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3204 I SÉRIE-NUMEROSO

Srs. Deputados, vamos então iniciar a discussão conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.ºs 41/V (PS) - Retoma do projecto de lei n.º 287/IV - Baldios, 64/V (CDS) - Estatuto dos baldios, 90/V (PSD) - Sobre baldios, e 225/V (PRD) - Sobre baldios.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Avelino.

O Sr. Alberto Avelino (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A fruição e gestão comunitária dos baldios é uma longa tradição secular, consagrada nos preceitos de origem consuetudinária e de outros que resultam de necessidades impostas pelas economias locais.
Nasceram os baldios de doações ou aforamentos feitos aos moradores de determinada freguesia ou freguesias ou parte delas, com o objectivo de promover o povoamento. Os que não tinham quaisquer terras tinham e têm nos baldios um contributo decisivo para a sua sobrevivência.
Para os que tinham alguns pedaços de terra, o baldio era e é o complemento indispensável da sua subsistência. Os produtos agrícolas, as pequenas explorações de cereais, um ou outro animal, seriam o que os habitantes tinham de seu.
A maior parte das vezes, os baldios eram zonas de serra e serviam para a apascentação do gado, para a busca de lenhas, era o local onde se ia buscar um ou outro tronco de árvore para a construção ou restauro da casa e ainda para o aproveitamento dos matos destinados às camas dos animais e fertilização das courelas e para retirar o barro para a construção das casas e de alguns utensílios domésticos.
Mais perto das povoações e com a mesma natureza de bens comuns, os logradouros para corar e enxugar as roupas ou para fazer a barreia da roupa, para juntar os matos que tinham sido curtidos na rua na época das chuvas, por calçamento das pessoas e dos animais.
Ali se depositava a lenha, antes de ser arrumada; ali se construíam os canastros ou espigueiros para secar o milho; ali se faziam as medas ou rolheiros de palha para alimento do gado e também para a sua cama ou para a enxerga do proprietário; na eira comum se debulhava o milho ou se malhavam os cereais.
Tudo bens comunitários.
Alguns baldios destinavam-se a agricultar, em geral não colectivamente; cada um fazia a sua lavoura; a florestação resultava da regeneração natural; aproveitava-se aquilo que a serra dava.
As condições de vida foram-se modificando, o baldio deixou de ser tão necessário e a falta de capacidade de percepção do Governo sobre o que representavam os baldios, aliada à cega concentração de poder e à falta de capacidade política para conciliar os interesses gerais do Estado com as regalias e hábitos ancestrais dos utentes, levou à florestação desmedida de tudo ou quase tudo quanto era baldio. Esta florestação representou o cerceamento de direitos, a perda de liberdade e a agressão.
A resistência das populações atingidas e a repressão que se lhe seguiu são retratadas por Aquilino Ribeiro no seu romance Quando os Lobos Uivam e que valeu ao seu autor mais uma das muitas perseguições que foram o preço da sua coragem, da sua coerência, do seu apego à liberdade e à gente humilde e pobre da nossa terra.
Este esbulho dos bens comunitários permitido pelo Decreto-Lei n.º 27 707, de 16 de Novembro de 1936, leve, como se diz atrás, a resistência das populações atingidas. Só depois de Abril de 1974 e, concretamente, com os Decretos-Leis n.ºs 39/76 e 40/76 se voltou a restabelecer o regime de fruição e gestão comunitária dos terrenos baldios e a criar, assim, as bases da devolução dos bens comunitários às populações: princípios que a nossa Constituição pouco depois consagraria em lei.
Aliás, aquando da discussão sobre baldios, em Maio de 1984, o meu companheiro de bancada Bento da Cruz levantava no início da sua exposição uma questão que continua hoje a ter a mesma actualidade e pertinência:
Os projectos de lei sobre os baldios repõem uma velha questão, a saber: será justo o legislador promulgar, de uma penada, uma norma chapa, inteiriça, rígida, para todo o País? Levanto a dúvida porque esta lei dos baldios, a ir por diante, vai destruir estruturas seculares de administração dos bens comunitários muito mais correctas, eficazes e actuais do que os projectos agora em estudo.
Citava o caso de Vilarinho das Fumas e de Rio de Onor - a Meca dos apaixonados, ou simples curiosos, da antropologia cultural. E permito-me comungar hoje com as interrogações de então: «Não estaremos aqui a destruir Rio de Onor?» E quantos Vilarinhos das Fumas e Rios de Onor não existem por esse Nordeste Transmontano, pelo Barroso, por Cabeceiras de Basto, por Terras de Bouro, por Castro Laboreiro, por grande parte da Beira Interior?
Qual a sensibilidade dos Srs. Deputados da maioria e, nomeadamente, dos Srs. Deputados da maioria oriundos e ou eleitos pelos círculos eleitorais destas bandas? Ficam insensíveis? Vão abrir portas à quebra e à morte de tradições seculares e dar lugar à alienação cega destes bens comunitários?
Dirão que é uma boa fonte de receita para algumas autarquias. Não é, não pode ser, Sr. Presidente e Srs. Deputados, esta a fonte para a autonomia financeira das autarquias. Dê-se cumprimento à Lei das Finanças Locais e evitem-se os míseros e escandalosos 5,4 % do Orçamento do Estado deste ano para o poder local.
Parece haver no seio da maioria o desejo de criar conflitos sociais em todos os sectores da nossa sociedade.
Certamente, Srs. Deputados da maioria, irão encontrar muitos Manuel Louva Deus a encabeçar a contestação das populações afectadas. Aliás, já os encontramos sob a forma de abaixo-assinados contestatários enviados para esta Câmara e remetidos para as Comissões de Administração do Território e da Agricultura e Pescas.
Daí, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a necessidade da análise sensata e profunda desta realidade chamada baldios, distribuídos por cerca de 7 500 unidades e cobrindo mais de 500 000 ha, localizados em zonas e subregiões deprimidas de minifúndio, de pequena e média propriedade, cuja valorização se considera necessário promover a escalas e a ritmos que possam realmente contribuir, em tempo útil, para a escalada europeia que, em matéria de desenvolvimento, constitui objectivo prioritário.
Acresce ainda tratar-se, para a grande percentagem da área total envolvida, de unidades com característica vocação para múltipla utilização e para o desempenho simultâneo de funções tanto de produção de bens como de benefícios indirectos, em qualquer dos casos de grande significado social, económico e ambiental.
Os baldios, enquadrados que estão, na sua maioria, no interior das fronteiras das zonas deprimidas, de minifúndio, pequena e média propriedade, deverão converter-se em verdadeiros modelos e pólos de desenvolvimento, criadores ou promotores de emprego especializado, e como tal qualificado; produtores de sustentáveis fluxos de bens múltiplos e de múltiplos benefícios indirectos, graduados em termos que melhor sirvam e harmonizem os interesses locais com

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