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1 DE JULHO DE 4992 2677

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr: Subsecretário de Estado: É um debate com grande pertinência este que hoje realizamos sobre o regime jurídico dos arquivos e do património arquivístico. De há muito tempo que todos os grupos parlamentares se vêm pronunciando pela necessidade de uma lei quadro reguladora dos arquivos, do património arquivístico e da política arquivística nacional. Ainda não há muito tempo essa necessidade foi salientada quando aqui se debateu o destino a dar aos arquivos da PIDE/DGS e da Legião Portuguesa.
Este debate está, no entanto, fortemente condicionado e limitado quanto às suas consequências concretas, não apenas pelo carácter redutor da opção do Governo de solicitar uma autorização legislativa para uma matéria que já constituía objecto de anterior iniciativa legislativa mas, também, porque só ontem, ao fim da tarde, nos, foi dado a conhecer o conteúdo do decreto-lei que o Governo pretende vir a aprovar ao abrigo da autorização que lhe for concedida. Este procedimento tem, evidentemente, o intuito de diminuir o debate parlamentar sobre a matéria, deslocando-o para outra sede ou, melhor dizendo, para parte nenhuma, deixando as decisões, como vem sendo hábito, para o puro arbítrio do Conselho de Ministros.
Todavia, o debate está condicionado por algo mais grave: é que o Governo optou, como se costuma dizer, por pôr o carro a andar à frente dos bois e, antes de vir aqui debater a política de arquivos, tratou de extinguir o Instituto Português de Arquivos e de caiar os Arquivos Nacionais/Torre do Tombo, tratando agora questões tão importantes como a gestão nacional dos arquivos ou a coordenação e a própria concepção da política arquivística nacional por mera remissão para decisões anteriormente tomadas pelo Governo no âmbito da tal reestruturação da SEC.
Assim, estando consumada a extinção do Instituto Português de Arquivos e a criação, em sua substituição, dos Arquivos Nacionais/Torre do Tombo, e tendo já sido definidas unilateralmente pelo Governo as atribuições deste organismo no âmbito da política de arquivos, trata-se agora de solicitar a autorização - que a maioria não negará para remeter a política de arquivos para as atribuições e competências de um "órgão de gestão", que não serão especificadas em lei posterior porque já estão estabelecidas por decreto-lei anterior, aliás, já chamado a ratificação pelo Grupo Parlamentar do PCP.
A extinção do IPA e a transferência das suas funções sem os anteriores especialistas, entretanto dispersados previamente à definição de uma lei quadro dos arquivos, abrindo a porta à actuação arbitrária de quem despreza a necessidade de conservar documentação histórica, foi uma machadada na arquivística nacional.
Deixando cair a concepção de uma rede nacional de arquivos e de uma política arquivística integrada, abriu-se caminho à arbitrariedade na definição da- política arquivística, comprometendo um trabalho de anos que daria resposta aos desafios inadiáveis da arquivística moderna e do interesse nacional.
O organograma dos Arquivos Nacionais/Torre do Tombo revela a ausência de uma hierarquia clara entre serviços: os que devem estudar a aplicação da política arquivística e os que estão encarregados de fazê-lo na Torre do Tombo. Não fica, pois, claro quem vai aplicar essa política. Não é apenas a estrutura que não se revela funcional, como são as pessoas competentes e com trabalho realizado que já lá não estão, podendo tudo comprometer o trabalho de anos do IPA.
Em artigo notável, publicado em 12 de Maio no jornal o Público, o Prof. Doutor José Mattoso já tão citado e elogiado neste debate aludia à incultura do poder político por não compreender o valor da cultura para o desenvolvimento do País, promovendo-a não por acreditar na sua importância real, "mas apenas em virtude da sua função decorativa ou como suporte do poder [...].
Há dois anos continuo a citar o Professor José Mattoso, o Governo resolveu honrar as boas tradições portuguesas do poder nesta matéria. A SEC tratou de expulsar os intelectuais dos seus gabinetes; substituiu-os por gestores, assessores, inspectores, controleiros e seguranças; iniciou, a seguir, o cuidadoso desmantelamento dos organismos existentes e o cancelamento dos projectos em curso e desencadeou processos disciplinares contra os menos dóceis. Tudo está a postos para colocar no quadro de excedentes os funcionárias incómodos e recomeçar tudo do zero.
Entretanto, para salvar as aparências, confiou a guarda da Torre do Tombo a um intelectual, mas teve o cuidado de o escolher na rara subespécie dos que nutrem uma especial predilecção pelos métodos policiais".
Acabei de citar provavelmente com o agrado de todos os Srs. Deputados o Sr. Prof. Doutor José Mattoso. Apetece, pois, perguntar: que outra coisa seria de esperar de um governo liderado por um Primeiro-Ministro que resume os seus hábitos de leitura a uns livros policiais e que o afirma publicamente como se a sua confessada e confrangedora incultura pudesse ser motivo de orgulho ou fosse exemplo digno de ser seguido?!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Permitam que volte a citar o artigo do Professor José Mattoso, na parte em que afirma que afirma que o problema não é tanto o da reestruturação dos serviços, mas a destruição de estruturas penosamente montadas, a interrupção gratuita de projectos, a expulsão de técnicos competentes, a intimidação dos que ficaram, a entrega das chefias a quem tem uma concepção policial da sua função.
Designar esta fúria destruidora como vandalismo cultural não é um exagero retórico, porque num pais com poucos recursos culturais, com uma desoladora falta de técnicos competentes, com dificuldades de planeamento e de organização, este desprezo pelo que foi feito anteriormente, esta incapacidade de aproveitar o que estava já em curso, esta mania de inovar, além de demonstrar a `barbárie' de quem o faz, acentuam o carácter irreparável das destruições à que se procedeu". É este o pensamento do Sr. Prof. Doutor José Mattoso.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Onde se exigia um organismo autónomo, flexível, isento e capaz de

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