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1168 I SÉRIE - NÚMERO 32

as feridas de duas conflagrações mundiais e do esboroamento dos impérios;
o progresso continuado do bem-estar e da qualidade de vida dos europeus, em cerca de cinco décadas de experiência comunitária;
a constituição de um grande mercado interno que, sendo objectivo de dimensão essencialmente económica, tem uma relevância política inquestionável e foi motor do progresso, sobretudo na segunda metade dos anos 80;
uma capacidade de relações externas, que se revela na maior rede de acordos de cooperação e de comércio com todas as regiões do mundo, dando expressão a uma influência internacional de grande projecção;
um progressivo alargamento do número de Estados-membros, que começou com seis, em 1957, e atinge, hoje, 15, colocando a União Europeia com 370 milhões de habitantes e com fronteiras que vão do Atlântico até à Rússia e da região Ártica até ao Mar Egeu;
uma solidariedade reforçada entre os Estados, designadamente por via da concepção e aplicação do princípio da coesão económica e social;
a consagração da cidadania europeia, com importantes novos direitos;
uma União Económica e Monetária, definida em termos realistas em plena segunda fase de transição;
uma cooperação reforçada, a nível da justiça e dos assuntos internos, que visa garantir o espaço sem fronteiras, sem quebra na segurança e liberdade dos cidadãos.
Mas, do outro lado da realidade europeia, não podemos deixar também de dar relevo aos seguintes aspectos:
a relativa saturação do modelo económico dominante até agora, em particular no que se refere à criação de empregos (17 milhões de desempregados na União Europeia);
a manutenção de segmentos populacionais significativos ainda marginalizados pelo progresso ou, pior ainda, verdadeiramente excluídos (recorde-se que 53 milhões de cidadãos da União Europeia se encontram no limiar da pobreza e provavelmente cerca de 5 milhões estão alojados de forma precária e sem condições),
a instabilidade política vivida nos Balcãs e no Cáucaso, situação ainda mais amarga quando se assiste a alguma debilidade da União Europeia para promover soluções que garantam a paz efectiva e duradoura, nomeadamente na Bósnia Herzegovina;
a pressão migratória sobre a União Europeia, proveniente do Leste, mas também do Sul, suscitando graves problemas de integração social e de segurança;
a aleatoriedade da situação na federação russa, onde se sabe com segurança que o comunismo faliu, mas onde todas as dúvidas se legitimam e se reforçam cada dia que passa sobre a futura fisionomia política e o perfil sócio-económico desse imenso país europeu que integra tantas contradições,
a vulnerabilidade da fronteira Sul, submetida a grande pressão migratória e às ameaças do fundamentalismo islâmico;
a difícil consolidação das democracias e das economias de mercado nos países do Centro e Leste europeu, vítimas de décadas de opressão totalitária, que deixaram estigmas profundos nas administrações, nas mentalidades e nos hábitos;
a perplexidade dos europeus perante a questão da sua segurança, pois, sem inimigo identificado, a Europa tem revelado dificuldades em organizar-se, com estabilidade e eficácia, para assumir nas suas mãos a sua própria defesa e segurança.
É nesta realidade que Portugal se move, naturalmente tirando partido das vantagens e benefícios do processo de integração europeia, mas partilhando também as suas dificuldades e desafios.
É com estas realidades que podemos e devemos perspectivar o futuro do continente europeu. E, já em 1996, os Quinze enfrentarão um grande momento negocial, quando derem início à Conferência Intergovernamental que vai rever o Tratado da União Europeia. Não nos podemos iludir quanto à dimensão e significado dessa tarefa. Será essa, provavelmente, a mais complexa e difícil negociação alguma vez enfrentada nestas cinco décadas de integração europeia.
É também a esta luz que os trabalhos desenvolvidos e a desenvolver pela Assembleia da República serão certamente contributos preciosos para apoiar o esforço negocial que caberá ao Governo conduzir, em sede dessa Conferência. E serão também factor importante para mobilizar os cidadãos para as questões que, cada vez mais, tocam os seus interesses fundamentais. Jogando-se o futuro da Europa, está inquestionavelmente a jogar-se também o futuro de Portugal.
0 trabalho de reflexão e de debate não deve, contudo, antecipar as negociações que têm o seu calendário e o seu quadro bem identificados. E devemos, por isso mesmo, resguardar-nos dos excessos de zelo, das armadilhas dogmáticas que alguns doutrinadores menos escrupulosos vão lançando. 15to é, há que reflectir, há que debater e há que encontrar novas respostas para questões cruciais da sociedade europeia, mas há que evitar querelas artificiais, que diminuam a nossa capacidade negocial e nos fragilizem no plano externo. E há, sobretudo, que evitar "correr atrás de foguetes", que, produzindo embora vistosa luminosidade, são efémeros e nos desviam da essência das grandes questões.
É neste espírito que tentarei identificar algumas ideias que me parecem básicas como orientação para as próximas etapas do processo de integração europeia.
Em primeiro lugar, permitam-me que enfatize o aspecto que considero mais importante para garantir qualquer perspectiva futura à União Europeia: a confiança entre os Estados.
Não há processo de integração que resista a um clima de desconfiança entre os parceiros. Mas a confiança não é um dogma indiscutível, nem resulta apenas da letra dos tratados. A confiança entre Estados, como bem sabemos, conquista-se pela prática efectiva de uma colaboração que cimenta nos povos a convicção de que partilham, sem ambiguidades, o mesmo projecto e prosseguem, sem desvios, um interesse que é comum.
0 sucesso da integração europeia tem muito a ver com este clima de confiança que os seus pioneiros souberam consolidar, até pela via, que não deve subestimar-se, da amizade pessoal entre os seus líderes.
A confiança assenta em algumas premissas e princípios, que são a base de qualquer sistema de integração: em primeiro lugar, a capacidade política e institucional de definir o interesse comum, nunca passível de redução ao somatório dos interesses das partes; em segundo lugar, a igualdade dos Estados enquanto parceiros soberanos, partilhando livremente um projecto comum e participando por inteiro na arquitectura das decisões; em terceiro lugar, o respeito pelas identidades nacionais, entendidas num quadro de saudável diversidade cultural, preservando sempre os valores fundamentais associados à história, à língua, à cultura e à tradição de um determinado espaço nacional, e, em quarto lugar, o direito de "cidadania", traduzido por incapacidade de controlo democrático do processo de decisão e, também, por uma visão mais abrangente do lugar que cabe ao cidadão no movimento de integração, às vezes infelizmente relegado para o simples papel de consumidor.

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