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17 DE NOVEMBRO DE 1993 393

A comparação com o que diz hoje é espantosa. Em política é legítimo ter o sentido da oportunidade, mas o que não pode é fazer-se do oportunismo uma política.

Aplausos do PS.

Em matéria de sinceridade, remeto-os ainda para a teorização que fazia o actual Primeiro-Ministro, em 1982, sobre a verdade em política económica (e aproximamo-nos do orçamento): «Eu, como ministro, nunca iria à televisão dizer que os preços iriam subir e, por isso, disse que era um erro tremendo o que o penúltimo Ministro do Comércio tinha feito. Eu, como ministro e como economista, só posso ir à televisão dizer que os preços vão subir menos, porque não gosto de cometer suicídio nem político, nem económico. E óbvio que um ministro não pode dizer que os preços vão subir. Tem de dizer que vão baixar.»

Risos do PS.

Se olharmos, hoje, as afirmações e as promessas feitas pelo Primeiro-Ministro e pelo Governo, à luz da teoria da verdade em política explicada pelo seu autor, teremos de concluir que elas não têm relação com a realidade do País. Tem, sim, a ver com os objectivos e os interesses do Governo. Tudo o que é bom para o Governo, tudo o que é bom, afinal, para o PSD, passa a ser verdadeiro. Tudo o que é mau para o Governo e para o PSD passa a ser falso. Por isso, este Governo nunca aceita as verdades incómodas. Para ele, fazê-lo seria um «erro», «um suicídio político e económico.»

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É uma doutrina excelente para conservar o poder a todo o custo, mas é uma doutrina fatal, quando aplicada por quem governa o País em período de dificuldade.
Ela explica, aliás, cabalmente, a forma como o Governo tem tratado o problema do desemprego. No quadro da teoria do oásis, começou por negá-lo até princípios deste ano. Isto apesar de as próprias estatísticas do INE revelarem então que, no período de um ano, se tinham perdido cerca de 170 mil postos de trabalho. Só que não foi para desempregados, foi para inactivos!
Logo depois, ouvimos o Primeiro-Ministro afirmar, com um sorriso, que fazer subir a taxa de desemprego para 6 % era um enorme sucesso deste Governo. Não comento agora o que isto significa em termos de. insensibilidade social. Em 23 de Abril, uma entrevista do Ministro do Emprego e da Segurança Social dava origem ao título: «Desemprego não é um problema do Governo». O mesmo Ministro viria a suspender, durante dois meses, a publicação das estatísticas do seu Ministério, para que elas não desmentissem os números anunciados pelo Primeiro-Ministro.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É que para este não conta o registo dos desempregados inscritos nos centros de emprego, só lhe interessa as estatísticas do INE, feitas por amostragem, e em que basta que um trabalhador inquirido tenha tido uma hora de actividade na semana anterior, mesmo em propriedade agrícola sua ou arrendada, para não ser considerado oficialmente desempregado. Também os que não tenham feito nenhuma diligência, no mês anterior, passam de desempregados a inactivos e deixam de figurar nas estatísticas. Basta conhecer o tecido sociológico, sobretudo no norte e centro do País, para compreender quantos dramas humanos ficam à margem das estatísticas do INE. Paciência! O que era preciso, então, era manter as aparências.
Um dia, porém, de repente, esta indiferença, esta insensibilidade social ao desemprego terminou. Como Saulo, na estrada de Damasco, também o Primeiro-Ministro viu a luz. Mas, por coincidência, só descobriu o desemprego no momento em que a sua invocação se tornava necessária para exigir aos trabalhadores, em nome do emprego, a redução dos salários reais.

Aplausos do PS e dos Deputados independentes Mário Tomé e João. Corregedor da Fonseca.

Mais um exemplo admirável da aplicação da teoria PSD da verdade em política.
Só que nem o Primeiro-Ministro consegue explicar o que ninguém consegue explicar: que o mesmo País que recebe, em média, mais de um milhão e meio de contos, em cada dia útil, a fundo perdido, das Comunidades Europeias, veja, no mesmo dia útil, inscreveram-se mais de um milhar e meio de desempregados nos respectivos centros de emprego. De facto, só em Outubro, inscreveram-se 31 114 novos desempregados. É o número mensal mais elevado desde que há registos, e eles existem desde os anos setenta. É o pior de todas as crises a que assistimos nas duas últimas décadas.
O Ministro das Finanças tinha prometido para este Outono uma recuperação que antecederia a recuperação europeia, começa a falar-se da recuperação europeia, mas o desemprego, em Portugal, aumenta a um ritmo sem paralelo nas duas últimas décadas.

O Sr. António Vairinhos (PS): - E nó resto da Europa?!

O Orador: - Por tudo isto, o PS tem defendido, desde há muito tempo, que o emprego constitua a principal prioridade da política económica; que esta, e em particular a política monetária, tem de visar, sobretudo, o combate à recessão e o relançamento da economia; que é preciso promover a formação de um mercado social de emprego, destinado a satisfazer as necessidades sociais e ambientais, mobilizando o Estado e a sociedade civil, para além das medidas de formação e de mera gestão do desemprego, utilizando os fundos comunitários; que é preciso estabelecer um Rendimento Mínimo Garantido, para evitar as formas mais dramáticas de pobreza e de exclusão social.
Face a tudo isto, o que nos choca é a desorientação evidente na condução da política económica. O conjunto de hesitações, de mudanças de rumo, o conflito permanente entre o Ministério das Finanças e o Banco de Portugal, perante a manifesta falta de autoridade política do Primeiro-Ministro.
O Governo chumba, assim, nos dois exames a que o sujeitámos sobre os critérios que asseguram a confiança dos cidadãos. Este Governo não faz parte do activo do País, é um encargo do nosso passivo. Usando a linguagem anglosaxónica, tão cara ao Ministro das Finanças, não é um asset é uma liability.

Aplausos do PS.

Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, neste contexto, o debate em concreto das verbas do orçamento assume uma importância muito relativa. Ainda assim, vamos fazê-lo.