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Quarta-feira, 20 de Maio de 1992 I Série - Número 65

DIÁRIO da Assembleia da República

VI LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1991-1992)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 19 DE MAIO DE 1992

Presidente: Exmo. Sr. António Moreira Barbosa de Melo
Secretários: Exmos. Srs. João Domingos Fernandes de Abreu Salgado
José Mário Lemos Damião
Belarmino Henriques Correia
José Ernesto Figueira dos Reis

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 15 minutos.
Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da entrada na Mesa de requerimentos e de respostas a alguns outros.
Em declaração politica, o Sr. Deputado Narana Coissoró (CDS) chamou a atenção para a necessidade de um referendo nacional acerca da ratificação do Tratado sobre a União Europeia, assinado em Maastricht.
Também em declaração política, o Sr. Deputado José Vera Jardim (PS), a propósito da excessiva burocracia da Administração, em a conhecer à Câmara um conjunto de projectos de reforma da autoria da seu partido, no sentido de debelar essa situação. Respondeu, no fim, a um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Guilherme Silva (PSD).
Ainda em declaração politica, o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa (PCP) criticou a Governo pelo processo de privatizações em curso.
O Sr. Deputado Júlio Henriques (PS) alertou para a situação de crise que se vive no sector têxtil.
A Sr.ª Deputada Isilda Martins (PSD) falou da Universidade do Algarve.
A Sr.ª Deputada Maria da Conceição Rodrigues (PSD) abordoa diversas questões de âmbito social no distrito de Portalegre.
Ordem do dia. - Foram discutidos e rejeitados, na generalidade, os projectos de resolução n.º 4/VI - Promove a realização da Convenção sobre Ambiente e Desenvolvimento, no âmbito da Cimeira da Terra (Rio de Janeiro, Junho de 1992) (PCP) e 22/VI - A Assembleia da República resolve promover e organizar em tempo útil um debate acerca da Conferência da Organização das Nações Unidas sobre Ambiente e Desenvolvimento, que irá realizar-se de 1 a 12 de Junho próximo no Rio de Janeiro (Os Verdes), intervieram no debate, a diverso título, os Srs. Deputados Miguel Urbano Rodrigues (PCP), André Martins (Os Verdes), Manuel Moreira (PSD), Gameiro dos Santos (PS) e Casimiro Tavares (CDS).
Procedeu-se à apreciação, na generalidade, do projecto de resolução n.º 16/VI - Medidas de defesa das crianças em risco (PS), tendo intervindo, a diverso título, os Srs. Deputados Julieta Sampaio (PS), Margarida Silva Pereira (PSD), Ferraz de Abreu (PS), Odete Santos (PCP), António Correia de Campos (PS), Lurdes Póvoa Costa (PSD) e Casimiro Tavares (CDS).
O projecto de resolução n.º 18/VI - Medidas de combate à seca (PCP) foi debatido, na generalidade. Intervieram, a diverso título, os Srs. Deputados Lino de Carvalho (PCP), Luís Capoulas Santos (PS) e Vasco Miguel (PSD).
Entretanto, foram aprovados, na generalidade, a proposta de lei n.º 9/VI - Estabelece o novo regime de colheita de órgãos de origem humana para transplantação, diagnóstico ou terapêutica ou para uma de investigação científica e o projecto de lei n.º 40/VI - Extracção de órgãos e tecidos para transplante (PS), assim como a proposta de lei n.º 21/V1- Autoriza o Governo a legislar em matéria de actividades paramédicas.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 50 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 25 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Abílio Sousa e Silva.

driano da Silva Pinto.
Ana Paula Matos Barros.
António Barbosa de Melo.
António Barradas Leitão.
António da Silva Bacelar.
António do Carmo Malveiro.
António Esteves Morgado.
António Fernandes Alves.
António Germano Sá e Abreu.
António Santos Pires Afonso.
Aristides Alves Teixeira.
Arlindo da Silva Moreira.
Armando Guerreiro da Cunha.
Arménio dos Santos.
Belarmino Henriques Correia.
Bernardino Gata da Silva.
Carlos de Almeida Coelho.
Carlos Duarte Oliveira.
Carlos Lopes Pereira.
Carlos Oliveira da Silva.
Cipriano Rodrigues Martins.
Delmar Ramiro Palas.
Domingos Duarte Lima.
Domingos José Soares Lima.
Eduardo Pereira da Silva.
Ema Maria Lóia Paulista.
Fernando Correia Afonso.
Fernando dos Reis Condesso.
Fernando Marques de Andrade.
Fernando Monteiro do Amaral.
Fernando Santos Pereira.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco Fernandes Martins.
Guilherme Rodrigues Silva.
Hilário Azevedo Marques.
Isilda Maria Pires Martins.
Jaime Gomes Mil-Homens.
João Alberto Granja Silva.
João Álvaro Poças Santos.
João Carlos Duarte.
João do Lago Mota.
João Granja da Fonseca.
João José da Silva Maçãs.
João Salgado.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Fernandes Marques.
Joaquim Vilela Araújo.
Jorge Paulo Roque da Cunha.
José Alberto Puig Costa.
José Augusto Silva Marques.
José Borregaria Meireles.
José de Almeida Cesário.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Leite Machado.
José Macario Correia.
José Mário Lemos Damião.
José Pereira Lopes.
José Reis Leite.
Leonardo Ribeiro de Almeida.
Luís António Martins.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Carrilho da Cunha.
Luís Filipe Pais de Sousa.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Baptista Cardoso.
Manuel Costa Andrade.
Manuel Lima Amorim.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Simões Marques.
Maria Conceição Rodrigues.
Maria da Conceição Pereira.
Maria de Lurdes Póvoa Costa.
Maria Helena Ramos Mourão.
Maria José Barbosa Correia.
Maria Leonor Beleza.
Maria Luísa Ferreira.
Maria Manuela Aguiar.
Maria Margarida de Sousa.
Marília Dulce Pires Morgado.
Melchior Pereira Moreira.
Miguel Bento Macedo e Silva.
Miguel Fernando Relvas.
Olinto da Cruz Ravara.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Chancerelle de Macheie.
Vasco Francisco Miguel.
Virgílio de Carneiro.
Vítor Manuel Igreja Raposo.

Partido Socialista (PS):

Alberto Arons de Carvalho.
Alberto Dentardes Costa.
Alberto de Sousa Martins.
Alberto Manuel Avelino.
Ana Maria Bettencourt.
António Alves Martinho.
António Correia Campos.
António da Silva Braga.
António de Almeida Santos.
António José Martins Seguro.
António Marques Júnior.
António Poppe Lopes Cardoso.
António Ribeiro Campos.
António Ribeiro da Silva.
Armando Martins Vara.
Artur Pereira dos Penedos.
Carlos Manuel Luís.
Edite Marreiros Estrela.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Fernando Manuel Costa.
Fernando Pereira Marques.
Helena Torres Marques.
Jaime José Matos da Gama.
João António Gomes Proença.
João Ferraz de Abreu.
João Maria Meneses Ferreira.
João Rui Gaspar de Almeida.
Jorge Lacão Costa.

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Jorge Paulo Almeida Coelho.
José Almeida Leilão.
José Barbosa Mota.
José Eduardo Cruz Jardim.
José Eduardo Reis.
José Ernesto dos Reis.
José Gameiro dos Santos.
José Manuel da Silva Lemos.
José Manuel Magalhães.
José Rebelo dos Reis Lamego.
Júlio da Piedade Henriques.
Laurentino José Castro Dias.
Luís Capoulas Santos.
Luís Filipe Madeira.
Manuel Alegre Melo Duarte.
Maria Julieta Sampaio.
Maria Santa Clara Gomes.
Raul Fernando Costa Brito.
Raúl Pimenta Rêgo.
Rogério Conceição Martins.
Rui António Ferreira Cunha.
Rui Machado Ávila.
Rui Rabaça Vieira.
Vítor Manuel Caio Roque.

Partido Comunista Português (PCP):

Jerónimo Carvalho de Sousa.
João Gonçalves do Amaral.
José Manuel Maia.
Lino Marques de Carvalho.
Miguel Urbano Rodrigues.
Octávio Augusto Teixeira.

Centro Democrático Social (CDS):

Casimiro da Silva Tavares.
José Luís Nogueira de Brito.
Narana Sinai Coissoró.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

André Valente Martins.

Partido da Solidariedade Nacional (PSN):

Manuel Sérgio Vieira Cunha.

Deputados independentes:

Mário Baptista Tomé.
Raul de Morais e Castro.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de requerimentos e da resposta a alguns outros.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Srs. Deputados, nas últimas reuniões plenárias foram apresentados à Mesa os seguintes requerimentos: ao Governo, formulados pelos Srs. Deputados Apolónia Teixeira, Miranda Calha, António Filipe, Fernando Marques, Cerqueira de Oliveira, Júlio Henriques, Mário Tomé e João Poças Santos; ao Ministério da Saúde, formulados pelos Srs. Deputados Macário Correia e Luís Peixoto; ao Ministério do Ambiente e Recursos Naturais, formulados pelos Srs. Deputados José Apolinário, Macário Correia, Isabel Castro, Luís Pais de Sousa e Lino de Carvalho; ao Ministério do Emprego e da Segurança Social, formulados pelos Srs. Deputados José Magalhães e Manuel Sérgio; ao Ministério da Justiça, formulados pelos Srs. Deputados Cerqueira de Oliveira, José Magalhães e Raul Castro; ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, formulados pelos Srs. Deputados Macário Correia, António Martinho e Manuel Sérgio; à EPAL, formulado pela Sr.ª Deputada Isabel Castro; à Secretaria de Estado da Cultura, formulados pelos Srs. Deputados António Filipe e Luís Pais de Sousa; ao Ministério das Finanças, formulado pelo Sr. Deputado Olinto Ravara; ao Ministério da Administração Interna, formulados pelos Srs. Deputados José Magalhães e Lino de Carvalho; ao Ministério da Educação, formulado pelo Sr. Deputado António Filipe; ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, formulado pelo Sr. Deputado Francisco Martins.
Entretanto, o Governo respondeu aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: Luís Sá, nas sessões de 6 de Dezembro, 9 de Janeiro, 11 e 12 de Fevereiro; Macário Correia, na sessão de 12 de Fevereiro; Ana Maria Bettencourt, na sessão de 13 de Fevereiro; Cerqueira de Oliveira, na sessão de 25 de Fevereiro; Agostinho Lopes, nas sessões de 25 e 27 de Fevereiro; João Corregedor da Fonseca, na sessão de 27 de Fevereiro; Paulo Pereira Coelho, na sessão de 12 de Março; Luís Peixoto e Manuel Sérgio, na sessão de 19 de Março; Mário Tomé, na sessão de 24 de Março; Vítor Raposo, na sessão de 26 de Março; José Apolinário, na sessão de 2 de Abril; Vítor Ranita, na sessão de 23 de Abril.
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Ferraz de Abreu.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma declaração politica, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao entregar na Mesa o projecto de resolução para que esta Assembleia, nos lermos do n.º 2 do artigo 284.º, assuma poderes de revisão constitucional por maioria de quatro quintos dos Deputados, o CDS desencadeou o processo político-parlamentar para a introdução das emendas constitucionais necessárias para a admissão de legislação ordinária em que estão interessados também outros partidos, bem como do referendo vinculativo sobre a integração de Portugal na Europa, com relevo óbvio para a ratificação do Tratado de Maastricht sobre a União Europeia, assinado em 7 de Fevereiro de 1992.
Não conheço nenhum tema político no último decénio que lenha apaixonado a opinião pública portuguesa como vem sendo a questão do referendo para a ratificação do Tratado de Maastricht. Não há dia em que este ou aquele analista ou comentador político não se pronuncie sobre a sua realização, com os argumentos mais variados; os principais órgãos da comunicação social reservam um espaço nobre, quase diário, para relatar as vicissitudes da proposta do CDS; os dirigentes de iodos os partidos fazem saber a sua posição a favor ou contra a sua realização e está já lançado o debate entre os constitucionalistas para averiguação de qual a melhor maneira de ultrapassar a proibição constante do artigo 118.º da Constituição da República Portuguesa.
Nem poderia ser de outra maneira: num Estado nacional, o primeiro e o único da Europa, com fundas raízes demo-

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cráticas lançadas logo nos primórdios da independência, tendo o povo sempre participado nos grandes desígnios nacionais, não faria sentido que, neste último decénio do século XX, com todas as técnicas de que dispomos para informar e auscultar a vontade popular, impedíssemos a actual geração, a que podemos chamar a geração europeia, de dar o seu veredicto sobre uma nova e decisiva etapa da sua história pátria, qual seja a da sua participação na nova arquitectura europeia.
No preciso momento em que a Europa se organiza, se reforça e avança para a sua nova configuração,.com a participação plena de Portugal em todos os seus centros decisores, seria inconcebível e intolerável que o soberano, que é o povo português, não manifestasse pelo seu voto directo, expresso e concreto o modo como pretende estar nessa nova entidade supranacional gizada em Maastricht e a forma como quer preservai a sua própria identidade moral, cultural e política nesse projecto.
Nada está ainda definitivamente adquirido para Portugal, nem para os Portugueses, nem para a Europa, nem para os Europeus, para que o povo se sinta resignado perante uma escolha para a qual não contribuiu nem conhece os seus fundamentos. O eleitorado preza os ditames irrenunciáveis do regime democrático em que vive e não admite que os representantes que elegeu para exercer em seu nome a soberania, por prazos curtos e bem limitados, tomem compromissos que ultrapassam o tempo do seu mandato, impondo aos futuros eleitos as decisões em que não se comprometeram nem podem considerar-se vinculados; os actuais representantes, aqui, no Parlamento, no Governo, ou na chefatura do Estado não se podem considerar investidos nos poderes para a definição irreversível do projecto europeu e consequentes obrigações e sequelas, que obviamente ultrapassam a vontade do representado no tempo e no acto de eleição, porque loca com o próprio conceito de soberania nacional. Só o povo, e só ele, pode directamente definir as suas opções para uma vigência superior à dos mandatos políticos normais.
Os factos históricos são sempre e necessariamente desenvolvimentos uns dos outros. Caracterizá-los desta maneira simplista banaliza o próprio acontecimento que se quer importante para o nosso devir colectivo.
Maastricht é, sem qualquer contestação, um facto histórico sem precedentes, uma nova etapa da integração europeia, que reforça a posição da Europa comunitária no cenário mundial, cria uma moeda única, avança na democratização das instituições europeias, procura organizar uma política externa e de segurança comuns. Através do Pacote Delors II, tende a criar um espaço político-económico e social organizado e equilibrado, fundado em três pilares: concorrência, cooperação e solidariedade. Como afirmou o Primeiro-Ministro Cavaco Silva, o Pacote Delors II é a consequência lógica do Tratado e constitui o primeiro passo para pôr em execução este último.
O Tratado de Maastricht não dá respostas claras a todas as interrogações e dúvidas; a complexidade do poder de decisão e o peso da burocracia de Bruxelas na elaboração e formulação da legislação comunitária, o défice democrático do Parlamento Europeu, a indefinição do conceito de subsidariedade para o efeito de transferências de competências nacionais e das próprias parcelas de soberania, a imprevisibilidade das consequências da moeda única, o papel dos pequenos países na definição da política externa e da segurança, a linha divisória entre as decisões (ornadas por unanimidade e por maioria qualificada que tranformam os países minoritários sujeitos aos interesses dos outros, os efeitos do aprofundamento e do alargamento que são objectivamente contraditórios, poderiam ser alguns dos exemplos mais evidentes.
Como é notório, não têm existido até agora entre nós os debates necessários para informar o País sobre a natureza e efeitos do Tratado da União Europeia para Portugal e para os Portugueses, nem nunca o Governo deu a conhecer às oposições as suas próprias posições sobre as questões controversas que estão a ser esmiuçadas por toda a parte.
A França acaba de fazer um grande debate, a propósito da revisão necessária para a ratificação; a Irlanda obteve um protocolo especial para o problema do aborto; a Alemanha debate o défice democrático e os problemas dos lander, a Inglaterra não quer abdicar do controlo sobre as suas fronteiras; em França ainda não é pacífica a solução quanto aos vistos; a Espanha tudo fax para entrar no directório dos grandes.
Só aqui, em Portugal, o Sr. Primeiro-Ministro quer que a Assembleia da República, a toque de caixa, ratifique o Tratado num abrir e fechar de olhos, impedindo dar voz ao povo que, segundo uma sondagem recente, por esmagadora maioria de 74 %, quer ter a sua palavra.
Pode a maioria, por meras questões de estratégia eleito mais e de glorificação do seu líder partidário - apresentado como o herói da integração europeia -, reduzir o debate e o processo político da ratificação parlamentar a uma troca de algumas considerações sábias numa destas tardes de Verão, cumprindo assim a recomendação do Grupo Liberal e Reformista do Parlamento Europeu que exige dos seus membros uma ratificação rápida e expedita. A opção do Partido Socialista nesta matéria é a de imitar o poder e conformar-se com as directivas da Internacional Socialista.
O chamado «consenso sobre a ratificação» de que falam alguns políticos influentes não passa de uma camuflagem do verdadeiro dissenso existente entre todos os partidos.
Tem o PSD e o PS a mesma noção de subsidariedade? Têm o PSD e o PS uma única opinião sobre as transferências de soberania? O PSD é igual ao PS quanto aos progressos da Carta Social Europeia? Têm o PSD e o PS a concepção idêntica sobre o papel da Assembleia da República na fiscalização da política comunitária do Governo? Aceita com igual à vontade o bloco central o calendário da União Monetária? Tem o Sr. Deputado Duarte Lima o mesmo entusiasmo pelo projecto da Europa federal como tem o Sr. Deputado Jaime Gama. E será esta identidade dos pontos de vista que, depois da conversa em segredo entre o Prof. Cavaco Silva e o Sr. Engenheiro António Guterres, leva os líderes socialista e social-democrata a combaterem o referendo e a fazerem juras que ratificarão o Tratado, substituindo-se à vontade popular?
Se não é público nem transparente o acordo PS-PSD que está na base deste «grande consenso», como podem os Deputados dos dois partidos representar os respectivos eleitorados? Será que a soberania nacional é negociável, conforme as conveniências pontuais dos chefes dos partidos do bloco central? Não! Numa democracia representativa, os Deputados (em de ter a exacta noção dos limites do seu mandato e do dever de, excepcionalmente, devolver aos seus mandantes - os eleitores - a opção sobre o futuro de Portugal, como sucede com a União Europeia. Nenhum Deputado, e muito menos o Primeiro-Ministro, tem o privilégio de definir por seu livre alvedrio as limitações à independência nacional e confiscar o direito que cada português tem de defender a identidade cultural do País como povo milenar que somos.

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Sr. Presidente, Srs. Deputados: Dissemos já que «Portugal corre o risco de caminhar às escuras na nova Europa, feita em segredo e aceite por decreto». O CDS quer o referendo nacional sobre a União Europeia, quer um grande debate sobre o modelo da Europa e, nessa medida, sobre o futuro de Portugal. O CDS quer que os Portugueses interiorizem e avaliem as consequências da decisão, a curto, a médio e a longo prazos; quer que os Portugueses saibam o que está aprovado e se é da vontade deles e o que é de imposição de outros. Quais são os custos e os lucros da União Europeia? Quais serão os poderes do nosso governo e os poderes dos órgãos supranacionais? Os Portugueses tem de conhecer como será a vida sem o escudo e com o ECU. Os Portugueses têm o direito de estar conscientes das profundas modificações económicas e sociais de que serão actores e autores. Numa palavra, é chegado o momento de os Portugueses saberem o que significa o choque europeu.
Só o referendo nacional dirá o que querem os Portugueses. Se a maioria, como parece que será, optar pelos caminhos para que apontam os artífices de Maastricht, nós, os Deputados, reproduziremos o mesmo voto nesta Câmara.
O referendo nacional que propomos seria, neste momento, de grande utilidade para a defesa dos interesses de Portugal. Só o referendo tomará possível que as prioridades da Europa sejam precisamente as que o nosso interesse exige no presente ciclo tia nossa história nacional. Mais do que a política formal, interessa-nos a verdade política. Nós, os Deputados da Assembleia da República, temos competência legal para ratificar o Tratado sobre a União Europeia assinado em Maastricht, mas na verdade irmos decidir sem o claro mandato dos que nos elegeram para votarmos em seu nome, quando o próprio povo se mostra interessado em manifestar-se directamente dada a gravidade do assunto, seria abusar da nossa representatividade.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para concretizar o referendo vinculativo, que nos parece uma exigência política nacional, queremos ultrapassar o entrave do artigo 118.º da Constituição da República Portuguesa mediante a introdução de uma norma excepcional e transitória na parte final do actual texto da Constituição.
Uma vez introduzido o preceito excepcional, poderemos depois convocar o referendo nacional sobre a União Europeia.
O referendo que o CDS propõe não é a favor nem contra o Governo. É um referendo por e para Portugal. O CDS exige-o por um dever de consciência política e obrigação cívica, e espera que esta Câmara o acompanhe, abrindo caminho a uma revisão constitucional com a urgência que as circunstâncias exigem.
Vamos mudar de velocidade para acompanhar a aceleração da História.
(O Orador reviu.)

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado José Vera Jardim.

O Sr. José Vera Jardim (PS): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: A burocracia atingiu em Portugal um peso e uma dimensão que se situam já ao nível do insuportável para os cidadãos em geral e para as empresas em particular.
A teia de deveres, ónus, procedimentos que se exigem a propósito do acto mais simples constitui sério travão à iniciativa individual e colectiva. Cada vez mais, a cada nova lei ou regulamentação corresponde uma parafernália burocrática com a dose maciça de requerimentos, reconhecimentos, escrituras, lermos, certidões, certificados, guias, públicas formas, um nunca mais acabar de papéis, enquanto que o sentido útil de muitas desta exigências escapa ao normal dos mortais.
Subjacente a lodo este estado de coisas, uma posição fundamental: a desconfiança em relação à sociedade civil. Tudo se controla para que nada de fundamental seja controlado. O notário controla o Registo Nacional de Pessoas Colectivas (RNPC); o conservador controla o notário; ambos se controlam um ao outro; as Finanças controlam tudo e todos e exigem que todos, até os tribunais, lhes comuniquem as mais variadas coisas. E todos controlam os cidadãos!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Os custos económicos de toda esta burocracia são enormes, os mais altos da Europa. Todos cobram para controlar e cobram bem! Para constituir uma sociedade cobra o RNPC; cobra o notário; cobra o conservador; cobra o ICEP, em caso de investimento estrangeiro; cobra a Imprensa Nacional; cobra a imprensa diária ou regional; cobram as Finanças. Para iodos estes controlos, cada vez existem mais cartões - de identidade, de contribuinte, da segurança social. Big brother em acção, mas «à portuguesa», com jeitinho.

Risos do PS.

Na verdade, a sociedade civil criou e continua a criar as suas próprias defesas. Aprendeu que a burocracia tem duas portas: a visível - a oficial - e a outra - «a porta do cavalo». E aprendeu depressa que é por esta que é forçoso entrar! E aí os «papéis» arranjam-se de outro modo, os problemas resolvem-se a outro ritmo. A «poria do cavalo» é a do clientelismo, do jeitinho, do compadrio, do Sr. Doutor ou do Sr. Engenheiro; a da corruptela ou da «corrupção branca»; a da falia de transparência e do favor. É a «mão direita» do Estado, mas é também a degradação dos princípios constitucionais da igualdade e da legalidade.
Para outros, ainda, e face aos custos astronómicos que a paranóia fiscal se recusa a reconhecer, a porta é ainda outra: classe executiva - suite em Mayfair, jantar no Simpsons, tabelião no Straud. E ainda fica muito dinheiro no bolso por comparação com o que cobra o notário da baixa lisboeta ou portuense, mal instalado, mal equipado, ajoujado ao peso de milhares de escrituras anuais, muitas vezes, dezenas por dia, e pelas filas intermináveis que enchem as escadas dos tugúrios onde o Estado os armazenou.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Os custos sociais de tudo isto são também enormes: custos para a economia, para o normal desenvolvimento das iniciativas legítimas dos cidadãos e para a imagem do Estado que, para a maior parte das pessoas, é personificada pelo funcionário que o atende ao balcão ou ao guichet da repartição e que lhe diz, porque outra coisa não pode dizer, que falta o reconhecimento da assinatura, que ultrapassou o máximo de linhas por lauda, que o solo não é aquele, que o bilhete de identidade caducou e há que arranjar outro, etc., etc., etc.
Tudo lógico, legal, inatacável! Eles são o Estado e o Estado tem este discurso.

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Outros discursos há. Os discursos do Governo, de Cavaco Silva, do PSD. São os discursos das belas intenções. «Amanhã tudo se resolverá pois vivemos numa democracia de qualidade». Mas para amanhã.
Vejamos o que dizem. «O homem é, para nós, o um último da política. Por isso entendemos que o funcionamento da Administração Pública deve orientar-se por critérios que não entravem a iniciativa dos indivíduos ou das organizações da sociedade civil» - ponto 4.3 do projecto do Programa do PSD.
«Desburocratização e simplificação como sectores de intervenção prioritária» - pág. 14 do Programa do XII Governo Constitucional.
«Aposta na qualidade da Administração Pública através da prestação de um serviço eficaz e satisfação célere das solicitações dos utentes» - pá». 76 das Grandes Opções do Plano.
E outras muitas citações poderíamos fazer.
De acções quanto à substância da burocracia, pouco, quase nada! Ratos paridos pela montanha das centenas de assessores, técnicos, adjuntos, secretários de Estado que se ocupam há anos com a reforma da Administração Pública nos vários sectores.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr: Presidente, Srs. Deputados: A simplificação e a desburocratização fazem-se sujeitando a critérios de utilidade, racionalidade e custo/benefício muitas das exigências burocráticas. Que utilidade tem? Se se abolir, o que se perde? Quanto custa ao Estado e aos cidadãos? Esse custo está relacionado com o benefício que se retira?
Se estas questões forem formuladas em relação a muitas das exigências formais, claramente nos apercebemos da sua inutilidade ou, pelo menos, de que o seu custo social e económico não é justificado pelas vantagens que delas se retiram, quando estas existem.
É, pois, uma acção continuada de crítica de imaginação! de iniciativa e de coragem de reformar. Os resultados não se farão esperar!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Pela nossa parte, fizemo-lo já em relação a muitos actos e contratos da vida jurídica quotidiana dos cidadãos e vamos apresentar os resultados na Mesa desta Assembleia dentro de minutos.
São estes, em suma, os resultados deste primeiro exercício de luta contra a burocracia, e que passo a expor:
Simplificação da constituição de associações por simples escrito particular e seu registo junto do Ministério Público, entidade já hoje com competência para controlar a legalidade da sua constituição, e abolição do registo junto dos governos civis;
Abolição da necessidade de escritura pública para uma série de negócios jurídicos para que hoje é exigida a sua constituição por documento autenticado ou com reconhecimento notarial: constituição de hipoteca, consignação de rendimentos, renda vitalícia, constituição e alteração da propriedade horizontal, constituição e alteração do direito de habitação periódica, celebração de contratos de arrendamento para comércio e indústria, trespasse, cessões de exploração de estabelecimentos comerciais e industriais, mútuos;
Possibilidade de constituição de sociedades por quotas mediante contrato-tipo a adoptar oficialmente e, neste caso, sem necessidade de escritura, bastando a simples autenticação das assinaturas e o posterior registo na conservatória;
Medidas de facilitação de vários actos das sociedades, designadamente para a sua constituição, e criação da figura do secretário da sociedade com funções de fé pública, sendo assim desnecessárias muitas das certidões e reconhecimentos a que, hoje em dia, as empresas tem de proceder.
Várias outras medidas de simplificação avulsas, designadamente a abolição quase generalizada do reconhecimento notarial por semelhança, a facilitação das procurações passadas a advogados e solicitadores, a definição em termos amplos da legitimidade destes para proceder a registos e deles reclamar ou recorrer, a facilitação da outorga de procurações a profissionais forenses, etc., etc., etc.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A reforma que hoje vamos apresentar é, sem dúvida, a mais ampla das últimas décadas em matéria de formalismo. negocial. Implica, por si só, a revisão de muitos dos artigos do Código Civil, do Código das Sociedades, do Código de Registo e Notariado e outra legislação avulsa, incluindo a Lei do Arrendamento.
A ser aprovada, como esperamos, deixarão de ser sujeitos a escritura muitos milhares de actos e negócios e diminuirá sensivelmente o número de actos notariais que, no ano de 1990, segundo os últimos números oficiais disponíveis, atingiram o montante de 8 milhões.
Poderíamos ter ido mais longe, mas tivemos em conta que reformas deste tipo tem de ser assimiladas por todos e que tem o seu próprio timing e limites balizados por concepções culturais e jurídicas enraizadas em séculos de prática. Há, pois, que fazer um compasso de espera para que a nova via possa ser assimilada consensualmente por todos. Só assim as reformas de fundo terão impacte e criarão raízes na sociedade portuguesa.
Srs. Deputados do PSD, chegou o momento de abandonar o terreno do discurso e de se defrontarem com o terreno do concreto.

Aplausos do PS.

Estão ou não, o Governo e o PSD, interessados na reforma de fundo do funcionamento è modo de relacionamento da Administração com os cidadãos? Estão ou não, o Governo e o PSD, disponíveis para passar das palavras aos actos e contribuir para uma Administração de qualidade e para a oxigenação da sociedade civil e não apenas para as «curas de emagrecimento» do Estado?
Estão ou não, o Governo e o PSD, disponíveis para dar um contributo decisivo para terminar de vez com a «corrupção branca» que campeia a olhos vistos na sociedade portuguesa?
Por nós, assumimos as nossas responsabilidades, conscientes das dificuldades e das limitações, pois sabemos não ser a lei a chave miraculosa, o «abre-te Sésamo» da solução de todos os problemas. É este o contributo que nos cabe dar neste momento e aí estamos perante o povo português a prestar contas. Que o Governo e a maioria saibam assumir também as suas responsabilidades!
Vou apresentar na Mesa o projecto de lei do Grupo Parlamentar do PS, aproveitando para dizer que é também uma forma de celebrarmos condignamente o Dia do Advogado, que hoje se comemora.

Aplausos do PS e do Deputado Guilherme Silva.

A Ordem, numa festa para que está convidado o Sr. Presidente da República, vai celebrar o Dia do Advogado. Os

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advogados são, como defensores dos direitos dos cidadãos, os primeiros a defrontar-se e a lutar quotidianamente contra a burocracia.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, encontram-se nas galerias a assistir à sessão, acompanhados dos respectivos professores, um grupo de alunos da Escola Secundária de Alijó, da Escola C+S de Murça, da Escola Preparatória Marquesa de Aloma de Lisboa e do Colégio Marista de Carcavelos, para os quais peço a vossa habitual saudação.

Aplausos gerais.

Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Vera Jardim, quero dizer-lhe que é com algum regozijo e satisfação que vejo o Partido Socialista aproximar-se das preocupações do Governo e do PSD...

Risos do PS.

... relativamente à necessidade de desburocratização e de simplificação das relações dos administrados com a Administração.
Ern boa hora registo este facto da parte do Partido Socialista e faço-o com duplo regozijo, porque sei e V. Ex.ª também afirmou que tomou essa atitude como advogado, hoje, dia de S. Ivo, patrono dos advogados, uma classe que, efectivamente, se bate quotidianamente por estas questões, porque sente na pele, ao acompanhar iodos os cidadãos que recorrem aos seus serviços, a teia complexa que, infelizmente, é ainda hoje a Administração.
Esperava que V. Ex.ª deixasse falar um pouco mais o advogado e menos o Deputado socialista, embora compreenda que tenha dado prevalência a esta segunda qualidade. E digo isto, porque se V. Ex.ª tem deixado falar um pouco mais o advogado com certeza que tinha prestado aqui o seu preito de justiça e de homenagem ao Governo pelo muito que tem feito nesta matéria.
Como Deputado socialista, compreendo que V. Ex.ª tenha tido dificuldade em fazê-lo, mas, como advogado, decerto que o faria, homenageando o Código de Procedimento Administrativo, que há poucos dias entrou em vigor, e que durante tantos anos registou sucessivas tentativas para ser aprovado e executado, lendo sido este Governo e esta maioria a aprová-lo. Também no ano passado foi aprovado o Decreto-Lei n.º 129/91, que veio simplificar igualmente determinados procedimentos, tomando mais fácil e transparente o relacionamento dos cidadãos com a Administração. Estes diplomas, e em particular o primeiro, constituem um exemplo marcante das preocupações do Governo, que não são apenas as de aprovar legislação. O Código de Procedimento Administrativo entrou em vigor, não porque constitua uma preocupação mas porque se trata de uma acção...

O Sr. José Magalhães (PS): - Acção com vacatio.

O Orador: -... concreta que os cidadãos estão a sentir no seu dia-a-dia na melhoria, na desburocratização e na simplificação das relações com a Administração.
Sr. Deputado José Vera Jardim, pela minha parte, e suponho que o meu grupo parlamentar não se oporá a tal medida, estamos disponíveis para analisar o projecto de lei que irá ser apresentado pelo Partido Socialista, dando o nosso contributo e conjugando esforços no sentido de mais passos serem dados no caminho da vulgarização e da simplificação.
Fazemo-lo sem qualquer preocupação de ordem partidária, lendo exclusivamente em mente a preocupação de melhor servir o País.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado José Vera Jardim.

O Sr. José Vera Jardim (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, também eu me regozijo pela disposição demonstrada por V. Ex.ª, em nome da sua bancada, em olhar de uma forma positiva o projecto de lei e outras iniciativas que iremos apresentar a esta Câmara nos tempos mais próximos. Serão todos na mesma linha de simplificar, de desburocratizar, de embaratecer, fazendo com que deixem de existir muitos dos ónus que hoje constituem esta tremenda leia que envolve o cidadão.
Infelizmente, Sr. Deputado, não posso acompanhá-lo inteiramente na primeira parte da sua intervenção. Eu diria que, ao subir à tribuna, fi-lo obviamente na veste de político e de parlamentar, também na de advogado, mas sobretudo, Sr. Deputado, como cidadão, porque este é um problema que diz respeito a todos os cidadãos e todos nós sabemos - V. Ex.ª sabe Ião bem como eu - o quanto de irracional, de impossível de sustentar para as empresas e para os cidadãos em geral atingiu a burocracia em Portugal.
Também não posso acompanhar V. Ex.ª quanto à obra dos governos do PSD nesta matéria. Infelizmente, não há muito para mostrar! Leia V. Ex.ª, por exemplo, o Manifesto Eleitoral do PSD, onde vem enunciada a grande obra do governo de Cavaco Silva no que diz respeito à desburocratização e verá que ela consiste em seis medidas das quais refiro algumas. Foi abandonado o reconhecimento da assinatura do médico nos atestados médicos e substituído o papel azul de 25 linhas por qualquer outro papel.
Sr. Deputado, nesta matéria, há um atraso de décadas e os governos do PSD não tem estado à altura das necessidades, sobretudo das actuais. Portugal, confrontado com uma economia aberta cada vez mais universalizada, não está
- e refiro-me às nossas empresas e aos nossos cidadãos em geral - em igualdade de circunstâncias com o que se passa hoje na Europa.
V. Ex.ª sabe isto tão bem como eu e há felizmente na bancada do PSD, porque sei que há, muitas pessoas que acompanharão este nosso projecto de lei e que ajudarão a vencer esta etapa decisiva para simplificar e desburocratizar a vida em Portugal.

Aplausos do PS.

Neste momento, reassume a presidência o Sr. Presidente, Barbosa de Melo.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por anunciar que vamos entregar na Mesa um projecto de resolução, visando a constituição

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de uma comissão de inquérito parlamentar ao processo das privatizações.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Não estamos a fazer qualquer desafio. Estamos, sim, a responder a um desafiada bancada do PSD, já que, através de voz autorizada, durante a discussão da Lei Quadro das Privatizações e como argumento para votar contra uma comissão de acompanhamento As privatizações proposta pelo PS, estranhamento silencioso em todo este processo, a maioria afirmava que a Assembleia da República teria sempre meios de fiscalizar o Governo. Assim se faça!
Se é certo que não foi aqui que as coisas começaram, aqui se deram dois momentos importantes: procedeu-se à revisão da parte económica da Constituição e aprovou-se a Lei Quadro das Privatizações. Nesses dois momentos, alguém aqui quis enganar alguém ou alguém se enganou face à realidade e ao curso das coisas.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Das actas da Comissão de Revisão Constitucional e do Diário da República de 12 de Novembro de 1989 constam abundantes declarações de garantias de «transparência processual, de utilidade pública, de independência nacional, de democratização do capital, do menos Estado e melhor Estado, da formação de novos e dinâmicos grupos económicos nacionais, da intocabilidade dos direitos dos trabalhadores», etc., etc., etc.!
Entretanto, num processo que já vinha detrás; há novos desenvolvimentos e avança-se para uma ofensiva global, visando a liquidação do património público empresarial com o objectivo estratégico e ideológico da reconstituição de grandes grupos capitalistas e dá restauração do capitalismo monopolista.
O governo PSD; animado por um retrógrado liberalismo, e através da intervenção administrativa alheia aos próprios mecanismos de mercado tão sacralizados pelo Executivo de Cavaco Silva, pretende que a reconstituição dós grandes grupos económicos e a concentração capitalista se opere não em resultado tia concorrência do sector privado com o sector público mas através de decretos liquidacionistas do sector empresarial do Estado e dá transferência forçada do património, recursos e bens nacionais para as mãos dos grandes capitalistas.
É pouco dizer que tem sido um processo pouco transparente tem sido, antes, um processo tenebroso!
A prosseguir e a concretizar-se esta gigantesca operação, o sistema sócio-económico corre sérios riscos de ser idêntico ao que vigorava durante a ditadura fascista. E se salvaguardamos o regime político é porque tal operação de entrega e de reconstituição está a ser feita no quadro de uma democracia parlamentar, o que não invalida-os perigos decorrentes para essa mesma democracia, na medida em que os seus mecanismos estatais e jurídicos podem soçobrar ante o poder e o controlo de grandes grupos económicos-dominantes associados as transnacionais.
Recentemente, num grilo de alma, António Champalimaud demonstrou a sua impaciência, à sua arrogância, o seu desejo de ajuste de contas com a democracia e com os trabalhadores, quando arrecadou, a preços de saldo, a Mundial Confiança e mais 10 milhões de contos por conta. Foi um erro táctico, um grito de alma, mas é um exemplo vivo dos escândalos, dos conluios ardilosos que se processam durante os leilões, colocando a nu um processo concertado, faseado e de carácter estratégico, onde o Governo assume o protagonismo e parceria.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Mas foi só mais um facto, que teve o mérito de abanar consciências. O rol começa a ser tão longo e as situações tão escandalosas que, hoje, já não é só PCP, os trabalhadores e as suas organizações a denunciar esta operação de grande envergadura!

Sr: Presidente, Srs. Deputados: Acusamos o processo de privatizações de tenebroso.
Como classificar, à luz dos interesses nacionais da independência e soberania económicas, um processo de leilão e entrega a preços subavaliados ao grande capital, particularmente ao capital estrangeiro, o melhor do património público empresarial?
Como é possível que encarregados de avaliar empresas públicas, para efeitos do seu leilão, as subavaliem e depois as arrematem?
Como reage o Governo ante os autênticos cambalachos, em curso, que levam, por exemplo, José Roquete a admitir em público que se conluiou previamente com José Manuel de Mello, antes de concorrer à compra do Totta & Açores; o Grupo Espírito, Santo a dizer, em praça pública, que queria a Tranquilidade e o BESCL, sem outros: concorrentes; o Grupo Mello a comprar a Sociedade Financeira Portuguesa, sem oposição; e Champalimaud a dizer que houve um «acordo de cavalheiros» para concorrer sozinho e adquirir por metade do preço, a valores internacionais, a Mundial Confiança?

O Sr. João Amaral (PCP): - É um escândalo!

O Orador: - Confirma-se ou não que o Governo quer permitir ao Grupo Mello tempo cedo para juntar capitais necessários, a fim de iniciar a privatização da Seguradora Império, e que o IPE estaria a negociar com este grupo a venda por um preço de saldo da Compal?
Champalimaud chama a isto «acordo de cavalheiros», mas no dicionário da língua portuguesa chama-se a isto, «cambalacho»!

Vozes do PCP e do Deputado independente, Mário Tomé: - Muito bem!

O Orador: - Com novos episódios a prosseguir no Pinto e Sotto Mayor, na Petrogal, na Cimpor e noutras empresas, que estão na calha de leilão!

Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo, no processo das privatizações, tem como eixo central uma estratégia e uma ideologia que se conforma com os objectivos dos grandes grupos estrangeiros e das sete velhas famílias que dominaram Portugal durante 48 anos de ditadura fascista.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Começou-se pela imposição de estrangulamentos financeiros, pela nomeação de autênticos comissários políticos ou homens de mão do grande capital para gestores que, depois do trabalho de sapa, se passaram para administradores da empresa privatizada; encarregaram-se avaliadores das empresas públicas que as subavaliaram ao preço da chuva e, nalguns casos, até as arremataram, aumentaram se progressivamente as indemnizações; facilitou-

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-se o acesso a dados confidenciais do banco ou da seguradora a privatizar; desencadeou-se o desmembramento de sectores altamente rentáveis, visando a sua posterior privatização; proeurou-se desarticular a organização dos trabalhadores e procedeu-se a ofensivas contra os seus direitos individuais e colectivos, à liquidação de milhares de postos de trabalho efectivos, já que se encontra estafada e desmistificada a lese do capitalismo popular.
São desprezados acórdãos do Tribunal Constitucional e recomendações do Provedor de Justiça quanto ao direito de participação nos órgãos sociais das empresas e em relação ao escrupuloso cumprimento de outros direitos dos trabalhadores.
O processo de privatizações está a ter também consequências nefastas para as populações e para o desenvolvimento regional. O encerramento da FÉIS, com o despedimento de iodos os trabalhadores e consequente perda do seu inestimável património, e o encerramento de ramais de caminhos de ferro, que não provocam apetência aos capitalistas, são exemplos da acentuação das assimetrias regionais e sociais.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A ânsia do lucro máximo conduzirá à degradação das empresas prestadoras de serviços públicos, nomeadamente nos transportes, na distribuição de energia e na saúde.
O Governo tem uma estratégia de liquidação e entrega e não uma estratégia de desenvolvimento económico e de garantia do interesse nacional.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Apesar das subavaliações, da entrega a concorrentes únicos em leilão, da abusiva transferência de propriedade de valiosas empresas a preços irrisórios para o seu valor, os capitalistas portugueses não estão em condições financeiras de, num curto espaço de tempo, adquirirem tudo quanto o Governo tem pressa em transferir para a propriedade privada para encaixar, só neste ano, 350 milhões de contos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Era inevitável que as transnacionais, em sectores tão vitais e determinantes (como o financeiro, o petrolífero, o da metalomecânica pesada, o das comunicações, o dos cimentos e o da energia), se apoderassem ou venham a apoderar de sectores estratégicos, com todas as consequências que isso tem para a nossa independência e soberania económicas. No quadro da Comunidade Europeia, em vez da concretização da coesão económica e social, Portugal corre o risco de se tornar num país de economia apendicular, periférica em que o desenvolvimento nacional e os padrões de vida do povo português serão sacrificados aos interesses, decisões e imposições dos países mais desenvolvidos.
Como afirmava recentemente o insuspeito Fernando Ulrich, «não nos podemos tomar o local onde os outros implementam as suas estratégias. E a diferença entre o País e o sítio».
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A dimensão lodosa a que chegou o processo das privatizações não se compadece com silêncios e cumplicidades. Transformou-se, sim, numa questão nacional que envolve o próprio regime democrático, o seu futuro e o futuro do País!
O inquérito parlamentar pode constituir uma valiosa contribuição da Assembleia da República a favor da democracia.

Aplausos do PCP, de alguns Deputados do PS e do Deputado independente Mário Tomé.

O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Mário Tomé (Indep.): - Sr. Presidente, fui encarregue de fazer uma oferta à Assembleia da República, que é uma peça magnífica, concretamente um jarro que só a Fábrica-Escola Irmãos Stephens consegue fazer, como resposta ã insensibilidade manifestada pelo PSD em sede de Comissão quando lhe foi pedido para ir visitar aquela fábrica a fim de, in loco, verificar o que eslava a provocar aquela situação - aliás, um pouco contraditoriamente com as preocupações que o próprio Sr. Governador Civil demonstrou ontem, em entrevista que tive com ele.
Esta minha entrega vai também acompanhada do pedido de agendamento da petição que já deu entrada há muito tempo nesta Assembleia para que seja constituída uma comissão de inquérito para apreciar a forma como foi gerida, sob orientação do Estado, a Fábrica-Escola Irmãos Stephens.

Neste momento, o Orador dirige-se à Mesa, entregando o jarro ao Sr. Presidente.

Aplausos do PS e do PCP.

O Sr. Raúl Rêgo (PS): - E estranho que o partido do Governo não aplauda!

O Sr. Presidente: - A Mesa agradece a lembrança, que fica à guarda no meu Gabinete.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Júlio Henriques.

O Sr. Júlio Henriques (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Firmado no conhecimento directo de uma pequena comunidade em crise, cuja vida económica e social decorre fundamentalmente da indústria de lanifícios instalada há longos anos, e também da consulta sistemática a documentos de analise sobre a problemática do sector têxtil em Portugal (destes destacando os produzidos pelo Ministério da Indústria e Energia, pelo Conselho Permanente de Concertação Social e pelo Relatório Karla Peijs do Parlamento Europeu), proponho-me a fazer à Câmara uma rellexão e um alerta para o que considero ser uma das questões mais relevantes para o futuro próximo de vastas regiões do País, envolvendo muitas dezenas de milhar de trabalhadores do têxtil, empresas e empresários do sector.
Os factos sito conhecidos e, por certo, motivo de preocupação a todos os níveis; mas é bom, até por isso mesmo, que a Assembleia da República os aprecie e que o Governo dedique a tão grave problema redobrada atenção, envolvendo os parceiros sociais, disponibilizando meios, e, acima de tudo, afirmando uma vontade política determinante e determinada para a criação de novos dispositivos de apoio à indústria (que passam pela área da promoção comercial e da formação profissional), acelerando, assim, os programas

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e as acções em curso - importantes, reconhece-se, mas insuficientes.
É que não basta ao Governo (cr uma reacção mal contida e infeliz às oportunas declarações do Deputado europeu João Cravinho, quando, em forum próprio, com o prestígio, que o Parlamento Europeu outorga ao seu Vice-Presidente, defendeu, em Fevereiro de 1990, a necessidade de um forte e urgente financiamento comunitário - 700 milhões de contos - para a reestruturação da indústria têxtil em Portugal.
Na altura, recordo, o Ministro da Indústria Ferreira do Amaral dizia, a despropósito e tão nervoso quanto inconveniente (e digo isto porque os patriotas não são os que adormecem sobre os problemas mas, antes, os que levantam a sua voz autorizada contra a inércia), «a indústria têxtil não está à venda». Excelente! Pela nossa parte, diríamos, ainda bem!
Mas, face à natureza e à grandiosidade dos problemas, deixo aqui a pergunta: tem-se feito tudo o que seria possível para evitar o agravamento de uma crise - bem se pode dizer! - anunciada? Tem o Governo agido de forma satisfatória para atalhar as consequências gravosas que estão aí?
É seguro que não! «A indústria têxtil não está à venda»; está, antes, e infelizmente, a caminho da falência!
Com efeito, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a concorrência em condições de vantagem relativas de países terceiros no espaço europeu - que é destino de 70 % das nossas exportações; a prática de taxas de juro incomportáveis (como o PS vem denunciando) somada a adopção pelo sistema bancário de um postura de desconfiança relativamente ao sector; o fortalecimento do escudo faceias moedas europeias; os elevados custos energéticos são factores, entre outros, cerceadores do investimento tecnológico, visando a qualidade e um mercado cada vez mais exigentes - com culpas também para alguns industriais (não empresários) que se acomodam, não cultivando o gosto pelo risco, felizes de estarem na Europa do mercado interno, a caminho da União Europeia e Monetária e da União Política, sem perceberem, ou Ungindo não perceber, o que isso significa, o que isso exige de todos nós.

O Sr. José Vera Jardim (PS): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este quadro, que é imperativo nacional mudar com urgência, vem traduzindo para o País uma situação bem pouco lisonjeira estamos hoje muito afastados dos nossos parceiros da Comunidade e alguns subsectores do têxtil - as confecções de vestuário, por exemplo - colocam-nos, lamentavelmente, numa situação próxima da que caracterizava a mesma indústria na Itália dos anos 60 (salários baixos, recurso à subcontratação, trabalho domiciliário, trabalho infantil, evasão fiscal, insegurança no emprego, segurança social mínima). Enfim, uma situação que urge mudai' e reclama actuação e medidas eficazes contra um tal estado de coisas!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A indústria têxtil e do vestuário, com os seus mais de 200 000 trabalhadores, representando 20 % do valor acrescentado bruto da indústria transformadora e 30 % das exportações, rondando os 700 milhões de contos, assume, sem dúvida, no nosso país, um enorme relevo no contexto da economia nacional. Por outro lado, visto em termos comparativos, em nenhum outro Estado membro da Europa comunitária se regista unia tão grande importância do sector, lacto que internamente tem de ser ponderado e assumido sem tibieza e com todas as consequências, e que, ao nível da Comunidade; sendo embora reconhecido, terá de merecer mais activo e diferenciado tratamento.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Aliás, outra coisa não se pode esperar da acção do Governo português e de uma Europa que se pretende solidária.
Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o que mais motiva a minha intervenção, para além das referidas vicissitudes por que vem passando o ramo têxtil e do peso que representa na economia nacional, é a circunstância de se tratar de uma indústria concentrada em regiões muito específicas e com carácter de quase exclusividade, acarretando, assim, problemas económicos e sociais acrescidos quando as fábricas fecham e a alternativa é o desemprego.
São disso exemplo o Vale do Ave e a Covilhã, casos de maior dimensão. Mas de forma não menos preocupante, e a solicitar a adopção de medidas urgentíssimas já que a Portaria n.º 381/88; que respeita à reestruturação dos lanifícios, não resolveu nem resolverá só por si as dificuldades, é o que se passa em localidades como Castanheira de Pêra, Mira de Aire ou Avelar, para reportar-me somente ao distrito de Leiria.
Numa outra perspectiva - e aqui já não se trata de situações de monoindústria - temos também o peso relativo que o têxtil representa em lermos de emprego em determinadas regiões, como são os casos de Coimbra e de Alcobaça. Em Coimbra, por exemplo, há um forte movimento que, envolvendo a sua associação comercial e industrial, a UGT, a CGTP e a própria câmara municipal, reclama justamente medidas urgentes que permitam salvaguardar os 4500 postos de trabalho do sector, distribuídos pelas 44 pequenas e médias empresas (PME) existentes no concelho de Coimbra.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O País dispõe de condições para actuar. O Governo, as confederações sindicais e patronais podem e devem convergir na busca das soluções mais ajustadas, que passam, obviamente, pelo recurso aos fundos comunitários.
O relatório anual da Comissão das Comunidades Europeias sobre a situação da indústria têxtil e do vestuário realça, até certo ponto, a vulnerabilidade especial destas empresas face a uma maior concorrência resultante da progressiva concretização das opções fundamentais da Comunidade em matéria de realização do mercado interno. Mais adiante, ao manifestar conhecimento do estado de degradação financeira em que se encontram as empresas têxteis de algumas regiões e dos esforços a empreender, admite que se justifica plenamente a acção do poder público, no sentido de proporcionar às referidas empresas um enquadramento favorável a este esforço. Mas nas regiões em que a adaptação da indústria as exigências actuais é menos avançada a dimensão dos ajustamentos a realizar em prazos relativamente curtos poderá, no entanto, ser tal que as soluções menos Onerosas a nível económico e social não sejam viáveis sem uma intervenção dos poderes públicos, o que representará uma despesa importante para este último.
Condições existem, mas é necessário agir e depressa! A implementação de algumas propostas apresentadas em sede do Conselho Permanente de Concertação Social poderá contribuir, a par de outros instrumentos hoje disponíveis graças aos fundos comunitários (muito para além do recém-anunciado RETEX, que pouco resolverá), para a resolução gradual do que consideramos ser neste momento um gravíssimo problema nacional.

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Sr. Presidente, Srs. Deputados: Seja-me permitido, a terminar, que deixe indicadas três proposta simples de execução verosímil, respigadas de entre muitas outras, capazes de alterar, de forma positiva, o panorama dramático vigente: primeira, em cada concelho onde o sector têxtil represente pelo menos 25 % do emprego industrial será criado e integrado no centro de emprego respectivo um núcleo específico vocacionado para apoiar os trabalhadores lançados no desemprego, com funções de orientação profissional e de formação e apoio à reinserção profissional; segunda, criação da figura instrumental dos planos específicos de desenvolvimento numa perspectiva integrada, dotados dos meios financeiros adequados, particularmente nas zonas da monoindústria têxtil; terceira, desoneração fiscal dos incentivos financeiros ao investimento.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Residindo ainda num pequeno meio industrial têxtil em crise, lendo, como tenho, profundo e directo conhecimento dos problemas, bem gostaria que esta minha despretensiosa intervenção na Assembleia da República pudesse contribuir para suster o processo de desertificação da minha terra e das outras, que são, afinal, as terras de iodos nos!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o período de antes da ordem do dia vai prolongar-se até as 16 horas e 45 minutos.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isilda Martins.

A Sr.ª Isilda Martins (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Venho falar-vos da Universidade do Algarve, a única universidade criada por decisão da Assembleia da República, e dizer-vos que a nossa universidade é hoje uma escola de sucesso.
Em meu nome e no dos algarvios que aqui represento, aproveito a oportunidade para, perante esta Câmara, agradecer, na pessoa de V. Ex.ª, a todos os que, em boa hora, subscreveram o projecto de lei n.º 45/1, para a criação do ensino superior no Algarve. Foi no dia 25 de Março de 1977, no decurso da 1.ª Sessão Legislativa da I Legislatura, sendo V. Ex.ª, Sr. Presidente, então Deputado, um dos subscritores.
O projecto viria a ser debatido na 2.ª Sessão Legislativa, no dia 4 de Maio de 1978, e aprovado por unanimidade.
Foram seus intervenientes os então Srs. Deputados António Esteves, do PS, na qualidade de relator substituto, por ausência do Deputado Luís Filipe Madeira, José Vitorino, do PSD, que apresentou o projecto, e, ainda Cristóvão Norte, do PSD, Adriano Rodrigues, do CDS, Zita Seabra, do PCP, e Acácio Barreiros, da UDP.
A ideia de dólar o Algarve de uma universidade há muito que vinha sendo defendida, sobretudo a partir da década de 60, pelos Drs. Mário Lyster Franco e Maurício Monteiro, no semanário regional Correio do Sul, entre outros.
Nessa época, era um sonho difícil de concretizar, por duas ordens de razão: a primeira, de natureza geográfica, prendia-se com o facto de o Algarve ser vítima de síndroma de «região periférica», votado por esse motivo ao esquecimento; a segunda, de natureza política: num País de estrutura político-administrativa fortemente centralizadora tal desiderato feria a tradição.
Foram os eleitos benéficos tia democracia que permitiram que a ideia pudesse ser retomada pela Assembleia da República e consagrada na Lei n.º 11/79, de 28 de Março, que, no seu artigo 1.º, determina a instituição da Universidade do Algarve, com sede em Faro, e autoriza a abertura de estabelecimentos noutras localidades. Consigna, ainda, o mesmo diploma a criação de uma comissão instaladora encarregada de apresentar, no prazo de um ano uma proposta de estruturação, localização dos estabelecimentos a criar, instalação e um plano de cursos, organizado de acordo com as características, potencialidades e necessidades da região e do País, nos seus aspectos económico, social e cultural.
Ao abrigo do Decreto-Lei n.º 46/83, de 18 de Junho, foram autorizados os cursos que conferiam o grau de licenciatura em Biologia Marinha e Pescas, Gestão de Empresas e Hortofruticultura.
Finalmente, no dia 30 de Outubro de 1983, deu-se início ao primeiro ano lectivo da Universidade do Algarve.
Fundava-se, assim, a primeira universidade de temática regional, aberta, dialogante e extrovertida, rompendo com a postura tradicional da universidade clássica, esotérica, quantas vezes alheada do País real e, quiçá, autista.
A Universidade do Algarve seria, de acordo com a filosofia defendida pelos seus fundadores, uma escola de cunho regional, tendo como prioridades o estudo dos problemas do Algarve e a elaboração de projectos que contemplem a diversidade do seu território e como objectivos naturais, para além da divulgação do saber, a valorização dos recursos naturais, a protecção do património cultural e natural, a definição das grandes linhas programáticas de ordenamento do território e a preparação de recursos humanos para as tarefas da regionalização, consignada na lei fundamental.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Só os países cultos são ricos. Sem um sistema de ensino efectivo, adequado e sem quadros técnicos bem preparados, não há desenvolvimento.
Na verdade, o atraso a que o Algarve esteve sujeito deve-se, em grande parte, à inexistência de uma universidade.
Os jovens que tinham a fortuna do acesso ao ensino superior não regressavam ao Algarve, por falia de oportunidades, e contribuíram, com o seu saber e inteligência, para o progresso de outras regiões.
Sendo a inteligência o património mais lucrativo, aos poucos, o Algarve foi-se descapitalizando e empobrecendo.
Assim se explica que o desenvolvimento que o Algarve hoje conhece se fique a dever à iniciativa de estrangeiros, sobretudo ingleses, porquanto a maioria dos naturais residentes, por falta de conhecimentos, apenas se dedicavam à prática da agricultura tradicional ou a funções intermédias e subalternas nos sectores secundário e terciário.
Ao saírem do Algarve, os nossos jovens desenraizaram-se e, quando se deu o surto da indústria turística, os postos de trabalho existentes foram preenchidos por indivíduos nascidos noutras regiões do País e mesmo no estrangeiro.
O Algarve tomou-se, gradualmente, naquilo que é hoje: uma região cujos naturais estão espalhados pelo resto do País e por texto o mundo e cujos habitantes talvez só cerca de metade sejam seus naturais, exercendo estes funções, até certo ponto, de menor projecção. Na verdade, no Algarve de hoje, quem domina as tecnologias de ponta, são em grande parte os estrangeiros ou nacionais nascidos noutras regiões, com especial relevo para os primeiros, a quem se deve a agricultura e as iniciativas fundamentais associadas ao turismo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Universidade do Algarve foi projectada para atingir uma população de 3000 alunos, ao fim de 15 anos de funcionamento. Ora, acontece que, no ano lectivo de 1990-1991, o número de alunos era de 1600 e, no ano de 1991-1992, a população escolar quase

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duplicou e passou para 3100. Isto é, atingiu-se, em 10 anos, o quantitativo estimado para 15 anos.
A Universidade abriu com um corpo docente composto por 25 elementos, dos quais apenas dois eram catedráticos. Passou, em 10 anos, para 319 docentes, sendo 92 o número de professores catedráticos.
A Universidade, que havia iniciado o seu funcionamento apenas com os ires cursos já indicados, hoje & constituída por quatro unidades de ensino universitário, três escolas de ensino politécnico e ainda cursos livres. A saber, o ensino universitário compreende: a Unidade de Ciências e Tecnologia Agrárias, a Unidade de Ciências Exactas e Humanas, a Unidade de Economia e Administração e a Unidade de Ciências e Tecnologias dos Recursos Aquáticos. Enquanto que o ensino politécnico contém: a Escola Superior de Educação, a Escola Superior de Tecnologia e a Escola Superior de Gestão, Hotelaria e Turismo.
No que respeita as instalações, a Universidade iniciou as suas actividades em pavilhões pré-fabricados, cedidos graciosamente por uma instituição de beneficência. Hoje, dispõe de infra-estruturas distribuídas por dois campus: o Campus da Penha, que abrange 14,50 ha, sendo a área coberta de 23 225 m2, que é a sede do Instituto Politécnico, e o Campus Universitário de Gambelas, com 20 ha e uma área coberta de apenas 5050 m2.
Ao abrigo do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 11/79, de 28 de Março, foram abertos estabelecimentos noutras localidades: Vila Real de Santo António, Lagos e Portimão.
Na prossecução dos objectivos com que foi criada, a Universidade do Algarve tem repartido a sua actuação por três grandes áreas: valorização dos recursos o humanos, investigação e apoio às actividades económicas e culturais da região.
Na área dos recursos humanos procura-se formar quadros técnicos capazes de assumirem a responsabilidade do desenvolvimento da região.
É gratificante saber que já obtiveram o seu diploma 421 alunos, sendo 209 com o grau de licenciai ura e 212 com o de bacharel, sem contar com os 786 professores que se formaram em serviço nos ensinos básico e secundário e com os cursos de pós-graduação em Estudos Superiores de Integração Europeia e Técnicas de Planeamento e Desenvolvimento Regional.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Universidade do Algarve define-se como uma escola de cunho regional que aponta para o estudo prioritário dos problemas locais com projectos que contemplem a diversidade do seu território, como já referimos.
Na consecução deste objectivo e no entendimento da investigação como factor de progresso económico, a Universidade do Algarve desenvolve, neste momento, cerca de 30 projectos de investigação, a maior parte dos quais suportados financeiramente por entidades públicas e privadas, o que constitui um assinalável êxito e o corolário de uma saudável e inteligente gestão.
Destacamos os seguintes projectos: impacte do Mercado Comum na economia portuguesa - contraio realizado com a Secretaria de Estado do Planeamento; programa de desenvolvimento das regiões transfronteiriças, em colaboração com a Universidade de Sevilha - contrato realizado com a Secretaria de Estado do Planeamento: estudo sobre sistemas hidropónicos - contrato realizado com uma entidade financeira ligada ao sector agrário; proieolíticos para o fabrico do queijo - contrato realizado com a Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica; aproveitamento dos resíduos sólidos das estações de tratamento de esgotos como fertilizantes - contrato com a Comissão de Coordenação da Região do Algarve; melhoramento da amendoeira e da figueira - contraio realizado com a Comissão de Coordenação da Região do Algarve; fotodegradação de pesticidas - contrato com o Instituto Nacional de Investigação Científica; cobertura sedimentar do quaternário no Algarve - contrato com o Instituto Hidrográfico; controlo ambiental e hormonal do crescimento da dourada - contrato celebrado com a CEE; estudos de base tendentes à conservação e valorização dos icliopovoamentos marinhos e gestão da pesca na costa sudoeste e paisagem vicentina - contrato com o Serviço Nacional de Parques, Reservas e Conservação da Natureza; o uso de lamas de depuração na agricultura - contrato com a Câmara Municipal de Loulé; potencial de pesca de stock de lulas no Atlântico Nordeste - contrato com a CEE; pesca experimental exploratória do caranguejo-da-fundura - contrato com a Comissão de Coordenação da Região do Algarve; impacte ecológico dos sistemas de aquacultura por jangadas e estratégias para controlar os fluxos de energia no ambiente marinho - contrato leito com, a CEE; utilização da esteva como fonte energética e de produtos químicos - contraio com a delegação regional do Ministério da Indústria e Energia; o nordeste Algarvio, persistência de formas de povoamento e de economia de subsistência - contrato com o INIC (Instituto Nacional de Investigação Científica); o presente do passado de Faro - contrato com a Câmara Municipal de Faro; a ria de Alvor, sua exploração e fixação humana, desde a Pré-História até aos nossos dias - contrato com a Câmara Municipal de Portimão; a Idade do Bronze no concelho de Aljezur. A necrópole de Corte Cabreira- contraio com a Camará Municipal de Aljezur; análise de comportamento do professor - contrato com o INIC; programa de investigação educacional -contrato com o Instituto de Investigação Educacional; torografia acústica para inonotorização geofísica dos fundos marinhos - contrato com a CEE; etc.
Acrescentamos ainda que, através do Programa Ciência, a Universidade do Algarve obteve um financiamento de 230 000 contos, destinado à instalação de um centro de desenvolvimento de ciências e de técnicas de produção vegetal, o que dará possibilidades acrescidas à investigação neste campo.
A Universidade do Algarve, atenta ao processo de desenvolvimento da região e no cumprimento da alínea 2), do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º. 11/79, de 28 de Março, que determina que os cursos a ministrar devem ler em conta as necessidades da região, assinou e tem em execução cerca de 40 convénios, que se traduzem em apoios às actividades económicas e culturais, locais, e consistem na realização de acções que, por diversos motivos, as instituições não conseguem efectuar e para as quais a Universidade se encontra vocacionada.
A saber: a criação de software para gestão - contratos com diversas empresas; o estudo económico para o Plano Director Municipal de Tavira - contraio com a autarquia e uma empresa privada; a análise de solos - contratos com diversas empresas; testes de materiais de construção; o uso de computadores nos ensinos primário, básico e secundário contraio com o Ministério da Educação; o apoio a comunidades com problemas de subdesenvolvimento - contraio com uma fundação estrangeira; a caracterização química de resíduos sólidos urbanos da região do Algarve e de outras regiões do País - contrato com uma empresa privada; parâmetros químicos da qualidade da água - contratos com empresas; controlo de qualidade em engenharia rural.

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caminhos e instalações eléctricas - contraio com a Direcção Regional de Agricultura do Algarve.
E com o objectivo de apoiar as actividades económicas foram criadas duas sociedades com participações de diversas empresas: a BIOTECNAR, dedicada aos temas da tecnologia alimentar e a CINTAL para as tecnologias de informação. Em laboratório, procede-se à análise de alimentos, aguas, efluentes e lixos urbanos.
Do exposto, é justo concluir que a Universidade do Algarve tem correspondido às melhores expectativas. No entanto, está longe de satisfazer as carências da nossa região, dado o deprimente atraso e flagrantes desvantagens comparativas em relação a outras regiões quer a nível de recursos humanos, onde se vê ainda forçada a importar quadros técnicos ou a entregar tarefas a elementos sem formação adequada com iodos os prejuízos que daí advêm.
Para que esta preocupante lacuna possa ser sanada e a Universidade tenha capacidade de resposta face à crescente procura, necessita de ampliar de imediato, as suas instalações.
O Algarve é uma região de grandes potencialidades que se mantinham improdutivas por falta de projectos de investigação, os quais estão agora em fase de arranque e, por esse motivo, necessitando de prementes incentivos.
E porque quem trabalha é merecedor do nosso apreço, endereço ao Sr. Presidente da Assembleia da República que seja portador, junto do Governo, da nossa mensagem e dos nossos anseios e recomende o apoio financeiro que a Universidade do Algarve carece para a prossecução dos projectos que estão elaborados e prontos a serem executados, nomeadamente: do edifício da Unidade de Ciências e Tecnologias dos Recursos Aquáticos; a conclusão das instalações definitivas no Campus de Gambelas; do edifício do complexo pedagógico do Campus de Gambelas, cuja construção poderá iniciar-se este ano, embora o quantitativo financeiro que lhe foi atribuído pelo PIDDAC também não permita a sua conclusão.
Sr. Presidente, solicitamos se digne certificar da possibilidade de transferência de verbas, de sectores que eventualmente por ausência de projectos atempados ou outras inércias não tenham capacidade de execução financeira, para a Universidade do Algarve, onde só a ausência de meios impede a sua concretização, assim como o vosso empenho junto do Governo no reforço do PIDDAC tradicional para 1993 a atribuir à nossa universidade.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apresentei aqui as condições de uma universidade de cujo futuro depende o próprio futuro do Algarve. Trata-se de uma região ferida, desde longa data, pela desatenção dos poderes e pelas ambições dos seus naturais que nela não encontraram resposta. O Algarve é um paraíso ameaçado. Temos por obrigação retomar o pleno que a natureza lhe traçou. Para isso, a Universidade, com todo o seu potencial de forças jovens, representa um grande meio de dinamização e de informação. O Algarve merece pessoas bem preparadas para o salvar de uma mediocridade de falsos lucros e precário espírito civilizador.
A Universidade precisa de apoios; os seus mestres merecem assegurar um destino maior do que o das suas praias e dos seus hotéis de férias. Tudo isso está bem, mas tem de ser vivido com algo mais do que a improvisação de mercado e a limitação da oferta. Julgar o Algarve uma cadeia de balneários naturais é julgar o mar uma banheira. O Algarve é uma terra admirável de que temos de orgulhar-nos. Não se troca simplesmente a luz do sol por divisas. É preciso que os homens aprendam isso e só a Universidade lhes dará as razões próprias para não provar. Peço mais do que justiça: peço boa fé e decisões atempadas!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria da Conceição Rodrigues.

A Sr.ª Maria da Conceição Rodrigues (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao assumir, hoje e aqui, a palavra, não escondo a minha satisfação pelo facto de, pela primeira vez, o meu distrito contar nesta Câmara com duas vozes do PSD.
É precisamente acerca do distrito de Portalegre e de algumas das suas questões fundamentais que me debruçarei hoje, procurando fugir aos temas abordados, há algumas semanas atrás, pelo meu colega de bancada João Maçãs.
Na sua intervenção, ele tocou essencialmente aspectos ligados à implementação da OID (Operação Integrada de Desenvolvimento) e seu impacte na vida da região.
Pela minha parte, desejaria debruçar-me, principalmente, sobre a problemática ligada as áreas sociais nas suas vertentes laboral, prestação de serviços de saúde, segurança social e educação.
Sem pretender transformar as minhas palavras num discurso pautado pelo optimismo, procurarei assumir uma postura consentânea com a realidade, não podendo deixar de dizer que muito existe para fazer mas que também grande foi a obra levada a cabo nos últimos anos.
Não lenho a menor dúvida, hoje, em assegurar que o distrito de Portalegre sofreu uma enorme transformação, resultando aos olhos de quem o conheceu, mesmo no passado recente, de forma verdadeiramente notável. Tratou-se de uma séria tentativa de o arrancar do marasmo e atraso em que, infelizmente, mergulhou, ao longo de décadas.
Atraso, desde logo, por ser uma região cuja principal fonte de receita reside num sector primário pouco promissor, associado ao facto de se localizar no interior, com difíceis acessos, uma população envelhecida e cada vez mais reduzida, graças ao forte surto emigratório.
Situação verdadeiramente injusta esta, porquanto, não se tratando também de uma região fortemente industrializada, é, no entanto, detentora de grandes potencial idades em termos de recursos naturais, já não falando no carácter das suas gentes, vincado por inúmeras tradições culturais e espírito hospitaleiro.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Entrando mais concretamente na matéria e designadamente no que respeita ao emprego, também nós, em pleno Alentejo, não fugimos à regra.
Até 1985, não só não se criaram postos de trabalho como era notória u sua diminuição. Esta é uma realidade inquestionável, por muito que nos doa, e foi também uma realidade que só mudou graças ao clima de confiança que foi possível gerar-se, sobretudo, nos últimos dois a três anos, com o aparecimento de nova legislação laboral, verdadeira reforma estrutural, da aposta no diálogo social e do investimento que se fez em matéria de formação profissional.
Nos últimos três anos, verificou-se uma muito maior cobertura do subsídio de desemprego e subsídio social de desemprego, relativos ao número global de desempregados. Através dos programas ocupacionais, foi possível ocuparem-se, nos últimos dois anos e meio, cerca de 2200 trabalhadores sazonais e desempregados de longa duração, criando-se cerca de 1700 novos postos de trabalho, de 1987 a esta parte.

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Igualmente, não podemos queixar-nos, no que respeita a infra-estruturas. Verificou-se a construção do Centro de Emprego de Elvas; abriu, há cerca de ano e meio, o de Ponte de Sor e encontra-se em fase adiantada de construção o novo Centro de Emprego de Portalegre, tendo sido inaugurado, o ano passado, um excelente centro de formação profissional também na capital do distrito.
Permitam-me que sublinhe a importância deste investimento, já que veio suprir inúmeras carências. Funcionam nele mais de uma dúzia de cursos que lançam no mercado local de trabalho pessoas habilitadas a desempenhar com propriedade funções que vão desde a informática aos mais variadas ofícios. Se atenderem, Srs. Deputados, as características do distrito, como campeão do envelhecimento e desertificação, certamente acompanhar-me-ão na relevância que lhe atribuo. Na verdade, não há eficácia ao nível do tecido económico nem possibilidade de absorção de novas tecnologias sem a existência de uma adequada formação profissional.
Se o combate ao desemprego e a criação de novos postos de trabalho é importante, sem dúvida que o não é menos a questão da saúde. Uma sem a outra inviabiliza qualquer hipótese de bem estar, de qualidade de vida, lança o Homem na angústia e no desespero, desencadeia a infelicidade.
Em matéria de saúde, diria que um grande esforço tem sido feito, quer a nível central quer regional, e também aqui as infra-estruturas e os equipamentos surgiram.
Nos últimos três anos foram abertos novos centros de saúde nos concelhos de Marvão, Avis e Monforte, estão em construção os de Ponte de Sor, Campo Maior e Elvas e abriu-se concurso público para a construção do de Arronches, para além de cerca de uma dezena de extensões de saúde e de uma obra de que há muito se necessitava, que é o Hospital Distrital de Elvas.
No entanto, não gostaria que se entendesse que tudo está bem no que à saúde se refere no distrito de Portalegre. Infelizmente, isso não acontece apesar do enorme trabalho levado a cabo. É que, de facto, o peso da interioridade também aí se manifesta e de que maneira! Muito embora a evolução de efectivos seja considerável, a verdade é que falta pessoal especializado, faltam médicos no distrito, sobretudo nos concelhos mais marcadamente rurais.
E esta enorme carência não tem podido ser ultrapassada apesar da abertura de concursos e de múltiplas diligências levadas a cabo no sentido de sensibilizar esses profissionais a deslocarem-se para a província. A tendência ainda é, compreensivelmente, para fazerem a sua carreira nos grandes centros, conduzindo regiões como a minha a graves dificuldades, porquanto, por vezes, levam a que o atendimento permanente não seja possível em alguns concelhos.
Esta é uma realidade que prejudica o esforço que se vem fazendo em lermos de investimento e muito embora o resultado do inquérito leito pela ARS (Administração Regional de Saúde) em três concelhos (Ponte de Sor, Avis e Portalegre) aponte para uma melhoria no campo da prestação de serviços de saúde, deixa-nos a todos obviamente preocupados pela inevitável sensação de desamparo que as populações, que nessa situação se encontram, naturalmente sentem.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Comecei esta minha intervenção dizendo que o meu distrito se tinha modificado muito ao longo destes últimos anos e procurei identificar-vos com ele no que à parte laboral e à saúde respeito.
Com a mesma simplicidade e igual realismo, permitam-me ainda que vos fale um pouco sobre segurança social e educação, já que nestas áreas a atenção do governo social-democrata se manifestou de forma tão importante ou mais do que nos anteriormente focados.
Diria que ao mencionar-se a interioridade, imediata e interiormente, somos transportados a situações de grande despovoamento e, consequentemente, de envelhecimento das populações.
O meu distrito é, como sabem, o mais marcado por esta triste realidade e foi também uma região extremamente sacrificada, onde os mais velhos e menos favorecidos pela sorte viveram situações de verdadeiro abandono, salvo quando os familiares deles se puderam ocupar.
Hoje, apesar de as reformas ainda não corresponderem ao que desejaríamos e eles merecem-, a situação foi completamente alterada, sobretudo se associarmos esta realidade a um importantíssimo conjunto de estabelecimentos sociais de apoio à terceira idade e à infância.
Nos últimos cinco anos o número de IPSS quase duplicou no distrito de Portalegre, sendo a cobertura praticamente a 100 % no que à terceira idade respeita. Existem 28 lares de idosos, 37 centros de dia e 29 serviços de apoio ao domicílio, para além de creches, jardins infantis, lares de crianças, centros de convívio e ATL dispersos por todo o distrito, contribuindo assim para que sejam mais felizes os que deram uma vida para o engrandecimento da sua terra e aqueles a quem incumbe projectar a sua obra no futuro.
Em relação à segurança social, terminaria fazendo uma referência ao moderno e funcional edifício, sede do centro regional, obra recente que muito orgulha a região e facilita a vida aos utentes.
Finalmente, Sr. Presidente e Srs. Deputados, permitam-me que manifeste a minha alegria ao abordar a educação no meu distrito.
E hábito dizermos que apostar na educação é investir no futuro.
Cada vez interiorizo mais esta verdade e me congratulo pela obra que os governos do Prof. Cavaco Silva aí levaram a cabo.
Muito rapidamente, porque não quero maçá-los mais, dir-vos-ei que passámos de uma situação muito má, em alguns casos péssima até, para nos situarmos, hoje, como o distrito que dispõe do melhor parque escolar do País. E não se pense, Srs. Deputados, que com isto pretendo apenas enaltecer a obra do Governo.
Todos os concelhos possuem, hoje, escolas C+S, melhorou-se a Escola Superior de Educação, criou-se a Escola Superior de Tecnologia e Gestão, a qual ainda se encontra a funcionar em instalações provisórias, estando as definitivas para lançamento breve de construção. Contamos com uma excelente residência de estudantes para alunos dos ensinos preparatório e secundário e estamos a desenvolver esforços para a criação de uma residência para estudantes do ensino superior.
Como as C+S da capital do distrito se encontram superlotadas, encontra-se praticamente na fase de arranque uma nova escola, a do Ribeiro do Baco, a qual servirá uma das zonas mais populosas da cidade.
Igualmente para obviar às grandes dificuldades de alojamento dos serviços do Ministério da Educação, que se encontravam dispersos e mal instalados, foram adquiridas instalações onde se encontram a funcionar,, há cerca de três meses, os Serviços de Coordenação da Área Educativa do Alio Alentejo em condições de dignidade.
Posto isto - e vou terminar -, espero ter deixado, aos que conhecem o distrito de Portalegre, a imagem de que ele já não é o mesmo de outrora e àqueles outros que ainda o não conhecem a firme vontade de o visitarem.

Aplausos do PSD.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 16 horas e 49 minutos.

O Sr. João Rui de Almeida (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra. Sr. Deputado.

O Sr. João Rui de Almeida (PS): - Sr. Presidente, o Grupo Parlamentar do PS requer à Mesa a interrupção dos trabalhos por um período de 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, é regimental. Está suspensa a sessão por 30 minutos.

Eram 16 horas e 50 minutos.

Srs. Deputados, está reaberta a sessão. Eram 17 horas e 45 minutas.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos dar início ao período da ordem do dia, com a discussão conjunta dos projectos de resolução n.ºs 4/VI e 22/VI, da iniciativa do PCP e de Os Verdes, respectivamente, relativos à Convenção sobre Ambiente e Desenvolvimento no Rio de Janeiro, no próximo mês de Junho.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Urbano Rodrigues.

O Sr. Miguel Urbano Rodrígues (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos a duas semanas da abertura da Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente e o Desenvolvimento (CNUED). Ela é tão significante para o futuro da humanidade que recebeu a designação simbólica de Cimeira do Planeta Terra.
No Rio de Janeiro, representantes de quase todos os povos do Mundo vão esforçar-se por aproximar dois objectivos, que deveriam ser convergentes e, na prática, tom sido contraditórios. Nesta viragem do século, o desenvolvimento, tal como é planeado e se concretiza nos países industrializados, agride o ambiente.
É neste contexto que a Assembleia da República aprecia hoje dois projectos de resolução, um do Partido Comunista Português, outro de Os Verdes, que visam aprofundar o debate sobre a Cimeira da Terra.
Ao propor, em Janeiro passado, que a Assembleia promovesse uma Convenção sobre Ambiente e Desenvolvimento, o meu partido pretendia criar um espaço para levantamento de questões relevantes em Portugal naquelas áreas e contribuir assim para uma clarificação das posições do País na Cimeira da Terra. A iniciativa permitiria simultaneamente sensibilizar a opinião pública nacional para os grandes problemas económicos, políticos e sociais que estarão em debate no Rio de Janeiro.
Por motivos que não cabe aqui analisar, os projectos do PCP e de Os Verdes estão decisivamente prejudicados quanto aos seus objectivos. A Cimeira da Terra está prestes a começar. A Assembleia ficou à margem do grande debate prévio.
Srs. Deputados, seria ingénuo esperar que a participação portuguesa no grande acontecimento respondesse ao mínimo exigível. O Governo limitou-se a produzir uns «relatoriozecos», como muito bem escreveu o meu camarada João Amaral no Jornal cie Notícias. O principal, redigido num português de matizes gongóricos, com enxertos de cientifismo duvidoso, chama sobretudo a atenção por conter parágrafos quase ininteligíveis.
Nas vésperas da abertura da ECO-92 uma chuva de críticas desaba na Europa sobre a Presidência portuguesa das Comunidades. São justíssimas. Organizações internacionais ligadas h defesa do ambiente censuram a displicência com que os representantes de Portugal conduziram os trabalhos preparatórios da Conferência do Rio.
O director do Bureau Europeu do Ambiente, Van Ermen, em entrevista ao semanário Expresso foi muito explícito: «O papel representado pela Presidência portuguesa nos trabalhos preparatórios de Nova Iorque foi fraco, não tendo havido uma verdadeira liderança. O embaixador português que conduziu as reuniões não estava à altura do encontro. Faltaram grupos de trabalho com capacidade e propostas de textos concretos para discutir».
As enérgicas teses do ministro Carlos Borrego sobre o lixo tóxico não encontraram tradução na prática.
«Não o vemos fazer nada» - comentou com razão a Greenpeace. «Como Presidente do Conselho de Ministros do Ambiente teria de apresentar propostas que forçassem decisões.»
Mas ficou de braços cruzados. Será por acaso que, há dias, a Comissão Europeia criticou no Parlamento Europeu a actuação da Presidência portuguesa, por omissa?
No tocante a defesa do ambiente tivemos, aliás, nesta Assembleia na última sexta-feira, uma prova concreta da teia de mentiras, em que o Governo se envolve. Os moradores de Riba de Ave arrancaram-lhe a máscara.
Srs. Deputados, o combate à contradição real, na prática da vida, entre o crescimento económico selvagem e o ambiente é uma vez o primeiro objectivo da Conferência do Rio de Janeiro. As sociedades mais ricas do planeta não encontraram até hoje soluções capazes de neutralizar estratégias que colocam a busca do lucro ilimitado como fim supremo da actividade social. Acontece que no limiar do século x» essas estratégias egoístas, além de aprofundarem o abismo já existente entre o Norte e o Sul, ameaçam a própria sobrevivência da humanidade.
Algumas gerações viveram no pós-guerra marcadas pelo pesadelo do holocausto nuclear. Hoje, o temor de que a Terra fique inabitável é outro. Nasce da agressão ao ambiente, resultante de uma concepção selvagem e egoísta do desenvolvimento económico. Os interesses das empresas transnacionais e a ideologia do consumo, sustentados pela ditadura mundial da tecnocracia, tornaram-se incompatíveis com uma nova ordem ecológica, humanizada, respeitadora dos ecossistemas, que garanta no nosso planeta, cada dia mais devastado e poluído, uma qualidade de vida satisfatória.
O diagnóstico do crime está feito. Assusta. Os países industrializados do Norte geram 90 % dos resíduos perigosos e emitem 74 % do dióxido de carbono que contribui para o sobreaquecimento do planeta. Produzem praticamente a totalidade do clorofluorcarbono, o temível CFC que destrói a camada de ozono - escudo natural contra os raios ultravioletas. A diminuição da camada de ozono - responsável pelo chamado efeito de estufa - atingiu no hemisfério Norte níveis entre 4 % e 8 % na última década.
Em certas regiões dos EUA, na transição do Inverno para a Primavera, a redução da camada, embora transitoriamente, chega aos 40 %. Segundo Robert Wilson, director dos Estudos e Processos Científicos da NASA: «se hoje fosse

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paralisada toda a produção do gases que afectam a camada de ozono, a camada destruidora já acumulada faria perdurar o chamado buraco antárctico até ao ano 2075».
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Temos de nos unir para defender o planeta ameaçado. Segundo o Programa das Nações Unidas para o Ambiente, a temperatura eleva-se perigosamente, o que faz subir o nível dos oceanos; Se a temperatura aumentasse de 1ºC a 4,5ºC nos "próximos 60 anos, o nível dos mares poderia subir um metro. Seria uma tragédia para cidades como Buenos Aires, Calcutá, Tóquio, Rio de Janeiro e, também, para Lisboa e Porto. Mais de 22 mil espécies animais e vegetais ficariam ameaçadas de extinção.
Situações adequadas a filmes de ficção-científica principiam a produzir-se, como realidades concretas, inundo fora: Na Austrália, as culturas do trigo e da ervilha foram já geneticamente afectadas. Os cancros da pele triplicaram. Do Chile chegam notícias dolorosas. Na cidade de Puerto Montt; no Sul, o trágico envelhecimento prematuro das pessoas é uma consequência da ruptura da camada de ozono: O cancro da pele e as doenças oculares alastram ali.
Na Dinamarca, o governo lançou apelos pela televisão para que as crianças se protejam com chapéus e óculos solares. O sol, que foi sempre um bem da natureza, começa a tomar formas de inimigo. O céu puro do início do século é hoje memória e saudade.
Maurice Strong, secretário da Cimeira da Terra, adverte a humanidade de que para se travar, a destruição do ambiente serão necessários 125 mil milhões de dólares por ano - o dobro do PIB português. José Lizzarga, director do Programa das Nações Unidas para o Ambiente (PNUMA), sublinha que não se exigem esmolas "dos países ricos, mas apenas que eles assumam a sua responsabilidade no combate - porque de uma luta difícil se trata pela sobrevivência do Homem.
Infortunadamente, o governo da mais poderosa das nações, os EUA, tem sido aquele que mais tem dificultado os consensos indispensáveis para a concretização de uma política humanista de preservação do ambiente. Os EUA é o país que mais contamina e destrói o ambiente. Emite mais de 26 % dos gases que aquecem a atmosfera e uma enorme percentagem do gás que destrói o ozono.
Srs. Deputados, o presidente George Bush estará presente no Rio de Janeiro. (Desejamos que anuncie uma mudança de política. Nas reuniões internacionais preparatórias da Cimeira isso, entretanto, não aconteceu. Em Nova Iorque e Paris, a delegação norte-americana vetou o objectivo principal. O projecto de convenção sobre o efeito de estrutura perde toda a força porque não será de cumprimento obrigatório. Os EUA, demarcando-se da CEE, negam-se a reduzir, até ao ano 2000, as emissões de dióxido de carbono (CO2), não ultrapassando os níveis de 1990.
O presidente George Bush, em defesa da opção americana, duramente criticada na Europa, alega que as grandes indústrias do seu país sofreriam prejuízos colossais. Recusa medidas que levariam a um choque entre a Administração e os grupos do petróleo, do carvão, do automóvel e dos armamentos, campeões da poluição.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tudo o que se diga no Rio sobre a defesa das florestas tropicais e quaisquer medidas tomadas para preservação da Hilea amazónica, pulmão da Terra, tudo isso será efémero e ilusório se as fontes da destruição acelerada do ambiente não forem contidas e neutralizadas. Fala-se na criação de um Conselho da Terra, onde participariam todos os chefes de Estado do planeta. A Itália sugere um Tribunal Internacional do Ambiente. Mas os mais
belos projectos serão pouco mais do que inócuos se os Estados poluidoras não mudarem de política. A tese da self regulation, defendida pelas grandes empresas transnacionais, é objectivamente criminosa Os seus resultados estão à vista.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O homem destruiu mais o ambiente nas últimas décadas do que ao longo dos 5000 anos transcorridos desde as primeiras civilizações por ele criadas. Estamos na beira do abismo. A Cimeira do Rio não é somente um conflito entre duas concepções antagónicas do desenvolvimento, não é apenas um episódio no choque, hoje dramático, entre o Norte e o Sul. O que ali se discute é, afinal, a continuidade da vida.
O planeta Terra é a pátria comum do Homem. Temos de o defender, juntos. Não temos outro. Somos todos iluminados pelo mesmo Sol.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Martins.

O Sr. André Martins (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de resolução n.º 22/VT, da iniciativa do Partido Ecologista Os Verdes, tinha como objectivo que a Assembleia da República se associasse às recomendações das Nações Unidas para promover, ao nível planetário, um debate que fomentasse a informação e a participação de todos os povos do Mundo, relativamente à importância que a Cimeira da Terra tem para o futuro de todos nós...
Este foi o objectivo primeiro, que esteve na origem da apresentação do nosso projecto, em 23 de Abril passado, na Assembleia da República. Aliás, a sua apresentação vem na sequência da decisão' anunciada aqui, na Assembleia da República, aquando da interpelação que fizémos ao Governo sobre política de ambiente è ordenamento do território, em 31 de Março passado, precisamente no seguimento do desafio que fizemos ao Governo para que a partir de então fizesse aquilo que até ali não linha feito, isto é, promover na sociedade portuguesa debates, envolvendo a sociedade civil, as organizações não governamentais, no sentido de preparar a Cimeira da Terra. O Governo assim não o entendeu. Portanto, recusou-se a cumprir aquilo que foram as recomendações das Nações Unidas ao convocar essa Conferência.
Esta nossa iniciativa está prejudicada, como já disse aqui o Sr. Deputado Miguel Urbano Rodrigues, porque não é nos próximos oito dias que a Assembleia da República vai promover um debate de forma a preparar o Governo, que irá representar o nosso país na Cimeira da Terra.
No entanto, não está ainda posta de parle a possibilidade - e lançamos aqui este desafio - de a Assembleia da República organizar um debate com vista a contribuir para á divulgação pública, para o envolvimento dos Portugueses nas questões importantes que vão ser tratadas na Cimeira da Terra e no que se refere ao futuro comum, na responsabilidade colectiva que todos temos; para que não caminhemos mais aceleradamente para o abismo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Julgo que está justificada a responsabilidade que assumimos neste processo e que, o Governo não quis assumir. Compreendemos certamente as razões do Governo, algumas delas estão, inclusive, bem expressas na própria constituição de uma comissão nacional preparatória da Conferência, em que, para além dos representantes dos ministérios, apenas envolveu um represen-

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tante das associações ambientalistas, e nem sequer considerou os municípios.
Como sabemos, a política de ambiente em Portugal, para além de dizer respeito a todos os portugueses, é uma questão fundamental a ser conduzida pelas autarquias deste país, com o envolvimento de iodas as associações de ambientalistas neste processo. De facto, o Governo recusou-se a promover este envolvimento.
Quando o Sr. Ministro do Ambiente e Recursos Naturais apresenta um relatório, que é a contribuição portuguesa para a preparação da Conferência, e afirma no seu preâmbulo que, em meados de 1991 ao interrogamo-nos sobre qual a expectativa em relação à política de ambiente em Portugal, a resposta não poderia deixar de ser positiva, isto é, conseguir-se um crescimento económico importante nos últimos quatro anos sem que houvesse aumento da degradação ambiental, isto é significativo, Srs. Deputados! O que é que encerra esta afirmação?
Já demonstrámos aqui, aquando da nossa interpelação ao Governo, que o estado do ambiente em Portugal se agravou significativamente nos últimos sele anos. O Livro Branco do Ambiente, cuja elaboração é da responsabilidade do Sr. Ministro, assinala o acentuar da degradação do estado do ambiente em Portugal. Mas depois o Sr. Ministro faz um relatório, que é uma contribuição de Portugal para a Conferência, e diz que o estado do ambiente em Portugal não se alterou, referindo-se apenas à evolução positiva do crescimento económico.
Isto é significativo do que está por detrás do não cumprimento das recomendações das Nações Unidas, ao não promover um debate alargado em Portugal sobre a importância desta Conferência.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Moreira.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por dizer a Câmara que vou apenas referir-me àquilo que está em discussão, ou seja, aos projectos de resolução do PCP e de Os Verdes. Não vou, portanto, abordar os temas e os objectivos da Conferência do Rio.
Para o PSD a Conferência das Nações Unidas sobre Ambiente e Desenvolvimento, a realizar de 1 a 12 de Junho, no Rio de Janeiro, pelos temas que vai abordar, assume uma vital importância para o futuro da humanidade.
Por isso o PSD deu o seu apoio activo à proposta do Partido Ecologista Os Verdes, apresentada no âmbito da Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente, no dia 27 de Abril, e discutida na reunião da Comissão, de é de Maio, para a realização, em tempo útil, de um debate público sobre as questões a tratar e os objectivos da Conferência das Nações Unidas sobre Ambiente e Desenvolvimento.
Acontece, porém, que, com o agendamento para o dia de hoje, no Plenário da Assembleia da República, do projecto de resolução n.º 4/VI, do PCP, que propõe a realização de uma convenção sobre ambiente e desenvolvimento, no âmbito da participação de Portugal na Conferência das Nações Unidas sobre Ambiente e Desenvolvimento, e o projecto de resolução n.º 22/VI, do Partido Ecologista Os Verdes, que propõe a organização de um debate sobre a Conferência da Organização das Nações Unidas sobre Ambiente e Desenvolvimento, pareceu-nos que só faria sentido a aprovação de imediato, na comissão especializada, da proposta do Partido Ecologista Os Verdes, se os projectos de resolução que estamos hoje aqui a discutir fossem retirados, dado a Comissão, assim e desde logo, se propor organizar e realizar o debate público sobre a Conferência do Rio de Janeiro.
Não foi esse o entendimento do PCP e do Partido Ecologista Os Verdes, e, por isso, com a sua teimosia, perdemos duas indispensáveis e preciosas semanas para a realização, em tempo útil, do referido debate.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero também aqui referir o facto de o projecto de resolução n.º 4/VI, do PCP, ter dado entrada na Mesa da Assembleia da República em 15 de Janeiro e de este partido, estranhamente, nunca o ter agendado. Para tal foi preciso que o PSD, na Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares, tivesse proposto o seu agendamento para o dia de hoje, em conjunto com o projecto de resolução n.º 22/VI, do Partido Ecologista Os Verdes.
O projecto de resolução do PCP propunha as datas de 15, 1é e 17 de Maio para a realização da convenção, datas essas já ultrapassadas. Daqui se conclui facilmente que o PCP nunca esteve efectivamente interessado em realizar esta convenção, porque, se o estivesse, já teria forçado o agendamento deste seu projecto de resolução há muito mais tempo.
Em relação ao projecto de resolução do Partido Ecologista Os Verdes, o conteúdo da resolução proposta é perfeitamente irrelevante, uma vez que a discussão e preparação da participação portuguesa na Conferência do Rio de Janeiro está decidida há vários meses.
O PSD considera que foi pena não se ler aprovado, no dia é de Maio, na Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente, a proposta do Partido Ecologista Os Verdes para a realização, em tempo útil, de um debate público sobre a Conferência do Rio, porque este debate seria mais uma tias fornias de sensibilização da comunicação social e da opinião pública portuguesa para a referida conferência.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Assim, temos todos de reconhecer humilde e realisticamente que, sendo hoje 19 de Maio e iniciando-se a Conferência do Rio de Janeiro no próximo dia 1 de Junho, não há já tempo suficiente para se organizar este debate e, por isso, o PSD declara, desde já, a sua total disponibilidade para, no âmbito da Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente, fazer a avaliação dos resultados da Conferência do Rio de Janeiro, apesar das dificuldades que subsistem, que esperamos sejam ultrapassadas e que os seus resultados sejam positivos para o futuro da Terra e da Humanidade e para um ambiente mais equilibrado e saudável.
(O Orador reviu.)

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se para pedir esclarecimentos os Srs. Deputados André Martins e Miguel Urbano Rodrigues.
Tem a palavra o Sr. Deputado André Martins.

O Sr. André Martins (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Moreira, quero começar por me solidarizar com as palavras com que acabou a sua intervenção. Aliás, penso que nelas, contrariamente ao que pretendeu afirmar, estão subjacentes todas as nossas intervenções nesta Assembleia, incluindo o projecto de resolução que apresentámos e a proposta que apresentámos à Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente, precisamente em 27 de Abril, como referiu.

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Sr. Deputado Manuel Moreira, nós pensamos que o espectáculo ó bom e faz bem porque é também uma forma de o homem participar na vida colectiva. No entanto, há tempos de trabalho durante os quais o espectáculo não é admitido e muito menos quando se trata de questões tão sérias como esta, como o Sr. Deputado reconheceu.
Ora, a questão que se põe é esta, Sr. Deputado - e isto foi explicado por mim na Comissão: o Partido Ecologista Os Verdes apresentou uma proposta na Comissão, no sentido se esta assumir a responsabilidade de promover um debate público e, precisamente o Sr. (Deputado, quando esta proposta foi apresentada na Comissão, entendeu que o Grupo Parlamentar do PSD iria reflectir sobre ela e que, depois, numa próxima reunião, oito dias depois, se pronunciaria sobre ela.
Precisamente oito dias depois, a Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares da Assembleia da República entendeu agendar para hoje os projectos do PCP e de Os Verdes e, quando, à tarde, a reunião da Comissão teve lugar, dei conhecimento desta situação à Comissão. O Sr. Deputado Manuel Moreira, coordenador do PSD na Comissão, disse então que o PSD eslava disponível para aprovar a nossa proposta, mas exigindo que Os Verdes retirassem este projecto do agendamento.
Ora, Sr. Deputado, é necessário, como aqui ficou demonstrado, que tenhamos em consideração duas coisas: uma primeira é que aquilo que estava em causa no projecto de resolução não tem a ver com a proposta que apresentei na Comissão. Ou seja, o que o projecto de resolução propunha era que a Assembleia promovesse um debate público para preparar a participação de Portugal na Conferencia do Rio.
Na proposta que apresentei na Comissão propõe-se que esta promova um debate público para que se sensibilize e se informe a opinião pública sobre os grandes e graves problemas que vão ser tratados na Conferência do Rio. Portanto, Sr. Deputado, uma coisa não inviabiliza a outra e vir aqui dizer que nós, teimosamente, não aceitámos a proposta do PSD é fazer espectáculo sobre uma questão tão séria como esta e nós não aceitamos esse tipo de espectáculo. O nosso comportamento, a nossa postura, aqui no Plenário ou na Comissão, tem sido sempre pautado pela coerência e, portanto, continuaremos a fazê-lo. Agora, não aceitamos que se faça espectáculo, como o Sr. Deputado pretendeu aqui fazer.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Urbano Rodrigues.

O Sr. Miguel Urbano Rodrigues (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Moreira, verifiquei, com alguma melancolia, que, num momento em que são feitas as mais graves acusações, dentro e fora do País, à política de ambiente do Governo do seu partido (e eu, ao falar, empreguei a palavra «chuva» em cascata), lendo a ausência do Sr. Ministro Carlos Borrego sido criticada até no Parlamento Europeu. As organizações ambientais l alam da omissão e da displicência com que a Presidência portuguesa se comporto nas conferências preparatórias em que se discutia um acontecimento que é da máxima importância para toda a humanidade. E essas omissões foram reais, estão na imprensa internacional e o Sr. Deputado Manuel Moreira vem agora trazer para aqui a questão do agendamento!
O Sr. Deputado está aqui há mais anos do que eu e sabe perfeitamente que há um partido, que é o seu, que tem a maioria e que, na Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares, toda a questão do que é ou não agendado depende, em última análise, da vontade do seu partido. Mas, mais do que isso, esta não era realmente a questão com se deveria prender neste momento. O Sr. Deputado disse mesmo que não ia referir-se à conferência que se inicia dentro de poucos dias no Brasil, da qual a humanidade está pendente porque dela depende o destino e a sobrevivência do homem.
Ora, num momento em que, superando divergências ideológicas e partidárias, se fala que os homens se devem unir para defender o planeta e as civilizações nele criadas, o Sr. Deputado está preocupado com a pequeníssima defesa do seu partido num caso destes e não com a problemática da Humanidade no planeta a que pertencemos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, Vem á palavra o Sr. Deputado Manuel Moreira.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em bom rigor os Srs. Deputados que me interpelaram não disseram nada de novo e devo dizer que devolvo o epíteto «espectáculo» ao Sr. Deputado André Martins, porque julgo também que quem faz espectáculo são aqueles partidos que apresentam projectos de resolução - como é o caso do PCP que o apresentou em 15 de Janeiro e não os agendam.
Foi preciso o PSD, como referi na minha intervenção, propor o seu agendamento para que hoje pudéssemos aqui discutir esse projecto, bem como o do Partido Ecologista Os Verdes, e, como tal, julgo que essa atitude de propor as iniciativas e não as agendar em tempo útil é que é uma atitude irresponsável, demagógica e de espectáculo.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - É verdade.

O Orador: - Porque se queríamos - e queríamos todos - fazer um debate sério sobre os objectivos e sobre os temas que vão ser abordados na Conferência do Rio, devíamo-lo ter leito há muito mais tempo e não apenas a 15 dias da Conferência, como disse o Sr. Deputado Miguel Urbano Rodrigues.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - É ignorante, surdo ou quê?!

O Sr. André Martins (Os Verdes): - Peça essa responsabilidade ao seu Governo.

O Orador: - A responsabilidade é sua, Sr. Deputado André Martins, bem como do PCP, na medida em que nós, no dia 6 deste mês, quando aderimos à vossa proposta, no âmbito da Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente, podíamos, ainda durante o corrente mês, preparar esse debate. E tínhamo-lo feito.

O Sr. André Martins (Os Verdes): - Ainda estamos a tempo. Uma questão não inviabiliza a outra.

O Orador: - Ora, os senhores não quiseram e, por isso, não estavam efectivamente interessados nele. Têm de reconhecer que não estavam interessados em fazer um debate público nem em associar esta Assembleia aos objectivos da Conferência do Rio.

Protestos do PCP e de Os Verdes.

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O Orador: - Por isso, Srs. Deputados, julgo que, efectivamente, deve haver mais humildade e seriedade quando se tomam as iniciativas para que elas tenham eleito útil.
(O Orador reviu.)

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Mais humildade. Boa receita!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Gameiro dos Santos.

O Sr. Gameiro dos Santos (PS):- Sr. Presidente, Srs. Deputados: A reduzida e insuficiente informação sobre a Conferência das Nações Unidas para o Ambiente e Desenvolvimento justifica plenamente a aprovação dos projectos de resolução n.ºs 4/VI, do PCP, e 22/VI, de Os Verdes, ambos com o objectivo de promover, sob a égide da Assembleia da República, um amplo debate sobre tal temática.
Questões fundamentais para o desenvolvimento harmonioso e equilibrado do Mundo não podem ser tratados unicamente por cientistas e políticos.

O Sr. Rui Ávila (PS): - Muito bem!

O Orador: - É urgente a participação activa de iodos os cidadãos, sejam eles técnicos ou especialistas, representantes de associações de defesa do ambiente ou de associações de desenvolvimento regional, representantes da Administração Pública Central ou das autarquias locais, representantes das associações económicas ou sindicais, professores ou alunos, jornalistas, etc.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A falia de iniciativa do Governo em matéria tão importante é confrangedora. O Ministro do Ambiente do país que preside actualmente à Comunidade Económica Europeia tem revelado uma grande falta de iniciativa e protagonismo político nesta matéria. Desde logo porque, no âmbito interno, não promoveu, como lhe competia, um grande debate nacional sobre o ambiente e o desenvolvimento e, no âmbito externo, não conseguiu levar os nossos parceiros da Comunidade Económica Europeia a assumir, frontalmente, propostas concretas a apresentar na Conferência do Rio de Janeiro.
Lamentavelmente, não temos ministro do Ambiente. Só hoje, decorridos quase cinco meses da Presidência portuguesa da CEE, o Ministro Carlos Borrego se mostra muito preocupado com o vazio criado à volta da Conferência do Rio de Janeiro, que pode transformar-se num mero passeio turístico de políticos pouco interessados em concertar soluções para salvar o Mundo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao contrario do que seria de esperar a menos de um mês da Conferência do Rio, os principais dossiers continuam bloqueados: não há objectivo definido para a redução de emissões de dióxido de carbono, apesar de, inicialmente, se ler apontado para atingir rapidamente o nível de 1990; não se concretizaram princípios e regras para a transferência de tecnologia para os países do Sul, de forma a ultrapassar a situação de miséria em que vivem; não se esclareceu o envelope financeiro. Quem vai pagar a conservação da Natureza e do Mundo? Já há acordo no seio da CEE. E o que pensam o Japão e os EUA sobre tudo isto?

Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo continua calado e insensível ao que pode acontecer no nosso planeta caso não se alterem significativamente as políticas de ambiente e de desenvolvimento. É que o aumento da erosão e acidificação dos solos, a contaminação das águas de superfície e subterrâneas, a destruição maciça da floresta, o contínuo efluir de gases para a atmosfera, designadamente o dióxido de carbono e os CFC, não nos augura nada de bom para o futuro da humanidade. E iodos nós temos o dever e a obrigação de deixar as novas gerações um mundo melhor do que aquele que encontrámos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Casimiro Tavares.

O Sr. Casimiro Tavares (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Discutir e preparar a participação portuguesa na Conferência da Organização das Nações Unidas sobre Ambiente e Desenvolvimento era, realmente, o objectivo do projecto de resolução do Grupo Parlamentar de Os Verdes e, na sua sintonia, do projecto de resolução subscrito pelos Deputados do Partido Comunista Português.
Pena foi que a sua discussão surgisse já tardiamente, a cerca de 15 dias da abertura da ECO-92. No entanto, ficar-lhes-á, pelo menos, a boa vontade e o benefício das intervenções!
Resta-nos não a preparação de trabalhos preparatórios desta Assembleia da República mas, pelo menos, a possibilidade de analise dos trabalhos dos comités preparatórios da Conferência do Rio, ontem anunciada por Maurice Strong - Secretário-Geral das Nações Unidas, sobre ambiente e desenvolvimento.
Oxalá que o grito de esperança de Maurice Slrong não seja prelúdio de falhanço da ECO-92, avisado já no cansaço e na desilusão de Carlos Pimenta e encenada por Cario Ripa de Meana, comissário europeu responsável pelo ambiente, quando também, ontem mesmo, referiu: «Os eco-diplomatas parecem-se cada vez mais com Nero, tocando lira perante Roma em chamas. Não se esqueçam do que aconteceu com Nero!». E, mais adiante: «Ano sim, ano não, os mesmos eco-diplomatas fazem encontros em vários locais agradáveis por todo o inundo. Entre festas e cocktails diplomáticos, as sessões plenárias chegam a um glorioso compromisso.»
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pode Roma encandescer em chamas, mas não será ao som da lira desta Câmara que, afinal, se quedou muda nas realizações! Valha-nos ao menos isso!

Aplausos do PS, do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, declaro encerrado o debate dos projectos de resolução n.ºs 4/VI e 22/VI, estando, assim, em condições de serem votados no período de votações, que se seguirá.
Vamos entrar no ponto seguinte da ordem do dia, ou seja, na discussão do projecto de resolução n.º 16/VI - Medidas de defesa das crianças em risco, apresentado pelo PS.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Julieta Sampaio.

A Sr.ª Julieta Sampaio (PS): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Em Portugal existem 20 000 crianças maltratadas pelas famílias - maus tratos, quer físicos quer de apoio psicológico e humano - que as leva à marginalidade.
Em Portugal existem cerca de 12 % de crianças que não cumprem a escolaridade obrigatória.

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Em Portugal há um número alarmante de crianças, de ambos os sexos, que vivem da prostituição.
Em Portugal a droga está a ser consumida crescentemente por crianças.
Os maus tratos, em Portugal, incidem, sobretudo, nas crianças com idades entre os seis e os catorze anos.
As características principais das crianças maltratadas, segundo estudos disponíveis, de que se salienta o trabalho do Gabinete de Estudos do Centro de Estudos Judiciários referente a 1986 e 1988, são o de serem mal educadas, agressivas, terem insucesso escolar, andarem fora de casa ato horas impróprias, serem rebeldes e apresentarem características de debilidade física e de atraso ou perturbação mental.
Os estudos efectuados até hoje afirmam a impossibilidade de avançar muito para além deste enunciado de características, não podendo aprofundar hipóteses explicativas sólidas para todos estes fenómenos.
A responsabilidade da sociedade, do Estado e dos poderes públicos em geral, essa é indiscutível, na necessidade da erradicação deste drama social.
De entre os principais tipos de maus tratos que as crianças sofrem, e apreendendo apenas o lado exterior desses maus tratos, ressalta u falta de cuidados e higiene de apresentação das crianças, os ralhos e as agressões verbais constantes a que estão sujeitas, falta de afecto e carinho e a falta de alimentação adequada.
Todos estes dados, se, por um lado, se justificam por existência de carências a nível local, por falta de recursos económicos e financeiros ou até pela inexistência de condições de saneamento e higiene das populações, por outro, justificam-se pela negligência por parte dos pais.
Quando os maus tratos são associados às famílias, tal resulta da existência de factores de alcoolismo (84,5 %), violência e agressividade (55,7 %) e desemprego, vindo a seguir, por ordem de importância, o atraso ou doença mental, a doença em geral, a situação de reforma, a deficiência física, o desleixo e, por último, o consumo de droga.
Das famílias irregulares - mães que se prostituem, pais que consomem droga e álcool em excesso, que estão desempregados ou vivem na marginalidade - são oriundas as maiores percentagens das crianças de risco.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: São estes alguns dos dados estatísticos que identificam esta grave situação social e de cuja gravidade não é lícito discordar.
Permitam, porém, que, sem ter a mesma pretensão de qualquer informação sociológica, relate um ou outro dos casos e situações de que tomámos conhecimento na recente deslocação tia Comissão de Educação, Ciência e Cultura ao distrito do Porto.
Uma criança de seis anos, Francisco de seu nome, disse-me que tinha quatro pais: o pai, o amante da mãe, o namorado da mãe e o homem que, as vezes, dormia lá em casa - provavelmente nem sempre o mesmo.
Outra criança de 11 anos, no Bairro de São Tomé, no Porto, consome diariamente duas gramas de droga. Para a adquirir, esta criança dedica-se ao roubo sistemático.
Na escola do Bairro de São Tomé, da freguesia de Paninhos, no Porto, uma outra mais velha já está presa em Custóias. Da escola, que não concluiu, transitou para Custóias.
Outra criança de 13 anos, na companhia da mãe, vive da prostituição, no intervalo das aulas.
São exemplos significativos!
No Bairro do Viso, freguesia de Ramalde, cerca de 20 % das crianças são abandonadas e, no ano lectivo anterior, só 3% das crianças tinham família constituída. A maioria são filhas de mães solteiras, que as abandonam ou são entregues aos avós ou a amas que, por sua vez, não as cuidam convenientemente.
Por outro lado, no já referido Bairro de São Tomé, das 23 crianças que frequentam a escola só três têm pai e mãe, as outras são oriundas de famílias desagregadas.
Saliente-se, assim, a grande preocupação do Sr. Governador Civil do Porto com os problemas da marginalidade e prostituição infantis no distrito, com referências especiais para as crianças dos Bairros de São João de Deus e Aleixo.
Sr. Presidente; Sr.ªs e Srs. Deputados: Também as condições de segurança das crianças, à saída das escolas e nos locais de residência, exigem uma cuidadosa atenção.
Numa zona que visitámos, em Paninhos, as crianças são assaltadas à saída da escola e aliciadas para a droga. Com cinco ou seis anos drogam-se com cola. Os traficantes residem no próprio bairro. Esta zona da freguesia de Paranhos é muito vulnerável a vários níveis. A Junta de Freguesia vai, brevemente; iniciar um programa, que se saúda, de sensibilização da toxicodependência, de que é pioneira no País, que é, essencialmente, vocacionado para a população escolar de Iodos os graus de ensino.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: A situação das crianças no nosso país é grave e exige um diagnóstico rigoroso e preciso, de que a Assembleia da República não se pode. nem deve, dissociar.
Se é verdade que o direito á vida é, porventura, o mais fundamental dos direitos, o direito a ter uma vida digna desse nome começa a ganhar-se ou a perder-se com os primeiros anos de existência. Não basta clamar, como o poeta, que «o melhor do mundo são as crianças», é preciso que nós sejamos dignos desse clamor.

O Sr. Rui Ávila (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Sr.ªs e Srs. Deputados: A Assembleia da República deve empenhar-se num levantamento preciso da situação das crianças em Portugal e promover o adequado debate sobre a temática. Só assim estaremos em condições de promover medidas legislativas e de apoiar as acções políticas necessárias à erradicação deste flagelo.

O Sr. Gameiro dos Santos (PS): - Muito bem!

A Oradora: - As crianças valem o nosso futuro!

Sr.ªs e Srs. Deputados, permitam-me agora que, para terminar, traga aqui um testemunho: lembram-se, com certeza, de, há relativamente pouco tempo, aquando da apresentação deste projecto de resolução, eu ler falado aqui no caso do Vítor Hugo - um menino de 22 meses, cujo assassino foi ontem condenado em 15 anos de prisão. Esse assassino está vivo, Srs. Deputados, mas a criança morreu! Não teve direito, sequer, a um futuro! Deixo isto à vossa consideração.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Silva Pereira.

A Sr.ª Margarida Silva Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, devo dizer-lhe que ouvi com agrado, e até com comoção, a sua intervenção, que tratou de uma questão que nos loca a iodos particularmente. Penso que é saudável, que será estimulante e esperemos que seja vantajoso, pelas possibilidades de divulgação junto da comunica-

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cão social, o trazer desta temática à Assembleia da República, fazermos hoje aqui esta discussão.
Todavia, Sr.ª Deputada, gostaria de partilhar consigo algumas reflexões e alguns problemas que me coloco sobre a estratégia a seguir relativamente a estas matérias.
A Sr.ª Deputada começou por afirmar, no início da sua intervenção, que, em Portugal, existem cerca de 20 000 crianças maltratadas. Como é que podemos saber exactamente esse número, se é verdade que a maior pane dos casos que se detectam acontecem no interior das famílias, no silêncio das famílias, onde, muitas vezes - e recordo aqui as palavras da Dr.ª Iliana Gersão, uma especialista nesta maioria -, «crianças morrem de dor», justamente porque não há possibilidade de que alguém lhes acuda e de, através de uma intervenção amiga, chegarem junto das entidades competentes.
É muito difícil, Sr.ª Deputada, dizer, neste momento, qual é o número exacto de casos como estes. Daí que esteja plenamente de acordo consigo - diria até que não posso estar mais de acordo - quando afirma que o levantamento dessas situações deve ser feito. Eu acrescentaria: deve continuar a ser feito, pois, neste momento, há entidades, em Portugal, que estão a trabalhar no terreno e a trabalhar tem. É justo dizer que o Centro de Estudos Judiciários, a Direcção-Geral da Família e o próprio Ministério da Saúde, no âmbito que lhe compete, tem feito um esforço grande para implementar medidas com carácter horizontal que dizem respeito a esta temática.
A Sr.ª Deputada propõe, como forma de contribuir para dirimir este problema, que seja encomendado um estudo, mas a principal reserva que se me coloca situa-se precisamente no âmbito da sua iniciativa. Sr.ª Deputada, em Portugal, num país cuja cultura de opinião pública está particularmente habituada a que essas coisas só vão ser ainda estudadas e analisadas, quando não estão a ser tratadas já, não estão a ser destinatárias de uma intervenção real, não será um estudo contraproducente do ponto de vista da pedagogia daqueles a quem, afinal de contas, mais as dirigimos, aqueles sobre cuja actuação mais queremos fazer incidir a nossa actuação política?
Por outro lado, a encomenda de um estudo pela Assembleia da República não me parece que deva entrar em conflito com aquilo que está a ser feito por várias entidades no terreno. Não abusando muito da paciência da Mesa aproveitaria um momento posterior para lazer alguma referência a isto.
Sr.ª Deputada Julieta Sampaio, não pensa que a estratégia mais correcta é utilizar o empenhado trabalho comunitário de muitos profissionais, cuja abnegação é absolutamente indiscutível e que estão já hoje, com lodo o seu carinho, com todo o seu profissionalismo e com todo o seu amor a actuar junto do problema, designadamente ao nível hospitalar, do próprio Ministério Público e outras entidades jurisdicionais?
É a pergunta que lhe coloco, desde já.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Julieta Sampaio.

A Sr.ª Julieta Sampaio (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Margarida Silva Pereira, fiquei satisfeita pela sua sensibilização e lenho a impressão que todos os Deputados desta Câmara lambem estarão sensibilizados com este problema, que é realmente grave.
A Sr.ª Deputada mencionou várias entidades que se tem interessado por esta temática das crianças, pelo que não queria deixar de referir aqui o empenhamento e a dedicação dos professores do ensino básico.

O Sr. António Braga (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Realmente, deve-se aos professores do ensino básico, Sr.ª Deputada, que muitas mais crianças não tenham caído no desespero - digo mesmo no desespero e, algumas, até na tortura. É que é através da escola que tem sido detectadas a maior parte das crianças sujeitas a maus tratos. Tem sido a escola - tenho o testemunho dos nossos colegas da Comissão de Educação, Ciência e Cultura que se deslocaram ao Porto - que, através de actividades extracurriculares, os prende a algo de útil e os tira da rua, evitando assim que eles caiam mais baixo.
Por isso, queria deixar aqui hoje a minha homenagem, muito sincera - penso que nisso estou acompanhada por todos os Deputados da Comissão Parlamentar de Educação, Ciência e Cultura - aos professores do ensino básico, que muito tem contribuído, bem como todos os Srs. Deputados, para que estas crianças em risco não o sejam tanto assim.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Sr.ª Deputada, detectei uma contradição no seu discurso quando disse que não há estimativas concretas: não se sabe se serão 20 000 ou 30 000. Os estudos que consultei e que V. Ex.ª referiu dizem respeito ao período de 1986-1988, pelo que há uma necessidade urgente de fazermos uma actualização e um levantamento. Não sei quem é que vai fazer o estudo, se são os professores do ensino básico, se são as organizações hospitalares. Só sei uma coisa: é que esta Câmara precisa de deliberar rapidamente...

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: -... e encomendar um estudo que nos permita legislar conscientemente e não às cegas.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Estas crianças não podem esperar mais. Sr.ª Deputada, enquanto há uma «democracia de sucesso», não pode haver em Portugal mais crianças como o Vítor Hugo, que ontem a televisão mostrou, e que com certeza fez correr lágrimas pela cara de muita gente!

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - É isto que pretendemos com este projecto de resolução.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos interromper o decurso do tema em debate para proceder às votações agendadas. Da folha que foi oportunamente distribuída constam três: a da proposta de lei n.º 9/VI, do projecto de lei n.º 40/VI, da iniciativa do PS, e da proposta de lei n.º 21/VI, da iniciativa do Governo. Temos ainda, como disse há pouco, os projectos de resolução relativos à Conferência da ONU no Rio de Janeiro, cuja discussão terminou antes da hora regimental e, por isso, irão ser votados também hoje.

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Por esta ordem, vou colocar todos estes textos à consideração de VV. Ex.ªs
Vamos votar, na generalidade, a proposta de lei n.º 9/VI, que estabelece o novo regime de colheita de órgãos de origem humana para transplantação, diagnóstico ou terapêutica ou para fins de investigação científica.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência dos Deputados independentes Mário Tomé e Raul Castro.

Srs. Deputados, está em votação, na generalidade, o projecto de lei n.º 40/VI - Extracção de órgãos e tecidos para transplante (PS).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência dos Deputados independentes Mário Tomé e Raul Castro.

Srs. Deputados, está em votação, na generalidade, a proposta de lei n.º 21/VI, que autoriza o Governo a legislar em matéria de actividades paramédicas.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do CDS e do PSN e votos contra do PS, do PCP e de Os Verdes.

Srs. Deputados, está em votação, na generalidade, o projecto de resolução n.º 4/VI - Promove a realização da Convenção sobre o Ambiente e Desenvolvimento, no âmbito da Cimeira da Temi (Rio de Janeiro, Junho de 1992) (PCP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e votos a favor do PS, do PCP, do CDS, de Os Verdes e do PSN.

Srs. Deputados, está em votação, na generalidade, o projecto de resolução n.º 22/VI - A Assembleia da República resolve promover e organizar, em tempo útil, um debate acerca da Conferência da Organização das Nações Unidas sobre Ambiente e Desenvolvimento, que irá realizar-se de 1 a 12 de Junho próximo no Rio de Janeiro (Os Verdes).

Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PSD, votos a favor do PS, do PCP, do CDS, de Os Verdes e do PSN e registando-se a ausência dos Deputados independentes Mário Tomé e Raul Castro.

Terminadas as votações, vamos retomar o debate em decurso, relativo ao projecto de resolução n.º 16/VI, na iniciativa do PS, relativo a medulas de defesa das crianças em risco.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Silva Pereira.

A Sr.ª Margarida Silva Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É objectivo desta minha intervenção dar alguma nota da concepção que. neste momento, o meu grupo parlamentai' tem acerca da estratégia, eventualmente mais adequada, para minorar este problema dramático das crianças em risco, que são vítimas do maus tratos - digo, neste momento, porque estou a ter em linha de conta os trabalhos que estão a ser produzidos no terreno.
A Sr.ª Deputada Julieta Sampaio referia há pouco a necessidade de encomendar um estudo que nos habilitasse a ler informação detalhada sobre esta matéria. O problema que colocamos, Sr. Presidente, Srs. Deputados, e o da eventual
contradição nestas palavras: «um estudo que nos habilite». Um estudo encomendado neste momento pela Assembleia da República, no nosso entender e depois de ouvirmos vários especialistas na matéria, não será porventura o elemento mais idóneo para nos habilitar efectivamente a tratar, de uma forma cabal, a problemática das crianças em risco.

Vozes do PS: - Porquê?!

A Oradora: - Porque seria sempre um estudo desconhecedor do trabalho que está a ser feito. Preferíamos que continuasse a avançar a acção que está a ser desenvolvida nos hospitais, assim como a do grupo de trabalho que neste momento desenvolve a. sua actuação no Centro de Estudos Judiciários.
Nos hospitais, em primeiro lugar, porque é muitas vezes aos bancos e aos centros de urgência - e não aos centros de pediatria - que chegam casos extraordinariamente graves, cuja triagem não é feita, e que poderá vir a sê-lo desde que junto desses bancos hospitalares funcionem grupos habilitados a fazer a sua despistagem. Refiro-me concretamente às unidades de queimados dos hospitais, onde chegam muitas vezes - dizem os médicos - crianças que recebem tratamento e vão imediatamente para casa sem que seja detectado o problema da negligência, ou mesmo do dolo, na ofensa corporal autêntica de que muitas vezes foram vítimas.
Além disso, entendemos também que há que continuar a implementar medidas de natureza legal e refiro, ainda que muito sucintamente, o diploma que, felizmente, se encontra em processo de conclusão, referente à adopção, o qual vai tomar o processo jurisdicional muitíssimo mais expedito e que, a par do processo jurisdicional, virá estruturar também um processo de adopção administrativa sempre com acompanhamento do Ministério Público.
Refiro também a criação, que pretendemos e saudaremos, do Instituto de Confiança do Menor, ou seja, a tentativa de criar famílias alternativas de acolhimento para as crianças que no interior das suas próprias famílias não conseguem a pedagogia e a vivência familiar adequada.
Por outro lado, ainda, não queria deixar de apontar a existência das comissões de protecção de menores e a implementação que se está a verificar ao longo do País dos chamados serviços de acolhimento. Esses serviços de acolhimento não têm aumentado, provavelmente, ao ritmo que todos desejaríamos, mas têm de facto aumentado nos últimos tempos.
Cremos que é pelo trabalho no terreno daqueles que, mercê da experiência que já tem, possuem dados e estratégias concretas para fazer a despistagem e encontrar alternativas, que alguma coisa pode ser feita neste país para minorar a situação terrível das crianças vítimas de maus tratos.
Sr.ª Deputada, questionei a oportunidade de um estudo encomendado neste momento pela Assembleia da República e pergunto também: a quem? A pessoas mais habilitadas do que aquelas que no Centro de Estudos Judiciários, no Ministério Público e nos hospitais actualmente trabalham? Existem essas pessoas em Portugal? Existem esses técnicos alternativos?
Um estudo vago e abstracto que apenas criasse na comunidade atingida por estas situações a ideia de que ainda nos encontramos numa pré-história do tratamento das crianças vítimas de maus tratos, com toda a carga nociva que isso poderia trazer, parece-nos, do ponto de vista da prevenção geral e até da prevenção especial, bastante desa-

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conselhado, independentemente do mérito que - reitero - reconhecemos à intervenção da Sr.ª Deputada, ao serviço de uma questão humanitária do maior interesse.

Aplausos ao PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Julieta Sampaio.

A Sr.ª Julieta Sampaio (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Margarida Silva Pereira, agradeço-lhe, mais uma vez, a solidariedade que mostrou nesta temática. Nem outra coisa, aliás, esperaria de V. Ex.ª.
Quero, no entanto, dizer-lhe que tudo o que a Sr.ª Deputada disse na sua intervenção não é contraditório com o que se propõe no projecto de resolução em debate. Pelo contrário, penso ser urgente que a Assembleia recolha todos os dados de que a Sr.ª Deputada falou e as informações de todas as pessoas que tem esses conhecimentos. Também estou informada de que esses estudos existem. É necessário formar uma comissão que faça a recolha de todos esses dados, de modo a habilitar esta Assembleia a legislar com o conhecimento real das situações, que são muitas e graves.
Permito-me recordar-lhe, Sr.ª Deputada, que uma coisa são as competências desta Assembleia e outra são as competências governativas. Neste caso concreto, que é um caso humano, penso que devem ser reunidos os esforços entre este órgão legislativo e o órgão político e executivo que é o Governo. Sobre esse assunto não pode haver divergências, nem acredito que as haja.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Ferraz de Abreu.

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Margarida Silva Pereira, fiquei um pouco perplexo por V. Ex.ª dizer que esta iniciativa iria com certeza ignorar os trabalhos já produzidos nesta matéria. Foi essa, segundo me pareceu, a sua afirmação, mas não consigo perceber por que é que tal iniciativa iria prejudicar esses trabalhos. Pelo contrário, em qualquer estudo que se fizesse iríamos, naturalmente, recorrer a todo o trabalho que já estivesse feito nesta matéria.
Mais, uma iniciativa deste tipo por parle da Assembleia da República só iria levar um grande estímulo às pessoas que já estão a trabalhar neste assunto.
Mais ainda, dada a gravidade deste problema, ficaria muito bem à Assembleia da República e constituiria um factor para a prestigiar demonstrarmos perante a opinião pública a nossa preocupação e o nosso desejo de legislar, no sentido de pôr cobro a uma situação tão trágica como esta.
Finalmente, referiu V. Ex.ª que os hospitais disporiam de uma grande informação nesta matéria. Permito-me não concordar consigo, porque os hospitais só tem conhecimento dos casos gravíssimos de crianças que são hospitalizadas. A grande maioria dos maus tratos, que, como aqui foi dito pela Sr.ª Deputada, são muitas vezes do foro psicológico, não chega aos hospitais, aos quais só chegam os casos graves, como, por exemplo, os tais queimados. De grande parte das crianças mal tratadas os hospitais não tem qualquer conhecimento.

O Sr. António Correia de Campos (PS): - Exactamente!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Silva Pereira.

A Sr.ª Margarida Silva Pereira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Ferraz de Abreu, estou de acordo em que muitos dos casos de maus tratos - admite-se, nesta altura, que até a maioria - sejam efectivamente do foro psicológico e que esses não cheguem aos hospitais.
De qualquer forma, chega aos hospitais uma fatia de casos que denuncia um universo sócio-familiar que também é, obviamente, muito importante. Penso que nessa matéria todos estamos, com certeza de acordo.
Quando questionei a oportunidade de um estudo que agora começasse, referia-me, naturalmente, aos lermos em que ele aparece no projecto resolução que o Partido Socialista apresentou. Essa resolução aponta - eventualmente isso até poderá ser alterado - para a ideia de um estudo a que se vai proceder ex novo. Foi isso que, de alguma maneira, me chocou.
É preciso sublinhar bem que o trabalho que irá ser desenvolvido vem na continuação de estudos e trabalhos já feitos ou em curso. É bom que isso passe para o exterior. O PSD considera - sublinho estas palavras e peço a compreensão dos Srs. Deputados para elas - que, por razões de prevenção geral e especial, o mesmo é dizer por razões de natureza pedagógica seria muitíssimo bom que passasse para a opinião pública a mensagem de que os nossos trabalhos seguem na continuação e em entrosamento absoluto com algo de muito substancial que já está a ser operado no terreno, com prejuízo de que efectivamente, a bem de uma causa magnífica, possamos dar um contributo que não interesse.
Quero, a terminar, dar apenas um breve nota. Eu, jurista, respeitadora socrática da lei, não partilho, de forma alguma, da visão, que considero algo optimista, de que é por via legislativa que todas estas coisas poderão ser resolvidas. Não afirmarei, de modo algum, que estão feitas todas as leis adequadas sobre esta matéria, mas direi que fizemos já, porventura, as principais e aderimos já, porventura também, aos instrumentos internacionais mais importantes. Neste momento trata-se da materialização, da efectivação, da aplicação da lei. Em questões deste género, como a da igualdade de oportunidades (à qual, segundo sei, a Sr.ª Deputada Julieta Sampaio é também, e felizmente, particularmente sensível) e a dos direitos das crianças em geral e das crianças vítimas de maus tratos em particular, o drama maior começa no momento da necessidade de aplicação da lei. É aí que se coloca o problema dos meios e das estratégias adequadas. É também aí que começa o debate.

Vozes do PS: - Para isso é que há o Governo!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quem tem assistido a debates organizados pela sociedade civil sobre o problema das crianças - e direi que «crianças em situação de risco» é um conceito que vai para além do de crianças vítimas de maus tratos - sabe que uma das questões suscitadas nos mesmos é a de que não há funcionamento das estruturas para responder as leis existentes. Esta é que é a realidade: as leis e a Constituição que existem não são aplicadas.
Sabemos - os serviços dos tribunais, o Ministério Público e os hospitais dizem-nos - que normalmente, quando

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surge uma criança maí tratada, agredida ou queimada, essa criança anda da casa do delegado ou delegada para casa do, médico ou médica, porque não há famílias de acolhimento nem centros de atendimento das crianças.
Esta, sim, é uma realidade. É preciso «pôr o dedo na ferida» e denunciar umas palavras que o Sr. Ministro da Justiça disse quando aqui travámos um debate sobre a criança, na sequência aliás de uma interpelação minha, no sentido de que não se deveria «nacionalizar» crianças. De lacto, os centros de atendimento não são para «nacionalizar» crianças, mas para atender crianças. O que fizeram o Sr. Ministro da Justiça e o Governo? Que centros de atendimento criou o Governo para atender estas crianças? Não fez rigorosamente nada!
O Governo limitou-se a criar no Diário da República comissões de protecção de menores que não vão funcionar, porque - dizem-nos os técnicos que trabalham nessa área - a assistência educativa não existe em Portugal para os menores que são atraídos pela marginalidade, por não haver meios para que essa assistência educativa funcione. Esta é que é a questão. Que este debate sirva para denunciar que em relação à criança e da parte do governo do PSD nada tem sido feito!

Vozes do PCP e do PS: - Muito bem!

A Oradora: - As leis do planeamento familiar, que servem para que as crianças nasçam num lar que as deseje e, assim, com menos possibilidade de se tomarem crianças em risco - e crianças em risco não são só as crianças que são batidas, mas as crianças que têm menos amor -, não são i efectivamente aplicadas. O número de mães adolescentes cresce e os filhos dessas mães têm grande possibilidade de vir a ser crianças em risco.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quando discutimos as questões da criança devemos ter a consciência de que as leis que Portugal tem nesta matéria, por via do 25 de Abril, que acabou com a autoridade tia família e criou os mecanismos legislativos para que o amor e a solidariedade existissem na família, são também das mais avançadas.
Nesta questão, não se traia efectivamente - estou de acordo, neste aspecto, com a Sr.ª Deputada Margarida Silva Pereira de grandes iniciativas legislativas, embora elas possam ser necessárias num ou noutro ponto. Podemos introduzir melhorias e podemos, por exemplo, em relação à regulação do poder paternal e aos alimentos devidos a menores, aceitar uma recomendação do Conselho da Europa sobre essa matéria.
Devo referir, a propósito, que o PCP irá reapresenta o seu projecto de lei relativo ao adiantamento dos alimentos devidos a menores, que penso que melhorará as condições de crianças que não recebem pensões de alimentos do pai ou da mãe, por dificuldade em obter tais pensões. É justo, na nossa opinião, que o Estado adiante essas pensões. Iremos reapresenta essa iniciativa, que faz falta. Há dois anos que o Sr. Ministro da Justiça prometeu uma proposta de lei sobre a adopção, que efectivamente faz falta.
Mais do que tudo isso, o que faz falta é ter, em relação aos vários sectores da vida português; - habitação, saúde, ensino, cultura - mecanismos que concretizem direitos conseguidos na lei. Ora, são, efectivamente, esses mecanismos que não existem! Sabemos que há crianças abandonadas, crianças que vivem na marginalidade, que são toxico de pendentes, que estão na prostituição - como recentemente foi denunciado pela sociedade civil em Aveiro -, que são vítimas de uma das fornias de violência que se instituiu em Portugal, o trabalho infantil, relativamente ao qual não venham dizer, Srs. Deputados, que é pura questão de mentalidades... As mentalidades - e isto aprende-se! -não surgem por acaso, porque a pessoa tem uma célula e um grão de plutónio nessa célula; as mentalidades surgem porque são criadas condições, assim como para que elas subsistam, isto é, por exemplo, para que uma pessoa se sinta autoritária na família. Portanto, são criadas condições para existir a agressão e a violência sobre a criança.
Srs. Deputados do PSD, falem da política do vosso Governo em relação a todas as áreas que mencionei e verão que, efectivamente, a situação que se vive relativamente à criança degrada-se - aliás, o último censo à população revela que a taxa de mortalidade infantil aumentou -, reconhecerão que nada fizeram para que Portugal as crianças: possam ser felizes.

Aplausos do PCP e do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Correia de Campos, utilizando tempo cedido pelo CDS e também pela Mesa.

O Sr. António Correia de Campos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, gostaria de dizer que este problema, como muitos outros, nomeadamente o dos idosos e o da deficiência, não é exclusivamente judiciário, nem de saúde, nem escolar, nem psicológico, nem muito menos psiquiátrico. É um problema interdisciplinar e, como acontece com todos os problemas interdisciplinares, tem muitas causas e precisa de muitas soluções coordenadas.
Ora, os governos, e não apenas o nosso, não têm soluções simples nem imediatas para estes problemas complexos e normalmente são, talvez, os equipamentos menos aparelhados para os solucionar.
Gostaria ainda de dizer, confirmando algumas das afirmações anteriores, que este é um tema obseuro, é um iceberg do qual apenas conhecemos a ponta e não todas as suas implicações, porque o problema é extremamente complexo. Finalmente, gostaria de trazer a esta Câmara dois exemplos próximos deste e usados em países onde os Parlamentos desempenharam uma função muito importante. Assim, gostaria de lembrar que, em Inglaterra, há 12 anos, por iniciativa, do Parlamento, fez-se o primeiro inquérito nacional à diminuição física, o chamado Amélia Harris Survey, que foi um estudo extremamente importante pelo qual; pela primeira vez, se passou a conhecer totalmente o problema da deficiência física e mental no Reino Unido, inquirindo todas as crianças e todos os jovens-adultos com mais de 16 anos.
O segundo exemplo, que gostaria de lembrar, teve lugar há cerca de 15 anos nos Estados Unidos da América. Assim, os problemas nutricionais eram de tal ordem, e tinham exactamente uma característica semelhante a esta. que o Congresso se uniu para organizar uma iniciativa, chamada HANES (Health and Nutrition Examination Survey), que leve resultados incontestados.
Na verdade, quando a realidade é complexa, ela precisa de ser conhecida por meios consensuais, que reúnam o maior sentido de apelo nacional.

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Assim, e para terminar, gostaria de dizer que não percebo porquê tanta resistência do PSD, considerando esta matéria como da exclusiva competência do Governo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para defesa da honra e da consideraçâo, tem a palavra a Sr.ª Deputada Lurdes Póvoa Costa.

A Sr.ª Lurdes Póvoa Costa (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sr.ª Deputada Odete Santos, a minha bancada não podia, face à sua intervenção, ficar calada.
Certamente que não era intenção da Sr.ª Deputada utilizar um tom tão agressivo ao referir-se a uma situação que, julgo, a todos exige uma maior ponderação e reflexão. De facto, trata-se de uma situação grave que nos loca a todos não fundo!... É o problema das crianças! Elas exigem de nós um tom mais doce, mais terno, Sr.ª Deputada!...
A Sr.ª Deputada acusou o Governo de nada fazer em relação às crianças em risco, referindo palavras aqui proferidas pelo Sr. Ministro da Justiça. De fado. Sr.ª Deputada, não é justo que lhe se refira dessa maneira.
Sabemos que muito há para fazer! Talvez ainda muito pouco esteja feito quanto às crianças maltratadas, mas lembro-a que foi graças a este Governo que, em todos os distritos do País, se criou um serviço de acolhimento e de apoio às famílias.
Neste momento, e a Sr.ª Deputada sabe-o, funcionam, ligados aos Centros Regionais de Segurança Social de todo o País, serviços onde se seleccionam famílias de acolhimento, que são estudadas por equipas puridisciplinares profundamente técnicas, que dão o seu parecer no sentido de para aí serem encaminhadas as crianças que, a lodo o momento, apareçam, tanto nos hospitais, abandonadas nas maternidades ou nas pediatrias, como as enviadas pelo Ministério Público.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No exercício do direito de defesa da honra, que foi exercido, de algum modo, retardadamente, uma vez que houve uma intervenção pelo meio e, aliás, parece que a senhora despertou tarde, a Sr.ª Deputada Lurdes Póvoa Costa não disse - e talvez tivesse sido útil lazê-lo - quantas crianças eram acolhidas nesses centros e por essas famílias de acolhimento. Gostaria de ouvir os números! Como sabe, são muito poucas!
Por exemplo, em Setúbal, há um centro de acolhimento de crianças que só tem capacidade para sete crianças. Espantoso!...
Assim, não é com paninhos quentes, com vozes lenias e delicodoces, com gestos melodramáticos ou com lágrimas correndo, mas que não correspondem efectivamente a políticas, que se resolve seja o que for! É aí que eu me irrito! De facto, não vale a pena citar versos de Augusto Gil - aliás, muito bonitos - e continuar sem fazer nada, Sr.ª Deputada! Será que a senhora não se irrita com isso? É mulher e por isso irrita-se, com certeza, ale mais! Não quer é demonstrá-lo! Mas a situação que muitas crianças vivem hoje no nosso país é uma situação para irritar!...
Falei no Sr. Ministro da Justiça e tenho muita legitimidade para lazê-lo como Deputada! Alias, também podia falar do Sr. Ministro do Emprego e da Segurança Social, que vai a seminários, como eu já ouvi, falar da legislação avançada mas não fala do trabalho infantil! Não diz, nesses seminários, que existe trabalho infantil em Portugal! Não é uma vergonha?! Não é uma vergonha que o ministro de um governo de uma democracia omita as graves situações que existem em Portugal? Isto é uma vergonha!
Por isso, lenho todo o direito de denunciar essa situação, porque o PSD ainda não calou a minha voz nem a calará a ninguém desta bancada! Não estamos a pedir louvaminhas ao Governo, estamos aqui para denunciar e a Sr.ª Deputada devia ter decoro em vir aqui criticar o facto de eu ler referido as palavras do Sr. Ministro da Justiça que, aliás, constam no Diário da Assembleia da República.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Casimiro Tavares.

O Sr. Casimiro Tavares (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É necessário pensar, programar e agir. É necessário fazer os estudos, debater e implementar tudo o que seja em prol das crianças. Simplesmente, para além de pensar e de programar, é sobretudo necessário agir e nós, depois de ouvirmos as palavras tilo interessantes e vivas das Sr.ª Deputadas, todos, de facto, sentimos este problema.
Ainda há oito dias, na minha terra, todos vivemos um problema que os jornais, na ocasião, relataram. Uma criança desaparecera e ninguém sabia dela, lendo sido procurada durante toda a noite; no dia seguinte apareceu. Tinha sido raptada. Estava em estado de choque, apresentava traumatismo craniano, um braço partido, perfurações no pescoço e no tronco que tinham sido feitas por uma arma branca.

A Sr.ª Julieta Sampaio (PS): - E ainda está no hospital!

O Orador: - O indivíduo que a linha raptado já tinha sido condenado por homicídio qualificado na pessoa da namorada e tinha cumprido oito anos de prisão, encontrando-se em liberdade condicional!
Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, agora interrogamo-nos: para além dos estudos e de todas estas soluções Ião necessárias, não será urgente revermos e reformularmos a política criminal? Não será necessário rever o sistema penal e até o próprio processo penal, quando admite que as declarações prestadas fora da audiência não sirvam de prova nessa mesma audiência? É preciso reestruturar o sistema prisional! É que o Homem não pode continuar beneficamente encarcerado à sombra do sistema! Cada criminoso deve ter um tratamento específico, porque cada homem é diferente do outro homem! Os homens não são iguais na natureza, são, sim, iguais em direitos.

Aplausos do CDS e de alguns Deputados do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, dou por encerrado o debate relativo ao projecto de resolução n.º 16/VI.
De seguida, vamos passar à apreciação do projecto de resolução n.º 18/VI, apresentado pelo PCP, relativo a medidas de combate à seca.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há cerca de um mês alertámos o Plenário e

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o Governo para a gravidade da seca que estava a atingir o País, em particular o Alentejo, e propusemos desde logo um conjunto de medidas que retomamos no projecto de resolução hoje em debate.
A vida, infelizmente, deu-nos, razão: a situação de então para cá agravou-se e o longo período de seca que estamos a viver inscreve-se já entre as piores do século. A água no solo, em muitas regiões, é de 15 % das necessidades das culturas de sequeiro; a percentagem de água nas albufeiras a sul do Tejo é de 59 % da sua capacidade máxima, quando em igual data do ano passado era de 95 %.
Mais de metade da produção de cereais de Outono/Inverno está perdida; grande parte das culturas de Primavera, como o arroz e o tomate, não serão feitas; faltam alimentos para os gados, cuja verdadeira dimensão só se sentirá daqui a alguns meses; há dificuldades para a extracção de cortiça; empresas a jusante e a montante da produção em crise económica. São estes alguns dos traços que caracterizam o quadro existente.
As associações de agricultores e de cooperativas, autarquias, comunicação social têm-se desdobrado, desde então, na caracterização da situação e na apresentação de propostas. E o que faz o Governo, a quem compeliria adoptar de uma forma decidida as medidas adequadas a minorar e combater a seca?
Em 19 de Março, já lá vão dois meses, o Governo anunciou em Conselho de Ministros um conjunto genérico de medidas já por si insuficientes. O Secretário de Estado dos Mercados Agrícolas e Qualidade Alimentar veio a esta Assembleia, em 28 de Março, repetir no essencial o comunicado do Conselho de Ministros. Por. fim, em 13 de Abril, foi nomeado o grupo de trabalho cujos resultados se desconhecem.
Ou seja, sempre que a situação aquece um pouco mais, em resultado das movimentações sociais, um qualquer secretário de Estado relembra que o Governo continua a estudar a adopção de um pacote de medidas, a negociar com a Comunidade, e repete o comunicado do Conselho de Ministros. Assim vejamos: o director regional de Agricultura do Alentejo, perante a Comissão de Agricultura e Mar, em, de Abril, limitou-se a alimentar que aguardava a regulamentação das decisões do Conselho de Ministros, e a única medida concreta que entretanto linha sido tomada dizia respeito ao apoio à alimentação dos ruminantes.
Entretanto, a situação agrava-se, com prejuízos irrecuperáveis na agricultura e noutros sectores da actividade económica e dificuldades no abastecimento de água às populações, sem que sejam postas em prática o conjunto de medidas concretas adequadas à situação.
O Governo tem demonstrado, nesta grave situação de seca, uma enorme incapacidade de tomar medidas de emergência, concretas, decididas e enérgicas, de passar das palavras aos actos. Esta lentidão na adopção de medidas e na apresentação de propostas de ajuda à Comunidade Europeia faz com que só em Julho ou Agosto os apoios estejam à disposição dos agricultores, se estiverem...
E, mais do que isso, a eventual aplicação das medidas a um pequeno número de concelhos mais afectados; o seu alcance limitado no essencial a apoios e indemnizações parciais destinadas a subsidiar a alimentação do gado e os cereais de inverno; a não consideração, até ao momento, de apoios específicos para as autarquias que enfrentam já em muitos concelhos (situação que se vai agravar) problemas graves de insuficiências no abastecimento de água; a ausência de apoios aos sectores de comercialização, designadamente cooperativas, de factores de produção; a não explicitação de medidas de apoio para ocorrer às situações de desemprego que vão atingir milhares de trabalhadores rurais; a despreocupação com medidas estruturais, tudo isto torna o pacote de medidas gerais anunciado pelo Governo ainda mais insuficiente.
É preciso olhar para todas as zonas do País afectadas pela seca, e que abrangem regiões tão distintas como Trás-os-Montes, Beira Interior, todo o Ribatejo e o Alentejo, entre outras. Assim sendo, o projecto de resolução - medidas de combate à seca -, apresentado pelo meu grupo parlamentar e hoje em debate, tem toda a razão de ser e oportunidade.
Face à dimensão da gravidade da seca nós propomos que a Assembleia da República se pronuncie pelas seguintes medidas de emergência: declaração do estado de calamidade pública, para os concelhos mais afectados; indemnizações que cubram os prejuízos sofridos pelas searas, incluindo os cereais não abrangidos pelos apoios comunitários como as aveias na base da área semeada e da média da produtividade do último triénio, e ainda as culturas de Primavera que não sejam semeadas ou plantadas devido à falta de água para a rega; subsídio a fundo perdido para a pecuária, tendo em vista a sua alimentação nos próximos 10 meses; disponibilização de alimentos para os gados; intervenção do IROMA no mercado pecuário, suspensão temporária das importações de gado para permitir o escoamento do gado nacional que tiver de ser abatido; autorização de assoreamento ou corte para o gado das searas perdidas, sem perda do subsídio à produção de cercais; linha de crédito bonificado para a campanha agrícola 1992-1993; moratória, sem juros, por um período de 18 meses para os créditos assumidos para investimento nas explorações afectadas pela seca; linha de crédito bonificado para as cooperativas de comercialização de factores de produção; apoios financeiros às autarquias para fazerem face aos encargos adicionais e imprevistos resultantes da seca; criação, em cada concelho, de comissões de acompanhamento das consequências da seca, .constituídas por representantes do Ministério da Agricultura, das autarquias e das organizações representativas dos vários sectores da lavoura, para seguimento da situação, levantamento de prejuízos, prestação de informações a todos os interessados e controlo da aplicação de medidas de apoio e de indemnizações, tendo em vista a necessidade de nenhum agricultor ou cooperativa afectada deixar de ter acesso aos apoios definidos ou a definir; resolução dos problemas de desemprego resultantes da seca, garantindo-se subsídio de desemprego a todos os prejudicados. O tempo de desemprego e respectivo subsídio devem ser considerados como tempo de trabalho para efeitos de registo.
Para além das medidas de emergência, propomos um conjunto de medidas estruturais, convictos de que só estas poderão, a prazo, garantir o combate à falta de água resultante do longo período de seca. É gritante a ausência de uma política da água e da gestão e regularização dos recursos hídricos no País. Cova da Beira, Vale do Sorraia, Alqueva, são disso exemplos gritantes.
O colóquio que o Grupo Parlamentar do PCP levou a efeito, recentemente, sobre o empreendimento de fins múltiplos do Guadiana demonstrou, sem margem para dúvidas, a importância e a necessidade da água como factor estratégico de desenvolvimento em principal instrumento de combate à desertificação. Neste aspecto a diferença com outros países da Comunidade é notória, basta um exemplo: a Espanha armazena cerca de 50 % das águas que correm no seu País. Em Portugal não passamos dos 9 %.

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É neste quadro que deve ser avaliado o empreendimento do Guadiana, constituído pelos subsistemas de Alqueva, Rocha da Galé e Pomarão, com a possibilidade de se construírem grandes albufeiras que armazenem 5000 milhões de metros cúbicos de água que anualmente se perdem no mar e que contribuirá, decisivamente, não só para atenuar fortemente as consequências das secas, que têm no Alentejo a sua mais grave expressão, como é condição necessária para o seu desenvolvimento.
Áqueles que numa visão tecno-economicista falam nos custos e na rentabilidade do empreendimento nós temos de falar nos custos da não construção, traduzidos em desertificação e na rentabilidade social, traduzida na garantia de vida.
Ultrapassados os diversos falsos argumentos que ao longo de décadas foram arremessados contra o empreendimento, esperemos que, finalmente, ele vá para a frente respeitando, no essencial, o projecto inicial. É que, como afirma o relatório intercalar tio consórcio que está a fazer a avaliação global do empreendimento, optar por uma solução tipo «Alquevinha» é o mesmo que optar pela solução de não regar o Alentejo.
Por isso, propomos que a Assembleia da República se pronuncie também pela construção do empreendimento de fins múltiplos do Guadiana, pela concretização do regadio da Cova da Beira, pela reabilitação dos perímetros de rega e pela regularização do Vale do Sorraia.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Assembleia da República só se prestigiará se, discutindo o projecto de resolução que apresentamos, se pronunciar favoravelmente pelo conjunto de medidas que propomos e cuja urgência é indiscutível.
Pela nossa parte, assumimos as nossas responsabilidades. Assumam VV. Ex.ªs as vossas.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Capoulas Santos.

O Sr. Luís Capoulas Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A queda de alguma precipitação nos princípios de Abril fez-nos acalentar esperanças sobre a possibilidade de poderem ainda ser atenuados alguns efeitos da seca que vinha, já então, atingindo proporções alarmantes.
Neste momento, não restam, infelizmente, quaisquer dúvidas de que os agricultores estão confrontados com uma situação de catástrofe que apenas antecipou a declaração de uma crise mais vasta, que se vinha progressivamente manifestando. Também a situação vivida nalguns sectores de actividade, mais directamente conexos com a actividade agrícola, e o abastecimento de água às populações nalgumas zonas constituem motivos de grande preocupação.
Não pode, por isso, o Partido Socialista deixar de denunciar a forma como o Governo tem vindo a enfrentar a situação, sobretudo a prevalência há várias semanas de uma total falta de preconização das medidas que pressurosamente entendeu fazer anunciar. Este facto tem contribuído para acentuar o grau de incerteza e de desespero que neste momento atinge uma significativa parcela da população activa agrícola portuguesa.
Com eleito, o Governo anunciou medidas para facilitar o escoamento do gado a abater e evitar o avultamento dos preços. Não referiu, porém, qual o preço de aquisição que vai ser praticado: será o preço de intervenção comunitário, inferior, como se sabe, ao preço de mercado? Será outro?
Qual? E no que refere ao gado ovino, onde a legislação comunitária nem sequer admite intervenção, como vai ser materializada a medida?
Anunciou também o Governo, através do Ministério da Agricultura, medidas tendentes a apoiar os produtores pecuários, para o que divulgou montantes máximos por cabeça a atribuir por espécies e por zonas do País. Mas quais são as zonas e quais os montantes a praticar em cada uma delas? Quais são os exactos compromissos que vão ser exigidos aos criadores?
Publicitou também o Governo a intenção de conceder moratórias de um ano sobre os empréstimos contraídos, bem como a concessão de créditos especiais a três anos com bonificações das taxas de juro. Mas quais vão ser as taxas de juro a praticar e quais as instituições de crédito com as quais o Governo já negociou esta linha de crédito? E quais são as que aceitaram contribuir com os 3 % que constam da nota informativa do Ministério da Agricultura?
Também a anunciada medida de transferência para o PÍUS de 382 000 t de cercais da CE nos parece tratar-se de uma medida sem quaisquer efeitos práticos directos junto dos agricultores e com vantagens para o próprio Estado com certeza inferiores às estimativas efectuadas.
Do que acaba de ser dito. Sr. Presidente e Srs. Deputados, parece-nos ter ficado demonstrado que, além de totalmente imprecisas, algumas medidas de combate aos efeitos da seca anunciadas pelo Governo são manifestamente inadequadas e claramente insuficientes.
O PS considera imperiosa e urgente uma mudança de atitude do Governo e entende ser necessária a adopção das seguintes medidas: criação de um gabinete de emergência, ao qual competirá proceder à rápida sondagem do país em função dos efeitos da seca e ao controlo da aplicação das ajudas (já reclamado atempadamente pelo PS), onde estejam representadas, para além do Ministério da Agricultura - como agora sucede -, as organizações representativas dos agricultores; o pagamento de uma ajuda ao rendimento dos produtores de cereais (e não só de trigo) até 100 % do valor da margem bruta regional por hectare, a calcular a partir das contas de cultura regionais; garantia de aquisição do gado bovino e ovino para abate ao preço do mercado que vigorava no início da declaração da seca, com majoração da perda de peso dela decorrente; atribuição aos bovinicultores, até Outubro de 1992, de 50 % do valor do custo da alimentação necessária para substituir as forragens, podendo efectuar-se o abate a partir de l de Julho, neste caso com perda, obviamente, da ajuda após o abate; apoio aos produtores de ovinos e caprinos nos lermos da proposta anterior, sendo admissível o abate a partir de 11 de Maio, com consequente perda da ajuda a partir da efectivação do abale; possibilidade do apoio aos produtores pecuários poder ser, total ou parcialmente, efectuado directamente em género (fardos de palha ou feno) a importar, dadas as condições vantajosas em termos de preços e transportes a que se sabe ser possível recorrer; a especificidade própria do regadio e da eventual ausência de rendimentos, por impossibilidade de realização das respectivas culturas, deverá ser objecto de medidas a adoptar consoante as circunstâncias de cada caso, devendo a situação excepcional do Vale do Sorraia, agravada pelo vazamento da barragem do Maranhão, constituir primeira prioridade;...

O Sr. António Braga (PS): - Muito bem!

O Orador: -... a adopção de medidas de apoio às autarquias obrigadas a recorrer a soluções excepcionais para abastecimento de água às populações.

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Sr. Presidente, Srs. Deputados: A dimensão atingida pela seca e as suas trágicas consequências, podendo ser atenuadas, não poderão, de modo nenhum, ser totalmente eliminadas pela simples decretação de medidas de emergência por mais amplas que sejam.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A situação veio, infelizmente, pôr a nu a total incorrecção da estratégia dos governos do PSD que, convém não esquecer, levam 12 anos - 10 dos quais ininterruptos -, de responsabilidade* directas na concepção e execução da política agrícola, tendo beneficiado de um conjunto de meios financeiros e de condições políticas para introduzir reformas estruturais, antes nem sequer imagináveis.
Sem dinheiros comunitários fez mais o Dr. Salazar pelo aproveitamento dos recursos hídricos para fins agrícolas do que os governos do Prof. Cavaco Silva, o que, longe de constituir elogio aos resultados dos Planos de Fomento do Estado Novo, demonstra bem a falta de mérito da governação do PSD nesta matéria.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Protestos do PSD.

O Orador: - Para além de nem sequer ter havido capacidade para proceder à reabilitação dos perímetros de rega existentes (ainda há dias a comunicação social fez eco de opiniões cientificamente credíveis, segundo as quais os actuais sistemas de gestão da água nos perímetros beneficiados pelo Estado desperdiçam 60 % da água utilizada),...

O Sr. António Braga (PS): - É típico do PSD!

O Orador: -... os governos do PSD secundarizaram completamento o esforço de investimento neste domínio, como, com toda a frieza, o demonstram os indicadores de execução do mais importante instrumento de intervenção neste campo - o PEDAP.
Por tudo isto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, para além dos tristes ensinamentos que a situação ad uai nos permite retirar, porque o fenómeno da seca é cíclico e se reveste de alguma regularidade, impõe-se a urgente adopção das medidas que propomos e doutras que se reconheçam igualmente positivas, mas impõe-se sobretudo uma profunda inflexão política que passe pelo rápido início do estudo, inventariação e aproveitamento dos recursos hídricos nacionais, dando execução, sem demora, a projectos como o do Alqueva ou dos Minutos que, sempre suspensos ou adiados, fazem com que a situação seja agora mais grave e maior o esforço de solidariedade do País para com as zonas e os sectores mais afectados.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Vasco Miguel.

O Sr. Vasco Miguel (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Capoulas Santos, lemos assistido, desde há muito, a uma luta entre o Partido Comunista Português e o Partido Socialista no sentido de, efectivamente, saber qual deles apresenta medidas mais reivindicativas para as zonas atingidas pela seca.
Ora, a questão que lhe quero pôr prende-se com o facto de estarmos a apreciar um projecto de resolução apresentado pelo Partido Comunista, pelo que a pergunta é muito simples: o Sr. Deputado Luís Capoulas Santos vai votar o projecto de resolução que o Partido Comunista apresentou ou vai votar o seu pseudo-projecto, que acabou de enunciar?
É que, efectivamente, o seu é muito mais completo, só que não pode ser votado! Muito concretamente, penso que temos de ter aqui discussões sérias e como está em análise o projecto de resolução do Partido Comunista apenas me interessa saber se os senhores apoiam ou não este projecto de resolução.

O Sr. António Braga (PS): - E vocês?!

O Orador: - O Sr. Deputado a seu (empo irá saber. Aliás, é já de seguida.
É que assim os senhores andam a iludir-nos: não querem ficar atrás das propostas do Partido Comunista e este, por seu lado, vem de seguida, com certeza, aqui, com outro normativo porá passar a frente das propostas que o Sr. Deputado agora enunciou. Mas, Srs. Imputados, não «embarcamos» nisso! Não podemos «embarcar» neste tipo de actuação.
Na verdade, compreendemos que a questão da seca é um problema dramático e sério, pelo que não podemos vir aqui fazer parangonas políticas. O que o Sr. Deputado fez e tenho muito respeito por si, pelo que peço desculpa, mas tenho mesmo de o dizer -, foi marginalizar, de certa maneira, o debate que estava em questão, pois tínhamos um projecto de resolução para apreciar e o Sr. Deputado falou de um projecto seu! Aliás, um projecto que, inclusive, não pode ser votado!
Portanto, a sua intervenção não foi séria: reivindicou tudo, mas sem qualquer cabimento neste ponto do debate.
Assim, quero saber, muito concretamente - e é importante que o Sr. Deputado diga a esta Câmara -, se vai votar ou não o projecto de resolução do Partido Comunista, porque o seu, efectivamente, não pode ser votado.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Capoulas santos.

O Sr. Luís Capoulas Santos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Vasco Miguel, muito obrigado pela sua questão.
Pretendi, com a minha intervenção, introduzir o tom de seriedade que a matéria justifica, pois na qualidade de Deputado pelo círculo de uma das zonas mais afectadas pela seca não poderia deixar de trazer aqui a preocupação, que é uma preocupação crescentemente gritante, de um número progressivo de pessoas ligadas ao sector agrícola, e não só.
Quanto à questão concreta que me colocou, o Sr. Deputado terá oportunidade de saber qual o sentido de voto da bancada do Partido Socialista no momento da votação, naturalmente.
Como teve oportunidade de verificar, há uma zona de interpenetração relativamente a algumas das medidas constantes do projecto de resolução aqui em debate e, obviamente, com essas estaremos de acordo. Mas o sentido principal da minha intervenção consistiu em alertar o Governo que, há mais de dois meses, tem vindo, pura e simplesmente, a enganar o País, anunciando-lhe um conjunto de medidas que está, cada vez mais, demonstrado que não tem qualquer, conteúdo.

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Admitindo que exista, da pane dessa bancada e do Governo, um sentido mínimo da responsabilidade que a situação exige, espero, com o conjunto de sugestões do Partido Socialista, permitir que o Governo, a quem compele adoptar a maior parle delas, possa, eventualmente - e não reclamaremos aqui direitos de autor -, adoptar as medidas que propomos, medidas estas que são positivas, mais completas e não encarecerão mais o Orçamento do listado do que as pseudomedidas que o governo do PSD anunciou.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vasco Miguel.

O Sr. Vasco Miguel (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de resolução n.º 18/VI, da autoria do Partido Comunista Português, sobre medidas de combate à seca, tem como objectivo, à primeira vista, fazer transparecer para a opinião pública uma preocupação acrescida em relação a todas as outras forças políticas de um problema grave, que penso todos estarem perfeitamente conscientes e empenhados na diluição das suas consequências.
A tentativa atrás referida è perfeitamente visível comparando as medidas que aqui foram apresentadas pelo Sr. Secretário de Estado dos Mercados Agrícolas e Qualidade Alimentar aquando de uma pergunta feita pelo Sr. Deputado António Campos sobre este mesmo tema. Mas, efectivamente, com algumas alterações para pior, o que nos leva a admitir que se trata de uma má cópia, onde são incluídas uma série de medidas já implementadas e outras tantas que estão aquém do preconizado pelo Governo, não falando já nas que estão perfeitamente contempladas em legislação já existente.
O problema da seca constitui, sem margem alguma de dúvida, uma questão, ou melhor, uma grande preocupação para os agricultores, particularmente os das zonas mais atingidas.
Cabe-nos, certamente, lutar ao seu lado no sentido de minorar os seus prejuízos, levando a que o Governo actue com eficácia e prontidão com todos os dispositivos que estiverem ao seu alcance.
Silo sobejamente conhecidas as medidas que o Governo accionou, as que vai accionar e ainda o esforço que neste momento está a lazer para alargar o leque de apoios da Comunidade Europeia, já anteriormente estabelecido no âmbito financeiro e no fornecimento de alimentos.
Inúmeras acções já foram realizadas pelas diversas bancadas parlamentares em tomo desta temática; quanta informação já nos foi cuida pelo Governo e pelas associações de agricultores; a Comissão de Agricultura e Mar já visitou as zonas mais atingidas.
Para quê esta tentativa de aproveitamento político, Srs. Deputados do Partido Comunista? A seca não pode servir de bandeira política para ninguém e muito menos como bode expiatório da vossa falta de capacidade para inovar e reorganizar algo de que foram reis e senhores. Este projecto de resolução mostra claramente que estão secos de ideias e de ideais.
Pensamos que colaborar na resolução e ler sobre tudo isto uma visão séria é perfeitamente compatível com as nossas competências, é perguntar ao Governo o ponto da situação neste momento, tanto no que diz respeito a uma inventariação global dos prejuízos como sobre a implementação das medidas estabelecidas.
Depois, e só depois, é que poderá haver da nossa parle uma tomada de posição séria e coerente, que pode incluir ou não uma crítica ou um apoio, ou até - porque não - um conjunto de sugestões que complementem, se necessário, tudo o que foi feito.
O Grupo Parlamentar do PSD não embarca em processos demagógicos que tem em vista, única e exclusivamente, uma tentativa de manipulação dos agricultores. Pensamos mesmo que estes métodos já estavam ultrapassados em virtude do pouco que haviam rendido no passado.
Srs. Deputados, vamos continuar alentos ao avançar das medidas e ò respectiva incidência na melhoria da situação, mas para já é nossa opinião que foram oportunas e equilibradas. Como tal, pela nossa parle, esta iniciativa é descabida e sem conteúdo inovador, pelo que não terá o nosso apoio.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se para pedir esclarecimentos os Srs. Deputados Lino de Carvalho e Luís Capoulas Santos.
Para esse efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Vasco Miguel, das duas uma: ou leu mal as medidas anunciadas pelo Governo, nomeadamente pelo Sr. Secretário de Estado, quando veio a este Plenário, ou leu mal o projecto de resolução que apresentamos agora!
Sr. Deputado, está de acordo que as medidas de combate à seca sejam restringidas a sele concelhos da margem esquerda do rio Guadiana?
Estamos de acordo que esses concelhos são particularmente afectados. Mas são só esses os afectados? E quanto ao resto do Alentejo? E toda a zona do Vale do Sorraia? E a Beira Interior? E Trás-os-Montes?
Sr. Deputado, está de acordo que os apoios a compensação de indemnizações por perda das searas se limite aos cereais de Outono/Inverno e com tectos de produtividade que não vão além dos 800-900 kg/ha como base de cálculo? E as culturas de Primavera e de regadio que não venham a ser feitas por falta de água nas albufeiras?
Sr. Deputado, está de acordo com a ausência de apoios às autarquias para fazer face aos encargos financeiros acrescidos, que têm de suportar, para abastecer de água as populações? Está de acordo com o facto de, ale ao momento, não terem sido definidas quaisquer medidas de apoio aos trabalhadores rurais desempregados, que devido à falta de trabalho nesse sector vão enfrentar situações inesperadas? Está de acordo com a ausência de comissões de acompanhamento a nível concelhio em que participem as diversas organizações da lavoura?
Sr. Deputado, estas são algumas das medidas que propomos e que não vimos registadas nas medidas enunciadas pelo Governo. Além do mais, já lá vão dois meses desde que foi anunciado esse rol genérico de medidas e até ao momento só uma foi implementada: a que antecipou o subsídio à alimentação do gado em metade de uma verba global para um determinado número de concelhos e que ainda não se sabe sequer qual é!...
Nós não copiámos. Pelo contrário, antes de o Sr. Secretário de Estado aqui se deslocar e antes de o Governo se pronunciar, fizémos uma intervenção sobre esta matéria onde avançámos o essencial das medidas que agora propomos no projecto de resolução, ou seja, com medidas muito mais amplas e abrangentes.

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Estas são as questões serias e deixo de lado, sem resposta, as cassetes normais que o Sr. Deputado Vasco Miguel aqui traz, já que o conteúdo da discussão é uma matéria que a todos deve preocupar tem a ver com os problemas da seca, com as medidas estruturais e de emergência para as quais é necessário accionar os mecanismos para o seu combate. Na verdade, ao longo destes meses, o que verificamos da parte do Governo são palavras, palavras, palavras,... mas faltam as acções enérgicas no terreno.
É essa a questão concreta que está aqui colocada

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Capoulas Santos.

O Sr. Luís Capoulas Santos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Vasco Miguel, lendo em atenção a escassez do tempo, gostaria de colocar-lhe com toda a frontalidade duas questões.
Em primeiro lugar, gostava de saber se considera que as medidas anunciadas e o grau de pormenorização efectuado até este momento são respostas satisfatórias para a ansiedade e para o desespero de milhares e milhares de agricultores do nosso país.
Sr. Deputado, tendo em atenção o cancelamento, há 12 anos, do projecto do Alqueva, e dado o significado que tem para a reconversão de uma vasta região que, desde então, não tem deixado de ver aumentada significativamente a sua desertificação física e humana, gostaria de saber se o PSD, como tudo indica, vai finalmente desbloquear o processo e se pensa que não há uma responsabilidade política já que as gerações vindouras terão de pagar por um adiamento que se repercutirá por mais de uma década, pois a conclusão das obras demorará cerca de duas se se iniciarem desde já.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Vasco Miguel.

O Sr. Vasco Miguel (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por agradecer as questões que me colocaram, mas não posso deixai de dizer que o Sr. Deputado Lino de Carvalho mais não fez do que enunciar o já conhecido rosário de perguntas de sempre quando aqui se fala da problemática da seca.
Na verdade, Sr. Deputado, não conheço nenhuma disposição legal que consagre que as ajudas vão ser restritas às zonas mais afectadas da margem esquerda do Guadiana, embora se dê prioridade as zonas mais debilitadas que, em nossa opinião, são precisamente essas. Certamente o Sr. Deputado concorda com esta medida.
Gostaria ainda de salientar que, em meu entender, o Sr. Deputado fez mal as contas no projecto que aqui apresentou, que se prendia com as indemnizações para cobrir os prejuízos sofridos pelas searas, incluindo os cereais não abrangidos pelos apoios comunitários, como as aveias e as oleaginosas, na base da área semeada e da média da produtividade do último triénio. Não queira prejudicar os agricultores!
Mas, já agora, posso informá-lo que a média do último triénio foi de 1600 kg/ha e a proposta do Governo é de 2000 kg/ha. Esta é uma questão que me parece bastante importante.
Por outro lado, Sr. Deputado, também não diga que não foi nada feito, que as suas medidas é que estão correctas e que tudo está por implementar, pois o Sr. Deputado sabe que no Conselho de Ministros de 19 de Março foi dada autorização para o pastoreamento ou corte das searas perdidas para o gado sem perda de subsídio à produção de cereais.
O Sr. Deputado também referiu algumas soluções para os problemas que se levantam com a questão da seca e que se prendem com a legislação já existente. Remeto-o, por exemplo, para a lei do arrendamento no que diz respeito à não rescisão de contratos de arrendamento quando o não cultivo da terra se deva à seca. E poderia ainda remetê-lo para outras disposições.

O Sr. Lino Carvalho (PCP): - Responda às questões que lhe coloquei!

O Orador: - Na verdade, ouvimos um rosário de questões. Não ponho em causa a sua preocupação quanto à questão da seca, aliás, nunca foi minha intenção fazê-lo, mas o que me parece é que falamos vezes demais da seca sem ter dados concretos da realidade. E estou já a reportar-me à questão colocada pelo Sr. Deputado Luís Capoulas Santos, que tem a ver com a inventariação da situação neste momento. O Sr. Deputado Luís Capoulas Santos sabe exactamente quid é, neste momento, o ponto da situação no que diz respeito à concretização das medidas que foram implementadas pelo Governo? Duvido que saiba, Sr. Deputado!
Penso que este debate só seria sério depois de sabermos exactamente qual é o ponto da situação, pois não me parece correcto virmos aqui falar da seca sem conhecer a realidade que se vive actualmente. Já se fala da seca há muito mais tempo, pois até no último debate que aqui travámos, e que teve a ver com Bruxelas, foram discutidos muitos aspectos e apresentadas propostas - por acaso o Partido Socialista não apresentou nenhuma, mas até podia ter apresentado, não é isso que está aqui em causa agora - que fazem parle do documento que emanou do Parlamento Europeu para a Comissão e para o Conselho. Mas, neste momento, tudo se reporta apenas a um simples comentário: querem ter a dianteira na questão das secas. Quem é que, efectivamente, oferece mais aos agricultores? Nós não vamos nisso, Srs. Deputados!
No que diz respeito ao Alqueva, o Sr. Deputado Luís Capoulas Santos admite que um projecto da envergadura do Alqueva se possa fazer sem um estudo efectivo e concreto?

O Sr. Luís Capoulas Santos (PS): - Demoraram 10 anos a estudar!

O Orador: - Sr. Deputado, antes de o PSD ser governo, já o PS tinha sido e nunca os Deputados do PSD aqui levantaram essa questão da responsabilidade nem nunca vos atribuímos qualquer responsabilidade por não lerem elaborado um projecto para o Alqueva.
Mas os Srs. Deputados estão agora a falar no Alqueva e só costumam falar nas coisas quando elas se vão concretizar. Ora, penso que isso agradável, pois pode ser que consigam, realmente, transmitir à opinião pública essa ideia de que foram os Srs. Deputados do Partido Socialista que alertaram o Governo para essas coisas. Na verdade, parece que está em vias de resolução o problema do Alqueva, tal qual os Srs. Deputados preconizam, e talvez nós também! Não me compele a mim falar sobre isso. Não é essa a questão que aqui me trouxe, mas, com certeza, vamos ter ainda oportunidade de falar muito sobre essa questão do Alqueva.
De qualquer maneira, não me parece justo vir aqui falar no Alqueva e não dizer, com seriedade, com lisura, que, efectivamente, o projecto do Alqueva não pode ser des-

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poletado por um sonho. Nilo sou perito nessa área, mas penso que vão ser necessários muitos anos para concretizar um projecto daquela envergadura.

Vozes do PS: - O Alqueva já tem barbas!

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - O projecto do Alqueva começou antes do 25 de Abril e quem o suspendeu não foi o Partido Socialista.

O Orador: - Srs. Deputados, a questão da seca é mais uma questão com que o Partido Socialista costuma divertir-se, mas nós levamos as coisas a sério e somos incapazes de fazer apartes como os que estão a surgir da bancada do Partido Socialista.
Penso que tudo tem de ser feito com dignidade e na altura devida.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peco-lhe para concluir a sua resposta.

O Orador: - Sr. Presidente, vou concluir dizendo o seguinte: tratar do problema da seca com o PSD só se houver apoio e um inventário concreto do ponto da situação. Vir aqui com projectos de lei só para tomar dianteiras e apanhar comboios em andamento, será bom que saibam que o PSD não embarca nisso!

Aplausos do PSD.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - O PSD é que fica sempre na estação!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, esgotaram-se as inscrições e também o tempo de quase todos os grupos parlamentares para o debate desta matéria relativa as medidas de combate à seca Declaro, por isso, encerrado o debate.
A votação dos projectos de resolução n.ºs 16/VI e 18/VI, que foram discutidos, será realizada na próxima terça-feira.
A nossa próxima reunião plenária terá lugar na quinta-feira, às 15 horas, e terá como ordem do dia a interpelação ao Governo n.º 5/VI (CDS), sobre política geral, com incidência na solidariedade institucional e do cumprimento das competências do Governo da República quanto às Regiões Autónomas.
Entretanto, votar-se-á, também na quinta-feira, à hora regimental, o parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre o recurso interposto da decisão do Presidente da Assembleia da República de admitir o projecto de lei n.º 147/VI (CDS), sobre a lei da greve.

Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 50 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

António José da Mota Veiga.
António Maria Pereira.
Carlos Lélis.
Carlos Manuel Gonçalves.
Fernando Cardoso Pereira.
Fernando Gomes Pereira.
Francisco Bernardino Silva.
Manuel Antero Cunha Pinto.
Manuel Casimiro de Almeida.

Partido Socialista (PS):

Alberto de Oliveira e Silva.
António Oliveira Guterres.
Carlos Manuel Costa Candal.
José Apolinário Portada.

Partido Comunista Português (PCP):

António Simões de Abreu.
Maria Odete dos Santos.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Adérito Soares Campos.
Alberto Cerqueira Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Álvaro José Martins Viegas.
António Correia Vairinhos.
António de Carvalho Martins.
António Paulo Coelho.
Carlos Almeida Figueiredo.
Carlos Miguel de Oliveira.
Cecília Pita Catarino.
Duarte Rogério Pacheco.
Elói Franklin Ribeiro.
Filipe Manuel Silva Abreu.
Guido Orlando Rodrigues.
João de Oliveira Martins.
João José Pedreira de Matos.
Joaquim Cardoso Martins.
José Álvaro Pacheco Pereira.
José Ângelo Correia.
José Bernardo Falcão Cunha.
José Freitas Costa Leite.
José Manuel da Silva Costa.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Manuel Azevedo.
Manuel Castro de Almeida.
Maria Fernanda Dias Cardoso.
Mário Belo Maciel.
Mário de Oliveira Santos.
Nuno Delerue Alvim de Matos.
Pedro e Holstein Campilho.
Pedro Manuel Passos Coelho.
Rui Carlos Alvarez Carp.
Rui Fernando da Silva Rio.
Rui Manuel Lobo Gomes Silva.
Simão José Ricon Peres.

Partido Socialista (PS):

António Crisóstomo Teixeira.
António Domingues Azevedo.
Carlos Cardoso Lage.
Eduardo Ferro Rodrigues.
Eurico José de Figueiredo.
Fernando Pereira de Sousa.
Guilherme de Oliveira Martins.
Joaquim Fialho Anastácio.
Joel Eduardo Hasse Ferreira.
José Manuel Leio Almeida.
José Rodrigues dos Penedos.
José Sócrates de Sousa.
Júlio Miranda Calha.

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Leonor Coutinho Santos.
Manuel António dos Santos.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião.
Apolónia Maria Teixeira.
Luís Carlos Martins Peixoto.
Maria de Lourdes Hespanhol.
Vítor Manuel Ranita.

Centro Democrático Social (CDS):

Adriano José Alves Moreira.
Manuel Rodrígues Queiró.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Isabel Maria Almeida Castro.

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