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26 DE MAIO DE 1994 2483

forma de pobreza e de exclusão social, o último retrato social da Europa comunitária estima em 32,7 % da população o número de pobres em Portugal, considerando para este efeito as pessoas cujos agregados familiares possuam um rendimento disponível por adulto inferior a metade do rendimento médio por adulto do respectivo país.
Mas esta é uma matéria em que se os dados globais que medem a pobreza podem ser diferentes consoante os critérios utilizados e de difícil medição directa e onde o Governo, indiferente ao fenómeno, não promoveu ainda a um necessário levantamento nacional, há, por outro lado, dados de diferentes origens que nos retractam bem a preocupante dimensão do problema.
Dos 400 000 desempregados, 44 % são-no há mais de um ano e somente metade é que recebem um qualquer tipo de subsídio de desemprego. Só aqui há 200 000 portugueses que, oficialmente, não têm qualquer tipo de remuneração ou de rendimento.
No Alentejo, por exemplo, região onde este problema está a atingir maior dimensão devido à destruição do tecido produtivo agrícola - primeiro com a liquidação da Reforma Agrária, agora com a Política Agrícola Comum -, 66 % dos 41 000 desempregados não recebem subsídio e muitas são já as casas onde marido e mulher estão nessas condições, onde a fome é já uma realidade!
Existem em Portugal cerca de 2,3 milhões pensionistas e reformados. Metade destes recebem pensões inferiores a 25 000$00 mensais, e isto num estrato populacional onde a pensão é, na maioria dos casos, a única fonte de rendimento.
A tradução em imagens concretas e bem reais da gravidade da pobreza em Portugal "tropeçamos" nós, todos os dias, nas ruas de Lisboa, do Porto e de muitos outros centros urbanos. São os sem abrigo, os bairros de barracas, os milhares de jovens que vagueiam pelas ruas e, só em Lisboa, as 150 000 pessoas com carências alimentares ou as mais de 250 000 sem alojamento condigno.
Mas é também a pobreza mais longe dos nossos olhos, a pobreza envergonhada, os novos pobres que foram sendo criados por um modelo de crescimento em que a riqueza criada se acumula cada vez mais num dos pólos da sociedade.
Acresce ainda a pobreza rural que a destruição da agricultura tem vindo a dramatizar cada vez mais. Saberão, porventura, os Srs. Deputados quantos casos há de suicídios de agricultores que, de repente, se viram atirados para uma situação de ruína e de pobreza, sem perspectivas, depois de uma vida de trabalho? São muitos, seguramente muitos, pelos exemplos conhecidos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 problema da pobreza e da exclusão social não é um fenómeno ocasional. É uma questão estrutural, incorporada no modelo económico vigente.
0 Portugal de Cavaco Silva, a Espanha de Gonzalez, a França do conservador Balladur, em suma, a Europa de Dellors, a Europa dos Governos mais ou menos conservadores, mais ou menos sociais democratas. Esta é, sobretudo, a Europa dos mercados, um lugar de trocas, a Europa do falso sucesso, do desenvolvimento não sustentado, onde a justiça e o progresso social são sacrificados no altar da competitividade a todo o preço, da apropriação e acumulação de riqueza num extremo da sociedade, enquanto no outro se acumulam os desempregados, os deserdados, os excluídos do progresso.

Onde está, no Livro Branco de Dellors e da Comissão, a Europa da solidariedade, da justiça e do progresso? 0 que aí está é, sobretudo, a Europa neo-liberal, da desregulamentação das relações de trabalho, do incremento do trabalho precário e do progressivo desmantelamento dos sistemas de protecção social.

É esta Europa que gera 55 milhões de pobres, bem como os mais de 20 milhões de desempregados com que nos confrontamos. É sobre esta Europa, é sobre este modelo de crescimento que é preciso reflectir e pôr em causa, sem prejuízo, naturalmente, da responsabilidade de cada Governo em cada país concreto - aqui, em particular, do Governo do PSD.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tendo ficado dito que os problemas da pobreza e da exclusão só poderão ser erradicados no quadro de outra lógica de desenvolvimento, a verdade é que se impõem medidas para minorar este grave problema em crescimento, a verdade é que se impõe a necessidade de mecanismos de garantia mínima de sobrevivência e de reinserção social dos milhões de pobres e excluídos, que sejam, eles próprios, um instrumento de suporte para que esses excluídos tenham um mínimo de meios ao seu alcance para a busca da sua reaquisição de personalidade e da sua própria reinserção social.
Esta matéria já aqui foi discutida, em Março deste ano, quando o PCP apresentou um projecto que visava instituir um rendimento mínimo de subsistência.
Voltamos hoje a ela, com um projecto idêntico do Partido Socialista, ao qual, evidentemente, damos o nosso acordo - sem prejuízo de algumas reflexões, traduzidas na pergunta que fizemos ao Sr. Deputado João Proença, em matéria de especialidade -, recordando a Recomendação da Comunidade, aprovada em Junho de 1992 com o voto favorável do Governo português.
Temos, contudo, razões para recear que se o projecto fosse votado teria o mesmo destino do projecto de lei do PCP: a sua rejeição pelos votos conjugados do PSD e do CDS-PP. 0 que é significativo. As questões sociais, este problema em concreto, é, evidentemente, uma das matérias separadoras de águas neste Hemiciclo.
0 CDS-PP, apesar da inspiração de solidariedade cristã de que se diz portador, quer sobretudo aproveitar a boleia para pôr em causa o sistema de segurança social, procurando contribuir para o desmantelamento dos sistemas de protecção social, que são aquisições deste século, e com isso gerar novos factores de pobreza e exclusão social.
0 PSD, esse, ora diz que Portugal já está a cumprir a Recomendação da Comunidade, o que é redondamente falso, ora diz que o sistema é caro e o País não tem recursos, "esquecendo-se", contudo, de colocar no outro prato da balança os custos da pobreza, da marginalidade e da insegurança de milhares de jovens e crianças, que são excluídos do sistema educativo e lançados nas margens da sociedade.
0 sistema é caro, apesar de o rendimento mínimo proposto ser claramente insuficiente? É verdade. 0 sistema não é perfeito? É verdade. A experiência francesa exige de nós alguma reflexão? Também é verdade.
Mas o que é também verdade é que não bastam votos piedosos nem serve uma paralisante discussão sobre as virtualidades e dificuldades do regime, enquanto, no dealbar do século XX1, centenas de milhar de portugueses se arrastam nos caminhos da pobreza e da exclusão social.

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