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2270 I SÉRIE - NÚMERO 66

social. Isto é, introduz o princípio de que não é legítimo restringir direitos fundamentais em nome de princípios transcendentes de origem religiosa, de étimo ideológico ou de quaisquer outros. Portanto, só para realizar fins imanentes à própria Constituição é que é lícito comprimir os direitos fundamentais.
De facto, por detrás deste preceito está um grande progresso histórico e civilizacional, estão séculos de evolução cultural, está todo o longo e coroado processo de secularização da sociedade e do Estado. Por isso se definiram os interesses e os direitos, coisas apesar de tudo de contornos por vezes difíceis de identificar, mas sempre mais ou menos referenciáveis. Por isso se definiram os interesses e os direitos como referentes possíveis em nome dos quais se podem sacrificar os direitos fundamentais. Portanto, foi só para salvaguarda de interesse e de direitos.
Ora, se alargarmos o referente de legitimação material do sacrifício dos direitos aos princípios e aos valores, então - que Deus nos valha! -, entramos num campo sem limites e, volente nolente, com ou sem consciência, com esta inovação, estaríamos a regredir do ponto de vista cultural.
Repito: talvez não tenha sido esta a intenção do CDS, mas a ser aprovada a sua proposta de alteração, do ponto de vista cultural, poderíamos estar a regredir para séculos que, há muito, consideramos ultrapassados.
Este é um dos preceitos mais sensíveis e mais importantes da Constituição. Assim, qualquer mexida nesta matéria, só se fosse feita com «luvas de amianto», com as quais, do nosso ponto de vista, o CDS não se soube munir.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, encontram-se a assistir à sessão alunos da Escola Secundária de Peniche e, também, um grande número de alunos da Faculdade de Direito de Lisboa que provavelmente, serão alunos de Direito Constitucional visto que estão acompanhados pelo Sr. Professor Jorge Miranda.

Aplausos gerais.

Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Deputado Costa Andrade, não temos receio de nos «queimarmos» com as propostas de revisão da Constituição que apresentamos. Assim, diria que as luvas a que se referiu deveriam ser de outro material. É que, realmente, se devemos ter cuidado ao revermos a Constituição, porventura o amianto traria uma certa dificuldade de «manuseamento» que não queremos ter.
O que quero dizer com isto é que não temos preconceitos quanto à Revisão Constitucional e a sua alusão às «luvas de amianto» poderia dar uma ideia contrária à que é a nossa posição.
Sr. Deputado Costa Andrade, ao apresentarmos esta proposta de alteração, a nossa intenção não foi a de regredir...

O Sr. José Magalhães (PCP): - Não?

O Orador: - Não foi, não, Sr. Deputado José Magalhães, como, aliás é bom de ver!... Por que é

que haveríamos de querer regredir nesta matéria? Que vantagens teríamos em regredir nesta matéria?

Antes pelo contrário, Sr. Deputado Costa Andrade!... Há poucos anos, depois da Revisão Constitucional de 1982, após ter sido consagrada na Constituição o Estado de direito democrático, vimo-nos confrontados com uma série de leis fiscais retroactivas. Ora, alguns de nós pensaram na possibilidade de argumentar contra elas, invocando essa norma e esse princípio fundamental e não pudemos fazê-lo, não nos foi dada essa possibilidade. É que a restrição não estava expressamente prevista na Constituição.

Assim sendo, Sr. Deputado Costa Andrade, com uma formulação como a que propomos, não seria mais fácil a nossa defesa nessa matéria?

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Podia explicitar melhor, Sr. Deputado?

O Orador: - Sr. Deputado Costa Andrade, é só isto: perante o apelo aos princípios e aos valores fundamentais, esta alteração pode dar-nos uma panóplia de defesa contra os ataques que, porventura, pode não nos ser dada pela possibilidade expressa na Constituição.
Foi essa a nossa intenção ao apresentarmos esta proposta de alteração. Se W. Ex.as entendem que essa nossa intenção seria frustre com esta nossa proposta, acabaremos por nos congratular por vê-la derrotada nesta Assembleia.
De facto, não temos qualquer problema quanto a esse aspecto, mas queremos ver esta nossa proposta discutida até ao fim.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, agradeço o seu pedido de esclarecimento porque, ao responder-lhe, dá-me oportunidade de clarificar alguns aspectos da minha intervenção.
Em primeiro lugar, quero deixar bem claro que, da nossa parte, não houve qualquer intenção de agredir propósitos do CDS. Falámos objectivamente da norma e não das intenções do vosso partido.
Sr. Deputado, se bem percebi o seu pensamento, o senhor entende que seria mais fácil lutar contra impostos retroactivos. Ora, nada é mais falso!
A seu tempo, discutiremos uma das matérias que penso, será das que terão maior relevo nesta Revisão Constitucional e que é a questão da irretroactividade dos impostos. No entanto, para já, temos por fundado o propósito de restringir a possibilidade de o legislador lançar impostos retroactivos. Nesse caso, isto tudo piora.
É porque, além dos interesses e dos direitos muito claros, o legislador pode ainda louvar-se dos valores e dos princípios. Até agora, para sacrificar direitos fundamentais, o legislador tem de demonstrar que há ali um direito - coisa relativamente precisa - ou um interesse - coisa também relativamente precisa. Mas se a proposta do CDS fosse aprovada o legislador não só teria estes parâmetros como, além disso, lhe bastaria invocar quaisquer princípios - a solidariedade social, o solidarismo -, quaisquer axiologias para além disto.