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224 I SÉRIE-NÚMERO 8

diminuída, sendo vários e convergentes os dispositivos tendentes a limitar ainda mais essas funções.
Pense-se, por exemplo, nos orçamentos, assunto de actualidade. Durante todo o ano, à margem do Parlamento, são feitas centenas de alterações às receitas e às despesas sem que os deputados tenham qualquer coisa a dizer. Uma altíssima percentagem do orçamento total é alterada por mecanismos de legalidade duvidosa. Os custos gerais de obras plurianuais não são revelados, ou são-no com excessiva fantasia. As verbas anuais que votamos aqui são uma parte certa de totais incertos, por vezes surpreendentes.
Querem que lhes recorde o caso do Centro Cultural de Belém, cujo montante do custo total era, no primeiro ano de dotação orçamental, de 6 milhões de contos e, no segundo ano de dotação orçamental, de 14 milhões de contos e vai ser neste ano, para surpresa de todos nós, de 27 milhões de contos? Cá estaremos para ver o que mais podemos esperar nos anos subsequentes!...
As consultas corporativas e os acordos com parceiros sociais, precedendo o debate parlamentar, numa pura tentativa de aproveitamento político, tomam esse debate praticamente inútil.
Medite-se, finalmente, no facto de não terem sido aprovadas pelo Parlamento, como a lei exige, as Contas do Estado, desde 1972, no que é sem dúvida o maior escândalo financeiro e político dos tempos modernos. Estranho e perigoso é que poucos são os que se preocupam com esta anomalia.

Vozes do PS:- Muito bem!

O Orador: - A propósito ainda da função fiscalizadora, é conveniente recordar que não estamos satisfeitos com o quadro legal e jurídico das comissões de inquérito - nem nós, nem, creio sinceramente, a grande maioria da opinião pública. Se há matéria que põe em crise o crédito do Parlamento, essa é seguramente a das comissões de inquérito.
Quarto objectivo: dotar a Assembleia da República, os grupos parlamentares e os deputados individuais de meios de trabalho à altura das suas necessidades e das suas funções revalorizadas. É persistente em Portugal a resistência ao Parlamento, como o é uma espécie de insidiosa difamação cultural da instituição democrática por excelência. E o que mais inquieta é que, por vezes, governos, políticos e até - imagine-se! - deputados colaboram na alimentação de tais tendências. Não perderei mais tempo a denunciá-las: são tenazes e ruins como a erva daninha, mas a democracia acabará por as vencer.
Antes de concluir, permitam-me mencionar mais uma das propostas que fizemos. Preocupados com um clima crescente de mistério, de imoralidade ou mesmo de ilegalidade nos assuntos políticos e económicos, clima esse que na opinião pública é bem mais alarmante do que se pensa, propomos que os deputados eleitos passem a publicar, no Diário da Assembleia da República, todas as suas fontes de rendimento, todos os seus vínculos profissionais e associativos e todos os seus compromissos patrimoniais. Estamos convencidos de que seria um excelente passo a dar.

Aplausos do PS.

Srs. Deputados, muito cordialmente apelamos aos deputados da maioria para se juntarem a nós neste esforço. Se não formos ouvidos, apenas garantimos que
continuaremos a luta por um Parlamento melhor. Ter uma maioria não isenta o Governo de deveres, não o liberta de fiscalização nem o dispensa de debate político. Ter uma maioria obriga o Governo a respeitar o público, através do esclarecimento de todos e do respeito pelos seus representantes. E os seus representantes não são apenas os eleitos da oposição: os próprios deputados da maioria merecem ser respeitados pelo Executivo, o que, convenhamos, nem sempre sucede.

Vozes do PS:- Muito bem!

O Orador:-O Governo gosta de monologar com o eleitorado e não aprecia sobremaneira o diálogo com o Parlamento. Aos deveres parlamentares prefere com frequência a declaração televisiva, dramaticamente encenada. A um debate contraditório, criativo e esclarecedor, prefere uma conversa recatada com um dirigente partidário ou um representante dos chamados parceiros sociais. Mais ainda: o Governo nem sequer responde completa e diligentemente aos requerimentos,...

O Sr. João Salgado (PSD): -A Câmara Municipal de Lisboa é que não!

O Orador: -... não fornece suficientes informações e estudos, esconde zelosamente os relatórios da Administração e controla boa parte dos contactos dos deputados com o exterior. Se a maioria quiser, poderemos fornecer-lhe estatísticas que ilustram bem a pobre performance do Governo. Qualquer que seja o critério de análise, esta situação não é saudável. E não nos venham dizer, como já aconteceu, que a oposição apenas quer conversa e debate. Por um lado, é verdade, mas sem o sentido pitoresco que os senhores lhe dão. É verdade porque a democracia é muito essencialmente também o regime da palavra livre e contraditória.

Aplausos do PS.

Por outro, é também verdade porque o afrontamento parlamentar e contraditório é a melhor maneira, a mais estabelecida maneira há séculos, de esclarecer os cidadãos.
Renovamos o apelo feito à maioria: convidamo-vos, Srs. Deputados, a construir um melhor Parlamento. Pensem na instituição democrática que querem legar aos vossos filhos. Poderão dizer-lhes, dentro de 20 ou 30 anos: «Eu estava lá, eu ajudei a fazer o primeiro Parlamento realmente democrático da história de Portugal.»
Srs. Deputados, há muito que aprendi algo que não esquecerei: quem melhor defende a democracia é o povo - melhor do que o Estado, melhor do que os soldados, melhor do que as instituições. Fá-lo, no entanto, se sentir que a democracia é sua e para si.
Entre outras consequências desta certeza, uma diz-nos respeito: se não soubermos ser dignos do voto que recebemos, os representantes do povo não serão reconhecidos como tal e serão inelutavelmente desprezados pelo soberano. Não tenhamos, pois, receio do dever, que é o nosso, de olhar severamente para os nossos defeitos. Uns são dos homens, certamente os mais difíceis de ultrapassar. Outros são das instituições: é desses que devemos cuidar.
Não se trata de sermos amados nem reverencialmente adulados, mas tão-só de merecermos a confiança que depositaram em nós.

Aplausos do PS, do PCP e do deputado independente João Corregedor da Fonseca.

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