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I Série - Número 116

Quinta-feira, 31 de Maio de 1984

DIÁRIO da Assembleia da República

III LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1983-1984)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 31 DE MAIO DE 1984

Presidente: Exmo. Sr. Manuel Alfredo Tito de Morais

Secretários: Exmos. Srs.

Leonel da Sousa Fadigas
Reinaldo Alberto Ramos Gomes
José Manuel Maia Nunes de Almeida
Manuel António de Almeida de Azevedo e Vasconcelos

SUMÁRIO.- O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 35 minutos.
Na ordem do dia, após a leitura do respectivo relatório e parecer da Comissão de Agricultura e Pescas, procedeu-se à discussão e votação, na generalidade, dos projectos de lei n.ºs 114/III (ASDI), sobre a anulação de apropriação de baldios, 199/III (CDS) e 281/III (PSD), ambos sobre baldios, que foram aprovados e baixaram à Comissão para discussão na especialidade.
Intervieram no debate, a diverso título, os Srs. Deputados Marques Mendes (PSD), Rogério de Brito e Lino Lima (PCP), Soares Cruz (CDS), João Abrantes (PCP), João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE), Alexandre Reigoto (CDS), Vilhena de Carvalho (ASDI), Cunha e Sá e Bento da Cruz (PS), José Moniz (CDS), Lopes Cardoso (UEDS) e António Costa (PS).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 15 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 35 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Abílio Henrique Nazaré Conceição.
Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Manuel Avelino.
Alexandre Monteiro António.
Amadeu Augusto Pires.
Américo Albino da Silva Salteiro.
António Cândido Miranda Macedo.
António da Costa.
António Domingues Azevedo.
António Frederico Vieira de Moura.
António Gonçalves Janeiro.
António José Santos Meira.
António Manuel do Carmo Saleiro.
Avelino Feleciano Martins Rodrigues.
Beatriz Almeida Cal Brandão.
Belmiro Moita da Costa.
Bento Gonçalves da Cruz.
Carlos Augusto Coelho Pires.
Carlos Cardoso Lage.
Dinis Manuel Pedro Alves.
Edmundo Pedro.
Eurico Faustino Correia.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Fradinho Lopes.
Fernando Henriques Lopes.
Francisco Augusto Sá Morais Rodrigues.
Francisco Igrejas Caeiro.
Francisco Lima Monteiro.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
Frederico Augusto Handel de Oliveira
Gaspar Miranda Teixeira.
Gil da Conceição Palmeiro Romão.
Hermínio Martins de Oliveira.
João de Almeida Eliseu.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João do Nascimento Gama Guerra.
João Luís Duarte Fernandes.
Joel Maria da Silva Ferro.
Joaquim José Catanho de Menezes.
Joaquim Leitão Ribeiro Arenga.

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Jorge Alberto Santos Correia.
Jorge Lacão Costa.
José de Almeida Valente.
José António Borja S. dos Reis Borges.
José Carlos Pinto Bastos Torres.
José da Cunha e Sá.
José Luís do Amaral Nunes.
José Luís Diogo Preza.
José Manuel Nunes Ambrósio.
José Manuel Torres Couto.
José Maria Roque Lino.
José Martins Pires.
José Maximiano Almeida Leitão.
Juvenal Baptista Ribeiro.
Leonel de Sousa Fadigas.
Litério da Cruz Monteiro.
Luís Abílio da Conceição Cacito.
Luís Silvério Gonçalves Saias.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Manuel Fontes Orvalho.
Manuel Laranjeira Vaz.
Maria Ângela Duarte Correia.
Maria do Céu Sousa Fernandes.
Maria da Conceição Pinto Quintas.
Maria Helena Valente Rosa.
Maria Luísa Modas Daniel.
Maria Margarida Ferreira Marques.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.
Nelson Pereira Ramos.
Paulo Manuel de Barros Barrai.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Rodolfo Alexandrino Suzano Crespo.
Rosa Maria da Silva Bastos Albernaz.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Rui Joaquim Cabral Cardoso das Neves.
Rui Monteiro Picciochi.
Silvino Manuel Gomes Sequeira.
Teófilo Carvalho dos Santos.
Victor Hugo Jesus Sequeira.
Victor Manuel Caio Roque.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD)

Abílio Mesquita Araújo Guedes.
Adérito Manuel Soares Campos.
Agostinho Correia Branquinho.
Anacleto Silva Baptista.
António Augusto Lacerda de Queiroz.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Nascimento Machado Lourenço.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Arménio dos Santos.
Carlos Miguel Almeida Coelho.
Cecília Pita Catarino.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Eleutério Manuel Alves.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando José Roque Correia Afonso.
Fernando Manuel Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Francisco Antunes da Silva.
Gaspar de Castro Pacheco.
Guido Orlando Freitas Rodrigues.
Jaime Adalberto Simões Ramos.
João Domingos Abreu Salgado.
João Evangelista Rocha de Almeida.
João Luís Malato Correia.
João Maria Ferreira Teixeira.
João Maurício Fernandes Salgueiro.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Luís Esteves Pinto Monteia.
Joaquim dos Santos Pereira Costa.
Jorge Nélio Ferraz Mendonça.
José Adriano Gago Vitorino.
José de Almeida Cesário.
José António Valério do Couto.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Luís de Figueiredo Lopes.
José Mário de Lemos Damião.
José Pereira Lopes.
José Silva Domingos.
Licinio Moreira da Silva.
Luís António Martins.
Manuel António Araújo dos Santos.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Manuel Pereira.
Maria Margarida Salema Moura Ribeiro.
Mariana Santos Calhau Perdigão.
Marília Dulce Coelho Pires Raimundo.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Manuel de Oliveira Costa.
Serafim Jesus Silva.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio Higino Gonçalves Pereira.

Partido Comunista Português (PCP)

Álvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António Dias Lourenço.
António José Monteiro Vidigal Amaro.
António da Silva Mota.
Belchior Alves Pereira.
Carlos Alberto da Costa Espadinha.
Carlos Alberto Gomes Carvalhas.
Carlos Alfredo de Brito.
Custódio Jacinto Gingão.
Francisco Manuel Costa Fernandes.
Francisco Miguel Duarte.
Georgete de Oliveira Ferreira.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.
João António Torrinhas Paulo.
João Carlos Abrantes.
Joaquim António Miranda da Silva.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel Santos Magalhães.
José Rodrigues Vitoriano.
Lino Carvalho de Lima.
Lino Paz Paulo Bicho.

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Manuel Gaspar Cardoso Martins.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria Ilda Costa Figueiredo.
Maria Odete Santos.
Mariana Grou Lanila.
Octávio Augusto Teixeira.
Paulo Simões Areosa Feio.

Centro Democrático Social (CDS):

Abel Augusto Gomes Almeida.
Alexandre Carvalho Reigoto.
António Gomes de Pinho.
Armando Domingos Lima Ribeiro Oliveira.
Basílio Adolfo Mendonça Horta da Franca.
Eugénio Maria Nunes Anacoreta Correia.
Francisco Manuel de Menezes Falcão.
Henrique Manuel Soares Cruz.
Hernâni Torres Moutinho.
João Carlos Dias M. Coutinho Lencastre.
José António de Morais Sarmento Moniz.
José Augusto Gama.
José Luís Nogueira de Brito.
José Miguel Anacoreta Correia.
Luís Eduardo da Silva Barbosa.
Luís Filipe Paes Beiroco.
Manuel António de Almeida Vasconcelos.
Manuel Jorge Forte Góes.
Manuel Leão Castro Tavares.

Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):

António César Gouveia de Oliveira.
António Poppe Lopes Cardoso.
Octávio Luís Ribeiro da Cunha.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

António Monteiro Taborda.
Helena Cidade Moura.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.

Agrupamento Parlamentar da Acção Social-Democrata Independente (ASDI):

Joaquim Jorge de Magalhães Mota.
Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho.
Ruben José de Almeida Raposo.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, os nossos trabalhos de hoje destinam-se à apreciação, na generalidade, dos projectos de lei n.ºs 114/III (ASDI), sobre a anulação de apropriação de baldios, e 199/III (CDS) e 281/III (PSD), ambos sobre baldios.
O Sr. Secretário vai agora proceder à leitura do relatório e parecer da Comissão especializada que se debruçou sobre estes 3 projectos de lei.

O Sr. Secretário (Leonel Fadigas): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o relatório e parecer da Comissão de Agricultura e Mar sobre os projectos de lei n.ºs 114/III, 199/III e 281/III é do seguinte teor:

Comissão de Agricultura e Pescas

Relatório dos Projectos de Lei n.ºs 114/III da ASDI, 199/III do CDS e 281/III do PSD

1 - O projecto de lei n.º 199/III, da iniciativa do Grupo Parlamentar do CDS, foi apresentado a 14 de Julho de 1983 (Diário da Assembleia da República, 2.ª série, n.º 22) e visa cometer às autarquias locais a administração dos baldios.
O projecto de lei n.º 281/III, da iniciativa do Grupo Parlamentar do PSD, foi apresentado a 3 de Fevereiro de 1984 (Diário da Assembleia da República, 2.ª série, n.º 82), visa igualmente integrar os baldios - terrenos usados e fruídos comunitariamente por residentes em determinada ou determinadas freguesias, ou parte delas, há, pelo menos, 100 anos (artigo l.º, n.º 1) - no domínio público da freguesia em que se localizam (artigo l.º, n.º 2), passando a caber a sua administração às juntas de freguesia (artigo 2º, n.º 1). - Por proposta das respectivas juntas de freguesia, as assembleias de freguesia poderão delegar a gestão dos baldios em utentes daqueles (artigo 2.º, n.º 2).
De sentido contrário é o projecto de lei n.º 114/III (Diário da Assembleia da República, 2.ª série, n.º 10), da iniciativa da ASDI, sobre anulação de actos de apropriação de baldios, que visa alargar os direitos das compartes através de recurso a acção popular (artigo 2.º), conferindo legitimidade na acção às assembleias de compartes, aos órgãos autárquicos dos prédios apropriados e no Ministério Público (artigo l.º).
2 - Não é a primeira vez que a Assembleia da República se vê confrontada com estas matérias.
Tal como se afirma no preâmbulo do projecto lei n.º 199/III (CDS) "na anterior legislatura, quer individual quer conjuntamcnte, os partidos integrantes da Aliança Democrática apresentaram projectos de lei, de conteúdo quase equivalente, sobre os baldios".
Na verdade, os projectos de lei apresentados sobre os baldios foram de iniciativa do PSD, CDS e PPM (361/II), de 23 de Junho de 1982 (Diário da Assembleia da República, 2.ª série, n.º 129), do PSD (291/II), de 9 de Janeiro de 1982 (Diário da Assembleia da República, 2.ª série, n.º 37), do PPM (289/II), de 8 de Janeiro de 1982 (Diário da Assembleia da República, 2.ª série, n.º 36), e do CDS (272/II), de 14 de Novembro de 1981 (Diário da Assembleia da República, 2.ª série, n.º 14).
O projecto de lei n.º 114/III (ASDI) vem retomar o projecto de lei n.º 362/II apresentado em 22 de Junho de 1982.
3 - As iniciativas, conjunta ou individualmente, dos partidos que constituíam a Aliança Democrática tinham como objectivo revogar a Lei n.º 91/77 (Diário da República, n.º 302, de 31 de Dezembro de 1977), que revogou o artigo 109.º da Lei n.º 79/77.
O regime actualmente aplicável aos baldios resulta da Lei n.º 91/77. Foi esta elaborada

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na sequência do projecto de lei n.º 79/I, subscrito pelo Grupo Parlamentar do PCP.
A lei foi aprovada em 29 de Novembro de 1977, com os votos favoráveis do PS, PCP e dos deputados independentes Carmelinda Pereira, Aires Rodrigues e Lopes Cardoso e com os votos contra do PSD e do CDS e do deputado independente Galvão de Melo (Diário da Assembleia da República, l.ª série, n.º 15, a p. 434).
Por força da Lei n.º 91/77 estão pois em vigor os Decretos-Leis n.º 29/76 e 40/76, de 19 de Janeiro.
É este regime que os projectos de lei n.ºs 199/III e 281/III visam modificar.
Por outro lado, o projecto de lei n.º 114/III da ASDI visa defender a não apropriação privada dos terrenos comunitários que constituem os baldios.
A iniciativa legislativa da ASDI veio dar corpo à opinião manifestada pelo Provedor de Justiça, que, em ofício enviado ao Exmo. Sr. Presidente da Assembleia da República e distribuído nos grupos e agrupamentos parlamentares, propõe "a adopção de medidas legislativas adequadas, tais como a de atribuir legitimidade ao ministério público para pedir a anulação policial dos actos de apropriação de baldios ou partes destes, e ou a de se instituir uma acção popular de a favor de qualquer comparte do baldio ...".
4 - A Constituição da República estatui no artigo 89.º:

ARTIGO 89.º

(Sectores de propriedade dos meios de produção)

1 - É garantida a existência de 3 sectores de propriedade dos meios de produção, dos solos e dos recursos naturais, definidos em função da sua titularidade e do modo social de gestão.

2 - O sector público é constituído pelos bens e unidades de produção pertencentes a entidades públicas ou a comunidades, sob os seguintes modos sociais de gestão:

a) Bens e unidades de produção geridos pelo Estado e por outras pessoas colectivas públicas;
b) Bens e unidades de produção com posse útil e gestão dos colectivos de trabalhadores;
c) Bens comunitários com posse útil e gestão das comunidades locais.
3 - O sector privado é constituído pelos bens e unidades de produção cuja propriedade ou gestão pertençam a pessoas singulares ou colectivas privadas, sem prejuízo do disposto no número seguinte.
4 - O sector cooperativo é constituído pelos bens e unidades de produção possuídos e geridos pelos cooperadores, em obediência aos princípios cooperativos.

À Comissão de Agricultura e Pescas têm entretanto chegado tomadas de posição de representantes das comunidades locais que geram os baldios e de autarquias locais que reclamam para si a sua administração.
As primeiras manifestam-se pela não entrega dos baldios às autarquias, conquanto as segundas sejam de opinião que a elas compete a sua gestão.
A Comissão de Agricultura e Pescas, analisando os projectos de lei n.ºs 114/II, da ASDI, 119/II, do Grupo Parlamentar do CDS, e 281/III, do Grupo Parlamentar do PSD, de acordo com as pertinentes disposições regimentais, considera que todos os projectos estão em condições de subir a Plenário, reservando os partidos as suas posições para o Plenário.

Assembleia da República, 30 de Maio de 1984. - O Presidente da Comissão de Agricultura, Álvaro Favas Brasileiro.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Rogério de Brito, poderá informar a Mesa das razões por que pediu a palavra?

O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Sr. Presidente, reconheço que pedi a palavra inoportunamente, já que o que pretendo fazer é uma declaração de voto, na sequência da votação que vier a ser feita sobre este relatório e parecer.

O Sr. Presidente: - Um momento, Sr. Deputado.

Pausa.

Sr. Deputado, a Mesa entende que este relatório não tem que ser votado em Plenário, uma vez que foi votado na Comissão.
Assim sendo, vou abrir o debate sobre os 3 projectos de lei já enunciados.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito?

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, é para exprimir a nossa concordância de que o relatório não tem de ser votado em Plenário e, nesse sentido, para dizer também que não há lugar a uma declaração de voto sobre uma votação em Plenário que é inexistente.
Simplesmente o que há - e para isso solicitamos a palavra através do meu camarada Rogério de Brito - é lugar a uma declaração de voto sobre o sentido do nosso voto em Comissão sobre esse relatório, de forma que ela seja junta ao relatório tal como este se encontra formulado.

O Sr. Alexandre Reigoto (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para me pronunciar sobre este assunto.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Alexandre Reigoto (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quando este relatório foi submetido à votação na Comissão o Partido Comunista Português não manifestou sequer a vontade de fazer qualquer declaração de voto, portanto não me parece quo este seja o momento adequado para o fazer.

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No entanto, se ele a quiser produzir, terá de a fazer por escrito e nunca por via oral.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, pretendo interpelar a Mesa no seguinte sentido: da parte do Sr. Deputado Alexandre Reigoto pode eventualmente haver necessidade de considerar que talvez não seja oportuno ouvir o que o Partido Comunista terá a dizer acerca do relatório, só que a questão não é essa, Sr. Deputado Alexandre Reigoto, e é nesse sentido que interpelo a Mesa. É que o direito de os partidos exprimirem, através de declaração de voto, a sua posição sobre o relatório que é presente a Plenário é um direito inquestionável, visto que toda a votação, segundo os princípios gerais de funcionamento do sistema democrático, dá direito a uma declaração de voto. Suponho que a discussão de uma questão como esta está completamente excluída a partir da própria prática da Assembleia.
Aliás, recordo que, por exemplo, muito recentemente, e no que toca ao relatório sobre a criação de freguesias, isso foi feito. Portanto, toda a prática da Assembleia aponta para que, naturalmente, lidos os relatórios podem ser lidas as declarações de voto produzidas ou entregues na altura ou aqui produzidas no Plenário através dos meios adequados, de que é exemplo, desde logo, o direito de intervenção.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa entende que de facto não há que, em Plenário, fazer declarações de voto sobre votações que foram efectuadas em sede de Comissão. Mas isso não impede, evidentemente, que cada partido, nas suas próprias intervenções sobre estes três projectos de lei, se refira ao que se passou na Comissão especializada.
Tem a palavra, ao que julgo também para se pronunciar sobre este assunto, o Sr. Deputado Marques Mendes.

O Sr. Marques Mendes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pedi a palavra exactamente para corroborar as palavras que V. Ex.ª, Sr. Presidente, acaba de proferir, na medida em que, segundo ouvi na leitura do relatório, a deliberação tomada na Comissão foi no sentido de que os partidos reservam as suas posições para o Plenário. Portanto, se alguma declaração de voto havia a fazer era na Comissão, porque o relatório é um documento da Comissão que só vem a Plenário para que a Assembleia tome conhecimento.

O Sr. Presidente: - Convém esclarecer que a Mesa teria procedido à leitura de quaisquer declarações de voto que tivessem vindo apensas ao relatório, mas o que é facto é que não vinha junta nenhuma declaração de voto.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, dá-me licença?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, eu devo dizer que começo a ficar com algum espanto em relação ao que se está a passar.
Sempre foi praxe desta Assembleia que os relatórios das comissões podiam incorporar as declarações de voto ou que elas, se os partidos assim o entendessem, podiam ser aqui produzidas.
Se o Sr. Presidente entende que se elas não foram reduzidas a escrito e entregues juntamente com o relatório não podem ser aqui produzidas, então nós temos um de dois caminhos: ou impugnamos a decisão da Mesa e suscitamos uma votação ou pedimos a suspensão dos trabalhos, redigimos a declaração de voto e ela é lida pela Mesa.
Eu suponho, Sr. Presidente, que facilitará bastante os trabalhos seguir-se a praxe desta Assembleia e V. Ex.ª considerar que aquilo que sempre foi feito nesta Assembleia também deverá ser feito neste momento, pesem embora as dúvidas que o Sr. Deputado Alexandre Reigoto parece estar a ter.
É muito mais simples conceder a palavra ao Grupo Parlamentar do PCP para que produza a declaração de voto que tem a produzir em relação àquele relatório do que seguirmos um dos caminhos que eu apontei e que repito: o da impugnação de uma deliberação da Mesa quando ela existir, o que levantaria vários problemas, como o Sr. Presidente calculará, ou o de pedirmos a suspensão dos trabalhos para reduzirmos a escrito a nossa posição para depois a Mesa ler daqui a meia hora.
Sr. Presidente, eu apelo ao bom senso. Nós produziremos a nossa declaração de voto como é praxe desta Assembleia, isto é, como aqui é habitualmente feito. De resto, não se trata de uma questão que leva ao atraso dos trabalhos desta Câmara! ...

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Alexandre Reigoto.

O Sr. Alexandre Reigoto (CDS): - Sr. Presidente, eu volto a insistir neste aspecto: se o Partido Comunista estivesse interessado em fazer uma declaração de voto teria manifestado essa sua intenção na reunião da Comissão aquando da votação do relatório. Como não o fez perdeu a oportunidade.
É que nós não estamos aqui para votar o relatório. Ele foi votado na Comissão e, não tendo havido qualquer intenção na produção da declaração de voto, creio que agora é que ela não se justifica de maneira nenhuma.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa assim o entendeu também.
De resto, os partidos têm a oportunidade de, durante o debate que se vai processar, fazerem as intervenções que entenderem, inclusivamente em relação àquilo que se passou na Comissão. Não creio, portanto, que se possa fazer uma declaração de voto sobre um voto que não foi expresso.
Tem de novo a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

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O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, este incidente não será de facto a melhor forma de iniciarmos este debate, e da nossa parte perguntamos ao Sr. Presidente o que é que acharia melhor em termos de prosseguimento do debate: que nós procedêssemos a uma impugnação da deliberação da Mesa, o que no quadro presente levantará dificuldades óbvias, ou que considerasse positivamente o nosso pedido de suspensão pelo tempo razoável, para reduzirmos a escrito a declaração de voto que V. Ex.ª depois determinará que a Mesa leia.

O Sr. Presidente: - Ó Sr. Deputado, eu não tenho que dar nenhuma opinião sobre isso. O Partido Comunista Português procederá como melhor entender.
No entanto, repito que a deliberação tomada pela Mesa foi a de que se iniciasse o debate e que durante o mesmo o Partido Comunista Português - porque parece ser o único que levanta o problema -, se desejar fazer uma declaração de voto em relação ao que se passou na Comissão, pois bem!, que o faça. Mas é evidente que a Mesa não tem que pronunciar-se sobre aquilo que o Partido Comunista Português entende fazer.
Tem a palavra o Sr. Deputado Soares Cruz.

O Sr. Soares Cruz (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de lembrar a toda a Câmara que é tradição na Assembleia da República que estas matérias apenas sejam tratadas no âmbito da comissão parlamentar. Isto é quando há lugar a declarações de voto sobre a matéria que diz respeito a relatórios elaborados nas comissões parlamentares elas são apresentadas na respectiva comissão. Não me ocorre nenhuma circunstância em que as declarações de voto aqui tenham sido lidas.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Amnésia!

O Orador: - Daí o facto de eu não perceber, de maneira nenhuma, que tenhamos de interromper os trabalhos do Plenário para que seja elaborada uma declaração de voto para, posteriormente, ser lida pela Mesa.

É evidente que se V. Ex.ª, Sr. Presidente, enveredar por esse caminho, o Sr. Presidente da Comissão Parlamentar de Agricultura e Mar, que apresentou esse relatório, terá que reunir para que todos os partidos que manifestaram interesse apresentarem as suas declarações de voto em sede da comissão.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, visto este incidente estar ultrapassado vamos iniciar ...

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, o incidente não está ultrapassado. Foi feita uma proposta concreta, em relação à qual não temos nada a opor, no sentido de que a Comissão reúna e sejam entregues as declarações de voto.
Se essa proposta razoável tivesse seguimento, então os trabalhos prosseguiriam sem nenhuma discussão.
Pela nossa parte não pode haver, nem há, nenhuma forma de querer prolongar um incidente desnecessário. Não cuidamos disso nem o queremos.

O Sr. Roleira Marinho (PSD): - Nota-se!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço o favor de não interromperem o orador.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Aquele Sr. Deputado sorridente, que nota as coisas com clareza, talvez não tenha reparado que o seu partido já fez muitas declarações de voto sobre trabalhos de comissão e relatórios que aqui foram apresentados nas exactas condições em que requeremos neste momento.

o nosso ponto de vista, não cremos que a questão se deva prolongar para além dos exactos termos em que foi colocada, e de maneira nenhuma queremos que o prolongamento dela sirva para evitar a discussão de fundo que deve ser feita.
Sendo assim, Sr. Presidente, nós nem impugnamos nem recorremos desta decisão, nem pedimos a suspensão da sessão. Porém, apenas dizemos que ao longo da nossa intervenção faremos as considerações que temos a fazer acerca do relatório da Comissão, sem que isso possa significar outra coisa do que nenhuma doutrina foi firmada acerca da interpretação das normas regimentais, nenhuma posição aqui foi assumida pela Assembleia e pelo Plenário em torno desta questão que possa infirmar o que é prática corrente da Assembleia.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, esperamos que numa próxima reunião dos presidentes dos grupos parlamentares este assunto seja abordado.
Srs. Deputados, vamos dar início à discussão conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.ºs 281/III, 199/III e 114/III.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Marques Mendes.

O Sr. Marques Mendes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Perdendo-se a origem dos baldios na longa noite dos tempos, pacífico ou unânime não tem sido, tanto nas antigas legislações como nas informações que nos transmitem os historiadores e os juristas, o entendimento acerca da qualificação jurídica dos baldios.
Essa problemática, bem como muito mais o que se prende com tais terrenos, tem variado, mais por razões históricas e sociais ou pressões de ordem conjuntural, do que em função de uma realidade tradicional e antiquíssima.
De um modo geral, porém, sempre foi por todos reconhecido e aceite, quer num passado próximo, quer num passado remoto, que os utentes tradicionais dos baldios agem no exercício de um indiscutível direito ao seu uso - apascentação de gados, cortes de lenha para consumo, cortes de mato, etc. - e não por qualquer acto de mera tolerância, nomeadamente dos poderes públicos.
Esse direito ao uso é um direito de moradores de determinado local, só porque são moradores, e que

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lhes pertence desde o momento em que o são, mas que também se extingue, sem mais, quando deixam de morar nesse mesmo local.
É como que um direito real, embora com características e contornos especiais, que o nosso direito consuetudinário, acolhido e respeitado pelo direito positivo, delineou e consagrou; porém, e contrariamente ao que por vezes se faz com certas afirmações, esse direito ao uso dos baldios distingue-se também claramente da compropriedade, no rigorismo do seu conceito.
Este direito ao uso dos baldios por parte dos seus tradicionais utentes transcende o exclusivo interesse individual de cada um, para ser realmente um direito radicado no interesse colectivo de todos eles.
Daqui que - salvo o ocorrido conjunturalmente em certos períodos históricos- sempre se tenha considerado, e bem, a regra de que os baldios não podem ser apropriados individualmente por qualquer utente, seja a que título for; por isso, a consagração do princípio, tal como sucede no projecto de lei em debate - que os mesmos estão fora do "comércio jurídico". Eles são objecto de uma afectação especial, qual seja a da satisfação de determinadas necessidades colectivas das populações, consoante as utilidades que deles possam ser obtidas.
O facto de umas vezes os baldios haverem sido considerados bens do domínio público, outras vezes do domínio privado e outras ainda bens comuns, isso em nada altera o que dito fica - e se mantém no projecto de lei em causa do PSD - quanto aos direitos dos utentes, à sua indisponibilidade e à sua referida afectação especial.
É bom reter-se o que dito fica, pois é muito frequente uma confusão por vezes reinante, em certos casos intencional e malévola, noutras por ausência de um necessário aprofundamento das realidades, entre esse direito ao uso por parte dos moradores, ou de certos moradores, a titularidade desses bens e a sua administração.
Também por vezes se confunde o uso comunitário dos baldios com certos modos ancestrais, e muito respeitáveis, que existem também de um sistema comunitário de as populações de determinadas freguesias decidirem sobre vários problemas da respectiva circunscrição.
Porém, trata-se de situações distintas, pois essa respeitável forma ancestral de as populações resolverem certos problemas da sua freguesia é algo diverso do uso comunitário dos baldios.
Aliás, há que acentuar ainda que no projecto de lei do PSD se continua a reconhecer que em certos casos o direito a usar um baldio não se estende a todos os moradores da freguesia, e que noutros esse direito cabe mesmo a moradores de mais de uma freguesia; mas, repetimos, pretendemos deixar claro que não queremos confundir a titularidade do terreno baldio, que esse pertence à freguesia onde se localiza, com o direito ao seu uso, segundo uma antiquíssima tradição, que inteiramente respeitamos e acolhemos no projecto de lei.
E o poder-dever de regulamentar esse direito de uso, com respeito inclusivamente pelos costumes tradicionais, tem como objectivo apenas impedir que uns exerçam esse direito em detrimento de outros, a quem cabe o mesmo direito, e sempre com o objectivo último da salvaguarda dos interesses comunitários dos respectivos utentes.
Recusamo-nos a aceitar que se extraiam conclusões apressadas ou mal intencionadas ou se pretendam colocar rótulos totalmente despropositados num projecto que em nada visa retirar esse consuetudinário e tradicional direito dos utentes.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Aceitamos que por vezes se façam juízos apressados, os quais, porém, levamos à conta de uma análise menos cuidada do projecto e das reais e rectas intenções que o ditaram.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quem, como nós, sociais-democratas, sempre tem pugnado pela dignificação, prestígio e respeito pelo poder local, confiando nas reais potencialidades do exercício do poder por parte das populações, através dos seus órgãos legítimos e legitimados democraticamente, não teme nem pode temer que - sem prejuízo daquele direito de uso da aludida indisponibilidade dos baldios e da sua já apontada afectação especial - aos competentes órgãos autárquicos de freguesia caiba o direito-dever de administrar esses terrenos que, sendo bens públicos no quadro da Constituição actual, caem no âmbito da sua titularidade.

As comunidades locais não constituem qualquer entidade ou pessoa colectiva dotada de personalidade e capacidade jurídicas, mas antes integram um conjunto de cidadãos que, radicados em determinada circunscriação territorial, essa sim, pessoa colectiva (autarquia), dela são elemento primordial e activo, a quem cabe decidir dos seus destinos através dos órgãos que eles próprios periodicamente são chamados a eleger.
Quem se afirmar defensor do poder local e das suas reais virtualidades não deve, nem pode, pôr em causa os respectivos órgãos, o que sempre sucederá se a par deles se persistir em consentir estruturas paralelas e com poderes paralelos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Dessa forma desprestigia-se o poder local, põe-se em causa os seus indiscutíveis benefícios, e mais não se faz senão criar um possível foco de contínuas tensões e mesmo de reais situações de permanente conflitualidade.
Ou se acredita, mas com sinceridade, no poder local, como o PSD acredita, e não se teme então que os seus órgãos saberão actuar na prossecução dos reais interesses das respectivas populações - tendo em conta todos os condicionalismos existentes na circunscrição territorial em causa -, ou então essa profissão de fé não passa de pura e lamentável demagogia, com profundos e autênticos laivos de hipocrisia.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Perante o que dito fica, e face à nossa real confiança no poder local e respectivos órgãos, não tememos em consignar no nosso projecto de lei o que nele se contém, quer quanto à administração pelas juntas de freguesia, quer quanto ao modo como as assembleias venham a deliberar, pois os membros eleitos para esses órgãos pelos seus mais próximos concidadãos saberão sempre e a cada momento actuar de forma a resolver os reais

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interesses de todos eles, com integral respeito pela especificidade de situações concretas que na respectiva autarquia existam.
Acresce que, para além disto, e como temos visto já ser decidido judicialmente em vários casos, sempre o PSD defendeu que a Constituição de 1976 tornou inconstitucionais os Decretos-Leis n.ºs 39/76 e 40/76, no que toca não só às aí consagradas assembleias de compartes e conselhos directivos mas também à sua personalidade e capacidade judiciárias e à administração de baldios e utilização das receitas dos mesmos em obras e melhoramentos na freguesia - atribuições estas exclusivas dos órgãos representativos da autarquia.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por isso, não foi por mero acaso, que com o artigo 109.º da Lei n.º 79/77 se quis revogar toda essa parte de tais diplomas anteriores à vigência da Constituição.
Para além de continuarmos a entender que a posterior revogação desse artigo 109.º não fez renascer a parte revogada daqueles diplomas, o certo é que, mesmo que tal se pudesse entender de modo diverso (e não é nem foi jamais esse o nosso entendimento), sempre eles estariam feridos de manifesta inconstitucionalidade.
Porém, a situação decorrente da revogação do artigo 109.º referido criou - há que reconhecê-lo - alguma disparidade de interpretações, a qual, para além de constituir um real foco de conflitos, não deixou de constituir uma situação de equivocidade, e mesmo de instabilidade, a que urgia pôr cobro.
Louvando o esforço nesse sentido feito já na II Legislatura, com a apresentação de vários projectos de lei sobre esta matéria, entendemos que é hora de resolver de uma vez por todas a situação, no respeito pelos direitos dos utentes dos baldios, das atribuições das autarquias e competências dos seus órgãos e da própria Constituição, cujos normativos referentes ao poder local, conjugados com o próprio artigo 89.º, apontam necessariamente para a solução que se quer ver definitivamente consagrada em diploma legal.
Defensores da democracia representativa, constitucionalmente consagrada, e contrários à existência de poderes paralelos aos dos órgãos autárquicos, a nossa posição mostra-se cristalina e perfeitamente ajustada a tais princípios, que defendemos sem tibieza, pese embora as posições contrárias, e nem sempre respeitosas, nomeadamente as que fora desta Câmara vêm sendo tomadas, mesmo por quem tinha o dever de curar e analisar mais atentamente o problema em causa.

Vozes do PSD:- Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não quis o Grupo Parlamentar do PSD neste seu projecto deixar de consagrar e regular a possibilidade de se usar o princípio estabelecido nos artigos 248.º e 263.º da Constituição, pois consideramos que nesta matéria a delegação de tarefas de administração pode contribuir para que os utentes, em colaboração e cooperação com os órgãos representativos da freguesia, melhor poderão permitir um exercício mais eficaz da resolução dos diversos e específicos problemas da autarquia e das populações.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Porém, e tal como a Constituição o prescreve, serão as respectivas assembleias, e tendo em conta os interesses dos utentes, os costumes tradicionais e a economia da região, que deverão decidir, caso a caso, com tempo e ponderação, da melhor solução a adoptar, tendo na devida atenção a prossecução dos reais e específicos interesses de toda a população da freguesia, sem esquecer, como é óbvio, que esta é formada por cidadãos com interesses próprios e específicos.
Contudo, não podemos esquecer, como se não esquece no projecto de lei em apreço, que essa delegação não pode constitucionalmente envolver o exercício, pela organização delegada, de poderes de autoridade, já que estes competem exclusivamente aos órgãos representativos da autarquia.
Para além de algumas propostas de alteração já apresentadas ao texto do projecto, com as quais queremos enriquecê-lo, desde já pretendemos deixar claro que em sede de especialidade estamos abertos à introdução de melhorias que enriqueçam os princípios em que assenta, sem prejuízo de nós próprios virmos a propor ainda novas alterações que melhor sirvam os objectivos do projecto em causa e os reais interesses das populações que dele são destinatárias.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Contudo, não cederemos à hipocrisia ou à demagogia barata, pois queremos seriedade e sinceridade de propósitos e a concretização de reais e legítimos interesses das populações, no integral respeito pelos princípios que defendemos e que decorrem da própria Constituição.
A transparência de processos e actuações e uma atenção serena mas urgente e profunda à realidade que nos cerca são, neste momento, mais que nunca, um imperativo que se nos coloca e que se não pode compadecer com hesitações ou demagogias, e muito menos com hipocrisias.
Nesta, como noutras matérias, temos de agir com realismo, com determinação e com a coragem que o País de todos nós exige.

Aplausos do PSD, do PS. da ASDI e do Sr. Deputado Alexandre Reigoto, do CDS.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Rogério de Brito.

O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Sr. Deputado Marques Mendes, creio que este debate terá começado mal! Começou logo com hipocrisias e demagogias e, a aceitarmos isso, teríamos que dizer que provavelmente a hipocrisia e a demagogia residirá naqueles que aqui as proferiram.
Tudo isto parece que já está a principiar distorcido, começando logo pela confusão entre o que é o poder local e o que são as comunidades locais. Isto não tem a ver com a defesa do poder local. Nós somos defensores do poder local, só que não se confunda poder local com comunidades locais, com interesses próprios e específicos destas. Aliás, se a defesa ou a particularização das comunidades locais fosse entendida como um ataque ao poder local, então teríamos que convir

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que a Constituição da República começava, ela própria, logo por atacar o poder local, porque é ela que distingue claramente as duas figuras: autarquias e comunidades locais.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Quanto à história dos poderes paralelos, gostaria de dizer que se o que aqui está em causa são poderes paralelos então estaremos todos infectados de poderes paralelos, a começar pela Constituição da República, que, por exemplo, no seu artigo 94.º, determina que as populações terão representação no Conselho Nacional do Plano através das autarquias e das comunidades locais. Comunidades locais essas que, por acaso, até são representadas no Conselho Nacional do Plano pelo Conselho Nacional dos Baldios.
Depois, o Sr. Deputado cria uma outra situação que, aliás, está no próprio preâmbulo que prefigura o vosso projecto de lei. Para lá da confusão entre autarquias e comunidades locais, o Sr. Deputado diz ainda que deverão ser as autarquias a representar legitimamente e a fazer a defesa dos interesses destas populações.
Acontece, pois, que o que está em questão não é a defesa ou a representação das populações dos baldios, mas sim o direito conferido pela própria Constituição da posse útil e gestão por parte das comunidades locais em relação aos bens comunitários. São situações jurídicas, constitucionais, totalmente distintas.
Nesta primeira intervenção não haverá tempo para abordar todo o articulado do projecto de lei do PSD. Porém, também não deixa de ser curioso verificarmos que, a determinada altura, o diploma em causa refere que os baldios são indisponíveis e que é permitida a sua alienação. Mas, posteriormente, prevê, no seu artigo 8.º, que os baldios podem ser objecto de expropriação por parte do Estado para instalação de equipamentos sociais ou de fomento turístico, industrial ou habitacional.
Portanto, gostaria de perguntar como é que é possível falar, por um lado, na indisponibilidade e, por outro lado, permitir que, a pretexto de interesses sociais, industriais e habitacionais, se proceda a essa mesma alienação. E aqui também cabe perguntar se não há a pretensão de, através da expropriação dos baldios, as autarquias responderem a problemas que não conseguem ultrapassar, designadamente em matéria de solos urbanos e da especulação que é feita em torno deles.
Caberia perguntar muitas mais coisas, designadamente se não estará aqui implícito permitir o avanço da filosofia do projecto de florestação do Banco Mundial e dos interesses das celuloses, como, aliás, já temos casos concretos que o comprovam.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Marques Mendes, há mais oradores inscritos para formular pedidos de esclarecimento. V. Ex.ª deseja responder já ou no fim?

O Sr. Marques Mendes (PSD): - No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra o Sr. Deputado Lino Lima.

O Sr. Lino Lima (PCP): - Sr. Deputado Marques Mendes, gostaria que V. Ex.ª fosse capaz de fazer um esforço para nos dizer qual é a diferença real, concreta, que existirá entre o sistema que propõem no vosso projecto de lei e aquele que existia antes do 25 de Abril.

O Sr. Presidente: - Também para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Soares Cruz.

O Sr. Soares Cruz (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tenho alguma dificuldade em definir regimentalmente esta minha intervenção porque não sei se deverá ser no âmbito da interpelação à Mesa ou de pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado Marques Mendes.
Num primeiro aspecto, talvez dirija a interpelação á Mesa e depois, V. Ex.ª, Sr. Presidente, fará o favor de interpretar doutamente o Regimento e deferi-la para o Sr. Deputado Marques Mendes, se for caso disso.
Gostaria, pois, de saber se a Mesa tem alguma informação pelo facto de a bancada do Governo se encontrar deserta durante tão importante discussão.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa não tem informação alguma acerca desse assunto.

O Orador: - Então, entendo a resposta de V. Ex.ª deferindo a perguntar para o Sr. Deputado Marques Mendes.
Nesse caso, Sr. Deputado Marques Mendes, não entende V. Ex.ª que esta matéria será suficientemente importante de forma a contarmos com a simpática presença de alguns membros do Governo ocupando as suas bancadas a fim de, eventualmente, poderem intervir na discussão e esclarecerem alguns espíritos menos esclarecidos acerca destas matérias?
Gostaria ainda de lhe colocar uma outra questão, questão essa que talvez seja em trânsito, pois possivelmente V. Ex.ª terá de a deferir para a bancada do vosso parceiro de coligação, ou seja, para o PS - que é a de saber se essa ausência dos membros do Governo terá alguma coisa a ver com aquele já tradicional diferendo existente entre S. Ex.ª, o Sr. Secretário de Estado das Florestas e o Sr. Ministro da Agricultura, Florestas e Alimentação. Não sei em que ponto é que as situações ficaram definidas, mas é do domínio público que há gravíssimas divergências quanto a isso.
Portanto, gostaríamos de estar esclarecidos porque, de facto, as nossas posições têm a ver com esse esclarecimento.
Gostaríamos, pois, de saber o que é que se passa em relação a esta matéria e, se possível, qual o fundamento do despacho que S. Ex.ª o Sr. Secretário de Estado das Florestas promulgou em relação a esta matéria e qual a posição do Sr. Ministro da Agricultura, que, tanto quanto sei, pertence ao partido que o Sr. Deputado mui ilustremente representa.

O Sr. Presidente: - Ainda para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado João Abrantes.

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O Sr. João Abrantes (PCP): - Sr. Deputado Marques Mendes, V. Ex.ª referiu várias vezes a Constituição em relação às matérias que hoje aqui discutimos.
Assim, gostaria que V. Ex.ª me dissesse se tem conhecimento do que preceitua o artigo 89.º da Constituição, nomeadamente no seu n.º 2, alínea c), em que são autonomizados os "Bens comunitários com posse útil e gestão das comunidades locais". Isto, para desmistificar um pouco a confusão que o Sr. Deputado faz em relação à identidade entre as autarquias locais e as comunidades locais, o que já foi referido pelo meu camarada Rogério de Brito. Portanto, Sr. Deputado, gostaria de ouvir a sua opinião em relação a esta questão.
Também queria que o Sr. Deputado me dissesse se conhece o que tem sido a realidade das realizações levadas a efeito quer pelos conselhos de compartes, quer pelos conselhos directivos de baldios. Posso fornecer-Ihe uma lista apenas dos distritos de Viseu e de Coimbra, para que V. Ex.ª tenha a noção de que milhares e milhares de contos tem sido gastos em proveito das comunidades e das populações locais. E mais não tem sido feito porque não têm sido cumpridos os Decretos-Leis n.ºs 39/76 e 40/76, que hoje os Srs. Deputados aqui pretendem revogar.
De facto, desde o congelamento de contas bancárias à falta de apoio jurídico e técnico, ao não reconhecimento de conselhos directivos de baldios e de comissões de compartes, tudo tem sido feito para que os Decretos-Leis n.ºs 39/76 e 40/76 não tenham sido devidamente aplicados.
As conflitualidades têm existido pelo não cumprimento destes dois decretos-leis em causa. Ora, com o projecto de lei do PSD as situações de conflitualidade e de instabilidade vão acentuar-se. E refiro-lhe apenas, Sr. Deputado, o caso dos baldios que sejam pertença de mais do que uma freguesia.
V. Ex.ª deve saber que a junta de freguesia corresponde a uma demarcação administrativa, enquanto que o que caracteriza o baldio é uma certa unidade geográfica que tem pólos económicos, sociais e culturais que as juntas de freguesia não estão vocacionadas para compreender.
E em relação à aplicabilidade das verbas, o que vai acontecer é que elas não vão ser aplicadas de maneira correcta nessas comunidades. Uma junta de freguesia não tem sensibilidade para poder fazer a aplicação dessas verbas de acordo com o critério de justiça que tem sido timbre dos conselho directivos e das comissões de compartes.
Portanto, esta questão da conflitualidade vai ser acentuada pelo vosso projecto de lei. Oxalá não tenhamos oportunidade de ver que as nossas preocupações irão ter, na prática, esse mesmo reflexo.

O Sr. Presidente: - Finalmente, para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Deputado Marques Mendes, antes de mais, gostaria de secundar as palavras ditas pelo Sr. Deputado Soares Cruz, pois não deixa de ser estranho que, pelo menos, o Sr. Secretário de Estado das Florestas, que estaria directamente interessado nisto, não esteja presente num debute desta natureza.
O projecto de lei do PSD, no seu artigo 1.º, n.º l, refere que "são baldios os terrenos usados e fruídos comunitariamente por residentes em determinada ou determinadas freguesias, ou parte delas, há pelo menos 100 anos".
Ora, como V. Ex.ª sabe, Sr. Deputado, existem baldios usurpados à população para florestação coerciva - e a este respeito não podemos esquecer o que no regime de Salazar se fez neste País - que deixam de ser considerados baldios.
Os baldios que foram florestados, administrados e explorados pelo Estado, com grande peso, como V. Ex.ª sabe, nos baldios do Norte e dos Açores, deixam de ser considerados baldios e automaticamente retirados às populações, já que, como refere o projecto de lei do PSD, os não gerem há mais de 100 anos. Gostaria, pois, de ser esclarecido sobre esta questão.
Não pensa V. Ex.ª que os baldios na posse das autarquias serão mais vulneráveis do que na posse dos utentes dos compartes, como tem sido demonstrado através dos tempos, com possível alienação para a entidade privada com prejuízos facilmente previsíveis?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Marques Mendes, se assim o desejar.

O Sr. Marques Mendes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou procurar ser breve nas respostas, porque, dada a fixação de tempos e as intervenções que outros colegas meus de bancada têm para fazer, terei que regular o tempo.
Todavia, não queria deixar de responder, ainda que muito sucintamente, a algumas questões que foram colocadas.
Começarei pelo Sr. Deputado Rogério de Brito, cujas considerações foram mais uma intervenção e, no fundo, poucos pedidos de esclarecimento formulou.
Porém, gostaria de lhe dizer que a comunidade - e referi isso na minha intervenção - não é nenhuma entidade jurídica. A comunidade é um conjunto de pessoas que vivem em determinada área, em determinada circunscrição territorial e que, nos termos da nossa Constituição, são representadas pelas autarquias. As autarquias são, pois, a pessoa colectiva em que se integram as comunidades.
Quanto a saber se os poderes paralelos existem, é evidente que sim. Só que não devem existir designadamente em matérias como esta. Porém, a propósito de outras perguntas, poderei avançar mais alguma coisa quanto a este aspecto.
Em relação à expropriação de baldios, se percorrermos como acto de soberania que é o acto de expropriação por interesses socialmente relevantes de interesse colectivo, verificamos que tem sido sempre possível a expropriação quer de terrenos privados, quer de baldios, etc. E isto porque sobrepõe-se um interesse público de muito maior valia do que qualquer outro interesse subjacente.
O Sr. Deputado Lino Lima pediu-me para fazer um esforço no sentido de estabelecer as diferenças ou as semelhanças entre este projecto de lei e o Código Administrativo.
Ora, Sr. Deputado, se V. Ex.ª analisar com cuidado o Código Administrativo e o projecto de lei, verificará que não há semelhanças. Poderá encontrar uma aproximação - e digo aproximação porque nem isso é rigoroso - na definição, mas não semelhanças.

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Quanto ao Sr. Deputado Soares Cruz, devo dizer-Ihe que não sou o Governo. Sou um membro de um grupo parlamentar, o Parlamento é autónomo do Governo e, portanto, não posso responder por que razão o Governo não está aqui representado.
O Sr. Deputado insinuou que a ausência do Governo talvez se deva a desinteresse quanto a esta questão. Bem, então devo dizer-lhe que por parte da bancada do CDS também haverá algum desinteresse nesta matéria.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Quanto a saber se o entendimento do Sr. Secretário de Estado das Florestas é divergente do nosso, do do Sr. Ministro, devo dizer-lhe que na minha intervenção referi que há entendimento, mas que a disparidade de interpretações é uma realidade. Porém, isso não significa que cada um de nós não tenha a sua posição. No entanto, estamos convictos de que a nossa é a correcta e a que se insere na Constituição.
O Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca fez uma afirmação com a qual não posso concordar, dizendo que o Sr. Secretário de Estado das Florestas é interessado nisto. Ora, isto é da competência do Parlamento, estamos aqui a discutir uma lei e não vejo em que é que o Sr. Secretário de Estado das Florestas possa ter interesse nisto. Que ele pudesse ter interesse em assistir ao debate, isso é outra questão!
Sr. Deputado João Abrantes, o artigo 89.º da Constituição tem servido para muita coisa. Assim, queria lembrar-lhe que o corpo do n.º 2 desse mesmo artigo refere que "o sector público é constituído pelos bens ... pertencentes a entidades públicas ou a comunidades ...", portanto, começa por dizer que são bens pertencentes a um conceito de titularidade - e eu referi isso na minha intervenção. Primeiro há que distinguir a titularidade, depois a posse útil, que é uso e fruição, e depois a gestão.
Volto a dizer que as comunidades têm os seus órgãos legítimos e legitimados democraticamente para representar as populações.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Quanto a saber se tenho ou não conhecimento de dinheiros gastos em prol das populações, é evidente que sim. Até tenho conhecimento de dinheiros gastos em prol das populações por pessoas que colaboram em variadíssimas obras em freguesias.
Segundo a Constituição e a própria lei, é claro que só os órgãos representativos das autarquias têm competência exclusiva para, no âmbito da sua circunscrição, exercer as variadíssimas atribuições que lhes são conferidas na lei, e não qualquer outra estrutura que a Constituição não consagre.
Creio que o Sr. Deputado terá feito alguma confusão quando, ao querer caracterizar o baldio, estabeleceu os limites. Ora, o que caracteriza os baldios não é, de modo algum, o limite, mas sim a sua afectação. Afectação essa - a que, por várias vezes ao longo da minha intervenção, fiz referência - que é dada a determinados utentes, que podem ser de toda a freguesia, de parte dela, consoante o costume e a tradição, para a usarem e fruírem para vários fins. Isto é o que caracteriza os baldios: e o uso comunitário, e não, de forma alguma, as suas limitações.
Há ainda uma afirmação que o Sr. Deputado fez que me deixa um pouco perplexo, senão mesmo preocupado, que é a de dizer que as juntas de freguesia não têm sensibilidade para utilizar os dinheiros.
Confesso que esta afirmação feita deste modo é grave, porque as juntas de freguesia, que são os órgãos executivos da autarquia freguesia, tem receitas e obrigações de aplicar os dinheiros. Portanto, não consigo perceber que se afirme que as juntas de freguesia não têm sensibilidade para utilizar os dinheiros em prol das populações.
As juntas de freguesia e os órgãos autárquicos - independentemente da colaboração que possam ter e lhe queiram chamar- resultam de uma eleição democrática das populações. Portanto, elas têm sensibilidade porque as pessoas que compõem esses órgãos, bem conhecidas dos seus concidadãos na respectiva comunidade, mereceram a total confiança.
O Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca fala em baldios na posse das freguesias. Não entremos outra vez no problema da confusão!
Não se trata da posse das freguesias, mas sim de que o baldio está afecto a um fim especial que é o uso e fruição por determinados moradores de determinada freguesia ou parte dela ou até de mais do que uma freguesia.
Não está propriamente na posse da freguesia. Está sim na sua titularidade, como bens do domínio público de que ela não pode dispor, mas tem o poder e o dever de administrar em prol e em benefício dos utentes dos mesmos baldios.
V. Ex.ª disse que tem conhecimento de baldios que foram usurpados. Bem, há usurpações, umas de má-fé, outras cujas juntas de freguesia alienaram e que nós prevemos possam ser, efectivamente, anuladas. Mas, por exemplo, os baldios florestados, tanto quanto eu sei - e creio que o Sr. Deputado também sabe -, continuam a manter as mesmas características e a mesma natureza de baldio, isto é, não perderam a natureza de baldio só porque os Serviços Florestais os florestaram.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Entretanto assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Basílio Horta.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Rogério de Brito, tem a palavra, ao que julgo para um protesto.

O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Sr. Deputado Marques Mendes, realmente assim é difícil a gente entender-se. Possivelmente por falta de tempo, o Sr. Deputado respondeu-me de uma forma extremamente curta e pouco explícita, tendo dado muito mais tempo a outras questões, o que, de algum modo, pode também demonstrar a dificuldade de contra-argumentar neste aspecto em matéria jurídico-constitucional.
De qualquer modo, refiro-lhe novamente que o Sr. Deputado afirma que são as autarquias a pessoa colectiva em que se integram as comunidades. É evidente que as comunidades estão dentro de um determinado limite administrativo, e isso está fora de questão.

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Mas do que não há qualquer dúvida é que, constitucionalmente, são claramente destrinçadas as pessoas públicas "autarquias territoriais" e as "comunidades locais". O Sr. Deputado não pode negar que estão destrinçadas simultaneamente.
O que está em causa não é a titularidade porque a titularidade não é da autarquia; a titularidade é, efectivamente, o bem público e o que está em causa é a posse, fruição e gestão desse bem comunitário por parte das comunidades locais. E tanto é assim que a Constituição o explicita.
Mas ainda colocaria outra questão: o Sr. Deputado será capaz de me indicar que outros bens públicos existem, para além dos baldios, na posse útil e gestão das comunidades locais?
Gostaria que o explicitasse e também que justificasse por que é que o Conselho Nacional dos Baldios está como representante das comunidades locais no Conselho Nacional do Plano.
Gostaria ainda de lhe referir o artigo 62.º da Constituição da República, que também distingue quer o papel das autarquias quer o das comunidades locais. É preciso ter isto em conta porque, efectivamente, elas prefiguram interesses e problemas distintos, mesmo que eventualmente tenham - e podem ter - muita coisa em comum. Mas têm questões que são perfeitamente peculiares a cada uma delas.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Marques Mendes, estão inscritos outros Srs. Deputados para protestar. Deseja responder no fim ou protesto a protesto?

O Sr. Marques Mendes (PSD): - Respondo no fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Nesse caso, tem a palavra, para um protesto, o Sr. Deputado Lino Lima.

O Sr. Lino Lima (PCP): - Sr. Deputado Marques Mendes, não lhe pedi a distinção formal entre o vosso projecto e o código fascista de Marcelo Caetano. O que lhe pedi foi que nos falasse sobre as consequências concretas do vosso projecto - no caso de ser aprovado - relativamente àquilo que sucedeu e que estava a suceder antes do 25 de Abril. Pedi-lhe isto porque o Sr. Deputado sabe muito bem que antes do 25 de Abril tinha passado a haver entidades - as juntas de freguesia - que podiam administrar os baldios. Passou então a falar-se em baldios do Estado e, em função dessa nova figura jurídica criada - baldios do Estado -, que não tinha qualquer tradição no nosso direito, os serviços florestais invadiram os baldios. Quais foram as consequências disso para as populações?
Pela administração das juntas de freguesia e em consequência da actividade dos serviços florestais, as populações viram reconhecidos e favorecidos os seus direitos e os seus interesses ou, pelo contrário, isso foi uma forma de expropriar as comunidades locais dos seus baldios e dos direitos que sobre eles tinham e também uma forma de criar todo um conjunto de problemas e de conflitos que tiveram sangue e mortos?
No vosso projecto, muito embora comecem por dizer que os baldios não podem ser alienados, que são excluídos do comércio jurídico, etc., vêm depois dizer, logo no artigo 9.º, que "os baldios constituídos por terrenos com capacidade de uso predominantemente não agrícola podem ser submetidos, total ou parcialmente, ao regime florestal, a requerimento das juntas de freguesia, com parecer favorável da respectiva assembleia".
Ora, isto é já uma porta aberta para que voltemos em concreto ao passado e àquilo que sucedeu no passado. É isso que nós não queremos. Queremos que se respeitem os direitos das populações que têm usufruído dos baldios, porque verificamos pela prática, pela tradição histórica e ainda por um passado muito presente que os baldios administrados pelas juntas de freguesia e os que foram entregues aos serviços florestais não corresponderam, de maneira nenhuma, aos interesses das populações e foram inimigos declarados dessas populações.
É isso que nós queremos evitar e era isso que eu gostava que o Sr. Deputado me dissesse, ou seja, que o vosso projecto não conduz a essa situação anterior ao 25 de Abril.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para um protesto, o Sr. Deputado João Abrantes.

O Sr. João Abrantes (PSD): - Em primeiro lugar, queria desfazer uma confusão feita propositadamente pelo Sr. Deputado Marques Mendes relativamente às minhas palavras.
Eu referi, e repito, que o âmbito das freguesias é, de facto, muito mais vasto do que o da comunidade e que a aplicação das verbas vai dar-se em locais que nada têm a ver com as localidades onde se situam os baldios, com prejuízo dessas populações.
Isso mesmo está patente num parecer do Sr. Provedor de Justiça, em que estão bem patentes todas as preocupações por nós aqui levantadas. Portanto, tal parecer merece ser ponderado e considerado.
Não sei se o Sr. Deputado conhece o parecer a que me estou a referir, mas se porventura o não conhece dar-lhe-ei uma fotocópia.
Voltando ainda à realidade que tem sido a acção dos conselhos directivos de baldios e das comissões de compartes, é inegável que têm sido feitas obras - têm sido gastos milhares e milhares de contos em proveito das populações - com a colaboração das autarquias locais e que tais obras têm sido efectuadas a par com o desenvolvimento florestal.
Há também provas de que, nas zonas onde os baldios são administrados por conselhos directivos e comissões de compartes, os fogos são muito menos, o que prova que as populações se mobilizam e movimentam e que sentem aquilo que é, efectivamente, seu.
Isto trouxe, de facto, uma situação de paz e de harmonia aos campos e às terras, situação que é inegável e só a não aplicação das Leis n.ºs 39/76 e 40/76 tem impedido que esta paz continue.
Foi a esta situação que o meu camarada Lino Lima se referiu, ou seja, que se vai voltar a uma situação idêntica à do fascismo. Portanto, de certeza absoluta que essa desestabilização vai ser verificada.
Eu gostaria ainda de lhe colocar uma outra questão relacionada com um artigo do vosso projecto: o prazo de 5 anos, prescrito no artigo 6.º, foi determinado porquê? Não teria sido estudado em função do

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tempo em que se inviabilizou e impediu o funcionamento dos conselhos directivos e das comissões de compartes?
A nós parece-nos que foi isso que, efectivamente, aconteceu.
Por outro lado, gostaria ainda de lhe referir uma última questão, que é a seguinte: não se está a querer suprir com este projecto as carências da aplicação da Lei das Finanças Locais a que os senhores sempre têm fugido?
Entretanto, tomou assento na bancada do Governo o Sr. Secretário de Estado para os Assuntos Parlamentares.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para um protesto, o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Deputado Marques Mendes, em relação ao n.º l do artigo l.º do vosso projecto e a propósito dos 100 anos nele referidos, V. Ex.ª disse que os baldios florestados - eu direi: os baldios usurpados às populações pela florestação coerciva e que, como V. Ex.ª sabe, acabou por conduzir à quebra radical da criação de ovinos e caprinos, provocando uma maior emigração e graves prejuízos à população - não perdem a qualidade de baldios. Gostava que me esclarecesse se não acha que o n.º l do artigo 1.º do vosso projecto vai, exactamente, fazer perder essa qualidade de baldio aos baldios florestados.
Já agora, far-lhe-ia outra pergunta: não acha que neste momento é extemporâneo votar qualquer lei menos cuidada sobre os baldios? Acha que é prioritária para a solução da crise da agricultura qualquer lei deste sentido sobre os baldios?
Não acha que se impunha um estudo profundo da situação actual, um levantamento a nível de todo o País que claramente nos esclarecesse sobre os baldios existentes, isto é, quais os florestados e quais os destinados à pastorícia? Quais os geridos e fruídos directamente pelas populações? Quais os reflexos sócio-económicos desses baldios nas populações residentes na área onde eles se encontram?
Não acha que se deveria discutir com as populações acerca dos baldios e sobre o destino a dar-lhes e só depois se apresentar qualquer projecto de lei?
VV. Ex.ªs, no PSD, fizeram qualquer estudo neste sentido, que justificasse ou que servisse de base a este vosso projecto?
Já agora, ainda lhe pergunto se não acha que já existem demasiados baldios ilegalmente apossados por negociantes, nomeadamente da construção civil?
Por esse motivo, pergunto-lhe, Sr. Deputado, se o novo artigo 6.º e o artigo 8.º do vosso projecto não podem vir a favorecer ainda mais alguns casos - a que eu chamarei de obseuros - de ocupação ilegal de baldios, que se sabe existirem pelo país.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Mendes para contraprotestar, se assim o desejar.

O Sr. Marques Mendes (PSD): - Sr. Presidente, não vou fazer nenhum contraprotesto, na medida em que o que ouvi foram conclusões - cada um tira as
que quiser -, foram intervenções, ao fim ao cabo foram novos pedidos de esclarecimento sobre assuntos que ainda nem tinham sido versados.
Como o tempo de que disponho é muito limitado e porque outras intervenções de colegas da minha bancada responderão a algumas das questões colocadas, e sendo certo que dizem respeito já a debate e discussão na especialidade, reservar-nos-emos para referir a nossa posição nessa altura.
Não tenho, pois, que contraprotestar perante aquilo que não foi protestado.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Alexandre Reigoto.

O Sr. Alexandre Reigoto (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Discutimos, hoje, uma matéria que é significativamente doutrinária e politicamente controversa.
Vem desde há muitos anos uma controvérsia sobre n exacta qualificação jurídica dos baldios, realidade ancestral, os "logradouros do povo" que a ordem positiva foi tutelando, por vezes moldando e em outras ignorando o desuso dos seus incisos regulamentados. Não vamos, aqui, e neste debate político na generalidade, esgotar esta vexato quaestio dos juspublicistas portugueses que têm os seus expoentes em Marcelo Caetano, Rogério Ehrart Soares, Francisco José Veloso e Diogo Freitas do Amaral. Todos, quer em obras genéricas, quer em expressivas monografias apontaram valiosas contribuições à qualificação jurídica dos baldios, tendo em conta principalmente o desaparecimento da categoria das coisas comuns no Código Civil de 1966, e logo a necessidade de optar pela dicotomia coisas públicas versus coisas particulares, imanente à conceptuologia aportada pelo novo ordenamento jurídico privatístico português.
Não se desconhece que o Código de Seabra sistematizava as coisas comuns como um tipo de comunhão, de base germânica, a contitularidade em mão comum. As águas ganharam relevância autónoma com o famoso Decreto n.º 5787 e os baldios viram a sua inscrição ser consagrada no Código Administrativo e, particularmente, no seu título VI da parte I (artigos 388.º a 403.º), com a epígrafe capitular genérica: "Da classificação e aproveitamento dos baldios".
Posteriormente a 1966, a tendência doutrinária era para consagrar a natureza jurídica dos baldios como pertença privada das autarquias, mas, como escreve Ehrart Soares "sujeitos à afectação especial de suportar certas utilizações pelos habitantes de uma dada circunscrição ou parte dela". (Revista de Direito e Estudos Sociais, ano XIV, 1967, pp. 259 e seguintes.)
Mas ao discutirmos, hoje, a matéria dos baldios pretendemos, acima de tudo, confrontar tal realidade com a filosofia global que norteia a concepção de Estado de direito democrático resultante da Constituição da República Portuguesa. E aqui transferimos a problemática para âmago político, até porque, ao nível de qualificação jurídica, o artigo 89.º da lei fundamental é esclarecedor quanto à dominialidade pública dos baldios.

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Sr. Presidente, Srs. Deputados: Situado o problema, importa dizer que desde há algum tempo o CDS tem procurado através de diversas iniciativas legislativas adequar a tradicional figura dos baldios e, primacialmente, a sua administração aos efectivos e legitimados representantes das comunidades locais, revogando a conceptuologia e a estrutura orgânica resultante dos Decretos-Leis n.º" 39/76 (particularmente este) e 40/76, de 19 de Janeiro.
Na verdade, estes decretos-leis, anteriores ao texto constitucional, optaram por atribuir a administração aos compartes - quer ao nível de assembleia, quer ao nível do conselho directivo -, ou seja, a uma forma organizativa típica de uma quase democracia directa.
Resultaram destes novos diplomas alguns conflitos entre alguns conselhos directivos e juntas de freguesia - cujos litígios os tribunais ainda dirimem -, principalmente naquelas zonas em que problemas partidários assumiram a sua cristalização num ou noutro dos órgãos, dividindo as populações, extremando os interesses, em alguns casos impedindo o total aproveitamento económico dos baldios, não pondo «os homens de acordo», mas sempre prejudicando os benefícios a auferir pelas comunidades de bens a aproveitar por todos!
Mas, na lei fundamental, há uma completa omissão dos órgãos de compartes, que haviam sido criados e vieram à luz com o Decreto-Lei n.º 39/76, anterior à Constituição da República.
Surgiu depois a Lei n.º 79/77, de 25 de Abril. O seu artigo 109.º regulamenta e disciplina o uso e fruição dos baldios, sua definição pelas assembleias municipais ou de freguesias e sua administração pelas câmara municipais ou juntas de freguesia, conforme os casos.
Finalmente, a Lei n.º 91/77 revogou o artigo 109.º da citada Lei n.º 79/77, sem fixar qualquer outro regime que regulamente e discipline o uso e fruição de baldios.
Criou-se, assim, a nosso ver nesta matéria, um autêntico vazio legislativo.
Criou-se a situação para efectivamente se entregar os baldios -administração e gestão- aos compartes, que deles se apropriaram na sequência natural do Decreto-Lei n.º 39/76.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com efeito, os compartes na maior parte dos casos nem se constituem em assembleia nem esta elege o conselho directivo, não cumprindo a lei. Mas mesmo que os órgãos citados agissem de harmonia com as competências que a lei lhes confere, não há garantia de que sejam idoneamente eleitos, porque não há a garantia de que os respectivos cadernos eleitorais estejam correctamente elaborados e que as eleições tenham decorrido ou decorram com a necessária e honesta legalidade e isenção, visto não haver qualquer órgão que assegure a fiscalização de tal acto eleitoral.
Outrora, os terrenos baldios incultos e marinhos tinham fins específicos para aqueles que não possuíam terrenos: a manutenção e apascentação de gados - a produção e corte de matos nos montados e logradouros para acamar os animais -, originando os estrumes e o abastecimento de lenha usada como combustível.
Estas razões já não existem e por isso os baldios estão a ser desaproveitados e não ocupados e por conseguinte lançados ao abandono, porque não são úteis à comunidade.
Destas consequências resultou já um aproveitamento por parte do Estado, através da silvicultura, de alguns terrenos baldios, sendo certo que a lei em vigor obs-tacula a sua continuidade. Pode, pois, dizer-se que a única maneira de evitar a continuação do desaproveitamento dos baldios consistirá na sua entrega à entidade pública responsável - freguesia ou município -, pois são estes órgãos e só eles os legítimos representantes das populações, e que melhor assegurarão o seu aproveitamento, nas diversas formas ou serviços que lhes podem prestar- reservatórios de água, florestação, explorações agrícolas adequadas, miradouros; e até um desenvolvimento pecuário cooperativo.
Como sabem, Sr. Presidente e Srs. Deputados, não havendo entendimento entre os órgãos autárquicos da freguesia ou município e a assembleia de compartes ou o conselho directivo - e normalmente não há -, sucede que os rendimentos dos baldios, e alguns têm largos proventos - sobretudo os florestados -, não podem ser utilizados sem o acordo dos autarcas, e, sendo assim, é manifesto o prejuízo das populações.
Mas também é manifesto o mal-estar das populações, porque não faz sentido cometer a administração dos baldios a outras entidades que não sejam as autárquicas, provocando situações de conflito, de paralelismo e de sobreposição, sendo certo que tais terrenos se destinam primacialmente a ser usados e fruídos pelas populações locais, que pelo voto confiaram aos titulares dos órgãos autárquicos a prossecução e defesa dos respectivos interesses recíprocos e a satisfação das necessidades comummente sentidas e a sua representatividade.
É esta situação que se pretende corrigir, consagrando, globalmente, a figura dos baldios, quer na reiteração da sua definição, quer inovando a sua estrutura orgânica, quer prevendo a susceptibilidade em algumas situações da sua desafectação quer ainda perspectivando - como o faz lambem em projecto autónomo a ASDI - a validade de alguns actos jurídicos praticados ou a praticar.
Assim, os projectos em apreço -o nosso e o do PSD - são equivalentes ao nível da doutrina que os envolve e podem do nosso prisma servir de base a um diploma único, que resulta em sede da especialidade, que tutela e consagre, adequada e sistematicamente, o estabelecido na Constituição da República, revogando, desde logo, a Lei n.º 91/77.
Neste conceito, a administração e gestão dos baldios, como as prevensas, é um acto constitucional e legítimo, não ofende nem contraria a vontade histórica dos povos, representa a continuação do progresso e desenvolvimento de muitas localidades - em geral as mais carecidas e desprotegidas - e faz esquecer a odiosa e violenta expoliação dos baldios às. populações.
Sendo os baldios de proveito exclusivo dos moradores de uma freguesia ou de parte dela, o próprio uso e fruição por parte das entidades públicas, dos bens do domínio público, por exemplo, não têm assento em normas administrativas que, em princípio, se limitam, nesse aspecto, a referir os termos em que podem ser usados em proveito de todos, ou em benefício de todos, ou pelas pessoas públicas no exercício de poderes soberanos.

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A lei fundamental, na parte que visa a matéria em apreço, o artigo 89.º, n.º 2, consagra:

2 - O sector público e constituído pelos bens e unidades de produção pertencentes a entidades públicas ou a comunidades, sob os seguintes modos sociais de gestão:

a) ...................................................
b) ...................................................
c) Bens comunitários com posse útil e gestão das comunidades locais.

É conveniente salientar que esta alínea mantém a sua formulação depois da revisão constitucional, não trazendo qualquer inovação para a compreensão da matéria. Acontece, portanto, que os órgãos de compartes não foram considerados no poder local instituído pela Constituição. Na lei fundamental em nenhum preceito se fez referência aos órgãos de compartes que, anteriormente, haviam sido criados pelo referido Decreto-Lei n.º 39/76.
Nem se pode dizer, aduzindo o artigo 89.º, que a Constituição remetendo para o conceito das comunidades locais quis inovar criando uma nova entidade específica para a gestão de «bens comunitários», um tipo de «direito sem sujeito» que não acolhemos numa interpretação sistemática do texto constitucional.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Regulamentar e disciplinar o uso e fruição dos baldios é, a nosso ver, função que só pode ser atribuída a quem, constitucionalmente, detém poderes de autoridade, e destes só dispõem os órgãos de soberania, os órgãos das regiões autónomas e os órgãos do poder local.
É às autoridades locais que incumbe, nos termos constitucionais, o dever de, através dos seus órgãos respectivos, providenciar no sentido da defesa dos interesses próprios e específicos das populações locais.
Os membros dos órgãos autárquicos são eleitos pelas populações locais respectivas, por voto directo e secreto, o que lhes assegura legitimidade popular.
Entendemos, finalmente, que sendo a propriedade do domínio público das autarquias, os poderes de uso e fruição cabem aos órgãos do poder local, podendo estes, em razão da afectação especial dos baldios, conceder poderes de administração às entidades que o costume tenha consagrado. A democracia e a história assim o exigem.

Aplausos do CDS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, para que efeito está a pedir a palavra?

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Para um pedido de esclarecimento, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Deputado Alexandre Reigoto, ouvi atentamente a sua intervenção, mas fiquei com algumas dúvidas que gostava de lhe colocar.
Logo no terceiro parágrafo do preâmbulo do vosso projecto, referem que «ora, são as autarquias locais ... quem, nesta lógica, deve administrar aqueles terrenos que se destinam primacialmente a ser usados e fruídos pelas populações locais». Ora, «primacialmente» pressupõe, com certeza, outras utilidades. Assim, desejo saber quais são as outras utilidades que VV. Ex.as prevêem para a utilização dos baldios.
Quanto ao artigo 2.º, VV. Ex.as declaram que «os baldios são administrados pelas juntas de freguesia ... por iniciativa própria ou a pedido de um número significativo de cidadãos eleitores residentes, delegar tarefas administrativas em organizações ...». Que tipo de tarefas administrativas prevê para isto e o que entende por número significativo de cidadãos eleitores residentes?
Tenho ainda outras dúvidas, mas passo directamente aos artigos 5.º e 6.º, onde me parece haver verdadeira intenção do CDS em alienar claramente os baldios à entidade privada.
Diz-se no artigo 5.º do projecto «os terrenos baldios encontram-se fora do comércio jurídico, não podendo no todo ou em parte, salvo o disposto no artigo seguinte...» e a verdade é que no artigo seguinte propõe-se que «são válidos os actos e negócios jurídicos que desafectem e alienem quaisquer parcelas de baldios quando confinantes com lugares ou aglomerados populacionais e se destinem à construção de habitações ou de quaisquer edifícios de interesse social» sem se declarar quem são as entidades que vão construir.
V. Ex.ª conhece a realidade do País, sabe que este n.º l do artigo 6.º é excessivamente perigoso porque possibilita compadrios de toda a espécie. Por isso, pergunto-lhe se, realmente, a intenção do CDS ao apresentar este projecto é ou não a de abrir claramente os baldios à entidade privada, de forma a prejudicar ainda mais as populações que até agora têm usufruído dos baldios.

O Sr. Presidente: - Para responder ao pedido de esclarecimento que lhe foi formulado, tem a palavra o Sr. Deputado Alexandre Reigoto.

O Sr. Alexandre Reigoto (CDS): -A tudo quanto o Sr. Deputado Corregedor da Fonseca disse resumo a minha resposta ao seguinte: além das utilidades que mencionei na minha intervenção, os baldios têm outras como, por exemplo, a construção de habitações para os pobres, a construção de logradouros públicos, de fontanários, de qualquer edifício útil à comunidade, de equipamento social, etc.
Quando o Sr. Deputado menciona o n.º 2 do artigo 5.º que diz «os actos ou negócios jurídicos que tenham como objecto a apropriação de terrenos baldios...», esqueceu-se de ler o que dizemos algures, ou seja, que a qualquer tempo podem ser revogados os compromissos que hajam sido tomados com entidades particulares.
Como esses contratos podem ser revogados, creio que, nesse aspecto, está salvaguardada a preocupação manifestada ao pretender insinuar que os negócios jurídicos podem ser uma questão definitiva. Mas não é assim porque o nosso projecto não prevê isso, mas sim que tais negócios podem ser anulados a todo o tempo.
Sr. Deputado, não sei se respondi às suas perguntas. Se não o fiz, apresento-lhe as minhas desculpas.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, deseja protestar?

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O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE:) - Desejo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Deputado, a sua argumentação não me convenceu. É evidente que o que se pressupõe da leitura do artigo 6.º do nosso projecto é a possibilidade de alienar - e muito rapidamente - os baldios para a construção de habitações. Diz-se ainda aqui «... de quaisquer edifícios de interesse social». V. Ex.ª diz que serão casas para os pobres, mas isso não vem aqui referido e seria bom que viesse. Mesmo assim, temos sérias dúvidas em podermos aceitar um artigo desta natureza, uma vez que sabemos o que está por detrás de algumas juntas de freguesia -todos sabemos como funcionam algumas juntas de freguesia, nomeadamente no norte do País- e o tipo de compadrios que podem existir para a construção de habitações.
Será fácil arranjar um baldio aliciante, com uma boa área, e declarar-se que seria óptimo fazer-se ali um bom edifício ou um bom prédio de apartamentos, ou outros edifícios - como se diz aqui - de interesse turístico.
Portanto, Sr. Deputado, é evidente que a vossa argumentação não me convenceu, pelo que estou em crer que a intenção clara e directa do CDS é apenas uma: facilitar a usurpação imediata e rápida dos baldios, prejudicando seriamente as populações.

O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, tem a palavra o Sr. Deputado Alexandre Reigoto.

O Sr. Alexandre Reigoto (CDS):- Sr. Presidente, não pedi a palavra para contraprotestar, mas é essa a forma regimental pela qual devo responder ao Sr. Deputado Corregedor da Fonseca.

Sr. Deputado, quero dizer-lhe que teremos tempo, aquando da discussão na especialidade, para respondermos a todas essas questões.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Vilhena de Carvalho.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei n.º 114/III, subscrito pelos deputados da ASDI, sobre a anulação de actos de apropriação de baldios, tendo uma formulação muito simples, quase dispensaria, tanto justificação, como apresentação.
Na verdade, ele nasce de uma necessidade concreta da vida real, por um lado, e, por outro, da insuficiente regulamentação da matéria por parte do Decreto-Lei n.º 40/76.
Como se sabe, em muitas regiões do País é grande o número de casos de apropriação indevida de baldios, seja através de actos de ocupação de facto, seja através de actos e negócios jurídicos feridos de nulidade.
Apesar de aquele Decreto-Lei n.º 40/76 atribuir legitimidade para a anulação desses actos às assembleias de compartes e, na sua falta, às junta de freguesia da área da situação das parcelas apropriadas, o certo é que muitos desses actos de apropriação só foram possíveis com a conivência das juntas de freguesia, acrescendo ainda a circunstância de as assembleias de compartes nem sempre se acharem construídas ou dificilmente se poderem constituir.
Daqui deriva, muito compreensivelmente, a necessidade de alargar a outras pessoas e entidades a legitimidade para intentar as competentes acções, com o objectivo de pôr cobro à delapidação dos baldios e à sua crescente apropriação privada, em contrário dos interesses das comunidades a quem pertencem.
O alargamento proposto estende-se à câmara ou câmaras municipais da área da situação dos prédios em questões e ao Ministério Público, entidades que se têm por idóneas para a defesa dos interesses em causa.
Por outro lado, estabelece-se a possibilidade de anulação dos actos ou negócios jurídicos de que se trata poder ter lugar, também, através da chamada acção popular.
A tanto se resume, pois, a economia do projecto de lei n.º 114/III, o qual é informado por uma clara preocupação de preservação dos baldios, como garantia do seu aproveitamento integral por parte dos seus possuidores tradicionais.
Dir-se-á que, achando-se em discussão os projectos de lei n.º 281/III, do PSD, e 199/III, do CDS, os quais apontam para a revogação do Decreto-Lei n.º 40/76, e a ter lugar a sua aprovação, o nosso projecto de lei, que visa a alteração do artigo 3.º daquele decreto-lei, perderia de todo o seu sentido útil.
Mas não é assim, no nosso modo de ver. De facto, seja qual for o texto final que venha a fixar o regime dos baldios, sempre a matéria de que trata o nosso projecto de lei terá de ser considerada, pois não poderão deixar de se prever e de a elas prover, as situações criadas pelos actos de apropriação indevida, seja de facto, seja através de negócios jurídicos anuláveis, de parcelas integrantes dos baldios.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A circunstância de existirem, espalhadas pelas diversas regiões do País, áreas imensas de baldios, o facto de a eles se acharem ligados interesses legítimos de numerosas populações, as mais delas pertencentes a estratos sociais de modesta condição social e a relevância económica que os mesmos baldios representam, não só para essas populações, como para o País, faz revestir o debate dos projectos de lei sobre os baldios do maior interesse, devendo concitar o máximo das atenções e desaconselhar a menor das precipitações por parte desta Câmara quanto ao tratamento desta matéria.
A esta consideração inicial juntemos o reconhecimento do número e variedade das iniciativas legislativas - as de agora e as apresentadas em anteriores legislaturas e ainda o manancial de exposições caído na Mesa da Assembleia da República e na Comissão de Agricultura, oriundas de conselhos directivos, secretariados de baldios e mesmo de juntas de freguesia e de câmaras municipais - e ficar-se-á com um quadro mais alargado dos reais interesses em jogo e do cuidado com quo, a alterar-se a legislação vigente, se deve proceder às inovações tidas por convenientes.
Naturalmente que quando lemos ou ouvimos dizer, por exemplo, que os projectos de lei pendentes nesta Assembleia sobre os baldios são «projectos gatunos», que o projecto de lei n.º 281/III é um diploma «infame e antinatural» e que com ele se pretende «roubar os povos», nós ficamos de cabeça fria e orelhas moucas e conhecemos muito bem a autoria de tais trovões.

Uma voz do PSD: - Muito bem!

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O Orador: - Não ignoramos, todavia, que o problema tem implicações de carácter económico e de carácter social e até político, de onde a fixação de um novo regime jurídico dos baldios deva, quanto a nós, afeiçoar-se à realidade dos factos mais do que moldar estes a abstractas concepções de direito.
A complexidade do problema, quanto a nós, deriva desde logo da circunstância de nem sequer os chamados «tratadistas» se acharem de acordo quanto à natureza jurídica dos baldios. Diríamos mesmo que existem duas linhas de pensamento diametralmente opostas, a que chamaremos, por ligação dos seus autores à respectiva escola, de «escola de Lisboa», por um lado, e «escola de Coimbra», por outro.
São os baldios coisas públicas? São coisas comuns? São coisas particulares? - Eis o que, em linguagem de escola, poderíamos chamar de autêntica vexata questio.
Por um lado, a escola de Coimbra, com nomes como José Tavares, Guilherme Moreira e Cabral Moncada, entre outros, considera os baldios objecto de propriedade pública das autarquias locais, podendo entrar no comércio privado por desafectação, nos termos gerais do domínio público - isto perante o Código Civil de 1867.
Por outro lado, a escola de Lisboa, com Marcelo Caetano em lugar cimeiro, diz que não é assim: que os baldios são coisas de uma categoria muito diferente das coisas públicas, porque as coisas públicas são utilizadas de harmonia com o seu destino e função no exercício de um direito subjectivo público, enquanto que os baldios fornecem um proveito económico imediato aos seus fruidores, que são individualizados e aos quais pertence em exclusivo, ou seja, com o direito de não permitirem a outrem essa fruição. E mais ainda: que as coisas públicas satisfazem necessidades colectivas a que o Estado ou as autarquias têm por função prover e o interesse privado dos utentes coincide com o interesse público da utilização.
Ao invés, os baldios são explorados pelos próprios interessados para satisfação de necessidades individuais, perfeitamente distintas entre si.
Tudo isto levou a doutrina a defender, segundo conclui Marcelo Caetano, que os baldios se incluem num domínio comum, categoria bem distinta do domínio público, caracterizada, sobretudo, pela propriedade comunal dos vizinhos de certa circunscrição ou de parte dela.
Os bens situados na área desse domínio comum constituiriam, mesmo, um certo tipo de propriedade colectiva, como é também reconhecido por outros autores.
Não se desconhece que o Código Civil vigente não trata expressamente da velha categoria das «coisas comuns», que eram reconhecidas e regulamentadas no velho Código do Visconde de Seabra, facto em que certa doutrina se apoia para considerar, agora, os baldios como coisas públicas, a que devia corresponder um regime jurídico próprio destas coisas públicas. Só que, quanto a nós, isto nem é insusceptível de discussão, nem definitivo.
De facto, o Código Civil vigente, ao consignar, no seu artigo 3.º, que «os usos que não forem contrários aos princípios da boa fé são juridicamente atendíveis quando a lei o determine», abre caminho a que, por lei, se possam reconhecer formas tradicionais de propriedade colectiva em favor de todos ou alguns dos vizinhos de qualquer lugar do território nacional, propriedade essa incidente sobre terrenos que sejam ou tenham sido trabalhados pelos mesmos vizinhos e seus antecessores durante um certo número de anos, em regime de exploração agro-silvo-pastoril ou silvo-pastoril em comum, de acordo com os seus usos e costumes.
Ora, a realidade da existência, em concreto, de formas desta propriedade colectiva, em diversas regiões do País, e a justa salvaguarda dos interesses das comunidades de vizinhos que das mesmas têm usufruído, secularmente, de geração em geração, merece, quanto a nós, contemplação legal na lei a elaborar sobre o regime dos baldios.
Quanto a nós, nem se deverão inventar ou forjar comunidades "desse tipo e legislar como se outras realidades diferentes não existissem, nem apenas contemplar estas, esquecendo aquelas.
Em coerência com este ponto de vista, propenderíamos, assim, para que se procurasse estabelecer, quanto ao regime legal dos baldios, um sistema misto que tivesse verdadeiramente em conta o que acabámos de dizer.
Na esperança de que se torne possível, em sede de especialidade, estabelecer esse preconizado regime, aprovaremos, na generalidade, todos os projectos de lei em discussão.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Cunha e Sá pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Cunha e Sá (PS): - Ê para formular um pedido de esclarecimento, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado Cunha e Sá.

O Sr. Cunha e Sá (PS):- Sr. Deputado Vilhena de Carvalho, serrano, nado e criado há pouco menos de meio século na «Barreias» das Terras do Demo, 3 eventos, hoje recordações, marcaram a primeira parte da minha adolescência: a emigração - à data apenas para o Brasil-, o volfrâmio das volframistas e a chamada «guerra dos baldios». Além de outros, como é óbvio, todos estes aspectos, em maior ou menor grau, marcaram o itinerário político e literário do mestre Aquilino - Aquilino Ribeiro, meu conterrâneo.
Efectivamente, nalgumas obras, como em Quando os Lobos Vivam, publicada na parte final da década de 50, aliás prontamente apreendida no regime de Salazar e que li à sucapa em Viseu, embora a temática principal fosse a mencionada «guerra dos baldios», uma das personagens, assaz a mais rica, do livro O Manuel Louva Deus encarna a figura do «brasileiro», emigrante definitivamente regressado à «santa terrinha», depois de muitos anos de «brasis», o qual uma vez conhecedor do processo de afectações dos baldios, adere e encabeça a contestação das populações. Embora ainda muito jovem vivi e assisti a um processo extremamente mal encaminhado e prepotente, além de manifestamente ardiloso por parte dos responsáveis dos serviços oficiais. Mas não só: os então presidentes das câmaras e regedores das freguesias, esquecendo os objectivos sociais dos baldios, as tra-

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dições comunitárias seculares e, mais grave ainda, a prévia audição ou mesmo conhecimento dos respectivos utentes, estabeleceram acordos secretos com os representantes do Governo, que oferecia a isca ou o engodo de magras indemnizações ou subsídios, que sempre permitiam inaugurar o chafariz ou a recuperação do adro da igreja. Referi, pois, até aqui, apenas aspectos evocativos.
A pergunta que lhe quero fazer reporta-se à referência que V. Ex.ª fez relativamente a um sistema misto. Qual é a posição de V. Ex.ª, uma vez que há 2 tipos de baldios -os baldios que funcionam como simples logradouros de toda a população e os baldios que se ligam só a um grupo de população-, no sentido de saber que legislação é que seria aplicável a uns e a outros, ou que legislação mista é que estará feita para estes 2 tipos diferentes de baldios.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Vilhena de Carvalho, há mais inscrições para pedidos de esclarecimento. V. Ex.ª deseja responder no fim a todos os Srs. Deputados?

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Respondo no fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para formular um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Deputado Vilhena de Carvalho, V. Ex.ª referiu, na sua intervenção, a ocupação indevida de baldios que existe um pouco por todo o lado. Estamos perfeitamente de acordo, porque essa também é a nossa opinião.
Já não entendo que, na parte final da sua intervenção, V. Ex.ª tivesse declarado que irá votar favoravelmente, na generalidade, os projectos de lei que estão a ser debatidos - creio que foi isso que disse.
Quero perguntar-lhe, para já, se V. Ex.ª encontra naqueles articulados algo de positivo que possa vir a melhorar a lei existente e se não acha que aqueles articulados poderão abrir ainda mais as portas aos interesses privados e outros, não considerando os interesses das populações, o que poderá finalmente vir a possibilitar uma ocupação ainda mais indevida dos baldios. Esta é a primeira pergunta.
Em relação a este debate, pergunto a V. Ex.ª -e já há pouco tinha feito uma pergunta a um outro Sr. Deputado, que não respondeu - se acha ou não que, antes de haver qualquer alteração à lei e ao regime dos baldios, antes de qualquer alteração de fundo à lei actual, antes de se aprovarem projectos de fundo -embora entendamos, e posso desde já informá-lo que o projecto de lei apresentado pelo Agrupamento Parlamentar da ASDI é defensável-, se deveria fazer um profundo levantamento sobre a situação actual dos baldios e sua incidência nas economias locais. Penso que só então, depois desse estudo, é que se poderia eventualmente melhorar o regime dos baldios e não introduzir-lhe malfeitores. Pergunto-lhe se, realmente, não seria preferível fazer-se primeiro um levantamento exaustivo, longo e profundo, e só posteriormente apresentarmos aqui projectos de lei que alterem radicalmente o existente regime dos baldios.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estamos na hora regimental prevista para se fazer o intervalo. No entanto, se estivessem de acordo, ouvíamos todos os pedidos de esclarecimento e, depois, usaria da palavra o Sr. Deputado Vilhena de Carvalho, para responder, se assim o entender.
Nenhum dos Srs. Deputados se opõe?

Pausa.

Srs. Deputados, uma vez que ninguém se opõe, vamos proceder dessa forma.
Para formular um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Rogério de Brito.

O Sr. Rogério de Brito (PCP): -Sr. Deputado Vilhena de Carvalho, tive em consideração os doutos pareceres que o Sr. Deputado transcreveu sobre a natureza jurídica dos baldios, feita à luz dos Códigos Civis de 1867 e de 1966 e até do Código Administrativo em vigor no tempo do anterior regime, o regime fascista. Chamo-lhe a atenção exactamente para isso. Ë que todas essas análises foram feitas com base na vigência dos Códigos Civis de 1867 e de 1966. Os próprios pareceres, a própria leitura de Marcelo Caetano é feita sobre os artigos do Código Civil de 1867, concretamente sobre os artigos 380.º e 381.º Posteriormente, as leituras feitas sobre o fim da propriedade comunal, etc., são feitas sobre o Código Civil de 1966.
Peço-lhe atenção, Sr. Deputado, porque o preceituado na Constituição da República, que é de 1976, vem dar um novo conteúdo à discussão da natureza jurídica dos baldios e vem definir, claramente e com todo o rigor, se não a titularidade - que a define -, o direito da posse útil e da gestão. Também é um facto que, mesmo que se colocasse em questão a titularidade, ter-se-á sempre que optar pelo detentor da posse útil e da fricção. É preciso que isto seja tido em devida conta.
Por outro lado, tendo conhecimento do projecto de lei apresentado pela ASDI e sendo certo que ele tem como base a própria posição do Provedor da Justiça -e, se calhar, até o parecer da Procuradoria-Geral da República-, gostaria que me explicasse como é que vai conciliar este projecto com os projectos de lei do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Vilhena de Carvalho. Informo-o de que dispõe de 4 minutos para o efeito, que é o tempo que resta ao seu agrupamento parlamentar.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): -Sr. Presidente, como o PCP não tem limitação de tempo, se me faltar tempo para responder ao Sr. Deputado Rogério de Brito, tenho a certeza de que ele me vai dispensar algum do seu tempo, naturalmente com permissão do Sr. Presidente.

Risos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Vilhena de Carvalho, a Mesa não vê inconveniente nisso. Tem a palavra, Sr. Deputado.

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O ir. Vilhena de Carvalho (ASDI):- Sr. Deputado Cunha e Sá, apreciei imenso a evocação que fez, pois rememorou a esta Câmara que em terras que bem conhece e de onde é oriundo existirão, porventura, ainda comunidades daquele tipo que também descrevi, isto é, comunidades possuidoras e detentoras, ao menos in illo tempore, de baldios que foram expropriados e porventura espoliados e que deram lugar àquilo a que chamou «guerra dos baldios».
Ora, é receando que possa continuar a haver conflitos à volta dos baldios como têm havido, apesar da existência dos Decretos-Leis n.ºs 39/76 e 40/76 - apesar dessa regulamentação, que já é pós-25 de Abril, não têm deixado de haver conflitos à volta dos baldios -, que entendo a absoluta necessidade de se estabelecer um correcto regime jurídico para os baldios. Quando digo que se deve procurar estabelecer um correcto regime jurídico para os baldios, quero significar que se devem encontrar as soluções adequadas para a realidade existente.
E tal como eu me mostro respeitador das comunidades que ainda subsistem, das antigas comunidades e dos restos daquilo a que chamei propriedade colectiva - tenho que ter isso em conta -, também não posso legislar em termos de inventar comunidades onde elas não existem. Dessa maneira, se se estabelece uma lei partindo do princípio de que todos os baldios - quantos venham a ser reconhecidos - terão como beneficiários entidades inexistentes; estou a fazer ficção.
Como, por um lado, a realidade nos dá a existência dessas comunidades mas, por outro lado, nos coloca perante situações diversas, preconizo que o regime a estabelecer seja um regime que contemple todas essas situações. Chamei-lhe regime misto, como lhe podia chamar aquilo que agora estou a dizer, ou seja, um regime que contemple a realidade e que não esteja a ficcionar aquilo que não existe, mas que não deixe de corresponder às reais necessidades, por um lado, aos interesses legítimos, por outro, e aos usos e costumes tradicionais ainda vigentes.
Ninguém pensará, por exemplo, em restituir a Rio de Onor aquilo que está debaixo das águas. Não podemos ficcionar um novo Rio de Onor, mas não nos podemos abstrair da existência, ainda hoje, de comunidades tradicionais que merecem o respeito, pelos usos tradicionais e pela utilização tradicional de determinados bens, que classifiquei -e adiro à tese- de propriedade colectiva.
Neste aspecto, aproveito já para dar em parte resposta ao Sr. Deputado Rogério de Brito, no sentido de afirmar que sou mais generoso que aquilo que o Sr. Deputado mostrou ser, porque V. Ex.ª faz finca-pé na posse útil e fruição dos vizinhos dos baldios e eu dou-lhe mais que a posse útil e fruição: dou-lhes um título de propriedade a que chamo «propriedade colectiva», desde que se verifiquem os requisitos que naturalmente têm de se exigir para a verificação da existência desse tipo de propriedade colectiva.
Suponho ter respondido ao Sr. Deputado Cunha e Sá e passo agora a responder ao Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca. Agradeço-lhe o facto de, por um lado, dizer que está de acordo com o nosso projecto de lei. Mas perguntou-me o Sr. Deputado como é que ele pode ser conciliável com a eventual aprovação dos projectos de lei do CDS e do PSD.

O. Sr. Presidente: - Desculpe-me interrompê-lo, Sr. Deputado, mas peco-lhe o favor de abreviar a sua resposta.

O Orador: - Sr. Presidente, penso que o tempo que agora estou a gastar já está a correr por conta dos interrogantes.
Sr. Deputado, penso que é compatível, na medida em que nos projectos em causa se prevê a possibilidade da anulação de actos ilícitos praticados em relação aos baldios, de modo que é uma questão de alargar as pessoas e entidades que têm legitimidade para intentar as respectivas acções de anulação. Não fazemos finca-pé para que o nosso projecto seja aprovado autonomamente e saia uma lei a partir dele; temos, sim, o propósito de que a matéria nele contida faça parte do conteúdo da lei sobre os baldios a elaborar na base de l, 2, 3 projectos, de um texto alternativo ou daquilo que efectivamente a esta Assembleia, na sede própria, parecer mais indicado.
Relativamente à pergunta que me fez, com a referência de que já a tinha feito a um outro nosso colega e, que, como não obteve resposta, endossou para mim, quase estava na disposição de fazer outro endosso - mas não o farei. Suponho que V. Ex.ª perguntou se nos projectos de lei do CDS e do PSD havia alguma coisa de positivo. A minha resposta é afirmativa. Por isso é que, na generalidade, os vou votar favoravelmente, procurando bater-me, na especialidade, para que eles contemplem os aspectos que efectivamente versei na minha intervenção.
Relativamente ao Sr. Deputado Rogério de Brito, já respondi a uma parte da questão que me colocou. No entanto, a memória não dá para tudo, o Sr. Deputado falava no projecto da ASDI, mas não sei em que sentido - era com certeza para apoiar.

Risos do PS, do PSD, do CDS e da UEDS.

Havia uma outra questão colocada pelo Sr. Deputado que dizia respeito ao projecto da ASDI - não me lembro bem em que termos, mas suponho que era para apoiar o projecto. Não é assim, Sr. Deputado?

O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado Vilhena de Carvalho.

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Sr. Deputado Vilhena de Carvalho, devo dizer-lhe que, não fora a contradição - que, quanto a nós, é mais do que manifesta- entre o projecto da ASDI e a sua posição favorável aos projectos do PSD e do CDS, iríamos com certeza apoiá-lo. Mas, na medida em que o Sr. Deputado, inclusivamente, reconhece a possibilidade de o vosso projecto, em sede de especialidade, ser adequado aos próprios projectos do PSD e do CDS, então não há hipótese alguma. Por outro lado, ainda não respondeu à questão dos outros pareceres que transcreveu, que se reportavam à vigência de códigos civis e de preceitos dos mesmos códigos que estão ultrapassados pelo preceituado na própria Constituição da República de 1976.

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O Orador: - Não vejo em quê, Sr. Deputado Rogério de Brito. Não vejo em quê, porque, para mim, diz mais o artigo 3.º do actual Código Civil do que a própria Constituição, na medida em que o artigo 3.º do actual Código Civil permite que, por lei, se respeitem determinados usos e costumes. Não vejo que haja um preceito na Constituição que diga outro tanto.

O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Contra a Constituição!

O Orador: - Contra a Constituição? Penso que não.

O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Dá-me licença que o interrompa de novo, Sr. Deputado Vilhena de Carvalho?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Sr. Deputado Vilhena de Carvalho, diria tão-somente que esses direitos que pretende conferir aos baldios são os que estão consignados na actual legislação em vigor. O que se passa -e ficaria desde já avançado o protesto que eu iria fazer- é que o Sr. Deputado afirma que pretende conferir direitos aos povos dos baldios que eles não têm, isto é, dar-lhes direitos.

O Orador: - Reconhecer!

O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Reconhecer! Então diria que lhes dá o que não pode dar e que lhes retira aquilo que lhes é devido e que já têm neste momento.

O Orador: - Sr. Deputado Rogério de Brito, ainda não retirei nada a ninguém, nem sequer dei, mas espero poder contribuir para que se estabeleça um regime que efectivamente se conforme o mais possível com a realidade. Aliás, gostaria de lhe lembrar que, quando faz o elogio -e algum é devido- aos Decretos-Leis n.ºs 39/76 e 40/76, nesses próprios decretos-leis se reconhece que não são a última palavra sobre a matéria e hoje isso é mais que evidente. O facto de se virem a regulamentar de maneira diferente nem sequer significa que muito do que está nesses decretos-leis não deva ser tido em consideração.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está suspensa a sessão para o habitual intervalo.

Eram 17 horas e 45 minutos.

Após o intervalo, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Carlos Lage.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 18 horas e 35 minutos.

O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Soares Cruz.

O Sr. Soares Cruz (CDS): - Sr. Presidente, quero-lhe colocar uma questão. Como sabe, na última semana ficou aprazada para segunda-feira que passou uma reunião de representantes dos grupos parlamentares. Por um equívoco lamentável, essa reunião não se pode realizar.
Portanto, dentro dessa linha e porque o grupo parlamentar que represento tem imenso interesse, para não dizer muita urgência, em ver os trabalhos programados, solicito a V. Ex.ª, para não dizer que requeiro, o favor de convocar uma reunião de representantes dos grupos parlamentares para hoje ou, então, para amanhã de manhã.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Soares Cruz, da minha parte não há qualquer dificuldade em convocar a reunião para hoje ou para amanhã, mas seria melhor ouvir os responsáveis pelos diversos grupos parlamentares, para se saber a hora que melhor convém a todos. O Sr. Deputado não se importa de estabelecer contactos para se saber a hora que melhor convém a todos?

O Sr. Soares Cruz (CDS): - Não, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Agradeço-lhe o favor concedido, Sr. Deputado Soares Cruz.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bento da Cruz.

O Sr. Bento da Cruz (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os projectos de lei n.ºs 199/III e 281/III repõem uma velha questão, a saber: será justo o legislador promulgar, de uma penada, uma norma chapa, inteiriça, rígida para todo o País? Levanto a dúvida porque esta lei dos baldios, a ir por diante, vai destruir estruturas seculares de administração dos bens comunitários muito mais correctas, eficazes e actuais do que os projectos agora em estudo.
Dou como exemplos, por mais conhecidos, Vilarinho da Fuma e Rio de Onor, aldeias comunitárias descobertas para o mundo pelo saudoso Jorge Dias, etnólogo de renome europeu. Vilarinho da Fuma, infelizmente, jaz submerso pelas águas da albufeira do mesmo nome. Mas Rio de Onor continua a ser a meça dos apaixonados, ou simples curiosos da antropologia cultural. Não estaremos aqui a destruir Rio de Onor?
Citei dois casos. Mas quantos Vilarinhos da Fuma e Rios de Onor por esse Nordeste Transmontano, pelo Barroso, por Cabeceiras de Basto, por Terras de Bouro, por Castro Laboreiro?
No Barroso, região que melhor conheço, o termo de cada aldeia está inequivocamente delimitado por «cruzes» gravadas em grandes rochas. Essas «cruzes» têm séculos e muito provavelmente são anteriores à nacionalidade. E todos as respeitam.
Por vezes, o termo, ou baldio, de um povoado toca em duas ou três freguesias. Ninguém levanta questões por isso. Cada povoação administra os seus baldios democraticamente segundo a lei, porque todas as aldeias possuem o seu estatuto de administração comunitária. Periodicamente o sino toca a «adjunto» ou a plenário de vizinhos, cada qual diz da sua justiça, vai-se a votos e o que a maioria decidir é o que se cumpre sem mais aquelas.
A quem estiver interessado em conhecer estes seculares regimes agro-pastoris, que ainda hoje funcionam às mil maravilhas, aconselho as obras de Jorge

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Dias, Ernesto Veiga de Oliveira, Benjamim Pereira, Fernando Galhano, Orlando Ribeiro e Pais de Brito, entre muitos outros.

Da leitura de todos eles se conclui que sempre que a administração dos baldios é retirada a essas organizações comunitárias, institucionalizadas pelo direito consuetudinário, com raízes na fundura dos séculos, duas calamidades são fatais: perda irremediável da harmonia dos povos e baixa espectacular do rendimento dos bens comunitários.
Púnhamos um exemplo do perigo que estes projectos de lei representam para a boa harmonia das povoações. Na freguesia de Salto, concelho de Montalegre, vigora um curioso regime pastoril que dá pelo nome de Vacaria do Monte da Maçã. 11 aldeias, 4 da referida freguesia de Salto, concelho de Montalegre, Trás-os-Montes, e 7 de várias freguesias do concelho de Cabeceiras de Basto, Minho, levam as vacas para as pastagens do monte da Maçã no primeiro domingo de Junho e lá as deixam, dia e noite, à guarda de 2 pastores, até 15 de Agosto. Fazem isto, no melhor entendimento, pelo menos desde 1598, segundo um tombo existente nos arquivos da Câmara Municipal de Cabeceiras de Basto.
Supúnhamos agora, o que Deus não permita, que um destes projectos de lei é aprovado. Estou mesmo a ver a [unta de Freguesia de Salto de dedo apontado aos parceiros de Cabeceiras: fora daqui! E lá se vai a harmonia secular daqueles povos.
Se do monte da Maçã, na Cabreira, dermos uma saltada à Mourela, maciço raiano que liga o Geres ao Larouco, veremos que as aldeias da margem direita do Cávado - Mourilhe, Frades, Sezelhe, Travassos do Rio, Covelães, Paredes, Pitões e Tourém-, chegada a Primavera, levam as vacas para a serra e lá as deixam todo o Verão em plena liberdade, sem peias nem pastor. Apenas aos domingos um dos vizinhos sobe a ver se alguma fez se aleijou ou pariu.
Suponhamos agora, o que Deus não queira, que esta lei dos baldios é aprovada e as freguesias de Rio se lembram de a aplicar na serra da Mourela? Começam as demarcações, as coimas, os conflitos, numa palavra: começa a guerra, onde sempre reinou a paz.
Se das altas serranias descermos a terras mais planas, o panorama é o mesmo.
Sirva de exemplo o que se passa em Peireses, freguesia da Chã, no vale do Rabagão.
Após a floresta e a Junta de Colonização Interna, Peireses ficou praticamente sem baldios, outrora extensos e pingues. Restam uns três logradouros comuns, os quais, arrematados periodicamente em leilão para pastagens, rendem uns cento e tal contos por ano. Ê com esse dinheiro, administrado pelos moradores num sistema rotativo e institucionalizado pelo tal direito consuetudinário, que Peireses suporta os encargos de material com a conservação do abastecimento de água, os caminhos, o forno, a capela, o cemitério e demais bens comunitários. Atrevem-se mesmo a obras novas! Caso de um lavadouro público, velho sonho jamais conseguido, mau grado anos de chapéu na mão e espinha dobrada ante a câmara e o Governo.
Suponhamos agora, do que Deus nos livre, que a lei dos baldios era aprovada e o presidente da junta se lembrava de ir buscar os rendimentos das «lamas» de Peireses para obras em Torgueda, ou Travassos, ou Fírvidas, ou em qualquer outra das 11 aldeias da freguesia? Era corrido a tiro...
E não julguem que isto é figura de retórica. Ainda há bem pouco tempo, atrevendo-se o presidente da junta a vender e ir chitar um terreno de Peireses sem o consentimento do povo, o sino tocou a rebate e o que lhe valeu foi dar às de viladiogo.
Quem nos garante a nós que os sinos do Barroso não estão já a tocar a rebate?

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou terminar com a exclamação do santo arcebispo de Braga, D. Frei Bartolomeu dos Mártires, no Concílio de Trento, quando advogava o casamento para os padres: Saltem Barrosani - pelo menos aos do Barroso.
Admito que no Minho, onde o limite das aldeias se dilue, no litoral, de extensas dunas, no centro do País, de grandes florestas, a administração dos baldios necessite de ser regulamentada.
Admito. Mais com esta cláusula: onde estiverem em vigor regimes consuetudinariamente institucionalizados de administração dos bens comunitários esta lei não se aplica.
Saltem Barrosani: Pelo menos no Barroso!
Em memória do Vilarinho da Fuma, e em nome dos muitos Rios de Onor ainda existentes, o Grupo Parlamentar do PS reserva-se desde já o direito de propor, na especialidade, alterações que ressalvem esses regimes da administração dos baldios usufrutuários.
Isto sem prejuízo, evidentemente, de darmos o nosso voto, na generalidade, ao projecto do PSD, dado que esse texto deixa a porta aberta à satisfação das nossas apreensões quanto ao destino dessas estruturas seculares, justas e dinâmicas, de bem governar os bens comunitários.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estão inscritos para formularem pedidos de esclarecimento os Srs. Deputados Rogério de Brito, João Abrantes, Lino Lima, José Moniz e Alexandre Reigoto.
Para formular um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Rogério de Brito.

O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Sr. Deputado Bento da Cruz, devo dizer que ouvi a sua intervenção, não direi com muita atenção, porque isso é um lugar comum, mas fundamentalmente com o interesse suscitado por alguém que demonstra uma sensibilidade muito grande em relação a esta questão, cujas raízes envolvem não apenas uma problemática de mera economia, mas fundamentalmente problemas sociais, humanos, morais e até éticos.
Subscreveria, por certo, inteiramente a sua intervenção não fosse a sua parte final, em que -permita-me este desabafo- está patente a imposição de uma cedência de ordem, diria, táctica, que não tem que ver com a sensibilidade que demonstrou ao longo de toda a sua intervenção. Não pretenderei tirar ilações desse facto - é um problema vosso -, mas chamarei tão-somente a atenção para o facto de a sua intervenção colocar o problema dos baldios, em termos de posse, gestão e fruição, no lugar devido, reconhecendo e respeitando os direitos desses mesmos povos utentes.

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Então pergunto: como compatibilizar essa perspectiva com os projectos de lei que diz que irá aprovar na generalidade, embora reivindique o direito de introduzir alterações na especialidade? É que se me afigura extremamente difícil esse trabalho em especialidade, pela simples razão de que, ao reconhecer correctamente os direitos dos povos dos baldios, estabeleceu a base da natureza jurídica dos mesmos e dos direitos. Então, tudo o que não se conjugasse nesse sentido deveria ser tido como excepção, que se admitiria como passível de ser atendida.
O que acontece é que das duas uma: ou desaparecem na especialidade os projectos de lei apresentados pelo PSD e pelo CDS e surge um projecto de lei que não tem nada que ver com estes aqui apresentados, o que duvido que seja autorizado pelos proponentes; ou, então, a sua correcta visão dos baldios e dos direitos dos povos será não a regra, mas apenas a excepção, que nunca poderá ser devidamente acautelada.

A Sr.ª Sida Figueiredo (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Chamo-lhe a atenção para esta situação, porque fundamentalmente o que está em causa é transformar um direito numa excepção, expropriar os povos dos baldios desse direito e, quando muito, conferir-lhes alguns direitos de excepção. Isso será, por certo, uma agressão à visão tão correcta que tem dos problemas inerentes aos baldios e aos seus povos.
O problema será seu e do seu partido, mas parece-me que, a partir da sua intervenção, o PS, pela sua voz, ficou com certeza comprometido com uma situação de facto. É que a posse, a gestão e a fruição dos baldios é um direito inalienável dos seus povos. A partir daqui, não sei como é que vão cozer a bota. Por certo que será pior do que a «bota botilde» do concurso «Um, Dois, Três»!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Bento da Cruz, deseja responder já ao Sr. Deputado Rogério de Brito ou após terem sido formulados todos os pedidos de esclarecimento?

O Sr. Bento da Cruz (PS):- Respondo no fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para formular um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Lino Lima.

O Sr. Lino Lima (PCP):- Sr. Presidente, desisto do meu pedido de esclarecimento.

O Sr. Presidente: - Para formular um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado José Moniz.

O Sr. José Moniz (CDS): -Sr. Deputado Bento da Cruz, na sua intervenção V. Ex.ª focou, de um modo que não poderíamos considerar emotivo, mas conhecedor das situações comunitárias do Norte de Portugal, o aproveitamento mais cuidado por parte das comunidades desses baldios, nomeadamente na apascentação de gado. E depois de fazer essa defesa exaustiva, perfeitamente compreensível, que também conhecemos e que o nosso projecto também contempla, acabou por dizer que seu grupo parlamentar apoiaria o projecto de lei do PSD, o que, a contrario, leva a pensar que não apoiará o projecto de lei do CDS.
Dentro da linha de raciocínio, pergunto-lhe em que bases, para além da fidelidade governamental, V. Ex.ª funda essa destrinça. E foco-lhe um caso preciso, que faz parte dos 2 projectos de lei. Admitimos, no artigo 2º, a delegação de competência e de tarefas às organizações que o costume fixou-exactamente aquilo a que V. Ex.ª aludiu na primeira parte da sua intervenção. O PSD não vai tão longe; pelo contrário, admite simplesmente a delegação de tarefas a comissões de gestão. Bastaria isto para V. Ex.ª apoiar o nosso projecto. Porquê, então, uma tomada de posição precisamente contrária àquela a que um conhecimento cuidado dos 2 projectos e o teor da sua intervenção levaria? Compare o nosso artigo 2." com o artigo 2.D do projecto do PSD, lembre-se e veja o fundamento da sua exposição. Gostaria de obter uma explicação a este respeito.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para formular um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Alexandre Reigoto.

O Sr. Alexandre Reigoto (CDS):- Sr. Deputado Bento da Cruz, V. Ex.ª falou, e muito bem, acerca da região de Montalegre, região que o Sr. Deputado diz conhecer muito bem - e concordo consigo -, mas que também conheço muitíssimo bem.
V. Ex.ª diz que, se por acaso este projecto de lei for aprovado, haverá um verdadeiro combate entre as assembleias de compartes e as autarquias. Porque conheço o povo de Montalegre - sei que é um povo paciente, moderado, que costuma cumprir a lei e com tendências a ser pacifistas- e sendo a democracia alternância do poder, pergunto-lhe se por acaso estes projectos forem aprovados e a administração comparte deixar de gerir os baldios e passar para as juntas de freguesias, se esses povos de que o Sr. Deputado falou, que muito bem conheço, não são capazes de aceitar essa alternância de poder ou essa mudança de baldios, porque ninguém falou, nem os projectos de lei falam, na expropriação dos baldios. Os baldios ficam na mesma com os povos; simplesmente, mudam de gestão e de administração.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Bento da Cruz.

O Sr. Bento da Cruz (PS): -Sr. Deputado Rogério de Brito, começo por lhe agradecer as palavras de apreço que me dirigiu. Quanto à sua pergunta, respondo que temos que, como comecei por dizer, diversificar a lei. Admito que os baldios não tenham a mesma estrutura em todo o País - falei dos do Norte, que têm aquele panorama que citei. Portanto, acho que, para ali, deveria fazer-se uma excepção.
O que comecei por dizer foi que admitia que os baldios possam ter necessidade de ser regulamentados em determinadas regiões do País. No Norte, onde essas estruturas já existem, a minha opinião é a de que se devem conservar. Foi isso que advoguei na minha intervenção.

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Quanto à pergunta que me fez de como poderia eu harmonizar as minhas palavras com o voto favorável na generalidade ao projecto apresentado pelo PSD, respondo que, quando for a altura da discussão da especialidade, nos bateremos precisamente porque estas estruturas que defendi sejam conservadas, que haja a tal excepção que permita que, naqueles casos, a lei não seja aplicada.
Quanto ao Sr. Deputado José Moniz, que me pergunta que diferença é que acho entre os 2 textos, claro que admito que eles são bastante semelhantes, mas o que nos interessa é chegar a um texto definitivo, discutido na especialidade, que contemple estes casos.
Quanto à pergunta do Sr. Deputado Alexandre Reigoto, claro que os povos do Barroso, que são os que melhor conheço, são pacifistas, mas também têm um sentido muito forte e arreigado de dignidade e de justiça e, portanto, não vão permitir com facilidade que aquilo que eles julgam que é legitimamente deles, desde há séculos, lhes seja agora retirado.

ra também temos que admitir que possa haver abuso de poder da parte da autarquia na apropriação ou no uso que vai fazer desses baldios. Nessa altura, quem é que defende os povos das pequenas comunidades desses abusos de poder das autarquias?
Por outro lado, como disse, o que está em causa é o rendimento dos baldios, e todos os autores que referi e que se têm dedicado ao estudo desses problemas apontam para o facto de, quando os baldios são retirados da gestão e da administração directa dos utentes, para serem entregues a instituições alheias a esse uso dos baldios, o seu rendimento desaparecer. E temos também que entrar em linha de conta com a harmonia que existe entre essas populações, que forçosamente vai perder-se quando começarem a demarcar os baldios e a quererem que os vizinhos não lhes entrem na propriedade.

O Sr. Presidente: - Para formular um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado José Moniz.

O Sr. José Moniz (CDS): -Sr. Deputado Bento da Cruz, entendo que V. Ex.ª não respondeu à questão que coloquei. Agradeço-lhe que repare no artigo 2.º do nosso projecto, o qual diz que «os baldios são administrados pelas juntas de freguesia em cuja área se circunscrevem, podendo as respectivas assembleias, por iniciativa própria ou a pedido de um número significativo de cidadãos eleitores residentes» -que serão naturalmente utentes dos baldios-, «delegar tarefas administrativas em organizações que o costume fixou». Agradeço-lhe. agora o favor de ler o artigo 2.º do projecto do PSD, que diz, no seu n.º l, que «a administração dos baldios compete às respectivas juntas de freguesia, cabendo às correspondentes assembleias de freguesia elaborar regulamentos destinados à sua utilização comunitária» e, no seu n º 2, que, «por proposta das respectivas juntas de freguesia» -não fala aqui nem em utentes nem em cidadãos eleitores, pois corta em absoluto os utentes e os compartes, nem fala de costumes-, «as assembleias de freguesia poderão delegar a gestão dos baldios em utentes daqueles». Ora, os utentes ficam completamente de fora desta questão, enquanto no nosso projecto de lei não ficam.
Pergunto-lhe, exactamente, se V. Ex.ª admite, como todos aqui admitimos, que na discussão na especialidade qualquer projecto de lei pode ser passível de melhoramento e, dentro da lógica de raciocínio da sua intervenção, se o nosso projecto de lei não é muito mais conforme com essa intervenção ou se V. Ex.ª e o seu grupo parlamentar só apoiam o projecto do PSD por uma questão de fidelidade, pura e simples, e não por uma análise objectiva, clara e perfeitamente crítica dos dois projectos, sem considerações de ordem política e relacionadas com a coligação.
Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Tito de Morais.

O Sr. Presidente: - Para um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado Rogério de Brito.

O 3r. Rogério de Brito (PCP):- Sr. Deputado Bento da Cruz, utilizando a figura regimental do protesto, colocar-lhe-ia uma questão.
Como vê V. Ex.ª a possibilidade de compatibilizar o direito à posse, gestão e fruição dos baldios por parte dos seus povos com o projecto de lei do PSD, que não só transfere esses direitos para as juntas de freguesias - através de uma manifesta expropriação -, como também, mesmo nos casos em que admite que existem razões de ordem social, cultural ou económica que podem justificar a manutenção da gestão nos baldios, diz que cabe às juntas de freguesia nomear os elementos que farão parte dos conselhos, que agora, segundo os projectos de alteração, são os conselhos de vizinhos. Quer dizer, nem sequer são os compartes dos baldios a ter o direito de eleger os elementos para o conselho dos vizinhos: é a junta de freguesia que o faz. Isto é a negação total dos vossos princípios, Sr. Deputado.
Face a isto eu terei de chegar à conclusão que, se vão fazer prevalecer na especialidade os vossos princípios, então nós não teremos os projectos de lei do PSD e do CDS. E, se não tivermos esses projectos, então para quê aprová-los na generalidade?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Bento da Cruz.

O Sr. Bento da Cruz (PS): -Sr. Deputado José Moniz, eu vou realmente emendar a mão dizendo que o que nos interessa é chegar a um texto definitivo que contemple esses casos e que vamos, por isso, votar favoravelmente ambos os textos.
Quanto à pergunta que me faz, Sr. Deputado Rogério de Brito, eu insisto que vamos votar para que na lei fique estabelecido que onde existam esses conselhos não haja necessidade de nomear outros.

O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Dá-me licença, Sr. Deputado.

O Sr. Bento da Cruz (PS): -Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Rogério de Brito (PCP):- V. Ex.ª colocou como excepção a esta lei os baldios do Norte e, portanto, considerando que estes deveriam ser mantidos, pois disse tratar-se de situações reconhecidas que deveriam ser mantidas.

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Perguntar-lhe-ia, Sr. Deputado: então e os baldios de outras regiões como os das Beiras Interiores, cuja forma e conteúdo são rigorosamente iguais aos baldios do Norte? Esses que referi - que estão no Centro - são excluídos, ou considera que devem ser incluídos na tal excepção? É que, se nós considerarmos como excepção os do Norte e os do Centro, eu pergunto a V. Ex.ª onde fica a regra?
É a estas contradições que os senhores têm de dar resposta.

O Sr. Bento da Cruz (PS): - Sr. Deputado, talvez eu me tivesse explicado mal. Não direito que é uma excepção, mas o que eu advogo é que seja incluído na lei uma cláusula que contemple esses casos que já existem, não como excepção, mas como cláusula que ressalve esses direitos adquiridos.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS):- Farei uma breve intervenção, porque para mais me não sobra o tempo e porque talvez também não mereça a pena, já que tudo, ou quase tudo, terá sido dito ao longo do debate.
A fruição e gestão comunitária dos baldios é uma tradição secular consagrada no direito consuetudinário e no direito positivo português que aparece posta em causa a partir da década de 30, nomeadamente quando o Governo estabelece, através do Decreto-Lei n.º 27 707, o princípio da reserva de baldios para efeitos de colonização, submete outros ao regime florestal e introduz a noção de baldios dispensáveis ao logradouro comum, ao aprovar o Código Administrativo do Prof. Marcelo Caetano.
Sobre o que foi a resistência das populações atingidas e ai repressão que se lhe seguiu, deixou-nos Aquilino Ribeiro páginas inolvidáveis no seu romance Quando os Lobos Uivam, já aqui invocado pelo Sr. Deputado Cunha e Sá. Romance apreendido pela PIDE e que valeu ao seu autor mais uma das muitas perseguições que foram o preço da sua coragem, da sua coerência, do seu apego à liberdade e à gente humilde e pobre da nossa terra.
E é assim que, se é verdade que a gestão comunitária dos baldios tem uma tradição secular, também é verdade que a resistência ao esbulho dos bens comunitários se pode rever num passado de determinação e coragem, de coragem e determinação não raramente pagas com o próprio sangue.
E é assim que, quando em Janeiro de 1976 se restabelecia o princípio da gestão comunitária dos baldios e se criavam os instrumentos jurídicos necessários à sua entrega às populações que deles tinham sido desapossados, mais se não fez do que corresponder a uma aspiração profunda dessas populações. Na verdade, os Decretos-Leis n.º* 39/76 e 40/76 -de que me orgulho de ser, juntamente com outros, e nomeadamente com o então ministro das Finanças e dirigente do Partido Socialista Salgado Zenha, um dos subscritores - vinham restabelecer o regime da fruição e gestão comunitária dos terrenos baldios, reatando uma tradição interrompida pelo regime facista, e criar as bases da devolução dos bens comunitários às populações.
Princípio que pouco depois a Constituição da República consagraria.
O retorno às formas comunitárias de utilização dos baldios não se tem feito sem dificuldades, é certo. Mas essas dificuldades radicam essencialmente nos obstáculos burocráticos que lhe são levantados, no desinteresse dos serviços oficiais e nas campanhas que contra ela têm sido desenvolvidas.
Não obstante, contam-se hoje por cerca de meio milhar as assembleias de compartes que sob uma ou outra das duas formas de gestão previstas no Decreto-Lei n.º 39/76 se encontram em funcionamento.
Como se afirma em documento entregue a esta Assembleia, «comunidades houve que com coragem e determinação conseguiram ultrapassar toda a gama de contratempos que lhe foram surgindo e hoje provam, através de realizações sociais e económicas que promoveram mercê das receitas que passaram a gerir, que a lei lhes trouxe aquilo por que sempre aspiraram e que se traduz no aumento do bem-estar e num maior apego à sua terra».
Ao fim e ao cabo aquilo para que hoje somos empurrados, mesmo quando outras sejam as intenções -mas de boas intenções está o inferno cheio-, é para o retorno a situações próximas, quando não idênticas, daquelas a que a legislação pós-25 de Abril havia posto cobro, abrindo-se de novo as portas ao desapossar progressivo das populações dos seus bens comunitários, à especulação, à satisfação de interesses privados.
Na verdade, o que concretamente nos propõem os projectos em discussão do PSD e do CDS?
Pura e simplesmente que a gestão dos bens comunitários seja retirada aos compartes e transferida para os órgãos autárquicos, abrindo-se do mesmo passo a possibilidade de alienação dos baldios, à revelia das populações que deles tradicionalmente usufruem, e fazendo-se tábua rasa dos princípios consagrados na Constituição.
A mingua de argumentos afirma-se que tal transferência se justificaria porque, sendo as autarquias os órgãos legítimos de representação local, a elas deveria caber a gestão dos bens comunitários, não sendo as assembleias de compartes mais do que intoleráveis organizações de poder paralelo.
O absurdo de um tal raciocínio, que ignora a natureza dos bens em causa, dos interesses que a eles se ligam, do universo concreto das populações que integram as assembleias de compartes, é por demais evidente. Levado ao extremo, um tal raciocínio conduzir-nos-ia a afirmar que, sendo o governo expressão legítima da vontade popular, as autarquias mais não são do que intoleráveis formas de poder paralelo!...
Que os interesses dos órgãos autárquicos e dos compartes podem não ser coincidentes, é evidente. A questão está em saber como arbitrá-los. A resposta está na procura de pontos de equilíbrio e não, como se propõe nos projectos, na pura e simples submissão dos interesses dos compartes aos dos órgãos autárquicos.
O que os projectos do PSD e do CDS nos propõem não. é uma revisão do disposto nos Decretos-Leis n.ºs 39/76 e 40/76 à luz da experiência adquirida ao longo destes últimos anos, revisão essa que nós não negamos. O que propõem é, ao contrário, uma inversão total da filosofia e dos princípios que informam aquelas leis; é a pura e simples supressão da gestão comunitária dos baldios, ao arrepio de tradição e da. Constituição da República.

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Remetendo-se a gestão comunitária para figura de excepção (se tal ponto de vista vingar) está-se a negar a filosofia dos diplomas cuja revogação se pretende, já que deveriam ser, obviamente, a regra e não a excepção.
A ofensiva contra a exploração comunitária dos baldios não é uma novidade e não surge hoje pela primeira vez.
A primeira tentativa concreta - de sucesso transitório- verificou-se com a aprovação em 1977 da Lei n.º 79/77, que, através da definição das competências das autarquias locais, retirava, por força do disposto no seu artigo 109.º, a gestão dos baldios às comunidades, transferindo-a para os órgãos autárquicos.
Por essa via se revogava de forma implícita e ínvia o Decreto-Lei n.º 39/76.
Efémero foi, contudo, o sucesso então alcançado pelos adversários da gestão comunitária dos baldios. Dois meses decorridos, a Assembleia da República revogava o artigo 109.º da Lei n.º 79/77.
Papel decisivo coube então ao Partido Socialista, sem cujos votos a revogação daquele preceito e o restabelecimento do regime instituído pelo Decreto-Lei n.º 39/76 não teriam sido possíveis.
Recorde-se que a favor da revogação votaram o Partido Socialista, o Partido Comunista e alguns depumida por estes dois últimos partidos. Quanto aos outros, o PSD e o CDS.
Coerente é pois, sem dúvida, a posição hoje assumida por estes dois últimos partidos. Quanto aos outros, a ver vamos.
Das razões que então fundamentaram o voto do Partido Socialista reza o Diário da Assembleia da República da época.
Talvez fosse bom, para reavivar os espíritos, relê-lo.
E nem se diga que na especialidade será possível alterar o sentido dos projectos de lei apresentados pelo PSD e pelo CDS. O que vamos votar na generalidade é antes de mais nada a filosofia que os informa, os seus princípios gerais, as suas grandes linhas, e essas são, repetimo-lo, contrárias à tradição comunitária, ao que dispõe o artigo 89.º da Constituição, e mais não fazem do que retomar a orientação que o artigo 109.º da Lei n.º 79/77 consagrava, e que a maioria dos deputados rejeitou em Dezembro de 1977.
Se os projectos do PSD ou do CDS vierem a merecer a aprovação desta Câmara é porque, na verdade, «as coligações têm razões que a razão desconhece e a coerência ignora».

Aplausos da UEDS e do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rogério de Brito.

O Sr. Rogério de Brito (PCP): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os projectos de leis em discussão, n.ºs 199/III (CDS) e 281/III (PSD), têm um conteúdo comum e um mesmo objectivo inconstitucional: tirar aos «povos» a posse útil, a administração e a fruição do bem comunitário por excelência que são os baldios.
São maus projectos de leis que atentam contra direitos seculares das comunidades dos baldios (restituídos após o 25 de Abril) e que, a serem aprovados e implementados, reconduziriam a graves situações de injustiça e conflitualidade, só possíveis de serem impostos, tal como no passado, com o recurso a uma vasta acção repressiva, que não deixaria de encontrar pela frente, tal como no passado, uma resistência tenaz e muito legítima.
Poder-se-á afirmar, aliás, que a luta das comunidades locais em defesa dos baldios remonta à época da colonização romana.
Mas apesar de tudo, apesar das constantes usurpações das classes dominantes, os baldios acompanharam durante séculos a evolução do regime de propriedade, só começando a ser verdadeiramente contestados e transformados (por outros, que não os seus utentes), na sua forma e conteúdo, a partir do século XIX e, sobretudo, durante o regime fascista.
Até então, sempre haviam sido possuídos e fruídos, em total liberdade, pelos seus povos.
Com efeito, é a partir da vigência do Código Civil de 1867 que começam a ser dadas diferentes interpretações quanto à natureza jurídica dos baldios, surgindo então vários autores a classificar os baldios como propriedade pública das autarquias locais.
Outro seria, contudo, o ponto de vista de Marcelo Caetano (Manual, 9.ª edição, volume n, pp. 951 a 956), que, a partir da classificação feita naquele Código, nos artigos 380.º e 381.º, das coisas em públicas, privadas e comuns, defendeu a tese da inclusão dos baldios num domínio comum, categoria diferente do domínio público, «caracterizado sobretudo pela propriedade comunal dos vizinhos de certa circunscrição ou de parte dela, representados pela autarquia local a que pertencem, que exerceria meros direitos de administração e polícia».
Posteriormente, com a promulgação e entrada em vigor do Código Civil de 1966 que suprimiu a categoria das coisas comuns- alguns autores passaram então a sustentar que estaria ultrapassada a fase da propriedade comunal dos vizinhos, devendo os baldios ser concebidos como coisas particulares, pertencentes ao património da autarquia, mas «sujeitos a afectação especial de sujeitar certas utilizações pelos habitantes de uma dada circunscrição ou parte dela» (p. 308).
E será neste contexto que traduziu, ao fim e ao cabo, as pressões de interesses estranhos às comunidades locais utentes dos baldios que, quer através de intervenções estatais, quer por usurpação de juntas de freguesia e câmaras municipais, quer ainda por conivência destas nas apropriações privadas, os baldios foram sendo saqueadas aos povos.
O suporte para estas acções foi dado fundamentalmente pelo Decreto-Lei n.º 27 207, de 1936, que escancarou as portas ao arbítrio do Estado, permitindo-lhe estabelecer, como lhe aprouvesse, a reserva de terrenos baldios ou a sujeição dos mesmos ao regime florestal. O Código Administrativo fascista completaria o cerco ao cometer (artigos 45.º, 51.º, 253.º, 255.º e 394.º) às juntas de freguesia e câmaras municipais a administração dos mesmos.
Foram profundas as roturas provocadas no tecido sócio-económico das comunidades dos baldios. O equilíbrio das suas economias foi devastado pela alienação das terras, pela florestação industrial, pelos interesses e parasitismo urbano-industrial de mãos dadas com a repressão. Aldeias desapareceram; muitas ficaram privadas da juventude que, não raras vezes, teve de seguir o caminho da emigração.
E contudo, e apesar de tudo, resistiram.

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É que o fascismo, tal como agora o PSD e o CDS, com a conivência mesmo que forçada do PS não compreendem, ou pensou que podia destruir a identidade sócio-económico e cultural que floresceu e se enraizou ao longo de gerações no seio daqueles «povos».
Foram muitos milhares aqueles que sofreram & prisão e os que derramaram o seu sangue na defesa dos baldios contra a prepotência e a corrupção do poder central, das câmaras e das juntas de freguesia, resistindo às apropriações ilícitas e ao roubo, ao empobrecimento e à ruína a que os sujeitaram. Os mesmos, ao fim e ao cabo, sobre quem hoje pendem de novo ameaças que julgaram definitivamente afastadas depois do 25 de Abril, após verem reconhecidos na Constituição e na lei os direitos por que lutaram durante tantos anos.
Com efeito, o Decreto-Lei n.º 39/76, de 19 de Janeiro, viria a estabelecer como aliás o reconhece, o próprio parecer da Procuradoria-Geral da República:

1.º Os baldios são terrenos comunitariamente usados e fruídos por moradores de determinada freguesia ou freguesias, ou parte delas, que exerçam a sua actividade no local, só por eles podendo ser usados e fruídos;
2.º Os baldios estão fora do comércio jurídico, são inalienáveis e imprescritíveis;
3.º Os baldios são administrados exclusivamente pelos compartes ou em regime de associação entre os compartes e o Estado, através de representante do Ministério da Agricultura;
4.º Ao Ministério da Agricultura, através das competentes direcções gerais, incumbe apoiar e promover a actividade de esclarecimento dos compartes nos baldios sobre a política florestal, bem como dar apoio na gestão das matas e produção.

Posteriormente, a Constituição da República viria a precisar a natureza jurídica dos baldios ao incluí-los no sector público de propriedade dos meios de produção, como bens comunitários com posse útil e gestão das comunidades locais (artigo 89.º, n.º 2, alínea c), da C. R. P.).
Mas a lei só por si não foi suficiente para travar o arbítrio, a prepotência e os compadrios a que caciques e serviços oficiais se haviam habituado. Tão-pouco impediu que interesses de verdadeiro parasitismo urbano-industrial continuassem a pressionar as autarquias, com a agravante de muitos destes interesses serem estrangeiros e decorrentes da filosofia subjacente aos projectos de florestação do Banco Mundial e das Celuloses.
Entrou-se, assim, numa fase de continuado desgaste dos povos dos baldios e dos seus conselhos directivos, sujeitando-os à erosão provocada por dificuldades de toda a ordem, grande parte delas levantadas pelos próprios serviços oficiais, cuja actuação acabou por pôr em causa a própria autoridade democrática do Estado. Com efeito, dentro dos próprios serviços oficiais, chegou-se ao ponto de serem dadas instruções no sentido de os decretos-leis n.03 39/76 e 40/76 não deverem ser aplicados e de os conselhos directivos dos baldios serem ignorados ou preteridos em relação às autarquias. Passaram, ilegalmente, a exigir a homologação de segundos mandatos dos CDB. Procederam ao congelamento indiscriminado das contas bancárias dos CDB e das receitas dos baldios. Têm efectuado cortes, vendas de madeira e leilões de resina sem conhecimento prévio dos CDB e dos compartes.
A todas estas acções acrescem, por parte das autarquias, constantes tentativas, muitas delas concretizadas, de apropriação das receitas dos baldios, de cedência, de arrendamento ou venda de parte ou do todo dos baldios. Casos já do domínio público, como o da Câmara de Valença (venda de terreno dos baldios) ou o da Junta de Freguesia de Oliveira de Frades (arrendamento do baldio à PORTUCEL por 29 anos), repetem-se em elevado número, tendo já suscitado pareceres da Procuradoria-Geral da República e a intervenção, inclusive, junto desta Assembleia, do Provedor de Justiça.
Entretanto, e em paralelo com todas estas ilegalidades, o PSD e o CDS tentaram nesta Assembleia, e por diversas vezes, avançar com iniciativas legislativas (todas elas abortadas) tendentes a dar «força de lei» àquilo que de facto constitui uma ilegalidade pegada.
No mesmo sentido ainda, a AD viria a propor, durante a revisão constitucional, a alteração substancial de todo o corpo do artigo 89.º, designadamente propondo a eliminação pura e simples da alínea c) do n.º 2, precisamente aquela que inclui os baldios no sector público de propriedade dos meios de produção, subsector dos bens comunitários com posse útil e gestão das comunidades locais (reconhecendo, por esta via, que o texto constitucional constitue uma barreira às suas pretensões).
Também esta tentativa falhou. E é agora, quando em coligação com o PS, que o PSD e o CDS voltam a tentar o que antes não conseguiram. Resta saber se será agora, precisamente com os votos do PS (por negação de todos os princípios antes defendidos por este partido), e agora contraditoriamente e envergonhadamente é repetido que tais tentativas inconstitucionais e imorais se vão concretizar?...
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ê curioso verificar que em qualquer dos preâmbulos que prefiguram os projectos do PSD e do CDS não são aduzidas quaisquer razões de causa que justifiquem a iniciativa, a não ser o «pretenso conflito» quanto à natureza jurídica dos baldios. Compreende-se que assim seja. Dificilmente os proponentes poderiam recusar factos tão concretos como o de, pela primeira vez, populações desde sempre esquecidas e marginalizadas pelo poder central, e mesmo pelas autarquias, terem tido a possibilidade de abrir caminhos e estradões, terem assegurado o fornecimento de água para consumo doméstico e agrícola, terem dotado as comunidades de equipamentos sociais e culturais como, por exemplo, fontanários, lavadouros, centros sociais, postos médicos, viaturas de bombeiros, etc. E tudo isto nas condições de boicote e erosão já denunciadas.
Tão-pouco poderiam refutar a falta de apoio dos serviços oficiais, que, aliás, até na sua representação, aquando da gestão mista, apenas para lá enviaram, não técnicos, não silvicultores, mas tão-somente guardas florestais, que chegaram a dificultar o fornecimento de plantas e sementes, o que não tem impedido que os compartes venham procedendo a acções de florestação e melhoramentos fundiários.
Do mesmo modo, não poderiam deixar de reconhecer que, na esmagadora maioria dos casos, os problemas que se têm levantado em matéria de florestação

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são resultantes dos próprios defeitos de uma política orientada para a florestação industrial, que inviabiliza o seu uso múltiplo e compromete a economia das populações, e, sobretudo, pela incapacidade de resposta dos serviços florestais. Com efeito, convém ter presente que os baldios não chegam a deter 10 % da área florestada do País e que as acções de florestação não tem conseguido, sequer, repor as áreas anualmente destruídas pelo fogo.
Sem possibilidades de prova de generalização, seriam ainda os alegados casos de conflito entre populações. Nos tribunais não há expressão dos mesmos. O mesmo já não se passa quanto a processos judiciais interpostos pelos conselhos directivos dos baldios contra autarquias e particulares, por apropriação ou uso indevido dos terrenos dos baldios, sendo sintomático que a esmagadora maioria dos casos tenha sido decidida a favor dos conselhos directivos.
Importa, finalmente, apreciar o conteúdo dos projectos de lei em questão à luz do preceituado na Constituição da República.
Senão, vejamos: os referidos projectos partem do pressuposto que os baldios pertencem ao domínio público indisponível das freguesias onde se localizam, porque afectos ao uso e fruição comum das populações. Donde, concluem, compete às autarquias a efectiva, legítima e exclusiva representação das populações locais e a prossecução e defesa dos seus legítimos interesses.
Ora bem, esta pode ser uma versão da revisão constitucional pretendida pelos referidos partidos, mas não é, com certeza, o preceituado na Constituição.
É que não é possível constitucionalmente confundir comunidades locais com autarquias locais, posto que estas estão claramente identificadas no artigo 237.º e seguintes como pessoas colectivas territoriais - precisando: as freguesias, os municípios e as regiões administrativas. Acresce ainda o facto de a referida destrinça estar claramente feita na Constituição, designadamente no artigo 65.º, n.º 2, alínea b), e n.º 4, no artigo 94.º, n.º 2, e no artigo 89.º, n.º 2, alíneas a) e c).
Aliás, é reconhecendo as realidades, os interesses e os direitos próprios das comunidades locais que o artigo 94.º, n.º 2, determina que no Conselho Nacional do Plano, em representação das populações, devem participar as autarquias e as comunidades locais, sendo inquestionável que, exactamente em representação das comunidades locais, está o Conselho Nacional dos Baldios.
Aliás, colocar-se-ia ainda esta questão: que bens comunitários em posse útil e gestão das comunidades locais VV. Ex.as conhecem para além dos baldios?
Seria curioso que dessem resposta a esta questão.
Por outro lado, a questão também não se pode colocar em termos de representação e defesa das populações dos baldios por parte das autarquias. O que está em causa é o direito à posse útil, gestão e fruição por parte das comunidades locais dos bens comunitários. E este direito está consignado no n.º 2, alínea c), do artigo 89.º, autonomizando-o em relação aos bens e unidades geridos pelo Estado e por outras pessoas colectivas públicas em que se integram as autarquias.
Curiosamente, os proponentes, reconhecendo a posse e fruição dos baldios por parte das comunidades utentes, mais não pretendem, com estes projectos de lei, que não seja a sua expropriação pura e simples, permitindo a sua sujeição ao regime florestal ou o seu destino para a instalação de equipamentos sociais ou de fomento turístico, industrial ou habitacional.
Não temos uma visão conservadora das coisas, mas não ignoramos as constantes pressões dos interesses, não raras vezes parasitários, urbano-industriais, em que se incluem as celuloses e a especulação dos solos urbanos que, protegidos, escapam à legítima expropriação, vindo a ser os baldios sacrificados e com eles as comunidades locais e seus utentes.
Decorre desta apreciação a recusa pura e simples de uma eventual utilização, por exemplo, para equipamentos sociais? É evidente que não.
Mas estes casos terão de ser encarados como excepção, e nunca como regra, e devendo merecer sempre o acordo dos compartes.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A obstrução sistemática à lei tem condicionado - tem mesmo comprometido gravemente- o desenvolvimento do modo social de gestão e frustado as justas aspirações dos povos em relação à melhoria das suas condições de vida e desenvolvimento das suas economias.
Os projectos de lei do PSD e do CDS -contra os quais vamos votar-, a serem implementados, reconduziriam ao processo de empobrecimento e ruína a que foram submetidos durante o fascismo.

Aplausos do PCP e do M DP/CDE.

Entretanto, voltou de novo a assumir a presidência o Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Presidente: - Para formular um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Alexandre Reigoto.

O Sr. Alexandre Reigoto (CDS): - Sr. Deputado, ouvi atentamente a intervenção de V. Ex.ª e queria formular-lhe duas perguntas.
Sendo as assembleias de freguesia eleitas democraticamente e tendo em conta a dimensão populacional e geográfica das populações e das autarquias, não entende V. Ex.ª que será uma fonte de conflito institucional que as assembleias de compartes continuem a gerir e a administrar os baldios?
V. Ex.ª é capaz de me informar, ainda, acerca da percentagem dos baldios que está a ser utilizada?

O Sr. Presidente: - Para responder ao pedido de esclarecimento formulado, tem a palavra o Sr. Deputado Rogério de Brito.

O Sr. Rogério de Brito (PCP): -Sr. Deputado Alexandre Reigoto, não sei se consegui entender bem as suas perguntas, mas creio que uma delas será esta: sendo as assembleias de freguesia eleitas democraticamente e dado o número populacional, não se estabelecerá um conflito constitucional se continuarem a ser os compartes a administrar os baldios?

O Sr. Alexandre Reigoto (CDS): -Não é um conflito constitucional, Sr. Deputado, é um conflito institucional.

O Orador: - Foi útil a sua correcção, Sr. Deputado, porque senão poderia dar uma grande bronca se se estivesse a referir ao conflito constitucional.

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Em relação ao conflito institucional, julgo que ele surgirá sempre se não tivermos em linha de conta que os baldios constituem uma realidade concreta que só respeita -o que não quer dizer que não haja casos em que aos baldios corresponde a própria área da junta de freguesia, mas esses são casos minoritários - ao suporte comunitário, muitas vezes de subsistência de determinadas comunidades locais, quantas e quantas delas totalmente isoladas das próprias sedes de freguesia, sujeitas a situações de interioridade impostas pelo relevo, pela pobreza dos solos e pelos próprios condicionalismos da vida económica daquelas populações locais.
Creio que não se pode confundir esta realidade com . uma freguesia, até porque, efectivamente, existem interesses totalmente antagónicos. Por exemplo, para as populações locais utentes dos baldios, este é um suporte, tendo portanto um significado económico e constituindo uma parte integrante da sua própria componente social, económica e até cultural. Por outro lado, o baldio já não tem o mesmo significado para as populações dos centros urbanos ou para as sedes de freguesia.
Não quero dizer com isto que não se reconheçam as virtualidades do poder autárquico ou que se ponham em causa os seus direitos. Não se trata disso. Trata-se, isso sim, do facto de que aqui não há nada de comum. E repare nesta situação, Sr. Deputado: todos sabemos, e isto é um facto, qual é a tendência quanto às receitas dos baldios que, quando transitarem - admitindo que este projecto vai para a frente-, em vez de reverterem para aqueles que são os seus utentes e que os gerem, são fruídas em favor do próprio orçamento das autarquias.
O Sr. Deputado conhece, tão bem quanto eu, a pressão, perfeitamente desigual, em relação ao interior rural, que exercem os interesses das áreas urbanas. Reconhece, certamente, que os rendimentos desses baldios acabariam por ser inevitavelmente desviados. E repare que os actuais projectos de lei nem sequer admitem a possibilidade -ou, pelo menos, não a explicitam - de que, pelo menos, uma parte substancial dos rendimentos subtraídos aos baldios revertam obrigatoriamente em benefício das próprias populações dos baldios.
Portanto, esta é uma falsa questão, e só haverá conflito institucional se voltarmos de novo às situações que a história - infelizmente recente, mas, por isso mesmo, bem presente - nos legou.
O Sr. Deputado quer maiores conflitos institucionais do que aqueles que durante dezenas de anos existiram, exactamente por ser aplicado um regime aos baldios como este que agora os senhores pretendem repor novamente, e que comportaram o sacrifício e contiveram em si mesmos a injustiça e a iniquidade?
É isto o que os senhores vão repor se os vossos projectos forem aprovados. r
Quanto à percentagem dos baldios em utilização, podia-lhe dizer que são 80% ou 90%. Mas, com toda a sinceridade, não sei, tal como o Sr. Deputado também não me sabe dizer ...

O Sr. Alexandre Reigoto (CDS): -Mais ou menos sei!

O Orador: - ..., quais são os que estão ou não em utilização. Todavia, sempre lhe direi que não tenho dúvida que na esmagadora maioria dos casos, até porque o baldio constitui um suporte comunitário da actividade económica dos seus povos, eles são com certeza utilizados.
No que diz respeito aos conceitos de utilização, pomos em causa a própria utilização dos serviços oficiais em matéria de florestação, quanto mais as dos povos dos baldios!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Costa.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os baldios, como é sabido, são terrenos usados e fruídos por uma comunidade de acordo com preceitos de origem consuetudinária e de outros que resultam de necessidades impostas pelas economias locais.
Os baldios nasceram de doações ou aforamentos feitos aos moradores de determinada freguesia ou freguesias ou parte delas com o objectivo de promover o povoamento.
Os vizinhos viviam à sombra do baldio. Os mais pobres não tinham terra e o baldio contribuía de modo decisivo para a sua sobrevivência. Para os que alguma tinham, o baldio era o complemento indispensável da sua subsistência. Os produtos agrícolas, as pequenas explorações de cereais, um ou outro animal, seriam o que os habitantes tinham de seu.
Os baldios, a maior parte das vezes, eram zonas de serra e serviam para a apascentação do gado, para o corte de lenhas, era o local onde se ia buscar uma ou outra árvore para a construção ou conserto da casa ou da mobília e ainda para o aproveitamento dos matos destinados à fertilização das suas courelas e para retirar o barro para a construção das suas casas e de alguns utensílios domésticos.
Mais perto das povoações e com a mesma natureza de bens comuns, os logradouros para corar e enxugar ou para fazer a barreia da roupa no inverno, para juntar os matos que tinham sido curtidos na rua na época das chuvas por calçamento das pessoas e animais. Ali se depositava a lenha antes de ser arrumada; ali se construíam os canastros ou espigueiros para secar o milho, se faziam as medas ou rolheiros de palha para alimento do gado e também para a sua cama ou para a enxerga do proprietário; na eira comum se debulhava o milho ou se malhavam os cercais.
Tudo bens comunitários.
Alguns baldios destinavam-se a agricultar, em geral não colectivamente; cada um fazia a sua arada, a florestação resultava da regeneração natural. Aproveitava-se aquilo que a serra dava.
Do baldio vinha a carne, o leite e a lã e a água para as regas.
Mas o baldio representava ainda a liberdade de viver, de caçar e de pescar.
As condições de vida foram-se modificando, o baldio deixou de ser tão necessário, passou a ter menor utilização e o Estado entendeu que os baldios deviam representar uma riqueza para o País desde que florestados.
Faltou então ao Governo poder de percepção sobre o que representava para os moradores o seu baldio e

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faltou também a capacidade política para conciliar os interesses gerais do Estado com as regalias e hábitos ancestrais dos utentes. A florestação representou o cerceamento de direitos, a perda de liberdade e a agressão psicológica. As revoltas naturais e espontâneas foram vencidas pela força.
Mas a floresta ficou.
O regresso, após o 25 de Abril, dos baldios às populações não representou, efectivamente, um regresso ao que fora antes e também nada se construiu de novo. Os rebanhos não voltaram; o apoio aos pequenos agricultores e operários agrícolas não funcionou; o estímulo às formas locais e directas de expressão e organização democrática não incentivaram os trabalhadores do campo a avançar no controle do processo produtivo e dos recursos naturais, como era propósito do Decreto-Lei n.º 39/76. Enfim, a política de reforma agrária que assim se estendia ao norte do País não encontrou eco nas populações utentes dos baldios ou porque as não conseguiu sensibilizar ou porque o processo não se completou até ao ponto de ter havido um regresso à terra.
As terras pertencentes aos baldios entregues por amizade ou favor político não foram recuperadas como se esperava.

O Sr. José Moniz (CDS): -Muito bem!

O Orador: - E o que se deu entretanto?
Nem todos os baldios foram restituídos aos utentes, por inércia natural ou procurada das juntas de freguesia, mas sempre com algumas culpas ou com o desinteresse dos utentes; há baldios que, por abandono de funções dos conselhos directivos e por falta de previsão legal, não possuem entidade administrante; o plano de aplicação das receitas deve ser homologado pelo governo civil e pelo Ministério da Agricultura, mas nem um nem outro dos organismos tem competência para intervir nesse plano, o que os coloca na posição incómoda e até desmerecedora de pactuarem com erros grosseiros; nos planos de aplicação de receitas há verbas consignadas a acções paralelas àquelas que deve desenvolver a autarquia local como, por exemplo, construção de cemitérios, electrificações, abastecimento de água, campos de futebol, etc., etc.; os rendimentos baldios florestados são, às vezes, mais avultados que os das juntas de freguesia, o que cria uma situação de conflito entre populações e órgãos; o conselho directivo dos baldios não tem de prestar contas a não ser à assembleia de compartes e, se o não fizer ou fizer irregularmente, não há sanção específica para a omissão, negligência ou dolo, o que parece inadequado quando se trata da administração de uma propriedade social; nunca foi definido qual o fim das receitas nem os objectivos gerais dos conselhos directivos no que concerne à melhor rentabilidade do baldio, pelo que tem havido mais interesse em beneficiar as populações em geral com as receitas dos baldios do que aplicar os rendimentos na melhoria dos factores de produção. O trabalho não apareceu, apareceu sim quem tivesse ideias sobre o aproveitamento dos rendimentos; do ponto de vista do interesse geral, e sem procurar ferir os interesses das comunidades locais que são a razão fundamental da existência dos baldios, pode dizer-se que não têm sido aproveitados e os planos de utilização, sendo feitos ou não, não são aplicados e constituem assim um obstáculo a uma política real do respectivo aproveitamento.
Noutra perspectiva: as juntas de freguesia recorreram muitas vezes ao expediente da justificação notarial para efeitos de registo predial e os baldios passaram assim de bens comunitários a propriedade privada das autarquias; há vendas de lotes de terreno onde se esconde, com generalizada cumplicidade, a situação de terreno baldio; há loteamentos de baldios feitos pelas autarquias perfeitamente ilegais e em que a venda não pode ser realizada mas o adquirente já tem ali casa feita.
Enfim: há arrendamentos que tem a natureza de urbanos feitos por conselhos directivos e juntas de freguesia para instalar depósitos de madeiras e outros que são destinados a plantações, como rezam os arestas dos tribunais e em que é interessada, por exemplo, a PORTUCEL.
Mas também se verifica, e é grave, que zonas de planície não possuindo, em geral, baldios, que só a serra tem, tenham sido sempre e continuem a ser as mais beneficiadas, em prejuízo daquelas que. pouco têm e que sofreram as limitações e as consequências da arborização. Sacrificados são ainda hoje os mesmos.
Enfim, é um rosário infindável de situações pouco edificantes para os conselhos directivos, os utentes e as juntas de freguesia.
E nós ficamos a pensar se os baldios ainda devem servir os fins que os costumes fixaram ou se a legislação que os rege não é de todo inadequada à situação económica e social em que se vive. Se entregues às juntas de freguesia têm condições para se manterem e servirem o fim útil da melhoria do nosso produto agrícola. Se não é justo e legítimo que as populações, às vezes abraçadas pelo baldio, tenham o direito de ser pagas ou indemnizadas pelos sacrifícios que tiveram na altura da sementeira da mata. Se não é justo e legítimo que as infra-estruturas das zonas onde existem baldios possam ser edificadas nesses mesmos baldios. Se não são em geral os baldios, quase sempre terrenos impróprios para cultura, que devem servir para o alargamento do desenvolvimento urbanístico, desviando-se a procura de outros terrenos aptos para a cultura. Se não deve o Estado, através dos serviços florestais, ter uma decisiva importância na florestação, na criação de reservas de caça e pesca, no povoamento e na produção de mel, por exemplo, a partir dos baldios.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quis transmitir a ideia da dificuldade da matéria.
Deixemos, no entanto, essas considerações, fundamentais, embora, para a resolução do caso dos baldios, e detenhamo-nos nos projectos que temos em mão.
Ambos têm como dado adquirido que os baldios são bens usados e fruídos pelos residentes em determinada freguesia ou freguesias ou parte delas.
E quanto à propriedade não se afastam da concepção de que são bens do domínio público da freguesia. O projecto de lei do PSD porque diz claramente que são bens do domínio da freguesia, o do CDS porque, não o dizendo, permite à junta de freguesia que venda partes dos baldios. Não prima, neste aspecto, pela clareza, mas, permitindo que, por deliberação da assembleia de freguesia, os baldios possam passar à proprie-

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dade privada da junta e à de terceiros, após aquela deliberação e a correspondente escritura, parece adoptar-se a mesma solução que, aliás, o CDS tinha adoptado no artigo 2.º do seu projecto de lei n.º 272/II.
Solução discutida mas, porque parece caber dentro dos n.ºs l e 2 do artigo 89.º da Constituição, pelo menos defensável.
E também é defensável por razões pragmáticas, como sejam as de dar às juntas de freguesia a sua verdadeira dimensão de defensoras dos interesses gerais das populações, de promotoras do progresso das comunidades, de participantes no ordenamento urbano das povoações, de alavancas no aumento do produto florestal e de representantes respeitadas do poder local, às vezes confrontadas com organizações paralelas de maiores posses.
Assim posta a questão da propriedade, já nos parece menos aceitável, por exemplo, a atitude assumida quanto à delegação da gestão nos utentes, razão de ser dos baldios, que só pode ser feita por proposta da assembleia de freguesia (PSD) ou também por iniciativa de grupos significativos de eleitores residentes, como diz o CDS de uma forma imprecisa, vaga e geradora de dificuldades.
O âmbito da delegação não está definido e mais me parece que os delegados serão apenas criados desempenhando tarefas administrativas (CDS), que quando não servirem são despedidos - despedidos sem justa causa e sem sequer poderem defender a bondade do seu trabalho.
Na verdade, ficamos a pensar se o objectivo é delegar ou é não delegar. Os utentes nada têm a dizer sobre a delegação; são os eleitores residentes que podem não ser utentes (CDS).
O momento da prestação de contas também nos oferece algumas dúvidas.
O problema da gestão dos baldios pertencentes a mais de uma freguesia é de solução ingrata e foi por isso que o PSD, no projecto de lei n.º 291/II, adoptou a solução do Código Administrativo de Marcelo Caetano, entregando a gestão ao município. Alterou, porém, a posição, para aparecer com outra semelhante à do CDS. A resolução do problema não é fácil, e a que foi encontrada, habilidosa, embora, porque entrega à assembleia municipal a sua resolução, dando-lhe apenas a possibilidade de escolher de entre as teses em conflito uma delas, pode não ser pacífica. Mas será, todavia, a melhor?!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, informo-o de que esgotou o tempo de que dispunha.

O Orador: - Muito mais teríamos para dizer mas, nesse caso, vou passar à frente.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Dá-me licença que interpele a Mesa, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Lage (PS):- Sr. Presidente, peço a V. Ex.ª que conceda alguma tolerância ao Sr. Deputado que está a fazer uma intervenção, que reputo de extrema importância, a fim de que ele a possa concluir sem quebrar o seu raciocínio.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra. Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): -Sr. Presidente, suponho que a UEDS ainda dispõe de tempo e, se assim for, cedemo-lo ao Sr. Deputado que está no uso da palavra.

O Sr. Presidente: - Com efeito, a UEDS dispõe ainda de 4 minutos, e, portanto, uma vez que lhe foi cedido este tempo, pode V. Ex.a, Sr. Deputado António da Costa, terminar a sua intervenção.

O Orador: - Estava eu a dizer que, o não uso do baldio durante certo tempo permitirá à assembleia de freguesia dar-lhe outro destino, embora marcadamente social. A decisão sobre o destino resulta apenas do não uso e esse destino, na nossa leitura, pode ser tudo, mesmo a divisão de talhões, embora a título precário, se for de manifesto interesse para as populações. A seguir virá o esforço para a respectiva aquisição. E necessário restringir o âmbito desta disposição, parece. Mas quando é que o baldio não é usado? Quando se determina o momento em que deixa de ser usado?
A venda do baldio ou parte dele é acto nulo (PSD) ou anulável segundo parece (CDS).
Admite-se a ratificação das vendas mesmo praticadas depois de Janeiro de 1976 (CDS) ou apenas até 1974 (PSD).
Deverá ou não haver um processo simples para a desafectação de parcelas confinantes e destinadas à expansão do agregado populacional?
Gostaríamos de deixar uma consideração final.
Sabemos que ninguém quer grande intervenção dos órgãos do Estado na administração autárquica. Os serviços florestais não podem sobrepor-se aos autarcas eleitos, mas não podemos esquecer o extraordinário valor que hoje representam os produtos florestais e o mais que podem representar. São detentores, os serviços florestais, de uma técnica de utilização e exploração. Sentimos, ao ler os projectos, que a colaboração deve ser maior e temos de ter a consciência de que não podemos servir-nos dos serviços florestais na altura da elaboração dos planos de utilização e exploração e de despedi-los porque recusam o consumismo ou o desbaratamento das matas, permitindo apenas os cortes em momentos adequados.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pensamos que os projectos devem ser corrigidos na especialidade de acordo com vectores que não podem deixar de ser: o respeito pelos órgãos políticos de administração local e pelas suas competências; a defesa consequente das formas tradicionais da utilização dos baldios pelos utentes; a organização de formas que possam minorar o abandono a que têm sido votadas as populações utentes dos baldios; a defesa dos interesses gerais do Estado com vista à protecção dos solos e dos recursos hídricos e à protecção das espécies cinegéticas e piscícolas que o ordenamento florestal naturalmente há-de prever.

Aplausos do PS. do PSD, do CDS e da ASDI.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

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O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. José Vitorino (PSD): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, dado que chegámos ao fim do período regimental, o Partido Social-Democrata requer, nos termos regimentais, a votação do projecto de lei n.º 281/III sobre baldios.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estávamos a discutir em conjunto os 3 projectos de lei, do PSD, do CDS e da ASDI e, uma vez que foi requerida a votação do projecto de lei do PSD, interpreto que o que se pretende e que os 3 projectos de lei sejam votados na mesma altura. Julgo, também, que as declarações de voto serão entregues, por escrito, na Mesa.
Como verifico que há consenso, vamos votar os projectos de lei, Srs. Deputados.

Vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 281/III, apresentado pelo PSD.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do CDS e da ASDI e com votos contra do PCP, do MDP f CDE e da UEDS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos agora votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 199/III, apresentado pelo CDS.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor du PS, do PSD, do CDS e da ASDI e com votos contra do PCP, do MDP/CDE e da UEDS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos por último votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 114/III, apresentado pela ASDI.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do CDS e da ASDI e com as abstenções do PCP, do MDP/CDE e da UEDS.

O Sr. Presidente: - Foi entregue na Mesa um requerimento de baixa à Comissão que é redigido nos seguintes termos:
Os abaixo assinados, deputados do PS e do PSD, requerem a baixa dos projectos de lei n.ºs 281/III, 199/III e 114/III a uma comissão mista formada por 17 elementos das Comissões de Agricultura e de Administração Interna e Poder Local com a seguinte composição: PS, 5; PSD, 4; PCP, 3; CDS, 2; MDP/CDE, 1; UEDS, 1; ASDI, I.
O prazo estabelecido para apresentação do relatório é de 60 dias.

Vamos votar este requerimento, Srs. Deputados.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Sr. Presidente, peço n palavra para fazer uma declaração de voto.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, tinha ficado decidido, sem oposição, que as declarações de voto seriam apresentadas por escrito.

O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Então, nesse caso, apresentá-la-ei por escrito, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vão ser anunciados os projectos de lei que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Leonel Fadigas): - Deram entrada na Mesa os seguintes projectos de lei: projecto de lei n.º 356/III, da iniciativa do Sr. Deputado Ferdinando Gouveia, do PS, sobre a elevação da vila de Loulé à categoria de cidade - foi admitido e baixou à comissão; projecto de lei n.º 357/III, da iniciativa da Sr.ª Deputada Odete Santos, do PCP, que aprova as medidas tendentes a organizar a resposta do Estado democrático à calamidade dos salários em atraso - foi admitido e baixou à 3.ª Comissão.

O Sr. Presidente. - Srs. Deputados, os trabalhos continuarão amanhã às 10 horas da manhã, com interrupções das 13 às 15 horas e das 20 às 22 horas, devendo terminar à l hora e meia do dia seguinte.
O período da ordem do dia incluí o pedido de urgência para a discussão do projecto de lei «n.º 351/III, do PCP, que estabelece o prazo limite para a publicação do plano anual e o prosseguimento da discussão das alterações ao Regimento.
Está encerrada a sessão.

Eram 20 horas e 15 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Almerindo da Silva Marques.
José Augusto Fillol Guimarães.
José Barbosa Mota.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

Amadeu Vasconcelos Matias.
Domingos Duarte Lima.
José Vargas Bulcão.
Pedro Miguel Santana Lopes.

Partido Comunista Português (PCP);

Manuel Correia Lopes.
Zita Maria de Seabra Roseiro.

Centro Democrático Social (CDS)

Alfredo Albano de Castro Azevedo Soares.
João Lopes Porto.
José Vieira de Carvalho.
Manuel Tomás Rodrigues Queiró.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados

Partido Socialista (PS):

Alberto Rodrigues Ferreira Gamboa.
António Jorge Duarte Rebelo de Sousa.

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Carlos Justino Luís Cordeiro.
Ferdinando Lourenço Gouveia.
Jorge Manuel Aparício Ferreira Miranda
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
Manuel Filipe Santos Loureiro.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD)

Amândio S. Domingues Basto Oliveira.
Amélia Cavaleiro Monteiro A. Azevedo.
António Maria de Orneias Ourique Mendes.
Arnaldo Ângelo Brito Lhamas.
Fernando José da Costa.
Fernando dos Reis Condesso.
João Pedro de Barros.
Joaquim Dias Carneiro.
José Ângelo Ferreira Correia.
Leonardo Eugénio Ramos Ribeiro Almeida.
Leonel Santa Rita Pires.
Luís António Pires Baptista.
Pedro Paulo Carvalho Silva.

Partido Comunista Português (PCP):

António Guilherme Branco Gonzalez.
Domingos Abrantes Ferreira.
Joaquim Gomes dos Santos.
Maria Luísa Mesquita Cachado.
Maria Margarida Tengarrinha.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.

Centro Democrático Social (CDS):

Adriano José Alves Moreira
António José de Castro Bagão Félix.
Francisco António Lucas Pires.
Horácio Alves Marçal.
João António de Morais Silva Leitão.
João Gomes de Abreu Lima.
Narana Sinai Coissoró.

Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):

Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.

Os Redactores: Ana Maria Marques da Cruz - José Diogo.

Declarações de voto enviadas à mesa para publicação e relativas à votação na generalidade dos projectos de lei n.ºs 114/III, 119/III e 281/III.

1 - Do deputado do IPS Cunha e Sá
Votámos favoravelmente os projectos apresentados pelo PSD e pelo CDS tendo em conta a necessidade de, através da discussão na especialidade, consagrar a distinção dos diferentes tipos de situações existentes.
Com efeito, pensamos serem perfeitamente distintos e deverem merecer regulamentação específica os casos em que se verifica o uso, a fruição e a gestão pelos utentes, assentes numa prática consuetudinária consolidada e, por outro, aqueles em que ela desapareceu ou nunca existiu e se torna necessário organizar a sua gestão por outra forma, ou seja, através dos órgãos autárquicos.
Igualmente votámos favoravelmente o projecto de lei apresentado pela ASDI por representar um instrumento de combate a práticas menos claras e desonestas de apropriação dos terrenos baldios.
2 - Do deputado do PSD Roleira Marinho
Não basta afirmarmos que somos defensores de um poder local forte, autónomo e independente, capaz de ultrapassar todas as dificuldades, nomeadamente as decorrentes de questões económicas; temos que às afirmações nesse sentido juntar as acções que estejam em sintonia com essa vontade.
Assim, o Partido Social-Democrata apresentou o projecto de lei n.º 281/III sobre baldios, pois entende que o regime jurídico que se vem seguindo na matéria não satisfaz o querer das populações, e, por outro lado, temos dúvidas sobre a sua existência legal (dado que foram revogadas as suas disposições aquando da aprovação por esta Assembleia do artigo 109.º da Lei n.º 79/77 e, aquando da revogação deste, não se recuperaram os Decretos n.ºs 39/76 e 40/76, que, no nosso entender, são inconstitucionais.
Das comunidades locais, das autarquias chegam a cada passo lamentações pela indefinição que existe na gestão dos baldios - e não raro muitos conflitos se geram, não porque os interesses sejam antagónicos, mas pela sobreposição de funções em órgãos de raiz diferente.
Em muitas freguesias fizeram-se já coincidir a junta de freguesia com o conselho directivo dos baldios, no sentido de colocar os baldios sob a administração da junta de freguesia, só que tal situação não resolveu totalmente os problemas existentes, e isto porque:
Continuaram a depender da aprovação do governo civil e dos serviços regionais do Ministério da Agricultura as deliberações da assembleia de compartes que aprovam o plano anual de aplicação das respectivas receitas.
Os elementos do conselho directivo não podem ser reeleitos, logo, caso sejam membros da junta de freguesia por mais que l mandato, mesmo que se verifique interesse da assembleia de compartes, não poderão exercer em simultâneo tais funções.
A escrituração dos movimentos da junta de freguesia terá de fazer-se em separado dos livros da assembleia de compartes, quando tudo se refere à própria freguesia e aos seus bens.
É necessário desburocratizar, tornar operacionais os textos legislativos, e todos temos consciência de que não é o que se passa hoje, e, por outro lado, mesmo considerando que o Decreto-Lei n.º 39/76 está em vigor, o que nele se consagra é uma tarefa administrativa que não envolve o exercício de poderes de autoridade.
O projecto de lei do Partido Social-Democrata procura ir ao encontro da vontade e das necessidades das populações que vivem nos meios rurais; pretendemos que os baldios possam ser plenamente administrados e fruídos pelas comunidades locais, as quais, por voto secreto e universal, elegem os respectivos órgãos autárquicos, a quem cabem por lei o dever e o direito de administrar os bens que a todos pertencem.
Não duvidamos que o problema dos baldios é um problema importante para a generalidade das popu-

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lações rurais do País, não duvidamos que é assunto de fácil politização e que, partidariamente, a cada passo, se procuram colher dividendos em favor das diversas forças, sempre desfraldando bandeiras sem que se procure criar o quadro jurídico necessário à melhor gestão dos terrenos baldios.
Com o projecto de lei que apresentamos, procura o Partido Social-Democrata dotar as comunidades locais com a riqueza que efectivamente lhes pertence, desbloqueando, ao mesmo tempo, avultadas verbas que se encontram cativas por não existirem órgãos legalmente constituídos que possam levantar e movimentar tais importâncias.
Um outro aspecto u que procuramos dar corpo é tornar aproveitados terrenos, quantas vezes impróprios até para sementeiras de pinhal, e que, pela sua localização dentro das povoações, seriam extremamente úteis para urbanizações (quantas pessoas, quantos cidadãos existem sem um palmo de terra e pretendem construir a sua pequena habitação, e, sem meios para comprar um terreno sujeito aos condicionalismos do mercado normal, não conseguem materializar um sonho de qualquer homem livre - ter a sua casa), e que, dentro de regras perfeitamente definidas, poderemos encontrar nos terrenos baldios. Trabalhos de simples alinhamentos e até aproveitamentos para instalação de equipamentos sociais colectivos, de que todas as nossas aldeias estão tão carenciadas, como jardins infantis, lares de idosos, ginásios, escolas, campos desportivos, piscinas ... e um nunca mais acabar de benefícios que só as populações urbanas ou os possuidores de bens de fortuna pessoal têm acesso.
Se é certo que com a legislação pós-25 de Abril se pretendeu disciplinar e corrigir abusos que alguns haviam perpetrado contra o interesse geral da colectividade, o certo é que, instituída a vida democrática nas autarquias, é urgente devolver efectivamente às populações e aos seus representantes legítimos a gestão dos baldios e avançarmos para além da indefinição de quem é «comparte» ou de quem não é.
Não podemos esquecer que o próprio aproveitamento do baldio hoje não é o mesmo de há alguns anos atrás - da lenha para consumo domestico, do mato para o estrume da horta, ou até da própria apascentação do gado; hoje o baldio é quase unicamente fornecedor de madeiras, que se destinam us diversas indústrias e cujo rendimento as autarquias procurarão aplicar em obras que as populações esperam e justamente merecem e exigem.
Nada é imutável e seria imperdoável da nossa parte que, por comodidade, nos remetêssemos a um silêncio fácil e não procurássemos ir ao encontro da vontade dos nossos eleitores, modificando, melhorando legislação que se encontra desfasada das realidades, porque o poder de autoridade tem de assentar em órgãos que a Constituição consagra - e no caso dos interesses locais esses órgãos são as respectivas autarquias -, legitimados pelo voto universal, directo e secreto, a quem compete a gestão de todos os bens das respectivas comunidades locais.
As teses que defendemos nem contrariam o previsto no artigo 89.º da Constituição nem o consuetudinariamente estabelecido, dado que aqui, por aditamento que apresentámos na Mesa, retomamos tal princípio que o projecto que havíamos apresentado na legislatura passada contemplava, embora no actual não conste explicitamente, situação a que atribuímos a importância que a sensibilidade comum reconhece.
Assim, pretendemos desde já acentuar o perfeito enquadramento constitucional do presente projecto de lei, porque se às organizações populares de base são atribuídas tarefas administrativas, que não contêm em si o exercício do poder de autoridade (exercem funções delegadas), cabendo, por isso, a outros órgãos a «gestão» e o poder de aplicar sanções àqueles que infrinjam as regras estabelecidas, e esse poder decorre de órgãos que compõem a própria organização política e democrática do Estado a que se refere a Constituição - no caso as autarquias-, a cias compete a gestão e a definição do modo como essa gestão deve ser executada.
O nosso projecto de lei procura dar corpo àquilo que sempre pensamos ser a melhor utilização dos baldios, a torná-los mais rentáveis e mais vividos localmente, sendo certo, porém, que saberemos acolher outras sugestões que melhorem a sua redacção ou ampliem o seu conteúdo pelo que votámos favoravelmente os 3 projectos de lei, mas afirmando-nos sempre pela predominância dos órgãos autárquicos sobre quaisquer outros na administração e gestão dos baldios, como bens pertencentes às comunidades locais.

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