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3980 I SÉRIE - NÚMERO 102

Compreender-se-á por isso que me detenha apenas sobre aquelas disposições que, mais significativamente, traduzem as opções fundamentais do diploma que nos é proposto pelo Governo. Aquelas que mais directamente interferem com a estabilidade do arrendamento e com o regime de realização e indemnização das benfeitorias e que, por isso mesmo, mais claramente traduzem a natureza da opção assumida no conflito direito de propriedade/direito de exploração e que mais evidentes e imediatas consequências têm no plano social e económico.
No que aos prazos e, portanto, à estabilidade da exploração arrendada, respeita, o leitor menos atento poderá ser levado a pensar que, para o arrendamento em geral, a proposta de lei introduz um regime novo, em que a duração do contrato é significativamente alargada (já que o prazo inicial passa de seis para dez anos).
Vou saltar para a apreciação de outro ponto, porque o próprio Sr. Ministro da Agricultura, Alimentação e Pescas já aqui nos disse que, tendo em conta a prorrogação automática, prevista na actual legislação, esta alteração não tem um grande significado prático e real e corresponde, no fundo, a manter a situação actual inalterada ou quase.
Acresce que a duração real dos contratos e, por consequência, a estabilidade do arrendamento, não pode ser medida apenas pelos prazos que a lei inicialmente lhes fixa. Tem de ser avaliada também pelas condições em que a denúncia e a renovação dos contratos podem ter lugar. E é aqui que tem de ser apreciado o significado real de, também em relação ao agricultor autónomo, aparentemente nada se ter alterado, mantendo-se as condições iniciais, isto é, contratos de duração anual, renováveis por iguais períodos de um ano sem uma oposição de principio em relação às primeiras cinco renovações.
Quando, porém, passamos a analisar as condições em que a denúncia e a renovação do contrato se podem verificar, constatamos que a situação se altera radicalmente e que a instabilidade do arrendamento é profundamente agravada em relação ao pequeno cultivador autónomo, que é aquele que, ao fim e ao cabo, carece de protecção mais clara e evidente. Ponderadas que sejam estas condições -e vamos ver o que realmente se passa -, concluíamos, como dizia, que a instabilidade se agrava.
Nos termos de legislação em vigor em relação ao agricultor autónomo, o contrato não pode ser denunciado - vou-me ater apenas aos exemplos mais flagrantes - sem que o senhorio invoque a necessidade de reocupar a terra para a explorar directamente e, mesmo nessas condições, o rendeiro pode opor-se ao despejo, desde que invoque que da permanência na terra depende a sua subsistência económica ou a do seu agregado familiar ou que no prédio arrendado tem habitação e que o termo do contrato de arrendamento o poderia colocar em grave risco de não encontrar outra habitação.
Nesta proposta de alteração apresentada pelo Governo, esta situação é pura e simplesmente anulada e, a partir do momento em que o proprietário pretende denunciar o contrato, o rendeiro não pode reivindicar nenhuma destas condições. Reivindicando a existência destas condições, em certos casos, não obstante esta oposição, o senhorio poderia recuperar as terras, mas tinha de provar em juízo que, em termos relativos situação que se criava era mais gravosa para ele senhorio, do que para o rendeiro.
E altera-se, igualmente o regime processual. É que a lei actual competia ao senhorio obter judicialmente o dês! pejo quando, invocando os termos da lei, o rendeiro a ele se opusesse, enquanto agora compete ao rendeiro ao pequeno agricultor autónomo - e temos de ter a noção do significado desta situação - interpor uma acção judicial para fazer valer os seus direitos e não basta a simples notificação do senhorio de que as condições eram preenchidas. Portanto, toda a situação se inverte.
O agricultor só pode opor-se ao despejo quando o prédio se destine a ser arrendado e quando aquele responda a três condições fundamentais que têm de se verificar cumulativamente: que vive exclusiva ou predominantemente da actividade agrícola, que a efectivação da denúncia põe em risco a sua situação económica e que a exploração agrícola do prédio obedece aos parâmetros previstos na legislação sobre os níveis mínimos de aproveitamento do solo.
Até estaríamos de acordo. Mas exigir do rendeiro o respeito pelos níveis mínimos de aproveitamento do solo já não é um factor de instabilidade, da tal instabilidade que justificava, da parte do Sr. Ministro, o não cumprimento da lei de níveis mínimos de produtividade? E pena que o Sr. Ministro aqui não esteja para nos explicar.
Diga-se ainda que na lei actual já se prevê que o senhorio emigrante possa recuperar a sua propriedade, preterindo-se as renovações automáticas previstas na lei só que, também ai, a situação se agrava, porque a Lei n.º 76/79, previa que, em todo o caso, em relação ao agricultor autónomo a primeira renovação de contrato nunca caducaria. Isto é, a lei previa que o senhorio não podia opor-se à primeira renovação. Agora, pode opor-se, de imediato, à renovação do contrato.
Não me quero prolongar demasiado e julgo que o que fica dito é o suficiente para mostrar a extensão e o significado das alterações introduzidas no regime de duração real do contrato.
Mas se este novo regime agrava a instabilidade dos arrendamentos aquele que se propõe para as benfeitorias conduzirá inevitavelmente os rendeiros a renunciar a qualquer esforço de investimento.
Actualmente há sempre lugar a indemnização do rendeiro pelas benfeitorias que haja efectuado com consentimento do senhorio ou suprimento nos termos da lei, quaisquer que sejam as condições em que cesse o contrato. Indemnização calculada pelo valor da benfeitoria no momento da cessação do contrato.
A proposta de lei vem-nos dizer que só reconhece o direito a indemnização em duas condições. Primeira, quando houver cessação do contrato por acordo mútuo entre as panes, situação em que o rendeiro terá direito à indemnização das benfeitorias expressamente consentidas pelo senhorio e não aquelas cuja construção tenha sido feita ao abrigo do suprimento judicial ou quando a resolução do contrato decorra da aplicação do artigo 20.º, que é aquele que define as condições em que, por exploração menos correcta ou por desrespeito das normas contratuais, o senhorio pode obter a resolução do contrato em relação ao rendeiro, caso em que as benfeitorias serão indemnizadas, mas segundo as regras do enriquecimento sem causa, isto é, não pelo valor no termo da cessação do contrato, mas pelo valor de custo.

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