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2596 I SÉRIE - NÚMERO 65

espectáculo em si mesmo redutor. É antes a substância ou a envolvente decisiva com que os povos se unem, os consensos nacionais se estabelecem, os dinamismos sociais se fortalecem para as grandes tarefas nacionais.
E esta não é uma questão de somenos no Portugal de hoje. Não haverá progresso nem dinamismo nacional assumido sem cultura democrática, à sua revelia ou contra ela.
Não haverá modernização sem justiça nem solidariedade.
Mas não haverá nenhuma delas sem que as energias nacionais para o progresso se mobilizem num quadro cultural democrático, em que a diversidade é uma riqueza insubstituível e o unanimismo, porque medíocre, uma doença mortal contra a Nação e o seu povo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Perante este corpo de valores, Sr. Primeiro-Ministro, V. Ex.ª reprovou, diria mesmo que prescreveu.
Acentuo que o digo com todo o respeito, que é em mim uma norma habitual de comportamento.
A questão não merecia referência especial se V. Ex.ª fosse uma pessoa qualquer. Sucede que V. Ex.ª tem sido o Primeiro-Ministro de Portugal, do Portugal democrático saído do 25 de Abril, erigido, com tanto suor, lágrimas, contradições e dificuldades, após décadas de autoritarismo e de silêncios.

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Muito bem!

O Orador: - V. Ex.ª, no seu comportamento e no seu discurso, utiliza o populismo demagógico como fonte de legitimidade política; pretende que a sua verdade seja sinónimo do interesse nacional; concebe o diálogo, que não pratica, como uma propaganda de sentido único; V. Ex.ª não sabe que a busca esforçada de consensos ou a resolução de conflitos pela síntese possível e necessária é quase sempre a única saída disponível em democracia.
V. Ex.ª equipara o funcionamento normal dos partidos democráticos, mediadores que são na instância política de anseios nacionais multiformes, a «jogadas» desprezíveis ou, o que é pior, a instrumentos de chantagem ou de prossecução de fins inconfessáveis perante os detentores da verdade, que seriam V. Ex.ª e o seu Governo.
V. Ex.ª quer - não faz mesmo outra coisa - dividir os Portugueses entre os bons e os maus, sendo os primeiros o seu Governo e os seus respeitosos seguidores e sendo os últimos todos aqueles que têm a veleidade - pasme-se - de se interrogar, de criticar, de propor alternativas, de aspirar a uma justiça de sentido múltipo, de pretender afinal o aprofundamento e a vivência democráticos.
V. Ex.ª, com ressonâncias profético-messiânicas, apela ao povo contra a Assembleia da República, como se a sua legitimidade não lhe viesse também desta, como se o Parlamento democrático não constituísse a essência da representação nacional, afinal do povo que temos. V. Ex.ª põe em causa a legitimidade desta Assembleia, sem com isto perceber - o que é sintomático - que está a fazer o mais grave ataque aos próprios fundamentos do regime que V. Ex.ª é suposto defender.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - V. Ex.ª confunde exercício do poder com arrogância, V. Ex.ª assimila o normal funcionamento dos direitos parlamentares, essenciais na nossa vida colectiva, i sinistras prerrogativas com ínvias motivações; V. Ex.ª equipara o patriotismo a si próprio, como se precisássemos de voltar atrás para lhe relembrar que, afinal, somos todos portugueses e que em circunstâncias difíceis muitos sofreram por isso e o não esquecem. Não o esquecem mas também o não reivindicam! V. Ex.ª, não se dá conta que a Nação é plural e o povo é democrático, quer progresso e justiça, mas não quer salvadores.

Vozes do PS e do MDP/CDE: - Muito bem!

O Orador: - Em democracia, V. Ex.ª não é o Estado. O Estado e o Governo são formas institucionais de organização do povo. Querer estar acima do Estado ou fora dele é estar fora ou acima do povo.
É isto, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, que não lhe consentiremos. Por todas as razões. Mas também porque não vemos possível que desse modo, a partir dessa base, se avance para o progresso, para a justiça e para a modernização num quadro democrático, único que permite a durabilidade do propósito e a coesão da Nação que temos. Poder democrático e arrogância são sempre incompatíveis.
Agora a questão política.
Este Governo leve sempre da democracia uma noção sumária e redutora. Teve sempre a maior dificuldade em entender que a oposição existe legitimamente para se opor.
Em vez de governar como lhe cumpria, ocupou-se muito mais em fazer oposição à legítima oposição parlamentar.

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Muito bem!

O Orador: - Apanhou a boleia de uma conjuntura económica externa invulgarmente favorável, se não mesmo - e isso é que é grave - irrepetidamente favorável, e passou o teu pó a subaproveitá-la. A sua obsessão, o seu passatempo e o seu objectivo foram o de fazer a guerra ao Parlamento, por ver nele um crítico e um obstáculo. Fez-lhe guerra pela simples razão, em si mesma normalíssima, de o Parlamento não abdicar de cumprir o que é o seu dever em qualquer regime democrático.

Uma voz do PS: - Muito bem!

O Orador: - Este governo quis afinal realizar um compromisso, em o mesmo impossível, entre a valorização de um governo de um só partido, pela via do relacionamento com um Parlamento que se desejou silenciar e pela guerra institucional que aquele sistematicamente lhe moveu.
Não conseguiu nem uma coisa nem outra.
À notória incapacidade que demonstrou para o relacionamento democrático constitucional com o Parlamento - em si mesmo potencial geradora de uma pré-rotura - somaram-se quer o desaproveitamento da conjuntura para a modernização pela via das reformas estruturais quer a clara impossibilidade de mobilizar os Portugueses para elas.
O real objectivo do governo do PSD - cada vez mais claro e óbvio - não era exactamente o de governar pela via da escolha das opções viradas para o