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10 DE FEVEREIRO DE 1993 1367

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Sérgio.

O Sr. Manuel Sérgio (PSN): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de consumir os escassos minutos que o teimoso Regimento me concede para me referir aos recentes episódios do folhetim «Portugal-Brasil».
Estes casos inserem-se no plano da pedagogia. Um pai ou uma mãe que queiram educar os seus filhos apoiados exclusivamente na rigidez das regras, sem o necessário acompanhamento afectivo e, sobretudo, sem preparar o espirito do educando para o carácter doloroso das medidas adoptadas, provocarão uma onda de reacções contraproducente.
Não é que Portugal tenha quaisquer responsabilidades educativas sobre o Brasil, porque entre países irmãos a relação deve basear-se no critério da paridade e da reciprocidade. Mas não há dúvida que persiste uma vaga tonalidade filial na atitude do Brasil em relação a Portugal nele vendo a sua matriz genética.
Ora, é aqui que julgo que se cometeram algumas irreflexões que importa ponderar. Da parte de Portugal deveria ter havido o cuidado de fazer preceder a aplicação de medidas moralizadoras do fluxo migratório de acções preparatórias no plano diplomático que garantissem uma adaptação psicológica e até administrativa às acções planeadas por parte das autoridades brasileiras e, até, dos cidadãos daquele país irmão que tencionaram demandar Portugal; da parte do Brasil, parece-me ter surgido a reacção típica do filho agastado por ter visto nas medidas aplicadas por Portugal um gesto punitivo, expressamente dirigido àquele país, o que não corresponde, obviamente, à realidade.
Todos conhecemos as normas respeitantes ao capítulo da imigração que nos são impostas pela Comunidade Europeia e que, no caso de Portugal, têm até uma particular acuidade, dada a sua posição geográfica. São imposições decorrentes das nossas responsabilidades comunitárias que não podemos enjeitar.
Mas os nossos compromissos com a Comunidade Europeia, opção superveniente que nem por isso deixa de ser natural, não poderão, em circunstancia alguma, fazer-nos perder de vista os ancestrais vínculos histórico-culturais de um país, como o nosso, de vocação eminentemente dialogai e ecuménica. E o Brasil - valerá a pena lembrá-lo? - ocupa um lugar de relevo nesta panóplia afectiva da alma portuguesa.
O que se pede, pois - e é este o apelo, modesto mas sincero, que aqui quisera deixar-, é que o fluxo afectivo e osmótico de uma relação que o futuro exige expotenciada jamais se veja afectado por vicissitudes de uma casuística administrativa de âmbito comunitário: Que a acção governativa se paute pela prudência, para que o decreto nunca abafe o afecto, o amor.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Costa.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Sérgio, pareceu-me, através da sua intervenção, inculpar, de alguma forma, a Comunidade Europeia e as nossas relações no âmbito da Comunidade pela situação ridícula, absurda e dramática que se viveu recentemente no Aeroporto de Lisboa, situação esta que tem marcado a atitude do Serviço de Fronteiras relativamente aos cidadãos brasileiros.
Gostaria, pois, de saber se o Sr. Deputado não tem presente - eu tenho e creio que a Câmara também - as palavras clarividentes ditas aqui pelo Sr. Secretário de Estado da Integração Europeia, aquando do debate nesta Assembleia do Acordo de Schengen, em resposta a uma pergunta que, expressamente, lhe foi colocada pela Sr.ª Deputada Edite Estreia, de que Portugal teria feito uma declaração, em anexo ao Acordo de Schengen, nos termos da qual Portugal ressalvava os direitos que havia concedido aos cidadãos brasileiros na aplicação do Acordo de Schengen.
De facto, se tivermos presente esta declaração do Sr. Secretário de Estado - certamente verdadeira, porque, se o não fosse, ele teria de assumir as responsabilidades pelo que disse na Assembleia da República -, não podemos «atirar» para a Europa as culpas que são, exclusivamente, do Governo português.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Sérgio.

O Sr. Manuel Sérgio (PSN): - Sr. Presidente, na realidade concordo inteiramente com o Sr. Deputado António Costa. Não digo que, na realidade, Portugal não tenha tido culpas - aliás, salientei-as e sublinhei-as -, mas chamei a atenção para o facto de Portugal estar na Europa, havendo acordos que se estabeleceram e em relação aos quais Portugal deve obediência.
De qualquer forma, isso não esconde os erros que ocorreram, sem dúvida, no Aeroporto de Lisboa. Portanto, estou inteiramente de acordo consigo. Talvez tenha sido um pouco delida a minha palavra, por estarmos no fim do dia... Em todo o caso, repito, estou inteiramente ao seu lado.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Urbano Rodrigues.

O Sr. Miguel Urbano Rodrigues (PCP): -Sr. Presidente, Srs. Deputados: Alguns órgãos de comunicação social utilizaram a palavra crise para qualificar a situação criada, no quadro das relações entre os povos de Portugal e do Brasil, por comportamentos absurdos de autoridades portuguesas de que têm sido vítimas cidadãos brasileiros.
A definição é inadequada. As relações entre os povos tomam forma em lentos e complexos processos moleculares, independem de opções administrativas que lhes fixam o quadro jurídico e permanecem acima do circunstancialismo e da miopia burocrática.
Mas incidentes tão indecorosos como os ocorridos no Aeroporto de Lisboa - e que não envolveram apenas brasileiros - não podem passar sem reparo do Grupo Parlamentar do PCP. É compreensível a indignação que suscitaram no Brasil, onde se tomaram tema de colunas editoriais e motivaram, inclusivamente, uma tomada de posição do Presidente da República.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: não me é possível abordar este assunto com distanciamento. Não me sinto neutro, pois vivi muitos anos no Brasil. Conheço a realidade social brasileira quase tão bem como a portuguesa e, portanto, posso ver e compreender a situação na perspectiva do outro lado do Atlântico.
Fiz parte do heterogénio núcleo de exilados portugueses que, do final dos anos 50 até ao 25 de Abril, transformou o Brasil, na definição de António Sérgio, em pátria de adopção. Éramos muitos, de Humberto Delgado e Rui Luís

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