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2240 I SÉRIE - NÚMERO 68

concentrado nas mãos de meia dúzia de gigantescas empresas e de uma pequena elite branca.
Num país cujo PIB per capita é pouco superior a um terço do português, a quase totalidade da população negra vive na miséria. Lembro apenas que 77 % da população trabalhadora tem um rendimento inferior a 18 contos por mês.
Encontrava-me em Thokoza quando ouvi pela rádio do carro um discurso muito belo sobre a necessidade de brancos, negros, mulatos e asiáticos concentrarem os seus esforços na criação de um país novo. Meditei, então, no apelo de Mandela para que todos colaborem no esforço prioritário no futuro imediato: criar empregos, construir casas, melhorar e dignificar os sistemas de ensino e de saúde.
Em Thokosa havia tiroteio naquele dia num dos hostels imundas barracas com estilo de caserna onde vivem sobretudo zulus. A votação fora interrompida. Não havia mais boletins. Nas bermas da estrada montanhas de lixo agrediam a paisagem e um cheiro nauseabundo subia daquelas estrumeiras. Nas secções de voto os olhares eram duros. Ali não penetrava o vento da fraternidade. E, infelizmente, na África do Sul há muitas Thokozas...
Srs. Deputados, fala-se muito em Portugal do AWB, o partido da extrema direita branca. Fui por isso até Ventersdorp, a pequena cidade a 250 km de Joanesburgo, que é um dos bastiões de Terre Blanche. Das estradas, vi as faixas demarcando imaginários limites do Volkstaat, o mítico estado bóer idealizado pelos senhores do AWB. As imagens daquilo que observei alarmaram muita gente na Europa. Os comandos do AWB, encapuçados, as trincheiras de sacos de areia nos passeios, em frente da sede da organização, o monumento que os wentcommando ergueram numa praça, as cruzes de inspiração suástica, as águias, todo o cenário envolvente irradiavam o desafio à liberdade, expressavam a contestação da mudança. Faziam rondas pelas ruas, chegaram a apontar armas ao grupo de que eu fazia parte. O tenente da polícia lembrou-me o oficial do romance eterno de Alan Patton: «Chora minha terra bem amada!»
Terre Blanche e a sua gente podem fazer muito mal e derramar sangue, mas não será aquela escumalha racista e nazi que impedirá o avanço do processo de democratização. A ameaça principal vem de outro lado e não resultará sequer da inevitável contestação do Inkata Freedom Party e do seu chefe Buthelezi. Creio que o maior problema que o Governo de Unidade Nacional vai enfrentar é inseparável da natureza dos obstáculos nas frentes económica e social. A unidade no Executivo será frágil e pode ser abalada pelas contradições entre a enorme expectativa gerada entre as massas - que esperam muito no tocante à dignificação da vida- e a inevitável resistência de influentes sectores da minoria branca à perda de privilégios que o apartheid lhes permitiu acumular. A nova e cautelosa política económica do ANC - mesmo sem nacionalizações- envolve um desafio muito complexo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como membro da delegação desta Assembleia tive a oportunidade e a felicidade de presenciar uma eleição que deixará marcas profundas na história da África e da totalidade da Terra, pátria do Homem. Considero, aliás, um acontecimento comparável à Revolução Francesa ou à Revolução Russa de 1917.
Por vezes esperamos dezenas de anos por um acontecimento que muda a vida de um povo. Lembrei-me em Joanesburgo do 25 de Abril durante a emocionante festa da vitória do ANC quando Mandela acabou de falar. Poucos se conheciam no grande salão do Carlton, mas todos dançavam abraçados, até Mandela. Todos, juntos, riam, choravam e cantavam. Tive consciência de ser testemunha de uma página de história profunda.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O realismo não impede o optimismo. Regresso da África do Sul com confiança reforçada. Volto de uma terra que foi berço de um regime odioso, confiante de que o povo sul-africano, na sua caminhada para uma nação multi-racial, possa abrir uma janela de esperança para a África e para o mundo. A humanidade está vocacionada para ser mestiça.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Pinto.

O Sr. Carlos Pinto (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Foi recentemente concluído o Acordo Geral de Tarifas e Comércio. Depois de longas negociações, abriram-se novas perspectivas ao comércio mundial, designadamente às pequenas economias cujas barreiras no domínio aduaneiro eram impeditivas de crescimento e desenvolvimento.
O Conselho da União Europeia aprovou este acordo, que foi formalizado em Marrocos em Abril passado e, no quadro desta negociação, foi unanimemente reconhecido pela Comissão da União Europeia enquanto negociadora mandatada pelo Conselho a orientação persistentemente defendida pelo Governo português quanto a um sector fundamental da nossa economia o sector têxtil nacional.
Por isso, não podia deixar, nesta circunstância, de me congratular com o êxito relativo, sempre relativo porque se trata de negociação bastante difícil e que teve um calendário bastante dilatado, e que é bom até no empenho que o Governo pôs na sua negociação.
Além disso, queria referir algumas circunstâncias que são muito positivas para esse sector: em primeiro lugar, a obtenção de um prazo transitório de 10 anos para a integração total do sector têxtil nas novas regras do comércio mundial; em segundo lugar, o reforço das regras e disciplinas no âmbito do combate ao dumping proveniente e praticado por alguns países, à fraude e à evocação acrescida da cláusula de salvaguarda que muitos países utilizam para derrogar os períodos de abertura do seu comércio à concorrência mundial.
Também em relação a aspectos positivos obtidos, não posso deixar de aqui abordar as questões referentes à abertura de novos mercados tradicionalmente fechados, como o dos Estados Unidos, em relação ao qual Portugal conseguiu que se iniciasse, em 1985, um período de redução das imposições aduaneiras.
Serve tudo isto para concluir que as linhas-mestras da posição portuguesa obtiveram vencimento no documento final do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio. O carácter vital e as características do sector industrial português dos têxteis foram objecto, neste período, de sucessivos memorandos e de um debate acrescido por parte da delegação portuguesa e do

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