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2376 I SÉRIE - NÚMERO 58

Sr. Presidente, Srs. Deputados: A situação actual do arrendamento em Portugal caracteriza-se, essencialmente, pelo seguinte quadro habitacional e jurídico: cerca de 36% dos fogos arrendados apresentam evidentes sinais de degradação, o que corresponde a 360 000 habitações. Não têm energia eléctrica 10%, carecem de água canalizada 25% e 600 000 habitações não têm instalações sanitárias. Dos locatários, 82% pagavam, em 1982, menos de 10% dos respectivos rendimentos, sendo as rendas médias de 1350$ na Grande Lisboa, 1170$ no Grande Porto e 1250$ nos distritos-padrão, Viseu, Évora e Faro. Mas, para se ter uma visão mais realista da actual estrutura do parque habitacional em Portugal continental, diremos que 34,3% pagam menos de 500$, 26,4% entre 500$ e 1000$, e 28,4% entre 1000$ e 3000$.
Com este parque, com esta estrutura, com estas taxas de esforço de pagamento, tendo em linha de conta as carências de toda a ordem, quer no que respeita à degradação dos fogos existentes, quer no que respeita à sua insuficiência, atingiu-se a ruptura. Estamos agora confrontados com ela. E isso decorre também, mas não exclusivamente, do actual regime jurídico do inquilinato.
Assim é que a lei n.º 2030 congelou os preços locativos em Lisboa e no Porto em 1948 com efeitos a partir de 1943. O Decreto-Lei n.º 445/74 veio suspender a avaliação quanto ao resto do País, o que, na prática, conduziu também ao congelamento. E só com o Decreto-Lei n.º 148/81 foi possível desbloquear novos contratos de arrendamento, em ordem a permitir a estipulação de rendas livres e de rendas condicionadas, estas sujeitas a actualizações anuais através de quocientes calculados na base de variações do índice médio ponderado de preços no consumidor, sem habitação, correspondente aos últimos 12 meses, para os quais existissem valores disponíveis. Se tomarmos em conta que o Decreto-Lei n.º 294/82 veio introduzir a repercussão das obras de reparação e beneficiação nos preços locativos, ficaremos com um quadro jurídico complexo que, nas suas linhas gerais, se pode apresentar do seguinte modo: .

A) Rendas congeladas, como efeito da Lei
n.º 2030 e do Decreto-Lei n.º 445/74;
B) Rendas livres e rendas condicionadas, cujo regime é regulado pelo Decreto-Lei n.º 48/81;
C) Rendas actualizadas por força da imputação do custo das obras de reparação e beneficiação, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 294/82;
D) Rendas limitadas;
E) Outros arrendamentos especiais, designadamente os previstos no n.º 2 do artigo 1083.º do Código Civil.

Iremos agora fazer uma análise aos princípios que enformam a proposta de lei n.º 77/III, posto o que acrescentaremos algumas sugestões e críticas com vista à sua melhoria.
No programa eleitoral do Partido Socialista e no próprio Programa do Governo, foi afirmado e aprovado, respectivamente, que uma das medidas imediatas consistiria na consagração do princípio da renda justa, assente em critérios de justiça social, o que postulava um modelo que fosse talhado dentro dos seguintes limites: a actualização seria periódica (em princípio após o decurso de períodos anuais) e atenuada por subsídios diferenciais suportados por receitas fiscais decorrentes da contribuição predial. Por outro lado, não poderão os coeficientes de actualização ultrapassar determinados limites, em ordem a mantê-los abaixo dos preços dos índices no consumidor, sem habitação.
A proposta de lei vem consagrar ainda três regimes de renda, quais sejam o de renda livre, renda condicionada e renda apoiada. Em relação ao regime de renda apoiada, a proposta de lei pouco ou nada diz, já que se limita a fazer a remissão para preceitos legais em vigor e até que o Governo fixe o respectivo regime legal. Mas, já no que toca aos regimes de renda livre e condicionada, foi preocupação do Executivo estabelecer algumas regras que impedissem o efeito multiplicador do desnível na lei da oferta e da procura, levando necessariamente à especulação ou ao pagamento de lucros extracontrato. Assim, estabeleceu-se um regime de compatibilização, que passa pela concessão de isenções fiscais no regime de rendas condicionadas e fixa as regras de suporte da renda inicial, que distancia o volume locativo em montantes mais ou menos atractivos, quer para senhorios, quer para inquilinos. Digamos que o princípio geral é o da fixação de rendas condicionadas, tornadas obrigatórias em algumas situações, sendo as rendas livres negociadas livremente e sem incentivos fiscais. Nesse domínio, a proposta de lei não foi tão longe como devia, já que deveria ter sido afirmado que os coeficientes terão de ser desiguais, obviamente - uns para as rendas livres e outros para as rendas condicionadas. Mais: pensamos que o coeficiente de actualização deverá ser contido anualmente entre dois terços a três terços do índice médio dos preços do consumidor sem habitação, nos últimos 12 meses, como limites mínimo e máximo. Pensamos que é importante que isto fique desde já exarado na lei, para evitar que as sucessivas políticas dos sucessivos governos venham porventura a fixar coeficientes da ordem dos 100%, quando, por razões de natureza política, isso possa, à luz dessa orientação, ser justificado. Por isso, defendemos que já nesta proposta de lei deveremos fixar coeficientes cujo limite mínimo seja de dois terços e máximo de três terços, obviamente para actualizações anuais das rendas de casa.

No contexto social e económico actual, o que é mais gravoso nesta lei não são as actualizações anuais. São-no indiscutivelmente as correcções extraordinárias, que, em inúmeras situações, poderão criar a rotura nos orçamentos familiares mais débeis. Temos perfeita consciência disso. Sabemos, todavia, que, nesses casos, o subsídio de renda poderá atenuar ou eliminar o défice dos rendimentos do agregado, desde que haja a preocupação de fixar os subsídios em função do rendimento bruto do agregado familiar do locatário, da dimensão média da família e da renda paga. Esperamos que o Governo atenda ainda àqueles casos excepcionais de manifesta carência, como, por exemplo, todos os que trabalham sem receber a contrapartida do salário, os desempregados e outros estratos que sofram carências iguais ou inferiores àqueles, que, afinal de contas, poderemos considerar situados em posição igual ou inferior aos próprios reformados e pensionistas. Pensamos que o subsídio de renda deverá também ser alargado a todos esses estratos da população activa ou não activa.
Mas o gravame das correcções extraordinárias, apesar de serem um mal necessário face à degradação do