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22 DE JUNHO DE 1995 3041

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Em Portugal, não têm sido tomadas medidas sérias e o tráfico de influência não tem encontrado pela frente dificuldades Ao lermos o relatório Nolan ou o relatório Rosés, verificamos a que distância nos encontramos de outros países democráticos que tem levado a sério o combate a este tipo de fenómenos.
Mais do que isso: na concretização da autorização legislativa que lhe foi concedida, o Governo divergiu intencionalmente da solução nela prevista quanto ao tráfico de influência, infringindo o seu alcance e comprometendo a sua eficácia.
O Governo quis que fosse bem mais difícil, em Portugal - do que, por exemplo, em França, que reviu recentemente o seu Código Penal -, que alguém pudesse ser condenado por tráfico de influência.

O Sr. José Vera Jardim (PS): - É bem verdade!

O Orador: - Sr. Presidente e Srs. Deputado, não é a moldura penal que está em causa; é o próprio alcance prático da incriminação.
Não silenciamos. Opomo-nos. E com a presente iniciativa pretendemos que esta postura mais laxista em relação ao fenómeno, que foi vertida na redacção governamental, seja substituída por outra que não só não nos deixe aquém das próprias referências do direito comparado como assegure virtualidades práticas e não meramente simbólicas à incriminação.
Nós não quisemos apenas mais um crime para, enfeitar o Código Penal. Queremos que o tráfico de influência seja realmente punível e punido na sociedade portuguesa e que isso fique claro no espírito de todos os traficantes e candidatos a traficantes de influência, qualquer que seja o círculo onde operem Estado, regiões, autarquias.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Mas uma coisa deve ficar clara: O que nós queremos, com esta iniciativa, não é alargar o âmbito da incriminação constante da autorização legislativa, que, neste ponto, defendemos e a que obviamente demos o nosso voto além do nosso impulso, na anterior sessão legislativa.
Queremos pôr termo à inaceitável operação de despenalização, melhor, de descriminalização, que se traduziu no afastamento intencional do decreto-lei que, reviu o Código Penal em relação à autorização e a infringiu em vários aspectos relevantes. Queremos retomar os precisos contornos da solução de incriminação que impulsionámos e que foi votada, há um ano, no Parlamento, pelo PS, pelo PSD e pelo PCP.
Por isso, nos voltamos para a bancada da .maioria e perguntamos- mantêm a redacção correcta, e apoiada no direito comparado, que votaram connosco em Junho de 1994 - e cuja versão final se ficou, aliás, a dever à competência da Sr.ª Deputada Margarida Silva Pereira -, ou acompanham a infracção governamental ao que foi aqui concebido, redigido e aprovado?

Aplausos do PS.

O caso tem ainda implicações mais sérias, porque a fornia como está concebido o artigo do Código Penal revisto, que consagra o crime de tráfico de influência, pressupondo valorações distintas e contrapostas às da autorização legislativa, torna aquela norma ferida de inconstitucionalidade.
Se a maioria não emendar a mão e não reconduzir agora a solução à sede e aos parâmetros de lei da Assembleia, tornar-se-á responsável por que ninguém possa afinal ser realmente punido pelo crime de tráfico de influência em Portugal: bastará que o arguido invoque o vício de inconstitucionalidade, introduzido pelo Governo.
Sendo a divergência claramente intencional, pode, aliás, perguntar-se se não terá sido esse o efeito pretendido pelo Governo, ao divergir da Assembleia.
Terá sido a impunidade prática do tráfico de influência que Cavaco Silva, Laborinho Lúcio e Fernando Nogueira, afinal, quiseram? É indispensável que, sobre este ponto, não subsistam dúvidas

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Como lucidamente se sugere no parecer aprovado pela Comissão, a delimitação entre tráfico de influência, censurável e punível, e área legitimável de lobbying, ou de profissão legitimada, corresponde a uma exigência que, não sendo nova, adquire, a partir de agora, maior acuidade. É, por isso, necessário sublinhar que o tráfico incriminado, tal como a corrupção, se caracteriza por operar num mercado oculto - um mercado de influência sobre a decisão pública, que se desenvolve e se organiza em vista da sua própria subtracção ao conhecimento público. O que for lícito, em matéria de lobbying - e nem tudo obviamente o poderá ser -, há-de obedecer necessariamente, como aliás acontece noutros países, a parâmetros de publicidade e, desejavelmente, a regulamentação estrita, a controlos e registos acessíveis ao público.

O Sr. José Vera Jardim (PS) - Muito bem!

O Orador: - Como alguém já escreveu, o tráfico de influência configura-se como um verdadeiro mercado negro, que se organiza em torno do acesso ao Estado, em violação frontal das exigências de igualdade, imparcialidade e publicidade, que integram o núcleo essencial do Estado de Direito democrático.
Ou seja: tanto no tráfico como na corrupção, estão em causa transacções que se situam numa espécie de mercado político oculto, paralelo ao «mercado oficial» do jogo democrático, onde a influência sobre o comportamento da Administração Pública é venalizada e trocada por benefícios tangíveis, agredindo a igualdade de acesso ao processo de decisão pública que é prometida pelo Estado de Direito.
Em democracia, uma e outro tem a esperada e intolerável consequência de dar a alguns, indivíduos, sociedades ou pessoas, recursos de acesso e influência no processo de decisão pública superiores aos que lhe seriam assegurados por um exercício aberto e conforme às leis. Daí que sejam, neste sentido, verdadeiros crimes contra a realização do Estado de Direito democrático.
Para além das alterações propostas no domínio da incriminação e punição do tráfico de influência- onde propomos que seja expressamente contemplado o abuso de função pública ou partidária e o uso de profissão para cobertura de actos de tráfico -, avançamos também neste projecto para a criação de um crime autónomo de «participação em empresa», que mantém uma relação de proximidade e proporcionalidade com a actual «participação em negócio», a que sistematicamente poderá e deverá ser associada, após aprovação na generalidade.

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