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DIÁRIO Da Assembleia da República

I Série - Número 31

Sexta-feira, 7 de Fevereiro de 1986

IV LEGISLATURA

1. SESSÃO LEGISLATIVA (1985-1986)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 6 DE FEVEREIRO DE 1986

Presidente: Exmo. Sr. Fernando Monteiro do Amaral

Secretários: Ex.mºs Srs. Reinaldo Alberto Ramos Gomes
Rui de Sá e Cunha
José Carlos Pinto B. Mota Torres
José Manuel Mala Nunes de Almeida

SUMARIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 25 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta do expediente, da apresentação de requerimentos e das respostas a alguns outros.
O Sr. Deputado José Mota (PS) referiu-se à importância do enquadramento do sector têxtil para a economia nacional.
O Sr. Deputado Manuel Moreira (PSD) salientou a importância da constituição da Associação de Municípios para o Desenvolvimento e Formação (ADEFORMA), cuja escritura ocorreu na passada segunda-feira, dia 3 de Fevereiro, na Câmara Municipal de Amarante.
O Sr. Deputado Carlos Brito (PCP) chamou a atenção para alguns problemas que afectam gravemente a situação do Algarve e respondeu, no fim, a um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Mendes Bota (PSD).

Ordem do dia. - Foram aprovados os n.ºs 21 a 26 do Diário.
Não foi concedida urgência à apreciação do projecto de lei n. º 51/IV (Criação do cargo de promotor ecológico com vista à defesa da vida e do meio ambiente, requerida pela Sra. Deputada Maria Santos (Indep.). No debate intervieram a diverso título, além da requerente, os Srs. Deputados Margarida Tengarrinha (PCP), Daniel Bastos (PSD), Raul Castro (MDP/CDE) Barbosa de Azevedo (PSD) e João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE).
Foram aprovados seis pareceres da Comissão de Regimento e Mandatos autorizando vários Srs. Deputados a depor em tribunal como testemunhas.
Foi igualmente lido e aprovado um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos sobre a substituição de um deputado do PSD.
Após apreciação das ratificações n.ºs 37/117 (PCP), 49/IV (PRD) e 53/IV(PS, PRD, PCP e MDP/CDE) foi aprovado na generalidade, na especialidade e em votação final global um projecto de resolução, apresentado pelo PS, pelo PSD, pelo PCP e pelo MDP/CDE, que repõe em vigor o Decreto-Lei n.º 451/85, de 28 de Outubro - Aprova o Estatuto do Pessoal Técnico, Técnico-Profissional, Administrativo e Auxiliar ao Serviço das Missões, Embaixadas e Consulados de Portugal. Intervieram no debate a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e Cooperação (Eduardo Azevedo Soares), os Srs. Deputados Caio Roque (PS), Custódio Gingão (PCP), Roberto Amaral (PSD), Cardoso Ferreira (PSD). Jorge Lemos (PCP), João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE) e José Gama (CDS).
Seguidamente, depois de lidos dois pareceres da Comissão de Economia, Finanças e Plano, foram aprovados na generalidade os projectos de lei n.ºs 48/IV (PCP), 92/IV (CDS) e 94/IV (PS)- alterações à Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado -, que baixaram à Comissão para apreciação na especialidade. Usaram
da palavra a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado do Orçamento (Rui Carp), os Srs. Deputados Ivo Pinho (PRD), João Cravinho (PS), Nogueira de Brito (CDS), Próspero Luís (PSD), Octávio Teixeira (PCP) e Raul Castro (MDP/CDE).
Entretanto, procedeu-se às eleições para cargos do Conselho de Fiscalização dos Serviços de Informação, do Tribunal Constitucional, do Conselho Superior de Defesa Nacional, do Conselho de Imprensa e do Conselho Nacional do Plano.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 9 horas e 53 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 25 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Adérito Manuel Soares Campos.
Alberto Monteiro Araújo.
Álvaro Barros Marques de Figueiredo.
Amândio Anes de Azevedo.
Amândio Santa Cruz Basto Oliveira.
Amélia Cavaleiro Andrade Azevedo.
António d'Orey Capucho.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Manuel Lopes Tavares.
António Paulo Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Arlindo da Silva André Moreira.
Arménio Jerónimo Martins Matias.

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Arnaldo Ângelo de Brito Lhamas.
Aurora Margarida Borges de Carvalho.
Belarmino Henriques Correia.
Cândido Alberto Lencastre Pereira.
Carlos Alberto Pinto.
Carlos Miguel Maximiano Almeida Coelho.
Cecília Pita Catarino.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Domingos Silva e Sousa.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando José Próspero Luís.
Fernando Manuel A. Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Francisco Jardim Ramos.
Francisco Mendes Costa.
Francisco Rodrigues Porto.
Francisco João Bernardino Silva.
Henrique Luís Esteves Bairrão.
Henrique Rodrigues Mata.
João Álvaro Poças Santos.
João Domingos Abreu Salgado.
João José Pedreira de Matos.
João José Pimenta de Sousa.
João Luís Malato Correia.
João Maria Ferreira Teixeira.
Joaquim Carneiro de Barros Domingues.
Joaquim da Silva Martins.
José de Almeida Cesário.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Filipe de Atayde Carvalhosa.
José Francisco Amaral.
José Júlio Vieira Mesquita.
José Luís Bonifácio Ramos.
José Maria Peixoto Coutinho
José Mendes Bota.
José Mendes Melo Alves.
José de Vargas Bulcão.
Licínio Moreira da Silva.
Luís António Martins.
Luís Jorge Cabral Tavares Lima.
Luís Manuel Neves Rodrigues.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel João Vaz Freixo.
Manuel José Marques Montargil.
Manuel Maria Moreira
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Miguel Fernando Miranda Relvas.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Alberto Limpo Salvad
Rui Manuel de Oliveira Costa.
Rui Manuel Parente Chancerelle Machete.
Valdemar Cardoso Alves.
Virgílio de Oliveira Carneiro.

Partido Socialista (PS):

Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Aloísio Fernando Macedo Fonseca.
António Cândido Miranda Macedo.
António Frederico Vieira de Moura.
António Miguel de Morais Barreto.
António José Sanches Esteves.
António Magalhães Silva.
António Manuel Maldonado Gonelha.
Armando António Martins Vara.
Armando dos Santos Lopes.
Carlos Alberto Raposo Santana Maia.
Carlos Manuel Luís.
Carlos Montez Melancia.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Fernando Henriques Lopes.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Rosado Correia.
José Augusto Fillol Guimarães.
José Barbosa Mota.
José Carlos Pinto B. Mota Torres.
José dos Santos Gonçalves Frazão.
Luís Silvério Gonçalves Saias.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.
Mário Manuel Cal Brandão.
Mário Nunes da Silva.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Raul Manuel Gouveia B. Junqueiro.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Victor Manuel Caio Roque.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Agostinho Correia de Sousa.
Alexandre Manuel da Fonseca Leite.
Ana da Graça Gonçalves Antunes.
António. Alves Marques Júnior.
António Eduardo A. de Sousa Pereira.
António Lopes Marques.
António Magalhães de Barros Feu.
António Maria Paulouro.
Arménio Ramos de Carvalho.
Bártolo de Paiva Campos.
Carlos Alberto da S. Narciso Martins.
Carlos Alberto Rodrigues Matias.
Carlos Artur T. Sá Furtado.
Carlos Joaquim de Carvalho Ganopa.
Eurico Lemos Pires.
Fernando Dias de Carvalho.
Francisco. Armando Fernandes.
Hermínio Paiva Fernandes Martinho.
Ivo Jorge de'Almeida dos Santos Pinho.
Jaime Manuel Coutinho de Silva Ramos.
João Barros Madeira.
Joaquim Carmelo Lobo.
Joaquim Jorge Magalhães Mota.
José Alberto Paiva Seabra Rosa.
José Caeiro Passinhas.
José Carlos. Torres Matos de Vasconcelos.
José Carlos Pereira Lilaia.
José Emanuel Corujo Lopes.
José Luís Correia de Azevedo.
José da Silva Lopes.
José Rodrigo de Costa Carvalho.
Maria Cristina Albuquerque.
Paulo Manuel Quintão Guedes de Campos.
Roberto de Sousa Rocha Amaral.
Rui José dós Santos Silva.
Rui de Sá e Cunha.
Tiago Lameiro Rodrigues Bastos.
Vaso Pinto da Silva Marques.
Vitorino da Silva Costa.
Victor Manoel Lopes Vieira.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Favas Brasileiro.
António da Silva Mota.
António Manuel da Silva Osório.

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António Vidigal Amaro.
Belchior Alves Pereira.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhais.
Carlos Alfredo de Brito.
Carlos Manafaia.
Cláudio José Santos Percheiro.
Custódio Jacinto Gingão.
Francisco Miguel Duarte.
João Carlos Abrantes.
José António Gonçalves do Amaral.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel dos Santos Magalhães.
José Rodrigues Vitoriano.
Luís Manuel Loureiro Roque.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria Ilda da Costa Figueiredo.
Maria Margarida Tengarrinha.
Octávio Augusto Teixeira.
Rogério Paulo Sardinha de S. Moreira.

Centro Democrático Social (CDS):

António Filipe Neiva Correia.
António Vasco Mello S. César Menezes.
Francisco António Oliveira Teixeira.
Hernâni Torres Moutinho.
Horácio Alves Marçal.
João Gomes de Abreu de Lima.
João da Silva Mendes Morgado.
José Augusto Gama.
José Maria Andrade Pereira.
Manuel Eugénio Cavaleiro Brandão.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Raul Fernandes de Morais e Castro.

Deputados independentes:

António Poppe Lopes Cardoso (UEDS).
Maria Amélia do C. Mota Santos (Os Verdes).

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai proceder-se à leitura do expediente.

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Ofícios

Dos Sindicatos dos Professores do Norte e Centro e telegramas do delegado sindical da Escola Domingos Rebelo, em Ponta Delgada, exigindo a revisão salarial de 1986 e remetendo duplicados de várias moções aprovadas em plenários sindicais; da Direcção do Sindicato dos Profissionais de Banca dos Casinos com sede em Lisboa, remetendo um duplicado do comunicado n.º 4/86, relativamente a assunto ocorrido no Casino de Espinho; do Sindicato dos Trabalhadores do Comércio e Escritório do Distrito de Leiria e do Sindicato dos Bancários do Norte, com sedes em Leiria e no Porto, respectivamente, dando conta das suas posições relativamente à legislação laboral, e do Sindicato dos Trabalhadores das Indústrias Alimentares de Hidratos de Carbono do Sul e Ilhas, com sede em Lisboa, remetendo moções aprovadas por trabalhadores de diversas firmas de panificação, relativamente à não publicação da nova portaria de regulamentação de trabalho para o sector da indústria de panificação.

Cartas

19 cartas e 49 postais de Fernando Alexandrino Peixoto da Silveira e outros, alunos da Faculdade de Medicina do Porto, protestando, cito, pela escandalosa desigualdade de critérios em termos de informação manifestada pela RTP em relação ao conflito que opõe o Ministério da Saúde à Ordem dos Médicos, jovens licenciados e estudantes de Medicina; da Comissão de Trabalhadores da MESSA, com sede em Mem Martins, remetendo cópia do texto de apoio à conferência de imprensa que realizaram no dia 29 do passado mês de Janeiro, e da Comissão Nacional de Trabalhadores da União de Bancos Portugueses, com sede em Lisboa, juntando fotocópias de exposições em que manifestam o seu descontentamento por não se encontrarem isentos da aplicação do IVA os refeitórios sociais.

O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Foram apresentados na Mesa na última reunião plenária os seguintes requerimentos: à Secretaria de Estado dos Transportes e Comunicações, formulado pelo Sr. Deputado Reinaldo Gomes; ao Ministério do Trabalho e Segurança Social, formulados pelos Srs. Deputados João Abrantes e Zita Seabra, respectivamente; ao Ministério da Justiça, formulado pelos Srs. Deputados José Magalhães e José Manuel Mendes; ao Ministério da Educação e Cultura e ao Governo (4), formulados pelo Sr. Deputado Jorge Lemos; ao Ministério da Defesa Nacional, formulado pelo Sr. Deputado Álvaro Brasileiro; ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, formulado pelo Sr. Deputado Aloísio da Fonseca; a diversos ministérios (9), formulados pelo Sr. Deputado Magalhães Mota; ao Ministério da Indústria e Comércio, formulado pelos Srs. Deputados Alexandre Leite, Carlos Ganopa e Carlos Carvalhas; a diversos ministérios (3), formulados pelo Sr. Deputado Francisco Armando Fernandes; ao Ministério da Educação e Cultura, formulados pelos Srs. Deputados Carlos Matias, Bártolo Paiva Campos, Joaquim Gomes dos Santos e José Coutinho; ao Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação, formulado pelo Sr. Deputado Daniel Bastos; à Secretaria de Estado da Juventude e a diversos ministérios (2), formulados pelo Sr. Deputado José Apolinário.
O Governo, entretanto, respondeu a requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: Magalhães Mota, nas sessões de 8 de Novembro e 5 de Dezembro; João Poças Santos, na sessão de 26 de Novembro; Álvaro Brasileiro, na sessão de 28 de Novembro; Maria Santos, na sessão de 3 de Dezembro; Virgílio Carneiro, na sessão de 10 de Dezembro; António Barreto e José Frazão, na sessão de 10 de Dezembro; José Manuel Mendes e José Magalhães, na sessão de 17 de Dezembro; Rogério Moreira e José Tengarrinha, na sessão de 19 de Dezembro; Gomes de Pinho e João Corregedor da Fonseca, na sessão de 20 de Dezembro; Helena Torres Marques, na sessão de 6 de Janeiro; António Janeiro, na sessão de 21 de Janeiro.

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Entretanto, deu entrada na Mesa a ratificação n.º 56/IV, da iniciativa dos Srs. Deputados Jerónimo de Sousa e outros (PCP), relativamente ao Decreto Lei nº 7-A/86, de 14 de Janeiro, sobre "salários em atraso". Foi admitido e baixou à
3ª Comissão(Comissão de Trabalho).

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Mota.

0 Sr. José Mota (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Desnecessário será deter-mo-nos alongadamente nas últimas referências, que revelam a enorme impor-tância que o sector têxtil tem para o nosso país.

Bastaria, pois, atentar em 3 ou 4 aspectos relativos ao enquadramento do sector têxtil na economia nacional para confirmar ouu, tão-só, recordar tal facto:

Cerca de 2000 empresas;
Quase 200 000 trabalhadores; ou seja, mais de um quarto do emprego das indústrias transformadoras;
Significa um quinto do PIB das indústrias transformadoras;
Aproximadamente 30% do total das exportações nacionais - em l984 as exportações têxteis excederam os 200 milhões de contos, número que será ultrapassado, em 1985, contribuindo com saldos flagrantemente positivos para a nossa balança comercial (em 1984 o saldo foi da ordem dos 100 milhões de contos);

Tal e tamanha importância terá merecido correspondente interesse da parte do Estado?
Parece que não.
Primeiro, foram - são? - as várias " versões provisórias" de planos para reestruturação, e modernização do sector que, sucessivamente, foram ficando nas gavetas, mesmo depois de se saber, e querer, irreversível o processo para a adesão de Portugal á CEE.
Em simultâneo, as desordenadas e avulsas concessões de "subsídios", sem qualquer política global integradora problemática das regiões de forte concentração têxtil, quando é notória essa mesma concentração regional.
Finalmente, no plano da defesa dos interesses comerciais do sector, é "o período de transição" para a plena integração dos nosso têxteis; é um acordo bilateral em Espanha, no mínimo, desvantajoso; é a aceitação, com um encolher de ombros, de gravíssimas limitações impostas pelos Estados Unidos da América ás nossas exportações de têxteis.
Teremos de ter razões de queixa.
Estes últimos aspectos, inseridos no contexto de uma regulação do comércio internacional de têxteis assumem maior relevância face à integração de Portugal na Comunidade Europeia.
Desde logo, Portugal passa a estar directamente interessado no Acordo Multifibras, e numa altura particularmente, importante para este processo, já que se discute a sua renovação, de resto num quadro nada pacífico.
O Acordo Multifibras (AMF) pretende ser um instrumento para a regulação do mercado internacional de têxteis, sendo uma excepção ás regras gerais do GATT, face á enorme importância que aquele sector tem nos países em vias de desenvolvimento, grandes exportadores de artigos têxteis e vestuário.
O sistema de contingentes procura, pois, garantir uma distribuição dos volumes de importação pelos vários países exportadores integrados no AMF, permitindo, por um lado um aumento ordenado do sector têxti1 nesses países, mas, por outro, salvaguardar a indústria dos países desenvolvidos.
Portugal, a partir da adesão á CEE, está colocado face ao AMF na posição de pais importador e, conquanto as quotas que nos foram determinadas não se possam considerar excessivas - 1,5% do total de importações pelos países da CEE -, não poderá deixar de se empenhar seriamente no processo dado a nossa situação de país exportador de têxteis e o enorme peso que o sector tem entre nós.
A abolição do Acordo Multifibras com a consequente inserção do comércio internacional de têxteis nas regras do GATT, teria paca nós consequências incalculáveis a médio prazo e, certamente, no imediato impediria a modernização da nossa indústria, ponto obrigatório de passagem para a defesa do sector e a melhoria sensível das condições dos que nele trabalham.
E se é natural que os países exportadores apareçam a defender o fim do AMF como o é, nesse contexto, a posição fechada dos Estados Unidos da América, já
é incompreensível e inaceitável que os governos de alguns países da CEE, em particular os da República Federal da Alemanha e da Inglaterra, defendam a libe-
ralização do comércio com aqueles países.
Será inaceitável que, à partida, se entenda a próxima renovação do acordo - AMF -como sendo a última.
Se é um facto que o AMF é uma excepção ás regras gerais do comércio internacional, não é menos verdade que não são os têxteis o único sector em que tal se verifica, como é também certo que a situação actual não prefigura um quadro para daqui a 3 ou 4 anos que permita uma livre concorrência internacional baseada em idênticas condições de custos de produção, em particular no que concerne aos salários praticados e às condições gerais de trabalho.
E bastaria atentar na posição dos Estados Unidos da América que, neste caso, não, só defendem as restrições para os países exportadores do AMF, como as pretendem impor a muitos outros, incluindo a CEE, para estranhar a febre liberalizante da Comunidade, onde a taxa de penetração das importações se situa já em 45%.
E Portugal tem acrescidas razões para travar qualquer liberalização face aos países terceiros no âmbito do AMF, quando foi a própria Comunidade que impôs contingentes às nossas exportações de têxteis, mesmo para o período pós-adesão.
Não há, todavia, conhecimento público das posições que, eventualmente, o Governo Português tenha estado, ou está, a assumir. Era importante que o País fosse informado da situação e das perspectivas que se lhe depararam.
Sr: Presidente, Srs. Deputados: O recente exemplo dos gravíssimos problemas do nosso comércio de têxteis com os Estados Unidos da América não é bom augúrio.
Como é possível que se aceite, porventura com um leve encolher de ombros, a imposição de restrições às nossas exportações de têxteis e vestuário por parte do Governo Norte-Americano em absoluta contradição com as regras existentes para a CEE de que Portugal é membro de pleno direito?

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Como é possível não se protestar energicamente perante a violação de um princípio-base comunitário, segundo o qual as relações comerciais terão de ser analisadas e determinadas com a CEE enquanto tal e não individualmente a um seu membro?
Como será admissível que se encontrem já exportações portuguesas embargadas, como, por exemplo, as referentes a camisas, calças e outras como as fronhas e os lençóis tenham as quotas praticamente esgotadas, sem que tais factos sejam do domínio público, quando é sabida a importância que o mercado norte-americano tem já para algumas empresas portuguesas que fizeram desse mercado o seu objectivo?
E conviria também conhecer a posição que a Comunidade tem perante tão grave problema, se é que com ele foi confrontada pelo Governo Português.
Facto é que poderá estar em jogo a sobrevivência imediata de empresas em sério risco, a manutenção de muitos postos de trabalho e, naturalmente, a perda a médio prazo de um mercado que tanto custara a ganhar e que boas perspectivas abria às nossas indústrias têxtil e de vestuário.
Ora, será suficiente dizer-se que o Governo Português não aceitou negociações com os EUA ou sequer consultas bilaterais, e que foi confrontado com a imposição unilateral de restrições?
Que se poderá então esperar de idênticas posições que vêm sendo defendidas pelos países nossos ex-parceiros na EFTA?
Que força terá ainda, então, Portugal para exigir da CEE uma posição que salvaguarde os seus interesses na renovação do Acordo Multifibras?
Ou teremos de concluir que os têxteis estão condenados a servir de moeda de troca para outras negociações...
Sr. Presidente, Srs, Deputados: Começa mal e denota enorme fraqueza um governo que, antes de o ser, afirmava ser necessário firmeza e renegociar os termos da adesão de Portugal á CEE, pois que não estavam devidamente acautelados os nossos interesses, e que agora se esquece de fazer valer os direitos que pertencem ao nosso país, devido à entrada na Comunidade Económica Europeia.
À firmeza nas palavras parece estar a suceder a fraqueza nos actos.
Não haverá progresso em Portugal se a tempo não atacarmos os problemas e alterarmos a situação.

Aplausos do PS.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, pretendia interrogar a Mesa sobre se não há mais inscrições para o período de antes da ordem do dia, uma vez que a nossa bancada tem uma intervenção para produzir dentro de escassos minutos. Por outro lado, será sempre possível recorrer a direitos regimentais que, de toda a forma, não queria utilizar para atingir tal objectivo. Assim, solicitava, através da Mesa, à Câmara a indicação sobre se há outros partidos interessados em produzir intervenções neste período ou não.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, chegou-nos a informação de que, efectivamente, só estariam inscritos os Srs. Deputados Carlos Brito e Manuel Moreira. Um e outro, por razões de dactilografia, encontram-se ainda a produzir o respectivo trabalho. Nestes termos, a Mesa vai aguardar até que um destes Srs. Deputados compareça para produzir a sua intervenção.
Entretanto, Srs. Deputados, informo VV Ex.as de que - e, aliás, com todo o prazer - recebemos a visita dos alunos da Escola Secundária da Baixa da Banheira, que se encontram numa das nossas galerias, agradecendo a favor de os acolherem com a saudação habitual que gostamos de dispensar à juventude.

Aplausos gerais.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Moreira.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na qualidade de deputado social-democrata, eleito pelo circulo do Porto, senti a necessidade de salientar neste hemiciclo a importância que se revestiu um acto simples mas marcante, estou certo disso, para o futuro de uma região do nosso pais, que ocorreu na passada segunda-feira, dia 3 de Fevereiro, na Câmara Municipal de Amarante - refiro-me, concretamente, à escritura da constituição da Associação de Municípios para o Desenvolvimento e Formação (ADEFORMA).
Com a constituição da ADEFORMA, deu-se um passo muito significativo e importante no caminho que Portugal tem ainda de percorrer, como defende o X Governo Constitucional da responsabilidade do PSD que é o associativismo municipal, a política de desenvolvimento regional e uma efectiva regionalização do País.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O que é a Associação para o Desenvolvimento e Formação?
A ADEFORMA é uma associação intermunicipal, constituída pelos municípios de Amarante, Marco de Canaveses, Baião, Felgueiras, Cabeceiras de Basto, Celorico de Basto e Mondim de Basto, cujo objectivo central é promover o desenvolvimento regional pela promoção de algumas das suas vertentes.
No artigo 2º dos estatutos da ADEFORMA define-se de uma forma muito clara quais são os seus objectivos:

1) A Associação tem por objecto a instalação de uma agência de desenvolvimento visando a promoção de iniciativas locais e regionais de aproveitamento dos recursos e lançamento de iniciativas de emprego;
2) Constitui, ainda, objecto da Associação as acções de formação, quer relacionadas com os planos de desenvolvimento regional e local, visando a criação de novas actividades e empregos, quer relacionados com a integração dos desempregados, de deficientes, de trabalhadores migrantes e de jovens quadros no mercado do trabalho; as acções de aperfeiçoamento, de reciclagem ou de qualificação profissional e, de um modo geral, quaisquer acções consideradas relevantes para o desenvolvimento da formação, a orientação dos pequenos investidores ou o desenvolvimento de indústrias artesanais.

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A ADEFORMA é constituída por tempo indeterminado e está aberta a admissão de outros municípios que queiram participar nesta cooperação Intermunicipal.
A Associação tem a sua sede provisória em Amarante e terá delegações em cada um dos municípios
Associados.
A ADEFORMA é constituída por dois órgãos que funcionam colegialmente - a assembleia intermunicipal e o conselho administrativo.
Os membros dos órgãos da Associação são designados de entre os elementos integrantes das câmaras dos municípios associados, sendo a duração do mandato destes igual à duração do mandato autárquico.
A criação da ADEFORMA (uma iniciativa consciente, responsável e arrojada dos autarcas dos referidos sete municípios, que eu quero aqui desde já salientar, e louvar.
A sua iniciativa integra-se plenamente no novo ciclo de vida das autarquias locais - o ciclo do desenvolvimento - como referi na minha última intervenção nesta Câmara, "sobre o desenvolvimento da cidade e concelho de Vila Nova de Gaia" , que se iniciou com as eleições autárquicas do passado dia 15 de Dezembro. Terminado o ciclo da afirmação e consolidação de um verdadeiro poder local democrático em Portugal e que nos últimos 10 anos deu respostas ás mais importantes carências básicas das populações locais; importa agora avançar de forma determinada e eficaz para o desenvolvimento equilibrado, autónomo, duradouro e sustentado a nível local e regional e, consequentemente,
a nível nacional.
É fundamental dar-se este salto quantitativo e qualitativo para bem do futuro do nosso país e dos nossos concidadãos.
A ADEFORMA integra-se neste objectivo e tem por isso caracter inédito e inovador, dado que a sua fundação constitui uma mudança decisiva nas preocupações e actividades das autarquias.
Em primeiro lugar porque os componentes económicos e sociais passam a inserir-se de uma forma mais vasta e completa da sua actividade. Reforça a visão integrada e globalizante da região inserida numa atitude de planeamento e, adequada gestão de recursos escassos, como demonstram a elaboração de planos de desenvolvimento integrado, promovida por algumas câmaras que integram a Associação. Permite uma mais correcta adequação entre a solução dos problemas das populações da região, a política nacional e os imperativos da adesão à Comunidade Económica Europeia.
Em segundo lugar, porque permite abranger uma área contígua, particularmente significativa do ponto de vista económico, encontrando áreas regionais de mais adequada dimensão para as acções imperiosas accionando economias de escala. Para tal agrega vontades económico-social e politicamente diversificadas, unidas no reconhecimento do papel do desenvolvimento regional e local na melhoria das condições de vida das populações.
Situada ,em região de grande densidade de municípios, e agregando realidades concelhias com traços comuns (importância do sector primário, densidade populacional, grande peso da população jovem, emigração e retorno, desemprego, carências de infra-estruturas), mas também com significativas diferenças (em áreas de influência urbana, estrutura geomorfológica, níveis de industrialização e acesso a serviços, potencialidades inexploradas) constituirá um exemplo.
A criação da ADEFORMA impunha-se e era urgente, dado o facto de estar em jogo as condições de vida de mais de duas centenas de milhares de habitantes e o futuro de mais de dezena de milhar de desempregados e, outros tantos em desemprego oculto ou com emprego precário, não fosse bastante dir-se-ia, como tem frequentemente salientado a Comissão de Coordenação da Região Norte, a Região Norte é aquela onde o problema do emprego, questão maior do mundo contemporâneo, se coloca com maior acuidade.
É imperioso conjugar esforços regionais, nacionais e comunitários para a resolução dos múltiplos e complexos problemas da Região Norte. A ADEFORMA é um contributo insubstituível.
Desenvolver é aumentar a acessibilidade de todos os cidadãos ao bem-estar permitido pela ciência e técnica, pela civilização contemporânea. Por isso, como alguém disse, todo o desenvolvimento, tem de ser desenvolvimento regional.
Apenas uma outra experiência na Região Centro. A ADEFORMA dá corpo, em Portugal, a um novo interveniente na actividade económica: o agente do desenvolvimento que, se possuído de dinamismo, conhecimento e com recursos, constituirá um pólo aglutinador de vontades diversas, galvanizadas na melhoria das regiões.
A ADEFORMA constitui um avanço para implementar esse objectivo, que é de todos. Criar estruturas, dinamismo, conjugação de esforços, agentes, visão planeada e integrada da solução dos problemas. O apoio comunitário, através dos fundos estruturais, como sejam os do FEDER, Fundo Social Europeu e FEOGA, serão a seiva que a Associação necessita para a sua consolidação.
Importa, igualmente, que o Governo e Administração de Portugal dêem também apoio possível em termos financeiros e removam os obstáculos administrativos eventualmente existentes, a fim de que está iniciativa tenha pleno êxito, cumprindo, assim, os seus importantes objectivos, como é o desejo dos autarcas e das populações da região.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Iniciativas desta natureza prestigiam e dignificam os autarcas e o poder local, dado que correspondem aos anseios das populações locais que querem ver resolvidos os seus problemas, satisfeitas as suas, necessidades e, assim, passarem a usufruir de bem-estar a que têm direito como seres humanos que desejam viver de forma feliz.
Assim, apelo, daqui da Assembleia da República, aos autarcas de outros municípios do nosso país, para que sigam o bom exemplo dos autarcas que criaram a ADEFORMA, a fim de que mais rapidamente o desenvolvimento local, regional e nacional sejam um facto real em Portugal.
A concluir esta minha intervenção direi que só com o apoio, criatividade e acção eficaz dos autarcas e das autarquias é que o Governo poderá ser capaz de cumprir a sua promessa e objectivo, de mudar Portugal para melhor, fazendo do nosso país uma nação próspera, desenvolvida, moderna e plenamente europeia.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

Neste momento, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Marques Júnior.

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O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Assembleia da República vai iniciar em breve, se o Governo cumprir os prazos legais a que está obrigado, a apreciação das propostas de lei das Grandes Opções e do Orçamento do Estado para 1986.
Trata-se não apenas de definir a política económica para o ano em curso e de proceder á afectação das verbas indispensáveis à sua execução, mas também, e simultaneamente, de fazer a distribuição dos recursos do Estado pelos diferentes sectores e pelas diferentes regiões do País, segundo as prioridades que aqui estabeleceremos.
Parece-me, por isso, ser este o momento adequado para chamar a atenção para algumas questões que afectam gravemente a situação do Algarve e que, a nosso ver, constituem prioridades nacionais ou regionais inquestionáveis.
Comecemos pelos problemas de água, cuja carência constitui um sério estrangulamento da agricultura e de outras actividades económicas algarvias e uma premente ameaça para o turismo e próprio abastecimento das populações residentes. O Plano de Rega do Algarve (constituído pelos dois sistemas Beliche-Odeleite-Guadiana no Sotavento e Funcho-Odelouca no Barlavento) é unanimemente considerado, desde há muito, como uma importante resposta para a situação. Estima-se, sem exageros, que o conjunto dos aproveitamentos possa garantir a rega de 40 000 ha, isto é, o dobro da área actualmente regada na região. Apesar disto, apesar das promessas dos sucessivos governos e das sucessivas datas de arranque e prazos de conclusão, as obras marcam passo e o protelamento é regra, por falta de verbas, por falta de direcção, por falta de vontade política, numa palavra.
Entretanto, o Algarve fica exposto ás consequências de uma nova seca, pois sabe-se que as secas são cíclicas e aos avanços da desertificação que ninguém ousa negar.
A resposta que recebi há dias da Secretaria de Estado da Agricultura, a um requerimento que dirigi ao Governo por intermédio dos Ministérios da Agricultura e Pescas e do Plano e de Administração do Território, não me deixa nada tranquilo em relação à atenção que esta questão fundamental para os Algarvios está a merecer do Governo. Aguardamos as Grandes Opções e o Orçamento e, embora consideremos que a questão não se reduz apenas à intervenção orçamental, é necessário que esta se verifique em dimensão proporcional a uma prioridade que não interessa apenas aos Algarvios mas a todo o país.
Passamos ao problema do saneamento básico. É conhecida a gravidade da situação, e embora alguns importantes passos tenham sido dados, por exemplo, em Albufeira (que não há muito andou nas bocas do mundo por escandalosas deficiências nesta área), subsistem situações muitíssimo delicadas em Olhão, Faro, Loulé, Quarteira, Lagos, Vila Real de Santo António e Tavira, que não poderão ser superadas sem um apoio considerável do Orçamento do Estado.
Chega-nos agora a notícia de que o actual Governo se prepara para extinguir, a curto prazo, a Comissão de Saneamento Básico do Algarve, que tem coordenado as acções de emergência e geridos os créditos especiais concedidos ás autarquias. A situação, que é preocupante, pode tornar-se alarmante se a extinção da CSBA for avante, especialmente, se não for criada uma alternativa às funções que tem exercido.
Passamos à situação da ria Formosa, cujos imensos recursos e potencialidades jazem por aproveitar e que em algumas zonas entra em processo acelerado de degradação. Há muito que se reconhece a necessidade de um verdadeiro plano de ordenamento, que preserve a reserva natural e defina as condições de exploração das suas riquezas. É claro, que nada tem a ver com isto a operação ainda obscura de demolição pela força de habitações de veraneio tentada há anos atrás e em parte consumada. No fim do passado Verão, a poluição atingia proporções verdadeiramente alarmantes na zona de Olhão, por exemplo, constituindo uma grave ameaça para toda a fauna marinha, designadamente para os riquíssimos viveiros de ameijoas, e agora de ostras também, existentes na zona. Por tudo isto, aguardamos com o maior interesse a oportunidade de conhecer se há medidas propostas pelo Governo e quais são.
Não nos vamos alongar muito com a situação das estradas, não porque não seja gravíssima, mas porque constitui um rosário interminável e, por isso, desajustado nas proporções desta intervenção. Chamamos a atenção para a necessidade da rápida conclusão da via rápida de acesso, chamamos a atenção para a marginal Sotavento-Barlavento dizendo que, pense-se o que se pensar, em matéria de prioridades ela se mostra cada vez mais como indispensável e inevitável, e concentremos a nossa preocupação na necessidade de acelerar as obras de beneficiação da estrada nacional n.º 125, designadamente no troço Olhão-Tavira, a passagem desnivelada de Estombar e o lançamento de uma nova ponte sobre o rio Arade em Portimão.
Quanto à situação dos portos e barras lembraremos que há cerca de 1 ano e por ocasião de um trágico naufrágio na barra de Tavira, foram solenemente prometidas obras de beneficiação que diminuíssem a sua perigosidade. Os meses passaram e não se vislumbra o mínimo sinal indiciador da vontade de dar cumprimento às promessas. Será que aparecem agora os tais sinais nos diplomas económicos para 1986? Carecidas de obras de desassoreamento e beneficiação estão igualmente as barras de Vila Real de Santo António, Fuzeta e Alvor, enquanto em Quarteira, Armação de Pêra, Albufeira e Salema se aguardam há muito obras de abrigo e atracação que dêem mais segurança às numerosas pequenas embarcações pesqueiras que operam nessas praias.
No capítulo da saúde, chamamos a atenção para a precária situação que se verifica ao nível dos cuidados primários a exigir especiais medidas de apoio à generalidade dos centros de saúde, numa região onde lhes cabe assistir não apenas a população residente, mas a população turística que a duplica, triplica e nalguns casos até quadruplica. Quanto aos cuidados diferenciados, além da necessidade de suprir as carências de pessoal no Hospital Distrital de Faro, entendemos que se torna cada vez mais evidente a necessidade de uma grande unidade hospitalar no Barlavento algarvio; e enquanto esta não for instalada, é preciso dar condições ao Hospital de Lagos para que este possa apoiar o Hospital de Portimão.
Na área do ensino, espera-se que neste Orçamento sejam finalmente atribuídas verbas para o arranque das instalações da Universidade do Algarve, bem como as necessárias ao pleno funcionamento dos seus serviços sociais. Soubemos que a verba de 25 000 contos, incluída por nossa iniciativa no Orçamento de 1985,

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visando a criação dos serviços sociais, só no final do ano foi desbloqueada. Espera-se, igualmente, que sejam accionados os comandos orçamentais, visando a construção de escolas preparatórias e secundárias em Alçoutim, Aljezur e Vila do Bispo. Quanto à primeira, as diferenças de opinião verificadas no passado entre a população do concelho sobre a sua localização não podem justificar o continuado protelamento, que tem como vítimas principais as crianças de todo o concelho. Esperam-se, igualmente as medidas orçamentais que garantam o arranque rápido de uma nova escola preparatória em Portimão e de uma nova escola secundária em Faro.
Uma palavra sobre a cultura, para assinalara que é necessário ultrapassar as ridículas verbas destinadas aos serviços culturais, numa região onde há tanto a fazer para a protecção do patrimônio histórico, artístico e cultural.
Quanto ao desenvolvimento regional, espera-se que este Orçamento ponha termo à tendência que se verificou o ano passado para esvaziar de meios o Programa do Nordeste Algarvio, retirando-lhe qualquer significado como programa integrado e até qualquer interesse para a região que pretende beneficiar.
Espera-se, com interesse, ver quais são as medidas que o Governo vai propor para ajudar as actividades económicas do Algarve, quase todas em processo de recessão, à excepção do turismo, a fazer frente ao impacte desastroso da adesão à CEE.
A propósito de adesão á CEE, as gentes do Sotavento Algarvio interrogam-se sobre o que se está a passar em relação ao acordo fronteiriço do Guadiana. Sabe-se que representantes do Governo estão a fazer reuniões com os grandes armadores mas, os pescadores e os pequenos armadores nada sabem dos propósitos do Governo. O que se estará a passar?
Alguns Srs. Deputados, eleitos por outras regiões podem achar que as preocupações que aqui ficam constituem uma exagerada carta reivindicativa regional. Cabe esclarecer que o não é. As iniciativas e medidas que reclamamos, na sua quase totalidade, correspondem a coisas há muito tempo assentes e objecto de repetidas promessas das entidades governamentais.
Não se desconhece também que as iniciativas e acções aqui abordadas ou recordadas, destinando-se prioritariamente às populações residentes, têm reflexos e consequências positivas em relação ao turismo, que não interessa apenas ao Algarve, mas ao País.
Reconhecemos que algumas reflexões, aqui adiantadas, teriam melhor cabimento numa assembleia regional. A verdade é essa mesma; quando se trata com alguma profundidade os problemas do desenvolvimento regional do Algarve, desagua-se necessariamente e sempre na necessidade de criação da região administrativa.
Até lá, permitam Srs. Deputados que, peça á Assembleia da República a melhor atenção para os problemas que acabo de expor, para os problemas do Algarve,
que são problemas nacionais.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento tem a palavra o Sr. Deputado Mendes Bota.

O Sr. Mendes Bota (PSD): - Sr. Presidente,
Srs. Deputados: Não é o facto de estarmos sentados em bancadas politicamente opostas que nos impedirá de reconhecer a justeza das reivindicações quando elas, efectivamente, tenham razão de ser. É o caso da intervenção do Sr. Deputado do Partido Comunista Português, Carlos Brito, à qual não tenho, obviamente, quaisquer objecções de fundo a fazer. Inclusivamente, quero até dar-lhe o meu apoio para juntar a minha voz ao coro daqueles que se batem para que o Algarve deixe de ser uma terra enteada deste país, nomeadamente em relação àquilo que representa para o todo nacional. No entanto, gostaria de lhe colocar algumas questões.
A primeira, referente á extinção do CSBA. Como o Sr. Deputado Carlos Brito sabe, a Comissão de Saneamento Básico do Algarve foi criada com base numa linha de crédito especial de 3 milhões de contos para as autarquias, verba essa que se encontra praticamente esgotada. Nomeadamente, as autarquias do Algarve esgotaram, algumas delas também, a sua própria capacidade legal de endividamento nessa mesma linha de crédito. Foram feitas muitas obras com base nesses créditos, aos municípios, mas muitas obras estão ,ainda, por continuar. É óbvio que o objecto inicial da CSBA foi ultrapassado; não queiramos agora transformar a CSBA em mais um organismo para coordenar o saneamento básico do Algarve porque, para isso, já existem outras instituições na dependência do Estado.
Em relação ás verbas para a Universidade do Algarve, o Sr. Deputado tem toda a razão quando considera que esta Universidade tem sido marginalizada em todo este processo. Mas gostaria de saber qual é a sua posição em relação ao investimento que foi feito - porventura até quase ás escondidas - e que ultrapassa largamente 1 milhão de contos, no Instituto Politécnico, em Faro, com condições de luxo e até de superluxo que são um autêntico atentado á dignidade daqueles que, na Universidade do Algarve, exercem funções discentes e docentes...
Em último lugar gostaria de saber se considera, ou não que as autarquias do Algarve têm, em boa medida, substituído o esforço de investimento e de aposta que a Secretaria de Estado da Cultura deveria fazer no Algarve através de obras de recuperação do património histórico, natural e paisagístico, considera ou não
Que, efecfivamente, uma das acções prioritárias que se deveria pôr em prática, a nível do investimento estatal no Algarve, deveria ser a de recuperar a dignidade histórica que a ponta de Sagres tem? A ponta de Sagres é um marco histórico não só da vida nacional, mas da vida europeia, mas encontra-se em autêntico estado de desgraças. Ali poderia fazer-se um bom museu das descobertas onde se poderia utilizar á nossa história em prol da principal actividade econômica do Algarve, que é o turismo.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Deputado Mendes Bota, agradeço as considerações que teceu e, tal como, acontece, com V. Ex.ª, não tenho praticamente ,nenhuma, discordância em relação às questõess que acaba de expor à Câmara.
Em relação à Comissão de Saneamento Básico do Algarve, gostaria de lhe dizer que tenho uma completa informação da situação: tratava-se de um programa de emergência que tinha um crédito de 3 milhões de contos, que está praticamente esgotado.
Contudo, é inegável que a Comissão fez algum trabalho positivo. Reconheço-o e creio que todos os quadrantes da vida política algarvia têm esse posiciona-

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mento. A Comissão fez um trabalho positivo, nomeadamente no que diz respeito à questão de Albufeira e a outros grandes problemas.
Creio que a própria acção da Comissão, o despertar das atenções para os problemas da acelerada degradação das estruturas, que são antigas e anquilosas, trouxe à superfície a gravidade de outros problemas.
Penso que o Sr. Deputado reconhecerá - inclusive pela sua experiência autárquica - que a obra a fazer é de tal monta que as autarquias não estão em condições de a realizar sem um grande apoio do Orçamento do Estado.
É nesse sentido, portanto, que nós e outras forças políticas do Algarve - inclusive o Partido Socialista teremos uma posição comum: reclamarmos do Governo esse apoio já que sem ele teremos graves problemas, com sérias implicações naquilo que é uma riqueza nacional (e não algarvia) o turismo do Algarve.
A nossa preocupação é, pois, que a Comissão de Saneamento Básico do Algarve seja extinta e que não haja nenhum programa alternativo para continuar aquele esforço que, a nosso ver, tem de ser desenvolvido pela linha do Orçamento do Estado, pela linha do apoio governamental e dos encargos governamentais. É esta, pois, a preocupação que aqui deixamos!
Por outro lado, o Instituto Politécnico é uma iniciativa marginal às forças políticas, sociais e culturais algarvias. E uma coisa que está à margem, que não se conhece! Devo dizer, quanto a isto, que também temos muitas preocupações em relação àquilo que se passa com o Instituto Politécnico. Fazemos críticas idênticas àquelas que acaba de fazer (por exemplo, em relação ao luxo), mas, em todo o caso, a nossa posição é esta: se ele vai ser extinto, então que se aproveitem as instalações.
De qualquer forma, digo-lhe, é uma iniciativa marginal: de uma maneira geral, as forças algarvias apostaram sempre no aceleramento da Universidade e, entretanto, foi nascendo aquele cogumelo um pouco à margem de tudo. Mas se for feito, naturalmente, deverá ser aproveitado! Contudo, também é necessário ver como e em que condições é que foi feito. Importa que uma certa distracção e uma certa clandestinidade com que as coisas se passaram venha à plena luz do dia para que o povo do Algarve conheça tudo que está por detrás disso.
Quanto à questão do património cultural, histórico e artístico, estamos, no essencial, de acordo. Tenho uma opinião positiva em relação á actuação das diferentes autarquias do Algarve nesta área. Por vezes, tenho a opinião que não é tão positiva, em relação a outras autarquias ou a certas questões, como por exemplo - e isso toca-o - embora não saiba com que responsabilidade: naquilo que foi feito em relação ao Poço de Almansil, que não me parece acertado, pois o "Poço ... " tem também alguma história, está ligado às secas cíclicas do Algarve, tendo, por isso, importância como património, mas, de uma maneira geral, creio que tem havido um esforço e uma preocupação positivos.
Levantei já, por várias vezes, a questão da compra, pelo Estado, do Palácio de Estói para o Museu Regional do Algarve, pois creio que esse Palácio teria todas as condições para isso, podendo até ser associado uma outra qualquer estrutura ao próprio Museu, incluindo qualquer exploração comercial. Creio que essa seria uma boa saída, uma boa solução.
Portanto, a ideia do museu na ponta de Sagres, adiantada pelo Sr. Deputado, não me parece que seja de pôr de lado. Como sabe, a ponta de Sagres é objecto de ofensivas degradadoras e até já houve quem pensasse construir lá uma torre ... ! Creio que foi muito bem coarctada essa tentativa e que foi bem defendida a dignidade da ponta de Sagres, dignidade essa que lhe advém não só do seu valor histórico, mas também pela própria tradição que tem na história dos Descobrimentos Portugueses.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, gostaria de esclarecer um pequeno equivoco, para o qual peço a vossa sensibilidade e atenção.
Há pouco, por lapso, foi referido que estavam presentes os alunos da Escola Secundária da Baixa da Banheira. De facto, os alunos são do Colégio de S. José, Ramalhão, Sintra.
Neste momento, à esquerda da Mesa, é que já se encontram presentes os alunos da Escola Secundária da Baixa da Banheira e, portanto, pedia aos Srs. Deputados uma saudação especial à juventude presente nesta Câmara.

Aplausos gerais.

Srs. Deputados, terminou o período de antes da ordem do dia.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Entrando agora no período da ordem do dia, vou pôr à vossa apreciação os nos 21 a 26 do Diário.
Há alguma objecção?

Pausa.

Como não há objecções, consideram-se aprovados. Vamos agora entrar na discussão e votação do parecer da Comissão de Equipamento Social e Ambiente sobre o pedido de urgência para a apreciação do projecto de lei n.º 51/IV, da iniciativa da deputada independente Maria Santos, sobre a criação do cargo de promotor ecológico com vista à defesa da vida e do meio ambiente.
Vai proceder-se à leitura do parecer.

Foi lido. É o seguinte:

Parecer da Comissão de Equipamento Social e Ambiente

Nos termos do artigo 283.º, n.º 2, do Regimento foi a Comissão de Equipamento Social e Ambiente solicitada pelo Sr. Presidente da Assembleia da República para produzir parecer fundamentado sobre a adopção do processo de urgência para a apreciação pela Assembleia da República do projecto de lei n.º 51/IV, relativo à criação do cargo de promotor ecológico com vista à defesa da vida e do meio ambiente.
Analisando o assunto na reunião da Comissão de 29 de Janeiro de 1986, através de intervenções dos vários grupos parlamentares, é parecer desta Comissão, por maioria, não aceitar os fundamentos invocados pela Srª. Deputada Independente

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,; ;.:::Marza Santos:no seu-.pedido ,dé.:úrgência,-conside.á; : rando,no entantoi ser urgente alanálise global de ., todos os .projectos .rèlacionadòs com: esta matéria.

' c'' '' Pàlácio."de' 'São Bento;,' 29 `de' Jánëirò`de ' ' "1986.-'-'O' Vice-Presidente;`Antónto érgióBàr-
.. . ' .6ósa 'dè ;4zevedó:"
..• .. _ ,

O Sr. Presidente: - Èstá,em discussão.,, ., , -,
._.... :.. r .: - ,
Tem a palavra a Sr. ã ,Deputada ;Ivl<áriaSantós p='p' _....='_....'>

A Sr.ª Maria $antos;ì,(Indep.):- -,='Sr..ºPresidente, Srs. Deputados: Solicitou o Partido Os Verdes o processo de urgênçiá,pará .ª criação ,dó- cargo: de ;promo.for ecológico com vista, á;,defçsá.-da,;vidá.e,do.meio ambiente, ciente "dàs^ implicações-que, tal,atitude desen.vadearia.;, .; c, .;;;'..- cít ,o.-..t ..c, .:: •. ..
. De facto; a-inexistênciác.de zumá lei _fundámental,..e -globalizante;,que.nesta,matériá se:áfirme;como instrumento indispensável para q. sucesso; de uma política do ambiente, determinaria:que a pqstura-,que..hóje .assu.mimos se,rèduzisse ao, silêncio:; gr,-.„-;; .,.,- ;,..,., _..cNo entanto; a;neéessidaderimperiosa-:da envolvência da comunidade, no-aperfeiçoamento- do.:seu--relacionamento com a natureza e a promoção da «ecologização» do pensamento social exigem que. se ,encontrem os meios que favoreçam uma gestão dòscecurso's,qüeºpro,piciando á satisfação das necessidades humanas .não degcáde' ò ''pátrimóüiti' riat'ürál'.é cúlfuiál, dos Pòítugueses.
Do levantamento efectuado sobre legislação portu
guesa no âmbito dó' "iènt'é Cónsiáta-se que o número
de decretos,-portarias e despachos abrangendo a.fauna,
`fl'orà; poluição das,`águás,-sonõra é'àtmósféri.cá, súbs
'tânciás `' périgosàs, `lcómpóstos"",q,;uímicos . e, 'pesticidas,
licenciamento industrial, parques, reservas ordenamento do téccitóno; pi'ófec'ção dos

solos, da paisagem e urbanismo ascendem a,:mais de 800 diplomas cujos conteúdos, quer pela sua antigui,dade,(de elaboração 1óu,çqncepção),,quér)pela;falta de . cumprimento e,óu ;fiscalização; :aliados a uma falta de . vontade \ política ;ou ; incapacidade, de,.intervenção dos organismos da tutela„ originaram, situações -de.grave ruptura ambiental:;,;_;,-,:c; 3_. ,',! .; , r c.:'
,.. , O processo -de, consciencialização: sobre a. situação cecológica actual irriplicará„quanto_a:nó-s;,-uma efectiva interacção entre o político, o cidadão -e- o'.ecologistà.
Como se compreendeíá; devèmbs),buséar.uma. solu
ção para o problema ecológico ,ao-nível-do ,desenvolvi
mento actual, o que pressupõe ó progresso e à inova
ção, e não o recuo, encontrando-se as soluções que
garantam-.,a coiporização real tio artigo,66.º da Cons
tituição, nomeadamente o ponto 2, que refere:=,b,e' ' ao'tEstado;-'Port'rnèiò- de '&ganismos
-pé pó-àpélb a-Anicíátivàs' populares:

. .,.; -,a), Prevenir•,e-controlar,:a;poluição,e,os seus
,.-,, •, ,,:efeitos eas-)fqrmas prejudiciais de erosão;
'i ..--'b).Ordenar-,o cespaço.territorial,:de forma a
;; : \•...construir):paisagens::biológicamente equilibradas; c.- - L , _-:_ .. .,' ,, ..
... : ,r) Criar,,:e ;-desenvolver:. resêrvas:• e ,parques
. : .:naturais- e;de. recreio; bem. -como' ..classifi-

,.- car,e protegèì, paisageris-e.sítibs, de-modo

:- .. ;-ra-garantir a cónservaçãó;da'riatureza e a

«: presérvaçãó de-.dalores culturais,de interesse
histórico---ou artístico; : ,: .:, :.

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.cd) .Promover o aproveitamento ìacional dos recursos naturais, salvaguardando a 'sua capacidade de. renovação e a estabilidade

ecológica.:

:,: r,Desenvolver não deve ser, nem.é, sinónimo de destruir, como também conservar a natureza não deve sig:nificar, nem significa, obstrução do- progresso. ,
...,A ilusão-..de que somos < gigantes» criadores capazes de domesticar as 'forças da natureza está na base de cmuitas das .dificuldades .actuais... . - :' .
Ao longo de milénios a humanidade foi crescendo, :destruindo as. florestas, estendendo as' pastagens e a terra de lavradio, cultivando a um nível não perturbacdor dos ecossistemas: Mas o curso: dos. acontecimentos .conduziuà criação de materiais que a própria natureza :.não -,pode produzir nem; portanto, 'utilizar.
É. nesta. circunstância que reside, em grande parte, a causa :essencial da crise ecológica..,. ' , . ,
c ;,,Mas _se a.crise.do meio ambiente decorre de 'uma má -igestãore actuação humanas, ela. poderá e deverá ser -contida se for,.implementada:uma dinâmica que propicie e promova a coordenação e a harmonização de -métodos,, cuja acção .corporizem .ºs princípios básicos !da .política. de, ambiente' e ordenamento do território, .-consignados numa lei base.. Ou, por outro lado; con:corram.numa fase, primeira para estabelecer a comuiricação. entre os órgãos existentes e -as comunidades sujeitas, a agressões provocadas por. degradação ambiental, agindo,como animadores do processo, cujo movimento implementado, que.parte da experiência real e concreta, ;façaconsignar.no espírito da lei a sua própria acção. -:,,Ou .seja, .entendo que' não devemos escalonar de modo rígido ou.hierárquico as posições que no campo da política ambiental urgem ser tomadas. .
.. P.eranté a delapidação das nossas riquezas naturais, devido à negligência, inoperância, desconhecimento ou ,desinformação; de que é exemplo a situação actual das -nossas, águas : - das quais depende directamente a :.vida.-,embora não possa ser considerada calamitosa, ;atinge já níveis de degradação que devém ser considerados como.muito preocupantes. . , .
;.c.Presentemente, podemos, afirmar que a maior parte -dos nossos rios e ribeiros' se encontram poluídos, alguns de modo, brutal.,
; ... „ . ,
Não é só a poluição industrial e urbana, sob a forma de,%águas L residuais; que polui . a nossa rede hídrica. :Outras.múltiplas actividades do homem provocam graves-,alterações no equilíbrio ecológico, como, por. exemplo, .ª urbanização desenfreada, as lixeiras (mesmo sob ia; forma de aterros sanitários), a agricultura (através de, adubos químicos e pesticidas), a ? falta de limpeza -das.linhas de água ou a extracção incontrolada de . areias..
Algumas situações são, de facto, casos notórios e exprëssam. bem o que já foi dito e, por isso, urge.tomar -medidas,-sobre casos concretos: os rios -Alvielá, Almonda; Trancão, , Vouga, Tâmega, ria de Aveiro, vestuário do, Tejo e do Sado; a contaminação de aquíferos subterrâneos nas zonas industriais (Estarreja ou ,Palmeia), toda a zona litoral do território.
;;-Como alguém disse, «desconfiai dos rios que pare.cémºdormir», e o Leça, em Matosinhos, é um dos nossos, rios adormecidos .....
. :: Também. a nossa fauna e flora estão sujeitas aos mais -violentos, atentados: incêndios (que todos.ºs anos devastam milhares de hectares de florestas), plantação indis-

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criminada de eucaliptos, extinção de espécies cinegéticas e declínio de outras. Podemos ainda considerar a caça desenfreada e outras actividades, algumas lucrativas, como a taxidermia (embalsamamento), o uso de pesticidas (muitos dos que usamos são proibidos a nível internacional), a pesca clandestina nos nossos rios e barragens por meios que destroem mais do que permitem recuperar.
Em Portugal a situação é já muito grave; é, pois, necessário agir com urgência, com a máxima urgência!
Se outro mérito não teve este pedido de urgência, que foi rejeitado pela Comissão de Equipamento Social e Ambiente, permitiu relembrar a esta Câmara que temos de trabalhar, acarinhando, do modo mais firme e determinado que soubermos, o nosso património natural e cultural, génese da nossa própria identidade nacional.
Por outro lado, fez consignar no parecer emitido pelo referido órgão que considerou "ser urgente a análise global de todos os projectos relacionados com esta matéria".

O Sr. José Magalhães (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Por intermédio do promotor ecológico pretende-se garantir a todos os cidadãos a possibilidade de apresentar queixas de actos praticados que atentem contra o património, o meio ambiente e a qualidade de vida.
Deste modo se criariam condições favoráveis a uma participação mais efectiva na resolução das questões ambientais, animando paralelamente o interesse dos cidadãos pela coisa pública, responsabilizando todos e cada um nas diferentes estruturas e nos diferentes níveis da vida nacional.
Se é verdade que a vida é um desafio fundamental, esse desafio é ainda mais difícil, mas também mais engrandecedor, quando aceitámos a responsabilidade de representar nesta Câmara o sentir, os anseios, as expectativas e os sonhos dos Portugueses.
Neste sentido, apelo aos Srs. Deputados que considerem como muito urgente todas as questões que se apresentem inequivocamente na defesa de um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado e que elas sejam agendadas, atempada e oportunamente.

Aplausos do PCP, do MDP/CDE e do deputado José Carlos Vasconcelos, do PRD.

O Sr. Raul Castro (MDP/CDE): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Raul Castro (MDP/CDE): - Sr. Presidente, estamos a discutir a urgência deste projecto de lei e, na verdade, o parecer ainda não foi distribuído aos deputados.
Penso que tal seria indispensável, visto que o que está em causa é, precisamente, a discussão da urgência deste projecto de lei.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Raul Castro, o parecer foi lido antes de se ter dado início ao debate. Contudo, vou providenciar no sentido de que ele seja distribuído por todos os Srs. Deputados.

Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Tengarrinha.

A Sr.ª Margarida Tengarrinha (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há cerca de 1 ano teve lugar nesta Assembleia uma discussão cujo objecto era exactamente o mesmo que hoje estamos a debater: o pedido de urgência para o projecto de lei, sobre a criação do cargo de promotor ecológico, com vista à defesa da vida e do meio ambiente.
Também nessa altura foi parecer da Comissão de Equipamento Social e Ambiente, por maioria, recusar o pedido de urgência, com a alegação de que a discussão e votação desse projecto não deveria ter lugar independentemente de outros diplomas de teor semelhante, nomeadamente projectos sobre a lei quadro do ambiente e da qualidade de vida. Mas o actual parecer da Comissão já denota um certo avanço sobre o do ano passado, pois, ao não aceitar o pedido de urgência, justifica-se, "considerando, no entanto, ser urgente a análise global de todos os projectos relacionados com esta matéria".
Cabe aqui perguntar qual é a medida temporal que a Comissão confere à palavra "urgente" no contexto acima citado. Pois convém recordar quantas iniciativas legislativas sobre este tema têm surgido nesta Assembleia, se têm arrastado ao longo dos anos e das várias legislaturas, alguns projectos lá conseguem emergir em apresentações ao plenário, mas depois voltam às gavetas, sendo repescados de tempos a tempos. E tudo isto em termos meramente formais, sem convicção e sem real sentido da verdadeira urgência que em Portugal assume a defesa do ambiente, do nosso património natural, do equilíbrio ecológico, sujeitos a agressões gravíssimas e à degradação constante e, em muitos casos, irreversível.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Sem ir mais atrás, desde 1980 surgiram sobre a matéria projectos de lei do PS (sem seguimento), do PCP (rejeitado), 2 do CDS (sem seguimento), dos reformadores (sem seguimento), do PPM (sem seguimento), do PS (rejeitado: tratava-se da lei quadro do ambiente e qualidade de vida, rejeitada com os votos contra do PSD).
Em 1981: projecto de lei da ASDI (sem seguimento), da ASDI (rejeitado), do PPM (sem seguimento), do PS (aprovado, em 27 de Abril de 1982, com os votos do PCP, tendo baixado à Comissão, ficando então sem seguimento - era o projecto de lei n.º 278/II).
Em 1982: projecto de lei do CDS (sem seguimento), do PPM (sem seguimento), da ASDI (sem seguimento).
Em 1983: projecto de lei n.º 102/III, da ASDI (sem seguimento), n.º 213/III, do PS (apresentado em plenário em 10 de Janeiro de 1984, também sem seguimento), e o n.º 203/III, de Os Verdes (cuja urgência foi rejeitada em 2 de Abril de 1985).
Já nesta IV Legislativa ressurgem o projecto de lei n.º 12/IV, do PSD, o projecto de lei n.º 63/IV, do PS, ambos sobre a lei quadro do ambiente e qualidade de vida, e o projecto de lei de Os Verdes, cuja urgência discutimos hoje.
Este vastíssimo conjunto de projectos de lei (que não enumerei exaustivamente), sobre o mesmo tema ou temas afins, parece demonstrar a importância que os vários partidos reconhecem ao problema em questão;

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mas, por outro lado, também parece acontecer que todo e qualquer pretexto vai servindo para adiar a definitiva discussão e aprovação de legislação cuja falta se faz sentir em termos muito graves.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Repito: esta é, sem dúvida, uma questão urgente pois trata-se de defender recursos, nalguns casos insubstituíveis, muitos dos quais em variadíssimas regiões e locais, já se encontram em situação de perecimento praticamente irrecuperável.
Por isso, consideramos oportuno e correcto o pedido de urgência agora em debate.
É evidente que este diploma não têm o alcance de uma lei quadro do ambiente que, sem dúvida, deverá ser urgentemente discutida. Mas também consideramos que a criação do cargo de promotor ecológico não colide com qualquer lei quadro que venha a ser aprovada. Pelo contrário, as regras condicionadoras de enquadramento inserem-se num vastíssimo campo de acção, que é aquele em que se deve dar uma larga amplitude de realização à participação, individual ou organizada, dos cidadãos. Ora, a criação do cargo de promotor ecológico visa, exactamente, a criação de uma entidade que, independentemente do que venha a ser a lei quadro do ambiente, tem um relevante papel na defesa do equilíbrio ecológico da qualidade de vida, na fiscalização, no acolhimento de propostas e queixas da população e na promoção do seu esclarecimento, dentro dos parâmetros do artigo 66.º da Constituição da República Portuguesa.
Convém sublinhar que está completamente por regular o direito de acção popular em defesa do ambiente, consagrado no artigo 66.º, n.º 3, da Constituição. E é bem urgente, Srs. Deputados, que os cidadãos possam, por sua iniciativa própria, individual ou colectivamente, actuar, junto dos tribunais e da Administração Pública para promover a prevenção ou cessação dos factores de degradação do ambiente e obter indemnizações quando sejam directamente lesados. O promotor ecológico, dentro das funções previstas neste projecto de lei, não tendo poder jurisdicional, poderá ser um apoio de grande valor para os tribunais, canalizar as queixas para os serviços públicos e responsáveis pelo acto ou pelo atentado e permitir que as questões se resolvam sem necessidade de recurso contencioso, isto é, de uma forma muito mais expedita.
Há manifestos exemplos da sua necessidade, dos quais citarei apenas três: a defesa dos recursos hídricos e contra a degradação e poluição da água; a defesa do solo, pelo controle da ocupação urbana do território, sendo outro dos atentados a actual eucaliptização anárquica e desenfreada, verdadeiramente criminosa para a defesa dos solos agrícolas; a defesa da floresta e das espécies vegetais em vias de extinção, tendo em conta os incêndios devastadores sem que se proceda ao necessário repovoamento florestal, como as populações exigem.
Neste momento, Srs. Deputados, em que tantos se vangloriam da entrada na CEE, convém recordar "o sério alerta que foi levantado pelo Comité Europeu para a Conservação da Natureza e dos Recursos Naturais (organismo dependente do Conselho da Europa), que ao elaborar um recenseamento das espécies vegetais ameaçadas revelou ser Portugal o terceiro país da Europa com mais espécies vegetais em vias de extinção. 0 que vos parece isto, Srs. Deputados?
Tem-se comprovado que em Portugal, como na generalidade do mundo capitalista, o ambiente e a qualidade de vida das populações não são preocupações predominantes dos governos, e não é a existência de ministérios de qualidade de vida que altera esta realidade.
Há poderosos interesses em jogo. Há (por vezes, na sombra) mãos capazes de travar iniciativas positivas. Há corrupção.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sublinhamos as vantagens da existência de uma figura pública, idónea e independente que tenha as funções atribuídas ao promotor ecológico, fora do quadro governamental. Por isso, votaremos favoravelmente o pedido de urgência agora pedido pelo Partido Os Verdes.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente:- Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Daniel Bastos.

O Sr. Daniel Bastos (PSD): - Sr.ª Deputada Margarida Tengarrinha, a criação do cargo de promotor ecológico com vista à defesa da vida e do meio ambiente previsto no projecto de lei apresentado pela Sr.ª Deputada Maria Santos, parece-nos que se deveria enquadrar numa análise global do ambiente e não ser tratado de per si, desenquadrado da globalidade dos problemas que afectam o meio ambiente.
Nestes termos, as perguntas que desejaria fazer-lhe são as seguintes: independentemente da urgência da discussão destas matérias, não entende a Sr.ª Deputada ser mais útil e necessária a discussão deste projecto de lei em conjunto com os restantes projectos de lei de ambiente, existentes na Comissão competente?
Por outro lado, a Sr.ª Deputada referiu-se a questões de corrupção: Não poderia ser mais explícita, indicando os casos concretos de corrupção existentes neste âmbito?
O Sr. Presidente: - Para responder, tem palavra a Sr.ª Deputada Margarida Tengarrinha.

A Sr.ª Margarida Tengarrinha (PCP): - Sr. Deputado Daniel Bastos; em primeiro lugar, creio que já expus suficientemente as razões que nos levam a apoiar este projecto de lei. Apesar de ser urgente e extremamente necessário que se discuta, na Assembleia da República, a lei quadro do ambiente e, eu disse-o e repito na minha intervenção, a verdade é que se têm verificado adiamentos sucessivos, por várias vezes os projectos de lei têm sido retidos na gaveta - aliás, eu citei apenas uma pequena parte, como o Sr. Deputado deve ter reparado e é isso que nos leva a apoiar este projecto de lei de Os Verdes.
Como tentei provar, a existência do promotor ecológico em nada colide com a lei quadro do ambiente. Pelo contrário, poderá até servi-la de uma forma eficaz. Daí que, embora pense, que a lei quadro do ambiente é indispensável e urgente, julgo que a figura do promotor ecológico em nada irá diminuir a discussão da lei quadro do ambiente, quando ela for feita. Só que o PSD e o CDS não a agendaram e, portanto, penso que a criação do promotor ecológico, pela sua importância, os espevitará a tentarem agendar o mais rapidamente possível um projecto de lei que tem a urgência que já foi salientada .

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Relativamente aos casos de corrupção, Sr. Deputado, não sejamos ingénuos: os problemas de corrupção existem e são constantemente visíveis. Aliás, posso citar-lhe alguns. É o caso do problema da utilização dos solos, é o caso da abertura de furos, que, como sabe, é ilegal em determinados parâmetros. Há mesmo casos, como o do barrocal algarvio, em que a colocação dos furos foi feita muitíssimo perto uns dos outros, provocando constantemente a lei e trazendo consigo o gravíssimo caso da penetração das águas dentro dos aquíferos, o que traz consigo a salinidade. E não é por acaso, por exemplo, que na minha terra - em Portimão - quando abrimos as torneiras sai água salobra. Ora, isto é proibido por lei!
Não estou a dizer que haja um caso ou outro de corrupção, mas sim que há dezenas!
Poderia citar outros casos de corrupção como sejam as construções atrabiliárias e anárquicas em solos de qualidade A. Ali mesmo em Faro, por exemplo, onde as terras de aluvião são das melhores do País, as terras estão a ficar cobertas de armazéns, de depósitos de automóveis, etc.
São empreendimentos ilegais que levam a suspeitar da existência de casos de corrupção mesmo debaixo da vista das autoridades.
Ora, aqui está um dos aspectos em que se torna necessária a existência de um promotor ecológico, para o qual sejam canalizadas as queixas respectivas.

Vozes do MDP/CDE e do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro.

O Sr. Raul Castro (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Já aquando da apresentação de um pedido de urgência para a mesma iniciativa legislativa, na anterior sessão legislativa, o MDP/CDE. se pronunciou pela urgência.
Verifica-se agora, do sucinto parecer apresentado e que é desfavorável à concessão da urgência, que o fundamento de tal negação consiste em se ter considerado - embora por maioria - que seria urgente a análise global de todos os projectos relacionados com esta matéria.
Em primeiro lugar, parece existir aqui uma contradição porque, ao considerar-se urgente a análise global de todos os projectos, está-se a reconhecer que este projecto também teria urgência em ser apreciado.
Em segundo lugar, não se compreende que seja esta a razão que levou a Comissão a recusar a urgência. Na realidade, pedir ou não a urgência para uma determinada iniciativa legislativa é uma faculdade do grupo parlamentar autor do respectivo projecto de lei. E não podem os deputados estar dependentes, como aqui se pretende fazer, daquilo que é uma faculdade - na qual esse deputado não pode interferir - de cada grupo parlamentar em pedir ou não a urgência para projectos de lei que se refiram a matéria semelhante.
Diferente disto seria, Sr. Presidente e Srs. Deputados, como já aqui aconteceu na Assembleia, que outros partidos se propusessem a apresentar iniciativas sobre esta matéria e que, então, se concedesse um prazo para esses partidos apresentarem também os seus projectos de lei. Mas não é este o caso: é que não se trata de projectos de lei idênticos a este, não se trata de projectos de lei sobre o promotor ecológico. Trata-se de projectos de lei sobre outras matérias que, embora tenham necessariamente alguma conexão com esta matéria, representam, todavia, matéria independente do promotor ecológico. Quer dizer, a lei quadro do ambiente, que é o exemplo mais característico - embora diga respeito ao ambiente e ao promotor ecológico -, não é uma iniciativa cujo objecto se possa confundir com o promotor ecológico. Daí que não se compreenda, e por isso o MDP/CDE irá votar favoravelmente a urgência do projecto de lei n.º 51/IV, que com base neste argumento - e é apenas este argumento que temos aqui em cima da mesa - se possa recusar a urgência a este projecto de lei.
Efectivamente, a criação de um promotor ecológico pela actuação positiva que ele viria a ter em relação aos problemas do ambiente e do equilíbrio ecológico afigura-se-nos uma iniciativa independente e importante no que diz respeito a um problema em que se verifica tão grande degradação no nosso país.
Por isso, Sr. Presidente, Srs. Deputados, o MDP/CDE votará favoravelmente esse pedido de urgência.

Vozes do MDP/CDE: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Azevedo.

O Sr. Barbosa de Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata considera mais urgente discutir os vários projectos de lei sobre ambiente que se encontram em estudo na Comissão de Equipamento Social e Ambiente do que a discussão isolada do projecto de lei n.º 51/IV sobre a criação do cargo de promotor ecológico, cujo processo de urgência, solicitado pela Sr.ª Deputada Maria Santos, agora se debate.
Consideramos que, primeiro, é preciso chegar a uma verdadeira lei de bases do ambiente e só depois discutir as entidades julgadas mais convenientes para o seu cabal cumprimento.
A esta conclusão chegou a Comissão de Equipamento Social e Ambiente na sua reunião de 29 de Janeiro de 1986, tendo até a Sr.ª Deputada Maria Santos admitido que requereu o processo de urgência para o seu projecto de lei n.º 51/IV para, dessa forma, provocar o aceleramento da discussão de todos os projectos de lei sobre esta matéria.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata, pelas razões expostas, é de opinião de que a discussão do projecto de lei atrás referido deverá ocorrer conjuntamente com os projectos de lei sobre ambiente que se encontram na respectiva Comissão, manifestando a sua disponibilidade para o efeito e não podendo por isso votar favoravelmente o processo de urgência, reservando a sua posição sobre o conteúdo daquele projecto para quando ocorrer a sua discussão.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Margarida Tengarrinha (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para pedir esclarecimentos.

O Sr. Presidente: - Lembro à Sr.ª Deputada Margarida Tengarrinha que já não dispõe de tempo.

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O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Sr. Presidente, é apenas para dizer que o MDP/CDE concede à Sr.ª Deputada Margarida Tengarrinha o tempo necessário para fazer o pedido de esclarecimento.

O Sr. Presidente: - Tem, então a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Tengarrinha.

A Sr.ª Margarida Tengarrinha (PCP): - Agradeço muito o tempo que me foi concedido pelo Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
Sr. Deputado, não será essa uma forma de lançar para as calendas gregas - tal como tem vindo a acontecer até aqui - a discussão e a aprovação de projectos de lei tão necessárias para a defesa não só nossa como dos nossos filhos e do futuro do nosso país?

O Sr. Presidente:- Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE):- Sr. Deputado Barbosa de Azevedo, V. Ex.ª ou o seu grupo parlamentar pensam pedir urgência para o debate das propostas ou projectos de lei que existam sobre a lei de bases do ambiente? Está o seu grupo parlamentar demasiado preocupado com este problema ou entende que esses projectos e propostas de lei vão para a lista de espera? Serão, ou não, debatidos brevemente?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Santos, igualmente para pedir esclarecimentos.

A Sr.ª Maria Santos (Indep.): - Sr. Deputado Barbosa de Azevedo, pedi a palavra para fazer uma pequena intervenção salientando também o conteúdo da questão que já aqui foi colocada: o Partido Social-Democrata pensa agendar brevemente, e com urgência, o seu projecto de lei? Para quando?

O Sr. Presidente: - Para responder aos pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Azevedo.

O Sr. Barbosa de Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em relação à pergunta que foi colocada pela Sr.ª Deputada Margarida Tengarrinha a nossa bancada deseja dizer-lhe que estamos empenhados na discussão dos vários projectos de, lei que se encontram na Comissão. Tendo sido o PSD a apresentar o primeiro desses projectos de lei, está interessadíssimo e muito empenhado em que ele seja discutido, e admite muito claramente a hipótese de solicitar a sua marcação.
O Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca falou também sobre esse processo, perguntando se o PSD admitia o facto de pedir o processo de urgência para os projectos de lei que têm a ver com esta matéria. A resposta já foi dada à Sr.ª Deputada Margarida Tengarrinha e é a mesma para o Sr. Deputado.

0 Sr. Presidente:- Para uma intervenção tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Santos.

A Sr. Maria Santos (Indep.):- Sr. Presidente; Srs. Deputados: De facto, as perspectivas que nortearam a necessidade de fazer agendar este processo de urgência foram conseguidas, tal como disse o Sr. Deputado do PSD.
Assumi as responsabilidades que devia assumir, ao solicitar que as questões acerca do ambiente viessem a este Plenário e sejam consideradas como objecto de debates urgentes.
É preciso agir, de modo a garantir um amplo debate sobre a problemática ambiental, levando esta Câmara a consignar no espírito da lei as nossas preocupações ecológicas. Por isso gostaria de vos trazer aqui as imagens concretas de situações que acontecem por este Portugal fora.
Tive oportunidade de estar no passado sábado no rio Alviela, de contactar com moleiros que neste momento já não têm os seus 28 moinhos a laborar e de conhecer, efectivamente, a grave ruptura ambiental que se verifica naquele rio. Nesse sentido, contar-vos-ei o início de uma pequena história possível sobre o rio.
Era uma vez um rio que se chamava Alviela. O azul das suas águas corria suavemente, acariciando as margens onde as populações ribeirinhas, harmonizadas com o seu rio vão criando e recriando a vida.
Ao som das águas se junta a voz fértil dos moinhos, que a sabedoria dos homens fazia laborar. No fundo desse rio cresciam algas de todas as cores e nadavam peixes de muitas espécies.
Era uma alegria ver os bandos de miúdos que depois da escola aprendiam a mergulhar e faziam do Alviela uma grande piscina.
Este pode ser o começo de uma das histórias que todos nós guardamos da infância, e que os velhos moleiros de Pernes me contaram no passado sábado. No entanto, se hoje quisermos contar aos nossos filhos temos de começar de outra maneira: Há muitos, muitos anos, existiu um rio...
Para que estas situações não aconteçam, para que possamos ser animadores de um processo de desenvolvimento capaz de inovar e avançar concretamente na resolução destas questões trouxe hoje este pedido de urgência que a Câmara, infelizmente, vai rejeitar.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente:- Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, consideramos encerrado o debate.
Vamos então passar à votação do parecer da Comissão de Equipamento Social e Ambiente que propõe a recusa do pedido de urgência formulado para o projecto de lei n.º 5l/IV.

Submetido à votação, foi aprovado com, votos a favor do PSD, do PS, do PRD e do CDS e votos contra do PCP, do MDP/CDE e da deputada independente Maria Santos.

O Sr. Presidente: - Vamos agora discutir e votar os pareceres da Comissão de Regimento e Mandatos sobre pedidos de autorização para que vários Srs. Deputados deponham em tribunal como testemunhas.
O Sr. Secretário vai proceder à leitura do primeiro parecer.

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Foi lido. É o seguinte:

Exmo. Sr. Presidente da Assembleia da República:

De acordo com o solicitado no ofício n.º 1325 - processo n.º 377 - 1.ª Secção do 1.º Juízo Correccional da Comarca de Lisboa, de 25 de Novembro último, enviado aos Srs. Deputados Eduardo Ribeiro Pereira e Raúl Pimenta Rêgo, tenho a honra de comunicar a V. Ex.ª que esta Comissão Parlamentar decidiu emitir parecer no sentido de autorizar os referidos Srs. Deputados a serem ouvidos, o primeiro como declarante e o segundo como testemunha de defesa, no processo em causa.
Com os melhores cumprimentos.

Palácio de São Bento, 29 de Janeiro de 1986.- O Vice-Presidente da Comissão de Regimento e Mandatos, Mário Júlio Montalvão Machado.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Vai agora proceder-se à leitura do segundo parecer.

Foi lido. É o seguinte:

Exmo. Sr. Presidente da Assembleia da República:

De acordo com o solicitado no ofício sem número processo n.º 279/84 - 1.ª Secção do 4.º Juízo Correccional do Tribunal da Comarca do Porto, de 10 de Janeiro corrente, enviado ao Sr. Presidente da Assembleia da República, acerca do Sr. Deputado José Rodrigo Carneiro da Costa Carvalho, tenho a honra de comunicar a V. Ex.ª que esta Comissão Parlamentar decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o referido Sr. Deputado a prestar declarações no processo em causa.
Com os melhores cumprimentos.

Palácio de São Bento, 30 de Janeiro de 1986. - O Vice Presidente da Comissão de Regimento e Mandatos, Mário Júlio Montalvão Machado.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Vai agora proceder-se à leitura do terceiro parecer.
Foi lido. É o seguinte:

Exmo. Sr. Presidente da Assembleia da República:

De acordo como o solicitado no ofício n.º 9/86 processo n.º 375/85 - 1ª Secção do 1.º Juízo do Tribunal da Comarca de Vila da Feira, de 6 de Janeiro corrente, enviado ao Sr. Presidente da Assembleia da República, acerca do Sr. Deputado Joaquim da Silva Martins, tenho a honra de comunicar a V. Ex.ª que esta Comissão Parlamentar decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o referido Sr. Deputado a depor como testemunha de defesa no processo em causa.
Com os melhores cumprimentos.

Palácio de São Bento, 29 de Janeiro de 1986. - O Vice Presidente da Comissão de Regimento e Mandatos, Mário Júlio Montalvão Machado.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Vai agora proceder-se à leitura do quarto parecer.

Foi lido. É o seguinte:

Exmo. Sr. Presidente da Assembleia da República:

De acordo como o solicitado no ofício n.º 51 738 processo n.º 532/82 - 5ª Secção da Directoria de Lisboa da Polícia Judiciária, de 2 de Dezembro último, enviado ao Sr. Presidente da Assembleia da República, acerca do Sr. Deputado Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo, tenho a honra de comunicar a V. Ex.ª que esta Comissão Parlamentar decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o referido Sr. Deputado a prestar declarações como testemunha no processo em causa.
Com os melhores cumprimentos.

Palácio de São Bento, 29 de Janeiro de 1986. O Vice-Presidente da Comissão de Regimento e Mandatos, Mário Júlio Montalvão Machado.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Vai agora proceder-se à leitura do quinto, parecer.

Foi lido. É o seguinte:

Exmo. Sr. Presidente da Assembleia da República:

Em conformidade com o ofício n.º 1313 - processo n.º 2413/84 - 1ª Secção do 5.º Juízo Correccional da Comarca de Lisboa, de 13 de Novembro passado, enviado ao Sr. Director-Geral dos Serviços Parlamentares, através do ofício n.º 273/85/SP, do Instituto de Ciências Sociais, datado de 11 de Dezembro de 1985, acerca do Sr. Deputado António Miguel de Morais Barreto, tenho a honra de comunicar a V. Ex.ª que esta Comissão Parlamentar decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o referido Sr. Deputado a depor como testemunha no processo acima referenciado.
Com os melhores cumprimentos.

Palácio de São Bento, 29 de Janeiro de 1986.- O Vice-Presidente da Comissão de Regimento e Mandatos, Mário Júlio Montalvão Machado.

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O Sr. Presidente: - Está em discussão.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Vai agora proceder-se à leitura do sexto parecer.

Foi lido. É o seguinte:

Exmo. Sr. Presidente da Assembleia da República:

Em conformidade com a carta enviada a V. Ex.ª em 15 do corrente, pelo Sr. Deputado António Borges de Carvalho, tenho a honra de comunicar a V. Ex.ª que esta Comissão Parlamentar decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o referido Sr. Deputado a depor como testemunha no processo n.º 30/85, do 3º Juízo, 2ª Secção, do Tribunal do Trabalho de Lisboa.
Com os melhores cumprimentos.

Palácio de São Bento, 29 de Janeiro de 1986. - O Vice Presidente da Comissão de Regimento e Mandatos, Mário Júlio Montalvão Machado.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, do ponto seguinte da ordem de trabalhos constam as eleições para cargos exteriores à Assembleia da República. Entretanto, como foi anunciado, que se procederia a essas eleições às 15 horas
Por chamada nominal, será preferível passarmos à discussão do projecto de lei
n.º 48/IV, apresentado pelo PCP.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faz favor.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, estão agendados para hoje, além das eleições de um juiz para o Tribunal Constitucional e outros cargos exteriores à Assembleia da República, os projectos de lei que V. Ex.ª fez referência sobre o enquadramento do Orçamento do Estado e várias ratificações.
É certo que não haveria problema em começarmos com as ratificações como foi ontem em principio, admitido em conferência de líderes, mas da parte da nossa
bancada temos dificuldades em iniciar desde já a discussão das ratificações por duas ordens de razões: primeiramente, o deputado da nossa bancada que intervirá convenceu-se que o período de antes da ordem do dia ia ser mais prolongado, como tem sido durante esta semana, e de facto, foi muito curto, acabou eram 11 horas e 10 minutos e, por outro lado presumo que o Governo gostará de estar representado nesta discussão.
Sugeria à Mesa que pudéssemos fazer desde já a l.ª chamada das eleições, mantendo as umas abertas até às 18 horas e 30 minutos, como estava previsto da
parte da tarde.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - E as ratificações seriam discutidas à tarde!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Raul Junqueiro.

O Sr. Raul Junqueiro (PS): - É apenas para dizer que estamos de acordo com a proposta do Sr. Deputado António Capucho.

O Sr. Presidente: - Uma vez que todas as bancadas estão de acordo, vamos proceder à 1.ª chamada para as respectivas eleições. Mas, ainda antes, peço a vossa atenção para a leitura de mais um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos.

Foi lido. É o seguinte:

Relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos

Em reunião realizada no dia 6 de Fevereiro de 1986, pelas 10 horas, foi apreciada a seguinte substituição de deputado solicitada pelo Partido Social Democrata:

Arménio dos Santos (círculo eleitoral de Lisboa) por Francisco João Bernardino da Silva. Esta substituição é pedida por um período de 15 dias, a partir do dia 4 de Fevereiro corrente, inclusive.

Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que o substituto indicado é realmente o candidato não eleito que deve ser chamado ao exercício de funções considerando a ordem de precedência da respectiva lista eleitoral apresentada a sufrágio pelo aludido partido no concernente círculo eleitoral.
Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:

A substituição em causa é de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

A Comissão: Presidente, António Cândido Miranda Macedo (PS) - Secretário, António Sousa Pereira (PRD) - Secretário, José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP) - Adérito Manuel Soares Campos (PSD) - Daniel Abílio Ferreira Bastos (PSD) - João Domingos Fernandes Salgado (PSD) - José Maria Peixoto Coutinho (PSD) -Henrique Rodrigues da Mata (PSD)-Manuel José Marques Montargil (PSD) - Carlos Cardoso Lage (PS) - Mário Manuel Cal Brandão (PS) - Joaquim Carmelo Lobo (PRD) - Jorge Manuel Abreu de Lemos (PCP) - José Manuel Antunes Mendes (PCP) - João Cerveira Corregedor da Fonseca (MDP/CDE).

O Sr. Presidente: - Está em discussão.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido a votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente :- Srs. Deputados, quanto às eleições para os cargos exteriores à Assembleia da República, foram apresentadas à Mesa algumas dúvidas relativamente ao modo de votar quanto à eleição do Sr. Juiz Conselheiro Amâncio Ferreira para o Tribunal Constitucional.

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A Mesa foi informada de que a lei impõe que se vote - quem o desejar - pelo processo de cruz apenas num quadrado.
Vamos então dar início às eleições para cargos exteriores á Assembleia da República. A Mesa será a primeira a votar, como é regimental. Depois proceder-se-á à chamada.

Procedeu-se às eleições.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, damos por encerrados os nossos trabalhos da parte da manhã. Depois de reaberta a sessão as umas continuarão abertas até às 18 horas e 30 minutos. O início dos trabalhos da parte da tarde será às 15 horas, que prosseguirá com a apreciação das ratificações.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 12 horas e 40 minutos.

Após o intervalo, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Fernando Amaral.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 15 horas e 25 minutos.

Srs. Deputados, segundo consenso que foi estabelecido entre as bancadas, vamos entrar agora na apreciação de ratificações.
Pergunto às bancadas se há alguma objecção a que as comecemos por apreciar, apesar de não estar presente qualquer membro do Governo.

Pausa.

Srs. Deputados, dado não haver objecções, vamos dar início à apreciação das ratificações n.ºs 37/IV (PCP) e 49/IV (PRD), sobre o Decreto-Lei n.º 451/85, de 28 de Outubro, que aprova o Estatuto do Pessoal Técnico, Técnico-Profissional, Administrativo e Auxiliar ao Serviço das Missões, Embaixadas e Consulados de Portugal e da ratificação n.º 53/IV (PS, PRD, PCP e MDP/CDE), sobre o Decreto-Lei n.º 500-B/85, de 27 de Dezembro, que revoga o Decreto-Lei n.º 451/85, de 28 de Outubro, que aprova o Estatuto do Pessoal Técnico, Técnico-Profissional, Administrativo e Auxiliar ao Serviço das Missões, Embaixadas e Consulados de Portugal.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Caio Roque.

O Sr. Caio Roque (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vamos hoje apreciar os pedidos de ratificação n.ºs 37/IV e 49/IV, pedidos pelo PCP e PRD, respectivamente, e n.º 53/IV, pedido pelo PS, PRD, PCP e MDP/CDE, respeitantes ao Estatuto do Pessoal Técnico, Técnico-Profissional, Administrativo e Auxiliar ao Serviço das Missões Diplomáticas e Consulados de Portugal.
Depois de mais de 10 anos de esforços intensivos com os sucessivos governos, conseguiram finalmente os trabalhadores das missões diplomáticas e consulares a consagração de muitas das suas reivindicações pelo IX Governo Constitucional.
O actual Governo, através do seu Primeiro-Ministro e do Ministro dos Negócios Estrangeiros, aquando da sua posse e na quadra do Natal, enviou uma mensagem aos emigrantes exprimindo a sua grande admiração e respeito por todos os trabalhadores portugueses residentes no estrangeiro. Porém, para quem, ao longo de muitos anos, tem contribuído com o seu trabalho e esforço para prestigiar o nome de Portugal em todo o mundo, as palavras, sobretudo as de circunstância, se bem que simpáticas, são insuficientes.
Poder-se-á aceitar como natural que um diploma como o Decreto-Lei n.º 451/85 não constituísse uma obra acabada de perfeição. Seria imaginável que o mesmo não corresponderia na sua totalidade aos anseios e expectativas dos trabalhadores a quem se destinava. Era ainda previsível - e por consequência que fossem feitas diligências no sentido de o aperfeiçoar. Era, e é ainda, legítimo esperar que o produto final fosse a concretização da esperança dos que, ao longo destes anos, foram exigindo enquadramento legal para a sua situação.
Como é que o Governo, com o argumento - dir-se-ia pueril - de que está a preparar nova legislação, revoga a anterior, criando no espaço, onde antes havia alguma coisa, um vazio desolador e reprovável? De facto, quem de bom senso deita fora as suas únicas calças, ainda que velhas, só porque tenciona comprar as substitutas dali a 2 meses?
Muitas têm sido as organizações e associações representativas dos emigrantes a tomar posição de firme e veemente condenação da revogação do decreto-lei cuja ratificação ora se solicita a esta Assembleia.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com a consolidação do regime democrático e com a adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia abriu-se para os nossos concidadãos, residentes na Europa e no Mundo, um novo horizonte de segurança, tranquilidade e bem-estar. Não será nunca impunemente que medidas como estas são impostas. Daí que os subscritores do pedido de ratificação n.º 53/IV entendessem ser seu dever usar dos poderes que a Constituição e o Regimento lhes concedem no sentido de propor a esta Câmara a reconsideração da revogação decidida e pôr luz, justiça e equilíbrio, numa situação que, incompreensivelmente criada pelo actual Governo, é daquelas exigências de todo em todo carente.
Os emigrantes, trabalhadores de Portugal no mundo, não podem, por imperativo moral e de consciência, estar sujeitos a todo o tipo de flutuações de conjuntura ou a sofrerem na carne e no espírito as consequências da instabilidade política e governativa. Merecem, pelo contrário, de todos nós a responsabilidade da acção propiciadora da melhoria das suas condições de vida. Se este princípio é válido para todos e deve merecer a nossa maior atenção, é-o também para os trabalhadores ao serviço das missões diplomáticas e consulados de Portugal.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pensamos ter justificado, com clareza e suficientemente, as razões da apresentação do pedido de ratificação n.º 53/IV, restando-nos esperar que esta Câmara assuma a recusa da ratificação e contribua assim para que seja regularizada uma situação que, a manter-se, reverteria em prejuízo dos nossos concidadãos trabalhadores, residentes no estrangeiro, ao serviço das missões diplomáticas e consulados de Portugal e em nada dignificaria os que, por acção ou omissão, permitiram a sua manutenção.

Aplausos do PS, do PRD e do PCP.

O Sr. Presidente: - Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Custódio Gingão.

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O Sr. Custódio Gingão (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Permitam, em primeiro lugar, Sr. Presidente, que manifeste a profunda estranheza da minha bancada pelo facto de o Governo não se ter dignado a comparecer até ao presente momento neste debate.
É um facto estranho, tanto mais que todos nós estaríamos à espera de explicações concretas do Governo sobre as várias questões que vamos pôr:
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao apresentar o requerimento para apreciação do Decreto-Lei n.º 451/85, de 28 de Outubro, pela Assembleia da República e ao subscrever com os Grupos Parlamentares do PS, PRD e MDP/CDE idêntico requerimento quanto ao Decreto-Lei nº 500-B/85, de 27 de Dezembro, o PCP pretendeu dar uma contribuição para que esta Assembleia possa não só conhecer, mas sobretudo intervir de modo positivo para a alteração das deficientes condições de segurança e estabilidade no emprego com que se têm vindo a debater, ao longo dos anos, os cerca de 1500 trabalhadores consulares e das missões diplomáticas que servem o Estado Português além-fronteiras.
Foi com surpresa e estupefacção que estes trabalhadores viram publicado no Diário da República 2.º suplemento ao n.º 298, 1ª série, com data de 27 de Dezembro de 1985, mas só distribuído no dia 8 de Janeiro, o Decreto-Lei n.º 500-B/85, que veio revogar o seu estatuto, consagrado legalmente pelo Decreto-Lei n.º 451/85, cuja entrada em vigor estava precisamente prevista para o dia 27 de Dezembro.
E a surpresa e estupefacção, para já não referir a revolta, são compreensíveis.
Efectivamente, o Decreto-Lei n.º 451/85, apesar de conter alguns erros e lacunas, tinha vindo ao encontro de uma velha e justa reivindicação daqueles trabalhadores - a definição de um estatuto profissional.
Após a sua publicação, por parte do anterior governo, estava dado o primeiro passo para a satisfação de uma luta que durava há mais de 10 anos. Não porque este diploma tivesse vindo a contemplar todas as exigências destes trabalhadores ou a superar todas as indefinições e lacunas que se colocavam ao sector. Mas, ainda assim, ele era um ponto de partida para que fosse possível chegar a um entendimento entre as partes interessadas.
E, nesse sentido, as organizações sindicais representativas destes trabalhadores manifestam o seu regozijo pela publicação do estatuto tendo contudo, contactado os diversos grupos parlamentares para que, em sede de ratificação, o decreto pudesse vir a ser alterado nos pontos considerados como mais negativos.
Na sequência de tais contactos, o meu grupo parlamentar e o grupo parlamentar do PRD decidiram requerer que o diploma governamental fosse submetido à apreciação desta Assembleia da República.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Indiferente a tudo isto, sem consultar ou ouvir ninguém, o Governo decidiu de maneira unilateral que o Decreto Lei n.º 451/85 se revelava de difícil execução, ignorou os compromissos assumidos entre o Ministério dos Negócios Estrangeiros e os sindicatos e resolveu, à revelia destes, fazer publicar o Decreto-Lei n.º 500-B/85, que revoga o estatuto. Ao proceder deste modo o Governo veio criar um vazio jurídico quer para os trabalhadores que de acordo com o Decreto-Lei n.º451/85, já tinham aderido à função pública, quer para aqueles que esperavam que o diploma fosse melhorado, no sentido de contemplar as suas situações.
O Governo, em vez de dialogar com os sindicatos e de com eles negociar a aplicação do Decreto-Lei n.º 451/85, fechou-lhes as portas das negociações e apresentou-lhes, como facto consumado, o regresso ao ponto zero.
E este regresso ao ponto zero é, a negação pura e simples a estes trabalhadores do estatuto sócio-profissional porque sempre têm lutado e que já haviam visto consagrado legalmente. E isto significa manter estes trabalhadores sujeitos ao vínculo anacrónico de assalariados locais em prestação eventual de serviço por ajuste verbal sem qualquer garantia de carreira ou estabilidade de emprego.
O beco para que este Governo tenta remeter estes trabalhadores, ao manter a situação de instabilidade em que viviam, está longe de obedecer aos princípios decorrentes da Constituição da República Portuguesa, não estabelecendo sequer garantias mínimas de estabilidade e segurança, no posto de trabalho que furtem estes trabalhadores ao arbítrio de qualquer governo.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Pode-se concluir sem o mínimo de erro que esta atitude do Governo foi pensada e utilizada como chantagem política, perpetrando uma situação em que estes trabalhadores estão totalmente desprotegidos das decisões arbitrárias do Governo ou até de qualquer embaixador. Face ao quadro actual o Governo pode em qualquer momento, despedi-los. E é de facto o que tem vindo a acontecer nos últimos anos e que por mais tempo se não pode manter.
É uma situação que estes trabalhadores não aceitam, já que não querem ser colocados na situação de clandestinos do Estado Português. A atitude irresponsável do Governo ao publicar o Decreto-Lei n.º 500-B/85, para além de imoral é injusta, traz também graves problemas aos nossos emigrantes e mostra, de facto, como além fronteiras, o governo do PSD pretende continuar a tratar os seus próprios funcionários.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por tudo o que já foi dito a Assembleia da República não pede, e não deve ficar indiferente a esta questão. E está em condições de fazê-lo recusando a ratificação do Decreto-Lei n.º 500-B/85 e repristinando o Decreto-Lei nº451/85 com base no qual se poderá aprovar uma lei de alterações tendente a contemplar as reivindicações destes trabalhadores ainda não consagradas legalmente.
Nesse sentido, subscrevemos o projecto de resolução para recusa de ratificação do Decreto-Lei n.º 500-B/85, e apresentámos um conjunto de propostas de alteração ao Decreto-Lei n.º 451/85 a ser considerado em sede de discussão na especialidade.
Com este espírito iremos votar, na certeza de que, com o nosso voto, estamos, a dar uma contribuição positiva para que a justiça seja reposta e o Governo
cumpra com honra as suas responsabilidades para com os trabalhadores que, no estrangeiro, servem o Estado Português.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Igualmente para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Roberto Amaral.

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O Sr. Roberto Amaral (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apenas umas breves palavras para manifestar a este Plenário a nossa posição sobre os pedidos de ratificação agora em apreciação.
Em 28 de Novembro do ano passado o meu grupo parlamentar pediu a ratificação do Decreto-Lei n.º 481/85, de 28 de Outubro, que aprovava o Estatuto de Pessoal Técnico, Técnico-Profissional, Administrativo e Auxiliar, ao Serviço das Missões, Embaixadas e Consulados de Portugal.
Pediu a ratificação deste diploma porque entendia que o mesmo sofria de algumas imperfeições, erros e lacunas que importava corrigir. Reconhecia, porém, que este diploma vinha ao encontro de uma velha reivindicação daqueles trabalhadores desenvolvida ao longo dos últimos 10 anos.
Posteriormente, e com a data de 27 de Dezembro, publicou o Governo o Decreto-Lei n.º 500-B/85 que revogou o Decreto-Lei n.º 451/85. No seu preâmbulo, considera o Governo ser o Decreto-Lei nº 451/85 de difícil execução nos termos em que foi formulado, contendo indefinições que terão de ser reformuladas por diploma de igual valor, ou criteriosamente especificadas por via regulamentar. Adiantava, de seguida, que tinha já em adiantada fase de preparação legislação mais adequada.
A publicação deste decreto-lei representou, para todos os trabalhadores envolvidos, o regresso à situação vigente anteriormente e que justificou e alimentou a sua luta durante os últimos 10 anos.
Pior ainda, foram entretanto criadas expectativas a esses trabalhadores - que são cerca de 1500 - tendo já grande parte deles optado pelo regime da função pública, regime este que garante a todos eles muito maior estabilidade e segurança.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Urge resolver este problema o mais urgentemente possível. A publicação do Decreto-Lei n.º 500-B/85, em vez de contribuir para a sua resolução, veio complicar um pouco mais as coisas, visto que, não tendo sido entretanto publicada a legislação anunciada no seu preâmbulo, torna-se impossível agora, por força dos artigos 197.º e 199.º do Regimento da Assembleia, proceder a alterações, em sede de ratificação, ao estatuto daqueles trabalhadores.
Por isso, Sr. Presidente, Srs. Deputados, entendemos que se impõe, por parte desta Câmara, a recusa da ratificação do Decreto-Lei n.º 500-B/85 que revoga o Decreto-Lei nº 451/85, de 20 de Outubro.
Esta recusa de ratificação implica a represtinação das normas constantes do Decreto-Lei n.º 451/85, que, não sendo as melhores, são contudo uma boa base de partida para a justa solução deste problema que afecta todos estes trabalhadores e que são, repito, cerca de 1500.
Importa agora não descansar sobre o assunto e tomar iniciativas legislativas no sentido de elaborar um novo estatuto para todos esses trabalhadores. E a isto, Sr. Presidente, Srs. Deputados, o Grupo Parlamentar do PRD estará pronto e disponível a dar a contribuição que souber e entender.

O Sr. Presidente: - Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Cardoso Ferreira.

O Sr. Cardoso Ferreira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PSD irá conceder ratificação ao Decreto-Lei n.º 500-B/85, no
fundo pelas razões que já foram aqui afloradas. Preocupa ao Governo a situação dos seus funcionários consulares, só que entendemos não ter sido a forma do Decreto-Lei n.º 451/85 a mais feliz. Nesse sentido, o Governo tem, como aliás consta do preâmbulo do decreto revogador, em adiantado estado de preparação legislação que consideramos mais adequada sobre esta matéria.
Há, de facto, um conjunto de circunstâncias que não estão suficientemente definidas no diploma e que entendemos que deverão ser reformuladas. Nesse sentido, o Governo tem aprontada, para muito breve, legislação que dará cabal resposta.
Entendemos também, à semelhança do Sr. Deputado Roberto Amaral, que no caso de não vir a ser concedida ratificação a este diploma, deve ficar, conforme manda o Regimento, na resolução, que haverá represtinação, porque nos parece que um vazio sobre esta matéria neste momento seria grave, pelo que deverá ficar em vigor o decreto anteriormente revogado.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, pediram a palavra os Srs. Deputados Jorge Lemos, João Corregedor da Fonseca e Custódio Gingão.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - O Sr. Deputado referiu que estava de acordo com o espírito do decreto em apreciação dado que concordava com as considerações do Governo quanto à dificuldade de aplicação do estatuto anterior.
Apenas gostaria de lhe pôr a seguinte questão: considera o Sr. Deputado ser a melhor forma de legislar revogar, pura e simplesmente, legislação que consagra um conjunto de direitos para um grupo de trabalhadores, deixando-os no vazio e sem saber o que vai suceder ou considera o Sr. Deputado que a melhor forma de legislar é, quando estiver pronto o novo diploma, alterar, corrigir e melhorar o anterior?
Está ou não de acordo comigo em que é inaceitável que, em nome de um decreto que estará em preparação - nós não sabemos se está apesar de o Governo dizer que está -, se deixe no vazio todo o estatuto desses trabalhadores?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Sr. Deputado Cardoso Ferreira, apenas uma questão muito simples.
O Sr. Deputado diz que o Governo tem para muito breve legislação concluída sobre esta matéria. O Sr. Deputado deve ser um deputado privilegiado que, com certeza, tem conhecimento dos critérios que o Governo vai adoptar e que tipo de legislação vai ser preparada e elaborada. A verdade é que o Governo não está cá, que o Governo não explicou nada à comissão parlamentar respectiva das suas intenções, que o Governo actuou desta forma ditatorial e que nada nos confirma que irá mesmo legislar.
Perguntava-lhe, pois, Sr. Deputado Cardoso Ferreira, se tem conhecimento da matéria que o Governo vai adoptar e se quererá fazer o favor de expor a esta Câmara as linhas gerais do pensamento do Governo. Caso contrário, Sr. Deputado, ponho em dúvida a sua

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afirmação de que o Governo tem pronta legislação para muito breve, porque se assim fosse estava aqui o Secretário de Estado ou o Ministro respectivo a expor claramente a esta Assembleia da República quais são as linhas gerais dessa legislação que está a ser preparada.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Custódio Gingão.

O Sr. Custódio Gingão (PCP): - O Sr. Deputado Cardoso Ferreira diz que também está preocupado com esta questão e que o Governo tinha já um trabalho muito adiantado sobre esta matéria. Nós também assim pensámos e tanto assim que, na Comissão de Negócios Estrangeiros, tratámos esta questão com todo o cuidado. A Comissão teve também o cuidado de escrever uma carta ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros para lhe perguntar se tinha algum diploma que pudesse entregar dentro de pouco tempo para ser discutido.
No entanto, o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, tal qual como virou as costas a estes trabalhadores, fez o mesmo à Comissão e nem sequer resposta nos deu. Portanto, isso é a prova provada de que o Governo não tem nada preparado e de que não está interessado em resolver este problema.
Diz também o Sr. Deputado Cardoso Ferreira que o Governo se preocupa com estes trabalhadores. Não lhe parece, Sr. Deputado, que a ausência de qualquer membro do Governo, nesta discussão é a prova provada de como este Governo vota estes trabalhadores ao desprezo, aliás como tem feito durante muitos anos ?

0 Sr. José Magalhães (PCP): - Está visto!

O Orador: - Aquando da campanha eleitoral, o Governo disse que era pela competência, disse tudo e mais alguma coisa e, Sr. Deputado, agora, quando os vários sindicatos ligados ao sector marcaram uma greve para o dia 18, o Governo vira-lhes as costas, não negoceia com eles e dá uma imagem, além fronteiras, de como o Estado Português trata os seus próprios funcionários. O Sr. Deputado, não acha que isto é de lamentar e que não dá nenhum prestígio ao Governo? Não lhe parece que seria melhor o Governo estar aqui e explicar, perante esta Câmara, como é sua obrigação, aquilo que tem feito e o que pensa fazer?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Cardoso Ferreira.

O Sr. Cardoso Ferreira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Devo dizer que também nós estranhamos a ausência do Governo. Procurámos informar-nos e o que aconteceu é muito simples: é que de facto, o que estava previsto em termos de ordem de trabalhos era apreciarmos primeiro o projecto de lei n.º 94/IV sobre o Enquadramento do Orçamento do Estado - foi nesse sentido que o Governo foi informado -, e o que acontece é que, neste momento, já está lá fora o carro do Sr. Secretário de Estado e presumo que este deverá entrar a todo o momento.
Em relação a algumas das questões, que aqui foram colocadas, nomeadamente as que referiram que eu sou um privilegiado, que devo saber muito mais do que a
própria Comissão, devo dizer também que se trata de uma questão de entendimento quanto à palavra do Governo. 0 Governo tem com certeza consciência - e o Sr. Secretário de Estado terá oportunidade de explicar - que este problema o preocupa de sobremaneira e que, naturalmente, quando diz que tem legislação em estado muito avançado, teve a preocupação, e daí a rapidez e a celeridade com que procedeu a esses trabalhos, de não deixar um vazio legislativo nesta matéria, de certo modo pondo em causa legítimas expectativas que foram criadas com o diploma revogado.
Sr. Deputado, não há privilégio nenhum, mas simplesmente a forma como encaramos e a seriedade da palavra dada pelo Governo, nomeadamente na, publicação oficial. Quanto ao mais, terão os Srs. Deputados oportunidade de endereçar as vossas questões, seguramente pertinentes, ao membro do Governo que, dentro de momentos, estará presente com certeza.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Então o melhor é suspender os trabalhos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lemos, pede a palavra para que efeito?

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, face a argumentação agora aduzida pelo Sr. Deputado Cardoso Ferreira, da parte da minha bancada haveria toda a disponibilidade para a suspensão da sessão por um tempo razoável para que o Sr. Membro do Governo pudesse subir as escadas e comparecer neste Plenário.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE)- Sr. Presidente, para não lembrar a "Severa" e uma vez que, pelo menos, temos lá em baixo o automóvel, requeria ao Sr. Presidente a suspensão dos trabalhos até à chegada de algum membro do Governo.

0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, queria dar-lhes o seguinte esclarecimento: o Governo não está presente por culpa nossa, porquanto, o Sr. Secretário de Estado, segundo a ordem de trabalho que havíamos agendado, tinha também disposto os seus trabalhos e só depois de eu ter aberto a sessão é que tomei conhecimento de que tinha sido alterada a agenda. Encontra-se já presente, o Sr. Secretário de Estado para o primeiro ponto da agenda, ou seja, o ponto 2.5, e tomaram-se já providências para que estivesse presente o Sr. Secretário de Estado no que respeita ao ponto 2.6, que agora está em apreciação.
De algum modo, foi por culpa nossa, na altura em que foi permitida, por acordo das diversas bancadas, a alteração da respectiva agenda não se ter telefonado
de imediato ao Sr. Secretário de Estado informando-o de que tinha havido essa alteração.
Vamos, pois, ter a paciência de aguardar uns momentos até chegar o Sr. Secretário de Estado.

0 Sr. António Capucho (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

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O Sr. António Capucho (PSD): - É para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, quero simultaneamente interpelar a Mesa e desfazer uma mal-entendido entre o Sr. Deputado Cardoso Ferreira e eu próprio. Quando lhe expliquei que já lá estava fora o "Carp", referia-me ao Sr. Secretário de Estado Rui Carp e não ao "carro".

Risos.

De facto, estranhando a ausência do Sr. Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação, interpelei o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, o qual me disse, há 10 minutos, que já tinha telefonado ao Sr. Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação e que ele vinha a caminho. Não estará lá o carro, que é uma coisa com 4 rodas, mas ele vem a caminho.
Assim, se o Sr. Presidente não interromper os trabalhos, o meu grupo parlamentar requer a suspensão da sessão por 15 minutos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, vamos então interromper os trabalhos por alguns minutos, precisamente para colmatarmos a referida omissão.
Está suspensa a sessão.

Eram 16 horas.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 16 horas e 40 minutos.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Gama.

O Sr. José Gama (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os governos são formados por homens de bem. Quem o ousa contestar nesta Assembleia e qual o governo que tem a ousadia de não reivindicar para si essa qualidade? Julgo que ninguém.
Por isso, foram homens de bem, e naturalmente responsáveis, que aprovaram, na reunião do Conselho de Ministros de 12 de Julho de 1985 - estavam, então, as eleições à vista -, o Decreto-Lei n.º 451/85, fazendo-se finalmente justiça a uma longa luta travada há mais de 10 anos pelo pessoal técnico, técnico - profissional, administrativo e auxiliar ao serviço das missões, embaixadas e consulados de Portugal.
Veio a campanha eleitoral e falou-se muito aos destinatários deste diploma da justeza da solução encontrada. Não vou cometer o pecado de dizer que o foi por meras razões "eleiçoeiras". Mas o que foi, foi: deram-se vivas ao novo diploma por esse mundo fora e, porque nestas coisas também se deve dar "o seu a seu dono", o mérito foi inteirinho para o governo do bloco central, formado por homens concretos, ou seja, por ministros do PS e do PSD.
Recordo-me de que nesse Conselho de Ministros estavam governantes que hoje se sentam nesta Câmara como deputados. Para poupar safanões de memória, lembro-vos os casos dos Srs. Deputados Amândio de Azevedo, Jaime Gama e Rui Machete. Estávamos, então, às portas de uma nova safra eleitoral.
Vêm as eleições, contam-se os votos, toma posse o novo Governo. E eis que os novos dirigentes entendem que os seus antecessores não terão resolvido da melhor forma a situação de profunda injustiça que grassava pelas nossas representações diplomáticas por esse mundo foral
É verdade que os nossos governantes não são deuses e que, por isso, lhes resta a contingência de pecar. Contudo, quando se arrepia caminho e se retomam os caminhos da virtude nova, não se podem causar prejuízos ao próximo.
Foi, infelizmente, o que aconteceu. Em 27 de Dezembro, meteu-se no caixote do lixo o diploma tão badalado na campanha eleitoral e cuja paternidade foi tão ciosamente defendida e atiraram-se para uma situação de angústia e inconformismo centenas de famílias portuguesas que já haviam ordenado a sua vida à luz do novo diploma.
Muito embora os dois secos considerandos do Decreto-Lei n.º 500-B/85, do pretérito dia 27 de Dezembro, deixe antever uma luz de esperança, a verdade é que, com esta atitude do Governo, regressamos à situação de injustiça anteriormente vivida.
Sinceramente, estranhamos que os governantes que hão-de aprovar o Decreto-Lei n.º 451/85 não venham tomar agora e aqui a mesma atitude na sua qualidade de deputados. Será estranho que ontem, como governantes, tenham utilizado um peso e uma medida e hoje, como deputados, venham utilizar um peso e uma medida diferentes. Se o fizerem, uma vez mais a coerência será posta em causa e, de alguma forma, em saldo.
No interesse dos mais de 1500 trabalhadores que lá fora, nas nossas casas diplomáticas, continuam, de alguma forma, Portugal, lamentamos a atitude do actual Governo. Resta-nos a certeza de que nem sempre os homens têm memória curta e, na altura própria, pedirão contas aos autores da injusta revogação tomada.
Os governos não são mais o que dizem, mas o que fazem. O que este Governo fez traduz uma inequívoca falta de consideração para com esses trabalhadores. Dai a nossa estranheza e a nossa recusa.
Quando dizem que um diploma novo está em estágio, nestas coisas sou um pouco como o São Tomé ao afirmar que é preciso ver para crer. Quando um sopro de vida iluminar esse diploma, aqui estaremos para o aplaudir.
Até lá, juntamos o nosso protesto e manifestamos a nossa mais profunda solidariedade aos trabalhadores injustiçados. No meu caso concreto de deputado eleito pelos emigrantes, se o não fizesse estaria a trair o meu mandato e a iludir a confiança crescentemente manifestada pelos emigrantes no CDS.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Já agora, perguntaria à Mesa se o Sr. Secretário de Estado se inscreveu para usar da palavra.

Vozes do PSD: - Essa agora!

O Sr. Presidente: - Ainda não se inscreveu, Sr. Deputado, mas penso que irá usar da palavra.

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O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do MDP/CDE não podia deixar de se solidarizar com os trabalhadores das missões, consulados e embaixadas, que, desde há longos anos, lutaram para que se aprovasse um estatuto do pessoal técnico, técnico -profissional, administrativo e auxiliar.
Ao fim de todos estes anos (11 anos, como já aqui foi dito), esse estatuto acabou por ser aprovado. Apesar de não agradar totalmente, os trabalhadores iniciaram então o seu processo de intervenção na função pública.
Mas - há sempre um "mas" - o governo do Prof. Cavaco Silva, confirmando provas dadas de total desprezo por quem trabalha, revogou essa disposição. E fê-lo, quando muitos dos trabalhadores já estavam a optar pela sua integração na função pública. Assim funciona este Governo.
Não tenhamos dúvidas de que quem defende a 1iberalização dos despedimentos não pode certamente aceitar - e este Governo - não aceita - um estatuto que minimamente contemple, direitos dos trabalhadores.
O Governo diz que está a preparar nova legislação. Sabendo que a Assembleia da República chamara a si este problema e que os trabalhadores e os sindicatos já tinham protestado e feito exposições sobre ele, o Governo deveria - tinha a obrigação disso - ter informado a Assembleia da República das traves-mestras da sua nova legislação é dos critérios que havia a adoptar: Nada nos disse. Esperemos que o Sr. Secretário de Estado nos diga, se é que vai usar da palavra, para ver se ficamos um pouco mais esclarecidos.
Perante o que se passa, e uma vez que homericamente o Governo despreza a Assembleia da República, mas, ao mesmo tempo, vai criando confrontos artificiais, preparando não se sabe bem o quê, o panorama é actualmente o seguinte: um qualquer embaixador ou funcionário superior de uma qualquer embaixada ou consulado que não goste de um funcionário despede-o; um, qualquer embaixador ou funcionário superior que pretenda colocar um amigo despede um outro funcionário e sustituiu-o; uma qualquer mulher de embaixador que acorde mal disposta ou que não goste da cozinheira despede-a sem ter qualquer dificuldade; e assim por diante, e assim continuará a ser.
Já passaram 11 anos depois do 25 de Abril em que os direitos - dos trabalhadores foram consignados na Constituição, pelo que, Sr. Secretário de Estado, já é tempo de acabar com este panorama.
Não compreendemos, e gostaria que o Sr. Deputado me explicasse claramente a razão da revogação do decreto-lei que tinha sido aprovado. A situação é grave e não deixa de nos preocupar cada vez mais.
A atitude governamental revela - já o disse - um total desprezo pelos direitos dos trabalhadores e, como é evidente, é ditatorial.
Aliás, de acordo com a, sua intenção de, em nome de uma discutível flexibilização da economia, se pretender flexibilizar os despedimentos, temos sérias dúvidas de que o Governo irá contemplar os direitos dos trabalhadores na sua próxima legislação (ao, que parece), já que nem sequer se preocupou em ouvi-los quando procedeu à revogação do decreto-lei.
As críticas estão formuladas. Esperemos apenas que o Sr. Secretário de Estado dê a esta Câmara explicação às dúvidas que até agora todos nós temos levantado.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação.

O Sr. Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação (Eduardo Azevedo Soares): Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou proferir umas breves palavras, respondendo às duas intervenções que acabaram de ser produzidas e procurando situar a discussão deste problema na sua devida dimensão.
Já aqui ouvimos dizer que se andava a tratar disto há 11 anos. Como decorre do preâmbulo do diploma que fez aprovar, o Governo apenas se propõe um pouco mais de tempo para corrigir alguns aspectos que estavam em causa neste diploma. 11 anos é muito tempo, mas penso que é capaz de ser melhor esperar 2 ou 3 meses para que, em primeiro lugar, o diploma se torne mais facilmente exequível, uma vez que ele não é bem exequível e, em segundo lugar, principalmente para que sejam também protegidos interesses de outros trabalhadores.
O Governo não pôs em causa a questão de seguir ou não para diante a criação de vínculo à função pública, questão que, segundo parece, preocupou especialmente - e bem - os Srs. Deputados. Há um problema de primeiro provimento que, no entender do Governo, parece não acautelar neste diploma direitos de outros trabalhadores e, outras famílias de trabalhadores que, por acaso e circunstância, estão em Portugal e não no estrangeiro. Nada faz supor que se tenha de privilegiar uns em relação a outros.
No entender do Governo, o primeiro provimento destes funcionários, que, até à data, são considerados como funcionários sem vínculo à função pública, tem de ser garantido com a protecção de outros trabalhadores que são funcionários que neste momento, na Secretaria de Estado, já têm vínculo à função pública. Esta é uma questão mais importante, de entre outras, que levanta a aplicação do diploma que se pretendeu revogar.
Neste plano, o Governo pretende duas medidas fundamentais: em primeiro lugar, rever a questão do primeiro provimento; em segundo lugar, garantir as condições, de uma forma geral já previstas no primeiro diploma, da ligação destes funcionários à função pública. Para esse efeito, inclusive, está em negociações com os sindicatos representativos destes trabalhadores, com os quais, no espaço de 3 ou 4 dias, terá as primeiras reuniões.

O Sr. Presidente: - Para pedirem esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Jorge Lemos, João Corrregedor da Fonseca e Custódio Gingão.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação: permita-me, em primeiro lugar, que discorde da sua consideração quanto ao facto de os trabalhadores poderem aceitar que pelo simples facto de o problema se ter andado a arrastar ao longo de 10 anos ele se continuasse a arrastar.
A questão não é essa, Sr. Secretário de Estado. Os trabalhadores viram consagrado um estatuto. Pode não ser o melhor - creio que não está em causa para ninguém ser o melhor ou o pior, mas viram consagrado um estatuto. E o que eles vêem neste momento, inde-

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tendentemente das promessas governamentais, é que esse seu estatuto é pura e simplesmente revogado, sem alternativa. O Governo diz que está em preparação. Mas diz o nosso povo que "enquanto o pau vai e vem folgam as costas". As expectativas criadas continuam sem resposta.
Em segundo lugar, o Sr. Secretário de Estado sabia que o decreto-lei relativo ao estatuto estava pendente de apreciação na Assembleia da República, quer por iniciativa do meu partido, quer por iniciativa do PRD. Não queremos de modo nenhum pôr em causa a iniciativa própria do Governo, mas é nossa consideração que, nessas circunstâncias, o Governo deveria ter tido, pelo menos, a delicadeza de saber junto da Assembleia da República para quando previa a discussão do estatuto e se iriam ou não ser introduzidas propostas de alteração antes de, de uma maneira que consideramos discriminatória e sectária, avançar com a pura e simples revogação do mesmo.
Finalmente, gostaria de colocar-lhe a seguinte questão: considera o Sr. Secretário de Estado aceitável que, tendo havido a consagração legal de um conjunto de princípios e de direitos para uma determinada categoria profissional, se possa aceitar que, sem lhe dar nada em troca, ela seja pura e simplesmente revogada, ou seja, que se possa retirar o que estava inscrito e dar-lhes uma mão cheia de nada e outra de coisa nenhuma? Será isso um princípio correcto de legislar e o que o actual Governo pretende?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): O Sr. Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e Cooperação disse que é necessário, na óptica do Governo, corrigir alguns aspectos do decreto-lei em causa e que isso está em negociações com o sindicatos.
Tenho em meu poder uma série de ofícios dos sindicatos, os quais também já recebemos, e parece-nos que não é essa a opinião dos sindicatos.
Uma vez que o Governo entendia que devia corrigir alguns aspectos do decreto-lei em causa, pergunto ao Sr. Secretário de Estado se, em vez de ter revogado o Decreto-Lei n.º 451/85, não seria curial que o Governo tivesse chamado exactamente os representantes dos sindicatos para discutir com eles os aspectos que o Governo entendia que deveriam ser corrigidos.
Por outro lado, pergunto ao Sr. Secretário de Estado o que é que vai acontecer àqueles trabalhadores que já optaram pelo Estatuto da Função Pública. Na Europa, creio que, pelo menos, 50 trabalhadores já terão optado pelo Estatuto da Função Pública. O que é que vai acontecer nesta altura? Gostaria que nos dissesse algo sobre isto.
Já agora, coloco-lhe a seguinte questão: o Sr. Secretário de Estado tem conhecimento de que este problema já ultrapassou, em certa medida, as nossas fronteiras, que foi apresentada uma queixa ao Parlamento Europeu e que as instâncias deste já pediram a Portugal informações complementares, sendo exactamente o Parlamento Europeu que vai estudar este problema criado pelo Governo Português para toda uma classe de trabalhadores? O que é que o Governo tem para responder a uma questão destas?

Vozes do PCP: - Nada!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Custódio Gingão.

O Sr. Custódio Gingão (PCP): - Sr. Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e Cooperação, certamente que o Governo tinha conhecimento de que a Comissão de Negócios Estrangeiros, ao discutir este problema, pediu uma informação ao Governo do que pensava sobre a matéria. Nesse sentido, a Comissão enviou uma carta dirigida ao seu Ministério, perguntando para quando estaria prevista a saída do diploma e qual o seu conteúdo. Já passaram 10 dias e, tanto quanto sei, a Comissão ainda não teve resposta.
Não lhe parece, Sr. Secretário de Estado, que isto é uma falta de respeito pela referida Comissão da Assembleia da República?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A segunda questão que quero colocar-lhe é a seguinte: não está nem pomos em causa o Decreto-Lei n. º 451/85, que criou o vínculo à função pública destes trabalhadores. Se ele é de difícil aplicação, não lhe parece que o Governo deveria chamar os representantes dos trabalhadores para com eles discutir a melhor forma de aplicar esse mesmo estatuto e, ao mesmo tempo, informá-los de qual era o diploma que tinha como alternativa e de quando ele seria posto em vigor?
Todavia, o Governo fez precisamente o contrário: confrontou os trabalhadores com o facto consumado, ou seja, tirou-lhes precisamente aquilo que tinham e não lhes deu nada. Pensa o Sr. Secretário de Estado que esta é a melhor forma de trabalhar com os trabalhadores, neste caso concreto com aqueles que representam o Estado Português além - fronteiras?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação.

O Sr. Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação: - Foram aqui levantadas duas ou três questões e uma outra, salvo o devido respeito, já foi respondida na minha intervenção anterior. Faria agora apenas algumas precisões.
Começaria pelo problema da revogação. Considerando o momento em que o Governo tomou posse e a data que o diploma revogado impunha para a sua própria entrada em vigor, ou seja, para a produção das suas consequências, determinava-se uma medida cautelar que o Governo entendeu ser a da revogação.
Desde logo se entrou em contacto com representantes dos trabalhadores. Com efeito, estão marcadas para o próximo dia 12 reuniões com 2 sindicatos representativos destes trabalhadores, depois de ter havido trocas de impressões informais sobre esta matéria. Assim, estão garantidos, para o dia 12 deste mês, encontros, negociações formais com os sindicatos representativos destes trabalhadores.
Quanto à questão da resposta à Comissão, não estou habilitado a precisar os termos em que essa resposta não foi dada. Em todo o caso, estou em condições de poder garantir que não o foi por menor respeito à Comissão, como é evidente.

Vozes do PCP: - Só?

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, quero solicitar a V. Ex.ª que, nos termos do artigo 101.º, n.º 3, do Regimento, seja dado conhecimento aos nossos colegas que se encontram a trabalhar em comissões de que vamos proceder a uma votação e que seja accionada a campainha de chamada.

O Sr. Presidente: - Agradeço aos serviços o favor de irem junto das comissões a fim de informarem os Srs. Deputados que vamos proceder a uma votação de um requerimento.
Entretanto, vou pôr à votação o requerimento de baixa à respectiva comissão das ratificações n.ºs 37/IV, do PCP, e 49/IV, do PRD, sobre o Decreto-Lei n.º 451/85, de 28 de Outubro.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, creio que o processo de votação não pode ser esse. 0 requerimento que V. Ex.ª referiu tem a ver com um Decreto-Lei que neste momento não está em vigor. Neste momento, está em vigor um Decreto-Lei que revogou o Decreto-Lei n.º 451/85 e, portanto, do nosso ponto de vista o que terá que votar-se, em primeiro lugar, é projecto de resolução de recusa da ratificação n.º 53/IV relativa ao Decreto-Lei n.º 500-B/85 e, posteriormente, o requerimento de baixa à comissão das ratificações n.ºs 37/IV e 49/IV relativas ao Decreto-Lei n.º 451/85.

O Sr. Presidente: - É que do processo de agendamento constava, em primeiro lugar, a apreciação das ratificações n.ºs 37/IV e 49/IV relativas ao Decreto-Lei n.º 451/85, de 28 de Outubro, e só depois é que constava a apreciação da ratificação n.º 53/IV relativa ao Decreto-Lei n.º 500-B/85, de 27 de Dezembro, que revoga o Decreto-Lei n.º 451/85, de 28 de Outubro. De maneira que vamos proceder desse modo Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, salvo melhor entendimento, não poderemos proceder desse modo, uma vez que não podemos fazer...

O Sr. Presidente: - Devo dizer-lhe que aceitei a sua objecção, Sr. Deputado. Estava apenas a explicar a razão do meu equívoco.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Com certeza, Sr. Presidente.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, devo dizer-lhes que foram feitas as diligências necessárias para que os deputados que estavam a trabalhar em comissões regressassem ao Plenário, pelo que estamos em condições de proceder à votação de um projecto de resolução, subscrito por deputados do PS, do PRD, do PCP, do CDS e do MDP/CDE, do seguinte teor:

1 - A Assembleia da República recusa a ratificação do Decreto-Lei n.º 500-B/85, de 27 de Dezembro que revoga o Decreto-Lei n.º 451/85, de 28 de Outubro, que aprova o estatuto do pessoal técnico, técnico-profissional, administrativo e auxiliar ao serviço das missões, embaixadas e consulados de Portugal.
2 - A recusa da ratificação do decreto-lei referido no número anterior implica a repristinação das normas constantes do Decreto-Lei n.º 451/85, de 28 de Outubro.

Vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PRD, do PCP, do CDS, do MDP/CDE e da deputada independente Maria Santos e votos contra do PSD.

O Sr. Presidente: - Vamos agora votar um requerimento apresentado...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, acabámos de proceder à votação na generalidade do projecto de resolução; temos agora que proceder à votação na especialidade e à votação final global para que o processo fique completo.

O Sr. Presidente: - Tem toda a razão, Sr. Deputado.
Srs. Deputados, vamos votar o n.º 1 do projecto de resolução.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PRD, do PCP, do CDS, do MDP/CDE e da deputada, independente Maria Santos e votos contra do PSD.

O Sr. Presidente: - Vamos votar o n.º 2.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PRD, do PCP, do CDS, do MDP/CDE e da deputada independente Maria Santos e a abstenção do PSD.

O Sr. Presidente: - Vamos proceder à votação final global do projecto de resolução.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PRD, do PCP, do CDS, do MDP/CDE e da deputada independente Maria Santos e votos contra do PSD.

O Sr. Presidente: - Penso que estamos em condições de votar agora o requerimento, oportunamente apresentado na Mesa ...

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O Sr. António Vitorino (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. António Vitorino (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penso que não deve haver lugar à votação do requerimento apresentado pelo Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português porquanto, salvo melhor opinião, nos termos do artigo 199.º do Regimento da Assembleia da República, a revogação do Decreto-Lei n.º 451/85 determina o encerramento automático do processo de ratificação que a ele se refere.
A recusa de ratificação do Decreto-Lei n.º 500-B/85 não produz automaticamente efeitos repristinatórios. Só quando a Assembleia da República se pronuncia abertamente sobre esse facto é que os efeitos repristinatórios podem ser produzidos. Pois bem, assim aconteceu, o que significa que a Assembleia da República emitiu uma vontade iniludível de repor em vigor, integralmente, o Decreto-Lei n.º 451/85, pelo que neste momento não há lugar à abertura de qualquer ratificação deste decreto-lei, o qual só poderá ser alterado através de projecto de lei que introduza alterações no mesmo normativo.
Portanto, penso que não há que votar o requerimento de baixa à comissão de qualquer ratificação relativa ao Decreto-Lei n.º 451/85, porque inexistente; o que há é que solicitar aos Srs. Deputados do Partido Comunista que transformem as propostas de alteração que apresentaram em sede de ratificação num projecto de lei autónomo de alteração do Decreto-Lei n.º 451/85.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penso que o Sr. Deputado António Vitorino levantou uma questão inteiramente pertinente. De facto, nos termos regimentais, quando um diploma sujeito a ratificação é revogado, o processo cessa automaticamente. Trata-se, salvo erro - e estou a citar de cor - do artigo 199.º do Regimento da Assembleia da República.
Assim sendo, e de modo a evitar-se que o processo legislativo, ou seja, que o processo de ratificação introduza um elemento adicional de insegurança na ordem jurídica, penso que, de facto, a solução preconizada, isto é, a de haver iniciativas legislativas que tomem como base o decreto-lei ora reintroduzido na ordem jurídica portuguesa, será, necessariamente, a melhor solução.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, não pretendemos pôr em causa as palavras do Sr. Deputado António Vitorino e inclinamo-nos a pensar que ele terá razão na sua argumentação.
Ora bem, este caso ocorre pela primeira vez na Assembleia da República, pelo que, do nosso ponto de vista, valeria a pena não fecharmos já o processo para permitirmos que esta matéria seja analisada na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias a fim de esta sobre ela emitir um parecer, depois de devidamente ponderado e de todos os elementos serem considerados, e, oportunamente, o processo ser trazido a Plenário.

O Sr. Cardoso Ferreira (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Cardoso Ferreira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para não fazer perder mais tempo à Câmara, declaro que a bancada do Partido Social-Democrata partilha do entendimento dos Srs. Deputados António Vitorino e Magalhães Mota. Nesse sentido, muito claramente, aponta o artigo 199.º do Regimento.

O Sr. Presidente: - Devo esclarecer a Câmara que tenho alguma dificuldade em seguir a interpretação dos Srs. Deputados Magalhães Mota e António Vitorino, sobretudo quando invocam o artigo 199.º do Regimento. 15to porque julgo que essa revogação é a que resulta da iniciativa tomada pelo Governo e não da iniciativa tomada pelos partidos políticos.
Entretanto, como o caso pode ter alguma incidência, importaria estabelecer, porventura, critérios mais seguros sobre a matéria, pelo que vou deixar esta matéria em suspenso para que, em conferência de líderes, o assunto seja tratado.
Sr. Deputado António Vitorino, agradecia que me dissesse a sugestão que apresentei tem ou não algum interesse.

O Sr. António Vitorino (PS): - Sr. Presidente, o artigo 199.º do Regimento diz que:

Se o Governo, em qualquer momento, revogar o Decreto-Lei objecto de apreciação, o respectivo processo é automaticamente encerrado.

Ora bem, foi isso que se verificou. Através do Decreto-Lei n.º 500-B/85, o Governo revogou o Decreto-Lei n.º 451/85, o que determinou o encerramento imediato do processo de ratificação do Decreto-Lei n.º 451/85.
A repristinação não é automática; depende da vontade da Assembleia da República. A Assembleia da República manifestou, pois, através da votação do projecto de resolução, a vontade de reposição integral do Decreto-Lei n.º 451/85 em vigor, pelo que, salvo melhor opinião, a alteração deste decreto-lei só pode ocorrer através de uma iniciativa legislativa autónoma.
Seja como for, V. Ex.ª entende dever submeter a questão à ponderação da conferência de lideres e não somos nós quem levantaremos qualquer objecção a esse procedimento, desde que não se vote neste momento o requerimento do Partido Comunista de baixa à comissão.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, eu não tinha entendido que teria havido uma revogação por parte do Governo do decreto-lei em apreço. Dado esse pres

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suposto, V. Ex.ª tem realmente toda a sua doutrina muito bem arquitectada e está, quanto a mim, na interpretação jurídica ao facto, absolutamente segura. Efectivamente, o requerimento não deve ser apreciado nem votado. Em todo o caso, na próxima conferência de líderes, esta questão poderá ser de novo abordada.

O Sr.Jorge Lemos, (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, mais uma vez referimos que não vamos pôr em causa a argumentação expendida pelo Sr. Deputado António Vitorino e pensamos que se trata de uma interpretação correcta do artigo 199.º do Regimento.
A dúvida que se nos coloca é a seguinte: da ordem do dia de hoje, para além da ratificação n.º 53/IV, relativa ao Decreto-Lei que acabámos de revogar constava
também a apreciação de duas anteriores ratificações:
Portanto, até ao momento, nunca surgiu qualquer problema no agendamento dessas ratificações que se referiam ao Decreto-Lei n.º 451/85. Foi nesse pressuposto
que apresentámos o requerimento de baixa à comissão do referido Decreto-Lei. De qualquer modo, gostaríamos que a questão não se fechasse aqui e que, ou em conferência de líderes, ou na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, pudesse ser ponderada com mais profundidade para que a Assembleia pudesse fazer jurisprudência sobre a matéria.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, já disse que, em conferência de líderes, iríamos analisar melhor está questão.
Srs. Deputados, passamos á discussão na generalidade dos projectos de lei n.º 48/IV, do PCP, 92/IV, do CDS, e 94/IV, do PS, sobre a Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado.
Vai proceder-se à leitura de um parecer da Comissão de Economia, Finanças e Plano.

Foi lido. É o seguinte:

Parecer da Comissão de Economia, Finanças e Plano.

Assunto: Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado - Processos de Urgência apresentados pelos Grupos Parlamentares dos Partidos Socialista e Comunista Português.

1 - Pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista, foi formulado um pedido de urgência para apreciação do projecto de lei, n.º 94/IV, o qual visa introduzir novas regras na actual Lei de
Enquadramento do Orçamento do Estado.
2 - Pelo Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, foi, igualmente, requerida a adopção do processo de urgência para a apreciação do projecto de lei n.º 48/IV, sobre o mesmo assunto.
3 - Também o Grupo Parlamentar do Centro Democrático Social, no seu projecto de lei n.º 92/IV, preconiza uma nova Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado.
4 - A Comissão de Economia, Finanças e Plano, na sua reunião de 15 do corrente, já tinha deliberado nomear uma subcomissão para apreciar,
conjuntamente, os três projectos de lei citados nos pontos anteriores, tendo sido fixado o prazo de 15 dias, a contar daquela data, para apresentação, pela subcomissão, do competente relatório.
5 - Nestes termos, esta Comissão nada tem a opor a que seja dado bom acolhimento aos pedidos de urgência formulados pelos Grupos Parlamentares dos Partidos Socialista e Comunista Português.

Palácio de São Bento, em 16 de Janeiro de 1986.- O Deputado Relator, Ivo Jorge, de Almeida dos Santos Pinho.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão o parecer agora lido.
Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Machete.

O Sr. Rui Machete (PSD): - Sr. Presidente, o parecer agora lido refere-se ao pedido de urgência para apreciação dos projectos de lei n.ºs 92/IV e 94/IV e
suponho que esse parecer já foi objecto de votação, uma vez que vamos de, seguida, discutir os próprios projectos de lei.

O Sr. Presidente: - Tem toda a razão, Sr. Deputado, pelo que se procederá à respectiva rectificação.
O Sr. Secretário informa-me de que não dispõe de qualquer outro parecer. Assim sendo, e em obediência ao que lhe havia solicitado, limitou-se a ler o relatório
presente nos autos.

O Sr. Rui Machete (PSD): - Se o Sr. Presidente me permite, o parecer foi entregue na Mesa, o mais tardar, hoje de manhã visto que o pedido de urgência gozou igualmente de grande urgência na elaboração do respectivo parecer.

O Sr. Presidente: - Enquanto procuramos o parecer em questão, antecipamos um pouco o intervalo regimental dos nossos trabalhos. A sessão recomeçará às 17 horas e 45 minutos.
Devo avisar os Srs. Deputados de que hoje ainda temos muito trabalho a realizar, uma vez que há tempos globais a cumprir, pelo que temo não ser possível terminarmos a sessão antes das 20 horas; a não ser que o intervalo não se prolongue para além das 17 horas e 45 minutos.
Srs. Deputados está suspensa a sessão.

Eram 17 horas e 22 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 18 horas e 5 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai proceder-se à leitura de um parecer da Comissão de Economia, Finanças e Plano.

Foi lido. É o seguinte:

Comissão de Economia, Finanças e Plano.

Assunto: Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado - projectos de lei de alteração apresentados pelos Grupos Parlamentares dos Partidos Socialista, Comunista e do Centro Democrático Social.

A Subcomissão nomeada na reunião de 15 de Janeiro passado da Comissão de Economia, Finan-

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ças e Plano, no âmbito das funções que lhe foram cometidas, procedeu à análise dos três projectos de lei de alteração da Lei de Enquadramento do Orçamento (Lei n.º 40/83, de 13 de Dezembro) que foram apresentados na Assembleia da República.
Ponderado o conteúdo dos três projectos de lei em apreciação e após a substituição do preâmbulo do projecto do Partido Comunista Português, a seu pedido, esta subcomissão entende por unanimidade que os três projectos de lei estão em condições de ser aprovados na generalidade.

Palácio de São Bento, 5 de Fevereiro de 1986. - A Subcomissão: Próspero Luís (PSD) Nogueira de Brito (CDS) - Helena Torres Marques (PS) - Octávio Teixeira (PCP) - Ivo Pinho (PRD).

O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Machete.

O Sr. Rui Machete (PSD): - Sr. Presidente, desejo saber se já foram distribuídas cópias da modificação, solicitada pelo Partido Comunista Português, do preâmbulo do seu projecto de lei, bem como da modificação, solicitada pelo CDS, ao seu projecto de lei inicial.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Rui Machete, em 4 de Fevereiro de 1986, as referidas substituições foram feitas, publicadas e distribuídas, tendo dado entrada nos Serviços de Apoio ao Plenário em 5 de Fevereiro de 1986.

O Sr. Rui Machete (PSD): - Se o Sr. Presidente me permite, referirei que suponho não ter sido feita a respectiva distribuição.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, diz-me o Sr. Faustino, responsável pelos Serviços de Apoio ao Plenário, que as modificações em questão se encontram incluídas nas pastas que são diariamente distribuídas aos grupos parlamentares.

O Sr. Rui Machete (PSD): - Sr. Presidente, encontram-se lá as duas alterações que referi?

O Sr. Presidente: - Não, Sr. Deputado. Das pastas apenas conta a alteração requerida pelo PCP.
Quanto à outra que V. Ex.ª referiu, solicitada pelo CDS ao seu respectivo projecto de lei, foi entregue em 30 de Janeiro de 1986 e procedeu-se à respectiva distribuição.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ivo Pinho.

O Sr. Ivo Pinho (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Pelos Partidos Socialista, Comunista e do Centro Democrático Social foram apresentados projectos de revisão da Lei n.º 40/83, de 13 de Dezembro, a qual fixa "as regras referentes ao Orçamento do Estado, os procedimentos para a sua elaboração, discussão, aprovação, alteração e fiscalização" e, ainda, a responsabilidade orçamental que impende sobre os titulares de cargos políticos e funcionários e agentes do Estado e demais entidades públicas, pelas acções e omissões que pratiquem no exercício das suas funções de execução orçamental.
Apesar de não ter apresentado um projecto autónomo de revisão da Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado, o PRD tem participado activamente nos trabalhos da Subcomissão especializada constituída no âmbito da Comissão de Economia, Finanças e Plano e mandatada para apreciar os projectos aludidos. Tais projectos visam, no essencial, cobrir lacunas e ou corrigir insuficiências e deficiências da lei vigente sendo que, todos eles, apesar das assinaláveis diferenças de conteúdo e de âmbito que apresentam, apontam para o reforço dos poderes de fiscalização, ex ante e ex post, da Assembleia da República enquanto órgão fundamental da "autoridade orçamental" do País. Esta acaba por ser a questão angular dos projectos de revisão, muito embora aspectos como o estrito cumprimento de certas regras orçamentais - designadamente as da especificação e da universalidade -, a explicitação da incidência orçamental dos benefícios concedidos pelo Estado e o controle das condições em que o Tesouro tem operado constituam, igualmente, matérias relevantes a considerar na revisão registe-se, ainda, que da discussão já havida na Subcomissão, resultou a conveniência de se promover a modificação da actual lei de enquadramento em domínios não previstos nos projectos apresentados - é o caso, fundamentalmente, das disposições respeitantes às denominadas "alterações orçamentais".
A complexidade e especificidade da matéria em apreço requerem, para além de competência técnica, bom senso, sentido de responsabilidade e pragmatismo. Não basta fazer uma boa lei, é preciso que a mesma seja exequível. Para tanto, o Governo deverá participar, empenhadamente, na iniciativa legislativa em curso. Até ao momento, não foi possível contar com o indispensável contributo de membros do executivo. Admite-se - e aceita-se - que o processo de preparação das Grandes Opções do Plano e do Orçamento do Estado para 1986 tenha inviabilizado a participação dos membros do Governo nos trabalhos da subcomissão mas, sublinha-se, o papel do Executivo é fundamental podendo inclusivamente traduzir-se na apresentação de propostas concretas de correcção e ou adaptação da actual lei de enquadramento em função de normas ou procedimentos comunitários eventualmente aplicáveis. O Governo e a Assembleia têm, em matéria de gestão orçamental, funções distintas, mas complementares, afigurando-se imperativo optimizar a sua actuação conjunta.
O PRD votou favoravelmente os pedidos de urgência apresentados pelos Partidos Socialista e Comunista para a apreciação das suas propostas. Fê-lo porque considerou não dever obstaculizar a rápida aprovação de uma nova lei mais consentânea com os poderes e as responsabilidades que, nesta área, incumbem à Assembleia. Porém, a já aludida complexidade dos trabalhos aliada à vontade de todos os partidos representados na Subcomissão de produzirem um trabalho não apenas meritório, mas socialmente útil e relativamente durável, tem evidenciado a necessidade de se caminhar depressa, mas não à pressa. É por isso que o PRD considera que os trabalhos da Subcomissão deverão ser interrompidos enquanto a Comissão de Economia, Finanças e Plano procede à apreciação - sem dúvida prioritária - da proposta de Orçamento do Estado para 1986.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao aprovar na generalidade, sem reservas nem preconceitos, todos os projectos apresentados, o PRD pretende patentear a sua

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vontade de participar, construtivamente, na revisão da Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado, a qual terá de ser suficientemente ampla para não ser sistematicamente derrogada pelos sucessivos decretos orçamentais e suficientemente específica para, efectivamente, definir, com o necessário rigor, as bases fundamentais da preparação, execução e fiscalização do Orçamento do Estado.
Nesse contexto, o PRD proporá, na discussão na especialidade, as disposições e alterações que considerar necessárias para maximizar a eficácia global - e potenciar o rigor e a verdade - da gestão das finanças públicas do País.

Aplausos do PRD e dos deputados do PS Helena Torres Marques e João Cravinho.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Cravinho.

O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começarei por exprimir preocupação pelo risco de desvalorização deste debate. Para alguns, tratar-se-ia de matéria árida, de alcance meramente processual, sem possibilidade de ganhar o aparato espectacular, a intensidade dramática dos grandes confrontos políticos. Em consequência, bastar-lhe-ia uma corrida rápida em sessão plenária.
Não é esta a nossa opinião. Nas instituições parlamentares ocidentais, o processo orçamental é o mais importante de todos os processos correntes de relação interinstitucional Governo-Parlamento. Por razões históricas, pois o consentimento do imposto é a matriz original da instituição parlamentar. Por razões económicas e sociais, visto que nenhum outro processo anual é mais pesado de consequências sobre o bem-estar do País. Por razões políticas, uma vez que nenhum outro processo o sobreleva na sua capacidade de revelador das preferências profundas do Governo e do Parlamento.
Por estas razões, em todos os países de tradição democrática o enquadramento do processo orçamental alinha entre os poucos normativos fundamentais de salvaguarda das mútuas responsabilidades do Parlamento e do Executivo na gestão pública. A revisão constitucional de 1982 colocou-nos nessa mesma orientação. A Lei n.º 40/83, de 13 de Dezembro, iniciou a construção dos normativos correspondentes, estando essa legislação muito carecida de aperfeiçoamentos a extensões que nos aproximem das práticas seguidas nesta matéria pela quase totalidade dos países europeus. As propostas do PS vão nesse sentido. A defesa que delas faremos conjugará reflexões segundo quatro eixos.
O primeiro eixo de reflexão assenta na necessidade de obter consensos largos, até ao limite da defesa da dignidade das nossas responsabilidades, como já aqui foi afirmado em outra ocasião. Deve-se ao CDS a iniciativa que conduziu à Lei n.º 40/83. O seu aperfeiçoamento é hoje objecto de projectos do PCP, do CDS e do PS. Sendo esta uma legislação processual fundamental para a consolidação e prestígio das instituições democráticas, a busca do consenso é a primeira obrigação que queremos assumir, desejando envolver nessa pesquisa todas as bancadas e o Governo.
A segunda linha de reflexão parte do princípio de que a reforma do enquadramento do Orçamento deve ser um processo gradual, um processo evolutivo. A reforma do processo orçamental deve evoluir à medida que crescer a, nossa própria capacidade institucional para dominar os complexos problemas de informação, de debate, de decisão e de fiscalização, inerentes à preparação é à execução do Orçamento do Estado.
A vontade de reformar sistemas institucionais tão complexos tem de se apoiar numa dinâmica gradualista de aperfeiçoamento continuado.
O terceiro eixo de reflexão leva-nos a pensar que o actual modo de intervenção da Assembleia da República no processo orçamental é excessivamente incipiente face às suas responsabilidades constitucionais. Deste modo, sendo razoável seguir uma via evolutiva de aperfeiçoamento, é também essencial evoluir rapidamente, introduzindo no mais curto espaço de tempo, inovações de grande envergadura no relacionamento da Assembleia com o Governo. Se não o fizermos, a Assembleia da República será inevitavelmente governamentalizada, como já vem sucedendo, refugiando-se em rituais fastidiosos. Não nos iludamos: o que está em jogo é a razão de ser, o mérito da própria Assembleia da República.
Por isso, o último eixo de reflexão tem por certo que só poderemos melhorar o processo orçamental se nós próprios, deputados da Assembleia da República, formos capazes de melhorar o nosso trabalho, dando-lhe maior qualidade e organizando muito mais eficazmente o apoio à informação e à decisão. Não poderemos orgulhar-nos da nossa condição de membros da velha Europa, sem colher na experiência, nossa e alheia, a lição fundamental de que o pior dos subdesenvolvimentos, raiz de todos os outros, é o subdesenvolvimento das instituições democráticas. O bom entendimento, desta lição tem de estar sempre presente na Assembleia da República.
Apoiado, neste quadro de reflexão, quem poderá estar satisfeito com o actual enquadramento do Orçamento?
Nos próximos anos, o Orçamento do Estado enfrentará graves problemas, para cuja resolução a Assembleia da República tem de contribuir construtivamente em colaboração, responsável com o Governo.
Temos um défice estrutural de realizações, no sentido de que existe uma massa enorme de necessidades públicas a satisfazer pelo Orçamento, para as quais não se encontram recursos. Apesar disso, é evidente que teremos de manter sob estrito controle o défice financeiro. Os juros da dívida pública em 1986 excederão 400 milhões de contos. Neste contexto, é preciso mobilizar todos os instrumentos úteis de colaboração da Assembleia da República e do Governo no sentido de gerir equitativa e racionalmente os, processos de obtenção de receitas e de realização de despesas.
Assim, o controle do défice não pode ser entendido no sentido repressivo das despesas justificadas. O controle do défice tem de ser tomado no sentido de não
desperdiçar inutilmente receitas que a equidade manda cobrar. E, o desperdício dessas receitas tanto pode vir por via de perdas de receita por concessão de benefícios, sem mérito económico e social, como por via de despesas sem contrapartida em utilidades que as justifiquem.
Posto deste modo o problema do défice, é urgente e importante que a Assembleia da República não continue a descurar, como até aqui, o controle das despesas fiscais, isto é, das perdas de receita por concessão de benefícios. Presumo que teremos, nesta tarefa, toda a colaboração do Governo, designadamente do Sr. Primeiro-Ministro, que, em 1980, quando era Minis-

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tro das Finanças e do Plano no governo do Dr. Sá Carneiro, emitiu o Despacho Normativo n.º 310/80 na sequência de outras medidas, pelo visto sem efeitos positivos, tendentes a rever o sistema de incentivos.
Remeto a Câmara para a leitura do preâmbulo desse despacho, no qual se faz a defesa da introdução das despesas fiscais como o critério de avaliação da equidade da concessão dos benefícios.
Nos termos desse despacho, se ele foi aplicado, a Administração, hoje em dia, conhece em pormenor e segundo vários critérios de classificação, as perdas de receitas por concessão de benefícios fiscais de natureza temporária. Importa também que a Assembleia de República conheça essas perdas de receita. 15to é, é fundamental tratar as despesas fiscais como parte integrante do Orçamento do Estado sujeito a deliberação da Assembleia da República. As despesas fiscais integram-se na reserva de competência da Assembleia da República. Poderemos continuar a demitir-nos da sua apreciação sistemática?
Se quisermos controlar o défice do Orçamento do Estado teremos de controlar as despesas fiscais, sem apriorismos negativistas, mas também sem laxismos irresponsáveis.
As despesas fiscais são um dos meios orçamentais de atingir os objectivos que o Orçamento prossegue. Pela sua origem, contribuem tanto para o défice como as despesas em dinheiro. O facto de permanecerem invisíveis aos olhos do cidadão comum não deve cegar nem a Assembleia nem o Governo. É preciso acabar com essa invisibilidade, tanto mais que a sua concessão é condicionada pela obtenção de figuras de mérito que raramente alguém fiscaliza ou avalia a posteriori. 15to é, nessas áreas a Assembleia da República tem muitas vezes apreciado no Orçamento o secundário e tem omitido a apreciação do essencial.
Um outro problema que a preparação do Orçamento deve esclarecer é o de saber qual a margem real de decisão de que gozam efectivamente o Governo ou a Assembleia da República. A exemplo do que sucede em outros países, seria útil distinguir as despesas propostas em função de compromissos herdados, em função "do peso do passado", das despesas propostas em função de novas políticas ou decisões pontuais. O Partido Socialista deseja avançar nesse caminho. Para esse efeito, propusemos a adopção do princípio da revisão automática, a prazos certos, dos fundamentos legais da concessão de benefícios. Ao método da habitual nomeação de uma comissão encarregada de descobrir o impossível sistema ideal e perfeito prefere-se a revisão gradual, mas sistemática e criteriosa. Se a nossa proposta fosse adoptada, em 4 anos estaria concluído um ciclo de revisão integral, sem prejuízo de se continuar a introduzir todos os anos novos aperfeiçoamentos.
Já se tem dito que o Orçamento português é, essencialmente, um orçamento de despesas já inexoravelmente comprometidas por força de decisões passadas ou de vínculos legais. Não seria útil reflectir em conjunto sobre as consequências dessas limitações sobre orçamentos futuros? Não seria essencial ganhar consensos sobre o modo de evitar para o futuro o crescimento desproporcionado do peso do passado? Poderemos pôr estas interrogações a propósito do controle do défice. Interrogações idênticas se poderão pôr a propósito dos encargos com o pessoal. Sabe-se que se gastam cerca de 300 milhões de contos, por ano, com encargos com pessoal e todos os anos vem o voto piedoso de fechar o ingresso no funcionalismo público. Bastará proporcionar o simples fecho geral de ingressos? Parece-me que não. Uma coisa é o rigor e a disciplina, a contenção; outra coisa, bem diferente, será a ordem cega de quem não quer nem deseja saber para não ter de ponderar e escolher.
Assim sendo, é legítimo que em sede de apreciação do Orçamento surja um relatório fundamentado sobre a política de pessoal do sector público administrativo e as suas consequências sobre os Orçamentos do Estado a 2 ou 3 anos de vista. Proporemos medidas nesse campo. Noutros campos, como neste, a questão essencial continuará sendo, por muitos e largos anos, como fazer mais e melhor com menos encargos.
O alargamento da margem de manobra para novas políticas pode e deve resultar tanto da reorganização de serviços como da descontinuidade de actividades que perderam justificação. A actual prática de impor economias e aumentos de produtividade por cortes uniformes de verba tem evidentes limitações. Seria mais eficaz organizar processos de avaliação de determinados serviços e actividades escolhidos com critério! Por exemplo, no âmbito do processo orçamental, o Governo poderia seleccionar, em cada ano, um certo número de áreas funcionais responsáveis por uma determinada percentagem da despesa sobre as quais faria propostas orçamentais baseadas em estudos de medidas conducentes a economias e aumentos de eficiência. Processo idêntico poderia ser seguido pela Assembleia da República no âmbito da fiscalização da execução orçamental, com incidência obrigatória na apreciação dos correspondentes Orçamentos em anos futuros.
Esta orientação liga de uma maneira inovadora a preparação e execução do Orçamento à reforma administrativa, também ele um processo sistemático, contínuo e participado que deve ser organizado em articulação com o processo orçamental. E muito duvidoso que se possa fazer a reforma administrativa por via da criação do Ministério ou Secretaria de Estado da Reforma Administrativa. Não seria mais sensato pôr a funcionar os processos de fiscalização democrática, mediante mecanismos abertos de auditoria e de decisão a que a Assembleia da República não deveria estar alheia?
Esta reflexão levanta a questão da articulação Assembleia da República-Governo. Não se trata de invadir a esfera do Executivo. Trata-se de dar à Assembleia a possibilidade de ela ser mais do que uma simples câmara de eco ou de secundária deriva.
A melhoria do enquadramento orçamental tem de se basear na nítida demarcação das tarefas que cabem ao Governo e à Assembleia da República. Quem tem a iniciativa do processo é o Governo, mas quem vota o Orçamento é a Assembleia da República. Quem lhe dá a execução é o Governo, mas quem o fiscaliza, em última instância, é a Assembleia da República. Um dos problemas frequentemente evocados é o de saber qual é o nível a que os parlamentos devem situar o seu poder de fixação das despesas. No que nos diz respeito, não é útil dar à Assembleia da República o poder de fixar as despesas em todo o seu pormenor. A flexibilidade necessária à boa governação deve permitir ao Executivo alguma margem de manobra na reafectação de verbas. Desse ponto de vista, a situação actual poderá corresponder a uma boa repartição de tarefas entre a Assembleia da República e o Governo se se verificarem duas condições: em primeiro lugar, uma informação

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muito mais abundante e precisa; em segundo lugar, um acompanhamento e uma fiscalização sérios. Estas duas condições estão longe de serem satisfeitas, mesmo em situações elementares. Portanto, a manutenção da votação das despesas a nível de desdobramento intermédio exigirá o aperfeiçoamento drástico dos mecanismos de informação, de acompanhamento e de fiscalização ao dispor da Assembleia da República. A excepcional importância deste tema justifica que em outra iniciativa legislativa nos ocupemos dele. Por agora bastará dizer que votar um orçamento propício a uma gestão flexível não pode continuar a ser idêntico a votar um orçamento na ignorância do que podem e devem fazer os serviços financiados pelos dinheiros públicos.
Uma outra objecção que acompanha o pedido de mais informação é a de que corremos o risco de inundar a Assembleia da República sob um mar de informação dispersa e insusceptível de ser dominada. Prevenindo esse risco, exige-se a apresentação de uma síntese dessa informação, organizada nos mesmos termos do Orçamento, para além do envio das informações pormenorizadas que deverão ser estudadas em pormenor pelas comissões especializadas. Deste modo será possível dominar a quantidade de material pedido, sintetizando-o no essencial e aprofundando-o na direcção que melhor responda às necessidades de cada uma das comissões especializadas. É o que sucede em França, onde a Assembleia e o Senador elaboram, a propósito do Orçamento, mais de 200 relatórios de exame orçamental: O Parlamento Francês recebe cerca de 300 documentos preparatórios com mais de
30 000 páginas de texto. Quererá o Parlamento Português declarar-se incapaz de absorver mais do que 3 ou 4 centenas de páginas? O actual enquadramento do
processo orçamental estipula apenas as datas limite da apresentação da proposta governamental - 15 de Outubro - e da sua votação - 15 de Dezembro. Estas
normas não garantem tempo suficiente para que a Assembleia da República possa desempenhar-se correctamente das suas responsabilidades. Podemos procurar
a solução desse problema antecipando a data limite de apresentação da proposta orçamental, ou enriquecendo o calendário do processo orçamental mediante a
introdução de certas fases intermédias, ou ainda conjugando as duas anteriores sugestões. Por exemplo, admitindo que o Governo desencadearia o processo administrativo de preparação do Orçamento no primeiro trimestre, seria possível submeter à Assembleia da República, até 1 de Junho, uma exposição documentada sobre a orientação geral da proposta de Orçamento, para o ano seguinte, tendo em atenção as previsões macro económicas a curto e médio prazos. O debate dessa
orientação geral na Comissão de Economia, Finanças e Plano, e eventualmente no Plenário, ainda que sem ser objecto de voto, seria um teste precioso para o afinamento da proposta final, no interesse do bom relacionamento institucional entre a Assembleia da República e o Governo.
Outras vias de solução poderiam consistir, em antecipar a obtenção de certos elementos informativos e mesmo de certos elementos integrantes do Orçamento do Estado, a título de anexo. No debate na especialidade exploraremos esses e outros meios susceptíveis de melhorar o processo orçamental.
Por razões de oportunidade reservam-se outras sugestões para futuros debates. Entre elas encontram-se medidas referentes, designadamente, à articulação entre
o curto e o médio prazos, através do melhor enquadramento orçamental de programas plurianuais e de introdução de previsões de receitas e despesas a 3 anos de vista; entre a descentralização e a desconcentração regionais e a ventilação espacial das despesas públicas.
Deixaremos ainda para outra oportunidade a temática do controle de execução e da organização da tomada de contas. A Assembleia da República não pode esquecer que o controle da execução e a tomada de contas fazem parte integrante do processo orçamental. Temos aqui uma lacuna muito grave que urge preencher.
Mas tudo isto põe também o problema dos meios à disposição da Assembleia da República. Suponho que teremos de nos debruçar sobre este problema a fim de reforçar a nossa capacidade de obtenção de informação e de análise do seu conteúdo. Como se escreveu recentemente num relatório parlamentar italiano, para além do esforço próprio dos deputados, serão o nível, a eficiência das estruturas de informação e de consulta que determinarão o grau real da autonomia dos Parlamentos em confronto com Executivos que têm ao seu dispor os imensos recursos técnico-profissionais dos ministérios, das empresas públicas e das várias instituições que gravitam na órbita dos governos.
Se a Assembleia da República não inverter o actual estado de coisas, acabará por ficar subordinada à vontade do Governo, perderá o mérito e prestígio. Que ninguém tenha ilusões a este respeito. A consciência que todos temos desta eventualidade, o sentido das responsabilidades constitucionais que nos incumbem serão certamente suficientes para que se produzam as reformas necessárias à consolidação das instituições democráticas. É neste pano de fundo que inscrevemos o debate sobre a revisão da Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado e estamos dispostos a dar toda a nossa colaboração para o aperfeiçoamento dos mecanismos existentes.

Aplausos do PS e de alguns deputados do PSD, do PRD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vou pedir para se encerrar o processo eleitoral. Se algum Sr. Deputado não tiver ainda votado, agradeço que o faça desde já. Peço aos serviços o favor de deslocarem as umas para a sala do Conselho de Ministros.
Peço ainda aos Srs. Deputados Valdemar Alves, Belmiro Correia, Carlos Luís, Aloísio Fonseca, João Abrantes, Custódio Gingão, Manuel Queiró, Barbosa da Costa e Sousa Pereira o favor de ajudarem os Srs. Deputados escrutinadores a fazer escrutínio o mais rápido possível, o qual se processará na sala do Conselho de Ministros.
Para uma intervenção, tem apalavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: "Lei reforçada" como a designa o Prof. Doutor Sousa Franco, ou "lei fundamental", "lei quadro", "lei directiva", integradora de outras leis, ou programando outras leis, como preferem outros, a Lei de Enquadramento do Orçamento deverá, sem dúvida, estar ao abrigo de constantes e frequentes alterações.
Podendo ou devendo também dizer-se que a sua violação é geradora de uma ilegalidade especial, de uma autêntica inconstitucionalidade indirecta, impõe-se que a sua revisão seja especialmente ponderada.

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Tal não significa, porém, ao menos no entendimento do meu partido, que nos devamos conformar com soluções que já se revelaram menos ajustadas à realidade ou devamos desistir de consagrar outras que a própria realidade recomendou.
É precisamente por isso que, sem prejuízo do reconhecimento da especial dignidade da Lei de Enquadramento do Orçamento, o meu partido aparece agora a propor a revisão da lei que em 1983 foi aprovada por esta Assembleia sobre uma nossa iniciativa, com a qual se visava já alterar a lei anterior - a Lei n.º 64/77, de 10 de Agosto.
Com efeito, entre a lei de 1977 e a de 1983 aconteceu a revisão da Constituição de 1982, revisão que representou em matéria de competência orçamental do Parlamento um autêntico virar de página.
Da solução dualista que, apesar de tudo, permaneceu na Constituição de 1976 passou-se a um sistema monista parlamentar, que houve que traduzir em sede de Lei de Enquadramento do Orçamento, assegurando o predomínio da Assembleia da República e definindo com a maior nitidez a separação entre o poder de aprovação parlamentar e o poder de execução, conservado pelo Governo.
Não será, portanto, de estranhar que em matéria de tão grande relevo e em que foi tão grande a inovação se aproveitem todos os ensinamentos fornecidos pela experiência e será mesmo de louvar a capacidade revelada para eliminar erros e corrigir soluções menos acertadas.
Pena é que esta possibilidade de colher os ensinamentos da experiência não exista noutros domínios em que, ao contrário, o legislador está sujeito a coletes de força, incompatíveis, em última análise, com a própria ideia democrática.
Não há dúvida que a experiência vivida por esta Assembleia com as alterações ao Orçamento do Estado para 1985 foi de molde a aconselhar por si só a revisão da Lei de Enquadramento do Orçamento.
Refiro-me, em particular, à proposta feita pelo Governo para regularização de um número apreciável de operações de tesouraria e a revelação que, a propósito, nos fez do aproveitamento que estava a ser feito do regime destas operações para conduzir toda uma política financeira paralela, sem controle parlamentar.
Refiro-me ainda ao modo como nasceu a necessidade de alguns dos reforços que nos foram propostos, a revelar a possibilidade de colocar o Parlamento perante factos consumados em matéria de alteração da despesa.
Refiro-me ainda ao conjunto de medidas de controle que o Sr. Ministro das Finanças anunciou na sua última intervenção, às quais conferimos os louvores que sem dúvida merecem, mas que entendemos que não devem quedar-se sob a forma de despacho, devendo antes figurar entre os esquemas de acompanhamento da execução orçamental consagrados na lei do enquadramento.
Foi, portanto, a necessidade de aproveitar a experiência colhida em 2 anos de vigência, enriquecida com o processo da última alteração orçamental que o CDS, autor da iniciativa que levou à aprovação da lei de 1982, apresentou agora um projecto de revisão.
Desde logo procurámos recuperar algumas das poucas soluções que constavam do projecto n.º 214/111 e que não encontraram guarida no texto unanimemente aprovado pela Câmara.
É o caso, em primeiro lugar, do princípio que gostaríamos de ver consagrado no normativo respeitante ao equilíbrio orçamental, e de acordo com o qual o eventual défice do Orçamento corrente não deve ser financiado através do recurso à criação de moeda.
Entendemos, na verdade, que o financiamento conseguido através do alargamento da base monetária pelas consequências nefastas que tem no empolamento da inflação, não deve ser objecto de uma norma simplesmente programática, recomendação que pode deixar de ser observada.
Na mesma linha, insistimos pela introdução de uma norma destinada a evitar que o atraso na aprovação do novo Orçamento tenha como consequência a manutenção de impostos extraordinários criados para vigorar apenas no período do Orçamento cuja vigência resulta prolongada.
Sendo em si mesma uma prática a evitar, a da criação de impostos extraordinários; não poderá admitir-se a manutenção, para além do previsto, da respectiva cobrança, como consequêncía de situação cujo desencadeamento e manutenção escapa completamente ao controle dos cidadãos contribuintes.
Seria como que pôr os cidadãos a pagar directamente o funcionamento menos normal das instituições.
Finalmente, pretendemos que no regime da alteração do Orçamento se faça claramente a distinção, no que respeita à competência parlamentar, entre as modificações pontuais e as modificações que, decorrendo do aumento da despesa global e que por isso mesmo impõem a aprovação de novas receitas, a não se fazer a distinção, como acontece com a Lei de 1982, está a contribuir-se para uma acumulação de tensões na execução do Orçamento, do que é exemplo o tipo de argumentação utilizado a certa altura pelo Governo a propósito da discussão do último orçamento suplementar, ao mesmo tempo que se não clarifica a questão importante do processo a seguir nas alterações globais.
Para além, no entanto, da recuperação de soluções do projecto n.º 214/III, o CDS proeurou, também, no projecto agora em discussão, consagrar algumas soluções então não previstas.
É o caso, em primeiro lugar, da necessária articulação entre o que se encontra estabelecido no novo regime dos bilhetes de Tesouro e o conteúdo da Lei de Enquadramento do Orçamento.
Esperamos que a alteração que, a este propósito, apresentamos para o artigo 11.º venha a transcender o simples formalismo da coordenação de regimes e aponte para um enquadramento mais razoável e coerente do financiamento do Tesouro e das suas articulações com o financiamento do défice aprovado.
Na mesma linha se situa a obrigação que propomos que seja imposta ao Governo de comunicar a esta Assembleia com uma certa periodicidade as operações de tesouraria realizadas, não apenas as sujeitas naturalmente a regularização por via orçamental, como ainda as realizadas como operações activas resultantes de financiamento ou adiantamento.
A experiência mostrou, realmente, que muitas destas últimas acabam por se transformar em simples despesa carecidas também de regularização orçamental.
Por último, no domínio das inovações, pretendemos evitar que no orçamento da despesa e nos capítulos votados por esta Câmara figurem verbas de tão grande

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amplitude e com aplicações de tal modo variadas que retirem à sua aprovação qualquer sentido à intervenção parlamentar.
Portanto, e resumindo: o CDS actua neste processo com o intuito de clarificar a lei aprovada em 1982, aproveitar a experiência fornecida pelos processos respeitantes ao Orçamento de 1985 ,e suas alterações e acautelar o papel do Parlamento sem cair nos excessos da parlamentarização da gestão orçamental.
Nessa perspectiva, estamos dispostos a ponderar não apenas as nossas soluções, mas as que foram apresentadas por outros partidos autores de projectos de alteração e pelos partidos que, não tendo apresentado quaisquer projectos de alteração, estão a colaborar activa e diligentemente nos trabalhos da Subcomissão constituída no âmbito da Comissão de Economia, Finanças e Plano.
Acima de tudo, esperamos que a pouca frequência desta sessão parlamentar não signifique menor atenção do Parlamento para uma lei tão importante como esta, que é a lei de Enquadramento do Orçamento, e que constitui o regime de uma das pedras de toque de intervenção da Assembleia da República na vida política portuguesa.
Esperamos ainda que - e a atitude do PCP ao alterar o preâmbulo do seu projecto de lei constitui um indício positivo - em relação a este projecto de lei se possa obter unanimidade nesta Câmara. Essa unanimidade será, neste caso, indispensável porque está em causa o regime de um aspecto importante e decisivo da intervenção do Parlamento.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado João Cravinho.

O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, as palavras que produziu na sua intervenção mostraram uma vontade de consenso que registo com imenso agrado, por tal me parecer fundamental a bem do prestígio da Assembleia.
Em todo o caso, gostara de lhe solicitar um esclarecimento sobre a interpretação de eventual diferença quanto ao princípio da fixação da Lei do Enquadramento do Orçamento do Estado, tendo eu dito que preferia um princípio evolutivo. Julgo, pois, que não há alguma contradição, na medida em que o Sr. Deputado Nogueira de Brito referiu directamente que há que incorporar nos normativos que regem o Orçamento a própria lição que for sendo colhida. Sucede que neste campo a Assembleia da República tem uma experiência muito restrita, em particular ela nunca examinou as contas do Estado. É evidente que quando as examinar surgirão problemas novos, que obrigarão - talvez até com maior aquidade do que aquela que sentimos por ocasião do orçamento suplementar - a rever o regime de enquadramento.
Gostaria, pois, que o Sr. Deputado Nogueira de Brito esclarecesse se entende que, sendo desejável, essa estabilidade não pode de maneira alguma, impedir que a própria Assembleia cristalize e tire proveito da experiência que for colhendo, sobretudo tendo em atenção a incipiência da sua actividade nesta matéria.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Deputado João Cravinho, suponho que a parte inicial da minha intervenção é esclarecedora nessa matéria. Não podemos negar a especial dignidade da Lei de Enquadramento do Orçamento porque ela regulamenta o processo de aprovação de uma outra lei, que é a Lei do Orçamento, propriamente dita. Portanto, ela tem como que uma dignidade paraconstitucional. Aliás, devo dizer que temos aqui no hemiciclo um especialista que é o presidente da Comissão de Economia, Finanças e Plano e que também nos poderá esclarecer neste domínio.
Simplesmente, Sr. Deputado João Cravinho, nunca será demais recordarmos a especial dignidade da Lei de Enquadramento e a especial importância que ela deve assumir e, portanto, a especialidade que todos nós devemos conferir-lhe e o entendimento de estabilidade que devemos ter em relação a essa mesma lei. Porém, por se tratar de matéria que conheceu inovação importante muito recente, tal não significa que não estejamos nós, CDS, sempre preparados e prontos a verter nessa lei os ensinamentos que a nova experiência da competência parlamentar de aprovação do Orçamento propriamente dito certamente vai aconselhar introduzir. Daí as iniciativas que tomamos 1 ano ou 2 volvidos sobre a aprovação da lei em
1983.
15so é fundamental, mas achamos que tal deverá ser sempre feito com especial ponderação por parte da Assembleia e com preocupação por parte dos deputados em conseguir estabelecer os consensos mais alargados possíveis em relação a essa matéria, tendo em conta a especial dignidade do diploma e do regime de que estão a tratar.
Portanto, o meu entendimento é esse e ,ele não está em desacordo com o do Sr. Deputado.

0 Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Próspero Luís.

O Sr. Próspero Luís (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: Foram apresentados a esta Assembleia três projectos de lei de alteração da Lei de Enquadramento do Orçamento - Lei n.º 40/83.
Dois desses projectos de lei pediram o processo de urgência. No guiso do Partido Social-Democrata, nem no Plenário nem na Comissão Especializada se devia deixa votar favoravelmente esses projectos de lei, ainda que se tivesse plena consciência de que a sua aplicação não seria possível na elaboração do presente Orçamento, pelo que a urgência solicitada perderia um pouco de significado.
Os três projectos de lei apresentados, ainda que versando matérias e apresentando desenvolvimentos diferentes visam, de acordo com a fundamentação da sua apresentação, introduzir aperfeiçoamentos no quadro legal em vigor nesta matéria, aperfeiçoamentos esses ditados pela experiência decorrida desde a entrada em vigor da presente leis e ainda reforçar os poderes de fiscalização desta Assembleia sobre a actividade económica e financeira do Governo.
Sem se querer entrar na análise destes projectos na especialidade, o que, aliás, estaria fora do âmbito deste debate, não se pode deixar de referir, sobre os mesmos, o seguinte: a maioria das disposições do projecto apresentado pelo Partido Comunista Português estão

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implícitas na Lei de Enquadramento em vigor e ou na Lei de Execução do Orçamento aprovada anualmente por esta Assembleia.
Este projecto visa, segundo aquele partido, uma maior clarificação e sistematização da presente lei, bem como tornar obrigatório aquilo que os governos vêm fazendo facultativamente. Mas contém mais que isto o referido projecto: ele pretende introduzir na lei disposições que, por se referirem às regiões autónomas e autarquias locais, podem encontrar-se feridas de inconstitucionalidade por estas não terem sido ouvidas [artigo 8.º, alínea h)], bem como pretende introduzir normas que podem implicar com a Lei Orgânica do Governo, matéria de exclusiva responsabilidade deste nos termos constitucionais quando pretende que a Comissão de Economia, Finanças e Plano poderá "sempre que o considerar conveniente, ouvir quaisquer responsáveis pela execução orçamental da administração central, incluindo os organismos dotados de autonomia administrativa e financeira e obter elementos relativos a qualquer despesa ou receita, bem como a qualquer outra operação orçamental realizada" (artigo 23.º, n.º 4), e ainda normas que devem ser e já o são reguladas pela Lei Comum -"Despesas com obras e aquisição de bens e serviços" - ( artigo 24.º - A ).
Este projecto visa, no entender do Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata, conduzir a uma parlamentarização da acção executiva do Governo nas áreas económicas e financeiras.
É perfeitamente compreensível tal intenção por parte do Partido Comunista Português dado que se encontra directamente afastado do Poder e não vê possibilidade de acesso a ele a curto prazo. Por isso, procura reforçar os poderes da Assembleia da República para, face aos mecanismos de funcionamento desta, ter acesso a áreas de que doutro modo estaria afastado.
O projecto do Centro Democrático Social pretende introduzir, ainda que de maneira pouco clara, a ligação da lei que criou os bilhetes de Tesouro com a Lei de Enquadramento do Orçamento (artigo 11.º) e contém disposições, algumas perfeitamente inaceitáveis para uma correcta gestão governativa, quando refere no seu artigo 4.º, n.º 3, que, quando não for possível equilibrar o orçamento corrente o "Governo não financiará o respectivo défice com criação de moeda", esquecendo-se, no entanto, de apresentar quaisquer alternativas para a forma de financiamento desse mesmo défice. Tal como o projecto do Partido Socialista contém normas sobre operações de tesouraria a que se referirá aquando da apreciação do projecto deste partido por o mesmo conter esta matéria com maior detalhe.
No que respeita ao projecto do Partido Socialista, ele apresenta três tipos de preocupações:

a) O problema dos benefícios e consequente perda de receitas e despesas e fixação dos períodos de vigência dos mesmos benefícios (artigos 27.º a 29.º). É assunto que, embora merecendo atenção e estando na linha de preocupações do Governo, deve ser tratado com muito cuidado, dada a nossa adesão à CEE, pois alguns dos benefícios poderão implicar pagamento de contrapartidas por parte do Estado;
b) O problema do acréscimo de informação a prestar pelo Governo à Assembleia, entrando nesta área em matéria que se considera da exclusiva responsabilidade do Governo e revelando algum desconhecimento sobre o que é, ou melhor, sobre o que deve ser um orçamento e a sua elaboração. Como, por exemplo, ao pedir, no seu artigo 30.º, o envio à Assembleia da República das instruções, directivas ou orientações emitidas pelo Governo no âmbito do processo orçamental (n.º 1) ou a pedir a apresentação à Assembleia da República dos pedidos, propostas ou projectos de despesa dos serviços, institutos e fundos autónomos (n.º 2);
c) O problema das operações do Tesouro, pretendendo que o Orçamento contenha informações que se consideram perfeitamente descabidas do Orçamento, como seja a " indicação discriminada das operações de tesouraria e dos avales previstos para o ano económico" (artigo 31.º).

Este entendimento resulta quer da definição legal deste tipo de operações que, de acordo com o artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 113/85, de 18 de Abril, são "todos os movimentos de fundos nos cofres do Tesouro que não se encontram sujeitos à disciplina do Orçamento do Estado, bem como todas as restantes operações escriturais com eles relacionadas no âmbito das contas do Tesouro", quer ainda pela sua natureza específica, relativamente à parte dessas operações que se julga ser as que o Partido Socialista pretende que sejam incluídas no Orçamento e que respeitam fundamentalmente a operações activas resultantes de financiamentos ou adiantamentos de fundos ou ainda as sujeitas a regularização por via orçamental, que não permite prever com exactidão que permita discriminá-las todas no Orçamento, pois tais operações, a ser possível prever e discriminar, deveriam passar a fazer parte integrante do Orçamento e não serem operações de tesouraria.
Também aqui há que ter cuidado, pois a adesão à CEE irá ter implicações nesta matéria.
Idêntica crítica se pode fazer, como se referiu, ao projecto apresentado pelo Centro Democrático Social no que respeita à discriminação das operações de tesouraria (artigo 23.º do seu projecto de lei do CDS), ainda que nesse se pretenda apenas o conhecimento a posteriori de tais operações.
O projecto de lei do PS enferma, segundo o Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata, dos defeitos referidos no início desta intervenção por ser um projecto que se julga só ter sido apresentado por razões conjunturais derivadas do apoio minoritário que o actual Governo tem nesta Assembleia. Doutra forma não se pode compreender a sua apresentação só após a saída desse partido do Governo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Entende o PSD que uma Lei de Enquadramento do Orçamento de Estado deve estabelecer as grandes linhas orientadoras da elaboração, aprovação, execução e fiscalização do orçamento, bem como as grandes linhas de relação entre o órgão que elabora e executa o orçamento - o Governo - e o órgão que aprova e fiscaliza a sua execução - a Assembleia da República.
Devendo conter apenas as grandes linhas de orientação, como se referiu, ela deve ser de execução permanente e não estar sujeita a apoios e consensos conjunturais que cada Governo consiga obter pontualmente nesta Assembleia.
Não se pode deixar de estranhar, nesta óptica, que apenas 2 anos após a entrada em vigor da lei que se pretende alterar, e que obteve largo consenso aquando

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da sua discussão e aprovação, e pouco tempo depois da tomada de posse do actual Governo tenham dado entrada nesta Assembleia 3 projectos de alteração da mesma lei, ainda que se compreenda, embora se não concorde, que os mesmos apareçam, dado o apoio minoritário que o actual Governo tem nesta Assembleia.
A nossa estranheza é ainda maior porque parte do conteúdo apresentado por 2 dos projectos de lei versam matérias - que foram incluídas após a discussão do orçamento suplementar - que só foram suscitadas porque o Governo, aquando da discussão do orçamento suplementar, pretendeu regularizar um conjunto de operações que há anos se arrastavam numa situação pouco clara, como era o caso das operações de tesouraria.
A nossa estranheza resulta ainda do facto de ser reconhecido pela doutrina sobre as finanças públicas que a Lei de Enquadramento em vigor se encontra perfeitamente ajustada aos ditames constitucionais e às exigências orçamentais de um Estado de direito e consagra um modelo orçamental que se revela original relativamente ao figurino europeu, no sentido de atribuir à Assembleia da República poderes orçamentais mais amplos do que aqueles que existem na generalidade dos Estados europeus, conforme reconhece Lobo Xavier no livro Enquadramento Orçamental em Portugal - Alguns Problemas.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Secretários de Estado: Com a apresentação, em Novembro passado, do projecto de lei n.º 48/IV, o Grupo Parlamentar do PCP visou abrir o processo de revisão da Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado, revisão que a vida mostrou absolutamente necessária. E só quem desconhecer a realidade vivida nestes últimos 2 anos pode considerar estranho que agora se proceda a uma revisão da Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado.
Com efeito, e face à experiência dos últimos anos, afigura-se da máxima urgência corrigir e aperfeiçoar o quadro legal em vigor, pondo cobro às distorções e entorses que se vêm multiplicando. A prática tem na verdade revelado, por exemplo: a não orçamentação integral das despesas e receitas do Estado; a profunda e arbitrária alteração pelos governos do Orçamento aprovado pela Assembleia da República; a subsistência de volumosas dotações não especificadas, verdadeiros "sacos azuis" para utilização governamental com fins político-partidários e de favorecimento de amigos e grupos de pressão; a ultrapassagem sistemática e impune de dotações aprovadas pela Assembleia da República; a atribuição de subsídios e outros benefícios financeiros sem controle nem transparência; o desrespeito pelas normas legais concernentes aos concursos públicos; os défices ocultos e a não divulgação dos reais contornos e dimensão da dívida do Estado e de todo o sector público administrativo; a utilização abusiva de empresas públicas para escamotear as efectivas responsabilidades financeiras do Estado; o crescimento e ilegal recurso às chamadas operações de tesouraria para reduzir, contabilística e artificialmente, as despesas e défices orçamentais; a tardia divulgação do teor integral do próprio Orçamento (note-se que, até hoje, ainda não foi publicado o desenvolvimento do Orçamento do Estado para 1985).
Foi tendo em atenção estas e outras inaceitáveis práticas governamentais que o Grupo Parlamentar do PCP apresentou o seu projecto de lei. Contrariamente ao propagandeado por alguns órgãos afectos ao Governo, e, como se viu, por deputados do partido que apoia o Governo, o projecto de lei do PCP não pretende bloquear a normal actividade governativa ou a parlamentarização do Orçamento.
Há quem pareça não ter ainda compreendido que a revisão constitucional de 1982 impõe à Assembleia da República a aprovação do Orçamento - ele próprio e não a de uma mera lei orçamental - e logo o controle efectivo da sua execução. O que o nosso projecto visa, isso sim, nos estreitos limites constitucionalmente consagrados, é eliminar ou limitar fortemente o tão generalizado recurso governamental a subterfúgios que violam princípios orçamentais basilares e, por outro lado, reforçar os poderes e responsabilidades da Assembleia da República tanto no âmbito da aprovação do Orçamento do Estado como no do acompanhamento e fiscalização da execução orçamental. 15to é: não se pretende bloquear a actividade do Governo, mas confiná-la aos seus exactos limites legais e constitucionais; não se visa a parlamentarização do Orçamento, mas confrontar a Assembleia da República com os seus indeclináveis deveres e obrigações constitucionais.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pese embora a participação activa dos grupos parlamentares representados na subcomissão criada para apreciação dos projectos de revisão da Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado, apresentados pelo PCP, pelo PS e pelo CDS, não foi possível concluir os trabalhos de forma a podermos fazer hoje a votação na especialidade e final global de uma nova Lei de Enquadramento, como seria desejável. A complexidade e especificidade da matéria em apreço exige que todas as propostas sejam devidamente ponderadas na especialidade. Pela nossa parte continuará a ser esse o nosso comportamento sem prejuízo, porém, da celeridade que reputamos necessária. A experiência já colhida do desenvolvimento dos trabalhos da subcomissão levam-nos a crer que será esse também o espírito da generalidade dos restantes grupos parlamentares. O mesmo não podemos dizer em relação ao Governo já que, até ao momento, ainda não se dignou corresponder ao convite de participação que lhe foi dirigido. Aguardemos que agora o possa fazer.
Finalmente, Sr. Presidente, Srs. Deputados, o Grupo Parlamentar do PCP irá votar favoravelmente, na generalidade, os três projectos de lei em apreciação. Porque todos eles apresentam contribuições válidas para a melhoria da lei em vigor. E é isso o que para nós está em causa: o conteúdo das propostas e não a sua origem partidária. O que, lamentavelmente, não parece ter estado na base do comportamento do PSD que, inicialmente, e ainda agora voltou à carga, tentou angariar apoios para rejeitar na generalidade o projecto de lei do PCP. Não por discordar das nossas propostas, pois, como expressamente foi afirmado, pretendia recuperar depois o essencial do articulado do nosso projecto. Mas rejeitar apenas porque vinha do PCP. Com o argumento, caricato, de desacordo com o preâmbulo. Ou seja, aparentemente pretendia rejeitar um projecto de lei por não concordar com aquilo que nele não é objecto de votação! Foi para evitar subterfúgios que

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propusemos a retirada do nosso preâmbulo e não porque tivéssemos chegado à conclusão de que ele não estava correcto. Aliás, o essencial da minha intervenção foi a leitura do preâmbulo que constava inicialmente do nosso projecto de lei.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A verdade é que o PSD não conseguiu os apoios que pretendia para tal manobra. É tempo de mudar de agulha. Os ventos, claramente, não lhe sopram de feição para tal tipo de actuações!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Próspero Luís.

O Sr. Próspero Luís (PSD): - Sr. Deputado Octávio Teixeira, não posso dizer que ouvi com muita atenção a sua intervenção por que não era nada que já não esperasse que viesse a fazer.
Como o que estamos aqui a votar são os projectos de alteração da Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado e como a razão por que o PCP apresenta este projecto é haver um conjunto de normas na lei que permita certas actuações menos próprias do Governo, gostaria que indicasse, concretamente, o seguinte: quais são as disposições da Lei n.º 40/83 que permitem que os governos usem subterfúgios para violar os princípios orçamentais basilares? Quais são as disposições da lei que permitem que efectivamente seja possível processar as alterações orçamentais, quando a lei regulamenta a forma como essas alterações orçamentais se devem fazer? Quais são as normas da lei que permitem os «sacos azuis»? Quais são as normas da lei que permitem que se ultrapassem sistemática e impunemente as dotações aprovadas? Será o Governo que utiliza as empresas públicas para escamotear défices?
Parece que a maior parte desta Assembleia já reconheceu que normalmente é o Governo que é chamado a cobrir os défices dessas empresas públicas. Foi esta Assembleia que recusou ao Governo, aquando da discussão do orçamento suplementar, que fosse possível cobrir as faltas de cumprimento das empresas públicas.
Sr. Deputado, quando o Partido Social-Democrata, através da minha pessoa, pretendeu obter apoios para reprovar politicamente a sua lei, foi por entender que não é normal que se utilize alterações de projectos de lei para pôr em causa a idoneidade moral dos governos. E o Sr. Deputado veja que não estava sequer a defender o Governo, que defendo, porque, quando o seu partido entregou este projecto de lei, este Governo tinha apenas duas semanas de vida e tinha acabado de discutir o Orçamento. O que se defendia não era propriamente o governo do PSD, o que se defendia e continua a defender é a idoneidade e os princípios que se devem respeitar no relacionamento entre a Assembleia e o Governo.
Não nos podemos ofender de o Governo utilizar expressões que não são do agrado da Assembleia da República e dos seus deputados, quando nos permitimos dar ao luxo de chamar todos os nomes que entendemos ao Governo.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Quem é que chamou nomes ao Governo?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - O Sr. Deputado Próspero Luís desde o início que tem mostrado um forte complexo de perseguição, porque desde o início considerou que o projecto de lei do PCP se destinava a este Governo, pura e simplesmente.
Ainda há pouco referiu - e não só para o PCP mas para todos os grupos parlamentares que apresentaram projectos de alteração - que estranhava que logo que este Governo entrou em funções aparecessem três projectos de alteração da Lei de Enquadramento do Orçamento. Se o Sr. Deputado eliminasse esse seu complexo de perseguição talvez fosse mais fácil entender e compreender a justeza da generalidade das propostas de alteração apresentadas nos três projectos.
Em relação às afirmações que fiz e ao que o projecto do meu grupo parlamentar fazia no seu preâmbulo inicial, sobre o que se tem passado, isso, Sr. Deputado, é do conhecimento público. Não são apenas afirmações do PCP, são afirmações públicas do anterior Secretário de Estado do Orçamento e nessa qualidade. São afirmações do actual Governo, Sr. Deputado, quando diz que quer clarificar as contas públicas, que quer normalizar as finanças públicas, que quer que o Estado seja uma pessoa de bem, etc., nessa altura, o Governo está a dizer, por outra forma, aquilo que acabei de dizer e que o meu grupo parlamentar dizia no preâmbulo do nosso projecto.
As próprias Contas Gerais do Estado, já publicadas, mostram claramente que se ultrapassa em muito, fora da competência legal, aquilo que é permitido aos governos. A própria discussão da revisão do Orçamento de 1985 mostra-o claramente e, por isso, queremos clarificar aquilo que de um modo geral não é permitido pela actual Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado e todos esses aspectos. Queremos também que a Assembleia da República tenha uma participação mais activa no controle da execução orçamental para evitar que se tornem a repetir essas situações.
Em relação à questão das empresas públicas, Sr. Deputado, aquilo que referi mantenho. E chamava-lhe a atenção para que o grande «buraco» que existe em termos de finanças públicas - e que não tem sido publicitado nem tem passado por esta Assembleia - é aquilo a que designadamente se tem chamado «os atrasados», em sentido amplo, poder central, os seus fundos e serviços autónomos. Sr. Deputado, dos cerca de 600 milhões de contos que existem neste momento atrasados, 95% são pelo menos créditos de empresas públicas. Foi isso que disse, foi apenas isso que quis dizer e está tudo dito.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro.

O Sr. Raul Castro (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Secretários de Estado: Trata-se de introduzir alterações na Lei de Enquadramento do Orçamento, lei essa que representa um instrumento fundamental relativamente ao Orçamento. Nesse sentido apontam os projectos de lei n.ºs 48/IV, 92/IV e 94/IV, apresentados respectivamente pelo PCP, pelo CDS e pelo PS.

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A Constituição atribui à Assembleia da República funções da maior importância no que respeita ao Orçamento do Estado. Na verdade, a Constituição atribui-lhe, por um lado, o objectivo de discutir e aprovar o Orçamento do Estado e, por outro lado, atribui-lhe também, juntamente com o Tribunal de Contas, o objectivo de assegurar e fiscalizar a sua execução.
Daqui decorre que a discussão que hoje estamos a travar seja uma discussão da maior importância, da qual nenhum grupo parlamentar se pode alhear.
Em função desta discussão chegamos à conclusão que nos três projectos de lei estão preconizadas medidas comuns. Trata-se, por exemplo, das que respeitam à inserção de medidas que impeçam o Governo de financiar o défice corrente com a criação de moeda, medida que aparece não só no projecto de lei apresentado pelo PCP, como também no projecto de lei apresentado pelo CDS, ou ainda aquela que respeita ao controle das chamadas operações de tesouraria, que é comum aos três projectos de lei apresentados.
Porque se trata, portanto, de assegurar a eficácia e o próprio prestígio desta Assembleia e porque se trata de assegurar a transparência do Orçamento e já que o próprio Governo se tem atribuído esse propósito de assegurar uma maior transparência, não será, com certeza, o Governo que poderá estranhar que outro órgão de soberania, que é esta Assembleia, tenha a mesma preocupação e a possa pôr em prática.
Por isso, o MDP/CDE irá aprovar na generalidade os três projectos de lei agora apresentados.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, dou a palavra ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento para uma intervenção.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento (Rui Carp): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A importância de uma lei que enquadra o Orçamento é por de mais evidente. É-o, em primeiro lugar, porque foi o Orçamento uma das géneses dos Parlamentos. Os parlamentos foram criados para controlar os dinheiros públicos e para controlar os dinheiros públicos criou-se a figura do Orçamento do Estado.
Naturalmente que, no caso presente, estamos perante a revisão de uma lei que tem por base razões variadas consoante os proponentes do articulado.
Em primeiro lugar, devo dizer que me parece que a revisão da Lei de Enquadramento do Orçamento deve estar directamente relacionada com a revisão constitucional, não porque ela seja uma lei de nível superior às leis ordinárias, mas porque define princípios orientadores fundamentais, quer para o Governo - não nos esqueçamos -, quer para o Parlamento.
Daí que, em princípio, não deverá ser quebrada uma certa estabilidade quanto à Lei de Enquadramento do Orçamento e só motivos muito fortes ou excepcionais poderão ser causa da sua revisão. No caso de existirem motivos para tal revisão, devemos procurar o máximo consenso ou, pelo menos, um grande consenso, não só das diversas correntes representadas no Parlamento, mas também das resultantes da relação desse mesmo Parlamento com o Governo, que é o órgão executivo. Diria mais: para a revisão da Lei de Enquadramento do Orçamento devem participar, cada um dentro da sua competência, a Assembleia, o Governo e a Administração Pública. Isto porque a Assembleia aprova o Orçamento e fiscaliza a sua execução,
porque o Governo o elabora e o executa e porque a Administração é o agente executivo propriamente dito. Assim, o Governo considera que a sua participação nos trabalhos de elaboração da Lei de Enquadramento do Orçamento é bastante importante e, diria mesmo, fundamental.
Deste modo, numa primeira apreciação - de carácter, digamos, valorativo - sobre o momento em que essa revisão é feita, considera-se que o momento não é o mais oportuno. Isto porque, simultaneamente, o Governo, desde o início do ano, discutiu o orçamento suplementar para 1985 e está a preparar o Orçamento para 1986. Daí a ausência forçada, por indisponibilidade material, dos membros do Governo mais directamente relacionados com o Orçamento e, em particular, a do Secretário de Estado do Orçamento.
Assim, parece-me que essa ausência, não pela qualidade, naturalmente, do Secretário de Estado do Orçamento, mas pelo sector da administração pública que ele tutela, já se reflecte, independentemente dos juízos de carácter normativo sobre os projectos que neste momento se encontram em discussão, designadamente em determinados aspectos técnicos que revelam imprecisão técnica ou desajustamento relativamente à exequibilidade de alguns normativos que se pretendem agora introduzir na Lei de Enquadramento do Orçamento. Portanto, neste caso, o Governo reafirma a sua disponibilidade para trabalhar com a Comissão ou Subcomissão na análise das alterações à Lei de Enquadramento do Orçamento.
Para além dos aspectos técnicos que se consideram imprescindíveis de corrigir nos projectos em discussão, convém salientar outros aspectos, designadamente o que se refere às operações de tesouraria. Na verdade, o facto de o conceito de operações de tesouraria não estar explícito em qualquer dos projectos levaria à inexequibilidade ou, melhor, ao engarrafamento - perdoem a expressão - da Assembleia quanto à sua análise porque, para além de existirem operações de tesouraria por conta de terceiros, existem ainda centenas de operações de tesouraria que são realizadas diariamente.
No caso presente, parece que a Assembleia se está a referir fundamentalmente - e penso que estou a interpretar o espírito do legislador - às operações de tesouraria activas, operações a liquidar e às operações de tesouraria que são adiantamentos e antecipações de operações orçamentais. No entanto, não quero ultrapassar o espírito do legislador.
Além do mais, essas operações estão proibidas e, caso curioso, foi a partir do dia 1 de Janeiro deste ano que algumas dessas operações de tesouraria, as tais que estão proibidas, são obrigatoriamente realizadas. Porquê? Porque com a entrada de Portugal na CEE, independentemente da aprovação ou não do Orçamento em tempo oportuno, o Estado Português tem de entregar mensalmente a sua contribuição financeira para o Orçamental Geral das Comunidades.
Aí está um exemplo típico, que passou despercebido à Subcomissão e que deverá ser naturalmente atendido quando da análise destes diplomas na especialidade, caso sejam hoje aprovados na generalidade. Portanto, o direito orçamental europeu tem aqui efeitos sobre o direito orçamental português e esses efeitos terão de ser contemplados na revisão da Lei de Enquadramento do Orçamento.
Além destes aspectos - não vou agora repetir os problemas suscitados sobre a parlamentarização ou governamentalização de algumas normas que constam dos

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projectos-, o outro aspecto que é importante nesta matéria e que terá necessariamente de sofrer correcções, pelo menos, de carácter técnico refere-se às chamadas despesas fiscais.
Por razões circunstanciais, estou particularmente dentro do problema. Estive ligado ao início, ao arranque, da contabilização dessas despesas fiscais quando da minha passagem pelo governo presidido pelo Dr. Sá Carneiro. Cinco anos volvidos, noto que infelizmente pouco se adiantou. Contudo, fez-se alguma coisa e recordo a esta Assembleia que no ano transacto já foi enviado um primeiro quadro sobre despesas fiscais. No entanto, também aí há que ter em especial atenção que a publicitação dessas despesas fiscais, designadamente as de carácter aduaneiro, podem ter consequências negativas para o País se não forem consagradas de uma forma ponderada, nos termos em que eu próprio terei muito gosto em explicar em sede de Comissão.
Finalmente, parece-me que será útil comparar as sugestões e propostas nascidas da Subcomissão parlamentar com os trabalhos que neste momento decorrem a nível da OCDE e que estão em fase final relativamente à comparação dos sistemas orçamentais dos principais países industrializados de economia de mercado, revelando os sucessos e os fracassos das grandes alterações em matéria de controle, de execução e de aprovação das contas públicas.
Trata-se de estudos que muito poderão enriquecer esta Assembleia porque nessa mesma OCDE existe uma análise sobre o sistema orçamental português em que, nalguns casos, até se elogia esse mesmo sistema orçamental português.
Portanto, não estamos atrás dos outros países em muitos aspectos orçamentais. Temos de adequar a nossa Administração Pública a esse mesmo sistema porque são hábitos de muitos anos.
Apesar de tudo, considero que muitos avanços se fizeram porque do orçamento das palavras, como disse há um bom par de anos o decano desta Assembleia, passámos para um orçamento de despesa. Mas ainda temos de passar para um orçamento de gestão pública, em vez de um orçamento de controle jurídico.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero aqui reafirmar um aspecto essencial, aliás já frisado por alguns dos Srs. Deputados, que é o de o Governo considerar que a Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado deve ser aprovada com o máximo consenso possível, senão na generalidade, pelo menos nos seus aspectos específicos, para que todos nós - Governo, Assembleia da República e restantes órgãos de soberania - possamos respeitar esse orçamento como um instrumento que moraliza a Administração, mas que também contribui para a boa gestão dessa mesma Administração.

Aplausos do PSD e do deputado Nogueira de Brito, do CDS.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Nogueira de Brito, Octávio Teixeira e João Cravinho.
Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Secretário de Estado do Orçamento, quero em primeiro lugar congratular-me vivamente pelo teor da sua intervenção, pois V. Ex.ª manifestou muito claramente a disponibilidade do Governo para participar no processo de revisão da Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado, salientando que essa participação era indispensável.
Não tenho nenhum mandato para falar em nome nem da Comissão de Economia, Finanças e Plano, nem da Subcomissão que tomou a seu cargo a elaboração do parecer sobre este processo legislativo e cujo coordenador se encontra aqui presente - o Sr. Deputado Próspero Luís. Em todo o caso, é-me grato afirmar a V. Ex.ª que, tanto no âmbito da Subcomissão como no da Comissão, tirámos precisamente a conclusão de que era indispensável a presença do Governo, representado designadamente pelo Sr. Secretário de Estado do Orçamento, e de elementos da Administração que, juntamente com V. Ex.ª, nos poderiam esclarecer sobre este processo.
Suponho que o Sr. Secretário de Estado já está informado de que, nessa perspectiva, deliberámos que o processo fosse interrompido para entretanto ter lugar a discussão parlamentar sobre a proposta de lei do Orçamento do Estado para 1986, sendo só retomado depois dessa discussão. Inclusivamente, no projecto de lei do CDS - projecto este que foi substituído, como o Sr. Presidente já salientou no passado dia 30 incluía-se uma disposição transitória onde se defendia claramente que a nova lei de enquadramento se não aplicaria à discussão da proposta de lei do Orçamento do Estado para 1986.
Este princípio que acabei de referir foi aceite por todos os membros da Subcomissão, já que não era mais do que a consagração de um princípio de razoabilidade.
Sr. Secretário de Estado do Orçamento, gostaria ainda de pôr mais dois pontos à sua consideração, o primeiro dos quais é o seguinte: como V. Ex.ª deve ter ouvido, comecei por salientar na minha intervenção a necessidade de se conferir uma particular estabilidade à Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado, que tem um lugar especial na hierarquia das leis produzidas por este Parlamento. No entanto, Sr. Secretário de Estado, penso que não nos deve estar vedada a possibilidade de, em matéria que é inovadora entre nós, colher os dados da experiência fornecidos na execução dessa mesma lei.
Não há dúvidas de que a discussão do orçamento suplementar constituiu uma experiência riquíssima em matéria de delineamento final do que deve ser uma lei de enquadramento orçamental - e suponho que o Sr. Secretário de Estado está de acordo comigo quanto a este aspecto. Com efeito, foram-nos aqui prestadas informações e levantados problemas que, sem dúvida, apontam no sentido da correcção da Lei de Enquadramento do Orçamento.
Gostaria que o Sr. Secretário de Estado me dissesse, em resposta a esta minha interpelação, se considera ou não ser isto verdade.
Quanto ao mais, também nós somos de opinião de que terá de haver um grande consenso porque se trata de uma lei reguladora da actividade desta Assembleia e das relações institucionais entre esta Assembleia e o Governo. Em todo o caso, vemos já um bom sinal desse consenso na atitude de grande disponibilidade que o Sr. Secretário de Estado acabou de manifestar perante esta Câmara.
No que diz respeito à necessidade de se corrigir os projectos de lei, penso que V. Ex.ª tem razão, pois a colaboração do Governo e dos elementos que ele entenda deverem colaborar - os quais o Parlamento

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está disposto a aceitar e até deseja - poderá, com certeza, contribuir para a correcção de alguns desses aspectos. É o caso das operações de tesouraria. A formulação que aparece nos projectos de lei está já corrigida por algumas das intervenções que aqui foram feitas hoje, designadamente pela minha, que proeurou comentar o projecto de lei do CDS. E evidente que não podem ser todas as operações de tesouraria, porque isso significaria uma autêntica inundação do Parlamento com uma relação de operações, que nada tem a ver com o controle da execução do Orçamento.
É sobre esses dois tipos específicos de operações com incidência directa na execução orçamental que recordei na minha intervenção e que tanto o Sr. Deputado Próspero Luís como o Sr. Secretário de Estado também referiram e que gostaríamos de ser informados.
Sr. Secretário de Estado do Orçamento, a questão que lhe queria pôr é a que referi há pouco e sobre ela gostaria de ouvir o seu comentário.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Secretário de Estado do Orçamento, vou ser muito breve nas referências que farei à sua intervenção.
Quero, em primeiro lugar, referir que, pela nossa parte - aliás é público, pois já o explicitámos várias vezes - também consideramos que há toda a conveniência em que uma lei deste tipo tenha o máximo consenso possível e de preferência a unanimidade da Câmara. Aliás, julgo que não será caso novo, na medida em que já se tentou isso, com sucesso, em 1983, quando se elaborou e aprovou a actual Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado.
Simplesmente, do nosso ponto de vista, a necessidade ou, pelo menos, a desejabilidade desse consenso não pode levar a que fique tolhido o poder de iniciativa da Assembleia da República em termos da apresentação dos seus projectos de lei.
Quanto à participação do Governo nesse processo, é claro e evidente que ela é absolutamente imprescindível. Há aspectos técnicos demasiado específicos para os quais convirá o apoio técnico, não apenas do Governo, mas do aparelho de Estado, da Administração Pública, das pescas que diariamente trabalham com a elaboração do Orçamento e com a sua execução. Aliás, isso nunca esteve em causa no seio da Subcomissão e com certeza que o Sr. Secretário de Estado sabe que foi feito um convite ao Governo para participar nos trabalhos da mesma. De qualquer forma, quero dizer-lhe que compreendemos perfeitamente o porquê da sua impossibilidade pessoal de prestar essa colaboração até ao momento.
Em relação à questão de eventuais propostas de difícil exequibilidade, pensamos que ela deverá ser discutida. Gostaria, no entanto, de chamar a atenção de V. Ex.ª para o facto de, apesar de tudo, esses casos que têm sido apontados de difícil ou mesmo impossível execução terem vindo a decrescer ao longo das reuniões da Subcomissão. Posso até informá-lo de que inicialmente chegou a ser apresentado como inexequível aquilo que actualmente já é exequível regularmente. É o caso da própria publicação do desenvolvimento do Orçamento, que é feita anualmente, dos mapas informativos anexos, que já têm sido fornecidos pelos anteriores governos, etc.
No entanto, admito que haja ainda um outro caso que necessite de uma ponderação e, nessa perspectiva, estaremos absolutamente dispostos e abertos a considerá-los e a analisá-los.
Termino, dizendo-lhe que o caso concreto que o Sr. Secretário de Estado apontou das operações de tesouraria já foi objecto de uma análise preliminar em sede de Subcomissão, tendo todos nós a consciência clara de que as propostas que cada um dos projectos de lei apresentam em relação às operações de tesouraria apontam para esses três grandes grupos de operações de tesouraria que V. Ex.ª há pouco referiu. Julgo que não será por aí que haverá problema em aparecer uma nova boa lei de enquadramento do orçamento do Estado e de se conseguir para ela um amplo consenso no seio da Assembleia da República. Esperemos que, quando recomeçarmos os trabalhos da Subcomissão, se possa concluir essa matéria rapidamente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Cravinho.

O Sr. João Cravinho (PS): - Sr. Secretário de Estado do Orçamento, como disse há pouco o Sr. Deputado Nogueira de Brito, as suas palavras deram-nos a certeza de que participará com muito interesse nos futuros trabalhos da Subcomissão, o que consideramos fundamental, na medida em que entendemos que o consenso deve ser obtido não só ao nível da Câmara mas também do Governo, beneficiando os trabalhos da crítica e do apoio que este puder dar em termos de fornecimento de elementos e sugestões.
Aliás, como também referiu o Sr. Deputado Nogueira de Brito, se fôssemos hoje apresentar de novo as nossas propostas, elas teriam já o benefício da discussão que se efectuou em sede de Subcomissão e certamente haveria aperfeiçoamentos.
Contudo, há aqui um problema extremamente importante, que é este: disse o Sr. Secretário de Estado que, em 1980, esteve na origem do despacho normativo que mandou contabilizar as despesas fiscais, o que, sem dúvida, o honra. Todavia, deverá ter também concluído que esse processo não é eficaz, visto que veio aqui dizer-nos que, infelizmente, muito pouco se progrediu, ou seja, ao que suponho, o despacho não terá obtido os efeitos desejados. Porquê? Porque os governos em Portugal - e não é o seu, nem o de 1980, nem este, são todos aqueles que até agora estiveram no poder depois do 25 de Abril não procuram realmente fazer realçar as virtualidades democráticas no próprio funcionamento da Administração, tendo em vista o controle das suas actividades. E o despacho normativo respeitante às despesas fiscais é bem exemplo disso.
Quer dizer, como a Assembleia da República, que é o órgão de fiscalização, não participou nessa actividade e como tudo se resume a um despacho normativo, que efectivamente ninguém fiscalizou, o que sucede é que esse normativo da maior importância ficou, digamos assim, praticamente sem efeito. Se o incluirmos na Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado o problema é totalmente diferente.
Assim, o que estamos aqui a querer não é valorizar o papel da Assembleia sobre o do Governo, ou seja, se V. Ex.ª quiser, diria "apagando o Governo". Pelo contrário, o que queremos é conjugar a Assembleia e

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o Governo, tirando do sigilo, colocando, digamos assim, na discussão democrática os aspectos fundamentais da despesa e receita públicas.
15so faz-se através de legislação que comprometa Governo e Assembleia numa análise racional, numa obtenção de informação sistemática e na assunção clara de responsabilidades.
E é isso que se pretende com a Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado. Assim, temos a certeza que teremos a sua colaboração.
Em todo o caso, há aqui um problema que julgo importante: as relações entre Governo e Assembleia da República estão neste momento de tal maneira enviesadas a favor do Governo que temos de dar um grande salto de inovação. Na verdade, estão enviesadas por isto: o Governo é que dispõe da informação, e é quem tem o processo de conhecer as coisas; a Assembleia da República não está equipada, direi que está subequipadíssima, não dispõe de autonomia de análise e de conhecimento que lhe permita aprofundar as matérias que são da sua responsabilidade.
Ora, este estado de coisas não pode prosseguir e o que se visa com a Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado é precisamente atingir pela raiz esse problema.
Esperamos ter a colaboração do Governo, porque não é este que está em causa, mas sim o fundamento da relação Governo/Assembleia da República numa sociedade democrática, que deve efectivamente pautar-se pelas regras que a experiência de outros parlamentos - muito mais, digamos, antigos que o nosso consagraram e por alguma boa razão.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: Sr. Presidente, vou proferir esclarecimentos muito breves.
Relativamente à questão colocada pelo Sr. Deputado Nogueira de Brito, é afirmativa a minha resposta. Efectivamente, V. Ex.ª realçou os aspectos do consenso, da importância da relação entre o Governo e a Assembleia nesta matéria.
Porém, o que coloquei em questão - e volto a fazê-lo outra vez foi a inoportunidade de tempo em o agendamento desta matéria ter coincidido com uma fase de elaboração de um orçamento do Estado que, como os Srs. Deputados terão oportunidade de ver dentro de muito pouco tempo, contém elementos informativos que, relativamente a outras propostas de lei relativas ao Orçamento do Estado, serão mesmo inéditos.
Portanto, este aspecto ainda se verificou simultaneamente com o trabalho de elaboração e o de colocar agora em execução o orçamento suplementar para 1985. Tudo isto, de facto, num espaço de tempo bastante apertado.
O Sr. Deputado Octávio Teixeira levantou questões sobre a exequibilidade ou não da Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado.
Ora, é evidente que estes aspectos das operações de tesouraria são importantes. O Governo não escamoteia e, aliás, neste aspecto também foi inovador quando, por alturas da apresentação da proposta de lei relativa ao orçamento suplementar para 1985, trouxe toda a informação que lhe era disponível em matérias de operações de tesouraria, que deveriam ser regularizáveis por via orçamental.
Simplesmente, aqui também há um problema técnico: é que quando se tratar do problema da informação e da fiscalização necessária e indispensável da Assembleia para as operações de tesouraria temos de ter em atenção que estas últimas não são orçamentais. E se as operações da tesouraria estão incluídas no Orçamento do Estado deixam de ser operações de tesouraria. Portanto, tem de haver aqui uma ponderação técnica e legal para evitar absurdos jurídicos, pelo que o Governo está naturalmente disponível para trabalhar com a Assembleia nesta matéria.
Quanto ao que o Sr. Deputado João Cravinho referiu para as despesas fiscais, o problema é em alguns aspectos de dificuldade material.
V. Ex.ª conhece com certeza um estudo, também comparado, sobre as despesas fiscais, em que há países muito mais avançados, com uma administração pública dispondo de outros meios de intervenção técnica muito superiores ao da Administração Portuguesa e que não têm os elementos sobre despesas fiscais tão desenvolvidos como se subentende que a Assembleia quer que o Governo lhe apresente.
Portanto, no que concerne às despesas fiscais há muitas maneiras de as tratar, pelo que me parece que deve haver aqui uma transparência dos elementos que o Governo dispõe, relativamente àqueles que a Assembleia terá de dispor.
Por conseguinte, o Governo não deve ocultar quaisquer elementos em relação à perda de receitas resultantes da concessão de incentivos fiscais. E não falo em benefícios fiscais, mas em incentivos, porque os benefícios devem ter uma duração muito precária. Assim, nesta matéria o problema é de capacidade técnica da Administração.
Mas, de qualquer maneira, como eu disse, ainda agora aquando da apresentação da proposta de lei relativa ao Orçamento do Estado para 1986, esta será acompanhada, em anexo informativo, dos elementos estatísticos disponíveis pelo Governo quanto às despesas fiscais.
Portanto, estamos perante uma câmara política, pois não têm carácter técnico, pelo que vou dispensar-me de discutir esses aspectos técnicos sobre as despesas fiscais, que aliás até me são bastante gratos em termos pessoais e académicos.
Quanto ao problema das estruturas da Assembleia, é evidente que esta tem de se equipar tecnicamente e, neste aspecto, muito terá de fazer. No entanto, não é só um problema da Assembleia, mas igualmente do próprio Governo, da Administração Pública, que nos toca a todos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, visto não haver mais inscrições, vou submeter à votação os projectos de lei n.ºs 48/IV, 92/IV e 94/IV, apresentados respectivamente pelo PCP, CDS e PS.
Penso que poderei colocar à votação conjunta estes 3 diplomas, se VV. Ex.as não virem nisso inconveniente.

O Sr. Rui Machete (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Rui Machete (PSD): - Sr. Presidente, pedia a V. Ex.ª que pusesse os diplomas em causa à votação separadamente.

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José Luís do Amaral Nunes.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Torres Couto.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Victor Hugo de Jesus Sequeira.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Francisco Barbosa da Costa.
Vasco da Gama Lopes Fernandes.

Partido Comunista Português (PCP):

Carlos Campos Rodrigues Costa.
Domingos Atarantes Ferreira.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
Joaquim Gomes dos Santos.
Maria Odete dos Santos.

Centro Democrático Social (CDS):

Abel Augusto Gomes de Almeida.
António José Borges de Carvalho.
Eugênio Nunes Anacoreta Correia.
Henrique José Pereira Moraes.
Henrique Manuel Soares Cruz.
José Luís Nogueira de Brito.
José Miguel Nunes Anacoreta Correia.
Manuel Tomás Rodrigues Queiró.
Narana Sinai Coissoró.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

José Pereira Lopes.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Mário Júlio Montalvão Machado.

Partido Socialista (PS):

Alfredo José Somera Simões Barroso.
António de Almeida Santos.
António Gonçalves Janeiro.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Teófilo Carvalho dos Santos.

Partido Renovador Democrático (PRD):

José Maria Vieira Dias de Carvalho.
Maria da Glória Padrão Carvalho.
Victor Manuel Ávila da Silva.

Partido Comunista Português (PCP):

António Anselmo Aníbal.
António Dias Lourenço da Silva.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.
Zita Maria de Seabra Roseiro.

Centro Democrático Social (CDS):

Adriano José Alves Moreira.
António José Tomás Gomes de Pinho.
Joaquim Rocha dos Santos.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

José Manuel do Carmo Tengarrinha.

Os REDACTORES:

- Cacilda Nordeste
- Ana Maria Marques da Cruz
- Carlos Pinto da Cruz.

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José Luís do Amaral Nunes.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Torres Couto.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Victor Hugo de Jesus Sequeira.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Francisco Barbosa da Costa.
Vasco da Gama Lopes Fernandes.

Partido Comunista Português (PCP):

Carlos Campos Rodrigues Costa.
Domingos Abrantes Ferreira.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
Joaquim Gomes dos Santos.
Maria Odete dos Santos.

Centro Democrático Social (CDS):

Abel Augusto Gomes de Almeida.
António José Borges de Carvalho.
Eugénio Nunes Anacoreta Correia.
Henrique José Pereira Moraes.
Henrique Manuel Soares Cruz.
José Luís Nogueira de Brito.
José Miguel Nunes Anacoreta Correia.
Manuel Tomás Rodrigues Queiró.
Narana Sinai Coissoró.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

José Pereira Lopes.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Mário Júlio Montalvão Machado.

Partido Socialista (PS):

Alfredo José Somera Simões Barroso.
António de Almeida Santos.
António Gonçalves Janeiro.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Teófilo Carvalho dos Santos.

Partido Renovador Democrático (PRD):

José Maria Vieira Dias de Carvalho.
Maria da Glória Padrão Carvalho.
Victor Manuel Ávila da Silva.

Partido Comunista Português (PCP):

António Anselmo Aníbal.
António Dias Lourenço da Silva.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.
Zita Maria de Seabra Roseiro.

Centro Democrático Social (CDS):
Adriano José Alves Moreira.
António José Tomás Gomes de Pinho.
Joaquim Rocha dos Santos.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

José Manuel do Carmo Tengarrinha.

OS REDACTORES: Cacilda Nordeste - Ana Maria Marques da Cruz - Carlos Pinto da Cruz.

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