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1018 I SÉRIE-NÚMERO 34

o que hoje é e surge aberrante na Procuradoria-Geral da República de um Estado de direito democrático.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Vem do tempo em que a maioria parlamentar que suporia o Governo não linha no Conselho, ela também, representantes do Parlamento por si mesma designados. A partir de agora, a actual maioria lerá no Conselho não dois mas três elementos da sua confiança, logo do Governo. Os «olheiros», como entendi, com alguma originalidade, poder chamar-lhes, sempre lá estarão, mas a outro título, mas com outra legitimidade.
Quererá a maioria reconhecer este facto ou vamos dormir? Quererá o Sr. Ministro da Justiça convir na arquitectura do Estado que decorre dos seus excelentes discursos ou apenas na que resulta dos seus às vezes surpreendentes decretos?

Eis a questão!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O banimento dos representantes do Ministro da Justiça desposaria, além do mais, a proposta também inclusa no projecto da maioria, no sentido de ser retirada ao Ministro da Justiça competência para «dar ao Procurador-Geral da República instruções de ordem genérica no âmbito das atribuições do Ministério Público».
Esta inovação já constava dos projectos de lei do PS e do PCP, mas nem por isso hei-de deixar de ovacionar a adesão da maioria a este salutar reforço de autonomia do Ministério Público. Só que a agora via reduzida das competências do Ministro, com referência à tutela limitada aonde ela cabe - ou seja, na relação de mandato correspondente ao patrocínio das acções cíveis -, não ajuda a justificar, antes pelo contrário, a presença de dois representantes seus no Conselho Superior do Ministério Público. Basta o cordão umbilical da ligação ao Governo constituído pelo poder de propor ao Presidente a nomeação ou a exoneração do Procurador-Geral da República. Mais do que isso seria demais!
Do proposto «enterro» da fiscalização dos órgãos de polícia criminal pelo Ministério Público - em que o projecto da maioria faz o papel de «gato-pingado» - o que diremos? Condolências à família da defunta?

Risos do PS.

Algo menos resignado do que isso. E desde logo que a actual competência da Inspecção do Ministério Público para «proceder a inspecções, inquéritos e sindicâncias aos serviços [...] da Polícia Judiciária» é uma garantia de defesa da legalidade democrática consagrada na totalidade dos Estados de direito europeus.
Assim sendo, do mesmo passo que nos integramos progressivamente na Europa comunitária, com ela comungando numa progressiva unidade institucional, dela nos afastaríamos neste aspecto essencial, de acordo com uma experiência que vem desde 1945, ou seja, desde os alvores do pós-guerra e que nasceu à revelia e resistiu com êxito aos apetites centralizadores da própria ditadura! Será que devo regressar às minhas sombrias premonições sobre a avidez concentracionista da actual maioria? Será que tenho de admitir a contragosto que neste somenos estou de acordo com o governo de Salazar e em desacordo com o actual Governo?

Risos do PS.

Uma coisa é certa: não é por distracção, nem por inadvertência, nem por desamor à separação de poderes e ao Estado de direito, que todas as democracias europeias convergem no pretenso «erro» que a maioria se propõe, agora, corrigir. Nem é decerto por amor à exacerbação desse «erro» que, nas mesmas democracias, são mais latos do que são, hoje, entre nós os poderes de fiscalização que se visa proscrever.
Lá como cá, o normal é que a fiscalização pertença ao orgão que defende a legalidade democrática; ao órgão a que compete o exercício da acção penal, competência que inclui a condução dos processos de inquérito penal. Deixaria o Ministério Público de fiscalizar também estes, quando delegados em órgãos de polícia criminal?
Sc só no quadro de cada processo crime isso fosse lícito ao Ministério Público, teria este, sempre que recebesse uma denúncia ou tivesse uma suspeita fundamentada, de promover mais um processo para poder fiscalizar o que, de outra forma, deixaria de poder? E quando se tratasse de denúncia de irregularidades consistentes em escutas telefónicas ilegais ou suspeitas de corrupção, cometidas pelos próprios agentes da Polícia Judiciária, que infelizmente também já aconteceu, embora a título excepcional? Como era? Ou processas ou não fiscalizas?
E quando a Polícia Judiciária, por hipótese teórica, atrasasse intencionalmente os processos? E quando intencionalmente os fizesse prescrever? E quando tudo isso pudesse conjugar-se com uma investigação envolvendo responsáveis do próprio Governo?

Aplausos do PS.

Espero que uma reflexão mais profunda leve a maioria a concluir que o resultado mais saliente da inovação proposta seria deixar mais expostos quer os órgãos de polícia criminal quer o próprio Governo.
Um último argumento de raiz analógica: seria impensável - além de inconstitucional - a aplicação de medida semelhante aos juízes de instrução criminal. A Constituição reserva a instrução à competência de um juiz. Será forçar muito as coisas invocar similitude de razões relativamente à competência fiscalizadora do Ministério Público sobre a Polícia Judiciária? E será despropositado admitir aqui mais um vício de inconstitucionalidade - ainda que com reservas, salvo seja -, se tivermos em conta que a Constituição comete ao Ministério Público o exercício da acção penal e que a lei ordinária não pode negar-lhe um instrumento fundamental desse exercício?
É minha convicção de que os ilustres subscritores do projecto da maioria leram mal e tentaram resolver pior um certo clima conjuntural de conflitualidade entre a Polícia Judiciária e o Ministério Público. A corda deve partir pelos princípios e não pelos humores.
Quanto à proposta extinção das auditorias jurídicas, hesito entre concluir que a não entendo ou que a entendo demais. Mas faço questão de resistir à tentação de admitir que a alteração proposta visa imunizar o Executivo contra o controlo da legalidade que constitui a sua razão de ser.
As referidas auditorias são hoje um mero prolongamento do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República junto de cada ministério ou departamento equivalente. Existem entre nós desde o início do século e sempre se entendeu, cá dentro e lá fora, até ao advento da originalíssima proposta do seu enterro, que os auditores desempenharam no passado, desempenham no presente e

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