, Sr. Deputado Carlos Brito, muito mau seria para mim e para a minha bancada se eu concordasse consigo. Seria sinal que tínhamos a mesma política, o que para nós seria sinal de que tínhamos uma política profundamente errada, desumana e injusta.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento tem a palavra o Sr. Deputado Herberto Goulart.

O Sr. Herberto Goulart (MDP/CDE): - Sr. Deputado Moura Guedes, V. Ex.ª fez uma intervenção de elogio entusiástico ao Governo presidido pelo presidente do seu partido. Naturalmente que registámos a expressão de todo o grupo parlamentar que aplaudiu de pé a intervenção de V. Ex.ª, na qual manifestou exuberantemente o apoio ao Governo de Pinto Balsemão. Mas enquanto ouvíamos a intervenção, interrogávamo-nos se V. Ex.ª estava a referir-se ao país em que vivemos ou se estaria a referir-se a um outro qualquer país imaginário, a um país que, apesar de estarmos aqui em Lisboa, por completo desconhecêssemos.
Em relação a toda a política económica, o Sr. Deputado apontou as benesses que o Governo está a conceder, apontou os sucessos que está a alcançar e citou um único dado, o da redução da inflação, esse, sim, o único objectivo que o Governo ainda mantém no Plano de 1981 em relação às grandes opções de médio prazo. Mas citou essa situação em termos que me parecem não ser correctos. V. Ex.ª citou-a como se o objectivo de manter a inflação nos 16 % estivesse facilmente ao alcance deste governo, e disse que a inflação no final de Maio se situava na ordem dos 15 %. Simplesmente V. Ex.ª não esclareceu que isso era com referência à média dos últimos doze meses. O Sr. Deputado não esclareceu que encontrar uma taxa de inflação de 15 % no final de Maio significa introduzir no cálculo toda a política artificial de contenção de preços que culminou no mês de Novembro do ano passado. Porque se V. Ex.ª comparasse o ritmo de crescimento da taxa de inflação não num período de doze meses mas olhasse apenas para os primeiros cinco meses deste ano, isto é, depois de ultrapassadas as campanhas eleitorais em que a AD estava interessada, verificaria que a projecção anual de tal taxa é superior a 24 %. V. Ex.ª falou com entusiasmo no apoio à política económica do Governo, mas eu gostaria que V. Ex.ª me explicasse como é que por todo o País, como um dado novo na situação social, agricultores do Centro, do Norte e até de Rio

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Maior manifestam, exuberantemente, o seu descontentamento quanto à política de preços dos produtos agrícolas.
E por último, Sr. Deputado Moura Guedes, só uma questão: V. Ex.ª teve o cuidado de se refugiar e não fazer nenhuma apreciação da política externa prosseguida pelo Governo AD. Falou apenas no sucesso ou na intensificação das relações com os países de expressão oficial portuguesa. Naturalmente que muito disso cabe ao empenhamento permanente, à correcção e à compreensão desses países pelo que se passa em Portugal e ao seu real interesse de cooperar com o povo português, com Portugal.
Pergunto apenas, Sr. Deputado Moura Guedes, se V. Ex.ª não acha estranho que perante o interesse de cooperar com Angola e Moçambique, nomeadamente, não sejam por parte do Governo e do Ministério dos Negócios Estrangeiros condenados os actos de agressão que a República da África do Sul tem cometido nas zonas fronteiriças destes dois países.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Moura Guedes, se assim o desejar.

O Sr. Moura Guedes (PSD): - Sr. Deputado Heberto Goulart, evidentemente que não irei responder a todas as questões que me colocou, até por falta de tempo e porque algumas das matérias que abordou não se contêm na minha intervenção. Desculpar-me-á, mas não me preparei e por isso não responderei. Responderei, sim, àquilo que se refere à minha intervenção.
Não sou economista, mas quanto à inflação, ainda há dias ouvi um ilustre e perfeitamente insuspeito economista - e perdoar-me-á se não lhe disser agora o nome, mas, se quiser, dir-lho-ei daqui a um bocado -, reconhecer (e o mesmo teria até interesse em demonstrar o contrário) que, de acordo com a sua previsão, a taxa de inflação no corrente ano se iria situar muito perto do limiar dos 16 %.

O Sr. César de Oliveira (UEDS): - Dos 18 %!

O Orador: - Foi isto o que ouvi. Oiço agora o Sr. Deputado dizer que não. Fico entre estas duas afirmações.
Quanto ao facto de a inflação conter uma política artificial ou não de contenção de preços, digo-lhe que não sei. O que referi na minha intervenção foi que a taxa de inflação para o corrente ano seria, de acordo com toda a previsão normal, à roda dos 16 %, cumprindo-se assim o objectivo do Governo, pois era isso que o Governo afirmou pretender.
Quanto às manifestações de desacordo com a política do Governo por parte dos agricultores em Rio Maior e noutras localidades, digo-lhe que as manifestações de que tenho conhecimento não são contra a política global do Governo ou sequer contra a política de preços do Governo, mas são manifestações perfeitamente pontuais, como, por exemplo, aconteceu num determinado momento em relação aos preços dos frangos e dos ovos, mas que tiveram resposta política imediata dos sectores respectivos do governo de Francisco Balsemão.
Finalmente, como consideração mais genérica, o Sr. Deputado Herberto Goulart acusa-me de fazer o elogio entusiástico do Governo e do Primeiro-Ministro. Penso que na resposta aos pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado António Vitorino, quando falei da teoria dos espelhos, já esclareci essa questão. Evidentemente que a sua perspectiva é diferente e - reafirmo - ainda bem que é diferente. Congratulo-me por haver uma oposição que fiscaliza, que critica, que tem opiniões diferentes das nossas e que tem outros projectos. 15so é sinal de democracia. Mal de nós se tal desaparecesse, porque então estaríamos no regime de partido único.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminou o período de antes da ordem do dia.
Retomamos os trabalhos às 15 horas e 30 minutos, iniciando-se então o período da ordem do dia.
Está suspensa a sessão.

Eram 13 horas e 20 minutos.

Após a suspensão da sessão assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Martins Canaverde.

O Sr. Presidente: -Está reaberta a sessão.

Eram 15 horas e 55 minutos:

Entretanto, havia tomado lugar na bancada do Governo o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais (Carlos Macedo).

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, entramos agora no período da ordem do dia.
Continua em debate a proposta de lei n.º 48/II, que concede ao Governo autorização para revogar a Lei n.º 56/79, de 15 de Setembro (Serviço Nacional de Saúde).
Tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais.

O Sr. Ministro dos Assuntos Sociais:- Sr. Presidente, Srs. Deputados, é apenas para responder de uma forma muito sucinta à intervenção do Partido Comunista feita ontem, no fim do debate, pela Sr.ª Deputada Zita Seabra.
Quando a Sr.ª Deputada refere o artigo 12.º da nova lei da saúde - dizendo que se espanta com os limites da liberdade de escolha do médico pelo doente, limites técnicos, financeiros e humanos - apenas lhe direi que essa liberdade é exactamente igual à que na Lei n.º 56/79 é consagrada. Lei essa que o seu partido aprovou e por isso não compreendo as suas questões sobre esta matéria.
No restante da sua intervenção, em determinado número de questões que são postas, nomeadamente em relação ao artigo 17.º, quanto aos grupos sociais vulneráveis - que estão completamente protegidos pela inteira gratuitidade - e outras questões que levantou, de facto nada têm a ver com a realidade do diploma. Nada têm a ver com este tipo de discussão. E quando a questão é colocada como a Sr.ª Deputada o fez - e refiro-lhe apenas que no artigo 8.º da Lei n.º 56/79, que remete para o artigo 6.º, se refere todo o problema que acabei de focar, da liberdade de escolha do médico pelo doente - ou a senhora não está a interpretar bem a lei

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ou está a seguir determinados esquemas pré-figurados que nada têm a ver com esta discussão.

O Sr. Silva Graça (PCP): - Falou e não disse nada!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra.

A Sr.ª- Zita Seabra (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. .Ministro dos Assuntos Sociais: Na verdade tinha uma certa esperança de que o Sr. Ministro - dado que teve uma noite inteira para pensar e preparar-se para vir aqui esclarecer-nos sobre o conteúdo do decreto-lei que apresenta para nossa apreciação - nos desse alguma achega, algum esclarecimento que permitisse que nós, deputados da oposição (e até os deputados da maioria), pudéssemos julgar melhor o diploma sobre que somos chamados a pronunciar-nos.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Mas não, o Sr. Ministro diz-me que o artigo 12.º do decreto-lei, que dispõe sob liberdade de escolha do médico, é afinal exactamente igual a um da lei do Serviço Nacional de Saúde que a Assembleia da República aprovou.
Sr. Ministro, foi isso mesmo que eu considerei uma grande hipocrisia! Pois se esse era o ponto-chave de ataque por parte da AD à Lei do Serviço Nacional de Saúde, se esse era o ponto fundamental com que o PSD e o CDS, nesta Assembleia e lá fora, atacaram a Lei do Serviço Nacional de Saúde.

O Sr. António Arnaut (PS): - Muito bem!

A Oradora: - ..., é, Sr. Ministro, uma grande hipocrisia vir propor um articulado exactamente igual aquele.

Vozes do PCP e do Sr. Deputado António Arnaut (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Das duas uma: ou quando estavam a atacar a Lei do Serviço Nacional de Saúde não consideravam a liberdade de escolha do médico como ponto fundamental - e então era pura e simplesmente um pretexto para atacar a Lei do Serviço Nacional de Saúde - ou, afinal, a AD mudou de opinião e já considera que não é importante alterar a lei neste momento em vigor e que a liberdade de escolha do médico não é uma coisa assim tão importante como se dizia.
Sr. Ministro e Srs. Deputados: Depois de ter ouvido intervenções sucessivas dos mais variados deputados da AD, acho extremamente curioso que agora, ao fim de um ano ou ano e meio de este ter sido o ponto-chave de ataque à Lei do Serviço Nacional de Saúde, se venha apresentar uma lei cujo conteúdo é exactamente igual ao da lei que pretendiam ver revogada. 15to só mostra, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que o que a AD quer, em relação ao Serviço Nacional de Saúde, não é alterar a lei que está em vigor num sentido positivo e progressista mas, sim alterar outras coisas, como demonstrei na minha intervenção.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais.

O Sr. Ministro dos Assuntos Sociais: - Sr.ª Deputada Zita Seabra, não estou de facto a perceber onde é que a Sr.ª Deputada quer levar a discussão quando a centraliza no artigo 12.º de um projecto de decreto-lei que neste momento não está em discussão porque o que estamos a discutir é uma autorização legislativa e não um projecto de decreto-lei. 15so será discutido noutra altura e foi por uma questão de consideração para com esta Câmara que o Governo entendeu apresentar o seu projecto de decreto-lei sobre o Serviço Nacional de Saúde.
A Sr.ª Deputada centraliza o artigo 12.º como coluna vertebral do projecto de decreto-lei sobre o Serviço Nacional de Saúde. Esse artigo refere-se à liberdade de escolha do médico pelo doente. Toda a gente sabe que essa liberdade de escolha - e não se chame aqui a AD nem outras posições, porque a única posição correcta que existe é que de facto há condicionalismos de ordem técnica, humana e financeira, só a demagogia é que poderá considerar que essa liberdade deve ser plena -, deve existir dentro dos condicionalismos que acabei de enunciar.
A Sr.ª Deputada ontem se calhar já não se recorda - na sua intervenção, espantava-se que nós fôssemos condicionar a liberdade de escolha do médico e por isso lhe chamei a atenção para o facto de essa liberdade de escolha obedecer a normas perfeitamente concretas e objectivas e daí ser a Lei n.º 56/79, nesse aspecto, exactamente igual. Só que a nossa discordância em relação à Lei n.º 56/79 não passa por este artigo, passa sim, por toda uma impregnação ideológica, passa, sim, por apontar para um modelo socializante da medicina, passa, sim, por aspectos dogmáticos, por aspectos regulamentares, que dizem respeito única e exclusivamente ao Executivo e que não têm de estar numa lei de bases. Se a Sr.ª Deputada não entende a diferença entre um projecto de lei de bases e determinados aspectos que nada têm a ver com esse projecto, a confusão é sua e não atire isso para cima do Governo.

Aplausos do PSD, do PPM e do CDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro, realmente é um espanto!
Eu que ouvi a AD, e particularmente o PSD e o CDS, durante anos, nesta Assembleia da República, considerar que o ponto fundamental do seu ataque à Lei do Serviço Nacional de Saúde era o artigo que impedia e colocava limitações à liberdade de escolha do médico, estranho que o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais venha agora dizer que não, que esse não é o ponto fundamental. Remeto-o para todos os discursos que foram feitos pelos Srs. Deputados da AD, alguns dos quais estão aqui presentes, e desafio o Sr. Ministro a demonstrar-me que esse não era um dos pontos fundamentais do ataque por parte da AD e particularmente do CDS, mas também do PSD -, à Lei do Serviço Nacional de Saúde aprovada por esta Assembleia. Leia os discursos, leia as intervenções produzidas quando do debate

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sobre a Lei do Serviço Nacional de Saúde. E mais: leia todas as afirmações e intervenções feitas por deputados da AD após a aprovação da Lei do Serviço Nacional de Saúde e verifique, Sr. Ministro, se não é esse um dos pontos fundamentais.
Mas, para nós, o que está em causa neste debate não é esse ponto. Com esse ponto só quisemos mostrar a incoerência da AD. Para nós o fundamental - e foi isso que eu disse na minha intervenção - é que este pedido de autorização legislativa tem dois objectivos chave: revogara Lei do Serviço Nacional de Saúde e criar um seguro de saúde com um regime claramente inconstitucional e lesivo dos interesses do povo e do País. É este o ponto fundamental. Demonstrei na minha intervenção que o resto são rendilhados de tal maneira mal feitos e feitos tão em cima do joelho que até contradizem a própria filosofia que andaram a pregar durante dois anos. Mas a hipocrisia da direita é sempre assim!

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Arnaut.

O Sr. António Arnaut (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Secretários da Mesa, caros colegas e Sr. Ministro dos Assuntos Sociais: A posição do Partido Socialista nesta matéria é clara, conhecida, inequívoca e peremptória.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Desnecessário por isso se tornaria que mais uma vez esta bancada informasse a Assembleia e o País dos seus principais pontos de vista sobre o Serviço Nacional de Saúde. Em todo o caso não quer o Partido Socialista deixar de marcar mais uma vez a sua posição e dirigir especialmente ao Sr. Ministro dos Assuntos Sociais algumas considerações, convictos de que, apesar de tudo, o Sr. Ministro possa ainda reflectir no terrível erro que vai cometer ...

Vozes do PS. - Muito bem!

O Orador: - ... revogando uma lei democrática. Uma lei que corresponde aos profundos sentimentos do povo português, que foi discutida publicamente - o primeiro e o grande debate público sobre um grande problema nacional - e foi apoiada entusiasticamente por todos os trabalhadores da saúde, designadamente pelos enfermeiros, sector progressista da Ordem dos Médicos, pessoal administrativo e técnico e, inclusive, Sr. Ministro, pelos próprios militantes do seu partido. É uma lei que tem por isso a marca do 25 de Abril, a marca do humanismo que a Revolução trouxe a este país e naturalmente que está impregnada desse sentido humanista e não ideológico e que respeita os valores essenciais da nossa Constituição. Mas este processo que hoje aqui culmina, naturalmente com a votação da maioria revogando a Lei. n.º 56/79, é, afinal de contas, o termo de um processo escandaloso, irregular e tortuoso - que é no fundo a subversão dos valores essenciais da nossa Constituição e um atentado aos sentimentos profundos do nosso povo que, em matéria de saúde, não precisa que lhe dêem lições -...

O Sr. Carlos Lage (PS): - Muito bem!

O Orador: - ..., começado no II Governo Constitucional, quando o CDS abriu a crise que deu lugar à queda desse mesmo Governo, justamente, porque o Partido Socialista não cedeu neste ponto, como não podia ceder porque era um ponto de honra, porque constava do Programa do Governo, aprovado em Conselho de Ministros e nesta Assembleia da República com os votos do PS e do CDS. E a crise abriu-
se justamente - e não foi por acaso que isso aconteceu na véspera de ser aprovado, finalmente, o diploma em Conselho de Ministros, isto é, em 12
de Julho de 1978.
O CDS e os interesses capitalistas que representa nunca se conformaram (nem se virão a conformar) com uma lei progressista. Aliás, as forças da direita nunca se conformarão com as leis que tendam à igualdade e à justiça social, porque essa é a lógica da direita.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por isso, quero dizer com toda a sinceridade que aceito e até compreendo, embora com alguma indignação, que este governo, liderado de facto pelo CDS, venha revogar a Lei do Serviço Nacional de Saúde.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O problema é que a direita governa à sua maneira, segundo a sua lógica - e não é contra isso que me indigno, porque como democrata respeito o resultado das eleições, a AD tem o mandato legítimo para governar, mas esse mandato tem limitações que são as que decorrem do próprio interesse nacional, que decorrem das leis vigentes e da Constituição -, mas quando a esquerda assumir o governo, então a esquerda tem de governar à maneira da esquerda, a, esquerda tem de governar segundo os interesses profundos do povo português, sem cedências à direita.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A minha indignação, portanto, é perfeitamente natural porque a direita governa segundo os seus princípios, segundo a sua lógica e naturalmente que as forças de direita não estão interessadas nas grandes reformas que interessam, nas grandes reformas que há séculos o povo português aguarda.

Vozes do PS e do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Mas o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais, que é (e até faz questão de se reclamar) um social-democrata, talvez não devesse dizer coisas como as que hoje aqui disse. Disse, por exemplo, que uma das razões da sua oposição a esta lei é ela ser socializante. De facto ela é socializante porque ser socializante é preocupar-se com a justiça social, com a

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igualdade dos cidadãos, é querer precaver numa situação tão desgraçada como é a doença - não há ninguém mais fraco do que o doente - um
nistro vem aqui arjhjrogar-se o direito de fazer esta
lei - e certamente qujkjkje o tem, mas não pelos argu
mentos que invoca. O argumjkjkento essencial que invoca
é a urgência em fazer esta lei porque essa urgência
não se compadece - diz-se no preãmbulo - com a
interrupção da actual,éssão legislativa. Mas o Sr. Mi
nistro reclama o prato de noventa dias para elaborar
a 1e1, o Sr. Ministro diz expressamente que a lei
entrará em vigor em 1982 Uo çao Bine qua non
eRecução nem se4uer Qstabelece um prazo
da SVa lamentaçºètdizer:, não há afinal
paca essa tegº
nnal4uer urgência.

experimentada, uma lei que certamente terá alguns defeitos e por isso no próprio programa de governo da Frente Republicana e, ainda assikhm o prazo de vigência começou há maisk de um ano. Este Governjhko uma lei que esthjá em vigor. Agora vai revogá-la sem seqkujer a V009 ao - Mu`- ut\ Si Ministro,
~^_aor. _ Se bºüé pD este Governo, há

iá um

ano e meio 9 que- a pD pº!r aqui apre-

portanto ano e me ébde á dia uae forma um

cri e aº meu ponto cri-

tan vários upac ºtes`t ba`hº desta a
ticáven㺠dignifica devia trazer á dmesn ei tão
q º Govecn como o Sr. Ministema fueceu,

que obre u oblema que terl do
porque u um p aº ºsso povo. \om

povo potwte to à `nàa n ! .

o Ftópt'º ..ro• --Mesto bem v

d p'S e do r ar.

O prados -- Dizem-eme aqui, ilustres colegas, que

eu descanse. Está agora luz amarela, tenho a impressão que disponho de 15 minutos. Trata-se de um debate na generalidade, não prescindo desses 15 minutos, Sr. Presidente.

Vozes do PSD: - Descanse, descanse!

p ,pesa,; -Dizem-me aqui -e enquanto a Mesa
h
conferencia eu aproveito este tempo que não conta -
para descansar. Devo dizer que agradeço muito sen
sibilizado as preocupações dos meus ilustres colegas
pelo meu estado físico. Precisarei de descansar fisica
mente, mas os meus caros amigos podem estar des
cançados, podem estar tranquilos, o Partido Socialista
não descansa nesta matéria e na luta pelo socialismo,
pela liberdade e pela justiça social.
Aplausos do PS, da ASDI e da UEDS.

V o o

anto, se nẠées a piºt Creio que disponho ainda, Sr. Presidente, de 5 mi-
O ~ºr•
-Pº' traz aqu Ministtov nutos.
gr. Ministro. que º Sr. dos sect
ament Vimas ptessóes a5 pol" , O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, como sabe está

qa Cert a AD9 aa4uelas fºrç iona
seguiu resistir a n,iço Nac previsto que as intervenções sejam de 10 a 15 minutos.

reaccionários a contra o

eram e contra º 25 d'e não prescinde dos 15 minutos, terá mais 5.
sempre estiveram $r. Mvnistto tem .

de, contra a
fiq
ue o
certamente pº

pagai ..

O St. Cgr, de Olá

... que traz n lei quE

OdCa1l que tevo8a aros posta

Orador.. Muito obrigado, - Sr. Presidente, e igua

Multo amento eputados!á I cedo naturalmente a todos os

eira. N. `estàl o tempo já é pouco. Vou agora debruçar-me

-

,hjte i»onienO èlguns r Direi que
seqnlde lei vaga abs-
k
ue aliás permite todas as inflexões e todos

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colossal as afirmações do Sr. Deputado Arnaut, evidentemente que não se trata senão de uma afirmação minha e ele poderá estar convencido exactamente do contrário, isto é, de que em vez de exprimir a colossal ignorância a que me refiro, exprime antes a colossal sabedoria. Retiro-me, por isso, rapidamente das afirmações teóricas e faço uma referência aos factos. Convido o Sr. Deputado António Arnaut a fazer uma referência que seja à nacionalização da medicina no programa do Partido Socialista Francês.
O Sr. Deputado não a encontrará!

Vozes do PS: - Ah! ...

O Orador: - Eu tenho aqui um resumo...

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - E o resto?!

O Orador: - ... de uma publicação que me parece idónea que diz: « pas question de nationalizer ni la médecine ni la pharmacie».
É o meu depoimento. Se as afirmações do Sr. Deputado António Arnaut são verdadeiras, terá de chegar à conclusão de que nós, Grupo Parlamentar do PSD, abandonámos a social-democracia ou o socialismo, mas o próprio Partido Socialista Francês também o abandonou. No caso de não ter acontecido isso com o Partido Socialista Francês, o Sr. Deputado António Arnaut terá de explicar melhor, talvez com menos ênfase e emoção, mas com mais rigor.
Finalmente, Sr. Deputado António Arnaut, o senhor disse aqui, e a população portuguesa sabia-o, que o vosso Serviço Nacional de Saúde era uma questão de honra. Simplesmente, o povo português votou duas vezes depois de saber isso ...

Vozes do PCP: - Três!

O Sr. Amadeu dos Santos (PSD): - O Eanes nunca falou nisso!

O Orador: - ... e não vos deu a maioria!
Se V. Ex.ª se quiser manter no campo da democracia, não deve pôr isto em questão.

Aplausos do PSD, do PPM e do CDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Arnaut.

O Sr. António Arnaut (PS): - O Sr. Deputado Silva Marques falou com uma colossal presunção de que é um senhor que sabe destas coisas todas. Eu, confesso a humildade, estou de facto a aprender, e cada dia aprendo mais. O Sr. Deputado Silva Marques certamente não conhece o programa do Partido Socialista Francês, mas, se o conhecesse, veria que eles defendem um modelo de Serviço Nacional de Saúde igual ao nosso, e até, devo dizer-lhe, a tipologia de centros comunitários de saúde que nós introduzimos na nossa Lei n.º 56/79 está no Programa do Partido Socialista Francês.

O Sr. Silva Marques (PSD): - 15so é exacto!

O Orador: - Eu estranho que o Sr. Deputado Silva Marques - um ilustre ornamento da bancada do PSD, ...

Risos do PCP.

... aliás com responsabilidades especiais, porque é vice-presidente do grupo parlamentar de um partido que se reclama social-democrata, mas que quer entrar na Internacional Liberal e já tem assistido, como observador, às reuniões da Inernacional Liberal -...

O Sr. Silva Marques (PSD): - Não fuja à questão!

O Orador: - ... venha aqui invocar exemplos do Partido Socialista Francês.

O Sr. Silva Marques: - Não fuja à questão que lhe pus.

O Orador: - O Sr. Deputado, à questão que me pôs, de me convidar a fazer referências ao Programa do Partido Socialista Francês, já lhe respondi.
Vou completar o meu protesto dizendo-lhe que não me azedam absolutamente nada as vossas intervenções, porventura feitas mais para que constem do registo do que por sinceridade. Tenho consciência disso e continuo a acreditar que há no Partido Social-Democrata verdadeiros sociais-democratas.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado António Arnaut: Este pedido de autorização legislativa é acompanhado por uma proposta de decreto-lei, e eu já ontem, na minha intervenção, tive oportunidade de me pronunciar sobre o seu conteúdo. Mas há dois esclarecimentos que queria pedir-lhe sobre algumas posições que estão em flagrante contradição com a posição assumida pelo PSD aquando do debate da lei do Serviço Nacional de Saúde, também conhecida por lei Arnaut.
Na declaração de voto do PSD, nessa altura, dizia o Sr. Deputado Brito Lhamas o seguinte:
Assim, não podemos aceitar a limitação da liberdade de escolha do médico, quando essa restrição é imposta por princípios fixos.

Dizia isto na votação na generalidade. Na votação final global, e em declaração de voto, dizia o Sr. Deputado Theodoro da Silva:
O principio da gratuitidade, tão veemente glosado, não fica minimamente consagrado no projecto Arnaut; são admitidas taxas moderadoras no sentido de impedir fluxos exagerados e desnecessários ao serviço de saúde, e para terem significado terão de ser de certo modo gravosos, pois, de outro modo, carecerão de eficácia. Assim sendo, fica prejudicada a afirmação de cuidados gratuitos, o que será contraditório com o artigo 64.º da Constituição.

Acha, Sr. Deputado Arnaut, que o CDS e , o PSD vão votar a favor da autorização legislativa apresentada pelo Sr. Ministro dos Assuntos Sociais?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Ele é que vai dizer o que nós vamos fazer?!

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O Sr: Jerónimo de Sousa (PPC): - O Narana não percebeu!

O Sr . Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Jaime Ramos.

O Sr. Jaime Ramos (PSD): - Em primeiro lugar, pergunto ao Sr. Deputado, António. Arnaut por que é que considera o pedido de autorização legislativa, do Governo um processo tortuoso e inconstitucional.
Chamo-lhe a atenção para o facto de o Sr. Deputado ter confundido - tal como fez ao longo, do seu projecto de lei - as noções de socializar e de estatizar. Socializar é pôr os organismos públicos ao serviço do bem comum, ao serviço da sociedade. Mas o Sr. Deputado reduziu-se sempre à fórmula simples de tudo estatizar, isto é, de considerar que só haveria um serviço de saúde socializante quando todos os seus agentes e todos os seus trabalhadores tivessem um estatuto funcionalizante e todos os organismos fossem estatizados. Mostrou isso mesmo agora quando contestou a parte do projecto de decreto-lei do Governo que se refere a organismos particulares que podem ter uma vida própria e estar ao serviço da sociedade de uma forma coordenada com o sector do Estado.
Depois, o Sr. Deputado referiu que nós, ao defendermos a revogação, da Lei n.º 56/79, estávamos, numa lógica de direita. Ora digo-lhe que isso não é assim, porque desde o princípio mostrámos a nossa clara oposição à Lei n.º 56/79. Recordo-lhe que a sua lei, ...

O Sr. Silva Graça (PCP): - Lei da República!

O Orador: ... não da República - desculpe chamar-lhe «a sua lei», mas foi assim que ficou conhecida - foi desde o princípio apoiada apenas pelo, Partido Socialista, principalmente pela ala marxista do Partido, pelos comunistas e pela UDP.
Na altura, todos os outros partidos - que hoje formam uma larga maioria - e os deputados sociais-democratas independentes votaram contra o seu projecto de lei, votaram claramente contra a estatização que o Sr. Deputado defendia. Hoje, alguns deles estão representados na FRS, mas penso que mantêm a mesma opinião, e isso demonstra que esta lei representava, claramente, um processo próximo do Partido Comunista. O Sr. Deputado, com convicção e com voluntariedade - acredito -, fez uma obra digna e ao serviço do Partido Comunista, obra essa de que eles têm bastante orgulho e que, por isso mesmo, têm procurado defender.
É por isso que se nota em França que o Partido Socialista, enquanto esteve sòzinho, nunca defendeu a socialização da medicina, mas talvez agora, com ministros comunistas, venha a fazê-lo. Contudo, em Portugal não, eram precisos ministros comunistas com o governo socialista, porque naquela altura o Sr. Dr. António Arnaut, defendeu bem as, posições, do Partido Comunista.

Aplausos do PSD

Defendeu depois, numa posição extremamente errada, a discussão pública da lei, a necessidade absoluta de ela ser discutida, dizendo que, se ela fosse discutida publicamente, seria apoiada pelo povo português.
Não temos medo de que haja discussões públicas sobre problemas importantes nem sobre processos legislativos importantes. Por isso, tivemos sempre a coragem de defender a existência de referendos, coisa que o Sr. Deputado nunca teve a coragem de fazer, pois o que V. Ex.ª quer são processos de discussão pública em assembleias minoritárias controladas por minorias activistas.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

É dessas que o Sr. Deputado quer e aceita como forma de opinião pública, e nunca como forma de referendo, que seria o processo mais correcto. Assim, por esse processo, só está a pôr em causa a democracia representativa, no fundo a Assembleia da República, e mais uma vez a defender ideias que poderão ser de um partido leninista, mas nunca de um partido socialista democrático.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Também para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais.

O Sr. Ministro dos Assuntos Sociais (Carlos Macedo): - Sr. Deputado António Arnaut, a primeira questão que lhe vou colocar é a de saber se, de facto, V. Ex.ª está recordado do projecto de decreto-lei que elaborou quando era Ministro e do projecto de lei que apresentou como deputado.
No preâmbulo desse projecto de decreto-lei, quando o senhor era Ministro, a socialização da medicina e dos cuidados médico-medicamentosos foi, pura e simplesmente, excluída, tal como outras coisas fundamentais. Era um projecto essencialmente centralizador, que permitia a complementaridade entre o sector público e o privado, e era um processo dos mais desburocratizantes.
Quando V. Ex.ª juntamente com outros deputados, tomou a iniciativa, de elaborar o projecto de lei que veio dar origem à Lei n.º 56/79, no preâmbulo refere-se à socialização da medicina, à socialização dos cuidados médico-medicamentosos, pulveriza o poder do Ministério dos Assuntos Sociais através de um basismo perfeitamente inconcebível e, pela primeira vez, nos artigos. 31 º e 32.º do seu projecto de lei - que mais tarde veio a originar a Lei n.º 56/79 -, o Sr. Deputado controla, através do Estado, toda a iniciativa privada e não a permite em termos já de complementaridade, mas coloca-a em termos supletivos.
Lembro-lhe esta diferença, porque falou no problema da socialização da medicina em relação ao artigo 64.º da Constituição.
Mais uma vez o Sr. Deputado vai buscar o problema das taxas moderadoras como financiamento. Nada no projecto de decreto-lei apresentado pelo Governo diz que as taxas moderadoras são uma via de financiamento, e, se o Sr. Deputado ler bem, isso até está excluído do capítulo respeitante ao financiamento, pois refere-se ao acesso e à moderação por isso se chamam taxas moderadoras - desse mesmo acesso.

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Por outro lado, o Partido Comunista, quando discutimos aqui quer o Programa do Governo, quer o Orçamento Geral do Estado, quer a interpelação sobre a saúde, disse várias vezes que, se nós não concordávamos com a Lei n.º 56/79, a revogássemos. Pois foi exactamente isso que se fez.
Por último, o Sr. Deputado refere-se à discussão pública do seu projecto de decreto-lei. De facto, no preâmbulo do projecto de lei de quando o Sr. Deputado era Ministro e, depois, no preâmbulo do projecto de lei que veio a dar origem à Lei n.º 56/79 diz-se, a certa altura, que a discussão é alargada aos hospitais, às escolas, às fábricas ou aos campos.
Ontem disse - e repito - que estranho muito, de facto, que tendo-se institucionalizado a democracia em Portugal e vivendo nós num Estado de direito, necessitemos de recorrer a esse tipo de basismo, quando o órgão competente para discutir as grandes questões do povo português é esta Assembleia - assim a considero e julgo que o Sr. Deputado também a considera. Portanto, é aqui que os assuntos têm de ser discutidos, e só através de uma via demagógica é que nós, nos hospitais, nos campos e nas fábricas pomos à discussão, assuntos desta natureza ou outros quaisquer.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Ainda para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Henrique de Moraes.

O Sr. Henrique de Moraes (CDS): - Sr. Deputado António Arnaut, ouvi com muito interesse a sua intervenção e gostei muito do entusiasmo posto na defesa, que, de resto, é timbre e costume de quem se dedicou profundamente a estes assuntos. Realmente, enalteço a sua dedicação e disponibilidade para um assunto tão importante.
De qualquer maneira, não posso deixar de lhe chamar a atenção para o facto de que, se o Partido Socialista tem uma inequívoca e firme decisão de levar a cabo um serviço nacional de saúde, os outros partidos e as outras correntes políticas têm igualmente o mesmo direito, e suponho que todos nós estamos inequívoca e firmemente decididos a levar a cabo também uma transformação da sociedade portuguesa no campo da saúde. Esse é um direito que a todos nos assiste e que suponho que também é nosso.
Não queria perder a oportunidade de lhe lembrar - e com certeza que estará de acordo comigo e, portanto, este pedido de esclarecimento é uma figura regimental - que, se o projecto de lei do seu partido e depois a lei desta Assembleia tiverem o apoio de discussões públicas (e amplas, no entender do Sr. Deputado), também não posso esquecer que a nossa posição foi reiteradas vezes afirmada antes das duas eleições que levaram a vitória à AD. Portanto, a justificação também se contém nesse programa eleitoral, e nós também temos de respeitar os vossos eleitores com a mesma legitimidade com que o Sr. Deputado e o seu partido têm de respeitar os centros que discutiram essa sua decisão. Assim, queria lembrar-lhe que legitimidade também nós a temos e que não vamos prescindir dela.
Registo com agrado que o Sr. Deputado considera que o interesse nacional é realmente um valor a respeitar, simplesmente há que saber quem é que decide, quando e qual é o interesse nacional.
Em relação ao facto de o Sr. Deputado ter dito que esta é uma discussão por atacado, pergunto-lhe quem é que iniciou este método. Caso esteja errado, de quem é a culpa senão do iniciador? E lembro-lhe o que foi o final da sessão legislativa de 1979, quando, por atacado, aqui discutimos, até altas horas de muitas noites seguidas, leis que surgiram nesta Assembleia e autorizações legislativas que foram impostas pela maioria então existente, com a legitimidade dessa maioria ...
O Sr. António Arnaut (PS): - Qual era a maioria?

O Orador: - A maioria era aquela que votava por maior número de votos os pedidos de autorização legislativa que iam aparecendo.
Ora, essa maioria impôs o seu trabalho e a sua vontade, com legitimidade e direito, na reunião dos líderes. Mas, se isso está errado e se esta situação também está errada, pergunto ao Sr. Deputado se a culpa não será mais de quem iniciou esse processo do que de quem o continua.

Vozes do PSD, do CDS e do PPM: - Muito bem!

O Sr. .Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Arnaut, se assim o desejar.

O Sr. António Arnaut (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de começar a responder aos pedidos de esclarecimento que me foram colocados, queria pedir antecipadamente desculpa de qualquer omissão que venha a verificar-se, o que não será por desconsideração, mas sim porque ou entendo que o problema já está esclarecido ou até por omissão minha.
Relativamente aos problemas que a Sr.ª Deputada Zita Seabra colocou - e que já aqui foram abordados sobre a liberdade de escolha do médico e da gratuitidade, digo-lhe que estou inteiramente de acordo com as palavras que a este respeito V. Ex.ª proferiu. De facto, a regulamentação prevista neste diploma sobre a liberdade da escolha do médico é exactamente igual àquela que se previa na Lei n.º 56/79 e, como a Sr.ª Deputada disse, esse ponto foi dos mais criticados pela direita, que dizia que a Lei n.º 56/79 não permitia minimamente a liberdade de escolha do médico.
Como na altura tive oportunidade de dizer várias vezes, esse é um problema falso e não vale a pena voltar a ele. Contudo, o que é significativo é que, tendo as forças da direita e as mesmas pessoas que aqui estão criticando tão acerbamente esse dispositivo da Lei n.º 56/79, agora o venham reproduzir no seu novo articulado. Essa hipocrisia já foi denunciada, e eu perfilho inteiramente as palavras da Sr.ª Deputada.

Vozes do PS - Muito bem!

O Orador: - Mas a questão da liberdade da escolha do médico tem também a ver com a cobertura sanitária do País. Ora, este diploma não prevê a cobertura sanitária do País, e continuarão a verificar-se as mesmas assimetrias gritantes que actualmente se verificam.

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Na Lei n.º 56/79 previa-se, e tudo apontava nesse, sentido, que se estabelecesse - aliás como a Constituição impõe - a cobertura médica e hospitalar de todo o País. Ora, este diploma não vai permitir isso porque a medicina convencionada - é bom que os Srs. Deputados da AD tenham isso presente - não faz sair os médicos dos seus consultórios. E não há nenhuma maneira, Sr. Deputado Barrilaro Ruas - que agora certamente me olha com interesse por aquilo que estou a dizer -, de fazer com que os médicos vão para Ribeira de Pena, para o interior do País, para o Portugal de cabras e carrascos de que fala o poeta, sem estabelecer as carreiras médicas e sem estabelecer o sistema socializante da medicina.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Este modelo não permite a cobertura médica e sanitária de todo o País, e por isso nem sequer existe liberdade de escolha do médico, porque, para isso, é preciso que pelo menos haja dois médicos - já La Palice o podia ter dito.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Muito bem!

O Orador: - A Sr.ª Deputada diz que se trata de princípios inconstitucionais. Já aqui o disse, mas quero denunciá-lo com todo o vigor: é que esta lei e o seu,
preâmbulo em nenhuma expressão se referem à Constituição.
Chamo a atenção do Sr. Ministro dos Assuntos Sociais para este ponto, pois, tratando-se, afinal de contas, de regulamentar o artigo 64.º da Constituição - porque o Serviço, Nacional de Saúde foi criado pela Constituição, que impõe ao Estado a criação de, um serviço nacional de saúde universal, geral e gratuito, tendente à socialização da medicina e dos sectores médico-medicamentosos - nem sequer uma vez o diploma se refere à Constituição. Assim, peço ao Sr. Ministro dos Assuntos Sociais para pôr neste preâmbulo pelo menos a referência. de que se trata de assegurar o direito à saúde aos Portugueses, nos termos da Constituição. Desafio-o a que faça isso.

Vozes do PCP:- É o fazes!

O Sr. Silva Graça (PCP): - O Sr. Ministro não gosta da Constituição!

O Orador: - Quanto às, taxas moderadoras, também já me referi a elas e não vale a pena insistir neste ponto, porque o tempo é limitado.
O Sr. Deputado Jaime Ramos, que é um jovem que muito aprecio, fez aqui considerações - como é que eu hei-de dizer para não ofender? - fossilizadas (não me refiro à pessoa, mas sim às afirmações).
Como é que um jovem médico, com um futuro promissor à sua frente, que, ainda por cima, nasceu numa aldeia e vive numa pequena localidade do meu distrito, que conhece essas realidades, como é que o senhor, que é social-democrata e que até vem aqui dizer que «socializar é pôr ao serviço do bem comum» - expressão que eu retive e que, portanto, fica no Diário -, vem aqui, embora de uma forma tímida e sem convicção, dar apoio a este projecto de decreto-lei, que não se destina a socializar, isto é, que não se destina a pôr os cuidados de saúde ao serviço do bem comum?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Lamento que o Sr. Deputado Jaime Ramos e outros Srs. Deputados - que já não me ofendem, porque eu não me ofendo com coisas tão ridículas e também não me ofende quem quer - venham dizer que foi a ala marxista do Partido Socialista que apoiou o projecto de lei sobre o Serviço Nacional de Saúde.
Custa-me até que tenha de entrar por esta matéria, pois o Sr. Deputado sabe que eu não sou comunista, mas não sou anticomunista. Sou é antifascista. O Sr. Deputado conhece, com certeza, o meu passado há muito tempo e sabe qual tem sido a minha luta política e até as posições que tomei no período que ficou na história com o nome de gonçalvista. Então, por que é que o Sr. Deputado vem sempre com esses chavões?
O projecto de lei sobre o Serviço Nacional de Saúde foi assinado pelo presidente do Partido Socialista, António Macedo, pelo secretário-geral, Mário Soares, pelo presidente do grupo parlamentar, Salgado Zenha, por mim próprio e por muitos camaradas que se encontram aqui presentes, e o Sr. Deputado vem dizer que é a ala marxista do partido. O Sr. Deputado não sabe que o Serviço Nacional de Saúde, que é a defesa da Constituição, do regime democrático e do 25 de Abril, é um ponto de honra do Partido Socialista? Será que, quando o Partido Socialista invoca esses valores essenciais, de que nunca abdicará, é um partido marxista? O Sr. Deputado não vê que está a cometer uma tremenda injustiça e que até está a trazer argumentos em defesa do próprio Partido Comunista?
Já tenho dito várias vezes que não sou marxista, mas sim de inspiração marxista e de formação cristã. Nunca enjeitei os meus valores e por eles continuo a bater-me. Portanto, sou Socialista mas o meu socialismo é um socialismo libertador, de rosto humano, é um. socialismo em que a liberdade, a igualdade e a fraternidade não são palavras vãs, porventura uma utopia, mas o que hoje é sonho será realidade amanhã, porque entre o sonho e a realidade a distância é a vontade. Ora, se nós tivermos vontade política e se acreditarmos nestes valores, certamente que haveremos de dar um empurrão no sentido do socialismo.

Aplausos do PS da ASDI e da UEDS.

Sr. Deputado Jaime Ramos a CGTP poderia ser para si considerada suspeita, mas lembro-lhe que há lá muitos socialistas e homens sem partido. Contudo, a própria UGT apoia o Serviço Nacional de Saúde previsto na Constituição. Então também terá uns ressaibos de comunismo, ou será que defender os valores do homem e da libertação do homem é ser comunista?
Aliás, não ponho em causa - e isto que fique aqui bem claro, pois já o disse aqui há pouco noutra intervenção, quando se discutiam os cuidados primários - a legitimidade do governo da AD para governar e até para revogar esta lei e fazer outras. 15so não está em causa, mas não venham os senhores falar apenas de legitimidade do voto, porque, afinal de contas, em

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termos numéricos nunca a direita teve mais votos do que a esquerda junta, e as eleições que contam não são apenas as legislativas. Também contam as eleições presidenciais, porque aí é que verdadeiramente se discutiu o regime democrático e constitucional.

Aplausos do PS, do PCP, da ASDI, da UEDS e do MDP/CDE e protestos do PSD, do CDS e do PPM.

Foram as eleições presidenciais que decidiram o futuro deste país em termos de continuação do caminho do 25 de Abril e da Constituição da República Portuguesa.

Aplausos do PS, do PCP, da ASDI, da UEDS e do MDP/CDE e protestos do PSD, do CDS e do PPM.

Caros colegas, ainda a propósito da questão levantada, devo dizer, desabrida e inconsequentemente, ao Sr. Deputado Jaime Ramos que eu sou um homem de esquerda e os companheiros de jornada têm de ser, necessariamente, homens de esquerda. Ora, não é com a direita que vamos fazer essa jornada da libertação do homem e de transformação das estruturas sociais arcaicas e caducas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por isso, Sr. Deputado, não volte nunca mais a dizer que estou a fazer o jogo do Partido Comunista, porque eu tenho muito respeito pelo Partido Comunista e pelos comunistas portugueses, que encontrei sempre nas lutas contra o fascismo.

Protestos do PSD.

Vozes do PSD: - Aqui nestas bancadas não há ninguém?

O Orador: - Meus caros amigos, encontrei também alguns que se sentam nessas bancadas, mas é bom que esses que se sentam nessas bancadas saibam honrar o seu passado e, nos momentos decisivos, saibam então escolher os seus companheiros de jornada.
O Sr. Ministro Carlos Macedo teve também a gentileza de me colocar algumas perguntas. Gostaria muito de lhe responder e discutir com V. Ex.ª estas matérias tão importantes na Comissão de Saúde e de Segurança Social desta Assembleia, numa reunião informal, num debate público, em todas as circunstâncias. Contudo, o Sr. Ministro nunca veio à Comissão de Assuntos Sociais ...

A Sr.ª Zita. Seabra (PCP): - Muito bem!

O Orador: - ... como eu vim várias vezes para colher dela os ensinamentos e participar nessa discussão, porque acredito que do diálogo sairá certamente alguma coisa importante.
Ora, esta lei foi, de facto, discutida nos hospitais - e participei nessa discussão em todos os hospitais centrais do País -, foi discutida nos campos, nas cidades e nas fábricas, e nesta Assembleia, durante três dias, foi submetida a uma ampla discussão pública, e isso não é basismo acéfalo nem consequente, mas, sim, um respeito que devemos ter pelo povo português.

Aplausos do PS, da ASDI e da UEDS.

Por que é que o Sr. Ministro não vai aos hospitais, não vai às cidades, não me convida a mim, a todos os grupos parlamentares e a outros portugueses interessados na matéria, à Ordem dos Médicos, ao Sindicato dos Médicos, aos Sindicatos dos Enfermeiros, a todos os trabalhadores da saúde, para discutirmos sinceramente esta matéria? Porque o Sr. Ministro tem medo da discussão, porque o Sr. Ministro nem quer a discussão, porque o Sr. Ministro tem de fazer uma lei do Serviço Nacional de Saúde que pague a factura aos barões da medicina.

Aplausos do PS, do PCP, da ASDI, da UEDS, do MDP/CDE e da UDP.

Só me resta saber se o Sr. Ministro, que cedeu em tantas matérias, vai agora ceder, nas duas que estão pendentes, à Ordem dos Médicos, e que são o pagamento por acto médico e o exclusivo da Ordem dos Médicos de conceder títulos de especialidade. Espero que o não faça, porque não podem conceder-se a uma organização desse tipo poderes majestáticos, como essa Ordem quer.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Ainda que confie em si e na sua seriedade, espero que o Sr. Ministro não o faça.
O Sr. Ministro dos Assuntos Sociais ainda me falou na diferença entre o projecto de decreto-lei que o II Governo tinha elaborado e o projecto de lei do PS que foi apresentado a esta Assembleia. Naturalmente que há algumas diferenças, porque, depois da queda do II Governo, a discussão continuou e foi enriquecida com muitas achegas vindas de vários sectores.
Já aqui há tempo disse que o projecto de decreto-lei do II Governo mereceu o apoio do CDS, que constava do Programa do Governo, que um dos Ministros que mais apoiou este projecto e aqui lhe presto mais uma vez essa homenagem foi o Ministro Sá Machado, que num concelho de Ministros do II Governo disse que, se este governo fizer esta lei, honra-se perante o País, porque faz alguma coisa de útil.
Quanto ao Sr. Deputado Henrique de Moraes, agradeço-lhe as suas amáveis palavras, que provêm da amizade e do convívio que temos tido e que vamos agora retomar na próxima semana, numa delegação parlamentar desta Assembleia, pois é sempre muito agradável conviver e conversar com o Sr. Deputado Henrique de Moraes.
O Sr. Deputado disse que também têm legitimidade democrática e que todos temos de respeitar o interesse popular. Quem é que decide o interesse popular e quem é que é intérprete do interesse popular? Não é o CDS nem o PS, mas, sim, o próprio povo que é juiz de si mesmo, e é o povo que tem de tomar nas mãos o seu destino. Por isso se justificava uma ampla e profunda discussão popular, para que, na verdade, esta lei correspondesse às profundas aspirações e às carências do nosso povo.
O Sr. Deputado, que é médico e tem entrado em hospitais, conhece a degradação e certamente tem um frémito de indignação quando vê homens e crianças a morrer por falta de assistência. médica, por abandono completo e até por falta de dinheiro, pois

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I SÊRIE -- NtiMERO 90

o Sr. Deputado; ãssim(como eu,' não perdeu ainda a capacidade de se . indignar. :...
' Aplausos do PS, da ASD! e da UEDS. , .º
jhj
O Shr. Fernandes'da Fonseca : = Sr. Djheputado, peço desculpa, -mas V. Ex.jª não pode formular pedidos de esclarjhhkecimento ao Sr. Minkistro,, por. quej a intervenção dele foi a pedir escjhklhjharecimentos ao Sr. Depjhutado Antónjkio Arnaut.
jhkjhjh
. O Sjrjk.hjk Jaime Ramos (PSD)* -- Sr. . Presidente, peço a palavra, para fazer, um projkjhktesto contra a intervenção do Sr. Deputado António -Arnaut.
khj
O Skjkjhjhkjhr. Presidente: - Faça favor. .
ukjh
O Sr. Jaime Ramoshkjhkjhj (PSD): -Sr.. jkDeputado António Arnaut, vou protestar contra algumajhs das ajkfirmações que fhez na sua úlhktima. intervenção, principalmente para recusar jhjha 'classificação dej tímida e jhsem convicção que atribuiu .à minha, interhvenção.
Se ,ela.pareceu tímida, foi porque, acima de tudo, não queria susceptibilizar- o. Sr. Deputado;h por quem tenho muitjha amizade, e porque sei que é uma pessoa que hsempre se hj.dedicou -ao problema dajhjh saúde com muita utopia; , com , muitah fantasia, , hjmas com voluntariedadhe ... jk.._ , ,
,Não ejhne .jhdiga que falei semjkjjh convicçãjko, porque, apesar de o Sr: Deputado falar semhpre mais alto do que eu,j talvez nãjko fale com mais razão do que eu. Contudokj, não é pela altura da voz-jknem pelos jkjgestos que se fazem que se tem ou não convicção nas palavras. kEu falo sempre cóxn convicção. , ,
Em reljação ao. Serviçojh Nacional de Saúde, eu dihjsse que ele foi defendido pela ala marxista , do Pajhrtido Socialista. Retirojh a ala marxista, mas direi.que será pela ala minoritárhkia .. .. - ,. , . jh. ., . , .
Por exemplo, ao vjerificar a. moção que venceu ojhj
Congresso do Partido Socialista, recordo-lhe, Sr. Dhe
putado António jkArnaut, que a referência ao Serviçojh
Nacional de. jhSaúde... aparecia em muito pequenas lijh
' quase disfkarçadas no texto. Talvez o Partidojh
Socialista se esteja a esquecer-do. seu serviço njacional
de saúde. jh- „jhjhhjh
Dejhpois, o Sr. Depjutado defendeu novamentejh um valor supremo das' eleihkções.presidencjhiais, mas digo-lhe qhjue .- tal como -há uni bocado, ao defendhker o debate pújhblico fora do Parhlamento - a defesa muito intensa do valojhjhr ; das eleições presidejhjnciais, que hjnós respeitamos e reconhecemos, significka um menosprezo grande pela instituiçjhão parlamentar.
Sr. Deputhado, não se devejh pkjhjhhrocurar sujar. hoje aquilo
que sejk pode comer amanhã: jkjhjhoje está em minoria
nesta inkjhstituição, más ajkmanhãjk poderá talvez restar em
maioria. - ,-, yjhjhjhjh
Por isso mesmo, .não vamos denegrir esta` instituição, que, na minha opinião, será a mais fiel representante da deínócracia e ; do sistema .democrático de um país.
Aplausos do. PSD, 'do C`iDS e: do PPM. - .-

O Sr. Presidente: - Para formular um .contrapro-: testo, tem a palavra o Sr. Deputado António Arnaut.,

O Sr. António Anjsut (,,PS): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estou preocupado porque, - num dia, em que temos tanta matéria importante para discutir, designadamente a aprovação do Estatuto dos Deputados que é uma coisa muito «mais impjjkjhortante» do que o Serviço Nacional de Saúde, pois vai criar outras condiçõeks, não ao povo português, mas, sim, aos deputados portugueses-, não quero tirjhar, tempo a V. Ex.as
,k
j
Akhplausos do PS e do PCP.
k
Direi apenas que o Sr. Deputado Jaime Ramos falou ksem convicção e timidamente. Simplesmente, o facto de aquele Sr. Deputado terjk falado timidamente e com uma voz suave e adocicada não me tira a, agressividade da sua intervenção. ,
jjkjkhjh
Vozejhjhs do PS: - Muito bem!

O Sr. Prjhesidente:- Para. uma intervenção, tem e. palavra o Sr. Deputado Sousa Tavares.jhj
h
Ojh Sr. Sousa, Tavares (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É difícil fazer umajh intervenção sobre o Serviço Nacional de kjSaúde, uma vez que à roda deste probljhema criase sempre um clima demasiada-jk. mente passional.
Tal comjho já aconteceu o ano passado - bemj como este ano durante a interpelação ao Governjho sobre saúde -, não é possívelh uma dicussão serena, não ékjjh possível um encarar jhdos problemas, não é possívekl desmistificar a questão, jkpois que à roda deste prjhoblema teceu-se uma teiajh de paixões e, sobretudo, jhde desvarios, que têm muito mjhais a ver com a política do que com a saúde do- povo português.
jhj
Vojjhjzes do -PSD, do CDS e do FFM: - Muito bem!
h
Qjh Orador: -Ora, o Serviço Nacional jhde Saúde não pode ser um instrumento poljhjhítico. O Serviço Nacional dejh Saúde é, acima de tudo, um serviço do povo, é uma coisa destinada a prestar tjhodas as formas de . medicina, seja curativa ou preventjkiva, ao povo português.j
A forma djke organizar esse proceso não é, nem pode sjer, definitiva. O processo do Serviço jkNaiconal de Saúde é vário, depende das hmentalidades de quem governa, depejhnde da concepção que se tem, depende inclusivamente das possibilidades jhhjkhjfinanceiras de um país.
kjh
Vozkjhes do PSD: -- Muito bem!
k
4hj orador: - Portanto, pajhrtir do princíp1.º comjho infelizmente parte o Sr. Depkutado António Arnautjh, hpor quem tenho, alijhás, muita estima -- de que só há um servjhiço nacionaljhjhjh de saúde possível,jh ou seja, aquele que ele inventou ou pregouk, parece-jhme, à, cjhabeça, um erroh basilar e que passionaliza imediatamente está Ashjskejhkmblhjeia e a torna invulnerável a qualquer espécie de discussrao serena. Se só há um serviço nacional de saúde possível - o serviço nacional de saúde Arnaut -, então nós, Portugueses, temos de fhjicar eternamente .. subjugados à prestação de saúde que o

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Portanto, não percebo por que é que se há-de exigir gratuitidade em relação ao Serviço Nacional de Saúde, que, aliás, se promete para as classes mais desfavorecidas da população. A única coisa que procuramos é ter um serviço de nível e não um serviço degradado. Porque um serviço, como aquele que os Srs. Deputados defendem seria sempre e só um serviço altamente degradado. Nunca poderia ser um serviço de qualidade.
A preocupação do Ministério dos Assuntos Sociais e do Governo é, acima de tudo, que o Serviço Nacional de Saúde ...

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - É falso!

O Orador: - ... seja um serviço com dignidade médica.
É mais importante ressalvar estes aspectos da dignidade, da qualidade, da rapidez e da eficácia na prestação de serviços. Não se estar como hoje, por exemplo, se está cinco meses à espera de uma radiografia, quando essa radiografia pode representar o diagnóstico de uma doença extremamente grave. Nos serviços de saúde que nós temos actualmente, os doentes e os utentes chegam às vezes a esperar cinco meses pelo fornecimento de uma radiografia. 15to é completamente impossível e este serviço não merece nome de Serviço Nacional de Saúde. É outra coisa qualquer, mas não é um serviço nacional de saúde.
Finalmente, quanto ao Sr. Deputado José Niza, sobre a indigitação de secretários de Estado e de ministros de agricultura que diz terem sido feitas no seio da AD, direi que preferia não entrar nesse assunto para não ter de falar em certas indigitações de ministros que se fizeram no tempo dos consulados PS, isto para não falar em como é que apareciam os ministros e como é que às vezes se fazia o bailado de pasta para pasta, durante quatro dias, em que os indigitados apareciam em três ou quatro pastas diferentes antes da formação dos ministérios, e depois essas pastas eram entregues a outras pessoas que nunca tinham sido sonhadas. E algumas dessas pessoas até foram feitas ministros porque quando se precisava de uma pessoa com uma determinada qualificação ia-se ao ficheiro do partido para encontrar um ministro possível.

Risos do CDS.

Gostaria de acrescentar mais uma coisa: a lei não propõe nem tem intenção de erigir como Serviço Nacional de Saúde o sistema de medicina convencionada. É bom que isto fique claro no espírito dos Srs. Deputados ...

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): -É falso!

O Orador: - ..., como está claro no meu espírito. E nós veremos se isso é ou não assim.
A convenção só surge quando é necessário haver rapidez, uma eficácia e uma maior economia da prestação de serviços.
O Sr. Deputado António Arnaut tem razão quando diz que o Ministério dos Assuntos Sociais fez o cálculo do custo da medicina convencionada requerida pela ordem dos médicos. Ora, é exactamente por isso que o Ministério está em franco conflito com a Ordem dos Médicos. O Ministério não aceita como princípio e rejeitou, terminantemente, qualquer sistema que levasse ao pagamento por espécie de cada acto médico, mesmo dos médicos que fazem parte das carreiras do Serviço Nacional de Saúde. 15so está completamente posto de parte.
Por isso o sistema proposto não é um sistema de medicina convencionada. É um sistema misto em que se recorre a todas as fórmulas cuja base fundamental assenta de um lado no hospita e do outro no centro de saúde, isto é, de um lado no centro de prestação de serviços primários e do outro lado na prestação de serviços secundários, com uma profunda interligação entre uns e outros.
Digo ainda ao Sr. Deputado José Niza que muitos dos problemas que o Governo teve de resolver em 1980, antes de atacar de fundo a questão do Serviço Nacional de Saúde, foram situações pendentes. Como fosse por exemplo, como o Sr. Deputado Arnaut conhece bem, a existência de centenas e centenas de vagas de especialistas nos hospitais, que foram providas em grande parte ...

Terminado o tempo de que o orador dispunha, foi-lhe cortada a palavra pelo controle automático de tempo.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

Durante esta intervenção reassumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente José Vitoriano.

O Sr. Fernandes da Fonseca (PS): - Peço a palavra para um protesto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Fernandes da Fonseca (PS): - O Sr. Deputado Sousa Tavares desculpará que eu use da figura de protesto, mas quero apenas dizer-he que fez confusão, na medida em que não respondeu às minhas perguntas. Não lhe perguntei por que é que a lei não foi cumprida. As minhas perguntas foram completamente diferentes, mas compreendo, perfeitamente, que. no meio de tantas questões o Sr. Deputado tenha feito essa confusão.
Efectivamente, o que eu lhe perguntei foi, em face das suas afirmações, que ou considerei inteiramente democráticas, de que a lei era utópica e que era necessário elaborar uma outra mais formal, mais económica, mais exequível, e em face das palavras do Sr. Ministro dos Assuntos Sociais que disse que os grandes problemas do povo português devem ser aqui analisados e discutidos, se o Sr. Deputado Sousa Tavares não achava que teria sido mais curial (e disse até que não empregava a palavra moral) que fossem os técnicos da sua bancada, ou os técnicos das bancadas da maioria, a elaborar um projecto de lei que fosse discutido nesta Assembleia. E dizia mais: que nesse sentido me sentia ofendido, como técnico, por não me ser dada a oportunidade de colaborar na elaboração dessa lei, que aqui seria discutida.

O Sr. Presidente: -Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Tavares para contraprotestar.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): - Não acho que exista nisto nem um aspecto moral nem um aspecto curial,

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e por uma razão: o Serviço Nacional de Saúde não é uma matéria reservada à Assembleia da República pela Constituição.
A Constituição estabelece, taxativamente, quais são as matérias reservadas à Assembleia da República e sobre as quais o Governo não pode legislar.
Portanto, já é um acto de deferência para com a Assembleia da República o trazer aqui uma lei de bases.
Além disso, duvido que pudesse ser feita uma lei de bases pela Assembleia, podia vir uma proposta de lei do Governo, mas isso é uma questão de antecipação de tempo, que eu compreendo perfeitamente, que, perante as necessidades de construir um eficaz serviço nacional de saúde que o Ministério tenha essa preocupação de tempo.
Quero também dizer-lhe que nestas bancadas existem com certeza muitas ,pessoas competentes para ter opiniões sobre o Serviço Nacional de Saúde, talvez, menos os médicos, porque desconfio muito dos especialistas a legislar sobre os seus próprios assuntos. Preferia que fosse, por exemplo, um médico a legislar sobe os assuntos da Ordem dos Advogados e, um advogado a legislar sobre os assuntos da Ordem dos Médicos. Portanto, talvez outras pessoas fossem susceptíveis, realmente, de dar um contributo notável para a elaboração da lei sobre o Serviço Nacional de Suúde que não tanto os médicos.
Estou convencido que essa contribuição não será negada e que os Srs. Deputados, se for pedida a ratificação deste decreto-lei - e quando isso acontecer já existirão diversos diplomas complementares regulamentadores da lei -,terão então muito melhor visão daquilo que se pretende construir e a discussão será muito mais útil do que o seria neste momento.

O Sr. Presidente: -Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Henrique de Moraes.

O Sr. Henrique de Moraes (CDS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Deputados: Apresentou o Governo a proposta de lei n.º 48/II referente ao pedido de autorização legislativa para revogar a Lei n.º 56/79, de 15 de Setembro.
As autorizações legislativas podem ser concedidas ou como consequência de um profundo estudo relativo à matéria sobre que versam ou, então, depois de uma mais rápida inspecção ao texto, desde que haja simultaneidade de acordo nos princípios genéricos e por uma questão de confiança do Governo.
Da nossa parte estamos no segundo caso. E se este pequeno apontamento, é feito neste momento é porque entendo que matéria desta envergadura deve ser discutida em bastante mais tempo do que o que corresponde a um dia.
Por isso mesmo, será com alegria que veremos, na altura própria, o pedido de ratificação deste diploma.
Sabemos bem que também ao Sr. Ministro dos Assuntos Sociais é grato este procedimento, pois ele também conhece a necessidade de um estudo muito cuidado e profundo desta questão.
Por estas razões as nossas considerações acerca deste problema irão ser breves.
Como é do conhecimento geral, foi no tempo do II Governo Constitucional que pela primeira vez se apresentou um documento sobre o sistema nacional de saúde, o qual deveria ser proposto para discussão e consequente votação.
Desfez-se esse governo e passado algum tempo o Partido Socialista apresentou um projecto de lei a esta Câmara baseado no documento acima referido mas com algumas diferenças fundamentais. Essas diferenças deram-lhe, a nosso ver, um cariz muito estreito ideologicamente, considerando por isso o meu partido necessário que se revogue a lei de saúde actualmente existente.
Esta não se insere na política da actual maioria governamental, estando por isso desfasada das intenções políticas da maioria do povo português, representadas pelas bancadas da AD.
De resto, até no preâmbulo do projecto de lei apresentado pelo Sr. Deputado António Arnaut, em nome do PS, se considerava que «a política sectorial de saúde terá, pois, de se inserir no delineamento da política mais geral, global e unitária da população e do desenvolvimento económico e sócio-cultural, ajustando as suas medidas específicas às dos restantes sectores a que está ligada, e de que em grande parte depende, por forma que o seu desenvolvimento se processe paralelamente».
Esta afirmação está, a nosso ver, correcta e significa que qualquer serviço nacional de saúde deverá ser coerente com o sistema político que. lhe está subjacente, não devendo impor-lhe regras que porventura o contrariem.
Portanto ou um serviço nacional de saúde contém normas muito gerais que se podem adaptar a várias soluções e ideologias políticas ou então a cada mudança de matiz na política de uma nação tem que corresponder um novo serviço nacional de saúde.
O Serviço Nacional de Saúde proposto pelo PS e aprovado nesta Assembleia não responde a estas exigências e é esta também a grande razão que, a nosso ver, justifica a atitude que tomou hoje o Governo.
Contrariamente ao que está a acontecer neste momento, em que existe uma maioria estável, quando o PS apresentou o seu projecto de lei isso não sucedia. Tanto assim que passados alguns meses a Assembleia era dissolvida tendo-se realizado eleições gerais.
Até parecia que o próprio PS queria dar ao seu projecto de lei uma garantia de precariedade, salto de pára-quedista sem pára-quedas, o que inevitavelmente se transforma em queda mortal.
Claro está que quando documento semelhante foi elaborado pelo II Governo Constitucional a .situação não era esta.
O Governo baseava-se numa maioria, era estável, o que permitia supor vir a ser de duração suficiente para pôr em execução uma reforma de fundo, e a exigir fôlego, como é um serviço nacional de saúde.
Nessa altura era oportuno e, para além disso, tinha outra qualidade a proposta preparada. Era menos dogmática, mais elástica, adaptando-se melhor a eventuais variações políticas. Paradoxalmente a lei aprovada, numa situação política completamente diferente da que se vive hoje, caracterizada por menor apoio parlamentar e menor estabilidade, foi mais rígida e com menos capacidade de adaptação.

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Este seu defeito condiziria inevitavelmente ao que está sucedendo hoje nesta Câmara e, com tudo o que politicamente aconteceu em Portugal, foi inútil e quase tempo perdido.
O II Governo era maioritário e aparentemente estável por isso justificava-se a proposta de tal lei.
O Partido Socialista não era maioritário, a situação política portuguesa era instável e por isso não se deveria ter aprovado um projecto de tal envergadura nessa oportunidade.
Além disso o carácter socializante afirmado já no preâmbulo do projecto de lei do PS, através de frases tais como «orientar a sua acção para a socialização da medicina e dos sectores médíco-medicamentosos» e também as afirmações proferidas pelo Sr. Deputado António Arnaut na discussão do SNS nesta Câmara, que dizia, se não me falha a memória, que embora o projecto não fosse defensor da socialização total da medicina, era de tendência socializante.
Ora, tudo isto, a meu ver, constitui um erro. Com as eleições de 1979 e as de 1980 as tendências políticas mudaram. A orientação do Governo não é socialista, por vontade expressa do eleitorado.
Portanto, só temos um caminho coerente: revogar a Lei do Serviço Nacional de Saúde, apresentando uma proposta que a substitua.
15to tem o nosso apoio e julgamos correcto, mesmo em relação à Constituição.
Não sou jurista nem constitucionalista, por isso não elevarei a discussão da matéria a esses altos níveis.
Tenho sobre o assunto o entendimento que possui a maioria dos portugueses sobre a matéria e tanto me basta.
Realmente o artigo 2.º da Constituição refere que o nosso processo político tem por objectivo assegurar a transição para o socialismo. É uma regra. Contudo, no mesmo artigo e antes dessa afirmação diz-se que «a República Portuguesa é um Estado democrático, baseado na soberania popular, no respeito e na garantia dos direitos e liberdades fundamentais e no pluralismo de expressão e organização política democráticas».
Ora, um Estado democrático, baseado no pluralismo de expressão e organização política democráticas, não pode - senão corre o risco de se negar a si mesmo - excluir do espectro político legal correntes e práticas não socialistas.
Felizmente em parte isso não tem acontecido e julgo que não teria sido necessário perante a Constituição elaborar uma lei. socializante que só servisse as correntes próximas desses ideais, mas que encerrava em si a sua destruição logo que um governo não socialista obtivesse a confiança da maioria desta Câmara.
Foi o que aconteceu em 1979 e em 1980. Por o Partido Socialista não ter levado em conta estas possibilidades, atrasou-se o início de melhoramentos no campo da saúde. Destes o povo português anda tão carecido, e é tão urgente generalizá-los que considero imperdoável a radicalizaço do Partido Socialista em matéria de saúde, o que não nos trouxe, como já disse, benefícios.
Julgo que justifiquei o nosso apoio à iniciativa governamental e se bem que, como de início afirmei, a discusso profunda da proposta deverá ser realizada aquando do seu pedido de ratificação, não quero deixar também de tecer algumas considerações sobre o documento emanado do Ministério dos Assuntos Sociais.
No preâmbulo apoiamos as afirmações produzidas acerca da universidade dos cuidados de saúde.
Realmente, uma coisa é a igualdade social, outra a justiça social. Nós somos por esta, o que justifica a concordância com a existência de taxas moderadoras.
É justo que estas existam em função das disponibilidades financeiras de cada um, isentando, como faz o projecto de decreto-lei, os mais carecidos.
De resto, é interessante notar que o projecto socialista criava taxas, embora afirmando-se a gratuitidade, o artigo 7.º demonstra, a nosso ver, o contrário.
E se em vez do que lá está escrito pudéssemos ler «que os serviços médicos do SNS são pagos, excepto nos casos de necessidade de racionalização da utilização das prestações», seria perfeitamente idêntico.
Apesar de tudo, nós preferimos a justificação apresentada pelo Governo àquela do projecto socialista. Neste o pagamento é para racionalizar serviços, naquele é para fazer justiça social.
Julgamos também que a proposta governativa encerra em si maior capacidade de autonomia e independência dos serviços. Porém, esta é matéria interessante para discussão mais demorada e posterior.
Em relação ao financiamento, o diploma agora em discussão também é mais realista.
É realmente uma utopia gizarmos sistemas de saúde desligados dos problemas económicos e financeiros. Esperar em Portugal que só o OGE seja capaz de corresponder às necessidades da saúde será de um optimismo exagerado. Por isso a definição de que outras verbas poderão e deverão ser integradas é feliz e proporcionará maior desafogo financeiro e por isso maior eficiência nas respostas.
Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Deputados: Fui breve por cultivar a síntese, porque a clareza de intenções do Governo não necessita de retórica para ser demonstrada, porque a nossa confiança neste Governo está solidamente alicerçada e também porque, sendo curto o tempo, desejamos que V. Ex.ª, Sr. Ministro, demonstre rapidamente o que a sua capacidade permite, isto é, um bom trabalho.

Aplausos do CDS, do PSD e do PPM.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos tem a palavra o Sr. Deputado António Arnaut.

O Sr. António Arnaut (PS): - Sr. Deputado Henrique de Morais, compreendo a situação delicada e controversa em que se encontra o CDS do ponto de vista político e ético.
No II Governo apoiou e fez seu o projecto do Serviço Nacional de Saúde e depois da queda do II Governo - que o CDS provocou justamente porque nunca aceitou uma reforma tão profunda no campo da saúde - o CDS enveredou, com os demais partidos da direita, pela oposição frontal, ao Serviço Nacional de Saúde.

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Daí que o Sr. Deputado Henrique de Morais tenha tentado, na sua intervenção - e estou até em crer que ela teve apenas esse objectivo -, justificar essa viragem radical de 180 º. E o Sr. Deputado Henrique de Morais tentou justificá-la com esta falsa alegação: o projecto do II Governo era diferente do projecto de lei que o Partido Socialista apresentou mais tarde nesta Assembleia.
O CDS estaria de acordo com o projecto sobre o Serviço Nacional de Saúde do II Governo, mas já não estava de acordo como projecto de lei que o PS apresentou na Assembleia, depois da queda do II Governo, justamente porque - no dizer do Sr. Deputado Henrique de Morais - ele continha inovações substanciais, isto é, desviava-se fundamentalmente do projecto do II Governo.
15so é inteiramente falso e quero aqui denunciar com toda a veemência que este é um argumento capcioso do CDS. O CDS tem que assumir as suas responsabilidades, e por acaso ao lado direito do Sr. Deputado Henrique de Morais está sentado o nosso comum amigo e ilustre deputado Rui Pena, que poderá testemunhar essa circunstância.
De facto, o CDS aprovou o Programa do II Governo, apoiou esse projecto e não tem nenhuma razão política, moral ou de qualquer outra espécie, para vir agora dizer que não está de acordo com ele!
Mas o Sr. Deputado Henrique de Morais, verificando esta dificuldade intransponível, pretende agora lançar alguma poeira nesta Câmara dizendo que o projecto de lei do PS, apresentado nesta Assembleia, se desviou do primeiro projecto e eu só lhe peço que nos diga quais são esses desvios, quais são essas diferenças.
Porém, eu posso antecipar-me e dizer quais são essas diferenças. As diferenças são apenas referentes ao facto de o projecto de lei apresentado na Assembleia da República tratar também de alguns aspectos regulamentares, mas nenhum dos princípios foi alterado. Os princípios do projecto do II Governo constitucional mantêm-se intactos e se o CDS aprova esses princípios então que proponha aqui um projecto de lei exactamente igual àquele que o II Governo elaborou e nessa altura terá o apoio do Partido Socialista.
Em conclusão, Sr. Deputado, diga-me, pois, quais são essas diferenças porque se não as disser fica patente que usou uma argumentação falsa.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Henrique de Morais, há mais oradores inscritos para fazer pedidos de esclarecimento. V. Ex.ª pretende responder já ou prefere responder no fim?

O Sr. Henrique de Morais (CDS): - No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente:- Tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Presidente, não vou pedir esclarecimentos, vou protestar contra a intervenção feita pelo Sr. Deputado Henrique de Morais. E vou protestar porque creio que uma questão que foi abordada pelo Sr. Deputado Henrique de Morais deve ficar clara nesta discussão.
O Sr. Deputado Henrique de Morais não disse nada sobre o conteúdo do projecto de decreto-lei que o Governo apresentou a esta Assembleia e que se propõe fazer. Não disse nada sobre como é que vai funcionar o sistema de saúde em Portugal, sobre qual é a alternativa que este governo propõe à Lei do Serviço Nacional de Saúde.
Aquilo que foi apresentado à Assembleia é apenas um decreto-lei com meia dúzia de artigos que não têm conteúdo real, o que não nos permite avaliar no concreto qual é o sistema que vai ser criado em Portugal. E nem a intervenção do especialista do PSD em questões de saúde, o Sr. Deputado Sousa Tavares, nem a intervenção de 3 ou 4 minutos do Sr. Ministro dos Assuntos Sociais nem a intervenção do Sr. Deputado Henrique de Morais nos disseram nada sobre como é que vai ser o futuro sistema de saúde em Portugal. Só nos disseram uma coisa: que vão revogar a Lei do SNS aprovada por esta Assembleia e que essa lei é má. Este decreto-lei é um cheque em branco!
O meu protesto vai exactamente no sentido de a Assembleia da República se estar a pronunciar nestas circunstâncias sobre um assunto que é do maior interesse para os Portugueses.
E quanto ao que nos disse há pouco o especialista do PSD em matéria de saúde, o Sr. Deputado Sousa Tavares, sobre as bichas da caixa, esclareço que não acabámos com essas bichas porque a Lei do Serviço Nacional de Saúde não foi cumprida.
Mas o que está em causa, Srs. Deputados, não é de maneira nenhuma a questão das taxas, que são apenas um pequeno degrau que tem por trás um elefante muito maior, uma coisa muito mais perigosa e grave para os Portugueses, que é o seguro de saúde, porque é através desse seguro que os senhores vão criar uma diferença entre os Portugueses.
É que, deste modo, só aqueles que podem pagar, que podem comprar a saúde, é que vão ter uma saúde melhor e o sistema que foi criado pelo Serviço Nacional de Saúde aprovado por esta Assembleia era um sistema que punha o Serviço Nacional de Saúde ao serviço do povo, face ao qual todos os portugueses eram iguais, não na miséria - como dizia o especialista em matéria de saúde deputado Sousa Tavares -, mas iguais perante o seu direito à saúde, que o Estado era obrigado a conceder-lhes, com qualidade como se faz noutros países, e os Srs. Deputados sabem bem que assim é!
Mas o Serviço Nacional de Saúde que agora se propõe não é isso: é um serviço de qualidade para os ricos, para quem pode pagar a saúde através de um seguro de saúde, e é um serviço de miséria para os indigentes que vão às juntas de freguesia pedir um atestado de pobreza! É isso que está em causa neste debate e é isso que é preciso denunciar, Sr. Deputado!

Aplausos do PCP.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

0 Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

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O Sr. Sousa Tavares (-PSD): - Sr. Presidente, é para, usando a fórmula regimental de protesto, dizer à Sr.ª Deputada Zita Seabra que há pouco me esqueci de referir a objecção que ela tinha feito relativamente ao seguro de saúde.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, desculpe-me, mas a Sr.ª Deputada Zita Seabra fez um protesto e o Sr. Deputado não pode protestar contra um protesto. No entanto, dou-lhe a palavra visto que o Sr. Deputado diz que há pouco se esqueceu de responder a uma questão que a Sr.ª Deputada lhe pôs. Peço-lhe que seja breve, Sr. Deputado.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): - Serei muito breve, Sr. Presidente, e pedi a palavra apenas porque o meu nome foi usado e lembrei-me de que me tinha esquecido de abordar essa questão.
Na Lei n.º 56/79 estava consignado o Serviço Nacional de Saúde, mas suponho que a medicina privada continuava a existir. O Sr. ex-Ministro Arnaut não a proibiu. O projecto de lei do PS não previa a sua extinção e, portanto, nada impedia os ricos de terem outros serviços de saúde que não fossem os do Serviço Nacional de Saúde.
Que confusão faz à Srª. Deputada Zita Seabra que os serviços à margem do Serviço Nacional de Saúde possam ser pagos directamente ou através de um seguro?
Visto que a Sr.ª Deputada já insistiu quatro vezes nesta questão, pergunto que confusão lhe faz que em Portugal - que é dos raros países onde isso não existe - possa existir a possibilidade de uma pessoa fazer um seguro de saúde.
Gostava de compreender o que é que isto tem a ver com o Serviço Nacional de Saúde.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - É evidente que agora tenho de dar a palavra à Sr.ª Deputada Zita Seabra.
Faça favor, Srª. Deputada.

A Srª. Zita Seabra (PCP): - O que o Sr. Deputado acaba de dizer é o que eu penso que é o fulcro da discussão que estamos aqui a travar.
O Serviço Nacional de Saúde que a AD pretende criar, e que apresenta aqui, é um Serviço Nacional de Saúde para os pobres. Os serviços públicos degradados ficam para os pobrezinhos e os ricos têm um seguro de saúde para se tratarem bem e terem acesso aos tais tratamentos extremamente caros e sofisticados que o Sr. Deputado há pouco referia. E até fez referência ao facto de Salazar ter tido acesso a esses serviços que hoje existem nos serviços públicos e a que, pela Lei do Serviço Nacional de Saúde, qualquer cidadão tinha acesso, se tivesse necessidade.
A grande diferença, Sr. Deputado, é que a AD apresenta aqui um texto em que se consignam serviços caros, altamente especializados, pagos através de um seguro para os ricos e os corredores do Hospital de S. José para os pobres, que continuam a fazer bichas e que continuam a ter de ir para as caixas e para os corredores dos hospitais como vão agora!
E se o Sr. Deputado alguma vez tivesse de calcorrear quilómetros para chegar a um serviço público de saúde e depois tivesse de ser internado num hospital como o dos Capuchos ou o de Santo António, então saberia qual é a diferença entre estar internado num hospital público degradado e ter acesso à clínica da Cruz Vermelha ou a outra clínica particular através de um seguro.

É isto que nós queremos evitar em Portugal, não é a igualização na miséria. Queremos que todos os Portugueses, que são iguais, tenham igual direito à protecção da saúde, pois há um princípio constitucional que estipula que o direito à protecção da saúde é universal, geral e gratuito. Queremos que um cidadão de Brangança não seja menos do que um deputado que vive aqui em Lisboa.

O Sr. António Arnaut (PS): - Muito bem!

O Sr. Sousa Tavares (PSD): - Dá-me licença que a interrompa, Sr.ª Deputada?

A Oradora: - Só um momento, Sr. Deputado.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): - Há bocado, permiti-lhe que me interrompesse!

A Oradora: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): - A Sr.ª Deputada está a fazer um discurso brilhante e extremamente inflamado sobre um processo de intenções quando eu estive aqui duas horas a dizer que as minhas intenções não são essas e não compreendo porque é que não responde exactamente ao problema que lhe pus.
A Sr.ª Deputada só me pode convencer se disser: nós queremos um Serviço Nacional de Saúde e proibimos o exercício da medicina à margem desse Serviço Nacional de Saúde.

O Sr. António Arnaut (PS): - Não é isso que esta em causa.

O Orador: - Diga isso claramente e eu aceito. Mas se não é isso que pretende, estamos aqui numa conversa de tolos que não resolve nada, porque os ricos terão sempre acesso à medicina que lhes apetecer!

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

A Oradora: - Sr. Deputado, quando .um advogado do PSD se mete a discutir uma matéria como a saúde dá coisas destas!
É que nós ao discutirmos a Lei do Serviço Nacional de Saúde estávamos de acordo que existisse a medicina privada, não éramos contra ela. Mas a questão não é essa, a questão é que não são nem os mesmos profissionais nem é o Estado ...

Esgotado o tempo de que a oradora dispunha, foi-lhe cortada a palavra pelo controlo automático de tempo.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Leonardo Ribeiro de Almeida.

O Sr. Presidente: - Também para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Henrique de Morais, tem a palavra o Sr. Deputado Vidigal Amaro.

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Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Concluindo o que a minha camarada estava a dizer, a questão é que não é o estado a pagar a medicina privada. Quando se defende a existência de uma medicina pública e de uma medicina privada não é o Estado que paga a medicina privada nem são as mesmas pessoas que fazem a medicina pública e a medicina privada precisamente para não degradarem a medicina pública, indo à tarde trabalhar para a medicina privada!
15to é que é um serviço Nacional de Saúde! As pessoas podem escolher e, se quiserem, podem optar pelo serviço público, que deve ser bom, pelo menos igual ao da medicina privada! É isso que pretendemos.
Mas em qualquer lado onde haja serviços públicos, estes são melhores que os privados ...

Vozes do PSD - Onde!?

O Orador: - ... e é isto que se pretende.

Quanto à intervenção do Sr. Deputado Henrique de Morais queria fazer dois pedidos de esclarecimento.
No artigo 9.º diz-se que todos os cidadãos têm o dever de participar na construção do Serviço Nacional de Saúde. E eu pergunto-lhe se o Sr. Deputado sabe quais foram os cidadãos que construíram este diploma sobre o Serviço Nacional de Saúde. Quais foram, quantos foram, etc.? Porque se diz claramente no artigo 9.º que todos os cidadãos têm o dever de participar na construção do SNS, queria saber, isto em relação ao Serviço Nacional de Saúde preconizado por este governo, quantos e quais foram os cidadãos que participaram na sua construção.
Foi esta a primeira dúvida que se me pôs, mas a partir desta, outra dúvida me surgiu, que é a seguinte: este diploma vai ser levado às organizações de trabalhadores, aos sindicatos, às fábricas, aos campos, etc., para eles poderem, como diz o diploma, participar na sua construção?
A segunda questão que lhe queria pôr diz respeito à regionalização. Quando o Sr. Deputado fala em regionalização, com certeza que não leu bem o articulado, porque esta regionalização é uma regionalização AD.
No diploma fala-se na criação das administrações regionais dos cuidados de saúde, mas esta descentralização é só para os cuidados extra-hospitalares, porque os cuidados hospitalares continuam centralizados. É o centralismo acéfalo deste Governo!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Députado Henrique de Morais para responder, se o desejar.

O Sr. Henrique de Morais (CDS): - Começo por responder ao Sr. Deputado António Arnaut, que considero uma pessoa de intenções rectas, que leva a sério aquilo que afirma.
A diferença essencial que eu vejo entre os dois diplomas está na própria justificação desses diplomas. A justificação é uma afirmação de intenções e não pode dizer que eu estou a fazer um processo de intenções porque, eu estou a lê-las.
Quando o Sr. Deputado apresentou o projecto de lei do seu partido referiu que considerava que o Estado deveria promover a racional e eficiente cobertura médica e hospitalar de todo o País, orientar a sua acção para a socialização da medicina e dos sectores médico-medicamentosos, disciplinar e controlar as formas empresariais e privadas da medicina, articulando-as com o Serviço Nacional de Saúde, etc., etc.
Ora bem, disto entende-se que há uma vontade expressa de socializar a medicina, vontade essa que não existia no preâmbulo daquilo que seria a proposta de lei do II Governo.
Ora, como o Sr. Deputado bem sabe, o CDS não é um partido socialista e com certeza que, se o Sr. Deputado, tivesse demonstrado essas intenções aquando da feitura da proposta de lei, a mesma não teria a concordância do CDS, ou pelo menos teria muito maior dificuldade em obtê-la.
Pela minha parte, eu teria a maior dificuldade em apoiar uma proposta desse género - se não mesmo a completa impossibilidade. É nisso que considero que há uma diferença substancial.

O Sr. António Arnaut (PS): - Só devido ao preâmbulo!?

O Orador: - Sim, porque ele demonstra toda a intenção do projecto de lei do PS.
Comecei por afirmar que considero que as suas intenções são rectas, que o Sr. Deputado não ilude ninguém quando as afirma e, portanto, não tenho qualquer dúvida que a intenção do projecto, de lei do PS era diferente da intenção da proposta de lei do II Governo e considero havia uma diferença substancial entre os dois diplomas.
É que, Sr. Deputado, os articulados podem ser exactamente iguais - e estes têm umas pequenas diferenças, como todo nós sabemos -, mas se tiverem intenções diferentes eles são orintados em diferentes sentidos e não foi «gato escondido com rabo de for a», pois isso foi frontalmente afirmado.
E é nessa frontalidade, pela qual o cumprimento, que eu me baseio para considerar que todo o projecto de lei do PS ia ser desenvolvido num sentido diferente do que seria se se tivesse mantido o II Governo e se se tivesse desenvolvido durante esse governo.

O Sr. António Arnaut (PS): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. António Arnaut (PS): - Sr. Deputado, como não quero fazer um .protesto ou usar qualquer outra fórmula regimental depois de o Sr. Deputado usar da palavra, apenas lhe pergunto se a diferença entre o projecto de decreto-lei do II Governo Constitucional e o projecto de lei que o PS apresentou a esta Assembleia está apenas no preâmbulo.
No entanto, lembro-lhe que a lei aprovada nesta Assembleia não tem preâmbulo.

O Orador: - Sr. Deputado, há-de concordar que, apesar de a lei não ter preâmbulo, o preâmbulo serve para os juristas - e eu não o sou - interpretarem a lei. E neste caso quem tinha de executar a lei ia executá-la sob a batuta da intenção do preâmbulo e não desligada dela.

Pausa.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Deputado Henrique de Morais teve a amabilidade de suspender a sua intervenção e eu permito-me anunciar à Câmara que se encontra na tribuna o Sr. Ministro para as Relações de Amizade com os Povos Estrangeiros da República Popular da China.

Aplausos do PSD, do PS, do CDS, do PPM, da ASDI, da UEDS, do MDP/CDE e de alguns deputados do PCP.

O Sr. Presidente: - Queira continuar, Sr. Deputado Henrique de. Morais.

O Orador: - Em relação à questão que o Sr. Deputado António Arnaut me pôs, não considero que sejam falsas as minhas afirmações, embora aceite que a sua interpretação seja diferente da minha. No entanto, dou muita ianportância às afirmações preambulares quando estas são feitas por pessoas que considero muito sérias e que não vão fugir às suas responsabilidades. E cito como exemplo o projecto de decreto-lei que estamos a discutir, que tem também um preâmbulo e é sobre esse preâmbulo que temos de meditar, porque nele estão contidas as intenções do actual governo.
Quanto ao, protesto feito pela Sr.ª Deputada Zita Seabra, queria dizer que, de facto, não considero que houvesse muita razão para protestar, mas, enfim, cada um tem legitimidade para escolher a forma de usar da palavra.
Mas quando a Sr.ª Deputada protesta porque ninguém das bancadas da AD explicou suficientemente o projecto de decreto-lei, é uma atitude legítima, pois cada um sente se está ou não suficientemente esclarecido conforme a sua vontade. E se realmente a Sr.ª Deputada não se sente esclarecida, lamento.
No entanto, chamo-lhe a atenção para o facto de eu ter começado a minha intervenção dizendo que considerava este tempo de discussão curto e de ter dado uma justificação genérica da apresentação desta proposta de lei. No entanto, reconheço que, efectivamente, devemos ter mais tempo para discutir este projecto de decreto-lei, através de um pedido de sujeição a ratificação.
E em relação a isto julgo que foi oportuno e útil

O Sr. António Moniz (PPM): - Cerca de quatro que o Governo tenha apresentado nesta altura esta minutos, Sr. Presidente.
proposta de lei acompanhada do respectivo projecto

de de-creto-lei, porque suponho que a matéria poderá
ser dw-.nvolvida após a sua aprovação e deste modo
a nossa análise será enriquecida e, portanto, daqui a
uns meses, também a nossa discussão sobre este
assunto será mais profunda.
Confesso que, pessoalmente -talvez por, não ser

jurista -, tenho alguma dificuldade em .prever todas
as consequências que as leis apresentam na sua secura
e gosto de as ver desenvolvidas e mais aproximadas

da ,prática para poder fazer um julgamento.
Acho realmente oportuno não ter feito incidir a
minha atenção num aprofundamento muito intenso
deste projecto de decreto-lei: e por isso julgo que a
Sr.ª Deputada não terá muita razão para protestar.
Em relação ao seguro de saúda -muito embora
agradeça as informações que foram dadas pelo
Sr. Deputado Sousa Tavares, que foram realmente
muito interessantes e completaram esta debate -
entendo, que .ele não serve para beneficiar os mais

ricos e é nesse sentido que lhe dou o meu apoio. Mas suponho que através desse seguro vamos adescar. regar» um :pouco das despesas do Estado em relação aos ricos, podendo esse dinheiro ser dirigido àqueles mais carenciados, isto é, aos pobres. É nesse sentido que eu lhe dou o meu apoio. ' ,

Em relação ao Sr. Deputado Vidigal Amaro e à regionalização, o Sr. Deputado perguntuu-me há bocado quem é que tinham sido as pessoas que elaboraram este projecto? A resposta é óbvia. O Sr. Deputado sabe bem que foram o Governo, os serviços sob a alçada do Ministério e eventualmente, alguns políticos da área da AD que o elaboraram.

Quanto à sua pergunta sobre a discussão ,pública, da lei que se pretende publicar, digo-lhe que não foi feita. Em .parte, esta discussão está a ser feita hoje, porque os órgãos da comunicação social noticiam o que se passa nesta Assembleia e assim o público vai tendo conhecimento de todos estes acontecimentos. Além disso, na discussão da ratificação que vai ser pedida, e que já foi aqui anunciada, ela poderá mais uma vez ser discutida. Nessa altura, com certeza que o Governo, se o entender, poderá pedir a opinião de outras organizações que .não estão ligadas directamente à Assembleha da Repúbhca.

Quanto à regionalização, embora não me lembre bem do que me perguntou, dá-me a impressão de que essa resposta terá de ser de pormenor e que será o Governo que terá de a dar quando apresentara primeira legislação.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura, a Mesa pergunta,lhe se poderia informar, dado as horas a que chegámos, qual o tempo que pensa levar na sua intervenção.

A Sr.º Helena CId'ade Moura (MIDP/UDE) : Sr. Presidente, penso que a aninha intervenção deverá durar cerca de sete ou oito minutos.

O Sr. Presid'ente: -Sr. -Deputado António Moniz, quanto tempo, pensa .gastar na sua intervenção?

O Sr. -Presidente: -Srs. Deputados, estão inscritos para intervenções os Srs. Deputados Helena Cidade Moura, António Moniz e Mário Tomé. Não sendo possível terminar este ponto da ordem do dia antes da suspensão da sessão, apenas concederei a palavra à Sr .• Deputada Helena Cidade Moura.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Cidade Moura.

A Sr.ª Helena Cidade Moura (MDP/C'DE) : Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: As palavras com que o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais se flagela, vindo a esta Assembleia da República representar a farsa do diálogo, confirmam que o Governo apresenta um pedido de autorização legislativa com a ridícula desculpa de que aa urgência dos problemas a resolver não é compatível com a normal interrupção da actual sessão legislativa».

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Depois de há um ano e meio o primeiro governo da AD ter tentado paralisar o dinamismo criado em volta da implementação do Serviço Nacional de Saúde, precisa ainda de mais meio ano para começar a pôr de pé a sua política, de tal maneira ela é difícil de equilibrar! Mas continuará a ser sempre estranho que o Governo e os partidos que o apoiam não tenham encontrado oportunidade para debater aberta e largamente a sua lei sobre o Serviço Nacional de Saúde.
A autorização legislativa é o grande tónico deste Governo, receitado talvez pelo.Ministro dos Assuntos Sociais, mas como toda a medicina curativa dificilmente traz a saúde.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - O expediente da autorização legislativa permite fugir ao diálogo nacional e à confrontação de ideias. Pretende, em última análise, colocar o País perante o facto consumado de uma lei governamental sobre um assunto da maior importância para todos os portugueses, levando a Assembleia da República e a sua lei de rastos atrás do Governo.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - O MDP/CDE repudia, ética e politicamente, o comportamento do Governo, denuncia a sua cobardia e o receio evidente da discussão e vota naturalmente contra o processo utilizado e contra o pedido do Governo.
Não se trata, porém, apenas.de um problema de processo o que aqui se discute.
Trata-se também de um problema de fundo, de conceito de vida e de sociedade, de orientação política e de concepção social.
O Grupo Parlamentar do MDP/CDE já teve ocasião de afirmar mais do que uma vez nesta Assembleia a sua convicção fundamentada do enorme falhanço que constituiu e constitui o denominado projecto da AD para a sociedade portuguesa. Não se transforma a realidade nem com ficções nem com voluntarismos!
No campo específico da saúde, a proposta de lei que o Governo apresenta para alterar as bases do Serviço Nacional de Saúde não é mais que uma tentativa infrutífera, porque incompatível com a dinâmica que à volta da saúde já foi criada, para inverter sectorialmente o que não foi possível fazer na globalidade da estrutura económico-social. Pontos há, no entanto, que não permitem sequer vislumbrar quais as hipóteses seguras de regulamentação e concretização ulterior.
Está neste caso, logo de início, o artigo 2.º, que trata das relações de complementaridade e coordenação, entre o sector público e o sector privado «através da celebração de convénios e do regime de reembolso».
No seu articulado, os actuais responsáveis governamentais do sector da saúde retomam conceitos passados, como seja o da gratuidade, definida no artigo 17.º para «os grupos sociais vulneráveis» que no futuro não muito longínquo teriam o nome de indigentes em atestados semelhantes àqueles que as juntas de freguesia do fascismo lhes passavam para poderem receber a esmola de um tratamento médico ou de um internamento hospitalar.
A sociedade portuguesa, porém, evoluiu e não é possível sob nenhum pretexto nem com qualquer máscara retomar os valores do passado, num mundo que caminha no sentido do progresso. Embora o Sr. Ministro tenha oportunamente e publicamente contado com o bom senso do povo. Não resultou!
Não se pode, nem com as roupagens douradas de um certo tecnocratismo, inverter a força social que gera uma nova e diferente dinâmica colectiva.
É neste sentido que resulta ambígua a redacção do artigo 24.º quando invocando os «critérios de racionalidade económica» que ninguém contesta, procura «implementar um sistema organizado e específico de
contabilidade analítica de custo-benefícios», que aplicado ao campo de uma saúde de reembolsos e de convénios entre sectores, pode abrir caminhos incontroláveis.
É ainda no vago e no desconhecido que se fica quando na alínea b) do artigo 22.º se fala em «outras receitas ... a ser criadas em legislação especial».
De todas.as intervenções vindas da AD nesta matéria tornou-se patente que o sentido de dignidade humana pode também dividir os deputados nesta Assembleia da República. Entre a pessoa não pagar, porque o Estado lhe assegura o direito à saúde só pelo facto de ser cidadão e estar vivo, e a pessoa pagar 20$ ou 50$, ou 100$, segundo os seus proventos, há a diferença entre ser-se livre e sentir-se seguro e o ser pobre ou ser rico perante a necessidade que se tem!

O Sr. Vidigal Armaro (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O povo português teve oportunidade depois do 25 de Abril de sentir e participar em algumas medidas pontuais de importante significado para melhorar as suas condições no campo da saúde.
Foi o caso das dezenas de vilas e aldeias que conheceram a rica e ainda que incompleta experiência do serviço médico à periferia.
Foi a participação entusiasta da população na procura, através das autarquias e de outros sectores de acção política e social, de soluções organizadas e colectivas para que a saúde tenha uma nova face no Portugal democrático.
Foi a rica e ampla discussão que por todo o País se realizou e que interessou milhares e milhares de pessoas, quando, na hora certa, o então ministro António Arnaut lançou um projecto de bases do Serviço Nacional de Saúde que serviu de suporte à lei que hoje vigora, que a AD ignorou durante todo o tempo que tem sido governo e que agora, para afastar os fantasmas e o pesadelo de uma realidade, pretende revogar na hora errada!
Tem, repetido o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais (e mais uma vez o escreve nesta proposta que agora envia) que pretende a inflexão do «caminho doentio para a saúde». Metáfora sem grande conteúdo!
Agora o que será pesado de consequências ricas de conteúdo será o facto de esta proposta de lei do Governo ser aceite nesta Assembleia. Nós diremos então que, irresponsavelmente, o Governo e a sua maioria inflectem.para a doença é fazem-no desleal-

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mente porque o fazem em nome do saudável caminho político aberto pelo povo português.

Aplausos do MDP/CDE, do PCP e de alguns do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, ficou acordado que a sessão seria suspensa às 20 horas. Portanto, o Sr. Deputado António Moniz fará a sua intervenção depois do jantar. Certamente que V. Ex.ª compreenderá e respeitará o horário estabelecido na Conferência dos Grupos Parlamentares. 15so foi o que efectivamente ficou combinado. A Mesa vai suspender os trabalhos.

O Sr. António Moniz (PPM): - Sr. Presidente, dá-me licença?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. António Moniz (PPM): - Sr. Presidente, se todos estivessem de acordo, faria a minha intervenção antes do intervalo, visto ser demasiado curta. Além disso, parece-me que a intervenção do Sr. Deputado Mário Tomé também é pequena.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado: ficou combinado na Conferência dos Grupos Parlamentares suspender a sessão às 20 horas. Como entendo conveniente respeitar o horário estabelecido, assim vou fazer.
A Mesa informa que entraram os seguintes projectos de lei: n.º 247/II, subscrito pelo Sr. Deputado Borges de Carvalho e outros Srs. Deputados do PPM, sobre a criação do concelho de Carnaxide; n.º 248/II, subscrito pelo Sr. Deputado Reinaldo Gomes e outros Srs. Deputados, sobre a criação do Centro de Promoção Náutica e Piscatória de Peniche, e n.º 249/II, subscrito pelo Sr. Deputado Vergílio Rodrigues e outros Srs. Deputados do PS, sobre a contagem do tempo de serviço docente para efeito de ingresso nas fases.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente: se V. Ex.ª me autoriza, fazia uma sugestão no sentido de se marcar o reinício dos trabalhos não para as 22 horas, mas para as 21 horas e 30 minutos, dado o atraso que já temos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, agradeço a sua sugestão, mas como já saíram da sala alguns Srs. Deputados não poderemos aceitá-la. Além disso, ficou assente na Conferência dos Grupos Parlamentares que a suspensão da sessão terminaria às 22 horas.
Srs. Deputados, peço-lhes o favor de comparecerem às 22 paras em ponto. A Mesa estará e VV. Ex.as têm a obrigação de comparecer pontualmente ao reinício da sessão.

Eram 20 horas e 5 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 22 horas e 25 minutos.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Moniz.

O Sr. António Moniz (PPM): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O PPM reconhece a necessidade premente de se preencher um vazio normativo resultante da revogação da Lei n.º 56/79, de 15 de Setembro, símbolo e expressão de dogmatismo em matéria de saúde.
E não venha dizer-se, hipocritamente, que se está a tentar fugir à discussão dos problemas. Há bem pouco tempo a oposição teve o ensejo de interpelar o Governo, podendo dizer de sua justiça, ouvindo as razões da Administração e atirando a esta, posteriormente, com uma autêntica torre de Babel de requerimentos, alguns a fazer número, devido à pobreza do seu conteúdo, outros simplesmente redundantes em relação aos primeiros e ainda uns últimos com montanhas de demagogia.
O espírito e o contexto da Lei n.º 56/79 já foram suficientemente discutidos. A maioria já afirmou repetidamente que quer conferir ao sistema de saúde um carácter descentralizado e desburocratizado que permita a necessária reestruturação e o aproveitamento óptimo dos equipamentos existentes, impedindo-se o divórcio desastroso entre a medicina pública e privada. Como já se afirmou, a AD e o seu governo apenas aceitam critérios de qualidade e de custos/benefícios, e não soluções ditadas por conceitos estatizantes pseudo-igualitários. Na ocasião da interpelação, tanto os Srs. Ministro dos Assuntos Sociais e Secretário de Estado como os partidos da maioria o declararam de forma inequívoca.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - É falso!

O Orador: - Simplesmente, a oposição não quis ouvir, tomando uma atitude doentia, para a qual não é possível qualquer diagnóstico ou a aplicação de qualquer terapêutica. Pois, para as oposições, não há democraticamente uma variedade de soluções, razão por que não lhes interessa uma discussão objectiva do problema da saúde.
Para eles, apenas há um dogma constituído pelas suas próprias perspectivas, da qual fizeram um tabu intocável, apesar da maioria do povo português ter demonstrado no sufrágio que nele não estava interessado.

Vozes do PS e do PCP: - Mentira!

O Orador: - A oposição já foi contaminada por uma espécie rara de «síndroma de Espinosa» ...

Risos do PSD.

... e certamente não pretenderá que o Governo tenha autorização para alterar a legislação sobre o Serviço Nacional de Saúde, e fazê-la substituir por outra mais realista e ajustada às exigências concretas da população.

Uma voz do PCP: - Com o seu voto, Sr. Doputado.

O Orador: - É bom que fique bem claro que tanto a oposição como a maioria têm a faculdade de exer-

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cer o direito salutar do pedido de ratificação dos diplomas que o Governo elaborará ao abrigo de autorização, razão por que o argumento de que não pretende discutir com as forças políticas da oposição não tem qualquer fundamento, a não ser congeminar-se um expediente demagógico para tentar confundir a opinião pública, afirmando melodramaticamente que se pretende legislar nas costas do povo e na penumbra dos gabinetes.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A proposta apresentada pelo Governo e distribuída a todos os grupos parlamentares constitui,
sem dúvida, uma tentativa de arquitectar a lei fundamental sobre saúde. Passaremos com ela a ter uma autêntica «constituição» da saúde, libertando toda a sua problemática da subordinação à alternância do poder e ao cariz partidário da força política que ocasionalmente ocupa o executivo.
A lei de bases da saúde não pode ser uma outra «reforma agrária» do ano iluminado de 1975, que parta de dogmas ridículos como o de que o trigo vermelho produzido com métodos e códigos vermelhos tem o dom especial de se multiplicar indefinidamente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Bastam a coragem política e a frontalidade demonstradas por esta intenção para que o PPM vote afirmativamente a autorização legislativa pedida pelo Governo.

Aplausos do PPM, do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: pediram a palavra os Srs. Deputados António Vitorino, António Arnaut, Fernandes da Fonseca e Luís Filipe Madeira.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Vitorino, para um pedido de esclarecimento.

O Sr. António Vitorino (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado António Moniz: - Trata-se de um pedido de esclarecimento no sentido rigorosíssimo do termo.
Como sou relativamente ignorante em diversas matérias, sem ter grande complexo de assumir a minha própria ignorância, como sou também cultor de algumas pequenas diversidades culturais que são trazidas a esta Câmara pelos Srs. Deputados e ainda como a intervenção do Sr. Deputado António Moniz me fez pensar não propriamente no «síndroma de Espinosa», mas no «síndroma de Pirandelo», eu gostaria que o Sr. Deputado António Moniz - numa generosidade que lhe é característica quando adjectiva as posições da oposição - me esclarecesse sobre esta angústia que me deixou depois de jantar: afinal, que espécie de síndroma é esse que seja o «síndroma de Espinosa»?!
Sempre lhe diria que honni soit qui mal y pense ...

Risos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - 15to é pior que uma torre!
O Sr. César de Oliveira (UEDS): - É pior que um elefante!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Fernandes da Fonseca.

O Sr. Fernandes da Fonseca (PS): - Sr. Deputado António Moniz: ouvi com muita atenção a sua intervenção e gostaria de colocar apenas uma pergunta muito simples e directa.
V. Ex.ª disse que não tem interesse para a oposição a discussão dos problemas objectivos de saúde. Pergunto-lhe se a discussão que se travou nesta Câmara, há muito pouco tempo, sobre cuidados primários da saúde, a respeito de um projecto de. lei apresentado por um dos partidos da oposição, não é um problema concreto da saúde neste país, problema que a maioria rejeitou.

O Sr. Presidente: - Para um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Filipe Madeira.

O Sr. Luís Filipe Madeira (PS): - Sr. Deputado António Moniz: como penso que V. Ex.ª não sofre de nenhuma síndroma de falta de vigor, eu quero protestar porque não pode servir de álibi a celeridade que estes trabalhos têm de ter nesta «maratona noctuma» para deixar passar em claro um aspecto que vai sendo repetido impunemente pela maioria desta Assembleia. Na verdade, a maioria desta Assembleia não pode arrogar-se o direito de representar a maioria dos portugueses.

Protestos do PSD, do CDS e do PPM.

15so, é uma confusão do ponto de vista aritmético: uma maioria de 47 % não é uma maioria de 100 %.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: terá o Sr. Deputado António Moniz confundido a maioria dos representantes com os representantes da maioria? Ou, como se diria em Coimbra, para o Sr. Deputado a beira da estrada será o mesmo que a estrada da Beira?

Risos do PS, do PCP, do MDP/CDE, da. UEDS e da ASDI.

O Sr. Presidente:.- Sr. Deputado António Moniz, se deseja responder aos pedidos de esclarecimento e ao protesto que foram formulados, tem a palavra.

O Sr. António Moniz (PPM): - Sr. Deputado António Vitorino: quanto ao «síndroma de Pirandelo», queria dizer-lhe que a cada um cabe a sua verdade V. Ex.ª ficará com a sua e eu com a minha.

Risos

O Sr. António Vitorino (UEDS): - Qual sua?

O Sr. .Presidente: - Srs. Deputados: pese o agrado provocado pelo excesso de. humorismo que todas VV. Ex.as vêm cultivando, a Mesa lembra-lhes a enorme quantidade de trabalho que temos para fazer. Pedia-lhes o favor de deixarem o Sr. Deputado António Moniz terminar a sua intervenção.
Queira continuar, Sr. Deputado.

O Sr. António Moniz (PPM): - Quanto ao Sr. Deputado Luís Filipe Madeira, vem com um «trocadilho» a que eu gostaria de responder com outro «trocadilho», que conheço muito bem e que o meu amigo deve conhecer também da vida de Coimbra. É a história do «olho nu». Mas não. me posso referir

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a ela, porque, além de haver muitas senhoras, estamos numa Assembleia que me merece muito respeito.

Risos.

Quanto ao Sr. Deputado Fernandes da Fonseca, pessoa que respeito muito ...

O Sr. Presidente: - Desculpe-me interrompê-lo, Sr. Deputado, mas há muito ruído na Sala e peço o favor de deixarem prosseguir o Sr. Deputado António Moniz. Além disso, gostaria de pedir ao Sr. Deputado António Moniz e a todos aqueles que fizeram o seu curso na Universidade de Coimbra que guardem, da liberdade de espírito que poderia correr entre o Choupal e a Alta, aquele sentido das proporções que não permite que tudo se transponha para a Câmara dos Deputados.

Risos.

Aplausos do PSD, do PS, do CDS, do PPM, da ASDI e da UEDS.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade de continuar, Sr. Deputado António Moniz.

O Orador: - Sr. Deputado Fernandes da Fonseca, pelo respeito que me merece, dir-lhe-ia que o problema da saúde, da maneira como foi colocado, consiste numa questão de perspectiva política, entendendo a maioria que a saúde não pode ser objecto de alternância partidária e que uma lei fundamental que escape ao cariz partidário é sempre necessária para este país. Tentar encobrir esta situação, estando em discussão situações concretas, nomeadamente o problema de falta de camas, julgamos que não leva a nada nem resolve os problemas.
Quanto a nós, há que esperar que o governo da maioria ponha em prática o seu sistema de saúde, para que a oposição veja se, na verdade, a administração da maioria é ou não competente. Antes disso, a oposição não o pode verificar, Sr. Deputado.

Aplausos do PPM, do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé, para uma intervenção.

O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Esta proposta de lei que pretende legitimar toda a prática que o Governo tem desenvolvido contra o Serviço Nacional de Saúde subordina-se a duas ou três ideias principais que, no fundo, são a base da política do Governo não só em relação à saúde, mas também em relação ao resto.
Para o Governo e para a AD tudo aquilo que aponta no sentido da melhoria das condições de vida dos trabalhadores sofre de facciosismo político-ideológico. Para se travar as leis e a actuação das instituições desse facciosismo basta que se ponha tudo a funcionar a favor quer do patronato, quer dos médicos privados, quer da medicina privada, etc. Ou seja, é sempre ideológico aquilo que diz respeito aos interesses de quem trabalha; não tem qualquer ideologia aquilo que diz respeito aos interesses de quem explora os que trabalham. Claro que isto é um vício de raciocínio, mas não engana ninguém.
Se a ideologia do Serviço Nacional de Saúde pode ser apodada de socializante, a desta proposta de lei, que quer liquidar este Serviço, é uma ideologia privatizante, contra o todo social, a favor de alguns.
Depois põe-se a questão, talvez a fundamental, de que o Serviço Nacional de Saúde não deve ser gratuito porque aqueles que ganham mais devem pagá-lo.
Já uma vez aqui disse que os trabalhadores não se importam que os ricos tenham a saúde «de borla» desde que a tenham pago previamente através de impostos fortemente progressivos e através da eliminação das condições de exploração que praticam. Esta é a questão fundamental.
Os senhores da AD e do Governo pretendem, acima de tudo, pôr a medicina privada «às cavalitas» da generalidade do povo, da necessidade da saúde de todos os portugueses. E, assim, serão todos os portugueses a pagar serviços péssimos para que a medicina privada possa progredir e florescer.
E não só pagam serviços péssimos, porque os médicos se repartem ou malpartem entre os serviços públicos que devem prestar e a sua própria medicina privada, mas também, fundamentalmente, porque o Governo se desculpa com a falta de verba orçamental para criar as estruturas necessárias a uma saúde decente para o povo, tentando que nós ignoremos que se o Orçamento não chega para a saúde é porque é delapidado e dissipado noutras áreas, noutras zonas, noutros níveis que não são de interesse para o povo, como para a repressão e para os incentivos à iniciativa privada. Poucas palavras são pois necessárias para expressar a nossa opinião sobre este pedido de autorização legislativa.
Se o Governo, por força do n.º 1 do artigo 170.º da Constituição, tem direito a esta iniciativa, como aliás invoca, o que não tem é o direito de rever a Constituição, como tem feito, dizendo descaradamente que não concorda com a lei e portanto não a cumpre. Não a cumpre porque ela não está de acordo com a Constituição. Logo, é a política do Governo que está mal.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo da AD impune, em função da maioria que nesta Assembleia o apoia, mas que não tem o apoio da maioria efectiva. do povo português, ao apresentar à Assembleia da República esta proposta de lei, tenta passar moeda falsa, tenta fazer batota. Nós dizemos: fora com os batoteiros, fora com o governo AD!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O artigo 64.º da Constituição da República é bem explícito no que à saúde se refere. E, se não os maçar muito, vamos aqui reproduzir ...

Vozes do PSD e de CDS: - Maça, maça!

O Orador: - Aliás, tudo aquilo que diz respeito à Constituição da República vos maça bastante, mas é nela que o povo português assenta grande parte da perspectiva da sua luta.
Todos têm direito à protecção da Saúde e o dever de a defender e promover. O direito à protecção da saúde é realizado pela criação de um Serviço Nacional de Saúde, universal, geral e gratuito, pela criação de condições económicas, sociais e culturais que garantam a protecção da infância, da juventude, da velhice e pela melhoria sistemática das

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condições de vida de quem trabalha, bem como pela promoção da cultura física e desportiva, escolar e popular e ainda pelo desenvolvimento da educação sanitária do povo.
Para assegurar o direito à protecção da saúde incumbe, prioritariamente ao Estado: garantir o acesso a todos os cidadãos, independentemente da sua condição económica, aos cuidados da medicina preventiva, curativa e de reabalitação; garantir uma racional e eficiente cobertura médica e hospitalar de todo o País; orientar a sua acção para a socialização da medicina e dos sectores médico-medicamentosos; disciplinar e controlar as formas empresariais e privadas da medicina, articulando-as com o Serviço Nacional de Saúde; disciplinar e controlar a produção, a comercialização e o uso de produtos químicos, biológicos e farmacêuticos e outros meios de tratamento e diagnóstico.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Foi com base no referido artigo 64.º da Constituição que esta Assembleia aprovou a Lei do Serviço Nacional de Saúde que, lamentavelmente, ainda não entrou em vigor e por isso também os governos AD têm de ser responsabilizados pela total infracção à legislação.
É esta lei, que consagra uma das mais significativas conquistas do povo português, que o governo AD pretende revogar e substituir por outra. Para benefício dos nossos trabalhadores, para benefício do povo português? É evidente,que não!
Argumentando com incrível cinismo e oportunismo, em nome de uma falsa responsabilidade, de um falso equilíbrio, de um falso realismo, o Governo AD quer, ao contrário do que afirma, com a legislação que propõe, perpetuar - também no que à saúde diz respeito - a desigualdade e a injustiça social.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sem pormenorizarmos, afirmamos que quer o preâmbulo do projecto de decreto-lei sobre o Serviço Nacional de Saúde, quer o seu articulado representam uma violação programada e sistematizada da Constituição da República.
E, Srs. Deputados, quer a AD queira quer não, e a despeito dos seus desesperados esforços, a Constituição da República Portuguesa de 2 _de Abril de 1976 está ainda em vigor, ainda não foi revista e, embora na prática se actue como tal, o caso é que a pretendida revisão ainda não foi feita.
Srs. Deputados, é dever de todos respeitar o artigo 165.º da Constituição, que confere, à Assembleia da República o .exercício de funções de fiscalização sobre a actividade do Governo e vigiar pelo cumprimento da Constituição ...
O Deputado da UDP assumirá, em pleno, os seus direitos, as suas funções, as suas obrigações e opor-se-á aos desígnios da AD.
Srs. Deputados da AD, é o próprio Governo que, ao invocar, ele também, o artigo 165.º da Constituição, na «Exposição de motivos», embora com objectivos diferentes, que lhes lembra, que nos lembra - veja-se só! - o cumprimento dos vossos, dos deveres dos deputados.
E, no cumprimento, desse dever, o deputado da UDP, como já afirmou, opor-se-á à tentativa deliberada de violação e subversão da Constituição por parte do Governo e da AD.
A UDP vota pela rejeição deste pedido de autorização legislativa do Governo, relativa ao Serviço Nacional de Saúde, e exige a entrada em vigor, de imediato, da Lei n.º 56/79, de 15 de Setembro, que, embora criticamente, aprovou e apoia.

O Sr. Jorge Sampaio (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Sampaio (PS): - Todos nós sabemos que a agenda de hoje está particularmente sobrecarregada e que o debate que aqui estamos a travar é de grande importância.
Mas, curiosamente, esse debate tem-se caracterizado, Sr. Presidente, por ouvirmos os talentos do Sr. Deputado Sousa Tavares, de resto inegáveis em matéria de saúde, as posições de outros deputados, e um observador minimamente atento, como proeuro ser, interroga-se sobre a seguinte questão: quando é que, finalmente, o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais vai esclarecer esta Câmara sobre a política de saúde efectiva que propõe para a comunidade portuguesa, qual o papel para a medicina preventiva na comunidade portuguesa, qual a prioridade para a medicina curativa, etc., etc., etc.?
15to porque, afinal de contas, tem-se estado a assistir a um diálogo entre as bancadas, mas do que se trata é de um pedido de autorização legislativa para se legislar sobre matéria de interesse nacional.
Qual é a opinião do Governo? Qual é a política governamental sobre esta matéria? Fala-se de gastos com a saúde, mas não se discute rigorosamente nada, sobre as prioridades a estabelecer.
No fundo, o que perguntaria à Mesa é se V. Ex.ª, Sr. Presidente, tem previsto, no calendário de inscrições, o uso da palavra por parte do Sr. Ministro dos Assuntos Sociais, para que possamos saber quando é que ele, finalmente, esclarece esta Câmara sobre a política de saúde deste Governo.

Aplausos do PS, do PCP, da ASDI, da UEDS e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - A única coisa que a Mesa pode dizer ao Sr. Deputado Jorge Sampaio e a Câmara é que concede a palavra a quem lha pedir.
Entretanto, esclareço que neste momento não há inscrições, pelo que declaro encerrado o debate e passamos de seguida à votação.

O Sr. António Arnaut (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputado.

O Sr. António Arnaut (PS): - Sr. Presidente, o encerramento do debate desta forma abrupta é talvez imprevisto, porque toda a gente estava a aguardar que o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais fizesse uma intervenção.
De forma que peço ao Sr. Presidente que pergunte expressamente ao Sr. Ministro se deseja fazer uma intervenção.

Protestos do PSD, do CDS e do PPM.

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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não está nas atribuições da Mesa senão dar a palavra a quem lha solicite e não pode estar a perguntar aos Srs. Deputados ou a qualquer membro do Governo se porventura desejam ou não usar da palavra.
O Sr. Ministro dos Assuntos Sociais tem o direito de solicitar a palavra quando entender dever fazê-lo, assim como consequentemente, qualquer de VV. Ex.as.
Foi por não haver inscrições e porque depois da intervenção do Sr. Deputado Jorge Sampaio o Sr. Ministro nada solicitou que a Mesa mais não teve de fazer do que declarar encerrado o debate.
Claro que VV. Ex.as poderão fazer as apreciações que entenderem em declaração de voto, mas neste momento está encerrado o debate e vamos votar.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - É para, na sequência da intervenção do Sr. Deputado António Arnaut, manifestar, em nome da minha bancada, acordo quanto à posição que a Mesa havia assumido.
Creio que se o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais não pediu a palavra, a Mesa não tinha de lha conceder, mas penso que, por vezes, há silêncios que são muito mais significativos do que todos os discursos e que, mais uma vez, o silêncio do Sr. Ministro é muito mais significativo do que qualquer discurso ...

Aplausos da UEDS, do PS, de alguns deputados do PCP e da ASDI.

Protestos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, desculpará que o interrompa, mas a verdade é que o debate está encerrado e o facto de qualquer Sr. Deputado continuar a fazer apreciações ao silêncio ou às intervenções dos outros Srs. Deputados ou de um membro do Governo significa reabrir o debate.

VV. Ex.as atribuirão ao silêncio do Sr. Ministro dos Assuntos Sociais o valor que entenderem. Na altura própria, a Mesa encerrou o debate e não o vai reabrir para que VV. Ex.as façam apreciações pelo facto de alguém usar ou não. da palavra.

Aplausos do PSD e do CDS.

O Sr. António Arnaut (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interrogar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputado.

O Sr. António Arnaut (PS): - Sr. Presidente, tenho-me habituado a apreciar a tolerância e a compreensão com que V. Ex.ª dirige os trabalhos desta Assembleia e sei que V. Ex.ª nunca encerrou um debate nestas condições.
O Regimento diz que o debate é encerrado se não houver mais oradores inscritos ou quando, tendo usado da palavra dois deputados de cada partido, tenha sido requerido o encerramento do debate. Mas nunca a Mesa encerrou um debate de uma forma tão abrupta e imprevista, porque sempre entendeu aceitar a inscrição de deputados que ainda não estivessem inscritos.
Pela circunstância de não haver nenhum deputado inscrio creio que a Mesa não podia encerrar o debate sem se certificar se algum deputado ainda pretendia usar da palavra. E, relativamente a esse facto, interrogo a Mesa no sentido de saber se V. Ex.ª atendeu a essa circunstância e se não entende dever perguntar se algum deputado ainda deseja intervir, designadamente pertencente a partidos que ainda não participaram neste debate.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Arnaut, V. Ex.ª disse que normalmente a Mesa conduzia os debates com tolerância e compreensão. Embora seja sempre mais agradável ouvir uma palavra que envolve uma valoração positiva dos nossos comportamentos do que aquela que possa envolver uma censura, devo dizer que, em consciência, tanto minha como de todos os meus colaboradores da Mesa, as suas palavras não passam de um acto de justiça, não são um favor nem sequer um cumprimento - é o reconhecimento de uma verdade de que todos temos consciência.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - V. Ex.ª mesmo, Sr. Deputado, deu a resposta a si próprio.
A Mesa encerrará os debates, nos termos do Regimento, quando não houver mais oradores inscritos ou quando, tendo já falado dois Srs. Deputados de cada partido, se requeira que a matéria seja dada por discutida. A segunda hipótese não se configurou, mas configurou-se claramente a primeira.
A Mesa não tinha oradores inscritos, informou-o e não me consta que V. Ex.ª, que tantas vezes tem exercido, com a mesma tolerância e compreensão, a vice-presidência, em honrosa substituição do Presidente efectivo, alguma vez tivesse, por falta de inscrições, perguntado se alguém mais desejava usar da palavra. É o simples facto de não haver oradores inscritos que determina o encerramento do debate.

Vozes do PSD e do CDS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Portanto, Sr. Deputado, sem prejuízo da oportuna questão que V. Ex.ª colocou, a Mesa entende que procedeu com a compreensão que sempre tem usado, que não prejudicou ninguém, que o facto de não haver oradores inscritos tinha o significativo e inequívoco sentido de que mais ninguém desejava usar da palavra, porque, se não, tê-lo-ia feito como todos VV. Ex.as o foram fazendo, e por isso considerou o debate encerrado. E não encontra em nenhuma das razões depois aduzidas nem nos motivos que determinaram posteriores pedidos de palavra alguma coisa que a leve a rever a posição que tomou e que mantém.

O Sr. Manuel Lopes (PCP): - Este Ministro é uma vergonha!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos então votar na generalidade a proposta de lei n.º 48/II, que concede ao Governo autorização para revogar a Lei

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n:º 56/79, de 15 de Setembro (Serviço Nacional de Saúde).

Submetida à votação, foi aprovada, com 109 votos a favor do PSD, do CDS e do PPM e 82 votos contra do PS, do PCP, da ASDI, da UEDS, do MDP/CDE e da UDP.

O Sr. Presidente: - Há alguma objecção a que se proceda de imediato à votação na especialidade e que só depois tenham lugar as declarações de voto?.

Pausa.

Como ninguém se opõe, vamos votar na especialidade, em conjunto, os dois artigos da proposta de lei.

Submetidos à votação, foram aprovados, com votos a favor do PSD, do CDS e do PPM e votos contra do PS, do PCP, da ASDI, da UEDS, do MDP/CDE e da UDP.

São os seguintes:

ARTIGO 1º

É concedida ao Governo autorização para alterar a legislação sobre o Serviço Nacional de Saúde, com revogação da Lei n.º 56/79, de 15 de Setembro, e sua substituição por nova lei do SNS e mais legislação complementar.

ARTIGO 2º

A.autorização concedida pela presente lei caduca noventa dias após a sua entrada em vigor.

O Sr. Presidente: - Para _uma declaração de voto, tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É na verdade lamentável que, estando nós a discutir um assunto tão importante para o. País e para os Portugueses, como é ,o Serviço Nacional de Saúde, o Ministro dos Assuntos Sociais, responsável pela elaboração do decreto-lei a que o Governo pro cederá, tenha usado da palavra durante as horas em que este debate se prolongou na Assembleia apenas numa extensão de vinte e cinco linhas do Diário da Assembleia da República: A intervenção do Sr. Ministro preencheu apenas meia página do Diário!
Esteve hoje aqui durante todo o dia, a Televisão à espera de que a votação sobre esta proposta de lei se desse, para depois o Sr. Ministro dar através dela os esclarecimentos que aqui, na Assembleia da República, perante os deputados, teve medo e se negou a dar.

Vozes do PCP: - Muito bem!

Neste momento o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais retira-se do hemiciclo.

A Oradora: - O Sr. Ministro prepara-se para ir à Televisão manipular o povo português.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Ainda para mais é malcriado!

A Oradora: - Não conheço que algum deputado dos partidos da oposição tenha sido convidado a fazer uma intervenção na Assembleia da República sobre este pedido de autorização legislativa. 15to é que é manipular. E o dignificado trabalho dos deputados nesta Assembleia não é votar chorudos vencimentos ou subsídios como hoje iremos votar vergonhosamente; o que dignifica esta Assembleia é levar ao conhecimento dos Portugueses o trabalho que os deputados aqui estão a fazer!
A AD tem medo do veredicto do povo, tem medo de que o povo português conheça o que os partidos pensam e tem medo de que o povo se aperceba de quem é que defende os seus interesses e quem é que está contra.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - É um escândalo que, num debate de apresentação e votação de uma proposta de revogação de uma das leis mais importantes para os Portugueses - a Lei do Serviço Nacional de Saúde - , o Ministro dos Assuntos Sociais tenha falado o equivalente a vinte e cinco linhas, não tenha dito nada durante o dia inteiro do debate parlamentar, tenha abandonado a Sala antes de este debate encerrar e se prepare agora para ir à Televisão prestar esclarecimentos e fazer manipulação perante os Portugueses.

Vozes da PCP: - É uma vergonha!

A Oradora: - 15to, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é uma vergonha, mas isto é a AD!

Aplausos do PCP, do MDP/CDE e de alguns deputados do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Ambrósio.

A Sr.ª Teresa Ambrósio (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Será uma declaração de voto muito simples, tão simples quanto nos obriga o último dia dos nossos trabalhos com uma agenda tão carregada.
Devo confessar que nunca pensei que chegássemos tão baixo na desqualificação desta Assembleia. O que hoje aqui se passou relativamente ao Serviço Nacional de Saúde não foi um debate político, foi uma tentativa de análise de grupo provocada pelo síndroma psicanalítico do Sr.Ministro dos Assuntas Sociais.
No fundo, o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais manifestou na sua bancada, durante todo o tempo, o seu silêncio face às comunicações, intervenções, defesas e propostas que aqui foram feitas pelos deputados eleitos pelo povo.
O Sr. Ministro não disse nada. Limitou-se, psicanaliticamente, a olhar para nós como se fôssemos um bando de pessoas ...

Vozes do PCP: - Nem isso!

A Oradora: - ... que precisam de uma cura - a
cura que a força totalitária da AD desejava impor a este país -, modificando, com desrespeito completo pela oposição, pelo valor da vontade e do querer do povo português, uma lei tão importante que trata da saúde e que beneficia os mais desprotegidos nesta sociedade.
O Sr. Ministro, para além de ter mostrado o seu síndroma psicanalítico, mostrou um desprezo completo por esta Assembleia.

O Sr. António Vitorino (UEDS): - Muito bem!

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A Oradora: - Desprezo que a força totalitária da maioria já tem mostrado várias vezes. Como foi dito pela bancada do Partido Comunista, o Sr. Ministro até abandonou a Assembleia numa altura em que o debate ainda não terminou e, que eu saiba das declarações de voto consta também as posições que os vários partidos políticos tomaram no debate que se fez sobre este mesmo assunto.

Aplausos do PS, do PCP, da ASDI, da UEDS e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem apalavra o Sr. Deputado Sousa Tavares.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PSD já esta tarde expôs as razões por que está de acordo com a autorização legislativa pedida pelo Governo.

Não somos, nem podíamos ser, como Partido Social-Democrata que somos, contrários à existência de um Serviço Nacional de Saúde. Pelo contrário, temos, em relação a esse Serviço Nacional de Saúde, uma exigência profunda, de claridade, de eficácia, de qualidade total.

O Sr. Manuel Lopes (PCP): - É preciso ter descaramento!

O Orador: - É isso que pretendemos. Pretendemos que o Serviço Nacional de Saúde a criar seja julgado por obras e não por palavras. Estamos todos fartos de palavras e todos precisamos de obras!

O Sr. Sousa Marques (PCP): - Especialmente das suas!

Protestos do PCP.

Sobretudo o povo português precisa de realidades. Há sete anos que lhe fazem promessas, mas há sete anos que a sua situação material pouco ou nada tem melhorado.

Protestos do PCP.

E, se melhorou um pouco, melhorou sobretudo com os governos que não lhes fizeram promessas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Manuel Lopes (PCP): - É preciso ter lata, Sr. Deputado!

O Orador: - Por isso temos esperança de que o Serviço ...

Protestos do PCP.

Uma voz do CDS: - Malcriados!

O Sr. Presidente: - Desculpe interrompê-lo, Sr. Deputado Sousa Tavares.
Srs. Deputados, parece-me estar definitivamente assente entre nós que não é admissível que se esteja a interromper permanentemente e em coro um Sr. Deputado que está no uso da palavra.

Peço a VV. Ex.as que, sem prejuízo do direito do aparte ou até de um senso de humor que há pouco fez passar por esta Câmara um belo momento, VV. Ex.as se coíbam de perturbar quem quer que seja que esteja no uso da palavra.

Queira ter a bondade de continuar, Sr. Deputado.

O Orador: - Sr. Presidente, infelizmente estou habituado a arruaças ...

O Sr. Carlos Brito (PCP): - A fazê-la, a fazê-la!

O Orador: - ..., de maneira que não me faz impressão de maior.
Direi simplesmente que temos esperança de que a nova lei permita a construção de um serviço nacional de saúde concertado com as nossas possibilidades, com uma lei sobre carreiras médicas assente nos três pilares fundamentais: o da carreira hospitalar, o do generalista e o do homem de saúde pública.
E quanto à carreira de saúde pública, muito esquecida em Portugal, é preciso ressuscitá-la na grandiosidade que atingiu com Ricardo Jorge e com outros expoentes no mesmo assunto.

Vozes do - PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por isso temos esperança de que esta lei assente nos postos de saúde, assente na interligação profunda entre os centros regionais de saúde e os hospitais, possa dar uma eficácia aos nossos serviços hospitalares, possa dotar os seus serviços de especialistas que não têm, possa dotar os seus serviços da enfermagem que não existe, possa, de facto, prestar uma assistência eficaz, aquela que podemos, com a nossa magreza de meios, dar desde já à população portuguesa.
Não é com promessas fantasmagóricas, não é acenando com shangrilás, que não estão nas nossas possibilidades financeiras, que realizaremos a melhoria efectiva do povo, mas é dando-lhe o pouco que podemos dar. E o pouco que lhe podemos dar é, apesar de tudo, um serviço hospitalar para o qual temos camas já em número suficiente, mas que não funcionam. E não funcionam porque não temos enfermagem, serviços e dotações suficientes.
É absolutamente necessário que esta eficacidade seja recuperada em Portugal para todos os serviços médicos. É preciso que os centros de saúde sejam uma realidade viva na despistagem preventiva das doenças, na prestação dos serviços primários, na sua interligação com a rede hospitalar.

O Sr. Guerreiro Norte (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Rede hospitalar essa graduada em três níveis: o dos cuidados fundamentais e diversificados, com base nos quatro hospitais centrais do Porto, Coimbra, Lisboa e Évora; a rede dos hospitais distritais, onde se darão os cuidados que não sejam necessários ser altamente diversificados; e os hospitais das misericórdias e os pequenos hospitais concelhios utilizados como centros de convalescença ou até de asilagem ...

0 Sr. António. Arnaut (PS): - Asilagem?! ...

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1 SÉ1t1E - NÜMERO 90'

O Óradore = ... de deficien'te's ou de. pessoas que átingiram uma idade de doença letal normalmente incurável.

Uma voz do PCP: - Brilhaffié! :..

O Orador: - E através desse serviço concertado de saúde, com .ª miragem de' inclusivamente dar aos médicos uma dignidade de carreira, sem lhes permitir a liberdade e a licenciosidade que até agora lhes têm. sido permitidas, obrigando-os, na medida em que se integram num serviço público e escolhem qualquer das três carreiras que acima indiquei, a mostrarem uma eficácia de serviço em jull time. sem com isso os obrigarmos a não poderem exercer medicina particular. Queremos que esse serviço seja. prestado com efectividade.
Por isso o projecto de saúde da AD está neste momento em franca oposição com a Ordem dos Médicos. _ . '
Basta ler o insuspeitíssimo jornal O Dia... , .

O Sr.- António Arnaut, (,PSI: -.15so é.paga _ dis-. forçar!

O Orador: - ... para se ver o ataque feroz desencadeado pela Ordem 'dos Médicos contra o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais e contra o próprio Ministério... , .

Por isso tudo quanto' aqui nesta Assembleia se disse, foi abater na água». Não se quer reconhecer a eficacidade de um esforço a verdade de uma intenção e a seriedade de uma intenção governativa que

esta lei representa.

,Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidentes -Como não há anais declarações devoto, considera-se encerrado definitivamente ...

O Sr. Veiga `de Oliveira (,PCP): - Peço a palavra,,
Sr. Presidente. : . -

-, O Sr. Presidente:- Faça favor, Sr., -Deputado. ,

O Sr. Veiga de Oliveira (,PCP): - Sr. Presidente, peço que fique registado que não tem cabimento falar em «licenciosidade dos médicos»...

O Sr. António Arnaut (RPS): Muito bem-, ,

` O Sr. Magalhães Mota (A6DI): Peço também à

palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: --Para que enfeito deseja usar da palavra, Sr. Deputado? '

O Sr. Magalhães Mata (A9DI): - Para fazer uma.

declaração de voto, Sr. Presidente.

` O Sr. Presidente : - Srs. Deputados, pedia ` ã VV. Ex.`5 que sempre que haja algum Sr. Deputado que queira fazer declaração de voto que se inscreva desde' logo para que a Mesa não declare encerrado ó debate. .

O Sr. António Arnaut (PS): - V. Ex.ª está afazer aquilo que há pouco se acabou de -sugerir!

O Sr. Presidente: = É só o Sr. Deputado Magalhães Mota que deseja ainda uma declaração de voto?

Pausa. 'r -' . ,

Tem V. Ex.` a palavra, Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votámos contra o pedido de autorização legislativa pelas razões que sucintamente passo a expor.
Em primeiro lugar, se dúvidas tivéssemos de que
este pedido de autorização significava muito clara
mente uma fuga ao debate perante esta Assembleia
da República, o comportamento do Sr. Ministro dos
Assuntos Sociais teria, de forma clara, insofismável
e evidente, denunciado que-era esse o exclusivo pro
pósito do Governo. O pedido de autorização era
efectivamente uma fuga ao debate no Parlamento
e isso mesmo .aqui ficou demonstrado. E digo que
era: uma fuga, porque o Governo sabe que a ratifi
cação não é a mesma coisa nem em tempo, nem
ná oportunidade do debate, nem nas possibilidades
que confere a esse mesmo debate e por sabê-lo é que
apresentou este pedido de autorização. Pedido de
autorização, tão sem justificação. quanto o mesmo
Governo, a propósito do regime de liberalização dos
cereais e do açúcar, não tem dúvidas em pedir a
convocação -da Comissão Permanente e uma nova
reunião desta Assembleia para discutir um assunto
que é, com certeza, de menor importância do que
a saúde dos, Portugueses. ..

Aplausos da ASDI e do PS.

Mais ainda, Sr. Presidente e Srs. Deputados: a autorização legislativa só tem cabimento constitucional se se tratar de matéria da exclusiva competência da Assembleia da República. Como dúvidas não existem de que o direito à saúde, regulado no artigo 64.º da, Constituição, não beneficia do regime do artigo 17.º do decreto-lei, isto é, não é um direito incluído nem no título 11 nem um direito que .possa ser protegido nos mesmos termos, a autorização legislativa só tem sentido e conteúdo porque há duas disposições - as dos artigos 16.º e 17.^ - que, essas sim, contendem com a própria disciplina constitucional, com a própria competência desta Assembleia da República.
Quando se fala de taxas moderadoras e de taxas moderadoras adequadas â capacidade económica dos cidadãos utentes, do que se está a falar é da criação de um novo imposto, de um novo imposto com regime novo, que vem afinal modificar totalmente o regime de prestação da saúde e o regime .constitucional a que a Constituição vigente dá cobertura e validade.

Vazes do PS---< Muito bem!

Ó Orador: =É .por isso e só por isso que a.autornzação foi, solicitada. Fora disso a ela não haveria cabimento e o 'silêncio do Sr. Ministro veio também demonstrar o porquê desse pedido de autorização.
Um antigò' ministro, o Dr. Gonçalves Rapazote, disse uma vez que cco poder não dialoga. 0 Sr. Mi-

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nistro dos Assuntos Sociais veio aqui corporizar essa afirmação.

Aplausos da ASDI, do PS, do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Entramos na discussão na generalidade da proposta de lei n.º 52/II, que concede ao Governo autorização para legislar sobre o planeamento urbanístico e o regime jurídico de solos, bem como sobre as medidas tendentes a incentivar a utilização dos solos urbanos e a urbanizar e penalizações consequentes.
Está em discussão.

Pausa.

Para uma intervenção, tem apalavra o Sr. Ministro da Habitação e Obras Públicas.

O Sr. Ministro da Habitação e Obras Públicas (Luís Barbosa): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Era minha intenção apresentar a esta Assembleia o clausulado do decreto-lei que pretendemos elaborar com base na autorização legislativa que agora se pede.
Em todo o caso, não houve tempo físico para o fazer. Considerámos deste modo que seria menos delicado apresentar a esta Assembleia um clausulado que depois, por força inclusivamente da consulta que entendemos dever fazer às autarquias, viesse a ser alterado, não digo com grande profundidade, mas, pelo menos, com mudanças de forma que representassem diferenças substanciais relativamente àquilo que apresentaríamos agora como clausulado.
Apresentámos um conjunto de princípios dos quais não nos afastaremos. Desde já me ponho à disposição de todos os grupos parlamentares para que, se quiserem ter a amabilidade de me indicar um vosso representante, eu possa, durante o próximo mês, dialogar com os representantes de cada um dos grupos parlamentares, no sentido de os sensibilizar para a elaboração de um clausulado definitivo no decorrer do próximo mês.
Gostaria ainda de fazer um aditamento ao texto que distribuímos: é intenção do Governo, para além dos princípios gerais enunciados no texto que foi distribuído, primeiro, não poderem ser considerados como solos urbanizáveis os seguintes tipos de solos: aqueles cuja capacidade de uso agrícola já esteja defendida por lei; aqueles cujo coberto vegetal, especialmente arbóreo, justifique serem considerados reservas ambientais ou de interesse cultural, paisagístico ou recreativo; aqueles cujo uso agrícola consistente interesse ao próprio agregado habitacional, à economia local, regional ou nacional; ...

O Sr. Luís Coimbra (PPM): - Muito bem!

O Orador: - ... aqueles de patente inaptidão para a construção por custo elevado ou insalubridade; aqueles que constituam valores culturais, históricos paisagísticos ou panorâmicos.

O Sr. Borges de Carvalho (PPM): - Muito bem!

O Orador. - É evidente que os proprietários destes terrenos devem ser incentivados a manter o actual uso para que não sofram o impacto da mais-valia provocada pela construção, não havendo, como é lógico, neste caso, qualquer tipo de penalização.
Por outro lado, a aprovação das áreas de desenvolvimento urbano prioritário será da competência do Ministro da Habitação e Obras Públicas, ouvido o Sr. Ministro da Qualidade de Vida.
Em terceiro lugar, a proposta das autarquias locais para definição das áreas de desenvolvimento urbano prioritário deve ter em conta o justo equilíbrio entre a previsão da evolução demográfica nos próximos cinco anos e a necessidade de criar uma oferta de solos adequada por forma a evitar movimentos especulativos.
É ainda intenção do Governo legislar sobre recuperação de edifícios existentes, não permitindo que áreas de construção prioritária prejudiquem o equilíbrio das áreas urbanas actuais, tendo particularmente em vista a necessidade de não comprometer a potencialidade dessas áreas no que respeita a equipamento e espaços livres.
Gostaria ainda de informar a Câmara que é intenção do Governo, como aliás se explicita nos princípios do texto distribuído, lançar uma tributação sobre os terrenos que se mantiverem numa situação expectante e que, portanto, não foram urbanizados e estejam considerados dentro de áreas urbanas prioritárias. Sobre essa matéria, é intenção do Governo aproveitar o próximo decreto orçamental do ano de 1982 para regular os aspectos de tributação que serão apresentados pelo Governo e que esta Câmara discutirá.
Fico à disposição dos Srs. Deputados para responder às perguntas que me queiram colocar.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Ministro da Habitação e Obras Públicas, creio que a complexidade do tema obriga a que ponhamos algumas questões prévias.
A primeira diz respeito à oportunidade deste pedido de autorização: quais são as razões que justificam este pedido de autorização legislativa? Há alguma razão de urgência especial? Qual é essa razão ou esse conjunto de razões que determinam que não seja uma proposta de lei a ser apresentada a esta Assembleia mas, em vez dela, um pedido de autorização legislativa?
Segunda questão: os objectivos da revisão da política de solos abrangem apenas a matéria que costuma considerar-se como relativa à expansão urbana, ou, pelo contrário, é toda uma política de ordenamento do território em matéria de gestão de solos que será matéria a abranger pelo diploma a efectivar oportunamente?
Terceira questão: prevê o Governo modificar, designadamente, o processo relativo às expropriações? Pensa o Governo corrigir o actual processo de expropriações, de acordo com o qual foi equiparada a uma decisão judicial, e parece que contrariamente ao disposto na própria Constituição, a arbitragem realizada na primeira fase do processo de expropriações?
Em relação à tributação a estabelecer futuramente, pensa o Governo que essa tributação vai isentar algumas acções por parte dos proprietários do terreno?

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Ou será uma tributação penalizadora por omissões em relação a outras actividades? Pensa o Governo legislar no sentido de serem tributados os solos não utilizados e reservados para a construção urbana e os prédios urbanos com condições e processos de obras ou de modificações que acabam por, não ser executadas?
Uma última questão, visto o tempo estar a acabar: o que se pensa quando no princípio dos traços gerais do diploma, se anuncia, no n.º 4, a « [...] garantia aos proprietários de uma justa e equitativa remuneração pela alienação dos seus terrenos»? 15to é uma nova forma de expropriação? É uma nova forma de aquisição? É um género intermédio, entre uma coisa e outra? De que modalidade se trata, afinal?

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro da Habitação e Obras Públicas, há mais oradores inscritos para pedir esclarecimentos. Deseja responder já ou no final?

O Sr. Ministro da Habitação e Obras Públicas: - No final, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Ministro.
Tem a palavra o Sr. Deputado Veiga de Oliveira.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Ministro da Habitação e Obras Públicas, temos graves preocupações suscitadas pela proposta de lei de autorização legislativa. 15to porque há claramente uma intenção centralista quando se afirma que «a aprovação das propostas de delimitação das áreas seja da, competência do Governo pelo Ministro da Habitação e Obras Públicas».
Com algum conhecimento de causa, digo-lhe que a competência não pode ser de V. Ex.ª, Sr. Ministro, ou de qualquer outro Ministro da Habitação e Obras Públicas. Quando muito, poderia haver uma competência de arbitragem em caso de litígio, nunca uma competência de 1.ª instância.
Gostaria, pois, de saber se o Sr. Ministro do Governo da AD, que sistematicamente se reclama de descentralizador, pretende manter este traço do pedido de autorização legislativa ou se desiste dele em favor da real autonomia municipal.
Uma outra questão que se coloca é a seguinte: toda a proposta de lei é. um pouco vaga, logo um pouco, para não dizer muito, inconstitucional. Em todo o caso, não queremos com nenhum parti pris tolher qualquer boa intenção. Por isso pretendemos esclarecer-nos a respeito do que se pretende com estas duas figuras: as áreas de desenvolvimento urbano prioritário e a área de construção prioritária.
O Sr. Ministro saberá certamente, tão bem como eu, que a questão que está por detrás de tudo isto é, por um lado, a da disponibilidade dos fundos urbanizáveis e, por outro, a da disponibilidade de habitação com suficiente fartura. Certamente que o Sr. Ministro sabe, tão bem como eu, que qualquer das duas questões tem a ver com tudo, mas sobretudo com o financiamento. A habitação é um problema de financiamento, é sobretudo um problema de financiamento e é, acima de tudo, um problema de financiamento.
Por isso, enquanto os departamentos competentes tiverem, como objecto principal o saber quem é o proprietário de quê,continuamos a não resolver o problema fundamental que é o do financiamento da habitação em condições para todos.
Coloco-lhe duas perguntas: como vai, por um lado, o Sr. Ministro respeitar a autonomia das autarquias, e, por outro, como. vai resolver os problemas de financiamento que são os problemas que estão fundamentalmente em causa?

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, queria interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr.º Deputado.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, na Conferência dos Presidentes dos Grupos Parlamentares ficou assente que haveria um pedido de esclarecimento por cada grupo parlamentar ...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Silva Marques, segundo me. Informam, parece que o que ficou assente foi que haveria uma aceitação por parte de todos os Srs. Deputados de uma certa contenção nos pedidos de esclarecimento.
Parece que essa taxativa fixação de um pedido de esclarecimento por partido não terá chegado a ficar consignada.

O Sr.º Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, parece-me que o que ficou assente na reunião dos líderes dos grupos parlamentares foi uma inscrição para pedidos de esclarecimento por cada grupo parlamentar, e quanto a protestos não haver limite de inscrições. Foi invocado que, relativamente a estes últimos, não faria sentido a limitação, na medida em que os protestos são imprevisíveis quanto à sua motivação.
Foi.isto que assentei no meu apontamento, embora não tivesse ficado definido um limite taxativo, pela razão que acabei de apresentar.
Todavia, peço aos outros grupos parlamentares que confirmem ou não este meu apontamento.

O Sr. Presidente: Realmente, Sr. Deputado, eu não presidi a .essa reunião dos representantes dos grupos parlamentares, foi o Sr. Vice-Presidente José Vitoriano que o fez e peço-lhe que nos informe sobre o assunto.

O Sr. José Vitoriano (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Efectiva-mente estive a presidir a essa reunião, tendo o Sr. Deputado Silva Marques sugerido que. as inscrições para pedidos de esclarecimento fossem limitadas a uma por cada partido. Porém, não houve consenso dos restantes partidos nesse sentido.
O que ficou estabelecido foi que haveria uma certa contenção da parte dos próprios partidos nos pedidos de esclarecimento, tendo em vista o não arrastamento dos trabalhos. Mas não houve nenhuma limitação taxativa sobre a matéria.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado José Vitoriano.
Aliás, devo informar o Sr. Deputado Silva Marques de que os dois Srs. Secretários da Mesa, Reinaldo Gomes e Maia Nunes de Almeida, confirmam o que o Sr. Deputado José Vitoriano acabou de dizer.

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Como V. Ex.ª sabe, nesse momento eu estava a receber o Sr. Ministro para as Relações de Amizade com os Povos Estrangeiros da República Popular da China, que depois esteve aqui no Plenário, mas a informação que me dão confirma o que já foi dito pelo Sr. Vice-Presidente.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, após o que V. Ex.ª acabou de dizer, é evidente que não mantenho a minha afirmação em termos de confrontação, mantenho é a minha convicção.
No entanto, gostava de lembrar que quem sugeriu a limitação das inscrições quanto aos pedidos de esclarecimento, e não quanto aos protestos, foi o Sr. Vice-Presidente José Vitoriano, Presidente em exercício. Mas, repito, aceito que o meu apontamento não seja correcto.

O Sr. José Vitoriano (PCP): - Sr. Presidente, se me permite, é apenas para confirmar que o Sr. Deputado Silva Marques tem razão quando diz que fui eu próprio que sugeri a limitação das inscrições para os pedidos de esclarecimento, sugestão que de facto não foi aceite.

O Sr. Presidente: - Certo, Sr. Deputado. Mas parece que está agora estabelecido o consenso. A única coisa que peço a VV. Ex.as é que, embora a Mesa conceda a palavra a todos os Srs. Deputados que a pedirem, os grupos parlamentares condensem o mais possível esses pedidos.
Tem então a palavra o Sr. Deputado Anselmo Aníbal para pedir esclarecimentos.

O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): - Sr. Ministro da Habitação e Obras Públicas: V. Ex.ª fez acompanhar a posteriori a proposta de lei de autorização legislativa de uma nota informativa. Essa nota informativa revela, a nosso ver, um papel menoríssimo no que concerne às câmaras municipais e propõe que elas façam as suas propostas de delimitação das áreas de desenvolvimento urbano prioritário e das áreas de construção prioritária, apresentando-as às comissões interdepartamentais, assim referidas no n.º 9 dessa nota informativa.
Ora nós gostaríamos de ver esclarecido o conteúdo, a composição e, de alguma forma, os poderes dessas comissões interdepartamentais, que, segundo a chamada nota informativa que acompanha a proposta de lei, terão uma forma diversa nas chamadas áreas metropolitanas.
A segunda questão que quero colocar é esta: o Ministério a que V. Ex.ª preside será o receptáculo destas duas figuras, destes dois instrumentos urbanísticos vindos dos 305 municípios?
O Sr. Ministro não aponta prazos de resposta e não dá indicações sobre a DGPU e DGERU e por isso, perguntava também quais as intervenções que lhes reserva no processo de estudo e de análise das propostas apresentadas pelos municípios e analisadas pelas tais comissões interdepartamentais.
A terceira questão relaciona-se com a publicação no Diário da República daquilo a que nós podemos chamar de «oferta racionalizada dos terrenos». As câmaras serão os detectores e receptáculos dos terrenos urbanizáveis nas suas áreas e os tais terceiros - os promotores imobiliários - poderão saber no jornal oficial quais os terrenos em todo o País disponíveis para compra? Nós gostaríamos que o Sr. Ministro pudesse precisar exactamente os termos dessa indicação oficial ou oficiosa do Diário da República acerca da oferta de imobiliário.
Por último, o Sr. Ministro faz referência explícita à manutenção dos artigos 22.º a 26.º da Lei dos Solos. Não faz referência a outros artigos, e cito apenas, por exemplo, os artigos 27.º e 28.º, para lhe perguntar se essa exclusão ou esse pôr entre parêntesis outros artigos fundamentais do Decreto-Lei n.º 794/76 é revelador de que, na sua perspectiva, Sr. Ministro, há a possibilidade de negar a existência desses artigos, de os excluir, de os revogar.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Silva Graça.

O Sr. Silva Graça (PCP): - Serei breve nos meus pedidos de esclarecimento, para sossego do Sr. Deputado Silva Marques.

Risos do PCP.

O Sr. Ministro deve lembrar-se de que no ano passado, depois de determinadas afirmações de uma figura hoje muito controversa da vida pública nacional, foi alterado o artigo 5.º da Lei dos Solos. E foi alterado por forma gravosa para a política de municipalização dos solos, o que já permitiu na prática - hoje já é escândalo público - a alienação em propriedade plena de solos de grande riqueza, a ameaça e a promessa de que outros serão alienados do mesmo modo à iniciativa privada, leia-se «especuladores imobiliários».
Hoje o governo AD vem, através do Sr. Ministro, pedir autorização legislativa sobre assuntos extremamente importantes, é de entre eles o problema da Lei dos Solos volta novamente à baila.
Na sua carta de 24 pontos, no texto de que faz acompanhar o pedido de autorização legislativa, o Sr. Ministro fala em penalizações relativamente aos proprietários de terrenos que não cumpram normas que nós ainda sabemos muito bem quais serão, como de resto já foi aqui frisado pelo meu camarada Veiga de Oliveira, que aludiu ao aspecto vago desta questão.
Assim, Sr. Ministro, pergunto se neste pedido de autorização legislativa e no decreto-lei que dela resultará, e que nós não sabemos qual é, embora se trate de matéria tão importante que deveria ser aqui discutida, os artigos 47.º a 51.º da actual e conhecida Lei dos Solos, ou seja os que falam concretamente da penalização dos 18 meses - para os Srs. Deputados que desconhecem o que isso é direi que se trata de terrenos expectantes, cujos proprietários são intimados a construir ou a apresentar planos para construção, e que, no caso de tal não acontecer, após os 18 meses, podem ser declarados de utilidade pública e expropriados -, desaparecerão e serão substituídos por esta «penalizaçãozinha» estou a lembrar-me do Regulamento Geral de Edificações Urbanas, que, de 8 em 8 anos, fixa uma multa de centenas de escudos para quem não faz obras de beneficiação nos seus prédios ...

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Repetindo: o estipulado nesses artigos será substituído por esta «penalizaçãozinha» - se calhar é isso que vem aí... -, que será um infinitamente pequeno ao pé dos grandes lucros e que fará desaparecer os artigos 47.º a 51.º, ou a penalização dos 18 meses para construção mantém-se no decreto-lei que o Sr. Ministro prevê fazer?
E é tudo, Sr. Ministro.

O Sr. Presidente: - Para responder.aos diversos pedidos de esclarecimento tem a palavra o Sr. Ministro Luís Barbosa.

O Sr. Ministro da Habitação e Obras Públicas (Luís Barbosa): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No que respeita às questões postas pelo Sr. Deputado Magalhães Mota, quero dizer.que as razões que justificam pedido de autorização legislativa, e portanto as rãzões do pedido de urgência, derivam essencialmente do facto de o Ministério se ver confrontado com uma situação de desenvolvimento perfeitamente descontrolado da construção clandestina e de considerarmos que não haverá possibilidade de lançar medidas que combatam a construção clandestina se efectivamente não tivermos criado uma oferta de solos urbanizados suficiente para que não surja, como solitção espontânea por parte das populações, a utilização de solos ad hoc dentro de esquemas de construção clandestina.
Por outro lado, como o Sr. Deputado verificará, o processo é forçosamente muito longo, visto que as autarquias irão ter não menos de 6 meses para definirem as áreas urbanas de desenvolvimento prioritário e a administração central - e com isto respondo já a uma outra questão - irá dispor de 3 meses para fazer essa aprovação nas tais comissões interdepartamentais.
Por outro lado, os proprietários dos terrenos terão 3 meses, a seguir a isso, para se definirem relativamente às suas intenções no que respeita à utilização dos terrenos: depois, terão mais 6 meses para apresentar projectos de loteamento às autarquias e ainda haverá mais 2 meses para que as autarquias ou as autarquias e a administração central aprovem esses projectos de loteamento.
15to, se os prazos não forem encurtados por livre iniciativa dos proprietários e das próprias autarquias, vai atirar para 1983, prazo muito longo. Aliás se não pedíssemos agora a autorização legislativa não teríamos naturalmente legislação aprovada sobre esta matéria antes do princípio do ano que vem e, portanto, teríamos gasto praticamente 6 meses, na melhor das hipóteses, pois admito que fosse um pouco mais, visto que entretanto teremos talvez a discussão do Orçamento Geral do Estado e de outros diplomas que irão ocupar a Câmara durante os últimos meses deste ano.
Estas, pois, as razões do pedido de urgência que me parece justificado.
Quanto à questão de saber se o diploma irá versar essencialmente os problemas de expansão urbana ou de ordenamento, direi que são exclusivamente os problemas de expansão urbana. Aliás, sabemos que há um projecto de lei sobre ordenamento do território apresentado, salvo erro, pelo Partido Socialista, e nós respeitamos que seja discutido e que esta Assembleia se pronuncie sobre ele. A nossa preocupação vai para aspectos muito concretos da expansão urbana que nesta altura têm a urgência que todos conhecemos e que é escusado estar a clarificar.
Quanto a saber se no fundo, se trata de uma forma de expropriação ou de uma forma intermédia, que se caracteriza pela disponibilidade dos terrenos face às autarquias, direi que não é uma forma de expropriação, mas sim uma forma intermédia entre a expropriação e a necessidade que as populações e as próprias autarquias e a administração central têm de dispor de terrenos para poderem promover a construção.
Quanto à questão de a tributação ser penalizadora: pois será penalizadora, mas naturalmente quando os usos a dar sejam, sem nenhuma sombra de dúvida, usos para construção. Teremos de preservar - e sobre isso temos tido conversas com representantes do PPM - aqueles solos que tenham uma vocação agrícola ou uma outra qualquer vocação especial. Tive mesmo o cuidado, quanto a este problema, de ler um conjunto de intervenções tendentes à preservação de solos que possam ter características de natureza cultural, paisagística ou agrícola, e que por isso mesmo devam ser preservados.
Um outro aspecto referido pelo Sr. Deputado Magalhães Mota relaciona-se com a garantia dada aos proprietários de uma remuneração justa e equitativa. Nós indicamos para essa remuneração justa e equitativa o número de 7 % sobre o valor final das edificações, número que é mais indicativo do que outra coisa porque dizemos «salvo estipulação em contrário». É um aspecto que terá de ser largamente debatido com as autarquias, e por isso não temos uma posição definitiva nesta matéria, já que as autarquias terão de certeza uma palavra muito importante a dizer sobre isso.
Os 7% são um valor indicativo que fomos buscar à prática corrente do que são os contratos de desenvolvimento. Hoje os contratos de desenvolvimento já têm um fim social e, portanto, os 7 % parecem ser um valor aceitável em certas condições, é óbvio, para desenvolvimentos urbanos que tenham um fim social nítido. E essa é uma prática, como sabem, corrente ao nível do Fundo de Fomento da Habitação.
O Sr. Deputado Veiga de Oliveira referiu o problema da intenção centralista do diploma. Eu não vou fazer uma análise em valor absoluto desta ideia de centralização ou não, mas uma análise em valor relativo.
O processo que propomos na nossa definição de intenções é menos centralizador até do que o processo que existe actualmente.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Ministro, dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Processo que, aliás, não se cumpre.

O Orador: - Não, Sr. Deputado. Em princípio ele está regulamentado e cumpre-se. Pode ser que, por vezes, não se cumpra, o que acontece, por exemplo, quando se fazem construções clandestinas. Mas fora

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a ela, porque, além de haver muitas senhoras, estamos numa Assembleia que me merece muito respeito.
Risos.

Quanto ao Sr. Deputado Fernandes da Fonseca, pessoa que respeito muito ...

O Sr. Presidente: - Desculpe-me interrompê-lo, Sr. Deputado, mas há muito ruído na Sala e peço o favor de deixarem prosseguir o Sr. Deputado António Moniz. Além disso, gostaria de pedir ao Sr. Deputado António Moniz e a todos aqueles que fizeram o seu curso na Universidade de Coimbra que guardem, da liberdade de espírito que poderia correr entre o Choupal e a Alta, aquele sentido das proporções que não permite que tudo se transponha para a Câmara dos Deputados.
Risos.
Aplausos do PSD, do PS, do CDS, do PPM, da ASDI e da UEDS.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade de continuar, Sr. Deputado António Moniz.

O Orador: - Sr. Deputado Fernandes da Fonseca, pelo respeito que me merece, dir-lhe-ia que o problema da saúde, da maneira como foi colocado, consiste numa questão de perspectiva política, entendendo a maioria que a saúde não pode ser objecto de alternância partidária e que uma lei fundamental que escape ao cariz partidário é sempre necessária para este país. Tentar encobrir esta situação, estando em discussão situações concretas, nomeadamente o problema de falta de camas, julgamos que não leva a nada nem resolve os problemas.
Quanto a nós, há que esperar que o governo da maioria ponha em prática o seu sistema de saúde, para que a oposição veja se, na verdade, a administração da maioria é ou não competente. Antes disso, a oposição não o pode verificar, Sr. Deputado.
Aplausos do PPM, do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé, para uma intervenção.

O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidenta, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Esta proposta de lei que pretende legitimar toda a prática que o Governo tem desenvolvido contra o Serviço Nacional de Saúde subordina-se a duas ou três ideias principais que, no fundo, são a base da política do Governo não só em relação à saúde, mas também em relação ao resto.
Para o Governo e para a AD tudo aquilo que aponta no sentido dá melhoria das condições de vida dos trabalhadores sofre de facciosismo político-ideológico. Para se travar as leis e a actuação das instituições desse facciosismo basta que se ponha tudo a funcionar a favor quer do patronato, quer dos médicos privados, quer da medicina privada, etc. Ou seja, é sempre ideológico aquilo que diz respeito aos interesses de quem trabalha não tem qualquer ideologia aquilo que diz respeito aos interesses de quem explora os que trabalham. Claro que isto é um vício de raciocínio, mas não engana ninguém.
Se a ideologia do Serviço Nacional de Saúde pode ser apodada de socializante, a desta proposta de lei, que quer liquidar este Serviço, é uma ideologia privatizante, contra o todo social, a favor de alguns.
Depois põe-se a questão, talvez a fundamental, de que o Serviço Nacional de Saúde não deve ser gratuito porque aqueles que ganham mais devem pagá-lo
Já uma vez aqui disse que os trabalhadores não se importam que os ricos tenham a saúde «de borla» desde que tenham pago previamente através de impostos fortemente progressivas e através da eliminação das condições de exploração que praticam. Esta é a questão fundamental.
Os senhores da A-D e do Governo pretendem, acima de tudo, pôr a medicina privada «às cavalitas» da generalidade do povo, da necessidade da saúde de todos os portugueses. E, assim, serão todos os portugueses a pagar serviços péssimos para que a medicina privada possa progredir e florescer.
E não só pagam serviços péssimos, porque os médicos se repartem ou mal partem entre os serviços públicos que devem prestar e a sua própria medicina privada, mas também, fundamentalmente, porque o Governo se desculpa com a falta de verba orçamental para criar as estruturas necessárias a uma saúde decente para o povo, tentando que nós ignoremos que se o Orçamento não chega para a saúde é porque é delapidado e dissipado noutras áreas, noutras zonas, noutros níveis que não são de interesse para o povo, como para a repressão e para os incentivos à iniciativa privada. Poucas palavras são pais necessárias para expressar a nossa opinião sobre este pedido de autorização legislativa.
Se o Governo, por força do n.º 1 do artigo 170.º da Constituição, tem direito a esta iniciativa, como aliás invoca, o que não tem é o direito de rever a Constituição, como tem feito, dizendo descaradamente que não concorda com a lei e portanto não a cumpre. Não a cumpre porque ela não está de acordo com a Constituição. Logo, é a política do Governo que está mal.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo da AD impune, em função da maioria que nesta Assembleia o apoia, mas que não tem o apoio da maioria efectiva. do povo português, ao apresentar à Assembleia da República esta proposta de lei, tenta passar moeda falsa, tenta fazer batota. Nós dizemos: fora com os batoteiros, fora com o governo AD!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O artigo 64.º da Constituição da República é bem explícito no que à saúde se refere. E, se não os maçar muito, vamos aqui reproduzir ...

Vozes do PSD e de CDS: - Maça, maça!

O Orador. - Aliás, tudo aquilo que diz respeito à Constituição da República vos maça bastante, mas é nela que o povo português assenta grande parte da perspectiva da sua luta.
Todos têm direito à protecção da Saúde e o dever de a defender e promover. O direito à protecção da saúde é realizado pela criação de um Serviço Nacional de Saúde, universal, geral e gratuito, pela criação de condições económicas, sociais e culturais que garantam a protecção da infância, da juventude, da velhice e pela melhoria sistemática das

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condições de vida de quem trabalha, bem como pela promoção da cultura física e desportiva, escolar e popular e ainda pelo desenvolvimento da educação sanitária do povo.
Para assegurar o direito à protecção da saúde incumbe, prioritariamente; ao Estado garantir o acesso a todos os cidadãos independentemente da sua condição económica, aos cuidados da medicina preventiva, curativa e de reabilitação garantir uma racional e eficiente cobertura médica e hospitalar de todo o País; orientar a sua acção para a socialização da medicina e dos sectores médico-medicamentosos disciplinar e controlar as formas empresariais e privadas da medicina, articulando-as com o Serviço Nacional de Saúde; º disciplinar e controlar a produção, a comercialização e o uso de produtos químicos, bio16gicos e farmacêuticos e outros meios de tratamento e diagnóstico.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Foi com base no referido artigo 64.º da Constituição que esta Assembleia aprovou a Lei do
Serviço Nacional de Saúde que, lamentavelmente, ainda não entrou em vigor; e por isso também os governos AD têm de ser responsabilizados pela total, infracção à legislação...
É esta lei, que consagra uma das mais significativas conquistas do povo português, que o governo AD pretende revogar e substituir por outra. Para benefício dos nossos trabalhadores, para benefício do povo português? É evidente, que não!
Argumentando com incrível cinismo e oportunismo, em nome de uma falsa responsabilidade, de um falso equilíbrio, de um falso realismo, o Governo AD quer, ao contrário do que afirma, com á legislação que propõe, perpetuar também no que à saúde diz, respeito a desigualdade e a injustiça social.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sem pormenorizarmos, afirmamos que quer o preâmbulo do projecto de decreto-lei sobre o Serviço Nacional de Saúde, quer o seu articulado representam uma violação programada e sistematizada da Constituição da República.
E, Srs. Deputados, quer a AD queira quer não, e a despeito dos seus desesperados esforços, a Constituição da República Portuguesa de, 2 de Abril de 1976 está ainda em vigor, ainda não foi. revista e, embora na prática se actue como tal, o caso é que a pretendida revisão ainda não foi feita.
Srs. Deputados, é dever de todos respeitar o artigo 165.º da Constituição, que confere, à Assembleia da República o exercício de funções de fiscalização sobre a actividade do Governo e vigiar pelo cumprimento da Constituição ...
O Deputado da UDP assumirá, em pleno, os seus direitos, as suas funções, as suas obrigações e opor-se-á aos desígnios da AD.
Srs. Deputados da AD, é o próprio Governo que, 1 ao invocar, ele também, o artigo 165.º da Constituição, na «Exposição de motivos», embora com objectivos diferentes, que lhes lembra, que nos lembra veja-se só! - o cumprimento dos vossos, dos de veres dos deputados.
E, no cumprimento, desse dever, o deputado da UDP, como já afirmou, opor-se-á à tentativa deliberada de violação e subversão da Constituição por parte do Governo e da AD.
A UDP vota pela rejeição deste pedido de autorização legislativa do Governo, relativa ao Serviço Nacional de Saúde, e exige a entrada em vigor, de imediato, da Lei n.º 56/79, de 15 de Setembro, que, embora criticamente, aprovou e apoia.

O Sr. Jorge Sampaio (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Sampaio (PS): - Todos nós sabemos que a agenda de hoje está particularmente sobrecarregada e que o debate que aqui estamos a travar é de grande importância.
Mas, curiosamente, esse debate tem-se caracterizado, Sr. Presidente, por ouvirmos os talentos do Sr. Deputado Sousa Tavares, de resto inegáveis em matéria de saúde, as posições de outros deputados, e um observador minimamente atento, como proeuro ser, interroga-se sobre a seguinte questão quando é que, finalmente, o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais vai esclarecer esta Câmara sobre a política de saúde efectiva que propõe para a comunidade portuguesa, qual o papel para a medicina preventiva na comunidade portuguesa, qual a prioridade para a medicina curativa, etc., etc., etc.?
15to porque, afinal de contas, tem-se estado a assistir a um diálogo entre as bancadas, mas do que se trata é de um pedido de autorização legislativa para se legislar sobre matéria de interesse nacional.
Qual é a opinião do Governo? Qual é a política governamental sobre esta matéria? Fala-se de gastos com a saúde, mas não se discute rigorosamente nada, sobre as prioridades a estabelecer.
No fundo, o que perguntaria à Mesa é se V. Ex.ª, Sr. Presidente, tem previsto, no calendário de inscrições, o uso da palavra por parte do Sr. Ministro dos Assuntos Sociais, para que possamos saber quando E que ele, finalmente, esclarece esta Câmara sobre a política _de saúde deste Governo.

Aplausos do PS, .do PCP, da ASDI, da UEDS e do MDP/CDB.

O Sr. Presidente: - A única coisa que a Mesa pode dizer ao Sr. Deputado Jorge Sampaio é à Câmara é que concede a palavra a quem lha pedir.
Entretanto, esclareço que neste momento não há inscrições, pelo que declaro encerrado o debate e passamos de seguida à votação.

O Sr. António Arnaut (PS): - Peço, a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputado.

O Sr. António Arnaut (PS): - Sr. Presidente, o encerramento do debate desta forma abrupta é talvez imprevisto, porque toda a gente estava a aguardar que o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais fizesse uma intervenção.
De forma que peço ao Sr. Presidente que pergunte expressamente ao Sr. Ministro se deseja fazer uma intervenção.

Protestos do PSD, do CDS e do PPM.

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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não está nas atribuições da Mesa senão dar a palavra a quem lha solicite e não pode estar a perguntar aos Srs. Deputados ou a qualquer membro do Governo se porventura desejam ou não usar da palavra.
O Sr. Ministro dos Assuntos Sociais tem o direito de solicitar a palavra quando entender dever fazê-lo, assim como consequentemente, qualquer de W. Ex.as
Foi por não haver inscrições e porque depois da intervenção do Sr. Deputado Jorge Sampaio o Sr. Ministro nada solicitou que a Mesa mais não teve de fazer do que declarar encerrado o debate.
Claro que W. Ex.as poderão fazer as apreciações que entenderem em declaração de voto, mas neste momento está encerrado o debate e vamos votar.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - É para, na sequência da intervenção do Sr. Deputado António Arnaut, manifestar, em nome da minha bancada, acordo quanto à posição que a Mesa havia assumido.
Creio que se o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais não pediu a palavra a Mesa não tinha de lha conceder, mas penso que, por vezes, há silêncios que são muito mais significativos do que todos os discursos e que, mais uma vez, o silêncio do Sr. Ministro é muito mais significativo do que qualquer discurso ...

Aplausos da EDS, do PS, de alguns deputados do PCP e da ASDI.

Protestos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, desculpará que o interrompa, mas a verdade é que o debate está encerrado e o facto de qualquer Sr. Deputado continuar a fazer apreciações ao silêncio ou às intervenções dos outros Srs. Deputados ou de um membro do Governo significa reabrir o debate.
VV. Ex.as atribuirão ao silêncio do Sr. Ministro dos Assuntos Sociais o valor que entenderem. Na altura própria, a Mesa encerrou o debate e não o vai reabrir para que W. Ex.as façam apreciações pelo facto de alguém usar ou não. da palavra.

Aplausos do PSD e do CDS.

O Sr. António Arnaut (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interrogar a Mesa.

O Sr. Presidente:- Tenha a bondade, Sr. Deputado.

O Sr. António Arnaut (PS): - Sr. Presidente, tenho-me habituado a apreciar a tolerância e a compreensão com que V. Ex.ª dirige os trabalhos desta Assembleia e sei que V. Ex.ª nunca encerrou .um debate nestas condições.
O Regimento diz que o debate é encerrado se não houver mais oradores inscritos ou quando, tendo usado da palavra dois deputados de cada partido, tenha sido requerido o encerramento do debate. Mas nunca a Mesa encerrou um debate de uma forma tão abrupta e imprevista, porque sempre entendeu aceitar a inscrição de deputados que ainda não estivessem inscritos.
Pela circunstância de não haver nenhum deputado inscrita creio que a Mesa não podia encerrar o debate sem se certificar se algum deputado ainda pretendia usar da palavra. E, relativamente a esse facto, interrogo a Mesa no sentido de saber se V. Ex.ª atendeu a essa circunstância e se não entende dever perguntar se algum deputado ainda deseja intervir, designadamente pertencente a partidos que ainda não participaram neste debate.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Arnaut, V. Ex.ª disse que normalmente a Mesa conduzia os debates com tolerância e compreensão. Embora seja sempre mais agradável ouvir ,uma palavra que envolve uma valorarão positiva dos nossos comportamentos do que aquela que posa envolver uma censura, devo dizer que, em consciência, tanto minha como de todos os meus colaboradores da Mesa, as suas palavras não passam de um acto de justiça, não são, um favor nem sequer um cumprimento é o reconhecimento de uma verdade de que todos temos consciência.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - V. Ex.ª mesmo, Sr. Deputado, deu a resposta a si próprio.

A Mesa encerrará os debates, nos termos do Regimento, quando não houver mais oradores inscritos ou quando, tendo já falado dois Srs. Deputados de. cada partido, se requeira que a matéria seja dada por discutida. A segunda hipótese não se configurou, mas configurou-se claramente a primeira.
A Mesa não tinha oradores inscritos, informou-o e não me consta que V. Ex.ª, que tantas vezes tem exercido, com a mesma tolerância e compreensão, a vice-presidência, em honrosa substituição do Presidente efectivo, alguma vez tivesse, por falta de inscrições, perguntado se alguém mais desejava usar da palavra. É o simples facto de não haver oradores inscritos que determina o encerramento do debate.

Vozes do PSD e do CDS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Portanto, Sr. Deputado, sem prejuízo da oportuna questão que V. Ex.ª colocou, a Mesa entende que procedeu com a compreensão que sempre tem usado, que não prejudicou ninguém, que o facto de não haver oradores inscritos tinha o significativo e inequívoco sentido de que mais ninguém desejava usar da palavra, porque, se não, tê-lo-ia feito como todos VV. Ex.as o foram fazendo, e por isso considerou o debate encerrado. E não encontra em nenhuma das razões depois aduzidas nem nós motivos que; determinaram posteriores pedidos de palavra alguma coisa que a leve a rever a posição que tomou e que mantém

O Sr. Manuel Lopes (PCP): - Este Ministro é uma vergonha!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos então votar na generalidade a proposta de lei n.º 48/11, que concede ao Governo autorização para revogar a Lei

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nº 56/79, de 15 de Setembro (5ecviço Nacional, dê Saúde) ... ... ... .

Submetida à votação, foi aprovada, com 109 votos ú favor do PSD, dó CDS e do PPM ,e 82 votos contra do PS, do PCP, da ASDI, da UEDS, do MDP/CDE e da UDP.

O Sr. Presidente: - Há alguma objecção a que se proceda de imediato à votação na especialidade e que só depois tenham lugar as declarações de ,voto?

Pausa.

Como ninguém se opõe, vamos votar na especialidade, em conjunto os dois artigos da proposta de, lei.

Submetidos à votação, foram aprovados, com. votos a favor do PSD, do CDS e dó PPM e votos contra do PS, do PCP, da ASDI, da UEDS, do MDP/CDE e da UDP.

São os ,seguintes:

ARTIGO,I.º

É concedida ao Governo autorização para, alterar a legislação sobre o Serviço Nacional de Saúde, com revogação da Lei n.º 56/79, de 15 de Setembro, e sua substituição por nova lei do SNS e mais legislação complementar.

ARTIGO 2,º

A autorização concedida pela presente lei caduca noventa dias após a sua entrada em vigor:

O Sr. Presidente:
Para uma declaração de, voto, tem à palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra...

A Sr.ª Zita Seabra (PCP) : - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É na verdade lamentável que, estando nós a discutir um assunto tão importante para o País e para os Portugueses, como é ,o Serviço Nacional de Saúde, o Ministro dos Assuntos Sociais, responsável pela elaboração do decreto-lei a que o Governo procederá, tenha usado da palavra durante as horas em que este debate se - prolongou na Assembleia apenas numa extensão de vinte e cinco linhas do Diário da Assembleia da República A intervenção do Sr. Ministro preencheu apenas meia página do Diário!
Esteve hoje aqui durante todo o dia, a Televisão à espera de que a votação sobre esta proposta de lei se desse, para depois o Sr. Ministro dai através dela os esclarecimentos que aqui, na Assembleia da República, perante os deputados, teve medo e se negou a dar.

Vozes do PCP: - Muito bem!

Neste momento o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais retira-se do hemiciclo.

A Oradora: - O Sr. Ministro prepara-se para ir à Televisão manipular o povo português.

O Sr. Jorge Lemos (,PCP): - Ainda para mais é malcriado!

A Oradora: - Não conheço que algum deputado dos partidos da oposição tenha sido convidado a fazer, uma intervenção na Assembleia da República sobre.
este pedido de autorização legislativa. 15to é que é manipular. E o dignifica o trabalho dos deputados nesta Assembleia não é votar chorudos vencimentos ou suicídios como hoje iremos votar vergonhosamente o que dignifica esta Assembleia é levar ao conhecimento dos Portugueses o trabalho que os deputados aqui estão afazer!
A AD tem medo do veredicto do povo, tem medo de que o povo português conheça o que os partidos pensam e tem medo de que o povo se aperceba de quem é que defende os seus interesses e quem é que está contra.

Vozes do PCP: - Muita bem!

A Oradora: - É um escândalo que, num debate de apresentação e votação de uma proposta de revogação de uma das leis mais importantes para os Portugueses a Lei do Serviço Nacional de Saúde, o, Ministro dos Assuntos Sociais tenha falado o elegitivamente a vinte e cinco linhas, não tenha dito nada
durante o dia inteiro do debate parlamentar tenha abandonado a Sala antes de este debate encerrar e se prepare agora para ir à Televisão prestar esclarecimentos e fazer manipulação perante os Portugueses.

Vozes da PÇP: - É uma vergonha!

A Oradora: - 15to, Sr. Presidente e Srs. Deputados, e uma vergonha, mas isto é a AD!

Aplausos do PCP, do MDP/CDE e de alguns deputados do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, cem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Ambrósio.

A Sr.ª Teresa Ambrósio (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Será uma declaração de voto muito simples, tão simples quanto nos obriga o último dia dos nossos trabalhos com uma agenda tão carregada. Devo confessar que nunca pensei que chegássemos tão baixo na desqualificação desta Assembleia. O que,
hoje aqui se passou relativamente ao Serviço Nacional de Saúde não foi um debate político, foi uma tentativa de análise de grupo provocada !pelo síndroma
psicanalítico do Sr. Ministro dos Assuntas Sociais. No fundo, o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais manifestou na sua bancada, durante todo o tempo,
o seu silêncio face às comunicações, intervenções, defesas e propostas que aqui foram feitas pelos deputados eleitos apelo povo.
O Sr. Ministro não disse nada Limitou-se, psicanaliticamente, a olhar para nós como se fôssemos um bando de pessoas ...

Vozes do PCP: - Nem isso!

A Oradora: - ... que precisam de uma cura a cura que a força totalitária da AD desejava impor a este país, modificando, com desrespeito completo.
Pela posição pelo valor da vontade e do querer do povo português, uma lei tão importante que trata da saúde e que beneficia os mais desprotegidos nesta
sociedade.
O Sr. Ministro, paru além de ter mostrado o seu, síndroma psicanalitico, mostrou um desprezo completo por esta Assembleia.

O Sr: António Vitorino (UEDS): - Muito bem!

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A Oradora: - Desprezo que a força totalitária da maioria já tem mostrado várias vezes. Como foi dito pela bancada do Partido Comunista, o Sr. Ministro até abandonou a Assembleia numa altura em que o debate ainda não terminou e, que eu saiba das declarações de voto consta também as posições que os vários partidos políticos tomaram no debate que se fez sobre este mesmo assunto.

Aplausos do PS, do PCP, da ASDI, da UEDS e do MDP/CDE.

O Sr. Presidentes - Para uma declaração de voto, tem apalavra o Sr. Deputado Sousa Tavares.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PSD já esta tarde expôs as razões por que está de acordo com a autorização legislativa pedida pelo Governo. Não somos, nem podíamos ser, como Partido Social Democrata que somos, contrários à existência de um Serviço Nacional de Saúde. Pelo contrário, temos, em relação a esse Serviço Nacional de Saúde, uma exigência profunda, de claridade, de eficácia, de qualidade total.

O Sr. Manuel Lopes (PCP) - É ire isto ter descaramento!

O Orador - É isso que pretendemos. Pretendemos que o Serviço Nacional de Saúde a criar seja julgado por obras e não por palavras. Estamos todos fartos de palavras e todos precisamos de obras!

O Sr. Sousa Marques (PCP): - Especialmente das suas!

Protestos do PCP.

Sobretudo o povo português precisa de realidades. Há sete anos que lhe fazem promessas, mas há sete anos que a sua situação material pouco ou nada tem melhorado.

Protestos do PCP.

E, se melhorou um pouco, melhorou sobretudo com os governos que não lhes fizeram promessas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Manuel Lopes (PCP): - E preciso ter lata, Sr. Deputado!

O Orador: - Por isso temos esperança de que o Serviço ...

Protestos do PCP.

Uma voz do CDS. - Malcriados!

O Sr. Presidente: - Desculpe interrompi-o, Sr. Deputado Sousa Tavares.

Sr. Deputados, parece-me estar definitivamente assente entre nós que não é admissível que se esteja a interromper permanentemente e em coro um Sr. Deputado que está no uso da palavra.
Peço a W. Ex.as que, sem prejuízo do direito do aparte ou até de um senso de humor que há pouco fez passar por esta Câmara um belo momento, VV. Ex.ª se coíbam de perturbar quem quer que seja que esteja no uso da palavra.

Queira ter a bondade de continuar, Sr. Deputado.

O Orador: - Sr. Presidente, infelizmente estou habituado a arruaças ...

O Sr. Carlos Brito (PCP): - A fazê-la, a fazê-la!

O Orador. - ..., de maneira que não me faz impressão de maior.
Direi simplesmente que temos esperança de que a nova lei permita a construção de um serviço nacional de saúde concertado com as nossas possibilidades, com uma lei sobre carreiras médicas assente nos três pilares fundamentais: o da carreira hospitalar, o do generalista e o do homem de saúde pública.

E quanto à carreira de saúde pública, muito esquecida em Portugal, é preciso ressuscitá-la na grandiosidade que atingiu com Ricardo Jorge e com outros expoentes no mesmo assunto.

Vozes do -PSD: - Muito abem!

O Orador: - Por isso temos esperança de que esta lei assente nos postos de saúde, assente na interligação profunda entre os centros regionais de saúde e os hospitais, possa dar uma eficácia aos nossos ser. viços hospitalares, possa dotar os seus serviços de especialistas que não têm, possa dotar os seus serviços da enfermagem que não existe, possa, de facto, prestar uma assistência eficaz, aquela que podemos, com a nossa magreza de meios, dar desde já à população portuguesa.
Não é com promessas fantasmagóricas, não é acentando com shangrilás, que não estão nas nossas possibilidades financeiras, que realizaremos a melhoria efectiva do povo, mas é dando-lhe o pouco que podemos dar. E o pouco que lhe podemos dar é, apesar de tudo, um serviço hospitalar para o qual temos camas já em número suficiente, mas que não funcionam. E não funcionam porque não temos enfermagem, serviços e dotações suficientes absolutamente necessário que esta eficacidade seja recuperada em Portugal para todos os serviços médicos. É preciso que os centros de saúde sejam uma realidade viva na despistagem preventiva das doenças, na prestação dos serviços primários, na sua interligação com a rede hospitalar.

O Sr. Guerreiro Norte (,PSD): - Muito bem!

O Orador: - Rede hospitalar essa graduada em três níveis: o dos cuidados fundamentais e diversificados, com base nos quatro hospitais centrais do Porto, Coimbra, Lisboa e Évora; a rede dos hospitais distritais, onde se darão os cuidados que não sejam necessários ser altamente diversificados; e os hospitais das misericórdias e os pequenos hospitais concelhios utilizados como centros de convalescença ou até de asilagem ...

0 Sr. António. Arnaut (PS): - Asilagem?! ...

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O Orador - ... de deficientes ou de pessoas que atingiram uma idade de doença letal normalmente incurável.

Uma voz do PCP: - Brilhaffié! :..

O Orador: - E através desse serviço concertado de saúde, com miragem de inclusivamente dar aos médicos uma dignidade de carreira, sem lhes permitir a liberdade e a licenciosidade que até agora lhes têm. sido permitidas, obrigando-os, na medida em que se integram num serviço público e escolhem qualquer das três carreiras que acima indiquei, a mostrarem uma eficácia de serviço em full time sem com isso os obrigarmos a não poderem exercer medicina particular. Queremos que esse serviço seja. prestado com efectividade.
Por isso o projecto de saúde da AD está neste momento em franca oposição com a Ordem dos Médicos.
Basta ler o insuspeitíssimo jornal O Dia...

O Sr. António Arnaut (PS) - 15so é paga destroçar!
O Orador: - ... para se ver o ataque feroz desencadeado pela Ordem dos Médicos contra o Sr. Ministro dos Assuntos Sociais e contra o próprio Ministério....
Por isso tudo quanto aqui nesta Assembleia se disse, foi abater na água». Não se quer reconhecer a eficacidade de um esforço a verdade de uma intenção e a seriedade de uma intenção governativa que esta lei representa.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidentes - Como não há anais declarações devoto, considera-se encerrado definitivamente ...

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, peço que fique registado que não tem cabimento falar em «licenciosidade dos médicos»...

O Sr. António Arnaut (RPS): Muito bem!

O Sr. Magalhães Mota (ADI): Peço também à palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que enfeito deseja usar da palavra, Sr. Deputado?

O Sr. Magalhães Mata (ADI): - Para fazer uma.

declaração de voto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente : - Srs. Deputados, pedia a VV. Ex.ª que sempre que haja algum Sr. Deputado que queira fazer declaração de voto que se inscreva desde' logo para que a Mesa não declare encerrado o debate.

O Sr. António Arnaut (PS): - V. Ex.ª está afazer aquilo que há pouco se acabou de sugerir!

O Sr. Presidente: - É só o Sr. Deputado Magalhães Mota que deseja ainda uma declaração de voto?

Pausa.

Tem V. Ex.ª a palavra, Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votámos contra o pedido de autorização legislativa pelas razões que sucintamente passo a expor.
Em primeiro lugar, se dúvidas tivéssemos de que este pedido de autorização significava muito claramente uma fuga ao debate perante esta Assembleia da República, o comportamento do Sr. Ministro dos Assuntos Sociais teria, de forma clara, insofismável e evidente, denunciado que era esse o exclusivo propósito do Governo. O pedido de autorização era efectivamente uma fuga ao debate no Parlamento e isso mesmo aqui ficou demonstrado. E digo que era uma fuga, porque o Governo sabe que a ratificação não é a mesma coisa nem em tempo, nem
dá oportunidade do debate, nem nas possibilidades que confere a esse mesmo debate e por sabê-lo é que apresentou este pedido de autorização. Pedido de
autorização, tão sem justificação quanto o mesmo Governo, a propósito do regime de liberalização dos cereais e do açúcar, não tem dúvidas em pedir a convocação da Comissão Permanente e uma nova reunião desta Assembleia para discutir um assunto que é, com certeza, de menor importância do que a saúde dos, Portugueses. ..

Aplausos da ASDI e do PS.

Mais ainda, Sr. Presidente e Srs. Deputados: a autorização legislativa só tem cabimento constitucional se se tratar de matéria da exclusiva competência da Assembleia da República. Como dúvidas não existem de que o direito à saúde, regulado no artigo 64.º da, Constituição, não beneficia do regime do artigo 17.º do decreto-lei, isto é, não é um direito incluído nem no título 11 nem um direito que possa ser protegido nos mesmos termos, a autorização legislativa só tem sentido e conteúdo porque há duas disposições as dos artigos 16.º e 17.^ - que, essas sim, contendem com a própria disciplina constitucional, com a própria competência desta Assembleia da República.
Quando se fala de taxas moderadoras e de taxas moderadoras adequadas â capacidade económica dos cidadãos utentes, do que se está a falar é da criação de um novo imposto, de um novo imposto com regime novo, que vem afinal modificar totalmente o regime de prestação da saúde e o regime .constitucional a que a Constituição vigente dá cobertura e validade.

Vazes do PS - Muito bem!

O Orador: - É por isso e só por isso que a autorização foi, solicitada. Fora disso a ela não haveria cabimento e o silêncio do Sr. Ministro veio também demonstrar o porquê desse pedido de autorização.
Um antigo ministro, o Dr. Gonçalves Rapazote, disse uma vez que que poder não dialoga. 0 Sr. Mi-

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nistro dos Assuntos Sociais veio aqui corporizar essa afirmação.

Aplausos da ASDI, do PS, do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Entramos na discussão na generalidade da proposta de lei n.º 52/11, que concede ao Governo autorização para legislar sobre o planeamento urbanístico e o regime jurídico de solos, bem como sobre as medidas tendentes a incentivar a utilização dos solos urbanos e a urbanizar e penalizações consequentes.
Está em discussão.

Pausa.

Para uma intervenção, tem apalavra o Sr. Ministro da Habitação e Obras Públicas.

O Sr. Ministro da Habitação e Obras ,Públicas (Luís Barbosa): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Era minha intenção apresentar a esta Assembleia o clausulado do decreto-lei que pretendemos elaborar com base na autorização legislativa que agora se pede.
Em todo o caso, não houve tempo físico para o fazer. Considerámos deste modo que seria menos delicado apresentar a esta Assembleia um clausulado que depois, por força inclusivamente da consulta que entendemos dever fazer às autarquias, viesse a ser alterado, não digo com grande profundidade, mas, pelo menos, com mudanças de forma que representassem diferenças substanciais relativamente àquilo que apresentaríamos agora como clausulado.
Apresentámos um conjunto de princípios dos quais não nos afastaremos. Desde já me ponho à disposição de todos os grupos parlamentares para que, se quiserem ter a amabilidade de me indicar um vosso representante, eu possa, durante o próximo mês, dialogar com os representantes de cada um dos grupos parlamentares, no sentido de os sensibilizar para a elaboração de um clausulado definitivo no decorrer do próximo mês.
Gostaria ainda de fazer um aditamento ao texto que distribuímos: é intenção do Governo, para além dos princípios gerais enunciados no texto que foi distribuído, primeiro, não poderem ser considerados como solos urbanizáveis os seguintes tipos de solos aqueles cuja capacidade de uso agrícola já esteja defendida por lei aqueles cujo coberto vegetal, especialmente arbóreo, justifique serem considerados reservas ambientais ou de interesse cultural, paisagístico ou recreativo; aqueles cujo uso agrícola consistente interesse ao próprio agregado habitacional, à economia local, regional ou nacional; ...

O Sr. Luís Coimbra (PPM): - Muito bem!

O Orador: - ... aqueles de patente inaptidão para a construção por custo elevado ou insalubridade; aqueles que constituam valores culturais, históricos paisagísticos ou panorâmicos.

O Sr. Borges de Carvalho (PPM): - Muito bem!

O Orador - É evidente que os proprietários destes terrenos devem ser incentivados a manter o actual uso para que não sofram o impacte da mais-valia
provocada pela construção, não havendo, como é lógico, neste caso, qualquer tipo de penalização.
Por outro lado, a aprovação das áreas de desenvolvimento urbano prioritário será da competência do Ministro da Habitação e Obras Públicas, ouvido o Sr. Ministro da Qualidade de Vida.
Em terceiro lugar, a proposta das autarquias locais para definição das áreas de desenvolvimento urbano prioritário deve ter em conta o justo equilíbrio entre a previsão da evolução demográfica nos próximos cinco anos e a necessidade de criar uma oferta de solos adequada por forma a evitar movimentos especulativos.
É ainda intenção do Governo legislar sobre recuperação de edifícios existentes, não permitindo que áreas de construção prioritária prejudiquem o equilíbrio das áreas urbanas actuais, tendo particularmente em vista a necessidade de não comprometer a potencialidade dessas áreas no que respeita a equipamento e espaços livres.
Gostaria ainda de informar a Câmara que é intenção do Governo, como aliás se explicita nos princípios do texto distribuído, lançar uma tributação sobre os terrenos que se mantiverem numa situação expectante e que, portanto, não foram urbanizados e estejam considerados dentro de áreas urbanas prioritárias. Sobre essa matéria, é intenção do Governo aproveitar o próximo decreto orçamental do ano de 1982 para regular os aspectos de tributação que serão apresentados pelo Governo e que esta Câmara discutirá.
Fico à disposição dos Srs. Deputados para responder às perguntas que me queiram colocar.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Ministro da Habitação e Obras Públicas, creio que a complexidade do tema obriga a que ponhamos algumas questões prévias.
A primeira diz respeito à oportunidade deste pedido de autorização: quais são as razões que justificam este pedido de autorização legislativa? Há alguma razão de urgência especial? Qual é essa razão ou esse conjunto de razões que determinam que não seja uma proposta de lei a ser apresentada a esta Assembleia mas, em vez dela, um pedido de autorização legislativa?
Segunda questão os objectivos da revisão da político de solos abrangem apenas a matéria que costuma considerar-se como relativa à expansão urbana, ou, pelo contrário, é toda uma política de ordenamento do território em matéria de gestão de solos que será matéria a abranger pelo diploma a efectivar oportunamente?
Terceira questão prevê o Governo modificar, designadamente, o processo relativo às expropriações? Pensa o Governo corrigir o actual processo de expropriações, de acordo com o qual foi equiparada a uma decisão judicial, e parece que contrariamente ao disposto na própria Constituição, a arbitragem realizada na primeira fase do processo de expropriações?
Em relação à tributação a estabelecer futuramente, pensa o Governo que essa tributação vai isentar algumas acções por parte dos proprietários do terreno?

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Ou será uma tributação penalizadora por Comissões em relação a outras actividades? Pensa o Governo legislar no sentido de serem tributados os solos não utilizados e reservados para a construção urbana e os prédios urbanos com condições e processos de obras ou de modificações que acabam por, não ser executadas?
Uma última questão, visto o tempo estar a acabado que se pensa quando no princípio dos traços gerais do diploma, se anuncia, nó n.º 4,- a « [...] : garantia aos proprietários de uma justa e' equitativa remuneração pela alienação dos seus terrenos»? 15to é uma nova forma de expropriação? É uma nova forma de aquisição? É um género intermédio entre uma coisa é outra? De que modalidade se trata, afinal?

O Sr. Presidente - Sr. Ministro da Habitação é Obras Públicas, há mais oradores inscritos para pedir esclarecimentos. Deseja responder já ou nó final?

O Sr. Ministro da Habitação é Obras Públicas: - No final, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Ministro.
Tem a palavra o Sr. Deputado Veiga de Oliveira:

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Ministro da Habitação e Obras Públicas, temos graves preocupações suscitadas pela proposta, de lei de legislativa. 15to porque há claramente uma intenção centralista quando se afirma que « a aprovação das propostas de delimitação das áreas seja da, competência do Governo pelo Ministro da Habitação e Obras Públicas».
Com algum conhecimento de causa, digo-lhe que a competência não pode ser de V. Exmo. Sr. Ministro,
ou de qualquer outro Ministro da Habitação e Obras Públicas. Quando muito poderia haver uma competência de arbitragem em caso de: litígio, nunca' uma
competência de 1ª instância. Gostaria, pois, de saber se o Sr. Ministro do Governo da AD, que sistematicamente se reclama de descentralizador, pretende manter este traço do pedido de autorização legislativa ou se desiste dele «em favor da real autonomia municipal.
Uma outra questão que se coloca é a seguinte toda a proposta de lei é um pouco vaga, logo um pouco, para não dizer muito, inconstitucional. Em todo o caso, não queremos com nenhum parti preste qualquer boa intenção. Por isso pretendemos esclarecer-nos a respeito do que se pretende com estas duas figuras as áreas de desenvolvimento urbano prioritário e a área de construção prioritária.
O Sr. Ministro saberá certamente, tão bem como eu, que a questão que está por detrás de tudo isto é, por um lado, a da disponibilidade dos fundos urbanizáveis e; por outro, a da disponibilidade de habitação com suficiente fartura. Certamente que o Sr. Ministro sabe, tão bem como eu, que' qualquer das duas questões tem a ver com tudo, mas sobretudo com o financiamento. A habitação é um problema de financiamento, é sobretudo um problema de financiamento e é, acima de tudo, um problema de financiamento.
Por isso, enquanto os departamentos competentes tiverem, como objecto principal o saber quem é o proprietário de quê, continuamos a não resolver o problema fundamental que é o do financiamento da habitação em condições para todos.
Coloco-lhe duas perguntas como vai, por um lado, o Sr. Ministro respeitar a autonomia das autarquias, e, por outro, como vai resolver os problemas de financiamento que são os problemas que estão fundamentalmente em causa?

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, queria interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr.ª Deputado.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, na Conferência dós Presidentes dos Grupos Parlamentares ficou assente que haveria um pedido de esclarecimento por cada grupo parlamentar.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Silva Marques, segundo me informam parece que, o que ficou assente foi que haveria uma aceitação por parte de todos os Srs. Deputados de uma certa contenção nos pedidos de esclarecimento.
Parece que essa taxativa fixação de um pedido de esclarecimento por partido não terá chegado a ficar consignada.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr: Presidente, parece-me que o que ficou assente na reunião dos líderes dos grupos parlamentares foi uma inscrição para pedidos cie esclarecimento por cada grupo parlamentar, e, quanto a protestos não haver limite de inscrições. Foi invocado que, relativamente á estes últimos, não faria sentido a limitação, na medida em que os protestos são imprevisíveis quanto à sua motivação.
Foi isto que assentei no meu apontamento, embora não tivesse ficado definido um limite taxativo, pela razão que acabei de apresentar.
Todavia, peço aos outros grupos parlamentares que confirmem ou não este meu apontamento.

O Sr. Presidente: Realmente, Sr. Deputado, eu não presidi á essa reunião dos representantes dos grupos parlamentares, foi o Sr. Vice-Presidente José Vitoriano que o fez e peço-lhe que nos informe sobre o assunto.

O Sr. José, Vitoriano (PCP): - Sr: Presidente, Srs. Deputados: Efectiva-mente estive a presidir a essa reunião, tendo o Sr. Deputado Silva Marques sugerido que as inscrições para pedidos de esclarecimento fossem limitadas a uma por cada partido. Porém, não houve consenso dos restantes partidos nesse sentido.
O que ficou estabelecido foi que haveria uma certa contenção da parte dos próprios partidos nos pedidos de esclarecimento, tendo em vista o não arrastamento dos trabalhos. Mas não houve nenhuma limitação taxativa- sobre a matéria.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado José Vitoriano.
Aliás, devo informar o Sr. Deputado Silva Marques de que os dois Srs. Secretários da Mesa, Reinaldo Gomes e Maia Nunes de Almeida, confirmam o que, o Sr. Deputado José Vitoriano acabou de dizer,

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1 DE JULHO DE 1981

Carro V. Ex.ª sabe, nesse momento eu estava a receber o Sr. Ministro para as Relações de Amizade com os Povos Estrangeiros da República Popular da China, que depois esteve aqui no Plenário, mas a informação que me dão confirma o que já foi dito pelo Sr. Vice-Presidente.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, após o que V. Ex.ª acabou de dizer, é evidente que não mantenho a minha afirmação em termos de confrontação, mantenho é a minha convicção.
No entanto, gostava de lembrar que quem sugeriu a limitaçãa das inscrições quanto aos pedidos de esclarecimento, e não quanto aos protestos, fo6 o Sr. Vice-Presidente José Vitoriano, Presidente em exercício. Mas, repito, aceito que o meu apontamento não seja correcto.

O Sr. José Vitoriano (PCP): - Sr. Presidente, se me permite, é apenas para confirmar que o Sr. Deputado Silva Marques tem razão quando diz que fui eu próprio que geri a limitação das inscrições para os pedidos de esclarecimento, sugestão que de facto não foi aceite.

O Sr. Presidente : - Certo, Sr. Deputado. Mas parece que está agora estabelecido o consenso. A única coisa que peço a VV. Ex.ª é que, embora a :Mesa conceda a palavra a todos os Srs. Deputados que a pedirem, os grupos parlamentares condensem o mais possível esses pedidos.

Tem então apalavra o Sr. Deputado Anselmo Aníbal para pedir esclarecimentos.

O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): - Sr. Ministra da Habitação. e Obras Públicas: V. Ex.ª fez acompanhar a posteriori a proposta de lei de autorização legislativa de uma nota informativa. Essa nota informativa revela, a nosso ver, um papel menoríssimo no que, concerne às câmaras municipais e propõe que elas façam as suas propostas de delimitação das áreas de desenvolvimento urbana prioritário e das áreas de construção prioritária, apresentando-as às comissões interdepartamentais, assim referidas na n.º 9 dessa nota informativa.
Ora nós gostaríamos de ver esclarecido o conteúdo, a composição e, de alguma forma, os poderes dessas comissões interdepartamentais, que, segundo a chamada nata informativa que acompanha a proposta cie lei, terão uma forma diversa nas chamadas áreas metropolitanas.
A segunda questão que quero colocar é esta o Ministério a que V. Ex.ª preside será o receptáculo destas duas figuras, destes dois instrumentos urbanísticos vindos dos 305 municípios?

O Sr. Ministro não aponta prazos de resposta e não dá indicações sabre a DGPU e DGERU e por isso, perguntava também quais as intervenções que lhes reserva no processo de estudo e de análise das propostas apresentadas pelos crrunicípias e analisadas pelas tais comissões interdepartamentais.
A terceira questão relaciona-se com a publicação no Diário da República daquilo a que nós apodemos chamar de « oferta racionalizada dos terrenos». As câmaras serão os detectores e receptáculos dos terrenos urbanizáveis nas suas áreas e os tais terceiros os promotores imobiliários padrão saber no jornal oficial quais os terrenos em todo o País disponíveis para compra? Nós .gostaríamos que o Sr. Ministro pudesse precisar exactamente os termos dessa indicação oficial ou oficiosa do Diário da República acerca da oferta de imobiliário.
Por último, o Sr. Ministro faz referência explícita à manutenção dos artigos 22.º a 26.º da Lei dos Solos. Não faz referência a outros artigos, e cito apenas, por exemplo, os artigos 27.º e 28.º, para lhe perguntar se essa exclusão ou esse ,pôr entre parêntesis outros artigos fundamentais do Decreto-Lei n.º 794/76 e revelador de que, na sua perspectiva, Sr. Ministro, há a possibilidade de negar a existência desses artigos, de os excluir, de os revogar.

O Sr. Presidente- - Tem a palavra o Sr. Deputado Silva Graça.

O Sr. Silva Graça (PCP): - Serei breve nos meus pedidos de esclarecimento, para sossego do Sr. Deputado Silva Marques.

Risos do PCP.

O Sr. Ministro deve lembrar-se de que no ano passado, depois de determinadas afirmações de uma figura hoje muito controversa da vida pública nacional, foi alterado o artigo 5.º da Lei dos Solos. E foi alterado por forma gravosa para a política de municipalização dos solos, o que já permitiu na prática - hoje já é escândalo público - a alienação em propriedade plena de solos de grande riqueza, a ameaça e a promessa de que outros serão alienados do mesmo modo à iniciativa privada, leia-se «especuladores imobiliários».

Hoje o governo AD vem, através do Sr. Ministro, pedir autorização legislativa sobre assuntos extremamente importantes, é de entre eles o problema da Lei dos Solos volta novamente à baila.

Na sua carta de 24 pontos, no texto de que faz acompanhar o pedido de autorização legislativa, o Sr. Ministro fala em penalizações relativamente aos proprietários de terrenos que não cumpram normas que nós ainda sabemos muito bem quais serão, como de resto já foi aqui frisado pelo meu camarada Veiga de Oliveira, que affidiu ao aspecto vago desta questão.
Assim, Sr. Ministro, pergunto se neste pedido de autorização legislativa e no decreto-lei que dela resultará, e que nós não sabemos qual é, embora se trate de matéria tão importante que deveria ser aqui discutida, os artigos 47.º a 51.º da actual e conhecida Lei dos Solos, ou seja os que falam concretamente da penalização dos 18 meses - para os Srs. Deputados que desconhecem o que isso é direi que se trata de terrenos expectantes, cujos proprietários são intimados a construir ou a apresentar planos para construção, e que, no caso de tal não acontecer, após os 18 meses, podem ser declarados de utilidade pública e expropriados, desaparecerão e serão substituídos por esta «penalizaçãozinha» estou a lembrar-me do Regulamento Geral de Edificações Urbanas, que, de 8 em 8 anos, fixa uma multa de centenas de escudos para quem não faz obras de beneficiação nos seus prédios ...

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da clandestinidade creio que se cumpre, e hoje a intervenção do Ministério é mais ampla do que aqui está preconizado.
Por outro lado, há um problema de fundo que deve ser equacionado, o que deve ser feito pela própria câmara. Parece-me que realmente a actividade da administração central se deverá virar muito mais para o ordenamento do território, para a definição das grandes linhas gerais de actuação. Mas também temos que considerar que nesta altura o ordenamento não está feito, que, portanto, essas linhas de política geral não estão definidas e que desse modo se pode cair numa situação anárquica. Julgo, pois, que teremos que preservar esse aspecto até encontrarmos melhores caminhos.
Outro problema diz respeito à definição das áreas de desenvolvimento urbano prioritário e às áreas de construção prioritária, problema com que nos temos debatido porque o título, por si, diz tudo e é um pouco difícil de, na definição, não se utilizar o próprio definido.
Em todo o caso, parece-me que a caracterização resultará mais da regulamentação da própria lei do que da definição, que forçosamente tem que ser vaga e imprecisa. Parece-me, pois, que será a regulamentação da própria legislação a elaborar que irá caracterizar com maior profundidade o que são áreas de desenvolvimento urbano prioritário e áreas de construção prioritária. O que quero garantir ao Sr. Deputado Veiga de Oliveira é que as intenções que estão por detrás disto são intenções que se podem considerar perfeitamente construtivas, que estão na linha - convenço-me disso - até de uma atitude mais progressista do que a que sempre houve neste país em matéria de solos.
Nesse sentido, creio que estamos a dar um passo em frente bastante importante nesta matéria relativamente a tudo o que se fez até agora.
Quanto ao problema ventilado sobre o financiamento da habitação, estou 150 % de acordo com o Sr. Deputado Veiga de Oliveira, tão de acordo que uma das primeiras acções do Ministério foi criar um novo sistema de crédito que vai precisamente dentro das linhas de orientação que, creio, o Sr. Deputado Veiga de Oliveira também defende.
Julgo que esse foi um primeiro passo. É preciso, naturalmente, que as nossas instituições de crédito se habituem a pensar no crédito para a aquisição de habitação de uma forma completamente diferente daquela em que têm pensado nos últimos anos ou desde sempre, se quisermos. Não é um trabalho fácil. Os bancários têm neste aspecto tradições e um conjunto de aspectos conjunturais a pesar-lhes que cria uma série de objecções, mas considero que o primeiro passo que se deu é fundamental, que é muito importante porque é um passo irreversível. Não estou convencido de que, qualquer que seja o governo que se siga a este, possa voltar atrás no sistema de crédito que criámos e que, como sabem, estabelece um prazo máximo de amortização de 30 anos e uma prestação máxima de 25 % do rendimento do agregado familiar.
15to até agora nunca se tinha feito e julgo que, felizmente, não vai ser possível, qualquer que seja o governo que se siga a este, e quando se seguir,
voltar atrás neste passo, que considero, repito, extremamente importante. O que é provável é que se dêem novos passos em frente.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Dá-me licença que o interrompa novamente, Sr. Ministro?

O Orador: - Com certeza, Sr. Deputado.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Ministro, V. Ex.ª sabe que a questão que referi quando falei no financiamento à habitação era uma questão toda particular e que não cabe, infelizmente, nos esquemas até agora usados por todos os governos desde o 25 de Abril até agora eu incluo todos os governos.
E a questão que referi e que supus entendida é uma questão muito precisa: a habitação é um bem duradouro, que dura, digamos, 60 anos, e que não deve nem necessita, e até é prejudicial se assim acontecer, estar sujeita a um esquema de crédito baseado na taxa de redesconto do banco central, que é uma taxa de redesconto anual e que nada tem a ver com um bem que é produzido para durar 60 anos, isto é, produzido hoje para que as gerações vindouras o utilizem.
Esta questão tem uma solução e o problema que levantei foi este, Sr. Ministro. E o que é preciso é que o seu governo, se realmente pretende resolver o problema, responda a esta questão.

O Orador: Posso dizer-lhe, Sr. Deputado Veiga de Oliveira, que o Governo pretende responder a essa questão e que o sistema de crédito que já foi anunciado e que brevemente vai entrar em vigor é a primeira resposta.
Se o Sr. Deputado me perguntar se eu considero que essa resposta é totalmente satisfatória, dir-lhe-ei que não e que pretendo ir mais longe nesse domínio. Mas também o Sr. Deputado Veiga de Oliveira compreenderá que os meios financeiros e quando falo neles falo do ponto de vista meramente tecnocrata, e não político não são fáceis de mover e para chegar onde chegámos já foi naturalmente preciso ultrapassar muitas tradições ao nível do nosso sistema de crédito. Mas o que pretendo, repito, é ir mais longe nessa matéria e estou convicto de que o conseguirei.
Aliás, gostaria também de dizer que nesta altura é já questão pacífica que os 40 000 fogos que o Governo, nos 4 anos do seu exercício, pretende construir serão exclusivamente destinados a famílias em condições de insolvência e que será o Estado que se irá substituir nesse mesmo sistema de crédito às próprias famílias insolventes. Espero conseguir encontrar as disponibilidades de crédito suficientes para podermos lançar outra operação de mais 40 000 fogos num sistema de crédito idêntico para as autarquias.
Desta maneira poderíamos considerar que a administração central, através do Fundo de Fomento da Habitação, e as autarquias estariam em condições de poder lançar durante os próximos 4 anos, 80 000 fogos para famílias insolventes.
Estou convencido de que, desse modo, conseguiríamos reduzir drasticamente, se não mesmo eli

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minar, a chaga social que hoje se apresenta neste domínio e que se traduz nas famílias insolventes que nesta altura não têm habitações condignas.
Penso, pois, que 80 000 fogos conseguiriam quase que eliminar, pelo menos nestes anos mais próximos, os problemas mais candentes que nesta altura temos para enfrentar.

Aplausos do Sr. Deputado do PSD Silva Marques.

Ao Sr. Deputado Anselmo Aníbal, que perguntou como iriam funcionar as comissões interdepartamentais e qual seria a sua constituição responderei que a ideia que o Governo tem nesta matéria é que temos de pôr fim a uma situação extremamente burocrática e totalmente descontrolada que nesta altura existe e que é o passeio dos processos pelos vários departamentos do Estado. Nunca se sabe quando é que se chega ao fim num processo de urbanização porque cada direcção-geral responde quando lhe calha e sem que haja uma forma disciplinada de encarar estes problemas.
Por outro lado os problemas que se levantam são rigorosamente problemas interdepartamentais que devem ser analisados à volta da mesa para serem
optimizados.
A nossa ideia é que várias direcções-gerais estejam presentes nestas comissões interdepartamentais a nível distrital e que à volta da mesa se assumam relativamente às áreas que lhes estão submetidas.
Essas comissões interdepartamentais serão, portanto, acrescidas com algumas direcções-gerais relativamente a alguns problemas específicos que se levantam nalgumas zonas, como é o caso, por exemplo, da vizinhança de estabelecimentos prisionais, de zonas com instalações militares, etc., etc.
A ideia é que essas comissões interdepartamentais consubstanciem a acção da administração central na aprovação, ou reprovação, ou na definição de algum, tipo de limitação nas áreas de desenvolvimento urbano prioritário propostas pelas Câmaras e, portanto, serão elas que, analisando os problemas, aprovarão, rejeitarão ou estabelecerão condicionantes às propostas das câmaras.
A posição do Ministro neste aspecto é uma posição de mera sanção de um acto que decorrerá essencialmente entre as próprias autarquias e estas comissões interdepartamentais a nível distrital.
Quanto à forma como deve ser publicada a indicação, a nível oficial ou oficioso, no Diário da República das áreas de desenvolvimento urbano prioritário, confesso que é um aspecto de pormenor que ainda não analisámos. Não apresentamos o clausulado precisamente por considerarmos que muitos aspectos de pormenor podem revestir-se de grande importância, e não queríamos precipitar-nos nessa matéria.
Como já disse, estamos convencidos de que a opinião das próprias autarquias poderá ser extremamente relevante e, portanto, esse é um aspecto que não está nesta altura estudado, mas que iremos analisar cuidadosamente e sobre o qual, se houver sugestões a fazer, desde já as agradecemos porque as consideraremos com toda a boa vontade.
Quanto às revogações possíveis de outra legislação, queria salientar que não previmos revogar nenhuma da legislação existente. De facto, a menos que venha ainda na análise que se vai fazer e no diálogo com as autarquias se encontrem alguns aspectos que impliquem a revogação de um ou outro artigo da legislação actualmente existente, parece-nos que, numa análise já relativamente profunda que se fez de toda a legislação existente, não vai ser necessário mexer em nada do que existe. É uma legislação complementar do que existe e que, digamos, tem como finalidade fundamental levar, a que a legislação existente possa ser utilizada com maior eficácia do que tem sido até agora.
Portanto, quando Sr. Deputado Silva Graça refere o problema do artigo 5.º estaremos rigorosamente nas mesmas condições. É nossa intenção que o problema das expropriações seja revisto, mas pensamos que há tempo para o fazer ao nível da Assembleia e de submeter a esta, propostas nesse sentido. Não é intenção do Governo legislar sobre essa matéria.
No que respeita aos artigos 47.º a 51.º não serão revogados pelo nosso decreto-lei.
Portanto, o que posso afirmar é que é intenção do Governo, no que respeita a matéria tributária, que, como já disse será discutida aqui no próximo ano, quando se discutir a proposta orçamental, que a penalização a estabelecer seja suficientemente desencorajante para que efectivamente os terrenos não fiquem numa situação de expectativa como até agora. Se assim não for não vale a pena tributar.
Se vamos tributar ou o fazemos para que a tributação seja uma realidade e tenha uma força coerciva sobre os próprios proprietários ou se vamos lançar uma pequena tributação, então ela não terá nenhum efeito e não valerá a pena.
Talvez se possa pensar se essa tributação poderá ser progressiva ou não, mas é já outro aspecto da questão, que também estamos dispostos a discutir na altura própria, visto que a tributação não virá a ser aplicada antes de 1983. Com todo o processo que está previsto nem sequer em 1982 ela será aplicada, porque só se cairá na situação de tributação a partir das acções a tomar pelos próprios proprietários durante o ano de 1983.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Aquilino Ribeiro Machado.

O Sr. Aquilino Ribeiro Machado (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tivemos oportunidade de verificar que os objectivos inicialmente latifundiários e extremamente vagos do pedido de autorização legislativa foram oportunamente corrigidos através de uma proposta de alteração.
Efectivamente, acusava certa preocupação e alguma perplexidade a disposição de legislar em matérias tão amplas como o planeamento urbanístico e o regime jurídico dos solos, entendido em termos gerais.
A referência ao planeamento urbanístico foi retirada e isto dá-nos um quadro mais limitado dos objectivos do Governo que, agora, o Sr. Ministro teve oportunidade de definir com um pouco mais de clareza.
No entanto, o documento que acompanha o pedido de autorização legislativa e que de algum modo faz a explanação das intenções subjacentes a este pedido,

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se nalguns aspectos é suficientemente elucidativo para termos uma ideia do que se pretende, noutros deixa-nos algumas dúvidas e também algumas inquietações.
Verificamos que há uma certa indefinição relativamente aos prazos estabelecidos e grande, direi mesmo profunda, confusão no seu concatenamento, na sua coordenação. Talvez que o documento não tenha sido elaborado ainda com a suficiente maturidade, mas as dúvidas que suscita são de referir.
Verificamos que, antes de mais nada, o espírito e a filosofia que enforma este propósito governamental se insere em alguns exemplos e experiências já praticados noutros países, nomeadamente em França, através das zones d'aménagement prioritaires et zones d' urbanisation prioritaires, e no fundo é a sua transposição para cá que se pretende levar a efeito.
As zonas de desenvolvimento urbanístico prioritário e as áreas de construção prioritária são, no fundo, a adopção dessas duas fórmulas que já estão experimentadas e que nalguns casos deram resultados positivos.
Mas, voltando aos prazos, verificamos que às Câmaras é dado um prazo para delimitar as zonas até ao dia 31 de Março de 1982. E em vista do enunciado que aqui se faz das necessárias especificações de que deverá ser acompanhada a definição das zonas e que, para todos os efeitos, correspondem a planos de urbanização, entendemos que este prazo é capaz de ser extremamente limitado se entendermos sobretudo que grande parte dos municípios, pese embora o apoio que o Governo se propõe dar-lhes através dos organismos que neste mesmo documento refere.
Este prazo se mostra extremamente débil para levar a efeito semelhante tarefa, até porque em muitos aglomerados com mais de 5000 habitantes não há ainda qualquer plano de urbanização previamente elaborado, o que não permite, em boa verdade, que se definam zonas de urbanização prioritárias ou áreas de construção prioritárias quando não existam planos de urbanização feitos. É uma situação do tipo da galinha e do ovo: a galinha será esta definição de áreas, mas o ovo terá de ser o plano de urbanização e vice-versa. Daí que estes prazos para os municípios nos pareçam demasiadamente curtos, a menos que se pretenda visar um número limitado de situações.
Esta delimitação de áreas que se pretende fazer e que será objecto de revisão todos os anos - o que parece positivo, como princípio - conduzirá à publicação no Diário da República das respectivas definições, uma vez aprovadas pelo Sr. Ministro das Obras Públicas, sabendo-se agora que será também escutado, para o efeito, o Sr. Ministro da Qualidade de Vida.
Mas entre a apresentação pelos municípios, a apreciação pelos organismos interdepartamentais, a aprovação pelo Sr. Ministro e a publicação no Diário da República vai, com certeza, passar bastante tempo, o que atira a expectativa de realização destes projectos para bastante longe.
Independentemente desta referência de pormenor, gostaria de salientar que aos particulares que se situam nas áreas de desenvolvimento urbanístico prioritário é dado um prazo de três meses para virem declarar se estão dispostos ou não a urbanizar os seus terrenos, se cedem os terrenos ao município, se não cedem nem estão dispostos a urbanizar ou se não declaram nada. Estas duas situações últimas são um pouco tautológicas porque para efeitos de tratamento com vista à criação de um ónus de tipo fiscal o tratamento será, com certeza semelhante.
Mas são dados três meses e seguidamente seis meses para os proprietários que se encontrem nas áreas de desenvolvimento urbanístico prioritário apresentarem projectos de loteamento. Ora, 6 mais 3 são 9, o que quer dizer que os proprietários terão, para todos os efeitos, nove meses para desenvolver este trabalho.
Como as áreas de desenvolvimento urbanístico prioritário comportarão seguramente e em muitos casos definições de terrenos que se encontram em áreas consideráveis, não urbanisticamente dotadas de infra-estruturas e cujo projecto de infra-estruturas dependerá de um projecto conjunto das várias infra-estruturas - suponhamos um terreno que constitui um enclave no meio de uma área rural que é definida como área de desenvolvimento urbanístico prioritário -, será com certeza inviável ou muito problemático para um proprietário de terreno nestas circunstâncias poder proceder ao estudo e ao projecto das infra-estruturas que depende da iniciativa de outros proprietários a montante e eventualmente a jusante. É uma dificuldade técnica a ter em conta na fixação destes planos.
Mas para os municípios que recebam esses terrenos através de contratos com os proprietários e que queiram levar por diante a sua urbanização por iniciativa própria, já é concedido um ano. Aqui há uma diferenciação de tratamento que não me parece nem equitativo nem justo, até porque aos municípios será dada com certeza maior facilidade para este efeito.
No entanto, para as áreas de construção prioritária, que por definição são aquelas que, temporalmente, têm condições para arrancar primeiro, já é dado aos proprietários um prazo de um ano para fazer a declaração. 15to não é compreensível nem aceitável para as áreas de desenvolvimento urbanístico prioritário estabelecem-se três meses para aquelas em que a construção poderá ser mais imediata estabelece-se um ano. Não é justo nem aceitável.
E aos proprietários que se situem dentro das áreas de construção prioritária não dotadas de infra-estruturas dá-se-lhe, ainda, mais dois anos para apresentarem os respectivos projectos de infra-estruturas, os projectos dos edifícios e o levantamento das respectivas licenças. Tudo isto constitui um encadeado de prazos, que, para efeitos comunitários de lei, parece acabar, unicamente, com todo este processo urbanístico. Ou seja os proprietários inseridos em áreas de desenvolvimento urbanístico prioritário apresentam os seus projectos a loteamento. E depois? Depois, não se sabe o que é que acontece Ou seja: vai recair sobre eles o tal ónus do imposto? Ou há qualquer fixação de novo prazo para a execução das obras?
Porque uma coisa é obter o licenciamento, outra coisa é ter apresentado os projectos, mas distinto disso é proceder à sua concretização, em relação ao que não se faz nenhuma referência a prazos, nenhuma referência à sequência natural deste processo.
Esta dúvida é suficientemente importante para justificar um esclarecimento e sobretudo uma correcção

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solos, dizendo que o Governo «pretendia simplesmente fazer um ajustamento de pormenor que tem apenas uma intenção de carácter prático». Dizia o então Ministro que eram «muitos e muitos diversos» os problemas que eram levantados junto da administração central, e à laia de justificação dizia que eram as câmaras municipais que levantavam mais a urgência da resolução deste problema. Salientava-se que havia «dificuldades de interpretação, estreito campo de decisões e maleabilidade da administração». O que é que se pretendia de facto, nessa altura? Queria aproveitar-se, como agora, o Verão para legislar, o Governo queria fazê-lo evitando o que considerava e considera o ónus das discussões parlamentares. Dizia que procurava suster com eficácia «o constante desenvolvimento das áreas de construção clandestina», salientando ainda que pretendia «a rápida disponibilidade pelo sector público de terrenos aptos» ...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, desculpe interrompê-lo, mas gostaria de pedir aos Srs. Deputados o favor de permanecerem na Sala ou se por qualquer motivo tiverem necessidade de sair que o fizessem rapidamente, mas que fosse possível manter na Sala aquele mínimo de atenção e de possibilidade para que o Sr. Deputado que está no uso da palavra o possa fazer com o sentimento de que está, realmente, a ser escutado.
É um pedido que tenho vindo a formular a VV. Ex.as e para o qual pedia o favor de me tornarem desnecessária a sua repetição.
Queira continuar, Sr. Deputado.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Confessava-se, portanto, que na prática o que se pretendia era a oferta de terrenos até então municipalizados. De facto o que aconteceu foi o Decreto-Lei n.º 313/80, de 19 de Agosto, e que dizia «poderá ser autorizada cedência dos terrenos em posse plena às entidades de direito privado». Damos este exemplo que é, aliás, o mais conhecido: a Câmara Municipal de Lisboa, que tomara para si as honras desta alteração e tinha anunciado o número do diploma - saiu na folha oficial em 19 de Agosto, como disse - num edital de 11 de Agosto (é uma habilidade dos circuitos de informação do actual presidente da Câmara Municipal de Lisboa), a Câmara Municipal de Lisboa, dizia, foi retirando os proveitos dessa revisão. Lembrada das grandes negociatas que entretanto patrocinara enquanto era dirigida por gerentes fascistas, quis aproveitar o uso em plena posse dos terrenos municipais, anunciando nestes dezoito meses em que tem dirigido Lisboa, vendas em posse plena de terrenos municipais, aproveitando-se para fornecer terrenos, para desmunicipalizar terrenos, apontando até previsíveis acções de reversão que alguns antigos titulares de terrenos poderão fazer por via judicial.
15to no meio de um fraseado que eu reputaria de demagógico, e é o mínimo que se poderá dizer, pois é difícil classificá-lo de uma forma menor.
Dizia então a Câmara Municipal de Lisboa que procurava acabar com as zonas degradadas e os bairros de barracas comprometeu-se a vender a globalidade dos terrenos por metro quadrado, em preço compatível com a economia de operação; e ficavam as empresas com o objectivo do realojamento, em extensão, das populações, sendo autorizadas a 85 % em venda livre, no mercado livre, e isto no meio de um sortilégio de palavras de que eu só lembrava as seguintes: «era para viabilizar a integração social dos realojados nas novas comunidades refazendo», - pasme-se a linguagem! - «o tecido social da cidade à custa de uma efectiva miscigenação». 15to é um texto de grande densidade ideológica, que às 0 horas e 20 minutos é realmente difícil analisar, elaborado de forma subtil, com uma sequência discursiva e sociológica em que convém atentar, naturalmente, dando origem a um elefante, também ...

O Sr. António Moniz (PPM): - Um elefante?!

O Orador: - Daí, Sr. Presidente, Srs. Deputados, o poder dizer-se que o resultado da autorização legislativa que foi pedida nessa altura e ao qual o Grupo Parlamentar do PCP votou contra, provou continuamente que não era processo de intenções o que então dissemos. Vimos, por este andar, o que a revogação do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 313/80 deu.
E variadas vezes aparece a indicação de que fazemos processos de intenção, antes das leis estarem presentes. Não é verdade. 15to é uma análise, a posteriori, daquilo que resultou de uma autorização aqui concedida, dia por dia, quase há um ano, e que deu origem ao tal Decreto-Lei n.º 313/80.

Uma voz do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Na página 1 da chamada nota informativa diz o Governo que não pretende revogar as leis igualmente em vigor sobre planeamento urbanístico e regime jurídico dos solos. Indica, o Sr. Ministro, que as quer complementar, o que, aliás, reiterou na sua expressão de há pouco.
Percebe-se, ao longo do texto, que quer criar dois novos investimentos urbanísticos e quer promover a criação de comissões interdepartamentais para desburocratizar, como diz o Sr. Ministro.
Mas, de facto, o que aqui aparece claramente é a aprovação das chamadas propostas de definição das áreas de desenvolvimento urbano prioritário e das áreas de construção prioritária, em nome do que se chama de salvaguarda dos interesses nacionais e regionais.
Mas, Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro, considerar-se-á que é a criação destas novas figuras urbanísticas que dará origem a uma nova produção de solos urbanizados? Melhor dito era a falta destes instrumentos legais que justificava a falta de «abundante produção de solos urbanizados»? Ou a carência de solos urbanizados tem uma história longa, um complexo de causas que nos escusaremos de repetir e denunciar, mas provando antes de tudo, o desmuniciamento em que a administração local sempre viveu, o desmuniciamento e a falta de mobilização de capitais públicos e não com as variáveis que o Sr. Ministro há pouco referiu quanto aos preços dos empréstimos, mas antes em relação a taxas de valoração efectiva dos capitais públicos. E há fórmulas de acentuar a participação da banca nesse esforço.
Esta proposta de lei continua a mesma constante: faz da administração local um parceiro pobre e débil que não pode receber mais meios porque é fraco e

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que sendo fraco não pode ter mais poderes. Mas diz ainda mais: que a administração local vai pôr, pelo menos no jogo da oferta pública, em termos que o Sr. Ministro ainda poderá precisar, todos os terrenos municipalizados, o que significa desmuniciarem-se, se bem entendo o raciocínio que preside à nossa proposta de lei, os municípios:
Primeiro, pretende-se que ponham os seus terrenos nas listas de oferta. Juntam-se os grandes compradores de imobiliário que conhecem pela simples leitura do jornal oficial onde há terrenos compráveis, não precisando de ter, nas suas empresas, pessoas para os detectarem. É a própria Administração que racionaliza a oferta, sendo a teia da oferta de terrenos em todo o País feita pelo jornal oficial ou de forma oficiosa. E os grandes compradores de terreno, com este passe de bandeja, compram melhor, mais barato e mais rapidamente.
Parece ser este, Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro, o elemento escondido da indicação destes 24 pontos desta chamada nota informativa que acompanhga a proposta de lei. Porque com estes dois novos instrumentos urbanísticos, as áreas de desenvolvimento urbano prioritário e as áreas de construção prioritária aplicáveis nas sedes de concelho e nos aglomerados urbanos com mais de 5000 habitantes, atinge-se a capacidade decisória dos órgãos autárquicos da administração local. Relegam-se esses órgãos autárquicos, se bem entendemos, para patrocinadores das boas propostas, porque o Sr. Ministro fica com o poder, que poderíamos considerar discricionário, de em relação aos 305 municípios dizer sim ou não, de apressar uns e atrasar outros, de fazer com que uns tenham todas as audições e, até, do Ministério da Qualidade de Vida - que o Sr. Ministro não se excusou de referir -, mas para outros, naturalmente, passando pela DGPU, pela DGERU e por outras terminadas em U ...

Risos do PCP.

... ficará o bloqueamento.
Ou seja, Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Ministïos: Passarão ou poderão passar dos municípios até ao metro quadrado para as mãos dos promotores privados mas dos solos, mas das mãos destes últimos nem um só centímetro quadrado vai ser municipalizado. Estamos perante a sequência lógica - inteligente, aliás - da segunda volta do Decreto-Lei n.º 313/80. Aliás, não é naturalmente indemne o facto de os dois Ministros aqui presentes serem ambos do CDS
Fecha-se um, puzzle e a reformulação do quadro júrídico do planeamento é feito como instrumento de excepção, nada atribuindo às câmaras, centralizando, na administração central. A Lei n.º 79/77 e o Plano Director Municipal ficam entre parêntesis, etc. Poderíamos falar de uma «febre de desmunicipalização de solos» e poderíamos dizer que isto coincide, embora com indicações diversas, com a não aprovação de uma lei de delimitação dos poderes das autarquias que legitime o carácter director do município em relação aos solos e com uma desburocratização que de facto existirá mas só alguns aproveitam.
O Sr. Ministro já há pouco respondeu a uma questão que foi posta pelo meu camarada Silva Graça, em relação aos artigos 47.º a. 51.º Eu acrescentaria apenas que o pedido de autorização legislativa agora presente invalida tudo isso, um conjunto de medidas que em dezoito meses legitima por parte, da Administração a expropriação por utilidade pública.
Neste momento fala-se do pagamento de um imposto, que pode ser apenas exemplar, como os 800$ que o DGERU indica, para aqueles que não fazem obras de conservação nos prédios de oito em oito anos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, é assim que o Ministério parece resolver os problemas. Há um ano o artigo 5.º, agora outros artigos.
Não é legítimo reiterar que estas soluções não atingem o cerne do problema da oferta, criando uma situação favorável aos promotores, e trocadores de terrenos?
É por tudo isso que votaremos contra este pedido de autorização legislativa.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Porto.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, pretendia interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Orador: - Creio que há vários dias se assentou julgo eu, que a duração das intervenções fosse de 15 minutos. Salvo erro do meu cronómetro, a intervenção que acabou de ter lugar ultrapassou-os.
Era isso que pretendia que fosse clarificado.

Uma voz do PCP: - O seu cronómetro não presta.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, como .V. Ex.ª naturalmente se terá apercebido, aconteceu que me fiz substituir pelo Sr. Vice-Presidente, Sr. Martins Canaverde, e que entrei no decurso da intervenção que estava a ser feita pelo Sr. Deputado da bancada do Partido Comunista. Em todo o caso, posso dizer-lhe, Sr. Deputado, que pelos Srs. Deputados Maia Nunes de Almeida e Mendes de Carvalho, na altura em que o Sr. Deputado Anselmo Aníbal começou a usar da palavra, foi marcado no cronómetro electrónico que agora rege o controle dos tempos a contagem decrescente de 15 minutos. Não sei se no decurso da intervenção houve alguma interrupção, mas o Sr. Deputado fez pelo menos uma paragem que me levou mesmo a perguntar-lhe se estava sem microfone, e teve lugar uma outra paragem que eu próprio solicitei, para pedir à Câmara o silêncio conveniente.
O cronómetro, como sabe, dá 30 segundos a mais, e não sei qual foi o tempo que V. Ex.ª constatou pelo seu relógio, mas houve os acréscimos, visto que quando se verificam interrupções destas tal é descontado no tempo de que o Sr. Deputado em questão usufrui, para usar da palavra.
Posso assegurar-lhe que a Mesa não está a conceder a nenhum Sr. Deputado mais tempo do que os exactamente 15 minutos acordados.

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Tem a palavra o Sr. Deputado João Porto, dispondo de 3 minutos.

O Sr. João Porto (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de colocar algumas questões ao Sr. Deputado Anselmo Aníbal.
O Sr. Deputado invocou a autorização legislativa concedida há um ano por esta Câmara ao Governo da qual resultou, posteriormente, o Decreto-Lei n.º 313/80. Gostaria que me dissesse por que razão invocou, por exemplo, para além da circunstância de ter sido pedida autorização legislativa sobre matéria que versava o regime jurídico dos solos e para além de ter sido uma autorização legislativa que foi discutida na última sessão do ano passado, esta comparação, tendo certo que o Decreto-Lei n.º 313/80 veio conferir às câmaras e à administração central a possibilidade de alienar a propriedade plena a favor de entidades privadas de terrenos na sua posse.
Esta autorização legislativa visa a possibilidade de o Governo aprovar um diploma no qual as figuras que aparecem no horizonte são precisamente ou a da alternativa que os proprietários virão a ter, ou levar ao efeito as urbanizações consideradas necessárias à expansão dos núcleos urbanos, ou pôr os terrenos à disposição das câmaras municipais, ou então ficarem sujeitos a uma penalização precisamente desincentivadora da especulação dos terrenos.
Gostava também que me dissesse - certamente a resposta será negativa - se sabe que a primeira solicitação recebida no Ministério da Habitação e Obras Públicas na sequência do Decreto-Lei n.º 313/80 foi precisamente a de um grupo de trabalhadores de Sines que pretendiam adquirir em propriedade plena os terrenos onde tinham as suas casas, das quais só possuíam o direito de superfície. Como vê, medida tão anti-social era difícil de conceber.
Finalmente, gostava que me dissesse se, quando o Governo ou a maioria propõem aqui alguma coisa em matéria de terrenos ou de construção, os senhores não imaginam logo que isso visa qualquer negociata com o presidente da Câmara Municipal de Lisboa.
Gostava de saber, meus senhores, se da vossa parte, já não vos pergunto quem tem medo do presidente da Câmara Municipal de Lisboa.

Risos do PCP.

... porque já todos percebemos quem tem medo dele ...

Uma voz do PCC: - Está arrumado!

O Orador: - ... e também sabemos por que é que têm medo dele: por causa da sua eficiência e da sua capacidade, a que Lisboa já não estava, há muito tempo, habituada.

Aplausos do CDS.

Risos do PCP.

Mas gostava de perguntar à bancada do Partido Comunista por que é que tem tanto medo do presidente da Câmara Municipal de Lisboa.

Aplausos do CDS.

O Sr. Sousa Marques (PCP): - O PSD não bateu palmas.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Anselmo Aníbal.

O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): - Sr. Deputado João Porto, chamámos à colação o Decreto-Lei n.º 313/80 porque está tudo ligado.
É um passo na desmunipalização dos solos e outros se darão ou outros se dariam se isso fosse aprovado. Esta indicação clara de desmunicipalização não aparece no texto, como não apareceu no seu pedido de justificação. As intenções temos nós de as descobrir, porque os senhores, naturalmente, as põem publicamente entre parêntesis. Mas há pessoas que as descobrem, há até mais gente do que os senhores pensam que descobre o «rabo escondido do gato». Está tudo ligado contra o artigo 65.º, contra as indicações de ordem constitucional sobre a municipalização e a nacionalização dos solos.
O Sr. Deputado João Porto pergunta: «Mas o que aparece no horizonte não é pôr os terrenos à disposição das câmaras? Mas o que aparece no horizonte não é, no fundo, que os terrenos vão ser municipalizados?» E nós respondemos: não é, não senhor.

O Sr. João Porto (CDS): - Eu não disse isso.

O Orador: - Disse-o e acrescentou ainda: ou a taxa!
Mas o que nós lhe respondemos é isto no fundo, no horizonte, está também o facto de os terrenos serem comprados por terceiros, ou seja, há sempre um terceiro expectante à espera de um terreno. Há um terceiro que lê o jornal oficioso, sabe dos terrenos, compra-os, algumas vezes por «tuta e meia», e aceita a oferta indiscriminada que é lhe presente. E volto a dizer: não tem de ter na sua empresa um descobridor de terrenos, é a folha oficial e são as câmaras que prestam esse serviço. Não foram, exemplarmente, os trabalhadores de Sines.
As grandes empresas que concorreram ao concurso de pré-qualificação da Câmara Municipal de Lisboa, essas, sim, sabem quais são os terrenos que têm em vista.
E, reportando-me ao Decreto-Lei n.º 313/80, ele admite e cria, de facto, para o Ministério da Habitação e Obras Públicas, a faculdade de alienar terrenos: «alienação da propriedade terrena, por acordo directo ou por concurso» Propriedade terrena que se liga, por exemplo, aos poderes que o actual MAP tem em relação à propriedade fundiária agrícola.
De facto, esta indicação faz com que o presidente da Câmara Municipal de Lisboa, da câmara AD, melhor dizendo, abra neste momento um concurso de venda de parte da cidade nas condições que aqui citei, ou seja, 1 m2 baratinho, como se diz, para fazer 15 % e 18 % para a iniciativa privada, numa operação, quer queiramos ou não, meus senhores, que envolve altíssimos interesses imobiliários e altíssima componente especulativa.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro da Habitação e Obras Públicas.

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O Sr. Ministro da Habitação e Obras Públicas (Luís Barbosa): - Antes de mais, queria responder às questões postas pelo Sr. Deputado Aquilino Ribeiro Machado relativamente ao encadeamento dos prazos.
É um problema sensível e delicado. Em todo o caso, estamos convencidos de que será no próprio diálogo com as autarquias que iremos, com certeza, encontrar a justificação para os prazos que apontámos ou estabelecer outros, se, de facto, estes vierem a mostrar-se irrealistas na discussão com as autarquias.
Quanto à discrepância entre prazos estabelecidos para as áreas de construção e para as áreas de desenvolvimento urbano prioritário, foi nosso entender que as áreas de construção prioritárias serão, de uma maneira geral, incluídas em áreas de desenvolvimento urbano prioritário, e estabeleceu-se um prazo superior para o aproveitamento das áreas de construção, na medida em que a decisão de construir, de uma maneira geral, envolve o encontrar um financiamento bancário ou de associados que permita fazer um desenvolvimento em termos convenientes. Pensou-se que um ano seria, naturalmente, indispensável para se poder desenvolver a acção de construção, que é fatalmente uma acção mais morosa.
Quanto à tributação ser de carácter progressivo, eu próprio aqui referi que é um aspecto que devemos considerar. Julgo que não vamos, nesta altura, tomar nenhuma posição sobre esta matéria, uma vez que a Assembleia da República terá oportunidade de discutir em pormenor esta mesma questão, como referi já, aquando da discussão do Orçamento para 1982.

Uma voz da CDS: - Muito bem!

O Orador: - Finalmente, uma questão, que preocupa o Sr. Deputado Aquilino Ribeiro Machado e que também preocupa o Governo: que a legislação não possa vir a permitir a transferência de lucros de proprietários para intermediários ou para promotores de imobiliários.
É um aspecto que tem de ser devidamente acautelado. A lei tem vários pontos sensíveis e que têm de ser estudados com extremo cuidado. Foi essa a única razão que nos levou a não apresentar um clausulado diferente do que existe, que não está suficientemente testado para termos a garantia de que não tenha de sofrer ainda algumas alterações, de forma a acautelar precisamente esse tipo de situações. São esses cuidados que iremos ter, e será com muito prazer, como já referi, que ouviremos os representantes, dos grupos parlamentares, quer da maioria, quer da oposição, no sentido de afinar estes pormenores.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado Aquilino Ribeiro Machado afirmou, aliás, que a legislação a aprovar ou que se pretende vir a definir é uma legislação com aspectos muito positivos, e é a esses aspectos positivos que estamos agarrados, é desses aspectos positivos que queremos fazer o ponto fulcral da legislação. Não estamos na disposição de permitir que aspectos negativos venham prejudicar aquilo que de positivo a legislação pode ter.
Quanto ao Sr. Deputado Anselmo Aníbal, estive a ouvir com cuidado a forma extremamente habilidosa como foi construindo toda uma teoria para chegar ao ponto que, naturalmente, era a sua descoberta do «gato».
Eu penso que, em matéria de «descobrir gatos», há muitos «gatos» para descobrir e tenho vindo a descobrir alguns desde que estou no Ministério da Habitação e Obras Públicas. Portanto, julgo que o «descobrir gatos» é tarefa que incumbe a todos nós.
De qualquer forma, o que lhe quero garantir, para seu descanso, é que o «gato» que descobriu não existe. Fabricou-o, proeurou encaminhar as coisas nesse sentido, mas, de facto, o objectivo da legislação não é esse. Devo dizer que, quando se fala na possibilidade de as autarquias porem à disposição, também, os seus terrenos, é porque, nesta altura, há autarquias que têm na sua posse terrenos que são maiores do que as áreas construídas. Há cidades, concelhos ou aglomerados urbanos de cidades com alguma relevância no País que têm, nesta altura, áreas expropriadas maiores que as áreas construídas e estão paralisadas. E é isso que não parece ser correcto. O que nós pretendemos é que as autarquias utilizem as áreas que têm à sua disposição e que não as mantenham numa situação de expropriação sem que lhes dêem o necessário desenvolvimento.

A Sr.ª Ercília Talhadas (PCP): - Quais?

O Orador: - Bom, se quiser, não referir-lhe a Câmara de Castelo Branco, a zona de Setúbal, onde há áreas que estão, nesta altura, reservadas pelo próprio Fundo de Fomento da Habitação e que são superiores à área construída em Setúbal. Julgo que é a isto que temos de pôr termo.
Aliás, deve dizer-se que até a própria Câmara Municipal de Lisboa tem, nesta altura, áreas de que poderá vir a dispor. Deve dizer-se, para além disso, que
a própria administração central está a fazer um inventário, pelos seus serviços de Património, dos terrenos de que ela própria dispõe sem nenhuma espécie de utilização.

0 Sr. Anselmo Aníbal (PCP): - Dá-me licença, Sr. Ministro?

O Orador - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): - É só uma indicação. O Sr. Ministro está num governo que fez uma aplicação da Lei das Finanças Locais que desmuniciou financeiramente os municípios. Esse desmunicimento não aparece no seu pensamento. O seu pensamento faz-se como se administração municipal não actuasse, pura e simplesmente, por não querer actuar. Não põe o problema em termos de tesouraria ou em termos de gestão simples. Gostaria que introduzisse, pelo menos, essa indicação no seu pensamento.

O Orador: - Com certeza, Sr. Deputado.
O que lhe posso garantir é que, com as intenções expressas neste diploma, as autarquias passarão a ter à sua disposição terrenos sem que seja necessário despender o quer que seja, visto que eles ficarão à sua disposição e não terão de os pagar, a não ser quando a construção estiver concluída, o que hoje não acontece quando se expropria.

Vozes do CDS: - Muito bem!

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O Orador: - Portanto, eu diria que existem algumas preocupações para evitar que a legislação possa, através de qualquer «buraco», fazer com que se propiciem lucros especulativos em matéria de terrenos. É um aspecto que teremos de acautelar, que teremos de corrigir, se à partida o não tivermos conseguido. Mas é essa, de facto, a intenção subjacente ao diploma.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Dá-me licença, Sr. Ministro?

O Orador - Faça favor.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Ministro, eu tenho prestado muita atenção desde o início da sua intervenção e ponho-lhe uma questão: há quem tenha um vezo contra os lucros. Eu suponho que não é disso que se trata, mesmo que os preços não sejam especulativos, e, de qualquer forma, há a lei que pune, bem ou mal. Mas mude-se a lei, se há que mudá-la, sobre os preços especulativos.
O problema não é esse, e o Sr. Ministro sabe qual é: é dispormos de terrenos suficientes e sobretudo de financiamento para construir habitações. Porque, enquanto estivermos a rodar em volta dos lucros que alguns vão ter ou não vão ter, estamos a rodar mal, Sr. Ministro.

Portanto, não nos fale da vossa proposta em termos de lucros especulativos, mas fale-nos dela em termos de capacidade de resolver, por um lado, a questão dos terrenos e, por outro, a possibilidade de financiar a construção de habitação, sem prejudicar a autonomia dos municípios. Esta é que é a questão, Sr. Ministro.

Habitação e Obras Públicas, mas o que pretendemos com este diploma é reduzir o poder discricionário que o Ministério da Habitação e Obras Públicas hoje tem. Este diploma confere menos poder ao Ministério da Habitação e Obras Públicas do que aquele de que dispõe actualmente. Hoje, de facto, nenhuma autarquia poderá urbanizar sem que haja aprovação, nem que seja de um plano de pormenor, por parte da Direcção-Geral do Planeamento Urbanístico. Por conseguinte, estamos a aligeirar ou a propor o aligeiramento de uma situação que hoje é mais gravosa. Era tudo o que queria dar como explicações.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Vamos votar na generalidade o pedido de autorização legislativa constante da proposta de lei n.º 52/II.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS e do PPM e votos contra do PS, do PCP. da ASDI, da UEDS, do MDP/CDE e da UDP.

O Sr. João Porto (CDS): - Dá-me licença, Sr. Presidente? É para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. João Porto (CDS): - Recordando que existe uma proposta alternativa relativamente ao texto do Governo, parece que a votação na especialidade não poderá ser feita sem essa indicação.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado. Há uma proposta de alteração entregue às 21 horas e 22 minutos, no decurso desta sessão n.º 90, que é intitulada como proposta de alteração, mas que à Mesa parece tratar-se de uma proposta de substituição, visto que é todo o texto anterior que desaparece para aparecer um texto novo relativo ao artigo 1.º. Não é verdade, Sr. Deputado João Porto?

O Sr. João Porto (CDS): - Exacto, Sr. Presidente.

0 Sr. Presidente: - Vamos votá-la.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do CDS e do PPM e votos contra do PS, do PCP, da ASDI, da UEDS, do MDP/CDE e da UDP.

É a seguinte:

Proposta de lei n.º 52/II

Proposta de alteração

Propomos que o artigo 1.º passe a ter a seguinte redacção:

ARTIGO 1º

É concedida ao Governo autorização para legislar sobre incentivos à utilização dos solos urbanizados e a urbanizar e penali-

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zações consequentes, com a resultante alteração do regime jurídico dos solos.

Palácio de S. Bento, 29 de Junho de 1981. - Pelo Grupo Parlamentar do PSD, Fernando Costa. - Pelo Grupo Parlamentar do CDS, João Porto. - Pelo Grupo Parlamentar do PPM Gonçalo Ribeiro Teles.

O Sr. Presidente: - Considera-se, portanto, substituído o artigo 1.º constante da proposta de autorização legislativa pelo texto agora votado.
Passamos à votação do artigo 2.º.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS e do PPM e votos, contra do PS, do PCP, da ASDI, da UEDS, do MDP/CDE e da UDP.

É o seguinte:

ARTIGO 2º

A autorização legislativa concedida pela presente lei cessa em 30 de Setembro de 1981.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Gomes.

O Sr. Sousa Gomes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, votámos contra a autorização legislativa pedida pelo Governo. não porque estejamos em desacordo expresso com a definição de algumas novas figuras de actuação urbanística do tipo das que o Governo pretende criar, sobretudo na óptica de desbloquear alguns problemas prementes de áreas urbanas com elevado grau de deterioração, mas porque não nos parece aceitável, em primeiro lugar, o tipo de motivos de urgência apresentados pelo Governo, nem sequer nos parece que a celeridade deste processo venha a ter grandes efeitos práticos em relação ao processo de discussão normal desta Assembleia.
Em segundo lugar, porque não aceitamos dissociar a discussão deste problema em torno de figuras novas de intervenção urbanística de uma aprovação mais ampla de esquemas de ordenamento do território e de planeamento urbanístico, problema que é objecto de um projecto de lei da minha bancada e que, entregue já no início desta sessão legislativa, só não foi ainda objecto de discussão porque a maioria não teve nisso qualquer empenho, nem urgência.
Finalmente, votámos contra, porque consideramos que a prática urbanística constitui um terreno de actuação privilegiada dos municípios, cuja competência não pode ser minimizada, e porque a aprovação de figuras legislativas nesta área não deve ser retirada da Assembleia da República, sob pena de se esvaziar a prazo a salvaguarda, a independência e o reforço das competências das autarquias, que todos aqui dizem querer preservar.

Aplausos do PS, da ASDI e da UEDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Porto.

O Sr. João Porto (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A justificar o sentido do nosso voto, direi, de uma forma muito sintética, que, em primeiro lugar, quanto ao fundo da questão, ninguém duvida da carência de solos urbanizados, no sentido da resolução dos nossos principais problemas urbanísticos, designadamente os decorrentes da necessidade de habitação.
Por outro lado, no que se refere à urgência contestada pela oposição, creio que o Sr. Ministro da Habitação e Obras Públicas deixou aqui claro o que significaria ter deixado a esta Câmara a discussão e aprovação do diploma de idêntico teor num futuro próximo.
No seu optimismo, o Sr. Ministro admitiu que o atraso seria de meio ano. Eu receio que esse atraso fosse bastante superior, já que esta Câmara se vê, neste. momento, a braços com tarefas de grande volume, designadamente a revisão constitucional e, no final do ano, como o Sr. Ministro lembrou, o Orçamento e um conjunto de diplomas que de há muito aguardam vez. Por outro lado, congratulamo-nos também com a abertura que o Sr. Ministro da Habitação e Obras Públicas explicitou, no sentido de acolher as sugestões que visem melhorar o diploma para se alcançarem mais eficazmente os objectivos do mesmo.
Enfim, diremos que a clareza das explicações do Sr. Ministro da Habitação e Obras Públicas, quer na exposição de motivos, quer nas respostas às questões colocadas durante o debate, nos dispensou de tomar a defesa deste pedido de autorização legislativa durante o debate, e limitámo-nos, assim, a aprová-lo simplesmente, certos de que desta autorização legislativa vai resultar um novo passo significativo e importante no sentido da resolução dos nossos problemas urbanísticos.

Aplausos do CDS, do PSD e do PPM.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Silva Graça.

O Sr. Silva Graça (PCP) : - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votámos contra a autorização legislativa aqui solicitada por diversas razões. Não ficou demonstrado que esta iniciativa seja de forte teor centralizador, bem pelo contrário. Aliás, a intervenção do Sr. Ministro adensou ainda mais a situação, particularmente quando, quase no fim, acusa, como é hábito da AD, hipocritamente os municípios de não avançarem no tocante a solos municipalizados, quando o Sr. Ministro sabe muito bem que é por culpa da AD, dos seus deputados e do seu Governo, que não dá condições financeiras nem meios de intervenção aos municípios para poderem avançar com os seus problemas de habitação, com o apoio ao movimento cooperativo, com o apoio à habitação social. Esta é a primeira razão, que nos parece fundamental.
Mais: é que o carácter centralizador é bem realçado também numa proposta de lei do Governo para revisão do Sistema Integrado de Incentivos ao Investimento, que será objecto de votação final global ainda hoje, tornando-se bem claro que, no tocante a esta política de urbanização, o que a AD tem é uma política profundamente centralizadora.
E, como se isto já não bastasse, o projecto de lei nada inova, nada de criador tem no tocante a terrenos urbanizados ou na facilitação de terrenos urba-

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nizados que promova habitação social, que promova apoio às cooperativas de habitação, às cooperativas insolventes, ao projecto SAAL, aos processos SAAL, que aguardam - nos gabinetes dos ministérios, no Fundo de Fomento de Habitação e em várias câmaras - o seu avanço para bem das populações. Nada é dito e nada se nos garante sobre isso.
E, por fim, Sr. Presidente e Srs. Deputados, votámos contra porque não percebemos como é que um Ministério de Habitação e Obras Públicas apresenta - ou melhor, percebemos, é o tal «gato» de que nós poderíamos falar ainda muito, mas, simplesmente, não temos tempo, Sr. Ministro - um pedido de autorização legislativa destes sem nada dizer no tocante ao financiamento à habitação. 15to vem da parte de um ministro e de um governo que anuncia uma lei quadro da habitação no seu programa de governo, o Programa do VII Governo. Nada é dito sobre isto, nada é correlacionado, e, aliás, esta última razão articula-se plenamente com as razões expostas anteriormente.
Como nota final, queria registar ainda a pobreza dos deputados do Governo no tocante à discussão de matéria tão importante para o futuro da resolução do problema da habitação no nosso país.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Borges de Carvalho.

O Sr. Borges de Carvalho (PPM): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A falta de orientação tanto a nível governamental como autárquico e a errada avaliação de potencialidades do solo têm levado a que ou se processem intervenções urbanísticas inadequadas, ou a que se abram as portas à especulação, ou ainda à falta de políticas de urbanismo local suficientemente atractivas para os agentes económicos, ou a que se fomente a construção clandestina ou a ela se fechem os olhos.
Se o objectivo essencial da legislação que o Governo se propõe elaborar com base nesta autorização é o de incrementar a urbanização das áreas necessárias à habitação e à expansão dos aglomerados, pondo à disposição dessa urbanização os terrenos adequados não pode tal autorização deixar de merecer o nosso apoio.
O busílis da questão está, em boa verdade, no adjectivo «adequados». Do entendimento do que são, ou não, terrenos adequados à construção, bem como da forma como, na prática, tal classificação for conferida, dependerá o êxito da legislação que o Governo ora fica autorizado a produzir.
Congratula-se o PPM pelo facto de muitos dos princípios de defesa do solo pelos quais se vem batendo há longos anos terem sido aqui consagrados na declaração de princípios produzida pelo Sr. Ministro.
A iniciativa do Governo utiliza, segundo a declaração de intenções de que falei, meios predominantemente incentivadores e não repressivos, o que também merece o nosso apoio.
Por outro lado, se o projecto obriga os proprietários a pôr os seus terrenos à disposição da comunidade para os fins mais adequados ao bem comum, fá-lo de forma a não pôr em causa os seus legítimos interesses. Tal facto é também merecedor de aplauso.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PPM é extremamente crítico em relação a todas as intervenções no território que não respeitem os valores culturais, paisagísticos, ambientais e agrícolas, por cuja preservação desde sempre se tem batido.
Da mesma forma tem o PPM denunciado sempre as práticas especulativas, tenham elas origem em particulares ou em entidades públicas.
Por isso que, se o PPM tem motivos para aprovar e para se congratular com o presente projecto, desde já declara que se manterá atento à sua implementação e aplicação, no sentido de evitar que as intenções correctas, que estão na sua origem, não venham a ser subvertidas por práticas ilegítimas ou especulativas.

Aplausos do PSD, do PPM e do CDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Costa.

O Sr. Fernando Costa (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A bancada social-democrata votou favoravelmente esta autorização legislativa, como não podia deixar de ser. Esta autorização legislativa, acompanhada da nota de intenções e, de alguma forma, da pormenorização do que vai ser o futuro decreto-lei sobre esta matéria, revela claramente a intenção do governo da Aliança Democrática de desbloquear uma situação que é cada vez mais grave e é a questão da habitação. E, se o problema concerne essencialmente à questão do financiamento, também não é menos verdade que a questão dos solos, a falta de solos e a especulação que rodeia a sua venda, é um problema que influi quer no custo quer na carência de habitação.
Vai este futuro diploma permitir dois importantes instrumentos jurídicos às autarquias, aumentando-lhes a sua capacidade de intervenção e a sua iniciativa, e, com a criação do imposto sobre os terrenos cujos proprietários não queiram construir ou se mantenham reservados, ao penalizá-los, pretende-se que seja incentivada quer a colocação desses terrenos no mercado de habitação quer a própria construção.
Foi a maioria acusada de pobreza sobre este problema nas suas intervenções.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito justamente!

O Orador: - Esse facto deve-se essencialmente à luta contra-relógio. Mas aquilo que nós, Aliança Democrática, e o Governo esperaríamos era, por certo, um maior número de críticas, de sugestões e de contributos, como o Sr. Ministro começou por pedir.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E vimos partidos da oposição que se limitaram a pedir simples esclarecimentos e a votar contra, quando ultimamente se tem acusado a Aliança Democrática de, pura e simplesmente e sem qualquer critério, rejeitar os projectos que vêm da oposição. Custa-me ver que, perante medidas tão

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positivas - faço justiça à intervenção do Sr. Deputado Aquilino Ribeiro Machado, que aqui salientou os aspectos positivos deste diploma e apenas realçou como aspecto negativo ou de menor importância por não estar suficientemente clarificada a questão dos prazos -, a oposição, numa matéria tão importante para a população portuguesa e nomeadamente para as autarquias, tenha dado aqui, ela sim, uma prova de que faz oposição por oposição. Custa-me que, perante questões tão importantes e que, ao fim e ao cabo, reconheceram ser - e as críticas que da oposição vieram a este diploma são perfeitamente compreensíveis, mas de menor alcance -, a oposição não tenha sabido dar também aqui, na medida da sua responsabilidade, o seu contributo.
Ao que cremos - é a aspiração que sentem os autarcas e é também na qualidade de autarca que falo-, podiam votar favoravelmente esta proposta de lei. As acusações que acabaram de fazer, remetemo-las à procedência, e daí que a nossa votação não pudesse deixar de ser favorável.

Aplausos do PSD, do PPM e do CDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tivemos em apreciação não um qualquer diploma, nem sequer um projecto, mas apenas uma nota justificativa que acompanhou, ainda que tardiamente, a proposta de lei de autorização legislativa. Como tal, é evidente que as críticas formuladas não podem ser as mesmas que em relação a um diploma necessariamente se formulariam.
Continuamos sem conhecer o diploma que corresponderá a este pedido de autorização e, por isso mesmo, quando esse pedido foi apresentado, o nosso grupo parlamentar interpôs recurso imediato contra a sua admissibilidade, visto que a proposta apresentada carecia de objecto. Viemos a retirar esse pedido quando a nota justificativa foi apresentada; na medida em que nos pareceu que, mau-grado a sua insuficiência, de algum modo já delimitava o âmbito da autorização. Mas a razão que nos assistia era de tal modo evidente que a proposta de alteração, subscrita pelos três partidos da maioria veio precisar melhor o objecto do pedido de autorização que era solicitado a esta Câmara.
Posto isto, interessará salientar que uma proposta de autorização legislativa deve definir claramente o seu âmbito para que a Assembleia da República sobre ela possa pronunciar-se. E, mau-grado os esclarecimentos prestados pelo Sr. Ministro das Obras Públicas, creio que toda a Câmara - concordando ou não com as posições que foram expressas-, de qualquer modo, deverá salientar, até pelo contraste com o que imediatamente antes se tinha passado, o esforço do Sr. Ministro em prestar esclarecimentos úteis.
Creio que, para além disto, é importante considerar que o próprio processo de consulta, que vai ser seguido não garante sequer que os princípios constantes da nota justificativa venham a ser plasmados tal e qual na lei para que se pede autorização. É isso que resulta do próprio processo adoptado, e
essa é também uma das razões do nosso voto negativo.
Por outro lado, o facto de o processo que se pretende iniciar só poder - pela própria sequência de prazos que o Sr. Ministro aqui nos traçou - apontar para 1983 é para nós razão justificativa de que uma proposta de lei teria, em tempo útil, suficiente oportunidade e cabimento. E nem se diga que o conjunto de trabalhos a cargo desta Assembleia é suficientemente importante para poder atrasar essa proposta de lei, quando - é certo que a proposta de menor alcance, de menor dimensão e de bem menor significado tem sido concedida a prioridade e urgência solicitada. Nenhuma proposta de lei do Governo - ao contrário do que acontece com projectos de lei, da iniciativa dos deputados, e mesmo quando versam sobre matérias idênticas a projectos de lei muito anteriores - tem visto recusada essa prioridade e essa urgência, ultrapassando todos os prazos, ultrapassando todas as prioridades, permanecendo acima de qualquer outra iniciativa.
Penso que estas razões são por si só suficientes para justificarem o nosso voto negativo, embora queira referir ainda outro aspecto: é que nos parece que a legislação adoptada, sem que exista uma legislação de ordenamento do território, é sempre uma legislação inconsequente. Sem que sejam classificados os solos, de acordo com a sua aptidão, sem que essa legislação possa ser considerada e manifestada, qualquer legislação que diga respeito apenas aos solos urbanos ficará necessariamente não só incompleta, como até extremamente condicionada nas suas próprias possibilidades de aplicação. Mais ainda: enquanto não se distinguirem, em termos legislativos, os solos urbanos aptos para construção de habitações e os solos urbanos, por exemplo, para construção industrial, também essa matéria ficará necessariamente prejudicada sendo certo que só o ordenamento do território permitirá resolver essas fórmulas. Por tudo isto, votámos contra.

Aplausos da ASDI.

O Sr. Presidente: - Antes de passarmos ao ponto seguinte da ordem do dia, dou a palavra ao Sr. Deputado Jorge Lemos, para proceder à leitura de um
relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É do seguinte teor o relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos:

Em reunião realizada no dia 30 de Junho de 1981, pelas 22 horas, foram apreciadas as seguintes substituições de deputados, solicitadas pelo Partido Comunista Português.
Hélder Simão Pinheiro (círculo eleitoral de Lisboa) por António José de Almeida Silva Graça (esta substituição é pedida por mais seis meses);
Dinis Fernandes Miranda (círculo eleitoral de Beja) por Mariana Grou Lanita da Silva (esta substituição é pedida por mais seis meses).
Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que os substi-

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tutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais apresentadas a sufrágio pelo aludido Partido nos concernentes círculos eleitorais.
Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:

As substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

presente relatório foi aprovado por maioria, com a abstenção do deputado da União Democrática Popular.

A Comissão: Presidente, Mário Júlio Montalvão Machado (PSD) - Secretário, Alexandre Correia de Carvalho Reigoto (CDS) - Secretário, José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP) - António Duarte e Duarte Chagas (PSD) - Cristóvão Guerreiro Norte (PSD) - Fernando José da Costa (PSD) - Mário Marques Ferreira Maduro (PSD) - Nicolau Gregório de Freitas (PSD) - Valdemar Cardoso Alves (PSD) - Armando dos Santos Lopes (PS) - João Alfredo Félix Vieira Lima (PS) - Alfredo Pinto da Silva (PS) - Manuel de A. de Almeida e Vasconcelos (CDS) - Maria José Paulo Sampaio (CDS) - Rui Eduardo Ferreira Rodrigues Pena (CDS) - Álvaro Augusto Veiga de Oliveira (PCP) - Jorge Manuel Abreu de Lemos (PCP) - Fernando de Almeida Sousa Marques (PCP) - Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho (ASDI) - Helena Tâmega Cidade Moura (MDP) - Mário António Baptista Tomé (UDP).

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, se ninguém tiver objecção, a Mesa considera aprovado este relatório e parecer.

Pausa.

Porque parece de vantagem, tendo em atenção a forma como os trabalhos estão a decorrer a Mesa irá anunciando a entrada de alguns diplomas. É o caso do projecto de lei n.° 250/II, subscrito pelo Sr. Deputado António Esteves e outros do Partido Socialista, que visa a criação da freguesia de Espiche no concelho de Lagos.
Quanto à proposta de lei n.° 54/II, e antes de a declarar em debate, poria aos Srs. Deputados da ASDI a seguinte questão: oportunamente, em requerimento subscrito pelos Srs. Deputados Magalhães Mota e Manuel Tílman, foi interposto recurso da admissão desta proposta de lei. Entretanto e como se estabeleceu já, até em conferência dos grupos parlamentares, está prejudicado o objecto do recurso e sei, por informação que solicitei a VV. Exas., que a vossa concordância é expressa a este respeito. Nesse sentido recaiu o despacho sobre o vosso requerimento, mas parece-me vantajoso que fique exarado no Diário que o facto de o recurso ter sido julgado prejudicado, tem a vossa concordância.
Está em discussão a proposta de lei n.° 54/II - Concede ao governo autorização para rever o sistema integrado de incentivos ao investimento - e tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Planeamento.

O Sr. Secretário de Estado do Planeamento (Alberto Regueira): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: A criação pelo VI Governo Constitucional do sistema integrado de incentivos ao investimento constituiu uma iniciativa essencial com vista á concretização do objectivo nacional de recuperação dos níveis do investimento produtivo que infelizmente tinham vindo a revelar-se em tendência decrescente na grande maioria dos anos anteriores a 1980.
Esse sistema procurou também objectivar e clarificar as condições de acesso das empresas aos benefícios do sistema e, digamos, a natureza dos benefícios que eram concedidos. O sistema foi extremamente positivo, deve ter certamente desempenhado um papel muito útil na recuperação das perspectivas de investimento, mas naturalmente, como acontece a todas as obras inovadoras, manifestou ao fim de um certo período de experimentação, determinado número de deficiências de perspectiva e determinadas lacunas que importa preencher. Julga o Governo, neste momento, dispor de um conjunto de experiências suficiente da aplicação do sistema para solicitar a esta Assembleia uma autorização legislativa. A urgência dessa autorização radica no facto de se entender que há razões de fundo a aconselhar a revisão do sistema e o receio de que a oportunidade da sua discussão por esta Assembleia viesse à ser protelada por tempo excessivo dadas as correcções que importa introduzir.
Eu pretenderia dar uma noção aos Srs. Deputados de quais as matérias em que se considera particularmente importante repensar as soluções retidas no contexto do esquema.
Penso que há matérias de natureza substancial e também de natureza processual. Atenhamo-nos sobretudo em relação às primeiras. O sistema integrado de incentivos ao investimento foi concebido na base de uma apreciação dos projectos de investimento segundo três critérios fundamentais: o da produtividade económica, o da prioridade sectorial e o da prioridade regional.
Foi substancialmente valorizado o critério da produtividade económica, com uma escassa atenção prestada ao critério da prioridade sectorial e ainda menor ao critério da prioridade regional. Isto quer dizer que a um projecto de investimento que tenha, à partida, uma produtividade económica definida nos termos previstos no diploma, de rentabilidade relativamente elevada, em princípio, é atribuída uma ponderação e facultado o acesso a benefícios também proporcionalmente bastante elevados. Em compensação, o sistema não está concebido de forma muito eficaz como instrumento de desenvolvimento industrial necessário ao País e ainda menos com instrumento de desenvolvimento regional que pode e deve também ser.
Na realidade, é importante que este sistema passe a constituir uma das alavancas mais essenciais com

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vista à concretização de uma determinada política de desenvolvimento industriai e é necessário por outro lado que atendamos à necessidade imperiosa de promover uma regionalização do processo de desenvolvimento económico com vista a ter em conta as imprescutíveis aspirações das populações das zonas menos desenvolvidas do País, até porque procedendo dessa forma nos iremos colocar numa perspectiva mais correcta face às obrigações e às limitações que futuramente sobre nós impenderão como consequência da adesão do País às Comunidades Europeias.
Na realidade, a criação de sistemas de incentivos ao investimento é fundamentalmente ou sobretudo admitida no âmbito das Comunidades Europeias, com vista à promoção do desenvolvimento regional e considera-se que atribuir uma ponderação mais a esse critério constituiu um passo decisivo no bom caminho. Por outro lado, o sistema não atribuía suficiente atenção à necessidade de canalizar para o financiamento dos projectos de investimento os recursos próprios por parte das empresas. Julgamos que há conveniência em introduzir no sistema algumas alterações que tenham, em atenção a necessidade de prover a uma dose maior do esforço de investimento a partir de recursos próprios e não do recurso ao crédito, como hoje acontece.
Por outro lado, e esta tem sido uma preocupação sentida muito fortemente pela generalidade dos empresários portugueses, o sistema, inadvertidamente, não criou condições para facilitar acções de investimento que têm um carácter muito normal, que têm um carácter de quase rotina e estou a referir-me e a pensar designadamente, nos investimentos de mera substituição, quando se trata de substituir uma máquina, um conjunto de máquinas que atingiu uma situação de obsolescência, que chegou ao fim do seu período de vida útil, que pura e simplesmente se avariou irremediavelmente.
Ora bem, nesse caso, não parece haver grandes razões para pensar num sistema de atribuição de incentivos de natureza financeira, porque naturalmente os encargos com a substituição desses equipamentos serão mais razoáveis com a utilização de provisões constituídas no decurso da actividade normal das empresas.
Mas se, pelo contrário, esses projectos, essas compras de equipamento não se realizarem por não haver equipamentos de produção nacional, disponíveis, se houver indiscutível necessidade de realizar a sua importação, não parece razoável estar a tributar, a onerar o esforço de investimento e portanto a dificultar a modernização da capacidade produtiva do País, a manutenção dessa capacidade no seu nível normal.
Há, por outro lado, Srs. Deputados, circuitos burocráticos muito alongados que pensamos ser urgente e indispensável repensar e tentar encurtar. Pensamos ser indispensável procurar que determinados prazos sejam observados em paralelo e não numa ordem sequencial; que haverá necessidade de prescindir de pareceres porventura excessivos ou desnecessários; que há necessidade de preencher uma autêntica lacuna que é a de distinguir quem como e em que condições vai fazer a comprovação, definitiva dos efeitos imputáveis ao projecto depois de decorridos dois anos de funcionamento normal do empreendimento.
Haverá necessidade também de considerar em que medida é que não será útil atribuir incentivos á determinados projectos que visem a substituição de importações e, na prática, este processo do SIII foi sobretudo pensado quase só para as actividades na perspectiva da exportação e também para encarar a hipótese de distinguir se vamos aumentar a prioridade regional e os casos de indústrias que já estão instaladas, e de que se questionam projectos de alargamento da sua capacidade dos casos de empresas que se vão instalar de novo.

Aplausos do PSD, do PPM e do CDS.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: Sem prejuízo do muito respeito e até - se me permite - da amizade que tenho por V. Exa., gostaria de começar por lhe formular um breve reparo. Creio que na actual orgânica do Governo deveria ser o Sr. Ministro das Finanças e do Plano a apresentar-se perante a Assembleia da República. No entanto, gostaria de corresponder aos esclarecimentos dados por V. Exa. pedindo-lhe ainda mais dois. O primeiro deles diz respeito- à referência que fez em relação às adaptações do SIII em relação a uma futura integração na Comunidade Europeia. Assim, gostaria de lhe perguntar qual a compatibilidade do sistema com a disciplina concorrencial. da CEE e qual o enquadramento futuro do sistema nas acções regionais da mesma CEE.
Em segundo lugar, quando o Sr. Secretário de Estado aponta para uma melhor selectividade do sistema e com maior atenção aos critérios definidos pela política industrial e pela política de desenvolvimento regional, gostaria de saber qual a relação destes critérios com o plano a médio prazo e com as opções do plano anual. Portanto, que tipo de correlação, que tipo de enquadramento e que género de selectividade decorre desta coordenação ou desta não coordenação?

O Sr. Presidente: - Também para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: Começarei por dizer que de algum modo fui surpreendido pela intervenção que V. Exa. aqui veio fazer, uma vez que ela foi a reflexão do lado do Governo das críticas que nós, oposição, temos vindo a anunciar e a declarar relativamente ao SIII.
Efectivamente, o Sr. Secretário de Estado começou por fazer uma tímida - por acaso bastante tímida - defesa do Sistema Integrado de Incentivos ao Investimento. Disse até uma coisa surpreendente que foi a seguinte: «O Sistema Integrado de Incentivos ao Investimento deve ter tido um papel na recuperação do investimento.» Pasme-se, porque o Sr. Secretário de Estado não sabe se teve, pois ele disse «deve ter tido».

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Na segunda parte da saia intervenção, e sem ourar de saber de aspectos processuais que aqui são menores em termos de discussão, embora sejam muito importantes em termos de desbloqueamento dos pedidos de investimento, V. Exa. fez uma desmontagem clara do SIII - melhor do que aquilo que nós poderíamos aqui fazer neste momento, pois talvez até possua mais elementos. Nesse aspecto foi bem-vinda a sua intervenção, porque, tal como recordará, nós sempre, dissemos que o SIII não passava de uma bandeira eleitoral que o governo da AD empunhou em determinada altura. Foi aqui várias vezes zurzida como tal, recordo-me de intervenções do Sr. Ministro Cavaco e Silva e até do ex-Primeiro-Ministro Sá Carneiro, que se agarraram ao SIII como sendo a salvação da Pátria e a resolução de todos os nossos males.
Posto isto, Sr. Secretário de Estado, solicitava-lhe que já agora nos esclarecesse um pouco melhor sobre a forma como o Governo pensa fortalecer o objectivo da prioridade da descentralização e da prioridade sectorial.
Gostaria ainda que V. Exa. me respondesse se nas alterações que pensa introduzir a este sistema se prevê uma valorização dos investimentos que declaradamente optem pela criação de novos postos de trabalho, sabendo-se como se sabe que o desemprego é um flagelo social extremamente pesado na sociedade portuguesa. Gostaria também de saber como pensa V. Exa. que, através das modificações que vai introduzir, os dinheiros da Nação, os dinheiros de todos nós, passarão a ser aplicados em investimentos que se farão, porque existe o SIII e não em investimentos que se fariam em quaisquer circunstâncias - aliás, como tem sucedido no período de vigência deste sistema até agora -, revertendo, portanto, os benefícios financeiros em meras transferências gratuitas para as mãos de, alguns investidores.

O Sr. Presidente: - Ainda para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Secretário de Estado, sinceramente não sei se lhe devo ou não dar os meus parabéns, porque pela sua intervenção o Sr. Secretário de Estado tentou glorificar formalmente o SIII. Contudo, espremendo toda a sua intervenção, apenas uma coisa resulta que, aliás, há cerca de um ano foi aqui denunciada por nós: é que o SIII é, de facto, um aborto legislativo.
O Sr. Secretário de Estado referiu que o Sul tem um papel muito positivo - aliás, isso vem numa das duas justificações que o próprio Governo necessitou de fazer em relação à proposta de lei para ver se conseguia de qualquer modo limpar a iniciativa legislativa do anterior Governo -, que teria hipoteticamente, apenas hipoteticamente, incentivado o investimento, etc. Ora, o que resulta de tudo isto é que o Governo actual pretende alterar tudo o que é de essencial no SIII no actual decreto-lei.
Apenas como exemplo recordar-lhe-ia a justificação que assinala no ponto n.° 2, em que diz que adoptaram-se algumas soluções de natureza substancial que vieram a revelar-se desaconselháveis. Na primeira justificação, ou seja, aquela que acompanhou a proposta de lei, refere que vai rever as condições de acesso
aos diferentes regimes, redefinir critérios de apreciação, etc., etc.
Para já, gostaria de lhe colocar algumas questões. Esta proposta de lei pretende uma autorização legislativa em matéria fiscal. O Sr. Ministro das Obras Públicas ainda há pouco referiu que na proposta de lei que. aqui foi discutida apresentaria as propostas de matéria fiscal na sede própria, ou seja, na discussão do Orçamento Geral do Estado, mas o Sr. Secretário de Estado não o faz. Isto são critérios divergentes, de acordo com a cor partidária dos membros do Governo?
A segunda questão seria a seguinte: dado que - como o Sr. Secretário de Estado referiu - o SIII é um aborto legislativo, que razões é que poderão levar os deputados desta Câmara a crer que um novo decreto, feito da mesma forma, por um governo da mesma área, não será um novo aborto legislativo? Será que a razão a apresentar é a de que o Sr. Secretário de Estado actual é mais competente que o anterior Secretário de Estado, ou de que este governo é mais competente e mais capaz que o anterior governo?

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Finalmente, também para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Miranda.

O Sr. Joaquim Miranda (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: V. Exa. iniciou a sua intervenção referindo-se ao SIII, dizendo que ele é um instrumento essencial. Aqui coloca-se a questão que gostaria de lhe formular e que, ao fim e ao cabo, vem na sequência daquilo que Já foi formulado pelo meu camarada Octávio Teixeira: sendo o SIII um instrumento essencial para o desenvolvimento económico - ou considerando-o o Governo como tal - e sendo intenção do Governo, como também já aqui foi referido, introduzir alterações em questões fundamentais dessa mesma legislação existente, gostaria de saber por que razão é que esta matéria não é discutida aqui na Assembleia da República.
Ora, esta razão parece-nos tanto mais pertinente quanto nos recordamos de que o próprio decreto-lei que consagra o SIII decorreu já ele de uma autorização legislativa há um ano atrás. E coloca-se-nos ainda mais pertinente quando sabemos que sobre esse mesmo decreto-lei existem nesta Assembleia pedidos de ratificação do PCP e do PS.
Ora, era natural que um instrumento considerado essencial pelo Governo merecesse desta Câmara uma discussão aprofundada, tanto mais que em certa medida o Governo, ao querer apresentar o SIII, pretende arranjar qualquer coisa como que substitutivo do planeamento constitucionalmente consagrado.
Por isso, Sr. Secretário, de Estado, coloca-se-nos a seguinte questão que gostaria de ver esclarecida: por que razão é que o Governo impede a discussão deste problema na Assembleia da República? Será que tem medo das críticas que a oposição lhe fará? Ou será que tem medo das consequências que adviriam de um conhecimento nomeadamente por parte de industriais de sectores diferentes, que vêem que com este sistema têm também benefícios bem diferenciados, até mesmo

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em relação ao nível regional, onde verificamos - e basta ver nos primeiros tempos de vigor do SIII - que apenas as zonas fortemente industrializadas foram beneficiadas, em detrimento das regiões do interior?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado, se assim o desejar.

O Sr. Secretário de Estado do Planeamento: - Em primeiro lugar, queria agradecer aos Srs. Deputados os pedidos de esclarecimento que me dirigiram e infelizmente tenho de lhes responder muito rapidamente.
Em relação às perguntas formuladas pelo Sr. Deputado Magalhães Mota, devo dizer que se pensa que o SIII será um sistema que deverá ser objecto de oportuna revisão quando se vier a verificar a entrada de Portugal nas Comunidades Europeias. No entanto, como se sabe, há ainda um período de alguns anos intercalares, embora poucos, e nem sequer se afasta a hipótese - pelo contrário, admite-se a hipótese - de que durante um certo número de anos, mesmo depois da adesão, possa vigorar ainda um regime de natureza intercalar. Ao longo desse período será com certeza possível ir adequando um regime de apoios ao investimento na perspectiva das normas comunitárias.
Em relação à ligação com as opções do Plano, não há dúvida de que a maior selectividade que se pretende introduzir, designadamente ao nível dos critérios e da prioridade sectorial, por vir exactamente do Ministério da Indústria, deverá traduzir as orientações de política industrial que vêm expressas e corporizadas no âmbito do plano de médio prazo.
O Sr. Deputado Manuel dos Santos espantou-se da tímida defesa que eu teria feito do diploma. Ora, chamo a atenção do Sr. Deputado para o facto dê que eu dispunha de um tempo extremamente limitado e mesmo assim não pude chegar ao fim dos meus considerandos. De qualquer das formas, não há nenhuma razão para espanto quanto ao facto de eu dizer que, da influência que o sistema deveria ter tido, uma vez que foi criado em fins de Junho, e como os projectos não se fazem de um dia para o outro, não era viável admitir que a reacção empresarial fosse imediata. Agora não há dúvida que o SIII veio criar expectativas completamente diferentes ao sector empresarial no plano da sua apetência à tomada de riscos e à realização de novos investimentos produtivos.
Portanto, não houve qualquer desmontagem clara do sistema pela minha parte, mas sim, pelo contrário, houve o reconhecimento de que as linhas fundamentais do sistema continuam correctas mas, naturalmente, há alterações e aspectos a sugerirem beneficiação.
O sistema, Sr. Deputado Manuel dos Santos, não era uma bandeira eleitoral. Pelo contrário, tenho a experiência concreta da aplicação do sistema para lhe poder dizer que é um sistema claramente incentivador do dinamismo empresarial e, por consequência, os benefícios que o sistema prevê não são fictícios, mas sim perfeitamente reais. Portanto, não se trata de uma bandeira eleitoral, mas sim de uma realidade.

O Sr. Guerreiro Norte (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Quanto à questão de fortalecer a prioridade regional e sectorial, a resposta é simples: é aumentando a ponderação no cálculo do P, portanto do p2 e do p3, ou seja da prioridade sectorial e da prioridade regional.
Quanto à criação de postos de trabalho, há já um subsistema do Sistema Integrado de Incentivos ao Investimento, que é, portanto, o sistema simplificado de incentivos às pequenas e médias, empresas. Ora bem, esse tem especificamente em atenção a criação de postos de trabalho e, de qualquer das formas, o peso e a função importante que é atribuída ao coeficiente de capital de produto nas fórmulas definidoras do sistema mostram que o sistema penaliza excessivamente os investimentos de capital intensivos, ou sejam, aqueles que por unidade de investimento criam muito poucos postos de trabalho.
Em relação às questões levantadas pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira, de maneira alguma eu entendo que se deve alterar, tudo o que é essencial. Que exagero, Sr. Deputado!
Rever os regimes, - e esse é o preâmbulo da proposta de autorização legislativa - não é mudar integral ou substancialmente os regimes; rever os regimes é fazer a sua leitura e mudar apenas aquilo que deve ser mudado. Portanto, tal como está a pretender intuir das minhas palavras, não se trata de uma revisão de carácter drástico.
Quanto a critérios divergentes segundo a cor partidária, trata-se de uma insinuação que eu rejeito liminarmente e de forma absolutamente categórica. .. Quanto ao facto de o sistema ser eventualmente um aborto legislativo, julgo já ter respondido na medida em que o fiz ao Sr. Deputado Manuel dos Santos. Não, se trata de um aborto legislativo, mas sim de um sistema correcto nas suas linhas gerais, embora susceptível de alterações e, naturalmente, seria perfeitamente deselegante estar a fazer comparações entre a minha pessoa e quem quer que seja que me tenha precedido ou que me venha a suceder nas minhas funções.
O Sr. Deputado Joaquim Miranda começou por dizer que eu tinha dito que o SIII era um instrumento essencial. Afinal de contas eu disse que era um instrumento essencial e não vejo onde é que o Sr. Deputado Octávio Teixeira viu que eu teria dito ou que estaria implicitamente a reconhecer que se trataria de um aborto legislativo.
Em relação ao facto de se saber por que razão não é discutida a matéria na Assembleia da República, meus senhores, julgo ter dado a explicação. Neste momento em que já há um número apreciável de projectos despachados, entende-se que o Governo já tem uma experiência suficiente e também já recebeu muitas sugestões e ideias novas que mostram que é a altura própria de introduzir no sistema as modificações aconselháveis.
Ora, passar mais três meses de Verão e, devido aos projectos legislativos que certamente beneficiarão de apreciação prévia por esta Assembleia, correr o risco de uma revisão do sistema ser protelada para daqui a muitos meses, criaria condições para que as dificuldades e as insuficiências, que eu, com toda a honestidade, não quis deixar de trazer aqui, viessem a perdurar. Penso que esta era uma situação que não convinha a ninguém, sobretudo não convinha aos interesses da economia portuguesa.

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O SIII não pretende de forma alguma ser um substitutivo do planeamento, pois naturalmente existem sectores diferenciados na nossa economia.
Quanto aos sectores de iniciativa pública, o Governo tem determinados instrumentos de intervenção em relação, digamos, ao sector empresarial privado, que, por exemplo na ordem externa, na ordem das exportações, tem uma importância extrema para a nossa economia. Ora bem, o SIII é um instrumento persuasivo de importância fundamental e penso que é uma circunstância particularmente feliz que tenhamos à nossa disposição um instrumento de conformação da evolução económica, na medida em que através dessa via é possível conformar de fornia diferente as expectativas dos empresários e dos futuros investidores.
Naturalmente que o Governo não tem medo de críticas; e permito-me manifestar o meu espanto por o Sr. Deputado Joaquim Miranda se ter referido ao facto de industriais de sectores diferentes se queixarem de terem acesso a benefícios diferentes. Mas, Sr. Deputado, é isso que é a política industrial; é isso que é a selectividade; é isso que é ter um critério e um padrão daquilo que mais convém ao desenvolvimento económico do País, e não tratar pela mesma bitola aqueles sectores onde porventura a criação de capacidade adicional se tornaria pouco razoável no momento presente, nem aqueles que encontram fortes condicionamentos de mercado. É isso que é a política industrial.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Em relação à questão da contribuição do sistema para o desenvolvimento regional, não há dúvida de que considero que há aí circunstâncias a rever. Portanto, é nesse sentido que o Governo não pode deixar de, por meu intermédio, vir aqui manifestar que naturalmente há aspectos que carecem de uma melhor ponderação. Por exemplo, não penso que na questão dos parques industriais se justifique dar exactamente o mesmo tipo de incentivos a uma unidade industrial que se instale num parque industrial vizinho da orla litoral, da orla desenvolvida do País, e outra que se encontre, por exemplo, numa zona interior, como a Covilhã, que, sendo sobretudo uma região de monoindústria, necessita de encontrar novas alternativas para o desenvolvimento e a reconversão das suas estruturas industriais.
É óbvio que o critério da prioridade regional pode e deve constituir um elemento extremamente importante de contribuição para a melhoria da situação em perspectiva das regiões do interior do País, a fim de que os seus habitantes tenham a oportunidade de aceder a níveis a que têm justamente aspiração, de maior progresso económico e social.
De maneira que, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a minha intenção ao vir aqui não era obviamente a de procurar esconder dificuldades. Há um sistema que nas suas linhas gerais é correcto, mas que pode e deve ser aperfeiçoado em aspectos de pormenor e noutros, em questões em que penso que se deve dar uma ponderação maior: Contudo, deve ser claramente reconhecido que o SIII constitui e constituirá um instrumento indispensável de reactivação do investimento produtivo, a bem do progresso económico do País.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Octávto Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para um protesto.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vejo-me obrigado a fazer um protesto perante as afirmações do Sr. Secretário de Estado, na medida em que para além da insuficiência de justificação da proposta de lei - aliás, o próprio facto de ter apresentado duas justificações é significativo-, a intervenção agora produzida pelo Sr. Secretário de Estado vem alterar ou agravar ainda mais a situação. Ao referir que apenas vai rever regimes, isso entra em contradição absoluta com a justificação escrita que acompanhou a proposta de lei.
Quando o Sr. Secretário de Estado ou o Governo diz que pretende redefinir os critérios de apreciação, não diz que vai rever a ponderação entre os diversos critérios, mas sim redefini-los, ou seja dar-lhes nova definição.
Por conseguinte, das duas uma: ou o Sr. Secretário de Estado pretende rever apenas o regime, tal como aqui diz, ou então é a afirmação que está errada. Aliás, o mesmo se pode referir em relação às duas justificações sobre os investimentos em equipamentos isolados.
Numa proposta diz-se que foi revogada legislação sem se ter criado alternativas adequadas nesse domínio e na segunda proposta diz-se, em contradição, que se pretende agora simplificar e desburocratizar.
Portanto, conviria que o Sr Secretário, de Estado clarificasse totalmente quais são as verdadeiras intenções do Governo e por que motivo é que há alterações radicais entre a intervenção de V. Exa. e as duas justificações e por que motivo é que há diferenças entre as duas próprias justificações escritas.

O Sr. Joaquim Miranda (PCP): - Sr. Presidente, também peço a palavra para um protesto.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Joaquim Miranda (PCP): - Sr. Secretário de Estado, gostaria de formular um pequeno protesto que advém do seguinte: o que eu referi não foi que não deva haver critérios diferentes nem incentivos diferentes para este ou para aquele sector. A questão que eu referi foi no âmbito do medo que o Governo teria em debater este problema na Assembleia da República e foi a seguinte: o Governo poderá ter medo, e terá certamente, de assumir aqui precisamente os critérios de selecção que advoga para o Sistema Integrado de Incentivos aos Investimentos.
Aliás, esta questão coloca-se também ao nível da própria regionalização. O Governo não assume - inclusivamente diz que vai modificar para melhor o critério de regionalização - nem aqui nem publicamente aquilo que verdadeiramente pretende introduzir - como alterações neste sistema.

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Portanto, foi somente isto que eu referi e não aquilo que o Sr. Secretário de Estado entendeu dizer.

O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado do Planeamento: - Sr. Presidente, Srs. Deputados:. Em relação às questões do Sr. Deputado Octávio Teixeira, apenas queria dizer que a segunda justificação é um mero complemento da primeira. Portanto, não é substancialmente diferente. Em segundo lugar, eu não disse que a intenção era apenas a de rever regimes, pois não era apenas isso.
Em relação às questões do Sr. Deputado Joaquim Miranda, gostaria apenas de dizer que o Governo não tem medo. Eu já disse nesta Assembleia muito claramente o que deveria acontecer quanto à evolução dos três critérios.
Quanto à prioridade regional, eu permito-me novamente insistir em que se deve aumentar a ponderação.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputando Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: Vou fazer uma intervenção muito rápida para justificar a nossa posição de voto. Como tal, ela servirá simultaneamente como declaração de voto.
Em princípio, o Grupo Parlamentar, do PS toma, relativamente ais autorizações legislativas que aqui são solicitadas, uma posição negativa, porque, de uma maneira geral, as considera perfeitamente injustificadas.
Esta atitude negativa em geral não significa que confirmemos o critério- que ontem um ministro do actual Governo aqui definiu, no sentido de que a concessão de uma autorização legislativa significaria uma prova de confiança, no Governo.. Se porventura viermos algum dia a conceder, uma autorização legislativa - e certamente que isto já aconteceu algumas vezes - não significa de modo algum uma prova de confiança política no Governo. Significa apenas que naquele caso concreto entendemos que essa era a atitude mais correcta a seguir e como tal a assumimos.
No caso concreto recordarei à Câmara e ao Sr. Secretário de Estado que o PS solicitou na devida altura a ratificação do decreto-lei que implementou o Sistema Integrado de Incentivos ao Investimento. Pedimos a sua ratificação: exactamente no sentido de introduzir melhorias nesse regime.
Já agora, a franqueza levar-me-á a dizer que muitas dessas melhorias vinham no sentido que o Sr. Secretário de Estado aqui anunciou e particularmente no reforço da prioridade regional e sectorial. Veremos se quando o Sr. Secretário de Estado passar à concretização desses objectivos corresponderá ou não aos anseios que o PS entende devem ser os mais correctos para esse sistema.
Desta vez iremos abster-nos, significando com isto que, dada a posição de solicitação de ratificação que ha devida altura apresentamos, esperamos com alguma ansiedade a posição que O Governo venha a tomar nesta matéria.
Desde já anunciamos que não renunciaremos ao direito de pedirmos a ratificação do diploma que vier a ser publicado se as alterações que vierem a ser feitas não corresponderem de todo àquilo que são os objectivos que, em nosso entender, devem enformar o Sistema Integrado de Incentivos ao Investimento.
Portanto, a nossa abstenção tem apenas e só este limitado significado.

Aplausos do PS e de alguns deputados do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (POP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Mais uma vez utilizando a força bruta da maioria de votos de que dispõe nesta Assembleia, que não a argumentação racional, o convencimento e o cumprimento da Constituição, a AD mais uma vez se apresta a passar um cheque em branco ao seu governo.
Mais. Com o pedido de autorização legislativa ora em discussão, o governo Balsemão pretende ainda fazer cair a ratificação n.° 55/II, relativa ao Decreto-Lei n.° 194/80, requerida pelo Grupo Parlamentar do PCP em Novembro de 1980, pretende, afinal, violar flagrantemente os direitos da oposição e impossibilitar a discussão pública dos chamados incentivos ao investimento.
O previsível voto favorável dos deputados da «AD» a pretensão do Governo torna-os objectivamente coniventes no furto à Assembleia da República do exercício da sua competência em matéria que lhe está reservada e na degradação da imagem deste órgão de soberania.
O seu voto cego em apoio da proposta do Governo é uma afronta à dignidade da Assembleia da República.

Uma voz do PCP: - Só asneiras!

O Orador: - E nem o exemplo concreto que nos é dado pelo próprio decreto-lei que o Governo pretende alterar os faz ter um rebate de consciência. Saberão os deputados da AD que o Decreto-Lei n.° 194/80 também ele foi publicado ao abrigo de uma autorização legislativa concedida apenas pelos votos das suas bancadas há um ano atrás? E não os fará pensar o facto de, sobre uma matéria de importância para o desenvolvimento económico do País, se pretender alterar questões de fundo de um diploma legal com um ano de vigência?
E saberão os deputados da AD que o Governo pretende que a autorização legislativa que solicita seja válida por um período de noventa dias, caducando esse prazo na altura em que se irá discutir o Orçamento Geral do Estado, em cuja sede deveriam ser apresentadas as alterações em matéria fiscal que o Governo pretende? A tomada de posição dos Srs. Deputados da AD significa apenas que nessas bancadas já não existe um mínimo de pudor, ou significa que não têm a certeza de em Outubro próximo ainda terem Governo?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Portugal da Fonseca (PSD): - Essa agora!

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O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O facto de o Governo pretender uma autorização legislativa que lhe permita alterar os aspectos essenciais de um decreto-lei publicado há apenas um ano é revelador da incompetência dos governos AD e é uma amostra exemplar dos resultados emergentes da elaboração de diplomas legais sobre questões de fundo fora do âmbito da Assembleia da República.
Mas é igualmente significativo sobre a incompetência dos governo da AD que só um ano após a publicação do Decreto-Lei n.° 194/80, descubram que se esqueceram de contemplar os investimentos de renovação e substituição, esquecimento tanto mais grave quanto é do conhecimento geral que o capital fixo na economia portuguesa é em grande parte obsoleto.
Esquecimento que demonstra ainda claramente que, tal como então alertámos e denunciámos, o governo Sá Carneiro ao publicar o Decreto-Lei n.° 194/80, apenas teve em vista o favorecimento do investimento estrangeiro e dos ex-monopolistas, mandando às ortigas as pequenas e médias empresas, cuja modernização enche a boca da AD, mas apenas com objectivos eleitoralistas.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na elaboração de qualquer sistema de incentivos ao investimento há três questões essenciais a definir:

Que benefícios conceder e qual a sua graduação;
Quais as condições de acesso a tais benefícios;
Que critérios usar na valoração dos investimentos, de modo a atribuir-lhes as diversas graduações de benefícios.

Ora, de acordo com a genérica e insuficiente exposição de motivos que acompanha a proposta de lei n.° 54/II e que a justificação adicional não veio melhorar é precisamente sobre tais aspectos fundamentais que o Governo pretende fazer incidir as alterações ao decreto-lei em vigor.
Qual o significado político da revisão que o governo Balsemão pretende fazer a um decreto-lei do governo Sá Carneiro? Significará tal revisão que «sem quebra dos princípios fundamentais que o informam», isto é, mantendo o objectivo puro e simples de beneficiar o grande capital com os recursos do Orçamento Geral do Estado, se pretende substituir a filosofia de Cavaco e Silva pela de Morais Leitão? Resultará a proposta de lei n.° 54/II de mais uma luta entre os diversos grupos de pressão que no seio da AD se degladiam?
E do ponto de vista técnico, que alterações pretende o Governo introduzir?
Irão ser alargados e aumentados os benefícios fiscais, que já hoje são um escandaloso bodo ao grande capital? Irão ser aumentadas as bonificações de juros para alguns investidores? Passará a haver mais classes de bonificação ou menos?
Irá ser revisto o âmbito dos sectores de actividade que podem beneficiar do SIII? Tal âmbito vai ser reduzido ou alargado? O sector de transportes passará a ser abrangido pelo sistema ou continuará a considerar-se que os transportes em Portugal não têm qualquer interesse para o desenvolvimento económico?
Será acentuada a discriminação contra o sector público da economia, resultante do facto de se privilegiarem os investimentos na indústria ligeira de tecnologias intermédias orientados para a exportação, ou a discriminação contra os investimentos nos sectores estratégicos sob controle do Estado será anulada?
Qual o sentido da «redifinição» dos critérios de apreciação? Será abandonado o método dos pontos? E qual será o método adoptado? O efeito do investimento sobre o emprego passará a ser considerado como um objectivo prioritário? As ponderações das prioridades sectorial e regional serão aumentadas ou reduzidas?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estas apenas um mostruário das muitas questões importantes que em qualquer sistema de incentivos ao investimento deve contemplar, A nenhuma delas a exposição de motivos da proposta de lei dá resposta. E porque de questões importantes se trata, não nos demitimos do direito e da obrigação de as discutirmos aprofundadamente nesta Assembleia. Daí também a nossa recusa de concessão da autorização legislativa pretendida pelo Governo.
Não é a necessidade de revisão total do Decreto-Lei n.° 194/80 que para nós está em causa. Tal necessidade é incontroversa. Daí que, há já vários meses, tenhamos requerido a sua sujeição a ratificação por esta Assembleia.
O que está em causa é que o governo Balsemão pretende seguir as pisadas do seu antecessor e proceder a uma revisão na sombra dos gabinetes, desta vez ao sabor dos interesses do CDS, do Ministro Morais Leitão e dos grupos de pressão que privilegiam.
O que está em causa é que o governo Balsemão, tal como o governo Sá Carneiro, não está interessado em promover o investimento de que o País carece, mas tão-só banquetear à mesa do Orçamento os interesses de classe que serve.
O que está em causa é que os governos da «AD», este como o anterior, apenas pretendem atentar contra a dignidade do órgão de soberania Assembleia da República, isto é, atentar contra a própria democracia, e servir os interesses mesquinhos do grande capital contra os interesses do País e do povo português.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Por isso, votaremos contra a concessão da autorização legislativa pedida na proposta d» lei n.° 54/II.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: Tivemos ocasião de exprimir ontem o nosso entendimento em relação ao voto a tomar a propósito de pedidos de autorização legislativa, recordando inclusivamente uma votação que assumimos em 1979 e na sequência da qual foi ontem aqui apresentada uma proposta de lei.
De facto, as autorizações legislativas não correspondem a um voto de confiança. Pelo contrário, elas correspondem a um pedido que é limitado constitu-

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cionalmente pelo seu objecto e que é solicitado em circunstâncias excepcionais perante a Assembleia dá República, visto que o pedido de autorização legislativa só tem cabimento em matérias de competência reservada à própria Assembleia. Ora, ao ter de limitar o seu objecto, o Governo adquire da parte dos deputados a possibilidade de eles apreciarem o conteúdo e o alcance da autorização que lhes é solicitada:
No caso presente - e isso justifica a posição que vamos tomar -, partindo de uma posição em que a proposta apresentada foi extremamente vaga e insuficiente, ela veio a ser concretizada sucessivamente. Os esclarecimentos aqui prestados pelo Sr. Secretário de Estado nas diversas intervenções que fez foram de molde a, em nosso entender, delimitar precisamente o objectivo do pedido de autorização legislativa que o Governo formulou.
Apraz-nos salientar que assim aconteceu, tanto mais quanto não é este o processo geralmente seguido. Neste caso - repito: neste caso - o pedido de autorização legislativa foi, pelo menos em nosso entender, delimitado com rigor e permitiu-nos sobre ele emitir em plena responsabilidade o nosso juízo.
Cremos que, delimitado assim o objecto desta autorização legislativa, estamos à vontade para dizer que muitas das correcções que se pretendem introduzir, através do pedido de autorização legislativa, no SIII correspondem a críticas e a objecções que por nós próprios tinham sido formuladas.
Como tal, não haveria razão para que neste caso, com o objecto do pedido de autorização perfeitamente delimitado e com a introdução de correcções que correspondem a objectivos que nós próprios formulámos, incidisse sobre ele um voto negativo.
É certo que a Assembleia da República tem pendentes pedidos de ratificação sobre o diploma do SIII. Mas, não nos parece exacto nem rigoroso, pelo menos do nosso ponto de vista, que, a propósito de inviabilizarmos agora este pedido de autorização legislativa para corrigir, viéssemos afinal a manter aquilo com que estamos em desacordo.
Daí que o nosso voto não seja necessariamente positivo, porque não conhecemos o texto integral da proposta que o Governo vai fazer publicar. Também não será um voto negativo pelas razões que amplamente expus.
Como tal, a ASDI vai abster-se em relação a esta votação.

Aplausos da ASDI e do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, encerrado o debate desta proposta de lei, vai proceder-se à votação na generalidade da proposta de lei n.° 54/II, que concede ao Governo autorização para rever o Sistema Integrado de Incentivos ao Investimento.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do CDS e do PPM, votos, contra do PCP, do MDP/CDE e da UDP e a abstenção do PS e da ASDI, registando-se a ausência da UEDS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, há alguma oposição em que a votação na especialidade se faça conjuntamente em relação aos dois artigos da proposta de lei?

Pausa.

Visto que não há oposição, assim se fará.
Srs. Deputados, vai proceder-se à votação na especialidade dos dois artigos da proposta de lei n.° 54/II.

Submetidos à votação, foram aprovados, com votos à favor do PSD, do CDS e do PPM, votos contra do PCP, do MDP/CDE e da UDP e a abstenção do PS e da ASDI, registando-se a ausência da UEDS.

Os artigos votados eram do seguinte teor:

ARTIGO 1.º

Fica o Governo autorizado a:

a) Rever o Sistema Integrado de Incentivos ao Investimento, criado pelo Decreto-Lei n.° 194/80, de 19 de Junho, designadamente visando o aumento da sua selectividade na prossecução dos objectivos de desenvolvimento económico do País e a melhoria da sua eficácia;
b) Criar um, sistema de incentivos fiscais e aduaneiros aos investimentos em equipamento de substituição.

ARTIGO 2.º

A presente autorização legislativa caduca no prazo de noventa dias a contar da sua entrada em vigor.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Herberto Goulart.

O Sr. Herberto Goulart (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados; Ao abrigo de uma autorização legislativa - que contara com o voto contra do MDP/CDE - o Governo criou o Sistema Integrado de Incentivos ao Investimento, pelo Decreto-Lei n.° 194/80, de 19 de Junho.
Na anterior sessão legislativa, o PCP e o PS requereram a ratificação daquele diploma, retomada agora nesta sessão legislativa. Embora tendo prioridade regimental, não foram discutidas nesta sessão legislativa.
Ninguém tem dúvida da necessidade de corrigir o SIII, tal como foi exuberantemente demonstrado, inclusivamente pelo Sr. Secretário de Estado do Planeamento. Inclusivamente, em termos processuais, sabe-se como há bem pouco tempo apenas cerca de 10% dos processos apresentados se encontravam já despachados.
Os pedidos de ratificação eram uma clara oportunidade para, através da sua discussão e nela envolvendo este órgão de soberania, se fazer a correcção do Decreto-Lei n.º 194/80.
Mas não foi isso o que se verificou. Mais uma vez o insólito foi introduzido na Assembleia da República. O Governo veio pedir uma nova autorização legislativa, nada definindo sobre ela.
Essa mesma razão levou a Assembleia a avançar com um processo de impugnação pela aceitação da proposta de lei pela Mesa. Essa impugnação desencadeou um original expediente por parte do Governo: o envio de uma «justificação adicional», que de justificação nada tinha, pois que relacionava áreas a alterar, mas nada avançou sobre o sentido de tais alte-

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rações, e que de adicional ainda menos tinha, visto que por palavras diferentes era uma repetição do preâmbulo da proposta de lei n.° 54/II.
São demasiados actos insólitos do comportamento do Governo em relação a esta Assembleia. Mas têm a vantagem de evidenciar a displicência com que o Governo trata este órgão de soberania, bem como a própria displicência perante a sua maioria de apoio.
Nas intervenções aqui produzidas, o Sr. Secretário de Estado indicou os objectivos genéricos da revisão pretendida e clarificou muito do sentido das alterações que se pretenderá introduzir com a autorização legislativa agora concedida. Mas ficaram em aberto muitas dúvidas.
O nosso voto contra é essencialmente pelo processo que foi desencadeado e utilizado pelo Governo para corrigir o decreto-lei em causa, bem como pela certeza de que o nosso voto não inviabiliza que, de algum modo, sejam introduzidas melhorias num decreto-lei que, tal como vem sendo hábito das iniciativas legislativas deste Governo, merece por parte do próprio Governo, pouco tempo depois, a necessidade da sua correcção.

O Sr. Presidente: - Também para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Miranda.

O Sr. Joaquim Miranda (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como decorreu da discussão da proposta de lei, são diversas as razões que determinaram o nosso voto contra o pedido de autorização legislativa referente ao chamado Sistema Integrado de Incentivos ao Investimento.
E a primeira decorre precisamente, como aqui referimos já, da fuga à discussão pela Assembleia da República que significa esta proposta de lei. Fuga iniciada com a autorização legislativa solicitada na sessão legislativa anterior, que deu origem ao decreto-lei que instituiu o SIII.
Fuga à discussão que se revela agora com a nova autorização legislativa, apenas um ano passado sobre a entrada em vigor do SIII, o que, para além de significar a incompetência do Governo, quer significar ainda o fazer cair dos pedidos de ratificação solicitados pelo PCP e pelo PS.
O que é ainda uma outra forma de fugir ao debate na Assembleia da República de um assunto que o Governo quer mesmo apresentar como substitutivo do planeamento constitucional.
O nosso voto contra decorre também do facto de o Governo nem sequer apresentar à Assembleia da República o texto das alterações que pretende introduzir ao decreto-lei que consagra o SIII, ficando-se apenas pelas generalidades, mantidas na intervenção do Sr. Secretário de Estado.
Por outro lado, pela própria discussão ficou claro que as alterações a introduzir pelo Governo não apontam para a solução de muitas das situações mais criticáveis no SIII.
O emprego e o equilíbrio orçamental continuam a não ser considerados critérios fundamentais na avaliação dos projectos.
Fala-se em regionalização mas não se diz qual o nível de ponderação futuro de tal critério.
Sectores da maior importância para a economia nacional continuam a ser marginalizados, como é o
caso dos transportes. E tudo aponta, enfim, para que o SIII continue a ser um instrumento apenas destinado a atrair o capital estrangeiro e a favorecer o sector privado, em detrimento do sector empresarial do Estado.
Por tais razões, o nosso voto contra a presente proposta de lei.

O Sr. Presidente: - Não havendo mais declarações de voto, considera-se encerrado este ponto da ordem do dia.

O Sr. Angelo Correia CPSD): - Da ordem da noite, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - É uma interpretação literal mas que a Mesa não pode usar.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, sugiro que se faça um intervalo de trinta minutos, tal como se chegou a consenso entre os diversos grupos parlamentares.

O Sr. Presidente: - Não duvidando da palavra do Sr. Deputado Carlos Lage, mas apenas por uma questão formal, pergunto à Câmara se há oposição.

Pausa.

Não havendo oposição, está suspensa a sessão.

Eram 2 horas e 20 minutos.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão, Srs. Deputados.

Eram 3 horas e 10 minutos.

O Sr. Presidente: - Vamos agora passar à discussão do projecto de lei n.° 245/II - Alteração ao Estatuto dos Deputados.
Tem a palavra o Sr. Deputado Araújo dos Santos.

O Sr. Araújo dos Santos (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não há país algum em que a democracia sobreviva ao exercício desprestigiado das instituições fundamentais que lhe dão o ser.
Daí impor-se a todo o democrata, como dever primordial e patriótico, contribuir para a dignificação dos vários órgãos de soberania e seus titulares, proporcionando-lhes condições mínimas de funcionamento edificantes.
Para tanto, impõe-se que os democratas se assumam em todas as circunstâncias com clareza e frontalidade em contraponto aos que, inimigos da democracia, procuram a degradação como caminho seguro à sua destruição.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Social-Democrata, consciente, quer da justeza e necessidade da reformulação de todas as condições

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de trabalho parlamentar, quer do melindre de tal questão, é um dos subscritores do projecto de lei agora em apreço.
Por via disso entende prestar esclarecimento, apenas aqui e agora, a VV. Exas. e a todo o povo português, do caminho seguido até ao encontro do actual articulado, bem como das razões das soluções encontradas, na certeza de que serão plenamente apreendidas, compreendidas e aceites.
Possuindo a convicção de que a democracia não se enriquece com um parlamento tolerado; dando corpo à vontade evidenciada ao longo de muitos meses por variadíssimos deputados oriundos não apenas das suas bancadas; consciente das suas grandes responsabilidades na defesa do regime democrático, advindo do facto de ser o maior partido português; o Partido Social-Democrata perante a omissão generalizada de iniciativas formais na matéria decidiu tratar o problema.
Para tanto, e ao mesmo tempo que recolhia múltiplas sugestões, procurou averiguar do tratamento conferido aos parlamentares noutros países da Europa Ocidental.
Daí resultou um rol de medidas que a análise crítica, primeiro e sobretudo, dos sociais-democratas no seu conjunto, depois dos seus parceiros de coligação e por último em reuniões e contactos com representantes dos vários partidos conduziu à actual proposta de articulado.
Para além disto toda a especulação é ilegítima, não merecendo, por isso, sequer um comentário.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Como é próprio de democratas, como é próprio dos que aceitam o diálogo e aspiram ao maior consenso, a caminhada foi feita pela nossa parte no abrir de portas a todas as contribuições. Portas que se mantêm abertas, como sempre, ao razoável e dignificante.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orado: - Por tal facto não fará sentido, e por isso o povo português não aceitará, que haja alguém que tendo começado já, no exterior, o insulto ao agora proposto, possa vir hoje aqui denegrir por denegrir, não assumindo posterior e consequentemente a coragem de dizer não às consequências das medidas propugnadas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Acreditamos que outros seguirão a denúncia de tais comportamentos, assumindo posição de voto coerente com essa denúncia.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Cumpre, aqui e agora, afirmar que o presente documento de que o Partido Social-Democrata foi motor privilegia nas soluções encontradas: o social ao económico, embora aqui se defenda uma reclassificação imprescindível da função de deputado; a segurança ao instável e desconhecido - nesse esforço não deixamos de ser plenamente acompanhados pêlos vários interlocutores.
Daí ser com satisfação que se aponta o estabelecimento de condições que, embora muito distantes das praticadas noutros países, são a nosso ver um passo importante, um primeiro passo, no assumir de medidas que hão-de reflectir-se positivamente em toda a vivência deste Parlamento.
De facto, o estipular de um seguro cobrindo os riscos de morte e invalidez permanente e temporária por doença ou acidente, além da criação da possibilidade de uma subvenção compensatória transmissível ao cônjuge e filhos, são medidas que retiram a todos os deputados e seus familiares a insegurança de espírito, adveniente de viagens por todo o país em condições bastante precárias; do marcar passo, quando não, o desfazer das mais que legítimas aspirações profissionais; da sobrecarga física e psíquica do trabalho parlamentar, que pode levar mais rapidamente à doença e são de todos conhecidos exemplos bem concretos; do abandono físico dos seus familiares e respectivos problemas pela esmagadora maioria dos deputados.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Haverá aqui algum deputado, haverá alguém entre os portugueses que não compreenda intimamente tais questões?
E não se diga que os actuais deputados apenas pensam em si.
Além de não corresponder aos sentimentos que nos animam, os factos demonstram o contrário, Com efeito, há bem pouco tempo este Parlamento aprovou os vencimentos dos presidentes das câmaras, propondo-se no dia de hoje aprovar também novos vencimentos e outras regalias ao órgão de soberania Presidente da República.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: o edifício que há-de delimitar toda a acção parlamentar não se esgota na aprovação do presente projecto de lei.
A definição de novas regras que possibilitem aos deputados o contacto imprescindível, vivificador e dignificante com os eleitores que nos elegeram e que são a razão da democracia, é condição essencial. A eles endereçamos, mais uma vez, o nosso respeito, afirmando ao mesmo tempo a nossa vontade inquebrantável em contribuir para a resolução dos seus problemas.
A melhoria de meios e instalações ao alcance do parlamentar são condições absolutamente necessárias à produção de melhor e mais rápido trabalho legislativo.
Aqui não podemos deixar de salientar a oportunidade de que se revestirá a próxima revisão do Regimento.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com os olhos postos no País, na defesa da democracia, na dignificação do Parlamento e mais órgãos de soberania; e não como várias vezes malevolamente se tem vindo a propalar, atingindo-nos a todos e à instituição de que fazemos parte, os deputados sociais-democratas apresentaram, vão defender e aprovar as medidas propostas na presente projecto de lei.
Fazem-no convictos de que, sendo a sua passagem por aqui, enquanto homens, efémera, legislam para todos os vindouros no estabelecimento de condições que levem à permanência e valorização dos órgãos que são a essência da democracia.
E ninguém democrata e patriota deste país se atreverá a dizer que o Parlamento poderá, como nós, passar!

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

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O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que a matéria que estamos neste momento a abordar é extremamente delicada, tem um impacte que, seja qual for o resultado deste debate, se irá repercutir na opinião pública e é uma matéria que, seja qual for a opinião que tenhamos sobre a proposta apresentada pelos partidos da maioria, deverá ser abordada, em meu entender, de forma serena, ao abrigo de especulação políticas e demagógicas que recairiam não apenas sobre os proponentes do projecto de lei - o que, como compreenderão esses próprios proponentes, a mim deputado da oposição me não causaria incomodo de maior -, mas recairiam seguramente sobre toda a Assembleia, coisa que, não só como deputado, mas como democrata, não poderia aceitar e para a qual nós UEDS não daremos o nosso contributo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Dito isto e definido, portanto, o quadro em que entendemos dever intervir neste debate, queria também liminarmente dizer, de forma clara, que o Grupo Parlamentar da UEDS votará contra o projecto da lei agora em apreciação.
E votaremos contra, não porque não consideremos razoável e aceitável que se reveja o actual Estatuto dos Deputados, mas porque já não nos surgem nem como razoáveis nem muito menos como aceitáveis os termos em que essa revisão nos é agora proposta. E isto por várias razões.
Por razões que têm a ver com o conteúdo do projecto considerado em absoluto e sem ter em conta, sequer, o carácter relativo e o enquadramento em que essas medidas têm de ser apreciadas. E citarei nesse aspecto apenas alguns exemplos, daquilo que no projecto constitui para nós matéria que, mesmo em termos absolutos, não é aceitável.
Não é aceitável para nós, por exemplo, que se conceda aos deputados o direito de virem a acumular futuros subsídios, futuras pensões - utilizemos a terminologia que se queira - com outras pensões de reforma a que eventualmente tenham direito por rendimentos provenientes do seu trabalho. Há aqui uma acumulação de direitos cujas razões e justificações não alcançamos verdadeiramente. E alcançamos menos ainda quando nos chega à mão uma proposta, emanada da mesma maioria, onde se propõe que a subvenção compensatória, que para todos os efeitos funciona com uma reforma, seja acumulável com outras reformas resultantes da função pública e que se especifique, por outro lado, que em relação ao Presidente da República a reforma que lhe é atribuída não é acumulável e nela devem ser deduzidas eventuais reformas a que tenha direito. Quer dizer, o Presidente da República não tem direito a subvenção compensatória e tem uma reforma que não é acumulável com outras, enquanto os deputados têm direito a esta acumulação. De facto, o critério que aqui se aplica ao Presidente da República parece-me o correcto, o que já não descortinamos são os critérios que presidiram à sua aplicação em relação aos deputados. Da mesma forma, relativamente à contagem em dobro do tempo de exercício do mandato de deputado, acumulado com todos os outros mecanismos compensatórios.
Mas, para além do valor absoluto das disposições, temos que as considerar no seu enquadramento social e económico, tendo em conta o que é a realidade e o nível de vida do País, tendo em conta o que são as condições da grande massa dos trabalhadores portugueses. E não podemos admitir, mesmo que em princípio certas disposições nos possam parecer justas, que os deputados venham a beneficiar de disposições que constituem reivindicações legítimas, em nosso entender, de há muitos anos dos trabalhadores da função pública e que lhes não foram até hoje reconhecidas, como a actualização das pensões de reforma, o que acontecerá para os deputados, sob a forma do tal subsídio compensatório, ou a transmissão da reforma ao cônjuge sobrevivo ou aos filhos menores. São reivindicações velhas da função pública que esta Assembleia não contemplou ainda e que são concedidas agora aos deputados.
Também não me parece legítimo nem curial que a Assembleia legisle nesta matéria, tendo-se recusado a apreciar e discutir aqui a situação real dos trabalhadores da função pública, quando a maioria recusou que se agendasse, tal como tinha sido solicitado pelos partidos da oposição, a ratificação do decreto-lei relativo aos vencimentos da função pública.
São estas algumas das razões, situadas em planos diferentes, que nos levam a votar contra o projecto de lei agora apresentado. Como nos leva também a votar contra o facto de que - e estamos de acordo com o Sr. Deputado do PSD que interveio de que há que contemplar a situação dos deputados, criando-lhes todas as condições necessárias ao exercício da sua função - nos preocupemos antes de mais nada com a situação pessoal dos Deputados, esquecendo as medidas que se impõem no sentido de serem criadas o mínimo de condições efectivas de trabalho para os deputados nesta Assembleia e que continuam a não existir.

O Sr. Sousa Gomes (PS): - Muito bem!

O Orador - Mais importante que as medidas que agora são propostas, parece-nos que deveria esta Assembleia ter-se debruçado sobre o que são as condições reais de trabalho dos deputados, criando-as para que eles possam efectivamente desempenhar cabalmente as suas funções.
Há que prestigiar a Assembleia. Seguramente que há. Mas o prestígio desta não se conseguirá nunca e apenas, se é que isso constitui uma forma de prestigiar a Assembleia, com a melhoria do estatuto pessoal dos deputados, aumentando-lhes as prerrogativas protocolares, se ao mesmo tempo continuarmos a trabalhar nas condições em que trabalhamos, se continuarmos a assistir à situação de em 90% do ano os deputados trabalharem dois dias e meio por semana em sessões plenárias, quando poderiam perfeitamente trabalhar quatro ou cinco, e no final das sessões legislativas fazem-se estas maratonas em que as leis são abordadas, contra a vontade até de todos nós, de uma forma apressada e superficial.
O trabalho da Assembleia não se prestigia enviando-se para ela, nas vésperas do seu encerramento, matéria que deverá ser apreciada pelos depu-

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tados sem lhes dar o mínimo de condições para á apreciarem devidamente, sob o pretexto de que é urgente tomar decisões sobre essa matéria, como se essa urgência só tivesse sido reconhecida quando a Assembleia estava para cessar as suas funções.
Penso que era por aqui que se deveria ter começado e é por aqui que se deve começar a trabalhar no sentido de prestigiar a actividade parlamentar.
É por essas razões, porque não estamos de acordo com muitas das medidas aqui propostas - e limitei-me apenas a apontar algumas -, pelo que elas contêm em si mesmo e em absoluto, porque não estamos de acordo com um tratamento que acaba por ser discriminatório em relação à grande massa dos trabalhadores, porque pensamos que não é por esta via que se prestigia nem se criam as condições de trabalho para a Assembleia, que votaremos contra o projecto apresentado pela maioria.
Por último, queria apenas reafirmar que pela nossa parte não utilizaremos o nosso voto contrário como matéria de especulação política nem de exploração demagógica, pelas razões que já expus. Isto porque essa exploração contribuiria não para desprestigiar a maioria, pois ela encarregar-se-á por si própria de se desprestigiar, mas para desprestigiar esta Assembleia; e nisso não seremos cúmplices, voluntários e conscientes.

Aplausos da UEDS, de alguns deputados do PS e do Sr. Deputado Cavaleiro Ferreira, do CDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Araújo dos Santos, para um pedido de esclarecimento.

O Sr. Araújo dos Santos (PSD): - O Sr. Deputado Lopes Cardoso começou a sua intervenção pela, afirmação de que o assunto em discussão é melindroso. Na intervenção que fizemos em nome do Partido Social-Democrata afirmamos exactamente o mesmo. Em sede de especialidade não deixará o PSD, tal como afirmei na intervenção inicial, de debater as soluções apresentadas.
No entanto, gostava que me respondesse a uma questão.
De facto, todos os partidos, tiveram a possibilidade de sobre esta matéria produzirem trabalho e não o fizeram. Por outro lado, dissemos também, que as portas estiveram abertas e continuam abertas às sugestões que entenderem por bem formular. Pergunta-se por que é que, tendo havido contactos com representantes do Grupo Parlamentar do Sr. Deputado Lopes Cardoso, não forneceram sugestões, não foram capazes de também dar o seu contributo pela positiva e desse modo permitir que, tal como propomos, o documento agora apresentado pudesse reunir o maior consenso possível.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Tenho muito gosto em prestar esse esclarecimento ao Sr. Deputado, embora deva começar por colocar as coisas nos seus precisos termos:
Tivemos conhecimento, por uma gentileza do PSD, do conteúdo do projecto que se propunha apresentar na sexta-feira. Isto é, com uma antecedência de três dias em relação ao início do debate de uma matéria desta importância. E não é que eu próprio - não queria estar aqui a trazer a cotação estas coisas, mas já que o Sr. Deputado o fez sinto-me a isso obrigado - não tivesse, não direi atempadamente, porque tudo isto surgiu já fora de tempo em meu entender, mas mais atempadamente do que aconteceu, insistindo na reunião dos grupos parlamentares com os seus colegas de bancada, no sentido de que providenciassem para que este projecto de Estatuto do Deputado fosse apresentado a tempo e horas - e tempo e horas, terá que concordar, não são três dias antes de se proceder ao debate - para que os partidos da oposição sobre ele se pronunciassem.
O que o Sr. Deputado pretenderia talvez, e legitimamente, é que nós UEDS colaborássemos com a maioria na elaboração do Estatuto do Deputado. Também dissemos claramente na sexta-feira - não me recordo se o Sr. Deputado estava presente - que não o faríamos, que não nos sentíamos obrigados a dar qualquer contributo na elaboração desse projecto, que o discutiríamos aqui no Plenário, aqui traríamos as nossas posições e aqui eventualmente apresentaríamos uma ou outra alteração naquilo que, em nosso entender, julgássemos alterável, sem prejuízo de entendermos ou deixarmos de entender, o que veio a acontecer, que globalmente o projecto deveria ser rejeitado, que foi a posição que assumimos.
Foi isto o que se passou e este o esclarecimento que tinha que lhe prestar.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.

O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A importância que os deputados atribuem a si próprios está aqui caracterizada nas bancadas totalmente cheias, no silêncio religioso com que estão a ouvir os intervenientes neste debate...

O Sr. Angelo Correia (PSD): - E o Sr. Deputado Mário Tomé também cá está hoje!

O Orador: -..., principalmente se o compararmos com a ligeireza, a agitação e a distracção com que aqui são abordados assuntos tão importantes, como há pouco o foi o Serviço Nacional de Saúde, em que o Sr. Deputado Sousa Tavares disse que era utópico criar condições de gratuitidade para a saúde, que é uma coisa considerada fundamental para todo o povo, porque as condições sociais têm de vir depois de se criarem condições financeiras. Também aqui se devia primeiro criar as condições de trabalho e depois é que se pensaria, quem o quisesse fazer, na melhoria material dos deputados.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma das características destes regimes, a que chamam tão democráticos, que por vezes não o são tanto como isso, é que os servidores do Estado e os seus funcionários têm tendência para se tornarem donos do próprio Estado. E estes são os passos que vão afastando aque-

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les que ainda não estão totalmente afastados e que corrompem a própria função do deputado como representante do povo, ao contrário do que dizia o Sr. Deputado do PSD, que é dando mais dinheiro aos deputados que se dignifica a sua actuação e que se permite um contacto melhor e mais eficaz com os seus eleitores.
Não é de nada disso que se trata. O deputado, como qualquer outro indivíduo nesta sociedade, vai ficando afastado do povo devido às condições económicas de favor especiais que vai tendo.
É por isso que a UDP vai dar o seu voto totalmente negativo ao Estatuto dos Deputados, ainda e principalmente, em face da situação efectiva em que vive a grande maioria do povo português e da situação para que se encontram relegados milhões de trabalhadores, que não vêem os seus direitos respeitados nem lá fora nem aqui dentro, onde toda a legislação que aqui é aprovada pela maioria AD é contra os seus interesses e reivindicações legítimas e justas. É totalmente inadmissível que se esteja aqui hoje a tentar fazer passar todo este escândalo das regalias para os deputados, quando se tratam os verdadeiros interesses do povo português da forma como eles têm aqui sido tratados.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Além do mais, há como que um certo simbolismo na assimilação do vencimento do deputado ao do secretário de Estado. Estou em crer que isso faz parte também das intenções e da prática da AD de governamentalizar esta Assembleia e assimilá-la ainda mais ao próprio Governo.

O Sr. João Morgado (CDS): - Essa é boa!...

O Orador: - Enquanto são reprimidos os trabalhadores, enquanto os trabalhadores da função pública vêem totalmente rejeitadas as suas reivindicações, enquanto se propõe aqui um subsídio para o risco político dos deputados, esquecem-se do risco político dos delegados sindicais e dos membros das comissões de trabalhadores, que enfrentam a repressão patronal, os despedimentos selectivos, não virando a cara à luta para levarem até ao fim o mandato para que foram eleitos.
É isto o que se passa, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é para isto que chamo a vossa atenção e é por tudo isto que a UDP votará contra. Desmistifiquemos a situação, não digamos que isto é uma coisa melindrosa, pois não tem melindre nenhum. Os Srs. Deputados querem melhorar as suas condições de vida e a AD quer que outros deputados assumam também com isto o tal afastamento do povo, que defendam menos os interesses de quem trabalha e sejam melhores instrumentos daqueles que mandam, dos grandes capitalistas e dos interesses políticos da própria AD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, também para uma intervenção, o Sr. Deputado Veiga de Oliveira.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há várias ordens de razões que nos levarão a votar contra este projecto de lei. Mas queremos que fique claro que preferiríamos, em vez de votar contra, que os proponentes o retirassem. Mais adiante explicaremos alguma coisa sobre esta questão.
Já se falou aqui, nomeadamente um dos proponentes, a respeito de um nível europeu dos deputados. Lembrei-me nessa altura das questões muito controversas do nível de salários dos pilotos da TAP. E lembrei-me que nunca nesta Assembleia, talvez excepto eu e mesmo isoladamente, houve alguém que tenha defendido que o nível dos salários dos pilotos da TAP deveria ser de um nível europeu.
Mas há mais. Vivemos em Portugal e sabemos qual é o nível do salário mínimo, conhecemos o problema das pensões, das reformas, sabemos que todos estes níveis são baixos, que somos um país ainda pobre e ainda não desenvolvido. Sabemos que há situações hoje extremamente compungentes e que nós, uns a favor e outros contra, relegamos para Outubro. Estou a lembrar-me dos contratos a prazo, por exemplo. Já se falou aqui também na função pública. Pois é verdade que a maioria não quis discutir a ratificação do decreto-lei que estipulou os novos vencimentos para a função pública. Discutimos aqui projectos de lei sobre contratos a prazo, mas por vontade da mesma maioria a discussão na especialidade passou para Outubro. E sabemos o que isso significa para muitos milhares de famílias.
Não quero com isto dramatizar, mas significar que não faz sentido considerar em absoluto uma comparação qualquer de deputados com outros deputados de quaisquer países. O que faria, sim, sentido era que nos comparássemos todos com o nosso país, com a nossa real situação económica e social.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Assim, insisto, Srs. Deputados, retirem o vosso projecto, porque votaremos contra, mas preferiremos que o retirem.
Outra questão que convém referir aqui é a muito falada dignificação da Assembleia e dos deputados. Estamos de acordo, que isto fique claro, com todas as medidas que dignifiquem os deputados e a Assembleia da República. Temos para nós que a Assembleia da República é por excelência o órgão de soberania representativo da democracia portuguesa. O nosso projecto de revisão constitucional dá disso nota clara e as nossas posições a respeito da revisão constitucional são disso prova clara. Mas a dignificação da Assembleia da República e dos deputados, de nós todos e daquelas que venham a ser eleitos no futuro, não passa só pelas condições materiais, isto é, por subsídios ou por outras condições materiais que estão ligadas aos subsídios dos deputados. Passa muito mais pela defesa do exercício dos poderes desta Assembleia, enquanto órgão de soberania por excelência da democracia portuguesa, e da defesa das condições do exercício da função de todos os deputados. Sabemos que aqui há matéria que dá pano para mangas, como se diz em português, e não nos parece que este projecto resolva alguma coisa de essencial neste capítulo. Este projecto vem, fundamentalmente, cumular com mais algumas benesses os Srs. Deputados e pouco mais do que isso.
Outra questão que aqui se levanta, e que foi já aludida também, é a da suposta hipocrisia do voto sobre esta matéria. Nós, que não temos arcas encoi-

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radas e que não temos telhados de vidro, podemos falar abertamente desta questão.

Vozes do PSD: -Nós também!

O Orador: - E insisto mais uma vez, Srs. Deputados, que votaremos contra, mas preferiríamos que retirassem o projecto.
Isto porque todos sabem, porque é público, que nós aqui nesta bancada, qualquer que seja o subsídio que votem e outras condições materiais, não auferiremos delas. Todos sabem, porque é público - atentem, Srs. Deputados-, que nós aqui nesta bancada somos pagos por fornia a não sermos prejudicados em relação a outra profissão anterior a sermos deputados, não melhoramos nem pioramos pelo facto de sermos deputados, é uma condição que impomos a nós próprios, e o excedente, que é razoável, mesmo hoje, em face destas condições que impomos a nós próprios, destina-se à actividade geral do partido, ao esclarecimento, à propaganda, ao proselitismo político, que naturalmente é uma actividade justa e politicamente legítima para qualquer partido.
Portanto, Srs. Deputados, não temos arcas encoiradas nem telhados de vidro, e, por ,isso, não temos nenhum problema em abordar a questão.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Mas há outra questão ainda que merece uma reflexão.
Srs. Deputados, nesta bancada entendemos fazer tudo pela consolidação da democracia e pelo seu aprofundamento. E não nos parece que estejamos no bom caminho se criarmos com este tipo de medidas como que uma casta política. Tenho ouvido muitas vezes falar e lido nos jornais uma expressão chamada «classe política». A minha interpretação dessa expressão tem vindo a variar no tempo. Este projecto de alteração ao Estatuto de Deputado é uma contribuição poderosa para que compreenda perfeitamente o que alguns pretendem dizer com a expressão «classe política» e será muito difícil, depois, substituir os elementos dessa casta. Diria que alguns só mesmo com a reforma ou com a agora chamada «subvenção compensatória» abandonarão o posto.
Isto não é bom para a democracia e não vai no, sentido da sua consolidação e aprofundamento, como defendemos.
Aqui há perigos, Srs. Deputados, e vemo-nos de todos os lados. Há quem argumente, com sinceridade, que os deputados, e de uma forma geral os titulares dos cargos políticos, devem ser pagos por forma a não serem sensíveis a pressões e injunções de tipo económico que se queiram exercer sobre eles. E digo que alguns argumentam com seriedade nesse sentido, mas é bom que não se substituam, as injunções e a capacidade de resistir por uma injunção total e global, feita a partir de dentro, isto é, do próprio cargo político de que se é titular e das benesses através do qual se obtém proveito.
Isto para dizer, portanto, que este é também um motivo de preocupação para nós. Este projecto, contra o qual votaremos, mas que preferiríamos que fosse retirado, contribuirá para criar uma casta, para dar significado concreto à tal expressão «classe política».
Finalmente, Srs. Deputados, houve aqui quem falasse da opinião pública, do' melindre e de que passamos - todos havemos de morrer certamente, tenho esperanças nisso

O Sr. Silva Marques (PSD):-Aí estamos de acordo!

O Sr. Borges de Carvalho (PPM): - O senhor vai para o céu!

O Orador: - e que a Assembleia fica. Mas, sinceramente, o problema da opinião pública é um problema muito grave, o do melindre é, quanto a nós, um falso problema. E o problema de passarmos e ficar a Assembleia também é um problema real. Não podemos, de forma nenhuma, contentar-nos em satisfazer rapidamente e por meios não tão correctos como isso a opinião pública. Não podemos contentar-nos com livrar as nossas consciências de um certo melindre, não podemos, de forma nenhuma, aceitar que tudo isto passa, que nós passaremos e que ficará a Assembleia. Isso é onda larga e não é desta onda larga que se trata.
Insisto, Srs. Deputados, não há nenhum melindre nisto e não há um problema de opinião pública. Há, sim, um problema da nossa opinião. E essa opinião deveria ser formada confrontando aquilo que é a realidade portuguesa, a realidade económica e social da grande maioria dos trabalhadores portugueses, daqueles que tudo produzem, para que nós também estejamos aqui, também para que haja democracia, pois são eles os seus pilares. É a nossa opinião, antes de tudo, que conta, e só depois virá a opinião pública.
E a nossa opinião, insisto, é que votaremos contra, mas preferiríamos que retirassem o projecto, porque não temos arcas encoiradas, porque não temos telhados de vidro, porque nesta matéria não há problema de hipocrisia para nós quando falamos.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

A Sr.ª Natália Correia (PSD):-Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito?

A Sr.ª Natália Correia. (PSD): - Para pedir esclarecimentos.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

A Sr.ª Natália Correia (PSD): - Eu estou de acordo com o Sr. Deputado Veiga de Oliveira quando diz que não é só pela via económica que se eleva o deputado à dignidade da sua missão. Creio que isso é indiscutível.
Quero, no entanto, perguntar-lhe o seguinte: se a alta missão institucional que cabe ao deputado é entendida como sacerdócio, como missão evangélica, não recairemos na mística salazarista da devoção dos deputados à transcendência do poder ditatorial, ou seja do parlamentarismo tumular em que a sua nulidade era remunerada?
É evidente que pagar deficientemente aos deputados é considerar deficientemente uma instituição que é fundamental ao corpo da democracia.

Vozes do, PSD e do CDS -Muito bem!

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O Sr. Santana Lopes (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito?

O Sr. Santana Lopes (PSD):-É também para pedir esclarecimentos, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Santana Lopes (PSD): - Sr. Deputado Veiga de Oliveira, ouvimos todos a sua intervenção com o máximo interesse, não por egoísmo - como procurou insinuar o Sr. Deputado Mário Tomé- mas porque entendemos que a questão se reveste de um certo melindre, o que já foi focado. É um problema suficientemente sério para merecer a nossa atenção e um esforço concertado de convergência entre todos aqueles que dizem ter por missão contribuir para o prestígio do órgão do qual fazem parte.
Acho que é perfeitamente correcto que se faça um apelo a que não haja hipocrisia e que se rejeitem as acusações de hipocrisia.
Mas, Sr. Deputado Veiga de Oliveira, há um primeiro ponto que eu queria ressalvar. Acho que nenhum de nós deve ter vergonha das ideologias que professa, o facto de um representante do Partido Comunista estar a fazer uma profissão de fé na defesa da instituição parlamentar eu gostaria de lhe perguntar se não é, pelo menos, paradoxal.
Para além disso, e reportando-se àquilo que disse o Sr. Deputado Lopes Cardoso, é evidente que todos nós temos a noção de que a questão do Estatuto dos Deputados deveria ser perspectivada globalmente e tendo em vista todo o conjunto dos estatutos dos titulares dos órgãos públicos em Portugal, desde o topo até ao baixo. Mas se assim não é, eu relembro que foi a maioria, foram os grupos parlamentares da maioria que apresentaram já nesta Assembleia da República uma proposta de alteração do Regimento, visando alterar as condições de trabalho c de funcionamento desta Assembleia, para se evitarem «maratonas» como aquela que referiu o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Eu gostaria de perguntar se não é hipocrisia fazer apelos a que se retirem os projectos, se não seria mais salutar e mais democrático, e se não se apagariam mais pressões infelizes de 1975, já que dizemos que estamos todos interessados na defesa da democracia e das suas instituições, se todos nós, em vez de alguns se refugiarem na posição fácil de atirar as responsabilidades de defesa do prestígio das instituições para cima da maioria -e nós não as rejeitamos, assumimo-las até ao fim -, fizéssemos um esforço para reflectir, meditar e chegar a um resultado final sobre o estatuto dos titulares dos órgãos públicos em Portugal, e nomeadamente dos deputados.
Quanto a leis orgânicas da Assembleia e quanto a condições de trabalho, quer os Srs. Deputados da oposição, quer os da maioria estão em iguais condições para propor as alterações que entendam por convenientes. Nós já propusemos a do Regimento, propusemos a do Estatuto dos Deputados, votaremos hoje a do Presidente da República. Como sempre, assumimos as nossas responsabilidades, e é com pena que vemos deputados da oposição alinharem nos sorrisos de escárnio de alguns que querem ver destruída a democracia e que directa ou indirectamente vão atalhando caminho nesse sentido.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Veiga de Oliveira para responder.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Vou responder em primeiro lugar à questão que me foi posta pela Sr.ª Deputada Natália Correia.
A Sr.ª Deputada tem razão quando diz que, no fundo, pode cair-se no perigo da transcendência sacerdotal. Nós também sabemos o que isso é. E sabemos por experiência muitas vezes dura. Nós podemos cair em erros desses. Ninguém pode garantir que não caia, mas não é o nosso caso, Sr.ª Deputada. Estamos muito vacinados a esse respeito.
O problema não é esse, Sr.ª Deputada. O problema é que nós não podemos, eu achamos que não devemos, considerar em absoluto ou em abstracto os aspectos económicos que rodeiam, necessariamente, o exercício da função de deputado como subsidiária de outra qualquer função. E também não podemos aceitar, ou achamos que não devemos aceitar, que se comparem, para aferir dessas condições, os nossos deputados com os deputados, por exemplo, da França, da Inglaterra, da Alemanha ou de qualquer outro país que tenha um nível de vida três a quatro vezes superior ao nosso. Não podemos fazer isso, Sr.ª Deputada. É um problema de respeito por todos os outros concidadãos, não é um problema de sacerdócio, porque aqui não há sacerdócio.

O Sr. Angelo Correia (PSD): - Isso é um engano! Até há um sumo sacerdote! ...

O Orador: - Neste lado não há sacerdotes!
Portanto, a questão de pagar ou não deficientemente aos deputados é a questão que se coloca.
Mas, Sr.ª Deputada, eu devo dizer-lhe o seguinte: certamente aqui nós divergiremos porque para nós, aqui nesta bancada, por razões de nos sentirmos obrigados, e até de sermos alguns de nós oriundos directamente da classe trabalhadora, não é assim muito difícil viver com um salário de deputados...

Vozes do CDS: - De 7 contos?! ...

O Orador: - É difícil, Sr.ª Deputada, mas é um hábito adquirido. É difícil, mas estamos integrados nisso. Não todos, e a Sr.ª Deputada porventura está a ouvir falar um que não teve esse hábito, pelo menos desde pequenino.
Mas não é essa a questão. É que, enquanto partido que se pretende sempre ligado aos problemas dos trabalhadores portugueses e aos problemas da classe operária portuguesa, não podemos, ou achamos que não devemos, aceitar que os deputados sejam pagos sem ser justamente em comparação com o nível real dos salários mínimos actuais em Portugal, das condições em geral de pagamento dos trabalhadores em Portugal, do problema da reforma, do problema do atendimento na doença, do problema das férias, etc., etc.

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Nós temos que olhar para nós. comparando-nos com aquilo que são os Portugueses e o que é o nosso país. É esta a questão.

O Sr. Silva Marques (PSD): - E é isso?!

O Orador - É disto que se trata e não de nenhum sacerdócio.
Quanto às questões postas pelo Sr. Deputado Santana Lopes, eu insisto que para nós não é uma questão de melindre. Não há questão de melindre, há é uma questão que se pode, e deve, tratar com inteireza e com as palavras- todas. Não há aqui nenhum melindre.

O Sr. Silva Marques (PSD): - De acordo!

O Orador - O que temo é que olhar olhos nos olhos, fazer contas e estabelecer critérios que sejam aceitáveis.
A última vez que o Estatuto dos Deputados foi melhorado eu fiz parte da subcomissão, que era constituída por elementos de todos os grupos parlamentares, que o preparou num primeiro texto, que depois foi podado e que, finalmente, foi votado nesta Assembleia. Mas, porque não foi podado tanto como nós queríamos mereceu-nos simplesmente a nossa abstenção. Não mereceu o nosso voto contra nem muito menos se disse que devia ser retirado.
Portanto, não há aqui nenhum melindre, é como que legislar a respeito de qualquer outra questão, mormente se se trata de questões deste tipo.
Nós estamos fartos de legislar, de ratificar decretos-leis sem que haja nenhum melindre.
Portanto, não é um problema de melindre, é um problema de, sinceramente e com os olhos nos olhos, fazermos contas e dizermos as palavras por inteiro, E também por isso não é um problema de hipocrisia, porque da nossa parte, o Sr. Deputado sabe-o muito bem, hão há hipocrisia nenhuma. Sabe bem que nós não temos razões nenhumas, para estar preocupados com o resultado da votação e sabe também que, e eu insisto, vamos votar contra porque achamos desproporcionada e despropositada, neste momento, a vossa proposta, mas preferíamos que ela fosse retirada.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE:

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Herberto Goulart para uma intervenção.
O Sr. Herberto Goulart (MDP/CDE): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei de revisão do Estatuto dos Deputados, acabado de apresentar, no conjunto de melhoria de situação que propõe para os deputados assenta, como foi explicado pelo Sr. Deputado do PSD apresentador do projecto, numa filosofia que visaria dignificar a. função do deputado e o próprio Parlamento.
Acreditamos, sinceramente, que, os deputados proponentes não vêem apenas .nos aspectos de situação material dos deputados as condições de dignificação do Parlamento e de dignificação da nossa actividade como deputado.
Mas em relação ao articulado, limitado, a aspectos de revisão do Estatuto dos Deputados, o projecto, apresentado merece-nos várias objecções.
Em primeiro lugar, temos objecções àquilo que poderíamos chamar o aumento salarial que corresponderia a este projecto e que se aproxima de uma percentagem de 50%.
Temos objecções também a outras melhorias muito substanciais de condições materiais, como seja o novo esquema que é proposto para as ajudas de custo.
Temos objecções às garantias profissionais adicionais que aqui se propõe e de que os deputados beneficiariam pelo simples facto de serem deputados, como seja o caso de se propor a contagem a duplicar do tempo do exercício de mandato para efeitos de reforma e para efeitos de situação nas actividades profissionais de origem dos deputados.
Temos ainda fortes objecções em relação aos privilégios vitalícios que são propostos neste projecto de lei, como é o caso da chamada «pensão de risco político».
Ao lermos o projecto que nos foi entregue na sexta-feira, e na sua forma manuscrita, tivemos a incómoda sensação de que estávamos a ler como que um caderno reivindicativo que os deputados apresentavam. E, naturalmente, pensamos que essa não é a melhor forma de encarar toda esta problemática de condições materiais do exercício da actividade de deputado.
Pensamos que o deputado exerce um mandato que é também um dever cívico e como tal ele não pode, pelo simples facto de ser deputado, ter um estatuto de privilégio ou uma garantia de estabilidade profissional ou ainda mesmo constituir um seguro de velhice.
Pensamos que o Estatuto actual previne suficientemente, naturalmente com excepções e nalguns casos até com algumas limitações, como seja, por exemplo, o caso das profissões liberais, que não possam ser prejudicados na sua actividade profissional os deputados que estiverem a exercer o seu mandato, o que é a mesma coisa que dizer que não possam ser prejudicados na situação de que dispunham antes de virem para a Assembleia da República.
Um outro aspecto que não podemos deixar de ter em conta é o cotejar esta altura de apresentar uma melhoria das situações materiais dos deputados quando, há bem pouco tempo, na comissão permanente, por voto maioritário da AD, foi recusada a possibilidade de agendação da ratificação do decreto-lei dos vencimentos da função pública, quando sabemos de toda a contestação de que esse decreto-lei e essa tabela foram alvo, quando todos, sabemos que aqui na Assembleia da República estava um abaixo-assinado com mais de 30 000 assinaturas de funcionários públicos que pediam aos grupos parlamentares que agendassem para ratificação tal decreto-lei.
Esta coincidência quase temporal é, pelo menos, chocante, assim como também é chocante este aumento muito significativo e muito substancial das condições materiais do exercício da função de deputado quando comparado com a generalidade da situação dos cidadãos portugueses.
Afinal, como tem ocorrido por vezes quando o Governo se tem auto-aumentado - tal como quando o Governo alterou condições de subsídio de residência e de ajudas de custo e foi publicamente condenado-, esta própria atitude, a ser aprovada na Assembleia da República, poderia levar ao comentário de que afinal neste órgão de soberania raciocina»

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mos em relação a necessidades de austeridade no País como sendo austeridade para os outros.
Mas, independentemente de tudo quanto disse e sem prejuízo de admitirmos, de facto, a necessidade de correcção do subsídio de que actualmente os deputados dispõem - e naturalmente que uma pista poderia ser retomar o critério que em tempos levou a fixação deste subsídio no equivalente ao vencimento da letra A da função pública-, estamos em desacordo com esta proposta de igualdade entre o subsídio . de deputado e o vencimento de secretário de Estado.
Não estamos a hierarquizar os estatutos dos membros de órgãos de soberania, limitamo-nos a procurar encarar as situações com realismo, pela natureza diferente das funções. Não é por acaso que a remuneração do deputado não é um vencimento, mas apenas um subsídio, ou pelo menos é identificada com essa designação de subsídio.
Naturalmente que há deputados que trabalham mais do que outros, basta, por exemplo, ser membro da direcção de um grupo parlamentar ou até fruto das diferenciações entre áreas de especialização. Não queremos, no entanto, entrar por este caminho, mas não podemos ignorar que a actividade do deputado não obriga a exclusividade de funções e que muitos Srs. Deputados, aqueles que têm possibilidades nesse sentido, prosseguem com actividades profissionais, naturalmente remuneradas, e provavelmente também a um ritmo menor daquele que poderiam fazer se não tivessem que responder aos seus compromissos e às suas obrigações enquanto deputados.
No entanto, tal situação não se passa com os Secretários de Estado ou com quaisquer outros membros do Executivo. Eles não dispõem, potencialmente, da possibilidade de dispensa das suas funções durante 3 a 4 meses por ano, de dispensa de actividade em férias de Páscoa ou em férias de Natal.
Por todos estes motivos, vamos votar contra na generalidade o projecto de lei n.° 245/II, proposto pela AD. Principalmente porque o consideramos inoportuno neste momento.
Não quer isto dizer que não apoiemos alguns dos aspectos, é o caso, por exemplo, do seguro de acidentes, é até o caso do aumento de ajudas de custo quando em representação da Assembleia da República.
Mas o que não podemos aceitar, e desculpem os Srs. Deputados da maioria voltar a usar esta expressão, é aquilo que me surge como que uma filosofia reivindicativa, o estabelecimento de um estatuto de privilégio material que, contrariamente ao pretendido ou ao que é afirmado como pretendido, em nossa opinião não é dignificante para a função do deputado nem dignificará este Parlamento.
Quero, finalmente, esclarecer que não pretendemos especular politicamente com esta nossa posição. Nesse aspecto, subscrevemos integralmente a parte correspondente da intervenção do Sr. Deputado Lopes Cardoso. O que queremos dizer é que transmitimos aqui, com muita sinceridade, a nossa opinião e, tal e qual como outros Srs. Deputados, recomendamos ao conjunto desta Assembleia da República que medite com cuidado e com serenidade sobre o projecto de lei que está aqui para apreciação e votação.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos para uma intervenção.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A esta hora da manhã eu quase que trocava de bom grado os benefícios do diploma por uma boa soneca, mas, como isso não é possível, vou dizer alguma coisa acerca do diploma.
A vida às vezes tem situações curiosas. No fim do II Governo Constitucional encontrava-me eu ali naquela bancada, que é a bancada do Governo, na qualidade de ministro adjunto, a tentar defender o melhor que podia um projecto de diploma que corrigia os vencimentos dos membros do Governo.
Na altura ganhavam a ridicularia de 26 700$, o que pouco os distanciava de quem tinha de contrair dívidas ou pedir esmola, e a correcção que se propunha era para 40 contos.
Esse aumento foi considerado escandaloso e, apesar de eu ter invocado a circunstância de que havia maneiras mais decentes de fazer cair os> governos do que pela fome, não consegui demover nem o Partido Comunista nem o Partido Social-Democrata. Votaram contra.
Ficou-me a vaga sensação de que não teriam votado contra -não quero fazer juízos psicológicos - no uso de uma grande indignação contra a proposta ou na sequência de uma grande indignação contra a proposta.
Mas a política tem as suas exigências. Longe de mim estar a usar qualificativos de fariseísmo, hipocrisia, nada disso. A política tem as suas determinantes, tem as suas causalidades próprias, que eu compreendo, e a verdade é que nós tivemos que votar sozinhos esse aumento de que não beneficiámos, de que já sabíamos que não íamos beneficiar porque já se sabia que o governo ia cair, e alguns membros do PSD que então votaram contra viriam a pertencer ao governo e «chamaram um figo» aos aumentos.
Nós hoje podíamos fazer aqui uma pequena vingança. Era fazer o mesmo, dizer: votem vocês os aumentos, que nos vão saber muito bem, e nós votaremos contra. Seria talvez popular, o povo não gosta muito dos aumentos dos vencimentos da classe política, sobretudo quando é a própria classe política a votá-los para si mesma. Mas é a Constituição que o diz, não somos nós. Foi o povo que quis que fossem os deputados a fixar os seus próprios vencimentos. É uma condicionante constitucional.
O problema é este: é que eu não vejo absolutamente nenhuma razão, com toda a sinceridade, para que um deputado ganhe menos que um secretário de Estado. Não vejo nenhuma.

Vozes ao PSD: - Muito bem!

O Orador: -Pelo contrário, só vejo alguma objecção em que o vencimento do deputado seja fixado em relação ao vencimento do secretário de Estado.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Eu veria com alguma simpatia que fosse fixado em percentagem do vencimento do Presidente da Assembleia da República, por forma a atingir-se Sensivelmente o mesmo resultado. Acho que há aqui uma forma de mitificação dos membros do

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Governo, e nós não temos nada que nos minimizar relativamente aos membros do Governo.

Vozes do PSD:- Muito bem!

O Orador. - Todos estamos de acordo em que a classe política -e não chamarei, como chamou o Sr. Deputado Veiga de Oliveira casta política - precisa de ser prestigiada.
Claro que ela não será prestigiada só pagando-lhe o necessário para as suas necessidades, um vencimento justo, ela será também prestigiada por outras formas, e terá de sê-lo por outras formas, e nesse sentido vão até desde já algumas alterações que propusemos ao projecto de lei.
Mas é preciso que nos entendamos: que, se o prestígio do deputado não passa só pela justeza do vencimento que aufere, passa também por esse vencimento. Porque, senão, amanhã teríamos instalações douradas, com móveis de estilo, com telefones de prata, com secretárias de mini-saia á passarem à nossa frente com folhinhas de papel dourado, mas, muito provavelmente, se não tivéssemos corrigido os vencimentos, teríamos de, antes de entrar, ficar por ali mais meia hora na escada, com o boné poisado, para ver se os trabalhadores que se dirigem à galeria depositavam no nosso boné umas moedas.
Isto é caricatura, obviamente, mas a vida não se compadece com a imutabilidade das remunerações, é preciso corrigi-las. E defender hoje que um deputado deva continuar a ganhar o que ganha é, desde já, começar a condená-lo a uma situação de miséria.
Acho que, efectivamente, não devemos criar castas políticas, acho até que nem será muito razoável falarmos em classes políticas, mas acho que deveríamos tender a institucionalizar uma carreira política. A carreira política é algo de diferente do amadorismo político em que temos vivido,...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - ...em que os deputados são tudo e também deputados, em que vêm ao Parlamento muitas vezes fazer um «biscato» ...

A Sr.ª Natália Correia (PSD): - Apoiado!

O Orador - ...nas horas vagas das suas profissões, porque não ganham como deputados - o suficiente para serem só deputados e não têm a garantia de uma reforma para o fim da sua vida, tendo por isso que ir buscá-la a outras fontes de receita.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Penso que a classe política tem de ter alguma tranquilidade quanto ao seu futuro e tem de poder, se quiser-e deve querê-lo-, dedicar-se em full time à sua função, porque ela bem o justifica e porque só assim nós podemos, cabalmente, desempenhar a nossa função de deputados.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Eu estou à vontade, não tenho nenhum complexo de culpa, pela razão simples de que qualquer aumento que seja agora votado apenas atenua o sacrifício que eu faço em não exercer a
minha profissão de advogado, para me dedicar à actividade política.
Estou, portanto, absolutamente à vontade. Só que, se nós estamos de acordo em que este projecto traz um contributo válido para corrigir uma injustiça e para valorizar uma classe que deve ser valorizada, não só neste aspecto mas noutros aspectos também, criando-lhe novas condições de trabalho -e já direi alguma coisa sobre isso-, a verdade é que isso justifica o nosso impedimento de votarmos contra este projecto, sob pena de, pessoalmente, fazermos um mau juízo de nós mesmos, dado que a. nossa convicção é esta que estou a expor.
Mas este projecto, apesar de tudo, tem defeitos que nos levam a não o podermos votar favoravelmente. Posso referir desde já alguns.
Em primeiro lugar, parece-nos 'que representaria algum exagero a acumulação de pensões que já foi referida pelo Sr. Deputado Lopes Cardoso, com o qual estamos de acordo nesse aspecto.
Achamos também que 25 % da subvenção compensatória, como agora se lhe chama, apenas ao fim de três sessões legislativas é, de certo modo, um exagero que deveria ser corrigido, e nós esperamos que o seja na discussão na especialidade.
Por outro lado, há algumas outras soluções que me parece que podem ser melhoradas e, nomeadamente, as pensões, que deviam ser condicionadas a uma idade mínima, sobre a qual não me vou neste momento pronunciar, uma vez que o faremos em rede da discussão na especialidade. Não é qualquer idade que dá direito a uma pensão que, no fundo, é, como lhe chamaram, uma pensão de reforma. Deveria conceder-se a tranquilidade dessa pensão só a partir de uma certa idade.
Pensamos, portanto, que o diploma pode ser melhorado, sem prejuízo de nós, na generalidade, ententermos que não deveremos, em consciência, votar contra ele, sob pena de sairmos daqui com a convicção de que teríamos feito um voto que, de algum modo, poderia ser qualificado de demagógico.
O Sr. Deputado Veiga de Oliveira falou demasiado, desculpará que o diga, em retirar o projecto, porque, sabendo muito bem que a maioria reage ao contrário das suas rogatórias, quando mais o meu amigo pedir para o retirarem mais pode ter a certeza de que ele não será retirado.

Risos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP) - Dá-me licença que o interrompa?

O Sr. Almeida Santos (PS): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Eu espero que o Sr. Deputado Almeida Santos, que me conhece há muitos anos, possa testemunhar que, se eu digo isso, o digo com toda a inteireza e olhando para os seus olhos e para os olhos da maioria.

Risos.

Retirem-no, Srs. Deputados!

O Sr. Almeida Santos (PCP): - Eu sei que sim. Mas, de qualquer modo, humor é humor. Não me

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prive de, de vez em quando, fazer uma ironia. É que, quando o ouvi dizer isso tantas vezes, pensei: «Bom, agora é que não o retiram mesmo!».

Risos.

A consequência fatal era essa. Era só isto que eu queria dizer.
Portanto, é esta a nossa posição. Propusemos algumas alterações que vão no sentido de criar condições de trabalho aos deputados, no sentido de eles poderem encontrar instalações nos círculos eleitorais, nos círculos de emigração e nesta Casa, o que, aliás, já foi defendido nos últimos discursos do Sr. Presidente da Assembleia. Portanto, precisamos de passar das palavras aos actos e devemos apressar o Governo para fazer um esforço definitivo no sentido de encontrar instalações nesta Casa, retirando, nomeadamente, daqui o Arquivo Histórico, a Torre do Tombo e, inclusivamente, arranjando uma instalação anexa onde possamos ter, cada um de nós, o seu gabinete, para podermos trabalhar tranquilamente, receber os nossos eleitores ou quem quiser falar connosco e podermos ter um mínimo de condições de trabalho.
Nessa altura, os aumentos que agora aqui votarmos passarão a ter o seu efectivo sentido. Até lá, preencheu-se uma das condições, mas ficou por preencher a outra condição para a dignificação da classe política.
Por outro lado, fomos no sentido de penalizar um pouco mais duramente as faltas a esta Assembleia. Entendemos que as primeiras três faltas podem continuar a ser penalizadas com 1/20 do vencimento, ou da remuneração ou do subsídio, que as segundas três faltas podem passar a ser penalizadas com 1/20 e que daí em diante seja penalizada com 1/15 cada falta. É uma atitude que vai no sentido, também, de responsabilizar os deputados, para uma maior efectividade na presença às sessões do Plenário. E não só às sessões do Plenário, uma vez que a grande parte do trabalho que eu tenho tido não tem sido no Plenário, mas sim ao nível das comissões, pois, como se sabe, os diplomas são muitas vezes aprovados aqui apenas na generalidade e posteriormente redigidos em definitivo nas comissões. O público não vê esse trabalho, vê apenas as bancadas vazias, e por isso temos também que fazer uma campanha de esclarecimento da opinião pública. Não temos que ter medo da opinião pública.

Vozes do PSD: -Muito bem!

O Orador - Temos de esclarecer a opinião pública sobre o valor e a importância do nosso trabalho, sobre o que ele representa no aspecto extensivo e no aspecto que não se vê e dizer-lhes que, se querem pedir, como têm o direito de pedir, responsabilidades pela eficácia e qualidade do nosso trabalho, têm de nos dar condições para que possamos efectivamente, dedicar-nos em full time, com total serenidade de espírito, à nossa função e ao nosso mandato.
É esse o sentido da nossa abstenção. Esperamos que na especialidade as nossas sugestões possam ser aprovada, quer as que propusemos em alternativas, quer as que vamos propor para a correcção de algumas das soluções propostas no projecto de hei. E estamos convencidos de que a opinião pública compreenderá que a classe política está, efectivamente, mal paga ao nível dos deputados e que uma melhoria das nossas compensações é mais do que justa e que, portanto, devem ser, com toda a justiça, aqui aprovadas.

Aplausos do PS e da ASDI.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado? Para pedir esclarecimentos?

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS):-Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): -Sr. Deputado Almeida Santos, referiu duas vezes na sua intervenção o resultado prático do voto contra, ainda que por forma diversa, por um lado sublinhando que votar contra seria fácil mas seria uma hipocrisia, porque teria a vantagem de votar contra e a vantagem de auferir os resultados de unia votação que a priorí sabia que seria favorável ao projecto em causa e, por outro, referiu-se à demagogia que comportaria o voto contra nestas condições.
Penso que não necessito de justificar perante esta Assembleia que a minha bancada se não move, como regra, pela demagogia. Porém, não gostaria que ficasse aqui esta ideia e queria recusar frontalmente a chantagem moral que ela comporta.
Mas tenhamos todos a coragem de admitir que os deputados que votam a favor do projecto o fazem porque o consideram justo, e não para encher os bolsos, e que aqueles que votam contra o fazem porque não estão de acordo com ele, pouco preocupados com o resultado concreto desse voto em termos pessoais.
E o esclarecimento que eu gostava de pedir ao Dr. Almeida Santos é se ele se recorda de que, aquando da votação que invocou há pouco, eu era deputado independente - e poderia ter usado o voto demagógico entendido nos termos em que o Dr. Almeida Santos O parecia entender- e se se recorda qual foi o meu voto nesta Assembleia quando se pôs o problema dos vencimentos dos ministros. Eu não era ministro, não era da maioria, nem tinha quaisquer perspectivas de voltar a ser ministro pêlos tempos mais próximos.

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra, Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Almeida Santos (PS): -Sr. Deputado Lopes Cardoso, meu querido amigo, eu creio que fui muito claro fugindo à qualificação de hipocrisia e só falei nisso e em demagogia em relação a nós próprios, dizendo que sairíamos daqui com a sensação de que teríamos feito um voto demagógico. Não acusei ninguém, fugi a qualificar a atitude dos nossos colegas desta Assembleia.
Portanto, nesse aspecto penso que não tem razão para se considerar ferido.
É exacto que, quando foi feita a votação dos aumentos do Governo, o Sr. Deputado Lopes Cardoso votou a favor desses aumentos e fez até uma decla-

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ração de voto de apoio frontal e corajoso. Tomou nessa altura uma atitude que era impopular, como esta, porventura, vai sê-lo.
Mas, já agora, lembro que em França a relação entre o salário mínimo e o vencimento de um deputado é de 1 para 6,5 e em Espanha é de 1 para 9. Assim, não temos de ter receio de fixar o vencimento que é referido no projecto, embora eu entenda que ele não deve ser referido ao vencimento do secretário de Estado, mas, em percentagem, ao vencimento do Presidente da Assembleia da República.
Penso que respondi ao Sr. Deputado Lopes Cardoso, mas cometi o pecado de me distrair porque o nosso querido amigo António Arnaut falou comigo enquanto o Sr. Deputado estava a falar e eu, por momentos, não captei a sua mensagem, que foi necessariamente mais importante do que ou entendi.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Dá-me licença que o interrompa?

O Orador - Faça favor.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Queria apenas esclarecer que não me senti ferido pela sua intervenção, pois, se me tivesse sentido ferido, teria feito um protesto, e não teria pedido um esclarecimento.
O que eu quis foi que da sua intervenção não surgisse no espírito de alguém qualquer dúvida e que ela pudesse ser entendida como uma afirmação nesse sentido.

O Orador: -Penso que tive a preocupação de salvaguardar qualquer espécie de juízo relativamente a outras bancadas e o juízo que fiz foi um juízo sobre nós próprios, dizendo que sairíamos daqui com essa sensação. Fiz, portanto, um juízo sobre nós e sobre mais ninguém.
Se, efectivamente, por forma indirecta, isto pode significar outra coisa, peço desculpa, mas a minha intenção era apenas qualificar o meu ponto de vista, e não o ponto de vista dos outros colegas.
Se permitirem uma graça, eu queria dizer que ninguém tem de sair daqui com a consciência violentada, porque, em última instância, estes direitos são renunciáveis.

Aplausos do PSD e de alguns deputados do PS e do CDS.

O Sr. Presidente:- permito-me lembrar a V. Ex.ª aquele espírito de contenção verbal que, embora sem formas taxativas, ficou apontado na reunião dos líderes dos grupos parlamentares, porque são 4 horas e 30 minutos e temos ainda a agenda bastante carregada.
Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota para uma intervenção.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, Sra Deputados: Creio que todos nós precisamos de ter a consciência clara de que muitos dos ataques ao Parlamento e aos deputados procuram ir dê encontro ao peso acumulado e inerte das críticas de cinquenta anos ao parlamentarismo e aos políticos e mais não são do que ataques as instituições democráticas.

O Sr. Angelo Correia (PSD) - Muito bem!

O Orador: - Creio que este é um primeiro passo e é também alguma coisa que nos pode levar a reflectir e meditar, porque ao longo deste debate se invocou, de vários modos e de vários pontos de vista, o prestígio desta Assembleia e também nós, como todos os democratas, dentro e fora desta Assembleia, estamos interessados no prestígio da Assembleia da República.
A dignificação das instituições democráticas interessa a todos os democratas e o seu desprestigio é o da própria democracia assim posta em causa.
É por isso que a função dos deputados e a independência com que exercem a sua função está directamente ligada com o prestígio da Assembleia da República e o estatuto pessoal dos deputados é condição para o exercício dignificado da sua função. É neste sentido que entendemos o projecto que é apresentado, é neste sentido que o consideramos na intervenção que procuro sintetizar tanto quanto possível.
Sendo o estatuto pessoal dos deputados, como disse, condição para o exercício dignificado da sua função, importa averiguar vários pressupostos.
Em primeiro lugar, interessa ter em consideração que o deputado pode ser tanto mais livre, e é tanto mais independente, quanto mais garantias tiver sob o ponto de vista da sua segurança material e da sua segurança social para exercer com dignidade a sua função.
Se o deputado é dependente do favor político, se ò deputado depende de condicionalismos de ordem externa, se ó deputado está frequentemente limitado na sua própria possibilidade de expressão, então ele não é realmente independente.
E se um deputado à Assembleia da República está sujeito a qualquer espécie de pressões que o possam limitar no livre exercício dos seus direitos -porque ele é um representante eleito e, como representante eleito, não deve ter mais sujeições-, se assim acontecer, então, o deputado não pode exercer livremente o seu mandato e está sempre condicionado à continuidade desse mandato, que será a única coisa que lhe confere segurança, e então, em vez de um deputado activo, interveniente e vivo, será com certeza um deputado meramente passivo, meramente apoiante, as mais das vezes silencioso e quando muito votante.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É por tudo isto que passa a independência e a dignificação dos deputados.
Mas este estatuto levanta um problema crucial que tem que se pôr à democracia portuguesa. Esse problema é o de saber se as condições de independência e de dignificação da missão do deputado pressupõem ou não uma ocupação a tempo inteiro dos deputados.
Não é compatível, do meu ponto de vista, o funcionamento de um parlamento independente e livre com a necessidade de o deputado acumular a sua actividade com outros tipos de actividade que prejudicam necessariamente a sua independência, que prejudicam necessariamente o seu modo de exercer a sua função e que inclusivamente se traduzem num

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desequilíbrio evidente no modo como os deputados podem exercer a sua actividade.
A verdade é que, tal como resulta do nosso regime constitucional, os deputados que são empregados por conta de outrem ou funcionários públicos têm a garantia de que não são prejudicados na sua profissão nem na sua carreira. Mas já o mesmo não acontece com aqueles que, por exemplo, exercem uma profissão liberal.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E é em relação a esta dualidade, em relação à possibilidade que alguns têm -que é, por um lado, uma desvantagem e, por outro, uma vantagem - de poderem ou não acumular o mandato de deputado com o exercício de outra profissão que nós temos que encarar as condições do exercício da função de deputado.
Direi, muito resumidamente, que em relação a este projecto em concreto aquilo que me parece pior resolvido é precisamente esta questão, porque a possibilidade de se acumularem pensões, a possibilidade de se acumularem benefícios corresponde a exaltar um modo de exercício da função de deputado que não é compatível com a dignidade e a independência que há pouco considerei condição essencial para o prestígio da Assembleia da República.
Direi, assim, muito resumidamente, que este projecto corresponde, por um lado, e do nosso ponto de vista, a uma dignificação indispensável da função do deputado e não são os vencimentos que lhe são atribuídos que, do nosso ponto de vista, suscitam maior margem de reparos. Mas, por outro lado, o projecto não resolve o problema das condições, essas, sim, indispensáveis.
E não são apenas as condições materiais para o exercício de uma actividade, não é só o complemento ao exercício dessa actividade traduzido em instalações, em apoios de toda a ordem, inclusivamente os próprios apoios no sentido de um equipamento mínimo indispensável, para que uma função se possa realizar de modo dignificante e dignificado, que impeçam que a actividade do deputado possa ser exercida como uma entrada por saída nesta Casa, de vez em quando, como uma função que se exerce em complemento de uma ou várias outras, como qualquer coisa que se exerce apenas por mero acidente e assim como uma espécie de condecoração ou de flor na botoeira.
Não entendemos assim a missão de deputado e cremos que, ao longo da nossa actividade parlamentar, os deputados desta bancada têm dado prova - e dizemo-lo de consciência tranquila- de que encaramos o mandato de uma forma exigente e responsável.
Por isso, e naturalmente, como decorre de quanto disse, também nós não votaremos contra o projecto, mas também nós não lhe daremos o nosso voto favorável.

Aplausos da ASDI e de alguns deputados do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Morgado, para uma intervenção.

O Sr. João Morgado (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Parlamento ocupa-se, neste momento, da discussão de uma matéria que já foi aqui considerada extremamente delicada e cuja delicadeza, a nosso ver, advém da circunstância de sermos nós próprios, os deputados, a ter que fixar o nosso próprio estatuto.
Penso que, a não ser assim, a ser outro órgão a tratar desta matéria, a delicadeza do problema ficaria de certa maneira eliminada. Simplesmente, é imperativo constitucional que assim aconteça e, por consequência, bom seria que a opinião pública fosse esclarecida de que assim tem de ser, porque muito do que se vê nos órgãos de informação refere que os deputados vão fixar os seus próprios vencimentos, mas não refere que é apenas neste órgão que esses vencimentos têm que ser fixados. E, se isto for devidamente esclarecido, retira, à partida, grande parte da razão da especulação que se faz com esta matéria.
A especulação, aliás, tem antecedentes. Sempre que nesta Câmara se tem debatido o Estatuto dos Deputados, sempre se tem especulado com esse debate, sempre se tem procurado, de uma forma ou de outra, denegrir o Parlamento, denegrir a situação dos deputados e mesmo as próprias pessoas dos deputados.
E isto tem sido assim, não só nos período» de debate do Estatuto, mas também durante os períodos de funcionamento do Parlamento.
É frequente encontrarmos em alguns órgãos de informação referências menos elogiosas à forma como funciona o Parlamento e, por consequência, também não nos admiramos que, logo que foi conhecido o anteprojecto do Estatuto dos Deputados, ele tenha sido publicado com foros de sensacionalismo.
Das intervenções que até aqui foram produzidas aquelas que mais cáusticas se mostraram contra o Estatuto dos Deputados tomaram em conta quase exclusivamente o aumento de proventos que o Estatuto refere.
Ê evidente que este Estatuto tem a ver com a próxima revisão do Regimento e que aquilo que ficar fixado neste Estatuto irá, naturalmente, condicionar e determinar as alterações regimentais. Por isso, é preciso que o Estatuto conceda ao deputado uma situação que lhe permita dedicar-se a tempo inteiro aos trabalhos parlamentares. E esta é a grande opção que temos que fazer neste Parlamento: se devemos ser deputados a tempo inteiro ou se devemos continuar a ser deputados em part time.
A Assembleia exige de todos nós o trabalho a tempo inteiro; simplesmente as condições económicas, e outras, de que temos disposto até aqui não permitiam um regime de trabalho deste tipo e por isso bem se justifica que avancemos desde já com algumas medidas que preparem o terreno para a opção definitiva que teremos que fazer nessa matéria.
Os lugares de deputados e os respectivos vencimentos estavam relacionados com os vencimentos da função pública. Este foi, quanto a nós, um erro grave, de que enfermou o Estatuto que pretendemos modificar.
A situação de deputado nada tem a ver com a situação de funcionário público, pois ele é um membro eleito e não tem qualquer vínculo semelhante aos vínculos que ligam o funcionário público à Administração. Assim, aferir o vencimento de deputado pelo vencimento do funcionário público parece-nos

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errado e melhor nos parece a solução agora adoptada.
Tal. como se fez recentemente para os órgãos autárquicos - como estão recordados, não se estabeleceu qualquer relação entre o vencimento dos presidentes das câmaras e o vencimento dos funcionários públicos-, também entendemos agora que a relação a estabelecer é entre órgãos eleitos e não entre funcionários públicos e membros eleitos.
Desse erro decorre o entendimento de que o aumento a atribuir, neste momento aos deputados seria um aumento paralelo ao que foi atribuído aos funcionários públicos. É preciso afastar este argumento que é falso, pois nós, embora tivéssemos o vencimento equiparado à letra A do funcionalismo, não éramos, nunca fomos, nem tínhamos o estatuto de funcionários públicos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A hora vai adiantada e vou apressar as minhas últimas considerações. Mas não quero terminar sem dizer que estranho bastante que o Partido Comunista tenha tomado a posição que tomou no que se refere ao debate deste diploma, dizendo inclusive que ele devia ser retirado, sem explicar concretamente porquê.
O diploma pode merecer o voto contra do Partido Comunista - e o Partido Comunista já disse que iria votar contra-, mas recomendar à maioria que, o retire parece-nos, realmente, uma atitude despropositada, sabendo como sabe que o diploma tem efectivamente razão de ser, reconhecendo-lhe mesmo, como reconheceu, algumas vantagens e sabendo, como sabe, que tem que ser neste Parlamento, que esta matéria tem que ser debatida e votada.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pelas razões expostas o CDS vai votar favoravelmente na generalidade este diploma, embora na especialidade vá procurar melhorar o seu teor, para p que já foram apresentadas as necessárias propostas de alteração.

Aplausos do CDS e de alguns deputados do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como hão há mais oradores inscritos, está encerrado o debate.
Vamos votar na generalidade o projecto de lei n.° 245/II - alteração ao Estatuto dos Deputados.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS e do PPM, votos contra do PCP, da UEDS, do MDP/CDE e da U DP e a abstenção do PS e da A SDI.

O Sr. Carlos Candal (PS):-Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado? Para uma declaração de voto?
O Sr. Carlos Caudal (PS): - Não, Sr. Presidente. É para informar que vai ser presente um requerimento solicitando a baixa deste projecto de lei à comissão- competente - que suponho ser a Comissão de Assuntos Constitucionais, embora não seja líquido, mas oportunamente isso se esclarecerá- para imediata discussão, é votação na especialidade.

O Sr. Presidente: - Tinha sido referido que era a Comissão de Regimento e Mandatos.

O Sr. Carlos Candal (PS): - É capaz de haver aqui um conflito positivo- de competências, porque me parece que a Comissão de Asuntos Constitucionais, no seu regulamento interno, se arroga essa competência, entre outras. Mas este é um problema que oportunamente será discernido.

O Sr. Presidente: -Estou perfeitamente de acordo, Sr. Deputado, e não será a Mesa que a esta hora levantará qualquer problema relativo a competências.
Srs. Deputados, há um requerimento de baixa à comissão, em que se solicita que a Comissão de Assuntos Constitucionais se reúna imediatamente para apreciar na especialidade o projecto de lei n.° 245/II.
Há alguma objecção?

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Peço a palavra para pedir um esclarecimento à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): -Sr. Presidente, eu queria perguntar como é que se vai proceder, ou seja, a comissão reúne agora e depois voltamos aqui?

O Sr. Presidente:-Não, Sr. Deputado, nós vamos continuar a trabalhar e a Comissão vai reunir.
Nós temos uma ordem de trabalhos a cumprir e o número de Srs. Deputados que constituem a comissão é proporcional a todos os grupos parlamentares, não havendo, portanto, qualquer prejuízo. Aliás, isto já tem acontecido outras vezes e a comissão reúne simultaneamente com os trabalhos do Plenário.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, desculpe eu insistir, mas não estou totalmente esclarecido. O diploma ainda será votado na especialidade nesta reunião?

O Sr. Presidente: - Penso que é esse o propósito dos grupos parlamentares que propõem a baixa à comissão.
Srs. Deputados, vamos votar o requerimento de baixa à comissão do projecto de lei n.° 245/II.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS, do CDS, do PPM e da ASDI e a abstenção do PCP. do MDP/CDE e da UDP.

O Sr. Presidente: - Peço ao Sr. Presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais o favor de convocar imediatamente a Comissão e a Mesa sugere à Comissão que utilize a antiga sala de reuniões do Conselho de Ministros, onde me parece que terão condições para trabalhar.
Há declarações de voto relativas à votação na generalidade do projecto de lei n.° 245/II?

O Sr. Carlos Brito (PCP):-Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, nos pretendemos fazer uma declaração de voto, mas, como o Sr. Presidente acaba de explicar que muito em breve o diploma será submetido ao Plenário para votação final global, pensamos que é preferível fazer a nossa declaração de voto nessa altura.

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O Sr. Presidente:-Srs. Deputados, vamos passar ao ponto seguinte da ordem do dia - projecto de lei n.° 223/11, do PS, sobre os vencimentos e pensões de reforma dos mais altos servidores do Estado.
Sr. Deputado António Arnaut, gostaria de saber se está disponível para assumir a presidência.

O Sr. António Arnaut (PS):-Estou sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então agradecia que me substituísse, Sr. Deputado.

O Sr. Deputado António Arnaut assume a presidência.

O Sr. residente:-Srs. Deputados, está em debate o projecto de lei n.º 223/11 do PS - vencimentos e pensões de reforma dos mais altos servidores do Estado. Peço aos Srs. Deputados que desejarem usar da palavra o favor de se inscreverem imediatamente.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Candal.

O Sr. Carlos Candal (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados estamos a discutir esta problemática da actualização dos vencimentos dos cargos políticos e, com prioridade e antecedência em relação à proposta sobre o Estatuto dos Deputados, estava pendente o texto ora em debate, que visa frontalmente a situação dos vencimentos do Presidente da República.
É uma situação com o seu quê de anómala, na medida em que, pelo menos em termos de vencimentos, as remunerações do Presidente da República, primeira figura do Estado, são inferiores às remunerações do Primeiro-Ministro. Independentemente das soluções particularizadas em sede de especialidade, afigura-se-nos que, de um ponto de vista global, o texto por nós apresentado merece aceitação. Deve-se sublinhar, para reforçar a nossa alegação, que o vencimento do Presidente da República havia sido alterado já há muito tempo, fixando-se em 52 contos, e que, desde aí, o aumento do custo de vida em Portugal cifra-se em 416%.
Para além da prioridade e da antecedência lógica que a própria numeração deste projecto tem, é manifesto que pareceria mal se abordássemos hoje, como fizemos, a problemática da situação económica dos deputados, deixando para qualquer outra ocasião o tema agora em debate. Aliás, pensamos que - salvo em questões de pormenor - será pensável encontrar uma solução unânime ou, pelo menos, quase unânime.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Pena.

O Sr. Ru! Pena (CDS): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não foi feliz a inserção deste diploma imediatamente a seguir ao Estatuto dos Deputados. Pode parecer que isso se tenha feito apenas por um gesto de reciprocidade e que por isso é que a Assembleia da República resolve atender à remuneração do Presidente da República. Com efeito, há razões para isso e as que foram apontadas pela bancada que apresentou este projecto de lei são suficientemente fortes para levar a considerar que se torna absolutamente necessário e urgente reformular o vencimento do Presidente da República, o órgão de soberania máximo da nossa hierarquia constitucional, em termos de lhe dar a dignidade a que realmente tem direito.
Neste sentido, o meu grupo parlamentar apoia a base deste projecto de lei e apresentou oportunamente à Mesa algumas alterações de pormenor, que apenas pretendem melhorar a redacção do seu articulado.
No entanto, importa fazer duas considerações complementares.
Em primeiro lugar, consideramos que, no que respeita à pensão de reforma ou àquilo a que aqui se chama pensão de reforma, apenas deve ser aplicada aos Presidentes da República eleitos no actual quadro constitucional.
Em segundo lugar, consideramos que as alterações que propomos a este projecto de lei devem ser vistas numa perspectiva de globalidade para todos os demais órgãos de soberania. Entendo que esta situação deve ser reformulada em termos de se preparar, a muito curto prazo, uma lei geral quadro de vencimentos ou de estatuto de todos os órgãos de soberania, que englobe o Presidente da República, Assembleia da República - e, consequentemente, deputados -, Governo e, eventualmente, tribunais. Independentemente disso, não pode haver distorções entre o estatuto ou regime de vencimentos de um órgão de soberania e os titulares dos outros órgãos de soberania.
Nestas condições, porque acabámos de aprovar na generalidade as alterações ao Estatuto dos Deputados e porque pode, eventualmente, alguma dessa matéria ferir ou ser diferente daquilo que estaremos a legislar para o Presidente da República, eu propunha desde já que a discussão na especialidade deste mesmo diploma fosse remetida para a Comissão de Assuntos Constitucionais, que neste momento se reuniu e está a discutir na especialidade o Estatuto dos Deputados. Assim, avançava uma sugestão de requerimento no sentido de que este diploma passasse a ser imediatamente votado na especialidade -se porventura, assim o espero, o aprovarmos na generalidade- pela mesma Comissão que se encontra reunida neste momento para votar na especialidade as alterações ao Estatuto dos Deputados.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o projecto de lei continua em discussão. A Mesa apela a que os Srs. Deputados se inscrevam no caso de quererem usar da palavra.
Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.

O Sr. Mário Tomé (UDP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A UDP vai-se abster em relação a este projecto de lei. E toma essa posição porque considera, em primeiro lugar, que o Presidente da República deve ganhar mais do que o Primeiro-Ministro. Em segundo lugar, considero que o Primeiro-Ministro já ganha de mais.

Risos.

Portanto, quanto a mim, u vencimento do Presidente dia República deve ser superior ao do Primeiro-Ministro.
Os Srs. Deputados às vezes riem-se ...

Risos.

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É preciso que fique claro que a UDP conhece perfeitamente o mundo em que vive. A UDP não tem a perspectiva utópica de querer que hoje, neste país, o Presidente da Republica, o Primeiro-Ministro e os Deputados ganhem tanto como um operário não qualificado.

Vozes do PSD: - Ah!

O Orador. - O que a UDP aponta é que no nosso país, por culpa...

Vozes do PSD e do CDS: - Da AD!

O Orador - ... da AD e do próprio Presidente da República, o caminho apontado pela UDP e pêlos próprios trabalhadores - maior justiça social e menor desequilíbrio entre as possibilidades de vida de todos os portugueses- foi efectivamente impedido e travado. A UDP contesta a actual sociedade e considera que, mesmo na perspectiva da luta desenvolvida com o 25 de Abril, não se poderia alcançar logo um igualitarismo total. As condições objectivas e as condições materiais de desenvolvimento das forças produtivas da própria sociedade não o permitiriam.
Mas isso não obsta a que a UDP considere a total injustiça da sociedade em que vivemos e da diferença de vencimentos, para já não se falar de rendimentos, praticada neste país. Isto deve ficar bem claro.
Portanto, a UDP pensa que o Presidente da República deve ganhar mais do que o Primeiro-Ministro. De qualquer forma, penso que o vencimento do Primeiro-Ministro é exagerado e que também será de mais o que ganhará o Presidente da República. Por essa razão, a UDP opta pela abstenção.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não há mais inscrições. Vamos, pois, proceder à votação na generalidade deste projecto de lei.

Submetido à votação, foi aprovado, com os votos a favor do PSD, do PS, do CDS, do PPM, da ASDI e da UEDS, e as abstenções do PCP e da UDP, estando ausente o MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Vamos proceder à discussão e votação na especialidade.
Mas chegou à Mesa um requerimento, subscrito pelo Grupo Parlamentar do Partido.. Socialista, que requer a baixa à comissão parlamentar competente, para imediata discussão e votação na especialidade, do projecto de lei ora aprovado na generalidade.
Proceder-se-ia da mesma maneira que em relação ao anterior projecto de lei. Vamos, pois, proceder à votação deste requerimento.

Submetido à votação, foi aprovado; com os votos a favor do PSD, PS, CDS, PPM, ASDI e UEDS e a abstenção do PCP, registando-se as ausências do MDP/CDE e da UDP.

O Sr. Presidente: - Nas mesmas condições que o anterior, o presente projecto de lei baixa, portanto, à Comissão de Assuntos Constitucionais.
Srs. Deputados, vamos iniciar o debate da proposta de lei n.° 29/II - lei da nacionalidade.
Os Srs. Deputados dispensam a leitura do relatório ou algum dos Srs. Deputados requer essa leitura?

Pausa.

Como nenhum dos Srs. Deputados requer essa leitura, considera-se que está dispensada.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Miranda para uma intervenção.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não vou fazer uma intervenção na generalidade porque neste momento se trata apenas da votação na especialidade. Por outro lado, não se trata só da proposta de lei n.° 29/11, mas também dos dois projectos de lei que foram aprovados na generalidade por esta Assembleia. Portanto, eu julgo que se trata somente de proceder à votação na especialidade, tendo em conta o relatório da Comissão cuja leitura foi dispensada. Sobre a votação na especialidade haverá naturalmente intervenções.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado tem de facto razão. Eu estava a guiar-me pela ordem de trabalhos oficial, que refere apenas a proposta de lei n.° 29/11, e supus que se tratava da discussão e votação na generalidade. Trata-se, portanto, de uma discussão na especialidade, segudo o texto aprovado pela Comissão e Constante no relatório cuja leitura foi dispensada pela Assembleia..
Os Srs. Deputados dispensam a leitura artigo por artigo? Algum dos Srs. Deputados vê necessidade de votação separada. ou, à semelhança do que se tem feito noutros casos, poderá fazer-se uma votação conjunta?
Tem a palavra o Sr. Deputado Azevedo Soares.

Neste momento tomou lugar na bancada do Governo o Sr. Ministro da Administração Interna (Fernando Amaral).

O Sr. Azevedo Soares (CDS): - Sr. Presidente, eu julgo que poderíamos efectuar a votação conjunta de todos aqueles artigos em que não houvesse oposição de alguns dos grupos parlamentares e não houvesse eventualmente divergências no sentido do voto. Pela nossa parte, poderemos naturalmente votar conjuntamente todas as disposições. Não tive oportunidade de consultar todos os grupos parlamentares. O Partido Comunista quer votar separadamente alguns artigos. Julgo que, se mais algum grupo parlamentar o quisesse fazer, poderíamos fazer uma enumeração dos artigos que teríamos de votar separadamente e votaríamos conjuntamente todos os outros. Do Partido Comunista, tenho a informação de querer votar em separado os artigos 8.°, 29.° e 30.º

O Sr. Presidente: - Como, de certa forma, o Partido Comunista foi interpelado acerca da votação em separado, concedo a palavra ao Sr. Deputado Lino Lima. Mas antes queria dizer que o relatório não menciona os termos da votação na Comissão. Por isso, a Mesa ignora qual é discrepância que existe entre os diversos grupos parlamentares.
Tem a palavra o Sr. Deputado Lino Lima.

O Sr. Lino Lima (PCP):-Sr. Presidente, a informação dada pelo Sr. Deputado Azevedo Soares é

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correcta. Nós não nos opomos à votação de todos os restantes artigos da proposta de lei, com excepção dos que o Sr. Deputado acaba de indicar, ou seja, os artigos 8.°, 29.° e 30.°.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Miranda.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou fazer uma intervenção o mais curta possível, tendo em conta o adiantado da hora e tendo em conta também que se está, apesar da técnica utilizada, numa discussão e votação na especialidade.
Conforme consta do relatório da Comissão, nós demos e damos concordância ao texto elaborado na Comissão de Assuntos Constitucionais e, por conseguinte, iremos votar a favor de todos os preceitos que fazem parte desse texto. Fazemo-lo, no entanto, não sem chamar a atenção desta Assembleia para dois pontos.
Em primeiro lugar, o texto elaborado pela Comissão de Assuntos Constitucionais baseia-se fundamentalmente no texto da proposta de lei, isto é, segue fundamentalmente determinado critério respeitante à atribuição da cidadania portuguesa, que é o critério do jus sanguinis. Pela nossa pane, julgamos que este critério pode ser adoptado desde que seja mitigado através do outro critério - o critério do jus soli. De certa maneira é isto que resulta do texto elaborado pela Comissão. Por isso não votaremos contra; daremos o nosso voto favorável.
Mas gostaríamos de salientar que, para nós, não se trata de uma questão de princípios irmos votar agora neste sentido. Não se trata de qualquer princípio ideológico ou de qualquer princípio conatural à regulamentação da cidadania. E muito menos se trata, para nós, de um qualquer compromisso no sentido de traduzirmos o critério do jus sanguinis em norma constitucional, conforme propôs a Aliança Democrática na sequência do projecto de Constituição do CDS de 1975. A solução que foi adoptada pela Comissão de Assuntos Constitucionais e que nós iremos subscrever é uma solução possível e que, no contexto actual, podemos considerar razoável. Não é a única solução e não é de modo algum o que desejamos que seja consagrado em sede de revisão constitucional. O artigo 4.º da Constituição não estabelece nenhum critério específico e entendemos que deve continuar a não estabelecer. Portanto, o legislador ordinário deve ter a possibilidade de, no futuro, ponderadas as circunstâncias de aplicação da lei, alterar o critério ou poder mitigá-lo de uma forma diferente daquela que aparece no texto elaborado pela Comissão de Assuntos Constitucionais.
Este é, portanto, o primeiro ponto. Nós damos o nosso acordo ao texto vindo da Comissão, mas tendo em conta esta observação.
Em segundo lugar, nós gostaríamos de salientar que o texto elaborado pela Comissão de Assuntos Constitucionais é um texto simples, que, embora tomando como base fundamental a proposta de lei apresentada pelo Governo, não deixou de tomar em consideração o projecto de lei que eu próprio tinha apresentado e o projecto de lei subscrito por deputados do Partido Socialista. É assim que no artigo 1.° alguns aspectos aparecem claramente de compromisso. É assim que noutros artigos, sobre os quais não me pronunciarei agora, também está patente a mesma ideia de compromisso e uma determinada procura de consenso.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para terminar -e desculpem-me a insistência-, eu gosaria de dizer que, apesar de a lei, tudo o indica, ter de designar-se lei da nacionalidade, isso de modo algum significa uma qualquer renúncia da minha parte ao nome «cidadania». Isso não significa, muito menos, que também em sede de revisão constitucional possamos aceitar que, em vez de cidadania, venha a falar-se em nacionalidade. O termo cidadania é muito mais correcto e, portanto, continuará a ser esse o nome que, na minha opinião, a Constituição deveria manter. E eu espero que uma futura lei a venha a adoptar para designar esta matéria.
Gostaria ainda de dizer que, relativamente ao texto vindo da Comissão, será necessário proceder-se a uma redacção final, tendo em conta uma melhoria de sistematização, uma harmonização de linguagem e as contribuições que ainda durante este debate certamente serão dadas por outros intervenientes.

O Sr. Presidente: - Pára que deseja a palavra, Sr. Deputado Lino Lima?

O Sr. Lino Lima (PCP): -Sr. Presidente, que gostava de dar um esclarecimento à Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado, embora a Mesa não tenha solicitado o esclarecimento. Mas é sempre bem vindo.

O Sr. Uno Lima (PCP): - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Eu não sou de forma nenhuma um formalista e preciosista, mas gostaria de chamar a atenção da Mesa para o seguinte: na votação na generalidade foram aprovados a proposta de lei n.° 29/II e os projectos de lei do PS e da ASDI. Baixaram todos eles à Comissão, não para que a Comissão procedesse a uma votação na especialidade, visto que não tinha competência para tal -neste caso, essa competência é reservada ao Plenário da Assembleia-, mas única e exclusivamente para que a Comissão organizasse uma espécie de guião que facilitasse a discussão e votação na especialidade em Plenário. Foi com essa intenção que se fez esse anexo ao relatório, que não é nem pode ser de maneira nenhuma considerado um texto de substituição, visto que, para ser texto de substituição, era necessário que a Comissão tivesse competência para votar na especialidade.
Portanto, creio que aqueles que subscreveram esse texto - e a posição partidária destes deputados consta do relatório - deveriam formalizar as propostas, para que elas fossem aqui votadas. Esses deputados consideram como formalização destas propostas o respectivo texto que a Mesa já tem? nós não nos opomos a isso. Mas queríamos que isto se clarificasse e que se esclarecesse que a votação é feita nestas condições.

O Sr. Presidente: - O seu esclarecimento foi de facto útil, Sr. Deputado Lino Lima. Contudo, afir-

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ma-se no relatório que a Comissão procurou elaborar um texto de sistematização, tomando ;por base a proposta de lei e tendo em conta os dois projectos de lei do PS e da ASDI. Em consequência, o texto que temos na Mesa é um texto de sistematização. Nessa medida, a Comissão não exorbitou dos seus poderes. De qualquer modo, as dúvidas que suscitou são legítimas e vão naturalmente ser esclarecidas.

O Sr. Carlos Candal (PS):-Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Candal (PS):- Sr. Presidente, as dúvidas são formalmente legítimas, mas não substancialmente, por duas ordens de razões. Em primeiro lugar, este texto é realmente um texto de substituição, embora no relatório se designe como um texto de sistematização. Do ponto de vista pragmático, este texto possibilita que se faça a discussão e votação na especialidade, sem prejuízo dos direitos dos grupos parlamentares, nomeadamente do PCP, de propor alterações ou de requerer a votação alternativa em relação a certos ou a todos os artigos. Mas este texto facilita uma solução expedita ...

O Sr. Presidente: - Desculpe-me interrompê-lo, Sr. Deputado, mas...

O Sr. Carlos Candal (PS): - Sr. Presidente, eu conheço o dispositivo e ia referi-lo.
Como dizia, para- além disso, acontece que o artigo 146.° do Regimento permite exactamente que as comissões possam sugerir ao Plenário a substituição por outro texto de uma proposta ou de um projecto de lei, tanto na generalidade como na especialidade.

O Sr. Presidente:: - Sr. Deputado, eu queria interrompê-lo justamente para lhe explicar que o que está em causa é o seguinte: havia uma proposta de lei do Governo, um projecto de lei do PS e outro da ASDI. A Comissão recebeu um mandato para proceder à sistematização desses diplomas. E cumpriu esse mandato apresentando um texto que afinal é um texto alternativo. Todavia, a questão que o Sr. Deputado Lino Lima apresentou com pertinência foi de que este texto encontra-se apenas assinado pelo presidente da Comissão e que, formalmente, terá de ser assinado pêlos Srs. Deputados que inicialmente teriam apresentado o projecto de lei.
Não é assim, Sr. Deputado Lino Lima?.

O Sr. Lino Lima (PCP):-Sr. Presidente, eu até já estou arrependido por ter pretendido esclarecer a Mesa. Eu não quero criar problema nenhum, ainda para mais a esta hora. Eu quis colocar a questão nos termos formais que me parece que têm de ser atendidos pela Mesa. Mas disse logo que não fazíamos qualquer objecção a que este texto que aqui está, tal como se nos apresenta, figure para a Mesa como formalização das propostas de alteração, apresentadas pêlos deputados do: PSD, do PS, CDS e ASDI, que fazem parte da Comissão.

O Sr. Presidente: - Mas esse era o entendimento, Sr. Deputado. V. Ex.ª levantou a questão.

O Sr. Lino Lima (PCP): - Eu levantei, a questão porque não queria que, como me parecia que estava a suceder, a Mesa conduzisse os trabalhos como se se tratasse de um texto de substituição, quando está visto que não pode ser. A Comissão não tinha competência para isso.

O Sr. Presidente: - Mas, Sr. Deputado, o relatório diz expressamente que se trata de um texto de sistematização.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Vitorino.

O Sr. António Vitorino (UEDS): - Sr. Presidente: é apenas para interpelar a Mesa sobre a metodologia da votação.
Ao que fui informado, a Mesa pretenderia votar em bloco na especialidade todos os artigos. Se fosse possível, o meu grupo parlamentar queria pedir a autonomização do artigo 1.°, pelo menos, dos demais artigos na votação na especialidade. Nós agradeceríamos porque teremos votações diferentes.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado: de facto, era cerca das 5 horas da manhã quando a Mesa fez essa sugestão, mas agora, 5 horas e 20 minutos, a questão está ultrapassada, visto que já está esclarecido, que há três artigos para serem votados em separado e outros em que, porventura, seja também requerida esta votação em separado. O Sr. Deputado quer que seja votado separadamente o artigo 1.° O PCP quer que se faça a votação em separado dos artigos 8.°, 29.° e 30.° Mais algum dos Srs. Deputados requer votações em separado?

Pausa.

Visto que não há mais requerimentos de Votações em separado, vamos votar separadamente apenas os artigos 1.°, 8.°, 29.° e 30.°.
Vamos, pois, votar em bloco todo o articulado, excepto os artigos 1.°, 8.°, 29.° e 30.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
É o seguinte p articulado aprovado:

CAPÍTULO II

Da aquisição da nacionalidade

SECÇÃO I

Aquisição da nacionalidade por efeito da vontade

ARTIGO 2.º

(Aquisição por filhos menores ou incapazes)

Os filhos menores ou incapazes de pai ou mãe que adquira a nacionalidade portuguesa, podem também adquiri-la, mediante declaração.

(Artigo 2.º da proposta de lei e artigo 13.° do projecto de lei n.º 164/II e artigo 4°, n.º 3, do projecto de lei n.º 53/II.)

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ARTIGO 3.º

(Aquisição em caso de casamento)

1 - O estrangeiro casado com nacional português pode adquirir a nacionalidade portuguesa mediante declaração feita na constância do casamento.

2 - A declaração de nulidade ou anulação do casamento não prejudica a nacionalidade adquirida pelo cônjuge que o contraiu de boa fé.

(Artigo 3.º da proposta de lei, artigo 4.º do projecto de lei n.° 164/11 e ainda artigo 3.º do projecto de lei n.º 53/11.)

ARTIGO 4.°

(Declaração após aquisição de capacidade)

Os que hajam perdido a nacionalidade portuguesa por efeito de declaração prestada durante a sua incapacidade podem adquiri-la, quando capazes, mediante declaração.

[Artigos 4.º da proposta de lei, 6.º, alínea a), do projecto de lei n.º 56/II e 8.°, alínea a), do projecto n.º 164/II.)

SECÇÃO II

Aquisição da nacionalidade pela adopção

ARTIGO 5,°

(Aquisição por adopção plana)

O adoptado plenamente por nacional português adquire a nacionalidade portuguesa.

(Artigo 5.º da proposta de lei e artigo 3.º do projecto de lei n.º 164/II.)

SECÇÃO III

Aquisição da nacionalidade por naturalização

ARTIGO 6.º

(Requisitos)

Igual ao artigo 6.° da proposta de lei n.° 29/II, aditando-se no final da alínea b) do n.° l a expressão «ou sob a administração portuguesa».

(Corresponde ainda ao artigo 4° do projecto de lei n.º 53/II e ao artigo 5.º do projecto de lei n.º 164/II.)

ARTIGO 7.ª

(Processa)

(Igual aos artigos 7.º e 8.º da proposta de lei, passando o artigo 8.º a n.º 3.)

Corresponde ainda ao artigo 6.º do projecto de lei n.º 164/II.)

CAPÍTULO IV

Da oposição à aquisição da nacionalidade por efeito da vontade ou da adopção

ARTIGO 9.º

(Fundamentos e processo)

(Igual ao artigo 10.° da proposta de lei n.º 29/II.)

Corresponde aos artigos 7.º do projecto de lei n.º 53/II e 15.º e 16.º do projecto de lei n.º 164/II.)

CAPÍTULO v

Dos efeitos da atribuição, aquisição e perda de nacionalidade

ARTIGO 10.º

(Efeitos da atribuição)

(Igual ao artigo 11.º da proposta de lei.)

(Corresponde ao artigo 2.°, n.º 2, do projecto de lei n.º 53/II e ao artigo 9° do artigo 10.° do projecto de lei n.º 164/II.)

ARTIGO 11.ª

(Efeitos das alterações da nacionalidade)

(Igual ao artigo 12.º da proposta de lei e ao artigo 10.º do projecto de lei 164/II.)

ARTIGO 12.º

(Efeitos da naturalização)

A carta de naturalização só produz efeitos se o seu registo for requerido dentro do prazo de seis meses, a contar da data da notificação para o seu levantamento.

(Corresponde ao artigo 13.º da proposta de lei e ao artigo 11.º do projecto de lei n.º 164/II com modificações.)

CAPÍTULO VI

Do registo central da nacionalidade

ARTIGO 13.º

(Do registo central da nacionalidade)

As declarações de que depende a atribuição, a aquisição ou a perda da nacionalidade portuguesa devem constar do registo central da nacionalidade, a cargo da Conservatória dos Registos Centrais.

(Corresponde ao artigo 14° da proposta de lei e ao artigo 17.º do projecto de lei n.º 164/II.)

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ARTIGO 14.°

(Declarações perante perante os agentes diplomáticos ou consulares)

(Igual ao artigo 15.º da proposta de lei.)

(Corresponde ao artigo 20.°, n.º l, do projecto de lei n.º 164/II.)

ARTIGO l5.°

(Igual ao artigo 16.° da proposta de lei.)

(Corresponde ao artigo 18.° do projecto de lei n.º 164/II.)

ARTIGO 16.º

(Igual ao artigo 17° da proposta de lei.)

(Corresponde ao artigo 21.° do projecto de lei n.° 164/II.)

ARTIGO 17.º

(Igual ao artigo 18° da proposta de lei.)

CAPÍTULO VII

Da prova da nacionalidade

ARTIGO 18.º

1 - A nacionalidade portuguesa originária de indivíduos nascidos em território português ou sob a administração portuguesa prova-se pelo assento de nascimento, sendo havidos como filhos de nacional português os indivíduos de cujo assento de nascimento não conste menção da nacionalidade estrangeira dos progenitores ou do seu desconhecimento.
2 - (Igual ao n.º 2 do artigo 19.° da proposta de lei.)

(O n.º l corresponde, com alterações, ao n.° l do artigo 19.º da proposta de lei. Corresponde ainda aos artigos 22.º e 23.º do projecto de lei n.° 164/II.)

ARTIGOS n.ºs ,20.° e 21.°

(Iguais aos artigos 20.°, 21.° e 22.º da proposta de lei.)

(O artigo 19° corresponde ao artigo 24.° do projecto de lei n.° 164/II.)

CAPÍTULO, VIII

Do contencioso da nacionalidade

ARTIGO 22.°
(Igual ao artigo 23° da proposta de lei.)

(Corresponde ao artigo 26.° do projecto de lei n.° 164/II.)

CAPÍTULO IX

Dos conflitos de lei sobre a nacionalidade

ARTIGOS 23.° e 24.º

(Iguais aos artigos 24.º e 25.º da proposta de lei.)

(Correspondem aos artigos 27.°, n.º l, e 28.º , do projecto de lei n.° 164/II.)

CAPÍTULO X

Disposições gerais

ARTIGO 25.º

(Igual ao artigo 26.º da proposta de lei e ao artigo 29.º do projecto de lei n.° 164/II.)

ARTIGO 26.º

(Igual ao artigo 27.º da proposta de lei.)

(Corresponde ao artigo 30° do projecto de lei n.º 164/II.)

CAPÍTULO XI

Disposições transitórias e finais

ARTIGO 27.º

(Igual ao artigo 29° da proposta de lei.)

ARTIGO 28.º

(Igual ao artigo 30.º da proposta de lei.)

(Corresponde ao artigo 33.° do projecto de lei n.° 154/II.)

ARTIGOS 30°. 33.º 33. º , 34.º e 35.°

(Iguais aos artigos 32.° a 36.º da proposta de lei.)

(Os artigos 32.°, 33.° e 35.° correspondem, respectivamente, aos artigos 36.°, 37.º e 38°, n.º 2, do projecto de lei n.° 164/II.)

ARTIGO 36.º

1 - Nos assentos de nascimentos ocorridos em território português, após a entrada em vigor deste diploma, de filhos apenas de não portugueses mencionar-se-á, como elemento de identificação do registando, a nacionalidade estrangeira dos progenitores ou seu desconhecimento.

2 - (Igual ao n.° 2 do artigo 37.° da proposta de lei.)

(O n.º l corresponde, com alterações, ao n.º l do artigo 37.° da proposta de lei.)

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ARTIGO 37.°

(Igual ao artigo 38.° da proposta de M.)

ARTIGO 38.º

(Igual ao artigo 39.º da proposta de lei.)

(Corresponde ao artigo 39.º do projecto de lei n.º 164/II.)

O Sr. Presidente: - Vamos agora votar o artigo 1.°

ubmetido à votação, foi aprovado, com a abstenção da UEDS e da UDP.

Ê o seguinte:

CAPÍTULO I

Da atribuição da nacionalidade

ARTIGO [...]

(Portugueses de origem)

1 - São portugueses de origem:
a) Os filhos de pai português ou mãe portuguesa nascidos em território português ou sob administração portuguesa, ou no estrangeiro se o progenitor português aí se encontrar ao serviço do Estado Português;
b) Os filhos de pai português ou mãe portuguesa nascidos no estrangeiro se declarem que querem ser portugueses ou inscreverem o nascimento no registo civil português;
c) Os indivíduos nascidos em território português, filhos de estrangeiros que aqui residam habitualmente há, pelo menos, seis anos e não estejam ao serviço do respectivo Estado, se declararem que querem ser portugueses;
d) Os indivíduos nascidos em território português quando não possuam outra nacionalidade.

2 - Presumem-se nascidos m Portugal, salvo prova em contrário, os recém-nascidos expostos em território português ou sob administração portuguesa.
[As alíneas a), b) e d) do n.º l correspondem às alíneas a), b) e c) do n.º l do artigo l.º da proposta de lei e, com alterações, aos artigos 1.º de cada um dos projectos de lei.]
[A alínea c) corresponde, com alterações, à alínea a) do artigo 1.º de cada um dos projectos de lei.]
[O n.º 2 corresponde ao n.º 2 do artigo 1.º da proposta e do projecto de lei n.º 164/II]

Na alínea a) do n.° l e no n.° 2 adita-se a referência a «ou sob administração portuguesa».

O Sr. Presidente: - Vamos agora votar o artigo 8.°

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS. do CDS. do PPM, da ASDI e da UEDS e votos contra do PCP. do MDP/CDE t da UDP.

É o seguinte:

CAPÍTULO III

Da perda da nacionalidade

ARTIGO 8.º

(Declaração relativa à perda da nacionalidade)

(Igual ao artigo 9.º da proposta de lei n.° 29/II.)

[Corresponde ao artigo 7.º, n.° l, do projecto de lei n.º 164/II e ainda às alíneas a) e b) do n.º l do artigo 5.º do projecto de lei n.º 53/II]

Entretanto reassumiu a presidência o Sr. Presidente Leonardo Ribeiro de Almeida.

O Sr. Presidente: - Vamos votar o artigo 29.º.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS, do CDS, do PPM. da ASDI e da UEDS e votos contra do PCP, do MDP/CDE e da UDP.

É o seguinte:

ARTIGO 29.º

Os que, nos termos da Lei n.° 2098, de 29 de Julho de 1959, e legislação precedente, perderam a nacionalidade portuguesa por efeito da aquisição voluntária de nacionalidade estrangeira podem adquiri-la mediante declaração, sendo capazes.

(Corresponde ao n.º l do artigo 31.º da proposta de lei.)

O Sr. Presidente: - Finalmente, vamos votar o artigo 30.°

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS. do CDS, do PPM, da ASDI e da UEDS e votos contra do PCP, do MDP/CDE e da UDP.

É o seguinte:

ARTIGO 30.º

(Igual ao n.º 2 do artigo 31.º da proposta de lei.)

O Sr. Presidente: -Para declaração de voto inscreveram-se vários Srs. Deputados.
Em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado António Vitorino.

O Sr. António Vitorino (UEDS):-Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar da UEDS abs-

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teve-se na votação do artigo l.° da proposta de lei da nacionalidade, em conformidade com a posição que adoptou na votação na generalidade, porque este. texto de substituição elaborado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, embora contendo disposições dos projectos de lei da ASDI e do PS e da própria proposta governamental que merecem o nosso apoio, contém ainda orientações que não coincidem com as nossas opções em matéria de lei da nacionalidade.
A orientação global desta proposta de dei e deste artigo 1.° continua a instalar a prevalência do jus sanguinis sobre o jus soli, optando por uma concepção que abrange, para além dos limites que consideramos razoáveis, o conjunto das pessoas que assim passam a poder assumir a cidadania portuguesa.
Este alargamento, em grande parte motivado por razões de política conjuntural, comporta consequências não completamente previsíveis. E neste capítulo não deixa de ser curioso que a maioria, sempre tão preocupada com a compatibitização da ordem jurídica interna com o ordenamento comunitário europeu, não tenha equacionado a£ consequências que as opções contidas nesta, lei comportam para as- próprias negociações com a Comunidade Económica Europeia.
A generalização da dupla nacionalidade, de par com a aceitação pelo nosso país do princípio da livre circulação dos trabalhadores decorrente da adesão ao tratado de Roma, não deixarão de criar situações complexas e difíceis em- face da CEE, que dentro em breve decerto serão sublinhadas pelas comunidades face a esta iniciativa que consideramos de visão pouco alargada.
Não nos parece pois que a lei ora adoptada satisfaça a definição de cidadania nos termos mais adequados ao modelo de Estado democrático europeu.
Daí. a nossa abstenção, porque embora julgando imprescindível a substituição da legislação anterior ao 25 de Abril, a iniciativa ora aprovada não nos satisfaz e dentro em breve seremos de novo chamados a revê-la, inevitavelmente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Lara.

O Sr. Sonsa Lara (PPM): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: As alterações político-administrativas e político-jurídicas verificadas em Portugal como consequência da nova era histórica iniciada pelo 25 de Abril, aliadas ao progressivo processo de europeização do nosso país e à importância que em todos os sentidos reveste a parcela emigrada da Nação, impunham a substituição da Lei da Nacionalidade portuguesa que, vigorando há mais de duas dezenas de anos, se apresentava manifestamente desactualizada.
Ressaltamos, mais- uma vez, a importância de tornar agora preponderante o critério do jus sanguinis, ao invés, do que acontecia no antigo regime jurídico, bem como o de adequar a lei aos princípios da igualdade dos cônjuges e da não discriminação entre os filho? havidos do casamento ou fora dele e ainda de acautelar as situações especiais decorrentes da adopção plena de estrangeiros por portugueses, ou da menoridade e incapacidade de filhos de adquirentes dá nossa nacionalidade.
O texto de sistematização elaborado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, tendo por base a proposta de lei n.° 29/II e os projectos n.°s 53/II e 164/II contempla satisfatoriamente as preocupações do PPM sobre as matérias que referi, razão pela qual o meu partido lhe deu o seu aval.

Aplausos do PPM e do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida; Salema.

A Sr.ª Margarida Salema (PSD): - Sr. Presidente, antes de produzir a minha declaração de voto, queria requerer, à Mesa a baixa da proposta de lei que acaba de ser votada à Comissão de Assuntos Constitucionais, a fim de esta proceder à sua redacção final.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, segundo o regime já decidido, posso informá-la que a deliberação da Câmara no sentido de prorrogar o trabalho das Comissões é para colaborar com os serviços de redacção final da lei. Portanto, sem prejuízo de ser atendido o requerimento de V. Exa., com toda a certeza que a redacção final será acompanhada pela comissão competente.

A Sr.ª Margarida Salema (PSD): - Obrigado, Sr. Presidente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PSD não pode deixar de registar com agrado a forma como a Comissão de Assuntos Constitucionais, ao debruçar-se sobre a proposta de lei n.° 29/II do Governo, o projecto de lei n.º 53/II, da ASDI, e o projecto de lei n.º 164/II, do PS, logrou alcançar um consenso sobre matéria tão importante, de dignidade constitucional, consenso esse traduzido no texto anexo ao relatório da Comissão;
Para além das questões de fundo já abordadas na discussão na generalidade, importa aqui fazer uma breve referência aos critérios de atribuição da nacionalidade. Efectivamente, enquanto o projecto de lei do PS mantinha o equilíbrio entre os critérios do jus sanguinis e do jus soli existente na Lei n.° 2098, com prevalência do jus soli, a proposta de lei do Governo, consagrando igualmente um sistema misto, inverte-o, no entanto, em benefício do jus sanguinis.
Como foi referido ampla e desenvolvidamente por colegas da minha bancada, tal critério deve prevalecer num país de forte emigração, no qual, após a déscolonização, o elemento pessoal deve contar, mais que o elemento territorial. Acresce que a vontade também desempenha um papel de relevo na determinação da nacionalidade, o que permite restringir os casos de plurinacionalidade. A alínea c) proposta ao n.° l do artigo 1.° não desvirtua o sentido da prevalência do critério do jus sanguinis, na medida em que os casos a que a norma eventualmente se venha a aplicar serão em número reduzido.
A maioria, das escassas alterações introduzidas relativamente à proposta de lei contribuem para um melhoramento formal e sistemático, da referida proposta de lei do Governo.

Aplausos do PSD. do CDS e do PPM:

O Sr. Presidente:-Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

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O Sr. José Manuel Mendes (PCP): -Sr. Presidente, Srs. Deputados, o Grupo Parlamentar do PCP votou como votou por três razões fundamentais: porque entende que era pertinente a revisão da legislação em vigor nesta matéria, designadamente no sentido da correcção de anomalias e inconstitucionalidades preceituais; porque dá o seu acordo a muitas das normas constantes do presente diploma, não obstante opor uma outra filosofia -não privilegiadora da óptica do jus sanguinis, pelo que nela existe de insustentável quando levada a situações-limite - à que presidiu à elaboração deste texto; porque (e eis uma questão de fundo) combate, sem ambiguidades, todo um quadro de criação de dupla nacionalidade enquinado por uma visão eleitoralísta da problemática que apreciámos.
Ao votarmos aqui, favoravelmente, aquando do debate na generalidade, os projectos de lei apresentados pela ASDI e pelo Partido Socialista, mau grado as reservas que nos suscitavam, ao negarmos o nosso apoio à proposta de lei do Governo, deixámos claro que víamos como positivas as medidas atinentes à introdução de benfeitorias necessárias, ou mesma úteis, nos tecidos normativos em confronto, uma vez que se partia de uma plataforma inquestionável: era imperioso substituir, de modo adequado aos comandos constitucionais, os dispositivos pegais vigentes.
Tal não significava, porém, que anuíssemos a toda uma manobra subtil, de longo alcance, perpetrada pela maioria, fazendo sintonizar esta lei com outras que visam a fabricação, «rapidamente e em força» (para me socorrer de uma fórmula tristemente célebre), em doses maciças, de novos eleitores, tenham ou não qualquer vínculo efectivo à Pátria, estejam ou não de posse daqueles elementos basilares em função dos quais é de consagrar a portugalidade. Tal procedimento, desconfigurador da própria ideia do povo que somos, subjazia, enroupado com declarações mais ou menos constitucionalizantes, a todo o imbrincado jogo do reconhecimento e concessão da dupla nacionalidade.
Porque pensamos não terem sido salvaguardados estes aspectos verdadeiramente medulares, em sede dos debates havidos no seio da Comissão de Assuntos Constitucionais, não nos restou qualquer outra posição que não fosse, coerentemente, votar contra aqueles artigos que infringiam os princípios por que nos batíamos e batemos. Na verdade, através de preceitos como o do artigo 8.°, entre outros, abrem-se as portas a possibilidades cuja gravidade não pode deixar de merecer a nossa condenação. Por exemplo, um cidadão americano, um qualquer hipotético Sr. John Smith, sem desrespeito (é óbvio), pode adquirir, mercê do funcionamento dos mecanismos previstos nesta lei, a nacionalidade portuguesa, mesmo que, sendo um descendente de portugueses em terceira geração, se encontre completamente desligado da raiz de sangue, da raiz histórica concreta, assim se permitindo que venha a participar nas decisões políticas que só ao nosso povo concernem.
Não esquecemos a situação de muitos emigrantes que, nomeadamente através da aquisição voluntária de nacionalidade estrangeira, de modo a usufruir regalias sociais de vária ordem, mantendo a família no nosso país, encontram aqui dificuldades de vulto no trato jurídico-civil, e não só, quando pretendem resolver alguns dos seus problemas. Só que não nos parece ser a solução do legislador aquela que correctamente atinge as finalidades que diz visar; ela trai os próprios objectivos porque acarretará aos emigrantes obstáculos face às leis do país em que vivem. E, no entanto, ainda poderia, muito remotamente, admitir-se a colocação do acento no princípio da vontade em algumas normas mais contestáveis, mas a maioria, apesar de proclamar que tal princípio dirige as alavancas da lei, preferiu prescrever, em certas instâncias, como a do já mencionado artigo 8.°, a atitude passiva do interessado, justamente aquela que mais favorece a formada AD dos novos eleitores.
Ora, reconhecendo, muito embora, as melhorias enxertadas na proposta governamental, entre as quais o afloramento do jus soli, como expediente temperador da opção de fundo, que é de sinal contrário, aprovando vários artigos por neles nada se detectar de inaceitável, não pode o Grupo Parlamentar do PCP subscrever o projecto político, que é da AD, de, a coberto da constitucionalização necessária, introduzir normas que rumam a fins extremos de conjuntura eleitoralista, e precários. O que é tanto mais grave quanto é certo estarmos a tratar de matéria que reveste a profunda dignidade de uma lei que é, para todos os efeitos, o recorte jurídico do nosso perfil de povo, com tudo o que tal implica de substância cultural, histórica e política.

O Sr. Presidente: - Acabou o seu tempo, Sr. Deputado.

O Orador: - Sr. Presidente, no entanto solicitava que fosse publicado o texto integral desta declaração de voto no Diário da Assembleia da República.

O Sr. Presidente: - Com certeza,. Sr. Deputado. Tem a palavra o Sr. Deputado Azevedo Soares.

O Sr. Azevedo Soares (CDS):-Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, não posso deixar de me congratular, e muito vivamente, por ter sido possível estabelecer um acordo em relação a matéria que é prefiguradora de uma situação política desejável e, por outro lado, matéria que, em si mesma, é de tal importância, de natureza, se não constitucional, pelo menos quase constitucional, e em ter sido possível a esta Câmara encontrar um acordo que dê de si própria a imagem de que em questões sérias e importantes para o País somos capazes de encontrar essas mesmas soluções.
E não seria necessário tecer mais quaisquer considerações sobre o sentido do nosso voto se não fora a necessidade de deixar aqui bem claro como tivemos razão quando votámos favoravelmente, na generalidade, o projecto de lei do Partido Socialista ao verificarmos que as bancadas da oposição votaram favoravelmente a esmagadora maioria das disposições que constam da proposta de lei do Governo, tirando apenas - e aqui tenho de rectificar o Sr. Deputado José Manuel Mendes- a única introdução que foi feita de afloramento do princípio do jus soli que foi a introdução da alínea c) que, conjuntamente com a alínea d) -que prevê o regime de apatridia-, ficam a ser as únicas duas hipóteses que vêm referidas nesse texto.

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Por essa razão, há a consciência sossegada da nossa bancada de que fizemos um bom serviço ao País, demos prova de uma capacidade de legislar e de encarar com total isenção e com total respeito o interesse nacional ao votarmos favoravelmente o projecto de lei do Partido Socialista na generalidade.
É esse texto geral que acabamos de votar e que tem por base, como já se referiu várias vezes nesta Câmara, a proposta de lei do Governo. Trata-se de um texto equilibrado quanto às soluções, é um texto que aceita a nova realidade que é o Portugal de agora e é, no fundo, um texto que desejamos possa ser exemplo de outras situações de igual interesse, de igual melindre, mas, ao mesmo tempo, de situações que deverão ter, em todos nós, o mesmo empenhamento, a mesma abertura para servirmos apenas e exclusivamente o interesse nacional.

Aplausos do CDS, do PSD e do PPM.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Candal.

O Sr. Carlos Candal (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Também o Partido Socialista se congratula pelo entendimento e pela cordialidade que reinaram na comissão e pela maneira serena como se procurou encontrar soluções, o que aliás vem sendo tradição nessa comissão.
Naturalmente que também nos congratulamos com uma ampla frente de acordo que se encontrou neste Plenário a propósito de uma lei que realmente faz integração constitucional. Pena é que uma lei desta dignidade não tivesse vindo a Plenário com mais tempo para debate para se poder esclarecer a opinião pública e os nossos emigrantes das razões de ser de muitas das soluções. Pena foi que a comissão não tivesse tido mais tempo paar particularizar alguns regimes, encontrar soluções de que andámos em busca e que não conseguimos sintetizar.
De todo o modo, para além de em sede de redacção ainda se poderem fazer obras de melhoria do diploma, nomeadamente até em termos de sistematização, parece que este diploma é meritório e corresponde à expectativa. Naturalmente que é um diploma de nacionalidade ou de cidadania que terá de ter o seu período de experiência face à nova condição subsequente à definição do Portugal actual.
Temos algumas reservas a pôr quanto a algum efeito de emperramento que a dupla nacionalidade possa vir a trazer para as nossas expectativas de integração na CEE. Isso não acontecerá a curto prazo dadas as dificuldades das negociações.
Temos também alguma expectativa quanto ao modo como a faculdade da dupla nacionalidade possa ser aproveitada em determinadas circunstâncias. É o problema do tal John Smith americano poder ser considerado, em determinadas circunstâncias, português de origem, embora não seja fácil que isso aconteça dadas as exigências estabelecidas na alínea b) do n.° l do artigo 1.°
Mas sobretudo o mérito deste diploma não tem a ver com o John Smith, tem a ver com o «Zé brasileiro português de Braga» ou com o «Zé venezuelano» que se viu forçado, por qualquer conveniência legítima de quem se vê em terra estranha, a granjear o seu futuro, a optar por naturalizar-se, às vezes sob formas menos legítimas de coacção.
É para esses portugueses e para seus filhos, ligados à comunidade, que foi a nossa preocupação de consagrar a possibilidade aberta da dupla nacionalidade.
O problema do jus sanguinis ficou colmatado na referida alínea c), que teria um tom nacionalista, chauvinista, porventura com uma certa nuance eventualmente rácica. Penso que assim fica infirmada essa suspeição ou essa reserva com essa alínea que, em bom momento, foi acolhida por proposta do Partido Socialista.
Veremos como se comportará na prática esta lei, sendo certo que a intenção foi boa e que, aparentemente, as soluções encontradas foram felizes.

Aplausos do PS, da ASDI e da UEDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Miranda.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): -Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro da Administração Interna: Em brevíssima declaração de voto diremos que votámos a favor de todas as disposições da futura lei da cidadania ou da nacionalidade portuguesa por dois motivos principais.
Em primeiro lugar, porque era mais que tempo de o País se dotar de uma nova lei de cidadania, mais de cinco anos após a entrada em vigor da Constituição, mais de cinco anos após a descolonização.
Em segundo lugar, porque o texto votado corresponde, no seu conjunto, a um esforço de compromisso, a um esforço de consenso em que, não apenas a respeito dos critérios de atribuição da cidadania, mas também a respeito de outras questões, se procurou estabelecer um acordo e se procurou clarificar um conjunto de soluções.
Lembrarei, por exemplo, o ter-se tomado claro que esta lei não vem, de modo algum, revogar o Decreto-Lei n.° 308/75 a respeito da conservação da nacionalidade portuguesa, publicado aquando da descolonização.
Gostaria ainda de acentuar que a votação deste texto não significa, em primeiro lugar, qualquer compromisso no sentido da constitucionalização do critério do jus sanguinis; em segundo lugar, qualquer renúncia ao termo «cidadania» e não significa, em terceiro lugar, e muito menos, qualquer assentimento quanto a uma pretensa, ou eventualmente pretensa, transposição automática dos critérios de atribuição ou de aquisição da cidadania em termos eleitorais ou de exercício de direitos políticos.
Finalmente, gostaria de salientar que, para lá do elemento jurídico-político, para lá mesmo do elemento do jus sanguinis, aquilo que define um povo é uma vontade de viver em comum, é uma petrença a uma mesma cultura, é uma vontade de continuar essa mesma cultura.
Esta lei vai ser posta à prova, esta lei será boa e eficaz se efectivamente contribuir para que a cultura portuguesa subsista, para que a convivência entre todos os portugueses, como cidadãos, se mantenha e se desenvolva no quadro da Constituição.

Aplausos da ASDI, do PS e da UEDS.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, de seguida passamos à votação final global da ratificação n.° 5/II apresentada pelo PS e relativa ao Decreto-Lei n.° 70/79, de 31 de Março, que regula a concessão de passaportes diplomáticos.
Entende o Plenário que pode ser dispensada a leitura do relatório da Comissão de Negócios Estrangeiros e Emigração?

Pausa.

Não se opondo ninguém a essa dispensa, vamos proceder à votação das alterações ao Decreto-Lei n.° 70/79.

Submetidas à votação, foram aprovadas por unanimidade (registando-se, no entanto, a ausência da UDP).

O Sr. Presidente: - Para. uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Herberto Goulart.

O Sr. Herberto Goulart (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, uma curta declaração de voto para uma rápida explicação.
O Grupo Parlamentar do MDP/CDE não faz parte da Comissão de Negócios Estrangeiros e Emigração, mas, se fizéssemos parte, em relação à proposta de aditamento de um n.° 4 ao artigo 2.°, que visava corrigir as alíneas h) e i) do n.° l desse mesmo artigo, tentando retomar a redacção que vinha do antecedente Decreto-Lei n.° 612/74, isto é, prevenir que os passaportes fossem apenas acessíveis a funcionários do Ministério dos Negócios Estrangeiros em efectividade de funções, se fizéssemos parte dessa Comissão teríamos retirado esta nossa proposta de aditamento, posto que a posição a que a Comissão chegou é, em nosso entender, bem mais válida do que a solução que havíamos apresentado.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Custódio Gingão.

O Sr. Custódio Gingão (PCP):-Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PCP votou favoravelmente a lei de alterações ao Decreto-Lei n.° 70/79. Fizemo-lo porque concordamos com as alterações propostas no sentido da clara definição das entidades que são titulares de passaporte diplomático. A saber, altos representantes dos órgãos de soberania, funcionários do serviço diplomático do Ministério dos Negócios Estrangeiros ou do quadro especializado quando em efectividade de serviço, bem como cônsules enviados quando acreditados junto do Estado receptor, como cônsules de carreira.
Em sede de votação na especialidade não podemos, contudo, dar o nosso voto favorável ao n.° 3 do artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 70/79, por discordarmos do seu conteúdo, que traduz uma exorbitância das funções do Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros com capacidade para decidir da atribuição ou manutenção de passaportes diplomáticos a cônjuges sobrevivos dos funcionários do serviço diplomático ou a estes funcionários em licença ilimitada, na disponibilidade ou aposentação.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Henrique de Moraes.

O Sr. Henrique de Moraes (CDS): -Sr. Presidente, se me permite, leio a declaração de voto no final da votação final global da ratificação n.° 22/II, já que a minha declaração de voto se refere tanto à ratificação atrás votada como à n.° 22/II.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado.
Antes de procedermos à votação final global da ratificação n.° 22/II, a Mesa informa a Câmara e todos os trabalhadores que têm estado a prestar a sua assistência durante esta nossa vigília parlamentar que decidi considerar como dispensados do serviço pelo dia de hoje todos os funcionários que foram forçados a prestar-nos o seu apoio e a trabalhar durante a noite.

Vozes do PS e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Passamos agora à votação final global da ratificação n.° 22/II, sobre o decreto-lei n.° 523/79, de 31 de Dezembro, que estabelece normas relativas à concessão e emissão de passaportes especiais, ratificação requerida pelo PS.
Ponho, portanto, à votação as alterações ao Decreto-Lei n.° 523/79.

Submetidas à votação, foram aprovadas por unanimidade (registando-se também a ausência da UDP).

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Custódio Gingão.

O Sr. Custódio Gingão (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PCP votou também a favor da ratificação n.° 22/II, relativa ao Decreto-Lei n.° 523/79, de 31 de Dezembro, que estabelece normas, relativas à concessão de passaportes especiais, com as propostas de alteração no sentido de alargar aos membros das assembleias regionais a concessão de passaportes especiais, no que respeita à sua requisição ao Ministro da Administração Interna, bem como no que respeita à sua validade, em tempo.
Desejamos sublinhar que quer nesta votação, quer na votação da ratificação do decreto-lei que regula a concessão de passaportes diplomáticos, votámos coerentemente com o que afirmámos aquando da discussão deste problema, a propósito da nossa discordância com a atribuição de passaportes diplomáticos aos deputados da Assembleia da República ou das regiões autónomas como o Decreto-Lei n.° 70/79 estabelecia.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Henrique de Moraes.

O Sr. Henrique de Moraes (CDS): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: O CDS votou favoravelmente a ratificação n.° 5/II, relativa ao Decreto-Lei n.° 70/79, de 31 de Março, que regula a concessão de passaportes diplomáticos.
Decidiu a comissão rejeitar a proposta do Grupo Parlamentar do MDP/CDE, bem como o ponto 3 do artigo 2.° da proposta do PSD.
Ambas, resumidamente, possibilitavam aos diplomatas reformados o uso do passaporte diplomático, através de decisão do secretário-geral do Ministério.

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É uso em alguns países isto assim suceder e poderá a actual decisão trazer algum desprestígio para a nossa diplomacia. Apesar desta reserva já expressa aquando da votação na generalidade, votámos hoje em conformidade com o relatório apresentado.
A prática decorrente desta aprovação demonstrará se ela vai ou não, no futuro, necessitar de alguma correcção para seu melhoramento. Se tal constatarmos, estamos prontos para actuar consequentemente.
Quanto à ratificação n.° 22/II, relativa à concessão de pasaportes especiais, a nossa aprovação é sem reservas.

O Sr. Presidente:- Não havendo mais inscrições para declarações de voto, considero encerrado este ponto da ordem do dia.
Srs. Deputados, há uma: votação final global, que não consta da agenda de hoje, do projecto de lei n.° 96/II, apresentado pelo PSD, sobre amnistia aos crimes previstos pelo Decreto-Lei n.° 274/75, de 4 de Junho. Parece que era consenso dos grupos parlamentares votar este projecto de lei em votação final global, embora o mesmo não conste da agenda de hoje.

O Sr. Sousa Marques (PCP):-Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Sousa Marques (PCP): -Sr. Presidente, há de facto consenso em se votar o projecto de lei. No entanto, como há outros diplomas agendados, que naturalmente terão, de ser votados, solicitava que fosse dado conhecimento a, todos os grupos parlamentares do texto final a que se chegou, depois de hoje mesmo se ter alterado na especialidade o texto inicial do projecto de lei.
Nós, pelo menos, ainda não recebemos o texto final e sem ele não estamos em condições de o votar,

O Sr. Presidente:-Sr. Deputado Sousa Marques, o texto final do projecto de lei está neste momento a ser distribuído a todos os grupos parlamentares.
Para que haja materialmente tempo para o seu exame, continuamos com a ordem do dia e mais adiante consideraremos o projecto de lei.
Passamos então à discussão da proposta de lei n.° 24/II e do projecto de lei n.° 194/II, apresentado pelo PS, sobre delimitação e coordenação das actuações da administração regional e local em matéria de investimentos.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP):-Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): -Sr. Presidente, a proposta de lei n.° 24/II, que V. Exa. referiu, que está agendada porque assim se estabeleceu e que naturalmente será votada, é um pouco árdua. Tenho a impressão de que com o nascer do Sol todos espertaremos um pouco. Propunha nesse caso que votássemos os dois últimos diplomas agendados, ou seja, o projecto de lei n.º 7/II e os projectos de lei n.º 48/II e 143/II é que só depois do pequeno-almoço entrássemos afoitamente na discussão dessa proposta de lei, que é extremamente árdua.
Pelo menos até agora não houve acordo sobre esta matéria. Por isso insisto em que se votem já os dois últimos pontos da ordem do dia, para ficarmos já despachados e só depois do pequeno-almoço - e o Sr. Secretário de Estado que se encontra presente paar discutir essa matéria não se importará decerto de nos acompanhar- é que discutíamos essa matéria.

Sr. Silva Marques (PSD):- Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente:-Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, quero apenas dizer que, nas circunstâncias do nosso trabalho, não tivemos possibilidade de ao menos darmos satisfação à pretensão que nos foi apresentada em conversas com os diferentes, grupos parlamentares. Quanto a nós, não pudemos dar satisfação a essa pretensão, porque isso prejudicaria a organização do nosso trabalho.
Aliás este argumento outras vezes tem sido invocado pela bancada do Partido Comunista, e a justo título. Nas circunstâncias do nosso trabalho, temos de proceder à discussão e votação da proposta de lei n.° 24/II e do projecto de lei n.° 194/II, sob pena de prejudicarmos á nossa própria organização de trabalho.

O Sr. Carlos Brito -(PCP)- Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente:-Faça favor, Sr. Deputado.?

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, reforçando um pouco aquilo que já foi dito pelo meu camarada Veiga de Oliveira, gostaria de alertar s Câmara, e antes de tudo o Sr. Presidente, para a circunstância de irmos fazer uma votação na especialidade que não está minimamente preparada.
Há dois diplomas aprovados na generalidade a proposta de lei n.° 24/II e o projecto de lei n.° 194/II -, e, como em comissão não foi possível chegarmos a nenhum consenso, vamos fazer uma votação na especialidade, considerando, além dos artigos constantes dos diplomas -13 artigos num diploma e 11 noutro-, mais 31 propostas de alteração. Será extremamente árduo. Creio até que não sairemos daqui senão passadas muitas horas, porque temos muitas discordâncias em relação a muitos dos artigos constantes da proposta de lei.
Creio que com proveito poderíamos despachar os dois pontos seguintes da ordem do dia e irmos pensando na maneira de se fazer a discussão e votação na especialidade destes diplomas.

O Sr. José Niza (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Niza (PS): -Sr. Presidente, são 6 horas da manhã. Os argumentos que estão a ser levan-

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tados são justos e o perigo de se cometerem erros é bastante. Penso que era possível uma outra solução: estes diplomas poderiam ser discutidos e votados, de acordo com uma futura deliberação da Comissão Permanente, ou na reunião plenária do próximo dia 7 ou eventualmente num outro dia que a Comissão Permanente escolhesse. Como há limites para tudo, pensamos que seria aceitável esta minha proposta, porque agora podemos entrar na zona do erro, que será prejudicial para todos.

O Sr. Silva Marques (PSD):-Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Silva Marques (PSD):-Sn Presidente, se o problema é o da falta de preparação, penso que não há motivo para não abordarmos imediatamente esta matéria. É que os assuntos foram repetida e profundamente discutidos. O que aconteceu foi que não se chegou a um texto, se se quiser, comum, o que resultaria numa sistematização. O que acontece é que os textos foram discutidos. Se dentro deste entendimento da divergência política que se verificou, houver um esforça...

O Sr. Carlos Brito (PCP): Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: -Faça favor.

O Sr. Carlos Brito (PCP):-Sr. Deputado, quando me referi à preparação foi no sentido de não ter havido um acordo, uma combinação ou um consenso para a votação na especialidade.
Acabámos, como se viu, de fazer uma votação final global muito rápida, porque havia todo um trabalho preparado.
Tenho experiência - muitos dos deputados que aqui estão também a têm - de se fazer uma votação na especialidade que não está preparada, relativamente à qual não houve nenhum acordo. Isso dá para muitas horas. Há a apresentação das propostas de alteração, há intervenções, há esclarecimentos, há declarações de voto. Isso dá, como disse, para muitas horas.

O Orador: - Respondendo àquilo que referiu -e ainda bem que o disse -, devo dizer-lhe que, se não abordarmos agora esta matéria, mas o dia 7 ou noutro dia, estaremos nessa altura na mesma situação em que agora nos encontramos.
Não escamoteemos as questões, apeguemo-nos ao conteúdo. Não houve possibilidade material de consenso por se terem verificado impossibilidades políticas. Creio que é esta a questão. Sendo assim, quer hoje quer daqui a um mês ou dois verificar-se-á exactamente a mesma situação.
Em segundo lugar, tratando-se de uma matéria que o País inteiro, e mais especificamente o País autárquico, espera, é nossa obrigação dar resposta a essa espera - nós, eventualmente, aprovando um mau texto, os senhores, eventualmente, condenando um mau texto. Isto em termos políticos, mas ambos, maioria e oposição, dando resposta àquilo que o País espera.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estamos a perder tempo a discutir o que vamos fazer e a gastar o tempo que devia ser utilizado a fazer as coisas. Há uma ordem do dia: ou a mesma é alterada, por consenso unânime dos partidos, ou então ela terá de ser respeitada. Creio que esta é a única posição que se pode seguir.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): -Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP):-Sr. Presidente, aquilo que vou dizer é mais directamente para o Sr. Deputado Silva Marques.
Sr. Deputado, V. Exa. acabou de dizer que no próximo dia 7, por exemplo, estaríamos nas mesmas circunstâncias. Digo-lhe, Sr. Deputado, que não estaremos, por várias razões: em primeiro lugar, porque não estaremos a começar a discussão e votação dos dois diplomas às 6 horas da manhã. Espero bem que não! Estaremos - penso - a começar lá para as 17 horas e 30 minutos. Isto já é, desde logo, uma grande diferença. Em segundo lugar, o facto de não haver acordo político não implica que se não faça aquilo que se pode fazer, eventualmente, até ao dia 7, isto é, ordenar todas as propostas de alteração e os dois textos e estabelecer uma sequência na votação.
É Isto o que significa preparar a discussão dos diplomas, o que nada tem a ver com o estarmos ou não de acordo em relação aos diplomas.
Se V. Exa., Sr. Deputado, tiver a certeza de que ninguém quer evitar a votação - o que estamos sincera e honestamente a querer mostrar-lhe é que se começarmos agora a discussão nem às 10 horas ou 11 horas da manhã teremos acabado- penso que então compreenderá a situação. E, Sr. Deputado, já não sei o que sairá a essa hora. Até pode suceder que V. Exa. se engane. Bem sei que é difícil enganarem-se, porque bem sabem que votarão a favor de uma só coisa: a proposta de lei do Governo. Portanto, VV. Exa. não se enganam.
No entanto já assisti nesta Assembleia a várias dificuldades nesse género e dir-lhe-ei que às vezes saem elefantes quando se está a pretender que saia um leão. Já uma vez aqui saiu um elefante sem ninguém dar por isso.
Pedia, Sr. Deputado, que considerasse, sinceramente, que a nossa proposta é justa e que não pretendemos adiar sine die a votação. Pretendemos apenas que ela se faça com um mínimo de condições, eventualmente na reunião plenária do próximo dia 7. E mais: suponho que neste momento há todas as condições para que a discussão e votação sejam consideradas liquidamente constitucionais.
Por todas as considerações que fiz, e também pela última, pedia insistentemente que esta discussão fosse transferida, eventualmente, para a reunião plenária do próximo dia 7, já que a mesma terá mesmo de se efectuar.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Deputado Veiga de Oliveira, em primeiro lugar, quanto às condições

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constitucionais, creio que se refere aos pareceres das assembleias regionais. Se é a isso que se refere, encontram-se na Mesa.

O Sr. José Niza (PS) - Não é isso.

O Orador: - Em segundo lugar, V. Exa. dirige-se a mim, e a justo título, na medida em que tenho responsabilidade na condução do debate. Mas devo dizer-lhe que nestas circunstâncias não farei aqui qualquer acordo no sentido que propõem. No entanto proporia que se abrisse a possibilidade de eu poder consultar o meu grupo parlamentar, porque não assumiria jamais essa responsabilidade. Sou um membro do meu grupo parlamentar, não tenho a menor dúvida em regressar aqui ou com a mesma posição ou com outra.

Vozes do PSD:-Muito bem!

O Orador: - Aqui não sou eu quem decide pelo meu grupo parlamentar, sou quem aplica as decisões que o meu grupo parlamentar toma.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Neste sentido, porque não desejo fazer o papel excessivo de estar a criar um impasse por razões de ordem individual, pediria uma interrupção dos trabalhos por cinco minutos para eu consultar o meu grupo parlamentar.

Vozes do PS e do PCP: - Muito bem!

O Sr. Sousa Gomes (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Sousa Gomes (PS):-Sr. Presidente, Sr.ª Deputados: Em nome da minha bancada, queria também, sem ir neste momento, de forma alguma, contra o pedido da bancada do PSD de se fazer um pequeno intervalo para uma decisão, chamar a atenção do Sr. Presidente e da Câmara para a circunstância de não nos parecer que a esta hora da manhã se possa iniciar o debate de um diploma que é talvez o mais importante ligado às autarquias locais votado nesta sessão legislativa. É um diploma não só importante, como, apesar de tudo, complexo. Existem dois diplomas - uma proposta de lei do Governo e um projecto de lei do PS- aprovados na generalidade, sobre que temos de nos debruçar artigo por artigo. A verdade é que sobrevieram dificuldades que impediram um consenso na comissão para se chegar a um texto comum. Essas dificuldades não poderão ser escamoteadas aqui no debate na especialidade e a minha bancada terá, justamente pela importância que este diploma tem, de fazer alguma explicação política pormenorizada das principais dificuldades que nos levam a não poder dar o nosso acordo à proposta de lei do Governo.
Nesse sentido, faço um apelo para que seja possível um consenso no sentido de, na reunião plenária do próximo dia 7 ou noutra data em que se venha a acordar, se chegar aqui com um texto minimamente ordenado, com as divergências perfeitamente estabelecidas e com uma ordem de votação.
Sejamos realistas: penso que é desprestigiante para esta Câmara abordar a esta hora da manhã, numa maratona sem sentido, um debate desta importância e neste contexto.

Vozes do PS: -Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Sampaio.

O Sr. Jorge Sampaio (PS): - Sr. Presidente, depois das palavras do Sr. Deputado Sousa Gomes, prescindo.

O Sr. Presidente: -Srs. Deputados, a Mesa desejava informar V. Exas. de que não é sem certa apreensão que se vê confrontada com a situação que resulta do ofício junto ao processo legislativo, subscrito pelo Sr. Presidente da Comissão de Administração Interna e Poder Local, onde se reconhece a impossibilidade que houve, até ao momento, de sistematizar os dois textos. Embora tenhamos na Mesa ordenadas numericamente todas as 32 propostas de modificação - e uso a expressão genericamente -, isso é em relação às propostas de alteração à um dos textos, mas a sistematização das disposições dos diplomas que está por fazer. Penso que isso poderia, eventualmente, alongar os trabalhos pela necessidade que a Mesa teria de ir sistematizando a situação.
Em todo o caso, parece-me que deve ser entendido como um requerimento feito pelo Sr. Deputado Silva Marques um pedido de interrupção dos trabalhos por 5 minutos par aconsultar o seu grupo parlamentar.

O Sr. Moura Guedes (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Moura Guedes (PSD): - Sr. Presidente, se V. Exa. me permite, penso que talvez não valha a pena fazermos uma interrupção. Creio que interpretar o pensamento da minha bancada ao dizer que as razões que vi aqui invocadas me parecem francamente atendíveis. Penso que participamos do desejo das outras bancadas desta Assembleia de que os debates decorram com toda a ponderação, equilíbrio e profundidade e possam ir ao fundo das questões e não passar ò vol d'oiseau sobre elas.
Penso que a estas horas seria extremamente difícil atendendo à complexidade da matéria que ainda não está sistematizada -o que daria um trabalho dobrado - fazermos esse trabalho com a devida ponderação. Atendendo a este facto e não obstante entendermos que se trata de uma matéria de grande urgência -não em termos até de interesse do Governo, mas sobretudo em termos de interesse das autarquias locais, que reivindicam a aprovação deste diploma e necessitam urgentemente dele -, não obstante tudo isto, daríamos o nosso acordo a que esta matéria fosse agendada para a reunião plenária do próximo dia 7.

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O Sr. Presidente: - Deve então entender-se que V. Exa. requer que a convocação da Comissão Permanente, a fim de apreciar, salvo erro, a proposta de lei n.° 55/II, inclua também na agenda da sessão a convocar a discussão e votação da proposta de lei n.° 24/II e do projecto de lei n.° 194/II.
Em todo o caso, e por mera cautela, pediria a V. Exa., Sr. Deputado Moura Guedes, que formulasse, por escrito, o aditamento ao requerimento que ontem me foi entregue para convocar a Comissão Permanente.

O Sr. Abreu Lima (CDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Abreu Lima (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Suponho que a matéria que está em causa, pela sua extensão, pela sua diversidade, pêlos problemas que implica e envolve de responsabilidade e interesse para todos os municípios deste país, não é consentânea com o cansaço que todos temos, com a serenidade que devemos ter e sobretudo com a dificuldade que a matéria encerra, na medida em que há dois textos paralelos difíceis de seriar e de coordenar, sendo ainda difícil estabelecer qualquer harmonia entre eles.
O CDS está de acordo em que seja adiada para a reunião plenária do próximo dia 7 a discussão e votação deste assunto e bom seria que houvesse possibilidade de, numa subcomissão, haver qualquer entendimento ou facilidade no sentido de se poder conjugar aquilo que os textos têm de comum, os pontos que são solucionados da mesma maneira, porque, tirando - penso - três ou quatro pontos, não há grandes divergências entre o projecto de lei do PS e a proposta de lei do Governo.
Apenas chamo a atenção para o facto de não se saber a que horas a reunião plenária do próximo dia 7 acabará. Parece-me que não será matéria muito pacífica a agendada para esse dia.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Abreu Lima, se me permite, farei uma sugestão: devolveríamos à Comissão Permanente o critério a seguir para esgotar a ordem do dia que, presumivelmente, fica desde hoje apontada: discussão e votação da proposta de lei n.° 55/II e discussão conjunta, e respectiva votação, da proposta de lei n.° 24/II e do projecto de lei n.° 194/II.
Assim, a Comissão Permanente, tendo em consideração as necessidades de tempo, apreciaria o assunto e fixaria ou uma sessão até se esgotar toda o matéria agendada ou, inclusivamente, a realização de duas sessões consecutivas. Parece-me que isso competirá à Comissão Permanente.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Brito (PCP): -Sr. Presidente, muito rapidamente, gostaria, por um lado, de me regozijar com o acordo que se pôde estabelecer relativamente a esta matéria, por outro, esclarecer que quando levantámos a questão não era para nos pouparmos ao trabalho - na altura até admitíamos trabalhar-, mas antes procurar melhorar as condições em que esse trabalho se ia realizar. Quando levantámos a questão era para que pudéssemos trabalhar melhor em proveito das autarquias e do poder local.

Vozes do PCP:-Muito bem!

O Orador: - Com o mesmo sentido & objectivo, sugeria a V. Exa., Sr. Presidente, que a Comissão de Administração Interna e Poder Local fizesse uma reunião antes do próximo dia 7 para tentar ainda assim, se possível, estabelecer algum consenso para a discussão e votação na especialidade, ou, pelo menos, ordenar melhor e estabelecer um guião para a votação na especialidade, o que torna muito mais fácil o trabalho.

O Sr. Presidente:-Sr. Deputado, o que acaba de dizer parece-me absolutamente razoável, embora a competência para a convocação das comissões pertença aos respectivos presidentes. Sugeria assim a V. Ex.ª, Sr. Presidente da Comissão de Administração Interna e Poder Local, que fizesse essa convocação e a tentativa de um melhor ordenamento e sistematização das matérias a discutir e votar.
Está, portanto, encerrado este ponto da ordem do dia.
Ultrapassado que está o ponto anterior da ordem de trabalhos, passamos à votação final global do projecto de lei n.° 7/II, sobre a igualdade dos cônjuges, apresentado pelo PCP.
Ponho à votação o texto final, elaborado pela Comissão de Direitos, Liberdade e Garantias.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade (registando-se a ausência da UDP).

O Sr. Presidente: - Para declarações de voto estão inscritos os Srs. Deputados Zita Seabra, Isilda Barata, Montalvão Machado, Jorge Sampaio e António Vitorino.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, é apenas para dizer que o Grupo Parlamentar do PCP se congratula com a aprovação deste projecto de lei e com o facto de na Comissão especializada que votou na especialidade o projecto de lei ter sido ele melhorado e precisado e alargado o seu âmbito no sentido positivo.
Congratulamo-nos por isso e pensamos que se deu um passo positivo no sentido da defesa da mulher porque é isso que está particularmente em causa -, no caso da rescisão do arrendamento. Daí o nosso voto a favor e a nossa congratulação, especialmente - repito- pelo facto de o projecto de lei ter sido aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isilda Barata.

A Sr.ª Isilda Barata (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O CDS votou a favor do projecto de lei n.° 7/II, o que já se tinha ;verificado aquando

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da discussão na generalidade, no sentido de darmos o nosso contributo para, a sua melhoria, felizmente que do projecto de lei original, após o exame em Comissão, só se aproveitou a epígrafe.
Na realidade, a Sr.ª Deputada Zita Seabra, na sua intervenção na discussão na generalidade, limitou-se a dizer que o projecto de lei era para a defesa dos direitos da mulher. Mais uma vez o PCP mostrou o seu sectarismo. Fala sempre nos direitos da criança, nos direitos da mulher, mas raras vezes fala nos direitos da, família.
Os direitos da família devem ter sempre prioridade para que se construa uma sociedade, mais equilibrada direitos da família esses que passam por salários condignos, higiene, saúde educação e habitação.
Também, neste domínio se, passou a falar mais em infantários e lares da terceira idade necessários por certo -, deixando de ,se lutar mais pela construção de habitações para albergar as três gerações.
Vai-se criando a mentalidade de crianças no infantário, pais no trabalho e avós nos lares da terceira idade. Uma sociedade completamente destruída, onde os efeitos já começara ,a ter as suas repercussões.
Isto é tudo sem demagogia, porque sou mulher e porque sou membro de uma família. Por isso, mais estranho que a Sr.ª Deputada tenha dado como exemplo da discriminação da mulher a frase de uma senhora permita-me esta correcção, porque eu sou pela primazia da mulher e entendo-a como uma senhora - que não ia ao sindicato porque o marido não deixava. Eu estava presente quando a tal senhora afirmou isso e agora vejo o grande abismo que nos separa, Sr.ª Deputada.

Risos.

A referida senhora, quando, pronunciou aquela frase, demonstrou que a harmonia familiar estava acima do sindicalismo. Mas para o PCP o sindicato está acima disso.

Risos.

Sr.ª Deputada, o direito à família também passa pela sua intimidade, e até lhe dou um conselho: não se meta onde não é chamada. É de boa ética! Terminei, Sr. Presidente.

Aplausos do CDS. Risos do PS, do PCP, da ASDI da UEDS e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, pelo amor de Deus, tenham a bondade de permitir que a ,Sra. Deputada continue a sua declaração de voto até ao fim.

Vozes: - Já terminou, Sr. Presidente.

Risos.

O Sr. Presidente: - Ah, já acabou?!

Risos.

Srs. Deputados, é que a Mesa não pode prever quando é que as declarações de voto acabam, por isso, a minha intervenção era perfeitamente oportuna, pois mais uma vez na Sala não estavam criadas as condições necessárias para que a declaração de voto pudesse ser produzida da melhor forma.
Tem a palavra o Sr. Deputado Montalvão Machado.

O Sr. Montalvão Machado (PSD):-Sr. Presidente, Srs. Deputados: A preocupação que nos merecem todos os problemas ligados à família levou o meu grupo parlamentar a votar favoravelmente o diploma em apreço.
Efectivamente, não há dúvida de que a protecção da casa-morada de família é um dos projectos que nos preocupam. Daí que compreendamos perfeitamente que as acções, nomeadamente as acções de despejo, destinadas a obter a desocupação de uma casa onde habita uma família devam ser necessariamente propostas contra marido e mulher. Isso não só para protecção da mulher, mas também para protecção do homem, porque, se há muitos arrendamentos que estão em nome do homem, muitos outros há que estão em nome da mulher, e tanto ele como ela são capazes de uma actuação contra o respectivo cônjuge menos correcta e menos séria.
Daí que compreendamos que esta lei de ordem processual, chamemos-lhe assim. E aplicá-la ás acções pendentes ainda não transitadas em julgado parece-me que é também uma medida razoável, já que isso representa um complemento do princípio que acabei de defender.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: -Srs. Deputados, a Comissão de Assuntos Constitucionais acaba de informar a Mesa de que a conclusão dos trabalhos sobre o Estatuto dos Deputados requer ainda o tempo de uma hora. Talvez não seja necessária exactamente uma hora, mas, por cautela,, entenderam que deveria ser esse o tempo de que, prudentemente deviam informar a Mesa.
Mas, como ainda temos votações finais globais a fazer as respectivas declarações de voto, continuaremos o nosso trabalho e aguardaremos pacientemente a conclusão dos trabalhos da Comissão.
Também para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Sampaio.

O Sr. Jorge Sampaio (PS): -. Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Socialista não fazia nenhuma tenção de produzir uma declaração de voto sobre uma matéria de interesse, mas efectivamente simples. Todavia, como já depois da discussão na generalidade se enxerta sempre nesta questão a questão da família, mal pareceria que nós todos não fizéssemos uma profissão de fé na família, que, mesmo dado o adiantado da hora, é sempre justificada.
E, como este Plenário de hoje deve ser o plenário mais notável do Mundo, porque, desde a delimitação dos investimentos à lei da nacionalidade, e por .aí fora, votou hoje matérias tão complexas, mal pareceria que sobre uma matéria tão simples não fizéssemos também a nossa declaração de voto, a nossa profissão de fé na família, evidentemente com algumas nuances. Cada um tem a família que merece ou a família da sua concepção,...

Risos.

... mas queríamos apenas dizer que nos congratulamos por ter sido possível um consenso simples, reparando uma injustiça que atinge prima fade as mulheres, porque não nos esqueçamos de que até 1976,

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pelo menos, o marido era o administrador dos bens do casal. Mas os maridos também estão satisfeitos, tal como certamente os deputados, porque também estão contemplados neste diploma.
Risos.

A Câmara está de parabéns, e não era pelo facto de a hora ser tão adiantada que eu deixaria, em nome do Partido Socialista de fazer esta declaração de voto.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: -O Sr. Deputado Jorge Sampaio fez uma declaração de voto que foi quase uma declaração de amor.

Risos.

O Sr. Jorge Sampaio (PS): -Sr. Presidente, se me da licença, as horas vão tão adiantadas que tudo é possível.

Risos e aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Tem também a palavra, para uma declaração de amor, ...

Risos.

.., perdão, para uma declaração de voto, o Sr. Deputado António Vitorino.

O Sr. António Vitorino (UEDS): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não sei como resistir ao convite tão gentil que o Sr. Presidente acabou de me fazer.
Risos.

O Sr. Presidente; - Honi soit qui mal y pense, Sr. Deputado!
Risos.

O Orador: - Seja como for, apesar do adiantado da hora, também estou de acordo consigo, Sr. Presidente. Ainda sei medir as distâncias.

Risos.

Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados: Não era intenção originária do Grupo Parlamentar da UEDS fazer uma declaração de voto sobre o projecto de lei n.° 7/II, relativo à igualdade dos cônjuges face à lei. Mas, atendendo a que foram aqui proferidas afirmações desamorosas sobre o papel da mulher e da família na sociedade portuguesa, talvez a ninguém mais do que a mim próprio, que tenho família, naturalmente, mas que não tenho mulher, porque sou solteiro,...

Risos.

...me assista uma especial autoridade moral para manifestar o apoio ao projecto de lei que aqui está em causa, na aspiração de que ele permitirá que, quando eu constituir família, possa manter com a minha mulher, a relação que a
Constituição da República e que este projecto ora contemplam.

Risos e aplausos gerais.

O Sr. Presidente:-Srs. Deputados, não há mais inscrições para declarações de voto.

O Sr. Silva Marques (PSD):-Sr. Presidente, se me permite, por essa razão, «u desejaria interpelar a Mesa sobre uma questão relativa à agenda dos nossos trabalhos.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Silva Marques (PSD):-Sr. Presidente, é evidente que, embora tenha requerido a palavra sob a forma de interpelação à Mesa, me vou dirigir aos outros grupos parlamentares.

Sr. Presidente, está agendada no ponto seguinte da ordem de trabalhos uma matéria que tem, no sentido negativo, um parecer, ou pelo menos uma comunicação, das assembleias regionais de que carece para que a sua aprovação preencha todos os requisitos constitucionais..
Uma das assembleias regionais - a Assembleia Regional dos Açores- comunicou a esta Assembleia que não estava em condições de emitir o seu parecer antes dos fins de Julho. Por outro lado, a Assembleia Regional da Madeira não nos comunicou o seu parecer, transmitiu apenas uma indicação de voto, que, salvo grande esforço de interpretação, não pode ser tomada como um parecer.
Julgo, pois, que estamos perante a ausência de dois requisitos para que se possa abordar a matéria em termos de preenchimento dos requisitos constitucionais. Nesse sentido, sugiro que essa matéria seja agendada para outra oportunidade.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Silva Graça, para se pronunciar, ao que suponho, sobre a proposta agora feita pelo Sr. Deputado Silva Marques.

O Sr. Silva Graça (PCP):-Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estou surpreendido com a proposta feita, porque: primeiro, há um texto alternativo consensual de toda a Comissão; segundo, foram consultadas as regiões autónomas, como, aliás, manda a Constituição; terceiro, foram cumpridos os prazos; quarto, trata-se de um assunto da maior importância para a descentralização administrativa, que o Sr. Deputado há bem poucos minutos defendeu tão acerrimamente.
Face ao consenso, não vejo que dificuldade haja em votar, até sem ser artigo por artigo, mas globalmente, a proposta a que se chegou por consenso na Comissão de Administração Interna e Poder Local.

O Sr. Presidente: - Para se pronunciar sobre o mesmo assunto, tem a palavra o Sr. Deputado Abreu Lima.

O Sr. Abreu Lima (CDS):-Sr. Presidente, nós não possuímos os textos das respostas quer da Assembleia Regional dos Açores quer da Assembleia Regional da Madeira, mas, pelo que me foi transmitido oralmente, o telex vindo dos Açores diz que os órgãos regionais não se podem pronunciar porque não dispuseram de tempo suficiente para convocar a Assembleia Regional e, assim, emitir o parecer pedido.

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É evidente que este texto é importante, é evidente que a matéria que está agendada para ser tratada é muito relevante em relação à criação de freguesias, fundamentalmente essas, mas penso que será inconstitucional entrarmos no tratamento desta matéria sem que tenhamos uma resposta, no sentido positivo ou negativo, da Assembleia Regional dos Açores, para não voltarmos a incorrer na inconstitucionalidade, que levou já este texto a ser anulado pelo Conselho da Revolução.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Deputado Silva Graça, eu não corro atrás da história, é a história que corre atrás de mim, e eu digo mim por uma questão de modéstia - penso que a história corre atrás de todos nós. É a história que nos faz andar para a frente, mais do que nós fazemos andar a história. Mas isto foi um desabafo de teoria geral.
Devo dizer-lhe, Sr. Deputado, que também penso que esta matéria é urgente, tendo em vista a descentralização.
Porém, se os Srs. Deputados do PCP são tão pressurosos em invocar argumentos que têm a sua razoabilidade dentro do contexto de argumentos e contra-argumentos que utilizamos, dentro do condicionalismo que creio que a todos nós abrange - julgo que não há nenhum deputado descondicionado, creio que, para alguma coerência -e desculpe-me a ousadia- da vossa parte, teriam de ter também em consideração os argumentos que eu invoquei e que são reais.
Efectivamente, foi-nos entregue um telex da Assembleia Regional dos Açores, que diz que só nos fins de Julho poderá dar o parecer que lhe foi pedido, e outro telex da Assembleia Regional da Madeira, que diz precisamente o seguinte:
[...] resolução essa que obteve a seguinte votação:

Ponto l - 3 abstenções do Partido Socialista;
Ponto 2 - aprovado por unanimidade;
Ponto 3 - votos contra: 3 do PS, 1 da UDP e 1 do PCP.

Dito isto, Sr. Deputado, se me perguntar qual foi o parecer, eu dir-lhe-ei que, efectivamente, não sei qual foi. É porque o que eu tenho é a indicação dos votos e, por isso, não posso, em rigor, dizer que o parecer foi este ou aquele. Essa indicação dos votos não me permite dizer qual foi a conclusão a que chegou a Assembleia Regional.

Mas, repare, Sr. Deputado, que eu estou a fazer uma observação. Eu não quero estar a extrapolar, mas, quanto ao preenchimento dos requisitos constitucionais, a situação é esta.
Portanto, julgo que, tendo sobretudo em consideração o debate que há pouco se produziu -e eu reconheço que não é exactamente o mesmo-, seria coerência da vossa parte -é um pouco abusivo da minha parte estar a fazer apelos à coerência, mas é assim - que sobre esta matéria também se passe o seu agenciamento para outra altura.

O Sr. Presidente: - Tem a .palavra o Sr. Deputado Veiga de Oliveira.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ponhamos primeiro alguns pontos nos «is».
Em primeiro lugar, nós temos naturalmente consciência - e já o afirmámos mais de uma vez- de que, tratando-se de uma lei sem nenhuma especialidade em relação às regiões autónomas, a Assembleia da República não carecia sequer de ouvir as regiões autónomas. Mas decidiu a Comissão ouvi-las, e nós achamos bem o entendimento, embora entendemos que, neste caso, a audição era dispensável.
Depois -e aqui houve um lapso da parte do Sr. Deputado Abreu Lima-, esta lei nunca foi sequer ao Conselho da Revolução; portanto, esse argumento não se põe.
Além disso, quanto aos pareceres que vieram, efectivamente um deles sofre de ambiguidade e outro diz que não tiveram tempo para dar o parecer. Mas, já que o pedimos, é de manter o pedido.
Finalmente, embora este projecto de lei também seja urgente em relação ao poder local, há situações que são urgentes e outras que não são, mas há algumas que são mesmo muito urgentes, nomeadamente em relação a certas situações de freguesias que carecem de nova reestruturação e de serem criadas algumas que nem existem - estou-me até a lembrar de que aqui bem perto de Lisboa existe um dormitório, mas hoje já com vida própria, que tem uns milhares de habitantes, mas que nem sequer freguesia é. Isto para lhe dizer que há situações que, de facto, são urgentes, mas que já o eram há um ou dois anos. Todavia, nós não pensamos que, neste caso, e uma vez que se enveredou por este caminho de consultar as regiões autónomas, não seja possível esperar mais uns dias para votar esta lei com todos, perdoem-me a expressão, os «esses e erres».
Nós pensamos que é urgente, mas não nos oporemos a que a votação seja adiada. Pensamos é que entretanto deve ser feito tudo o que é necessário fazer na Comissão para que se possa proceder à votação ainda durante esta sessão legislativa.
Outra questão que queremos pôr é esta: é que não há comparação, apesar de tudo, entre este texto que mereceu o consenso da Comissão ...

O Sr. Silva Marques (PSD): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador:.-Faça favor.

O Sr. Silva Marques (PSD): - A situação material é a mesma, .Sr. Deputado, porque a situação em que uma comissão chega a um texto comum e aquela em que não chega a texto nenhum, em termos materiais, é a mesma.

O Orador: - Eu percebo a nuance, Sr. Deputado, mas, do ponto de vista do trabalho da Assembleia, é uma situação totalmente diferente, porque poderíamos votar de uma só vez todos os artigos.
Portanto, neste caso, a situação é totalmente diferente, embora - repito - perceba a sua nuance. Mas, mesmo assim, nós não nos oporemos a que seja atendido ainda o prazo necessário para obtermos

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a resposta da Assembleia Regional dos Açores. Pedimos é à maioria que providencie para que esta matéria seja ainda votada durante esta sessão legislativa.

O Sr. Presidente: - Parece, pois, que está estabelecido o consenso sobre a retirada deste ponto da ordem do dia de hoje.
Entretanto, insistir-se-á junto das regiões autónomas para a remessa breve dos pareceres, visto que a Constituição exige que elas sejam ouvidas. Porém, também se põe o problema de saber se as regiões autónomas não terão de agir com a brevidade razoável, em termos de também não entravarem a marcha dos nossos trabalhos.
A Mesa aproveita para anunciar a entrada na Mesa do projecto de lei n.° 251/11 (criação do Museu do Trabalho do Porto), apresentado pelo PCP.
Passamos agora à votação final global do projecto de lei n.° 96/II, sobre a amnistia dos crimes previstos pelo Decreto-Lei n.° 274/75, de 4 de Junho.
A Câmara prescinde da leitura do relatório?

Pausa.

Entendo o silêncio como sendo de concordância.

O Sr. Carlos Lage (PS):- Sr. Presidente, nós pedimos apenas dois ou três minutos, nem é necessário que os Srs. Deputados saiam da Sala, para reflectirmos por um momento.

O Sr. Presidente: - O seu pedido é perfeitamente regimental, Sr. Deputado. E, como se trata de uma votação final global, que, creio, é a última que temos para fazer, para além da votação dos dois textos que a Comissão de Assuntos Constitucionais está a apreciar, sugiro que se faça uma pequena interrupção até às 7 horas e 15 minutos. Assim, VV. Exa. terão tempo de considerar o problema da posição a tomar nesta votação e, quando chegarem os dois textos que falta votar, faremos também a votação deste diploma, que não ocupa mais de um minuto.
Assim sendo, suspendo a sessão até às 7 horas e 15 minutos.
Eram 6 horas e 50 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 7 horas e 50 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, visto parecer já haver um texto em condições de ser votado, vamos então passar à votação final global do projecto de lei n.° 96/II, relativo à amnistia dos crimes previstos pelo Decreto-Lei n.° 274/75.
Penso que já foi dispensada a leitura do relatório, mas, em todo o caso, volto a perguntar se algum de VV. Exa. exige a leitura ou se o Plenário dispensa que ela se faça.
Pausa.

Entendo o silêncio da Câmara como dispensa da leitura do relatório. Vamos, portanto, votar o texto final.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do MDP/CDE e da UDP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Marques, para uma declaração de voto.

O Sr. Sousa Marques (PCP):-Sr. Presidente, a minha curta declaração de voto tem a intenção de dizer que em sede de discussão e votação na especialidade foram introduzidas algumas benfeitorias a este documento, nomeadamente no que diz respeito à necessidade de se fazer prova de qualidade de desalojado das ex-colónias portuguesas ou de emigrante ou no caso de se limitar o número de veículos que podem ser legalizados e amnistiados por este projecto de lei, acabado de aprovar por unanimidade nesta Assembleia.
De qualquer modo, e apesar de termos votado favoravelmente, continuamos a recordar as preocupações que afirmámos durante o debate na generalidade e que nos levam a concluir no sentido de no futuro se impossibilitar, sob qualquer forma, que se volte a amnistiar crimes deste tipo, particularmente quando misturados com situações concretas, como as que se viveram com os desalojados das ex-colónias e com alguns emigrantes -e que estão misturados, desorganizados- que cometeram estes crimes.
Naturalmente, uma amnistia só existe quando existem crimes. Temos a consciência das condições em que esta amnistia foi aprovada, mas repetimos aqui as nossas preocupações em relação a essa matéria, para que no futuro não se voltem a repetir amnistias deste tipo.

O Sr. Presidente: - Não sei se existem mais declarações de voto.
Pausa.

Não havendo, está encerrado o debate e a votação deste projecto de lei.
Pode algum de VV. Exa. esclarecer a Mesa sobre os textos dos outros dois diplomas já estarão prontos para votação final global?

O Sr. Carlos Candal (PS):-Sr. Presidente, penso que V. Exa. se refere ao projecto de lei n.° 245/II, relativo ao estatuto dos deputados, e ao projecto de lei n.° 223/II, cujo texto está ainda em trabalho na Comissão.
Relativamente ao primeiro, poderei abordar o tema.

O Sr. Presidente: - Exactamente, referia-me a esses dois diplomas, sobre o primeiro dos quais peço então ao Sr. Deputado que elucide a Câmara.

O Sr. Carlos Candal: - Não há, de momento, e dada a urgência, um relatório escrito.
De todo o modo, a situação ficará clara dizendo-se que este projecto de lei n.° 245/II, depois de trabalho na Comissão ,tem dois artigos: o artigo 1.°, onde se relacionam as diversas alterações a vários artigos do estatuto, e o artigo 2.°, que contém disposições transitórias.
Na Comissão, e quanto à votação na especialidade, refiro, quanto ao conteúdo desse artigo 1.° do projecto, ou seja, relativamente às alterações nos vários artigos do Estatuto dos Deputados: o artigo 3.° do Estatuto foi aprovado por unanimidade; o artigo 4.°,

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aprovado por maioria, cora a abstenção da UEDS; o artigo 5.°, aprovado por maioria, com a abstenção da UEDS; o artigo 6.°, aprovado por unanimidade; o artigo 7.°, aprovado por unanimidade, salvo o seu n.° 5, que: foi aprovado por maioria, com votos contra do PS, da ASDI e da UEDS; relativamente ao artigo 10.°; o seu n.° 1, foi aprovado por unanimidade, o n.° 2 aprovado por maioria com votos contra da UEDS, e os n.ºs 3 e 4 aprovados por unanimidade; o artigo 11.° aprovado por unanimidade;, o artigo 12.°; aprovado por maioria, com votos contra da UEDS; o artigo 13.°, aprovado por unanimidade; o artigo 14.° - e neste artigo só estão em questão os n.ºs 6 e 9, o primeiro dos quais já aprovado por maioria, com votos contra da UEDS e o último aprovado por unanimidade; o artigo 16.°, aprovado por unanimidade; artigo 17.°, n.° 1, aprovado por unanimidade e os e os n.º 2 e 3, aprovados por maioria, com votos tra da UEDS; o artigo 18.°,. n.° l aprovado por maioria, com votos, contra do PS, da ASDI e da UEDS, e os n.ºs 2 e 3, aprovados por maioria, com votos contra da UEDS, o artigo 19.°, aprovado por maioria, com a abstenção da UEDS; p artigo 21.°, aprovado por unanimidade.
Quanto ao artigo 2.° do projecto de lei e que se refere às chamadas disposições transitórias, o n.° [...] foi aprovado por unanimidade..,

O Sr. Carlos Brito (PCP):- Sr. Deputado, importa-se que o interrompa?

O Sr. Carlos Candal (PS): - Faça favor.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Deputado Carlos Candal, agradeço-lhe a interrupção, mas pedia-lhe que o Sr. Deputado, como relator da Comissão, esclarecesse que o PCP não participou nos trabalhos, da Comissão, para que, sempre que o Sr. Deputado Candal refira votações por unanimidade, fique claro que o PCP não participou nessas votações, porque não participou nos trabalhos da Comissão.

O Orador: - Oportunamente o direi:
Falava eu do artigo 2.° do projecto, na versão que resultou da discussão, cujo n.° l foi aprovado por unanimidade, e os n.ºs 2 e 3 aprovados por maioria, com votos contra da UEDS.
Asc alterações propostas pela UEDS que não ficaram prejudicadas foram votadas. Tratava-se de dois artigos novos sobre declarações, de actividade profissional e declaração de rendimentos, tendo sido rejeitados por maioria, com votos a favor do PS e da UEDS e a abstenção da ASDI.
Fica consignado que este trabalho se processou na Comissão de Assuntos Constitucionais, com as presenças dos titulares da Comissão e as substituições que constam do respectivo livro de presenças, sendo certo, como já foi aflorado, que deputados do Partido Comunista não participaram nos trabalhos da Comissão, nem os titulares da Comissão, nem quaisquer substitutos para os mesmos, o que, aliás consta do livro de presenças e da acta que- será feita oportunamente.

Sr. Presidente!-Sr. Deputado, acaba de esclarecer a ausência dos Srs. Deputados do Partido Comunista na Comissão. Foi esse o único partido nessas circunstâncias, estando todos os outros presentes?

O Sr. Carlos Candal (PS): - Sr. Presidente, posso de memória referir que o Sr. Deputado da UDP também' não estava presente, bem como deputados do MDP/CDE, o que tem interesse dizer-se, para ficar registado no Diário da Assembleia, embora conste do livro de presenças, bem como há-de ser referido na acta respectiva da Comissão.

O Sr. Presidente - Segue-se, portanto, a votação final global.
Pausa.

Tem a palavra p Sr. Deputado Carlos Brito;

O Sr. Carlos Brito (PCP): -Sr. Presidente, desejávamos poder dispor de, pelo menos, um exemplar do novo texto, agora aprovado na Comissão, para podermos votar.

O Sr. Presidente:-O Sr. Deputado Carlos Candal tem possibilidade de fornecer o novo texto imediatamente?

O Sr. Carlos Candal (PS): - Naturalmente que sim, se forem tiradas fotocópias. O texto está manuscrito, havendo texto corrido e remissões para artigos que mantiveram a formulação do projecto. Espera-se que, fotocopiando-o,, se entenda facilmente o texto, embora isso exija algum tempo de modo que possa, o Partido Comunista formular a sua opinião.

O Sr. Presidente: - Se o Partido Comunista for o único partido a pedir esclarecimento sobre este ponto, talvez se dispensasse a perda de tempo material que se levava a fazer as fotocópias, podendo aquele, partido examinar com o Sr. Deputado Carlos Candal o próprio texto, se este Sr. Deputado consentisse nisso.
Sr. Deputado Carlos Candal, como V. Exa. parece que é o único elemento presente neste momento do seu grupo parlamentar, se pudesse fazer o exame conjunto com o Partido Comunista, talvez se dispensassem as fotocópias e ficaria esclarecido aquele partido.
O Sr. Deputado Lopes Cardoso pediu a palavra.
Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS):-Sr. Presidente, aproveito este pequeno intervalo, o que me permite não atrasar os trabalhos, para fazer uma chamada de atenção para a Mesa, por uma situação que se está à criar e que me parece ser lamentável. O facto é que sairemos daqui, sem que os meios, de comunicação social que acompanharam todo esse debate em relação a matéria que obviamente tem o seu interesse e uma certa expectativa por parte da opinião pública, tenham conhecimento de qual foi, de facto, o resultado final desta votação e qual o texto que ficou aprovado.

O Sr. Presidente:- Sr. Deputado, V. Exa. compreende que, estando nós a trabalhar como estamos, com a compressão de tempo e a situação de exaustão

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em que nos encontramos, é também uma questão de tempo o tornar público o texto definitivo, o que será feito, com certeza, dentro de umas escassas horas. Tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, prescindo da palavra.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se os Srs. Deputados já estão esclarecidos, poderíamos seguir, em relação ao projecto de lei n.° 223/11, o mesmo critério agora tomado.

O Sr. Carlos Brito (PCP):-Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, neste momento já estamos em condições de votar o projecto de lei n.° 245/II.

O Sr. Presidente: - Agradecia que examinassem também o projecto de lei n.º 223/II, para fazermos depois as votações seguidas.

O Sr. Rui Pena (CDS): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Rui Pena (CDS): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: Eu sugeria ao Sr. Deputado Nunes de Almeida que desse a todos os Srs. Deputados uma rápida noção da votação do projecto de lei n.° 223/II no seio da Comissão.

O Sr. Presidente: - Se V. Exa. não vê inconveniente, depois de a bancada do PCP estar esclarecida sobre os dois textos, votaremos o primeiro e imediatamente antes da votação do segundo solicitar-se-á ao Sr. Deputado Nunes de Almeida que forneça esse esclarecimento.

O Sr. Carlos Brito (PCP): -Sr. Presidente, estamos já em condições de votar ambos os projectos de lei, pois também já tomámos conhecimento do n.º 223/11.

O Sr. Ruí Pena (CDS): -Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Rui Pena (CDS): - Sr. Presidente, vi agora uns conciliábulos entre diversos grupos parlamentares e queria saber qual era a matéria destas discussões e, por consequência, se foi alterado ou não determinado preceito que anteriormente, e na reunião da Comissão, se havia votado.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Almeida Santos (PS): -Sr. Deputado Rui Pena, a única correcção que se fez foi a seguinte: chegou-se à conclusão de que, quando mudámos o critério de fixação do vencimento dos deputados, subvenção, subsídio ou como lhe chamam, e deixou de se equiparar ao vencimento de Secretário de Estado, nós quisemos fazer a equivalência a esse vencimento, mas com referência ao vencimento do Presidente da Assembleia da República. Feitas as contas,, tínhamos fixado a percentagem em 75 %. Simplesmente, verificámos que esses 75 % dão uns 2 ou 3 contos mais do que o vencimento de Secretário de Estado. Assim, preferimos ficar 1000$ abaixo, fixando-nos na percentagem de 70 %. Se o Sr. Deputado concordasse, seria excelente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Rui Pena, V. Exa. deseja usar da palavra?

O Sr. Rui Pena (CDS): - Não, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente:-Srs. Deputados, passamos então à votação final global do projecto de lei n.° 245/II apresentado pêlos partidos que integram a Aliança Democrática e que se refere à alteração do Estatuto dos Deputados.
Ponho à votação o texto final elaborado pela Comissão.

Submetido à votação foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS, e do PPM, votos contra do PCP, da UEDS e ao MDP/CDE e a abstenção do PS e da ASDI, registando-se a ausência da UDP.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PCP votou contra, na votação final global, o projecto de lei n.° 245/11, que altera o Estatuto dos Deputados, tal como já tinha votado antes, na votação na generalidade, isto é, votando firmemente contra este projecto de lei.
E votou desta maneira em coerência com os princípios de sobriedade que preconiza e que pratica nesta matéria e também com a orientação que sempre defendeu relativamente aos subsídios dos deputados.
Em nosso entender, a Assembleia da República não se prestigia aumentando os vencimentos dos deputados e melhorando as condições materiais de vida dos deputados. A Assembleia da República prestigia-se desempenhando cabalmente as suas competências e atribuições e, naturalmente, melhorando as condições de exercício do mandato dos deputados e desenvolvendo uma actividade que corresponda aos interesses e às aspirações do povo português. E na verdade, Srs. Deputados, a actividade da Assembleia da República tem sido bem pobre. Foi aqui recordado que a Assembleia da República não quis discutir a ratificação apresentada pelo meu partido e outros relativamente às novas tabelas salariais da função pública. Foi também recordado, Srs. Deputados, que não se quis discutir e aprovar na especia-

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lidade, antes de férias, a legislação pendente na Assembleia da República sobre contratos a prazo.
Mas poderia também dizer que a Assembleia tem manifestado pouca vontade política de tratar da resolução que versa sobre a contratação colectiva, matéria controversa e inadiável.
O grande salto, porque é, de facto, um grande salto, agora dado em matéria de vencimentos e de outras regalias infunde-nos a justa e legítima preocupação de isso ser um ponto de partida para a criação, como já dissemos, de como que uma casta privilegiada que se vai distanciando do País real e das condições em que vive a grande maioria do nosso povo. Basta que nos lembremos, Srs. Deputados, da distância a que já se fica do salário mínimo nacional. E isto, Srs. Deputados, para não falar, por exemplo, da pensão dos rurais, para não falar do vencimento de um assalariado agrícola que não trabalhe em permanência numa empresa.
Na verdade, Srs. Deputados, as alterações ao Estatuto dos Deputados, que estão a provocar comentários desfavoráveis, em nada elevam o prestígio da Assembleia da República e a função do deputado. Na verdade, Srs. Deputados, as alterações que agora foram introduzidas constituem um escândalo, atendendo às condições muito precárias em que vive a maioria do nosso povo, atendendo à grande pobreza com que se debate o nosso país.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não obstante o facto de na discussão na especialidade que se fez na Comissão nós termos votado favoravelmente algumas propostas de alteração ao articulado do Estatuto dos Deputados, entendemos que nessa mesma Comissão e na discussão na especialidade se aprovaram disposições em relação às quais nós tivemos ocasião de manifestar aqui a nossa oposição aquando da discussão na generalidade. Em nosso entender, eram mais significativas e mais merecedoras de crítica, entre outras, as disposições que se referiam à acumulação de subvenções e outros rendimentos do trabalho à contagem em dobro do tempo do exercício do mandato dos deputados para efeitos de aposentação. O facto de se terem mantido justamente as disposições que nós considerávamos mais susceptíveis de críticas, mais gravosas, obrigou-nos, obviamente, a votar contra o projecto de lei, quando fomos colocados agora perante a contingência de o ter de votar em bloco e globalmente.
Queria também dizer que não posso deixar de lamentar que as propostas de aditamento que tinham sido apresentadas pelo meu grupo parlamentar e relativas à declaração de rendimentos dos deputados, a fazer no início e no termo do mandato, e à declaração sobre as actividades profissionais durante o exercício do mandato, que, obviamente, não teriam efeitos práticos, mas contribuiriam para uma certa transparência, que é importante aos olhos da opinião pública, não tivessem merecido o acolhimento da maioria dos partidos representados na Comissão especializada.
É verdade, e eu registo, que os partidos que votaram contra a nossa proposta de aditamento ou se abstiveram e assumiram, de algum modo, na declaração de voto que formularam, o compromisso de, naquela que eles entenderiam ser a sede própria para essa matéria, ser contemplada, se pronunciarem a favor, ou seja, quando baixar a este Plenário disposição que contemple de forma mais apropriada, segundo eles, esta nossa proposta. Registo este facto, mas lamento que não tenha sido desde já aprovada. Espero que, quando de novo a questão baixar à Assembleia, ela possa merecer a aprovação unânime desta Câmara.

O Sr. Presidente:-Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Candal.

O Sr. Carlos Candal (PS): - Uma breve declaração de voto, para dizer que mantivemos na votação final global a nossa posição de abstenção, que tínhamos revelado na votação na generalidade.
Apesar de termos votado favoravelmente na especialidade a generalidade das propostas de alteração ao Estatuto dos Deputados, como resulta do relatório, entendemos manter a nossa posição de abstenção, dado que votámos contra dois preceitos decisivos para a nossa apreciação, ...

O Sr. Borges de Carvalho (PPM): - É ridículo!

O Orador: - ... concretamente o n.° 5 do artigo 7.°, que se refere à contagem do tempo em dobro para efeitos de reforma, e o n.° l do artigo 18.°, que se refere às regras da subvenção compensatória aos deputados que cessaram o seu mandato. Este voto contra a contagem em dobro não é apenas pela regra da contagem em dobro, mas também pela perspectiva da aprovação, mais adiante, da referida subvenção compensatória, porque entendemos que, de algum modo, há uma duplicação de protecção económica àqueles que tenham sido deputados.
Quanto a esta subvenção compensatória, votámos contra porque entendemos que os critérios estabelecidos não eram os mais defensáveis.
Votámos a favor dos dois artigos novos, propostos pela UEDS e que já aqui foram referidos, um deles a obrigação de declaração de rendimentos no início e no termos do mandato, porque está na linha de um projecto de lei de âmbito mais geral que em tempos ainda recentes aqui trouxemos e que foi rejeitado.
Quanto à declaração de actividade profissional, entendíamos que, embora não esteja consignada a exclusividade de funções para os deputados, seria de interesse saber-se, dentro do Parlamento e publicamente, quais são os deputados que exercem funções a tempo inteiro. A tempo inteiro todos exercem, naturalmente, mas seria de interesse saber-se quais os deputados que acumulam com actividades remuneradas privadas, no sentido, que parece ser o caminho a seguir, da profissionalização dos deputados.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, também para uma declaração de voto, o Sr. Deputado Vilhena de Carvalho.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma curtíssima declaração de

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voto para dizer que não nos foi possível alterar o sentido do nosso voto. Mantivemos agora, tal como quando da votação na generalidade, a nossa abstenção, porqanto apesar de termos votado favoravelmente, na especialidade, a maioria dos preceitos, obtiveram ainda vencimento alguns por virtude dos quais nós não podíamos comprometer o nosso voto, neste momento, no sentido positivo. Cito, nomeadamente, o caso do artigo 18.°
Essa foi, pois, a razão pela qual mantivemos o nosso voto de abstenção.

O Sr. Presidente: - Tem a .palavra o Sr. Deputado Rui Amaral, ainda para uma declaração de voto.

O Sr. Rui Amaral (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata acaba de votar favoravelmente o projecto de lei que conjuntamente com o CDS e o PPM subscreveu e que altera o Estatuto dos Deputados. Fá-lo com rigoroso respeito pela Constituição da República e tendo por suporte a competência que esta lhe confere na linha, aliás, das leis que configuram o Estatuto dos Deputados na versão que agora é objecto de alteração.
O Grupo Parlamentar do PSD considera que esta votação 6 de algum modo uma votação politicamente transcendente, isto por duas ordens fundamentais de razões: porque a democracia só se dignifica com a dignificação dos órgãos de soberania e dos elementos que os compõem e lhes dão vida e porque este acto de coragem política tem o significado de um sério aviso a todos quantos, consciente ou inconscientemente, de forma mais frontal ou mais insidiosa, tudo fazem para criar na opinião pública o clima emocional estruturalmente crítico relativamente à democracia portuguesa e aos seus órgãos.

Vozes do PSD - Muito bem!

O Orador:-Como aqui tive oportunidade de referir há poucas semanas atrás em declaração política feita em nome do Grupo Parlamentar do PSD, são agentes fundamentais da campanha de descrédito da instituição parlamentar, que é o baluarte supremo da democracia, grupos políticos cujas intenções a esse respeito nunca foram novidade para nós, aqueles para quem a democracia representativa é meramente um instrumento de subversão dessa mesma democracia, que se utiliza mais do que se tolera para perverter o regime.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - São, em segundo lugar, todos aqueles que se acoitam por detrás de siglas democráticas para também eles, quais cavalos de Tróia, fazerem, por vias diferentes, mas convergentes, regressar o País aos tempos anteriores ao 25 de Abril.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - São ainda aqueles que dispõem, tantas vezes gratuita e irresponsavelmente, dos órgãos da comunicação social para, por um processo de lavagem colectiva de cérebros, abrirem caminho àqueles que os sustentam na sua mediocridade e na sua insídia. Quanto a estes, permita-se-me o aparte, o PSD, a quem não é fácil atribuir o controle ou sequer a identificação ideológica de qualquer órgão de comunicação social, responde, com a coragem e a galhardia do partido que se fez o maior no isolamento internacional,...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - ... que não são alguns jornais ou jornalistas que impedirão, como nunca foram capazes de impedir, que o PSD se afirme como um partido que assume as responsabilidades do poder com frontalidade e sem complexos e que portanto assume as alegadas impopularidades com a consciência de que o mandato é seu e que não tem intenção de reduzir a extensão eleitoral desse mesmo mandato.

Aplausos do PSD e do PPM.

O PSD, o maior partido português a despeito de uma larga faixa estranhamente convergente de alguma comunicação social e, mais do que a despeito disso, eventualmente contra essa mesma faixa, não tem intenção de convencer quem, na má fé, na ignorância, no despeito ou na mediocridade, pretende alimentar-se de escândalos inventados que vende a uma escassa faixa de portugueses, com a mesma imoralidade do mixordeiro que procura vender gato por lebre.

O Sr. Santana Lopes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Desejariam talvez que o Governo que o PSD apoia tomasse medidas administrativas que outros governos e outros órgãos de soberania tomaram para se erguerem da sua pequenez, arvorando-se em mártires da repressão.
Sá Carneiro resistiu durante meses a uma campanha sistemática que da forma mais vergonhosa procurou denegrir a sua estatura e comportamento moral e cívico. A isso respondeu com a indiferença dos que estão acima daqueles que toda a vida chafurdam sem serem capazes de sair do pântano de si próprios.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador.-O povo deu-lhes a resposta que a sabedoria desse mesmo povo tornava inevitável. Também agora o PSD assume desde a primeira hora, com idêntica dignidade ,a mesma posição. Agora e no futuro nós correremos os riscos que partidariamente entendermos, porque só nós seremos beneficiários ou vítimas da nossa política.
São finalmente e ainda todos aqueles que pretendem, com intenções que nos causam alguma perplexidade, diminuir esta Assembleia e os seus membros que têm um mandato popular pelo qual se bateram e que mereceram e que olham com arrogância antidemocrática esse mesmo mandato.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PSD é o responsável essencial deste projecto que elaborou no seu seio e em completa harmonia e solidariedade. Faz parte dos seus hábitos mais saudáveis, que decorrem aliás do respeito, que é característica essencial do nosso partido, pelo princípio da solidariedade entre os seus membros. Daí

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que importe declarar de forma definitiva que os projectos subscritos por deputados do PSD são sempre - insisto, sempre- projectos que todos os deputados do PSD o Grupo Parlamentar, no seu conjunto, consideram como seus.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Acima das divergências saudáveis num partido que não é monolítico, tudo quanto seja a formulação pública de documentos veiculados por membros do seu grupo parlamentar, salvo declaração solene em contrário, são documentos que todos os deputados solidariamente subscrevem, numa manifestação de unidade que relativamente ao exterior se traduzirá sempre na sua defesa intransigente.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O PSD, e designadamente o seu grupo parlamentar, assume inteira responsabilidade pêlos seus actos e iniciativas, o que inclui os actos e iniciativas dos seus membros que o façam no exercício de mandatos específicos que lhes tenham sido confiados pêlos órgãos competentes. E esse há-de considerar-se sempre como um exercício legítimo, e portanto comprometedor de todo o grupo, salvo quando, repete-se, expressamente for declarado o contrário!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Feitas as considerações que precedem e que, dados os acontecimentos das duas últimas semanas, se consideram perfeitamente justificadas, é tempo de acentuarmos dê forma igualmente clara e frontal que o PSD respeitou escrupulosamente os compromissos e a ética que enforma as suas actuações no seio da Aliança Democrática.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Continuaremos, a fazê-lo mesmo quando seja notório que esse comportamento sofre por vezes desvios graves de reciprocidade. O PSD tomou a iniciativa de um projecto de lei, discutiu-o com representantes credenciados e qualificados dos partidos da maioria e, num espírito da maior abertura e consenso, negociou como é seu hábito, o que significa, em teoria e na circunstância de facto, que se chegou, por aproximações sucessivas, a textos cada vez mais consensuais.
Não lamentaremos -nunca o faremos- o facto de o presente projecto não ser o projecto do PSD nem sequer o projecto que foi objecto do primeiro acordo com os partidos parceiros da Aliança Democrática. Essa é uma consequência inevitável do fenómeno da coligação, é o preço que gostosamente pagamos e continuaremos a pagar pelo facto de estarmos numa coligação de partidos diferentes, com processos de actuação diferentes, com estratégias e tácticas eventualmente diferentes. A Aliança Democrática é um acto voluntário de que não estamos arrependidos e que, a nosso ver, continua a ser o projecto com o qual se identifica no essencial a maioria esmagadora dos portugueses.
Por isso nós, PSD, não somos os simples ou exclusivos subscritores deste projecto e os únicos responsáveis pela sua aprovação. Por isso nós somos apenas, mas solidariamente, co-subscritores de mais um projecto da Aliança Democrática cujas virtudes e defeitos assumimos como nossos e exigimos que os nossos parceiros assumam com idêntica convicção.

Vozes do PSD: -Muito bem!

O Orador: - E como assumimos a parte e o todo solidário dos defeitos e das virtudes, assumimos com idêntica solidariedade as suas consequências que, a nosso ver, como é habitual, o povo português- há-de compreender e apoiar apesar de todos quantos se empenham sem sucesso em campanhas de descrédito, uma -vez- mais condenadas ao fracasso.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Álvaro Brasileiro (PCP): - Como piada, não está mal!

O Orador:-Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de acentuar que os partidos da oposição democrática acabaram por votar favoravelmente a quase totalidade do projecto apresentado. Importa que a opinião pública registe este consenso democrático de que só se afastou a UEDS, em curiosa associação de voto com o Partido Comunista.

O Sr. Sousa Marques (PCP): -Que parvoeira!

O Orador: - O que quer dizer que mais uma vez legislámos de acordo com a vontade de uma vasta maioria do povo português. Sempre tivemos a consciência disso e agora aqui temos a confirmação pública iniludível desse facto.
Legislar, como governar, é uma atitude eminentemente responsável e o nosso mandato, o mandato da maioria, é o de legislar e de governar de acordo com o programa com que se apresentou ao eleitorado.
É o que acabamos de fazer, uma vez mais.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Presidente:-Tem a palavra, para uma declaração de voto, o Sr. Deputado Rui Pena.

O Sr. Rui Pena (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não vou propriamente fazer uma declaração política, mas sim uma declaração de voto.
Entendo que um processo como o da revisão do Estatuto dos Deputados é um processo necessariamente lento. Entendo que o Estatuto dos Deputados deve corresponder, em cada momento, às situações concretas do Parlamento, deve sobretudo ter como objectivo a dignificação da instituição parlamentar, logo da democracia, e acessoriamente a dignificação dos titulares deste órgão de soberania.
Foi na prossecução destes objectivos que nós votar mós favoravelmente esta lei. E fizemo-lo precisamente tendo em conta todos os interesses elevados desta Casa e evitando também que a lei tombasse em determinados regimes que pudessem ser escandalosos relativamente ao povo português de que nós somos e queremos ser dignos representantes. E devo dizer, Srs. Deputados, que neste processo legislativo de alteração do Estatuto dos Deputados - que, como sabem, se iniciou pela Lei n.° 5/76, de 10 de Setem-

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bro-, o Partido Comunista, que hoje apareceu com o dedo indicador a acusar-nos perante o povo português, em 9 de Janeiro de 1979 fez distribuir por todos os grupos parlamentares um documento em que se propunha rever alguns pontos sobre os quais o Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português julgava pertinentes alterações ou aditamentos ao Estatuto dos Deputados. E, para além do livre trânsito e do passe universal para transportes colectivos, que já foi resolvido numa anterior modificação do Estatuto dos Deputados, para além da alteração do subsídio mensal ao Presidente da Assembleia da República, com ponto de interrogação aos Vice-Presidentes, que também foi objecto de uma alteração legislativa ao Estatuto dos Deputados, e para além do uso e porte de arma de defesa, que realmente não colheu aceitação da parte das outras bancadas, e de que portanto desistiu, a verdade é que ficaram dois pontos, neste elenco arrolado pelo Partido Comunista Português, por concretizar. Refiro-me concretamente ao regime de previdência, assistência médica e medicamentosa e aposentadoria e às garantias do trabalho.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Considero que as alterações que fizemos ao Estatuto dos Deputados através desta lei visam precisamente responder a estes dois pontos que o Partido Comunista Português havia salientado, dizendo que estava de acordo com eles, tendo-os feito distribuir em 9 de Janeiro de 1979 aos outros grupos parlamentares. E quero acrescentar ainda que precisamente nas reuniões que então se fizeram, com a presença de representantes qualificados do Partido Comunista Português, e relativamente a uma temática que foi considerada aqui, por alguns Srs. Deputados que não votaram esta lei, como menos correcta, um deles diz respeito ao tempo e ao factor a considerar para efeitos de aposentação relativamente ao mandato de deputados.
Pois bem, no projecto de regime e de alteração ao Estatuto dos Deputados sobre a aposentação, estava escrito que para fins de aposentação por exercício de qualquer actividade o tempo de subscritor da Caixa Geral de Aposentações por efeito do exercício do mandato de deputado será contado com o coeficiente de 2,25.

Risos.

Sr. Presidente. Srs. Deputados: O Partido Comunista Português em 1979 admitia um coeficiente de 2,25, quando nós hoje fixámos, com o escândalo de muitos, um coeficiente de 2.

Aplausos do CDS, do PSD e do PPM.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não é preciso dizer mais nada para ver quem realmente está a brincar com a Assembleia da República.

Aplausos do CDS, do PSD e do PPM.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Dá-me licença. Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado pede a palavra para que efeito?

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): -Sr. Presidente, eu suponho que a muitos títulos posso usá-la, visto que claramente o Sr. Deputado Rui Pena, em vez de
uma declaração de voto, e além talvez de uma declaração de voto, pretendeu lançar a ideia de que o Partido Comunista ...

O Sr. Presidente:-Sr. Deputado Veiga de Oliveira, queira esclarecer a Mesa sobre o fim para que pede a palavra. A Mesa entende, pelo tom com que está a responder ao Sr. Deputado, que é para um protesto. É este o sentido que se deve dar à sua intervenção?

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Pode ser um protesto, sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem V. Exa. a palavra, para o que dispõe de dois minutos.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, o meu protesto é muito claro: o Sr. Deputado Rui Pena, depois de uma pseudodeclaração de voto, ou de uma declaração de voto -como queira-, começou a citar uma suposta atitude do Partido Comunista Português ...

Uma voz do CDS: -Suposta?!

O Orador: -... atitude essa que, tomada em 1979, não condiria com a que tomámos hoje.
Ora, Sr. Deputado, o documento que o Sr. Deputado tem na mão o que diz é que nós seleccionávamos algumas áreas para rever. Não diz como pensávamos rever e o Sr. Deputado, que não esteve na subcomissão, não sabe como pensávamos revê-la. Mais, o Sr. Deputado sabe tanto disso que até disse que o uso e porte de arma ... de defesa não teve o acolhimento das outras bancadas. Simplesmente, Sr. Deputado, esse direito está na lei hoje em vigor, ou seja, o Estatuto dos Deputados. O Sr. Deputado conhece tanto disso que nem sequer sabe o que está no Estatuto. O Estatuto diz exactamente isso o Sr. Deputado pode usar não só uma arma de defesa, como até pode usar um canhão sem recuo. Mas essa é outra questão.
Portanto, o Sr. Deputado não sabe do que está a falar. Mas mais: quando se refere à aposentadoria, o Sr. Deputado deve saber que o que está escrito neste texto não é da autoria do Partido Comunista Português, nem do seu representante, que era eu - e é por isso que eu falo com toda a autoridade -, mas sim um dos números que se adiantou, mas que não é proposta de ninguém. Foi um número que, porque não era aceitável na altura -nem esse nem qualquer outro -, nós retirámos.
Ora nós não aceitámos em 1979 fazer qualquer alteração, excepto aquelas a que se procedeu, sendo uma delas a do uso e porte de arma e outra o problema da previdência dos deputados. O Sr. Deputado Rui Pena também não sabe desta última alteração, porque não recorre a ela, mas consta do Estatuto dos Deputados. Eu ainda há pouco referi esse aspecto.
O que o Sr. Deputado pretendeu foi lançar uma coisa que é quase uma calúnia, ou seja, que o PCP teve uma posição em 1979 e hoje tem outra.
Pergunto-lhe: por que razão lançou o Sr. Deputado essa atoarda? Com que finalidade? O que é que o molesta no nossa posição? A nossa posição é a

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mesma, mas, se fosse diferente, tínhamos ou não esse direito?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para um contraprotesto, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Pena.

O Sr. Ruí Pena (CDS): - Sr. Presidente Srs. Deputados: Queria dizer que é perfeitamente natural que relativamente ao uso e porte de arma de defesa eu não tivesse notado essa alteração do Estatuto dos Deputados, uma vez que, ao contrário dos Srs. Deputados do PCP, eu não tenho necessidade de usar arma de defesa.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - : Não foi essa a posição do seu partido.

O Orador. - De qualquer modo, o que eu quis demonstrar quando chamei à colação este documento do PCP datado de 9 de Janeiro de 1979 foi precisamente a hipocrisia deste mesmo partido.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Hipocrisia de quem em 1979 admitia estas alterações - tal como o fez em conversas, tendo referido que não utilizaria este facto publicamente em termos acusadores em relação a quem aprovasse aquelas alterações ao Estatuto dos Deputados - e vem agora na sua declaração de voto fazer pura demagogia, precisamente como se este diploma que acabámos de votar não redundasse na consecução dos objectivos da dignificação da instituição parlamentar e dos titulares desta Assembleia da República.

Vozes do CDS, do PSD e do PPM: - Muito, bem!

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Carlos Brito (PCP):- Sr. Presidente, invocando o direito de defesa, gostaria de responder às últimas alegações do Sr. Deputado Rui Pena.

O Sr. Presidente: - Mas o Sr. Deputado sentiu-se atingido na sua dignidade ou na dignidade do seu partido?

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, fomos acusados de hipocrisia e de outras coisas mais.

O Sr. Presidente: - Mas, Sr. Deputado Carlos Brito, a palavra hipocrisia tem sido hoje aqui usada por tantos Srs. Deputados sem que isso tenha constituído motivo de injúria ou de dignidade!
Sr. Deputado Carlos Brito, faltam cinco minutos para as nove horas da manhã e parece-me que vai sendo tempo de concluirmos, quanto mais não seja por razões de decoro.

O Sr. Carlos Brito (PCP):- Sr. Presidente, eu seria muito breve naquilo que tenho para dizer.

O Sr. Presidente: - Para que se não diga que V. Exa. ficou cerceado do seu direito , de defesa, concedo-lho dois minutos para usar desse mesmo direito, Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Sousa Marques (PCP): -E não é nenhum favor!

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A 'última alegação do Sr. Deputado Rui Pena é de uma infelicidade completa e de uma deslealdade total.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O processo de revisão do Estatuto dos Deputados foi iniciado em 1979 - por iniciativa do PS, era então maioritário na Assembleia da República- com uma recolha geral de propostas e sugestões. Desta recolha geral constavam as áreas sobre que cada partido entendia dever haver um debate e uma troca de opiniões frutuosas entre os diversos grupos parlamentares.
O Sr. Deputado Rui Pena tem um papel onde o Grupo Parlamentar do PCP selecciona algumas dessas questões. Mas nós temos o papel do CDS.

Risos do PCP.

Assim, desafio o Sr. Deputado a tornarmos público esses nossos papéis, para que o Sr. Deputado possa verificar que as questões que o PCP admite poderem ser discutidas como matéria de alteração ao Estatuto dos Deputados estão em perfeita coerência com as nossa propostas de sempre.
Portanto, a hipocrisia é sua, Sr. Deputado Rui Pena, que não tem a coragem de assumir as suas posições.
Aplausos do PCP e protestos do PSD, do CDS e do PPM, tendo o deputado do PCP insistido em continuar no uso da palavra.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa não pode consentir que no final desta sessão as coisas corram por este caminho.
Aliás não posso deixar de chamar a atenção do Sr. Deputado Carlos Brito para o seguinte: se V. Exa. entendeu que era atentatória da sua dignidade e da dignidade do seu partido a palavra «hipocrisia», não deveria V. Exa. tê-la repetido no uso do seu direito de defesa.

Aplausos do PSD, do CDS e do PPM.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente:- Não lhe posso conceder mais a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - É para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente:-Nesse caso, tenha a bondade, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Brito (PCP): -Sr. Presidente, V. Exa. acabou por absolver a palavra «hipocrisia», dizendo que ela não era ofensiva e que, inclusivamente, teria sido muito usada nesta sessão.

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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, eu não disse que esse era o meu critério. A minha intervenção deveu-se mais a razões de celeridade. Mas, a partir do momento em que V. Ex.ª invocou um diferendo que eu respeitei, limito-me a tomar a posição que me parece coerente, no sentido de que nenhum Sr. Deputado deve, ao usar do direito de defesa em relação a um termo que considerou ofensivo, usar esse mesmo termo em relação a qualquer outro deputado.

Vozes do PSD, do CDS e do PPM: -Muito bem!

O Sr. Presidente: - Parece-me que esta é uma posição de coerência.
Portanto, tendo V. Ex.ª usado do seu direito de defesa, o Sr. Deputado Rui Pena tem igual tempo para usar também do direito de defesa.
Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Pena.

O Sr. Rui Pena (ODS): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com muita serenidade, muita calma, e portanto sem repetir qualquer dos termos que foram empregues pelo Sr. Deputado Carlos Brito, deixo, à guisa de pergunta, a seguinte questão: quem é que aqui mudou de posição? Foi o Grupo Parlamentar do CDS ou o Grupo Parlamentar do PCP?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como é que nós podemos qualificar a atitude de um partido e de um grupo parlamentar que aqui tomou hoje, perante nós e perante o povo português, a atitude que o Grupo Parlamentar do PCP tomou, que nem sequer quis participar nas reuniões da comissão que discutiu na especialidade esta matéria?

O Sr. Lino Lima (PCP): - Não seja mentiroso,

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP):-Sr. Presidente peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente:-Tenha a bondade, Sr. Deputado.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP)c - Sr. Presidente, Srs. Deputados, gostaria de saber quem é que nesta sessão, depois de se fazer a votação e algumas declarações de voto, iniciou uma discussão na declaração de voto procurando ofender um grupo parlamentar. Quem é que tomou esta atitude?
Segunda questão: o Sr. Presidente considera que tem sido prática nesta Assembleia - ou que se pode considerar como moral- trazer para o Plenário não apenas as posições de voto nas comissões ou as opiniões manifestadas mas sim simples localizações de áreas em que se poderia analisar esta ou aquela proposta?
Finalmente, queria perguntar à Mesa, se em face do Diário da Assembleia da República, é ou não verdade que o grupo Parlamentar do PCP em 1979
- aliás com a diminuição de tudo aquilo que era considerado na nossa proposta - absteve-se em relação a essa proposta. Sendo assim, há alguma
contradição entre a nossa actual posição e aquela que tomámos em 1979?
São estas as perguntas que queria fazer à Mesa.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Se bem entendi as perguntas que V. Ex.ª colocou à Mesa, pretende que esta emita parecer sobre o comportamento que os diversos partidos tomam. É evidente que neste aspecto a Mesa deu a todos VV. Ex.ª, fartamente -porventura para além de tudo aquilo que era regimental, com uma tolerância que até já foi censurada-, a possibilidade de debaterem os vossos próprios critérios.
A Mesa não vai - nem tem de o fazer - tomar posição sobre aspectos que dizem respeito ao comportamento dos partidos, a não ser quando esse comportamento mereça a intervenção da Mesa.
Encerrado este incidente, entramos no ponto seguinte da ordem de trabalhos. Trata-se da votação final global do projecto de lei n.° 223/11, apresentado pelo PSD, pelo CDS e pelo PPM, sobre os vencimentos e pensões de reforma dos mais altos servidores do Estado.
Antes, porém, peço ao Sr. Vice-Presidente Martins Canaverde o favor de assumir a presidência no momento em que se vai debater este diploma.

Pausa.

Srs. Deputados, devo à Câmara a explicação óbvia de que, tratando-se de um projecto de lei em que se prevêem situações que parecem prender-se também com o Presidente da Assembleia da República, são elementares e evidentes as razões que me levam, por escrúpulo, a abster-me de votar.

Neste momento reassumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Martins Canaverde.

O Sr. Presidente:-Srs. Deputados, antes de passarmos à votação final global do projecto de lei n.° 223/11, apresentado pelo Partido Socialista, tem a palavra o Sr. Deputado Nunes de Almeida, para dar uma explicação à Câmara.

O Sr. Nunes de Almeida (PS):-Sr. Presidente, Srs. Deputados, a comissão reuniu e votou na especialidade, com diversas alterações, o projecto de lei n.° 223/11.
Tendo em conta que o projecto de lei é bastante reduzido, para conhecimento de todos os Sr. Deputados, permitir-me-ia ler os diversos artigos na redacção que ficou aprovada.
Assim, o projecto de lei passaria a ter o seguinte título:

Fixa os vencimentos e subvenções compensatórias dos mais altos servidores do Estado.

O seu artigo 1.° teria a seguinte redacção:

O vencimento mensal do Presidente da República é fixado em 150 000$ e o abono para despesas de representação em 50 000$.

Este artigo foi votado por unanimidade.

Artigo 2.°

O vencimento mensal e o abono para despesas de representação do Presidente da República serão actualizados sempre que ocorrer qualquer alteração nestas remunerações relativamente a qualquer membro do Governo e em igual proporção.

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Este artigo também foi aprovado por unanimidade.
Relativamente ao artigo 3.°, foi votada uma proposta de alteração, com os votos favoráveis do PSD, do CDS e do PPM, com a abstenção da UEDS, tendo o PS, a ASDI e a UEDS votado a favor do texto correspondente do seu projecto de lei.
Portanto, o artigo 3.° ficou com a seguinte redacção:

1 - É atribuída uma subvenção compensatória mensal igual a 80 % do vencimento do Presidente da República em exercício aos titulares do cargo de Presidente da República eleitos nos termos da actual Constituição após o termo do respectivo mandato.
2 - Aos titulares do cargo de Presidente da República que não tenham completado o respectivo mandato será atribuída uma subvenção calculada proporcionalmente ao tempo de exercício efecivo do cargo.
3 - Em caso de morte, 75% da subvenção transmitem-se conjuntamente ao cônjuge, enquanto viúvo, aos filhos menores ou incapacitados e aos ascendentes a seu cargo, mesmo que o mandato ainda não tivesse sido completado.

O artigo 4.° teve o voto contra da UEDS e o voto favorável dos restantes partidos. É do seguinte teor:

Aplica-se aos titulares do cargo de Presidente da Assembleia da República o disposto no artigo anterior com relação ao vencimento do Presidente da Assembleia da República em exercício, considerando-se como mandato, para efeitos do cálculo da subvenção compensatória, o tempo de uma legislatura.

Artigo 5.

Compete ao [Governo tomar as providências orçamentais necessárias à boa execução do disposto na presente lei.

Este artigo também foi aprovado por unanimidade.
Para fazer referência, devo dizer que estiveram presentes na reunião da Comissão dê Assuntos Constitucionais deputados do PSD, do PS, do CDS, do PPM, da ASDI e da UEDS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos agora passar à votação final global. do projecto de lei n.º 223/11.
Ponho à votação o texto final elaborado pela Comissão.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS, do CDS, do PPM, da ASDI e UEDS e a abstenção do PCP (registando-se a ausência do MDP/CDE e da UDP).

Neste momento reassumiu a presidência o Sr. Presidente Leonardo Ribeiro de Almeida.

O Sr. Presidente: - Pára uma declaração de voto, tem a palavra a Sr.ª Deputada Natália Correia.

A Sr.ª Natália Correia (PSD):- Sr. Presidente, Srs. Deputados, ao dignificarmos o aumento do vencimento e das despesas de representação do Presidente da República, moveu-nos o objectivo de o dignificarmos nessa alta magistratura, peça fundamental do regime.
Tratando-se de um órgão de soberania, que não a Assembleia da República; onde está em causa estimarmos a nossa função em coerência com um estatuto que a não desdoure, estamos mais à vontade para, com toda a desinibição, dar a verdadeira dimensão à total dignidade que esse órgão contém.

Aplausos do PSD, do PS, do CDS, do PPM do ASDI e da UEDS.

O Sr. Presidente; - Srs. Deputados, chegámos ao termo dos nossos trabalhos de hoje.
Resta-me apenas pedir a V.Ex. as só um minuto depois de declarar encerrada a sessão, visto que quando se declarar encerrada a sessão fica também extinto o período de trabalho suplementar da Assembleia e já me será regimentalmente lícito falar a V.Ex. as no ponto que desejo tratar.

O Sr. António Vitorino (UEDS): -Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: Para que efeito?

O Sr. António Vitorino (UEDS): -Sr. Presidente, em nome do meu grupo parlamentar, gostaria de expressar ao Sr. Presidente, aos Srs. Vice-Presidentes e aos Srs. Secretários da Mesa o nosso apreço pelo trabalho extremamente árduo que tiveram juntamente connosco durante esta maratona parlamentar. Agradecemos também a tolerância, o espírito de diálogo e até o sentido de humor com que V. Ex.ª, Sr. Presidente, os seus coadjutores e os Srs. Secretários dirigiram os trabalhos desta maratona parlamentar.

Aplausos da UEDS, do PSD. do PS, do CDS, do PPM e da ASDI.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peco-lhe que acredite que nos sensibiliza extraordinariamente as amáveis palavras que acaba de nos dirigir. É profundamente grato ao nosso espírito a posição que acaba de assumir.
Peço licença para me associar a V. Ex.ª na parte em que as suas palavras foram endereçadas aos Srs. Secretários da Mesa que neste momento aqui se encontram, aos outros que aqui também trabalharam, aos Srs. Vice-Presidentes que tantas vezes tiveram a gentileza de me substituir, porque realmente sem eles e também sem a compreensão e -porque não dizê-lo?- ã estima tantas vezes afectuosamente sentida de todos VV. Ex.ªs, o nosso trabalho teria sido com certeza inteiramente nulo. Agradeço-lhe imenso, Sr. Deputado.
Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, de maneira nenhuma quero prolongar esta sessão, mas creio que era uma lamentável omissão, involuntária da parte do meu camarada e da parte do Sr. Presidente, que nós não tivéssemos associado às nossas palavras os trabalhadores da Assembleia da República que deram o seu esforço e colaboraram connosco nesta sessão.
Aplausos gerais.

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O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado
Silva Marques.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria tornar extensivo todos os votos que acabam de ser feitos à Polícia de Segurança Pública que também aqui nos acompanhou até esta hora.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Niza.

O Sr. José Niza (PS):-Sr. Presidente, para que ninguém fique esquecido, tendo nós tido aqui jornalistas a acompanhar-nos durante todo este tempo, para eles também os nossos agradecimentos.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: -Se VV. Ex.ªs me permitem - e para encerrar a sessão -, em meu nome, em nome da Mesa, em nome dos trabalhadores desta Casa e dos jornalistas saudamos todos os grupos parlamentares indistintamente.

Aplausos gerais.

Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 9 horas e 10 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD)

Alberto Augusto Faria dos Santos.
Amadeu Afonso Rodrigues dos Santos.
Arménio dos Santos.
Cipriano Rodrigues Martins.
Dinah Serrão Alhandra.
Eleutério Manuel Alves.
Fernando José da Costa.
Fernando Manuel A. Cardoso Ferreira.
João Afonso Gonçalves.
Germano Lopes Cantinho.
João Aurélio Dias Mendes.
José Angelo Ferreira Correia.
José Augusto de Oliveira Baptista.
Luís Fernando C. Nandim de Carvalho.
Manuel António Lopes Ribeiro.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Maria Adelaide S. de Almeida e Paiva.
Maria Margarida do R. da C. S. M. Ribeiro.
Mário Dias Lopes.
Mário Ferreira Bastos Raposo.
Mário Marques Ferreira Maduro,
Natália de Oliveira Correia.
Pedro Miguel Santana Lopes.
Virgílio António Pinto Nunes.

Partido Socialista (PS)

Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Marques Antunes.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
António Azevedo Gomes.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Francisco B. Sousa Gomes.
António Gonçalves Janeiro.
António José Vieira de Freitas.
Avelino Ferreira Loureiro Zenha.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Fausto Sacramento Marques.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
João Francisco Ludovico da Costa.
Joaquim José Catanho Menezes.
Joaquim Sousa Gomes Carneiro.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Manuel César Nunes de Almeida.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Francisco da Costa.
Manuel da Mata de Cáceres.
Manuel dos Santos.
Mário Alberto Lopes Soares.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Rui Fernando Pereira Mateus.

Centro Democrático Social (CDS)

Alberto Henriques Coimbra.
Alfredo Albano de C. Azevedo Soares.
Álvaro Manuel M. Brandão Estêvão.
António José Tomás Gomes de Pinho.
Eugênio Maria N. Anacoreta Correia.
Henrique Manuel Soares Cruz.
João Lopes Porto.
José Duarte de Almeida Ribeiro Castro.
José Girão Pereira.
Luís Carlos Calheiros V. Sampaio.
Manuel A. de Almeida de A. Vasconcelos.
Rui Eduardo Ferreira Rodrigues Pena.
Ruy Garcia de Oliveira.

Partido Comunista Português (PCP)

José Manuel da C. Carreira Marques.
Lino Carvalho de Lima.
Manuel Correia Lopes.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.

Partido Popular Monárquico (PPM)
António Sousa Lara.
Gonçalo Pereira Ribeiro Teles.
Luís Filipe Ottolini Bebiano Coimbra.

Acção Social-Democrata Independente (ASDI)
Manuel Tílman.

Faltaram à sessão os seguintes Sr. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD)

Amândio Anes de Azevedo.
Amélia Cavaleiro M. de Andrade Azevedo.
António Augusto Lacerda de Queiroz.

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João Vasco da Luz Botelho Paiva.
Maria Helena do Rego C. Salema Roseta.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Manuel da Cruz Roseta.

Partido Socialista (PS)

Alfredo José Somera Simões Barroso.
António Cândido Miranda Macedo.
António Emílio Teixeira Lopes.
António Manuel de Oliveira Guterres.
António Manuel Maldonado Gonelha.
Francisco de Almeida Salgado Zenha.
José Luís Amaral Nunes.
Manuel Alfredo Tito de Morais.

Centro Democrático Social (CDS)

Diogo Pinto Freitas do Amaral.
Francisco António Lucas Pires.
Luís Filipe Paes Beiroco.

Partido Comunista Português (PCP)

Álvaro Barreirinhas Cunhal.
Domingos Abrantes Ferreira.
Vital Martins Moreira.

O Redactor de 1.ª Classe, Armindo Augusto Afonso. - O Redactor Principal, Manuel Adolfo Vasconcelos. - O Chefe da Divisão de Redacção, José Pinto. - O Director dos Serviços de Apoio Parlamentar, Januário Pinto.

Declaração de voto relativamente ao voto apresentado peto Partido Comunista em relação a incidentes verificados na Nazaré.

1 - Os deputados da Acção Social-Democrata Independente (ASDI) votaram favoravelmente o voto apresentado pelo Partido Comunista. E fizeram--se porque ao longo do debate, em particular as intervenções dos deputados -Fleming de Oliveira e o aparte do deputado Fernando Costa ainda mais ofensivo para a população da Nazaré - nos convenceram de que, sem argumentos relativamente aos factos, nem credibilidade para sugerir, de novo, apenas inquéritos ao nível governamental, a AD procurava enquadrar politicamente os incidentes, numa amálgama tendenciosa e em montagem claramente artificial. O inquérito já requerido, a propósito dós incidentes verificados no Estádio da Luz, pelos partidos da FRS, será meio importante para esclarecer as causas de um fenómeno que se vai repetindo.

2 - O que de nenhum modo poderemos permitir é que procurem justificar-se os incidentes e a sua gravidade, com o carácter pretensamente agressivo e violento das gentes da Nazaré.
O que não é admissível é que se aceitem e aplaudam excessos, ou que se entenda que é a tiro que as polícias devem intervir.
Nem se diga que tais disposições visam apenas «marginais».
Sob pena de se pôr em causa o princípio de que os acusados se presumem inocentes, são de facto os direitos de todos, a ser ameaçados.

3- Os deputados da ASDI não podem também eximir-se a renovar uma chamada de atenção que oportunamente fizeram ao Governo (requerimento publicado a p. 286 do Diário da Assembleia da República. 2.ª série, n.° 16, de 7 de Janeiro de 1981).
Nova legislação emanada do Governo AD -o despacho normativo que fixou novas tabelas de preços para os policiamentos efectuados pela PSP - alterou as condições em que se processava o policiamento nos recintos desportivos, que só, em casos excepcionais, fora tornada obrigatória pelo Decreto--Lei n.° 94/79, de 20 de Abril.
Designadamente, transformar-se as despesas com o policiamento num gravíssimo encargo que muitos clubes desportivos não têm condições para suportar.
O resultado evidente é que, não realizando os polícias uma função preventiva, são chamados ou resolvem-se a intervir quando os conflitos atingiram já dimensão grave ou, porque a sua dimensão é extemporânea, provocam elas próprias o agravamento ou a gestão de conflitos.
O nosso voto é, assim, também, uma chamada de atenção para uma das causas que, ao menos em nosso entender, estão em foco na sucessão de incidentes que preocupam e justamente o povo português e com ele a Assembleia da República.

Os Deputados do Partido da Acção Social-Democrata Independente, Vilhena de Carvalho - Jorge Miranda.
Parte não lida da declaração de voto do Sr. Deputado José Manuel Mendes referente à proposta de lei n.° 29/II e aos projectos de lei n.º 53/II e 164/II -Lei da Nacionalidade.

A forma injustificadamente apressada que emoldurou a feitura do texto aqui aprovado constitui de resto, um outro aspecto lamentável do processo a que aludimos. Pensamos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que a importância dos problemas e o seu alto garbo institucional deveriam ter aconselhado maior ponderação e cuidado. Com isso se prezaria o prestígio desta Câmara e, como é claro, a democracia portuguesa e o nosso povo. Metas que, não o esqueçamos, terão que estar sempre diante da nossa actividade e não se compadecem, de maneira alguma, com o afogadilho ou as conveniências momentâneas de uma maioria.

Ratificação n.º 5/11
Decreto-Lei n.º 70/79, da 31 de Março (regula a concessão ; de passaportes diplomáticos)

Comissão de Negócios Estrangeiros e Emigração

Relatório

Aos 29 dias do mês de Abril de 1981, na reunião da Comissão de Negócios Estrangeiros e Emigração, foram discutidas e votadas na especialidade as propostas de alteração apresentadas pêlos Grupos Parlamentares do PS, do PSD e do MDP ao Decreto-Lei n.° 70/79, de 31 de Março de 1979, que regula a concessão de passaportes diplomáticos.

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Os representantes dos grupos parlamentares presentes aprovaram, por consenso, as propostas de alteração apresentadas pelo Grupo Parlamentar do PSD e pelo Grupo Parlamentar do MDP, bem como a proposta de eliminação e as propostas de alteração apresentadas pelo Grupo Parlamentar do PS.
Igualmente por consenso, o ponto 4 da proposta de alteração do Grupo Parlamentar do MDP, bem como o ponto 3 do artigo 2.° da proposta do PSD foram rejeitados por todos os grupos parlamentares presentes.

Palácio de São Bento, 11 de Junho de 1981. - O Relator, Maria Alda Nogueira. - O Presidente da Comissão de Negócios Estrangeiros e Emigração, Francisco António Lucas Pires.

ARTIGO ÚNICO

O artigo 2.º e a alínea c) do n.° l do artigo 3.° do Decreto-Lei n.° 70/79, de 31 de Março, passam a ter a seguinte redacção:

ARTIGO A

1 - São titulares de passaporte diplomático:
a) O Presidente da República;
b) O Presidente da Assembleia da República;
c) O Primeiro-Ministro;
d) O Presidente do Supremo Tribunal de Justiça;
e) Os Conselheiros da Revolução;
f) Os membros do Governo;
g) O procurador-geral da República, o presidente do Conselho Nacional do Plano, o Provedor de Justiça, o presidente do Supremo Tribunal Administrativo e o presidente do Tribunal de Contas;
h)O Os Presidentes da Assembleia e dos Governos Regionais;
i) Os funcionários do serviço diplomático do Ministério dos Negócios Estrangeiros em efectividade de serviço;
j) Os funcionários do quadro especializado do Ministério dos Negócios Estrangeiros em efectividade de serviço;
l) Os cônsules enviados quando acreditados junto do Estado receptor como cônsules de carreira, nos termos do disposto no § 1.° do artigo 53.° do Regulamento do Ministério.

2 - São igualmente titulares de passaporte diplomático:
a) Os cônjuges das entidades referidas nas alíneas a) a h) do número anterior;
b) As pessoas de família dos funcionários do serviço diplomático e do quadro de pessoal especializado definido nos termos do § 1.° do artigo 146.° do Regulamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros, aprovado pelo Decreto n.° 47478, de 31 de Dezembro de 1966, quando com eles vivam ou com eles tenham de viajar e não exerçam profissão.

ARTIGO 3.º

l..........................................................
a) Membros dos governos regionais, quando em missão oficial;
b) ........................................................
c) ........................................................
d) ........................................................
e) ........................................................
g) ........................................................
h) ........................................................

2- ........................................................

Ratificação nº 22/II

Decreto-Lei n.° 523479, da 31 de Dezembro (Estabelece normas relativas à concessão e emissão de passaportes)

Comissão de Negócios Estrangeiros e Emigração

Relatório

Aos 29 dias do mês de Abril de 1981, na reunião da Comissão de Negócios Estrangeiros e Emigração, foram discutidas e votadas na especialidade as propostas de alteração apresentadas pêlos Grupos Parlamentares do PSD e do PS ao Decreto-Lei n.° 523/79, de 31 de Dezembro de 1979, que estabelece normas relativas à concessão e emissão de passaportes especiais.
Os representantes dos grupos parlamentares presentes aprovam por concenso as propostas acima referidas.

Palácio de São Bento, em 25 de Junho de 1981. - O Relator, Maria Alda Nogueira. - O Presidente da Comissão de Negócios Estrangeiros e Emigração, Francisco António Lucas Pires.

ARTIGO ÚNICO
O n.° l do artigo 1.°, o n.° l do artigo 3.° e a alínea b) do artigo 4.° do Decreto-Lei n.° 523/79, de 31 de Dezembro, passam a ter a seguinte redacção:

ARTIGO 4.º

l - O passaporte especial destina-se exclusivamente:
a) Aos membros da Assembleia da República;
b) Aos membros das assembleias regionais;
c) A altas entidades civis e militares;
d) Às pessoas incumbidas pelo Governo de missão extraordinária de serviço público no estrangeiro, se a natureza da missão não importar a concessão de passaporte diplomático.

2 - .......................................................

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ARTIGO 3.°

l - As requisições de passaportes especiais serão dirigidas ao Ministro da Administração Interna.
2 - ...................................................

ARTIGO 4.º

O passaporte especial é válido:

a) Por dois anos e para número ilimitado de viagens, quando concedido às entidades referidas nas alíneas a), b) e c) do n.° l do artigo l1.º,
b) Pelo período fixado no despacho que fixou a respectiva missão, nos casos da alínea d) do n. ° l do artigo 1.°

Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias

Projecto de lei n.° 7/II (Defesa da igualdade dos cônjuges em acção que implique perda de direitos) .

(Texto final elaborado pela Comissão)

ARTIGO ÚNICO

1 - Sem prejuízo do disposto no artigo 19.° do Código de Processo Civil e do artigo 1682-B do Código Civil, devem ser propostas contra o marido e a mulher as acções que possam implicar a perda dê direitos que só por ambos ou com o consentimento de ambos possam ser alienados, designadamente as acções que tenham por objecto directa ou indirectamente a casa de morada de família.
2 -O disposto no número antecedente aplica-se às acções pendentes em que não haja decisão com trânsito em julgado incompatível com a sua aplicação, cabendo ao juiz ordenar os actos necessários.

Palácio de São Bento, 25 de Junho de 1981. - O Presidente da Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias, António de Almeida Santos.

Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias

Projecto de lei n.° 96/11 (Amnistia aos crimes previstos pelo Decreto-Lei n.º 274/75)

ARTIGO

l - São amnistiados os seguintes crimes, quando hajam sido praticados por desalojados das ex-colónias ou por emigrantes:

a) Os crimes previstos pelo Decreto-Lei n.º 274/ 75, de 4 de Junho, em relação a veículos entrados em Portugal até 31 de- Dezembro de 1979;
b) Os crimes de falsificação previstos no artigo 216.° do Código Penal, seus números e § único e, bem assim, os crimes de uso de documentos falsos, previstos no artigo 222.° do mesmo diploma, quando referidos a documentos que digam respeito aos mesmos veículos;
c) Os delitos de descaminho ou de tentativa de descaminho, tendo por objecto os veículos referidos ,nas .duas alíneas antecedentes;
d) Os crimes de burla tipificados pela venda de veículos legalizados com base em documentos falsificados) por qualquer dos meios delituosos previstos nas três alíneas anteriores;

2 - A prova da qualidade de desalojado das ex-colónias ou de emigrante faz-se por todos os meios admissíveis em direito.

ARTIGO 2.º

1 - Os crimes previstos no artigo anterior só poderão, todavia, ser amnistiados, desde que no respectivo processo se mostre satisfeita a totalidade dos direitos aduaneiros, sobretaxa de importação, se a houver, é imposto de venda de veículos automóveis, devidos pela sua importação.
2 - Os crimes previstos no artifo l.° não deixarão de ser amnistiados, mesmo que cometidos em relação a veículos furtados, mas, neste caso, só relativamente aos agentes daqueles, crimes que desconhecessem esse facto e não tivessem agido, por alguma forma, como agentes da subtracção fraudulenta das viaturas, e ainda que se vejam legalmente impossibilitados de cumprir a condição expressa no n.° l deste artigo.
3 - Beneficiarão igualmente das disposições desta lei os agentes dos crimes previstos no artigo 1.º a quem não seja exigível o cumprimento da condição imposta no n.º l deste artigo, por não serem os responsáveis pelo pagamento dos respectivos direitos aduaneiros.

ARTIGO 3.º

No caso de não ter sido ainda instaurado nenhum processo por qualquer dos crimes referidos no artigo 1.°, os seus agentes só poderão beneficiar do disposto nesta lei se no prazo de 180 dias, a partir da data da sua entrada em vigor, requererem o pagamento das imposições devidas pela sua importação, nos termos do artigo-anterior.

ARTIGO 4.°

Sem prejuízo do disposto no artigo 10.°, os veículos apreendidos pela Polícia Judiciária, pela Polícia de Segurança Pública, pela Guarda Nacional Republicana, pela Guarda Fiscal, pelos serviços alfandegários, ou por quaisquer outras entidades públicas, deverão ser imediatamente entregues a quem seja titular ou requerente do respectivo processo de legalização na alfândega, sem prejuízo da integral observância das formalidades legais que condicionam a sua importação e circulação.

ARTIGO 5.º

l- Todos os processos, ainda em instrução preparatória, ou em que já tenha sido deduzida acusação, lavrado despacho de prenuncia ou equivalente, ou proferida decisão sem trânsito em julgado, ficarão suspensos, pelo prazo de cento ë oitenta dias e só

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prosseguirão se, decorrido este prazo, não se mostrar provado nos autos que se encontram pagos os respectivos direitos e demais imposições legais, ou que tal pagamento ou pedido de isenção foram requeridos no respectivo processo alfandegário. Os processos serão definitivamente arquivados logo que neles se prove o pagamento dos mesmos direitos e imposições, ou prosseguirão, sob informação da alfândega de que esse pagamento não foi efectuado no respectivo prazo, por facto que só possa ser imputado ao requerente.

2 - O atraso no processo alfandegário ou a falta de formulação do pedido de legalização perante as alfândegas que sejam devidos à falta de deferimento do pedido do BRI, não são imputáveis a culpa do requerente, desde que o BRI tenha sido requerido até 10 de Outubro de 1980.

ARTIGO 6.°

l-Para os fins previstos nos artigos 15.°, 16.° e 17.° e respectivos números do Decreto-Lei n.° 455/ 80, de 9 de Outubro, poderão passar-se, a pedido dos interessados, das alfândegas, ou sob promoção do Ministério Público, certidões de informações ou declarações da Interpol ou de qualquer outra entidade competente nacional ou estrangeira e que se encontrem em processos pendentes na Polícia Judiciária, nos tribunais, nas alfândegas ou ainda em quaisquer outros organismos públicos, e donde constem elementos úteis ao esclarecimento da identidade do proprietário do veículo, da data da entrada da viatura em Portugal ou quaisquer outros com interesse para a sua legalização.
2 - As certidões referidas no artigo anterior serão passadas com carácter de urgência, e sem qualquer dispêndio, quando se destinem a instruir e ser juntas ao processo de legalização dos veículos a que digam respeito.
3- Para os fins previstos no n.° 17 deste artigo, os documentos falsificados, apenas parcialmente, não deixarão de fazer prova, à falta de outra, em
relação aos elementos verdadeiros que deles constem, sem prejuízo da sua ulterior inutilização.

ARTIGO 7.º

São amnistiadas simultaneamente todas as transgressões conexas com os crimes previstos no artigo 1.°, desde que, em relação a estes crimes, se mostre cumprida a condição expressa no n.° l do artigo 2.°

ARTIGO 8.º

Os veículos a que se aplica a presente lei, incluindo todos os que se encontrem submetidos a despacho, mas ainda não desembaraçados da acção fiscal, não pagarão qualquer taxa de estada.

ARTIGO 9.°

1 - As penas aplicadas por decisão com trânsito em julgamento pela prática de crimes que, se ainda não tivessem sido definitivamente julgados, estariam abrangidos pela presente amnistia, são perdoadas, se ainda não cumpridas, ou na parte em que o não houverem sido.
2 - O perdão previsto no número anterior fica sujeito às condições de legalização da importação dos correspondentes veículos exigidas na presente lei para aplicação da amnistia.

ARTIGO 10.°

A amnistia e o perdão previstos na presente lei só são aplicáveis até ao máximo da importação de três carros por agente.

ARTIGO 11.º

A presente lei entra em vigor no dia imediato ao da sua publicação.
Palácio de São Bento, 30 de Junho de 1981. - O Presidente da Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias, António de Almeida Santos.

Página 3748

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