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I Série - Número 49

Quinta-feira, 17 de Março de 1994

DIÁRIO da Assembleia da República

VI LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1992-1993)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 16 DE MARÇO DE 1994

Presidente: Exmo Sr. António Moreira Barbosa de Melo

Secretários: Exmos Srs.
João Domingos Fernandes de Abreu Salgado
Vítor Manuel Caio Roque
José Mário Lemos Damião
José de Almeida Cesário

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 30 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da entrada na Mesa do projecta de resolução n.º 96/VI, de requerimentos e de respostas a alguns outros.
Em interpelação à Mesa. o Sr. Deputado José Vera Jardim (PS), a propósito do Dia Mundial dos Direitos dos Consumidores, saudou as organização defesa do consumidor e as suas actividades, ao que se associaram os Srs. Deputados Octávio Teixeira (PCP), Rui Carp (PSD) e Nonata Coissoró (CDS-PP).
Em declaração política, o Sr. Deputado Manuel dos Santas (PS) criticou a política económica do Governo, lendo, no final respondido a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Rui Rio e Rui Carp (PSD).
A Sra. Deputada Maria Luísa Ferreira (PSD) referiu-se ao Ano Internacional da Família, que se comemorava em 1994, e a iniciativas levadas a cabo no seu âmbito. No fim, respondeu a pedidos de esclarecimentos dos Srs. Deputados André Mortais (Os Verdes) e Elisa Damião (PS),
O Sr. Deputado Américo de Sequeira (PSD) enunciou as principais carências estruturais que afectam o Alta Minho.
Após leitura, a Câmara aprovou o voto n.° 98/VI - De saudação peta passagem do Dia Mundial dos Direitas do Consumidor (PS).

Ordem do dia. - Foram aprovados os n.ºs 37 a 39 do Diário.

Discutiu-se o projecto de resolução IL° 94/VI - Apoio e defesa da vitivinicultura e dos vitivinicultores nacionais face à reforma, da OCM dos vinhos (PCP)) sobre o qual usaram da palavra, a diverso título, os Srs. Deputados Imo de Carvalho (PCP). Ferreira Ramos (CDS-PP). Carlos Duarte (PSD), António Campos (PS), Vasco Miguel (PSD) e Luís Capoutas Santos (PS).
O Projecto de lei n.º 42/VI - Dá nova redacção ao n.º do artigo l7.º do Decreto-Lei n.º 338/88, de 28 de Setembro (Atribuição de alvarás e licenciamento de estações emissoras de radiodifusão) (PS) foi apreciado, tendo intervindo, a diverso título, os Srs. Deputados Arons de Carvalho (PS), Amónio Filipe (PCP). Miguel Macedo (PSD), Ferreira Ramos (CDS-PP) e João Corregedor da Fonseca (Indep.).
Procedeu-se ao debate da proposta de resolução n.º 55/VI - Aprova, para adesão, a Convenção Constitutiva do Fundo Multilateral de Investimento (MIF) e a Convenção de Administração do Fundo Multilateral de Investimento. Tendo o Sr. Deputado Duarte Pacheco (PSD) feito a síntese do relatório elaborado pela Comissão de Economia, Finanças e Plano, relativo a esta proposta de resolução, usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado do Tesouro (Francisco Esteves de Carvalho), os Srs. Deputados Guilherme d'Ouveira Martins (PS). Lino de Carvalho (PCP) e Sousa Lara (PSD).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 55 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 30 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

Adão José Fonseca Silva.
Adérito Manuel Soares Campos.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Álvaro José Martins Viegas.
Américo de Sequeira.
Anabela Honório Matias.
António Costa de Albuquerque de Sousa Lara.
António da Silva Bacelar.
António de Carvalho Martins.
António do Carmo Branco Malveiro.
António Esteves Morgado.
António Fernando Couto dos Santos.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Caeiro da Motta Veiga.
António Manuel Fernandes Alves.
António Maria Pereira.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Armando de Carvalho Guerreiro da Cunha.
Arménio dos Santos.
Belarmino Henriques Correia.
Carlos Alberto Lopes Pereira.
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves.
Carlos Manuel de Oliveira da Silva.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel de Valleré Pinheiro de Oliveira.
Cipríano Rodrigues Martins.
Domingos Duarte Lima.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Alfredo de Carvalho Pereira da Silva.
Ema Maria Pereira Leite Lóia Paulista.
Fernando Carlos Branco Marques de Andrade.
Fernando dos Reis Condesso.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando José Russo Roque Correia Afonso.
Fernando Monteiro do Amaral.
Fernando Santos Pereira.
Filipe Manuel da Silva Abreu.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco João Bernardino da Silva.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hilário Torres Azevedo Marques.
Jaime pomes Mil-homens.
João Álvaro Poças Santos.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Domingos Fernandes de Abreu Salgado.
João Granja Rodrigues da Fonseca.
João José da Silva Maçãs.
João José Pedreira de Matos.
João Maria Leitão de Oliveira Martins.
Joaquim Cardoso Martins.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Vilela de Araújo.
Jorge Avelino Braga de Macedo.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Agostinho Ribau Esteves.
José Albino da Silva Peneda.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José de Almeida Cesário.
José Fortunato Freitas Costa Leite.
José Guilherme Pereira Coelho dos Reis.
José Guilherme Reis Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Leite Machado.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Macário Custódio Correia.
José Manuel Álvares da Costa e Oliveira.
José Manuel Borregaria Meireles.
José Manuel da Silva Costa.
José Manuel Nunes Liberato.
José Mário de Lemos Damião.
José Pereira Lopes.
Luís António Carrilho da Cunha.
Luís António Martins.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel da Silva Azevedo.
Manuel de Lima Amorim.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Baptista Cardoso.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Simões Rodrigues Marques.
Maria da Conceição Figueira Rodrigues.
Maria da Conceição Ulrich de Castro Pereira.
Maria Helena Falcão Ramos Ferreira.
Maria José Paulo Caixeiro Barbosa Correia.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Maria Margarida da Costa e Silva Pereira Taveira de Sousa.
Marflia Dulce Coelho Pires Morgado Raimundo.
Mário Jorge Belo Maciel.
Melchior Ribeiro Pereira Moreira.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Nuno Francisco Fernandes Derne Alvim de Matos.
Nuno Manuel Franco Ribeiro da Silva.
Olinto Henrique da Cruz Ravara.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Carlos Alvarez Carp.
Rui Fernando da Silva Rio.
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva.
Simão José Ricon Peres.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Bernardes Costa.
Alberto da Silva Cardoso.
Alberto de Sousa Martins.
Alberto Manuel Avelino.

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Alberto Marques de Oliveira e Silva.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António Carlos Ribeiro Campos.
António de Almeida Santos.
António Domingues de Azevedo.
António José Borram Crisóstomo Teixeira.
António José Martins Seguro.
António Manuel de Oliveira Guterres.
Armando António Martins Vara.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Manuel Luís.
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Enrico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Manuel Lúcio Marques da Costa.
Gustavo Rodrigues Pimenta.
Helder Oliveira dos Santos Filipe.
Helena de Melo Torres Marques.
Jaime José Matos da Gama.
João António Gomes Proença.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Maria de Lemos de Menezes Ferreira.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Américo Fialho Anastácio.
Joaquim Dias da Silva Pinto.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho.
José António Martins Goulart.
José Eduardo dos Reis.
José Eduardo Vera Cruz Jardim.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos.
José Rodrigues Pereira dos Penedos.
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
Júlio da Piedade Nunes Henriques.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Leonor Coutinho Pereira dos Santos.
Luís Filipe Marques Amado.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Maria Teresa Dória Santa Clara Gomes.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui António Ferreira da Cunha.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Vítor Manuel Caio Roque.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
João António Gonçalves do Amaral.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Carlos Martins Peixoto.
Maria Odete dos Santos.
Miguel Urbano Tavares Rodrigues.
Octávio Augusto Teixeira.
Paulo Jorge de Agostinho Trindade.
Paulo Manuel da Silva Gonçalves Rodrigues.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Adriano José Alves Moreira.
Manuel José Flores Ferreira dos Ramos.
Narana Sinai Coissoró.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

André Valente Martins.
Isabel Maria de Almeida e Castro.

Partido da Solidariedade Nacional (PSN):

Manuel Sérgio Vieira e Cunha.

Deputado independente:

João Cerveira Corregedor da Fonseca.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta do diploma que deu entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deu entrada na Mesa, e foi admitido, o projecto de resolução n.° 96/VI - Programa de compensação financeira para os pescadores por motivos de abate e imobilização definitiva ou temporária das embarcações (PCP).
Gostaria também de anunciar que a Assembleia da República recebeu uma carta do Comité Nobel Norueguês que dá conta de que foi aceite a proposta aprovada por esta Câmara no sentido de ser atribuído ao Bispo de Dili o Prémio Nobel da Paz para 1994.
Foram ainda apresentados na Mesa, nas últimas reuniões plenárias, os seguintes requerimentos: aos Ministérios da Justiça, das Finanças, da Saúde, do Emprego e da Segurança Social e à Secretaria de Estado para a Modernização Administrativa, formulados pelo Sr. Deputado Paulo Trindade; ao Governo e à Secretaria de Estado da Juventude, formulados pelo Sr. Deputado António Filipe; a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Marques Júnior; ao Ministério do Planeamento e da Administração do Território, formulado pelo Sr. Deputado Júlio Henriques; aos Ministérios do Emprego e da Segurança Social e das Obras Públicas, Transportes e. Comunicações, formulado pelo Sr. Deputado Mário Tomé; ao Ministério das Finanças, formulado pelo Sr. Deputado Carlos Oliveira e à Câmara Municipal de Almada, formulado pela Sr.a Deputada Isabel Castro.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, do período de antes da ordem do dia de hoje consta uma declaração política.

O Sr. José Vera Jardim (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Vera Jardim (PS): - Sr. Presidente, gostaria de anunciar que, dentro de momentos, iremos entregar na Mesa um voto de saudação referente à passagem do Dia Mundial dos Direitos do Consumidor.
Nos últimos dias, o País assistiu a uma demonstração da grande vitalidade e do enorme sentido de responsabilidade cívica dos movimentos de consumidores do nosso país. Aliás, sempre defendemos que é na organização, no movi- (...)

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(...) mento organizado dos consumidores que está a melhor, forma de defesa dos direitos dos cidadãos.
O que se passou ontem foi, a nosso ver, uma forma de demonstrar essa vitalidade, esse sentido de responsabilidade cívica, pelo que entendemos que esta Assembleia deve saudar o movimento organizado dos consumidores como forma de manifestação da vitalidade da sociedade civil na defesa dos interesses dos cidadãos.

Aplausos do PS.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, tal como foi referido aqui pelo Sr. Deputado José Vera Jardim, consideramos que aquilo que se passou ontem foi uma manifestação clara e concreta do movimento e do interesse que existe no reforço e fortalecimento das organizações de defesa do consumidor.
A adesão popular que houve ao apelo feito pela DECO mostra claramente quão impopular e justamente impopular é a tentativa que a banca, concertadamente, pretende levar a cabo, prejudicando e abusando claramente da posição dos consumidores, pois, ao fim e ao cabo, conduz ao engano de todos os cidadãos portugueses, todos os utilizadores do cartão multibanco.
Os portugueses foram induzidos a utilizar um cartão, uma forma de movimentação de fundos, designadamente de pagamentos, mais fácil (e sendo mais fácil para o consumidor é mais barata para a banca, em termos de tratamento administrativo) e mais certa e mais segura para os comerciantes.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Repito, a banca induziu os consumidores a fazer essa utilização de forma gratuita e depois de ter criado o hábito e de ele se ter consolidado nos consumidores, altera as regras de uma forma unilateral, impondo a aplicação de um imposto - e é um imposto e não uma taxa porque a quantia a pagar varia de acordo com o volume da despesa efectuada e paga através do multibanco.
Há 15 dias propusemos uma audição parlamentar a várias entidades, designadamente à Associação Portuguesa de Bancos. Insistimos na necessidade e urgência de que essa audição tenha lugar, mas, do nosso ponto de vista, é também imperativo que o Governo analise, do ponto de vista legal e político, até que ponto está a ser ultrapassada, pisada e, incumprida a lei da concorrência, que impede a acção concertada da banca.

Aplausos do PCP.

O Sr. Rui Carp (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Rui Carp (PSD): - Sr. Presidente, em primeiro lugar, gostaria de lamentar a medida anunciada de que vão passar a ser oneradas as transacções que utilizam o chamado sistema multibanco.
Queria também actualizar as informações já aqui prestadas, na medida em que ontem a Comissão de Economia, Finanças e Plano, face à não resposta ao convite que a mesma fez à Associação Portuguesa de Bancos, aprovou um pedido de audição para que aquela associação e outras entidades relacionadas com a vida comercial venham esclarecer-nos esta situação, que, do ponto de vista do PSD, é injusta.
Por outro lado, o Governo disponibilizou-se, desde logo, a vir à Comissão explicar todas as suas iniciativas para que, de uma forma eficaz, esta situação seja resolvida a contento dos consumidores e comerciantes.
Entendemos que a aplicação desse ónus é extremamente inoportuna. Aliás, o Sr. Ministro do Comércio e Turismo já fez declarações públicas nesse sentido. Por parte das instituições políticas-Governo e Assembleia da República- há, pois, uma frente comum para evitar toda esta situação.
Por último, quero deixar bem claro que entendemos que a iniciativa que a DECO tomou ontem é uma iniciativa da sociedade civil - e como tal deve ser-lhe entregue -, não devendo, por isso, as organizações partidárias retirar daí qualquer proveito.
O PSD, mais do que ninguém, acredita nas potencialidades da sociedade civil e crítica quem daí tira a conclusão de que a iniciativa privada é má para o País, pois pensamos que ela é o motor de todo o desenvolvimento.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O que sucedeu ontem é a prova evidente de que a iniciativa privada tem força para resolver estes problemas.
Nós, que temos o poder legislativo, podemos ajudar a corrigir, se for caso disso, as distorções, mas tirar daí a conclusão de que é preciso estatizar é muito perigoso. Isso seria subalternizar, secundarizar a força da sociedade civil.
Em conclusão, diria que devemos saudar- e a nossa iniciativa de ontem na Comissão de Economia, Finanças e Plano foi exactamente nesse sentido - a sociedade civil mas não partidarizar este assunto, que respeita fundamentalmente aos agentes não políticos da sociedade portuguesa.

Aplausos do PSD.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, não podemos deixar de tomar partido pêlos consumidores.
Efectivamente, cada um de nós já sentiu na sua pele que os serviços bancários cobram dos cidadãos, dos seus clientes, dos consumidores importâncias desconhecidas, impondo encargos e fazendo descontos nas nossas contas sem nós darmos por isso.
Nunca nos disseram que uma transferência bancária custava dinheiro, que ia aumentar o preço do livro de cheques, que o facto de pedirmos que nos telefonem ou que façam um pagamento a uma determinada entidade custava tanto, etc.
Sabemos que os bancos não são nossos criados, nossos empregados e, se todo o serviço tem um preço, não lhes negamos o direito de se pagarem pelos serviços que nos prestam. Agora, é uma regra sã da concorrência, da honestidade comercial avisar antecipadamente o consumidor, o cliente, da tabela dos preços dos serviços. Por exemplo, dizer, com antecedência, «a transferência para o seu senhorio do pagamento da renda da casa vai-lhe custar tan- (...)

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(...) - e há casos, em que a renda de casa custa 750$ por mês, cobrando o banco por essa transferência para o senhorio uma taxa de 200$. Isto é, a renda da casa fica ao cliente em 950$00. Vejam lá o despautério que é o serviço de cobrança dos bancos! E o inquilino nada mais pode fazer senão pagar 200$, para não gastar dinheiro em eléctricos, para não estar à porta do senhorio à espera do recibo, etc. Aliás, muitas vezes os recibos das rendas de casa são colocados no banco e os inquilinos não têm outra alternativa senão ir lá pagar essas rendas baratas.
Outro problema que verificámos foi que este exemplo está a alastrar-se também a outras empresas públicas. Cito, por exemplo, as chamadas estimativas de electricidade, em que o consumidor paga uma determinada quantia por estimativa que depois, é ajustada e que representa o falso financiamento dessas empresas à custa do consumidor.
Portanto, Sr. Presidente é Srs. Deputados, não podemos deixar de verberar este procedimento do conjunto dos bancos, que, na defesa dos seus interesses, parecem agir em cartel contra o consumidor.
Assim, tomamos como boas as palavras do Sr. Deputado Rui Carp e esperamos que o PSD tome a iniciativa - e nós estaremos com o PSD - de propor a adopção de medidas legais que contrariem essa prática abusiva dos bancos e das empresas públicas.

(O Orador reviu.)

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa nada tem a acrescentar às perguntas que foram feitas e devolve apenas a questão para as regras de concorrência do direito comunitário.
Srs. Deputados, vamos entrar agora no período de antes da ordem do dia relativo a declarações políticas.
Para uma declaração política em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Completam-se hoje 100 dias de exercício de funções, como Ministro das Finanças, do Dr. Eduardo Catroga.

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Contou também os fins de semana?

O Orador: - Trata-se, provavelmente, de um período de tempo insuficiente para se proceder a um juízo definitivo sobre o exercício de funções do actual Ministro das Finanças..
No entanto, decorreu já o tempo suficiente para que o «estado de graça», que tradicionalmente se dá a cada governante, tenha terminado.

O Sr. Silva Marques (PSD): - O «estado de graça» são 300 dias e não 100!
O Orador: - Acumulam-se sinais, tiques e comportamentos que legitimam as nossas dúvidas, subsistem indefinições e banalidades que suportam as nossas preocupações.
Motivos, de resto, não nos faltam: o apuramento final dos resultados económicos e financeiros do exercício de 1993 ultrapassou as expectativas mais pessimistas; o PIB decresceu, acentuando a divergência cavaquista com a Europa Comunitária; os sectores produtivos, penalizados por políticas e medidas irresponsáveis e fundamentalistas, face ao verdadeiro compromisso com a Europa, estão desarticulados e insusceptíveis de reestruturação a curto prazo; o desemprego e o emprego precário aumentam todos os meses; o equilíbrio financeiro da Segurança Social não existe o que torna preocupante a evolução futura do Estado-Previdência português; apesar dos apelos lancinantes do Sr. primeiro-ministro, as taxas de juro reais mantém-se proibitivas e o dinheiro continua a passar do sistema de produção para o sistema financeiro; os resultados dos apoios comunitários acentuam a divergência interna, a litoralização do País, o predomínio da cidade em relação ao campo, o privilégio do especulativo em relação ao produtivo.
Perante este quadro de crise aguardava-se que o Ministro das Finanças apontasse objectivos, identificasse prioridades, em suma, que redimisse políticas.
Durante este período de 100 dias tivemos muitas vezes o Ministro das Finanças na comunicação social, identificamos mesmo algumas diferenças de comportamento e personalidade com os seus antecessores. Não vislumbramos, contudo, apesar dos repetidos discursos e das numerosas preocupações de diferenciação formal, qualquer linha política coerente, susceptível de constituir um verdadeiro ataque à situação de crise económica que o País atravessa.

Vozes do PS::- Muito bem!

O Orador: - Como referiu recentemente o Secretário-Geral do meu partido, António Guterres, «o responsável das Finanças, Eduardo Catroga, não é um ministro mas sim um anti-depressivo»: .não cura o doente, põe-no apenas bem disposto.

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Depende da doença!

O Orador: - Talvez não fosse, no entanto, de esperar outra coisa. A política económica, como o próprio tem referido repetidas vezes, é da responsabilidade do primeiro-ministro. Ora o primeiro-ministro Cavaco Silva ainda não mudou.
Sabemos que só pode resolver os problemas quem os conhece e os aceita. O primeiro-ministro já demonstrou muitas vezes que desconhece os verdadeiros problemas dos portugueses e já revelou, repetidamente, uma completa insensibilidade sobre as consequências sociais da debilidades da economia real. Por tudo isto não seria de esperar grandes modificações.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A questão do emprego é a prioridade das prioridades da sociedade portuguesa, mas o agravamento brutal de 1993 não foi estancado no período já decorrido de 1994.
As medidas apresentadas, com pompa e circunstância proporcional à sua falsidade e vacuidade, pelo Sr. primeiro-ministro, não resolveram nem resolverão a situação.
O desemprego em Portugal, que atinge proporções alarmantes, situando-se bastante acima de 8 % da população activa, e o emprego instável e mal remunerado constituem fatia crescente da população trabalhadora.
A incapacidade da economia real, decorrente de penalização que sofreu e continua a sofrer das erradas políticas macro-económicas, em gerar empregos e recursos financeiros para a segurança social, é alarmante.
Acumulam-se as dívidas à Segurança Social, pondo em causa o sistema e a sobrevivência das próprias empresas, com os consequentes desempregados e o crescimento exponencial das situações de insolvência perante o sistema de protecção social.

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Perante estes quadro, o Sr. Ministro dás Finanças apenas formulou duas intenções e lançou um apelo: anunciou, difusa e abstractamente, a progressiva eliminação do imposto de selo sobre as operações bancárias; prometeu, não se sabe para quando e em que termos, a diminuição de 1000$ no preço da tonelada de fel consumido pela indústria; apelou ao sistema bancário para, voluntariamente, proceder ao abaixamento das taxas de juro.
É muito pouco - e sobretudo muito pouco fundamentado -, se pensarmos que as duas intenções têm uma tradução financeira significativa no Orçamento do Estado, que o Sr. Ministro não explicou como vai compensar a perda de receita e que o apelo não poderá ter qualquer efeito enquanto não mudar a política monetária e o Estado se recusar a utilizar o peso que ainda têm no sector bancário, para actuar num sistema de crédito segmentado, como é o português, em favor das pequenas e médias empresas e do investimento produtivo.
Acresce que, não tendo sido definido qualquer ritmo ou data para a concretização destas intenções, nem elaborada qualquer alternativa para a provável insatisfação do apelo, se mantém, mesmo em relação a este mínimo, uma completa ausência de quadro estratégico de actuação.
Há, no entanto, um sector a que o Governo - e nomeadamente o Ministério das Finanças - tem dedicado, nos últimos dias, particular atenção mediática: o sistema fiscal.
O Governo «descobriu» agora que, afinal, não foi feita a reforma fiscal que era uma das «jóias da coroa» dos governos de Cavaco Silva.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Muito bem!

O Orador: - Só assim se entende a decisão do Ministro das Finanças de nomear uma nova «comissão para estudar a reforma fiscal».
Já em diversas ocasiões - e pela boca de diversos Deputados - o PS formulou o seu juízo sobre a chamada reforma fiscal do Governo de Cavaco Silva.
Sem procurar ser exaustivo, lembro que sempre afirmámos que o conjunto de normas fiscais a que Cavaco Silva tem chamado reforma não garante a necessária intercomunicabilidade geradora de um imposto único sobre o rendimento como, aliás, determina a Constituição da República Portuguesa.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sempre afirmámos também que a excessiva centralização do acto tributário com a consequente desumanização dos impostos, o acentuado laxismo da fiscalização fiscal decorrente da falsa poupança de recursos indispensáveis e, na prática, a não garantia plena da defesa dos direitos dos contribuintes, eram elementos mais do que suficientes para sustentar a tese da inexistência de uma verdadeira reforma.
A manutenção da iniquidade fiscal e o seu agravamento em desfavor dos rendimentos de quem trabalha por conta alheia, bem como as reiteradas práticas de evasão e de fraude fiscal, que começam a revelar características verdadeiramente estruturais, justificaram que, recentemente, tivéssemos proposto a elaboração de um livro branco sobre o Sistema Fiscal.
A maioria, com a cegueira habitual, chumbou mais esta iniciativa
O colapso do sistema fiscal, que o Governo parece ter descoberto agora, é, assim, uma realidade conhecida, identificada e prioritária para o Partido Socialista há muito tempo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Em pleno debate do Orçamento do Estado para 1994 propusemos medidas de reforço financeiro que atenuassem primeiro e anulassem depois o estrangulamento da máquina fiscal, sendo certo, como se provou, que a despesa proposta rapidamente seria compensada pelo acréscimo de receitas obtido.
A ratificação do decreto-lei que altera a Lei Orgânica da Direcção-Geral de Contribuições e Impostos foi outra oportunidade para identificar defeitos e apresentar soluções.
As preocupações do Sr. Ministro das Finanças são assim, e neste contexto, retardadas, intempestivas e incoerentes.

O Sr. José Vera Jardim (PS): - Muito bem!

O Orador: - O espectáculo dos últimos dias em volta das decisões e nomeações dos sucessivos directores-gerais de Contribuições e Impostos é, no fundo, a consequência imediata da completa desorientação do Governo.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Muito bem!

O Orador: - O Primeiro-Ministro prometeu, com o Orçamento do Estado de 1994, o desagravamento fiscal. Os pensionistas e os reformados já sentiram este ano o que é o desagravamento fiscal do Governo.
Os restantes contribuintes senti-lo-ão no próximo ano, quando se verificar a liquidação do IRS devido pêlos rendimentos de 1994.
O Governo prometeu justiça e luta contra a fraude e a evasão fiscal e os últimos dados conhecidos apontam para apenas 1,6% dos contribuintes tenha declarado rendimentos superiores a 15 000 contos, enquanto a execução orçamental, pelo lado das receitas, se mantém verdadeiramente insatisfatória.
Desconhecem-se quais as medidas que o Governo tomará para resolver o problema das facturas falsas e é insuficiente a informação sobre os controlos aplicados relativamente às irregularidades no pagamento dos impostos.
Com este quadro, importava encontrar uma gigantesca cortina de fumo. Foi encontrada nos últimos dias e é de todos conhecida.
A inabilidade e a instabilidade do Ministro das Finanças no ataque aos problemas de natureza fiscal, revelada nos últimos dias, é patética e preocupante.
O regime fiscal vigente é injusto e iníquo e não constitui ainda um factor ou um estímulo para o desenvolvimento.
A proposta fiscal para 1994, porque imobilista, deveria ter sido rejeitada.
Com efeito, a aplicação do actual quadro fiscal produzirá agravamento fiscal dos contribuintes mais indefesos, manterá e agravará as deficiências da administração fiscal, com prejuízo para o Estado e para os próprios contribuintes, atingirá, brutalmente, certos sectores sociais, como já se verificou relativamente aos reformados e penalizará certos tipos de poupança social, economicamente justificáveis e aceitáveis.
O ataque e a solução destas questões é o trabalho que está por fazer, pelo Sr. Ministro das Finanças.
Esperava-se do seu ministério das Finanças uma atitude mais correcta e responsável e a correspondente alternativa de política fiscal.
As intervenções recentes só serviram para acentuar o descrédito e aprofundar o descalabro.
Ao fim de 100 dias de exercício de poder, o Ministro das Finanças não merece, em geral, e não merece, em (...)

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(...) especial, no âmbito da política fiscal, a nossa aprovação. Está chumbado.
Aplausos do PS e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.
Não esperamos que o Dr. Catroga seja substituído. Esperamos sim, nós, mudar brevemente o Primeiro-Ministro, principal responsável da situação de crise que vivemos e da desesperação de soluções que sentimos.

Aplausos do PS e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca..

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Rui Rio e Rui Carp. Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Deputado Manuel dos Santos, sendo hoje o Dia Mundial dos Direitos do Consumidor,...

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Foi ontem, Sr. Deputado.

O Orador: - ... confesso que devia haver algum organismo que nos defendesse de discursos desse género.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas constato que há alguma inversão no discurso do Partido Socialista nesta matéria, que tem vindo a dizer que a política económica do Governo mudou e hoje disse, pela voz do Sr. Deputado Manuel dos Santos, que, afinal, a política económica do Governo não mudou.
Confesso que foi hoje que, nesta matéria, V. Exa. acertou. Realmente a política económica do Governo não mudou nem vai mudar e nós vamos ter resultados bem positivos na economia portuguesa, precisamente pela manutenção da política correcta.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Isso é uma ameaça?

O Orador: - Portanto, embora diga que o Sr. Ministro das Finanças devia apontar para novos objectivos, não há que apontar novos objectivos já que eles constam do programa eleitoral do PSD. São esses que, pura e simplesmente, estamos a cumprir.
Mas aproveito a ocasião para rebater as três maiores questões que, nesta matéria, o Partido Socialista, e nomeadamente o seu Secretário-Geral, tem levantado ao Governo, referindo-se a primeira questão à produção agrícola.
O Sr. Secretário-Geral do Partido Socialista - e não só, porque o Partido Socialista também o tem feito - tem dito que a produção agrícola, em Portugal, tem caído.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - E isso é falso?

O Orador: - Aproveito a oportunidade para dizer que é falso sim senhor, Sr. Deputado Ferro Rodrigues. É possível que algumas culturas tenham decaído,...

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - A cultura política do PSD!

O Orador: - ... mas a produção agrícola portuguesa como um todo aumentou e a população agrícola baixou. Logo, a produtividade na agricultura subiu, Srs. Deputados do Partido Socialista!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Nem um comunista diz isso!

O Sr. José Magalhães (PS): - Graças a Deus temos um novo oásis!

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - O cargo de Ministro da Agricultura vai ficar vago, mas assim não chega lá!

O Orador: - A segunda grande crítica do Partido Socialista é de que, em Portugal, as taxas de juro são altas.
Quanto a isto, em primeiro lugar, direi que, no pós 25 de Abril, nunca as taxas de juro foram tão baixas como hoje; em segundo lugar, nunca se fez tanto pela sua descida como se faz hoje e, em terceiro lugar, os senhores esqueceram que, quando foram Governo, as taxas de juro eram superiores a 30%.

Vozes do PSD: - Muito bem! Protestos do PS.

Srs. Deputados do Partido Socialista, a terceira grande crítica do PS ao Governo refere-se à política a que os senhores chamam de escudo caro, de que o Secretário-Geral do Partido Socialista não se cansou de falar na televisão ainda esta semana.
A política do escudo caro não é verdade; a evolução da paridade do escudo com as moedas dos nossos principais parceiros comerciais não aponta nesse sentido e apenas temos feito uma. política de estabilidade cambial. Não me admira, no entanto, que os senhores achem que o escudo está caro, porque quando VV. Exas. foram Governo o escudo não valia nada. Aí é que está a grande diferença, Srs. Deputados!
Finalmente, permita-me que lhe diga que a política económica do Governo não mudou nem vai mudar e será isso que permitirá a Portugal acompanhar a retoma da Europa desde já e não como no passado, em que isso aconteceu não sei quantos anos depois.
Srs. Deputados, não aceitamos a desvalorização fácil que VV. Exas. queriam, senão tínhamos de pagar a desvalorização agora; não aceitamos o descontrolo salarial, pois estaríamos a pagá-lo agora; não aceitamos mais despesa pública, porque estaríamos a pagá-la agora. Graças a esta política económica já se vê luz ao fundo do túnel e essa luz é a derrota política do Partido Socialista.

Aplausos do PSD.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Mas nunca reconheceram o túnel!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Carp.

O Sr. Rui Carp (PSD): - Sr. Deputado, Sr. Presidente: Já que estamos a falar de defesa dos consumidores, apetece-me perguntar quem é que nos defende, a nós, de discursos alarmistas...

O Sr. Silva Marques (PSD): - Ninguém!

O Orador: - ... como o que acabou de ser feito pelo Sr. Deputado - com todo o respeito -, que não tem esperança, que não acredita na realidade portuguesa nem dos portugueses.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Rui Rio (PSD): - Eles nem acreditam neles próprios!

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O Orador: - Sim, nem neles próprios!

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Boa piada!

O Orador: - Mas eu vou jogar o jogo com as regras do Sr. Deputado Manuel dos Santos, vou jogar no seu campo.
O Sr. Deputado falou nos 100 dias do Ministro Eduardo Catorga e eu falo em quase nove anos de governo Sócial-Democrata com os sucessos bem conhecidos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - As falências! O desemprego!

O Orador: - O Sr. Deputado falou em intervenções do Sr. Ministro das Finanças cheias de banalidades e eu respondo-lhe que os investidores portugueses, os agentes económicos e até os sindicatos têm aceite e louvado a abertura, o diálogo e a forma como o Sr. Ministro das Finanças tem apresentado as políticas do Governo - e não as suas, porque as políticas são do Governo.
Portanto, o Sr. Deputado, ao dizer que o Ministro diz banalidades, está a criticar a sociedade civil e os agentes económicos e sociais.
V. Exa. disse que foram os piores anos e que nunca houve uma perspectiva tão pessimista. Bom, pergunto-lhe se é pessimismo ter as taxas de inflação mais baixas desde os finais dos anos 60, como ainda na semana passada o Sr. Deputado José Lamego teve a honestidade de reconhecer. Então, não percebo esse pessimismo, sabendo nós que a inflação é o maior cancro para o poder de compra dos cidadãos.
O Sr. Deputado disse que não havia um discurso com perspectivas. Sr. Deputado, ainda há cerca de duas semanas foi aprovado em Bruxelas o Plano de Desenvolvimento Regional para Portugal, que é, como diz o Sr. Primeiro-Ministro, a magna carta do desenvolvimento português para o século XXI.
V. Exa. disse, ainda, que a política económica do Governo estava a flutuar e que não havia política económica. Bom, recordo-lhe a aprovação, em Bruxelas, do 2.° Programa de Convergência para a economia portuguesa. É que se isso fosse assim, então, o senhor estava a chamar incompetentes, incultos e impreparados aos membros da Comissão Europeia e do próprio Conselho de Ministros das Finanças da Comunidade.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - A uma parte substancial!

O Orador: - V. Exa. está a ser demasiado forte contra quem sabe e isso terá os seus custos.
Finalmente, V. Exa. falou do sistema fiscal, dizendo que está tudo mal. Ora, implicitamente, - e talvez não fosse essa a sua vontade, reconheço-o - o senhor fez o maior elogio ao Governo...

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - É que o Governo não tem nada a ver com a evasão fiscal!...

O Orador: - ..., porque foi o Governo que anunciou tudo o que há em matéria de combate à evasão fiscal, que tomou a iniciativa e que está, claramente, no campo, a tomar as medidas correctas, no momento exacto.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Há 10 anos que há evasão fiscal e só agora é que o Governo se preocupa?!

O Orador - Ora, este é o maior elogio ao Governo, que certamente o senhor não queria fazer mas acabou por fazê-lo.
E para não dizerem que sou eu quem está a dizer que as coisas correm bem, vou citar o...

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Lá vem o The Economist!

O Orador: -... último relatório do Banco de Portugal, sem preocupações de prioridade, que na primeira página diz: «alguma recuperação da actividade industrial no final de 1993».

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): -- Fantástico!

O Orador: - Isto para uma crise que, todos sabemos, é a pior crise mundial desde o final da Guerra Mundial, não sei se é mau, penso que é bom!

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Ter alguma recuperação é fantástico!

O Orador: - Mais adiante diz-se que «o ritmo de crescimento dos preços no consumidor voltou a abrandar». Bom, se isso não é positivo, então, não .sei!

O Sr. José Magalhães (PS): - A que preço? A que preço?

O Orador: - E diz mais: «os valores do comércio externo confirmam alguma recuperação da actividade económica e da procura externa». Isto é negativo?...
Mais adiante diz-se que «as indicações mais recentes apontam para garantir à redução da inflação, a competitividade .e o crescimento sustentado» e mesmo em relação ao consumo privado, que é tão sensível à chamada convergência real, diz-se que «em 1993 o consumo privado manteve uma taxa de crescimento real positivo».

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Fantástico!...

O Orador: - Portanto, Srs. Deputados, todos os indicadores, perante uma situação que é grave e preocupante, são positivos, ou seja, há uma saída!
Quanto ao facto de o PS ter dito que as medidas fiscais do Orçamento do Estado para 1994 não era boas ou, como o senhor disse, que o Orçamento foi imobilista, pergunto-lhe onde é que estão as alternativas que o PS apresentou? Onde é que elas estão desde essa altura? A quem é que V. Exa. vai pedir essas alternativas? É ao Dr. Medina Carreira? Ao Dr. Daniel Bessa? A algum dos ilustres Deputados da sua bancada? Onde é que estão as suas alternativas?
Sr. Residente, Srs. Deputados: Vou concluir como comecei,...

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Mais vale tarde do que nunca!

O Orador: - ... ou seja, dizendo que discursos destes bem merecem uma defesa do consumidor.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

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O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começarei por responder ao Sr. Deputado Rui Rio dizendo-lhe que se enganou no filme, pois não foi exactamente isso que se passou aqui...

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Então, é publicidade enganosa!

O Orador: - Exacto! É publicidade enganosa! V. Ex.a fez um discurso que não tem nada a ver com o que eu disse. Aliás, está já anunciado e brevemente, será agendado pela Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares, um debate sobre política económica em geral...

O Sr. Rui Carp (PSD): - Queremos é propostas vossas!

O Orador: - ... e talvez ai as suas considerações se possam aceitar e justificar.
De qualquer forma, a minha intenção não foi a de fazer um debate sobre a situação económica, até porque há muitos debates sobre este tema na Assembleia da República e o PS já, por várias vezes, teve oportunidade de apresentar os seus pontos de vista.
Mas a verdade é que V. Ex.a começou por se enganar no filme quando disse que hoje estávamos a comemorar o Dia Mundial dos Direitos do Consumidor. Ora, isso revela...

O Sr. Rui Rio (PSD): - Então, e este voto de saudação? É vosso!

O Orador: - Veja a data!
Bom, como dizia, isso revela a atenção que V. Exa. dá a estas questões...

O Sr. Rui Carp (PSD): - Eu disse que estávamos a falar disso hoje!
O Orador: - ... e às manifestações da sociedade civil e a hipocrisia com que, por vezes, a sua bancada se pronuncia sobre determinadas questões, porque, .no essencial, desconhece-as, ignora-as e não as respeita, como se viu pelo seu engano.
Relativamente aos factos que referiu, não abordarei nada a não ser a questão das taxas de juro e abro esta excepção porque V. Exa. até se dá o caso de ser membro de um Conselho Fiscal de uma entidade bancária extremamente poderosa e, portanto, devia ter um pouco mais de conhecimento. Aliás não sei o que é que o senhor está a fazer nesse Conselho Fiscal. Talvez a receber a senha, pois desconhece completamente a situação da economia real, pelo que não sei, repito, o que é que está lá a fazer.
De facto, o senhor devia saber que as taxas de juro a que nos referimos são as taxas de juros reais e estas continuam elevadíssimas, sobretudo nos sectores produtivos da economia que mais necessitavam que elas hão fossem tão elevadas, nomeadamente nas pequenas e médias empresas, como disse na minha intervenção, a que, provavelmente, V. Exa. não esteve atento, apesar de, com a sua experiência e prática, ter tido oportunidade de ter entendido o que eu quis dizer.
Por outro lado, retive também, da sua parte, uma ameaça de, afinal de contas, nada mudar na política económica do Governo.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Pois não!

O Orador: - Esse é um juízo que V. Exa. faz e para nós isso é uma ameaça.
Relativamente ao Sr. Deputado Rui Carp, com toda a franqueza, penso que já não pegam muito as referências ao alarmismo, aos discursos sem esperança.

O Sr. José Magalhães (PS): - Com pessimismo!

O Orador - Diga-me uma coisa com isso, o senhor quis dizer que voltamos ao discurso do oásis? Foi isso que quis dizer? Se é isso, tem de nos esclarecer, para sabermos que tipo de percepção é que o senhor tem da realidade económica. Na verdade - e digo isto com toda a contrição e franqueza-, apercebi-me de que as intervenções do Sr. Ministro das Finanças não passaram de intervenções mediáticas e, portanto, não quero louvar-me naquilo que ele disse. Porém, ele já fez intervenções, aliás, variadas, conforme o sítio e as pessoas para quem está a falar, onde se distanciou completamente das políticas anteriores e onde aparece de forma muito vincada esta ideia do pessimismo relativamente à situação actual, embora de esperança relativamente à evolução.
Portanto, não percebo como é que V. Exa. nos pode atribuir essa condenação, quando, de algum modo, na apreciação do presente, até nem divirjo muito daquilo que mediaticamente o Sr. Ministro das Finanças tem vindo a dizer em diversas ocasiões.
O que pretendi dizer com o meu discurso é que se está a criar, na opinião pública portuguesa, nos agentes económicos, nos fautores dessa opinião, na comunicação social, a ideia de que estamos perante um Ministro das Finanças completamente diferente, dinâmico, com novas ideias, com novas iniciativas. Ora, isto é completamente falso!
O que procurei dizer foi que, efectivamente, continuam as políticas que já vinham do passado - aliás, isso seria de esperar, porque o Primeiro-Ministro é o mesmo e vai ser o mesmo durante mais cerca de ano e meio...

O Sr. Rui Carp (PSD): - Mais! Mais!

O Orador: - ... e ele é o responsável pela política económica.
De qualquer forma, a ideia que o PSD e o Sr. Ministro das Finanças têm feito passar para a opinião pública é a de que estamos perante um aggiornamento e uma modernização do estilo de intervenção do Ministro das Finanças, e isso pode ser perigoso, pois cria expectativas!
Sei que a base de que ele partiu, e é assim que se justifica a audição e a aceitação que ele tem em certos sectores que V. Exa. referiu, em termos de simpatia e de credibilidade, era muito baixa. Portanto, é natural que, num primeiro momento, o Sr. Ministro das Finanças até mereça alguma credibilidade. Mas passaram-se 100 dias, o Sr. Ministro das Finanças anunciou duas ou três medidas, desgarradas, que não ritmou, não datou, nem quantificou, fez um apelo patético à baixa das taxas de juro, tendo, aliás, instrumentos de intervenção no sentido de proceder à sua diminuição mais efectiva, referiu-se ao sistema fiscal - ele sim, de forma alarmista e derrotista-, dizendo que era preciso fazer uma nova reforma fiscal, criou uma cortina de fumo para que as pessoas não percebessem e referiu que o essencial era a evasão fiscal, a iniquidade, a fraude, as facturas falsas, mas essa cortina de fumo dirimiu-se na semana passada e não vamos voltar a ela.
Foi isto que o Sr. Ministro das Finanças fez ao longo de 100 dias, que já é um período de tempo suficiente para que digamos que «o rei vai nu», ou seja, neste caso, que «o Ministro das Finanças vai nu». Foi isto que quis dizer com (...)

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o meu discurso, Sr. Deputado Rui Carp, e nada daquilo que o senhor referiu que eu quis dizer.
De facto, não se trata de uma mensagem de esperança mas, sim, de uma mensagem correcta...

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - A mensagem adaptada às circunstâncias!

O Orador: - Exacto, uma mensagem adaptada à forma como estão a decorrer as coisas, porque é, sobretudo, uma mensagem realista.
Quanto ao aumento da produção na agricultura, deixe-me fazer um pouco de graça e não se ofenda se lhe disser que só conheço um sub-sector na agricultura que, eventualmente, terá aumentado, o dos nabiços. De resto, nada aumentou, seguramente!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - O Sr. Secretário vai dar-nos conta das escolas que hoje nos visitaram.

O Sr. Secretário (Lemos Damião): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Acompanhados dos seus professores, visitaram-nos hoje 55 alunos da Escola Secundária da Baixa da Banheira; 150 alunos da Escola C+S da Carpalhosa, de Monte Real; 50 alunos da Escola Secundária de Mação; 59 alunos da Escola Secundária de Riachos; 50 alunos da Escola Secundária de Pinhal do Rei, da Marinha Grande; 40 alunos da Escola Secundária Magalhães de Lima, de Aveiro; 40 alunos da Escola de Ensino Básico n.° 183, de Lisboa, e 45 alunos da Escola Secundária de Albufeira.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sra. Deputada Luísa Ferreira.
A Sra. Luísa Ferreira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por proclamação da Assembleia Geral das Nações Unidas de 8 de Dezembro de 1989, o ano de 1994 é celebrado como o Ano Internacional dá Família.
Portugal está desde a primeira hora envolvido nesta importante iniciativa que foi mesmo considerada, no seio das Nações Unidas, como o evento de maior relevância da Organização, neste final de milénio.
Com efeito, o nosso País fez parte do grupo daqueles v que, em 1987, propôs o estudo da oportunidade deste Ano Internacional. Assumiu, depois, com entusiasmo e empenhamento, a tarefa das celebrações, aderindo formalmente à iniciativa através da Resolução n.° 11/91.
Por ser o primeiro país a constituir a sua comissão nacional e pela qualidade do programa de acção que apresentou, Portugal foi distinguido pelas Nações Unidas, em Maio de 1992, como Patrono Qualificado do Ano Internacional da Família.
Esta distinção assenta bem a Portugal, nação onde a Família foi sempre considerada como unidade básica da sociedade portuguesa e respeitada como fonte de virtudes, ao longo de séculos de História.
Foi aqui, Sr. Presidente e Srs. Deputados, nesta Casa, símbolo da democracia portuguesa, que, após o 25 de Abril, os constituintes encontraram os precisos termos para reconhecer a importância que o povo português atribui à família, assegurar os seus direitos enquanto unidade e, também, os dos seus membros enquanto cidadãos.
Reza o texto do artigo 67.°, n.° 1, da Constituição da República Portuguesa: «A família, como elemento fundamental da sociedade, tem direito à protecção da sociedade e do Estado e à efectivação de todas as condições que permitam a realização pessoal dos seus membros».
A consciência generalizada dos desafios com que a família se debate no nosso tempo foi determinante na escolha do tema que serve de base às celebrações do ano - Família: capacidades e responsabilidades num mundo em transformação. Com este tema pretende-se uma profunda reflexão sobre o papel da família tradicional face às novas referências patentes nas sociedades modernas e a procura de soluções adequadas para os problemas que se lhe deparam.
A família é o berço primeiro onde o desprotegido ser humano depara com o amor, a ternura e a segurança, onde desenvolve o conhecimento e a afectividade, onde encontra a satisfação material das suas necessidades básicas. Todo o ser humano tem direito a possuir uma família, espaço vocacionado por excelência para que o seu desenvolvimento se processe de forma harmoniosa e equilibrada.
Mas este direito que toda a criança tem de ser feliz estende-se à totalidade do agregado familiar, implica profunda consciencialização de direitos e deveres e impõe uma atitude responsável por parte de cada um dos seus elementos. É que a estabilidade da família tem a ver com a realização pessoal dos seus membros e precisa de sentimentos de solidariedade activa que cimentem a união do núcleo familiar, como são a compreensão e a interajuda.
A instituição-família regida por concepções ultrapassadas de diferente responsabilização entre o homem e a mulher está hoje posta em causa por razões várias, entre as quais avulta o cada vez maior acesso da mulher ao mercado de trabalho.
O direito à igualdade de oportunidades na educação e na cultura, no trabalho e na especialização profissional, na participação social e política, tem de estar na base da partilha de tarefas e de responsabilidades. Mas as profundas transformações do mundo moderno, com as novas concepções de vida daí resultantes, vieram levantar problemas complexos que exigem análise profunda e para os quais a família, por si só, não consegue respostas satisfatórias nem soluções adequadas. Referimo-nos a problemas sociais graves resultantes dos rapidíssimos avanços científicos e tecnológicos, com a deslocação massiva de populações dos centros rurais para as áreas urbanas, que implicam graves questões no âmbito da educação e do emprego, da habitação, dos transportes, da poluição e saúde, dos apoios à primeira e terceira idades, da prostituição e da droga, entre outros. São questões preocupantes que. se reflectem na estabilidade emocional das pessoas e põem em risco a segurança das famílias e o futuro das sociedades.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Foram estas generalizadas preocupações da sociedade civil que aleitaram o poder político e estiveram na base do encontro que, no ano de 1993, sob a égide das Nações Unidas, congregou durante uma semana responsáveis de países da Europa e da América do Norte, em Malta, para tratar do dossier Família. E, apesar das diferenças culturais, socio-políticas e socio-económicas dos participantes, oriundos do Norte, do Sul e do Leste, foi por todos reconhecida a importância crucial da família como célula-base da sociedade e afirmada a premente necessidade de implementação de políticas globais de família que não se esgotem no sector da política social.
O programa para o Ano Internacional da Família vem sendo cumprido entre nós, desde 1991 - ano considerado

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(...) preliminar -, e envolveu acções de sensibilização, de divulgação, de difusão de documentos, de esclarecimento, a edição de um boletim e a identificação de temas prioritários sobre a situação da família portuguesa.
A etapa preparatória - que decorreu nos anos de 1992 e 1993 - contou com acções de desenvolvimento de estudos dos temas definidos como prioridades e a promoção da família através dos média com diversas acções a nível nacional e local e ainda com a publicação de um livro sobre a problemática da família em Portugal, a elaboração de propostas para o reforço das capacidades e melhoria do quadro de vida das famílias e também a difusão de documentação e a organização de conferências a nível nacional. Finalmente, no ano que decorre - o das celebrações -, o programa inclui uma conferência a nível internacional, um relatório sobre a situação da família portuguesa, a edição de publicações e a emissão de selo e medalha comemorativos.
Com este ambicioso programa pretende-se - Sr. Presidente e Srs. Deputados- chamar a atenção de todos os intervenientes para este projecto apresentado sob a égide das Nações Unidas que tem como magno objectivo a construção da mais pequena democracia no coração da sociedade.
A meta deste Ano Internacional é promover a família, instituição depositária de valores humanos essenciais e inalienáveis, transformando-a em agente consciente e activo das mutações constantes do tempo em que vivemos. Tarefa ingente, que visa evitar a fragilidade das gerações e reforçar a coesão do tecido social, há-de, certamente, pelo seu alto valor, mobilizar tanto a sociedade civil como o poder político neste dobrar de século.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - É que - Sr. Presidente e Srs. Deputados - está em causa o bem-estar das gerações presentes e futuras, o progresso das nações e a própria dignidade da pessoa humana.
Paulo VI apelou um dia para que os homens fossem homens. Nós apelamos, este ano, para que as famílias sejam verdadeiramente famílias, isto é, que sejam autênticas fontes de ternura, de compreensão, de solidariedade e de amor e que os Estados saibam compreender isso e lhes criem as condições propícias.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados André Martins e Elisa Damião. Tem a palavra o Sr. Deputado André Martins.

O Sr. André Martins (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sra. Deputada Maria Luísa Ferreira, não quero pôr em causa as boas e dignas intenções com que V. Exa trouxe uma questão tão importante à Assembleia da República neste ano de 1994, que se entendeu designar por Ano Internacional da Família. No entanto, penso que deve merecer um debate alargado e aprofundado na sociedade portuguesa, o qual deverá passar por este Parlamento.
Apesar de dispor de pouco tempo, não posso deixar de fazer alguns reparos relativamente aos quais gostava de conhecer a sua posição. A Sra. Deputada falou da família como algo de abstracto. Em Portugal, a família - e foi por essa razão que não pude deixar de questioná-la - atravessa situações extremamente graves que têm a ver, em nosso entender, com a política que tem sido seguida ao longo dos últimos anos e de que o seu partido tem sido o responsável governamental.
Concretizando: na passada segunda-feira, a convite da União dos Sindicatos de Braga, desloquei-me a esse distrito onde tive oportunidade de falar com milhares de trabalhadores deste país, homens e mulheres, o núcleo central da família portuguesa (talvez não seja o da família tradicional), e de verificar que, nalguns casos, ambos estão desempregados, têm filhos que passam fome e nem sequer dispõem de condições para pagar os transportes que os levam à escola.
Sra. Deputada, esta realidade social põe em causa, como muito bem disse, a insegurança na família portuguesa e, mais genericamente, a sociedade portuguesa, pois são milhares e milhares de trabalhadores que se encontram nesta situação.
Também constatei que uma das causas deste estado de coisas se deve ao facto de algumas das empresas, designadamente, dos têxteis e do calçado, predominantes nesta região, terem declarado falência, fechado e dê, em simultâneo, os seus proprietários se terem candidatado a fundos comunitários de reabilitação da sua actividade económica. Os trabalhadores, pelo seu lado, foram despedidos e são obrigados a recorrer ao fundo de desemprego. Entretanto, os proprietários dessas empresas candidataram-se a fundos comunitários e montaram outras, enquanto que alguns dos trabalhadores que, há dezenas de anos, trabalhavam nas empresas falidas são integrados, com contratos a prazo de seis meses, nas novas empresas dos mesmos proprietários e trabalham com as mesmas máquinas.
Este é o resultado de uma política de que é responsável o seu Governo; são situações concretas da família, da sociedade portuguesa, com que gostava de confrontá-la, Sra. Deputada, para que não falemos apenas da situação da família e dos graves perigos que atravessa, com o que estou de acordo, mas também das situações concretas existentes na sociedade portuguesa.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sra. Deputada Elisa Damião.

A Sra. Elisa Damião (PS): - Sr. Presidente, Sr.a Deputada Maria Luísa Ferreira, registo com agrado a preocupação de V. Exa pela família. Aliás, é significativo que seja uma Deputada a fazê-lo, pois os Deputados estão sempre menos motivados para este tema.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Não diga isso!

A Oradora: - Registo que o Sr. Deputado também se preocupa, mas pouco. Nesta matéria, o Sr. Deputado Silva Marques dá poucos contributos e, por mais que afirme o contrário nestes apartes, nada se vê «preto no branco».
Em todo o caso, também registo que a Sr.a Deputada passou em revista um conjunto de realizações sublinhando o Ano Internacional da Família bem como os contributos que Portugal seguramente dará para este debate sobre a família do séc. XX, tema sobre o qual nos interrogamos a propósito de todos os aspectos da vida.
Lamentavelmente, V. Ex.ª não falou dos contributos do seu partido e do seu Governo, que tem gravíssimas responsabilidades neste domínio, desde logo, por não dar seguimento a um projecto de lei da sua autoria que teve idêntico destino ao da Lei de Bases da Família e ao de apoio às famílias monoparentais e mães menores, para já não falar de outros projectos de lei cuja apresentação aqui se foi sucedendo.
Comemorar não basta, Sr.ª Deputada! Falar nos anos internacionais a pretexto dessas comemorações não é sufi- (...)

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(...) ciente, tanto mais quando sabemos que, em Portugal, 35 % das famílias vivem no limiar da pobreza e 25 % da população, de acordo com as estatísticas mais recentes, vivem mesmo em situação de pobreza e que uma em cada cinco crianças vive numa família monoparental, com escassos recursos, dificuldades e sem estruturas de apoio.
Também sabemos que a família média portuguesa-e não apenas as famílias carenciadas - não tem apoios nos mais diversos níveis, a começar pêlos equipamentos sociais. Hoje, é dramático que uma jovem mãe que trabalha tenha de prescindir de cerca de 60% do seu salário médio para pagar um jardim de infância ou uma creche, mas mais dramático, ainda, é quando se junta um idoso a uma criança.
Gostava que, relativamente a estas matérias, se tivesse, pelo menos, a coragem de falar nelas para perceber a dimensão dos problemas que temos de resolver.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sra. Deputada Maria Luísa Ferreira.

A Sra. Maria Luísa Ferreira (PSD): - Sr. Presidente, começo por agradecer aos Srs. Deputados que formularam pedidos de esclarecimento a oportunidade que me dão de complementar este assunto que tanto interessa à sociedade portuguesa.
O Sr. Deputado André Martins referiu-se especialmente ao distrito de Braga, onde se deslocou ultimamente. Porém, calculo que tenha passado pouco tempo nessa região, razão pela qual não aprofundou devidamente as questões que se suscitam, em especial, no que diz respeito ao Vale do Ave, pois sou obrigada a lembrar-lhe que os próprios sindicatos louvam as medidas sociais pensadas para o Vale do Ave.
Falou também nos transportes que levam as crianças à escola, mas certamente que por lapso, pois não só são gratuitos como estão a cargo das autarquias. Só por lapso é que V. Exa se referiu a essa matéria, certamente!

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Naturalmente que tanto o Sr. Deputado André Martins como a Sra. Deputada Elisa Damião se preocupam com as questões que afligem a família não só em Portugal como em todas as sociedades. Naturalmente que também estamos atentos a esse problema e foi por essa razão que, da tribuna, enunciei algumas questões graves, que interessa enfrentar para tomar as medidas adequadas em ordem à sua resolução.
Penso que o meu partido não merece as palavras que a Sr.a Deputada Elisa Damião lhe dirigiu. O meu partido equaciona as questões e o Governo procura resolvê-las, mas «Roma e Pavia não se fizeram num dia». Estamos no bom caminho para resolvê-las e é claro que haverá sempre reparos a fazer quer governe o Partido Social-Democrata ou qualquer outro partido.
Trata-se de problemas muito graves que, como já disse, a rapidez da evolução científica e tecnológica levanta e que se devem, essencialmente, à deslocação massiva de populações que se concentram nos grandes centros.
Tudo o que seja feito não é suficiente. No entanto, lembro-lhe que o Governo tem tomado medidas importantes de apoio às famílias de menores recursos, de menores rendimentos, e que a própria iniciativa que aqui tomei não está afastada. Na verdade, como esta Legislatura não terminou,
ainda estamos a tempo de fazer andar para a frente essa iniciativa, até porque estou tão interessada como V. Exa na resolução de problemas desta índole.

Aplausos do PSD.

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas e o PSD também está? Os 134 Deputados?

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Américo de Sequeira.

O Sr. Américo de Sequeira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Fica lá em cima, no extremo Noroeste de Portugal, limitado, a Norte e a Leste, por 135 Km de fronteira com a Galiza, a Sul, pelo agrupamento de concelhos do Baixo Cávado e, a Oeste, pelo oceano.
Os seus 2 222 Km2 representam 10,4% de toda a região do Norte, 2,5% da do Continente e perfazem o «NUT Minho-Lima», formado por dois agrupamentos de concelhos, correspondentes aos vales daqueles rios, à volta de cujas bacias hidrográficas se estrutura o território, essencialmente encaixado pelas montanhas do interior, em que é relevante uma avantajada área do Parque Nacional.
Estou a referir-me, como é óbvio, ao Alto Minho, todo ele coincidente com o distrito de Viana do Castelo, região e comunidade que desde sempre vêm sonhando, natural e justamente, com amanhãs diferentes.
Porque assim é, vêm traçando caminhos, terçando esforços e alimentando a paciência e a esperança, com a determinação de quem procura a mudança e acredita num futuro que venha a ser vivido em novos e sucessivos patamares de desenvolvimento que os seus recursos naturais e a força das suas gentes justificam e permitem vislumbrar.
Se, do que afirmo, outras muitas provas não houvera, bastaria aquela que, no âmbito do primeiro Quadro Comunitário de Apoio e dó primeiro Programa Operacional do Alto Minho, foi exuberantemente prestada pelas 10 autarquias da região, que, numa solidariedade sem equívocos, numa determinação conjunta exemplaríssima, indiferentes aos seus diversos posicionamentos político-partidários, souberam potenciar um investimento da ordem dos 9 milhões de contos, convertidos numa substancial melhoria das acessibilidades internas, saneamento básico e abastecimento de água, pequenos pólos industriais, recuperação urbana, ordenamento, espaços de lazer, desporto, cultura e divulgação do património.
Se um justo aplauso é devido à coragem, quase audaciosa, do poder local, manda a justiça que também se releve a acção da Administração Central, a qual começa a ser visível por aquelas bandas, já directamente, através de contratos-programa, em infra-estruturas de transportes, de educação, de saúde e de equipamento social diverso, realizadas umas e outras programadas em PIDDAC para tempos que se avizinham.
Tudo junto, porém, face à globalidade das carências estruturais, por um lado, e às potencialidades endógenas do Alto Minho, por outro, constitui apenas a primeira etapa de uma corrida que vai ser ainda penosamente longa, por há muitos anos atrás se não haver iniciado, como justo seria que tivesse acontecido. De facto, é possível e fácil recensear no Alto Minho um conjunto de fenómenos que indiciam ali um estádio de desenvolvimento ainda muito distante daquele outro que os tempos novos postulam e a justiça fundamenta.
À perifericidade da região e suas inevitáveis consequências acrescem a interioridade, a complexa orografia, as assi- (...)

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(...) metrias internas, a dispersão de grande parte do seu território, encaixado entre os dois vales que a estruturam e habitado por uma população rarefeita e marcadamente envelhecida.
O êxodo populacional, sendo embora uma característica secular daquele povo, veio assumindo, nas décadas mais recentes, foros de desertificação preocupante.
Débil é a estrutura produtiva, ainda fortemente centrada num sector primário sem produtividade; irregularíssima é a distribuição do seu tecido, apenas com aflorações industriais significativas em Viana do Castelo e pouco mais do que incipientes em alguns dos outros nove concelhos do distrito. Releva o sector terciário, de alguma dinâmica, que poderá esmorecer se nos demais sectores se não arrancar a tempo em passo estugado.
É óbvia, por ali, a dependência de rendimentos exógenos pouco consistentes, por serem essencialmente oriundos da emigração e facilmente geradores de um fenómeno perigoso: o desequilíbrio entre, por um lado, os índices de despesa real que se vai registando e, por outro, a capacidade/incapacidade local efectiva de produzir riqueza firme.
As preocupações aprofundam-se pela ainda muito nítida insuficiência de infra-estruturas essenciais de ordem vária, das que, a título de mero exemplo, se revelam as grandes acessibilidades ao exterior.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estando, como estamos de facto, diante de uma «área problema», não assumiremos, todavia, uma postura dramática nem um fatalismo inconsequente.
A verdade é que o Alto Minho comporta no seu seio uma panóplia invejável de recursos próprios, potenciadores de um desenvolvimento firme e inestimável, capaz de sustar a hemorragia migratória e de fixar, a prazo, a maior quota do seu melhor capital: os seus filhos.
Soberbos são os recursos paisagísticos do Alto Minho, desde o mar à montanha, com relevo para as áreas do Parque Nacional.
Alta é a valia do seu património cultural diversificado.
Relevem-se as potencialidades termais de Monção e de Melgaço e as surpreendentes albufeiras do Alto Lindoso/Soajo e de Touvedo/S. Jorge.
Aí temos, em tudo isso e por toda a parte, matéria que bonde para um turismo irresistível, por diferente no género e na qualidade.
Referência não menor é devida aos recursos silvícolas e às condições singularmente propiciadoras da aquacultura, quer marinha quer, fundamentalmente, nas abundantes águas interiores.
Depois, as condições edafoclimáticas permitem perspectivar as possibilidades reais de um novo e diferente contributo do sector primário, bem superior ao que se vem assistindo. Distingam-se as realidades da vitivinicultura e da bovinicultura, acolá com as excelências do alvarínho, do loureiro e trajadura, aqui, com o exemplo das raças autóctones prestadoras de carnes que são hoje raro manjar.
Do ponto de vista geográfico, os 135 Km de fronteira com a Galiza, a similitude da cultura, dos problemas e dos interesses constituem um quase privilégio potenciador de sinergias para acções de desenvolvimento em comum. Desenvolvimento que tem de o ser do todo, integrado e homogéneo, o que recusa e condena a tentação de os protagonistas de «Arco Atlântico» cederem ao egoísmo chauvinista de se constituírem em lobby aprofundador das actuais assimetrias.
O desenvolvimento deve ser promovido segundo critérios de justiça distributiva, o que recusa o privilégio da concentração monocêntrica e impõe novas e alternativas centralidades, propiciadoras de um desenvolvimento globalizante, que vá aligeirando as assimetrias entre litoral e interior.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não é excessivo admitir que o Alto Minho comporta potencialidades para um sério impulso de desenvolvimento, o qual pode assentar na diversificação e vitalidade de um bom tecido produtivo, designado e, fundamentalmente, construído a partir dos recursos endógenos, de acordo com uma lógica de localização orientada pela oferta de matérias-primas, sempre sem prejuízo daquele ainda magnífico equilíbrio natural.
O Alto Minho é, na verdade, um espaço ainda reservado ao crescimento da esperança. Só que esta tem um tempo razoável de que se alimenta e outro que, se excessivo, a pode matar e, por via disso, tornar o futuro irremediável.
Acredito que assim não será se à dinâmica da sua renovada geração de autarcas e aos fundos do segundo Quadro Comunitário de Apoio se juntarem os de outros programas sectoriais e se a Administração Central se tornar mais célere na execução das grandes infra-estruturas programadas, designadamente na área das acessibilidades, de que saliento o lanço da auto-estrada de Braga a Valença, o Itinerário Complementar n.° 26, Viana/Ponte de Lima/ Arcos de Valdevez/Ponte da Barca/fronteira da Madalena, a nova ponte sobre o Lima, em Ponte da Barca, a variante à Estrada Nacional n.° 101, em Arcos de Valdevez, o Itinerário Complementar n.° l, Porto/Viana/Valença, os acessos à nova ponte de Viana, a conclusão dá ponte Monção/Sal Vaterra, as do Peso e de Vila Nova de Cerveira.
Depois é preciso que o porto comercial de Viana do Castelo, onde foram feitos investimentos relevantes, se dinamize para a competitividade e amplie consideravelmente o seu hinterland.
Criar condições é urgente, para que tantos filhos do Alto Minho, que povoam as universidades e institutos politécnicos, designadamente o de Viana do Castelo, ali possam fixar-se e investir o seu saber, generosidade e juventude.
É imperativo reforçar tecnicamente as estruturas ligadas à prestação de serviços na área empresarial e superar deficiências de informação e de formação profissional.
Finalmente, impõe-se aligeirar a burocracia, vigiar os circuitos e apurar a sensibilidade de quem informa, para decisão, as candidaturas ao Sistema de Incentivos Regionais em todas as áreas da sua intervenção. É que, se assim acontecer, não faltarão aos alto-minhotos o empenho e o dinamismo necessários para fazerem o resto que precisa de ser feito, a fim de que a região chegue atempadamente aos patamares de desenvolvimento a que tem direito incontestável.
Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vai ser lido o voto n.° 98/VI - Dê saudação pela passagem do Dia Mundial dos Direitos do Consumidor (PS).

O Sr. Secretário (João Salgado): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o voto é do seguinte teor:
Por ocasião da passagem de mais um Dia Mundial dos Direitos do Consumidor, instituído em comemoração da data em que o Presidente John Kennedy produziu um discurso político consignando os direitos dos consumidores, sublinhando a sua importância social, económica e política, e concluindo pela célebre asserção «consumidores somos todos nós», a Assembleia da República, reconhecendo a plena actualidade do debate das questões de(...)

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(...l) consumo e a sua importância para elevação dos níveis de qualidade dos cidadãos:
a) Saúda o movimento organizado dos consumidores e reconhece a generosidade e o fundamento da sua acção em defesa dos direitos dos cidadãos consumidores;
b) Reconhece o papel extremamente positivo desempenhado por instituições como a DECO, associação de utilidade pública que este ano completa 20 anos de actividade e quê hoje mesmo demonstrou a sua vitalidade e o seu grande sentido de responsabilidade cívica, ao apelar directamente aos consumidores para que reagissem contra a iniciativa da banca de cobrar uma taxa por todas as transacções feitas com utilização dos cartões MULTIBANCO.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação. Não havendo pedidos de palavra, vamos passar à votação.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de
Os Verdes e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Mário Tomé.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.
Eram 16 horas e 55 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de mais, estão em aprovação os n.0* 37, 38 e 39 do Diário, respeitantes às reuniões plenárias dos dias 9, 10 e 11 de Fevereiro.
Não havendo objecções, consideram-se aprovados.
Srs. Deputados, vamos iniciar a discussão do projecto de resolução n.° 94/VI - Apoio e defesa da vitivinicultura e dos viticultores nacionais face à reforma da OCM dos vinhos (PCP).
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Comunidade Europeia tem em curso de discussão uma proposta visando a reforma da política vitivinícola. É o início do alargamento da reforma da Política Agrícola Comum às produções mediterrânicas. Ao vinho seguir-se-ão as horto-frutícolas e o azeite. São produções estratégicas para o nosso país, que consubstanciam o grosso das culturas em que a nossa agricultura se pode apoiar para concorrer com as agriculturas da União Europeia.
Aquando da reforma da PAC, que prejudicou seriamente os agricultores e a agricultura portuguesa, o Governo afirmou que a aposta de defesa do sector para o nosso país seria ganha aquando da definição das políticas para as produções típicas do sul da Europa.
Ora, a Comunidade está agora a iniciar esse caminho. O Conselho de Ministros da Agricultura da Comunidade irá debater, ainda em Março ou Abril, uma proposta da Comissão sobre a evolução e futuro da política vitivinícola, que é, nos termos em que está redigida, intolerável e inaceitável para Portugal.
Ao silêncio do Governo nesta matéria, opomos a necessidade de um debate público, de uma mobilização do sector vitivinícola, da definição de uma posição e de uma política nacionais, que defendam os interesses da vitivinicultura portuguesa no «quadro da Comunidade Europeia.»
A Assembleia da República tem hoje essa oportunidade com o projecto de resolução que apresentamos e que, a ser aprovado, contribuirá, inclusivamente, para potenciar a força negociai do País nesta matéria.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A vinha e o vinho têm uma importância estratégica para a agricultura portuguesa, a preservação do mundo rural, o meio ambiente e a própria identidade cultural do país (veja-se o Douro e as suas vinhas), com profundas repercussões sociais.
Ocupa cerca de 250 000 viticultores, abrange uma área de 377 000 ha e cerca dê 365 000 explorações, representa 19% do Produto Agrícola Bruto e 38% das exportações agro-alimentares. Em determinadas regiões do país, como no Douro, não há alternativas culturais à vinha.
A produção vínica nacional oscila, em média, entre os 9 e os 10 milhões de hectolitros. Não há excedentes estruturais de vinho em Portugal e a nossa produção representa unicamente cerca de 5% da produção comunitária.
Temos um vinho de qualidade, com possibilidades (e necessidades) de crescer, designadamente na área dos VPQRD. Com uma boa promoção, nos mercados nacionais e internacionais - que não tem sido feita -, com a racionalização dos circuitos de comercialização e com uma boa política de preços, o vinho português está em condições de competir e de vencer com os melhores vinhos dos outros países da Europa.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Claro que para isso não pode suceder o que se passa actualmente: uma garrafa de um bom vinho português custa num supermercado de Londres 3,5 dólares enquanto um bom vinho francês custa 1,5 dólares.
É sabido, pelo contrário, que a Comunidade Europeia tem apresentado desequilíbrios estruturais no sector, expressos nos 24 milhões de hectolitros (cerca de 15% da produção total) sem escoamento, que se prevê existirem no final do século.
Só que estes excedentes têm razões que as propostas da Comissão das Comunidades parece desconhecer.
A primeira tem a ver com a prática enológica, seguida nos países setentrionais da Europa (proibida - e bem! - em Portugal), da adição de sacarose ou açúcar de beterraba fermentado - a chamada chaptalização-a mostos com baixo valor alcoométrico natural, tendo em vista aumentar artificialmente a graduação e a quantidade de vinho produzido e, com isto, atingindo-se produtividades artificiais elevadíssimas.
Dou-vos um exemplo: a Alemanha, que tem vinhos de grau alcoólico natural de 4,5° ou 5°, lança no mercado vinhos afamados, graduados com 9° ou 10°, mas cuja graduação é atingida - muitas vezes sem que o consumidor se aperceba - com a adição de açúcar de beterraba.
É esta beberragem, a que alguns chamam vinho, a responsável por grande parte dos excedentes existentes na Europa.
Basta dizer que se calcula em cerca de 250 000 toneladas a sacarose anualmente consumida nesta operação, dando lugar, só por si, a um volume adicional de vinho de cerca de 20 milhões de hectolitros, isto é, 83% dos excedentes da Comunidade previstos para o final do século.
É por isto, também, que a Alemanha (mas podemos igualmente referir o Norte de França ou a Itália), com um terço da área de vinha de Portugal, tem uma produção 30% superior à nossa, através de produtividades artificiais, que chegam a atingir os 150 hl/ha, enquanto a produtividade média portuguesa é da ordem dos 30 hl/ha e a da Comunidade é de 65hl/ha.
Sendo esta a razão fundamental dos excedentes, não desconhecemos a existência de outras: diminuição do con- (...)

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(...) sumo por troca com o whisky ou a cerveja (muitas vezes em resultado de uma propaganda «anti-vinho», que não anti-alcoólica), para o que contribui também o elevado e injustificado preço final no consumidor, sem contrapartida no preço pago ao produtor; importações de países terceiros, as quais, aliás, terão tendência para aumentar, como resultado dos acordos do GATT; elevada fiscalidade sobre o vinho, em alguns países.
Ora, o espantoso é que a proposta da Comunidade para a reforma da política vitivinícola ignora quase completamente estas questões fundamentais, não as referindo nem atacando, preferindo optar por uma política que, em síntese, aponta como soluções-chave a definição de quantidades de referência - «quotas» de produção para cada país -, ignorando a magna questão das produtividades, o incremento do arranque das vinhas e, numa fase transitória, a aplicação da destilação obrigatória (cujo regime seria profundamente alterado), paga a um preço que corresponde a cerca de 18% do preço de orientação, na proporção correspondente aos excedentes, distribuídos igualmente por todos os países da Comunidade em função das suas produções históricas.
Simultaneamente, propõe generalizar a possibilidade do uso de sacarose a toda a Comunidade, enquanto quer retirar a ajuda à utilização do mosto concentrado, que até é um produto vínico e cuja utilização, em anos de fracas produções, constitui um instrumento de equilíbrio dos mercados.
Em síntese, Portugal, que produz um vinho de qualidade, que apenas corresponde a S % da produção comunitária, que não contribui para os excedentes, que aceitou a interdição de circulação dos vinhos verdes para fora da região demarcada porque tinham um valor alcoométrico abaixo dos 8,5°, seria obrigado, agora, a aumentar o arranque de videiras e a queimar 15% da sua produção (cerca de 1,5 milhões dê hectolitros) para se poder continuar a produzir, a consumir e a importar vinho «a martelo», feito à base de açúcar, dos países setentrionais do Norte da Europa. Por exemplo, a Itália e a França, responsáveis, cada um, por 33 % da produção comunitária (repito, a nossa é de 5%) e com produtividades duplas da nossa, destilariam os mesmos 15%.
Se tivermos, ainda por cima, em linha de conta que o custo de um grau de álcool feito à base de sacarose é muito inferior ao custo de um grau de álcool vínico, podemos ficar com uma perspectiva mais clara da gravidade do que é proposto e do «terramoto» que tudo isto significaria para os já muitos fracos rendimentos dos agricultores.
A concretizar-se esta proposta seria a vitória dos lobbies do açúcar e, mais uma vez, das orientações favoráveis aos países setentrionais da Europa, orientações, aliás, contrárias aos critérios seguidos na anterior reforma da PAC, onde, pelo contrário, foram penalizados os sistemas culturais assentes em elevadas produtividades.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Face a este quadro, o nosso projecto de resolução defende, em síntese, que a Assembleia da República e, através dela, o País se pronunciem contra esta proposta da Comissão.
Por isso, propomos: há que começar por definir o que é «vinho». Vinho é o produto extraído da vinha e não o produto feito artificialmente em «laboratório».
Há que proibir ou condicionar fortemente o uso de sacarose, embora se admita, para o efeito, p estabelecimento de um período de transição.
Devem ser penalizadas as produções que ultrapassem certas produtividades, as quais não poderão deixar de ser consideradas na definição das quantidades de referência para cada país.
Não deve ser retirada a ajuda à utilização do mosto concentrado.
As ajudas ao rendimento dos viticultores devem ser totalmente financiadas pelo orçamento comunitário e devem privilegiar os produtores situados em regiões de menores produtividades e maiores custos, com explorações ou parcelas de menor dimensão e em regiões vitícolas sem produções alternativas.
Devem ser priorizados os programas e apoios à reestruturação das vinhas para alargar a produção de vinho de qualidade. Lembramos que, neste momento, estão pendentes por falta de verbas, no Instituto do Vinho e da Vinha, projectos rondando os 5 000 ha para reestruturação da vinha, sendo que os valores previstos no QCA estão longe de corresponder às necessidades de um programa que, prevendo a reestruturação de 30 000 ha de vinha no nosso país, só financiou até ao momento cerca de 5 000 ha.
Por fim, é preciso não abandonar o princípio da preferência comunitária e é necessária uma política de melhoria dos circuitos de comercialização, de promoção e valorização do vinho e de reforço dos mecanismos de controlo e fiscalização.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Seria intolerável que o Governo português optasse, de novo, por uma posição pouco firme, frágil, aceitando eventualmente os pressupostos fundamentais da proposta da Comunidade a troco de «trinta dinheiros». Seria, de novo, vender interesses estratégicos da agricultura e dos agricultores portugueses e do mundo rural por uma miragem de subsídios limitados no tempo e que nunca compensariam a liquidação de uma parte importante da nossa vitivinicultura e da nossa própria cultura e a quebra dos rendimentos dos agricultores.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - As dificuldades com que se debate a nossa vitivinicultura - dificuldades financeiras das adegas cooperativas, que exigem medidas urgentes, como uma linha de apoio à «stockagem» dos vinhos e crédito bonificado de campanhas, os baixos preços ao produtor, as dificuldades de escoamento a e concorrência desleal, designadamente com vinhos de Espanha, sem qualidade, que estão a ser, de modo ilegal, importados a granel para serem lotados ou vendidos como vinho nacional - seriam extremamente agravadas com as medidas agora propostas pela Comunidade.
Há condições para um largo consenso na definição de uma posição em defesa dos interesses da vitivinicultura e dos viticultores portugueses.
O projecto de resolução do PCP abre essa possibilidade e aponta nesse sentido.
Esperemos que, desta vez, a Assembleia da República se prestigie, não se demitindo das suas responsabilidades.

Aplausos do PCP e do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos inscreveram-se os Srs. Deputados Ferreira Ramos e Carlos Duarte.
Para esse fim, tem a palavra o Sr. Deputado Ferreira Ramos.

O Sr. Ferreira Ramos (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, em primeiro lugar, queria dizer-lhe que, por parte do Grupo Parlamentar do CDS-PP, este quadro negro que traçou corresponde integralmente à realidade e, por isso, queremo-nos associar à dignidade e à profundidade das soluções que aponta, (...)

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(...) nomeadamente aquelas que constam da síntese deste projecto de resolução.
Como este projecto de resolução tem por base um documento de reflexão da União Europeia, a questão que coloco tem a ver com a coincidência de, neste mesmo dia, a Comissão de Assuntos Europeus estar reunida para discutir, de alguma forma, o acompanhamento e a apreciação, pela Assembleia da República, do papel de Portugal na construção europeia.
De facto, o CDS-PP participou nessa iniciativa, ao ser o primeiro partido a avançar com a necessidade de a Assembleia da República legislar no sentido de ser estabelecido um quadro de acompanhamento e de apreciação do papel do País na construção europeia.
Posto isto, não lhe parece que um projecto de resolução desta natureza, sem esse enquadramento normativo - que ainda não existe-, não estará, de certo modo, debilitado? Se por um lado podemos considerar que ele veio tarde, já que na altura devida, aquando ,da sua apresentação, pelo CDS-PP, foi chumbado, por outro lado não julga que veio algo cedo demais?
Não considera, não obstante, aquilo que referi em primeiro lugar, isto é, a existência de uma perfeita coincidência, na sua quase generalidade, deste projecto com o pensamento do CDS-PP nesta matéria, .que ele teria outra profundidade e, eventualmente, outro alcance se fosse debatido aquando da existência de um normativo claro e aprovado por esta Assembleia, que permitisse a esta fazer um verdadeiro acompanhamento e apreciação do papel do Governo português na construção europeia?

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lino de Carvalho, havendo mais um orador
inscrito para pedir esclarecimentos, V. Exa. deseja responder já ou nó fim?

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Duarte.

O Sr. Carlos Duarte (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, em primeiro lugar, gostaria de. salientar o facto de o Partido Comunista Português ter apresentado aqui uma iniciativa, relacionada com o sector agrícola, que está quer na agenda comunitária quer na nacional.
Assim, ao contrário de outros partidos da oposição, nomeadamente o PS, que se ocupam com a discussão de alguns casos administrativos e de gestão corrente, da máquina do Ministério da Agricultura, o PCP apresenta aqui iniciativas, discorde-se ou não delas, com seriedade, que merecem um debate aprofundado.
Em relação a esta iniciativa, gostaria de saber se o Sr. Deputado concorda ou não que os princípios que a enformam implicam, nomeadamente, a supressão da «chaptalização», bem como da adição dá sacarose e a necessidade de um financiamento a 100% pela Comunidade em relação aos rendimentos.
De facto, as posições do Governo português expressas, quer na acta do Conselho de Ministros da Agricultura da Comunidade, realizado nos dias 21 e 22 de Setembro de 1993, quer através do Sr. Ministro da Agricultura, Dr. Arlindo Cunha, correspondem às que os senhores hoje apresentaram, oito meses depois! Portanto, os princípios não são novos e sempre foram defendidos pelo PSD e pelo Governo português; aliás, estamos esperançados de que se consiga alterar a proposta indo ao encontro deles.
Todavia, é de salientar que este projecto de resolução contém algumas incorrecções técnicas e erros de substância no seu conteúdo, que impedem, eventualmente, a sua aprovação completa.
Sr. Deputado Lino de Carvalho, concorda ou não que este texto, a ser analisado em sede de comissão e na especialidade, deverá merecer uma análise mais aprofundada, de forma a adequar a sua terminologia técnica e a sua substância àquilo que é a necessidade da posição negociai do Estado português? E está o Partido Comunista disponível para esta alteração na substância?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, desde já agradeço aos dois Srs. Deputados as questões que me colocaram.
De facto, não penso que o projecto de resolução n.° 947 VI seja uma iniciativa legislativa debilitada. Se for aprovado, e quero crer que será, consubstanciará, talvez pela primeira vez em relação a uma matéria que está em processo de discussão e de decisão na Comunidade, uma posição de fundo deste órgão, representante do povo português, quanto a uma questão central para o sector e para o País em geral.
A definição da posição tomada pela Assembleia da República não deixará, seguramente, de ser tida em conta pêlos outros órgãos de soberania, em particular pelo Governo, a quem compete negociar esta proposta em Bruxelas. Ele não está, portanto, debilitado!
Em relação ao normativo que o Sr. Deputado Ferreira Ramos referiu, sempre temos defendido que é preciso reforçar os mecanismos de acompanhamento das políticas comunitárias, por parte da Assembleia da República. E, aliás, temos sido os primeiros a criticar, nesta Assembleia, o facto de o Governo, muitas vezes, nos colocar perante políticas consumadas, sem ouvir, previamente, a Assembleia e sem procurar criar um consenso de opiniões em questões que poderiam ser consensuais para a defesa dos interesses nacionais.
Além do mais, diria que nem sequer o actual quadro legal existente é, muitas vezes, aplicado! Se a actual Lei de Acompanhamento fosse aplicada, nos termos em que foi aprovado pela Assembleia da República, já seria um grande passo para esse tal processo de acompanhamento e de algum controlo por parte da Assembleia da República em relação às políticas comunitárias.
Quanto às questões colocadas pelo Sr. Deputado Carlos Duarte, devo dizer que o que conheço das posições do Governo português é muito pouco...

O Sr. Carlos Duarte (PSD): - A reunião da Comissão de Agricultura realizada em
Janeiro é muito pouco?!

O Orador: - E conheço, sobretudo, aquelas que, na reunião da Comissão de Agricultura, o Sr. Secretário de Estado, a nosso pedido, foi procurar esclarecer junto do Sr. Ministro da Agricultura, isto é, as posições que o Governo iria defender no quadro da Comunidade.
Quero crer que existe nesta matéria um largo campo de consenso, incluindo o próprio Governo. Mas a verdade é que todos - e eu próprio - ficámos com dúvidas sobre qual o enquadramento, e os vários níveis, em que o Governo (...)

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(...) se propunha defender as posições portuguesas na Comunidade: se pretendia, pura e simplesmente, impedir o avanço da proposta, cujo pressuposto fundamental tem de passar pela proibição ao condicionamento do acto de «chaptalização» ou se, porventura, queria condicionar a sua posição a algumas soluções negociais, a encontrar no quadro do processo negociai em curso, designadamente o «troco», com alguns subsídios acrescidos para o arranque das vinhas.
Pensamos que «trocos» desta natureza não são aceitáveis, muito menos nesta questão. Exige-se, pois, quanto a esta matéria, uma posição muito firme e clara, que não ficou suficientemente esclarecida com a ida do Sr. Secretário de Estado à Comissão de Agricultura e Mar.
Sr. Deputado, quanto à possibilidade de se fazer uma análise mais aprofundada deste diploma, na especialidade, tudo depende daquilo a que os senhores chamam incorrecções técnicas; se não se alterar aquilo que são os princípios gerais e a estrutura fundamental do nosso projecto de resolução - e que, estou convencido, devem colher o consenso de todos os grupos parlamentares, dos sectores da vitivinicultura portuguesa e até, direi mesmo, do próprio Governo. Mas como dizia, caso não se altere a sua estrutura fundamental, naturalmente, estamos abertos para as correcções que, em sede de especialidade, os diferentes partidos queiram introduzir, de modo a melhorar o texto que apresentamos. Todavia não dispensamos, como é óbvio, a sua aprovação hoje, na generalidade, com o processo legislativo sequente que se afirma.
Também queremos dizer, Sr. Deputado, que a aprovação deste projecto de resolução, nos termos em que está, servirá, inclusivamente - isto é, se esta for a posição séria do Governo -, para potenciar e reforçar ò próprio poder negociai do País no quadro das negociações que estão em curso na Comunidade.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra ao próximo Deputado inscrito, queria saudar, em nome da Câmara, a presença de uma delegação do Bundestag, constituída por Deputados do Parlamento alemão, que fazem parte do Grupo de Amizade Parlamento Alemão/Parlamento Português.

Aplausos gerais, de pé.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Campos.

O Sr. António Campos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Primeiro-Ministro e o Ministro da Agricultura festejaram exuberantemente o acordo conseguido, durante a presidência portuguesa, para a reforma da Política Agrícola Comum.
Essa festa, como dissemos na altura, foi feita à custa do abandono de interesses vitais para Portugal.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Muito bem!

O Orador: - Hoje, sem se sentirem ainda todas as consequências desse acto irresponsável e fortemente penalizador para o nosso país, já todos começaram a ter a noção da dimensão do erro cometido.
Foi uma reforma que não integrou nenhuma das produções para que temos aptidão, colocando-as à mercê dos interesses, como já várias vezes denunciei nesta Assembleia.

O Sr José Vera Jardim (PS): - Muito bem!

O Orador: - A reforma beneficiou muitos países, principalmente os do Norte da Europa, mas foi feita contra Portugal.
Agora, para amenizar o erro cometido, resta-nos a esperança de que, no seio da Comunidade, haja firmeza e convicção na negociação de políticas isoladas para as nossas produções. Essas negociações já começaram no sector vitivinícola é seguir-se-ão os dossiers das frutas e dos hortícolas, também decisivos para o futuro do nosso mundo rural. O êxito ou a derrota do dossier vitivinícola repercutir-se-á, em grande parte, nas restantes negociações.
Entendemos que o relatório apresentado pela Comissão ao Conselho é inaceitável porque viola todas as regras de funcionamento da Comunidade na defesa da qualidade e da genuinidade dos produtos.
O vinho é um produto falsamente excedentário na Europa comunitária - chamo a atenção de que, após a entrada em vigor dos acordos do GATT, vai haver a concorrência do Chile, da Argentina, da Austrália, dos Estados Unidos, etc., e a curto prazo dos países de Leste, todos eles com custos de produção inferiores aos nossos. Assim, embora o consumo de produtos alcoólicos tenha aumentado, o vinho entrou em declínio, baixando o seu consumo cerca de 2 milhões de hectolitros por ano.
O Parlamento Europeu discutiu, há uma semana, esse relatório elaborado pela Comissão e, pela primeira vez, há um choque evidente entre o que pensa o Parlamento e o que pensa a Comissão. Encontra-se, assim, aberta a porta ao Governo para poder ganhar as negociações na Comissão e no Conselho e, se não conseguir tal objectivo, é porque continua com a política de negociar dinheiros, para se servir deles politicamente e não para defender o mundo rural e a nossa agricultura.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Não é aceitável que a Comunidade se debata com falsos excedentes, que custam mais de 1600 milhões de ECU, excedentes esses conseguidos através da adulteração do produto por via da adição de sacarose; é o mesmo que financiar as laranjadas em vez de financiar os sumos de laranja!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A primeira questão que se coloca é a de definir o que é o vinho: se é um produto saído da fermentação do mosto das uvas ou se é um produto saído da beterraba açucareira, à qual se juntaram umas uvas.
Portugal é um país com aptidão natural para a produção de vinhos de alta qualidade, tendo o vinho a maneio sido sempre proibido entre nós, na defesa da qualidade e do produto natural.
Não podemos, pois, aceitar, só porque os países do Norte e algumas regiões do Sul não têm condições naturais para a sua produção, que a Comunidade entre na falsificação e na desvirtualização do vinho, junto do consumidor. Essa adulteração abrirá também as portas a toda a espécie de falsificação vinda dos países do GATT.
Para que o consumo seja recuperado, este é o momento de rever toda a política vitivinícola da Comunidade, impondo-lhe fortes regras na defesa da qualidade.
Portugal lançou no mercado, com êxito, vinhos naturais de baixo teor alcoólico, como os verdes do Minho ou os leves do Oeste, o que prova que há consumo para os mais variados tipos de vinho.

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A ser permitida qualquer adição para recuperar grau. alcoólico, só o deve ser com a aplicação de mostos concentrados rectificados, que não têm quaisquer influências organolépticas no produto final.
Não é. compreensível ao comum dos cidadãos que a Comunidade crie os excedentes, através da adulteração do vinho, e venha depois impor regras penalizadoras aos países verdadeiramente produtores, a fim de se desfazer desses excedentes.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Essa política não é aceitável, como não é tolerável que esta produção não tenha ajuda ao rendimento na mesma proporção que têm os produtores de cereais ou dos ruminantes, garantidos para os produtores do Norte na célebre negociação da reforma da PAC.
Somos a favor da canalização dessas ajudas para as regiões com vocação natural para a vitivinicultura, bem como da destilação dos vinhos de inferior qualidade. Defendemos uma política individualizada para os vinhos de altíssima qualidade e este é o momento de reformar e abrir esperanças ao sector.
Não aceitamos a capitulação e o desinteresse manifestados pelo Governo e pêlos Deputados do PSD no Parlamento Europeu - nem sequer participaram na comissão e na grande vitória que já houve no Parlamento Europeu.
Depois da negociação da reforma da Política Agrícola Comum, contra os nossos interesses, resta-nos agora exigir ao Governo um comportamento responsável ë um empenhamento redobrado.
O vinho representa 19% do produto agrícola bruto e abrange mais de 200 000 produtores. Esta produção não pode ser tratada com a habitual incapacidade a que o Ministério nos habituou.
Na defesa dos interesses nacionais, votaremos favoravelmente o projecto de resolução do Partido Comunista e esperamos que o PSD faça o mesmo, tanto mais que estão à porta as eleições para o Parlamento Europeu e, neste momento, os senhores terão que participar aqui, de facto, na defesa dos interesses nacionais.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vasco Miguel.

O Sr. Vasco Miguel (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não devemos abordar este tema sem ter uma definição exacta acerca do produto que está em causa, para que se tenha plena convicção no tratamento do assunto.
Depois de muito investigar em redor do termo vinho, chegámos, e ainda bem, à conclusão de que «o vinho é o produto obtido exclusivamente pela fermentação alcoólica, total ou parcial, de uvas frescas, esmagadas ou não, ou de mostos de uvas». Quem o afirma são enólogos como Emile Peynaud, Ribereau-Gayon, Octávio Pato e tantos outros, mas o mais interessante é que é também esta a definição adoptada pela Comunidade Europeia.
Neste momento, o sector do vinho apresenta um excedente estrutural médio de 22 milhões de hectolitros, prevendo a CCE que,- no ano 2000, esse excedente passe para 24 milhões de hectolitros, devido, fundamentalmente, à quebra de consumo que se constata nos países produtores.
Propõe a CCE tomar medidas por forma a que, dentro de três ou quatro anos, desapareçam os excedentes estruturais, as próprias exportações não sejam apoiadas e as destilações se realizem unicamente para retirar do mercado excedentes conjunturais.
Para atingir tal objectivo, propõe a adaptação ordenada do potencial vitícola mediante programas regionais de arranque, fortemente majorados, susceptíveis de receberem ajudas nacionais. Tais programas seriam desenvolvidos por projectos integrados, que compreenderiam medidas de emparcelamento, florestação, protecção do ambiente e desenvolvimento rural.
Os programas regionais compreenderiam ainda um conjunto de ajudas (co-financiadas pela Comunidade e Estados membros), destinadas a apoiar a limitação dos rendimentos por hectare, assim como à divulgação e formação técnica dos viticultores e ao apoio a acções específicas destinadas a facilitar a comercialização do vinho.
Como medidas que a CCE designa como «complementares para o equilíbrio do mercado» propõe ainda: estender a toda a Comunidade a possibilidade de praticar a «chaptalização» (actualmente só permitida nas regiões do Norte), eliminando a ajuda proporcionada às regiões meridionais para aplicação do mosto concentrado que utilizam no «enriquecimento», e fixar limites ao rendimento/ha dos VQPRD, estabelecendo regras para a sua desclassificação.
O programa de redução do potencial produtivo seria acompanhado (e levado a efeito) por uma reforma do sistema de destilações que consistiria: numa destilação facultativa, no início da campanha, destinada a eliminar excedentes conjunturais; até se atingir o equilíbrio comunitário da oferta-procura, numa destilação obrigatória, a preços extremamente baixos, cuja gestão seria da responsabilidade dos Estados membros produtores (previsão de sanções comunitárias e nacionais); numa destilação obrigatória dos subprodutos; a juzante do sistema de destilações, na revisão do papel dos Estados membros produtores e da Comunidade nos encargos do escoamento dos álcoois vínicos, evoluindo-se para o seu co-financiamento.
A repartição pelos Estados membros produtores quer da diminuição do potencial vitícola (arranque) quer da destilação obrigatória seria feita em função das «produções nacionais históricas» e da produção de referência a atingir num mercado comunitário equilibrado.
Na reunião do Comité Consultivo Vitivinícola, realizada em 17 de Fevereiro de 1989, onde estive presente, foi analisada com grande vigor a problemática dos mercados, destilações e enriquecimento do vinho.
Foi sobre este último tema que estalou a polémica. A Comissão informou que o Conselho sempre tinha feito «ouvidos moucos» a esta questão, o que, no entender de alguns países, levava a serem postos perante factos consumados, que chocavam peremptoriamente com as directrizes comunitárias, porque não se pode; por um lado, implementar o arranque da vinha e, por outro, utilizar algo para ampliar o vinho. Chegou-se, então, à conclusão de que o problema não é a alternativa de açúcar e mosto mas, sim, o ordenamento do vinho na Comunidade, porque estamos perante a tecnologia do enriquecimento e não numa enologia do enriquecimento, ficando clara a ideia de que o enriquecimento com mosto concentrado deve ser apenas um corrector e não uma prática sistemática, visto o aumento de grau não ajudar em nada o comércio.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Em Outubro de 1992, face à reforma da OCM, a Comissão mediterrânica elaborou um relatório por (...)

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(...) unanimidade sobre dois grandes temas - a modificação do sistema de enriquecimento e a harmonização da regulamentação comunitária -, onde constam estudos muito aprofundados sobre a quase totalidade das causas da crise vitivinícola, onde ressalta um ataque muito concreto à «chaptalização» e onde o presidente da OIV afirma que o volume mais importante dos excedentes provém das práticas culturais ou enológicas contrárias às normas deontológicas elementares. Face à crise, somos obrigados a abordar o tema da «chaptalização», porque a OIV estabeleceu como princípio fundamental a protecção dos interesses gerais dos viticultores e não os interesses parciais de grupos de pessoas ou de regiões. A «chaptalização» é um assunto importante, que devemos analisar, visto que a definição da OFV precisa claramente que o vinho é uma bebida obtida pela fermentação exclusiva da uva ou dos mostos de uvas e não de sacarose, pelo que a utilização do açúcar de beterraba ou de cana está em contradição com esta definição, porque se trata de um produto estranho à uva.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não poderemos apoiar a proposta da Comissão, tal como está formulada, por inúmeras razões não só de ordem excedentária mas também de qualidade e mercado.
Por isso, o PSD está em sintonia com o sentido geral do projecto de resolução, embora este contenha algumas imprecisões técnicas e numéricas, pelo que nos parece carecer de uma análise mais cuidada em sede de comissão parlamentar.
Também em abono da verdade devemos referir que, na reunião do Conselho de Agricultura da Comunidade Europeia, de 20 e 21 de Setembro de 1993, o Sr. Ministro Arlindo Cunha chamou a atenção para uma série de questões que correspondem ao que julgamos serem as nossas pretensões em relação à nova OCM ê que passam pela harmonização da regulamentação vitivinícola comunitária com igualdade de direitos e obrigações, pela supressão da «chaptalização», pela definição de uma política europeia de defesa e promoção do vinho para aumentar o consumo e pela manutenção intransigente de Portugal como país vitivinícola.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Capoulas Santos.

O Sr. Luís Capoulas Santos (PS): - Sr. Presidente; Sr. Deputado Vasco Miguel, ouvi com atenção a sua intervenção e registo com apreço as suas palavras. De facto, esta é uma matéria que merece um largo consenso entre os portugueses, já que se trata de uma actividade agrícola que ocupa uma percentagem considerável da população activa e contribui largamente para o rendimento.
A questão que quero colocar-lhe, Sr. Deputado Vasco Miguel, tem a ver com o seguinte: tendo sido esta matéria objecto de discussão, na semana passada, no Parlamente Europeu, e, ao que se saiba, tendo sido aprovado um projecto de resolução, baseado no Relatório Serra, que, em certa medida, constituiu aquilo que foi considerado por alguns observadores como a apresentação de um «cartão amarelo» à Comissão, gostaria de perguntar-lhe por que razão nenhum Deputado do PSD no Parlamento Europeu apresentou qualquer proposta ou deu qualquer contributo, que, de alguma forma, ajudasse à defesa das posições que
vieram a ser aprovadas por uma maioria, a qual, como sabe, contou com o apoio dos Deputados portugueses no Parlamento Europeu.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Vasco Miguel.

O Sr. Vasco Miguel (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Capoulas Santos, como é evidente, não devo interferir nas atitudes dos meus colegas a nível do Parlamento Europeu.
Contudo, como o Sr. Deputado sabe, uma das pessoas que colaborou directamente na elaboração desse documento- que, aliás, tenho aqui no meu dossier- e que já numa intervenção posterior tinha feito um apelo à unidade dos países mediterrânicos no sentido da proibição da exceptualização foi o Deputado do PSD, Vasco Garcia. Nada mais posso dizer-lhe, porque não quero entrar em campos que desconheço.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais pedidos de palavra, declaro encerrado o debate sobre o projecto de resolução n.° 94/VI, da autoria .do PCP. A Mesa foi informada de que irá dar entrada um requerimento de baixa à Comissão deste diploma.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, se bem entendi, o projecto de resolução é, primeiro, votado aqui na generalidade e, só depois, baixa à Comissão.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a votação será feita amanhã, quinta-feira, que é o dia habitual para a realização das votações.
Srs. Deputados, vamos passar à apreciação do projecto de lei n.° 242/VI - Dá nova redacção ao n.° 3 do artigo 17.° do Decreto-Lei n.° 338/88, de 28 de Setembro (atribuição de alvarás e licenciamento de estações emissoras de radiodifusão sonora), apresentado pelo PS.
Tal como a Mesa vem interpretando o Regimento, vou começar por dar a palavra, por cinco minutos, ao Sr. Deputado relator, Miguel Macedo, para, se assim o entender, fazer uma síntese do relatório.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Prescindo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Assim sendo, vou dar a palavra ao autor do projecto de lei, Sr. Deputado Arons de Carvalho. A Mesa concede-lhe cinco minutos para a introdução do debate, que é independente do que foi atribuído ao seu

Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Arons de Carvalho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: As rádios de cobertura local começaram a ser licenciadas, há já cinco anos. Sem alvarás, muitas delas iniciaram as suas emissões há mais de 10.
Já é, assim, possível fazer um balanço. E é obrigatório tomar medidas.
As rádios locais mudaram a comunicação social portuguesa e não apenas a radiodifusão. Não me refiro apenas ao aumento do pluralismo e da concorrência ou ao (...)

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próprio «tempo» dos acontecimentos ou da actividade política, mas, sobretudo, à expressão das comunidades locais.
Em muitos concelhos, a rádio local tem um papel relevante como pólo de difusão cultural, uma vez que não há cinema, o teatro não chega, os clubes de vídeo, as livrarias e as bibliotecas não existem, a liberdade de imprensa está limitada à opção entre um jornal desportivo de Lisboa e a folha local sem expressão nem leitores, a televisão que se vê com mais nitidez e frequência ainda é muitas vezes o primeiro canal da TVE, a televisão privada só chegará talvez no próximo ano e a televisão por cabo no próximo século.
Em muitos outros concelhos, nomeadamente no litoral, as rádios locais não estão tão isoladas. A concorrência acesa com os outros media torna a sua existência simultaneamente menos relevante, mas, por vezes, mais difícil.
É possível, no entanto, traçar um quadro geral da situação das rádios locais em Portugal: progressiva concentração; diminuição do pluralismo; diminuição da produção própria; diminuição da programação virada para temas regionais e locais; diminuição do número de rádios com noticiários próprios; desaparecimento de rádios locais; crescentes dificuldades de natureza financeira e muitas outras sujeitas à inesperada concorrência de novas cadeias nacionais e regionais.
Aumentou, de facto, drasticamente a concentração da propriedade. Alguns grupos detêm hoje várias rádios, nomeadamente de âmbito local. Mesmo uma seita religiosa de origem brasileira viu na compra de algumas estações um óptimo investimento.
Pior do que isso, algumas estações locais não difundem hoje qualquer espaço de programação própria. Onde há dois ou três anos havia programas e noticiários virados para as questões locais e regionais e um óbvio esforço de acompanhamento da vida das comunidades, restam muitas vezes algumas salas com material abandonado. Essas estações, que ganharam os alvarás graças a muito entusiasmo e a algumas promessas, já não têm programas próprios, nem jornalistas, nem outros empregados. Apenas uma antena para retransmitir na íntegra a progrmaação de outra rádio.
De pouco valeram, de facto, os concursos públicos que seleccionaram as rádios regionais e locais. Repare-se como estão, hoje, por exemplo, as duas estações regionais vencedoras do concurso público de Junho de .1990. Menos de três anos depois, ambas tinham desaparecido: a Radiopress foi absorvida pela TSF e a Correio da Manhã Rádio pela Rádio Comercial.
Entretanto, em cerca de metade dos concelhos do conjunto dos distritos do interior do País, não há rádios locais, porque nenhuma entidade se candidatou.
No distrito de Portalegre, por exemplo, apenas dois dos 15 concelhos dispõem, hoje, de uma rádio local.
Estes dados demonstram que há uma íntima relação entre grau de desenvolvimento e dinamismo económico e social e a capacidade para fundar uma estação de rádio.
Mas há outro aspecto demonstrável: as rádios locais desempenham um papel relevante, sobretudo nos concelhos mais isolados e menos desenvolvidos, precisamente naqueles onde as carências das populações são muitas, mas as receitas publicitárias das rádios inevitavelmente poucas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo não tem qualquer política para a radiodifusão. É-lhe rigorosamente indiferente que as rádios locais existam ou desapareçam.
Há três anos, publicou um despacho, que impunha a distribuição pelas rádios locais e pela imprensa regional de uma percentagem equivalente a 10 % das receitas da publicidade estatal. O despacho continua por cumprir!
Nos últimos meses, ameaçou intervir contra as estações propriedade de uma seita de origem brasileira. Nunca o fez!
Em 1991, proibiu, estupidamente, a associação de rádios para a produção e difusão conjunta de programas. O PSD aplaudiu.
Em Março de 1992, mudou radicalmente de posição. Passou a permitir «a difusão simultânea de programas culturais, formativos ou informativos». O PSD continuou a aplaudir.
Hoje, muitas rádios retransmitem já toda a programação, violando o artigo 6.° da Lei da Radiodifusão. Ninguém sabe o que o Governo pensa sobre esta matéria.
A lei proíbe que uma pessoa colectiva tenha participação em mais do que duas empresas de radiodifusão. Toda a gente sabe que este preceito não é cumprido!
A lei faz depender a transmissão de alvarás de uma autorização do Governo. Nunca ninguém a solicitou, mas todos os meses os jornais noticiam a mudança de propriedade de rádios.
Se tudo continuar como até aqui, não haverá, dentro de alguns anos, muitas rádios locais. As opções de política de comunicação social, que levaram à criação de mais de 300 rádios locais, ficarão sem qualquer sentido.
O País e a liberdade de informação não beneficiariam com esta situação.
A radiodifusão sonora é ainda, apesar dos vertiginosos progressos tecnológicos, um bem limitado. Isso implica não só uma selecção dos concorrentes à utilização das frequências, com natural eliminação dos menos apetrechados, como um conjunto de obrigações para os vencedores dos concursos: pluralismo, qualidade, promoção educacional e cultural. No caso das rádios locais, acrescente-se uma outra: a ligação às realidades dos concelhos onde se inserem.
Há muitas coisas incompatíveis com esta conclusão: o desrespeito absoluto pêlos concursos públicos; a utilização de um bem do domínio público para fins particulares de mais do que duvidosa seriedade (vide as rádios ligadas a seitas ditas religiosas); o desaparecimento de diversas rádios, cujas antenas são agora meros retransmissores de programação alheia; a recusa obstinada do Governo em estender às rádios locais o quadro de apoios em vigor, há mais de dez anos, para a imprensa regional.
O projecto de lei que o PS hoje coloca à discussão pretende contribuir para combater esta realidade.
As propostas apresentadas não são inovadoras. Muitos países, entre os quais os próprios Estados Unidos da América, impõem mínimos de programação própria. Outros prevêem formas de apoio às estações locais, de forma a que elas possam eficazmente desempenhar a sua função.
O Orçamento do Estado para 1994 prevê uma verba superior a 1 milhão de contos para apoio à imprensa. Ninguém compreende que o que generosamente se dá à imprensa-e também ao cinema, ao teatro, ao audiovisual e a outras formas de expressão da cultura - se recuse à rádio.
Conheço de cor a argumentação do Governo e do PSD: as rádios locais tiveram de provar a sua viabilidade económica quando venceram os concursos públicos.
Este argumento esquece não só a realidade da situação da radiodifusão como as profundas mudanças nas regras da concorrência do sector, graças à acção ou à inacção do Governo: os aumentos de potências, a permissão das cadeias ou da transmissão simultânea de programas,, a nova situação das rádios regionais.
O governo da Região Autónoma dos Açores estabeleceu, há cerca de quatro anos, um quadro geral de apoios às rádios idêntico àquele que o PS vem defendendo. Propõe-se mesmo, agora, renová-lo. Entendeu o papel insubstituível das rádios locais.

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Quando será que Governo e PSD lhe seguem o exemplo? Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este debate é uma boa oportunidade para debater a deplorável história recente da radiodifusão, em Portugal, e a forma como o Governo PSD, por acção e por omissão, permitiu que o processo de concentração da propriedade dos órgãos de comunicação social aplicado às rádios tenha conduzido à destruição da maior parte das rádios locais e à instauração de uma selva radiofónica que não conhece leis nem limites.
A morte das rádios locais já foi anunciada na imprensa como um facto em vias de consumação. Várias causas têm sido apontadas para esse facto e podemos, hoje, discuti-las.
Porém, há uma causa evidente para a situação lamentável a que, hoje, se assiste e que conhece, todos os dias, novos desenvolvimentos. Essa causa é a política do Governo para a comunicação social e, em particular, para a radiodifusão. A morte das rádios locais tem sido um objectivo prosseguido pelo Governo.
Todas as medidas tomadas pelo Governo em relação à actividade de radiodifusão e todas as medidas que o Governo se tem abstido de tomar, no sentido de fiscalizar a legalidade das situações existentes, corporizam uma actuação governamental marcada pela, arbitrariedade, pelo clientelismo e pelo objectivo de permitir aos grupos monopolistas que se movem no domínio da comunicação social destruir o movimento das rádios locais e substituí-lo por um amontoado de estações radiofónicas transformadas em meros postos de retransmissão.
Merece a pena rememorar os passos mais significativos deste processo.
A situação radiofónica que se vivia em Portugal, em 1987, era marcada pelo aparecimento recente do chamado movimento das «rádios piratas». Na ausência de uma legislação enquadradora da actividade de radiodifusão local e regional, centenas de rádios locais fizeram o seu aparecimento, criando um facto sem precedentes na história da comunicação social em Portugal.
As comunidades locais passaram a ter voz na rádio. A radiodifusão tornou-se um veículo de comunicação, de debate e de conhecimento mútuo entre as pessoas. A rádio aproximou-se dos cidadãos. As formas de comunicação através da rádio diversificaram-se, A actividade de radiodifusão tornou-se também uma expressão de livre associativismo.
É público e notório que entre as centenas de rádios locais que então apareceram coexistiram boas e más rádios. Rádios com e sem condições técnicas adequadas. Rádios com profissionais e rádios assentes exclusivamente em projectos lúdicos. No entanto, o aparecimento das rádios locais veio enriquecer globalmente o panorama da comunicação social em Portugal, pela diversidade de comunicação que introduziu, pela dinamização das comunidades locais que propiciou, pelo pluralismo que veiculou e por uma nova geração de profissionais de rádios que veio a gerar.
Evidentemente que se impunha uma regulamentação da actividade de radiodifusão. Evidentemente que fazia todo o sentido impor condições de viabilidade e de idoneidade técnica aos projectos de radiodifusão e disciplinar o espectro radiofónico.
No entanto, desde o controverso processo de licenciamento das frequências de rádio locais que se verificou que não foram esses os objectivos visados pelo Governo. A primeira medida do Governo foi proibir todas as rádios locais até que o processo de atribuição de alvarás ficasse concluído. A segunda medida foi a conclusão desse processo com uma atribuição de alvarás, marcada pela arbitrariedade e pela satisfação do clientelismo político, com prejuízo de muitos projectos sérios e idóneos.
O resultado está hoje bem à vista. Desde recursos de impugnação da atribuição de alvarás, julgados procedentes pêlos tribunais administrativos, até rádios que foram licenciadas e nunca emitiram.
A atribuição de frequências regionais seguiu o mesmo processo. A frequência regional de Lisboa foi atribuída a uma rádio de audiência ínfima, mas cujo proprietário fazia parte do júri. Nunca criou até hoje os emissores regionais de que era suposto dispor, limitando-se a alugá-los à RDP, e está hoje transformada em mera retransmissora de uma rádio nacional que pertence ao mesmo proprietário. A rádio que obteve a frequência regional do Porto foi, entretanto, absorvida por uma rádio local que havia perdido o concurso para atribuição da frequência regional de Lisboa.
A situação que hoje se vive é, assim, confrangedora. Dos 310 alvarás atribuídos em 1987, nem um terço está a cumprir o estatuto editorial a que se comprometeu; das 11 rádios que obtiveram alvarás em Lisboa e Porto, apenas três existem hoje nessa qualidade.
As responsabilidades do Governo neste estado de coisas não podem ser iludidas. O Governo tem pactuado e mesmo incentivado o total espezinhamento da legislação quê ele próprio aprovou. Se não, vejamos: dispõe o Decreto-Lei n.° 388/88, de 28 de Setembro, que «cada pessoa colectiva só poderá deter participação numa outra empresa de radiodifusão, não podendo essa participação exceder 30 % do respectivo capital» e ainda que «cada pessoa singular apenas poderá ser titular de capital ou exercer funções de administração numa única empresa de radiodifusão». Não faltam exemplos de incumprimento chocante destas disposições legais.
O Governo Regional da Madeira atribuiu um subsídio de 14 400 contos à empresa «Ramos, Marques e Vasconcelos», de que é sócio o conhecido dirigente do PSD Jaime Ramos, por conta de quatro rádios de que esta empresa dispõe na Região Autónoma da Madeira (Rádio Palmeira, Rádio Zarco, Rádio Sol e Rádio Brava), cabendo, assim, a cada uma destas rádios o dobro do subsídio que coube a qualquer uma das outras rádios existentes na Região.
São conhecidos e publicitados casos de rádios locais de Lisboa que anunciam as frequências em que transmitem no Porto, em Coimbra, no Alentejo e no Algarve; rádios do Porto que transmitem em Coimbra e em Viseu; rádios da Amadora que transmitem também no Porto e no Algarve; e rádios de Loures que transmitem também no Alentejo.
Por outro lado, são conhecidas rádios que aparecem de novo, controladas por outras rádios, destinadas a determinados sectores do público e o caso de uma seita religiosa que dispõe, pelo menos, de três rádios e de tempo de emissão em mais 17.
Por isso, pergunto: perante esta situação, que é publicamente conhecida, o que fez o Governo até ao momento para assegurar o cumprimento do disposto do Decreto-Lei n.° 388/88, de 28 de Setembro? A resposta é simples: nada!
O que não espanta quando se sabe que foi o próprio Governo que optou por vender a Rádio Comercial em OPV, sabendo perfeitamente que o comprador já controla-

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va outras rádios, incorrendo, portanto, em contradição com o disposto na lei.
O Governo, porém, não se limitou a estas graves omissões. Também nunca reabriu o concurso relativamente às frequências locais que, entretanto, ficaram disponíveis, quer as de Lisboa e Porto, cujas rádios obtiveram frequências regionais, quer as 80 frequências que ficaram disponíveis após o primeiro pseudo-concurso.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quando obtiveram os respectivos alvarás, por decisão do Governo, as rádios locais tiveram de demonstrar, nos termos da lei, a viabilidade económica e financeira dos respectivos empreendimentos e procederam à descrição detalhada da actividade que se propunham desenvolver, com. particular relevo para o horário de emissão e mapa de programação, e tiveram de apresentar o respectivo pacto social e ainda uma declaração respeitante às limitações à participação de pessoas colectivas no capital de mais de uma empresa de radiodifusão.
Acontece que, ainda nos termos da lei, «quaisquer alterações que impliquem modificações dos direitos e obrigações constantes do alvará terão de ser autorizadas pelas entidades competentes», sob pena de suspensão do alvará.
Assim, pergunto: o que tem feito o Governo, enquanto entidade competente, para assegurar o cumprimento do disposto na lei? Como é evidente, a resposta é «nada», o que representa uma gravíssima violação dos direitos de quem foi preterido na atribuição das frequências.
Como se pode conceber que alguém que tenha sido preterido na atribuição de uma frequência de rádio e se propunha desenvolver um projecto de acordo com as regras estabelecidas para o concurso público veja agora que aqueles que, à sua custa, obtiveram a frequência com base em determinados compromissos façam tábua rasa daquilo a que se comprometeram, ao ponto de se limitarem a vender os direitos obtidos, perante a passividade das chamadas entidades competentes.
Esta situação demonstra que o Governo concebeu e pôs em prática uma política para as rádios locais, tendo como objectivo principal a sua destruição. O Governo concebeu os concursos para a atribuição de rádios locais como mero trampolim para os negócios dos grupos monopolistas, que já hoje controlam os grandes meios de comunicação social. Para esse efeito, concebeu e pôs em prática uma política de verdadeiro, asfixiamento das rádios locais, negando-lhes apoios essenciais à sua actividade e à sua manutenção.
O Governo PSD já demonstrou a sua falta de vontade para moralizar o panorama radiofónico nacional, especialmente ao nível local e regional. Apesar de diversas declarações de intenções por parte de responsáveis pelo sector, o Governo nunca desencadeou os mecanismos legais, que a si próprio atribuiu, para fazer respeitar o ordenamento legal em vigor. A situação a que se chegou impõe a adopção de medidas concretas que restabeleçam a legalidade no sector da radiodifusão.
É indispensável que, urgentemente, sejam divulgadas as frequências presentemente disponíveis e se calendarizem os próximos concursos públicos para atribuição de alvarás. É necessário que sejam definidos os contornos de uma. futura legislação que assegure o carácter local das rádios locais e garanta os apoios públicos indispensáveis para a manutenção dessas características, que limite a concentração de empresas de radiodifusão e concretize uma fiscalização autêntica e isenta do cumprimento da legislação aplicável e das condições impostas pela atribuição de alvarás.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Aquele que foi o genuíno movimento das rádios locais está hoje cada vez mais a ser transformado numa multiplicação de antenas retransmissoras de programações alheias; aquela que foi, no seu conjunto, uma das mais enriquecedoras experiências encetadas nas últimas décadas no domínio da comunicação social, está hoje cada vez mais a ser transformada em mero palco de actuação de grupos económicos, que controlam rádios, jornais, televisões, cinemas, distribuidoras, gráficas e que, pêlos vistos, determinam a actuação do Governo de acordo com os seus interesses. Com tudo isto, quem perde são os cidadãos, o pluralismo e a democracia.

Aplausos do PCP e do Deputado independente João Corregedor da Fonseca.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Ferraz de Abreu.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por iniciativa do Partido Socialista, é esta Assembleia instada a pronunciar-se sobre o projecto de lei n.° 242/VI, que não só pretende alterar o n.° 3 do artigo 17.° do Decreto-Lei n.° 338/88, de 28 de Setembro, entretanto já objecto de alterações por força do Decreto-Lei n.° 30/92, de S de Março, como também visa impor ao Governo a obrigação de regulamentar um conjunto de «apoios do Estado aos órgãos de comunicação social», que incluem, para as estações emissoras de radiodifusão sonora de cobertura local, descontos nas tarifas de telefones, telexes e feixes hertzianos, a distribuição obrigatória de publicidade do Estado, a comparticipação nas despesas com as agências noticiosas sediadas em território nacional, a promoção de formação de quadros e, finalmente, a comparticipação em despesas relativas ao reapetrechamento tecnológico.
Para um melhor entendimento do que está em discussão, vamos analisar, em separado, as propostas contidas nos n.os. 1 e 2 do projecto de lei em apreço.
Assim, a preocupação primeira contida no projecto de lei n.° 242/VI é impedir situações em que rádios locais são utilizadas como meros retransmissores de programação de outras estações emissoras, impondo-se, por isso, que todas tenham uma «programação própria em pelo menos um terço do período de emissão, com um mínimo de quatro horas por dia, que inclua dois ou mais serviços noticiosos».
Se é certo que a alteração proposta dá resposta às preocupações reveladas na exposição de motivos do projecto de lei em apreço, não é menos certo, no nosso entendimento, que nunca esteve em causa, mesmo depois das alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.° 30/92, o necessário e impostergável cumprimento das normas da Lei n.° 87/88, que, como sabemos, regula o exercício de actividade de radiodifusão.
Com efeito, se atentarmos no disposto do artigo 6.° da já citada Lei n.° 87/88, constataremos que, para além dos fins gerais da actividade de radiodifusão, enumerados no artigo 4.°, constituem fins específicos do exercício da actividade de radiodifusão de cobertura regional e local, entre outros: «alargar a programação radiofónica a interesses, problemas e modos de expressão de índole regional e local e difundir informações com particular interesse para o âmbito geográfico da audiência».
Ou seja: sendo impensável que resulte das alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.° 30/92 uma subalternização dos específicos fins das rádios de cobertura regional e local, menos se poderá admitir a sua completa e total in-

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versão, como sempre acontecerá, quando não estejam a ser prosseguidos os objectivos fixados na Lei n.° 87/88.
Acresce que, convenhamos todos, de nada servirá formular exigências legais, como as que vêm propostas no artigo 1.° do projecto de lei do Partido Socialista se a estas não forem associadas as adequadas sanções.
É que, sobre estas, nada se diz, pelo que sempre continuariam em vigor, como continuam, os mecanismos sancionatórios já consagrados na lei e que - recorde-se - prevêem, em caso de incumprimento, a suspensão do respectivo alvará, o que, como sabemos, é impeditivo do exercício da actividade de radiodifusão.
E, neste domínio ainda, é de inequívoca relevância recordar aqui que, por força do Decreto-Lei n.° 338/88, quaisquer alterações que impliquem modificações dos direitos e obrigações constantes do alvará terão de ser autorizadas pelas entidades competentes para a respectiva atribuição, não podendo ser concedida aquela autorização antes de decorridos três anos sobre a sua emissão, sob pena, de igual forma, de suspensão do alvará.
E estas exigências e sanções legais ganham, decerto, tanto mais sentido quanto nos recordarmos que o processo de atribuição de alvarás não deixou de ter em conta o mapa de programação e o horário de emissão propostos pêlos então candidatos, constituindo até estes elementos factores decisivos na ponderação daquela decisão.
Por tudo isto, reafirmamos a convicção de que o artigo 1.° do projecto de lei em apreço nos parece tendencialmente menos exigente, face ao já disposto nos diplomas legais que regulam esta matéria, instituindo uma espécie de «serviços mínimos» a que as rádios locais estariam obrigadas na ausência de cumprimento de obrigações livremente assumidas e que foram determinantes na atribuição do respectivo, alvará.
É assim, nesta medida, uma proposta politicamente supérflua, sem deixar de ser injusta, porque altera condições na base das quais também foram atribuídos os alvarás de licenciamento. É ainda uma proposta tardia para quem, ao contrário do PSD, só agora acolhe preocupações que sempre foram as nossas.
Pelo que ficou dito, melhor se compreende a exigência - que reafirmamos - de reforçar e intensificar as acções de fiscalização, para que, neste domínio, se evitem e sancionem eventuais situações menos compatíveis com o quadro legal vigente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei n.° 242/ VI, do Partido Socialista, pretende ainda, no seu artigo 2.°, impor ao Governo a regulamentação de um conjunto de apoios do Estado aos órgãos de comunicação social, tendo como especiais destinatárias as estações emissoras de radiofusão sonora de cobertura local.
Pretende-se, designadamente, a regulamentação de apoios que vão dos descontos nas tarifas de telefones, telexes e feixes hertzianos, à distribuição obrigatória de publicidade do Estado, à comparticipação do Estado nas despesas decorrentes dos serviços prestados por agências noticiosas sediadas em território português, à promoção de formação dos seus quadros até à comparticipação em despesas relativas ao reapetrechamento tecnológico.
Para os mais desatentos a conclusão a retirar da leitura desta proposta seria a de que, com ela, o Partido Socialista estava a trilhar novos caminhos e a propor novas soluções, preenchendo, assim, um largo campo de omissão do Estado no apoio às estacões de radiodifusão sonora de âmbito local.
E, no entanto, quão enganosa e precipitada seria esta conclusão só permitida a quem desconheça os apoios vigentes para a formação profissional e para a cooperação, nos termos previstos, por exemplo, na Portaria n.° 411/92, bem como o acesso a uma percentagem não inferior a 10 % do valor bruto dos investimentos realizados com a distribuição de publicidade do Estado, nas condições da Portaria n.° 1/91, de 2 de Janeiro.
Assinale-se, de resto, quanto a esta última, que, com a assinatura, em 1992, do Protocolo entre a APR e o Gabinete de Apoio à Imprensa, foi já iniciada a atribuição das verbas resultantes da distribuição da publicidade do Estado pêlos órgãos de comunicação social, regional e local.
Quanto ao resto, omite-se, deliberadamente, que a realidade das rádios locais tem pouco mais de cinco anos e, não esquecendo os avanços tecnológicos entretanto verificados, não deixa de ser verdade que parece excessivo, pelo menos para já, falar de apoios à reconversão tecnológica.
Até porque, mais uma vez o recordamos, era exigência do concurso público de licenciamento que os candidatos fizessem prova não só da sua viabilidade económica e financeira como também das instalações e equipamentos projectados.
E não é certamente sustentável afirmar que, no estudo de avaliação da capacidade económica e financeira dos projectos, não assumiam especial relevo os custos das tarifas de telecomunicações e da utilização de feixes hertzianos, tanto mais que, como bem se compreende, são custos necessários ao regular funcionamento destes órgãos de comunicação social.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pelo que ficou dito. não consigo evitar a convicção de que esta iniciativa do Partido Socialista tem, em termos políticos, um valor meramente recorrente.
Trata-se de uma iniciativa em relação à qual se não divisa outra ambição para além da pretensão de contar para efeitos estatísticos. Achamos que é pouco e insuficiente. Merece, por isso, cumprir aquela ambição...

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu):- Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Arons de Carvalho.

O Sr. Arons de Carvalho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Macedo, parece-me que a sua intervenção- essa sim! - é supérflua, porque, por um lado, vem repetir todos os argumentos que o PSD vem esgrimindo, ao longo dos tempos, contra o conjunto de apoios do Estado às rádios locais e, por outro lado, demonstra que conhece muito bem a lei mas não conhece rigorosamente nada daquilo que, na prática, se passa no terreno.
Pergunto-lhe, muito concretamente, se entende que a lei, que o Sr. Deputado diz que existe e não precisa de ser alterada, porque está perfeitamente de acordo com a realidade das rádios locais, está a ser cumprida, nomeadamente em relação à propriedade de mais do que uma empresa de radiodifusão, à venda de alvarás e ao respeito por uma programação que tenha em conta os interesses regionais e locais, principalmente o tal artigo 6.° da Lei da Radiodifusão, que o Sr. Deputado citou, e se está em condições de me garantir que o Protocolo estabelecido entre a Associação Portuguesa de Radiodifusão e o Gabinete de Apoio à Imprensa sobre os tais 5 % de publicidade institucional está a ser cumprido ou não.
É que, no fim de contas, o Sr. Deputado conhece a legislação mas não a realidade e não sabe como é que esta lei está a ser diariamente ultrapassada por algumas rádios, em prejuízo da generalidade das rádios locais do nosso país.

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Se o nosso projecto é, como o Sr. Deputado diz, supérfluo e tardio, devo dizer que conheço a situação e sei que foi o próprio Subsecretário de Estado Amândio de Oliveira quem pediu às associações representativas das rádios locais - a Associação Portuguesa de Radiodifusão e a Associação das Rádios de Inspiração Cristã - uma proposta de alteração à legislação em vigor e, precisamente, algumas das propostas que essas duas associações entregaram, há pouco tempo, ao Subsecretário de Estado vão no seguimento do projecto que o Partido Socialista agora apresentou.
Portanto, pergunto-lhe se está em condições de aqui nos afirmar que é essa a receptividade que o Governo ou o PSD vai ter em relação às propostas apresentadas pelas associações do sector da radiodifusão.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Barbosa de Melo.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Ferreira Ramos.

O Sr. Ferreira Ramos (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Macedo, da sua intervenção resulta, aliás, tal como já resultava do relatório da Comissão, de que V. Ex.a foi relator, onde levantava já determinadas questões que aqui nos expôs, que o normativo existente é perfeitamente suficiente para acautelar determinadas situações gravíssimas que o PS reafirma existirem na exposição de motivos do projecto de lei que aqui está em discussão. Essa é também a opinião do CDS-PP.
Sabendo que a imprensa local e as rádios locais são extremamente importantes na formação e na liberdade de opinião, na formação de correntes de discussão e na reposição de notícias, que, obviamente, não têm qualquer enquadramento nos conflitos geopolíticos, nas facturas falsas, nos conflitos entre Belém e S. Bento, antes têm um espaço próprio, porque, se não fossem esses órgãos de informação, determinadas notícias nunca poderiam chegar ao conhecimento dos cidadãos - e passo aqui por cima do relevante papel da imprensa regional, principalmente no contacto os emigrantes portugueses -, pergunto-lhe se, na verdade, considera que a fiscalização tem existido.
Por outro lado, V. Ex.a, na sua intervenção, disse também que, se houvesse mais fiscalização, não se teria chegado, a estas situações. Por isso, pergunto-lhe: o que pensa que é necessário para haver essa fiscalização?
Quem não se recorda de ligações perigosas em algumas atribuições de frequências, de situações que acabaram nas barras do tribunal, de notícias vindas a público sobre a atribuição de subsídios e apoios que parecem ser verdadeiros escândalos, em relação, por exemplo e segundo creio, a Pombal, a Oliveira de Azeméis e a Murtosa!
Depois de tudo isto, que é preciso mais para haver fiscalização e para se fazer cumprir a lei?
Por último, considera ou não que a existência de um apoio estatal que ultrapasse aquilo que pode ser considerado apoio a um serviço público, que esta imprensa local e estas rádios locais prestam, pode, de alguma forma, quebrar a liberdade que se pretende, ao tomar estes órgãos de comunicação social dependentes em demasia do poder estatal?
Para o CDS-PP chega e é preocupante a ligação e a promiscuidade que, por vezes, determinados órgãos de comunicação social regional têm com determinados poderes, nomeadamente o económico e o político, como já foi aqui referido por Deputados de outras bancadas, que, infelizmente, existem não só nas regiões autónomas, mas também aqui no continente, tornando-se cada vez mais perigosas e graves.
Resumindo: concordando, como disse, com a maior parte da exposição de motivos constantes do relatório por si apresentado, quero perguntar-lhe o seguinte: o que- pensa que é necessário existir para haver mais fiscalização? Com as notícias que vêm a lume e que são relatadas nos órgãos de comunicação social, pensa que não há necessidade de se investigar? É que, se se investigasse aleatoriamente, teríamos aqui, com certeza, situações idênticas àquelas que o PS retraia, que são graves e que todos nós consideramos como tal.

(O Orador reviu.)

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Macedo, o que se passou com a atribuição .de alvarás às rádios locais aqui há alguns anos deve ser por todos nós recordado- poderemos classificá-lo de muito complexo, para não lhe chamar de uma forma muito mais rigorosa e dura.
Poderíamos mesmo entender que, em certos momentos, á atribuição de alvarás e a forma como tudo decorreu foi mesmo escandalosa. Não o esquecemos e isso veio-me à lembrança depois de ver o rigor que V. Ex.a tentou imprimir à apreciação deste projecto de lei na sua intervenção.
O que actualmente se passa também já aqui foi explicitado: existem rádios que já não são bem rádios locais, mas simples retransmissoras, existem algumas passagens do testemunho, o que a lei também não prevê e reprova, e existem ainda alguns perigos, que subsistem e se agravam, no tocante a rádios locais, muitas das quais, se este panorama continuar, encerrarão as suas portas.
É evidente que também importa recordar antes de mais a importância das rádios locais como serviço público e a importância que essas mesmas rádios locais podem e devem desempenhar no nosso país, quer na formação quer na informação do nosso público.
Em meu entender, é necessário criar condições que possibilitem o fortalecimento dessas rádios locais e não o seu enfraquecimento. E na exposição de motivos deste projecto de lei faz-se mesmo alusão a uma recomendação do Parlamento Europeu quando se recomenda «aos Estados membros a adopção de medidas financeiras para proteger e desenvolver as estações emissoras locais».
Assim, Sr. Deputado Miguel Macedo, desejava que me dissesse porque razão está contra o desconto das tarifas relativas ao telefone, ao telex ou a feixes hertezianos, perante a experiência que temos tido ao longo destes anos e perante os perigos que existem de .muitas rádios locais encerrarem as suas portas - o que já aconteceu a muitas delas. Porque razão é que V. Ex.a está contra a adopção destas medidas, que vêm exactamente ao encontro daquilo que na Europa se preconiza, essa Europa que VV. Ex.as, momeadamente o Grupo Parlamentar do PSD, tantas vezes propalam para justificar medidas muitas vezes gravosas para o País.
Creio que, nomeadamente no n.° 2 deste projecto de lei apresentado pelo PS, há alguns aspectos positivos que são bastante importantes e na sua argumentação não encontrei uma explicação suficientemente credível para rebater o que está proposto.

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O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, gostaria de começar por dizer que todos estaremos de acordo em considerar este domínio da comunicação social e em particular o domínio abrangido pela actividade de radiodifusão sonora, de âmbito local ou regional, como um domínio que; por eleição, é propício ao exercício da liberdade no seu sentido mais amplo - a liberdade de comunicar, de informar e dê exercer uma actividade com relevância social, em alguns casos quase uma actividade única neste sector tão importante para as populações e para o enquadramento do projecto de desenvolvimento do País.
Mas não posso deixar de reforçar o que disse na minha intervenção e que, aliás, tinha já expresso no parecer que apresentei na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias: este projecto de lei, apresentado pelo PS, aparece aqui um pouco como o sancionamento de uma situação que o mesmo PS reconhece ser hoje, em muitos casos, uma situação não muito famosa, acabando com uma série de exigências que estão previstas na lei, com as quais, à partida, até parece estar de acordo, e defendendo as tais exigências mínimas, a que chamei na minha intervenção o enquadramento de um serviço mínimo de actividade de radiodifusão deste tipo de estações emissoras.
Ora, é contra isto que estou e é, face a esta situação, que demonstro a minha incompreensão e o meu desacordo, porque, de facto, o que aqui está em causa - e houve Srs. Deputados que fizerem o favor de levantar o problema- é, sobretudo, uma questão de fiscalização.
Se querem saber a minha opinião, devo dizer que, em relação a este domínio, entendo que não foi feito tudo, para não o dizer de outra maneira. Há, de facto, situações relativamente às quais é preciso haver uma fiscalização mais atenta e mais cuidada, sobretudo, uma fiscalização feita em tempo útil, para evitar questões e situações que, ao que parece e conforme é com alguma frequência noticiado na comunicação social, vão, apesar de tudo, acontecendo neste domínio tão relevante:
Só que isso não significa que partamos desta eventual realidade para a afirmação da alteração da lei que regula esta matéria, que, do meu ponto de vista, continua a ter, neste domínio, virtualidades que devem ser preservadas, sobretudo, através dos mecanismos de fiscalização que têm de ser mais prontos, mais eficazes e mais efectivos.
E, a este propósito, espero- e quero aqui dizê-lo com toda a convicção- que, dentro de pouco tempo, o Governo comece, de facto, a dar sinais concretos, pautáveis e sentidos de que quer fazer, cumprir a lei que aqui aprovámos na Assembleia em relação a estas matérias.
Depois, quero apenas salientar, relativamente a uma das questões que o Sr. Deputado Arons de Carvalho aqui colocou, que a distribuição das verbas da publicidade do Estado para os órgãos da imprensa regional e local não é de 5 %, mas de 10 %. É o que está previsto na portaria e, por força de um protocolo celebrado entre a Associação Portuguesa de Radiodifusão (APR) e o Gabinete de Apoio à Imprensa, em 1992, a informação que tenho é que já foram distribuídas verbas resultantes da aplicação desse mesmo protocolo, sendo, no entanto, de salientar, para sermos aqui intelectualmente honestos e justos, que, na própria previsão da portaria em causa, se dizia que esta publicidade a atribuir a estacões de radiodifusão de âmbito local ou regional teria de ter sempre em conta a natureza da própria publicidade em causa.
Consequentemente, estamos, se quiser, num plano ainda experimental e incipiente a este nível - e incipiente porque tem só um ano de duração - e parece-me, portanto, que não poderemos sentir a posição tão desesperante do Sr. Deputado Arons de Carvalho, porque, apesar de tudo, está já em funcionamento e em efectividade a produção de efeitos resultantes deste protocolo que foi assinado.
Quanto às propostas da Associação de Radiodifusão e da Associação de Rádios de Inspiração Cristã, devo dizer que, neste momento, não as conheço. Se foram apresentadas ao Governo, este, a seu tempo, dará naturalmente conhecimento delas; não sei se a Assembleia da República vai ter autonomamente conhecimento dessas propostas, não as conheço e, portanto, não vou pronunciar-me sobre elas.
Sr. Deputado Manuel Ramos, quero dizer-lhe, muito rapidamente, o seguinte: em relação à questão da fiscalização, julgo já lhe ter respondido e, tanto quanto entendi da sua segunda questão, V. Ex.ª colocou-me o problema de saber se este apoio do Estado às rádios locais não acabará por ter um efeito perverso, na medida em que fará aumentar uma dependência destas relativamente a um determinado poder político.
Sobre esta questão, dir-lhe-ia que, durante esta discussão- como, aliás, noutras discussões sobre esta matéria produzidas nesta Casa -, ouvi serem expressas várias preocupações quanto ao controlo das rádios locais por grupos económicos ou pelo Governo, mas, curiosamente, nunca ouvi aqui ninguém reflectir sobre o controlo a que estas rádios são, aliás, particularmente vulneráveis, exercido, por exemplo, através do poder político local, que, como V. Ex.a sabe, tem, em muitos domínios, uma posição de grande preponderância. Esse, sim, até porque está mais perto da realidade que representa esse tipo de rádios locais, que são, portanto, ou beneficiadas ou prejudicadas com esse tipo de actividade de comunicação social, têm, do meu ponto de vista, contribuído também para algumas inquietações que neste domínio se levantam.
Queria trazer aqui esta nota porque acho que merece a pena fazermos uma reflexão, não só sobre a questão das dependências económicas que existem de facto, mas sobre este outro tipo de dependência que também julgo ser importante.
Finalmente, Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, devo dizer-lhe que não estou contra a adopção de algumas das medidas propostas no n.° 2 do projecto de lei apresentado pelo PS. O que digo é que este projecto de lei não tem em conta, em algumas das medidas que enumera, que estas já existem e que estão em vigor- nessa medida, entendo serem supérfluas em relação àquilo que vêm acrescentar de novo para esta matéria.
Em segundo lugar, não me parece fazer muito sentido, num momento em que julgo que todos reconhecemos haver algumas dificuldades neste sector e em que é preciso estabilizar este quadro e pôr em pleno funcionamento todos os mecanismos já previstos nas leis existentes, introduzir outros diplomas sobre a matéria.
Não julgo que seja o momento adequado para o fazer e que este projecto de lei seja um bom ponto de partida para um novo enquadramento no domínio da radiodifusão local.
Assim, não me manifestei contra as medidas propostas, pois não o podia fazer, uma vez que, como referi, algumas dessas medidas constantes do n.° 2 do projecto de lei apresentado pelo PS são já medidas efectivas que têm uma consagração efectiva noutros diplomas que este Governo, aliás, fez publicar.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Arons de Carvalho.

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O Sr. Arons de Carvalho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O debate até agora realizado sobre este tema suscita-me novas considerações e, sobretudo, o apelo para que os Srs. Deputados Miguel Macedo e Ferreira Ramos me esclareçam sobre alguns pontos, relativamente aos quais me ficaram algumas dúvidas, que, neste momento, seria importante clarificar.
Uma das dúvidas que a intervenção do Sr. Deputado Miguel Macedo me suscitou é a seguinte: disse, há pouco, o Sr. Deputado que o projecto de lei apresentado pelo PS acabaria com algumas exigências que já estão previstas na lei; por outras palavras, quis dizer que este projecto de lei propunha uma menor exigência relativamente às rádios do que aquela que a actual legislação contemplai
Faço um apelo ao Sr. Deputado Miguel Macedo para que me diga em que é que o nosso projecto de lei é mais recuado, mais tímido, menos rigoroso do que a lei actual.
Por outro lado, pergunto-lhe se considera que aquilo que propomos contraria, e de que forma, o que está actualmente previsto na lei e não é cumprido, justamente porque ela precisa de uma disposição interpretativa mais rigorosa que esclareça definitivamente quais são, de facto, as exigências concretizadas no artigo 6.° da Lei da Radiodifusão.
A segunda questão que gostava de ver esclarecida tem a ver com o facto de o Sr. Deputado Miguel Macedo ter referido que não é necessária, neste momento, uma alteração da lei.
Regozijo-me com as formas de independência que o Grupo Parlamentar do PSD tem em relação ao Governo, mas a informação de que disponho é precisamente a de que o próprio Governo se propõe alterar á legislação e, para esse efeito, pediu a colaboração das associações 'representativas das rádios. Nessa medida, gostava que o Sr. Deputado Miguel Macedo clarificasse também este ponto.
Um terceiro aspecto que me parece importante esclarecer relaciona-se com aquilo que o Sr. Deputado acabou de admitir, ou seja, que a lei não está a ser cumprida espera que o Governo, dentro de pouco tempo, faça por cumpri-la.
O Sr. Deputado, que é leitor de jornais, certamente, tem verificado, desde há alguns meses, o aparecimento frequente de notícias, recolhidas junto de porta-vozes próximos do Subsecretário de Estado Adjunto Amândio Oliveira, segundo as quais o Governo irá intervir, há situações irregulares que irão ser objecto de fiscalização e estão a ser feitas gravações contínuas da programação.
O resultado de toda essa investigação, de toda essa fiscalização, não é, até agora, palpável, ou seja, a lei não foi alterada nem houve qualquer actuação governamental sobre o que se diz ser irregular .
Bom, pela minha parte, pergunto-lhe quantos meses serão necessários para que o Governo faça cumprir a lei, se entende que ela não está a ser cumprida.
A quarta questão que quero suscitar traduz-se num pequeno esclarecimento: quando falei aqui em 5 %, referia-me apenas às verbas destinadas às rádios locais, uma vez que os 10 % repartem-se pela imprensa regional e pelas rádios locais.
Finalmente, quero esclarecer um aspecto relativo à intervenção do Sr. Deputado Ferreira Ramos. Parece-me muito perigosa a afirmação que fez, segundo a qual os apoios do Estado à comunicação social põem em causa a sua independência. Isso pode ser verdade, por exemplo, em relação à imprensa, quando estão em causa os subsídios para a sua reconversão tecnológica,, mas a realidade é que se esse quadro geral de apoios à imprensa de âmbito nacional e à imprensa de âmbito regional não existisse - e existe, em Portugal, há 10 anos - essa imprensa desapareceria. Portugal tem, hoje, uma fortíssima imprensa regional, em grande medida porque existem apoios do Estado ao porte pago, subsídios ao papel e outros.
Assim, gostaria que o CDS-PP clarificasse, de uma vez por todas, a sua posição e se a sua convicção é a de que esse conjunto de apoios deve, pura e simplesmente, ser extinto. È que, nesse caso, não duvido de que, com a extinção de grande parte dos apoios à imprensa ligada à igreja, à imprensa totalmente independente e à imprensa ligada a muitas associações, essa imprensa desaparecerá. É esta a proposta que o CDS-PP tem para a imprensa regional em Portugal? Parece-me que era importante sabermos disso nesta fase do debate.

O Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, vou fazer uma intervenção muito rápida.
O Sr. Deputado Arons de Carvalho perguntou-me se considero que este projecto de lei contraria a lei em vigor. Quero dizer-lhe que entendo que não e, por isso mesmo, considero-o supérfluo. É tão simples como isto: entendo que não contraria e, precisamente por causa disso, é supérfluo.
Em relação à menor exigência, é óbvio que no n.° 1 do projecto de lei do Partido Socialista verifica-se uma menor exigência.

O Sr. Arons de Carvalho (PS): - Porquê?

O Orador: - É que, sendo este domínio, e já frisei essa questão, um domínio em que os candidatos ao licenciamento de um alvará assumiram, livremente - no quadro daquilo que era a previsão legal -, compromissos em relação à programação, ao horário de funcionamento, ao tempo de horas, ao número de serviços noticiosos, etc., quando se estabelece que são, no mínimo, dois serviços noticiosos, quatro horas por dia, de programação própria e outro requisito de que agora não me recordo, o que se está a fazer é a alterar as condições que inicialmente tinham sido previstas, aceites e assumidas pelas partes, neste processo.
Criam-se, assim, outras condições que, porventura, teriam sido assumidas por candidatos que ficaram fora do licenciamento por manifesta inferioridade em relação a outras propostas que foram, então, aprovadas e aceites.
Para terminar, Sr. Deputado Arons de Carvalho, mantenho aquilo que disse em relação à questão da fiscalização. Admito que existam casos em que a fiscalização já o devesse Ter assumido e, com esta afirmação, não digo nada que os membros do Governo, que têm a tutela sobre esta matéria, não tivessem já dito na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias. Aliás, eles próprios são os primeiros a reconhecer, tal como o Sr. Deputado fez na sua intervenção, que é preciso operacionalizar os mecanismos de fiscalização, no sentido de tornar efectiva...

O Sr. Arons de Carvalho (PS): - Eu não disse isso!

O Orador: - Não estou a dizer que o Sr. Deputado o disse, mas, sim, que acabou por reconhecer que eles manifestaram a sua preocupação e deram passos no sentido de começar a fazer uma efectiva fiscalização.

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Como estava a dizer, é preciso operacionalizar esta fiscalização, no sentido de tornar efectiva a letra da lei que rege, hoje, este sector.
Para terminar, com uma nota de humor, a minha intervenção sobre esta matéria, deixe-me dizer-lhe, Sr. Deputado Arons de Carvalho, que aquilo que me preocupa, no fim deste debate, é a excessiva dependência de V. Ex.ª em relação às informações do Governo.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ferreira Ramos.

O Sr. Ferreira Ramos (CDS-PP): - Sr. Presidente, vou intervir muito brevemente, para esclarecer o Sr. Deputado Arons de Carvalho e para reafirmar, ao fim e ao cabo, aquilo que já disse nos esclarecimentos que tive ocasião de pedir ao Sr. Deputado Miguel Macedo.
Temos de separar, claramente, os vários tipos de apoios ou subsídios, se quiserem. Aquilo que disse, e volto a afirmar, foi que temos de ter em atenção esse papel de serviço público, nomeadamente no que se refere à imprensa regional, pois já está sobejamente adquirido, desde há largas dezenas de anos, e temos exemplos, no nosso país, de jornais seculares com a importante missão de ligação dos emigrantes portugueses noutras partes do mundo.
E se em relação a esses não há qualquer dúvida, também não há qualquer dúvida, como compreenderá, em relação ao porte pago, pois, ao fim e ao cabo, o porte pago não é uma dádiva a um determinado jornal, é o pagamento de um serviço público prestado por esse jornal. Aliás, se calhar, quem sai directamente beneficiado com o porte pago, mais do que o próprio jornal, é o leitor, o consumidor final. Poderíamos falar agora dos problemas que aí vêm, com a cintagem obrigatória, mas isso são outras questões.
De qualquer modo, aquilo que disse e reafirmo, porque é essa a nossa posição, foi que determinados subsídios, determinados apoios em que as regras hão sejam claras, em que as situações não sejam perfeitamente definidas, podem criar determinadas dependências .em relação a quem concede os subsídios, e não é esse o papel da imprensa regional, nomeadamente devido à necessidade de ela ser um espaço onde esteja sempre aberta a capacidade de formar opiniões, a liberdade de formar opiniões.

(O Orador reviu.)

O Sr. Arons de Carvalho (PS): - Com esta segunda intervenção estou de acordo!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como não há mais inscrições, dou por encerrado o debate do projecto de lei n.° 242/VI, apresentado pelo PS.
Passamos agora ao último ponto da nossa ordem de trabalhos de hoje, que consiste na apreciação da proposta de resolução n.° 55/VI - Aprova, para adesão, a Convenção Constitutiva do Fundo Multilateral de Investimento (MIF) e a Convenção de Administração do Fundo Multilateral de Investimento.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr Secretário de Estado do Tesouro.

O Sr. Secretário de Estado do Tesouro (Francisco Esteves de Carvalho): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo submete à Assembleia da República uma proposta de resolução que aprova, para adesão, a Convenção Constitutiva do Fundo Multilateral de Investimento (MIF) e a Convenção de Administração do Fundo Multilateral de Investimento.
Por despacho de 6 de Fevereiro de 1992, do Sr. Primeiro-Ministro, foi dado o acordo de princípio à adesão de Portugal a este Fundo.
Criado com o objectivo de promover as reformas e estratégias que visam o desenvolvimento do sector privado da América Latina e das Caraíbas, o Fundo exerce funções intermédias e complementares, entre as do Banco Interamericano de Desenvolvimento, cuja actividade é largamente dirigida ao financiamento do sector público, e as da Corporação Interamericana de Investimento, exclusivamente destinada ao financiamento de empresas privadas.
Sediado em Washington, o Fundo funciona como instrumento financeiro de carácter temporário, que contribui para a criação das condições económicas que proporcionem o desenvolvimento do sector privado.
O Fundo opera através de três facilidades: a Facilidade de Cooperação Técnica, a Facilidade de Recursos Humanos e a Facilidade de Desenvolvimento da Pequena Empresa que visam, respectivamente, a prestação de assistência técnica, o desenvolvimento dos recursos humanos e o apoio ao desenvolvimento da pequena empresa, quer através de doações, quer através de empréstimos.
O Fundo entrou em actividade em 11 de Janeiro de 1993 e, após a conclusão de todos os processos formais de adesão, deverá contar com 28 países membros, cujas contribuições ascenderão a cerca de 1300 milhões de dólares.
A adesão de Portugal ao Fundo, agora submetida à aprovação da Assembleia da República, visa o reforço dos laços económicos entre o nosso país, a América Latina e as Caraíbas, num momento em que Portugal aposta na internacionalização da sua economia, através do incremento das exportações e do próprio investimento privado português, e em que se verificam sinais de retoma no crescimento económico daquela zona do globo.
A adesão de Portugal a este Fundo permitirá reforçar o apoio a uma maior actuação dos empresários e investidores portugueses na América Latina, a qual apresenta actualmente sinais encorajadores. Para além dos esforços de carácter bilateral na área do comércio e do investimento, constata-se que os bens e serviços fornecidos por Portugal, em 1992, no quadro dos financiamentos do Banco Interamericano de Desenvolvimento, a que este fundo está ligado, ultrapassaram os 11 milhões de dólares.
O montante de 4 milhões de dólares, fixado como a nossa contribuição para o Fundo, é consentâneo com a posição da economia portuguesa na cena internacional e será realizado através da emissão de S notas promissórias, emitidas anualmente e a resgatar durante o período de vida do Fundo.
Assim, dada a importância que reveste a nossa adesão à instituição em apreço, o Governo submete à aprovação da Assembleia da República as Convenções que constituem os estatutos do Fundo Multilateral de Investimento.

O Sr. Presidente: - Para fazer uma breve síntese do relatório elaborado pela Comissão de Economia, Finanças e Plano, relativo a esta proposta de resolução, tem a palavra, na qualidade de relator, o Sr. Deputado Duarte Pacheco.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou fazer uma síntese do relatório que foi aprovado na Comissão de Economia, Finanças e Plano, na reunião do dia 15 de Março.
Sinteticamente, o relatório refere que a proposta de resolução n.° 55/VI, apresentada pelo Governo à Assem-

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bleia da República, aprova, para adesão, duas convenções: a Convenção Constitutiva do Fundo Multilateral de Investimento e a Convenção de Administração desse mesmo Fundo.
O relatório refere ainda que o Fundo Multilateral de Investimento é criado no âmbito do Banco Interamericano de Desenvolvimento, do qual Portugal faz parte desde 1959, tem uma vigência de 10 anos, prazo que pode ser prorrogado por um período não superior a 5 anos, visa essencialmente um apoio às .pequenas e médias empresas, sobretudo às micro-empresas, tentando que elas passem para o sector formal da economia latino-americana, e desdobra a sua actividade em quatro grandes áreas, isto é, uma linha de recuperação técnica, uma linha de recursos humanos, uma linha de desenvolvimento da pequena, empresa e um fundo de investimento à pequena empresa.
Concluímos que o Fundo Multilateral de Investimento, o qual atinge uma verba superior a 1256 milhões de dólares, estabelece para a contribuição portuguesa uma verba de 4 milhões de dólares.
A Comissão de Economia, Finanças e Plano entende, pois, que esta proposta de resolução se encontra em condições de subir a Plenário, para ser discutida e aprovada.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins.

O Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A participação de Portugal na União Europeia não pode fazer esquecer o relacionamento com outras regiões do mundo, em termos de abertura, de interdependência e de valorização mútua.
A globalização da economia mundial, a necessidade de incentivar a cooperação para o desenvolvimento e a indispensabilidade de favorecer a própria diversidade europeia, através de uma geometria variável no comércio, e nas relações económicas internacionais, constituem elementos fundamentais a ter em consideração nos tempos que atravessamos.
A América Latina e as Caraíbas são regiões com as quais os povos europeus e, em particular, as nações peninsulares têm relações históricas, sendo positivos todos os contributos que favoreçam o seu aprofundamento.
A Europa não deve fechar-se sobre si mesma, daí que todos os instrumentos que se orientem para a abertura e para a cooperação devam ser incentivados, dentro de uma preocupação de eficiência e equidade no plano internacional. Tal é o caso das Convenções que hoje apreciamos e que constituem o Fundo Multilateral de Investimento. Está em causa a necessidade de atracção de capital privado para o desenvolvimento económico dos países da América Latina e Caraíbas, a reforma das condições de investimento, a redução do ónus da dívida externa para níveis controláveis e a liberalização dos regimes de investimento, como já foi aqui afirmado pelo Sr. Secretário de Estado do Tesouro.
Os membros regionais e extra-regionais do Banco Interamericano de Desenvolvimento, entre os quais se encontra Portugal, acordaram, assim, em estabelecer um fundo multilateral, como forma transitória de apoiar a reforma das condições de investimento. Pretende-se disponibilizar os recursos essenciais para completar as actividades do Banco Interamericano de Desenvolvimento, da Sociedade Interamericana de Investimentos e de outros bancos multilaterais de desenvolvimento, em apoio das suas políticas e iniciativas de promoção da reforma das condições de investimento.
Muito se disse sobre a década perdida para o desenvolvimento na América Latina - a década de 80. A dívida externa, a dependência e o subdesenvolvimento não podem deixar de ser referidos.
No entanto, nos anos 90, temos de afirmar que uma batalha está a ser ganha na América Latina. Essa batalha é a batalha da democracia e esse facto não pode. nem deve, ser esquecido, designadamente a propósito da aprovação de um instrumento como este.
Neste sentido, é indispensável a criação de condições económicas e sociais, para que o direito ao desenvolvimento seja respeitado e garantido. Como novo direito, chamado «da terceira geração dos direitos, constitui natural complemento dos direitos políticos de participação e dos direitos económicos e sociais. Instrumentos como este Fundo Multilateral de Investimentos poderão ser factores positivos no sentido que referimos, desde que as ideias de solidariedade e de desenvolvimento estejam bem presentes.
O que está em causa, além do incentivo ao desenvolvimento da reforma das condições de investimento, é a implantação de estratégias de desenvolvimento baseadas em políticas económicas sólidas que aumentem as oportunidades de emprego, que incentivem as pequenas e médias empresas, que melhorem a distribuição de rendimentos e a igualdade de oportunidades no processo de desenvolvimento. Daí que devam ser concedidos financiamentos aos países da América Latina e Caraíbas, a fim de habilitá-los a identificar e implementar reformas de política que aumentem os investimentos e que absorvam os custos relacionados com a alteração das condições de investimento e com a expansão do sector privado, bem como com a ampliação da participação de pequenos e médios empresários nas respectivas economias.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A terminar, permita-se-me uma especial referência ao respeito e à salvaguarda nestas Convenções pelas conclusões da Conferência do Rio sobre o meio ambiente e desenvolvimento, designadamente quanto à Agenda 21. Com efeito, é objectivo expresso deste Fundo a criação de condições para um desenvolvimento sustentável, como protecção do ambiente e do equilíbrio ecológico, o que merece ser realçado.
Fernando Moran, ao falar da América Latina, costuma referir-se à Europa fora da Europa. Todos sabemos que as américas são mais do que essa referência. Por isso. ao comemorar-se a viagem de Colombo, houve a preocupação de salientar o encontro de culturas, encontro esse que tem de ser renovado constantemente, revelando-se também ele neste tipo de instrumentos, ao qual damos a nossa concordância. Importa, porém, que, europeus e latino-americanos, comprendamos que as causas da democracia e do desenvolvimento só podem ser defendidas com mais cooperação e solidariedade e com mais livre circulação e abertura económica.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Sempre temos defendido que Portugal não deve abandonar mas, sim, pelo contrário, reforçar os laços de cooperação com países como os dá América Latina e os africanos de língua oficial portuguesa, em relação aos quais nos acompanham profundos laços de ordem histórica, cultural e económica. Infelizmente, nem sempre isto tem sucedido e, a par da nossa adesão à Comunidade Europeia, tem-se vindo a diminuir e a es-

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(...) quecer muitas vezes estas relações históricas, espaço que tem sido, por vezes, ocupado por outros países. Todos os instrumentos criados que permitam reforçar esta perspectiva, que defendemos, que é a de manter, desenvolver e recuperar, em muitos casos, as relações de cooperação com países que nos são próximos, que, portanto, visem este objectivo, merecem o nosso acolhimento. Nesse, sentido, a participação de Portugal neste Fundo Multilateral de Investimento, na medida em quê possa contribuir, embora limitadamente, para esse objectivo, tem o nosso acordo.
Contudo, não queremos deixar de sublinhar que a entidade definida para a administração deste Fundo, concretamente o Banco Interamericano de Desenvolvimento, não tem nos povos destes países da América Latina e Central uma imagem favorável. Isto porque, muitas vezes, á actuação do Banco Interamericano de Desenvolvimento tem sido acompanhada de pressões, de ingerências, de tentativas de condicionamento do livre desenvolvimento das vias próprias que cada povo tem o direito de seguir.
Neste momento, fazemos votos, porventura pios, de que ao aplicar-se este Fundo Multilateral de Investimentos não se criem em seu torno condicionamentos, ingerências, como os que temos visto serem praticadas noutras áreas, através desta instituição financeira, que agora está aqui definida como a administradora do Fundo.
Neste quadro e com estas preocupações, damos o nosso acordo à proposta de resolução apresentada pelo Governo.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Lara.

O Sr. Sousa Lara (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Presente a Convenção constitutiva do Fundo Multilateral de Investimentos e a Convenção de administração do mesmo Fundo para aprovação da Assembleia da República, sob proposta do Governo, feita nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis. Os objectivos e a justificação das Convenções relativas a este Fundo Multilateral de Investimentos estão bem enquadradas nos considerandos iniciais respectivos, dos quais é politicamente importante nesta ocasião ressaltar e explicitar alguns pontos.
Em primeiro lugar, a crescente adopção de principologia da economia de mercado, por parte de dirigentes e lideres de países da América Latina e Caraíbas, afirmando-se, assim, a adesão, de âmbito cada vez mais alargado, a salutares parâmetros de abertura e liberalização, no que toca aos circuitos e agentes económicos, com especial destaque para a dos regimes de investimento.
Em segundo lugar, o reconhecimento, por parte dos mesmos dirigentes, da necessidade de reduzir o peso específico das dívidas externas destes países, bem como tornar controlados e razoáveis os encargos decorrentes dos serviços das mesmas dívidas. A imperiosa necessidade de atrair o investimento privado, como meio de se poder quebrar o ciclo vicioso em que caíram algumas das economias dessas zonas, tornando-se desta forma urgente promover profunda remodelação das condições circunstanciais existentes até agora, que são limitativas e redutoras da acção e operacionalidade, quer dos investidores internos, quer dos investidores internacionais. Para atingir estes propósitos, torna-se fundamental e insubstituível a solidariedade dos países mais ricos e mais desenvolvidos, a qual se expressa, e bem, neste contexto, pela doação simultânea de fundos proporcionalmente adequados às suas capacidades respectivas, como mecanismo transitório para ultrapassar a inércia decorrente do ciclo vicioso referenciado e assim desencadear as reformas necessárias à atracção dos investimentos privados geradores, como se espera, de um novo surto de desenvolvimento integrado.
Tal Fundo é estabelecido no Banco Interamericano de Desenvolvimento com a colaboração da Sociedade Interamericana de Investimentos, articuladamente com outras entidades bancárias multilaterais vocacionadas para o desenvolvimento, o que se afigura como procedimento correcto neste macro-processo, tendo em vista os objectivos específicos que se visam atingir, mormente os resultados sociais de natureza, portanto, transeconómica, que são as pequenas empresas e os pequenos investidores, dos principais agentes económicos que se desejam mobilizar com os estímulos articuladamente programados. Opção que se considera de sublinhar publicamente.
O Banco Interamericano de Desenvolvimento concordou em proceder à administração do dito Fundo, dele fazendo parte, como membros, os países beneficiários visados. Estão assim, em nosso entender, reunidas e criadas as condições necessárias para que, conscientemente, aprovemos a ratificação solicitada, expressando desta forma, solenemente, a nossa adesão aos princípios que norteiam esta macroacção, em prol do desenvolvimento internacional, colocando ênfase especial, quer nas suas componentes atinentes à solidariedade internacional, quer na perspectiva do desenvolvimento estruturalmente integrado, longínquo da lógica do simples crescimento, que torna hoje, mais uma vez, justíssimas as palavras do Papa Paulo VI, ao dizer: «O desenvolvimento é o novo nome da paz»!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, visto não haver mais inscrições, dou por encerrado o debate da proposta de resolução n.° 55/VI.
Informo ainda a Câmara de que a nossa próxima reunião plenária será amanhã, quinta-feira, às 15 horas, e terá, além do período de antes- da ordem do dia, como ordem do dia a discussão das propostas de lei n.'* 61 /VI - Autoriza o Governo a estabelecer um regime sancionatório da violação de planos regionais de ordenamento do território e 93/VI - Autoriza o Governo a alterar o regime jurídico do licenciamento municipal de obras particulares, havendo ainda o período regimental de votação, no qual se incluirão os diplomas hoje debatidos.
Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 55 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

(...) Barrosa Pereira Dias.
António Augusto Fidalgo.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António José Barradas Leitão.
Carlos de Almeida Figueiredo.
Cecília Pita Catarino.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José Angelo Ferreira Correia.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete.
Vítor Pereira Crespo.

Partido Socialista (PS):

António Poppe Lopes Cardoso.

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Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
José Manuel Santos de Magalhães.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Manuel Capoulas Santos.

Partido Comunista Português (PCP):

António Manuel dos Santos Murteira.
Deputado independente:
Mário António Baptista Tomé.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

Adriano da Silva Pinto.
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto.
Carlos Alberto Pinto.
Delmar Ramiro Palas.
João Alberto Granja dos Santos Silva.
Joaquim Maria Fernandes Marques.
Manuel Albino Casimiro de Almeida.
Manuel Antero da Cunha Pinto.
Manuel da Costa Andrade.

Partido Socialista (PS):

Ana Maria Dias Bettencourt.
António Fernandes da Silva Braga.
António Luís Santos da Costa. Carlos Cardoso Lage.
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
Maria Julieta Ferreira Baptista Sampaio.
Rogério da Conceição Serafim Martins.

Partido Comunista Português (PCP):

Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

António Bernardo Aranha da Gama Lobo Xavier.
José Luís Nogueira de Brito.

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