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2442 I SÉRIE - NÚMERO 76

extremamente importantes do nosso ordenamento jurídico e, de algum modo, da civilização democrática dos Estados ocidentais. Por um lado, garantir que continue a ser respeitada a autonomia e a possibilidade dos indivíduos e dos grupos devidamente organizados de não só terem os seus direitos como poderem dispor da sua tutela jurídica sem ingerências indevidas de terceiros e, por outro, reconhecer que existem situações e interesses que justificam uma acção não só de apoio, uma acção adjuvante, do juiz mas também justificam que esses interesses permitam congeminar mecanismos de legitimidade processual muito para além daqueles que são tradicionais no processo da época liberal.
Estas circunstâncias, que, por exemplo, no processo civil avançaram de uma maneira mais nítida logo em matéria de litígios nas questões laborais, permitem claramente perceber que hoje não nos podemos manter arreigadamente ligados à ideia do esquema individualista do processo civil e daquilo que, de algum modo, foi a sua derivação no processo contencioso administrativo, muito embora aí, de uma maneira um pouco singular, se tenha, no nosso caso e ao arrepio do que aconteceu na Alemanha ou na Itália, consignado uma legitimidade processual do Ministério Público indiscriminada e alargada a todos os casos, quer seja defendente, seja impugnante, seja pura e simplesmente fiscalizador da legalidade.
Portanto, é essa cautela de assegurar a coexistência entre esses dois princípios que nos obriga a sermos, por um lado, muito meticulosos e muito prudentes no estudo das soluções e, por outro, a, conscientemente, aceitarmos que é necessário inovar e ir para além dos princípios tradicionais em matéria de direito processual.
O ponto extremamente importante é, justamente, o de encontrar uma fórmula de aceitar a relevância dos chamados interesses difusos. Referiu há pouco o Sr. Deputado Almeida - e muito bem! -, que ninguém sabe em rigor o que sejam interesses difusos e há até aqueles autores que, fiéis às velhas categorias, vêm afirmar que os interesses difusos não são mais do que interesses in itinere que estão a caminho de serem reconhecidos como interesses colectivos ou como interesses individuais detidos por massas significativas dos sujeitos de direito.
Porventura, a circunstância de também, em concomitância com esta correcção, digamos assim, do modelo liberal do processo, se vir a reconhecer que, no ordenamento jurídico, o Estado não é uma pessoa colectiva una e que não há uma identificação entre o ordenamento jurídico e o Estado vem abrir a hipótese, extremamente fecunda, a meu ver, de admitir que haja interesses que não têm necessariamente de ser encabeçados nem sequer por agrupamentos colectivos não reconhecidos na sua personalidade jurídica pelo ordenamento. E é esse um dos casos em que, porventura, a acção popular se vem a revelar mais fecunda, como o evidenciam as situações em matéria de ambiente ou de saúde.
Portanto, o primeiro ponto que gostava, claramente, de deixar aqui marcado é a nossa abertura, como grupo parlamentar e como partido político, para a consideração das perspectivas inovadoras que se têm vindo a abrir, não apenas no processo administrativo mas também no processo civil, no que respeita à consideração dos interesses difusos e do posicionamento social dos litigantes.
É verdade que não é apenas o problema judicial que nos deve preocupar. Há pouco, a propósito da apresentação dos relatórios, tive ocasião de observar que se nos afigura extremamente importante dar o necessário relevo ao procedimento administrativo e reconhecer que se deu um passo significativo com o Código do Procedimento Administrativo no sentido de incorporar para o âmbito do jurídico, dando-lhe relevância, um conjunto de interesses e de posições jurídicas que, anteriormente, não havendo audiência dos interessados, não seria possível atribuir e reconhecer.
O artigo 104.º do Código de Procedimento Administrativo é, nesse capítulo, um avanço muito grande e que, aliás, tem repercussões imediatas no contencioso administrativo porque quem participa nesse procedimento, naturalmente, ipso facto ganha possibilidades de, mesmo nos esquemas tradicionais da legitimidade, vir a ser parte no contencioso administrativo.
Mas há que reconhecer que, para além daquele que já foi um progresso significativo feito na actual regulamentação do Código do Procedimento Administrativo, duas lacunas significativas podem e devem, a meu ver, ser consideradas em sede de acção popular ou dentro da matéria que estamos a considerar neste domínio.
A primeira diz respeito aos procedimentos em matéria de planificação administrativa, matéria omissa no Código do Procedimento Administrativo, que vai permitir, se justamente se aceitar a participação popular sem limitações e, portanto, de qualquer indivíduo que esteja interessado em matéria de procedimentos conformativos ao nível global, como, por exemplo, em matéria de planificação do ordenamento do território, de urbanismo ou de outras acções administrativas planificadas, que vão permitir dar a conhecer, em primeiro lugar, as suas sugestões ou as suas críticas à Administração e haver, por parte desta, naturalmente, o dever de aceitar as sugestões para as ponderar e, depois, justificar a razão por que eventualmente as rejeita.
É evidente que, nesta circunstância, a participação eventual de um actor popular no contencioso administrativo ganhará um outro relevo, uma outra importância e terá um outro impacte.
Também, ainda em matéria de procedimento administrativo, não será despiciendo dar o devido relevo aos chamados processos de massa, isto é, aos processos em que podem participar conjuntamente ou até um, apenas, em representação de muitos que tenham interesses similares. É já uma aproximação muito significativa e muito importante àquilo que é o interesse próximo do interesse difuso, embora a identificação de um conjunto de titulares permita classificá-lo, ainda, como interesses individuais repetidos num conjunto vasto de cidadãos.
Depois, em matéria de processo civil, a meu ver, há que avançar claramente na investigação das possibilidades das chamadas «acções de grupo» e das class actions. Trata-se não apenas de multiplicar casos de substituição processual com bases objectivas e, eventualmente, automáticas, mas de ir para além disso e de, portanto, admitir uma capacidade judiciária activa muito para além das situações em que tradicionalmente a doutrina a aceita.
Por último, em matéria de processo penal, reconhece-se que é possível, quanto aos actos que tomam obrigatório pôr em marcha o processo penal e quanto à participação no processo penal como assistentes, alargar as condições em que essa participação pode ser feita. Mas deve reconhecer-se que estas considerações não levam a ignorar que as problemáticas próprias do procedimento administrativo, do processo contencioso administrativo, do processo penal e do processo civil merecem que se lhes dê um tratamento adequado e um tratamento que deve ser diferenciado.

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