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19 DE MAIO DE 1989 3999

estando nós já submetidos a uma política agrícola comum, esse facto não viesse a exigir de nós alguma capacidade de previsão constitucional, e não mais do que isso, relativamente ao futuro próximo.
Devo dizer que formalmente, porventura, poderíamos continuar com a Constituição que temos e nem por isso deixaríamos de ter grandes problemas, como não tivemos agora no âmbito da política agrícola, mas não haveria uma perfeita adequação da Constituição à nova situação comunitária criada com a nova. adesão ao Tratado de Roma.
Que grandes alterações é que introduzimos? Concluirei no fim, mas basicamente pusemos termo a uma querela semântica, que não é mais do que isso, deixando de referir a expressão «reforma agrária» e passando a conceber este capítulo apenas em termos de política agrícola tom court, assim como há um artigo para a política comercial tout court e outro artigo para a política industrial tout court. A Constituição passa assim a ter um equilíbrio que hoje não tem.
Por outro lado, eliminámos uma referência que tem uma carga polémica e em relação à qual se pode discutir se tem atrás de si um grau de eficácia e de prestígio que justificasse continuarmos a polemizar sobre ela. Penso que posso passar agora, com toda a tranquilidade, ao cotejo entre o que há de novo e aquilo que estava na actual Constituição.
O artigo 96.°, que se refere aos objectivos da política agrícola, praticamente reproduz ò actual artigo 96.° Em vez de transformação das estruturas fundiárias fala--se agora em racionalização dessas estruturas, porque nós entendemos que a palavra «racionalização» é mais vasta, abrange a transformação, mas é mais rica: não se limita a transformar, quer também racionalizar e é disso que se trata. Em vez de haver neste artigo 90.° a referência à transferência progressiva da posse útil da terra para aqueles que a trabalham (devo dizer que nunca entendemos bem, e muitas vezes o dissemos, o conceito de posse útil e, na verdade, ele não veio a ter um papel relevante na vida do País nos últimos catorze anos) fala-se agora no acesso não só à posse útil, não só sequer à posse, mas à propriedade ou à posse da terra e demais meios de produção por aqueles que a trabalham.
Aqui está .uma verdadeira revolução legislativa, aqui está uma verdadeira inovação pela via da Revisão Constitucional. O que aqui se diz é que o Estado se demite de ser ele próprio o detentor e o proprietário das terras que expropriou no âmbito da reforma agrária e que quer entregá-las. Más a quem? A pequenos e médios agricultores, a cooperativas de agricultores, a cooperativas de trabalhadores agrícolas! Esta é a verdadeira e grande inovação desse capítulo. É alguma coisa que tem um significado que porventura pode não ter paralelo no âmbito desta Revisão Constitucional. O PCP aprovou e votou connosco, honra lhe seja feita. Apesar de provavelmente ter mais afinidades com o conceito de posse útil do que nós temos, o PCP entendeu que essa era uma inovação e deu-lhe o seu voto.
Na alínea e) fala-se em incentivar o associativismo dos agricultores e a exploração directa da terra, mas não há inovação nenhuma porque é apenas uma «importação» que se faz para os objectivos do que hoje se encontra na alínea d) dó artigo 102.°, que naturalmente desaparece. Só que tem mais significado que este incentivo ao associativismo seja um objectivo da política agrícola do que seja apenas uma vaga obrigação do Estado.
Como já referi, a Reforma Agrária deixa se ser encarada como um dos instrumentos fundamentais da realização dos objectivos da política agrícola - desaparece-o n.° 2 do artigo 96.° -, mas a verdade é que a política agrícola continua, a ter objectivos de que a Reforma Agrária era instrumento.
O artigo 97.°, como sabem, refere-se à eliminação dos latifúndios. A eliminação dos latifúndios continua a existir no artigo 97.° com uma obrigação constitucional e, mais do que isso, é pela primeira vez, transferida para as incumbências do Estado.
Hoje isso não acontecia. A eliminação dos latifúndios é hoje um limite material de revisão, mas nós não nos limitámos a respeitá-lo - foi esse o nosso ponto de vista relativamente a todos os limites materiais de revisão - e entendemos que deve continuar a ser respeitado. Não entendemos que o nosso agro, a nossa propriedade esteja já devidamente estruturada no aspecto fundiário. Entendemos, sim, que a reestruturação da nossa propriedade agrícola tem que continuar, deve prosseguir, e que um dos instrumentos dessa reorganização e reestruturação é exactamente a possibilidade da eliminação de latifúndios. Portanto, o latifúndio deixa, tal como hoje, de ser um meio de realizar a transferência da posse útil da terra para aqueles que a trabalham, que, por seu turno, é apenas um outro meio de promover a melhoria da situação económica e social dos trabalhadores rurais e dos pequenos e médios agricultores. Realço melhor: trata-se de um meio dê realizar outro meio para realizar outro meio para realizar um fim, é passa a ser ele próprio um instrumento directo desse mesmo fim. É uma incumbência directa, e fundamental do Estado. Não é um princípio económico do artigo 290.°, passa a ser uma incumbência fundamental do Estado.
Por outro lado, acontece ainda que o redimensionamento previsto no artigo 87.° implica, necessariamente - não era preciso dizê-lo - o uso da faculdade de apropriação colectiva com indemnização, prevista no artigo 82.° O próprio artigo 97.° fala em expropriação. De resto, o actual artigo, 97.° também não impõe a expropriação de todos os principais latifúndios, como acontece genericamente em relação aos principais meios de produção. Sobre isso já dissemos qual é o nosso entendimento: .é, repito, apenas um meio de realizar outro meio de promover a melhoria da situação económica, social e cultural dos trabalhadores rurais.
Por outro lado, o actual artigo 97.°, tal como o novo artigo, não define o que seja latifúndio. Não diz se o latifúndio passa a sê-lo a partir de certa área ou de certo grau de produtividade. Deixa isso à lei, tal como agora continua a deixar. Hoje diz: «A lei determinará os critérios de fixação dos limites máximos das unidades de exploração agrícola privada.» Também o novo artigo 97.° refere que o redimensionamento será regulado por lei, que deverá prever, em caso de expropriação, o direito à reserva de área, etc.
Para além disso, a alínea n) do artigo 168.° inclui, na competência reservada da Assembleia da República, a fixação dos limites máximos e mínimos previstos nas unidades de exploração agrícola privadas, tal como hoje. De novo, e bem, as terras expropriadas serão entregues a título de propriedade ou de posse, e não apenas a título de posse útil, como hoje, aos que directamente a trabalham.