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1036 I SÉRIE-NÚMERO 34

Constituição da República Portuguesa, que hoje aqui nos reúne ern debate, que se deseja, e felizmente se confirma, pautado apenas por exigências de uma ética política que não pode deixar de enformar a discussão em torno das grandes questões de Estado.
O que está em causa é a definição de uma das pedras de suporte do Estado de direito democrático e isso deveria bastar para impor clareza às propostas apresentadas, que, por isso, constituem, elas próprias, o espelho onde se projecta o real compromisso de cada um perante aquela autonomia. É aqui, na opção que determinou cada projecto em discussão, que se escancara a diferença entre aqueles que, apregoando a autonomia do Ministério Público, afinal a temerão e, portanto, embora sem o reconhecerem, a limitam; e aqueles outros, como nós, que, partindo do imperativo constitucional, a aceitam, dela retirando todas as consequências.
Desde logo, importa garantir, pela natureza própria das competências do Ministério Público, que, excepção feita à representação dos interesses privados do Estado, a autonomia se aproxime do conceito de independência. Para tanto há que retirar ao Governo, por intermédio do Ministro da Justiça, a competência para emitir instruções, ainda que de carácter genérico.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Muito bem!

O Orador: - E aí iodos os projectos são concordantes, embora seja de registar, a proposta inscrita no projecto do CDS, que pretende, inaceitavelmente quanto a nós, substituir aquelas instruções por meras recomendações, instrumento que se não coaduna com a natureza executiva dos actos de vontade política do Governo, que, ou actua em termos políticos, no domínio da sua competência e decide, responsabilizando-se pelo resultado, ou se situa fora daquela esfera de atribuições e, pura e simplesmente, não deve intervir.
Não é, todavia, aí que, fundamentalmente, se joga a questão da autonomia de uma magistratura do Ministério Público que se queira independente face aos restantes poderes do Estado.
Com efeito, tratando-se, como se trata, de uma magistratura hierarquicamente organizada, dirigida pelo Procurador-Geral da República, com ampla competência, ele sim, para a emissão interna de instruções vinculativas e de natureza específica, é aí, na definição do estatuto do Procurador-Geral da República, que se evidenciam aqueles que, de pleno, advogam a autonomia e, portanto, garantem ao cargo estabilidade política; e aqueles outros que, discursando sobre a autonomia, permitem e defendem afinal a total e permanente dependência do cargo de Procurador-Geral da República de critérios da mais pura discricionariedade política.
Definir, por isso, o mandato do Procurador-Geral da República é apenas uma exigência que decorre, logicamente, da consagração real da autonomia do Ministério Público. Fazê-lo, impede, por um lado, a sua nomeação vitalícia, inconcebível num Estado de direito democrático por impeditiva do saudável princípio da alternância;...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: -... e, por outro lado, garante a estabilidade ao longo do mandato, pressuposto sem o qual se retirará qualquer verdadeiro sentido à afirmação de uma autonomia com independência.
Autonomia com mandato significa, portanto, independência. Autonomia sem mandato estável nega a própria autonomia, afecta a transparência do sistema e permite a manobra e a pressão políticas que, então contraditoriamente, se diz pretender evitar-se.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por isso que o Governo apoie a nomeação do Procurador-Geral da República por um período de cinco anos renovável uma vez e durante o qual se garanta que a sua exoneração, a ter lugar, apenas poderá ocorrer a pedido seu ou por motivos de natureza disciplinar.
E não se pretenda desviar a atenção da essência do problema tentando lançar equívocas suspeições relativamente à permanência no cargo do actual Procurador-Geral da República.
Temos claramente afirmado o reconhecimento da elevada dignidade com que tem exercido as suas funções e eu próprio tive já ocasião de afirmar publicamente entender que a norma que venha a definir o respectivo mandato não deve ter aplicação rectroactiva. É isso que resulta para já da inexistência de qualquer disposição transitória.
Todavia, para a hipótese de se entender dever produzi-la, adiantarei ser já da opinião de que com a entrada em vigor da nova lei, e só aí, deverá dar-se início ao primeiro período de cinco anos, mantendo-se assim, no cargo, o actual Procurador-Geral da República.
Deste modo se dignifica o sistema, se respeita totalmente e sem hipocrisias ou subserviências a autonomia do Ministério Público e se renova a confiança na pessoa do Procurador-Geral da República.
E não se diga também, tentando justificar o inexplicável, que desta forma desaparece, sobre o Procurador-Geral da República, o duplo controlo democrático radicado na possibilidade da sua exoneração a lodo o tempo por acordo entre o Governo e o Presidente da República.
Quem tem a independência como atitude, como convicção interiorizada e como conceito claramente assumido não pode deixar de manifestar a sua perplexidade perante uma proposta que, por um lado, se afirma defensora da independência do Procurador-Geral da República enquanto magistrado e, por outro lado, faz dele o único magistrado cuja permanência no cargo depende de um controlo e de uma vontade meramente políticas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: -É, pois, aqui, Srs. Deputados, que se joga a verdadeira autonomia do Ministério Público, sendo justamente na composição do seu Conselho Superior que deve estabelecer-se a matriz de democraticidade que uma magistratura não electiva não comporta originariamente.
E por isso que em tomo daquela composição novas questões se suscitam.
E, uma vez mais, também aí uma reflexão desapaixonada se imporia. Alguns projectos, invocando, apressadamente (a meu ver) a Constituição, e de uma assentada, varrem do Conselho os procuradores-gerais distritais e as personalidades designadas pelo Ministro da Justiça. Em ambos os casos agora mal, percebendo-se, porém, agora também, que de entre a autonomia aparente afirmada no Conselho e a autonomia efectiva garantida no Procurador-Geral da República há que optar, nós optamos pela efectiva.

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