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Sexta-feira, 28 de Outubro de 1994

I Série - Número 5

DIÁRIO
Da Assembleia da República

VI LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1994-1995)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 27 DE OUTUBRO DE 1994

Presidente: Exmo. Sr. António Moreira Barbosa de Melo

Secretários: Exmos. Srs. José Mário Lemos Damião
José de Almeida Cesário
Belarmino Henriques Correia
José Ernesto Figueira dos Reis

SUMÁRIO

O Sr Presidente declarou aberta a reunião às 15 horas e 25 minutos.
Antes da ordem do dia.- Deu-se conta da entrada na Mesa da audição parlamentar n.º 28/VI de requerimentos e de respostas a alguns outros.
A Sr.ª Deputada Margarida Silva Pereira (PSD) relatou a viagem que uma delegação da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias fez à Região Autónoma dos Açores, tendo a esse propósito usado também da palavra, além da relatora, os Srs Deputados Martins Goulart (PS), Narana Coissoró (CDS-PP), Lino de Carvalho (PCP), Correia Afonso e Guilherme Silva (PSD).
Em declaração política, o Sr. Deputado Manuel Alegre (PS) teceu diversas críticas ao Governo e ao PSD, tendo respondido a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados João Amaral (PCP), Guilherme Silva, Silva Marques e Nuno Delerue (PSD).
O Sr Deputado Gustavo Pimenta (PS) condenou a intervenção proferida pelo Sr.Deputado Pacheco Pereira aquando da discussão da moção de censura apresentada pelo CDS-PP. No final, respondeu a um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Narana Coissoró (CDS-PP).
A Sr.ª Depurada Helena Falcão (PSD) apelou ao Governo para que integre no esquema de acção médico-social os encargos com subsídios de transporte, alojamento e alimentação em estâncias termais.
Ordem do dia.- A Câmara apreciou as propostas de resolução n.º 64/VI - Aprova, para ratificação, o Protocolo de Adesão da República Helénica à União da Europa Ocidental, 65/VI - Aprova o Acordo de Cooperação em Matéria de Defesa entre o Governo da República Portuguesa e o Governo do Remo de Marrocos e 73/VI.
Aprova, para ratificação, o Acordo Europeu que cria uma Associação entre as Comunidades Europeias e os seus Estados Membros, por um lado, e a República da Bulgária, por outro, e respectivos Protocolos e Anexos, bem como a Acta Final com as Declarações, tendo as duas primeiras sido aprovadas.
Usaram da palavra, a diverso título, além dos Srs Secretários de Estado da Cooperação (Briosa e Gala) e da Defesa Nacional (Figueiredo Lopes), os Srs Deputados Luís Geraldes (PSD), José Lello (PS), João Amaral (PCP), Miranda Calha (PS), Adérito Campos (PSD), Joel Hasse Ferreira (PS), João Poças Santos e Sousa Lara (PSD).
A Câmara denegou a automação a um Deputado para depor em tribunal como testemunha e aprovou um requerimento da Comissão de Inquérito Parlamentar para Apreciação do Processo de Privatização do Banco Tona e Açores solicitando a prorrogação do seu prazo de funcionamento por 30 dias.
Foram ainda aprovadas as propostas de resolução n.º 72/VI - Aprova, para ratificação, o Acordo Constitutivo do Fundo para o Desenvolvimento dos Povos Indígenas da América Latina e Caraíbas e 74/VI - Aprova, para ratificação, o Acordo de Supressão de Vistos entre a República Portuguesa e a República da Eslovénia.
Finalmente, foram apreciados os projectos de deliberação n.º 101/VI - A Assembleia da República delibera o cancelamento do processo de revisão constitucional, dissolvendo-se em consequência a respectiva Comissão Eventual (PCP), que foi rejeitado, e 102/VI - Sobre a suspensão do prazo dos trabalhos da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional (PSD), que foi aprovado Produziram intervenções os Srs Deputados Manuel Queira (CDS-PP), João Amaral (PCP), Guilherme Silva (PSD) e Alberto Martins (PS).
O Sr Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 20 minutos.

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0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 25 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD):

Adão José Fonseca Silva.
Adérito Manuel Soares Campos.
Adriano da Silva Pinto.
Alberto Cerqueira de Oliveira.
Alberto Monteiro de Araújo.
Américo de Sequeira.
Anabela Honório Matias.
António Augusto Fidalgo.
António Costa de Albuquerque de Sousa Lara.
António da Silva Bacelar.
António Esteves Morgado.
António Fernando Couto dos Santos.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António José Barradas Leitão.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Armando de Carvalho Guerreiro da Cunha.
Arménio dos Santos.
Belarmino Henriques Correia.
Carlos Alberto Pinto.
Carlos de Almeida Figueiredo.
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves.
Carlos Manuel de Oliveira da Silva.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel de Valleré Pinheiro de Oliveira.
Delmar Ramiro Palas.
Domingos Duarte Lima.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Ema Maria Pereira Leite Lóia Paulista.
Fernando Carlos Branco Marques de Andrade.
Fernando dos Reis Condesso.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando José Russo Roque Correia Afonso.
Fernando Santos Pereira.
Francisco Antunes da Silva.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hilário Torres Azevedo Marques.
Jaime Gomes Milhomens.
João Álvaro Poças Santos.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Domingos Fernandes de Abreu Salgado.
João Granja Rodrigues da Fonseca.
João José da Silva Maçãs.
João José Pedreira de Matos.
Joaquim Cardoso Martins.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Maria Fernandes Marques.
Joaquim Vilela de Araújo.
Jorge Avelino Braga de Macedo.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José de Almeida Cesário.

José de Oliveira Costa.
José Fortunato Freitas Costa Leite.
José Guilherme Pereira Coelho dos Reis.
José Guilherme Reis Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Leite Machado.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Macário Custódio Correia.
José Manuel Alvares da Costa e Oliveira.
José Manuel Borregana Meireles.
José Manuel da Silva Costa.
José Mário de Lemos Damião.
José Mendes Bota.
Luís António Carrilho da Cunha.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Albino Casimiro de Almeida.
Manuel Antero da Cunha Pinto.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel da Silva Azevedo.
Manuel de Lima Amorim.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Baptista Cardoso.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Simões Rodrigues Marques.
Maria da Conceição Figueira Rodrigues.
Maria da Conceição Ulrich de Castro Pereira.
Maria Helena Falcão Ramos Ferreira.
Maria José Paulo Caixeiro Barbosa Correia.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Margarida da Costa e Silva Pereira Taveira de Sousa.
Mário Jorge Belo Maciel.
Melchior Ribeiro Pereira Moreira.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Nuno Francisco Fernandes Delerue Alvim de Matos.
Nuno Manuel Franco Ribeiro da Silva.
Olinto Henrique da Cruz Ravara.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Rui Carlos Alvarez Carp.
Rui Fernando da Silva Rio.
Simão José Ricon Peres.
Virgílio de Oliveira Carneiro.

Partido Socialista (PS):

Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Bernardes Costa.
Alberto da Silva Cardoso.
Alberto de Sousa Martins.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Ana Maria Dias Bettencourt.
Aníbal Coelho da Costa.
António Alves Martinho.
António de Almeida Santos.
António Domingues de Azevedo.
António Fernandes da Silva Braga.
António José Borrani Crisóstomo Teixeira.
António José Martins Seguro.
António Luís Santos da Costa.
António Manuel de Oliveira Guterres.

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Carlos Manuel Luís.
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Manuel Lúcio Marques da Costa.
Gustavo Rodrigues Pimenta.
Jaime José Matos da Gama.
João António Gomes Proença.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Maria de Lemos de Menezes Ferreira.
João Paulo de Abreu Correia Alves.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Dias da Silva Pinto.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
José António Martins Goulart.
José Eduardo dos Reis.
José Eduardo Vera Cruz Jardim.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Santos de Magalhães.
Júlio da Piedade Nunes Henriques.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Luís Filipe Marques Amado.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Manuel Capoulas Santos.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Maria Julieta Ferreira Baptista Sampaio.
Nuno Augusto Dias Filipe.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Rogério da Conceição Serafim Martins.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui António Ferreira da Cunha.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Vítor Manuel Caio Roque.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
João António Gonçalves do Amaral.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Paulo Jorge de Agostinho Trindade.
Paulo Manuel da Silva Gonçalves Rodrigues.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Adriano José Alves Moreira.
Narana Sinai Coissoró.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

15abel Maria de Almeida e Castro.

Partido da Solidariedade Nacional (PSN):

Manuel Sérgio Vieira e Cunha.

ANTES DA ORDEM DO DIA

0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai anunciar o diploma, os requerimentos e as respostas a requerimentos que deram entrada na Mesa.

0 Sr. Secretário (José Cesário): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deu entrada na Mesa, e foi admitida, a audição parlamentar n.º 28/VI - Situação dos caminhos-de-ferro e seu reflexo nos utentes, nos trabalhadores e no desenvolvimento (PCP), que baixou à 5.ª Comissão.
Na última reunião plenária, foram apresentados à Mesa os seguintes requerimentos: ao Governo e ao Ministério da Educação, formulados pelos Srs. Deputados Guilherme d'Oliveira Martins e Gustavo Pimenta; à Secretaria de Estado da Cultura, formulado pelo Sr. Deputado João Rui de Almeida; a diversos Ministérios, formulados pelos Srs. Deputados Fialho Anastácio, José Manuel Maia e Luís Sá; aos Ministérios do Emprego e da Segurança Social e da Saúde, formulados pelo Sr Deputado Paulo Trindade; ao Ministério da Agricultura, formulado pelo Sr. Deputado Nuno Filipe.
0 Governo respondeu aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: Macário Correia, na sessão de 8 de Março; e André Martins e Guilherme d'Oliveira Martins, nas sessões de 14 e 15 de Setembro.

0 Sr. Presidente: - Como VV. Ex.ªs sabem, na Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares, ficou assente reservar os primeiros minutos do período de antes da ordem do dia de hoje para a apresentação, ao Plenário, de uma relação racionalizada do trabalho efectuado, nos princípios de Setembro, pela delegação parlamentar que se deslocou à Região Autónoma dos Açores.
Na linha desse convénio, e depois de ter dado entrada na Mesa o relatório da referida delegação parlamentar, que farei publicar, darei a palavra, em primeiro lugar, ao presidente da delegação parlamentar e, em seguida, a cada um dos grupos parlamentares, para fazerem um breve comentário.

0 Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

0 Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

0 Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, na reunião da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional, realizada esta manhã, foi anunciada a intenção de entrega de documentos - pelo menos, de dois projectos de deliberação relativos ao processo de revisão constitucional. Um desses documentos foi anunciado pelo PSD como sendo a suspensão do processo e outro pelo PCP, tendo em vista o cancelamento do processo de revisão constitucional. Nessa reunião, foi também levantada a hipótese de, hoje mesmo, esses projectos serem agendados.
Posto isto, pergunto ao Sr. Presidente se vai promover a realização de alguma conferência dos representantes dos grupos parlamentares, no sentido de ainda hoje poderem ser agendadas e discutidas essas matérias. E, desde já, declarava ao Sr. Presidente a nossa inteira disponibilidade para esse agendamento.

Vozes do PCP: - Muito bem!

0 Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

0 Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

0 Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, vou usar da palavra na qualidade de Vice-Presidente da bancada do PSD, porque se trata de uma questão que tem a ver com a iniciativa do Partido Social Democrata. Efectiva-

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mente, referimos, na reunião da Comissão Eventual para Revisão Constitucional, que iríamos apresentar - como vamos - na Mesa um projecto de deliberação tendente à suspensão dos trabalhos dessa Comissão.
Esse documento está a ser preparado, pelo que julgo que será entregue na Mesa durante os trabalhos e, eventualmente, a tempo - se houver consenso - de ser agendado e discutido ainda hoje.

0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estão em causa os trabalhos de uma comissão parlamentar eventual, que tem uma missão definida pela Assembleia da República. A Mesa só adiantará qualquer acção na sequência da manifestação de opinião da comissão parlamentar, propriamente dita. Não é a conferência dos representantes dos grupos parlamentares que terá de ser ouvida, pois, em primeiro lugar, tenho de saber qual é a posição da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional.

0 Sr. Alberto Costa (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

0 Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

0 Sr. Alberto Costa (PS): - Sr. Presidente, queria apenas dizer que também nós, Grupo Parlamentar do Partido Socialista, estamos preparados para discutir, de imediato, essa proposta de deliberação que foi anunciada. Estranhamos, aliás, que ela ainda não tenha sido apresentada.
Pela nossa parte, há todo o interesse em que seja, rapidamente, clarificada uma situação de perturbação e de anomalia que está criada em torno do processo de revisão constitucional.

0 Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, peço, de novo, a palavra para interpelar a Mesa.

Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, peço desculpa por voltar a usar da palavra, mas queria clarificar que a minha referência à conferência dos representantes dos grupos parlamentares tinha a ver com a necessidade de consenso para agendar os projectos de deliberação que referi.
Todavia, de acordo com as manifestações de vontade a que assistimos, por parte das bancadas do PSD e do PS, parece que esse consenso está estabelecido - provavelmente, o CDS-PP irá pronunciar-se no mesmo sentido - e, por isso, ainda poderá ser feito para hoje o agendamento desses projectos.

0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, espero apenas o passo procedimental que me anunciam, mas que não vejo concretizado.
Vamos passar, então, ao primeiro ponto da ordem de trabalhos de hoje, que não será descontado nos tempos atribuídos aos vários grupos parlamentares para o período de antes da ordem do dia. Há um tempo próprio, destinado à análise da relação racionalizada da viagem de estudo feita a todas as ilhas dos Açores por uma delegação parlamentar.
Entretanto, foi-me solicitada a concordância no sentido de se começar por uma apresentação, ainda mais resumida, das conclusões desse relatório. Assim sendo, antes de dar a palavra ao presidente da delegação parlamentar, tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Silva Pereira, na qualidade de relatora, para, resumidamente, apresentar as conclusões que figuram no relatório.

A Sr.ª Margarida Silva Pereira (PSD): - Sr. Presidente, fá-lo-ei de seguida, mas permita-me que, antes, exprima aqui o meu agradecimento público a todos os meus colegas, dos vários partidos, que integraram esta delegação parlamentar e sem cujo auxilio prestimoso teria sido completamente impossível à relatora produzir este texto.
Naturalmente, vou fazer uma leitura rápida das, apesar de tudo, extensas conclusões com que nós avançamos. E sublinhava, em primeiro lugar, aquilo que no relatório surge, precisamente, em último lugar, para que tenha mais ênfase, e que é uma conclusão de substância.
Afirma o relatório: "A visita à Região Autónoma dos Açores proporcionou à delegação a confirmação de que a autonomia regional é a solução mais adequada a dar resposta às especificidades insulares, importando o seu aprofundamento e aperfeiçoamento em sede de revisão constitucional".
E por se tratar de matérias da competência da Assembleia da República e do Governo, a delegação enunciou vários aspectos, sobre os quais entende que deve incidir a actuação dos poderes públicos, e que serão também objecto do seu grande empenho. A saber: "Clarificação jurídico-constitucional do poder legislativo das regiões autónomas e apuramento de outros aspectos do texto da Constituição da República relativos ao perfil das autonomias; audição atempada, pela Assembleia da República e pelo Governo, dos órgãos de Governo próprio da Região sobre as matérias legislativas que lhe digam respeito nos termos constitucionais; aprovação e execução urgente de projectos relativos a novas edificações e restauro de edifícios para instalação dos serviços da Administração Central".
Em matéria tutelada pelo Ministério da Defesa: urgência em dar uma utilização ao património público, designadamente às moradias que o Ministério da Defesa dispõe em Santa Cruz das Flores, resultante da desactivação da base francesa, das quais apenas seis estão a ser utilizadas, sendo as restantes muito adequadas para a fixação de professores e de outros técnicos de que a ilha carece; possibilidade de aproveitamento, para fins municipais e turísticos, das instalações, agora sem utilização, da Rádio Naval na ilha das Flores e reforço dos meios financeiros necessários à execução das missões de busca e salvamento e de fiscalização da zona económica exclusiva (ZEE), que competem ao Comando Operacional dos Açores.
Em matéria tutelada pelo Ministério das Finanças: definição e dum quadro legal para o relacionamento financeiro entre a Região e a República, necessidade de manutenção das Direcções de Finanças de Angra e da Horta e adequadas instalações para as Repartições e Direcções de Finanças.
Em matérias da competência do Ministério do Planeamento e Ordenamento do Território: necessidade de aplicação e adequação da Lei das Finanças Locais às especificidades regionais, em particular no que concerne ao cálculo das verbas do FEF.
Em matérias da tutela do Ministério da Justiça: aprovação e execução de projectos referentes a instalações para tribunais, residências de magistrados, registos e estabelecimentos prisionais.
Na área da educação: necessidade de criar incentivos para a fixação de professores que ministrem o ensino secundário, até ao 12.º ano, nas ilhas mais pequenas e periféricas - a este propósito, friso que a delegação recolheu, nos Açores, a opinião do Governo Regional, dos autarcas e de vários agentes educativos, bem como dos sindicatos neste sentido; que o Orçamento do Estado passe a inscrever, anualmente, dotações necessárias ao financiamento da

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Universidade dos Açores, nos mesmos termos em que acontece para as demais Universidades portuguesas; concretização urgente da transferência aprovada no Orçamento do Estado para 1994 para a Universidade dos Açores e a construção de instalações adequadas para o Departamento de Oceanografia e Pescas e, bem assim, o cumprimento integral do plano referente às instalações dos três pólos da Universidade dos Açores.
Em matéria da competência do Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, é imperativa a garantia de fixação da ANA, E.P., no arquipélago, com a definição de uma estratégia adequada à Região Autónoma dos Açores, salvaguardando em especial: a manutenção do Centro de Controlo Aéreo do Atlântico em Santa Maria, cuja importância é decisiva para a segurança e para a não desertificação da ilha; a permanência dos Serviços da ANA, E.P., na ilha das Flores, por serem indispensáveis à segurança e operacionalidade do aeroporto de Santa Cruz, definição de uma estratégia da TAP que tenha em conta as especificidades da Região, designadamente no que se refere à garantia de ligações com o exterior, e muito especialmente com o continente e as comunidades de emigrantes, e ainda a uma política adequada de tarifas que permita uma melhor articulação com a transportadora aérea regional, tendo em conta, particularmente, a necessidade de melhorar o sistema de transportes para as ilhas mais longínquas.
Na área do emprego e segurança social: implementação da construção das instalações do centro de férias do INATEL, na ilha do Pico.
Em matéria da tutela do Ministério da Agricultura: criação de um quadro legal que permita o acesso dos agricultores rendeiros sem contrato escrito aos apoios nacionais e comunitários à agricultura.
E, por fim, em matéria da tutela do Ministério do Mar: reformulação do Decreto-Lei n.º 292/92, de 29 de Setembro, de modo a que a legislação sobre navegação costeira tenha em conta a realidade insular".
Peço à Câmara que releve o facto de ter sido feita esta leitura, porventura massuda e exaustiva, das conclusões do nosso relatório, mas o escopo inicial que lhe presidiu foi o de dar conta das grandes preocupações que os Deputados da Nação sentiram existir naquela Região e da preocupação correlativa que trazemos em que, de facto, sejam questões atendidas, muito proximamente, pelo Parlamento nacional.

Aplausos gerais.

0 Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Martins Goulart.

0 Sr. Martins Goulart (PS): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Contrariamente ao que foi prenunciado por, alguns arautos do "maldizer", ficou demonstrado à sociedade que a recente deslocação de uma delegação da Assembleia da República aos Açores constituiu uma jornada de intenso trabalho.
No contexto desta importante missão institucional, realizaram-se mais de 50 reuniões com as mais variadas entidades que, de forma simpática, nos acolheram e, do ponto de vista dos Deputados, tornaram úteis as diversas sessões de trabalho. Como é sabido, reunimos em todas as ilhas com os representantes institucionais dos órgãos do poder local e regional, sem descurar os contactos com as entidades representativas dos principais sectores da sociedade civil.

Reconheço, todavia, que o programa da visita poderia ter sido diferente.
Teria, pessoalmente, preferido uma maior acentuação da presença institucional da Assembleia Legislativa Regional, não só na fase preparatória da deslocação como durante a realização das visitas a cada ilha, em particular. 0 acompanhamento dos nossos trabalhos por uma representação pluripartidária da Assembleia Legislativa Regional estaria plenamente justificado numa visita de carácter eminentemente parlamentar, com a consequente dignificação do órgão máximo da autonomia regional.
Apesar desta ou de qualquer outra lacuna verificada, o que importa salientar é que o programa que cumprimos não impediu os Deputados que visitaram pela primeira vez a Região Autónoma dos Açores de conhecerem com bastante profundidade a realidade açoriana. Diria até que alguns - se não todos os Deputados continentais que integraram a delegação - partiram dos Açores compreendendo bem e sentindo-se próximos da nossa multifacetada comunidade insular, o que os habilita, se assim entenderem, a defender - com conhecimento de causa e em qualquer lugar - os interesses dos Açores.
Em resultado desta visita pioneira de uma delegação da Assembleia da República a uma região autónoma de Portugal, é-me muito grato poder testemunhar, na qualidade de Deputado eleito pelos Açores, a existência de um inequívoco empenhamento institucional na procura de soluções justas para alguns dos principais problemas que afectam a Região Autónoma dos Açores.
Formulo votos de que esse empenhamento, baseado na vontade de um núcleo em crescimento de Deputados à Assembleia da República oriundos de várias regiões do País, permita que, num curto prazo, se consensualizem tomadas de posição políticas e institucionais que abram caminho para a resolução definitiva de questões prioritárias para o desenvolvimento dos Açores.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: 0 relatório ora apresentado realça, nas suas conclusões, os principais problemas - os casos mais agudos e, porventura, mais marcantes - da actualidade açoriana.
Porque temos conhecimento da meritória intenção de V. Ex.ª, Sr. Presidente, de fazer a entrega deste relatório ao Sr. Primeiro-Ministro, não posso deixar de fazer um apelo, nesta ocasião, a uma nova tomada de atenção e à intervenção urgente do Governo para que as questões que nele são levantadas - e que ao Governo compete resolver deixem de constar no extenso rol das expectativas frustradas que continuam a ferir a honra e a ofender os direitos dos cidadãos portugueses naturais dos Açores.
Hoje em dia, o mais comum dos cidadãos bem se esforça por entender como é possível que a estabilidade institucional, decorrente de um quadro hegemónico de poder político, que se verifica tanto no plano nacional como a nível de qualquer das regiões autónomas, não permita, a quem governe o País, e no caso em apreço, os Açores resolver, sem entraves, problemas que se arrastam ao longo dos anos, em contradição com os compromissos políticos propagandeados sistematicamente em época de eleições.
Esta incompreensão gera, naturalmente, a indignação popular e o descrédito das instituições, constitui a semente da descrença na classe política e, em última instância, agrava perigosamente o risco de serem postas em causa as virtualidades do próprio regime democrático.
0 mínimo que o Governo, o Parlamento, os órgãos de governo próprio das regiões autónomas e as demais instituições democráticas têm de garantir aos cidadãos é tanto

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ou tão pouco como o honrar institucional da palavra dada, definindo e executando com seriedade, e no âmbito das respectivas competências, políticas que vão ao encontro dos interesses da comunidade nacional, no seu todo, e respeitem também os valores da diversidade que nos enriquecem como Nação.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Cabe, pois, também, ao Parlamento uma quota da responsabilidade no processo de resolução das questões de âmbito nacional que carecem de solução inadiável e que foram reconfirmadas pela delegação da Assembleia da República que se deslocou aos Açores.
As restantes matérias responsabilizam o Governo e o presente relatório discrimina-as pelos diferentes sectores da actividade governativa.
Saiba o Governo entender a natureza e a importância de alguns dos assuntos pendentes, situados na área das suas competências, e decida agir, sem demora nem subterfúgios, encontrando a resposta adequada e satisfazendo com justiça os legítimos anseios dos portugueses dos Açores.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Antes de terminar, gostaria de explicitar, de forma sucinta, os temas que, no entender do Partido Socialista, devem ser considerados fundamentais para a viabilização do desenvolvimento dos Açores como região autónoma de Portugal e parte integrante da Europa: o aperfeiçoamento do modelo constitucional da autonomia político-administrativa, que deverá, entre outras matérias, clarificar as competências da Assembleia Legislativa Regional e tomar efectivo o respectivo exercício; a normalização, por via legislativa, do relacionamento financeiro entre o Estado e a Região, no respeito pelos princípios da solidariedade nacional e da autonomia regional, nomeadamente criando uma lei-quadro das finanças regionais; a adaptação da Lei das Finanças Locais à realidade própria das autarquias dos Açores, cuja complexidade é acentuada pelo fenómeno da "dupla insularidade"; a definição e a implementação de uma política nacional de transportes aéreos e marítimos que, de acordo com o princípio da continuidade territorial, venha a permitir a extensão aos Açores do conceito das redes transeuropeias; a alteração da norma de serviço público nacional, no domínio da comunicação social, através da qual se garanta o respeito pelo princípio da igualdade no uso do direito à informação em todo o espaço nacional; o reforço do investimento nas comunicações, com particular incidência na modernização e aumento de capacidade do sistema de telecomunicações, introduzindo novos serviços e novas facilidades proporcionadas pelas tecnologias modernas; a definição e a implementação de políticas de educação, de formação profissional e de saúde, adequadas não só à Região mas também às características próprias de cada ilha, designadamente através de incentivos diferenciados e eficazes para a fixação de quadros qualificados, com especial incidência nas ilhas e concelhos mais distantes dos centros urbanos; o exercício peremptório, por parte de Portugal, do direito de invocar o princípio do "interesse vital" junto das instâncias comunitárias, sempre que as medidas de política decididas em Bruxelas atentem contra interesses regionais inalienáveis, nomeadamente nos domínios da agro-pecuária e das pescas.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Nestas circunstâncias, coloca-se sempre a questão dos custos. E os custos financeiros inerentes ao desenvolvimento dos Açores são os custos relativos ao investimento necessário à manutenção de uma região insular habitada no meio do Atlântico, onde se respeitem os direitos de cidadania das populações de cada uma das suas parcelas territoriais e se promovam, sem discriminações, oportunidades de progresso e de realização colectiva. São os custos de se continuar Portugal nos Açores e de se dar uma nova dimensão à Europa.
Trata-se de um investimento irrecusável, que terá de ser principalmente assegurado pelo Estado português e pela União Europeia, na justa medida das necessidades de desenvolvimento da Região, concebido em solidariedade e no respeito pelas coesões nacional e comunitária, porque, por fim, está em causa garantir o bem-estar e o futuro das gerações vindouras de um povo que tem História e que não abdica dos direitos que lhe advém de ser e querer continuar a ser português e europeu.

Aplausos do PS, do PSD e do PCP.

0 Sr. Presidente: - Para uma intervenção, agora em nome dos representantes do Grupo Parlamentar do PSD que fizeram parte desta delegação, tem a palavra a
Sr.ª Deputada Margarida Silva Pereira.

A Sr.ª Margarida Silva Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Fazer parte da primeira delegação parlamentar desta Casa que visitou a Região Autónoma dos Açores foi um privilégio, porque ela constituiu um dos momentos mais altos e gratificantes dos trabalhos da Legislatura - afirmo-o em meu nome e sei que assim exprimo o sentir de todos os Deputados do meu grupo parlamentar que, neste contexto, se deslocaram aos Açores e em cuja representação tenho a honra de tomar a palavra nesta circunstância.
0 PSD estruturou a composição da sua representação nesta viagem também segundo o critério de fomentar o conhecimento daquela Região Autónoma por aqueles que, eleitos pelo continente, não haviam tido ainda ocasião de conhecer os Açores ou, pelo menos, de conhecer com profundidade a totalidade das ilhas que durante 10 dias visitámos e por onde se desenvolveu o nosso trabalho.
Em nenhuma circunstância o registo político que trazemos poderia ignorar a beleza singular do arquipélago, a cultura e a simpatia das gentes - germes indefectíveis da dignidade e da grandeza daquela terra. Mas a esse aspecto acresce que o contacto físico, geográfico, com a Região Autónoma dos Açores, terá sido, pela natureza das coisas, o momento em que um parlamentar mais se confronta com o desafio da representação do todo nacional que lhe compete, o momento em que essa responsabilidade da representação o convoca de uma outra forma e ainda mais estimulante, o momento, portanto, de um novo desafio.
É que a linguagem do desenvolvimento, os enunciados das carências económicas e sociais, da criação da igualdade de oportunidades não têm ali o mesmo sentido, não têm ali o mesmo horizonte de referência que lhes atribuímos quando nos referimos ao continente, mesmo quando aqui, em Portugal continental, nos referimos àquelas zonas mais duras e clamantes por actuação política e por justiça social, como as terras transmontanas, alentejanas ou da península de Setúbal, por onde, aliás, fui eleita.
É seguramente outra coisa ser das Flores ou do Corvo ou de qualquer ilha açoriana periférica e não ter podido nascer lá porque falta o hospital e a mãe teve de dar à luz em terra alheia.
É seguramente outra coisa ter, por lei, o direito de estudar e escolher uma profissão, mas, para isso, haver que abandonar a casa e a família em plena adolescência, justamente quando o apoio familiar e as referências dos valores que são próximos se erguem como mais estruturantes da personalidade.

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É seguramente outra coisa o isolamento, quando o avião não aterra por insegurança, quando o próprio barco se aventura ao mar, enfrentando dificuldades imensas, quando as notícias chegam e se transmitem por um único canal de televisão e se fica mais impedido de participar na construção da obra comum.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - A solidariedade ganha aqui, por estes caminhos difíceis, um outro significado.
Perceber que ela tem uma indispensável tradução em obra social e custos orçamentais acrescidos para todos nós é uma obrigação e impõe uma atitude política transversal às querelas partidárias ou mesmo aos modelos de desenvolvimento e de justiça social que defendamos, porque são os étimos do desenvolvimento e da justiça que estão em causa, muito mais e para além das opções que, a seguir, com toda a legitimidade, cada partido assume no seu percurso.
Dos Açores trazemos, assim, este apelo de responsabilidade política acrescida, que não se compreende ou assimila apenas pelo contacto com relatos, reportagens ou estatísticas - os relatos, as reportagens e as estatísticas que Deputados como eu, eleitos pelo continente, tinham até agora como único meio de conhecer o arquipélago. É preciso conhecer a terra e falar com os açorianos, é preciso ir e estar lá!
Confiamos que a Assembleia da República assuma que é assim, o que seguramente vai acontecer, também porque este é o sentimento da delegação e do Presidente desta Casa - aliás, o sentido das palavras que trocou com a delegação, a propósito dos Açores, deu-nos essa convicção.
Dos Açores trazemos também a convicção de que, numa luta duríssima contra as dificuldades, têm os políticos optado pelo caminho da atenção prioritária aos problemas sociais. Dois terços do orçamento regional destinam-se à educação e à saúde, numa assunção lúcida das prioridades do desenvolvimento que, em primeiro lugar, coloca as questões sociais e se arreda de aventureirismos ultraliberais ou de desacreditadas utopias hiperestatizantes.
Dos Açores trazemos a noção da importância do confronto da União Europeia, económica e tecnologicamente desenvolvida, com a sua dimensão marítima.
Foi também por via dos Açores que Portugal trouxe à União Europeia este contributo institucional incomum de pequenas regiões insulares e periféricas e, assim, pôde contribuir para uma visão transcontinental da estrutura da Europa.
Dos Açores trazemos, enfim, o quadro vivo da experiência autonómica. Uma autonomia que não se forjou erraticamente, fruto de algum acaso político, nem se materializa, hoje, em obras públicas apenas, como laivo de um qualquer fontismo.
A autonomia regional é um fenómeno social de afirmação das gentes e desenvolve-se, mau grado as dificuldades, mercê de uma direcção política clara e competente.
É esta autonomia que urge ser aprofundada através da clarificação e do alargamento dos poderes dos órgãos de governo próprio.
Esta autonomia é a grande responsável pelo incremento dos hábitos de participação da sociedade açoriana e que constituem exemplo para qualquer comunidade. É esta autonomia, porventura, a principal responsável por uma plêiade de quadros da Administração Pública, central e local, e de dirigentes políticos açorianos que, a todos os níveis, são exemplo de qualidade, empenho e exigência, numa época de infravalorização do político e que, nesse sentido, nos apelam e convocam para um grande exemplo.

Aplausos do PSD.

0 Sr. Presidente: - Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

0 Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Serei breve nesta evocação da nossa viagem aos Açores.
Açores é, hoje, a fronteira da Europa - a fronteira de entrada para os que vêm do "segundo mundo" e a fronteira de saída para os que, da Europa ou do Terceiro Mundo, buscam o caminho dos novos mundos.
Nesta viagem, foi-nos dado ver como é que numa região, hoje tecnicamente chamada ultraperiférica, é possível ser-se português, é possível ser-se regionalista, como o açoriano, e universalista, como todo o povo português.
Em primeiro lugar, gostava de falar sobre a autonomia regional dos Açores. Se o arquipélago dos Açores não fosse autónomo e regional, com certeza, não seria Açores, porque a sua especificidade, tanto no plano intelectual como na parte física, confere às nove ilhas que o constituem uma solidariedade na unidade e uma unidade na diversidade que são próprias daquelas ilhas.
Cada um vive a sua vida, mas sabe que está ligado às outras ilhas e a Portugal por laços indestrutíveis; cada um quer aquilo que os outros querem, mas também cada um sabe dar aquilo que os outros pedem. E é esse sentimento, de que Açores é Portugal e de que Portugal sem Açores não passaria de uma pequena província da Península Ibérica, que dá grandeza ao continente, pelas suas ilhas, e às ilhas, devido ao continente. É essa ligação que existe entre as terras dispersas no mar e o sólido continente que lança sobre elas o seu "olhar" de nacionalidade, que confere a genuinidade açoriana de que tanto nos honramos.
0 relatório dá conta de tudo quanto ali fizemos e de tudo quanto ali apurámos, para que o Governo central tenha a maior atenção aos problemas que nos foram colocados. Devo dizer que não são problemas descobertos por nós, não são problemas novos que tenhamos investigado ou trazido ao vosso conhecimento, é meramente um sublinhar dos problemas que ainda resta resolver.
Em segundo lugar, há uma coisa que é preciso notar: enquanto os serviços nacionais se degradam por falta de conservação, por má situação e por falta de equipamentos, os serviços regionais são sempre modernos, bons e bem instalados. 15to significa que os Açores esperam que cada um cumpra a sua parte da solidariedade e nós temos de tomar nota disso, ou seja, isto é uma chamada de atenção para que os ministérios responsáveis por estes serviços tenham sempre presente que não podem deixar para os outros o que eles têm de fazer por si próprios.
Como profissional do foro e da justiça, não posso deixar de me revoltar com o que se passa em certos serviços judiciários e, principalmente, com as casas de magistrados.
Ver na ilha de Santa Maria um tribunal apertado nas divisões da câmara; ver o registo de toda a ilha, com centenas de anos, exposto à chuva, ao "bicho" e a todas as formas de destruição, sem que ninguém se lembre de que ali está a história da ilha, de que ali estão todos os nascimentos, mortes e óbitos, toda a vida de cada um dos cidadãos de Santa Maria, bem como a história política da ilha, faz-me pensar, muitas vezes, naquilo que fazemos e naquilo que os nossos serviços fazem, quando deixam com-

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pletamente ao abandono, mas completamente ao abandono um serviço de tanta e tanta importância.

Aplausos do Deputado do PS Martins Goulart.

Da mesma forma, verificámos que naquele tribunal, na referida ilha, o gabinete do juiz não deve ter mais do que 5 m2, o gabinete do Ministério Público não tem um lavatório próprio; as testemunhas são obrigadas a ficar, de pé, nos corredores; a arguição dos declarantes, em processos crime, é ouvida por todos... Ou seja, o segredo de justiça está na "praça" e ninguém cuida de saber por que é que um tribunal há-de funcionar desta forma...!
Vamos à ilha das Flores e vemos casas desabitadas, que não foram construídas pelo Governo português mas foram entregues ao Governo português e que, segundo dizem, o excesso de zelo de um burocrata quer fazer delas património nacional para mostrar serviço, para mostrar que vendeu a bom preço aos próprios naturais, aos próprios açorianos, que precisam daqueles edifícios para serviços públicos urgentes.
Vamos aos serviços de educação, que, embora tenham autonomia, não têm criadas as condições minimamente necessárias para que esta geração de açorianos possa usufruir das mínimas condições de escolaridade.
Já aqui foi dito o que representa para uma família ter de abandonar o seu filho aos 13 ou 14 anos, sem saber para onde vai e sem ter dinheiro para isso. É que mandar um filho, com 14 anos, para outra ilha não representa apenas um prejuízo moral, representa também um prejuízo financeiro, ou seja, não os podem mandar, pois têm de prover à sua subsistência com 20, 25 e 30 contos.

0 Sr. Presidente: - Sr.Deputado, atenção ao tempo.

0 Orador: - 0 Sr. Presidente está a chamar-me a atenção para o tempo e tem razão, porque falar dos Açores, realmente, faz-me perder no tempo e naquele vasto espaço que tantas carências tem, como nos foi dado ver e viver.
Que o nosso relatório sirva, pelo menos, para pôr em acção, para pôr em acto os deveres de solidariedade do Governo central para com o governo regional. Esse é o nosso voto.
Finalmente, quero agradecer ao Governo Regional dos Açores e, principalmente, ao seu Presidente, Dr. Mota Amaral, o amável convite que nos dirigiu e que tanto nos historiou.

Aplausos do PSD, do PS e do PCP.

0 Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

0 Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 PCP participou, com gosto e activamente, desde a primeira hora, na visita da delegação da Assembleia da República à Região Autónoma dos Açores.
Fizémo-lo com a ideia de que importa estreitar relações com todas as partes do território nacional e, neste particular, com a Região Autónoma dos Açores, com os órgãos próprios da Região, com as estruturas económicas e sociais e com os cidadãos.
Em nossa opinião, a visita foi não só gratificante no plano individual mas também útil no plano colectivo, porque permitiu desenvolver novos canais de diálogo entre a Região e o continente, porque permitiu aos açorianos conhecerem melhor o pensamento dos vários grupos parlamentares que integram a Assembleia da República e porque, finalmente, nos permitiu aprofundar o conhecimento do processo autonómico, das suas especificidades e dos chamados custos de insularidade. Mas importa agora que a visita não se esgote com este acto regimental que hoje estamos aqui a protagonizar.
Foi possível redigir um relatório onde toda a delegação chegou a consenso sobre um conjunto de problemas e preocupações que nos foram expostos e que, todos reconhecemos, precisam de ser considerados e resolvidos, mas é preciso agora levar esse relatório à prática. Por isso aqui recordo sinteticamente o que ficou aprovado na delegação: reuniões urgentes com os ministros responsáveis por alguns desses problemas. É o caso, por exemplo, do Ministro da Defesa, por forma a resolver os problemas resultantes do encerramento da Base das Flores e, em particular, os que se relacionam com a disponibilização para a região, em condições aceitáveis, do património público devoluto, designadamente das moradias livres da Estação Francesa de Telemedidas.
É o caso do Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações para que se mantenha na ilha de Santa Maria o Centro de Controlo Aéreo e a operacional idade do respectivo Aeroporto. Nesta matéria, aliás, está já agendado para o próximo dia 2 de Novembro o debate do projecto de resolução que, inspirado na proposta do meu camarada João Amaral, reuniu a assinatura de Deputados de todos os partidos e que se pronuncia, exactamente, pela manutenção daquela estratégica infra-estrutura em Santa Maria. Vamos ver agora se o PSD, aqui na Assembleia da República é coerente com as promessas que fez nos Açores!...
Por outro lado, foi também acordado promovermos outras iniciativas, designadamente interpelando em conjunto o Governo, pelos diversos meios regimentais ao nosso alcance, sobre as restantes conclusões que fazem parte do relatório ou concretizando-as aqui na Assembleia da República para aquelas que forem da nossa competência. No entanto, é preciso que isto seja realizado em tempo útil.
Estou a lembrar-me, desde já, da necessidade de no próximo Orçamento do Estado serem cumpridas as expectativas criadas, designadamente quanto, por exemplo, ao reforço do Fundo de Equilíbrio Financeiro para as autarquias ou às verbas necessárias para a instalação do Departamento de Oceanografia e Pescas da Universidade dos Açores e que não aconteça o que inexplicavelmente está a acontecer com o boicote que o Governo está a fazer à transferência para a Universidade dos Açores de 2,1 milhões de contos aprovados no Orçamento do Estado para 1994.
Mas são também importantes: o problema dos transportes aéreos e marítimos; a definição pela TAP e a ANA de uma estratégia adequada à região; o reforço de meios de busca e salvamento e de fiscalização da ZEE à disposição do Comando Operacional dos Açores; a criação de incentivos para a fixação de professores e outros técnicos, designadamente nas ilhas mais pequenas, longínquas e isoladas; a criação do 9.º ano de escolaridade na ilha do Corvo; a adequação da legislação à especificidade da Região, como é o caso da "carta de patrão de costa", a instalação dos serviços periféricos do Estado; a concretização das promessas quanto à construção do Centro de Férias do Inatel na ilha do Pico; a realização de uma política agrícola que apoie os agricultores e promova as produções com denominação de origem. Estas são, pois, algumas das múltiplas questões pendentes que importa agora não esquecer.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao contrário do que afirmou na Assembleia Legislativa Regional uma destacada fi-

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gura da organização do PS dos Açores, a viagem não foi nem turística nem gastronómica.

0 Sr. Silva Marques (PSD): - Um socialista disse isso?!...

0 Orador: - Naturalmente que apreciámos as imponentes belezas naturais dos Açores, a sua gastronomia e a sua cultura, mas nem para isso tivemos, infelizmente, muito tempo ao longo dos 10 dias em que percorremos todas as ilhas e das 51 intensas reuniões que realizámos e que nos permitiram conhecer mais de perto a realidade autonómica açoreana e fazer um levantamento largo de muitos dos problemas com que se debate a Região Autónoma dos Açores.
Queremos voltar a reafirmar, nesta oportunidade, que para o PCP a autonomia é uma realidade inquestionável que importa acarinhar e melhorar no quadro dos princípios constitucionais vigentes.
Neste âmbito há, ainda, caminhos a percorrer e incompreensões a ultrapassar quanto à concretização do princípio constitucional da solidariedade devida às regiões autónomas, tendo em conta a especificidade e os custos de insularidade que, no caso dos Açores e em relação às ilhas mais longínquas, se traduz numa dupla insularidade, ou seja, na insularidade da insularidade.
Solidariedade que é também condição de reforço da própria unidade nacional. Mas, Srs. Deputados, convenhamos que o défice de solidariedade - aliás, imputável ao Governo nacional do PSD - não justifica tudo: há muitas insuficiências que derivam da política do próprio Governo regional.
Começo por destacar a ausência de um programa de desenvolvimento integrado para cada uma das ilhas dos Açores, em particular das ilhas mais pequenas e isoladas.
Está a reproduzir-se na Região Autónoma o mesmo modelo de desenvolvimento do continente: assimetrias crescentes entre as diversas ilhas com sérios perigos de desertificação das mais pequenas e longínquas.
0 que se passa com a inexistência do 9.º ano de escolaridade no Corvo, com a rede de cuidados de saúde, com a ausência de programas de desenvolvimento local que, por exemplo, estimulem a instalação de pequenas unidades de transformação agro-alimentar e que promovam produções com denominação de origem (como, por exemplo, a "carne-Açores"), com a dificuldade de transportes marítimos e aéreos, com o crescente desemprego, designadamente em S. Miguel, é matéria que tem a ver muito com a estratégia de desenvolvimento regional liderada pelo PSD que não tem permitido um pleno aproveitamento do esforço financeiro do País e dos fundos comunitários.
Aliás, é nossa opinião que, se impõe clarificar os poderes legislativos regionais, com os quais estamos de acordo, também se impõe criar uma lei-quadro para o relacionamento financeiro entre a Região e o continente.
Por outro lado, não posso deixar de sublinhar o domínio hegemónico, quase asfixiante, que o PSD e o Governo regional exercem sobre a região com a criação de uma rede clientelar e de dependências diversas e com o afastamento de, cidadãos de cargos públicos por razões políticas.
Mas também é preciso sublinhar, nesta oportunidade, que o PSD/Açores e os Deputados do PSD eleitos pela Região são parte integrante do PSD nacional e, nessa qualidade, apoiantes de um Governo que é responsável por muitos dos problemas e dificuldades da região autónoma e açorianos.
0 PSD não pode cultivar um discurso regional de aparente oposição, que lhe é muito conveniente para açoriano consumir, e com isso branquear e ser solidário com as políticas que no plano nacional o seu próprio Governo toma contra a autonomia.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pela nossa parte, a visita que fizemos não caiu em saco roto. Aliás, já começámos a trabalhar e em consequência da viagem o Deputado do PCP na Assembleia Legislativa Regional apresentou um projecto de lei visando permitir aos agricultores rendeiros sem contrato escrito o acesso aos apoios comunitários. Iremos continuar com outras iniciativas.

Esperamos, agora, que a viagem e as conclusões do relatório não caiam no esquecimento do PSD. Pela nossa parte, aqui e nos Açores, estaremos atentos ao cumprimento das expectativas criadas e das promessas feitas no interesse do reforço da autonomia regional no quadro da unidade nacional, no desenvolvimento da Região Autónoma dos Açores e na melhoria das condições de vida da sua população.

Aplausos do PCP e do Deputado do PS Martins Goulart.

0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, por uma dificuldade de comunicação não
dei a palavra inicialmente a quem foi, a meu pedido, presidir a esta delegação parlamentar: o Sr. Vice-Presidente, Correia Afonso, que, a partir de certo momento, teve de ser substituído, por compromissos que tinha com a União Interparlamentar, pelo Sr. Presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, Deputado Guilherme Silva.
Assim, e corrigindo esse lapso, darei a palavra para uma intervenção ao Sr. Deputado Correia Afonso que chefiou a delegação da Assembleia da República que se deslocou aos Açores.

0 Sr. Correia Afonso (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No dia 6 de Setembro de 1994 uma delegação da Assembleia da República iniciou uma deslocação à Região Autónoma dos Açores.
Essa delegação parlamentar - e coube-me a honra de chefiá-la - foi integrada por Deputados do PSD, do PS, do PCP e do CDS-PP.
0 convite para essa deslocação foi dirigido à Assembleia da República pelo Presidente do Governo Regional dos Açores, que indicou como objectivo: "0 estudo e a observação directa das realidades e problemas insulares".
Aterrámos na cidade património mundial - falo, obviamente, de Angra do Heroísmo. Paradoxalmente, começámos pela Terceira, percorrendo depois as nove ilhas do arquipélago dos Açores.
A chefia da delegação parlamentar, a partir do dia 9 de Setembro, passou a pertencer ao Deputado Guilherme Silva, quando tive de regressar a Lisboa, pressionado por outros compromissos parlamentares.
Durante a visita à Região Autónoma dos Açores a delegação cumpriu um plano preestabelecido que lhe permitiu encontrar, ouvir e dialogar com as pessoas que, segundo cremos, melhor podiam informar-nos e esclarecer-nos acerca das "realidades e problemas insulares".
0 relatório escrito desta visita da delegação parlamentar, de que a Sr.ª Deputada Margarida Silva Pereira, com muito mérito, foi relatora, descreve em pormenor o nosso trabalho nas ilhas, pelo que me dispenso de repeti-lo aqui. Assim, esta intervenção não é nem o meu nem o nosso relatório.
Entre aqueles a quem ficámos a dever muita da informação que recolhemos, quero nomear as seguintes entida-

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des: o Ministro da República; o Presidente e os Membros do Governo Regional; os autarcas; as populações das nove ilhas; os professores e outros agentes do processo educativo, os médicos e o pessoal hospitalar; os comandos militares; as associações agrícolas; e os sindicatos da UGT e da CGTP.
É da mais elementar justiça reconhecer aqui, publicamente, a contribuição, por vezes controversa, mas sempre positiva, que todos eles deram para o esclarecimento da delegação parlamentar.
A beleza paradisíaca dos Açores mais uma vez seduziu-nos, como sempre, deixou-nos a marca de uma forte impressão. Mas não íamos à procura de pedras, embora não sejamos insensíveis ao seu encanto e ao seu testemunho da História. A nossa motivação era outra: as pessoas, as suas angústias e aspirações; o seu direito legítimo de quererem viver, ser felizes.
A delegação parlamentar percorreu as nove ilhas açorianas; reuniu, dialogou, observou e verificou que muitas das dificuldades das suas populações resultam do facto de estarem distantes dos centros de poder político e económico - é a periferia com os seus efeitos.
Mas o facto de estarem isoladas pelo mar, a chamada insularidade, também tem reflexos especiais e os problemas decorrentes da periferia e da insularidade são, depois, potenciados pela dispersão ao longo das nove ilhas que constituem o arquipélago e que se estendem pelo Atlântico. É a multi-insularidade, ou a condição arquipelágica dos Açores; é a insularidade dentro da própria insularidade.
A problemática dos interesses, a forma de viver das populações e até, por vezes, a sua maneira de estar são, profundamente, marcadas pelas características geofísicas, que permanecem depois e se transmitem a modelar as económicas e sociais.
A periferia, a insularidade e o arquipélago condicionam a existência de todos os que lá residem. Lá estão ancoradas as especificidades regionais, que exigem tratamento adequado, imediato e conhecedor, aplicado pela própria comunidade local.
A autonomia dos Açores, com o seu regime político-administrativo, é assim a resposta que todas essas circunstâncias que têm estado na base de uma reivindicação que os açorianos sustentam desde 1892.
Coube ao regime democrático, nascido do 25 de Abril, dar finalmente a resposta, o que é, certamente, um motivo de orgulho para todos nós.
A autonomia político-administrativa significa, grosso modo, que as regiões, através de órgãos próprios, decidem as matérias de interesse específico para as ilhas, e para elas.
Mas o que é o "interesse específico"? É urgente clarificar e dar precisão a este conceito de "interesse específico" para acabar com ambiguidades e frustrações que as populações açoreanas não merecem.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na sua visita de trabalho, a delegação parlamentar pôde aperceber-se da problemática açoreana. As dificuldades advêm em grande parte dos elementos naturais, da geofísica e das suas projecções sobre as pessoas.
No enquadramento mais geral surge, assim, um pressuposto de que depende, em grande parte, a resolução de muitas outras questões: a acessibilidade da Região. Por outras palavras: é o problema dos transportes ou das comunicações, externos e internos.
Os Açores distam do continente; só lá se chega, ou só de lá se sai, pelo mar ou pelo ar, isto é, por barco, avião ou satélite.
São a periferia e a insularidade, mas, além disso, é também o arquipélago. A própria ligação interna, entre as ilhas, é também indispensável, mesmo quando estiverem em causa pequenas comunidades.
Nos Açores - peço licença para repetir - os problemas que nos interessam são as pessoas e estas, muitas ou poucas, têm sempre direito à sua dignidade e também à nossa solidariedade.
É, portanto, prioritário assegurar ligações aéreas, marítimas e telecomunicações e, naturalmente, as respectivas infra-estruturas: aeroportos, portos e
tele-estações. Muito tem sido feito e é justo reconhecer tudo o que se tem avançado para acabar com o isolamento secular dos açorianos e aproximar as ilhas do continente e umas das outras, mas muito ainda haverá que fazer.
Não posso saber neste momento - mas isso agora não interessará - quem deve suportar todos esses encargos. Sendo uma prioridade, a condicionar o desenvolvimento dos Açores, é meu sentimento que todos os continentais devem essa solidariedade aos açorianos.
Na nossa deslocação encontrámos também em algumas ilhas dificuldades de recrutamento de pessoal técnico e para prestação de serviços de educação e de saúde.
Compreende-se que seja difícil contratar professores, médicos, paramédicos e técnicos para se instalarem junto de pequenas comunidades, por vezes isoladas, sem condições atractivas de carreira profissional.
Creio que a melhoria de transportes e comunicações e a reformulação de carreiras profissionais poderão ser contribuições válidas para ajudar a resolver essas questões.
Na nossa visita encontrámos e ouvimos outros problemas e insatisfações, que constam do relatório que a delegação parlamentar apresentou hoje ao Sr. Presidente da Assembleia da República. É aí o lugar do seu registo; aí estarão à vossa disposição.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A nossa deslocação à Região Autónoma dos Açores confrontou-nos com o direito que todas as pessoas têm de escolher o local onde querem viver: a isso chama-se liberdade.
Todos nós devemos respeitar esse direito fundamental e contribuir para que as pessoas consigam viver o melhor possível no local que escolheram: a isso chama-se solidariedade.
A delegação parlamentar partiu para os Açores com o objectivo de estudar e observar as realidades e problemas insulares. Cumpriu a sua missão, conheceu e registou as especificidades regionais. Mas a delegação e todos nós regressámos enriquecidos: além da boa experiência, trouxemos connosco a consciência de uma maior solidariedade que é devida aos nossos compatriotas açorianos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

0 Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

0 Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se não fora a circunstância de, pelas razões que o Sr. Presidente da Assembleia já referiu, ter substituído o Sr. Deputado Correia Afonso no terceiro dia da viagem da delegação parlamentar aos Açores, não se justificaria, depois de todas as intervenções, que eu próprio usasse aqui e agora da palavra sobre esta matéria.
Em todo o caso, tendo chefiado a delegação nos sete dias dos dez que lá estivemos, não podia deixar de dizer alguma coisa sobre a viagem.
Em primeiro lugar, gostaria de dizer que talvez devesse ser eu, quem de entre todos, quem menos se surpreendeu com a realidade insular dada a circunstância de eu ser

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natural de uma ilha. Mas, a verdade é que, conhecendo já algumas ilhas dos Açores, quero confessar aqui que esta visita me permitiu ter uma noção bastante mais completa e diferente daquela que tinha sobre essa realidade multiplicada pelas nove ilhas do arquipélago dos Açores com todos os problemas que essa subinsularidade levanta e que vêm sendo aqui referidos.
Mas esta nossa visita foi também uma visita à nossa História. E nós hoje vivemos numa época que tem os seus paradoxos e, por vezes, vivemos muito mais intensamente as coisas mais longínquas. De facto, o mundo transforma-se cada vez mais numa aldeia global. A mediatização e a comunicação fácil aproximam-nos das coisas que estão longe, mas a verdade é que isso vem, dizia eu, criando alguns paradoxos, nomeadamente o de não estarmos atentos às coisas que estão mais perto - aliás, às vezes, conhecemos os museus das grandes capitais e não conhecemos o museu que está ao nosso lado...

O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Em relação à realidade das regiões autónomas passa-se muito isto: não conhecemos com a profundidade que devíamos, como parlamentares que somos, a realidade das regiões autónomas.
Assim, quero deixar aqui um desafio: que esta visita de uma delegação parlamentar não seja um acidente na nossa vida parlamentar e que não resultasse apenas das solicitações que as regiões fazem, no caso concreto o convite que nos foi dirigido pelo Governo Regional. Era bom que a Assembleia programasse, através das suas comissões e das várias actividades em que está envolvida, uma visita que permitisse a todos os parlamentares fazerem em cada Legislatura uma viagem às regiões autónomas.
Esta visita foi também, como já disse, uma visita à nossa História Na verdade, quem pode esquecer que foi Angra o último reduto da resistência portuguesa contra Filipe II?

O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Quem pode esquecer que foi em Vila Franca do Campo que se travou uma batalha entre as forças espanholas e as forças chefiadas por António Pior do Crato? Quem pode esquecer que foi ali que D. Pedro IV formou um governo enquanto se desenrolavam as lutas liberais em Portugal? Quem pode esquecer, pois, que a história dos Açores ou a História de Portugal não se fez no passado sem os Açores, não se faz no presente sem os Açores e não se fará no futuro sem os Açores?

Aplausos do PSD e de alguns Deputados do PS.

Assim, gostaria de deixar aqui expresso um agradecimento, quer ao Sr. Presidente do Governo Regional dos Açores, que dirigiu este convite à Assembleia, como também a todas as entidades do Governo Regional, do poder autárquico e das associações com quem tivemos reuniões e contactos, pela forma extremosa e simpática e pela atenção que dispensaram a toda a delegação parlamentar.
Srs. Deputados, esta visita fez-se numa altura em que os Açores comemoram o centenário da autonomia, comemorações essas que, aliás, se iniciaram com a presença do Sr. Presidente da Assembleia da República.
Na altura em que se comemora um facto tão importante para a história dos Açores - direi mesmo para a História de Portugal - lembrar figuras como Aristides da Morta, que aqui, na Câmara dos Deputados, apresentou em Março de 1892 um projecto de lei que pretendia consagrar as primeiras linhas de autonomia regional e em que as justificava no seu preâmbulo desta forma: «(...) os açorianos encontrarão novos motivos para extremarem a mãe-pátria a quem dedicam um amor sacrossanto e por quem têm feito penosos sacrifícios nas épocas mais críticas da nossa história, sustentando, à custa da sua propriedade e do seu sangue, a independência nacional e os princípios em que assenta a actual constituição do Estado.»
Srs. Deputados, esta nota do preâmbulo do projecto de lei de Aristides Motta mantém alguma actualidade. E foi por isso também que o relatório que a Sr.ª Deputada Margarida Silva Pereira elaborou, e a quem felicito pelo excelente trabalho, conclui, exactamente, com uma chamada de atenção da Câmara de que, em sede de revisão constitucional, é também o momento próprio para expressarmos a nossa solidariedade para com os nossos compatriotas dos Açores e da Madeira, aprofundando e aperfeiçoando a autonomia regional.
Srs. Deputados, deparámos também com algumas reclamações que mantêm inteira actualidade. Foi uma constante em várias das ilhas que visitámos e em várias das instituições com quem nos relacionámos, designadamente com a Assembleia Legislativa Regional, o alerta para a circunstância de continuar a haver legislação nacional que não tem em conta as realidades das regiões autónomas.
E aqui, mais uma vez, me louvava em Aristides Motta e me revia até, de certo modo, numa nota que ele deixava então nos seus trabalhos parlamentares e que diz o seguinte: «Sacrificamos o geometrismo e a uniformidade que tem sido o carácter dominante das ideias que tem inspirado a nossa legislação-pátria, mas, por isso mesmo, julgamos empreender um trabalho fértil em resultados úteis, porque mais harmónico com a realidade, mais aproveitador de todos os elementos da actividade que naturalmente desenvolvem os cidadãos quando investidos de funções que respeitam particularmente à região em que vivem.»
Srs. Deputados, não vou repetir aqui o conjunto de questões que nos foram colocadas nos Açores, que dependem de intervenções da Assembleia da República e do Governo da República que já foram aqui referidas e que constam do nosso relatório.
Não quisemos deixar nos Açores promessas relativamente ao que nos pediam, mas deixámos uma, que é a do nosso empenhamento no sentido de dar satisfação às reivindicações justas daquelas populações. E, entre todas, quero aqui salientar a que diz respeito à manutenção, em Santa Maria, do Centro de Controlo Aéreo do Atlântico. É, do nosso ponto de vista, de importância vital que este centro ali permaneça para a fixação das populações naquela ilha. Sei que há problemas de ordem técnica, sei que há problemas que têm a ver com os nossos compromissos internacionais no âmbito em que se insere esta actividade, mas creio que se houver uma vontade política clara ela será ultrapassada e poderemos garantir que permaneça nos Açores este serviço.
Dizia eu que esta visita foi também uma visita à nossa própria História. E quero lembrar que também a nossa literatura não teria a grandiosidade e a dimensão que tem se não incluísse figuras como Antero de Quental, Vitorino Nemésio e Natália Correia.
Acabaria esta minha intervenção com uma pequena citação de Vitorino Nemésio, de um artigo que escreveu em O Corsário das Ilhas, sobre os Açores, e que terminava assim: «Enfim, o Corvo fecha a oeste o segredo das ilhas dos Açores, com o seu gado vacum anaínho, os seus 182

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fogos sem ferrolho e os seus patriarcas de barbas e arrecada baleeira que resolvem sentados numa pedra os pequenos interesses da comuna."
Esta referência ao Corvo e à circunstância de ainda ali, hoje, se manterem estas casas sem fechadura, sem ferrolho, como referia Vitorino Nemésio, é um sinal que não é exclusivo dos Açores. É o sinal do coração aberto que fomos encontrar nos Açores, de que esse coração se prendeu ao nosso e o de que vai aqui, com certeza, reflectido-se em cada um de nós, reflectindo-se nas direcções dos
Grupos que integramos, ter uma visão cada vez mais solidária com os açorianos.

Aplausos do PSD.

0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, resta-nos, em nome da Assembleia, agradecer a todos quantos fizeram parte desta delegação parlamentar que se deslocou, em visita de trabalho, a toda a Região Autónoma dos Açores, agradecer ao Sr. Presidente do Governo Regional a iniciativa de nos ter convidado e agradecer ao Sr. Ministro da República, às autoridades regionais, estatuais e locais todo o obséquio que quiseram ter para com os Srs. Deputados.
Muito obrigado a todos.
Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Alegre.

0 Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 PS apresentou o seu projecto de revisão constitucional com o propósito de contribuir responsavelmente para a reforma e melhoria do sistema político. Está disposto a
dialogar no âmbito da Comissão, mas não conversa a dois e não participa em negociações secretas com o PSD ou qualquer outro partido.

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Orador: - Não há melhoria possível da lei fundamental fora de um quadro de transparência que é cada vez mais indispensável à credibilidade e ao prestígio das instituições. Por isso, desafiamos uma vez mais o PSD a explicar aqui o que é que quer propor em privado que não seja capaz de propor em público.

Aplausos do PS.

0 PS não tem nada a esconder. 0 PS não cede a ultimatos. A revisão constitucional tem a sua sede própria. Ou se fará aí ou não se fará. E se não se fizer a responsabilidade será do PSD, desta vez em sintonia com o PCP, que
acabou de propor o seu cancelamento.

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A resposta do Secretário de Estado da Cultura às notícias divulgadas pelo jornal Público sobre eventuais irregularidades na utilização do Fundo de Fomento Cultural não é apenas arrogante e destemperada, é patética.

Não vamos deter-nos na apreciação dos factos que lhe são imputados num relatório feito por auditores do Tribunal de Contas e que tem o carimbo de Março deste ano, não nos parecendo, por isso, que sejam tão "requentados" quanto o Dr. Santana Lopes pretende. Compete ao Tribunal de Contas pronunciar-se, em primeira instância, sobre esses factos e apurar se é ou não verdade que um Fundo
destinado a prestar apoio financeiro às actividades culturais foi utilizado para outros fins que, de tão pouco culturais, me dispenso de enumerar.
0 Tribunal de Contas dirá. 0 que é politicamente grave é a reacção do Secretário de Estado da Cultura.
Foi patético vê-lo aparecer, de fotocópias na mão, fora de si, aos jornalistas, no decurso da reunião de um órgão do seu partido, a ameaçar tudo e todos. Só lhe faltou desafiar um jornalista e um seu antigo director-geral para a pancada. E foi muito pouco elegante a tentativa de transferir responsabilidades para a sua antecessora, que, por sinal, é colega de Governo e de partido. Aquele ferrabrás portou-se, afinal, como um queixinhas.

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Orador: - Mais grave foi a manifestação pública de desconfiança nos tribunais portugueses.
Onde é que já se viu um membro do Governo passar um atestado público de desconfiança à justiça do seu país? E em que outro país da Europa é que um membro do Governo que assim se comportasse não seria imediatamente demitido?

Aplausos do PS.

Convenhamos que um Secretário de Estado da Cultura deve ter outra contenção e outra disciplina. Não pode comportar-se publicamente como um campeão de bairro ou um varredor de feiras. A um membro do Governo exige-se menos marialvismo e mais maneiras, e, sobretudo, mais sentido de Estado. A principal campanha contra o Secretário de Estado da Cultura é feita pelo Dr. Santana Lopes.

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Orador: - Mas a desorientação do Secretário de Estado da Cultura não é um acto isolado, ela reflecte a desorientação geral do PSD.
Desorientação que tem a sua expressão mais sintomática na guerra civil verbal que o PSD desencadeou ultimamente contra o Presidente da República, contra o Procurador-Geral da República e contra as oposições, principalmente contra o PS e o seu Secretário-Geral. É um comportamento estranho na forma e no conteúdo.
Na forma, pelos excessos de linguagem, pelo extremismo, pelo estilo por vezes quase grosseiro, como o das sinistras aparições televisivas de um Dr. Pedro Pais de Vasconcelos, que são de meter medo ao susto.
Na forma, ainda, pela multiplicação de porta-vozes, numa tentativa orquestrada de lateralizar a discussão e impedir o verdadeiro debate político sobre as grandes questões nacionais.

Ele é o Dr. Vasconcelos em Lisboa, o Dr. Calvão da Silva em Coimbra, o Dr. Graça Moura sempre, sempre na televisão, o Dr. Marques Mendes, idem, idem, aspas, aspas! E, claro, o Deputado Duarte Lima, que além de parlamentar excelente, como brilhante músico que é deu o mote.

Risos.

Sempre com os mesmos alvos: Presidente da República, Procurador-Geral da República, PS e António Guterres.

E aqui chegamos ao conteúdo: que pretende politicamente o PSD? Intimidar? Inibir? Dissuadir? "Carmonizar" a Presidência da República? Governamentalizar o Procurador-Geral? Amedrontar o PS? Ficar sozinho em campo, sem equilíbrio nem separação de poderes, sem fiscalização, sem alternância?

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Porquê tanto ataque a tudo o que não é PSD? Porquê tanta obsessão em ver, na mais pequena crítica, uma conspiração e nos outros órgãos do Estado tenebrosas forças de bloqueio?
0 que é que, afinal, pretende? Alterar o regime? Provocar uma crise política?
Alguém devia, por exemplo, explicar ao PSD que não é o Presidente que depende do Governo, é o Governo que depende do Presidente; não é o Governo que pode mandar calar ou demitir o Presidente, é precisamente o contrário.
Nem sempre, em política, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o que parece é. Por isso, pensamos que este radicalismo do PSD, tendo aparentemente o propósito de amedrontar os outros, não é senão, afinal, a expressão do próprio medo do PSD. Os excessos do PSD são o reflexo do seu medo. 0 PSD está com medo de perder. E o medo gera perturbação, o medo provoca o excesso. E já se sabe que os deuses enlouquecem aqueles que querem perder.
0 medo faz emergir no PSD e no Governo uma cultura e um estilo que julgávamos definitivamente enterrados. E o Primeiro-Ministro a aparecer pretensamente situado acima das querelas político-partidárias, a pedir que o deixem ocupar-se do "interesse nacional" e a insinuar que só vem ao Parlamento perder tempo. Como se a política fosse um pecado, como se ele próprio não fosse um político que utiliza a condição de Primeiro-Ministro para constantemente fazer campanha e propaganda como Presidente do PSD.

Aplausos do PS.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Aplaudi, no outro dia, sem complexos nem hipocrisia, o excelente discurso do Deputado Pacheco Pereira. Foi um discurso que estabeleceu uma fronteira cultural entre uma tradição liberal e outra que o não é.
A forma e o conteúdo de algumas intervenções, a que me referi, mostra que essa fronteira passa, também, por certos sectores do PSD e do próprio Governo.
Mais inquietantes do que a desorientação verbal são as situações e as propostas susceptíveis de pôr em causa os direitos fundamentais dos cidadãos e que, em si mesmas, constituem um grave desvio ao funcionamento do sistema democrático.
Está, no primeiro caso, a inexistência de uma fiscalização democrática aos Serviços de Informações da República.
António Guterres tornou clara a nossa posição: "0 Grupo Parlamentar do PS não dará os seus votos para a eleição de uma comissão sem poderes efectivos, que seja um mero instrumento branqueador de desvirtuamentos e ilegalidades".
Esperamos que o Governo reconsidere e tenha em conta, também, as dúvidas e interrogações levantadas pelo Presidente da República. Mas se não mudar de posição, o PS não se calará nem pactuará com a degenerescência dos Serviços de Informação e a sua transformação numa nova polícia secreta agindo por conta do Governo ou por conta própria. Porque tal poria em causa a própria natureza do Estado de Direito democrático.

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Orador: - Está, no segundo caso, não menos preocupante, a proposta de lei que regula a mobilização e requisição. Trata-se de uma proposta de lei que tem como objectivo completar a Lei do Serviço Militar em obediência ao enquadramento da Lei de Defesa Nacional das Forças Armadas e ao respectivo comando constitucional.
Sabe-se que, no âmbito de Defesa Nacional, exceptuando os casos do Serviço Militar e do Serviço Cívico, só são admitidas restrições ao exercício de direitos fundamentais, mediante declaração de estado de sítio e estado de emergência.
Por isso, nunca poderá haver restrições ao exercício de direitos fundamentais na lei que regula a mobilização de pessoas e requisição de bens, salvo prévia declaração de estado de sítio ou de emergência.
Ora, as matérias respeitantes a direitos, liberdades e garantias constituem reserva relativa da Assembleia da República. Portanto, a restrição de direitos respeitantes à mobilização teria que ter a forma de lei. Mas o seu enquadramento só é reconduzível a uma situação de estado de sítio ou de emergência, que é da responsabilidade absoluta da Assembleia da República.
Por isso, esta proposta de lei, que admite a mobilização e a requisição sem prévia declaração do estado de sítio ou de emergência, constitui uma flagrante violação da Constituição da República e põe em causa os direitos, liberdades e garantias fundamentais dos cidadãos.
Criaria uma situação de excepção permanente, à qual todos os cidadãos estariam vinculados, ficando na disponibilidade e dependência da vontade do Governo.
Nem nos momentos de maior exaltação revolucionária se fez uma lei assim. Seria Orwell. A porta aberta para a colectivização geral de pessoas e bens. Todos seríamos potencialmente propriedade do Estado, um simples nome ou número a mobilizar e a requisitar.
Na feliz expressão de um camarada meu, se o absurdo ou ilegalidade consagrassem esta lei, passaríamos a viver num país de militares adiados, de mobilizados na reserva e de proprietários à espera de expropriação.

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados. A desorientação do PSD provoca-lhe desvios de linguagem e de estilo. A desorientação do Governo origina outros desvios mais preocupantes.
A recusa do Primeiro-Ministro em participar na sessão solene de abertura da Universidade de Coimbra é uma ofensa a toda a Academia de Coimbra e é um facto sem precedentes.

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Orador: - É também um acto de fraqueza e de insegurança, revelador da dificuldade do Governo e do seu Primeiro-Ministro em enfrentar situações onde, além do aplauso, possa surgir também a crítica, como é próprio da democracia.

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Orador: - Como Deputado, pelo círculo de Coimbra, deixo aqui o meu protesto contra este acto que representa uma fuga do Primeiro-Ministro às suas responsabilidades políticas e uma ofensa à mais velha universidade do País.

Aplausos do PS.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 PSD desperdiçou a oportunidade histórica que lhe foi oferecida pela maioria, pela estabilidade, pelos fundos comunitários.
Temos hoje o aparelho produtivo do País gravemente afectado, a agricultura e as pescas em crise, a indústria debilitada.

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Falharam todas as reformas de fundo. Na Educação e na Saúde reinam a desordem, as contradições e a incerteza. Cresce o desemprego. Aumenta a insegurança. Portugal não só não está no pelotão da frente, como se desenvolve menos do que a média europeia. Estamos a ficar para trás.
Sem ideias, sem políticas, sem projecto, o PSD tem hoje como principal desígnio a conservação do poder pelo poder. É um partido zangado com tudo e todos, talvez consigo mesmo. Um partido desorientado, que não sabe assumir as suas responsabilidades e que não faz outra coisa senão dizer mal dos outros. Fanfarronice e má língua, eis ao que se resume hoje a prática política do partido do Governo.

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Orador: - À desorientação do PSD e aos seus excessos verbais, há que contrapor a firmeza serena de quem acredita na mudança tranquila para outra forma de governar, com outro estilo e outro conteúdo político, outra sensibilidade social e cívica, outra perspectiva histórica e cultural.

Aplausos do PS, de pé.

0 Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados João Amaral, Guilherme Silva, Silva Marques e Nuno Delerue.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

0 Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Alegre, inscrevi-me precisamente no início da sua intervenção. De facto, ela tem numerosos pontos com os quais concordo inteiramente e se não fosse uma "cabeça" que, pela conjuntura, lhe meteu eu não faria esta pergunta.
A minha pergunta tem a ver com a posição que assumiu em relação à revisão constitucional. 0 Sr. Deputado Manuel Alegre veio aqui dizer que a posição do PS é favorável à continuação da revisão constitucional - este é o sumo da sua intervenção nesse ponto.
0 que é que o PS pretende desta revisão constitucional, feita no quadro desta Assembleia da República e feita neste momento?
Sr. Deputado, considerámos, desde sempre, que esta revisão era inoportuna, além do mais por se pretender realizar perto de um acto eleitoral, num momento em que os esforços e a atenção dos partidos da oposição se deveriam concentrar na definição de uma política alternativa e no combate às políticas do Governo.
Quer, então, prosseguir uma revisão constitucional com o PSD, encontrando com ele soluções, porque não há outra maneira de a fazer senão através de votações convergentes do PSD e do PS? Quer fazê-lo num quadro em que o combate essencial era outro?
Quase que perguntava: Sr. Deputado Manuel Alegre, que sentido teria a parte fundamental da sua intervenção num quadro em que pretendesse continuar com o processo de revisão constitucional?
Aliás, temos também de perguntar ao PS e ao Sr. Deputado Manuel Alegre qual o conteúdo da revisão constitucional que quer fazer com um partido que é maioritário na Assembleia, que é maioritário na Comissão e que, de alguma forma, forçosamente, tem de ter um papel determinante no conteúdo da revisão. Quer fazer uma revisão com um partido como o PSD, cujo projecto de revisão constitucional corresponde à subversão do texto da Constituição, corresponde a atingir o núcleo duro essencial progressista da Constituição, nomeadamente no que toca à organização económica, aos direitos dos trabalhadores, aos direitos sociais, à questão do equilíbrio de poderes, que o PSD quer fazer pender mais a favor do Governo, pela centralização do Estado e pela eliminação das regiões. 15to é, afinal o que é que o PS pretende quando quer continuar com o processo de revisão constitucional? Quer ficar prisioneiro do PSD nesse processo?

Aplausos do PCP.

0 Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Alegre.

0 Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Deputado João Amaral, fui muito claro. 0 que disse é que o PS não quer ficar prisioneiro, não ficará prisioneiro nem anda a reboque do PSD ou de qualquer outro partido.
Conheço as posições do PCP a este respeito, só que me parece haver uma contradição flagrante entre estar contra a revisão constitucional neste contexto e a apresentar um projecto próprio.
No que respeita ao conteúdo ou ao que nós pretendemos, politicamente, da revisão constitucional, isso faz parte do nosso próprio projecto. 0 que é preciso é que cada um assuma claramente as suas responsabilidades porque, neste momento, não está tanto em causa saber quem é favorável mas quem é que assume a responsabilidade política do cancelamento da revisão constitucional A posição do PS é muito clara: somos pela visibilidade deste processo, somos pela transparência porque pensamos que a transparência e a abertura também fazem parte da construção de uma alternativa política.
É preciso apurar as responsabilidades, saber quem é politicamente responsável pela eventual suspensão da revisão constitucional, e essa responsabilidade política está definida e está atribuída: a posição do PCP é conhecida desde o princípio, pelo que o PSD será politicamente responsável pela interrupção da revisão constitucional.

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Deputado Manuel Alegre, isso quer dizer que também querem acabar mas não querem ter a responsabilidade!

0 Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

0 Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Deputado Manuel Alegre, também vou centrar o meu pedido de esclarecimento na única matéria relativamente nova que o seu discurso teve e que decorre da situação conjuntural relativa à revisão constitucional.
0 Sr. Deputado Almeida Santos já pôde explicar esta manhã, na Comissão Eventual para a Revisão Constitucional, exaustivamente, a posição do PS e referiu, inclusivamente, que não poderia haver estas reuniões bilaterais, este diálogo bilateral com o PSD porque consideraria isto um adultério! 15to levou o Sr. Deputado Costa Andrade a dizer: "mas que casamento é que há, do PS? É um casamento com o PCP?" E, realmente, agora, esta intervenção do Sr. Deputado João Amaral, "cheirou-me" a um simulacro de zanga de cônjuges, pelo que é capaz de ser verdade a afirmação do Sr. Deputado Costa Andrade, esta manhã: o adultério que o Sr. Deputado Almeida Santos considera

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decorrer de reuniões bilaterais com o PSD tem a ver com esse casamento, aqui confirmado.
Sr. Deputado Manuel Alegre, esta pressa e esta insistência, agora também aqui confirmada por si, de imputar ao PSD o comprometimento relativamente ao não prosseguimento dos trabalhos da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional e à não efectivação de uma revisão, é mais uma entre muitas posições completamente diversas do PS. 0 Sr. Deputado Almeida Santos, em Agosto deste ano, numa entrevista à revista Visão, quando já estavam apresentados os projectos, ou grande parte deles, designadamente o do próprio PS, diz: "Seria um acto patriótico adiar os trabalhos de revisão para depois das legislativas" - temos aqui uma primeira posição do PS. Depois, temos a posição do Engenheiro Guterres, nos Estados Gerais, em que diz: "Ou o PSD concorda com as nossas propostas em matéria de sistema eleitoral, ou nós abandonamos os trabalhos e não há revisão". E agora temos aqui a terceira, a de que o PS quer, preocupadamente, inverter o ónus da não revisão para o PSD. Gostaria de saber como é que V. Ex.ª concilia isso com as anteriores posições do seu partido, nomeadamente de altos responsáveis!
Ora, o que se passa, é esta coisa, muito clara - e, efectivamente, tenho de louvar a coerência do Sr. Deputado Almeida Santos porque ele não quer a revisão, acha patriótico que não haja revisão e, portanto, tem de negar diálogos bilaterais com o PSD! A razão é só esta: ele sabe que a revisão só se faz, como só se fez no passado, em diálogo bilateral entre os partidos, particularmente entre os dois partidos que são indispensáveis à formação dos dois terços.
Gostaria também que V Ex.ª explicasse à Câmara quais foram os segredos do passado nesses diálogos que levaram à revisão e quais os arrependimentos que o PS tem.

0 Sr. Nuno Delerue (PSD): - Muito bem dito!

0 Sr. João Amaral (PCP): - 15so, isso!

0 Orador: - Da parte do PSD, houve reuniões no passado mas não há segredos. E agora continuaria a haver reuniões e a não haver segredos! E continuaria a não haver segredos por duas razões: queríamos que, no final dessas reuniões, fossem feitos comunicados à imprensa sobre o que lá se tinha passado; e, obviamente, queríamos que fosse tudo trazido, claramente, na altura própria, à Comissão Eventual para a Revisão Constitucional. 0 que não se pode negar é esta evidência: até para uma revisão minimalista, como a que se fez para o Tratado de Maastricht, foi necessário o diálogo bilateral, desde logo, com o Engenheiro Guterres.
V. Ex.ª está a transformar o PS num grupo de arrependidos! Já o Sr. Presidente da República se declara arrependido de, quando Primeiro-Ministro, ter interferido na comunicação social, na televisão pública, de dar instruções e dar ordens - está arrependido! Já fez a auto-crítica! VV. Ex.ªs agora estão arrependidos de ter feito reuniões bilaterais para revisões constitucionais anteriores! Vamos ver quando é que o PS faz o arrependimento dos seus arrependimentos!

Aplausos do PSD.

0 Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Alegre.

0 Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Deputado Guilherme Silva, o PS é um partido muito pretendido. 0 PCP, por vezes, quer-nos empurrar para um casamento com o PSD e nós não queremos casar com o PSD! 0 PSD quer-nos empurrar para um casamento com o PCP e também não estamos na eventualidade de contrair esse matrimónio! 0 casamento do PS, nesta matéria, é com a transparência, com a clareza e com a visibilidade - esse é que é o nosso casamento.

0 Sr. Silva Marques (PSD) - Mas isso é poligamia!

0 Orador: - 0 PSD só veio falar de negociações bilaterais, que são estranhas, ambíguas e que têm em si a suspeita de negociações secretas, depois de o PS ter dito, muito claramente, que a revisão constitucional seria feita na comissão, que seria na comissão, ou não seria! 0 PSD só vem com a proposta de negociações bilaterais depois, e vem para inviabilizar a revisão constitucional, fazendo um ultimato ao PS!

0 Sr. Guilherme Silva (PSD): - 15so não é verdade!

0 Orador: - Ora, o PS não é partido que ceda a ultimatos!

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Orador: - Quanto à minha posição, devo dizer que estou muito contente porque eu sempre fui, de facto, contra os pactos a dois. Sempre fui, desde o princípio...

0 Sr. Guilherme Silva (PSD): - Já é arrependido há muito tempo!

0 Orador: - Não, não sou arrependido. Sempre tive a mesma posição nesta matéria. Estou muito contente com a posição do meu partido e felicito os meus camaradas porque penso que a construção de uma alternativa passa por esta visibilidade e por esta transparência. Pactos de regime, pactos a dois, negociações bilaterais, negociações secretas - esse é o caminho que leva à perda de credibilidade das instituições. Nós não vamos por aí! Revisão constitucional é na comissão ou não é. 0 PSD sabe disso, e ao vir agora com o ultimato é para a inviabilizar. A responsabilidade política é vossa! E, uma vez mais, perguntamos: o que é que têm a propor-nos em privado que não sejam capazes de propor em público?

Aplausos do PS.

0 Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.

0 Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Deputado Manuel Alegre, não quero deixar de referir que estou inteiramente convencido de que o Sr. Secretário de Estado da Cultura responderá, ele próprio e no momento apropriado, sem precisar de defensores. E é pena que o Sr. Deputado não aguarde essa oportunidade para que o debate tenha mais interesse e utilidade.
Relativamente à intervenção que proferiu, ouvimos desvanecidos a sua prelecção desenvolvendo um tema querido ao Sr. Presidente da República, que é o tema dos quistos! E o Sr. Deputado fez a enumeração dos malefícios dos quistos! Não vou abordar todos os quistos, o tempo é escasso, mas focarei alguns que o Sr. Deputado referiu.
Falou, relativamente à questão da revisão constitucional, no facto de pretendermos negociações secretas - o meu colega Guilherme Silva já lhe respondeu nesse ponto, não

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vou repetir o que ele disse, dir-lhe-ei apenas que, de toda a evidência (e hão-de perdoar-nos uma conclusão de observadores atentos) do intenso debate interno que, nos últimos tempos, dividiu o PS, venceu, pelo menos neste momento, a ala soarista! A ala guterrista tentou renovar o PS de forma autêntica e consequente, na lógica da bipolarização: PSD, o pólo à direita, e PS, o pólo à esquerda.

Risos do PS.

Guterres bateu-se por isso de forma persistente, mas perdeu. Venceram os frentistas, aqueles que não querem que o PCP desapareça e seja excluído de uma hipotética maioria alternativa de Governo. Venceram, pois, os soaristas! Mas repare que o Dr. Mário Soares não tem razão, Sr. Deputado Manuel Alegre!
E eu não vou repetir os nossos argumentos: os senhores sabem que nós entendemos que não só é legítimo qualquer partido fazer apelo à maioria absoluta como também que a inversa é completamente absurda - amanhã, os partidos diriam aos cidadãos «votem em nós, mas non troppo, não votem muito, senão podemos ter a maioria absoluta e isso será extremamente nocivo»!
Não quero repetir os nossos argumentos. É evidente que a maioria absoluta é legítima, é evidente que ela é útil e, sobretudo num Estado de direito como o nosso, com uma partilha de poderes que dá origem a um equilíbrio inteiramente satisfatório do exercício dos diferentes poderes.
Mas, insisto, não quero repetir os nossos argumentos. Vou invocar o depoimento de um homem suspeito de insuspeito, porque ele chega a esta conclusão na decorrência da sua experiência, e insuspeito dada a corrente política de onde ele é oriundo. Diz ele o seguinte: «atendendo à nova constituição do executivo, não estou, de facto...» (ele responde a uma pergunta que lhe é feita), «...muito satisfeito com estes primeiros meses; aliás, estes primeiros meses provaram que, de facto, é muito difícil gerir uma Câmara sem maioria absoluta». Não é nenhum social-democrata! Não é nenhum intrépido defensor do Estado laranja! É o cidadão comunista, Presidente da Câmara Municipal de Sesimbra, Ezequiel Lino!
Como vê, Sr. Deputado, outras pessoas da Constituição na parte do sistema económico estivesse à frente do Partido Socialista um homem que foi capaz de resistir a todas as pressões - e nós sabemos quantas elas foram! -, o Dr. Vítor Constâncio.

O Sr. José Magalhães (PS): - Isso é esmagador!

O Orador: - Não é esmagador, mas vou fazer fotocópia para que o Sr Deputado Manuel Alegre a leve ao ilustre pensador Dr. Mário Soares.

O Sr. José Magalhães (PS): - É um «rato». Ah, Ah, Ah!

O Orador: - Não é um «rato», é um presidente de câmara, um homem que merece o respeito de todos nós e que vem trazer ao debate dos sistemas políticos um contributo que me parece útil. E surpreendem-me essas suas gargalhadas desdenhosas para um recente colega e camarada de partido.

Aplausos do PSD.

Sr. Deputado Manuel Alegre, preciso de ser breve e, por isso, focarei outro ponto, o dos diálogos secretos e da transparência. O Sr. Deputado e líder actual do Partido Socialista, Engenheiro Guterres, infelizmente, renunciou a uma das suas principais apostas e hoje temos de concluir que foi uma felicidade, foi uma sorte para o nosso país que no momento em que se colocou a necessidade de revisão

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Nós sabemos quantas pressões ele sofreu, à esquerda e à direita, no Partido Socialista...

Protestos do PS.

... e se ele não tivesse estado à altura de resistir a todas essas pressões o nosso país não teria dado um passo em frente, um passo indispensável, no sentido da sua modernização e do seu progresso. Por isso, a nossa homenagem ao grande cidadão Vítor Constâncio.

Protestos do PS.

Srs. Deputados, quem desdenha dos vossos são os senhores e isso é muito mau sinal.

Não quero abusar do meu tempo de intervenção e por isso vos diria uma coisa. O vosso grave problema é que os socialistas deitaram fora todas as suas fundamentais referências do passado. O Estado era bom, já não presta; o Plano era óptimo, já não presta; a propriedade colectiva era boa, sobretudo os principais meios de produção, já não presta; a Internacional Socialista era boa e eu estou convencido que mesmo ela já não vos presta. Só que os senhores não têm nada para pôr em seu lugar e daí a vossa dificuldade.
O Sr. Deputado Manuel Alegre diz que os deuses enlouquecem os que estão perdidos, do que não há a menor dúvida. É por isso que o vosso estado de loucura já vai em fase adiantada.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Alegre.

O Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Silva Marques, gosto sempre muito de o ouvir, velho amigo e companheiro que foi de outras lides. Começo por lhe dizer que o Partido Socialista também pediu e pede, a maioria, como é normal por parte de um partido que aspira ao poder, mas o que nós não dizemos é que se não a tivermos vamos para casa. Nós não fazemos chantagem sobre o eleitorado.

Aplausos do PS.

Se, eventualmente, tivermos maioria relativa assumiremos as nossas responsabilidades.

Aplausos do PS.

O Sr. Deputado parece estar muito preocupado com as nossas divisões mas confunde diferença de opiniões e pluralismo com divisões. O Partido Socialista está unidíssimo, basta olhar para a nossa bancada, e nunca esteve tão unido. Se fosse a si, preocupava-me é com as divisões no Governo. Li os relatos que vêm nos jornais sobre a reunião de Catalazete e ficámos sem saber que política externa é que temos. Se é aquela que advoga, e bem, neste caso, o Ministro Dias Loureiro quando diz que temos que reforçar as nossas ligações com África e com o Brasil ou se aquela que advoga o Ministro dos Negócios Estrangei-

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ros quando diz que com o Brasil e a África nada! A lusofonia não dá votos, diz o Ministro Fernando Nogueira e, portanto, só Europa, só Europa, só Europa! Ficamos sem saber, mesmo numa matéria em que julgávamos que havia consenso no partido do Governo, que política externa é que temos.
Sr. Deputado, as divisões ou as diferenças de opiniões num partido político fazem parte da dinâmica da própria vida democrática, mas as divisões dessa natureza num partido de Governo ou num Governo são mais preocupantes porque têm consequência nos actos de administração e nos actos públicos.
E também o aconselhava a ler aquela lei de que falei porque o Sr. Deputado arrisca-se a ser expropriado, arrisca-se a ser mobilizado, e o senhor, que não foi à tropa, pode ir à tropa,...

Risos do PS.

...sem declaração do estado de sítio ou de emergência, Ou será que o Sr. Deputado Silva Marques é pelo colectivismo geral de pessoas e bens?! Olhe que nem o Pol Pot!!

Risos do PS.

Quanto à revisão constitucional, nós suspeitamos que sabemos o que nos queriam propor. Eventualmente, um pacto a dois para, através de uma engenharia eleitoral, esvaziar os outros dois partidos. 0 Partido Socialista é um partido responsável que aspira a vencer eleições mas não por processos artificiais e não alinhará jamais numa manobra que se destine, por processos artificiais, a esvaziar partidos concorrentes. Não, não o faremos. Se é essa a proposta secreta a fazer em privado, nós dizemos claramente que não.
Quanto ao Secretário de Estado da Cultura, Santana Lopes, quero apenas dizer que o sítio próprio para criticar o Governo é aqui. Eu critiquei a sua reacção, que é realmente preocupante. E nem me refiro sequer àqueles factos que, aliás, nem são muito importantes, o que é importante é o seu destempero, a forma como ele vem desafiar tudo e todos. Se calhar vai-me desafiar para a pancada! Ficava deliciado, estou com muita vontade.

Aplausos do PS.

0 Sr. Presidente: - Sr. Deputado Silva Marques, pediu a palavra para que efeito?

0 Sr. Silva Marques PSD: - Para defesa da consideração, Sr. Presidente.

0 Sr. Presidente: - Dar-lhe-ei a palavra para esse efeito após terem sido formulados todos os pedidos de esclarecimento, Sr. Deputado.
Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Delerue.

0 Sr. Nuno Delerue (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Alegre, vou-me cingir exclusivamente às considerações que fez relativas às declarações do Sr. Secretário de Estado da Cultura sobre pretensas irregularidades no Fundo de Fomento Cultural. E vou começar pôr lhe dar razão em não querer discutir, neste momento, e aqui, a questão de fundo.
Mas, sobre esta matéria, sobre as considerações que fez e as que não quis fazer, coloco-lhe duas perguntas. A primeira é esta: V. Ex.ª entende ou não que o Tribunal de Contas também está sujeito à crítica? É seu entendimento que o Tribunal de Contas ou qualquer outro órgão de soberania estará eventualmente acima da crítica?
É que, se V. Ex.ª entender que não está, a única questão que nos poderá prender não é um problema de conteúdo mas um problema de forma. E se é um problema de forma gostava que me dissesse que considerações é que faz em relação não ao Sr. Secretário de Estado da Cultura mas a um camarada seu, de partido, concretamente o Sr. Presidente da Câmara Municipal do Porto, que acusou o Tribunal de Contas de ser um quisto da democracia. Essas declarações estão gravadas e se V. Ex.ª quiser poderei fornecer-lhas.
Sr. Deputado Manuel Alegre, se é este o entendimento que teve em relação àquilo que considerou - não é a minha opinião - uma atitude menos correcta do Secretário de Estado da Cultura, gostava, com a frontalidade que lhe reconheço, que V. Ex.ª tivesse agora a coragem também de classificar uma afirmação desta contundência e desta gravidade.

Vozes do PSD: - Muito bem!

0 Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Alegre.

0 Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Delerue, suponho que não ouviu aquilo que eu disse porque não me referi aos factos que são imputados ao Sr. Secretário de Estado. E digo-lhe mais: penso até que esses factos não têm muita importância.
Evidentemente que sou de opinião que nenhum órgão está acima da crítica, mas o Governo também não está acima da crítica. Nem falei do Tribunal de Contas! E se o meu camarada Fernando Gomes fez essa declaração penso que ele queria referir-se a mudança da lei, e ele até nem é membro do Governo. É muito mais grave que um membro do Governo ponha em causa - como pôs - a justiça portuguesa quando diz "ir aos tribunais? Ficaria com os cabelos brancos!" 15so é que é gravíssimo! Foi isso que critiquei assim como o facto de ele se defender com actos cometidos pela sua antecessora, o que é uma deselegância. Foi tudo isso que critiquei. Quanto aos factos deve ser o Tribunal de Contas a pronunciar-se.
Evidentemente que tenho confiança no Tribunal de Contas. Eu não faço como, às vezes, certos membros do seu partido e do Governo que procuram subverter os outros órgãos, desestabilizá-los, porque isso inquina a democracia. E a democracia é feita de crítica mas é feita também de equilíbrio e de separação de poderes.

Aplausos do PS.

0 Sr. Presidente: - Para defesa da consideração, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Marques.

0 Sr. Silva Marques (PSD): - Sr. Presidente, é apenas para corrigir um dado relativamente aos avatares da minha vida e da minha cidadania. 0 Sr. Deputado Manuel Alegre disse que eu não fiz o serviço militar, mas foi por grave lapso.
De facto, não tinha feito o serviço militar antes do 25 de Abril porque me tinha recusado a fazer a guerra, embora isto não constitua uma crítica a quem a fez, e inclusivamente não tinha "assentado praça" visto que havia sido convocado para Penamacor quando acabei a minha licenciatura em Direito. E, tudo ponderado, entendi não "assentar pra-

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ça", mas "assentei" logo que regressei ao país a seguir ao 25 de Abril e nessa altura fui presente a uma junta militar que me deu como capaz para todo o serviço militar...

Risos.

E assim fui convocado e "assentei praça" como soldado raso no Regimento de Chaves, no Verão de 1975, escusado será dizer em pleno Verão quente e em pleno período do SUV.

Risos.

E tinha um colega meu, de Boticas, também ele soldado raso, que me perguntava: "Homem, como é que você, sendo tão velho, está aqui?"

Risos.

E eu dizia-lhe: "Meu caro, andei a passear. E ele respondeu: "C'um raio, muito você passeou!"

Risos.

Mas ainda bem que "assentei praça". 0 comandante do meu regimento, que era um esquisito revolucionário - foi o único comandante da Região Militar Norte que ficou sob as ordens do Corvacho enquanto todos os outros comandantes, em estado de rebeldia, se colocaram sob as ordens de Hugo dos Santos -, esse meu comandante, um esquisito revolucionário da época, dizia ao seu pessoal alinhado na parada antes de partirmos em esclarecimento popular no fim de semana: "Soldados!.. " - tinha ele trocado repentinamente as páginas do manual do oficial miliciano de que nós nos lembramos - " ... 0 exército não está mais ao serviço da burguesia, agora somos todos povo, todos irmãos". Mas, como aquele excesso lhe fazia vir ao de cima os interstícios de uma carreira de bom oficial do exército, levantava, cerrava o punho e dizia: "Mas, oh pá, disciplina é que tem que haver".
Sr. Deputado Manuel Alegre, fiz o serviço militar com as vantagens de ter conhecido por dentro aqueles que se bateram para que a democracia, antes e depois, vigorasse no nosso país. Esses que se bateram decerto que não se deixam desviar hoje em dia e não serão decerto as discussões de circunstância que os poderão dividir sobre a raiz da sua própria cidadania e dos seus próprios combates.
Mas este lapso relativamente ao serviço militar permite-me dizer que, sendo já naquela altura colaborante do PSD, não sofri qualquer benefício nem qualquer privilégio e muitos outros, creio que sim, safaram-se do serviço militar graças a bons padrinhos.

Aplausos do PSD.

0 Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Alegre.

0 Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Silva Marques, essa era de facto uma lacuna gravíssima na minha informação. Aliás, sempre tive muita pena de não ter o Sr. Deputado Silva Marques comigo em Mafra, mais tarde nos Açores e depois em Angola. Sempre tive uma grande pena disso. Não sabia que tinha "assentado praça" depois do 25 de Abril e só tenho pena de não ter sido comandante de pelotão dessa situação.

Risos do PS.

0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, ainda vou dar a palavra a dois Srs. Deputados para intervenções no período antes da ordem do dia.
Para o efeito, tem a palavra o Sr Deputado Gustavo Pimenta.

0 Sr. Gustavo Pimenta (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A propósito da discussão da moção de censura ao Governo, o Sr. Deputado Pacheco Pereira produziu neste Parlamento, no passado dia 20, uma intervenção a reter, por várias razões.
Aparentando dirigir-se, praticamente em exclusivo, ao partido censurante, o Sr. Deputado tornou evidente - de forma notável, aliás - que o CDS-PP se situa, cada vez mais, nas margens do sistema político vigente.
Não será de perder muito tempo com o assunto, mas apenas o necessário para expressar o espanto de ver cidadãos tão respeitáveis e respeitados, como os Srs. Deputados do CDS-PP, suportarem os ataques do seu líder aos políticos em geral e aos Deputados em particular.
Os Srs. Deputados do CDS-PP, como tantos outros militantes centristas, sabem bem que o necessário aperfeiçoamento do sistema político não passa pelos embustes do discurso do Dr. Manuel Monteiro. Mas o afirmado pelo Sr. Deputado Pacheco Pereira é notável, sobretudo, por outras e substantivas razões.
Em rigor, a sua intervenção não se dirigiu a esse virtual partido que apresentou a moção de censura. 0 discurso do Sr. Deputado para reduzir o "PP" à sua importância residual seria excessivo, seria quase inútil, rondaria a inocência, e o Sr. Deputado Pacheco Pereira não é inocente nem a sua acção, obviamente, é inútil.
0 seu pensado labor intelectual tem o superior sentido da defesa da democracia, na justa medida em que defende os seus órgãos e os seus agentes, com todos os seus defeitos e com todas as suas virtudes. Por isso, as suas palavras só noutro lado podem encontrar o destinatário perfeito.
Na verdade, os piores ataques à instituição parlamentar não são as aleivosias do Dr. Monteiro, como pretende, ou finge pretender, o Sr. Deputado Pacheco Pereira.
0 que de mais demolidor se revela contra a classe política, em particular contra a Assembleia da República, será o comportamento daqueles que, conhecendo-lhe as debilidades mas reconhecendo-lhe a indispensabilidade, usam os ditames do seu circunstancial poder para impor a arbitrariedade.
Conhece-se a estrutura clientelar do Estado que comportamentos desse tipos gera Conhece-se como os vícios de semelhante estrutura são a causa de cultura fértil para a corrupção e para o compadrio. Conhece-se como o poder assim instalado tenta impedir o funcionamento dos mecanismos que o visam controlar. Mas, conhecendo-se, há coisas que se não entendem: não se entende como é que se descaracteriza uma lei sobre a declaração do património e do rendimento dos políticos ao ponto de torná-la irrelevante, não se entende como é que se não dotam de meios adequados todos quantos têm por missão o combate à corrupção; não se entende como é que se eleva à categoria de forças de bloqueio tudo quanto deva comportar-se como instrumento de fiscalização do poder estabelecido; não se entende que haja quem recuse viabilizar as alterações constitucionais necessárias à revitalização do regime democrático.
A vertigem do poder continuado tem destes desvios, quase sempre em nome de Portugal e em nome dos portugueses, quase sempre culpando os outros pelo que não se é capaz ou não se quer fazer.

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É por isso que o destinatário real das palavras do Sr. Deputado Pacheco Pereira não é, verdadeira e especialmente, o CDS-PP. A substância da sua mensagem vai direitinha para o interior do PPD-PSD. Que o PPD-PSD tenha sabido ouvi-la.

Aplausos do PS.

0 Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

0 Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, não sei se a figura regimental que vou utilizar é um pedido de esclarecimento. A prosa que acabo de ouvir foi tão prolixa e inaudível, provavelmente em virtude de qualquer problema no som da Assembleia, que não percebi rigorosamente nada. Só ouvi falar em "Monteiro", "Deputados do CDS", "Pacheco Pereira", "artigo", etc.
Se o orador abordou qualquer coisa relacionada com a intervenção que o Sr. Deputado Pacheco Pereira fez durante o debate da moção de censura ao Governo, apresentada pelo CDS-PP e cujos excertos são hoje publicados no jornal "Diário de Notícias", quero informá-lo que a resposta será também dada nos órgãos de comunicação social. Efectivamente, como disse durante o debate, tal intervenção foi um exercício para a comunicação social, para artigos de opinião, e a resposta será dada também na comunicação social. Aquilo que V. Ex.ª disse - ou que me pareceu que V. Ex.ª disse - também foi objecto de um artigo no vespertino "A Capital", exactamente nos mesmos termos, ou seja, dizendo que a intervenção do Deputado Pacheco Pereira era mais para dentro do partido, para ser ouvida pelo Professor Cavaco Silva, do que pelo CDS-PP, e, portanto, a sua intervenção não trouxe qualquer novidade a não ser ao PSD. Foi por isso que perguntei à Mesa qual era o nome do orador, para ver coincidia com o do articulista de "A Capital".
Sr. Deputado, se está a levantar a luva, em nome dos Deputados do CDS-PP, contra o Dr. Manuel Monteiro, nós dispensamos esses favores, já que sabemos tratar dos nossos problemas dentro da família e responderemos ao Dr. Pacheco Pereira quando e onde escolhermos o terreno para o fazer.
Muito obrigado pelo favor que pretendeu prestar-nos, mas dispensamos esta generosidade.

0 Sr. Presidente: - Pare responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Gustavo Pimenta.

0 Sr. Gustavo Pimenta (PS): - Sr. Deputado Narana Coissoró, como é evidente sei que - e assumo-o - quando a mensagem não chega ao destinatário em princípio o vício está sempre no emitente, e eu assumo perfeitamente que não me tenha feito compreender pelo Sr. Deputado. Aliás, isso não era, para o caso, relevante, visto que se o Sr. Deputado entende que a forma como o seu grupo parlamentar reage ao comportamento do seu líder é a adequada, esse problema é do CDS-PP.
Porém, enquanto o Sr. Deputado pertencer a esta Assembleia e enquanto o comportamento do presidente do seu partido, com alguma sistematização, for o de atacar os políticos em geral e em particular os Deputados, não poderei deixar de manifestar o meu espanto pelo comportamento que, nessa matéria, os Srs. Deputados do CDS-PP têm tido. Foi só isso o que quis dizer.
Quanto à circunstância de a minha intervenção poder ser - e pelos vistos é - coincidente com alguns artigos publicados na comunicação social, devo dizer ao Sr. Deputado que leio muitos jornais - por acaso não leio "A Capital" - e que isso apenas significa que não estou só naquilo que penso. Ao contrário do que o Sr. Deputado possa pensar, isso reconforta-me.

Vozes do PS: - Muito bem!

0 Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Falcão.

A Sr.ª Helena Falcão (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Embora o assunto que me traz a esta tribuna verse uma matéria com forte pendor em saúde, não será apenas nesse âmbito que centrarei o objecto da minha intervenção ao propor-me falar de termalismo.
Pretendo antes, numa perspectiva mais abrangente, enquadrar este tema no contexto da política de desenvolvimento económico e social do País
0 tempo, em si intemporal, reserva à história da humanidade um ínfimo espaço, cuja dimensão não excede a indelével marca de um pequeno ponto.
Porém o Homem, reduzido à escala finita e na incessante busca de conhecer-se, carece de um perfil, onde inscreve um passado e um presente, procurando delinear o futuro num esboço que será tão fiel e aproximado da linha real, por definir, quanto maior for o rigor de análise e a riqueza de elementos colhidos no traçado já existente.
Usando a terminologia médica, direi que só será possível avaliar com critério o prognóstico de uma situação e instituir a terapêutica adequada na posse de um diagnóstico correcto, assente por sua vez, numa história e numa observação clínica precisas.
Partindo deste conceito - e apesar da escassez de minutos de que disponho -, não resisto a uma breve referência histórica, relançando alguns dados do passado e da actualidade, que sirvam de introdução à temática que pretendo abordar.
Desde os tempos mais remotos que o Homem reconhece na água, como elemento precioso e indispensável à vida, inúmeras propriedades e múltiplas aplicações.
Em certas épocas, esse reconhecimento foi levado ao exagero, prestando-se um verdadeiro culto a águas que, segundo a crença, eram panaceia para todos os males ou poderiam conferir dotes sobrenaturais de eterna juventude e beleza a quem as bebesse ou nelas se banhasse.
Não seria por mera casualidade que os templos médicos da Antiga Grécia residiam junto a nascentes de água medicinal.
Hipócrates, ao considerar a doença como um distúrbio dos humores do corpo, enfatizou a influência do meio ambiente, dos hábitos alimentares e do repouso físico e psíquico, constatando os efeitos benéficos da água, tanto em aplicação local como geral.
Esta teoria terá contribuído, decisivamente, para o abandono de lendas e de crenças, surgindo então, na base da medicação hídrica, o conhecimento empírico.
Segundo Plínio, a crenoterapia alicerçada neste conhecimento terá sido, para os romanos, a terapêutica mais importante.
Dessa civilização trazida até nós, ainda hoje podemos testemunhar no País vestígios e ruínas do que terão sido esplendorosas instalações de grandes cidades termais.
Chaves, com as famosas Aquae Flaviae e Vizela, dedicada ao deus Bormanicus, são paradigmas do que acabo de referir.
Modernamente, a credibilidade da hidroterapia assenta, sobretudo, no conhecimento científico, mercê de um estu-

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do aprofundado das características físico-químicas e minerais das águas, que veio permitir uma melhor interpretação das suas propriedades e uma mais correcta aplicação das mesmas.
0 próprio conceito de termalismo mudou. Hoje, não se confina apenas à mera fruição das águas medicinais, mas, antes, ao efeito potenciador resultante da combinação de diversos recursos naturais renováveis, coadjuvado por métodos complementares de reabilitação.
A terapêutica termal ganhou maior expressividade na Europa no fim do século passado e no início deste século.
Em consequência da II Guerra Mundial, grande número de estabelecimentos termais foram inteiramente reconstruídos e dotados de equipamento moderno.
Portugal, poupado aos bombardeamentos, não teve que renovar as instalações termais da época, edificadas, na maioria dos casos, no final do Século XIX.
Em virtude disso, sofreu uma considerável desactualização em matéria de termalismo, comparativamente a outros países europeus.
Actualmente, exceptuando algumas estâncias termais com instalações e equipamento modelares, uma boa parte delas ainda carece de obras de beneficiação de certa envergadura, não obstante o apoio que tem sido dado pelos governos do Professor Cavaco Silva, designadamente ao ter sido criada, na Presidência do Conselho de Ministros, a Comissão Nacional do Termalismo.
A frequência termal tem flutuado segundo padrões sociais. Até aos anos 40, os aquistas eram, predominantemente, da alta e da média burguesia. Porém, a moda da tez bronzeada, como novo símbolo de beleza, fez com que esta clientela passasse a preferir os benefícios da helioterapia e da talassoterapia das nossas praias.
Começa-se, no entanto, a desenhar uma relativa inversão desta tendência, pelos riscos que representa para a saúde a excessiva exposição solar.
A partir dos anos 50, é a classe trabalhadora, oriunda de um estrato social economicamente débil, que mais recorre à terapêutica termal.
Nos últimos anos, o termalismo sofreu um forte impulso, despertando maior interesse tanto ao nível da saúde como ao de outros sectores, que viram nesta actividade uma fonte de receita e uma forma de, eles mesmos, se expandirem.
0 turismo, a indústria hoteleira e a comercialização das águas de mesa, são exemplo disso.
As estâncias termais constituem lugares aprazíveis e de eleição para o homem civilizado, no tratamento ou no mero repouso do stress quotidiano, longe da poluição sonora e atmosférica das grandes urbes.
Devem, pois, ser respeitadas como espaços de reserva natural e de preservação do meio ambiente.
Portugal possui uma riqueza extraordinária em águas medicinais, quer em qualidade quer em quantidade.
Para se ter uma ideia do nosso património neste recurso natural, posso afirmar que, qualitativamente, temos águas com características tão raras que as tornam quase únicas a nível europeu.
Cito, a título de exemplo, as águas bicarbonatadas sódicas de Vidago Salus, pelo facto de poderem ser aplicadas por via parenteral.
Relativamente à quantidade, embora o número de estâncias termais em exercício não chegue a meia centena, são conhecidas, no território nacional, cerca de mil nascentes de água minero-medicinal.
Mais de três dezenas são águas quentes, com temperaturas que chegam a atingir os 73º centígrados, à emergência natural. Uma captação mais profunda das águas, além de as eximir de eventuais contaminações, garantindo a sua maior qualidade e pureza bacteriológica, permite obtê-las a uma temperatura ainda mais elevada.
Deste modo, os estabelecimentos termais de águas com altas temperaturas podem aproveitá-las como energia geotérmica no aquecimento das instalações balneares, reduzindo, assim, os seus custos de manutenção.
Importa realçar, a este respeito, as medidas de carácter inovador encetadas pelos governos do Professor Cavaco Silva, introduzindo alterações no quadro legal de recursos geológicos, em que, pela primeira vez, foi contemplada, em diploma próprio, a exploração da geotermia como recurso energético.
Seria fastidioso, para não dizer inoportuno, enumerar aqui as vastíssimas propriedades e aplicações clínicas das nossas águas.
Direi apenas que a crenoterapia está particularmente indicada em doenças crónicas, e que as águas minero-medicinais portuguesas, salvaguardando algumas excepções, têm como principal vocação as patologias reumática e músculo-esquelética, respiratória e digestiva e as afecções da pele.
Um pouco à semelhança do que já foi feito noutros países da Europa, o termalismo deve ser considerado entre nós como um importante pólo de atracção turística e um filão inesgotável de riqueza nacional.
0 seu incremento, em particular nas zonas mais interiores do País, pode constituir um excelente meio de combate à desertificação, pela criação de novos postos de trabalho a diversos níveis, promovendo a fixação de pessoas a esses locais.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Independentemente do inegável interesse do termalismo em saúde, julgo ter focado, em traços gerais, outros ângulos reveladores do enorme potencial num contexto mais vasto.
Creio também, face ao novo enquadramento legal, que estão criadas as condições propícias à expansão desta actividade.
Será, pois, uma boa aposta para o estímulo à iniciativa privada e às autarquias, como forma adequada de aproveitamento de fundos, em projectos que visem o desenvolvimento local e regional, em várias vertentes.
A concluir esta minha intervenção não posso deixar de aflorar um aspecto que tem a ver com o termalismo social.
Em 1976, o Estado, reconhecendo um espaço próprio a este tipo de terapêutica, integrou o termalismo no esquema de acção médico-social, assumindo os encargos não só referentes aos cuidados de saúde prestados nas estâncias termais, como também os subsídios de transporte, de alojamento e de alimentação.
Esta medida veio determinar uma subida em flecha da frequência termal, que culminou em 1981.
Contudo, em 1982, por despacho do então Ministro dos Assuntos Sociais, foram retirados os referidos subsídios, o que veio a lesar as camadas sociais mais desprotegidas.
Verificou-se, assim, um decréscimo significativo da frequência termal nesse ano, traduzido em menos 4622 aquistas relativamente ao ano anterior.
Escusando-me a qualquer comentário sobre esse despacho, do ponto de vista social considero-o de eficácia assaz discutível à luz de um critério estritamente economicista, se atendermos ao binómio despesa assumida com os respectivos subsídios no tratamento termal versus encargos do Estado referentes à comparticipação em medicamentos de elevado custo, instituídos em doenças crónicas, já para não falar no grau de incapacidade temporária destas afecções, bastante frequentes na nossa população activa, dando ori-

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gem a um índice de absentismo ao trabalho altamente preocupante e nocivo à economia do País.
O que acabo de referir é corroborado pelo estudo em doentes portadores de afecções crónicas que, quando submetidos a cura termal, consomem no ano subsequente menor quantidade de medicamentos e de forma mais espaçada, em virtude de as crises de agudização da sua doença serem menos frequentes e de duração mais curta.
Assim, lanço o meu apelo ao Governo, no sentido de estudar a possibilidade de revogação, total ou parcial, do aludido despacho, a fim de que sejam concedidos, pelo menos aos pensionistas e reformados, os subsídios que atrás mencionei.
Apesar do encargo decorrente desta eventual medida, minimizado, em parte, pela redução substancial no consumo de medicamentos, creio que os idosos bem merecem esse nosso esforço.
Muitos deles, ao cabo de uma existência votada ao trabalho, à família e à sociedade, vivem os seus últimos dias com parcos recursos, entregues à solidão ou em lares, verdadeiros «depósitos humanos», onde, por ironia e estranha sorte, em vez de esperança de vida passam a ter esperança de morte.
Considero, por isso, um dever cívico e de solidariedade humana, modificar, pelos meios ao nosso alcance, esse entardecer sombrio, de modo a que, chegado, enfim, o inevitável momento de transformação numa outra forma de vida, a sua hora crepuscular tenha ainda alguma cor, em belos e suaves matizes.

Aplausos do PSD e do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 17 horas e 45 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço ao Sr. Deputado Ferraz de Abreu que assuma a presidência.

Neste momento, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Ferrai de Abreu.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos iniciar a ordem do dia com a discussão da proposta de resolução n.º 64/VI - Aprova, para ratificação, o Protocolo de Adesão da República Helénica à União da Europa Ocidental.
Na sua qualidade de relator, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Geraldes.

O Sr. Luís Geraldes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Governo apresentou à Assembleia da República a proposta de resolução n.º 64/VI, que aprova, para ratificação, o Protocolo de Adesão da República Helénica à União da Europa Ocidental.
A importância da União Europeia Ocidental após a assinatura, em Maastricht, do Tratado da União Europeia, ganha uma nova dimensão como componente de defesa da União Europeia e como meio de fortalecer o pilar europeu da Aliança Atlântica.
Será certamente útil analisar certos aspectos da declaração relativa ao papel da União da Europa Ocidental e as suas relações com a União Europeia e com a Aliança Atlântica.
Os Estados membros da UEO acordam na necessidade de criar uma verdadeira identidade europeia de segurança e de defesa e de assumirem responsabilidades europeias acrescidas em matéria de Defesa. Esta identidade será progressivamente construída através de um processo gradual em fases sucessivas.
A UEO fará parte integrante do desenvolvimento da União Europeia e reforçará o seu contributo para a solidariedade na Aliança Atlântica.
Os Estados membros da UEO acordam na perspectiva, a prazo, de uma política de defesa comum, no âmbito da União Europeia, que poderá conduzir, no momento próprio, a uma defesa comum compatível com o da Aliança Atlântica
O objectivo da relação da UEO com a União Europeia consiste em erigir a União da Europa Ocidental por etapas, enquanto componente de defesa da União Europeia. Para esse efeito, a UEO está disposta a formular e a executar, a pedido da União Europeia, as decisões e as acções da União com implicações em matéria de defesa.
A República Helénica, ao aderir à UEO na sequência do convite que a União da Europa Ocidental lhe dirigiu em Novembro de 1992, constitui uma decisão coerente com a política seguida pelo país em relação à sua adesão à Comunidade Económica Europeia, decisão essa apoiada por todos os partidos políticos, tendo o Tratado de Maastricht sido ratificado pelo Parlamento da República Helénica por esmagadora maioria.
Contudo, será bom não esquecer que esta adesão da República Helénica à UEO leva consigo, para além das vantagens do alargamento, algumas inquietações. As dificuldades de carácter regional, como sendo as relações com a Turquia por causa da questão de Chipre e, mais recentemente, a dificuldade surgida em relação à Macedónia, representam inquietações de carácter permanente e que terão de ser acompanhados com bastante cuidado e delicadeza.
Finalmente, é positivo constatar que o Conselho Superior de Defesa Nacional, na sua sessão ordinária de 30 de Junho de 1994, emitiu parecer favorável, obtido por unanimidade, quanto à proposta de resolução que aprova, para ratificação, o Protocolo de Adesão da República Helénica à União da Europa Ocidental.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Finalmente, na qualidade de relator, desejo dar conhecimento à Câmara de que a proposta de resolução foi analisada na Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação e que esta considera que a mesma se encontra em condições de ser discutida em Plenário.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Cooperação.

O Sr. Secretário de Estado da Cooperação (Briosa e Gala): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A aprovação, para ratificação, do Protocolo de Adesão da República Helénica à União da Europa Ocidental (UEO), concluído em Roma a 20 de Novembro de 1992, que hoje aqui está em apreciação, é mais um passo de interesse inegável para a construção do projecto de integração europeia em que estamos empenhados.
Com efeito, não pretendendo fazer um relato de todas as vicissitudes por que a UEO passou desde a sua criação, em 17 de Março de 1948, deter-me-ia, de passagem, em particular, na fase que se inicia em 1984, com a Declaração

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de Roma, em Outubro desse ano, fase essa de revitalização e de redefinição do papel da organização.
Na verdade, na enunciação dos objectivos da UEO, feita nessa data, é posto o acento tónico na promoção da progressiva integração europeia e no aumento da contribuição europeia para o fortalecimento da Aliança Atlântica.
Por sua vez, com a Plataforma de Haia sobre Segurança Europeia, de Outubro de 1987, encerra-se um primeiro ciclo de renovação da UEO. Nela se consagraram três princípios fundamentais, que orientaram a evolução futura da organização.
Em primeiro lugar, a construção da Europa integrada permanecerá incompleta enquanto não possuir uma componente de segurança e de defesa.
Em segundo lugar, a segurança dos países europeus ocidentais só poderá ser assegurada em estreita associação com os aliados norte-americanos.
Em terceiro lugar, o empenho dos Estados membros da UEO em reforçar o pilar europeu da Aliança Atlântica.
O desmembramento do bloco soviético, com a emergência de regimes democráticos na Europa de Leste, e a reunificação da Alemanha levaram, de algum modo, a um interregno no processo de reactivação da UEO, durante o qual se negociaram as adesões de Portugal e da Espanha, em Novembro de 1988.
Encerrado o segundo alargamento, abriu-se um novo ciclo de revitalização, que culminou na Declaração de Maastricht, de Dezembro de 1991. Esta declaração tem quatro pontos fundamentais.
Primeiro: define-se o lugar a UEO na nova arquitectura europeia de segurança entre a União Europeia, de que a UEO será a componente de defesa, e a Aliança Atlântica, de que será um instrumento para o reforço do pilar europeu.
Segundo: decide-se atribuir à UEO uma capacidade operacional.
Terceiro: definem-se as modalidades para o terceiro alargamento - estatutos de membro de pleno direito, de associado e de observador.
Quarto: foi decidida a transferência do Secretariado da UEO para Bruxelas.
A reflexão sobre a formulação de uma política comum de defesa europeia é ainda actualmente feita sobre a convicção, expressa na declaração ministerial de Haia a que já me referi, de que uma Europa integrada ficará incompleta enquanto não incluir a segurança e a defesa, razão pela qual Portugal não pode deixar de apoiar a legítima pretensão da Grécia na adesão à UEO, o que é, assim, a consequência lógica da sua participação na União Europeia. Acresce que, como se disse, a UEO é também um meio para o reforço do pilar europeu da Aliança Atlântica, da qual a Grécia também é membro.
O Protocolo hoje em apreciação, que consagra a adesão da República Helénica à UEO, apenas não foi ainda assinado por Portugal e pela Holanda. Esta situação de atraso está a gerar alguma preocupação junto da Grécia, espelhada, inclusive, na imprensa de anteontem daquele país.
O início, por Portugal, da presidência da UEO, no próximo dia 1 de Janeiro, torna, assim, muito desejável uma rápida conclusão deste processo.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado José Lello, tem a palavra para uma intervenção.

O Sr. José Leio (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Num momento em que à velha ordem bipolar sucedeu um clima de incerteza e de instabilidade quanto à consistência e solidez de um equilíbrio de segurança estável e duradouro na Europa, fará sentido a procura do estreitamento de laços de solidariedade e cooperação entre países aliados que partilhem ideais comuns, propósitos concordantes e interesses convergentes.
Na verdade, assiste-se hoje à emergência de múltiplos sintomas de crise nas margens da Europa comunitária. De tais expressões de instabilidade, insegurança e conflitualidade, relevando, ao mesmo tempo, dos factores geopolíticos em presença e do ressurgimento de elementos tradicionais de antagonismo que potenciam disputas de grande intensidade e de recorte étnico, nacionalista e religioso, ressalta, igualmente, o surgimento de novos sinais de risco e contingência.
Preocupante é, assim, a manifestação de ameaças de um novo tipo, como a ambiental, a de carácter terrorista, a criminalidade organizada, a droga, ou, então, a disseminação das tecnologias de destruição massiva, do descontrolo do tráfego armamentista ou, ainda, a ameaça em que se constitui a pressão demográfica sobre a ilha de prosperidade que é a Europa e que poderá conduzir a fenómenos de rotura social e do sistema.
Em face da volubilidade da actual situação, será, pois, natural que se procure o reforço da coesão europeia no tocante aos aspectos da defesa e da segurança, de molde a optimizar os recursos disponíveis, em ordem a encontrarem-se soluções de complementaridade aos esquemas existentes.
Não estará, assim, em dúvida o papel insubstituível desempenhado pela Aliança Atlântica, que, no decurso das últimas décadas e, designadamente, durante os tempos difíceis da guerra fria, muito contribuiu para garantir um clima de paz, de tranquilidade e de segurança na zona, o que permitiria, aliás, aos europeus conseguirem, num quadro de cooperação mútua muito estreito, promover a estruturação desse espaço de progresso, desenvolvimento e de liberdade que é hoje o da União Europeia.
Ora, na decorrência desse aprofundamento de uma construção europeia, que. sem a dimensão da segurança e da defesa, ficaria inevitavelmente incompleta, o Tratado da União Europeia pressuporia a integração plena da UEO no quadro do seu próprio desenvolvimento ao atribuir-lhe a componente da preparação e execução das decisões e acções da União que venham a ter repercussões específicas no domínio da defesa.
Assim, os Estados membros da União da Europa Ocidental acordaram na assunção de responsabilidades adequadas naquele domínio, tendo em vista a criação de uma identidade europeia de segurança e de defesa coerente e efectiva.
Nestes termos, a UEO, ao integrar a União Europeia, institucionalizar-se-ia como núcleo potenciador credível de um verdadeiro pilar europeu da Aliança Atlântica, ao respeitar as obrigações decorrentes do Tratado do Atlântico Norte, reforçando, pois, os vínculos de solidariedade e coadjuvação já existentes, designadamente ao prever uma cooperação militar mais estreita complementar da Aliança Atlântica, nomeadamente nos domínios da logística, dos transportes, da formação e da vigilância estratégica.
A República Helénica, que partilha conjuntamente com o nosso país a sua dupla condição de membro, ao mesmo tempo, da União Europeia e da Aliança Atlântica, solicitou a sua adesão à UEO, pelo que lhe foi endereçado em 20 de Novembro de 1992 um convite formal para aderir à organização, num processo em tudo idêntico ao que levaria Portugal e Espanha à sua inserção nessa estrutura em Março de 1990.

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Ao assinar o protocolo de adesão à UEO, a Grécia aceitou integralmente os princípios fundamentais sobre os quais se deverão reger as relações entre os Estados membros da União, entre os quais se incluem, naturalmente, os que pressupõem a resolução pacífica dos diferendos mútuos bem como a inibição do recurso à força em tais situações. Acrescerá ainda referir o empenhamento e determinação que a Grécia tem evidenciado em prol da construção europeia.
É claro que posições assumidas pela Grécia em relação aos Balcãs, designadamente à República da Macedónia, nomeadamente o uso de veto no seio das instituições comunitárias no sentido de contrariar o respectivo reconhecimento diplomático, mais a assunção de um discurso eivado de alguma ambiguidade em relação a uma desejável aceitação da imutabilidade do actual traçado de fronteiras existente, ao que acrescem desenvolvimentos recentes no tocante à questão albanesa e ao citado Epiro do Norte bem como a alegada relutância na aplicação do embargo decretado pelas Nações Unidas à Sérvia, com a qual o povo grego partilha laços religiosos e relações tradicionais de profunda solidariedade, seriam de molde a relevar alguma preocupação sobre a eventualidade da adesão da República Helénica à UEO vir fortuitamente a potenciar factores de risco suplementares em termos de segurança,, ao invés de, como se sublinha no Protocolo de Adesão, se constituir numa etapa significativa no desenvolvimento da identidade europeia de segurança e de defesa.
Mau grado tais considerações, o facto é que a Grécia, um país cuja posição geoestratégica e de imperativa importância para a segurança europeia, é já um aliado de Portugal desde 17 de Outubro de 1951, tendo sempre cumprido cabalmente com as suas missões e deveres nesse âmbito. Desde então, a sua fidelidade ao espírito do Tratado do Atlântico Norte foi coexistindo com as atribulações do seu histórico antagonismo face à Turquia.
Por outro lado, a experiência diz-nos que, mau grado os acidentes de percurso, de que a crise cipnota terá tido, quiçá, um carácter de maior complexidade, o facto é que a sua inserção no quadro de solidariedade e cooperação da Aliança terá porventura evitado desenvolvimentos mais funestos. Ou seja, em presença da experiência acumulada com as condicionantes decorrentes dos imperativos do artigo 5.º do Tratado de Washington, teremos de ser optimistas quanto ao futuro e às perspectivas de, pese embora o artigo 5.º do Protocolo que Modifica e Completa o Tratado de Bruxelas, a atitude grega se pautar na UEO por idêntico comportamento ao assumido no seio da NATO.
Assim, o PS dá a sua concordância à ratificação do Protocolo de Adesão da República Helénica à União da Europa Ocidental.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu)- - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Geraldes.

O Sr. Luís Geraldes (PSD): - Sr. Presidenta, Srs Membros do Governo, Srs. Deputados: Na sequência da posição assumida nesta Câmara, tecerei simplesmente algumas brevíssimas considerações em relação à proposta de resolução em apreço.
É bom e digno de registar que a adesão da Grécia, ou da República Helénica, à UEO constitui, de facto, mais um passo no reforço de uma Europa cada vez melhor, ou que se quer cada vez melhor. Tudo isto porque a Grécia faz parte integrante da União Europeia, é um aliado na NATO e tem uma posição geoestratégica extremamente importante para que não possa ser tomada em consideração, com as devidas responsabilidades que, naturalmente, a Europa, a NATO e, eventualmente, a UEO, que se pretende pilar de segurança e defesa, venham a desenvolver em todo o contexto europeu.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Penso que é extremamente agradável e saudável que esta Câmara, sem tibiezas nem algumas dúvidas, venha a dar concordância à aprovação desta resolução, que a nós, sociais-democratas, muito satisfaz.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado João Amaral, tem a palavra para uma intervenção.

O Sr. João Amaral (PCP)- - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Creio que este debate ficaria mal se não fossem aqui registadas as opiniões que a Comissão de Defesa Nacional emitiu, no quadro do relatório que teve de fazer.
Assim, quero recordar, transcrevendo sem comentários, uma parte significativa desse relatório, que diz que a adesão da Grécia, além de vantagens, traz inquietações: «Em relação à NATO, a questão de Chipre que mantém vivo o conflito com a Turquia, tendo esta ocupado o Norte da Ilha em 1975; desconforto nas relações com a Albânia, causado pelo afluxo de refugiados albaneses e pela questão do estatuto da minoria grega. Nesta data, porém, a questão mais importante é a da exaltação nacionalista causada pela questão da Macedónia».
Mais à frente, depois de uma descrição minuciosa da situação existente em relação a cada um destes casos, o relatório termina dizendo o seguinte' «Uma visão institucional poderá inclinar-se no sentido de que a adesão traduz um alargamento da área de paz consolidada, e, ao mesmo tempo, um constrangimento permanente no sentido de evitar que a agressividade se agrave».
Esta parte do relatório, que é a chamada componente optimista com que o relator, o Sr. Deputado Adriano Moreira, resolveu conclui-lo, e, pelos vistos, a «fresta» por onde VV. Ex.ªs olham para um «sol radioso», o qual, creio, os desenvolvimentos que desde 22 de Junho até à data presente se verificaram na zona não permitem a mais alguém visualizar, a não ser a VV. Ex.ªs.
Creio até que fica sempre em aberto saber-se como é que, sendo esta a situação da Grécia, a República Portuguesa encara o artigo 5.º do Tratado de Bruxelas modificado, quando diz que, no caso de uma das Altas Partes Contratantes ser objecto de uma agressão armada na Europa, as outras levar-lhe-ão imediatamente, de acordo com as disposições da Carta das Nações Unidas, ajuda e assistência por todos os meios, incluindo pelos meios militares. Isto é, como é que W. Ex.º, com este ar ligeiro, aprovam esta adesão, da qual resulta, por força de uma disposição do Tratado de Bruxelas, a possibilidade de envolvimento directo de forças armadas portuguesas ou do Estado português na crise dos Balcãs, com a qual nada tem a ver, histórica ou geograficamente?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr Deputado José Lello.

O Sr. José Lello (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Amaral, V. Ex.ª fez uma pergunta e como me tinha

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pronunciado sobre essa questão nos termos em que referiu, respondo-lhe com outra pergunta.
V. Ex.ª pergunta como é possível compatibilizar uma aprovação a esta adesão, ou uma ratificação desta adesão, tendo em conta o artigo que referiu, o qual, aliás, também tinha mencionado na minha intervenção. Ora, pergunto-lhe em que medida esse preceito é mais limitativo do que o artigo 5.º do Tratado de Washington, o qual pressupõe que, em caso de agressão armada de qualquer país da Aliança, os outros aliados considerem que é um ataque à sua própria soberania? Esse é um preceito que se pode considerar redundante na actual situação, porque os países com os quais a Grécia tem mantido esse tipo de conflitualidades não são membros da Aliança Atlântica. Pior foi o problema com a Turquia, uma vez que se tratavam, efectivamente, de dois membros aliados. Portanto, a sua preocupação não faz sentido no actual quadro, sendo a Grécia, como é, um membro da Aliança Atlântica.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr Presidente (Ferraz de Abreu): - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Lello, se tivesse ouvido a sua intervenção, ter-lhe-ia feito logo uma observação em aparte, mas, como isso não aconteceu, vou fazê-la agora, em voz alta. É que o artigo 5.º do Tratado de Washington não obriga, não é vinculativo, pelo contrário, deixa à decisão política dos Estados prestarem, ou não, nas circunstâncias concretas, auxílio militar. Já o artigo 5.º do Tratado de Bruxelas, modificado e tal como existe, é de aplicação automática.
Assim, o que quero deduzir da intervenção do Sr. Deputado José Lello é o seguinte: ou não conhece esta pequena diferença ou, então, mais sensatamente, talvez considere que o artigo 5.º do Tratado de Bruxelas está escrito mas não é para cumprir, como provavelmente também não o serão muitas outras obrigações que existem.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Não havendo mais inscrições, dou por encerrado o debate relativo à proposta de resolução n.º 64/VI - Aprova, para ratificação, o Protocolo de Adesão da República Helénica à União da Europa Ocidental, que será votada à hora regimental.
Srs. Deputados, vamos dar início à apreciação da proposta de resolução n.º 65/VI - Aprova o Acordo de Cooperação em matéria de defesa entre o Governo da República Portuguesa e o Governo do Reino de Marrocos. Dado que os Srs. Deputados relatores, André Martins e Marques da Costa, não se encontram presentes, vou dar a palavra ao autor da iniciativa, o Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional.
O Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional (Figueiredo Lopes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Acordo de Cooperação em matéria de Defesa entre o Governo da República Portuguesa e o Governo do Reino de Marrocos constitui mais um passo dado pelo Governo português no caminho do aprofundamento das relações, no âmbito da defesa, com os países que se inserem na nossa área estratégica regional e, em particular, na região sul da bacia mediterrânica.
Na verdade, Marrocos é não só um Estado com quem Portugal mantém tradicionalmente boas relações mas também um dos países mais estáveis da margem sul do Mediterrâneo, numa altura em que o Magrebe enfrenta vários problemas de estabilidade e de segurança.
Assim, convictos de que o reforço da cooperação entre os dois países, tanto na área militar como nas áreas tecnológica e industrial, em matéria de defesa, irá favorecer a paz e a segurança na área, iniciaram-se, em 1988, os contactos que viriam a ser concluídos pela assinatura, em 23 de Setembro de 1993, de um Acordo de Cooperação em Matéria de Defesa.
O Acordo de Cooperação prevê a constituição de comissões mistas, que coordenarão e supervisionarão as actividades resultantes dos acordos técnicos complementares, estabelecidos ao nível das respectivas forças armadas, e que, a partir dos finais de 1994, abrangerão não só a Força Aérea mas também a Marinha de ambos os países.
Em termos concretos, o Acordo em apreço irá permitir um intercâmbio, nos mais variados campos, entre as culturas ocidental, representada por Portugal, e a magrebiana, intercâmbio esse que, na área militar, abrangerá nomeadamente as seguintes acções: a organização de visitas e colóquios, assim como a troca de delegações e de pontos de vista, no que se refere aos conceitos de organização, estratégia, táctica e logística; a preparação e execução de treino operacional de forças pertencentes às forças armadas dos respectivos países; a troca de observadores em exercícios nacionais e ainda a frequência de cursos de formação.
Indo mais longe e num âmbito mais específico, teremos ainda possibilidade de estabelecer programas comuns para a investigação, desenvolvimento e produção de materiais e de equipamentos de defesa, assim como assistência mútua, através de troca de informação técnica, tecnológica e industrial, e a utilização das respectivas capacidades para a produção, para além do desenvolvimento das trocas comerciais no âmbito dos equipamentos de defesa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para finalizar, quero realçar que, sobrepondo-se a todas estas iniciativas de carácter técnico, este intercâmbio irá proporcionar uma melhor compreensão das características de ambos os países, nas suas vertentes cultural e social, transmitidas através dos membros das respectivas forças armadas, o que, como já referi e gostaria novamente de acentuar, irá reforçar as já boas relações de amizade e de diálogo político, contribuindo significativamente para a manutenção de um clima de estabilidade e de segurança na região.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional, quero fazer duas ou três perguntas acerca deste Acordo, que, penso, serão úteis para o trabalho que vamos desenvolver neste momento.
Em primeiro lugar, Sr. Secretário de Estado, creio que seria importante que este Acordo tivesse vindo acompanhado do quadro das nossas relações com Marrocos. E quando falo do quadro das nossas relações, refiro-me ao conjunto de acordos que existem e estão em vigor, inclusivamente até a alguma informação sobre o modo como funcionam.
Em minha opinião, a forma como este Acordo está aqui a ser discutido e encarado seria um pouco estranha se aceitássemos que isso significava que tínhamos um acordo militar com Marrocos desinserido de qualquer outro tipo de

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acordo. Portanto, era determinante e decisivo, para a compreensão daquilo que se pretende, saber qual é o quadro exacto das nossas relações com Marrocos. E essa é uma questão muito importante, porque temos de saber exactamente o modo como este Acordo encaixa no conjunto das nossas relações com Marrocos.
A minha segunda pergunta tem a ver com a estratégia seguida para este tipo de acordos com países do Magrebe. Temos duas formas de encarar esta questão: ou num quadro mais geral de relacionamento com o conjunto de países do Mediterrâneo e esse será o quadro da Conferência sobre Segurança e Cooperação no Mediterrâneo, ou num quadro bilateral.
Evidentemente que o quadro multilateral, o de uma conferência sobre segurança, não exclui o bilateral. Porém, o que pergunto é o seguinte: por que é que se avança com um acordo militar com Marrocos em vez de se fazerem esforços no sentido de uma cooperação mais ampla? E essa cooperação mais ampla e não só a da Conferência sobre Segurança e Cooperação no Mediterrâneo como a do Grupo 5+5. Repito: porquê? Isto é, qual é o objectivo de isolar Marrocos neste quadro?
Para a minha terceira pergunta gostaria de obter uma resposta clara, porque creio não haver qualquer hipótese de considerar este Acordo se assim não acontecer.
Marrocos, como o Sr. Secretário de Estado disse, é um país estável, o que significa, em linguagem corrente, que é um país que tem prisões grandes. Mas além de prisões grandes, Marrocos tem também um relacionamento com outros povos da região que não é tão pacífico como isso. Nomeadamente, há uma questão grave envolvendo um território que Marrocos entende estar, neste momento, sob a sua soberania.

O Sr Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado, faça o favor de terminar.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.

Essa questão grave tem a ver - e vamos chamar as coisas pelos nomes - com a República Saauri. Ora, o que lhe pergunto muito concretamente, Sr. Secretário de Estado, é se este Acordo salvaguarda as posições que têm sido assumidas internacionalmente, nomeadamente no quadro das Nações Unidas, em relação à República Saauri.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional.

O Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional: - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Amaral, responderei apenas a uma parte da sua pergunta e pedirei ao meu colega, Secretário de Estado da Cooperação, que responda à outra, visto que a sua questão tem fundamentalmente a ver com as relações externas e não tanto especificamente com as relações de defesa.
No quadro das relações de defesa, não há dúvida de que Portugal tem vindo a desenvolver contactos frutuosos: não só com o Reino de Marrocos mas também outros países do Magrebe, nomeadamente com a Tunísia, com os quais tem já estabelecido formas de cooperação muito concretas, designadamente nos campos da formação e da organização e do intercâmbio ao nível das forças armadas.
O desenvolvimento deste Acordo bilateral é, em nossa opinião, um passo importante, porque vai contribuir para reforçar a nossa posição na área e para que tenhamos tenha, desde já, um aliado com uma posição destacada, sobretudo no papel que tem desenvolvido para a tranquilidade e a segurança daquela região
Por outro lado, é sabido que Portugal actua activamente e tem contribuído para o desenvolvimento de outros fora, nomeadamente o Grupo 5+5 e outras instâncias, onde tem dado o seu contributo e apoiado significativamente o esforço dos países do sul da Europa no sentido de estreitarem relações com o outro lado do Mediterrâneo.
No entanto, se me permite, deixo que o meu colega complete a resposta à sua questão, porque ele, provavelmente, terá mais informação a dar sobre essa matéria.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - De acordo com o solicitado pelo Sr. Secretário de Estado da Defesa Nacional, tem a palavra, se assim o entender, o Sr. Secretário de Estado da Cooperação.

O Sr. Secretário de Estado da Cooperação: - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Amaral, gostaria de dizer que este acordo bilateral de defesa com Marrocos não exclui, de modo algum, uma abordagem multilateral das relações de segurança com este país.
Efectivamente, no âmbito da própria UEO - aliás, a questão da segurança da bacia mediterrânea vai ser justamente uma das preocupações da presidência portuguesa no primeiro semestre do próximo ano - e da Aliança Atlântica, assim como da CSCE, existem iniciativas de diálogo com este país, em que participam também outros países europeus. Portanto, uma realidade não exclui a outra.
Gostaria também de anunciar-lhe que Portugal está profundamente empenhado em vários exercícios de carácter multilateral, como o do, já aqui referido, Grupo 5+5, ao qual posso acrescentar o do Fórum do Mediterrâneo, que é justamente um espaço onde vai debater-se um quadro institucional também de acompanhamento das questões de segurança e de estabilidade política no Mediterrâneo. Previsivelmente, haverá, inclusive, uma reunião no nosso país de coordenadores políticos, durante o mês de Novembro.
Como referi, consideramos que a região do Mediterrâneo e, em particular, a região do Magrebe, deve ser objecto de uma abordagem global, ou seja, também de um ponto de vista económico e social, que é, de facto, a primeira instância da defesa da estabilidade, o que estamos a fazer no âmbito da União Europeia, e também no âmbito das preocupações de estabilidade e de segurança dos diversos/ora multilaterais e não prejudicando, igualmente, o nível bilateral, que é o que estamos a fazer, hoje, aqui.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miranda Calha.

O Sr. Miranda Calha (PS): - Sr Presidente, Srs. Deputados: A Assembleia da República trata, hoje, do Acordo de Cooperação em Matéria de Defesa entre a República Portuguesa e o Reino de Marrocos.
Como o próprio texto do Acordo refere, os respectivos intervenientes reconhecem as relações de amizade existentes, consideram-se pertencentes a um mesmo espaço geográfico, que facilita a estabilidade regional, e entendem que a assunção da cooperação entre ambos favorece a paz e a segurança na região. Marrocos situa-se numa região - o denominado Magrebe - cuja importância não é por demais destacar.

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A II Guerra Mundial, enfraquecendo as potências coloniais, permitiu aos povos da África do Norte a sua ascensão à independência. Estes novos países criaram as suas próprias estruturas administrativas e procuraram construir economias capazes de acompanhar ou de se integrar nas mudanças internacionais que se operavam.
Os modelos de desenvolvimento diferenciaram-se de país para país, mas a proximidade e a evolução da comunidade europeia originou que os Estados do Magrebe procurassem estabelecer ligações institucionais e apoios para o desenvolvimento.
No entanto, a crise do Golfo e as transformações internacionais, que tiveram lugar mais recentemente, criaram sentimentos diversos com repercussão no relacionamento com a Europa.
De facto, sobressaíram problemas e desafios para esta região que têm a ver certamente com deficiências económicas e uma grande pressão demográfica, com o desenvolvimento de fenómenos de índole religiosa.
Não espantam, assim, as instabilidades sociais internas, muito embora seja nítida a evolução para o multipartidarismo, o reforço de liberdades e as preocupações face às questões relacionadas com os direitos do homem.
A Europa não tem ficado indiferente a todos estes fenómenos e várias foram as iniciativas comunitárias para a região, como disso é exemplo a política mediterrânica renovada.
Neste contexto se inscreve também a iniciativa da França, da Itália, da Espanha e de Portugal - e, mais tarde, com Malta - para, em conjunto com os países da União do Magrebe Árabe, concertarem um processo de cooperação no Mediterrâneo Ocidental.
A cooperação do Magrebe com a agora União Europeia beneficiou essencialmente países como Marrocos, Argélia e Tunísia, tendo a Líbia permanecido fora destes processos de colaboração.
Mas se a crise do Golfo levantou sentimentos diversos, com repercussões no plano económico, também é importante salientar que, no plano da segurança, aquela guerra suscitou inquietações partilhadas por países da Europa e do norte de África e Médio Oriente. Assim se justifica a proposta de criação de uma conferência, tendo em vista a segurança e cooperação mediterrânicas e englobando os países mediterrânicos das duas margens, todos os países árabes e o Irão, os países europeus, antigas repúblicas soviéticas, os Estados Unidos e o Canadá, ou seja, uma conferência seguindo de perto o modelo da Conferência de Segurança e Cooperação Europeia.
A cooperação nos planos económico e de segurança tem vindo a evoluir e a desenvolver-se entre a Europa e os países do Magrebe.
Importa, portanto, aqui salientar qual a orientação externa do Estado português em relação àquela área, questão esta que, aliás, foi, há momentos, colocada.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O contacto entre o sul da Europa e o norte de África vai mais longe do que os relacionamentos mais recentes.
Faz parte da história desta parte do Mediterrâneo. Há trechos de história desta região que são mesmo comuns aos povos que nela se situam.
Desde há muito, Portugal tem mantido com Marrocos uma aproximação e relações de amizade, que têm tido expressão numa cooperação crescente envolvendo os mais diversos campos. É natural, assim, que se estabeleça um acordo de cooperação na área da defesa, tendo em conta a importância estratégica dos dois Estados situados nas zonas de entrada no Mediterrâneo e sendo conhecida também a vontade de colaboração com a Europa que Marrocos- que, aliás, já pediu a adesão a este espaço europeu - tem vindo a desenvolver, de par com a evolução para modelos institucionais internos pluralistas- de que é exemplo a sua nova Constituição, onde se afirma o apego ao respeito dos direitos do homem, tal como são aceites universalmente - e na sequência da aceitação do plano de paz da ONU, tendo em vista a regulação pacífica do problema do Sanara Ocidental, para que a própria Resolução n.º 809 do Conselho de Segurança daquela organização aponta.
Pressupomos ainda que Marrocos se manterá fiel à doutrina expressa por sua Majestade o Rei Hassan II no tratamento da questão das praças espanholas de Ceuta e de Melilha.
Sr. Presidente, Srs. Deputados Comungando de um espaço geográfico comum, com uma longa história na região que muitas vezes foi comum, com uma procura constante de estreitamento de relações, situando-se, como já foi referido, à entrada do Mediterrâneo e com uma ligação ao Atlântico, a cooperação em termos de segurança nasce quase como natural e óbvia.
O acordo firmado, ao qual damos o nosso apoio, estabelece bases de cooperação tanto na área militar como nas áreas tecnológicas e industriais em matéria de defesa.
Ao aproximarem-se, através de mais este meio de colaboração, os nossos países cimentam a amizade entre si e favorecem a paz e a segurança nesta região, ou seja, o espaço geográfico onde se situam Portugal e Marrocos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu)' - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Adérito Campos.

O Sr. Adérito Campos (PSD):- Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs Deputados: Submete o Governo à apreciação da Assembleia da República a proposta de resolução n.º 65/VI - Aprova o Acordo de Cooperação em Matéria de Defesa entre o Governo da República Portuguesa e o Governo do Reino de Marrocos.
Os pressupostos deste acordo assentam na vontade de consolidação e desenvolvimento das relações de amizade entre Portugal e Marrocos; no interesse e vantagens recíprocas de compreensão e colaboração mútuas que facilitem a estabilidade na região; na convicção de que a cooperação entre os dois países, quer na área militar quer nas áreas tecnológicas e industriais em matéria de defesa, favorece a paz e a segurança no espaço geográfico em que os dois países se integram.
Ao longo dos séculos, de muitos séculos, se vêm desenvolvendo as relações entre Portugal e Marrocos. A história mostra-nos quantas inúmeras vezes os caminhos dos dois povos se entrecruzaram e as marcas que esse relacionamento deixou, e continua a deixar, são por demais evidentes. Países próximos, partilhando o mesmo espaço geográfico, com alguns interesses geoestratégicos comuns, ambos percebem a sua enorme importância para a segurança da entrada do Mediterrâneo e a sua imprescindibilidade para, em tarefa colectiva mais vasta, ajudarem a definir todo um quadro de cooperação e colaboração entre a União Europeia e os países do Magrebe.
A complexidade que caracteriza esta região, na qual sempre aconteceram múltiplos factores de instabilidade política e social, com particular incidência nos últimos tempos, deve conduzir a que se reforcem os meios daquelas cooperação e colaboração capazes de permitirem um maior equilíbrio no desenvolvimento dos dois lados do mar

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Mediterrâneo e, consequentemente, um desejável e duradoiro desanuviamento de situações político-sociais explosivas.
Do nosso ponto de vista, do ponto de vista de Portugal, a criação das mais largas condições de estabilidade, da paz e de segurança na região e de enorme importância, dado o nosso especial posicionamento de proximidade com Marrocos. E não só proximidade na perspectiva do espaço continental, como também na da Região Autónoma da Madeira, que dista apenas a quatro centenas de quilómetros da costa marroquina.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O plurissecular relacionamento histórico entre os dois países, para além das razões de ordem geoestratégica já referidas, é simultaneamente mais um contributo e uma evidência do peso recíproco de cada um deles na determinação de factores de estabilidade regional, bem como na definição de formas de cooperação entre si e entre os espaços políticos e económicos mais latos que cada um deles integra: a União Europeia e o Magrebe.
E se assim é quanto à política e à economia, por todas as razões se compreende que assim seja também quanto às questões de defesa. Por isso mesmo, o acordo que estamos agora a apreciar é bem-vindo.
Este acordo de cooperação entre Portugal e Marrocos consta de 10 artigos e define um conjunto de formas de cooperação em matéria de defesa Cooperação que, para além dos aspectos estritamente militares, trata objectivos tão relevantes como a investigação, o desenvolvimento, a produção de material e equipamento de defesa, bem como a promoção da assistência mútua, através da troca de informação técnica, tecnológica e industrial e a utilização das respectivas capacidades científicas, técnicas e industriais para o desenvolvimento, a produção e as trocas comerciais de materiais e equipamentos de defesa destinados a satisfazer as necessidades dos dois países.
É possível a participação nesta cooperação de um país terceiro, estando contudo sujeita a acordo prévio das duas partes, nos termos do artigo 3.º. Os artigos subsequentes revelam os meios para atingir os objectivos propostos, enquanto que o artigo 7.º prevê a criação de uma comissão mista, presidida pelos ministros encarregados da defesa ou seus representantes, tendo em vista a boa execução das disposições do acordo. Este será válido por cinco anos, tacitamente renovável por períodos de dois anos, podendo ser denunciado, por escrito, por qualquer das partes.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Porque estamos perante um acordo com inequívoca importância, acordo que assegura e responde aos interesses nacionais, potenciador de condições de estabilidade, paz e segurança na região, no respeito e em cumprimento de um relacionamento histórico, que se pretende cada vez mais sólido, o Grupo Parlamentar do PSD vai votar favoravelmente a proposta de resolução n.º 65/VI em discussão.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, na minha intervenção, pedi aos membros do Governo presentes uma informação, que, segundo creio, será fácil de dar, sobre o conjunto de acordos que existem entre Portugal e Marrocos. A pergunta concreta que lhes coloquei foi: «existem acordos em outras áreas? Se existem, quais são?» Portanto, pretendia saber se este acordo é isolado ou se, como penso, se insere num conjunto de acordos com Marrocos.
Uma segunda questão, para a qual peço a atenção dos Srs. Secretários de Estado, refere-se à questão por mim colocada e, depois, também pelo Sr. Presidente da Comissão de Defesa, no sentido de ser esclarecido sobre a forma como este acordo militar vai funcionar no que toca às relações com a República Sarauí, isto é, sobre a aplicação das resoluções do Conselho de Segurança das Nações Unidas que têm em vista essa área do Magrebe. A minha pergunta é muito simples: este acordo ressalva a integral aplicação das resoluções das Nações Unidas, contemplando assim os legítimos direitos do povo da República Sarauí?
Agradecia a resposta a estas perguntas, porque ela determinará a nossa posição em relação a este acordo.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Cooperação.

O Sr. Secretário de Estado da Cooperação: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Respondendo ao Sr. Deputado João Amaral, gostaria de referir que este acordo de cooperação em matéria de defesa não e, de facto, mesmo com Marrocos, um acto político e diplomático isolado, ele é mais uma peça importante no edifício de cooperação que temos com este país, que muito prezamos, entre as quais podemos citar o acordo celebrado por ocasião da realização da I Cimeira Luso-Marroquina, o Tratado de Amizade, de Boa Vizinhança e de Cooperação.
Há mais acordos em outras áreas específicas de cooperação que estão, do ponto de vista económico, a seguir o seu curso. Não venho preparado para lhe dar uma lista exaustiva, mas posso referir-lhe que, por exemplo, no domínio das pescas, está a decorrer uma cooperação muito interessante.
Quanto à questão mais específica que me coloca, do ponto de vista diplomático, gostava de dizer-lhe que, sem prejuízo da aplicação deste acordo, Portugal pauta a sua conduta em matéria de política externa pela estrita observância das resoluções aplicáveis das Nações Unidas.

Aplausos do PSD.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para pedir esclarecimentos.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Cooperação, a formulação usada foi «sem prejuízo deste acordo, Portugal respeita as resoluções». O que é que isto quer dizer, Sr. Secretário de Estado? Isto quer dizer que o acordo prevalece sobre as resoluções? É que às vezes a oralidade pode trair as formulações e, portanto, como admito isso, talvez o Sr Secretário queira corrigir a forma utilizada, para que não fique registada nesses termos.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Cooperação.

O Sr. Secretário de Estado da Cooperação: - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Amaral, naturalmente que

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as resoluções das Nações Unidas têm uma força vinculativa obrigatória e geral e é em conformidade com o Direito Internacional que nós próprios celebramos acordos bilaterais com outros países.

O Sr. Miranda Calha (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Tem a palavra para o efeito.

O Sr. Miranda Calha (PS): - Sr. Presidente, foi aqui perguntado se havia uma percepção clara em relação ao encaminhamento das resoluções do Conselho de Segurança da ONU, neste caso concreto a Resolução n.º 809, e eu próprio também perguntei se havia uma percepção em relação à doutrina expressa por Sua Majestade o Rei Hassam II no tratamento da questão das praças espanholas de Ceuta e Melilha. Ora isto, em matéria de defesa, é da maior sensibilidade e importância; por isso, pedia-lhe que veiculasse junto dos responsáveis governamentais a necessidade de nos ser prestado um esclarecimento mais claro e aprofundado em relação a esta matéria, que não pode ser vista de maneira ligeira.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado, a Mesa registou a observação que acaba de fazer e, se ninguém deseja interpelar a Mesa também sobre esta matéria, dou por encerrado o debate desta proposta de resolução e passamos imediatamente ao período de votações.
Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de um parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.

O Sr. Secretário (João Salgado): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Tribunal Judicial da Comarca de Baião, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de não autorizar o Sr. Deputado Alberto Araújo (PSD) a depor, como testemunha, num processo que se encontra pendente naquele tribunal.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se as ausências do PSN e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Luís Fazenda.

Srs. Deputados, vamos passar à votação de um requerimento da Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar para apreciação do processo de privatização do Banco Totta & Açores em que solicita a concessão de um prazo adicional de 30 dias, para efeito de elaboração, discussão e votação do relatório final e, eventualmente, de projecto de resolução, de acordo com o estipulado no artigo 11.º, n.º 2, da Lei n.º 5/93, de 1 de Março.
Está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se as ausências do PSN e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Luís Fazenda.

Constitutivo do Fundo para o Desenvolvimento dos Povos Indígenas da América Latina e Caraíbas.

Submetido à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se as ausências do PSN e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Luís Fazenda.

Srs. Deputados, vamos passar à votação da proposta de resolução n.º 74/V1 - Aprova o Acordo de Supressão de Vistos entre a República Portuguesa e a República da Eslovénia.

Submetido à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se as ausências do PSN e dos Deputados independentes João Corregedor da Fonseca e Luís Fazenda.

Srs. Deputados, vamos passar à votação da proposta de resolução n.º 64/VI - Aprova, para ratificação, o Protocolo de Adesão da República Helénica à União da Europa Ocidental.

Submetido à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PS, do CDS-PP e de Os Verdes e votos contra do PCP.

Srs. Deputados, vamos passar à votação da proposta de resolução n.º 65/VI - Aprova o Acordo de Cooperação em Matéria de Defesa entre o Governo da República Portuguesa e o Governo do Remo de Marrocos.

Submetido à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PS e do CDS-PP e abstenções do PCP e de Os Verdes.

Srs. Deputados, por consenso, vamos entrar na discussão dos projectos de deliberação n.ºs 101/VI- A Assembleia da República delibera o cancelamento do processo de revisão constitucional, dissolvendo-se em consequência a respectiva Comissão Eventual (PCP) e 102/VI- Sobre a suspensão do prazo dos trabalhos da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional (PSD), que serão votados no final da discussão. Cada grupo parlamentar terá dois minutos para se pronunciar.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Queiró.

O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para o CDS-PP, o processo de revisão constitucional é importante, porque permite desideologizar e desconstitucionalizar matérias que já não devem caber em constituições modernas e não programáticas, abrindo as portas a uma importante revisão, ou reforma, do sistema político. Por isso, estamos numa posição contrária à do PCP, que propõe o cancelamento do processo de revisão, o que votaremos contra.
O PS e o PSD estão, em questões processuais, envolvidos em diferenças, como, por exemplo, acerca do prazo e outras, que não nos dizem respeito e que esperamos ver ultrapassadas, para que o processo de revisão constitucional se possa concluir com sucesso, com êxito, como necessita o País e o povo português.
Logo, no que toca ao projecto de deliberação apresentado pelo PSD, vamos abster-nos com essa esperança.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.
Srs. Deputados, vamos passar à votação da proposta de resolução n.º 72/VI - Aprova, para ratificação, o Acordo.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PCP entende que este processo de revisão cons-

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titucional é inoportuno, desnecessário, politicamente ilegítimo e até perigoso para o regime democrático constitucionalmente consagrado, pelo que entendemos, desde o início, que ele não deve prosseguir.
A proposta política do PCP é a de que o processo de revisão constitucional seja cancelado e que, por isso, a respectiva comissão eventual seja dissolvida. De facto, não faz qualquer sentido prosseguir um processo de revisão constitucional num momento em que a questão central da vida política está já centrada na alternativa política ao Governo do PSD. Não faz qualquer sentido prosseguir, um processo de revisão constitucional onde, forçosamente, o PS tem de dar uma mão ao PSD, porque toda e qualquer proposta de alteração à Constituição tinha de ser, forçosamente, repito, aprovada pelos dois partidos, o que significa, inelutavelmente, a necessidade de haver um entendimento. E é por isso, num quadro como este, que esta revisão é perigosa e desnecessária, já que não há qualquer questão urgente que implique a sua elaboração.
Ela é também politicamente ilegítima, porque, não tendo sido objecto de debate político na altura da constituição desta Assembleia, aquando das eleições de 1991, não faz qualquer sentido encetar agora, à revelia de um debate com o País, um processo de revisão constitucional.
Assim, a nossa proposta é no sentido de haver um cancelamento, pois pensamos ser a proposta exigível democraticamente.
A proposta apresentada pelo PSD, de suspensão dos trabalhos da comissão, tem duas componentes: é materialmente a suspensão, mas, por sua vez, envolve também uma operação de chantagem política, totalmente inadmissível. O PSD faz ao PS, digamos, o "canto da sereia" e tenta, com uma operação de chantagem, obrigar o PS a uma negociação. Portanto, a proposta do PSD é, nesta componente, inadmissível, mas também é, simultaneamente, do ponto de vista material, simplesmente a suspensão dos trabalhos, que, por serem injustificados, não devem prosseguir. É dentro destas balizas que definiremos a nossa posição relativamente à proposta do PSD, se chegar a ser votada.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado Guilherme Silva,...

Pausa.

Srs. Deputados, têm de concordar que a Mesa tem, na realidade, de dar a palavra de acordo com as inscrições. Evidentemente que a norma é a de dar a palavra ao proponente no início do debate; simplesmente, se o proponente não a pede, a Mesa tem de a dar a quem se inscreve.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Faça favor.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, não quero prolongar este incidente, mas gostaria de dizer que, precisamente como o Sr. Presidente acabou de dizer, é norma dar a palavra em primeiro lugar a um Deputado do partido proponente. Era isso que a Mesa devia de ter feito, ou seja, dar a palavra a um Deputado do partido proponente.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado Octávio Teixeira, o Deputado do partido proponente também pode informar a Mesa desse desejo, porque, apesar de ter apresentado uma proposta, pode não querer usar da palavra.

O Sr. João Amaral (PCP) - Mas o partido proponente quer falar!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu) - Faça favor.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, é apenas para registar a autocrítica do Sr. Deputado Octávio Teixeira, já que, tanto quanto percebi, o PCP é proponente de um projecto de deliberação em debate e quem usou da palavra em primeiro lugar foi o Sr. Deputado Manuel Queiró.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - O Sr. Deputado Guilherme Silva também é proponente e neste momento não quer usar da palavra, prefere que seja um outro Sr. Deputado a intervir.
Como é que a Mesa se há-de entender no meio de tudo isto?!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, peço desculpa, a razão por que estava há pouco a pedir que um outro Deputado de um outro partido usasse da palavra era por estar impedido de o fazer, pois estava a falar ao telefone, com um membro do Governo, de um assunto urgente.

O Sr. Alberto Martins (PS): - Se estava a receber instruções...

O Sr. João Amaral (PCP): - Se estava a falar com um membro do Governo, está tudo explicado!

O Orador: - Foi essa e só essa a razão. Mas neste momento já estou disponível para usar da palavra, como proponente do projecto de deliberação apresentado pelo PSD.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, este incidente revela a dificuldade do PS falar sobre esta matéria, porquanto, se tivesse atendido à minha dificuldade de momento, usaria da palavra para falar sobre estes projectos de deliberação.
Esta questão foi já tratada esta manhã, na Comissão Eventual para a Revisão Constitucional, e é conhecida a posição do PSD e o seu empenhamento neste processo, empenhamento esse que foi levado ao ponto de ter dirigido a todos os grupos parlamentares uma proposta de diálogo bilateral, de forma a podermos aproximar posições e facilitar o trabalho da Comissão. Fizemo-lo de uma forma alargada, repito, a todos os grupos parlamentares, mas só o Grupo Parlamentar do CDS-PP respondeu afirmativamente.
Ora, visto o PS ser um partido indispensável à formação dos 2/3 necessários à viabilização de qualquer revisão constitucional, entendeu o PSD insistir junto do PS no sentido de obter esse diálogo. Não era uma situação inédita, bem pelo contrário, a nossa história das revisões constitucionais, desde a Constituição de 1976, confirma que só dessa forma tem sido possível levar por diante os processos de revisão, o que não é, de modo algum, uma subalternização

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da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional, bem pelo contrário, e as actas das comissões anteriores confirmam-no. Há um trabalho de aproximação que facilita depois o trabalho da comissão de revisão e que tem a ver com uma coisa muito simples: a vontade, ou não, de fazer a revisão.
Percebemos perfeitamente a recusa de diálogo do PS, pois cia afere-se e assenta na posição, que é pública, do Dr. Almeida Santos, que já em Agosto dizia ser patriótico não fazer esta revisão e adiá-la para depois das eleições legislativas; o Sr. Eng.º António Guterres foi no mesmo sentido, nos Estados Gerais, ao dizer: "ou o PSD está de acordo com a nossa proposta relativamente às questões da revisão, designadamente quanto ao sistema eleitoral, ou abandonamos os trabalhos da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional".
Pensamos que tem de haver o mínimo de dignidade parlamentar, pelo que nunca ameaçámos abandonar a Comissão. Nesta circunstância, face à fixação de um prazo para a conclusão destes trabalhos, para nós, só há uma forma de dignificar a Comissão e a Assembleia: suspender os trabalhos até que haja sinais dos demais grupos parlamentares, e em particular do PS, para uma abertura que conduza à sua efectiva viabilização e não ao "faz de conta" em que o PS é especialista.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Martins.

O Sr. Silva Marques (PSD): - O Sr. Deputado vai justificar-se! Os senhores puseram-se de joelhos perante as imposições do PCP, que os impediu de fazer a revisão constitucional!

O Sr. Alberto Martins (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Silva Marques, Sr. Deputado Guilherme Silva: Compreendemos a incomodidade do PSD nesta matéria, que é, sobretudo, a de ser a parte principal na execução de acordes finais de uma marcha fúnebre sobre a revisão constitucional. E o PSD está a fazer estes acordes finais da marcha fúnebre sobre a revisão constitucional no pior dos registos, que é o de uma fuga em dó menor. O PSD está a fugir à revisão constitucional.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Está a auto-excluir-se do processo de revisão constitucional, porque, fundamentalmente, não quer, não está preparado, como diz no seu projecto, para dar respostas concretas às grandes questões que se encontram sobre a mesa.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Pergunto, o PSD quer ou não a livre participação dos cidadãos em todos os actos eleitorais? Não quer! O PSD quer ou não um referendo nacional, alargado e participado?

O Sr. Silva Marques (PSD): - Depende!

O Orador: - Não quer! O PSD quer ou não controlos interorgânicos e maior participação dos órgãos de soberania? Não quer! O PSD quer ou não um reforço da garantia dos direitos dos cidadãos? Parece não querer!
O PSD não tem respostas para estas questões ou não as quer dar, por isso deseja encerrar o processo de revisão constitucional.
Pela nossa parte, o que o PSD está a fazer, significa, de forma definitiva, radical e precisa, que não quer aperfeiçoar o sistema político. Mais: o PSD aceitou recuar naquilo que tinha sido até agora uma grande bandeira sua, que é o sistema eleitoral.
O PSD não tem qualquer resposta para o sistema eleitoral, para a participação dos cidadãos, razão porque foge, desta forma lamentável, do processo de revisão. Pela nossa parte, iremos promover, no futuro, um processo de revisão, com uma nova legitimação democrática, uma nova alteração da relação de forças entre maioria e minoria, uma nova Câmara, e é isto o que o PSD não quer mas é isto o que o PS vai obrigar o PSD a fazer.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes). - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este processo de revisão foi precipitado e não é, claramente - e dissemo-lo desde o início -, um processo de revisão reclamado pelos cidadãos. É feito em nome dos cidadãos, mas deles não recebeu qualquer legitimidade de mandato porque a questão da revisão constitucional esteve ausente do debate na campanha eleitoral há quatro anos. É feito em nome dos cidadãos, mas não lhes dá espaço para terem, através das suas organizações e dos seus movimentos autónomos, a possibilidade de se fazerem ouvir num processo que era suposto ser aberto, discutido, vivido e participado e que o horizonte temporal imposto, de três meses, claramente não permite.
Por isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o problema que se coloca hoje, aqui e agora é o da gestão das hipocrisias e do desconforto entre os vários partidos que queriam esta revisão e os que, a querendo, a precipitaram. Portanto, trata-se de saber se se quer gerir a hipocrisia, o "faz de conta", continuando, deste modo, a descredibilizar o Parlamento, ocupando-o ficticiamente numa revisão que, todos sabem, não vai acontecer, porque não é possível até Dezembro, ou se o Governo assume com dignidade, clareza e frontalmente perante os cidadãos que, efectivamente, desencadeou um processo errado, que não tem condições para o levar por diante e tem de o suspender, porque, por ser um ano de eleições, não há condições nem : nada justifica que ele vá por diante.
Portanto, trata-se de saber se se suspende ou se põe cobro à hipocrisia. Nós defendemos a solução do "pôr cobro à hipocrisia".

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu)- - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, vamos votar o projecto de deliberação n.º 101/VI- A Assembleia da República delibera o cancelamento do processo de revisão constitucional, dissolvendo em consequência a respectiva Comissão Eventual (PCP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, do PS e do CDS-PP e votos a favor do PCP e de Os Verdes.

Vamos votar o projecto de deliberação n.º 102/VI- Sobre a suspensão do prazo dos trabalhos da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional (PSD).

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Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, votos contra do PS e abstenções do PCP, do CDS-PP e de Os Verdes.

Srs. Deputados, vamos iniciar a discussão da proposta de resolução n º 73/VI- Aprova, para ratificação, o Acordo Europeu que Cria uma Associação entre as Comunidades Europeias e os seus Estados Membros, por um lado, e a República da Bulgária, por outro, e respectivos Protocolos e Anexos, bem como a Acta Final com as Declarações.
Para uma intervenção, tem a palavra, na qualidade de relator, o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Os aspectos, essenciais que constam do relatório aprovado na Comissão de Assuntos Europeus referem-se a este acordo que, cria uma associação entre as Comunidades Europeias e os seus Estados membros, por um lado, e a República da Bulgária, por outro, e reconhece o interesse em permitir a participação da Bulgária no processo de integração europeia bem como o carácter fundamental das mudanças democráticas nesse país, destinadas a instaurar um novo sistema político e económico baseado, nomeadamente, no pluralismo político.
A associação vem estabelecer gradualmente uma zona de comercio livre entre a Comunidade e a Bulgária, criando, também, no plano institucional, o conselho de associação que, em tempo oportuno, reunirá para decidir a passagem para a segunda fase deste processo.
A nível parlamentar, o diálogo político previsto no Acordo "realizar-se-á no âmbito do Comité Parlamentar da Associação"
As questões relativas à circulação de trabalhadores, ao direito de estabelecimento e à prestação de serviços entre a Comunidade e a Bulgária, bem como as disposições relativas à circulação de capitais e a aproximação de legislações são também detalhadamente apreciadas no Acordo, nomeadamente nos Títulos IV e V.
A cooperação económica tem como objectivo contribuir para o desenvolvimento e o potencial crescimento da Bulgária, abrangendo os domínios industrial e agrícola, e prevendo-se também a cooperação nos domínios da ciência e tecnologia, da educação e formação (incluindo o reconhecimento mútuo de diplomas), da energia, do ambiente, dos transportes e das telecomunicações, da saúde, do emprego, da segurança social e da luta contra a droga, entre outros.
A cooperação cultural e Financeira é objecto dos Títulos VII e VIII.
Um conjunto de anexos estabelece, nomeadamente, a listagem de produtos industriais e agrícolas excepcionados e temporariamente excluídos no Acordo, concessões pautais comunitárias e búlgaras e outros actos de carácter jurídico, nomeadamente, em matéria de propriedade imobiliária.
O conjunto destes processos, no âmbito dos quais se estabelece a cooperação entre a Comunidade Europeia e a Bulgária, é simultâneo com o detalhe e a flexibilidade que permitirão um ajustamento e uma evolução progressiva da Bulgária a caminho do espaço comunitário, conjugado com a cooperação em domínios tão relevantes como os focados.
Por outro lado, e a terminar, este acordo de associação insere-se num conjunto de acordos similares, alguns dos quais já ratificados por esta Assembleia, dizendo respeito, essencialmente, a associações de Estados da Europa Central e Oriental à Comunidade Europeia, que, enquanto instrumentos reguladores desse processo nos domínios económicos e em vastas áreas que integram, aparecem como
satisfazendo o essencial dos objectivos visados. É também o caso deste.
A particular situação da Bulgária, nos planos político e económico, merece, assim, da Comunidade, uma atenção especial à evolução da cooperação concretizada neste acordo. Da sua análise, permitimo-nos concluir que integra as regras genericamente adequadas para a evolução búlgara na aproximação económica, cultural e política ao espaço comunitário europeu e às suas instituições.
A Comissão concluiu com o seguinte parecer: a Comissão Parlamentar de Assuntos Europeus, tendo presente o acordo de associação e o relatório apresentado, é de parecer que este mesmo acordo pode ser apreciado em Plenário, nada obstando à sua aprovação para ratificação, a qual, aliás, se recomenda.

Vozes do PSD e do PS:- Muito bem!

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Cooperação.
O Sr. Secretário de Estado da Cooperação:

Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados Na sequência das grandes transformações verificadas nos Países da Europa Central e Oriental (PECO), nos finais da década de 80, impunha-se à Comunidade Europeia dar uma resposta cabal aos desafios e solicitações decorrentes desse processo tendo, nomeadamente, em conta o interesse manifestado pelos Estados em causa em se incorporarem no processo de integração europeia e o carácter determinante do apoio comunitário para o sucesso da reestruturação económica e das reformas políticas empreendidas pelos novos regimes instituídos na região.
O relacionamento bilateral entre a Comunidade e este grupo de países assumiu uma primeira forma contratual através da celebração de acordos de comércio e de cooperação. O primeiro destes acordos foi assinado com a Hungria, o país mais avançado no processo de reformas, em Setembro de 1988, seguindo-se, em 1989 e em 1990, os outros principais países da região. Já em 1992, precisamente durante a Presidência portuguesa, foram negociados e assinados os acordos com os três Estados bálticos e com a Albânia.
Este modelo contratual, de âmbito limitado e com carácter não preferencial, serviu principalmente para formalizar a normalização das relações entre a Comunidade e os seus vizinhos de Leste depois de décadas de divisão política, ideológica e económica e foi, desde cedo, considerado insuficiente como resposta ao desejo dos PECO de estabelecerem com os Doze um relacionamento especial, reflectindo a proximidade geográfica, os valores comuns e uma interdependência acrescida. A Comunidade não podia deixar de responder a este anseio, em solidariedade com as transformações democráticas em curso, e também no seu próprio interesse, tanto no plano económico como, principalmente, no da segurança e estabilidade da Europa.
O Conselho Europeu de Estrasburgo, em 8 e 9 de Setembro de 1989, concluiu que a Comunidade deveria "prosseguir o seu exame das formas apropriadas de associação com os países que estão na via das reformas económicas e políticas", na sequência do que se desenvolveu um processo de reflexão interna conducente à definição do modelo de acordo de associação a aplicar com estes países e que recebeu a designação de Acordo Europeu, para sublinhar a importância da iniciativa política que consubstanciava.
Os acordos europeus obedecem a um claro condicionalismo, reservando-se aos países que dêem provas concre-

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tas de respeito pelos direitos humanos e pelo Estado de direito, de aplicação da regra do pluripartidarismo, de organização de eleições livres e democráticas e de liberalização da sua economia com vista à instituição de uma economia de mercado.
Estes acordos têm como objectivos promover a integração económica e a aproximação política entre as partes e apoiar os esforços de reestruturação económica e de reforma política dos parceiros de Leste através da criação progressiva de uma zona de comércio livre e da instituição de mecanismos adequados de diálogo político e de cooperação económica, financeira e cultural.
Em 18 de Dezembro de 1990, foram aprovadas pelo Conselho de Ministros das Comunidades as primeiras directivas de negociação para acordos deste tipo simultaneamente para a Hungria, a Polónia e a Checoslováquia. Os respectivos acordos viriam a ser assinados, também simultaneamente, em finais de Dezembro de 1991.
As directivas de negociação para um acordo europeu com a Bulgária foram aprovadas pelo Conselho das Comunidades em 11 de Maio de 1992, durante a presidência portuguesa, simultaneamente com as directivas para a Roménia, tendo os acordos europeus com estes países sido assinados, respectivamente, em l de Fevereiro e 8 de Março de 1993.
Atendendo à morosidade inerente aos processos de ratificação pelos Doze, as disposições comerciais e matérias conexas, de competência exclusivamente comunitária, foram objecto de acordos provisórios entre a Comunidade e os dois países, respectivamente, e que são aplicados até à entrada em vigor dos acordos europeus. O Acordo Provisório com a Roménia entrou em vigor em Maio de 1993 e o Acordo Provisório com a Bulgária entrou em vigor no dia 31 de Dezembro de 1993.
Sr. Presidente, Srs Deputados: O presente acordo, que tem uma vigência ilimitada, institui uma associação entre as Comunidades Europeias e os seus Estados membros, por um lado, e a Bulgária, por outro, e compreende a institucionalização do diálogo político entre as partes; o estabelecimento gradual de uma zona de comércio livre entre estas, prevendo a liberalização geral das trocas de produtos industriais e concessões no sector agrícola; a realização de esforços no sentido da progressiva integração noutros domínios (circulação de trabalhadores, direito de estabelecimento, fornecimento de serviços, circulação de capitais, concorrência, aproximação de legislações); o estabelecimento de cooperação entre as partes nos domínios económico, financeiro e cultural e o apoio da Comunidade ao desenvolvimento económico da Bulgária, designadamente, ao seu processo de transição para a economia de mercado.

Aplausos do PSD.

O Sr Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Poças Santos.

O Sr João Poças Santos (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A apreciação do acordo de associação entre as Comunidades Europeias e a República da Bulgária, para além das suas óbvias especificidades, insere-se num quadro mais vasto de relacionamento da União Europeia com as jovens democracias da Europa Central e Oriental.
Efectivamente, depois das mudanças profundas que se produziram naquela região, as relações da União com esses países, nomeadamente com a Bulgária, foram de início estabelecidas por acordos de comércio e cooperação, tendo sido, posteriormente, assinados acordos europeus de associação do tipo do que hoje analisamos.
Convém, neste particular, distinguir entre os acordos de primeira geração e os que se consubstanciam no modelo, dito, de associação.
Assim, os primeiros baseiam-se nos artigos 113.º, 235.º e 228.º do Tratado de Roma, os quais dão à Comunidade a responsabilidade da política comercial com países terceiros e a consequente competência para com eles assinar acordos comerciais. No que diz respeito ao caso búlgaro, tal acordo foi assinado em 24 de Setembro de 1990 e entrou em vigor em l de Novembro de 1990, levando, portanto, praticamente quatro anos de efectiva vigência e de bom relacionamento entre as partes.
Já os acordos chamados de segunda geração, como o que agora se aprova para ratificação, baseiam-se, ao invés, no artigo 238.º daquele Tratado, que atribui à Comunidade competências para assinar acordos de associação com Estados terceiros, os quais, para além da necessária concordância do Parlamento Europeu, têm de ser ratificados pelos Estados membros, nomeadamente através de aprovação parlamentar.
Quando, após décadas de isolamento compulsivo, a abertura política e económica da Bulgária o permitiu, a União formalizou as suas relações com este Estado por meio do supramencionado acordo bilateral de comércio e cooperação com uma base contratual abrangente.
Concomitantemente, o processo de reformas políticas e económicas iniciadas pelo povo e instituições búlgaras foi alvo de programas comunitários de apoio, designadamente através de facilidades mercantis, e de uma estreita cooperação em vários domínios.

O Sr. Mui Carp (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Esta política, que não se circunscreve ao caso vertente mas é comum a outros países nas mesmas circunstâncias políticas e geográficas, visa uma aproximação progressiva, mas segura, relativamente ao Espaço Económico Europeu. O presente acordo insere-se no desenvolvimento desse objectivo e pretende igualmente a criação de novas estruturas e instrumentos que aprofundem uma verdadeira parceria da União com esses países com o objectivo último de, a longo prazo, possibilitar a almejada adesão.
De facto, os acordos europeus constituem um meio de a União Europeia potenciar uma relação de confiança mútua, promovendo a estabilidade política, a consolidação das instituições democráticas e o crescimento económico. Do ponto de vista do destinatário principal - a Bulgária -, revestirá a forma de um adequado instrumento para que o período de transição que actualmente se vive seja aproveitado como uma oportunidade única no sentido do desenvolvimento e do bem-estar das populações, apesar das dificuldades de toda a ordem que se fazem sentir.
No seguimento da extinção do COMECON, no ano de 1991, o reenquadramento dos intercâmbios comerciais entre os seus antigos membros e entre estes e os demais agravou de modo significativo os, já de si, graves problemas económicos e financeiros, nomeadamente, pondo em evidência o carácter obsoleto de grande parte do seu tecido produtivo e padrões de consumo.
Este facto, aliado ao desmantelamento da União Soviética e à reunificação alemã, potenciou os anseios de um "regresso à Europa" que encontra como via privilegiada a aproximação à União Europeia e ao que esta representa em termos de qualidade de vida, de segurança e de paz.

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28 DE OUTUBRO DE 1994 163

O Sr. Rui Carp (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O acordo que a proposta de resolução n.º 73/VI apresenta e uma resposta - ténue, ainda, mas muito importante - a essas aspirações e a essa vontade política de construção europeia.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados Do ponto de vista de Portugal que, durante largos anos anteriores à adesão, beneficiou do estatuto de país associado à CEE. não pode deixar de se enunciar claramente a nossa solidariedade com a Bulgária e demais países da Europa Central e de Leste

O Sr. Rui Carp (PSD): - Muito bem!

O Orador: - De facto, não podem colher aqui quaisquer argumentos egoístas de que, nalguns sectores, estas economias podem ser concorrenciais com a do nosso país. As vantagens da paz e segurança europeias sobrelevam claramente sobre aquelas questões pontuais.
Por isso, não pode o Grupo Parlamentar do PSD deixar de dar, convictamente. o seu voto favorável à aprovação, para ratificação, do Acordo de Associação da República da Bulgária com a União Europeia e os seus Estados membros
Pela nossa parte, podemos dizer, bem ao jeito eslavo. Nema probleme!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr Joel Hasse Ferreira (PS)' - Sr. Presidente, Srs Membros do Governo, Srs. Deputados: É criada por este acordo uma associação entre as Comunidades Europeias e a Bulgária, a qual se engloba no âmbito do processo de redefinição e de reequilibro político, económico e mesmo cultural de todas as áreas e Estados situados entre as fronteiras da antiga CEE e da ex-União Soviética.
O abandono dos sistemas económicos de direcção central, a queda dos regimes políticos de partido único ou de pluralismo formal realmente controlado e hegemonizado por partido único permitiram o gradual retorno dos povos da Europa de Leste ao caminho democrático típico das nações da União Europeia
Impôs-se, então, a criação de mecanismos de coordenação e de articulação económica que ajudassem a consolidação dos regimes democráticos instaurados e permitissem a reestruturação dos tecidos económicos desses países de forma a poderem suportar o choque da integração europeia e beneficiarem, mesmo, com as sinergias criadas.
Entretanto, a situação de transição terá de ser pilotada e gerida. Os acordos de associação gizados, previstos para 10 anos, permitem, de certa forma, ultrapassar ou reduzir disparidades económicas e desenvolver a cooperação política entre a União Europeia e os Estados em causa.
Abre-se um caminho mais largo para que se consolide a ideia europeia, se expandam os mercados e se facilite a livre circulação de trabalhadores
A Bulgária é um Estado europeu, reconhecidamente integrado na cultura e no espaço geográfico da Europa, aberto ao diálogo com os vizinhos, ponte para a Turquia e para a outrora zona soviética - a área russo-ucraniana e as suas zonas envolventes. Constituindo uma ponte para o Leste, e bem-vinda neste processo de associação que permitirá à Comunidade/União Europeia compatibilizar o diálogo a leste com o processo de integração a norte e o aprofundamento das instituições existentes.
Neste acordo, trata-se de estabelecer um quadro evolutivo que apoie o desenvolvimento do comércio, reforce a cooperação industrial e agrícola, propugne a defesa do ambiente, dinamize a cooperação cultural e o desenvolvimento regional e coordene políticas económicas e monetárias, científicas e tecnológicas, educativas e de formação.
Neste contexto, será certamente árduo o trabalho de compatibilização das legislações, mas afigura-se indispensável quando se antevê que um processo como este de associação económica e cooperação em múltiplas áreas possa vir a desembocar, a um prazo largo, numa ulterior integração política, verificando-se oportunidade e condições adequadas.
Enquanto se desenvolvem estes acordos de associação, aproximando o conjunto União Europeia e Estados associados das fronteiras da Europa histórica e cultural, não podemos deixar de reflectir em que o processo de construção europeia, combatendo chauvinismos deslocados, buscando sucessivamente novas etapas de unidade económica e de integração política, gera uma realidade nova na história que, de tratado em tratado, de integração em integração, de associação em associação, contra alguns ventos e a favor de muitas marés, se vai afirmando no espírito, na prática e na vivência quotidiana dos cidadãos, das empresas, das instituições, dos países
A fronteira da Europa da União tem de ser estabelecida, para alem dos condicionalismos geográficos, com o critério do respeito pelos direitos humanos e pelo funcionamento democrático dos regimes Com a associação da Bulgária, que tem sido acompanhada ou ate precedida pela associação com outros países da Europa Central e de Leste, começa a visualizar-se com clareza uma vasta zona que permitirá antever um novo subespaço europeu, uma vasta região de centro-leste que, da Polónia à Bulgária, englobando Roménia, Hungria, Eslováquia e República Checa, eventualmente vindo a alargar-se aos Estados Bálticos, permitirá, tendo em conta a próxima integração já referendada popularmente da Finlândia e da Áustria, uma continuidade político-económica europeia a leste. Restará um problema que não e menor mas ultrapassa o âmbito desta intervenção, o da redefinição dos relacionamentos deste espaço, destes países, com a Rússia, a Bielorússia, a Ucrânia e a Moldávia, nomeadamente.
Por tudo o exposto e pela análise detalhada do texto do articulado, espelhada nos relatórios das comissões, julgamos que a Assembleia da República deve dar o seu voto favorável à ratificação do Acordo Europeu que Cria uma Associação entre as Comunidades Europeias e os seus Estados membros, por um lado. e a República da Bulgária, por outro, e respectivos Protocolos e Anexos
O voto favorável a este acordo de associação e um contributo significativo que devemos dar no caminho do reencontro dos países europeus com o seu próprio destino!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu). - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr Deputado Sousa Lara.

O Sr Sousa Lara (PSD): - Sr Presidente, Srs. Deputados: É-me particularmente grato, recordando especialmente a minha condição de Presidente do Grupo Parlamentar

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164 I SÉRIE - NÚMERO 5

de Amizade Portugal-Bulgária, apresentar perante VV. Ex.ªs alguma justificação política que funda a decisão favorável que o meu grupo parlamentar irá dar em momento oportuno, aprovando a proposta de resolução n.º 73/VI.
Em primeiro lugar, chamo à colação a referência feita por um, no relatório aprovado pela Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação, de ter o Acordo precedente em outros, celebrados com Estados do Centro e Leste europeu, considerados como sendo de segunda geração, como aqui já foi dito, por se não limitarem aos domínios da cooperação comercial, sobrepondo-lhe exigências de natureza política relativas ao respeito pelos direitos humanos e pelas comunidades minoritárias. Esta decisão envolve uma política decisiva pelo que cair numa burocratização destes actos, transformá-los numa espécie de rotina empobrecida no seu conteúdo político, é diminuí-los na sua grandeza e significado e - o que seria bem mais grave - nas perspectivas de futuro que abrem aos países da Europa oriental ora visados.
A União Europeia não pode fechar-se a Sul e Portugal tem aí um papel fundamental a desempenhar. Mas há que sublinhar que o mais premente desafio da Comunidade é constituído pelos países de Leste. Do nosso ponto de vista, seria um erro entender que as conquistas democráticas por eles alcançadas, e que justificam os acordos de supressão de vistos e de associação que temos aprovado constantemente, são irreversíveis e não carecem de esforço de maior por parte da Europa Ocidental. Longas décadas de ditadura deixam marcas nas pessoas e nas instituições que se esbatem mas que não se apagam imediatamente.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A Europa tem exigências que nós defendemos: democracia política, Estado de direito, economia de mercado, direitos do homem e das minorias e todo o património que lhes vem adjacente. Mas quem exige tem obrigações A par da Europa, da formação da riqueza, é preciso construir a Europa da solidariedade. É neste propósito que votaremos favoravelmente esta proposta de resolução.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Srs Deputados, não havendo mais inscrições, está encerrado o debate.
A próxima sessão plenária realiza-se amanhã, a partir das 10 horas, e constará de perguntas ao Governo.

Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 20 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD)

Alípio Barrosa Pereira Dias.
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto.
António de Carvalho Martins.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António Manuel Fernandes Alves.
António Maria Pereira.
Carlos Alberto Lopes Pereira.
Cecília Pita Catarino.
Cipriano Rodrigues Martins.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Filipe Manuel da Silva Abrem.
Francisco João Bernardino da Silva.
José Albino da Silva Peneda.
José Manuel Nunes Liberato.
José Pereira Lopes.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva.
Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.

Partido Socialista (PS):

António Alves Marques Júnior
António Poppe Lopes Cardoso.
Armando António Martins Vara
Carlos Manuel Natividade da Costa Candal.
Joaquim Américo Fialho Anastácio.
José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.

Partido Comunista Português (PCP):

António Manuel dos Santos Murteira.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Maria Odete dos Santos.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Manuel Tomas Cortez Rodrigues Queiró.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

André Valente Martins.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PSD).

Álvaro José Martins Viegas.
António José Caeiro da Motta Veiga
Eduardo Alfredo de Carvalho Pereira da Silva.
Fernando Monteiro do Amaral.
João Alberto Granja dos Santos Silva.
Luís António Martins.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira
Marília Dulce Coelho Pires Morgado Raimundo
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Vítor Pereira Crespo.

Partido Socialista (PS)

Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins.
João Cardona Gomes Cravinho.
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho.
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego.
José Manuel Marques da Silva Lemos.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Leonor Coutinho Pereira dos Santos.
Maria Teresa Dória Santa Clara Gomes.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.

Partido Comunista Português (PCP):

Luís Carlos Martins Peixoto.
Miguel Urbano Tavares Rodrigues.
Octávio Augusto Teixeira.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

José Luís Nogueira de Brito

aria da Conceição Seixas de Almeida.

Deputados independente.

João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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