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I Série - Número 37

Sexta-feira, 28 de Fevereiro de 1986

DIÁRIO da Assembleia da República

IV LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1985-1986)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 27 DE FEVEREIRO DE 1986

Presidente: Exmo. Sr. Fernando Monteiro do Amaral

Secretários: Exmos. Srs.

Reinaldo Alberto Ramos Gomes
José Carlos Pinto B. Mota Torres
António Eduardo Andrade de Sousa Pereira
José Manuel Mala Nunes de Almeida

SUMÁRI0. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 35 minutos.
Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da apresentação de requerimentos e da resposta a alguns outros, e da entrada na Mesa de vários diplomas.
A Sr.ª Deputada Cecília Catarino (PSD) falou sobre a importância do Programa de Reequilíbrio Financeiro da Região Autónoma da Madeira assinado entre os Governos Central e Regional e, no fim respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE) e Amónio Esteves (PS).
O Sr. Deputado João Amaral (PCP) criticou a conferência de imprensa ontem dada peto PSD e o financiamento proposto pelo Governo para as autarquias locais no Fundo de Equilíbrio Financeiro (OE para 1986). No fim, respondeu a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado José Lello (PS).
O Sr. Deputado Ramos de Carvalho (PRD) referiu-se à relevante função supletica em relação ao Estado desempenhada pelos clubes desportivos e analisou a sua situação financeira.
O Sr. Deputado Armando Vara (PS) trouxe à colação as principais carências que afectam o sector agrícola do distrito de Bragança, apontando algumas medidas tendentes à sua supressão. Depois respondeu a pedidos de esclarecimento da Sr.ª Deputada Margarida Tengarrinha.
O Sr. Deputado José Seabra (PRD) falou sobre a situação das vias de comunicação do distrito de Leiria.
Ordem do dia. - Após leitura, foi aprovado um relatório e parecer da Comissão de Regimento de Mandatos sobre substituição de Deputados.
Procedeu-se à apreciação, na generalidade, da proposta de lei n. º 5/IV (Altera o artigo 2. º da Lei n. º 75/79, de 29 de Novembro, sobre a Radiotelevisão).
Após a leitura do relatório respectivo da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, intervieram no debate, a diverso título, além do Sr. Ministro-Adjunto e para os Assuntos Parlamentares (Fernando Nogueira), os Srs. Deputados Sottomayor Cardia (PS), Jorge Lemos (PCP), Raul Castro e João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE), Raúl Rêgo (PS), Rui Machete e Costa Andrade (PSD), Borges de Carvalho (CDS), José Magalhães f PCP), Alexandre Manuel (PRD), Raul Junqueiro (PS), Correia Afonso (PSD), José Carlos Vasconcelos (PRD), Duarte Lima (PSD), Andrade Pereira (CDS), Jorge Lacão (PS), Lopes Cardoso (Indep.) e Manuel Alegre (PS).
Foi, depois, aprovado um requerimento, apresentado pelo PRD, solicitando a baixa a uma comissão eventual a ser constituída, para efeito de nova apreciação da proposta de lei em apreço.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 25 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 35 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Alberto Monteiro Araújo.
Amadeu Vasconcelos Matias.
Amândio Anes de Azevedo.
António d'Orey Capucho.
António Paulo Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Arlindo da Silva André Moreira.
Arménio Jerónimo Martins Matias.
Arnaldo Ângelo Brito Lhamas.
Aurora Margarida Borges de Carvalho.
Belarmino Henriques Correia.
Carlos Alberto Pinto.
Cecília Pita Catarino.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Domingos Duarte Lima.
Domingos Silva e Sousa.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando José Próspero Luís.
Fernando José Russo Roque Correia Afonso.
Fernando Manuel Cardoso Ferreira.

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Fernando Monteiro do Amaral.
Francisco Jardim Ramos.
Francisco Rodrigues Porto.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Henrique Rodrigues Mata.
João Álvaro Poças Santos.
João Domingos Abreu Salgado.
João Luís Malato Correia.
João José Pimenta de Sousa.
João Maria Ferreira Teixeira.
Joaquim Carneiro de Barros Domingues.
Joaquim da Silva Martins.
José de Almeida Cesário.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Filipe Atayde Carvalhosa.
José Francisco Amaral.
José Júlio Vieira Mesquita.
José Maria Peixoto Coutinho.
José Mendes Bota.
José Pereira Lopes.
Luís António Damásio Capoulas.
Luís António Martins.
Luís Jorge Cabral Tavares de Lima.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Joaquim Dias Loureiro.
Manuel João Vaz Freixo.
Manuel José Marques Montargil.
Manuel Maria Moreira.
Maria Antonieta Cardoso Moniz.
Mário Jorge Belo Maciel.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Miguel Fernando Miranda Relvas.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete.
Valdemar Cardoso Alves.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Vítor Pereira Crespo.

Partido Socialista(PS):

Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Aloísio Fernando Macedo Fonseca.
António de Almeida Santos.
António Cândido Miranda .Macedo.
António Frederico Vieira de Moura.
António Gonçalves Janeiro.
António Manuel Ferreira Vitorino.
António Miguel de Morais Barreto.
António José Sanches Esteves.
António Magalhães Silva.
António Manuel Maldonado Gonelha.
Armando António Martins Vara.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Luís.
Fernando Henrique Lopes.
João Cardona Gomes Cravinho.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Rosado Correia.
Jorge Lacão Costa.
José Augusto Fillol Guimarães.
José Luis do Amaral Nunes.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José dos Santos Gonçalves Frazão.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Luís Silvério Gonçalves Saias.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.
Mário Manuel Cal Brandão.
Mário Nunes da Silva.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Raul Manuel Gouveia Bordalo Junqueiro.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Victor Hugo de Jesus Sequeira.
Victor Manuel Caio Roque.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Alexandre Manuel da Fonseca Leite.
Ana da Graça Gonçalves Antunes.
António Alves Marques Júnior.
António Eduardo de Sousa Pereira.
António Lopes Marques.
António Magalhães de Barros Feu.
António Maria Paulouro.
Arménio Ramos de Carvalho.
Carlos Alberto Narciso Martins.
Carlos Alberto Rodrigues Matias.
Carlos Artur Trindade Sá Furtado.
Carlos Joaquim de Carvalho Ganopa.
Bártolo de Paiva Campos.
Fernando Dias de Carvalho.
Francisco Armando Fernandes.
Francisco Barbosa da Costa.
Hermínio Paiva Fernandes Martinho.
Ivo Jorge de Almeida dos Santos Pinho.
João Barros Madeira.
Joaquim Carmelo Lobo.
Joaquim Jorge de Magalhães Mota.
José Alberto Paiva Seabra Rosa.
José Caeiro Passinhas.
José Carlos Torres Matos de Vasconcelos.
José Carlos Pereira Lilaia.
Jaime Manuel Coutinho de Silva Ramos.
José Manuel Corujo Lopes.
José Luis Correia de Azevedo.
José Lopes Ferreira Casal.
José da Silva Lopes.
José Rodrigo de Costa Carvalho.
Maria Cristina Albuquerque.
Paulo Manuel Quintão Guedes, de Campos.
Roberto de Sousa Rocha Amaral.
Rui José dos Santos Silva.
Tiago Gameiro Rodrigues Bastos.
Vasco Pinto da Silva Marques.
Vitorino da Silva Costa.
Victor Manuel Lopes Vieira.

Partido Comunista Português(PCP)

Álvaro Favas Brasileiro.
António da Silva Mota.
António Vidigal Amaro.
Belchior Alves Pereira.
Carlos Campos Rodrigues Costa.
Carlos Manafaia.
Cláudio José dos Santos Percheiro.
Custódio Jacinto Gingão.
Francisco Miguel Duarte.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.

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João Carlos Abrantes.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Luís Manuel Loureiro Roque.
Maria Ilda da Costa Figueiredo.
Maria Margarida Tengarrinha.
Octávio Augusto Teixeira.
Zita Maria de Seabra Roseiro.

Centro Democrático Social (CDS):

Abel Augusto Gomes de Almeida.
António José Borges de Carvalho.
António Vasco Mello César Menezes.
Hernâni Torres Moutinho.
Horácio Alves Marçal.
José Maria Andrade Pereira.
Narana Sinai Coissoró.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Raúl Fernando de Morais e Castro.

Deputados independentes:

António Poppe Lopes Cardoso (UEDS).

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se ao anúncio dos documentos entregues na Mesa.

O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Na última sessão foram apresentados os seguintes requerimentos: a diversos Ministérios (6), formulados pelo Sr. Deputado Jorge Lemos e outros; a diversos Ministérios (3), formulados pelo Sr. Deputado Raul Junqueiro; aos Ministérios da Indústria e Comércio e do Trabalho e Segurança Social, formulado pelo Sr. Deputado Rui Silva; a diversos Ministérios (4), formulados pelo Sr. Deputado Francisco Armando Fernandes; ao Governo (3), formulados pelo Sr. Deputado António Sousa Pereira; a diversos Ministérios (5), formulados pelo Sr. Deputado Silva Lopes; ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, formulado pelo Sr. Deputado Vítor Ávila; ao Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação, formulado pelo Sr. Deputado José Seabra; ao Ministério do Plano e da Administração do Território, formulado pelos Srs. Deputados José Magalhães e Vidigal Amaro; ao Ministério da Administração Interna, formulado pelo Sr. Deputado José Mendes Bota.
Foram ainda recebidas as seguintes respostas a requerimentos: do Governo, aos requerimentos apresentados pelos Srs. Deputados Maria Santos, na sessão de 28 de Novembro; António Barreto, na sessão de 3 de Dezembro; Belchior Pereira, na sessão de 19 de Dezembro; João Corregedor da Fonseca, na sessão de 20 de Dezembro; Carlos Lilaia e Rogério Moreira, na sessão de 9 de Janeiro; Manuel Moreira, na sessão de 16 de Janeiro; António Osório, na sessão de 21 de Janeiro; António Tavares e outros, na sessão de 30 de Janeiro; José Magalhães e Daniel Bastos, na sessão de 4 de Fevereiro, e Ivo Pinho, na sessão de 6 de Fevereiro.
Deram entrada na Mesa os seguintes diplomas: projectos de lei n.ºs 145/IV, apresentado pelo Sr. Deputado Carlos Carvalhas e outros, do PCP, que aprova medidas tendentes à baixa imediata dos preços de venda ao público dos combustíveis - foi admitido e baixou à 9.ª Comissão; 146/IV, da iniciativa do Sr. Deputado Gomes de Pinho e outros, do CDS, relativo à Lei das Consultas Directas aos Cidadãos Eleitores - foi admitido e baixou à 1.ª Comissão; 147/IV, da iniciativa do Sr. Deputado Rui José dos Santos Silva e outros, do PRD, sobre concessão de pensões de preço de sangue e por serviços excepcionais ou relevantes - foi admitido e baixou à 10.ª Comissão; 148/IV, apresentado pelo Sr. Deputado Rui José dos Santos Silva e outros, do PRD, relativo ao seguro de pessoal dos corpos de bombeiros - foi admitido e baixou à 10.ª Comissão; 149/IV, da iniciativa do Sr. Deputado Carlos Coelho e outros, do PSD, sobre o enquadramento legal das associações de estudantes - foi admitido e baixou às 4.ª e 13.ª Comissões; 150/IV, apresentado pelo Sr. Deputado José Apolinário e outros, do PS, relativo ao estatuto das associações de estudantes do ensino secundário - foi admitido e baixou às 4.ª e 13.ª Comissões; 151/IV, da iniciativa do Sr. Deputado José Apolinário e outros, do PS, relativo ao estatuto das associações de estudantes do ensino superior - foi admitido e baixou igualmente às 4.ª e 13.ª Comissões; 152/IV, apresentado pelo Sr. Deputado José Luís Nunes e outros, do PS, sobre alienação de bens do Estado em empresas públicas de comunicação social - foi admitido e baixou à 1.ª Comissão; 153/IV, apresentado pelo Sr. Deputado Jaime Coutinho Ramos e outros, do PRD, sobre o regime jurídico das associações de estudantes do ensino médio e superior - foi admitido e baixou às 4.ª e 13.ª Comissões.
Deu ainda entrada na Mesa a ratificação n.º 56/IV, da iniciativa do Sr. Deputado João Amaral e outros, do PCP, relativa ao Decreto-Lei n.º 13/86, de 23 de Janeiro, que define o regime jurídico dos contratos de arrendamento de renda condicionada - foi igualmente admitida.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Catarino.

A Sr.ª Cecília Catarino (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Entre o Governo Central e o Governo da Região Autónoma da Madeira acaba de ser assinado o Programa de Reequilíbrio Financeiro daquela Região. É um acto que tem a maior relevância para esta parcela de Portugal e para o País em geral.
A política de desenvolvimento empreendida com sagacidade, competência e determinação pelo governo da região autónoma nesta última década, que permitiu recuperar atrasos de cinco séculos e meio de domínio colonial e centralista, dando corpo a grandes projectos de iniciativa do Estado, entre os quais assumem particular relevo não só os realizados nos domínios da saúde, da educação e da habitação, mas também, e sobretudo, nos domínio da infra-estruturas portuárias, aeroportuárias, de comunicação e de saneamento básico, traduziu-se num endividamento substancial e crescente da região.
Deve, desde já e de uma forma muito firme, sublinhar-se que o governo regional consignou rigorosamente só a investimentos os meios financeiros que foi obtendo fora do território da região autónoma,

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dando um exemplo de rigor na publicação dos dinheiros públicos bem diferentemente infelizmente do que se tem passado no continente.
Agiu se com celeridade para que em face das previsíveis taxas de inflação e desvalorização do escudo os custos não subissem a tal ponto que tornassem ínvia eis esses investimentos.
A obra realizada nestes anos pelo governo regional bem como a melhoria substancial das condições de vida das populações está bem à vista dos que quiserem ver. Só não as reconhecerão aqueles que por deformação grave queiram persistir na ignorância.
E não se esqueça que há dez anos a população da Madeira tinha um rendimento per capita de metade do da população do continente o que tornava imperioso e urgente recuperar o atraso e promover o desenvolvi mento.
E o surto de desenvolvimento e progresso experimentado por uma das mais carenciadas regiões de Portugal veio demonstrar que o 25 de Abril valeu a pena que o regime democrático permitiu e permite experiências regionais coroadas de êxito que ponham fim ao centralismo asfixiante e nos aproximarão cada vez mais da Europa saibamos nós aproveitar as oportunidades.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Temos dividas é verdade. Mas temos obra.
A situação de desequilíbrio financeiro a que se chegou resultava em grande medida da não aplicação por parte dos governos da Republica de algumas disposições constitucionais e estatutárias nomeadamente no tocante ao planeamento e desenvolvimento e económico social da região.
Quase sempre se encontrou incompreensão quando não nítida obstrução do Governo Central e insuficientes se revelaram as situações pontuais adoptadas
O programa de reequilíbrio financeiro da Região Autónoma da Madeira tão insistemente solicitado pelo governo regional e agora acordado que prevê a redução drástica da divida nos próximos cinco anos constitui um acto de coragem de competência de determinação e mesmo de patriotismo do governo do Prof. Cavaco Silva e veio demonstrar que havendo vontade política e uma leal e frutuosa colaboração entre órgãos de governo central e regional se resolvem os problemas do Pais.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora - A solidariedade da República Portuguesa assim manifestada à minha região consolida me equivocamente a unidade nacional e a opção portuguesa do povo madeirense.
Seja-nos permitido aqui e agora mais uma vez deplorar a deturpação omissão e calunia oriunda de tantos sectores e quadrantes políticos em relação à política seguida pelo governo da região ao serviço do povo madeirense.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Saberão Srs. Deputados que as dês pesas correntes são suportadas unicamente pelas receitas próprias da região e que o seu aumento anual tem
sido muito inferior a taxa de inflação o que revela a disciplina praticada no seio da administração publica madeirense?
Saberão Srs. Deputados as dificuldades que foi pré ciso vencer pá a se por de pé a obra que se conhece quando por exemplo a densidade populacional da Madeira e três vezes a do continente e a dos Açores quando a orografia só permite a utilização económica de um terço do território quando os municípios só por si não podem sobre viver financeiramente quando o investimento publico tem de representar mais de 60% do investimento total quando temos de importar por barco ou a ião mais de 80% do que consumimos?
As forças retrógradas não se cansam de procurar ofuscar a nossa experiência coroada de êxito apesar de todas as dificuldades especificas e da incompreensão.
A Madeira soube aproveitar as oportunidades nisto ricas para o seu desenvolvimento contribuindo desse modo para o progresso de Portugal.
Infelizmente ate ao actual governo jamais o Estado Português deu cumprimento a Constituição no sentido de serem definidos os imperativos constitucionais de participação na elaboração do Plano nacional por parte da Região Autónoma da Madeira bem como de participação na definição e execução das políticas fiscal monetária financeira e cambial de modo a assegurar o controle regional dos meios de pagamento em circulação e do financiamento dos investimentos necessários ao desenvolvimento económico social da região.
A Republica Portuguesa porem arrecadou sempre as receitas fiscais e os lucros das actividades bancária e seguradora na região as receitas fiscais sobre os lucros das empresas sediadas no continente e actuantes na Madeira. A Madeira propiciou só em 1985 em cambiais ao Estado Português 18 milhões de contos bem como os lucros resultantes das respectivas opera coes 65% dos 100 milhões de contos em poupança acumulada na banca madeirense estão aplicados no resto do território nacional e muitos outros são ainda os benefícios propiciados pela Região Autónoma da Madeira ao todo nacional.
Daí que as disposições constitucionais agora finalmente cumpridas não são a mera aplicação de um preceito mas antes e sobretudo a materialização de uma obrigação nacional.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Estamos conscientes de que outras regioes1do Pais designadamente as do interior sofrem de, carências idênticas aspiram também ao progresso ao desenvolvimento e a justiça social Sabemos bem da grave crise que o Pais atra essa em muito consequência da ineficácia dos governos centrais.
Nós madeirenses queremos aqui mais uma vez afirmar a nossa total solidariedade para com o todo nacional e muito particularmente para com as regiões e populações mais desfavorecidas.
Dispomo-nos aos sacrifícios necessários para que em conjunto encontremos rapidamente os rumos do progresso de Portugal na eliminação das profundas assimetrias existentes.
Ao actual Governo e em particular ao Sr. Primeiro Ministro Prof. Cavaco Silva que vemos animado deste firme propósito não regatearemos o nosso apoio.

Aplausos do PSD.

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O Sr. Presidente: - Inscreveram-se para formular pedidos de esclarecimento os Srs. Deputados João Corregedor da Fonseca e António Esteves.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr.ª Deputada Cecília Catarino, a determinada altura da sua intervenção V. Ex.ª referiu que o 25 de Abril valeu a pena. É evidente que é grato ouvirmos sempre alguém referir-se a isso para que não restem dúvidas de que defendemos a autonomia das Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores.
Porém, em relação a este problema, V. Ex.ª deve estar recordada do que se passou o ano passado e nos anos anteriores aquando da discussão do Orçamento do Estado, em que o problema da Madeira foi considerado pelos governantes como perfeitamente assustador. Esta questão não se coloca tanto em relação aos Açores, pois há um outro equilíbrio, mas em relação à Madeira a situação é terrífica.
Na intervenção que proferiu, V. Ex.ª diz por que é que se chegou a esta situação e atira as culpas para os governos centrais, dizendo que não foram postos em execução o planeamento e o desenvolvimento económico-sociais da região. Ora, gostaria que a Sr.ª Deputada esclarecesse um pouco melhor este aspecto.
Também gostava de saber como é que a Madeira pode justificar uma dívida de 50 milhões de contos, mais 10 milhões de contos de juros para 1986. Já agora, gostaria de ser informado sobre qual o produto interno bruto da Madeira, o que é que esta ilha produz, quais as garantias que ela dá e como é que se pôde chegar a uma dívida tão grande.
Como é que a Sr.ª Deputada justifica as afirmações ontem proferidas pelo Sr. Ministro das Finanças quando foi assinado o Protocolo de Reequilíbrio Financeiro entre o Governo Central e a Madeira, uma vez que esta vai receber 14 milhões de contos mais 10 milhões de contos para pagamento de juros, em que o Sr. Ministro disse: ,
A dívida não é sustentável nem dispensável e que, por isso, é preciso pôr termo à sua escalada e condicionar-lhe as despesas públicas regionais.
É evidente que, em última análise, a responsabilidade cabe aos governos centrais, pois deviam ter posto um travão à situação caótica que se vive na Madeira.
Gostaria que a Sr.ª Deputada me esclarecesse as questões que coloquei e, nomeadamente, que fizesse o comentário às afirmações ontem publicamente proferidas pelo Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Presidente: - Sr.º Deputada, V. Ex.ª deseja responder já a este pedido de esclarecimento, ou no fim de todos os pedidos de esclarecimento?

A Sr.ª Cecília Catarino (PSD): - Prefiro responder no fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra o Sr. Deputado António Esteves

O Sr. António Esteves (PS): - Sr.ª Deputada Cecília Catarino, ouvi com atenção a sua intervenção e, sem pôr em causa aquilo que são os naturais e falados
custos da insularidade, porque vi hoje nos jornais que a dívida da Madeira é da ordem dos 50 milhões de contos, gostaria de ser informado sobre se, de facto, a dívida atinge mesmo esse montante.
A aplicação desse dinheiro ao desenvolvimento da Região Autónoma da Madeira é de molde a permitir condições a que essa dívida seja paga em termos normais e razoáveis? Queria ainda saber se esse pagamento vai resultar através de uma oneração sistemática e futura do Orçamento do Estado ou se, antes pelo contrário, o gasto desse dinheiro há-de produzir a riqueza necessária ao pagamento da dívida.
Quando a Sr.ª Deputada falou nos fluxos financeiros importantes da ordem dos 18 milhões de contos que trariam para o Estado Português altos benefícios, pareceu-me que V. Ex.ª queria concluir que por isso a Madeira se sentia prejudicada. Ora, também sou deputado eleito por uma região que gera elevados fluxos financeiros e lembro - pois este é um número conhecido - que no Algarve são geradas divisas da ordem dos 90 milhões de contos e as entidades do Algarve não têm dívidas visíveis e recebem, através do Orçamento do Estado, umas magras centenas de milhares de contos. Não sei se o que a Sr.ª Deputada queria concluir era que, apesar dessa grande divida, a Madeira ainda está prejudicada porque contribuiu para o continente com fluxos assinaláveis, como são esses 18 milhões de contos de divisas. Será que a Madeira ainda quer mais, além daquilo que neste momento é a dívida conhecida, com alguma estupefacção por parte de muitos portugueses que não compreendem bem tal problema? Aliás, eu próprio também não o compreendo e gostaria que a Sr.ª Deputada mo explicasse.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr.ª Deputada Cecília
Catarino.

A Sr.ª Cecília Catarino (PSD): - Srs. Deputados João Corregedor da Fonseca e António Esteves, agradeço muito as perguntas que me colocaram e sem desprimor para o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, vou começar por responder a um pedido de esclarecimento formulado pelo Sr. Deputado António Esteves porque não quero que paire, nem de perto nem de longe, qualquer ideia nesta Assembleia e no País que por a Região Autónoma da Madeira permitir uma receita ao Estado Português de 18 milhões de contos em cambiais, isso tem alguma coisa a ver com o facto de a Madeira se achar ou não prejudicada.
Não, Sr. Deputado, não se trata disso! O que quis e quero demonstrar é que a solidariedade entre as regiões autónomas e o continente deve funcionar nos dois vectores: solidariedade da região autónoma para com o todo nacional, propiciando ao todo nacional e ao Estado Português todas aquelas contribuições que, por força da sua própria situação, pode fornecer.
Portanto, quando na Região Autónoma da Madeira podemos ter uma receita de cambiais de 18 milhões de contos, sentimo-nos satisfeitíssimos pelo facto de com isso podermos contribuir para o progresso de Portugal no seu todo. Não há aqui qualquer espécie de sentimento no sentido de acharmos que estamos a dar uma coisa ao Estado Português a que ele não tem direito. O Estado Português tem direito a receber esses cambiais porque há uma parcela do território - que por acaso é a Madeira - que tem essas receitas que são não só da região mas, sobretudo, do todo nacional.

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Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Queria que este aspecto ficasse bem frisado porque muitas vezes há confusões.
Em relação às questões colocadas pelo Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca e porque não disponho de muito tempo para responder quero lembrar o seguinte no n 1 do artigo 231 da Constituição estabelece se que os órgãos de soberania asseguram em cooperação com os órgãos do governo regional o desenvolvimento económico e social das regiões autónomas visando em especial a correcção das desigualdades derivadas da insularidade e por outro lado segundo a alínea f) do artigo 229 as regiões autónomas podem aprovar o plano económico regional o orçamento regional e as contas da região e participar na elaboração do plano nacional.
O Estatuto da Região Autónoma por seu lado consagra no artigo 50 que o desenvolvimento económico e social da região de era processar se dentro das linhas definidas pelo plano regional integrado no plano nacional que diligenciará pelo aproveitamento das potencialidades regionais e pela promoção do bem estar do nível e da qualidade de vida de toda a população com vista à realização dos princípios constitucionais.
Ora Sr. Deputado o que se tem verificado nestes últimos anos é que não tem havido participação nos dois sentidos na elaboração do plano nacional Normalmente o que até agora se tem verificado é- que na Região Autónoma da Madeira que estava num sistema de atraso que qualquer um dos Srs. Deputados que a visitou antes do 25 de Abril pode constatar se tornava imperioso - sob pena de os custos se agravarem extraordinariamente e de se chegar a um ponto em que não era minimamente possível fazer as obras indispensáveis - que o governo regional desenvolvesse imediatamente as acções indispensáveis para obstaculizar o atraso em que se vivia naquela região.
Foi pois nesse sentido que o governo regional trabalhou afectando rigorosamente todos os financiamentos obtidos a obras de investimento Não se gastou um único tostão em consumos mas sim em investimentos
Sr. Deputado e um facto que temos uma divida grande Porem V. Ex.ª referiu apenas uma parte do discurso do Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Foi a parte mais substancial Sr.ª Deputada!

A Oradora: - Permito-me ler uma parte do discurso do Sr. Ministro das Finanças quando refere que é do domínio publico o surto de progresso que a Região Autónoma da Madeira tem vindo a conhecer no decurso dos dez últimos anos Sem por minimamente em causa o dinamismo e a competência da administração regional a qual presto a minha homenagem não se poderá alvitrar que uma tal evolução pressupõe uma necessidade de significativo financiamento [...].
Portanto Sr. Deputado ha o reconhecimento de que há um endividamento e uma situação que é preciso suster mas essa situação só não foi sustida há mais tempo por incompreensão e falta de vontade política dos governos centrais
Sr. Deputado não disponho de muito tempo mas se for preciso posso fornecer a cópia de uma declara cão produz da por membros responsáveis dos governos centrais em que inclusivamente se chegou a sustentar e de certo modo a julgar a ideia de irmos para uma situação de ruptura da tesouraria inclusivamente não pagando ao funcionalismo publico.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Isso é grave!

A Oradora: - Sr. Deputado tudo isto e muito complicado!

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Dá-me licença que a interrompa Sr.ª Deputada?

A Oradora: - Faça favor Sr. Deputado.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr.ª Deputada não acha que aquando da discussão do Orçamento do Estado a Madeira tem possibilidades de esclarecer o porque de todas as dividas. Gostaria de ter o relatório completo para o esclarecimento publico da divida que se obteve

A Oradora: - Sr. Deputado ía concluir esta intervenção dizendo que no debate do Orçamento do Estado para este ano teremos todo o gosto em esclarecer todas as duvidas que forem suscitadas pelos Srs. Deputados da oposição quanto a esta matéria.
Em relação a uma dúvida levantada pelo Sr. Deputado António Esteves gostaria ainda de dizer que na realidade a divida é a que o Sr Deputado mencionou e no que respeita a saber como e que ela ai ser paga terei todo o gosto em lhe facultar o texto do protocolo assinado na medida em que não disponho de mais tempo para poder estar a responder ponto por ponto àquilo que perguntou

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente Srs. Deputados: A posição publica de confronto com a Assembleia da Republica ontem assumida oficial mente pelo Partido Social Democrata põe claramente em evidencia que o governo do Dr. Cavaco Silva em vez de querer governar quer e impor às instituições e ao País um autentico diktat baseado na pretensa indiscutibilidade das suas opiniões na intenção de se apropriar das competências dos outros órgãos de soberania e na tentativa de imposição intimidatória das suas opções.
Oito dias depois da derrota que sofreu nas eleições presidenciais o PSD em vez de assumir o respeito devido às decisões democraticamente tomadas no exercício das competências próprias deste orgão de sobe rama utiliza a comunicação social tentando irar o Pais contra a Assembleia da Republica para lhe tentar impor as suas opiniões partidárias e o seu modelo de política

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Tudo se passa como se afinal o PSD e o Governo quisessem deixar claro perante a opinião publica que de boa vontade prescindiriam da existen

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cia da Assembleia, como se tivessem a intenção de instituir a censura do debate democrático e a amputação da representação popular.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O «deixem-nos governar» transforma-se no «quero, posso e mando», de que não entende - ou faz de conta que não entende - que incumbe a esta Assembleia exercer, com responsabilidade, mas com liberdade, as suas competências em defesa dos interesses do povo, da democracia, do País.

Aplausos do PCP, do MDP/CDE e de alguns Srs. Deputados do PS.

A Assembleia, os deputados, há-de fazê-lo, no quadro das iniciativas que lhe sejam presentes e no seu debate e ponderação; hão-de fazê-lo onde seja necessário, justo e adequado.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Esse, Srs. Deputados, é o compromisso que assumimos e devemos ao País.

Aplausos do PCP.

Em múltiplos campos.
Abordarei especialmente um desses campos, o do sistema de financiamento das autarquias locais.
O valor global da verba do Fundo de Equilíbrio Financeiro proposto pelo Governo situa-se em escassos 15 % de variação em relação ao que receberam no ano anterior.
Nenhuma razão pode justificar esta opção.
O poder local, num país marcado por profundas carências e acentuadas assimetrias, é reconhecidamente uma trave mestra do desenvolvimento e do bem-estar das populações. Ninguém nega o esforço realizado pelos eleitos locais na melhoria das condições de vida das populações, como ninguém nega a alta rendibilidade dos investimentos realizados pelas autarquias.
Os valores que anualmente têm vindo a ser inscritos no Orçamento do Estado para transferência para as autarquias têm vindo a degradar-se ano a ano.
A percentagem do FEF em relação ao total da despesa pública orçamentada caiu de 5.ª em 1984 para 4.ª em 1985 e agora, na proposta apresentada, para 4.ª. A mesma queda se verifica em relação aos valores do PIB.
Não é só neste aspecto que a proposta governamental está errada.
É que, na distribuição município a município, a proposta, se fosse aprovada, traduzir-se-ia no agravamento dos desequilíbrios regionais, já que, em geral, ela joga em desfavor dos distritos e municípios do interior.
Basta ver, por exemplo, que enquanto a variação é de 16,5% para o distrito do Porto ou de 21,5% para o distrito de Faro, ela não atinge os 15% em distritos como Castelo Branco, Santarém, Évora, Portalegre e Beja, com variações respectivamente de 14,0%, de 10,2%, de 9%, de 8,6% e de 9,0%.
A nível de municípios as distorções são significativas.
Pelo menos 62 municípios têm uma variação inferior a 10% enquanto 31 têm variações superiores a 20%, dos quais 5 variações superiores a 30%.
Num mesmo distrito, o fosso é por vezes gritante. Por exemplo, no distrito de Bragança, Mirandela tem uma variação de 5,3% e Freixo de Espada à Cinta de 31,2%. No distrito de Faro, Albufeira tem 36,4%, enquanto Alcoutim tem 5%, Castro Marim 5%, São Brás de Alportel, 9,1% e Vila do Bispo 5,4%.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Municípios há em que se estabeleceu a moda, ou do grande aumento, ou, ao contrário, do aumento reduzido.
Por exemplo: Campo Maior variou 7,9% de 1984 para 1985 e agora a proposta é de 5,0%. Alcanena variou de 1984 para 1985 7,9% e agora é proposto 5%.
O mesmo para Vila Nova da Barquinha e Benavente.
Há situações de variação de valores que, ou são inexplicáveis ou demonstram a completa falência dos critérios. Por exemplo, Tomar variou de 1984 para 1985 27,7% e este ano é proposto 9,1%!
Obviamente, Srs. Deputados, que num quadro destes é totalmente impossível fazer justiça. Pelo menos, justiça «justa».
Essa só será possível no quadro da revisão profunda da Lei das Finanças Locais. O PCP já apresentou, logo na primeira reunião da Assembleia, um projecto de lei sobre a matéria. Apelamos aos partidos que anunciaram ir tomar idênticas iniciativas para que as concretizem. Como os factos demonstram, trata-se de um debate urgente, que nenhuma razão justifica continuar a adiar-se!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Mas o facto de não existir ainda a necessária revisão da Lei de Finanças Locais não pode justificar que não se faça, ao menos, a justiça possível.
Os municípios, a Associação Nacional de Municípios, reclamam uma variação do FEF de 25%, com a garantia de um mínimo de 20% para cada município.
O Governo, por tudo o que fez e disse até ao momento, não mostra qualquer disponibilidade para alterar a sua proposta e para dialogar seriamente com as autarquias locais.
Que o faça então a Assembleia da República.
Nesse sentido, anuncio que o Grupo Parlamentar do PCP apresenta hoje na Mesa da Assembleia da República uma proposta de substituição no mapa vi, município a município, propondo um aumento global de cerca de 25%, respeitando as situações dos municípios que recebiam mais do que isso na proposta do Governo e garantindo que nenhum município receberá menos do que 24,857%.
A proposta de substituição apresentada pode implicar que todos os acréscimos em relação à proposta do governo sejam imputados a despesa de capital. É uma solução possível, não necessária.
Estamos certos que, com sentido de justiça, a Assembleia da República assumirá responsavelmente a defesa do poder local e a garantia mínima da sua autonomia financeira.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado José Leio.

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I SÉRIE — NUMERO 37

O Sr José Leio (PS) — Sr Deputado João Ama ral ouvi o com atenção e dei me conta que a dado passo da sua intervenção o Sr Deputado referiu pres soes e criticas de teor demagógico da parte designa damente do Sr Primeiro Ministro do Governo e do PSD à Assembleia o que se pode considerar uma manifesta e intolerável intromissão no funcionamento regular regimental e normal da Assembleia da Repu blica

Por essa razão e dada a referencia que V Ex aqui fez a esse tipo de atitude pergunto se não considera que essa barrage sobre o Parlamento por parte do Governo e do partido governamental não constitui em si mesma uma tentativa de governamentalizar a Assem bleia da Republica

O Sr Duarte Lima (PSD) — A Assembleia da Republica é que quer parlamentanzar o Governo'

O Sr Presidente — Para responder tem a palavra o Sr Deputado João Amaral ;

JO

O Sr João Amaral (PCP) — Sr Deputado José Leio tenho a maior consideraçâo pela autonomia régio nal nomeadamente pela situação e pelos problemas que possam existir na Região Autónoma da Madeira só que quando soube que a primeira inscrição no período de antes da ordem do dia era do PSD o que pensei naturalmente foi que o PSD iria tratar nesta Casa o que a esta Casa compete tratar s o

Vozes do PCP e do MDP/CDE — Muito bem'

O Orador — Mas não se verificou isso O que se verificou foi que o PSD utiliza a comunicação social faz uma conferencia de imprensa para fora da Assem bleia tentar resolver o que não consegue resolver den tro da Assembleia o que traduz uma questão muito simples o PSD tem uma enorme dificuldade em côa bitar com a oposição , (

c o Vozes do PCP — Muito bem1 T

O Orador — O PSD não se dá com a oposição Aplausos do PCP do PS e do MDP/CDE '

O Sr Presidente — Para uma intervenção tem a pala rã o Sr Deputado Ramos de Carvalho

t

O Sr Ramos de Carvalho (PRD) — Sr Presidente Srs Deputados Nos termos do n 2 do artigo 79 da Constituição incumbe ao Estado promover onen tar e apoiar a prática e a difusão de cultura física e do desporto em colaboração com as escolas e as asso ciaçao desportivas

Foi certamente dentro destes parâmetros que o ante nor Governo entendeu necessário definir os princípios e as normas que devem orientar a intervenção dos poderes públicos nesta área e o seu relacionamento com os vá los agentes desportivos estabelecendo assim as bases gerais do sistema desporti o tendo para tal efeito promulgado o Decreto Lei n 164/85 de 15 de Maio ainda não regulamentado Prevê se neste decreto lei entre outras orientações os meios de apoio do Estado às pessoas colectivas de direito privado com

atribuições no âmbito do desporto tais como conces são de subsidio incentivos à construção de infra estruturas e equipamento formação de praticantes dirigentes técnicos desporti os e demais participantes nas actividades desportivas fornecimento de material e ser iços na realização de pró as desportivas fome cimento de elementos informativos e documentais incenti os a estudos técnicos desportivos estabeleci mento de relações com organismos internacionais <_ com='com' de='de' reflecte='reflecte' poderá='poderá' praticantes='praticantes' mais='mais' grandes='grandes' du='du' das='das' maioria='maioria' concordar='concordar' ela='ela' tem='tem' orientação='orientação' ida='ida' nomea='nomea' ao='ao' pró='pró' dirigentes='dirigentes' as='as' deste='deste' desportivas='desportivas' esta='esta' evidente='evidente' economicamente='economicamente' afligem='afligem' que='que' deixar='deixar' seus='seus' espirito='espirito' dedica='dedica' dos='dos' damente='damente' preocupações='preocupações' se='se' çao='çao' desporto='desporto' sem='sem' não='não' pois='pois' tanta='tanta' a='a' quer='quer' e='e' sócios='sócios' dado='dado' sacrifício='sacrifício' é='é' modestas='modestas' sombra='sombra' aquelas='aquelas' grande='grande' pais='pais' p='p' elevado='elevado' associações='associações'>

Por outro lado torna se necessário dignificar o con ceito de desporto através da implementação de fortes e penetrantes campanhas de formação para um correcto e sadio modo de estar na ida desporti a

De facto as moti açoes no desporto são inúmeras a provocarem não raras distorsoes na sua filosofia e a solicitarem pronta intervenção do Governo "i

Sem prejuízo da acuidade que nos merecem os demais factores de desen olvimento desportivo a for mação a todos os níveis reveste se de importância capi tal e e indubitavelmente um dos meios mais relê antes do apoio do Estado às estruturas associativas no âmbito do desporto É no sentido de chamar a atenção desta Camará a razão desta minha intervenção com a fina lidade de sensibilizar os poderes públicos para a neces sidade que penso urgente de ajudar a resolver os pró blemas com que se debate como atrás referi a grande ma ona dos clubes desportivos mesmo aqueles que albergam no seu seio praticantes profissionais

jSr Presidente Srs Deputados Não pretendo nem e esse o espirito ,desta inter ençao formular aqui os meios de fomento apoio e intervenção do Estado no desporto mas indubita el é que os clubes vem desem penhando em relação ao Estado nesta área uma fun çao supletiva de grande relevo t ^ ^

Permitam me contudo no que respeita a apoios financeiros chamar a atenção desta Camará parado facto de já se encontrar publicada legislação que com a sua aplicação tem vindo a gerar receitas precisa mente destinadas ao Fundo de Fomento do Desporto para apoio aos clubes desportivos Refiro me natural mente à legislação que regula a exploração de salas de bingo fora dos casinos

Com efeito foi inicialmente publicado o Decreto Regulamentar n 41/82 de 16 de Julho de 1982 que no seu artigo 26 estabelece a seguinte distribuição de receitas para as seguintes entidades 5*7 para o FAOJ 5% para o Fundo de Fomento de Desporto para apoio aos clubes desportivos instituições de uti hdade publica do concelho onde foram geradas as recei tas l O 97 para as comissões regionais de turismo que abranjam no seu âmbito os concelhos onde foram gera das as receitas S V para o Fundo de Turismo 5% para a Inspecção de Jogos ,/f

Foi depois publicado o Decreto Regulamentar n 70/82 de 25 de Outubro de 1982 a prever no seu artigo l que quando as concessionárias da explora çao das salas de bingo forem colectividades desporti vás a seguinte distribuição de receitas 5% para o

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Fundo de Fomento de Desporto, para apoio aos clubes desportivos com sede no concelho onde foram geradas as receitas ou nos concelhos limítrofes e que não explorem o jogo; 5% para as comissões regionais de turismo; 5% para o Fundo de Turismo; 5% para a Inspecção de Jogos.
Mais tarde, foi publicado novo Decreto Regulamentar, com o n.º 18/85, de 19 de Março de 1985, que veio alterar não só os critérios de distribuição das referidas receitas brutas, como também as respectivas percentagens, revogando o Decreto Regulamentar n.º 70/80.
O referido artigo 26.º do Decreto Regulamentar n.º 41/82 encontra-se actualmente redigido com a seguinte distribuição no que respeita ao desporto: 5,5% para o Fundo de Fomento de Desporto para apoio aos clubes desportivos de utilidade pública que não explorem o jogo. E quando as concessionárias de exploração das salas de bingo, forem colectividades desportivas, a distribuição bruta será seguinte: 2,5% para o Fundo de Fomento de Desporto, para apoio aos clubes desportivos de utilidade pública que não explorem o jogo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao indicarem-se sucintamente os critérios de distribuição e as respectivas percentagens, fazemo-lo por nos parecer que as alterações no mesmo não foram as mais justas, quer quanto às receitas a atribuir aos clubes quer quanto às outras entidades contempladas na sua distribuição.
Se, à primeira vista, poderá parecer que tal situação não terá grande importância, logo tal convicção se altera se tivermos em conta que, só no que diz respeito às verbas geradas para o Fundo de Fomento do Desporto, para apoio aos clubes desportivos desde o inicio das respectivas explorações, facilmente se poderá concluir da relevância de tal situação:

Assim no ano de 1983 as verbas geradas atingiram o montante de.... 53 759 000100
No ano de 1984 ............. 142 203 000$00
No ano de 1985 ............. 175 051 000$00

O que perfaz, nestes 3 primeiros anos ...................... 371 013 000$00

Mas o mais importante de toda esta questão, e que deverá merecer a nossa atenção, é que estas verbas, já produzidas, ainda não foram distribuídas pelos clubes que a elas têm direito.
Nem sequer foram distribuídas aquelas previstas numa legislação inicial posteriormente alterada e revogada, que mandava distribuir as respectivas receitas pelos clubes dos concelhos onde elas eram geradas.
Aconteceu pelo menos em relação aos clubes do concelho de Coimbra, onde existe uma sala em exploração.
Isto por falta do estabelecimento de critérios quanto à sua distribuição para apoio aos clubes, e já lá vão mais de 3 anos, o que não acontece quanto às outras entidades contempladas legalmente.
Poder-se-á compreender que não seja fácil estabelecer tais critérios, mas o que não se poderá aceitar é que se leve tanto tempo a estabelecê-los, sabendo-se das dificuldades com que tantos clubes desportivos se debatem, mormente aqueles que desenvolvem tarefas e fomentos que cumpririam ao próprio Estado.
Julgamos, por isso, que o Governo deverá, urgentemente, estabelecer os respectivos critérios de distribuição de apoio aos clubes, para que os mesmos não sejam processados, como tantas vezes acontece por pressões de toda a natureza.
Deverá ser evitado que os apoios possam ser uma simples e linear distorção de meios financeiros e procurem sim a viabilização de projectos e programas de interesse recíproco em domínios desfavorecidos da intervenção educativa e social do desporto.
Por último, em ordem à moralização e transparência da causa pública, seria bom que os apoios a conceder aos clubes, como subsídios, etc., fossem publicados no Diário da República, a exemplo do que o Governo já anunciou em relação a outros tipos de subsídios.

Vozes do PRD: - Muito bem!

O Orador: - Evitar-se-iam, assim, no mínimo, especulações e descabidos proteccionismos.

Aplausos do PRD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Armando Vara.

O Sr. Armando Vara (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Represento uma região conhecida pelas qualidades de trabalho e determinação das suas gentes, que sempre responde afirmativamente às solicitações e aos desafios que lhe são colocados. Todavia, o reconhecimento por parte dos poderes públicos nunca foi o desejável de tal forma que hoje se encontra impregnada de um substancial atraso em sectores de grande importância para o futuro da região.
Teria interesse, a propósito da discussão aqui travada acerca das verbas para a Região Autónoma da Madeira, estabelecer uma comparação entre os investimentos realizados numa região e noutra.
Sem querer repetir aquilo que já diversas vezes foi dito e recusando o discurso miserabilista que normalmente apresenta a região como uma terra sem potencial humano necessário ao seu desenvolvimento, importa referir que a população de Trás-os-Montes, particularmente a do distrito de Bragança, é fundamentalmente rural, com uma percentagem de ocupação na agricultura superior a 52% do total da população activa, aí residindo uma das razões, senão a principal razão, do baixo rendimento das populações do distrito. Estudos publicados há relativamente pouco tempo estabelecem uma comparação entre o distrito de Bragança e a região de Hamburgo, em matéria de produtividade, de 1 para 12.
Ora, sendo esta região parte integrante de um país que acaba de aderir à CEE, o que está mal na agricultura do distrito de Bragança?
Primeiro, a falta de infra-estruturas básicas que proporcionem as necessárias economias de escala para que a exploração se torne rentável, destacando-se a necessidade de vias de comunicação que escoem os produtos para os mercados consumidores em condições de inalterabilidade das suas características;
Segundo, um quadro institucional adequado que se adapte à estrutura de produção daquela área, como seja a criação de mercados de primeira transacção, que garantam o escoamento dos produtos agrícolas a um

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determinado preço de referência e que estejam habilitados a promover a continuidade das transacções nos circuitos comerciais mais alongados;
Terceiro, a falta de coordenação, entre as produções a montante e as transformações dos produtos a jusante, por forma a obviar à: falta de aproveitamento da capacidade produtiva instalada no Complexo agro-industrial do Cachão, desenvolvendo-se para isso um programa de produção agro-pecuária integrada que passa necessariamente por um. reordenamento cultural, um redimensionamento da propriedade agrícola e a introdução de factores de produção de reconhecida produtividade técnica;
Quarto, a exiguidade de investimento no sector agrícola e o excessivo grau de subemprego motivado pelo sobredimensionamento do número de efectivos agrícolas e ainda da estrutura etária desses efectivos;
Quinto, a falta de pequenas albufeiras que permitam o aproveitamento das águas de superfície que, dadas as características do relevo, tornem possível não só aproveitar grandes quantidades como ainda fazer convergir diversas fontes para uma só albufeira. Para além das transformações que permitiria em matéria de solos - passagem de culturas de sequeiro para regadio, poderia em alguns casos ter um aproveitamento energético que aliviasse a nossa dependência e rentabilizasse ainda mais a exploração desse tipo de infra-estruturas.
Sem ser demasiado fastidioso na exposição dê carências lembro contudo que nesta altura- desintegração europeia que deve ser de redimensionamento da economia portuguesa, as instituições públicas e o poder político têm de estar preparados e ter capacidade de resposta, orientando convenientemente os fundos comunitários ao nosso dispor, suscitando, também por essa via um forte entusiasmo e uma são mobilização por parte dos agentes na transformação da estrutura económica do País e particularmente neste caso rio distrito de Bragança.
Deveriam, pois, ser desenvolvidas, de imediato, actividades que permitissem: o aproveitamento das verbas constantes do programa dê auxílio ao sector agrícola para colmatar no mais curto espaço de tempo as principais dificuldades evidenciadas atrás, assumindo para isso um calendário que seja coerente com á hierarquização em termos de importância de cada medida ê com o seu reflexo económico-social, por forma a que venham a ser convenientemente aproveitadas; o aproveitamento dos fundos do FEDER para que nos distritos de Vila Real e Bragança possam acelerar a construção dos troços da via rápida Porto-Bragança, nó sentido de rapidamente suprir o forte estrangulamento causado pelas vias de comunicação!

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Estabelecer, desde já;, programas; .de ordenamento cultural em sintonia com uma política de solos e redimensionamento de propriedade por forma a conseguir criar condições para produções competitivas quer pela qualidade quer pelo custo; através da criação de centros de formação profissional, estimular os mais jovens e mais vocacionados a desenvolverem actividades que estejam enquadradas num programa integrado de desenvolvimento para a região, como sejam a exploração ê ou transformação de produtos do sector agro-pecuário, a criação, de unidades hoteleiras de reconhecida utilidade, turística permitindo o aproveitamento, integral dos recursos naturais da região procurar sensibilizar os nossos vizinhos espanhóis nó sentido de encontrar, soluções para problemas comuns, particularmente em zonas, fronteiriças, com vista à obtenção de vantagens recíprocas no domínio das actividades económicas de que se destaca prolongamento da via rápida Porto Bragança para Espanha bem como à abertura de fronteiras.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para além das medidas apontadas, promover a regionalização do País terá de ser, no presente, a grande reforma. Acreditar nas potencialidades e capacidades das populações do interior é das várias regiões do País para localmente avaliar e resolver os principais estrangulamentos é o grande desafio do presente. Não podem os mais altos responsáveis continuar a passar pelo Nordeste Transmontano, em tempo de eleições prometendo o céu e a terra para persistirem os mesmos problemas, para tudo ficar na mesma. É preciso regionalizar para desenvolver.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Trás-os-Montes, quer desenvolver-se e olha p futuro, com confiança esperando que o País manifeste sua disciplinariedade com as zonas menos desenvolvidas assumindo, também, os custos de interioridade permitindo os investimentos indispensáveis ao salto em frente, e, principalmente, permitindo que as decisões que lhe respeitam venham a ser tomadas por Órgãos de decisão. Regional democraticamente eleitos.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Pediram a palavra, para formular, pedidos de esclarecimento, as Sr.ªs Deputadas Margarida Tengarrinha, e Cecília Catarino. No entanto, a Sr.ª Deputada Cecília Catarino não dispõe de tempo. Tem, por isso, a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Tengarrinha.

A Sr.ª Margarida Tengarrinha (PCP): - Sr. Deputado Armando Vara, desejo apenas obter um pequeno esclarecimento visto; que também temos tido bastante interesse pelos problemas da Região de Trás-os-Montes.
Em primeiro lugar, gostaria de saber qual é o grau de conhecimento e a opinião do Sr. Deputado sobre a questão do Projecto de Desenvolvimento Integrado de Trás-os-Montes, com qual tivemos condições de nos pôr em contacto através da Comissão, de Coordenação Regional, do Norte e que nos pareceu, quando a Comissão Parlamentar da Agricultura lá esteve, extremamente atrasado é com graves lacunas.
Em segundo lugar, gostaria de saber, qual é o papel que o Sr. Deputado acha que deve ser conferido ao Complexo Agro-Industrial dor Cachão dentro das linhas gerais que acabou de enunciar.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Armando Vara.

O Sr. Armando Vara (PS): - Sr.ª Deputada Margarida Tengarrinha em primeiro lugar, quero agradecer-lhe a oportunidade que me dá de, respondendo, ao seu pedido de esclarecimento, trazer ou prolongar durante mais algum tempo a discussão dos problemas de Trás-os-Montes.

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Houve, de facto, um plano de desenvolvimento global integrado que tinha, em princípio, duas componentes: a componente não agrícola e a componente agrícola. A componente não agrícola, que tinha como principais objectivos o saneamento básico e a construção de algumas vias importantes, foi-se desenvolvendo. E foi-se desenvolvendo porque esse tipo de iniciativas estava a cargo das câmaras municipais, que foram, a pouco e pouco, incluindo nos seus planos e nos seus orçamentos o desenvolvimento dessas fases e, portanto, essa componente não agrícola resultou.
Quanto à componente agrícola, atrevo-me a dizer-lhe que, em princípio e nalguns casos, foi um desastre porque foi mal pensada. Depois, ao longo das várias fases de execução, não houve acompanhamento dos técnicos e o que hoje se verifica é que ficou tudo como estava e nalguns casos a situação talvez até tenha piorado.
Quanto ao Complexo Agro-Industrial do Cachão, devo dizer-lhe que é nossa convicção que ele pode ser o grande pólo de desenvolvimento da agricultura da região desde que sejam injectados os meios indispensáveis ao seu funcionamento e desde que, em termos de gestão e talvez do próprio redimensionamento dessa unidade, se possa avançar, corrigindo alguns defeitos que ainda existem.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Seabra, que dispõe de 3 minutos.

O Sr. José Seabra (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: As vias de comunicação constituem um factor estrutural determinante do processo económico e do desenvolvimento das comunidades, pelo aproveitamento das potencialidades locais que permitem, pela atenuação dos desequilíbrios regionais que possibilitam, pelo desenvolvimento turístico que asseguram e pela divulgação de culturas e reforço da solidariedade entre os povos que incrementam.
Sem vias de comunicação apropriadas será difícil dar concretização às aspirações legítimas de todas as regiões do País e ter acesso aos recursos da civilização moderna e em particular aproveitar os decorrentes da nossa adesão à CEE.
O distrito de Leiria possui, em plena época de integração, em espaços económicos e sociais desenvolvidos, uma rede de vias de comunicação obsoleta, deteriorada e insuficiente em face dos legítimos anseios das suas gentes e do dinamismo económico que lhe é reconhecido.
As estradas têm um traçado incorrecto, ferindo o princípio de que a distância mais curta entre dois pontos é um segmento de recta. Tal situação dificulta as ligações intra-regionais e o acesso à rede nacional, acentuando o isolamento que as suas populações têm procurado quebrar. Como se tal não bastasse, as armadilhas estão ocultas nos inúmeros buracos que proliferam por todas as estradas do distrito e põem em risco a segurança de pessoas e bens. Também neste domínio não se sabe se foi a rataria deslocada das auto-estradas, se estamos em plena paisagem lunar ou se, pelo contrário, existe uma total e flagrante ausência de qualidade do pavimento e bermas, regra geral maquilhado em períodos pré-eleitorais e inexoravelmente votado à negligência após tais actos. Os acidentes ocorrem diariamente - a insegurança é uma constante para quem circula no distrito.
A linha férrea do Oeste está obsoleta não correspondendo minimamente às necessidades distritais. Os comboios são lentos - numa época em que se roda a centenas de quilómetros por hora é pré-histórico levar-se 3 horas de Leiria a Lisboa! Para além disso, não têm comodidade e tornam-se uma perturbação pelas inúmeras passagens de nível que têm.
É urgente modernizar a linha do Oeste, adequando-a às novas necessidades de transportes, de pessoas e bens, impostas pelo desenvolvimento das regiões que pretende servir.
Deve constituir também prioridade levar o comboio até Peniche, antiga e actual aspiração das suas gentes. A economia da zona que detém mais de 50% da rede nacional de frio, a renovação do porto, a importância hortícola e turística e os menores custos do transporte ferroviário justificam-no perfeitamente.
Por último, a abertura da Base Aérea de Monte Real ao tráfego civil preencherá uma lacuna no tecido das vias de comunicação da região. Este projecto é louvável e desejável.
A indústria da região fortemente exportadora, nomeadamente no domínio dos moldes e cerâmica artística, entre outras; o termalismo e o turismo regionais e a sua localização são por si só factores que tornam necessária a sua concretização. Não devemos esquecer que o local de maior afluxo de peregrinos e turistas de Portugal é Fátima e que se situa a escassas 4 dezenas de quilómetros!
É com obras, com projectos estruturais que se dá confiança aos empresários, se dá sentido ao desenvolvimento regional e se contribui para aproximar o distrito de Leiria em distância e em progresso às sociedades desenvolvidas. Suprir carências constitui mais que um desafio uma verdadeira prova de competência e de capacidade.
A terminar gostaria de afirmar, ou melhor não gostaria mas sou compelido a fazê-lo, que não sei o que admirar mais se a espantosa exigência do progresso ou a «imaginosa» negligência do retrocesso e a habilidade de entortarmos aquilo que deveria ser direito ou o mais direito possível: é caso para dizer que a Europa está ali tão perto e nós aqui tão longe!

Aplausos do PRD e de alguns deputados do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, informo que estão presentes nas galerias os alunos da Escola Secundária de Peniche, acompanhados pelos seus professores.

Aplausos gerais.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, entrando agora no período da ordem do dia, vai proceder-se à leitura de um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos.
Foi lido. É o seguinte.

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Relatório e parecer

Em reunião realizada no dia 27 de Fevereiro de 1986 pelas 10 horas foram observadas as seguintes substituições de deputados.

Solicitada pelo Partido Socialista

Jorge Fernando Branco de Sampaio (circulo eleitoral de Lisboa) por Mano Nunes da Silva Esta substituição e pedida nos termos da alínea c) do n 2 do artigo 5.º da Lei n.º 3/85 (Estatuto dos Deputados) para o período de 1 de Março a 30 de Junho próximo inclusive.

Solicitada pelo Partido do Centro Democrático Social

Joaquim Rocha dos Santos (circulo eleitoral do Porto) por Manuel Fernando da Silva Monteiro Esta substituição é pedida para os dias 27 de Fevereiro corrente a 14 de Março próximo inclusive

Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha verificou-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que de em ser chamados ao exercício de funções considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais apresentadas a sufrágio pelos aludidos partidos nos concernentes círculos eleitorais.
Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente a Comissão entende proferir o seguinte parecer:

As substituições em causa são de admitir uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

A Comissão.

Presidente Antónia Cândido Miranda Macedo (PS) - Vice Presidente Mário Júlio Montalvão Machado (PSD) - Secretario António Sousa Pereira (PRD) - Secretário José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP) - Daniel Abílio Ferreira Bastos (PSD) - João Domingos Fernandes Sal gado (PSD) - José Mana Peixoto Coutinho (PSD) - Antónia Morgues Mendes (PSD) - Henrique Rodrigues da Maia (PSD) - Manuel José Marques Montargil (PSD) - Carlos Manuel Luís (PS) - Carlos Alberto Correia Rodrigues Matias (PRD) - Vasco da Gama Fernandes (PRD) - Jorge Manuel Abreu de Lemos (PCP) - Antónia José Borges de Carvalho (CDS) - João Cerveira Corregedor da Fonseca (MDP).

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados amos de seguida proceder a votação do relatório e parecer que acabou de ser lido.

Submetido a votação foi aprovado por unanimidade registando se a ausência dos deputados independentes Gonçalo Ribeiro Teles e Maria Santos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados da primeira parte do período da ordem do dia consta a apreciação na generalidade da proposta de lei n.º 5/1V que altera o artigo 2.º da Lei n.º 77/79 de 29 de Novembro (Radiotelevisão).
Vamos aguardar a chegada do Sr Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares para fazer a apresentação da proposta de lei.

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares (Fernando Nogueira): - Sr. Presidente, Srs. Deputados O programa do X Governo Constitucional que tem vindo a ser escrupulosamente cumprido identifica a livre circulação de informação e a existência de um salutar espirito critico de toda a comunidade nacional que só uma comunicação social activa e independente conseguira proporcionar como uma das condições para o desenvolvimento e progresso que o Pais carece.
Esses objectivos só são atingi eis caso existam saiu tares condições de concorrência Os monopólios por via de regra inibem o espirito de iniciativa estiolam a imaginação prejudicam a criatividade E quando esses monopólios respeitam a um meio de comunicação social como a televisão então as consequências são ainda mais nefastas porquanto conduzem a querelas constantes a polemicas desnecessárias e a um estado permanente de erosão e desgaste quer dos trabalhado rés ao seu serviço quer dos poderes públicos que por força da lei exercem a respectiva tutela.
Por outro lado ao persistir se na manutenção do monopólio de Estado sobre o exercício da actividade de televisão quando se verificam enormes saltos qualitativos no domínio do progresso tecnológico da produção difusão e recepção de informação mais não se está a fazer do que a impedir o progresso fomentar a desobediência à lei impedir internamente aquilo que seguramente será violado a partir do exterior com o consequente desprestigio dos poderes públicos e pré juízo dos interesses nacionais.
Quem nos dias de hoje pensa e defende que atra es de normas jurídicas consegue suster a realidade para todo o sempre ou está prisioneiro de preconceitos retro grados ou está de má fé.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados a proposta de lei n.º 5/IV pretende abrir nesta Assembleia o debate sobre quem e por que meio pode ter acesso à actividade de televisão. O Governo propõe que seja facultado à Igreja Católica no regime de concessão o exercício dessa actividade Dessa proposta não abdica Mas manifesta desde já abertura a uma maior diversificação da responsabilidade pela actividade televisiva prevenindo se embora os riscos de uma pulverização indesejável e tendo sempre presente a salvaguarda de valores essenciais
As razões e os fundamentos da opção preferencial pela Igreja Católica estão contidos no Programa do Governo e desenvolvidos na exposição de motivos que acompanha a proposta de lei agora em discussão. Dispensamo-nos por isso de os repetir nesta ocasião.

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De resto o problema em apreço está longe de se esgotar na vertente jurídica. Não é possível a ninguém escamotear os aspectos políticos que a envolvem.
Temos de enfrentar as dificuldades de forma frontal. Torneá-las é protelar artificialmente a solução dos problemas, é manter o País adiado. Não decidir mais uma vez sobre esta questão seria mais um retrocesso, seria mais um passo atrás, uma fuga às responsabilidades de cada um.
O dramatismo sobre a isenção ou falta de isenção da televisão em Portugal e a polémica sobre a qualidade dos respectivos programas não se resolvem nem ultrapassam, do ponto de vista do Governo, a partir de iniciativas burocráticas, pela multiplicação de pareceres ou pela criação de mais e mais órgãos de controle. O único caminho é o da concorrência. Concorrência que aqui deve obedecer a regras muito apertadas por estarem em causa valores públicos fundamentais. Só por essa via se alcançará a qualidade e o pluralismo.
No início de 1982, a Assembleia da República teve oportunidade para resolver esta questão. Passados quatro anos surge uma nova oportunidade. Adiá-la uma vez mais constituirá grave responsabilidade. O País julgará os que a assumirem.
Ninguém pode acusar o Governo de incoerência. O que se propõe agora não é diferente do que consta no seu programa. Existe da nossa parte abertura ao diálogo nos limites definidos. Seria negativo, muito negativo, que se fechassem liminarmente as portas do diálogo.
Há indicadores seguros de que a maioria esmagadora da população portuguesa quer o fim do monopólio estatal da televisão.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É obrigação dos governantes acompanhar a vontade colectiva. Assim o estamos a fazer.
Queremos o progresso e a preservação dos valores culturais do nosso país. Queremos que a escolha para os Portugueses não se reduza à opção entre a televisão pública nacional e televisões estrangeiras.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Temos obrigação de proporcionar aos Portugueses uma ou mais alternativas nacionais. É por isso que estamos aqui.

Aplausos do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se para formular pedidos de esclarecimento, os Srs. Deputados Sottomayor Cardia, Jorge Lemos, Raul Castro e João Corregedor da Fonseca.
Antes de conceder a palavra ao primeiro orador, peço ao Sr. Vice-Presidente Carlos Lage o favor de vir substituir-me na presidência e informo ainda os Srs. Deputados de que, depois de os pedidos de esclarecimento serem formulados, será lido pela Mesa um Relatório e Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias relativo à proposta de lei em apreço.
Tem a palavra o Sr. Deputado Sottomayor Cardia.

O Sr. Sottomayor Cardia (PS): - Sr. Ministro, desejo formular a V. Ex.ª uma questão, que é a seguinte: quando e em que termos a concessão de um canal de televisão foi requerida ou solicitada pela Conferência Episcopal Portuguesa?

Uma voz do PSD: - Pergunta de historiador!
Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente Carlos Lage.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Ministro, V. Ex.ª falou muito de concorrência, falou muito de necessidade de acabar com o monopólio estatal, mas ignorou no seu discurso uma coisa essencial que é a Constituição da República Portuguesa.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - E a Constituição da República Portuguesa determina, expressamente, que o objectivo que o Governo hoje pretende trazer aqui a esta Assembleia não é possível no quadro da actual Constituição.
O Governo terá todo o direito, o PSD terá todo o direito, de pensar o que pensa sobre a televisão, mas terá de aguardar pela revisão constitucional para propor as necessárias alterações de modo a que, eventualmente, venha a considerar-se o problema que agora o Governo pretende colocar.
Em segundo lugar, o Sr. Ministro e o seu Governo representam aqui na Assembleia da República, praticamente na sua íntegra, o texto da proposta de lei n.º 80/11. Nem sequer colheram a experiência do ex-Ministro do PSD, Marcelo Rebelo de Sousa, que na altura dizia que a proposta de lei n.º 80/11 estava mal preparada, estava infundamentada, precisava de maiores estudos e elementos. Trazem-na praticamente na íntegra a esta Assembleia da República.
Há uma terceira questão, Sr. Ministro, que me parece particularmente grave: é grave que um Governo da República Portuguesa tente utilizar e introduzir num debate político numa Câmara que se quer séria o nome de uma instituição como a Igreja Católica, tentando por esse modo abrir e criar clivagens fictícias entre portugueses, criar uma suposta guerra de questão religiosa, que não existe...

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Guerra santa!

O Orador: - ... quando o objectivo que é visado com esta vossa iniciativa é, tão-só e simplesmente, dar resposta aos grandes interesses económicos que se vêm movendo no sentido da abertura da televisão ao sector privado.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Ora nem mais!

O Orador: - São, aliás, conhecidas as ligações de elementos dirigentes do partido que apoia o actual Governo a interesses económicos fortíssimos para a exploração privada da televisão em Portugal.

Uma voz do PSD: - E a televisão soviética!

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O Orado: - E o Sr. Ministro enquanto dirigente do PSD não se pode furtar a responder neste debate a essas questões como sejam os elementos que estão por trás da chamada TVN os dirigentes do PSD que se integram nesse projecto e a proposta que o Governo aqui apresenta São factos que tem de ficar extrema mente claros perante a opinião publica e a que o Governo terá de dar resposta
Não basta Sr. Ministro apresentar aqui a imagem de candura a imagem de que tudo estaria bem. É necessário em primeiro lugar respeitar a Constituição e sobretudo respeitar esta Assembleia da Republica e não trazer para aqui algo que com ela nada tem a er como sejam supostas questões religiosas que oito a dizer não existem e que o Governo está a tentar aproveitar para a prossecução dos seus mesquinhos objectivos políticos.

Aplausos do PCP.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - É a controvérsia sobre algum dogma de fé!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro.

O Sr. Raul Castro (MDP/CDE): - Sr. Ministro a intervenção que V. Ex.ª aqui produziu assenta nalguns equívocos.
Porém antes de salientar quais são esses mesmos equívocos importa referir que tendo já ha ido em legislaturas anteriores dois debates nesta Assembleia sobre propostas semelhantes - o que o Governo não desconhece - o Governo sabia que ao apresentar esta proposta iria provocar novamente a abertura de um debate e encontrar opiniões divergentes (e possível mente maioritariamente dirigentes) da sua proposta de lei.
Pergunta se assim o seguinte qual é na realidade a intenção do Governo9 Será que o Governo pretende por em confronto a proposta do Governo em nome de interesses que ele diz defender da TV e da Igreja Católica7 Será que o Governo pretende colocar em confronto a Igreja Católica com as forças da oposição no Parlamento?
Se era esse o seu objectivo Sr. Ministro posso dizer lhe que se enganou porque efectivamente o que está em causa não e o interesse da Igreja Católica mas sim um outro interesse mais legitimo o cumprimento da lei fundamental do nosso pais
Toda a intervenção de V. Ex.ª foi feita à revelia dos problemas constitucionais que a concessão de um canal de televisão a Igreja Católica necessariamente implica. E não e possível fazer as afirmações que o Sr. Ministro aqui fez nomeadamente quando referiu a necessidade de se por fim ao monopólio estatal da televisão sem afrontar directamente a Constituição.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sem duvida!

O Orador: - E sobre isto V. Ex.ª não disse uma única palavra.
Ignoro quais os indicado es seguros que o Sr. Ministro tem de que a maioria da população quer o fim do monopólio estatal da televisão Os indicadores seguros que nós temos pelo contrario indicam que a maioria da população quer o fim da manipulação da televisão pelo Governo.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - E Sr Ministro deixe que lhe diga o seguinte depois de se terem debatido nesta Assembleia alguns diplomas para o melhoramento da comunicação social a intervenção de V. Ex.ª é chocante colocando se em confronto com esta Camará na medida em que o Governo parece demitir se do cumprimento da própria lei não só quando afirma que não interessa aperfeiçoar e criar mais órgãos mas também quando diz que não é possível assegurar a defesa de diplomas legais Mas não e ao Governo que cabe assegurar o cumprimento das leis? Que Governo e este que vem aqui afirmar que não é com diplomas legais que se pode assegurar a ordem constitucional?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Ministro em nossa opinião o que esta em causa não é apenas a concessão do tal canal à Igreja Cato liça mas sim a concessão de vários canais para grupos de pressão económica alguns deles já conhecidos.

pesar dos desmentidos anteontem aqui proferidos pelo Sr Secretário de Estado o que está em causa e entregar a radiodifusão comercial - com boa facturação de publicidade e boa facturação geral - a grupos de pressão económica já tornados públicos o que está em causa é levar os principais jornais nomeadamente o Jornal de Noticias - com óptima situação Financeira e com uma facturação de publicidade da ordem dos 700 000 contos - para grupos de pressão económica
V. Ex.ª diz que a polémica sobre a isenção da Radio televisão Portuguesa não se resolve com a pulverização de órgãos de controle - estas pala rãs foram agora proferidas pelo Sr Ministro Pergunto lhe Sr. Ministro se V. Ex.ª está contra o Conselho de Comunicação Social ou se entende que ele deveria pelo contrário ver reforçados os seus poderes.
Por que é que V. Ex.ª entende que o orgão de controle da isenção da Radiotelevisão Portuguesa - o Conselho de Comunicação Social - não e útil para essa função?
Gostaria de saber Sr Ministro - colocada que esta já a questão da inconstitucionalidade desta proposta - se não esta o Governo interessado num debate aberto sobre comunicação social - de acordo aliás com a pi oposta já aqui apresentada pelo Sr Deputado Magalhães Mota - para que todos os aspectos relacionados com estas e outras questões fossem bem debatidos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Raúl Rêgo.

O Sr. Raúl Rêgo (PS): - Sr. Ministro queria perguntar a V. Ex.ª se na altura em que a RTP foi fundada já havia ou não uma Concordata com a Igreja.
Segunda questão ao ser renegociada a Concordata depois do 25 de Abril pelo Ministro Salgado Zenha a situação da RTP era ou não a mesma de hoje? Esta questão foi ou não aflorada? Parece me que não foi

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Nesse caso, perguntava também ao Sr. Ministro se não estaremos perante o caso de um Governo «ser mais papista do que o Papa».

O Sr. António Vitorino (PS): - É mais «patriar-quista» do que o patriarca!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, em relação à questão colocada pelo Sr. Deputado Sottomayor Cardia, quero dizer que não existe um requerimento da Igreja Católica mas, sim, muitos; houve requerimentos no passado e este Governo já recebeu um requerimento de uma instância da Igreja Católica a requerer o exercício da actividade televisiva em Portugal.
Mas lembro ao Sr. Deputado, e a todos os deputados, que o Programa de Governo é anterior a esse requerimento e que o Governo, neste momento, ao apresentar esta proposta de lei não está a fazer mais do que a cumprir na íntegra o seu programa, que foi apreciado nesta Câmara e que o Governo não pode nem vai deixar de aplicar naquilo que depende exclusivamente de si.

O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Em relação à questão colocada pelo Sr. Deputado Jorge Lemos gostaria de dizer que não lhe reconheço a qualidade de «notário» da Constituição.
Não é pelo facto de o Sr. Deputado Jorge Lemos dizer «isto é constitucional» ou «isto não é constítucional» que as coisas são como o Sr. Deputado deseja.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Então, explique lá!

O Orador: - Ninguém tem a qualidade de ser notário, de passar declarações sobre aquilo que é constitucional ou inconstitucional!
E, se a proposta de lei é inconstitucional, então não compreendo por que é que não foi impugnada a sua admissibilidade, uma vez que seria o momento próprio de o fazer.

Aplausos do PSD.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Porque pode, pura e simplesmente, não ser preciso.

O Orador: - Apreciei muito, Sr. Deputado Jorge Lemos, a sua atitude paternalista em relação à Igreja Católica...!!!
O Sr. Deputado disse que o Governo está a instrumentalizar a Igreja Católica.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - E é verdade!

O Orador: - Verifico agora que o Sr. Deputado Jorge Lemos sai em defesa da Igreja, mas, muito sinceramente, Sr. Deputado, julgo que a Igreja Católica dispensa bem a sua defesa, ainda que oficiosa.
A Igreja Católica, como já tive oportunidade de dizer ao Sr. Deputado Sottomayor Cardia, requereu o exercício da actividade televisiva em Portugal. Contudo, o Governo não pode despachar esse requerimento sem que a lei ordinária, a lei da televisão seja alterada.

O Sr. Sottomayor Cardia (PS): - Como, quando e em que termos?

O Orador: - E é por isso que estamos hoje aqui!
Não há guerra nenhuma que o Governo queira fomentar entre os Portugueses em função das suas opções religiosas, ideológicas ou quaisquer outras.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Vê-se!...

O Orador: - Há outras entidades que as querem fomentar, mas não o Governo, por certo!

O Sr. José Magalhães (PCP): - Talvez seja o PSD, que é a sombra do Governo.

O Orador: - E o Sr. Deputado Jorge Lemos chegou ao cúmulo de dizer que o Governo, com esta proposta de lei, está a dar curso a grandes interesses económicos.

O Sr. José Magalhães (PCP): - E não estará?

O Orador: - O Governo, nesta proposta de lei, diz que a televisão é propriedade do Estado e que a actividade televisiva será exercida através de concessão a empresa pública, só admitindo uma excepção: a atribuição de um canal à Igreja Católica. Afirmar, como o Sr. Deputado Jorge Lemos afirmou, que o Governo está a prosseguir interesses económicos é o mesmo que dizer que por detrás da Igreja Católica estão grandes interesses económicos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Isso é o que os senhores querem!

O Orador: - Foram suas as palavras e não minhas, Sr. Deputado!

Aplausos do PSD.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Aí está a chicana, às claras!

O Orador: - A chicana é feita pelo Sr. Deputado e não por mim!

O Sr. José Magalhães (PCP): - As vossas amálgamas entre os «proenças» e os bispos... Essa é que é a chicana!

O Orador: - O Sr. Deputado Raul Castro afirmou que eu não produzi uma única palavra sobre os aspectos jurídicos da questão.
Pedir-lhe-ei desculpas, Sr. Deputado, mas eu referi-me a eles. No entanto, como julgo não valer a pena gastar muitas palavras, remeti os problemas jurídicos da questão para a exposição de motivos que o Sr. Deputado, com certeza, leu porque está interessado neste debate e em tudo o que se passa nesta Assem-

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bleia - onde pode encontrar a justificação jurídica por que o Governo considera que é constitucional a concessão de um canal de televisão a Igreja Católica.
Não vale a pena chover no molhado não vale a pena repetir o que está dito!

O Sr. António Capucho (PSD:) - Muito bem!

O Orador: - Não me apercebi que o Sr Deputado João Corregedor da Fonseca me tivesse feito perguntas directas sobre a proposta de lei em discussão Apesar disso dir-lhe-ei que entendo que o Conselho de Comunicação Social deve existir Posso dizer lhe a titulo pessoal que entendo que se devia rever a legislação do Conselho de Comunicação Social conjunta mente com a do Conselho de Imprensa já que há uma sobreposição de competências que pode ser prejudicial que pode ter efeitos negativos E digo lhe em nome do Governo que estamos disponíveis para analisar essa problemática.
Falou também da criação de órgãos de controle ou de outras formas de o exercer e perguntou onde é que o Governo as descobriu. Olhe Sr. Deputado descobriu as por exemplo no projecto de lei discutido aqui anteontem que o MDP/CDE apresentou na Assembleia da Republica e no qual os conselhos de redacção também teriam de dar parecer vinculativo sobre a nomeação dos directores de informação.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Portanto ía está mais uma forma de controle que do ponto de vista do Governo não vai garantir o pluralismo O pluralismo a independência e a qualidade dos programas tal como acontece hoje na Radiodifusão Portuguesa resulta de uma sã concorrência de uma concorrência controlada pelos órgãos próprios e não da criação de mais órgãos de controle de mais pareceres vinculativos ou não vinculativos do orgão A B C ou D.

Vozes do PSD e CDS: - Muito bem!

O Orador: - É portanto esta a opinião do Governo!

Aplausos do PSD e do CDS.

Ao Sr. Deputado Raúl Rego queria dizer o seguinte e claro que a Concordata está em vigor e não fala expressamente na atribuição de um canal à Igreja (nem tinha de falar) mas o artigo 41 da Constituição da Republica Portuguesa diz que as confissões religiosas tem direito a meios próprios de comunicação social E nos termos jurídico formais para esta matéria a Constituição da Republica - pelo menos no entender do Governo - ainda e um orgão legislativo numa categoria hierárquica superior à Concordata.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Governo não e mais papista do que o Papa porque o Governo não inventou nada O Governo não está a querer atribuir à Igreja Católica algo que ela não tenha já requerido As posições da Igreja Católica sobre esta matéria são publicas noto nas conhecidas e só quem andar distraído é que não percebe - ou faz de conta que não percebe - que a Igreja Católica quer mesmo exercer a actividade televisiva em Portugal.
Acredito quero ainda acreditar que a Assembleia da Republica vai facultar essa possibilidade

Aplausos do PSD e do CDS.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Peço a palavra Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito Sr. Deputado?

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente e porque o meu nome foi referido na intervenção do Sr. Ministro Adjunto.

Risos do PSD e do CDS.

Uma voz do PSD: - Ah! não gostou da "do notário"

O Sr. Presidente: - Então para usar do direito de defesa tem a palavra Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados Sr Ministro Em primeiro lugar que na dizer lhe que a postura que o Governo aqui pretende assumir quanto a constitucionalidade deste diploma só pode ser lida de duas maneiras ou ha uma ignorância rotunda dos preceitos constitucionais ou pretende se um afrontamento com a ordem constitucional.
O PCP não permitirá que uma tal postura a para a frente.
Em segundo lugar as palavras produzidas pelo Sr. Ministro nas respostas que deu aos pedidos de esclarecimento demonstram com clareza que o facto de se mencionar a Igreja Católica nesta proposta de lei revela que não e a Igreja que está em causa mas tão só os interesses que o Governo pretende er defendidos e que não são os interesses daquela instituição mas sim dos grupos económicos que se movem por detrás do Governo e do partido que o apoia.
Usar o nome da Igreja Católica como o Sr. Ministro acabou de fazer não e dignificante nem do Governo - mas isso e um problema dele - nem sobretudo da Assembleia da Republica E contra isso que protestamos firmemente.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para dar explicações tem a palavra o Sr. Ministro Adjunto.

O Sr Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Fiquei a saber que daqui em diante não devo citar nas rés postas a pedidos de esclarecimento o nome do Sr Deputado Jorge Lemos pois ele considerará que isso constitui uma ofensa à sua honra e à sua dignidade

Risos do PSD.

Daqui em diante não o citarei mais. Há pouco o Sr. Deputado Jorge Lemos pretendeu ser notário da Constituição agora diz que o Governo é ignorante em matéria constitucional e pretende ser um mestre escola da Constituição pretende dar lições de Direito Constitucional?

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Quanto às considerações que fez sobre a utilização do nome da Igreja Católica, julgo que o Sr. Deputado está a incorrer no mesmo erro de há pouco, quando disse que eu tinha invocado o seu nome e que, por isso, se sentia atingido na sua honra. Pelos vistos, queria que o membro do Governo que apresentou uma proposta de lei onde se fala expressamente na concessão de um canal à Igreja Católica não referisse esta instituição e dissesse, porventura, «concessão de um canal à entidade X».
Também tomo nota disso, Sr. Deputado!

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Raúl Rêgo solicitou, também, a palavra. Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Raúl Rêgo (PS): - Sr. Presidente, não tenho outra alternativa senão a de invocar a honra por me ter sido respondido nada ao que perguntei.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Raúl Rêgo é juiz nessa matéria, Dou-lhe a palavra, ao abrigo do artigo 89.º do Regimento.

O Sr. Raúl Rêgo (PS): - Parece-me que ninguém defende melhor os interesses da Igreja Católica do que a própria Igreja Católica, Sr. Ministro, e o facto de serem negociadas concordatas e de a Igreja Católica nem sequer ter posto o problema do canal de televisão mostra que é realmente o Governo que quer criar problemas e não a Igreja.
Além disso, o Sr. Ministro também não respondeu sequer à pergunta do meu camarada Sottomayor Cardia relativa a saber quem, qual a entidade que teria requerido o canal para a Igreja Católica. Isso é muito importante porque o Patriarcado é uma coisa e o representante da Igreja Católica em Portugal é outra muito diferente.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Ministro Adjunto.

O Sr. Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares: - Sr. Deputado Raúl Rêgo, eu não quis, de modo algum, atingir a sua honra e julgo que isso foi notório para toda a Câmara. O Governo não invoca apenas a Igreja Católica e se repararam no que eu disse - e com certeza seguiram com atenção a introdução a este debate - verificaram que o Governo invoca interesses nacionais para fomentar a concorrência e para garantir o pluralismo e a isenção dos programas.
O facto de na Concordata não figurar qualquer referência à televisão não significa que a Igreja Católica não esteja interessada em exercer actividade de televisão em Portugal. Julgo que a mais do que isto não posso responder e não sei que esclarecimentos suplementares posso dar.

O Sr. Raúl Rêgo (PS): - Mas quem é que requereu?

O Orador: - Notei também, Sr. Deputado Raúl Rêgo, que a sua honra foi ofendida por não ter respondido, do seu ponto de vista, a uma pergunta formulada por um outro companheiro seu de bancada, o que é realmente uma concepção um tanto estranha da honra.

O Sr. Lopes Cardoso (Indep.): - Mas quem é que requereu? E um requerimento secreto!

O Sr. Sottomayor Cardia (PS): - Quem é que requereu?

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai ser lido o relatório e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias relativo a esta proposta de lei.
Foi lido. É o seguinte:

Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias

Proposta de Lei n.º 5/IV

Relatório e parecer

1 - Com o pedido de prioridade e com a solicitação de que fosse adoptado o processo de urgência, foi apresentada pelo Governo a proposta de lei em apreciação, à qual foi atribuído o n.º 5/IV e que respeita à alteração do artigo 2.º da Lei n.º 75/79, de 29 de Novembro.
2 - Por despacho do Sr. Presidente da Assembleia da República de 27 de Dezembro de 198S, baixou a dita proposta a esta Comissão, sendo certo que, entretanto, o Governo prescindiu do pedido de adopção do processo de urgência em 16 de Janeiro próximo passado.
3 - Importa, nos termos do artigo 141.º do Regimento, que esta Comissão dê parecer sobre a aludida proposta de lei.
4 - Começarão por enumerar-se as alterações à actual redacção do artigo 2.º da Lei n. º 75/79, propostas pela presente iniciativa legislativa.
Assim:

Para o n.º 1 propõe-se uma nova redacção que coincide rigorosamente com o preceituado no n.º 7 do artigo 38.º da Constituição da República Portuguesa; O n.º 2 da actual redacção sofre as alterações que decorrem dos adiante referidos dois novos números;
O n.º 3 da actual redacção passa, na proposta de lei, para n.º 5, sem quaisquer alterações;
São introduzidos dois novos números: o 3, que prevê a atribuição, em regime de concessão, de um canal de radiotelevisão à Igreja Católica, e o 4, que possibilita o acesso à utilização de meios de radiotelevisão às restantes confissões religiosas.
5 - A questão de admissibilidade constitucional de qualquer fórmula alternativa à do monopólio estadual do exercício da actividade radiotelevisiva é particularmente controversa.
Constitui mesmo questão já por diversas vezes as distintas solicitações e segundo diferentes soluções equacionadas pela Assembleia da República. Os argumentos aduzidos são conhecidos.

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Constam exaustivamente dos debates realizados no Plenário da Assembleia em 1982 e 1984 (que podem ser apreciados nos respectivos Diários) para já não falar dos debates da própria revisão constitucional.
Todos os partidos concordaram que os meios de raiz da actividade televisiva não podem ser objecto de propriedade privada.
O PSD e o CDS consideram que a solução da proposta de lei do Governo é compaginável com o texto constitucional.
O PS entende que a proposta de lei do Governo se encontra fenda de inconstitucionalidade na medida em que a atribuição por via legislativa de um canal de televisão a uma entidade privada representa uma flagrante violação do disposto no n.º 7 do artigo 38 da Constituição que prescreve que a televisão não pode ser objecto de propriedade privada.
Tem o legislador ordinário inferido de tal normativo que a actividade da radiotelevisão é um ser viço publico e que como tal é no domínio publico que devem manter se os bens materiais afectos ao exercício dessa actividade bem como o respectivo modo social de gestão.
Tal posição legal e constitucional pode não obstar porém ao acesso de entidades privadas em condições de igualdade e de equidade à utilização dos meios e serviços de televisão no quadro do ser iço publico Essa não é manifestamente a solução governamental.
O PRD entende que só por si e em abstracto a abertura à iniciativa privada da utilização dos meios e serviços de televisão não é inconstitucional dado não estar abrangida pela proibição estatuída no artigo 38 n 7 da Constituição da Republica Portuguesa. Além do mais a utilização devidamente regulamentada da utilização dos meios e serviços televisivos por parte de entidades privadas não equivale necessariamente à alteração do seu modo social de gestão nos termos e com o sentido que tal conceito assume ao artigo 89 da Constituição da Republica Portuguesa.
Assim a constitucionalidade de tal utilização do ser iço publico da televisão dependerá sempre da pré a definição do respectivo regime jurídico em termos aptos a garantir a independência isenção pluralismo e qualidade informativa e cultural que decorrem da sua natureza bem como o respeito pelo principio da igualdade no acesso das entidades privadas àquele serviço sem prejuízo do tratamento diferenciado e desigual das situações objectivamente diferentes e desiguais.
O PCP considera grosseiramente inconstitucional a proposta de lei n.º 5/IV e mantém o seu entendimento de que a Constituição na sua redacção originária e na que decorre da revisão constitucional de 1982 exclui a apropriação privada da televisão não sendo admissível designadamente a sua exploração por entidades não publicas ao abrigo de concessão ou titulo similar Esta opção constitucionalizada evitar o controle do poderoso meio que e a TV por grandes grupos económicos e de pressão (os únicos que dispõem dos meios financeiros para tal necessários) e a sua consequente instrumentalização contra as liberdades o pluralismo e a objectividade. Os comportamentos inquietantes a que hoje se assiste por parte de certos grupos nacionais e estrangeiros que entre si disputam o controle do espaço radioeléctrico português (recorrendo mesmo a meios ilegais e m constitucionais) confirmam os perigos que a Constituição quis conjurar
O PCP não ignorando a necessidade de cuida dosa ponderação no quadro constitucional do impacte das novas tecnologias no domínio áudio visual não colaborará em quaisquer esforços para fazer de forma ínvia por lei ordinária o que dependeria de uma alteração da opção constitucional (cujas razoes subsistem como os factos vem demonstrando) Sublinhando os perigos que com portariam actuações do tipo das descritas o PCP considera que a apresentação pelo Governo de Ca aço Silva da inconstitucional proposta de lei n.º 5/IV e a insistência no seu agendamento e votação representam ademais uma grave operação de chicana política Ao instrumentalizar abertamente a Igreja Católica ao procurar provocar clivagens artificiais entre os Portugueses (em torno de uma questão religiosa inteiramente inexistente) o Governo prossegue da forma mais condenável e pelos meios mais censuráveis a sua política de guerrilha institucional e subordina mais uma vez irresponsavelmente a mesquinhos objectivos e interesses conjunturais o debate nacional de importantes questões institucionais
O MDP/CDE entende que a proposta de lei e inconstitucional como resulta do disposto no artigo 38.º n.º 7 da Constituição e ate do que resulta ainda do estabelecido no artigo 41.º n.º 5 também da Constituição precisão que completa e reforça o estatuído no citado artigo 38.º n.º 7 na medida em que a garantida utilização de meios de comunicação social próprios as confissões religiosas não pode por em causa o principio de que a televisão não pode ser objecto de propriedade privada inclusive atra és da concessão.
Estatuídas as posições supracitadas acerca da questão da constitucionalidade a Comissão é de parecer que atentas as suas competências regimentais e o historial que envolve este tipo de iniciativas à proposta de lei pode subir ao Plenário para que o debate na generalidade permita aprofundar as questões que surgiram na Comissão e outras que os grupos parlamentares julguem pertinentes.

Palácio de São Bento em 25 de Fevereiro de 1986.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados lido o relato no e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais Direitos Liberdades e Garantias vou comunicar lhes a lista já ordenada pela Mesa de oradores inscritos para produzirem intervenções Dela constam os Srs. Deputados Sottomayor Cardia Rui Machete José Carlos Vasconcelos Jorge Lemos Raul Junqueiro Correia Afonso Andrade Pereira Jorge Lacão Abel Gomes de Almeida Alexandre Manuel Borges de Carvalho e Raul Castro. No entanto continua aberta a lista de inscrições - com esta informação quis só que ficassem com uma ideia da hierarquia das inscrições.
Tem a palavra o Sr Deputado Sottomayor Cardia.

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O Sr. Sottomayor Cardia (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Uma iniciativa legislativa deslocada e absurda pode sempre oferecer ocasião a que sejam equacionados problemas pertinentes. É o que sumariamente tentarei nos escassos minutos disponíveis.
A evolução tecnológica está tornando a televisão um serviço crescentemente influente, generalizado e acessível. Sobretudo nas sociedades superdesenvolvidas. Em maior ou menor grau, um pouco por todo o mundo desenvolvido.
A nenhum Estado ou poder público é lícito opor obstáculo à recepção audiovisual com objectivo de retirar ao cidadão o direito de ser informado. Daí não decorre, é óbvio, que a emissão audiovisual seja considerada direito fundamental. Releve-se o enunciado de tal evidência. Mas a frequência com que, em certos círculos da nossa melhor sociedade, se confunde o direito à recepção e o direito à emissão no domínio televisivo impõe que se comece por recordar o que todos sabem ou têm direito a saber. Como têm o direito de saber que se trata de direitos de natureza diferente. É o direito de compreender esta diferença que alguns sectores de opinião querem desesperadamente apagar na prática, recorrendo ao pseudo-argumento de que a difusão por satélite altera a razão de ser dos dispositivos condicionantes da emissão televisiva. Ora o que na verdade altera - e altera reduzindo - é a capacidade do espectro radioeléctrico hertziano para viabilizar a difusão das emissões produzidas. Mas tal facto introduz novas razões para que se disciplinem as condições de emissão, nunca para que se anule o princípio da limitação à faculdade de emitir. E ridículo seria promover ou consentir na proliferação de emissores nacionais apenas para desmotivar os portugueses de ligar ao estrangeiro. Defesa dos valores e interesses nacionais, sim e sempre; barreiras físicas - neste caso radioeléctricas - isoladoras do mundo, obrigado, não.
Antes de discutir modelos institucionais de política do audio-visual, convém se decida se tal política deve ser sujeita a valores e, na hipótese afirmativa, a que valores. Respondo sem hesitação: uma política de televisão deve conformar-se a valores, que são, do meu ponto de vista, a garantia da liberdade e a promoção da diversidade. É desta opção de base que decorre tudo o que direi. Se optasse pelo indiferentismo axiológico em matéria de política do audio-visual ou se entendesse que os valores a salvaguardar deveriam ser os da propaganda, os do endoutrinamento ou os da viciação da informação, chegaria - reconheço - a conclusões diametralmente opostas.
Liberdade e diversidade. Neste particular, liberdade quer dizer igualdade de oportunidades no acesso ao exercício do direito de informar e comentar. Diversidade quer dizer vontade de fazer corresponder a programação das emissões à variedade de interesses dos telespectadores. É isso que o Estado tem obrigação de querer fazer ou deixar fazer através da televisão.
No caso de um serviço altamente oneroso, em princípio não lucrativo e necessariamente limitado pelo espectro radioeléctrico, a garantia da liberdade e a promoção da diversidade obtêm-se mais facilmente, em democracia, através da televisão tutelada pelo Estado do que através da televisão tutelada por entidades privadas ou cooperativas. Sobretudo em países pouco desenvolvidos, como é o nosso caso.

O Sr. Borges Carvalho (CDS): - Não está demonstrado!

O Orador: - A liberdade e a diversidade podem legitimamente entender-se não só em sentido cultural, mas também em sentido empresarial. Não o contesto. Contesto, isso sim, que se deva considerá-los exclusivamente ou preferencialmente em sentido empresarial e só acessória ou aparentemente em sentido cultural. Sei que a tese oposta tem muitos adeptos, mas não sou obrigado a aceitá-la. Respeito-a quando claramente formulada, combato-a em todas as suas manifestações.
Na sessão anterior, aprovámos na generalidade três projectos de lei apresentados por iniciativa do PS, do PRD e do PCP. A todos é comum o objectivo de garantir a independência dos órgãos de comunicação social do Estado em geral e da RTP em especial. Assinalam passo importante no sentido de defender a liberdade e a diversidade da emissão televisiva no plano cultural. Alguns os terão considerado indesejáveis por isso mesmo. Outros se terão desagradado por meras razões de circunstância. Os mais lúcidos terão porventura suspeitado que tais diplomas podem constituir dispositivo eficaz de prestígio da RTP. Os inimigos do sector público da comunicação social têm fundadas razões de amargura.

O Sr. Borges de Carvalho (CDS): - É verdade.

O Orador: - Devem em princípio ser consideradas com bons olhos iniciativas que reconheçam a entidades não públicas a possibilidade de constituir empresas de emissão televisiva. Sustento apenas que tal desiderato deve também conformar-se ao respeito dos dois mencionados valores: liberdade e diversidade.
Nada mais coerente com o princípio da função social da propriedade privada. Não ignoro que nesse princípio se contêm pelo menos duas teses de natureza diferente. Uma tese de âmbito geral: a afirmação de que é socialmente útil a vigência de um regime jurídico que reconhece a propriedade privada de bens económicos. Uma tese de âmbito especial sobre o critério de legitimação de situações concretas: a afirmação de que há certos bens económicos relativamente aos quais a possibilidade ou persistência da apropriação privada se legitima em razão da utilidade da função social, e se ilegítima em razão na nocividade da função social, desse tipo de apropriação.
Do meu ponto de vista, a propriedade privada de bens económicos legitima-se, regra geral, sem recurso casuístico ao requisito da utilidade da função social da apropriação privada e, excepcionalmente, em razão da utilidade concreta da função social desse tipo de apropriação.
Do meu ponto de vista, também, o suporte da propriedade privada ou cooperativa de uma empresa de televisão não constitui corolário da tese geral; legitima-se necessariamente pela utilidade concreta desse tipo de apropriação, ou seja, nos termos da tese especial. Se um dos valores a salvaguardar não fosse o da diversidade, admito que o meu ponto de vista, plenamente compatível embora com a ideologia democrata-cristã, pudesse não o ser com a ideologia liberal. Mas sendo a televisão um serviço materialmente limitado, tanto no plano físico como no plano económico, sou levado a pensar que só este ponto de vista, e não o oposto, é compatível com as versões não darwinistas

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do liberalismo Ou seja com o liberalismo entendido em plano diferente da mera simpatia pela lei da força neste caso da força do poder económico E penso o por duas razões simples A primeira consiste em que onde e quando não é possível uma concorrência leal a liberdade não é um direito liberal mas um privilégio um favor uma regalia A segunda reside no facto de que no caso da televisão e designadamente em pais pequeno o motor da empresa televisiva não e o lucro mas a influencia cultural confessional ideológica ou política.
Em actividade tão relevante como a televisão não deve haver lugar a regalias privilégios ou favores Nem há razão para transigir com privilégios de natureza cultural confessional ideológica ou política Mesmo que não soubéssemos que mais procurada seria a influencia confessional do que a cultural a ideológica do que a confessional a política do que a ideológica.
Para que a iniciativa económica privada ou cooperativa seja desejável no plano da televisão importa se distingam as modalidades em que essa iniciativa pode ser considerada.
A plena liberalização da televisão por ondas hertzia nas e fisicamente impossível não seria liberdade mas anarquia O espectro radioeléctrico nacional é um recurso físico limitado e saturável.

O Sr. Borges de Carvalho (CDS): - Saturado?

O Orador: - A iniciativa privada ou cooperativa deve por conseguinte estar sujeita ao regime de licenciamento Ora o exercício do licenciamento só é admissível no plano dos princípios liberais desde que se rés peitem critérios equitativos se observe em todos os casos a regra de concurso publico e se proporcionem a todos os interessados iguais oportunidades Licencia mentos por entidade suspeita de favoritismo segundo critérios não equitativos ou mediante concursos abertos sem prazos suficientemente dilatados e úteis - se riam sempre licenciamentos perigosos mais provável mente contribuiriam para a homogeneização do que para a diversidade. A liberdade de empresa em sectores não lucrativos que exigem avultados investimentos pode mais facilmente transformar se em factor de massificação do espirito do que em garante de pluralismo em escola de civismo e cultura viva em espaço de actualidade plena informação isenta e diálogo aberto.
Acresce que os termos da responsabilidade civil e penal por abusos cometidos através da televisão devem ser objecto de legislação especial. Tanto para salva guarda de quem tem acesso à actividade de emissão televisiva como para salvaguarda do direito das pessoas ao bom nome e reputação Não seria justo qualificar igualmente do ponto de vista civil ou penal os abusos cometidos na impressa escrita e os abusos cometidos pela televisão Não sei em que fase de adiantamento se encontram os trabalhos preparatórios de tal legislação. Mas se no que diz respeito à televisão queremos viver à inglesa ou à americana não podemos manter a portuguesa irresponsabilização jurídica a que os caluniadores estão habituados entre nós.

O Sr. Lopes Cardoso (Indep.): - Muito bem!

O Orador: - O regime de concessão - e a proposta de lei em apreço pretende outorgar uma concessão - é desajustado a uma empresa como a RTP que apenas
dispõe de dois canais Ate porque do meu ponto de ista o segundo deve ser utilizado para fins educativos e culturais como já em grande parte acontece Aliás isso necessariamente resulta de qualquer projecto que de facto atribua prioridade à educação E fica se por exemplo sem saber se pretendendo conceder o segundo canal à Igreja Católica se entende aça bar com a telescola ou confia ía a entidade beneficia na da concessão Não entro na discussão analítica do articulado Outros senhores deputados o faraó Quero em todo o caso deixar claro que entendo que tal pró posta de lei e totalmente alheia ao um verso democrático ofenderia em principio a imagem do alegado beneficiário - e já há aqui indícios claros de que assim e - e viola não só o principio da separação entre as Igrejas e o Estado mas sobretudo o principio da igualdade dos cidadãos perante a lei E conduziria se fosse aprovada a uma situação de singularidade de Portugal no mundo cristão É de facto uma iniciativa que reflecte bem a mentalidade do Governo e o seu alheamento da evidência democrática. Iniciativa que aliás - e contrariamente ao que acabou de declarar o Sr. Ministro - não altera antes consolida o monopólio televisivo do Estado.
Vejo com simpatia que desde já a RTP subscreva com entidades privadas contratos para emissão de pró gramas em que aquelas estejam legitimamente interessadas - como e o caso da celebração litúrgica dominical - ou para as quais sejam especialmente qualificadas. Mas tal não pode confundir se com a concessão da gestão de um canal televisivo.
Vejo igualmente com simpatia o projecto de admitir a liberdade de empresa na emissão de televisão ou difusão por cabo. É um serviço de interesse social designadamente turístico e alcance restrito. Não há razoes técnicas ou doutrinárias que o desaconselhem e pode constituir experiência útil.
Objectar se me á que raciocino no mero plano de Princípios doutrinários e que não discuto a interpreta cão do n.º 7 do artigo 38 da Constituição isolada mente ou em conexão com o 1 do artigo 89 da mesma lei fundamental Não sendo jurista e normal que deixe para outrem a tarefa Para os constitucionalistas em geral mas - confesso - em especial para a prudência do Tribunal Constitucional porque só a decisão deste é dirimente Concelho apenas em que o sentido do n.º 7 do artigo 38 não só não e evidente como alguém autorizadamente disse mas nem sequer é claro Quer se opte pela jurisprudência dos conceitos quer se opte pela jurisprudência dos interesses Mas esta e - reconheço - matéria em que sou inteiramente leigo.
Observo porem que a du ida sobre a interpretação das normas constitucionais criou disparidade de expectativas. É compreensível que os que sustentam a possibilidade constitucional de formação de empresas não publicas de televisão se tenham preparado para apresentação a eventual concurso de licenciamento E é igualmente compreensível que o não tenham feito os que dão a interpretação contrária Ha portanto na sociedade portuguesa uma radical desigualdade de expectativas entre os que entendem que a Constituição consente o licenciamento a Cooperativas e os que entendem que ela o não consente. Só após decisão sobre tal matéria poderá abrir se um concurso de licenciamento sem ofender o principio da igualdade de oportunidades

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Creio ter-me afastado utilmente dos absurdos horizontes mentais do Governo e ter dado exemplo concreto do que pode ser uma posição clara aposta na modernização de Portugal em atitude reformista. Proceder gradualmente e por etapas, sem precipitações, sem dogmas (salvo os da democracia e do Estado de direito) e confiante na utilidade dos ensinamento da experiência. Para resolver os problemas com justiça, cumpre equacioná-los com rigor. E antes de mais com rigor relativamente à determinação dos valores essenciais: a liberdade e a diversidade. Se bem interpreto a vontade maioritária, o que os telespectadores querem é uma televisão livre e variada. Os que quiserem uma televisão idealizada ou subserviente ao poder não encontraram, não encontram e não encontrarão em mim um representante do seu ponto de vista.

Aplausos do PS, do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Sottomayor Cardia solicitaram a palavra os Srs. Deputados Rui Machete e Costa Andrade.
Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Machete.

O Sr. Rui Machete (PSD): - Sr. Deputado Sottomayor Cardia, com a profundidade a que já nos habituou, V. Ex.ª fez um discurso sereno em que analisou, da sua perspectiva evidentemente, alguns dos problemas que esta proposta de lei coloca.
Gostaria de começar por sublinhar essa perspectiva serena, e intelectualmente correcta, em que o Sr. Deputado situou o problema - aliás, outra coisa, dele, não seria de esperar.
Como em breve terá ocasião de ver, Sr. Deputado Sottomayor Cardia, defendo, em muitos aspectos, pontos de vista diametralmente opostos, mas gostaria de não deixar em claro um aspecto em que estou, parece-me, em desacordo e do qual não fiquei com uma ideia nítida acerca do seu pensamento.
Evidentemente, que estamos de acordo em que deve ser dada a prevalência aos aspectos culturais sobre os económicos - aí não há dissensão em matéria de televisão -, mas o Sr. Deputado referiu com bastante insistência uma distinção entre o direito fundamental do receptor e pareceu-me excluir, da matéria dos direitos fundamentais, os problemas da emissão.

Uma Voz do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Ora julgo que esse aspecto, que, como teremos oportunidade de ver ao longo do debate, não é, de modo nenhum, despiciendo, não é reconfortado por aquilo que resulta dos artigos da Constituição.
Efectivamente, quando a Constituição trata, em matéria de direitos, liberdades e garantias, a partir do artigo 37.º, dos problemas da liberdade de expressão e de informação, tem oportunidade de referir os meios de comunicação, como a imprensa e a televisão. É, portanto, a propósito dos direitos fundamentais que isso é referido e eu gostaria de sublinhar que, de uma maneira muito sintomática, o Sr. Deputado Sottomayor Cardia omitiu qualquer referência ao artigo 41.º da Constituição, onde, de uma maneira clara, se diz, no seu n.º 5, que é garantida a liberdade de ensino de qualquer religião praticada no âmbito da respectiva confissão, bem como - e é isso que interessa - a utilização de meios de comunicação social próprios para o prosseguimento das suas actividades.
Trata-se de um direito fundamental, julgo eu - e era sobre isso que gostaria de ouvir o Sr. Deputado -, e, mais do que isso, trata-se ainda e fundamentalmente, se quiser dentro da sua óptica, de um «privilégio» que é dado às confissões religiosas, o que infirma alguns aspectos, suponho, do seu raciocínio.
Por último, gostaria ainda de acrescentar que, se convergimos na prevalência dada à cultura sobre a economia, divergimos na confiança que temos sobre o papel do Estado em assegurar a imparcialidade nesta matéria televisiva, o que, aliás, os debates acerca da televisão têm vindo a demonstrar à saciedade, sejam quais forem os partidos que estejam no governo.
Não deixo de estranhar que o Sr. Deputado tenha tanta fé no papel motor do Estado em sociedades menos evoluídas, como será a nossa, visto que aí estamos claramente em posições antagónicas.

O Sr. Presidente: - Uma vez que o pretende fazer já neste momento, tem a palavra, para responder, o Sr. Deputado Sottomayor Cardia.

O Sr. Sottomayor Cardia (PS): - Embora queira economizar o tempo de que o meu partido dispõe, não vou utilizar mais do que 30 segundos, pelo que vou responder já ao Sr. Deputado Rui Machete.
Sr. Deputado Rui Machete, muito obrigado pelas palavras que me dirigiu e pelas considerações que formulou.
O meu ponto de vista é o de que a emissão audio-visual é um direito não fundamental.
Quanto às confissões religiosas, elas dispõem de meios, mas não de todos os meios, de acesso à comunicação social, enquanto entidade emissora.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr. Deputado Sottomayor Cardia, também eu começo por expressar uma concordância: a de que, do ponto de vista constitucional, as coisas não são claras. Não me parece que se possa com uma evidência soberana dizer, como o PS fez na comissão, que este diploma era manifestamente inconstitucional.
Também concordo com a atitude do Sr. Deputado, quando diz que talvez devêssemos deixar o assunto à prudência do Tribunal Constitucional para que, de uma vez por todas, a entidade competente se pronunciasse sobre a questão. Penso que essa seria a atitude mais correcta e não a de dizer com aquela certeza - aliás, não é própria de quem encara estes problemas com o grau de problematicidade que eles têm - e com aquelas evidências que o PS revelou.
Daí, portanto, a minha concordância com esta atitude intelectual que me merece todo o respeito. Já não me parece - e aqui começa a surgir uma certa discordância - que o Sr. Deputado deva, de certa maneira, condicionar as suas atitudes ao desenvolvimento da legislação penal em matéria de punição dos crimes cometidos através dá televisão.
Salvo melhor entendimento, a pergunta que o Sr. Deputado fez, não o explicitando mas dirigindo-a implicitamente ao Governo, está mal dirigida. É que o orgão com competência para legislar em matéria criminal é por definição a Assembleia da República.

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Sendo o Sr. Deputado uma pessoa altamente qualificada no seu grupo parlamentar talvez devesse fazer a pergunta para ai ou para aqui mas nunca ao Governo quando este aqui apresenta uma proposta de lei.
É descabido condicionar - embora não o tenha feito de forma expressa reconheço o - e usar isto) como tópico da argumentação É uma argumentação desprovida de plausibilidade.
Não posso também deixar de manifestar a minha discordância quando o Sr Deputado estabelece como silogismo da sua argumentação o devermos partir da definição de uma axiologia - aqui estamos de acordo partamos da definição de uma axiologia - na qual devem constelar sobretudo dois valores fundamentais a diversidade e a pluralidade - também estou de acordo - mas - e aqui começa a nossa divergência - ninguém melhor do que o Estado para garantir a diversidade e a pluralidade.
Aliás o Sr. Deputado também não concorda com isto porque no fundo usa uma palavra para escudar o seu discurso onde diz.
O Estado é que tutela o Estado é a melhor tutela da diversidade e da pluralidade Ora por definição tutela e diversidade e pluralidade são de per si de certa maneira autonômicas. Não é crível que se queira dinamizar e maximizar a diversidade e a pluralidade apelando para um único centro um centro de tutela que seria o Estado.
De resto a preocupação de tutela que o Sr. Deputado manifesta no seu discurso e recorrente vai mais longe e assume também a tutela de uma outra entidade que é a própria Igreja Católica pois disse que mais uma vez seria um desprivilégio do próprio beneficia no como já aqui se começou a notar. Creio ter ouvido isto mas se assim não foi - noto pela expressão do Sr. Deputado que não o terá dito - peço-lhe desculpa.
De qualquer forma pareceu me perceber da sua intervenção que o Sr. Deputado inclusivamente assumimos inconvenientes para o beneficiário dizendo que há mais uma vez uma certa atitude de tutela.
O Estado como garante e único centro numa sociedade moderna num mundo plural numa realidade policêntrica absolutamente incontrolável ou seja sugerir o Estado em garante da diversidade e da pluralidade e coisa que não esperava ouvir da parte do Sr Deputado Sottomayor Cardia. Também não me parece Sr. Deputado que tenha razão quando a pretexto de uma eventual desigualdade da existência de liberdade do exercício de actividade televisiva pela Igreja Católica reconduz esse facto à ideia de liberalismo fale em privilégios e parta dai para legitimar a proposta de lei.
Creio que não tem razão Aliás levada às ultimas consequências isso lê ar nos ía a cortar a existência de uma emissora de rádio e até nessa lógica de igualdade absoluta a impedir os contratos para transmissão de cerimonias litúrgicas dominicais uma vez que não se verifica na prática que as outras convicções religiosas tenham um direito com essa consistência.
Parece me pois que também deste ponto de vista a argumentação está viciada.
De resto é estranho que o Sr. Deputado nunca tenha analisado - com alguma prudência o fez - a questão de um ponto de ista da sua legalidade Apenas a colocou sob um ponto de vista da sua oportunidade, oportunidade em nome é certo de uma certa axiologia mas uma oportunidade com a qual não posso concordar.
Aliás o próprio Dr. Mário Soares não concorda com ela uma vez que na véspera das eleições quando lhe foi perguntado pelo semanário Expresso o que pensava da concessão de um canal televisivo à Igreja Católica disse ser óptimo excelente e teceu todas as loas possíveis.
Ora penso que o Dr. Mário Soares também estará preocupado com os valores do pluralismo com os alo rés culturais e com a possibilidade de por o interesse do cultural sobre o económico.
Em síntese Sr. Deputado deixe me exprimir lhe o meu aplauso quanto à sua prudência em matéria de constitucionalidade Lamento que neste aspecto não seja seguido pelo PS como prova a respectiva tomada de posição na comissão
Concordando embora com a sua axiologia não posso deixar de reconhecer que os caminhos que propõe são extremamente disfuncionais em relação à axiologia que proclama.

O Sr. Presidente: - Ainda para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Sottomayor Cardia tem a palavra o Sr. Deputado Borges de Carvalho.

O Sr. Borges de Carvalho (CDS): - Sr. Deputado Sottomayor Cardia grande parte daquilo que lhe que ria dizer já foi dito e melhor do que eu o fana pelo Sr. Deputado Costa Andrade De qualquer maneira não quero deixar de aproveitar a oportunidade para lhe colocar algumas questões.
Em primeiro lugar e ao contrário do que pensa o Sr. Deputado Rui Machete não considero a sua intervenção como serena Com efeito uma intervenção em que o epíteto mais suave que se dá ao Governo e o de ter obseuros horizontes mentais não e com certeza uma intervenção serena.
De qualquer forma sendo a sua intervenção feita em nome de valores tais como a liberdade o pluralismo e outras coisas que andam na oca de toda a gente não deixa de ter todos os ingredientes para as mais graves limitações a essa mesma liberdade e a esse mesmo pluralismo.
Porventura por estar irritado com algum Telejornal vem apelar para legislação designadamente penal especial relativamente à televisão o que seria em termos democráticos extremamente grave?
Afinal V. Ex.ª vem apelar em nome da liberdade do pluralismo e de outros valores para todo um leque de limitações a essa liberdade e a esse pluralismo Dai que eu não possa deixar de lhe pedir que se explique melhor pois fortes duvidas ficaram no meu espirito.
O Sr. Deputado chega ao ponto de depois de fazer a apologia da igualdade de oportunidades defender a televisão por cabo Ora nada há de mais elitista que a televisão por cabo.
Como e evidente eu não sou contra a televisão por cabo no entanto e o tipo de emissão que e dirigido apenas a quem paga e não à generalidade dos cidadãos
Assim como é que o Sr. Deputado pode vir falar em igualdade de oportunidades nessa matéria? Só se for igualdade de oportunidade de pagar por parte de quem tiver dinheiro.

O Sr. Sottomayor Cardia (PS): - Exactamente!

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O Orador: - Para terminar, Sr. Deputado, pedia-lhe que fizesse um exercício de consciência e comparasse as consequências do n.º 4 do artigo 38.º da Constituição com as do n.º 7, ou seja, que comparasse o que é a imprensa escrita hoje em Portugal, apesar da imprensa pública, com a apagada e vil tristeza da televisão monopolista em Portugal.
Penso que, se realmente V. Ex.ª não tiver, a este respeito, os obseuros horizontes mentais que assaca ao Governo, talvez chegue a conclusões corripletamente contrárias àquelas que na sua intervenção proeurou aqui trazer.

Aplausos do CDS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Sottomayor
Cardia.

O Sr. Sottomayor Cardia (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, quero dizer que, do meu ponto de vista, o PS já ganhou o essencial deste debate, isto é, imprimir um teor reflexivo e responsável ao debate e afastá-lo de aspectos emocionais, como ele, até agora, vinha sendo conduzido.

Uma voz do PS: - Muito bem!

O Orador: - Louvo-me não só das declarações do Sr. Deputado Rui Machete como das do Sr. Deputado Costa Andrade e até também das do Sr. Deputado Borges de Carvalho, visto que uma coisa é a concordância, outra coisa é a aceitação, que expôs de uma maneira parlamentar e adequada, do universo democrático.

O Sr. Borges de Carvalho (CDS): - Muito obrigado, muito obrigado!

O Orador: - Sr. Deputado Costa Andrade, quanto às disposições penais e civis, penso que é prudente que sejam feitas. Nem sequer perguntei ao Governo se as está a fazer.
Quanto à questão da tutela, o Sr. Deputado disse que eu tinha assumido a tutela da Igreja Católica. Ora, isso eu repudio inteiramente, pois não assumo a tutela da Igreja Católica. Penso é que o Governo a está a querer assumir sem requerimento da Conferência Episcopal Portuguesa ou da Nunciatura Apostólica, que são as únicas entidades que teriam competência para fazer autorizadamente este requerimento, e não quaisquer outras entidades que não têm essa competência.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - O Sr. Deputado, permite-me que o interrompa?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr. Deputado, nessa parte da minha intervenção, ressalvei a hipótese de não ter entendido bem o seu pensamento. Mas pergunto-lhe se disse ou não, por estas ou por outras palavras, que esta iniciativa redundava, de certa maneira, em desvantagem para a própria Igreja Católica. Ora, se o disse, o que é isto senão tutela?

O Orador: - Isso não é tutelar, é, sim, formular um juízo de valor sobre uma situação emergente de uma decisão, que, espero, não venha a ser tomada e que resultaria de uma iniciativa imponderada.
Quanto à questão da rádio, Sr. Deputado Costa Andrade, penso que ela tem um estatuto social diferente, quer no plano material quer no plano económico, do da televisão, pelo menos para já. A regra da função social da propriedade aplica-se diversamente a uma e à outra.
Esta é a minha opinião, mas precisamente porque num Parlamento há posições contraditórias é que elas devem ser discutidas e eu fico muito satisfeito por ter contribuído para inaugurar neste debate uma discussão serena sobre esta matéria.
O Sr. Deputado referiu as posições do Dr. Mário Soares. Ora, devo dizer-lhe que gostaria de saber o que é que o Prof. Freitas do Amaral pensa da minha argumentação.

Aplausos do PS, do PCP e do MDP/CDE.

Risos do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos interromper a sessão, que recomeçará às 15 horas.
Está, pois, encerrada a sessão.

Eram 13 horas.

Após o intervalo, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Fernando Amaral.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 15 horas e 25 minutos.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado António Capucho pede a palavra para que efeito?

O Sr. António Capucho (PSD): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem, então, a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Capucho (PSD): - Queria apenas chamar a atenção do Sr. Presidente para o facto de não se encontrar nenhum deputado na bancada do CDS.

O Sr. Presidente: - A Mesa já diligenciou no sentido de mandar chamar os Srs. Deputados do CDS.

Pausa.

Uma vez que já tomámos providências relativamente à presença de deputados do CDS, por quem aguardamos há já algum tempo, e visto que hoje ainda temos uma longa caminhada a percorrer, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Machete, para uma intervenção.

O Sr. Rui Machete (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A Assembleia da República, ao discutir na generalidade a proposta de lei n.º 5/IV, que pretende alterar o artigo 2.º da Lei n.º 75/79, de 29 de Novembro, tem perante si duas alternativas: ou, seguindo o modelo dos debates de 1982 e de 1984 sobre o mesmo assunto, se queda em questões jurídicas e políticas preliminares, estabelecendo um «braço de ferro» com o Governo e reduzindo a questão a mais um episódio da luta entre este e a oposição, ou, pelo contrário, a Câmara aproveita

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o ensejo para com serenidade aprofundar o problema da cessação do monopólio do Estado sobre a televisão e do acesso de outras entidades a este poderoso meio de comunicação de massas.
Se optar pelo primeiro caminho a sorte deste debate está de antemão traçada e restará ao Governo procurar na opinião publica compensação para a derrota inevitável que vai ser sofrida no hemiciclo. Tudo se resumira ao registo no deve e haver do Governo e da oposição de mais um sucesso em que os contabilistas de um e outro lado não estarão certamente de acordo quanto ao resultado final Mas perdeu se uma grande oportunidade de evidenciar a capacidade de reflexão deste Parlamento.
Se a Assembleia porém pensar enveredar pela segunda via abrem se outras perspectivas Nada então estará decidido a priori pela simples clivagem dos votos de cada grupo parlamentar Os deputados aceitarão discutir sem prejuízos e sem posições irredutíveis os argumentos das diversas teses em presença A Camará não funcionará como simples caixa de ressonância dos estados maiores partidários realizando antes a missão clarificadora e criadora que os velhos constitucionalistas atribuíam à livre discussão entre os representantes do povo Então seja qual for o resultado final da votação que encerrar o debate o Parlamento terá dado um passo significativo no esclarecimento de tão momentânea questão haverá um progresso e já não será possível voltar a colocar os problemas de modo estreito como até aqui muitas vezes tem sido analisados. Tão pouco poderá dizer se que se cavou um fosso entre os católicos e os não católicos.
O que vos proponho Srs. Deputados é que olhando menos a formulação concreta dos textos que são sem pré susceptíveis de aperfeiçoamento e alteração nos debrucemos sobre as questões políticas e jurídicas fundamentais que estão por detrás deles. Estou seguro que se o fizermos a Assembleia da Republica às vezes tão injustamente desconsiderada ou até vilipendiada sairá engrandecida aos olhos dos Portugueses e com ela naturalmente a democracia.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Há aliás boas razoes para repropor o tema à consideração desta Câmara. A Radiotelevisão constitui um dos exemplos mais flagrantes da rapidez da mutação tecnológica da década de 80 e da rápida caducidade dos modelos assentes em concepções e estádios técnicos de há poucos anos mas já hoje claramente ultrapassados.
A maioria dos nossos constituintes de 1976 excessivamente confiantes na capacidade do Estado tinha em mente - embora não o tivesse querido ou sabido vazar integralmente dos preceitos da lei fundamental - um sistema em que era tecnicamente fácil assegurar aos poderes públicos o monopólio dos meios televisivos adentro das nossas fronteiras e com ele excluir que os receptores portugueses pudessem receber comunica coes televisivas de outra fonte ou por outro meio Esse era de resto o modelo herdado de antes do 25 de Abril e que correspondeu a uma certa fase de evolução das técnicas de transmissão de imagem à distancia e a um figurino adoptado com variantes nos diversos países europeus
Cedo se verificou que em largas faixas fronteiriças e depois com a melhoria dos meios de recepção mui tos quilómetros para o interior do território era possível captar as emissões da nossa vizinha Espanha. Mas é a operacionalidade já actuai nuns casos ou num próximo futuro noutros dos sistemas de televisão por cabo e de radiodifusão directa da imagem por meio de satélites que vem tornar este modelo concebido na sua pureza e radicalidade obsoleto. Em breve os Europeus uns mais do que outros consoante a situação geográfica dos respectivos países poderão através das antenas adequadas ver em suas casas anos programas estrangeiros com a mesma nitidez e em condições de som idênticos aos produzidos nos seus próprios pai sés E os Portugueses embora vendo menos programas que os cidadãos de países europeus mais centrais sempre terão a possibilidade de escolher entre dez a quinze canais diferentes para além dos nacionais. Tudo vai depender da bolsa de cada um e da qualidade das antenas parabólicas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A evolução técnica teve como consequências a acentuação da importância da cooperação internacional em matéria de produção e difusão televisivas e a valorização dos aspectos económicos e concorrenciais por contraposição com a perspectiva predominantemente cultural ate agora seguida na abordagem desta problemática Neste ultimo sentido e significativo o Livro Verde Televisão sem Fronteiras publicado em 1984 pela Comissão das Comunidades Europeias Mais recentemente ainda em artigo do ultimo numero do Archiv dês ceffentlichen Rechts publicado em Dezembro passado Hoffmann. Riem que é um conhecido especialista na matéria ao estudar as implicações em matéria de deregulation ou diminuição da intervenção legiferante do Estado do chamado modelo de mercado concorrencial nos meios de comutação televisivos põe de sobreaviso os seguidores entusiastas do exemplo americano e da prevalência dos aspectos económicos sobre os efeitos nocivos. Tinha naturalmente em vista o que concerne à Republica Federal da Alemanha e prevenia contra uma exageração dessa tónica economicista. Mas se aproximar demasiado os meios de comunicação social da lógica do mercado concorrencial é exagero merecedor de critica o que não podemos e fechar os olhos à alteração estrutural que a televisão por cabo e a televisão por satélite vieram trazer O quadro de referencia a que nos devemos ater no que respeita aos aspectos técnicos é assim para o futuro completamente outro.
Por outro lado a experiência dos últimos 15 anos em Portugal no que à televisão diz respeito veio demonstrar que se e verdade que aquela constitui um meio poderoso de intervir na formação da opinião publica e por isso mesmo assume enorme relevância para a garantia do direito fundamental da liberdade de expressão de pensamento e de opinião e ainda para a existência de um autentico pluralismo social não é menos exacto que o monopólio do Estado através da sua empresa publica não se mostrou a melhor maneira para o conseguir. Provam-no as acusações que de todos os lados e em todos os momentos chovem sobre a instrumentalização da televisão ao mesmo tempo acusada de ser ou pró governamental ou favorável a este ou àquele partido da oposição Poderemos dizer que haja

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ou não justiça nesse juízo, existe consenso entre todos os partidos para considerar a TV como ré convicta de parcialidade ou de favoritismo. Só há divergências evidentes é sobre quem são os beneficiários desse pretenso favoritismo ...
Sr. Presidente, Srs. Deputados: As transformações técnicas e o circunstancialismo político atrás invocados explicam, talvez, a razão por que a maioria dos partidos representados nesta Assembleia admite hoje, ao contrário do passado, e pelo menos de jure condendo, o acesso das entidades diversas do Estado à Radiotelevisão.
Mas, volvendo agora a nossa atenção para os problemas jurídicos que têm de ser dilucidados a propósito desta proposta de lei do Governo, distinguiremos três questões principais: Primeira, se é lícito conceder o serviço público de televisão a entidades diversas do Estado e da actual empresa pública concessionária; segunda, se é constitucionalmente admissível atribuir à Igreja Católica um canal de televisão e a que título jurídico; terceira, quais são os princípios que devem reger as concessões de serviço público televisivo a serem outorgadas.
A primeira questão tem a ver com a interpretação correcta do artigo 38.º, n.º 7, da Constituição, onde se prescreve que:

A televisão não pode ser objecto de propriedade privada.

Digamos, antes de mais, que a explanação pormenorizada das diferentes teses que têm sido sustentadas acerca do sentido e do alcance deste preceito exigiriam uma descrição detalhada de «pré-compreensão» e dos topoi escolhidos pelos diversos interpretes, o que, brevitatis causa, nos não é possível aqui fazer. Há, em resumo, os que pensam que a «propriedade privada», que nesse artigo se refere, corresponde ao que o Código Civil disciplina nos seus artigos 1302.º e seguintes, conceito que é também usado no artigo 62.º da própria Constituição. A restrição do artigo 38.º, n.º 7, significa que o legislador constituinte instituiu um regime de direito público em matéria de televisão, assegurando que a titularidade do direito público de propriedade pertence sempre ao Estado ou, através de um esquema de divisão de poderes, a uma pessoa colectiva de direito público que integre a Administração. Mas a gestão de exploração, essa, tanto pode ser realizada directamente pelo Estado como pode ser concedida a uma pessoa colectiva diversa, quer de natureza pública, quer cooperativa, quer puramente privada. A concessão no seu âmbito poderá abranger a simples exploração de frequência ou também a propriedade das infra-estruturas e dos instrumentos necessários à produção e transmissão dos programas de televisão.
Posição oposta sustentam os que entendem que a expressão «propriedade privada» é equivalente a «sector privado», tal como é descrito no artigo 89.º, n.º 3, da Constituição, retirando daí a consequência de que a gestão da televisão nunca poderá ser entregue a pessoas colectivas privadas ou, pelo menos, a pessoas colectivas que não integrem a Administração Pública.
Inclino-me claramente no primeiro sentido. Militam a seu favor não só razões históricas aquando da elaboração da Constituição de 1976 (Diário da Assembleia Constituinte, p. 1100) e da revisão constitucional de 1982 (ver Jorge Miranda, Revisão Constitucional e
Democracia, Lisboa, 1983, pp. 81 a 82) como sobretudo e mais directamente ainda razões de ordem valorativa e sistemática. Desde logo não parece poder admitir-se qualquer subordinação do artigo 38.º, n.º 7, ao artigo 89.º, pois que tal implicaria que a nossa lei fundamental adoptara uma percepção economicista de televisão no sentido que criticámos há pouco a propósito da experiência americana, enquadrando-a na constituição económica - é bem característica a referência no artigo 89.º a sectores de propriedade dos bens de produção - e não a enquadrando, como deve ser, na constituição cultural.
Ouvimos, aliás, há pouco uma clara explanação neste sentido feita pelo Sr. Deputado Sottomayor Cardia.
Mas a inclusão do preceito que vimos comentando - o artigo sobre «Liberdade de imprensa e meios de comunicação social» (artigo 38.º), ele próprio inserido no capítulo I do título n sobre direitos, liberdades e garantias - e desenvolvendo sob o ponto de vista dos mass media, a clássica liberdade de expressão e de informação afasta claramente tal interpretação.
Diversos outros argumentos poderiam ainda ser esgrimidos, como, por exemplo, o facto de os bens das entidades públicas mencionadas no artigo 89.º, n.º 2, poderem ser objecto de propriedade privada, o que permite inferir que o problema do domínio público e do seu modelo de gestão estão fora do âmbito do citado artigo, conclusão que é reconfortada pelo facto de as duas matérias serem tratadas em alíneas diferentes do artigo 168.º, n. º 1, da Constituição, a alínea y) e a alínea x).

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Seria também lícito, citando-se o disposto no artigo 41.º, n.º 5, da Constituição e a necessidade de se chegar a uma «concordância prática», concluir que os meios de comunicação social próprios, garantidos a qualquer religião, envolvem, no que concerne à televisão, a faculdade de terem a gestão, que não já a propriedade, dos meios televisivos adequados.
Neste ponto, divergimos frontalmente da interpretação constitucional dada pelo Sr. Deputado Sottomayor Cardia.
Chegamos, assim, a uma posição favorável à concessão do serviço público televisivo a entidades diferentes da actual concessionária e que podem ser públicas ou privadas.
Estamos, por isso mesmo, agora em condições de abordar o segundo problema: é legítimo, numa perspectiva jurídico-constitucional, atribuir um canal televisivo à Igreja Católica como esta reiteradamente vem solicitando? As discordâncias neste tema registam-se a propósito, nomeadamente, do princípio de igualdade, afirmando-se designadamente que tal concessão se traduziria num privilégio em prejuízo de outras religiões ou até de outros grupos, associações ou mesmo de pessoas colectivas com fins lucrativos, isto é, sociedades.
A observação crítica seria certamente procedente se com a outorga da concessão se visasse o seu exclusivo. Mas tal não é manifestamente o caso, como resulta inequivocamente da proposta de lei do Governo. Sob o ângulo técnico, sabe-se que, na actual fase de desenvolvimento, existe a possibilidade de fazer funcionar em Portugal pelo menos quatro canais e que o quinto, embora em condições mais difíceis, não é impossível.

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Do ponto de vista jurídico constitucional no que rés pé ta aos meios de comunicação social os princípios orientadores que hão de reger o comportamento do concessionário são a garantia do pluralismo pré condição essencial da democracia - artigo 1.º da Constituição - e a igualdade de oportunidades tradução neste domínio do principio da igualdade perante a lei. O pluralismo é garantido pelo facto de poder haver mais do que um concessionário para além da própria empresa publica actual a Radiotelevisão Portuguesa e ainda pelas obrigações de comportamento a que cada concessionário ficará sujeito.
A igualdade de oportunidades tem de ser interpretada à luz da própria conformação que o legislador constitucional lhe deu ao consignar um regime especial de vantagem para as confissões religiosas no artigo 41.º n.º 5. Por força da Concordata da história e da própria realidade sociológica a Igreja Católica tem em Portugal um lugar impar entre as diversas religiões situação especifica que há que ter em conta na ponde ração a atribuir as diversas solicitações que eventual mente vierem a ser feitas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Compete à discricionariedade do legislador ordinário isto e em primeiro lugar a esta Assembleia que há de guiar se pelo quadro básico de valores constitucionais escolher as soluções que pré ser ando o pluralismo de expressão das diversas opiniões em todos os domínios do pensamento - nota característica de uma sociedade aberta como pretendemos ser - venha respeitar a especial posição dada às confissões religiosas no artigo 41.º n.º 5 da Constituição e o peso particularíssimo quer jurídico quer histórico e sociológico que entre nós tem a Igreja Católica.
Sinceramente entendo que dentro da ampla gama das soluções possíveis a concessão à Igreja Católica de um canal de televisão não prejudica a outorga de outras concessões a quem nisso se mostrar interessado e tenha as condições para tal A negação da concessão a Igreja de meios televisivos tendo esta formulado o respectivo pedido essa sim viola frontalmente o artigo 41.º n.º 5 da Constituição.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Definido este caminho não tem o legislador que se preocupar com a qualificação jurídica das pessoas colectivas eclesiásticas no nosso direito interno Publicadas as disposições legais necessárias bastará concertar com a própria Igreja Católica quem a representa para este efeito.
E por isso que a pergunta há pouco feita pelo Sr Deputado Sottomayor Cardia sobre quem tinha feito a solicitação em nome da Igreja e neste aspecto irrelevante.
A última questão que nos propusemos abordar reporta se ao novo modelo estrutural a adoptar para o meio de comunicação social televisão e às condições em que as concessões devem ser outorgadas Não julgo possível indicar aqui senão algumas linhas muito gerais Cabe desde logo referir que terá de criar se um organismo que ele pelo cumprimento das normas constitucionais e ordinárias neste sector similar ao Conselho de Comunicação Social mas com os poderes apropriados a este domínio específico. Haverá igual mente que estabelecer as condições do equilíbrio económico financeiro de cada concessão.
Importa ainda salvaguardar em relação à empresa publica e aos restantes concessionários a regulamentação do direito de resposta a responsabilidade civil e criminal pelas infracções cometidas atra és da emissão de programas televisivos e obviamente também o direito de antena nos períodos eleitorais.
Quanto à programação propriamente dita será desejável estabelecer regras que disciplinem por forma quantificada a obrigatoriedade da transmissão de pró gramas baseados na literatura na musica e em geral nos valores da cultura portuguesa bem como uma limitação dos tempos de publicidade O principio da correcção de procedimento e da verdade informativa exigira objectividade e rigor na escolha dos factos a noticiar e no modo como as noticias serão dadas As imposições relativas ao conteúdo dos programas no caso de confissões religiosas tem de adaptar se e rés peitar a autonomia e finalidade próprias destas entidades não podendo em nenhum caso e seja qual for a entidade concessionária traduzir se numa actividade censória ou de orientação ideológica.
Tratando-se de uma matéria relativa a direitos liberdades e garantias e ao regime dos bens do domínio publico a definição do condicionalismo das concessões deverá ser directamente feita pela Assembleia da Republica ou objecto de competente autorização legislativa Os n 2 3 e 4 da proposta de lei n.º 5/1V deverão ser revistos em conformidade com o facto de a mate na que tem por objecto caber na reserva relativa da competência legislativa da Assembleia - artigo 168 n.º 1 alíneas b) e x) Tal não significa obviamente que não caiba ao Governo a outorga da concessão propriamente dita.
Em conclusão termino da mesma forma que iniciei esta minha intervenção apelando para que a Assem bleia ao discutir este importante tema olhe sobretudo para as questões de fundo que estão postas e não para a formulação concreta feita nos preceitos propostos pois se houver entendimento maioritário possível o Plenário ou a Comissão saberão encontrar as alterações ou aditamentos adequados.
Em matéria de tamanha importância para católicos e não católicos seria pena muita pena mesmo que a preocupação do detalhe obscurecesse a isso de conjunto. Tenho esperança e faço votos para que assim não aconteça.

Aplausos do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Pediram a palavra para formular pedidos de esclarecimento os Srs. Deputados José Magalhães Alexandre Manuel e Jorge Lemos.
Tem a palavra o Sr Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado Rui Machete o Sr. Deputado veio dizer à Camará caprichando no tom e no estilo que há dois caminhos um dos quais péssimo para discutir esta matéria.
O grande problema Sr Deputado Rui Machete é que o caminho péssimo foi desde logo trilhado pelo Governo ao apresentar nos termos em que apresentou esta proposta em torno da qual se está lamentavelmente a centrar o debate.

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Nós não estamos a travar um debate, na sede, porventura, de uma interpelação ou de um debate sobre política geral sobre os desafios que para a Assembleia e para o legislador decorrem das novas tecnologias, mas um debate sobre a concessão de um canal de TV à Igreja Católica, o que, por sua vez, reproduz os debates que já travámos no passado sobre a mesma matéria, em relação à qual só temos de reproduzir todos e cada um dos argumentos que produzimos e que são do conhecimento da Câmara e do Governo.
O Governo não ignora a posição existente sobre esta matéria, que tem uma larga afirmação nesta Câmara. Assim, o colocar a questão como colocou, inquinou ab initio o debate.
O Governo, sabendo tudo isto, apresentou uma proposta que é uma verdadeira autorização legislativa em branco, numa matéria em que não cabe qualquer autorização legislativa e em que tudo tem de ser decidido ao milímetro. Porém, fê-lo, no momento e nas condições em que o fez, com um manifesto carácter de pressão sobre a Assembleia da República. E mais: com um carácter de pressão sobre a situação política.
É inquestionável que o Governo proeurou utilizar esta autorização legislativa para influir nos resultados das eleições presidenciais...

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Ora essa, então amanhã há presidenciais?!

O Orador: - ... e que proeurou apresentá-la num momento em que receava ou desejava, pelo menos, uma impugnação por parte do Grupo Parlamentar do PCP. Isto para precipitar um debate que cavasse uma suposta questão religiosa e que colocasse, falsamente, de um lado os que votam a favor da proposta, e estão com a Igreja Católica, e de outro os que votam contra a proposta - e, portanto, supostamente, esses não estariam com a Igreja Católica -, o que é uma divisão que recusamos em absoluto, pois consideramo-la uma instrumentalização abusiva de uma instituição que não deve ser instrumentalizada.
Mas o Governo fez pior e era para isso que queria chamar a atenção do Sr. Deputado Rui Machete.
O Governo sabe, em princípio, como todos nós (porque lemos), que o programa do PS prevê uma futura - e dependente de revisão constitucional - abertura da televisão a entidades privadas e o programa do PRD prevê qualquer coisa que está, não sei porquê, a ser escamoteada neste debate. Ora, penso que é altura de despir esse fantasma e assumi-lo no Plenário da Assembleia da República.
O que lá se diz - qualquer cidadão pode ler e eu li-o - é o seguinte:
Defende-se a concessão, por intervenção decisória do CCS, de canais de televisão, mantendo-se a propriedade do Estado ou a concessão de tempo de antena, nos já existentes, a cooperativas e empresas privadas, concessão em que devem ter preferência profissionais de informação associados para o efeito ou empresas já com provas neste domínio, em termos a regulamentar e garantindo sempre o essencial dos princípios exigíveis também para a estação oficial.
Isto é o que se lê nesse documento, que é público.
Devo dizer que entendo que esta posição, ou estes exactos contornos, só são concretizáveis pelo legislador depois de uma revisão constitucional que altere aquilo que não foi alterado na revisão de 1982. A situação será, assim, porventura, alterável, mas só em sede de revisão constitucional.
Serão possíveis outras formulações, e o PRD anunciou-nos isso em comissão - aguardamos explicações que, certamente, serão dadas em devido tempo e pela devida forma - sobre uma outra figura jurídica, que seria a possibilidade de acesso a entidades privadas sem alteração de modo de gestão. Logo se verá o que é isso...
Sabendo isto, o que o Governo está a fazer aqui, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é simplicíssimo: é uma operação de chantagem e de pressão...

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Não apoiado!

O Orador: - ... para tentar fazer com que a Assembleia da República aprove, agora e já, antes da revisão constitucional, um regime que antecipe coisas que diversos partidos aqui sustentam, mas que, Sr. Presidente e Srs. Deputados, podem ser feitas pela boa e devida forma, na altura própria, se assim couber, e no quadro próprio. Antecipar isso afigura-se-nos muito ilegítimo.
O Sr. Deputado Rui Machete - com isto concluo - vem dizer-nos que temos de reflectir. Ora, Sr. Deputado, como é que podemos reflectir com uma arma ao peito, com a Igreja Católica «ao peito»? Como é que a Assembleia da República, que é um órgão de Estado laico, pode intervir nesta matéria com dois fantasmas: um programa de um partido que tem voz própria e que se há-de exprimir e uma Igreja que não está aqui, não podendo exprimir-se nesta sede?
Este debate está inquinado e deve ser reconduzido ao devido trilho através da rejeição desta proposta de lei, recomeçando-se então tudo numa base sã. Isto porque aquilo que o Sr. Deputado disse não tem nada a ver, se bem o entendi - se não o entendi, agradeço-lhe que me clarifique -, com uma perspectiva que é veiculada pela operação de chicana que o Governo conduziu. O Sr. Deputado quer alterar isso? Então, devo dizer-lhe que precisa fazer muito mais do que o que fez.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Alexandre Manuel, no pressuposto de que o Sr. Deputado Rui Machete pretenderá responder no final.

O Sr. Alexandre Manuel (PRD): - Sr. Deputado Rui Machete, ainda que V. Ex.ª saiba que discordo dos princípios que presidiram à sua intervenção - tal ficou claro no debate travado na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias -, não posso, no entanto, deixar de clarificar de notável a sua intervenção. Apesar de tudo, ela levantou-me algumas questões, uma das quais queria avançar desde já.
Diz V. Ex.ª, em determinado momento, que não se deve deixar de conceder à Igreja meios televisivos, tendo esta formulado o respectivo pedido - penso que é este o termo.

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Como apesar das solicitações aqui feitas o Sr. Ministro não nos conseguiu explicar se de facto a Igreja Católica enquanto tal o tinha requerido pergunto a V. Ex.ª se por acaso tem conhecimento de que a Igreja tenha feito esse pedido e em que condições.
É que ao contrario do que V. Ex.ª disse perante as afirmações publicas de alguns membros da hierarquia da Igreja parece que esta não queria um canal de televisão nos termos que são avançados nesta proposta governativa e então a questão deixa de ser irrelevante para ser importante.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Deputado Rui Machete muito do que teria a perguntar já foi colocado pelo Sr. Deputado José Magalhães Porém ainda assim valeria a pena colocar lhe duas questões.
Quanto aos pressupostos do actual debate creio que estamos esclarecidos.
O Sr. Deputado Rui Machete fala nos num quadro diferente do quadro que estamos a discutir. Não estamos a discutir no quadro da globalidade do audiovisuais mas uma questão muito concreta que aqui nos foi trazida pela proposta de lei n.º 5/IV. Portanto tentar confundir as duas coisas não e possível no actual momento
Sr. Deputado Rui Machete gostaria que comentasse a postura governamental ao longo de todo este processo.
O Governo apresenta a proposta em fins de Dezembro pede urgência para essa proposta e a Assembleia da Republica em sede de comissão própria considera que a urgência não e de atender.
Entretanto o Governo para alcançar esse objectivo retira o pedido de urgência e pede que o Presidente de prioridade à discussão da matéria em Plenário

Uma Voz do PSD: - É regimental!

O Orador: - Então o Sr. Deputado Rui Machete considera que este modo de actuação governamental é um modo de actuação sério? Se, se pretende urgência para uma determinada matéria e se essa urgência é negada pela maioria de uma comissão especializada é ou não provocar um confronto com esta Assembleia da Republica insistir no carácter prioritário do agendamento de uma tal matéria.
A segunda questão Sr Deputado Rui Machete e a seguinte quem definiu as regras deste debate não fomos nós mas o próprio Governo E se aqui se está a falar de cristãos ou não cristãos de ateus e de santos não foi pelo nosso lado que essa ideia surgiu Quem a trouxe - do nosso ponto de vista de uma maneira abusiva - foi o próprio Governo que traz para a Assembleia da Republica para um debate que na nossa opinião deveria ser um debate sério a travar no devido tempo uma arma de pressão que é o nome da Igreja Católica.
Considera correcto Sr Deputado Rui Machete que um governo confronte a Assembleia da Republica numa matéria tão delicada como a que estamos a tratar nestes termos?

O Sr. Presidente: - Para responder tem a palavra o Sr. Deputado Rui Machete.

O Sr Rui Machete (PSD): - O Sr. Deputado José Magalhães pergunta como é que podemos fazer este debate com a Igreja Católica ao peito.
Se V. Ex.ª fosse religioso diria que era simples rezando. Porém suponho que não é o melhor conselho a dar-lhe.
No fundo Sr Deputado o problema é este penso que o Governo teve o mento de repropor a questão.
A apresentação que o Sr. Ministro Adjunto aqui realizou foi extremamente aberta Foi pena que depois o debate na sequência da sua intervenção passasse para questões menores No entanto isso não foi culpa do Governo mas em resposta às interrogações que lhe foram feitas.
O que penso é exactamente aquilo que ha pouco tive ocasião de referir na minha intervenção. A Assembleia da Republica -os deputados e os grupos parlamentares- tem 2 caminhos V. Ex.ª entende que só pode escolher o primeiro que é o de fazer um debate extremamente dialéctico mas em que se atem estrita mente à proposta de lei do Governo procurando dês cortinar nela todas as intenções dolosas que nela efectivamente não se encontram para evitar discutir a questão de fundo
Penso que pelo contrário o caminho que se me afigura claramente preferível - e que foi aliás o caminho seguido pelo Sr. Deputado Sottomayor Cardia - é o de discutir as questões de fundo a propósito de um problema que é fundamental e o qual não sei muito bem como é que se há de por de outra maneira Isto é como e que se vai discutir o problema da possibilidade do acesso das confissões religiosas a televisão -obviamente que quando se fala das confissões religiosas a Igreja Católica avoluma entre todas elas por que em Portugal do ponto de ista histórico e sócio lógico não tem comparação com as outras e não discuto o problema da sua dignidade pois essa é igual do ponto de vista constitucional- sem mencionar a Igreja Católica? Então vamos te receio de mencionar a Igreja Católica e ainda por cima de falar no seu nome quando a Igreja Católica tem vindo reiterada mente a pôr essa questão e a manifestar o seu interesse em que ela seja resolvida?

Uma Voz do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Penso que isto não e a melhor forma de encetarmos este debate.

O Sr. José Magalhães (PCP) Dá me licença que o interrompa Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado Rui Machete nós não estamos a recusar nos a considerar a existência institucional da Igreja Católica como é evidente

O Orador: - Também era melhor!

O Sr. José Magalhães (PCP): - O vicio não está ai mas em centrar o debate sobre esta questão que é uma questão do Estado laico numa pretensão de uma deter

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minada entidade, canonicamente erecta, da Igreja Católica. Isto é usar a Igreja Católica como um desentupidor do monopólio público. Não pode ser, Sr. Deputado!
O Orador: - Quer dizer que V. Ex.ª entende que o direito de petição pode existir para todas as pessoas colectivas, mas não para a Igreja Católica?! É uma opinião, mas não é a minha.
O que penso, e volto a repetir, é que cada grupo parlamentar, cada deputado, escolherá o caminho que considerar mais apropriado para discutir este ponto.
Eu propus, efectivamente, de entre as duas alternativas, aquela que me parecia mais consentânea com a dignidade do problema e com a dignidade que a Assembleia da República deve emprestar a este debate. É esta a minha opinião. Posso estar errado, mas disse-o e reitero-o agora aqui.
O Sr. Deputado Alexandre Manuel pôs-me, no fundo, o problema de saber se não há algumas diferenças de tom na forma como a hierarquia católica ou as diversas estruturas organizatórias da Igreja Católica pensam este problema, criticando, no fundo, a minha afirmação de que essa matéria era relativamente irrelevante.
Efectivamente, penso que para a Assembleia da República o problema é irrelevante. A Assembleia da República não tem que se debruçar sobre a maneira especificamente concreta como esta ou aquela estrutura da Igreja deseja que a concessão lhe seja feita, nem sobre a problemática interna da Igreja Católica, o que, diria, é uma espécie de interferência em negócios internos.
O que a Assembleia da República tem que discutir é outra coisa e essa é que é relevante: sendo inequívoco que várias instâncias da Igreja se manifestaram no sentido de desejar ter uma interferência em termos de comunicação social, tendo um canal televisivo ou tendo uma concessão, é necessário saber se, do ponto de vista da análise de todos os interesses em presença, a Assembleia da República está de acordo ou está em desacordo com essa pretensão. Essa é que é a questão fundamental!
Depois, a forma de concertar esta questão em concreto depende da maneira como o legislador vier a conformar a lei e da maneira como o Governo, na execução dessa autorização legislativa, vier a estruturar a forma concreta da concessão.
Penso, por isso, que debatermos esta questão é estarmos a desviar a nossa atenção de questões fundamentais para questões de pormenor, parecendo-me, no fundo, que há, por vezes, um certo desejo de fazer valorizar excessivamente essas questões para desviar a atenção e criar algumas dificuldades suplementares, que, no fundo, não devem existir.
Não é essa, certamente, a sua intenção, mas é essa a intenção com que alguns outros têm suscitado o problema. Agradeço-lhe, de qualquer modo, a forma extremamente lhana e cortês como apreciou a minha intervenção.
O Sr. Deputado Jorge Lemos, no fundo, veio repetir, embora por outras palavras, a posição do Sr. Deputado José Magalhães e eu limitar-me-ei a remetê-lo para aquilo que há pouco referi.
No fundo, é importante saber se o PCP é a favor ou contra a possibilidade de a Igreja Católica, como confissão religiosa, dispor de uma situação «privilegiada», se é admissível ou não que outras confissões religiosas tenham acesso à televisão e se é possível que outras entidades tenham também acesso a este órgão de comunicação social.
Essa é que é a questão e não vale a pena termos subterfúgios ou fórmulas que se apresentam como escapatórias. Temos de dizer sim ou não, embora sob diversas formas e de diversas maneiras, discutindo o problema. Não digo que seja ilegítimo tomar uma posição contrária, obviamente, porém, há que a assumir, sem com isto referir pretensas considerações eleitoralistas que neste momento já não têm sentido.
Aliás, o facto de este debate se realizar neste momento e de o Governo insistir nele significa claramente que o propósito do Governo não era uma propósito eleitoralista, era apenas o de repropor uma questão que é efectiva e insistentemente manifestada por várias instâncias da Igreja e que, no fundo, é uma questão verdadeiramente importante, dada a nossa evolução desde 1976.
No fundo, há ainda um outro ponto que vale a pena equacionar, pois é extremamente relevante. É que há os que acreditam que o Estado pode ser o árbitro imparcial, o melhor garante da imparcialidade no que diz respeito ao pluralismo da expressão de pensamento de uma sociedade aberta e há os que tem o maior cepticismo perante esse papel de árbitro, indiferente, que em princípio não deve caber ao Estado, e que estão efectivamente confortados no seu cepticismo pela experiência que até agora se registou em matéria televisiva.
Já há pouco, a propósito da intervenção do Sr. Deputado Sottomayor Cardia, tivemos ocasião de ouvir a explanação da primeira tese. Ora, sou claramente adepto da segunda tese, o que, aliás, corresponde ao modelo seguido praticamente em todos os países europeus em que existe uma sociedade aberta.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Raul Junqueiro.

O Sr. Raul Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Assembleia da República continua hoje a análise e discussão de diversos projectos e propostas legislativas, visando de uma forma ou de outra modificar a situação existente em matéria de televisão.
Trata-se de um debate importante que, acima de tudo, nos deverá sensibilizar e motivar para a resolução das grandes questões que hoje se colocam em matéria de comunicação.
O poder político não pode ignorar por mais tempo a necessidade de estabelecer com clareza e realismo as linhas mestras de um modelo audio-visual.
Nunca como hoje tal definição se tornou urgente e mesmo indispensável.
De pouco adiantará mexer em pontos específicos da legislação existente, que se encontra desajustada e virada para o passado, se não curarmos de saber para onde queremos ir e que objectivos pretendemos atingir.
A consolidação do regime democrático e a evolução tecnológica são as duas razões fundamentais que têm de nos motivar para encarar a comunicação em moldes completamente diferentes do que tem acontecido até hoje.
No que toca à evolução tecnológica é patente que ela está a transformar a estrutura económica, social e política das sociedades modernas.

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No os meios de comunicação electrónica e novas técnicas de teledifusão fazem aparecer no os media e revolucionam a forma e a maneira de comunicar.
Modernas redes de telecomunicações de suporte electrónico oferecem multi-serviços diferentes canais de rádio e TV nacionais e estrangeiros telemática e informática residencial e profissional.
Alguns dos novos serviços proporcionados pelos suportes electrónicos permitem ao utilizador domes tico ou profissional recolher toda uma vasta gama de informações das precisões meteorológicas às cotações da bolsa e dos câmbios das transacções bancárias às reservas de programas turísticos dos horários de transportes aos preços dos diferentes produtos de mercado.
Alguns dos mais importantes meios de comunicação social escritos recorrem a novas tecnologias de composição impressão e transmissão para publicar em simultâneo a mesma edição do jornal em diversos pontos do Mundo.
Os satélites de distribuição europeus hoje com uma dezena de programas de televisão disponíveis duplicarão a sua capacidade de transporte de sinais
Os satélites de difusão directa a lançar em breve colocarão ao alcance da recepção doméstica dezenas de programas de televisão oriundos de múltiplos países.
O custo dos sistemas de recepção e demais equipa mentos descodificadores continuará a baixar acelerada mente tornando se acessível à bolsa dos cidadãos e por maioria de razão às comunidades de pequena e media dimensão.
A sociedade de informação oriunda da revolução tecnológica está pois em formação
Ela acarretará uma no a dinâmica económica social e política uma alteração radical dos hábitos de produção e de consumo e num certo sentido uma nova noção de civilização.
Mas se a evolução tecnológica nos obriga a repensar e a perspectivar em novos moldes a comunicação também a consolidação do regime democrático nos de era impelir no mesmo sentido.
Só uma programação e uma informação livres pluralistas e isentas podem contribuir para o enriqueci mento informativo e cultural da população enraizando nos comportamentos a vivência democrática cultivando os valores da identidade nacional fortalecendo o respeito pelas instituições e leis da Republica despertando nos espíritos a liberdade critica.
Só uma programação e uma informação livres pluralistas e isentas podem promover o progresso social nomeadamente através da formação e da recreação de todos os portugueses no respeito dos direitos e liberdades fundamentais.
Só uma programação e uma informação livres pluralistas e isentas podem garantir a todos os cidadãos o exercício dos direitos de informar informar-se e ser informado sem os impedimentos nem as discrimina coes previstas na Constituição da República.
Só uma programação e uma informação livres pluralistas e isentas podem finalmente assegurar o normal funcionamento das instituições democráticas assim como o seu atento acompanhamento apreciação e fiscalização e ainda deixar exercer sem limitações o principio de alternância democrática do poder.
Para que tal programação e tal informação sejam possíveis é fundamental que se instituam os mecanismos necessários dando aos critérios da competência e do profissionalismo da concorrência e do pluralismo da estabilidade e da responsabilidade o seu justo valor.
É pois desta análise combinada da necessidade de consolidação do regime democrático e da evolução tecnológica que resulta a premência de se avançar para a definição de um modelo audio visual.
Um modelo que possa perdurar no tempo discutido e refectido por todos de forma a que o mesmo represente um autentico consenso político e social.
Temos de seguir o caminho que outros países democráticos já empreenderam e finalizaram com êxito no sentido de se mudar para melhor resolvendo os problemas do presente e preparando o futuro.
Não podemos transformar a discussão destas quês toes em afrontamentos políticos e partidários destina dos a recolher duvidosos dividendos nomeadamente eleitorais junto da opinião pública.
Importa antes demonstrar que todos compreendemos a importância do que está em jogo tentando esbater as nossas naturais diferenças e valorizando as nossas semelhanças.
Constitui dever da Assembleia da Republica encontrar respostas para problemas que exigem uma grande seriedade e ponderação e também permito me dizê-lo uma grande abertura de espirito.
Há que analisar e enfrentar questões essenciais e de fundo como por exemplo o futuro acesso da iniciativa publica privada e cooperativa aos meios audiovisuais a implantação de novos suportes tecnológicos de difusão quer se trate de cabos quer de satélites o modelo de gestão das empresas publicas de radiodifusão sonora e televisiva o regime de licenciamentos a participação de representantes da opinião publica na orientação pró gramática dos meios audio visuais o funcionamento ou não de uma alta autoridade para o audio visual.
Trata-se de questões que só podem ser resolvidas se for possível estabelecer uma amplo debate e gerar idêntico consenso.
A proposta de lei do Governo, não só não visa definir ou mesmo contribuir para a definição das Unhas gerais que hão de orientar um modelo audio visual mas ao contrário parece tão somente consagrar de forma atabalhoada e precipitada uma situação de privilégio.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Muito bem!

O Orador: - Ficamos a pensar, em face das inconstitucionalidades do texto e da incoerência da proposta que o Governo no fundo não quis resolver o problema que ele próprio colocou mas antes agitar alguns espantalhos em vésperas de eleições como de resto aconteceu noutras ocasiões.
Nós não temos uma posição imobilista ou conservadora sobre a radiodifusão sonora ou televisiva.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Nota-se!

O Orador: - Reconhecemos que na era da comunicação em que vivemos e na sociedade de informação para que caminhamos aceleradamente não é possível manter formas organizacionais de meados do século ou defender cegamente tabus ideológicos que a evolução da tecnologia vem deitando por terra

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Em matéria de recepção televisiva, por exemplo, quem poderá falar hoje de monopólio em Portugal, quando mais de 800 000 portugueses vêem com regularidade a televisão espanhola e quando muito outros começam a captar as emissões oriundas do satélite europeu?
Em matéria de produção de programas, para referir outro aspecto - em minha opinião talvez o mais importante desta matéria -, quem poderá negar a urgência de se proceder ao seu estímulo, viabilizando novas condições e novos meios, em ordem a preservar a cultura portuguesa e mesmo a própria identidade nacional?
Tudo isto tem de ser objecto de análises e de decisões importantes, em sede própria, no momento oportuno e com o máximo consenso possível.
Também nós respeitamos a Igreja Católica e subscrevemos as palavras do Governo, quando refere o seu insubstituível papel na História de Portugal ou quando lhe atribui o carácter de uma das mais vigorosas instituições da nossa sociedade.
Reconhecemos à Igreja Católica o direito de aceder à televisão, como hoje largamente acontece, e também o direito de ter os seus próprios órgãos de comunicação, audio-visuais incluídos, no respeito pelas regras básicas inerentes a um Estado de direito.
Mas temos de reconhecer igual direito a outras instituições, outras entidades ou mesmo grupos de cidadãos, certamente pessoas de bem, merecedoras de idêntico respeito.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - De resto, mesmo após a intervenção do Sr. Ministro, continuamos a ficar na dúvida se, e sobre que forma, a Igreja Católica formulou na verdade o pedido de ter direito a um canal de televisão, nas condições propostas pelo Governo.
Importaria esclarecer tal ponto, que reputamos essencial para a compreensão das verdadeiras razões da iniciativa presente a esta Assembleia.

O Sr. Raúl Rêgo (PS): - Muito bem!

O Orador: - Em todo o caso, num país em que as frequências disponíveis para televisão são reduzidas, em que as limitações do espectro radioeléctrico não permitem mais de três coberturas nacionais, como seria possível atribuir ou concessionar algumas delas sem ponderação mínima dos interesses do Estado Português?
Ou será que se pretende concessionar aquilo que já é pertença da RTP?
Se assim fosse, tal mais não representaria do que um atentado ao serviço público de televisão, fundamental e devidamente protegido em todos os países democráticos do Mundo; além da tentativa de reforçar o privilégio atrás referido, isentando dos necessários investimentos em infra-estruturas e redes de difusão, transmissão e retransmissão, quem a tal seria obrigado.
Os novos caminhos do audio-visual não podem ser trilhados sobre as cinzas das actuais empresas públicas de rádio e de televisão.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - De qualquer modo, como compreender a atribuição ou concessão de frequências, sem recurso a concurso público, sem a elaboração dos necessários cadernos de encargos, sem a salvaguarda dos princípios elementares que norteiam qualquer Estado de direito?
Como aceitar hoje em Portugal, membro de pleno direito da Comunidade Económica Europeia, procedimentos que não vigoram em nenhum país democrático, da Itália aos Estados Unidos, da Espanha ao Canadá?
Por isso mesmo dizíamos há pouco que o Governo, ao agir desta forma perante uma assunto tão importante, mais parece interessado em criar conflitos e agitar bandeiras do que propriamente encontrar soluções.

Vozes do PS e do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A proposta de lei do Governo é tecnicamente incorrecta, eticamente inaceitável e ideologicamente imobilista.
O Governo não perspectiva a igualdade de oportunidades no acesso aos meios audio-visuais; é nesta medida discriminatório e pouco transparente.
O Governo não perspectiva uma correcta gestão do espectro radioeléctrico; é nesta medida imprudente e delapidador de um bem nacional escasso e de insubstituível importância.
O Governo não perspectiva a qualquer abertura no acesso aos meios audio-visuais e concretamente à televisão; é nesta medida profundamente estatista.
O Governo não perspectiva a evolução tecnológica, nomeadamente nos meios de teledifusão; é nesta medida timorato, inseguro e desconhecedor do que se está a passar em matéria de Comunicação.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Muito bem!

O Orador: - A proposta de lei do Governo não poderá, pois, ter o nosso aval.
O voto que vamos assumir não representa uma posição negativa relativamente as soluções que têm de ser encontradas para enfrentar com êxito o desafio da sociedade de informação. Ele representa o repúdio de conceitos ultrapassados e ineficazes. Mas representa, sobretudo, o desejo sincero de podermos vir a discutir nesta Assembleia, com serenidade e seriedade, as bases gerais do modelo áudio--visual que nos há-de guiar nos próximos anos.
Algumas contribuições para este objectivo foram já apresentadas e certamente que muitas outras o serão ainda. Trata-se de um desafio lançado a nós próprios e também ao Governo. Um desafio que implica colaboração, conjugação de esforços e solidariedade. Um desafio que precisa de ser vencido, a bem da democracia, do desenvolvimento e da modernização.

Aplausos do PS, do PCP e do deputado independente Lopes Cardoso.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Correia Afonso, Rui Machete e Costa Andrade.
Tem a palavra o Sr. Deputado Correia Afonso.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Sr. Deputado Raul Junqueiro, V. Ex.ª, na sua intervenção enunciou algumas permissas, mas pareceu-me que a conclusão não estaria perfeitamente de acordo com elas.

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O Sr Deputado como técnico que e desta área das telecomunicações começou por dizer que quanto aos meios audiovisuais a legislação existente está já desactualizada e irada para o passado e disse ainda que a evolução tecnológica não obriga a repensar em novos moldes a comunicação televisiva que a informação e a programação devem ser livres pluralistas e isentas para poderem assegurar o normal funcionamento das instituições democráticas E ate aqui subscrevo perfeitamente e totalmente as afirmações que V. Ex.ª produziu.
Mas a partir daqui quando se pensaria que o Sr Deputado Raul Junqueiro entraria numa visão de abertura pelo contrario iniciou um caminho I de bloqueamento.
Temos de compreender - julgo que a Câmara tem efectivamente que entender isto - que a televisão ou a prática televisiva tem limitações.
A Constituição assegura o direito de livre expressão de pensamento bem como o direito de informar e ser informado e no desenvolvimento lógico deste princípio assegura também o direito à liberdade de imprensa E mais o próprio n.º 4 do artigo 38.º refere que...
A liberdade de imprensa implica o direito de fundação de jornais e quaisquer outras publicações independentemente de qualquer autorização administrativa caução ou habilitações prévias.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Não é o caso das televisões!

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - A televisão não é uma publicação?

O Orador: - Mas quando a Constituição se refere à televisão há uma limitação e o principio atrás referido não tem a sua sequência lógica Porquê? É natural pois por uma lado - o como V. Ex.ª disse - o espaço electromagnético é limitado e o Estado tem de o gerir e por outro o equipamento para a instalação de televisão é tão dispendioso que "abrir o sector da radiotelevisão a qualquer pessoa significa apenas um privilégio para com os grandes grupos económicos Estou perfeitamente de acordo com isto!

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - O Estado paga e os outros usam!

O Orador: - O Estado tem de limitar a abertura do sector da radiotelevisão porque a base da televisão deve ser dele próprio A propriedade da televisão deve ser do Estado e alem disso deve ser ele a gerir o espaço electromagnético.
Mas o problema não é esse Sr Deputado o problema não está em discutir se a propriedade da televisão dos equipamentos de todo o material que deve ser do Estado O problema está em saber se as entidades privadas podem utilizar esse espaço electromagnético embora sob licença concessão e controle do Estado
E a esse respeito o Sr Deputado Raul Junqueiro fez uma confissão extraordinária dizendo que.
Neste momento mais de 800 000 portugueses já assistem a televisão espanhola e alguns assistem mesmo a televisão por satélite [...]

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - A televisão espanhola não manipula!

O Orador: - ... recusa a alguns portugueses o direito de fazerem emissões quando reconhece esse mesmo direito aos espanhóis e aos satélites.
Assim Sr. Deputado Raul Junqueiro a pergunta que lhe queria colocar é a seguinte o Sr. Deputado disse que admitia - e reconheci isso - a utilização da televisão por entidades privadas Porém apenas referiu que o meio de lá chegar era através de concurso. Portanto se bem percebi o Sr. Deputado Raul Junqueiro não recusa o principio mas sim a forma ao abrigo de um princípio de igualdade de oportunidades.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Raul Junqueiro pretende responder no final?

O Sr. Raul Junqueiro (PS): - Sim Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Assim sendo tem agora a palavra o Sr. Deputado Rui Machete.

O Sr. Rui Machete (PSD): - Sr. Deputado Raúl Junqueiro ouvi com muita atenção a sua exposição aliás muito interessante Porém tenho de começar - até para evitar ao Sr. Deputado Borges de Carvalho ter a canseira da gestão de negócios nesta matéria - por, protestar quanto à apreciação que fez no que diz respeito ao comportamento do Governo.
Penso que V. Ex.ª comete uma injustiça pois o Governo ao propor este problema permite que a Assembleia faça um debate que felizmente está a ter a elevação suficiente que o assunto que estamos a discutir efectivamente merece.
A questão que queria colocar lhe foi de algum modo precludida pela pergunta do meu colega de bancada. Porém também gostaria de a formular em termos muito simples pois parece me que há divergências pró fundas de opinião entre as duas intervenções ate agora efectuadas por parte da bancada socialista isto que elas acentuam pontos que são en alguns aspectos claramente antagónicos.
Mas em suma o que gostaria de lhe perguntar e o seguinte de acordo com o raciocínio que foi desenvolvido - e aliás brilhantemente pelo Sr Deputado Raul Junqueiro - parece que a conclusão que se deverá tirar é a de que há que proceder a afirmamentos importantes nesta proposta aquando da especialidade mas na generalidade o voto do PS deve ser um voto favorável ou pelo menos deve não impedir que se passe a uma análise profunda na especialidade De contra no a sua longa explanação acaba por perder muito do seu significado e do seu sentido
Ora como me pareceu inferir se da exposição do Sr. Deputado Sottomayor Cardia uma conclusão claramente contrária gostaria de saber afinal de contas em que é que ficamos.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr. Deputado Raul Junqueiro a minha intervenção é sensivelmente semelhante às dos meus colegas de bancada só que a propósito de outro tópico

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V. Ex.ª, na sua intervenção, permitiu-se acusar o Governo de várias coisas, entre as quais de «desconhecedor» e outros epítetos não tão simpáticos quanto isso, e acentuou, em determinada altura, que a proposta de lei enferma de várias inconstitucionalidades. Esperei o desenvolvimento do discurso para ver a prova desta asserção, porém, ela não foi revelada.
Sendo certo que há pouco se efectuou uma outra intervenção da bancada do PS menos ponderada, mais extrema, talvez mais adequada a estas coisas da constitucionalidade e da inconstitucionalidade, sendo certo que vários constitucionalistas hesitam e que a Assembleia da República já resolveu positivamente esta questão em outra sede, noutra altura, já se pronunciou favoravelmente pela constitucionalidade de uma proposta de lei como esta, sendo certo tudo isto e tendo sobretudo em conta a intervenção mais dubitativa do seu colega de bancada, Sr. Deputado Sottomayor Cardia, teria o Sr. Deputado Raul Junqueiro a gentileza de nos explicitar as razões que o levam a falar em «inconstitucionalidades manifestas»?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Raul Junqueiro.

O Sr. Raul Junqueiro (PS): - Srs. Deputados, teria de ser extremamente breve, uma vez que o meu partido dispõe neste momento de apenas cinco minutos e o debate ainda está no seu início.
De qualquer forma - e começarei pelo último dos pedidos de esclarecimento formulados, isto é, pelo Sr. Deputado Costa Andrade - quero somente referir que não explicitei as inconstitucionalidades que, em meu entender, existem na proposta de lei porque esta tarefa estará a cargo do meu companheiro de bancada deputado Jorge Lacão na sua intervenção. Nessa altura, as nossas intervenções complementam-se, pois não são contraditórias, pelo que o meu companheiro Jorge Lacão terá oportunidade de o esclarecer nessa matéria.
No que toca ao Sr. Deputado Correia Afonso, gostaria de lhe dizer que não fiz uma confissão quando disse que 800 000 portugueses viam a televisão espanhola. Isto resulta antes de. estudos de opinião feitos e, portanto, constatei a evidência, embora não me conste que esse número de portugueses vejam qualquer canal da televisão da Igreja de Espanha.
Por outro lado, gostaria de referir que não pretendi bloquear a discussão de fundo acerca desta matéria. Na verdade, penso que quem bloqueia de facto a proposta de discussão do modelo audio-visual - e até da abertura que necessariamente se tem de fazer relativamente aos modelos atrás referidos, defendendo claramente o meu partido que tal terá de se fazer - é o Governo, ao apresentar uma proposta de lei como a que está em discussão.
Ora, no fundo, o que está aqui em discussão não é o modelo audio-visual, não é se estamos de acordo ou não em «abrir» os meios audio-visuais a outro tipo de iniciativas, em regulamentar aspectos importantes desse modelo - que não se prendem apenas com o acesso da Igreja à televisão, embora este seja importante -, mas antes se damos ou não o nosso aval à forma de se modificar a situação existente na televisão portuguesa através da proposta de lei em debate, que é, do meu ponto de vista e como eu disse, tecnicamente incorrecta, eticamente inaceitável e ideologicamente imobilista, porque realmente não perspectiva a verdadeira abertura que em nossa opinião terá de se vir a fazer.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado e para terminar - dado que tenho de ser económico no tempo -, se o Sr. Deputado esteve de acordo com as minhas permissas, de certeza absoluta que estará igualmente de acordo com as minhas conclusões. E estas são aquelas que apontam para a necessidade de, sobre esta matéria, se fazer uma discussão serena e profunda, em ordem a podermos dar realmente o passo em frente que a sociedade portuguesa exige neste campo.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Com essas conclusões estou de acordo!

O Orador: - No que concerne ao Sr. Deputado Rui Machete, gostaria de começar por lhe referir que penso que o Governo colocou mal este debate e até creio ter inferido isso das palavras e da exposição de V. Ex.ª, que também apreciei muito.
No entanto, devo dizer-lhe que o voto do PS é favorável a um novo modelo na era do audio-visual, a um novo modelo de comunicação; é um voto favorável nesse sentido e toda a minha intervenção está feita nesta perspectiva.
Penso que a Assembleia tem obrigação, com seriedade e com ponderação, de fazer esse debate, essa análise. Acontece, porém, que não o podemos fazer com base nesta proposta de lei, que não aponta para nenhuma abertura neste capítulo. Esta é uma proposta de lei restritiva e específica, visando resolver ou, como eu disse, não resolver um determinado caso concreto.
Se a Assembleia estiver de acordo em discutir todas estas questões de outra maneira, vamos a isso!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Carlos Vasconcelos.

O Sr. José Carlos Vasconcelos (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PRD gostaria que o debate que ora nos ocupa decorresse sem que as nuvens da demagogia e da radicalização o perturbassem.
O PRD entende que seria útil que aproveitássemos esta oportunidade não para repetir apenas velhos argumentos, e extremar posições, mas para discutir serenamente um tema tão delicado quanto importante, na procura do nosso esclarecimento mútuo, e esclarecimento dos Portugueses - e na procura mesmo dos consensos necessários.
O PRD desejaria, enfim, que não perpassasse neste debate a simples sombra de qualquer querela religiosa, que felizmente não existe, nem de qualquer aproveitamento para fins políticos da Igreja Católica e dos católicos, que o respeito que todos lhes devemos não pode consentir.
Pela nossa parte, tudo faremos para que assim seja.

Uma voz do PRD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A proposta de lei apresentada pelo Governo não é, porém, com pesar o digo, de molde a tranquilizar-nos sobre

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os votos que atrás formulei E Isto pela ocorrência conjugada de dois importantes factores primeiro a deficiente ou precária elaboração e fundamentação para um diploma que se ré este de iniludível importância e significado segundo a época em que o Governo e entrou para a Assembleia da Republica e na qual queria que fosse discutida em plena campanha eleitoral para as presidenciais

Uma voz do PRD: - Muito bem!

O Orador: - Ora se bem ajuízo tudo aconselhava por um lado que uma proposta de lei como esta fosse mu to mais elaborada e fundamentada em ordem a alem do mais propiciar um debate mais aprofundado e enriquecedor e por outro lado que não fosse apresentada e discutida numa época de naturais exacerba mentos e paixões como é a eleitoral antes numa outra propicia a uma apreciação mais serena ponderada e reflexiva
Espero porem que um debate descomplexado e desdramatizado por parte desta Camará e a aprovação por ela de uma proposta a que mais adiante aludirei ajudem a suplantar tais dificuldades e nos conduzam no bom caminho, Caminho que não e seguramente num problema tão delicado e decisivo como este nem o de enterrar a cabeça na areia como a avestruz nem de saltar etapas e correr sem regras bem definidas
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A proposta do Governo da nos poucas certezas e deixa nos imensas duvidas E são duvidas sobre aspectos tão cruciais que só por si impediriam de tal como está lhe pudéssemos dar o nosso apoio e a nossa aprovação.
Com efeito e talvez mais o que a proposta - não direi oculta mas - omite do que aquilo que revela De tal forma que nem ficamos a saber face ao texto do diploma submetido à nossa apreciação se o canal a atribuir a Igreja seria um no o canal a montar pela Igreja a suas expensas se seria um dos dois canais já existentes da RTP e que mudaria de mãos ignorando se completamente em que quadro em que circunstancias e com que contrapartidas.
Quando nem isto se sabe é de facto difícil se não impossível saber se menos. De tal sorte que bem se pode dizer que a proposta de lei se limita a anunciar a esta Assembleia da Republica que o Governo quer atribuir a Igreja Católica um canal de televisão ignora se qual em termos que ele próprio governo decidirá como muito bem entender legislando por decreto lei.

Aplausos do PRD.

Assim para lá do n.º 1 que passa a reproduzir o n.º 7 do artigo 38.º da Constituição os outros quatro números do artigo único da proposta de lei do Governo remetem nos pura e simplesmente para futuros decretos leis que em ultima análise definiriam tudo o que de mais relevante importa definir.
Ora alem do mais matéria inquestionavelmente referente a direitos liberdades e garantias e ao regime dos bens do domínio publico como esta é situa se na esfera da competência exclusiva da Assembleia da República nos exactos termos das alíneas b) e x) do n.º 1 do artigo 168 da Constituição da Republica.

Vozes do PRD: - Muito bem!

O Orador: - Logo por aqui pois e em nosso entendimento a proposta de lei é inconstitucional E não obstante o disposto no artigo 41.º n.º 5 parece também se Io por desrespeitar o principio da igualdade consagrado no artigo 13.º da lei fundamental.
Questão mais controversa neste domínio e que tem a ver com o fundo de uma problemática em que se deve situar o acesso da Igreja Católica à televisão e o da constitucionalidade ou não da concessão a entidades privadas da exploração do serviço publico televisão.
Quanto a ela dividem se os constitucionalistas havendo os e insignes a defender teses contrárias ou contraditórias nomeadamente tendo em conta o disposto no artigo 89 n 3 da Constituição e quanto ao direito das confissões religiosas à comunicação social o já citado artigo 41.º
Se atentarmos nas posições tomadas pelos partidos representados neste Parlamento à luz designadamente dos debates aqui realizados em 1982 e 1984 vê se que se não erro e de modo muito sintético o PS o PCP e o MDP tem sustentado o entendimento de que na economia da nossa lei fundamental são indissociáveis os conceitos de propriedade e de modo social de gês tão e por isso seria inconstitucional qualquer forma de concessão ou mesmo utilização autónoma - se assim me posso exprimir - da televisão por parte da iniciativa privada.
Pelo contrário o PSD e o CDS sustentam que apenas a propriedade privada e de raiz é constitucional mente interdita mas já o não são todas as formas de concessão incluindo as que importem transferencia de gestão
Não me alongarei sobre estes aspectos jurídicos quer porque a eles se referirão ainda outros meus companheiros de bancada quer porque entendo que os argumentos fundamentais em favor das duas posições são conhecidos e não se justifica transformar esta sessão numa espécie de sabatina de direito constitucional
Impõe se sim acentuar pela nossa parte que a posição do PRD não coincide exactamente com nenhuma destas duas.
Conforme a posição tomada na 1 comissão o PRD entende que só por si e em abstracto a abertura à iniciativa privada da utilização dos meios e serviços de televisão não e inconstitucional dado não estar abrangida pela proibição estatuída do artigo 38.º n.º 7 da Constituição da Republica.
Além disso a utilização devidamente regulamentada dos meios e serviços televisivos por parte de entidades privadas não equivale necessariamente à alteração do seu modo social de gestão nos termos e com o sen tido que tal conceito assume no artigo 89 da Constituição.
Assim a constitucionalidade de tal utilização do serviço publico da televisão dependerá da prévia definição do respectivo regime jurídico em termos aptos a garantir a independência a isenção o pluralismo e a qualidade informativa e cultural que decorrem da sua natureza bem como o respeito pelo principio da igualdade no acesso das entidades privadas àquele ser viço sem prejuízo do tratamento diferenciado e desigual das situações objectivamente diferentes e desiguais.

Aplausos do PRD e do PSD.

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O Orador: - Isto quer dizer, evidentemente, que em minha opinião deve haver critérios de preferência na escolha daqueles que terão acesso à utilização, nos termos referidos, do «meio» televisão, de acordo com regras bem definidas e de um «caderno de encargos» perfeitamente claro. E não temos dúvida que às confissões religiosas deverá ser dado um dos espaços televisivos para a prossecução dos seus fins específicos; e que dentro das confissões religiosas a Igreja Católica tem, por todas as razões, um lugar absolutamente preponderante, que deve ser tomado em conta na concretização daqueles critérios de preferência.

Aplausos do PRD e do PSD.

O Orador: - E, entre os grandes princípios orientadores, uma das questões que desde logo se coloca é a de saber quem, na prática, deverá decidir sobre a escolha dos candidatos ao acesso ao meio televisivo e, depois, presidir à fiscalização da sua actividade.
Pois bem, uma coisa é em minha opinião injustificável: não pode ser o Governo - claro que não digo só este governo, mas qualquer governo -, antes tem de ser um conselho ou uma espécie de «alta autoridade», com competência para o efeito, como acontece em Inglaterra, país que aliás tem um modelo que me parece ser o mais próximo do ideal.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A posição do PRD, de acordo com o seu programa é, claramente, a de abrir à iniciativa privada a rádio e a televisão, com garantias de que serão respeitados todos os valores e princípios que a Constituição e as leis do sector da comunicação social pretendem preservar - como a independência, perante o poder político, o poder económico ou quaisquer grupos de pressão -, a isenção, o rigor e o pluralismo.

Uma Voz do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Entendemos também que os grandes meios de comunicação social, com destaque para a TV, devem desenvolver uma acção enformada por uma larga visão cultural e até por uma certa pedagogia democrática.
Pensamos que não faz sentido querer manter o monopólio estatal, da televisão, tal como ele ainda hoje se verifica. E não faz sentido até porque a própria RTP, ao longo dos anos, como aqui acentuei ao defender o projecto de lei que apresentamos sobre esta matéria - tem sido a primeira a violar com grande frequência os grandes princípios a que atrás me referi e que a constituição consagra e quer proteger.

Aplausos do PRD.

Acresce, e além do mais, que em nossa opinião também não faz sentido querer manter tal monopólio num momento em que a televisão espanhola já cobre boa parte do território nacional e tem tendências a cobri-lo ainda mais, designadamente com a estação de TV da Galiza e a entrada em funcionamento do retransmissor de Tuy num momento em que o progresso tecnológico no domínio dos satélites faz com que em breve tenhamos acesso, a preços já não impraticáveis, a várias estações estrangeiras, num momento em que a TV por cabo se tende a desenvolver, etc.
Como disse, quase a abrir, não se pode ou não se deve, por um lado enterrar a cabeça na areia como a avestruz ou, por outro, saltar etapas e correr sem regras bem definidas.
Interessa avançar, cuidadosa mas seguramente, sem ter medo dos «ventos da história», neste domínio, sem permitir o que até já entre nós se está a verificar no sector da rádio, tendo em conta as experiências alheias, mas também as especificidades do nosso país e o respeito escrupuloso - insisto uma vez mais - em valores de que não podemos abdicar e que já são hoje em meu juízo imanentes no regime democrático saído do 25 de Abril.
Há, assim, que não perder tempo, até uma proposta como a que o Governo apresentou, apesar de todas as deficiências e limitações que lhe apontamos e que fazem com que nunca a possamos votar favoravelmente, podem porventura ser aproveitadas como o desencadeador de um processo que, não a ignorando de longe e largamente a ultrapasse.

Uma Voz do PRD: - Muito bem!

O Orador: - Assim, e em conformidade com a postura não sectária, aberta, dialogante, construtiva, e virada para o futuro que o PRD procura ter nesta Câmara e na vida política portuguesa, entendemos que seria muito útil a vários títulos que, antes de nos pronunciarmos em definitivo sobre esta matéria pudesse ser constituída nesta Câmara uma comissão especial, composta nos termos regimentais, que apreciasse com mais atenção, detença e profundidade toda a problemática subjacente, à proposta de lei do Governo. Isto em ordem a poder apresentar a esta Assembleia um texto alternativo que, possibilitando embora a abertura à Igreja Católica da televisão, a enquadrem, com respeito pelas normas constitucionais, no contexto mais amplo e global em que ela se deve situar, e definir desde logo os grandes princípios orientadores neste domínio, a comissão, aliás e evidentemente, poderia e deveria considerar outras iniciativas legislativas que entretanto fossem apresentadas, quer pelo Governo, quer pelos Srs. Deputados.
Neste sentido o meu partido irá apresentar à mesa um requerimento e uma proposta. Ao fazê-lo, cremos estar a sugerir a solução mais adequada para o tratamento sereno, ponderado e aprofundado do tema, como os interesses do País exigem. Ao fazê-lo, intentamos que se procure um largo consenso fim domínio em que o consenso nos parece a todos os títulos desejável. Ao fazê-lo, assumimos as nossas responsabilidades. Cada partido, cada deputado, ao votar, assumirá as suas.

Aplausos do PRD e do PSD.

O Sr. Presidente: - Pediram a palavra para formular pedidos de esclarecimento os Srs. Deputados Duarte Lima, Jorge Lemos, João Corregedor da Fonseca e Borges de Carvalho.
Tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Lima.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Sr. Deputado José Carlos Vasconcelos, permita-me V. Ex.ª que comece por felicitá-lo pela intervenção serena e pelo espírito de tentativa de clarificação e de despolarização deste debate, que foi claro nas suas palavras.

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Começo por salientar a postura seria com que V. Ex.ª de inicio entendeu -contrariamente a algumas vozes que já aqui se fizeram ouvir hoje- que não estava em causa neste debate nenhuma questão religiosa isso é efectivamente um espantalho um fantasma que se tem procurado atirar para esta Camará
Não há nenhuma questão religiosa nenhum cisma nem nenhuma controvérsia sobre nenhum dogma de fé para vir argumentar se com esse espantalho de que é uma questão religiosa que está hoje aqui em causar.
V. Ex.ª não levantou também a problemática de saber qual a entidade dentro da Igreja Católica que fez este pedido ao Governo reiteradas vezes o problema não se deve por assim já que o Patriarcado de Lisboa ou qualquer diocese é uma entidade jurídica canónica mente erecta que semelhantemente à conferencia episcopal tem legitimidade para se dirigir ao Governo e manifestar uma pretensão como esta.
Aliás saliento -da tentativa de clarificação e de dês polarização do debate que V. Ex.ª pretendeu aqui introduzir- a referencia que fez de que quem de era decidir sobre a escolha dos candidatos à actividade radiotelevisiva não de era ser o Governo Penso que V. Ex.ª pela referencia que fez ao modelo inglês terá no seu espirito a defesa de um sistema de instituição de uma alta autoridade para a televisão E sobre isso gostaria que o Sr Deputado enunciasse perante a Camará mais alguns dados adicionais de esclareci mento Como e que deve ser constituída essa alta auto ndade9 Vai ser um órgão vai ser um cargo individual9 Como e por iniciativa de quem vai ser criado?
E só faço esta referencia pelo seguinte é que estamos a verificar -em função do condicionalismo poli tico existente no nosso pais- uma tentativa de transferir decisivamente para o Parlamento funções que extravasam aquilo que é o quadro histórico das funções de qualquer parlamento ou seja a função essencialmente legislativa.

O Sr. Borges de Carvalho (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Estamos a assistir a tentativas de par tidos da oposição para que a Assembleia tenha para alem das funções nítida e tipicamente legislativas outras que se intrometem naquilo que são as áreas tradicionais do Executivo no exercício da Administração.
Queria que V. Ex.ª introduzisse mais algum tópico clarificador desta sua posição sobre a forma como se de era eventualmente exercer esta alta autoridade -como V. Ex.ª denomina- para a televisão.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclareci mento tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados Sr. Deputado José Carlos Vasconcelos penso que numa matéria como a que estamos a discutir é preciso com clareza não enterrar a cabeça na areia nem saltar etapas
V. Ex.ª começou por tecer considerações sobre o conteúdo da proposta de lei em debate Considerou a má inaceitável e insusceptível de obter um voto favorável por parte do PRD.

O Sr. Lopes Cardoso (Indep.): - Isso e bom para ela não baixar à comissão.

O Orador: - Sena digamos um absurdo que o que é mau que o que é insusceptível de obter um voto favorável daquele partido fosse uma semente para obter qualquer coisa de bom numa eventual estrutura a criar.
Portanto uma primeira questão que gostaria de lhe colocar era a seguinte considera que uma má base de partida pode dar origem à concretização de um objectivo?
Passamos a uma segunda questão Referiu V. Ex.ª que em torno desta matéria era essencial verificarem se consensos Estamos de acordo e pensamos que em primeiro lugar o grande consenso da sociedade portuguesa e a Constituição da Republica e que é nesse quadro que os problemas tem de ser encarados Assim perguntar lhe íamos se considera a atitude assumida pelo Governo - que é passível de ser tratada noutro quadro que não o do próprio - como uma atitude consensual ao saber que apresentando a proposta do seu partido a confrontar a maioria da Assembleia9 Acha isso uma postura consensual?
Em terceiro lugar o monopólio publico da televisão tem razão de ser Sr Deputado José Carlos Vasconcelos. Poderá V. Ex.ª ter as suas ideias sobre isso mas ele tem razão de ser porque como sabe o espaço radioeléctrico é limitado não é um espaço como aquele em que se mo e a imprensa escrita ou as estações de radio - que tem um processo especifico de tratamento na Constituição
O meio televisivo é extremamente poderoso e exige grandes investimentos a que não terão acesso com felicidade largos sectores mas apenas grandes grupos económicos e não desconhece o Sr Deputado José Carlos Vasconcelos que os grupos económicos estão ai e estão a pressionar nesse sentido
Pergunto-lhe se considera ou não que com os requisitos do programa do seu partido do PRD são assegurados os princípios exigíveis para a estação oficial a admitir se uma abertura da televisão que constitucionalmente não e possível e se eles estão garantidos na base com que estamos aqui a trabalhar Por outro lado partindo da má base como aquela que aqui temos -que é uma autorização legislativa em branco- como e que o PRD pretende chegar a um bom documento de trabalho9 Considera ou não do seu ponto de vista e de acordo com o seu próprio partido que o que se deveria aprovar era um conjunto de regras e a partir daí então trabalhar no sentido de chegar a solução a ou à solução.
Por outro lado Sr. Deputado sabe bem que aprovar na generalidade um determinado projecto e aprovar em principio o seu sistema Nós gostaríamos de ter uma clarificação por parte do PRD gostaríamos de saber o que e que o vosso partido pretende pois neste momento isso para nós não está claro Pretende de facto desmontar uma manobra como a classificou -algo que é impossível de ser votado pelo PRD- ou então o que é que pretende obter rosas a partir de ervas daninhas?

Uma Voz do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclareci mento tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca

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O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Deputado José Carlos Vasconcelos, dispomos de pouco tempo mas gostamos de reflectir sobre questões muito claras. O MDP/CDE não tem o hábito de ser ambíguo e não gosta de tomar posições sobre questões ambíguas.
Porém, Sr. Deputado, ficámos sem entender se o PRD considera ou não inconstitucional esta proposta de lei. Ficámos sem compreender, porque não ficou muito claro, qual o sentido do voto do seu partido. Portanto, coloco-lhe uma pergunta muito clara para tentar obter também uma resposta clara: o PRD vota ou não favoravelmente esta proposta de lei?

O Sr. António Capucho (PSD): - O PRD já disse que não!

O Orador: - A segunda pergunta que lhe quero colocar é a seguinte: ao tentar remeter para a comissão parlamentar esta proposta, antes de qualquer votação, pretende-se evitar que o Plenário possa tomar posição, que não haja aqui qualquer votação exactamente para facilitar ao PRD manter uma situação que, perante a sua última intervenção, me parece ser muito ambígua?

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Borges de Carvalho.

O Sr. Borges de Carvalho (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nunca é demais vermos clarificarem-se posições que julgávamos mais obscuras do que afinal são. Nunca é demais ouvir o PRD dizer, afinal, o que pensa sobre este ou outro assunto.
Não me surpreende, Sr. Deputado José Carlos Vasconcelos, a posição que aqui acabou de tomar, até porque V. Ex.ª representa em pessoa o resultado da liberdade. O jornal que V. Ex.ª fundou e dirigiu - e sou insuspeito ao dizer-lho porque nunca fui adepto das ideias que defende e muito menos das personalidades - é o exemplo dos bons resultados que a liberdade pode dar e, como já há pouco tive ocasião de referir, este país só tem a congratular-se com as «janelas que abriu» para a liberdade de informação e só tem, infelizmente, a fazer o contrário acerca das «janelas que fechou».
Embora V. Ex.ª tenha dito que o seu partido não votará favoravelmente a proposta cuja discussão aqui nos traz, julgo poder, no entanto, inferir das suas palavras que ela pode representar uma janela que se abre ou a tentativa de a abrir.
O problema é que V. Ex.ª, na sequência disto, parece ter medo da aragem que por essa janela possa entrar e quer, imediatamente a seguir, colocar os anteparos absolutamente necessários, chegando ao ponto de falar numa alta autoridade contra a televisão.
Sr. Deputado, queria fazer-lhe duas perguntas. A primeira é no mesmo sentido da pergunta do Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, ou seja, qual o vosso sentido do voto? Que não é favorável já se sabe, mas é abstenção ou é voto contra? Dou-lhe em troca um rebuçado ao dizer-lhe que acerca da alta autoridade contra a televisão votarei sempre contra, em qualquer circunstância; portanto, espero que V. Ex.ª me pague na mesma moeda e diga como vai votar.
A outra pergunta é a seguinte: em relação ao requerimento que VV. Ex.ªs vão apresentar, qual é o prazo que propõe para as diversíssimas comissões se se debruçarem sobre o assunto? Talvez por esse prazo se possa ajuizar da efectiva urgência que VV. Ex.ªs atribuem ou não à abertura da tal janela e à entrada da tal aragem na nossa comunicação social.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Carlos de Vasconcelos.

O Sr. José Carlos de Vasconcelos (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Obviamente não irei responder a algumas considerações que foram feitas e que não são questões. Porém, em relação às perguntas, irei tentar dar-lhes respostas.
A primeira questão, colocada pelo Sr. Deputado Duarte Lima, e de certa forma também pelo Sr. Deputado Borges de Carvalho, é sobre o que seria esta espécie de órgão a que chamei, para facilidade de expressão, «alta autoridade», obviamente a favor da televisão e não contra ela.
Penso que não há, como sabe, modelos únicos nos países em que existe alguma coisa de semelhante, que tanto pode ser um órgão colegial - embora não muito numeroso para não se transformar num miniparlamento - como um órgão individual. Obviamente, penso que esse órgão não deverá depender do governo, eventualmente, nem da Assembleia, mas, antes, ser independente dos dois e resultar de um consenso, sempre através da aprovação por uma maioria qualificada desta Câmara.
Todavia, há vários cenários possíveis para a concretização desta figura, que vem funcionando noutros países e nos parece ser a mais adequada para vir a superintender neste domínio.
Em relação às questões colocadas pelo Sr. Deputado Jorge Lemos, cuja inteligência já aqui me habituei a respeitar, admira-me um pouco que tenha ficado com alguma dúvida sobre qual é o sentido de voto do PRD quando, por várias vezes (pelo menos duas) no decurso da intervenção - e esta resposta dirige-se também ao Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca - eu disse que a nossa posição nunca poderia ser favorável a esta proposta de lei tal como está e considerei-a claramente inconstitucional pelo menos em dois aspectos.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Não pode ir à Comissão sendo inconstitucional!

O Orador: - Assim, obviamente, o nosso voto nunca poderá ser favorável.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Considera a proposta inconstitucional...

O Orador: - Eu disse-o claramente.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - ... mas considera que, a partir dela ou do seu sistema, é possível fazer uma coisa boa...

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O Orador: - Já irei a questão de saber se uma má partida pode dar uma boa chegada.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Parlamentarmente há algumas regras!

O Orador: - Também me admira a sua intervenção no que respeita à questão dos grupos económicos.
Salientei também mais do que uma vez que entendemos ser importante que haja uma abertura a iniciativa privada mantendo se o respeito integral por todos os valores constitucionais e pela independência do meio televisão designadamente face ao poder económico Repeti isso duas vezes.
Quanto a forma como isso se consegue e as dificuldades que dai derivam obviamente que não somos cegos e sabemos que elas existem. É por isso que entendemos que esta matéria deve ter um estudo mais aprofundado
Seja como for o que também não podemos admitir e que com medo do poder económico pura e simples mente tudo continue sempre na mesma e não se faça nada

Vozes do PRD do PSD e do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Portanto a nossa proposta e o nosso requerimento pressuporão obviamente que não haja uma prévia aprovação na generalidade desta proposta a qual evidentemente não poderia de nenhuma forma obter o nosso acordo.
Também o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca me perguntou se considero ou não inconstitucional a proposta de lei Volto a dizer que o disse pelo menos duas vezes.
Perguntou também se se pretende evitar que se tome posição Respondo que não A nossa posição está perfeitamente tomada se houver votação votaremos contra. Não tomamos posições ambíguas e seria bom que algumas pessoas se habituassem de uma forma definitiva a distinguir o que é a ambiguidade contra a qual somos e o que é a tentativa pelo menos de dia logo e de formar consensos que e uma coisa totalmente diferente da ambiguidade.

Aplausos do PRD.

Finalmente temos a questão - talvez a mais interessada das que designadamente o Sr Deputado Jorge Lemos colocou - de saber se de uma má proposta (que consideramos que esta é) se pode chegar a uma boa solução.
Não gostaria de usar uma imagem deste tipo mas vou usaria. O que entendemos exactamente é que não se pode continuar por sistema a adiar soluções mesmo razoáveis à espera que se tornem óptimas.
Devo dizer que por exemplo só não votámos desfavoravelmente o projecto de lei do PS sobre a quês tão da informação televisiva para dar talvez por uma ultima vez a possibilidade de estas questões serem discutidas entendemos exactamente que com tudo o que se possa ter de positivo e também de negativo não se chega a nenhum lado se não se fizer um bocadinho de bem à espera de fazer muito melhor pois corre se o risco de nem sequer se fazer esse bocadinho Assim não se chega a lado nenhum Vamos ver e se fazemos alguma coisa para não continuarmos sempre na mesma com medo de que alguma coisa que façamos seja pior do que melhor

Aplausos do PRD do PSD e do CDS

Usando uma imagem que já se utilizou como o Sr. Deputado Jorge Lemos sabe muito bem ate de uma má pedra se pode fazer uma boa sopa. Vamos tentá-lo.

Aplausos do PRD do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados deram entrada na Mesa um requerimento e uma proposta que ou ler de imediato para depois mandar fotocopiar e distribuir como manda o Regimento designadamente no seu artigo 86.º
Vai proceder-se à leitura do referido requerimento.

Foi lido. É o seguinte.

Requerimento

Nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 148.º do Regimento da Assembleia da Republica os deputados abaixo assinados em numero de dez requerem a baixa do texto da proposta de lei n.º 5/IV que altera o artigo 2.º da Lei n.º 77/75 de 29 de Novembro a uma Comissão Eventual a constituir para efeito de nova apreciação no prazo de 20 dias.

O Sr. Presidente: - Vai proceder se à leitura da referida proposta.

Foi lida. É a seguinte.

Proposta

Nos termos e para os efeitos do artigo 39 do Regimento os deputados abaixo assinados em numero de dez propõem a constituição de uma Comissão Eventual para efeito de no a apreciação no prazo de vinte dias da proposta de lei n.º 5/IV.
A Comissão será constituída pelos seguintes deputados:

PSD -8
PS -5
PRD -4
PCP - 3
CDS -2
MDP - 1

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados vai proceder se de imediato à correspondente distribuição destes documentos.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito Sr. Deputado?

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - É para interpelar a Mesa no sentido de saber o que é que o Sr Presidente vai fazer a este requerimento que deu entrada na Mesa.

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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não posso submetê-lo à votação enquanto não for distribuído. Mandei fotocopiá-lo, como aliás disse logo no início antes de o ler, e distribuí-lo, assim como à proposta.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Certo, Sr. Presidente. Agradeço-lhe o esclarecimento.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao apresentar na Assembleia da República a proposta de lei n.º S/IV e ao insistir no seu acelerado agendamento e votação, contra a opinião maioritária desta Assembleia, o Governo revelou que não se move por propósitos sérios de abordagem de um problema de tão graves implicações institucionais, antes optando por uma atitude irresponsável com claros objectivos de confronto e chicana política, ao serviço de obscuros interesses.
O Grupo Parlamentar do PCP reafirma que considera frontalmente inconstitucional a proposta de lei em debate e mantém na íntegra o seu entendimento de que a Constituição, na sua redacção originária e na que decorre da revisão constitucional de 1982, exclui a apropriação privada da televisão, não sendo admissível, designadamente, a sua exploração por entidades não públicas, ao abrigo de concessão ou a outro qualquer título de carácter similar.
Como temos afirmado, o monopólio público da televisão consagrado na Constituição constitui a garantia institucional da liberdade de expressão e informação dos cidadãos, visando evitar o controle do poderoso meio de comunicação social que é a Radiotelevisão por grandes grupos económicos e de pressão, os únicos que dispõem dos meios económicos e financeiros para tal necessários. Ao dispor no seu artigo 38.º, n.º 7, que «a televisão não pode ser objecto de propriedade privada», visa, precisamente, impedir que ela possa vir a ser instrumentalizada contra as liberdades e o pluralismo, a independência e a objectividade informativas e formativas.
São conhecidos planos e projectos de grupos nacionais estrangeiros que disputam entre si, publicamente, o controle do espaço radioeléctrico português, não hesitando mesmo em recorrer a meios inconstitucionais e ilegais para alcançar tal objectivos, como recentemente sucedeu com a emissão-pirata da chamada TVN, no passado mês de Novembro, em que se destacaram altas personalidades do PSD e do CDS e o director político da campanha de Freitas do Amaral, Proença de Carvalho.
Tais comportamentos não podem deixar de suscitar fundada preocupação e inquietação e confirmam os perigos que a Constituição quis conjurar.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo, com a apresentação da proposta de lei n.º 5/IV e a insistência no carácter urgente do seu agendamento e votação, apesar de a Assembleia da República, em sede de comissão especializada, haver recusado tal urgência, pretendeu envolver este órgão
de soberania numa grave operação de chicana política, não hesitando em para tal utilizar abusivamente o nome de Igreja Católica.
Ao tentar instrumentalizar a Igreja Católica e ao procurar criar clivagens artificiais entre os Portugueses em torno de uma «questão religiosa» inteiramente inexistente, o Governo prossegue, da forma mais condenável e pelos meios mais censuráveis, a sua política de guerrilha institucional e subordina mais uma vez, de maneira irresponsável, a mesquinhos objectivos e interesses conjunturais o debate nacional de importantes questões institucionais.
E os factos aí estão para o comprovar.
Desde logo, o Governo entendeu retomar, com um pequeno acerto, a proposta de lei n.º 82/11, do segundo governo da AD, considerada pelo então Ministro dos Assuntos Parlamentares Marcelo Rebelo de Sousa, como um diploma incompleto, impreparado e carecido de profundos aprofundamentos e melhoramentos. Mas nem isso o Governo se deu ao trabalho de fazer. Surgiu aqui retomando e retocando ao de leve a autorização legislativa em branco de 1982.
Não forneceu elementos, não apresentou estudos, quis a proposta votada em marchas forçadas, tudo com o objectivo de impedir uma consideração ponderada das questões em análise. Pretende confundir, pressionar, intimidar.
Ao proceder de tal modo, o Governo não propicia qualquer tipo de reflexão ponderada por parte da Assembleia da República quanto ao problema da televisão; antes a bloqueia. Não visa a análise das questões - visa, sim, acirrar falsas divisões e provocar afrontamentos na sociedade portuguesa, nem que para tal tenha de recorrer à Igreja Católica, o que não pode deixar de ser considerado como um comportamento abusivo, chicaneiro e atentatório da dignidade a que têm direito os órgãos de soberania. A Igreja Católica é uma entidade merecedora de todo o respeito e não pode estar sujeita a ser utilizada como instrumento com que o Governo tenta travar uma batalha contra a oposição, estabelecendo clivagens não existentes entre os que quereriam o bem da Igreja e os que, supostamente, a quereriam prejudicar. A questão não é essa, como o debate tem vindo a clarificar.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Foi espantosa a arrogância revelada esta manhã pelo Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares. Foi espantosa a vontade de confundir o que nunca deveria nem poderia ser confundido.
Quando se, conhecem os poderosos interesses financeiros que se movem a favor da abertura inconstitucional, quanta hipocrisia e farisaísmo envolve a tentativa que fez de esconder a operação chicanei rã do Governo detrás do manto da Igreja Católica e do interesse nacional.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Muito bem!

O Orador: - A Assembleia da República não pode alinhar nesta manobra governamental e certamente não o fará.
E não se diga que somos apenas nós, PCP, que temos esta interpretação.

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Cabe aqui recordar que o próprio Conselho de Comunicação Social ao apreciar o Programa do Governo e no que se referia em concreto ao propósito de atribuir um canal de televisão à Igreja Católica tornou publica a posição de - passo a citar - manifestar com todo o respeito devido nomeadamente nos planos histórico sociológico e cultural à Igreja Cato liça que a verificar se uma revisão constitucional que tal permita é discriminatória de outras instituições organismos confissões religiosas etc definir desde já como faz o Governo no seu Programa (e insiste na pré sente proposta) a Igreja Católica como beneficiário exclusivo mais provável de uma eventual concessão de exploração total ou parcial de um canal de televisão à iniciativa privada.
Sr. Presidente Srs. Deputados refira se ainda que ao apresentar a proposta de lei n.º 5/IV nos termos em que o fez o governo de Cavaco Silva demonstrou bem quão balofas são os propagandeados conceitos de rigor eficácia e defesa do interesse nacional.
Não se tece uma única consideração sobre as sequências que adviriam para a empresa publica de Radiotelevisão caso se viessem a concretizar os objectivos governamentais Nada sobre o impacte em termos de publicidade cujas receitas para 1986 se calculam em mais de 4 300 000 contos. Nada sobre o papel que a RTP teria de assumir face à empresa concessionária em termos de equipamento e respectivos custos nada sobre utilização de materiais e seu regime e nada sobre o futuro dos trabalhadores da empresa publica de televisão mantendo se igual silencio quanto a tantos e tantos outros problemas que deveriam preocupar o Governo na gestão dos bens que a toda a sociedade pertencem.
Mas tendo em conta a experiência da RTP e da sua gestão talvez se possa compreender a razão deste silencio São conhecidas as ligações de gestores e altos funcionários da RTP a interesses privados que usam e abusam da RTP e dos seus equipamentos em proveito próprio nos mais diversos domínios desde a produção ao equipamento técnico fruindo os de maneira parasitária.
Tem sido estes os mesmos ou aqueles com quem directa ou indirectamente se tem associado que contribuindo para a degradação da empresa publica atra vês da sua má gestão aparecem agora como paladinos da defesa da concorrência televisiva para nas suas empresas e com os seus objectivos económicos e poli ticos fazer aquilo que não foram capazes de fazer na Radiotelevisão Portuguesa quando estavam à frente dos conselhos de gerência.
Mais são conhecidas as ligações de membros do actual Governo com grandes grupos económicos e interesses vultosos no domínio da actividade televisiva e não seria de estranhar que a proposta de lei os reflectisse de alguma forma.
Mas esta Assembleia é que não os pode aceitar.
Este debate é um debate viciado à partida e malsão.
Não ignoramos a necessidade de cuidadosa ponde ração no quadro constitucional e legal do impacte das novas tecnologias no domínio audiovisual. Mas não colaboraremos em quaisquer esforços para fazer por via ínvia por lei ordinária o que dependeria sempre de uma alteração da opção constitucional cujas razoes como os factos vem demonstrando subsistem inteiramente.
Pelo nosso lado o Governo não conseguirá levar para diante este seu plano inconstitucional nem tão pouco o confronto institucional a que se propunha Votaremos serenamente contra a proposta de lei Estamos confiantes - ainda estamos confiantes - de que será essa também a atitude que a Assembleia da Republica adoptará.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Correia Afonso pediu a palavra para pedir esclarecimentos?

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Pedi Sr. Presidente mas acabo de ter conhecimento de que o meu grupo parlamentar já não dispõe de tempo Por isso prescindo da palavra.

O Sr. Presidente: - Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente penso que a questão da falta de tempo se estará a colocar a mais do que uma bancada.
Por isso pergunto se não seria melhor em face de um tema de tão grande importância como o que estamos a discutir alargarmos o tempo do debate de modo a que eventuais questões que pudessem surgir não ficassem sem resposta.

O Sr Presidente - Entretanto a Mesa está confrontada com outro problema que colocaria aos Srs. Deputados Agradeço o favor de prestarem atenção àquilo que vou referir precisamente para obter de imediato a vossa opinião
O requerimento e a proposta que foram apresenta dos pelo PRD tem de ser imediatamente votados como determina o artigo 86.º n.º 5 do Regimento Entre tanto chegou ao nosso conhecimento que os autores deste requerimento e desta proposta não queriam de modo nenhum perturbar o andamento desta discussão.
Pergunto aos Srs. Deputados e vêem algum inconveniente a que eu os submeta à votação apenas no momento que precede o anuncio da votação como determina o artigo 148 Se não houvesse objecções continuaríamos com o debate e apenas os submeteria à votação no momento que precede o seu anuncio da votação da proposta Há alguma objecção?

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Peço a palavra Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra Sr. Deputado.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente estou de acordo com a proposta de V. Ex.ª mas gostaria de focar o seguinte se bem entendo há um requerimento que teria de ser submetido imediatamente à votação mas que beneficiará do tratamento que V. Ex.ª muito inteligentemente lhe quer dar e também uma proposta de criação de uma comissão Portanto a ordem lógica é a de que o requerimento só pode ser votado depois de a Assembleia aprovar - no caso de rejeitar ele ficaria sem objecto - a criação dessa comissão A ordem de votação tem que ser mudada.

Vozes do PSD e do CDS: - Não!

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O Sr. Presidente: - Certamente que sim, Sr. Deputado. Primeiro, votar-se-á o requerimento e só se ele for julgado procedente é que se vota a constituição da comissão. Caso contrário, não teria sentido.
Vamos, então, deixar esta questão e prosseguir o debate, para não perdermos tempo.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Correia Afonso, que dispõe de 6 minutos para o efeito.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Está em debate uma proposta do Governo para alteração do artigo 2.º da Lei n.º 75/79, de 29 de Novembro, acerca da Radiotelevisão.
Como bem refere o relatório e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, apenas é proposta a alteração dos n.ºs 2, 3 e 4 daquele preceito legal.
Primeiro dispõe-se que a radiotelevisão possa ser objecto de concessão a empresa pública.
Depois, prevê-se a atribuição dum canal televisivo à Igreja Católica.
Finalmente, aceita-se que as restantes confissões religiosas possam também ter acesso à utilização de meios de radiotelevisão.
Esta matéria - televisão - tem sido largamente debatida nesta Assembleia, principalmente numa perspectiva constitucional.
Discutiu-se o conceito de propriedade privada e a sua extensão, aplicável à televisão.
Abordou-se uma definição de televisão com vista a apurar se abrangeria o próprio serviço de transmissão ou se ficaria limitada à distribuição e transporte de imagens e sons por ondas electromagnéticas.
Enfim, virou-se e revirou-se a questão, sempre com uma preocupação dominante: saber se o normativo constitucional permite a utilização de parte do espaço electromagnético, televisivo, por entidades diversas do Estado.
Trata-se de uma questão, obviamente interessante, que consente pôr à prova a imaginação e a vontade de progresso do intérprete.
É sabido, e constitui já um lugar-comum, afirmar que os direitos e liberdades têm de coabitar na área constitucional onde tiverem expressão e que, portanto, se impõe a sua compatibilização.
Eles sofrem as limitações que resultam de outros direitos e liberdades também reconhecidos.
Prescrever que a televisão não pode ser objecto de propriedade privada - como faz o artigo 38.º, n.º 7, da Constituição - e garantir ao mesmo tempo a utilização dos meios de comunicação social no exercício da liberdade de ensino de qualquer religião - como promete o n.º 5 do artigo 41.º também da Constituição - é contradição, mas apenas aparente.
O relatório e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias de 13 de Fevereiro corrente, que, nos termos dos artigos 38.º e 141.º do Regimento, se pronunciou sobre a proposta governamental, é muito claro acerca das perspectivas de constitucionalidade do diploma.
E o Sr. Deputado Rui Machete, meu companheiro de bancada, já desenvolveu, com a segurança e o brilho que lhe são habituais, a questão da conformidade constitucional.
Parece ser, portanto, dado adquirido que «a televisão não pode ser objecto de propriedade privada».
É o que dispõe o n.º 7 do artigo 38.º da Constituição.
É também o que o Governo propõe para o n.º 1 do artigo 2.º da Lei n.º 75/79, de 29 de Novembro.
Mas alcançou controvérsia a conclusão de que a radiotelevisão, sendo um serviço público, pode ser objecto de concessão a empresa pública.
É esta a situação no momento.
Creio no entanto que o tema «televisão» não deve ser reduzido à mera óptica jurídica, embora constitucional.
É preciso olhá-lo também de forma diversa. A televisão é um meio de comunicação social com grande influência na difusão de cultura.
Aparecida, em termos correntes e comerciais, no início da década de 40, rapidamente atingiu multidões de telespectadores, que hoje se estimam com frequência em dezenas de milhões, se não mais.
Chegando a todos os lugares e a todas as pessoas, é legítima e mesmo imperativa uma preocupação de isenção, objectividade e pluralismo que deve dominar as emissões televisivas.
Sabemos contudo que o homem não consegue atingir uma isenção e objectividade completas, por maiores que sejam os seus esforços nesse sentido.
Tal como a perfeição é inatingível, a isenção e a objectividade serão sempre também valores tendenciais.
O homem, ainda que lute e não se conforme, vê sempre a realidade pelos seus próprios olhos, com as suas perspectivas e os seus preconceitos, com toda a carga cultural que transporta sempre consigo.
Recordo todos aqueles que no dia-a-dia da comunicação social procuram e atingem uma grande proximidade da isenção e que merecem, portanto, a nossa homenagem.
Mas todos sabemos que o resultado, em pleno, nunca é conseguido.
A comunicação social tem uma origem, mas também tem um destinatário. E o seu fim imediato é esclarecer e informar esse destinatário que é, ao fim e ao cabo, o cidadão português.
Se na origem a comunicação social não consegue atingir a isenção e a objectividade, procuremos ao menos compensar esta deficiência no destino.
É este um dos fundamentos mais convincentes usados na defesa da liberdade da comunicação social.
Quando a informação leva ao destinatário as diversas perspectivas da realidade, é ao cidadão que as recebe que compete compor e unificar essa mesma realidade.
Nesta postura, seria de defender a concessão do maior número possível de canais televisivos.
A diversidade da comunicação televisiva permitirá assim ao destinatário maior rigor na recriação da realidade.
Infelizmente, o espaço de ondas electromagnéticas é limitado.
Se todos tivessem concessões de canais de televisão, seria a forma mais simples de efectivamente recusar ao cidadão o direito à informação televisiva.
O Estado tem, portanto, que controlar e gerir o espaço electromagnético.
Surge assim, com evidência, uma aparente colisão entre o direito de informar e ser informado, por um lado, e a necessidade de o Estado controlar e gerir o espaço electromagnético, por outro.

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É garantida a liberdade de imprensa sem outras limitações constitucionais.
Mas não parece possível assegurar a liberdade de canais televisivos.
Não obstante no actual momento da evolução das telecomunicações em que é quase corrente a televisão por cabo por satélite ou de além fronteiras reduzir a zero a concessão de canais televisivos faz mais recordar práticas censórias vencidas do que preocupações constitucionais
As sociedades não podem ser bloqueadas impedir ou restringir exageradamente a comunicação social nomeadamente a televisão e contrariar o direito de informar e de ser informado e obstar ao enriqueci mento cultural do cidadão
Podemos concluir portanto o seguinte a radiotelevisão não pode ser objecto de propriedade privada constitui um serviço publico mas pode ser facultada a sua utilização a entidades privadas o Estado deve controlar a concessão de canais televisivos não só como forma de gerir o espaço electromagnético mas também as emissões televisivas como meio de assegurar um contributo alto para a formação e informação do povo português a previsão da concessão a Igreja Católica de um canal de radiotelevisão e às restantes confissões religiosas do acesso a utilização dos meios televisivos compatibiliza o disposto no artigo 38.º n.º 7 com o n.º 5 do artigo 41 ambos da Constituição da Republica.
Sr. Presidente, Srs. Deputados Aderimos à Europa, vemos em democracia.
Façamos com que também face à televisão a nossa perspectiva seja de abertura e de progresso.

Aplausos do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados chegámos à hora pré ista para o intervalo regimental pelo que amos interromper os trabalhos ate às 18 horas e 5 minutos.
Está suspensa a sessão.

Eram 17 horas e 35 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados está reaberta a sessão.
Eram 18 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção tem a palavra o Sr. Deputado Andrade Pereira.

O Sr. Andrade Pereira (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados Com a proposta de lei ora em discussão pretende o Governo alterando a redacção do artigo 2 da Lei n.º 75/79 de 29 de Novembro possibilitar a efectivação do direito consagrado no artigo 41.º n.º 5 da Constituição da Republica Portuguesa através de se poderosíssimo meio de comum cação social que e a televisão.
E prevê designadamente a possibilidade de concessão de um canal de televisão à Igreja Católica.
A primeira questão que esta iniciativa legislativa do Governo encerra e a de saber em que medida ela é compaginável com o disposto no n.º 7 do artigo 38.º da Constituição isto e a de saber em que medida a concessão de um canal televisivo à Igreja Católica briga com a proibição constitucional de a televisão ser objecto de propriedade privada.
Trata-se de uma questão já largamente debatida nesta Assembleia quer nos trabalhos preparatórios da Constituição vigente quer a propósito de uma proposta de lei semelhante (a n.º 80/II) feita pelo Governo em 1982 quer ainda no seio da discussão do projecto de Lei n.º 305/III apresentado pelo CDS em 1984.
Importa pois em primeiro lugar apreciar a proposta de lei em debate a luz da sua conformação constitucional.
Os n.ºs 1 e 5 do artigo 2.º na redacção ora pró posta para a Lei n.º 77/79 de 29 de Novembro não merecem obviamente qualquer reparo no plano da sua constitucionalidade por isso que o primeiro é a reprodução do n.º 7 do artigo 38.º da Constituição e o ultimo corresponde sem quaisquer alterações ao actual n.º 3.
A redacção da proposta para o n.º 2 não lê anta problemas no que concerne à sua conformação com a ordem constitucional embora se creia que atenta a justificação que lhe é dada na exposição de motivos a mesma de era ser objecto de alguma reformulação.
Análise mais detalhada reclamam os n.ºs 3 e 4 que se propõem para a nova redacção do artigo 2.º da Lei n.º 75/79 na medida em que visam possibilitar o acesso à actividade da radiotelevisão por parte da Igreja Católica e em medida diferenciada das restantes confissões religiosas.
Poderá dizer-se - como se faz na exposição de motivos da proposta de lei em análise - que como eles se cura da efectivação do direito consagrado no artigo 41.º n.º 5 da Constituição da Republica Portuguesa das diferentes confissões religiosas a utilização de meios de comunicação social próprios para o prosseguimento das suas actividades. E não sofre duvida que a televisão e como os restantes meios de comunicação social meio adequado a prossecução das actividades designadamente a propagação do seu magistério das confissões religiosas em geral e particularmente da Igreja Católica.
Dúvida pode suscitar se é sobre se e em que medida o direito consagrado no referido n.º 5 do artigo 41.º é contestável com o artigo 38.º n.º 7 também da Constituição onde se prescreve que a televisão não pode ser objecto de propriedade privada.
Maneira fácil de ultrapassar a dificuldade consisti na em defender que este normativo constitucional (ora vazado no n.º 1 da redacção proposta) se reporta tão só à propriedade no sentido jurídico económico do termo isto e veda apenas a propriedade privada da televisão mas não a sua gestão por entidades privadas.
Ou ainda de outro modo pretender que a proibição constitucional atinge apenas a apropriação privada dos instrumentos e das infra estruturas necessárias à distribuição e transporte por intermédio de ondas electromagnéticas de imagens permanentes e sons destina dos à recepção directa pelo publico e não à emissão de programas Dir-se-ía nesta hipótese que o conceito de televisão utilizado no citado n.º 7 do artigo 38 abrangeria aqueles instrumentos e infra-estruturas e não os serviços de comunicação.
Crê-se porém não ser correcta esta posição.
Pelo contrário a inserção daquele normativo no titulo relativo a direitos liberdades e garantias a própria epígrafe (liberdade de imprensa impõe que no preceito constitucional em análise televisão é não

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só o meio técnico de comunicação mas também ou até, principalmente, os serviços de comunicação que, através daqueles, se prestam ao público, ou seja, a emissão de programas acessíveis ao público.
A «televisão», tal como é concebida neste preceito, não é, pois, um bem económico e, muito menos, um bem de produção. E tem, por força da decisão constitucional, tal como hoje existe e sem prejuízo de o CDS entender que a mesma deve ser objecto de revisão, de estar sujeita ao regime de propriedade pública e afectada a um fim de utilidade pública. E um bem do domínio público.
Ora, as coisas públicas estão fora do comércio jurídico privado, pelo que são insusceptíveis de redução à propriedade particular, imprescritíveis e impenhoráveis.
Mas, à luz das normas do direito público, as coisas públicas podem ser comerciáveis, admitindo, designadamente, «a criação de direitos reais administrativos e de direitos administrativos de natureza obrigacional em benefício dos particulares, designadamente concessões, como ensina Marcello Caetano no seu Manual do Direito Administrativo.
Assim, a natureza pública do bem «televisão» não impede a sua exploração por confissões religiosas, desde que essa exploração obedeça ao regime de concessão (de domínio público e de serviço público), o que envolve, por parte do Estado, o poder de a regulamentar e de resgatar a concessão, quando for caso disso.

O Sr. Cavaleiro Brandão (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Decorre daqui que o n.º 7 do artigo 38.º não proíbe a concessão do serviço público «televisão» a pessoas de direito público ou de direito privado. Ponto é que o legislador, no exercício da competência prevista na alínea x) do artigo 168.º da Constituição estabeleça o regime jurídico da exploração da televisão definindo, designadamente, quem, para isso, pode requerer e obter concessões.
É, de algum modo, isso que com a presente iniciativa legislativa do Governo se pretende alcançar, sem prejuízo de se reconhecer que, na regulamentação da concessão, se deve ser particularmente rigoroso na preservação dos elementos essenciais do regime publicístico.
Permita-me abrir um parêntesis para dizer que a adequação a essas normas do regime publicístico na concessão que o Governo propõe poderia também ser objecto de sindicância por parte desta Câmara, através do funcionamento do instituto da ratificação do decreto-lei que a proposta governamental propõe. Assim, não se poderá dizer que a aprovação da lei, tal como ela é proposta pelo Governo, significa uma autorização legislativa ou um cheque em branco ao Governo para legislar como entende. Ficaria sempre a esta Câmara uma possibilidade de sindicar, de fiscalizar, de alterar, eventualmente, a forma como o Governo viesse a regulamentar a concessão que fizesse à Igreja Católica.
É que também não se pode estranhar que o Governo nesta sua iniciativa legislativa não tivesse sido tão cauteloso, tão pormenorizado, na regulamentação, quando é certo que, através dos antecedentes que este tema tem na Câmara, levaria a pensar que a primeira questão que importava debater era a de saber se a Câmara se
pronunciava ou não no sentido da admissibilidade constitucional da concessão às confissões religiosas de um canal televisivo.
Parece-nos que neste momento há já indicação de que a Câmara vai pronunciar-se no sentido dessa mesma constitucionalidade e, por isso, é que nos parecia que, em sede de discussão na especialidade ou mesmo em sede de ratificação do decreto-lei a publicar, poderia vir a ser concretizado e escalpelizado o modo como a concessão é feita.
Em todo o caso, isto não quer dizer que não estejamos abertos à solução que aqui foi avançada pelo PRD, no sentido de se constituir uma comissão que venha a estudar esse mesmo problema e, portanto, venha a enriquecer a proposta do Governo neste sentido.
Ainda assim, e de qualquer modo, não queria deixar de salientar que a proposta de lei actual apresenta, em relação à de 1982, duas consideráveis beneficiações, quais sejam: a de omitir no n.º 2 a locução «quando propriedade do Estado», o que poderia inculcar, a contrário, que a televisão poderia ser propriedade particular; e a de introduzir no actual n.º 4 a possibilidade de acesso à utilização da televisão por parte das restantes confissões religiosas para além da Igreja Católica, afastando assim o desrespeito pelo princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º da Constituição, inconstitucionalidade que hoje também já aqui foi referida, mas que, obviamente, não existe na presente proposta de lei, se entendermos que igualdade significa proporcionalidade.
Portanto, essa possibilidade de inconstitucionalidade está afastada.
Acresce que a mais recente doutrina - e refiro-me, designadamente, a pareceres do Dr. Jorge Miranda, do Dr. Barbosa de Melo e do Prof. Afonso Queiró - se tem pronunciado no sentido da compatibilização das normas constitucionais (o artigo 38.º, n.º 7, e o artigo 41.º, n.º 5) em termos de defender a possibilidade constitucional de concessão de um canal televisivo às confissões religiosas.
Pelas razões ligeiramente apontadas, por coerência com a posição que o levou em 1984 a apresentar o projecto de lei n.º 305/III, por homenagem ao saudoso deputado Adelino Amaro da Costa que na Assembleia Constituinte defendeu, contra quem pretendia que no artigo 38.º se dissesse que «a televisão será objecto de propriedade de empresa pública», a forma negativa que acabou por ser plasmada na Constituição, justamente para permitir o encontro de soluções jurídicas diversificadas, por consideração pelo papel extremamente relevante da Igreja Católica na sociedade portuguesa, por se crer que isso contribuirá para melhorar o pluralismo e a qualidade desse meio de comunicação social ímpar que, nos nossos dias, é a televisão, o CDS votaria favoravelmente, na generalidade, a proposta de lei em discussão, assim como, também pelas razões já avançadas, pois tem toda a disponibilidade para o fazer, votar favoravelmente o requerimento já apresentado na Mesa da Assembleia da República.

Aplausos do CDS e de alguns deputados do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, as diferentes bancadas estabeleceram o consenso de que cada grupo parlamentar poderia dispor de mais 10 minutos. Confiados de que nem todos precisarão desse tempo, tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Jorge Lacão, que dispõe de 14 minutos.

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O Sr. António Capucho (PSD): - Peço a palavra Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra Sr. Deputado.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente a minha bancada deu consenso a esse alargamento dos tempos para cada grupo parlamentar no pressuposto de que a votação é feita na reunião de hoje.

O Sr. Andrade Pereira (CDS): - Esse é também o entendimento do CDS!

O Sr. Presidente: - Faltou esse aditamento Sr. Deputado.
Efectivamente foi me referido que o alargamento dos tempos era no convencimento de que a votação dos requerimento se realizaria hoje.

O Sr. Lopes Cardoso (Indep.): - Peço a palavra Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (Indep ) - Sr Presidente peço lhe desculpa pois o defeito é meu mas é que não entendo o que é que quer dizer a expressão no convencimento de que se vota hoje.
Pergunto à Mesa se se procede ainda hoje a vota coes independentemente de um eventual prolonga mento decorrente do alargamento dos tempos.
Não estou a levantar qualquer problema apenas quero ser esclarecido. Isto porque o convencimento estabelecido de que se vota hoje para mim na prática não se traduz em coisa nenhuma.
Pergunto pois se o que ficou estabelecido foi ou não no sentido de se proceder ainda hoje a votações ainda que haja necessidade de se prolongar a sessão

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado fui pouco feliz quanto à expressão que utilizei Devo dizer lhe que amos ainda hoje proceder à votação.
Tem pois a palavra para uma intervenção o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente Srs. Deputados: Uma vez mais se projecta nesta Assembleia da Republica essa causa velha que consiste em disputar ao Estado o monopólio do serviço de televisão para constituir um outro monopólio na esfera privada.
Uma vez mais as correntes conservadoras do pensamento político se juntaram para acusar de imobilistas todos aqueles que não desejam contribuir para condicionar o acesso à actividade televisiva tão só a pressupostos de ordem confessional doutrinária ou filosófica.
A tentativa ora retomada de atribuir um canal de televisão a Igreja Católica que o Governo ainda não esclareceu quando como e porque entidade foi requer do não e infelizmente um contributo positivo para a definição de um modelo possível para o futuro do nosso audiovisual - onde a Igreja como instituição tenha o direito de aceder em equidade e liberdade plena Mais parece ser a resultante de uma deliberada predisposição de tornar inviável qualquer debate responsável e profundo sobre a televisão que temos e a televisão que queremos.
Onde deveria discutir se o tempo e o modo de enquadrar nos planos constitucional jurídico administrativo e material as possibilidades de abertura da actividade radiotelevisiva tudo se queda a partir da infeliz iniciativa governamental em querer saber quem se quem não é a favor de um canal de televisão para a Igreja
Estão porém desajustadas as premissas de forma a não permitirem uma conclusão inteligível sobre o verdadeiro problema E o verdadeiro problema é afinal o de saber se nos próprios termos da exposição de motivos da proposta de lei n.º 5/IV a livre circulação de informação e a existência de um salutar espirito crítico de toda a comunidade nacional que só uma comunicação social activa e independente conseguirá proporcionar é nos dias que correm melhor garantida através do acentuar de reais garantias de liberdade independência e pluralismo no sector publico da televisão ou se pelo contrário e a liberdade de empresa que melhor concorre para acentuar e defender esses aspectos essenciais.
Quem concluir pela via da liberdade de empresa ou a ela ligar as exigências de uma tecnologia em mutação deverá todavia perspectivar as suas opções em função do Estado de direito em que vivemos e não fazer tábua rasa dos seus princípios a começar pelos constitucionais Foi o que o Governo fez na senda de anteriores iniciativas falhas de coerência e de fundamento.
Face à proposta de lei em apreço o Governo contraria a ideia de uma televisão exclusivamente situada no domínio publico mas não cuida de tomar posição sobre o sistema que com equidade poderia em seu entender estabelecer o acesso a entidades privadas.
O Governo aproveita se de um clima favorável a uma ideia plural de televisão para condicioná-lo a uma solução restritiva da própria pluralidade O Governo interpreta a Constituição de um modo discricionário e visa estabelecer na lei uma solução ela própria discricionária O objectivo afinal é um único o qual nada tem de comum com a preocupação de estabelecer um enquadramento coerente dos problemas da comunicação social mormente no que à televisão diz respeito
Por isso na mira de levar a água ao seu moinho a qualquer preço já vimos defender a tese de não se tratar sequer no caso concreto de fazer sair o exercício da radiotelevisão do domínio publico. A justificação já esteve no passado em que a Igreja Católica nos termos da Concordata era uma pessoa colectiva de direito publico e portanto susceptível de se com paginar com a proibição do artigo 38 n 7 da Constituição de que a televisão não pode ser objecto de propriedade privada Face ao reparo de que qual quer Estado estrangeiro acreditado em Portugal tem a mesma natureza jurídica e todavia ninguém lhe reconhecera na ordem interna tal prerrogativa o argumento pareceu cair do pedestal.
Seria necessário intentar outras construções Temo-las visto ensaiadas nas tentativas várias de recorrer à figura da concessão para justificar a compatibilidade do normativo constitucional com a abertura televisiva à iniciativa particular.
Não define - dizem-nos - a Constituição no seu artigo 89.º a existência de três sectores de propriedade e dele não resulta que o modo social de gestão - publico privado ou cooperativo - é essencial para defi

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nir a pertença de um bem a um sector e que, em consequência, um bem público pode, sem prejuízo dessa titularidade, vir a encontrar-se em regime de exploração no sector privado?
Em consequência, não compatibiliza o próprio texto constitucional a proibição de televisão em regime de propriedade privada com a possiblidade de gestão privada de televisão - sem prejuízo, portanto, da sua titularidade pública?
Resposta afirmativa - pensaram alguns; solução à vista - julgaram outros. E correram a consagrar a descoberta. Foi, por exemplo, o que o CDS fez na legislatura passada. Da forma desastrosa de que muitos estarão lembrados.
Pretendeu, então, o CDS abrir as portas da Lei n.º 75/79, pela revisão do n.º 2 do seu artigo 1.º A ideia era a de que a Constituição não definia um conceito técnico-jurídico de televisão e que, como tal, este poderia, numa interpretação chamada de «útil e actualista», ser despejado da ideia de transmissão para ficar apenas ligado à ideia de distribuição. A actividade televisiva, assim compreendida, era configurável a uma espécie de carteiro electromagnético a distribuir imagens e sons gerados por milagre ou geração espontânea. Por via desta ficção, já o Estado poderia concessionar os seus serviços de distribuição e transporte televisivos. Tudo ficaria bem com a Constituição porque se manteria incólume a proibição de a televisão ser objecto de propriedade privada.
A construção do CDS revelou-se afinal como o que era: artificial e incapaz de englobar no conceito de televisão o momento essencial da emissão, indispensável ao acto material de transmissão televisiva. Transmissão exige emissão. Sem esta não há actividade televisiva. Não se transmite o que se não emitiu. Porque televisão é um acto dinâmico e não um conceito estático, redutível a um conjunto de bens materiais.
Por isso, a problemática da televisão não é redutível a uma discussão juridicista sobre a titularidade dos equipamentos que a suportam, vista à luz da parte da Constituição dedicada à organização económica. Eis uma conclusão que há muito se estabeleceu e cuja doutrina se reflecte no Parecer n.º 29/79, da então Comissão Constitucional, emitido em sede de prevenção da constitucionalidade da Lei da Radiotelevisão.
Aí se refere que «a televisão não pode ser considerada como um meio de produção económico e o serviço público correspondente a um mero produto material». Reconhece-se, em consequência, que a inserção sistemática do preceito relativo à televisão, no título da Constituição relativo aos «Direitos, Liberdades e Garantias», tem como significado a sua avaliação específica, fora do quadro da organização económica, designadamente dos preceitos relativos à estrutura de propriedade dos meios de produção.
Se não estamos submetidos à estrutura de propriedade dos meios de produção, a avaliação do n.º 7 do artigo 38.º da Constituição limita então as razões de dúvida.
A televisão, como orgão de comunicação social que a Constituição não quis que fosse objecto de propriedade privada, deve, pois, por enquanto, ser pública e compreendida no âmbito de um serviço público.
É o que, em tese geral, decorre da doutrina de tantos publicistas. Veja-se, por exemplo, o que afirma um administrativista insuspeito aos olhos dos deputados do PSD e do CDS. Como diz o Prof. Afonso Queiró, nas suas lições de Direito Administrativo:
Certas das coisas que estão afectas ao uso público, e que por isso são públicas, são afectadas a outro uso, a uso privado pela concessão e, nessa medida, como que deixam de ser públicas por todo o tempo que a concessão durar [...]
Não sendo este o sentido da norma constitucional, não pode ser esta a sua derivação prática. Iria longe o contra-senso ou mesmo a falta de senso.
Eis uma conclusão que não contém novidade. Perante ela, importa todavia manter-nos atentos ao sinal dos tempos.
Não estamos já sob a influência fronteiriça (e não apenas) da televisão espanhola? Não aguardamos mesmo, para breve, o início da recepção das emissões, via satélite, do Projecto Olympus? Antenas de largo alcance não permitem já captar as emissões de países mais distantes?
Convenhamos, todavia, que recepção é uma coisa, emissão uma outra. O monopólio público de emissão televisiva existe em vários países democráticos europeus e tal não os tem impedido de definir um modelo tecnologicamente adequado no domínio do audiovisual. Alguns, porém, já começaram o caminho no sentido da abertura da televisão à iniciativa privada; outros, certamente, se lhe seguirão. A nenhum, que se saiba, lhe ocorreu substituir regras abertas de licenciamento e concurso público por atribuições de privilégio a instituição social, cultural ou confessionalmente relevantes, por mais respeitáveis que sejam.
Invocar, como o fez o Governo, o papel que, desde há séculos, a Igreja Católica desempenha em Portugal para lhe atribuir um canal de televisão é, seguramente, um motivo de grande significado no concurso de motivos que justificariam outras opções. Fundamentar uma opção legal de privilégio na norma constitucional que garante o direito de utilização pelas confissões religiosas de «meios de comunicação social próprios para o prosseguimento das suas actividades» é, obviamente, ignorar que o conteúdo das emissões de um canal de televisão não seria, em qualquer caso, exclusiva ou mesmo predominantemente atinente às matérias da fé e do ensino religioso. Toda a dimensão laica do conteúdo das emissões ficaria, assim, condicionada a um sistema de monopólio em toda a esfera privada. Temos então o direito de nos perguntar: será esse o quadro que se tem em vista quando se fala de abertura da televisão à livre iniciativa? Em face do princípio da igualdade dos cidadãos, definido no artigo 13.º da Constituição, a que luz se justifica um tratamento de privilégio que permita a uma instituição - qualquer que seja - não a possibilidade de concorrer à obtenção de um canal de televisão, mas de aceder, em regime de monopólio privado, à direcção de um canal televisivo?
A fazer valimento a proposta de lei do Governo, a Igreja assumiria, em monopólio privado, a direcção de um canal de televisão. A respectiva programação seria, obviamente, regida por critérios de liberdade inerentes à sua própria orientação, mas essa orientação, facto normal à natureza de uma instituição religiosa, tem a sua inspiração e expressão próprias no domínio filosófico e religioso. Ignoraremos, nós, que a ausência de

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pluralismo filosófico e religioso pode limitar a expressão global de outros pluralismos possíveis desejáveis e igualmente necessários ao equilíbrio da sociedade portuguesa?
Não conjuremos as evidencias A iniciativa constante do projecto governamental em nada ajuda a colocar como rigor os problemas da televisão em Portugal não garante o pluralismo não melhora as condições de exercício do direito a informar e a ser informado não consagra uma solução de equidade fundada na consideração de regras gerais compromete o princípio da igualdade de oportunidades dos cidadãos perante a lei e do ponto de vista constitucional uma pretensão inviável
Lamentavelmente a proposta governamental deixa de lado as possibilidades de acesso de entidades privadas à utilização dos meios e serviços do serviço publico de televisão. Em nada coopera para fixar um conceito adequado de televisão como meio de comunicação social Dirigindo se a actividade radiotelevisiva directamente ao publico a televisão por cabo com audiência restrita será ainda subsumivel ao conceito de televisão como órgão de comunicação social? Uma pergunta a que o Governo não responde dado que nem sequer a encara Como não encara o desafio tecnológico.
Mesmo de um ponto de vista liberal a proposta de lei do Governo revela se afinal antiliberal por natureza. É a expressão patente do imobilismo Razoes que se nos afiguram bastantes para suscitar o voto contra no do Partido Socialista perante uma proposta sem consistência nem habilidade.
Voto que exclui qualquer ambiguidade e por isso não comunga da posição política e regimentalmente absurda de querer transformar em base de trabalho um objecto maioritariamente apontado como imprestável Posição que alem do mais recusa participar da crise de identidade dos que não se tendo desembrulhado em iniciativa própria aceitável desejam todavia embrulhar se em iniciativa alheia apesar de a considerarem inaceitável.
Voto que exclui a ambiguidade. Que não exclui porem uma disponibilidade para apreciar soluções quando estas forem transparentes e realistas desenvolvidas a favor da independência do pluralismo da qualidade e de uma inovação autentica no domínio da comunicação social.

Aplausos do PS do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado João Salgado pede a palavra para pedir esclarecimentos Acontece que o PS não dispõe de tempo para responder. Pergunto pois se mesmo assim V. Ex.ª deseja usar da palavra.

O Sr. João Salgado (PSD): - Nesse caso prescindo Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção tem a palavra o Sr. Deputado Abel Gomes de Almeida.

O Sr. Abel Gomes de Almeida (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados Uma vez mais tem esta Assembleia que se ocupar da Radiotelevisão agora a propósito da proposta de lei n.º 5/IV.
Assunto tão repetidamente debatido pela Camará há de ser por certo tema de prolongada acuidade motivo de reais preocupações - de reforma ou de conservação - do Governo e das forças políticas aqui representados Numa palavra do pais político. Todavia o debate sobre a televisão não é exclusivo das preocupações partidárias e estende se ao homem comum que em sua casa nos centros de convívio e a mesa do café discute com afinco este problema que o futuro seguramente não deixará de ironizar mas que hoje se apresenta ao menos aparentemente para os seus defensores revestido da maior transcendência e legitimidade o monopólio estadual.
Esta reserva de exclusivo por parte do Estado mais do que um gesto paternalista mais do que uma atitude tutelar ao reclamar para si o controle absoluto segundo a segundo do que nos e dado er e ou ir portas adentro e onde quer que haja um aparelho de televisão tem sido sustentada pelos seus defensores com a invocação ao caso de alegados ultrapassáveis impedimentos constitucionais.
Muitas muitíssimas horas foram consumidas pela Assembleia na discussão jurídica do tema com profusa apresentação de argumentos por vezes de talhe algo curioso.
Contudo para alem do debate jurídico formal relativo aos contornos do problema subjaz a questão fundamental a da concepção que se tem da liberdade nomeadamente no que diz respeito a sua efectiva expressão.
Nós no CDS continuamos a sustentar que a sociedade só será verdadeiramente livre quando o Estado deixar para trás de si alguns preconceitos que tem man tido contra o indivíduo contra a sociedade civil. Mas o Estado criado com o 11 de Março aristocrático no pior sentido tem resistido o mais que pode ao movi mento inevitável que conduzirá a sua adequação a realidade social do mundo moderno.
O Estado e alguns dos que o ser em tem encontrado no imobilismo o ultimo reduto de defesa de privilégios que um e outros sabem não serem duradouros. Mas enquanto durarem duram - e talvez façam jeito No caso concreto da RTP é aparentemente aliciante para qualquer Governo manter o monopólio actual Mas como acertadamente referiu aqui nesta Assembleia o líder do nossos Grupo Parlamentar os frutos de tal sementeira nem sempre tem sido tão abundantes quanto as expectativas da colheita.
Assim sendo bom será que todos olhemos a quês tão de frente e a situemos objectivamente nos planos em que deve ser situada e que a nosso ver são fundamentalmente os seguintes é ou não deseja el o monopólio do Estado quanto a emissão de programas? Há ou não obstáculo do sistema constitucional a concessão de um canal televisivo?
Não vejo Srs. Deputados que hoje se possa defender como regime ideal o exclusivo estatal da emissão de programas Basta atentar nas recentes evoluções ope radas em outros países A concepção de liberdade tal como é entendida nas nações ocidentais vem exigindo o acesso ainda que cuidadoso de outras entidades à exploração de canais televisivos.
Diz-se também entre nós que o monopólio do Estado não é impeditivo da independência e do pluralismo nem mesmo da concorrência de programas entre os canais

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Mas a independência e o pluralismo que o actual sistema asseguram -manifestamente insuficientes e desequitativos em atenção aos protestos a que têm dado azo em todos os quadrantes- são qualidades que não se atingem necessariamente por força de disposição legal que as pretenda impor. País em que só o Estado pode dispor do acesso à emissão é País em que vigora uma concepção reduccionista deste fundamental meio de expressão que é a televisão.
Também não cremos no argumento de que, no actual contexto, pode haver uma verdadeira concorrência entre os dois canais. Pode-se criar, porventura, alguma competição entre os respectivos programas. Todavia, sempre dentro da mesma matriz enformadora imposta, ainda que involuntariamente pelo domínio exclusivo do Estado.
Ao fim e ao cabo quem defende, em si mesmo, o monopólio estadual de emissão com fundamento nas suas virtudes intrínsecas? Poucos, e quem se tem empenhado na sua manutenção, com base em alegados impedimentos jurídicos, mormente de natureza constitucional? Alguns mais.
O CDS tem sustentado, nesta assembleia, não existir preceito constitucional de que decorra estar vedado, a outras entidades que não o Estado, o acesso à exploração da emissão.
Sendo a televisão um bem do domínio público por força da Constituição da República, nada impede que a sua exploração seja atribuída em regime de concessão (de domínio público e de serviço público).
Não há pois, a nosso ver, qualquer conflito ente a proposta de lei n.º 5/IV e os preceitos constitucionais vigentes.
Por isso votá-la-emos favoravelmente ou, em alternativa, os requerimentos entretanto apresentados.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: dentro em breve mais emissões estrangeiras serão captáveis em Portugal. Já agora muitos milhares de pessoas seguem, dia a dia, os programas da televisão espanhola. A alternativa concedida aos portugueses para os programas da actual RTP vai ser, apenas, uma das várias emissões estrangeiras que chegarem até nós? Estaremos, se assim for, a defender a nossa língua, costumes e tradições populares? Estaremos, dessa forma, a incentivar a nossa produção artística e em geral a estimular o nosso desenvolvimento cultural?
Em suma: Estaremos conscientes do que, para além de tudo, está em jogo? Bom será que estejamos.

Aplausos do CDS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Alexandre Manuel.

O Sr. Alexandre Manuel (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao iniciar a minha intervenção neste debate, quero dizer claramente que o irei fazer com a preocupação de impedir que seja criada irresponsavelmente uma questão religiosa. Infelizmente, no entanto, o modo como alguns órgãos de comunicação social costumam tratar questões como esta, a ausência de informação por parte do Governo em relação à Assembleia e os princípios que terão presidido a redacção desta proposta de lei - incorrectos, pelo menos - deixam-nos algumas sérias apreensões.
Foi aproximadamente assim que, em Fevereiro de 1982, o Prof. Jorge Miranda, então deputado eleito neste Parlamento, iniciou a sua intervenção a propósito das questões de inconstitucionalidade suscitadas em redor do texto de uma proposta de lei semelhante aquele com que, de momento, esta Câmara se vê confrontada. Ou seja: quatro anos depois, também razões políticas acabaram por ditar um texto mais que discutível, este que, agora, constitui tema de debate.
É que, de facto, Sr. Presidente, Srs. Deputados, o que neste momento realmente está em causa não é o direito da Igreja Católica também fazer ouvir a sua voz através da televisão. Porque isso nós o defendemos, porque isso sempre o defendemos, clara e inequivocamente, desde que não sejam violados os princípios constitucionais. Só que, de facto, há pontos em que a Constituição seria claramente posta em causa se esta proposta de lei viesse eventualmente a ser aprovada.
Nem valerá a pena, no caso, referir-me à polémica questão da propriedade, segundo a qual o adjectivo «próprios», referido no n.º 5 do artigo 41.º da Constituição, deverá, segundo uns, ser entendido como «privativos» e, segundo outros como «adequados». Não esqueço simultaneamente a leitura daqueles que consideram que, por si só e em abstracto, a concessão a entidades privadas da utilização dos meios e serviços de televisão não é inconstitucional, já que ela não estaria abrangida pela proibição estatuída no artigo 38.º da Constituição. Argumentam, a propósito, que, com aquele artigo, apenas se pretendeu proteger, não propriamente a integração obrigatória do serviço de televisão num qualquer dos sectores de propriedade dos meios de produção, mas apenas e tão-somente o carácter público desse serviço. É, em resumo, a importante questão da utilização e gestão aqui colocada em anteriores legislaturas e que, a seu tempo, poderá merecer debate mais aprofundado.
Também não valerá a pena alongarmo-nos sobre a questão, hoje ultrapassada, da personalidade jurídico-pública por alguns atribuída à Igreja Católica. Esta é, na verdade, um sujeito de direito internacional, mas, na ordem interna portuguesa, não pode ser considerada pessoa colectiva de direito público.
Assim, debruçar-me-ei antes sobre as referências que, no diploma governativo, são feitas à Igreja Católica em confronto com «as restantes confissões religiosas». Deixamos no entanto, dada a sua complexidade, o problema de saber se a consagração do acesso à televisão, por parte dessas mesmas confissões religiosas, não exigirá que o legislador consagre, desde logo, os termos em que outras confissões, que não a Católica, ou até mesmo entidades privadas, poderão dele beneficiar.
É que, além de garantir a todas as confissões religiosas a utilização de todos os meios de comunicação social em ordem à prossecução do seu múnus pastoral, a nossa actual Constituição, ao contrário da de 1933 após a revisão de 1951 ou de outras como a espanhola ou a italiana (cito apenas dois dos exemplos mais significativos), não considera que a Igreja Católica deva ser objecto de qualquer tratamento especial. Nem certamente ela mesmo o permitiria, mais de 20 anos depois de um Vaticano II que, através de um dos mais importantes documentos produzidos por padres conciliares - a Gaudium et Spes -, proclamou a sua independência e a sua inequívoca autonomia em relação à «comunidade política».
Outra questão a merecer ainda uma referência especial diz respeito à competência legislativa, já que, no caso da proposta em causa, se trata de matéria da reserva relativa desta Assembleia. E é-o duplamente nos

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termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 68.º da Constituição a questão dos direitos liberdades e garantias e para se dar cumprimento às limitações impostas no respeitante aos bens de domínio publico Ou seja no caso o Governo qualquer governo não pode legis lar nesta matéria salvo se munido da devida autorização legislativa concedida por este Parlamento.
Nem se argumente a propósito como parece pré tender se através desta proposta que bastará para tanto que esta Camará aprove os princípios básicos deixando se ao Executivo a tarefa de emanar as normas que permitirão a sua concretização prática.
É que Sr. Presidente, Srs. Deputados neste caso á reserva de competência legislativa da Assembleia abrange a totalidade dos regimes jurídicos sobre esta1 matéria e não apenas os seus princípios ou bases gerais pelo que a proposta governativa viola afinal princípios consagrados no n.º2 do artigo 114.º da Constituição segundo o qual nenhum órgão de soberania pode delegar os seus poderes nos outros órgãos a não ser nos casos e nos termos expressamente previstos.
E colocada assim a questão pouco mais terei a dizer neste momento.
Só que perante a importância do assunto e as suas inevitáveis consequências importa que mais alguma coisa seja acrescentada Para se reafirmar aquilo que constitui matéria importante do programa eleitoral do PRD e que por mim aqui já foi expressa somos pela abertura da televisão à iniciativa privada mas com regras cumprindo a Constituição.
Não esquecemos os avanços tecnológicos e sabemos que de momento Portugal é porventura dos países europeus menos preparados - também legislativa mente - para enfrentar esse embate de inevitáveis consequências em vários domínios incluindo o cultural Sabemos que a liberalização da televisão aparece de momento como fenómeno talvez inevitável Por nossa parte no entanto tudo faremos para que ela venha a acontecer depois de definidas as regras quadro do espaço televisivo e sem esquecer questões tão importantes como o mercado publicitário ou a vocação de serviço publico indispensável a um órgão com a importância e a força da televisão mas que jamais constitui vocação da iniciativa privada.
Aliás e para além do que na Constituição se diz explicitamente em relação às diferentes confissões religiosas e aos meios de comunicação social próprios5 para o prosseguimento das suas actividades (o já citado artigo 41.º ) não creio que a Igreja Católica se dispusesse a aceitar privilégios em relação a outras confissões religiosas ou ate mesmo em relação a outro tipo de entidades.
Somos de facto pela abertura e saberemos por ocasião do debate - a que não nos furtaremos - rés peitar a dimensão da Igreja Católica e a importância que ela assume na sociedade portuguesa.
Com todos os benefícios que a ela lhe cabem e com todas as obrigações que lhe cumprem e que porventura lhe devemos Por agora diremos apenas que a ser irreversível o fim do monopólio áudio visual ele no entanto não se compadece com aquilo que alguns pré tendem apelidar de fatalismos tecnológicos nem muito menos com interesse políticos Por nossa parte pretendemos apenas respeitar as regras queremos apenas respeitar as regras todas as regras.

Aplausos do PRD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos estão inscritos os Srs. Deputados Lopes Cardoso e João Corregedor da Fonseca. Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (INDEP.): - Sr. Deputado Alexandre Manuel no início da sua intervenção V. Ex.ª começou por afirmar que a proposta de lei em discussão era mais do que discutível.
Depois em toda a crítica que teceu ao longo da sua intervenção critica essa claríssima brilhante e que subscrevo integralmente mais acentuou a ideia de que em sua opinião a proposta de lei e mais do que discutível.
No entanto não posso esconder uma certa perplexidade quando cotejo essa afirmação com o discurso do seu colega de bancada Sr. Deputado José Carlos Vasconcelos e com um requerimento de que V. Ex.ª e um dos subscritores.
Afinal estamos perante uma proposta de lei cujo texto é mais do que discutível ou perante um texto que é uma base aceitável de discussão? Em que ficamos Sr Deputado? Será que quem tem razão e o Sr. Deputado Jorge Lacão quando ao terminar a sua intervenção dizia que o PRD que não foi capaz de se desembrulhar de uma base e de um projecto aceitável acabou por se embrulhar na discussão de um diploma alheio que à partida considera inaceitável?

O Sr. Presidente: - Uma vez que o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca prescinde de formular o pedido de esclarecimento para o qual se inscrevera tem a palavra o Sr. Deputado Alexandre Manuel para responder.

O Sr. Alexandre Manuel (PRD): - Sr. Deputado Lopes Cardoso agradeço-lhe as suas referencias e reafirmo aquilo que disse esta proposta de lei e inconstitucional e é - demos de vantagem a primeira - pelo menos duas vezes e meia inconstitucional. Isso não significa que seja inevitável que este tema seja urgente mente discutido.
Penso que é uma asneira estarmos a esconder a verdade sobre algo que nos vai cair em cima pelo que será melhor estarmos preparados para o enfrentar e isto para que não nos aconteça aquilo que sobre muitos outros assuntos nos tem acontecido.

O Sr. Lopes Cardoso (Indep ): - Sr. Deputado dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - Faça o favor Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (Indep.): - Sr. Deputado Alexandre Manuel na lógica do seu raciocínio não seria mais natural que o PRD considerando urgente que esta questão se dirimisse apresentasse à Assembleia um projecto de lei que não fosse duas vezes e meia inconstitucional como o é em sua opinião esta proposta de lei mas que não fosse pelo menos 50 % inconstitucional?
Porquê tomar como base de trabalho um documento que considera inconstitucional9 É que nesse caso estamos a inaugurar um novo processo de discussão nesta Camará que é o de tornar perfeitamente inúteis as discussões na generalidade. É que desde que haja uma iniciativa em torno de uma matéria que por si mesma tenha interesse vamos passar a aprovar toda e qual

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quer que ela seja, para a partir dela fazermos algo interessante. Trata-se de um processo novo, pelo que passaríamos, então, a dispensar as discussões na generalidade, poupando à Assembleia 50 % do trabalho que tem vindo a desenvolver ao longo de todo este tempo.

O Orador: - Sr. Deputado Lopes Cardoso, repito que pelo facto de esta proposta de lei ser discutível é que a queremos discutir seriamente.
O que quero dizer a V. Ex.ª é que, de facto, não vamos trabalhar sobre esta proposta; a propósito dela apresentámos, sim, um requerimento para que a questão seja debatida por todos os partidos e na proporção em que estão representados nesta Câmara.

O Sr. Raúl Rêgo (PS): - Contra a Constituição!

O Orador: - O Sr. Deputado Raúl Rêgo fará o favor de o denunciar, pois se isto for inconstitucional nós também faremos ...

O Sr. Raúl Rêgo (PS): - O Sr. Deputado é que o disse!

O Orador: - Não vamos debater a proposta mas, sim, o tema, pois trata-se de um tema muito importante, sendo também importante que não se adie a respectiva discussão.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Borges de Carvalho.

O Sr. Borges de Carvalho (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É a primeira vez que intervenho neste Plenário depois do que na semana passada aqui se discutiu sobre comunicação social e devo dizer-lhes que me sinto algo diminuído na minha capacidade como deputado, bem como sinto diminuída a capacidade desta Câmara como órgão legislativo.
De facto, pela primeira vez e depois de quase quatro anos de presença nesta Câmara, na semana passada, vi-me obrigado a votar um projecto de lei que não conhecia e que não me tinha sido dado a conhecer, nem a mim nem aos outros Srs. Deputados. Foi uma imposição que me fizeram e contra a qual mais uma vez aqui protesto. Curiosamente tratava-se também de matéria relativa à comunicação social e de um projecto que diminuía esta Câmara como Câmara legislativa e a precipitava em meandros administrativos que lhe não competem.
Não sei se, por este andar, um dia não serão os deputados encarregados de fiscalizar o Mercado da Ribeira ou de ver se as licenças de condução de bicicleta estão em ordem. Para lá caminhamos.

Risos.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pese, embora, a qualidade das argumentações aqui aduzidas pela maioria dos Srs. Deputados que intervieram antes de mim, este debate não é relativo à concessão do canal televisivo à Igreja Católica - nisso estou de acordo com o PCP - nem sequer o de se saber o que é ou não é inconstitucional nesta matéria. O que está na base deste debate é o saber-se quem é realmente pela liberdade da comunicação social e quem dessa liberdade não faz outra coisa senão uma maneira de conseguir que ela não exista.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - É isto o que está aqui verdadeiramente em causa.
De facto, e o próprio debate o justifica, dificilmente poderíamos aqui concluir da constitucionalidade ou não de qualquer das posições que aqui foram assumidas ou da própria posição do Governo. Dificilmente conseguiríamos concluir se o facto de se conceder um canal televisivo à Igreja Católica é ou não limitativo dos direitos de outrem. No entanto, facilmente chegamos à conclusão de quem está de um e de outro lado da liberdade.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - É nessa medida que a tal «janela de ar livre», de que há pouco se falou neste debate, se abre do lado dos deputados liberais, do lado dos democratas-cristãos, bem como do lado dos sociais-democratas que são substantivamente democratas e adjectivamente sociais.

Risos.

Mas essa «janela» começa a fechar-se daí para lá: quando se chega ao PRD, cuja ideologia ainda não é bem conhecida de todos nós, já não está tão aberta; quando se chega ao PS, ela fecha-se, embora outro dia ainda se tenha ouvido entrar um pouco de ar, provocando um pequeno assobio, pela boca do Sr. Deputado António Barreto - contudo o dedo inquisitória! do Sr. Deputado Jorge Lacão terá tapado esse buraquinho ...

Risos.

... Quando chegamos à bancada que está à minha frente, a «janela» não só está fechada como todas as possíveis calafetagens estão nela colocadas.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Para violar a Constituição estão todas as janelas fechadas e calafetadas.

O Orador: - Chegamos ao ponto de nesta Câmara, ao fim de 12 anos de ouvir o PCP formular acusações à RTP dizendo que esta não é pluralista, que não está de acordo com os preceitos constitucionais e legais que enformam a comunicação social em Portugal, ouvirmos o PCP aqui dizer que o monopólio estatal da televisão é, garantia do pluralismo naquele órgão de comunicação social. Veja-se o que a experiência ensinou ao Partido Comunista, ou seja, rigorosamente nada.

Risos do CDS e do PSD.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Aproveita-se da televisão para, depois, a vir atacar.
O Orador: - Portanto, daí não poderia, de maneira nenhuma, vir ar fresco e puro. Aliás, o ar frio que vem desses lados vem de outros sítios muito mais longínquos e, felizmente, não chega a esta Casa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O que se passa é que por imperativo constitucional, que o Partido Socialista teve por bem obstar a que fosse alterado aquando da revisão da Constituição em 1982, os deputados deste país, em 1986, 3 dias depois do nascimento do primeiro bebé proveta em

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Portugal 3 dias depois da primeira transplantação cardíaca no nosso pais o Partido Socialista obriga esta Camará a uma discussão que perdoem me a expressão tem algo de troglodita.
De facto não se pode em 1986 pensar numa discussão deste tipo num Parlamento democrático A liberdade já devia ter entrado em Portugal muito mais profundamente do que o fez bem como já deveria ter entrado nas tais disposições constitucionais que o PS - porventura a pensar nas eleições presidenciais de 1985 - quis conservar e pelas quais neste momento e o único responsável Talvez também não seja por acaso que em relação ao Partido Socialista o que é substantivo e o socialismo e o que é democrata é adjectivo.
Isso talvez explique muitas das diferenças e hoje nesta Câmara mais uma vez.

O Sr. Presidente: - V. Ex.ª Sr. Deputado Borges de Carvalho tem de terminar a sua intervenção pois excedeu o seu tempo.

O Orador: - Tenho muita pena Sr Presidente pois tinha ainda mais algumas coisas para dizer.
No entanto espero que a luz da liberdade caia sobre os já que apesar da intervenção da Igreja Católica é pouco prova el que o Espirito Santo cá desça.

Aplausos do CDS e do PSD.

Risos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Que grande intervenção!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP) - Já chega!

O Sr. Presidente: - Para formular um protesto tem a palavra o Sr Deputado José Magalhães. Devo adiantar que o Sr. Deputado Borges de Carvalho não tem tempo para responder.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente suponho que o Sr Deputado Borges de Carvalho tem alguns segundos para responder Nós temos cerca de 12 minutos salvo erro.

Voz do PS: - Dê-lhe 30 segundos.

O Sr. Presidente: - V. Ex.ª tem tempo Sr. Deputado José Magalhães. Assim sendo pode usar da palavra para formular o protesto.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente Srs. Deputados Consideramos a intervenção do Sr. Deputado Borges de Carvalho particularmente lamentável.

Vozes do CDS: - Oh!

O Orador: - Este debate começou torto mal e numa base malsa por iniciativa do Governo.
O Governo trouxe aqui esta manha de forma perfeitamente arrogante um tom e um estilo pressiona dor - eu diria chantagista - ousou lançar para o hemiciclo argumentos que deturpam completamente a questão institucional que aqui devia ser objecto de reflexão séria lançou confusão brandiu formas de pressão que consideramos lamentáveis pelo que o debate foi seriamente prejudicado por isso
O Estado laico português teve que discutir a quês tão dos meios de comunicação social e da gestão dos meios audiovisuais dos anos 80 debaixo do fantasma de uma pressão do Governo sobre partidos com assento nesta Camará e debaixo de pressão da Igreja Católica sobre a Assembleia da Republica sendo a Igreja Cato liça alheia a essa forma de chantagem.

Vozes do PCP: - Muito bem!

Protestos do PSD e do CDS.

O Orador: - Ora isto e de uma enorme gravidade porque com esta base não pode haver debate sereno.

Vozes do PSD: - É preciso lata!

O Orador: - nem pode ha er um debate - que muitos dos Srs. Deputados aqui sublinharam ser necessário - aprofundado sobre as diversas questões como por exemplo o regime constitucional e as suas implicações as razoes que lê aram a Constituição a proibir a apropriação privada da televisão - que se mantém como provam as movimentações de certos grupos económicos que usam meios ilegais e ate criminosos como forma de pressionar lá fora aquilo que o Governo pressiona ca dentro quer uns quer outros da mesma forma abusiva.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Verificando se tudo isto e tendo apesar disto e graças aos esforços de certos deputados sido possível travar um debate em que muitos dos Srs. Deputados - importa reconhece Io - procuraram reflectir serenamente carrear os argumentos de carácter constitucional reflectir sobre as questões técnicas apelar para a reflexão - isso aconteceu até da parte da bancada do PSD e não me pronuncio sobre as intenções fundas que estiveram na base dessa atitude - vem o Sr Deputado Borges de Carvalho no fim da tarde - e fim de tarde mas ainda ninguém jantou Sr. Deputado - e diz nos em tom brejeiro chocarreiro que nos parece inaceitável.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - e desqualificado coisas anãs que serão lugar de anedota mas que não são termos para um debate na Assembleia da Republica.
Gostaria ainda de sublinhar que uma das mais lamentáveis mistificações deste debate por parte das bancadas que sustentaram a operação de chicana governamental foi precisamente o facto de terem pró curado introduzir confusões
Uma das confusões maiores foi aquela que o Sr Deputado Borges de Carvalho sem habilidade e de forma grossa aqui veiculou como critica ao PCP Qual seja a de que o PCP teria durante este debate defendido aquela forma de fazer televisão que tem sido feita pela RTP sob a vossa gestão.

Vozes do PCP: - Muito bem!

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O Orador: - Isso não aconteceu em nenhum momento.
Pensamos que uma das coisas mais lamentáveis é que o Governo se prevaleça da péssima política seguida - contra a Constituição! - para procurar destruir a Constituição neste ponto e dizer que ela não serve, não tendo razão. Srs. Deputados, isto é fazer o mal e a caramunha, como se costuma dizer, porque aquela televisão que ali está não é modelo de coisa nenhuma.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - A nossa televisão e com a vossa gerência.

O Orador: - Aquela é a vossa televisão; aquela é a televisão assassinada pela vossa gestão; aquela é a televisão onde o português á assassinado todos os dias; aquela é a televisão que ignora os direitos das regiões; aquela é a televisão que ignorou a problemática dos jovens; aquela é a televisão que não serve a educação; aquela é a televisão que desinforma; aquela é a televisão que manipula e, naturalmente, cada minuto desta televisão é publicidade contra esta televisão, mas não, certamente, contra a Constituição.

Vozes do PCP: - Muito bem!

Protestos do PSD e do CDS.

O Orador: - Se o Sr. Deputado nos vem dizer que a televisão boa é a do Sr. Proença de Carvalho e que a televisão boa é aquela que alguns dos senhores, que lá estão, fariam se de lá saíssem para fazer ao lado o que lá fazem, por amor de Deus!... Os senhores já lá estiveram várias vezes e quando de lá saem vê-se o que é que se fez.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Este estilo de debate, Sr. Presidente, consideramo-lo profundamente lamentável e consideramos que a responsabilidade suprema por esta distorção acaba por ser do Governo, que ao fornecer esta péssima base de trabalho, que é incorrigível, conduziu a este desaforo a que se assistiu esta tarde.

Aplausos do PCP, do MDP/CDE e de alguns deputados do PS.

O Sr. Presidente: - Para formular um protesto tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Alegre. V. Ex.ª dispõe de 2 minutos, Sr. Deputado.

O Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tomo a palavra porque o Sr. Deputado Borges de Carvalho, num estilo próximo do Parque Mayer - sem desprimor para os artistas de revista -, insinuou que os socialistas não são democratas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Ora bom, os socialistas nunca foram liberticidas. Historicamente, em Portugal, a direita já foi, várias vezes, liberticida.
Eu protesto, mas dou um desconto porque com a sua intervenção o Sr. Deputado Borges de Carvalho apenas veio demonstrar que para ele a democracia não é um substantivo nem um adjectivo, mas é apenas um advérbio de modo.

Aplausos do PS, do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Se calhar não sabe o que é um advérbio de modo!...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Borges de Carvalho, a Mesa faz-lhe uma concessão especial de 2 minutos para contraprotestar.

O Sr. Borges de Carvalho (CDS): - Sr. Presidente, muito obrigado pela generosidade da Mesa e espero que os 2 minutos cheguem.
Em relação à intervenção do Sr. Deputado José Magalhães devo fazer dois ou três pequenos comentários.
A primeira parte da sua intervenção dirigiu-se ao Governo, não se dirigiu a mim e, portanto, não lhe devo qualquer resposta.
Naquela parte da sua intervenção que é dirigida a mim, o Sr. Deputado não percebeu nada do que eu disse quando falei na RTP.

Vozes do CDS: - É o costume!

O Orador: - Porque o que eu disse foi que o PCP andava, há 12 anos, a dizer que a RTP era uma desgraça, para chegar à conclusão, 12 anos depois, que o grande remédio para essa desgraça é a RTP continuar a ser o monopólio estatal que é.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - O Sr. Deputado não percebe!

O Orador: - Portanto, se ao fim de 12 anos de monopólio estatal, os senhores ainda não perceberam que o monopólio estatal não serve - tal como nenhum monopólio serve -, o problema é vosso. Eu não posso meter-lhes isto pela cabeça abaixo, Srs. Deputados!

O Sr. José Magalhães (PCP): - Não é que não lhe falte vontade!

O Orador: - Nem quero! Não tenho nada com isso.
Em relação à segunda parte, a minha intervenção terá sido, de facto, - e eu disse-o aqui - produzida num estilo que não pretendia ser o mesmo de outras intervenções que aqui foram feitas. No entanto, pelo seu protesto se vê que a intervenção acabou por pôr o dedo na ferida, Sr. Deputado. E é isso que o Sr. Deputado não tolera! E é isso que o irrita! Compreende?! É isso que o faz protestar desabridamente, chamar nomes às pessoas, etc.
Eu pus, de facto, o dedo na ferida. Disse-lhe que os monopólios não serviam para nada. Disse que os senhores são contra a liberdade de informação, porque foi contra ela que os senhores sempre foram. Está ali o Sr. Deputado Raúl Rego que o diga.

O Sr. José Magalhães (PCP): - É ridículo!

O Orador: - Está ali, com certeza, o representante da Rádio Renascença, que o pode dizer.

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Porque se VV. Ex.as tivessem conseguido cá meter a ditadura bolchevista que tentaram impor em 1975 a estas horas não havia discussão nenhuma.

Aplausos do CDS e de alguns deputados do PSD.

O Orador: - Compreende Sr. Deputado?

O Sr. José Magalhães (PCP): - É completamente ridículo!

O Orador: - Portanto quando pus o dedo na fenda V. Ex.ª irritou-se e irritou-se muito bem.
Quanto ao Sr. Deputado Manuel Alegre devo dizer lhe que não chamei liberticidas aos socialistas.
Utilizei.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Borges de Carvalho verifico que os 2 minutos não chegam porque V. Ex.ª se expandiu por caminhos que não eram os próprios.

Aplausos do PS.

O Orador: - Sr. Presidente queria só dizer algo ao Sr. Deputado Manuel Alegre e já termino.
Não tive a intenção de tratar o PS por liberticida. No entanto a verdade é que quando se chega à hora da verdade - desculpe o pleonasmo - o PS patina o que é grave É triste ver VV. Ex.ªs que de facto são democratas patinarem como patinam e obrigarem as pessoas a fazer intervenções que lhes ponham um pouco também o dedo na fenda na esperança de que connosco elas não caiam em saco roto. Podem cair agora mas podem não cair de futuro.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Sr. Sottomayor Cardia (PS): - Sr. Presidente peço a palavra para exercer o direito de defesa da honra-

O Sr. Presidente: - Porquê Sr. Deputado?

O Sr. Sottomayor Cardia (PS): - Pretendo defender a minha honra pois o Sr. Deputado Borges de Carvalho disse que eu tinha patinado.

Risos gerais.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra Sr. Deputado.

O Sr. Sottomayor Cardia (PS): - Sr. Deputado Borges de Carvalho eu nunca patinei em defesa da liberdade.
Mas acontece que na verdade ao ouvir V. Ex.ª e embora eu nunca tivesse tido a honra de ter assento na Assembleia Nacional eu ouço o eco da voz do Sr Deputado Casal Ribeiro.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD e do CDS.

O Sr. Borges de Carvalho (CDS): - Sr. Presidente peço a palavra para defesa da minha honra.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Borges de Carvalho V. Ex.ª já não tem tempo. Há pouco a Mesa fez lhe uma concessão.

O Sr. Borges de Carvalho (CDS): - Sr. Presidente se eu por dizer que o Sr Deputado Sottomayor Cardia patinou o ofendi então que diabo ele chama me Casal Ribeiro e eu não tenho o direito de me defender!

Risos.

Est modus in rebus.

O Sr. Presidente: - Faça favor Sr. Deputado. Concedo-lhe dois minutos.

O Sr. Borges de Carvalho (CDS): - Sr. Deputado Sottomayor Cardia perdoo lhe porque V. Ex.ª e um jovem e portanto é natural que cometa essas grosserias.

Risos do CDS.

O Sr. Deputado sabe perfeitamente - e se não sabe devia saber - que entre mim e o Sr Deputado Casal Ribeiro nunca houve qualquer resquício de parecença V. Ex.ª devia ter ou o conhecimento histórico de algumas coisas - o que possivelmente não tem - ou então abster se de proferir insultos que não só lhe ficam mal a si como ao seu partido como a esta Camarário.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães pareceu-me que V. Ex.ª pediu a palavra.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Pedi sim Sr. Presidente. Mas quando o debate desce ao m el a que acabamos de assistir não há palavra possível a não ser o encerramento do debate.

Vozes do PCP: - Muito bem!

Protestos do CDS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro.

O Sr. Raul Castro (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo. Com esta e outras iniciativas legislativas pretende o Governo um alibi a curto e a longo prazo para justificar os fracassos da sua acção governativa.
Isto mesmo se pode ler hoje em titulo nos jornais come resumo da conferencia de imprensa de ontem do Grupo Parlamentar do PSD
Oposição quer levar a Assembleia da Republica a impedir a acção governativa
E no caso da proposta de lei agora apresentada o Governo procura ainda reforçar tal alibi à custa dos sentimentos religiosos da maioria da população. O Governo bem quis dar um canal da TV à Igreja Cato liça mas aqueles que não respeitam tais sentimentos não o querem permitir Seria um efeito que se pretenderia obter
Torna-se por isso necessária uma advertência liminar o MDP/CDE não põe em causa a dimensão e o relevo da Igreja Católica no nosso país e respeita pró

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fundamente os sentimentos religiosos da maioria da população, sentimentos esses que, de resto, são partilhados até por muitos dos seus militantes.
É que, na verdade, o que está em causa não são esses sentimentos religiosos, mas algo de muito diverso, que o Parlamento não pode deixar de cumprir, que é a Constituição da República, lei fundamental do País.
E a Constituição impede, clara e frontalmente, a concessão de um canal da TV à Igreja Católica, como o Governo pretende.
Se não bastasse o princípio da igualdade do artigo 13.º da Constituição, se não bastasse o princípio de que são irreversíveis todas as nacionalizações efectuadas depois de 25 de Abril, princípio consagrado no artigo 83.º, deveria ainda invocar-se não só o disposto no artigo 38.º, n.º 7, no sentido de que a televisão não pode ser objecto de propriedade privada, aliás reforçado com a disposição do artigo 41.º, n.º 5, que, ao garantir a utilização dos meios de comunicação social às confissões religiosas, não só limita tal direito à sua utilização (aliás, já praticada na TV), como não põe em causa o princípio anterior do artigo 38.º, n.º 7.
É certo que o Governo defende que tal concessão não colidiria com a nua propriedade, mas só com a fruição da TV. Simplesmente, não se pode ignorar que o direito de propriedade, tal como o define o artigo 1305.º do Código Civil, se traduz em o proprietário usufruir «de modo pleno e exclusivo dos direitos de uso e fruição», o que deixaria de se verificar se a entidade pública TV proprietária partilhasse tal uso e fruição, plenos e exclusivos, com outrem.
De resto, desde a revisão da Constituição, em 1982, nem sequer se pode admitir a pretendida concessão a entidades privadas, já que o projecto de lei de revisão constitucional n.º 2/11, da AD, previa a possibilidade de concessão da exploração a entidades privadas, mas tal projecto foi rejeitado.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O que significa que a ideia da «concessão» da proposta de lei do Governo não é nova, mas está morta e enterrada, pelo menos, desde 1982.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Afirmou aqui o Governo que a concessão em causa visa assegurar o pluralismo da televisão.
Estranha afirmação esta por parte do órgão de soberania a quem incumbe a condução da política geral do País e a Administração Pública.
Pois não devem os órgãos de comunicação social estatizados salvaguardar a sua independência perante o Governo e assegurar tal pluralismo, como dispõe o artigo 39.º da Constituição?

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sem dúvida!

O Orador: - O pluralismo e a independência da televisão não se asseguram com a concessão de canais a entidades privadas, mas sim internamente, dentro da própria televisão, respeitando e cumprindo os princípios que a devem orientar, a sua independência e pluralismo.

Aplausos do MDP/CDE e do PCP.

Ao pretender conceder um canal à Igreja Católica, o Governo abre a porta a outras entidades privadas, que vão fazendo exercícios de aquecimento, e que nada têm a ver com os respeitáveis interesses da Igreja, mas sim com obseuros interesses, que visam não o progresso, mas a exploração mercantilista, não a independência e o pluralismo, mas a manipulação da opinião pública, sem qualquer espécie de entraves.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Por isso, tal como nos debates de 1982 e de 1984, o MDP/CDE votará contra esta proposta de lei.

Aplausos do MDP/CDE, do PCP, do Deputado Independente Lopes Cardoso e de alguns deputados do PS.

O Sr. Presidente: - Igualmente, para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Lima.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Não é nova nesta Câmara a matéria que hoje o Governo nos submete a apreciação, embora desta vez a proposta de lei em apreço se apresente mais clara, menos polémica e juridicamente menos controvertida do que em momentos anteriores.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Boa piada!

O Orador: - Também o tempo decorrido, a evolução das circunstâncias e as inúmeras reflexões originadas por anteriores discussões permitem encontrar espaços de consenso e entendimento entre as diversas forças políticas, em detrimento de posições apriorísticas, que muitas vezes se circunscreveram exclusivamente a áreas pontuais e menores que tinham mais que ver com o embate resultante de determinado circunstancialismo político do que com o fundo da questão controvertida.
Não podemos, por isso, deixar de saudar esta iniciativa do Governo - de resto em cumprimento do seu Programa - vertida na proposta de lei n.º 5/IV.
Razões de ordem jurídica e política fazem com que esta proposta de lei mereça a concordância genérica do PSD.
No entanto, não queremos deixar de assinalar que a Câmara poderá fornecer alguns contributos positivos para a melhoria do seu articulado, a atender pelas sugestões alvitradas por senhores deputados de várias bancadas, e muito em particular por deputados do PRD. Cremos que tais contributos serão considerados bem-vindos, não só por parte da nossa bancada, mas certamente também por parte do Governo, que a este respeito, como a respeito de outras matérias, tem mostrado uma atitude de abertura e de diálogo.
Em nossa opinião, é hoje uma tese maioritária, em termos doutrinais, a aceitação da constitucionalidade de uma proposta de lei como esta, que visa permitir a concessão de exploração de um canal de televisão a empresa pública -pessoalmente, penso que o texto deveria estender essa possibilidade a empresas privadas em regime de concurso -, bem como à Igreja Católica, e garantir o acesso aos meios de televisão às restantes confissões religiosas. E isto porque o preceituado

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no n.º 7 do artigo 38 da Constituição a nosso ver não de e ser considerado em subordinação ao artigo 89.º da lei fundamental

O Sr. José Magalhães (PCP): - Essa agora!

O Orador: - Pensamos que ambos estes artigos ao falarem de propriedade não a referem no mesmo sentido.
A análise correcta da estrutura material do n.º 7 do artigo 38.º leva-nos a concluir que as coisas aí referidas (ondas e canais emissão de programas acessíveis ao publico em geral) relevam predominantemente como refere Barbosa de Melo em parecer detalhado sobre a matéria de valores e interesses públicos que transcendem de longe os valores e interesses meramente económicos
Este artigo reporta se assim à propriedade num sentido meramente jurídico económico pretende vedar a propriedade privada da televisão mas não a sua gês tão por entidades privadas.
O que não deverá ser esquecido pelo legislador isso sim é que a televisão está sujeita ao regime de propriedade publica pelo que a utilização dos seus canais e emissores não pode fazer se sem o respeito de regras próprias de uso e exploração que deverão ser criteriosamente formuladas em função dos valores e interesses que estão em jogo.
E não se conclua como já foi feito a favor da tese da inconstitucionalidade da concessão de exploração com o argumento histórico de que na revisão constitucional de 1982 a AD tentou consagrar explicitamente essa possibilidade e que tal tentativa não fez venci mento Também então o MDP/CDE tentou impedir explicitamente essa possibilidade e esta tentativa foi igualmente rejeitada Donde bem se pode concluir que o legislador optou por deixar a questão em aberto como na altura referiu o deputado da ASDI Jorge Miranda por forma a permitir à lei ordinária uma certa elasticidade e a consagração jurídica de fórmulas relativamente variáveis em atenção referia ele a feno menos tecnológicos que em grande medida excedem as nossas previsões e as nossas possibilidades de pequeno pais e que poderão aconselhar a que a lei ordinária possa inclinar se hoje num sentido e amanha noutro.
Somos pois de opinião que o texto constitucional é suficientemente lato para abarcar a ideia da concessão de gestão de um canal de televisão por pessoas de direito publico ou privado bem assim como a utilização de frequências televisivas em regime de concurso publico como já foi aventado
Relativamente a admissibilidade pela proposta de lei do Governo da concessão de exploração de um canal de televisão à Igreja Católica a nossa opinião é francamente concordante sem tibiezas nem subterfúgios
Por um lado o artigo 41.º n.º 5 da lei fundamental garante às confissões religiosas a utilização de meios de comunicação social próprios para o prosseguimento das suas actividades não exceptuando desses meios a televisão desde que rigorosamente respeitadas as for mas que a lei vier a prever
E esta interpretação é mais consentânea com o principio pluralista dominante na nossa Constituição que tem um particular relevo nos meios de comunicação social.
A liberdade e a concorrência - não em termos desenfreados mas limitados pela própria natureza das coisas e pelos condicionamentos que legalmente virem a ser exigidos - são virtualmente mais aptas para garantir o pluralismo e a isenção do que o monopólio esta dual. E a comprova Io está o facto de a realidade social se encarregar de desmentir uma certa ideia que alguns pretendem ler na Constituição de que a reserva do monopólio estadual só por si seria garantia bastante de isenção independência e pluralismo. Para tanto bastara reparar que nos últimos dez ou onze anos como hoje já aqui foi abundantemente referido a nossa televisão foi incensada por todas as forças políticas portuguesas acusada das mais graves arbitrariedades e atropelos informativos. Se a lógica tivesse algum sen tido na política - e parece que para os senhores deputados não tem - se as palavras e os discursos dos par tidos aqui representados não são um mero entretenimento de hoje para esquecer amanha só há uma conclusão a extrair e a de permitir uma experiência nova em termos de radiotelevisão obviamente no respeito pelo que as normas constitucionais permitem.

O Sr. José Magalhães (PCP): - É comovente!

O Orador: - A Igreja Católica portuguesa vem manifestando desde 1981 a sua pretensão de explorar em regime de concessão um canal de televisão Esta atitude teve desde logo o mérito de abrir um debate profundo e longo entre as forças políticas portuguesas que nesta altura estará por certo suficientemente amadurecido. Muitas das posições então afloradas com paixão inclusiva e uma pretensa querela que se poderia abrir entre a Igreja e o Estado Português que hoje tornou a ser aqui de novo explorada carecem de fundamento.
Por outro lado é sabido que a Igreja Católica tem em Portugal uma importância muito particular e que essa importância lhe é reconhecida pelo Estado Português sem qualquer contestação pela especialidade do regime concordatário.
Porém e óbvio que isso não e razão para que a Igreja Católica seja colocada numa posição ilegítima de vantagem Não o pretende por certo a própria Igreja como não o pretende o Estado Português nem qualquer dos seus órgãos de soberania em particular o Governo
Mas também se não vislumbram razoes objectiva mente válidas para que a Igreja Católica seja discriminada desfavoravelmente só porque foi a primeira entidade a levantar a questão ou talvez só por ser a instituição que é.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É falso!

O Orador: - Pela nossa parte - e nisso acompanhamos o Governo - não utilizamos subterfúgios espúrios para chamar coisa diferente àquilo que entendemos dever ser feito Assumimos com clareza que esta pró posta de lei visa permitir entre outras coisas a concessão de exploração de um canal de televisão à Igreja Católica bem como permitir o seu acesso a outras confissões religiosas ou a outro tipo de sujeitos de direito.
Para os diversos casos o legislador poderá consagrar regimes diferenciados que atendam à especificidade de cada situação

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Bom será que aqueles que querem impedir estes objectivos sejam igualmente claros perante a opinião pública, não se ficando por uma dúbia posição de «sim, mas talvez ...», que mais não será do que uma forma de pretender adiar, ad infinitum, a resolução do problema que hoje aqui se discute.
Entendemos, de igual modo, que se não deve ficar por aqui. Que se deve avançar, como se propõe o Governo fazer e como já foi igualmente salientado por alguns deputados da oposição, na formulação de uma lei quadro que defina a actividade da radiotelevisão. Só que isso não é impeditivo que esta proposta de lei ou que o aproveitamento que dela possa ser feito tenha alguma consequência positiva na discussão que hoje aqui vamos ter.
Com a apresentação desta proposta de lei o Executivo deu cumprimento a uma das promessas do seu programa eleitoral e do seu Programa de Governo. Um foi sufragado nas umas e outro viabilizado por esta Câmara, pelo que não fazem sentido as acusações enviezadas que aqui lhe foram dirigidas de eleitoralismo.
Aguardamos que aquilo que alguns partidos consideravam ser positivo aprovar, caso formassem governo, não passe a ser inútil, só porque o Governo é dirigido por outros. Não se alterou o interesse nacional em que haja uma televisão mais pluralista e mais isenta, com mais qualidades nos seus programas e, afinal, menos causticada por todos quantos - e parece que são muitos - se encontram insatisfeitos com os serviços que actualmente presta.
E deixo uma reflexão final, que tem a ver com a concorrência de emissões televisivas: sou deputado por um distrito - o de Bragança -, e na quase totalidade dos seus concelhos tem-se oportunidade de assistir, durante todos os dias, à excelente concorrência que os dois canais da televisão espanhola fazem, de resto em óptimas condições de imagem, à televisão portuguesa.
Como português ficaria mais feliz se essa concorrência viesse de dentro de casa, e não de fora de portas.

Aplausos do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Não havendo mais nenhum senhor deputado inscrito, dou a palavra ao Sr. Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares.
O Sr. Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Já vem sendo hábito que, sempre que o Governo se apresenta nesta Assembleia com qualquer iniciativa legislativa, proliferem as críticas, se atribuam as piores intenções ao Governo, quer de eleitoralismo, quer de instigação a conflitos institucionais, quer, agora, de fomento de guerras religiosas, quer sabe-se lá de que mais.

O Sr. José Magalhães (PCP): - E não é?!

O Orador: - A propósito desta lei em concreto essas criticas são, se possível, ainda mais contraditórias e mais destituídas de fundamento do que o habitual. Umas vezes foi afirmado que se pretendia instrumentalizar a Igreja, outras que se lhe queria dar um privilégio injustificado. Umas vezes se disse que a proposta era demasiado restritiva e até imobilista, por se limitar a quebrar o monopólio estatal através de uma concessão à Igreja, outras se disse que o Governo o que estava era a defender grandes interesses económicos privados.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - E não está?! O Governo não sabe?!

O Orador: - Chegou-se até - e aqui, sim, existiu um absurdo raciocínio, produto de um quadro mental totalmente heterodoxo - a afirmar que o lançamento do debate pelo Governo é que constitui bloqueio ao próprio debate. Nada de mais falso e injusto. Curioso é notar que quem assim age e fala nunca tomou a iniciativa de lançar esse mesmo debate; antes se limita a impedi-lo ou a adiá-lo indefenidamente.
No normativo jurídico existente, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a disposição legal que define quem e por que meios se exerce a actividade de televisão é o artigo 2.º da Lei n.º 75/79, de 29 de Novembro. A presente proposta de lei do Governo recai justamente sobre este artigo, e isso dá oportunidade à Assembleia da República para decidir aqui e agora sobre esta problemática.
Se alguns dos senhores deputados não querem viabilizar a concessão directa e imediata de um canal de televisão à Igreja Católica, que o Governo considera ser um imperativo constitucional resultante do artigo 41.º, n.º 5, da Constituição, julgo restarem-lhes dois caminhos alternativos: ou viabilizam já a proposta de lei na generalidade, com a possibilidade de introdução posterior de alterações na especialidade, ou não a rejeitam liminarmente e há sempre fórmulas, ainda que de recurso - e uma já aqui foi adiantada -, para, sem dilações excessivas, se poder chegar a um consenso razoável.
A única via inaceitável é a da rejeição pura e simples, porque, nesse caso, o que se recusa não é tanto a proposta de lei do Governo, mas, mais uma vez, a solução do problema.
Dizer-se que se é a favor do fim do monopólio estatal da televisão em discursos inflamados e eleitoralistas, porque proferidos em campanha eleitoral, e depois recusar-se levar as palavras à prática, então, sim, estamos perante uma atitude politicamente reprovável, eticamente inadmissível e tecnicamente inconsequente.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Em 1982 esta Assembleia da República pronunciou-se pela não inconstitucionalidade da concessão de um canal à Igreja Católica. Seria, no mínimo, desconcertante que em 1986 se pronunciasse justamente no sentido contrário.
Mas, mais do que isso, aqueles que se pronunciaram em 1982 pela inconstitucionalidade de tal propósito, embora alguns deles manifestem concordância, no campo dos princípios, com a solução preconizada, são os mesmos que, no mesmo ano, em sede de revisão constitucional, não alteraram a limitação que dizem existir, e prometem agora resolver o problema para depois da próxima revisão constitucional.
Estamos perante o conhecido fenómeno muito característico de algumas forças políticas portuguesas da fluidez do discurso e do imobilismo de acção.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Governo agiu, mostrou abertura ao diálogo, é consequente nas suas atitudes e comportamentos.

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Só quem está fendo de economicismo crasso ou de materialismo cego poderá argumentar 'que o artigo 89 da Constituição abrange o bem televisão. O artigo 89.º refere se a bens objectiva e imediatamente ligados à actividade económica bens avalia eis apenas ou pré dominantemente pelo seu valor económico.
A organização económica na Constituição é um domínio materialmente distinto de outros como por exemplo a cultura a administração ou a política
O que está em jogo do ponto de vista constitucional nesta matéria de televisão são principalmente valores personalistas e por isso embora a televisão não possa ser objecto de propriedade privada pode obviamente ser objecto de exploração e gestão privadas.
A postura do Governo nesta matéria como em tudo o mais é clara e transparente Queremos resolver os problemas do nosso pais não de forma desarticulada mas sim de acordo com o nosso Programa. A nossa palavra é só uma. A nossa política assim o confirma.
Por parte do Governo não há mudança de opinião. A melhor solução para garantir desde já um efectivo pluralismo e independência da televisão face ao poder político e económico será a concorrência entre um canal da responsabilidade da Igreja Católica e os canais da televisão publica.
A decisão cabe agora Sr. Presidente e Srs. Deputados à Assembleia da Republica.

Aplausos do PSD e do CDS.

O Sr. Sottomayor Cárdia (PS): - Peço a palavra para usar o direito de defesa Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Sottomayor Cárdia (PS): - Sr. Ministro V. Ex.ª declarou ser inaceitável que se vote contra esta proposta de lei o que só demonstra que não respeita a liberdade de voto dos deputados.

Protestos do PSD.

É uma ofensa ao Parlamento Sr Ministro: Tomei a palavra não para defender a minha honra mas sim a honra do Parlamento.

Aplausos do PS do PCP do MDP/CDE e de alguns deputados do PRD.

Protestos de alguns Deputados do PSD batendo com os mãos nas carteiras

O Orador: - Contudo o que é mais lamentável é que não fiquei surpreendido pois este governo é apenas uma agencia não direi de publicidade mas de propaganda.

Aplausos do PS do PCP e do MDP/CDE.

Protestos de alguns deputados do PSD batendo com as mãos nas carteiras.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra para dar explicações o Sr. Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares.
O Sr. Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares - Sr. Deputado Sottomayor Cárdia do mesmo modo que há pouco tive que referir - e não e esse o meu estilo nem a minha forma de conviver em democracia - que não reconhecia a ninguém o direito de ser um notário da Constituição tenho agora que dizer que também não conheço a ninguém nem mesmo a pessoas com pró as dadas em termos de democracia o direito de fazer as afirmações que V. Ex.ª quis fazer porque o Sr Deputado também não e um notário dos governos nem da democracia dos governos Era só isto que lhe queria dizer Sr. Deputado.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra para protestar o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Esta é sem tirar nem por a atitude do Governo perante a Assembleia da Republica.

O Sr. João Salgado (PSD): - Isso é demagogia!

O Orador: - O Governo entra de manha larga a proposta de lei e chega ao fim da tarde e coloca a Assembleia da Republica perante um dilema neste exacto tom e estilo os senhores ou crêem ou morrem. Quem está por um lado naturalmente que serve o Pais quer resolver os problemas etc e portanto está com o Governo.

Protestos do PSD.

O Orador: - Quem não quiser e forçosamente herege ateu detesta o Pais e quer destruir o Governo.

Vozes do PCP - Muito bem!

Protestos do PSD.

O Orador: - Isto é gravíssimo Srs. Deputados pois não diz apenas respeito aos Grupos Parlamentares do PCP do PS do PRD ou dos outros partidos que estão no posicionamento em que estão em relação ao Governo que como todos sabem é minoritário.

Vozes do PSD: - Mas É legitimo!

O Orador: - Isto em levantar um fundo de lama contra o Parlamento que e muito perigoso

Risos do PSD.

O Governo está a conduzir junto da opinião publica. Os Srs. Deputados rirão gargalharão o que quiserem mas vão ter a paciência de me ouvir.

Vozes do PCP: - Muito bem!

Protestos do PSD.

O Orador: - O Sr Deputado João Salgado se quer usar da palavra levante-se e fale!

Pausa.

O Governo já foi objecto de uma nota - o que é inédito - do Parlamento aprovada em conferencia de lideres verberando em condições que consideramos severas mas justas o seu comportamento a propósito do orçamento suplementar para 1985

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Este governo ousou em relação ao Orçamento do Estado para 1986 fazer junto da opinião publica uma mistificação gravíssima que continua agora a fazer ao insinuar que a Assembleia da República recebeu a tempo - o que não aconteceu - o Orçamento que o recebeu com tudo o que também não aconteceu e que ainda não apreciou o que deveria ter apreciado e que se recusa a conceder a urgência
Este governo que está ali sentadinho com aquele ar inocente e que sabe que nada disto é verdadeiro que sabe que entregou a proposta de lei do Orçamento do Estado tarde violando a lei sem os anexos devidos sem os mapas comparativos sem os elementos necessários que ainda hoje não tinha entregue na minha comissão o orçamento do ministério competente o que nos impossibilitou de o debater seriamente insiste junto da opinião publica que a Assembleia é calaceira preguiçosa não trabalha e obstaculiza a acção governativa que o Governo quer levar a cabo com toda a velo cidade.
Srs. Deputados isto é uma mistificação gravíssima porque veicula junto da opinião publica uma imagem negativa - e de resto falsa - do Parlamento ao mesmo tempo que atribui ao Governo méritos que ele não tem.
Mais mesmo quando toda a gente o acusa de pró ceder mal o Governo levanta se e de uma maneira arrogante diz.
Procedi bem e quem estiver em posição crítica está no banco dos réus.
Foi o que aconteceu hoje Srs. Deputados O debate a que assistimos levou concludentemente à condenação - mesmo por parte da própria bancada do PSD que não o subscreveu - do diploma do Governo pois ainda à pouco ouvimos o Sr Deputado Duarte Lima dizer que o texto precisava de uns arranjos que era um texto susceptível de críticas.
O texto é um verdadeiro podão e uma provocação tendo sido condenado generalizadamente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado peço lhe o favor de terminar o seu protesto e de não se desviar do tema ou seja da intervenção do Sr. Ministro. É que se o Sr. Deputado começa a invocar outros Srs. Deputados daqui a pouco há novos pedidos de palavra e nunca mais acabamos o debate.

O Orador: - Muito obrigado Sr. Presidente Dizia eu que mesmo quando acontece o que sucedeu hoje isto é o facto de ninguém tomar aquela pró posta com uma coisa susceptível de ser aprovada quo tale - e há até quem a rejeite firmemente dizendo que é super inconstitucional é muito inconstitucional é inconstitucional ou seja com graduações - o Governo exibe se nesta postura "das duas uma ou os senhores aprovam ou rejeitam" Não há mas nem meio mas e o Governo exerce sobre a Assembleia a mesma atitude de pressão e de chantagem que caracterizou toda a sua conduta.
Em nosso entender este é um procedimento gravíssimo A Assembleia da Republica não pode aceitar este sistema de pressão sistemática que ainda por cima sub verte tudo e qualifica os opositores - o que é um direito democrático - de verdadeiros criaturos que atentam contra as instituições democráticas e o interesse nacional
Não é assim e nós não aceitamos nem nunca aceitaremos essa visão das coisas.

Aplausos do PCP do MDP/CDE do deputado independente Lopes Cardoso e de alguns deputados do PS.

O Sr. Presidente: - V. Ex.ª, pretente contraprotestar Sr. Ministro!

O Sr. Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares: - Abstenho-me de contraprotestar Sr. Presidente.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente - Para pedir esclarecimentos tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Ministro não há duvida de que o que está a passar se nesta ponta final faz me lembrar o que há uns anos se passava neste país (aliás ainda se passa um pouco) com a corrente surrealista É que o comportamento da bancada do PSD Sr Presidente e Srs. Deputados é na realidade um comportamento de uma confortável muito confortável maioria Srs. Deputados era conveniente que fossem menos arrogantes e devo dizer lhes que os pés servem para andarmos na rua e não para batermos com eles nas bancadas que aliás custam dinheiro ao erário publico e à Assembleia.

Protestos do PSD.

Sr. Ministro V. Ex.ª declarou que nunca aqui ninguém tinha tomado a iniciativa de um debate da natureza deste.

O Sr. João Salgado (PSD): - Está habituado a bater com os pés!

O Orador: - V. Ex.ª é que se fez ouvir e continua a fazer se ouvir. No entanto devo dizer lhe que se faz ouvir muito mal Sr. Deputado!
Estou à espera de ver por parte de V. Ex.ª uma contribuição extremamente positiva para os trabalhos desta Assembleia. Agora não me interrompa e se quiser peça ao Sr Presidente autorização para protestar.
Sr. Ministro V. Ex.ª disse que nunca ninguém tinha tomado a iniciativa de trazer um problema destes à Assembleia. Não é bem assim V. Ex.ª sabe que em 1983 ou 1984 não me recordo bem o CDS apresentou um projecto de lei visando o mesmo que a pró posta de lei em debate o MDP/CDE e creio que outros grupos parlamentares apresentaram um pedido de impugnação desse projecto de lei por inconstitucionalidade tendo este sido rejeitado exactamente por inconstitucionalidade.
Já que não fiquei esclarecido com as explicações que deu ao Sr Deputado Sottomayor Cardia gostava que me explicasse o que é que quer significar com a expressão "ou viabilizam já ou não aceitam liminarmente sem dilações excessivas vias inaceitáveis etc. É que só posso entender como conselhos paternalistas aquilo que V. Ex.ª disse.
É o Governo que está aí sentado Sr Ministro e portanto é preciso ter muito cuidado com este tipo de declarações

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V. Ex.ª disse que e conhecido o fenómeno do imobilismo de acção Perante este imobilismo de acção pergunto ao Governo por intermédio do Sr. Ministro se esta e uma das prioridades do Governo se esta e uma das prioridades de que o Pais carece O Governo não tem outro tipo de prioridades como seja uma política de emprego uma política de desenvolvimento económico não demagógico uma política de ensino uma política de saúde. Não será mais prioritário Sr. Ministro fazer baixar os preços dos transportes dos bens de consumo imediato que poderão surgir após a baixa de preços dos combustíveis? O imobilismo é da nossa parte ou e da parte do Governo?
O Sr. Ministro diz que não há mudança de opinião do Governo e que a concorrência é salutar para garantir a independência e o desenvolvimento da qualidade da informação televisiva. A esse aspecto temos uma opinião que poderá ser desenvolvida aquando do debate já aqui proporcionado pelo Sr. Deputado Magalhães Mota.
A propósito da concorrência vem publicado no jornal O Dia - e está nos recortes da Assembleia da Republica - que para além da Igreja o Expresso a TVN e as Produções Costa do Castelo estariam interessados num canal de televisão Nomeadamente esta ultima diz - e está publicado no jornal O Dia que é neste caso um jornal insuspeito - que se é concedido a Igreja qualquer canal ela também quer um pois não tem que haver vantagens para ninguém.
Pergunto-lhe se for concedido um canal à Igreja vamos ter anos canais para todos quantos assim o entendam e possam pedir nomeadamente empresas de jornais Cooperativas de jornais empresas privadas grupos de pressão económica etc?
E capaz de me dizer Sr. Ministro o que pensa a este respeito?

O Sr. Presidente: - Para responder tem a palavra o Sr. Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro Adjunto e para os Assuntos Parlamentares: - Sr. Deputado Corregedor da Fonseca Não e verdade que tenha dito que nunca houve qual quer iniciativa para debater esta questão na Assembleia da Republica.
O que disse foi que até se chegou aqui a afirmar que o lançamento do debate pelo Governo é que constituía um bloqueio ao debate - houve alguém que afirmou isto nesta Assembleia da Republica.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - E é verdade!

O Orador: - E eu disse que não havia nada de mais falso e injusto - estas são palavras textuais.
Curioso e notar que quem assim age e falou nunca tomou a iniciativa de lançar esse mesmo debate Antes se limita a impedi-lo ou adiá-lo indefinidamente.
Portanto o Sr Deputado ouviu o que quis ouvir e não o que eu disse.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Ainda em relação à questão das alternativas que formulei claro que os senhores deputados sabem naturalmente distinguir entre juízes opinativos e juízos directivos.

Governo tem o direito de dar a sua opinião O Governo não dá directivas à Assembleia da Republica.
Agora a Assembleia da Republica e os senhores deputados terão que ter a paciência e a bondade de ouvir a opinião dos membros do Governo porque senão os membros do Governo não vem aqui fazer nada.

Aplausos do PSD.

Sr. Deputado quanto a questão que formulou sobre vários canais o Governo respeita as competências da Assembleia da Republica É o senhor que tem que responder a isso mesmo pois e à Assembleia da República que cabe alterar a Lei da Televisão O senhor decidirá conjuntamente com os seus pares.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados em virtude de não haver mais inscrições dou por encerrado o debate na generalidade.
Antes de prosseguir quanto a dois requerimentos que estão aqui para serem submetidos à vossa votação.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Peço a palavra, Sr. Presidente

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado pede a palavra para que efeito?

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Para interpelar a Mesa Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem então a palavra Sr Deputado.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - O Sr. Presidente disse que havia dois requerimentos.
Tanto quanto me quer parecer existe apenas um requerimento e uma proposta Assim na opinião do Grupo Parlamentar do MDP/CDE só há motivo para uma votação a de um requerimento em que os deputados do PRD requerem a baixa da proposta de lei a uma comissão eventual.
Quanto à outra proposta Sr Presidente e evidente que a nossa opinião e a de que não deverá ser votada hoje Isto porque e uma proposta para a constituição de uma comissão eventual a composição de uma comissão eventual pelo que terá que ser agendada em devido tempo aliás como sucedeu ainda há relativa mente pouco tempo quando se tratou creio eu da criação de uma comissão eventual para as contas do Estado.
Portanto Sr Presidente parece me que só há lugar a uma votação que é a do requerimento do PRD da baixa do texto da proposta de lei n.º 5/IV a uma comissão eventual.
Quanto à proposta - creio que ate nem devia ser uma proposta mas um projecto de resolução - ela entra depois no processo legislativo comum de acordo com o Regimento
Por isso Sr. Presidente creio que só pode haver a votação do requerimento e não da proposta

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado na medida em que V. Ex.ª interpelou a Mesa continuo a afirmar que vou colocar à votação dois requerimentos

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Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, faço-o, porque ia a prosseguir na sua enunciação quando V. Ex.ª me interrompeu.
Srs. Deputados, num dos requerimentos, emanado da Comissão de Agricultura e Mar...

Risos.

O Sr. Presidente: - ... solicita-se que «seja criada uma subcomissão de pescas no âmbito da Comissão de Agricultura e Mar, tendo a composição abaixo indicada:

PSD - Reinaldo Alberto Ramos Gomes, como coordenador;
PS - Luís Gonçalves Saias; PRD - António Magalhães Barros; PCP - Carlos Manafaia; CDS - Henrique Soares Cruz; MDP/CDE - João Corregedor da Fonseca».

Risos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, nos termos do n.º 2 do artigo 37.º do Regimento da Assembleia da República esta subcomissão só pode ser formada com autorização do Plenário.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Peço a palavra, Sr. Presidente

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Muito obrigado pela explicação, Sr. Presidente, mas teria sido útil também que V. Ex.ª me interrompesse e explicasse o que se estava a passar, pois parece-me que não se trata de um requerimento da Comissão de Agricultura e Mar, mas antes de uma proposta de deliberação.
É uma proposta de deliberação que a Comissão de Agricultura e Mar apresenta ao Plenário para que este então decida. Não é, Sr. Presidente, salvo o devido respeito que tenho por V. Ex.ª, um requerimento. Tudo o que eu disse em relação ao restante, mantenho.

O Sr. Presidente: - Muito bem, Sr. Deputado. Aceito o que acabou de dizer, para não levarmos mais longe esta discussão, porque perdíamos realmente tempo.
Portanto, Srs. Deputados, vamos proceder à votação da proposta de deliberação apresentada na Mesa pela Comissão de Agricultura e Mar.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos agora proceder à leitura do requerimento apresentado na mesa por deputados do PRD.

Foi lido. É o seguinte:

Nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 142.º do Regimento da Assembleia da República, os deputados abaixo-assinados, em número de 10, requerem a baixa do texto da proposta de lei n.º 5/IV, que altera o artigo 2.º da Lei n.º 77/75, de 29 de Novembro, a uma comissão eventual, a constituir para efeito de nova apreciação no prazo de 20 dias.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Sr. Presidente, queira desculpar, mas estava desatento, pelo que, se V. Ex.ª pudesse mandar repetir a leitura, agradecia-lhe.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai ser lido de novo o referido requerimento.
Foi lido de novo.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai finalmente ser colocado à votação o requerimento que acabou novamente de ser lido.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PRD e do CDS, votos contra do PS, do PCP, do MDP/CDE e dos deputados independentes Lopes Cardoso e Afaria Santos, e a abstenção do deputado do CDS Borges de Carvalho.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Borges de Carvalho.

O Sr. Borges de Carvalho (CDS): - É apenas para informar que farei chegar à Mesa uma declaração de voto por escrito.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Barreto.

O Sr. António Barreto (PS): - É também para dizer que entregarei a minha declaração de voto na Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, ponho agora à vossa consideração se, em presença das dúvidas levantadas pelo Sr. Deputado Corregedor da Fonseca, deve ou não ser já votada a proposta de constituição de uma comissão eventual, cujos termos são os seguintes:
Nos termos e para os efeitos do artigo 39.º do Regimento, os deputados abaixo-assinados, em número de 10, propõem a constituição de uma comissão eventual, para o efeito da nova apreciação, no prazo de 30 dias, da proposta de lei n.º 5/IV.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Presidente, formalmente o Sr. Deputado Corregedor da Fonseca tem razão.
Penso, no entanto, que ganharíamos todos, e a celeridade dos trabalhos connosco, se a proposta pudesse já ser objecto de votação hoje. Isto, como é óbvio, só é possível se houver consenso.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado Corregedor da Fonseca.

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1280 I SÉRIE-NÚMERO 37

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Não damos consenso Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados não havendo mais nada a tratar por hoje tenho apenas que indicar lhes que a ordem de trabalhos do dia de amanha cuja sessão começa às 10 horas é o prosseguimento aã ordem de trabalhos agendada para hoje.
Srs. Deputados está encerrada a sessão.

Eram 20 horas e 25 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social Democrata (PPD/PSD):

Adérito Manuel Soares Campos.
Álvaro Barros Marques de Figueiredo.
Amândio Santa Crus Basto Oliveira.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Manuel Lopes Tavares.
Cândido Alberto Alencastre Pereira.
Carlos Miguel Maximiano Almeida Coelho.
Cristo ao Guerreiro Norte.
Dinah Serrão Alhandra.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Francisco Mendes Costa.
João José Pedreira de Matos.
Joaquim Eduardo Gomes.
José Assunção Marques.
José Guilherme Coelho dos Reis.
José Luís Bonifácio Ramos.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
José Vargas Bulcão.
Licínio Moreira da Silva.
Luís Manuel Neves Rodrigues.
Manuel da Costa Andrade.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Rui Manuel de Oliveira Costa.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.

Partido Socialista (PS)

Alberto Manuel Avelino.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Manuel de Oliveira Guterres.
Armando dos Santos Lopes.
Carlos Alberto Raposo Santana Maia.
Carlos Montez Melancia.
Helena Torres Marques.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Jaime José Matos da Gama.
José Apolinário Nunes Portada.
José Barbosa Mota.
José Carlos Pinto B Mota Torres.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Rui Fernando Pereira Mateus.

Partido Renovador Democrático (PRD)

Agostinho Correia de Sousa Eurico Lemos Pires.
Maria da Glória Padrão Carvalho.
Vasco da Gama Lopes Fernandes.

Partido Comunista Português (PCP)

António Anselmo Aníbal.
António Dias Lourenço da Silva.
António Manuel da Silva Osório.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Joaquim Gomes dos Santos.
José Manuel dos Santos Magalhães.
José Rodrigues Vitoriano.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Mana Odete dos Santos.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.
Rogério Paulo Sardinha de S. Moreira.

Centro Democrático Social (CDS)

António José Tomás Gomes de Pinho.
Eugénio Nunes Anacoreta Correia.
Henrique José Pereira de Moraes.
Henrique Manuel Soares Cruz.
José Augusto Gama.
José Luís Nogueira de Brito.
José Miguel Nunes Anacoreta Correia.
Manuel Eugénio Cavaleiro Brandão.
Manuel Tomás Rodrigues Queiró.
Pedro José Del Negro Feist.
Manuel Fernando Silva Monteiro.

Deputados independentes:

Maria Amélia Mota Santos (Os Verdes)

Faltaram a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social Democrata (PPD/PSD)

Jaime Carlos Marta Soares.
José Mendes Melo Alves.

Partido Socialista (PS):

Alfredo José Somera Simões Barroso.
Carlos Manuel N. Costa Candal.
José Manuel Torres Couto.
Teófilo Carvalho dos Santos.

Partido Renovador Democrático (PRD)

José Maria Vieira Dias de Carvalho.
Victor Manuel Ávila da Silva.

Partido Comunista Português (PCP)

Carlos Alfredo de Brito Domingos Abrantes Ferreira.

Centro Democrático Social (CDS)

Adriano José Alves Moreira.
Francisco António Oliveira Teixeira.
João da Silva Mendes Morgado.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE)

José Manuel do Carmo Tengarrinha.

Deputados independentes

Gonçalo Pereira Ribeiro Teles (PPM)

Declaração de voto enviada para publicação
sobre a proposta de lei n.º 5/IV.

Votei contra o envio para comissão da proposta de lei do Governo n.º 5/IV (concessão de um canal de televisão à Igreja Católica) por considerar que esta decisão não foi tomada pelos méritos da questão nem por

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28 DE FEVEREIRO DE 1986 1281

necessidades processuais, mas apenas porque o adiamento foi julgado oportuno em função de necessidades políticas de natureza mais vasta.
Ao abster-me na votação dos projectos relativos à comunicação social e preparando-me para me abster no caso da proposta n.º 5/IV, entendo desta maneira não tomar parte no que considero ser um medíocre processo legislativo, desenvolvido assim por causa de uma iniciativa negativa do Governo e por causa da inexistência de reais projectos alternativos e inovadores por parte dos partidos parlamentares.
Pretender manter o monopólio estatal da televisão é tão negativo e tão sectário quanto fazer uma falsa abertura. A concessão, em exclusivo, de um canal à Igreja Católica não constitui real abertura nem real modernização. E não se pode sequer invocar a concorrência, como faz o Governo, quando o concorrente é escolhido e lhe é garantida a exclusividade.
Precisamos, isso sim, de um regime legal global e moderno que consagre, proteja e desenvolva simultaneamente a liberdade de informar e de ser informado;
a liberdade de produzir e consumir informações e comunicações; a seriedade e a responsabilidade das empresas de comunicação social, públicas ou privadas; a independência e a isenção da actividade dos meios e dos profissionais de informação; a diversidade e o pluralismo dentro das empresas estatais de comunicação social; e finalmente o estabelecimento de critérios gerais públicos e conhecidos que presidam ao licenciamento de empresas de comunicação social (em particular de rádio e de televisão) ou a que o Parlamento e o Governo tenham de se submeter, no futuro, para as suas decisões relativas à concessão de exploração.
Os recentes debates parlamentares, as propostas de lei e o projecto de lei que discutimos esta semana não satisfazem este conjunto de exigências. Em particular, a oposição entre «monopólio de Estado» e «duopólio Estado-Igreja Católica» é infeliz, redutora e geradora de conflitos no futuro.
O Deputado do PS, António Barreto.

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PREÇO DESTE NÚMERO 217$00

Depósito legal n. º 8818/85

IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA, E. P.

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