O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

28 DE FEVEREIRO DE 1992 1027

tar eficazmente o Estado, exercer a acção penal e defender um amplo leque de interesses, que vão do ambiente e do património aos direitos dos consumidores e dos mais fracos, sem autonomia face ao Governo e às entidades públicas, sem dirigir a investigação criminal e fiscalizar a Polícia Judiciária e outras polícias criminais.
Assim o compreendeu a Constituição. E se não foi mais longe, designadamente em maioria de direcção da investigação e Fiscalização da polícia criminal, é, como resulta dos trabalhos preparatórios da revisão constítucional, porque entendeu não ser obrigatório dizer o que parecia evidente, não tendo nunca sido contestado, o que foi várias vezes proclamado por Ministros da Justiça do PSD, incluindo o actual. Parecia evidente, mas afinal não é.
Comecemos pela composição do Conselho Superior do Ministério Público. Foi inequívoco, durante muito tempo, o entendimento de que o que estava estabelecido na Constituição implicava a não participação de representantes do Governo.
É certo que a Constituição não definiu o número, mas definiu quem designava os seus membros: a Assembleia da República e os magistrados do Ministério Público. Isto resulta, com clareza, dos trabalhos preparatórios da revisão constitucional. O PSD vem agora defender que «inclui», quer dizer «não exclui» e que, portanto, o Governo também pode nomear membros para este Conselho. A tese, a nosso ver, não tem cabimento do ponto de vista jurídico-constitucional.
O problema não é resolúvel provavelmente face ao argumento meramente literal; o que nos leva a considerar que a Constituição pretendeu excluir representantes do Governo do Conselho Superior do Ministério Público não é tanto o facto de eles não serem referidos na Constituição como essa exclusão ser uma consequência lógica da consagração constitucional da autonomia do Ministério Público, que é, antes de mais, uma autonomia face ao Governo e à Administração.
Mas a participação de membros indicados pelo Governo é descabida também do ponto de vista democrático.
Enquanto os partidos da oposição propõem sete membros designados pela Assembleia da República, o Governo propõe cinco membros designados pelo Parlamento e dois pelo Governo, o que, com certeza, leva a distorcer a representatividade do Conselho e leva a uma sobre-representação do partido do Governo. Isto é: a tomar mais maioria quem é maioria e menos minoria quem o é, ao contrário do que resulta do voto popular.
Sobre a fiscalização dos órgãos de polícia criminal pelo Procurador-Geral da República, apenas direi que, a nosso ver, é uma aberração a proposta da sua eliminação e que pode pôr em causa liberdades e direitos individuais. A investigação criminal e o combate à corrupção podem passar a pautar-se por critérios meramente políticos e partidários. A polícia criminal depende, e não pode deixar de depender, do Ministério Público. E essa dependência decorre da Constituição e das funções que confere ao Ministério Público. Estas não podem deixar de envolver a direcção da investigação criminal e o poder de fiscalização está associado à direcção da investigação criminal.
De resto, e já que falámos aqui em citações de intervenções passadas, creio que vale a pena, também pela minha parte, fazer uma citação do Sr. Ministro da Justiça, concretamente de um discurso feito na Polícia Judiciária, em 6 de Abril de 1990. Aí se disse que a Polícia Judiciária, pela sua natureza, deve definir-se como um orgão de polícia criminal, auxiliar da administração da justiça, organizada hierarquicamente na dependência do Ministro da Justiça e fiscalizada pelo Ministério Público. Creio que é importante o facto de ter sido incluída nesta definição da Polícia Judiciária, ligando-a à respectiva natureza, a ideia de que a fiscalização compete ao Ministério Público.
Estamos, no entanto, num período de evoluções e aquilo que posso temer é que o Governo e o PSD evoluam do momento de eliminar a fiscalização da Polícia Judiciária para eliminar uma outra questão, que também nesta definição era de natureza e pode deixar de ser, que é a dependência da Polícia Judiciária do Ministério da Justiça, e passar, como os jornais dizem, para o Ministério da Administração Interna.
De resto, o Sr. Ministro da Justiça nega, ainda hoje, em declarações ao Diário de Noticias, qualquer intenção de separar a investigação criminal da dependência do Ministério Público. Mas o preâmbulo do projecto de lei do PSD afirma expressamente: «exclui-se do âmbito de competência própria do Ministério Público a fiscalização dos órgãos de polícia criminal, por se tratar de competência que, originariamente, deve caber ao Governo»; e as novas redacções que o PSD propõe para os artigos 3.º e 10.º afastam claramente essa competência do Ministério Público e do Procurador-Geral da República.
Quanto à proposta de eliminação dos auditores jurídicos, que o PSD igualmente pretende, manifestamos o nosso desacordo. As suas funções de consulta jurídica de membros do Governo, que podem não acatar os respectivos pareceres, e de acompanhamento de processos em que é parte ou interessado o respectivo ministério podem ser úteis, e mais ainda quando não se propõe qualquer alternativa para apreciar preventivamente a legalidade.
Que quer o PSD afinal? Que o Supremo Tribunal Administrativo, nos processos contenciosos, deixe de poder solicitar cópias dos pareceres de auditores que não foram respeitados pelos membros do Governo? Perder-se-ia um factor de defesa preventiva de legalidade sem proposta de uma alternativa e sem que se veja o que se ganharia em troca!
Finalmente, acerca da limitação do mandato do Procurador-Geral da República, a grande questão é perguntarmo-nos qual é a razão da oportunidade deste debate, introduzido pelo PSD na vida política portuguesa. É difícil não ver nele uma medida que visa directamente, embora de forma envergonhada, a figura do actual Procurador-Geral da República, a cuja dignidade, isenção e independência queremos prestar homenagem, bem como à forma discreta e competente como tem desempenhado o seu cargo.

Aplausos do PCP e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.

Poderíamos fazer de conta, ao debater esta proposta, que apenas está em causa o perfil de um cargo em abstracto. Poderíamos comparar soluções de vários países, debater vantagens ou desvantagens de cada regime. Poderíamos, até, debater em que medida, com a limitação do mandato do Procurador, seriam afectados ou não os poderes do Presidente da República e, em consequência, questionar a constitucionalidade desta solução.
Mas o essencial é sublinhar que a opção actual tem funcionado bem e é isso que incomoda o PSD e o leva a abandonar a posição do seu então Ministro da Justiça, Mário Raposo, que afirmava que a fixação de um prazo

Páginas Relacionadas
Página 1028:
1028 I SÉRIE-NÚMERO 34 certo para o mandato do Procurador-Geral da República «não aproveita
Pág.Página 1028
Página 1029:
28 DE FEVEREIRO DE 1992 1029 e de forma tão ruidosa como contraditória, vêm desfraldando a
Pág.Página 1029
Página 1030:
1030 I SÉRIE-NÚMERO 34 ordenação democrática da vida e do poder, que não comporta santuário
Pág.Página 1030
Página 1031:
28 DE FEVEREIRO OE 1992 1031 Para além disso, seria geradora de conflitos que ao legislador
Pág.Página 1031