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3 DE JULHO DE 1992 2687

consciente de que estava em ano de eleições, metesse o projecto na gaveta de onde há poucos dias voltou a sair.
O projecto não ficou esquecido nem abandonado pelos seus mentores: Limitou-se a aguardar melhor oportunidade.
Também desta vez, o projecto de lei surge rodeado de ingredientes folhetinescos que bem caracterizam os seus autores. É o dito por não dito. É o facto desmentido a pés juntos que, afinal, se revela como sendo verdadeiro. São, mais uma vez, as dúvidas e as especulações sobre a paternidade ou a maternidade de tal projecto, que ninguém ousa recusar inteiramente, mas que ninguém assume com frontalidade.
Mas não é a questão da paternidade do projecto que é verdadeiramente grave. O mal de tal filho que tanto envergonha os seus pais está, precisamente, em ter vindo ao mundo. O grande problema deste projecto não é tanto o de saber quem o pensou ou escreveu. O grande problema é que o projecto de lei do PSD sobre segredo de Estado, preconizando a substituição da Administração aberta e da transparência na condução dos assuntos públicos pelo secretismo elevado a regime regra da actividade governamental e com contornos praticamente discricionários, voltou a ser apresentado. Quanto ao autor material, é o PSD, é Cavaco Silva, independentemente de quem, circunstancialmente, possa aparecer a dar a cara pelo projecto.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O PSD sabe que falhou na sua primeira tentativa de impor um regime de segredo de Estado subversivo da ordem constitucional, por força de uma poderosa oposição que se manifestou na opinião pública. E sabendo-o, face aos justificados alertas que começaram a surgir por antecipação a esta segunda tentativa, o PSD passou rapidamente à ofensiva e tratou de encenar toda uma operação de charme em torno de um suposto novo projecto, pretensamente respeitador da excepcionalidade do segredo de Estado, para tentar fazer passar por novo e diferente um projecto de lei que, no concreto, em nada difere do anterior.
Este projecto de segredo de Estado é, nada trais, nada menos, a reapresentação do projecto anterior.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: A aprovação de uma lei sobre segredo de Estado que consagre a sua estrita excepcionalidade decorre da Constituição. Não para permitir ao Estado passar a ter segredos que hoje não tenha, mas precisamente para limitar os abusos que possam ocorrer da falta de regulação legal desta matéria.
O segredo de Estado deve ser delimitado, para evitar que possam ocorrer situações como a que resultou da invocação escandalosa do segredo de Estado, pelo Primeiro-Ministro Cavaco Silva, para inviabilizar o julgamento em Portugal de indivíduos implicados nas acções terroristas dos GAL.
Uma lei sobre segredo de Estado não pode servir para delimitar extensivamente as matérias sob a sua alçada ou para alargar o secretismo da vida pública. Deve servir rigorosamente para o contrário: para, dando concretização aos princípios da Administração aberta e da publicidade dos actos do Estado, reduzir à mais estrita excepcionalidade os casos em que o segredo se justifique e pôr cobro a situações que, como se sabe, frequentemente se verificam na acção governativa do PSD, de ocultação ilegítima de informação aos cidadãos, à comunicação social ou aos partidos da oposição.

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

O Orador: - O segredo de Estado não deve servir para defender o Estado dos cidadãos. É algo que, tendo obviamente que ver com a defesa do Estado, tem tanto ou mais a ver com a defesa dos cidadãos, face aos abusos do Estado.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Não há nada a opor a uma discussão séria, nesta base, sobre segredo de Estado. O Grupo Parlamentar do PCP chegou a apresentar, na anterior legislatura, um projecto de lei sobre esta matéria e está pronto, a qualquer momento, para o fazer de novo. Só que não é uma discussão séria que o PSD pretende.
O que pretende o PSD é proibir a divulgação dos escândalos em que os seus membros do Governo se vêem envolvidos e ameaçar de prisão os jornalistas que ousem torná-los conhecidos da opinião pública.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O PSD não está interessado em delimitar o segredo de Estado, mas apenas em, com esse pretexto, consagrar o "segredo de Governo" e alargar os seus domínios até ao infinito. Em nome do segredo de Estado, o que o PSD pretende é restringir severamente direitos elementares dos cidadãos no acesso a informações e documentação necessários a um correcto acompanhamento da vida pública, em todas as suas vertentes.
Este projecto de lei do PSD está nos antípodas do direito à informação e da Administração aberta, adquiridos constitucionalmente, após uma luta de muitos anos. Visa proteger os governantes contra os cidadãos. Revela o medo que é próprio das consciências pouco tranquilas.
Do edifício do seu anterior projecto de lei, o PSD só alterou ao de leve o tom da pintura.
O âmbito do segredo de Estado é potencialmente o mesmo, o que quer dizer escandalosamente amplo. Pode, designadamente - sublinho o designadamente -,ser submetida a segredo de Estado uma imensidão de matérias onde quase tudo pode caber.
O debate. que, há poucos dias, aqui realizámos acerca do relatório da Comissão de Fiscalização dos Serviços de Informações e a confirmação da vigilância desses serviços sobre cidadãos no pleno exercício das liberdades democráticas foi bem revelador da grave mutilação da democracia que representaria a classificação automática como segredo de Estado de todas as suas actividades. Proteger com o segredo de Estado acções de vigilância a sindicatos, a estudantes, a comunidades africanas ou a autoridades judiciais é algo de absolutamente inaceitável. Não é aceitável que o Governo utilize o secretismo das actividades dos serviços de informações para vigiar os que se lhe oponham.
Acresce ainda que, segundo o projecto de lei do PSD, podem classificar matérias como segredo de Estado todos os membros do Governo ou os seus substitutos legais.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Pode assim o Primeiro-Ministro considerar segredo de Estado os fracassos da presidência

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