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12 DE JANEIRO DE 1995 1107

Mas a vacuidade e a extensão ilimitada do n.º 2 do artigo 3.º centra-se em que a "matéria operacional é toda &,:informação, documento ou material que, embora não classificado, tenha por objecto o sistema ou o dispositivo das Forças Armadas e das forças de segurança", o que torna esta restrição um saco sem fundo, aberta ao arbítrio de uma indeterminabilidade do preceito que desnatura a extensão do direito constitucional de queixa ao Provedor de Justiça e as exigências do dever de cooperação.
Ademais, a fórmula proposta é, desde logo, confusa e, de duvidoso alcance.
No Colóquio Parlamentar sobre Justiça Militar a que já aludi, disse, a propósito deste artigo, Freitas do Amaral (e cito a acta do referido colóquio): "A meu ver, esta é uma fórmula vaga, difícil de interpretar e que, penso, haveria toda a vantagem em transformar numa fórmula clara para todos. 0 que é que se pretende dizer? Pretende-se dizer que o Provedor de Justiça não pode pedir informações, em matéria de Forças Armadas, senão ao Ministro da Defesa Nacional, que não pode ir pedi-las directamente aos Chefes de Estado-Maior ou até a oficiais de escalão inferior a estes últimos? Será isto o que se pretende dizer?" Ninguém sabe.
Acresce que as limitações ao dever de cooperação pelo filtro hierárquico do Ministro da Defesa Nacional não tem estrito carácter regulamentador e consubstancia uma alteração legal de especialidade que, manifestamente, subverte o genérico dever de cooperação de todos os órgãos e agentes da Administração Pública, autonomamente considerados.
Sr. Presidente, Sr. e Srs. Deputados: Direi, em conclusão, que a presente proposta de lei é uma tentativa de revogação ou de revisão inconstitucional do Estatuto do Provedor de Justiça, pondo em causa o seu carácter de independência, de informalidade e de liberdade de acção.
Com esta proposta, para aplicação no âmbito militar, todos ficam a perder: o Provedor de Justiça, que é mutilado inconstitucionalmente nas suas competências; os cidadãos militares, que vêem levantar-se um incidente de suspeição sempre que usem o direito de queixa, o que, na prática, o reduz à sua inexistência.
Fica a ganhar, finalmente, um vezo controleirista, arcaizante, corporativo e tutelar, a que o Ministro da Defesa Nacional dá a sua chancela final. Esta proposta de lei de seis artigos é confusa, em tudo o que não é confusa nem inconstitucional é inútil e em tudo o que não é inútil é inconstitucional. Esta proposta de lei não faz falta ao Estado de direito democrático.

Aplausos do PS.

0 Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Correia de Jesus.

0 Sr. Correia de Jesus (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: A Assembleia da República e o Governo, num magnífico exemplo de cooperação institucional, têm vindo a dotar o País com as leis de que este carece em matéria de defesa nacional e Forças Armadas.
No início desta minha intervenção não posso deixar de repudiar as intenções que aqui têm sido atribuídas ao Governo pelos oradores que me antecederam, por tomar esta iniciativa legislativa.
Na verdade, com a apresentação da proposta de lei n.º 89/VI, o Governo dá cumprimento ao disposto no n.º 3 do artigo 33.º da Lei de Defesa Nacional e das Forças Armadas.
Ao tomar tal iniciativa, o Governo não só dá expressão a imperativos do nosso ordenamento jurídico, mas também acentua a sua preocupação humanista de regular, por forma clara e inequívoca, o exercício do direito de queixa que assiste aos elementos das Forças Armadas em face da violação de direitos, liberdades e garantias, bem como a explicitação dos seus limites.
0 artigo 1.º da proposta de lei reafirma o direito de todos os cidadãos poderem apresentar queixa ao Provedor de Justiça por acções ou omissões dos poderes públicos responsáveis pelas Forças Armadas de que tenham resultado, nomeadamente - e sublinho a palavra "nomeadamente" -, a violação dos seus direitos, liberdades e garantias ou prejuízo que os afecte.
Estamos perante uma formulação universal do direito de queixa oponível aos poderes públicos responsáveis pelas Forças Armadas, direito irrestrito quanto ao seu objecto já que, nos termos da proposta, o mesmo passa a poder ser exercido em relação a quaisquer actos ou omissões.
Atentas as especificidades da defesa nacional e das Forças Armadas, em termos axiológicos e organizacionais, a proposta estabelece, no seu artigo 2.º, que o direito de queixa só pode ser exercido por militares ou agentes militarizados das Forças Armadas depois de esgotadas as vias hierárquicas estabelecidas na lei.
E, para evitar qualquer incerteza ou dilação no exercício do referido direito de queixa, o mesmo artigo dispõe sobre quando se consideram esgotadas as vias hierárquicas e estabelece prazos curtos para o indeferimento tácito e para a preclusão do poder-dever da autoridade recorrida se pronunciar.
Atentos os mesmos valores e interesses, a proposta, no seu artigo 3.º, exclui do objecto da queixa a matéria operacional ou classificada, tendo o cuidado de definir uma e outra.
Por motivos óbvios, a delimitação material constante do artigo 3.º aplica-se não só a todos os militares no activo mas também aos que se encontram na situação de reserva, fora do serviço efectivo ou na situação de reforma, e aos agentes militarizados das Forças Armadas que estejam na situação de reforma.
No que toca à intervenção do Provedor de Justiça em matéria de defesa nacional e das Forças Armadas, o artigo 6.º da proposta de lei estabelece que a recolha de elementos e de informações será feita através do Ministro da Defesa Nacional, com o que se pretende acautelar a eficácia no fornecimento de tais elementos e informações, bem como a unidade de direcção em relação às forças, unidades, estabelecimentos, órgãos ou serviços militares dependentes do Ministério da Defesa Nacional.
Os dispositivos constantes da presente proposta de lei desenvolvem, pois, as matérias enunciadas no artigo 33.º da Lei de Defesa Nacional e das Forças Armadas e constituem normas, especiais em relação às normas gerais do Estatuto do Provedor de Justiça, o que equivale a dizer que, fora do âmbito da presente proposta, se aplicam as disposições da Lei n.º 9/91, de 9 de Abril, correspondente àquele estatuto.
Não se trata de reduzir ou de limitar os poderes do Provedor de Justiça, trata-se de harmonizar a legislação ordinária com a Constituição da República.
Se é certo que esta prevê, no seu artigo 23.º, a figura do Provedor de Justiça com o estatuto que aí se consagra, não é menos certo que dedica o seu Título X à defesa nacional e daí faz decorrer importantes consequências em matéria de actuação dos poderes públicos responsáveis pela defesa nacional e Forças Armadas, bem como dos elementos que as integram.
Foi tendo em conta tudo isso que o Governo apresentou a presente proposta de lei.

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