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I Série - Número 73

Quarta-feira, 29 de Abril de 1987

PORTE PAGO

DIÁRIO da Assembleia da República

IV LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1986-1987)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 28 DE ABRIL DE 1987

Presidente: Exmo. Sr. Fernando Monteiro do Amaral

Secretários: Exmos. Srs.

Daniel Abílio Ferreira Bastos
Carlos Manuel Luís Rui de Sá e Cunha
José Manuel Mata Nunes de Almeida

SUMÁRIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão eram 15 horas e 35 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta do expediente, dos requerimentos, das respostas a alguns outros e dos diplomas entrados na Mesa.
Em declaração política, o Sr. Deputado Carlos Brito (PCP) referiu-se à crise política e criticou alguma imprensa pela forma como tem noticiado os acontecimentos. No final, respondeu a protestos do Sr. Deputado António Capucho (PSD) e a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Gomes de Pinho (CDS).
Igualmente, em declaração política, o Sr. Deputado Lopes Cardoso (PS) aludiu também à crise, ao processo como se desenvolveu e à posição do PS. No fim, respondeu a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado José Carlos Vasconcelos (PRD).
O Sr. Deputado Coruja Lopes (PRD) verberou o Governo e a Associação Portuguesa de Bancos pela elaboração de um diploma que visa a integração dos novos trabalhadores admitidos nas instituições de crédito subscritoras do ACT do sector no regime geral da Segurança Social
O Sr. Deputado Henrique de Moraes (CDS) recordou a aprovação, em 1981, do Planeamento Museológico, congratulou-se pela escolha do Museu de Alberto Sampaio, em Guimarães, para coordenador dos distritos de Viana do Castelo e Braga e alertou para um erro que esteve na base da classificação do Palácio Vaiada, em Lisboa, como imóvel de interesse público.
O Sr. Deputado Rui Silva (PRD) teceu críticas ao Governo por nada fazer no sentido de salvaguardar e promover a genuinidade e qualidade do artesanato português.

O Sr. Deputado António Marques (PRD) caracterizou socio-economicamente o distrito de Lema.

Ordem do dia. - Foi aprovado um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos relativo à substituição de um deputado do PS.

Após apreciação do Relatório da Comissão Eventual de Inquérito ao Acidente de Camarote, foi aprovado, na generalidade, na especialidade e em votação final global, o projecto de resolução n.º 40/IV, sobre a publicidade dos autos constantes do relatório. Intervieram no debate, a diverso título, os Srs. Deputados Armando Lopes (PS), Correia Afonso e José Luís Ramos (PSD), Correia Azevedo (PRD), Horácio Marçal (CDS), João Salgado e Dinah Alhandra (PSD), José Magalhães (PCP), Cecília Catarina (PSD) e Henrique de Moraes (CDS).
Foi aprovado, na generalidade, na especialidade e em votação final global, o texto alternativo aos projectos de lei n.ºs 381/IV, 385/IV e 386/IV, relativos à intervenção da Assembleia da República em matérias respeitantes à participação de Portugal na CEE.
Foi aprovado, na generalidade, na especialidade e em votação final global, o projecto de lei n.º 326/IV (PCP), acerca de medidas de emergência sobre o ensino-aprendizagem do Português.
Procedeu-se à aprovação, em votação final global, das propostas de lei n.01 26/IV (Lei de Segurança Interna) e 14/IV (Lei do Serviço Militar) e da lei de alteração ao Decreto-Lei n.º 358/86, de 27 de Outubro - ratificações n. ºs 109/IV (PS), 111/IV (PCP) e 114/IV (PRD) - (alienação de quotas e acções do Estado em empresas de comunicação social).
Foram também aprovados, em votação final global, os textos alternativos aos projectos de lei n.ºs 405/IV, 409/IV, 411/IV, 413/IV e 414/IV (Eleição de Deputados ao Parlamento Europeu), aos projectos de lei n.º 171/IV, 400/IV, 401/IV e 404/IV (Dia do Estudante), aos projectos de lei n.º 61/IV, 88/IV, 89/IV, 149/IV, 150/IV, 151/IV e 153/IV (Enquadramento Legal das Associações de Estudantes) e aos projectos de lei n.º 49/IV, 92/IV e 94/IV (Revisão da Lei do Enquadramento do Orçamento do Estado).
Aprovou-se, igualmente em votação final global, o projecto de lei n.º 343/IV (Extinção da enfiteuse ou aforamento), a lei de alteração ao Decreto-Lei n.º 293-A/86, de 12 de Setembro - ratificações n.ºs 95/IV, 96/IV e 97/IV - (cria a sociedade anónima de responsabilidade limitada com a designação de SILOPOR) e o texto alternativo aos projectos de lei n.º 377/IV e 384/IV (crimes dos titulares dos cargos políticos, penas e respectivos efeitos).
Foram ainda aprovados, na generalidade, na especialidade e em votação final global, o projecto de lei n.º 426/IV (na versão subscrita por todos os partidos) (altera a data de entrada em vigor do Código de Processo Penal) e o projecto de lei n.º 168/IV (direito à contagem, para efeitos de aposentação, do tempo em que os trabalhadores dos CTT contratados para além do quadro permaneceram em regime de disponibilidade, em serviço - (alteração ao Decreto-Lei n.º 150/83, de 26 de Abril).
Por último, a Assembleia aprovou em votação final global o texto alternativo ao projecto de lei n.º 112/IV (transmissão pela rádio e pela televisão de produções dramáticas portuguesas).
Entretanto, procedera-se à eleição de um membro para o Conselho de Comunicação Social; de membros suplentes da Delegação da Assembleia da República na Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa; à aprovação de um relatório e parecer da Comis-

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são de Regimento e Mandatos autorizando diversos Srs. Deputados a serem ouvidos em tribunal, e à aprovação dos n.ºs 33 e 34 do Diário.
Após o anúncio dos diplomas entrados na Mesa durante a sessão, o Sr. Presidente encerrou-a eram 22 horas e 5 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 35 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Abílio Mesquita Araújo Guedes.
Adérito Manuel Soares Campos.
Alberto Monteiro Araújo.
Álvaro Barros Marques de Figueiredo.
Amadeu Vasconcelos Matias.
António Augusto Ramos.
António d'Orey Capucho.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Arlindo da Silva André Moreira.
Arnaldo Angelo de Brito Lhamas.
Aurora Margarida Borges de Carvalho.
Belarmino Henriques Correia.
Cândido Alberto Alencastre Pereira.
Carlos Alberto Pinto.
Cecília Pita Catarino.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Dinah Serrão Alhandra.
Domingos Duarte Lima.
Domingos Silva e Sousa.
Fernando Barata Rocha.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando José R. Roque Correia Afonso.
Fernando Manuel Cardoso Ferreira.
Fernando Monteiro do Amaral.
Francisco Hermínio Pires dos Santos.
Francisco Jardim Ramos.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Henrique Rodrigues Mata.
Jaime Carlos Marta Soares.
João Álvaro Poças Santos.
João Domingos Abreu Salgado.
João Luís Malato Correia.
João José Pedreira de Matos.
João Manuel Nunes do Valle.
João Maria Ferreira Teixeira.
Joaquim Carneiro de Barros Domingues.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim da Silva Martins.
José de Almeida Cesário.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Francisco Amaral.
José Guilherme Coelho dos Reis.
José Júlio Vieira Mesquita.
José Luís Bonifácio Ramos.
José Maria Peixoto Coutinho.
José Mendes Melo Alves.
José de Vargas Bulcão.
Licínio Moreira da Silva.
Luís António Martins.
Luís Jorge Cabral Tavares Lima.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Fereira Martins.
Manuel Maia Moreira.
Maria Antonieta Cardoso Moniz.
Maria João Godinho Antunes.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Miguel Ferrando Miranda Relvas.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete.
Valdemar Cardoso Alves.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Vítor Pereira Crespo.

Partido Socialista (PS):

Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Aloísio Fernando Macedo Fonseca.
Américo Albino Silva Salteiro.
António de Almeida Santos.
António Cândido Miranda Macedo.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Domingues Azevedo.
António Frederico Vieira de Moura.
António Manuel Azevedo Gomes.
António Miguel de Morais Barreto.
António José Sanches Esteves.
António Magalhães Silva.
António Manuel de Oliveira Guterres.
António Peppe Lopes Cardoso.
Armando António Martins Vara.
Armando dos Santos Lopes.
Carlos Alberto Raposo Santana Maia.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Luís.
Carlos Manuel G. Pereira Pinto.
Fernando Henriques Lopes.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
Helena Torres Marques.
Jaime José Matos da Gama.
João Cardona Gomes Cravinho.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
Jorge Lacão Costa.
José Apolinário Nunes Portada.
José Augusto Fillol Guimarães.
José Barbosa Mota.
José Luís do Amaral Nunes.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José dos Santos Gonçalves Frazão.
Leonel de Sousa Fadigas.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Alberto Tito de Morais.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cárdia.
Raul da Assunção Pimenta Rego.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Victor Hugo de Jesus Sequeira.
Victor Manuel Caio Roque.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Agostinho Correia de Sousa.
Alexandre Manuel da Fonseca Leite.
Ana da Graça Gonçalves Antunes.

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António Alves Marques Júnior.
António Eduardo de Sousa Pereira.
António João Percheiro dos Santos.
António Lopes Marques.
António Maria Paulouro.
Arménio Ramos de Carvalho.
Carlos Alberto Narciso Martins.
Carlos Alberto Rodrigues Matias.
Carlos Artur Trindade Sá Furtado.
Carlos Joaquim de Carvalho Ganopa.
Fernando Dias de Carvalho.
Francisco Barbosa da Costa.
Hermínio Paiva Fernandes Maninho.
Ivo Jorge de Almeida dos Santos Pinho.
Jaime Manuel Coutinho da Silva Ramos.
João Barros Madeira.
Joaquim Jorge Magalhães Mota.
José Carlos Torres Matos de Vasconcelos.
José Carlos Pereira Lilaia.
José Emanuel Corujo Lopes.
José Fernando Pinho da Silva.
José Luís Correia de Azevedo.
José da Silva Lopes.
José Torcado Dias Ferreira.
Manuel Ferreira Coelho.
Maria Cristina Albuquerque.
Maria da Glória Padrão Carvalho.
Paulo Manuel Quintão Guedes de Campos.
Roberto de Sousa Rocha Amaral.
Rui José dos Santos Silva.
Rui de Sá e Cunha.
Tiago Carneiro Rodrigues Bastos.
Vasco da Gama Lopes Fernandes.
Vasco Pinto da Silva Marques.
Vitorino da Silva Costa.
Victor Manuel Ávila da Silva.
Victor Manuel Lopes Vieira.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António Manuel da Silva Osório.
António Vidigal Amaro.
Belchior Alves Pereira.
Bento Aniceto Calado.
Carlos Alfredo de Brito.
Carlos Campos Rodrigues Costa.
Carlos Manafaia.
Cláudio José Santos Percheiro.
Custódio Jacinto Gingão.
Domingos Abrantes Ferreira.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
José António Gonçalves do Amaral.
João Carlos Abrantes.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
José Estêvão Correia da Cruz.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Santos Magalhães.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Rodrigues Vitoriano.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Maria Ilda da Costa Figueiredo.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.
Rogério Paulo Sardinha de S. Moreira.
Zita Maria de Seabra Roseira.

Centro Democrático Social (CDS):

Adriano José Alves Moreira.
António Filipe Neiva Correia.
António José Tomás Gomes de Pinho.
Carlos Eduardo Oliveira e Sousa.
Francisco António Oliveira Teixeira.
Henrique José Pereira de Moraes.
Henrique Manuel Soares Cruz.
Hernâni Torres Moutinho.
Horácio Alves Marcai.
João Gomes de Abreu Lima.
Joaquim Rocha dos Santos.
José Miguel Nunes Anacoreta Correia.
Manuel Afonso Almeida Pinto.
Manuel Eugénio Cavaleiro Brandão.
Manuel Tomás Rodrigues Queiró.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

João Cerveira Corregedor da Fonseca.
João Manuel Caniço Seiça Neves.
José Manuel do Carmo Tengarrinha.

Deputados independentes:

Gonçalo Pereira Ribeiro Teles.
Maria Amélia Mota Santos.
António José Borges de Carvalho.
Rui Manuel Oliveira Costa.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à leitura do expediente.

Deu-se conta do seguinte:

Expediente

Petições

N.º 126/IV - Movimento Democrático das Mulheres dos Distritos de Lisboa e Setúbal, expondo a situação das mulheres e apelando para que se altere, transforme e melhore o seu quotidiano de mulheres, cidadãs e trabalhadoras. Encontra-se distribuída à 2.ª e 12.ª Comissões.
N.º 127/IV - Abílio Martins Tavares e outros, residentes em Lisboa, expondo a situação do prédio habitado designado «antigo hospício de S. Bernardo», solicitando que seja sustada a sua venda e que lhe sejam feitas beneficiações ou concedidas habitações de renda acessível. Encontra-se distribuída à 1.º e 9.ª Comissões.
N.º 128/IV - Comissão de Trabalhadores da EPAC, com sede em Lisboa, solicitando seja esclarecida se existe disposição legal que impossibilite a EPAC de poder participar em concursos públicos para a importação de cereais. Encontra-se distribuída à 1.ª Comissão.
N.º 129/IV - CUMs - Comissão Unitária das Mulheres do Porto, com sede no Porto, exigindo a descida dos preços do leite e do pão, a adopção de medidas para a baixa do custo de vida e a concretização de uma política que conduza à criação de novos postos de trabalho. Encontra-se distribuída à 3.ª Comissão.
N.º 130/IV - Maria Justina Correia e outros, residentes em Lisboa, apelando no sentido de ser corrigido a alteração ao regime de dedicação exclusiva na carreira docente universitária no ensino superior politécnico e de investigação científica. Encontra-se distribuída à 4.ª Comissão.

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N.º 131/IV - Federação Nacional dos Sindicatos da Função Pública e outros, com sede em Lisboa, solicitando no sentido de serem criadas condições que respeitem os direitos e os interesses dos trabalhadores e utentes do sistema de segurança social. Encontra-se distribuída à 2.ª Comissão.

O Sr. Secretário (Daniel Bastos): - Na sessão do dia 23 de Abril de 1987 foram apresentados os seguintes requerimentos: ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Daniel Bastos; à Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas (S), formulados pelo Sr. Deputado Caio Roque; ao Ministério do Plano e da Administração do Território, formulado pelo Sr. Deputado João Abrantes; ao Governo, formulados pelos Srs. Deputados Hermínio Martinho, Magalhães Mota e Álvaro Brasileiro, respectivamente; a diversos ministérios (50), formulados pelo Sr. Deputado Jorge Lemos e outros; ao Ministério da Educação e Cultura, formulado pelo Sr. Deputado Rogério Moreira; ao Ministério do Trabalho e Segurança Social (3), formulados pelos Srs. Deputados João Amaral e Cláudio Percheiro; ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, formulado pelo Sr. Deputado Oliveira e Costa; ao Governo (2), formulados pela Sr.ª Deputada lida Figueiredo; no dia 24 de Abril de 1987, ao Ministério da Indústria e Comércio, formulado pelo Sr. Deputado Ramos de Carvalho; a diversos ministérios (4), formulados pelo Sr. Deputado Armando Fernandes; ao Governo (4), formulados pelo Sr. Deputado Carlos Lilaia; ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, formulado pelo Sr. Deputado Vasco Marques; a diversos ministérios (12), formulados pelo Sr. Deputado Pinho Silva; ao Ministério da Educação e Cultura, formulado pelo Sr. Deputado Oliveira e Costa; ao Governo (4), formulados pelo Sr. Deputado Roleira Marinho e outros; a diversas Secretarias de Estado (2), formulados pelo Sr. Deputado Cláudio Percheiro.
O Governo respondeu a requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: Maria Santos, na sessão de 15 de Julho, e nas sessões de 15 e 27 de Janeiro e 26 de Fevereiro; lida Figueiredo, na sessão de 17 de Fevereiro; Vidigal Amaro, na sessão de 10 de Outubro; Armando Fernandes, nas sessões de 11 de Novembro e 3 de Dezembro; Raul Junqueiro, na sessão de 21 de Novembro; João Abrantes, na sessão de 3 de Dezembro; Sá e Cunha, na sessão de 4 de Dezembro; Corujo Lopes, na sessão de 11 de Dezembro; José Magalhães e Odete Santos, nas sessões de 13 de Fevereiro e 25 de Março; Jorge Lemos e outros, na sessão de 26 de Fevereiro; Sousa Pereira, na sessão de 6 de Março; Carlos Manafaia e José Vitoriano, na sessão de 10 de Março; Correia de Azevedo, na sessão de 19 de Março; José Apolinário, na sessão de 26 de Março.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai anunciar os diplomas que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Daniel Bastos): - Deram entrada na Mesa os projectos de lei n.ºs 422/IV, da iniciativa do Sr. Deputado Cláudio Percheiro e outros, do PCP, sobre o exercício das competências das autarquias abrangidas pela zona de intervenção do Gabinete da Área de Sines, que foi admitido e baixou à 10.ª Comissão; 423/IV, da iniciativa do Sr. Deputado Hermínio Martinho e outros, do PRD - carta do trabalhador voluntário -, que foi admitido e baixou à 3.ª Comissão; 424/IV do Sr. Deputado José Magalhães e outros, do PCP - garante a todos o acesso aos documentos da Administração -, que foi admitido e baixou à 10.ª Comissão; 425/IV, apresentado pelo Sr. Deputado António Guterres, do PS - elevação da vila do Fundão à categoria de cidade -, que foi admitido e baixou à 10.ª Comissão; 426/IV, apresentado pelo Sr. Deputado António Capucho, do PSD - alteração ao Código e Processo Penal -, que foi admitido e baixou à 1.ª Comissão; 427/IV apresentado pelo Sr. Deputado Carlos Pinto e outros, do PSD - elevação da vila do Fundão a cidade -, que foi admitido e baixou à 10.ª Comissão; 428/IV, da iniciativa do Sr. Deputado Horácio Marcai e outro, do CDS - Lei de Bases da Gestão Hospitalar -, que foi admitido e baixou à 2.ª Comissão; 429/IV, da iniciativa dos Srs. Deputados Jorge Patrício e outros, do PCP - criação da freguesia do Vale da Amoreira, no concelho da Moita, distrito de Setúbal -, que foi admitido e baixou à 10.ª Comissão.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, queria pedir a vossa colaboração para o seguinte: vão ter lugar hoje três votações e para que elas se processem sem grandes atropelos e se não vissem nisso inconveniente, poder-se-ia desde já começar com as votações, enquanto decorre o período de antes da ordem do dia.
Se não ha objecções, vamos proceder desse modo. Para tanto, pedia aos Srs. Deputados Roleira Marinho, Caio Roque, Carlos Ganopa e Jorge Patrício o favor de servirem de escrutinadores. As votações que irão ter lugar têm como objectivo a eleição de um membro para o Conselho de Comunicação Social, a eleição de membros para e Conselho da Europa e a aprovação ou rejeição do relatório da Comissão de Regimento e Mandatos sobre pedidos de autorização para que os Srs. Deputados sejam ouvidos como arguidos por infracção de artigo 1.º da Lei n.º 4/83, de 2 de Abril.

O Sr. Amónio Capucho (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito deseja usar da palavra, Sr. Deputado?

O Sr. António Capucho (PSD): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado António Capucho.

O Sr. Amónio Capucho (PSD): - As votações, ou melhor, as linhas estarão abertas até que horas? V. Ex.ª já referiu?

O Sr. Presidente: - Até às 18 horas e 30 minutos, Sr. Deputado.
Penso que os Srs. Deputados já têm na bancada os respectivos votos.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Magalhães Mota, pede a palavra para que efeito?

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O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Penso que antes de ser aberto e iniciado o processo de votação seria indispensável conhecer qual o parecer da Comissão de Regimento e Mandatos sobre o pedido de autorização para que os Srs. Deputados sejam ouvidos, a fim de sabermos aquilo que votamos.

O Sr. Presidente: - Sim, sim, Sr. Deputado. A votação ainda se não iniciou, porque ela começa com a votação da Mesa.
O Sr. Secretário vai ler o relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos que seguidamente será submetido a votação secreta.

O Sr. Secretário (Daniel Bastos): - O relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos é do seguinte teor:

Pelo ofício n.º 3105, de 18 de Dezembro de 1986, do 2.º Juízo do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa - Processo n.º 6406/86, é solicitada autorização para o Sr. Deputado Henrique Rodrigues da Mata ser ouvido como suspeito no processo referenciado.
Pelo ofício n.º 3088, de 16 de Dezembro de 1986, do 2.º Juízo do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa - Processo n.º 6647/86, é solicitada autorização para o Sr. Deputado Joaquim Eduardo Gomes ser interrogado no processo referenciado.
Pelo ofício n.º 993, de 12 de Fevereiro de 1987, do 5.º Juízo do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa - Processo n.º 6642/86, é solicitada autorização para o Sr. Deputado Fernando Henriques Lopes ser ouvido como arguido no processo referenciado.
Pelo ofício n.º 995, de 12 de Fevereiro de 1987, do 5.º Juízo do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa - Processo n.º 6411/86, é solicitada autorização para o Sr. Deputado António Magalhães da Silva ser ouvido como arguido no processo referenciado.
Pelo ofício n.º 3106, de 18 de Dezembro de 1986, do 2.º Juízo do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa - Processo n.º 6415/86, é solicitada autorização para o Sr. Deputado Victor Manuel Lopes Vieira ser interrogado no processo referenciado.
Pelo ofício n.º 2090, de 24 de Novembro de 1986, do 1.º Juízo do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa - Processo n.º 5000/86, foi solicitada autorização para o Sr. Deputado Carlos Manuel Pereira Pinto ser interrogado no processo referenciado.
Todos os Srs. Deputados que ficam referidos foram denunciados por incumprimento do disposto no artigo 1.º da Lei 4/83, de 2 de Abril.
Esta Comissão não vê razões para alterar o entendimento que se contém no parecer que aprovou em sua reunião de 25 de Fevereiro de 1987, o qual mereceu a votação unânime do Plenário da Assembleia da República, e por isso aqui dá por reproduzida a fundamentação aí exposta.
Assim, a Comissão de Regimento e Mandatos da Assembleia da República emite o seguinte parecer:

Devem ser autorizados os Srs. Deputados Henrique Rodrigues da Mata, Joaquim Eduardo Gomes, Fernando Henriques Lopes, António Magalhães da Silva, Victor Manuel Lopes Vieira e Carlos Manuel Pereira Pinto a serem ouvidos como arguidos nos processos contra eles pendentes, e já identificados, em datas que lhes venham a ser designadas.

O Deputado Relator, António Morgues Mendes.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos pois iniciar a votação e, como é regimental, começamos pela Mesa.

Pausa.

Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Já ninguém tem dúvidas sobre o sentido das decisões que o Sr. Presidente da República vai tomar em relação à presente crise governamental. Não restam dúvidas também que esta será a derradeira ou uma das derradeiras reuniões plenárias da presente legislatura.
Permita-se-nos, pois, que aproveitemos esta ocasião para nos pronunciarmos sobre o mais previsível desenvolvimento da crise e sobre o próprio funcionamento da Assembleia da República com a actual composição.
Comecemos pela crise. Comecemos por duas observações.
A primeira, para referir o dom espantoso que alguns jornalistas, especialmente dos órgãos de informação afectos ao Governo, revelaram para adivinhar o pensamento do Sr. Presidente da República.

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - Estava à vista!

O Orador: - Bruxos! - Já alguns lhe chamaram. Na verdade, não se limitaram a adivinhar o sentido geral das elocubrações presidenciais, adivinharam até o momento das decisões e a data das eleições antecipadas. Extraordinário! É com toda esta ciência, que seguramente não provém da bola de cristal, que têm estado a «trabalhar» a opinião pública! Estaremos perante uma manifestação de presidência aberta?
A segunda, para referir as exigências feitas pelo Primeiro-Ministro Cavaco Silva, logo que se apercebeu que o seu Governo ia ser demitido pela aprovação da moção de censura. Eram quatro, lembramos.
Primeira, não formar um novo governo com base no seu partido.
Segunda, não aceitar a formação de um novo governo com base noutros partidos.
Terceira, exigir a realização de eleições gerais antecipadas imediatamente.
Quarta, reivindicar que o seu governo demitido ficasse como governo de gestão.

Uma voz do PSD: - Vitória total!

O Orador: - Neste momento já é possível comparar as exigências feitas com as previsíveis decisões que muito brevemente serão tomadas. A verificarem-se tal

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como se prevê, bem se pode dizer que o figurino adoptado nem se parece com a prática dos regimes parlamentares puros, nem com os regimes semipresidencialistas. Dir-se-ia que estamos em Inglaterra, onde é o Primeiro-Ministro que decide sobre a dissolução das Câmaras e a convocação de eleições gerais e a Rainha de Inglaterra se limita a subscrever tais decisões.
Há que reconhecer que é uma evolução particularmente preocupante e que por certo vai marcar profundamente a próxima campanha eleitoral.
Com efeito, as competências constitucionais do Presidente da República, tudo o indica, serão exercidas tendo apenas em conta as exigências do partido do Governo que tem apenas 88 deputados, ignorando a vontade maioritária da Assembleia da República reiteradamente expressa. Como justamente tem sido sublinhado preparam-se decisões que acabam por punir a Assembleia da República por esta ter feito uso das suas competências constitucionais para condenar e interromper uma política errada que não serve os interresses do País.

Uma voz do PSD: - Muito mal!

O Orador: - Isto é inadmissível e deve encontrar uma resposta clara por pane do eleitorado!

Aplausos do PCP.

Neste momento importa reafirmar que nada justifica a realização de eleições antecipadas, pois existem no actual quadro parlamentar possibilidades reais para se formar um governo dispondo de apoio largamente maioritário. Não se conhece nenhum argumento com mínima credibilidade democrática para justificar que não se tenha ao menos tentado explorar esta possibilidade, uma vez que até surgiu quem se dispussesse fazê-lo.
As condições em que tudo isto aconteceu não poderá deixar de ser outro tema importante da futura campanha eleitoral.
Mas o que é verdadeiramente assombroso é a decisão de convocar eleições mantendo em gestão o Governo demitido que já deu abundantes provas de desrespeito pela legalidade democrática e de abuso do poder na utilização em benefício dos seus objectivos partidários, da comunicação social, dos bens e dos meios do Estado.

O Sr. Licínio Moreira (PSD): - Não apoiado!

O Orador: - A propósito da comunicação social diga-se num parêntesis que não há dia sem que um ministro ou um Secretário de Estado não apareça na sempre solícita RTP a apresentar ou a justificar a sua medidazinha demagógica.
Uma tal gestão é absolutamente inadmissível, para mais em período eleitoral, e a persistir tem de ser vista como podendo adulterar o resultado das eleições.
A luta por condições que garantam uma gestão isenta e rigorosa neste período faz parte da grande batalha eleitoral que, a nosso ver, as forças democráticas devem travar num espírito de convergência em torno de grandes objectivos nacionais com a plena confiança de que está ao seu alcance derrotar a direita e de que há, em Portugal, uma maioria que quer viver em democracia e de acordo com os ideais do 25 de Abril.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Muito bem!

O Orador: - O PCP interveio na presente crise com espírito construtivo, disponibilidade para encontrar soluções e grande serenidade.
Fizemos tudo para viabilizar a formação de um Governo no presente quadro parlamentar, porque entendemos que é a solução que mais convém ao País e ao regime democrático. É exactamente com o mesmo espírito que iremos travar a batalha eleitoral com plena confiança no veredicto do nosso povo.
Levamos do trabalho da Assembleia da República que vai ser dissolvida o sentimento de uma experiência importante. Foi sem dúvida uma das mais notáveis legislaturas do período posterior ao 25 de Abril. Julgamos justo enaltecer a forma correcta e firme como a Assembleia da República, num clima de grande incompreensão que se mantém até ao fim, soube assumir as suas competências, tanto legislativas como fiscalizadoras. lista Assembleia cai porque aprovou uma moção de censura ao Governo. Ficará na história!
Nós, os deputados comunistas, temos consciência de ter dado um contributo importante para o bom funcionamento da Assembleia da República e para as respostas mais positivas dadas por este órgão de soberania aos problemas do nosso povo e do nosso país. Por isso, no termo antecipado da legislatura o podemos dizer com pleno à-vontade: honrámos o mandato dos portugueses que nos elegeram!

Aplausos Co PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, convoco os representantes de todos os grupos parlamentares para uma reunião no meu gabinete, dentro de 10 minutos, a fim de realizar me is uma conferência sobre o agendamento dos muitos diplomas que aguardam votação final global.

Sr. Deputado António Capucho, pediu a palavra para que efeito?

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, é para protesta- relativamente à intervenção do Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Deputado Carlos Brito deixe que lhe diga que os slogans e as linhas de foiça do Partido Comunista Português que V. Ex.ª acata de enunciar para a próxima campanha eleitoral não indiciam, de facto, grandes perspectivas eleitorais paia os comunistas no nosso país. Se se tratasse de outro partido, e apesar de tudo, não me coibiria de lhe desejar felicidades; tratando-se do Partido Comunista, ião o posso fazer porque seria contrário aos interesses nacionais.

Aplausos do PSD

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Gomes de Pinho, pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, é para formular um pedido de esclarecimento.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado.

O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Deputado Carlos Brito, a intervenção de V. Ex.ª suscita-me algumas breves questões que gostaria de lhe pôr.

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A primeira é a de saber se o Sr. Deputado considera que o Sr. Presidente da República tem ou não legitimidade para dissolver a Assembleia. Isto é, se estão ou não reunidas as condições constitucionais que permitem ao Sr. Presidente da República o exercício desse poder.
Em segundo lugar, permito-me interrogá-lo sobre quais as razões que levam o Partido Comunista a ser, ainda hoje, nesta Câmara, o último defensor da solução de nomeação de um governo no actual quadro parlamentar, partido este que tem sido tão lesto em promover o derrube de governos, em reivindicar eleições, em afirmar que a vontade popular e o recurso a esta são uma condição fundamental do funcionamento da democracia portuguesa e da defesa das conquistas da revolução. Assim, o que leva o Partido Comunista a inverter esta tradição, esta lógica, este raciocínio e, por todos os meios que estiveram ao seu alcance, alguns quase inapropriados, diria eu, a vir opor-se a que a crise tivesse este desfecho?
Em terceiro lugar, o Sr. Deputado Carlos Brito voltou a referir com insistência que, no quadro da actual composição parlamentar, há condições para a formação de um governo alternativo ao actual? Isto suscita--me a terceira pergunta: que garantias recebeu o Partido Comunista, designadamente do Partido Socialista e do Partido Renovador Democrático (suponho que do MDP/CDE ainda não será necessário obtê-las), para poder fazer essa afirmação? Isto é, será que o Partido Comunista tem a garantia de que um governo formado por qualquer dos partidos que actualmente compõem a chamada maioria de esquerda poderia obter uma maioria parlamentar nesta Câmara? Que garantias tem e de quem?
Sr. Deputado, penso que a resposta a esta pergunta é fundamental, sob pena de a sua intervenção ser, no mínimo, inconsistente, isto para não a adjectivar de uma maneira mais drástica ou mais violenta, que o encerramento para breve desta Legislatura, apesar de tudo, não justificaria.

Aplausos do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, começaria por responder aos pedidos de esclarecimento e, depois, ao protesto do Sr. Deputado António Capucho.
Em relação aos pedidos de esclarecimento, diria que as considerações finais do Sr. Deputado Gomes de Pinho são uma boa desculpa. Portanto, pode perguntar com violência que nós somos pessoas serenas e responder-lhe-íamos com serenidade, mas com a firmeza que nos caracteriza, na defesa da democracia e dos interesses nacionais.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Não temos medo da violência do CDS, como já provámos não ter medo de outras violências muito mais violentas que a do CDS!
Quanto às perguntas, desculpe que lhe diga, mas creio que muitas delas revelam desatenção. Por exemplo, quanto à primeira, é evidente que consideramos que o Sr. Presidente da República tem legitimidade constitucional para dissolver a Assembleia da República e isso está dito textualmente na minha intervenção. Portanto, a sua pergunta está respondida e, naturalmente, não passa pela cabeça do PCP pôr em causa as competências constitucionais do Sr. Presidente da República. Sr. Deputado Gomes de Pinho, por quem nos toma?
Bem, quanto à sua outra afirmação de que somos o último defensor da nomeação de um governo no quadro parlamentar, talvez o Sr. Deputado Gomes de Pinho se tenha precipitado: os nossos trabalhos ainda agora começaram e, portanto, é provável que, ainda hoje, haja intervenções de outros deputados e provavelmente também ainda hoje outros partidos se pronunciarão sobre a crise, sobre a decisão do Sr. Presidente da República. Portanto, não seja apressado, seja sereno! Compreendemos a situação difícil em que o CDS se encontra, acossado pela hegemonia do PSD, mas tenha calma! Enquanto a Assembleia funcionar, tem terreno para poder defender as suas opiniões e expor os seus pontos de vista. Só é pena que não o faça de uma maneira mais franca e mais desabrida, sobretudo no que toca aos vossos vizinhos do lado, não sei se do direito se do esquerdo ...

Risos do PSD e CDS.

O Sr. José Magalhães (PCP): - É melhor não!

O Orador: - Bem, também está respondida a sua outra pergunta sobre o que é que leva o PCP neste momento a colocar aqui a questão da formação de um governo no actual quadro parlamentar. É claro que agora dizemo-lo como uma posição de princípio, como uma reafirmação, pois é evidente que, como decorre da intervenção que produzi, pensamos claramente que essa oportunidade está passada.
Perguntou-me também porque é que defendemos a formação de um tal governo. Também a isso respondi, claramente, na minha intervenção. Repare que fomos de uma grande disponibilidade porquanto admitimos diferentes soluções: um governo de base PS, um de base PRD ou um governo com base nos dois partidos. Não fizemos exigências em relação à nossa participação no Governo. Portanto, com toda esta abertura, o que é que pretendíamos, exactamente, ir ao encontro do interesse nacional e dos do regime democrático, que pensámos que se salvaguardariam nas condições presentes. É claro que não temos isto como uma «tabuada» para todas as situações. Na verdade, a Constituição comporta diferentes soluções para serem adaptadas às condições políticas do momento.
Porém, as presentes condições, parece-nos que a nossa seria a solução mais apropriada, noutras condições até entendemos que seria mais apropriada a dissolução da Assembleia da República e a convocação de eleições legislativas antecipadas e não negamos que o tivéssemos feito no passado. Mas a Constituição comporta um quadro de diferentes soluções e cabe às forças políticas determinarem, em cada momento, qual é a mais conveniente ao interesse nacional.
Assim, creio que respondo à sua última pergunta dizendo que, no quadro presente da Assembleia da República onde, como dizia alguém, é o lugar em que se devem formar e desfazer os governos - certamente tem esta citação na memória -, a maioria das forças representadas se pronunciava pela formação de um governo no actual quadro parlamentar. Sr. Deputado Gomes de Pinho, não me diga que nunca ouviu isto,

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dito, repito, reiterado pela maioria dos partidos com assento na Assembleia da República. Ora, quer melhor garantia do que esta afirmação dos partidos, feita pela boca dos seus representantes? Para mim, essa é a maior de todas as garantias. E é nessa convicção e na disponibilidade que o nosso partido sempre manifestou para viabilizar um governo do tipo e na base que há pouco citei que temos esta profunda convicção que aqui reafirmamos para dizer que era escusada esta dissolução, que é prejudicial para o País e para a democracia portuguesa.

O Sr. Duarte Lima (PSD): - Está enganado!

O Orador: - Em relação ao protesto do Sr. Deputado António Capucho, quero agradecer-lhe: nada melhor para a nossa campanha eleitoral que essa «declaração de guerra» do PSD. Era o que esperávamos, um dos objectivos da nossa declaração política era o de ver o PSD acirrado contra nós!
Sabemos que somos um obstáculo grande à política antidemocrática que o PSD vinha realizando e pensamos que somos um obstáculo grande a uma política do PSD contrária aos interesses dos trabalhadores e da maioria do povo português e a favor de um punhado de portugueses. Sabemos que somos um obstáculo à política do PSD de tirar aos pobres para dar aos ricos e sabemos ser essa a sua posição!

Vozes do PSD: - Pelo contrário!

O Orador: - E, por isso, ficamos satisfeitos e agradecidos com a declaração que acaba de fazer!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Carlos Lage.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No momento em que se aproxima o termo daquilo a que podemos chamar a primeira fase da crise política com o mais que provável anúncio pelo Sr. Presidente da República da dissolução desta Assembleia e consequente realização de eleições antecipadas, vale a pena - ao menos do nosso ponto de vista - relembrar aqui o que foi a posição do Partido Socialista ao longo deste processo.
Muito foi dito já sobre a crise aberta com a moção de censura subscrita pelo PRD, crise tornada inevitável pela arrogância demonstrada pelo Governo, não só durante os meses do seu mandato, como em face da situação criada com a apresentação daquela mesma moção de censura.
Arrogância intolerável em democracia, sejam quais forem as circunstâncias; arrogância intolerável, por maioria de razão, da parte de um governo sufragado por menos de um terço do eleitorado.
A posição do Partido Socialista foi, desde o anúncio da moção de censura, que haveria de conduzir à queda do Governo, uma posição responsável, coerente e assumida sem ambiguidades.
Responsável porque, colocando os méritos da estabilidade governamental acima dos interesses partidários, mas recusando sacrificar a essa estabilidade os valores essenciais da democracia, o Partido Socialista se dispôs, desde lego, a viabilizar a permanência do executivo, garantindo que fosse, através do diálogo, o respeito pelas raras mínimas do funcionamento e do relacionamento democrático, no quadro das instituições.
Coerente porque, tendo o Partido Socialista recusado, desde o inicie, a sua confiança ao governo de Cavaco Silva - enquanto outros iam fazendo da acção desse mesmo governo balanços positivos, que serviam para justificar o apoio que objectivamente lhe concediam - não podia, perante a recusa de qualquer diálogo, tomar outra atitude que não fosse a que tomou: votar a moção de censura.
Sem ambiguidades porque não hesitou em assumir de forma clara e pública, conhecendo embora os imponderável que, do um ponto de vista estritamente eleitoral e partidário, essa posição comportava, a eventualidade de consentir na manutenção do Governo, exigindo, como contrapartida, o compromisso negociado do acatamento de algumas regras indispensáveis à normalização democrática da vida política portuguesa.
À abertura demonstrada pelo Partido Socialista respondeu o Governo com a sobranceria que se conhece, com a arrogância que foi, e continua a ser, timbre do seu comportamento.
Tornada assim inelutável a queda do Governo e aberta a crise política, com responsabilidades que ao Governo cabem e que este não pode enjeitar, o Partido Socialista afirmou-se disponível para procurar, com empenho, uma solução alternativa no actual quadro parlamentar.
Nesse sentido tornou claro ser seu entendimento que uma tal solução era, não apenas desejável, mas possível, e foi mais longe - foi até onde podia ir - assegurando a sua disponibilidade para conduzir as tarefas necessárias à formação de um novo governo, não fugindo a assumir, nesse quadro, as responsabilidades que lhe cabiam.
Fê-lo, antes do mais, e como lhe cumpria, junto do Sr. Presidente da República; fê-lo, depois, perante esta Assembleia e os restantes partidos; fê-lo, finalmente, perante a opinião pública.
Ninguém de boa fé o pode negar; ninguém de boa fé poderá afirmar que o Partido Socialista recusou as obrigações que lhe tocam como maior partido da oposição.
Ao manifestar-se, inequivocamente, disposto a formar governo, o Partido Socialista não o fez porque anseie sê-lo, a qualquer preço, ou em quaisquer circunstâncias.
Não nos moveu nem nos move a ambição do poder, mas o desejo que contribuirmos, de forma positiva, para a solução que, do nosso ponto de vista, era a que melhor servir a os interesses do País.

Uma voz do PS: - Muito bem!

O Orador: - Existem soluções para a crise no actual quadro parlamentar e o Partido Socialista entende que se não deve, nem pode, aceitar como inelutável que, quando se não garante a existência de governos de legislatura, se vá paulatinamente aceitando o princípio das «legislaturas cê governo» (para usar a fórmula feliz do Dr. João Jardim).
A dissolução da Assembleia da República haverá sempre de constituir um acto de excepção, justificável em circunstâncias extremas, esgotadas que tenham sido as outras soluções possíveis no quadro constitucional.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Muito bem!

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O Orador: - Mas - e importa que também aqui não fique lugar onde caibam dúvidas - ao afirmar a sua disponibilidade para formar governo, o Partido Socialista não esqueceu - porque é esse o modo como emende o funcionamento dos nossos mecanismos constitucionais - que é ao Presidente da República que, na actual conjuntura, cabe a primeira palavra - a palavra decisiva - no apontar dos caminhos que devem conduzir à solução da crise.
Não podia esperar-se, nem exigir-se, por isso, do Partido Socialista diligências para as quais não estivesse mandatado.
Não há governos de iniciativa parlamentar sobre os quais o Presidente da República se deva pronunciar a posteriori: a iniciativa cabe, constitucionalmente, ao Presidente da República; à Assembleia da República compete a aprovação ou rejeição dos governos gerados a partir dessa iniciativa.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Muito bem!

O Orador: - Não se pode, por isso, esperar ou pedir ao Parlamento ou aos partidos um comportamento diverso, e cuja lógica se inscreve num mecanismo inexistente, que a Constituição não contempla e que a última revisão rejeitou: o mecanismo da moção de censura construtiva.
Os que agora reclamaram do Partido Socialista que, ao arrepio do que é a sua leitura do texto constitucional, subvertesse o que entende ser o normal funcionamento das instituições, promovendo, sem mandato, a formação de um novo governo e submetendo-o depois, por iniciativa própria, ao Presidente da República, deveriam porventura ter pensado, atempadamente, na necessidade de um mínimo de diálogo e de entendimento antes de terem desencadeado os mecanismos da crise.
E não se diga que, ao fazer depender do Presidente da República quaisquer iniciativas concretas tendentes à formação de um novo governo, o Partido Socialista mais não faz do que refugiar-se num argumento puramente formal, para se furtar às suas próprias responsabilidades.
Considerar como artifício puramente formal o respeito pelos imperativos constitucionais e admitir que possam ser interpretados ao sabor da conjuntura é uma posição que o Partido Socialista liminarmente rejeita.
Dir-se-á que mais importante do que respeitar a forma do texto constitucional é respeitar o espírito. É verdade. Mas não é menos verdade que, com frequência, os apelos ao respeito pelo espírito, como modo de subverter a forma, são o primeiro passo para que de um e da outra se venha a fazer tábua rasa.
A partilha de responsabilidades, de competências, de poder de iniciativa, inscrita na Constituição, não é uma mera questão formal: dela decorre a própria natureza do regime.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, numa palavra, o Partido Socialista fez quanto estava ao seu alcance para tornar possível o objectivo democrático de levar ao seu termo a actual legislatura.
A solução concreta proposta pelo Partido Socialista ao Presidente da República - a indigitação do seu leader para formar governo - teria aberto o caminho às negociações políticas que, em nosso entender, conduziriam a uma solução governativa com um apoio parlamentar no mínimo superior àquele de que dispôs o governo de Cavaco Silva.
Não foi este o entendimento do Presidente da República, que tudo indica optará pela realização de eleições antecipadas.
É uma opção diversa da do Partido Socialista, com a qual se pode ou não estar de acordo, mas cuja legitimidade não pode ser questionada.
É uma opção que o Partido Socialista, independentemente do seu próprio ponto de vista, acatará com o respeito que sempre lhe haverão de merecer as decisões que, no exercício das competências que a Constituição lhe confere, o Presidente da República entender tomar.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, estamos, ao que tudo indica, em vésperas de novas eleições.
O Partido Socialista encara-as com a serenidade e a confiança de quem está certo que, uma vez mais, a maioria do povo português recusará o bloco de direita conservador e retrógrado e escolherá o progresso, a solidariedade e a justiça social.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Carlos Vasconcelos.

O Sr. José Carlos Vasconcelos (PRD): - Sr. Deputado Lopes Cardoso, parece-nos evidente que o Partido Renovador Democrático quando suscitou a questão da apresentação da moção de censura - e posso afirmá-lo aqui, nesta Câmara - tinha com certeza elementos mais do que firmes quanto à sua posição face ao Governo, até pelas posições repetidamente tomadas nesta Câmara pelos partidos que constituem a sua maioria, e bastará lembrar que, desde logo, o Partido Socialista e o Partido Comunista apresentaram moções de rejeição face a este governo.
Obviamente, V. Ex.ª também não desconhecerá que entre este e outros partidos houve várias trocas de impressões, em vários momentos, sobre a evolução da situação política e que esses partidos, por sua vez, conheciam a evolução da opinião do PRD.
Recordaria a V. Ex.ª que, tendo o PRD concedido a este governo o prazo de um ano, ao fim deste tempo passou a fazer um balanço da acção governativa e considerou que era possível fazer melhor do que ele fez.
Quando aqui foram rejeitadas as grandes opções do Plano a médio prazo e o Governo retirou as de 87, o PRD anunciou publicamente que este governo deixava de ter a sua confiança, a partir daí desafiou - no sentido amigável, claro - o Partido Socialista para tomar uma iniciativa que conduzisse a uma alternativa e durante dois ou três meses o PRD esperou por essa iniciativa. Como ela não surgiu, e tendo-se verificado coisas tão graves como a publicação, como resolução, ao fim e ao cabo, do essencial das opções do Plano aqui rejeitadas e como o chamado «caso da Estónia», em nossa opinião e na da grande maioria desta Câmara, altamente violador da noção de Estado e da solidariedade institucional, é natural que tomássemos a atitude que tomámos e da qual não nos arrependemos, muito pelo contrário, como aqui salientei, pois consideramo-la oportuna e foi assumida com inteira responsabilidade.
Finalmente, pergunto também a V. Ex.ª se entende que, segundo a interpretação dos mecanismos constitucionais, deveria caber ao Sr. Presidente da República uma indigitação, que não fez. Aliás, foi esta interpretação que fiz, em primeira mão, na intervenção poli-

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tica que produzi na quinta-feira e, portanto, acompanhamo-lo na crítica implícita nas suas palavras a essa acção.
Portanto, para além da divergência formal ou de interpretação jurídico-constitucional sobre a quem competiria a iniciativa e sabendo-se que o Sr. Presidente da República queria que antes da indigitação se lhe apresentasse uma solução, pergunto se, ultrapassada essa questão, meramente formal - questão que nos leva um pouco à história «do ovo e da galinha», porque dizia o Partido Socialista «nós só tomaremos a iniciativa se o Sr. Presidente da República indigitar» e o Sr. Presidente dizia «eu só indigitarei desde que me tragam uma solução», estivemos um pouco na história do ovo e da galinha!...
Bom, retomando a ideia que estava a expor devo dizer que, de facto, é grave que com estes pretextos se vá para a solução que tudo indica irá acontecer e, assim, o que pergunto é se V. Ex.ª entende que o Partido Socialista, para além deste argumento formal, fez tudo o que estava ao seu alcance para, mesmo discordando - como nós discordamos - desta posição do Sr. Presidente da República, lhe levar a solução que, de facto, era possível no actual quadro parlamentar.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado José Carlos Vasconcelos: Deixemos de parte a história que fez do período que precedeu à moção de censura e a inversão de discurso, pretendendo deixar, agora, no ar a ideia de que, de algum modo, estava tudo combinado, quando a sua bancada na altura da moção de censura reivindicou aos quatro ventos tê-la assumido de fornia totalmente independente e à revelia de quaisquer entendimentos.

Risos do PSD.

Deixemos de lado também o facto estranho de se poder compatibilizar a recusa da confiança ao Governo no mesmo momento em que se viabiliza um instrumento fundamental da política governamental, que foi o do Orçamento.

Uma voz do PS: - Muito bem!

O Orador: - Deixemos, pois, tudo isso de lado, neste momento, para dizer apenas que é evidente que o Partido Socialista considera que tudo fez, embora admita que outros entendam que não o tenha feito, mas - e volto a afirmá-lo - penso que aqueles que entendem que havia outras coisas a fazer, antes de desencadearem o mecanismo da crise deviam ter tomado as cautelas necessárias para que mais alguma coisa pudesse ter sido feita ...

Uma voz do PS: - Muito bem!

O Orador: - ... ou para que estivéssemos claramente de posse de todos os elementos dessa crise.
Estamos, portanto, convictos, conscientes - e não temos dúvida que esse é o sentimento da opinião pública -, que o Partido Socialista fez tudo quanto estava ao seu alcance, no quadro constitucional, para viabilizar uma solução alternativa, porque essa nos parecia aquela que melhor servia os interesses do nosso país.
Não consideramos que o nosso posicionamento - e também o disse - se radique numa mera questão formal. Não nos podemos ater a isso! A iniciativa, ou o poder de iniciativa, cabe ao Presidente da República, ele exerce-a, ou não, conforme entende e no exercício legítimo das suas competências, não se podendo exigir dos partidos que sem mandato promovam a constituição de governos a submeter ao Presidente da República.
É a inversão total dos mecanismos constitucionais!

O Sr. José Carlos Vasconcelos (PRD): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. José Carlos Vasconcelos (PRD): - Sr. Deputado Lopes Cardoso, só para lhe fazer uma pergunta, pois pode ser que esteja mal recordado e admito-o.
Em 1977 ou 1978, quando foi da queda do I Governo Constitucional - aliás, foi o único caso em que um governo caiu aqui -, o Partido Socialista levou, então, ao Presidente da República uma solução de um governo PS/CDS.
Perguntava, pois, a V. Ex.ª se foi assim que se passou.

O Orador: - Sr. Deputado José Carlos Vasconcelos, neste momento não lhe posso responder sinceramente se foi assim ou não que tudo se passou. Mas aquilo de que estou seguro é que quando o Dr. Mário Soares levou ao general Ramalho Eanes a proposta de um governo PS./CDS, com base no tal acordo parlamentar de incidência governamental, tinha recebido do Sr. Presidente da República o «fogo verde» - se me permite a expressão - para conduzir essa operação.
E não voltemos atrás, Sr. Deputado, senão teria de lhe dizer que a minha posição e a do meu partido nesta crise é exactamente a mesma que eu próprio e o Partido Socialista assumimos perante o Sr. Presidente da República de então e hoje presidente do PRD, general Ramalho Eanes.
A discussão é a mesma; curiosamente, caminhou-se para as mesmas soluções e a nossa posição mantém-se igual à que tínhamos.

O Sr. José Carlos Vasconcelos (PRD): - Só que nessa altura a maioria da Assembleia da República era a favor de eleições.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Corujo Lopes.

O Sr. Corujo Lopes (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Foi a classe bancária recentemente surpreendida com a notícia de que o Governo, em conluio com í. Associação Portuguesa de Bancos - organismo que, pelas suas características, se assemelha ao antigo Grémio dos Banqueiros -, tem elaborado, para publicação, um decreto-lei que visa a integração dos novos trabalhadores admitidos nas instituições de crédito subscritoras do acordo colectivo de trabalho do sector no regime geral de segurança social.
Prevê e decreto-lei em questão que as instituições empregadoras ficam desobrigadas do pagamento de quaisquer complementos de pensões, bem como da correcção das retribuições, como se encontra consignado

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no acordo colectivo de trabalho do sector. Também, no que se refere à assistência médica, ficarão os trabalhadores integrados no regime de prestação do serviço nacional de saúde.
Se tais medidas fossem levadas à prática, além de violarem direitos legítimos, teriam como consequências principais: a consagração de uma discriminação inaceitável entre bancários - actuais e futuros -, o que contraria o princípio de igualdade de tratamento; a violação da Convenção 98 da Organização Internacional do Trabalho - direito à livre negociação; a consequente extinção, a breve prazo, dos serviços de assistência médico-sociais dos bancários, cuja institucionalização foi negociada no âmbito da contratação colectiva de trabalho; a integração forçada de toda a classe no regime geral de segurança social, com a perda de direitos adquiridos, contratualmente negociados.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Constituição determina a institucionalização de um sistema de segurança social unificado e descentralizado que os trabalhadores bancários defendem. No entanto, tal preceito constitucional não pressupõe a perda de direitos adquiridos livremente negociados.
Desde 1938 que os bancários, através de lutas persistentes, foram forçados a negociar na sua convenção colectiva de trabalho matéria de saúde e segurança social, porque, por razões de ordem material, os banqueiros sempre se eximiram a efectuar os descontos obrigatórios para a Previdência.
Só que a conquista de determinadas regalias de carácter social teve muitas vezes como contrapartida cedências em áreas importantes, como justas actualizações salariais e aumento do horário de trabalho.
Porém, em 1970, quando os banqueiros verificaram que o número de trabalhadores atingidos pela invalidez aumentava, decidiram, através do governo corporativo de então, criar a Caixa de Previdência dos Empregados Bancários, com o desrespeito dos direitos adquiridos e sem a garantia da cobertura financeira, pois não existiam, assim como não existem hoje, reservas matemáticas constituídas.
A luta então travada foi dura: os sindicatos foram encerrados e as suas direcções destituídas e um dos seus mais destacados dirigentes sindicais for preso pela PIDE. Cerca de um ano depois, no entanto, a classe não só recuperou os seus sindicatos, como conseguiu que os seus direitos se mantivessem intactos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os bancários, hoje, como ontem, estão dispostos a dialogar, com o objectivo de encontrar as melhores soluções para tão candente problemática e desejosos de que a justiça social e progresso sejam uma constante na sociedade portuguesa.
Por outro lado, já declararam publicamente, através dos seus órgãos representativos, que rejeitam liminarmente qualquer solução por via administrativa e exigem que a discussão de toda esta matéria, com respeito absoluto pelos direitos adquiridos, seja efectuada em sede própria para negociação - a revisão contratual.
Igualmente, rejeitam a justificação de que as dificuldades económicas de algumas instituições se devem às responsabilidades assumidas com o pagamento de pensões, e não à política desastrosa que este governo e alguns dos anteriores, bem como os conselhos de gestão por eles nomeados, têm levado à prática.
Como ex-dirigente do Sindicato dos Bancários do Norte, estou ciente de que a classe, independentemente de divergências de carácter político-sindical, saberá unir esforços no sentido de mais uma vez impedir que os seus legítimos direitos sejam defraudados.

Aplausos do PRD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Henrique Moraes.

O Sr. Henrique Moraes (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em 1981 o Secretário de Estado da Cultura de então aprovou um planeamento museológico. Neste planeamento definiam-se as áreas atribuídas aos museus dependentes do Instituto Português do Património Cultural (IPPC).

Justificou-se esta medida pela «necessidade de coordenar as actividades dos museus, descentralizando a coordenação, estabelecendo uma rede museológica nacional, coerente com as reais necessidades do País, através da qual museus de uma determinada região possam ser coordenados por um museu considerado central».

Para realizar esses objectivos classificaram-se museus coordenadores regionais, cujas funções ficaram estabelecidas da seguinte maneira: inspecionar os monumentos dependentes do IPPC; informar o IPPC sobre as necessidades de conservação e restauro do património cultural; coordenar os museus tecnicamente dependentes do IPPC de acordo com a orientação traçada pelo departamento de museus do IPPC; fornecer ao IPPC parecer sobre museus cuja criação se projecta.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Escolhido para museu coordenador dos distritos de Viana do Castelo e Braga foi o Museu de Alberto Sampaio, em Guimarães.

A escolha não poderia ter sido mais feliz. Em primeiro lugar, pela cidade em si. Guimarães, nunca será demasiado repeti-lo, tem um património histórico de todos conhecido e importantíssimo, possuindo uma concentração de monumentos dificilmente ultrapassada em qualquer outra cidade portuguesa.

É o castelo, são as igrejas e mosteiros com a sua beleza e espiritualidade, são as suas casas, uns belos solares antigos onde predomina a pedra, outras mais simples onde a beleza exterior, torneada na madeira, encanta quem as vê. É a sua tradição industrial, que constitui riquíssimo património, e outros monumentos espalhados por todo o concelho.

Em segundo lugar, pelo quanto mereceu as pessoas que ao estudar e depender a divulgação patrimonial têm dedicado muito do seu tempo.

Já no século passado um grupo de vimaranenses defendeu e conseguiu que não fosse demolido o seu castelo.

Também, por iniciativa particular, foi criada a Sociedade Martins Sarmento, que, para além da intenção de homenagear quem soube descobrir e estudar a citânia de Briteiros, tem por fim o estudo da arqueologia e a instrução popular. De igual modo, foi ainda criado o já referido Museu de Alberto Sampaio, por Alfredo Guimarães, repositório de arte a quem a Secretaria de Estado deu a conveniente importância. E ainda, e mais recentemente, a ruralidade do concelho é mostrada e organizada num museu de agricultura em Fermentões.

Posto este pequeno resumo e estas considerações, e atendendo que o próprio Secretário de Estado reconhecia que «nem todos os museus reúnem capacidade de

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resposta técnica e financeira para dar cabal cumprimento à coordenação», pretendo, por achar justo e necessário, que a Secretaria de Estado apoie toda a actividade do Museu de Alberto Sampaio, de maneira que se reforce e vinque mais a função coordenadora do referido Museu. Nesse sentido, deve-se aumentar as verbas, distribuir uma viatura, aumentar o quadro de pessoal, criando, se necessário, lugar de importância compatível com a coordenação de outros museus e, muito principalmente - se estas regiões foram criadas com uma intenção de serem provisórias -, pelas razões atrás expostas, nunca de Guimarães deve ser retirada a sede de coordenação museológica, tornando-a definitiva, para honra, orgulho e bem do património português.

s Vimaranenses em geral e a sua Câmara deviam e devem acarinhar o seu museu e colaborar para reforçar a sua importância.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Outro assunto que pretendo focar, chamando a atenção para um erro grosseiro cometido há alguns anos pela Secretaria de Estado da Cultura, é o despacho de l de Abril de 1980 - é antigo, mas é bom -, que determina a classificação como imóvel de interesse público o Palácio Vaiada, ao Calhariz, imóvel esse que se dá como sendo o comprado pelo Theodoro de O Mandarim, para se instalar em Lisboa.
Ora, a verdade é que o palacete escolhido por Eça de Queirós para instalar em Lisboa o Theodoro foi o Palacete Pinto Basto, ao Loreto.
Basta reler O Mandarim para se verificar essa afirmação (v. p. 50, 1.ª ed., 1880, de O Mandarim), ali se diz:
Comprei e habitei o palacete amarelo ao Loreto [...].
V. também as pp. 177 e 178 do mesmo livro e edição, onde se lê:
Então, indignado, um dia subitamente reentrei com estrondo no meu palacete e no meu luxo. Nessa noite de novo o resplendor das minhas janelas alumiou o Loreto [...].
Reparar que o resplendor das janelas alumiou o «Loreto», e não o «Calhariz».
De resto, para Eça de Queirós o «Loreto» sempre foi o Largo do Loreto, também chamado Largo do Chiado ou Largo das Duas Igrejas [v. O Crime do Padre Amaro, ed. de 1880 (inteiramente refundida e recomposta), p. 661], ali se diz:
Dentro da multidão de grulhas que se apertava contra o balcão questionava-se forte, e pelo passeio, no Largo do Loreto defronte ao pé do estanco, pelo Chiado até ao Magalhães [...]
Resta acrescentar que o Palacete Pinto Basto, onde se encontra a Companhia de Seguros A Mundial, é por esse nome conhecido, por ter sido adquirido por João Ferreira Pinto Basto quando veio viver em Lisboa por ter sido nomeado por El-Rei D. João VI controlador-geral do tabaco.
Anos antes, o palacete tinha sido sede da legação de França, ao tempo em que era ministro o célebre general Lannes, depois feito duque de Monte-Bello por Napoleão I.
Prestada esta informação julgo pertinente e que a Secretaria de Estado consulte o processo de classificação, pondere as bases em que ele foi feito, indague das razões, mane e reler C) Mandarim, corrija o erro, honre Eça de Queiroz os e todos aqueles que, vivos ou mortos, tanto o admiram e o admiraram.
Aplausos do CDS e de alguns deputados do PSD e do PRD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Silva.

O Sr. Rui Silva (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A cultura constitui a primeira linha de defesa do turismo de cada país. O que distingue verdadeiramente os mercados turísticos não são os hotéis ou as praias, as características geográficas ou climatéricas, mas essencialmente os seus aspectos culturais.
O património dos povos foi-se construindo, pouco a pouco, ao longo dos séculos, conferindo uma identidade própria a cada país. Nesse património cultural tem um lugar de destaque o artesanato.
Em Portugal assistimos a um rápido movimento de extinção dos valores culturais populares, nomeadamente das formas de vida tradicionais, muitas delas milenárias, num processo paulatino de desruralização, homogeneização e e costumes, internacionalização cultural e substituição de antigas tradições por novos modos de viver, ditados por interesses económicos sob a ditadura implacável da publicidade veiculada pelos meios de comunicação social. Este fenómeno da erosão da cultura popular e do advento da «era do plástico» é no nosso país bem patente no domínio da actividade artesanal. O artesanato português, tão rico e tão variado, com exemplares que são produto de um aperfeiçoamento que tem séculos de evolução, demonstrativos da mais autêntica arte popular, está, a não serem tomadas medidas urgentes, condenado a desaparecer, talvez com mais velocidade do que se supunha.
Para além de algum apoio que a esta actividade é dispensado pelo instituto da formação e emprego, apenas os órgãos regionais e locais de turismo, e algumas autarquias locais através de feiras e exposições, pugnam pela defesa, promoção e comercialização do artesanato. Este esforço, porém, não tem sido acompanhado por outras áreas do poder e, hoje, Portugal é um dos países do mundo que não dispõe de uma efectiva estrutura oficial de apoio, defesa e promoção do artesanato em funcionamento.
Em Junho de 1981, através do Decreto-Lei n.º 154/81, foi criada uma estrutura que efectivamente nunca funcionou: a CIPA - Comissão Interministerial para o Artesanato não reúne há mais de dois anos; a CEA - Comissão Executiva para o Artesanato, integrada por representantes dos Ministérios do Trabalho, Cultura e Turismo, nunca funcionou em pleno e quase desde o seu início se encontra restringida ao representante daquele primeiro Ministério; os NARAS - Núcleos de Apoio Regional ao Artesanato, em número de cinco, apenas dois ou três funcionaram minimamente e hoje encontram-se desactivados.
Foram feitas várias tentativas de levantamento do artesanato português, de um inventário das modalidades ainda e ostentes, de identificação dos artesãos, mas todas morreram à nascença. Praticamente não há acções de informação para novos artesãos.

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Grande parte dos pedidos de apoio enviados directamente para Lisboa ou através dos NARAS ficaram sem resposta e foram arquivados.
O selo de garantia, que atesta origem e qualidade, criado pelo Decreto-Lei n.º 246/82, continua a não ser aplicado.
Uma absurda e elevada caça fiscal sufoca a feitura de algumas peças de artesanato português. Veja-se o exemplo dos tapetes de arraiolos, que começam a ser manufacturados em países estrangeiros, tais como o Brasil, a Coreia e as Filipinas, que até pretendem utilizar Portugal como trampolim para a sua comercialização na Europa.
Os pequenos artesãos, à mercê da referida «caça fiscal», são tributados como se de industriais se tratasse. Uma tributação mínima terá de urgentemente ser encarada, se é que não se pretende acabar de vez com as modalidades de artesanato que ainda subsistem.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Qual o futuro do artesanato português? é uma pergunta hoje feita por todos quantos assistem à agonia lenta deste nosso património de séculos.
Tem faltado, sobretudo, vontade política para encarar de frente esta situação, seguindo-se as pisadas de outros países, nomeadamente do Terceiro Mundo, onde existem estruturas e organismos de apoio ao artesanato, já para não invocar exemplos como os de França, onde existe um ministério do artesanato, e Espanha, com a Empresa Nacional de Artesania, que coordena toda a actividade do artesanato espanhol.
O Partido Renovador Democrático, atento a estas situações, fará hoje entrega, na mesa da Assembleia da República, de um conjunto de requerimentos dirigidos a vários ministérios que possibilitem informação concreta e esclareçam devidamente entre outras as carências atrás referidas.

Vozes do PRD: - Muito bem! Aplausos do PRD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Marques.

O Sr. António Marques (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Caracterizar sócio-economicamente o distrito de Leiria não é tarefa fácil. Tentá-lo-ei, todavia, em pequeno ensaio, dado o número e a amplitude de problemas que afectam o distrito e as suas 143 freguesias, espalhadas por 16 concelhos e cobrindo 3515 km2, que representam 4% da superfície de Portugal continental.
Com uma população residente de cerca de 420000 habitantes, 205 000 homens e 215000 mulheres, sofreu na década de 60 a 70 uma diminuição de 34000 habitantes, devido à emigração. Cresceu, todavia, na década de 70 a 80 12%, a um ritmo um pouco inferior ao ritmo nacional, que é de cerca de 15%. Mesmo este aumento da população não foi harmonioso, havendo concelhos onde o crescimento foi negativo, como no caso de Pombal, Alvaiázere e Figueiró dos Vinhos, com taxas negativas de 6%, 5% e 1,6%, respectivamente, e outros concelhos com acentuados crescimentos, como os da Marinha Grande, Leiria e Peniche, onde as taxas de crescimento foram de 34,5%, 24,7% e 23%, respectivamente.
A população do distrito de Leiria tem obedecido à regra geral das suas últimas décadas, que, por força da diminuição da natalidade e da mortalidade geral, tem vindo a envelhecer.
Mesmo assim a estrutura etária do distrito é das mais novas do País, os concelhos onde predomina a actividade agrícola são os que possuem uma população mais envelhecida, como Alvaiázere e Pedrógão Grande, onde existem mais de 20% de cidadãos com 75 anos.
Os concelhos mais industrializados, que são Marinha Grande, Leiria, Peniche e Batalha, têm uma população mais jovem, e aí os indivíduos com 65 anos são apenas 10%.
Claro que se constata, já aqui, uma deslocação interna dos jovens em busca de melhores condições de vida.
A população activa é de cerca de 174 000 pessoas, sendo 55000 mulheres e 119000 homens, que representam 68% da população activa.
Há que constatar aqui um forte desequilíbrio, porquanto os homens, que representam apenas 41,4% da população residente, constituem 68% da população activa, o que demonstra um nítido desemprego no sector feminino.
Por sectores, a população activa distribui-se do seguinte modo e evoluiu da seguinte maneira entre 1970 e 1981: o sector primário, que em 1970 representava 44,2% da população activa, em 1981 já só representava 26,8%; o sector secundário, que em 1970 ainda contribuía com 33,3% da população activa, em 1981 já contribuía com 44,4% dessa população, e o sector terciário, que em 1970 constituía 22,5% da população activa, em 1981 passou a 28,8%.
Entre 1970 e 1980 o sector primário libertou 18,5% de população activa e tal ficou a dever-se às alterações da estrutura produtiva, sobretudo ao grande crescimento industrial.
A estrutura social da população activa assenta na seguinte diversidade: domina a classe dos trabalhadores por contra de outrem, sendo estes 112 951, ou seja 65%; os trabalhadores por conta própria são 39 501, o que corresponde a 22%, e finalmente os patrões com trabalhadores ao seu serviço e outros representam 12% da população.
A estrutura produtiva oferece-nos, no sector agrícola, três zonas diferenciadas: o norte e o centro do distrito com predominância das culturas silvícolas; a zona sul com predominância da hortofruticultura e da vinha, e a baixa litoral, sobretudo o concelho da Marinha Grande, coberta por mata de pinheiro-bravo.
A área agroflorestal representa 151 309 ha, com 65 266 explorações, produzindo 71 410 t de batata, que corresponde a 64% da produção nacional, 30 552 t de milho, que corresponde a 6,3 % da produção nacional, l 089 000 hl de vinho, que corresponde a 8% da produção nacional, e ainda 5952 hl de azeite, que corresponde a 1,8% da produção nacional.
A fruticultura tem um peso muito grande na região e em todo o distrito; lá existem 24% da área nacional das macieiras e 26% da área nacional das pereiras, cuja produção é de 33000 t de maçã, que representa 30% da produção total, e 35000 t de pêra, num total nacional de 100000 t.
Em 1980 existiam ainda no distrito 41 238 explorações de gado suíno, 17 425 de gado bovino e 12 372 de gado caprino.

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A produção de leite é muito importante no distrito e tem aumentado muito nos últimos anos.
Das espécies florestais em destaque surge o pinheiro--bravo, com l IS 021 ha, seguido do eucalipto, com 13 380 ha, o carvalho, com 1410 ha, subsistindo ainda o castanheiro, com 800 ha.
Caracterizar a indústria é um elemento muito importante para podermos medir o bem-estar do distrito. A indústria transformadora situa-se principalmente nos concelhos de Leiria, Marinha Grande, Batalha, Nazaré, Porto de Mós e Caldas da Rainha, representando 22% da população activa e 70% do total da indústria no distrito.
Os produtos minerais não metálicos ocupam 14 512 trabalhadores, os químicos e derivados 5339 trabalhadores, os têxteis 4580 trabalhadores, o sector da alimentação e bebidas 4114 trabalhadores, os produtos metálicos 3344 trabalhadores, as madeiras 3300 trabalhadores, o papel e o carvão 1158 trabalhadores e a metalurgia de base 309, o que perfaz um total de 36 692 trabalhadores só para a indústria transformadora.
Não possuímos dados que nos permitam produzir uma análise profunda e pormenorizada do sector terciário e por isso não o fazemos para não errar ou não especular.
Uma última palavra, para dizer que apesar dos esforços significativos que as populações e o poder local têm desenvolvido, alguns indicadores são suficientes para atestar a situação que apresenta o distrito em relação à qualidade de vida: mais de 50% dos alojamentos não possuem água canalizada; mais de 80% dos lugares não possuem rede de esgotos; mais de 75 % dos lugares não têm recolha de lixo, e ainda 3,3 % de todos os lugares do distrito não têm electrificação, percentagem que no concelho de Pombal equivale a 11%.
Podemos adiantar que, face a todos estes problemas, sobretudo no sector industrial e apesar de sabermos que existem problemas de salários em atraso e encerramento de unidades de produção, é necessário que todas as forças políticas tenham esta questão em atenção para que possamos provocar uma verdadeira terapêutica de choque, que revitalize a indústria, que revitalize o sector primário e dote o sector terciário com todas as condições para que o distrito singre rumo ao futuro!

Aplausos do PRD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminou o período de antes da ordem do dia.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Secretário vai proceder à leitura de um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos.

O Sr. Secretário (Sá e Cunha): - O relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos é do seguinte teor:

Em reunião realizada no dia 28 de Abril de 1987, pelas 16 horas, foi apreciada a seguinte substituição de deputado:

Solicitada pelo Partido Socialista:

Augusto Martins Ferreira do Amaral (círculo eleitoral de Lisboa) por Hermínio da Palma Inácio. Esta substituição é pedida nos termos da alínea b) do n.º 2 do art. 5.º da Lei n.º 3/85 (Estatuto dos Deputados), por um período não superior a seis meses, a partir do dia 2H de Abril corrente, inclusive.
Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que o substituto indicado é realmente o candidato não eleito que deve sei chamado ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência da respectiva lista eleitora apresentada a sufrágio pelo aludido Partido no concernente círculo eleitoral.
Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:
A substituição em causa é de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisito: legais.
A Comissão: Secretário, Rui de Sá e Cunha (PRD) - Secretário, José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP) - Daniel Abílio Ferreira Bastos (PSD) - João Domingos Fernandes Salgado (PSD) - Carlos Cardoso Lage (PS) - Fillol Guimarães (PS) - Carlos Manuel Luís (PS) - Jaime Manuel Coutinho Ramos (PRD) - Carlos Alberto Correu Rodrigues Maias (PRD) - Vasco da Gama Fernandes (PRD) - Carlos Manafaia (PCP) - José Manuel Antunes Mendes (PCP) - António José Borges de Carvalho (CDS).

Sr. Presidente: - Vamos votar o relatório e parecer que acabou de ser lido.
Submetido a votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência dos deputados independentes Maria Ramos, Ribeiro Telles, Borges de Carvalho e Oliveira e Cesta.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, da ordem do dia consta o relatório sobre Camarate e a votação do respectivo projecto de resolução. Cada partido dispõe de dez minutos e estão inscritos os Srs. Deputados Armando Lopes, Horácio Marcai e José Luís Ramos. Comunico ainda que, dada a sua extensão e o facto de ele já ser conhecido dos Srs. Deputados, foi dispensada a lei .ura do relatório.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Armando Lopes.

O Sr. Armando Lopes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Comissão de Inquérito, a que tive a honra d; pertencer, elaborou um extenso e minucioso relatório no qual se expõem objectivamente os principais problemas que o acidente de Camarate levanta.
São nada menos de 81 páginas do Diário da Assembleia que conglobam, quer as posições que fizeram maioria, quer posições que a não fizeram, o que, a nosso ver, dá às pessoas que as lerem nota do esforço desenvolvido ao longo de muitos meses, e até anos, desta Comissão e das outras as duas que a precederam para tentar apurar como se e eu o acidente que vitimou em 4 de Dezembro de 1980 o Primeiro-Ministro, o Ministro da Defesa, os seus acompanhantes e a tripulação do avião Cessna.
De tudo quanto ali se menciona, quer pôr em relevo, nesta intervenção, apenas dois pontos pela importância que se lhes atribuiu.

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Irei referir-me, por um lado, a um hipotético e misterioso desaparecimento do produto da raspagem dos tecidos dos pés do piloto Jorge Albuquerque e, por outro, ao relatório de dois ilustres professores auxiliares do Instituto Superior Técnico (IST).
Não me referirei a qualquer acto posterior a 22 de Janeiro de 1987 exactamente porque nesse dia terminou a sua actividade a Comissão de Inquérito e nessa data se extinguiu também esta Comissão.
Se alguma coisa porventura aconteceu depois dessa data não foi a Comissão que o ordenou, o autorizou, ou o apreciou.
Não é problema que tenha o mínimo interesse nesta discussão.
O misterioso desaparecimento da amostra H
Dentre os mistérios que se criaram ao longo deste processo - muitos dos quais foram sendo sucessivamente esclarecidos -, avulta, pela implementação que dele se fez, o do desaparecimento da célebre amostra H.

A Sr.ª Dinah Alhandra (PSD): - Não apoiado!

O Orador: - Tratava-se do produto obtido, por raspagem, de tecidos da parte interna dos calcâneos do piloto Jorge Albuquerque - poalha metálica extraída dos tegumentos pelo engenheiro britânico Eric Newton, quando de exumação do cadáver em Novembro de 1982.
O exame que devia ser feito, como foi, pelo Laboratório Nacional de Engenharia e Tecnologia Industrial (LNETI) tinha por fim detectar a eventual presença de materiais estranhos aos usados no cokpit do avião e eventuais indícios de os materiais terem sofrido os efeitos da deflagração de engenhos explosivos, como consta do próprio relatório do LNETI.
O resultado dessa análise revelou que se tratava de uma partícula negra montada em plexiglass e ligeiramente desbastada, revelando a existência no seu interior de incrustações aparentemente metálicas.
O espectro do material negro revelou a predominância de silício, cálcio, titânio e alumínio e de outros elementos em menores quantidades (magnésio, fósforo, enxofre, cloro, potássio, vanádio, crómio e ferro).
As incrustações metálicas verificou-se serem constituídas por uma liga de alumínio, com um espectro idêntico aos das amostras A, B, I e J.
A mesma amostra tinha tido um exame óptico preliminar com pequeno grau de ampliação e depois um novo exame pormenorizado ao microscópio estereoscópico, com apoio de microscópio electrónico, com identificação do material por aspecto radiográfico e identificação comparativa do LNETI, sob a supervisão do engenheiro Eric Newton.
Nenhum destes exames revelou quaisquer sinais de explosão.
Mais tarde, novas radiografias ao que restava da amostra H teriam indiciado ao radiologista que as examinou que afinal a intensidade luminosa que inicialmente revelava a existência de partículas metálicas agora não aparecia.
Isto bastou para que se levantasse a suspeita do desaparecimento da amostra inicial.
Só que este desaparecimento consubstanciava um crime de contornos mais tenebrosos.
É que quem teria feito desaparecer a amostra H original tê-la-ia substituído por outra qualquer substância amorfa.
Analisemos o mistério e suas implicações.
O problema do desaparecimento ou não desaparecimento da amostra H só pode Ter importância se puserem em causa os exames anteriores quer do engenheiro Eric Newton, quer, sobretudo, dos técnicos do LNETI.
A suspeição levanta naturalmente a questão da competência técnica e até honradez dos técnicos do LNETI que procederam às análises.
Ouvido sobre este ponto o engenheiro Oliveira Sampaio, que chefiou aquele grupo de técnicos, referiu que o Laboratório tinha analisado aquilo que lhe havia sido enviado e que a recolha dos fragmentos analisados fora feita com o cuidado e critério que um exame daquele melindre exigia, sabendo os técnicos muito bem o que procuravam para que não examinassem aquilo que realmente lhes era proposto que procurassem.
Esclarece mais que o trabalho fora executado por dois técnicos de altíssima competência.
Se isto assim foi, parece sem significado útil o destino posterior da amostra H ou de qualquer outra amostra.
O exame foi feito e o resultado tornou-se conhecido.
De resto, foi também referido no processo, por mais de uma fonte, que o exame radiográfico pode revelar o aspecto dos objectos radiografados, mas não pode determinar a sua composição e natureza - isso só consegue realizar-se por intermédio de exames metalúrgicos ou metalográficos.
O Prof. Pinto da Costa, ilustre director do Instituto de Medicina Legal do Porto, escreveu no seu parecer:
É desprovido de qualquer interesse médico-legal todo o tipo de argumentação envolvendo argumentos de natureza radiológica para inferir um diagnóstico médico-legal exclusivamente por meio de radiologia.
No mesmo sentido se tinha já pronunciado o radiologista Gama Afonso.
A aceitar-se a informação científica destes ilustres especialistas, será, pelo menos, duvidoso que o novo exame radiológico tenha detectado coisa diversa da que constituiu inicialmente a célebre amostra H.
Mas, ainda que se aceitasse essa divergência, sempre restariam os exames feitos, quer pelo perito britânico Eric Newton, quer pelos especialistas do LNETI, quando as amostras estavam indiscutivelmente intactas e estes exames apontam no sentido atrás referido.
Sem que se criem suspeições gravíssimas sobre os distintos técnicos que procederam aos exames, não se pode fugir dos resultados a que eles chegaram.
Essas suspeições apontariam para que técnicos reputados, altamente competentes e que nessa qualidade teriam sido escolhidos pelo LNETI, de repente tivessem um total eclipse de qualidade e se revelassem de uma confrangedora incompetência.
Ou apontariam mesmo para que tais técnicos tivessem praticado conscientemente o gravíssimo crime de ocultação de provas ou de alteração das perícias.
Ora, quanto a tal suspeição, estamos com os velhos princípios de que quem alega a existência de uma fraude tem naturalmente de provar que ela existiu - e não há a mínima prova nesse sentido - e de que toda a pessoa está inocente da prática de qualquer crime até que se prove que o praticou.

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É, de resto, a regra de ouro do n.º 2 do artigo 32.º da Constituição.
Nesta Casa, pelo menos, será muito difícil pensar de outra maneira.
Falamos na amostra H, mas poderíamos falar num certo tubo encontrado nos terrenos do aeroporto sobre os quais teria passado o avião sinistrado e que durante bastante tempo se quis fazer acreditar que era uma peça largada em voo por aquele avião, por virtude da explosão a bordo, tubo que afinal se veio a provar que aquele avião não tinha.

A Sr.ª Dinah Alhandra (PSD): - Isto é um escândalo!

O Orador: - Ou num pedaço de jante que seria do avião sinistrado, quando afinal se veio apurar pertencer a um avião de carreira, um DC-10.
O relatório do Instituto Superior Técnico
Mas o elemento fundamental esgrimido na Comissão para defesa da tese da sabotagem foi o já célebre relatório de dois professores auxiliares do Instituto Superior Técnico (IST).
Teríamos, assim, a ciência a apontar num sentido totalmente diferente daquele para que apontaram os diversos peritos aeronáuticos, tanto nacionais, como estrangeiros, que sobre o acidente se debruçaram e que indicaram como causa da queda do avião a paragem do motor esquerdo por falta de gasolina.
É, porém, evidente que o dito relatório sofre de base de uma insuficiência científica insanável.
Um raciocínio científico pode ser muito brilhante, pode ser vestido de equações e teoremas, de cálculos e fórmulas impecáveis (e não tivemos a fortuna de o relatório os mostrar), mas se a base de que partiu não é um dado certo, não é um dado assegurado, inquestionável, a conclusão é tão incerta como a base de que se partiu.
Ora o que se passou com o relatório foi desde logo a insegurança, a incerteza e a confusão contraditória da base que se tomou para o raciocínio, havendo bases contraditórias que poderiam, com igual legitimidade, tomar-se como bases do raciocínio a fazer.
Com efeito, solicitado o estudo e remetidos aos técnicos os elementos de facto em poder da Comissão, logo em 7 de Abril de 1986 um dos técnicos que veio a elaborar o relatório revelou as gravíssimas contradições da matéria de facto, quer quanto à possível trajectória de voo, quer quanto às condições atmosféricas, quer quanto aos fragmentos que teriam sido encontrados no terreno.
Quanto a estes fragmentos e sua disposição no terreno, esse técnico pôs mesmo em realce as contradições flagrantes entre os três elementos da Polícia Judiciária (PJ) que sobre o assunto se tinham pronunciado de forma totalmente discordante.
E para que não houvesse dúvidas na Comissão sobre o seu real embaraço inquiria, a concluir, o seu ofício:
Em face destes dados, que não consigo compatibilizar, pergunto: qual a extensão e configuração do rasto de fragmentos que V. Ex.ª entende deva servir de base à análise solicitada ao Instituto Superior Técnico?
Em face destes dados que não consigo compatibilizar.
E era delas que teria de partir.
Respondeu-lhe o Sr. Presidente da Comissão que não tinha outros dados e que os fornecidos era tudo quanto a Comissão tinha.
Pois bem: foi destes dados que os técnicos do IST partiram.
Poderiam tê-lo feito em termos científicos e até mesmo de simples lógica formal?
A resposta é um claro e rotundo não, evidentemente.
Se os dados não eram certos, se não podiam ser compatibilizados, era ilegítimo, cientificamente, e sofístico em termos de lógica, querer tirar deles uma conclusão válida.
Mas foi isso que os ilustres técnicos vieram a fazer.
Esta questão, a nosso ver, arruma desde logo o célebre relatório.
Foi por esta elementar razão que o Sr. Procurador-Geral da República, ao pronunciar-se sobre ele como possível «e emento probatório», afirmou que sendo os dados de que partiu inconsistentes, radicando em estimativas ou em raciocínio de base conjecturável, o valor do estudo é nenhum. E à mesma conclusão chegou também o Sr. Director-Geral da P J ao apreciar o dito relatório, como não podia deixar de ser.
Mas outras faltas, a nosso ver, graves, apresenta o relatório.
Desde lego, porque no meio da barafunda e contradição das versões quanto à disposição no terreno dos fragmentos encontrados os ilustres técnicos comprometeram-se a que fariam o seu estudo tomando por base e relatório do inspector Pedro Amaral de 22 de Dezembro de 1980.
Mas nas o fizeram, como vieram a reconhecê-lo expressamente.
E porquê? Porque o tal relatório de 22 de Dezembro de 1980 não dava qualquer configuração geométrica à disposição no terreno dos fragmentos encontrados.

Vozes do PSD: - Ah! ...

O Orador: - E então os ilustres técnicos foram procurar a última versão trazida aos autos pelo mesmo inspector seis anos depois do acidente.
Isto representa desde logo uma quebra desse compromisso assumido.
Mas traduz também uma escolha arbitrária entre as três posições sucessivas e divergentes nos relatos que ao longo dos anos foi fazendo o referido inspector da PJ.
No relatório de 22 de Dezembro de 1980 havia para ele um rasto geometricamente não definido, entre o fim da pista e as casas onde o avião caiu.
A Sr.ª Dinah Alhandra (PSD): - Há outras testemunhas que confirmam isso!

O Orador: - Em 22 de Março de 1983, dois anos e meio depois do acidente, localiza os fragmentos encontrados em três locais:
a) No morro, atrás das casas onde o avião caiu, onde encontrou papéis queimados ...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Armando Lopes, lamento interrompê-lo, mas terminou o seu tempo, pelo que lhe peço o favor de concluir a sua intervenção.

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O Orador: - Sr. Presidente, tencionava realmente ler mais algumas folhas, que lhe peço que sejam publicadas.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Armando Lopes, elas serão publicadas, mas peco-lhe que faça o favor de concluir.

O Orador: - Sr. Presidente, agradeço-lhe a concessão e embora a minha intervenção, no que respeita à publicação, continue a seguir, vou conclui-la de seguida oralmente.

O texto que a seguir se publica entre parêntesis corresponde à parte do discurso não lida.

a) [...] junto do poço e do poste e ainda aquilo a que chamou uma peça em forma de ninho de abelha e fibra que se aventou ser do revestimento do turbocompressor - e apurou-se depois que o turbocompressor do avião sinistrado não tinha qualquer revestimento;
b) Após a entrada no terreno entre duas vedações, segundo lugar, encontraram-se vestígios de lã de vidro;
c) A cerca de 50 m-60 m do fim da pista encontraram de novo papéis queimados.

O rasto contínuo desaparece e surgem os fragmentos depositados em três sítios diversos.
Em 8 de Maio de 1986, cerca de cinco anos e meio depois do acidente, surge pela primeira vez no relato deste inspector um rasto de vestígios numa linha recta com mais ou menos 8 m de largura.
Porque é que o relatório dos técnicos do IST escolheu esta última versão é coisa que não é explicável face aos compromissos por aqueles técnicos assumidos e às contradições do próprio inspector ao longo dos anos.
De resto, este ultimo informou a Comissão que tendo estado na zona entre as traseiras das casas e a estrada, não cobriu pessoalmente a zona intermédia entre essa zona e o fim da pista.
O seu conhecimento directo sobre esta matéria é assim muito limitado e não abrangente de todo aquele rasto que veio a referir.
Mas foi ele a base deste consideradíssimo estudo.
Mas outras falhas apresenta o relatório dos ilustres peritos do IST.
Assim, interessava saber qual a quantidade da gasolina que ardeu, naturalmente para determinar a intensidade do incendo e a altura que as partículas queimadas podiam ter atingido.
As três quantidades possíveis para que os cálculos apontavam, conforme a base do raciocínio de que os peritos poderiam partir, eram 300 l, 302 l e 2541, sem falarmos na gasolina existente nos automóveis que arderam.
Em face destes três números de que lhe foi dado conhecimento, os técnicos tinham de pôr as três hipóteses e desenvolver cada uma delas.
Não fizeram nada disto.
Jogaram com um novo número, o de 2401, inferior àqueles três números, e dizem que fizeram os seus «raciocínios» com base naqueles 2401. Dizemos «raciocínios», pois nenhuns cálculos a justificar constam do relatório.
Em matéria científica, neste ponto, como nos outros, a aplicação de fórmulas ou princípios científicos é coisa que não foi fornecida: conhecem-se os resultados a que os ilustres técnicos dizem ter chegado, desconhecem-se completamente os processos e cálculos científicos dos seus juízos de apreciação.
Pois bem, aqueles 240l teriam aparecido, no dizer dos ilustres técnicos do IST, porque os bombeiros teriam apagado o incêndio e haveria gasolina que não ardeu que teria ficado a constituir uma lama na rua onde o avião caiu - justificação que então deram e de que posteriormente se esqueceram, arranjando uma outra, completamente contraditória com aquela.
Só que os autos não dizem que teria ficado gasolina por arder, ninguém se apercebeu da existência de tal lama na rua e as fotografias juntas aos autos não revelam a sua existência.
Interessava também aos técnicos saber qual a duração do incêndio.
E porque os autos não eram claros a tal respeito, perguntaram por escrito qual tinha sido essa duração.
Foi-lhes respondido expressamente que essa duração teria sido de, pelo menos, cinco minutos.
Apesar disso o relatório vem dizer que afinal o incêndio durou de quatro a cinco minutos - sem explicar o porquê desta baixa.
Se os elementos do processo lhes permitissem essa conclusão, não teriam formulado a pergunta. Se a formularam teriam de respeitar a resposta.
Porquê a não respeitaram?
Porquê diminuíram a duração do incêndio?
Era importante também para os técnicos saber qual a intensidade do vento no momento do acidente.
O Instituto Nacional de Meteorologia e Geofísica (INMG) informou, pelo seu ofício de 24 de Abril de 1986, que a velocidade do vento, medida de meia em meia hora, era, às 20 horas, de sete nós e, às 20 horas e 30 minutos, de cinco nós.
Um estudo rigoroso e imparcial obrigaria os técnicos a considerarem nos seus cálculos ou o valor médio (seis nós) ou um dos dois valores indicados (sete e cinco nós), sem invalidar nem um nem outro.
Os ilustres peritos, porém, dizem que fizeram os seus cálculos na base dos quatro nós, baixando assim a velocidade indicada do vento. Porquê? Não se sabe.
Mais.
Quando o piloto pediu autorização para descolar, recebeu da torre de controle a informação de que a velocidade do vento era de seis nós.
Não acreditamos que a torre dê informações erradas aos pilotos.
E daí que a conclusão é necessariamente ou a de que na torre algum aparelho indicava aquela velocidade do vento ou a de que a torre havia recebido essa informação da entidade encarregada de estar a par dessa velocidade e que seria certamente o INMG.
Já nem falamos no facto, que os ilustres peritos não ignoravam, de que tendo atingido a pluma térmica a altura de 80 m acima da superfície do terreno onde ardeu o avião, como dizem, teriam de investigar ou calcular qual seria a velocidade do vento a essa altura, para que os seus raciocínios tivessem carácter científico.
E para mais essa altura fazia uma diferença daquela onde se encontrava o anemógrafo de cerca de 100 m.
Finalmente, quanto ao rumo do vento, nova falha.
O relatório considerou que esse rumo era de 327º magnéticos.

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Não obstante as informações fornecidas pelo INMG, indicam que o rumo do vento, medido de meia em meia hora, era, às 20 horas, de 340º e, às 20 horas e 30 minutos, de 330º.
Também aqui os raciocínios científicos, para terem viso de verdade, teriam de respeitar ou o rumo médio - e não seriam muito rigorosos - ou cada um daqueles rumos, não enjeitando nenhum.
Não foi isso que se fez e o resultado foi partir-se de um número diverso.
Também a este propósito convém realçar que quando o piloto pediu autorização para descolar recebeu da torre de controle a informação de que o vento tinha o rumo de 340º magnéticos.
Em face de todas estas discrepâncias de base, que valor científico tem o relatório dos senhores peritos?
A nós afigura-se-nos que sendo o relatório claudicante nas suas premissas, necessariamente que claudica nas suas conclusões.
É evidente que o trabalho da Comissão e o seu relatório se prestariam a comentários muito mais completos do que estes que ora faço.
Só que a clareza e abertura com que o relatório foi elaborado dispensam-me de me alongar mais.
Tudo quanto se fez é produto de um trabalho intenso.
A intenção que pusemos na descoberta da verdade compensa-nos largamente do esforço desenvolvido.
Os resultados desse esforço são os que são; o relatório põe-os à luz do dia.
Se for votada a proposta de se facultar tudo à Procuradoria-Geral da República, o seguimento normal, o iter processual adequado, ser-lhe-á dado pela única entidade que num país democrático deve apreciar os factos sob o ponto de vista criminal, e tentar detectar e perseguir os seus agentes, se concluir que houve crime.
Em nosso entender a Assembleia da República cumpriu escrupulosamente o seu dever.
As outras entidades que façam o mesmo, e certamente o farão.
Aplausos do PS, do PRD e do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estão inscritos para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Armando Lopes os Srs. Deputados Correia Afonso e Cecília Catarino. Só que o Sr. Deputado Armando Lopes não dispõe de tempo, uma vez que os dez minutos do PS foram esgotados.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Sr. Presidente, pedi a palavra apenas para declarar que, em virtude do pouco tempo disponível, não vou fazer perguntas ao Sr. Deputado Armando Lopes. De qualquer modo, queria deixar aqui bem claro que a intervenção do Sr. Deputado Armando Lopes vai claramente contra o sentido da prova produzida perante a Comissão.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Armando Lopes, na medida em que o Sr. Deputado Correia Afonso formulou um juízo de valor, vou conceder-lhe a palavra para que possa responder, se assim o desejar.

Tem então a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Armando Lopes (PS): - Sr. Deputado Correia Afonso, essa é a opinião de V. Ex.ª, que não é, no entanto, a opinião da maioria da Comissão, cujo relatório esta exactamente na linha daquilo que eu disse. De resto, V. Ex.ª poderá ler depois as considerações que escrevi, mas que não pude ler por falta de tempo, e porque V. Ex.ª é uma pessoa de boa fé, concordará que eu tenho razão.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Horácio Marçal cumpre-me assinalar a presença de alunos da Escola Secundária de Luísa de Gusmão, de Lisboa, e da Escola Secundária de Carolina Micháelis, do Porto, aos quais agradecemos a visita ao Parlamento e a presença na sessão.
Aplausos gerais.

Sr. Deputado Horácio Marcai, assinalei há momentos a sua inscrição, só que, como há quatro Srs. Deputados do PSD inscritos, pergunto-lhe se não vê inconveniente em que o Sr. Deputado José Luís Ramos, do PSD, use primeiro da palavra, para que possamos cumprir a regra da alternância.

O Sr. Horário Marçal (CDS): - Não vejo inconveniente, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem então a palavra, Sr. Deputado José Luís Ramos.

O Sr. José Luís Ramos (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Assembleia da República, através do mecanismo das comissões de inquérito, procedeu a um amplo e aturado trabalho no apuramento da verdade acerca da tragédia de Camarate. Se a 1.º Comissão se limitou à ar alise dos inquéritos oficiais da responsabilidade do DGAC (Direcção-Geral da Aeronáutica Civil) e da Polícia Judiciária, concluindo pela existência de irregularidades, omissões e contradições, já as 2.º e 3.1 Comissões partiram de um objectivo mais vasto - o apuramento das causas e circunstâncias da tragédia de Camarate.
Há que, antes do mais, enaltecer este trabalho, que dignificou a instituição parlamentar, sobretudo se tivermos em conta o total inoperância e alheamento de diversos órgãos da Administração Pública.
Será de elementar justiça agradecer a todos aqueles, e foram largas dezenas, que através de depoimentos, experiências, estudos e peritagens prestaram um valioso contributo para o eficaz cumprimento dos objectivos da Comissão.
O PSD considera, por outro lado, que há que, aqui e agora, prestar pública homenagem aos representantes dos familiares das vítimas, que incansavelmente ajudaram os trabalhos das comissões parlamentares de inquérito. Estamos certos de que sem o seu precioso auxílio não teria esta Comissão cumprido o seu desiderato de forma tão cabal.
Aplausos do PSD.

Os deputados do PSD que integraram a Comissão de Inquérito à Tragédia de Camarate fizeram-no na qualidade cê cidadãos eleitos pelo povo, a quem se exigia a busca da verdade sem obediência a quaisquer ditames de natureza partidária ou subterfúgios de ordem política. Se foi esse o nosso propósito, se foi essa a nossa conduta, é exactamente nessa postura que hoje,

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ultrapassado o dever de sigilo a que nos obrigámos, nos colocamos perante o País para afirmar que Francisco Sá Carneiro, Adelino Amaro da Costa e seus acompanhantes foram cobardemente assassinados em consequência de sabotagem do avião Cessna que os transportava na noite de 4 de Dezembro de 1980.
Esta conclusão baseia-se num conjunto de provas materiais e periciais inequívocas que ao longo destes anos as diversas comissões tiveram a oportunidade de recolher e apreciar detalhadamente.
Assim: várias testemunhas oculares observaram distintamente o incêndio do avião em pleno voo e descreveram o facto de uma fornia essencialmente coerente entre si; foi encontrado no solo um rasto de fragmentos provenientes do avião; peritos de indiscutível idoneidade e competência técnico-científica concluíram pela necessária libertação daqueles fragmentos durante o voo da aeronave; foram detectados e radiografados fragmentos nos pés do piloto; peritos em radiologia concluem que os fragmentos provêm de um metal de densidade muito superior à do alumínio e que se alojaram nos calcâneos do piloto animados de energia cinética; o Cessna, ao embater num primeiro andar de uma vivenda antes de se imobilizar na rua, provoca um incêndio autónomo no forro do telhado, o que prova que o avião vinha a arder em voo; a ausência de comunicação com a torre prova o corte anormal de comunicação rádio; a ausência de fracturas nos corpos das vítimas prova que nenhum dos ocupantes do Cessna se encontrava consciente na altura do embate do avião; a disposição relativa dos corpos das vítimas prova que o co-piloto abandonou em pleno voo o cokpit do avião em consequência de uma emergência muito grave a bordo; peritos aeronáuticos e mesmo um especialista em acção antiterrorista concluem pela sabotagem do avião, com evidente preocupação de simular um desastre aéreo à descolagem.
Mas se isto não bastasse, que dizer da recente descoberta do laboratório de polícia científica de que as roupas das vítimas se encontram impregnadas de fósforo?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A conclusão de que Camarate teve como origem uma sabotagem impõe-se cada vez mais com acutilante transparência.
Contudo, dir-nos-ão que a maioria da Comissão não nos acompanhou nas conclusões acima enunciadas e justificadas.
Só que, Sr. Presidente e Srs. Deputados, as maiorias parlamentares produzem decisões políticas que nem sempre se traduzem em verdades materiais. Se uma comissão de inquérito decidisse que o Sol girava à volta da Terra não deixaria, contudo, o contrário de se verificar.
Risos do PCP.

A votação do relatório de Camarate implicou para alguns a aferição da oportunidade política e para outros a obediência à disciplina partidária. Mesmo assim, o relatório fabricado à última hora foi aprovado por uma margem tangencial, que só pôde existir porque a maioria dos deputados que o votaram favoravelmente não acompanharam os trabalhos da Comissão, desconhecendo, portanto, qual a verdade material a apurar.

O Sr. José Magalhães (PCP): - É falso. É uma calúnia!

O Orador: - É verdade e sabe-o bem, Sr. Deputado.
Desta forma, o partidarismo e a conjuntura política sacrificaram a verdade que a todos obrigava.
E não nos digam, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que o relatório aprovado é convincente.
Afirmar válidas as conclusões da DGAC e da PJ, aliás contraditórias entre si, é, nos dias de hoje, desatenção ou má-fé. A inconsistência daquelas conclusões já foi há muito demonstrada e é surpreendente que, depois de assistir à queda fragorosa dos argumentos oficiais, se venha agora a defender a desnecessidade da sua revisão.
É o próprio presidente da Cl da DGAC que afirmou na Comissão que se o rasto tinha a configuração que a PJ lhe aponta, então o avião vinha a arder em voo, pondo em causa tudo o que tinha dito antes.
Como se pode afirmar que as conclusões da DGAC são correctas se já o SP AC, em 1982, considerava o relatório oficial um documento de muito duvidoso valor técnico e científico?
Como se pode afirmar que as conclusões da DGAC estão correctas se as investigações infringiram as normas da ICAO?
Como se pode afirmar que as conclusões da DGAC estão correctas se está provado que a queda do avião se não deveu a qualquer falta de combustível?
Como se pode afirmar que as conclusões da DGAC são correctas se elas foram caindo uma a uma ao longo dos trabalhos da Comissão, através de depoimentos, acareações e estudos de elevado rigor científico?
Que dizer do documento produzido pelos peritos do IST acerca do nosso relatório? É no mínimo chocante ...
Permito-me ler uma pequena passagem:
As muitas incorrecções de que estas subsecções estão pejadas só podem ser compreendidas se a elaboração desta parcela do texto do relatório tiver sido cometida a algum dos membros da Comissão que nunca tenham o ensejo de encontrar nas diversas reuniões em que houve a oportunidade de debater os aspectos em causa.
É natural que tudo isto nos deixe aflitos e sem resposta.
Mas, face à inexistência de argumentos para a tese probatória do acidente e face ao avolumar das provas que apontavam para o atentado, a única posição que vos restava era afirmar a realidade das estafadas e caducas conclusões oficiais.
Não interessa a eliminação de José Moreira, que desenvolvia, à altura, uma investigação particular sobre Camarate; não interessa o desaparecimento das pastas de documentação confidencial que se encontravam no interior do avião; não interessam as obstruções documentadas à investigação e aos descaminhos comprovados de pecas do processo, como sejam as partículas nos pés do piloto, os originais dos desenhos que traçavam com precisão a configuração do rasto dos fragmentos do avião depositados no terreno, os métodos destrutivos de análise a que estão a ser submetidas as roupas das vítimas; não interessa que a DINFO tenha avisado um piloto para não voar na altura da tragédia; não interessam as informações militares, dizendo que algo de grave estaria para acontecer; não interessa que um ex-agentes da Judiciária tenha apontado um dos presumíveis autores da sabotagem.

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Muito menos interessa o impressionante conjunto de provas irrefutáveis que há pouco enunciei. Há que as afastar de qualquer forma, nem que isso implique má fé ou falsidades gritantes e notórias.
Basta ler o relatório aprovado para se ver que assim é.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: aproveito o ensejo para denunciar publicamente a tentativa de negociação na busca do fácil «consenso» a que se assistiu na última fase dos trabalhos da Comissão, e em especial na Comissão de Redacção.
Só que a verdade não se negoceia nem se partilha; Sá Carneiro, Adelino Amaro da Costa e seus acompanhantes foram assassinados e o PSD não descansará enquanto não forem descobertos os responsáveis (autores, cúmplices e encobridores).
Ó processo ficou a aguardar melhor prova, melhor prova foi produzida desde 81 até agora. Urge, pois, continuar o processo até ao apuramento total do crime perpetrado em 4 de Dezembro de 1980; exigem-no as nossas consciências, exige-o o povo português.
Aplausos do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Azevedo.

O Sr. José Luís Azevedo (PRD): - Sr. Deputado José Luís Ramos, V. Ex.ª fez referência a uma recente descoberta do Laboratório de Polícia Científica. Como membro da Comissão de Inquérito do Acidente de Camarate, não me recordo - nem mesmo depois de extinta a Comissão - de me ter chegado às mãos qualquer parecer ao estudo recente sobre análises aos restos do acidente. Por essa razão, peço ao Sr. Deputado José Luís Ramos que faça o favor de me informar concretamente a que é que se estava a referir.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ramos.

O Sr. José Luís Ramos (PSD): - Sr. Deputado, muito rapidamente, porque dispomos de pouco tempo, quero dizer-lhe que, embora o Sr. Deputado não tenha sido daqueles que faltou mais - o que não é verdade, pois esteve lá sempre -, geralmente estava desatento e é natural que agora também o esteja. Referia-me a este documento que tenho aqui na mão. É verdade que foi produzido depois do encerramento dos trabalhos da Comissão, mas também é verdade que o foi a pedido do juiz de Loures e foi entregue na Comissão e no Plenário.
Portanto, se estivesse atento, talvez tivesse conseguido ler o documento - coisa que parece que não aconteceu.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Horácio Marcai.

O Sr. Horácio Marçal (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O País foi fortemente abalado, ao início da noite de 4 de Dezembro de 1980, com a queda do avião que transportava o Primeiro-Ministro, Dr. Francisco Sá Carneiro, o Ministro da Defesa, engenheiro Adelino Amaro da Costa, e seus acompanhantes.
Mais estupefactos ficaram os Portugueses quando de imediato se veio a saber que todos os passageiros e tripulantes do avião haviam perecido em Camarate.
Vivia-se um clima de alta emoção política, já no final da campanha eleitoral para as presidenciais, em que se sabia que alguns não olharam a meios para atingir os seus fins.
Soares Carneiro já vislumbrava a vitória que o povo lhe iria dar, pelo que, para alguns, ter-se-iam de diminuir as bases de apoio ao candidato presidencial da então Aliança Democrática.
Derrotá-lo antes de consumado o acto eleitoral era - constava-se - eliminar os grandes tribunos e as figuras carismáticas da máquina eleitoral que o apoiava. Derrotá-lo parcialmente após as eleições era retirar-lhe, do caminho do apoio político, aqueles que lhe proporcionariam, 10 exercício do cargo, as ajudas indispensáveis a uma gestão eficaz, a bem da estabilidade e progresso de Portugal.
Perpassa-a pelo espírito do verdadeiro povo português que algo se iria passar que pudesse entravar ou impossibilitar a concretização da directriz traçada pelos homens que escolheram e pelos que apoiavam Soares Carneiro. Assim, a queda do avião foi no momento da notícia o impacte e a emoção, para depois se transformar na consumação de um acto que muitos já vinham terrendo e até esperando.
Falar hoje, aqui, no desastre de Camarate tem que nos levar a transportar ao período eleitoral que vivíamos em 1980, às emoções e aos fins que cada um queria e deseja-a atingir, muitas vezes, infelizmente, sem escolher os meios utilizados, sem cuidar que o combate e o prédio fica desigual quando por meios ilícitos ou violento; se retira da peleja o adversário, que só por ser mais forte ou melhor preparado ou dotado tenha que ser eliminado.
Sabia-se que naquele presente e no futuro a luta política em Portugal sem Sá Carneiro e Amaro da Costa era desigual Havia para alguns sem escrúpulos que preparar o campo do futuro que lhes abrisse as portas à prossecução dos seus desígnios. Não estava em causa o progresso e o futuro de Portugal, estava sim, ainda em causa, a teoria da «terra queimada», que pretendia desertificar Portugal de valores idóneos para proporcionar a ascensão mais fácil dos medíocres e oportunistas ou daqueles que defendiam e ainda defendem outro modelo de sociedade que tem muito a ver com outros países, mas pouco com o verdadeiro Portugal, livre, democrático, cristão e próspero que pretendemos e devemos ser.
Por isso, Sr. Presidente, Srs. Deputados, a tragédia de Camarate, na óptica do meu Partido e especialmente na minha e dos meus colegas que integraram esta Comissão, não oferece quaisquer dúvidas na sua génese, nas suas intenções e nas suas consequências.
Integrámos esta e a anterior Comissão, com um aprofundamento exaustivo dos interrogatórios e da análise das provas e dos documentos.

eslocámo-nos ao aeroporto, onde apreciámos os destroços e o avião; verificámos in loco o local da queda; visitámos, no Hospital de Santa Maria, as peças constantes do processo; participámos, com isenção e sem partida riscos, nos inquéritos em que estiveram a depor dezenas de testemunhas durante centenas de horas.
Ouvimos declarações a favor e contra a hipótese de sabotagem.

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Fizemos no nosso espírito e no nosso intelecto a selecção de depoimentos das provas, mas depois de sintetizarmos o volumoso processo de dados mais relevantes constatámos o seguinte:

1) Inúmeras testemunhas referem que o avião já vinha a arder antes do embate e outras afirmam peremptoriamente que viram uma «bola de fogo» antes de o avião colidir;
2) Outras afirmaram ter ouvido um rebentamento no avião antes de ele descolar;
3) Confirmou-se que houve libertação de fragmentos durante a fase do voo, que foram encontrados no solo, segundo o trajecto do avião e de acordo com a incidência e velocidade do vento;
4) O posicionamento dos cadáveres no avião, em que se constata que o co-piloto foi encontrado não por cima dos restantes, mas ao contrário, por baixo, o que só se justifica pelo facto de no início do voo o piloto ter detectado alguma anormalidade na aeronave e ter dado ordem ao seu colega para ir atrás verificar o que se passava, motivo pelo qual aí se encontrava aquando da queda e como o avião, depois de embater, ficou inclinado, a arder, o referido co--piloto ficou por baixo dos seus companheiros de voo, o que não sucederia se fosse sentado no seu lugar, à frente;
5) A existência de fragmentos metálicos não do material do avião que impregnavam os membros inferiores de um piloto, fragmentos esses que entretanto desapareceram do processo;
6) Não existência de fracturas nos corpos das vítimas, o que nos leva a concluir que no momento do embate já os ocupantes não estavam conscientes;
7) A dosagem de carboxi-hemoglobina no sangue das vítimas faz supor que os ocupantes estiraram durante o incêndio, o que vem dar cabimento à asserção de que o fogo a bordo se instalou antes do embate;
8) A não pesquisa de fósforo na roupa das vítimas, por falta de meios técnicos, na ocasião, no Instituto de Medicina Legal de Lisboa, inibiu-nos de considerar a hipótese plausível, pela escolha de outros dados, de que se podia tratar de bomba incendiária. Todavia, pesquisas recentes, à base de métodos de fluorescência, admitem, passados mais de seis anos, que as vestes dos que pereceram se encontram impregnadas de fósforo, consequente ao rebentamento de bomba incendiária;
9) A morte do dono do avião, da sua companheira e de um advogado ligado ao processo são factores de pesar na hipótese de que havia que eliminar testemunhas que viessem a testar que estavam de posse de dados que nos elucidariam, mas principalmente aos que não querem ou não lhes convém ver a verdade de Camarate.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pêlos dados recolhidos, ficou-nos a convicção de que se tratou de sabotagem, e não de mero acidente, ficou enraizada no nosso espírito, daí o CDS não ter votado na Comissão o relatório nas partes que contrariam esta tese.
Hoje mais nos convencemos que Camarate foi um processo selectivo de eliminação política que o País tem de condenar e que este Plenário deverá ter, pelos dados
recolhidos, de dizer ao País e a todo o mundo, de uma vez por todas e sem tibieza, que em todos nós nos ficou a convicção que Camarate foi uma sabotagem e um crime.
Por imperativo de consciência, para defesa da verdade, pelo respeito que nos merecem os mortos, pela defesa da vida humana, pela consolidação da liberdade e da democracia e pelo progresso de Portugal, o CDS votará pela hipótese de sabotagem do avião que vitimou os grandes arautos da democracia futura, Sá Carneiro e Amaro da Costa.
Aplausos do CDS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Salgado.

O Sr. João Salgado (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por lamentar o pouco tempo que o meu partido dispõe para discutir um assunto tão sério, tão grave e que originou perdas humanas irreparáveis, seres esses que fazem falta a este povo ansioso por verdade.
Ao longo de um ano de árduo trabalho, esta 3.ª Comissão debruçou-se sobre este inquérito. Ouvimos dezenas e dezenas de pessoas, umas a demonstrar a sua grande incapacidade para os cargos que ocupam, outras a quererem a verdade, a darem tudo para que algo de concreto se vislumbre.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Perdi dois amigos, Francisco Sá Carneiro e António Patrício Gouveia, dois homens com quem trabalhei e muito me honraram ao serem meus amigos.
O País perdeu um estadista, um homem no apogeu da sua vida política, que se tornou uma personalidade fundamental da vida política contemporânea e tendo sempre por objectivo ajudar os mais desfavorecidos.
O que vejo?! Vejo partidos a votarem um relatório, em vez dos Srs. Deputados individualmente, como membros da Comissão.
Vejo Srs. Deputados que, apesar de sentirem e declararem pelos corredores que o que aconteceu na noite de 4 de Dezembro de 1980 foi sabotagem, votarem exactamente o contrário daquilo que tinham constatado ao longo de todo o processo, por simples obediência partidária.
Outros, que nunca tinham integrado qualquer comissão sobre o inquérito Camarate, logo à partida tudo tentaram fazer para demonstrar que foi um mero acidente, sem êxito, diga-se.
O que fez correr este partido nesta tese?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Daqui afirmo solenemente, num grito de dor e vigor, que não foi para isto que nasceu a democracia. Esta nasceu para a verdade, e não é a verdade o que consta do relatório do PCP.
Como humanista, como homem, como deputado, afirmo que não me posso calar ao assassínio perpetrado a Francisco Sá Carneiro e seus acompanhantes.
Aplausos do PSD e do CDS.

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O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr." Deputada Dinah Alhandra.

A Sr.ª Dinah Alhandra (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma brevíssima intervenção ou, mais propriamente, um veemente e sentido protesto. Foi com indignado espanto que tomei conhecimento da deliberação da conferência de líderes de apenas conceder escassos minutos a cada partido para a discussão e votação do relatório da Comissão Especial de Inquérito a Camarate.
Camarate: milhares de horas de trabalho de deputados e de funcionários desta Casa; centenas e centenas de páginas e relatórios técnicos.
Camarate: um atentado - é deliberadamente que emprego a palavra «atentado» - em que perderam a vida um primeiro-ministro de Portugal, o seu Ministro da Defesa, acompanhantes e tripulação.
Dir-se-ia que, perante o espectro da dissolução do Parlamento, alguém pretendeu livrar-se rapidamente deste pesadelo. Daí, as condições do seu agendamento. Varre-se Camarate rapidamente para debaixo do tapete e não se fala mais nisso!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sá Carneiro e as demais vítimas foram assassinadas em 4 de Dezembro de 1980. O autor ou autores desses crimes permanecem até hoje ocultos. Hoje, cometer-se-á aqui um novo crime contra as vítimas de Camarate. Mas desta vez os seus autores são bem conhecidos do povo português, que não deixará de os julgar. Como disse alguém, é possível enganar toda a gente por um curto espaço de tempo e é igualmente possível enganar umas quantas pessoas durante muito tempo. Mas é impossível enganar toda a gente o tempo todo!
Aplausos do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Correia Afonso.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O tempo concedido ao meu partido é tão limitado que não posso fazer a intervenção que tencionava produzir e que este assunto merece. Direi apenas algumas palavras, aquelas que efectivamente não posso calar.
O relatório aprovado pela maioria dos membros da Comissão de Inquérito ao Acidente de Camarate é - há que dizê-lo! - verdadeiramente uma peça deplorável.

A Sr.ª Cecília Catarino (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Direi mesmo que se trata de documento com que a instituição parlamentar não fica prestigiada. E à instituição parlamentar todos nós pertencemos e todos nós servimos; daqui este meu inconformismo.
As maiorias podem condicionar o futuro, mas não está ao seu alcance alterar a verdade ou mudar o passado. E o caso de Camarate, como é conhecido, em que após escassos segundos de voo de despenhou um Cessna, é obviamente uma operação de sabotagem.
São muitas as provas produzidas perante a Comissão de Inquérito e todas apontam nesse sentido - não tenho tempo para as enumerar, mas já foram bastante referidas em intervenções anteriores. O relatório, infelizmente, fugiu a essas provas. Quis evitá-las, ignorou-as.
A sabotagem apurada relativamente à tragédia de Camarate pede ser, decorridos mais de seis anos sobre a sua consumação, um caso político desactualizado. Mas, Sr. Presidente, a história precisa de conhecer a verdade e os Portugueses, ao fim de tanto tempo, têm o direito de saber o que se passou. É por isso que para nós, deputados, que estamos ao serviço do País, Camarate é um caso de consciência, é um caso de responsabilidade, é um caso de ética.

O Sr. Joio Salgado (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Foi nesta convicção intima - e não por ter recebido qualquer indicação partidária, que não aceitaria - de consciência que rejeitei o relatório da Comissão de Inquérito e subscrevi a declaração de voto.
Julgo, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que, mais de seis anos decorridos sobre 4 de Dezembro de 1980, chegou o mostro de a Assembleia da República informar o País de que Sá Carneiro, Amaro da Costa e seus acompanhantes foram efectivamente assassinados. Esta é a verdade, e por maior e mais bem elaborados que sejam os relatórios não a podem esconder.
Aplausos do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o ST. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O debate que aqui hoje se realiza e, antes dele, a aprovação pela Comissão Parlamentar de Inquérito do Relatório, cuja realização foi ordenada pelo Plenário da Assembleia da República, é sem dúvida um acontecimento com significado histórico. Vamos pôr ponto final, quando votarmos a resolução em debate, a uma forma doentia, anómala e, diria mesmo, perversa, de abordar a tragédia de Camarate e a uma forma de instrumentalizar politicamente alguma com a que deveria merecer um profundo respeito a todos aqueles que têm assento nesta Casa e a todos os portugueses.

Uma voz do PS : - Muito bem!

O Orador: - Tivemos sinais dessa forma de tratamento nas intervenções de todos - mas todos, lamentavelmente - os Srs. Deputados do PSD, que falaram até agora, na forma acusatória, descabelada e irresponsável como dirigiram imputações - as mais graves, que ferem a própria honorabilidade dos membros da Comissão! -, sem fazerem uma prova, sem adiantarem um facto, sem terem na mão mais do que os fantasma as e as suspeições por que se têm orientado e de que tem engordado nestes anos. E isso não pode continuar, e isso vai acabar!
Aplausos do PCP, do PS, do PRD e do MDP/CDE. Vozes do PSD: - Não é verdade!

O Orador: - Antes da aprovação deste relatório e depois dele verificaram-se inúmeras operações de pressão, de intimidação, de chantagem, de contra--informação. Pressões inclusivamente de carácter pessoal ...

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O Sr. Joio Salgado (PSD): - Eu também fui ameaçado!

O Orador: - ... ameaças de carácter pessoal, insultos do mais baixo jaez, que, no entanto, foram repetidos agora aqui por senhores deputados do PSD, o que estabelece uma imputação, um nexo de causalidade. Quem os fez aqui e quem os fez lá fora? Há alguma diferença? É o que se há-de saber algum dia!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Vieira Mesquita (PSD): - Pois há-de!

O Orador: - E isso, todavia, não impediu a aprovação do relatório.

Fizeram o que puderam para que a Comissão Parlamentar não pudesse aprovar um relatório com a fundamentação, a extensão, a profundidade e a documentação que eram adequadas. Queriam substituir um relatório parlamentar por um chorrilho dogmático de imputações, não fundado em elementos de facto apurados, aliás já publicado por um conhecido cartoonista muito antes da Assembleia da República se debruçar sobre esta matéria. Recusaram-se a analisar objectivamente os elementos para cuja pesquisa estivemos sempre - mas sempre - abertos. Viram sempre aquilo que queriam ver, estavam convencidos no início daquilo de que ficaram convencidos no fim.

A Sr.ª Dinah Alhandra (PSD): - O mesmo se pode dizer dos outros!

O Orador: - Tinham um preconceito quando entraram e saíram com esse mesmo preconceito com que tinham entrado naquela Comissão Parlamentar.

O Sr. João Salgado (PSD): - O mesmo se pode dizer do PCP!

O Orador: - E isto é o contrário da atitude que deve presidir a uma comissão parlamentar de inquérito.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Mas isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, vai acabar com a revelação pública dos autos. Todos, mas todos, os portugueses vão poder ver que elementos são esses.

O Sr. João Salgado (PSD): - Óptimo!

O Orador: - E vão poder surpreender-se como é que é possível que, com base em certos elementos contraditórios, fragmentários e absolutamente incompatibilizáveis entre si, um partido com especiais responsabilidades suba à tribuna - como subiu agora - e diga: «Sá Carneiro e Amaro da Costa foram cobardemente assassinados.»
Aplausos do PCP, do PS, do PRD e do MDP/CDE. A Sr.ª Cecília Catarino (PSD): - E foram!

O Orador: - Meus senhores, se assim fosse, o vosso comportamento nestes meses teria sido não só uma fraude, como uma comédia política indigna de qualquer deputado, de qualquer político de cabeça!
Aplausos do PCP, do PS, do PRD e do MDP/CDE.
Porque se isso tivesse acontecido, se a Comissão Parlamentar de Inquérito, por qualquer forma, tivesse apurado elementos que permitissem inferir directa e imediatamente essa conclusão, então, meus senhores, tendo sido o relatório aprovado em 22 de Janeiro deste ano e sendo os Srs. Deputados do PSD Governo - neste momento, demitido, mas eram-no, então, e continuam a ter os poderes e as responsabilidades -, deveriam ter tido outra atitude. Que fizeram os Srs. Deputados do PSD e o governo do PSD? Anunciaram um jantar comemorativo!

O Sr. João Salgado (PSD): - Essa história já é velha!

O Orador: - Que medidas tomaram a nível de Direcção-Geral de Aeronáutica Civil? Nenhuma!
Que medidas tomaram a nível da Polícia Judiciária? Nenhuma!
Os Srs. Deputados do PSD lançam um conjunto vastíssimo de suspeições, mas não tomam - como não tomaram nestes anos - nenhuma das medidas concretas adequadas à gravidade das imputações que fazem.

O Sr. António Mota (PCP): - Lá sabem porquê!

O Orador: - E isto chama-se duplicidade política! A isto chama-se farisaísmo político, a isto chama-se manipulação e instrumentalização da Assembleia da República, porque consiste em afirmar aqui aquilo de que não se extraem depois consequências políticas. Se os Srs. Deputados entendessem que um quarto daquilo que vem sugerido nas vossas afirmações era verdade, teriam tido o dever de irem - já não digo como deputados, mas como cidadãos, como gente honesta - à Procuradoria-Geral da República e exigirem o desencadeamento das providências adequadas.
Aplausos do PCP, do PS, do PRD e do MDP/CDE. Protestos do PSD e do CDS.

O Ministro da Justiça em funções neste momento era o Ministro da Justiça em funções à data da morte de Sá Carneiro.
Aplausos do PCP, do PS, do PRD e do MDP/CDE.

O Ministro da Administração Interna, que, como o relatório da Comissão comprova, não tomou as mínimas medidas necessárias para proteger os destroços e impedir que qualquer suspeição fosse lançada sobre as causas do acidente de Camarate, é hoje ainda o Ministro da Administração Interna. São os mesmos, exactamente os mesmos! Que fizeram? Como é que se pode entender que Srs. Deputados do PSD possam fazer o triste espectáculo de um punhado que, à revelia do vosso governo, da vossa direcção partidária, vem à Assembleia da República fazer um conjunto de imputações que põem todos os demais no banco dos réus, enquanto no vosso partido se verifica essa posição de duplicidade, de hipocrisia e - repito - de farisaísmo?!
Como é que é possível que o secretário-geral do PSD, interrogado no Meridien sobre a questão de Camarate, diga: «Bah! O PSD continua aberto à descoberta da verdade sobre Camarate?» Então a verdade sobre Camarate, Srs. Deputados do PSD, não é que - como disse o deputado José Luís Ramos - «Sá Carneiro foi cobardemente assassinado».

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Então que secretário-geral e que PSD é este que permite, pela boca do deputado José Luís Ramos, uma afirmação peremptória e diz no Meridien esta coisa interrogativa?
Que orientação é esta? Que forma de fazer política é esta? É uma forma indigna de fazer política e devo dizer que é exigível muito mais de qualquer deputado, mesmo do PSD - e o PSD tem especiais responsabilidades.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, algum dia se saberá porque é que determinadas bocas que andaram caladas durante muito tempo se abriram - provavelmente em perjúrio - ...

O Sr. João Salgado (PSD): - Perjúrio, Sr. Deputado?!

O Orador: - .... a Comando de certo PSD, em certa altura do inquérito.

Algum dia se saberá também quem é que encomendou os estudos ou os trabalhos de determinados «peritos» que atestaram verdadeiramente com base em dados ou pressupostos falsos.
E, por outro lado, algum dia se saberá por que é que alguns responsáveis do PSD, de ontem e de hoje, metem os pés pelas mãos quando chamados a depor perante a Comissão Parlamentar de Inquérito. A revelação dos autos, em resultado da aprovação deste projecto de resolução que aqui debatemos vai ser significativa. Veremos, então, como é que o PSD vota: se ousa votar pela abertura do inquérito ou se vota contra ou, então, se inventa uma posição de abstenção, se foge à votação.
Quando tivermos a possibilidade de ler integralmente esses depoimentos, essas declarações desses ministros do PSD, desses dirigentes do PSD, então o povo português poderá realmente reformular juízo mais sólido sobre tudo isto. Nós entendemos que o relatório da Comissão, face aos dados de que dispúnhamos para esse efeito, é um contributo positivo, que procurámos levar o mais longe possível. Repito: estivemos abertos a todas as diligências, não recusámos uma só.
Tomamos por uma «rapaziada», por uma brincadeira de mau gosto, as observações e imputações feitas por alguns dos Srs. Deputados do PSD sobre as presenças e ausências na Comissão de Camarate. Pela nossa parte não vos medimos ao cronometro pelas vossas presenças ou ausências!... Não vos faremos a ofensa de discutir quando é que estavam ou não presentes ..., de distinguir quando diziam o que pensavam e quando o que pensavam não era o que diziam... Não vos faremos isso! Consideramos que esse é um comportamento incompatível com a dignidade do mandato parlamentar.
Finalmente, Sr. Presidente e Srs. Deputados, há-de saber-se também um dia por que é que os deputados do PSD e o governo do PSD não «conseguiram» trazer a Portugal os técnicos do NTSB - organismo responsável pela investigação de acidentes dos Estados Unidos da América. Por que é que se frustraram outras diligências que poderiam ter sido úteis para pôr fim a certas suspeições. Faço esta pergunta porque muitas das suspeições deste processo, Sr. Presidente e Srs. Deputados, resultam precisamente de não terem sido aclarados, em devido tempo, certos aspectos que poderiam sê-lo se o tivessem sido atempadamente. A responsabilidade aí, mais uma vez, é vossa, do vosso governo que estava e n funções em 4 de Dezembro, do governo que se lhe seguiu, de todos os vossos outros responsáveis. Por uma vez, alguém, que é vosso amigo e aliado - se é que não é inimigo -, teve razão quando disse que se a conclusão fosse aquela que agora os Srs. Deputados repetiram, quem estava sob o fogo cerrado da crítica era o PSD.

A Sr.ª Dinah Alhandra (PSD): - É verdade!

O Orador: - É verdade, mas, mesmo não sendo assim, estais sob o fogo cerrado da irresponsabilidade, da manipulação política e da actuação indigna face a uma questão que merecia mais respeito de toda a Câmara, incluindo o da vossa bancada. O PCP, que se bateu para que houvesse um relatório e para que ele fosse tão longe quanto possível, vai bater-se agora para a revelação pública dos autos e para a transmissão à Procuradoria-Geral da República do seu conteúdo integral, a fim de que todos possam ajuizar adequadamente.
Acreditam que se deve ir até ao fundo e que cada qual deve ajuizar livremente. Mas acabou-se hoje, vai acabar-se hoje um dos fantasmas mais mórbidos com que o PSD tem alimentado a vida política portuguesa. Só isso é positivo!

Aplausos do PCP, do PS, do PRD e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ramos.

O Sr. José Luís Ramos (PSD): - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Sr. Deputado José Magalhães, costumo ouvi-lo com imensa atenção nesta Câmara, mas, de facto, hoje, se há que falar ;m fantasmas, quem me pareceu fantasma foi o Sr. Deputado. Um fantasma de si próprio, do que costuma ser e principalmente do rigor jurídico de que costuma imbuir as suas intervenções.

O Sr. Deputado disse aqui que não foi assim como os deputados do PSD disseram, mas não nos contradisse em nada, não nos contradisse e não desdisse em nada do que nós dissemos em termos de dar contraprovas materiais em relação às provas que apontámos. O Sr. Deputado não nos desmentiu em nada! Não basta dizer que «assim não»; é necessário provar e o Sr. Deputado não provou!
Quem provou, ao longo deste tempo, foi o PSD, como referiu na sua declaração de voto. As provas são nossas e não suas e - repito - não basta afirmar que não é verdade!
Em relação à outra situação, Sr. Deputado, não há aqui duplicidade nenhuma entre o Governo, os deputados do PSD e a Assembleia da República. O que aconteceu foi que a Assembleia da República - e não só com a sua actual constituição - instituiu comissões de inquérito para provar a causalidade da tragédia de Camarate. E estamos todos à espera das suas conclusões, pois estes não são de ontem nem de há dois anos; elas surgem hoje ao País, Sr. Deputado José Magalhães!
E quem teve alguma responsabilidade no encobrimento da verdade e talvez mesmo na sua apresentação ao País, os responsáveis foram e são os Srs. Deputados!

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O Sr. José Magalhães (PCP): - Isso é ridículo!

O Orador: - É porque, ao não votarem as conclusões que nós próprios apresentámos, justificadamente, foram os Srs. Deputados que disseram que assim não, que se devia ir por outro caminho. Então, não venham agora acusar quem quer que seja, nem os governantes do passado, nem os do presente, de responsáveis.
São os Srs. Deputados que - ao que parece, Sr. Deputado José Magalhães -, de consciência feita, dizem ter a certeza que foi acidente. Mas o Sr. Deputado José Magalhães, nas conclusões do relatório que aprovou, ainda diz que não há necessidade de rever as conclusões anteriores.
Então se não há necessidade de rever as conclusões anteriores é porque o avião caiu por falta de gasolina.
É isto que os Srs. Deputados estão a dizer ao País. Como é que querem agora que o Governo tome, qualquer que seja, a responsabilidade? Nós, por nós estamos disponíveis para ir até ao fundo da questão, estamos disponíveis para que a Procuradoria-Geral da República e outras entidades competentes apreciem a totalidade dos autos.
Mas, Srs. Deputados, até o Sr. Deputado José Magalhães não nega que tem alguma importância, uma importância decisiva, a conclusão da Comissão de Inquérito, e esta é a de que houve acidente naquela situação e que as conclusões oficiais anteriores estavam bem fundamentadas, pelo que esta Comissão de Inquérito conclui pela desnecessidade da sua revisão.
E então, Sr. Deputado, quem são os responsáveis? Não somos nós! São os Srs. Deputados que querem que isto continue assim. Mas estou descansado porque, ao que parece, os senhores estão de consciência tranquila, têm a certeza de que isso assim foi.
A concluir, repito o que já disse: lamento que, por um lado, o Sr. Deputado José Magalhães não tenha desdito em nada das provas que nós apresentámos e que, por outro, o desfasamento entre as provas que apresentam e a realidade seja tão notório que é necessário que haja documentos, nomeadamente produzidos por peritos que aqui chamámos, que vos desdigam ponto por ponto, linha a linha. Mas os Srs. Deputados continuam impávidos, serenos e calados porque têm o dogmatismo da verdade ao vosso lado. Oxalá assim seja!...
Gostaria muito que o Sr. Deputado comentasse estes pontos, se é que é possível...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Correia Afonso, V. Ex.ª dispõe de dois minutos para formular os pedidos de esclarecimento que julgar convenientes.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Muito obrigado pela informação, Sr. Presidente.

O Sr. Deputado José Magalhães acabou de dar mais um triste espectáculo nesta Assembleia.

Vozes do PCP: - Olha quem fala! O espectáculo são vocês...

O Orador: - Subiu àquela tribuna e, animado de um furor persecutório verdadeiramente estalinista...

Risos do PCP.

. . despejou os seus impropérios.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Acusou tudo e todos, uns de se expressarem de forma doentia, outros de terem proferido ameaças, e chegou ao ponto de nos reprovar por não termos, no passado, denunciado ministros e outros políticos pelo facto de não terem actuado de forma diferente.
Disse tudo de um modo que nós já conhecíamos e que repudiamos, mas não apresentou provas.
É preciso que a Câmara perceba o porquê deste nervosismo do Sr. Deputado José Magalhães: é que ele é o autor material deste lamentável relatório da Comissão Eventual de Inquérito ao Acidente de Camarate.
Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Correia Azevedo.

O Sr. Correia Azevedo (PRD): - Sr. Presidente, não vou pedir esclarecimentos mas, antes, solicitar a V. Ex.ª que, caso seja possível, me esclareça sobre um assunto relacionado com esta questão.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado pretende interpelar a Mesa?

O Sr. Correia Azevedo (PRD): - Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Queira ter a bondade.

O Sr. Correia Azevedo (PRD): - Sr. Presidente, hoje, no inicio dos trabalhos do Plenário, desloquei--me aos Serviços de Apoio às Comissões, a fim de pedir, caso houvesse, alguma coisa de novo sobre a questão de Camarate. Tenho de esclarecer que é frequente, após a extinção de uma comissão eventual, chegarem novos elementos, e neste caso chegou, nomeadamente, um documento já referido, enviado pelo Instituto Superior Técnico.
Foi-me respondido por esses Serviços que pelas 15 horas da tarde o Sr. Deputado José Luís Ramos teria lá estado com um ofício do Tribunal de Loures, que era acompanhado por um parecer do Laboratório de Polícia Científica e que se referia a um pedido desta Assembleia do dia 13 de Abril de 1987.
Acontece que nem da parte da Comissão haveria qualquer pedido ao Tribunal de Loures, nem é conhecido pelos membros da Comissão algum pedido por parte da Assembleia da República sobre questões relacionadas com Camarate.
Há pouco fui «mimoseado» pelo Sr. Deputado José Luís Ramos acerca da minha participação na Comissão. Ora, acontece que, se não fui o deputado mais assíduo, devo ter sido dos mais assíduos a essa Comissão na medida em que só faltei a uma reunião.
Quanto ao trabalho dos deputados do PRD nessa Comissão, não vou explanar, mas posso afirmar que ele está perfeitamente patente nos autos da Comissão - espero, aliás, que esta Assembleia aprove a resolução e que estes venham a ser tornados públicos.
A questão que queria colocar é a de saber se, efectivamente, o Sr. Presidente recebeu algum ofício do Tribunal de Loures, se este já recebeu despacho do

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Sr. Presidente e, a ser assim, se esse documento corresponde à fotocópia exibida pelo Sr. Deputado José Luís Ramos.
Aplausos do PRD e do PCP.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, na verdade recebi uns elementos fotocopiados que vinham capeados com um ofício do Tribunal de Loures, fazendo referência a um ofício que tinha sido emanado da Assembleia da República. Procurei informar-me sobre quem o tinha feito, mas tal ofício não se encontra nos respectivos arquivos, facto que estranho. Vou, portanto, procurar averiguar como é que o Tribunal de Loures me envia aqueles elementos capeados por esse ofício, fazendo referência a um ofício emanado da Assembleia da República, que não saiu daqui ou que, pelo menos, não consta nos respectivos arquivos, segundo a informação prestada pelo meu chefe de gabinete. Em função disso, mandarei juntar esses elementos aos respectivos autos.
Aplausos do PRD.

O Sr. José Luís Ramos (PSD): - Sr. Presidente, pretendia interpelar a Mesa a fim de dar explicações acerca deste incidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Luís Ramos (PSD): - Sr. Presidente, a Comissão Eventual de Inquérito ao Acidente de Camarate, ou à Tragédia de Camarate, concluiu os seus trabalhos em Janeiro e antes disso já tinha pedido ao juiz de Loures uma análise à roupa das vítimas, o que não foi possível efectivar nessa altura. Findo o prazo da Comissão de Inquérito à Tragédia de Camarate, deputados que integravam essa Comissão, entenderam de per si, com deputados do CDS, do PSD e do PS, subscrever uma carta conjunta, em que pediam ao Tribunal de Loures esses exames.
Feito isso, o Tribunal respondeu e enviou esse ofício na sexta-feira, por mão própria, que é entregue por mim nos Serviços de Apoio às Comissões, hoje, terça--feira.
Apenas há um pequeno lapso aí referido, da culpa exclusiva do juiz de Loures: não havia qualquer ofício da Assembleia da República, mas, sim, um ofício subscrito por deputados do CDS, do PS e do PSD, que lhe pediam as diligências que foram agora apresentadas.
Sr. Deputado Correia Azevedo, penso que está esclarecido e percebo a sua insatisfação. Gostaria de lhe perguntar, uma vez que neste momento até já temos provas a mais, se é por isso que está assim tão incomodado.
Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para interpelar a Mesa, certamente, tem a palavra o Sr. Deputado Armando Lopes.

O Sr. Armando Lopes (PS): - Exactamente, Sr. Presidente.
Como foi referido que o tal ofício foi mandado daqui para o Tribunal de Loures e com a assinatura dos deputados do PS, sem nenhuma especificação, pretendo dizer, muito claramente, que não assinei coisíssima nenhuma e que, recentemente, veio ter comigo o Sr. Deputado Armando Vara que diz exactamente o mesmo.

Vozes do PRD: - Claro, claro!

O Sr. José Luís Ramos (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Luís Ramos, penso que o assunto já está esclarecido, pelo que não vamos agora perder mais tempo com isso.

Vozes do PSD: - Não está não!...

O Sr. José Luís Ramos (PSD): - Sr. Presidente, muito rapidamente, peço a palavra para esclarecer este incidente.

Não sou procurador da disciplina partidária do PS, mas quero dizer que confirmo - e o Sr. Deputado Armando Lopes depois verá com todos os elementos da Comissão - que há assinaturas nessa carta, entre as quais a de um deputado do PS. Não tenho a certeza se é ou não a do Sr. Deputado, mas o senhor também não é o procurador de todos os deputados do PS. O que é facto é que as assinaturas estão lá, basta confirmar!

O Sr. Correia Azevedo (PRD): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Certamente não é sobre a mesma matéria, pois não, Sr. Deputado?

O Sr. Corroía Azevedo (PRD): - É sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Ainda é?! Então queira ter a bondade de a fazer rapidamente.

O Sr. Correia Azevedo (PRD): - Foi-me pedido pelo Sr. Deputado José Luís Ramos que o assunto ficasse de vez esclarecido. No entanto, Sr. Presidente, foi exibido p do Sr. Deputado José Luís Ramos um documento que fazia referência a pesquisas recentes nas roupas das vítimas. Pergunto, pois, se o documento que o Sr. Deputado tem corresponde ao mesmo que o Sr. Presidente tem em mão e que suponho que ainda não obteve despacho. Pretendia também saber do Sr. Presidente se esse documento é confidencial e se é correcto, antes de ele ser despachado, fazer qualquer fotocópia particular.

Aplausos ao PRD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, já esclareci que mandei procurar saber quem é que escreveu esse ofício, na medida em que na resposta ao mesmo se refere ter sido a Assembleia da República. Mas já foi explicado pelo Sr. Deputado José Luís Ramos e de forma suficiente, de maneira que já não tenho mais dúvidas sobre este problema.
O Sr. Deputado José Luís Ramos deseja prestar mais algum esclarecimento?

O Sr. José Lufe Ramos (PSD): - Sr. Deputado Correia Azevedo, francamente não percebi qual era a sua pergunta. Se era sobre a fotocópia que diz eu ter exibido, o que tenho comigo é o Diário da Assembleia da República..

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Está muito preocupado em saber quais os documentos que tenho, mas julguei que o Sr. Deputado estaria mais preocupado em apurar a verdade sobre Camarate e não propriamente em saber quais os documentos que tenho ou não.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado José Magalhães, tem a palavra o Sr.ª Deputada Cecília Catarino...

A Sr.ª Cecília Catarino (PSD): - Não, não, Sr. Presidente. É para fazer um protesto à intervenção do Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Cecília Catarino (PSD): - Sr. Deputado José Magalhães, ouvi atentamente a sua intervenção. Ouvi e vi todo o trabalho desenvolvido pelo seu partido e pelo Sr. Deputado na Comissão Eventual de Inquérito ao Acidente de Camarate e há uma dúvida que se me põe: por que é que o Partido Comunista Português quer à viva força, seja de que maneira for, que o que aconteceu na noite de 4 de Dezembro de 1980 seja considerado um acidente e não um atentado, como nós entendemos pelas provas abundantemente produzidas, que se verificou.
Pode o Sr. Deputado estar certo e seguro de que, seja qual for a posição aqui assumida no Plenário por todos e cada um dos partidos, o povo português, ao ter acesso a todo o trabalho produzido pelas Comissões de Inquérito, ficará de uma vez por todas sobejamente esclarecido e confirmado aquilo que pensam, desde 1980: que Camarate foi um atentado premeditado com intuitos nitidamente de, de uma vez, matar dois dos principais, senão os principais, obreiros de uma verdadeira democracia para Portugal.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que nós, deputados do PCP, partimos - e isso é um pouco visível no nosso comportamento em todo este processo - para os inquéritos sucessivos sobre Camarate com a preocupação única de buscar, por todos os meios ao alcance desta Câmara, a verdade, a partir da análise e da apreciação, através dos instrumentos a que estamos todos vinculados (que não são nem os da paixão, nem os da confiança, nem os do medo, nem os do amor partidário, por assim dizer, ou os da dor), mas têm que ser os elementos jurídico-processuais penais que regem as comissões parlamentares de inquérito. São esses os critérios, é essa a bússola, é esse o método. Acho verdadeiramente espantoso que num país em que houve o 25 de Abril, em que já vão treze anos decorridos sobre o 25 de Abril, ainda haja alguém que se erga de dedo estendido, com ar «savonarolesco» para a bancada do Partido Comunista e diga: «Foi um deputado comunista que escreveu o relatório». Foi sim, senhor. E daí?

Aplausos do PCP.

O Orador: - Qual é o problema?

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - O Sr. Deputado José Magalhães, a respeito de dedos, percebe muito. Devo dizer-lhe que esse dedo que está a referir foi o mesmo que da Tribuna nos apontou. Percebeu?

Aplausos do PSD e protestos do PCP.

O Orador: - Sr. Deputado, a diferença entre o meu partido e esta Câmara e o seu partido é a de que no seu partido, quando o Prof. Cavaco diz: «percebeu?», as pessoas agacham-se ..., aqui não.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE, e risos do PSD.

Sucede que no nosso relatório, aprovado pela maioria da Comissão, procurámos considerar, um a um, os diversos aspectos suscitados durante o processo de debate público - repito, público - desta questão. Devo dizer que quem ler o relatório ou quem ler apenas o sumário verifica que lá estão inventariadas as diversas questões, incluindo relatórios dos sucessivos períodos sobre as questões mais polémicas, tais como os fragmentos metálicos, a amostra «H», os resultados da apreciação radiológica. Mais: considerámos de mente limpa as várias hipóteses, mesmo as suscitadas no conhecido livro Camarate, que tinha motivado uma apreciação negativa vinda da Polícia Judiciária e que o vosso partido, no Governo, aceitou. Repito: que o vosso partido, no Governo, aceitou. Nós considerámos essas hipóteses, uma a uma.
Considerámos a hipótese dos pilotos do cargueiro francês, a do Lee Rodrigues, as revelações de um ex--PIDE que por lá apareceu, as questões suscitadas pela «Grande Reportagem», a tese do complot de Lisbonne, que o Sr. Deputado Horácio Marcai repetiu aqui em português, as questões relacionadas com certos aspectos difíceis de explicar, tais como a ausência de comunicações com a torre durante o voo, a performance do avião, a posição relativa dos corpos das vitimas, etc.
Permiti-me, por isso, dispensar, na intervenção que produzi, a consideração de tudo aquilo que está considerado no relatório. Foi isso e apenas isso e não porque dê por provadas as observações feitas, de resto em tom desabrido e sintomático, pelo Sr. Deputado José Luís Ramos, assim como outras. Pura e simplesmente, não me senti vinculado a reproduzi-las; elas estão no relatório. Relatório que - e teríamos muito gosto em termos para isso o vosso voto a favor, mas, ao que parece, não o podemos esperar - poderá ser lido pelo povo português e os cidadãos que o lerem ajuizarão dessas razões.
Agora, permitam-me que vos diga uma coisa: é sintomático dos doentes em situação malévola, em situação difícil, ficarem extremamente sensíveis a tudo, mesmo aos piores curandeiros ...

O Sr. João Salgado (PSD): - Também é médico? ...

O Orador: - ... e o que acontece é que, pelos vistos, há no PSD uma fracção de deputados - a que podíamos chamar a «fracção diabist» - que irrespon-

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savelmente aceita subscrever, com o ar e com o estilo que aqui ouvimos e com o tal dedo do Sr. Deputado Correia Afonso, as teses para as quais não conseguimos encontrar nos autos elementos probatórios. Peço--vos muita desculpa, mas nós não conseguimos encontrar ..., e os Srs. Deputados também não!

Vozes do PSD: - Vocês não querem é encontrar!

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Sr. Deputado José Magalhães, o senhor está verdadeiramente convencido de que aqui em Portugal isso de chamar doentes àqueles que estão contra nós ou que discordam de nós ainda pega?

Aplausos do PSD.

O Sr. João Salgado (PSD): - Isso era no tempo de Salazar! Salazar é que dizia isso!

O Sr. Correia Afonso (PSD): - O Sr. Deputado, que invoca a democracia em cada três palavras que produz - o que para mim é sintomático -, tem a coragem de nos dirigir o labéu de sermos doentes só por não concordarmos consigo?
Mais: não se atreveu a dizer que essa doença era psiquiátrica, mas já agora acabe, se faz favor.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado Correia Afonso, a posição do PSD é difícil. Percebo o seu destempere, mas não é caso para baixar a tanto. Aquilo que eu disse foi que o PSD se comportava «como aqueles doentes que [...]». Isso consta do Diário, pelo que me dispenso de repetir ...

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - E é uma metáfora!

O Sr. João Salgado (PSD): - Depois lemos!

O Orador: - ... e, para quem saiba português, é uma metáfora, como diz o José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - E quem não sabe o que é uma metáfora ...

O Orador: - Agora, a questão grave é esta: é que considero mórbida a maneira como o PSD trata a questão de Camarate. Isso eu disse, repito e repetirei: é mórbida. Foi mórbida desde logo na maneira como um grupo de deputados vossos, contra um Governo vosso, introduziu a questão na Assembleia da República. Os Srs. Carlos Macedo e outros que - (sic transit gloria mundi) - não estão cá - lançaram a questão de Camarate contra um vosso Governo.
O Sr. Deputado considera isto não doentio? A guerra dos Macedos contra Balsemão, dos Euricos contra Meneres Pimentel e Viana Baptista, dos Ribeiros e Castros, Freitas do Amaral e outros contra sabe-se lá quem, dentro e fora do PSD! Considera isto fisiológico? O Sr. Deputado tem uma noção de saúde e de doença que se fez preocupar quanto à sua saúde e à sua doença.

Risos do PCP.

Está um pouco invertido quanto aos conceitos, neste ponto pelo menos. Agora reparemos: consideram também normal que, sendo ministro o Dr. Rui Machete e tendo a Polícia Judiciária um relatório em que rebate, ponto a ponto, o livro do «cartoonista» que temos vindo a citar (e que tem como nome Augusto Cid), os Srs. Deputados cheguem à Assembleia da República, e tendo isso rebatido, instaurem um inquérito parlamentar?! É o mesmo partido que tudo isto faz: aceita no Governo uma coisa e vem a público lançar uma grandíssima suspeição.
E mais: agora querem levar a suspeição além da sua fronteira possível, porque a fronteira é hoje, Srs. Deputados, a fronteira é hoje! Não podem continuar a dizer o que disse e Sr. Deputado José Luís Ramos, uma vez que esse discurso acabou - e congratulo-me com o facto! Não podem continuar a dizer: «Nós, deputados do PSD ...
Eu sei lá se são os deputados do PSD?! Será a fracção «diabisti»? Serão todos? E o Governo? Por que é que o Governo não está aqui, Srs. Deputados? Por que razão é que não está aqui?
Protesto do PSD.

Por que é que o Governo não vem ao debate final em que se discute a questão de Camarate (e lembro que o Governo estava noutras circunstâncias no debate de Camarate)? Então o Governo não tem uma palavra a dizer? Mais, desde 22 de Janeiro, o Governo tem os elementos disponíveis sobre esta matéria. Então não mandam fazer um relatório à Direcção-Geral da Aeronáutica Civil? Então não dizem nada à Polícia Judiciária? Então não pedem uma aclaração? Então não tomam nenhuma iniciativa? Então o Ministro Mário Raposo, que já era Ministro na altura, não tem nenhuma iniciativa? Leiam o seu depoimento na Comissão Parlamentar de Inquérito, publique-se o seu depoimento publique-se o extraordinário depoimento do Ministro Eurico de Melo na Comissão Parlamentar de Inquérito; publique-se o extraordinário depoimento do Prof. Freitas do Amaral na Comissão Parlamentar de Inquérito; e depois disso, meus senhores, entendam--se uns com os outros! A partir de agora, acabou o uso das instituições para resolver um conflito e um fantasma que é vosso e só vosso.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Os Portugueses julgarão a partir dos autos, e só a partir dos autos, com esses elementos. Se os Srs. Deputados estão dispostos a acreditar em teses do género:
Há uma bomba que não deixa vestígios, e portanto a Comissão Parlamentar não encontrou os vestígios de uma bomba que não deixa vestígios.
Se os Srs. Deputados estão dispostos a baixar ao grau zero de racionalidade, força! O caminho é vosso, estão sozinhos, completamente sozinhos. Não contem connosco e a partir de agora não contem também com as instituições. Se não forem amanhã à Polícia Judi-

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ciaria debitar exactamente o que aqui debitaram, a acusação de duplicidade não é apenas uma acusação de duplicidade; é também uma acusação de um comportamento político e eticamente indigno e inqualificável.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Não aceitaremos, a título nenhum, que sobre os escombros da tragédia de Camarate se construa uma farsa nesta Assembleia. Por isso, vamos votar a favor do projecto de resolução.
O povo português que julgue e decida a fim. Ele terá a última palavra.
Aplausos do PCP, do PS, do PRD e do MDP/CDE.

O Sr. José Luís Ramos (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para exercer o direito de defesa.

O Sr. Presidente: - Antes de lhe dar a palavra, queria anunciar que já ultrapassámos o termo da votação para a eleição de dois deputados para integrar a Delegação Portuguesa ao Conselho da Europa.
Pergunto, no entanto, se há algum Sr. Deputado que ainda não tenha votado.
Pausa.
Como já todos votaram, peço aos Srs. Escrutinadores Roleira Marinho, Carlos Galopa e Jorge Patrício o favor de encerrarem as umas e procederem ao escrutínio.
Tem V. Ex.ª a palavra, Sr. Deputado José Luís Ramos.

O Sr. José Luís Ramos (PSD): - Sr. Deputado José Magalhães, muito rapidamente dir-lhe-ei que o PSD e eu próprio não lhe reconhecemos o direito de ser nosso juiz. Portanto, o Sr. Deputado não tem nada que vir aqui armar-se no que quer que seja, na consciência moral de quem quer que seja e muito menos na nossa, Sr. Deputado. Nessa parte fique muito bem descansado!
Em relação à compatibilização ou não entre o Governo, o PSD e os deputados que integraram a Comissão, repito o que há pouco disse, se é que o Sr. Deputado não percebeu: os deputados do PSD que integraram na Comissão Eventual de Inquérito integraram-na como cidadãos eleitos pelo povo. Não tiveram, nem podiam ter, em conta qualquer disciplina partidária nem qualquer opinião, fosse de quem fosse e a que nível fosse da hierarquia partidária ou da hierarquia política, Sr. Deputado. E a diferença que se situa entre nós e os senhores, entre aqueles que votaram a nossa declaração de voto e aqueles que votaram aquilo que foi aprovado na Comissão de Inquérito; é a diferença entre a aferição da política - e da baixa política - e aqueles que trataram de apurar a verdade.
É por isso que o Sr. Deputado José Magalhães não consegue perceber a nossa postura ao longo dos diversos meses de trabalho na Comissão Eventual de Inquérito. Por isso esta situação. Por isso o Sr. Deputado, aqui e hoje, à falta de argumentos, à falta de provas, vem dizer:
Então o que é que o Governo pensa sobre isto? E o Sr. Ministro Eurico de Melo? E o Sr. Professor Freitas do Amaral?
Sr. Deputado José Magalhães, os deputados do PSD que integraram a Comissão Eventual de Inquérito pensam que aquilo que aconteceu no final do relatório, e que foi discutido e amplamente analisado através dos depoimentos, acareações, etc., foi o que dissemos na declaração de voto. Não nos ativemos, nem podíamos fazê-lo, a quaisquer posições, seja de quem for.
Também lhe quero dizer que estou certo de que se o relatório aprovado na Comissão Eventual de Inquérito fosse aquele que preconizámos - não antes porque o Parlamento estava a decidir e o Sr. Deputado podia vir dizer que se o Governo actuasse antes de a Comissão Eventual de Inquérito fechar -, então era porque aqui d'el rei o Governo estava a antecipar-se à Assembleia, aqui d'el rei porque o Governo estava a ultrapassar as competências da Assembleia, aqui d'el rei porque o Governo estava a fazer isto e aquilo. Mas não, o Governo esteve sossegado, calado, como, a nosso ver, era o seu dever. O Governo espera e esperou, até hoje, que a Comissão Eventual de Inquérito ao Acidente de Camarate dissesse de sua justiça. Mas estou convencido, dizia eu, que se a conclusão não fosse aquela que os senhores aprovaram, se não fosse aquela que os senhores referiram, mas outra, o Governo agiria em consonância com aquilo que foi aprovado na Comissão Eventual de Inquérito. Estou certo disso, agora e no futuro e não no passado, como os senhores queriam.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A explicação não vai consistir na reprodução de tudo aquilo que eu disse, embora isso me apetecesse face àquilo que o Sr. Deputado José Luís Ramos acaba de repetir, por sua vez.
Em todo o caso, gostaria de sublinhar que me parece que há limites para tudo e os Srs. Deputados do PSD, e o PSD, excedem os limites razoáveis numa matéria destas que exigia outra seriedade, outra dignidade e, sobretudo, uma ausência completa de duplicidade.
Então o Sr. Deputado José Luís Ramos vem aqui dizer que o Governo não se «mexe» porque a Assembleia da República aprovou o relatório que aprovou?

O Sr. José Luís Ramos (PSD): - Eu não disse isso. Não é nada disso!

O Orador: - O Sr. Deputado está a brincar connosco e com a Assembleia da República, e nós não podemos aceitar esse tipo de atitudes.

O Sr. José Luís Ramos (PSD): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. José Luís Ramos (PSD): - Sr. Deputado, eu não disse nada disso, mas uma coisa completamente diferente.

Se bem que não há perjúrios na Comissão Eventual de Inquérito ...

O Orador: - Faz bem em sublinhar!

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O Sr. José Luís Ramos (PSD): - ... o Sr. Deputado, há pouco, falou nisso, talvez sobre isso saiba mais do que eu -, o que lhe posso dizer, aqui e hoje, termina o dever de sigilo dos membros da Comissão Eventual de Inquérito, é a partir de agora, não antes, não no passado, mas a partir de agora, que cumpre a todos, por todas as formas e mais alguma, tentar fazer as démarches, nomeadamente às instituições competentes, que acharem por bem fazer. Não podia ser no passado, Sr. Deputado, não podia ser há um ano, nem há meio ano, nem mesmo no dia 22 de Janeiro, quando o relatório foi aprovado. Que eu saiba, o dever de sigilo acaba hoje e é a partir de agora que podemos dizer aquilo que eu muito bem disse na tribuna e que claramente assumo.

O Orador: - Sr. Presidente, fico estupefacto: realmente eu conhecia gente formal, mas o Sr. Deputado José Luís Ramos sai daqui com a coroa de gloria da «formalite».

O Sr. José Luís Ramos (PSD): - Muito Obrigado!

O Orador: - O PSD conhece o livro Camarote - ou pelo menos o Sr. Deputado José Luís Ramos idolatra o livro em questão -; é um defensor acérrimo da campanha que O Diabo sempre fez sobre esta matéria, ao contrário de outros semanários: repetiu, ponto por ponto, as teses, sem nenhum grau de novidade, publicadas nesse tipo de órgãos de comunicação social; há processos em tribunal, a questão foi examinada pela Polícia Judiciária; a questão foi vista e revista pelo Governo, como provam as actas da nossa Comissão e o PSD ainda vem reclamar que só a partir de hoje - suponho que não, que ainda será depois da publicação da resolução (cuidado com o formalismo!) - é que se sente obrigado a denunciar publicamente aquilo que considera ser o significado real da tragédia de Camarate?!!!
Srs. Deputados, não há paciência, admito eu, para aceitar essas viragens e esses flic, flac's numa matéria desta gravidade, porque os Srs. Deputados, e o vosso Governo, que conhecem tudo isto teriam tido obrigação de tomar providências. Digo-lhe que não percebo como é que o Sr. Ministro da Justiça, nesta matéria, exibiu o silêncio que continua a exibir neste momento.
Aquilo que eu disse, e repito, é que o PSD não vai poder continuar, a partir de hoje, a ostentar a postura dúplice e a virar «Macedos» contra «Balsemões» e «Balsemões» com «Menéres Pimentéis» contra «Cavacos» e «Cavacos» com «Euricos de Meios» com «Capuchos» esse está com todos, aliás. Não vai poder continuar a fazer isso ...

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - .. pela razão simples de que o povo português vai poder ler as actas integralmente.

Vozes do PSD: - Oxalá!

O Orador: - O que é pena é que vai poder ler essas actas contra o voto do PSD ou com a abstenção envergonhada e envergonhante do PSD, e isso lamentamos profundamente.
Quanto ao mais, o juiz há-de ser serenamente o povo português ...

Vozes do PSD: - Exacto!

O Orador: - ... e devo dizer-lhe que isso não nos inquieta minimamente ...

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Inquieta-nos apenas que um partido que desempenha o papel fulcral que o PSD desempenha na cerni política portuguesa, como é sabido, possa dar no tratamento de uma matéria deste melindre e desta impotência o tom de tragicomédia a que hoje assistimos, lamentavelmente, nesta Sala.
Devo dizer que lamentamos profundamente, porque é extremamente degradante.
Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Peço ao Sr. Vice-Presidente Carlos Lage o favor de se dirigir ao meu gabinete para presidir a i ma breve conferência de líderes parlamentares, apenas e tão-só, para apreciarem um aspecto pontual quinto à programação das votações que irão ter lugar.
Aos Srs. Representantes dos grupos parlamentares peço o favor de lá comparecerem para decidirem sobre essa questão.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Henrique de Moraes.
Informo de que dispõe de três minutos.

O Sr. Henrique de Moraes (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sei que disponho de muito pouco tempo e, por isso mesmo, direi breves palavras, já que também f i: parte da Comissão de Inquérito à tragédia de Camarate e não quero deixar de dar aqui o meu testemunhei daquilo que se passou e da resolução e votação que produzi nessa Comissão.
A Comissão reuniu durante mais de um ano, trabalhou profundamente e de uma maneira que eu considero muito difícil, porque era difícil a matéria que estava em causa. Produzimos um relatório que foi aprovado, mas não com o meu voto. É a essa circunstância que quero aqui vir dar o meu testemunho pessoal.
Votei a favor da tese que considera a tragédia de Camarate como uma tragédia de causa humana e, por isso mesmo, não quero deixar de, perante a Assembleia e de todo o povo português - que, penso, irá, em última análise, julgar o nosso trabalho e a nossa decisão, honrando assim quem morreu nesse dia -, afirmar que estou convencido, em consciência, de que a tragédia d: Camarate foi realmente um crime.

Aplausos do CDS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, o Sr. Secretário vai proceder à leitura do projecto de resolução n.º 40/IV.
O Sr. Secretário (Daniel Bastos): - O projecto de resolução n.º 40/IV, apresentado por deputados do PS, do PRD, cio PCP e do MDP/CDE, é do seguinte teor:
A Assembleia da República, tendo apreciado o relato io apresentado pela Comissão Eventual de Inquérito ao Acidente de Camarate, constituída

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pela resolução n.º 1/86, de 2 de Janeiro, delibera, nos termos do artigo 6.º da Lei n. º 43/77, de 18 de Junho:

a) Mandar publicar no Diário da República, 1.º série, o relatório da Comissão e respectivas declarações de voto em anexo à presente resolução;
b) Dar publicidade, na maior extensão possível, aos autos da Comissão Eventual de Inquérito, cujo relatório foi apreciado pelo Plenário, bem como das que a antecederam, nos termos decorrentes das disposições legais aplicáveis, cabendo ao Presidente e aos Vice--Presidentes da Assembleia da República assegurar que sejam solicitadas aos depoentes as autorizações necessárias e realizadas as demais diligências necessárias ao público acesso aos documentos de inquérito;
c) Facultar de imediato e integralmente os autos à Procuradoria-Geral da República, para que possa examiná-los, avaliar os elementos deles constantes e proceder consoante as conclusões da apreciação que leve a cabo;
d) Recomendar que, pelas entidades competentes do Governo e da Administração Pública, sejam ainda adoptadas as providências necessárias e adequadas para que os elementos juntos aos autos, na sequência das averiguações da Comissão, possam ser examinados por peritos aeronáuticos estrangeiros, cuja intervenção foi solicitada e não pode ser obtida pela Assembleia da República.

O Sr. Presidente: - Peço aos serviços competentes o favor de procurarem verificar se alguns Srs. Deputados estão a trabalhar em comissões, porque vamos entrar em processo de votação.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, os Srs. Deputados do CDS tinham deixado em aberto a questão de saber se, sim ou não, subscreviam o texto que foi depositado na Mesa apenas por necessidades burocráticas.
Gostava, pois, de saber se os Srs. Deputados do CDS formalizam essa assinatura ou se entendem não o fazer antes que o texto seja submetido a votação.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Gomes de Pinho.

O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, respondendo à pergunta acabada de fazer, quero informar que não subscreveremos o texto.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Guido Rodrigues.

O Sr. Guido Rodrigues (PSD): - Sr. Presidente, solicito a V. Ex.ª que se aguarde alguns momentos pelos nossos colegas que se encontram na conferência de lideres e em outros trabalhos parlamentares para que participem nas votações a que vamos proceder.

O Sr. Presidente: - Vamos aguardar alguns momentos, Srs. Deputados.
Pausa.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Se bem entendi, a pedido do PSD, a reunião de líderes teria sido interrompida. Neste momento estou na dúvida se a reunião foi ou não interrompida, inclusivamente porque não estamos lá representados: quando nos dirigíamos para lá, perante o pedido do PSD, sobrestámos a isso.
Assim, estou sem saber qual a situação em que nos encontramos. Se há conferência de líderes, teremos de estar presentes.

O Sr. Correia Afonso (PSD): - Agora há votações.

O Orador: - É verdade, mas parece que a conferência de líderes continua a decorrer, não obstante a vossa solicitação, que tem o nosso acordo.

O Sr. Guido Rodrigues (PSD): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Guido Rodrigues (PSD): - Na realidade, a minha ideia era a de que a conferência de líderes fosse interrompida ou terminasse e que os Srs. Deputados viessem para o Plenário para se proceder às votações que se vão seguir. Era essa a minha ideia e é esse o desejo do PSD.

O Sr. Presidente: - Vou já mandar chamar os representantes dos grupos parlamentares que estão na conferência de líderes.
Pausa.

Srs. Deputados, vamos, pois, proceder à votação, na generalidade, do projecto de resolução n.º 40/1 V.

O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, quero solicitar que a votação na especialidade se faça por alíneas.

O Sr. Presidente: - Assim se fará, Sr. Deputado. Vamos proceder à votação, na generalidade.

Submetido a votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PRD, do PCP, do MDP/CDE e dos deputados independentes Ribeiro Telles e Maria Santos e as abstenções do PSD e do CDS.

Entrando na especialidade, vamos votar a alínea a).

Submetida a votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PS, do PRD, do PCP, do MDP/CDE e dos deputados independentes Ribeiro Telles e Maria Santos e votos contra do CDS.

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Srs. Deputados, vamos votar a alínea b).
Submetida a votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência dos deputados independentes Borges de Carvalho e Rui Oliveira e Costa.
Srs. Deputados, vou submeter à votação a alínea c).
Submetida a votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PRD, do PCP, do CDS, do MDP/CDE e dos deputados independentes Ribeiro Tel-les e Maria Santos e a abstenção do PSD.
Srs. Deputados, vamos votar a alínea d).
Submetida a votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PRD, do PCP, do CDS, do MDP/CDE e dos deputados independentes Ribeiro Teles e Maria Santos e a abstenção do PSD.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação final global.
Submetido a votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PRD, do PCP, do MDP/CDE e dos deputados independentes Ribeiro Telles e Maria Santos e as abstenções do PSD e do CDS.

O Sr. Correia de Azevedo (PRD): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Correia de Azevedo (PRD): - Sr. Presidente, é apenas para informar V. Ex." de que o PRD fará chegar à Mesa uma declaração de voto por escrito.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, informo W. Ex.as de que não é necessário fazerem avisos dessa natureza, dado que ficam autorizados a apresentar declarações de voto por escrito, até à próxima quinta--feira, de todas as votações que irão hoje ter lugar.
Vamos de seguida proceder à votação, na generalidade, do texto alternativo, apresentado pela Comissão de Integração Europeia, respeitante aos projectos de lei n.05 381/IV, 385/IV e 386/IV.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Capucho (PSD): - Pergunto a V. Ex.ª se é legítimo a minha bancada requerer, ao abrigo das disposições regimentais aplicáveis, o adiamento da votação na especialidade para a próxima reunião plenária do texto alternativo a este conjunto de diplomas, no caso de ser aprovado na generalidade.
Risos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, em função daquilo que foi deliberado em conferência de líderes, isso não é possível, uma vez que esta se manifestou no sentido de tal processo não ser utilizado hoje.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, sendo assim, o PSD, que se manifesta frontalmente contra o agenciamento na especialidade e a votação global final, hoje, quer deste diploma quer do que se segue, na da votação, adoptará as medidas que entender necessárias junto da Presidência da República.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): - Não vai mandar no Presidente. Mais pressões sobre o Presidente?!...

O Orador: - ..., para que efectivamente não entrem em vigor - dada a forma como se está a pretender que sejam aprovados- estes projectos de lei.

O Sr. Presidente: - Fica registado, Sr. Deputado.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, peço à Mesa o especial lavor de identificar os projectos de lei não apenas pelos números, que nem sempre os temos, mas pela matéria, isto por que estamos aqui ligeiramente perplexos...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, estamos a apreciar o texto alternativo aos projectos de lei n.º 381/IV, do Partido Renovador Democrático, sobre a intervenção da Assembleia da República em matérias respeitantes à participação de Portugal nas Comunidades Europeias, n.º 385/IV, do Partido Socialista, sobre a participação da Assembleia da República na formulação das políticas comunitárias, e n.9 386/IV, do Partido Comunista Português, que estabelece normas tendentes a salvaguardar e garantir o pleno exercício das competências da Assembleia da República no tocante às questões decorrentes da adesão à CEE.

Pausa.

Como não há inscrições, vamos votar, na generalidade, o texto alternativo aos diplomas que enunciei.
Submeti Io a votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PRD, do PCP, do CDS, do MDP/CDE e dos deputados independentes Maria Santos e Ribeiro Telles e votos contra do PSD.
Srs. Debutados, vamos agora proceder à votação na especialidade.
Submetido a votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PRD, do PCP, do CDS, do MDP/CDE e dos deputados independentes Maria Santos e Ribeiro Telles e votos contra do PSD.

É o seguinte:

Artigo 1.º

Informações sobre o relacionamento com as Comunidades Europeias

l - O Governo facultará à Assembleia da República informação detalhada sobre as matérias em apreciação nas várias instituições das Comunidades, por forma que seja plenamente perceptível a elaboração das políticas comunitárias nos diversos domínios, bem como a posição das entidades que tem a cargo a definição da posição portuguesa face a cada uma delas.

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2 - O Governo enviará à Assembleia da República, com urgência, informações completas sobre:

a) Projectos de regulamentos, directivas, decisões, recomendações, resoluções e pareceres do Conselho de Ministros das Comunidades Europeias propostos pela Comissão;
b) Programas e orientações preparados pela Comissão das Comunidades Europeias como base para possíveis deliberações do Conselho de Ministros com natureza legislativa;
c) As modificações que forem sendo introduzidas pelas diferentes instâncias das instituições comunitárias acerca dos projectos, programas e orientações referidos nas alíneas anteriores;
d) Resultados das deliberações pelo Conselho sobre os projectos, programas e orientações referidos nas alíneas anteriores.

3 - O Governo informará a Assembleia da República, regularmente e em tempo útil, relativamente às ordens do dia das reuniões do Conselho de Ministros das Comunidades.

4 -A Assembleia da República disporá do acesso a documentação comunitária recebida pela Representação Permanente de Portugal junto das Comunidades Europeias e ainda a documentação elaborada pela Direcção-Geral das Comunidades Europeias, pela Comissão Interministerial para as Comunidades Europeias e pelas estruturas orgânicas de cada Ministério incumbidas da coordenação interna de assuntos comunitários.

Artigo 2.º Competência da Assembleia da República

1 - O Governo consultará a Assembleia da República sobre as posições a assumir nas várias instituições comunitárias, sendo tal consulta obrigatória sempre que esteja em causa matéria que, pelas suas implicações, envolva a competência da Assembleia da República, devendo, em cada caso, a Comissão referida no artigo 4.º elaborar o competente parecer.
2 - A Assembleia da República, no exercício das suas competências, pronunciar-se-á, por iniciativa própria e sempre que o julgar conveniente, sobre os projectos de legislação e de orientação das políticas comunitárias.

Artigo 3.º Verbas dos fundos estruturais

A intervenção da Assembleia da República no tocante ao planeamento e ao financiamento decorrentes da adesão, designadamente no respeitante aos fundos estruturais, exerce-se nos termos da lei do enquadramento do Orçamento do Estado e dos planos ou programas nacionais em que se preveja a utilização daqueles fundos.

Artigo 4.º Comissão para os Assuntos das Comunidades Europeias

l - A Comissão Parlamentar especialmente incumbida de acompanhar os assuntos relacionados com a participação de Portugal nas Comunidades Europeias será designada por Comissão para os Assuntos das Comunidades Europeias.

2 - A Assembleia da República, através dos seus serviços próprios, disporá de adequados arquivos de documentação sobre as Comunidades Europeias e sobre todos os aspectos que se relacionem com a integração de Portugal nas estruturas, os quais serão postos à disposição dos deputados e, de modo especial, da Comissão referida no número anterior.

Artigo 5.º

Comissão Mista Assembleia da República - Parlamento Europeu

1 - A fim de estimular o reforço das instituições parlamentares na vida das Comunidades Europeias, bem como a sua solidariedade, e de contribuir para um melhor acompanhamento da participação de Portugal nas suas actividades, é criada uma Comissão Mista Assembleia da República - Parlamento Europeu.
2 - A Comissão Mista Assembleia da República - Parlamento Europeu é constituída por deputados escolhidos de acordo com o princípio de proporcionalidade e em partes iguais pela Assembleia da República e pelos deputados eleitos em Portugal para o Parlamento Europeu.
3 - A Comissão Mista Assembleia da República - Parlamento Europeu elaborará o seu próprio Regimento e será presidida rotativamente por um dos seus membros pertencentes à Assembleia da República ou ao Parlamento Europeu.

Artigo 6.º Relatório anual

O Governo apresentará, nos três meses seguintes ao fim de cada ano, um relatório sobre a evolução ocorrida nesse ano do relacionamento entre Portugal e as Comunidades Europeias, em que se analisem nomeadamente as deliberações tomadas ou projectadas pelas instituições dessas Comunidades com maior impacte para Portugal, as medidas postas em prática pelo Governo em resultado das deliberações dos órgãos comunitários e a política de adaptação de vários sectores da vida nacional decorrente da participação nas Comunidades Europeias.

Srs. Deputados, vamos proceder à votação final global deste mesmo texto alternativo.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PRD, do PCP, do CDS, do MDP/CDE e dos deputados independentes Ribeiro Telles e Maria Santos e votos contra do PSD.

Srs. Deputados, vamos apreciar o texto alternativo ao projecto de lei n.º 326/IV (PCP), relativo a medidas de emergência sobre o ensino-aprendizagem do Português.

O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, o que está em votação é o texto alternativo subscrito por vários partidos ou não?

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O Sr. Presidente: - Sim, Sr. Deputado. É o texto alternativo.

O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Nesse caso, Sr. Presidente, talvez fosse conveniente indicai os partidos que o subscrevem.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado.

Os Srs. Deputados que subscrevem o texto alternativo são os seguintes: António Osório, do PCP, Agostinho Domingues, do PS, Carlos Sá Furtado, do PRD, Gomes de Pinho, do CDS, e Seiça Neves, do MDP/CDE.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, uma vez que não há um texto alternativo da Comissão, como tal - há é um conjunto de propostas de alteração subscritas por deputados de diversos partidos -, é necessário regimentalmente, creio eu, submeter, primeiro, à votação, na generalidade, o projecto de lei do PCP, porque só esse é que existe na Mesa e a Comissão, como tal, não tem um texto alternativo.
Jurídico-formalmente é, pois, preciso fazer, primeiro, a votação, na generalidade, do projecto de lei que existe, aprovando em seguida as alterações, que constituem materialmente um articulado alternativo, mas que o não é formalmente.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 326/IV, subscrito pelo PCP, PS, PRD, CDS e MDP/CDE, relativo a medidas de emergência sobre o ensino-aprendizagem do português.
Submetidos à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PRD, do PCP, do MDP/CDE e dos deputados independentes Maria Santos e Ribeiro Telles e votos contra do PSD e do deputado independente Rui Oliveira e Costa e a abstenção do CDS.
Srs. Deputados, em relação a este projecto de lei há um texto de alteração subscrito pelos Srs. Deputados António Osório, Agostinho Domingues, Sá Furtado, Gomes de Pinho e Seiça Neves.
Há alguma objecção a que a votação, na especialidade, destes artigos se faça em bloco?

Pausa.

Visto não haver, vamos proceder dessa forma.

Submetidos à votação, foram aprovados, com votos a favor do PS, do PRD, do PCP, do CDS, do MDP/CDE e dos deputados independentes Maria Santos e Ribeiro Telles e votos contra do PSD e do deputado independente Rui Oliveira e Costa.

É o seguinte:

Artigo 1.º Ensino-aprendizagem d* língua portuguesa

O ensino-aprendizagem da língua portuguesa deve ser estruturado por forma que todas as componentes curriculares contribuam, de forma sistemática, para o desenvolvimento das capacidades do aluno ao nível da compreensão e produção de enunciados orais e escritos em português.

Artigo 2.º

Reestruturação dos programas e formação contínua

Com vista à concretização do disposto no número interior, serão adoptadas medidas relativas aos primeiros nove anos de escolaridade, nomeadamente:

a) Reestruturação vertical e horizontal dos programas, com definição clara e rigorosa do objecto de estudo e dos objectivos a alcançar, designadamente os objectivos mínimos, nos diferentes níveis de ensino, no domínio da língua e da cultura portuguesas;
b) Remoção de acções de formação contínua cê professores, tendo em conta a heterogeneidade das habilitações científicas e a diversidade da formação profissional dos docentes., bem como a necessidade de adopção de medidas tendentes à concretização do disposto no artigo anterior.

Artigo 3.º Medidas excepcionais

Sempre que tal se revele necessário, serão adoptadas medidas excepcionais que dêem resposta eficaz a dificuldades patenteadas por alunos no domínio da aprendizagem e utilização da língua materna.

Artigo 4.º Bibliotecas escolares

1 - Serão criadas bibliotecas em todos os estabelecimentos de ensino que ainda as não possuam e implementadas medidas no sentido de assegurar a permanente actualização e o enriquecimento bibliográfico das bibliotecas escolares.
2 - As bibliotecas escolares serão apetrechadas com os livros indispensáveis ao desenvolvimento cultural e ao ensino-aprendizagem da língua materna e adequados à idade dos alunos, cabendo ao Ministério da Educação e Cultura criar as condições de acesso e de orientação dos alunos relativamente à leitura.

Artigo 5.º

Outras actividades

1 - Os estabelecimentos de ensino organizarão actividades visando o desenvolvimento nas crianças e nos jovens do interesse pela leitura e pela cultura.
2 - O disposto no número anterior poderá revestir- formas diversificadas e designadamente:

a) Acções de animação da biblioteca;
b) Desenvolvimento da imprensa escolar;
c) Dramatização de textos.

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Artigo 6.º Meios audiovisuais

O Governo, através dos departamentos responsáveis pela educação e pela cultura, promoverá a realização de programas de formação e de divulgação da língua, da literatura e da cultura portuguesas, usando, para isso, os meios áudio-visuais à sua disposição.

Artigo 7.º

Plano de Desenvolvimento do Sistema Educativo

O Governo incluirá no Plano de Desenvolvimento do Sistema Educativo a apresentar à Assembleia da República um programa articulado de medidas sobre o ensino do português, tendo a ele subjacente um quadro orientador que lhe confira:

a) Coerência científica e psicológica;
b) Exequibilidade;
c) Reavaliações regulares e reajustamentos sempre que necessário.

Artigo 8.º

Norma revogatória

Fica revogada toda a legislação que contrarie o disposto na presente lei, nomeadamente o despacho n.º 32/EBS/86, de 17 de Setembro, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 227, de 2 de Outubro de 1986.
Vamos passar à votação final global do projecto de lei n.º 326/IV.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PRD, do PCP, do CDS, do MDP/CDE e dos deputados independentes Maria Santos e Ribeiro Telles e votos contra do PSD e do deputado independente Rui Oliveira e Costa.
Srs. Deputados, vamos passar à votação final global da proposta de lei n.º 26/1 V, sobre a Lei de Segurança Interna.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PS, do PRD, do CDS e dos deputados independentes Ribeiro Telles e Rui Oliveira e Costa, votos contra do PCP, do MDP/CDE e da deputada independente Maria Santos e a abstenção do deputado Vasco da Gama Fernandes (PRD).
Srs. Deputados, vamos passar à votação final global da proposta de lei n.º 14/IV, sobre a Lei do Serviço Militar.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PS, do PRD, do PCP, do CDS, do MDP/CDE e dos deputados independentes Ribeiro Telles e Rui Oliveira e Costa e o voto contra da deputada independente Maria Santos.
Vamos passar à votação final global da lei de alteração ao Decreto-Lei n.º 358/86, de 27 de Outubro, respeitante às ratificações n.08 109/IV (PS), 111/IV (PCP) e 114/IV (PRD), sobre alienação de quotas e acções do Estado em empresas de comunicação social.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PRD, do MDP/CDE e dos deputados independentes Maria Santos e Ribeiro Telles, votos contra do PSD e do CDS e a abstenção do deputado independente Rui Oliveira e Costa.
Srs. Deputados, vamos passar à votação final global do texto alternativo da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias aos projectos de lei n.ºs 405/IV, 409/IV, 411/IV, 412/IV, 413/IV e 414/1 V, sobre eleições de deputados ao Parlamento Europeu.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PRD, do PCP, do CDS, do MDP/CDE, dos deputados independentes Maria Santos e Ribeiro Telles, votos contra dos deputados Cecília Catarino, Jardim Ramos, Cândido Pereira, Vargas Bulcão e Melo Alves (PSD) e abstenções do PSD e do deputado independente Rui Oliveira e Costa.
Vamos passar à votação final global do texto alternativo da Comissão de Juventude aos projectos de lei n.05 171/IV, 400/IV, 401/IV e 404/IV, respeitantes ao Dia do Estudante.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS, do PRD, do PCP, do MDP/CDE e dos deputados independentes Maria Santos e Ribeiro Telles e Rui Oliveira e Costa e votos contra do CDS.
Vamos passar à votação final global do texto alternativo da Comissão de Juventude aos projectos de lei n.0! 61/IV, 88/IV, 89/IV, 149/IV, 150/IV, 151/IV e 153/IV, sobre o enquadramento legal das associações de estudantes.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, no artigo 5.º, n.º 2, 2.º linha, do texto alternativo deve suprimir-se a expressão «[...] do seu exercício e [...]». Ou seja, o n.º 2 do artigo 5.º ficará com a seguinte redacção:
[...] o presente diploma, para efeitos da representação perante o Estado, [...]
O Sr. Presidente: - Há alguma objecção a esta alteração, Srs. Deputados?
Pausa.
Visto não haver, vamos votar o texto alternativo, com a emenda que o Sr. Deputado Carlos Coelho referiu.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Srs. Deputados, vamos passar à votação final global do texto alternativo da Comissão de Economia, Finanças e Plano aos projectos de lei n.ºs 48/IV, 92/IV e 94/IV, de revisão da Lei do Enquadramento do Orçamento do Estado.

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Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PRD, do PCP, do MDP/CDE e dos deputados independentes Mana Santos e Ribeiro Telles, votos contra do PSD e do deputado independente Rui Oliveira e Costa e a abstenção do CDS.
Vamos passar à votação final global do projecto de lei n.º 343/IV, sobre extinção da enfiteuse ou aforamento.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Srs. Deputados, vamos passar à votação final global do texto alternativo da Comissão de Agricultura e Mar, respeitante às ratificações n.05 95/IV, 96/IV e 97/IV, referentes ao Decreto-Lei n.º 293-A/86, de 12 de Setembro, que cria a sociedade anónima de responsabilidade limitada com a designação de SILOPOR.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PRD, do PCP, do MDP/CDE e dos deputados independentes Maria Santos e Ribeiro Telles e votos contra do PSD, do CDS e do deputado independente Rui Oliveira e Costa.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, creio que na cronologia normal das votações se seguiria uma série de projectos que, abreviadamente, costumamos designar por «pacote autárquico» e que diz respeito a elevação a vilas, cidades e a criação de freguesias. Ora, a conferência de líderes parlamentares decidiu não proceder ao seu agendamento por razões que os colegas conhecem, contudo, V. Ex.ª convocou nova conferência de líderes para reapreciar o problema à luz de uma informação entretanto surgida no sentido de que em relação às novas vilas e cidades teria havido por parte da Comissão de Administração Interna e Poder Local um parecer favorável a este agendamento.
Como essa conferência de líderes não teve lugar porque dois ou três grupos parlamentares não compareceram por, em plenário, se estar em votações, gostaria de solicitar a V. Ex.ª que providenciasse no sentido de saber, junto de cada um dos grupos parlamentares, se não será possível ter conhecimento da disponibilidade ou não de procedermos às votações dos diplomas que apenas dizem respeito a elevação a vilas e a cidades.
Desde já devo adiantar que o meu grupo parlamentar está disposto a tal.

O Sr. Soares Cruz (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Soares Cruz (CDS): - Sr. Presidente, gostaria de informar que o meu grupo parlamentar não aceita esta sugestão; antes está disponível a participar numa eventual conferência de líderes parlamentares, caso V. Ex.ª entenda convocá-la.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, também peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, gostaria de informar que pretendíamos solicitar um intervalo de 15 minutos. Portanto, a realizar-se a conferência de líderes agradecia que ela não tivesse lugar antes desse intervalo, que já era nossa intenção solicitar.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado requereu um intervalo de 15 minutos?

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, se houver uma interrupção da votação para se realizar uma conferência cê líderes parlamentares, então solicitarei um intervalo de 15 minutos, mas não o queria fazer interrompendo a votação. No entanto, se a votação for interrompida por outras razões, aproveitarei para solicitar um intervalo de 15 minutos.

O Sr. Presidente: - Então, se V. Ex.ª me permite, tomo isso como um requerimento.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Não, Sr. Presidente. Se me permite, sem ser sob a forma de requerimento, mas apelando para a compreensão de V. Ex.a, pergunto se é ou não intenção do Sr. Presidente realizar uma conferência de líderes.

O Sr. Presidente: - Se o Sr. Deputado requerer um intervalo de 15 minutos, convocarei de imediato uma conferência cê líderes.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Se o Sr. Presidente convocar uma reunião de líderes parlamentares, então requeira a interrupção a que já aludi.

Risos.

O Sr. José Carlos Vasconcelos (PRD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Carlos Vasconcelos (PRD): - Sr. Presidente, apenas gostaria de recordar que ainda temos de votar os projectos de lei respeitantes à responsabilidade criminal dos titulares de cargos públicos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o processo de votações ainda não terminou.

O Orador: - Pela intervenção que há pouco o Sr. Deputado António Capucho fez parti do princípio que já tinham acabado as votações referentes aos projectos de lei.

Vozes do PSD: - Faltam muitas!

O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, estamos no decurso de um processo de votação e pensamos que sei ia inadequado que ele fosse interrompido para se realizar a conferência de líderes. A nossa sugestão é a de que se concluam as votações das matérias

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sobre as quais não há controvérsia em relação ao seu agenciamento e, depois disso, se V. Ex.ª assim o entender, realizar-se-ia a conferência de líderes.
Parece-nos inconveniente que, neste momento, o processo de votações seja interrompido para dar lugar à conferência de líderes.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à votação final global do texto alternativo da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias aos projectos de lei n.ºs 377/IV e 384/IV, relativo aos crimes dos titulares dos cargos políticos, penas e respectivos efeitos.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PRD, do PCP, do CDS, do MDP/CDE e dos deputados independentes Maria Santos e Ribeiro Telles, e votos contra do PSD e do deputado independente Rui Oliveira e Costa.
Srs. Deputados, vamos passar à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 426/IV (versão subscrita por deputados de todos os partidos), respeitante à alteração da data de entrada em vigor do Código de Processo Penal.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Vamos votar na especialidade.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
É o seguinte:

Artigo único

A data de entrada em vigor do Código de Processo Penal, prevista no n.º l do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 78/87, de 17 de Fevereiro, é diferida para l de Janeiro de 1988.
Vamos passar à votação final global.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Srs. Deputados, vai ser submetido à votação, na generalidade, o projecto de lei n.º 168/IV, relativo ao direito à contagem, para efeitos de aposentação, do tempo em que os trabalhadores dos CTT contratados para além do quadro permaneceram em regime de disponibilidade, em serviço (alteração ao Decreto-Lei n.º 150/83, de 26 de Abril).
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do deputado independente Borges de Carvalho.
Srs. Deputados, vamos passar de imediato à votação, na especialidade, do mesmo projecto de lei.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do deputado independente Borges de Carvalho.

É o seguinte:

Artigo único

É aditado o artigo 1.º-A ao Decreto-Lei n.º 150/83, de 6 de Abril, com a seguinte redacção:

Artigo 1.º-A

Idêntico tratamento será aplicado aos trabalhadores contratados para além dos quadros de pessoal da empresa, em relação ao período de tempo em que permaneceram em regime de disponibilidade, sem serviço.
Vamos agora proceder à votação final global.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do deputado independente Borges de Carvalho.
Srs. Deputados, vai ser submetido à votação o projecto de lei n.º 112/IV, do PRD, relativo à transmissão pela rádio e pela televisão de produções dramáticas portuguesas.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Capucho.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, em nossa opinião, este projecto de lei não está em condições de ser submetido a votação final global.
A informação prestada em conferência de líderes era de que este diploma estaria pronto no que respeita à votação na especialidade. Contudo, segundo a informação que nos chega, não foi ainda concluído o processo de votação na especialidade, pelo que o projecto de lei não está ainda em condições de ser submetido a votação final global.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Carlos Vasconcelos.

O Sr. José Carlos Vasconcelos (PRD): - Sr. Presidente, de facto, o Sr. Deputado António Capucho tem razão, mas uma vez que houve uma troca de impressões entre deputados de vários grupos parlamentares relativamente ao aspecto do diploma sobre o qual havia dúvidas, peço atenção para a possibilidade de, depois da conferência de líderes, este projecto de lei ser votado ainda hoje.
Agradeceria, portanto, que não fosse desde já excluída essa possibilidade, ficando a mesma dependente da conferência de líderes.

O Sr. Presidente: - Tem razão o Sr. Deputado António Capucho, pelo que este projecto de lei é retirado até nova oportunidade.
Srs. Deputados, vão ser lidas as actas que resultaram da verificação do escrutínio das votações secretas que tiveram lugar.
Foram lidas. São as seguintes:

Acta sobre a eleição para o Conselho de Comunicação Social

Aos 28 de Abril de 1987, realizou-se no Plenário da Assembleia da República a eleição para o Conselho de Comunicação Social, tendo-se apresentado a sufrágio o candidato João José Magalhães Ferreira Pulido de Almeida.

Entraram nas umas 203 votos, assim distribuídos:

Votos a favor - 116; Votos brancos - 78; Votos nulos - 9.

Verifica-se, assim, que o candidato proposto não obteve o número de votos necessários à respectiva investidura.

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Acta sobre a eleição da Delegação da Assembleia da República na Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa (membros suplentes).
Em 28 de Abril de 1987 procedeu-se no Plenário da Assembleia da República à eleição em epígrafe, tendo-se verificado a entrada nas umas de 203 votos, assim distribuídos pelos diversos candidatos:

Votos a favor
Votos não
Abstenções
Brancos
Licinio Moreira da Silva
106
61
23
13
Aurora M. Borges de Carvalho
94
79
14
16
Raul Fernando S. C. Brito
151
36
10
6

Verifica-se assim que os candidatos Licínio Moreira da Silva e Raul Fernando S. Costa Brito são os candidatos que obtiveram o número de votos necessário à respectiva investidura.
Acta relativa à concessão de autorização para que diversos senhores deputados sejam ouvidos em tribunal.
Aos 28 de Abril de 1987, realizou-se no Plenário da Assembleia da República a votação do Relatório da Comissão de Regimento e Mandatos sobre o pedido de autorização para que os senhores deputados abaixo listados sejam ouvidos como arguidos, por infracção ao artigo 1.º da Lei n.º 4/83, de 2 de Abril.

Entraram nas urnas 203 votos, assim distribuídos:

Votos a favor
Votos não
Abstenções
Brancos
Henrique Rodrigues da Mata
169
16
12
6
Joaquim Eduardo Gomes
169
16
12
6
Fernando Henriques Lopes
168
17
12
6
António Magalhães Silva
168
17
12
6
Victor Manuel L. Vieira
168
17
12
6
Carlos M. Pereira Pinto
169
16
12
6

Verifica-se, assim, que aos senhores deputados se aplica o parecer constante do relatório da Comissão.
Srs. Deputados, vamos interromper os nossos trabalhos por 15 minutos.
Solicito aos presidentes dos grupos parlamentares o favor de comparecerem no meu gabinete.
Eram 19 horas e 50 minutos.
Srs. Deputados, está reaberta a sessão. Eram 20 horas e 55 minutos.
Srs. Deputados, por lapso, não foram postas em aprovação os n.05 33 e 34 do Diário, o que faço agora.

Pausa.

Não havendo objecções, estão, pois, aprovados. Srs. Deputados, encontra-se na Mesa uma proposta de deliberação, que vai ser lida.

O Sr. Secretário (Daniel Bastos):

Proposta de deliberação

A Assembleia da República deliberou conferir ao seu Presidente os poderes necessários para convocar as comissões especializadas para efeitos de redacção final dos projectos e propostas de lei aprovados.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar a proposta de deliberação que acabou de ser lida.
Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade. Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, neste quadro, pretendia solicitar a V. Ex.ª que fosse mantida a convocação feita para amanhã, às 10 horas e 30 minutos, da reunião da Comissão de Administração Interna e Poder Local, a fim de se proceder à redacção final da lei relativa ao Estatuto do Eleito Local.

O Sr. Presidente: - Muito bem, Sr. Deputado.

Fica, portento, convocada a Comissão de Administração Interna e Poder Local para os efeitos que V. Ex.ª acatou de referir. Pergunto, entretanto, aos senhores presidentes das comissões se estão convocadas para amanhã mais reuniões de comissões.

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado Roberto Amaral, que é o presidente da Comissão de Negócios Estrangeiros e Emigração

O Sr. João Amaral (PCP): - Ó Sr. Presidente, não pode ser!...

O Sr. Roberto Amaral (PRD): - Sr. Presidente, a Comissão de Negócios Estrangeiros e Emigração também convocou hoje uma reunião para amanhã às 11 horas.

O Sr. Presidente: - Essa reunião é para efeitos de redacção fim l?

O Sr. Roberto Amaral (PRD): - Não, Sr. Presidente. Destina-se a aprovar duas actas em atraso por forma que todas elas fiquem aprovadas.

O Sr. Presidente: -- Por analogia, essa convocação está perfeitamente justificada, pelo que deve ser mantida.

O Sr. João Amaral (PCP): - Não pode ser, Sr. Presidente!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelha.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, certamente por lapso, não entendi bem o que V. Ex.ª disse antes, n- as em relação aos diplomas que votámos hoje, presumo que será necessário que V. Ex.ª convoque as comissões para efeitos de redacção final depois de voltarem da assessoria jurídica.

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O Sr. Presidente: - Certamente que sim, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Mas é necessário avisar desde já?

O Sr. Presidente: - Certamente que não, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Então, peço desculpa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, a questão agora colocada pelo Sr. Deputado Roberto Amaral em relação ao funcionamento de uma comissão para aprovação de duas actas levanta uma questão de fundo.

Até aqui ainda conseguíamos velejar, embora com bastantes dúvidas, dado que compete à Comissão Permanente, nos termos da alínea h) do n.º l do artigo 43.º do Regimento, «decidir as reclamações sobre inexactidões dos textos de redacção final dos decretos e resoluções da Assembleia».
Enfim, trata-se de um sistema que não será muito claro, mas nós já tínhamos deliberado que as próprias comissões poderiam reunir, e já não a Comissão Permanente, nos termos em que está deliberado constitucionalmente. Mas que as comissões possam reunir para aprovar actas começa a ser um exagero, Sr. Presidente. Pelo menos, excede claramente o que acabou de ser considerado possível pela Assembleia da República.
Neste quadro, solicito, Sr. Presidente, que reconsideremos o que foi deliberado, entregando a função de fazer a redacção final à Comissão Permanente ou que, discretamente, nos reduzíssemos àquilo que aqui foi deliberado, que é fazer a redacção final de diplomas.
Quase diria que, dada a tendência que se está a verificar, talvez fosse melhor reconsiderarmos a deliberação, dá-la por prejudicada por ser necessário adaptada às regras constitucionais e entregarmos esta tarefa de redacção final dos diplomas à Comissão Permanente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, com as minhas desculpas renovadas, e agora mais esclarecido em relação ao sentido da sua intervenção de há pouco, pretendia solicitar a sua aquiescência para a convocação da Comissão Parlamentar de Juventude para amanhã pelas 11 horas para efeitos de redacção final da lei sobre subsídio social de desemprego aos jovens candidatos ao primeiro emprego.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, em presença das objecções de ordem jurídica aqui levantadas, e que penso terem fundamento sério, não o farei.
Foram cometidos ao Presidente a capacidade ou os poderes para convocar as comissões especializadas, mas o Presidente não as convocará porque, como agora ficou esclarecido, a Comissão Permanente tem poderes bastantes para proceder à redacção final dos diplomas em causa.

Pausa.

Srs. Deputados, temos agora em apreciação o texto alternativo do projecto de lei n.º 112/IV, apresentado pelo Sr. Deputado Magalhães Mota e outros, do Partido Renovador Democrático, sobre a transmissão pela rádio e televisão de produções dramáticas portuguesas.

Pausa.

Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Cardoso Ferreira.

O Sr. Cardoso Ferreira (PSD): - Sr. Presidente, solicito a V. Ex.ª que aguarde durante alguns breves minutos antes de se proceder à votação, uma vez que ainda estamos a articular o sentido do nosso voto. Para isso, serão necessários dois ou três minutos, mas não mais que isso.

O Sr. Presidente: - Pois, sim, Sr. Deputado. Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, em determinado momento, interrompemos os nossos trabalhos para se realizar uma conferência de líderes, que deveria decidir sobre o agendamento ou não dos projectos de lei de criação de vilas e cidades.
Peço-lhe, pois, Sr. Presidente, o favor de me informar quanto ao resultado dessa conferência de líderes, ou melhor, peco-lhe que informe a Câmara -que tem direito a essa informação- já que eu, como membro da direcção do meu grupo parlamentar, obviamente, estou informado.

O Sr. Presidente: - Tem toda a razão, Sr. Deputado.

A conferência de líderes entendeu que não era oportuno que se procedesse às votações dos projectos de lei de elevação de cidades e vilas.

Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, o entendimento da conferência de líderes terá sido esse.

No entanto, quero deixar aqui expresso que o Partido Socialista era favorável ao agendamento dos referidos projectos de lei.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Moreira, suponho, para intervir sobre este assunto.

O Sr. Manoel Moreira (PSD): - Sr. Presidente, é apenas para dar conhecimento à Câmara de que o Grupo Parlamentar do PSD era favorável à votação nesta sessão de todos os projectos de lei referentes à elevação de povoações a vilas e de vilas a cidades, continuando a manter essa disponibilidade.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Presidente, pensamos que se estabeleceu um mau precedente, mas, uma vez que isso aconteceu, queremos dizer que não foi pela nossa parte que não se formou consenso para que esses diplomas fossem agendados.

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O Sr. Silva Marques (PSD): - Então, foi pela parte de quem?!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, esta questão foi discutida uma conferência de líderes dos grupos parlamentares que teve lugar há cerca de três horas, onde foi decidido, por uma larguíssima maioria, de que só se separou -já que as questões têm de ser esclarecidas como deve ser- o PSD, embora com a consideração de que não faria disso qualquer aproveitamento exterior de polémica, o não agendamento dos referidos diplomas. Portanto, todos os partidos, incluindo o CDS, o PRD, o PS, o MDP/CDE e o PCP, concluíram que não havia razões que justificassem o referido agendamento.
Entretanto, e como é sabido, esse agendamento só poderia ser feito por consenso, pelo que bastaria que um deputado, por exemplo o Sr. Deputado Lopes Cardoso ou outro do Grupo Parlamentar do PS, discordasse para que ele não fosse feito.
Posteriormente, houve um facto novo, que foi o anúncio, através da mensagem do Sr. Presidente da República transmitida pela televisão, da dissolução da Assembleia da República, após o que se realizou outra conferência de líderes onde, face a esse facto novo, a posição que foi assumida pelos representantes dos grupos parlamentares foi a de que não havia o consenso necessário, nomeadamente porque um dos grupos parlamentares não o deu. Assim, embora com a disponibilidade de outros grupos parlamentares, incluindo o nosso, se pudesse aceitar isso numa situação que era desagradável e complicada, o que foi considerado foi que, não havendo consenso, não era possível o agendamento.
Colocar agora a questão em estilo de «lavar roupa suja» ou de entender que é necessário dar o dito por não dito não nos parece que seja a melhor solução.
Entendemos, portanto, que neste momento o problema está resolvido por si.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, de facto, várias coisas ocorreram ao longo desta tarde e houve uma reflexão que também evoluiu segundo os factos que se sucederam, pelo que é natural que neste momento se verifique o consenso que durante a tarde não se pôde verificar por razões inteiramente razoáveis.
Ao que parece, portanto, neste momento verifica-se um consenso. De facto, embora no decorrer da tarde a situação não estivesse tão clara, neste momento não há, aparentemente, objecções de maior para que não se votem os diplomas relativos às vilas e cidades e seria mesmo lastimável que não se votassem.
De facto, pelas intervenções aqui havidas em consequência deste pequeno incidente, verifica-se que há consenso, pelo que seria um absurdo que, agora que ele existe, não se fizesse a votação.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Silva Marques, devo dizer-lhe que a ilação que está a tirar não é inteiramente correcta, pois nem todos os grupos parlamentares se pronunciaram no sentido que o Sr. Deputado referiu.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Peço a palavra para interpelar a mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, agradeço que me conceda a palavra porque não queria deixar de esclarecer a minha posição, até porque não tenho por hábito lavar aqui roupa suja. E se estive calado até a momento em que entendi suscitar esta questão em virtude do anúncio da eventual discussão do projecto de lei apresentado pelo PRD sem que tivesse havido qualquer contestação -diploma em relação ao qual devo dizer que não temos nenhuma objecção- foi porque justamente tinha entendido e aceite a não existência de consenso, na base de que a alocução televisiva do Sr. Presidente da República, invocada pelo Sr. Deputado João Amaral, criava uma situação nova que poderia justificar a não existência de consensos na conferência de líderes. Só que essa nova situação não pode servir para justificar o não consenso em relação à discussão dos diplomas relativos às vilas e cidades e permitir o consenso em relação a uma outra questão, cuja relevância não me parece ser tão grande que não possa eventualmente aguardar o mesmo período de tempo. Portanto, ou os critérios são iguais ou, então, para além desses argumentos há outros.
Esta foi a única razão pela qual me senti na obrigação de levantar a questão no sentido de esclarecer a nossa posição, tendo antes disso mantido o silêncio que em condições normais deveria manter e que teria guardado se a questão não tivesse assumido esta forma.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Dá-me licença que interpele a Mesa, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Presidente, o projecto de lei em causa estava agendado por consenso de todos o:: grupos parlamentares. Nestas circunstâncias, pergunto se a intervenção do Sr. Deputado Lopes Cardoso significa que o Grupo Parlamentar do PS retira agora o consenso que antes tinha dado para esta votação.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Presidente, permite-me que responda à pergunta feita pelo Sr. Deputado Magalhães Mota?

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Sr. Deputado Magalhães Mota, julguei que se tornava evidente da minha intervenção que, pela nossa parte, não pomos em causa o vosso agendamento, como também não nos pareceram válidos -e por isso demos o consenso para o outro agendamento- os argumentos que foram invocados pare recusar o agendamento dos diplomas referentes às vilas e cidades.

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A única coisa que disse foi que não entendia que esse argumento pudesse ser considerado válido para uns casos e inválido para outros.
Pela nossa parte, não temos nada a opor a que o vosso projecto de lei seja votado.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, fica, portanto, assente que não houve consenso para a votação dos diplomas relativos à elevação de povoações a vilas e de vilas a cidades.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, o que me aflige é o pretérito, pois o pretérito já passou e o presente aparentemente mostra que há consenso. Ora, se verificamos que neste momento há consenso, será um absurdo que agora, que se verifica o consenso, não se faça a votação.
Meu Deus, de absurdos já estamos um bocado carregados! ...
Risos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Silva Marques, a verdade é que não podemos julgar pelas aparências e as manifestações das bancadas não foram no sentido que V. Ex.ª referiu.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, peço perdão, mas as aparências por vezes são a melhor forma de expressão. Quando nesta circunstância não há objecções expressas a que se vote, é o consenso mais vivo que se pode verificar. Pelo menos eu não posso compreender isto de outra forma.
Aplausos de alguns deputados do PSD.

O Sr. Presidente: - A norma do silêncio, Sr. Deputado Silva Marques, não pode ser seguida aqui como sendo um processo de aprovação, a não ser que os grupos parlamentares se manifestem todos nesse sentido.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Então peço a V. Ex.ª que interpele os grupos parlamentares, um a um, para verificar se afinal de contas a minha interpretação corresponde ou não à realidade. De toda a aparência, quem tem razão sou eu, mas V. Ex.ª pode verificar se estou equivocado.
Pausa.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa deliberou por maioria que não deve fazer essa pergunta aos grupos parlamentares. Eles é que têm de tomar essa iniciativa.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, permite-me que interpele, de novo, a Mesa?

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, é absolutamente normal - e isso já ocorreu em diversas circunstâncias - que caiba à Mesa essa iniciativa, porque senão cada um de nós teria de começar a falar espontaneamente. Várias vezes assim aconteceu - o que é normal, repito - e é quase uma inevitabilidade técnica que, perante uma determinada circunstância, a Mesa pergunte sucessivamente a cada grupo parlamentar se está ou não de acordo ou, concretamente neste caso, se aceita que se passe à votação dos projectos de lei relativos às vilas e cidades.
Evidentemente que, até por razões técnicas, esta pergunta tem de ser feita pela Mesa. Imagine V. Ex.ª que nós falávamos todos ao mesmo tempo! ... Não nos ouviríamos!

Risos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, já todos falaram há pouco sobre isso, à excepção de um grupo parlamentar, e não posso levar isto mais longe, sob pena de estar a obrigar alguém a manifestar-se quando não tenho o direito de o fazer.

Aplausos do PRD, do PCP, do CDS, do MDP/CDE e de alguns deputados do PS.

Vamos, pois, avançar com a votação relativa ao texto ...

O Sr. António Capucho (PSD): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, lamento muito mas, em relação a este texto, o Grupo Parlamentar do PSD precisa de dois minutos de pausa.
Mas, mais: detectámos num dos textos votados em votação final global, concretamente naquele que se reporta às eleições para o Parlamento Europeu, aquilo que se nos afigura ser uma gritante inconstitucionalidade.

O Sr. João Amaral (PCP): - Só agora?! Risos do PCP.

O Orador: - De facto, foi tardiamente, mas isso é normal dado o processo de votação que hoje ocorreu.
Nestas circunstâncias, se V. Ex.ª concordar, bem como os restantes líderes parlamentares, gostaríamos de nos reunir em conferência de líderes para podermos analisar esta situação.
Nestes termos, requeiro a interrupção dos trabalhos por 10 minutos.

O Sr. Presidente: - É regimental, pelo que a interrupção é concedida.
Entretanto, convido os representantes dos grupos parlamentares a comparecerem no meu gabinete.
Está suspensa a sessão.
Eram 21 horas e 20 minutos.
Srs. Deputados, está reaberta a sessão. Eram 21 horas e 55 minutos.
Srs. Deputados, para dar cumprimento à norma regimental, vão ser enunciados os diplomas que deram entrada na Mesa, uma vez que não teremos outra oportunidade para o fazer.

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O Sr. Secretário (Mota Torres): - Durante a sessão plenária de hoje deram entrada na Mesa os projectos de lei n.ºs 430/IV, da iniciativa do Sr. Deputado Pinho Silva, do PRD, sobre os professores colocados em escolas desfavorecidas; 431/IV, da iniciativa do Sr. Deputado Pinho Silva, do Partido Renovador Democrático, sobre os directores e subdirectores das escolas do ensino primário; 432/IV, também da iniciativa do Sr. Deputado Pinho Silva, do Partido Renovador Democrático, sobre o pagamento das fases; 433/IV, da iniciativa do Sr. Deputado António João de Brito e outros, do PRD, sobre sondagens de opinião; 434/IV, apresentado pelo Sr. Deputado Anselmo Aníbal e outros, do Partido Comunista Português, sobre a recuperação e reconversão urbanística em zonas de interesse patrimonial histórico; 435/IV, da iniciativa do Sr. Deputado Sá Furtado e outros, do Partido Renovador Democrático, sobre a criação e reconhecimento de universidades; 436/IV, da iniciativa do Sr. Deputado Barbosa da Costa e outros, do Partido Renovador Democrático, sobre a criação das freguesias de Nossa Senhora da Conceição e Nossa Senhora do Amparo e Boavista-Cardosas; 437/IV, da iniciativa da Sr.ª Deputada Odete Santos e outros, do Partido Comunista Português, sobre a garantia de alimentos devidos a menores; 438/IV, da iniciativa da Sr.ª Deputada Odete Santos e outros, do Partido Comunista Português, que reconhece o direito à indemnização por despedimento a trabalhadores de empresas extintas; 439/IV, da iniciativa da Sr.º Deputada Odete Santos e outros, do Partido Comunista Português, que garante a igualdade de tratamento dos trabalhadores da Portline e TRANSINSULAR em relação à aplicação dos instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho; 440/IV, da iniciativa do Sr. Deputado Anselmo Aníbal e outros, do Partido Comunista Português, sobre medidas para a recuperação da Brandoa; 441/IV, da iniciativa do Sr. Deputado Carlos Brito e outros, do Partido Comunista Português, sobre defesa da estabilidade de emprego e revogação da legislação em vigor sobre contratos a prazo; 442/IV, da iniciativa do Sr. Deputado Rogério de Brito e outros, do Partido Comunista Português, sobre o regime de acesso à propriedade rústica e ao exercício à actividade agrícola por parte de estrangeiros; 443/IV, da iniciativa conjunta do Partido Socialista, do Partido Renovador Democrático, do Partido Comunista Português e do Movimento Democrático Português, tendo como primeiro subscritor o Sr. António Marques, sobre a criação da escola superior de arte e design nas Caldas da Rainha; 444/IV, da iniciativa do Sr. Deputado Jaime Coutinho e outros, do PRD, sobre a integração dos deficientes das Forcas Armadas em serviço no regime do Decreto-Lei n.º 43/76, de 20 de Janeiro, e 44S/IV, da iniciativa do Sr. Deputado António Paulouro, do PRD, sobre a elevação de Paul-Covilhã à categoria de vila.
Deram ainda entrada na Mesa as ratificações n.ºs 155/IV, ao Decreto-Lei n.º 138/87, de 20 de Março, que cria navios de treino de mar, da iniciativa do Sr. Deputado Carlos Manafaia e outros, do PCP; 156/1 V, ao Decreto-Lei n.º 79-A/87, de 18 de Fevereiro, que integra as modalidades de aplicação a Portugal do Regulamento Comunitário n.º 797/85, de 12 de Março, que institui uma acção comum relativa à melhoria da eficácia das estruturas agrícolas, e revoga o Decreto-Lei n.º 172-J/86, de 30 de Junho, da iniciativa do Sr. Deputado Álvaro Brasileiro e outros, do PCP; 157/IV, ao Decreto-Lei n.º 100/87, de 5 de Março, que harmoniza a legislação da Região Demarcada do Dão aos princípios e normas estabelecidos na Lei n.º 8/85 de 4 de Junho, que aprova a lei quadro das regiões demarcadas vitivinícolas, da iniciativa do Sr. Deputado Álvaro Brasileiro e outros, do PCP; 158/IV, ao Decreto-Lei n.º 104/87, de 6 de Março, que reformula a legislação regulamentadora da Região Demarcada dos Vinhos Verdes, da iniciativa do Sr. Deputado Al/aro Brasileiro e outros, do PCP; 159/1 V, ao Decreto-Lei n.º 147/87, de 24 de Março, que estabelece os princípios gerais orientadores da utilização das radiocomunicacões e revoga o Decreto-Lei n.º 17 899, de 29 de Janeiro de 1930, e o Decreto-Lei n.º 22 783, de 29 de Janeiro de 1933, e todas as disposições regulamentadora!, da iniciativa do Sr. Deputado Álvaro Brasileiro e outros, do PCP, e 160/1 V, ao Decreto-Lei n.º 146/87, de 24 de Março, que torna obrigatória a instalação de infra-estruturas telefónicas nos edifícios a reconstruir ou a construir, da iniciativa do Sr. Deputado Anselmo Aníbal e outros, do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, retomando o processo de votação ...

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, é devida uma explicação à Câmara a propósito da minha intervenção em que pedi a suspensão dos trabalhos para analisarmos ama situação concreta relacionada com a lei eleitoral para o Parlamento Europeu.

O Sr. Presidente: Agradeço que o faça, Sr. Deputado.

O Sr. António Capucho (PSD): - A conferência de líderes entendeu que não havia qualquer inconstitucionalidade na questão que levantámos e, por consenso, chegou-se a uma redacção que é satisfatória em relação aos objectivos que pretendíamos, pelo que, pela nossa parte, o assunto está encerrado.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos então votar ...

O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, permita-me que sob esta figura preste um esclarecimento à Câmara sobre a razão pela qual o CDS aceita votar este diploma.
Entendemos que, após o anúncio pelo Sr. Presidente da República da dissolução da Assembleia da República, não faia sentido que esta Assembleia procedesse à votação de qualquer lei, pois, embora ela esteja eventualmente na plenitude dos seus poderes constitucionais, não está verdadeiramente na plenitude dos seus poderes políticos. E pensamos que fazê-lo poria em causa a imagem e a dignidade desta instituição. Esta é a nossa interpretação.

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Porém, pensamos que o projecto de lei que agora vai ser submetido à votação só não foi votado antes desse anúncio por razões de ordem puramente técnica e às quais os autores do projecto e seus subscritores são completamente alheios e que resultam de uma interrupção, que eles não solicitaram, dos trabalhos. Deste modo, e apenas por essa razão, vamos manter o nosso assentimento quanto ao agendamento desse projecto e vamos votá-lo.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos, pois, proceder à votação final global do texto alternativo apresentado pela Comissão de Educação, Ciência e Cultura do projecto de lei n.º 112/IV, sobre a transmissão pela rádio e televisão de produções dramáticas portuguesas.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PRD, do PCP, DO CDS, do MDP/CDE e da deputada independente Maria Santos, e a abstenção do deputado independente Borges de Carvalho.
Srs. Deputados, nada mais havendo a tratar, compete-me apenas encerrar os trabalhos e agradecer--vos, depois desta maratona e neste momento final, todo o trabalho que desenvolveram ao longo destes meses, prestigiando necessariamente a Assembleia da República, e a colaboração que me deram.
Sem mais delongas, porque ao fim de tanto trabalho já não é altura para produzir algumas considerações, queria, apenas e tão-só, agradecer-vos a delicadeza e a bondade com que sempre colaboraram com a Mesa. De um modo especial, queria agradecer aos Srs. Vice-Presidentes e aos Srs. Deputados Secretários, que foram incansáveis para que o trabalho que referi pudesse ter algum valor útil.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Presidente, queria exprimir os agradecimentos do meu grupo parlamentar à Mesa, pela forma como conduziu os nossos trabalhos, e também a todos os funcionários da Assembleia da República, pela colaboração que nos prestaram e, de um modo geral, a todos aqueles que connosco colaboraram durante os trabalhos parlamentares, designadamente em nome dos seus órgãos de comunicação social e que acompanharam os trabalhos parlamentares.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, nada mais havendo a tratar, declaro encerrada a sessão.
Eram 22 horas e 5 minutos.

Declarações de voto enviadas à Mesa para publicação relativas à votação do projecto de resolução n.º 40/IV, publicidade dos autos constantes do relatório da Comissão Eventual de Inquérito ao Acidente de Camarate.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma brevíssima intervenção ou, mais propriamente, um veemente e sentido protesto.
Foi com indignado espanto que tomei conhecimento da deliberação da conferência de líderes de apenas conceder escassos minutos a cada partido para a discussão e votação do relatório da Comissão Especial de Inquérito a Camarate.
Camarate! Milhares de horas de trabalho de deputados e funcionários desta Casa; centenas e centenas de páginas de depoimentos, acareações, relatórios técnicos!
Camarate! Um atentado - é deliberadamente que emprego a palavra «atentado» - em que perderam a vida um Primeiro-Ministro de Portugal e o seu Ministro da Defesa, acompanhantes e tripulação!
Dir-se-ia que, perante o espectro da dissolução do Parlamento, alguém pretendeu livrar-se rapidamente deste pesadelo. Daí as condições do seu agendamento!
Varre-se Camarate, rapidamente, para debaixo do tapete e não se fala mais nisso!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sá Carneiro e as demais vítimas foram assassinados em 4 de Dezembro de 1980.
O autor ou autores desses crimes permanecem ocultos.
Hoje, cometer-se-á aqui um novo crime contra as vítimas de Camarate! Mas, desta vez, os seus autores são bem conhecidos do povo português, que não deixará de os julgar!
Como disse alguém, é possível enganar toda a gente por um curto espaço de tempo; é igualmente possível enganar umas quantas pessoas durante muito tempo! Mas é impossível enganar toda a gente o tempo todo!
A Deputada do PSD, Dinah Alhandra.

1 - As comissões parlamentares de inquérito (ou de investigação, como são designadas nos EUA ou na vizinha Espanha) são um dos instrumentos de informação com que tradicionalmente contam as assembleias legislativas. São, essencialmente, uma informação recolhida por um processo de grupo e não por um deputado (ao contrário dos requerimentos e perguntas), reservado ao tratamento de questões de particular relevância e implicam o relacionamento do parlamento não apenas com o Governo mas com outras pessoas.

As finalidades a atingir por um parlamento que determina um inquérito hão-se assim situar-se no âmbito do controle da actuação do Governo ou da Administração e permitem preparar acções legislativas ou julgar da conduta política adoptada perante um problema importante.
Isto é, o Parlamento, ao determinar um inquérito, não pode (nem deve) assumir funções que não são as suas. Actua tendo em vista legislar ou exigir responsabilidades políticas.

Não é outra a experiência dos parlamentos de outras países (v., por todos, BIAYS «Lês Comissions d'enquête parlamentaire», in Revue de Droií Publique et de Ia Science Politique, 1954, CROUZATIER «Lê role dês comissions d'enquête du Congrés dês Etats--unis», in Revue de Droií Publique et de Ia Science Politique, 1975, HAMILTON, The Power to Prove. A Study of Congressional Investigation, Randon House, N.Y. 1976, e PACE, «Inchiesta parlamentare», in Enciclopédia dei Diritío, XX, Giuffré, Milan, 1970).

2 - A lei portuguesa é igualmente clara.

Os inquéritos parlamentares «têm por objecto o cumprimento da Constituição e das leis e a apreciação dos actos do Governo e da Administração» (Regimento da Assembleia da República, art. 251.º, n.º 1).

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O inquérito parlamentar sobre Camarate, sucessivamente repetido, não cumpre o seu objecto.
Pouco ou nada se pretende inquirir ou apreciar sobre os actos do Governo de então, em que, aliás, os Ministros da Administração Interna e da Justiça, o primeiro responsável pela segurança, o segundo pelas investigações, eram, em 1980, precisamente os actuais titulares engenheiro Eurico de Melo e Dr. Mário Raposo.
Procurando transformar os deputados em investigadores policiais, função para a qual não estão minimamente vocacionados - ao menos na sua maior parte - nem preparados, o inquérito parece pretender pelo voto chegar a conclusões e, quando não impo-las, ao menos sustentar e alimentar campanhas.
3 - Não é possível, com a seriedade que o respeito devido às pessoas que perderam a vida, utilizar deste modo o que deveria ser a sua memória. Os deputados do Partido Renovador Democrático que integram a Comissão Eventual de Inquérito e os restantes, que apenas ao relatório elaborado tiveram acesso, entendem, por isso, dever acrescentar ao seu voto duas sugestões.
Mantém-se em aberto o processo organizado no âmbito da Procuradoria-Geral da República.
Não parece ser outro o lugar próprio para serem colocados os materiais recolhidos, cuja triagem de validade e aferir da credibilidade é tarefa de especialistas.
Por outro lado, se é sobre a Polícia Judiciária - cuja competência e isenção o PRD não põe em dúvida - que pretende fazer recair-se a sombra duma dúvida, importante seria que, pelo Governo, fossem actuados os mecanismos indispensáveis para colher o apoio de polícias de investigação de outros países, que com as autoridades portuguesas pudessem colaborar.
O relatório de uma comissão de inquérito que, afastando-se da função parlamentar, se organizou para realizar tarefas que lhe não são próprias, é e sempre será um instrumento praticamente inútil para todos quantos, com objectividade, rigor e boa fé, se preocupam com a verdade.

Lisboa, 28 de Abril de 1987. - Os Deputados do PRD: Correia Azevedo - Barbosa da Costa - Agostinho de Sousa - António Marques - Hermínio Martinho - Carlos Matias - Pinho Silva - Corujo Lopes - Ivo Pinho - Ferreira Coelho - Arménio de Carvalho - João de Brito - Vítor Ávila - Rui Silva - Roberto Amaral - Silva Ramos - José Carlos Vasconcelos - Vasco Marques - Silva Lopes - Marques Júnior - Sousa Pereira - Dias Ferreira - Guedes de Campos - Costa Carvalho - Maria da Glória Padrão (e mais dois subscritores).

Declarações de voto enviadas à Mesa para publicação e relativas à votação do projecto de lei n.º 326/IV (medidas de emergência sobre o ensino-aprendizagem do português).
A degradação generalizada do conhecimento e da prática da língua portuguesa tem suscitado a atenção unânime para o valor que ela consubstancia. Com efeito, a língua é património cultural, expressão de identidade nacional; é importante factor de socialização, gerador da vida colectiva e da coesão dos seus falantes; é, finalmente, o instrumento indispensável à aquisição e à expressão dos diversos saberes.
Todos reconhecem que a língua portuguesa é um bem a preservar, a dignificar, a desenvolver, e que tal salvaguarda passa, inevitavelmente, pela melhoria da qualidade do seu ensino-aprendizagem.
Por outro lado, é um facto que o insucesso escolar (e social) está intimamente ligado a um desenvolvimento inadequado cia capacidade linguística. Carências em língua materna afectam a capacidade de comunicação, as estruturas de pensamento, diminuem as possibilidades de um correcto entendimento de um saber escolar ainda predominantemente verbal.
Eis porque melhorar as condições de aprendizagem da língua portuguesa é combater o insucesso escolar e garantir a abordagem, com êxito, de novos domínios do conhecimento e da cultura. Temos, sem dúvida, consciência da existência de factores exteriores à escola determinante; dessa insuficiência linguística, desde a origem sócio-cultural dos alunos à influência dos meios de comunicarão social. Mas isso não pode constituir motivo para que o Governo deixe de tomar as medidas julgadas convenientes para melhorar a qualidade do ensino-aprendizagem da língua portuguesa. Nesse sentido, foi publicado o Despacho n.º 32/EBS/86, que consigna a obrigatoriedade de obtenção, por parte dos alunos, de ura nível superior a 2 na disciplina de Língua Portuguesa, como condição necessária à aprovação ou transição de ano. Medidas complementares ao disposto neste despacho, relativas essencialmente à formação dos professores de português e ao aumento dos tempos lectivos semanais na disciplina de Português, para os alunos que denotem dificuldades de aprendizagem foram determinadas pelos Despachos n.ºs 41/EBS/?6, 42/EBS/86 e 43/EBS/86.
O Despacho n.º 32/EBS/86 provocou fortes e díspares reacções de pais, de alunos, de professores e de outras entidades. E dentro deste clima que o PCP apresentou à Assembleia da República o projecto de lei n.º 326/IV, com o objectivo de estabelecer «medidas de emergência sobre o ensino-aprendizagem do português». O PSD votou contra este projecto, o mesmo fazendo em Dilação a um texto alternativo, de autoria dos partidos da oposição, apresentado hoje ao Plenário, e que, 10 essencial, não diverge do primeiro diploma. De facto, são omitidos os n.ºs 2 e 3 do artigo 2.º e os n.ºs 2 do artigo 5.º e do artigo 7.º e suprimidos o: artigos 3.º e 8.º do projecto de lei.

As razões do nosso voto são duas:

Em primeiro lugar, ao proporem a revogação (artigo 10.º co projecto de lei e artigo 8.º do texto alternativo) do Despacho n.º 32/EBS/86, há intromissão na esfera de competência executiva e administrativa do Governo, violando-se, desse modo, o princípio constitucional da separação dos poderes entre órgãos de soberania.
Em segundo lugar, ambos os diplomas são inócuos, sem sentido inovador, preconizando medidas que foram já adoptadas pelo Governo ou estão consignadas na Lei de Bases do Sistema Educativo. Onde está, pois, o carácter de «medidas de emergência» pretendido pelos diplomas em apreciação? Repare-se que:

a) O artigo 1.º do projecto de lei e do texto alternativo é ipsis verbis o conteúdo do n.º 7 do artigo 47.º da Lei de Bases;
b) O artigo 2.º -sobre «acções de formação»- está já consignado no Despacho n.º 41/EBS/86, onde s: estabelecem orientações metodológicas e se determinam acções de natureza pedagógico-

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-didáctica com carácter presencial, destinadas a professores de Língua Portuguesa de habilitações não próprias, e acções de sensibilização aos docentes das outras disciplinas, numa perspectiva de interdisciplinaridade;

c) Os artigos 3.º e 4.º do projecto de lei ou o artigo 3.º do texto alternativo consignam matéria já tratada no Despacho n.º 29/EBS/86 (compensação educativa) e reforçam até duas horas lectivas semanais de Português o horário dos alunos com dificuldades de aprendizagem e ou aproveitamento escolar insuficiente na língua materna;
d) O artigo 5.º do projecto ou o artigo 4.º do texto alternativo estão contemplados no Despacho n.º 41/EBS/86, que determina o envio, pela Direcção-Geral do Ensino Básico, para as escolas, de obras de autores portugueses, fomentando, assim, a prática da leitura;
e) O artigo 6.º do projecto ou o artigo S.º do texto alternativo têm a sua correspondência em normativos já publicados: o Despacho n.º 41/EBS/86 dispõe no n.º 10.2 a realização de acções circum-escolares, designadamente concursos literários e jogos florais com vista a fomentar o desenvolvimento da língua e cultura portuguesas;
f) Em relação ao artigo 8.º do projecto de lei, foi publicado já o Decreto-Lei n.º 57/87, de 31 de Janeiro, que estatui uma nova política de manuais escolares, prevendo que na sua apreciação seja tido em conta o conteúdo e a expressão linguística.

O MEC estará sempre atento à qualidade dos meios educativos, como, aliás, decorre da sua responsabilidade.

Lisboa e Palácio de São Bento, 28 de Abril de 1987. - O Deputado do PSD, Fernando Conceição.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: O governo do PSD agiu, também em matéria de educação, como se fosse dono e senhor do País. Para fundamentar esta acusação basta referir o total desprezo do Ministério da Educação pela Lei de Bases do Sistema Educativo, elaborada e votada por esta Assembleia e, facto relevante, com grande contributo do Grupo Parlamentar do PSD. Bem vexados se devem sentir os deputados sociais--democratas da Comissão de Educação, Ciência e Cultura, mas têm de pagar a factura do despotismo reinante no seu partido.
Como a palavra de ordem do governo de Cavaco Silva era de ataque sistemático à Assembleia da República, havia não só que ignorar os diplomas de origem parlamentar como ainda se impunha legislar em sentido contrário às determinações da Assembleia, mesmo quando estas traziam a chancela dos deputados do PSD. O que era preciso demonstrar é que o PSD é o senhorio de Cavaco Silva! Recordemos, por exemplo, o episódio dos vencimentos dos professores universitários.
A missão imposta ao Governo pela Assembleia da República, através da Lei de Bases do Sistema Educativo, de elaboração de legislação complementar nos vários sectores da educação está por cumprir. Intencionalmente.
No entanto, ao arrepio da mesma lei parlamentar e, o que é mais grave, ferindo princípios constitucionais, o Governo produziu diplomas, como o despacho do Português eliminatório, que a opinião pública repudiou.
O Grupo Parlamentar do Partido Socialista tudo fez no sentido de levar o Governo a reconhecer o erro cometido, dando-lhe a oportunidade de, pelo menos, suspender a aplicação de uma medida punitiva sem sentido nas actuais circunstâncias do ensino-aprendizagem do Português. Fomos mesmo até à concessão de um prazo ao Governo para alterar a situação, recusando o pedido de urgência apresentado pelo Partido Comunista. Foi, da nossa parte, mais uma atitude de coerência e de sentido da responsabilidade, sem olhar ao risco de quaisquer equívocos lançados na opinião pública pelos meios de comunicação social manipulada pelo Governo. A suspensão teria permitido introduzir alguns factores de correcção, de forma a não castigar os mais inocentes - alunos das camadas culturalmente mais desfavorecidas, filhos de emigrantes nascidos no estrangeiro, etc.
No diploma em apreço procurámos introduzir na especialidade algumas melhorias que não alterassem o espírito do projecto inicial. As mais importantes visam dar corpo ao preceito da Lei de Bases do Sistema Educativo sobre a interdisciplinaridade. De acordo com esse preceito, transcrito no presente projecto, todos os professores do ensino básico e secundário terão de se assumir também, em maior ou menor grau, como professores de Português.
Pelo projecto de lei n.º 326/IV, em vez de medidas negativas ficam consagrados alguns princípios metodológicos inovadores capazes de valorizar o português na sua dupla dimensão de valor nacional histórico-cultural e de instrumento de aperfeiçoamento individual e colectivo dos cidadãos.
As associações de pais, os encarregados de educação, alunos e professores vão encontrar na nova lei algum lenitivo para a sua legítima ansiedade. Mas, sobretudo, criam-se algumas condições legais para uma nova pedagogia do ensino do português. Recusamo-nos a transformar em papão dos meninos a gloriosa língua nacional.
O reino da língua e da Pátria não se consolida hoje por ódio e medo, mas por solidariedade e com boa pedagogia.
O Deputado do PS, Agostinho Domingues.
Fala-se mal o português! Uma das causas é a deficiência do seu ensino. Vai o projecto de lei n.º 326/IV ao encontro das preocupações do PRD, no sentido de promover a sua melhoria, muito embora saibamos que o problema é mais profundo e tem raízes sociais e económicas, ligadas ao nosso desenvolvimento, ou falta dele. Não nos iludamos, não se pode alcançar uma transformação radicalmente saudável com escolas superlotadas, corpo docente de cada escola instável e, tantas vezes, gigantesco, com o anonimato e a desumanização crescentes, a desarticulação dos programas, os valores mercantis e consumistas socialmente imperantes, a ideia generalizada entre a juventude que o compadrio, o empenho, a influência sobrelevam o conhecimento e a competência, a sufocação do raciocínio conceptual e discursivo pelo visual superficial-

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mente impressionista, a falta de apoio escolar a largas camadas da população juvenil de fraca capacidade económica.
Uma escola de via única, uniformizadora e indisciplinada, tem de dar lugar a um sistema escolar diversificado, adaptado às potencialidades e virtualidades individuais, de modo a diminuir a chaga do insucesso escolar.
A falta de uma rede adequada de creches, infantários, jardins-de-infância, reflecte-se irremediavelmente na capacidade de articulação oral e na aquisição de vocabulário e de estruturas semânticas, mormente nas crianças de lares sem capacidade económica suficiente, que infelizmente são a larga maioria.
O caso da aprendizagem do português é irremediavelmente agravado entre nós pela programação da televisão, na sua maior pane falada em inglês, e a influência castelhanizante ao longo da nossa extensa região raiana. Há que produzir mais TV em português, dando prioridade às emissões para crianças e jovens.
É toda uma estrutura sociológica e educativa que tem de ser corrigida e aperfeiçoada. A começar pelo Ministério da Educação, que tem de dar provas de exemplaridade na condução da política educativa. Não é fazendo desabar punições sobre os jovens -e pensamos logo nos oriundos de famílias não só economicamente mais débeis, mas também sem tradição cultural académica-, contribuindo para a sua marginalização social e intelectual, que se vai no caminho certo. Daí termo-nos constantemente oposto, sempre que foi caso e ocasião, ao Despacho n.º 32/EBS/86, de 17 de Setembro, publicado no Diário da República, 2." série, n.º 227, de 2 de Outubro de 1986.
Eis, a traço grosso, algumas das razões por que o PRD vota favoravelmente o diploma em apreço, por vir a contribuir para melhor falar e escrever a língua portuguesa.

O Deputado do PRD, Carlos Sá Furtado.

Declarações de voto enviadas à Mesa para publicação e relativas à votação da proposta de lei n.º 26/IV (Lei de Segurança Interna).
Com a aprovação da Lei de Segurança Interna, a Assembleia da República contribuiu para reforçar a ordem jurídica portuguesa e o Estado de direito democrático consagrado na Constituição da República.
Com efeito, à semelhança do que já se fez com a publicação da Lei de Defesa Nacional e das Forças Armadas, relativa à defesa da República contra qualquer ameaça externa e à organização das Forças Armadas, a Lei de Segurança Interna vem agora definir as bases gerais da actividade do Estado no domínio da manutenção da ordem e da tranquilidade públicas, bem como da prevenção da alteração das mesmas, e ainda da organização e funcionamento das forças e serviços a quem incumbe o dever de assegurar e proteger, de modo permanente, o regular exercício dos direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos e o normal funcionamento das instituições.
Trata-se de verdadeiras leis orgânicas do Estado, imbuídas de igual dignidade legislativa e que se enquadram no mesmo conjunto normativo, composto ainda por outros diplomas, como a lei que fixa os regimes de estado de sítio e de estado de emergência e, futuramente, a lei de protecção civil.
Conjunto informativo esse onde se integram os princípios, as políticas e as actividades que visam garantir a segurança nacional no seu sentido mais alto.
Compreende-se, por isso, o relevo dado por esta Lei à definição e organização das instituições do Estado e dos seus órgãos no que respeita à condução e execução da política de segurança interna.
Responsabilidades que não podem deixar de ser partilhadas pelos cidadãos, a que a Lei confere especiais deveres de colaboração.
O que bem se compreende, quanto é certo que as actividades de segurança têm a ver com a vida das pessoas, com o seu comportamento e relacionamento social e com a sua comparticipação na escolha e na realização de um destino comum, em paz e em tranquilidade, no quadro e o interesse nacional.
Por ultimo, Sr. Presidente e Srs. Deputados, seja-me permitido salientar o que o processo de apreciação e votação desta Lei veio demonstrar: por um lado, o consenso dos partidos democráticos é possível em grandes questões de Estado; por outro lado, a dignidade e a seriedade do diálogo institucional que teve lugar com o Governo. Depois de apresentar uma proposta que mereceu a aprovação do Parlamento, na generalidade, o Governo nunca assumiu qualquer atitude dogmática nas suas relações com os deputados. Sem transigir com os fins, os objectivos e o sentido de eficácia da sua proposta - integralmente respeitada na lei agora votada -, o Governo, através dos seus competentes membros, dialogou com a Assembleia da República, colaborou com a respectiva Comissão Parlamentar e participou empenhadamente na obtenção de um largo e substancial consenso; e fe-lo motivado por um apurado, exigente e democrático sentido de Estado. O mesmo não se verificou com os partidos de extrema-esquerda, que uma vez mais demonstraram estarem agarrados a mitos ou possuídos de complexos que os impedem de ver que, com a presente Lei, o que se teve em vista foi fornecer melhores instrumentos para a defesa de valores de que o Estado democrático não pode prescindir.
Por tudo quanto se acaba de referir, Sr. Presidente e Srs. Deputados, regozijamo-nos com a aprovação final da Lê de Segurança Interna, uma lei fundamental para a defesa e consolidação da democracia e das liberdades fundamentais. Para o Partido Social-Democrata só em paz e segurança é possível materializar e conferir eficácia à acção política, que, como é um bem, visa o progresso, o desenvolvimento e o bem-estar dos Portugueses.

Lisboa, 28 de Abril de 1987. - O Deputado do PSD, Licinio Moreira.

O voto cio PCP contra o texto final da Lei de Segurança Interna constitui um alerta para os sérios perigos e ameaças que pendem sobre as liberdades e a tranquilidade dos cidadãos.

l - O novo diploma surge num quadro marcado por múltiplos factores de preocupação e inquietação, de entre 0:1 quais se destacam, pela sua especial gravidade:

A consumação de um processo de centralização ilegal de todas as polícias (e de serviços de informações), sob autoridade única de um ministro, na sequência da Resolução do Conselho de Ministros n.º 85/86, de 11 de Dezembro;

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A montagem e funcionamento dos aparelhos dos diversos serviços de informações em moldes que, além de não se coadunarem com a Constituição, infringem e exorbitam os próprios limites legais (no tocante ao recrutamento de agentes e nas próprias actividades, que, como tudo indica, incluem a fichagem de militantes de partidos políticos), num quadro em que não funcionam sequer os mecanismos de fiscalização previstos na Lei (como demonstrou o recente escândalo DINFO);
O reforço e alargamento de áreas de intervenção do Serviço de Estrangeiros, com perda de funções da Guarda Fiscal, e a criação de um novo banco de dados sem limitações nem fiscalizações;
A intensificação das ligações das polícias portuguesas com polícias estrangeiras, em termos que podem conduzir (designadamente sob invocação da luta antiterrorista) a novas formas de devassa da vida privada de cidadãos e a padrões de actuação (v. g. tipo NATO) incompatíveis com a Constituição e as leis portuguesas;
A crise da Polícia Judiciária, cuja reestruturação e relacionamento com o Ministério Público vêm suscitando larga polémica, num quadro marcado por graves bloqueamentos e por uma situação de quase demissão ou pré-demissão de chefia superior, agravada pelo impacte do escândalo denominado «são bentogate»;
A inadequação do enquadramento legal da Polícia de Segurança Pública (cujo regime disciplinar foi recentemente declarado inconstitucional pelo Tribunal Constitucional em termos que originam novos melindres e dificuldades, especialmente no tocante ao direito de associação sindical dos membros daquela força de segurança);
A proliferação de formas de actuação ilegal de forças de segurança (incluindo a realização abusiva de escutas e vigilâncias) e o uso sistemática de corpos especiais de repressão para impedir o livre exercício de direitos de cidadãos (incluindo através de brutais cargas contra trabalhadores em luta); O uso, por forcas de segurança, de meios vídeo para registo de imagens de concentrações, manifestações, desfiles e outras formas de luta popular, com ulterior tratamento, circulação e aproveitamento em condições obscuras e carecidas de cobertura e enquadramento legal;
A difusão por responsáveis de forças de segurança de concepções sobre as respectivas missões abertamente incompatíveis com os princípios e limites constitucionais, mormente a apologia de uma concepção global de segurança nacional;
A realização pelas Forcas Armadas de exercícios que prevêem a sua utilização contra partidos políticos, organizações populares e trabalhadores em luta, qualificados como «inimigo interno»;
A actuação incontrolada de empresas privadas de segurança, dando azo à utilização de armamento proibido e a actividades de vigilância, perseguição e intimidação inteiramente ilegais e perniciosas (desenvolvidas em certos casos ao serviço de potências estrangeiras como os Estados Unidos da América);
A utilização abusiva da informática para invasão da esfera de privacidade dos cidadãos (abrangendo o tratamento, constitucionalmente proibido, de actos pessoais relativos às actividades partidárias e sindicais), tanto por parte de entidades públicas (incluindo as polícias) como privadas (de forma inteiramente incontrolada);
A inexistência de mecanismos legais que garantam aos cidadãos o apoio jurídico que lhes permita o acesso ao direito e aos tribunais (para fazer valer os seus direitos quando atingidos por ilegalidades e prepotências), bem como a protecção e indemnização quando vítimas de crimes;
A ausência de resposta adequada a novas e velhas formas de criminalidade organizada, acarretando a larga impunidade de redes de tráfico de droga, armas, divisas e de exploração de mulheres e a utilização do território nacional como placa giratória para operações internacionais que põem em risco a segurança dos Portugueses;
O crescimento contínuo do número de presos, com a exploração do número de preventivos, a degradação das condições da vida prisional (impossibilitando qualquer efeito ressocializador) e a abertura de um trágico ciclo de suicídios de reclusos, provocando geral apreensão e instabilidade na opinião pública;
O bloqueamento da justiça penal (por falta de meios, instalações, pessoal, regras processuais adequadas) e a multiplicação de actos de «ajuste de contas» e outras formas de «justiça» privada, tudo contribuindo para a perda de segurança e confiança dos cidadãos nos tribunais.

2 - A comparação entre o articulado aprovado pela Assembleia da República na presente votação final global e o texto das propostas de lei 71/III (apresentada pelo governo do «bloco central») e 26/IV (da autoria do governo minoritário do PSD) revela que a viva repulsa provocada na opinião pública por aquelas propostas repercutiu positivamente no labor legislativo da Assembleia da República.
2.1 - O amplo debate travado desde 1983 sobre os factores reais de intranquilidade e insegurança e os meios de combate à criminalidade (incluindo o necessário combate ao terrorismo) conduziu a uma útil clarificação: foram repudiadas na discussão pública e na Assembleia da República as teses e concepções dos partidos e sectores de direita que invocam sistematicamente a luta antiterrorista como pretexto para a criação de meios de excepção para utilizar contra o movimento popular, reprimir trabalhadores em luta, devassar a intimidade dos cidadãos, transformar os aparelhos de segurança em armas de ataque a opositores políticos, «policializar» o quotidiano da vida social.
2.2 - O debate pôs a nu as debilidades e vulnerabilidades que podem levar a uma ausência de resposta a situações que ponham em perigo a tranquilidade pública, a uma insuficiente protecção dos cidadãos, à incapacidade de prevenção de crimes e à impunidade dos que por eles devam responder. Entre tais debilidades incluem-se: a travagem da expansão territorial da Polícia Judiciária (e a sua inadequada e increteriosa cobertura do País), a inadequada organização da mesma Polícia para o combate a novas formas de criminalidade (v. g. económica, corrupção), a incorrecta repartição de recursos pelos diversos departamentos da

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Polícia Judiciária e o não provimento dos respectivos quadros; a não adopção de medidas de adequada formação no âmbito da Polícia de Segurança Pública, as restrições aos direitos dos seus membros (dificultando a plena democratização do seu funcionamento e criando um clima desfavorável à coesão e eficácia daquela força), cuja distribuição territorial é inadequada; as carências existentes no âmbito no Ministério Público no tocante a pessoal, meios e instalações; a crise judicial nas suas diversas vertentes e dimensões (incluindo as decorrentes da não adopção atempada de medidas de reorganização judiciária - com a revisão da divisão judicial do País, a criação de novas comarcas e novos tribunais - e de medidas de emergência para suster a degradação do equipamento judiciário: há tribunais a cair aos bocados ...); a degradação do sistema prisional, convertido em escola superior do crime; as dúvidas e dificuldades decorrentes do novo Código Penal, cuja entrada em vigor em 1983 foi acompanhada da concretização dos pressupostos para a sua aplicação de diversos mecanismos de humanização da justiça penal, frustrando-se, assim, os méritos e virtualidades que lhe eram assinalados; a ausência de nova legislação processual penal, que, no estrito respeito pela Constituição, permita a célere e justa punição dos responsáveis pela prática de crimes; a inadequação e incorrecção da legislação que regula a organização e funcionamento dos tribunais de execução de penas ...
É de salientar, por outro lado, que os comportamentos das forças de segurança que se assinalaram no início são, pela sua ilegalidade ou anomalia, factores não de garantia, mas de perturbação da segurança dos cidadãos. Durante o processo de elaboração da lei agora objecto de votação final, a Assembleia da República, especialmente através da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, pôde aprofundar o conhecimento dessas ilegalidades e anomalias, que em diversas circunstâncias condenou muitas vezes, por iniciativa dos deputados do PCP.

2.3 - Os trabalhos parlamentares, na Assembleia decorrente das eleições de 6 de Outubro de 1985, foram dominados por uma interrogação central: «É necessária uma lei de segurança interna?» Estava, na verdade, em preparação um novo Código de Processo Penal, sede própria para a inclusão de disposições relativas a meios de recolha de provas de crimes e à definição de restrições ao exercício de certos direitos, dentro dos limites constitucionais. Por outro lado, está dentro das competências do Governo definir normas organizativas e de auto-estruturação, bem como de enquadramento das forças de segurança.
Qual o sentido e a utilidade face a tudo isto (e aos factores reais de intranquilidade) de uma lei de segurança interna?
Os deputados do PCP consideraram que de nenhuma utilidade se revestiria tal instrumento jurídico e que poderia ser pernicioso (e inconstitucional) se consagrasse soluções como as contidas na proposta de lei n.º 26/1 V, que o PCP impugnou, por inconstitucional, ponto de vista que veio a ser acolhido pela 1.ª Comissão e pelo Plenário.
É de assinalar que a proposta do governo de Cavaco Silva fora já expurgada de alguns dos aspectos duramente criticados à versão apresentada pelo IX Governo (v. g. normas sobre intervenção das Forças Armadas na resolução de conflitos sociais, sobre o regime do estado de sítio, sobre proibição e dissolução de manifestações e reuniões. sobre a sujeição de membros do poder judicial a organismos e estruturas de obediência governamentais. Não incluía também como questões de «segurança interna» os problemas da protecção civil face a catástrofes naturais e intempéries - miscigenação indébita (perigosa) que caracterizara a proposta antecedente. Apresentava, no entanto, diversos aspectos inconstitucionais. A proposta:

a) Em primeiro lugar configura uma noção de segurança interna vaga e envolvente, viabilização o tratamento de conflitos e questões sociais como se fossem «questões de polícia»;

b) Visava impor aos cidadãos, em geral, um dever tal de «facilitar» a vida das polícias que acabam por abranger o dever de facilitar as actividades dos próprios serviços de informações e estabelecer para os funcionários e gestores públicos o dever de delação e outras formas (pacificadas) de colaboracionismo;

c) Em terceiro lugar, a proposta constituía um verdadeiro código de processo penal paralelo, duplicando e agravando medidas já constantes do CPP (aliás em termos que mereceram crítica generalizada):
Fora da sole própria, o Governo pretendia a concessão a um larguíssimo rol de autoridades policiais de vastos poderes para vigiar pessoas, deter cidadãos, encerrar estabelecimentos, tudo em acréscimo ao já previsto no Código e com indefinição quanto a pressupostos e condições de aplicação;
O Governo quer, por outro lado, que se concedesse ao MAI e em quem este delegasse poderes para mandar interceptar, «por motivo de urgência insuperável», correspondência e colocar sob escuta telefones;

C) que seria triplamente inconstitucional:

1.º Porque se admitiam expressamente escutas pelos serviços de informações à margem do processo penal;
2.º Porque se pretendia consumar administrativamente actos de controle de comunicação em processo penal sem intervenção prévia do juiz;
3.º Porque se pretendia autorizar o MAI (ou o seu substituto legal) a manipular a magistratura e a esvaziar-lhe a independência, sendo uma fraude à Constituição e um insulto à magistratura a ideia de pôr magistrados a carimbar «validações» de escutas já feitas pelo Ministro;
d) A 4.ª característica da proposta e a tentativa de militarizar a PSP, solução escandalosa e inconstitucional e censurável quanto à forma usada: inviamente, essa opção, sendo fulcral, surgia omissa no preâmbulo e dissimulada na parte final de uma alínea do n.º 2 do art. 14.º;
e) Finalmente, o Governo, sempre tão cioso de que a Assembleia da República não lhe invadisse as competências, pretendia que Tosse regulada pela Assembleia da República a sua organização interna (que é a única matéria da sua exclusiva competência, nos termos do art. 201.º, n.º 2,

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da Constituição), institucionalizando-se assim um Conselho Governamental de Segurança, mero somatório de governantes, polícias e membros do aparelho de informações, e fixando a AR as próprias competências do Primeiro-Ministro e do Ministro da Administração Interna!

2.4 - Reveste-se de particular importância clarificadora, nesta óptica, o debate travado sobre estes aspectos na Comissão de Assuntos Constitucionais no quadro de uma audiência com os membros do Governo responsáveis pela proposta. Da respectiva acta (relativa à reunião de S de Junho de 1986) salientam-se os passos seguintes:
O Sr. Ministro da Administração Interna usou da palavra para sublinhar que o enquadramento da proposta é o constante da respectiva exposição de motivos. O Governo considera que o Estado Democrático precisa de uma Lei de Segurança Interna para realizar as suas finalidades, em pleno respeito pelos direitos dos cidadãos, face à crise de segurança dos meios justificados de acção dos grupos de banditismo. A proposta tem em conta o debate travado pela Assembleia da República sobre segurança interna na anterior legislatura e as observações dos partidos que recentemente o Governo consultou. Trata-se de uma lei de Estado, concluiu o Sr. Ministro.
O deputado José Magalhães comparou as circunstâncias do presente debate e as do anterior, assinalando estar hoje em elaboração um novo Código de Processo Penal, estar vigente o estatuto da PSP, em elaboração a lei do estado de sítio. Sendo a segurança interna o produto, o resultado final de um vastíssimo conjunto de factores, como encerrá-los todos num só instrumento legal? E que justificação tem duplicar na Lei de Segurança Interna normas do Código de Processo Penal ou excepções ao Código de Processo Penal? Qual o sentido actual de uma Lei de Segurança Interna, quando há dois instrumentos cuja falta foi invocada no passado para justificar a necessidade da Lei de Segurança Interna?
O Sr. Ministro, em resposta, citou os passos da exposição de motivos da proposta de Lei de Segurança Interna em que se sintetizam os objectivos a prosseguir, tendo o Sr. Secretário de Estado precisado que se trata de uma lei-quadro, tal como há lei de Defesa Nacional para regular a defesa militar de República. Trata-se aqui de regular a defesa civil da República, sem prejuízo de leis ulteriores desenvolverem ou regulamentarem o regime agora definido. A proposta tem ainda o mérito de regular pela primeira vez após o 25 de Abril a matéria das medidas de polícia, ainda objecto de velhíssimas normas.
O deputado José Manuel Mendes, fazendo o reparo de que a proposta não configura uma pura lei-quadro (uma vez que contém normas cujo fito principal é estabelecer regimes paralelos ou excepcionais, derrogações, etc.), aludiu às carências das polícias e as suas reclamações de mais e melhores meios, perguntando se a questão da Segurança Interna não será neste momento uma questão de gestão, e não de lei.
O Sr. Ministro considerou que há três aspectos a assinalar quanto à segurança interna: o legal (importando suprir carências legais), o executivo (reforço de meios materiais e pessoais à disposição do Estado) e o judicial. Há carências em todos estes domínios, não só na parte legislativa. Mas sem exageros. Vejam-se os estudos sobre segurança interna: todos apontam para carências e insuficiências de todos os sistemas. As leis de segurança interna só existem em países onde há liberdade, nos demais não são precisas.
Antes do 25 de Abril também as medidas de segurança interna eram tomadas em Portugal sem lei. As leis de segurança interna são precisas em regimes democráticos. Insiste, porém, em que não são apenas carências de lei, mas também nos planos executivo e judicial.
O deputado Andrade Pereira pretendeu que o Sr. Ministro explicitasse se em alguma medida a Lei de Segurança Interna não duplicaria o CPP, por exemplo em matéria de escutas, buscas, etc., ao que lhe foi replicado que os dois diplomas são complementares. O Sr. Secretário de Estado da Administração Interna explicou que as normas sobre escutas tinham sido inseridas na Lei de Segurança Interna por ser contra a nossa tradição colocar no Código de Processo Penal um regime em que é uma autoridade administrativa a decidir. É uma medida mais especial que as outras. Na luta contra o terrorismo as escutas são fundamentais: 70% das incriminações feitas em Espanha não teriam sido possíveis sem escutas.
O deputado Jorge Lacão relembrou a solução a que os partidos governamentais haviam chegado na anterior legislatura em matéria de escutas, tendo o Sr. Secretário de Estado da Administração Interna observado que tal solução fora tida em conta. O mesmo deputado perguntou então por que não tinha sido encarada a solução de deferir ao Ministério Público a competência para determinar escutas especiais, tendo-lhe respondido o Sr. Ministro que na economia da proposta do Governo o Ministério da Administração Interna autoriza sob proposta e para um número limitado de crimes, tem de comunicar logo ao juiz, que pode suspender. É um compromisso entre a eficácia executiva e o controle judicial. Lamentou por fim que algumas notícias jornalísticas insinuem que a decisão do Ministro da Administração Interna é «arbitrária».
O deputado Jorge Lacão comentou que, tratando-se de um acto administrativo, tal regime é incompatível com a Constituição. Perguntando o Sr. Secretário de Estado da Administração Interna porquê, replicou o deputado Jorge Lacão que tal decorre do artigo 34.º, n.º 4, da Constituição, que o Sr. Secretário de Estado da Administração Interna de imediato leu, sublinhando que está nas competências da Assembleia da República emanar o regime legal proposto, ressalvando as exigências constitucionais.
Pedindo a palavra, o deputado José Magalhães assinalou ser criticável que se apresentem como «evidentes» interpretações até hoje inéditas e até mesmo pacificamente consideradas «desevidentes». Por exemplo, ao restringir escutas ao processo criminal, a Constituição da República Portuguesa excluiu-as em relação a serviços de informações, sendo os constituintes sensíveis aos horrores da PIDE.
O Sr. Ministro aludiu então à multiplicidade de escutas ocorridas após o 25 de Abril. Relembra as que tiveram lugar nos tempos do general Vasco Gonçalves, segundo relatórios certamente do conhecimento dos presentes. O Governo pretende precisamente disciplinar as escutas, para evitar abusos.

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O deputado José Magalhães declarou em nome do seu partido considerar grave qualquer amálgama nesta matéria. Ainda há bem pouco tempo na mesma Sala o Sr. Director-Geral da Polícia Judiciária teve ocasião de aludir ao impacte das novas tecnologias no campo das escutas e às dificuldades de controle das escutas feitas por certos meios electrónicos. Mas sendo ilícitas essas escutas, a questão não é legalizá-las ou dar ao Governo poderes para fazê-las em larga escala, quando a Constituição as restringe ao processo criminal e às autoridades judiciais - vedando-as aos serviços de informações.
O deputado João Seiça Neves analisou o artigo 18.º da proposta de lei, considerando que nele se prevê o exercício de poderes jurisdicionais por uma autoridade administrativa.
O Sr. Secretário de Estado observou então que o mecanismo do artigo 18.º só prevê escutas nos casos de periculum in mora, para crimes particularmente graves. Lembrou ainda que todos os sistemas próximos do nosso têm leis especiais para este efeito. O terrorismo é um fenómeno novo que exige meios de combate novos. Se se passar os olhos pelas leis vigentes na Espanha, França e Itália, comprovar-se-á isto mesmo. Por outro lado, a proposta consagra as cautelas necessárias: quem é o Ministro que vai submeter-se a uma desautorização do juiz, sendo certo que está ainda sujeito a responsabilidade política...
O deputado Seiça Neves sublinhou que constitucionalmente a intervenção judicial deve ser prévia. O Governo inverte a ordem natural das posições Governo/judicatura. Aliás, a solução proposta quanto a escutas contrasta com a relativa a medidas similares em que o Governo propõe intervenção prévia do juiz. Quanto à lição do direito comparado, confessa estar muito longe de a conhecer com rigor, sendo como é um modesto advogado de Aveiro. Sem dúvida, seria bem passar os olhos pelas leis estrangeiras, designadamente as da Europa. Sabe, porém, uma coisa e essa é que Portugal não tem a mesma situação que outros países, a começar por Espanha, no tocante ao terrorismo.
O Sr. Ministro afirmou então que de há anos para cá havia dois ou três países considerados «santuários do terrorismo»: Portugal, Bélgica e Suíça. Em Portugal felizmente não sucedeu como na Bélgica um surto de terrorismo terrificante e sanguinolento, face ao qual as autoridades se viram impotentes: não tinham legislação, as forças de segurança estavam divididas entre o Ministério da Administração Interna e o da Justiça. Tiveram de fazer à pressa legislação, designadamente sobre escutas.
Será melhor que surja primeiro um surto de terrorismo para só depois pensarmos na forma de o combater?
O deputado Seiça Neves comentou então que a proposta governamental não é preventiva: é repressiva. É como uma sentinela que dispara primeiro e só depois pergunta quem vem lá.
Face ao que o Sr. Ministro repetiu a interrogação antes formulada: Será de esperar primeiro pelo terrorismo para só depois aprovar os meios para o combater?
O Sr. Secretário de Estado da Administração Interna, por sua vez, insistiu na importância das escutas telefónicas para o combate ao terrorismo. «Será comezinho mas é mesmo necessário, sob pena de ineficácia» - acrescentou.
O Sr. Ministro lembrou ainda que hoje se discute em França se não devem passar a fazer-se cartazes com o retrato de criminosos e indicação do prémio para quem contribua para a sua captura, como sucede, aliás, na RFA.
Para comentarem estas declarações, pediram a palavra os deputados Jorge Lacão e José Magalhães, tendo o primeiro começado por afirmar pretender desfazer um equívoco. Para o seu partido não está em causa haver Lei de Segurança Interna. A questão são as soluções. Por isso pergunta como encararia o Governo se fossem o Procurador-Geral da República ou o juiz de instrução a autorizar as escutas urgentes.
Ao que o Sr. Secretário de Estado da Administração Interna respondeu que já hoje são possíveis escutas autorizadas pelo juiz de turno, regime esse que deve manter-se. O agora proposto só serve para situações de urgência insuperável. Quanto a atribuir-se competência ao Procurador-Geral da República, o Governo achou preferível ser o Ministro da Administração Interna, por estar em contacto com as forças de segurança. Trata-se de dar resposta a casos de urgência insuperável e com tais cautelas que qualquer Ministro pensará muito antes de decidir.
O deputado José Magalhães assinalou que o debate destas matei ias se tem feito até agora, em regra, num tom e nível que acha de manter. São incompatíveis com esse nível «argumentos» como os subjacentes à interrogação «terrorismo primeiro e lei depois?» ou o desafio do Sr. Secretário de Estado da Administração Interna à Assembleia da República, perguntando-lhe se seria preciso um «caso Aldo Moro» para o Parlamento se decidir a aprovar legislação antiterrorista. Trata-se de formas de pressão inaceitáveis, por um lado, por outro, escamoteiam que em Portugal há uma armadura jurídico-penal vastíssima edificada em nome do antiterrorismo, incluindo o Código Penal, que dele dá uma noção larguíssima. Frequentemente invoca-se o direito comparado para afirmar que Portugal está «atrasado» nas leis antiterroristas, quando é certo que desde 1981 há instrumentos excepcionais criados com esse pretexta, alguns dos quais não existem em outros países que nos são apontados como exemplo (por exemplo, em França o Governo não propôs há dias à Assembleia Nacional a definição autónoma de um crime de «terrorismo» por achar excessivos os riscos de um tipo criminal vago: esse tipo criminal existe, porém, entre nós). Hoje em Portugal o combate ao terrorismo é uma questão de gestão eficaz de meios com adequada vontade política. A revista Cambio 16 informou recentemente que durante a acção do comando terrorista «Chamada da Cristo» na Avenida da Liberdade, escritórios da Air France, havia agentes dos serviços secretos franceses protegendo as operações para impedir danos humanos. Que se saiba estes elementos agiram livremente e se não foram detectados não foi por falta de lei e polícias a quem cabia detectá-los...
O Sr. Ministro comentou que o Serviço de Estrangeiros não i>ode controlar tudo. Prepara-se, aliás, a revisão da sua orgânica. Em qualquer caso, não é fácil a disciplina das actividades dos elementos de serviços secretos estrangeiros em Portugal. Há os de toda a espécie de países, sob as mais diversas formas, incluindo adidos comerciais, encarregados de negócios, etc.

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O Sr. Secretário de Estado da Administração Interna replicou que considera também ele que o debate deve ser travado a certo nível. Por isso, o Governo ouviu os partidos da oposição e acolheu observações por estes produzidas. A questão do terrorismo está muito viva na Europa, mas apesar disso o Governo não colaborou em nenhuma campanha de agitação de fantasmas. Acha que deve legislar-se nacionalmente, sem agitação, sem pressões psicológicas. Trata-se de legislação de Estado a aprovar e debater com espírito de Estado.
Porém, se algum grupo parlamentar levar o debate para campos inaceitáveis, o Governo responderá ao mesmo nível e com intensidade que fará arrepender-se quem enveredar por tais vias. Assim, será se se registarem certas imputações e mesmo «bocas» como algumas das que o PCP dirigiu a deputados do PS no anterior debate, incluindo ao próprio deputado Jorge Lacão, presente na reunião. O Governo não aceitará passivamente tais métodos.
O deputado Jorge Lacão pediu então a palavra para considerar inaceitável um estilo de actuação traduzido em advertência aos deputados do tipo «portem-se bem senão [...]», ao que o Sr. Secretário de Estado da Administração Interna replicou que avisar primeiro é melhor, nem outro é o sentido da palavra avisar. O Governo não pode admitir ser colocado na posição de réu nesta matéria.
O deputado José Magalhães protestou pelo carácter abusivo e pressionante das declarações do Sr. Secretário de Estado da Administração Interna, inaceitável institucionalmente e politicamente significativo. Duvidando que a intimidação colha, o deputado considerou que não será por esse caminho que o Governo iludirá as suas próprias responsabilidades. Qualquer caso Aldo Moro seria da responsabilidade do Governo, com lei ou sem lei.
Contraprotestando, o Sr. Secretário de Estado da Administração Interna reafirmou que o regime especial de escutas telefónicas é o mínimo dos mínimos. Sem isso, o Governo não se responsabiliza por um caso Aldo Moro.
O deputado Duarte Lima tomou depois a palavra para recordar ponto a ponto as características do mecanismo previsto no artigo 18.º da proposta, que sublinha destinar-se a um número bem restrito de situações.
O deputado José Luís Ramos teceu, por sua vez, considerações sobre os fundamentos da proposta governamental, chamando a atenção da Comissão para dois aspectos. Por um lado, o terrorismo existe, ameaça seriamente o regime democrático, mas é uma ficção, é uma realidade a que é preciso dar resposta. Por outro lado, é preciso ter em conta o direito comparado, sendo evidente que só se pode comparar o comparável, como sublinhava há pouco outro deputado, mas sendo necessário ponderar as correntes que face a problemas similares conduziram a alterações legais em países similares ao nosso.
O Sr. Ministro interveio para realçar que a Lei de Segurança Interna é uma «lei quente», exige um equilíbrio entre a liberdade e a segurança. É um assunto difícil, debatido em todos os países que prezam as liberdades. O que se pede dos deputados é que ajudem o governo a encontrar esse equilíbrio. A proposta foi estudada por uma comissão de reputados juristas. Visa a coordenação de forças e serviços de segurança e a definição de parâmetros de actuação. Trata-se de delimitar o conteúdo e os limites das actividades de segurança interna e, por outro lado, de definir as entidades e meios que a devem protagonizar a fim de cumprir as obrigações do Estado. Trata-se de enfrentar formas organizadas de crime, agindo, em muitos casos, com pura maldade.
O terrorismo não está debelado entre nós, como provam recentes acções em pleno dia. E são muitos os que, com razão, pedem responsabilidades ao Ministério da Administração Interna, perguntando como podem tais coisas acontecer.
É preciso dotar o Estado de meios legais necessários. Não que a falta de eficácia se deva só à falta de leis. A eficácia do aparelho de justiça também inspira preocupações (veja-se o que está a ocorrer com o julgamento de Monsanto, designadamente o risco de esgotamento dos prazos de prisão preventiva sem que se tenha atingido fase adiantada do julgamento). Verifica--se também que não há condições de segurança adequadas para certos tipos de réus. No mesmo caso de Monsanto, é um espectáculo fantasmagórico a deslocação quotidiana de presos de alta segurança. A própria Penitenciária de Lisboa é vulnerável (já recentemente foram tomadas medidas para prevenir fugas em helicópteros).
Toda esta situação foi prestada pelo Governo. Já várias forças políticas passaram pelo Governo. Todos terão responsabilidades pela realidade existente. O Governo não se põe numa posição de «pessoas boas» que condenam todos os que estiveram antes no poder.
As questões existentes devem, pois, ser debatidas em profundidade e de boa fé. A Lei de Segurança Interna é necessária. O Governo pede a sua aprovação. Reconhecendo as deficiências que há no plano executivo e judicial, há também carências no plano legal a que é necessário responder. O documento apresentado pelo Governo é susceptível de ser aperfeiçoado. O Governo estará atento a todos os contributos que vão nesse sentido e ouviu com atenção as objecções do PCP, designadamente.
No tocante às questões de inconstitucionalidade suscitadas pelo PCP e MDP/CDE, o Sr. Secretário de Estado da Administração Interna pediu autorização para as examinar uma a uma, nos seguintes termos, seguindo a ordem do recurso do PCP:

a) A Constituição da República não define segurança interna. Logo a proposta não viola a Constituição da República Portuguesa. Não há uma noção constitucional de segurança interna;
b) A fixação de deveres dos cidadãos mesmo nos termos do n.º l do artigo respectivo não viola os princípios da necessidade e proporcionalidade no tocante aos deveres de colaboração. Aliás a própria lei dos Serviços de Informação os prevê. O Governo adoptou formulação rigorosamente idêntica à constante dessa lei («justificadamente»). Também o Decreto-Lei n.º 35 007 fixa deveres de colaboração com a justiça e ninguém considerou tal diploma inconstitucional; poderá discordar-se da solução politicamente, mas não poderá alegar-se inconstitucionalidade;
c) Quanto à militarização da PSP, o artigo 270.º da Constituição da República Portuguesa permite-a, como aliás tem entendido a Procuradoria-Geral da República. A proposta limita-se, aliás, a declarar o que é, a retratar a situação actual. Aliás, os batalhões de sapa-

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dores de bombeiros são também estruturas militarizadas. Poderá dizer-se que a solução é indesejável, mas não será inconstitucional;

d) Relativamente às medidas de polícia, a proposta enumera-as e fixa os princípios da sua aplicação (necessidade e proporcionalidade). Trata-se de uma lei-quadro. Não se trata de tipificar sanções - coisa que exige mais rigor. Ulteriormente os estatutos das forças policiais precisarão as condições em que podem ser aplicadas as medidas de polícia. Hoje o seu enquadramento consta de um velho diploma cujo aperfeiçoamento é agora proposto pela primeira vez após o 25 de Abril. Depois se fará a tipificação rigorosa dos casos. Todavia, se a Assembleia da República entender pormenorizar na especialidade o texto proposto pelo Governo no tocante às medidas de polícia, isso será bem vindo;
e) A «condução ao posto policial mais próximo» é inconstitucional? Não se tratou de criar uma figura próxima da garde à vue, mas de responder à necessidade de assegurar a identificação dos cidadãos, questão que tem originado dificuldades, recorrendo-se à figura do crime de desobediência em caso de recusa de identificação para garantir a condução à esquadra sob prisão nesses casos - solução insatisfatória. Também se recorre a rusgas que são inconstitucionais e o Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro, contém um regime de detenção para identificação. A norma proposta não fixou de propósito prazo durante o qual o processo de identificação tem de concluir-se, para evitar configurar um caso de garde à vue inconstitucional. Mas admite que se possa vir a fixar prazo. Por outro lado, a identificação de estrangeiros pode ser mais morosa, facto que é preciso ter em conta (nesta altura o Sr. Ministro pediu a palavra para narrar caso recentemente ocorrido com o Sr. Embaixador da França que, tendo tido um acidente, mostrou às autoridades os seus documentos franceses, pelo que foi conduzido à esquadra. Tendo ulteriormente protestado, foi-lhe perguntado se tinha exibido o seu cartão diplomático emitido pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros, documento que se verificou não ter, sendo pois responsável pelos inconvenientes de que se queixava.) O Sr. Secretário de Estado reconhece que a formulação da proposta pode originar problemas, dado usar o conceito de «estritamente necessário». Mas pode ser difícil fixar prazo, uma vez que a identificação pode demorar, sobretudo se o processo tiver lugar no início de um fim de semana (afirmação que levou o Deputado José Magalhães a comentar que o Governo achava normal uma detenção de cidadãos por 72 horas «aguardando identificação»). O Sr. Secretário de Estado da Administração Interna reconheceu que o regime previsto pode conduzir a incomodar honestos cidadãos, mas há situações graves a debelar. Não haverá soluções óptimas.
J) A solução proposta quanto a escutas não será também inconstitucional, uma vez que:
O artigo 34.º, n.º 4, permite escutas para efeitos de processo criminal. É o caso das que venham a ser necessárias para os fins cos serviços de informações. E que o processo criminal «inicia-se com a notícia da prática de informação ou algo que pareça tal», na definição da doutrina. Logo e quando os serviços de informação agissem seria para este efeito. Evidentemente, embora pedida pelo director do SIS a escuta seria para ser executada pela Polícia Judiciária, as escutas nunca seriam do SIS; tecnicamente seriam feitas pelos CCT/TLP;
Interrogado pelo Deputado Jorge Lacão sobre se acha isso compatível com a separação que a Lei dos Serviços de Informação estabelece entre as informações e o processo penal, o Sr. Secretário de Estado ca Administração Interna replicou, interrogando como pode admitir-se que o SIS ao possa pedir uma escuta se tiver a informação de que vai haver um atentado, por exemplo;
Tendo o Deputado Jorge Lacão objectado e, nesse caso se trataria de uma medida cê processo penal, o Sr. Secretário de Estado da Administração Interna reafirmou a sua anterior posição, admitindo que se não fosse considerada de processo penal a escuta para fins dos serviços de informação seria inconstitucional;
O Sr. Ministro complementarmente configurou nos seguintes termos a aplicação do dispositivo proposto: os serviços que obtenham informações ou que entendam que í vigilância de certas comunicações pode ser útil, dilo-ão. O director do SIS proporá, os TLP executarão. Isto é: face a algo de suspeito, o SIS fará a escuta. Se detectar factos, transfere de imediato o processo para a Polícia Judiciária;
As condicionantes propostas são tais que põem uma espada sobre a cabeça do Ministro, que em caso de ilegalidade se sujeita a uma vigorosa ordenação pública e política, o que levou o Deputado Lacão í objectar que por tudo isso a prudência deve começar no próprio legislador ao desenhar o quadro legal;
Em segundo lugar a competência para autorizar as escutas em processo criminal tem de ser do juiz? A actividade investigatória não tem de ser dirigida por um juiz. Por outro lado, se não houver validação as {trovas obtidas são nulas (artigo 32.º, n.º 6, da Constituição da República Portuguesa);
Em terceiro lugar, as escutas justificam-se pelo estado de necessidade, cujos contornos são estudados por Gomes Canotilho e Vital Moreira em comentário ao artigo 43.º da Constituição da República Portuguesa, em condições que o Sr. Secretário de Estado da Administração Interna considera aplicáveis a este caso. Nestas situações estar-se-á perante caso de necessidade. Nos demais aplicar-se-á o Código de Processo Penal;

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Em quarto lugar o juiz é livre de validar ou não. Logo não se fere a independência do juiz.

g) A proposta não agride a competência exclusiva do Governo e o Governo ficou muito surpreendido com o argumento do PCP. A Assembleia da República devia ficar contente com a proposta. O Governo podia ter legislado nesta matéria, mas quis que fosse a Assembleia da República. É um caso de competência concorrencial e não exclusiva. A proposta regula serviços dependentes do Governo, mas não a sua organização interna. Mesmo a repartição de competências entre o Ministério da Administração Interna e o Ministério Público é reflexo da política de segurança interna. Aliás, há precedentes: veja-se a Lei de Defesa Nacional...;
h) Não se percebem também as objecções deduzidas quanto à polícia marítima. Quem pode ser senão ela a responder pela fiscalização dos mares. A segurança interna não pode restringir-se a terra. O Deputado José Magalhães explicou que os termos em que o recurso equacionava a questão eram diferentes dos usados em outros pontos, percebendo-se o melindre (trata-se de típicas missões de segurança interna proibidas às Forças Armadas; não há polícia civil marítima; logo é difícil dar resposta à solução de facto sem entorse à Constituição da República Portuguesa, salvo equacionando em termos hábeis a natureza da missão). O Sr. Secretário de Estado da Administração Interna declarou que, apesar de tudo o que se tem dito, não tem como líquido que as missões de segurança interna só possam ser desempenhadas pelas forças de segurança. Tem dúvidas se as Forças Armadas não poderão actuar, sob o comando sempre do Ministério de Defesa Nacional, e não do Ministério da Administração Interna. Em Espanha, por exemplo, as missões marítimas vão passar para a Guarda Civil. O Sr. Ministro observou que talvez devesse haver entre nós uma polícia marítima civil e fez um apelo final a que seja debatida e aprovada como lei de estado uma lei de segurança interna, a debater com mais cabeça e menos coração. O Governo está disponível para o diálogo e voltará a debater o assunto com a Comissão, se necessário. O Governo não se considera possuidor da verdade, pelo que todas as achegas positivas serão bem vindas.
Agradecendo aos membros do Governo a sua colaboração, o Sr. Presidente em exercício deu a reunião por encerrada, dela se lavrando a presente acta, que vai assinada nos termos regimentais.

2.5 - Na sequência, a 1.ª Comissão emitiu o seu parecer, em que se considerou:

a) A segurança interna é uma função de polícia, como tal prevista no artigo 272.º, n.º l, da Constituição, tal como o é a defesa da legalidade democrática e dos direitos dos cidadãos. São estes dois conceitos constitucionais subsumíveis aos conceito de segurança interna? É o que pretende a proposta de lei e os recursos contestam. Não se ilude a dificuldade doutrinária e legislativa na delimitação do conteúdo da segurança interna. Procurou-se, por isso, até ao momento, uma delimitação negativa, conduzindo à sua distinção relativamente aos objectivos de defesa nacional e de protecção civil. Tal delimitação encontra-se assegurada na proposta do Governo. Quanto à definição positiva do conceito, deve a questão ser abordada em discussão de fundo;
b) Estatuir sobre deveres gerais e especiais de colaboração, em matéria de segurança interna, cometendo «falta disciplinar grave», independentemente de eventual responsabilidade criminal, quem omitir um dever especial, é problemática que se afigura ser da lei ordinária, sendo a medida da sua utilização avaliável à luz dos grandes princípios orientadores da constitucionalidade. Estarão feridos os princípios da necessidade e da proporcionalidade? Fundamentando o texto da proposta, sustentou-a o Governo com base na existência de norma similar no sistema de informações da República. Sucede que tal norma é inexistente no sistema de informações, justamente em atenção à teleogia dos serviços informativos e à necessidade de garantir o direito dos cidadãos à privacidade. De onde se torna possível concluir pela existência de um excesso de medida constante da proposta governamental;
c) A matéria relativa à restrição de direitos aos agentes da PSP tem constituído questão das mais controvertidas à luz do actual ordenamento constitucional. Com efeito, diz o artigo 18.º, n.º 2, da CRP que «a lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição...», estatuindo o artigo 270.º que «a lei pode estabelecer restrições ao exercício de (certos) direitos [... ] dos militares e agentes militarizados [...]. Por sua vez o artigo 272.º, n.º 4, estabelece que «a lei fixa o regime das forças de segurança».
Pode uma interpretação literal ou sistemática da Constituição concluir que a polícia é um órgão da Administração Pública insusceptível de equiparação, para certos efeitos, ao regime das Forcas Armadas? Mais concretamente, a Constituição permite ou rejeita a possibilidade de qualificar como militarizados os agentes da PSP? A que luz se fundamentará a qualificação dos agentes da GNR e da Guarda Fiscal como agentes militares, uma vez que actuam na ordem interna? Parece, por outro lado, que as distinções inequivocamente formuladas na Constituição e consagradas na Lei da Defesa Nacional entre defesa nacional e segurança interna apontariam para regimes diversos na qualificação dos respectivos agentes. E que este terá sido o propósito da Lei de Defesa Nacional ao ter qualificado em termos meramente transitórios a PSP como força militarizada. Acresce que a evolução das polícias tende, nos estados de direito, a constituí-las como agentes da Administração Pública. Temos, em conclusão, um problema difícil de discernir no plano do nosso ordenamento constitucional. A Procuradora-Geral da República tem emitido parecer favorável à qualificação da PSP como

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força militarizada. O instituto da polícia, sobretudo após a revisão constitucional, parece apontar no sentido de uma evolução civilista. Qual a solução mais adequada? Eis o que não parece possível estabelecer sem uma atenção cuidada à jurisprudência dos interesses. De acordo, aliás, com a doutrina expressa sobre o caso pela OIT, ao considerar o problema da restrição de direitos dos agentes da PSP um problema do foro da legislação interna portuguesa;

d) A tipificação das medidas de polícia decorre do comando constitucional expresso no artigo 272.º, n.º 2. Que tal tipificação deva ser integralmente ordenada na Lei de Segurança Interna, é o que o Governo põe em dúvida e o recurso do PCP reivindica. A solução num sentido ou noutro talvez resida na opção inicial quanto ao âmbito da segurança interna: se as funções de polícia forem integralmente subsumíveis ao conceito de segurança interna, como o Governo pretende no artigo 1.º do diploma, então parece adequado que as respectivas medidas estejam tipificadas no diploma; em caso contrário, importará conhecer qual a esfera das funções da polícia não abrangiveis pela segurança interna e, portanto, quais as medidas de polícia susceptíveis de utilização em cada caso. Ô diploma, tal como se encontra formulado, não resolve o problema, remetendo o Governo para a legislação estatutária das várias forças e serviços de segurança;
e) A detenção para identificação é contestada nos recursos como significando uma forma de privação da liberdade que a Constituição não prevê e não consente «no seu artigo 27.º, onde trata do direito à liberdade e à segurança». Nos termos da proposta (artigo 17.º, n.º 4), «a recusa de identificação constitui crime de desobediência» e a presença no posto policial é limitado ao «tempo estritamente necessário à identificação». Do ponto de vista constitucional reconhece-se o melindre da proposta, tanto mais que a não definição do tempo mínimo necessário à identificação incorre no grave risco de que a detenção possa prolongar-se, inclusive para além do prazo máximo que a Constituição estabelece (artigo 28.º, n.º 1) para validação ou manutenção da prisão preventiva, nos casos em que esta é admissível;
f) A faculdade conferida ao Ministro da Administração Interna para «autorizar o controle das comunicações» é uma disposição defendida pelo Governo como medida excepcional de processo penal. O artigo 28." da proposta governamental levanta os seguintes problemas essenciais:

1) Confere competência ao director do Serviço de Informações de Segurança para propor o controle das comunicações, em manifesta contradição com o diploma regulador do sistema, designadamente nos seus artigos 3.º e 4.º, visando a garantia constitucional do regime de direitos, liberdades e garantias e interditando o desenvolvimento de quaisquer actividades do âmbito ou competência específica dos tribunais ou das entidades com funções de polícia, designadamente todas as acções relativas à instrução do processo penal;
2) Confere ao titular de um órgão de soberania - o Governo - funções de processo penal, colocando deste modo em crise o princípio da independência dos tribunais; afecta a norma constitucional de que a instrução é da competência de um juiz; contradiz a orientação do processo penal constituindo, segundo o qual o processo penal só se inicia, nos crimes não dependentes de queixa particular, por acção do Ministério Público; e ainda, em conclusão, viola o princípio do sigilo das comunicações (artigo ?4.º da Constituição);
3) A validação póstuma conferida à autoridade judicial competente, além de levantar o grave problema da abertura do processo penal por iniciativa alheia ao Ministério Público, põe em crise a independência de julgamento dos tribunais, nos termos do título v da Constituição. Deve, entretanto, salientar-se a incongruência sistemática de verter para a lei de segurança interna providências de natureza semelhante a outras constantes do anteprojecto do futuro Código de Processo Penal, que, pelo seu carácter excepcional, merecem tratamento aprofundado, sistematicamente coerente e não contraditório com o regime constitucional de direitos, liberdades e garantias;

g) A questão relativa à eventual inconstitucionalidade orgânica que resultaria da aprovação, pela Assembleia da República, de matérias da competência exclusiva do Governo parece resultar subalternizada em face da possibilidade de admitir que o princípio constitucional da interdependência entre órgãos de soberania permitirá a aprovação, pela Assembleia, de matérias de iniciativa legislativa do Governo, desde que não contendam com a sua orgânica;
h) Finalmente, nas actuais circunstâncias, é de admitir que à polícia marítima sejam conferidas, no domínio marítimo, funções de polícia no âmbito da segurança interna.
Termos em que a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias exprimiu reservas sobre a constitucionalidade de algumas das soluções constantes da proposta de lei n.º 26/IV e considerou que o significado e a importância da proposta, reconduzida fundamentalmente a uma verdadeira e autêntica lei organizativa, melhor deviam ser avaliadas na apreciação de fundo.
2.6 - Posteriormente, o Governo retirou a sua proposta relativa ao artigo 18.º do diploma, substituindo-a por outra sobre a qual a Comissão emitiu o parecer seguinte:
Na sequência da apresentação pelo Governo à Assembleia da República da proposta de lei n.º 26/IV sobre segurança interna e da elaboração pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitas, Liberdades e Garantias de parecer relativo a recursos de impugnação apresentados por deputados do PCP e do MDP, entendeu o Governo reformular o artigo 18.º da referida proposta.

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De acordo com a nova redacção do preceito, a faculdade, em certos casos, inicialmente conferida ao Ministro da Administração Interna para autorizar o controle das comunicações, passa a ficar sujeita a autorização judicial prévia.
O texto da nova redacção foi admitido nos termos regimentais. Por sua vez, os deputados do Grupo Parlamentar do MDP/CDE, ao abrigo do artigo 127.º, n.º l, alíneas), do Regimento da Assembleia da República, interpuseram recurso da admissibilidade da proposta de alteração apresentada pelo Governo por, em seu entender, a mesma violar a Constituição e princípios nela consignados, designadamente os seus artigos 32.º, n.º 7, e 37.º, n.º 4.
Para o Grupo Parlamentar do MDP/CDE estariam assim violadas as normas constitucionais de que «nenhuma causa pode ser subtraída ao tribunal cuja competência esteja fixada em lei anterior» (artigo 32.º, n.º 7), e da proibição de ingerência na correspondência e nas telecomunicações, «salvo os casos previstos na lei em matéria de processo criminal» (artigo 34.º, n.º 4).
No primeiro caso, a violação adviria da fixação legal de uma competência territorial genérica ao juiz de instrução; no segundo caso, a violação resultaria da contradição da medida legal proposta com o princípio constitucional invocado e sua derivação no direito positivo - Código de Processo Penal (artigo 45.º) e disposições combinadas do Decreto-Lei n.º 605/75.
Perante o exposto, considera-se que, independentemente da avaliação dos eventuais méritos ou deméritos da solução proposta pelo Governo, a fixação legal de nova competência ao juiz de instrução não deve contender com a interdição constitucional da desanexação ou subtracção dos processos na esfera de competência dos tribunais respectivos, que a medida deve ser genérica, não produzir efeitos especiais retroactivos e não discriminar quaisquer tipos legais de crime à competência especial de certos tribunais. Por outro lado, deve acentuar-se que o Governo qualifica, na justificação de motivos, a atribuição da competência de autorização de controle das comunicações como sendo, no caso sub-judice, uma media especial de processo penal.
Subsistem, neste ponto, as dúvidas expressas no primeiro parecer relativas à incoerência sistemática da medida legal proposta, justamente por se tratar de uma medida de processo penal e, como tal, se afigurar que tal matéria melhor seria tratada no âmbito do respectivo código. Esse é um problema de política legislativa, avaliável em apreciação de fundo e não em fase de controle prévio da constitucionalidade.
Termos pelos quais a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, reafirmando o ponto de vista sobre o parecer inicial, considerou que a proposta de alteração ao artigo 18.º da proposta de lei n.º 26/IV devia ser objecto de apreciação de fundo.

2.7 - Tendo encetado, entretanto, o processo de elaboração do Código de Processo Penal, a Assembleia da República deliberou, com o voto contra do PCP, incluir nesse diploma diversas das disposições excepcionais (ditas de combate ao terrorismo e à criminalidade violenta ou altamente organizada) cuja necessidade era sustentada pelo Governo. Tais disposições relativas à detenção «para identificação», ao estatuto dos arguidos, às revistas, buscas, apreensões, escutas e intercepções foram objecto de intenso debate da l.1 Comissão e no Plenário e vieram em parte a ser consideradas inconstitucionais pelo Tribunal Constitucional (cf. Acórdão n.º 7/87, de 9 de Fevereiro). Subsistiram, porém, em aspectos fundamentais as soluções criticadas pelo PCP, que requereu a alteração do diploma em sede de ratificação. Não tendo tal ocorrido, veio o mesmo, porém, a ser suspenso até l de Janeiro de 1988, no dia 28 de Abril de 1987, o que viabiliza o aprofundamento do debate público sobre os preceitos mais preocupantes para a liberdade e tranquilidade dos cidadãos.

3 - O debate travado em Plenário e ulteriormente na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias levou a que o texto final da Lei de Segurança Interna diferisse em aspectos fulcrais e essenciais da versão originariamente apresentada pelo Governo. Tal decorreu da apresentação de sucessivas propostas de alteração, examinadas e discutidas em subcomissão e ulteriormente no Plenário da Comissão (com a participação, em dado passo, dos Ministros da Justiça e da Administração Interna).

A Lei:

a) Não visa substituir, nem duplicar, nem sobrepor-se ao Código de Processo Penal e a qualquer outro diploma da área que regula. Trata-se de uma lei de princípios, uma lei catálogo, lei programa e lei orgânica;
b) Na definição de princípios gerais reproduz a conceptologia constitucional, sublinhando (artigo 1.º, n.º 1) que as actividades de segurança interna devem exercer-se nos termos da lei penal e processual penal, das leis orgânicas das polícias e demais diplomas que limitam e enquadram o funcionamento das forças de segurança, devendo sempre respeitar (artigo 2.º) os direitos, liberdades e garantias e os demais princípios do Estado de direito democrático. Transcrevem-se igualmente as disposições constitucionais relativas às medidas de polícia, à organização das forças de segurança e ao regime de prevenção dos crimes (aspecto importante omitido na proposta governamental: segundo a Constituição, o próprio combate aos crimes contra a segurança do Estado só pode fazer-se com observância das regras gerais sobre polícia e com respeito pelos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos);
c) Foi expurgada de quaisquer disposições processuais penais ditas especiais (relativas a escutas e identificações);
d) Restringe os deveres de colaboração dos cidadãos ao que decorre do Código Penal e dos Estatutos das Forças de Segurança. A ninguém se impõe o dever de delação ou o dever de colaboração com os serviços de informações. O dever de não obstrução do normal exercício das competências de entidades policiais haverá de ser cumprido, tendo em conta precisamente que não se estabelece um dever de acção positiva e que se sobrepõe um comportamento normal por parte das policias, existindo o direito de resistência e de não obediência a mandatos le-

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gítimos e a condutas abusivas e ilegais. Remete-se para a lei a regulamentação dos deveres dos funcionários públicos, incluindo o regime de responsabilidade (que são ambos da competência exclusiva da AR). À AR cabe também especificar os limites do dever de comunicação pelas chefias dos factos relativos a crimes de espionagem, sabotagem ou terrorismo;

e) As normas sobre coordenação e cooperação das forças de segurança (artigo 6.º) estabelecem dispositivos de salvaguarda de autonomia funcional de cada serviço (limitando, designadamente, a comunicação recíproca de dados - n.º 2);
f) O capítulo u (relativo à intervenção dos diversos órgãos de soberania na definição, coordenação e execução da política de segurança interna) não regula apenas as competências e poderes do Governo, sublinhando o papel da AR (e conferindo aos partidos da oposição um novo direito: o direito de serem ouvidos regularmente sobre o andamento dos principais assuntos da política de segurança). A AR apreciará anualmente um relatório do Governo sobre a situação do País em matéria de segurança (artigo 7.º, n.º 3);
g) As normas relativas ao Governo e seus poderes implicam a revogação da Resolução do Conselho de Ministros n.º 85/86, de 11 de Dezembro, que atribuiu ao Ministro de Estado o comando de todas as polícias, centralizando-as («em situação inadiável»), com ultrapassagem da orgânica do Governo e das forças de segurança (e serviços de informações). As regras de enquadramento fixadas nos artigos 8.º, 9.º e 10.º pressupõem o respeito pela normais competências de cada Ministro, não atribuem ao Primeiro-Ministro outros poderes que não os decorrentes do que é constitucionalmente admissível, dadas as suas funções de direcção ministerial e responsabilidade suprema pelo Governo. Quando delegue competências no MAI, não podem as medidas operacionais ser aplicadas com preterição das competências de outros ministros (artigo 9.º, n.º 3), medida cuja verificabilidade é todavia escassa e cuja aplicação rigorosa não pode ser garantida;
h) O Conselho Superior de Segurança viu alterada a sua natureza e composição, com correcção do Estatuto do PGR (que nele participa por direito próprio para fiscalização e garantia da legalidade democrática);
i) O Gabinete Coordenador de Segurança verá reguladas as suas normas de funcionamento por decreto-lei (artigo 12.º, n.º 3) e tem funções de estudo e não de estado-maior;
j) As normas sobre as forças e serviços de segurança são um menor catálogo, do qual não se extrai a qualificação de cada uma delas (expurgou-se a norma que previa a militarização da PSD);
l) As normas sobre autoridade de polícia valem apenas nos limites e dentro dos termos das leis orgânicas de cada força, não lhes aditando a Lei de Segurança Interna qualquer nova competência;
m) O regime das medidas de polícia (artigo 16.º) é basicamente remissivo (só pode haver vigilâncias, identificações, apreensões, expulsões nos tenros da legislação vigente ou futura - da competência da AR - e dentro dos limites da Constituição. Aponta-se para que venham a ser estabelecidas medidas especiais [encerramento temporário de paióis, cessação da actividade de organizações criminosas (v. g. sabotagem, espionagem, terrorismo), sujeitas a validação judicial] (artigo 16.º, n.º 2);
n) Vincula-se os agentes policiais não uniformizados que emitam mandados legítimos vinculativos dos cidadãos a identificarem-se previamente (artigo 17.º);
o) Centraliza-se na PJ tudo o que diga respeito à realização de escutas. Na redacção final do artigo 18.º foi formalmente excluída a possibilidade de comunicação a serviços de informações de resultados de escutas (artigo 18.º, n.º 4), sendo-lhes vedado requerê-las (essa competência é apenas dos órgãos de polícia criminal responsáveis pelo processo - artigo 18.º, n.º 2).
Acresce que as disposições relativas ao regime de escutas (e intercepções) não têm aplicação até l de Janeiro de 1988. Com efeito, a Lei de Segurança Interna remete nesse ponto para o novo Código de Processo Penal que foi suspenso pela Assembleia da República até àquela data.
4 - O PCP votou os aperfeiçoamentos, limitações e correcções, de que se fez referência. Bateu-se para que a LSI fosse expurgada dos aspectos mais gravosos. Não logrou, porém, a sua inteira supressão. Nem a sua entrada em vigor no quadro em que se mantém em funcionamento o Governo demitido do PSD deixa de oferecer sérios riscos de perversão e desnaturação daquilo mesmo que na lei foi objecto de correcção (v. g. centralização de polícias e serviços de informação).
Por tudo isto, não podia o PCP deixar de votar contra o diploma na sua redacção final. O PCP continuará a bater-se para que sejam suprimidos os verdadeiros factores de que depende a intranquilidade e insegurança dos cidadãos e aprovada legislação que, em vez de os agravar, contribua para a defesa dos direitos, liberdades e garantias e do Estado de direito democracia.
O Deputado do PCP, José Magalhães.

Declarações de voto enviadas a Mesa para publicação e relativas à votação da proposta de lei n.º 14/1V (Lei do Serviço Militar).

l - O Grupo Parlamentar do PCP contribuiu activamente p.ira a elaboração, aperfeiçoamento e aprovação de uma nova Lei do Serviço Militar, que substituísse a velha lei de 1968 (elaborada no auge da guerra colonial).

Ponderando o resultado globalmente positivo do trabalho da especialidade realizado na Comissão Parlamentar de Defesa Nacional, o Grupo Parlamentar do PCP não hesitou em dar o seu voto favorável ao texto que subiu a Plenário para votação final global.

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No trabalho em que se empenhou na Comissão de Defesa, o Grupo Parlamentar do PCP pautou-se por dois objectivos fundamentais:
Que a nova Lei do Serviço Militar desse inteiro acolhimento aos princípios constitucionais relativos ao papel e missão das Forças Armadas e à determinante função cívica e patriótica do serviço militar obrigatório;
Que a nova Lei do Serviço Militar contribuísse de forma significativa para a dignificação do serviço militar obrigatório e para o respeito dos direitos e garantias dos jovens que o prestam.
Foi nesse quadro que o Grupo Parlamentar do PCP (quer nas dezenas de propostas de alteração que apresentou, quer nas posições que assumiu e defendeu durante o debate na especialidade) contribuiu activamente para o resultado aprovado em votação final global, com o qual se congratula.

2 - O Grupo Parlamentar do PCP entende que existem condições para a diminuição (feita em prazo razoável) do tempo de serviço efectivo prestado nas Forças Armadas.
Por isso, defendemos, sem reservas, que a lei fixasse que, a prazo relativamente curto (prazo necessário, face às adaptações que têm de ser introduzidas), a duração do serviço efectivo normal passasse a ser de doze meses no Exército e dezoito meses na Força Aérea e Marinha. Foi a solução que veio a ser acolhida.
Entretanto, sublinhamos paralelamente que esta redução do tempo de serviço não deveria conduzir nem a um inconveniente (e inconstitucional) reforço da profissionalização das Forças Armadas, nem à degradação do estatuto dos jovens militares do SMO, conduzidos a funções «menores» ou menos qualificadas, isto enquanto as funções mais técnicas e mais nobres seriam reservadas a «profissionais» (permanentes ou em regime de contrato).
Respondendo a esta preocupação, a Lei veio a integrar uma norma proposta pelo PCP, nos termos da qual fica estatuído o seguinte:
Sempre que o período normal de serviço militar obrigatório seja insuficiente para a satisfação de necessidades técnicas das Forças Armadas, poderão estas recorrer ao regime de contrato para o prolongamento daquele serviço.
Esta norma consagra o espírito do legislador, que, assim, aponta para reforçar o SMO (e o seu prolongamento pelo período necessário) como base organizatória das Forças Armadas.

3 - Relevo especial merece ainda a questão das idades para cumprimento das obrigações relativas ao serviço militar, quer as idades para o recenseamento, inspecção e incorporação, quer as idades limite (mínima e máxima) de obrigações militares.

Foi o Grupo Parlamentar do PCP que propôs o abaixamento das idades para recenseamento, inspecção e incorporação (idades que conduziam, na situação actual, a que o ano normal de incorporação fosse o ano em que o jovem fazia 21 anos). A nova lei consagra a diminuição de um ano, pelo que o ano normal de incorporação passa a ser o ano em que o jovem faz 20 anos.

As vantagens desta solução são óbvias para a vida dos cidadãos portugueses.

4 - A concepção global dos deveres dos portugueses para com a Pátria (e qual é, nesse quadro, o conteúdo do serviço militar) ficou, em nossa opinião, exemplarmente definida no artigo 1.º do diploma aprovado.

Através de formulações que correspondem às que o Grupo Parlamentar do PCP propôs, ficou esclarecida a universalidade do dever de defesa da Pátria, a que estão vinculados não só os que cumprem o serviço militar como os que (por excepção constitucional - é o caso dos objectores de consciência; por excepção legal - é o caso das mulheres; ou por excepção resultante de situações de facto - é o caso dos jovens que não chegam a ser incorporados por desnecessidade) não cumprem o serviço militar ou dele são dispensados.

É neste quadro que deve ser encarada como positiva a solução encontrada para as mulheres. Efectivamente, nada justificava alargar a obrigação de prestação de serviço militar às mulheres, quando é sabido que o País não tem estruturas nem capacidade para que elas pudessem ser incorporadas. Por outro lado, e como factor decisivo, as mulheres estão obrigadas ao dever de defesa da Pátria, nada impondo que ela se deva manifestar pela prestação do serviço militar (o que seria contrário a profundas tradições da vida nacional).

As soluções encontradas para a hipótese de serviço militar voluntário serão questionáveis, mas têm, pelo menos, o mérito de clarificarem que deverão ser «salvaguardados os princípios constitucionais aplicáveis à protecção da igualdade dos cidadãos e da função social da maternidade».

5 - A lei que veio a ser aprovada representa um efectivo avanço na concepção global sobre a função do serviço militar. Em muitos pontos isso deve-se a propostas concretas apresentadas pelo Grupo Parlamentar do PCP, que importará aqui registar.

É o que se passa (para além das questões já referidas em pontos anteriores):

Com o dever, imposto ao Governo, de fornecer informação sobre o conteúdo do serviço militar (artigo 12.º);

Com o princípio de respeito (quando possível) pelas preferências manifestadas pelos homens no que toca ao ramo, especialidades e área geográfica onde gostariam de prestar o SMO (artigo 14.º, n.º 3);

Com a possibilidade de recurso da classificação atribuída (artigo 14.º, n.º 4), que, já que o acto final de classificação é qualificado como acto administrativo definitivo e executório, vem a permitir recurso judicial;

Com o facto de as situações de estudo (incluindo, como era proposta do PCP, as situações de aprendizagem profissional e formação profissional) virem a ser consideradas em termos amplos como motivo de adiamento.

A estas inovações, que resultam de propostas do Grupo Parlamentar do PCP, acrescem outras significativas, aprovadas com a intervenção activa dos deputados comunistas. É o caso das seguintes questões:

Simplificação das diferentes situações face ao Serviço Militar (artigo 2.º);

Fixação do regime de «recondução sucessiva» em quadros permanentes como uma situação transitória, a ser feita cessar (artigo 4.º, n.º 7);

Obrigação de incluir no OE a expressão numérica dos quantitativos de pessoal a incorporar anualmente;

Revogação da taxa militar.

6 - O Grupo Parlamentar do PCP não quer deixar de acentuar, entretanto, que a lei aprovada é particular-

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mente pobre no que respeita aos direitos e garantias dos jovens que prestam o SM (matéria determinante para a dignificação do SMO).
É certo que, com propostas e apoio do PCP, foi consagrada:
A consagração do valor global do SMO para a valorização cívica, cultural e física dos jovens que o cumprem (artigo 1.º, n.º 3);
A obrigação estadual de informar os jovens sobre o SMO, seu sentido e possibilidades (artigo 12.º);
A obrigação de considerar as preferências manifestadas pelos jovens a incorporar (artigo 14.º, n.º 3);
A possibilidade de adiamento, incluindo para os jovens operários [artigo 18.º, n.º 3, alínea b)];
A fixação do valor do subsídio de amparo num mínimo correspondente ao salário mínimo nacional;
O princípio da equivalência entre os cursos, disciplinas e especialidades das Forças Armadas e os similares ministrados em estabelecimentos civis;
A extensão das garantias de emprego aos trabalhadores não permanentes (artigo 34.º, n.º 1).
Só que, e lamentavelmente, não tiveram acolhimento propostas concretas do PCP que teriam dado outra dimensão à consagração dos direitos e garantias dos jovens militares.
Não foram, assim, consagradas e acolhidas propostas do PCP que:
Permitiam, dentro de certos limites (18 a 22 anos), a opção sobre o ano de incorporação;
Elevavam o valor do pré;
Garantiam a gratuitidade dos transportes de fim-de-semana;
Contribuíam para a satisfação dos interesses fundamentais dos jovens no que respeita às condições de alojamento, alimentação e fardamento;
Permitiam a constituição de um sistema de colaboração e participação que viabilizava a intervenção criativa dos militares do SMO nas áreas fundamentais do bem-estar (sem prejuízo, obviamente, da cadeia de comando).
A acção pela consagração destes direitos não terminou com a elaboração desta lei. Lamentando que não tivessem sido acolhidas estas propostas, manifestamos a nossa vontade de continuar uma acção política global que conduza à sua consagração.
7 - Importa realçar ainda a eliminação da expressão «em situações de excepção» na alínea b} do n.º l do artigo 28.º, que se refere às possibilidades de convocação excepcional das classes de disponíveis. A eliminação dessa expressão é uma reafirmação do princípio constitucional de que o emprego das Forças Armadas nos estados de emergência e de sítio só pode ser feito no quadro legal já definido pela Assembleia da República e de acordo com as leis concretas que declarem essas situações. E nunca por mero decreto do Governo.

Situação diferente é a prevista nesse artigo 28.º, n.º l, alínea b):

É a situação de perigo de guerra ou de agressão eminente ou efectiva por forças estrangeiras.
Acolhem-se assim preocupações legítimas, mas num quadro de respeito pela Constituição.

8 - A lei aprovada é, sem dúvida, uma lei arejada. Não isenta de defeitos (alguns deles já referidos). Mas globalmente positiva.

Saudamos a sua aprovação, mas continuaremos a trabalhar para melhorar o que deve e pode ser melhorado.
Para bem do Serviço Militar Obrigatório, para bem da Juventude Portuguesa, para bem das Forças Armadas de Portugal.
Assembleia da República, 30 de Abril de 1987. - O Deputado do PCP, João Amaral.

Votámos centra esta iniciativa porque cremos que, com a ausência de definição de um serviço cívico não armado e alternativo ao serviço militar, a aprovação deste texto reforça uma componente militarista da sociedade, não perspectivando a criação de uma postura sócio-cultural adaptada à era que desponta que se pretende vivida em paz.
No entanto, foi bom que o texto final tenha retirado o alcance de uma medida considerada muito injusta: a obrigatoriedade de as mulheres prestarem serviço militar. Com efeito, o texto final define o regime de prestação de serviço militar feminino de uma forma voluntária, satisfazendo assim as reivindicações das mulheres portuguesas.
Assembleia da República, 28 de Abril de 1987. - A Deputada Independente, Maria Santos.
Declaração de voto enviada à Mesa para publicação e relativa à votação da lei de alteração ao Decreto-Lei n.» 358/86, de 27 de Outubro (ratificações n.01109/IV, 111/IV e 114/1 V).
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Decreto-Lei n.º 358/86, de 27 de Outubro, foi, por iniciativa da oposição da esquerda parlamentar, submetido a ratificação desta Assembleia da República.
Movidos pelo propósito de mais uma vez pôr em causa a competência legislativa do Governo, o que já era indiciada na Lei n.º 20/86, de 21 de Julho, ao exigir-se a sua regulamentação por decreto-lei, o PS, o PRD e o PCP introduziram empecilhantes alterações ao decreto-lei ratificando.
Aliás, já a Lei n.º 20/86, se mostra eivada de burocratizantes normas que entravam uma gestão correcta e escorreita por parte do Governo relativamente à concretização d: reformas estruturais no âmbito da comunicação social estatizada que este se propunha realizar.
Não obstante os escolhos assim levantados, o Governo regulamentou, pelo exigido decreto-lei, a mencionada lei, o que se terá revelado aos olhos da oposição «militante» como autêntica determinação do Governo em reestruturar, apesar das dificuldades criadas, o sector público da comunicação social.
Havia por isso de sujeitar tal diploma a ratificação para adiar, por mais uns tempos, a sua aplicação e por esta via tentar provar a falsa e propagandeada incapacidade do Governo.
As alterações ora introduzidas no decreto-lei agravam a situação criada e dificultam a aplicação de medidas destinadas a organizar e racionalizar o sector público da comunicação social, conduzindo outrossim à manutenção e fixação da sua estagnação.
Quem estará, por exemplo, interessado em adquirir uma empresa quando à partida sabe que a lei reserva a maioria do capital para o sector público?

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Como aceitar e compreender que a concessão e cessão de exploração tenham o mesmo regime das próprias alienações?

Em consequência.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Social Democrata não pode votar favoravelmente as emendas introduzidas pela lei ora votada por entender que tornam ainda pior o que já não era bom por força da Lei n.º 20/86.

Lisboa, 28 de Abril de 1987. - O Deputado do PSD, José Vieira Mesquita.

Declaração de voto enviada à Mesa para publicação e relativa à votação do texto alternativo aos projectos de lei n.ºs 405/IV, 409/IV, 411/IV, 413/1V e 414/1V (eleição de Deputados ao Parlamento Europeu).

1 - Nos termos do Tratado de Adesão de Portugal e de Espanha às Comunidades Europeias, artigo 28.º, n.º l, resultou para cada um dos novos Estados Membros o estrito dever de, até ao fim do corrente ano de 1987, proceder à eleição dos seus deputados no Parlamento Europeu.

De tal decorre a imperiosa necessidade de dotar o nosso ordenamento legislativo com mais um diploma que prescreva normas sobre os diversos aspectos de mais um acto eleitoral a que os cidadãos portugueses recenseados nos cadernos eleitorais são chamados, desde a legislação aplicável, para a qual se remeta, o colégio eleitoral, a capacidade eleitoral activa e passiva, as ineligibilidades e incompatibilidades dos candidatos, a marcação da eleição, a organização de listas e apresentação de candidaturas, a campanha eleitoral, o boletim de voto e o envelope utilizado no voto por correspondência, o apuramento dos resultados e, finalmente, o contencioso e o ilícito eleitoral.

2 - Consciente desta obrigação, o Governo apresentou na Mesa da Assembleia da República, em 27 de Março de 1987, a proposta de lei n.º 55/IV, a qual não chegou a ser apreciada na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias (a 1.ª Comissão), por, entretanto, ter caducado, em virtude da aprovação da moção de censura ao Governo.
Perante o decesso de tal iniciativa governamental, deputados do PSD transformaram aquela proposta de lei do Governo em projecto de lei, que recebeu o n.º 405/IV, vindo tal partido a ser secundado por todos os restantes partidos parlamentares, os quais, cada um de per si, apresentou o seu projecto de lei (CDS - 409/IV, PCP - 411/IV, MDP/CDE - 413/IV, PRD - 412/IV e PS - 414/IV), tendo todas as seis iniciativas merecido aprovação na generalidade.

3 - Da discussão na especialidade resultou o texto que acaba de ser votado, tendo o PSD em Comissão votado contra o disposto no artigo 2.º, que estabelece um único circulo eleitoral, com sede em Lisboa, e contra o artigo 3.º, n.º l, o qual restringe a capacidade eleitoral activa aos cidadãos portugueses recenseados no território nacional ou no território de qualquer Estado membro das Comunidades Europeias. Por isso o voto de abstenção de deputados do PSD não eleitos pelas Regiões Autónomas, na aprovação global final, deverá ser entendido tendo em conta as posições assinaladas no debate na especialidade.

4 - Com efeito e como tivemos oportunidade de declarar em Comissão, os partidos da oposição não quiseram atender às especificidades próprias dos arquipélagos da Madeira e dos Açores, que justificaram a sua autonomia política e administrativa e até nos acordos que o País vem fazendo com as Comunidades Europeias. Nem mesmo aquela forma mitigada, buscada do projecto de Código Eleitoral, que, torneando a hipotética inconstitucionalidade da criação de três círculos eleitorais, assegurava sempre representação específica no Parlamento Europeu a cada uma das Regiões Autónomas.

5 - Quanto à drástica redução da capacidade eleitoral activa dos cidadãos portugueses recenseados nos respectivos cadernos das mais diversas «Sete Partidas do Mundo», não se entende o argumento de que, por exemplo, o português recenseado na cidade de São Paulo, no subcontinente sul-americano, de entre as cidades a que acolhe dentro dos seus muros o maior número de portugueses, não possa escolher os deputados portugueses que hão-de representar o País no Parlamento Europeu. Terá porventura o cidadão português raiano, por exemplo, residente em Quadrazais, mais legitimidade para votar para o Parlamento Europeu?

6 - Também no debate da Comissão nos batemos para que não fossem considerados inelegíveis os membros do Governo, de órgão de Governo próprio de Região Autónoma, do Governo ou da Assembleia Legislativa de Macau, os governadores civis, não nos convencendo a argumentação produzida pelos demais partidos de que tais inelegibilidades resultavam de imposição da CEE, ou melhor do artigo sexto da Decisão do Conselho das Comunidades Europeias relativa à eleição de membros do Parlamento Europeu por sufrágio universal directo, o qual diz que a qualidade de membro do Governo (e outros titulares de cargos aí mencionados) de Estado membro é incompatível com a de Deputado ao Parlamento Europeu. Antes de mais, o argumento literal, tirado das expressões usadas em tal artigo, aponta para que se esteja perante uma verdadeira incompatibilidade, porque bem se compreende. Depois, sempre se poderia invocar o argumento de que o legislador comunitário apenas teve em vista as eleições para o Parlamento Europeu, pois torna-se incompreensível que um membro do governo possa ser candidato à Assembleia da República e não já fazer parte de uma lista de deputados ao Parlamento comunitário.

7 - Analisados muito à pressa cada um dos seus projectos de lei, naturalmente não se conseguiu amadurecer as melhores soluções para uma lei indispensável à eleição directa dos representantes portugueses no Parlamento Europeu. A sua actuação, que se espera para breve, deixará ver melhor as faltas cometidas e as lacunas existentes. Dado o pendor instrumental da lei ora aprovada, a pressa que houve em ultimá-la e, ainda, que a mesma se destinará à eleição deste ano, não correrá muito tempo sem que se vejam os erros cometidos.

Lisboa, 28 de Abril de 1987. - O Deputado do PSD, Licínio Moreira.

Declarações de voto enviados à Mesa para publicação e relativas à votação do texto alternativo aos projectos de lei n.(tm) 171/1V, 400/IV, 401/1V e 404/IV (Dia do Estudante).
A consagração do dia 24 de Março como Dia do Estudante é uma justa homenagem às lutas travadas em 1962 contra a ditadura. Mas é também o pôr fim a escandalosas proibições da comemoração deste dia pelos estudantes.
Com esta lei todos os estudantes poderão a 24 de Março de cada ano reunir-se para relembrar as históricas manifestações estudantis de 1962, mas também

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para continuar a tradição que remonta a 1951, no espírito de defesa intransigente dos interesses dos jovens estudantes. Com esta lei reforçam-se os mecanismos de confraternização e de união dos estudantes portugueses. Por isso, embora não concordando com o apoio tutelar do Estado a estas comemorações, que veio a ser consagrado no texto final, o Grupo Parlamentar do PRD congratula-se com a aprovação do diploma.

Os Deputados do PRD: Ana Gonçalves - Tiago Bastos - Jaime Coutinho.

Reafirmamos por último o carácter globalmente positivo desta decisão da Assembleia da República e consideramos que ela se deverá traduzir numa crescente atenção dos órgãos de soberania face às preocupações e protestos estudantis.

O Deputado do PCP, Rogério Moreira.

O Grupo Parlamentar do PCP tomou a iniciativa de apresentar, já na passada sessão legislativa, o projecto de lei n.º 171/IV, destinado a consagrar legalmente o dia 24 de Março como Dia do Estudante.
Foi com agrado que vimos outros grupos parlamentares assumirem, por ocasião do agendamento desta matei ia, outras iniciativas legislativas de sentido semelhante.
O Grupo Parlamentar do PCP, através dos seus deputados na Comissão Parlamentar de Juventude, empenhou-se assim na elaboração do texto final desta lei. depois da sua aprovação na generalidade, e considera positivo o facto de, com o seu contributo, ter sido possível comprir o prazo de cinco dias dado pelo Plenário para a sua apreciação na generalidade.
Votámos favoravelmente o texto agora submetido à votação por considerarmos que ele é, no essencial, positivo, quer porque permite ultrapassar obstáculos muitas das vezes colocados por órgãos de gestão das escolas e pelo próprio Ministério da Educação a realizações estudantis que visam assinalar a data de 24 de Março, quer porque prevê medidas de apoio, a formalizar por diferentes entidades, dentro do espírito de lotai autonomia das estruturas associativas estudantis e de acordo com os princípios da igualdade de tratamento e não discriminação. Em última análise, trata-se de dar corpo legal a uma sentida aspiração histórica do Movimento Estudantil e que radica na luta pela democracia e pelos direitos dos estudantes. Justifica-se, aliás, assinalar a feliz coincidência entre a aprovação desta lei e uma outra, também hoje votada pela Assembleia da República e que consagra um conjunto de direitos às associações de estudantes, numa demonstração de reconhecimento da importância da sua actividade, também ela erigida a partir da luta das associações durante o regime fascista.
Embora votando favoravelmente, o Grupo Parlamentar do PCP não pode deixar de manifestar a sua opinião contrária face à disposição incluída no artigo 2.º do diploma agora aprovado e que sugere alguns «objectivos» para a comemoração do Dia do Estudante. Na nossa opinião, é aos estudantes, e apenas a eles, que compete definir o âmbito, o conteúdo e as formas das comemorações do 24 de Março, como vem, aliás, sucedendo ano após ano, não fazendo como tal sentido que seja o Estado, através deste seu órgão de soberania, a pretender definir tais contornos; a redacção final encontrada para este artigo é, no entanto, bem mais comedida em relação a tais intenções, nomeadamente se comparada com a formulação, em exclusivo e originariamente, defendida no projecto de lei apresentado pelo PSD.
Consideramos igualmente que o texto do artigo 3.º devia ter deixado uma maior amplitude de organização das iniciativas do dia 24 de Março, não indiciando as estruturas que deverão por elas ser responsáveis, deixando tal questão ao critério exclusivo dos estudantes de cada estabelecimento de ensino.
Declarações de voto enviadas à Mesa para publicação e relativas à votação do texto alternativo aos projectos de lei n.ºs 61/IV, 88/IV, 89/IV, 149/1 V, 150/1 V, 151/1V e 153/1V (Enquadramento Legal das Associações de Estudantes).
O Grupo Parlamentar do PSD votou favoravelmente o texto alternativo da Comissão Parlamentar de Juventude sobre o «Enquadramento Jurídico das Associações de Estudantes» por entender que este vem preencher, apesar de algumas deficiências que a nosso ver possui, uma lacuna no ordenamento jurídico português, vindo superar a ambiguidade e indefinição legais que até hoje caracterizava, especialmente no que respeita ao ensino secundário, o associativismo estudantil.
O movimento associativo foi e é uma das mais pujantes realidades no âmbito da juventude portuguesa. Tendo sido um forte bastião contra o totalitarismo, antes e depois do 2 5 de Abril de 1974, é hoje o espaço onde se aprende a democracia feita participação e solidariedade. E, assim, de justiça que o Estado apoie o movimento associativo em duas vertentes: por um lado, removendo todos os obstáculos legais e formais derivados da inexistência de um quadro legal próprio; por outro, incentivando positivamente as associações de estudantes através da concessão de direitos, isenções e regalias que representam a consagração do reconhecimento da comunidade nacional dos méritos inegáveis do papel das AE.
A solução final a que foi possível chegar oferece-nos fundadas dívidas quanto a alguns aspectos. É o caso da insuficiente estatuição do princípio «uma escola - uma associação». Este princípio, em relação ao qual todas as foiças políticas manifestaram mais ou menos platonicamente o seu acordo, não se encontra rigorosamente estabelecido no texto da lei.
Não obstante, o esforço denodado da JSD nos trabalhos de especialidade permitiu a consagração do princípio de que em cada escola ou, se caso disso, academia o Estado apoiará uma e só uma associação de estudantes, o que, no nosso entender, corresponde a uma forma indirecta de harmonizar o texto da lei com o espírito de unidade que sempre caracterizou o movimento associativo estudantil.
Já no que se refere às associações de trabalhadores-estudantes o nosso desacordo é frontal, pela maneira ilegítima como aparecem contempladas no texto da lei. Se é verdade que o quadro dos apoios determinam uma posição secundária e complementar destas em relação às associações de estudantes representativas de toda a escola, facto é que a forma equívoca como se encontra redigido o texto pode permitir interpretações que levam a considerar estas situações como autênticas situações paralelas que teriam de repartir meios e apoios, enfraquecendo o movimento associativo e desvirtuando a unidade dos estudantes.
Este e outros aspectos, com os quais não concordamos total ou parcialmente, não são, no entanto, suficientes para impedir o nosso voto positivo à presente lei, tendo em consideração que a prática irá salientar, estamos feitos, a justeza das nossas posições e impor-se-ão no f aturo algumas alterações ao presente texto.

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A lei sobre «Enquadramento Jurídico das A. E.» irá, apesar de tudo, constituir um marco fundamental na historia do movimento associativo em Portugal, para o qual a JSD - organização política de juventude na qual militam a maioria dos dirigentes associativos de todos os graus de ensino - se orgulha de ter contribuído decisivamente, reivindicando desde há vários anos a sua aprovação e tendo participado de modo empenhado na elaboração da sua versão final, que, de um modo geral, se aproxima do projecto que inicialmente apresentou.

Pelo Grupo Parlamentar do PSD, João Poças Santos.

O Grupo Parlamentar do PRD congratula-se com a aprovação desta lei que vem dar às AE um quadro mais favorável à sua actuação.
Não será mais possível impedir os estudantes de se associarem e de defenderem os seus interesses. É particularmente significativo que as estruturas representativas dos estudantes tenham a partir de agora o direito de se pronunciar sobre a legislação do ensino e sobre a vida da escola.
Saiu assim reforçado o movimento associativo e saíram também ampliados os mecanismos de participação dos jovens na sociedade.
Maiores serão agora as responsabilidades das AE, que terão de ser verdadeiramente independentes e apartidárias para que seja possível a defesa intransigente dos verdadeiros interesses dos estudantes portugueses.

Os Deputados do PRD: Ana Gonçalves - Tiago Bastos - Jaime Coutinho.

O Grupo Parlamentar do PCP deu o seu voto favorável ao diploma que acabámos de aprovar, relacionado com associações de estudantes, na sequência de toda a actividade que durante largos meses desenvolveu através dos seus deputados na Comissão Parlamentar de Juventude.
Com efeito, o diploma agora aprovado dá acolhimento a uma perspectiva fundamental que o PCP defendeu sempre que este assunto foi debatido pela Assembleia da República: não se trata de utilizar as faculdades legislativas da Assembleia para impor uma malha apertada excessivamente regulamentadora à constituição e funcionamento das associações de estudantes; menos ainda se tratava de impor, por quaisquer meios, disposições que contrariassem ou limitassem o exercício de direito de associação por parte dos estudantes.
Ao invés, optando pela consagração de um vasto conjunto de direitos às estruturas associativas estudantis quer do ensino secundário quer do ensino superior, a Assembleia da República decidiu-se, e bem, pelo caminho que mais se adequa às necessidades das AE e que por estas era, aliás, aguardado com razoável expectativa.
A aprovação deste diploma revela igualmente o reconhecimento pela Assembleia da República da importante actividade desenvolvida pelas associações de estudantes. A dinâmica associativa assume-se com especial dimensão e amplitude, não obstante as dificuldades que inúmeras vezes lhes são colocadas quer pelas atitudes arbitrárias de alguns conselhos directivos quer pelo próprio posicionamento em muitas circunstâncias assumido pelo Ministério da Educação, negando-se a ouvir e ou contrariando as opiniões estudantis e discriminando-as nos (parcos) apoios materiais concedidos. A ambas as atitudes responde a Assembleia da República positivamente, através da consignação de importantes direitos às AE: direito de participação na definição de áreas fundamentais da política educativa e da vida das escolas, a dispor de instalações próprias, apoio material e técnico do Estado, apoio especial à imprensa associativa, direito de antena, isenções fiscais, critérios objectivos para a atribuição de subsídios, etc.
Por último, justifica-se salientar o carácter igualmente positivo que assume a decisão, contemplada no diploma agora votado, de não discriminação das estruturas associativas dos trabalhadores-estudantes, garantindo-lhes, quando existentes, direitos idênticos aos dos seus colegas dos cursos diurnos.

Assembleia da República, 28 de Abril de 1987. - O Deputado do PCP, Rogério Moreira.

Declaração de voto enviada à Mesa para publicação e relativamente à votação do texto alternativo aos projectos de lei n.ºs 49/IV, 92/IV e 94/IV (Revisão da Lei do Enquadramento do Orçamento do Estado).

Em 9 de Janeiro de 1986 o Partido Socialista apresentou à Assembleia da República um projecto de lei, que tive a honra de subscrever, propondo alterações à Lei do Enquadramento do Orçamento do Estado.
O objectivo desta revisão resultava patente para todos.
Com efeito, a Lei n.º 40/83, em vigor, tinha sido aprovada em tempo recorde antes da votação do Orçamento do Estado para 1984 e fora necessária em consequência da revisão constitucional que alterou o processo orçamental e o papel da Assembleia na sua elaboração e aprovação.
A velocidade que foi necessário imprimir aos trabalhos para a sua elaboração levaram à existência de lacunas ou de erros que a experiência mostrou ser necessário ultrapassar.
Estamos pois agora perante uma lei que na sua essência se baseia na ainda em vigor e que merecera aprovação de todos os partidos, apenas com a abstenção do PCP, e em relação à qual se introduziram agora aditamentos ou alterações em alguns dos seus artigos.
Podemos classificar as alterações referidas em dois grupos:
Em primeiro lugar, as que consistem em precisar melhor o que deve integrar o Orçamento do Estado: é o caso de se prever que a concessão de subsídios, subvenções, donativos passe a ser inscrita no OE; ou a exigência, que já vinha expressa nos princípios, mas não concretizada na prática, da publicação de mapas globais anexos, com os elementos necessários à apreciação da situação financeira do sector público administrativo - incluindo as regiões autónomas e as autarquias locais-, bem como de todo o sector público empresarial - empresas públicas e sociedades de capitais públicos; de precisão da utilização possível da dotação provisional a inscrever no Ministério das Finanças; precisão ainda sobre o conteúdo do articulado da proposta de lei do OE e sobre a avaliação da eficácia das despesas.
No que respeita ao mapa VII, agora VIII, previu-se que passe a referir de forma clara os respectivos encargos plurianuais, evidenciando as fontes de financiamento e a sua ventilação por regiões e os programas e projectos que sejam novos.
Maior precisão foi também dada aos diversos anexos informativos que terão de acompanhar a proposta

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de Lei do OE, por forma que a Assembleia da República passe a dispor dos elementos necessários à justificação da política orçamental apresentada, designadamente do eventual défice corrente e das formas da sua cobertura, com a especificação do seu impacte sobre a política monetária, a política global de crédito interno, o mercado de capitais e o endividamento externo.
Precisa-se ainda a forma como o Governo pode recorrer ao crédito público, interno e externo, para além dos limites e fora das condições estabelecidos no OE.
Em segundo lugar, houve aditamentos e alterações que visam o fornecimento pelo Governo à Assembleia da República de informação complementar.
São de referir em especial a necessidade que passa a haver de justificação do saldo do orçamento corrente, a existência de um novo mapa, que passará agora a ser o VII, sobre os orçamentos dos fundos e serviços autónomos, com discriminação daqueles cuja despesa exceda 2 milhões de contos.
A imposição das condições em que fundos e serviços autónomos podem contrair empréstimos para além dos montantes expressamente aprovados no OE.
O novo regime de recurso a operações de tesouraria para reforço de créditos orçamentais.
O novo regime das contas públicas que permita à Assembleia da República um acompanhamento da execução do Orçamento de Estado, bem como o facto de se passar a exigir que a CGE passe a apresentar explicações sobre as diferenças registadas entre o orçamentado e o executado, quer no que respeita aos capítulos relativos às receitas, quer às despesas. Esta inovação é fundamental. Sem ela a análise das contas públicas é um mero exercício comparado de números, sem justificação técnica e sobretudo política. Afinal, a razão que leva a Assembleia da República a debruçar-se, para além do Tribunal de Contas, na análise desta matéria.
Um dos aspectos importantes cuja alteração se propõe nesta lei diz respeito à sua discussão e votação nesta Assembleia.
Como se sabe, a discussão do OE na generalidade faz-se em plenário - depois de inúmeras reuniões realizadas normalmente por todas as comissões parlamentares e em especial pela Comissão de Economia, Finanças e Plano.
A discussão e votação das despesas faz-se também nesta Comissão, em reunião especial, pública e gravada.
Até agora a discussão e votação das receitas fazia-se em plenário e dava origem a reuniões que se prolongavam por toda a noite.
Um assunto com a importância deste e as suas consequências em matéria fiscal merece, na nossa perspectiva e da maioria dos deputados representados na Comissão de Economia, um debate profundo, completo, exaustivo, mas sereno e consequente.
Esta a razão porque o projecto de lei agora em votação prevê que também para as receitas se adopte um processo idêntico ao até agora previsto para as despesas e que, portanto, a sua discussão e votação passe a ser feita em sessões públicas e gravadas da Comissão de Economia, Finanças e Plano.
Naturalmente e à semelhança do que acontece em relação às despesas, sempre o plenário, se assim o decidir, pode avocar a si a discussão e votação das materiais que entender.
Continuará a votar-se em plenário, na especialidade, a matéria relativa a empréstimos e outros meios de financiamento dos défices.
Como inovação, refira-se ainda a possibilidade de a Assembleia da República, por solicitação da Comissão
de Economia, Finanças e Plano, poder passar a convocar as entidades que considere relevantes para o seu esclarecimento.
É um passo importante e que dignificará quer o funcionamento da Assembleia da República, quer dos serviços e empresas cuja posição é fundamental para que os deputado; tenham um conhecimento das matérias que estão a analisar.
Ao longo de pouco mais de um ano, de doze reuniões oficiais da subcomissão criada para elaboração desta Lei - s das vicissitudes que sucessivas substituições do seu presidente-, deputados do PSD em estágio para gestores públicos, com o bizarro de o último presidente indigitado nunca chegar a ter aparecido, foi possível chegar a este projecto final.
Creio, sinceramente, que esta é sem dúvida uma das leis mais importantes votadas na presente legislatura.
Esperemos que a sua aplicação permita a elaboração de um melhor e mais completo Orçamento do Estado e um mais profundo e mais sereno processo para a sua discussão e votação.
Esta a razão por que a votamos favoravelmente.

Pelo Grupo Parlamentar do PS, Helena Torres Marques.

Declarações «lê voto enviadas à Mesa para publicação e relativas à votação do projecto de lei n.º 343/IV (extinção da enfiteuse ou aforamento).

O Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata votou favoravelmente o projecto de lei n.º 343/IV, certo de que praticou um acto de inteira justiça, com vista à resolução dos graves problemas que afectam os «foreiros de Salvaterra de Magos».
Cumpre realçar o esforço de todos os grupos parlamentares para a solução encontrada, esperando que finalmente se consiga desbloquear o arrastado problema que há tantos anos afecta os «foreiros de Salvaterra de Magos»
Tal como em tempo da discussão em plenário da Assembleia da República tivemos oportunidade de dizer, mais uma vez repetimos que temos consciência de que «o 15 de Abril vai começar agora para os foreiros de Salvaterra de Magos».

Lisboa, 18 de Abril de 1987. - Os Deputados do PSD: Paulo Coelho - Álvaro Figueiredo - Neves Rodrigues - Vasco Miguel - Cândido Pereira.

O Partido Socialista manifesta a sua grande satisfação pelo facto de a Assembleia da República ter aprovado por unanimidade a lei que produz alterações no Decreto-Lei 195-A/76, de 16 de Março, diploma legal que extinguiu a enfiteuse, as quais visam elidir da realidade agre ria nacional os últimos resíduos do aforamento.
Por esta forma, onze anos após a acção legislativa do Poder Executivo, a Assembleia da República vem completar a obra do Governo para acabar definitivamente com o instituto anacrónico da enfiteuse, instituto que desempenha um papel relevante na colonização e povoamento do território nacional, mas que, com a evolução dos métodos e sistemas de produção agrícolas, deixou de desempenhar a função de instrumento de progresso para converter-se em travão de desenvolvimento.
Efectivamente a modernização da agricultura confere aos factor» de produção representados pelos capitais

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de exploração fixos e benfeitorias fundiárias um valor e eficiência produtiva preponderantes relativamente ao factor de produção terra.
Nestes termos todo o tipo de contrato que desfavoreça o investimento nos tipos de capital que constituem o elemento dinâmico do desenvolvimento agrícola deve ser legalmente desencorajado ou extinto. No segundo termo da disjunção metemos o aforamento, o qual, ao dar lugar a uma forma de propriedade imperfeita não estimula o investimento nem confere a segurança na fruição dos frutos da iniciativa empresarial e do trabalho. E o trabalho é o agente fecundante das forcas produtivas, como o exprimiu sugestivamente Alexandre Herculano, em 1873, por estas palavras:

A terra, considerada em si, exclusivamente, é tanto objecto de direito de propriedade como a atmosfera, a luz, a chuva, o vapor, a electricidade. As suas forças produtivas dormem inúteis e infecundas enquanto não as despeita o trabalho, e o trabalho é a prolação do indivíduo, a manifestação da sua inteligência e da sua força [...]. Mutilam-no, se o expulsam do solo vivificado por ele.

Os foreiros de Várzea Fresca e Califórnia, no concelho de Salvaterra de Magos, cujos antepassados desbravaram as terras em mato, criaram o solo agrícola, plantaram as espécies arbóreas e arbustivas e construíram a habitação e os cómodos agrícolas, como alguns outros era situação semelhante, viviam dilacerados pelo sentimento de mutilação por não possuírem a propriedade do suporte físico daquilo que é a obra da sua inteligência e da sua força.
Assim a lei da Assembleia da República liberta estes agricultores da condição de inferioridade jurídica e com este acto honra-se e honra esta prestimosa classe de produtores agrícolas.

Palácio de São Bento, 28 de Abril de 1987. - O Deputado do PS, José Frazão.

Declaração de voto enviada à Mesa para publicação e relativa à votação do texto alternativo aos projectos de lei n.ºs 377/IV e 384/IV (titulares dos cargos políticos, penas e respectivos efeitos).

1 - Aquando do debate na generalidade dos projectos de lei n.º 377/IV (PS) e 384/IV (PRD) e ao darmos o voto favorável aos diplomas, logo vincámos que nos empenharíamos profundamente em comissão para que o texto alternativo a surgir fosse substancialmente melhorado em relação às duas iniciativas legislativas.
2 - Aconteceu, porém, que do debate e votação na especialidade resultou um texto pouco diferente do projecto de lei n.º 377/IV (PS). Por isso, e sobretudo porque tal discussão se fez a correr e num período de trabalho excessivo nesta Assembleia da República, o que não permitiu a necessária ponderação e amadurecimento das melhores soluções, ficaram a fazer parte do texto aprovado como lei normas de todo em todo desajustadas ou até iníquas. Assim, e muito embora no artigo 6.º haja havido a intenção de manter intocáveis as circunstâncias derimentes, o certo é que entendemos que o titular de cargo político não deve em circunstância alguma ser punido criminalmente, embora ligeiramente, sempre que demonstre que agiu em defesa de interesses ou valores mais importantes do que aqueles que sacrificou com a sua conduta.
3 - Os efeitos das penas tiveram por base aquele que constitucionalmente está previsto para o titular do primeiro órgão de soberania - o Presidente da República-, ou seja, a destituição do cargo e a impossibilidade de reeleição. Parece violento o efeito da pena aplicado em crime de responsabilidade praticado pelo Presidente da República, tendo em conta, sobretudo, que a pena mais grave que, porventura, lhe fosse aplicada num crime comum grave, por exemplo parricídio, não lhe acarretará tal efeito. Simplesmente, o legislador constitucional decerto não deixou de ponderar que se estava perante o titular do primeiro órgão de soberania na hierarquia do Estado, eleito por mais de metade, pelo menos, dos portugueses recenseados no território nacional e no território de Macau, garante da aplicação da Constituição e do regular funcionamento das instituições democráticas, símbolo da unidade do Estado Português.
Mas se tais razões justificam, ou podem justificar, um efeito tão grave, já o mesmo não poderá justificar um efeito de perda de mandato para um autarca que foi condenado numa levíssima pena. Melhor seria, no nosso entender, que só a partir de uma certa pena em concreto é que a demissão de um titular de cargo político ou a perda de mandato em determinado órgão político seriam adequadas.
4 - Ficou-nos, por tudo isto, a convicção de que a lei aprovada pode ter efeitos perversos, na medida em que pequenas faltas, como são normalmente as praticadas por autarcas, a nível de freguesias, podem desmotivar muitos cidadãos portugueses a dar o seu empenhado contributo nas comunidades de que fazem parte, quando, volvidos treze anos após o Movimento do 25 de Abril de 1974, uma das realidades mais frutuosas trazidas com a implantação das liberdades no País foi precisamente o estabelecimento do poder local e a eficácia e estabilidade com que, de um modo geral, os órgãos políticos das freguesias, dos municípios e das regiões autónomas têm actuado.
O voto contrário do PSD à presente lei é por tudo isto plenamente justificado.

Lisboa, 28 de Abril de 1987. - O Deputado do PSD, Licínio Moreira.

Declaração de voto enviada à Mesa para publicação e relativa à votação do projecto de lei n.º 168/1V (direito à contagem, para efeitos de aposentação do tempo em que os trabalhadores dos CTT contratados para além do quadro permaneceram, em regime de disponibilidade, em serviço (alteração ao Decreto-Lei n.º 150/83, de 26 de Abril).

O Grupo Parlamentar do PCP tem seguido com toda a atenção, desde o seu início, os problemas decorrentes da aplicação do Decreto-Lei n.º 50/83, que determinou o direito à contagem, para efeitos de aposentação, do tempo em que os trabalhadores dos CTT permaneceram em regime de disponibilidade, sem serviço. Entenderam, por isso, votar favoravelmente a autorização que o normativo fixado no projecto de lei n.º 168/IV, por nele se fixar o que resulta de uma interpretação não restritiva da base geral do diploma legal n.º 150/83: de facto, ficam assim garantidos direitos a todos os trabalhadores no conjunto de condições que se pretendiam resolver.

Assembleia da República, 28 de Abril de 1987. - O Deputado do PCP, Anselmo Aníbal.

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2858 I SÉRIE - NÚMERO 73

Declaração de voto enviada à Mesa para publicação e relativa à votação do projecto de lei n.º 112/1V (transmissão pela rádio e televisão de produções dramáticas portuguesas).

«A iniciativa legislativa acabada de votar, de responsabilidade originária do PRD e com a história parlamentar a que aludimos aquando do debate na generalidade, consagra regras equilibradas de enquadramento de transmissão, na rádio e na TV, de trabalhos dramáticos de autores portugueses.
O regime agora ensejado é, em algum sentido, moralizador e incentivador. Socorrendo-se do formulário adoptado pela chamada Lei da Música, estabelece cotas mínimas de emissão, cominando sanções (pela via contraordenacional) nos casos em que sofrer violações, aprovando-se as multas sempre que ocorram reincidências. Ademais, procura-se definir, com a possível eficácia, o quadro prescritivo, por forma a estimular a acção dos dramaturgos e a incrementar a actividade dos grupos teatrais, bem como a produção nacional, com destaque para a que for interna da RTP.
De há muito que os sindicatos dos sectores envolvidos e os trabalhadores dos espectáculos reivindicavam uma legislação de protecção face aos fenómenos crescentes de colonização cultural, de activação do mercado de emprego e enriquecimento global da técnica e da estética do teatro. A carta de propostas, bem conhecida, não encontrou cabal resposta na lei aprovada hoje. E é pena, já que, sendo muito positiva, a base de partida (do PRD) era francamente moderada. A impossibilidade de consenso, sobretudo com o PSD, levou o Grupo Parlamentar autor do projecto de lei a soluções que reputamos relevantes. Assinalarei, de entre elas, as duas seguintes: a que obrigava a RTP a passar as peças com que cumpriria os contingentes previstos no canal de maior audiência e em horário nobre; a que estendia os preceitos restinentes do presente diploma às estações radiofónicas privadas. Nada explica que assim não seja, conforme afirmámos nas múltiplas reuniões de subcomissão e pelos fartos motivos aí expressos.
Não obstante a fragilização do impacte da lei, por obra de cedências feitas a forças conservadoras, ela mantém virtualidades; constitui-se como um rival do caminho a prosseguir e aprofundar no futuro. A esta luz -e quase só a ela-, subscrevemos, com reservas sinceras, o texto alternativo vindo da 4.ª Comissão, ratificando-o pelo voto favorável que lhe demos há instantes. Não desistiremos, entretanto, de buscar melhores resultados a prazo, nomeadamente através de uma intervenção legiferadora, se ela se revelar de todo em todo necessária.

Assembleia da República, 28 de Abril de 1987. - O Deputado do PCP, José Manuel Mendes.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Arménio dos Santos.
Carlos Miguel Maximiano Almeida Coelho.
Francisco Mendes Costa.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
Luís Manuel Neves Rodrigues.
Manuel Joaquim Dias Loureiro.
Mário Jorge Belo Maciel.

Partido Socialista (PS):

Hermínio da Palma Inácio.
José Carlos Pinto B. Mota Torres.
José Manuel Torres Couto.

Partido Renovador Democrático (PRD):

José Rodrigo C. da Costa Carvalho.

Partido Comunista Português (PCP):

António da Silva Mota.
Luís Manuel Loureiro Roque.

Centro Democrático Social (CDS):

Abel Augusto Gomos de Almeida.
Eugênio Maria Anacoreta Correia.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Abílio Gaspar Rodrigues.
Amândio Sinta Cruz Basto Oliveira.
Amélia Cavaleiro Andrade Azevedo.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Jorge de Figueiredo Lopes.
António Manuel Lopes Tavares.
José Assunção Marques.
José Mendes Bota.
José Olavo Rodrigues da Silva.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.

Partido Socialista (PS):

Carlos Manuel N. Costa Candal.
Eduardo Ribeiro Pereira.
João Rosado Correia.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raul Manuel Gouveia Bordalo Junqueiro.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.

Partido Renovador Democrático (PRD):

António Magalhães de Barros Feu.
Francisco Armando Fernandes.
José Alberto Paiva Seabra Rosa.
José Caeiro Passinhas.

Partido Comunista Português (PCP):

António Dias Lourenço da Silva.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Joaquim Gomes dos Santos.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.

Centro Democrático Social (CDS):

João da Silva Mendes Morgado.
José Augusto Gama.
José Maria Andrade Pereira.
Narana Sinai Coissoró.

As REDACTORAS: Maria Amélia Martins - Maria Leonor Ferreira.

PREÇO DESTE NÚMERO: 256$00

Depósito legal n.º 8818/85
IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA, E, P

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