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17 DE FEVEREIRO DE 1990 1595

talvez precise de entender que o tempo, para os homens, conta-se por unidades de vida e que, quando se perde, são unidades de vida que se perdem.
Esta é uma referência que considero fundamental, até porque uma observação, que julgo merecer algum comentário técnico, proferida hoje pelo Sr. Ministro da Educação, dirigindo-se à Câmara, me parece bastante afastada da realidade, ao imaginar que a interpretação autêntica das leis só pode fazer-se por uma lei de igual dignidade.
Quem faz a interpretação autentica das leis é a capacidade do Executivo. Não há nenhuma lei que resista à sua capacidade e elas ou se desenvolvem ou fenecem, consoante essa capacidade de interpretação autêntica se desenvolve.
Aquilo que principalmente, eu gostaria de sublinhar hoje, porque não vamos ter tempo de discutir os detalhes dos projectos apresentados e em sede de comissão procurar-se-á discuti-los, é o ambiente inaceitável em que estes problemas estão a ser encarados neste momento da vida da Europa e do País. E porquê?! Porque, em Portugal, aprendemos tardiamente que o aparelho da investigação e do ensino não prepara para a certeza; submetemos o jovem a um processo de integração longuíssimo (no ensino secundário, 12 anos; na universidade, 4 ou 5 anos) e, quando o lançamos na sociedade, a sociedade que lhe ensinámos já lá não está, porque ela evolucionou mais rapidamente do que aquilo que lhe ensinámos. Isso obriga-nos a assumir que temos de ensinar para a incerteza e nós não estamos preparados para a incerteza.
Julgo que a geração dos professores responsáveis deste país, pelo menos na sua maior parte, não está preparada para ensinar para a incerteza. Já é muito termos percebido que aquilo que temos de fazer é preparar para a incerteza, mas para a incerteza do desafio e não a da estrutura social, a do aparelho do Estado ou a da retaguarda, em que deve apoiar-se essa juventude que nós lançamos para a incerteza.
E em que situação é que vivemos neste ambiente? Vivemos nesta situação: não temos certezas sobre o valor do ensino secundário! E os tecnocratas perdem imenso tempo, na medida deles, com as suas estatística e cálculos para nos explicarem que são 12 anos mal aplicados porque os alunos chegam ao fim mal ensinados, não tem habilitação suficiente e a preparação necessária para entrar no ensino superior, e, então, vai de inventar esquemas, vai de fazer estatísticas, vai de substituir os homens por médias, para ver quem é que se aproveita desse aparelho péssimo que sustentamos e no qual pomos os jovens durante 12 anos.
O jovem é a vítima desse sistema incerto e quando chega ao ensino superior... em vez de condenarmos os responsáveis pelo mau sistema, matamos as vítimas, que são os que sofrem o preço final deste sistema inaceitável. Ora, nós precisamos de ter mais alguma certeza sobre qual é a validade do nosso aparelho de ensino!
Por outro lado, chegamos à estruturação do ensino superior, vamos discutir a autonomia dos politécnicos e a articulação com as universidades, mas suponho que ninguém me sabe dizer exactamente qual é a filosofia do ensino politécnico, porque ele também nasceu entre nós como resposta duvidosa para muitas dúvidas do aparelho educativo que tínhamos.
Mas quando é que isto acontece? Acontece quando a universidade portuguesa, finalmente, aprendeu que desapareceu a universidade com fronteiras! É a universidade sem fronteiras que vem aí, num país que ainda não sabe o que é que significa a comunidade universitária portuguesa e que tem manifestações muito concretas. Quem não serve para o ensino oficial serve para o ensino privado! Quem não tem condições para ser seleccionado nessas temerosas provas pode obter o título noutro sítio e vir com a mesma dignidade, capacidade e responsabilidade, idoneamente certificado pela autoridade do Estado, que lhe diz: o senhor não servia para eu o ensinar, mas para ser ensinado pelos outros vê-se que tinha qualidades excelentes!

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Isto não pode continuar desta maneira! Mas estamos nesta situação, num país que ainda não tem definição, repilo, para aquilo que é a comunidade universitária. Porquê? Porque deixa correr por vales diferentes o ensino oficial e o ensino privado! Tem uma manifestação, num conselho de reitores que tem feito um trabalho excelente, mas o Estado não põe reitores nas universidades privadas!... Não temos a ideia do que é a comunidade universitária ou reconhecemos que não temos condições para a instituir!...
Talvez já tenhamos ultrapassado o tempo em que cada universidade era uma ilha onde não se reconhecia a validade até do próprio ensino que se fazia nas outras universidades dentro do mesmo país. Espero que nenhum diplomado de Coimbra se aborreça se eu lembrar que a Universidade de Lisboa teimava em ser mais antiga que a de Coimbra, o que dificilmente se podia comprovar, e, perdida essa batalha, passou a referir-se a Universidade de Coimbra como uma universidade de província. Era isto a comunidade universitária que nós tínhamos! ...
Ora, essa fronteira desapareceu. Vi este país, durante dezenas de anos, recusar reconhecer a validade dos títulos obtidos no estrangeiro pelos doutores portugueses de excelente qualidade, cujas teses se baseavam numa bibliografia exclusivamente constituída pelas teses, que não reconheciam, das universidades estrangeiras. Isto era a universidade isolada e com fronteiras.
Mas, neste momento, estamos na universidade sem fronteiras. E como é que avançamos para a incerteza da sociedade? E como é que avançamos para a incerteza da comunidade universitária europeia quando, na nossa retaguarda, só temos dúvidas, só temos uma perda de tempo - que, repito, se mede como na agricultura -, só temos insegurança na definição dos aparelhos de intervenção, só temos dúvidas sobre a validade do ensino que se faz no aparelho do ensino secundário, só temos dúvidas sobre se a definição do corpo docente português está em equação com a proliferação das universidades que se deu?
Esse problema, que é tão fundamental, é certamente uma das traves mais frágeis do nosso aparelho para responder à universidade sem fronteiras.
Penso que, neste panorama, pode representar -representa, com certeza - uma mensagem de grande esperança o facto de o Sr. Ministro da Educação ter aqui mais uma vez lembrado que a sua linha fundamental de orientação é a procura do consenso. E é exactamente isso que nós queremos, o consenso. Mas que seja também dada alguma oportunidade à Câmara e às oposições. Dê-se-lhes a oportunidade de, alguma vez, poderem ter a alegria de contribuir com uma ideia útil para a resolução deste problema, uma ideia que dispense a maioria de, trabalhosamente, procurar outra e que lhe permita alguma